Covid-19 | Enquanto se debate a acessibilidade da vacina, especulação bolsista gera biliões João Luz - 27 Jul 2020 Entre farmacêuticas que negam a intenção de lucrar com a vacina contra a covid-19 e dúvidas quanto à base de custos, pequenas empresas e laboratórios que procuram a tão aguardada inoculação tornam-se estrelas do mercado bolsista. O mundo aguarda a vacina e o número de infecções sobe em flecha, quase à mesma velocidade dos lucros dos executivos de topo das empresas do sector [dropcap]A[/dropcap]s leis não escritas dos mercados estão de novo a trocar as prioridades de governos e povos. Os números de novas infecções de covid-19 continuam a subir vertiginosamente, à medida que, um pouco por todo o mundo, se intensificam esforços para encontrar a tão desejada vacina, que restitua a normalidade ao mundo de pernas para o ar. Pelo meio, muito dinheiro é feito na bolsa, com os Estados Unidos a encabeçar a capitalização da ciência nos mercados bolsitas, mas empresas chinesas não ficam atrás no lucro das subidas vertiginosas de acções. Antes da análise ao valor das empresas, o futuro custo da própria vacina ainda está envolto em mistério, sem certezas de vir ser acessível às populações. Na semana passada, representantes das farmacêuticas Moderna Inc e Merck & Co foram ouvidos no Congresso norte-americano para apresentar uma estimativa quanto ao lucro que esperam obter assim que for aprovada uma vacina contra a covid-19. A representante da Merck, Julie Gerberding, expressou incerteza quanto à possibilidade de a vacina ser acessível a todos. “Não iremos vender a nossa vacina a um preço elevado, mas ainda é prematuro dizê-lo, porque estamos longe de compreender as bases do custo produtivo”, referiu em audiência, citada pela agência Reuters. A Merck ainda não começou a fazer testes em humanos, o que a coloca uns passos atrás de outros candidatos na corrida científica. Directores executivos da Johnson & Johnson e da AstraZeneca declararam que vão colocar o preço a um nível que coloca de parte o lucro, enquanto a pandemia estiver em expansão. Na mesma audiência perante congressistas, enquanto os representantes da Merck e da Moderna não admitiram os preços que têm em mente, a Pfizer mostrou intenção de lucrar se a sua vacina for aprovada. Convém referir que, ao contrário da Moderna e da AstraZeneca, a Pfizer não recebeu fundos públicos para desenvolver uma vacina. Apenas dois dias depois da audiência, segundo o The Washington Post, a Pfizer e uma empresa de biotecnologia alemã de nome BioNTech assinaram um acordo com o Governo norte-americano para a entrega de 100 milhões de doses a troco de 1,95 mil milhões de dólares, o maior investimento da Casa Branca num produto ainda não aprovado. O Governo norte-americano tem ainda opção para comprar mais 500 milhões de doses. Estes acordos podem conduzir à compra da larga maioria das vacinas que a Pfizer planeia fazer até ao fim de 2021, às quais se acrescenta a compra de 300 milhões de doses da AstraZeneca e 100 milhões da Novavax. Em declarações ao The Washington Post, o presidente do Centro para a Ciência e Interesse Público, Peter Lurie, alertou para a possibilidade destes negócios aumentarem o risco de exclusão de populações de países em desenvolvimento. “Basicamente, alguns países mais ricos estão a arrebatar as empresas candidatas a conseguir uma vacina. Isto pode colocar de parte populações, que enfrentam maiores riscos face à pandemia, que assim ficam desprotegidas.” A grande farra Em Wuhan, onde começou a pandemia, os testes para a vacina Ad5 vão na segunda fase de testes aleatórios num estudo com placebo-controlado. Para já, os resultados são animadores, com a maioria dos participantes a adquirir imunização. De acordo com o Diário do Povo, as injecções começaram a ser ministradas a meio de Abril. As “cobaias” foram adultos com mais de 18 anos que nunca testaram positivo à covid-19. Os 603 voluntários foram aleatoriamente escolhidos para tomar diferentes doses da vacina ou um placebo, sem nunca lhes ser comunicado o que haviam tomado. Citado pelo Diário do Povo, Fengcai Zhu, do Centro de Prevenção e Controlo de Doenças da província de Jiangsu, mostrou-se optimista com o avanço. “A segunda fase dos testes acrescenta provas da segurança e imunogenicidade numa amostra populacional maior do que a da primeira fase”, revela o investigador que trabalha já na terceira fase. Os avanços e a potencialidade da vacina produzida pela Cansino Biologics levaram à febre bolsista, com as acções da empresa chinesa a subirem 1.74 por cento na semana passada, quando foram divulgados os resultados dos testes. Numa análise comparada ao ano, as acções da Cansino Biologics subiram 183 por cento, impulsionadas pelas investigações à covid-19. O caso da Cansino Biologics está longe de ser único, ou de exemplificar o cúmulo da ganância. Através do espectro das indústrias médica e farmacêutica, executivos de topo e membros da administração estão a capitalizar em força com a corrida à vacina. Sempre que são feitos anúncios de progressos conquistados, incluindo financiamento público, são feitos milhões nas bolsas. O The New York Times noticiou este fim-de-semana que, depois dos anúncios de progressos científicos, executivos de, pelo menos, 11 empresas, algumas de pequenas dimensões, venderam acções num valor que ultrapassou os mil milhões de dólares desde Março. Alguns “insiders” estão a lucrar com compensações que já estavam calendarizadas ou com trocas automáticas de acções, mas, em muitas situações, executivos de topo aproveitam a subida vertiginosa do valor das acções das suas empresas para arrecadar lucros milionários. Aliás, existem casos em que foram atribuídas opções de compra de acções momentos antes de anúncios sobre progressos científicos que levariam a grandes valorizações. Velocidade Warp Algumas destas empresas são de pequena dimensão e muitas vezes a sua sobrevivência depende do desenvolvimento bem-sucedido de apenas um fármaco. A Vaxart, sediada no Sul de São Francisco, na Califórnia, é um bom exemplo do esquema milionário que surge, à semelhança de outros casos, com um anúncio aparentemente inesperado. A empresa anunciou que a vacina contra a covid-19 em que está a trabalhar foi seleccionada para o programa do Governo norte-americano “Operation Warp Speed”, que financia projectos para chegar o mais rapidamente possível à inoculação. O anúncio levou à subida galopante das acções da Vaxart, cujos executivos, semanas antes, tinham recebido opções de compra de acções cujo valor cresceu para seis vezes mais. O The New York Times avança que um fundo de investimento que controla parcialmente a Vaxart ganhou automaticamente mais de 200 milhões de dólares. Várias empresas estão a atrair o escrutínio do Governo e das autoridades reguladoras por usarem a Operação Warp Speed como esquema de marketing. O diário nova-iorquino exemplifica com o título do comunicado de imprensa de São Francisco: “A vacina contra a covid-19 da Vaxart foi seleccionada pelo Governo norte-americano para a Operação Warp Speed”. Porém, a realidade é mais complexa do que aparenta o comunicado da empresa. A vacina da Vaxart foi aceite como candidata para testes em primatas organizados por uma agência federal, em conjunto com a Operação Warp Speed. Mas a empresa não está entre as seleccionadas para receber o financiamento prestado pelo programa para a produção em massa de vacinas. Também ainda não é conhecida qualquer investigação das autoridades que fiscalizam os mercados bolsitas, nomeadamente por conhecimento interno que desvirtua a concorrência. Alto grau de contágio Ouvido pelo The New York Times, Ben Wakana, director da ONG a favor de medicação a preços acessíveis, sublinhou ser “inapropriado os executivos de empresas farmacêuticas lucrarem com uma crise”. “Todos os dias, acordamos e fazemos sacrifícios durante esta pandemia. As empresas farmacêuticas encaram isto como uma oportunidade para lucrar”, rematou ao diário. É longa a lista de executivos que acumularam lucros na ordem dos sete e oito dígitos graças à busca pela vacina e formas de tratamento para a covid-19. As acções da Regeneron, uma empresa de biotecnologia de Nova Iorque, subiram quase 80 por cento desde Fevereiro, quando anunciaram a colaboração com o Governo federal na busca por tratamento. Desde então, os executivos no topo da hierarquia empresarial, e membros do conselho de administração, venderam quase 700 milhões de dólares em acções. O CEO, Leonard Schleifer, ganhou num dia apenas 178 milhões de dólares no passado mês de Maio. Em todo o mundo, estão a ser investigadas e desenvolvidas mais de 150 vacinas contra o novo tipo de coronavírus, com duas dúzias já a ser testadas em humanos. O objectivo de encontrar uma forma que garanta a segurança e saúde de milhares de milhões de pessoas afectadas pela pandemia é todos os dias minado pela ganância de poucos, em detrimento de muitos.
Covid-19 | Coreia do Norte regista primeiro caso suspeito de coronavírus Hoje Macau - 26 Jul 2020 [dropcap]U[/dropcap]m primeiro caso “suspeito” de coronavírus foi hoje identificado na Coreia do Norte, que entrou em um estado de “emergência máxima”, avançou hoje a agência oficial do regime de Pyongyang, KCNA. Em causa está uma pessoa que “retornou em 19 de Julho depois de cruzar ilegalmente a linha de demarcação”, que serve de fronteira com a Coreia do Sul, segundo a KCNA. Pyongyang garantiu que não há nenhum caso de coronavírus e que as fronteiras do país permaneciam fechadas. No início do mês, os jornais da Coreia do Norte referiam que o líder Kim Jong Un tinha apelado à cúpula do partido para se manter alerta contra o coronavírus, avisando que a complacência poderia conduzir a “riscos inimagináveis e a uma crise irrecuperável”. Apesar do apelo, Kim reafirmou que a Coreia do Norte não registava um único caso de covid-19 acrescentando que o país “impediu completamente a invasão do vírus maligno” apesar da crise sanitária que se regista em todo o mundo. A nível global, muitos especialistas já demonstraram sérias dúvidas sobre a situação da pandemia na Coreia do Norte devido à proximidade da República Popular da China, onde a doença teve origem, e por causa das infra-estruturas sanitárias precárias do país. A Coreia do Norte encerrou as fronteiras no princípio do ano, proibiu a entrada de turistas e mobilizou os profissionais de saúde a imporem quarentena (14 dias) a todos os cidadãos que apresentassem sintomas da doença. Para muitos observadores, o recente confinamento do país atingiu fortemente a economia da Coreia do Norte seriamente afectada pelas sanções impostas pelos Estados Unidos por causa do programa nuclear. A pandemia de covid-19 já provocou cerca de 640 mil mortos e infectou mais de 15,8 milhões de pessoas em 196 países e territórios, segundo um balanço feito pela agência francesa AFP.
Covid-19 | China com 46 novos casos, valor diário mais alto em mais de um mês Hoje Macau - 26 Jul 2020 [dropcap]A[/dropcap] China diagnosticou 46 casos de covid-19 nas últimas 24 horas, valor diário mais alto em mais de um mês, 22 dos quais na região de Xinjiang e 13 na de Liaoning, indicaram hoje as autoridades chinesas. O país asiático registou 11 casos em viajantes oriundos do exterior, os chamados casos importados, cinco na região da Mongólia Interior, três na província de Cantão, e um também em Fujian, Shandong e Tianjin. Urumqi, a capital da região autónoma de Xinjiang, no extremo noroeste da China, detetou um surto há mais de uma semana, interrompendo um período de quase duas semanas sem novos casos por contágio local na China. Xinjiang implementou medidas de prevenção, incluindo a suspensão do metropolitano local e o cancelamento de centenas de voos, e iniciou uma campanha maciça de testes para tentar conter o surto o mais rapidamente possível, noticiou a imprensa local. Em Dalian, cidade portuária no nordeste do país, as autoridades declararam “estado de guerra”, para evitarem novo surto do coronavírus. As autoridades ordenaram o encerramento de mercados de frutos do mar, após terem detectado os primeiros casos numa fábrica de processamento, segundo o jornal estatal Global Times. Para impedir que o aglomerado de casos dê origem a um novo surto, o governo local tomou várias medidas, incluindo exigir testes de ácido nucleico a quem usar a linha 3 do metropolitano local, que passa pela planta de processamento afectada. O governo local ordenou ainda o encerramento de jardins de infância e exigiu a “desinfecção generalizada” de centros comerciais e mercados. As autoridades de saúde acrescentaram que, até à meia-noite, tiveram alta 19 pacientes, fixando o número total de casos activos no país asiático em 288. De acordo com os dados oficiais, desde o início da epidemia a China registou 83.784 infectados e 4.634 mortos devido à covid-19, a doença causada pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2). A pandemia de covid-19 já provocou cerca de 640 mil mortos e infectou mais de 15,8 milhões de pessoas em 196 países e territórios, segundo um balanço feito pela agência de notícias France-Presse (AFP).
