China condena pressão exercida pelos Estados Unidos sobre Portugal Hoje Macau - 12 Out 20204 Dez 2020 [dropcap]A[/dropcap] China condenou hoje a pressão exercida pelos Estados Unidos para Portugal banir o grupo de telecomunicações chinês Huawei da infra-estrutura de redes 5G, defendendo que nenhum país com “espírito independente” cederá a Washington. “Coagir outros países para que obedeçam à sua vontade não é apenas um acto flagrante de assédio, mas também uma evidente rejeição dos princípios de economia de mercado defendidos pelos Estados Unidos”, apontou à agência Lusa o Ministério dos Negócios Estrangeiros da China. “Nenhuma nação com um espírito independente se associará a esta campanha” de Washington, acrescentou o Ministério, em comunicado. Durante uma visita a Lisboa, na semana passada, o subsecretário de Estado norte-americano Keith Krach frisou a importância de excluir a Huawei das redes de quinta geração (5G), a Internet do futuro. A visita de Krach ocorreu poucos dias depois de, numa entrevista ao Expresso, o embaixador norte-americano em Lisboa, George Glass, ter considerado que os portugueses “têm de fazer uma escolha agora” entre “trabalhar com os parceiros de segurança, os aliados, ou trabalhar com os parceiros económicos, os chineses”. Glass admitiu que “Portugal acaba inevitavelmente por ser parte do campo de batalha na Europa entre os Estados Unidos e a China” e alegou que o país asiático tem “planos de longo prazo para acumular influência maligna através da economia, política ou outros meios”. As palavras do diplomata foram criticadas pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, e pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que lembrou que “em Portugal, quem decide acerca dos seus destinos são os representantes escolhidos pelos portugueses”. Na mesma nota, enviada à Lusa, a China acusou os Estados Unidos de “infringirem as regras do comércio internacional” e “danificarem os interesses dos consumidores e negócios”. “Acreditamos que todos os países vão manter uma posição justa e objetiva e fazer escolhas independentes, de acordo com os seus interesses, os interesses em comum com outros países e a tendência do desenvolvimento da humanidade”, lê-se no comunicado. O Governo chinês lembrou ainda que Portugal e a China mantêm uma parceira estratégica global. A Parceria Estratégica Global entre Portugal e a China foi assinada em outubro de 2010, durante a visita de Estado a Lisboa do então Presidente chinês, Hu Jintao, a que se seguiram importantes investimentos chineses na economia portuguesa. A relação entre a China e os Estados Unidos deteriorou-se rapidamente nos últimos dois anos, com várias disputas simultâneas entre as duas maiores economias do mundo. Em Pequim e em Washington, referências a uma nova Guerra Fria são agora comuns. Para além do boicote à Huawei, a administração de Donald Trump colocou outras 70 empresas chinesas na Lista de Entidades do Departamento de Comércio, limitando o seu acesso a tecnologia norte-americana. No Mar do Sul da China, uma faixa de navegação vital na região Ásia-Pacífico, navios de guerra norte-americanos e chineses disputam agora constantemente posições, enquanto Washington passou a realizar visitas de alto nível a Taiwan, uma afronta a Pequim, que considera a ilha parte do seu território. Uma prolongada guerra comercial subsiste também entre os dois países, apesar de um acordo de Fase 1, que não conheceu novos desenvolvimentos desde o final do ano passado. Os dois lados mantêm taxas alfandegárias punitivas sobre centenas de milhares de milhões de dólares das exportações de cada um.
IC | Abertas candidaturas para apoio de dois milhões de patacas para cinema Hoje Macau - 12 Out 20204 Dez 2020 [dropcap]O[/dropcap] Instituto Cultural (IC) lançou ontem a quarta edição do Programa de Apoio à Produção Cinematográfica de Longas Metragens, estando as candidaturas abertas até ao dia 25 de Novembro. Cada filme seleccionado poderá receber um subsídio no montante máximo de dois milhões de patacas. O regulamento determina que serão seleccionados até quatro beneficiários, sendo que cada um pode receber um apoio financeiro que corresponde a 80 por cento dos custos totais previstos para o projecto aprovado. O subsídio será utilizado para cobrir os custos de produção, promoção e marketing do filme. Segundo uma nota, o IC pretende, com este programa, “promover o desenvolvimento da indústria cinematográfica de Macau, fomentar talentos de cinema locais, melhorar a capacidade de produção da indústria cinematográfica local, incentivar os cineastas a envolverem-se na produção cinematográfica de longas metragens e criar mais obras cinematográficas criativas locais”. Os candidatos devem ser residentes permanentes da RAEM com mais de 18 anos de idade, inclusive, devendo ter alguma experiência na área do cinema, tal como a realização ou produção de, pelo menos, uma longa metragem com duração não inferior a 80 minutos ou de duas curtas metragens (de ficção) com duração superior a 20 minutos cada, anteriormente exibidas. O júri irá seleccionar, numa primeira fase, dez projectos com base em cinco critérios, tal como o “conteúdo e criatividade do argumento apresentado na sinopse do guião, a capacidade do candidato e da equipa para implementar o projecto, a viabilidade do projecto de produção, o grau de perfeição do projecto e racionalidade orçamental”. Na segunda fase de selecção o júri fará uma resenha escruta dos projectos e fará uma análise da documentação apresentada de acordo com os cinco critérios já referidos. Será também tida em conta a “integridade do argumento (guião) completo e a viabilidade da proposta de promoção e marketing”. Será feita ainda uma entrevista pessoal com o candidato e elementos da sua equipa, bem como a revisão da apresentação do projecto do candidato, a fim de seleccionar os candidatos finais.
SMG | Sinal 3 de tempestade tropical poderá ser emitido a partir das 18h Hoje Macau - 12 Out 20204 Dez 2020 [dropcap]O[/dropcap]s Serviços Meteorológicos e Geofísicos (SMG) deverão emitir o sinal 3 de tempestade tropical entre as 18h e as 21h de hoje, aponta uma nota. Em relação à emissão do sinal 8 de tempestade, poderá ocorrer entre a madrugada e a manhã desta terça-feira, dia 13, embora a possibilidade seja “relativamente baixa a moderada”. Os SMG informam ainda que a depressão tropical localizada na parte nordeste do mar do sul da China vai intensificar-se e continuar a mover-se para oés-noroeste em direcção à Ilha Hainan. Quanto ao tempo, “entre hoje à noite e o dia 14 vai ser instável, havendo aguaceiros e ventos fortes”. Prevê-se a ocorrência de inundações nas zonas baixas do Porto Interior esta terça-feira de manhã devido à influência do “Storm Surge” e ocorrência de aguaceiros fortes. A altura de inundação prevista é cerca de 0,4 metros.
O regresso de Sócrates luis-sa-cunha - 12 Out 20204 Dez 2020 [dropcap]O[/dropcap]s portugueses estão fartos de ouvir falar de José Sócrates, uma criatura que subiu das irregularidades na Câmara Municipal da Covilhã com projectos na mão que eram autênticos mamarrachos que nenhuma edilidade do mundo aprovaria até à cadeira de primeiro-ministro deste Portugal endividado até ao tutano. Especialmente as dívidas monstruosas que três gerações futuras irão pagar no que respeita às escandalosas Parcerias Público-Privadas (PPP) que tanta tinta corruptiva fez correr. As PPP de Sócrates são um escândalo e ainda bem que foi preso por alegados crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e mais umas dezenas de acções criminosas, antes que a criatura avançasse para mais pontes sobre o rio Tejo, TGV e aeroportos. Um megalómano que soube enriquecer possivelmente devido às notas que caíram com a chuva nos seus terraços habitacionais, em especial o de Paris, onde gastou milhões só para remodelar o imóvel adquirido num dos bairros mais chiques da capital francesa. As PPP’s são um dos maiores cancros da nossa economia e que irão levar anos e anos para serem pagas. Uma mina para os amigos de Sócretes, uma criatura tão poderosa no expectro sócio-políItico-judicial que o seu julgamento talvez seja realizado se um dia Portugal passar a ser uma região autónoma de Espanha… E a que propósito estamos a escrever sobre o medíocre veraneante da Ericeira? É que na semana passada assistimos a um escândalo no seio do governo e da Presidência da República que deixou o país atónito. Vítor Caldeira era há 25 anos o presidente do Tribunal de Contas. Um homem de bem, profissional exímio, um exemplo de transparência e independência, mas… que de vez em quando lá estava Caldeira a criticar certas decisões do governo socialista, o que em democracia é absolutamente saudável. O Tribunal de Contas não foi criado para ser um yes man do governo, antes pelo contrário. Este organismo tem a obrigação de velar pela seriedade das acções governativas e indicar todas as lacunas que as despesas oficiais possam apresentar. Mas em Portugal tudo é diferente. Quem não está com o poder, leva… já dizia há muito o ex-ministro socialista Jorge Coelho. E desta feita, o primeiro-ministro, António Costa, refastelado no cadeirão do seu gabinete do palácio de São Bento, pegou no telefone e vai daí: – É o senhor presidente Vítor Caldeira? – Sou sim, senhor primeiro-ministro! Faz o obséquio de dizer… – É para lhe dizer que já não o reconduzo no lugar. Termina aqui o seu trabalho… – Mas?!… Está lá?!… Estou?! A notícia correu célere. O exemplar presidente do Tribunal de Contas tinha sido demitido por telefone, atitude nada cordial. As conjecturas não se fizeram esperar, nomeadamente a mais triste e incómoda para quem chefia um governo que diz respeito aos milhares de milhões de euros que aí vêm a caminho oriundos da União Europeia para fazer frente aos mais diversos e espampanantes projectos e adjudicações que nunca poderão ter a adversidade do Tribunal de Costas. Obviamente, uma conjectura grave. Entretanto, rapidamente o primeiro-ministro anunciou o substituto de Vítor Caldeira. Pior a emenda que o soneto. Uma escolha que recaiu num socratino. José Tavares é dado pela Polícia Judiciária como muito próximo do ex-secretário de Estado de José Sócrates, Paulo Campos, um dos principais suspeitos nas investigações às PPS’s e que sempre foi o braço-direito de Sócrates nos chamados cambalachos com o venezuelano Hugo Chavez e o líbio Muhamar Kadaffi. José Tavares é mencionado no inquérito às Parcerias Público-Privadas, caso onde se investigam prejuízos de cerca de 3,5 mil milhões de euros para o Estado, numa alegada prática de corrupção e de outros ilícitos criminais. A proximidade entre Paulo Campos e o novo presidente do Tribunal de Contas é atestada com diversos emails trocados entre o ex-secretário de Estado de Sócrates e José Tavares, então director-geral do Tribunal de Contas, em 2009 e 2010. José Tavares terá inclusivamente participado em reuniões secretas com o governo de José Sócrates para tentar contornar o chumbo que os próprios juízes conselheiros do Tribunal de Contas fizeram a quase todos os contratos das subconcessões rodoviárias lançados pelo então ministro Mário Lino e Paulo Campos. E os mais diversos políticos da oposição e o povo observador destas temáticas políticas em geral perguntam-se como pode existir tão pouca seriedade ou tanto compadrio na nomeação de um cargo de suma importância para uma governação transparente e profícua. Lá diz o ditado que à mulher de César não basta ser séria, há que parecer… *Texto escrito com a ANTIGA GRAFIA
Organização da Polícia em 1867 José Simões Morais - 12 Out 20204 Dez 2020 [dropcap]Q[/dropcap]uando a 26 de Outubro de 1866 o Governador de Macau José Maria da Ponte e Horta (1866-1868) tomou posse, as circunstâncias determinavam a urgência de reformas nos vários serviços da Administração da colónia. Assim, logo em Novembro começou a nomear uma série de comissões para estudar e elaborar as necessárias reformas a empreender e entre elas constava uma nova organização para o Corpo de Polícia. N’ O Boletim do Governo de Macau de 12 de Novembro de 1866, o Governador determinava: O Corpo da Polícia desta cidade tinha então como comandante Francisco Justiniano de Souza Alvim Pereira, pertencente ao exército de Portugal e capitão adido ao Batalhão de Macau; como Tenente ajudante, Frederico Guilherme Freire Corte Real, tenente adido ao Batalhão de Macau pertencia também ao exército português; e como Tenente, Francisco Augusto Ferreira da Silva, tenente do Batalhão de Macau. Corpo da Polícia de Macau Uma nova força de Polícia fora organizada em 1857, a princípio exclusivamente do Bazar e depois geral de toda a cidade, pelo macaense Bernardino de Senna Fernandes (1815-1893), que o comandou até 1863, primeiro no posto de Capitão e depois como Major de segunda linha, de que hoje (1866) conserva ainda as honras. Mas a ideia inicial proveio do negociante chinês Aiong-Pong, com propriedades e lojas no Bazar, que em 1857 engajou por conta própria uma pequena guarda composta por europeus, à semelhança do que se fazia à noite com os “quartos chinas – vigias nocturnas. Todos os que tinham propriedades no bazar acharam boa ideia. Foi assim que Bernardino de Senna Fernandes e alguns chineses principais se uniram para aumentar essa guarda, de maneira a poder vigiar e guardar também os seus bens. Essa guarda devia ser paga por meio de subscritores chineses e para lhe darem existência jurídica, solicitaram a aprovação do governo, que lha deu pela portaria n.º 41, de 29 de Setembro de 1857 e publicada no n.º 50, do Boletim Oficial de 3 de Outubro. Ficava sob uma comissão de três negociantes chineses, que cobravam dos outros negociantes uma determinada quantia para manterem os 50 portugueses, que policiavam o bazar”, segundo o Padre Manuel Teixeira. A 2 de Janeiro de 1859, o produto das licenças provenientes dos espectáculos de autos-chinas, realizados na Porta do Campo de St.º António, foi destinado à aquisição de armamento para a Força de Polícia, cujo comandante Bernardino de Senna Fernandes mandou vir da Inglaterra. Este criou também “a Polícia de Mar, que salvou muitas vidas e propriedades no tufão de 27 de Julho de 1862; com um dos seus vapores e mais duas embarcações de vela aprisionou, à testa de 25 homens da força do seu comando, quatro embarcações de contrabandistas chineses, guarnecidas cada uma com 87 homens e seis a oito peças de artilharia de grosso calibre; apreendeu ainda uma embarcação de piratas com $5230, remetendo tudo à Fazenda Pública; prendeu mais três embarcações de piratas, que andavam roubando as aldeias próximas de Macau”, segundo o padre Manuel Teixeira, que refere, “Tendo sido proibida a importação de víveres para Macau em 1858 depois da retirada dos chineses, ordenada pelos mandarins em consequência da guerra entre a China e a Inglaterra [2.ª Guerra do Ópio], conseguiu ele que os mandarins de Heong-shan e Ching-Shan suspendessem essa proibição.” Por Portaria de 11 de Outubro de 1861, o Governador Izidoro Francisco Guimarães determinou a criação da Força da Polícia, e deu-lhe um Regulamento, com que se devia reger o Corpo de Polícia do Bazar que passou a chamar-se Corpo de Polícia de Macao. No extenso Regulamento, o Capítulo 1.º Artigo 2.º refere, . Assim Bernardino de Senna Fernandes tornou-se Major Comandante do Corpo de Polícia de Macao. Já a 4 de Setembro de 1853, o Capitão Ricardo de Melo Sampaio atestara que Senna Fernandes em 15 de Agosto de 1849 acompanhara sempre a força que foi guardar a Porta do Cerco, servindo de meio de comunicação entre essa força e o Conselho do Governo, arriscando-se sem temor das balas. Foi também Presidente da Comissão Administrativa da Santa Casa da Misericórdia e superintendente da Emigração Chinesa, prestando ainda outros serviços à Colónia.
