Rota das Letras traz “Ode Marítima” ao Teatro D. Pedro V no próximo dia 23

A “Ode Marítima”, central na obra de Álvaro de Campos, vai ser declamada integralmente, pela primeira vez, num palco de Macau no âmbito do Festival Literário – Rota das Letras. O espectáculo de Pedro Lamares, baseado no extenso poema de um dos heterónimos de Fernando Pessoa, tem lugar no Teatro D. Pedro V, às 21h do próximo dia 23, véspera do encerramento do Festival Literário, anunciou ontem a organização, num comunicado enviado às redacções.

Nas palavras do filósofo José Gil, em “Ode Marítima” – considerado uma das obras-primas da poesia portuguesa – “exterior e interior são separados pela mesma ‘distância’ que vai do poeta no cais deserto ao navio que ele vê ao longe. É a distância entre a sensação e a coisa, entre a sensação como realidade interior e o paquete como realidade exterior. Ora, esta distância liga-se a uma sensação ‘primitiva’, como diz Pessoa, sensação que desempenha um papel essencial em toda a sua poesia: a sensação de mistério. Na ‘Ode Marítima’, o mistério é significado por toda a distância, tudo o que se separa, todo o movimento que cria uma separação”, realça a mesma nota.

Pedro Lamares desempenhou o papel de Fernando Pessoa em “O Filme do Desassossego”, de João Botelho e participou em filmes dos realizadores como Jorge Paixão da Costa, Vítor Goncalves, Joaquim Leitão e António Pedro Vasconcelos. Na televisão apresenta o programa “Literatura Aqui” (RTP2) com Filipa Leal, em que faz selecção e gravação de textos. Além disso, dirige espectáculos, lecciona em escolas de teatro e comunicação e é ainda director artístico da cooperativa “Casca de Noz”, ainda de acordo com a organização.

A oitava edição do Festival Literário – Rota das Letras vai decorrer entre os próximos dias 15 e 24. No próximo domingo, pelas 15h, a Livraria Portuguesa acolhe uma conferência de imprensa de apresentação do programa.

Sem racionalidade não há segurança rodoviária

[dropcap]N[/dropcap]o passado dia 1 de Março, na Av. Marginal Flor de Lótus, ocorreu mais um acidente rodoviário que custou a vida a uma jovem de apenas 22 anos. Aparentemente, a motorizada em que aquela circulava foi embatida por uma carrinha que não respeitou o sinal de paragem obrigatória (stop) e a regra da prioridade que militava a favor da malograda motociclista.

 

Entretanto, tomei conhecimento de que por causa disso foi convocada uma manifestação para o dia 9 de Março, por parte de um conjunto de deputados, visando protestar contra o reconhecimento mútuo de cartas de condução entre a RAEM e a RPC. São coisas diferentes.

 

Não estando em causa o legítimo de exercício do direito de manifestação e indignação relativamente a essa decisão, nem o aproveitamento político que lhe possa estar subjacente, considero que seria importante voltar a reflectir sobre as razões para que num espaço tão pequeno como é Macau ocorram tantos acidentes e tão graves.

 

Começando por aqui, seria bom que se tivesse presente o quadro abaixo, elaborado a partir dos dados disponibilizados pelos Serviços de Estatística e Censos (DSEC), relativamente aos últimos anos:

 

 

* – Fonte: dados obtidos online na página da DSEC

 

Creio que o número total de vítimas da DSEC se refere a pessoas envolvidas quer em acidentes de viação quer em transgressões às leis de trânsito, visto que se não sendo o resultado a soma de feridos e mortos não se vê de onde vem tal número. Mas independentemente das dúvidas que possam resultar desse indicador, os números dos acidentes de viação, transgressões às leis do trânsito, de mortos e feridos seria mais do que suficiente para fazer soar todos os alarmes.

 

Há pouco mais de dois anos, neste mesmo jornal, deixei umas “Notas Rodoviárias” em que foram abordadas algumas questões atinentes a este assunto. Volto hoje ao tema.

 

O reconhecimento mútuo de cartas de condução entre a RAEM e a RPC, que de novo está na ordem do dia, é apenas uma ínfima parte de um problema maior. Esse reconhecimento poderá contribuir para um maior congestionamento do trânsito e um agravamento da actual situação, mas em nada ajuda a combater a atitude irresponsável de muitos condutores, sejam eles de automóveis ligeiros, motociclos ou pesados, públicos, de concessionários ou privados, e de peões.

 

Repare-se que condutores com carta de condução da RPC ou de qualquer outro país, e alguns até sem habilitação para a condução, já circulam pelas estradas de Macau sem dificuldades de maior, como se viu pelo acidente de 01/03/2019 e também já acontecera com um condutor do interior da RPC, com licença coreana, que em 31/01/2019 provocou um acidente por circular em contramão.

 

Portanto, o problema não está no reconhecimento mútuo. Com ele ou sem ele temos milhares de acidentes num território mais pequeno que uma herdade alentejana de produção de bovinos que há dias esteve na razão da assinatura de um acordo entre a CESL-ASIA e o Banco da China, numa cerimónia com o Secretário para a Economia e Finanças.

 

Quem circula pelas estradas da RAEM já se apercebeu da forma imponderada e à margem dos regulamentos como por aqui se conduz. A qualquer hora.

 

Não obstante o esforço feito pelas autoridades, continua a ser vulgar ver circular nas pontes veículos pesados na via de circulação mais à direita. Não só veículos pesados. Muitos automóveis ligeiros, motociclos e ciclomotores também circulam encostados à direita da faixa de rodagem, ainda quando o lado esquerdo se encontra desimpedido. O mesmo acontece fora das pontes em qualquer faixa de rodagem que tenha mais do que uma via no mesmo sentido (Istmo de Coloane, novas avenidas do Cotai). Por vezes vão pela via central. E isso acontece quer com condutores profissionais, quer com amadores, residentes ou não-residentes, e até com veículos ao serviço de entidades oficiais.

 

Resumindo o que diariamente vejo na estrada, diria que se faz o possível para não se parar nas passadeiras, sendo que os piores são os condutores de veículos com dupla matrícula. Por outro lado, fazem-se tangentes aos peões nas passadeiras, havendo peões que se atiram literalmente para as zebras, outros atravessam o Cotai passando por cima dos canteiros centrais, saltam vedações, colocam em risco a sua segurança e a de quem circula. Vêem-se inversões de marcha nos locais mais inacreditáveis, por vezes com circulação em contramão, como na Estrada de Seac Pai Van, junto à gasolineira, e nas imediações da Urbanização One Oasis. Muda-se de direcção e pára-se de repente sem se sinalizar a manobra, apenas para se conversar com outro condutor (caso dos táxis) ou falar ao telemóvel, ignorando-se a existência dos sinais luminosos e dos outros que circulam. Há ainda quem faça inversão de marcha e aborde cruzamentos esquecendo que as regras da prioridade aqui não são iguais às da RPC, e os que conduzindo autocarros param a meio das rotundas e em vias com prioridade para deixarem entrar os colegas, perturbando a circulação e obrigando a parar quem não tem que parar.

 

Há, por isso, necessidade do Governo da RAEM, designadamente através das Secretarias para os Transportes e Obras Públicas e da Segurança, apostar numa melhor formação de condutores e de peões, desencadeando acções de natureza pedagógica. Numa primeira fase recorrendo a campanhas de sensibilização, com especial incidência sobre os condutores que vêm do interior da China, que pensam que em Macau as regras são as mesmas, razão pela qual circulam sistematicamente pela direita e violam prioridades, bem como sobre os motoristas de táxi, condutores de autocarros e instrutores de condução. Será seguramente mais económico e fácil distribuir panfletos em chinês nas fronteiras a quem se dirige à RAEM, ou levar a efeito campanhas na rádio e na televisão, do que pagar indemnizações e acudir a quem perde os seus entes queridos ou os vê ficarem incapacitados para a vida. Essas acções pedagógicas devem abranger polícias com responsabilidade no trânsito, que deviam ser os primeiros a dar o exemplo na circulação pela esquerda e no uso de sinais luminosos. Depois, num segundo momento, será necessário autuar forte e feio, mobilizando mais agentes para a estrada do que para a verificação de parquímetros, onde até hoje ninguém morreu ou ficou marcado para o resto da vida.

 

Estas acções devem ser acompanhadas de uma melhoria das condições de circulação estradal, designadamente junto às bermas, nivelando-se as tampas, tapando buracos que dão cabo de jantes, pneus e suspensões, melhorando o alcatrão, em suma, introduzindo-se racionalidade e programação adequada nas intervenções nas vias públicas. Não é por se impedir as inversões de marcha no Cotai ou não se reconhecer as cartas da RPC que o problema se resolve e os números melhorarão.

 

Não havendo uma cultura rodoviária e pedonal de respeito pelos outros e de cumprimento da lei, com mais ou menos manifestações por causa das cartas de condução, apesar dos limites de velocidade baixíssimos, continuará tudo na mesma. A segurança na estrada não pode ser uma arma política. A insegurança rodoviária já está cá dentro há muito tempo, não vai ser agora importada. Exijam-se as medidas adequadas ao Chefe do Executivo e ao Governo da RAEM.

Uma manhã normal no parque das nações

[dropcap]R[/dropcap]espondo enquanto co-editor a uma professora búlgara que lecciona em Inglaterra para lhe dizer que não sou eu que estou a coordenar a publicação de um certo “volume especial” para uma revista académica, é um colega italiano. Escrevo depois aos investigadores indianos que convidaram para um interessante estudo sobre desenvolvimento turístico em zonas rurais da Índia para lhes dizer dos meus possíveis calendários para visitar a região, partindo do Japão – e também para os lembrar que temos que responder ao colega da Nova Zelândia que no dia anterior nos enviou o protocolo para utilização do programa informático que desenvolveu e que tão preciosa ajuda pode dar ao projecto. Esclareço detalhes da minha integração temporária num centro de investigação em Sapporo, que está para breve, com o respectivo director. Indeciso entre participar em excelentes conferências nas maravilhosas cidades de Hong Kong e em Split, que infelizmente decorrem nos mesmos dias, contacto o director escocês da escola de Hong Kong com quem me vou cruzando com regularidade acidental e os colegas croatas com quem mantenho contacto mais assíduo, seja por razões académicas, seja por outras mais pessoais. Coisas do Mediterrâneo…

 

Numa relativamente longa pausa para café, respondo a mensagens mais informais de familiares e amigos, quase todos em Portugal, com proximidade facilidade pelas possibilidades das “redes sociais” e comunicações digitais gratuitas com vídeo e tudo. Faço os meus “likes” de acordo com a importância do que vou lendo ou os sorrisos que me vão suscitando algumas leituras. Acrescento novas razões a preocupações antigas sobre o que se vai passando na Turquia ao ver os “posts” das pessoas que conheci nos cinco meses em que vivi na maravilhosa Istanbul. “Desamigo” um indivíduo que insiste em partilhar as falsas notícias com que a extrema-direita vai agredindo diariamente o que nos resta de democracia, depois da pedagógica, paciente e amigável explicação no dia anterior. Dou por encerrada a sessão e dedico-me ao futebol, com as notícias e resumos dos dois jogos da véspera na Liga dos Campeões. Desta vez houve golos e foram logo 7 em dois jogos, uma fartura em comparação com a seca absoluta do dia anterior.

