Imposto de Circulação | Deputados temem que nova lei crie confusão João Santos Filipe - 26 Nov 2021 A partir de Janeiro deixa de ser obrigatório afixar nos veículos o selo do imposto de circulação. Os deputados que estão a analisar na especialidade o diploma temem que o tempo para explicar as mudanças à população não seja suficiente As alterações legais que vão abolir a obrigação de afixar nos veículos o dístico do imposto de selo estão a causar preocupações aos deputados da comissão da Assembleia Legislativa que analisa na especialidade o diploma. Falta pouco mais de mês para a entrada em vigor das mudanças e teme-se que o tempo para promover e explicar as alterações à população não seja suficiente. “O objectivo da lei é eliminar a afixação do dístico. O senhor secretário explicou-nos que não vai alterar o dever do pagamento do imposto de circulação. As pessoas têm de pagar entre Janeiro a Março, como nos anos anteriores, mas não precisam de imprimir ou afixar o dístico”, começou por explicar Ella Lei, presidente da comissão. No entanto, o tempo para a entrada em vigor das alterações começa a apertar. Até Janeiro, ainda falta concluir a análise na especialidade, a comissão emitir o seu parecer e a proposta de lei ser votada em plenário. “Hoje é 25 de Novembro, estamos preocupados. O Governo diz que ainda vai fazer alguns ajustes na redacção da lei, que tem poucos artigos, e a proposta tem de ser aprovada antes de 1 de Janeiro do próximo ano”, traçou como cenário. “Estamos preocupados porque falta pouco mais de um mês e não sabemos se o Governo vai ter tempo”, acrescentou a deputada. Tudo nos conformes Contudo, o Executivo, que ontem se fez representar pelo secretário para a Administração e Justiça, André Cheong, acredita que tem meios para terminar a lei a tempo. “O Governo respondeu-nos que está preparado para responder às dúvidas dos cidadãos [após a entrada em vigor da lei]. Disseram-nos também que vão ter tempo para formar pessoal antes da entrada em vigor das alterações à lei”, revelou Lei, sobre a posição do Executivo. Sem a obrigação de afixar o dístico espera-se uma simplificação dos processos relativos ao imposto de circulação. Contudo, não haverá redução do preço, o que não implica que as mudanças não beneficiem a população. Foi esta opinião da deputada que lidera a comissão. “Se as pessoas não têm de imprimir o dístico, ficam numa situação melhor. Antes, elas podiam fazer o pagamento, mas como não tinham colado o dístico num lugar bem visível do veículo ficavam sujeitas a uma sanção. Agora, o cidadão fica apenas com o dever de pagar o imposto, não tem de afixar o dístico”, justificou Ella Lei. “Os cidadãos ficam a ganhar, o processo torna-se mais conveniente”, acrescentou.
Violência doméstica | Wong Kit Cheng exige novas medidas Andreia Sofia Silva - 26 Nov 2021 Ontem celebrou-se o Dia Mundial da Violência Doméstica e a deputada Wong Kit Cheng aproveitou o período antes da ordem do dia na Assembleia Legislativa (AL) para exigir alterações ao actual sistema de recolha de provas e tratamento dos casos, alertando para as poucas condenações na justiça. Wong Kit Cheng entende que é preciso aperfeiçoar “o procedimento de participação dos casos de violência doméstica”, uma vez que, cinco anos depois da entrada em vigor da lei, continuam a existir “dificuldades na recolha de prova”. Desta forma, a deputada entende que as vítimas devem ser avaliadas psicologicamente e receber apoio terapêutico. Wong Kit Cheng pede que os serviços de apoio às famílias das vítimas sejam melhorados, podendo as autoridades estudar “a possibilidade de fornecer recursos financeiros, alojamento e outros apoios adequados de acordo com a situação real antes, durante e depois do processo”, indo além da mera definição das medidas na legislação. Defendendo o reforço de medidas de controlo destes casos entre fronteiras, Wong Kit Cheng quer também que seja melhorada a eficácia do trabalho interdepartamental. A deputada deseja ver regulamentada a conciliação familiar, para que instituições de serviço social privadas possam proporcionar esse tipo de serviço.
Finanças | Lei de gestão de fortunas aprovada na generalidade Andreia Sofia Silva - 26 Nov 2021 Foi ontem aprovada na generalidade a proposta de lei da fidúcia, que estabelece um regime de gestão de fortunas, sendo que apenas sete tipos de instituições em Macau têm autorização para gerir fortunas. O secretário para a Economia e Finanças, Lei Wai Nong, adiantou que com a aprovação da lei foi dado um passo para a “construção de um sistema financeiro moderno”, enquanto que o presidente da Autoridade Monetária e Cambial de Macau (AMCM), Chau Sau San, adiantou que desde a transferência de soberania, em 1999, o número de contas de gestão de fortunas tem aumentado. Actualmente são mais de 400 mil contas abertas no território, que movimentam mais de 270 mil milhões de patacas. O deputado Ip Sio Kai considerou que a lei era esperada “há muito tempo” e que é importante “para desenvolver o sector financeiro”, tendo em conta que muitos bancos “já desenvolvem actividades de gestão de fortunas”, apesar da ausência de regulamentação que uma separação clara dos capitais. Por seu lado, Pereira Coutinho questionou como serão fiscalizados estes processos e garantida a qualificação dos profissionais ligados à gestão de fortunas. Já Song Pek Kei disse ser necessário “criar confiança” com este novo regime, pelo facto de estar ligado à gestão de patrimónios de avultado valor. O secretário assegurou que a AMCM será responsável pela fiscalização dos processos.
Deputados aprovam reforço orçamental de 6,3 mil milhões Andreia Sofia Silva - 26 Nov 202126 Nov 2021 A Assembleia Legislativa aprovou ontem, com carácter de urgência, um reforço orçamental de cerca de 6,3 mil milhões de patacas vindos da Reserva Financeira. A revisão orçamental prevê também a redução dos montantes atribuídos a organismos com gestão autónoma e financiamento público A Assembleia Legislativa (AL) aprovou ontem a terceira proposta de revisão do orçamento para este ano que prevê uma injecção de 6,3 mil milhões de patacas da Reserva Financeira e a redução dos orçamentos de organismos especiais com gestão autónoma, mas financiamento público. A revisão contempla também a redução da despesa do orçamento ordinário integrado no valor acima das 10,4 mil milhões de patacas. Relativamente às receitas do orçamento integrado, a redução foi superior a 16,7 mil milhões de patacas. Na proposta apresentada, com carácter de urgência, pelo secretário para a Economia e Finanças, Lei Wai Nong é referido que a revisão orçamental se deve ao facto de não ser possível garantir um equilíbrio entre receita e despesa face à queda das receitas brutas do jogo e, consequentemente, dos impostos arrecadados pelo Governo. Até Outubro deste ano, as receitas do jogo foram de 72,1 mil milhões de patacas, valor “longe da estimativa anual de 130 mil milhões de patacas”. A proposta apresentada a plenário refere ainda que o valor acumulado do imposto sobre o jogo foi de apenas 26,5 mil milhões de patacas, ou seja, “não chegou aos 60 por cento da taxa de execução orçamental”. Com esta alteração, o saldo do orçamento ordinário integrado da RAEM para este ano será superior a 675 milhões de patacas. O secretário frisou que o Governo continua “a reduzir as despesas desnecessárias”, reforçando “as que dizem respeito ao bem-estar da população”. Na mesma proposta, o Executivo declara também que “as perspectivas para as receitas das finanças públicas não são muito optimistas para os restantes meses do ano”, tendo sido ordenado aos serviços e organismos públicos “a avaliação das despesas orçamentais necessárias” até Dezembro. Obras por pagar Ron Lam U Tou pediu explicações sobre a redução da verba do PIDDA (Plano de Investimentos e Despesas da Administração) no valor de 4,6 mil milhões de patacas, mas o Governo justificou o corte com o facto de muitas obras públicas não terem sido realizadas devido à pandemia. “Temos de fazer a liquidação tendo em conta a execução da obra, só depois é que pagamos. Se as obras não forem concluídas este ano serão pagas com o orçamento do próximo ano. Está reservada uma verba no orçamento para pagar essas obras do PIDDA, neste aspecto há continuidade”, explicaram os responsáveis da Direcção dos Serviços de Finanças (DSF). Os dirigentes da DSF disseram também que, caso o ritmo de construção destes projectos públicos avance, aumentam também as despesas a pagar pelo Executivo. Essas despesas serão pagas com o montante destinado à dotação profissional, que para o próximo ano será de 2,9 mil milhões de patacas.
Ella Lei exige planeamento de futuras operações do Metro Ligeiro Andreia Sofia Silva - 26 Nov 2021 A deputada Ella Lei utilizou o período antes da ordem do dia para exigir ao Governo um planeamento da futura operação do Metro Ligeiro, uma vez que o contrato “já passou da metade” e “nos próximos três a quatro anos vão ser construídas mais linhas”. “O Governo tem de planear atempadamente as opções e os planos para a futura operação”, apontou a deputada, que pediu, no entanto, que estejam em cima da mesa várias opções, sobretudo em matéria de recursos humanos. “O Governo deve ter objectivos claros de formar pessoal local para continuar a operar o Metro Ligeiro, e criar uma equipa local de operação, sobretudo pessoal especializado em técnicas essenciais”, disse Ella Lei. A deputada dos Operários lembrou que, de acordo com o plano delineado, cerca de 95 por cento dos postos de trabalho no Metro Ligeiro serão ocupados por residentes. No entanto, defendeu que faltam esclarecimentos sobre a percentagem de funcionários especializados e não especializados, além de que a sociedade receia que os trabalhadores locais “continuem a ser incapazes de desempenhar funções técnicas especializadas ou assumir cargos relevantes de chefia na área de operação, gestão e manutenção”. Ainda em matéria de recursos humanos, Ella Lei adiantou que “os trabalhadores locais se queixaram muitas vezes de serem tratados de forma injusta e optaram por se demitir”, situação que levanta dúvidas quanto à estabilidade destes postos de trabalho. Pedido orçamental Na mesma intervenção antes da ordem do dia, a deputada referiu também que o Executivo deve “preparar-se com as duas mãos para a futura operação geral” dp meio de transporte “caso a equipa local não consiga assumir as suas responsabilidades e seja preciso adjudicar parcialmente o serviço”. A legisladora ligada à Federação das Associações dos Operários de Macau, sugeriu mesmo que as autoridades escolham “outras empresas adjudicatárias experientes e capazes” para evitar problemas contratuais. Além disso pediu a divulgação do orçamento global do novo traçado do Metro Ligeiro, e que todo o processo seja fiscalizado para “evitar situações em que o financiamento não possa ser custeado no futuro”.
