Plano Director | Especialistas querem visão a longo prazo e mais dados

Especialistas ligados à engenharia e ao planeamento urbanístico esperam que o Executivo possa ser mais transparente em relação ao Plano Director, apresentando os prós e contras de construir a linha Leste do Metro Ligeiro à superfície ou debaixo da terra. Agnes Lam considera faltar coordenação ao Governo

 

[dropcap]“O[/dropcap] que vejo é que não existe coordenação suficiente e é por isso que trouxemos aqui especialistas de diferentes sectores”, afirmou ontem Agnes Lam, à margem de um encontro promovido pela Universidade de Macau (UM) sobre os planos previstos na área dos transportes e da cidade inteligente, que constam no Plano Director.

Numa sessão que juntou, académicos e técnicos ligados à engenharia e ao planeamento urbanístico, foi consensual a ideia de que o Governo deveria partilhar mais informações e dados concretos, que estiveram na base das decisões apresentadas no plano que se encontra em consulta pública até 2 de Novembro.
Lee Hay Ip, presidente honorário da Associação de Engenharia Geotécnica e membro do Conselho de Planeamento Urbanístico (CPU) afirmou estar preocupado com a construção da linha leste do Metro Ligeiro, nomeadamente, com o facto de não existir nenhum estudo comparativo que indique as vantagens e desvantagens de fazer a obra acima do subsolo, recorrendo a uma ponte, ou debaixo da terra, através de um túnel subaquático, sendo esta última, a opção em cima da mesa.

“Devia existir um intervalo de custos de construção, para o público ter noção, de que se trata de uma obra de 50 milhões ou de 500 mil milhões. Deviam listar os prós e os contras e o custo correspondente de cada opção de forma a que a população de Macau tenha dados suficientes. Para já, não temos nada. Além disso, não sabemos quais os custos de operação, a longo prazo, de fazer um túnel”, apontou.

Devido às mudanças climáticas provocadas pelo aquecimento global, Lee Hay Ip apontou ainda que “ir para debaixo da terra” acarreta outros riscos, tal como o aterro da Zona A poder vir a inundar, colocando em causa o projecto, que assegura o transporte de passageiros, mesmo quando é içado o nível 10.

“O nível das inundações que resultam do “storm surge” tem vindo a aumentar desde o Hato. Se demorarmos 10 anos a construir a linha leste, quer dizer que em 2030, quando estiver operacional, e com uma perspectiva de utilização de 20 anos, em 2050, com o nível das inundações a aumentar, o próprio aterro da Zona A pode ficar abaixo do nível da água. Será seguro manter o metro a funcionar nestas condições e com tantas pessoas debaixo da terra?”, sublinhou engenharia geotécnico.

Por seu turno, Sio Chi Veng, Presidente da Associação dos Engenheiros de Macau alertou para a importância de não descurar os interesses de turistas e residentes e os gastos a longo prazo, inerentes à manutenção das infra-estruturas previstas no Plano Director, sobretudo porque “Macau tem muito dinheiro”.

“Não podemos pensar que [o Plano Director] apenas vai afectar os próximos 20 anos, mas talvez os próximos 100. Estas infra-estruturas vão afectar a vida de Macau depois de 2040. Macau (…) não se preocupa com quanto tem de gastar com a manutenção. Mas se compararmos com outras regiões, que têm limitações financeiras, as estações (…) incluem, por exemplo, um centro comercial ou uma área residencial, para a tornar lucrativa e funcional. Acho importante considerar o panorama geral, a longo prazo, e não apenas os custos iniciais”, defendeu

Só para turistas?

Outra das preocupações apontadas prende-se com o facto de o Plano Director não prever a passagem do Metro Ligeiro no centro de Macau. Para Chan Mun Fong, professor adjunto da Faculdade de Ciências e Tecnologia da UM, a decisão “foi uma grande desilusão”, esperando, pelo menos, que o plano que previa ligar a Barra às Portas do Cerco “não seja esquecido”.

“Não quero continuar a ouvir que o Metro Ligeiro é para os turistas. Esta linha poderia mudar essa concepção, ou seja, que é também capaz de servir uma grande fatia da população de Macau. Por isso, é possível fazer uma obra que sirva a população e que não tem obrigatoriamente de passar no meio da cidade”, referiu o académico.

Também Lee Hay Ip considerou que a passagem pelo centro de Macau “é muito importante para os residentes”, apesar de compreender que “é muito difícil em termos de engenharia”. “Neste caso, fazer o metro passar por baixo da terra pode ser uma boa solução”, acrescentou.

Agnes Lam espera igualmente que o Governo volte a pôr no plano “a intenção de colocar o metro a passar pelo centro de Macau”.

“O traçado actual não está suficientemente focado no dia-a-dia das pessoas e da comunidade. Alguns desses planos já existiam e, se não os podemos concretizá-los, é preciso explicar porque não podem ser feitos”, vincou a deputada.

Ondas de choque

Para Agnes Lam, a falta de coordenação na forma como o Plano Director foi apresentado está relacionada com o facto de o Governo de Ho Iat Seng ser relativamente recente.

“O conflito deve-se também, a meu ver, com o facto de Macau ter mudado de Governo há pouco tempo. Alguns departamentos já tinham feito parte do planeamento, mas, ao mesmo tempo, há indicações em sentido contrário. Acho que o Governo, especialmente o novo Chefe do Executivo, que parece ser mais determinado a tomar decisões, deve dar atenção à forma como os trabalhos estão a ser coordenados”, explicou a deputada ao HM.

De acordo com a deputada, um exemplo disso é a possibilidade de o Executivo deixar cair os planos previstos para a Zona D, para construir o novo aterro que vai ligar a Zona A ao nordeste de Macau, algo que estará a ser negociado com o Governo Central.

“Há uma intenção substancialmente diferente em relação ao que consta no Plano Director e o Governo tem de explicar a razão, fornecendo dados, o que justificou essa decisão. Se consideram que a Zona D não é boa ideia (…) têm de traduzir isso em números, porque, neste momento, não é possível compreender como foi tomada esta decisão”, explicou.

Hac Sá | Agnes Lam questiona projecto do parque de campismo

Agnes Lam tem dúvidas se o novo projecto do parque de campismo de Hac Sá está de acordo com o Plano Director, segundo o Jornal do Cidadão. Segundo a deputada, a zona deve ser preservada e caso o projecto tenha fim turístico, a preservação da montanha pode ficar em risco, defendendo também que a zona da praia não deve ser demasiado desenvolvida.

Lo Chi Kin, vice-presidente do conselho de administração do Instituto para os Assuntos Municipais (IAM), disse no programa Fórum Macau, do canal chinês da Rádio Macau, que o projecto de renovação do parque de campismo não deve ser “de nível internacional”, explicando que a intenção do Governo é disponibilizar instalações municipais de boa qualidade aos residentes. Lo Chi Kin disse que o projecto do novo parque de campismo deve estar de acordo com o Plano Director, actualmente em consulta pública, algo que motivou o adiamento dos trabalhos do IAM.

FAOM sem consenso sobre possível apresentação na AL de projecto de lei sindical 

[dropcap]O[/dropcap]s deputados ligados à Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM) ainda não chegaram a consenso quanto à possibilidade de apresentarem um novo projecto de lei sindical na Assembleia Legislativa (AL). Na conferência de imprensa de ontem, que serviu para fazer um balanço da última sessão legislativa, foram apresentadas posições diferentes sobre o assunto.

Para Lam Lon Wai, eleito pela via indirecta, cabe ao Governo apresentar a proposta, ouvindo as posições do Conselho Permanente de Concertação Social (CPCS) e da população. “A lei sindical só tem vantagens para a sociedade e estamos optimistas em relação à legislação”, disse. Ella Lei lembrou que o Governo prometeu avançar para a lei sindical, defendendo uma discussão com a sociedade sobre a elaboração do diploma, a fim de incluir os direitos sindicais e o direito de participação dos trabalhadores.

Já Lei Chan U, frisou que a lei sindical já foi chumbada no hemiciclo mais de dez vezes, mas que o consenso em torno desta questão ainda está a ser construído junto da sociedade. O deputado lembrou que o último relatório do CPCS sobre este assunto revela que há uma maior proporção de pessoas a pedir a lei sindical o quanto antes. Lei Chan U sublinhou que este diploma é necessário, além de já ter sido prometido pelo actual Chefe do Executivo, Ho Iat Seng.

Dúvidas e pandemia

Relativamente ao trabalho desenvolvido na qualidade de deputados, Lei Chan U lembrou que a FAOM recebeu, em contexto de pandemia, muitos pedidos de ajuda da parte de trabalhadores do sector da restauração, construção civil, logística e jogo. O deputado disse que na próxima sessão legislativa é importante melhorar a questão dos salários em atraso e implementar uma maior regulação das licenças sem vencimento, bem como reforçar o combate ao trabalho ilegal.

Além das preocupações relacionadas com a pandemia, a FAOM lidou também com queixas sobre habitação e trânsito. Os deputados, como Ella Lei, expressaram o desejo de que o Governo possa melhorar o planeamento urbanístico e a utilização dos terrenos.

Ella Lei frisou que é necessário estabelecer um calendário na área da habitação pública, a pensar nos candidatos em lista de espera e pede a construção de mais apartamentos T2 ou T3 para os candidatos com famílias maiores, além de dizer ser necessário criar mais políticas de habitação para a chamada classe sanduíche.

O deputado Leong Sun Iok afirmou esperar que o Executivo apresente o projecto completo do metro ligeiro com mais detalhes sobre o orçamento e o segmento da Ilha de Hengqin. Além disso, o tribuno defendeu que o Governo deve recorrer aos terrenos não aproveitados para criar mais parques de estacionamento provisórios. Ainda na área do planeamento urbano, Lam Lon Wai pede o aproveitamento de 40 terrenos que ainda estão por recuperar, como é o caso do terreno à entrada da Taipa destinado ao parque temático Oceanis ou onde está a velha fábrica de panchões Iec Long. O deputado deseja ainda que sejam criadas mais zonas verdes nos novos aterros ou em zonas costeiras na península e ilhas.

Ambiente | DSPA não define metas para reduzir uso de plástico

O Governo não se compromete com metas ou medidas restritivas para prevenir o uso de plástico. A resposta da Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental, à interpelação de Sulu Sou, esbarra no pedido de acção de activistas de defesa do ambiente e na urgência de travar o poluente que está em todo o lado

 

[dropcap]O[/dropcap] Governo não vai estabelecer metas, nem prazos, para a redução do uso de plástico, é a principal conclusão que se retira da resposta da Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental (DSAP) a uma interpelação escrita de Sulu Sou. Posição que esbarra não só no pedido do deputado, mas também na expectativa de activistas ambientais, como Annie Lao da Macau for Waste Reduction.

“Acho que o Governo é muito lento a agir. Para mim, não são sérios em relação ao ambiente, por isso só conseguem dar passinhos pequenos”, reagiu a activista que tem movido uma cruzada contra o plástico de uso único.

A resposta assinada por Raymond Tam refere que está “previsto um novo estudo no 4º trimestre do corrente ano, com vista a comparar a tendência da variação dos sacos de compra abandonados, incluindo os sacos de plástico”. O director da DSAP acrescenta que será feita uma avaliação regular, mas, “por enquanto, não há uma meta de redução”.

Posição que não surpreende Annie Lao, mas que testa a paciência. “Dizem que vão continuar a estudar e estudar. De quantos estudos precisam para perceberem o problema ambiental que existe há tantos anos? O mundo está cheio de plástico, o tempo de fazer estudos acabou, é preciso passar à acção imediata, agir.