Cônsules dizem que China e Macau têm sido parceiros de Angola e Moçambique Hoje Macau - 24 Jul 2020 [dropcap]O[/dropcap]s cônsules de Angola e Moçambique disseram ontem à agência Lusa que a China continental e Macau têm sido parceiros estratégicos no combate à pandemia. Têm tido uma “contribuição bastante valiosa, muito importante mesmo, Macau em particular, através do Fórum Macau, contribuiu com alguns donativos em termos de material de prevenção, bem como a República Popular da China, através do Governo central”, afirmou o cônsul-geral de Moçambique em Macau. “Penso que têm sido parceiros estratégicos neste combate à pandemia”, resumiu Rafael Custódio Marques. O chefe da missão de Moçambique em Macau salientou que a ajuda se materializou sobretudo ao nível de “material de prevenção e de combate à pandemia e mesmo em relação a troca de informações, a nível técnico, a nível médico, através de videoconferências”. A importância da ajuda chinesa e do antigo território administrado por Portugal foi igualmente partilhada pelo cônsul-geral de Angola em Macau. “Do Fórum [Macau] temos recebido todo o apoio necessário, dentro das possibilidades do Fórum. Recentemente recebemos a oferta (…) de algum material de combate à pandemia, já agradecemos, mas nunca é demais continuar a receber esse apoio”, afirmou Eduardo Velasco Galiano. O chefe da missão de Angola em Macau sublinhou ainda a ajuda assegurada directamente pela China continental, onde também foi “adquirido muito material”. Sob controlo As declarações de ambos foram realizadas à margem de uma sessão de partilha de resultados do trabalho realizado por um grupo de peritos médicos antiepidémico do Governo da China na Argélia e Sudão, entre 14 de Maio e 11 de Junho, e que contou com a primeira participação do género de especialistas de Macau. Tanto Eduardo Velasco Galiano como Rafael Custódio Marques não descartaram a possibilidade de solicitarem apoio a uma equipa semelhante, que desse apoio no combate à pandemia ao nível da prevenção e da formação. Os dois diplomatas, contudo, frisaram que a situação nos respectivos países está “sob controlo”. Em Angola, há a registar 812 casos e 33 óbitos, ainda que o número de contágios tenha aumentado de cerca de 40 para mais de 800 em apenas dois meses, sublinhou o cônsul-geral em Macau. Com um total de 1.557 casos de covid-19, 11 mortos e 523 pessoas recuperadas, Moçambique vive em estado de emergência desde 1 de Abril.
A escola das meninas João Romão - 24 Jul 2020 [dropcap]P[/dropcap]or coincidências da história, ou pelo menos da cronologia, nasci no Maio de 68 e entrei na escola primária em 1974, poucos meses após a Revolução de Abril, no grupo de crianças a quem coube inaugurar o ensino público em regime democrático. Entre outras coisas, as turmas passaram a ser mistas, com rapazes e raparigas na mesma sala, uma característica trivial do ensino contemporâneo, mas radicalmente inovador à época. Ainda assim, lembro-me de que eram apenas quatro as raparigas que faziam parte da minha turma, quase completamente masculina, portanto. Além das turmas, coube-nos também inaugurar as escolas mistas, já que até aí rapazes e raparigas frequentavam a escola primária em edifícios diferentes. Na vila onde vivia, antes do 25 de Abril tínhamos a “escola dos meninos” e a “escola das meninas”, na boa tradição salazarista. Quase 50 anos passaram e agora trabalho numa grande e moderna cidade japonesa, por obra de outras coincidências, do campo da geografia ou de outros fenómenos mais complexos. Também é por vaga coincidência que estou de regresso à escola a tempo inteiro, desta vez como professor, profissão cujo exercício não tinha sequer remotamente planeado mas que se foi posicionando nos incertos horizontes da precariedade contemporânea como uma bastante razoável alternativa para sobreviver confortavelmente em terras nipónicas – ou mesmo noutras, se vier a ser o caso. Foi então nesta outra geografia e neste outro momento histórico que me voltei a confrontar com uma certa banalidade na separação por género dos processos educativos. Neste caso, não é que haja – pelo menos de forma generalizada – escolas especificamente orientadas para rapazes: o que há frequentemente, pelo menos na generalidade das grandes cidades, são escolas de diversos níveis de ensino exclusivamente dirigidas a raparigas. Vou deixar de lado, pelo menos por enquanto, as limitações deste binarismo de género cada vez mais anacrónico e dos problemas que vai levantando (também por cá) e fico-me por algumas das causas e consequências deste fenómeno com que lido agora bastante mais de perto. Surpreendem facilmente quem cá chega as desigualdades de género no Japão, país de reconhecida competência na liderança dos progressos tecnológicos das sociedades contemporâneas: ainda que a tendência seja crescente, são menos de metade as mulheres adultas que participam no mercado de trabalho japonês. Aliás, é frequente remeterem-se à pacatez e ao recato do lar após o casamento, mesmo quando têm níveis avançados de educação e competentes desempenhos profissionais. Tornam-se esposas e eventualmente mães a tempo inteiro. Na realidade, chega a ser difícil encontrar lugares em creches, mesmo tratando-se de um país onde é tradicionalmente baixa a natalidade. O universo laboral é largamente masculino e quando mais se sobe nas hierarquias de decisão, poder e salários, mais acentuada é essa dominação. Não será um caso exclusivamente japonês, no entanto: na realidade, têm fraca expressão histórica na Ásia os movimentos feministas que desde os anos 1960 reivindicam igualdades e liberdades, sobretudo na América e na Europa. Em grande medida, são essas desigualdades que justificam a existência de Universidades (e escolas secundárias, também) só para mulheres: num universo com ampla dominação masculina, a participação activa das mulheres implica a aquisição de competências que ultrapassam largamente os domínios técnicos do exercício de qualquer profissão, requerendo também outro tipo de conhecimentos e práticas, ligados a formas de comunicação, colaboração ou negociação. Em todo o caso, parece haver um longo caminho a percorrer até que estas novas competências tenham impacto efectivo num universo laboral e social amplamente dominado por uma cultura patriarcal que se traduz no controle dos vários poderes de decisão, do espaço doméstico e familiar às estruturas de representação política, passando, naturalmente, pelos postos de trabalho. Não por acaso, há iniciativas legislativas recentes a oferecer significativos incentivos fiscais às empresas que empreguem mulheres – até porque o envelhecimento populacional também gera uma certa escassez de força de trabalho – mas tendem a ser relativamente lentos os impactos destas medidas sobre culturas e estruturas de poder profundamente enraizadas na sociedade. Aliás, mesmo com 50 anos de movimentos feministas na Europa ou na América, a plena igualdade está ainda hoje manifestamente longe de ter sido alcançada. Não posso dizer que conhecesse pouco desta realidade antes de vir viver para o Japão: na realidade, o meu conhecimento era completamente nulo. Mas é numa destas universidades femininas que trabalho actualmente, num belo campus com amplos espaços verdes, arquitectura moderna e tecnologias avançadas, que oferece condições de trabalho extraordinárias. São pouco mais de 5.000 alunas, jovens japonesas diligentes e educadas, sistematicamente compenetradas no seu trabalho, num generalizado ambiente de tranquilidade e gentileza. Já entre os professores, no entanto, a maioria é masculina. E também quando se entra nos topos das hierarquias de direção e administração, a presença feminina é minoritária. Talvez não tivesse sido esse o plano original da corajosa mulher que fundou a universidade há mais de 100 anos, mas é, ainda assim, um contributo visível e relevante para desenvolver futuros diferentes. As improváveis coincidências da história e da geografia acabaram por me proporcionar um muito singular, surpreendente e estimulante projecto profissional, portanto.
Anhedonia I António de Castro Caeiro - 24 Jul 2020 [dropcap]O[/dropcap] hedonismo é uma das ideologias de mais fácil adesão na existência humana. A palavra é deriva do adjectivo grego HEDYS, -EIA, Y e tem ainda repercussões na palavra latina SUAUUIS, -E e na inglesa SWEET. O hedonismo corresponde assim ao princípio de acordo com o qual orientamos a vida por uma procura do é doce, suave, dá prazer, satisfaz, gratifica. Por outro lado, rejeita-se toda a amargura, é causa de sofrimento, frustra. A equação existencial estaria matematicamente resolvida. Escolhe-se o prazer superlativo e rejeita-se o sofrimento, também, superlativo. Em caso e impossibilidade de escolha inequívoca, há matizes na teoria abarcante de todas as possibilidades de decisão. Pode escolher-se o menor sofrimento possível em vista de sofrimentos maiores tal como se pode rejeitar prazeres menores em vista de prazeres maiores. Mas a vida parece estar decidida. Em qualquer circunstância, escolhe-se sempre o prazer como um bem. Em qualquer circunstância também, rejeita-se sempre o sofrimento como um mal. A figura do Hedonismo considerada por si não obtém um aplauso unânime e desde a antiguidade que não foi uma ideologia simpática. Antes pelo contrário. Numa primeira leitura de Platão, por exemplo, vemos os prazeres ligados ao corpo – os prazeres sensuais, sexuais, com a comida, bebida, em geral com todo e qualquer conteúdo do mundo – liminarmente excluídos. Platão não é anti prazer e se podemos dizer que é um asceta é apenas no sentido radical da palavra grega, de alguém que se dedica a exercícios espirituais e não quer ficar sob a alçada de nenhuma obsessão compulsiva. A verdadeira história contra o Hedonismo pode ser lida na acção que lhe é movida pela Igreja Católica como uma das faces da destruição. E não sem razão. Não podemos nunca ler superficialmente as coisas. Temos de perguntar pelo sentido das experiências que as coisas têm nas nossas vidas e nas vidas das pessoas. Qual é o verdadeiro sentido do prazer? Qual é a dimensão do prazer na vida de uma pessoa e das pessoas que estão à sua volta? Quais são as consequências para as nossas vidas das escolhas que fazemos quando nos decidimos por viver uma vida dedicada ao prazer? O que é uma vida que rejeita liminarmente toda a espécie de sofrimento? Por outro lado, temos de perguntar também o que leva alguém a atacar os prazeres. Naturalmente, ninguém sente desgosto com as coisas de que gosta. Por isso, atacar o prazer, aquilo de que naturalmente gosta, implica uma dimensão metafísica, um sentido que vai para além da experiência sensível que está a ser tida. O que levará alguém a condenar o “bem” que fazem os prazeres sensuais e que, dizemos, nos leva à loucura ou então à procriação e propagação da espécie, ao Cocktail de hormonas que permite identificar grupos de adolescentes nas praias, locais de lazer ao entardecer, nos cafés, bares e discotecas, ao facto de se apaixonarem e sentirem tensão erótica entre si? Por outro lado, parece já compreensível o que levará à condenação da ingestão de alteradores do estado da consciência que levam a experiências que são descritas pelos protagonistas dessas alterações de estado como viagens transcendentes. Como compreensível é o que levará à condenação do jogo, quando alguém sente o prazer enorme da antecipação da possibilidade enquanto antecipação, independentemente do resultado, da perda ou do ganho. Não fará também sentido condenar a ambição de poder e da luxúria que resulta do seu exercício? Qualquer que seja o conteúdo de prazer, um único prazer, muitos prazeres, todos os prazeres possíveis e imaginários, há uma diferença entre o que cada um de nós é e o conteúdo específico desse prazer. O amante, o alcoólico, o cocainómano, o jogador, o tirano têm uma necessidade inalienável de coisas que não têm neles próprios. São atirados para outros amantes, para substâncias: bebida e cocaína, cartas e dados, outras pessoas, povos para poderem exercerem os comportamentos que os definem. As compulsões dependem de coisas existentes fora de si. Não há nenhuma possibilidade que exista neles mesmos que os satisfaça. Nunca conseguem estar neles. Não sabem conviver com eles. Nunca estão sossegados. Não sabem o que é a tranquilidade. Não conhecem a serenidade. Estão continuamente a antecipar o próximo momento de intoxicação ou a reagir à fúria do último momento. Existem entre amantes, entre bebedeiras, entre “cheiros”, entre apostas, entre violências. O espaço intermédio é o do vazio, o do arrependimento e remorso ou só o do tédio. Depois de esquecida ou superada “a última vez”, começam logo a preparar “a próxima”. O hedonismo é a ideologia que confunde o BEM com o PRAZER. Que bem haverá numa vida que se confunde com a erradicação da ressaca ou que espera pela próxima embriaguez, mas nunca se encontra verdadeiramente consigo nunca?
