Deputados apelam à vacinação contra a covid-19 João Santos Filipe - 18 Mai 2021 José Chui Sai Peng e Mak Soi Kun apelaram ontem à população que se vacine e colabore com o Governo na luta contra a pandemia da covid-19, evitando consequências para o turismo. “Macau posiciona-se como centro mundial de turismo e lazer e como cidade habitável, se a taxa de vacinação for baixa em comparação com outros países e regiões, Macau poderá ficar marginalizada, criando-se incertezas para a recuperação económica e para o seu desenvolvimento futuro”, alertou Mak Soi Kun. Por sua vez, Chui focou a segurança das vacinas e indicou que após a aprovação pela Organização Mundial de Saúde que produto da Sinopharm está ao nível da vacina da Pfizer.
Nacionalismo | Aprovadas alterações à Lei do Hino João Santos Filipe - 18 Mai 2021 A Assembleia Legislativa aprovou ontem, na generalidade, as alterações à Lei da Utilização, Protecção da Bandeira, Emblema e Hino Nacionais. As alterações visam acompanhar as mudanças mais recentes no Interior e, entre outras, coisas impede que os símbolos sejam utilizados para fins comerciais ou em funerais, à excepção dos casos estipulados por lei. A lei encoraja igualmente o ensino dos símbolos aos estudantes do ensino primário.
Despesa Pública | Lei da contratação pública actualizada João Santos Filipe - 18 Mai 2021 Os deputados aprovaram ontem as alterações à lei que obriga a que os concursos públicos sejam obrigatórios para obras superiores a 15 milhões de patacas, ou aquisições de serviços um valor de 4,5 milhões ou mais. Apesar da aprovação da lei, vários deputados mostraram-se preocupados com a possibilidade de corrupção e por considerarem que as alterações não contribuem para aumentar a transparência. “O decreto-lei em causa e os valores foram definidos em 1989 e estão desactualizados. Temos de ter em conta os preços dos materiais, a situação económica e outros valores”, explicou Lei Wai Nong. O secretário para a Economia e Finanças prometeu ainda nova lei para o próximo ano para lidar com outras questões de fundo nas contratações públicas, para aumentar a transparência. Enquanto a nova proposta não é apresentada, Lei disse que vão ser emitidas instruções internas no Governo sobre como conduzir os concursos públicos.
Deputado diz que agentes imobiliários não têm meios para executar despejos João Santos Filipe - 18 Mai 2021 O deputado Wang Sai Man afirmou que os agentes imobiliários estão a ser prejudicados devido à concorrência desleal de administradores de prédios, que, segundo o legislador, actuam muitas vezes como intermediários. A queixa foi deixada ontem na Assembleia Legislativa e o deputado alertou para a necessidade de criar um tribunal específico para lidar com os “arrendatários trapaceiros”. “Nestes últimos anos tem sido frequente administradores prediais, devido à sua familiaridade com moradores e ao seu conhecimento dos edifícios, desempenharem o papel de intermediário, para facilitar a venda e compra de propriedades”, alertou. A lei não permite a intermediação por parte de agentes sem licença. Contudo, Wang queixou-se que o Executivo não trabalha activamente na supervisão. “A Lei da actividade de mediação imobiliária prevê sanções para mediadores imobiliários sem licença, vulgarmente designados por “agentes não licenciados”. Porém, segundo os operadores, só quando há denúncias os serviços fiscalizam e aplicam sanções, portanto, enfrentam dificuldades”, indicou. Tribunal especial As reivindicações do deputado exigiram igualmente a criação de um tribunal só para as questões do arrendamento. “Nesta situação de epidemia, os atrasos no pagamento de rendas e as rendas em dívida destacam-se cada vez mais, e os proprietários não querem recorrer à via judicial para defender os seus direitos. Por isso, o sector está preocupado com o arrastamento dos eventuais processos judiciais e a utilização de muitos recursos humanos, o que pode gerar despesas avultadas, sem se saber se é possível recuperar rendas”, revelou. Por isso, num contexto em que diz que a arbitragem é ignorada pelos inquilinos, apontou os tribunais como a única solução. “Proponho ao Governo a criação de um tribunal para resolver conflitos de arrendamento, e criar bom ambiente para o mercado imobiliário, com vista a proporcionar mais espaço de sobrevivência ao sector e a apoiar o seu desenvolvimento saudável e ordenado”, vincou. Na intervenção antes da ordem do dia de ontem na Assembleia Legislativa, Wang defendeu ainda alterações às leis da publicidade no sector do imobiliário e da intermediação imobiliária. O deputado diz que se os agentes estiverem obrigados a identificar os donos das casas na publicidade que se arriscam a violar a lei de protecção de dados. “A lei sobre a actividade publicitária prevê que, na venda de imóveis, ‘é obrigatória a divulgação do nome do proprietário e da empresa construtora’. Porém, os operadores entendem que é difícil satisfazer esta exigência no processo de compra e venda de imóveis de segunda mão”, indicou. “O acto de divulgar o nome completo do proprietário pode violar a Lei de protecção de dados pessoais. A par disso, é difícil aceder às informações sobre os construtores civis de prédios baixos construídos há muitos anos”, atirou.
AL | Coutinho sugere que o Governo compense lesados do Yoga World João Santos Filipe - 18 Mai 2021 José Pereira Coutinho aqueceu o ambiente no hemiciclo ao sugerir que o Governo compensasse os lesados do Yoga World. O deputado argumentou que os residentes foram prejudicados devido à lentidão da Assembleia Legislativa, gerando um aceso debate Pereira Coutinho afirmou ontem que o Governo devia compensar os lesados do espaço de Yoga World, porque a Primeira Comissão da Assembleia Legislativa está a discutir há mais de dois anos a nova lei de protecção dos consumidores. Contudo, a interpelação ofendeu outros deputados, que pediram esclarecimentos sobre a intervenção de Coutinho, respondendo que este nunca compareceu às reuniões da comissão que analisa a lei. Numa altura em que há mais de 100 queixas de lesados pelo espaço de ioga que fechou portas, depois de pedir aos utilizadores para anteciparem anuidades, Coutinho levou o caso à Assembleia Legislativa. Na única intervenção em português, o deputado culpou os colegas por não terem concluído os trabalhos relacionados com a lei de protecção dos consumidores. “Como se explica, perante os cidadãos, este enorme atraso na aprovação do projecto lei de protecção dos direitos e interesses do consumidor ora ‘cozinhado’ a ‘lume brando’ na 1ª. Comissão da AL?”, começou por perguntar. Assim sendo, sugeriu que o Governo compense os prejudicados devido às falhas dos deputados: “Pelas razões acima apontadas, nomeadamente os atrasos causados pelo Governo na aprovação do referido projecto lei ainda em sede da 1ª. Comissão da AL desde Março de 2019, sugerimos que o Governo compense financeiramente os prejudicados por via de um dos vinte e seis fundos públicos, com por exemplo, através da Fundação Macau”, afirmou. A intervenção gerou prontamente resposta por parte da comissão visada, através do presidente da mesma, Ho Ion Sang. “Como presidente da comissão mencionada vou dizer que manifesto o meu protesto. Durante a apreciação da lei, a comissão reuniu mais de 16 vezes com os representantes do Governo, além das reuniões técnicas. Foram elaborados cinco textos de trabalho, a comissão e o governo já procederam a uma apreciação global e profunda da proposta e os trabalhos estão prestes a serem terminados”, fez um ponto da situação. Depois, Ho atacou Coutinho: “Nunca esteve presente nas reuniões, nem deu qualquer contributo. Face a isto a acusação sobre o trabalho da comissão é injusta. É injusta para todos os que participamos nos trabalhos. Manifesto um forte protesto. Peço que retire a intervenção”, pediu o deputado ligado à União Geral das Associações dos Moradores de Macau. Porém, Pereira Coutinho não é membro da comissão e não está obrigado a comparecer às reuniões. Todavia, pode participar de forma voluntária nos trabalhos. Tradutor, traidor? Também Ip Sio Kai se mostrou incomodado com o pedido de indemnização. “Não concordo com a intervenção. Há leis em vigor que protegem os direitos dos cidadãos. Está mesmo a dizer que o Governo deve pagar à população devido à lentidão do nosso trabalho? Está a exagerar…”, vincou. Ip ainda colocou a hipótese de a intervenção de Coutinho ter sido um erro de tradução do português para o chinês. Não foi, mas o deputado pediu a Coutinho que clarificassem esse aspecto. Em resposta, José Pereira Coutinho atacou o Governo, por não apresentar propostas de lei bem trabalhadas, o que no seu entender terá levado a cinco versões diferentes. O legislador ligado à Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau recusou ainda ter dito que os colegas não trabalhavam. “Eu nunca disse que os deputados não trabalharam, disse que o tempo gasto foi muito longo. A população acha que é impossível uma comissão levar tanto tempo a discutir uma lei que protege interesses nucleares”, clarificou. “As pessoas acham que levam muito tempo”, frisou. No entanto, Coutinho fugiu à questão sobre reafirmar o pedido para que o Governo pagasse as compensações aos lesados devido à lentidão dos deputados, um aspecto que o presidente da AL, Kou Hoi In não deixou passar em claro: “Não sei se pretende fazer alguma alteração à sua intervenção. O deputado Ip Sio Kai pediu esclarecimentos porque houve uma crítica. Se não disse que a comissão está a demorar, então há que alterar a intervenção ou retirar a intervenção”, afirmou. O apontamento ficou sem resposta.
Heitor Romana: “Macaenses têm de estar no exercício do poder” Andreia Sofia Silva - 18 Mai 2021 Assessor do ex-Governador Rocha Vieira em Macau e actualmente professor catedrático no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, Heitor Romana fala do tom paternalista que a China tem assumido em relação a Hong Kong e Macau e defende que os macaenses têm de ter maior protagonismo no poder político em prol da sua sobrevivência Falou recentemente, numa palestra online, da importância da cultura estratégica dos países na tomada de decisões diplomáticas. No caso da China, que análise faz? A cultura estratégica da China tem como elemento de referência o conceito de tempo histórico, civilizacional, estratégico. Quando os líderes chineses, o Partido Comunista Chinês (PCC), nas diferentes gerações, se referem ao papel da China na ordem internacional, no equilíbrio do sistema internacional, vão sempre apoiar a posição do país no mundo, e até a sua política interna e externa, em aspectos de base ideológica. A propósito do conceito “o sonho chinês”, de Xi Jinping, é trabalhado num quadro onde estão sempre presentes as ideias de história e tradição e valores culturais. Outro aspecto da cultura estratégica associado ao tempo é a ideia de flexibilidade, dualidade, equilíbrio. Podemos dizer que há uma certa continuidade em ideias chave no pensamento chinês que incorpora os princípios do equilíbrio, harmonia. A China tem vindo a afirmar que não quer enveredar pela via bélica. Exactamente. A China proclama que quer harmonia para o mundo. Mas há uma dualidade, as contradições que são a marca do comportamento estratégico chinês, o Ying e o Yiang. É o equilíbrio dessa contradição que sustenta essa harmonia. A forma como a China olha para a ordem internacional também é assim. Vejamos, aliás, um conceito interessante que não é de Mao Tse-tung, mas que ele desenvolveu, que é o das contradições antagónicas e não antagónicas. Foi Lenine que avançou com isso, na ordem internacional e na luta de classes. A China pratica isso no desenvolvimento da sua política externa. As contradições antagónicas, que separam de forma incontornável os actores, e aí poderemos dizer que há uma contradição antagónica entre a China e os EUA. Refere-se ao sistema político. Por exemplo, mas não só. Também pela percepção que cada país tem do que deve ser a ordem internacional. A China rejeita liminarmente a hegemonia dos EUA no mundo. Hoje a China continua a assumir o papel de líder do [eixo] Sul-Sul, dos [países] que se opõem à hegemonia dos EUA ou dos blocos que se venham a constituir. Até que ponto essa cultura estratégica se verifica na relação da China com as regiões administrativas especiais? Há um aspecto central da cultura chinesa que é a natureza paternalista do exercício do poder ao longo da história, e também de indulgência. Primeiro por parte do Imperador e depois pelo Partido. É a ideia de que o indivíduo deixado a si próprio tem dificuldades em sobreviver, e a comunidade também. Historicamente e culturalmente Macau e Hong Kong são chineses, têm a influência do sul da China. E há uma perspectiva paternalista que, aliás, é muito visível quando Hong Kong e Macau voltam à soberania chinesa, à Pátria-mãe. Esta perspectiva paternalista do poder aplica-se perfeitamente a Macau e a Hong Kong. Como? Essa visão paternalista observa-se sobretudo em Macau, porque Hong Kong e Macau não são a mesma coisa. A ideia de garantir, controlar, disciplinar, monitorizar, para que tudo corra bem. Mas este discurso foi aplicado também em Portugal durante quase 50 anos, de que a sociedade deixada sozinha resultava num caos. É esse o medo da China, o caos. Também em relação a Taiwan se verifica esse paternalismo? É algo potencialmente belicista. O caso de Taiwan tem outros contornos, também há o regresso à Pátria-mãe. Taiwan é o filho pródigo que se afastou e que mais tarde ou mais cedo vai ter de voltar ao regaço da família e será castigado se não o fizer. Mas Taiwan tem outros contornos que não se esgotam nesta leitura, nomeadamente estratégicos. Tem uma posição geoestratégica fundamental na ligação entre o mar do sul da China e a China setentrional. Está no eixo de passagem do comércio marítimo do Estreito de Malaca até ao Japão. Hong Kong e Macau também têm esse posicionamento, mas não se compara. Mas a propósito de Hong Kong e Macau, esse paternalismo político dentro da cultura estratégica faz o seu caminho. Mas até que ponto há diferenças? É preciso perceber, sem complexos, que Hong Kong era uma colónia de um grande poder mundial, o Reino Unido. Hong Kong é uma grande metrópole cosmopolita, um centro de negócios, porta de entrada durante muito tempo de investimento estrangeiro na China e, por isso, tem uma posição geoestratégica ímpar, que dá à sua sociedade um carácter único. Há a figura dos naturais de Hong Kong que é diferente ds macaenses, é uma espécie de cidadania. O “hongkonguer” é até um conceito político. Corresponde a uma forma de estar e de vida e, aliás, a Lei Básica estabelece que durante 50 anos se mantém mais ou menos alterada essa forma de vida. Em Macau isso existe, mas não vale a pena fazer uma comparação com Hong Kong. Mas em relação a Macau, queria fazer a justiça do seu papel na China. Em que sentido? Macau já não é só a capital do jogo e verdadeiramente nunca foi só isso. Há uma funcionalidade geopolítica de Macau para a China em três momentos. Macau tem uma importância para a China que não pode ser esquecida. Que momentos são esses? Dois deles correspondem também a interesses de Portugal. O primeiro momento foi em 1987 com a assinatura da Declaração Conjunta. Macau estava num processo de transformação, o PCC tinha aprovado as quatro modernizações e a política de abertura ao exterior, que levou à criação das Zonas Económicas Especiais. O ano de 1987 antecede o processo de abertura da China. A China aí procurou garantir a credibilidade internacional e demonstrar que era um parceiro fiável. O processo que começou em 1987 e terminou em 1999 corresponde no plano dos interesses estratégicos externos da China ao momento de afirmação do país na ordem internacional. E Macau tem um papel importante aí porque foi o seguro da estabilidade da China. Se as coisas tivessem corrido mal em Macau a imagem da China teria sido afectada. O processo de transição de Hong Kong foi bem mais conturbado. É verdade. Mas mesmo assim em Hong Kong acaba por correr bem. Houve questões de natureza política que envolveram o último Governador, mas não se evitou que a transição tivesse corrido com normalidade, nunca houve uma ruptura. Houve algumas posições antagónicas, também verificadas em Macau, mas a nossa diplomacia era completamente diferente, menos agressiva. De que posições antagónicas fala em relação a Macau? A questão da localização dos quadros e a atribuição da nacionalidade portuguesa aos chineses residentes em Macau, uma questão muito sensível. Resolvida por Mário Soares. Sim. Mas era um problema. A localização da justiça também era outro problema. E há um outro que é de uma enorme sensibilidade. Participei nesse processo. Chegou a estar em cima da mesa e a ser discutido a possibilidade, quer em Hong Kong quer em Macau, da implementação da pena de morte. E não está lá, na Lei Básica. Isso são vitórias muito importantes para Portugal. Não quero ser injusto para Portugal nem para Macau, mas provavelmente a China estava naquela fase em que queria garantir que era um parceiro credível na ordem internacional, com uma posição mais defensiva. E qual a segunda funcionalidade de Macau? Temos de 1999 até 2016 uma funcionalidade, que achava que era mais de narrativa do que foi na prática, que é quando a China cria o China-Africa Fórum e quando Macau passa a ter a funcionalidade de ligação à CPLP graças à instalação do secretariado do Fórum Macau. Essa segunda funcionalidade de Macau é de natureza geoeconómica. A terceira funcionalidade é a que Macau vive hoje, de geotecnológica. Em que sentido? Tem a ver com a zona da Grande Baía, que tem um espaço extraordinário de crescimento tecnológico e científico. Tem activos tecnológicos e académicos e Portugal pode entrar novamente em Macau através da cooperação científica e tecnológica. Não nos podemos esquecer que Macau, para o seu território e população, tem muitas instituições do ensino superior. Não há falta de massa crítica para se alavancar projectos de investigação científica no espaço da Grande Baía. [Macau] até pode desenvolver pequenos nichos tecnológicos que têm a ver com essa massa crítica. Apesar da dimensão de Macau, o ponto de ligação de culturas é mais do que um discurso. Em que sentido? Uma vez, numa palestra, lancei uma provocação: imaginar que Macau, um dia, não tinha um único falante de português. A influência portuguesa terminava nesse dia? Acho que não. Há questões relacionadas com uma forma de vivência, modelos organizacionais da Administração, a paisagem urbana que são marcantes ainda. Há a ideia de para onde irá o macaense no futuro. Esse é o grande debate, onde fica a comunidade macaense quando a integração regional é, cada vez mais, uma realidade. Era inevitável. Não falo da extinção do macaense porque há sempre elementos de continuidade. Mas a apresentação da variável macaense tem de ter uma componente política, não se esgota na componente identitária e cultural. Os macaenses têm de estar também no exercício do poder. Mas não têm estado. Hoje temos apenas um secretário macaense [Raimundo do Rosário]. Pois. Mas o macaense, no sentido identitário e sociológico, só conseguirá ter presença se essa presença for política e também na máquina da Administração pública. São esses dois pilares importantes da afirmação dos macaenses no século XXI. A comunidade macaense tem de estar nas universidades e nos centros estratégicos. No período da transição a comunidade ganhou muito maior projecção do que tinha até então. Mas Portugal fez muito e a Administração portuguesa fez muitíssimo. Deixamos dois tipos de herança, incluindo infra-estruturas físicas. Podíamos ter deixado mais, podíamos, mas fizemos em pouco tempo o inimaginável. E deixamos um modelo de organização social, de matriz portuguesa, de concepção da justiça, da Administração. Há um sistema para democrático, com a composição do órgão legislativo e elementos de participação política, mas de sujeição também. Este sistema será mantido até 2049? É um grande desafio. A Lei Básica de Macau, tal como a de Hong Kong, são documentos emanados do poder central. Dentro do PCC existem facções e a evolução desse jogo irá depender da aplicação mais ou menos plástica da aplicação das leis básicas. O processo de transição das duas regiões teve momentos de avanços e recuos negociais que resultaram de interpretações diferentes dos Estados, mas também das disputas internas dentro do Partido sobre o que deveria ou não ser aplicado dentro de Macau e Hong Kong. É da dialéctica dessas forças [internas do Partido] que vai resultar o ajustamento à evolução da realidade política, social e económica das duas regiões administrativas especiais.