Das lamentações Anabela Canas - 12 Out 20204 Dez 2020 [dropcap]D[/dropcap]e vez em quando mais alguém, que parte para outro lado do tempo, nos reúne. Na amizade, na melancolia, na companhia necessária ao que parte e a quem fica de mãos vazias e alma triste. E depois vamos comer. É importante comer juntos. Divergir para histórias e memórias e gafes recentes e carinhosas de amigos, na circunstância em que trocamos os pés pelas mãos. A perda de alguém que nos é querido ou que é querido a alguém que nos é querido. Uma cadeia em que nos situamos tristes, de um modo ou de outro. Ali estamos, de frente para os três. Ele que partiu, Ele que talvez esteja e que preside a tudo e em quem, mesmo se não acreditamos, gostaríamos de acreditar e que queremos sentir atento, e que, se ajuda for necessária, mande um sereno par de anjos para mostrar o caminho da eternidade. E ele, o clérigo que, entre ambos, se dispõe a mediar em representação de quem lhe é superior. Que depressa nos faz sentir vermes abaixo. Como estando num anfiteatro enorme. Em cima aquele a quem desejaríamos ser, mesmo que momentaneamente, conduzidos como conforto e elevação, mais abaixo, o imponente representante, um pouco mais abaixo o que vai a caminho do céu e muito mas muito mais abaixo estes seres colocados no palco, quando diz que é para nós que se deve virar a atenção. Estávamos enganados. Pensávamos vir pelo que partiu ou está de partida para o céu. E pelo céu em si. Pelo espírito que tanto nos transcende destes corpos e que esperávamos que nos fosse apontado como quem nos mostrasse uma estrela. Abespinhado pelo ínfimo atraso de quem veio desfalcada de atravessar noite de vazio e em branco, e pela congregação que nem toda se benzeu nem respondeu, que admoestada e já com a voz a sumir lá fez das tripas coração e amén. Tal e qual como crianças que quanto mais se lhes ralha menos respondem. Ali estamos, em despedida, em companhia e numa certa nostalgia de crer que o momento inspira. Em algo que acompanhe quem parte, para um lugar utópico, que conduza serena e suavemente quem vai. E no respeito pela espiritualidade que, ansiamos, perpasse nas palavras, sobretudo nas que são espontâneas e livres do espartilho anacrónico das escrituras, e liberte ou suavize a dor de quem fica e fica com um enorme M de morte na alma, um pesado V de vazio a querer ganhar espaço e um enorme N que é a pessoa que não estando estará para sempre. E nos ouvidos as palavras de quem supostamente sabe. Sabe? Mas tropeçava sempre na leitura do nome inteiro, que não memorizou, como se a ler pela primeira vez e a custo e como se não o conhecesse de lado nenhum. E não conhecia. Desejamos para dentro que não se engane a encomendar-lhe a alma. Vou dizer umas breves palavras – enunciou ao sair das escrituras – que não são para acusar ninguém. Acende-se uma pequena luz de alerta. Interrompemos-lhe mentalmente o fio condutor e paramos brevemente a perguntar-nos de que vamos ser seguramente acusados. Como miúdos da escola. Porque não soubemos ou não quisemos responder amém nos sítios próprios e mesmo depois de advertidos de que o tínhamos que fazer. A revolver na memória as palavras de estilo que nos competiam mas já as vozes sumidas e contrafeitas e tristes. Ficou zangado. Diz-nos que muitas pessoas não são cristãs, simplesmente baptizadas. Aí está. Desenvolve e acusa. Desenvolve e acusa. Cegamos porque não conseguimos ensurdecer. Aquilo é connosco. Não nos conhece mas não gosta de nós. E não quer que tenhamos ilusões de que Cristo também não gosta de nós. Mas não foi ao que viemos. Viemos por sentimentos, por anseio espiritual face à morte de alguém e à nossa futura em construção. Viemos por respeito. Qualquer coisa em que acreditar mesmo que por momentos, mesmo que seja uma metáfora bela que conforta quem está triste. Que aponte uma luz, uma chama, uma ideia holística, uma harmonia no estar e no partir. Qualquer coisa. Ali, como em qualquer outro lugar de culto. Num templo budista ou à beira de uma falésia. Depois penso confortada que talvez o Cristo dele seja outro que não o nosso. A cada um o seu anseio. Um Cristo, ou outro. Mas ali estava ele de figura imponente a desinfectar as mãos esguias e longas de minuto a minuto. Eu acho, dizia P. depois, enquanto caminhávamos ao longo do muro liso da cidade dos mortos, que ele, de cada vez que tinha um mau pensamento, desinfectava as mãos. Algo sobe em mim e sei que num momento qualquer sem eu dar por nada, vai sair em palavras que não cabem ali. Não quero ouvir mais nada não quero ter mais nenhuma palavra daquela voz para lembrar não quereria que a minha amiga tivesse que ouvir mais nada. Saio. Longa pausa de silêncio e três cigarros. Espreito discretamente e ainda oiço aquela voz maldosa. Recuo para o exterior de segurança. Volto a tempo de ouvir outra voz, uma voz de quem soube amar e cuidar e amou e ama, a dizer as últimas palavras e belas, antes da partida para a última morada. A voz e as palavras – aquelas – as únicas que valem a pena.
Resistência | Quarteto de veteranos com saldo positivo em Zhaoqing Sérgio Fonseca - 12 Out 20204 Dez 2020 Como diz o povo português, “velhos são os trapos”. Pois bem, quatro nomes incontornáveis do automobilismo de Macau voltaram a juntar-se para disputar as “6 Horas de Endurance do Circuito Internacional Guangdong” no passado dia 8 de Outubro, uma prova de resistência para viaturas de Turismo que se disputa todos os anos no circuito permanente dos arredores da cidade de Zhaoqing [dropcap]O[/dropcap] quarteto da “250 Macau Spirit Racing” – o ano passado a equipa chamava-se “246 Macau Spirit Racing” por razões óbvias – voltou a ser composto por Rui Valente (59), Ricardo Lopes (59), Belmiro de Aguiar (65) e José Mariano da Rosa (67), que se sentaram novamente aos comandos do Honda Integra Type-R nº20, um carro que já tem alguns anos, mas ainda está distante da provecta idade daqueles que o conduziram. Deste tétrade apenas Rui Valente continua assiduamente activo no desporto motorizado local, mas como o próprio admitiu, desta vez “os meus companheiros de equipa empenharam-se mais e rodaram todos mais rápido que o ano passado”. E foi mesmo o ex-regular da Corrida da Guia do Grande Prémio de Macau a realizar a qualificação, colocando o Honda na segunda posição da grelha de partida de dezanove viaturas, tendo apenas sido superado por um inalcançável e muito mais moderno Audi R8 LMS TCR, carro que haveria de vencer a corrida com um certo à vontade. Os quatro veteranos do território realizaram uma prova isenta de erros, mas as paragens nas boxes acabaram por prejudicar um melhor resultado. “Rodámos sempre em segundo da geral nas duas primeiras horas, mas quando tivemos que atestar de gasolina e mudar de pneus perdíamos muito tempo”, explicou Rui Valente ao HM. Com cada piloto autorizado a fazer turnos de condução com o máximo de 75 minutos, Rui Valente fez a partida, para depois passar o volante a Ricardo Lopes, para uma hora depois ser a vez a “Miro”, antes do mais graduado de todos, Mariano da Rosa, assumir os comandos. Até à mostrarem da bandeira de xadrez Lopes, “Miro” e Valente voltaram a sentar-se no cockpit do carro japonês. “Chegámos a cair até nono, mas depois fomos subindo outra vez. Quando voltei à pista, a uma hora e dez minutos do fim, só foi possível ir até ao 5.º lugar da geral e ganhar a nossa classe, pois ficámos ainda a duas voltas do quarto e do terceiro classificados”. Parar é que não A equipa da RAEM não conseguiu repetir o pódio à geral, mas venceu a sua classe e no final o saldo era positivo. “Foi pena não termos acabado nos três primeiros, mas acho que quinto lugar obtido foi bom”, disse, em jeito de balanço, Rui Valente. Num ano atípico para o automobilismo na região, os quatro macaenses não têm planos para voltar a competir este ano, como confirma Rui Valente, o mentor desta iniciativa. “Este ano não, mas esperamos voltar já em 2021”, até porque os planos para o futuro próximo passam por “continuar a fazer corridas de resistência na China”. Regressar ao Grande Prémio de Macau não está nos planos destas “velhas glórias”, com a excepção de Rui Valente, que lá estará no Grande Prémio de Macau no mês de Novembro, no pelotão da Taça de Carros de Turismo de Macau. Contudo, “desacelerar” não é uma palavra que esteja no vocabulário do quarteto da “250 Macau Spirit Racing” e poisar o capacete não é uma meta a atingir a curto prazo.