 

Volto ao trabalho concentro-me na organização dos painéis de discussão que tenho que organizar, com um colega holandês e outro italiano numa uma conferência de Helsínquia, lá para o fim da Primavera. Envio detalhada proposta aos organizadores finlandeses e ao presidente da organização, também holandês. O programa está praticamente fechado mas há outra conferência a organizar pelo mesmo grupo, já no Outono mas também em terras nórdicas. Discutido o assunto internamente no dia anterior, apresento a nossa proposta inicial aos colegas sueco e israelita que organizam o evento, na Suécia. Constato ainda que, para a visita mais próxima, não tenho resposta do colega de Taiwan que contactei há mais de uma semana. A comunicação digital às vezes é um bocadinho volátil. Paciência. Estará muito longe de ser a primeira vez que organizo sozinho a visita a uma cidade que desconheço. Na realidade é um prazer e não tenho memória de alguma ter corrido mal.

 

Dedico-me então com paciência a mais um puzzle que se há de tornar artigo académico, adicionando argumentos devidamente fundamentados em pesquisas anteriores, discutindo como o respectivo contexto e objectivos ajudam ou não à minha própria proposta explicativa, e redefinido uma e outra vez uma estrutura narrativa que parece já bastante estável e adequada. Veremos mais tarde o que pensam disto os meritíssimos “referees” da revista para onde o artigo for submetido, que ainda faltam uns meses até o puzzle estar completo e discutido com os colegas holandês e japoneses com quem trabalho neste caso. A manhã está tranquila e solarenga, as temperaturas têm estado acima dos 0 graus e a neve começa a derreter aceleradamente na cidade, muito mais cedo do que é habitual.

 

Interrompo o trabalho para ir almoçar ao centro de Sapporo, um “ramen”, uma das mais típicas massas japonesas. Opto desta vez pela carne de porco numa deliciosa sopa de caranguejo, mas há outras variantes. Os restaurantes especializados seguem quase sempre semelhante metodologia: faz-se o pagamento e escolhe-se o prato numa máquina que imprime o talão que há de ser entregue ao balcão. No centro da cidade as máquinas têm informação em inglês (e às vezes em chinês e coreano), para facilitar a vida aos turistas (ou residentes com dificuldade de leitura, como é o meu caso). Tomo uma bica razoável no café da omnipresente cadeia coreana que tem sempre sala de fumadores e leio alguma coisa do que vai sendo publicado no Hoje Macau a medida que vou recebendo por email as notificações dos novos artigos online. Amanhã irei reler esta crónica e enviá-la também para Macau, a menos que me pareça um total despropósito que não interessa a ninguém.

Branquear com sangue

[dropcap]O[/dropcap] castelo está cercado, aproxima-se o fim. O general Kurogane sobe aos cómodos reais para confrontar a Dama Kaede, astuciosa intriguista, cujas conjuras e ciladas, acrescidas de um sortilégio sexual, conduziram o clã Ichimonji à catástrofe iminente.

A câmara fixa-se nela e Kaede, niponicamente hierática, como deve ser a alteza sobretudo em face do veredicto, vai fitando um ponto infinito enquanto revela que o seu triunfo é inexorável assim alcançando a vingança por que tanto porfiara. Está iminente a aniquilação dos Ichimonji que décadas atrás haviam massacrado a sua família.

Kurogane desembainha a catana e ante o clamor de pânico das cortesãs, na parede para onde agora olhamos estampa-se um formidável jorro sangue. O realizador Akira Kurosawa oferece-nos alguns segundos de fascínio e silêncio para contemplarmos aquele esplendor vermelho.

De seguida o General Kurogane repta quem o quiser ouvir: “Preparem-se para morrer.” E parte para a batalha.

Ao longo de “Ran” o General Kurogane assassinara e cometera crimes irremissíveis porque a todos os valores sobrelevou o princípio da lealdade. Em nome dela permitiu-se executar as iniquidades que lhe foram encomendadas pelo seu Senhor; para não a desfalcar recalcou apreensões e dúvidas, comprometendo-se com franqueza em actos que sabia serem indecentes.

Mesmo que imperturbável e deixando connosco o encargo de ajuizar o que nos dava a ver, a câmara de Kusosawa, porque nada omitindo, foi-nos revelando a personagem do General Kurogane como sórdida e degradada. Um esbirro sempre teria o indulto da inconsciência e da subordinação, mas o braço direito do Senhor não tem como atenuar a sua parte de responsabilidade individual.

É inesperado, logo um golpe de génio, daqueles que desequilibram o escrúpulo do espectador, que no final de “Ran” Kurosawa conceda a Kurogane uma dádiva inestimável – a redenção. É, aliás, uma dupla e apoteótica oferta: primeiro a de acertar contas com a perfídia ao cortar o mal pela raiz acutilando a Dama Kaede, no que acrescenta mais uma grave culpa ao seu rol; mas a seguir a de resgatar a honra com uma morte em combate.

Aliás retrocedendo àquela cena capital nela descobrimos, porque só ali nos é dado saber, que afinal a odiosa Dama Kaede também agiu com abandono e sem cupidez, por motivos superiores ao seu interesse pessoal, consciente desde o início das suas maquinações de que, na melhor das hipóteses, trespassá-la-ia a lâmina de uma catana. Também ela agiu por fidelidade, neste caso à memória dos seus antepassados, desafrontando o ultraje com um castigo ainda maior do que o sofrido. Maior porque mais subtil do que a mera extinção olho por olho, dente por dente, da casa Ichimonji. A queda que ela provocou é antecedida por um apogeu de poder e força, angariados por uma sucessão de infâmias políticas, conjuras familiares e massacres militares. Não só ela fez com que os Ichimonji caíssem de mais alto como trabalhou para que merecessem a ruína.

Ou seja também com a Dama Kaede Kurosawa foi misericordioso. A economia narrativa de “Ran” ficaria estropiada se ela fosse retirada de cena de maneira inconclusiva, rendendo o seu desenlace à imaginação e à especulação dos espectadores, talvez a pior desgraça a que se pode condenar uma personagem. Esse martírio ficou reservado para o velho rei Hidetora cuja ponderação, equidade e candura no início do filme, ao dividir com isenção o reino pelos seus três filhos, desencadeou todos os tormentos e tribulações que fomos presenciando. Hidetora, o justo, acaba cego e só a tactear o vazio à borda de um precipício.

As culturas mais díspares e historicamente incomunicáveis, todas reconhecem o sacrifício da vida pela sorte das armas como um honroso resgate dos males antes praticados. “Ran” é assim um filme absolutamente japonês e absolutamente shakespeariano. A tragédia é inseparável do sangue – nos tempos de hoje talvez o elemento que mais repugna ao sentimentalismo e ao moralismo vigentes – e tem aqui como detonador a lealdade, pois é por via dela que se corre para a perdição.

Do elenco de virtudes cardinais a lealdade será a que mais a que mais sobressalta a ética com os seus dilemas, a que mais corrompe as outras virtudes e a que mais dano causa a quem a professa. Incubado nas decisões erradas que incauta e aleatoriamente por ela vamos tomando o vírus do fatalismo nela latente pode alastrar a peste da tragédia, esse ectoplasma que se apropria sem remédio de uma vida.

Pior do que a lealdade só a deslealdade.

Biologias I

[dropcap]A[/dropcap]s disciplinas contemporâneas “biologia” e “zoologia” visam a vida. A biologia estuda a vida e os organismos vivos. Comporta em si diversos campos de investigação. A zoologia faz parte da biologia e estuda a vida animal. De qualquer modo, o acrescento “-logia” tal como noutras palavras: teologia, filologia, antropologia, significa disciplina científica. Portanto, há um suporte teórico e um modelo cognitivo de acesso a objecto específico pertencente a cada disciplina. Ainda: percebe-se que há ramificações e especificações em cada disciplina ao ponto de se poder pensar no plural: biologias e zoologias. Não se pretende reivindicar os termos “biologia” e “zoologia” para novas ciências ou novas concepções da vida em geral, humana e animal. Pretende-se, antes, procurar perceber o que na antiguidade estava em causa quando se falava de “bios” ou de “zôê”.

 

Muitas vezes, o que quer que os antigos visassem com o termo “bios” e “zôê”, ambos tinham o mesmo referente. Tal pode ser percebido quando verificamos a expressão “bios te kai zôê” (a existência tal como a vida) em Aristóteles. A hendíade reforça um único campo de investigação, ainda que com duas expressões diferentes. Mas mais. Parece haver uma troca de referente ou campos semânticos. Às vezes, o que parece ser visado segundo uma designação, noutras circunstâncias, parece ser visado pela outra. Por um lado, “bios” parece ter o sentido de “zôê”. Por outro, “bios” e “zôê” têm sentidos diferentes, ainda que se complementem.

Mas vamos por partes.

 

Aristóteles, na Ética a Nicómaco, distingue formas de vida ou horizontes “zoóticos”, para poder identificar a que diz propriamente respeito à existência humana. Primeiro, identifica uma dimensão que nós, humanos, partilhamos com animais mas também com vegetais. A nossa capacidade de assimilar nutrientes e de crescer é comum ao reino animal e ao reino vegetal. Cresce-nos o cabelo e as unhas. Aumentamos de tamanho desde a mais tenra idade. Desenvolvemo-nos até à idade adulta. Definhamos, envelhecemos. Morremos. A vida manifesta-se no seu sentido vegetal mais próprio na capacidade de processar alimentos, nutritivos, sólidos e líquidos, de os ingerir, digerir, assimilar. Nós e os animais e os vegetais. Aqui, não há diferença alguma entre a vida humana enquanto horizonte zoótico e os reinos animal e vegetal. Sem dúvida que há diferença no modo como nos acercamos dos nutrientes, os seleccionamos e segregamos. A planta de modo diferente dos animais. Os animais de um modo diferente do ser humano. Mas a “dieta” e o “regime alimentar” sempre foram objectos de estudo desde a antiguidade e encontra-se mesmo fixada nos textos mais antigos do pensamento ocidental.

