OMS | Estudo revela que uma em cada seis pessoas no mundo sente-se só

Um relatório da Organização Mundial de Saúde refere que a solidão é um problema crescente. Baseado num estudo realizado entre 2014 e 2023, o documento concluiu que uma em cada seis pessoas no mundo se sente só, com destaque para jovens dos 13 aos 29 anos. A região do Sudeste Asiático apresenta, contudo, valores menos problemáticos

 

Cada vez se fala mais do impacto devastador da solidão como causa potencializadora de doenças. Desta vez, um relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS), divulgado na segunda-feira e realizado pela Comissão para a Conexão Social, traz dados sobre o problema, concluindo que uma em cada seis pessoas diz sentir-se só, um estado que não sinónimo de estar sozinho.

Além disso, o problema é maior nos mais jovens, pois um em cada cinco diz sentir-se só, o que mostra que um quinto da população mundial entre os 13 e 29 anos diz sentir solidão.

O estudo, intitulado “Da solidão à conexão social – traçando um caminho para sociedades mais saudáveis: relatório da Comissão da OMS sobre Conexão Social”, incide sobre os anos de 2013 e 2024, abrangendo, portanto, a pandemia, um período em que grande parte das populações mundiais enfrentaram períodos de confinamento, algumas delas sozinhas nas suas habitações. O estudo foi enviado a jornalistas de 194 países membros da OMS, e os dados foram tratados em consonância com outros trabalhos já realizados sobre o tema e com apoio de especialistas de todo o mundo, incluindo da China. Bin Yu, do Medical College Tianjin University, foi um dos participantes do projecto.

O relatório aponta que entre 2014 e 2023 “estima-se que 16 por cento das pessoas em todo o mundo – uma em cada seis – sentiram a solidão”, algo que “afecta todas as idades e regiões”. Porém, é um sentimento “mais comum entre adolescentes e adultos jovens”, com uma taxa de 20,9 por cento de jovens entre os 13 e 17 anos, enquanto que a taxa reduz um pouco, para os 17,4 por cento, no caso dos jovens adultos dos 18 aos 29 anos.

O sentimento de solidão “diminui com a idade”, sendo também “mais comum em países de baixos rendimentos, onde quase uma em cada quatro pessoas (24 por cento) afirmou sentir-se solitária”.

O estudo da OMS destaca ainda que “as taxas mais elevadas se encontram na região africana da OMS”, com 24 por cento; seguindo-se as regiões do Mediterrâneo Oriental (21 por cento), sendo que no Sudeste Asiático esse sentimento é menos sentido pelos inquiridos, registando-se apenas 18 por cento.

“A região europeia tem a taxa mais baixa, com cerca de dez por cento”, diz a OMS, que distingue solidão de isolamento social. Neste campo, “os dados são mais limitados”, mas destaca-se o isolamento dos idosos. “As estimativas sugerem que 25-34 por cento dos idosos estão socialmente isolados”, tratando-se de dados relativos aos anos entre 1990 e 2022.

Quando se chega à idade adulta, dos 30 aos 59 anos, a percentagem de pessoas que se sente só baixa para 15,1 por cento, sendo que nas pessoas com 60 anos ou mais é ainda menor, com 11,8 por cento.

Relativamente ao género, “as taxas estimadas de solidão em mulheres e homens são semelhantes (16,1 e 15,4 por cento, respectivamente), com as maiores diferenças estimadas entre adolescentes (24,3 por cento entre mulheres e 17,2 por cento entre homens) e idosos (13 por cento entre mulheres e 9,9 por cento entre homens)”.

Quem mais sente

O relatório refere que hoje em dia “a desconexão social é generalizada em todas as regiões e em todas as faixas etárias”, com consequências que são “graves e subestimadas, afectando a mortalidade, a saúde física e mental, o bem-estar, a educação, a economia e a sociedade em geral”. “A sua ocorrência generalizada e as suas graves consequências tornam-na uma questão séria de saúde pública global “, é referido.

E quem se sente mais sozinho? A OMS dá destaque a “grupos marginalizados”, nomeadamente “pessoas com deficiência, lésbicas, gays, bissexuais, transgéneros, intersexuais, queer (ou, por vezes, em questionamento) e outros indivíduos (LGBTIQ+) e migrantes”. Estas pessoas “são mais propensas a sentir solidão e isolamento do que outros grupos”, deixando-se a ressalva que “os dados anteriores são demasiado limitados para determinar se as taxas de isolamento social e solidão aumentaram ou diminuíram”.

No caso dos portadores de deficiência, persistem cenários como não conseguir “aceder a instalações sociais e aproveitar oportunidades devido a barreiras físicas nos edifícios, acesso limitado a transportes e falta de informação e comunicação acessíveis, enquanto outras enfrentam estigma estrutural que limita as suas oportunidades de emprego ou outras barreiras socioculturais que levam a um nível de educação mais baixo, relações menos estáveis e condições de habitação mais precárias”.

São identificados “muitos factores” que levam as pessoas a sentir-se sozinhas, nomeadamente a “modernização, industrialização e as mudanças tecnológicas”, podendo ser “responsabilizados pelo que, muitas vezes, se presume ser um aumento do isolamento social e da solidão, mas a maioria permanece sem comprovação”.

“Sabemos que certos fatores aumentam o risco de os indivíduos sofrerem de desconexão social. Estes incluem má saúde física ou mental (especialmente depressão), traços de personalidade como neuroticismo, não ter um parceiro ou ser solteiro, viver sozinho e características do ambiente construído, como mau acesso a transportes públicos. O impacto da tecnologia digital ainda não é claro, mas os especialistas recomendam cautela, especialmente para proteger a saúde mental e o bem-estar dos jovens”, é ainda referido no estudo.

A OMS destaca, ao longo de todo o texto, como é difícil quantificar sentimentos de solidão, sendo relativamente recentes este tipo de definições e, sobretudo, diferenciação entre o sentimento de sentir-se só e o estar efectivamente só. O relatório inclui testemunhos de pessoas de vários países e culturas que descrevem que, mesmo estando com um companheiro ou amigos, sentem-se sós, num cenário causado por muitos factores.

No caso dos jovens, “a constatação de elevadas taxas de solidão entre adolescentes é consistente com os resultados de pesquisas anteriores, embora o resultado possa estar sujeito a considerações tanto de desenvolvimento como metodológicas”.

“Como a solidão resulta de uma discrepância percebida entre as conexões sociais reais e as desejadas ou esperadas, a taxa mais elevada na adolescência pode ser devida a expectativas mais elevadas de conexões sociais durante a fase de desenvolvimento, que é marcada por mudanças emocionais e psicológicas significativas. Os idosos relatam uma satisfação comparativamente maior com as suas relações sociais. De acordo com estas estimativas, os idosos apresentam as taxas mais baixas de solidão, o que contradiz estudos anteriores que realçavam os idosos como a faixa etário com algumas das mais elevadas taxas. Isto pode ser devido à disponibilidade e qualidade limitadas dos dados anteriores sobre idosos”, é explicado.

O estudo destaca, porém, ser “possível que a prevalência da solidão seja maior entre os adultos com 80 anos ou mais”, tratando-se de uma “conclusão consistente com estudos anteriores, nos quais se verificou uma distribuição em forma de ‘U’ de solidão entre os adultos mais velhos”.

Mais de 800 mil mortes

Estamos numa era em que a chamada saúde social está em risco, sendo considerada pela OMS como “um pilar vital, mas muitas vezes negligenciado, de saúde, tão essencial quanto a saúde física e mental”.

“As relações sociais podem reduzir o risco de doenças, aumentar a esperança de vida e fortalecer o tecido das comunidades e da sociedade. As relações sociais melhoram a vida, dando-nos significado e um sentimento de pertença”, lê-se ainda, sendo referido que hoje a solidão afecta uma em cada seis pessoas em todo o mundo e causa “cerca de 871.000 mortes anualmente (2014-2019)”.

“Novas estimativas sugerem que a solidão, por si só, pode ser responsável por cerca de 871.000 mortes por ano. O custo económico destes impactos abrangentes na sociedade está apenas a começar a ser compreendido. As estimativas sugerem custos substanciais para os empregadores, os sistemas de saúde e cuidados e os indivíduos. Ligações sociais mais fortes proporcionam uma protecção importante nos domínios da saúde, social e económico”, lê-se.

O relatório destaca que muitas destas questões só agora começam a ser percepcionadas e analisadas. “Provavelmente isso já acontece há anos, mas a pandemia da doença coronavírus 2019 (covid-19) e a crescente preocupação com a tecnologia digital trouxeram mais atenção para a questão, inclusive por parte dos governos”, é explicado.

A OMS aponta ainda uma correlação entre a pobreza ou baixos rendimentos e o sentimento de solidão.
“Em geral, quanto mais baixo é o grupo de rendimento de um país, maior é a taxa de solidão. Estima-se que os países de baixo rendimento tenham a prevalência mais elevada (24,3 por cento), seguidos pelos países de rendimento médio-baixo (19,3 por cento), países de rendimento médio-alto (12,1 por cento) e países de alto rendimento (10,6 por cento)”, pode ler-se.

Apesar de alguns cenários preocupantes, a OMS deixa algumas sugestões e diz mesmo que “há esperança” para contornar o problema. “Existem estratégias eficazes para promover a conexão social e estas devem ser ampliadas”, passando, por exemplo, pelo “monitoramento regular da prevalência da conexão social, do isolamento social e da solidão em nível global, regional e nacional”. Esse monitoramento deve ser encarado como “uma alta prioridade”, permitindo “acompanhar o progresso e medir o impacto das estratégias para lidar com a questão”.

Sugere-se ainda o “desenvolvimento e a adopção, a nível internacional, de instrumentos de medição fiáveis, válidos interculturalmente para a conexão social, o isolamento social e a solidão”, devendo ser encarada “como prioridade” a criação “de um instrumento para medir a conexão social, tal como concebida neste relatório: nas três dimensões de estrutura, função e qualidade”.

O estudo teve como base documentos de referência sobre estimativas globais e regionais da prevalência da solidão e da mortalidade devido à solidão, “as primeiras desse tipo”; uma revisão global de documentos políticos; mapeamento e análise de redes, a inclusão de 64 experiências vividas por pessoas em relação à conexão social, isolamento social e solidão, bem como “evidências de alta qualidade, priorizando revisões sistemáticas, meta-análises e estudos multinacionais em grande escala”, sem esquecer a experiência do próprio Grupo Consultivo Técnico da OMS sobre Conexão Social, “composto por 20 especialistas globais de renome”.

1 Jul 2025

Cinemateca | Festival de Cinema Infantil até Agosto

Julho e Agosto são meses do calendário guardados para a edição deste ano do Festival Internacional de Cinema Infantil de Macau, com exibições na Cinemateca Paixão. A iniciativa, do Instituto Cultural, integra-se na programação do Festival de Artes de Macau e traz os grandes clássicos para a infância, como “Aladino” ou “Rei Leão”

 

O Verão está aí e com ele também os grandes clássicos do cinema infantil que marcaram gerações, primeiro os pais, e agora os filhos. São estes clássicos que integram a edição deste ano do Festival Internacional de Cinema Infantil de Macau, integrado no Festival de Artes de Macau, e que decorre ao longo deste mês de Julho e de Agosto na Cinemateca Paixão.

Esta iniciativa do Instituto Cultural (IC) pretende levar às salas de cinema os mais pequenos e revelar-lhes histórias repletas de emoção e fantasia, muitas delas feitas numa época em que os telemóveis não eram ainda uma realidade. Nesta que é a segunda edição do festival, dedicada também aos “graúdos com um espírito jovem”, apresentam-se filmes integrados em várias secções, sendo possível ver ou rever “Aladino”, “O Rei Leão”, “Cinderela” ou ainda títulos mais recentes “George, o Curioso”, “Happy Feet” ou “Paddington no Perú”, entre tantos outros.

Numa das secções do festival, intitulada “Transformações Cinematográficas”, inclui-se uma selecção de filmes adaptados de livros infantis e ilustrados; ou ainda a secção “Clássicos para Todas As Crianças” que apresenta “animações originais, como a Branca de Neve e os Sete Anões, permitindo aos mais novos reviver o encanto das histórias clássicas”, descreve o IC.

Dentro dos clássicos, “O Rei Leão” exibe-se no dia 27 de Julho a partir das 15h e traz uma conversa pós-exibição. Apesar de este filme ter uma edição mais recente, é a versão de 1994 que será exibida na Cinemateca, repleta das emoções do jovem leão Simba em luta contra o seu tio Scar, ambicioso e mau que o leva a acreditar ter sido responsável pela morte do seu pai. Porém, Scar apenas quer liderar o reino. Nesta luta, Simba cresce, apaixona-se e ganha dois amigos, Timon e Pumba. Estes personagens acabaram, eles próprios, por ser integrados noutros projectos de animação.

No mesmo dia, mas às 11h, é a vez de ver “Aladino”, o homem do tapete voador, sendo exibida a história feita nos anos 90 que será depois analisada numa conversa pós-exibição. Dentro dos clássicos, no dia 20 de Julho apresenta-se uma versão antiga da “Branca de Neve e dos Sete Anões”, neste caso de 1937, quando a Cinderela tenta escapar à madrasta e às meias-irmãs más e feias, indo em busca do seu príncipe encantado.

Os mais recentes

Numa onda mais contemporânea, a Cinemateca Paixão exibe “Paddington na Amazónia”, filme do ano passado, numa versão que tem dobragem em cantonês. A exibição acontece sábado, 26 de Julho, e revela a história do urso que adora marmelada e fica perdido na selva, “numa aventura emocionante e cheia de perigos”.

Já este sábado, serão exibidas algumas curtas de animação, a partir das 15h. É o caso de “George, O Curioso”, em que “o explorador Ted, o homem do chapéu amarelo, viaja até África na esperança de recuperar um artefacto importante para o seu amigo Bloomsberry, director de um museu”. Porém, acaba por encontrar-se com George, um “macaco inquieto”, que se esconde no navio que traz Ted de volta a Nova Iorque. É então que se iniciam uma série de aventuras de um macaco metido no meio da cidade. Nessa mesma tarde exibe-se “Toc, Toc! Os Pequenos Animais Estão a Chamar”.

No domingo, dia 6, exibe-se novamente esta última curta, ao lado de “Onde Vivem os Monstros”. A partir das 11h é possível conhecer a história de “Max”, um “rapaz traquina e sensível que se sente incompreendido em casa e foge para onde vivem os monstros”. É então que ele chega a uma “ilha onde conhece criaturas misteriosas e estranhas, com emoções tão selvagens e imprevisíveis como os seus comportamentos”, sendo que os “monstros anseiam por um líder que os guie, tal como Max deseja ter um reino para comandar”. “No entanto, ele rapidamente percebe que governar não é assim tão simples, e que as relações nesse novo mundo são mais complicadas do que imaginava”, acrescenta a sinopse desta produção.

