Turismo | Coutinho quer quotas para residentes nos ‘resorts’

O deputado quer que o Governo aproveite a revisão dos contratos de exploração de jogo para exigir às concessionárias a criação de quotas para residentes continuarem a usufruir dos hotéis e ‘resorts’ quando a entrada de turistas do Interior da China for normalizada. A proposta vai ser apresentada ao Chefe do Executivo

 

[dropcap]O[/dropcap]deputado da Assembleia Legislativa (AL) José Pereira Coutinho defendeu ontem que o Governo deve passar a exigir aos casinos uma quota turística para residentes, nos ‘resorts’ de luxo, durante a revisão das concessões do jogo.
À agência Lusa, o deputado disse que as medidas do Governo de incentivo ao turismo doméstico resultaram, assim como os pacotes de descontos promovidos pelas concessionárias do jogo que exploram os ‘resorts’ integrados. No entanto, defende Pereira Coutinho, é preciso dar continuidade a essa política. “Tendo em conta a pandemia e as restrições de deslocação de residentes de Macau para o exterior, o Governo introduziu medidas extremamente positivas em articulação com as concessionárias de jogo, o que permite que, sobretudo aos fins-de-semana e feriados, as famílias possam usufruir de hotéis e ‘resorts’, locais de diversão muito virados para as famílias, muitas das quais nunca tinham sequer entrado naqueles locais”, explicou.
“As medidas introduzidas estão a resultar, como é o caso da aquisição de bilhetes a preços módicos, o que fez com que, aos fins-de-semana, em especial o último que passou, as concessionárias estivessem lotadas”, acrescentou.

Investimento interno

É neste contexto que o deputado vem defender que “na revisão dos contratos seja introduzida uma percentagem para os residentes de Macau poderem, no futuro, continuar a beneficiar dessas medidas, mesmo quando começarem a surgir mais turistas do continente”.
“Esta quota turística local deveria fazer parte da responsabilização das concessionárias para com o território, porque a maior parte dos lucros não é investida em Macau”, salientou.
A proposta vai ser apresentada ao líder do Governo “no âmbito do diálogo permanente com o Chefe do Executivo”, para se deixar a mensagem de que as acções foram positivas, mas que merecem continuidade”, sustentou.
O Governo de Macau prometeu avançar com um concurso público até 2022, ano em que terminam as licenças de exploração do jogo.

AL | Agnes Lam explicou voto a favor de criminalização de “notícias falsas”

A deputada defende que perdia legitimidade para “negociar” com o Governo se tivesse votado contra a segunda versão da lei. Como tal, Agnes Lam argumenta que o voto a favor da criminalização das fake news foi para manter “a capacidade de lutar por mudanças no futuro”

 

[dropcap]A[/dropcap]deputada Agnes Lam esteve entre os 27 membros da Assembleia Legislativa que na semana passada votaram a favor das alterações à Lei de Protecção Civil, que criminalizam notícias consideradas falsas pelas autoridades. Este foi um dos aspectos mais polémicos da lei que levou o Governo a apresentar uma segunda versão do diploma, após críticas do sector. Apesar das mudanças, quatro deputados do campo democrata votaram contra o artigo.

Feita a votação, a legisladora sentiu necessidade de explicar o seu voto, num comunicado publicado nas redes sociais, durante o fim-de-semana. A “cedência” do Executivo foi utilizada como justificação: “Será que podemos votar contra uma lei que já foi alterada, após termos pedido algumas alterações? Sim, podemos. Mas se votarmos contra, que motivação tem o Governo para fazer cedências no futuro?”, argumentou Agnes Lam.

A deputada eleita pela via directa considerou ainda que se tivesse votado contra o artigo polémico no futuro não poderia exercer influência junto do Executivo para outras alterações necessárias: “Este voto a favor não é apenas devido às mudanças feitas [no diploma], é também para manter a capacidade de lutar por mudanças no futuro”, vincou. “É um aspecto político, e espero que todos compreendam”, apelou.
Sobre o conteúdo do documento, Agnes Lam defendeu que as duas objecções que tinha foram alteradas pelo secretário Wong Sio Chak, após uma reunião.

A deputada considerava ser inaceitável que os órgãos de comunicação social estivessem obrigados por lei a aderir à propaganda oficial, porque isso “facilmente levaria à interferência na liberdade de imprensa”. Segundo Agnes Lam, como esta obrigação foi removida na segunda versão da lei, nada impedia que votasse a favor.

Versão aceitável

Quanto à segunda objecção, a legisladora afirmou ser contra a utilização da expressão “por quaisquer outros motivos” no artigo que criminalizava a difusão de notícias falsas. Como a expressão foi removida, Agnes Lam considerou que já podia votar a favor.

Porém, a legisladora defendeu que o Executivo até foi mais longe e alterou outros aspectos, como a obrigatoriedade de estar declarado o estado de emergência para haver crime, assim como a obrigatoriedade de provar intenção de causar pânico e dificultar as operações de resgate e salvamento. Finalmente, segundo a deputada, também só haverá condenação no caso de a informação falsa estar relacionada com os mecanismos de resposta a crises. “Com as mudanças […] senti que os requisitos para haver condenação eram aceitáveis e que seria impossível condenar alguém sem intenção de cometer o crime. O artigo reuniu os requisitos pelos quais lutei e, por isso, decidi votar a favor”, explicou.

A resposta acabou por não convencer todos os seguidores da deputada, e num comentário Agnes Lam foi mesmo confrontada com o facto de agora falar em objecções à versão inicial, mas no dia da votação na generalidade ter saído do Plenário sem votar. A deputada defendeu-se e respondeu que o facto de ser contra um artigo individual não faz com que seja contra o restante conteúdo do diploma.

Defesa de Miguel Ian rejeita papel de “mentor” em alegado grupo criminoso

[dropcap]O[/dropcap] Ministério Público considera que o alegado grupo de Ng Kuok Sao “dependia” de Miguel Ian para elaborar documentos, e que o antigo funcionário do IPIM assumia o cargo de “mentor” na organização. “Desempenhava um papel muito importante, de mentor e conselheiro porque quando o grupo tinha dificuldades lembrava-se logo dele”, descreveu o delegado do MP. No entender da acusação, os conselhos dados por Miguel Ian não se deviam apenas a uma relação de amizade, já que antes de 2014 ficou dois anos e nove meses sem contacto com Ng Kuok Sao.

Depois disso, Pak Wa Ngai descreveu que as conversas entre os dois arguidos se centravam em dois aspectos: pedidos de residência e imóveis na Ilha da Montanha. Para o MP, em troca das informações prestadas, Miguel Ian tinha o objectivo de comprar imóveis na Ilha da Montanha a um valor abaixo do mercado. Em causa está a possível venda de fracções no edifício Star Tower por Ng Kuok Sao, a um preço de 19 mil renminbis por metro quadrado. O MP reconheceu que Miguel Ian ainda não adquiriu essas fracções, mas argumentou que 20 por cento dos imóveis permanecem disponíveis para compra.

A defesa da ex-chefia também foi ouvida ontem e disse que os imóveis disponíveis pertencem a uma testemunha do caso, frisando que Miguel Ian “não chegou a receber vantagens ilícitas nem tinha motivo para falsificar documentos” para o grupo de Ng Kuok Sao. Além disso, a defesa descreveu que entre as mensagens trocadas entre os dois só três eram sobre a Star Tower e duas sobre pedidos de residência, num universo de mensagens em que havia 47 a combinar refeições.

O advogado Jorge Ho declarou que Miguel Ian “não sabia” que o conteúdo dos documentos apresentados ao IPIM era falso, e que o empresário “estava a aproveitar-se dele”. Descreveu assim que Miguel Ian foi “demasiado boa pessoa” e que “por causa desta acusação perdeu o emprego, a família perdeu o pilar de sustento económico”.

Caso IPIM | Ministério Público pede condenações, defesa aponta falta de provas

Nas alegações finais apresentadas ontem em tribunal no caso do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau, o Ministério Público considerou que os factos que alegou foram provados, enquanto a defesa alertou para a falta de provas

 

[dropcap]O[/dropcap] julgamento do processo que tem Jackson Chang, ex-presidente do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM), no banco dos réus entrou ontem nas alegações finais. O Ministério Público (MP) manteve os crimes, e considerou que todos “os factos da acusação ficaram provados”. Da parte da defesa, o advogado de Jackson Chang disse que o ex-presidente do IPIM “não merece a justiça que passou, mas merece a justiça que será feita”.
Descrevendo Jackson Chang como “inocente”, Álvaro Rodrigues pediu para no caso de ter outro entendimento, o tribunal aplicar ou para ponderar pena suspensa se optar por prisão, tendo em conta a personalidade, percurso profissional e tempo de prisão preventiva cumprido pelo arguido.
“Por tudo o que aprendemos neste processo, acredito que a prisão preventiva do arguido foi completamente injusta, infundada e infeliz (…). Um pai que eventualmente para manter um posto de trabalho a uma filha passou uma informação a essa mesma filha e já pagou com pelo menos um ano de prisão, um ano de humilhação nos media, eu acho que chega”, declarou.
O MP alega que Ng Kuok Sao e a esposa, Wu Shu Hua, chefiavam uma associação criminosa criada em 2010, que funcionou até ser descoberta. Durante esse período, a acusação diz que foram falsificados vários documentos para pedir fixação de residência. Os empresários recrutariam clientes e cobravam “taxas exageradas”. O delegado do Ministério Público Pak Wa Ngai disse que a participação de Jackson Chang no alegado grupo “parece ser baixa”, mas deu a entender que o ex-presidente do IPIM não teria recebido várias vantagens ilícitas se tivesse prestado apoio apenas num caso. Lançada a ideia, declarou que “podemos confirmar, sem dúvidas, que participou na associação criminosa”.
O advogado de Jackson Chang, contestou a acusação. “A hipótese de ser considerado membro de associação criminosa não faz sentido nem chamando as regras de experiência comum”, declarou Álvaro Rodrigues. O advogado argumentou que Jackson Chang denunciou dezenas de casos suspeitos, alguns dos quais relativos a pedidos de fixação de residência tratados pela empresa de Ng Kuok Sao e que indeferiu vários que obrigaram o empresário a devolver o dinheiro aos requerentes.
“Não fazia sentido Ng Kuok Sao dar benefícios a quem só lhe prejudicava os negócios”, notou o advogado. Para além disso, argumentou que não há informações novas em relação às outras acusações contra Jackson Chang para justificar que a associação criminosa seja um crime autónomo.
Álvaro Rodrigues considera que o Ministério Público não agiu de forma “leal”, por acusar Jackson Chang com o “maior número de crimes possível, na esperança” de condenação. Ao longo da sua intervenção, disse também que o MP teceu acusações “sem provas nenhumas”, e que se “prendeu um inocente”.