Covid-19 | Índia com menos de 300 mil casos pela primeira vez em 25 dias Hoje Macau - 17 Mai 2021 A Índia registou 281.386 casos de covid-19 nas últimas 24 horas, ficando abaixo dos 300 mil diários pela primeira vez em 25 dias, mas contabilizou novamente mais de quatro mil mortos num dia, foi hoje anunciado. O segundo país mais afetado no mundo em número de casos, depois dos Estados Unidos, já acumulou quase 25 milhões de infeções desde o início da pandemia (24.965.463), de acordo com dados do Ministério da Saúde indiano. A Índia registou um declínio gradual dos casos, depois de ter atingido números de mais de 400 mil contágios, há duas semanas, no âmbito de uma segunda vaga da pandemia com um impacto sem precedentes no sistema de saúde, com falta de oxigénio e de camas. Nas últimas 24 horas, o país registou 4.106 mortos, com o total de óbitos desde o início da pandemia a ascender agora a 274.390. Especialistas alertaram que os números oficiais poderão estar subavaliados, devido à falta de testes e à crescente propagação do novo coronavírus nas zonas rurais, onde a cobertura sanitária é menor. Nova Deli, uma das cidades mais duramente atingidas pela crise, que sobrecarregou hospitais e crematórios, prolongou por uma semana o confinamento de quase 20 milhões de habitantes, enquanto o estado oriental de Bengala impôs, no domingo, uma série de restrições devido ao aumento de casos na região. A campanha de vacinação está a decorrer de forma lenta, com vários estados a criticarem as limitações no fornecimento das vacinas, apesar de o Governo ter aberto a 01 de maio o programa a todos os cidadãos com mais de 18 anos de idade. A Índia só conseguiu completar a vacinação de pouco mais de 3% da população (cerca de 40 milhões de pessoas), apesar da intenção anunciada de vacinar 300 milhões de pessoas até julho. O total de vacinas administradas ronda os 182,9 milhões, de acordo com os dados atualizados diariamente pelo Ministério da Saúde indiano. A pandemia de covid-19 provocou, pelo menos, 3.371.695 mortos no mundo, resultantes de mais de 162,4 milhões de casos de infeção, segundo um balanço feito pela agência de notícias France-Presse (AFP).
Myanmar | Papa apela à paz e ao fim da violência Hoje Macau - 17 Mai 2021 O Papa Francisco celebrou ontem uma missa especial sobre Myanmar (antiga Birmânia), em que reiterou os apelos à paz e ao fim da violência ao quarto mês da sangrenta repressão da Junta Militar contra civis. A missa na Basílica de São Pedro, no Vaticano, em que estavam presentes poucas centenas de fiéis, na maioria estudantes e religiosos birmaneses, decorreu depois de vários apelos à paz feitos nos últimos meses por Francisco, que visitou a Birmânia em Novembro de 2017, sendo esta viagem a primeira visita papal a uma nação predominantemente budista. Na homilia, o sumo pontífice argentino evitou denunciar abertamente o regime militar birmanês que derrubou, a 1 de Fevereiro, o Governo eleito de Aung San Suu Kyi e, em vez disso, pediu aos fiéis para que sejam “firmes na verdade”, exortando-os a não perder a esperança. “Queridos irmãos e irmãs, nestes dias em que vosso amado país, Birmânia, conhece a violência, o conflito e a repressão, perguntemos a nós mesmos: o que somos chamados a manter? Em primeiro lugar, a manter a fé”, afirmou. Francisco apelou também à unidade, considerando a divisão entre as comunidades e os povos uma “doença mortal”. “Sei que algumas situações políticas e sociais são maiores do que nós. Mas o compromisso com a paz e com a fraternidade vem sempre de baixo: cada pessoa, nas pequenas coisas, pode fazer a sua parte. No meio da guerra, da violência e do ódio, a fidelidade ao Evangelho e o ser pacificador exigem empenho, também através de opções sociais e políticas, mesmo com risco de vida”, realçou.
19 anos de fome pode dar novo confinamento André Namora - 17 Mai 2021 De norte a sul o país vestiu-se de verde para comemorar ao fim de 19 anos a vitória, diga-se merecida, do Sporting como campeão nacional de futebol. Há milhares de jovens que nunca tinham tido a sensação de ver o seu clube ser o número um. Fizeram parte de claques, gritavam, viajaram a acompanhar os “leões”, invadiram a academia de Alcochete e foram para tribunal depois de agredirem jogadores, treinadores e equipa médica, tiveram os mais diferentes presidentes e treinadores e afinal, durante 19 anos apenas choraram. Desta vez foi diferente: chegaram à loucura. De manhã cedo já estavam ao redor do estádio de Alvalade com os cachecóis e bandeiras, sem pensar que o Boavista podia estragar a festa. Vá lá, que um golinho do único avançado que deixou de saber marcar golos, o Paulinho, foi o suficiente para que o país esteja a falar de tudo o que se passou. A festa foi enorme, mas não se tem falado em outra coisa sobre o aspecto de uma festa deste género em estado de calamidade. O coronavírus não joga à bola mas rola por todo o lado e os responsáveis e especialistas pela Saúde sabem perfeitamente que o perigo espreita a todo o momento se entrarmos numa espiral de desleixo. As autoridades do país, sejam elas camarárias, dirigentes do Sporting e Direcção-Geral de Saúde é que têm a culpa do descalabro que se assistiu. Realizou-se uma reunião com as referidas entidades e a Polícia de Segurança Pública (PSP) e esta alvitrou que a festa se realizasse apenas no interior do estádio do Sporting, com um número limitado de adeptos e com o teste rápido feito à entrada. A proposta da PSP foi rejeitada. E aqui é que está o busílis. Mais ainda: a PSP recomendou que o autocarro dos sportinguistas não percorresse as ruas de Lisboa para evitar os ajuntamentos e a possibilidade de propagação da covid-19 ou de qualquer variante do vírus que anda por aí. Como é que foi possível autorizar no exterior do estádio a instalação de ecrãs gigantes para que a multidão visse o jogo? Porque não se fizeram avisos com antecedência de que seria proibido o ajuntamento de público junto ao estádio? Quem permitiu a venda de bebidas alcoólicas junto ao estádio tendo provocado como consequência que arruaceiros atirassem com garrafas e pedras aos agentes policiais? Naturalmente que estes responderam em força e os confrontos foram uma vergonha que manchou a chamada festa. Quanto ao ministro da Administração interna, que só tem feito asneiras, desta vez devemos tirar-lhe o chapéu porque a sua PSP fez tudo para evitar multidões que pudessem propagar o vírus. E o ministro não tinha a certeza do resultado do encontro. O Boavista podia vencer e não havia razão nenhuma para ajuntamentos sem máscara de protecção e muito menos sem distanciamento físico. O Presidente Marcelo veio meter-se no assunto a posteriori. A que propósito? Tinha de ter tomado medidas sérias muito antes dos acontecimentos. E pede responsabilidades. A quem? Aos ministros da Saúde e da Administração Interna? E por que não aqueles que têm proibido a presença de público nos estádios de uma forma organizada e em número reduzido? Desta vez, Marcelo está mal a pedir a cabeça de alguém porque a culpa é simplesmente de quem não aceitou as propostas da PSP e aí, meus caros, temos alguma informação que os dirigentes do Sporting é que quiseram a bagunça a que se assistiu porque teriam o receio de uma invasão do relvado no final do jogo e que pudesse contaminar alguns jogadores. Balelas, porque os jogadores andam por todo o lado incluindo centro comerciais. O que se passou nos festejos verdes não foi nenhuma brincadeira, foi algo de muito sério porque passadas duas semanas iremos ver o resultado da pandemia no que respeita a infectados. Para já, no sábado o número já tinha aumentado para cerca de 500 infectados relativamente ao dia anterior e para sete óbitos quando antes dos festejos não se verificava nenhuma morte. Se temos no país ainda vários lugares em cerco sanitário e com elevado número de pessoas infectadas, como foi possível permitir que milhares de adeptos leoninos se juntassem daquele modo? Os 19 anos sem ganhar um campeonato nacional tinha de ter sido festejado com bom senso e mostrar que o respeito pelos seus concidadãos tinha de ser a pedra de toque, não vá o caso resultar em novo confinamento geral, pelo menos na região de Lisboa. O Sporting sempre foi um grande clube, tem história, há muitos anos ganhava campeonatos em anos seguidos, mereceu ser campeão este ano, mas os seus dirigentes não estiveram à altura do momento pandémico que todos vivemos e só por isso não enviamos um viva ao Sporting. *Texto escrito com a antiga grafia
Em Espanha, no México e Molucas José Simões Morais - 17 Mai 2021 A nau San Antonio comandada por o capitão Jerónimo Guerra chegava a 6 de Maio de 1521com 55 tripulantes ao porto das Muelas em Sevilha, após ter-se perdido da armada durante a procura do Estreito. História bem arquitectada e ensaiada ao longo da travessia do Atlântico, que acusava Magalhães de mandar matar os capitães Mendonça e Quesada, e abandonar Juan de Cartagena e o padre na praia de San Julián. Sabendo do pacto feito ainda em Sevilha entre os capitães castelhanos, Diego de Barbosa, ao ver preso o capitão Álvaro da Mesquita, homem de confiança e primo de Fernão de Magalhães, como genro na Casa de Contratación de las Indias tentou sem êxito contestar a versão apresentada. Por o Imperador Carlos V estar ausente de Espanha, era regente o Bispo Rodriguez da Fonseca, que sabendo o ocorrido ao seu provável filho Juan de Cartagena, logo enviou um barco para o ir buscar. Sob cárcere manteve o caído em desgraça da Mesquita e colocou a esposa de Magalhães em prisão domiciliária com o filho Rodrigo, o qual viria a falecer em Setembro de 1521 e sua mãe Dona Beatriz em Março de 1522. Tudo devido ao venenoso português Estêvão Gomes, que referia estar Magalhães a pensar atraiçoar o Rei de Espanha e trabalhar para Portugal. Fora um dos instigadores da revolta da tripulação do San Antonio a 8 de Novembro 1520, durante a travessia do Estreito, quando preso o capitão Álvaro da Mesquita, a nau maior e a mais abastecida fugia da armada e retornava, decorrendo a viagem pelo Atlântico sem problemas. Fim do Império Azteca Já no México, Hernán Cortês a 26 de Maio de 1521 preparava o cerco à capital dos Aztecas, Tenochtitlán, com 844 soldados, 84 cavaleiros e 50 mil tlaxcaltecas. Os espanhóis em 1492 abordaram o continente americano nas primeiras viagens de Cristóvão Colombo, ficando pelas ilhas das Antilhas onde ergueram povoações, mas essas colónias eram atacadas e arrasadas pelo guerreiro povo maia, ao qual pertenciam os aztecas. O povo maia habitava a Meso-América desde 2500 a.n.E. e a sua gloriosa cultura manteve-se até ao século XIII, quando constantes lutas internas dentro da Confederação marcaram o início do declínio de um dos mais civilizados povos do mundo. Florescera quatro mil anos, numa confederação de cidades independentes ligadas na religião, cultura e escrita comum. Cada cidade possuía um governo próprio, fazendo alianças quando o perigo aparecia. Colombo ao explorar a costa das Caraíbas chegava a 28 de Outubro de 1492 à ilha de Cuba, mas só em 1511 os espanhóis a conquistavam, instalando aí o poder administrativo do Novo Mundo. No entanto, sondagens à costa mexicana só foram feitas em 1518 por Juan de Grijalba, não descobrindo um bom local para aportar. Tivera uma resistência feroz dos índios, que mataram muitos dos seus, mas trouxe um bom carregamento de ouro e notícias das riquezas existentes. Instou o Governador de Cuba Diego Velásquez a realizar aí uma nova expedição e este escolheu Hernán Cortês, pois acompanhara-o nas missões de pacificação de São Domingos e na conquista de Cuba. A 23 de Outubro de 1518, Cortês nomeado capitão recebeu as instruções para a perigosa missão de explorar o continente, mas a hesitação de Velásquez levou Cortês à ruptura. À revelia partia a 18 de Fevereiro de 1519 em direcção à costa do Golfo do México com onze barcos, cem marinheiros, 500 soldados, doze canhões, 18 cavalos e uma matilha. Em Abril, no lugar de Vera Cruz desembarcaram e daí marcharam pelo litoral para Norte, onde Cortês mandou fundar a Vila Rica de La Vera Cruz a 22 de Abril de 1519 e como quartel-general ergueu um forte, casas e a igreja. Daí escreveu a Carlos V a pedir carta régia para a cidade e a ruptura com o governo de Cuba, afim de estabelecer um novo poder. Para ter suporte legal criou o cabildo (associação de famílias nómadas) a 8 de Julho, a quem Cortês delegou os poderes que Velásquez lhe entregara. No dia seguinte, o novo poder fazia de Cortês o alcaide, chefe de justiça e capitão general. A tentativa de sublevação de alguns espanhóis a pretender regressar a Cuba, levou-o a encalhar e desmontar os navios e daí, com eles empreendeu a marcha para o interior até Tenochtitlán, capital dos Aztecas (actual cidade do México). A 8 de Novembro de 1519, o Imperador Azteca Moctezuma II, aconselhado pelos sacerdotes a não os confrontar, foi recebê-los e convidou-os como hóspedes para ficarem no centro da cidade, num enorme palácio com espaço para alojar os exércitos espanhóis e seus aliados índios. Dias depois, convidava Cortês a visitar a capital, que contava com 300 mil habitantes. A situação para os espanhóis piorou bastante no ano de 1520 e após grandes mortandades e acontecimentos tristes, encontrava-se agora Cortês, a 26 de Maio de 1521 a cercar Tenochtitlán. Sitiada por 79 dias, a resistência terminou a 13 de Agosto, com a capital em total ruína. Assim, o Império Azteca, existente desde 1325, expirava três anos após a chegada de Cortês. Até às Molucas Morto Fernão de Magalhães em Mactán a 27 de Abril de 1521 e em Cebu degolados os capitães Duarte Barbosa e Juan Rodriguez Serrano a 1 de Maio, a expedição não foi abandonada apesar dos trágicos acontecimentos. Fugiam agora a caminho das Molucas, mas com uma insuficiente tripulação a rondar os 115 e a Concepción incapacitada para navegar, foi a nau desmontada, retirando-lhe o aproveitável, como os pregos, e queimada no dia seguinte. Restavam dois dos cinco barcos iniciais, comandando o piloto João Lopes de Carvalho a nau capitã Trinidad e Gómez de Espinosa a Victoria, mas em vez de seguirem directos para Sul, pois as Molucas ficavam na linha do Equador, desorientados, vaguearam em ziguezague e afim de obter mercadoria para as trocas, dedicaram-se ao corso. Daí chegarem ao Brunei a 9 de Julho, fazendo apenas breves saídas a terra para abastecer, mas vinte dias depois estavam as naus cercadas por dezenas de barcos indígenas. Na refrega, foram as armas de fogo a salvá-los, conseguindo capturar o filho do Rei de Luzon (a maior ilha das Filipinas) que por ali andava. Perderam-se alguns tripulantes, então em terra e entre outros o filho brasileiro de Lopes de Carvalho, preteridos por ouro na troca com o príncipe, querido do sultão do Brunei. A 16 de Setembro, devido aos desatinos como piloto e capitão, Carvalho foi substituído por Gómez de Espinosa, que passou a comandar a armada e cedeu a nau Victoria a Juan Sebastián de Elcano. Partiam a 27 de Setembro para Sudeste, desfazendo o errado rumo até então tomado e daí dar à baía de Butuán, na parte Norte da ilha de Mindanao, onde encontraram um junco chinês que ia para Maluco e os levaram à ilha de Tidore, onde chegaram a 8 de Novembro de 1521, sendo bem acolhidos por o sultão Almanzor. Meses antes aí morrera envenenado Francisco Serrão, que vivia nas Molucas em Ternate e como homem de armas desse sultão viera em guerra à inimiga Tidore. Na mesma altura, encontrava Magalhães a morte, ficando assim por realizar o encontro combinado entre ambos para as Molucas.