1 Jul 2025

Desemprego | Mais residentes com trabalho em três meses

Dados da Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC) revelam que há mais residentes empregados no espaço de três meses, além de que a percentagem de residentes desempregados à procura do primeiro emprego baixou. Estes números, ontem divulgados, dizem respeito aos meses de Março a Maio, em comparação com o trimestre correspondente a Fevereiro a Abril deste ano.

Assim, de Março a Maio, havia em Macau 282.200 residentes empregados, mais 300 pessoas, tendo-se verificado que “o número de residentes empregados do ramo da construção cresceu”.

Porém, “o número de residentes empregados do ramo das actividades financeiras decresceu”. Além disso, o número de residentes desempregados à procura do primeiro emprego representou 8,4 por cento de todos os residentes desempregados, menos 1,8 pontos percentuais, face ao período precedente.

Já o número de residentes desempregados, foi de 7.200, sendo que “a maioria dos que estavam à procura de um novo emprego trabalhou antes nos ramos do comércio a retalho, construção e lotarias ou outros jogos de aposta”.

Em termos gerais, a taxa de desemprego nos meses de Março a Maio foi de 1,9 por cento, enquanto a taxa de desemprego dos residentes foi de 2,5 por cento, “ambas idênticas às do período passado (Fevereiro a Abril)”. A população activa, incluindo residentes e trabalhadores não residentes, era de 380.200 pessoas, menos 400; além de que a população empregada, 373.000, baixou em 200 pessoas, ambos os casos em comparação com os meses de Fevereiro a Abril.

1 Jul 2025

Anabela Santiago, académica: “A China é reformista e moderada”

Anabela Santiago acaba de defender na Universidade de Aveiro a tese de doutoramento que analisa como a China se tem posicionado, nas últimas décadas, como actor importante na “Governança Global de Saúde”. Hoje, Pequim procura “mecanismos alternativos” de cooperação no “Sul Global” e tenta construir um modelo alternativo à Organização Mundial de Saúde

 

 

Comecemos pelo conceito de governança global de saúde (GGS). Trata-se de um conceito mais contemporâneo ou relativo ao período do pós-II Guerra e fundação da Organização Mundial de Saúde (OMS)? Quais têm sido os principais actores desta governança até ao crescimento da China?

A GGS é um conceito cuja proeminência e relevância cresceram significativamente no século XXI, em grande parte impulsionada pela globalização económica e pela interconexão mundial. Embora a saúde global tenha desde sempre transcendido as fronteiras nacionais, exigindo abordagens multidisciplinares e cooperação internacional, apenas a partir de da década de 1990 é que se tomou maior consciência dela. Historicamente, a GGS tem sido influenciada predominantemente por potências ocidentais e por valores neoliberais. Os principais actores desta governança, até ao crescimento da China, foram historicamente marcados por intervenções de entidades como a OMS e organizações não-governamentais, predominantemente norte-americanas e europeias.

Uma das conclusões da sua tese de doutoramento é que a China tem vindo a posicionar-se de forma progressiva nessa liderança. Esse posicionamento começou concretamente quando e porquê?

Sim, a China tem-se posicionado progressivamente como um actor de relevo na evolução do sistema de GGS. Embora não seja possível apontar uma data exacta de início, a China evoluiu de um país relativamente isolado para um actor principal nas arenas política, económica e tecnológica globais. A sua crescente influência económica e política representa uma mudança também na dinâmica histórica da GGS, sendo que já na década de 1960 a China tentava ter um papel de assistência humanitária em saúde nos países vizinhos e em África. A tese destaca que a experiência da China pode ser vista como um exemplo do que é alcançável quando um Estado escolhe o seu próprio caminho em vez de um modelo pré-estabelecido, alinhando-se com a previsão do século XXI como o “Século da Ásia”.

Os anos da pandemia influenciaram esse posicionamento? De que forma?

A pandemia de covid-19 realçou a necessidade de cooperação global em saúde, bem como as consequências potenciais da falha em priorizar a saúde global. A tese explora a evolução da Rota da Seda da Saúde antes e depois da pandemia, indicando que os anos da pandemia permitiram uma maior conscientização da necessidade de instrumentos como a Rota da Seda da Saúde como plataformas de cooperação mais efectiva entre as Nações. Embora não esteja detalhado nesta secção específica, é implícito que a pandemia intensificou a actuação da China na diplomacia da saúde e na assistência ao desenvolvimento em saúde.

Olhando para as reformas internas que a China tem levado a cabo na área da saúde, quais destaca como mais importantes?

Abordo, na tese, as reformas do sistema de saúde da China e destaco que o modelo de governança chinês é uma combinação única de reformas económicas orientadas para o mercado e desenvolvimento liderado pelo Estado, incorporando elementos de neoliberalismo e autoritarismo nas questões políticas em geral, sendo que o sector da saúde não é diferente em nada dos restantes. Uma das contribuições da China mencionadas, reconhecida pela OMS, é o seu modelo de atenção primária à saúde baseado na reconhecida boa prática dos “barefoot doctors” (médicos pés descalços). Além disso, a tese analisa as principais políticas de reforma e o seu progresso e desafios no período de 2009-2018, que compreendem as reformas dos cuidados de saúde primários, a reforma hospitalar e farmacêutica. O programa “Healthy China 2030” também é um referencial importante e ambicioso das reformas domésticas da China em matéria de saúde, abarcando igualmente os determinantes sociais.

É intenção de Pequim criar uma entidade alternativa à OMS, ou simplesmente criar um movimento alternativo que possa coexistir com a OMS, no contexto do relacionamento com o Sul Global? Como poderia isso funcionar?

A tese sugere que a China adopta uma “abordagem dual”: ao mesmo tempo que se integra nas estruturas globais existentes, forja simultaneamente caminhos alternativos, particularmente através de alianças regionais como os BRICS e parcerias com o Sul Global. Isso indica uma intenção de criar um movimento alternativo que possa coexistir e complementar o papel da OMS, em vez de uma entidade alternativa directa. A China demonstra um claro compromisso em alinhar os objectivos da iniciativa “Belt and Road” com os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, mostrando a sua vontade de apresentar estas iniciativas como complementos aos mecanismos de cooperação já existentes na ordem liberal internacional. A visão do Presidente Xi Jinping de uma “Comunidade de Futuro Compartilhado para a Humanidade”, que inclui a noção de “Comunidade Global de Saúde para Todos”, também aponta para uma nova perspectiva no âmbito da cooperação internacional.

Máscaras, vacinas e Medicina Tradicional Chinesa (MTC): quais os produtos ou instrumentos usados pela China para se posicionar como um actor cada vez mais global na GGS?

A tese destaca que a China é um provedor indispensável de bens públicos globais de saúde, essenciais para a cadeia de suprimentos de produtos, como é o caso das máscaras e das vacinas. A MTC também é mencionada como um dos grandes contributos da China para a governança global da saúde, com os seus tratamentos derivados de ervas chinesas, alguns dos quais já reconhecidos pela OMS em 2017. Além disso, a assistência médica chinesa e as equipas médicas enviadas para outras regiões do globo são instrumentos importantes da diplomacia da saúde chinesa.

Na criação de um movimento ou realidade alternativa à OMS, a China poderá estar a tirar partido da falta de uma representatividade plena nessa mesma OMS, ou lacunas no seu funcionamento?

A tese não aborda directamente se a China está a tirar partido de uma falta de representatividade plena na OMS ou de lacunas no seu funcionamento. No entanto, ela enfatiza que o trabalho visa preencher uma lacuna no conhecimento científico em relação ao paradigma da governança da saúde de uma perspectiva não-ocidental e liberal, dando ênfase à China como actor do Sul Global. Isto sugere que a China procura fortalecer modelos alternativos que podem oferecer soluções mais personalizadas para desafios de saúde, diferentes dos defendidos pelos países ocidentais, posicionando-se como um actor reformista moderado.

De que forma a política externa da União Europeia (UE) em relação à China tem afectado ou influenciado este posicionamento do país na governança global da saúde?

Na tese, a quarta publicação, intitulada “Challenges on the European Union-China cooperation in higher education from ‘people-to-people dialogue’ perspective: The case of health-related joint projects”, explora a cooperação no ensino superior, em particular aquela que inclui projectos relacionados com a saúde. Verifica-se, pois, que, apesar do diálogo estratégico e económico, a deterioração das relações bilaterais UE-China intensificou-se, com a Comissão a assumir um declínio de entusiasmo devido a “contramedidas da China às sanções da UE em direitos humanos, coerção económica e medidas comerciais contra o mercado único, e o posicionamento da China na guerra na Ucrânia”. Embora se reconheçam desafios e tensões, a cooperação no ensino superior, incluindo projectos de saúde, é vista como parte de um quadro mais amplo de construção de parceria estratégica entre a UE e a China. No entanto, evidencia-se que não existe uma longa tradição de cooperação em saúde entre a UE e a China no ensino superior, e que existem poucos projectos conjuntos em comparação com o panorama geral. Sugere-se que tanto a UE como a China deveriam fazer mais esforços para alinhar os currículos de estudos médicos e promover mais pesquisa conjunta em áreas relacionadas com a saúde, doenças infeciosas, entre outros.

Na era Trump 2.0, e sem pandemia, qual poderá ser o papel da China na governança global da saúde?

Embora a tese seja publicada este ano, foca-se no período que antecede e inclui a pandemia, onde não especulo directamente sobre um cenário futuro de “Trump 2.0” sem pandemia. No entanto, a tese argumenta que a China não é apenas um participante, mas uma força reformista moderada na formação das normas de saúde globais. Independentemente de cenários políticos futuros, a sua crescente influência económica e política, a diplomacia estratégica em saúde, as reformas internas e iniciativas como a Rota da Seda da Saúde continuarão a moldar o seu papel na governança global da saúde. A visão de uma “Comunidade Global de Saúde para Todos” também permanece como um princípio orientador para os esforços da China.

Este poder da China na GGS verifica-se mais com acordos bilaterais ou multilaterais?

A tese sugere que o poder da China na governança global da saúde se manifesta tanto através de acordos bilaterais quanto multilaterais, mas com uma ênfase crescente em certas formas de cooperação que fortalecem o seu papel no Sul Global e através de mecanismos alternativos. Embora a tese não quantifique explicitamente a predominância entre bilateral e multilateral, o foco nas alianças regionais (BRICS) e parcerias com o Sul Global (que frequentemente envolvem acordos bilaterais e iniciativas de cooperação de grupo) e a Rota da Seda da Saúde indicam uma abordagem híbrida.

30 Jun 2025

Fronteiras | Continua a aumentar circulação automóvel

Dados da Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC) mostram que não pára de crescer o movimento automóvel entre fronteiras. Em Maio deste ano, circularam entre Macau e os diversos postos fronteiriços 934.175 automóveis, o que representa um aumento anual de 23,1 por cento.

No que diz respeito ao movimento de automóveis ligeiros de passageiros nos postos fronteiriços, equivaleu a 886.954, mais 25,5 por cento face a Maio de 2024, dos quais 190 milhares de entradas e saídas foam de automóveis com matrícula única de Macau que circularam entre Macau e Hengqin, um aumento anual de 49 por cento.

Enquanto isso, 140 milhares de entradas e saídas foram de automóveis a circular ao abrigo da “Circulação de veículos de Macau na província de Guangdong”, o que representa um aumento de 14,5 por cento. Se olharmos para os primeiros cinco meses do ano, o movimento de automóveis nos postos fronteiriços foi de 4.370.042 viaturas, um aumento de 23,1 por cento em termos anuais.

30 Jun 2025

Galaxy Arena | Digressão de Eason Chan passa por Macau e traz documentário

O cantor e actor de Hong Kong anda em digressão e traz vários espectáculos a Macau no mês de Agosto, integrados na “Fear and Dreams World Tour”. Os fãs podem também comprar bilhete para o documentário exibido a 5 de Agosto sobre os bastidores dos espectáculos

 

Eason Chan, conhecido actor e cantor de Hong Kong, vai estar em Macau com a sua digressão mundial, a “Fear and Dreams World Tour”. Os espectáculos acontecem na Galaxy Arena entre os dias 1 e 3 de Agosto e depois entre os dias 8 e 10 do mesmo mês, para que os fãs possam desfrutar ao máximo do cantopop escrito e cantado por esta personalidade de Hong Kong que o tem ajudado a construir uma carreira bem-sucedida nos últimos anos.

Mas a vinda de Eason Chan traz um bombom para os fãs, com a exibição do documentário, no dia 5, sobre a digressão que tem passado por diversos palcos.

A sinopse do projecto fala de como a “vida é uma peça de teatro, em que os cantores interpretam as suas canções”, sendo que “Fear and Dreams: Now is the only reality”, o nome do documentário, pretende mostrar como isso tem acontecido na vida de Eason Chan.

“Desde o conceito inicial do concerto em 2018 até à última paragem da digressão mundial ‘Fear and Dreams’ em 2025, ‘Fear and Dreams: Now is the only reality’ documenta a jornada nos bastidores. Em palco, Eason abre o coração para partilhar o concerto temático com o público, mas fora do palco o filme revela as lutas e experiências menos conhecidas”, lê-se ainda.

Assim, no dia 5, o público poderá perceber o outro lado da carreira do artista, reflectindo sobre ideias como “o medo está sempre presente; os sonhos são uma escolha; o presente é a única realidade”, defendidas pelo artista e passadas neste documentário.

Ainda segundo a mesma sinopse, “mais do que apenas um documentário sobre um concerto, este filme é uma crónica de sete anos da vida de Eason Chan”, pautados por “perturbações causadas pela pandemia global, problemas de saúde, e uma lesão acidental causada por um desmaio”.

Além da exibição, o dia 5 de Agosto inclui também uma “sessão de partilha”, em que “Eason irá partilhar histórias dos bastidores da digressão mundial ‘Fear and Dreams’, existindo a oportunidade de haver interacções ao vivo para que o público possa partilhar histórias pessoais sobre a digressão”.

Não faltarão produtos de merchadising, como uma t-shirt para cada participante “desenhada por Eason Chan” e ainda um cartão de lembrança. Os bilhetes para este evento em específico estão à venda desde quarta-feira.

