Lucidez versus Conhecimento

[dropcap]A[/dropcap] escritora alemã Clara Casper Krieger publicou em 1977 um ensaio sobre o acto de escrever, «A Arte da Previsão», que rapidamente se tornou um clássico entre as minorias de leitores de vários países. Leia-se à página 16: «Escrever, para mim, por um lado aproxima-se da filosofia: iluminar o que não se sabe, que mantemos escondido de nós ou nem suspeitávamos que nos rondava. Assemelha-se à apresentação de fantasmas. Escrever é apresentar aos outros, e antes de mais a nós mesmos, fantasmas, corpos invisíveis que nos rondam, que pressentimos, um para além da apresentação. Apresentar aquilo que não há, mas que existe. Por outro lado, escrever separa-se claramente da filosofia porque não traça um mapa de conhecimento para chegar a iluminar esse desconhecido que apresenta. O mapa que traço é ele mesmo desenhado a desconhecido e vou apagando os vestígios do que possa conhecer. Escondo o mais que posso o conhecido, para que o desconhecido possa brilhar melhor. Não se escreve com o que se sabe. Aquilo que se sabe é para esconder, para ser alicerce do desconhecido que queremos mostrar. Quem quer mostrar conhecimento, sabe bem que deve dedicar-se à ciência ou à filosofia. Por isso, há sempre mais acções de uma personagem do que aquelas que mostro. Há sempre mais que eu sei acerca das personagens do que escrevo. Não se trata, claro, de um saber teórico, mas de factos, como saber quantas colheres de açúcar põe no café ou até se prefere chá a café. São dados que tenho acerca da personagem, mas que não vejo interesse nenhum em revelar. Aliás, as minhas personagens são construídas em torno de uma tentativa de fuga do quotidiano ou da angústia de depararem-se com a impossibilidade de escaparem dele.» Aqui, os leitores de Clara Krieger rapidamente se lembram de Anna, a protagonista do romance «A Máquina de Lavar», que fazia psicanálise desde os seus 21 anos (tinha 39), porque não conseguia aceitar a sua necessidade de vida social. Anna tinha vergonha de gostar de estar com os outros. Mais: tinha vergonha de ter vontade de estar com outras pessoas. Há anos que tentava, em vão, livrar-se, não da vergonha, mas da necessidade de vida social. Ambicionava conseguir um dia libertar-se dessa necessidade, pois estava convencida de que isso seria o início de conseguir libertar-se de todas as coisas mais comezinhas da vida.

Anna não apenas tenta fugir do quotidiano como se confronta com a sua impossibilidade. O romance é impressionante, como sabem todos aqueles que o leram. Regressando ao ensaio de Clara Krieger, escreve:

«Escrever não é apenas fazer contas fictícias, contas entre a possibilidade e o sonho, é acima de tudo fazer contas acerca do medo que temos de não saber. A escrita não se aproxima da descrição do que é o mundo, não trata do que vê. A escrita aproxima-se da experiência de tentar explicar a um surdo o que é a música, explicar as cores a um cego. Porque escrever um sentimento ou um pensamento é precisamente isso. A escrita que não tente alargar impossíveis pode existir, mas não me interessa.»

E como não lembrar aqui, nós leitores dos romances de Clara Casper Krieger, da personagem de «A Pintora», Julia Scholz, que não reconhecia as cores, as confundia. O livro passa-se todo na cabeça, nos pensamentos de Julia, e a um dado momento lemos: «Para inventar cores e formas não preciso de saber se é verde ou vermelho.»

A escritora alemã faz assim, no seu ensaio, um exame sobre o que é para si o acto de escrever, uma espécie de «ars poetica», o que faz com os seus leitores estejam ao mesmo tempo a lembrar os seus romances, à medida que avança nas páginas do ensaio. Se a citação anterior do ensaio nos levou para aquela frase e para a Julia de «A Pintora», muito mais nos leva a citação seguinte, pois aquilo que a escritora diz acerca da escrita poderia – e foi dito – ter sido dito pela pintora, se trocarmos escrever por pintar. Leia-se: «O que me move a escrever é não ter a mínima ideia do que me leva a escrever. Ou o que move um humano a casar-se e a ter filhos sem perguntar seriamente por que o faz, mas aceita viver daquela maneira como se tivesse de ser, como se casar e ter filhos fosse como a rotação da Terra, as estações do ano ou beber água. O que me move a escrever é não saber o que é isto de ser humano, embora conviva com eles há décadas e seja uma ínfima parte do conjunto da totalidade deles. O pior dos pecados é julgar que se sabe. Os gregos antigos sabiam bem disso, se bem que não tivessem a palavra pecado. Não sabemos nada. Sabemos transformar tempo em dinheiro, pelo menos alguns sabem, e trocar uma lâmpada do tecto da sala.»

A meio do livro, Clara Krieger cita um poeta alemão seu contemporâneo e seu amigo, Hans Magnus Enzensberger, e cita estes versos do livro «Mausoléu», a propósito de um poema sobre o primeiro antropólogo moderno, o espanhol quinhentista Bernardino de Sahúgun e o livro «Descrição de Todas as Coisas da Nova Espanha», para explicar aquilo que a autora chama de lucidez: «“[…] O que lhe interessa de facto / nelas (logo em nós) não é o que se pode comparar, / mas aquilo que não compreende. // Uma ciência que vê o ser humano / como qualquer coisa de diferente. É o incompreensível / que mete medo, e é a única esperança.” Enzensberger dialogando com esse longínquo primeiro antropólogo, apropria-se da experiência dele para mostrar o que é o mister do poeta: “A caverna / Ali estende-se, ali torna-se longa e funda, / abre-se, estreita. É um lugar apertado, um lugar de angústia. Ali é intransitável, áspera. É um lugar terrível, um lugar de morte, um lugar de trevas. Ali é sombria, / escura. A sua boca está escancarada, fauces abertas. / Fauces largas, fauces estreitas. / Eu vou ficar na caverna. / Entro. Estou aqui. Estou na caverna.” A comparação entre escrever e estar isolado numa caverna não é difícil de entender, assim como a comparação que faz da escrita um lugar de morte, de trevas. Porque a escrita é como a noite, sombria, escura, traz à flor branca do papel os nossos maiores medos, os maiores temores. Escrever é adentrar a noite, habitar a noite da caverna. Desencantar todos os nossos medos, fantasmas. Também Kafka compreendeu bem este paradoxo da escrita, esta necessidade de excesso de escuro de modo a iluminar o que não se vê, quando escreveu: “Já muitas vezes pensei que, para mim, a melhor maneira de viver seria estar com utensílios para escrever e um candeeiro na divisão mais interior de uma cave fechada.” Enzensberger termina o seu poema com os seguintes versos: “e não se pode pôr um pé na terra do México / sem pisar o cadáver de um índio. // O massacre ‘em si, até se compreende’. / Tudo previsível, de fio a pavio / de cabo a rabo / pela segunda natureza, pela ganância / e o zelo – ordens, não é? Entendemo-nos todos / muito bem, pela situação de classe e economia. / Se a expressão ‘Um mundo diferente’ significa alguma coisa, / então significa qualquer coisa que não podemos prever.” No acto de escrever, o que é único, diferente, é a lucidez com que ilumina o que é a vida, de uma forma muito singular. Lucidez não é o mesmo que conhecimento, não é o mesmo que saber. Lucidez é ver sem conseguir explicar, ver sem saber. Nunca devemos escrever como quem sabe, mas como quem tem visões, como quem alucina. Devemos escrever como um profeta, não como um filósofo. Curiosamente, é isto a lucidez.»

E uma vez mais somos convocados pela memória para um romance de Clara Krieger. O livro não pretende verdades, mas antes, como diz o título, «previsões».

Perpetuum mobile

[dropcap]E[/dropcap]ntre 1926 e 1939, ainda na União Soviética, Béla Bartók compôs 153 peças progressivas para piano, em seis volumes, uma colecção famosa intitulada Mikrokosmos, organizada por ordem de dificuldade e destinada principalmente ao estudante de piano. Mikrokosmos, Sz. 107, publicada em 1940, é um dos marcos no repertório pedagógico do piano mas, no entanto, é muito mais do que um manual de piano “clássico”. As peças envolvem não apenas os aspectos técnicos da execução do instrumento, mas também os fundamentos da composição – como em “Ostinato”, “Variações livres” e “Imitação e inversão”, técnica composicional e ideias programáticas como em “Do diário de uma mosca” ou a famosa “Seis danças em ritmo búlgaro”, peças que formam a conclusão apaixonada desta obra única.

As peças progridem de estudos para iniciantes muito fáceis e simples a exibições técnicas avançadas muito difíceis, que são hoje em dia usadas na pedagogia moderna de piano. Segundo Bartók, a obra “surge como uma síntese de todos os problemas musicais e técnicos que foram tratados e em alguns casos apenas parcialmente resolvidos nas obras para piano anteriores “. Os Volumes 1 e 2 são dedicados ao seu filho, Peter, enquanto os Volumes 5 e 6 são concebidos como peças de concerto executáveis ​​profissionalmente.

Bartók indicou que essas peças também poderiam ser tocadas noutros instrumentos; a cravista Huguette Dreyfus, por exemplo, gravou peças dos Volumes 3 a 6 num cravo.

Este trabalho está em linha com outras obras didácticas de compositores pedagógicos como Pyotr Ilyich Tchaikovsky, Dmitri Kabalevsky e Sergei Prokofiev. Algumas peças são homenagens directas a teclistas, incluindo Robert Schumann, Johann Sebastian Bach e François Couperin. Outras são inspiradas na música folclórica, são estudos de ritmo ou de técnica pianística. No prefácio, o próprio Béla Bartók recomenda que os alunos pianistas não se contentem em aprender o instrumento tocando apenas as peças de seus Mikrokosmos, mas sugere também abordar os famosos Estudos de Carl Czerny, ou o Pequeno Livro de Anna Magdalena Bach, de Johann Sebastian Bach. Assim, a colecção educativa de Bartók não deve ser considerada como um método de piano, mas sim como uma colecção complementar às peças técnicas tradicionais.

Em 1940, pouco antes de emigrar para os Estados Unidos, a fim de aumentar o repertório que podia tocar com a sua mulher, Ditta Pásztory-Bartók, o compositor arranjou sete das peças de Mikrokosmos para dois pianos, intitulando-as Sete Peças de Mikrokosmos. Perpetuum Mobile , do Volume 5 de Mikrokosmos, e o número três do conjunto, é uma das obras mais exigentes da colecção, usando a peça anterior, Estudos em Notas Duplas, como trampolim de inspiração, principalmente nos seus aspectos rítmicos. No entanto, há trabalhos ainda mais difíceis à frente no Volume 6, o último livro de Mikrokosmos.

Perpetuum Mobile abre com um ritmo motriz que é a fonte do material temático. Motórico e implacável, adquire maior intensidade na subida e torna-se mais calmo à medida que desce no teclado. A música repete-se e incha, contrai-se e fica mais suave, sempre, porém, parecendo inquieta e nervosa.