O meu rebanho de palavras Rosa Coutinho Cabral - 24 Jul 2020 [dropcap]H[/dropcap]á coisas que estão enterradas no chão da terra – pedra tumular da humanidade. Nela navegam todos os meus mortos, todos os meus vivos, desde que há passado, presente e futuro. É este o mundo do meu pastoreio, onde um rebanho de palavras se espalha e espera que as encontre, junte e lhes dê algum alimento. É preciso cavar, adubar, semear o campo para colher as bagas com que sobrevivem as metáforas, analogias e demais condimentos que servem a escrita, è preciso cuidar dos campos onde colhemos as palavras que empurram o mundo, escrevendo-me nele. Entre elas, ouço Zaratustra: Aquilo que chamastes mundo, deveis primeiro criá-lo para vós. O motor está ligado. O movimento começa no grande escorrega do mundo interior. A rampa alonga-se numa viagem vertiginosa sem se deter e entra no subsolo como se eu fosse um verme nas mãos de um poeta. Estava a ser escrita sem saber. Era apenas uma palavra a deslizar sem ruído e a sumir-se no chão, comovendo-se com a enorme dor humana. A humidade pesada e aglomerante da terra cola-se ao corpo, enterrando-me viva no pranto de todos os que sofrem pela mão de Pessanha, a mesma carga dos homens-ratos de Steinbeck que sustentam o peso da terra inatingível na sua imensa pobreza. Já sem saliva, já sem sentidos, fico a saber que para as palavras pastarem é preciso o exílio, a dor e estar longe em cada uma que se lança ao nascimento e que pode, uma vez nascida, nomear-se como coisa da linguagem. Não que esta seja a casa do ser, desculpar-me-à o humanismo de Heidegger, mas porque formata a cultura, a imagem e a experiência mundo – é o seu horizonte. Agora sei que quando a escrita acontece o corpo escreve-se, nasce e morre. E o mundo também. Sei que as palavras são capazes de se libertar dos limites da linguagem e da jaula onde estão encaceradas – formando a mancheia que prefiro. O meu rebanho de palavras é o meu acervo, espectáculo que exige a todo o momento a representação do meu olhar de colecionadora. Como diz Sontag caso não saiba que fazer com os olhos ávidos, tem sempre ao seu dispor esse outro, sempre, próximo, interior: um livro. As palavras desfilam perante os meus olhos como coisas que me extasiam, fazendo de mim a leitora que, cada vez que lê, é escrita no folhear contínuo deste arquivo indecente. Grafada no jogo intenso do mundo das palavras desejadas, resgato-as como objectos raros e preciosos, ou protejo-as da incúria de um destino esquecido. Talvez seja apenas uma ladra, como Bukowski, que rouba e amealha no seu mealheiro feroz palavras cheias de raiva. E refaço-me internamente nas mãos que escrevem nesta outra rua de letras onde reconheço Plath e Nietzsche de mãos dadas, como se fossem estrelas a dançar para Platão, arrastando-me no horizonte – o grande escorrega do mundo. Nesta abissalidade sem dormência evolam-se as delicadas folhas de livros onde ecoam as vozes dos escritores. A vida não vem empacotada em experiências de três actos – diz-me Joyce com quem deambulo no arquivo de citações do coleccionador de palavras que abriu sem medo a sacola de Odisseu, contra o aviso de Tirésias, libertando a mutabilidade maldita da escrita. É preciso uma nova linguagem, novas palavras do ver, pensar e dizer das personagens e fazê-las viajar de um livro para outro, como Stephen Dedalus, já de si trajeto de um mito, que vai parar a Ulisses. Encontro Molly Brown a dizer sim-à-vida, no lance em que Joyce iguala Nietzsche, retirando às palavras o veneno oculto que as faz serviçais da cristalização das formas, do sentido, da verdade – libertando a linguagem do seu papel de ilusão. Ando agora aos trambolhões nas palavras de um homem que cria a sua própria linguagem, em metamorfoses constantes, na fragmentação, discontinuidade, colagem, interrupção, num sem número de processos que anunciam, num gesto contemporâneo, a morte da narrativa como era conhecida até então. Quando Pina Baush morre no café Muller, diante de mim, eu morro com ela. Mas o meu corpo não cai. Antes fica suspenso entre ser e não ser, como no laboratório que Melville criou para Bartleby, numa pura potência de se emancipar tanto do ser como do não-ser, e criar a sua própria ontologia, nas palavras de Agamben. Também não quero sair de trás do biombo verde. Também preferia não o fazer… O escrivão acolhe-me no seu colo e embala-me até adormecer, ao som das letras que o escrevem enquanto se recusa a escrever. Naquela contingência, acordo e flutuo no arquivo-linguagem que nos mantém suspensos em letras e palavras, com vontade de mobilizar outra imagem da literatura. O que interessa é a obra que fica e a cortante novidade que tenho de guardar. O meu corpo desfaz-se na escrita de Gertrude Stein e na sua montagem desabrida contra todos os costumes narrativos. Escrever é sempre uma matéria em devir, como diz Deleuze. Estou exausta: é muita coisa para um pastor. Ia dizer à escrita que estava cansada desta tarefa, mas o rosto meridional de Barthes debruça-se sobre as mãos que agora me escreviam: Até o momento só existe uma escolha possível, e essa escolha faz-se entre dois métodos igualmente excessivos: considerar um real inteiramente permeável à história e ideologizar; ou inversamente, considerar um real finalmente impenetrável, irredutível, e, nesse caso poetizar. É como imagino o horizonte onde repouso a cabeça, quando a madrugada me deita sobre o mar e a terra, à espera do meu rebanho de almas nuas.
Uma solipsista laowai em Pequim Sara F. Costa - 24 Jul 2020 [dropcap]F[/dropcap]injo um obrigadinha inevitável, melhor slogan para a mulher que me serve à mesa. Ingénua só à distância, sabe que vive no centro do mundo. Mas por dentro, ah, por dentro, irrito-me miudinho. Há sete pratos, todos variações de comida de rua japonesa. Lembro-me daqueles festivais de comida asiática no Martim Moniz. Subitamente, apetecia-me que houvesse um voo low cost para o Martim Moniz. Mas estar longe é a combinação perfeita para mim. Dia-a-dia transitório. Ser estrangeira, laowai, macaca branca (白猴子) quando me sento em mesas de reuniões de empresas das quais não sei o nome em troca de uns yuans extra. Este sítio, é o sítio ideal para se irritar involuntariamente, para quem tem transtornos já embutidos na personalidade, tão transtornada sempre que apanhei um transtorno de personalidade. Gosto desta cidade patológica onde se aprende todos os dias um novo sentido para a vida. Com a sua morfologia urbana altamente variável. Além de nós, só existem as nossas experiências. A minha auto-imagem, reflexo de elevação vertical da base para o mais alto ponto da arquitectura ou elemento integral estrutural do prédio com anúncios em Led, belas jovens de farda sorridente publicitam as bebidas de que Mao gostava. Jovens de farda comunista com maquilhagem. Paradoxos, mais paradoxos. Esta cidade é o episódio dissociativo de ontem à noite no bar clandestino, aberto noite fora e dia dentro. A fuga psicogénica na praça de Tiananmen. Estendo-me agora no meio da praça e sou descontínua. Hei-de abandonar-te antes que me abandones, cidade! Tenho técnicas, sei lidar com isto, toda eu psicanálise até ao cabelo. Acusações essas de ser doente mental só porque me afeiçoei demasiado ao hipertexto, pu-lo num pedestal! Sei perfeitamente que Barthes ia amar esta opressão da mesma forma que eu. É aqui que estou bem, a mover-me por áreas urbanas polarizadoras em constante mutação da percepção de estímulos exteriores. Aglomero as noites de poesia sobre a cama, o quarto enfeitado com um neon que diz “espetadas” em rosa fluorescente comprado no taobao. No parapeito da janela, tenho uma placa que diz “Flowers are nice”, trouxe-a de uma loja de recordações na zona de Gulou. Nice é o pátio da galeria de arte para se fumar e beber Qingdao toda a tarde, romanizar em pinyin sempre e falar de arte, da arte dos trabalhadores migrantes das fábricas mas entretanto temos galerias de arte ocupadas por bolsas de apoio à criação artística do Instituto Goethe. Nunca ouvi as alemãs a falarem de gentrificação. Como digo, há coisas das quais não se fala nesta cidade. Há dragões informáticos descontrolados, nocivos, respirar aqui é nocivo mas nós estamos viciados. O estrangeiro chega aqui e fica toxicomaníaco. Há sete anos estive neste fenómeno muralhado e constatei algo único: a instabilidade, o vazio, não está só cá dentro, está também cá fora. Eu sou este lugar. Eu sou. Sete cervejas, oito poetas que acham que isto é uma religião. Transitar,crush and run em fuga dos seus transtornos, vestidos de paranóia. Em busca de uma personalidade qualquer algures num lugar de aluguer. Uma personalidade de aluguer. Sem estigma, só amor. Sentimento puro, gentrificado. Sentir que os prédios da cidade também nos crescem para dentro.
Automobilismo | China GT anuncia duas corridas no Grande Prémio Sérgio Fonseca - 24 Jul 202025 Jul 2020 A organização do Campeonato da China de GT anunciou esta semana nas redes sociais, em língua chinesa, o calendário para a temporada que está prestes a arrancar e que inclui, não uma, mas duas visitas ao Grande Prémio de Macau [dropcap]D[/dropcap]epois de mais de meio ano de motores silenciados, a competição chinesa de carros de Grande Turismo (GT) irá iniciar-se no segundo fim-de-semana de Agosto no Circuito Internacional de Zhuzhou. Devido aos constrangimentos causados pela pandemia mundial da COVID-19, a temporada de 2020 do Campeonato da China de GT irá prolongar-se até ao final de 2021, contemplando assim um número recorde de dez eventos, quatro deles fora da China Interior. Depois da jornada dupla em Zhuzhou e de uma outra no circuito de Fórmula 1 de Xangai, segundo o calendário agora apresentado, a caravana do campeonato chinês tem viagem marcada para o Circuito da Guia para a última prova do ano 2020. Mas o campeonato não termina com a deslocação à RAEM, visto que esta será uma “Super-Temporada”, a primeira de um campeonato nacional chinês de automobilismo. O organizador espera começar o novo ano na Malásia, onde esteve em 2019, para continuar na Tailândia, com uma prova em Buriram, e regressar a território chinês para mais três provas: Xangai, Zhuzhou e Xangai. “Em Novembro de 2021, a primeira Super-Temporada do China GT espera regressar a Macau outra vez e terminar no Grande Prémio de Macau”, é possível ler na comunicação. A Comissão Organizadora do Grande Prémio de Macau ainda não se pronunciou publicamente sobre o programa da 67ª edição do evento, no entanto, é certo que a Taça GT Macau não será, pela primeira vez nos últimos seis anos, palco da Taça do Mundo FIA de GT. Pela comunicação da organização chinesa, que carece ainda de confirmação pública oficial por parte entidades responsáveis locais, que nesta matéria têm sempre a última palavra, o pelotão do Campeonato da China de GT irá ocupar o lugar deixado vago pela federação internacional. O Campeonato da China de GT está dividido em duas categorias – uma para carros da categoria GT3 (iguais aos da Taça GT Macau) e outra para carros GT4 (vistos o ano passado a correr na Taça GT da Grande Baía) – e realiza duas corridas por fim-de-semana, não tendo sido revelado o formato que irá utilizar na sua anunciada comparência no Circuito da Guia. Habitualmente, cada carro é pilotado por dois pilotos, sendo um deles profissional e o outro amador. A competição chinesa começou a ganhar peso e importância a partir de 2016 e tem na sua história um episódio de má memória para o automobilismo de Macau, pois foi neste campeonato que André Couto, ao volante de um Nissan GT-R Nismo GT3, teve o violento despiste na pista de Zhuhai com consequências físicas que o obrigaram a uma longa mas feliz recuperação física em 2017. Para além de Couto, também Rodolfo Ávila, Billy Lo, Mak Ka Lok ou Ip Un Hou representaram no passado a RAEM nesta competição sancionada pela autoridade desportiva nacional da China. Boa alternativa Uma presença do Campeonato da China de GT no maior evento automobilístico do sudeste asiático em 2020 irá certamente aumentar o perfil internacional de um campeonato ainda muito focado para o mercado interno, não obstante de contar hoje com um parque automóvel preenchido pelas as várias marcas envolvidas na disciplina: Audi, BMW, Mercedes-AMG, Porsche, McLaren, Lamborghini, etc. “Caso se concretize, acho que irá tornar o campeonato mais competitivo e atraente para equipas asiáticas, embora tenha ainda uma forte componente chinesa”, admite Duarte Alves, que desde 2017 tem colaborado pontualmente com várias equipas do Campeonato da China de GT, quando o seu preenchido calendário no GT World Challenge Asia e no Super GT (Japão) assim o permite. “Acho que ao inserirem o Grande Prémio de Macau no calendário poderão elevar o estatuto do campeonato. No entanto, não sei como será o formato das corridas, porque regra geral são duas corridas, de uma hora de duração cada, com paragem nas boxes obrigatória, algo que não será fácil aplicar em Macau”. O experiente engenheiro de Macau reconhece que esta é uma boa alternativa para a continuidade de uma corrida que foi introduzida no programa do evento em 2008. “Falando como fã do Grande Prémio de Macau, assumindo que a Taça GT terá continuidade, é muito positivo para os fãs das corridas de carros de GT3, pois será mais uma corrida desta categoria mas com pilotos profissionais e amadores, isto se as regras normais do Campeonato da China de GT se mantiverem para esta prova”.