Eason Chan anda nos palcos com a digressão “Fear and Dream” desde 2022, mas o projecto jea tem o fim anunciado para este ano. Os concertos em Macau prometem trazer os grandes êxitos da sua carreira, os clássicos ou actuais, como “2001: A Space Odissey”, “Flowerless”, “Lies” ou “The Distance Between Hearts”, entre tantos outros. De destacar que os bilhetes para os espectáculos no Galaxy Arena também já estão à venda.

Vida no palco

Desde o álbum de estreia, que ganhou o seu nome e editado em 1996, muita música aconteceu na vida de Eason Chan, que já conta com um punhado de trabalhos discográficos editados não apenas em cantonês, mas também em mandarim. No caso do cantonês, o último trabalho saiu em 2023, com o nome de “Chin Up!”, enquanto em mandarim o mais recente disco é “C’mon In~”, de 2017.

Mas a carreira de Eason Chan também está bastante ligada à grande indústria de cinema de Hong Kong, contando já com mais de 40 filmes no currículo desde a sua estreia, em 2007, um ano depois de ter iniciado a sua carreira na música.

E se o sucesso nos palcos está à vista, nos ecrãs esse sucesso não tem sido inferior, já que recebeu uma nomeação para “Melhor Actor Secundário” nos Hong Kong Film Awards em 2000 pelo seu papel em “Lavender”. Cinco anos depois ganhou nova nomeação nos Golden Bauhinia Awards em Hong Kong pelo trabalho em “Crazy N’ The City”. Seguiu-se uma nomeação em 2008, desta vez nos Taiwan Golden Horse Awards, os maiores prémios da indústria de cinema da região.

Segundo o website do actor e cantor, a revista Time considerou-o “um pioneiro e influenciador na cena Cantopop”, com êxitos como ” “My Happy Times”, “Shall We Talk”, “The king of karaoke”, “Next Year, Today”, entre outros.

Antes de começar a sua carreira artística na região vizinha, Eason Chan esteve em Inglaterra, mas só depois de participar no Concurso de Novos Talentos é que a história de sucesso arrancou.

Na parte musical, Eason Chan ganhou na categoria de “Most Outstanding Pop Male Singer Award” nos prémios “Top Ten Chinese Gold Songs Award Concert” durante 13 anos consecutivos, tendo ganho nove vezes consecutivas o prémio “The Most Favorite Male Singer” em mais uns prémios da música, os “Ultimate Song Chart Awards Presentation”.

O álbum “U87” ganhou fama mundial, sobretudo porque Eason Chan conseguiu um contrato com uma produtora de cariz global, tendo sido considerado pela Time como “um dos cinco álbuns asiáticos que valia a pena comprar em 2005”, além de que ganhou seis prémios no concurso “Ultimate Song Chart Awards Presentation”, descreve a sua biografia oficial.

27 Jun 2025

Turismo | Registada quebra nas excursões da China

Dados da Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC) mostram que nos cinco primeiros meses deste ano Macau recebeu 855 mil turistas em excursões, o que representa um aumento muito ligeiro de 0,7 por cento em termos anuais.

Já os excursionistas do Interior da China, foram 732 mil, menos 2,2 por cento em termos anuais. Porém, no que diz respeito a visitantes internacionais, contabilizaram-se 99 mil, mais 12,4 por cento, com destaque para os turistas oriundos da Coreia do Sul, um total de 46 mil, o que representa uma subida de 24,2 por cento.

Se olharmos apenas para o mês de Maio, o número de turistas em excursões foi de 128 mil pessoas, menos 21 por cento em termos anuais, “devido principalmente ao número de entradas de visitantes em excursões do Interior da China (101.000) ter diminuído 27,9 por cento”, explica a DSEC.

Porém, “o número de entradas de visitantes internacionais em excursões (22.000) cresceu 22,8 por cento face a Maio de 2024, destacando-se que os visitantes em excursões da República da Coreia (8.000) ascenderam 20,5 por cento”, lê-se na nota oficial.

27 Jun 2025

Isabel Rio Novo, autora da biografia de Luís de Camões: “Tempo em Macau foi de tranquilidade”

Será lançada amanhã, no Consulado-geral de Portugal em Macau e Hong Kong, a biografia de Luís de Camões, da autoria de Isabel Rio Novo. Em entrevista ao HM, a autora desvenda alguns segredos sobre a vida do poeta em Macau, um período de relativa calma no meio de uma vida quase sempre turbulenta

 

Porque decidiu embrenhar-se na escrita de mais uma biografia sobre Camões?

É verdade que Luís Vaz de Camões foi biografado muitíssimas vezes ao longo de 500 anos. No entanto, há 50 anos que não havia uma biografia sobre ele. Do meu ponto de vista e do editor, Camões merecia uma biografia mais actual que revisitasse de uma forma desprovida todo tipo de preconceitos, buscando fontes conhecidas, a pesquisa de informação ainda não descoberta e onde se fizesse a releitura de todas as obras anteriores. Esta biografia não é apenas uma súmula, mas também a reinterpretação daquilo que já se sabia, mas que raramente tinha sido relacionado. O livro traz também alguns dados novos com alguma documentação que foi descoberta.

Como nasceu a sua relação com a escrita de Camões?

Apaixonei-me e fui daquelas jovens leitoras que não ficou atormentada com Camões. Pelo contrário, gostei logo e deixei-me seduzir pelo Camões lírico. Sou das áreas de Literatura Comparada e da História, e nesse sentido sempre compreendi a dimensão e importância da obra de Camões.

E quais são?

É uma obra e um autor muito do seu tempo e da sua época, que foi extraordinária, com o Renascimento, o Humanismo e as viagens da navegação. Mas, ao mesmo tempo, é uma obra que é produto de um génio literário fora de série, daqueles que podemos contar um punhado na história da literatura universal.

Que Camões encontramos nesta biografia?

Tentei ir ao fundo, retirar camadas do sentido que estes 500 anos foram acrescentando a Camões, no sentido em que cada época leu o seu Camões e produziu a sua interpretação. Quis descobrir o substracto, o homem de carne e osso que viveu e escreveu há 500 anos.

Foi um homem sofrido, com muitas dificuldades financeiras.

Foi um homem com uma relação complexa e difícil com a realidade, não só do seu tempo, mas também com a realidade [em si]. O tema da época, do desconcerto do mundo, de como a sociedade parece funcionar ao invés daquilo que deveria funcionar, tratando-se de um tópico literário do Renascimento, foi algo que Camões sentiu de forma pessoal e genuína.

De que forma?

Ele viveu uma série de dissabores, de experiências extremas. Basta dizer que esteve preso várias vezes e por razões diversas. Fez grandes viagens numa altura em que estas eram empreendimentos absolutamente arriscados, morosos e complicados. Camões esteve envolvido em expedições militares, e quase toda a sua vida foi soldado. Mas esse conjunto de experiências permitiu-lhe ser quase tudo aquilo que alguém podia ser na época em que viveu.

Foi um dos autores mais viajados da época, tendo estado no Brasil, Goa…

Sim. Mesmo a ligação a Macau, que é contestada por alguns estudiosos, mas não por mim… sou persuadida, face à documentação existente e testemunhos indirectos, que Camões passou pela China com o cargo de provedor dos defuntos e ausentes. Quando isso aconteceu já existia, ainda que de forma muito incipiente, o estabelecimento português na China, que já era Macau. Não se sabe se Camões exerceu esse cargo que lhe foi atribuído pelo vice-rei D. Francisco Coutinho, se ele estava exactamente designado para ser provedor durante a viagem, ou provedor no estabelecimento de Macau. Mas o que ele conheceu da China foi, seguramente, esse pequeno entreposto que Portugal tinha conseguido, a muito custo, com muita dificuldade e depois de muitas tentativas, obter na China.

O que fazia um provedor dos defuntos?

Sempre que um português morria no Oriente, um soldado ou mercador, era preciso assegurar os direitos dos herdeiros, das famílias que normalmente estavam em Portugal. O provedor tinha de identificar o falecido, a sua naturalidade, origem e fazer com que os herdeiros fossem conhecidos. Tinha ainda de guardar os bens do falecido antes que fossem roubados, levá-los a leilão, guardar as moedas que daí resultassem e depois levar tudo isso para Lisboa. Era um processo que, se corresse bem, demorava muitos meses, pois era preciso enviar esse dinheiro para as autoridades de Goa que depois o enviavam na carreira da Índia para Lisboa.

Podemos falar de um período de estabilidade na vida de Camões em Macau?

Sim. Até essa nomeação como provedor dos defuntos, tudo o que Camões conhecia do Oriente tinha sido como soldado. Mal chega a Goa [1553], embarca semanas depois numa primeira expedição militar. Sabemos porquê: não porque tivesse alguma apetência bélica, mas porque só participando em expedições ganhava o seu soldo. Embora toda a gente dissesse que os soldados viviam muito pobremente, o soldo era o que Camões tinha para sobreviver. O tempo vivido em Macau, em que esteve liberto das obrigações de soldado, foi um tempo de tranquilidade em relação à subsistência, que estava assegurada. Dispunha de algum tempo e calma para prosseguir o trabalho com “Os Lusíadas”. Mais do que isso, tanto quanto as fontes permitem deduzir, Camões conheceu em Macau uma fase de equilíbrio em termos de vida pessoal e amorosa, na medida em que, na viagem de regresso, trazia consigo, segundo o testemunho de Diogo do Couto, uma rapariga chinesa.

Dinamene.

Esse foi o termo usado pelo cronista. Não sabemos se seria uma rapariga chinesa ou asiática. Essa rapariga com quem Camões vivia maritalmente era alguém de quem gostava muito, segundo o testemunho de Diogo do Couto. Mas Dinamene não seria, certamente, o nome dela, por ser um nome mitológico que, aliás, já Camões usava na sua lírica, mesmo antes de ter embarcado para o Oriente. As raparigas chinesas com quem os soldados e mercadores em Macau viviam amancebadas eram baptizadas e recebiam um nome cristão. Portanto, Dinamene até teria um nome cristão e português. Mas como não sabemos o nome dela, e se for com consciência de que usamos uma espécie de metáfora, podemos chamar-lhe Dinamene.

Ela morre depois numa viagem e deixa Camões muito abalado.

Na viagem de regresso de Macau a Goa, provavelmente no fim do seu mandato como provedor, Camões sofre o célebre naufrágio, no qual perde os bens pessoais que tinha amealhado, incluindo os bens dos defuntos de que era guardião, e isso vai trazer-lhe complicações. Sofre também a perda de Dinamene. O naufrágio foi junto a alguns nos mares da China, provavelmente junto à foz do rio Mekong.

Considera improvável que tenha perdido aí parte de “Os Lusíadas”.

Os primeiros biógrafos dizem que Camões se salvou desse naufrágio com uma tábua. Não é descabido que tenha conseguido salvar, nessa tábua, o manuscrito dos Lusíadas. Mas também não é de excluir que Camões soubesse de cor o seu poema. A memória das pessoas no século XVI era diferente. Estavam muito habituadas a guardar as coisas de memória. E nós sabemos, porque a prova obtém-se na obra de Camões, que este tinha uma memória extraordinária. Tenho forma de o provar, claro, que Camões seja um dos raros autores que conhecia de cor o seu poema.

Considera que Camões teve uma vida inferior ao seu verdadeiro talento?

Sem dúvida. Segundo um conjunto demasiado extenso de testemunhos concordantes, ele morre pobre, mesmo em condições miseráveis, e segundo uma testemunha ocular, sem ter um cobertor com que se cobrir. Por outro lado, Camões ficou conhecido a seguir à publicação dos Lusíadas, que foram comentados e lidos [no tempo de vida do poeta]. Temos o testemunho de Faria de Sousa, um dos primeiros biógrafos de Camões, que diz que quando este passava nas ruas as pessoas paravam e apontavam. Camões tinha também uma figura que se destacava, com o olho vazado e a usar uma pala. Nessa altura, já estaria bastante doente, a usar muletas. Mas há um conjunto de poetas, que é muito pouco crível que não conhecessem Camões, que nunca se lhe referem. Há, por outro lado, outros humanistas, como Pedro Magalhães Gândavo, que desde logo o elogia como o príncipe dos poetas portugueses.

Mas o rei dá-lhe uma tença por feitos prestados e pela publicação de “Os Lusíadas”.

Essa famosa tença, que não devia ser grande coisa, porque todos os biógrafos antigos dizem que era irrisória, é-lhe atribuída como uma espécie de reforma militar, por causa dos 17 anos de serviço no Oriente, e não propriamente como recompensa pela publicação de “Os Lusíadas”. A carta de mercê de D. Sebastião, que lhe atribui o título de Cavaleiro Fidalgo, não tinha, na prática, nenhuma repercussão, mas dava-lhe 15 mil reais. [A publicação de “Os Lusíadas”] terá sido um argumento adicional [para a carta] e não o argumento principal. Isso leva-nos a crer que D. Sebastião nem sequer terá lido ou ouvido ler “Os Lusíadas”, terá recebido uma informação indirecta, favorável sobre o poema.

Como se deu o processo de edição de “Os Lusíadas”?

Foi um acontecimento, porque tanto a imprensa como os livros que se publicavam por ano eram uma quantidade muito pequena. No ano em que “Os Lusíadas” são publicados foram a única obra de cariz não religioso [a ser editada]. Para custear a edição é mais que provável que Camões tenha tido o apoio de um mecenas, provavelmente D. Manuel de Portugal, da família dos Condes do Vimioso. Conseguir que a obra fosse imprensa era um processo moroso e complicado, pois tinha ainda de passar pelo Exame Prévio das autoridades civis, da autoridade régia e da censura da Inquisição. O revedor do Santo Ofício acaba por não só deixar passar o livro, como tecer uma quantidade de elogios quase inédita no alvará que autoriza a publicação da obra. Se formos pegar nos pareceres emitidos pelo mesmo revedor, não há nenhuma outra obra sobre a qual ele seja tão elogioso como foi com a epopeia de Camões.

Na Indonésia, fez amizade com um escravo da Ilha de Java.

Camões esteve, pelo menos uma vez, na ilha de Ternate, na Indonésia, no arquipélago das Molucas, numa altura em que houve conflitos motivados por um capitão português extremamente cruel para com o rei ou sultão de Ternate, e que originaram uma espécie de guerra entre os portugueses e os locais. Camões tem uma canção que descreve a ilha de Ternate. Não sabemos se foi nessa altura, ou em outra passagem pelo Extremo Oriente, que Camões se ligou a um jaú, ou javanês, mas que podia não ser exactamente do Extremo Oriente, mas um escravo liberto que se tivesse ligado por amizade a Camões. E isto porque numa das primeiras biografias de Camões lê-se que jaú, com o nome cristão António, pedia esmola à noite. Essa liberdade de movimentos de um escravo indicia que, provavelmente, seria um escravo liberto. Pedia esmola para Camões, para ele próprio e para a mãe de Camões, com quem Camões terá vivido nos últimos anos de vida.