 

Sugestão de audição:
Béla Bartók: Perpetuum mobile, de Mikrokosmos, Sz. 107
3 Pianos, Bernardo Sassetti, Mário Laginha, Pedro Burmester – Sony, 2007

Pearl Horizon | Polytex desiste de pedido de indemnização de 25 mil milhões

Kou Meng Pok, ex-presidente da defunta União dos Proprietários do Pearl Horizon, elogia a decisão, por considerar que numa fase de pandemia o mais importante é evitar assuntos que ameacem a estabilidade social

 

[dropcap]A[/dropcap] Polytex abdicou do pedido de indemnização em que exigia 25 mil milhões de patacas Governo. Este era o montante que a empresa pretendia receber por “prejuízos”, “lucros cessantes” e “danos morais”, relacionados com a recuperação pelo Executivo do terreno onde estava a ser construído o empreendimento Pearl Horizon.

A informação da desistência foi divulgada pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância, no domingo à noite, e terá entrado no tribunal a 11 de Setembro. Como não teve oposição do Ministério Público acabou por tornar-se definitivo. No entanto, não foram reveladas as razões que levaram o grupo a tomar esta posição.

A desistência recebeu elogios de Kou Meng Pok, ex-presidente da União dos Proprietários do Pearl Horizon, que desde 2015 lutava pelos direitos das pessoas que, como ele, pagaram, mas nunca receberam as respectivas casas.

“Já passaram muitos anos e o ambiente mudou muito, principalmente com a pandemia. Se esta decisão contribuir para manter a tranquilidade social não me parece negativa”, afirmou Kou Meng Pok, ao HM. “Não sei qual é a justificação da Polytex, mas como residente local sinto que é uma boa decisão porque permite às pessoas recuperem a tranquilidade”, acrescentou.

Kou Meng Pok revelou ainda ter dissolvido a associação União dos Proprietários do Pearl Horizon. “Durante muitos anos fui torturado com o assunto, porque também sou uma vítima e perdi a minha fracção. Só que já não penso mais nisto”, começou por desabafar. “As coisas não correram como queríamos. Defendíamos que as compensações deviam ser pagas de acordo com as áreas das fracções, mas o destino quis que a resolução fosse diferente e só temos de aceitar”, sublinhou.

A União dos Proprietários do Pearl Horizon foi assim dissolvida e o valor das quotas acumulado, de 125 mil patacas, foi entregue ao centro “A Madrugada”, que apoia pessoas com deficiência mental e que está subordinado à Associação dos Familiares Encarregados dos Deficientes Mentais de Macau.

Primado da estabilidade

Larry So, politólogo, acredita que a decisão terá sido tomada por motivações políticas, principalmente quando não são apresentadas justificações. “Estamos a falar de uma companhia que tem outros projectos e que quer continuar a investir em Macau. Se continuassem com a acção iam colocar-se numa posição de confronto com o Governo, que no futuro até poderia prejudicá-los”, explicou So. “Esta decisão aponta que eles acreditam que é melhor resolver o assunto longe dos tribunais, mais nos bastidores”, acrescentou.

Larry So sublinhou ainda que a situação financeira em tempo de covid-19 faz com que a prioridade do Governo passe pela estabilidade social. A Polytex terá percebido que caso vencesse a acção haveria uma reacção negativa forte. “Seria muito difícil para as pessoas aceitarem que uma empresa vista como especuladora e incapaz de cumprir os seus contratos fosse compensada, principalmente numa altura de dificuldades financeiras”, apontou. “E a empresa terá compreendido esse aspecto, assim como o facto de o Governo também não querer mais factores de instabilidade política”, concluiu.

Justiça | TSI mantém decisão que retira licença a falsa psicóloga 

[dropcap]O[/dropcap] Tribunal de Segunda Instância (TSI) rejeitou o recurso apresentado por uma mulher a quem foi atribuída licença como psicóloga, mas que não possui competências profissionais para exercer. O caso remonta a 26 de Abril de 2012, quando a mulher apresentou junto dos Serviços de Saúde de Macau (SSM) o pedido de licenciamento para o exercício da actividade de terapeuta (psicoterapia), que foi autorizado no dia 26 de Outubro desse ano. No entanto, a 12 de Novembro de 2015, o Comissariado contra a Corrupção (CCAC) contactou os SSM “alegando que descobrira que fora concedida a habilitação de psicólogo a um indivíduo munido da carta magistral de ciências de educação, em vez da carta magistral de psicologia clínica”.

O CCAC exigiu que os SSM “explicassem os fundamentos e os motivos da habilitação desse indivíduo como psicólogo”. Os SSM perceberam depois que a pessoa indicada pelo CCAC era a mulher que tinha feito o pedido de licenciamento da sua actividade. “Por lapso de raciocínio sobre o certificado de estágio apresentado por A, [os SSM] entenderam erradamente que esta satisfizera as condições de habilitação como psicóloga”.

A mulher perdeu a licença a 31 de Outubro de 2016, uma vez que os SSM entenderam que esta “não reunia os requisitos”. No entanto, esta recorreu para o Tribunal Administrativo, que acabou por negar o recurso. O TSI veio agora confirmar essa decisão.

Arranca hoje consulta pública de casas para a “classe sanduíche”

O lançamento de uma nova opção para a compra de casa no território está em cima da mesa, mas o plano de habitação para a “classe sanduíche” apresentado ontem deixa várias opções em aberto. O custo vai ter em conta o preço da habitação praticado no mercado privado das zonas em redor

 

[dropcap]A[/dropcap]rranca hoje a consulta pública sobre o plano de habitação para a chamada “classe sanduíche”, que decorre até 11 de Dezembro. Este tipo de habitação é definido como sendo “de natureza privada, com melhores áreas e melhores condições do que as da habitação económica, com um preço de venda superior ao da habitação económica, mas inferior ao da habitação privada, e que pode entrar no mercado de habitação decorrido o prazo fixado”. Mas quase tudo está por definir, desde os moldes de acesso à compra das casas, à própria definição de classe sanduíche.

No documento de consulta explica-se que o preço vai ser definido aplicando uma percentagem de desconto sobre o preço da habitação praticado no mercado privado das zonas em redor, mas não são avançadas hipóteses. O director substituto dos Serviços de Estudo de Políticas e Desenvolvimento Regional, Ung Hoi Ian, remeteu a fixação do preço para uma fase posterior.

O limite mínimo do rendimento mensal sugerido para candidatura ao novo tipo de habitação varia entre 19.455 e 38.910 patacas para um agregado familiar de uma pessoa. Já o limite máximo é entre 10 a 20 por cento superior ao da económica, ou seja, entre 42.801 e 46.692 patacas para um agregado familiar de uma pessoa.

As incertezas alargam-se à forma de aquisição das casas, sem decisão ainda sobre sorteio ou ordenação com base em pontos. E no que toca à revenda das casas, são dadas como hipóteses prazos de 8 a 10 anos, ou de 16 anos.

Nas restrições às candidaturas, o público pode seleccionar entre todos os membros da família serem residentes permanentes, ou essa exigência ser feita apenas ao candidato e metade dos elementos do agregado. São ainda dadas várias opções sobre a possibilidade de o candidato e elementos do agregado familiar serem ou terem sido proprietários de imóveis. A idade é dos poucos pontos em que o Governo apresenta apenas uma sugestão: que um candidato individual tenha 23 anos, podendo ter apenas 18 se concorrer com o agregado familiar.

Ser ou não ser

“Já conseguimos ter um sistema estável quanto à oferta de habitação social”, disse Ung Hoi Ian, ressalvando que ainda há “falta” na habitação económica. Porém, destacou que a reserva de terrenos aumentou. Espaço esse que o documento refere garantir terrenos destinados à optimização de infraestruturas e à construção de habitações.

Por outro lado, o documento de consulta inclui duas hipóteses sobre a definição de “classe sanduíche”. Uma delas entende que são os residentes com rendimentos que ultrapassam o limite estipulado para a candidatura à habitação económica ou que se encontram no fim da lista de espera para esse tipo de fracções, e que não conseguem acompanhar a subida de preços no mercado privado de habitação. É-lhe apontada a vantagem de aliviar a pressão da procura de habitação económica, mas o risco de sobreposição de candidaturas a fracções das duas categorias.

Outra opção, é defini-la apenas como os residentes com rendimentos que ultrapassam o limite fixado para a habitação económica, mas que não conseguem acompanhar a subida de preços no privado.

FAOM | Cheque pecuniário mantém-se, mas com “ajustamentos”

Ho Iat Seng, Chefe do Executivo, assegurou aos representantes da Federação das Associações dos Operários de Macau que medidas de apoio social como o cheque pecuniário e subsídios vão manter-se, mas com alguns “ajustamentos”

 

[dropcap]E[/dropcap]m época de crise muito se tem falado da possibilidade de o Governo pôr um ponto final no programa de comparticipação pecuniária no próximo ano. No entanto, tal não deverá acontecer.

Representantes da Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM) reuniram ontem com Ho Iat Seng, Chefe do Executivo, que confirmou a manutenção do cheque pecuniário e outros apoios sociais, mas com alguns “ajustamentos”. A notícia foi avançada pelo canal chinês da Rádio Macau e confirmada pelo HM.

“Mencionámos a continuidade das medidas de beneficência, como a comparticipação pecuniária, o subsídio para as tarifas de electricidade e água e os vales de saúde, entre outros. Ho Iat Seng confirmou que se vão manter, mas com ajustes”, garantiu Choi Kam Fu, vice-presidente da direcção da FAOM.

O encontro de ontem serviu para debater políticas que vão integrar as próximas Linhas de Acção Governativa (LAG) para 2021. Segundo o canal chinês da Rádio Macau, “o Chefe do Executivo disse que no próximo ano as medidas que beneficiam a população serão mantidas, mas serão feitos ajustamentos apropriados para garantir que são bem implementadas”.

Citado por um comunicado em língua portuguesa, Ho Iat Seng sublinhou que “deve haver contenção nas despesas gerais do governo”, mas “não irá reduzir as despesas necessárias ao bem-estar da população”, pelo que medidas como a do Plano de Comparticipação Pecuniária “serão mantidas de acordo com o previsto no próximo ano”.

No entanto, como “a epidemia de pneumonia causada pelo novo tipo de coronavírus é um problema global, é impossível prever a sua evolução”, pelo que o Governo “precisa de estudar como é que o Plano de Comparticipação Pecuniária poderá ser aproveitado para dinamizar a economia local e o consumo interno, bem como estabilizar o emprego dos trabalhadores das pequenas, médias e micro empresas, que representam 40 por cento da população activa de Macau”, aponta o mesmo comunicado.

Numa nota oficial divulgada na semana passada, foi referido que Ho Iat Seng estaria a analisar a continuação do referido programa de apoio. “Em relação ao plano de comparticipação pecuniária para o próximo ano, o Chefe do Executivo adiantou que o Governo está ainda a estudar e as informações concretas serão divulgadas no relatório das linhas de acção governativa do próximo ano.”

Manter o emprego

Na reunião os representantes da FAOM pediram ao Governo que dê prioridade à estabilidade do emprego dos residentes e que aumentem as acções de formação. Segundo explicou a deputada Ella Lei ao canal chinês da Rádio Macau, Ho Iat Seng afirmou dar grande importância às propostas da FAOM para resolver os problemas de desemprego e habitação surgidos durante a crise gerada pela pandemia.