“Out! Coloane Art Festival” acontece em Junho e promete diversidade Andreia Sofia Silva - 17 Mai 2021 O grupo teatral Rolling Puppet, de Kevin Chio e Teresa Teng Teng, traz em Junho a segunda edição do “Out! Coloane Art Festival”, que acontece no espaço da companhia em Coloane, o “House of Puppets Macau”. A pandemia e o isolamento vivido por muitos no período de confinamento é o tema do espectáculo “Lone Together”. Mas nem só de teatro se fará este festival No próximo mês de Junho, os amantes do teatro e das artes têm em Coloane, no espaço “House of Puppets Macau”, a oportunidade de desfrutarem de diversos espectáculos e assistirem às mais variadas representações artísticas. A companhia teatral “Rolling Puppet – Alternative Theatre” organiza a segunda edição de “Out! Coloane Art Festival”, uma iniciativa que ganha agora um nome diferente depois da edição inaugural que aconteceu no ano passado. O cartaz deste ano inclui o espectáculo “Lone Together”, que acontece nos dias 19 e 20 de Junho e que tem o lado emocional da pandemia como tema de fundo, conforme contou ao HM Kevin Chio, um dos fundadores da companhia “Rolling Puppet”. “O ano passado vivemos em confinamento e parámos todas as actividades sociais, deixamos de ver os nossos amigos. A certa altura sentimo-nos muito sozinhos e isolados, mas ao mesmo tempo houve pessoas que sentiram uma certa liberdade para poderem ser elas mesmas, sem multidões, para fazerem o que querem. Então este espectáculo é, ao mesmo tempo, sobre liberdade e isolamento.” Este não será apenas um espectáculo de marionetas, mas terá outros elementos que ajudam a contar esta história. “Não vamos fazer o tradicional espectáculo de marionetas em que dizemos tudo. Em vez disso vamos ter sete narradores que precisam de parceiros em palco. Alguns deles vão recorrer às marionetas, aos seus corpos ou a alguns objectos. [Haverá números de] stand-up comedy, projecções. Alguns só fazem trabalho físico. Vamos, portanto, ter diferentes estilos”, frisou Kevin Chio. Apesar de a linguagem base do espectáculo ser o cantonês, sem tradução ou legendas, Kevin Chio acredita que a mensagem poderá ser transmitida a um público estrangeiro. Em nome da diversidade Com o “Out! Coloane Art Festival”, Kevin Chio explica que a ideia é trazer diversas expressões artísticas ao público de Macau. A prova disso é que, além de “Lone Together”, que Kevin Chio descreve como uma forma de teatro alternativo, haverá também o “Art Soup Bazar”, com partilha de receitas de sopas ou outros elementos relacionados com este tema. “Teremos um espaço aberto, um bazar onde se pode fazer esta partilha”, de ideias e objectos, apontou. Acima de tudo, Kevin Chio defende que, nesta segunda edição, o espectro das artes reveladas é maior. “Não nos focamos apenas no teatro com marionetas. Resolvemos apostar nas residências artísticas e temos outras iniciativas que não estão propriamente relacionadas com o teatro. Quisemos trazer uma maior diversidade para promover a arte e um estilo de vida ligado ao espaço que temos em Coloane.” Kevin Chio recorda que “uma iniciativa destas nunca aconteceu em Coloane”, além de que a primeira edição do festival teve lugar semanas antes da pandemia, “numa fase estranha”. “As coisas agora estão melhores, começamos a ter o nosso próprio espaço, a ter mais pessoas a compreendê-lo. Temos um maior espectro ao nível das artes e do espectáculo”, frisou. O “Out! Coloane Art Festival” é também o resultado de algumas residências artísticas que o grupo tem acolhido, nos últimos meses, no espaço “House of Puppets Macau”. A ideia era estabelecer um programa de intercâmbio com o grupo “Thinkers’ Studio”, de Taiwan, mas esse projecto foi adiado devido à pandemia. “Partilhamos com eles o que fomos desenvolvendo. No próximo ano quando a pandemia terminar vamos ter este intercâmbio de artistas com Taiwan”, disse Kevin Chio. A mudança para Coloane aconteceu em 2018, depois de o tufão Manghkut ter destruído o espaço que os Rolling Puppet tinham na península de Macau. Depressa o grupo conseguiu construir uma forte relação com a comunidade onde se inseriu. “Temos um café e as pessoas podem vir e conhecer os artistas, em vez de estarmos escondidos num qualquer edifício industrial. [O público] compreende e apoia mais o teatro em Macau. Começámos a ter alguns amigos que nunca tinham ido ao teatro, mas depois de nos conhecerem começaram a ver os nossos espectáculos”, rematou.
Grande Baía | Construtor fez um carro da categoria TCR Sérgio Fonseca - 17 Mai 2021 Durante algum tempo ouviu-se com frequência no bas-fond do automobilismo chinês falar sobre a existência de um terceiro construtor chinês, cuja identidade nunca foi propriamente revelada, muito interessado em juntar-se à Lynk & Co e à MG na popular categoria de carros de Turismo TCR. Tratava-se da GAC Motor, um construtor automóvel de Cantão Em 2017, a BAIC Motor e a Shanghai Lisheng Racing Co. Ltd apresentaram o BAIC Senova D50 TCR. O carro, desenhado em parceria com a empresa italiana Hexathron Racing Systems, foi inspirado na regulamentação técnica da categoria TCR, mas nunca recebeu a homologação TCR para ser aceite noutras competições que usam esta plataforma. No entanto, este carro foi usado durante três temporadas no troféu monomarca do Interior da China, tendo sido visto entre nós por duas ocasiões, durante os Grande Prémios de Macau de 2016 e 2017, dando corpo à Taça da Corrida Chinesa. A BAIC é uma presença regular no desporto automóvel nacional e internacional, tanto no Campeonato da China de Carros de Turismo (CTCC), como em provas de todo-o-terreno, inclusive tendo participado na última edição do rali Dakar. Durante alguns anos o construtor automóvel de Pequim terá avaliado a possibilidade de construir um verdadeiro TCR, tendo como base no Senova D50 de troféu. No entanto, essa ideia, por diversas razões, nunca se materializou. Já o TCR da Grande Baía saiu do papel. O GA6 TCR da GAC Trumpchi foi construído pela Maxpeeding Rods em parceria com a Chongqing Guogui Racing Technology. Este carro, que foi totalmente modificado e fabricado de acordo com as especificações TCR, terá recebido apoio do grupo Guangzhou Automobile Group Motor Co Ltd (GAC Motor). O grupo tem uma forte presença dentro do Interior da China, estando igualmente a entrar em novos mercados no Sudeste Asiático, Médio Oriente e América do Sul. Ao mesmo tempo, a marca fundada em 1955 também não é estranha aos desportos motorizados, com participações em ralis, todo-o-terreno e velocidade. A ideia de construir um TCR passava por colocá-lo a competir no TCR China, para depois projectar a marca noutras paragens internacionais, usando para isso a plataforma criada pelo empresário italiano Marcello Lotti e usada em inúmeros campeonatos e corridas internacionais como a Corrida da Guia. Feito como lá fora O GAC Trumpchi GA6 TCR foi equipado com um motor de dois litros turboalimentado e com uma caixa de velocidades sequencial da francesa Sadev, igual àquela utilizada nos TCR das marcas Audi, SEAT ou Volkswagen. Segundo o preparador: “vale ressaltar que a carroceria do carro adopta um esquema modular, e a gaiola de protecção em liga que atende aos regulamentos da federação de automobilismo da China é personalizada por meio de digitalização 3D”. Para o ECU (centralina electrónica), foi escolhido um Emtron KV12, com o preparador a fazer igualmente referência “ao sistema de suspensão independente personalizada, aos travões (da marca inglesa) AP, ao tanque de combustível de 60 litros da ATL, ao sistema de levantamento automático pneumático do chassis aos extintores da OMP que garantem o profissionalismo e a segurança do carro de corrida”. Fim prematuro Dois exemplares do GA6 TCR foram vistos a testar no circuito de Tianma, em Xangai, pela primeira vez no Verão de 2019 e já com os números e autocolantes oficiais do TCR China nas portas. Um carro chegou mesmo a ser colocado em exposição no Salão do Automóvel Modificado da China, realizado no Complexo de Feiras de Importação e Exportação da China em Pazhou, Guangzhou, no final do ano de 2019. Em 2020, quando se esperava a estreia dos GA6 TCR nas pistas, deu-se a pandemia e os calendários de todas as competições automóveis chinesas foram dilacerados. Isto, apesar do campeonato TCR China ter conseguido as suas doze corridas inicialmente planeadas, incluindo a finalíssima de luxo nas ruas da RAEM. Do projecto do GA6 TCR nunca mais se ouviu falar, este terá sido colocado numa gaveta a aguardar melhores dias e, essencialmente, verbas da casa-mãe para poder ombrear com os Lynk & Co do grupo Geely e os MG do grupo SAIC. Apesar dos carros ainda existirem, estes nunca foram homologados pela organização internacional do TCR, o que na teoria os impede de correr em qualquer competição que cumpra a regulamentação, incluíndo o TCR China. Para obter esta homologação seria necessário enviar um exemplar para a Europa, de modo a que este fosse avaliado pelos técnicos competentes, o que neste cenário de crise sanitária e restrições nas viagens internacionais, não é definitivamente fácil para qualquer estrutura com base na China Interior.
O Jogo das Escondidas – 30 primeiros capítulos Fernando Sobral - 17 Mai 20216 Jul 2021 Deve afirmar-se que o céu é, sem dúvida, corruptível. Cristoforo Borri Collecta Astronomica, 1631 Macau, 1923 I Benedito Augusto naufragou duas vezes. E duas vezes sobreviveu. Por isso gosta de lembrar, a quem o escuta, que há uma velha lenda dos marinheiros que diz que, no terceiro naufrágio, se alcança a imortalidade. Apesar de acreditar que tal possa ser possível, nunca o tentou comprovar. Hoje prefere a terra ao mar, Macau em vez dos mares do sul da China. De resto, em Benedito Augusto nada é o que parece. Desde logo, esse não é o seu verdadeiro nome. O de nascimento, de que não há registo, ficou perdido em Lisboa. Desde que apareceu em Macau que é conhecido como padre Augusto, mas nada garante que, pelo caminho, desde que percorreu os mares e as terras da Ásia antes de chegar a Macau, não teve outros nomes e outras vidas. O tenente Félix Amoroso sondou-o com o olhar, intrigado. De cabelo preto, com uma pequena barba onde já despontavam alguns cabelos brancos, o padre Augusto vestia uma cabaia de ganga escura. A sua face era morena, com grandes olheiras, que salientavam ainda mais uns olhos negros incandescentes. Era um mistério. Mas, mesmo assim, era o mais precioso agente do tenente. Falava cantonês, inglês, francês e, claro, português. Como pretenso padre, jesuíta segundo dizia, penetrava em lugares interditos a outros ocidentais. Ouvia atrás de portas que se fechavam a sete chaves quando outros as tentavam ultrapassar. Sabia perscrutar a alma dos outros como ninguém. Defendia-se, dizendo que sendo o Diabo a origem de todos os males, o seu objectivo era vencê-lo. O Diabo tentava todos os seres humanos. Por isso, saber o que cada um queria não era um pecado. Saber os segredos dos que queriam o Mal era uma acção ao serviço de Deus. Mesmo que pago pelo vil metal que corrompia os homens. Amoroso não sabia se a argumentação do padre era verdadeira ou falsa. Mas isso era, para já, indiferente. Ele era-lhe útil. Benedito Augusto levou aos lábios o copo de cerveja que tinha à sua frente. Depois de, com evidente prazer, saciar a sede, disse, sorrindo: – Não sou ninguém, meu caro tenente. Posso ser toda a gente. Gosto de ser invisível. Como um anjo disfarçado no reino das trevas. – Ou um diabinho mascarado no mundo dos que se julgam anjos. – Se isso o conforta… II Félix Amoroso gostava que Benedito Augusto continuasse a ser invisível. Olhou à volta. Estavam numa espécie de taberna tão escura que apenas se viam sombras recortadas pela luz mortiça de umas lâmpadas de óleo que não eram limpas há muito tempo. Ninguém se importava. Os que ali estavam queriam que as suas faces passassem despercebidas. Marinheiros com tatuagens, com sinais e rugas que eram fruto de passados impossíveis de descobrir, trabalhadores das docas, piratas. Homens que tinham tentado descobrir o paraíso e que tinham escorregado no seu caminho. Por desejo dos outros. Ou por culpa própria. A vida era um contínuo labirinto. E nem todos queriam descobrir a saída dele. Ali, naquela pequeno local sem nome junto ao Porto Interior, desenhavam-se traições e conspirações. Marinheiros sôfregos de terra firme vinham gastar o dinheiro das suas aventuras legais ou ilegais. Ou procurar uma mulher, antes de voltarem ao mar. Mas todos falavam baixo. Um grupo de homens chineses estava sentado num recanto. As suas faces dificilmente eram visíveis. Na mesa que ocupavam, uma chama de uma vela movia-se com a sua respiração. Bebiam, enquanto pareciam esperar alguém. Também ali estavam alguns homens solitários, quase todos ocidentais, perdidos nos seus pensamentos e na vida. Era de uma conspiração que Benedito Augusto queria falar ao tenente Amoroso. Escutara-a ali. Às vezes o tenente tinha a sensação que o padre Augusto tinha um tom ressentido. Muitas vezes sarcástico, mas outras vezes parecia alguém que se queria vingar. Dos outros, de si próprio, do que vira e do que algures fizera ou deixara por fazer. Como ele, sabia que não havia inocência no mundo. Como quase todos os portugueses, tinham, ao longo dos séculos, perdido demasiado tempo e energia a sobreviver. Ele próprio o sabia. Sobrevivera a La Lys, durante a Primeira Guerra Mundial, antes de rumar a Macau. O tenente tinha um perfil esguio, quase duro, mas aparentava uma doçura e elegância no olhar e na sua forma de falar e sorrir. O seu bigode estava bem aparado. A cor morena ganhara contornos dourados por causa do sol. Apresentava sinais de fadiga e falta de horas de sono nos seus olhos amendoados. Apesar de habituado à linguagem das armas, movia as mãos com delicadeza. III Talvez por isso, quer Benedito Augusto, quer Félix Amoroso, embora parecessem vir de mundos diferentes, tinham tanto em comum. A sua semelhança aproximara-os. Ou um segredo, que, receosos, ambos partilhavam. – Meu caro Amoroso. Eram dois homens. Um, chinês. O outro deveria ser europeu ou americano. Falavam inglês, mas o ocidental, apesar de ser loiro, era de outro país. Nunca o tinha visto. Conversavam em sussurro, num canto. Eu, por acaso, estava na mesa mais próxima, com um pirata que quer reformar-se. Eles falavam de Macau e da sua venda. – Da venda de Macau? – Sim, segundo o ocidental, Portugal vai vender Macau à Alemanha. É um segredo, mas isso vai realizar-se brevemente. Parecia preocupado em arranjar dinheiro para comprar a simpatia de quem era importante em Macau para que tudo corresse sem problemas aqui, depois do Governo de Lisboa anunciar a venda. Amoroso franziu a testa. Nunca tinha ouvido nada sobre esse assunto. – E não soubeste mais nada? De onde vinha o chinês? – Ele costuma estar por aqui. Tem um barco. Acho que ou é pirata ou, então, faz contrabando. De arroz, de ópio, de seda. Mas deve dar-se bem com as autoridades e com as tríades, porque não parece ter receio de nada. É preciso que existam piratas para que se justifiquem gastos e custos de muita gente, da administração às empresas de seguros marítimos, não é verdade? – Achas que isso é assim? Benedito Augusto fez um esgar: – Hoje é difícil ser puro e inocente. – Como pretenso padre, deverias acreditar nisso. – Sou padre. Formei-me num colégio jesuíta. Conheci a sua história. Aprendi muito com eles. Sabe como foi, já lhe contei, tenente. Tive de fugir de Portugal, quando chegou a República. Queriam enforcar os padres, como eu, nos candeeiros. Acabei por vir parar aqui. E o tenente, porque veio para Macau? – Para descansar da guerra, meu caro padre. Dos pesadelos e dos fantasmas. – E encontrou paz aqui? – É mais fácil falar com os deuses aqui do que em Lisboa. Félix Amoroso encolheu os ombros. Fungou: – O que me dizes é muito vago. Que posso eu investigar com isso? – Saber se há fumo no meio do fogo, não? Descobrir quem é o ocidental. Deve andar por aí. Quanto ao resto eu acabarei por saber. IV O tenente tirou um envelope do bolso e passou-o discretamente para as mãos de Benedito Augusto. – Está aí tudo o que te é devido. – Confio em si. Colocou o envelope no interior da cabaia. E voltou a dar um gole na cerveja. Amoroso sentiu-se, por momentos, incomodado. O chão estava muito sujo. Tal como a mesa e os bancos onde estavam sentados. Este era um local de trânsito, entre o mar e terra firme. Os mais endinheirados, depois, deveriam ir para os bordéis, ou para casas de ópio e de jogo na Rua da Felicidade. Onde as portas, como o desejo, eram vermelhas. Diziam que esta era a cidade dos pecados. Como se o resto do mundo fosse diferente. Era um porto onde alguns se escondiam do passado e outros se refugiavam das incertezas do mar. Sentiu-se esgotado, estranhamente desperto e sem sono. Lá fora, a cidade dormia tranquilamente. Ouviu a voz do padre Augusto: – Em Macau não deveríamos olhar para o sol. Cega-nos com sonhos irrealizáveis. A sua voz era calma e segura. Reconfortante, para quem não o conhecia nem poderia desconfiar dele. O tenente respondeu: – Deus, às vezes, está ausente em parte incerta. Era o que acontecia ali, onde apesar da presença das força de segurança portuguesas, as sociedades secretas controlavam as ruas e os becos. – Deus deixa-nos ver. E decidir. De dia vemos o que os outros nos querem deixar ver. De noite podemos vislumbrar o que devemos ver. As sombras iluminam mais do que a luz. Amoroso sorriu com as palavras do padre Augusto, um homem tão sombrio como a escuridão da noite. Sentia que ele queria destruir o mundo que conheciam, para que fosse possível construir, a partir das suas ruínas, um outro. Queria uma nova ordem que restabelecesse o equilíbrio entre o céu e o inferno. Como se tal fosse possível. Augusto voltou a falar: – Talvez seja o momento de mudarmos tudo. Não podemos ver para lá do horizonte, mas sinto que algo se aproxima. E não é bom. O tenente Amoroso pensou, por momentos, na chinesa Ding Ling. Ela poderia ser um futuro bom, se acreditasse que isso ainda era possível. V Por isso não escutou as palavras do padre Augusto, que soavam a despedida: – Lembra-se do jogo das escondidas, tenente? Em crianças, contávamos até cem, com os olhos fechados, antes de podermos ir à procura dos que se tinham ido esconder. Trouxemos esse jogo de Portugal para Macau. E continuamos a jogá-lo aqui. Mas, às vezes, fechamos os olhos e não fazemos intenção de descobrir quem está escondido. E escondemo-nos tão bem que temos medo de voltar a aparecer. 