26 Jun 2025

China-Portugal | Pavilhão em Chengdu mostra produtos portugueses

No empreendimento Euro-Asia National Commodity Pavillion, em Chengdu, estão instalados pavilhões destinados a países e empresários estrangeiros que querem estabelecer negócios na China. Portugal também lá está, representado pelo Pavilhão de Portugal, mas segundo o gestor Ângelo Sousa, faltam apoios do Governo português e força para combater a concorrência

 

“Para nós não há barreiras entre Portugal e a China. Estamos 365 dias cá e lá.” É desta forma que são apresentados os objectivos da equipa que está por detrás do Pavilhão de Portugal presente no Euro-Asia National Commodity Pavillion, em Chengdu, e que é gerido por dois sócios: Yinhui Tui e Ângelo Freitas de Sousa.

Os dois perceberam que a zona de Xangai tinha atingido um ponto de saturação no comércio de produtos e que era necessário ir mais para o interior do país tentar vender coisas tão portuguesas como o vinho, bacalhau ou azeite.

O HM conversou com Yinhui Tui sobre este projecto à margem de um almoço promovido, em Lisboa, pela Associação dos Amigos da Nova Rota da Seda, presidida por Fernanda Ilhéu. O evento serviu, precisamente, para Yinhui Tui apresentar os objectivos do Pavilhão de Portugal e tentar captar interesses empresariais.

“Trata-se de um mercado muito importante para os produtos portugueses. Na China separamos o país [em termos comerciais] em quatro mercados. Temos a região de Pequim e Xangai, que chamamos de ‘Yangtze River Economic Zone’, e a ‘Pearl River Economic Zone’. A quarta zona é composta pelas cidades de Chengdu e Chongqing e que se trata de uma nova área económica estabelecida em 2020. Os produtos portugueses têm bastante potencial nestes mercados”, referiu.

O empresário lembra que o marketing dos produtos portugueses está ainda aquém daquele que é feito por empresários franceses, espanhóis ou de outros países, mas que quando o comprador chinês descobre o vinho ou o azeite, fica surpreendido.

“Em Xangai, por exemplo, alguns clientes já têm a sua opinião formada sobre os produtos franceses ou australianos. Mas muitos acham que os produtos portugueses têm mais qualidade”, disse Yinhui Tui, referindo que na zona em que o Pavilhão de Portugal opera, na província de Sichuan, “as pessoas são um pouco mais conservadoras e preferem experimentar, provar e sentir antes de comprar”.

“O nosso pavilhão está junto ao pavilhão francês e muitas vezes vemos clientes a optar pelo vinho francês. Mas quando passam pelo nosso pavilhão, veem as nossas marcas e perguntam o que é que nós temos. Quando percebem que temos vinho mais barato em relação ao francês, ficam surpreendidos e dizem que é melhor, e aí compram.”

Este responsável explica que a população na quarta zona económica é de 130 milhões de pessoas, bem mais do que o número de pessoas a viver na Península Ibérica. “Daí achar que é um mercado com muito potencial”, frisou.

O papel da Lusosino

Yinhui Tui e Ângelo Freitas de Sousa criaram a Lusosino que funciona como a entidade gestora do pavilhão, que nasceu “com a intenção de promover os produtos portugueses no grande mercado da China”. Assim, existe um “showroom” de produtos bem portugueses, representando-se algumas marcas conhecidas como é o caso das bolachas Vieira, vinho Esporão, o sal Marnoto, as compotas Prisca ou a Vista Alegre, entre outras. É neste pavilhão que “os expositores exibem os melhores produtos, os compradores descobrem tendências e onde ambos encontram as condições para concretizar negócios”. De resto, a Lusosino, através deste pavilhão, ajuda empresários portugueses nas campanhas de marketing e na melhor forma de contactar potenciais clientes chineses.

Concretamente, a Lusosino promete realizar “registos de produtor e marcas, representação comercial, análise do mercado, apoio e preparação de viagens ao mercado, entre outros serviços”, lê-se no website.

Porém, e segundo contou Ângelo Freitas de Sousa ao HM, há muitos obstáculos para colocar produtos portugueses na China. “[A zona de Chengdu e Chongqing] tem a vantagem de ser um mercado em crescimento e que não está sobrecarregado de exportadores e não tem vícios como acontece na zona de Xangai. É um mercado com uma área muito grande e em que existem muitos produtores.” Por vícios, o empresário refere a “concorrência” de outros países e hábitos de compra dos clientes chineses, que mais depressa procuram produtos de outras nacionalidades do que de Portugal. “Há hábitos de certas marcas que estão implementadas e as pessoas já nem olham para outras, nem as experimentam.”

O projecto do Pavilhão de Portugal começou por uma ideia de Ângelo Ferreira de Sousa, que tem uma esposa chinesa que o ajuda no negócio. “Conheci o Yinhui Tui, ele gostava de produtos portugueses, ficámos amigos e depois acabámos por juntar energias”, referiu, explicando que o interior do país está ainda a conhecer os produtos estrangeiros, e não apenas portugueses.

“A zona de Xangai já não tem por onde crescer mais e esta é uma zona económica em crescimento. Há muitas fábricas que se estão a deslocar para Chengdu, pelo que haverá mais desenvolvimento”, adiantou.

Ausência de marketing

O empresário português lamenta que as autoridades portuguesas tenham dado pouco apoio ao projecto, à excepção de algum acompanhamento por parte da AICEP – Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal.

“Todo o investimento foi feito por nós e não temos tido muito apoio. Tivemos alguma ajuda da AICEP, mas nada de especial. Nós é que fazemos feiras, os ‘showrooms’, para dar a provar e a conhecer os nossos produtos nas principais cidades”, disse Ângelo Ferreira de Sousa.

O empresário lamenta também que, apesar da relação de centenas de anos entre Portugal e a China, haja ainda falhas na estratégia comercial para a exportação de produtos portugueses no país. “Os espanhóis estão muito mais à frente do que nós”, exemplificou.

Relativamente ao papel de Macau como plataforma, o empresário diz que é igualmente difícil trazer produtos de Portugal para a China ou de Macau para a China, devido à falta de acordos aduaneiros e pouca flexibilidade.

“Não é por termos a ligação a Macau que eu consigo, por exemplo, colocar enchidos, bacalhau ou as conservas na China, ou ainda outros produtos portugueses. Para passar de Portugal para Macau é fácil, mas já não é tão fácil levar depois produtos portugueses de Macau para a China. Não temos conseguido fazer muita coisa através de Macau, mas também não temos procurado muito”, disse.

Na apresentação em Lisboa, Yinhui Tui adiantou alguns números que estão por detrás da construção do Euro-Asia National Commodity Pavillion, e que ajudam a compreender a sua dimensão: cerca de 70 mil milhões de euros de investimento e um espaço de 300 mil metros cúbicos. O Pavilhão de Portugal não faz apenas sessões de contactos ou feiras: se um empresário quiser lá deixar armazenadas toneladas de produtos, pode fazê-lo. Depois, o Pavilhão fica encarregue da distribuição por várias zonas da China. “No mercado do Sul, mais perto de Macau, já existe muita competição em algumas zonas, pelo que se deve apostar no Interior da China”, frisou Yinhui Tui, referindo-se ao potencial e ao factor novidade que existe em algumas zonas do país no tocante ao comércio.

26 Jun 2025

Coloane | Filipe Afonso lança obra que destaca importância de casas de palafitas

O mais recente livro de Filipe Afonso, coordenador do curso de arquitectura da Universidade de São José, olha para um modelo habitacional em risco de desaparecer, mas que pode ser visto em Coloane, ou em antigas zonas piscatórias de Hong Kong. “Coloane Grammar” apresenta soluções alternativas para o reaproveitamento destas casas e a sua classificação como património

 

Pegando na ideia de gramática que dá nome ao livro, quais os principais termos ou conceitos em torno de Coloane, da sua tradição e preservação, que pode enumerar?

A “gramática” do livro introduz o conceito de arquitectura vernacular, que reflecte o conhecimento da construção informal, local, e a identidade marítima desta comunidade de Coloane. Aborda o património em risco, ao propor um método de catalogação das casas existentes, método esse digital, que estabelece um diálogo entre tradição e modernidade para preservar esta paisagem cultural.

Que propostas concretas são sugeridas no livro para a protecção e preservação das palafitas de Coloane?

O livro propõe (indirectamente) a classificação das palafitas como património para lhes conferir protecção legal. Ao catalogar as palafitas existentes, o livro contribui para preservar a memória deste tipo de arquitectura e para uma discussão mais vasta sobre a sua possível protecção.

Como se poderiam reaproveitar as palafitas tendo em conta esses modos de vida específicos e a diversificação económica que o Governo quer atingir?

As palafitas poderiam ser reaproveitadas para turismo de experiência, ou centros de interpretação cultural, valorizando a história local. Podem ser transformadas em espaços criativos e artísticos ou na realidade propor novas construções em madeira ao longo da linha de água, com diversos usos e que possam gerar valor para a comunidade de Coloane, contribuindo para a diversificação cultural e económica de Macau.

Porquê abordar Coloane e as palafitas? Como surgiu este projecto?

Coloane e as palafitas foram abordadas pela sua singularidade arquitectónica e cultural, representando uma memória e identidade ameaçada de Macau. Este património em risco tem um potencial de valorização significativo. O projecto surgiu também da lacuna de conhecimento científico sobre estas estruturas e da necessidade urgente de as documentar, consolidando-se como uma investigação académico-científica.

No contexto asiático ou do Sudeste Asiático, as palafitas de Coloane são ou não caso único em termos arquitectónicos?

As construções sobre a água são comuns em vários países Asiáticos, as palafitas de Coloane não são um caso único em termos de existência. Veja-se o exemplo, em Hong Kong, da conhecida aldeia de Tai O, mas são singulares no seu contexto específico. A sua arquitectura é o reflexo de influências regionais e materiais locais, adaptada à história da evolução da comunidade piscatória de Coloane e ao desenvolvimento de Macau. O seu valor reside na sua linguagem arquitectónica particular e na sua persistência num ambiente urbano em rápida transformação.

Qual a história por detrás do surgimento das palafitas? Está associada aos relatos de pirataria em Coloane, por exemplo, que remetem até ao início do século XX?

As palafitas surgiram como uma solução prática e funcional para o modo de vida relacionado com o mar, permitindo acesso ao mar, protecção contra as marés e uso eficiente do espaço em áreas costeiras. Os relatos de pirataria em Coloane não foram a causa directa do seu surgimento. As palafitas são, essencialmente, a resposta de uma arquitectura informal das comunidades locais em se adaptar ao ambiente marítimo.

Ideia de museu sobre as palafitas de Coloane parada desde 2017

A necessidade de preservação das palafitas de Coloane não é uma ideia recente. Entre 2017 e 2018, a Direcção dos Serviços de Turismo propôs a criação de um museu inteiramente dedicado a contar a histórias destas habitações dispostas na Rua dos Navegantes, mas o projecto foi sendo adiado por questões legais.

Em 2018, o Jornal Tribuna de Macau (JTM) publicou um artigo onde se referia, precisamente, a ausência de “fundamentos legais” para a construção de novas infra-estruturas na área marítima de Macau, algo que mudou, entretanto, tendo em conta que a RAEM passou, a partir de 2018, a incluir na sua jurisdição a gestão de 85 quilómetros quadrados de zonas marítimas.

Só no ano passado terminou o processo de consulta pública relativo aos planos do Executivo para a criação de um “Zoneamento Marítimo Funcional”, “Plano das Áreas Marítimas” e demais leis conexas, não existindo ainda uma decisão concreta sobre aquilo que será feito sobre as palafitas. Tanto o zoneamento como o plano serão definidos para um período temporal até 2040.

Um dos objectivos do Executivo é a preservação ambiental e ecológica, bem como de certas vivências da população. Um dos pontos do relatório da consulta pública fala em “optimizar as modalidades de exploração oceânica de acordo com as necessidades de desenvolvimento de Macau; coordenar o uso do mar no âmbito de produção, vida quotidiana da população e ecologia” e realizar “usos do mar intensivos e economizadores para concretizar a alocação racional dos recursos das áreas marítimas”.

Em 2018, segundo o JTM, a DST garantiu que seria necessário “aguardar pela divulgação da Lei de Bases da Área Marítima e do Regulamento Administrativo sobre a Administração da Utilização das Zonas Marítimas” e só depois se poderia pensar na planificação do museu. O HM questionou a DST sobre esta matéria, não tendo, até ao fecho desta edição, obtido novos esclarecimentos.

Um desenvolvimento gradual

Numa dissertação de mestrado em Arquitectura, defendida em 2023 na Universidade de Coimbra, Ana Rita Rodrigues fez o estudo da “Evolução do Território de Macau – Aterros e Desenho Urbano nas Ilhas de Taipa e Coloane”, tendo concluído que “a ocupação portuguesa nas ilhas de Taipa e Coloane trouxe melhorias na infra-estrutura, segurança e organização das vilas”. No final do século XIX, “já existiam, nas ilhas, escolas, hospitais e infra-estruturas básicas, promovendo o crescimento económico da região”.

Referindo a existência das palafitas “usadas para a construção de barcos de pesca e habitação para os pescadores, naturalmente viradas para o rio”, numa zona de Coloane composta “por habitações precárias de um ou dois andares, ao contrário do tipo de habitação comum encontrada em Taipa ou Macau, que era mais voltada para o desenvolvimento em altura”.

A autora destaca ainda que o “desenvolvimento foi mais lento” em Coloane, bem como a ausência, em ambas as ilhas, de “um plano geral unificado e a necessidade de melhor planeamento urbano para garantir um ambiente coeso e sustentável”.

24 Jun 2025

Exposição | “Universo em Milímetros”, de Chan Hin Chi na Fundação Rui Cunha

Descreve-se a si próprio “natural de um país estrangeiro”, mas com raízes em Macau. A visão que tem do mundo conta-a em desenhos feitos com caneta e tinta que expressam também as suas idas e vindas entre a China continental e o território. Tudo isto pode ser descoberto na mostra “Universo em Milímetros”, que inaugura hoje na Fundação Rui Cunha

 

A Fundação Rui Cunha (FRC) acolhe na sua galeria, a partir de hoje, mais uma exposição. Trata-se de “Universo em Milímetros”, uma imensa colecção de 245 peças, com 56 desenhos de tamanho médio e 189 pequenos esboços de Chan Hin Chi, artista local cuja vida sempre se pautou por deslocações a várias cidades da China, mas também a diversos países como Japão, Alemanha, Suíça, França ou Portugal, entre outros. Segundo uma nota do autor, este descreve-se como sendo “natural de um país estrangeiro que se mudou para Macau, para fixar residência, na década de 60 do século passado, quando era pequeno”.