Içado sinal 1 de tempestade tropical Hoje Macau - 11 Out 20204 Dez 2020 [dropcap]O[/dropcap]s Serviços Meteorológicos e Geofísicos de Macau (SMG) emitiram ontem um alerta de tempestade tropical. As autoridades de Macau indicaram que o sinal número 1 foi emitido “às 22:00”, quando a depressão tropical estava “a cerca de 770 quilómetros” a sudeste de Macau, indicaram, em comunicado. A depressão tropical “está a intensificar-se gradualmente e vai continuar a mover-se para oeste” em direção a Hainão, a sul da China, acrescentou a mesma nota. Os SMG referiram ainda existir uma “probabilidade relativamente alta” de emitirem o sinal número 3, na segunda-feira à noite. Para este ano, as autoridades de Macau disseram prever quatro a seis tempestades tropicais no território em 2020, algumas delas podendo mesmo “atingir o nível de tufão severo ou super tufão”.
Plano Director II – Centro, para que te quero? Hoje Macau - 11 Out 20204 Dez 2020 [dropcap]F[/dropcap]oi apenas no último quartel do séc. XX que se iniciaram infra-estruturas na Europa que permitiriam a necessária e efectiva reabilitação das qualidades que são intrínsecas ao centro das cidades, entretanto exaustos ou abandonados. Nomeadamente o estabelecimento de transportes colectivos de condução automática e generalizada à periferia, inclusivamente aos aeroportos, e que levariam os residentes a prescindir da utilização de automóveis próprios na cidade. A tarefa enfrentou dificuldades semelhantes à de levar no passado o caminho de ferro ao centro de cidades já consolidadas, todavia em cidades já maiores, mais consolidadas, mais densificadas e mais intensificadas. Foi essa a génese das linhas expresso de metropolitano urbano e suburbano, escavadas mais fundo às já existentes, que teriam estações de correspondência no centro da cidade e onde necessariamente foram sacrificados quarteirões para construção dessas estações e de instalações auxiliares ou complementares. Foi também quando os transportes colectivos passaram a ser planeados em modo “seamless”, i.e. contínuo, com ligações de correspondência cómodas e resguardadas da intempérie. Foi para isso que se demoliu em 1971 o mercado Les Halles no centro da cidade de Paris e se lançou mais tarde mão à obra de Potsdamer Platz em Berlim em 1990, imediatamente à reunificação da Alemanha e à queda do muro, e que foi considerada o maior estaleiro que a Europa alguma vez conheceu. Ou seja, os castros históricos da cidade poderão permanecer imutáveis, mas os centros da cidade contemporânea não. Ou se aperfeiçoam dia a dia, ou se degradam também dia a dia. À escala de Macau já se efectuaram duas intervenções semelhantes, uma no Tap Seac, outra na Praça Ferreira do Amaral, mas onde muito pouca coisa concorreu nessas oportunidades. No caso de Berlim sequer foi necessário empreender demolições, pois a Segunda Guerra Mundial se encarregara disso. Potsdamer Platz era por onde o muro de Berlim passava e onde toda essa cintura fora limpa de destroços no pós-guerra, mas não foi reconstruída, para vigilância e segurança da nova linha de fronteira. Mas é também em Berlim onde melhor se percebe o que o centro significa para uma cidade, exactamente por via de dele ter sido privada. Com a divisão no pós-guerra do território alemão e da sua capital pelas forças aliadas, apenas a França, a Inglaterra e os Estados Unidos aderiram a que as suas ocupações integrassem o mesmo novo estado alemão. A repercussão disso em Berlim foi que apenas os sectores da cidade ocupados por esses aliados se unificassem e pertencessem ao novo estado Alemão Federal, todavia separados do sector soviético da cidade, o qual tinha continuação para o território do outro novo estado alemão a que pertenceu, a Alemanha Democrática. A questão releva porque o centro de Berlim estava no sector soviético e aí permaneceu como o centro de Berlim, capital da República Democrática Alemã. Os sectores francês, inglês e americano eram constituídos por periferias da cidade original, e passaram a relacionar-se entre si como troços de uma cidade sem centro, e onde lugares junto ao muro, outrora bairros de prestígio muito perto do centro, como Potsdamer Platz e Kreuzber, passaram a ser as traseiras de uma cidade nova. Daqui também se extrai que Berlim Oriental teve condições para ser a capital da República Democrática Alemã, mas Berlim Ocidental não teve condições para ser a capital da República Federal Alemã. Mais ainda releva o facto de que foi nestas mesmas condições que o município de Berlim Ocidental geriu urbanisticamente a cidade, durante mais de 50 anos, sem cuidar de a resolver. Efectivamente a sanação dessa situação não passava por planeamento urbanístico ou por reordenamento territorial. Passava antes por restabelecimento de outras condições cuja base não era de ordenamento territorial, todavia necessárias para que planeamento urbanístico se cumprisse com sentido. No mesmo ano de 1990 em que as repúblicas alemãs se reunificaram e o muro de Berlim caiu, a obra de Potsdamer Platz foi imediatamente lançada e essa foi a oportunidade e o principal instrumento que serviu para “coser” o tecido urbano original, reunificando e reapetrechando. Efectivamente retirar ou desactivar o centro de uma cidade é o mesmo que desorganizar, desarticular ou descomandar um organismo. Por outro lado, o oposto, i.e. o excesso de concentração e de intensificação dos centros, e que se designa pode macrocefalia, por analogia ao que acontece com outros organismos, poderá ser outra forma de disfuncionalidade, se os instrumentos necessários para essa gestão não estiverem disponíveis, não produzirem resultados eficazes ou forem desproporcionais aos recursos do território. Nessas situações poderão prosseguir medidas de descentralização, que não passa por repetir o centro, antes de intensificar outros centros de hierarquia inferior ao abrigo da “teoria dos lugares centrais”, ou especializar esses centros, sendo que existiram sempre funções que são reservadas ao centro que se encontra no topo dessa hierarquia. É também assim que se administram estruturas governamentais, nisso o ordenamento territorial não é muito diferente, pelo que não é difícil obter o mesmo entendimento por parte de quem governa territórios. O Projecto do Plano Director apresentado para a RAEM caracteriza-se por “Um Centro, Uma Plataforma, Uma Base” e propõe o uso de “portais”, “centros modais”, “cinturas” e “núcleos” para criar a nova estrutura espacial urbana. Esses termos preenchem o que se descrevem atrás a respeito de ligações com outras regiões (portais), especialização articulada de centros (núcleos e centros modais), assim como novas acessibilidades, se bem que só periféricas (cinturas). Nada se menciona a respeito do centro que organiza, articula, norteia ou comanda todo este organismo. As designações utilizadas são “Centro Mundial de Turismo e Lazer” que antes corresponde a uma especialidade extensível a toda a Região Administrativa Especial, “Centros Modais de Cooperação Regional”, todavia todos localizados na periferia e “Centro Histórico” incluído na zona consolidada da península de Macau, para a qual não foi definida nenhuma estratégia. É isso o que reveste o projecto de Plano Director mais em sentido de Plano de Urbanização de novas zonas, e menos de Plano Director de toda a região. O projecto contempla que se preservem as actuais zonas comerciais concentradas na Avenida de Almeida Ribeiro e na ZAPE, destinadas essencialmente às actividades de comércio e serviços, nomeadamente as actividades comerciais, os escritórios, as actividades financeiras, de retalho, de restauração, de convenções e exposições, entre outros. Tudo funções que caracterizam um CBD (Central Business District), mas nada sobre a sua intensificação, o seu reapetrechamento ou a sua actualização como centro de um organismo com um novo desenvolvimento urbano. Ou seja, algo que evolui em sentido de microcéfalo, de que não se conhece exemplo em urbanismo. A medida mais sugere ser temporária, e que esse centro passe entretanto a ser noutro local, ou sequer na RAEM, e que o actual centro só não será para implodir porque incluiu um centro histórico classificado património mundial. O mesmo é dizer que o actual centro evoluirá em sentido de castro histórico, mas isso também não prescinde de dever ser funcionalmente e acessivelmente apetrechado, por não é exclusivamente arqueológico ou museográfico. Mesmo que a intenção seja de entregar o centro e os bairros antigos à estratégia económica neoliberal, que foi o modo mais generalizado como as cidades conseguiram conduzir renovação urbana no passado recente, essa massa económica carece de apetrechamento e de interfaces. A pergunta simples, com alcance de aperfeiçoamento de Plano Director, é: – À chegada a Macau, para onde se vai apontar o sinal de “centro”, e como lá se chega?
Global Media | Paulo Rego anuncia saída da administração Hoje Macau - 11 Out 20204 Dez 2020 [dropcap]O[/dropcap] administrador não executivo do Global Media Paulo Rego anunciou no sábado a saída da administração de um dos maiores grupos de comunicação social portugueses, detentor de títulos como Jornal de Notícias e Diário de Notícias. “Fiz a minha parte nesta administração. Chegou a altura de me demitir. A KNJ acredita no futuro desta companhia, mas não está directamente envolvida nas actuais circunstâncias”, escreveu Rego, representante da companhia de Macau KNJ, do empresário Kevin Ho, na carta enviada ao conselho de administração e à qual a Lusa teve acesso. “A empresa encontrou o caminho para o futuro, com um novo accionista que traz uma nova força ao GMG [Global Media Group]. Já não depende de mim”, acrescentou na missiva, escrita em inglês, numa referência à entrada do empresário Marco Galinha, proprietário do grupo Bel. Em Setembro, a Global Media, que detém ainda a rádio TSF, entre outros títulos, anunciou a conclusão de um acordo com o grupo Bel do empresário Marco Galinha para a entrada como accionista de referência no GMG. De acordo com a imprensa, Marco Galinha terá ficado a deter 40 por cento daquele grupo de ‘media’.