2. Os olhos de Ding Ling eram negros. Tão escuros como a cor do seu cabelo, comprido, mas enrolado e travado por agulhas vermelhas. O cheongsam branco, com dragões verdes nas mangas, que vestia, ajustava-se perfeitamente ao atraente corpo da chinesa. Nos dedos anelares cintilavam anéis de jade verde e de ouro com esmeraldas. Caminhou até junto do tenente Félix Amoroso, entre a nuvem de fumo que se movia muito devagar dentro da sala. A luz das lâmpadas de gás era ténue, mas mesmo assim era visível o brilho hipnótico dos seus olhos. Algo que Amoroso bem conhecia. A sua voz era aveludada e acolhedora: – Deseja um chá, tenente? – Se tal for possível. Ding Ling aproximou-se de uma jovem chinesa, a quem fez o pedido. Esta retirou-se sem falar e sem olhar para o tenente. – Os seus empregados são todos assim, silenciosos como gatos, menina Ling? – Gosto do silêncio. Traz-me conforto e segurança. Em grande parte da “Noite Tranquila”, na discreta casa de jogo e de ópio de Ding Ling, na Calçada das Verdades, quase não se escutava o ruído das conversas. Quem procurava a tranquilidade tinha de a procurar. Os seus clientes eram selectos. Tal como as cortesãs que ali se encontravam. E isso tinha um preço. “Porque tudo na vida tem um preço”, dizia, sem emoção visível, Ding Ling. Amoroso sentiu o odor do fumo do ópio que vinha do piso superior e que se misturava com o do tabaco. Ela fez sinal para subirem. Ele seguiu-a até a uma pequena sala, onde se sentaram junto a uma mesa de madeira de cerejeira. VI – Que te traz desta vez a esta humilde casa, tenente? – Julgo que o sabe, menina Ding. A morte de João Carlos da Silva, um dos secretários do Governo, que apareceu morto esta manhã perto da porta deste estabelecimento. – Um trágico acontecimento, tenente. – Ele era um frequentador assíduo da “Noite Tranquila”, não era? – É verdade, tenente. Esteve aqui ontem à noite, saíu daqui vivo, e foi encontrado morto na calçada, a uns metros daqui. Assassinado com golpes de faca. O meu funcionário chamou a polícia. Nada tenho a esconder das autoridades portuguesas. E todos temos a ganhar se tratarmos do assunto discretamente. João Carlos da Silva, um secretário do gabinete do novo governador de Macau, Rodrigo José Rodrigues, que fora nomeado em Janeiro pelo Governo português. Silva, e residia há muitos anos em Macau, era conhecido pela sua paixão pelo jogo e pelas cortesãs que eram mestres na arte da sedução na casa dos prazeres de Ding Ling. Era um homem frágil e inseguro, segundo se dizia. Mas muito competente no trabalho. A mulher, depois de poucos meses em Macau, deixara-o e regressara a Lisboa. Levara a filha de ambos, ainda criança. Ele ficara e nunca mais conseguira criar uma família. E isso era um ponto fraco para quem estava no centro do poder. Independentemente da investigação da polícia, Amoroso decidira ir até a um local que conhecia bem. Essa era a sua missão em Macau: ver o que os outros não viam e alertar o comandante militar da ilha da Taipa ou o Governador. Ouviu a voz de Ding Ling: – O senhor Silva era um homem muito querido aqui. Um excelente cliente. Ninguém desejaria a sua morte. Amoroso olhou para ela e sorriu. Ele próprio era um bom cliente daquele local. – Claro. Tentou manter alguma frieza, mas sabia as suas fraquezas quando estava perto de Ding Ling. – Achas que a morte dele foi um mero azar do destino ou tem alguma implicação maior? – O senhor Silva tinha uma posição sensível na administração portuguesa de Macau. Por isso todos os cenários são possíveis. – E pensas que algum de nós poderá ter a ver com a sua morte? – Querida Ling, tenho de fazer uma escolha entre ti e a razão da morte dele? Ou entre ti e a menina que estava, eventualmente, com ele? – Não te peço tanto. Embora muitas vezes na vida tenhamos de fazer escolhas difíceis ou que nos parecem impossíveis. VII Amoroso sentiu o aroma do chá, que entretanto tinha sido colocado na mesa. Era reconfortante, aquela hora. Durante o dia poupava o corpo ao álcool. E a noite ainda não tinha chegado. – Quem era a menina com que ele estava ontem à noite? – Com a Li Bei. Sabes quem é. Temos estado lado a lado desde pequenas. Caminhámos juntas. Navegámos juntas. Matámos juntas. Partilhámos coisas que não imaginas. Dormi com ela durante anos. O seu olhar denotou prazer ao dizer isso. Só para ver a reacção de surpresa do tenente. – Ficarias admirado com as mudanças que uma cabeça pode sentir depois de passar uns dias na cama com ela. Vim de Xangai para aqui com ela. É como se fosse minha irmã. Ding Ling, conscientemente, despertava-lhe o desejo. Ele nunca tinha estado na cama com Li Bei. E não sabia que elas tinham essa relação tão forte. Afinal não a conhecia tão bem como julgava. Amoroso tentou afastar da memória as suas noites com a chinesa. – Diz-me, ninguém se aproximou do reservado do senhor Silva ontem à noite? – A Li Bei tratou do seu conforto. Como sempre fez. Ele saiu daqui, antes do sol nascer. Ninguém ouviu nada, até se encontrar o corpo caído na rua. Mas diz-me, tenente Amoroso, porquê essa interesse? Desconfia de algo? – O senhor Silva tinha informações que poucas pessoas têm em Macau. Temos um novo Governador. Esta morte não poderia ser mais inoportuna. Ling Ding fechou os olhos. Disse apenas: – É verdade. Ela tinha, para além daquela casa de prazeres, uma frota de juncos e lorchas e um centro de distribuição no Porto Interior, onde guardava as mercadorias que vinham de várias cidades da Ásia. Herdara todo esse negócio do seu tio, em circunstâncias trágicas e que um ano antes fora muito falado em Macau. Desde então o negócio prosperara. Falava-se que os seus interesses se tinham alargado ao contrabando de ópio e que ela tinha agora ligações à tríade do Bando Verde. Tudo rumores sem confirmação. Mas Macau era uma cidade pequena. Reinava a inveja. E em locais assim os segredos nunca poderiam ser bem guardados. Quando a questionara sobre isso, ela respondera de forma impassível: “Uma cidade portuária precisa do comércio para sobreviver”. Nada poderia ser mais verdade. VIII Amoroso ouviu outra vez a voz dela: – Quando cheguei a Macau só trazia duas coisas, a tristeza e a necessidade de encontrar uma via para voltar a reconciliar-me com a vida. Na verdade tudo é um pouco assim. Estamos preparados para seguir em frente. Vês isso quando contemplas a natureza. A força da vida é tremenda, é algo perfeitamente assombroso. – Tu és uma força da natureza. – Não seria sem a tua ajuda. Ding Ling não precisava de dizer mais nada. O segredo que ambos compartilhavam não poderia ser dito em voz alta. Era uma história que não deveria ser confidenciada a outras almas. Talvez por isso Amoroso não conseguisse viver sem vir ter com ela. A vida seria diferente se não tivesse vontade de sentir os espinhos das rosas mais belas e misteriosas. Ela aproximou-se e roçou os lábios pelo pescoço de Félix Amoroso. Ficou assim durante algum tempo, antes de dizer: – Que desejas mais, tenente? Ele não conseguiu responder. O corpo quente de Ding Ling colara-se ao dele e aprisonara todos os seus movimentos e pensamentos. Ela colocou a sua mão na dele e puxou-o para uma pequena porta que estava escondida atrás de um biombo de laca, com fundo preto e imagens de uma batalha, colocado no canto da sala. Entraram num quarto muito pequeno, quase só ocupado por duas camas de pau preto, que dava para dois fumadores e por uma mesa comprida em cima dos quais estavam dois cachimbos de ópio e outros utensílios. Ding Ling tirou-lhe as roupas e fez com que ele se deitasse numa das camas. Depois também tirou o seu vestido. Sentou-se junto a ele e, depois, soergueu-se para lhe beijar os lábios e, depois, todo o corpo. Muito devagarinho. Ele sentiu o corpo dela, fechou os olhos e abandonou-se. Mais tarde, o ópio trouxe-lhe o resto do repouso que tanto procurava. Só se levantou já os raios de sol irrompiam por Macau. Estava sozinho. A cama de Ding Ling estava vazia. Fora um sonho maravilhoso. IX 3. Somos o que não somos. Tal como as coisas não são o que parecem. O tenente Félix Amoroso sabia isso, porque a sua vida mais recente era o resultado desse enigma eterno. Mas não era isso que o incomodava agora, quando estava prestes a entrar no edifício da Avenida Almeida Ribeiro onde se situava o escritório de Joaquim José Palha, comerciante de vinhos e facilitador de negócios. Tinha outras aptidões muito elogiadas, como ser uma voz escutada junto de alguns dos mais importantes comerciantes da comunidade chinesa. Alguns deles dominavam o mundo do jogo. Palha era um homem ambicioso. Alguém tinha dito que o caminho até ao cimo conduz-nos mais para baixo, mas até agora ele tinha estado imune a esse destino. Amoroso subiu até ao primeiro andar, onde uma jovem secretária chinesa lhe abriu a porta da sala onde Palha o esperava. Este estava sentado, atrás de uma grande mesa de madeira. Nas paredes viam-se prateleiras com livros diversos, muitos deles de Direito e de História. Palha parecia inquieto. Com a mão esquerda, brincava com uma ampulheta. Quando viu o tenente, colocou-a na mesa, e a areia fina que estava no compartimento superior começou a cair no inferior. Como que a mostrar que o tempo tinha começado a contar. Olhou para Amoroso com ar inquiridor. Disse, afavelmente: – Bem-vido tenente Amoroso. Sente-se, por favor. Sei que, como eu, é um homem com o tempo contado. Por isso não o demorarei. – Quando me pediu para vir aqui fiquei com dúvidas sobre o que desejava. Não frequentamos os mesmos círculos. Nem temos interesses coincidentes. – Não estaria tão certo, tenente. Macau é uma cidade pequena. Todos se encontram. E todos dizem mal dos outros assim que estes viram as costas. Não é diferente em Portugal. Somos mestres na arte do fingimento e da inveja. Imagino que sabe isso. Mas estamos condenados a viver uns com os outros. E a garantir que Macau sobrevive. Por isso os nossos interesses acabam por ser mais ou menos comuns, não lhe parece? Para além de comerciante, Palha era também membro do Leal Senado, eleito pelo Centro Republicano Eleitoral, grupo político criado há poucos anos. A política, em Macau, pouco ou nada tinha a ver com o que se passava em Lisboa. A capital de Portugal estava longe e o seu frágil braço apenas era visível nas decisões do Governador. X Lisboa não conhecia a realidade de Macau nem os interesses e necessidades de quem lá vivia. A cidade era um ponto pequeno e longínquo no mapa do Império português. Palha era um homem poderoso. A sua voz era dominadora. Os seus olhos, frios e cintilantes, contrastavam com um sorriso terno mas firme, que sublinhavam as palavras. Tinha uma cerrada barba preta e vestia um fato de linho claro, de corte perfeito. – Vou ser franco e directo consigo, tenente. Está em Macau desde quando? 1919, 1920? – 1920. Desde há três anos. – É verdade. Nada é já uma surpresa para si. Já percebeu que, de um momento para o outro, tudo o que construímos pode ruir. Lisboa não sabe e não percebe nada. Porque, para além da pequena política pacóvia onde se vai afogando, também está mais preocupada em sobreviver. Nada que admire um português. Somos todos náufragos em busca de uma bóia. E à espera de uma sereia. Deu uma risada. – Percebeu o que se passou neste último ano? A nossa situação é muito débil. Portugal já não é uma potência que imponha respeito. Amoroso recordava-se. Macau estivera à beira do precipício. E ainda não estava salva. Não caíra porque a sua capacidade de sobrevivência era semelhante, ou mesmo superior, à de Portugal. Quando estava com um pé no abismo, um milagre, um acontecimento inesperado ou um homem providencial mudava o sentido do vento. Até ao início de 1923, Macau fora palco de uma sublevação sem precedentes. Que tivera a ver com a frustrada tentativa do general Ch’en Chiu Ming eliminar Sun Yat-sen. A agente de Ch’en, uma mulher irrascível chamada Wong Pik-wan, viera para Macau para incendiar os ânimos. Nessa altura as forças nacionalistas mais radicais proclamavam que a China deveria reaver rapidamente a soberania sobre os territórios ocupados pelas potências estrangeiras. Macau era um alvo fácil. Todos temiam um ataque à cidade, a partir da China continental. Fora mesmo, nesses meses, criado um Corpo de Voluntários da Defesa Civil. A confusão era total. O então governador, Henrique Correia da Silva, estava em Hong Kong, de regresso a Lisboa. XI Depois de um incidente na Rua da Felicidade, em finais de Maio de 1922, entre um soldado do contingente moçambicano e uma cantadeira, a indignação popular dirigida por Wong desembocara no Largo do Chip Seng, com os soldados portugueses cercados. As espingardas Mauser acabaram por fazer o resto – dezenas de manifestantes foram mortos. O próprio Sun Yat-sen, que sempre recebera o apoio dos republicanos em Macau, e por isso tinha o coração dividido, esteve prestes a apoiar os revoltosos depois do massacre. Mas uma tentativa de assassínio na sua própria sede de Governo, fez com que, na fuga de Cantão, Macau surgisse como uma boa alternativa de refúgio. Poderia oferecer a paz que Macau necessitava. Negociações entre as autoridades portuguesas e os representantes de Sun tinham-se iniciado e fora mesmo oferecido ao fundador da República chinesa um empréstimo substancial para salvar as falidas finanças do Kuomitang. Alguém acabou por denunciar a tentativa de acordo em Hong Kong e isso foi o fim das ilusões. Mas as autoridades portuguesas tinham ganho tempo e a sublevação esmorecera. Wong ainda se movera na cidade flutuante de juncos do Porto Interior e no Bazar, mas, perdida a aposta, regressara a Cantão. Palha interrompeu as recordações de Amoroso. – Por essa altura, tomou conta do seu novo posto, não foi tenente? – Mais ou menos. O chefe da polícia secreta foi demitido por ser, no mínimo, conivente com as acções da senhora Wong. Mas eu não sou o novo chefe da polícia secreta. – Eu sei. Mas é a sua sombra. Só responde perante o Governador e o chefe militar de Macau, não é verdade? Amoroso não disse nada. Olhou para a ampulheta de Palha. A areia fina continuava a cair. – E a senhora Wong, sabem dela? – Sun Yat-sen retomou o controle de Cantão. Ela está em fuga. Não deve ter muito futuro. Em 1923, Macau recuperara a normalidade. É certo que as tríades dominavam, como sempre, os negócios subterrâneos. Na cidade flutuante do Porto Interior ninguém conseguia impôr a lei. Os piratas cirandavam, à vontade, nas águas circundantes. Mas o jogo estava a regressar às regras não escritas e observadas por todos. Para sobreviver era preciso não ouvir, não ver e, sobretudo, não actuar. Havia uma aparência de sossego como há mais de um ano não existia. XII Palha acariciou os braços da firme cadeira de madeira, cerejeira segundo parecia, como se ela fizesse parte dele. – Sabe de onde veio esta cadeira, tenente? – Não imagino. – Pertenceu a um director da VOC, a companhia das Índias holandesa e, depois, a um director da East India Company. Tem cerca de 150 anos. Sempre foi muito cuidada. Não é só confortável. É um símbolo de poder. Esta madeira influencia-nos na forma como exercemos as nossas acções. Temos de saber como nos sentamos nela, precem dizer-me os seus antigos proprietários. E eu esforço-me para merecer essa confiança. O seu olhar era malicioso. Continuou: – Temos um novo governador, o doutor Rodrigo Rodrigues. Ele vai precisar de homens que o ajudem a compreender o mundo em que vivemos. Homens como ele precisam de outros como o tenente. Para os protegerem do mundo. Acha que essa é a sua missão, tenente? Palha parou um pouco. Virou a ampulheta, mostrando que tinha tempo. Continuou a falar: – Eu acredito nesta cidade. E se há alguém capaz de a tornar melhor é você. Disse-me uma vez que a força de um homem vê-se no momento em que ele se confronta consigo próprio. Em que ouve vozes na sua cabeça, argumentando que está certo, porque alguém está errado. Saber a diferença, nesse momento, é o que faz um oficial. O que faz um homem. Sinto que sabe fazer essa escolha. A certa, é claro. Olhou fixamente para o tenente. Este sabia o que Palha estava a querer dizer. Mais do que aconselhar o novo governador, queria que o convencesse das ideias do comerciante para o território. – Eu sei que será o homem certo para essa missão. Como foi capaz de fazer tudo para proteger a sua amiga Ding Ling durante os tumultos do ano passado. O seu olhar era amistoso, mas as palavras soavam como lâminas. E o tenente sentiu um arrepio na espinha. Porque sabia o que queria que ele recordasse. Palha chantageava-o com um fantasma que nunca iria repousar ou dormir. Uma ferida que nunca poderia cicatrizar. XIII 4. O silêncio convida-nos a reflectir. Nesses raros momentos escutam-se coisas que normalmente não se costuma ouvir. Os suspiros do vento, o chilrear dos pássaros, as batidas do coração. Sente-se a aproximação silenciosa dos gatos. “Tigre sentado, dragão escondido”, dizia-se na China. Eles, sem se moverem, passam despercebidos. Uma sábia lição de vida, pensou Ding Ling. O calor de início de tarde ajudava-a a apreciar essa ausência de ruído. Estava quase inerte, sentada na varanda do primeiro andar do “Noite Tranquila”. Bebia em pequenos goles um chá morno e usava um leque para criar uma pequena brisa. Por baixo, na rua, alguns corpos arrastavam-se silenciosamente, mais por necessidade do que por vontade. Quase sem dar por isso recordou Cantão e uma das vezes que fora à ópera, com o seu pai. Tinham ido ver “Dai Loi Hwa” (“ A Filha do Imperador”), a história de uma jovem princesa, Changping, que é forçada a esconder-se num mosteiro para não ser presa pelo exército dos inimigos da sua família. Mas é traída por todos e não pode confiar em ninguém, até que encontra um homem leal e bravo, Zhou, a quem fora prometida em casamento. A tragédia está-lhes destinada. Cercados pelo poder que os oprime, na noite do seu casamento, ela vai provar o seu amor