Deontologia em cheque

O Ministério Público acusou Jackson Chang de violar “os deveres e o código de deontologia dos funcionários públicos”, e de abuso de poder ao requer informações sobre processos de pedidos de residência de algumas pessoas. Pak Wa Ngai disse que o ex-presidente do IPIM forneceu dados confidenciais ao empresário Ng Kuok Sao, explicando que no caso de uma requerente deu informações de que o investimento tinha de ser de 13 milhões de patacas.
No seguimento, refutou a defesa de a informação de 13 milhões de patacas ser o valor necessário público em 2018. “É absurda essa posição. Mesmo que tenha sido divulgada em 2018, isso não tem efeitos retroactivos no que aconteceu. Antes não se podia ter acesso a essa informação”, declarou Pak Wa Ngai. O debate sobre que informações do IPIM eram confidenciais foi uma constante nas sessões de julgamento. Para o MP, ficou provado que o montante mínimo de investimento e o progresso dos pedidos não podiam ser divulgados.
Da parte da defesa, Álvaro Rodrigues notou a inexistência de uma regra escrita que dite a confidencialidade. O advogado argumentou que os factos da acusação são de uma altura em que o IPIM estava em transição para adoptar novas medidas, descrevendo como “louvável” a postura de “transparência” de Jackson Chang perante os cidadãos. “Não faz sentido acusar de violação de segredo o funcionário que tem poderes para determinar o que é segredo ou não”, declarou. Sobre ajudar os requerentes em relação ao andamento de processos, o advogado defendeu que “não é abuso de poder, é um dever da administração”.
A acusação acredita que Jackson Chang correu o risco de dar as informações a troco de benefícios. Os salários de Angela Ip, mulher, e Júlia Chang, filha, que trabalharam numa empresa de Ng Kuok Sao em períodos desfasados, estariam entre eles. O MP descreveu que não encontrou vestígios de Angela Ip ter trabalhado na empresa e que Júlia Chang não tinha capacidades para exercer a função de recepcionista, comentando que o seu salário “não era razoável”, por ser mais alto que o de uma colega com habilitações superiores. “Achamos que estes chamados salários eram benefícios do grupo de Ng Kuok Sao a [Jackson Chang]”, declarou o delegado.
Álvaro Rodrigues remeteu a análise desta acusação para hoje, mas frisou que tanto a mulher como a filha trabalharam na empresa e que os investigadores do Comissariado contra a Corrupção (CCAC) o admitiram.
O MP alegou ainda que Jackson Chang forneceu informações através da filha. “Júlia desempenhou um papel importante entre Jackson Chang e Ng Kuok Sao”, disse Pak Wa Ngai, acrescentando que isso ocultou a ligação entre os dois homens. Para além disso, recordou que o ex-presidente do IPIM pediu à mulher para apagar mensagens.
“Essas condutas sem dúvida tinham como objectivo ocultar a proveniência ilícita dos interesses”, declarou.

A origem do dinheiro

Para além da família, o MP descreveu que o empresário deu “lai sis” com regularidade a Jackson Chang. A lógica da acusação é que por não ter sido descoberto que o ex-presidente tenha dado informações a outras pessoas, a proveniência dos “lai sis” seria Ng Kuok Sao.
No caso de 500 mil dólares de Hong Kong que o casal emprestou a um amigo, a acusação não encontrou transferências bancárias desse valor nas contas de Angela Ip ou Jackson Chang. A teoria é que esse numerário “não vinha das contas bancárias nem de rendimentos normais dos dois”, mas antes de pagamentos de Ng Kuok Sao que o casal guardaria. “Se tivesse depositado no banco seria mais fácil ser descortinada esta forma de entrega em numerários para ocultar proveniência ilícita desses bens”, descreveu.
De acordo com o MP, o dinheiro em numerário que permitiu a compra de dois relógios e 51 mil patacas encontradas no gabinete de Jackson Chang tem a mesma origem.
A defesa abordou alternativas para a origem do dinheiro. Descreveu que entre Abril de 2011 e Março de 2014 foram levantadas 544,500 mil patacas de contas de Jackson Chang, e que entre 2016 e 2018 foram levantados 230 mil dólares de Hong Kong. “Montante mais do que suficiente para comprar dois relógios. E repare que para fazer esse exercício não precisamos de ‘powerpoint’”, comentou.
Álvaro Rodrigues frisou ainda que o arguido ganhava em média 1,3 milhões de patacas e que era proprietário de dois imóveis na Taipa, juntamente com a mulher. Uma das fracções foi hipotecada em 2013 por 4,9 milhões de patacas. Depois de um contrato promessa de compra e venda na ilha de Hengqin de 2,9 milhões de renminbis, restavam 1,5 milhões de patacas.
O advogado notou que o investigador chefe do CCAC não conseguiu confirmar a origem do dinheiro. “No direito penal, meter uma pessoa na cadeia sem provas directas? Só com experiência comum?”, alertou. O causídico argumentou que a experiência comum foi usada pela acusação para “restituir os factos”.

Rodolfo Ávila conquista nove pódios em Zhouzhou

[dropcap]A[/dropcap]o todo, foram nove os pódios conquistados pelo piloto de Macau, Rodolfo Ávila, durante o fim de semana, no Circuito Internacional de Zhuzhou. Cinco no Campeonato da China de Carros de Turismo (CTCC) e outros quatro na prova que assinalou o arranque da temporada do campeonato TCR China.
Num “super evento” de seis dias a contar para o CTCC, e que equivaleu a metade da temporada, em oito corridas, Rodolfo Ávila conquistou três segundas posições e dois terceiros lugares. O rescaldo do fim de semana não foi ainda mais brilhante, devido a uma falha mecânica no VW Lamando conduzido pelo piloto de Macau, registada quando liderava confortavelmente a última corrida da prova, obrigando-o a desistir.
“Foi talvez a semana mais dura da minha carreira, pois nunca tinha realizado tantas corridas num tão curto espaço de tempo. Ainda assim, estamos todos muito contentes pelo regresso das corridas depois de uma paragem tão longa devido a razões que são alheias ao automobilismo”, afirmou Ávila em comunicado. “A minha equipa fez um bom trabalho e evoluímos em termos de performance ao longo da semana. Gostava de ter saído daqui com uma vitória, mas tal não foi possível. Ainda faltam disputar outras oito corridas até ao final do ano, portanto ainda muito pode acontecer”.
Com estes resultados, o piloto de Macau ocupa agora o quarto lugar na classificação de pilotos, estando a 333 Racing à frente na classificação de equipas. O CTCC regressa em Setembro para uma jornada de duas corridas no Circuito Internacional de Xangai, no fim-de-semana de 12 e 13 de Setembro.

Vira o disco

Também no Circuito Internacional de Zhuzhou, Rodolfo Ávila deu início à sua temporada de 2020 do campeonato TCR China com quatro subidas ao pódio, conquistando uma segunda posição e três terceiras posições ao volante do MG6 da MG Xpower Team.
“Dadas as circunstâncias, o resultado global do fim-de-semana acaba por ser muito positivo. Não havia muito mais que pudesse fazer. O nosso carro não está ainda ao nível da concorrência e vamos ter que trabalhar para encurtar esta diferença nas próximas provas. Todavia, estes resultados são como um prémio para todos os membros da equipa que fizeram um enorme esforço para que conseguíssemos estar aqui na máxima força”, disse o piloto de Macau.
Os concorrentes do campeonato TCR China regressam ao activo no fim-de-semana de 12 e 13 de Setembro, também no Circuito Internacional de Xangai.

Tudo o Que se Atribui a Zhao Boju

Paulo Maia e Carmo

[dropcap]Z[/dropcap]hao Xigu (activo c.1195 – c. 1242) um influente crítico de arte da dinastia Song, no seu tratado curiosamente intitulado «Relação de Pura Alegria da Caverna do Eremita» (Dongtian Qinglu Ji) insurgiu-se contra os pintores que, antes de pintar, já tinham escolhido os títulos das pinturas, tornando-as assim indiferentes às surpresas proporcionadas pelo próprio acto de pintar.

Esses pintores, de entre aqueles que vieram para o Sul em 1127, «não levavam a sério a pintura, não estudavam os dez mil livros, não enchiam o olhar com pinturas antigas nem viajavam de carro ou a cavalo pela metade do território debaixo do céu.» Porque «só então podiam pegar no pincel. De outro modo não entenderiam a actividade» da pintura. Os que a entendessem, escreveu «nem deixariam traços do pincel», ideia que exprime a supremacia do espírito sobre a técnica, que é o que deve prevalecer.