O Chefe do Executivo adiantou também que dá grande importância à manutenção do emprego dos residentes e que revitalizar a economia e assegurar o emprego depois da crise são questões importantes. Ho Iat Seng anunciou que pretende investir, no próximo ano, cerca de 18 mil milhões de patacas em infra-estruturas, acreditando que irá criar muitos postos de trabalho e melhorar a situação de emprego e terá também prometido novos projectos de habitação pública para satisfazer as necessidades da população, noticiou o canal chinês da Rádio Macau.

Citado por um comunicado em língua portuguesa, o Chefe do Executivo adiantou ainda que, tendo em conta a situação epidémica, “a situação geral está no bom caminho, mas ainda levará algum tempo para a recuperação económica”, pelo que Macau e as suas gentes “vão passar ainda por tempos difíceis”.

Quanto à política de manutenção das profissões de croupier nos casinos ou motoristas apenas para residentes, Ho Iat Seng assegurou que se “mantém inalterada”. Além disso, Ho Iat Seng adiantou que “não haverá alterações das promessas do governo sobre a política da habitação”. Quanto aos trabalhos legislativos da Lei sindical, o governante “sublinhou que o governo vai seguir os procedimentos e submeter, o mais rápido possível, o documento para consulta pública à discussão do Conselho Permanente de Concertação Social e seguidamente a consulta pública”.

Ho Sut Heng, presidente da FAOM, disse esperar que o Governo “dê atenção às necessidades de habitação por parte dos residentes com rendimentos baixos ou médios”, e que conclua “rapidamente” a consulta pública sobre o “Plano de Habitação para a Classe Sanduíche”, apresentado esta semana. A FAOM deseja ainda que o Executivo “possa fiscalizar a execução e cumprimento dos novos contratos pelas empresas de autocarro”, além de planear a habitação para idosos.

* Notícia editada com a informação disponibilizada pelo comunicado em língua portuguesa

Novo Macau | Petição pede revisão de lei no seguimento do caso Viva Macau

O alargamento dos prazos para procedimentos disciplinares e a criação de um sistema disciplinar especial para titulares de principais cargos estão entre as sugestões da Associação Novo Macau aos deputados. Numa petição dirigida à Assembleia Legislativa, é pedido seguimento às recomendações do CCAC no caso Viva Macau

 

[dropcap]A[/dropcap] Associação Novo Macau (ANM) submeteu ontem uma petição à Assembleia Legislativa, apelando ao seguimento das recomendações do Comissariado Contra a Corrupção no âmbito do caso Viva Macau e à revisão de leis para que algo de semelhante não volte a acontecer.

O objectivo é evitar que outros dirigentes não sejam também responsabilizados depois de condutas irregulares. Em comunicado de imprensa, a ANM defende que a Assembleia Legislativa deve estudar uma reforma dos prazos para procedimentos disciplinares e a criação de um sistema disciplinar especial para titulares de principais cargos.

Recorde-se que no mês passado foi divulgado o relatório do Comissariado contra a Corrupção (CCAC) em que se conclui que não houve crime de corrupção ou dolo no empréstimo de 212 milhões de patacas pelo Fundo de Desenvolvimento Industrial e Comercialização à falida Viva Macau.

Apesar disso, o relatório apontou que do lado do Executivo houve negligência e falta de rigor na concessão de tranches do empréstimo. E o CCAC defendeu que o Governo deve adoptar regulamentação específica sobre a atribuição de apoios, competência para a autorização, deveres dos beneficiários e sistema de supervisão.

“No futuro, os vários órgãos da RAEM devem ser mais proactivos e esforçarem-se mais para monitorizar o Governo. Não podem continuar a esperar até o público estar muito insatisfeito ou até mesmo organizar protestos de larga escala”, diz a nota. A ANM recordou que caso aconteceu há mais de uma década e que se tivesse havido iniciativa para o investigar mais cedo, os problemas podiam ter sido identificados antes, evitando que os limites de tempo impedissem a responsabilização dos dirigentes implicados.

Colmatar falhas

“O Governo da RAEM não é eleito por sufrágio universal, e os cidadãos não podem castigar os dirigentes através de voto”, lê-se na nota. Além disso, a ANM criticou o facto de o Chefe do Executivo ter “poderes únicos” relativamente à aprovação de despesas elevadas. No seu entender, as despesas públicas deviam ser aprovadas pela Assembleia Legislativa. Outra crítica da ANM incidiu sobre o facto de o CCAC não ter recolhido testemunhos do Chefe do Executivo e do secretário para a Economia e Finanças de então, ou seja, Edmund Ho e Francis Tam.

A Novo Macau entende que a situação mostra que o Código Penal “tem falhas”, propondo na petição que as leis de Hong Kong, China Continental e Taiwan sejam referência e que a conduta irregular de dirigentes constitua uma ofensa criminal quando causem consequências sérias às finanças públicas, interesse público ou direitos dos cidadãos, mesmo quando não houver provas de o infractor ter agido com dolo. Além disso, defende a criação de um mecanismo para exigir indemnização aos dirigentes que tenham causado perdas financeiras à RAEM.

Hác Sá | António Katchi considera inconstitucional impedimento de TNR a marcação de churrasco

O jurista António Katchi considera que, indirectamente, a medida anunciada pelo IAM que exclui não residentes de fazer marcações para aceder à zona de churrasco de Hác Sá implica “segregação social”. A associação Green Philippines Migrant Workers Union acha as regras discriminatórias e racistas. Já o IAM diz que, no futuro, as medidas podem ser alargadas

 

[dropcap]A[/dropcap]ntónio Katchi considera “inconstitucional” e “ilegal” a medida que permite, exclusivamente, aos residentes de Macau portadores de BIR (Bilhete de Identidade de Residente), efectuarem a marcação prévia obrigatória para aceder à zona de churrasco do Parque da Praia de Hác Sá, que volta a abrir na próxima sexta-feira.

Já a nível político, o jurista considera a decisão “ignóbil” e que, indirectamente, implica “segregação racial”, até porque no caso concreto do parque de Hác Sá, os seus principais utilizadores são habitualmente trabalhadores não residentes (TNR) de nacionalidade filipina.

“Politicamente, considero a decisão ignóbil e mais um testemunho do processo de ‘fascização’ do regime político de Macau. Diria, aliás, que, neste caso preciso, a exclusão dos TNR consiste basicamente na exclusão dos filipinos, pois são estes os principais utilizadores daquele espaço (pelo menos, de entre os TNR). Indirectamente, portanto, a decisão implica segregação racial”, explicou António Katchi ao HM.

Recorde-se que, de acordo com o Instituto para os Assuntos Municipais (IAM), a partir da próxima sexta-feira, quem quiser aceder à zona de churrasco do Parque da Praia de Hác Sá está obrigado a fazer marcação prévia. As marcações podem ser efectuadas apenas por residentes de Macau, de acordo com as fases de agendamento e horários estabelecidos pelo IAM, sendo o número máximo de utilizadores por grelhador, de quatro pessoas.

“Os requerentes devem ser residentes de Macau e cada requerente pode efectuar apenas um pedido em cada fase, até esgotarem as vagas”, pode ler-se no comunicado do IAM.

Em contramão

Sobre as razões para considerar a decisão do IAM inconstitucional e ilegal, o jurista António Katchi começou por apontar o facto de a zona de churrasco da praia de Hác Sá estar abrangida no conceito de “espaço público” e não de “instalação pública”. Isto porque, de acordo com o Regulamento Geral dos Espaços Públicos (RGEP), apenas no segundo caso “podem ser estabelecidas regras a restringir o acesso e o uso de instalações públicas”.

“A zona de churrasco da praia de Hác Sá não cabe no conceito menor de ‘instalação pública’, mas no conceito maior de ‘espaço público’. Logo, não está abrangida pelo disposto no artigo 3.º do RGEP, ainda que esteja sujeita ao poder regulamentar do IAM”, expôs Katchi.

Segundo o RGEP, entende-se por espaço público as “instalações, bem como os lugares ou áreas (…) predominantemente destinados ao uso da população, nomeadamente passeios, praças, vias públicas, jardins, praias e áreas de preservação ambiental”.

Contudo, mesmo considerando que o IAM possa estabelecer restrições de acesso e uso de instalações públicas previstas na lei, o jurista afirma que o organismo está sempre obrigado a respeitar os princípios consignados na Lei Básica, facto que, neste caso, considera não estar a acontecer porque a decisão viola o princípio da igualdade.

“Ao desfavorecer os trabalhadores ditos ‘não residentes’ em relação aos ‘residentes’ numa questão em que tal desfavorecimento não encontra qualquer justificação razoável, está a sujeitá-los a uma discriminação, violando assim o princípio da igualdade”, vincou António Katchi.

Além disso, citando o Código Civil onde consta que “os não-residentes são equiparáveis aos residentes de Macau quanto ao gozo de direitos civis, salvo disposição legal em contrário”, o jurista lembra que a liberdade de acesso e utilização de espaços públicos ou abertos ao público é um direito civil.

Por último, o académico aponta ainda que, ao vedar o acesso a um espaço aberto ao público, o IAM está a infringir os artigos 33.º e 43.º da Lei Básica, dado que impõe restrições à liberdade de deslocação dentro de Macau.

Para o jurista, esta restrição é “inadmissível” pelo facto de não se encontrar “estabelecida em lei” e porque “não se afigura uma medida necessária nem adequada para assegurar a protecção de direitos fundamentais ou de outros valores ou interesses constitucionais”.

Sentir na pele

Contactada pelo HM, Benedicta Palcon, presidente da associação Green Philippines Migrant Workers Union, não hesitou em considerar a medida “discriminatória”.

“Acho que o Governo de Macau está a tornar-se cada vez mais racista e discriminatório relativamente aos portadores de bluecard e trabalhadores migrantes. Não consigo encontrar qualquer razão para que não permitam que os portadores de bluecard utilizem a zona de churrasco do parque público, porque todos devem ter os mesmos direitos quando é chegada a altura de desfrutar do seu tempo livre”, afirmou ontem a responsável ao HM.

Benedicta Palcon confessou ainda não compreender qual o fundamento de saúde pública relacionado com a prevenção de covid-19 no território, que esteve na base da decisão anunciada pelo IAM. Isto quando, por exemplo, na altura da reabertura das piscinas municipais, não foram implementadas regras semelhantes e, diariamente, residentes e não residentes, convivem em restaurantes.

“Não consigo compreender porque é que nas piscinas públicas também não se pede os cartões de identidade ou os bluecards para entrar. Qual é a diferença? Além disso, o parque de churrascos é uma área pública, ao ar livre. Basta irmos aos restaurantes para as condições serem as mesmas e ainda por cima num espaço fechado”, acrescentou.

A reboque da medida anunciada, Benedicta Palcon apontou também não compreender a medida excepcional anunciada pelo Governo e que irá permitir aos pilotos estrangeiros que vão participar no Grande Prémio de entrar em Macau, mediante o cumprimento de quarentena à entrada. Isto, quando os TNR de nacionalidade estrangeira estão proibidos de entrar no território desde Março.

Além disso, a responsável defende que a discriminação do Governo pode ser vista também no facto de os portadores de bluecards não terem recebido qualquer apoio monetário, como o cartão de consumo, destinado apenas aos residentes de Macau.

“Acho que o Governo devia dar apoios aos portadores de bluecard, pois também foram afectados pela pandemia e os que ficaram sem trabalho ficaram também sem fonte de receitas”, apontou.