por ele. Juntos tomam veneno, e morrem, no jardim do palácio onde se conheceram. Nunca esquecera aquela história. Como se ela fosse um fantasma que pesasse sobre toda a sua vida. Talvez fosse. Mas o seu destino era concluir uma missão. Só não sabia se terminaria em tragédia. Antes da hora de almoço, estivera numa pequena casa, na Travessa dos Santos, onde uma facção do Bando Verde tinha a sua discreta sede macaense. Lá estavam Wang Du, Wu Fei e Yao Wong. E, claro, Li Bei. O assunto era sensível e deveria permanecer secreto até à acção. O Kuomitang de Sun Yat-sen, confrontado com uma permanente guerra na China, estava numa difícil situação financeira e Ding Ling poderia ajudar a resolver parte do problema. Um dos seus agentes, funcionário do Banco Nacional Ultramarino, soubera que um importante valor em ouro e em moeda estrangeira de vários homens de negócios seria remetido, em breve, de Macau para a sede do Hong Kong and Shanghai Banking Corporation. XIV Iria num vapor, guardado por homens armados. Mas isso era algo que não era um problema impossível de tornear. As águas do delta do Rio das Pérolas e do Mar da China estavam repletas de juncos de piratas, ao serviço de todos os interesses. Não seria difícil a Wang Du, que tinha estreitos contactos com muitos deles, conseguir um grupo suficientemente forte para assaltar o barco que transportaria os valores. Restava saber quando e onde. O seu agente no BNU descobriria o segredo. Os pensamentos de Ding Ling foram cortados pela voz de Li Bei: – Desculpa interromper-te, irmã. Está lá fora um estrangeiro que diz querer falar contigo. – Quem é? – Diz chamar-se Maximilian Wolf e traz uma proposta que quer discutir contigo. Ding Ling não estava com disposição para conversas que necessitavam de excessiva concentração. E estava farta de homens com propostas de negócios. Mas acabou por dizer: – Diz para esperar por mim no escritório. Li Bei retirou-se e, depois, Ding Ling caminhou até lá. Quando entrou deparou com um homem alto e loiro, de olhos azuis, que estava de pé com as mãos colocadas atrás das costas. Vestia um fato de linho azul e, assim que a viu, retirou o chapéu que usava. A voz era áspera, talvez fruto de anos de consumo excessivo de álcool de pouca qualidade. – Menina Ding Ling, presumo… – É verdade. E o senhor é Maximiliam Wolf…? – Max, se desejar. Um humilde homem de negócios alemão sediado em Hong Kong e de visita a Macau. Ding Ling sentou-se atrás de uma pequena secretária e fez sinal ao alemão para se sentar à sua frente. Ele assim fez. A voz da chinesa tinha um tom desconfiado: – Diz que tem uma proposta para me fazer. Muitos o fazem, senhor Wolf. Que negócios tem, então, para me propôr? Tenho fornecedores dos melhores produtos que posso colocar à venda. Que posso não ter? Max fez um sorriso malicioso. Cruzou as pernas, para ficar mais confortável. – Não se importa que eu fume, menina Ding? – Esteja à vontade. Ele assim fez. Colocou um cigarros entre os lábios gretados e acendeu-o. Depois de apreciar o fumo a entrar nos pulmões, e de o expelir, disse: – Eu não lhe venho vender produtos. Ou melhor, venho ajudá-la. Se o desejar, claro. XV Ding Ling semicerrou os olhos. Questionou-o: – Ajudar-me? Eu não preciso de ajuda. Tenho vários negócios estáveis e rentáveis. – Menina Ding, eu sei que é inteligente. Que prevê o futuro, antes de muitos outros. Admiro-a. Mas talvez não saiba o que se move para lá do horizonte e que poderá cair como uma bomba em Macau. – Que facto é esse, senhor Wolf? – Max, pode começar a chamar-me Max. Como sabe, há quem diga que a realidade deste local frágil é mais interessante do que o mito que se criou à sua volta. A cidade do pecado, dizem, sequiosos de um prazer imaginado servido por mulheres que ora são sereias, ora deusas. Enquanto jogam a vida e a riqueza que pilharam algures. Eu sei que os homens desta terra são duros. Não temem navios de piratas, nem os das potências coloniais. Não têm medo de armas. Não têm medo de espadas e punhais. Será que não há nada de que possam ter medo? A voz de Max Wolf era pausada e agradável. Mas os seus olhos eram frios como punhais. Há muito que Ding Ling não sentia um arrepio na espinha como naquele momento. Ele continuou: – Sabe, menina Ding, dentro de poucas semanas será anunciada a venda de Macau à Alemanha. Ela estremeceu. – Como sabe isso? – Tenho as minhas fontes. Muito credíveis. Porque eu represento alguns interesses alemães nesta parte do mundo. Não do Governo alemão. Mas de empresas alemãs, que estão desejosas de avançar para aqui, a seguir a esse anúncio. Como imagina, os que defendem a presença portuguesa, ou os que têm ligações a eles, passarão a ter mais problemas para lucrarem com os seus negócios. Nova administração, interesses diferentes, se me é permitido dizer. – E isso, o que tem a ver comigo? Wolf bateu com as pontas dos dedos no tampo da mesa. Ding Ling não gostou do ruído. – Tudo, é claro. Sei que é uma voz escutada em Macau. Tem amigos, bons, junto das comunidades chinesa e portuguesa. Amigos e clientes. Pode aliciá-los para que a presença alemã aqui não seja recebida com desconfiança ou, mesmo, com resistência. É certo que os militares alemães não são como os portugueses. Não são fracos e têm mais meios, em termos de armas e navios de guerra. Será muito mais difícil para quem quiser resistir às novas autoridades. XVI Antes que Ding Ling pudesse responder, Wolf continuou: – Assim, menina Ding, se se aliar a mim, tem tudo a ganhar. Se se opôr, terá tudo a perder. Os seus amigos portugueses não terão nenhum poder. Fugirão, que nem ratos, como se costuma dizer, à primeira oportunidade. Para Goa. Para Lisboa. Para qualquer lugar. Os portugueses são filhos do mar. Ding Ling pestajenou, nervosamente: – Percebo o seu ponto de vista, embora não o partihe completamente. Mas, já agora, diga-me: e, se decidir ajudá-lo, que ganho efectivamente? – Ganhará dinheiro e reputação. Posso resolver-lhe um problema que sei que a absorve. Precisa de dinheiro para financiar as actividades do Kuomitang. Eu posso ajudá-la nisso. Tenho acesso a fundos suficientes para que fique muito bem cotada junto de Sun Yat-sen. Com quem, diga-se, também queremos ter boas relações. Dinheiro não é uma questão para nós. – Nós, quem? – Para mim e para as pessoas que represento. Há muito que Max acabara de fumar o seu cigarro. Acendeu outro. – Não a quero apressar muito, menina Ding. Mas não tenho muito tempo. Preciso de resultados, de forma breve. Ou seja, necessito de uma resposta sua dentro de dois, três dias. Que lhe parece? – Tenho de reflectir. – Sim, eu sei como são os chineses. Jogam com o tempo. O problema é que, nós, os ocidentais, estamos sempre a olhar para o relógio. Espero pois uma resposta rápida. E, sendo assim, não a ocupo mais nem lhe tiro tempo para a sua profunda reflexão. Que sei que será a mais sensata. Max fez um sorriso sarcástico. Levantou-se e colocou o chapéu na cabeça. O brilho dos seus olhos era mortal. Fez uma ligeira vénia e saíu. Pouco depois, ainda Ding Ling estava de olhos fechados, a tentar pôr ordem nos seus pensamentos, Li Bei entrou. – Diz, querida irmã. – O alemão já saíu. Mas, recordei-me, já cá tinha estado. Ding Ling franziu os olhos. – Quando? – Na noite em que o senhor Silva foi morto. Estiveram a conversar os dois, com ar pouco amigável, antes do senhor Silva ter ido ter comigo. Este estava muito nervoso. Fumou mais ópio do que o habitual. XVII 5. Da magnífica varanda do hotel Boa Vista, o tenente Félix Amoroso observava a Baía da Praia Grande, onde alguns juncos indolentes navegavam ao sabor das suaves ondas e do vento. Estava encostado a um dos pilares, imerso na vista, a fumar. Ali criava-se a errada sensação que o tempo não tinha fim. Mas, como aprendera com os chineses, o ciclo da vida era como a das estações. Não era um caminho contínuo rumo a um futuro que queríamos descobrir e, se possível, conquistar. Ouviu um ruído e isso fez com que caminhasse até encontrar um homem sentado num cadeirão a ler um jornal. Era o novo Governador de Macau, Rodrigo José Rodrigues. Aproximou-se dele e saudou-o: – Boa tarde, senhor Governador. Não o tinha visto. Este sorriu, salientando mais a sua face esguia. Tinha o cabelo e o bigode negros e usava uns óculos redondos onde se refugiavam uns olhos inquietos. – Sente-se aqui, ao meu lado, tenente Amoroso. Estava a ler o “Diário de Notícias”, que aqui chega com largo atraso. Mas é uma boa forma de saber algumas coisas que vão acontecendo em Lisboa. E o tenente, não me diga que veio ver a sessão de poesia organizada pela minha mulher? Eu já lá estive, mas agora é a parte mais social, que dispenso. – Sei que a senhora Rita Margarida Rodrigues é uma distinta poetisa. – Há quem o afirme. Eu não serei o melhor juiz em causa própria. Mas, sinceramente, também penso o mesmo. Falava pausadamente, como se meditasse cada palavra. Às vezes levava a mão aos óculos num gesto mecânico ou nervoso. – Que bela vista, não é verdade, tenente Amoroso? – É verdade, senhor governador. Presumo que daqui tem uma outra visão de Macau. Talvez um pouco diferente da que tem desde o Palácio de Santa Sancha. Rodrigo Rodrigues fez um esgar: – Do lugar do poder tem-se sempre um olhar diferente sobre o mundo. E que nem sempre é real. Perde-se, muitas vezes, o contacto com a poeira. É por isso que quem quer dirigir bem, tem de se rodear de pessoas competentes. E atentas. Eu dependo de homens como você. Agarrou num copo de vinho branco que estava na mesa e levou-o à boca. Bebeu um pouco, antes de continuar: – Desde que aqui estou já percebi que Macau vive longe de Lisboa. O relógio aqui marca horas diferentes das de Portugal. E lá decide-se sem se conhecer o que se faz aqui. XVIII Amoroso fungou. Aproveitou para para confrontar Rodrigo Rodrigues com as notícias que começavam a circular: – Diz-se, senhor governador, que há quem em Lisboa defenda a venda de Macau. Para evitar despesas e chatices. – Fala-se agora disso aqui? Essa é uma história muito antiga. Já vem do tempo da monarquia. O Oliveira Martins falou disso. O Eça de Queiroz também. Mas agora parece que ganhou nova alma para nos atormentar os dias e as noites em Macau. Pelo que li aqui no “Diário de Notícias” foi tema de um debate muito aceso entre um deputado, o senhor Jaime Leote do Rego e o ministro das Colónias, o senhor Domingos Leite Pereira. Tudo por causa de um artigo que saiu num jornal americano, que dizia que o Governo português estava em negociações com a Alemanha para a venda deste território. O Governo português desmentiu. Sabe o que disse o ministro? Está aqui! Notava-se alguma irritação na sua voz. Agarrou no jornal e leu uma frase que sublinhara a tinta azul: – Diz o ministro: “Portugal não está em condições de alienar seja o que for do seu património. Não o quer fazer e, nem o fará nunca, pois que não está em circunstâncias de alienar seja o que for dos seus territórios”. Se o ministro o diz, deve ser verdade. – Pode não ser, senhor Governador. Disseram-me que há alemães que já estão a operar em Macau como se o negócio estivesse feito. – Penso que não esteja. Mas, nunca se sabe. Portugal tem os cofres com aranhas e certificados de dívidas bolorentos lá dentro. E sabe como é: quem controla a dívida de um país, define as suas decisões. A nossa dívida não tem fim. Já nem se sabe quando começou. E o que resta para vender? As colónias… Amoroso observou: – Mas não há fumo sem fogo, não é verdade senhor Governador? A menos que saiba algo que não queira, ou não possa dizer, esse é um assunto que interessa a quem vive aqui. Seria muito diferente ter um governo alemão ou continuar com um português em Macau. XIX – Também penso assim, tenente. O que acha do assunto? – Os alemães têm interesses coloniais. E os ingleses não têm já interesse nisto. Dominam Hong Kong e parte de Xangai. Têm a Índia. Os alemães sim, cobiçam um império. Conhece a cerveja Tsingtao, senhor Governador? Está à venda em Macau e a história começa aí. No final do século XIX as forças navais alemãs tomaram conta da Baía de Jiaozhou, de um porto que conhecemos como Tsingtao, como concessão colonial. Os alemães estabeleceram-se lá e construíram a sua pequena Baviera. E criaram mesmo essa cerveja, que lhes lembrava as suas raízes. Mas, no início da Primeira Guerra Mundial, os alemães foram afastados dali pelo Exército Imperial Japonês, aliado dos europeus e americanos na Ásia. Não surpreendeu que a cervejaria alemã passasse a ser japonesa. No ano passado foi acordado que o porto voltasse à posse da China, mas a situação ainda é confusa. Desde que perderam a concessão Berlim quer ter um entreposto comercial nesta zona. Macau era um pitéu para eles degustarem com salsichas. O Governador deu uma risada e voltou a agarrar no jornal. – Pelos vistos este foi um debate interessante, à nossa maneira, é claro. Veja o que o deputado Leote do Rego, verdadeiro herói republicano que muito prezo, disse sobre a notícia: “Esse jornal pode ser lido por 60 milhões. Tem 22 edições por dia. É um jornal importante, não há dúvida visto que os jornais se fizeram eco dele. Eu entendi que devia chamar a atenção de S. Excelência para o jornal, não para provocar um desmentido, porque não era preciso que das cadeiras do Poder se viesse dizer que o Governo não pensava em alienar qualquer porção do território português, mas se poder afirmar aqui que o coração português se tinha amargurado, como de facto se amargurou, com a notícia que veio nesse jornal. Essa afirmativa já foi feita por um estadista espanhol por outra forma. Que Portugal é igual à colónia inglesa de maior importância. E até já se foi mais longe, dizendo-se que uma grande nação tinha aqui encravada uma feitoria britânica”. XX Fez uma pausa, antes de continuar: – E o deputado Agatão Lança aproveitou para trucidar a política externa portuguesa. Veja o que ele disse, sobre a nossa delegação em Washington: “O consulado é um quarto de hotel, onde habita o nosso representante e diz que Portugal é tão pequeno que cabe no seu bolso do colete”. E mais: “Os nossos interesses na América do Norte estão exactamente melhor defendidos na época do Verão, isto é, quando o nosso Ministro em Washington vai gozar as delícias do clima em outra terra, ficando a legação entregue ao nosso ministro do Brasil”. O futuro de Macau parece bem entregue, não? – Que lhe posso dizer, senhor Governador, que já não saiba? – Foi por isso que fugiu de Lisboa e se refugiou aqui, tenente? – Foi um conjunto de razões. O aroma pouco agradável do panelão onde se misturam interesses pessoais e negócios foi outro. – Compreendo. E os chineses, o que acharão? – Para já estão em lutas internas. Como se provou até há pouos meses aqui. Mas não deverão achar piada a uma eventual venda. Ou correm connosco daqui, ou negococeiam com quem já estão habituados a viver. – Isso não é apenas uma mentira que contamos a nós próprios? – Os chineses e os portugueses criaram um clima de entendimento quase perfeito aqui. Excepto os mais radicais ou nacionalistas, há um equilibrio estável. Nem nós os incomodamos nos seus negócios. Nem eles nos chateiam. – Já agora, aproveito para lhe colocar outra questão, tenente. Acha que a morte do senhor secretário João Carlos da Silva pode estar ligada a todas estas movimentações? – Pode estar. Afinal, muitos podem estar interessados no que se decide em Lisboa ou Santa Sancha. Ter lá um ouvido atento dá jeito. Para já coloquei os meus melhores informadores em campo. Rodrigo Rodrigues dobrou o jornal e fitou Amoroso: – Parece-me bem. Convém estarmos atentos. Já agora, se não se importa, tenente, gostava de saber a sua opinião sobre um assunto. XXI O Governador prosseguiu: – Estou a pensar em reforçar o sentimento nacional em Macau. Foram os republicanos que recuperaram o nosso maior poeta, Luís de Camões. Passaríamos a fazer, no dia de Portugal, uma romagem à gruta de Camões. Acho que isso é importante. Vivemos tempos de decadência. Como aqueles que Antero de Quental ou Guerra Junqueiro transportaram para linhas escritas em “Casas da decadência…” ou na “Pátria”. Ou que Viana da Mota sintetizou na sinfonia “A Pátria”. Como dizia Teixeira de Pascoaes: “neste momento Portugal é um mistério, é impossível a gente calcular o que virá a ser dele”. Honrar Camões é um sentimento de revolta republicana. Sabe, em 1880, por ocasião das comemorações em louvor de Camões, o “Diário de Notícias” distribuiu gratuitamente 30 mil exemplares de “Os Lusíadas”. Era a crise que fazia com que se procurassem respostas no passado. Esta crise pode fazer com que voltemos a acreditar no futuro de Portugal. Amoroso respondeu apenas: – Parece-me uma excelente ideia, senhor Governador. Foram interrompidos pela chegada de duas mulheres. Rodrigo Rodrigues levantou-se e Amoroso fez o mesmo. – Querida, já acabou? Ela sorriu: – Já sim, foi excelente. – Quero apresentar-vos o tenente Félix Amoroso. Faz parte do departamento de informações de Macau. E esta é a minha mulher, dona Rita Magarida Rodrigues, e esta uma amiga que já aqui fez, a dona Sofia Ramos Palha, esposa do senhor Palha. Amoroso olhou para esta, que, em contrapartida, não afastou seu o olhar, percorrendo o corpo do tenente. Não teria mais de 30 anos. Menos cerca de 20 do que o seu marido. Tinha a pele clara e o cabelo e olhos castanhos. O nariz arrebitado e os ohos pequenos denotavam alguém com uma curioidade latente. O Governador disse: – Temos de ir, não é verdade, querida? Ela fez um gesto com a cabeça, em sinal de concordância. Sofia Palha seguiu com eles. Mas não se coibiu de olhar para trás e voltar a mirar o tenente Amoroso. XXII Macau engana-nos, dizia Benedito Augusto com voz matreira. Parece que o sexo está sempre visível. Mas isso não é verdade. Nem sempre o vemos. Sabemos que ele está por ali, em todo o lado, sempre à espreita. Olhou para o tenente Félix Amoroso, tentando avaliar a sua reacção. Este parecia não notar que uma vaga parte destas afirmações também estavam dirigidas a ele. Benedito sussurrou: – Há algo maligno nestas ruas. Uma coisa estranha, uma escuridão onde se movem sombras. Almas perdidas que não se querem salvar. Ele falava do sexo. Insinuava também que João Carlos da