Bar Che Che – The Breathers acolhe “Sensations”, com várias actuações ao vivo Andreia Sofia Silva - 24 Jul 2020 Beber um copo enquanto se ouve um som é a aposta do bar Che Che – The Breathers para este sábado. O evento “Sensations”, organizado em parceria com o colectivo de músicos Darkroom Perfume, traz ao palco nomes como Rita M, Betchy Barros, MNDY, ARI e um DJ Set de Rocklee, numa promessa de variedade de sons [dropcap]S[/dropcap]ensações no palco e fora dele, com música para todos os gostos, do hip-hop à electrónica, e ao pop-rock. É esta a aposta do bar Che Che – The Breathers, situado na Taipa, em parceria com o colectivo Darkroom Perfume. Na página oficial do evento no Facebook, a promessa é de uma noite com “sons cheios de alma com vocalistas, músicos e rappers, bem como DJs”. No cartaz constam nomes Rita M, MNDY, ARI, Betchy Barros e Rocklee, que protagoniza um DJ set. Ao HM, Rita Martins, artista integrante do colectivo Darkroom Perfume, confessou que a ideia por detrás de “Sensations” é organizar “um evento com tipos de música que nem toda a gente está acostumada a ouvir e que vai fazer com que as pessoas explorem as suas experiências e sentimentos quando ouvem as músicas”. Da parte de Gabriel Yung, gerente do bar, também havia a vontade de organizar algo diferente em termos de entretenimento nocturno. “Na verdade contactei o Rocklee para trabalhar em parceria com o meu bar, pois acho que faltam em Macau locais onde se possam organizar este tipo de eventos, onde as pessoas podem desfrutar de música num bar.” Rita Martins tem boas expectativas para sábado, até porque “o pessoal já sabe o tipo de eventos que organizamos”. É o mesmo público que “demonstra apoio para aquilo que estamos a tentar fazer na área do entretenimento em Macau”. Cartaz preenchido MNDY, vocalista nascido e criado em Macau, é um dos nomes que faz parte do cartaz de sábado. Formado na conceituada Berklee College of Music em Boston, Estados Unidos, MNDY “viajou até as suas raízes para se conectar mais com a música que se faz a nível local”. Desta forma, o estilo desta cantora é uma mistura entre jazz, música alternativa e R&B, onde músicos como James Blake, Banks e AURORA são as suas influências. Betchy Barros, uma cantora de neo-soul radicada em Macau, sobe também ao palco do Che Che – The Breathers no sábado. As suas maiores inspirações são os grandes nomes da soul, como Erykah Badu, Alicia Keys e Amy Winehouse. “Devido à sua formação multicultural, o maior desejo de Betchy é partilhar a sua mente com o mundo enquanto luta pela igualdade como activista”, aponta o colectivo Darkroom Perfume numa nota partilhada nas redes sociais. ARI, diminutivo de Ariclan, é outro dos nomes que actuam no sábado. Trata-se de um músico e compositor natural de Macau que toca vários instrumentos, trazendo uma “luz única” aos seus concertos. “Esta façanha deu-lhe um reconhecimento por parte da indústria musical mais comercial e proporcionou-lhe oportunidades para colaborar com vários artistas do sudeste asiático”, explica o colectivo Darkroom Perfume. Um dos exemplos do sucesso de ARI foi em 2016, quando o músico representou Macau na competição chinesa “Sing! China”. No ano seguinte, o artista fez uma digressão pela Ásia e América do Norte com o artista Matzka, de Taiwan. Mais recentemente, ARI tem colaborado com outras produções musicais e artistas. Esta não é a primeira vez que os Darkroom Perfume organizam eventos em Macau, mas a aposta na diversidade e na diferença é algo que está sempre presente. “O nosso colectivo quer oferecer uma plataforma para artistas locais, quer sejam djs, cantores, rappers ou músicos, para poderem partilhar com o público de Macau, e não só, o gosto pela música. Normalmente fazemos uma mistura de live acts com dj sets, dependendo do tipo de evento que é organizado”, explicou Rita Martins. No sábado as portas abrem às 21h e a entrada são 150 patacas, com direito a duas bebidas.
Guia | Novo Macau faz queixa ao CCAC sobre prédio de 90 metros Pedro Arede - 24 Jul 2020 A Associação Novo Macau apresentou uma queixa ao CCAC por considerar que o prédio de 90 metros de altura na Avenida do Dr. Rodrigo Rodrigues viola a Lei do planeamento urbanístico. O Grupo para a Salvaguarda do Farol da Guia voltou a alertar a UNESCO sobre o prédio inacabado na Calçada do Gaio [dropcap]A[/dropcap] Associação Novo Macau considera que a planta do lote situado na Avenida do Dr. Rodrigo Rodrigues, que prevê a construção de um prédio com 90 metros de altura, viola a Lei do planeamento urbanístico. Recorde-se que o projecto tem sido contestado por danificar a integridade visual da paisagem do Farol da Guia, que integra a lista do património mundial da UNESCO. De acordo com um comunicado divulgado ontem, a Novo Macau revela ainda que, após suspeitar que o conteúdo da planta de condições urbanísticas (PCU) do lote é susceptível de violar a lei, fez queixa junto do Comissariado contra a Corrupção (CCAC), solicitando a abertura de uma investigação sobre o caso e a suspensão de todos os trabalhos relacionados com o projecto. A associação aponta que o conteúdo da PCU falha ao não especificar correctamente os índices de ocupação e de utilização dos solos máximos permitidos e a altura máxima permitida dos edifícios, normativas previstas no Artigo 59.º da Lei do planeamento urbanístico. “A planta viola claramente Lei do planeamento urbanístico e afecta o direito legal de informar o público (…) e falha em cumprir os princípios da legalidade, justiça, transparência e promoção da participação pública, estipulados pela Lei do planeamento urbanístico. A Novo Macau considera, por isso, que a planta é ilegal”, pode ler-se no comunicado. Além da queixa junto do CCAC, a Novo Macau considera ainda que a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) deve “ter a iniciativa de retirar a planta em questão”. No comunicado, é ainda apontado que, no seguimento da consulta pública da planta de condições urbanísticas, perto de 80 por cento das opiniões mostram oposição ao projecto. Ameaça constante A Novo Macau reitera ainda que, a paisagem do Farol da Guia tem sido “constantemente ameaçada” pelas construções que têm vindo a ser repetidamente edificadas na Avenida do Dr. Rodrigo Rodrigues. “A Novo Macau apela encarecidamente ao Governo que restrinja os limites de altura dos edifícios em redor do farol, de forma a evitar que projectos legais, embora irrazoáveis, continuem a prejudicar uma paisagem extremamente valiosa, que integra a lista do património mundial”. Também o Grupo para a Salvaguarda do Farol da Guia abordou ontem o tema da preservação da integridade visual do monumento, através do envio de mais uma carta dirigida à UNESCO. Depois de em Junho ter enviado uma primeira carta e de se ter encontrado, no mês seguinte, com o Instituto Cultural (IC), o grupo de salvaguarda pede à UNESCO que relembre o Governo de Macau acerca do prédio inacabado na Calçada do Gaio, cuja altura de 81 metros está acima do limite de 52,5 metros fixado para a zona. Considerando este um “compromisso feito há 12 anos entre os governos da China e Macau para com a comunidade internacional e os residentes de Macau”, o grupo acusa as autoridades locais de “incapacidade e insensibilidade” para proteger o património mundial da região. “O Governo de Macau deve ser honesto para com a comunidade internacional. Sem mentiras! Sem desculpas! A utilização de uma avaliação do impacto no património feita à medida, de forma a justificar qualquer tipo de violação ou para manter a altura do edifício inacabado nos 81 metros é um insulto à inteligência da comunidade internacional e dos cidadãos de Macau”, pode ler-se na nova carta enviada à UNESCO. O Grupo para a Salvaguarda do Farol da Guia pede ainda à UNESCO que torne públicos os relatórios sobre a avaliação do impacto no património, entregues pelo Governo em 2017 e 2018 e que relembre as autoridades de Macau da sua obrigação de preparar estudos de impacto antes do início de qualquer obra na Avenida do Dr. Rodrigo Rodrigues.
Caso IPIM | Testemunha negou limite mínimo de investimento Salomé Fernandes - 24 Jul 2020 O chefe da divisão de fixação de residência entre 2012 e 2015 disse ontem em tribunal que durante esse período não estava estabelecido um mínimo de investimento, e defendeu que o objectivo inicial relativamente à publicação de critérios era de abertura [dropcap]O[/dropcap] funcionário do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM) que chefiou a divisão de fixação de residência entre 2012 e 2015 disse ontem em tribunal que durante esse período não havia um limite mínimo de investimento, ao contrário de outros testemunhos. Ao invés, disse que se adoptou uma grelha de pontos, em que quanto mais elevado o investimento, mais alta era a pontuação. António Lei explicou que a decisão acabou por recair em não divulgar esta grelha ao público, mas que inicialmente tinha sido pensado “revelar o mais possível para facilitar” a vida à população. De acordo com a testemunha, o ex-presidente do IPIM e arguido no caso, Jackson Chang, pediu-lhe para elaborar uma grelha com o objectivo de “facilitar a apreciação dos casos” e “estabelecer critérios”. Pretendia-se ainda atrair investimento e profissionais especializados para Macau. Mas apontou a existência de divergências relativamente à sua divulgação. No seu testemunho, defendeu que, ao contrário do público em geral, um requerente ou procurador constitui parte interessada e “tem o direito de consultar o processo” e o seu andamento. A testemunha disse ainda que Jackson Chang pediu informações sobre o andamento de pedidos de casos particulares. Sobre o seu entendimento para a razão dessas perguntas, foi directo: “creio que alguém lhe pediu informações”. Mas desconhece se os dados chegaram por essa via a terceiros. Neste âmbito, notou que os processos acabariam por ser submetidos ao presidente, e que devia dar as informações pedidas por Jackson Chang por ser seu superior hierárquico. Além disso, declarou ter recebido instruções do arguido para responder aos pedidos de informações de membros da comissão executiva. Por outro lado, explicou que durante esses três anos, o tempo de permanência em Macau não era um critério nos pedidos de residência e que não se ponderou apurar “in loco” a relação laboral. Para justificar a ausência deste critério, a testemunha deu como exemplo a possibilidade de uma empresa querer destacar pessoal no exterior para angariar clientes. Assinar às cegas “Só me limitei a assinar”. Foi assim que uma técnica superior do IPIM respondeu quando questionada sobre a elaboração de um relatório. Indicando que os colegas de cargos mais baixos precisavam que os relatórios fossem assinados por técnicos superiores, apontou que confirmou apenas elementos básicos, desconhecendo o que motivou a aprovação de um processo de fixação de residência. Em reacção, a juíza questionou a testemunha sobre se o seu trabalho “era só assinar” e se “assinou fechando os olhos”. A trabalhadora que escreveu o documento, afirmou que os funcionários que recebiam os documentos não podiam dizer se o salário não tinha os valores exigidos, e que um mecanismo online para os requerentes não dava resultados vinculativos, nem explicava quais as rúbricas da candidatura com melhor ou pior pontuação. Questionada pela defesa, disse que quando os critérios dos montantes mínimos de investimento para aprovação da fixação de residência se alteravam, passava a ser o novo valor a ser tido em consideração, mesmo para processos que tivessem dado entrada no IPIM anteriormente. “Em caso de surgir um novo regulamento temos de o usar nos pedidos que ainda não foram aprovados”, explicou. Não soube indicar se existia algum documento com essa norma, mas frisou tratar-se de ordens de um superior. Para esclarecer quem definiu esta norma vão ser chamadas novamente duas testemunhas do IPIM a tribunal.
Cartão de consumo | Nova fase mantém valor diário e dispensa inscrição Pedro Arede - 24 Jul 2020 A segunda fase do subsídio de apoio à economia começa em Agosto, mantendo o valor diário nas 300 patacas. Os detentores do cartão da 1ª fase podem carregar montante de 5.000 patacas a partir de segunda-feira num dos 190 postos, sem necessidade de inscrição ou marcação. As infrações previstas para operadores foram reforçadas [dropcap]A[/dropcap] partir de segunda-feira será possível carregar os cartões de consumo em circulação, com o montante de 5.000 patacas, relativo à segunda fase do plano de subsídio de consumo que vai de 1 de Agosto a 31 de Dezembro. Para o fazer, o saldo do cartão deve estar a zeros e os utilizadores devem dirigir-se a um dos 190 postos de carregamento, não sendo necessária inscrição, marcação prévia ou apresentação de identificação. A novidade foi avançada ontem na sede do Governo por Tai Kin Ip, Director dos Serviços de Economia (DSE). Quer isto dizer que, durante a próxima semana, apenas poderão ser carregados os cartões cujo valor tenha sido gasto na totalidade, já que a 1ª fase termina na sexta-feira, 31 de Julho. Desta forma, o saldo remanescente de todos os cartões ficará a zero a 1 de Agosto, permitindo o carregamento do novo montante, mesmo a quem não esgotou, na totalidade, as 3.000 patacas da 1ª fase. Assim, quem já é detentor do cartão de consumo, entre 27 de Julho e 14 de Dezembro, poderá fazer o carregamento através do sistema automático “de toque” num dos 190 postos de serviços públicos, bancos, associações e empresas. Sobre os destinatários, âmbito de aplicação e montante máximo de utilização diária, fica tudo na mesma. Ou seja, o plano de apoio destina-se aos portadores do BIR permanente ou não permanente de Macau e pode ser usado para comprar produtos e serviços no mesmo tipo de estabelecimentos. O limite a despender por dia continua fixado nas 300 patacas. Isto, apesar de Tai Kin Ip ter chegado a admitir o contrário no mês passado. A razão, assenta num estudo baseado na experiência da 1ª fase. “Quando apresentámos o relatório já analisámos o limite máximo diário e, na verdade, há poucas pessoas que conseguem utilizar 300 patacas num dia, apenas cerca de 6,0 por cento. Por outro lado, mais de 80 por cento utilizaram menos de 200 patacas diariamente. Por isso, depois de ponderar decidimos manter o limite nas 300 patacas”, explicou Tai Kin Ip. Quem ainda não tem cartão ou acabou entretanto por perdê-lo, pode levantar um novo cartão de consumo pré-carregado com 5.000 patacas num dos seis locais destacados para o efeito. Neste caso, o requerente ou representante tem de apresentar o original do BIR, sendo, no entanto, dispensada inscrição ou marcação. Quem perdeu o cartão, só poderá levantar um novo, caso tenha participado a ocorrência junto do CPSP. Os locais de carregamento e levantamento dos cartões de consumo podem ser encontrados online, na página exclusiva sobre o “Plano de Subsídio de consumo” da DSE. Mais fiscalização O director da DSE revelou ainda que para fiscalizar os operadores e estabelecimentos comerciais, foram introduzidas mais penalizações. Nesta segunda fase, sempre que se verificarem actos de aceitação ilícita do subsídio de consumo ou dadas informações enganosas sobre os preços, o estabelecimento passa a estar banido de aceitar pagamentos com o cartão de consumo. Foram ainda introduzidas melhorias ao nível do levantamento do cartão de consumo por parte de menores de idade, de forma a permitir que, além do pai, mãe ou tutor, o acto possa ser feito por um parente maior até ao 3º grau (avós, irmãos, tios) ou por outra pessoa indicada pelos pais ou tutor. Tai Kin Ip revelou ainda que a 2ª fase do plano de consumo tem como objectivo principal continuar a “assegurar o emprego e estabilizar a economia” e envolve um investimento total de 3,6 mil milhões de patacas, isto “se todos os residentes levantarem o cartão”, esclareceu. Sobre a Macau Pass, empresa responsável pelo serviço, Tai Kin Ip esclareceu que na segunda fase, irá cobrar às PME uma taxa até 0,5 por cento, por transacção. 3ª fase descartada O director dos Serviços de Economia (DSE), Tai Kin Ip, revelou ontem que não existem, para já, planos para o lançamento de uma 3ª fase do plano de subsídio de consumo. “Vamos continuar a observar a implementação da 2ª fase e a situação económica para haver mais ponderações. Por enquanto ainda não estamos a ponderar outro plano depois desta segunda fase”, sublinhou. Sobre a 1ª fase, Tai Kin Ip avançou que foram gastos 1,87 mil milhões de patacas pelos residentes, acreditando que até ao fim do mês a totalidade do montante dos cartões seja consumido.