Covid-19 | Filipinas quer dar alimentos grátis à população para vacinar 15 milhões em três dias Hoje Macau - 25 Nov 2021 O Presidente das Filipinas quer vacinar 15 milhões de pessoas contra a covid-19 em três dias com a ajuda do exército e polícia, e sugeriu a distribuição de alimentos gratuitos aos vacinados para convencer a população. Num discurso transmitido na terça-feira à noite do palácio presidencial de Malacañang em Manila, Rodrigo Duterte pediu às autoridades locais que utilizem “todos os recursos necessários, especialmente recursos humanos” para estes dias nacionais de vacinação entre 29 de novembro e 01 de dezembro. “Autorizo todos os governadores e presidentes de câmara. Gastar o dinheiro. Um dia, pagarei”, disse o Presidente, que incluiu a distribuição de alimentos gratuitos entre as recomendações para persuadir os mais relutantes em se vacinarem . Esta operação sem precedentes no país vai exigir a participação de 160.000 voluntários para multiplicar por sete a taxa habitual de vacinação, que mal chega a 700.000 doses por dia, e para levar as doses para áreas remotas do arquipélago. Duterte também disse que aqueles que não querem ser vacinados não devem ter acesso a restaurantes e hotéis “porque são um perigo para a saúde pública”. Com uma população de mais de 100 milhões, 33,5 milhões de filipinos receberam até agora as doses completa das vacinas, incluindo três milhões de crianças com idades compreendidas entre os 12 e os 17 anos. Muitos filipinos estão relutantes em serem vacinados após a controvérsia de 2016 sobre uma vacina contra o dengue promovida pelo Governo, destinada a crianças, mas que mais tarde se descobriu aumentar o risco de sintomas graves em pacientes que não tinham tido a doença no passado. Depois de manter um dos confinamentos mais longos e rigorosos do mundo em Manila, as autoridades aliviaram quase todas as restrições nos últimos meses, uma vez que o número de casos diminuiu. As Filipinas são o segundo país mais afetado pelo novo coronavírus no Sudeste Asiático, depois da Indonésia, com 2,8 milhões de pessoas infetadas e 47.000 mortos.
Portugal e Espanha candidatam documentos da viagem de Magalhães à memória da UNESCO Hoje Macau - 25 Nov 2021 Portugal e Espanha apresentam até terça-feira uma candidatura conjunta de documentos singulares sobre a viagem de circum-navegação de Fernão de Magalhães ao Registo da Memória do Mundo da UNESCO, anunciou o Governo português. O anúncio foi feito pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, durante uma conferência de imprensa que se seguiu a uma reunião da Comissão Nacional das Comemorações do V Centenário da Circum-Navegação, em Lisboa. Aos jornalistas, o ministro sublinhou o trabalho realizado nos últimos dois anos para assinalar a primeira volta ao mundo (1519/1522), liderada por Fernão de Magalhães e concluída por Sebastian Elcano, apesar da covid-19, que afetou muitas das iniciativas, como a viagem do navio-escola Sagres, interrompida pela pandemia. O ministro anunciou que Portugal e Espanha apresentam a candidatura à UNESCO até final deste mês, sublinhando uma particularidade: “É apresentado um conjunto de documentos (15) – o Diário de Pigafetta [cronista desta viagem], um relato indireto por Fernando de Oliveira [português] e 13 documentos que existem nos arquivos nacionais de Portugal e Espanha e que permitem compreender, também de outros pontos de vista, o significado absolutamente inaugural da viagem de circum-navegação”. Neste registo, recordou Augusto Santos Silva, “estão inscritos documentos e conjuntos documentais portugueses, o mais conhecido dos quais é, merecidamente, a carta do achamento do Brasil (Pedro Vaz de Caminha)”. Outros bens com participação portuguesa que constam deste registo são o Tratado de Tordesilhas, a Coleção Corpo Cronológico, os Arquivos dos Dembos, o relatório da primeira Travessia Aérea do Atlântico Sul, por Gago Coutinho e Sacadura Cabral, o roteiro da primeira viagem de Vasco da Gama à Índia e os manuscritos do Comentário do Apocalipse (Beato de Liébana) na Tradição Ibérica. Também o Codex Calixtinus da Catedral de Santiago de Compostela e outras cópias medievais do Liber Sancti Iacobi: As origens ibéricas da tradição Jacobeia na Europa, o livro de registo de vistos concedidos pelo cônsul de Portugal em Bordéus Aristides de Sousa Mendes e Chapas Sínicas – Registos Oficiais de Macau durante a Dinastia Qing (1693-1886). Augusto Santos Silva destacou a singularidade do conjunto de documentos que será apresentado a esta candidatura e que inclui, por exemplo, a carta que o rei de Espanha dirige ao rei português, procurando explicar que o facto de ter promovido e financiado uma viagem às Molucas não significava nenhuma tentativa de embaraçar ou prejudicar os interesses da coroa portuguesa”. “Esperamos que os outros 11 países percorridos pela viagem de circum-navegação se associem. Certamente que apoiarão esta candidatura”, referiu. Segundo Augusto Santos Silva, estes são os últimos tempos antes da apresentação da candidatura, que termina na terça-feira. Para trás ficou a apresentação do documento às comissões nacionais de Portugal e Espanha. O programa Memória do Mundo foi criado pela UNESCO em 1992 com o objetivo de proteger e promover o património documental mundial através da conservação e do acesso aos documentos. As celebrações deste centenário vão passar pela publicação de resultados da investigação científica em curso: “Já publicámos este ano o livro que apresenta sistematicamente os roteiros e os relatos do primeiro século de domínio do estreito de Magalhães. Magalhães descobre a passagem do Atlântico Sul ao Pacífico e no século seguinte (século XVI) os diferentes pilotos e marinheiros vão desbravando esse estreito e aprendendo a dominá-lo”, afirmou o ministro. “Os roteiros e relatos desse primeiro século de travessia do estreito de Magalhães foram objeto de investigação analítica e erudita da parte do historiador português Henrique Leitão e do investigador espanhol José María Morena”, referiu. E acrescentou: “Esse trabalho já está editado e agora editaremos um segundo que é a primeira abordagem desse primeiro século de travessias do estreito de Magalhães, mas a partir das representações cartográficas, os mapas e os roteiros que foram sendo construídos para auxiliar os navegantes a atravessar o estreito”. Prevista para os próximos dias está a publicação da “primeira tradução portuguesa, com os aparatos eruditos necessários, do texto canónico do diário de Pigafetta”, o cronista desta fantástica viagem. “Desde 1999 que dispomos de um texto fixado filologicamente a partir das várias versões que existem dos diários de Pigafetta. Esse texto ainda não está traduzido em língua portuguesa, passará a estar, mercê do trabalho de estrutura de missão e da equipa científica dirigida pelo professor Henrique Leitão”. Neste encontro com a comunicação social, o ministro destacou ainda outros projetos para o terceiro e último ano das comemorações do V centenário da viagem, como a organização da “grande exposição” Pelos Mares do Mundo, que tem uma equipa curatorial luso-espanhola e que abrirá no próximo mês de maio no Museu Nacional Soares dos Reis, no Porto. “Será o culminar de todo o trabalho que, no domínio das exposições, temos feito e servirá também de ensejo para a organização de uma exposição itinerante com Espanha, por terras de Portugal e de Espanha e que, de algum modo, fará a ligação entre o fecho das comemorações formais e a continuação, num e noutro país, da memória sobre esse feito extraordinário que foi a circum-navegação e o exemplo que representa para nós hoje na atualidade”. De entre as atividades realizadas em 2021, o ministro destacou o início dos oito projetos de investigação no domínio das ciências do mar e da observação, financiados pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia, no valor de 2,4 milhões de euros e que estão em curso, com a apresentação dos primeiros resultados prevista para 2022. Ao nível da produção editorial, Augusto Santos Silva referiu “o universo das publicações especialmente dirigidas ao público infantojuvenil e de divulgação da viagem de circum-navegação, a importância de Fernão de Magalhães e Juan Sebastián Elcano e o significado da viagem para a história portuguesa”.