Chan Hin Chi não faz da arte a sua profissão a tempo inteiro, sendo jurista. Mas é nos desenhos a caneta e tinta que se expressa plenamente. Segundo a mesma nota, dedica-se aos desenhos, ou esboços, desde criança, e “com o curso do tempo foi-se especializando em fazer desenhos com delicadeza e paciência”, características ganhas “nos estudos de Direito e linguística”, conjugando todos estes elementos “com a exigência de equilíbrio entre a dureza e suavidade de movimentos na prática da arte marcial chinesa Taijiquan”.

Desta forma, os desenhos presentes nesta exposição apresentam um certo “sentido de nostalgia”, procurando o autor recorrer a “papéis específicos de dimensão não superior a um cartão postal, onde se traça o mundo visual com um sentido tridimensional”, para que se possa “ver grande através do pequeno”.

Existem, nestes esboços, “um universo ilimitado e criado pela riqueza das linhas e cores”, que poderão inspirar o público. “É por causa disto que a exposição e retrospectiva de desenhos se intitula ‘Universo em Milímetros'”, é destacado.

Mais do que uma partilha

“Universo em Milímetros” acarreta em si uma mão cheia de intenções por parte do seu autor, que vão além da simples partilha de um trabalho artístico com o público. Chan Hin Chi quer também expressar “alguns entendimentos obtidos ao longo de uma vida de 64 anos, em particular ao nível da vida profissional, que se relaciona com trabalhos feitos nas áreas da assessoria jurídica, gestão pública e tradução”.

A sua vida pessoal, com residência em Macau desde os anos 60, deu-lhe “uma visão muito abrangente e compreensão do mundo sob diversas ópticas”, nomeadamente a nível histórico, administrativo, jurídico ou político”, frisou.

Tal expressa-se nos desenhos que faz, e que apresenta na Galeria da FRC a partir de hoje. O autor “considera que a compreensão do que se passa no mundo não se pode fazer de uma forma fragmentada, pois todas as coisas se interligam. Essa visão constitui o essencial desta exposição, que articula duas actividades que, aparentemente, não têm ligação: o exercício de funções jurídicas e o desenho, sendo que a primeira se faz de forma racional e lógica, e na segunda predomina a subjectividade, a emoção e a paixão”, explicou.

Para o autor e artista, na prática de todas as actividades existe uma certa inclusão e “complementariedade”, bem como “a combinação e coexistência, o que faz com uma pessoa interessada, como o autor, possa ter uma visão mais alargada e aprofundada” de um certo mundo.

Conjunto de emoções

Chan Hin Chi refere ainda que desenhar nasce de uma espécie de “desilusão pela configuração da vida”, em que a composição de um desenho se faz “de forma parecida à complexidade da trajectória de vida, que depende necessariamente do controlo de nós próprios, com ligação ao ego, e factores incontroláveis, que muitas vezes nos são externos”.

“Cada desenho é um desenho para si próprio, sendo algo extremamente semelhante ao que se passa na prática jurídica e nos estudos linguísticos, concluindo-se que cada desafio pode ser uma meditação sobre a vida”, frisou. Desta forma, o autor considera que a “prática do desenho e a prática do Direito são actividades emocionais e racionais, mas que se combinam”.

Por isso, os trabalhos que podem ser vistos nesta exposição “foram produzidas nos intervalos entre as duas actividades”, tratando-se de desenhos que têm “amadurecido e purificado no fundo do coração do autor”, permitindo a este “permanecer entre o passado e a actualidade”.

Para Chan Hin Chi, uma das conclusões que se pode tirar do seu duplo trabalho de jurista e artista é a formação de uma relação com a imagem, as letras e o texto num todo. “Hoje em dia, com o desenvolvimento acelerado das áreas da ciência e tecnologia, a informação é dominada pelo texto, avultado como vastos oceanos, e é por vezes intimidatório para quem quer dominar isso. Perante este efeito secundário da civilização, muitas pessoas tendem, inconscientemente, evitar o texto e fazer uma aproximação às imagens para fundamentar o seu conhecimento da realidade. Mas este fenómeno deve-se ao facto de o texto poder, meramente, descrever a realidade com símbolos, enquanto as imagens demonstram-na como ela é, apresentando-se tendencialmente os objectos reais, tornando estas últimas mais aceitáveis e acessíveis”, descreveu.

A FRC descreve ainda, sobre esta mostra, que se trata de uma colecção que “representa as marcas de tinta deixados pelo autor ao longo dos anos, cuidadosamente seleccionadas de entre mais de duas centenas de pequenas obras, com o objectivo de as partilhar com os apreciadores de desenho, e aperfeiçoar a sua arte através da interacção e da troca de experiências”. A inauguração acontece a partir das 18h30.

24 Jun 2025

Governo admite aumentar cauções pagas pelas agências de viagem

Helena de Senna Fernandes, directora da Direcção dos Serviços de Turismo (DST), disse ontem na Assembleia Legislativa (AL) que poderá haver um aumento do valor da caução a apresentar pelas agências de viagens no âmbito do licenciamento da actividade. A garantia foi dada no debate sobre a votação, na especialidade, da nova lei da actividade das agências de viagens e da profissão de guia turístico, aprovada ontem no hemiciclo.

“Temos o modelo da prestação da caução e do seguro de responsabilidade civil, que é igual ao interior da China. Vamos ponderar se é ou não necessário elevar o montante da caução e talvez haverá um ligeiro ajustamento, mas penso que não será um aumento muito grande”, disse Helena de Senna Fernandes.

Esta informação, surgiu a propósito da intervenção do deputado José Pereira Coutinho, que sugeriu uma alteração ao modelo composto pelo pagamento de caução e de seguro de responsabilidade civil associados às viagens que não são pagas pelos viajantes, e que é tratado no âmbito do processo de licenciamento das agências.

“Em Hong Kong existe um fundo de indemnização, e em Portugal há o Fundo de Garantia de Viagens e Turismo. Há anos que usamos o modelo da caução e do seguro de responsabilidade civil, há forma de o alterar?”, questionou o deputado. Segundo o portal do Turismo de Portugal, o referido Fundo “responde solidariamente pelo pagamento dos créditos dos viajantes decorrentes do incumprimento de serviços contratados às agências de viagens”.

Helena de Senna Fernandes explicou que, no caso de Hong Kong, o fundo é suportado com uma percentagem das comissões cobradas nas excursões, sendo que, nos dois territórios, “em termos de número de turistas, é muito diferente”.

Sem licenças permanentes

Outro dos pontos abordados pelos deputados, diz respeito ao facto de as agências terem de renovar a sua licença anualmente. Coutinho sugeriu uma licença permanente, mas o Governo entende que cabe às empresas decidir consoante o panorama do mercado.

“O sector está sempre em mudança, e no que diz respeito às agências há umas que têm mais ou menos actividade. Temos de saber como é a situação delas, daí termos colocado o prazo de um ano para a renovação da licença”, explicou.

Tai Kin Ip, secretário para a Economia e Finanças, declarou que “tem a ver com a sua vontade” a continuidade, ou não, do negócio por parte das agências. “Temos serviços electrónicos para a renovação das licenças, o que facilita muito a sua vida, mas as agências têm de manifestar a sua vontade de renovação”, rematou.

20 Jun 2025

Fracções devolutas | Ip Sio Kai pede mudança do regime fiscal

O deputado Ip Sio Kai defendeu ontem na Assembleia Legislativa (AL), no período de antes da ordem do dia, a alteração do regime fiscal aplicável às fracções devolutas, tendo em conta “as mudanças no mercado” e a “rápida alteração dos hábitos de consumo emergentes”, o que levou à “redução contínua da atractividade das lojas tradicionais”.

Desta forma, o deputado entende que deve ser revisto o Regulamento da Contribuição Predial Urbana “no que se refere à matéria colectável das fracções autónomas desocupadas”, podendo o Executivo “conceder, por exemplo, a isenção ou redução da contribuição predial urbana aos proprietários que pretendem arrendar lojas desocupadas a preços inferiores aos praticados no mercado, para serem indústrias culturais e criativas, start-ups e empresas sociais”. A ideia é que se possa incentivar o uso de “recursos desaproveitados, impulsionando a economia comunitária e o desenvolvimento do empreendedorismo juvenil”.

Ip Sio Kai recorda que “algumas lojas estão desocupadas há muito tempo e, mesmo que os proprietários baixem as rendas, não conseguem arrendá-las”, causando constrangimentos ao pagamento da contribuição predial urbana.

20 Jun 2025

Aviação | Ron Lam teme continuação do monopólio da Air Macau

Foi ontem aprovada, na especialidade, a proposta de lei da actividade de aviação civil, que vem liberalizar o mercado aéreo comercial da RAEM. Porém, o deputado Ron Lam mostrou-se preocupado que, mesmo com o fim do monopólio da Air Macau, a empresa continue a dominar o mercado.

“A proposta de lei abre a possibilidade à concessão de novas licenças de outras concessionárias, mas não sabemos quando é que isso vai acontecer, mantendo-se a Air Macau em actividade. No passado, houve uma subcontratação do direito de concessão [Viva Macau], mas não funcionou porque a actual concessionária ficou com as melhores rotas”, acusou o deputado.

O diploma em questão entra em vigor no próximo ano e o deputado diz-se “preocupado [com a possibilidade] de o direito do tráfego continuar nas mãos da actual concessionária, não se conseguindo uma abertura transparente e justa”, caso “o Governo não actue de forma mais activa”.

Um dos membros do Executivo referiu que o Governo não vai ficar “de braços cruzados”, apesar de “a economia [de Macau] ser pequena”. “Vamos tentar negociar sem limites no tocante ao número de passageiros, permitindo que as companhias aéreas venham para Macau. Não vamos divulgar nomes, mas há mais companhias que têm interesse e vão ter em consideração o mercado e origem dos passageiros. Aí decidem se celebram acordos ou não”, frisou o mesmo responsável.

20 Jun 2025

Subsídio para a infância | Lo Choi In pede alargamento para seis anos de idade

A deputada Lo Choi In usou ontem o período de intervenções antes da ordem do dia para pedir ao Governo a extensão do subsídio para a infância para crianças até aos seis anos de idade. A medida apresentada este ano prevê o apoio para crianças até aos três anos para combater a acentuada quebra na taxa de natalidade

 

É certo que ainda agora o subsídio para a infância foi criado pelo actual Executivo, liderado por Sam Hou Fai. Esta foi, aliás, uma das grandes novidades do seu primeiro relatório das Linhas de Acção Governativa (LAG) para este ano. Porém, isso não impediu a deputada Lo Choi In de sugerir a extensão do apoio para crianças até aos seis anos de idade, sendo que actualmente o apoio está previsto para crianças dos 0 aos 3 anos. O subsídio começará a ser distribuído a 15 de Julho terá um valor global de 18 mil patacas.

“Apelo ao Governo para que, em relação ao aumento da taxa de natalidade, adopte políticas e medidas mais abrangentes”, nomeadamente “o alargamento do âmbito do subsídio de assistência na infância a crianças até aos 6 anos, agora até aos 3 anos, para abranger mais famílias com necessidades, apoiando-as a suportarem os custos com crianças e elevando a sua qualidade de vida”.

A deputada apresentou os exemplos seguidos noutros países e regiões, nomeadamente o Japão, que definiu a baixa taxa de natalidade como “uma das acções governativas mais importantes a resolver pelo seu Governo”. Segundo a deputada, o Governo japonês “definiu um plano de apoio financeiro de 5 anos, dando assim importância muito maior comparativamente com a nossa medida”. Ao todo, o Japão dá apoios a crianças e jovens até à idade de 18 anos.

Dados citados pela deputada mostram que em 2013 a taxa de natalidade foi de 11,1 por cento, com 6600 recém-nascidos, números que caíram para 5,3 por cento no ano passado, “com apenas 3607 recém-nascidos”. Assim, “os números evidenciam que, em 10 anos, a taxa de natalidade diminuiu para metade”.

Do Japão à Coreia

Lo Choi In dá os parabéns ao Executivo de Sam Hou Fai por se ter “apercebido da situação e tomado de imediato uma série de medidas”, que passam também pelo “aumento do subsídio de nascimento do Fundo de Segurança Social”.

“As despesas familiares são muito elevadas. O novo subsídio de assistência na infância não é abrangente e é insuficiente, não abrangendo as crianças nascidas antes dos anos 2020-2021, ou seja, famílias que já sustentaram dois, três ou mais filhos”, comentou a deputada ligada à comunidade de Jiangmen.

“Actualmente, face à inflação, à recessão económica e a um ambiente social em que se quer dar tudo do melhor para os filhos, teremos de ver quais serão os resultados deste subsídio”, acrescentou.

Além do Japão, Lo Choi In apresentou também o exemplo de Taiwan, cujo subsídio de assistência na infância é atribuído até aos seis anos, enquanto que na Coreia do Sul “a taxa de natalidade é igualmente baixa e é [um país] menos rico do que nós”, embora “o subsídio de assistência na infância abranja crianças até aos sete anos, as quais podem obter um subsídio total superior a 100 mil dólares de Hong Kong”. Lo Choi In referiu que, neste caso, “há subsídios escalonados, para incentivar e ajudar as famílias com mais de dois filhos”.

“Os efeitos do subsídio das referidas três regiões, ao nível do aumento da taxa de natalidade, ainda estão por observar, mas, em comparação, o nosso apoio é obviamente insuficiente”, rematou.

20 Jun 2025

Emprego | Lei Chan U pede reforço do papel Concertação Social

O deputado Lei Chan U considera que o Executivo deve, no actual contexto laboral, “reforçar o papel do Concelho Permanente de Concertação Social (CPCS)”, no sentido de “reforçar as suas funções e aperfeiçoar o mecanismo de diálogo tripartido [Governo, patrões e trabalhadores], com vista a promover a harmonia nas relações laborais e desenvolvimento sustentável da sociedade”, e tendo em conta também “a evolução dos tempos e o desenvolvimento socioeconómico”.

De resto, abordando a área laboral, vários deputados usaram ontem o período de antes da ordem do dia para voltar a chamar a atenção para as consequências do fecho dos casinos-satélite e as necessidades de emprego dos residentes.