Global Times diz que Consulado americano em HK e Macau é fortaleza de ataque à China João Luz - 24 Jul 2020 [dropcap]“N[/dropcap]ão é segredo que os Estados Unidos encaram o seu Consulado Geral em Hong Kong e Macau como uma fortaleza de ataque à China”. Esta frase integra um editorial do jornal oficial Global Times que ataca Washington na actual batalha diplomática entre as duas potências mundiais. O jornal oficial menciona as justificações norte-americanas para o encerramento da embaixada chinesa em Houston, como as questões de “propriedade intelectual” e “informação privada”, e condena que seja sugerida a participação de pessoal diplomático chinês em actividades ilegais contra interesses norte-americanos. “Os Estados Unidos perderam toda a credibilidade. O tamanho das representações diplomáticas chinesas não excede as necessidades do trabalho do dia-a-dia. Nenhum dos nossos consulados emprega milhares de diplomatas e empregados, como o Consulado Geral dos Estados Unidos em Hong Kong e Macau”, prossegue o editorial do órgão do Partido Comunista Chinês publicado ontem. Noutro artigo publicado também no Global Times, o ministro dos Negócios Estrangeiros da China argumenta que desta vez o mundo sabe que foi Washington a abrir “um novo campo de batalha”. Neste artigo, publicado ao fim da noite de quarta-feira, é avançado que “alguns juristas sugeriram o encerramento do Consulado Geral em Hong Kong e Macau como uma medida de retaliação e de busca da estabilidade em Hong Kong”. De seguida, o artigo sugere que pessoal do consulado norte-americano desempenhou um papel nos protestos na RAEHK. Estudos e opinião O Global Times terá também conduzido uma sondagem no Weibo, na quarta-feira, a perguntar aos cibernautas que representação diplomática norte-americana preferiam ver encerrada como gesto de retaliação. Segundo o jornal, até às 21h30 de quarta-feira, mais de 8600 pessoas votaram, com quase 80 por cento a preferir o Consulado Geral dos Estados Unidos em Hong Kong e Macau. “O resultado do inquérito reflecte vividamente a raiva pública contra a interferência norte-americana em Hong Kong”, interpretou Tian Feilong, da Associação Chinesa dos Estudos sobre Hong Kong e Macau, um think-tank baseado em Pequim. Na mesma votação no Twitter, 64,9 por cento dos inquiridos escolheu o consulado em Hong Kong e Macau, 10,4 por cento preferiu a representação em Guangzhou e 7,8 por cento em Chengdu. Importa referir, que o Global Times cita uma notícia da Reuters que avançou que seria o consulado de Wuhan a encerrar. O jornal oficial justifica a abertura de hostilidades diplomáticas com o frenesim e a falta de controlo em que está a Administração Trump à medida que se aproximam as eleições. “As eleições presidenciais estão a estragar a relação entre as duas maiores potências do século XXI. A humanidade, que deseja paz, estabilidade e desenvolvimento, terá de pagar por isso”, argumenta o jornal oficial.
Chumbos abolidos ou limitados do ensino básico ao secundário João Luz - 24 Jul 2020 A partir do próximo ano lectivo terminam as reprovações até à quarta classe. Para os 5º e 6º anos o limite máximo de chumbos será de 4 por cento e para o ensino secundário oito por cento. O Governo anunciou ontem as medidas que procuram evitar que os alunos percam o interesse no ensino [dropcap]P[/dropcap]assa tudo, a bem ou a mal. Segundo o regulamento administrativo que estabelece o sistema de avaliação do desempenho dos alunos da educação regular de Macau, as reprovações no ensino básico, da primeira à quarta classe, estão abolidas. Ou seja, todos os alunos serão automaticamente aprovados, de ano para ano. A novidade foi anunciada ontem, em Conselho Executivo, pelo porta-voz do organismo e secretário para a Administração e Justiça, André Cheong, e pelo director dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ), Lou Pak Sang e aplica-se a partir do ano lectivo 2021/2022. O fim dos chumbos no ensino básico foi justificado pelo director da DSEJ com o desenvolvimento das crianças que frequentam este grau educativo e pelo pulo cognitivo e lógico que uma criança dá por volta do 4º ano de escolaridade. Reter um aluno nessa altura poderia ser contraproducente. “O quarto ano é essencial, dá-se uma grande alteração ao nível cognitivo e da lógica”, referiu Lou Pak Sang. A decisão da DSEJ resultou de um relatório elaborado por uma comissão depois de visitas e reuniões com entidades congéneres de regiões vizinhas e nas observações dos sistemas de ensino tidos em consideração. Lou Pak Sang, sem referir as regiões envolvidas, adiantou que foram tidas em conta as vantagens e desvantagens deste sistema até se chegar ao regulamento apresentado ontem. Outra novidade, é o peso da intervenção dos encarregados de educação que podem solicitar a retenção, com a autorização as escolas, por exemplo, se o aluno tiver faltado muito às aulas. Para os 5º e 6º anos lectivos, a taxa de reprovação máxima é de 4 por cento dos alunos da escola, enquanto para o ensino secundário é 8 por cento. Em ambos, podem abrir-se excepções, caso a escola e os encarregados de educação entendam que o chumbo terá efeitos positivos no desenvolvimento educativo do aluno. Especiais e retidos Lou Pak Sang entende que o aluno não tira vantagens por ser retido um ano e aponta que um dos objectivos deste regulamento foi “controlar a retenção num nível justo para que os alunos possam consolidar a sua base” e que, se os chumbos se alargam nos anos, “os alunos podem perder o interesse na aprendizagem”. Ontem foi também apresentado o regulamento administrativo do regime do ensino especial, que vem actualizar disposições em vigor há mais de 20 anos. O regulamento distingue três graus de aluno de ensino especial. Os que estão em educação inclusiva (com objectivos curriculares basicamente iguais aos alunos da educação regular), os alunos de turmas pequenas de ensino especial e alunos das turmas do ensino especial. A distinção entre as duas últimas categorias encontra-se ao nível dos objectivos curriculares. Os alunos das pequenas turmas têm como missão “adquirir conhecimentos, desenvolver capacidades e atitudes fundamentais e factores imprescindíveis para se poderem dedicar a uma profissão. Os alunos das turmas de ensino especial, que sofrem de problemas mais severos, têm como objectivo adquirir capacidade para viver autonomamente, assim como competências técnico-profissionais e atitudes básicas. Foi também criado e definido o conceito de aluno sobredotado. Nesse sentido, o director da DSEJ referiu que é necessário “seleccionar estes alunos e avaliar as suas potencialidades, permitir que desempenhem as suas próprias capacidades, e observar qual a área em que têm mais vantagem e talento.” Lou revelou ainda que em 2015 havia em Macau 38 escolas que ministravam ensino inclusivo, número que aumentou para 43 estabelecimentos no actual ano lectivo e que subirá para 48 escolas no próximo ano. Quanto ao número de turmas de ensino especial são no total 841.
Luís Menezes Leitão, bastonário da Ordem dos Advogados de Portugal: “Acordo de Extradição deveria ser revisto” Andreia Sofia Silva - 24 Jul 2020 Bastonário da Ordem dos Advogados de Portugal até 2022, Luís Menezes Leitão diz que é certo o regresso do protocolo com a Associação dos Advogados de Macau, cujos detalhes estão a ser ultimados. Relativamente ao Acordo de Extradição assinado com Macau, o bastonário defende uma revisão e diz que as respostas do Ministério da Justiça português “não são minimamente convincentes” [dropcap]O[/dropcap] Acordo de Extradição assinado entre Portugal e Macau está parado, mas não suspenso, segundo notícias recentes. A actual direcção da Ordem dos Advogados (OA) mantém a mesma posição contra o documento, tal como a anterior direcção? Esse Acordo sempre nos suscitou bastantes preocupações e devemos dizer que a resposta que o Ministério da Justiça deu relativamente às preocupações que foram expressas pelo meu antecessor [Guilherme de Figueiredo] não pareceram minimamente convincentes. Alegaram a Convenção de Extradição anterior sem fazer referência expressa a que estamos perante um Acordo posterior, ou seja, relativamente a todas estas questões. Por outro lado, verifica-se que nada foi alterado relativamente aos problemas que existiam, isto porque, de facto, o Acordo poderá envolver uma extradição relativamente a factos que não estavam previstos na lei quando foram praticados. O Acordo admite a possibilidade de existirem pedidos de extradição relativamente a factos que não são crime em Portugal e também o facto de ocorrerem situações em que está expressamente prevista a extradição para outras regiões da China. Não nos esqueçamos da polémica que suscitou relativamente a Hong Kong com as leis de extradição e que estão a gerar todas estas questões. Estamos também perante uma situação estranha ao dizer que o Acordo está parado mas não está suspenso. O que verificamos é que ainda não se avançou neste âmbito, mas compreendemos que nesta situação de pandemia não há tempo para discutir tudo e o Parlamento [Assembleia da República] tem estado ocupado com inúmeras matérias. A nosso ver esse Acordo suscita-nos reservas, não ficamos esclarecidos com a resposta do Ministério e queremos sensibilizar os grupos parlamentares para essa questão. Portugal tem uma longa tradição relativamente a situações de garantias de defesa e esperamos que continue a mantê-la neste quadro relativamente a esta situação. A OA tem de manter essa posição sobre este Acordo. Foram feitos novos pedidos de esclarecimento junto do Ministério da Justiça? Que eu saiba não houve qualquer alteração da posição do Ministério, bem pelo contrário. Em todas as declarações públicas o Ministério tem mantido a sua posição e parece-me que também o MNE tem colocado a mesma posição. Mas não é o Governo que terá a última palavra sobre este assunto, também haverá uma palavra do Parlamento e do Presidente da República. É algo sobre o qual nos vamos bater para que os princípios que defendemos fiquem aqui consagrados. Como explica este compasso de espera para a promulgação deste Acordo de mais de um ano, e que coincide agora com a entrada em vigor da lei da segurança nacional de Hong Kong? O Governo português pode revelar aqui alguma falta de estratégia na conclusão deste dossier de forma atempada? Não sei, tem de perguntar ao Governo. Mas a situação de Hong Kong tem evoluído de forma muito rápida e talvez de uma forma que não se previa. Uma série de Estados estão a pôr em causa os acordos assinados com Hong Kong e esse é um factor que tem dias. Não tenho a certeza de que possa haver uma ligação entre as duas situações. De qualquer das formas, acho que a situação de Hong Kong tem de fazer ponderar tudo o que existe hoje e que leva a que a OA se tenha pronunciado como se pronunciou. Isso é algo que tem de ser verificado porque o que se está a passar em Hong Kong suscita de facto alguma preocupação no quadro dos diversos países europeus e nos EUA. O Governo português deveria suspender o Acordo? O Acordo deveria, pelo menos, ser revisto de forma a esclarecer as coisas mais preocupantes. Apesar de ter havido uma assinatura, tem de haver uma ratificação, e por isso neste quadro a situação deveria ser revista. Não vou ao ponto de defender uma total suspensão, mas seria preferível que houvesse de facto um acautelamento das preocupações que existem e que foram expressas pela OA. Acho que ambas as partes, quer Portugal e RAEM, teriam a ganhar com essa situação até devido ao afastamento da comparação com Hong Kong, que não me parece que seja minimamente desejável. O Governo de Macau já referiu que há aspectos da lei da segurança nacional que necessitam de ser revistos ou reforçados. Teme esta revisão da lei? Esperamos que Macau, que tem tido uma relação com Portugal bastante grande neste âmbito, também acautele os padrões que nós temos e que pensamos serem comuns em termos de justiça e segurança. Quero crer que todas as posições que venham a ser tomadas em Macau estejam em conformidade com o património que partilhamos neste