Macau lança primeira carta de vinhos lusófonos recomendados Hoje Macau - 25 Nov 2021 O Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM) anunciou ontem o lançamento da primeira carta de vinhos recomendados dos países de língua portuguesa 2021. O lançamento foi feito pela Exposição de Produtos e Serviços dos Países de Língua Portuguesa (PLPEX), que vai decorrer entre 10 e 12 do próximo mês, no território, em associação com a iniciativa “Vinhos do Mundo, Carta de Vinhos de Xangai”, indicou o IPIM, em comunicado. Além daquela carta, 20 vinhos lusófonos, representados por empresas de Macau, foram premiados na iniciativa “Vinhos do Mundo, Carta de Vinhos de Xangai”, como “Marca de excelência do ano”, “Marca de qualidade do ano” e “Marca de selecção do ano”, por um grupo de mais de dez jurados, entre críticos de vinhos internacionais, ‘sommeliers’ e comerciantes, numa “degustação e avaliação profissional”, em Xangai (norte da China), acrescentou. A cerimónia de entrega dos prémios vai decorrer durante a PLPEX, onde também se vai realizar uma degustação de vinhos lusófonos, para “criar uma plataforma de intercâmbio e cooperação para as empresas de diferentes proveniências e apresentar referências fidedignas às empresas compradoras e distribuidores profissionais”, na aquisição de vinhos de países de língua portuguesa. Com potencial O IPIM apresentou na quarta Exposição Internacional de Importação da China, entre 5 e 10 de Novembro, em Xangai, uma prova de vinhos lusófonos “para promover Macau na construção do Centro de Distribuição dos Produtos Alimentares dos Países de Língua Portuguesa”, entre outras actividades para dar a conhecer o desenvolvimento económico e comercial dos países lusófonos, assim como sobre as áreas financeira e jurídica de Macau, com vista a prestar serviços e apoio à cooperação empresarial entre a China e os países de língua portuguesa. A 2021PLPEX, cujo objectivo é promover o intercâmbio e a cooperação entre a China e os Países de Língua Portuguesa a nível económico, comercial e cultural e potenciar o papel de Macau como a plataforma sino-lusófona, decorre em simultâneo com a 26.ª Feira Internacional de Macau (MIF) e a Exposição de Franquia de Macau.
Taiwan e a Revolução Francesa Carlos Morais José - 25 Nov 2021 Na política internacional existe uma diferença considerável entre “adversários/competidores” e “inimigos”. Ora face ao extraordinário desenvolvimento que a China (RPC) tem conseguido nas últimas décadas é actualmente ambígua a posição dos EUA face ao gigante asiático. O presidente Trump, a quem as questões económicas interessavam particularmente, abriu de forma grosseira as hostilidades criando múltiplas dificuldades às empresas chinesas de se expandirem no mercado global. O caso Huawei é o mais mediático, mas não é o único. Várias firmas chinesas viram erguerem-se barreiras aos seus produtos, quer alfandegárias, quer políticas. Ou seja, os EUA compreenderam que não podem deixar os chineses agir livremente no mercado global sob pena de serem ultrapassados no seu próprio jogo. País que costuma defender a liberdade comercial, quando isso convém às suas empresas, já outro galo canta quando compreende não ter capacidade para jogar com essas mesmas regras. E quando é assim, mudam-se as regras do jogo. Foi o que fez Trump, aumentando radicalmente as taxas alfandegárias relativas a produtos chineses e invocando, cinicamente, questões relacionadas com os direitos humanos de modo a restringir o interesse por certos produtos feitos na China, como o caso do algodão produzido em Xingjiang. Felizmente para a RPC o seu mercado interno é de tal modo vasto e a sua população conheceu um tal crescimento económico, solidificando uma extensa classe média, que as empresas chinesas conseguem sobreviver mesmo quando os mercados internacionais lhes levantam problemas, seguindo as ordens americanas. Nos EUA o tema China é transversal aos dois maiores partidos e o actual presidente Joe Biden segue as pisadas do seu antecessor. Contudo, cada vez mais a retórica americana parece pretender transformar um adversário industrial e comercial, num inimigo global, fazendo da China um substituto da defunta URSS e criando o ambiente propício a uma nova Guerra Fria. Para isso, a política externa dos EUA não se coíbe de tentar desestabilizar por vários meios a sociedade chinesa. Hong Kong é disso um exemplo (conseguido numa primeira fase e depois falhado, mas com graves consequências para a cidade), como a situação dos Uigures em Xingjiang (os EUA apoiam grupos no exterior sediados em Idlib, sede do Estado Islâmico) e, agora mais recentemente, Taiwan. A questão de Taiwan é particularmente sensível para Pequim. De modo nenhum a RPC admitirá, no horizonte, outro desfecho que não seja a reunificação do país. No entanto, a RPC já deu mais que mostras da sua paciência e deixou, a partir de 1979, de empregar o termo “libertação de Taiwan”, que sugeria uma intervenção militar, preferindo “a promoção de uma reunificação pacífica, através do desenvolvimento dos laços económicos e humanos”. Sabe-se, contudo, e Pequim não se cansa de o reafirmar, que uma declaração de independência motivaria uma invasão, independentemente de pressões internacionais ou da presença militar dos EUA. Nos últimos tempos, sentindo-se respaldada pelos EUA e pelas suas acções e discursos sinófobos, a actual administração da ilha tem-se mostrado cada vez mais reticente face à RPC. Se o Kuomitang havia enveredado por uma política de “dois gumes”, mantendo a aliança estratégica com os EUA, mas fortalecendo sobremaneira os laços económicos com Pequim e mantendo na gaveta quaisquer veleidades independentistas, já o partido agora no poder tem de tal modo hostilizado a RPC que os media internacionais, a soldo dos interesses americanos, fazem questão de proclamar, em manchetes atrás de manchetes, a iminência de uma guerra. The Economist, por exemplo, fez uma capa em que considerava o Estreito de Taiwan como “o lugar mais perigoso do planeta”. Regularmente assistimos, nos últimos meses, a notícias principais em órgãos de comunicação social que vão da direita radical e trauliteira (Fox News) à esquerda liberal e fofinha (The Guardian) em que Taiwan aparece em parangonas e a invasão da ilha é dada como algo adquirido, prestes a acontecer. Declarações de responsáveis militares americanos reforçam esta propaganda belicista, algo que não é novo e faz parte da estratégia usual do império americano, em Taipé e noutras partes do mundo. Mais recentemente, os EUA têm procurado novos aliados na Ásia, além do subjugado Japão, como a Índia, o Vietname, as Filipinas, entre outros, sempre com o objectivo de minar os interesses chineses. A administração de Taiwan, dirigida pelo Partido Democrata Progressista (DPP) da senhora Tsai, para agradar aos patrões americanos de forma radical, prestou-se em 2020 a envenenar o seu próprio povo, na medida em que levantou uma interdição de importação de carne de porco, alimentada com ractopamina, uma substância nociva que actua nos músculos dos animais, e que impede a sua comercialização, por exemplo, na União Europeia. Para o DPP, vale tudo, desde que isso garanta aos seus membros fartos negócios, nomeadamente de armas, com os EUA. Se, num dia, Biden reafirma a política “uma só China”, no dia seguinte um grupo de congressistas americanos desloca-se a Taipé para “avaliar a situação”. Como se os EUA não dispusessem na capital da ilha de um chamado American Institute in Taiwan (AIT), com filiais noutras cidades da ilha. O AIT define-se como uma organização sem fins lucrativos financiada pelo governo dos EUA. Contudo, na prática, é uma das presenças mais caras dos americanos na Ásia e todos se lhe referem como sendo uma embaixada de facto, incluindo o próprio director da instituição. Ou seja, os EUA lançam mão de todos os meios para provocar Pequim e minar as relações com Taipé. De tal modo o discurso subiu de tom que a própria senhora Tsai já veio dizer que não pretende declarar independência e assim dar sinal verde para a invasão. Mas as provocações continuam porque os EUA sabem que podem usar a carta Taiwan para denegrir a imagem internacional da China. Muito boa gente teme a eclosão de uma guerra, que poderia ter consequências terríveis, para a região e para o mundo, mas não nos parece que as coisas cheguem a esse ponto de total irracionalidade. Cabe, principalmente, à própria ilha decidir se quer ser um peão no jogo global dos EUA ou se pretende manter o status quo e melhorar as relações com Pequim, no sentido de não excluir uma futura e inevitável reunificação. Apesar do que vem quase diariamente esparramado na imprensa internacional, não acreditamos que a RPC prepare uma invasão, a não ser que a administração da ilha cruze a chamada “linha vermelha”. E também não acreditamos que Taipé embarque totalmente nas aventuras que lhe são postas na mesa pelos americanos. A paz é fundamental para o desenvolvimento das condições de vida das populações e o actual status quo, reafirmado pelos dois lados do Estreito em 1992, permite uma coexistência pacífica cuja continuação fará com que a reunificação aconteça quando mudanças dos dois lados criarem a atmosfera ideal para isso. Mas isso é um assunto interno do País do Meio. A China parece nunca ter pressa e compreende de modo distinto do Ocidente o desenrolar da História, como se existissem duas diferentes velocidades. Zhou Enlai, quando perguntado sobre o que pensava da Revolução Francesa, respondeu que só tinham passado ainda 200 anos e por isso ainda era cedo para dessa revolução extrair conclusões, quanto mais exprimir uma opinião. Também por esta razão, acredito que a questão de Taiwan só poderá ter uma resolução pacífica e acabará por se atingir a reunificação. PS: Porque referi o ex-primeiro-ministro Zhou Enlai, não resisto a partilhar um episódio dos anos 60. Num encontro com Nikita Kruschev, o presidente da URSS disse-lhe: “A diferença entre a União Soviética e a China é que eu tenho origens camponesas e populares, enquanto o senhor vem da classe privilegiada dos mandarins.” Ao que Zhou lhe respondeu: “Tem razão mas em comum temos o facto de ambos termos traído as nossas origens”.