Leong Hong Sai disse que “as oportunidades e postos de trabalho dos trabalhadores dos casinos-satélite continuam a ser um problema que urge resolver”, além de que “o número de trabalhadores não-residentes está a aumentar constantemente, e a situação de subemprego e desemprego estrutural dos residentes é também o primeiro tema do Governo da RAEM”.

Já Zheng Anting lembrou os dados do primeiro trimestre deste ano que mostram que “o número de desempregados com ensino superior aumentou em relação ao trimestre anterior, atingindo cerca de 50 por cento do total”, existindo “fraca vontade de contratação por parte das empresas”.

Assim, segundo o deputado, “a sociedade receia que os recém-graduados não consigam encontrar um emprego razoável, mesmo baixando as suas expectativas salariais”.

20 Jun 2025

Ron Lam diz que houve problemas com fim do 3G

Ron Lam referiu ontem na sessão plenária que houve problemas com o fim de utilização da rede 3G. Numa intervenção antes da ordem do dia, o deputado referiu que “a rede 3G deixou de funcionar a 5 deste mês, mas muitos utilizadores de telemóveis tiveram problemas nas chamadas de voz ao utilizarem os serviços de telecomunicações móveis, pelo que se dirigiram aos pontos de venda das empresas de telecomunicações para pedir ajuda, e as longas filas de espera aí suscitaram a insatisfação do público”.

Segundo Ron Lam, os problemas com a transição de rede duravam “há mais de uma semana e ainda havia muitas pessoas a dirigirem-se às empresas de telecomunicações para resolver o problema do 3G”, sendo que só a 12 de Junho o Executivo “explicou que o problema se devia ao facto de o sistema 3G utilizar a tecnologia de comutação de circuitos para prestar serviços de voz, ao passo que os 4G/5G passaram a utilizar a tecnologia de comutação de pacotes”, sendo que tal obrigou os utilizadores a realizar chamadas com a função VoLTE.

Neste contexto, “alguns utilizadores que não activaram a função VoLTE, enfrentando o problema da interrupção da função de voz”. Ron Lam diz ter recebido “queixas de residentes que afirmam que alguns operadores de telecomunicações ofereceram serviços gratuitos de transferência, mas não podem agora utilizar os números originais dos telemóveis do Interior da China e de Hong Kong”, além de que “os operadores não conseguiram fornecer a lista dos telemóveis compatíveis com VoLTE na sua rede, pelo que os utilizadores ficaram muito confusos”.

O deputado diz que muitos idosos ficaram incontactáveis e que este caso “demonstra que o Governo e os operadores não prepararam nenhum plano de contingência para a saída da rede 3G da RAEM”.

O problema dos activos

Para o deputado, a transição de redes com problemas só mostra que é necessário “proceder a uma avaliação séria deste caso, para evitar que casos semelhantes se voltem a repetir”. O deputado diz estar “preocupado com o desenvolvimento das telecomunicações de Macau nos últimos dez anos, que tem sido ‘injusto, pouco transparente e imprevisível'”, lembrando que desde a liberalização do regime de exploração exclusiva da rede fixa em 2011, “foi introduzida uma segunda operadora, mas o Governo não conseguiu acabar com o monopólio da ‘utilização exclusiva’ dos activos da concessão das telecomunicações, nem emitir, o mais cedo possível, a licença de convergência de redes telecomunicações”.

Desta forma, sugeriu que o Governo “deve quebrar e regularizar o actual regime de utilização exclusiva dos activos da concessão, bem como o regime desactualizado de licença de telecomunicações, a fim de estabelecer uma base sólida e um espaço de desenvolvimento sustentável para o desenvolvimento do sector de telecomunicações de Macau”.

20 Jun 2025

Eleições | “Soldado de Mao” afirma-se inocente e diz que esteve seis dias sem conseguir tomar banho

Acusado de corrupção eleitoral e de possuir um negócio ilegal de Mahjong, Wong Wai Man voltou ontem à carga para clamar a sua inocência. O presidente da Associação dos Armadores de Ferro e Aço diz ter sido “provocado” para subir até ao telhado onde esteve algumas horas, além de ter estado seis dias sem poder tomar banho ou trocar de roupa

 

O panorama das eleições legislativas para o hemiciclo já ferve. Além de estas serem as eleições com o menor número de listas candidatas desde a criação da RAEM, a polémica está instalada com o quase candidato Wong Wai Man, que tentou submeter a sua candidatura, sem sucesso.

Conhecido também como o “Soldado de Mao” e “Capitão de Macau”, e depois de ter sido acusado de corrupção eleitoral e de possuir um negócio ilegal de Mahjong, eis que Wong Wai Man voltou ontem à carga para dar explicações: recusa as acusações de que é alvo, diz ter sido perseguido pelas autoridades e refere como “tortura” a forma como foi tratado aquando da sua detenção.

O presidente da Associação dos Armadores de Ferro e Aço esteve, na segunda-feira, várias horas em cima de um telhado de uma casa feita com chapa metálica na Taipa, tendo sido socorrido pelo Corpo de Bombeiros. Uma solução que diz ter sido “provocada” depois de ter sido detido pela Polícia Judiciária (PJ), reencaminhado ao Ministério Público e receber a convocação do Comissariado contra a Corrupção (CCAC), que o acusa de possuir o negócio ilegal.

Wong Wai Man explicou que, pouco tempo depois de ter saído do gabinete do CCAC, na zona do NAPE, foi interceptado por um funcionário deste organismo que alegou a falta de assinatura em alguns documentos. Porém, não satisfeito com a situação, Wong Wai Man apanhou um táxi em direcção à Taipa, acabando por se refugiar no telhado. “Não tive outra opção, o CCAC queria perseguir-me até à morte. Por isso fiquei no telhado”, explicou.

Relativamente às acusações da prática de corrupção eleitoral, o homem diz que é pobre e que não tem condições financeiras para cometer esse tipo de ilegalidades. Sobre o alegado negócio ilegal de Mahjong, Wong Wai Man destacou que a sede da associação a que preside tem, de facto, mesas de Mahjong, mas apenas para usufruto dos sócios.

Sobre o uso de dinheiro nestes jogos, Wong Wai Man disse que sempre existiu um cartaz a dizer que era proibido haver apostas em dinheiro e que havia, na sede da associação, uma caixa para donativos, mas que tal se destinava a apoios voluntários dos sócios para ajudar ao funcionamento da associação.

Isto porque, segundo este, além de ser presidente é também o único a suportar todas as despesas da Associação dos Armadores de Ferro e Aço, nomeadamente as relacionadas com a renda, água e luz, tendo em conta que desde 2014 que a entidade não recebe subsídios.

Uma coisa é certa: a sede da associação irá fechar portas amanhã devido ao fim do contrato de arrendamento. Wong Wai Man diz que, por enquanto, não vai procurar uma nova morada para a associação pois, para já, tem em mãos um assunto mais premente: a procura de um lugar para viver. Wong Wai Man fazia da sede da associação a sua casa.

Lição para a vida

Apesar de ter perdido a oportunidade de submeter uma lista e ser candidato às eleições para a Assembleia Legislativa pela via directa, Wong Wai Man argumentou que o mais importante foi participar em todo o processo e aprender coisas novas. O “Capitão de Macau” referiu ainda que se dedica à sociedade de coração e não por egoísmo. O seu ideal é fazer coisas com justiça em prol da sociedade, uma vez que defende que as associações tradicionais não defendem o povo.

Wong Wai Man contou ainda aos jornalistas um episódio pessoal para justificar a sua participação nas causas sociais e públicas. “Em 2007 a minha esposa estava grávida e os hospitais convenceram-na a pôr término à gravidez porque a taxa de sobrevivência do bebé seria de 50 por cento, devido ao facto de ter sido detectada uma anomalia fetal depois dos exames. Insisti e o Governo acabou por pagar a operação no valor de 70 mil patacas. Por isso, quero dar a minha contribuição para retribuir um favor ‘ao céu'”, disse.

Seis dias sem banho

Segundo o jornal All About Macau, Wong Wai Man referiu ainda ter estado seis dias sem tomar banho e dormir, tendo permanecido uma semana desaparecido até se apresentar junto do CCAC esta segunda-feira. Antes de o fazer, este referiu ter estado um total de seis dias detido, o que para si foi “uma tortura”, e que no total esteve todo esse tempo sem tomar banho, dormir ou trocar de roupa. No domingo, terá conseguido voltar a casa.

“Ontem à noite [terça-feira] consegui finalmente dormir bem e tomar banho. Fiquei seis dias sem poder tomar banho ou trocar de roupa”, explicou. A subida ao telhado da casa na Taipa foi também uma forma de protesto pela forma como terá sido tratado, assegurou.

A detenção teve lugar na madrugada de quarta-feira passada, dia 11, entre as 3h e as 4h da manhã, com o argumento de que Wong Wai Man manteria um negócio ilegal de Mahjong. Foi então que ficou detido durante 48 horas numa esquadra na Taipa, tendo depois sido transferido para as instalações do Ministério Público (MP) para continuar a prestar declarações.

Depois desse processo, foi notificado para se apresentar junto do CCAC, tendo assinado os documentos pedidos. De seguida, foi novamente detido por mais 48 horas e transferido novamente para o MP. Quando, já na rua, foi novamente informado de que teria de voltar ao CCAC para assinar mais documentos, decidiu fugir e refugiar-se no telhado.

18 Jun 2025

Cancro da mama | Investigação da UM faz “descoberta revolucionária”

Um estudo desenvolvido por uma equipa liderada por dois docentes da Universidade de Macau procura respostas para o combate ao cancro da mama. Os académicos concluíram que as células cancerígenas se disseminam principalmente através do sistema linfático, e não pela corrente sanguínea

 

“O sistema linfático é a via principal para a disseminação e metástase do cancro da mama, revelado pelo rastreamento da linhagem de células únicas” é um artigo científico que procura aumentar o conhecimento que permita encontrar soluções para a doença. O trabalho foi desenvolvido por uma equipa de investigação liderada pela professora catedrática Chuxia Deng e pelo professor assistente Miao Kai da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Macau (UM) e, segundo uma nota da UM, trata-se de uma “descoberta revolucionária no estudo das metástases do cancro”.

Assim, e pela primeira vez, foi feita “uma análise qualitativa e quantitativa das vias das metástases do cancro da mama”, tendo sido aplicado pelos cientistas “um sistema de código de barras baseado numa abordagem de rastreamento de linhagem de células únicas”, chamado CellTag.

Com este método, foram obtidos resultados que revelam que “as células cancerígenas se disseminam principalmente através do sistema linfático, e não pela corrente sanguínea”. Além disso, aponta a nota da UM, “a investigação também descobriu que a interacção entre as células tumorais e o microambiente tumoral (TME) determina o potencial metastático das células cancerígenas”, ou seja, se estas poderão, ou não, reproduzir-se com facilidade.

Neste sentido, “o estudo demonstra de forma sistemática as vias das metástases tumorais e abre novos caminhos para o desenvolvimento de estratégias de tratamento do cancro”, é descrito.

O artigo foi publicado na revista “Molecular Cancer” e é o resultado de uma investigação realizada por uma vasta equipa, constituída por Kai Miao, Aiping Zhang, Xiaodan Yang, Yipeng Zhang, Anqi Lin, Lijian Wang, Xin Zhang, Heng Sun, Jun Xu, Yuzhao Feng, Fangyuan Shao, Sen Guo, Zhihui Weng, Peng Luo, Xiaoling Xu e Chu-Xia Deng.

Destaque para a colaboração de cientistas de outras instituições do ensino superior da região, como Aiping Zhang, da Universidade Hospitalar Hong Kong-Shenzhen, e Jingyao Zhang e Shuai Gao, ligados à China Agricultural University em Pequim. Por sua vez, Dong Wang e Xiao-Yang Zhao estão ligados à School of Basic Medical Sciences, da Southern Medical University, em Guangzhou.

Microambiente é factor importante

A UM explica, no mesmo comunicado, que o estudo em questão “fornece evidências empíricas para a preferência de rota na metástase do cancro”, demonstrando que as células tumorais estão “pré-programadas” com “informações intrínsecas que determinam o seu potencial metastático”, além de que estas células “adaptam de forma dinâmica a sua expressão genética com base no microambiente dos órgãos-alvo”.

Desta forma, “estas descobertas estabelecem as bases para o desenvolvimento de terapias direccionadas à metástase linfática, como a inibição da sinalização de citocinas ou a interrupção da comunicação entre o tumor e o estroma para suprimir a metástase”.

Na investigação foi utilizada a “tecnologia de sequenciamento de RNA de célula única”, o que permitiu à equipa “descobrir que células tumorais geneticamente idênticas exibem perfis de expressão genética específicos do órgão”, pelo que o microambiente se revela “fundamental na formação do comportamento das células tumorais”.

“Por exemplo, as células metastáticas pulmonares regulam positivamente os genes relacionados com o stress oxidativo, enquanto as células metastáticas hepáticas activam vias reguladoras metabólicas”, é referido.

O perigo das metástases

A UM destaca que, nas doenças oncológicas, as metástases são a principal causa de morte. Porém, até à data, “os mecanismos que governam a selecção da rota” dessas mesmas metástases permaneciam “obscuros”.

“Usando a tecnologia CellTag, a equipa de pesquisa fez o rastreio da disseminação de células de cancro da mama em modelos de camundongos”, tendo descoberto que “menos de 3 por cento das células cancerosas se espalham pela corrente sanguínea, enquanto mais de 80 por cento metastatizam através do sistema linfático para órgãos distantes, como os pulmões e o fígado”.

Assim, “uma análise mais aprofundada mostrou que as células disseminadas pela linfa têm padrões de expressão genética distintos e comunicam estreitamente com as células estromais, tais como fibroblastos e células endoteliais, no microambiente, formando um mecanismo adaptativo ‘semente-solo'”.

Olhando para o estudo, os autores explicam que a metástase do cancro “é um processo no qual as células tumorais do tumor primário invadem a membrana basal dos vasos sanguíneos ou linfáticos (intravasação), viajam pelo sistema sanguíneo ou linfático e colonizam órgãos e ou tecidos distantes para continuar o seu desenvolvimento”. Vários estudos apontam para o facto de as metástases serem responsáveis por 70 a 90 por cento da mortalidade relacionada com o cancro, sendo que “a disseminação de células tumorais na vasculatura e nos vasos linfáticos ocorre simultaneamente na grande maioria dos cancros”.

Estradas de sangue

Na discussão dos resultados, os autores do estudo dizem que, em termos gerais, “as células tumorais metastatizam principalmente através da circulação sanguínea e do sistema linfático”, sendo que até à publicação deste trabalho tinham sido realizados “inúmeros estudos para distinguir o papel de ambos os sistemas nas várias fases da metástase do cancro”, sem se saber “qual a via ‘preferida’ para a metástase à distância”.