Zhao Xigu alinha-se com aquela que seria qualificada como a «pintura dos letrados» (wenrenhua) e é por isso desafiante saber quem eram aqueles que ele via como pintores exemplares. De um deles a expressão «sem traços de pincel» (wubiji) noção estética e filosófica, tornar-se-ia literal e a mera alusão ao pintor, um estimado referente. Chamava-se Zhao Boju e o seu nome confundir-se-ia com o de um irmão mais novo, igualmente pintor, Zhao Bozhu no qual a mudança de um caracter quase não modifica a pronúncia do nome. Sabe-se que um deles viveu entre 1120 e 1182, do outro apenas que viveu até 1162. O facto de os dois serem muitas vezes referidos em conjunto por Chen Jiru, Dong Qichang ou Shen Hao não ajuda à distinção.

Zhao Boju foi porém um nome associado ao revivalismo da pintura dos Tang, das paisagens azuis e verdes (qinglu) e ouro e jade (jinbi) associadas a Li Sixun (651-716-18). O pintor que, segundo alguns biógrafos terá nascido na Província de Hebei e trabalharia na Academia de Huizong (r.1100-1126) tornar-se-ia um favorito do imperador Gaozong (r. 1127-1162) sendo filho do pintor Zhao Lingrang (activo em 1070-1100) que era descendente do fundador dos Song, Tazu (r.960-975). São-lhe atribuídas obras como «Cores de Outono sobre rios e montanhas» (rolo horizontal, a tinta e cor sobre seda, 56,6 x 323,2 cm) datada de 1160 e que se encontra no Museu do Palácio, em Pequim e que poderia justificar uma curiosa atribuição de uma suposta «Paisagem de Outono» que foi apresentada na corte de Hongwu, o primeiro imperador dos Ming (r.1368-1398) que sem bases factuais lhe outorga a autoria.

Muitas outras pinturas em museus por todo o mundo lhe são atribuídas sempre com um ponto de interrogação. O que não se pode negar é que, se não os traços do pincel é o espírito de Zhao Boju como queria Zhao Xigu, que permanece vivo na memória daqueles que ao longo dos séculos foram limpando a poeira para ver quais eram afinal as suas fugidias pinturas.

Covid-19 | Fabricantes de máscaras chineses lutam pela sobrevivência

[dropcap]R[/dropcap]egulamentos mais rígidos e preços em queda estão a causar uma luta pela sobrevivência entre os fabricantes de máscaras da China, à medida que a pandemia da covid-19 tornou o mercado mais competitivo.
“Desde Abril, as encomendas caíram entre cinco e seis vezes”, lamentou Yang Hao, director comercial da CCST, empresa da cidade de Shenzhen especializada em purificadores do ar, mas que se converteu num fabricante de máscaras de protecção respiratória no auge da epidemia.
Primeiro país afectado pelo novo coronavírus, a China rapidamente se consolidou como o principal fabricante de máscaras a nível mundial. Pequim não hesitou em utilizar essa capacidade no plano diplomático, com doações ao exterior divulgadas pelos órgãos oficiais de Pequim.
Entre Março e Maio, o país asiático exportou mais de 50 mil milhões de máscaras, de acordo com os dados das alfândegas chinesas. Isto representa 10 vezes a produção total deste tipo de equipamento face ao mesmo período do ano anterior.
Centenas de empresas embarcaram na corrida pelo fabrico de máscaras, à medida que a necessidade de equipamento de protecção contra o coronavírus aumentou em todo o mundo e os preços dispararam.
A construtora de automóveis chinesa BYD, por exemplo, converteu-se em poucas semanas no maior fabricante do mundo de máscaras, com capacidade para 5 milhões de unidades por dia.
Segundo a consultora Tianyancha Business Database, quase 74.000 empresas registaram-se como fabricantes de máscaras na primeira metade do ano, face a menos de 6.000, no ano anterior. O mês de Abril representou metade daquele número.
No entanto, o mercado ficou saturado, apesar de o uso de máscara continuar a ser usual ou mesmo obrigatório em vários países, face ao ressurgimento da epidemia nas últimas semanas.
“Há muitos pequenos produtores não qualificados e isso levou à queda dos preços”, explicou o analista Wilfred Yuen, do banco de investimento BOCI, de Hong Kong, citado pela agência France-Presse.
Como resultado, várias fábricas encerraram e trabalhadores ficaram com salários por receber, levando a protestos, segundo o China Labour Bulletin, uma revista que reporta sobre a sociedade civil do país.
O gestor de vendas de uma empresa de produtos médicos com sede em Hebei, perto de Pequim, disse vender agora as suas máscaras com prejuízo, com um preço de venda “de cerca de 0,4 yuans, contra 1,7 yuans, no auge da epidemia”.
A matéria-prima comprada no auge da epidemia custou então “30 vezes mais” do que agora.

Em risco

A consultora Daxue Consulting observou que a corrida ao fabrico de máscaras “levou a uma queda geral da qualidade e a um aumento nas fraudes”.
Depois de várias reclamações sobre a suposta qualidade da produção chinesa, Pequim apertou drasticamente os critérios de exportação, em Abril. Os fabricantes são agora obrigados a apresentar uma certificação do país de destino.
A situação acabou por afectar vários importadores, incluindo empresas portuguesas, que após terem pago à cabeça encomendas de máscaras ficaram com o equipamento retido nas alfândegas chinesas e não conseguiram, até à data, reaver o dinheiro, segundo empresários contactados pela agência Lusa.
Os países europeus, entretanto, começaram também a produzir as suas próprias máscaras, usando máquinas compradas na China, segundo Yang Hao.
A América Latina, região do mundo com maior número de casos, é hoje o principal cliente da empresa, a par dos Estados Unidos.
No entanto, as exportações para os EUA são feitas “por meio de um terceiro país”, devido às tensões comerciais com Washington, explicou Yang.
O jornal em língua inglesa Global Times estimou recentemente que 95 por cento dos fabricantes chineses podem fechar até ao final do ano.

Actor Alberto Villar morre aos 87 anos

[dropcap]O[/dropcap] actor Alberto Villar, morreu sábado aos 87 anos, em Lisboa, onde estava hospitalizado, confirmou à Lusa fonte familiar.
Nascido em 1933, Villar estreou-se como amador no Grupo Miguel Joaquim Leitão, em Leiria, e, como profissional, em 1959, na companhia itinerante de Rafael de Oliveira, onde se manteve até 1961, e com a qual percorreu o país em sucessivas digressões.
A sua carreira foi marcada por várias digressões, tanto em Portugal como no estrangeiro, nas distintas companhias a que pertenceu, nomeadamente na de Amélia Rey Colaço/Robles Monteiro, Metrul, onde foi também encenador, na de Francisco Ribeiro, ou no Teatro de Todos os Tempos e na Companhia Independente de Teatro e no Teatro Experimental de Cascais (TEC).
No Teatro Nacional D. Maria II, desde a sua reabertura, em 1978, participou em várias peças, designadamente, “Auto da Geração Humana”, “O Judeu”, “Pedro, o Cru”, “Auto de Santo António”, “As Fúrias”, “Ricardo II”, “Felizmente Há Luar”, “As Alegres Comadres de Windsor” ou “Os Filhos do Sol”. A sua carreira de mais de 50 anos está muito associada ao D. Maria II, onde esteve em cena quando se deu o incêndio no edifício, em 1968.
“Foi um dia muito triste”, recordou, numa entrevista à agência Lusa, referindo “a força e o ânimo da Sra. D.ª Amélia [Rey-Colaço] para [continuar] como companhia, noutro teatro”.

Lápis azul

Estrearam em seguida, no então Teatro Avenida, em Lisboa, “A Invasão”, de Miguel Franco, em que fez parte do elenco. A peça “saiu de cena pouco depois da estreia, proibida pela Censura, após uma ida ao teatro do almirante Américo Thomaz”, então Presidente da República.
“Ficámos todos arrasados, mas seguimos em frente pois a companhia dependia da bilheteira, já que era muito curto o apoio do Estado”, afirmou.
Não foi a primeira vez que Villar sentiu a repressão da Censura. Em 1973 fez parte do elenco da peça “Fonte de Ovejuna”, de Lope de Vega, segundo versão de Natália Correia, pelo TEC, numa encenação de Carlos Avilez.
“A estratégia era apresentar a peça em Espanha e, confiando numa boa apresentação e recolher boas críticas, como aconteceu, e apresentá-la depois em Portugal, contornando a Censura Prévia”.
A peça em que no final as actrizes despiam as blusas e de peito nu se dirigiam à plateia foi apresentada em Portugal, mas com advertência das autoridades de “apenas o ser no concelho de Cascais”, contou numa entrevista à agência Lusa.
Uma das últimas vezes que surgiu em palco foi em 2015, no Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa, na peça “Cyrano de Bergerac”, de Edmond de Rostand, que João Mota encenou.
Alberto Villar era o nome artístico de José Alberto do Espírito Santo, nascido em Leiria a 2 de Novembro de 1933.
Alberto Villar contracenou, entre outros, com os actores Raul Solnado, Camilo de Oliveira, Eunice Muñoz, Catarina Avelar, Guida Maria, Rita Ribeiro e Alina Vaz, com quem codirigiu o projecto “Viagens ao Teatro”, que esteve em cena, em Lisboa, durante 25 anos.

Terminadas pinturas em dois murais na Rua de 5 de Outubro

[dropcap]O[/dropcap]O “Plano das Lojas com Características Próprias” foi lançado no início do mês passado, e a primeira fase teve como foco a Rua de 5 de Outubro, comunicou a Direcção dos Serviços de Economia (DSE). Houve 41 lojas com características reconhecidas, cumprindo os requisitos de terem produtos característicos ou serviços de alta qualidade, elementos culturais e sucessão de técnicas, reconhecimento social, estilo inovador e boa reputação.

O objectivo da DSE passa por remodelar as imagens distintivas de diferentes zonas e criar pontos populares para mostrar as histórias e cultura locais de Macau através de murais de pintura. Foram concluídos os trabalhos dois murais, e vão começar “em breve” os trabalhos da terceira pintura, esperando o Governo que a iniciativa promova o fluxo de pessoas que visita essas zonas.