Silva morrera por causa dele. Por excesso. Enquanto muitos outros continuavam a viver por causa dele. O tenente contornou o copo de cerveja com os dedos, antes de dizer: – Nunca sentes desejo, Benedito? – Sou mais forte do que ele. – Mas o sexo tenta-te… – A vida é um conjunto infinito de tentações. Saber escolher as que fazemos é a forma de concretizarmos a nossa vitória sobre elas. Falando assim Benedito escondia o passado e, depois, esclarecia o presente: – Sim, acho que o senhor Silva foi morto por causa do sexo. Não tem a ver com qualquer conspiração política que se desenvolve nas sombras desta cidade. – Há uma conspiração? – Que acha, tenente? É ingénuo? Sente-se no ar, entre os fortes aromas das comidas orientais e a conservadora cozinha portuguesa. A conspiração transpira, como os picantes mais fortes. Veremos o que acontece, mas alguém está à espera de ganhar, e muito, com o que se pode vir a passar. Benedito Augusto e Félix Amoroso bebiam cerveja e comiam arroz com galinha numa taverna chinesa na Rua da Felicidade. Antes, o tenente tinha estado a jogar fan-tan com marinheiros chineses, até que o padre chegou e o afastou do vício. Dissera-lhe: – O vício causa-nos alucinações e, depois, conduz-nos ao abismo. – Tenho outros vícios piores, Benedito. – Eu sei. Conheço-os. – Mais do que eu desejaria. – Sabe, tenente, não é por mal. Faz parte de mim e do que faço. Saber é poder. Mas diga-me, jogar não lhe faz desenvolver um sentimento de culpa? XXIII – Sentir-me-ia culpado se não jogasse. Meu caro Benedito, a vida é um jogo, todos o dizem. Um jogo viciado, com cartas marcadas, porque sabemos como acaba. Estes, pelo menos, são mais indecifráveis. Nunca sabemos se ganhamos ou perdemos. Mas sonhamos que é possível vencer. E só isso que importa. Amoroso sorriu ao dizer estas palavras. – Elucide-me, Benedito. Porque diz que João Carlos da Silva morreu por causa do amor, ou do sexo? – Há algo que me intriga. Sabe, o alemão, que se chama Maximilian Wolf, esteve ontem à noite com Ding Ling. – Esteve? Não sabia. – Imagino que não. A sua querida amiga não lhe disse nada. Mas sabe como é. As mulheres têm sempre segredos. Não sei do que falaram, mas o que sei é que o senhor Silva e o alemão estiveram lá na noite em que ele foi assassinado. Discutiram. Um pirata que conheço viu-os. Não percebeu o que diziam. O alemão saíu e não voltou. E o Silva foi ter com Bei Li, a amiga de Ding Ling. – Como sabes? – Uma das raparigas de Ding Ling, Xiao Yi, contou isso ao pirata que me confidenciou isso. Ele oferece-lhe muitas prendas, depois de cada assalto. Diz que, um dia, a levará dali para casarem. Ela acredita e vai-lhe contando coisas que acontecem ali. É uma fonte que não se esgota. Tudo se sabe nas noites de sexo, álcool e ópio em Macau. – Só que tudo aponta para que o alemão possa ter assassinado o Silva. Talvez este estivesse a espiar o Governo, para saber mais coisas sobre o que pensam os portugueses ou o que sabem sobre essa ideia de Macau poder ser vendida aos alemães. – E o alemão voltava dois dias depois à cena do crime? – Sim. Para vir ter com Ding Ling é porque há uma conexão. Mas, é sempre arriscado, regressar ao local de um crime. – Tenente, vá por mim. Silva tinha fome de sexo. Desde que a mulher o deixou, vivia sozinho. Ia ali, à casa dos prazeres da menina Ding. Mas seria só isso? O tenente acariciou o queixo. Nada era claro. Mas agora precisava de saber mais. Junto de Ding Ling. E encontrar o alemão. XXIV – A dúvida é a nossa vida, tenente. Nem sempre é fácil distinguir os verdadeiros sentimentos dos falsos. Porque tudo se compra e se vende. Num mundo em desordem moral todos estão dispostos a vender-se. Talvez até a sua amiga. – Nem todos, padre. – Acredita mesmo nisso, tenente? Pense em si. Amoroso sentiu as palavras como um murro no estômago. Bebeu mais um gole de cerveja. Sentiu vontade de sair dali e entrar na “Noite Tranquila” para falar com Ding Ling. Confrontá-la com o que Benedito lhe dissera. Por momentos sentiu-se atraiçoado pela mulher que fnalmente conseguira acalmar os seus ânimos. Com sexo e ópio, Ding Ling domara a sua fúria. Sentira-se amado. Agora parecia outra vez um náufrago. Benedito abanou a cabeça: – Não é caso para tanto, meu caro tenente. Não é preciso manter uma relação conflituosa com a realidade. Sabe que quanto maiores são as nossas debilidades, mais vastos costumam ser os nossos planos. A menina Ding sabe os seus pontos fracos. Como é que se diz? O seu calcanhar de Aquiles. E você sabe que ela sabe isso. Por isso aumenta as expectativas. Não o faça. Amoroso não respondeu. Os seus olhos concentravam toda a sua fúria, mas o corpo ia deixando de estar tenso. Estava a acalmar-se, o que era a melhor solução. Falaria com Sing Ling depois, quando a tempestade se concentrasse toda dentro de uma garrafa. E a pudesse atirar para o mar, para que fosse apenas aberta noutras latitudes. Foi buscar mais duas cervejas. – Tsingtao, meu caro Benedito. Para não nos esquecermos do que é importante. Continuo a achar que esse alemão nos levará até ao assassino do secretário Silva. – Pode ser que tenha razão, tenente. É uma questão de paciência. Amoroso olhou para Benedito Augusto. Sentiu-se desconfortável. O padre leu-lhe o pensamento. Sabia que quanto mais um homem te conta, mais perigoso te tornas para ele. E quanto mais perigoso és menos opções tens no futuro. Tinha que evitar que Amoroso pensasse que ele poderia ser seu inimigo. XXV Ding Ling aproximou-se de Félix Amoroso e beijou-o ao de leve. Os olhos de ambos cruzaram-se como se estivessem a preparar-se para um duelo. Estudavam-se, como numa dança de morte. A luz estava demasiado fraca para poderem escolher claramente qual o caminho a seguir. O ruído que se ouvia era de feridas que se tinham aberto e gritavam pela cicatrização. Mas, tal como depois da chuva que cai, leve mas interminável, era preciso que o sol secasse os mal entendidos. Ambos sabiam isso. Ding Ling sentou-se de pernas cruzadas numa cadeira de bambu, como sempre fazia antes de partir para a batalha. Disse: – A cidade flutuante é a alma de Macau. Os portugueses, outrora senhores do mar, preferem hoje o chão sólido da terra, os portos aos barcos. Talvez por isso tivessem deixado de ser aventureiros. Ding Ling fez um sorriso enigmático, depois de dizer tudo isto. Continuou: – Tu ainda não sabes se preferes uma coisa ou a outra, querido tenente. Os olhos negros da chinesa eram impenetráveis. Mas, por fim, os seus lábios abriram-se um pouco e isso fez com que a sua face se tornasse mais amigável e atraente. Ela, sedutora, ergueu-se da cadeira e olhou para os seus anéis antes de dizer: – Há homens que preferem não saber a verdade. – Eu não sou como esses homens que conheceste. Ou que conheces. O tenente Félix Amoroso soava ríspido, mas era como um cubo de gelo prestes a derreter-se perante o primeiro sorriso da chinesa. – Eu necessito de saber a verdade. Que acordo fizeste com Max Wolf? O fumo que vinha do andar inferior do “Noite Tranquila” cruzou, por escassos momentos, o espaço entre ambos. Foi o suficiente para que Ding Ling ganhasse um pouco de tempo. Serenamente, respondeu: – Prefiro ser jade, ainda que despedaçada, do que um tijolo, ainda que intacto. A minha integridade é espiritual. Sou leal a quem tenho de o ser. Não troco isso por interesses materiais, querido tenente. O fumo ficou mais espesso. E ameaçou tornar-se sufocante. Amoroso inspirou fundo. Sentiu raiva contra si próprio e tentou recuperar o sangue frio: – Que te propôs ele? XXVI Os olhos dela fecharam-se devido ao fumo. Pegou num leque que estava em cima da mesa e abanou-o. O fumo dispersou-se e Ding Ling agarrou numa garrafa de vodka russo e virou-se para Amoroso: – Queres? Face ao silêncio dele, ela encheu dois copos e, depois de lhe entregar um, levou o seu aos lábios e disse, sarcasticamente: – Sem vodka, a que é que se resume a conversa entre as pessoas? Riu-se e bebeu mais um gole. Nunca parecia ficar embriagada. Mantinha sempre a serenidade. Era a protagonista da paz onde não havia lugar para ela. Disse: – Há gente sem alma e sem espírito. Tudo muda mas, na verdade, nada muda no mundo. Ele propôs-me uma coisa simples: aliciar gente importante para a sua causa em troca de vantagens materiais para mim e para o Kuomitang. – E tu, que respondeste? – Disse que ia pensar. – E já o fizeste? – Já o tinha feito antes da proposta. Não lhe respondi. Nem lhe responderei. Tudo nos separa. Não pode haver falsas tréguas entre nós. E os portugueses não são para aqui chamados, como sabes. Só me interessa o futuro da China. O respeito de Ding Ling estava reservado para os raros homens e mulheres que se poderiam cruzar com ela na sua luta e que a poderiam derrotar. Nunca pediria tréguas, nem através do sexo. Amoroso sabia, por experiência própria, isso. As paixões dos homens sempre tinham sido armas forjadas em louvor das suas necessidades. Os dela não eram assim. Quanto a paixões reais talvez tivesse tido uma, ou dias. Talvez tivesse por Li Bei. Talvez tivesse por ele. O seu amor era outro. Se o Governo soubesse o que verdadeiramente a movia, que era incendiar o mundo, já a teriam silenciado. Mas ela era a senhora que oferecia o prazer a quem o desejava. Poucos poderiam desconfiar que ela não era água. Era fogo. Ali, numa atmosfera de aromas chineses e de fumo de cigarros e de ópio, ela observava e tomava notas mentais sobre o que via. Para futuro uso. Às vezes parecia meditativa e deixava-se manietar por uma quase melancolia. Aí recorria ao corpo de Li Bei para pacificar a sua alma. Mas se Amoroso aparecesse numa dessas noites, ele seria a paz num conflito sem tréguas entre dois corpos. Talvez houvesse outro mistério qualquer por detrás dos seus olhos guerreiros. XXVII Qual era o seu passado? Desde a sua infância, Ding Ling tinha um estranho talento para o silêncio. Mesmo quando ria. – Qual é o teu plano, doce Ling? – A verdadeira informação tem um preço, querido tenente. Mostra-me, primeiro, qual é o teu verdadeiro objectivo. – Isso também tem um preço. – Não é difícil saber, querido tenente. Uma mulher consegue guardar silêncio. Os homens falam como tolos na primeira taverna que encontram. Os olhos dela brilharam intensamente, antes dele dizer: – O que é que tenho de te dar pelo teu silêncio, se te contar os meus segredos? – Eu não digo nada. – Eu também não direi o que seja sobre os teus. – Enquanto me amares guardarás os meus segredos, eu sei. E eu sei que me amas por causa dos meus segredos. Disse tudo isso numa voz doce, como se estivesse a contar uma história idílica muito antiga. E com um sorriso que faria com que alguém, menos apaixonado, perdesse o controle. Amoroso cortou o silêncio: – Só preciso de paz. – Não há paz onde há quem mande e quem obedeça. Onde não há liberdade e há necessidade de a obter. Estou comprometida numa guerra. – Então eu confiarei em ti e nós sempre nos compreenderemos. Mas porque não continuas a dizer mentiras, se não há Inferno para ti, doce Ling? – As mentiras são necessárias, porque as pessoas são tolas. Insensatas. Tu foste soldado. Agora és espião. Que vieste fazer para Macau? Contar baixas, remendar botas, escrever cartas de amor? É isso que os soldados fazem no meio de uma trégua. Em Macau sonhavas encontrar essa paz, essa pausa na tua vida entre o inocente e ingénuo que foste antes da guerra e o que és agora. Sobreviveste e começaste a pensar no que era importante para ti. Precisavas de paz. Cansaste-te. Vieste para Macau ser fiel a ti mesmo, mas ainda não deixaste de estar cansado. – Por amor fazem-se coisas terriveis. Sabes algo sobre isso? Os olhos dela tentaram esconder o que lhe ia na alma. Mas isso era impossível. Depois Ding Ling disse: – Falas como alguém que viveu tudo e não tem medo de nada. – Sobrevivi a uma guerra. – Eu também. E estou no meio de outra. XXVIII – Responde-me, doce Ling: quem poderá escutar os cantos da sereia do alemão? Tu? – Duvidas de mim? Ding Ling respondia como se a ferida tivesse voltado a abrir-se. E a desconfiança tivesse regressado. A voz de Amoroso soou doce: – Não, nunca o faria. Mas preciso de saber quem ele poderá aliciar. – Eu também quero saber isso. Mas para isso é preciso começar por perceber o pensamento dos homens que aqui em Macau já se juntaram a ele. Poderá ser por medo do poder que diz ter. Ou medo dos canhões alemães. Mas pode não ter nada a ver com isso. E ser algo que desconhecemos. – Ele move-se numa direcção que promete caos sem fim. Macau sempre foi um porto seguro para Sun Yat-sen. Poderá continuar a sê-lo no futuro. Com os alemães, apesar das promessas, nunca saberão. Nunca terão a certeza. – Estás a defender Portugal e não os teus interesses. – Às vezes não há diferença. Gosto de ser fiel a mim próprio. – É isso que eu gosto em ti. Ding Ling saíu por momentos da pequena sala e chamou Wei Zi, uma jovem chinesa que Amoroso conhecia há algum tempo. Era uma das favoritas da senhora que mandava no “Noite Tranquila”. Era pequena, de olhos amendoados e sedutores. Falavam em cantonês e Amoroso só percebeu algumas partes da conversa. Ding Ling dizia-lhe que era necessário saber tudo o que sabia um chinês que sabiam trabalhar para Max Wolf. Wei Zi ia acenando com a cabeça e, depois, virando-se para Amoroso disse com voz sedosa, num português arrastado: – Ele vai contar-me tudo. Usarei todos os truques. Todos os prazeres que ele conhece. E os que desconhece. O seu olhar era de uma inocência completa, como se o que dizia fosse algo insignificante. Sexo por informação. Wei Zi fez uma vénia e saíu. Ding Ling disse então, virando-se para Amoroso: – Ela vai contar-lhe a história de como teve de se esconder do tio, quando era ainda muito nova. Uma história que nunca contou a ninguém. E, depois, quando acordarem de manhã, vai confessar-lhe que ele é único. Diferente de todos os homens com quem se deitou. Ele estará vulnerável. Sabes, querido tenente, todas as derrotas do corpo dos homens começam na horizontal. Amoroso sentiu uma vertigem. Muitas vezes queria ter uma visão impoluta da vida. Embora ele próprio não tivesse praticado sempre esse princípio. Bastava já ter frequentado muitas vezes a “Noite Tranquila” apenas pelo sexo. Mas custava-lhe usar certas tácticas. Doía. Olhou para Ding Ling. Esta fez um sorriso irónico e, depois, disse: – Meu querido tenente, julguei que já sabias isto há muito tempo. Já não há Bem nem Mal. XXIX 8. Antes da primeira explosão, o céu estava límpido. As estrelas pareciam imóveis. O tenente Amoroso sentia uma pequena brisa fresca nas faces enquanto caminhava junto ao Porto Interior. Mas depois, numa fracção de segundo, tudo mudou. As estrelas focaram invisíveis e o aroma a queimado foi-se intensificando. Primeiro foi só uma explosão. Depois, muitas. O céu encheu-e de cores e as luzes ardiam em todas as direcções. O fogo de artifício iluminou os céus de Macau, de uma forma cada vez mais desordenada. Não era tempo de festividades. O tenente olhou para a zona de onde partiam os foguetes. Viu um clarão de fogo rente às casas. Estava junto à taverna onde se costumava encontrar com Benedito Augusto. Ouviu gritos e viu pessoas a correr, vindas das casas. O ruído tornou-se ensurdecedor. O tenente ficou ali, durante longos minutos, imóvel, a olhar para a cor do céu, até que apenas se passou a ver um clarão muito claro ao longe. O fogo deixara de tentar atingir a casa dos deuses celestiais. Depois caminhou até à taverna. Sentou-se, pediu uma cerveja e esperou. Benedito, apressado, trouxe a notícia. A Fábrica de Panchões de Keng Cheng, que ficava no bairro de San Kiu, explodira. Apesar das tentativas para afastar estas fábricas das zonas residenciais, e de vários acidentes que tinham causado dezenas de mortes, só agora isso começava a ser feito, com a construção da primeira fábrica na ilha da Taipa. O fogo-de-artifício fazia parte da vida de Macau e dos chineses. E as fábricas de panchões tinham sempre trabalho. Eram fonte de riqueza. O fogo-de-artifício servira, desde tempos remotos, para afugentar inimigos na guerra ou para afastar a má sorte. XXX O vermelho e as faúlhas sempre foram bons presságios. E o fumo criava uma boa atmosfera, contava Benedito, que depois concluiu: – Neste caso não foi. A explosão trouxe a má sorte a Keng Cheng. E à sua amiga, Ding Ling. – O que é que têm eles a ver um com o outro? – Tudo, meu caro tenente. A menina Ding e o senhor Keng jogam as cartas do Kuomitang e, diz-se, do Bando Verde. A explosão pode ter sido um acidente. É comum. Mas, neste momento, também pode não ter sido, não lhe parece? Amoroso bebeu um gole da sua cerveja. Lembrou-se por momentos de um capitão, Álvaro Esteves, que conhecera na batalha de La Lys. Que ali morrera, como muitos outros. Era um homem que fora capaz de amar esse punhado de tempo a que chamamos vida. Cada dia, para ele, era uma forma de emoção, um tremor. Falavam, nas trincheiras, da nostalgia do campo, das dúvidas e do assombro que era a vida. “Sou um romântico”, dizia, com um esgar irónico. “Converto tudo em sentimentos”, concluia, enquanto cortava um pouco de chouriço para colocar no pão. Esperavam uma barragem de artilharia alemã. “Não sei como posso fazer uma descrição do que vi no mundo e do que o mundo fez comigo. A nossa vida está feita de muito pouco. Amar, gozar, sentir e celebrar os instantes, olhar várias vezes as paisagens e os pássaros para não esquecermos, e declinar até à velhice”, dizia, com a sensação que não chegaria a velho. Não chegou. O fogo-de-artifício assustara Amoroso. Lembrara-lhe esse amanhecer, quando o fogo de armas fora tão intenso que nada poderia sobreviver. Benedito Augusto olhou para ele e sentiu-o errático e triste. Disse: – Quando temos dúvidas, a verdade é um bom início de conversa. – O que seria das sociedades sem o uso da mentira? – É verdade, o que seria de nós se não jogássemos com a mentira? Só isso nos permite evitar a derrota. Mas aqui só os fracassados irão ver os deuses. É por isso que gosto desta parte do mundo. Os anjos foram seduzidos pelo Diabo e caíram na terra. Ficaram aqui, corpos de carne e osso. – Gosto de o ouvir padre. Tem a educação que eu nunca tive. – E o tenente a vida que eu sempre desejei.