Façam algo. Apelo ao Governo para agir com coragem, ambição, para ser ousado”, desabafa a ambientalista.
Ainda no capítulo dos estudos, importa referir que todos os anos, cada pessoa consome, pelo menos, 50 mil partículas de microplásticos e respira a mesma quantidade, indicou um relatório publicado em 2019 na revista científica Environmental Science and Technology. No mês passado, outro estudo científico demonstrou que se pode encontrar plástico em órgãos vitais como pulmões e fígado, mas também nos rins e baço.

Fim da esferovite

A resposta de DSPA refere ainda que “existem diferentes opiniões na sociedade sobre a implementação de medidas restritivas” e que o Governo “deve ponderar a sua operacionalidade” e eficácia.

Entretanto, a entidade liderada por Raymond Tam garante que vai continuar a apostar na sensibilização da sociedade para “promover práticas mais amigas do ambiente”. Uma atitude louvável, na óptica de Annie Lao, que reconhece o papel pedagógico do Executivo. Porém, considera que “sem regulamentação é impossível consciencializar as pessoas.”

Fica o compromisso de restringir, de forma faseada, o uso de utensílios de mesa de plástico descartáveis” e no próximo ano o plano é “proibir a importação de utensílios de mesa de esferovite”. Medida aplaudida pela activista, principalmente porque as embalagens de esferovite não podem ser recicladas em Macau, ao contrário das de plástico. Mas que peca pelo impacto menor, por não ser tão utilizado por restaurantes como o plástico.

Uma outra questão que Annie Lao gostaria de ver respondida é o impacto da pandemia na questão ambiental. “Neste momento, devido à pandemia, as pessoas têm a tendência para pedir mais takeaway. Portanto, presumo que o uso de plástico vai aumentar ainda mais”.

Segurança | Armas e equipamento de vigilância importados por Macau

Em Macau existe tecnologia que permite interceptar dados de telemóveis. Uma entidade pública comprou em 2015 um IMSI catcher através do Governo suíço, e no ano passado foram rejeitadas mais duas encomendas. Além disso, Macau foi destino de armas de pequeno calibre, munições e de um sistema anti-drone, para dar alguns exemplos de equipamentos encomendados nos últimos anos a diversos países

 

[dropcap]N[/dropcap]o céu multiplicam-se os olhos, enquanto a vigilância se estende em terra. Em 2015, as autoridades de Macau importaram um IMSI catcher, um equipamento de vigilância que permite a intercepção de dados de telemóveis. “Podemos confirmar que a 21 de Agosto de 2015, foi aprovada a mediação e exportação de um IMSI catcher para uma agência governamental anti-corrupção”, respondeu ao HM o Consulado Geral da Suíça em Hong Kong.

De resto, a base de dados sobre tecnologia de vigilância “Surveillance Industry Index” mostra que Macau adquiriu tecnologia de intercepção em 2015, através do Governo suíço.

Questionado sobre a tentativa de comprar material militar e de vigilância a outros países, e de que se trata em concreto, o gabinete do secretário para a Segurança respondeu não ter informações a prestar.

O Comissariado Contra a Corrupção (CCAC) também optou pelo silêncio. “Não temos comentários às suas questões”, foi a resposta dada ao pedido de confirmação do uso de um IMSI-catcher em investigações, quanto tempo os dados são mantidos e se são partilhados com outras entidades.

Um IMSI catcher funciona como uma falsa torre de rede móvel, levando telemóveis que estejam perto a conectar-se. Através deste mecanismo, pode ser partilhada a identidade do cartão SIM e revelada a localização do utilizador. Alguns podem também interceptar mensagens de texto GSM (Sistema Global para Comunicações Móveis) e chamadas. Há relatos de uso de IMSI catchers por forças policiais em vários locais do mundo.

O Consulado explicou que em Maio de 2015 o Governo da Suíça reforçou os critérios de avaliação para exportações e intermediação de mercadorias para vigilância da internet e telemóveis. A licença é negada se houver motivos para acreditar que os bens a ser exportados ou mediados vão ser usados como meio de repressão. A avaliação é feita de acordo com critérios internacionais da legislação de controlo de mercadorias.

Os equipamentos para vigilância da Internet e de telemóveis integram os chamados bens de uso duplo – podem ser utilizados a nível militar e civil. “A exportação de tais bens da Suíça é controlada desde 2012 com base em acordos internacionais. Para exportações da Suíça, a licença deve ser obtida através da Secretaria de Estado para os Assuntos Económicos SECO, com base na legislação de controlo de mercadorias”.

A procura por um IMSI catcher por autoridades da RAEM voltou a acontecer no ano passado, mas a representação consular indica que o licenciamento se tornou mais restritivo ao longo dos anos. “A 1 de Abril de 2019, não foram aprovados pela Secretaria de Estado dos Assuntos Económicos SECO novos pedidos de exportação de dois IMSI catchers adicionais para destinatários governamentais”, disse o Consulado Geral da Suíça, acrescentando que “devido à situação actual, tais mercadorias não seriam autorizadas no presente”.

Atenção à proporcionalidade

A advogada Catarina Guerra Gonçalves considera que a utilização deste tipo de equipamento coloca em risco o direito à privacidade. Em causa está a possibilidade de aceder a dados de tráfego (que permitem identificar para quem se liga, quando, com que duração e frequência), conteúdo e localização celular através do IMSI catcher.

A advogada alerta que a Lei Básica protege especificamente a liberdade e o sigilo dos meios de comunicação dos residentes de Macau e que nenhuma autoridade pública pode violar os mesmos, excepto por razões de segurança pública ou de investigação criminal. “Tanto a obtenção de dados de localização celular como de dados de tráfego afronta o direito fundamental à inviolabilidade das telecomunicações, (…) e só pode ser feito nas situações excepcionais aí previstas e com respeito dos princípios da proporcionalidade, adequação e necessidade”, analisou a especialista da área de protecção de dados pessoais.

A jurista deu como exemplo a impossibilidade de abranger um conjunto de pessoas que tenham telemóveis que não estejam envolvidas na prática de um crime, sendo “erigidas à categoria de suspeitos” pela circunstância de estarem no local e no momento em que ele é cometido.

“Ora, aparentemente, o IMSI catcher permite precisamente abranger todas as pessoas que estejam próximas do mesmo e que não se aperceberão que o seu telemóvel está a ligar-se a uma torre móvel falsa, o que constitui uma clara violação da privacidade”, declarou ao HM. Na óptica de Catarina Guerra Gonçalves, “dificilmente, o IMSI catcher pode ser usado proporcionalmente devido à forma como opera”.

A advogada observou ainda que a intercepção ou gravação de comunicações depende de ordem ou autorização do juiz, e que se os elementos recolhidos não forem relevantes devem ser imediatamente destruídos, com base no Código de Processo Penal.

Num tom mais geral, Julien Chaisse, professor de Direito na City University of Hong Kong e especialista na Plataforma de Política de Dados do Fórum Económico Mundial, comentou que os governos justificam o uso de IMSI catchers “em resposta à ameaça para fins de investigação ou, mais geralmente, para propósitos de segurança interna”, e que se tornaram “uma ferramenta poderosa para exercer vigilância sobre indivíduos seleccionados”.

Ao HM, explicou que, na maioria das jurisdições, são utilizados pela polícia ou serviços de inteligência, mas que o seu uso por vezes é ilegal por razões de liberdade civil ou protecção da privacidade. E aponta que o recurso a esta tecnologia está “bastante difundido”, com governos como o do Reino Unido, China e França a utilizá-la.

O docente considera que a interceptação de comunicações só deve ser feita depois de autorização judicial. “No entanto, parece que as autoridades supervisoras têm meios técnicos para usar IMSI-catchers quando querem e contornar esta limitação real ou potencial. Na verdade, há muito pouco controlo em jurisdições como os Estados Unidos, Inglaterra, França… Portanto, é difícil provar se foram feitas escutas fora da estrutura de controlo judicial”, apontou. Julien Chaisse ressalvou ainda assim que os dados recolhidos ilegalmente podem constituir evidência inadmissível perante um julgamento.

Defesas erguidas

Encontra-se informação dispersa sobre importações de equipamento militar e de uso duplo para a RAEM em documentos de governos que passaram licenças de venda. Um relatório sobre o controlo de exportações do Departamento do Comércio Internacional do Reino Unido de 2015 mostra as licenças autorizadas para bens com destino a Macau. A nível militar foi autorizada uma licença para munição de armas de pequeno calibre para finalidade de treino.

Entre o material não militar foi dada luz verde a câmaras, software e equipamento de segurança de informação, bem como equipamento de intercepção de telecomunicações. O valor total destes bens foi na ordem dos 5,4 milhões de libras. Por outro lado, foi rejeitada a venda de granadas de gás lacrimogéneo.

No relatório da entidade britânica surge uma licença rejeitada no relatório de 2017, referente a equipamento de protecção para substâncias usadas em controlo de motins, como por exemplo gás pimenta ou lacrimogéneo. No entanto, receberam autorização para munições de armas de pequeno calibre, equipamento de segurança de informação, e de identificação/detecção de explosivos civis.

O HM consultou dados do Ministério da Economia, Indústria e Competitividade de Espanha que indicam duas licenças autorizadas de exportação de material de defesa e uso duplo em 2017 para Macau, num valor de 15.246 euros. Os documentos apontam que o usuário final foi um privado.

Céu e inferno

A União Europeia (EU) adoptou em 2008 uma posição comum sobre o controlo da exportação de equipamento e tecnologia militar. “O objectivo da Posição Comum é assegurar a exportação responsável de armas pelos Estados-Membros, nomeadamente de forma a que a mesma não contribua para repressão interna, instabilidade regional ou agressão internacional, graves violações dos direitos humanos ou do direito internacional humanitário”, lê-se num relatório sobre a aplicação das regras de exportação. A União Europeia frisa que “uma política responsável em matéria de comércio de armas contribui para a manutenção da paz e da segurança internacionais”.

O documento mostra a exportação de armas da EU em 2018, por destino, um deles foi Macau. A Áustria emitiu seis licenças numa categoria que abrange armas de calibre inferior a 20mm, armas automáticas com calibre inferior a 12,7mm, assessórios ou componentes deste material, e uma licença para munições. Esta compras tiveram um preço de cerca de 69 mil euros. Da República Checa as licenças atingem 90.863 euros para adquirir munições.

Também Itália emitiu uma licença em 2018, no valor de 17.850 euros. O Consulado Geral de Itália em Hong Kong explicou ao HM que o equipamento em causa é um sistema anti-drone, comprado por uma entidade governamental, e que foi fornecido de acordo com todos os procedimentos internacionais e nacionais.

Mais recentemente, um relatório do Ministério da Economia e Energia alemão de 2019 revela que o país rejeitou exportações para Macau, no valor de 17.680 euros. Quando questionado sobre o produto em causa e se era destinado a uma entidade governamental ou privada, o Consulado Geral alemão em Hong Kong não quis comentar.

Riscos informados

O jurista António Katchi defende que o Governo devia esclarecer a população sobre os equipamentos usados pelas autoridades e entidades públicas em investigações. “As pessoas têm o direito de saber a que riscos estão expostas, quer nas suas comunicações, quer quando participem em manifestações, quer, inclusivamente, quando desobedecem a uma ordem policial”, disse ao HM.