À procura de explicações

Contactado pelo HM, o IAM afirmou que a decisão anunciada em comunicado na passada sexta-feira é uma “primeira fase” e que após avaliada a resposta do sistema ao número de pedidos e à situação de utilização do espaço “será considerado o alargamento das medidas”.

O organismo fez ainda questão de esclarecer que “o acesso dos trabalhadores não residentes à zona de churrasco é permitido”, mas que “para efeitos de reserva online”, esta “terá de ser realizada por um residente de Macau”.

“Sendo que a reabertura da zona de churrasco tem de cumprir com as medidas anti-epidémicas mencionadas no comunicado divulgado na sexta-feira, nesta primeira fase, o processo de reserva online deve ser realizado por um residente de Macau”, pode ler-se na resposta do IAM.

Por seu turno, questionados sobre as motivações que estiveram na base da decisão de impedir que os TNR reservem a zona de churrasco, os Serviços de Saúde (SS) remeteram todas as explicações para o IAM.

“Não temos nenhum representante do IAM aqui, pelo que não podemos responder”, começou por dizer ontem o médico adjunto da direcção do Centro Hospitalar Conde de São Januário Alvis Lo Iek Long, por ocasião da conferência de imprensa sobre a covid-19.

“Acho que o IAM vai divulgar informações posteriormente. Em relação a esta situação, temos diferentes instruções e orientações e nós, na perspectiva da prevenção da pandemia, definimos recomendações. O serviço competente, conforme a realidade do espaço adoptou as nossas recomendações para elaborar as suas instruções. Acho que não é apropriado os SS comentarem sobre se as medidas [do IAM] são correctas ou adequadas”, acrescentou o responsável.

Já a médica Leong Iek Hou, coordenadora do Núcleo de Prevenção e Doenças Infecciosas e Vigilância da Doença, limitou-se a recordar as recomendações de prevenção emitidas para a reabertura das zonas de churrasco do parque de Hác-Sá.

“Assim como as outras exigências dirigidas aos espaços que podem ter concentrações de pessoas, é preciso medir a temperatura, apresentar o código de saúde, garantindo que este é verde. No espaço, deve-se evitar a concentração de pessoas e nos grelhadores do churrasco deve ser mantida uma distância de um metro. As pessoas só podem tirar as máscaras quando estiverem a comer e, quando falam, precisam de utilizar as máscaras”, vincou Leong Iek Hou.

Recorde-se que, a partir do dia da reabertura vão estar disponíveis 55 grelhadores em cada uma das duas sessões de marcação prévia diárias, sendo os horários de utilização das duas sessões das 11h30 às 17h30 e das 18h00 às 23h59.

As marcações poderão ser feitas através do sistema de inscrição de actividades na página electrónica do IAM, sendo possível agendar datas abrangidas em cada período de 14 dias. Assim, a primeira fase de marcação será entre 16 e 29 de Outubro, a segunda entre 30 de Outubro e 12 de Novembro e assim sucessivamente.

Decretada quarentena para oriundos da cidade de Qingdao

[dropcap]O[/dropcap] Governo anunciou ontem que todos aqueles que tenham estado na cidade chinesa de Qingdao, província de Shandong, e que viajem para Macau devem ser submetidos a uma quarentena obrigatória de 14 dias. Trata-se de uma medida que entra em vigor à meia noite desta terça-feira, 13 de Outubro.

Segundo a agência Lusa, vão ser testadas nove milhões de pessoas na cidade depois de terem sido detectados 12 novos casos nas últimas horas. A Comissão de Saúde de Qingdao informou, em comunicado, que foram inicialmente detectados três casos assintomáticos, testados 377 contactos próximos, tendo aí sido diagnosticados mais nove casos.

Entre os nove infectados, oito são pacientes ou funcionários no Hospital Municipal para Doenças Pulmonares de Qingdao, enquanto o outro é familiar de um dos infectados.

Entre os casos previamente diagnosticados como assintomáticos, dois passaram a ter sintomas relacionados com a doença. As autoridades designaram o referido hospital de Qingdao para tratar viajantes oriundos do exterior que apresentam resultados positivos para a covid-19 nos testes realizados à chegada ao país.

A campanha terá duração de cinco dias e deve abranger toda a população da cidade, ou mais de nove milhões de habitantes. As autoridades de Macau não têm, para já, dados dos residentes de Macau que possam ter estado em Qingdao nos últimos dias.

AMCM | Empréstimos para actividades imobiliárias com aumento de 187,5 por cento

[dropcap]D[/dropcap]ados fornecidos ontem pela Autoridade Monetária e Cambial de Macau (AMCM) revelam que os empréstimos destinados a actividades imobiliárias registaram um aumento de 187,5 por cento e Agosto por comparação ao mês de Julho, tendo atingido as 4,24 mil milhões de patacas.

Dos empréstimos concedidos, 99,2 por cento destinaram-se aos residentes locais e cresceram 186,1 por cento para 4,21 mil milhões de patacas, enquanto que os empréstimos para não residentes cresceram apenas 33 milhões de patacas. Entre Junho e Agosto deste ano o número médio mensal dos novos empréstimos comerciais destinados a actividades imobiliárias atingiram 2,7 mil milhões de patacas, um aumento de 42,4 por centro face ao período de Maio a Julho.

Pelo contrário, os empréstimos hipotecários para habitação registaram uma quebra de 41,1 por cento em relação a Julho, tendo registado o montante total de 4,91 mil milhões de patacas. Os empréstimos concedidos aos residentes representaram 77,4 por cento do total, tendo sofrido uma quebra de 36,5 por cento, no valor de 3,80 mil milhões de patacas. Já os empréstimos concedidos aos não residentes registaram uma quebra de 52,6 por cento, no valor de 1,11 mil milhões de patacas. Entre Junho e Agosto o número médio mensal dos novos empréstimos à habitação atingiu as seis mil milhões de patacas, um aumento de 14 por cento em comparação aos meses de Maio a Julho.

China condena pressão exercida pelos Estados Unidos sobre Portugal

[dropcap]A[/dropcap] China condenou hoje a pressão exercida pelos Estados Unidos para Portugal banir o grupo de telecomunicações chinês Huawei da infra-estrutura de redes 5G, defendendo que nenhum país com “espírito independente” cederá a Washington.

“Coagir outros países para que obedeçam à sua vontade não é apenas um acto flagrante de assédio, mas também uma evidente rejeição dos princípios de economia de mercado defendidos pelos Estados Unidos”, apontou à agência Lusa o Ministério dos Negócios Estrangeiros da China.

“Nenhuma nação com um espírito independente se associará a esta campanha” de Washington, acrescentou o Ministério, em comunicado. Durante uma visita a Lisboa, na semana passada, o subsecretário de Estado norte-americano Keith Krach frisou a importância de excluir a Huawei das redes de quinta geração (5G), a Internet do futuro.

A visita de Krach ocorreu poucos dias depois de, numa entrevista ao Expresso, o embaixador norte-americano em Lisboa, George Glass, ter considerado que os portugueses “têm de fazer uma escolha agora” entre “trabalhar com os parceiros de segurança, os aliados, ou trabalhar com os parceiros económicos, os chineses”.

Glass admitiu que “Portugal acaba inevitavelmente por ser parte do campo de batalha na Europa entre os Estados Unidos e a China” e alegou que o país asiático tem “planos de longo prazo para acumular influência maligna através da economia, política ou outros meios”.

As palavras do diplomata foram criticadas pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, e pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que lembrou que “em Portugal, quem decide acerca dos seus destinos são os representantes escolhidos pelos portugueses”.

Na mesma nota, enviada à Lusa, a China acusou os Estados Unidos de “infringirem as regras do comércio internacional” e “danificarem os interesses dos consumidores e negócios”.

“Acreditamos que todos os países vão manter uma posição justa e objetiva e fazer escolhas independentes, de acordo com os seus interesses, os interesses em comum com outros países e a tendência do desenvolvimento da humanidade”, lê-se no comunicado. O Governo chinês lembrou ainda que Portugal e a China mantêm uma parceira estratégica global.

A Parceria Estratégica Global entre Portugal e a China foi assinada em outubro de 2010, durante a visita de Estado a Lisboa do então Presidente chinês, Hu Jintao, a que se seguiram importantes investimentos chineses na economia portuguesa.

A relação entre a China e os Estados Unidos deteriorou-se rapidamente nos últimos dois anos, com várias disputas simultâneas entre as duas maiores economias do mundo. Em Pequim e em Washington, referências a uma nova Guerra Fria são agora comuns.

Para além do boicote à Huawei, a administração de Donald Trump colocou outras 70 empresas chinesas na Lista de Entidades do Departamento de Comércio, limitando o seu acesso a tecnologia norte-americana.

No Mar do Sul da China, uma faixa de navegação vital na região Ásia-Pacífico, navios de guerra norte-americanos e chineses disputam agora constantemente posições, enquanto Washington passou a realizar visitas de alto nível a Taiwan, uma afronta a Pequim, que considera a ilha parte do seu território.

Uma prolongada guerra comercial subsiste também entre os dois países, apesar de um acordo de Fase 1, que não conheceu novos desenvolvimentos desde o final do ano passado.

Os dois lados mantêm taxas alfandegárias punitivas sobre centenas de milhares de milhões de dólares das exportações de cada um.

IC | Abertas candidaturas para apoio de dois milhões de patacas para cinema

[dropcap]O[/dropcap] Instituto Cultural (IC) lançou ontem a quarta edição do Programa de Apoio à Produção Cinematográfica de Longas Metragens, estando as candidaturas abertas até ao dia 25 de Novembro. Cada filme seleccionado poderá receber um subsídio no montante máximo de dois milhões de patacas. O regulamento determina que serão seleccionados até quatro beneficiários, sendo que cada um pode receber um apoio financeiro que corresponde a 80 por cento dos custos totais previstos para o projecto aprovado. O subsídio será utilizado para cobrir os custos de produção, promoção e marketing do filme.

Segundo uma nota, o IC pretende, com este programa, “promover o desenvolvimento da indústria cinematográfica de Macau, fomentar talentos de cinema locais, melhorar a capacidade de produção da indústria cinematográfica local, incentivar os cineastas a envolverem-se na produção cinematográfica de longas metragens e criar mais obras cinematográficas criativas locais”.

Os candidatos devem ser residentes permanentes da RAEM com mais de 18 anos de idade, inclusive, devendo ter alguma experiência na área do cinema, tal como a realização ou produção de, pelo menos, uma longa metragem com duração não inferior a 80 minutos ou de duas curtas metragens (de ficção) com duração superior a 20 minutos cada, anteriormente exibidas.

O júri irá seleccionar, numa primeira fase, dez projectos com base em cinco critérios, tal como o “conteúdo e criatividade do argumento apresentado na sinopse do guião, a capacidade do candidato e da equipa para implementar o projecto, a viabilidade do projecto de produção, o grau de perfeição do projecto e racionalidade orçamental”.

Na segunda fase de selecção o júri fará uma resenha escruta dos projectos e fará uma análise da documentação apresentada de acordo com os cinco critérios já referidos. Será também tida em conta a “integridade do argumento (guião) completo e a viabilidade da proposta de promoção e marketing”. Será feita ainda uma entrevista pessoal com o candidato e elementos da sua equipa, bem como a revisão da apresentação do projecto do candidato, a fim de seleccionar os candidatos finais.