TNR | TUI rejeita recurso mas critica actuação do CPSP sobre manifestações Andreia Sofia Silva - 17 Mai 2021 A União Progressista dos Trabalhadores Domésticos de Macau queria celebrar o Dia do Trabalhador, mas o Corpo de Polícia de Segurança Pública recusou o pedido de manifestação por entender que os trabalhadores não residentes não têm esse direito. O recurso da associação foi rejeitado pelo Tribunal de Última Instância, mas a actuação das autoridades não escapou às críticas do TUI O Tribunal de Última Instância (TUI) rejeitou o recurso interposto pela União Progressista dos Trabalhadores Domésticos de Macau, presidida por Jassy Santos, no âmbito de um pedido de manifestação apresentado junto do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) para a celebração do dia 1 de Maio, e que foi recusado. O recurso da União avançou a 4 de Maio, juntamente com mais duas associações, mas foi rejeitado porque não foram seguidos os trâmites legais. Segundo o conteúdo do acórdão noticiado pelo Canal Macau da TDM, o TUI entende que os agentes do CPSP não fundamentaram devidamente a sua decisão. “Salta à vista que o alegado indeferimento não constitui uma decisão da entidade – ou órgão – por lei declarada(o) como competente para se pronunciar sobre a matéria em questão, no caso, o comandante do CPSP.” Neste sentido, “os ditos ‘agentes’ poderão ter feito – por manifesta e absoluta falta de competência sobre a matéria – a ‘prestação de uma (mera) informação’ sobre o pedido que lhes foi apresentado, não se podendo de forma alguma considerar aquela como uma ‘manifestação de vontade’ da entidade competente para o efeito”. O TUI acrescenta ainda que “não se deixa de notar que se tem como estranha a ‘conduta dos agentes da Polícia de Segurança Pública’ em questão que, em nossa opinião, deviam submeter o ‘pedido’ apresentado à consideração e decisão nos termos legalmente previstos”. Caberia então ao comandante do CPSP comunicar a decisão por escrito “e com expressa invocação das respectivas razões justificativas”. Em discussão Em declarações ao HM, Jassy Santos declarou que está a ser analisada a hipótese de fazer um novo pedido de manifestação. Desta vez, a dirigente espera que o CPSP possa fazer outra interpretação da lei de reunião e de manifestação. “O grande objectivo deste recurso é ter a correcta interpretação da lei de reunião e de manifestação para que a possamos usar como base num futuro próximo. Vamos tentar novamente [submeter outro pedido de manifestação] e temos vindo a dialogar entre nós. Se começarmos do início teremos de apresentar o formulário e teremos de ter o documento que comprova que aceitam ou que recusam o nosso pedido.” O pedido de protesto poderá ser sobre o facto de os trabalhadores não residentes (TNR) não estarem incluídos no novo plano de apoio ao consumo por meios electrónicos, mas há mais problemáticas em cima da mesa. “Veremos o que podemos fazer, porque não sei o que vamos celebrar este ano, além do Dia do Trabalhador. Ainda estamos na fase de planeamento”, rematou.
Agnes Lam apela ao aumento de actividades de Verão para jovens João Santos Filipe - 17 Mai 2021 Com os efeitos da pandemia a limitar actividades, como deslocações a Hong Kong, Agnes Lam quer saber quais os planos do Governo para entreter a juventude durante as férias de Verão. O tema foi abordado numa interpelação escrita, revelada na sexta-feira. No documento, a deputada recorda que no ano passado, devido à pandemia, o número de vagas em eventos desportivos e recreativos foi 27.121. Para este ano, no Conselho da Juventude, já foi avançado que o número deverá aumentar, uma vez que é possível viajar para o Interior sem restrições de maior. Todavia, segundo a interpelação, o número ainda vai ficar longe das vagas disponíveis antes da pandemia, o que para Agnes Lam é uma preocupação. “Sabemos que o número de vagas em actividades recreativas e desportivas vai aumentar, mas qual vai ser a dimensão do aumento”, questiona a deputada. “Além do crescimento das vagas, será possível aumentar a diversidade de actividades?”, acrescentou. A legisladora revela ainda que tem recebido queixas de pais que tentam inscrever filhos nas actividades de Verão, mas que acabaram por esbarrar na inexistência de vagas, ou que estas se gastam rapidamente. Escola no Verão Ao mesmo tempo, a deputada considera que as escolas deviam manter-se abertas todos os dias no Verão, à excepção do Domingo. Segundo Agnes Lam, o objectivo seria disponibilizar espaços aos mais jovens, sem sobrecarregar o pessoal das escolas, para praticarem desporto ou estudarem nas bibliotecas. Lam escreve igualmente que com o aumento de espaços disponíveis é igualmente mais provável que se evitem concentrações de alunos, um objectivo das autoridades face à situação pandémica. A deputada recorda ainda ao Executivo que as restrições de contratação de não-residentes têm feito com que muitas famílias passem dificuldades em casa, porque não conseguem encontrar quem tome conta dos filhos. Neste contexto, pede ao Executivo para responder ao problema.
Economia | Lei Wai Nong reunido com governante de Jiangsu Hoje Macau - 17 Mai 2021 O secretário para a Economia e Finanças, Lei Wai Nong, e o vice-Governador do Governo Popular da Província de Jiangsu, Hui Jianlin, reuniram na quinta-feira para discutir as várias áreas em que os governos de ambos territórios podem cooperar. Segundo o comunicado oficial, Hui destacou o papel de Macau “enquanto plataforma de serviços para a cooperação económica e comercial entre a China e os países de língua portuguesa” e disse esperar que a RAEM ajude “as empresas da Província de Jiangsu a entrar no mercado dos países de língua portuguesa”. O vice-Governador destacou ainda a organização em Macau da “Cimeira para o Desenvolvimento Comercial e Industrial da Província de Jiangsu, Macau e os Países de Língua Portuguesa”, que se organiza na RAEM desde 2011. Hui mencionou ainda as ligações ao nível do entretenimento, com a transmissão pelas televisões da província de eventos como a “Noite de Jiangsu no Fórum de Economia de Turismo Global – Macau” ou os concertos de ano novo em Macau, que foram transmitidas pela Jiangsu Satellite TV. Os representantes de Macau deslocaram-se à província de Jiangsu para realizar várias actividade de promoção do turismo. A iniciativa teve como nome “Semana de Macau em Jiangsu” e Lei Wai Nong agradeceu a hospitalidade dos Governo Popular da Província de Jiangsu e do Governo do Município de Nanjing, capital da província. Lei Wai Nong apontou que existe vontade do lado da RAEM de “reforçar a cooperação nas quatro áreas da medicina tradicional chinesa, finanças, tecnologia e cultura”.
Biblioteca Central | Ng Kuok Cheong quer saber critérios de selecção Hoje Macau - 17 Mai 2021 Ng Kuok Cheong quer ter acesso às qualificações profissionais da Comissão de Avaliação das Candidaturas do projecto da Nova Biblioteca Central e aos critérios de selecção do projecto vencedor. O pedido foi feito através de interpelação escrita. O deputado pede para confirmar se a manutenção do painel de mosaicos na fachada foi um dos critérios do caderno de encargo, assim como a obrigação de estabelecer uma relação entre o painel, a praça do Tap Siac e o edifício, para manter as características de ponto de referência cultural e homenagear a história local. O legislador esclarece que ficou com dúvidas depois de ter recebido queixas sobre o projecto. Na origem das reclamações esteve a não manutenção do painel de mosaicos na fachada. A proposta da Mecanoo, que venceu o concurso público, propõe a manutenção do painel no interior. Contudo, Ng Kuok Cheong defende que as dúvidas devem ser esclarecidas e que a pontuação das propostas revelada. Por outro lado, recorda que no passado várias obras públicas ultrapassaram frequentemente o orçamento e o prazo de execução e, para evitar o desperdício, pergunta se há mecanismos para garantir que o orçamento prometido de 500 milhões de patacas é cumprido.
Aliança Macau | Desistência das eleições movida por doença João Santos Filipe e Nunu Wu - 17 Mai 2021 O potencial cabeça de lista da Aliança Macau desistiu da corrida eleitoral por motivos de saúde. Kyan Su Lone foi aconselhado pela família e o médico a não participar nas eleições, “uma decisão difícil”. Por outro lado, o dirigente máximo do CCAC afirmou que recebeu cerca de 30 queixas sobre o processo de candidaturas “Apesar de ter sido algo prudente quando lancei a candidatura, sair da corrida eleitoral foi uma escolha difícil.” Foi desta forma que Kyan Su Lone, representante da Aliança Macau, comentou o seu afastamento das próximas eleições para a Assembleia Legislativa, acrescentando que não tenciona recandidatar-se num futuro próximo. Em declarações ao jornal Ou Mun, Kyan Su Lone apresentou motivos de saúde para justificar o abandono da corrida, além de confessar ter receio de não aguentar o stress das eleições. Assim sendo, seguindo conselhos familiares e do médico, decidiu sair da corrida e dirigir-se para Hong Kong para receber tratamento médico. Sem confirmar o tipo de doença de que padece, Kyan Su Lone garantiu que depois de ser refazer dos problemas de saúde irá liderar uma equipa para intervir na vida social de Macau, sobretudo no que diz respeito à diversificação económica, à prosperidade e à divulgação do espírito do amor à pátria. Além disso, o quase candidato agradeceu a compreensão, confiança e apoio que recebeu desde que começou a recolher assinaturas. A Aliança Macau entregou a lista da comissão de candidatura com mais de 500 eleitores a 26 de Abril, mas a 10 de Maio enviou uma carta à Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa a declarar a desistência. Sem grande mal O comissário contra a corrupção, Chan Tsz King, revelou ontem que o organismo que lidera tinha recebido até ontem cerca de 30 queixas e dezenas de consultas sobre o processo inicial das candidaturas às eleições. Segundo o canal chinês da Rádio Macau, Chan Tsz King apontou que, para já, não se verificaram quaisquer infracções óbvias aos regulamentos, mas apenas dúvidas e mal-entendidos. O líder do CCAC apelou ainda à máxima atenção dos candidatos para os regulamentos e lei eleitoral e revelou que o organismo fez cerca de 900 inspecções a actividades de associações, incluindo através de visitas não anunciadas. As declarações de Chan Tsz King foram feitas à margem do evento prova de orientação pela cidade intitulada “Vamos actuar para umas eleições limpas”. Chan Tsz King afirmou que todo o pessoal do CCAC, independentemente da sua categoria, está empenhado no combate à corrupção eleitoral, assegurando a integridade, a justiça e a imparcialidade das eleições.
Eleições | Novo Macau defende direito de nomeação de forças militarizadas João Santos Filipe - 17 Mai 2021 A Associação Novo Macau considera que as forças militarizadas devem poder apoiar comissões de candidatura fora das horas de serviço. A CAEAL tem uma leitura diferente A Associação Novo Macau considera que os agentes das forças de segurança e bombeiros têm o direito de fazer parte de comissões de candidatura, ao contrário da última interpretação da Comissão para os Assuntos das Eleições para a Assembleia Legislativa (CAEAL). A posição foi tomada ontem numa conferência de imprensa, onde estiveram Sulu Sou e Rocky Chan, vices-presidentes da associação. “Nós concordamos que os trabalhadores do Governo ou os agentes militarizados devem respeitar a neutralidade política quando estão de serviço”, afirmou ontem Rocky Chan, vice-presidente da Novo Macau. “Mas, quando não estão de serviço, esses trabalhadores têm o direito de fazer parte das comissões”, sustentou. As comissões de serviço são uma plataforma que serve como base para se poder fazer uma lista às eleições legislativas. Cada comissão deve ter entre 300 e 500 residentes permanentes. Neste sentido, Chan considerou que para as eleições serem justas é necessário que as pessoas possam apoiar aqueles em que querem votar. “A CAEAL diz que fazer parte de uma comissão de nomeação é uma tomada de posição. Por isso, para eles, os agentes militarizados não têm esse direito. Nós questionamos esta posição e discordamos”, atirou. “Os direitos de fazer parte de uma comissão de nomeação, de eleger e ser eleito fazem parte de uma eleição democrática e em condições de igualdade. Todos os eleitores devem ter o direito de nomear os candidatos em que querem votar”, justificou. “Se restringirem o direito de nomeação, vai haver impacto nas eleições, que se torna injusta. É por isso que para nós é muito claro que se não estão de serviço têm o direito de fazer parte de uma comissão de candidatura”, acrescentou. Diferenças de classe A Novo Macau admite o direito de o pessoal militarizado apoiar comissões de candidatura, mas considera que os juízes devem ficar de fora. Rocky Chan explicou que a dualidade de critérios se deve à lei, que define muito bem as alturas em que os agentes da polícia estão em “regime de disponibilidade permanente”. Neste regime, o polícia está força do serviço, mas sabe que pode ser chamado a qualquer altura para trabalhar. Se, devido a esta disponibilidade, trabalhar mais de 44 horas por semana, têm direito a um subsídio suplementar. “O regime que veio regular o subsídio suplementar é muito claro, por isso fora desses tempos, deviam poder apoiar as comissões de candidatura”, afirmou. Quanto aos magistrados, Rocky Chan afirmou que a independência é mais importante no trabalho, porque têm a última palavra em relação a decisões que colocam em confronto diferentes partes. Por outro lado, Chan afirmou que a lei para os magistrados define muito claramente que “não têm o direito de participar em actividades políticas”. Na ocasião, os representantes da Novo Macau criticaram ainda a CAEAL por considerarem que o órgão foi ambíguo sobre o assunto, num primeira fase, e por não ter afastado a possibilidade de sanções aos funcionários que já apoiaram comissões de candidatura.