Para além disso, considera que os médicos e enfermeiros devem ser esclarecidos sobre os materiais e equipamentos de que o Governo dispõe para operações repressivas, para poderem explicar os riscos da sua utilização e preparar-se adequadamente “para o tratamento das pessoas que viessem a ser atingidas”.

Sobre a rejeição da venda a Macau de equipamento militar e tecnologia de uso duplo por outros países, António Katchi entende que “poderá – ou deveria – constituir uma reacção à paulatina fascização do regime político de Macau, que tem tido como traço mais saliente o fortalecimento do poder, tanto jurídico como de facto, das autoridades policiais, quer perante os particulares, quer perante os demais poderes públicos”. No seu entender “o cenário está a ser montado para que, quando houver agitação social em Macau, a PSP e a PJ possam impunemente ‘partir a espinha’ aos ‘agitadores’, então convenientemente apodados de ‘terroristas’ ou ‘separatistas’ a soldo de forças estrangeiras”.

Mais câmaras

O secretário para a Segurança, Wong Sio Chak, autorizou a instalação e utilização de mais 37 câmaras de videovigilância. De acordo com o despacho publicado ontem em Boletim Oficial, 33 destinam-se ao posto de migração do terminal marítimo do Porto Interior e de Iates da Divisão de Controlo Fronteiriço Marítimo e Aéreo do Departamento de Controlo Fronteiriço. A gestão do sistema de videovigilância fica sob a responsabilidade do Corpo de Polícia de Segurança Pública.

ONU | Xi Jinping recusa politização da pandemia

[dropcap]O[/dropcap] Presidente chinês, Xi Jinping, considerou esta terça-feira, na ONU, que se deve recusar a politização da pandemia de covid-19 e garantiu que a China “nunca entrará nem numa guerra fria nem numa guerra quente”.

Xi Jinping falava, num discurso pré-gravado, no debate geral da 75.ª sessão da Assembleia Geral da ONU, que decorre na sede da organização, em Nova Iorque, sem uma referência explícita aos Estados Unidos, cujo Presidente, Donald Trump, exigiu às Nações Unidas, no mesmo fórum, que peçam responsabilidades à China pela actuação de Pequim na fase inicial da expansão da pandemia do novo coronavírus.

“A China é o maior país em vias de desenvolvimento que sempre seguiu um caminho pacífico e de cooperação. Nunca pretendemos lutar pela hegemonia nem pela expansão e nunca procuraremos as supostas tentativas de influência”, afirmou o chefe de Estado chinês.

“Não temos a intenção de entrar numa guerra fria ou numa guerra quente com nenhum país. Pelo contrário, persistimos em ultrapassar as diferenças através do diálogo e solucionar as disputas através de negociações”, acrescentou.

Sem nunca se referir aos Estados Unidos ou ao nome do Presidente norte-americano, Xi Jinping mostrou-se contra o protecionismo e unilateralismo e foi ao encontro das palavras do secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, ao defender o multilateralismo e a concertação de posições para ultrapassar as divergências.

“A politização da pandemia deve ser recusada e temos o imperativo de criar uma visão aberta e inclusiva, contra o protecionismo e contra o unilateralismo”, observou, salientando que se deve também “repudiar as disputas ideológicas, ultrapassar as armadilhas do choque das civilizações e respeitar mutuamente o caminho de cada país”.

Garantindo que Pequim está a colaborar com várias instituições científicas para se encontrar uma vacina eficaz para combater a covid-19, Xi Jinping lembrou que a própria China já está na fase final de ensaios clínicos para assegurar esse objetivo.

“Assim que estiverem disponíveis, iremos oferecê-las como bens públicos globais, priorizando os países em vias de desenvolvimento”, afirmou, referindo que Pequim irá também “cumprir o compromisso” de, nos próximos dois anos, oferecer 2.000 milhões de dólares para programas destinados à agricultura, alívio da pobreza, educação, mulheres, crianças e alterações climáticas.

Para o Presidente chinês, a prioridade passa por apoiar os países em desenvolvimento, sobretudo os africanos, e promover o alívio da dívida.

“A covid-19 não será a última crise da humanidade e devemos estar preparados para combatermos juntos os eventuais desafios globais. A pandemia lembra-nos que vivemos numa aldeia global interconectada e interdependente. (…) e mostra-nos que a globalização económica é uma realidade objetiva e uma corrente histórica. Não se pode meter a cabeça na areia, como a avestruz”, sublinhou.

Para Xi Jinping, a covid-19 demonstra que a humanidade “necessita de uma revolução” para propiciar formas ecológicas de promover o desenvolvimento e a construção da civilização ecológica, dando o exemplo chinês, cujas medidas ambientais vão permitir atingir as metas mínimas de dióxido de carbono antes de 2030 e materializar a neutralidade do carbono antes de 2060.

Já a nível internacional, o Presidente chinês anunciou que a China vai oferecer 50 milhões de dólares ao Plano Mundial de Resposta Humanitária ao covid-19 das Nações Unidas, e idêntico montante, a terceira contribuição, ao Fundo Fiduciário de Cooperação Sul/Sul entre a China e a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO).

Anunciou também a expansão, a partir de 2025, e por mais cinco anos, do programa ligado ao Fundo para a Paz e Desenvolvimento China/ONU e que Pequim vai instalar um Centro Global de Conhecimento e Inovação Geoespacial das Nações Unidas e um Centro Internacional de Investigação de Macrodados também na sede da organização.

A semana de alto nível na Assembleia Geral da ONU começou esta terça-feira, num formato sem precedentes nos 75 anos da organização, em que os discursos de chefes de Estado e de Governo será feita por vídeos previamente gravados, devido à pandemia.

Huawei a lutar pela “sobrevivência” face a “incessante agressão” de Washington

[dropcap]O[/dropcap] presidente rotativo da Huawei, Guo Ping, reconheceu hoje que a “incessante agressão” dos EUA colocou o grupo de tecnologia chinês sob “forte pressão” e que o seu objetivo agora é lutar para “sobreviver”.

“A Huawei está numa situação difícil”, disse Guo, na abertura da conferência anual ‘Huawei Connect’, que decorre em Xangai, a “capital” financeira da China. “A agressão implacável exercida pelos Estados Unidos colocou-nos sob pressão significativa”, acrescentou.

Trata-se da primeira declaração pública do presidente do grupo chinês desde a entrada em vigor, na semana passada, das mais recentes medidas de Washington.

O Departamento de Comércio dos EUA anunciou que, a partir de 15 de setembro, os fornecedores globais da Huawei que usam tecnologia norte-americana no desenvolvimento ou produção dos seus produtos devem primeiro obter autorização de Washington para venderem componentes essenciais à empresa chinesa.

A Huawei e os seus fornecedores de ‘chips’ eletrónicos criaram reservas e tentaram concluir as entregas antes da entrada em vigor daquelas medidas.

Guo disse que a empresa continua a “avaliar cuidadosamente os impactos” e sublinhou que a “batalha pela sobrevivência” é agora o seu principal objetivo.

O presidente lembrou que a Huawei vai continuar a investir em conectividade, computadores de alto desempenho ou em Inteligência Artificial (AI).

A “sinergia” entre esses campos é fundamental não só para a Huawei, mas para o setor como um todo, afirmou.

Alguns fabricantes dos EUA, como a Intel ou a AMD, anunciaram que obtiveram a aprovação de Washington para fornecerem alguns produtos à Huawei, embora não tenham detalhado quais.

Outros fornecedores não norte-americanos pediram a licença de Washington para trabalharem com a empresa chinesa, mas ainda não receberam resposta.

A Huawei Technologies Ltd., a primeira marca global de tecnologia da China e líder no fabrico de equipamentos de rede e dispositivos móveis, está no centro de um conflito entre EUA e China motivado pelas ambições tecnológicas de Pequim.

Os Estados Unidos acusam a empresa de estar sujeita a cooperar com os serviços de inteligência chineses e lançaram uma intensa campanha para convencer os países aliados a excluírem-na das suas redes de quinta geração, a Internet do futuro.

Austrália, Estados Unidos, Nova Zelândia, Reino Unido ou Japão baniram já a participação da empresa nos seus mercados. Vários países europeus estão também a limitar a participação da Huawei nas suas infra-estruturas.

Em maio, a administração de Donald Trump estipulou também que os fabricantes estrangeiros de semicondutores que usem tecnologia norte-americana devem obter licença para vender semicondutores fabricados para a Huawei, dificultando ainda mais o acesso da empresa a componentes essenciais.

A Huawei nega as acusações dos Estados Unidos e as autoridades chinesas dizem que o Governo de Donald Trump está a usar leis de segurança nacional para restringir um rival que ameaça o domínio exercido pelas empresas de tecnologia norte-americanas.

O ponto do marido, as episiotomias de rotina e as grávidas que ficam por ouvir

[dropcap]O[/dropcap] ponto do marido é uma prática obstétrica que não consta nos manuais médicos. Há quem diga que é um mito: e de facto há qualquer coisa de misterioso à volta deste ponto. Não há uma narrativa científica de como veio ou de como se propagou, ou se existe exactamente como ‘ponto do marido’ que se insinua. No imaginário e na preocupação das grávidas existe de certeza. No imaginário público existe cada vez mais, já que se torna mais comum discuti-lo e analisá-lo. Antes da peça publicada pelo jornal Público no início do mês de Setembro, eu era uma ignorante do ponto. Mas o ponto precisa de um contexto, e o contexto é o da episiotomia de onde surge, supostamente, como consequência.

No momento de parir, quando os profissionais médicos acham que o canal não está francamente aberto para possibilitar o nascimento, realizam um corte no períneo, que se chama episiotomia. Quando se sutura este corte, com vários pontos, diz-se que o ponto do marido é o ponto que está a mais. As motivações mais pessimistas para este ponto realçam a tendência de ver o corpo gestante ao serviço dos outros. O foco no prazer masculino numa altura como aquela é um claro exemplo. Mas há quem diga que este ponto serve para ajudar a criar mais estrutura no períneo, para que não fique laço e flácido. As boquinhas de que ‘aperta-se mais um bocadinho, porque ele vai gostar’ é, supostamente, gozo. Uma brincadeirinha. Ninguém faz pontos mais apertados a pensar nos homens, fazem-no porque traz vantagens a quem está a parir, supostamente.
Mas ainda há mais conteúdo por digerir. Como qualquer assunto que envolva sexo, genitais, género e bebés.

De acordo com a OMS, recomenda-se que a episiotomia seja feita em 20 por cento dos partos. Em Portugal – dados de Macau não são de fácil acesso – 70 por cento dos partos levam com esta prática. Os dados da China continental também apontam para a regularidade do procedimento. Em vez de usado quando estritamente necessário, é usado como rotina. Já é mau o suficiente que a episiotomia seja tão popular.

Agora, sair disso, ainda, pontos que podem trazer mais complicações – dor na relação sexual, infecções, incontinência e desconforto geral – sinaliza um total desrespeito pelas pessoas que estão a parir. Mito ou não, há coisas que acontecem que não deviam acontecer.

As associações pelos direitos da mulher na gravidez e no parto, como existe em Portugal, ajudam a esclarecer a desarmonia que existe entre o contexto hospitalar e médico e o que acontece no momento de parir. Tudo bem que os partos destes nossos homo sapiens sapiens não são particularmente fáceis. Parece que esta estrutura, ao evoluir para encaixar a nossa capacidade bípede, tornou os partos mais difíceis do que nos outros mamíferos. As ancas estreitaram-se para andarmos erectos e os problemas no parto começaram.