 

O segundo estrato zoótico, se assim lhe pudermos chamar, é o da vida sensitiva ou perceptiva. Há textos em que Aristóteles exclui o reino vegetal da possibilidade de ter percepção. Outros há que o inclui. O reino animal partilha da possibilidade humana de ter capacidades perceptiva ou sensorial. Mas como é que uma planta pode ter percepção? Para Aristóteles, o facto de absorver água e os seus nutrientes e mesmo a necessidade de luz para a sobrevivência indicam, mais do que simbolicamente, a possiblidade de as plantas serem “sensíveis” ao meio ambiente. De resto, o modo como Aristóteles via a morfologia de uma planta por analogia com um animal não deixa de nos deixar perplexos do mesmo modo que nos permite compreender o que ele tem em mente. Diz Aristóteles, no De Anima, que a planta está de pernas para o ar, com o que corresponde, analogamente, à cabeça de uma animal enterrado na terra. Os seres animais, como os seres humanos, alimentam-se pela boca, normalmente, situada na cabeça. Assim, também uma planta. Só que a planta está de pernas para o ar e com a cabeça enterrada na terra. Podemos argumentar que o girassol parece ter a cabeça virada para o sol e, assim, gira orientado pelo movimento que o sol parece esboçar-se. Ainda assim, percebe-se que a terra dá nutrientes e a fotossíntese é uma realidade. Por outro lado, seres humanos e animais partilham de uma capacidade mais sofisticada de percepção, de locomoção, de reprodução e conservação, defesa, protecção e caça. A visão parece ser partilhada pelo cavalo, o boi e o ser vivo. Todavia, vemos de maneiras diferentes a mesma coisa. Podemos até reconhecer uma capacidade de visão ao falcão que nunca teremos. O mesmo com o olfacto do cão, etc. etc..

 

O horizonte zoótico que é próprio do ser humano, segundo Aristóteles, e não é partilhado por nenhum ser vivo nem ser vegetal, é o prático ou pragmático. Se quisermos, os humanos podem “existir” e a vida humana acontece na existência. Mas a vida animal e a vegetal, embora estando na realidade e na vida, nunca poderão existir. Uma planta está junto de outra. Pode até ser enxertada noutra. Mas nunca conviverão. Um animal pode conviver com outro animal, mas não existirá como cidadão num mesmo estado. “Ser um com outro” é uma expressão reservada ao ser humano. Só o ser humano existe com outro na polis, tem história e antecipa futuro. A zôê praktikê de que fala Aristóteles designa o horizonte específico do ser humano, mas, ainda assim, não capta a característica fundamental do bios.

O bios quer dizer a existência humana enquanto cronologicamente constituída: o tempo finito ou crónico, a distribuição da existência por tempo sido, tempo ser e futuro a haver, aspirações e desejos, conquistas e perdas, ambições e frustrações. Para os gregos, o bios mais do que um horizonte da cronologia que nos é loteada, é o resultado de uma escolha em que cada um pode ser de um determinado modo e ter um modo de vida.

Uma diferença de escalas

[dropcap]A[/dropcap] velocidade da luz é de 299.792.458 metros por segundo. Comummente arredondada para 300.000 km/s, a velocidade da luz – no vácuo – parece corresponder ao limite de velocidade do universo. Para se ter uma ideia da magnitude deste número – e simultaneamente da sua incrível insuficiência perante as distâncias cósmicas – veja-se o seguinte: a distância entre a terra e a lua é de aproximadamente 384.400 km (dependendo da posição orbital do nosso satélite), à velocidade da luz levaríamos apenas 1,255 segundos a lá chegar e uma ida e volta tardaria menos de 3 segundos (um desfasamento que aliás podemos verificar nas comunicações com os astronautas que foram à lua, todas elas apresentando desfasamento entre emissão e recepção).

Já a distância média entre a terra e o sol é de uns consideráveis 149.597.871 km – o correspondente a uma Unidade Astronómica, outra unidade de grandeza para distâncias cósmicas. À velocidade da luz, levaríamos 8 minutos e 20 segundos para percorrer essa distância.

A estrela mais próxima do nosso sistema solar é Alfa Centauri, um sistema de três estrelas gravitacionalmente unidas. Fica a 4,37 anos-luz de distância, cerca de 4.1343392 x 1013 quilómetros. Um ano-luz equivale – como o nome indica – à distância percorrida pela luz em vácuo num ano (9.4607 x 1012 km). À velocidade da luz – velocidade que não conseguimos atingir nem de muito longe, levaríamos 4 anos e qualquer coisa a percorrer a distância da terra ao sistema Alfa Centauri. A velocidade da luz, absolutamente avassaladora na escala da terra e mesmo no sistema solar, é ridiculamente lenta quando consideramos distâncias cósmicas.

Na verdade, a nível cósmico tudo parece-me mover-se com extraordinária lentidão, mesmo que à nossa escala não o pareça. Mesmo a uns nada despiciendos 230 km/s (quase um milhão de quilómetros por hora), o sol leva cerca de 255 milhões de anos para completar uma órbita à volta do centro da Via Láctea. Na verdade, no nosso tempo medido em anos e não em milhões de anos, as coisas parecem estar em câmara lenta ou mesmo paradas.

Quando penso na piada cósmica que é a nossa métrica humana – fadada a perguntar o que não pode saber e a postular abstractos que é incapaz de compreender vivencialmente – sinto-me esmagado pelo tanto e tão inacessível que temos em nosso redor. Postula-se existirem cerca de um septilião de estrelas no universo (é um 1 seguido de 24 zeros). Todas elas a distâncias a que humanamente não temos acesso. Todas elas orbitando centros de galáxias a velocidades tão elevadas do nosso ponto de vista e tão irrisórias de um ponto de vista cósmico. Algumas destas estrelas são tão grandes por comparação com o nosso sol e queimam tão rapidamente o seu combustível que durarão um ínfimo do tempo que este tem previsto durar (uns modestos dez mil milhões de anos).

À infinidade horizontal pode corresponder peculiar infinidade vertical. Como no filme Animal House de 1978 se diz: “então o nosso sistema solar pode ser apenas um átomo na unha de um gigante?”. Podemos ser apenas uma instância que aos olhos de um observador noutra escala se mexe muito rapidamente – tal como os átomos parecem fazê-lo à nossa escala. Podemos ser apenas um átomo numa molécula de dióxido de silício num copo de vidro que se está a estilhaçar por ter caído ao chão. Podemos ser ainda mais ridiculamente pequenos do que pensamos.

Arquitecto luso acredita que há solução física para o circuito

[dropcap]A[/dropcap] RAE vizinha volta a vestir-se de gala este fim-de-semana para receber a caravana do Campeonato FIA de Fórmula E, a competição de carros eléctricos apadrinhada pela Federação Internacional do Automóvel (FIA) e que caiu no goto dos construtores automóveis pela sua pegada ambiental.

Durante décadas a fio vários entusiastas lutaram para que Hong Kong tivesse o seu evento motorizado, algo que Macau arrebatou em 1954. Foi com entusiasmo que a ex-colónia britânica recebeu a competição de carros eléctricos pela primeira vez em 2016. Contudo, quatro anos depois, o estro esmoreceu e o contrato vigente entre a Formula E Holdings e as entidades de Hong Kong ainda não foi renovado. A continuidade do evento está dependente dos resultados das negociações em curso e uma decisão final está pendente da viabilidade económica do evento.

Pela primeira vez desde que entrou no calendário, Hong Kong não será a prova de abertura de uma temporada, tendo sido deslocada para o lugar de quinta corrida do calendário. Desenhada pela portuguesa RS Project, a pista urbana de 1,860 km de perímetro na frente do porto continua “estreita mas desafiadora”, como classifica o piloto brasileiro Lucas Di Grassi, campeão da disciplina em 2017.

Para a edição deste ano, “em termos de desenho não houve qualquer alteração de layout”, explicou o arquitecto Rodrigo Nunes ao HM. “Somente o planeamento para a construção é que esteve mais apertado relativamente ao planeamento dos dois primeiros anos, mas neste momento o construtor local também já tem alguma experiência o que permite fazer uma construção mais assertiva.”

A maior novidade do campeonato que conta com a presença de gigantes da indústria automóvel como a Audi, BMW, DS, Nissan, NIO, Jaguar ou Mahindra, é mesmo a utilização de um só carro durante a corrida de “45 minutos mais uma volta”. As novas baterias produzidas pela McLaren Applied Technologies introduzidas na temporada 2018/2019 conseguem durar a corrida completa, evitando-se assim a paragem embaraçosa nas boxes para trocar de carro.

 

Há espaço

O evento organizado pela Associação Automóvel de Hong Kong (HKAA) teve no seu primeiro ano um prejuízo de 50 milhões de dólares de Hong Kong e a segunda, que correu financeiramente melhor, também não ficou no verde. Não menos problemática para a continuidade do evento é a falta de espaço para aumentar o perímetro do circuito numa área já por si congestionada de edifícios.

Os organizadores do campeonato requerem uma extensão de 2,2 km para os seus circuitos, com a chegada na próxima época de mais dois construtores automóveis: Mercedes e Porsche.

A Estação de Hong Kong ocupa a parte oriental do traçado e não pode ser encerrada durante os dois dias do evento devido às ligações com o aeroporto. Uma solução poderá passar por prolongar o circuito até Wan Chai, pois a primeira parte, na Lung Wo Road, não pode seguir pela parte do túnel. A FIA recusou no passado um traçado proposto nessa zona devido às altas velocidades que os carros iriam atingir. A colocação de chicanes, para abrandar os carros, era uma possibilidade em cima da mesa.

Sem revelar muito do projecto, o arquitecto Rodrigo Nunes está optimista, afirmando “que existem soluções viáveis que já foram apresentadas e o circuito idealmente deverá ter 2,4 km.”

 

Pódio na mira de Félix da Costa

Em termos desportivos, o belga Jérôme D’Ambrosio chega a Hong Kong na liderança do campeonato. Em segundo lugar está uma cara bem conhecida de Macau, António Félix da Costa. O português que venceu por duas vezes a prova de Fórmula 3 da RAEM triunfou na ronda de abertura do campeonato, na Arábia Saudita, e foi segundo classificado no México. A BMW Motorsport está bastante mais forte este ano e “Hong Kong sempre foi um bom circuito para para mim”, relembra o piloto de Cascais que foi 5º e 6º classificado, em 2016 e 2017, respectivamente. “A equipa está altamente motivada, como eu estou. Será a 50ª corrida da Fórmula E e tenho estado envolvido desde a primeira temporada. Isto é também algo que me orgulha”, afirmou o português.