Livro | José Luís Peixoto apresenta “Regresso a Casa”, onde a Ásia marca presença Andreia Sofia Silva - 11 Out 20204 Dez 2020 José Luís Peixoto, escritor, lançou em Agosto um novo livro de poemas que não é mais do que um retrato das experiências vividas pelo autor, onde se incluem viagens pela Ásia. Países como a China, Tailândia ou Coreia do Norte são retratados na obra editada pela Quetzal [dropcap]“R[/dropcap]egresso a Casa”, lançado por José Luís Peixoto em Agosto, é o mais recente livro de poesia do escritor que já esteve em Macau, a propósito do festival literário Rota das Letras. Nesta obra, o autor lança um olhar sobre si próprio, a sua carreira literária, mas também sobre algumas das viagens que já realizou. É a vez de José Luís Peixoto regressar à Coreia do Norte, país onde esteve na qualidade de turista e que levou à publicação de “Dentro do Segredo – Uma Viagem pela Coreia do Norte”. No “25.º andar do Hotel Yanggakdo”, nome do poema introdutório do capítulo sobre a Coreia do Norte, o autor descreve o seu corpo “talvez dissolvido no cheiro dos lençóis, detergente / ácido e pobre, ou talvez espalhado sobre estas alcatifas”, enquanto recorda memórias de infância. Ou aquele em que “No topo da Torre da Ideia Juche”, Peixoto diz que “às vezes, parece que consigo distinguir vento na paisagem”. É um lugar que é “uma praça vazia, é um hotel em construção / permanente, um hotel de 330 metros de altura / em construção permanente”. “Tive oportunidade de visitar a Coreia do Norte por cinco vezes desde 2012”, contou José Luís Peixoto ao HM. “Por motivos bastante evidentes, que se prendem com as especificidades socio-políticas do país, e não só, essa é uma experiência muito marcante na minha vida. Além disso, escrevi um livro e múltiplos artigos, que dão conta das leituras e da atenção que dediquei a esse país.” Segue-se a China, cujo capítulo arranca com o poema “Palácio de Verão”. Mas há também “Chengdu”, onde o autor escreve: “Impressiona-nos estar tão longe de casa”, e onde, no Parque do Povo, “pousamos chávenas de chá sobre as mesas de pedra”. José Luís Peixoto confessa que os poemas escritos sobre a China “são uma pequeníssima ‘janela’ para horizontes a que me quero dedicar de forma muito mais consequente no futuro”. “A China, do passado e do presente, é um espaço que lança algumas das questões mais fundamentais deste tempo e, mesmo, da natureza humana. Nos breves exemplos deste livro, pretendi abrir uma passagem para esse trabalho que quero levar a cabo. Nestes poemas, tracei linhas entre o remoto e o íntimo, propondo um contraste entre referências que, para uma perspectiva portuguesa, podem ser consideradas ora ‘exóticas’, ora ‘familiares’”, afirma. E depois, aparece a Tailândia. Peixoto começa por descrever a experiência única de andar de tuk-tuk. “Inclino-me nas curvas, sou projectado para trás / nos arranque da aceleração / agarro-me bem / vou numa moto-táxi no trânsito de Banguecoque / escuto black metal escandinavo”. Mas há também relatos da “Aldeia da tribo Mlabri”, cujos membros “mudam de lugar assim que amarelecem as folhas / de bananeira que usam para cobrir os telhados”. Para José Luís Peixoto, estar na Tailândia constituiu uma experiência bastante diferente daquela que viveu na China, por exemplo. “Embora a Tailândia tenha relações importantes com a China, existem diferenças enormes entre essas duas realidades. Este livro de poesia tem uma abordagem muito pessoal aos temas e, por isso, a minha própria experiência acaba por ser também muito marcante na forma como abordo essas duas culturas.” A ideia de “Casa” José Luís Peixoto não consegue enumerar um poema preferido de “Regresso a Casa”, talvez porque o “assunto mais central seja a ideia de ‘casa’”. “De formas muito diversas, todos temos esse espaço nas nossas vidas, quer seja de uma forma física e concreta ou simbólica e subjectiva. Foi nessa reflexão acerca das minhas várias ‘casas’ que o livro foi construído.” Para isso, o autor faz referências a Galveias, a aldeia alentejana de onde é natural, ou Oeiras, onde actualmente reside. Mas há também poemas sobre “os livros que escrevi e à própria poesia, reconhecendo que também existem essas ‘casas’ imateriais”. Se há uma casa, há também o regresso, “que implica uma deslocação, uma viagem e, por isso, acabei por me referir também a outros lugares, que estão ligados ao meu percurso e à minha bibliografia, como é o caso da Coreia do Norte, da Tailândia e da China”. “Regresso a Casa” surge depois das publicações de poesia “A Criança em Ruínas”, “A Casa, A Escuridão” e “Gaveta de Papéis”. “Há cerca de uma dúzia de anos que não publicava um livro de poesia. Ainda assim, esse é um género que tem uma grande presença no meu quotidiano. Não apenas porque faz permanentemente parte das minhas leituras, mas também porque é uma espécie de ‘molde’ para a minha maneira de pensar”, frisou o autor. José Luís Peixoto tinha, há muito, a ideia de fazer este livro, mas nunca pensou que o projecto iria surgir durante o período de confinamento, devido à pandemia da covid-19. “Quando chegou o confinamento, estava a trabalhar num romance. Interrompi esse trabalho porque as condições desse período não me permitiam manter a continuidade de escrita, assim como de raciocínio. Então, foi nessas circunstâncias que comecei a escrever alguns poemas ligados directamente ao que estávamos a passar. A partir daí, o livro foi expandindo.” O confinamento acabou por se revelar uma ajuda preciosa. “Teve a vantagem prática de me proporcionar tempo. Senti, no entanto, que a quarentena colectiva gerava uma certa claustrofobia, o que não é favorável à literatura e à poesia. Ainda assim, também é de assinalar que a procura de um certo ‘escape’ nas palavras acabou por propiciar muita escrita. Em qualquer dos casos, seguramente que o livro seria muito diferente se tivesse sido escrito noutro tempo, segundo outras condições”, adiantou. “Dimensão pessoal” O último capítulo é dedicado à “Bibliografia”, em que o autor reflecte sobre todos os livros que publicou até então. “Num livro com uma dimensão pessoal tão grande como é o caso deste, creio que está sempre presente a perspectiva do balanço. Neste caso, a referência aos meus próprios livros vem na sequência das múltiplas referências pessoais que o livro inclui, como é o caso da minha família, de lugar específicos…neste ano, passaram 20 anos sobre a edição de autor do meu primeiro livro, que se chama Morreste-me. Esse é um número redondo que instiga à auto-reflexão. Vinte anos já permite retirar algumas conclusões.” Para José Luís Peixoto, “toda a escrita literária, e a poesia no interior desse imenso território, é sempre um diálogo connosco próprios”. “Por vezes, tornando esse jogo de espelhos ainda mais complexo, trata-se de um diálogo connosco próprios através dos outros. Não apenas da forma como tomamos o outro em consideração enquanto leitor, mas também pela forma como transportamos para a escrita aquilo que são reflexos da forma como vemos o outro. Ainda assim, também nós estamos sempre presentes nesse retrato porque, em última análise, somos nós que observarmos, que escolhemos nomear”, acrescentou. Terminado o período de confinamento, o autor pretende regressar ao romance que começou a escrever durante a quarentena. “Tem avançado a muito bom ritmo. Acredito que deverá estar pronto para publicação no próximo ano. Oxalá nessa altura toda esta pandemia seja apenas uma memória”, rematou.
APEP | Lista única renova mandato com 24 votos a favor Andreia Sofia Silva - 11 Out 20204 Dez 2020 Filipe Regêncio Figueiredo foi reeleito presidente da Associação de Pais da Escola Portuguesa de Macau na última quinta-feira por mais dois anos. As prioridades são o ensino do mandarim e comunicação mais uniforme entre a direcção e a comunidade educativa. Na assembleia-geral, pais revelaram descontentamento com os novos horários [dropcap]A[/dropcap] lista única candidata à direcção da Associação de Pais da Escola Portuguesa de Macau (APEPM) foi reeleita na quinta-feira com 24 votos e duas abstenções, num universo de 125 votantes inscritos. Ao HM, Filipe Regêncio Figueiredo, que continua presidente, revelou que uma das prioridades da APEP é tentar melhorar o ensino do mandarim na EPM. “Queremos ver o que é possível fazer para melhorar a aprendizagem da língua. Os pais, em geral, notam pouca evolução. Na assembleia-geral vários pais portugueses disseram não entender como é que não há evolução, enquanto que pais estrangeiros questionaram o método de ensino.” A APEP pretende também contribuir para melhorar a “comunicação da escola com os pais e a comunidade educativa no geral”. Na assembleia-geral de quinta-feira, onde esteve presente a direcção da EPM e 30 encarregados de educação, a questão dos horários deste ano lectivo foi a mais abordada. “Foi questionada a razão pela qual deixaram de existir tardes livres e porque é que não há um horário em que os alunos entram todos os dias à mesma hora.” Da parte da direcção da EPM, presidida por Manuel Machado, ficou a garantia de que estão a ser cumpridas as recomendações da Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ), no sentido de haver 70 minutos de actividades lectivas no período da manhã e da tarde, razão para não existirem tardes livres. No entanto, relata Filipe Regêncio Figueiredo, um dos pais terá questionado quais seriam as actividades lectivas, alegando que poderiam ser extra-curriculares. No entanto, a direcção da EPM frisou que têm de ser dadas aulas e não outro tipo de actividades. NetGiae a funcionar Na assembleia-geral foi também perguntado sobre o ataque informático à plataforma NetGiae, embora “se tenha dado prioridade a outras questões”. O presidente reeleito da APEP disse ao HM que a plataforma já está a ser usada por professores. “Segundo a direcção [da escola], os pais e alunos vão começar a ter acesso ao NetGiae já esta semana, em princípio.” Quanto aos problemas levantados com o ensino à distância durante o período de confinamento, Filipe Regêncio Figueiredo diz que a EPM tem um plano de contingência caso surjam situações semelhantes. “Nesse momento, esse plano vai ser analisado pela APEP. Pensamos que neste aspecto as coisas possam funcionar melhor, e que haja uma uniformização dos procedimentos dos professores.” Apesar de ter sido reeleito, Filipe Regêncio Figueiredo confessou que gostaria de “surgissem outras listas” candidatas à direcção da APEP. “Gostava também que houvesse mais participação dos pais”, rematou.
Tabaco | Pandemia reduz inspecções e multas Andreia Sofia Silva - 11 Out 20204 Dez 2020 [dropcap]A[/dropcap] pandemia da covid-19 levou à redução de inspecções a locais de fumo por parte dos Serviços de Saúde (SS), bem como ao número de multas aplicadas. Ao todo, os SS realizaram 257 inspecções a casinos, onde acusaram 130 pessoas de fumarem em locais proibidos. O número de inspecções diminuiu 74,1 por cento em relação a igual período do ano passado, enquanto que houve uma redução de 88 por cento no número de pessoas apanhadas a fumar em sítios proibidos por lei. Quanto aos pedidos de licenciamento de salas de fumo por parte das operadoras de jogo, a maior parte foi aprovada. Segundo os SS, desde o dia 1 de Janeiro até ao dia 30 de Setembro foram recebidos pedidos de 40 casinos para o licenciamento de 751 salas de fumo, tendo sido autorizadas 736 salas, distribuídas por 38 casinos. Fora do contexto de jogo, os SS realizaram 123.730 inspecções em estabelecimentos do território, menos 52,13 por cento do que entre os meses de Janeiro e Setembro de 2019. Do total de 1766 acusações proferidas, 1744 dizem respeito a pessoas identificadas a fumar em zonas proibidas, enquanto que apenas 21 casos se referem à ilegalidade dos rótulos dos produtos de tabaco. Houve apenas um caso de venda ilegal de tabaco electrónico. Quanto ao pagamento das multas, 81,9 por cento fizeram o respectivo pagamento. O mesmo comunicado dá conta da existência de 103 locais com a maior incidência de infracções, onde se incluem o espaço de jogo Mocha Golden Dragon e o edifício Heng Wan, na zona de lazer da Rua Norte do Patane. Nestes locais foram realizadas 357 inspecções e emitidas 70 acusações.