Contudo, esta não deverá servir como desculpa para tornar o parto mais médico e menos natural. Uma coisa são doenças que o nosso corpo não sabe combater, outra coisa é parir, e para isso, o nosso corpo deve ter algum conhecimento.

O suposto ‘ponto do marido’ e as episiotomias de rotina são sintomas da desvalorização da experiência da grávida em detrimento da prática médica. Só que estes domínios não devem ser incompatíveis. As associações, grupos e até partidos políticos andam a dar voz às experiências de parir que não são ouvidas, outras que nem conseguem falar. Pessoas com planos de partos que não os vêm respeitados, mulheres que nem foram avisadas que lhes fizeram uma episiotomia – só se apercebem quando o efeito da epidural passa e as dores dos pontos as ataca. Mulheres que desenvolvem complicações graves, e que poucos lhes dão ouvidos.

O mais surpreendente nisto tudo, é que, na minha pesquisa (pela diagonal, veja-se) em bases de dados científicas, parece que está tudo bastante alinhado. Não há mesmo evidência de que as episiotomias de rotina tragam mais vantagens às mães, aos bebés ou aos pais. Parece ser consensual que a episiotomia, como prática de rotina, é desaconselhada por completo. A forma como este saber científico não chega à sala de partos é que nos deixa confusos. Deixa-nos a ponderar, que forças serão estas, as que moldam e desvalorizam a representação e voz da mulher grávida e parturiente?

Campanha de Pequim contra o jogo faz disparar corrida ao dinheiro dos casinos

[dropcap]O[/dropcap]s receios de uma nova campanha de Pequim contra o jogo fora da jurisdição do Interior, que incluirá Macau, geraram uma corrida aos depósitos nos casinos e nas empresas promotoras de jogo, também conhecidas por junkets.

Segundo um artigo publicado ontem pela agência noticiosa Reuters, tudo começou depois de em Julho o Governo Central ter identificado as transferências de capitais para fora do Interior como um risco para a segurança nacional. Face à posição tomada por Pequim, a agência fala numa corrida “sem precedentes” por parte dos clientes para levantarem dinheiro junto dos junkets em Macau e em especial do Grupo Suncity.

Contudo, a corrida aos depósitos não se ficou apenas pelas empresas responsáveis por trazer os jogadores VIP, também houve uma corrida para trocar as fichas por dinheiro junto das operadoras, que em resposta à situação inesperada estão a limitar a quantia de fichas que pode ser trocada por dinheiro.

“Não estamos a falar do levantamento de milhões, mas antes de milhares de milhões”, reconheceu, à Reuters, um membro da direcção de um casino local, que pediu para não ser identificado. “Nós temos dinheiro no banco, mas com todos os clientes e fazerem levantamentos acabamos por enfrentar um problema”, foi acrescentado.

Efeito dominó

O cenário da corrida ao dinheiro junto dos casinos foi confirmado por vários dirigentes ligados às operadoras de Macau, que falam em levantamento de “milhares de milhões” de dólares de Hong Kong.

No que diz respeito aos junkets, o Grupo Suncity é um dos mais afectado, também pelo facto de os jogadores acreditarem que a empresa liderada por Alvin Chao está na mira do Governo Central. As alegações foram recusadas pela Suncity.

No entanto, segundo a Reuters, foi com a Suncity que a tendência se instalou e espoletou um efeito dominó comum a toda a indústria do jogo. Como os clientes começaram a levantar o dinheiro depositado com os junkets, estes viram-se obrigados a trocar as fichas que utilizam nas salas de jogo VIP por dinheiro. Porém, as operadoras não têm liquidez para trocar todas as fichas e tiveram de colocar um limite na quantidade de dinheiro que pode ser levantado.

Neste cenário, foi inclusive criado um grupo online por parte de clientes da Suncity que não conseguem receber o seu dinheiro e que agendaram um protesto para hoje.

Questionada pela Reuters sobre a corrida ao dinheiro guardado nos casinos e junkets, a Autoridade Monetário de Macau (AMCM) garantiu que está a fazer tudo para manter o abastecimento de dólares de Hong Kong ao mercado estável.

Calendário 2021 da WTCR deverá incluir GP Macau

[dropcap]O[/dropcap] Circuito da Guia deverá figurar no calendário provisório do próximo ano da Taça do Mundo de Carros de Turismo da FIA (WTCR). Todavia, os organizadores da competição estão igualmente a considerar muito seriamente a possibilidade de não realizar qualquer prova na Ásia em 2021, após este ano terem sido obrigados a cancelar os seus quatro eventos previstos para esta região do globo, incluindo a tradicional visita ao Grande Prémio de Macau.

Devido à pandemia da covid-19, que limitou drasticamente a movimentação de pessoas, a competição promovida pela Eurosport Events foi das primeiras a riscar do seu calendário de 2020 as visitas ao continente asiático este ano. Quando já se fazem planos para 2021, a WTCR prepara-se para seguir o mesmo caminho, caso a situação se mantenha. François Ribeiro, o CEO da Eurosport Events, disse ao portal especializado TouringCarTimes.com que planos de contingência estão a ser pensados com vista à próxima temporada, pois ninguém pode garantir hoje que será possível correr fora da Europa em 2021.

“Claro que não é a nossa vontade”, disse François Ribeiro à publicação online. “Temos contratos e aspirações para regressar à Ásia, a Macau, à China, à Coreia do Sul, como estávamos a planear este ano. Mas seremos nós capazes de organizar transportes internacionais? Estarão esses países (e territórios) abertos a estrangeiros? Haverá voos comerciais? Haverá lugar a quarentenas ou não?”

A WTCR, que sucedeu ao defunto WTCC, visitou a RAEM em 2018 e 2019, dando corpo à internacionalmente reputada Corrida da Guia. Aquela que seria a terceira visita ao território foi cancelada em meados de Maio, quando ficou perceptível que a crise sanitária à escala mundial não teria uma resolução rápida.

Oito provas com Macau

Este ano a WTCR introduziu uma série de medidas para reduzir os custos, desde a diminuição dos dias de cada evento, até a limitações no número de staff e pneus a utilizar. Contudo, como a economia mundial passa por um período difícil, mais medidas serão introduzidas a curto prazo, e François Ribeiro confirmou ao TouringCarTimes.com que o calendário de 2021 deverá ser composto por apenas oito provas com duas corridas cada.

“O que foi prometido às equipas e já foi acordado com a FIA é que haverá oito eventos, com um máximo de duas corridas por evento, porque controlar os custos no próximo ano é mais crítico do que nunca”, afirmou o CEO da Taça Mundial. “Temos já cinco eventos na Europa, mais três eventos que estávamos a planear para a Ásia antes do confinamento – Coreia do Sul, China e Macau – mas haverá um plano de reserva (com provas) só na Europa”.

Dada a ausência do pelotão da WTCR no próximo mês de Novembro, de acordo com Comissão Organizadora do Grande Prémio de Macau, este ano a Corrida da Guia “irá adoptar as especificações TCR, e os pilotos serão seleccionados a partir das corridas TCR Asia e Asia Pacific 2.0T, com a participação também de pilotos locais”.

O palco dos olhos

Santa Bárbara, Lisboa, quarta, 26 Agosto

[dropcap]D[/dropcap]escobri há dias carta velhíssima de décadas na qual me apontavam indomável vontade de fazer acontecer. O tom era elogioso, mas esta inclinação parecia também assustar a minha correspondente. Sobressaltado fiquei com a constância da pulsão logo comprovada com uma lista de projectos, ensaiados, começados, participados, abandonados, esquecidos, até cumpridos. Para quê? Para cansar o animal? Qual deles me define? De que fujo? É chegada a altura de arquivar outro. Há catorze anos, não se chamava ainda «Spam Cartoon», mas «Mundo a seus pés». A ideia tida, à mesa, desconfio, com o André [Carrilho], e à qual se somaram depois a Cristina [Sampaio], o João [Fazenda] e o José [Condeixa] era simples, como insistíamos em apresentá-la: «micro-filmes de 30 segundos que comentam temas de actualidade à maneira de um cartoon editorial, em lógica auto-conclusiva de gag.» Sem palavras, acrescento.

Mas com imprescindível sonoridade. «O eixo em torno do qual tudo gira é a síntese, no desenho como no argumento: impacto máximo com meios mínimos.» Conseguimos, nos programas de apoio aos filmes de animação, o impulso inicial para apurar a ideia achando que o resultado bastaria para convencer um canal de televisão, ou que tornaríamos o conceito viral. O desenho de humor tinha que se mexer. Afinal, o comentário político, sobretudo na imprensa, vive uma das piores crises da sua história e corre o sério risco de parar.

Adiante. Depois de promessas não cumpridas e falsas partidas, descobrimos a enérgica confiança do António José Teixeira, primeiro na SIC Notícias, depois na SIC, até que acabámos na RTP3, no lugar que nos parecia o indicado, um telejornal. Na sonoplastia, o Philippe Lenzini substituiu o José e o João precisou do tempo que nisto gastava. Entrou o Tiago [Albuquerque]. De início, a criação era bastante comunitária, mas a dinâmica dos prazos (semanais) e a exiguidade da equipa, foi reduzindo ao mínimo essencial essa partilha.

Cabia-me o papel de produtor, cada vez mais alheado. Discutimos muito e quase nada. Divergimos talvez de menos. Aprendi bastante, sobretudo nas gradações do olhar, na redução dos corpos ao mínimo, de como o movimento nos muda e afecta até a forma de contar. Não vivem nas antípodas, a criação e a produção, mas o «Spam Cartoon» não precisa de mim para acontecer. Devo gastar tempo a pensar nos modos e propósitos de fazer. De me fazer.

Horta Seca, Lisboa, terça, 8 Setembro

Varsóvia continuará na névoa das histórias, não arrisco aceitar o convite para acompanhar a edição polaca de «Salazar – Agora, na hora da sua morte» (ed. Parceria A. M. Pereira), com que enfrentámos há uns bons 15 anos, o Miguel [Rocha] e eu, o sinistro fantasma (algures na página). Gostaria de desvendar as razões do interesse local em personagem tão do fadário nacional, esperando que não resultem do furor autoritário que volta a atravessar o mundo. Estas respostas aos tormentos de qualquer sociedade são maneira desesperada de pôr pensos rápidos em pernas partidas, e à martelada. Revisitei a novela gráfica e não saí desgostado, confirmei mesmo que pede reedição, com ligeiros acrescentos. Em dias de constante avaliação, reconheço neste projecto um dos mais desafiantes e compensadores que me foi dado experimentar. A preparação logo se fez visita guiada, um tudo nada obsessiva, a um painel de personagens complexas e inquietantes, a uma riquíssima floresta de icónicas imagens, portanto, à identidade deste país, desembocando no fecundo diálogo com o Miguel, que obedeceu tão só à mais delirante criatividade, em raro entendimento. Com a condescendência amigável de Antónia Maria Pereira, guardiã de casa editora tão cheia de espectros. Seguiu-se o lançamento, pontuado por episódios de espanto um pouco por todo o país, menos Santa Comba Dão, e apenas por nunca termos sido convidados. A perturbação gerada pelo protagonista-tema, abordado em bd, e longe do libelo panfletário, gerou situações que mereciam ser contadas; como a quente sessão no Museu do Neo-Realismo, em Vila Franca de Xira, onde uma dúzia de militantes vociferaram a estranha incapacidade em aceitar a inteligência do ditador, ou a comovente de Baleizão, que de súbito se tornou catarse colectiva de período doloroso. Sem esquecer, ainda que tenha perdido para sempre as exactas palavras, a calorosa apresentação do [Manuel António] Pina, em Gaia, para dois ou três gatos pingados. Ou a primeira, dessa em salão nobre à pinha, no Ministério das Finanças, no Terreiro do Paço, lugar para sempre assombrado.