Félix da Costa não é o único piloto lusófono numa grelha de partida de vinte e dois carros cheia de estrelas. O Brasil conta com quatro pilotos, todos eles ex-pilotos de Fórmula 1 e nomes sonantes do automobilismo “canarinho”. Para além de di Grassi, vencedor do Grande Prémio de Macau de Fórmula 3 em 2005, estarão também à partida Felipe Massa, com a Venturi, Filipe Nasr, com a Dragon, e Nelsinho Piquet Jr, com a Jaguar. Num evento condicionado a um só dia, a corrida principal está agendada para as 16h00.

Lançada agência para ligar o mundo literário lusófono ao asiático

Chama-se Capítulo Oriental, a nova agência literária dedicada a escritores lusófonos e asiáticos. Hélder Beja é o rosto por detrás do projecto, que incorpora também uma editora vocacionada para livros de e sobre Macau

[dropcap]F[/dropcap]oi oficialmente lançada ontem a Capítulo Oriental, descrita como a “primeira agência literária com o objectivo principal de trabalhar entre a Ásia e os países e territórios de língua portuguesa”. O novo projecto abraça também uma vertente editorial, vocacionada para obras de e sobre Macau, onde se encontra sediada. O primeiro título com a sua chancela vai ser lançado já em meados do mês, no âmbito do VIII Festival Literário – Rota das Letras, a ter lugar entre os próximos dias 15 e 24.

Hélder Beja, que, em 2018, deixou o cargo de director de programação do Rota das Letras, ao fim de sete anos, lidera a Capítulo Oriental realizando um sonho há muito almejado. “Este projecto surge muito no seguimento do que tem sido o meu trabalho ao longo da última década, dedicado e ligado à literatura dos países de língua portuguesa e também da Ásia. Era uma ideia que tinha há alguns anos, que foi preparada com calma”, explicou ao HM. Trabalhar entre “estes dois mundos enormes” figura como o principal intento da Capítulo Oriental, idealizada para dar a conhecer a “diferentes públicos” a carteira de mais de 60 autores, muitos deles premiados, de Macau, Hong Kong, Taiwan e China, Índia, Filipinas, Tailândia, Singapura, Malásia, Coreia do Sul ou Austrália, bem como de Portugal, Brasil, Moçambique, Cabo Verde ou Guiné Bissau, entre outros.

O projecto tem, na verdade, “quatro braços”, dado que, além da agência literária propriamente dita (o principal) e de editora, vai cobrir ainda as áreas de eventos e tradução. “A Capítulo Oriental pretende servir de ponte entre a Ásia e os países de língua portuguesa através do agenciamento de direitos autorais, incentivando traduções, promovendo a participação dos seus autores em festivais e feiras do livro, organizando eventos e publicando antologias multilingues em Macau”, diz um comunicado enviado às redacções pela recém-criada agência literária que, entretanto, assinou acordos com entidades congéneres, como a Bookoffice e a Storyspell (Portugal) e a MTS Agência (Brasil), bem como com editoras independentes.

O próximo passo será “trabalhar caso a caso, com os autores representados, tentando colocá-los em diferentes editoras de um lado e doutro, no sentido de tentar ter autores asiáticos traduzidos para a língua portuguesa e vice-versa”, indicou Hélder Beja, reconhecendo tratar-se de um “processo longo” que “não vai acontecer de um dia para o outro”.

Rampa de lançamento

Já a editora vai dar a conhecer-se ao público dentro de dias, com o lançamento dos primeiros dois títulos, ambos da autoria de escritores de Macau: “A Humidade dos Dias”, de Luís Mesquita de Melo, e “Vidro Imaculado”, livro trilingue de poesia, de Jenny-Lao Phillips. O primeiro vai ser lançado este mês, durante o Rota das Letras, enquanto o segundo tem publicação agendada para Abril. A “pequena” editora – como lhe chama Hélder Beja – “vai fazer um trabalho interessante”: “Além de autores de Macau, queremos publicar e traduzir autores que escrevem sobre Macau. Entre os autores que representamos há vários que têm obras sobre Macau ou relacionadas com Macau e, nesses casos, ponderamos mesmo vir nós a assumir a tradução e a edição dessas obras que têm ligação muito forte a Macau”. “Esses projectos estão já num ponto mais avançado e acredito que não demorará muito até que consigamos apresentar algo”, complementou.

A aventura dos cinco

Além do mentor e director, a Capítulo Oriental tem mais quatro elementos. Além de Helena Ramos (vocacionada para os países de língua portuguesa) e Annie Wang (vocacionada para os países asiáticos, em particular para a China), que trabalham directamente para o projecto, a agência literária tem outros dois sócios. Em causa “dois pequenos investidores” que Hélder Beja prefere não nomear.

À equipa ‘titular’ juntar-se-ão outras pessoas à medida que os projectos forem ganhando forma. “Há um grande grupo de pessoas que costumava trabalhar connosco – comigo acima de tudo – que trabalharão connosco sempre que haja projectos, sempre que for necessário”, explicou Hélder Beja, referindo-se a peças-chave como tradutores ou revisores de texto.

A Capítulo Oriental ganhou forma às expensas dos sócios, não contando, pelo menos na fase de arranque, com qualquer tipo de financiamento. “Neste momento, é o nosso trabalho e o nosso próprio investimento que está a levar a agência para a frente. Obviamente que, no futuro, a ideia é tentar encontrar os parceiros certos e os apoios necessários para os projectos”.

Huawei processa EUA por restrições à entrada de equipamentos

A empresa tecnológica chinesa Huawei anunciou ontem que vai processar o Governo dos Estados Unidos por ter proibido a compra dos equipamentos de telecomunicações pelos serviços públicos.

O gigante mundial de ‘smartphones’ abre, assim, uma frente judicial contra as suspeitas de alegada espionagem avançadas por Washington.

A Huawei indicou que o processo foi interposto em Plano, no estado do Texas (sul dos EUA), e visa a proibição imposta a diferentes serviços norte-americanos sobre a compra de equipamentos e serviços do grupo chinês, ou de trabalhar com empresas terceiras que sejam clientes.

“O Congresso dos Estados Unidos nunca foi capaz de fornecer qualquer prova que justifique as restrições aos produtos da Huawei. Somos forçados a tomar esta acção legal como último recurso”, disse Guo Ping, um dos responsáveis da empresa.

Em conferência de imprensa, na sede do grupo, em Shenzhen, no sul da China, Guo também acusou os Estados Unidos de ‘piratear’ servidores Huawei e de roubar ‘e-mails’.

Por outro lado, “se esta lei for retirada, como devia ser, a Huawei poderá levar para os Estados Unidos as tecnologias mais avançadas e ajudar o país a construir melhor as redes de 5G”, a quinta geração de tecnologia móvel, sublinhou.

Guo adiantou que o grupo chinês ia pedir o pagamento de compensações e juros pelas “restrições inconstitucionais” que visam a Huawei.

 

Guerra aberta

A Huawei, a segunda maior empresa de ‘smartphones’ do mundo, começou em 2019 uma agressiva campanha de comunicação para combater as acusações de Washington de que os equipamentos de telecomunicações do grupo podiam ser usados por Pequim para espiar outros países.

Os Estados Unidos proibiram a empresa, apesar de ser líder mundial neste campo, de participar na implantação da rede 5G em solo norte-americano. Ao mesmo tempo, estão a pressionar os aliados ocidentais a tomarem medidas semelhantes.

Na ofensiva contra a Huawei, Washington pretende também julgar a directora financeira, Meng Wanzhou, por violação das sanções contra o Irão.

Detida no início de Dezembro no Canadá e actualmente em liberdade condicional vigiada, Meng é também filha do fundador do grupo Ren Zhengfei, de 74 anos.

A próxima audiência do processo de Meng está marcada para 8 de Maio em Vancouver, onde foi detida durante uma escala entre dois voos.

Entretanto, dois canadianos foram detidos na China, por suspeita de terem posto em perigo a segurança nacional chinesa. A acção foi considerada por vários países ocidentais como uma medida de retaliação.

O domínio da Huawei nas telecomunicações e na implantação da rede 5G tem suscitado crescentes preocupações nos Estados Unidos, não só devido ao passado do fundador da empresa, um ex-engenheiro do exército chinês, como devido a uma lei que impõe aos grupos com sede social na China a prestar ajuda técnica aos serviços de informações.

Os Estados Unidos receiam que Pequim possa usar “backdoors”, portas de acesso aos equipamentos que podem, potencialmente, permitir espiar comunicações.

“Doença da altitude” justifica proibição de visitas ao Tibete

Num mês em que se assinalam aniversários de rebeliões contra o domínio chinês, Pequim restringiu ainda mais as visitas de estrangeiros à região

 

[dropcap]O[/dropcap] secretário do Partido Comunista Chinês no Tibete justificou a interdição do acesso de estrangeiros àquela região dos Himalaias, durante o mês de Março, com a possibilidade de os “visitantes sofrerem de doença da altitude”.

Citado pela imprensa local, o líder comunista no Tibete, Wu Yingjie, disse que as restrições são necessárias para “garantir a segurança” dos turistas.

Segundo confirmou a agência Lusa, as agências de viagens estão a recusar turistas estrangeiros em visitas ao Tibete, durante este mês, quando se celebra um par de aniversários sensíveis que questionam a legitimidade da soberania chinesa na região.

“Após considerarmos as condições geográficas e climáticas específicas [do Tibete], adoptámos uma série de regulamentações para as visitas de estrangeiros, de acordo com a lei”, disse.

No dia 10 de Março celebra-se o 60.º aniversário desde uma frustrada rebelião contra a administração chinesa, que terminou com o exílio na vizinha Índia do líder político e espiritual dos tibetanos, o Dalai Lama, que Pequim acusa de ter “uma postura separatista”.

E no dia 14 de Março de 2008, a capital da região autónoma do Tibete, Lhasa, foi palco de violentos ataques contra a presença chinesa, que resultaram em 18 mortos, segundo dados do Governo chinês. Um número desconhecido de tibetanos foi morto pelas tropas chinesas na sequência daquele incidente.

Além do visto chinês, os estrangeiros precisam de uma autorização especial para visitar o Tibete, uma exigência que as autoridades normalmente justificam com as “tradições únicas da etnia tibetana, o património cultural, a capacidade de receber turistas e as necessidades de proteção ambiental”.

Os turistas estrangeiros que querem visitar o Tibete, incluindo a capital Lhasa, têm de fazê-lo em grupo e acompanhados de um guia, e Pequim proíbe diplomatas e jornalistas estrangeiros de entrarem na região, excepto em visitas organizadas pelas autoridades ou pelo departamento de propaganda do Partido Comunista.