“As lojas participantes concordam, em geral, que o plano pode produzir efeitos da marca e desempenhar um papel activo na promoção e divulgação (…) para encontrar novas oportunidades de negócios quando os turistas voltarem a Macau após a epidemia”, pode ler-se na nota.

A Rua de 5 de Outubro é descrita pela DSE como uma zona “rica em história” e com “grande concentração de lojas e restaurantes característicos”. As primeiras lojas receberam apoio da DSE para entrar na plataforma de consumo Meituan Dianping, do Interior da China, para que os turistas tenham informações sobre os seus negócios.

“Com o desenvolvimento social e o avanço da informação tecnológica, as PME devem procurar mudança pela inovação, especialmente havendo um grande espaço para a exploração de marcas, elevação do valor acrescentado de serviços e produtos, desenvolvimento científico, tecnologia e as aplicações on-line”, defendeu a DSE.

O organismo criou um projecto para as lojas características, com instrutores de consultoria a dar orientações às empresas, em conjunto com o Centro de Produtividade e Transferência de Tecnologia de Macau. Estão ainda planeados workshops nas áreas de vendas online, serviço de qualidade e venda, aplicação técnica e gestão de riscos e de operações.

FRC | Conferências abordam facetas de Eça de Queiroz, da diplomacia à ópera

O 120.º aniversário da morte do escritor Eça de Queiroz vai ser assinalado em Agosto e Setembro na Fundação Rui Cunha, num ciclo de conferências que aborda o autor português em três facetas, da diplomacia à ópera. O programa é organizado em parceria com a Associação dos Amigos do Livro em Macau e o Instituto Português do Oriente

 

[dropcap]O[/dropcap] programa comemorativo dos 120 anos da morte de Eça de Queiroz, organizado pela Fundação Rui Cunha, a Associação dos Amigos do Livro em Macau e o IPOR – Instituto Português do Oriente, arranca em 13 de Agosto, quinta-feira, às 18h30, no auditório Stanley Ho, com uma conferência sobre a carreira diplomática do escritor, apresentada por Carlos Frota, primeiro cônsul-geral de Portugal no território.

Uma das questões mais pertinentes sobre a carreira diplomática de José Maria de Eça de Queiroz é saber quanto prevalecia o olho de jornalista e de romancista cáustico na defesa dos interesses de Portugal.
O autor que ficaria para a história como um dos nomes maiores do realismo literário português, ingressou na carreira diplomática em 1873 com a nomeação para cônsul de Portugal em Havana. Durante o auge da produção literária, desempenhou funções consulares em Newcastle e Bristol, em Inglaterra, seguindo-se Paris como destino profissional, em 1888.

Conversa com música

A 20 de Agosto, também às 18h30, é a vez de a professora Ana Paula Dias apresentar “Eça na ópera”, na Fundação Rui Cunha, a propósito das referências à música clássica e árias líricas nos seus romances.
A sessão, que vai incluir alguns trechos musicais alusivos à obra de Eça, falecido em 16 de Agosto de 1900, integra-se nas “Conversas Ilustradas com Música”, produzidas pelo escritor Shee Vá na Fundação Rui Cunha, cujo ciclo actual tem como tema “A ópera na literatura – Ouvir com os olhos”.

A fechar o programa, no dia 1 de Setembro, também na Fundação Rui Cunha, o mote é a internacionalização, tradução e adaptação da obra do escritor, com a exibição do filme mexicano “O Crime do Padre Amaro”, do realizador Carlos Carrera, com Gael Garcia Bernal, Ana Claudia Talacon e Sancho Garcia.
A controversa adaptação do romance homónimo de Eça foi nomeada para o Óscar de melhor filme estrangeiro em 2002.

A sessão é precedida de uma conferência pela professora Dora Nunes Gago.
Todas as sessões serão em português e a entrada é livre, mas sujeita a limite, em virtude do cumprimento das medidas sanitárias regulamentares em vigor.

Imigrante ilegal do Interior permaneceu mais de dois anos em Macau

[dropcap]U[/dropcap]m homem que tinha sido proibido de entrar em Macau conseguiu estar durante dois anos da RAEM em excesso de permanência, sem que as autoridades se tivessem apercebido da situação. O caso foi revelado pelo Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) na sexta-feira, depois de o indivíduo ter sido apanhado durante uma operação de trânsito.

O imigrante ilegal, natural do Interior, foi deportado e proibido de entrar em Macau em 2014, uma vez que já na altura tinha ficado em excesso de permanência, ou seja sem um visto válido. No mesmo período teve ainda tempo de cometer um roubo.

No entanto, em 2018 a proibição de entrada expirou e o homem utilizou o seu passaporte do Interior para voltar a entrar em Macau, de forma legal. A partir desse dia 6 de Agosto de 2018, o sujeito foi permanecendo durante dois anos, sem autorização e sem que as autoridades tivessem detectado a situação.
Durante esse período, o indivíduo de 30 anos arranjou um passaporte falso da Coreia e mesmo em tempo da pandemia da Covid-19 foi falsificando imagens dos códigos de saúde, para poder circular pelo território e permanecer nos hotéis.

Foi só quase ao fim de dois anos, numa operação de trânsito, na madrugada de quarta-feira, que a polícia se apercebeu da permanência excessiva. Quando mandaram parar um táxi, os agentes abordaram o imigrante ilegal e pediram que apresentasse um documento de identificação. A pessoa apenas mostrou uma imagem do telemóvel, com um passaporte da Coreia, que disse ter deixado no quarto de hotel.
Com a imagem do passaporte, as autoridades procuraram no registo de entradas o número do documento e verificaram que não havia qualquer registo de entrada.

Um homem, duas histórias

Confrontado com este facto, o sujeito alterou a versão dos acontecimentos disse ter entrado com um documento de Hong Kong, o que levou as autoridades a desconfiar de toda a situação.
Após uma investigação, foi descoberto que o detido era mesmo do Interior e que tinha entrado de forma legal em Macau. Contudo, permaneceu além do tempo a que estava autorizado, frequentando hotéis e casinos na RAEM.

Numa operação de buscas ao quarto do hotel onde o sujeito estava alojado, as autoridades acabaram mesmo por encontrar o passaporte falsificado e 57 imagens do código de saúde de Macau e de Cantão falsificadas, com o objectivo de permitir a entrada nos casinos.

As autoridades questionaram igualmente a mulher do hotel onde o homem se encontrava sobre o facto de não ter detectado a situação, mas esta afirmou que tinha aceitado o registo, sem prestar atenção à falsificação das imagens do código de saúde.

Herança | Pansy Ho quer ser informada de movimentações testamentárias

Depois de Deborah Ho e Michael Hotung, foi a vez de Pansy Ho interpor um pedido junto do Registo de Sucessões sobre a propriedade do seu pai. O objectivo é impedir a distribuição de herança sem que os seus advogados sejam previamente informados

 

[dropcap]P[/dropcap]ansy Ho juntou-se à disputa legal pela propriedade do seu pai, noticiou o South China Morning Post na sexta-feira. A filha mais velha da segunda esposa de Ho avançou com um pedido no Registo de Sucessões (Probate Registry, em inglês) em Hong Kong a exigir que os seus advogados na Baker & McKenzie sejam informados de movimentações relacionadas com o testamento do pai.

É a terceira pessoa da família, depois de Deborah Ho e Michael Hotung, a pedir para ser informada com antecedência sobre movimentos de concessão da herança desde a morte de Stanley Ho, a 26 de Maio, quando o magnata contava 98 anos. O multimilionário deixou 16 filhos de quatro mulheres. De acordo com a solicitação, os executantes do testamento não devem distribuir os bens sem antes informarem os representantes legais de Pansy Ho.

A Forbes avalia a fortuna de Pansy Ho com um valor de 3,7 mil milhões de dólares americanos, e aparece em 23º lugar na lista das 50 pessoas mais ricas de Hong Kong de 2020. Em Março de 2019, a sua fortuna valia 4,6 mil milhões. Pansy Ho lidera a Shun Tak Holdings, que foi fundada pelo pai, e também detém participações na operadora de jogo MGM China e na SJM.

Iniciativas prévias

Vale a pena lembrar que apenas onze dias depois da morte de Stanley Ho, deu entrada no Registo de Sucessão um pedido de Deborah Ho para os seus advogados serem informados das movimentações associadas ao testamento do pai. Foi a primeira movimentação pública sobre o testamento. Já em 2011, divergências no controlo dos bens de Stanley Ho motivaram uma batalha jurídica entre membros da família.

Uma semana depois, era a vez de um sobrinho de Stanley Ho avançar com uma acção legal para registar o seu interesse no património do magnata. Michael Hotung fez um pedido no Registo de Sucessões para os seus advogados serem avisados antes da distribuição da fortuna. Já no ano passado tinha interposto um processo contra Stanley Ho a exigir dois mil milhões de dólares de Hong Kong relativos ao pagamento de dividendos sobre acções que não tinham sido pagas da STDM, em nome da sua mãe, Winnie Ho, que faleceu em 2018.

SS | Lei Chin Ion rejeita discriminação a pessoal do privado

[dropcap]O[/dropcap] director dos Serviços de Saúde (SS), Lei Chin Ion, disse que o Governo dá oportunidades de formação a licenciados em medicina e médicos no público e no privado “com uma atitude não discriminatória”. A afirmação foi feita em resposta a uma interpelação escrita de Chan Iek Lap.

O deputado indicou que as despesas com os serviços de saúde aumentaram de 1,1 mil milhões no início da transferência de soberania para oito mil milhões nos últimos anos e reconheceu o investimento na formação. No entanto, apontou que o sector privado não tem o mesmo acesso aos seminários e cursos organizados para a classe profissional. Defendeu assim a criação de uma instituição para a formação contínua ao nível dos cuidados de saúde primários para os profissionais do privado terem “oportunidades de aprendizagem iguais” às dos trabalhadores do sector público.