Coelho da Rocha, Lisboa, quarta, 9 Setembro

A casa de Pessoa reabriu toda arrumadinha e fomos visitá-la guiados pela gentileza da sua directora, Clara Riso. Em tempos de tempo estendido, embricado, enlaçado, a exposição do autor que se fechou sobre si para abrir mundos não será permanente, mas de longa duração. Quer isto dizer que este modo de dispor vida e obra terá olhares hóspedes que habitarão, não o quarto interior, mas o das janelas para a rua. Interior e no lugar do coração será sempre a biblioteca, com o seu alinhamento de lombadas mergulhando ramos no oxigénio ou abrindo raízes em térrea profundidade, interrompidas aqui e ali por duplas significativas, a de «Reflexões sobre a Língua Portuguesa», de Francisco José Freire. Ou a da folha de rosto dedicada de «Príncipio», da Esfinge Gorda. Notas a lápis a prolongar leituras até ao corpo do poema. Esta floresta jamais será do esquecimento. Até por estar livre e devidamente na rede (http://bibliotecaparticular.casafernandopessoa.pt/). Este andar bombeia sangue entre o cima dos heterónimos e o baixo da biografia, se for o caso, nuvens em cima e aquíferos abaixo. Nesta nova maneira de dizer Fernando há um relâmpago chamado Almada. O rosto de Pessoa foi Almada quem o fez. As caras não se lhe fixavam nem no espelho, que ele bem tentava em cartões de visita, em cartas astrológicas, em missivas variadas. Almada foi o único a apanhá-las. Somos recebidos naquele cubo onde a luz obedece a um para desenhar o outro à mesa e chapéu, pose real de caneta e cigarro, tinta e fumo, as muitas dimensões do futuro que era, afinal, a sua casa. Isto se tempo fosse futuro. Há ainda estudos para inscrições dos heterónimos na pele da cidade, mas o que me apanhou foi o retrato a lápis de um primeiro olhar, o de 1913, no exacto ano em que se encontraram. Não se sabe de outro retrato feito em vida do poeta e este terá sido ao vivo, olhos nos olhos. Talvez por isso, Pessoa está vivíssimo e desalinhado, próximo de um real por haver.

De olhar estranhamente sereno. Não distingo o que nasce da vida do que vem da obra. Ao lado, brilha o exemplar de «A Invenção do Dia Claro», relido por acaso durante a travessia do deserto, um dos momentos em que o poeta se fez editor, em que escreveu leituras com o concreto do objecto, ele que era bastante dado ao prático, pelo menos de cabeça. «O preço de uma pessoa», escreve ali aquele que pinta, «vê-se na maneira como gosta de usar as palavras. Lê-se nos olhos das pessoas. As palavras dançam nos olhos das pessoas conforme o palco dos olhos de cada um.”

Sambando na lama

«Did you ever get the feeling that the world was a tuxedo and you were a pair of brown shoes?»
George Gobel (comediante americano)

[dropcap]P[/dropcap]ara começar uma confissão breve: muitas vezes – tantas vezes – serve esta vossa casa para me refugiar dos dias, mesmo quando olho para eles e digo o que vejo. Numa declaração de intenções pífia, feita desde o inicio destas crónicas, disse que eram as pequenas coisas que me interessavam para aqui – os olhares, os gestos, os modos, os sentires. Era a rua e não o mundo que me apetecia conversar.

Ainda é verdade. Mas existem alturas em que as pequenas coisas engrandecem, tomam dimensões inimagináveis e atacam os nossos planos de auto-imunidade. Não podemos escapar a este fenómeno que por falta de melhor termo técnico designaria de “vidinha”, assim, à Alexandre O’Neill. Só que esta vidinha que agora me fez refém não deve ser desprezada: existe e sobretudo em alturas mais difíceis. O emprego que escasseia, o dinheiro que não existe, os compromissos que se devem manter e não é possível – tudo redunda em tristeza, angústia e outras emoções mais ou menos desagradáveis. E uma coisa vos garanto: é difícil escrever com distanciamento sobre este assunto porque aqui o distanciamento social não é possível. Os sentimentos ficam exacerbados, os amigos impacientes e nós – ou eu, já que aqui estou – apenas vemos a luz ao fundo do túnel como sendo um comboio que avança na nossa direcção.

São dias de uma impotência triste, viscosa. As pessoas ficam estranhas porque o mundo nos agride no que é mais próximo e rasteiro mas nem por isso menos real. É difícil resistir e cada um terá a sua estratégia de sobrevivência. Mas combater este inimigo torna-se mais complicado porque justamente se confunde com o quotidiano. Não se trata de tragédia, uma perda em que se pode fazer o luto. Trata-se dos dias da semana que de repente ganham dentes e nos atacam sem piedade.

E o que fazer, então? Há algum tempo um enorme amigo dizia para deixar de pertencer aos que acham que o mundo já não nos quer. Desta vez, enganou-se: sou eu que não quero este mundo e mais ainda nestas alturas. Parafraseando o enorme João César Monteiro, não é o mundo que me expulsa: sou eu que o condeno a ficar. E assim concluo que a única e pobre resistência é não desistir. Sair da trincheira com medo das balas, mas sair. Só que não assim, resignado e cabisbaixo. Não: a atitude também pode salvar. E outra vez recebo consolo nas canções – esta, Cantando No Toró, do grande Chico Buarque: «Sambando na lama de sapato branco, glorioso/ Um grande artista tem que estar feliz/ Sambando na lama e salvando o verniz». Contra a lama, o sapato branco da nossa existência e que se lixe. Se alguém morrer, pelo menos será a morte do artista.

Rota das Letras | Festival em formato concentrado aposta em autores locais

Numa versão altamente marcada pela pandemia, o festival literário vira-se para dentro e aposta nos autores de Macau. Além da homenagem a Henrique de Senna Fernandes, será celebrado o centenário da publicação de “Clepsydra” de Camilo Pessanha e discutido o impacto do confinamento nos autores locais

[dropcap]A[/dropcap] homenagem ao escritor macaense Henrique de Senna Fernandes vai ser um dos pontos altos da edição deste ano do Festival Literário Rota das Letras, que decorre entre 2 e 4 de Outubro. O programa, que inclui também a celebração dos 100 anos da publicação de “Clepsydra”, de Camilo Pessanha, foi apresentado ontem e vai ter uma sessão dedicada à pandemia da covid-19 e aos efeitos do confinamento na criação literária.

A cerimónia que vai celebrar o escritor macaense está agendada para 4 de Outubro, o mesmo dia em que morreu em 2010. Para assinalar a memória de Henrique de Senna Fernandes serão apresentadas as primeiras traduções em chinês e inglês do livro de estreia do autor macaense, “Nam Van – Contos de Macau”. A obra foi publicada pela primeira vez em 1978, em português.

“Uma das principais razões de ser do Festival Literário é a aproximação, através da literatura, das diferentes comunidades de Macau”, justificou Ricardo Pinto, director-geral do Rota das Letras, sobre a escolha.

“Fazemo-lo desta vez dando pela primeira vez a conhecer aos públicos de língua chinesa e inglesa, a obra que revelou Henrique de Senna Fernandes como um exímio contador de histórias”, realçou.

A sessão agendada para as 17h nas Oficinas Navais conta com a participação do filho do escritor, Miguel de Senna Fernandes, que vai publicar o seu primeiro livro de contos.

Ao contrário das edições anteriores do festival, que se prolongavam por mais de uma semana, a pandemia levou a que a organização optasse por uma edição em moldes diferentes. Também o facto de as fronteiras de Macau estarem encerradas a pessoas com nacionalidade estrangeira levou a organização a focar mais a atenção nos autores locais.

“A crise devastadora que se abateu sobre o mundo obrigou-nos a repensar a edição deste ano do Festival, numa perspectiva realista de contenção de custos e de aposta nos talentos locais”, explicou Ricardo Pinto.

“Esta mesma crise, enquanto tema de reflexão para todos nós, não podia obviamente estar ausente da programação do Festival”, acrescentou.

Reflexões sobre a pandemia

Com a aposta a passar pela “prata da casa”, Eric Chau, Wang Feng, Jenny Lao-Phillips e Konstantin Bessmertny são os autores presentes na sessão de abertura, marcada para as 14h30 de 2 de Outubro, na Oficinas Navais. Os autores vão reflectir sobre os efeitos da pandemia para a sociedade, para o futuro e o impacto para as suas futuras obras. “Numa época de crise em que o mundo está dividido em diferentes zonas de bloqueio, a ideologia de ‘Think Global Act Local’ parece ser especialmente relevante”, comentou Alice Kok, directora executiva do Rota das Letras. “Agora é tempo de reforçar a nossa energia criativa e trazê-la para a boca de cena”, considerou.

Depois da sessão de abertura do festival, serão anunciados os vencedores do Concurso de Contos, além do lançamento do livro de poemas “Sétimo Céu”, que conta com a participação de escritores como Jidi Majia, José Luís Peixoto, Gisela Casimiro e Hirondina Joshua.

Na manhã do primeiro dia do evento decorre também a abertura da Exposição de Fotografia ‘Macau, 2020: Tempo de Introspecção’ e o lançamento da revista Zine Photo, da autoria de João Miguel Barros.

A agenda de um primeiro dia muito preenchido termina com uma peça de teatro intitulada “O Momento”, a cargo da Associação de Teatro de Macau Comuna de Pedra, inspirada no romance 1984, de George Orwell.

Sábado foi o dia escolhido para celebrar os 100 anos da publicação de “Clepsydra”, livro que agrega os poemas dispersos do autor que passou a maior parte da sua vida em Macau, onde está sepultado. Os poemas de Pessanha vão ser ditos e cantados num recital dirigido pelo maestro Simão Barreto, numa sessão agendada para as 18h30 nas Oficinas Navais.

Cultura | Pandemia motiva descida de participação em actividades

No segundo trimestre do ano o número de pessoas a participar em actividades culturais desceu 24,7 por cento, fruto da pandemia. As ocupações mais populares entre os residentes foram a ida à biblioteca e ao cinema

 

[dropcap]E[/dropcap]ntre Abril e Junho deste ano, o número de pessoas que participou em actividades culturais desceu significativamente, tendência mais visível nas idas ao cinema e espetáculos. É o que indica um inquérito sobre a participação dos cidadãos em actividades culturais divulgado ontem pela Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC). O objectivo do inquérito foi conhecer a participação de indivíduos, com idade igual ou superior a 16 anos.

Os dados da DSEC mostram que 229.100 indivíduos participaram em actividades culturais no segundo trimestre deste ano, representando uma descida de 24,7 por cento em termos anuais, e que a taxa de participação foi de 39,4 por cento. Uma quebra que a DSEC atribui a “alguns espectáculos, exposições e filmes terem sido cancelados ou adiados, aliado ao facto de a intenção dos cidadãos saírem de casa se ter reduzido, como consequência da pandemia da pneumonia causada pelo novo tipo de coronavírus”.
Ir à biblioteca e ao cinema foram as actividades mais populares, mas com diferenças de 6,7 e 15,9 por cento, respectivamente.