 

Diferendo secular

A China considera que a região é desde há séculos parte do território chinês.

Mas seguidores do Dalai Lama, o líder espiritual dos tibetanos, que em 1989 foi galardoado com o Prémio Nobel da Paz, acusam Pequim de tentar destruir a identidade religiosa e cultural do Tibete.

O secretário do PCC negou ainda que a população de cerca 3,3 milhões tibetanos apoie o Dalai Lama.

“O Dalai Lama não trouxe nada de bom para o povo tibetano. Embora no estrangeiro ele tenha algum apoio, os tibetanos estão muito gratos pela prosperidade que o Partido Comunista trouxe”, disse.

Segundo a organização com sede em Washington International Campaign for Tibet, mais de 150 tibetanos imolaram-se pelo fogo, desde Fevereiro de 2009, em protestos contra o que classificam de opressão do Governo Chinês.

Tufão Hato passa a denominar-se “Yamaneko”

[dropcap]O[/dropcap] anúncio foi feito ontem pelos Serviços Meteorológicos e Geofísicos (SMG): o “Hato” vai designar-se oficialmente “Yamaneko”. Traduzindo do japonês, a origem de ambos os nomes, o tufão, que atingiu Macau em 23 de Agosto de 2017, passa de “pombo do céu” para “gato bravo”.

A nova nomenclatura foi aprovada na 51.ª Conferência Geral do Comité dos Tufões, realizada em Cantão entre 26 de Fevereiro e 1 de Março, mas apenas anunciada ontem pelos SMG em comunicado. O Hato – o mais forte tufão a atingir Macau em mais de meio século, que ceifou dez vidas e causou prejuízos na ordem de 12,5 mil milhões de patacas – não foi, porém, o único a ser rebaptizado. Na reunião, de quatro dias, os membros do Comité dos Tufões aprovaram ainda os nomes “Yun-yeung”, fornecido por Hong Kong, e “Koinu”, proposto pelo Japão, em substituição de “Kai-tak” e “Tembin”, tempestades tropicais que provocaram sérios danos em 2017.

Já o “Mangkhut”, que atingiu a RAEM em Setembro último, viu o seu nome ser excluído permanentemente, à semelhança do que sucedeu com a “Rumbia”, outra tempestade tropical severa de 2018.

Os nomes dos ciclones tropicais no Noroeste do Pacífico e no Mar do Sul da China são elaborados e aprovados pelo Comité dos Tufões, com cada um dos membros a fornecer dez nomes por uma determinada ordem. Com efeito, “quando um tufão causa grandes prejuízos a um ou mais membros, os que sofreram prejuízos podem solicitar ao Comité dos Tufões a remoção definitiva do nome do tufão, deixando de ser utilizado”, explicam os SMG na mesma nota de imprensa.

O Comité dos Tufões foi criado em 1968 pela UNESCAP (Comissão Económica e Social para a Ásia e o Pacífico das Nações Unidas) e pela Organização Meteorológica Mundial, com a missão de reduzir as perdas por desastres causados por tufões na região Ásia-Pacífico. Actualmente, conta com 14 membros nacionais e regionais. A delegação da RAEM foi liderada pelo director substituto dos SMG, Tang Iu Man.

Governo constrói ligação directa entre Zona A e Av. do Nordeste

O Executivo anunciou a construção de uma ponte e um viaduto para aliviar o trânsito na Zona da Pérola Oriental agravado pela Ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau. O projecto foi apresentado ontem ao Conselho Consultivo de Trânsito

 

 

[dropcap]U[/dropcap]ma ponte que faz a ligação directa entre a Zona A e a Avenida do Nordeste e que permite evitar a Rotunda da Amizade. A estrutura é depois completada com um novo viaduto que vai ligar a Avenida do Nordeste à Avenida Ponte da Amizade, também de forma a evitar a rotunda. É esta a solução do Governo para aliviar os congestionamentos naquela zona causados pela abertura da Ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau.

O projecto foi discutido ontem no Conselho Consultivo de Trânsito e no final foi apresentado por Lam Hin San, que dirige a Direcção de Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT). “Na reunião discutimos o reordenamento rodoviário da zona junto à Rotunda da Amizade. Apresentámos duas soluções, uma com a travessia em forma de ‘S’ e outra em recta”, começou por revelar o director da DSAT. “Mas como o projecto em forma de ‘S’ era mais perigoso e tinha menos segurança, também porque temos de pensar nos motociclos, optámos pela travessia com uma via recta”, explicou.

Segundo o director da DSAT, outra das vantagens deste projecto é permitir a conclusão dos trabalhos mais rapidamente, encurtando o prazo em cerca de quatro meses. A obra vai ser feita em duas fases distintas.

“A primeira fase vai fazer a ligação entre a Avenida do Nordeste e a Zona A, vai passar por cima da Ponte da Amizade. A segunda fase vai fazer a ligação entre a Avenida do Nordeste e a Avenida Ponte da Amizade, e não passa pelo mar”, explicou.

Além da passagem de viaturas, as ligações com a Zona A vão permitir a circulação de peões: “Pensámos na densidade populacional da Zona A no futuro e que muitas dessas pessoas pretendem deslocar-se a pé. Por isso teremos instalações para que possam atravessar a ponte a pé”, explicou.

Neste momento, o Governo ainda está a preparar o concurso público pelo que não há orçamento nem tempo previsto para as obras. Mesmo assim, Lam Hin San acredita que a primeira fase esteja concluída dentro de um ano e meio.

 

Falta de condutores

Ontem, na reunião do Conselho Consultivo do Trânsito (CCT) foi também abordada a situação dos condutores dos transportes públicos. De acordo com os dados apresentados pelo director da DSAT, actualmente há quase 1400 motoristas de autocarros disponíveis. Porém, o número de passageiros não para de aumentar, ajudado pelo volume de turistas, levando a DSAT a falar num problema de sustentabilidade.

“Actualmente, o número de motoristas de autocarro não chega a 1400, ainda há falta de 400 motoristas. No futuro, mais ou menos, 20 por cento dos condutores vão-se aposentar. Com o crescimento do número de passageiros e turistas, acaba por haver uma grande falta de mão-de-obra”, explicou Lam Hin San. “É muito difícil conseguir contratar condutores. Houve representantes das empresas de autocarros a referir que o salário médio desses condutores é de 29 mil e há mesmo condutores que recebem 40 mil por mês”, acrescentou.

 

 

“Cruzamento da morte” bloqueado

De acordo com o director da DSAT, Lam Hin San, o cruzamento na Avenida Marginal da Flor de Lótus, onde na sexta-feira morreu uma jovem de 22 anos, vai continuar bloqueado, temporariamente. “Em conjunto com a polícia, bloqueámos a estrada. Estamos a rever a segurança do local e se verificarmos, como em qualquer outra estrada, que há riscos que não conseguimos reduzir ou eliminar, então o bloqueio pode ser permanente. Até vermos o que vamos fazer, essa estrada fica bloqueada”, informou Lam Hin San.

 

 

 

Novos radares na ponte

O Governo planeia instalar novos radares de velocidade na Ponte da Amizade, afirmou ontem Lam Hin Sam. O objectivo é aumentar a segurança dos condutores. “Vamos instalar mais radares de velocidade. Discutimos no Conselho Consultivo de Trânsito e concluímos que é uma medida que pode proteger os residentes. Foi uma opinião unânime”, disse o director da DSAT. O limite de velocidade não sofre alterações, com o máximo a ser de 80 km/h no tabuleiro e de 40 km/h no acesso.

 

DST promove Macau na feira de tursimo ITB Berlin

[dropcap]T[/dropcap]ermina no domingo a feira internacional ITB Berlin dedicada ao turismo, onde se encontra uma delegação da Direcção dos Serviços de Turismo (DST) com o intuito de promover Macau como destino turístico. A intenção passa por atrair mais visitantes internacionais interessados em explorar o mercado de viagens de longo curso numa das maiores feiras de turismo do mundo.

O expositor de Macau, com 63 metros quadrados, tem como tema “Sentir Macau Ao Seu Estilo” que pretende apresentar os principais pontos turísticos do território, assim como evidenciar o charme da Cidade Criativa da UNESCO em Gastronomia. A juntar ao stand dedicado a Macau, a DST, o Departamento de Cultura e Turismo de Guangdong e a Administração do Turismo de Hong Kong têm também um expositor conjunto para promover as atracções turísticas da Grande Baía.

Em comunicado, a DST revela que se reuniu com operadores turísticos internacionais com o objectivo de reforçar ligações “e atrair mais visitantes de diferentes mercados para Macau”.

A ITB Berlin reúne todos os anos cerca de 10 mil expositores oriundos de mais de 180 países e territórios. No ano passado, passaram pela feira mais de 170 mil visitantes.

Infracções nos casinos com tabaco subiram 21,2% até Fevereiro

[dropcap]D[/dropcap]urante os primeiros dois meses do ano, 320 pessoas foram apanhadas a fumar em locais proibidos dentro dos casinos, aliás, o tipo de estabelecimento com o maior número de infracções à Lei de Prevenção e Controlo do Tabagismo, informaram ontem os Serviços de Saúde em comunicado.

As infracções – mais 56 ou mais 21,2 por cento em termos anuais homólogos – foram detectadas na sequência de 427 inspecções, levadas a cabo em conjunto com a Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ), o triplo (ou mais 289) face a igual período do ano passado. Em termos globais, ascenderam a 1.032 as infracções sinalizadas até Fevereiro, das quais seis relativas a ilegalidades nos rótulos dos produtos de tabaco. Segundo os Serviços de Saúde, 760 (ou 73,6 por cento) das 1.032 pessoas sancionadas por fumarem em zonas interditas já pagaram as multas.

A maioria dos infractores é do sexo masculino (957) e sensivelmente sete em cada dez turistas (713), indica o mesmo comunicado, dando conta de que foi preciso o apoio das forças de segurança na hora de aplicar as multas em 18 casos.

Governo recusa fazer consulta pública sobre reconhecimento mútuo

Actualmente, 40 mil residentes de Macau já têm carta de condução do Interior da China. No entanto, o director dos Serviços para os Assuntos de Tráfego defende que o reconhecimento vai facilitar a vida dos mais jovens, que querem conduzir na Grande Baía

 

 

[dropcap]A[/dropcap] questão já foi muito debatida, as opiniões são conhecidas e por esse motivo o director da Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT), Lam Hin San, recusa fazer uma consulta pública sobre o reconhecimento mútuo das cartas de condução entre Macau e o Interior da China. A posição foi tomada, ontem, após uma reunião do Conselho Consultivo do Trânsito (CCT).