Lei Chin Ion defendeu que os profissionais de saúde devem assumir as suas próprias responsabilidades, nomeadamente ao manterem os seus conhecimentos e competências médicas actualizados. “Com base na experiência obtida, mesmo que o Governo da RAEM invista recursos na organização de cursos relevantes, como cursos na área da medicina familiar (…), os resultados previstos, nomeadamente a inscrição por parte dos profissionais de saúde e o desempenho académico não foram satisfatórios”, declarou.

Dívidas com cartões de crédito subiram 10 milhões de patacas num ano

[dropcap]O[/dropcap] valor das dívidas atrasadas relacionadas com cartões de crédito aumentou 23,9 por cento no segundo trimestre do ano, de acordo com as estatísticas publicadas pela Autoridade Monetária de Macau, na sexta-feira. Segundo os dados revelados, o montante em dívida há mais de três meses é agora de 54,9 milhões de patacas, quando no mesmo período do ano passado estava situado em 44,3 milhões de patacas, o que representa um aumento de 10,6 milhões de patacas.
Entre o montante de 54,9 milhões de patacas, 15,2 milhões de patacas têm um atraso entre três a seis meses. Também neste capítulo, houve um aumento do montante face ao período homólogo, de 14,2 por cento, uma vez em 2019 as dívidas com um atraso de três a seis meses eram de 13,3 milhões de patacas.
Ao mesmo tempo que há cada vez mais pessoas a atrasar o pagamento dos créditos dos cartões houve igualmente uma maior contenção no recurso a este instrumento de financiamento. Entre Abril e Junho, o montante de crédito usado foi de 4,6 mil milhões de patacas, uma quebra anual de 20,8 por cento, uma vez que para o mesmo período do ano passado o crédito pedido tinha atingido 5,8 mil milhões de patacas.

Mais em circulação

Os números publicados na sexta-feira mostram igualmente a continuação da tendência de emissão de novos cartões de créditos. No segundo trimestre estavam em circulação 1,46 milhões de cartões de crédito na RAEM, o que significa um aumento de 7,1 por cento face ao período homólogo.
No ano passado por altura do segundo trimestre estavam em circulação1,36 milhões, o que quer dizer que no espaço de um ano houve um crescimento de 100 mil cartões.
Entre os cartões em circulação, a maior parte é denominada em patacas, com 1,02 milhões, seguida pelos cartões em renminbis, que são 345,7 mil, tendo havido um aumento de cerca de 5 mil cartões face ao ano passado. Finalmente, os cartões em dólares de Hong Kong são 96,4 mil.
Quando somado todo o limite de crédito dos cartões em circulação o valor é de 41,4 mil milhões de patacas, um aumento de 8,7 face ao período homólogo.

Metro Ligeiro | Ella Lei quer aposta na formação de técnicos locais

Deputada quer a que sociedade gestora do Metro Ligeiro crie equipas técnicas locais para que Macau se torne independente ao nível da operação, gestão e manutenção e que assegure o trabalho dos residentes. Uma carruagem vazia avariou na sexta-feira entre as estações do Estádio e Pai Kok, afectando 100 passageiros que viajavam noutra unidade

 

[dropcap]E[/dropcap]lla Lei quer que a sociedade responsável pela gestão do Metro Ligeiro de Macau dê prioridade à formação de técnicos locais, com o objectivo de garantir a independência e estabilidade da prestação de serviços ao longo do tempo, e oferecer mais oportunidades para os trabalhadores do território.
Argumentando que o Metro Ligeiro é o primeiro projecto de transporte ferroviário de Macau e que a MTR (Macau) “ainda não tem responsabilidades na área da operação, gestão e manutenção”, pois depende do apoio da empresa de metro de Hong Kong, Ella Lei considera que a Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL) deve exigir que a empresa invista na formação de trabalhadores locais.

“Mesmo que seja necessário introduzir trabalhadores estrangeiros no início da exploração, devem ser criadas condições para garantir que os locais tenham prioridade no acesso ao emprego, proporcionando mais oportunidades de mobilidade horizontal e vertical”, pode ler-se numa interpelação divulgada no sábado.

Por escrito, e sublinhando que os trabalhadores não residentes (TNR) podem optar por sair do território ou ser impedidos de ficar, em qualquer momento devido às políticas de emprego, a deputada quer saber quantos TNR foram contratados pela MTR de Hong Kong e Macau para dar resposta às exigências da operação e quais são as suas categorias de trabalho.
Quanto à aposta na formação, Ella Lei pediu esclarecimentos em relação às intenções da MTR (Macau) para os próximos anos.

“O que está a ser feito pelo Governo e pela MTR (Macau) relativamente à formação de técnicos especializados em falta, nos sectores da operação e manutenção do Metro Ligeiro? Quais as metas para a formação e inclusão de pessoal local?”, questionou Ella Lei.

Acidente fantasma

Uma carruagem do Metro Ligeiro avariou na passada sexta-feira, por volta das 21h, deixando o comboio parado entre as estações do Estádio e Pai Kok. Não havia qualquer passageiro a bordo da composição.
O incidente foi confirmado no dia seguinte através de uma nota divulgada pela Sociedade de Metro Ligeiro de Macau, dando conta que cerca de uma centena de passageiros que viajavam no comboio seguinte foram afectados.

“Por volta das 21h11 do dia 7, devido a avaria, uma unidade de composições da Estação do Estádio para a Estação de Pai Kok ficou parada. Tendo em conta a reactivação sem sucesso, a mesma unidade permaneceu na Estação do Cotai Oeste, pelo que cerca de 100 passageiros na unidade seguinte necessitaram de viajar noutra [carruagem]”, pode ler-se no comunicado.

Segundo a MTR, após a avaria, “foi implementada temporariamente a circulação de dois sentidos num carril único entre as Estações do Oceano e do Posto Fronteiriço de Lótus, com frequência de 18 a 24 minutos”.
As causas da avaria estão ainda por apurar, estando a ser feita uma “inspecção detalhada” à carruagem em causa.

DSAJ | Centros de arbitragem adaptados à nova lei

[dropcap]O[/dropcap]s regulamentos internos e as estruturas dos centros de arbitragem foram ajustados depois da entrada em vigor da nova lei da arbitragem e do regime de criação das instituições, indica um comunicado da Direcção dos Serviços de Assuntos de Justiça (DSAJ). Estes foram os tópicos que marcaram a reunião na semana passada entre a DSAJ e os centros de arbitragem locais.
A nota explica que o presidente do Centro de Arbitragem do WTC de Macau, Tsui Wai Kwan, e o presidente da Associação dos Advogados de Macau, Jorge Neto Valente, indicaram que os trabalhos para adaptar os centros à exigência de internacionalização do sector já foram concluídos.
Tsui Wai Kwan mencionou a necessidade de reforçar a formação de árbitros locais e convidar árbitros de renome do exterior, para “aumentar a credibilidade e o reconhecimento quanto às instituições de arbitragem”. Por seu lado, Jorge Neto Valente apontou a necessidade de divulgação das vantagens do regime na nova lei, de forma a atrair as partes litigantes de diferentes países e regiões, nomeadamente dos países de língua portuguesa e da Grande Baía. O director da DSAJ, Liu Dexue, quer que os centros criem uma estratégia de desenvolvimento para atrair mais partes litigantes.
De acordo com uma reposta de Li Dexue a uma interpelação escrita, o Centro de Arbitragem de Conflitos de Consumo de Macau instaurou um total de 635 casos de arbitragem desde a sua criação. Já o Centro de Arbitragens Voluntárias da Associação dos Advogados de Macau e o Centro de Arbitragem do Centro de Comércio Mundial de Macau, tiveram dois e quatro casos arbitrais, respectivamente.

Ambiente | Sulu Sou quer mais restrições a plásticos descartáveis

[dropcap]A[/dropcap] cobrança de taxa de sacos de plástico foi criada “tarde”, mas tratou-se de “um primeiro passo crítico” para a política do poluidor-pagador. A ideia foi defendida por Sulu Sou numa interpelação escrita ao Governo. O deputado considera que a consciência da sociedade para a redução de plástico continua a aumentar e que muitas pessoas esperam que o Executivo tome o próximo passo “de forma mais decisiva”, no sentido de legislar restrições ao uso dos outros plásticos descartáveis.
“Apesar de o plástico ser apenas um tipo de resíduo sólido, o seu tempo de decomposição natural é superior a mil anos e a taxa de reciclagem é extremamente baixa. Depois de ser processado por um incinerador de lixo, liberta gases altamente tóxicos, causando séria poluição ambiental”, descreveu o deputado.
Observando que já se passou mais de um ano desde a implementação da taxa sobre os sacos de plástico, questionou que ferramentas vão ser usadas para avaliar a situação e a efectividade da redução dos sacos. Sulu Sou também quer saber se há algum objectivo faseado de redução deste tipo de resíduos.
Para além disso, o deputado pediu pormenores sobre a calendarização da promessa da Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental em banir caixas de comida de esferovite em 2021. Nomeadamente sobre as fases de investigação, consulta e legislação até à adopção da medida. Outra das dúvidas que coloca é se vai simultaneamente ser restringido o uso de outros produtos de plásticos descartáveis ou de esferovite, e se vai ser encorajada o recurso a produtos biodegradáveis.