Preferência por bibliotecas

No caso dos residentes, 196.900 participaram em actividades culturais. A taxa de participação foi de 43,3 por cento, diminuindo 13,7 pontos percentuais, a nível anual. A ocupação que teve mais participação foi a ida à biblioteca. Um total de 108.200 residentes frequentou estes espaços, representando ainda assim menos 21,4 por cento em termos anuais.

A taxa de estudantes que foram às bibliotecas fixou-se em 66,1 por cento, mais do dobro do que a adesão dos não estudantes, que foi de 20,1 por cento. O ramo profissional também teve influência: a participação dos residentes empregados no sector da educação foi a mais alta, atingindo 46,8 por cento. Foi seguida por quem trabalha na administração pública e segurança social.

De entre todas as actividades, “assistir a espectáculos” foi a que teve maior decréscimo de residentes (-47,9 por cento), num total de 40.700 pessoas. Os mais populares foram musicais e espetáculos de dança. A opção pelo teatro foi feita por 22.900 residentes.

A sétima arte atraiu menos 42,4 por cento dos locais, comparativamente ao segundo trimestre do ano passado. Foram ao cinema 96 mil residentes, e a taxa de participação de 21,1 por cento. Destaca-se que dos filmes escolhidos, 38.700 residentes assistiram a filmes/vídeos produzidos em Macau, número que cresceu 20 por cento. De acordo com a DSEC, participaram mais os indivíduos com idade entre os 16 e 24 anos.

O número de residentes que assistiu a exposições de arte diminuiu quase 30 por cento para 23.900. No entanto, destaca-se que 90,2 por cento destes residentes também marcaram presença noutras actividades culturais e 75,3 por cento participaram em três ou mais tipos de manifestações culturais.

BNU e Banco da China garantem cumprir lei contra branqueamento de capitais

[dropcap]O[/dropcap] presidente do Banco Nacional Ultramarino (BNU) revelou ao HM que a instituição está muito satisfeita com os mecanismos implementados para evitar o branqueamento de capitais. Foi desta forma que Carlos Álvares reagiu ao trabalho de investigação do Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ) com base em documentos remetidos à agência FinCEN, e que revelaram que clientes do banco tinha recebido cerca de 40,3 milhões de dólares americanos em operações denunciadas às autoridades dos EUA. Na origem das denúncias estiveram suspeitas de branqueamento de capitais.

“Podemos afirmar que estamos muito satisfeitos com os mecanismos de controlo existentes no BNU, que são auditados pela autoridade de supervisão, pela nossa casa-mãe e pela auditoria interna do BNU e que até à presente data, têm demonstrado elevada eficácia e uma sólida robustez”, afirmou Carlos Álvares, numa resposta enviada o HM.

Nas questões colocadas ao presidente do BNU foi também perguntado se teria havido denúncias por parte da instituição ao supervisor de Macau a alertar para um eventual branqueamento de capitais, mas evocou “questões relacionadas com o sigilo bancário” para não comentar.

Resposta do Banco da China

Também a representação de Macau do Banco da China tomou uma posição sobre o assunto, numa resposta enviada ao HM. A instituição estatal chinesa está ligada a 43 movimentos bancários dos 62 ligados ao território que foram reportados à agência FinCEN.

Por um lado, o Banco da China sublinhou que o facto de haver um relatório sobre uma transferência não significa que tenha havido qualquer tipo de crime. “A apresentação de relatórios de transacções suspeitas por parte dos bancos às autoridades de supervisão não significa que essas transacções foram consideradas impróprias ou criminosas”, realçou.

Por outro lado, o BOC garante que cumpre sempre as regras das jurisdições onde actua. “O nosso banco atribui sempre grande importância ao combate ao branqueamento de dinheiro e ao financiamento do terrorismo”, foi indicado. “É um princípio basilar do nosso negócio”, foi acrescentado.

IC | Livro de Joshua Wong continua fora das bibliotecas a ser avaliado

Dois meses depois, o livro “Não Sou uma Criança”, de Joshua Wong continua em avaliação pelo Instituto Cultural, sendo impossível de ser requisitado nas bibliotecas públicas. Livrarias locais afirmam não ter este ou outros volumes do autor disponíveis, para não se envolverem em assuntos políticos. Já a Livraria Portuguesa diz não sentir pressão

 

[dropcap]O[/dropcap] Instituto Cultural (IC) confirmou na segunda-feira ao HM que a obra “Não Sou uma Criança” de Joshua Wong, continua em avaliação, não podendo ser requisitada nas bibliotecas públicas. Além disso, só em 2020 foram inspeccionados, no total, 140 livros.

“As bibliotecas públicas realizam trabalhos de avaliação constantes, tendo avaliado mais de 140 tipos de livros este ano. O livro a que se refere está a ser avaliado”, afirmou o IC na resposta enviada.

A confirmação de que a obra continua inacessível no sistema público de bibliotecas de Macau, surge dois meses depois do IC ter avançado que o título está a ser analisado e que, por isso, “não há condições para aceder ao mesmo”.

Questionada sobre o motivo para manter a obra sob inspecção, o IC argumentou, uma vez mais, com a necessidade de “optimizar a qualidade das colecções e a utilização do espaço das bibliotecas” e com o facto de realizar constantemente “trabalhos de avaliação e triagem de colecções”, em sintonia com as práticas das bibliotecas públicas internacionais.

“As bibliotecas públicas do Instituto Cultural (IC) têm vindo a seguir os princípios estabelecidos na ‘Política de Desenvolvimento de Colecções’, tendo em conta vários factores, incluindo a importância dos livros no local de publicação original, o equilíbrio das opiniões dos conteúdos, a capacidade de referência das entidades editoras, o conteúdo que atende ao escopo das colecções, às características, ao valor de referência de pesquisa e assim por diante”, afirmou o IC.

Recorde-se que após a entrada em vigor da lei da segurança nacional em Hong Kong, várias bibliotecas da região vizinha retiraram livros de Joshua Wong, e de outros autores, das estantes, também para efeitos de “análise”.

Contactado pelo HM, o responsável pela gestão da Livraria Portuguesa, Ricardo Pinto, avançou que não lhe cabe “interpretar ou comentar posições assumidas por serviços do Governo da RAEM”, mas que, se colocada em abstracto, a questão da defesa da livre circulação de ideias, tem sido “desde sempre (…) a postura adoptada”.

Questionado se existe pressão ou auto-censura por colocar à venda obras de activistas de Hong Kong, o responsável afirmou peremptoriamente que não, acrescentando que, desde que começou a gerir a Livraria Portuguesa em 2011, sempre que existiram contactos do Governo, “foi para nos encomendarem a compra de livros, nunca para suprimir a sua venda”.

Ricardo Pinto acrescenta ainda ter sido encomendado e vendido recentemente na livraria Portuguesa um exemplar do livro “(Da falta de) Liberdade de Expressão” de Joshua Wong, a única obra do autor editada em português. “O livro em causa foi já encomendado por um dos nossos clientes, e entregue em devido tempo”, confirmou.

Política à parte

Já na livraria Wan Tat, na Rua do Campo, o discurso é diferente. Uma funcionária do espaço confirmou ao HM que as obras “Unfree Speech: The Threat to Global Democracy and Why We Must Act, Now”, “Não Sou uma Criança” e “Não Sou um Herói” de Joshua Wong e “My Journeys for Food and Justice”, da deputada de Hong Kong Tanya Chan não estão disponíveis para venda no espaço.

Questionada se a procura pelas obras tem aumentado nos últimos tempos, a mesma funcionária apontou “não ser conveniente” divulgar informações relacionadas com clientes. “Não queremos estar envolvidos em assuntos políticos, somos apenas uma loja, que sabe quais são os livros mais populares ou com os temas mais positivos”, acrescentou.

As mesmas reservas foram encontradas na livraria Seng Swong, na Calçada do Monte, onde foi ponto assente que as obras de Joshua Wong nunca estiveram à venda. “Este tipo de livros não é muito bom pois vão contra o Governo Central. Acho que nunca ninguém veio cá à procura dos livros dele”, disse a funcionária do espaço ao HM.

Comunidades | Elogios a programa de apoios de Portugal, apesar do cepticismo

Concurso para financiar movimentos associativos é uma boa iniciativa, os apoios são bem-vindos, mas as associações de Macau lidam com falta de informação e um histórico de inactividade de Portugal no que diz respeito a apoios vindos de Lisboa

 

[dropcap]U[/dropcap]ma iniciativa que merece muitos elogios, mas olhada com algum cepticismo devido a muitos anos de inactividade. É desta forma que as associações locais ouvidas pelo HM encaram o concurso promovido pelo Estado Português para financiar os movimentos associativos das comunidades portuguesas.

A abertura de candidaturas para que as associações que servem as comunidades portuguesas decorre entre 1 de Outubro de 31 de Dezembro de 2020 e este ano, ao contrário do anterior, a iniciativa foi promovida pelo Consulado nas redes sociais.

A promoção não passou despercebida às associações locais, que elogiam a iniciativa, apesar de já terem aprendido a viver sem apoios vindos de Portugal. É este o cenário traçado por Amélia António, presidente da Casa de Portugal, e Miguel de Senna Fernandes, presidente da Associação dos Macaenses.

“Considero que pode ser um apoio muito importante, até porque há associações que não conseguem outros apoios. Até para nós [Casa de Portugal] haver esta possibilidade é importante porque os apoios podem sempre tapar buracos no orçamento”, considerou Amélia António.

A importância não se prende apenas com a questão financeira, é também política, principalmente quando a associação depende do financiamento de instituições ligadas ao Governo da RAEM. “É muito desagradável estar num sítio onde se está completamente dependente das ajudas locais e do país onde se está, e ao mesmo tempo que não sem tem ajuda nenhuma do país de origem”, vincou. “Cria situações delicadas, principalmente quando se pede ajuda. Às vezes ouvem-se coisas de que não se gosta”, acrescentou.

Falta de informação

Por sua vez, Miguel de Senna Fernandes apontou o facto de haver pouca informação sobre este concurso junto das associações locais, o que faz com que persistam ainda muitas dúvidas. “A intenção é boa, e é sempre de louvar quando o Ministério dos Negócios Estrangeiros toma uma iniciativa a pensar na diáspora, mas era bom que nos dessem mais informação sobre o programa. Só espero que não seja apenas uma manifestação de boas intenções” disse o presidente da ADM.

Já sobre o facto de as associações locais terem aprendido a viver sem contar com apoios de Portugal e deste apoio ser tardio, Miguel de Senna Fernandes mostra-se resignado. “É uma boa iniciativa. Mas nós já parámos de nos queixar há muito tempo [por não haver apoios de Portugal] porque sabemos como as coisas são”, admitiu. “Eles têm tantos problemas internos que não têm tempo para a diáspora. É esta a ideia que tenho. E não me engano muito se considerar que outras associações congéneres pensam o mesmo sobre o Governo de Portugal”, atirou.

Neste momento, os representantes das duas associações admitem que a informação que possuem ainda é escassa e ainda não se debruçaram sobre este dossier, até porque têm outros problemas e a entrega das candidaturas só começa a partir do mês de Outubro. No entanto, ambos mostraram a intenção de se candidatarem.

Segunda vez

Criado pelo Governo de Portugal, em 2017, o primeiro concurso para atribuir apoios às associações sem fins lucrativos e ligadas às comunidades portuguesas foi lançado no ano passado, também entre 1 de Outubro de 31 de Dezembro.