A poesia e a sageza António Cabrita - 25 Nov 2021 A imprevisível Hilda Hilst, que depois de escrever cinco extraordinários livros de prosa que ninguém lia se entreteve durante anos a tentar gravar (literalmente) as vozes dos mortos, declarou assim nesse bendito livro de entrevistas que se intitula Fico Besta Quando me Entendem: «Minha relação com Deus é uma relação muito especial; fica muito difícil de explicar isso. Considero a literatura uma coisa essencial e acho que, se ela não é essencial, não deve ser manifestada. Mas isto de “Deus”, como costumam chamar, não sei. Eu chamo Deus de tantos nomes: Obscuro, Grande Obscuro, Sorvete Almiscarado… Cada um dá um nome ao seu Deus. Existem algumas coisas que o seu ser essencial deseja, mas que, na verdade, na vida física, cotidiana, não deseja. Um exemplo disso é o primeiro poema do meu livro Sobre a tua grande face. É um desejo do meu eu mais profundo, mas, na verdade, não desejo isso, aliás prefiro que nunca aconteça isso. A minha parte mais verdadeira, essa parte melhor de mim é que deseja. Esse primeiro poema é de despojamento absoluto, onde digo: “Honra-me com teus nadas. / Traduz meu passo / De maneira que eu nunca me compreenda… “. “Honra-me com teus nadas…” Estou lendo, para vocês, para verem como existe uma diferença entre o que você realmente quer e o que o seu espírito mais profundo deseja. E, na vida, o que você pode viver, no seu cotidiano, pode não ter nada a ver com essa verdade mais profunda. Aqui, eu me coloco como um ser humano. Noutro poema escrevi: “E de ti, Sem Nome,/ Não desejo alívio./ Apenas estreitez e fardo./ Talvez assim me ames:/ desnudo até o osso/ Igual a um morto”. Isso é meu espírito, em que acredito. Acredito na alma imortal. O meu espírito mais profundo deseja isso, mas, na realidade, na minha verdade de todo dia, eu não desejo a pobreza, nem a fealdade, nem o medo. Aliás tenho horror da pobreza, tenho um pânico medonho. O meu ser-verdade é que tem vontade disso tudo. Essa outra e esses outros que nós somos no dia a dia são máscaras que a gente coloca o tempo todo. Talvez o desejo da santidade seja uma nostalgia do homem. A maior vontade do homem, talvez, seja a santidade, a bondade absoluta, a generosidade, a perfeição, uma luz muito perfeita. Um dia, em algum lugar, nós conhecemos essa luz. Acho que toda a nossa vida, aqui, parece ser a busca dessa luz que não conseguimos reaver. É isso. Mas acho que o tom está se tornando muito sério. Eu preferia que fosse mais leve, porque ninguém vai ficar meu amigo, assim. Gostaria que se desse uma abertura para o que vocês quisessem perguntar, mas nada de tão grave. Acho que isso é bom para quando se escreve.» O que me faz lembrar, a seguinte entrada do meu diário: «Escrevi este poema: “Tapar todos os buracos de uma vida/ Pode custar-nos a vida/ E desligar-nos dos breves lampejos/ De silêncio em que sob a laje a erva se empolga./ Voltar atrás, fazer entalhes/ No remo ao invés de o meter na água,/ Torna inúteis as sementes de cravinho/ Enfiadas pela criança na fechadura da porta do castelo”. Escrevi este poema, ou pelo menos esta pronunciação em forma de verso e hesito no modo de avaliá-lo. Julgo que esta minha hesitação resume todas as minhas dúvidas sobre a sageza. Adoro os sages, leio-os, cito-os, trago-os no bolso, não vivo sem eles. Mas desejo profundamente estar aquém ou além, não na sageza. A sageza é muitas vezes apenas a forma redonda de acomodar o mundo num espaço de concordâncias e analogias que o tornam mais confortável. Aí a sageza funciona como uma espécie de plaina sobre as farpas e irregularidades da madeira – dá-nos uma âncora no meio do ciclone. Ora, julgo que as âncoras só na água não são decoração, o que lhes acontece no ar, ou na terra, por exemplo. Dito isto, desconfio que a sageza tenda a fazer da parte apostasia, evadindo-se então de frequentar as partes fronteiriças que o real sempre detona e revela. Há um excesso de sentido na sageza, como se houvesse mais acessos do que limites. Este poema por exemplo é redondo. Chegar a esta “sageza” – passe a soma de ignorâncias que tal supõe – levou anos, muitos. O que lhe é que lhe falta, para além da eventual carência de expressão poética? A exterioridade do mundo, o curto-circuito, uma ventania que abra um poro e escancare uma vista para algo maior – enigmático, inapreensível à minha auto-complacência. Os orientais preveniam contra isto. Lembravam que todo o itinerário de Buda era irreproduzível e imitar-lhe a santidade só traria consigo o risco da idolatria. Cada um está condenado a desenhar a sua própria cartografia e um entrelaçamento próprio num padrão cujo objectivo não é repetir-se mas desenvolver-se. É pura perda de tempo imitar seja o que for, seja o Herberto, seja um patamar mínimo de competência que nos permita exigir uma resposta ou uma certa visão das coisas que nos distinga. Quando chegamos aqui atravessamos como um alfinete o tecido da sageza mas o fito é romper e não sossegar nesse pequeno furo/ âmbito que nos serve momentaneamente de patamar. Talvez por isso Mircea Eliade, nos seus diários, quis contar como foi surpreendido por Alan Watts, na visita que este lhe fez a casa e que face à oferta de um chá lhe terá respondido que preferia um bagaço, se acaso houvesse. O sage trocava-lhe as voltas, expunha a face de um homem chão, lembrava ao historiador das religiões que o corpo é para gastar e não para ser poupado.”
Dois cidadãos chineses detidos por posse de abalone condenados na África do Sul Hoje Macau - 25 Nov 2021 Dois homens de cidadania chinesa detidos por posse de abalone, um molusco valorizado na Ásia, no valor de cerca de 55.000 euros, foram condenados a dois anos de prisão na África do Sul, anunciaram hoje as autoridades. Os homens, de 50 e 47 anos, foram presos “por posse de 4.600 abalones, incluindo 1.098 abalones cozidos, 1.858 abalones vivos e 1.644 abalones secos” em maio de 2020, anunciou a unidade de polícia de elite da África do Sul, os Falcões. Um cidadão do Maláui, de 33 anos, que trabalhou para os traficantes foi também condenado a um ano de prisão. Por vezes chamado “trufa do mar”, o abalone é um molusco marinho apreciado por elites, particularmente na China. A pesca é regulada por quotas na África do Sul. Nos últimos 10 anos, a quantidade pescada ilegalmente quase duplicou, de acordo com a Traffic, organização não-governamental que controla o comércio de vida selvagem. A maior parte da colheita legal e ilegal do molusco pescado destina-se à Ásia, especialmente a Hong Kong, onde é popular nos restaurantes.
China assina novo acordo para reforço da colaboração militar com Rússia Hoje Macau - 25 Nov 2021 A Rússia e a China assinaram ontem um quadro de referência para o estreitamento dos laços militares, com Moscovo a referir-se a voos estratégicos norte-americanos cada vez mais frequentes perto das fronteiras dos dois países. O ministro da Defesa russo, Serguei Shoigu, e o seu homólogo chinês, Wei Fenghe, “manifestaram o interesse comum em intensificar exercícios militares estratégicos e patrulhas conjuntas da Rússia e da China”, anunciou o Ministério da Defesa russo. “A China e a Rússia são parceiros estratégicos há muitos anos”, disse Shoigu e “hoje, perante crescentes perturbações geopolíticas e maior potencial de conflito em várias partes do mundo, o desenvolvimento desta interacção é especialmente relevante.” Shoigu e Wei saudaram uma série de manobras recentes que envolveram aviões de guerra e forças navais russas e chinesas, e assinaram um plano de cooperação militar para 2021-2025. Shoigu apontou voos cada vez mais frequentes de aviões estratégicos dos EUA perto das fronteiras russas, dizendo que só no último mês houve 30 missões deste tipo. Este mês, durante um exercício da força estratégica global dos EUA, “10 bombardeiros treinaram o cenário de usar armas nucleares contra a Rússia praticamente em simultâneo a partir das direcções este e oeste”, exemplificou Shoigu, acrescentando que se aproximaram até cerca de 20 quilómetros da fronteira russa. “Neste ambiente, a coordenação entre Rússia e China torna-se um factor de estabilização nos assuntos globais”, sustentou o ministro. Em conjunto Na sexta-feira, dois bombardeiros estratégicos russos Tu-95MS e dois bombardeiros estratégicos chineses H-6K fizeram uma patrulha conjunta sobre o Mar do Japão e o Mar da China Oriental, levando a Coreia do Sul a deslocar aviões de combate. A Rússia tem procurado expandir os laços com a China, à medida que as suas relações com os EUA e aliados ocidentais se afundaram para níveis próximos dos da Guerra Fria, sobretudo depois de, em 2014, Moscovo ter avançado com a anexação da península da Crimeia, território da Ucrânia.