Espaço | Missão em Marte com contributo de laboratório local João Santos Filipe - 17 Mai 2021 O Laboratório de Referência do Estado Chinês para as Ciências Lunares e Planetárias da MUST aconselhou a missão sobre o tempo certo para aterrar o robot Zhurong em Marte Passavam alguns minutos das 7 horas de sábado (hora de Macau), quando a China se tornou no segundo país a aterrar com sucesso um robot de exploração em Marte. Para esta missão histórica, contou com o contributo do Laboratório de Referência do Estado Chinês para as Ciências Lunares e Planetárias da Universidade de Ciência e Tecnologia (MUST, em inglês). Ao HM, Keith Chow, professor assistente do Instituto de Ciências Espaciais, explicou o papel da MUST na missão: “A nossa contribuição passou pela simulação das condições atmosféricas de Marte. É uma vertente muito importante, porque ao conhecer de forma detalhada a atmosfera, como a estrutura vertical e a movimentação dos ventos, é possível conhecer as melhores condições para a aterragem”, afirmou. “As simulações que realizamos foram utilizadas para perceber a altura ideal, assim como as condições, para fazer a aterragem. Foram essas as nossas funções principais”, acrescentou. O Laboratório de Referência do Estado Chinês para as Ciências Lunares e Planetárias da MUST foi chamado a contribuir para a missão que permitiu igualar o feito que até agora só tinha sido alcançado pelos Estados Unidos devido à potência do simulador. “A diferença é que temos um sistema de simulação mais potente, de resolução alta. Como sabemos, há limitações na observação da atmosfera de Marte, por isso, este simulador é uma mais-valia”, indicou. “Eles depois observaram os dados, comparam com a outra informação que recolheram e tomaram uma decisão sobre os procedimentos”, completou. “Sem sobressaltos” Sobre o acontecimento, Keith Chow mostrou-se “muito feliz” e considerou que a missão tem sido “muito bem sucedida”. “Este objectivo foi conseguido, e os procedimentos correram de forma fluida, não houve assim sobressaltos. Também a aterragem foi relativamente perto da zona prevista, o que é muito positivo para a primeira aterragem chinesa”, vincou. O cientista tinha começado a colaborar com a missão há cerca de cinco anos, quando o projecto foi estabelecido, embora recuse a ideia de que seja uma longa colaboração. “Se avaliarmos cinco anos em termos de investigação, não se pode dizer que é muito tempo”, indicou. O robot que aterrou em Marte tem o nome de Zhurong, que significa Deus do Fogo. O equipamento estava desde Fevereiro na órbitra do planeta, onde tinha chegado em Fevereiro deste ano através da missão Tianwen-1. Devido à distância entre Marte e a Terra, de 320 milhões de quilómetros, a mensagem a confirmar o sucesso do procedimento por parte do Zhurong demorou 17 minutos a chegar. A aterragem do robot Deus do Fogo foi elogiada por Xi Jinping, que afirmou tratar-se de “um feito excepcional”. Além disso, o governante destacou o contributo dos membros da missão espacial para o país. “Foram corajosos para aceitar o desafio, perseguiram um nível de excelência e colocaram o nosso país no nível dos mais avançados em termos da exploração planetária”, afirmou.
Gaza | Mortandade sobe com ataques israelitas, enquanto Nações Unidas discutem solução Hoje Macau - 17 Mai 2021 Depois de uma semana de hostilidades, à hora do fecho desta edição o número de mortos do lado palestiniano ronda as duas centenas, com mais de 50 crianças mortas, enquanto do lado israelita as baixas contam-se pelos dedos de duas mãos. O Conselho de Segurança da ONU reuniu ontem para tentar encontrar uma via que conduza ao cessar-fogo, com a China a culpar Washington pela inacção das Nações Unidas A reunião, inicialmente marcada para sexta-feira com carácter de urgência, foi solicitada por 10 dos 15 membros do Conselho de Segurança das Nações Unidas (China, Tunísia, Noruega, Irlanda, Estónia, França, Reino Unido, São Vicente e Granadinas, Níger e Vietname). Os últimos dados do Ministério da Saúde palestiniano apontam para a existência de 181 vítimas mortais na Faixa de Gaza na sequência dos bombardeamentos do exército israelita. Do lado de Israel, o último balanço dá conta de 10 mortos. Os Estados Unidos, que tinham rejeitado a data de sexta-feira para a reunião, mostraram-se favoráveis a que o encontro se realizasse no início da próxima semana, “para dar um pouco mais de tempo à diplomacia para conseguir resultados”, nas palavras do chefe da diplomacia norte-americana, Antony Blinken. Porém, Washington acabou por concordar em realizar a reunião de emergência ontem, numa solução de compromisso entre as duas datas, segundo fontes diplomáticas. A realização deste tipo de reuniões de urgência por videoconferência requer o consenso dos 15 Estados membros do Conselho de Segurança, mas tem sido prática comum nos últimos meses, devido à pandemia de covid-19. O Ministro dos Negócios Estrangeiros chinês, Wang Yi, foi uma das vozes que apelou à intervenção do Conselho de Segurança para procurar o alívio da escalada de violência e culpou os Estados Unidos pela inacção da ONU. “Infelizmente, o conselho tem falhado sem chegar a consensos, com os Estados Unidos a apostarem numa posição que contraria a justiça internacional”, referiu no sábado Wang, citado pela Xinhua, numa conversa telefónica com o seu homólogo palestiniano Shah Mahmood Qureshi. O governante chinês voltou a expressar o apoio à chamada solução de dois estados independentes, via que deve ser a prioridade das Nações Unidas, com vista a colocar de novo Israel e Palestina na mesa de negociações. Cruz que se carrega O Comité Internacional da Cruz Vermelha (CICV) pediu ontem aos membros do Conselho de Segurança da ONU que “exerçam influência máxima para acabar com as hostilidades entre Israel e Gaza”, um conflito de “intensidade nunca antes vista”. “As populações de Gaza e de Israel enfrentam o mais intenso ciclo de hostilidades registado em anos”, refere o CICV num comunicado publicado a poucas horas de ter lugar uma reunião virtual do Conselho de Segurança da ONU dedicada ao conflito no Médio Oriente. No mesmo comunicado, citado pela Agência France-Presse (AFP), o CICV apela a todas as partes que “ponham fim à escalada (da violência) e garantam o melhor acesso às pessoas afectadas na Faixa de Gaza”. “A intensidade deste conflito é algo que nunca tínhamos visto antes, com ataques aéreos incessantes contra Gaza, uma zona densamente povoada, e com foguetes a atingirem grandes cidades de Israel, provocando a morte de crianças de ambos os lados”, refere o director-geral do Comité Internacional da Cruz Vermelha, Robert Mardini. Leve reprimenda A Casa Branca advertiu Israel de que garantir a segurança dos jornalistas é “primordial”, após uma investida israelita ter destruído um edifício em Gaza onde funcionava a agência de notícias Associated Press, que ficou “chocada e horrorizada” com o ataque. “Dissemos directamente aos israelitas que garantir a segurança dos jornalistas e dos meios de comunicação independentes é uma responsabilidade de importância crítica”, disse a porta-voz da Casa Branca, Jen Psaki. As forças armadas israelitas destruíram no sábado um edifício que albergava os escritórios da agência de notícias Associated Press (AP) e outras organizações jornalísticas em Gaza, num ataque à capacidade de os meios de comunicação reportarem o que se passa no território. O ataque, cujas razões continuam por explicar, aconteceu uma hora depois de os militares terem avisado o proprietário que iam atacar o edifício, ordenando a sua evacuação. Através de uma declaração, a AP manifestou-se “chocada e horrorizada” com o ataque israelita, que destruiu a torre que albergava os seus escritórios e os da Al Jazeera, em Gaza, que classificou de um “desenvolvimento incrivelmente inquietante”. “Estamos chocados e horrorizados com o facto de os militares israelitas terem atacado e destruído o edifício que alberga o escritório da AP e outros meios de comunicação em Gaza”, disse o presidente da agência norte-americana de notícias, Gary Pruitt. E acrescentou: “Há muito que conhecem a localização do nosso escritório e sabiam que os jornalistas estavam lá. Fomos avisados de que o edifício seria atingido”. “Este é um desenvolvimento incrivelmente perturbador. Evitámos por pouco a terrível perda de vidas. Cerca de 10 jornalistas e ‘freelancers’ da AP estavam no edifício e, felizmente, conseguimos retirá-los a tempo”, disse. Pruitt referiu que a AP solicitou informações ao governo israelita e que está em contacto com o Departamento de Estado norte-americano para tentar saber mais. “O mundo estará menos informado sobre o que está a acontecer em Gaza por causa do que aconteceu hoje”, concluiu. Ex-vizinhos de escritório Por seu lado, o chefe do gabinete da Al Jazeera na Palestina e em Israel classificou o ataque como um “crime” e uma tentativa de o exército israelita “silenciar os media”. Falando em directo no canal de notícias em língua árabe, o chefe do gabinete da Al Jazeera para a Palestina e Israel, Walid al-Omari, disse que este “crime” era mais um de uma “série de crimes perpetrados pelo exército israelita”, em Gaza. Israel não quer “apenas espalhar a destruição e a morte em Gaza, mas também silenciar os meios de comunicação social que vêem, documentam e dizem a verdade sobre o que está a acontecer”, adiantou, advertindo que tal “é obviamente impossível”. O proprietário da Torre Jala, Jawad Mehdi, disse que um oficial dos serviços secretos israelitas o avisou, antes do ataque, que tinha uma hora para evacuar o edifício. Mehdi pediu mais 10 minutos para os jornalistas levarem o seu equipamento, o que foi recusado. A Al Jazeera confirmou na rede social Twitter que os seus escritórios estavam no edifício e transmitiu imagens ao vivo do desmoronamento da torre, envolta numa nuvem de poeira. O exército israelita alegou que equipamento militar do Hamas se encontrava no edifício, onde os profissionais dos meios de comunicação estavam a ser utilizados como “escudos humanos”. Disse ainda que avisou previamente “os civis” no seu interior. Rotas de fuga A passagem de Rafah, aberta excepcionalmente pelo Egipto para a entrada das ambulâncias na Faixa de Gaza, não é controlada por Israel, que impôs um bloqueio ao enclave palestiniano há cerca de 15 anos. Por norma, esta passagem fronteiriça está encerrada aos feriados, incluindo a Eid al-Fitr, a celebração muçulmana que marca o fim do jejum do Ramadão e que começou na quarta-feira. Uma criança foi o único sobrevivente depois de um bombardeamento das forças israelitas ter pulverizado no sábado de manhã uma casa no campo de refugiados de al-Shati. Entre os escombros foram encontrados 10 corpos, oito deles de crianças, de acordo com a agência de notícias palestiniana WAFA. Ontem de manhã, um ataque aéreo das forças israelitas atacou vários prédios em zonas residenciais e estradas numa parte da cidade de Gaza. Fotos de residentes e jornalistas mostraram os danos provocados pelas bombas, incluindo uma cratera que bloqueou um dos principais acessos a Shifa, o maior hospital da faixa de Gaza. Num comunicado, o secretário-geral da ONU, António Guterres, disse estar “desolado” com o número de baixas civis. “O secretário-geral recorda todas as partes que atacar indiscriminadamente alvos civis e meios de comunicação social são violações das leis internacionais e devem ser evitados a todo o custo”, afirmou em comunicado. O chefe da diplomacia europeia convocou para amanhã uma reunião de emergência dos ministros dos Negócios Estrangeiros da União Europeia (UE) por videoconferência para discutir a escalada da violência entre Israel e palestinianos. “Tendo em conta a escalada em curso entre Israel e a Palestina e o número inaceitável de vítimas civis, convoco uma videoconferência extraordinária dos ministros dos Negócios Estrangeiros da UE para terça-feira”, escreveu Josep Borrell na sua conta na rede social Twitter. Segundo o alto representante da UE para os Negócios Estrangeiros e Política de Segurança, os ministros irão “coordenar e discutir a maneira como a UE pode contribuir para pôr fim à violência actual”.
Registado 50º caso de covid-19 em Macau Hoje Macau - 16 Mai 2021 Foi hoje detectado o 50º caso de covid-19 em Macau. Segundo informações divulgadas pelo Centro de Coordenação de Contingência do Novo Tipo de Coronavírus, trata-se de um indivíduo proveniente do Nepal que estava a realizar a quarentena, tendo acusado “francamente positivo” ao teste de ácido nucleico de rastreio à covid-19. Trata-se, portanto, de “um caso de recaída assintomático importado”. O homem tem 31 anos de idade e viajou de Kathmandu, Nepal, no dia 24 de Abril. Antes de entrar no território, o teste de ácido nucleico deu negativo. No dia seguinte, a 25 de Abril, o indivíduo foi submetido a novo teste de ácido nucleico, que deu negativo, e a um teste de anti-corpos IgM, que deu positivo. O indivíduo foi reencaminhado para o Centro Clínico de Saúde Pública de Coloane, uma vez que as autoridades consideraram que “tinha sido infectado com a covid-19 e havia o risco de recaída”. Os testes de ácido nucleico efectuados a 28 de Abril, 2 e 9 de Maio deram todos negativos. Risco de surto O Centro de Coordenação alerta para o “risco elevado de surgir um surto de uma variante altamente contagiosa”. Neste sentido, todos os residentes serão submetidos a testes anti-corpos. “Com isto evita-se que estes indivíduos, após saída de observação médica em isolamento, possam pôr em perigo as suas famílias e a comunidade.” Tendo em conta o aumento de casos em Taiwan, o Centro de Coordenação decidiu aumentar a quarentena obrigatória de 14 para 21 dias para quem viaje para Macau a partir da Ilha Formosa. Além disso, aqueles que estão sob observação médica devido ao histórico de viagens e residência na região de Taiwan devem ser submetidos a autogestão da saúde por 7 dias após o término da observação médica de 14 dias, durante o qual a cor do código de saúde da pessoa passará a ser amarelo”. Esta medida não se aplica, contudo, aos que já completaram a observação médica tendo em conta o histórico de viagens e residência em Taiwan. O Centro deixa ainda notar que “se as condições permitirem as medidas originais [quarentena de 14 dias] serão reiniciadas o mais rápido possível”. Foi ainda decretada a quarentena obrigatória de 14 dias para todos os que viajam para Macau a partir da Vila de Shangpai, Condado de Feixi, da Cidade de Hefei da província de An Hui, ou da Vila de Chentun e Vila de Xiongyue, da Cidade de Yingkou da província de Liaoning, na China. A partir das 21h deste domingo, dia 16, será ainda obrigatória a quarentena para quem tenha estado, nos últimos 14 dias, na comunidade de Yiyuan, do distrito de Heping, da cidade de Shenyang, da província de Liaoning, também na China.
Covid-19 | Quarentena de 21 dias para quem chega de Taiwan Hoje Macau - 16 Mai 2021 Todas as pessoas que nos 21 dias anteriores à sua chegada a Macau tenham estado em Taiwan terão de cumprir no território uma quarentena de 21 dias. A decisão foi anunciada no sábado pelo Centro de Coordenação de Contingência do Novo Tipo de Coronavírus, tendo entrado em vigor à meia noite deste domingo, dia 16. O Centro informa também que “aqueles que estão sob observação médica devido ao histórico de viagens e residência na região de Taiwan devem ser submetidos a autogestão da saúde por 7 dias após o término da observação médica de 14 dias, durante o qual a cor do código de saúde da pessoa passará a ser amarelo”. Esta medida não se aplica, contudo, aos que já completaram a observação médica tendo em conta o histórico de viagens e residência em Taiwan. O Centro deixa ainda notar que “se as condições permitirem as medidas originais [quarentena de 14 dias] serão reiniciadas o mais rápido possível”. Este sábado as autoridades de Taiwan aumentaram o nível de alerta para a capital, Taipei, e Nova Taipei devido ao surgimento de 180 novos casos de transmissão local. Segundo o jornal Taipei Times, as novas medidas preventivas estarão em vigor até ao dia 28 deste mês. O Centro de Coordenação decidiu também decretar a quarentena obrigatória de 14 dias para todos os que viajam para Macau a partir da Vila de Shangpai, Condado de Feixi, da Cidade de Hefei da província de An Hui, ou da Vila de Chentun e Vila de Xiongyue, da Cidade de Yingkou da província de Liaoning, na China.
Covid-19 | Índia com mais de quatro mil mortos nas últimas 24 horas Hoje Macau - 16 Mai 2021 A Índia registou 4.077 mortes devido à covid-19 e 311.170 infeções nas últimas 24 horas, segundo o Ministério da Saúde indiano. Desde o início da pandemia o país já registou 270.284 mortes e mais de 25 milhões de casos. A Índia é o segundo país do mundo que registou mais infeções, apenas atrás dos Estados Unidos. A pandemia de covid-19 provocou, pelo menos, 3.359.726 mortos no mundo, resultantes de mais de 161,7 milhões de casos de infeção, segundo um balanço feito pela agência francesa AFP.