Segundo a informação publicada no portal das Comunidades Portuguesas foram distribuídos cerca de 560 mil euros a 95 projectos, alguns dos quais pertencentes às mesmas associações, como foi o caso da Associação Portuguesa Cultural e Social de Pontault-Combault e a Cap Magellan, situadas em França.
Na lista de candidaturas apoiadas e rejeitadas não há qualquer associação com ligações a Macau.

DSAL | Queixa sobre licença sem vencimento julgada improcedente

Não foi dada razão à única queixa de um trabalhador local sobre férias não remuneradas. Desde o início do ano até Julho, a DSAL foi notificada de casos de licenças sem vencimento a envolver 144 trabalhadores

 

[dropcap]E[/dropcap]ntre Janeiro e Julho deste ano foi instaurado apenas um processo de conflito laboral sobre férias não remuneradas, envolvendo um trabalhador local. A investigação foi concluída e a queixa julgada improcedente. É o que avança o director dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL), Wong Chi Hong, em resposta a uma interpelação escrita de Sulu Sou.

“Em virtude do impacto causado pela epidemia, algumas empresas de Macau programaram férias não remuneradas por estarem sujeitas à pressão derivada da exploração dos negócios”, reconheceu Wong Chi Hong. Durante os primeiros sete meses do ano, a DSAL recebeu notificações de férias não remuneradas de quatro empresas, a envolver 144 trabalhadores. Ainda longe do ano terminar, já foram ultrapassados os números de 2019, quando foram recebidas notificações de quatro empresas, a abranger um total de 139 trabalhadores.

Wong Chi Hong indicou que apesar de a Lei das Relações de Trabalho não obrigar o empregador a notificar a situação de licença sem vencimento à DSAL, os termos devem ser negociados antecipadamente com o trabalhador. Além disso, frisou que se o empregador despedir o trabalhador porque as duas partes não chegaram a um consenso se considera resolução do contrato de trabalho sem justa causa. Algo que implica o pagamento de indemnização ao trabalhador.

Recorde-se que o Governo aprovou um plano de formação subsidiada que abrange pessoas com rendimentos afectados por estarem em licenças sem vencimento. O empregador pode sugerir até cinco trabalhadores para aumentar competências técnicas nos cursos, quem frequentar a formação durante licença sem vencimento um subsídio de 5.000 patacas.

Postura séria

Sulu Sou havia demonstrado preocupações pela possibilidade de haver trabalhadores obrigados a tirarem licenças sem vencimento e pediu que se fiscalize se o princípio da prioridade de empregabilidade de residentes é aplicada. “Houve também empresas que pediram aos residentes que tirassem licença sem vencimento, mas arranjaram trabalhadores não residentes (TNR) para trabalharem nas mesmas funções, tais como vendedores, seguranças, empregados de mesa e outras posições da linha da frente”, disse o deputado.

Sobre este ponto, o director da DSAL disse que vai lidar “de forma séria” com casos em que as empresas despeçam sem justa causa trabalhadores locais ou se verifique uma “diminuição significativa” dos direitos destes por causa da contratação de trabalhadores não residentes.

Educação | Fusão da DSEJ e da DSES concluída este ano 

[dropcap]L[/dropcap]ou Pak Sang, director dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ), garantiu, em resposta a uma interpelação escrita do deputado Ho Ion Sang, que o processo de fusão da DSEJ com a Direcção dos Serviços de Ensino Superior (DSES) deverá estar concluído ainda este ano. “O regulamento administrativo já se encontra na fase final de preparação e, de acordo com o plano, a fusão destes dois serviços será concluída e implementada este ano para reorganizar, combinar e integrar as suas funções, bem como para melhorar a coordenação e a eficácia das políticas de educação.”

A mesma resposta dá conta de que a revisão da lei que regula o ensino técnico-profissional também deverá estar concluída em breve. “A discussão e o relatório dos trabalhos de revisão do actual regime de ensino técnico-profissional foram concluídos recentemente. O texto encontra-se, de momento, na fase de elaboração do projecto de regulamento administrativo, prevendo-se a sua publicação em 2021”, aponta Lou Pak Sang.

O director da DSEJ adiantou alguns dados relativos ao ensino técnico-profissional no ano lectivo anterior. No ensino superior, dos 108 cursos de licenciatura que funcionaram no ano lectivo de 2019/2020, mais de 60 por cento, cerca de 70 cursos, concentraram-se no ensino com orientação profissional, ligados a várias áreas especializadas como a terapia da fala e da linguagem, enfermagem ou tradução, entre outras. No ensino secundário, nove escolas oficiais e particulares realizaram 35 cursos técnico-profissionais, além de que mais de 130 empresas ou entidades proporcionaram aos alunos os estágios profissionais.

Hengqin | Ho Iat Seng vê com bons olhos cooperação com o Japão

O Chefe do Executivo mostrou-se satisfeito pelo interesse do sector comercial japonês em apostar no desenvolvimento de Macau e da ilha de Hengqin. Numa reunião por videoconferência, Macau e o Japão comprometeram-se a intensificar a cooperação bilateral em áreas como a economia, cultura, gastronomia e energias renováveis

 

[dropcap]O[/dropcap] Chefe do Executivo espera ver o sector comercial do Japão a participar no desenvolvimento na zona de cooperação aprofundada entre Guangdong e Macau, na ilha de Hengqin.

A vontade de Ho Iat Seng foi partilhada na passada segunda-feira, durante uma reunião por videoconferência realizada com representantes da união parlamentar de amizade entre o Japão e Macau, Grande Baía, durante a qual foi ainda abordado o intercâmbio cultural e de pessoas entre os territórios.

Se por um lado, Ho Iat Seng começou por sublinhar que Macau enquanto mercado “aberto ao mundo”, tem uma relação de longa data com o Japão e bases sólidas que permitem desenvolver uma cooperação económica estreita no futuro, do outro lado do ecrã, o presidente da união parlamentar, Takeo Kawamura, afirmou esperar que os elementos do organismo possam estabelecer pontes entre os dois territórios “em prol da intensificação da comunicação entre a China e o Japão”.

De acordo com uma nota oficial, durante a reunião, as duas partes abordaram ainda temas como a diversificação industrial, formação de quadros, cultura gastronómica, exportação de produtos agrícolas, construção de uma cidade inteligente e de baixo carbono, aplicação de tecnologias de energias renováveis e o desenvolvimento da indústria da medicina tradicional chinesa.

Ideias com futuro

Mostrando agrado em relação à participação, num futuro próximo, do sector comercial japonês no desenvolvimento de Macau e Hengqin, Ho Iat Seng afirmou ainda que Macau está “profundamente empenhado em avançar com o desenvolvimento da tecnologia 5G” para a construção de uma cidade inteligente.

Durante o encontro, o Chefe do Executivo, congratulou ainda os interlocutores pela eleição de Yoshihide Suga como novo primeiro-ministro do Japão.

Já Takeo Kawamura elogiou, as medidas firmes tomadas por Ho Iat Seng, desde que tomou posse, e o sucesso obtido no combate à epidemia. O mesmo responsável recordou que a união parlamentar de amizade entre o Japão e Macau, Grande Baía foi fundada a 17 de Junho de 2020 e o seu consultor principal é secretário-geral do Partido Liberal Democrático japonês, Toshihiro Nikai, sendo ainda composta por mais 25 parlamentares.

Andrew Leung, académico e consultor: “Os EUA sentem que a China está a comer o seu almoço”

Andrew Leung, académico, consultor e cronista de Hong Kong, é um dos oradores numa palestra online, organizada pela Universidade Autónoma de Lisboa, que tem hoje início e onde se vai abordar o crescimento dos países euro-asiáticos, o multilateralismo e o papel que a iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota” tem nesse contexto. Andrew Leung, diz que o cenário de tensões e de multilateralismo não vai mudar com a eleição de um novo Presidente nos EUA, e defende que será difícil cimentar a liderança chinesa a nível global

 

[dropcap]A[/dropcap] sua palestra aborda o posicionamento da China nos dias de hoje por oposição ao dos EUA. Mas afirma também que vivemos num mundo multilateral.

Temos hoje uma nova ordem mundial dividida por poderes crescentes onde se inclui a China, claro, que é o país que mais compete com os EUA. Mas temos também a Rússia, Índia e outros poderes no Médio Oriente, como o Irão. O mundo está a mudar porque tem sido dominado pelo Ocidente, mas hoje temos o crescimento de poderes continentais mais tradicionais, como os países que referi. Temos então um crescimento da Eurásia e o conflito entre a China e os EUA é apenas uma parte de todo o cenário. Esta mudança de poderes é influenciada por esse conflito, mas não só. Há também outros competidores, sobretudo na Eurásia.

A Europa está a perder peso no palco mundial?

Estamos a assistir ao crescimento da Ásia contra a Europa, que está a tornar-se mais fracturante, particularmente com o Brexit, e também em termos demográficos, pois a população está envelhecida. Mesmo a Europa, como um todo, tem hoje uma economia maior do que a norte-americana, mas não é um país, é um conjunto de nações com muitos interesses. Temos todas estas dinâmicas multilaterais. O mundo era dominado pela hegemonia americana. A China não consegue retirar a liderança aos EUA, não tem capacidade para o fazer e não o quer fazer, pois o país não está interessado em intrometer-se nas questões de outros países. Mas à medida que a China se torna maior e mais influente isso reflecte-se na economia americana. O medo dos EUA é que, com o fortalecimento da China, a influência norte-americana a nível económico ou militar na Ásia-Pacífico seja ameaçada ou sofra mesmo uma erosão. Há vários factores em jogo e a guerra comercial entre a China e os EUA é apenas um deles.

Não enfrentamos uma Guerra Fria, mas é uma guerra com várias frentes. Qual o caminho para a paz global?

Antes da II Guerra Mundial não havia a bomba atómica. Mas hoje os EUA, EUA e Índia são potências nucleares, e também temos a questão dos mísseis, que estão cada vez mais sofisticados. A China está a apostar numa posição simétrica: não tem de ser igual ao seu adversário, mas tem poder. No tempo da Administração Nixon, na Guerra Fria, os EUA tinham como inimigo a URSS. A China era um país extremamente pobre e era considerado pela Administração Nixon como um parceiro para os interesses americanos contra os soviéticos. Foi um período de lua de mel, porque servia a ambos os países.

Mas isso mudou.

Depois surgiu a Organização Mundial do Comércio (OMC), a economia chinesa estava a desenvolver-se, produzia sapatos e t-shirts, o tipo de coisas que já não se produziam nos EUA. Os EUA queriam ajudar a China a entrar para a OMC, porque muitas fábricas americanas poderiam mudar-se para a China e o país poderia também liberalizar-se. Essa era a esperança. Contudo, todos estes anos depois, a China já não está a produzir sapatos e compete com os EUA em campos como a rede 5G, por exemplo. Os EUA sentem que a China está a comer o seu almoço, além de que se assiste a uma mudança de dinâmicas no Mar do Sul da China. A China agora está a aproximar-se ao Ocidente através do projecto “Uma Faixa, Uma Rota”, para que o comércio de gás e combustível possa ser feito por terra através do Médio Oriente para a Europa. Daí o interesse em desenvolver as economias na Eurásia. Já a Rússia quer manter a sua influência e tem interesses comuns com a China.

As presidenciais americanas estão marcadas para Novembro. Poderemos ver alguma mudança neste cenário de multilateralismo com um novo presidente americano?