Miguel Castro Caldas, dramaturgo: “O teatro é o texto, e o texto é o fantasma” Andreia Sofia Silva - 25 Nov 2021 O dramaturgo e professor universitário Miguel Castro Caldas é o autor da peça “Se eu vivesse tu morrias”, que este fim-de-semana sobe ao palco da BlackBox no Edifício do Antigo Tribunal. A história do triângulo amoroso de Lívia, que parte do epitáfio de Robespierre, espelha o conflito entre a vida e a morte Qual a sensação de ver um texto seu traduzido para cantonês? Foi o Dinis Chan que contactou com o Rui Trigão, que trabalha na DGArtes. Queriam fazer algo com autores portugueses em teatro e ele sugeriu este texto. Fui depois contactado pelo Dinis e aceitei. Acho extraordinário e não estava nada à espera. Este espectáculo circulou bastante em Portugal e esteve em França e Itália, mas nunca imaginei que fosse parar à China. É extraordinário passar para uma língua que não conheço. Isso tem qualquer coisa a ver com o espectáculo. Em que sentido? Quando dizemos “Se eu vivesse tu morrias” é quando qualquer coisa para existir tem de tomar o lugar de outra coisa que tem de abdicar de existir. Esse é o centro. Eu, a Lígia Soares, o Filipe Pinto, o Miguel Loureiro, o Tiago Barbosa e o Gonçalo Alegria, que construímos este espectáculo, tínhamos a ideia central de que os actores quando preparam um texto fazem uma operação de substituição do texto pelo seu corpo, e as palavras ditas pelas suas vozes. Ao vermos isso, e tomarmos essa consciência, resolvemos fazer um espectáculo em que o texto está visível, pois os actores e o público têm um livro. Eu tinha uma intuição, que era quando os actores estão presentes, há qualquer coisa de fantasmagórico. Há algo que também está presente, mas que não se vê. Comecei a conversar com estes meus colegas sobre isto e chegámos a esta constatação: o teatro é o texto, e o texto é o fantasma. Neste momento, traduzido para cantonês, o fantasma é o texto da língua portuguesa. Mas também poderá ser o texto em língua chinesa. Exactamente. Tenho pena de não poder assistir, e disseram que me iam enviar a filmagem da peça. Acho isso extraordinário porque a própria filmagem já é um suporte que não é teatro, é um ecrã. O que vou ver é um texto que eu conheço e um espectáculo que eu fiz, mas não vou perceber nada. Mas ao mesmo tempo, na minha cabeça, tenho a referência do texto que escrevi. Será um embate com um corpo desconhecido. É desconhecido, mas que tem algo de reconhecível ao mesmo tempo. Isso é um bocadinho o que acontece com a arte, pois gostamos de ver uma coisa, surpreendente, mas para conseguirmos reconhecer esse desconhecido tem de existir algo reconhecível. Faz falta traduzir mais teatro português, e fazendo essa tradução o texto funciona da mesma forma em palco? Sim, deve-se traduzir o máximo possível. A actividade de tradução deveria ser a coisa mais normal. Traduzir é também próprio da interpretação e da percepção. Quando estamos a ver, a perceber, estamos a traduzir. É sempre saudável traduzir, mas claro que o resultado é diferente. As obras de arte são todas traduzíveis, por mais difícil que isso seja. Como começou a escrever este texto e o que procurou transmitir? Este texto estreou em 2016. Tinha este ponto de partida, a ideia de que o actor afirma a sua presença real e física em palco. E eu andava com isto na cabeça: isso é verdade, mas talvez não seja preciso sublinhar tanto isso. Achava que havia outra coisa, e no teatro mais ainda. Há a presença do corpo e da personagem, mas há outra natureza de presença. O que seria isso? Rapidamente concluímos que no teatro, de maneira muito literal, o que não está presente é o texto, substituído pelos corpos. Tentámos então fazer uma coisa, colocar o texto em evidência, pôr o público com o texto nas mãos, e fizemos um livro. Assim, o público tem de estar constantemente a decidir se prefere ler ou se vê o espectáculo, porque é impossível fazer as duas coisas ao mesmo tempo. E daí o “Se eu vivesse, tu morrias”. Se eu quiser ler o texto, perco o espectáculo. Se eu quiser ver o espectáculo, morre o texto. Um dilema que permanece. Claro. E o texto que escrevi para este espectáculo tem um triângulo amoroso, é a mulher que tem um marido e um amante e em que se jogam todas estas coisas. A impossibilidade de poder ter os dois ao mesmo tempo. São coisas que podem parecer disparatadas, mas que ganham relevância pela forma como foram escritas e apresentadas. O epitáfio do Robespierre é um pseudo-epitáfio, tem a ver com isto, e o espectáculo também. No fim de tudo tem a ver com a morte. O epitáfio de Robespierre diz “Passante, não chores a minha morte, se eu vivesse tu morrias”. Este pseudo-epitáfio é o povo a gozar com Robespierre, porque como se sabe matou muita gente. É a ideia de “se eu estivesse vivo tu estarias morto”, mas tem outra profundidade. Se Robespierre estivesse vivo não haveria espaço para muitos vivos virem a seguir, no sentido em que as pessoas têm de morrer para outras nascerem, é a ordem natural da vida. Porquê um triângulo amoroso? Pensou abordar esta dualidade vida/morte de outra forma? Essas questões surgem a partir da história, que é corriqueira, mas penso que a partir dela chegamos a questões mais profundas. Acho que só se compreende vendo o espectáculo ou lendo o texto. A Lívia apaixona-se por um homem, mas tem um marido, e surge essa problemática. Este texto tem um certo sentido de humor. A determinada altura, surge um problema de coração e precisa de fazer um transplante, e acaba por ser o amante que lhe dá o seu próprio coração. Parece uma telenovela, mas não é. Mas é o amante que dá o coração e não o marido. Tinha aqui alguma mensagem em particular a transmitir? Não tenho mensagens para transmitir. A maneira como eu encaro o meu trabalho como artista, é problematizar algumas coisas que encontro. Neste caso, é “o que é que desaparece para algo de novo aparecer”? O que vai ser sacrificado? Não é uma mensagem, não faço uma apologia do sacrifício. A minha questão foi ver o que está por detrás, ver se é possível pôr as duas coisas em simultâneo e experimentá-las, ver como funcionam. Os espectadores é que decidem o que querem fazer com isso. Primeira vez Depois de passar por palcos portugueses como a Culturgest, em Lisboa, e o Teatro Académico Gil Vicente, em Coimbra, a peça “Se eu vivesse tu morrias” chega pela primeira vez a Macau, só em chinês, numa tradução inédita em cantonês da autoria de Dinis Chan. O projecto é desenvolvido pelo grupo Theatre Farmers e pela Associação de Irmandade de Teatro Criativo. O espectáculo sobre ao palco no sábado às 15h e às 20h, enquanto que no domingo há uma única sessão às 15h.
Justiça | TUI diz que António Coelho Neves foi despedido sem justa causa João Santos Filipe - 25 Nov 2021 Em Abril de 2020 o chef António Coelho foi despedido do restaurante que fundou, por ser acusado de ter faltado vários dias ao trabalho. O cozinheiro contestou a acusação e argumentou que o despedimento foi feito sem justa causa. Os tribunais deram-lhe razão O Tribunal de Última Instância (TUI) considerou que o chef António Neves Coelho foi despedido sem justa causa pelo António Grupo Limitada. A decisão final foi tomada no dia 10 de Novembro, não há mais hipótese de recurso, e revelada pelos tribunais da RAEM. A disputa entre as duas partes surgiu em Abril de 2020, quando, segundo vários relatos da imprensa na altura, António terá sido abordado pelo grupo para baixar o salário várias vezes. Como recusou, acabou por ser despedido, com a alegação de que havia justa causa para o despedimento. Entre as razões para a justa causa, o grupo alegou que António Coelho tinha gozado 118 dias de licença extra não autorizada, além de ter sido acusado de tentar convencer o staff do restaurante a demitir-se em bloco. Na altura do despedimento, António Coelho já não trabalhava como chef, visto que desde 2018 tinha o cargo de Embaixador de Culinária. Ao HM, António mostrou-se satisfeito com a decisão, por sentir que foi feita justiça. Contudo, recusou haver qualquer sentimento de felicidade. “Não se pode dizer que estou contente. O que sinto é que se fez justiça, e quando isso acontece as pessoas ficam satisfeitas”, afirmou. “Era óbvio que não tinha faltado ao trabalho e toda a gente sabe isso. Todos me encontravam no restaurante até altas horas das noite”, acrescentou. O chef destacou também o funcionamento da justiça. “É uma decisão de um caso laboral, mas o que é importante realçar é o funcionamento da justiça em Macau, e, pessoalmente, sinto que funcionou”, sublinhou. Com a decisão, António deverá receber o montante por despedimento sem justa causa, além de outras despesas relacionadas com o processo. Em curso Além deste caso que chegou agora ao fim, António Coelho e o António Grupo Limitada, controlado pela empresa Sniper Capital, estão envolvidos em outras disputas. Segundo a Macau News Agency, num artigo de Abril em 2020, uma das batalhas legais implica a questão dos direitos de autor do restaurante António, que manteve o nome original e o logótipo, apesar da saída do fundador. O logótipo do restaurante ainda hoje tem a assinatura de António Coelho, apesar do chef principal ter passado David Abreu, em Junho de 2020. António Coelho é um dos chefs de comida portuguesa mais conhecidos e bem-sucedidos do território e em 2013 foi distinguido pelo Governo da RAEM, devido ao seu contributo para o desenvolvimento do turismo.