Segurança Interna | Wong Sio Chak assume comando de resposta a crises

Na sexta-feira foram apresentadas alterações legislativas que visam harmonizar a lei de Segurança Interna com a Lei de Protecção Civil. O mecanismo conjunto de resposta a crises de segurança interna passa a ser assumido por Wong Sio Chak

 

[dropcap]O[/dropcap] secretário para a Segurança, Wong Sio Chak, vai assumir as funções de responsável pelo comando conjunto de resposta a crises de segurança interna. A proposta à alteração da Lei de Bases da Segurança Interna foi discutida no Conselho Executivo e apresentada na sexta-feira. O próximo passo será o envio para a Assembleia Legislativa para ser votada.
“Neste momento, o comandante-geral dos Serviços de Polícia Unitários é o responsável pelo comando conjunto de respostas a crises internas. Com as alterações propostas esta responsabilidade passa para o secretário para a Segurança”, afirmou André Cheong, secretário para a Administração e Justiça e porta-voz do Conselho Executivo.
O comando conjunto é um mecanismo que agrega as corporações e serviços de segurança e tem como objectivo responder a eventuais ameaças à segurança interna. A alteração da figura no topo da estrutura pretende harmonizar o diploma sobre a segurança interna com o recém-aprovado Regime Jurídico de Protecção Civil, que também tem um mecanismo de acção conjunta, onde já está definido que o secretário para a Segurança é o responsável máximo.
“Não há alterações nas competências dos diferentes serviços. Queremos conjugar esta lei [da Segurança Interna] com o modelo aplicado para a Protecção Civil, que já foi apreciada e aprovada pela Assembleia Legislativa”, explicou o porta-voz.
A favor da mudança, André Cheong argumentou também que as alterações irão permitir delegar mais facilmente as diferentes competências do mecanismo de resposta.
Outra alteração na proposta de lei é o fim da separação entre “corporações”, como os Bombeiros e a PSP, e “serviços de segurança”, como é o caso da Polícia Judiciária ou a Autoridade de Aviação Civil. Na nova proposta, todas estas entidades passam a ser consideradas “organismos públicos que compõem o sistema de segurança interna”.

Regulamento de habitação

Além das alterações à lei da segurança interna, o Conselho Executivo discutiu também o regulamento administrativo que vai definir os procedimentos para a o regime de candidatura, atribuição e arrendamento de habitações sociais.
Este regulamento vai entrar em vigor a 20 de Agosto com a nova Lei de Habitação Social que foi aprovada no ano passado e altera as condições de acesso. Por exemplo, os contratos de arrendamento passam a ser de cinco anos.
No entanto, antes das novas regras serem aplicadas, o presidente do Instituto de Habitação, Arnaldo Santos, explicou que há 2.600 famílias à espera de vaga neste tipo de casas e que vão ser tratadas de acordo com os procedimentos antigos.
Segundo os dados apresentados pelo IH, nesta altura, há cerca de 12 mil famílias em habitações sociais, 90 por cento das quais não paga qualquer tipo de renda. No que diz respeito a estas 12 mil famílias, 900 agregados auferem rendimento superior ao limite, o que faz com que tenham de pagar rendas.

Fronteiras | Vagas diárias de testes à covid-19 sobem para 23 mil

[dropcap]F[/dropcap]oi alargado de 16.000 para 23.000 o número de vagas diárias para realizar testes de ácido nucleico, obrigatórios para quem quer cruzar as fronteiras rumo a Guangdong. O anúncio foi feito na sexta-feira por Alvis Lo Iek Long, médico adjunto do Centro Hospitalar Conde de São Januário, por ocasião da conferência de imprensa de actualização do novo tipo de coronavírus.
Apontando que 23 mil exames representam uma capacidade para testar diariamente 3,4 por cento da população total de Macau, o responsável apontou que o acréscimo foi possível “através do aumento de equipamentos, reagentes e formação ao pessoal competente pela recolha de amostras”.
Alvis Lo referiu ainda que em Macau já foram testadas voluntariamente, e de forma gratuita, 300 mil pessoas, lembrando que o 1º teste de ácido nucleico é gratuito, tanto para residentes de Macau, como para trabalhadores não residentes. Depois disso, a realização do teste à covid-19 está sujeita a uma taxa que, a partir de quarta-feira, será reduzida de 180 para 120 patacas.
Recorde-se que para usufruir da isenção de quarentena à entrada de Guangdong, é obrigatório apresentar, na fronteira, o código de saúde e um resultado negativo ao teste de ácido nucleico efectuado nos últimos sete dias.

Covid-19 | Eva Air vai realizar cinco voos para a Europa

Os voos da Eva Air vão ter como destino Londres e Paris, com escala em Taipé. As ligações não são exclusivas para alunos e quem tiver como destino Portugal vai ter de encontrar outros voos na Europa

 

[dropcap]A[/dropcap] Eva Air vai organizar cinco voos nos próximos dois meses para a Europa, Londres e Paris, com escala em Taipé. A informação foi avançada pela representante dos Serviços de Turismo, Lau Fong Chi, durante a conferência de imprensa do Governo sobre a pandemia da covid-19.

As datas para os voos com destino a Londres, previstas para os dias 26 de Agosto, 9 e 23 de Setembro, têm como objectivo oferecer uma alternativa aos estudantes universitários que precisam de viajar para a Europa. “É um serviço disponibilizado pela companhia Eva Air. Sabemos que muitos estudantes têm de ir para a Europa, por isso contamos com a ajuda do sector turístico e da companhia aérea”, afirmou Lau. “Este serviço é a pensar nos estudantes de Macau, mas outras pessoas também podem utilizar. Para tal, têm de entrar em contacto com a companhia”, acrescentou.

Além desta ligação, estão também previstos voos para Paris, com as datas de 28 de Agosto e 4 de Setembro, igualmente com escala em Taipé.
Quem quiser viajar para Portugal precisa encontrar um outro voo que faça as ligações entre Londres ou Paris e um aeroporto português.
A representante dos Serviços de Turismo disse ainda que também a Air Macau oferece voos para a Europa, mas com ligações em Seul. Porém, quanto aos pormenores das ligações, a DST aconselho os interessados a contactar a companhia.

Teste gratuitos em análise

Na sexta-feira, Alvis Lo, médico-adjunto do Hospital Conde São Januário, foi ainda questionado sobre a hipótese de Macau seguir o exemplo de Hong Kong e fazer testes gratuitos à população. “Temos de ver o futuro. Mas, o teste já é gratuito para as pessoas que precisam mesmo de o fazer. Para os que optam por fazer porque querem passar as fronteiras, em princípio acreditamos que devem pagar o preço. Nem sequer os trabalhadores não-residentes pagaram o primeiro teste”, respondeu Alvis Lo, sobre a hipótese.

Por outro lado, o representante do Governo sublinhou o esforço feito para reduzir o preço do teste, que na semana passada foi alterado de 180 patacas para 120 patacas. “Temos a esperança de conseguir sempre um preço dos testes mais baixo para os cidadãos. Só que temos de considerar vários factores, porque não podemos tomar decisões sozinhos, também há custos para os comerciantes e temos de negociar com eles”, argumentou.

Em relação ao número de testados, foi anunciado que cerca de 800 vendedores de peixe foram submetidos à triagem. As autoridades preparam-se agora para fazer com que todos os condutores de autocarros sejam igualmente testados.

Turismo | Macau adere à Organização das Cidades do Património Mundial

Macau aderiu na sexta-feira à Organização das Cidades do Património Mundial, por ser um “símbolo de unidade e exemplo de fusão e coexistência da cultura oriental e ocidental”. Em ano de pandemia, especialistas comentam as diferenças entre Macau e Veneza em termos de riscos para o património

[dropcap]S[/dropcap]egundo o comunicado do Governo de Macau, foi realizada na sexta-feira a “Cerimónia de Afiliação da Região Administrativa Especial de Macau na Organização das Cidades do Património Mundial (OWHC)” através de videoconferência.
Durante a cerimónia, o presidente da OWHC e também presidente da Câmara de Cracóvia, Polónia, Jacek Majchrowski afirmou que “Macau é um raro exemplo de um lugar aonde ao longo dos séculos, houve uma convergência estética, cultural, de arquitectura e de diferentes técnicas do Oriente e do Ocidente”, segundo o comunicado.
Por essa razão, apontou a mesma nota, Jacek Majchrowski, “expressou estar muito feliz por poder dar as boas-vindas a Macau nesta sua adesão à OWHC, como símbolo de unidade e exemplo de fusão e coexistência da cultura oriental e ocidental”.
Segundo o Governo, esta adesão “facilitará a obtenção de informações internacionais sobre preservação do Património Mundial e a participação de Macau em eventos relevantes, aprendendo a experiência de outros locais no que diz respeito à preservação de propriedades do património mundial, potenciando assim ainda mais a reputação internacional de Macau como cidade Património Mundial”.
Macau foi representando pela secretária para os Assuntos Sociais e Cultura, Ao Ieong U.
O território tornou-se na terceira cidade chinesa a aderir à organização, depois de Suzhou e Dujiangyan.
A Organização das Cidades Património Mundial foi fundada a 8 de Setembro de 1993 em Fez, Marrocos. É composta por mais de 300 cidades nas quais estão localizados sítios incluídos na Lista do Património Mundial da UNESCO.
O centro histórico de Macau foi inscrito na lista do Património da Humanidade da UNESCO em 15 de Julho de 2005, tendo sido designado como o 31.º local do Património Mundial da China. A classificação integra vários edifícios históricos construídos pelos portugueses, incluindo o edifício e largo do Leal Senado, a Santa Casa da Misericórdia, as igrejas da Sé, de São Lourenço, de Santo António, de Santo Agostinho, de São Domingos, as Ruínas de São Paulo e Largo da Companhia de Jesus ou o Farol da Guia.