GPDP | Valor total das multas aumentou 244,1% em 2019 Salomé Fernandes - 11 Out 20204 Dez 2020 O relatório anual de 2019 do Gabinete de Protecção de Dados Pessoais mostra que foram aplicadas sanções em 40 processos de investigação, e emitiu 24 talões de multa – que chegaram a 929 mil patacas. O coordenador do GPDP alerta para os “testes severos”, decorrentes do desenvolvimento da informatização [dropcap]A[/dropcap]o longo do ano passado, as multas impostas pelo Gabinete de Protecção de Dados Pessoais (GPDP) atingiram 929 mil patacas, o que representou uma subida de 244,1 por cento em relação ao ano anterior. Dos 24 talões de multa emitidos em 2019, seis envolveram marketing de beleza, num montante de 715 mil patacas, revela o relatório anual do GPDP referente a 2019. No prefácio do relatório, o coordenador do GPDP descreve as dificuldades que os organismos de protecção de dados enfrentam. Yang Chongwei indica que ao longo dos últimos anos “o grau da informatização social atingiu um nível sem precedentes”. “Devido ao rápido desenvolvimento da informatização, ainda existem brechas na legislação e riscos no mundo virtual, [e] acontecem, de vez em quando, actos de violação da privacidade das pessoas, trazendo testes severos para autoridades de protecção de dados pessoais das diversas regiões”, acrescenta. O GPDP deu início a 155 processos de investigação no ano passado, e a contar com 122 que transitaram de 2018, o organismo tratou de 277 casos em 2019, dos quais 149 foram concluídos. Vale a pena notar que se em 40 dos casos concluídos (26,8 por cento) foram aplicadas sanções, em 31,5 por cento houve falta de provas. Das investigações que arrancaram em 2019, mais de 62 por cento incidiu sobre a falta de legitimidade do tratamento de dados pessoais, enquanto 55,5 por cento se referia à falta de protecção dos direitos dos titulares dos dados. Foram ainda investigados três casos de acesso indevido, e um de violação do dever de sigilo. Mais de 85 por cento processos foram instaurados depois de queixas e denúncias de cidadãos. Apenas nove por cento resultou de intervenção por iniciativa própria da entidade. Além disso, a maioria das entidades investigadas eram privadas (201) – onde se destacaram serviços de promoção e de consultadoria – mas também foram sujeitos a escrutínio 31 indivíduos e dez entidades públicas. Casos arrumados Um dos casos que o relatório destaca é sobre um estabelecimento comercial que pagou as contribuições para o regime da segurança social durante seis anos, relativas a um indivíduo que não trabalhava na empresa. O documento indica que havia uma “confusão na gestão de dados de trabalhadores” do estabelecimento, o qual não tinha legitimidade para tratar os dados pessoais do indivíduo, pelo que foi multado em 30 mil patacas. Noutro âmbito, aparece um caso que envolve sistemas de videovigilância e gravação telefónica instalados num centro, sem o relatório especificar qual. Na apresentação do processo indica-se que “os estudantes, que vivem no centro, não podem levar consigo os telemóveis podendo apenas utilizar o telefone do centro que tem função de gravação de som para ligar para fora”. Foi aplicada uma multa de nove mil patacas ao centro. Multiplicaram-se pedidos Em 2019, o GPDP recebeu 72 pedidos de autorização, representando um aumento de 188 por cento em comparação aos 25 pedidos de 2018. Já em relação aos pedidos de notificação, 205 disseram respeito à transferência de dados para fora da RAEM. Por outro lado, em 2019 deu-se o pico mais alto dos últimos cinco anos de pedidos de consulta. De um total de 2.940 pedidos, uma subida de 60,7 por cento face ao ano anterior, a videovigilância foi o quinto tema mais frequente. Foram ainda pedidos 44 pareceres ao GPDP, 40 apresentados por entidades públicas e quatro por privadas e indivíduos. Os Serviços de Alfândega pediram um parecer sobre a utilização de videovigilância em veículos e embarcações de serviços. Descrevendo que as finalidades de utilização não cumprem o regime jurídico da videovigilância em espaços públicos, o GPDP sugere no parecer que as câmaras funcionem como auxílio na aplicação da lei, apenas com a captação imagens do patrulhamento diário, e para supervisão do processo de aplicação da lei pelo pessoal dos Serviços de Alfândega. O GPDP descreve que devem ser eliminadas imagens de casas de banho, templos e hospitais, entre outros locais, que sejam filmados sem intenção. E é exemplificado que “não devem ser filmadas, de forma excessiva, as imagens da área marítima fora da jurisdição de Macau”.
Hác Sá | TNR de fora na reabertura da zona de churrasco Pedro Arede - 11 Out 20204 Dez 2020 [dropcap]A[/dropcap] zona de churrasco do Parque da Praia de Hác Sá volta a abrir na próxima sexta-feira, dia 16 de Outubro e, para já, a utilização do espaço estará vedada a não residentes, ou seja a portadores de bluecards. Além disso, e apenas para os portadores BIR que queiram usufruir dos grelhadores do parque, passa a ser obrigatório fazer marcação prévia, de acordo com fases de agendamento e horários estabelecidos pelo Instituto para os Assuntos Municipais (IAM). “Os requerentes devem ser residentes de Macau e cada requerente pode efectuar apenas um pedido em cada fase, até esgotarem as vagas”, pode ler-se num comunicado divulgado pelo IAM. Detalhando, segundo a mesma nota, a partir do dia da reabertura estarão disponíveis 55 grelhadores em cada uma das duas sessões de marcação prévia diárias, sendo os horários de utilização das duas sessões das 11h30 às 17h30 e das 18h00 às 23h59. As marcações poderão ser feitas a partir de hoje através do sistema de inscrição de actividades na página electrónica do IAM, sendo possível agendar datas abrangidas em cada período de 14 dias. Assim, a primeira fase de marcação será entre 16 e 29 de Outubro, sendo a segunda entre 30 de Outubro e 12 de Novembro e assim sucessivamente. Após feita a marcação, cada residente poderá fazer-se acompanhar de três familiares ou amigos para a zona, estando o número máximo de utilizadores de cada grelhador limitado a quatro pessoas. De acordo com as orientações emitidas pelos Serviços de Saúde haverá apenas uma entrada e saída da zona de churrasco, sendo obrigatória a utilização de máscara durante toda a permanência no parque, excepto durante o consumo.
Semana Dourada | Pouca gente e quartos a preço de saldo João Luz - 11 Out 20204 Dez 2020 A primeira ‘onda’ de turistas desde o início da pandemia trouxe pouco mais de 156.300 pessoas a Macau durante os feriados da Semana Dourada, muito longe dos 985 mil visitantes registados em 2019. Apesar do preço médio por quarto ter caído 30%, a taxa média de ocupação sofreu uma redução superior a 50% [dropcap]A[/dropcap]pesar de não ser esperada a habitual enxurrada de turistas, que todos os anos acorrem a Macau para aproveitar a Semana Dourada, o sector do turismo depositava algumas esperanças num dos períodos tradicionalmente de maior intensidade de negócios. Entre 1 e 8 de Outubro entraram em Macau 156.300 visitantes, número que contrasta naturalmente com as 974.337 entradas verificadas no mesmo período de 2019, correspondendo a um decréscimo de 86 por cento. Em média, não chegaram a entrar 20 mil pessoas por dia, que estavam obrigadas a apresentar teste negativo para a covid-19, de acordo com os dados divulgados no sábado pela Direcção dos Serviços de Turismo (DST). Nos oito dias da Semana Dourada, os 19.538 visitantes diários traduziram-se numa queda de 86 por cento de turistas em relação a igual período de 2019. Deste universo, apenas 13 vieram do mercado internacional, ou seja, fora da China, Hong Kong ou Taiwan. A abertura dos vistos individuais e de grupo a toda a China continental, a partir de 23 de Setembro, trouxe alguma esperança às autoridades de Macau que este período marcasse o arranque da revitalização turística do território. O Executivo de Ho Iat Seng apostou na antecipação do Festival de Luz para coincidir com este período, tornando-o no primeiro grande evento a ser organizado após o início da pandemia e lançou-se nos preparativos para o Grande Prémio de Macau. Contudo, os resultados continuam muito longe dos registados em 2019, quando o território foi visitado por quase 40 milhões de pessoas. Ofertas e pechinchas Importa recordar que a DST lançou diversas campanhas de publicidade, como a Semana de Macau em Pequim e os milhões de patacas em cupões oferecidos pela Trip.com. Ainda assim, os esforços do Governo não impediram os fracos resultados dos hotéis. Este ano, a taxa média de ocupação hoteleira durante a Semana Dourada foi de 43,6 por cento, número que representou uma descida de 50,4 pontos percentuais em comparação com o mesmo período no ano passado. Olhando para as diferenças entre segmentos de oferta hoteleira, os hotéis de cinco estrelas tiveram ocupação média de 43,2 por cento, menos 52 por cento que na Semana Dourada do ano passado. Os estabelecimentos de quatro estrelas registaram ocupação de 45,2 por cento, reflectindo 47,4 por cento de quebra. Além da ocupação a meio-gás, também o custo da estadia caiu. De acordo com a DST, o preço médio por quarto nos hotéis e pensões de Macau foi de cerca de 1.290,5 patacas, uma descida de 30,0 por cento face à Semana Dourada do ano passado. Nos hotéis de cinco estrelas, o preço médio do quarto fixou-se em 1.634 patacas, menos 26,9 por cento, enquanto que nos hotéis de quatro estrelas cerca de 605,2 patacas, menos 49,4 por cento. Macau dispõe de 42.441 quartos de hotéis e pensões em actividade.
Ung Vai Meng alerta para negligência de locais históricos no Plano Director Andreia Sofia Silva - 11 Out 20204 Dez 2020 [dropcap]U[/dropcap]ng Vai Meng, ex-presidente do Instituto Cultural (IC), alertou para a necessidade de uma maior preservação de zonas históricas tendo em conta o actual projecto do Plano Director, noticiou o jornal Ou Mun. Segundo Ung Vai Meng, a definição de zonas constante no projecto pode alterar o actual tecido histórico do território, tendo dado como exemplo o desaparecimento do istmo Ferreira do Amaral [que vai da praça das Portas do Cerco, a norte, à Estrada do Arco, a sul] da zona Norte 2. De frisar que este istmo era uma “língua” de terra que ligava a península de Macau à China, sendo “um laço importante” entre Macau e o país e que por isso deve ser mantido, disse Ung Vai Meng. O ex-presidente do IC disse também, numa sessão de consulta pública sobre o projecto, que a proposta de nomeação das zonas também negligencia nomes como Areia Preta, Mong-Há e Nam Van que têm o seu significado histórico e já fazem parte do léxico da população. Mak Tat Io, chefe do departamento de Planeamento Urbanístico da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), explicou que a divisão territorial proposta foi feita em termos estatísticos, sendo efectuada a divisão do centro histórico em três zonas [Zona Central 1, 2 e 3] que possuem maior ligação entre si. Além disso, a separação pode resultar numa divisão das ruas e zonas, embora o futuro Plano Director tenha em conta o património e o actual tecido urbano. Mak Tat Io disse ainda que a zona do istmo Ferreira do Amaral é mencionada na lista dos 23 corredores visuais. Consenso, precisa-se Na mesma sessão de consulta pública, alguns residentes levantaram a questão do futuro crematório. Mak Kim Meng, representante do Instituto para os Assuntos Municipais (IAM), adiantou que a localização será feita com base no consenso da sociedade e que não existem, para já, quaisquer planos. O responsável adiantou ainda que o projecto do Plano Director prevê dez por cento de terrenos para equipamentos de utilização colectiva e 23 por cento para a construção de infra-estruturas públicas, pelo que haverá espaço suficiente para o crematório. Mak Tat Io disse que isso não significa que existe a necessidade de construir o crematório, mas tal assunto será decidido quando houver consenso social.
Empresas públicas | Sulu Sou quer detalhes sobre remunerações Pedro Arede - 11 Out 20204 Dez 2020 Sulu Sou quer que o Governo crie novas orientações para que sejam divulgadas informações sobre os quadros superiores das empresas de capitais públicos. O objectivo passa por garantir a transparência e a utilização eficiente do erário público [dropcap]S[/dropcap]ulu Sou considera não fazer sentido que as informações de remuneração dos quadros superiores das empresas de capitais públicos sejam confidenciais, ao abrigo da lei da protecção de dados pessoais. Através de uma interpelação escrita, o deputado pede, por isso, que, tal como acontece com os deputados e representantes do Executivo, o Governo torne pública a informação sobre as remunerações dos membros da Assembleia Geral, Conselho de Administração, Comissão Executiva e do Conselho Fiscal das empresas com participação pública. “As remunerações auferidas pelos membros das estruturas orgânicas das empresas de capitais públicos, ao contrário das empresas privadas, provêm, em parte, do erário público e não devem cair no âmbito da chamada privacidade pessoal”, pode ler-se na interpelação escrita. Reforçando mesmo tratar-se de um “mistério” cujo fim iria “evitar situações de remunerações excessivas”, Sulu Sou questiona se o Governo irá exigir que, no futuro, estas empresas divulguem informações sobre os salários, sobretudo, dos quadros superiores. Lembrando que as empresas com participação pública inferior a 50 por cento estão dispensadas de apresentar informações na “Plataforma da divulgação pública de informações de empresas de capitais públicos”, por escrito, o deputado pergunta ainda se o Executivo está a ponderar produzir legislação específica, de forma a obrigar que, também as empresas com capitais públicos que não sejam controladas pelo Executivo, tenham o dever de publicar informações. Próximos capítulos Fazendo referência ao facto de o Governo ter retirado a participação de 15 por cento que detinha na sociedade gestora do Centro Incubador de Novas Tecnologias de Macau, S.A., anunciado por Sónia Chan na passada quarta-feira, Sulu Sou quer ainda saber, com precisão, quais os mecanismos de avaliação e análise que estão por trás desta e de futuras decisões do género. “Em termos gerais, qual é o plano do Governo para retirar a participação, mandar encerrar ou reverter investimentos em empresas de capitais públicos? A decisão [de retirar a participação de 15 por cento] assenta em que indicadores e mecanismos de avaliação? Será possível publicar a análise custo-benefício, a fim de permitir ao público fiscalizar o uso racional do erário público?” Recorde-se que na semana passada, Sónia Chan afirmou também que as empresas que o Governo vier a considerar que não justificam o investimento público, “podem encerrar ou as suas funções serem transferidas para outros serviços”.