SMG | Sinal 3 de tempestade tropical poderá ser emitido a partir das 18h

[dropcap]O[/dropcap]s Serviços Meteorológicos e Geofísicos (SMG) deverão emitir o sinal 3 de tempestade tropical entre as 18h e as 21h de hoje, aponta uma nota. Em relação à emissão do sinal 8 de tempestade, poderá ocorrer entre a madrugada e a manhã desta terça-feira, dia 13, embora a possibilidade seja “relativamente baixa a moderada”.

Os SMG informam ainda que a depressão tropical localizada na parte nordeste do mar do sul da China vai intensificar-se e continuar a mover-se para oés-noroeste em direcção à Ilha Hainan. Quanto ao tempo, “entre hoje à noite e o dia 14 vai ser instável, havendo aguaceiros e ventos fortes”.

Prevê-se a ocorrência de inundações nas zonas baixas do Porto Interior esta terça-feira de manhã devido à influência do “Storm Surge” e ocorrência de aguaceiros fortes. A altura de inundação prevista é cerca de 0,4 metros.

O regresso de Sócrates

[dropcap]O[/dropcap]s portugueses estão fartos de ouvir falar de José Sócrates, uma criatura que subiu das irregularidades na Câmara Municipal da Covilhã com projectos na mão que eram autênticos mamarrachos que nenhuma edilidade do mundo aprovaria até à cadeira de primeiro-ministro deste Portugal endividado até ao tutano. Especialmente as dívidas monstruosas que três gerações futuras irão pagar no que respeita às escandalosas Parcerias Público-Privadas (PPP) que tanta tinta corruptiva fez correr. As PPP de Sócrates são um escândalo e ainda bem que foi preso por alegados crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e mais umas dezenas de acções criminosas, antes que a criatura avançasse para mais pontes sobre o rio Tejo, TGV e aeroportos. Um megalómano que soube enriquecer possivelmente devido às notas que caíram com a chuva nos seus terraços habitacionais, em especial o de Paris, onde gastou milhões só para remodelar o imóvel adquirido num dos bairros mais chiques da capital francesa. As PPP’s são um dos maiores cancros da nossa economia e que irão levar anos e anos para serem pagas. Uma mina para os amigos de Sócretes, uma criatura tão poderosa no expectro sócio-políItico-judicial que o seu julgamento talvez seja realizado se um dia Portugal passar a ser uma região autónoma de Espanha…

E a que propósito estamos a escrever sobre o medíocre veraneante da Ericeira? É que na semana passada assistimos a um escândalo no seio do governo e da Presidência da República que deixou o país atónito. Vítor Caldeira era há 25 anos o presidente do Tribunal de Contas. Um homem de bem, profissional exímio, um exemplo de transparência e independência, mas… que de vez em quando lá estava Caldeira a criticar certas decisões do governo socialista, o que em democracia é absolutamente saudável. O Tribunal de Contas não foi criado para ser um yes man do governo, antes pelo contrário. Este organismo tem a obrigação de velar pela seriedade das acções governativas e indicar todas as lacunas que as despesas oficiais possam apresentar. Mas em Portugal tudo é diferente. Quem não está com o poder, leva… já dizia há muito o ex-ministro socialista Jorge Coelho. E desta feita, o primeiro-ministro, António Costa, refastelado no cadeirão do seu gabinete do palácio de São Bento, pegou no telefone e vai daí:

– É o senhor presidente Vítor Caldeira?
– Sou sim, senhor primeiro-ministro! Faz o obséquio de dizer…
– É para lhe dizer que já não o reconduzo no lugar. Termina aqui o seu trabalho…
– Mas?!… Está lá?!… Estou?!

A notícia correu célere. O exemplar presidente do Tribunal de Contas tinha sido demitido por telefone, atitude nada cordial. As conjecturas não se fizeram esperar, nomeadamente a mais triste e incómoda para quem chefia um governo que diz respeito aos milhares de milhões de euros que aí vêm a caminho oriundos da União Europeia para fazer frente aos mais diversos e espampanantes projectos e adjudicações que nunca poderão ter a adversidade do Tribunal de Costas. Obviamente, uma conjectura grave.

Entretanto, rapidamente o primeiro-ministro anunciou o substituto de Vítor Caldeira. Pior a emenda que o soneto. Uma escolha que recaiu num socratino. José Tavares é dado pela Polícia Judiciária como muito próximo do ex-secretário de Estado de José Sócrates, Paulo Campos, um dos principais suspeitos nas investigações às PPS’s e que sempre foi o braço-direito de Sócrates nos chamados cambalachos com o venezuelano Hugo Chavez e o líbio Muhamar Kadaffi. José Tavares é mencionado no inquérito às Parcerias Público-Privadas, caso onde se investigam prejuízos de cerca de 3,5 mil milhões de euros para o Estado, numa alegada prática de corrupção e de outros ilícitos criminais. A proximidade entre Paulo Campos e o novo presidente do Tribunal de Contas é atestada com diversos emails trocados entre o ex-secretário de Estado de Sócrates e José Tavares, então director-geral do Tribunal de Contas, em 2009 e 2010. José Tavares terá inclusivamente participado em reuniões secretas com o governo de José Sócrates para tentar contornar o chumbo que os próprios juízes conselheiros do Tribunal de Contas fizeram a quase todos os contratos das subconcessões rodoviárias lançados pelo então ministro Mário Lino e Paulo Campos.

E os mais diversos políticos da oposição e o povo observador destas temáticas políticas em geral perguntam-se como pode existir tão pouca seriedade ou tanto compadrio na nomeação de um cargo de suma importância para uma governação transparente e profícua. Lá diz o ditado que à mulher de César não basta ser séria, há que parecer…

*Texto escrito com a ANTIGA GRAFIA

Organização da Polícia em 1867

[dropcap]Q[/dropcap]uando a 26 de Outubro de 1866 o Governador de Macau José Maria da Ponte e Horta (1866-1868) tomou posse, as circunstâncias determinavam a urgência de reformas nos vários serviços da Administração da colónia. Assim, logo em Novembro começou a nomear uma série de comissões para estudar e elaborar as necessárias reformas a empreender e entre elas constava uma nova organização para o Corpo de Polícia.

N’ O Boletim do Governo de Macau de 12 de Novembro de 1866, o Governador determinava:
O Corpo da Polícia desta cidade tinha então como comandante Francisco Justiniano de Souza Alvim Pereira, pertencente ao exército de Portugal e capitão adido ao Batalhão de Macau; como Tenente ajudante, Frederico Guilherme Freire Corte Real, tenente adido ao Batalhão de Macau pertencia também ao exército português; e como Tenente, Francisco Augusto Ferreira da Silva, tenente do Batalhão de Macau.

Corpo da Polícia de Macau

Uma nova força de Polícia fora organizada em 1857, a princípio exclusivamente do Bazar e depois geral de toda a cidade, pelo macaense Bernardino de Senna Fernandes (1815-1893), que o comandou até 1863, primeiro no posto de Capitão e depois como Major de segunda linha, de que hoje (1866) conserva ainda as honras. Mas a ideia inicial proveio do negociante chinês Aiong-Pong, com propriedades e lojas no Bazar, que em 1857 engajou por conta própria uma pequena guarda composta por europeus, à semelhança do que se fazia à noite com os “quartos chinas – vigias nocturnas. Todos os que tinham propriedades no bazar acharam boa ideia. Foi assim que Bernardino de Senna Fernandes e alguns chineses principais se uniram para aumentar essa guarda, de maneira a poder vigiar e guardar também os seus bens. Essa guarda devia ser paga por meio de subscritores chineses e para lhe darem existência jurídica, solicitaram a aprovação do governo, que lha deu pela portaria n.º 41, de 29 de Setembro de 1857 e publicada no n.º 50, do Boletim Oficial de 3 de Outubro. Ficava sob uma comissão de três negociantes chineses, que cobravam dos outros negociantes uma determinada quantia para manterem os 50 portugueses, que policiavam o bazar”, segundo o Padre Manuel Teixeira.

A 2 de Janeiro de 1859, o produto das licenças provenientes dos espectáculos de autos-chinas, realizados na Porta do Campo de St.º António, foi destinado à aquisição de armamento para a Força de Polícia, cujo comandante Bernardino de Senna Fernandes mandou vir da Inglaterra. Este criou também “a Polícia de Mar, que salvou muitas vidas e propriedades no tufão de 27 de Julho de 1862; com um dos seus vapores e mais duas embarcações de vela aprisionou, à testa de 25 homens da força do seu comando, quatro embarcações de contrabandistas chineses, guarnecidas cada uma com 87 homens e seis a oito peças de artilharia de grosso calibre; apreendeu ainda uma embarcação de piratas com $5230, remetendo tudo à Fazenda Pública; prendeu mais três embarcações de piratas, que andavam roubando as aldeias próximas de Macau”, segundo o padre Manuel Teixeira, que refere, “Tendo sido proibida a importação de víveres para Macau em 1858 depois da retirada dos chineses, ordenada pelos mandarins em consequência da guerra entre a China e a Inglaterra [2.ª Guerra do Ópio], conseguiu ele que os mandarins de Heong-shan e Ching-Shan suspendessem essa proibição.”

Por Portaria de 11 de Outubro de 1861, o Governador Izidoro Francisco Guimarães determinou a criação da Força da Polícia, e deu-lhe um Regulamento, com que se devia reger o Corpo de Polícia do Bazar que passou a chamar-se Corpo de Polícia de Macao. No extenso Regulamento, o Capítulo 1.º Artigo 2.º refere, . Assim Bernardino de Senna Fernandes tornou-se Major Comandante do Corpo de Polícia de Macao.

Já a 4 de Setembro de 1853, o Capitão Ricardo de Melo Sampaio atestara que Senna Fernandes em 15 de Agosto de 1849 acompanhara sempre a força que foi guardar a Porta do Cerco, servindo de meio de comunicação entre essa força e o Conselho do Governo, arriscando-se sem temor das balas. Foi também Presidente da Comissão Administrativa da Santa Casa da Misericórdia e superintendente da Emigração Chinesa, prestando ainda outros serviços à Colónia.

Das lamentações

[dropcap]D[/dropcap]e vez em quando mais alguém, que parte para outro lado do tempo, nos reúne. Na amizade, na melancolia, na companhia necessária ao que parte e a quem fica de mãos vazias e alma triste. E depois vamos comer. É importante comer juntos. Divergir para histórias e memórias e gafes recentes e carinhosas de amigos, na circunstância em que trocamos os pés pelas mãos. A perda de alguém que nos é querido ou que é querido a alguém que nos é querido. Uma cadeia em que nos situamos tristes, de um modo ou de outro.

Ali estamos, de frente para os três. Ele que partiu, Ele que talvez esteja e que preside a tudo e em quem, mesmo se não acreditamos, gostaríamos de acreditar e que queremos sentir atento, e que, se ajuda for necessária, mande um sereno par de anjos para mostrar o caminho da eternidade. E ele, o clérigo que, entre ambos, se dispõe a mediar em representação de quem lhe é superior. Que depressa nos faz sentir vermes abaixo. Como estando num anfiteatro enorme. Em cima aquele a quem desejaríamos ser, mesmo que momentaneamente, conduzidos como conforto e elevação, mais abaixo, o imponente representante, um pouco mais abaixo o que vai a caminho do céu e muito mas muito mais abaixo estes seres colocados no palco, quando diz que é para nós que se deve virar a atenção. Estávamos enganados. Pensávamos vir pelo que partiu ou está de partida para o céu. E pelo céu em si. Pelo espírito que tanto nos transcende destes corpos e que esperávamos que nos fosse apontado como quem nos mostrasse uma estrela.