Cidade suspensa

A pandemia suspendeu a pressão turística em Macau, que em 2019 recebeu o dobro dos visitantes de Veneza, mas especialistas apontam diferenças entre as duas cidades, ambas património mundial da UNESCO, a começar pelos riscos para o património.
No ano passado, Macau foi visitada por perto de 40 milhões de turistas, numa área com 30 quilómetros quadrados – mais que Paris (38 milhões), Veneza (20) ou Portugal (27 milhões), depois de o país se tornar um destino popular.
Em Macau, antes da crise sanitária, a cada segundo entravam, em média, 1,2 turistas – mais de 70 por minuto, 4.500 a cada hora, cerca de 109 mil por dia.
O cartoonista Rodrigo de Matos, que colabora com o jornal Ponto Final e o semanário Expresso, ilustrou as enchentes num ‘cartoon’ de 2017: uma lata de sardinhas com a marca “Macau”. “Antes da covid era o dia a dia, principalmente no centro da cidade: havia zonas em que era praticamente impossível uma pessoa andar, fazia lembrar uma discoteca”, recorda.
A viver no território desde 2009, o cartoonista nunca tinha visto “a cidade tão vazia”, tirando durante “o ocasional tufão”, e acredita que “melhorou a qualidade de vida” dos residentes. “Aproveitamos para ver algumas partes da cidade a que normalmente não vamos, devido à enchente de pessoas. Para quem não conhecia o centro histórico, é a altura ideal”.
Quem por estes dias passeia no território encontra uma cidade vazia, do centro histórico deixado pelos portugueses aos mais de 40 casinos. No Venetian Macau só os funcionários vestidos de ‘gondolieri’ evocam a presença humana, à excepção do ocasional visitante.
O presidente do Conselho Internacional de Arquitectos de Língua Portuguesa (CIALP), Rui Leão, que chegou ao território no final dos anos 1970, critica a enorme transformação da cidade desde a liberalização do jogo, em 2002. “Nos últimos anos estamos submetidos a um excesso [de turistas] que é verdadeiramente aflitivo”, com consequências “em tudo”: “deixa de se ter cafés ou mercearias de bairro” no centro histórico, exemplifica.
As queixas são as mesmas de Veneza ou Barcelona, e, mais recentemente, Lisboa: gentrificação, aumento do preço do imobiliário, poluição, degradação dos monumentos.
Mas se Macau sofre de igual pressão turística, “a situação é diferente”, defende Leão. “O turista que vai a Veneza ou a Lisboa vai lá por causa do património, da arquitectura, da cidade em si”, enquanto em Macau “as pessoas vêm pelos casinos”, explica. Por essa razão, “em Veneza e Lisboa o património está salvaguardado, porque é muito claro que sem aquele património não há turismo. Em Macau, não há essa consciência: o património pode desaparecer, e tem desaparecido”, lamenta.

Brilhantina e decadência

Do alto da escadaria das ruínas de São Paulo, vê-se o Grand Lisboa, a joia da coroa do antigo magnata Stanley Ho, num território em que os casinos rivalizam com o património autêntico deixado pelos portugueses.
“Temos o Venetian, que é a imitação de Veneza, o Parisian, com a imitação da torre Eiffel, e vamos ter o Londoner”, aponta a arquitecta Maria José de Freitas, a viver em Macau desde 1997, dois anos antes da transferência para a China.
Para a doutoranda em patrimónios de influência portuguesa, é esta “espécie de Disneylândia” que atrai “os milhares de turistas da China que procuram uma atmosfera europeia”, com as visitas ao centro histórico a não passarem de um apontamento. “Eles passam pelas ruínas de São Paulo para tirar uma fotografia e dizer ‘estive aqui’, não têm tempo sequer para ler as placas”, critica.
A visita deixa, apesar disso, marcas no centro histórico, inscrito como Património da Humanidade em 15 de Julho de 2005. “As ruínas de São Paulo estão constantemente a ser percorridas por turistas, e os autocarros e a poluição, e todo o tráfego rodoviário na zona, são extremamente prejudiciais”, sublinha.
A arquitecta aponta que continua sem haver um plano de protecção do legado português em Macau, previsto na lei de salvaguarda do património de 2013, aprovada oito anos após a inscrição na Unesco.
Sem balizas legais, o património deixado pelos portugueses viu-se rapidamente cercado pela pressão imobiliária, com o Governo a autorizar a construção de casinos na península e edifícios a despontar em torno da área protegida.

Terra à vista

A polémica mais recente envolve o Farol da Guia, o primeiro farol na costa sudeste da Ásia, ameaçado pelos planos de construir um edifício de 90 metros. O caso levou a Associação Novo Macau a apresentar queixa ao Comissariado contra a Corrupção, em 23 de Julho, um mês depois de o Grupo para a Salvaguarda do Farol da Guia se ter queixado à UNESCO.
Em 2017, o Comité do Património Mundial da UNESCO criticou o Governo pelo “possível impacto de empreendimentos de grande altura nas paisagens do Farol da Guia e da Colina da Penha”, alertando que a falta do plano de salvaguarda do património pode pôr em perigo o seu estatuto.
Para Rui Leão, a degradação não parece fácil de inverter, quando 80 por cento do PIB de Macau vem das receitas do jogo, o grande chamariz de turistas.
“Qualquer economia monofuncional é um sítio onde não há muito debate”, lamenta o arquitecto, considerando que o território se arrisca a perder o que faz a sua diferença: um património de cinco séculos, na encruzilhada entre oriente e ocidente.
“Isso faz com que Macau não seja um sítio alienado ou insuportável, como Doha [capital do Qatar] ou o Dubai, em que pode haver muito dinheiro, mas não há mundo: são cidades ‘fake’, feitas de nada”, defende.

Racista sou eu

[dropcap]V[/dropcap]ivo num país onde se apreciam os transportes públicos, claramente preferidos em relação ao automóvel nas deslocações quotidianas nas grandes cidades: não é coisa de pobre, é uma questão de racionalidade do urbanismo, da ecologia e da qualidade de vida. Naturalmente, além da inevitável bicicleta, também utilizo estes transportes: um comboio convencional e um “monorail” quase diariamente e autocarros muito ocasionalmente. Também é natural que os veículos estejam frequentemente cheios em zonas urbanas, ainda que a ocupação tenha, felizmente, diminuído bastante nos tempos em que as vivências em espaços públicos são manifestamente afectadas pela presença do covid-19 – ou pelo menos pela ominipresença de um mais que justificado e generalizado medo.

O que é menos “natural”, tendo em conta a quantidade de gente que usa estas formas de transporte, é que raramente alguém se sente ao meu lado. Não deixa de ser bastante conveniente e simpático nos tempos que correm, mas sempre causa algum “desconforto”, para dizer o mínimo, em tempos de convivências “normais”, ou pelo menos não afectadas pelo temor de contágios potencialmente mortíferos. Não é coisa minha e já mais de uma vez encontrei textos com descrições semelhantes escritos por pessoas estrangeiras a viver no Japão – o “síndroma do lugar vazio”, como lhe chamou um desses cronistas do ciberespaço. Poderá haver diferentes causas, explicações e motivações para o fenómeno, mas na generalidade dos casos este manifesto ostracismo só é ultrapassado com pessoas que me conhecem – amizades, colegas ou alunas que ocasionalmente coincidam comigo num transporte público.

Outra peculiaridade japonesa tem a ver com a utilização de um alfabeto (o chamado “katakana”) exclusivamente utilizado para a adaptação de palavras com origem em línguas estrangeira – normalmente o inglês, ou na realidade o americano, já que é dos Estados Unidos que chegam os grandes impactos culturais, económicos ou políticos. A utilização deste alfabeto implica algumas curiosas mutações, já que há regras que têm que ser mantidas, por exemplo em relação aos sons. Uma delas, com efeitos muito significativos, é que as palavras terminam sempre com o som de uma vogal (com excepção do som “m”). Aliás, mesmo as sílabas no interior das palavras têm que terminar com sons de vogais. Uma das muitíssimas palavras que sofre pesadas mutações neste contexto é a palavra “half” (metade, em inglês), que na adaptação ao “katakana” se torna “ha-fu”, com um “a” vagamente prolongado e um “fu” final que lhe dá um toque quase insuspeito de se querer dizer “half”.

Vem isto a propósito de ter rapidamente reparado que a minha filha, recentemente nascida no Japão, com mãe japonesa, e certamente portadora de enorme graciosidade, era carinhosamente tratada na maternidade onde nasceu como “ha-fu”, a expressão que, vim a saber agora, é generalizadamente utilizada para designar descendentes de uma pessoa japonesa e de uma pessoa estrangeira. Por ser tão graciosa rapidamente se tornou bastante popular entre o pessoal do hospital, mas ainda assim é “ha-fu”, meia-pessoa, portanto, designação com a qual terá que viver enquanto cá estiver e para a qual teremos certamente as nossas estratégias de defesa e contra-ataque rápido, sempre que for caso disso.

Vêm estes casos sintomáticos de um certo racismo estrutural e estruturante, não violento nas suas manifestações imediatas mas não necessariamente inóquo nas suas consequências pessoais, sociais ou políticas, a propósito da vaga racista que tem crescido um pouco por todo o lado, auto-legitimada pela representatividade institucional de movimentos abertamente xenófobos e/ou fascistas, como podemos testemunhar também em Portugal. Pela parte que me toca, não é de agora, que estou no lado da minoria, que o assunto me preocupa: já nos anos 90, numa das minhas primeiras crónicas na imprensa comercial, tinha escrito sobre racismo após o assassinato de Alcino Monteiro. Volto ao tema após o bárbaro assassinato racista do Bruno Candé: este racismo manso e sonso com que vivemos quotidianamente não deixa de ser discriminatório todos os dias, mesmo se a violência extrema de um assassinato ocorra raramente. Está tudo lá, contra os que são menos e estão na posição mais débil. O mínimo que a decência nos exige perante a discriminação sistemática é usar a nossa posição de privilégio para estar ao lado e defender quem é atacado e discriminado. Foi por isso que cedo me juntei a grupos como o SOS-Racismo, lá vão uns 30 anos, e por este lado destas trincheiras vou ficando, que o mundo ainda não está para esta trégua.