“A discussão foi lançada em 2013 e já passaram seis anos. Tanto na Assembleia Legislativa, como na Internet e em diferentes ocasiões houve muitos debates e discussões sobre o assunto”, justificou Lam Hin San. “Compreendemos que os cidadãos dão muita importância à segurança, e nós estamos a fazer uma consulta pública sobre a lei do trânsito rodoviário em que podem partilhar opiniões. Mesmo na elaboração das leis, nós fazemos todos os possíveis para garantir a segurança”, completou.

Segundo o cenário traçado pelo director da DSAT, quando for aprovado o reconhecimento vai haver campanhas para sensibilizar os condutores do Interior da China. “Em relação aos cidadãos do Interior da China, vamos aumentar as campanhas de sensibilização das regras de Macau, para que conduzam de uma forma mais segura”, explicou.

Nos últimos tempos surgiram mais vozes a pedir a consulta pública sobre um tema que está longe de gerar consenso e que motiva uma manifestação marcada para amanhã. Apesar da autorização para a assinatura do acordo de reconhecimento mútuo ter sido concedida em Abril de 2017, pelo Chefe do Executivo ao secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo do Rosário, o processo não conheceu novos desenvolvimento. Ontem, Lam Hin Sai voltou a dizer que não há uma data prevista para a conclusão do acordo.

“É um problema do procedimento. Ainda não temos qualquer novidade, é preciso tempo para o andamento do procedimento. Espero que possam entender a situação”, afirmou sobre os trabalhos. “Neste momento, não há qualquer novidade”, complementou.

 

Facilitar vidas

Lam Hin San sublinhou que o acordo tem como objectivo melhorar a vida da população, principalmente dos mais novos. “Espero que os cidadãos possam entender que a nossa intenção é facilitar as suas vidas, para que se possam deslocar ao Interior da China e conduzir, principalmente aos mais jovens”, argumentou

O director da DSAT revelou também que, actualmente, já 40 mil cidadãos de Macau têm carta de Condução do Interior da China. Por outro lado, afirmou que 250 mil residentes têm carta de condução de Macau e poderão ser potenciais beneficiados. “Para essas pessoas que não têm carta de condução do Interior da China é mais conveniente, caso queiram deslocar-se lá, nomeadamente para o desenvolvimento dos jovens. Temos de criar melhores condições para eles”, frisou.

Lam Hin San avançou ainda que entre 2015 e 2018 o número de condutores estrangeiros em Macau, que utilizaram os acordos de reconhecimento de cartas de condução, caiu de 8.000 para 6.000. Por outro lado, explicou que há 2.300 condutores do Interior da China a conduzirem em Macau, com utilização do reconhecimento de cartas com Hong Kong.

Ao mesmo tempo, explicou que ao longo dos últimos três anos o número de pedidos de Macau para cartas internacionais, que permite aos cidadãos conduzir no estrangeiro, foi de 24 mil por ano.

Grande Baía pode colmatar lacunas de Macau

[dropcap]Z[/dropcap]hang Xiaoming, director do Gabinete para os Assuntos de Hong Kong e Macau do Conselho de Estado chinês, acha que Macau e Hong Kong podem “resolver, com eficácia, problemas de longa data e conflitos profundos quando tiverem oportunidade de trabalhar em conjunto com as nove cidades do Interior da China” que formam o projecto de integração da Grande Baía. O director considera que a complementaridade que o plano implica irá “fortalecer” as duas regiões administrativas especiais e “fomentar o desenvolvimento de forma coordenada e integrada”.

Zhang não revelou os problemas e conflitos que devem ser resolvidos, mas durante a apresentação das linhas gerais do plano estratégico foi apontada a Macau a tarefa de promover a diversificação da economia, além do desenvolvimento da plataforma com os países de língua portuguesa.

Por um lado, o projecto da Grande Baía “trilha o caminho para a abertura total do país e cria um novo motor de crescimento sustentado. Por outro lado, acrescenta um novo espaço que pretende acelerar o desenvolvimento económico de Hong Kong e Macau”, teorizou Zhang Xiaoming.

O líder do Gabinete para os Assuntos de Hong Kong e Macau do Conselho de Estado chinês reiterou ainda que “se deve insistir no princípio de “Um País”, ao mesmo tempo que se respeitam os “Dois Sistemas”.

Zhang aproveitou ainda para reforçar a confiança “na sabedoria e capacidade dos compatriotas de Hong Kong e Macau para governar as suas cidades”.

Novo Macau adere ao protesto de amanhã contra o reconhecimento mútuo das cartas de condução

A Associação Novo Macau vai juntar-se ao protesto de amanhã contra os motoristas ilegais, alertando para as “bombas-relógio” da estrada. O reconhecimento mútuo das cartas de condução com a China, cujas negociações se encontram em curso, constitui o outro foco de contestação

 

[dropcap]C[/dropcap]astigar os condutores ilegais, abaixo o reconhecimento mútuo das cartas de condução” figura como o ‘slogan’ do protesto que sai amanhã à rua. A manifestação vai contar com a Associação Novo Macau que pretende renovar o apelo ao Chefe do Executivo para que suspenda o reconhecimento mútuo das cartas de condução com a China, cujas negociações decorrem há pelo menos um ano, até à realização de uma consulta pública. A Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT) descarta essa possibilidade (VER PÁGINA AO LADO).

A Novo Macau, que tem como vice-presidente Sulu Sou, junta-se assim ao protesto convocado pelos deputados Ng Kuok Cheong e Au Kam San, que reúne ainda o apoio dos quatro deputados dos Operários (Ella Lei, Lam Lon Wai, Lei Chan U e Leong Sun Iok), que ontem manifestaram publicamente estar ao lado dos promotores da iniciativa.

O protesto foi convocado após o trágico acidente que colheu a vida a uma estudante de 22 anos, resultante do choque provocado por uma carrinha de uma empresa ‘junket’ contra a moto em que seguia. A Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL) lançou uma investigação, que estima demorar um mês a concluir, para apurar se o condutor era trabalhador não residente da China e se tinha autorização para desempenhar a função de motorista.

Embora reconhecendo que a morte da jovem foi o “ponto de partida”, Sulu Sou deixou claro que o objectivo do protesto é “pôr as pessoas a discutir” o tema e a própria lei. “Não queremos usar um acidente individual para promover a manifestação”, afirmou, durante uma conferência de imprensa realizada ontem pela Novo Macau que descreve os motoristas ilegais como “bombas-relógio da estrada”.

Dados facultados pela associação revelam que, em 2017, durante inspecções a 1.243 automóveis, a polícia interceptou 73 motoristas ilegais. Um rácio que não é “de todo baixo” e que pode nem sequer ser representativo da realidade. Neste sentido, uma das principais críticas vai para a falta de aplicação da lei, com Sulu Sou a pôr em causa o poder ou a capacidade de investigação das autoridades: “Não podemos aceitar o desempenho do Governo”.

Fraca dissuasão

Outra lacuna tem que ver com a dissuasão. À luz da lei, caso o empregador “utilize trabalhadores não residentes em actividade profissional alheia à autorizada”, é punido com multa de 5.000 a 10.000 patacas. Se a situação for “grave”, a lei prevê ainda a revogação total ou parcial das autorizações de contratação de trabalhadores não residentes concedidas. As empresas podem ainda ficar privadas de pedir novas autorizações durante um período de seis meses a dois anos. Ora, segundo a Associação Novo Macau, em 2017, foram 154 os empregadores punidos por terem motoristas ilegais ao seu serviço, mas apenas nove autorizações de quatro empregadores foram anuladas.

Para a Novo Macau existem ainda “abusos” relativamente ao decreto-lei, de 1984, à luz do qual os cidadãos da China podem obter uma licença de condução especial, com validade de um ano, renovável, desde que apresentem uma declaração do representante legal em Macau das empresas sediadas do outro lado da fronteira: “Muitos dos portadores de licença de condução especial estão a conduzir ilegalmente os ‘shuttles’ dos casinos”.

Culturas diferentes

Problemas que levam ao outro mote do protesto: o reconhecimento mútuo das cartas de condução. “Tem de ser sublinhado que mesmo antes do esquema [de reconhecimento mútuo das cartas de condução com a China] ter sido assinado e aplicado, os motoristas ilegais da China, que têm uma cultura e um estilo de condução diferentes, têm-se tornado uma potencial ameaça ao tráfego de Macau, como resultado de vazios legais e da falta de aplicação da lei”. Neste sentido, “se o reconhecimento mútuo de cartas de condução, se tornar uma realidade, mais de 300 milhões de condutores da China podem guiar em Macau sem efectuar qualquer exame. A aplicação da lei vai ser mais difícil e o trânsito em Macau menos seguro”, alerta a Novo Macau. A manifestação, que arranca pelas 15h, parte do Jardim de Vasco da Gama, terminado na sede do Governo com a entrega de petições.

Leong Sun Iok pede disciplina para ensinar jovens a cumprir a lei

[dropcap]O[/dropcap] deputado Leong Sun Iok quer saber se o Governo pondera a inclusão de uma disciplina obrigatória no ensino secundário capaz de dar a conhecer aos jovens os procedimentos legais a que possam estar sujeitos em caso de desobediência à lei.

O objectivo é educar os mais novos para a “obediência, reduzindo assim a delinquência juvenil e o bullying escolar”, aponta em interpelação escrita.

Para Leong, trata-se de uma necessidade premente tendo em conta o aumento da criminalidade registado no ano passado entre as camadas mais jovens. O deputado recorda que de “entre os dados da criminalidade apresentados pela Secretaria para a Segurança, em 2018 existiram 61 casos que envolveram 92 pessoas”. Trata-se de um aumento preocupante, sublinha, visto que “em comparação com os 45 casos registados em 2017, envolvendo 53 pessoas, há uma acréscimo de 35,6 por cento na criminalidade praticada pelos jovens de Macau”, aponta.

 

Estudo obrigatório

Para combater a situação, Leong Sun Iok considera necessária a criação de uma disciplina de carácter obrigatório no ensino secundário de modo a educar os jovens para o cumprimento da lei. “Posso perguntar ao Executivo se está a equacionar a inclusão de uma disciplina de educação jurídica, fixa no currículo, para cultivar a consciência correcta dos alunos sobre a obediência à lei desde cedo?”, questiona.

Por outro lado, é necessário avaliar os mecanismos que promovem a comunicação eficaz entre escolas, pais e jovens, para evitar situações de desobediência à lei, acrescenta.

Outro aspecto abordado foi o crescente número de casos de crimes sexuais contra os mais novos, sendo que um terço acontece em meio escolar. Neste sentido, Leong Sun Iok apela a uma maior fiscalização das escolas acerca do cumprimento das directrizes que têm sido dadas pela Direcção dos Serviços de Educação e Juventude com o fim de alertar os alunos para a ocorrência de abusos.