Shenzhen | Ho Iat Seng reúne com Xi Jinping esta semana Hoje Macau - 11 Out 20204 Dez 2020 [dropcap]X[/dropcap]i Jinping vai marcar presença esta semana na cerimónia do 40.º aniversário da zona económica especial de Shenzhen, de acordo com o South China Morning Post. A agenda das celebrações está centrada nas actividades de quinta-feira, mas o Presidente da República Popular da China pode chegar a Shenzhen já amanhã. O jornal de Hong Kong dá conta de que Xi tem reunião marcada com Ho Iat Seng e com Carrie Lam, separadamente. A última vez que o Presidente chinês se encontrou com o Chefe do Executivo de Macau foi para lhe dar posse a celebrar a implementação da RAEM, em Dezembro do ano passado. “A última ordem que tivemos foi para ter tudo pronto na segunda-feira”, referiu uma fonte do South China Morning Post, que adiantou ser expectável que Xi reitere o compromisso com a política de abertura e que indique o sector tecnológico como decisivo no rumo económico da China. A reunião com Carrie Lam será outro dos pontos altos da semana, no rescaldo da implementação da Lei de Segurança Nacional em Hong Kong, e enquanto estão detidos em Shenzhen 12 residentes da região vizinha, incluindo um cidadão português. A zona económica especial de Shenzhen “nasceu” a 26 de Agosto de 1980, parte do esforço de Deng Xiaoping de abertura do país ao mundo, apenas dois anos depois do final da Revolução Cultural. A última visita de Xi à cidade aconteceu em Outubro de 2018, quando sublinhou o compromisso com o processo de reforma e continuação da abertura económica, bem como o estabelecimento de uma “cidade socialista exemplar”.
AL | Orçamento para 2021 reduzido em quase 20 mil milhões Pedro Arede - 11 Out 20204 Dez 2020 A Assembleia Legislativa é a primeira “vítima” do corte de 10 por cento dirigido aos organismos públicos, anunciado em Junho por Ho Iat Seng. Só na rubrica “Instalações e equipamentos” o corte foi de 86 por cento [dropcap]O[/dropcap] valor que consta na proposta do Orçamento Privativo da Assembleia Legislativa (AL) para 2021 está fixado 183.787 milhões de patacas, menos 19.919 milhões de patacas relativamente ao Orçamento inicial de 2020, no valor de 203.706 milhões. O valor para o próximo ano terá agora de ser aprovado em sede de Plenário. De acordo com a proposta publicada no portal da AL, a elaboração do orçamento para o próximo ano teve em conta as disposições emitidas por Ho Iat Seng em Junho, no sentido de o valor não exceder o montante de 2020 e de reduzir as despesas correntes em 10 por cento. “O valor proposto do Orçamento global da AL para o ano económico de 2021 é inferior em 19.919.000 patacas ao valor do Orçamento inicial de 2020 (203.706.300), e representa um decréscimo anual da despesa orçamentada de 10 por cento, decréscimo idêntico face ao orçamento previsto à data de 30 Abril do mesmo ano”, pode ler-se no documento. Do corte de 19.919 milhões de patacas, a rubrica de despesa que sofreu a maior redução diz respeito às “Instalações e equipamentos”, registando um decréscimo de 86 por cento, ou seja, menos 3.890 milhões em relação ao orçamento de 2020. Assim, para 2021, o valor alocado a esta rubrica será de 630 mil patacas, quando em 2020 foi de 4.520 milhões. O corte irá resultar na “suspensão da realização de obras e da aquisição de equipamentos e sistemas informáticos não urgentes”. Segue-se a rubrica “Despesas com o funcionamento”, onde está previsto um corte de 28 por cento, ou seja, menos 7.688 milhões em relação ao orçamento inicial do ano passado. O decréscimo do orçamento inicial de 27.479 milhões (2020) para 19.790 milhões (2021) ficará a dever-se, principalmente, “à diminuição da aquisição de bens e serviços”. Já nas “Despesas com pessoal” o corte previsto será de 4,0 por cento, representando uma diminuição de 6.737 milhões. A justificação dada, aponta apenas, neste caso, para a necessidade de apresentar um valor mais baixo em relação à despesa de 2020, “atendendo à situação real”. Desta forma, o valor alocado a esta rubrica em 2021 será de 161.956 milhões de patacas, quando em 2020 foi de 168.694 milhões. Nota ainda para diminuição de 1.600 milhões de patacas (menos 53 por cento) do valor previsto para 2021 na rubrica “Outras despesas correntes”, fixando o montante total alocado em 1.400 milhões de patacas. O valor da despesa inicial orçamentada para 2020 era de 3.000 milhões. Contudo, para fazer face a “despesas imprevistas”, a AL prevê reservar 1.400 milhões em “dotações provisionais”. Sobre a rubrica “Transferências, Apoios e Abonos”, a proposta prevê um corte de 17 por cento, ou seja, menos 2.000 mil patacas em relação a 2020, altura em que o orçamento inicial previsto foi de 10.000 patacas. Do princípio Contas feitas, segundo a proposta que terá agora de ser aprovada em plenário, o orçamento de 183.787 milhões de patacas para 2021 resulta das estimativas sobre as “Transferências do orçamento central da RAEM”, seguidas das estimativas sobre a “Venda de bens e serviços – outras” (10.000 patacas), “Reposições dos pagamentos efectuados em anos anteriores” (5.000 patacas) e “Mobilização dos saldos de execução orçamental” (500.000 patacas). Recorde-se que esta é a primeira materialização do despacho assinado por Ho Iat Seng em Junho, para que o valor orçamentado para 2021 dos serviços e organismos públicos que adoptam o regime de contabilidade de caixa, não exceda o de 2020 e sejam feitos cortes de 10 por cento das despesas correntes. Na altura, Ho Iat Seng, ex-presidente da AL, estabeleceu ainda que, até 30 de Outubro, todos os orçamentos de serviços e organismos públicos devem estar prontos.
Caso IPIM | Jackson Chang, Glória Batalha e Miguel Ian condenados com penas efectivas João Santos Filipe - 11 Out 20204 Dez 2020 O ex-presidente do IPIM foi absolvido dos crimes mais graves de associação criminosa, corrupção, e branqueamento de capitais, mas levou uma forte reprimenda da juíza durante a leitura da sentença. Os três principais envolvidos do IPIM foram ainda acusados de abalarem “o sistema e a imagem [do programa de fixação de residência] de forma muito negativa” [dropcap]J[/dropcap]ackson Chang, Glória Batalha e Miguel Ian foram condenados com penas de prisão efectiva, na sequência do esquema montado para lucrar com processos de fixação de residência através do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM). A sentença do caso mais mediático do ano foi lida na sexta-feira e a juíza Leong Fong Meng fez uma forte reprimenda aos envolvidos: “abalaram o sistema e a imagem [do programa de fixação de residência] de forma muito negativa, por isso a pena tem de ser efectiva. Espero que reflictam bem sobre os vossos actos”, referiu a magistrada. No que diz respeito a Jackson Chang, ex-presidente do IPIM, a condenação foi de dois anos de prisão efectiva pela prática de quatro crimes de violação de segredo e três crimes de inexactidão de elementos no preenchimento da declaração de rendimentos. Com a decisão o ex-dirigente do IPIM, que estava em prisão preventiva, foi libertado e fica a aguardar em liberdade a decisão de um eventual recurso. As partes envolvidas têm 20 dias para decidir se vão recorrer. No caso da decisão da primeira instância ser confirmada, Jackson Chang vai ter de regressar à prisão de Coloane para cumprir mais sete meses. A sentença absolveu assim o ex-presidente do IPIM dos crimes mais graves de que estava acusado, nomeadamente de participação em associação criminosa, corrupção activa e passiva e branqueamento de capitais. Apesar da absolvição, o tribunal deu como provado que Jackson Chang e o empresário Ng Kuok Sao, líder da associação criminosa, mantinham contacto próximo. Por isso, a juíza Leong Fong Meng fez questão de frisar a Jackson que apenas era ilibado da prática de corrupção por falta de provas. “Sobre o crime de corrupção, o tribunal entende que não há provas suficientes para condená-lo. Se cometeu o crime, só você é que sabe”, sublinhou, num tom ríspido. A juíza criticou ainda duramente Chang por não ter cumprido com as suas responsabilidades. “Não revelou qualquer arrependimento. Era alto dirigente e devia ter cumprindo rigorosamente a lei. Devia ter dado um bom exemplo aos subordinados. Mas não actuou dessa forma, ignorou e violou a lei e utilizou a sua posição para fornecer a terceiros informação interna e confidencial”, sentenciou. “A sua conduta afectou a imagem da Função Pública, do Governo e da população”, acrescentou. Entre os 26 arguidos do processo constavam a esposa de Jackson Chang, Angela Ip, a filha Júlia Chang e a amante Zheng Chu Mei, que foram declaradas inocentes de crimes de branqueamento de capitais. A esposa foi também absolvida do crime de inexactidão de elementos no preenchimento da declaração de rendimentos. Batalha perdida Quanto a Glória Batalha, a juíza deu como provados praticamente todos os quesitos apresentados pela acusação e condenou a ex-vogal do IPIM a um ano e nove meses de prisão efectiva pela prática de um crime de abuso de poder e dois de violação de segredo. Na leitura da sentença, a juíza Leong censurou Glória Batalha por não ter confessado: “Optou pelo silêncio, mas a sua responsabilidade foi muito alta. E pelo seu silêncio, o tribunal não conseguiu entender se teria qualquer tipo de arrependimento. Espero que reflicta bem e não engane as pessoas e o Governo”, disse à ex-vogal do IPIM. “Não deu um bom exemplo. A pedido de amigos forneceu informação interna e confidencial a terceiros. […] Afectou a imagem da Função Pública, do Governo e da população”, acrescentou. Para o tribunal, Glória Batalha cometeu os crimes quando prestou ajuda em dois processos de fixação de residência, ao fornecer informações sobre o funcionamento do sistema de pontuação para a aprovação dos pedidos. Além disso, o tribunal considerou que a ex-vogal ajudou uma candidata à fixação de residência porque utilizou a sua função para conseguir uma pré-avaliação interna, de forma a que quando fosse apresentada a candidatura os requisitos necessários já estivessem reunidos. Por sua vez, Miguel Ian, ex-director-adjunto do Departamento Jurídico e de Fixação de Residência por Investimento do IPIM, foi o arguido ligado ao Governo sentenciado com a pena mais dura, quatro anos de prisão efectiva, pela prática de sete crimes de falsificação de documento. Para Leong Fong Meng, Miguel Ian não fez parte da associação criminosa, mas auxiliou de forma consciente em vários processos, e utilizou os seus conhecimentos para contornar eventuais obstáculos nos processos de residência. Segundo a juíza, em troca, foi oferecida a Miguel Ian a possibilidade de investir em imobiliário na Ilha da Montanha, com preços “relativamente baixos”. “Devia cumprir as leis e era a pessoa que melhor conhecia as leis. Utilizou o seu conhecimento sobre os serviços. Elaborou documentos com base em informação falsa e afectou a imagem da Função Pública, do Governo e da população”, sentenciou a magistrada. Estas três condenações foram as que mereceram palavras mais duras, com Leong a esperar que os castigos sejam de lição: “Os três dirigentes não serviram de bom exemplo e directa e indirectamente fizeram com que os pedidos requeridos por uma associação criminosa com informação falsa fossem aprovados. Houve problemas causados pela vossa conduta e é por isso que levam pena efectiva”, sublinhou. “Não tiveram coragem de admitir o erro o que foi um desrespeito. Da vossa parte, não houve arrependimento, mas espero que tenham aprendido a lição”, concluiu. História de uma associação Apesar da reprimenda mais dura ter sido para os ex-funcionários do IPIM, as penas mais pesadas foram aplicadas aos membros da associação criminosa, principalmente ao empresário Ng Kuok Sao, que se encontrar em parte incerta, e à esposa, Wu Shu Hua, que faltou ao julgamento por motivos de saúde. Segundo o tribunal, Ng criou a associação para lucrar com os processos de residência, amealhava clientes e dava ainda indicações às operacionais, as irmãs Irene Iu e Elaine Iu. “O tribunal entende que Ng Kuok Sao e Wu Shu Hua estavam à frente de uma associação criminosa. Ng Kuok Sao arranjava clientes, liderava a associação e dava instruções para que as empregadas acompanhassem os processos, com informações falsas. Wu Su Hua era a encarregada pela situação financeira”, afirmou a juíza. O empresário foi condenado a 18 anos de prisão, pela prática de um crime de associação criminosa e 23 de falsificação