Nada disto me impede, infelizmente, de usar também conceitos e formulações racistas. Continua a ser para mim um exercício sistemático contrariar as ideias e o contexto da sociedade em que fui educado – e em que o racismo e as inerentes discriminações estão profundamente enraizadas, estruturando em grande medida a forma como olhamos para outras pessoas ou sociedades: os franceses que são pretensiosos, os ingleses que são snobs, os espanhóis que não são de fiar, uns bêbados, os russos, umas putas, as russas e as brasileiras, uns gandulos, os marroquinos ou mesmo os alentejanos e até eu próprio, algarvio. Um saco de porrada para todas as ocasiões, os pretos. Não é só em anedotas que se traduzem todos os estereótipos e preconceitos com que olhamos para pessoas, de formas só aparentemente inofensivas: isto estrutura, de facto, formas de discriminação. Contrariar essas formas de violência no meu próprio pensamento continua a ser uma tarefa que tomo como essencial para poder olhar o outro como a pessoa que é e não como o rótulo que lhe foi colado. Há uma educação e uma sociedade profundamente racistas que nos deram a todos estas formas de olhar de cima para baixo sobre toda a diferença.

Reparo, entretanto, na quantidade enorme de pessoas que na imprensa ou nos ciberespaços da vida contemporânea garantem que não são racistas, enquanto discutem acaloradamente se o seu país é ou não racista. Uma discussão estéril e inconsequente, evidentemente, que atira para longe o olhar que devia ficar perto: em vez dessa imprecisa generalização de “o país”, talvez fosse mais produtivo cada pessoa olhar para si própria, como o racismo estrutura tão frequentemente o seu próprio olhar e como procurar que esse olhar tantas vezes preconceituoso e redutor não se traduza em discriminações e formas de violência sobre as outras pessoas.

Automobilismo | Rodolfo Ávila soma mais um pódio em Zhuzhou

Após quatro das oito provas do CTCC que estão a ser disputadas no Circuito Internacional de Zhuzhou, o piloto de Macau está no quarto lugar do campeonato. Ávila viu também ontem confirmada a participação no TCR China

 

[dropcap]R[/dropcap]odolfo Ávila (VW Lamando) subiu ontem ao lugar mais baixo do pódio na primeira das duas corridas que se disputaram no Circuito Internacional de Zhuzhou, a contar para o Campeonato da China de Carros de Turismo (CTCC). Na segunda prova, o piloto de Macau não foi além do sétimo lugar, depois de ter arrancado de sexto e queixou-se de problemas com os pneus.

“A primeira corrida correu como esperávamos e é sempre muito positivo ter uma presença constante nos lugares do pódio. Na segunda corrida, voltei a ter os mesmos problemas de ontem, com os pneus a terem uma queda de performance muito grande nas últimas cinco voltas”, afirmou Ávila, em comunicado, no final da prova. “Contudo, um dos meus companheiros de equipa venceu a corrida, o que é um sinal positivo e significa que estamos no bom caminho”, acrescentou.

Após quatro corridas, que se disputaram nos últimos dois dias, Ávila está no quarto lugar com 43,5 pontos. Em primeiro encontra-se o experiente David Zhu (BAIC), com 48,5 pontos, seguido por Martin Cao (KIA) e Dong Dong (VM Lamando).

Hoje é dia de “descanso” no que diz respeito a corridas, mas o piloto tem duas sessões de qualificação que definem a ordem de partida para as quatro corridas de amanhã e domingo, que também são disputado no Circuito Internacional de Zhuzhou.

No TCR China

Além da participação no CTCC, Rodolfo Ávila vai aproveitar o fim-de-semana para correr igualmente no Campeonato da China de Carros de Turismo (TCR China).

O piloto de Macau conduzir o MG6 da MG XPower Team nas seis jornadas duplas do campeonato. A primeira ronda é no Circuito Internacional de Zhuzhou, onde Ávila se encontra também a correr no CTCC, o que significa que nos próximos dois dias vai somar oito corridas. Já anteriormente, o piloto havia tripulado o MG6, mas só ontem teve a oportunidade de testar pela primeira vez o carro para a nova época.

“Obviamente que este não é um cenário ideal, mas depois de tantos adiamentos e interrogações, só estar aqui, pronto a participar nas primeiras corridas do ano, já me deixa bastante feliz”, reconheceu sobre a participação no TCR China. “Conheço bem ambos os carros, as equipas e também o circuito, portanto sinto-me capaz de enfrentar o desafio que temos pela frente. Vivemos tempos especiais e este será com certeza um evento especial”, considerou.

Recaída

[dropcap]O[/dropcap]s distúrbios que admitem uma possibilidade crónica de recaída estão bem caracterizados. As actividades que estão associadas a tais distúrbios são preferidas a qualquer outra actividade. Tais actividades persistem a despeito das péssimas consequências. Qualquer adicção é assim.

No limite, quem está agarrado a uma substância intoxicante prefere as actividades que a promovem e estão ligadas ao seu consumo do que qualquer outra actividade mesmo que no passado lhe tenha dado um grande prazer ou em si tenha um grande valor existencial. Um consumidor de heroína ou crack vai dar-se com outros consumidores e fazer o que eles fazem para arranjarem o produto, em vez de estar com a sua família de origem ou a família que criaram, vão dedicar-se de manhã à noite a tentar arranjar droga, antecipar o próximo transe ou a ressacar a pedrada em vez de trabalhar, praticar desporto, fazer o que quer que se possa fazer no dia a dia. Por outro lado, persistirá em levar a cabo o conjunto de actividades ligadas ao consumo, mesmo sabendo que põe a saúde e em última análise a vida em perigo.

Mas o que é a recaída? A recaída é a incapacidade de parar de tomar substâncias adictivas para sempre: drogas, álcool, nicotina. Note-se que é possível a abstinência e até por períodos longos de tempo. É até possível que um a adicto nunca mais volte a usar a sua substância de eleição do momento em que suspende a toma até ao final da vida. Mas a recaída é uma possibilidade que existe na vida de uma pessoa propensa ou talvez como se deva dizer com a doença da adicção. E mais. Quanto mais tiver passado tempo desde que deixou de consumir mais iminente está o tempo da recaída. Devemos olhar para a estatística como para uma possibilidade não como para uma realidade que vai fatidicamente acontecer. Como possibilidade dá que pensar. E faz sentido. Logo a seguir à abstinência, o consumidor está num momento revolucionário, está a lidar com várias dimensões da sua vida completamente novas. Provavelmente, está num ambiente diferente do da sua casa. Está numa clínica de desintoxicação. Tem uma agenda própria, com toma de ansiolíticos e se calhar anti-depressivos. Tudo é novo para ele. Tem terapia ocupacional. O corpo regenera e sente energias que nunca tinha sentido. Mas o quotidiano há-de instalar-se e com o quotidiano, virão ocasiões que farão criar situações propícias para a recaída. Tudo o que estiver ligado a stress e ansiedade mas também a prazer e euforia, na verdade, qualquer ocasião de alteração percepcionada relativamente ao estado normal será propícia à recaída. Vem uma vontade enorme de beber um shot da bebida de eleição, dar um cheiro, um shot, tomar um comprido, dar uma passa, seja o que for. Esta vontade não é uma escolha. Vem como uma vontade que dá ao consumidor e é avassaladora, incontrolável. Contudo, o que se passa a seguir é feito sob hipnose ou resulta da sua vontade?

É sob o estado hipnótico e contra a sua vontade que vai ao ATM para levantar dinheiro? Se não tiver dinheiro, vai pedir dinheiro aos seus amigos e familiares como? Para roubar tem de tomar medidas, fazer escolhas.

Tem de ir a sítios, executar tarefas. Depois, se não arranjar dinheiro, tem de vender os bens que roubou. Tem em todo o caso de levar o dinheiro ao locar onde compra droga ou fazer vir o dealer até si. Só no fim vai para um ambiente da sua escolha onde se sente em segurança para cheirar ou injectar-se. O alcoólico tem a tarefa mais facilitada, porque pode ter tudo em casa. Ainda que se estiver sob medicação, terá de esperar alguns dias para beber sem mal estar.

Mas a ânsia, a vontade tremenda, de consumir, ficar bêbedo ou pedrado não é uma escolha. E não tem que ver com prazer. Há uma diferença fundamental entre prazer e necessidade. Querer fumar um cigarro, para inalar a nicotina, é uma vontade desesperante e não tem que ver com prazer. Há prazer associado ao alívio sem dúvida, mas haverá mais prazer ou alívio?

Na psicologia da adicção, a recaída é uma inevitabilidade como possibilidade. O facto de uma pessoa recair efectivamente não é uma inevitabilidade. É difícil de saber se alguém terá o seu sistema, a sua existência, a vida do ponto de vista biológico, cerebral, somática, mental tão limpa como a tinha quando não tinha causado danos. Não se sabe se os danos são irreversíveis. Sabe-se, contudo, que a continuação é o estado de morbidez permanente e o lento suicídio.

Mesmo com o risco da recaída, não há outra possibilidade. Não é perdido por um, perdido por mil. A abstinência, a sobriedade, é a única possibilidade de regeneração do cérebro e assim do círculo vicioso que se criou para si próprio, em que o sentido da existência é a expectativa de uma subida do prazer, de uma ida às alturas, da euforia, mas só para uma queda inevitável. Quanto mais alta é a subida, de mais alto é a queda.

Sobe-se e desce-se muitas vezes, mas nunca se chega sequer à normalidade em que as pessoas normais se encontram. Está-se mesmo lá em baixo, com uma fasquia baixíssima, sem saber se haverá outro dia. O amor por uma substância é a loucura, nem sequer é estúpido. É suicida.