âmbito em termos de tutela das garantias e de defesa e protecção das pessoas. Não antecipamos nada em sentido contrário. Olhando para a situação de Hong Kong está em causa uma progressiva perda de autonomia e uma eventual violação da Declaração Conjunta? Não vou ao ponto de fazer essa avaliação. Mas o que temos visto é algo que, na perspectiva de existir uma jurisdição autónoma, de acordo com o quadro “um país, dois sistemas” que se manteve nas diversas declarações, estamos a ver uma aproximação muito grande a uma jurisdição que se está a afastar relativamente ao que era em termos de autonomia. Isso, a nível internacional, está a ser avaliado pelos diversos países e estas questões estão a ser colocadas relativamente aos acordos de extradição. Parece-me que seria preferível que se mantivesse essa autonomia, o que é uma garantia em relação a Hong Kong, a nível internacional e também para a própria posição da República Popular da China. Ter-se colocado a perspectiva de haver um período de transição de 50 anos, que começou em 1997, e que terminará em 2047, [significa que] ainda faltam 27 anos para haver uma aproximação grande como está a ocorrer já no âmbito deste sistema. Seria preferível, e até para o papel da China no mundo, que essas duas jurisdições mantivessem o período de transição que está previsto e que deveria ser respeitado. Pelo menos a nível internacional a imagem que está a dar é que existe uma certa antecipação, o que não me parece que seja adequado. A situação política em Hong Kong e o possível impacto em Macau estão a causar algum receio aos advogados portugueses em Macau? Nota uma maior vontade de regresso a Portugal ou maior receio do exercício da profissão no território? Não tenho notado nada disso. Os colegas de Macau com quem tenho falado estão perfeitamente integrados e bastante satisfeitos com o exercício da advocacia em Macau. Não temos visto nada, até agora, em que se coloque algum problema em termos do exercício da advocacia em Macau. E devo dizer que a situação em Macau não se compara minimamente com Hong Kong. Não nos parece que o quadro da advocacia em Macau, com base no que tenho contactado, nomeadamente com o presidente da Associação dos Advogados de Macau, [tenha sofrido alterações]. [É um quadro] bastante satisfatório. Não temos tido queixas algumas. Há vozes críticas por parte de alguns advogados da crescente erosão da autonomia, mas também do Estado de Direito em Macau. Qual a sua posição sobre isso? Espero que a situação de Hong Kong não seja vista como um precedente. A situação de Macau sempre foi tratada de forma muito distinta face a Hong Kong e o processo de transição também ocorreu de forma completamente distinta e com uma melhor relação entre a China e Portugal do que a relação que a China teve com o Reino Unido. Compreendo que a situação de Hong Kong possa ser vista como um precedente para Macau, mas desejo que isso não venha a acontecer. Alguns receios que se têm colocado relativamente a este Acordo de entrega justificam o facto de esperarmos que o património jurídico existente em Macau se mantenha durante 50 anos. Não vemos que haja justificação para esses receios, mas por isso é que pequenas coisas que não são correctas devem ser logo alvo de aviso, como é o caso deste Acordo. Portugal deveria ter defendido melhor neste Acordo o que são os princípios jurídicos essenciais relativamente ao que é o Direito português e que faz parte do património que temos em comum com Macau. Relativamente ao protocolo com a Associação dos Advogados de Macau, vai ser retomado no seu mandato? A nossa intenção é essa. Já falámos com o dr. Jorge Neto Valente que manifestou o máximo interesse para que haja uma renovação do protocolo que já existia, mas que esteve interrompido durante um longo período. Discutimos isso no Conselho Geral e temos o máximo interesse. É também uma forma de mantermos a nossa ligação em termos jurídicos com Macau onde neste momento existe ainda um grande património jurídico comum. Achamos que ambas as advocacias podem trabalhar em conjunto. Já há uma data concreta para que esse protocolo entre em vigor? Temos tido alguma dificuldade de comunicação devido à pandemia. Já tivemos várias reuniões, já me encontrei com o dr. Jorge Neto Valente aqui em Portugal e temos estado em contacto. O nosso Conselho Geral está também a discutir o protocolo e esperamos que muito brevemente ele possa ser retomado. Penso que é útil para ambas as partes. Há pontos que têm de ser alterados ou melhorados? Não estávamos insatisfeitos com o protocolo anterior. Há sempre melhorias a fazer e temos um grupo de colegas que estão a trabalhar nisso. Contamos que terminem esse trabalho muito brevemente para que o protocolo possa ser assinado. A OA pondera fazer protocolos com outras jurisdições? Há espaço para protocolos com a China, por exemplo? É algo que possamos sempre equacionar. Esses protocolos onde existe uma língua completamente distinta, como é o caso da China, podem ser mais difíceis de fazer, mas neste momento temos em debate um protocolo com a Ordem dos Advogados da Ucrânia. Estamos sempre disponíveis e se houvesse interesse da parte da Ordem dos Advogados chinesa essa proposta seria examinada.
O desconforto da vida Manuel de Almeida - 23 Jul 2020 “Entre mim e a vida há um vidro ténue. Por mais nitidamente que eu veja e compreenda a vida, eu não lhe posso tocar”. Fernando Pessoa (1888 – 1935) [dropcap]A[/dropcap] vida das pessoas baralha narrativas fáceis, não são novelas, contos – viajar através da vida -, é um longo, sinuoso e árduo caminho. Não somos apenas fruto das nossas escolhas. Outros nela interferem de maneira abusiva, pelo prazer de mandar, desequilibrar, inquietar. Existem também sociedades que esvaziam o “cidadão” da sua capacidade de escolher, transformando-o num simples fantoche, marionete – subjugam-no. São governos malévolos. Ao instinto que sonha, à razão que ordena, à inteligência que observa e compara, à justiça com alma, à ética com rosto, à curiosidade pela inocência do futuro, tudo se perde na ditadura da ilusão. Uma vida com propósito, significado e prazer, é dar voz a mais e melhor política, lutar pela protecção ambiental – não por moda ou em abstracto -, defender o património cultural – material e imaterial -, “enfrentar uma política educativa vocacionada para fomentar o facilitismo e a ignorância”. Devemos exigir um ensino que contribua para formar indivíduos cultos, interessados e activos – seres pensantes – Homens Livres. Já nem falo de Saúde (falta poder de decisão), nem de Habitação (é preciso articular ferramentas). Há “massa”… Há uma máxima de Tolstói, que se aplica a Macau, que nem uma luva e, passo a citar: “há quem passe pelo bosque e apenas veja a lenha para a fogueira”. São intrigantes, complexas, vadias, esdrúxulas certas crónicas de vida – engolir em silêncio, sofrer vinganças sobre ideias, assédio moral, crimes sexuais, enclausurar a ambição, a tortura que atordoa a velhice – os direitos do cidadão não podem depender de uma capacidade tecnológica – , a dor dos catequistas do regime – queixam-se –, mostram um ar deprimido, violência doméstica, viver a utilidade do inútil, o vejetar no mundo subversivo social. Os caminhos a seguir são sempre um dilema. O desconforto, o imprevisível da vida. A grande crise que se vive hoje em dia é uma crise de valores e comportamentos individuais e de vida em sociedade. Não “é a economia, estúpido!”. Existe défice de cultura, educação, ciência, civismo – há uma grande histeria de ignorância e estupidez. Não se ouvem ruídos, mas silêncios, precisamos de uma vida que decline os silêncios. Temos de reavaliar a base espiritual da sobrevivência… Pode-se comprar o coração do povo, mas, espero, nunca se comprará a inteligência da sociedade. Apesar desta permanecer incapaz de perguntar, descobrir, exigir. (Isto são apontamentos dos meus cadernos de tendências, tento reconstruir o pensar, delinear, perscrutar o horizonte – a luz crepuscular da vida –, cheio de omissões e contradições da minha longa caminhada existencial. Permanecer ou atravessar?) Valerá ainda a pena construir espaços (lugar) e tempos ? Não, denotamos já uma expressão de cansaço existencial (um desenraizamento da identidade), é preferível guardar o “silêncio da memória do que o ruído da celebração”. A vida flui – Macau será a morgue onde jazem as ilusões! Lembram-se da história da Fada Oriana, da Sophia? Castigada. Perdeu as asas e a varinha de condão. Só ao tentar salvar uma velha que estava a cair do abismo, mesmo sem asas e varinha, saltou do abismo e agarrou a velha pelos pés. Aí, apareceu a fada rainha que lhe devolveu as asas e a varinha de condão. Perceberam ? É esta a história…
GIC Challenge | Rui Valente obtém vitória em Guangdong Sérgio Fonseca - 23 Jul 2020 Depois de vários contratempos e atrasos, fruto das restrições causadas pela pandemia global da COVID-19, Rui Valente foi o primeiro piloto de matriz portuguesa de Macau a dar início à sua temporada desportiva, e logo com um triunfo na prova de abertura do “GIC Challenge” no passado fim-de-semana no Circuito Internacional de Guangdong [dropcap]U[/dropcap]sando a sua experiência de mais de três décadas de automobilismo, o piloto português da RAEM há mais tempo no activo, levou o seu “velhinho” Honda Integra DC5 a uma vitória incontestável numa corrida, que teve uma hora de duração, na sinuosa pista dos arredores da cidade chinesa de Zhaoqing. “Estou muito satisfeito com esta vitória, mas não foi uma corrida fácil, pois teve início às 14h40 e foi disputada sob intenso calor”, explicou Rui Valente ao HM, lembrando que não só o piloto, mas também as mecânicas das viaturas sofrem com a elevada humidade e calor que se fazem sentir nesta altura do ano na região do Delta do Rio das Pérolas. A regulamentação da prova não obriga a reabastecimentos, pois o depósito de gasolina destes carros consegue armazenar gasolina para uma hora seguida de competição. Contudo, as regras ditam que qualquer equipa que inscreva dois pilotos no mesmo carro, terá que efectuar uma paragem após meia hora de corrida. Como Rui Valente correu “a solo”, viu-se obrigado a entrar nas boxes por duas ocasiões, passando no “pitlane” a 60km/h, mas sem a necessidade de imobilizar a viatura. Este contra-tempo de visitar as boxes por duas ocasiões não desmoralizou o “nosso” piloto, que soube como superar as suas limitações e suplantar uma concorrência melhor apetrechada. Estratégia perfeita Numa corrida de “endurance”, em que há a necessidade de uma ida às boxes, a rapidez em pista só por si não é garantia de um bom resultado no final. A estratégia do piloto do Honda, um carro que ainda está nas especificações Grupo N (N2000), resultou em pleno, visto que os dois principais candidatos ao triunfo acabaram por ser surpreendidos pela táctica do veterano piloto do território. “Arranquei de terceiro lugar na grelha de partida e envolvi-me na luta pelo primeiro lugar nas primeiras três voltas, mas depois fiz a minha primeira passagem pelas boxes, deixando-os a disputar a liderança”, contou Rui Valente. “Quando saí, dei mais quatro voltas, passei alguns concorrentes mais lentos e fiz uma nova passagem. Depois, daí em diante, foi sempre a abrir até à bandeira de xadrez”. O favorito à vitória nesta corrida era um BMW 320si (ex-WTCC), que tinha sido o carro claramente mais rápido na qualificação, no entanto, o piloto perdeu muito tempo em batalhas por posições, caindo na classificação da corrida. “Tenho a segunda corrida do GIC Challenge a 15 de Agosto, e com certeza que os meus adversários vão fazer tudo para me superar, portanto vou ter que me defender. Vou tentar evoluir o velho Honda e torná-lo mais rápido nas rectas, com maior velocidade de ponta”, afirma o piloto que chegou a ser o único representante português na Corrida Guia nos anos 1990s e que nas corridas dos campeonatos de Macau corre actualmente com um MINI Cooper S. Com este triunfo, Rui Valente foi o primeiro piloto não-chinês a vencer uma corrida de automobilismo na República Popular da China em 2020.