Abespinhado pelo ínfimo atraso de quem veio desfalcada de atravessar noite de vazio e em branco, e pela congregação que nem toda se benzeu nem respondeu, que admoestada e já com a voz a sumir lá fez das tripas coração e amén. Tal e qual como crianças que quanto mais se lhes ralha menos respondem.

Ali estamos, em despedida, em companhia e numa certa nostalgia de crer que o momento inspira. Em algo que acompanhe quem parte, para um lugar utópico, que conduza serena e suavemente quem vai. E no respeito pela espiritualidade que, ansiamos, perpasse nas palavras, sobretudo nas que são espontâneas e livres do espartilho anacrónico das escrituras, e liberte ou suavize a dor de quem fica e fica com um enorme M de morte na alma, um pesado V de vazio a querer ganhar espaço e um enorme N que é a pessoa que não estando estará para sempre. E nos ouvidos as palavras de quem supostamente sabe. Sabe? Mas tropeçava sempre na leitura do nome inteiro, que não memorizou, como se a ler pela primeira vez e a custo e como se não o conhecesse de lado nenhum. E não conhecia. Desejamos para dentro que não se engane a encomendar-lhe a alma.

Vou dizer umas breves palavras – enunciou ao sair das escrituras – que não são para acusar ninguém. Acende-se uma pequena luz de alerta. Interrompemos-lhe mentalmente o fio condutor e paramos brevemente a perguntar-nos de que vamos ser seguramente acusados. Como miúdos da escola. Porque não soubemos ou não quisemos responder amém nos sítios próprios e mesmo depois de advertidos de que o tínhamos que fazer. A revolver na memória as palavras de estilo que nos competiam mas já as vozes sumidas e contrafeitas e tristes. Ficou zangado. Diz-nos que muitas pessoas não são cristãs, simplesmente baptizadas. Aí está. Desenvolve e acusa. Desenvolve e acusa. Cegamos porque não conseguimos ensurdecer. Aquilo é connosco. Não nos conhece mas não gosta de nós. E não quer que tenhamos ilusões de que Cristo também não gosta de nós. Mas não foi ao que viemos. Viemos por sentimentos, por anseio espiritual face à morte de alguém e à nossa futura em construção. Viemos por respeito. Qualquer coisa em que acreditar mesmo que por momentos, mesmo que seja uma metáfora bela que conforta quem está triste.

Que aponte uma luz, uma chama, uma ideia holística, uma harmonia no estar e no partir. Qualquer coisa. Ali, como em qualquer outro lugar de culto. Num templo budista ou à beira de uma falésia. Depois penso confortada que talvez o Cristo dele seja outro que não o nosso. A cada um o seu anseio. Um Cristo, ou outro.

Mas ali estava ele de figura imponente a desinfectar as mãos esguias e longas de minuto a minuto. Eu acho, dizia P. depois, enquanto caminhávamos ao longo do muro liso da cidade dos mortos, que ele, de cada vez que tinha um mau pensamento, desinfectava as mãos.

Algo sobe em mim e sei que num momento qualquer sem eu dar por nada, vai sair em palavras que não cabem ali. Não quero ouvir mais nada não quero ter mais nenhuma palavra daquela voz para lembrar não quereria que a minha amiga tivesse que ouvir mais nada. Saio. Longa pausa de silêncio e três cigarros.

Espreito discretamente e ainda oiço aquela voz maldosa. Recuo para o exterior de segurança. Volto a tempo de ouvir outra voz, uma voz de quem soube amar e cuidar e amou e ama, a dizer as últimas palavras e belas, antes da partida para a última morada. A voz e as palavras – aquelas – as únicas que valem a pena.

Resistência | Quarteto de veteranos com saldo positivo em Zhaoqing 

Como diz o povo português, “velhos são os trapos”. Pois bem, quatro nomes incontornáveis do automobilismo de Macau voltaram a juntar-se para disputar as “6 Horas de Endurance do Circuito Internacional Guangdong” no passado dia 8 de Outubro, uma prova de resistência para viaturas de Turismo que se disputa todos os anos no circuito permanente dos arredores da cidade de Zhaoqing

 

[dropcap]O[/dropcap] quarteto da “250 Macau Spirit Racing” – o ano passado a equipa chamava-se “246 Macau Spirit Racing” por razões óbvias – voltou a ser composto por Rui Valente (59), Ricardo Lopes (59), Belmiro de Aguiar (65) e José Mariano da Rosa (67), que se sentaram novamente aos comandos do Honda Integra Type-R nº20, um carro que já tem alguns anos, mas ainda está distante da provecta idade daqueles que o conduziram.

Deste tétrade apenas Rui Valente continua assiduamente activo no desporto motorizado local, mas como o próprio admitiu, desta vez “os meus companheiros de equipa empenharam-se mais e rodaram todos mais rápido que o ano passado”. E foi mesmo o ex-regular da Corrida da Guia do Grande Prémio de Macau a realizar a qualificação, colocando o Honda na segunda posição da grelha de partida de dezanove viaturas, tendo apenas sido superado por um inalcançável e muito mais moderno Audi R8 LMS TCR, carro que haveria de vencer a corrida com um certo à vontade.

Os quatro veteranos do território realizaram uma prova isenta de erros, mas as paragens nas boxes acabaram por prejudicar um melhor resultado. “Rodámos sempre em segundo da geral nas duas primeiras horas, mas quando tivemos que atestar de gasolina e mudar de pneus perdíamos muito tempo”, explicou Rui Valente ao HM.

Com cada piloto autorizado a fazer turnos de condução com o máximo de 75 minutos, Rui Valente fez a partida, para depois passar o volante a Ricardo Lopes, para uma hora depois ser a vez a “Miro”, antes do mais graduado de todos, Mariano da Rosa, assumir os comandos. Até à mostrarem da bandeira de xadrez Lopes, “Miro” e Valente voltaram a sentar-se no cockpit do carro japonês. “Chegámos a cair até nono, mas depois fomos subindo outra vez. Quando voltei à pista, a uma hora e dez minutos do fim, só foi possível ir até ao 5.º lugar da geral e ganhar a nossa classe, pois ficámos ainda a duas voltas do quarto e do terceiro classificados”.

Parar é que não

A equipa da RAEM não conseguiu repetir o pódio à geral, mas venceu a sua classe e no final o saldo era positivo. “Foi pena não termos acabado nos três primeiros, mas acho que quinto lugar obtido foi bom”, disse, em jeito de balanço, Rui Valente.

Num ano atípico para o automobilismo na região, os quatro macaenses não têm planos para voltar a competir este ano, como confirma Rui Valente, o mentor desta iniciativa. “Este ano não, mas esperamos voltar já em 2021”, até porque os planos para o futuro próximo passam por “continuar a fazer corridas de resistência na China”.

Regressar ao Grande Prémio de Macau não está nos planos destas “velhas glórias”, com a excepção de Rui Valente, que lá estará no Grande Prémio de Macau no mês de Novembro, no pelotão da Taça de Carros de Turismo de Macau. Contudo, “desacelerar” não é uma palavra que esteja no vocabulário do quarteto da “250 Macau Spirit Racing” e poisar o capacete não é uma meta a atingir a curto prazo.

Içado sinal 1 de tempestade tropical

[dropcap]O[/dropcap]s Serviços Meteorológicos e Geofísicos de Macau (SMG) emitiram ontem um alerta de tempestade tropical. As autoridades de Macau indicaram que o sinal número 1 foi emitido “às 22:00”, quando a depressão tropical estava “a cerca de 770 quilómetros” a sudeste de Macau, indicaram, em comunicado.

A depressão tropical “está a intensificar-se gradualmente e vai continuar a mover-se para oeste” em direção a Hainão, a sul da China, acrescentou a mesma nota. Os SMG referiram ainda existir uma “probabilidade relativamente alta” de emitirem o sinal número 3, na segunda-feira à noite.

Para este ano, as autoridades de Macau disseram prever quatro a seis tempestades tropicais no território em 2020, algumas delas podendo mesmo “atingir o nível de tufão severo ou super tufão”.

Plano Director II – Centro, para que te quero?

[dropcap]F[/dropcap]oi apenas no último quartel do séc. XX que se iniciaram infra-estruturas na Europa que permitiriam a necessária e efectiva reabilitação das qualidades que são intrínsecas ao centro das cidades, entretanto exaustos ou abandonados. Nomeadamente o estabelecimento de transportes colectivos de condução automática e generalizada à periferia, inclusivamente aos aeroportos, e que levariam os residentes a prescindir da utilização de automóveis próprios na cidade.

A tarefa enfrentou dificuldades semelhantes à de levar no passado o caminho de ferro ao centro de cidades já consolidadas, todavia em cidades já maiores, mais consolidadas, mais densificadas e mais intensificadas.

Foi essa a génese das linhas expresso de metropolitano urbano e suburbano, escavadas mais fundo às já existentes, que teriam estações de correspondência no centro da cidade e onde necessariamente foram sacrificados quarteirões para construção dessas estações e de instalações auxiliares ou complementares.

Foi também quando os transportes colectivos passaram a ser planeados em modo “seamless”, i.e. contínuo, com ligações de correspondência cómodas e resguardadas da intempérie.

Foi para isso que se demoliu em 1971 o mercado Les Halles no centro da cidade de Paris e se lançou mais tarde mão à obra de Potsdamer Platz em Berlim em 1990, imediatamente à reunificação da Alemanha e à queda do muro, e que foi considerada o maior estaleiro que a Europa alguma vez conheceu.

Ou seja, os castros históricos da cidade poderão permanecer imutáveis, mas os centros da cidade contemporânea não. Ou se aperfeiçoam dia a dia, ou se degradam também dia a dia.

À escala de Macau já se efectuaram duas intervenções semelhantes, uma no Tap Seac, outra na Praça Ferreira do Amaral, mas onde muito pouca coisa concorreu nessas oportunidades.
No caso de Berlim sequer foi necessário empreender demolições, pois a Segunda Guerra Mundial se encarregara disso. Potsdamer Platz era por onde o muro de Berlim passava e onde toda essa cintura fora limpa de destroços no pós-guerra, mas não foi reconstruída, para vigilância e segurança da nova linha de fronteira.

Mas é também em Berlim onde melhor se percebe o que o centro significa para uma cidade, exactamente por via de dele ter sido privada.

Com a divisão no pós-guerra do território alemão e da sua capital pelas forças aliadas, apenas a França, a Inglaterra e os Estados Unidos aderiram a que as suas ocupações integrassem o mesmo novo estado alemão.

A repercussão disso em Berlim foi que apenas os sectores da cidade ocupados por esses aliados se unificassem e pertencessem ao novo estado Alemão Federal, todavia separados do sector soviético da cidade, o qual tinha continuação para o território do outro novo estado alemão a que pertenceu, a Alemanha Democrática.