É referido no artigo, citando outros estudos, que as “células cancerígenas entram na corrente sanguínea através da intravasação para se tornarem CTCs [Circulating Tumor Cells – Células Tumorais em Circulação], tendo-se revelado altamente correlacionadas com os resultados de sobrevivência de pacientes com cancro da mama”.

Os autores explicam também que “o sistema linfático é considerado crítico para a metástase”, pois “as células de melanoma com experiência no sistema linfático eram mais resistentes à ferroptose e formavam mais metástases”, sendo que nos casos de “ressecção de tumor primário, as células cancerosas podem se disseminar ainda mais dos gânglios linfáticos para os vasos sanguíneos e formar tumores metastáticos nos pulmões”.

Até à data, “embora a disseminação metastática fosse viável por ambas as vias, a importância relativa de cada processo para um determinado tipo de cancro e o órgão-alvo era desconhecida devido à falta de ferramentas quantitativas adequadas”, algo a que este estudo, com recurso ao sistema CellTag, pretendeu dar resposta.

Assim, “demonstramos que a maioria das células metastáticas do pulmão e do fígado pode ser detectada no sistema linfático, em vez de CTCs [Células Tumorais em Circulação] derivadas do sangue, indicando que os vasos linfáticos podem ser a via preferida para a metástase das células tumorais, pelo menos no cancro da mama”.

Os autores prometem não parar por aqui na descoberta do percurso feito pela metástase das células cancerígenas, tendo já realizado “testes preliminares” com algumas células a fim de descobrir a possibilidade de redução “drástica” das células tumorais disseminadas por via linfática. “Continuaremos a trabalhar nisso para aprofundar o mecanismo de disseminação linfática e explorar as interrupções terapêuticas em nossos esforços futuros”, é referido.

18 Jun 2025

Fotografia | Imagens de Jorge Veiga Alves celebram Macau em Lisboa

A Casa de Macau em Lisboa apresenta, na próxima segunda-feira, 23, o projecto fotográfico “À Procura de Macau”, da autoria de Jorge Veiga Alves, ex-residente de Macau e fotógrafo amador. O principal objectivo deste evento é celebrar o Dia de Macau e das Casas de Macau, data marcada no calendário a 24 de Junho

 

Junho é o mês de celebrar Macau e o seu santo padroeiro, São João Baptista, nomeadamente no dia 24 de Junho, conhecido como o Dia da Cidade, em comemoração da vitória sobre os holandeses em 1622, na Batalha de Macau. É assim, num mês já com muito calor e pautado pelos Santos Populares que se celebra a tradição e a história de Macau, algo também feito, este ano, pela Casa de Macau em Lisboa, desta vez com recurso à fotografia.

Assim, apresenta-se, na próxima segunda-feira, 23, o fotoprojecto da autoria de Jorge Veiga Alves, ex-residente do território e fotógrafo, intitulado “À Procura de Macau”. A partir das 16h30 podem ver-se imagens da Macau de um outro tempo.

Segundo uma nota da Casa de Macau, trata-se de um evento que “simboliza a data festiva do dia de Macau e das Casas de Macau (24 de Junho)”, podendo o público participante ver “o trabalho foto-artístico das imagens e sensações capturadas ao longo de décadas distintas de pré e pós transição, recuperando memórias ao mesmo tempo que nos vai oferecendo a exaltação de uma Macau sempre presente em nós”.

A apresentação digital de fotografias feitas em Macau percorre os anos de 1986-1994, 2005-2016 e 2024, tendo sido apresentada no Centro UNESCO de Macau da Fundação Macau e na Fundação Rui Cunha. As imagens serão apresentadas em 190 slides, e pretende-se dar respostas às questões “como era Macau no final da década de 80-princípios da década de 90” e ainda “como evoluiu ao longo do tempo aos olhos de um português curioso em tentar conhecer a cultura chinesa, as marcas portuguesas em Macau e a interacção entre as duas comunidades”.

Desta forma, o público poderá ver o contraste entre o analógico e o digital, pois as fotografias feitas no período 1986-1994 foram captadas em modo analógico, tendo sido digitalizadas e alvo de alguma recuperação e tratamento em pós-produção digital. As imagens mais actuais foram já todas feitas no formato digital.

Jorge Veiga Alves confessou: “Ao longo dos anos procurei evoluir na minha técnica fotográfica, todavia, algo tem permanecido constante: a admiração e afecto pela singular História de Macau e do que foi produzido nesse percurso, pela sua riquíssima cultura multifacetada e de convivência multisseculares, pelas suas gentes e locais”.

Economista criativo

Apesar de ser licenciado em Economia, Jorge Veiga Alves sempre teve uma grande paixão pela imagem. Exerceu grande parte do tempo da sua actividade profissional no Banco de Portugal, mas durante oito anos (de 1986 a 1994) esteve requisitado pelo Governo de Macau para trabalhar na AMCM – Autoridade Monetária e Cambial de Macau.

Fotógrafo amador que entrou, no início da década de 70, no maravilhoso mundo da fotografia através do modo analógico, fez fotografia submarina e foi totalmente conquistado pelo modo digital. Participou em exposições e apresentações audiovisuais de fotografia colectivas e individuais.

Em 2017, realizou uma apresentação digital de fotografias na Casa de Macau em Portugal com o título “Macau: Um Olhar de Jorge Veiga Alves”. Criou o projecto “À Procura de Macau /Searching for Macau” que abrange a recuperação, divulgação e disponibilização de imagens em fotografia e vídeo que fez em Macau quando aí residiu e quando revisitou.

Este projecto foi concretizado na realização de diversas iniciativas, nomeadamente, exposições e apresentações digitais de fotografias e a disponibilização de imagens a diversas instituições em Portugal e em Macau com o objectivo de preservação de memórias e utilização e divulgação com fins científicos e culturais sem fins lucrativos. Grande parte do seu espólio de imagens feitas em Macau está depositado na Biblioteca digital do CCCM – Centro Científico e Cultural de Macau.

Diversas fotografias da sua autoria estão presentes em sítios e instituições nacionais e internacionais, nomeadamente no sítio “Memória de Macau” da Fundação Macau, no Arquivo de Macau e no Museu de Arte de Macau. Algumas fotografias foram distinguidas em concursos nacionais e internacionais.

17 Jun 2025

Comércio | Gestor do Cuppa Coffee pede apoio a empresas portuguesas

A história do Cuppa Coffee remonta a 2008 quando era difícil encontrar um espaço em Macau para beber um bom café. A localização na Taipa Velha trouxe fama ao projecto, mas o espaço acabou por fechar portas e mudar-se para o Studio City. João Encarnação, que gere o café, fala das novidades e da importância de apoiar projectos de matriz lusófona

 

Tudo começou na mente da portuguesa Cristiana Figueiredo, numa altura em que para um português ou apaixonado por café a viver em Macau era difícil encontrar um espaço para desfrutar desta bebida acompanhada por produtos de padaria ou pastelaria, à boa maneira lusa.

Cristiana Figueiredo disse, numa numa entrevista ao Instituto de Promoção do Comércio e Investimento de Macau (IPIM), o que a levou a investir neste tipo de negócio. “Na Europa, as pessoas têm por hábito frequentar cafés tanto para descansar como para trabalhar. Quando vim para Macau, há mais de 20 anos, apercebi-me de que a cultura do café português não é popular em Macau, daí ter nascido a ideia de abrir um café em Macau, esperando promover a comida e a cultura do café português”.

Desde 2008 que o Cuppa Coffee, associado ao projecto inicial da empresária, Nata Bakery, fundado em 2007 e focado nos produtos de padaria e pastelaria, se tornou num dos espaços preferidos da comunidade portuguesa, estrangeira e até residente do território. Porém, o rumo do ambiente económico, com maiores dificuldades no pagamento de rendas, tem ditado algumas transformações ao projecto, que agora encerra portas à entrada da Taipa Velha e também junto aos lagos Nam Van, para estar apenas no empreendimento Studio City, no Cotai. O encerramento nos lagos Nam Van deu-se em Janeiro.

Ao HM, João Encarnação, director e accionista da empresa que gere o Cuppa Coffee, explica que, na verdade, a mudança para o Cotai já estava decidida há muito tempo. “Costumo dizer que não houve uma mudança para o Studio City, porque esse era um plano que já existia e que surgiu independentemente do fecho da loja da Taipa. Iríamos sempre abrir este espaço independentemente de continuarmos, ou não, com a loja na Taipa, cujo fecho se deveu a uma negociação falhada relativamente à renda do espaço.”

Segundo João Encarnação, que hoje gere a empresa com Nicole Massa Helm, ambos consideraram que “na situação económica actual não havia condições para continuar naquele espaço, que é relativamente grande e tinha os seus custos”.

“Precisávamos de fazer alguma contenção se queríamos que o negócio continuasse a funcionar, porque a alternativa é sempre fechar completamente. Não desistimos da ideia de abrir qualquer coisa na Taipa e de estarmos um pouco mais próximos dos nossos clientes regulares e mais fiéis, pelo que continuamos com esse propósito de abrir outro estabelecimento na Taipa que possa servir os clientes que lá vivem. Portanto, não há propriamente uma deslocação para o Studio City”, adiantou João Encarnação.

O director e accionista entende que esta mudança acarreta sempre alguma nostalgia. “Temos pena de o ter fechado. Custou-nos, temos realmente muita pena”, confessou. “Era uma decisão que podia ter sido tomada há mais tempo, pelo menos um ano, mas ainda tentámos manter ali o estabelecimento, mas não nos foi possível. Veremos o que o futuro nos reserva.”

Apesar destas mudanças, o Cuppa Coffee pode ser considerado um caso de sucesso. “Funcionou ali durante muitos anos e funcionou bem. Este é um negócio que tem de ter determinadas condições para funcionar porque, como sabemos, tem muito movimento, mas com pouco rendimento relativamente a cada cliente. Trata-se de um negócio que precisa de muitos clientes para se sustentar, e durante muitos anos, ao nível dos valores das rendas e de tudo o resto, fornecedores por exemplo, era bastante mais barato e as coisas funcionavam melhor”, recorda.

A localização na Taipa Velha deu ao Cuppa Coffee “um reconhecimento e uma clientela muito grande”, apesar das crescentes dificuldades. “À medida que os preços foram aumentando, também precisámos de aumentar os nossos preços, mas nunca na proporção do aumento das despesas. Houve uma altura em que não podíamos continuar”, assumiu.

O que o futuro reserva

João Encarnação assegura que aquilo que os clientes sempre procuraram neste espaço vai continuar no Studio City: bons produtos de café e pastelaria, com a presença de Portugal. “Tentamos sempre introduzir produtos novos. Criámos uma bebida nova, à base de café e coco, que é excelente. Introduzimos também o ‘Nata Bomb’, um conceito de batido ‘milkshake’ com sabor a nata, uma verdadeira bomba”, descreveu.

Há também “produtos tradicionais portugueses que não existiam antes, como o pão de louro”, bem como os donuts com sabores diferentes, “para completar a oferta que temos”. “A nossa oferta já é tão variada que, mesmo sem introduzirmos mais produtos, é suficiente para satisfazer os valores dos clientes portugueses e de outros também.”

João Encarnação disse ainda que a mudança do estabelecimento para o Studio City nasceu de um convite. “Não sabemos ainda como vai correr, é uma aposta que estamos a fazer neste momento”, sendo que o objectivo é sempre voltar ao café de rua. “O conceito de ter uma loja de bairro ou na rua é algo que nos interessa muito e já estamos a ver outras possibilidades”, acrescentou.

“Não tenho dados suficientes para, neste momento, lhe dizer que a mudança para o Studio City é ou não uma aposta vencedora. É diferente, tal como o conceito, e vamos ter outro tipo de clientes além dos habituais.”

Um projecto “do coração”

Olhando para trás, João Encarnação conta que, por exemplo, nunca se registaram grandes problemas em matéria de recursos humanos. “Até hoje não sentimos o grande problema da falta de mão-de-obra, nunca foi algo que nos tenha afectado grandemente. Hoje em dia não é tão fácil como antigamente ter quotas [para trabalhadores não-residentes], pois há bastantes locais que precisam de colocação. É capaz de nos ser mais fácil, neste momento, arranjarmos mais trabalhadores locais do que antigamente”, disse, confirmando que as rendas continuam a ser o grande problema para negócios deste tipo.

“O Cuppa Coffee é um projecto do coração e durante a pandemia apercebi-me que ia fechar. Percebi também que estavam a ocorrer uma série de encerramentos, quase em simultâneo, de outros estabelecimentos portugueses. Falei com a minha sócia, que tem muita experiência nesta área, e disse-lhe que gostava de tentar manter o Cuppa Coffee aberto. Ela cedeu ao meu repto e comprámos [à Cristiana Figueiredo], fizemos todos os possíveis para que continuasse exactamente com o mesmo conceito e a mesma qualidade que vinha tendo com a Cristiana, que fez um excelente trabalho na criação e crescimento do Cuppa Coffee.”

Ultrapassados os anos da pandemia, e numa altura em que Macau enfrenta uma quebra no consumo local, João Encarnação diz que “cumpre um bocadinho à comunidade portuguesa fazer os possíveis para apoiar o esforço que fazemos para que tudo continue aberto”.

“Não falo apenas do Cuppa Coffee, mas também da Trigo D’Ouro, da Manteigaria, dos restaurantes portugueses e do Lord Stow, que não sendo um negócio tipicamente português baseia-se na cultura portuguesa. Todos estes negócios têm de ser alimentados e suportados. Da nossa parte, cumpre-nos manter a qualidade, mas a comunidade portuguesa tem de aproveitar o que existe e apoiar os negócios portugueses”, apelou.

Apesar da quebra do consumo por parte dos locais, João Encarnação diz que se garante um equilíbrio com o consumo dos turistas. “Sentimos um pouco isso [quebra de consumo], mas conseguimos contrabalançar com as ofertas que fazemos e que satisfazem o gosto dos chineses locais e dos visitantes. Mas claro que isso [quebra de consumo] tem, naturalmente, impacto nos negócios, não apenas nos portugueses, e isso vê-se na cidade. Mas penso que ainda há alguma massa crítica para manter os negócios portugueses abertos”, rematou.