Voltarei a fotografar com os teus olhos Luís Carmelo - 23 Jul 2020 [dropcap]A[/dropcap] Maria Beatriz Matias era uma mulher do mundo. Grande pintora e pessoa de colheitas raras. Adorava perseguir o voo das gaivotas no Vondelpark de Amesterdão. Conhecia-lhes os traçados, decifrava-lhes os abecedários, presumia-lhes os grandes círculos no ar. Sempre que eu subia àquele terceiro andar da Wilhelminastraat, havia uma tela com mulheres e asas, muitas asas vermelhas em processo de construção e colagem. E chá, muito chá. E pessoas adoráveis que tive a sorte de conhecer. Raramente era inverno, porque ela guardava as folhas prateadas dos plátanos e afirmava que lhe congelavam o tempo em segredo. Junto à varanda, a corda e o cesto resistiam em estado de prontidão à Chagall, pois, caso houvesse incêndio, a Beatriz entregar-se-ia acrobaticamente às nuvens. Na vida nada é comedido. Mais cedo ou mais tarde todos os rios acabam por transbordar. Com a Maria Beatriz Matias, aprendi duas coisas fundamentais e só hoje me dou conta disso. Primeiro: a verdadeira família não é a que herdamos geneticamente, mas sim a outra – ou as outras – que vamos construindo ao longo do tempo. Segundo: não é por se ter nascido e crescido na mesma terra e falar a mesma língua que somos obrigados a viver para sempre dentro de um mesmo aquário, a maior parte das vezes turvo e opaco. O mundo a sério é sempre do outro lado. Seja do outro lado da família, seja do outro lado dos cheiros da infância. Sempre pratiquei intuitivamente estes dois princípios, mas foi ela quem me deu a ver como eles brilhavam, de facto, no meio do universo. Jaromil, protagonista de ‘La vie est ailleurs’, romance de Kundera com título tomado a Rimbaud que saiu a público em 1969 (e que a Beatriz tantas vezes citava), sabia bem que assim era. Vimos lado a lado o Astor Piazzolla em Utreque. E o que ela riu das palavras iniciais do concerto: “Quando comecei a compor, ninguém no meu país entendeu o que eu fazia. E hoje ninguém no meu país ainda entende o que eu faço. É essa a minha alegria”. A Beatriz sabia de cor ‘Le bateau Espagnol’ do Léo Ferré, cantava-o com xailes negros e depois voltava a rir como quem depena a angústia até poder agarrá-la pelas vísceras e atirá-la para dentro do canal. E rir-se-ia ainda mais ao ver o animal a ir ao fundo naquela água verde, suja, cheia de objectos e histórias que tanto a fascinavam. Visitei com a Beatriz a casa onde John Ruskin viveu em Veneza. Ficava mesmo em frente à ilha de San Giorgio Maggiore. Num repente, vi-a a saltar para o parapeito de uma das janelas e confessou-me que lhe apetecia morrer ali. Seria muito sincero esse seu desejo, mas ela na verdade auscultava patamares mais vastos do que a simples vertigem momentânea. Uma vez, em casa do José Barrias, em Milão, disse para quem a quis ouvir que não se importava nada de desaparecer, desde que ficasse para sempre a voar. E ria sempre do que dizia. A Beatriz morreu a rir. Temos um livro pronto a sair a público há mais de três décadas, intitulado ‘As Muitas Manhãs’ (era, também, uma homenagem a Almada Negreiros e às suas “quatro manhãs”). Os desenhos da Beatriz acamparam nessa altura ao lado de um punhado de poemas meus, traduzidos pela Catherine Barel, que mantenho ainda comigo. Não sairá jamais a público, pois há verdades que não se editam. Tinhas toda a razão, Beatriz, quando dizias que é um crime escrever e ler diante da rebentação das ondas. Fiquei tão triste com a notícia da tua morte, Beatriz. Sim: morte. Detestas como eu que se diga que alguém partiu. Ninguém parte para sempre, afinal. Continuaremos em Bruges de volta das enguias com natas ou no ‘Trou Noire’, em Paris, no meio daquelas performances e instalações que o nosso querido José M. Rodrigues quis que fossem da cor do vinho tinto e não da água. A invisibilidade é uma anestesia perigosa, sabemo-lo bem. No dia em que eu quebrei umas quantas costelas – tu sabias que a bicicleta andava azarada – fizeste de propósito aquele desenho em que um touro se transformava em pedra. Mas era uma pedra-menina com folhos de saia de onde caíam duas ou três penas da cor do sangue. A alegoria esgotou-se na altura, mas flutuou ao jeito dos zepelins até ao dia em que te estou aqui desastradamente a escrever. Na realidade, todo o choque, todo o embate, toda a batida – mesmo a do mar de Zandvoort em Janeiro – é um recomeço. Hoje voltarei a fotografar com os teus olhos. E regressarei certamente a esse afinco de liberdade que era a visão mais íntima e verdadeira de Jaromil. Juro que tentarei regressar todos os dias à abertura do mundo, enclausurando no escuro a pequenez de que tu também fugiste.
As duas cabeças António Cabrita - 23 Jul 2020 21/07/20 [dropcap]N[/dropcap]o Jardim Zoológico de San Diego, na Califórnia, vê-se algo bastante raro embora não excepcional: cobras do deserto californiano que, devido a algum tipo de acidente genético, têm duas cabeças. O que complica a vida a este corpo com duas cabeças é que são duas vontades, dois sujeitos, do ponto de vista cerebral. E podem morrer por causa disso: cada cabeça busca comida de seu lado; quando uma encontra comida, a outra desvia-a na direcção que prefere e assim essas pobres cobras de duas cabeças dificilmente se conseguem alimentar, apenas em zoológicos. Vemos, então, que o princípio da exclusão funciona mesmo entre duas cabeças-de-cobra que têm o mesmo corpo. Associo isto às culturas nas sociedades pós-coloniais. As supostas remanescências da cultura colonial e a suposta e “restituída” cultura de origem são duas cabeças que se recusam a perceber que hoje vivem num mesmo corpo híbrido e as duas cabeças em vez de conjugar esforços para se conseguirem alimentar combatem-se e morrem à fome. O resultado dá a soma resto zero do princípio da exclusão! Já, Heinz von Foerster, um dos pais da cibernética, apontava há cinquenta anos, o grande paradoxo da auto-organização dos sistemas. E explicava que se obviamente a auto-organização significa autonomia, por outro lado um sistema auto-organizado é um sistema que tem de aplicar-se para construir e reconstruir a sua autonomia e, portanto, nesse esforço desperdiça energia. Ou seja, fica sujeito à entropia, à dissipação da força que o mantinha regulado, coeso. Para recuperar o equilíbrio que lhe permite a sobrevivência a única hipótese é esse sistema captar energia de fora, ou seja, observava Von Foerster qualquer sistema para ser autónomo, acaba por estar dependente do mundo que lhe é exterior. E essa dependência não será apenas energética, mas também informativa, porque todo o organismo vivo extrai informações do mundo exterior, a fim de organizar o seu comportamento. Este modelo não é nada dissemelhante ao que se passa com as culturas e as identidades. Nós somos alguma coisa por referência a outras que nos estão enganchadas, embora fora de nós, a identidade é um valor no processo de diferenciação que distingue o significado de “ser africano” do significado de “ser europeu”, tal como a palavra se engancha no silêncio. Sou pela defesa do incremento das línguas-mãe em Moçambique, pelo resguardo da sua dignidade edificando uma literatura nessas línguas, porque as línguas transportam consigo sensibilidades únicas; contudo, creio igualmente que o português é um ganho irrenunciável e que as culturas não são bolhas estanques, ilhas. Ou seremos ilhas mas em arquipélago, organizado num sistema de mútua influência e em perpétua re-combinação. Não existe o branco, o preto, o azul, existe a crioulagem, tal como se aprende na física das cores, tal como ensina o filósofo Edouard Glissant. Nesta discussão, infinita, sobre a questão das identidades tenho a maior dificuldade em perceber as posturas extremadas. Que alguém se reivindique exclusivamente bantu, a partir dos instrumentos e das categorias que lhe foram dados por uma educação de influência ocidental e vice-versa, que um europeu não seja sensível a aspectos da cultura africana que o podem enriquecer. E fico sempre um pouco incomodado no momento obnóxio em que alguém desata a falar em nome da ancestralidade. Não é invulgar que desse fundo mágico que o romântico Herder emprestou aos imaginários colectivos emerja uma vontade de nos alhearmos daquilo a que Stendhal chamava a “força moral”, a coragem de pensar por si próprio – posto que na verdade cada homem está sozinho na História. Na próxima vez que participar de um debate destes já sei que argumentos usar contra o “abuso dos ancestrais”. 22/07/20 Uma observação de José Navarro de Andrade no Facebook leva-me a rever alguns filmes do Preston Sturges, e sobretudo essa comédia extraordinária The Palm Beach Story (1942)/ Uma Mulher de Verdade, com a Claudette Colbert. Uma das coisas mais difíceis de trabalhar com alunos de guionismo é os diálogos, um dos territórios mais áridos nas artes narrativas. Conheço óptimos escritores que não atinam com os diálogos e são realmente raros os filmes (dois, três, ao ano) em que os diálogos sejam primorosos. A maior parte das vezes os diálogos apenas ilustram a acção, não estabelecem uma dialéctica com ela (quando muito cumprem a função de revelarem a parte emocional das personagens) nem montam uma rede comunicacional que é por si só um outro espectáculo porque dispara os níveis de significação e de subentendidos. Um bom diálogo vira o contexto de pantanas, serve a trama para a desviar. Billy Wilder era um mestre nisso. Constato agora que o Preston Sturges – de que só tinha visto dois ou três filmes há 30, 40 anos, na pouca assiduidade com que frequentava a Cinemateca – é absolutamente outra referência a seguir. De ontem para hoje vi três filmes dele e agora terei de farejar nos filmes em que ele só fez os diálogos. The Palm Beach Story é uma festa, sobretudo pela personagem feminina, uma «mulher prática» de todo desassombrada e que, sabendo ser leal, à hipocrisia dos costumes diz nada e faz o que tem a fazer. Sturges, revolucionou a screwball comedy (a comédia de situações inconvencionais) porque a doseou com as técnicas de “marivaudage” (que tira todos o proveito do jogo das máscaras e da mentira) e é o exemplo de como uma enorme massa de diálogos num guião – se maduros e acutilantes (a dificuldade de explicar isto aos realizadores) não impede que a narrativa tenha um bom ritmo – só depende do pico dos actores e do “factor de improbabilidade à pele” das situaões. E digo-vos, o final do filme é tão trepidante e surpreendente como o de Quanto mais Quente Melhor, do Billy Wilder, pois socorre-se da técnica do “deus ex-machina” com uma eficácia (louca) que se impõe como necessária. Um filme imperdível. Há uma cópia menos má, legendada em português, no Youtube.