A questão releva porque o centro de Berlim estava no sector soviético e aí permaneceu como o centro de Berlim, capital da República Democrática Alemã. Os sectores francês, inglês e americano eram constituídos por periferias da cidade original, e passaram a relacionar-se entre si como troços de uma cidade sem centro, e onde lugares junto ao muro, outrora bairros de prestígio muito perto do centro, como Potsdamer Platz e Kreuzber, passaram a ser as traseiras de uma cidade nova.

Daqui também se extrai que Berlim Oriental teve condições para ser a capital da República Democrática Alemã, mas Berlim Ocidental não teve condições para ser a capital da República Federal Alemã.
Mais ainda releva o facto de que foi nestas mesmas condições que o município de Berlim Ocidental geriu urbanisticamente a cidade, durante mais de 50 anos, sem cuidar de a resolver.

Efectivamente a sanação dessa situação não passava por planeamento urbanístico ou por reordenamento territorial. Passava antes por restabelecimento de outras condições cuja base não era de ordenamento territorial, todavia necessárias para que planeamento urbanístico se cumprisse com sentido.

No mesmo ano de 1990 em que as repúblicas alemãs se reunificaram e o muro de Berlim caiu, a obra de Potsdamer Platz foi imediatamente lançada e essa foi a oportunidade e o principal instrumento que serviu para “coser” o tecido urbano original, reunificando e reapetrechando.
Efectivamente retirar ou desactivar o centro de uma cidade é o mesmo que desorganizar, desarticular ou descomandar um organismo.

Por outro lado, o oposto, i.e. o excesso de concentração e de intensificação dos centros, e que se designa pode macrocefalia, por analogia ao que acontece com outros organismos, poderá ser outra forma de disfuncionalidade, se os instrumentos necessários para essa gestão não estiverem disponíveis, não produzirem resultados eficazes ou forem desproporcionais aos recursos do território.

Nessas situações poderão prosseguir medidas de descentralização, que não passa por repetir o centro, antes de intensificar outros centros de hierarquia inferior ao abrigo da “teoria dos lugares centrais”, ou especializar esses centros, sendo que existiram sempre funções que são reservadas ao centro que se encontra no topo dessa hierarquia.

É também assim que se administram estruturas governamentais, nisso o ordenamento territorial não é muito diferente, pelo que não é difícil obter o mesmo entendimento por parte de quem governa territórios.

O Projecto do Plano Director apresentado para a RAEM caracteriza-se por “Um Centro, Uma Plataforma, Uma Base” e propõe o uso de “portais”, “centros modais”, “cinturas” e “núcleos” para criar a nova estrutura espacial urbana.

Esses termos preenchem o que se descrevem atrás a respeito de ligações com outras regiões (portais), especialização articulada de centros (núcleos e centros modais), assim como novas acessibilidades, se bem que só periféricas (cinturas). Nada se menciona a respeito do centro que organiza, articula, norteia ou comanda todo este organismo.

As designações utilizadas são “Centro Mundial de Turismo e Lazer” que antes corresponde a uma especialidade extensível a toda a Região Administrativa Especial, “Centros Modais de Cooperação Regional”, todavia todos localizados na periferia e “Centro Histórico” incluído na zona consolidada da península de Macau, para a qual não foi definida nenhuma estratégia.

É isso o que reveste o projecto de Plano Director mais em sentido de Plano de Urbanização de novas zonas, e menos de Plano Director de toda a região.

O projecto contempla que se preservem as actuais zonas comerciais concentradas na Avenida de Almeida Ribeiro e na ZAPE, destinadas essencialmente às actividades de comércio e serviços, nomeadamente as actividades comerciais, os escritórios, as actividades financeiras, de retalho, de restauração, de convenções e exposições, entre outros.

Tudo funções que caracterizam um CBD (Central Business District), mas nada sobre a sua intensificação, o seu reapetrechamento ou a sua actualização como centro de um organismo com um novo desenvolvimento urbano. Ou seja, algo que evolui em sentido de microcéfalo, de que não se conhece exemplo em urbanismo.

A medida mais sugere ser temporária, e que esse centro passe entretanto a ser noutro local, ou sequer na RAEM, e que o actual centro só não será para implodir porque incluiu um centro histórico classificado património mundial.

O mesmo é dizer que o actual centro evoluirá em sentido de castro histórico, mas isso também não prescinde de dever ser funcionalmente e acessivelmente apetrechado, por não é exclusivamente arqueológico ou museográfico.

Mesmo que a intenção seja de entregar o centro e os bairros antigos à estratégia económica neoliberal, que foi o modo mais generalizado como as cidades conseguiram conduzir renovação urbana no passado recente, essa massa económica carece de apetrechamento e de interfaces.

A pergunta simples, com alcance de aperfeiçoamento de Plano Director, é:
– À chegada a Macau, para onde se vai apontar o sinal de “centro”, e como lá se chega?

Global Media | Paulo Rego anuncia saída da administração

[dropcap]O[/dropcap] administrador não executivo do Global Media Paulo Rego anunciou no sábado a saída da administração de um dos maiores grupos de comunicação social portugueses, detentor de títulos como Jornal de Notícias e Diário de Notícias.

“Fiz a minha parte nesta administração. Chegou a altura de me demitir. A KNJ acredita no futuro desta companhia, mas não está directamente envolvida nas actuais circunstâncias”, escreveu Rego, representante da companhia de Macau KNJ, do empresário Kevin Ho, na carta enviada ao conselho de administração e à qual a Lusa teve acesso.

“A empresa encontrou o caminho para o futuro, com um novo accionista que traz uma nova força ao GMG [Global Media Group]. Já não depende de mim”, acrescentou na missiva, escrita em inglês, numa referência à entrada do empresário Marco Galinha, proprietário do grupo Bel.

Em Setembro, a Global Media, que detém ainda a rádio TSF, entre outros títulos, anunciou a conclusão de um acordo com o grupo Bel do empresário Marco Galinha para a entrada como accionista de referência no GMG. De acordo com a imprensa, Marco Galinha terá ficado a deter 40 por cento daquele grupo de ‘media’.

Livro | José Luís Peixoto apresenta “Regresso a Casa”, onde a Ásia marca presença

José Luís Peixoto, escritor, lançou em Agosto um novo livro de poemas que não é mais do que um retrato das experiências vividas pelo autor, onde se incluem viagens pela Ásia. Países como a China, Tailândia ou Coreia do Norte são retratados na obra editada pela Quetzal

 

[dropcap]“R[/dropcap]egresso a Casa”, lançado por José Luís Peixoto em Agosto, é o mais recente livro de poesia do escritor que já esteve em Macau, a propósito do festival literário Rota das Letras. Nesta obra, o autor lança um olhar sobre si próprio, a sua carreira literária, mas também sobre algumas das viagens que já realizou.

É a vez de José Luís Peixoto regressar à Coreia do Norte, país onde esteve na qualidade de turista e que levou à publicação de “Dentro do Segredo – Uma Viagem pela Coreia do Norte”. No “25.º andar do Hotel Yanggakdo”, nome do poema introdutório do capítulo sobre a Coreia do Norte, o autor descreve o seu corpo “talvez dissolvido no cheiro dos lençóis, detergente / ácido e pobre, ou talvez espalhado sobre estas alcatifas”, enquanto recorda memórias de infância. Ou aquele em que “No topo da Torre da Ideia Juche”, Peixoto diz que “às vezes, parece que consigo distinguir vento na paisagem”. É um lugar que é “uma praça vazia, é um hotel em construção / permanente, um hotel de 330 metros de altura / em construção permanente”.

“Tive oportunidade de visitar a Coreia do Norte por cinco vezes desde 2012”, contou José Luís Peixoto ao HM. “Por motivos bastante evidentes, que se prendem com as especificidades socio-políticas do país, e não só, essa é uma experiência muito marcante na minha vida. Além disso, escrevi um livro e múltiplos artigos, que dão conta das leituras e da atenção que dediquei a esse país.”

Segue-se a China, cujo capítulo arranca com o poema “Palácio de Verão”. Mas há também “Chengdu”, onde o autor escreve: “Impressiona-nos estar tão longe de casa”, e onde, no Parque do Povo, “pousamos chávenas de chá sobre as mesas de pedra”.

José Luís Peixoto confessa que os poemas escritos sobre a China “são uma pequeníssima ‘janela’ para horizontes a que me quero dedicar de forma muito mais consequente no futuro”.

“A China, do passado e do presente, é um espaço que lança algumas das questões mais fundamentais deste tempo e, mesmo, da natureza humana. Nos breves exemplos deste livro, pretendi abrir uma passagem para esse trabalho que quero levar a cabo. Nestes poemas, tracei linhas entre o remoto e o íntimo, propondo um contraste entre referências que, para uma perspectiva portuguesa, podem ser consideradas ora ‘exóticas’, ora ‘familiares’”, afirma.

E depois, aparece a Tailândia. Peixoto começa por descrever a experiência única de andar de tuk-tuk. “Inclino-me nas curvas, sou projectado para trás / nos arranque da aceleração / agarro-me bem / vou numa moto-táxi no trânsito de Banguecoque / escuto black metal escandinavo”.

Mas há também relatos da “Aldeia da tribo Mlabri”, cujos membros “mudam de lugar assim que amarelecem as folhas / de bananeira que usam para cobrir os telhados”.

Para José Luís Peixoto, estar na Tailândia constituiu uma experiência bastante diferente daquela que viveu na China, por exemplo. “Embora a Tailândia tenha relações importantes com a China, existem diferenças enormes entre essas duas realidades. Este livro de poesia tem uma abordagem muito pessoal aos temas e, por isso, a minha própria experiência acaba por ser também muito marcante na forma como abordo essas duas culturas.”

A ideia de “Casa”

José Luís Peixoto não consegue enumerar um poema preferido de “Regresso a Casa”, talvez porque o “assunto mais central seja a ideia de ‘casa’”. “De formas muito diversas, todos temos esse espaço nas nossas vidas, quer seja de uma forma física e concreta ou simbólica e subjectiva. Foi nessa reflexão acerca das minhas várias ‘casas’ que o livro foi construído.”

Para isso, o autor faz referências a Galveias, a aldeia alentejana de onde é natural, ou Oeiras, onde actualmente reside. Mas há também poemas sobre “os livros que escrevi e à própria poesia, reconhecendo que também existem essas ‘casas’ imateriais”.

Se há uma casa, há também o regresso, “que implica uma deslocação, uma viagem e, por isso, acabei por me referir também a outros lugares, que estão ligados ao meu percurso e à minha bibliografia, como é o caso da Coreia do Norte, da Tailândia e da China”.

“Regresso a Casa” surge depois das publicações de poesia “A Criança em Ruínas”, “A Casa, A Escuridão” e “Gaveta de Papéis”. “Há cerca de uma dúzia de anos que não publicava um livro de poesia. Ainda assim, esse é um género que tem uma grande presença no meu quotidiano. Não apenas porque faz permanentemente parte das minhas leituras, mas também porque é uma espécie de ‘molde’ para a minha maneira de pensar”, frisou o autor.

José Luís Peixoto tinha, há muito, a ideia de fazer este livro, mas nunca pensou que o projecto iria surgir durante o período de confinamento, devido à pandemia da covid-19. “Quando chegou o confinamento, estava a trabalhar num romance. Interrompi esse trabalho porque as condições desse período não me permitiam manter a continuidade de escrita, assim como de raciocínio. Então, foi nessas circunstâncias que comecei a escrever alguns poemas ligados directamente ao que estávamos a passar. A partir daí, o livro foi expandindo.”