Análise | Aumento de validade de testes com efeito imediato no jogo Pedro Arede - 25 Nov 2021 O alargamento para sete dias do prazo dos testes à covid-19 para cruzar fronteiras vai ter um impacto “forte” e “imediato” nas receitas brutas de jogo. A ideia é defendida por especialistas do sector ouvidos pelo HM, que acreditam que a nova meta anual de 86 mil milhões de patacas em impostos sobre o jogo vai ser alcançada A alteração de 48 horas para sete dias da validade dos testes de ácido nucleico, necessário para sair de Macau rumo a Zhuhai vai ter um impacto “forte” e “imediato, nas receitas brutas de jogo, com especial incidência no mês de Dezembro. Além disso, apontaram especialistas do sector ao HM, transmite “confiança” às autoridades do Interior da China. Acerca da previsão do Governo de 86 mil milhões de patacas em impostos sobre o jogo, os peritos acreditam que a meta é “conservadora” e será alcançada. Para um dos especialistas, com longa experiência na área do direito de jogo e que pediu para não ser identificado, o relaxamento das medidas nas fronteiras vai ter um impacto “bastante forte”. “Isto vai ter um impacto positivo bastante forte. Acho que há aqui um potencial para as receitas brutas voltarem a crescer, até porque o número de visitantes vai aumentar outra vez”, começou por dizer ao HM. “O aumento do número de visitantes não vai afectar os resultados de Novembro (…), apesar de as receitas brutas virem a ser, obviamente, bastante superiores às do mês passado. Esta nova medida vai afectar especialmente o mês de Dezembro”, acrescentou. O mesmo especialista referiu ainda que o alargamento do prazo dos testes vem dar “maior confiança à população que vem a Macau” e transmite às autoridades do Interior da China “a ideia de que as coisas podem voltar ao novo normal”. Também o advogado especialista do sector do jogo, Carlos Eduardo Coelho destacou o alívio das limitações. “Qualquer medida que alivie as restrições impostas em Macau tem sempre um impacto imediato na economia e nas receitas de jogo. Portanto, acredito que esta medida também o terá (…) pois poderá vir mais gente, essas pessoas poderão estar cá mais dias e isso terá consequências imediatas na nossa economia”, vincou. Espera olímpica Questionados sobre a meta de 86 mil milhões de patacas em impostos sobre o jogo, no seguimento da intenção de voltar a recorrer à reserva extraordinária, os especialistas consideraram a estimativa “alcançável” e “conservadora”. Recorde-se que o valor corresponde a uma redução de 44 mil milhões de patacas relativamente ao montante inicialmente previsto. “As previsões de 86 mil milhões de patacas, são perfeitamente alcançáveis (…) e algo conservadoras, no sentido de que será possível atingir estes valores, mesmo se acontecer alguma coisa [novo surto], apontou o perito que pediu não ser identificado. Também Carlos Eduardo Coelho acredita que as previsões vão ser cumpridas e que o valor pode mesmo ser “mais elevado”, caso não surjam novos surtos de covid-19. Contudo, ressalva o primeiro especialista ouvido pelo HM, “é preciso ter a noção de que a política de tolerância zero vai continuar” e que a maior preocupação do Governo Central, neste momento, é a organização sem sobressaltos dos Jogos Olímpicos de Inverno de Pequim, agendados para Fevereiro de 2022. Para o perito, só depois de concluído o evento é que poderão haver mudanças substanciais nas medidas fronteiriças. Até lá, podem vir aí mais restrições. “Até ao final dos Jogos Olímpicos, todas as medidas necessárias para conter qualquer tipo de surto vão ser implementadas (…) porque há essa vontade declarada do Governo Central. O relaxamento pode acontecer depois do evento, mas não significa a abertura completa, nem nada que se pareça. Cá em Macau, sei perfeitamente que as fronteiras de Macau com o mundo exterior, ou seja, fora da China incluindo Hong Kong, vão continuar fechadas, diria, até 2023”, apontou.
LAG 2022 | André Cheong afasta criação de mais carreiras especiais na Função Pública Andreia Sofia Silva - 25 Nov 202125 Nov 2021 O secretário André Cheong, disse que a criação de mais carreiras especiais na Função Pública está fora dos planos do Governo. “Já simplificámos algumas carreiras e iremos continuar. O Governo vai continuar a trabalhar por esta via, reduzindo as carreiras especiais. Não podemos ter muitas, pois assim não conseguiremos trabalhar em prol da progressão dos trabalhadores.” Vários deputados chamaram ainda a atenção para as condições salariais dos funcionários públicos das camadas de base, com salários mais baixos. Mas o secretário apenas respondeu com prudência. “Não estamos a pensar na revisão do regime salarial dos trabalhadores. Temos de ser muito prudentes no ajustamento das carreiras e dos índices [salariais], porque está tudo interligado. Se fizermos um ajustamento numa carreira, aparecem trabalhadores de 30 carreiras a dizer que essa mudança não é justa”, rematou. Função pública | Regime disciplinar vai ser revisto André Cheong referiu que é intenção do Governo rever todo o regime disciplinar na Função Pública após a revisão do regime de responsabilização de dirigentes e chefias. “Quando aplicamos o regime disciplinar aplicamos o regime geral das infracções, mas isso já não está de acordo com o desenvolvimento da sociedade. No próximo ano vamos rever o regime disciplinar de todos os funcionários públicos.” Estas mudanças poderão incluir ainda uma revisão ao nível das disposições do Código Penal, frisou o secretário. “Estive cinco anos no CCAC [Comissariado contra a Corrupção] e vi vários casos desses. Há que melhorar todo o regime”, adiantou.
Hengqin | Governo estuda novo regime para Função Pública Andreia Sofia Silva - 25 Nov 2021 O Governo está a estudar a criação, no âmbito do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau (ETAPM), de um novo regime para os funcionários públicos que sejam destacados para a zona de cooperação aprofundada com Hengqin. “No futuro, quando o ETAPM for revisto, veremos como criar um novo regime para quem vai trabalhar na zona de cooperação aprofundada”, disse o secretário para a Administração e Justiça, André Cheong. Da parte de Macau mais de 30 funcionários públicos vão ser destacados para Hengqin, mudança que “não vai afectar o funcionamento” da Administração, assegurou o secretário. “Os funcionários públicos vão manter o mesmo estatuto que têm em Macau. Por exemplo, há feriados em Macau que não existem no Interior da China. Estamos a trabalhar para chegar a um consenso e prevenir que existam problemas nessa zona”, adiantou. André Cheong prometeu ainda resolver a situação da passagem na fronteira, devido à pandemia. “É um problema, pois os nossos trabalhadores não conseguem passar a fronteira e há questões que não se resolvem por videochamada. Estamos a dialogar para resolver este assunto.”
Governo Electrónico | Cooperação com grupo Alibaba vai continuar Andreia Sofia Silva - 25 Nov 2021 Termina no final deste mês o acordo-quadro de cooperação entre o Governo e o grupo chinês Alibaba, mas André Cheong garantiu que a ligação irá continuar. Porém, o secretário para a Administração e Justiça admitiu que Macau “tem um grande atraso” na modernização da máquina administrativa O Governo vai continuar a cooperar com o grupo chinês Alibaba, fundado por Jack Ma, ainda que o acordo-quadro assinado em 2017 chegue ao fim no final deste mês. A garantia foi dada pelo secretário para a Administração e Justiça, André Cheong, no debate de ontem sobre o relatório das Linhas de Acção Governativa (LAG) para o próximo ano. “A cooperação vai findar no final deste mês e, de uma forma geral, os resultados foram satisfatórios. Criámos o centro de computação em nuvem, bem como a reestruturação da conta de acesso comum. Vamos manter as relações com o grupo Alibaba e alargar os projectos a construir”, apontou. Além disso, André Cheong adiantou que o grupo vai também dar formação a funcionários públicos. “O grupo Alibaba vai destacar professores e vamos enviar trabalhadores para estagiar [na empresa] e aprender novidades.” De resto, o secretário sublinhou que a governação electrónica é a grande aposta para a reestruturação da Administração Pública, embora admita que em Macau exista “um grande atraso” nesta matéria. “Eu e o Chefe do Executivo já fomos várias vezes a Guangzhou, que registou um grande progresso na área da governação electrónica. Temos de trabalhar ainda mais nesta área. A promoção do Governo electrónico não é uma missão, mas uma obra a longo prazo para melhorar a máquina administrativa”, frisou. Registos mais simples Foram vários os deputados que exigiram esclarecimentos sobre a modernização da Administração. André Cheong assegurou que mais de 100 serviços públicos estão integrados na plataforma “Acesso Comum aos Serviços Públicos”, e que até 31 de Outubro mais de 255 mil residentes abriram conta na plataforma, mais 2,8 vezes face ao ano passado. André Cheong garantiu que há mais serviços que podem ser integrados, nomeadamente apólices de seguros. “Podemos contactar as seguradoras [sobre a possibilidade] de os serviços de automóveis poderem ser incluídos na conta de acesso comum, como, por exemplo a apólice de seguro e o imposto de circulação.” Além disso, os cartões de estudantes ou profissionais, como da Associação dos Advogados de Macau ou mediadores imobiliários, podem ser inseridos na conta de acesso comum. Contudo, André Cheong deixou uma ressalva: “não esperamos que esta seja uma conta muito complexa, caso contrário não conseguiremos aceder a nada”. “Não vamos introduzir todos os serviços na conta de acesso comum”, frisou. O Governo pretende ainda digitalizar e simplificar serviços de registo civil e notariado. “Não pretendemos fazer uma simples electronização dos serviços. Queremos que o registo de nascimento e óbito não tenha de ser feito presencialmente, enquanto que para o registo de divórcio e casamento [as pessoas] só tenham de ir uma vez tratar das formalidades. Temos de ajustar as leis notariais e do registo civil”, explicou o secretário. Modelo do BIR muda Wong Pou Ieng, directora dos Serviços de Identificação, adiantou ontem que o actual modelo do BIR deverá sofrer alterações, mas não para já. “Estamos a rever os termos de encriptação do nosso modelo, porque estão muitos dados inseridos no chip e esta tecnologia fica desactualizada. Não vamos trocar de BIR a curto espaço. Vamos analisar se em termos técnicos e jurídicos é viável ter um BIR digitalizado. Em termos jurídicos, o bilhete em suporte físico não pode ser substituído”, adiantou, acrescentando que a mudança só deverá ocorrer em 2023.