Fundo de Pensões com défice de 570 milhões em 2018

No ano passado o Fundo de Pensões registou um défice de 570 milhões de patacas. Se o cenário de perdas continuar, o organismo fica sem activos disponíveis em 2031. A solução poderá passar por um injecção de capital a considerar nas despesas do orçamento para 2020

 

[dropcap]O[/dropcap] Fundo de Pensões de Macau registou, em 2018, um défice de 570 milhões de patacas. A informação foi deixada ontem pela nova presidente do organismo, Ermelinda Xavier, à margem da cerimónia de tomada de posse. “De facto registámos um défice de 800 milhões de patacas em 2015 e no ano passado um défice de cerca de 570 milhões de patacas”, disse. No entanto para a responsável não se trata de “uma situação de grande alarme”. De acordo com Ermelinda Xavier, “no ano passado houve um défice de um montante bastante elevado, mas no futuro o objectivo é continuar a melhorar a situação”.

Na calha, está um pedido de injecção de capitais por parte do Governo para 2020. “Estamos a analisar a possibilidade de haver transferências extraordinárias. Este ano, provavelmente não, porque estamos já em Março. Mas talvez no ano que vem”, apontou.

Entretanto, Ermelinda Teixeira reitera que se as contribuições continuarem a não cobrir as despesas do Fundo de Pensões, em 2031 o organismo pode ver os seus activos esgotados. “Apesar do défice apresentado, não há razões para alarme porque em termos de liquidez estamos numa situação satisfatória, até 2031”, sublinhou.

 

Alertas antigos

Recorde-se que em Junho do ano passado a Comissão de Acompanhamento para os Assuntos de Finanças Públicas da Assembleia Legislativa alertou para as dificuldades do Fundo. “Em 2022, [o Fundo de Pensões] vai ficar exaurido de disponibilidades em caixa, o que quer dizer que as contribuições não dão para cobrir as prestações que tem que pagar” e, “em 2031, vai ficar sem activos”, explicou o presidente da comissão, Mak Soi Kun, citando projecções feitas pelo Executivo em 2012.

De modo a garantir uma maior sustentabilidade, o organismo vai rever as políticas de investimento que tem vindo a adoptar. “Em relação aos activos, tínhamos investimentos mais conservadores, e vamos rever se esta política tem necessidade de ser mudada”.

Para o efeito há que ter em conta a situação internacional do mercado financeiro, “em que existem muitas situações imprevistas”. “Estamos  numa guerra comercial entre a China e os EUA pelo que temos que considerar estas situações”, apontou Ermelinda Xavier. Por isso, “vou fazer uma revisão mais profunda da situação em que estamos. Vamos também proceder a uma nova locação de activos, diversificando os nossos investimentos, não só aplicando os fundos em acções ou obrigações”, disse.

Entretanto, a colecção de arte japonesa, avaliada em 13,6 milhões de patacas e que se encontra guardado nos cofres do Banco Nacional Ultramarino tem um “peso insignificante”, tendo sido adquirida “apenas” para “diversificar o portfólio”.

No que respeita ao Regime de Previdência, o Fundo de Pensões vai apostar nas novas tecnologias para facilitar o acesso dos contribuintes ao sistema. “Hoje em dia tudo é electrónico e nós vamos fazer o nosso melhor neste sentido”, referiu a responsável.

Actualmente, há 3300 trabalhadores aposentados e cerca de 500 beneficiários da pensão de sobrevivência.

Angela Leong pede informações sobre combate a pensões ilegais

[dropcap]A[/dropcap] deputada Angela Leong quer que o Governo faça um ponto de situação dos trabalhos sobre a criminalização das pensões ilegais e aumente as medidas de combate a este fenómeno. Numa interpelação divulgada ontem, a legisladora pergunta ao Executivo o que foi feito até agora pelo grupo de trabalho que está a estudar a criminalização das pensões ilegais.

Este assunto dividiu o Executivo, com o secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, a defender a criminalização, enquanto o secretário para a Segurança, Wong Sio Chak, defendeu que a infracção administrativa, que normalmente se traduz em multa, é suficiente para combater o fenómeno.

No que diz respeito à criminalização, a quarta mulher de Stanley Ho pergunta se o grupo vai ouvir as opiniões da comunidade, dos gestores de condomínios e ainda proprietários. Segundo a deputada, estas opiniões são importantes para garantir apoio alargado da população.

Por outro lado, Leong revela preocupações com as medidas tomadas para reforçar a fiscalização às pensões ilegais. “Há novos desafios no combate às pensões ilegais, como a abertura da nova fronteira na ponte, como é que as autoridades vão reforçar as capacidades de investigação e inspecção de pensões ilegais?”, pergunta. “E em relação aos portais online que são utilizados por estas pensões ilegais, que medidas estão a ser tomadas para que não possam operar?”, acrescenta.

 

Inocente em 2015

Ainda em relação aos mecanismos das autoridades, a deputada pede que lhe seja fornecida informação sobre a execução das medidas de patrulhamento em edifícios, mecanismos de denúncia e medidas de aproximação dos gestores de condomínios, que são tidos como fundamentais para o combate às pensões ilegais.

Recorde-se que em Maio de 2015, um apartamento detido por Angela Leong, no Edifício Lake View, foi alvo de uma operação das autoridades e detectou-se estar a ser utilizado como pensão ilegal. Os inquilinos ilegais pagavam pela utilização do espaço entre 182 patacas e as 609 patacas, por dia.

Na altura, a deputada sempre negou desconhecer o que se passava e responsabilizou o arrendatário pelo destino da fracção habitacional. A versão de Angela Leong foi acolhida pelas autoridades que multaram o arrendatário no valor mínimo permitido, ou seja, de 200 mil patacas. O valor máximo da multa seria de 800 mil patacas.

Sanções diferentes para restaurantes dentro e fora de hotéis

A proposta de lei da actividade dos estabelecimentos hoteleiros estabelece multas diferentes para restaurantes consoante se situem dentro ou fora de hotéis. Os deputados que analisam o diploma na especialidade querem saber a razão

 

 

[dropcap]A[/dropcap]s multas a aplicar a restaurantes que estejam abertos sem licença para operar são maiores se estiverem localizados dentro de hotéis. De acordo com a proposta de lei da actividade dos estabelecimentos hoteleiros, as sanções para as restaurantes e bares situados em hotéis podem variar entre as 100 e as 150 mil patacas, enquanto os estabelecimentos fora destes empreendimentos continuam a ser regulamentadas pelo Decreto-Lei n.º 16/96/M, actualmente em vigor. Para estes casos, as multas estão fixadas entre 10 e 30 mil patacas.

Esta situação não é bem aceite pelos os deputados da 2ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa que analisam na especialidade a proposta de lei. “Temos de perguntar ao Governo porque é que há multas diferentes para os estabelecimentos dentro e fora dos hotéis”, apontou o presidente da comissão, Chan Chak Mo. “Acham que os que estão dentro dos hotéis são mais ricos?” questionou. É de salientar, que o deputado é também presidente da União das Associações dos Proprietários de Estabelecimentos de Restauração e Bebidas de Macau e proprietário de diversos restaurantes no território e fora dele.

 

Procedimentos simplificados

A partir da entrada em vigor do novo diploma, as unidades de restauração situadas dentro de hotéis, independentemente da sua dimensão e características, passam a ser apenas licenciadas pela Direcção dos Serviços de Turismo (DST). Com a lei que está agora em vigor, “era muito confuso saber quem emitia as licenças, se a DST ou se o Instituto para os Assuntos Municipais (IAM)”, aponta Chan. “Com esta classificação agora é simples. Se está dentro dos hotéis vai à DST”, disse.

No exterior, as licenças continuam a ser emitidas de acordo com o decreto lei de 1996 pelos dois organismos, tendo em conta as características dos estabelecimentos – por exemplo “a DST emite para restaurantes de luxo e o IAM para pequenos cafés”.

Outra questão abordada na reunião de ontem prende-se com a possibilidade de inspecções que permitam a entrada de agentes dos serviços de turismo nos quartos de hotel. Faz parte das competências da DST “aceder a todas as instalações para realizar inspecções e na lei que tem estado em vigor, os serviços só podem aceder “aos espaços públicos ou de serviço”, disse Chan Chak Mo. De acordo com a assessoria da comissão, os quartos de hotel passam a poder ser visitados pela DST, mas os deputados querem que o Governo esclareça esta questão.

Liu Sha, maestro e director musical da Orquestra Chinesa de Macau: “A música é emoção e paixão”

[dropcap]A[/dropcap]os 40 anos, Liu Sha assumiu pela primeira vez, o papel de director musical na Orquestra Chinesa de Macau, que também dirige como maestro. Aluno de topo do Conservatório Central de Música, em Pequim, Liu Sha já conduziu 43 orquestras com a visível paixão que o caracteriza. Com origens humildes e juventude marcada por amarguras, o propósito do maestro é levar ao público a beleza da música e o sentimento da melodia

 

 

Como começou a sua relação com a música?

O meu pai era músico e a minha mãe gostava muito de cantar. Durante a minha infância, visitava frequentemente salas de ensaio de teatro chinês. Via também muitos concertos. Nasci em Jinan, a capital da província de Shandong. Lembro-me do primeiro concerto que vi de uma orquestra sinfónica, originária dos Estados Unidos. Acho que devia ter cerca de 6 anos de idade e fiquei fascinando com o músico que tocava os címbalos. Impressionou-me muito. Apesar do gosto que ficou, o meu pai não queria que eu estudasse música, achava que a estrada da música era complicada, difícil de percorrer e não levava a muito dinheiro. Ainda assim, estudei piano com cerca de nove anos de idade, o que em termos de formação é muito tarde, mas gostei muito. Na altura, havia um pianista francês muito famoso, Richard Clayderman. Apesar de não ser clássico e ser mais pop, as suas composições eram muito boas. Portanto, quis aprender a tocar piano. Mas o concerto mais importante a que assisti, em 1993, foi o Concerto de Ano Novo, pela Filarmónica de Viena. O maestro era o italiano Riccardo Muti. Marcou-me imenso e apresentou-me à figura do maestro. Aquilo é que era ser maestro. Achei espectacular e poderoso. Outra coisa aspecto importante foi aperceber-me que são precisos dez dedos só para tocar piano, mas uma batuta consegue controlar tudo. Excelente!