de documentos, que se prenderam com criação de empresas de fachada, simulação de contratos de trabalho, dissimulação de obras de construção, entre outros, com o objectivo de levar o IPIM a aprovar os pedidos de autorização de fixação de residência. A pena de 18 anos tem ainda em conta dois crimes de burla de valor consideravelmente elevado que Ng tinha cometido anteriormente e que foram considerados para a pena. Wu Shu Hua, responsável pelas finanças da associação, foi condenada a pena efectiva de 12 anos de prisão, pelos crimes de associação criminosa e 19 de falsificação de documento. A mulher do empresário não esteve presente no julgamento por motivos de saúde. Quanto às irmãs Irene e Elaine Iu foram condenadas com penas de 8 anos 6 meses e 7 anos e seis meses, respectivamente, ambas por um crime de associação criminosa e vários de falsificação de documentos. Irene Iu, que foi a única condenadas por associação criminosa a comparecer na leitura da sentença, ficou em prisão preventiva. Shen Hong Fang, arguida que se destacou por declarar um rendimento mensal entre os 500 mil e 600 mil yuan, foi condenada a três anos e 6 meses de prisão efectiva, por dois crimes falsificação de documentos. Entre os 26 arguidos do megaprocesso, 19 foram considerados culpados e sete foram ilibados dos crimes que vinham acusados. Leal recurso O advogado de Glória Batalha, Pedro Leal, afirmou no final do julgamento que vai interpor recurso da decisão de condenação da sua cliente. O causídico mostrou ainda incompreensão face à decisão de punir uma pessoa sem antecedentes criminais com uma pena efectiva. “A pena era susceptível de ser suspensa e não se vê razão absolutamente nenhuma [para não ser]. É uma pessoa que pautou toda a sua vida pela lei, tem 50 e tal anos, nunca teve o menor problema com a justiça”, afirmou. Por outro lado, o advogado mostrou-se contra a reprimenda da juíza, pelo facto da cliente não ter confessado a prática dos crimes. “Aparentemente o tribunal acha que ela deve confessar uma situação que ela não considera que praticou… E levou uma reprimenda daquelas… custou-lhe bastante. Ela está triste e eu também”, relatou. Pedro Leal questionou também o facto de Jackson Chang ter sido condenado por sete crimes e ter uma pena de dois anos, enquanto a sua cliente foi condenado por três crimes, que resultaram numa pena de 1 ano e 9 meses. Chang pode recorrer Jackson Chang ficou satisfeito com a decisão, mas mesmo assim pondera recorrer para a Segunda Instância. Foi este o balanço feito à saída da sessão pelo seu representante, Álvaro Rodrigues. “Ainda há esperança. Ainda não tomamos a decisão se vamos recorrer, mas vou falar com o meu constituinte na próxima semana e, em princípio, acho que é para recorrer”, afirmou o causídico. Caso a decisão de sexta-feira se torne definitiva, o ex-presidente do IPIM tem de cumprir mais sete meses de prisão, uma vez que esteve mais de 1 ano em prisão preventiva. Contudo, este desfecho não foi visto como negativo. “Estamos satisfeitos porque a esposa e a filha também foram absolvidas. E ele também está satisfeito”, acrescentou o advogado. “Demasiado pesada” No final da sessão, Jorge Ho, advogado de Miguel Ian, considerou a pena de quatro anos de prisão, a que foi condenado o seu cliente, demasiado pesada. “No meu entender, parece-me uma pena demasiado pesada face à condenação”, disse o advogado, ao HM. Uma vez que Miguel Ian não esteve presente na sessão, o advogado não conseguiu responder definitivamente se ia recorrer da sentença. A decisão só vai ser tomada depois de ouvir o cliente, mas avançou que a hipótese é “muito provável”. Sócios de Kevin Ho condenados Kevin Ho, delegado de Macau na Assembleia Popular Nacional, foi o único accionista da Companhia de Engenharia de Instalação de Equipamentos Hunan (Macau) Limitada a ficar de fora do megaprocesso do caso IPIM. No entanto, os outros dois sócios da empresa, Ng Kuok Sao e Tang Zhang Lu foram considerados culpados. Ng foi condenado a 18 anos de prisão pelo crime de associação criminosa e 23 de falsificação de documento. Já Tang foi sentenciado a cinco de prisão efectiva pela prática de três crimes de falsificação de documento. O tribunal entendeu ter ficado provado que a empresa foi utilizada como fachada a associação de Ng aprovar mais processos de fixação residência. Um desses processos foi o de Tang, que surgiu como gerente. Porém, o tribunal entendeu ser tudo fachada: “O número de trabalhadores declarados e de obras recebidas pela empresa Hunan não se conforma com o trabalho que foi executado na prática. Como não contrataram o número de trabalhadores declarados, também não precisaram dos gerentes que declaram. Os documentos sobre esta empresa têm conteúdos falsos”, considerou o tribunal. Anteriormente, Kevin Ho declarou ser accionista da empresa, mas estar afastado há mais de 11 anos da gestão corrente. “Foi há muito muito tempo que a empresa foi criada e para ser sincero nem me recordo em que condições. Fiquei surpreendido com a ligação, porque não tenho nada a ver com o caso que está em tribunal”, declarou Kevin Ho ao HM, em Julho deste ano.
Como um farol admin - 11 Out 20204 Dez 2020 [dropcap]H[/dropcap]abituamo-nos a saber que certos faróis dominam as encostas da terra. Lá em cima uma luz que aclara o tempo. Que tem tanto de meteorologia como de calendário. E avisa quem vem lá. Senão o farol, o sino de uma torre, um quebra-luz. Um tambor. Uma bandeira. Henrique de Senna Fernandes representava o domínio de toda uma comunidade sempre com relutância em distinguir de onde vinha. Senna Fernandes era, por inteiro, a peça que unia o labirinto. Que o endireitava e lhe aprumava as pétalas, elevando as suas rosas. A sua presença abraçava toda a ideia de um passado. De uma regra de partilha que culminava na união entre os povos. E o mundo fez-se assim. Mais completo. Como quem olha para o Céu e diz: “Só mais um bocadinho”. E esse bocadinho durou 87 anos menos dez dias. Henrique de Senna Fernandes nasceu em Macau, no dia 15 de Outubro de 1923. Na mesma volta da Terra nascia em Cuba o escritor italiano Italo Calvino. O filósofo francês Michel Foucault viria ao mundo exactamente três anos depois. Isto para quem quer acreditar na precisão dos astros, que ditam a personalidade do ser humano e lhe definem o rumo. O que é certo é que todos elegeram a escrita como o seu dever no mundo. Dentro de Senna Fernandes, um rumorejar de realidades diversas que se escreveu nas entrelinhas da herança ancestral portuguesa, goesa e chinesa, que já se prolonga por dois séculos e por muitas gerações. Foi essa álgebra que equacionou e definiu os passos de uma criança e o pôs a crescer num enclave tropical onde a portugalidade moldou a essência do cenário. Uma cidade calma, onde a vida simples acontecia e os governadores desembaraçavam os éditos directamente do seu palácio. Henrique crescia na Praia Grande repleta de juncos e vapores alimentados nos despojos das caravelas. O mar a bater em território intocado ainda sem aterros, sem a abrupta mão do homem. Do outro lado, o interior, a viagem para a China, a pequena distância, na pega de uma tancaneira, com passagem fugidia pela Rua da Felicidade, onde outros sentidos se consumiam. O ardor pela escrita começou cedo, aos 11 ou 12 anos, que anunciavam o despertar da puberdade e o remate da inocência. Do pai recebeu a amizade das letras, com o sabor dos livros que lhe despertavam a imaginação e o levavam para bem longe da sua península, nessa altura sem pontes e sem extensões. Aí disciplinou a sua ânsia e alongou o seu mundo. Antes do liceu, a atenção de um professor exaltou-lhe as ideias, incitando-o a aprender mais, a ler com entusiasmo e a procurar enredos e esclarecimentos para a vida que badalava como sinos. Depois, a escrita mais a sério, desenfreada, a rabiscar cadernos com histórias que o encantavam. Normalmente com raparigas, que desde pequeno enfeitiçaram o seu traço, definindo toda a trama da sua literatura ainda por nascer. No pano de fundo uma guerra. O Japão a assolar Hong Kong. A família a perder a prosperidade e a escrita a tornar-se o esconderijo de uma brincadeira muito mais séria. O seu olhar atirado para os outros a indagar os seus actores. À procura de falas e de amores proibidos, que lhe acercavam a alma. A misturar vivências, juntando os discordes da sociedade. Entretendo-se com eles, atirando-os ao ar, deixando-os a fermentar dentro de um baú, que se foi enchendo com os seus contos que revelavam muito mais do que uma juventude, formando, daí para a frente, uma personalidade que foi aprendendo a caminhar à sombra das suas personagens. Marinheiros, dançarinas, homens das leis. Outros fora delas. Depois chegou a vez de Portugal, com o seu inusitado deslumbramento. Anos complicados em Coimbra, a debater-se com as intransigências de um mal amado curso de Direito, mas imprescindível para o seu futuro. Colega de Agostinho Neto, Carlos Wallenstein e do seu conterrâneo Carlos d’Assumpção, que com ele partilhava a ilustre ascendência bem-nascida em Macau. Desse período ficou o espanto e o júbilo das raízes portuguesas. Mais tarde conseguiu formular sentimentos aglutinando as suas duas origens, dizendo: “Se Portugal é a minha pátria, Macau é a minha mátria”, sempre com ironia por uma coisa que só se pode rever nas nuvens do céu. Senna Fernandes, apesar de tudo, sabia de onde vinha e conhecia o lugar para onde ia, porque aí tinha nascido. De regresso ao território macaense o Direito deu-lhe a subsistência. Com escritório aberto na Almeida Ribeiro pôde delinear o seu rumo com pleno à vontade. A advocacia dava-lhe a liberdade financeira para construir os seus castelos e as suas princesas. Amante da boa vida, partiu para uma carreira dada a experiências e ensinamentos, formando no seu cargo de professor na Escola Comercial Pedro Nolasco – onde seria também director – os andamentos de centenas de macaenses e estudantes da sua língua-mãe. Lugar onde não faltaram os preceitos que nenhum compêndio sabia descrever. Conhecimentos de uma vida de muitos degraus que complementaram com dedicação a educação dos seus filhos. À parte, ao sabor das ventoinhas no tecto, a sua escrita ganhou toda a consistência. Nos livros plantou os seus amores, a memória de desejos fugazes e proclamou a paixão assolapada pelo ente feminino que o ajudou a definir como nenhum outro a ambivalência do ser macaense com os seus intricados enredos apaixonados que envolviam orgulho, saudade e esperança. Do seu engenho saltaram “Nam Van” e “Mong-Há”, ambos livros de contos, e os seus mais brilhantes “Amor e Dedinhos de Pé” e “A Trança Feiticeira”, que ganharam o galardão de ingresso na grande tela do cinema. Figura interventiva na sociedade de Macau, o escritor macaense – distinção que se deveria escrever sempre com maiúscula – nunca deixou de apontar o dedo à ineficácia de Portugal na elaboração de um plano de futuro para o território, que deixava passar os seus governadores como quem mudava de casaco, nunca se importando certeiramente com os alicerces da casa que foi construindo. A família Senna Fernandes, apesar de alguns receios, acreditou sempre em Macau e aqui continuou a viver depois da passagem de testemunho para a China, país que nunca deixou de abraçar a figura da comunidade macaense como vínculo cravado na história e modelo de uma cultura única no mundo, de tolerância pacífica e interligação memorável. Da qual Henrique Senna Fernandes, para além das palavras que o tornaram eterno, foi o verdadeiro paradigma. No Homem, na compreensão e na herança que deixa. Senna Fernandes foi dignificado quatro vezes pela administração portuguesa, recebendo a Comenda da Ordem do Infante D. Henrique (1986), a Medalha de Mérito Cultural (1989) e a Medalha de Valor (1995), concedidas pelo governo de Macau, e o título de Grão-Oficial da Ordem de Sant’Iago de Espada, recebido das mãos do presidente Jorge Sampaio, em 1998. Seria ainda agraciado, já pela administração chinesa, com a Medalha de Mérito Cultural (2001) e com diversos títulos Honoris Causa, que confirmaram todo o carinho e importância concedidos pelas gentes da sua terra. O advogado e escritor deixou viúva, sete filhos, nove netos e dois bisnetos. Senna Fernandes deixa também obra inacabada e uma imensa saudade em todo o fulgor expressivo de Macau, que do lado de lá da sua encosta nunca deixará de iluminar. Como um farol, o sino de uma torre ou um tambor.