Horas extraordinárias | Coutinho refere lei portuguesa, mas secretário afasta problemas Andreia Sofia Silva - 24 Nov 202125 Nov 2021 O deputado José Pereira Coutinho alertou para o problema do contacto dos funcionários públicos por parte das chefias após o horário de expediente, citando uma nova legislação aprovada em Portugal no passado dia 3. Este diploma proíbe que as chefias contactem os seus trabalhadores após o horário de trabalho, mesmo que estes estejam em regime de teletrabalho. “Todos os dias, depois de irem para casa, os funcionários têm de responder a mensagens no WeChat ou Whatsapp, mas também têm família e crianças. Como é que o Governo calcula essa compensação? Em Portugal há uma lei que diz que os trabalhadores não devem ser contactados depois do regresso a casa”, disse hoje no debate sobre o relatório das Linhas de Acção Governativa para o próximo ano. Em resposta, o secretário André Cheong, da tutela da Administração e Justiça, garantiu que todos os que trabalham efectivamente após o seu horário normal recebem o devido pagamento. O governante deu como exemplo a diferença entre responder a uma dúvida simples ou escrever um relatório. “Em Portugal a lei não diz que os funcionários públicos não podem responder a mensagens. É difícil calcular o tempo e não sei se existe uma situação de abuso de poder. Em Macau, por causa da pandemia, os trabalhadores tiveram de passar a trabalhar em casa, mas vamos evitar o trabalho até muito tarde. Se estes tiverem de trabalhar após o horário de expediente vamos pagar horas extraordinárias”, garantiu.
Dados pessoais | Deputado Wong Sai Man diz que actual lei “trava” troca de informações Andreia Sofia Silva - 24 Nov 2021 O deputado Wong Sai Man disse esta tarde na Assembleia Legislativa (AL) que a lei de protecção de dados pessoais em Macau “trava” a partilha de informações com as regiões vizinhas e a digitalização dos serviços públicos. “A lei da protecção dos dados pessoais está a travar o nosso trabalho. A troca de dados dentro dos serviços públicos não deveria ser tão limitada. É necessário rever a lei para acelerar os trabalhos da governação electrónica, temos de ter uma troca de informações com as regiões vizinhas. Será que isso pode ser feito com a actual lei?”, questionou. O secretário para a Administração e Justiça, André Cheong, assegurou que o Gabinete de Protecção de Dados Pessoais terá sempre de emitir parecer antes de uma eventual revisão do diploma. “É um tema ao qual temos de dar prioridade. Vamos ver quais os dados que podem ser disponibilizados e só assim poderemos ter uma cidade digital. Em muitas das situações teremos de perguntar ao Gabinete para fazer essa transferência de dados”, concluiu.
Segurança nacional | Governo promete rever leis e reforçar actividades patrióticas Hoje Macau - 24 Nov 2021 O secretário da Administração e Justiça, André Cheong, disse ontem, no hemiciclo, que o Governo vai reforçar a segurança nacional em 2022, através de leis e acções de formação nas escolas e serviços públicos. Durante o debate sectorial das Linhas de Acção Governativas (LAG) para 2022, na Assembleia Legislativa (AL), André Cheong frisou que o Governo vai apresentar a alteração à “lei relativa à defesa da segurança do Estado”, a primeira desde que este diploma entrou em vigor, em 2009. “Ao longo dos 12 anos de execução da lei relativa à defesa da segurança do Estado, a situação da segurança internacional e das regiões vizinhas tem vindo a modificar-se, pelo que as garantias do sistema jurídico do Governo da RAEM para a defesa da segurança do Estado devem também acompanhar a evolução dos tempos no sentido de salvaguardar a soberania, a segurança e os interesses do desenvolvimento do Estado, de modo a prevenir e reprimir eficazmente a intervenção estrangeira e garantir efetivamente os direitos e interesses legítimos dos residentes e a prosperidade e a estabilidade da sociedade”, lê-se no documento. Reforço do patriotismo André Cheong prometeu ainda que para o ano os trabalhadores dos serviços públicos participarão em acções de formação sobre a Constituição e a Lei Básica, a lei relativa à defesa da segurança do Estado, a cultura chinesa, entre outras, com a finalidade “de aprofundar o sentido de identidade nacional dos trabalhadores dos serviços públicos e aumentar a sua capacidade na realização dos trabalhos da ação governativa”. Para 2022, o patriotismo também será reforçado nas escolas e associações através de “diversas actividades de divulgação jurídica centradas na Constituição, na Lei Básica, na lei relativa à defesa da segurança do Estado e nas leis fundamentais relacionadas com a vida quotidiana”.
Caso Dore | TUI entende que Wynn também deve pagar indemnização Hoje Macau - 24 Nov 2021 O Tribunal de Última Instância (TUI) entende que a operadora de jogo Wynn deve pagar, juntamente com a Dore, empresa promotora de jogo, a indemnização aos lesados de um caso de desvio de fundos de uma sala VIP ocorrido em 2015. O acórdão, ao qual a TDM Rádio Macau teve acesso, confirma a decisão do Tribunal de Segunda Instância (TSI) e condena a Wynn e Dore a pagarem um total de seis milhões de dólares de Hong Kong, mais os juros de mora, aos lesados que investiram nesta empresa. Recorde-se que o Tribunal Judicial de Base (TJB) entendeu que apenas a Dore tinha de pagar a indemnização, mas numa decisão proferida em 2018 o TSI decidiu que a Wynn também devia suportar este pagamento. O caso Dore diz respeito ao desvio de 700 milhões de dólares de Hong Kong de uma sala VIP por parte de uma funcionária da Wynn. Paulo Martins Chan, ex-director da Direcção de Promoção e Inspecção de Jogos, defendeu à Macau News Agency que esta decisão pode fazer com que as operadoras de jogo fiquem mais cautelosas quanto à exploração das salas VIP por parte dos junkets, podendo optar por explorarem, por si próprias, este segmento de jogo.
Colhido por nuvens a alta velocidade João Paulo Cotrim - 24 Nov 2021 Santiago, Óbidos, quinta, 14 Outubro Embrenhado que andava na celebração de certa ideia de resistência, devo ter achado que o tempo me acompanhava a par e passo, na vez de insistir naquela tão sua corrida inexorável. É de contar ainda com as muitas hesitações em torno da celebração de uma década titubeante, sinuosa, arriscada, exuberante, excessiva. Mas estava decidido, por razões várias, fazer prova de vida nesta edição do Folio. De súbito, os dias viraram semanas e estas quinzenas e a areia revelava que estavam os livros estavam por fazer. Eram só sete e um cd. Para aqui chegar, portanto, foi uma oficina de milagres. Para falhar que não seja por pouco. Começamos por este lugar sagrado com a exposição a partir do «Diário das Nuvens». O João Francisco [Vilhena] não consegue esconder o seu entusiasmo em torno de uma biblioteca das nuvens que radica em Aristófanes e espalha por séculos e séculos. Chama a atenção para a luz que se projecta no altar, sem outra imagem que uma enorme nuvem, em diálogo com as massas que abandonam com vagar as lombadas e enchem de mais céu o recanto. Este resplendor prolonga-se na obscuridade da capela mínima de São Martinho, com a projecção dos pequenos filmes, cruzamento de vozes e sons do etéreo e da terra. Foi momento de relembrar o Edgar Libório, mestre da luz e do som. Bebíamos já uma Cadáver Esquisito, isto se tivesse chegado. Ainda teremos que apresentar a vida amarrotada de Jean Moulin e as ilustrações para Natália [Correia] e Aurelio [Arturo] de uma mão-cheia de colombianos e portugueses, antes de nos dedicarmos à cerveja literária, que tardou em chegar. Suspensas das vigas da Artes & Letras, do mano Luís [Gomes], estão as ilustrações que acompanham cada um dos seis contos. Alguns cartapácios talvez não tenham apreciado a quebra no sossego imposta pelos amantes do lúpulo. Mas por estes dias, o ponto de encontro para perdidos e desorientados fixou-se aqui. Casa da Música, Óbidos, sexta, 15 Outubro O nó teimava em não descer da garganta. Os miúdos que iam interpretando os poemas de «Tens é garganta! – Só se pode ser poema no Outono», acompanhados pelos colegas que compuseram os acompanhamentos musicais, voavam alto. Custa-me não enumerar aqui cada um dos nomes, quando preciso de dizer que foi o Luís Germano, que anda a fazer da sua escola Josefa d’Óbidos laboratório exemplar de promoção da leitura, que o Henrique [Manuel Bento Fialho] fez uma primeira escolha de poemas das nossas edições, depois selecionados pelos jovens leitores, que José [Anjos] animou depois as oficinas à procura da respiração exacta. O CD está bastante bem, mas o palco transfigurou-se em jardim semeado e esta celebração da palavra afirma a escola como lugar vivo. Santiago, sábado, 16 Outubro Saltada a Lisboa, digo Setúbal, para a inauguração da «Ilustração Portuguesa», na Festa da Ilustração, com livro incluído. Mais uma corrida, soltando o perfume da tinta e das imagens, e logo me encontro frente à lareira enquanto se entrava Luiz Pacheco adentro, no clube de leitura dedicado aos malditos. «Comunidade» continua um ser vivíssimo. Nunca o corpo foi avaliado, medido, devorado, celebrado assim. Todos conhecem o Pacheco, mas afinal quase nenhum o lê. Apetecia-me uma Cadáver Esquisito, mas os hóspedes dos dias anteriores protegeram-nas com a própria vida. O Jorge [Silva] deu magnífico ritmo ao pequeno volume que reúne os 80 textos nascidos da provocação fotográfica diária do João Francisco [Vilhena]. Nunca antes me tinha obrigado à prática diária da escrita e o resultado escalda-me as mãos. Apesar de uma ou outra ideia, da volúpia da descrição, dos socos na narrativa, foi sobretudo a palavra que persegui, os ossos do sentido, a transfiguração da oralidade. Fui livre que nem cumulus. A riqueza de formas e subtilezas, a gama do épico ao sussurrado, destas imagens não deixam de interpelar. No ecrã não estavam mal, com a luz a parecer surgir do seu interior. Mas o seu lugar é o papel, tal como parecem ter sido feitas para encher capelas, igrejas, catedrais. São objectos do mistério, onde nos espelhamos de mil modos. Assim os poemas quando cumpridos. Teatro da Rainha, Caldas, terça, 19 Outubro Vejo da plateia o círculo de luz projectado sobre o José Luiz [Tavares] no palco do Diga 33. O rigor da sua poesia impressiona sempre, tanta oficina e leitura, muito horizonte e ideia. A que se somam depois os pedaços de vida, as causas, os interesses, paixões e ódios. Há uma fulgurante verdade no que faz. Podia até ser puro artifício, desde que escrevesse o mesmo, mas assim brilha no escuro. Espaço Ó, Óbidos, quarta, 20 Outubro Está mais confessional hoje, o Miguel [Martins], no baile de apresentação à sociedade de «Do Outro Lado». Atira episódios intensos, conta bastidores da recolha dos dispersos de tantos anos, que está longe de ser completa, mas seja esta a sua vontade quase sempre da frugalidade e do apuro. De qualquer modo, exemplifica na perfeição o percurso de uma voz que pratica a mais terna das raivas. Ou será o inverso? Óbidos, sexta, 22 Outubro Não podia deixar de ser festa, a apresentação de «Micróbios», do Henrique [Manuel Bento Fialho], pelos modos, temas e práticas. O Fernando Mora Ramos fez leitura de abrir apetites, partindo tudo e lançando aos quatro ventos. O autor estava em casa e foi de espadeirar com ironia o alto e o baixo. Que bem sabia agora uma Cadáver Esquisito. Lá iremos, mas antes «O Ângulo Raso», acabado de chegar da gráfica, deu azo a bela sessão em torno de Fernanda Botelho, com intervenções substanciais da Joana [Botelho], da Paula Morão e do José Manuel dos Santos. Agora a cerveja, outra vez. Com livro onde recolhem os seis contos expostos nos corpos das garrafas. Vieram dizer que as sucessivas intervenções acabaram sendo sessão de stand up. Se isto fosse brincadeira. Óbidos, sábado, 23 Outubro Estou para ver as reacções a este «Puta de Vida», começando pelo título. (Estou furioso por não ter dado por título próximo do Miguel Esteves Cardoso). Contém uma energia que se comprovou no modo como tocou a plateia durante a leitura a várias vozes de um capítulo fulcral. O tema será a violência, também a conjugal, mas os romances não se medem aos temas. Aprendo com gozo que o Luís [Cardoso] é animal de palco, não apenas no modo como enfrenta as questões nos debates, mas a ler e a cantar o seu Timor. A noite cresceu nos Bons Malandros, como habitualmente, desta vez regadas a Cadáveres.