17 Jun 2025

Empreendedorismo | Evento para empresas locais quer captar “investidores anjo”

Macau acolhe hoje um evento destinado a captar os chamados “investidores anjo” para projectos locais de empreendedorismo. O “Macau Angel Investor Network” decorre no “The Macao Young Entrepreneur Incubation Centre” e pretende dar apoio a projectos empresariais emergentes ou simplesmente startups que estão a dar os primeiros passos

 

Chama-se “Macau Angel Investor Network”, qualquer coisa como “Rede de Investidores Anjo em Macau” e pretende aproximar residentes que desejam ser empresários de sucesso e criar os seus próprios negócios numa economia que se quer diversificada. O evento está marcado para hoje no Da Hengqin Development Center, no número 517 da Avenida da Praia Grande, Edifício Comercial Nam Tung, entre as 11h e as 12h30, e conta com diversas personalidades ligadas à economia local, mas não só. São eles Raphael Chan, vice-director da Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico (DSEDT), Paulo Andrez, presidente emérito da “European Business Angel Network” e ainda figuras como Emanuel Soares, consultor jurídico, U Man Fai, investidor-anjo para a zona da Grande Baía e partner/fundador do “Esencia Fund” e ainda Ung Choi Kun, ex-deputado à Assembleia Legislativa e presidente da Kun Cheong Holding ltd e também ele um “investidor-anjo”. O evento é desenvolvido pela Associação para o Empreendedorismo e Inovação para Macau, China e Países de Língua Portuguesa, a que está ligado Marco Duarte Rizzolio, sendo co-organizado pela Associação Plataforma Sino-Lusófona de Macau para o Desenvolvimento Sustentável.

Ao HM, este explicou os principais objectivos que estão por detrás desta iniciativa. “Queremos conectar investidores anjo a startups e pequenas e médias empresas (PME) locais, fomentando o ecossistema empreendedor e promovendo a diversificação económica de Macau”. Por sua vez, Alvin Fong, também ligado à organização deste evento e presidente da Direch International, defendeu que se pretende “criar uma plataforma que reúna o conhecimento sobre investimentos-anjo, ajudando na diversificação da economia de Macau”.

Segundo Rizzolio, “os investidores anjo, que investem capital próprio em empresas emergentes, são fundamentais para apoiar startups em estágios iniciais onde as possibilidades de financiamento são mais escassas no sector financeiro tradicional”.

“Além disso”, frisou, a rede de contactos que hoje decorre na Avenida da Praia Grande “procura aproximar investidores dos países de língua portuguesa e da China, criando um acesso mútuo aos melhores projectos desenvolvidos nessas regiões e reforçando Macau como um elo estratégico entre o Oriente e o Ocidente”.

Para Alvin Fong, este é o “momento oportuno” para a realização de um evento desta natureza, tendo em conta que “o mundo está a passar por muitas mudanças e novas oportunidades estão a surgir”.

Segundo Marco Duarte Rizzolio, até já ocorreram, em Macau, eventos anteriores na tentativa de captar investimentos anjo, “mas esta é a primeira vez que se pretende criar uma rede de ‘Business Angels’ em Macau com investidores chineses e de países de língua portuguesa”.

“As condições para realizar este evento agora surgem de vários factores, como o crescimento acelerado da inovação e tecnologia, a maior digitalização e o uso de software nos negócios, a necessidade de diversificar a economia local, o foco crescente na Grande Baía como um polo de inovação”, disse.

Em causa, estão também factores como “o esforço conjunto de entidades públicas e privadas em criar um ambiente favorável ao empreendedorismo”, algo que foi muito potenciado pelos anos de pandemia, defendeu, por ter trazido a Macau e às autoridades “uma nova compreensão sobre a importância de apoiar negócios locais e regionais, tornando este momento particularmente estratégico”.

Quem é quem

Para a sessão de hoje foram convidados “empresários e empreendedores de sucesso, alguns dos quais são líderes nas suas áreas”, sendo que a sua “experiência e inteligência acrescentam muito a este evento”, destacou Alvin Fong.

Já Marco Duarte Rizzolio, frisou que estarão presentes “pessoas interessadas em tecnologia e inovação, incluindo alguns investidores anjo, representantes de fundos de capital de risco, empresários de renome e especialistas em inovação e desenvolvimento empresarial”.

A sessão de hoje trata-se de uma “oportunidade para obter conhecimentos valiosos e ampliar a rede de contactos”, sendo que Marco Duarte Rizzolio destaca personalidades como Paulo Andrez, “reconhecido especialista internacional em empreendedorismo, inovação e investimento anjo”, ou ainda Ung Choi Kun, “figura proeminente em Macau nos sectores do imobiliário e da educação, sendo também investidor anjo em várias empresas”.

Questionado sobre as principais áreas em que se foca esta iniciativa, Rizzolio acrescenta que o acontecimento está voltado para “startups e PME que actuam em sectores como a tecnologia, o turismo inteligente, a economia verde, saúde, educação digital, logística ou finanças”, por se tratarem de “sectores com alto potencial de crescimento e que estão alinhados tanto nas necessidades locais”, nomeadamente na estratégia de diversificação económica “1+4” ou ainda “as tendências globais”.

“Queremos identificar empresas inovadoras que possam prosperar não apenas em Macau, mas também na Grande Baía e em mercados internacionais”, acrescentou este responsável que está também ligado à organização do concurso de startups e empreendedorismo, o “929 Challenge”.

Momento certo

Para Alvin Fong, Macau apresenta actualmente potencialidades para a conexão de projectos empresariais às cidades da Grande Baía, todas elas situadas na província de Guangdong.

“Macau tem muita liberdade e flexibilidade para experimentar novas ideias. Além disso, recebemos muitos turistas de todo o mundo. Sendo uma das onze cidades da GBA, Macau é, de facto, uma excelente plataforma”, frisou. Por sua vez, Marco Duarte Rizzolio fala em “características únicas” do território, “como a sua posição como ponte entre a China e os países de língua portuguesa, um ambiente regulatório estável e incentivos fiscais e financeiros que podem atrair investidores e startups”.

Existe ainda “o aumento do foco na diversificação da economia além do sector do jogo”, verificando-se “um terreno fértil para inovação e novos negócios”.

“Num cenário global de taxas de juro baixas, mercados de capitais com alguma fricção geopolítica, o investimento em tecnologia tem apresentado múltiplos incomparáveis face a outros activos. Nesse contexto, a criação de mais incentivos financeiros e o fortalecimento de programas de apoio a startups são passos cruciais”, destacou o co-criador do evento.

Grande concorrência

Apesar das potencialidades, persistem os desafios, tendo em conta que “Macau não tem muitas vantagens além do sector do jogo”, existindo “uma concorrência intensa na Grande Baía”, alertou Alvin Fong.

Para Marco Duarte Rizzolio “os desafios são significativos”, pois “a transição de uma economia tão dependente do sector do jogo para um modelo mais diversificado leva tempo e exige esforços coordenados”.

Há ainda que ter em conta as oportunidades que surgem com a integração da RAEM na ilha de Hengqin, adiantou Rizzolio, que recorda, porém, “os desafios relacionados à competitividade e a adaptação regulatória”.

“Além disso, a remodelação habitacional e comercial exige equilíbrio entre o crescimento económico e a preservação do tecido social local. É essencial criar políticas que incentivem o empreendedorismo e o investimento, minimizando os impactos negativos dessas transformações”, lembrou.

Questionados sobre se as autoridades têm feito o suficiente na captação de investidores-anjo, ambos defendem que há mais trabalho a fazer. “Este é um bom começo, mas mais pode ser feito no futuro”, disse Alvin Fong.

Já Marco Duarte Rizzolio, referiu que “o Governo da RAEM tem feito esforços importantes”, além de mencionar “várias vezes a necessidade de criar uma rede de ‘Business Angels'”.

“Macau tem apoiado muitas iniciativas que visam estimular o investimento. É verdade que a criação de mais incentivos financeiros e o fortalecimento de programas de apoio a startups são passos cruciais. Também é necessário promover Macau de forma mais activa como um destino atractivo para investidores, destacando as suas vantagens competitivas no cenário internacional. Este evento é um exemplo de boa colaboração entre o sector público e privado para estimular o ecossistema”, defendeu Rizzolio.

Destaque ainda para o facto de o evento de hoje se realizar em estreita conexão com a 369, uma entidade que pretende transformar-se “num hub internacional de ciência e tecnologia em Macau, dando às novas gerações um palco maior de exploração” de oportunidades, disse Alvin Fong, presidente desta entidade. Marco Duarte Rizzolio salientou que estamos perante “uma incubadora do ecossistema de Macau que tem organizado vários eventos”.

16 Jun 2025

Consulado | Sara Augusto apresenta livro e exposição sobre Camões

“Vasto Império do Coração” é o título do livro que Sara Augusto apresenta na próxima quarta-feira. A obra, acompanhada por uma exposição focada na presença de Camões em Macau, faz parte do cartaz de celebrações do 10 de Junho – Dia de Portugal, Camões e das Comunidades Portuguesas

 

Macau continua a celebrar a portugalidade e o poeta maior da língua portuguesa, Luís de Camões, com vários eventos e protagonistas. Desta vez o foco é, novamente o poeta, mas a iniciativa nasce de Sara Augusto, académica, docente de português na Universidade Cidade de Macau e também fotógrafa.

“Vasto Império do Coração” é o verso de António Couto de Viana que dá nome ao livro e exposição será apresentada na próxima quarta-feira, 18 no Auditório Stanley Ho, no Consulado-geral de Portugal em Macau e Hong Kong. A mostra composta por 12 imagens de Sara Augusto, fica também patente no mesmo local.

Ao HM, Sara Augusto explica que a escolha do nome para a obra e exposição “tem a ver com a sonoridade do verso”. “O poema a que pertence é um poema atormentado, que faz contrastar a imensidade da obra de Camões como um país que não corresponde às expectativas do sujeito poético. Mas não foi o sentido do poema que me interessou, foi este verso em particular que me parece relacionar-se com a vocação para as viagens marítimas e sobretudo com a expansão da língua portuguesa. Camões, como um dos poetas mais celebrados na nossa língua, representa esse vasto poder de uma língua, capaz de expressar latitudes e culturas diferentes como mostra a riqueza da literatura lusófona”, explicou.

“Vasto Império do Coração” resulta do trabalho desenvolvido por Sara Augusto para um congresso. “Esse trabalho foi depois mais desenvolvido e apresentado num colóquio em Pequim, organizado também pelo Instituto Português do Oriente, no âmbito da celebração dos 500 anos do nascimento do poeta. Desta apresentação veio a ideia de publicar um volume com uma antologia de textos, um estudo e registo fotográfico, ambos da minha autoria.”

Testemunhos poéticos

A obra em causa é uma antologia que “recolhe registos poéticos de visitantes, de escritores portugueses que residiram em Macau algum tempo e de escritores nascidos em Macau, revelando laços que celebram, se identificam e que inscreveram Camões na memória colectiva”.

Sara Augusto adianta que “o conjunto de textos abrange pouco mais de dois séculos” e o ponto de partida é o poema “Camões”, de Almeida Garrett, “que se tornou o modelo da imagem romântica do poeta solitário, escrevendo os seus versos no cenário da gruta”.

“Este modelo foi levado à letra no século XIX e em grande parte do século XX. O livro ‘A Gruta de Camões’ de Monsenhor Manuel Teixeira foi uma fonte importante, tal como a consulta dos cinco volumes da antologia ‘De Longe à China’, além de uma pesquisa demorada na Biblioteca Pública de Macau. A antologia contém poemas de Miguel Torga, Sophia, José Augusto Seabra, José Jorge Letria, por exemplo. Outros poetas portugueses visitaram e viveram algum tempo em Macau, como António Manuel Couto Viana, José Valle de Figueiredo, ou ainda Alice Vieira e Eugénio de Andrade”, explicou Sara Augusto.

O lugar de Adé

A autora destaca que “foi muito importante a poesia de inspiração camoniana de José dos Santos Ferreira, Adé, que chegou a traduzir poemas de Camões para patuá, ou ainda a poesia de José Joaquim Monteiro, Leonel Alves, Maria do Rosário Almeida, António Correia, Fernanda Dias, Josué da Silva, António Bondoso, José Maria Bártolo”.

Depois, já no século XXI, “o tema camoniano continuou, tomando formas distintas e mais elaboradas, como acontece com Fernando Sales Lopes, Jorge Arrimar, António Mil-Homens e ainda Carlos Morais José”, este último um nome que Sara Augusto considera “incontornável”, tendo em conta o romance “O Arquivo das Confissões”.

As imagens na exposição são a preto e branco e focam-se “no jardim e na gruta de Camões”, pretendendo “acompanhar o registo poético”. Com os dois projectos, a responsável quis “participar da celebração dos 500 anos do nascimento de Camões e apresentar um acervo de forma organizada, acompanhado de um estudo”.

Além disso, “pretendeu-se reunir a poesia que fala de Camões, mas também a imagem subjectiva de um registo fotográfico”, disse.

12 Jun 2025

G-Dragon | Deputados exigem maior verificação de ilegais

A descoberta de trabalhadores ilegais nos postos de venda do concerto do rapper e compositor G-Dragon, em Macau, levou os deputados a manifestarem-se ontem no hemiciclo, no período de antes da ordem do dia, exigindo maior fiscalização nesta matéria.

O deputado Lei Leong Wong diz ter recebido “várias queixas de trabalhadores de diversos sectores que alegam que há muitos trabalhadores ilegais” no território, nomeadamente “‘fotógrafos acompanhantes’ nas redes sociais do Interior da China, que têm ‘licenças especiais de condução’ e aproveitam para o exercício ilegal da actividade de transporte”. Lei Leong Wong lembrou que “registou-se um caso suspeito de trabalho ilegal numa zona de venda de lembranças, durante um concerto realizado em Macau por um cantor muito famoso da Coreia do Sul, o que despertou a atenção de Macau e das regiões vizinhas”. Para o deputado, “todas estas situações, além de prejudicarem gravemente os direitos e interesses dos trabalhadores locais, podem ainda afectar as estratégias e o planeamento do desenvolvimento económico de Macau”.

Também Leong Sun Iok recorreu a este tema para intervir, dizendo que “num concerto realizado recentemente, terão sido contratados 68 trabalhadores ilegais para a venda de lembranças”, num caso que envolveu “estudantes universitários a estudar em Macau e trabalhadores a exercer funções não autorizadas”. Segundo o relato do deputado, “houve mesmo quem afirmasse ser voluntário para fugir às responsabilidades, caso que despertou a atenção da sociedade”.

Para Leong Sun Iok, “o problema de trabalhadores ilegais tem vindo a reduzir o espaço de sobrevivência das empresas cumpridoras da lei e dos trabalhadores locais”.

12 Jun 2025