Soldado desconhecido João Paulo Cotrim - 23 Jul 2020 Santa Bárbara, Lisboa, terça, 7 Julho [dropcap]B[/dropcap]em sei, acumula-se para ali uma lista de leituras por cumprir, de respostas por distribuir, de nós por desatar. As circunstâncias nem por um momento apaziguaram ansiedades, pararam desejos, travaram projectos, antologias, volumes, obras completas. O futuro, portanto, a dizer presente. Bem sei dos afazeres, mas por portas travessas estou noutra. (Surrealismo é, para mim, portas atravessadas pela travessura. Aliás, de qualquer maneira, chaleira.) Regressei a Tardi, o das trincheiras art nouveau, do sangue a vestir corpos e a desenhar cidades. Fui directo ao «120, Rue da la Gare» (ed. Casterman), transescrito, que é como quem diz, transporto do policial homónimo de Leo Malet. De tantos me receitarem policiais mal traduzidos tratei de ir a um original. O homem faz da arquitectura personagem e convinha-me o perfume de Paris, que no caso é sobretudo Lyon. Queria perder-me nas janelas, nas varandas, mas não me apareceram tantos espelhos assim. Uma leitura psicanalítica travessa poderia dizer que foi o nevoeiro que me atraiu, com voz off e cava. De tanto ouvir, e até escrever, que atravessávamos longa noite, no meu caso mais pelo mistério do que pelo maléfico, afinal a boa descrição dos dias mais longos está na descida das nuvens para diluir os contornos, as esquinas, as arestas. Poderia ter saltado noutra direcção, mas desci ao campo arqueológico onde se arquivam os ensaios titubeantes das figuras e domínios e temas que farão de Tardi um autor. Passei por «Adieu Brindavoine» (ed. Casterman), mas, estava escrito, era só etapa nas cores do deserto para chegar ao preto e branco propício de «La Véritable Histoire du Soldat Inconnu» (ed. Futuropolis). Aviso chaleira, de qualquer maneira: para efeitos do ao que venho terei que desfiar a narrativa, mas sem talento, estou descansado, para reduzir o que Tardi faz acontecer às palavras que o descrevem. A sobrecapa oferece figura nua branca, com reforço subtil de verniz, rodeado de estátuas tumulares, uma delas segura a coroa da glória, mas parece em desequilíbrio. Quase nu, melhor dizendo, por estar o escanzelado de bigode de óculos e chapéu de coco a aparecer das águas negras, como negros são os céus, uns e outras divididos por nuvens vermelhas. Negro sobre negro, com subtil reforço de verniz, estão as garrafais «TARDI» (coisa tonitruante de obra a vender-se completa). A figura, há que dizê-lo, é um autor. Na capa esconde-se figura esquelética e desdentada, careca e de minúsculos olhos, vestida no rigor dos começos do século das grandes guerras, em posição de grito, branca a camisa, os dentes esparsos, a minusculeza dos olhos, cinzas a dizer o resto, vermelha a língua e o grito em AAAR arredondado. É o editor. (Com umas palavras antes da aventura, Tardi conta da Futuropolis e Étienne Robial, nos idos de 1970, laboratório onde a as palavras autor e editor não eram ditas por sugerirem desconsiderações contratuais. Curioso, no momento em que o nome procurava romper com a indústria, afirmar a criação por detrás da máquina.) Estamos agora no cemitério onde tudo começa. Assim pensa a personagem perdida: «Encontrava-me de novo nas trevas mais profundas, onde o meu temperamento ansioso tantas vezes me levava.» Os mausoléus fazem-se ilhas e estas palácios nos quais a deriva da personagem principal, entretanto despida como convém nas viagens primordiais, vai reencontrar e matar velhos conhecidos e recém reconhecidos. Até que uma inevitável aeronave o resgata para o transportar à enorme e labiríntica casa do editor, enlouquecido como acabam todos. «Reconheci a decoração característica, de extremo mau gosto». Só ali a personagem perdia se descobre enquanto autor. Não um qualquer, mas de «romances de aventuras a dez tostões, simplistas e aflitivos, mas que logo conheceram vivo sucesso popular». O que foi enfrentando, em modos sonhados e eróticos, foram as suas criações, que com ele discutem neste instante as minúcias não apenas das narrativas e do acontecido, mas dos perfis, qualidades e destinos. O editor, por exemplo, tinha aparecido como tiranossaurus, de cérebro minúsculo inversamente proporcional à sua ferocidade. A morte, piloto de aeronaves, oriunda do seu primeiro romance é quem o atinge e atira para as trincheira da grande guerra de onde lhe recolhem as ossadas que estão sob o Arco do Triunfo na qualidade de soldado desconhecido. Marquei já com o meu futuro psicanalizador: vamos trocar umas ideias sobre o assunto? Santa Bárbara, Lisboa, sábado, 17 Julho O Expresso de hoje entrevista Isa Gomes, a professora de português tornada figura mediática por ter aparecido na televisão (os tempos estão tão confusos que soa regresso aos anos 1980 e as pastilhas Pirata). Por ter alguma coisa a dizer? Só para a conhecermos melhor. Que andará ela a ler? Responde, logo com surpresa e interrogação: «Leituras? Nunca fui muito de ler livros, mas sempre adorei tê-los.» Esta afirmação quase subtil acerca da leitura de livros e do que cada um é muito de ser está longe de morrer sozinha, e tenho algures guardada resposta semelhante de escritora e, se pior pudesse ser, com responsabilidades. Tenho-o dito em debate por várias vezes e logo com reacções aflitas e assertivas: com honrosas excepções, os nossos professores não lêem, sendo que a doença é mais grave nos que supostamente ensinam a língua. Há-de haver estudos, mas basta fazer contas às tiragens, andar pelas escolas e ouvir as apresentações dos convidados, enfim, ler as «poesias». Basta estar atento. O país não lê, por que raio (de trovoada) se poderia exigir isso à profe? Será preciso a um engenheiro saber da evolução dos materiais? As pontes romanas foram feitas a olho e pedra e ainda se atravessam, que nem portas ou chaleiras. E que vos dizia eu? Omnipresente está a radioactividade do simbólico: «sempre adorei tê-los!». Convém ter por perto um livro, assim uma vela na dispensa, para quando falta a luz. O Plano Nacional de Leitura tem um pilar no professorado, mas dará para fazer pontes em cima dele? Também vos tinha dito, ancião que vou sendo, que o meu melhor professor foi de português, com língua e muito mais? Ponho-me depois a pensar em que páginas de livros tocaram por estes dias as mãos que apedrejam a professora que se está a esforçar para ler até ao fim do Verão um livro de contos. Aaaarh, dizia o editor enlouquecido.
Japão alivia restrições e permite entrada de alguns residentes estrangeiros Hoje Macau - 23 Jul 2020 [dropcap]O[/dropcap] Japão decidiu ontem permitir a entrada de mais residentes estrangeiros, aliviando as restrições de imigração devido a covid-19, começando com trabalhadores e estudantes, no dia em que círculos empresariais europeus e norte-americanos demonstraram preocupação pela situação. A entrada no território vai ter alguns requisitos, como um teste negativo à covid-19 antes da chegada ao país, e vai ser escalonada, segundo disse o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, em reunião com o grupo de trabalho de gestão da pandemia. Abe, que não especificou a partir de quando vão ser aplicadas essas excepções, assinalou também que está a considerar deixar entrar de forma limitada e durante um curto período de tempo empresários da Europa e dos Estados Unidos, e que vão começar negociações com mais 12 países e regiões para retomar as viagens de negócios bilaterais. Entre os territórios com os quais Tóquio vai negociar estão a China, Coreia do Sul, Taiwan, Hong Kong, Macau, Brunei ou Birmânia. O Japão conseguiu chegar a acordo ontem com o Vietname e a Tailândia para aliviar as restrições e permitir a retoma de viagens “até final de Julho”, mas manteve a exigência de uma quarentena de 14 dias, conforme anunciado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros. As negociações também estão em curso com a Austrália e Nova Zelândia, países que os nipónicos consideram ter o vírus sob controlo. Ainda ontem, antes de Abe anunciar o alivio das medidas, os círculos empresariais europeus e norte-americanos no país lamentaram a persistência da proibição de entrada de estrangeiros, mesmo os que residem no país, acreditando que essa medida prejudica a sua atividade. Enquanto os japoneses são convidados a observar uma quarentena de 15 dias no regresso ao país, os residentes estrangeiros no Japão não podiam regressar se tivessem saído, excepto em certos casos “humanitários” (urgência familiar, por exemplo) devidamente justificados. Essa política de padrões duplos, única entre os países do G7, constitui um “sério obstáculo para muitos membros e as suas famílias”, sublinhou Christopher LaFleur, presidente da Câmara norte-americana de comércio no Japão, durante uma conferência de imprensa em Tóquio. “Isso terá certamente um impacto” na imagem e na atractividade económica do Japão, porque gera “imprevisibilidade” para muitas empresas estrangeiras, afirmou também Michael Mrozczek, presidente do Conselho Empresarial Europeu no Japão. Outras medidas Abe indicou ainda que o Governo vai considerar as condições para permitir a entrada de atletas e outras pessoas envolvidas nos adiados Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Tóquio 2020, que esta quinta-feira começam a contagem de um ano para a cerimónia de abertura, a ser realizada no dia 23 de Julho de 2021. Esse compromisso acontece no mesmo dia em que o governo japonês anunciou a inclusão e 17 outros países na lista de proibição migratória, elevando o número de territórios afectados para 146. O Japão contabilizou até ao momento mais de 27.000 casos de covid-19 e 1.002 mortes, incluindo as relacionadas com o cruzeiro Diamond Princess, que esteve em quarentena em Fevereiro.
História | Centenário da presença militar portuguesa em Macau em debate Andreia Sofia Silva - 23 Jul 2020 Ricardo Borges, investigador da Universidade de São José, dá hoje uma palestra intitulada “100 anos de presença militar portuguesa em Macau (1875-1975)”. Ao HM, o académico denuncia alguns “erros” e “mitos” que foi encontrando em artigos sobre a história militar portuguesa do século XX e alerta para um afastamento progressivo da génese das fortificações militares actualmente destinadas ao turismo [dropcap]F[/dropcap]oi em 1975 que se deu a saída da Guarnição Militar Portuguesa de Macau, mas antes disso há uma imensa história com 100 anos de existência para contar. Ricardo Borges, investigador da Universidade de São José (USJ), aborda hoje essa história no Grand Lapa, a partir das 19h, numa palestra promovida pela Câmara de Comércio França-Macau. Ao olhar para o centenário da presença militar portuguesa em Macau, o investigador percebeu “a falta de estudos sistematizados”, uma vez que “todas as publicações que existem acabam por parar no final do século XIX e não há uma continuação para o século XX”, disse ao HM. No início do século XX, sobretudo até ao final da I Guerra Mundial, em 1918, houve “um investimento na Guarnição com o Governador Correia da Silva, que de facto trouxe a Guarnição para o século XX em termos tecnológicos e estruturais, já com cerca de 20 anos de atraso”. Em 1933 dá-se início ao Estado Novo em Portugal, com a implementação de uma nova Constituição, que acaba por influenciar o posicionamento e o investimento do Governo de Salazar na Guarnição Militar Portuguesa em Macau e em todo o Ultramar. Ricardo Borges denota que existe “uma marcada diferença de abordar a Guarnição até 1933”, uma vez que, com a nova Constituição, “existem ordens de Lisboa para se cortar nas despesas de todas as colónias e as despesas militares são as primeiras a levarem um corte”. Posteriormente desenvolve-se “um período de grande instabilidade na Ásia”, onde, além dos tumultos políticos na China, com a queda do Império e a Guerra Civil entre nacionalistas e comunistas, acontecem “as ambições imperiais japonesas que se fazem sentir mais cedo do que a II Guerra Mundial”. “Em 1937 já se sentiam essas fricções no sul da China e vou falar um pouco sobre algumas das coisas que ainda não foram abordadas sobre Macau no período da II Guerra Mundial”. Nesse sentido, Ricardo Borges vai “aprofundar aquilo que a Administração portuguesa aqui em Macau acabou por vender aos japoneses. E também vou falar da documentação que foi destruída, era uma situação muito complicada”. A “grande guarnição” A implementação da República Popular da China, em 1949, faz Salazar reforçar o número de homens na Guarnição Militar Portuguesa em Macau. Esta passa a constituir “um projecto político muito importante para a imagem internacional do Estado Novo e para a própria imagem interna de sustentação do regime”. Dessa forma, “em 1949 e até ao final da década estavam em Macau todos os anos mais de 3 mil soldados, uma grande guarnição num território pequeno e com uma população diminuta”. Tal acabou por ter um efeito social, uma vez que muitos soldados portugueses acabaram por constituir família em Macau e ficar pelo território. “É um período com muita influência na comunidade portuguesa.” Até 1975 mantém-se “intocável o status quo entre Portugal, a Administração portuguesa e o regime comunista na China”. Ricardo Borges diz ter recolhido depoimentos de antigos soldados e oficiais que “revelam que a postura era muito diferente na forma de encarar os militares em Macau”. Militares e turismo Olhando para as fortificações e infra-estruturas militares que permanecem no território, Ricardo Borges lamenta que não haja uma maior associação entre a sua génese e significado original e o turismo. “Tudo começou com a Fortaleza da Barra, que foi transformada em pousada em 1981, mas também quando o Governador Rocha Vieira transformou a Fortaleza do Monte no Museu de Macau. O património está materialmente bem preservado e há cuidados, mas todas as novas sinergias que estão a ser associadas a estes locais afastam sempre o visitante da sua origem militar.” Ricardo Borges dá o exemplo da Fortaleza da Barra, “onde existe uma grande transformação do espaço e que dissocia muito daquilo que era a sua função original”. Quanto à Fortaleza do Monte está-se perante “um caso paradigmático”, uma vez que “se o visitante entrar na Fortaleza pelo Museu, quando chega lá acima não tem nenhuma noção de que está numa fortificação”. O investigador alerta para o facto de existir “cada vez mais uma postura pós-colonialista, com uma clara dissociação daquilo que é a antiga função [das estruturas militares] e da forma como são hoje apresentadas a visitantes ou residentes”. Em termos académicos, Ricardo Borges também lamenta que, na feitura da história militar na viragem do século XIX para o século XX, existem “inúmeros erros”. “É o que chamo de mitos gravados na pedra, mas que não têm qualquer sustentação. Muita da investigação que tenho feito contradiz muitos destes mitos que se calcificaram ao longo do século XX. É necessário muito cuidado quando se trata da história militar em Macau durante o século XX. Esse é um trabalho que ainda está por fazer”, conclui.
Mong-Há | Associação de Arquitectos abre concurso para circuito pedonal Andreia Sofia Silva - 23 Jul 2020 [dropcap]A[/dropcap] Associação de Arquitectos de Macau (AAM) está a promover a Competição de Arquitectura para Projecto do Circuito Pedonal Sem Barreiras do Parque Municipal da Colina de Mong-Há. O principal objectivo da competição, garante a AAM, “é a reorganização do circuito pedonal da Colina de Mong-Há”. A fim de melhorar a acessibilidade e fluidez do tráfego entre a área da Colina de Mong-Há e a zona de Fai Chi Kei, “propõe-se a criação de um percurso pedonal sem barreiras arquitectónicas, conveniente e inclusivo a todos os habitantes e visitantes da colina”. O período de inscrição, que começou ontem, vai estar aberto até às 14 de Agosto. As propostas são submetidas na sede da Associação dos Arquitectos de Macau, na Avenida do Coronel Mesquita, N.º 2F e serão aceites nos dias 20, 21 e 24 de Agosto (das 15h às 17h). A AAM aponta, em comunicado, que o Parque Municipal da Colina de Mong-Há “é um dos mais importantes espaços recreativos na zona norte de Macau”. A iniciativa é organizada em conjunto com o Instituto para os Assuntos Municipais (IAM) e os candidatos podem participar de forma individual ou em grupo, sendo que pelo menos um dos membros do grupo deve ser arquitecto registrado na Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT). Os projectos candidatos devem respeitar “o ambiente natural, a história e cultura da zona e que proponham injectar novos elementos que enriqueçam o ambiente e as instalações públicas”. As propostas vencedoras recebem um prémio de 150 mil patacas, enquanto as menções honrosas um bónus de 50 mil patacas.