Nuno Júdice, poeta | A poesia é a relação com a vida Andreia Sofia Silva - 24 Nov 2021 “A Estrofe que Dança”, uma antologia de poemas do mexicano Rámon López Velarde é o mais recente projecto editorial de Nuno Júdice, mas o poeta português está a preparar dois novos livros, um inédito e uma antologia poética. Em conversa com o HM, o autor lamentou que a poesia contemporânea tenha esquecido as influências clássicas Acaba de lançar uma antologia de poesia de Ramón López Velarde. Como surgiu a oportunidade de editar este projecto? Conheci a poesia de Velarde no México. Foi o primeiro contacto que tive com a biografia. Na Cidade do México, a Casa da Poesia foi construída no sítio onde viveu. É um espaço que todos conhecem, um centro da poesia da América Latina. [Velarde] interessou-me porque tem, no fundo, um universo com tópicos que passam pela vida na província, pelos costumes camponeses, pela memória da infância, muito ligada à Igreja, e as figuras dessas cidades. Eram, na altura, cidades muito pouco cosmopolitas. Isso tem muito a ver com as minhas memórias do Algarve e dessa relação com uma vida ainda rural. A antologia nasceu do facto de este ano ser o centenário da morte do poeta e por sugestão da embaixada do México para que fizesse esta antologia. Como tenho relações pessoais com o México, e sendo um país de que gosto muito, não foi uma imposição, foi algo que aceitei com muito gosto. Que linha orientadora seguiu para a selecção dos poemas? Velarde tem uma obra relativamente escassa, só publicou três livros, e não foi muito difícil fazer essa selecção. Quis dar um pouco os vários aspectos da sua poesia. Há uma parte que está ligada à influência da poesia sul-americana da época, uma poesia influenciada pelo pan-asianismo francês, com um certo formalismo na escolha do vocabulário, uma escolha muito erudita, mas não incompreensível, como alguns pan-asianos. Depois existem os poemas que se ligam a memórias da sua adolescência, o tempo passado no seminário, e os personagens familiares, pessoas ligadas a uma burguesia rural rica. Ele descreve os interiores das casas, as mulheres que tinham uma sensualidade que o atraía, embora ele fosse religioso. Depois um outro campo de poemas que são inspirados pelos dois amores que teve. São poemas em que esse amor é quase um canto desesperado para atingir o impossível. Quando vai para a Cidade do México já tem uma vida mais cosmopolita, e é a terceira parte da poesia, em que vemos toda a cultura da época, a atracção pelos bailados. A obra de Velarde tem também poemas relativos a esse cosmopolitismo e às mudanças políticas, em que se passa de um momento em que o país vive agitado e entra depois na normalidade. É um poeta muito rico em termos de figuras da sociedade e, ao mesmo tempo, dá-nos um lado biográfico fascinante. Ao lermos Velarde acabamos por compreender o México. Traduzi o poema final, que se tornou numa espécie de poema nacional do México, e onde temos uma visão do país desde a conquista até à actualidade. Esse é um dos grandes poemas do Velarde, embora já não tenha um aspecto mais pessoal da sua vida. Há dois poetas em Portugal que podemos comparar [com Velarde]. Um deles é o Cesário Verde, que dá a visão de uma Lisboa que ainda é campo, mas que já começa a ser uma cidade cosmopolita, e depois João Lúcio, um poeta pouco conhecido em Portugal. É do Algarve e também fala na sua poesia da sociedade do seu tempo. Publicar Velarde em português permite o acesso à poesia sul-americana? É uma poesia ainda pouco conhecida no universo da língua portuguesa? Sim. Têm havido algumas traduções dos grandes poetas sul-americanos da época, mas o mais conhecido continua a ser o Jorge Luís Borges que apaga um pouco todos os outros. Em relação a nós, é o Fernando Pessoa. Julgo que esta tradução pode ajudar a suscitar curiosidade por outros poetas e pela grande poesia da América Latina desde o fim do século XIX. Alguns dos grandes poetas espanhóis são sul-americanos. Publicou no ano passado “O Regresso a um cenário campestre”, depois de ter lançado também um livro de poesia em 2019. Depois desta antologia, planeia escrever um novo livro de poemas? Sim. Estou a preparar uma antologia dos 50 anos de poesia, o primeiro livro é de 1972 (risos). Já lá vai um tempo. Esse livro deve sair em Março ou Abril. Estou também a escrever um novo livro que sairá depois do Verão, lá para Setembro ou Outubro. Está no processo retrospectivo de olhar para tudo o que já escreveu. Como tem sido esse trabalho? Quando se lê tudo o que está para trás às vezes temos a tentação de pôr muitas coisas de lado. Ao longo da minha poesia tenho mantido a escrita sobre os mesmos temas, há um desenvolvimento e uma aproximação dessas realidades que vão amadurecendo com o tempo. Não rejeito nada daquilo que escrevi. É como se fosse um livro que tivesse começado a ser escrito em 1972 e que ainda continua. Fazer esse exercício é como se olhasse para si próprio. Sim. Há por vezes poemas que têm a ver com a época, um bocado mais formais, dos anos 70 e princípios de 80. São mais jogos de palavras. Mas, felizmente, nunca fui muito por esse caminho. Tenho mantido uma linguagem e uma temática muito pessoais. Considera-se um poeta dos sentimentos? Sim. O que talvez distinga a poesia da ficção é esse olhar para dentro. E quando olhamos para dentro há muitas memórias e imagens, lembranças da cultura e do que lemos. Mas o que há também é a relação com a vida. O sentimento tem uma parte importante. Como olha para a poesia que se faz hoje em dia? Há uma nova poesia e poetas importantes que ganharam já um lugar, na poesia feminina, mas também alguns poetas que se têm afirmado neste século. Na minha geração tínhamos muita influência da poesia francesa, e líamos e aprendíamos com a poesia portuguesa do século XIX, com Almeida Garrett, António Nobre, Cesário Verde. Hoje essas marcas culturais já não estão tão presentes. Há um afastamento da cultura mais clássica? Sim. E há também uma maior aproximação ao quotidiano, com uma linguagem mais próxima realidade contemporânea. Já não é uma língua poética como era na minha geração. Falamos de uma “poesia express”, para se ler no rodopio dos dias? Sim, e às vezes o problema é esse, porque depois perde-se. É uma poesia que vai desaparecendo quando a realidade passa a ser outra. Mas esse é o problema em relação à poesia desde sempre. Acha que a poesia tem menos qualidade? Não. A língua portuguesa presta-se muito à poesia, e é uma forma de expressão histórica e natural. Diria que, nesse aspecto, a qualidade da escrita a poesia mantém-se a um nível elevado. Às vezes é só preciso atingir a capacidade de fazer com que o poema permaneça e que comunique. Para mim, um aspecto essencial é que o poema fale com o leitor e que haja um diálogo entre os dois. Isso é o mais difícil. Com as redes sociais e a era digital é mais fácil publicar poesia e ficção sem que haja um filtro? Claro. O poema impresso, o livro, é fundamental. No meu caso, quando estou a ler as provas, percebo o que funciona e o que não funciona. Ver na Internet, num ecrã, há um contacto demasiado directo e não há distância que permita separar o que é bom do que é mau. Esse trabalho sobre a linguagem é fundamental.