Henrique, a palavra – sempre admin - 11 Out 20204 Dez 2020 [dropcap]U[/dropcap]m dia ante a solicitação de resumir a literatura francesa do seu tempo, André Gide pensou e concluiu: “De nós todos, só ele sobreviverá”. Falava de George Simenon, o autor de mais de cem livros, quase todos do género policial, criador da figura do inspector Maigret, mais vivo e real na sua enticidade do que quantos personagens por esse mundo fora… O autor dos “Faux monnaieurs”, referia-se ao génio do contador de histórias. O que nós queremos da literatura é o mesmo que queremos da vida: aventura, romance, grande história no cenário de magníficas paisagens.Se me dessem a regalia de levar um só livro para um longo degredo no deserto, por isso levaria, por certo, “As Mil e uma Noites”… Eis a chama que nos fascinava em Henrique de Senna Fernandes – arquivo vivo e inesgotável de histórias, episódios, personagens da comédia humana da velha Macau, que sobrevivia para nosso deleite ao fluir refulgente do seu verbo evocador, arauto de uma retentiva de memórias que lograva a alquimia de tornar presente o “morto” passado. Ouvi-lo era como estar nos coxins de Haroum Al-laxide, fascinados sem cansaço com a narrativa hipnótica de Sherazade… por mil e uma noites. A primeira vez que o encontrei, no seu escritório da Almeida Ribeiro, ia para o convidar para escrever para a Revista de Cultura do ICM, e passaram-se cinco horas como cinco minutos… Nasceu aí a minha grande paixão, o meu primeiro fascínio por Macau. Henrique era assim, era isto, que é raro – encarnação da alma de um lugar. A força jorrante do seu verbo evocativo, de tão densa e impaciente de exprimir-se, embargava-lhe momentaneamente a voz, mas isso mesmo tinha o poder de mais nos empolgar a atenção, à vivacidade e fluência, nos seus assomos expansivos e suspensões mágicas. Henrique, meu amigo, obrigado por nos ter deixado para a eternidade o retrato dessa “Macau eterna”, uma Macau que te antecedeu mas não no olvido letal, porque se perpetua nas tuas obras escritas. Henrique, “o contador de histórias”: Ficará, para sempre aqui, no coração da cidade uma praça vazia e uma cadeira vazia, à espera da tua voz. Repeti agora as palavras de admiração (e despedida já…) que te disse em público e tive a graça de serem por ti ouvidas: Henrique, meu Amigo, és o símbolo vivo, e o derradeiro, dessa Macau eterna, porque essa esvai-se, esbarronda-se todos os dias sob nossos olhos. E é quando os tempos nos encenam espectáculos como este, que nós mais valorizamos a Memória, intangível fio que entretece os fragmentos do tempo, nos alicerça a identidade que nos salva de perecermos nas vagas letais, de nos descaracterizarmos em amnésias esquizofrénicas. Serás, Henrique, talvez, o abencerragem simbólico daquela Macau eterna… Serás… Mas venha o que vier, por mais espalhafatoso em arquitecturas, mais embasbacante em números e estatísticas, mais engordado em tamanhos que não em grandeza – aquela Macau sempre nos contemplará do mais alto firmamento, sempre mais alta e sublime que arranha-céus e orçamentos, porque foi projecto universal de quem sonhou, com ela e através dela, a unidade essencial do género humano, as famílias humanas todas em ecúmena fraterna.
Henrique de Senna Fernandes, o autor que falta traduzir e estudar Andreia Sofia Silva - 11 Out 20204 Dez 2020 Nam Van – Contos de Macau, livro de Henrique de Senna Fernandes, tem agora uma edição em inglês, mas o caminho não se fica por aqui. David Brookshaw, tradutor da obra do escritor macaense, acredita que seria importante mais traduções em inglês sobretudo a pensar na diáspora macaense que reside nos EUA. Dois académicos defendem que há ainda muito a estudar na obra de Senna Fernandes [dropcap]N[/dropcap]o ano que marca o décimo aniversário da morte do maior romancista macaense de sempre, a organização do festival literário Rota das Letras decidiu apostar na tradução, para inglês e chinês, de Nam Van – Contos de Macau, de Henrique de Senna Fernandes. No entanto, não só é preciso traduzir mais obras de Senna Fernandes para que se tornem mais globais, como são necessários mais estudos académicos sobre aquilo que escreveu. Ao HM, David Brookshaw, tradutor oficial da obra de Senna Fernandes para inglês, destaca o facto de este tipo de traduções necessitarem sempre de um grande trabalho de diálogo e de sedução junto das editoras. A literatura macaense pode ser considerada de nicho e o interesse por ela pode dissipar-se com os anos, mas David Brookshaw acredita que fazem falta mais traduções em inglês a pensar na diáspora macaense a residir nos EUA. “Quando fiz a tradução de ‘A Trança Feiticeira’ para a Hong Kong University Press achava que seria interessante para os leitores de Hong Kong, mas isso não chega para justificar uma tradução em inglês. A Hong Kong University Press tem uma editora parceira nos EUA e acho que esse mercado é importante, porque o país está mais aberto a traduções do que o meu país, por exemplo [Reino Unido].” Além disso, “há uma importante diáspora nos EUA que já não tem ou que nunca teve o português como língua”. Traduzir Senna Fernandes para inglês também seria importante “para o campo de estudos sobre literaturas asiáticas”, exemplificou David Brookshaw. O tradutor, que actualmente se dedica a traduzir Pepetela, escritor angolano, e que também se debruça sobre os escritos de Mia Couto, confessa que chegou a tentar uma tradução, também junto da Hong Kong University Press, de “Amor e Dedinhos de Pé”. “Não consegui nada com esse contacto, porque isso tem a ver com as pessoas que estão nas editoras. E o editor da Hong Kong University Press reformou-se há muito tempo e nunca mais tive esse contacto pessoal. Depois vieram outros projectos”, adiantou. Quanto a “Nam Van – Contos de Macau”, David Brookshaw já tinha traduzido dois contos para o projecto de uma antologia. Desta vez coube-lhe a tradução dos restantes contos e a revisão do que já tinha traduzido. “Nestes 20 anos melhorei como tradutor. O meu inglês e português são melhores”, disse. “Pelo que vejo o Ricardo [Pinto] tem interesse em promover a literatura de Macau em língua portuguesa para inglês, para ter um público maior em Macau e até na grande China.” Uma obra documental Rogério Miguel Puga, académico da Universidade Nova de Lisboa (UNL) que se dedica a estudar muita da literatura macaense, também defende a aposta na tradução das obras de Henrique de Senna Fernandes, tendo em conta o carácter documental da sua obra. “É de louvar esta iniciativa [de traduzir Nam Van – Contos de Macau] e talvez se pudessem traduzir mais obras dele. Os contos são muito interessantes. Isso iria facilitar o acesso a essa literatura por parte dos investigadores de língua inglesa, para poderem estudar a literatura de Macau em comparação com outras”, defendeu ao HM. Além da tradução, Rogério Miguel Puga fala da importância da academia olhar mais para os escritos de Senna Fernandes. “Há ainda muita coisa a explorar na sua obra, sobretudo esta dimensão plural dos seus romances. Já há muita coisa estudada e publicada mas há um trabalho [necessário] de sistematização das principais temáticas da literatura macaense, que estão todas, de uma forma mais desenvolvida e substancial, na obra de Senna Fernandes. A obra dele funciona como um repositório representativo das temáticas da literatura macaense. Há muito trabalho ainda por fazer e espero que os novos investigadores o façam”, apontou. Também Dora Nunes Gago, docente da Universidade de Macau (UM), acredita que continua a ser importante olhar os contos e romances de Henrique de Senna Fernandes do ponto de vista dos estudos comparatistas. “Apesar das diversas teses e estudos já realizados sobre o autor tanto em Macau como em Portugal ou no Brasil, e outros países, creio que continuam a surgir novas vias de abordagem e de análise, nomeadamente através de perspectivas comparatistas.” No caso da UM, o departamento de português tem neste momento dois alunos do mestrado de Estudos Literários e Culturais a estudar as obras do autor, além de que Nam Van – Contos de Macau foi também tema de uma tese de mestrado defendidas em Julho do ano passado, também na UM. “De um modo geral os alunos de mestrado mostram interesse e lêem com muito agrado as obras do autor. Os alunos da China sentem-se seduzidos pela representação de um universo social e cultural que é distinto deles, apesar da proximidade. Já os alunos de Macau revelam curiosidade relativamente ao passado da sua terra”, frisou Dora Nunes Gago. Um “natural contador de histórias” Traduzir Henrique de Senna Fernandes é trazê-lo para o século XXI e fazer com que ele perdure no tempo. Mas é também um meio para que chegue a novas gerações, apesar de David Brookshaw o considerar “um escritor um pouco do século XIX”. Mas, datas à parte, o que os leitores querem são boas histórias, aponta o tradutor. “Ele foi um natural contador de histórias. São histórias empolgantes em que a juventude contrasta com a velha geração conservadora. É o liberalismo contra o conservadorismo com a qual os jovens podem sempre identificar-se. Embora chame o autor de um ficcionista do século XIX era também a juventude que ele conhecia. Ele cresceu no tempo dos grandes filmes de Hollywood e portanto as histórias dele também funcionam um pouco como filmes.” Além disso, traduzir Henrique de Senna Fernandes tem a tradução primordial de contribuir para a manutenção da comunidade macaense, tema onde perdura “um certo pessimismo”. “Talvez por essa razão seja preciso dar a conhecer a vida da comunidade. E mesmo que o futuro seja outro é preciso conhecer a história, sobretudo durante a vida e juventude do Henrique”, disse. É esse ponto que é tão importante e que “fascina” Rogério Miguel Puga: o facto de estarmos perante obras que são verdadeiros retratos documentais de uma época, sociedade ou comunidade. “Os romances de Senna Fernandes funcionam quase como crónicas ou documentários da vida de Macau em termos da acção dos romances e da interacção entre a cidadela cristã e a comunidade chinesa, as especificidades da comunidade macaense. Ele utiliza inclusivamente diálogos e termos em patuá e isso torna a obra de Henrique de Senna Fernandes muito interessante, assim como os contos.” Uma forma de reflexão Para Dora Nunes Gago, há um “indiscutível valor cultural, social e histórico da obra de Henrique de Senna Fernandes que se mantém, pois é intemporal”. “Através da leitura dos seus romances, revisitamos o passado de Macau, e, através dessa revisitação, colhemos lições para o nosso presente e futuro. Assim, no mundo globalizado do século XXI, marcado em certa medida pelo individualismo, extremismos e rejeição de diferenças, a obra de Senna Fernandes convida-nos a reflectir sobre as mais variadas formas de tolerância, de aceitação do ‘outro’ distinto e diverso, sobre os modos de ultrapassar barreiras, aparentemente quase intransponíveis, entre diferentes comunidades , línguas e culturas”, acrescenta a académica. Mais do que isso, os escritos de Senna Fernandes são uma “voz que se ergue a relembrar os complexos e ricos meandros da identidade macaense, contribuindo para um sentido de pertença, no caso dos leitores de Macau, e que parece que se esbate, ao longo do tempo, devido a uma descaracterização que afecta continuamente Macau”, conclui Dora Nunes Gago.