O confinamento acabou por se revelar uma ajuda preciosa. “Teve a vantagem prática de me proporcionar tempo. Senti, no entanto, que a quarentena colectiva gerava uma certa claustrofobia, o que não é favorável à literatura e à poesia. Ainda assim, também é de assinalar que a procura de um certo ‘escape’ nas palavras acabou por propiciar muita escrita. Em qualquer dos casos, seguramente que o livro seria muito diferente se tivesse sido escrito noutro tempo, segundo outras condições”, adiantou.

“Dimensão pessoal”

O último capítulo é dedicado à “Bibliografia”, em que o autor reflecte sobre todos os livros que publicou até então. “Num livro com uma dimensão pessoal tão grande como é o caso deste, creio que está sempre presente a perspectiva do balanço. Neste caso, a referência aos meus próprios livros vem na sequência das múltiplas referências pessoais que o livro inclui, como é o caso da minha família, de lugar específicos…neste ano, passaram 20 anos sobre a edição de autor do meu primeiro livro, que se chama Morreste-me. Esse é um número redondo que instiga à auto-reflexão. Vinte anos já permite retirar algumas conclusões.”

Para José Luís Peixoto, “toda a escrita literária, e a poesia no interior desse imenso território, é sempre um diálogo connosco próprios”. “Por vezes, tornando esse jogo de espelhos ainda mais complexo, trata-se de um diálogo connosco próprios através dos outros. Não apenas da forma como tomamos o outro em consideração enquanto leitor, mas também pela forma como transportamos para a escrita aquilo que são reflexos da forma como vemos o outro. Ainda assim, também nós estamos sempre presentes nesse retrato porque, em última análise, somos nós que observarmos, que escolhemos nomear”, acrescentou.

Terminado o período de confinamento, o autor pretende regressar ao romance que começou a escrever durante a quarentena. “Tem avançado a muito bom ritmo. Acredito que deverá estar pronto para publicação no próximo ano. Oxalá nessa altura toda esta pandemia seja apenas uma memória”, rematou.

APEP | Lista única renova mandato com 24 votos a favor

Filipe Regêncio Figueiredo foi reeleito presidente da Associação de Pais da Escola Portuguesa de Macau na última quinta-feira por mais dois anos. As prioridades são o ensino do mandarim e comunicação mais uniforme entre a direcção e a comunidade educativa. Na assembleia-geral, pais revelaram descontentamento com os novos horários

 

[dropcap]A[/dropcap] lista única candidata à direcção da Associação de Pais da Escola Portuguesa de Macau (APEPM) foi reeleita na quinta-feira com 24 votos e duas abstenções, num universo de 125 votantes inscritos. Ao HM, Filipe Regêncio Figueiredo, que continua presidente, revelou que uma das prioridades da APEP é tentar melhorar o ensino do mandarim na EPM.

“Queremos ver o que é possível fazer para melhorar a aprendizagem da língua. Os pais, em geral, notam pouca evolução. Na assembleia-geral vários pais portugueses disseram não entender como é que não há evolução, enquanto que pais estrangeiros questionaram o método de ensino.”

A APEP pretende também contribuir para melhorar a “comunicação da escola com os pais e a comunidade educativa no geral”.

Na assembleia-geral de quinta-feira, onde esteve presente a direcção da EPM e 30 encarregados de educação, a questão dos horários deste ano lectivo foi a mais abordada. “Foi questionada a razão pela qual deixaram de existir tardes livres e porque é que não há um horário em que os alunos entram todos os dias à mesma hora.”

Da parte da direcção da EPM, presidida por Manuel Machado, ficou a garantia de que estão a ser cumpridas as recomendações da Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ), no sentido de haver 70 minutos de actividades lectivas no período da manhã e da tarde, razão para não existirem tardes livres.

No entanto, relata Filipe Regêncio Figueiredo, um dos pais terá questionado quais seriam as actividades lectivas, alegando que poderiam ser extra-curriculares. No entanto, a direcção da EPM frisou que têm de ser dadas aulas e não outro tipo de actividades.

NetGiae a funcionar

Na assembleia-geral foi também perguntado sobre o ataque informático à plataforma NetGiae, embora “se tenha dado prioridade a outras questões”. O presidente reeleito da APEP disse ao HM que a plataforma já está a ser usada por professores. “Segundo a direcção [da escola], os pais e alunos vão começar a ter acesso ao NetGiae já esta semana, em princípio.”

Quanto aos problemas levantados com o ensino à distância durante o período de confinamento, Filipe Regêncio Figueiredo diz que a EPM tem um plano de contingência caso surjam situações semelhantes.

“Nesse momento, esse plano vai ser analisado pela APEP. Pensamos que neste aspecto as coisas possam funcionar melhor, e que haja uma uniformização dos procedimentos dos professores.”
Apesar de ter sido reeleito, Filipe Regêncio Figueiredo confessou que gostaria de “surgissem outras listas” candidatas à direcção da APEP. “Gostava também que houvesse mais participação dos pais”, rematou.

Tabaco | Pandemia reduz inspecções e multas

[dropcap]A[/dropcap] pandemia da covid-19 levou à redução de inspecções a locais de fumo por parte dos Serviços de Saúde (SS), bem como ao número de multas aplicadas. Ao todo, os SS realizaram 257 inspecções a casinos, onde acusaram 130 pessoas de fumarem em locais proibidos.

O número de inspecções diminuiu 74,1 por cento em relação a igual período do ano passado, enquanto que houve uma redução de 88 por cento no número de pessoas apanhadas a fumar em sítios proibidos por lei.

Quanto aos pedidos de licenciamento de salas de fumo por parte das operadoras de jogo, a maior parte foi aprovada. Segundo os SS, desde o dia 1 de Janeiro até ao dia 30 de Setembro foram recebidos pedidos de 40 casinos para o licenciamento de 751 salas de fumo, tendo sido autorizadas 736 salas, distribuídas por 38 casinos.

Fora do contexto de jogo, os SS realizaram 123.730 inspecções em estabelecimentos do território, menos 52,13 por cento do que entre os meses de Janeiro e Setembro de 2019. Do total de 1766 acusações proferidas, 1744 dizem respeito a pessoas identificadas a fumar em zonas proibidas, enquanto que apenas 21 casos se referem à ilegalidade dos rótulos dos produtos de tabaco. Houve apenas um caso de venda ilegal de tabaco electrónico. Quanto ao pagamento das multas, 81,9 por cento fizeram o respectivo pagamento.

O mesmo comunicado dá conta da existência de 103 locais com a maior incidência de infracções, onde se incluem o espaço de jogo Mocha Golden Dragon e o edifício Heng Wan, na zona de lazer da Rua Norte do Patane. Nestes locais foram realizadas 357 inspecções e emitidas 70 acusações.

GPDP | Valor total das multas aumentou 244,1% em 2019

O relatório anual de 2019 do Gabinete de Protecção de Dados Pessoais mostra que foram aplicadas sanções em 40 processos de investigação, e emitiu 24 talões de multa – que chegaram a 929 mil patacas. O coordenador do GPDP alerta para os “testes severos”, decorrentes do desenvolvimento da informatização

 

[dropcap]A[/dropcap]o longo do ano passado, as multas impostas pelo Gabinete de Protecção de Dados Pessoais (GPDP) atingiram 929 mil patacas, o que representou uma subida de 244,1 por cento em relação ao ano anterior. Dos 24 talões de multa emitidos em 2019, seis envolveram marketing de beleza, num montante de 715 mil patacas, revela o relatório anual do GPDP referente a 2019.

No prefácio do relatório, o coordenador do GPDP descreve as dificuldades que os organismos de protecção de dados enfrentam. Yang Chongwei indica que ao longo dos últimos anos “o grau da informatização social atingiu um nível sem precedentes”. “Devido ao rápido desenvolvimento da informatização, ainda existem brechas na legislação e riscos no mundo virtual, [e] acontecem, de vez em quando, actos de violação da privacidade das pessoas, trazendo testes severos para autoridades de protecção de dados pessoais das diversas regiões”, acrescenta.

O GPDP deu início a 155 processos de investigação no ano passado, e a contar com 122 que transitaram de 2018, o organismo tratou de 277 casos em 2019, dos quais 149 foram concluídos. Vale a pena notar que se em 40 dos casos concluídos (26,8 por cento) foram aplicadas sanções, em 31,5 por cento houve falta de provas.

Das investigações que arrancaram em 2019, mais de 62 por cento incidiu sobre a falta de legitimidade do tratamento de dados pessoais, enquanto 55,5 por cento se referia à falta de protecção dos direitos dos titulares dos dados. Foram ainda investigados três casos de acesso indevido, e um de violação do dever de sigilo. Mais de 85 por cento processos foram instaurados depois de queixas e denúncias de cidadãos. Apenas nove por cento resultou de intervenção por iniciativa própria da entidade.

Além disso, a maioria das entidades investigadas eram privadas (201) – onde se destacaram serviços de promoção e de consultadoria – mas também foram sujeitos a escrutínio 31 indivíduos e dez entidades públicas.

Casos arrumados

Um dos casos que o relatório destaca é sobre um estabelecimento comercial que pagou as contribuições para o regime da segurança social durante seis anos, relativas a um indivíduo que não trabalhava na empresa. O documento indica que havia uma “confusão na gestão de dados de trabalhadores” do estabelecimento, o qual não tinha legitimidade para tratar os dados pessoais do indivíduo, pelo que foi multado em 30 mil patacas.

Noutro âmbito, aparece um caso que envolve sistemas de videovigilância e gravação telefónica instalados num centro, sem o relatório especificar qual. Na apresentação do processo indica-se que “os estudantes, que vivem no centro, não podem levar consigo os telemóveis podendo apenas utilizar o telefone do centro que tem função de gravação de som para ligar para fora”. Foi aplicada uma multa de nove mil patacas ao centro.

Multiplicaram-se pedidos

Em 2019, o GPDP recebeu 72 pedidos de autorização, representando um aumento de 188 por cento em comparação aos 25 pedidos de 2018. Já em relação aos pedidos de notificação, 205 disseram respeito à transferência de dados para fora da RAEM.

Por outro lado, em 2019 deu-se o pico mais alto dos últimos cinco anos de pedidos de consulta. De um total de 2.940 pedidos, uma subida de 60,7 por cento face ao ano anterior, a videovigilância foi o quinto tema mais frequente. Foram ainda pedidos 44 pareceres ao GPDP, 40 apresentados por entidades públicas e quatro por privadas e indivíduos.

Os Serviços de Alfândega pediram um parecer sobre a utilização de videovigilância em veículos e embarcações de serviços. Descrevendo que as finalidades de utilização não cumprem o regime jurídico da videovigilância em espaços públicos, o GPDP sugere no parecer que as câmaras funcionem como auxílio na aplicação da lei, apenas com a captação imagens do patrulhamento diário, e para supervisão do processo de aplicação da lei pelo pessoal dos Serviços de Alfândega.

O GPDP descreve que devem ser eliminadas imagens de casas de banho, templos e hospitais, entre outros locais, que sejam filmados sem intenção. E é exemplificado que “não devem ser filmadas, de forma excessiva, as imagens da área marítima fora da jurisdição de Macau”.