 

Foi aí que decidiu seguir a carreira de maestro…

O problema é que nasci e cresci em Jinan. Não sabia por onde começar para estudar para ser maestro. Na altura, só havia dois locais onde podia seguir os estudos necessários: os conservatórios de Pequim e Xangai. Tinha apenas 13 ou 14 anos e ambas as cidades eram muito longe. Ainda assim, decidi que era isso que queria. O passo que dei foi escrever a muitos professores de música, aos que tinha ouvido falar. Até que um dia, um professor do Conservatório Central de Música, em Pequim, respondeu. Escreveu-me: “jovem rapaz, querer estudar é muito bom, mas tens de ter em mente que é um percurso extremamente difícil, um dos mais difíceis no mundo da música”. Na carta escreveu a morada de casa e telefone e disse-me que se eu queria mesmo estudar devia pedir aos meus pais para me levarem para Pequim.

 

 

Como disse aos seus pais que queria seguir estudos para maestro?

Uma noite, depois do jantar, falei com eles. “Mamã, papá, por favor, sentem-se. Preciso de falar convosco porque tenho uma decisão importante para tomar.” Então, mostrei-lhes a carta do professor. Não disseram uma única palavra. Este período da minha vida foi muito complicado, porque perdi os meus pais. Três anos depois de entrar no Conservatório Central de Música, a minha mãe morreu. Eles não tinham palavras porque estudar para maestro é uma área que necessita de muitos estudos, principalmente piano, audição, canto, teoria musical, harmonia. A minha família era pobre e a minha mãe teve de pedir muito dinheiro emprestado para me enviar para Pequim. Eles ficaram felizes com a carta, mas eram tempos difíceis. Três anos depois chegara a altura para fazer os exames de admissão ao conservatório, depois de completar o secundário. A minha mãe estava doente no hospital e o meu pai estava a tomar conta dela. Tinha 17 anos quando fui de comboio para Xangai, era a minha primeira vez em Xangai, não conhecia lá ninguém e não fazia ideia como chegar ao conservatório. Fiz o exame e fui o aluno melhor classificado. De repente, reparei que o segundo dia de exames era em Pequim. Como conseguiria chegar a Pequim? Não sabia comprar bilhetes de avião, nem como apanhar um avião, não sabia nada disto. Perguntei a muitas pessoas. Cerca da meia-noite desse dia, aterrei em Pequim. Na manhã seguinte fiz o exame e também fiquei em primeiro lugar. Quatro dias depois de receber a carta a dar-me os parabéns pela admissão no conservatório, a minha mãe morreu. Foi um período difícil. No entanto, estava a dar passos importantes para a realização do meu sonho.

 

 

Como foi realizar esse sonho e poder levá-lo ao público?

Para mim, a música é emoção e paixão. Amigos e professores dizem que quando estou a dirigir uma orquestra que sentem a minha paixão. Mas no início, os nervos tomavam conta de mim. Quando me formei, e era um jovem maestro apenas com um ou dois concertos no meu currículo, ficava muito tenso. Antes do primeiro concerto que dirigi queria morrer, a batuta tremia, as mãos estavam suadas, foram momentos de grande tensão. Começaram a surgir ideias estranhas na minha mente, como “e se em dirigir mal a orquestra, o que faço a seguir?” Isto aconteceu em 1999, estava prestes a conduzir a orquestra de estudantes do Conservatório Central de Música. A obra era uma composição para orquestra chinesa. Quando o concerto começou, entrei num estado mágico. Um músico disse-me depois que estava a cantar a música tão alto, quase ao nível de volume da orquestra. Foi um momento de muita excitação e intensidade. E o tempo da música, os compassos, cada vez mais rápidos. Não conseguia controlar-me, nem a velocidade da música.

 

 

Os dias de nervosismo ficaram para trás, mesmo antes da estreia de um espectáculo?

Hoje em dia não sinto tensão, apenas esperança e excitação. Mesmo que seja o primeiro concerto de uma nova composição já não entro nervoso em palco, porque há 14 anos que conduzo orquestras e já dirigi cerca de 300 novas obras. Nove anos depois de me formar, estudei orquestra sinfónica e ópera no conservatório de São Petersburgo. Estudei técnicas e estilo russo, uma aprendizagem que incidiu sobre obras antigas. As composições para orquestra chinesa não param de ser escritas e existem apenas no papel, em pauta, sem um CD, ou gravação. Se quiser conduzir Mozart, Brahms, Beethoven, posso ouvir um CD.

 

 

Quais os passos necessários para preparar um concerto?

Ser maestro é muito difícil, antes dos ensaios é necessária muita preparação. Preciso, talvez entre um mês ou um ano, para conhecer o repertório da peça que vou conduzir. Preciso tirar a melodia do papel para o piano. Quando não me sinto muito confortável com a música vejo-me obrigado a falar com o compositor, encontrar-me com ele para saber como ele “canta” a obra. O segundo passo é saber como posso transportar para a orquestra a minha paixão, as minhas ideias e a minha arte. Em casa, penso estes aspectos ao mais ínfimo detalhe. O terceiro passo é na sala de ensaio. Uso os meus braços para conduzir, uso a língua e a emoção para explicar do que se trata a obra, o seu significado.

 

 

Como tem sido a experiência como maestro e director musical da Orquestra Chinesa de Macau?

É a primeira vez que trabalho numa posição de gestão. Planear a próxima temporada e a temporada a seguir em termos de direcção musical é um novo desafio. Estou a gostar bastante e isso transparece para os músicos. Quando cheguei encontrei-os muitos fechados, quase sem emoção, apenas a tocar como um trabalho para ganhar um salário. Hoje em dia, acho que estão mais felizes a tocar. Esse aspecto é muito importante para mim. Em termos musicais, antes o som da orquestra soava um pouco rígido. Agora, parece mais relaxado, tranquilo.

 

 

Quando chegou a Macau disse que gostaria que os músicos tocassem com paixão. Como se consegue arrancar essa emoção dos músicos?

Primeiro, tive de inspirar e encorajá-lo, explicar a obra e o que precisamos fazer em termos técnicos. Depois, é importante deixar claro que eu é que mando. Peço-lhes e eles têm de fazer. Muitas vezes recordo aos instrumentistas das minhas orquestras que somos músicos e que temos a grande responsabilidade de levar a beleza da música ao público. Algo que é muito importante.

 

 

 

Que tipo de música ouve em casa?

Ouço, em primeiro lugar, música clássica. Também gosto muito de Jazz, Louis Armstrong e Charlie Parker. Como preciso fazer muita pesquisa na área da música chinesa, esse género também é uma constante.

 

 

Como prepara concertos que fundem géneros diferentes de música, como o fado?

Tivemos um concerto com uma artista de fado. É uma realidade separada, uma cultura diferente com um pano de fundo diferente, mas a minha orquestra cobre muitos estilos musicais, em termos técnicos. Em Macau, o fado é apreciado por uma grande parte do público devido à ligação com Portugal. Eu também gosto muito de fado, gosto muito da Katia Guerreiro, por exemplo. Quando ouço as suas músicas, parece que ela consegue capturar a minha alma. Para preparar um concerto que mistura dois géneros, preciso conhecer a cantora e o seu repertório. Depois são necessários arranjos para transportar as melodias tocadas só por duas pessoas para uma orquestra com muitos elementos. Como maestro, preciso das pautas e de ter tudo detalhado. Mas por vezes o trabalho é facilitado pela compatibilidade de estilos. O Fado é muito movido pela melodia, assim como a música chinesa.

 

 

Enquanto maestro, o que é importante passar para os músicos?

Paixão e entendimento mútuo. Falamos muito. Para um maestro, comunicação é muito importante. Já dirigi 43 orquestras diferentes, orquestras chinesas, teatro, sinfónicas, ballet, dirigi, por exemplo, “O Lago dos Cisnes”. A comunicação é muito importante. O olhar, a expressão facial e, claro, a linguagem são as formas para transmitir exactamente o que quero e para nos encontrarmos.

Ministério Público recorre da decisão que considerou John Mo inocente

[dropcap]O[/dropcap] Ministério Público recorreu da decisão que ilibou o académico John Mo da acusação de um crime de violação. Ao HM, o MP confirmou que contestou a decisão, que tinha como data limite de recurso o dia de ontem.

“Vimos por este meio informar que o Ministério Público interpôs recurso da sentença do processo que envolve John Mo”, pode ler-se numa resposta enviada pelo Ministério Público ao HM.

O ex-director da Faculdade de Direito da Universidade de Macau era acusado da prática de um crime de violação, depois de uma noite num bar de karaoké, a 23 de Junho de 2018. Contudo, o tribunal, que recorreu às imagens de CCTV do espaço, considerou que a alegada vítima nunca fez nada para evitar o envolvimento entre os dois e que nunca se mostrou incomodada com os avanços de John Mo.

Além do académico, o caso envolve também Lei Iok Pui e Yang Manman, que enfrentavam acusações da prática do crime de violação e omissão de auxílio. A decisão final segue agora para o Tribunal de Segunda Instância.

Turismo | Macau prepara “mega operação” em Portugal

[dropcap]O[/dropcap]Governo vai organizar uma “mega operação” turística em Portugal, na próxima semana, durante a Bolsa de Turismo de Lisboa de 2019 (BTL), onde será o destino internacional convidado deste ano. A delegação chefiada pelo secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, tem planeada “uma série de actividades que serão conduzidas em Lisboa e no Porto para proporcionar uma actualização sobre Macau enquanto destino turístico e assinalar o 20.º aniversário da RAEM”, indica um comunicado divulgado ontem pelos Serviços de Turismo.

De 12, um dia antes do arranque da BTL, a 16 de Março, vai ser apresentado um espectáculo de vídeo ‘mapping’, na Praça do Comércio, “sobre a história da cidade, as suas ligações a Portugal e recentes desenvolvimentos do destino”. Macau, que foi nomeado como Destino Preferido 2019 pela Associação Portuguesa de Agências de Viagens e Turismo, vai ter um expositor denominado “Sentir Macau Ao Seu Estilo” na BTL, para divulgar o património classificado pela UNESCO e a gastronomia, refere a mesma nota. Em paralelo, vai ser lançada uma exposição com trabalhos de mais de 30 artistas de Macau, a 13 de Março, na Delegação Económica e Comercial de Macau, em Lisboa. No dia seguinte, grupos de dança de rua de Macau vão actuar na Praça do Rossio, Rua Augusta, Praça do Comércio e Ribeira das Naus.

A delegação de Macau vai ainda deslocar-se ao Porto, no dia 15, para a abertura de uma exposição no Edifício Paços do Concelho, onde vão estar patentes “40 desenhos do talentoso jovem artista autista de Macau, Leong Ieng Wai, que retratam monumentos, praças e a vida da cidade”.