Não creio. A ordem mundial continua, com o crescimento de países em desenvolvimento e a mudança de poder do Ocidente para o Oriente, e também com o foco na China enquanto potência emergente e a ameaça ao domínio americano. Se olharmos para os democratas, há um consenso de que a China é uma ameaça existencial para os EUA em termos económicos, militares, tecnológicos, de direitos humanos e ideológicos. Um recente inquérito da Pew Research Center revela que cerca de 60 por cento dos americanos têm uma visão negativa da China. Isto porque olham para a mudança que está a acontecer no mundo e, claro, não gostam da política chinesa e da violação dos direitos humanos. Também não gostam do desafio que a ascensão chinesa representa para a influência americana. Muitos não compreendem a China e pensam que o país vai substituir os EUA na liderança mundial, mas a China não é capaz de fazer isso.

Porquê?

Nem todos os países vão aceitar a liderança chinesa. A China está a aumentar a sua influência para defender os seus próprios interesses, e por isso é que a tendência [de um mundo multilateral] se irá manter. Este conflito entre a China e os EUA não é apenas comercial, militar ou ideológico, baseia-se também numa percepção. Porque é que tantos países seguiram, ao longo de todos estes anos, a liderança norte-americana? Por causa dos valores. Não apenas as instituições democráticas, mas a capacidade de o país assumir a liderança mundial.

Os candidatos às presidenciais norte-americanas têm perfis diferentes, e isso pode mudar a relação do país com a China.

Não acredito que muitas pessoas na China se preocupem se Trump ganhar um segundo mandato. Biden é mais equilibrado, mas a percepção de que a China é um desafio não vai mudar.

Na sua palestra aborda também a relação que a iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota” tem nesta questão do multilateralismo.

Este projecto comporta uma faixa económica entre a China e a Ásia Central, a caminho da Europa, que liga a China ao Ocidente. Há também uma rota marítima que vai até ao Mar Mediterrâneo e Mar Vermelho. A China tem vindo a falar também da Rota da Seda digital que, na verdade, liga todo o mundo. Esse é o plano da China em prol de uma maior globalização e multilateralismo. Mas claro que no final todas as ligações vão dar à China. Segundo um estudo recente da Goldman Sachs, mesmo que a economia chinesa esteja a abrandar, é ainda possível que esta se transforme na maior do mundo em 2032. Mas não é possível o PIB chinês ultrapassar o PIB americano. O PIB não é sinónimo de poder a nível mundial. Temos Macau, com um PIB muito maior do que o de Hong Kong, mas com muito menos poder. O poder de um país depende também da dimensão da sua economia e da sua conectividade. Esse dia vai chegar para a China mas, por outro lado, a trajectória da nação está a tornar-se mais difícil, porque há uma imagem negativa do país. A China tem hoje mais poder e uma maior capacidade para defender os seus interesses, mas isso gerou um maior conflito.

Hong Kong é uma das peças neste conflito entre a China e os EUA.

Hong Kong sempre foi uma economia aberta e muito dependente do comércio e sistema financeiro internacionais. Mesmo antes da transferência de soberania, já Hong Kong era um membro independente da OMC. Os EUA não reconhecem hoje esse estatuto autónomo, devido às sanções, mas a OMC não depende da autoridade norte-americana. O estatuto mantém-se, mas há o risco de erosão, e isso é muito perigoso para Hong Kong. O sector financeiro é dominado por muitos bancos americanos que beneficiam da existência de uma bolsa de valores. Mas estes bancos não recorrem apenas a Hong Kong, usando o território como base para fazerem negócios em todo o mundo. Acredito que os bancos americanos estão a ser muito cuidadosos para não saírem muito do barco [neste momento].  Mas não são apenas as tensões em Hong Kong que estão em causa no conflito entre a China e os EUA. Há Taiwan, o Mar do Sul da China, Xinjiang. Hong Kong é uma peça neste tabuleiro de xadrez, e está num fogo cruzado. Mas como disse há uma forte presença americana em Hong Kong e a banca dos EUA está a usar Hong Kong e a existência do princípio “um país, dois sistemas” para fazer negócios com o resto do mundo e também para negociar com o mercado chinês.

A lei da segurança nacional veio alterar um pouco as coisas.

Hong Kong continua a estar bem posicionado porque faz parte da China. Mesmo com a imposição da lei de segurança nacional o território continua a ser muito diferente do que se passa do outro lado da fronteira. A China quer que Hong Kong continue a actuar de forma autónoma, sobretudo para as empresas chinesas que usam o território para aceder a mercados internacionais. Acredito que o acordo de livre comércio RCEP (Regional Comprehensive Economic Partnership) pode entrar em vigor mais cedo ou mais tarde, têm sido feitos progressos. Caso entre em vigor no próximo ano Hong Kong estará muito bem posicionado.

Que análise faz a esse posicionamento no contexto euro-asiático?

Hong Kong, enquanto centro financeiro internacional, tem um papel a desempenhar na iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”, que inclui a zona da Eurásia e também da Ásia-Pacífico. Há muitas oportunidades de investimento para os profissionais de Hong Kong, como os advogados, que alargam o campo de acção na área da arbitragem. Hong Kong pode também ser usado como peça central em termos de implementação da Common Law. Haverá um crescente interesse por parte dos profissionais de Hong Kong e das suas instituições.

Macau é um território bem mais pequeno, mas também tem um papel neste contexto euro-asiático?

Macau pode apostar na área tecnológica, e foi assinado recentemente um acordo com o grupo Alibaba para transformar o território numa cidade inteligente. Isso é encorajado por Pequim, porque nos últimos anos o território tem estado dependente de uma única indústria, o jogo. Agora há uma aposta na diversificação económica e a tecnologia é um exemplo. Mas há uma coisa que Macau tem, ao contrário de Hong Kong, que é o legado português. Com a língua portuguesa há uma aproximação ao Brasil, por exemplo, que é um grande parceiro da China. O Governo de Macau tem vindo a desenvolver uma maior relação com os países de língua portuguesa.

Empresas da UE vendem à China tecnologia de vigilância – Amnistia Internacional

[dropcap]A[/dropcap] Amnistia Internacional (AI) alertou ontem que três empresas europeias vendem a agências de segurança pública na China tecnologia de vigilância que pode contribuir para o aumento dos abusos de direitos humanos naquele país.

O alerta baseia-se numa investigação da organização de defesa dos direitos humanos, divulgada por ocasião da reunião prevista para terça-feira em Bruxelas de representantes das três instituições europeias – Parlamento Europeu, Comissão e Conselho (presidência) – sobre uma revisão das regras aplicadas às exportações da União Europeia (UE).

Segundo a Amnistia Internacional (AI), três empresas europeias, com sede em França, na Suécia e na Holanda, “venderam sistemas de vigilância digital, como tecnologia de reconhecimento facial e sistemas de câmaras em rede, para os principais intervenientes do aparelho de vigilância em massa chinês”.

A AI alerta que “em alguns casos, os dispositivos exportados foram diretamente usados em programas indiscriminados de vigilância em massa, com o risco de serem utilizados contra uigures e outros grupos étnicos predominantemente muçulmanos em todo o país”.

Ainda segundo a AI, “a maioria dos governos da UE, incluindo a França e a Suécia, está a resistir aos apelos para fortalecer as regras de exportação de forma a incluir fortes salvaguardas de direitos humanos na tecnologia de vigilância biométrica, uma área que as empresas europeias dominam”.

A organização reconhece que a Alemanha, que exerce atualmente a presidência do Conselho Europeu, e a Holanda, têm defendido a necessidade de reforçar essas regras, mas a questão não foi até agora resolvida no quadro europeu.

“A indústria de vigilância biométrica da Europa está fora de controlo. Este anúncio de vendas para agências de segurança chinesas e instituições de investigação que as apoiam é apenas a ponta do icebergue de uma indústria multimilionária que está a florescer, vendendo os seus produtos a quem viola os direitos humanos, com poucas salvaguardas contra abusos na utilização final”, alerta Merel Koning da Amnistia Internacional.

O relatório cita projetos de vigilância em massa da China como “Skynet” e “Sharp Eyes”, usados pelas agências de segurança para “uma expansão da vigilância sem precedente”, e frisa que a vigilância é omnipresente na região de Xinjiang, “onde até um milhão de uigures e membros de outros grupos étnicos estão retidos em chamados ‘campos de reeducação’”.

“A condenação pelos governos da UE da repressão sistemática em Xinjiang é esvaziada enquanto continuarem a permitir que empresas vendam a tecnologia que pode estar a facilitar esses abusos”, acrescentou Merel Koning, responsável da AI para a Política, Tecnologia e Direitos Humanos, em comunicado.

A organização destaca que as ferramentas de vigilância biométrica, como o ‘software’ de reconhecimento facial, “estão entre as tecnologias de vigilância digital mais invasivas, que permitem aos governos identificar e seguir pessoas em espaços públicos e selecioná-las em função das suas características físicas ou comportamentais”.

“Estas tecnologias representam uma clara ameaça aos direitos de privacidade, liberdade de reunião, de expressão, de religião e de não-discriminação”, afirma.

As empresas denunciadas pela AI são a Morpho, que integra a multinacional francesa Idemia e em 2015 contratou a venda de equipamento de reconhecimento facial ao gabinete de segurança pública de Xangai, a sueca Axis Communications, que desenvolve e comercializa redes de câmaras de vigilância e, entre outros contratos, forneceu a expansão da rede de câmaras “Skynet” na cidade de Guilin (sul) de 8.000 para 30.000, e a holandesa Noldus Information Technology, que vendeu sistemas de reconhecimento de emoções a instituições de segurança pública chinesas para vigilância em universidades, nomeadamente no Xinjiang, entre 2012 e 2018.

A AI apela à UE que inclua a tecnologia de vigilância digital no quadro regulatório das exportações, reforce as salvaguardas de direitos humanos nas decisões comerciais e assegure que todas as empresas conduzem uma avaliação de impacto nos direitos humanos nas suas exportações.

“Em resposta à Amnistia Internacional, a Axis Communications afirmou que não lhe é exigida licença para exportar câmaras para serem usadas em programas de vigilância em massa chineses. É precisamente este o problema do atual quadro de regulação de exportações da UE. Os governos da UE têm de fazer face às suas responsabilidades e controlar esta indústria”, afirmou Merel Koning.

Ponto da situação em Hong Kong

[dropcap]N[/dropcap]o passado dia 16, o Governo de Hong Kong deu uma conferência de imprensa onde anunciou que cerca de 1.780.000 residentes se tinham voluntariado para participar no programa de testagem universal ao novo coronavírus, destes, apenas 42 apresentaram resultados positivos. O Executivo da cidade contribuiu apenas com a verba de 530 milhões de dólares de de Hong Kong para cobrir as despesas do programa, dos quais 370 milhões se destinaram a pagar os salários do pessoal médico e das equipas de apoio ao processo de testagem.

O programa foi levado a cabo pela equipa de testagem do ácido nucleico, vinda do continente expressamente para este fim. Uma vez terminado o processo, cerca de 600 membros da equipa regressaram ao continente. Ao chegarem à China, ficaram todos sujeitos a uma quarentena de 14 dias. Os investigadores responsáveis sugeriram que a testagem se deveria repetir na passagem do Outono para o Inverno, para controlar o novo surto epidémico. Afirmaram ainda que enviarão de novo as equipas para Hong Kong sem qualquer hesitação. Estas palavras aquecem-nos o coração.

Hong Kong tem actualmente 7,5 milhões de habitantes. Apenas 1,78 milhões participaram neste programa, ou seja, cerca de um quarto da população. Como salientámos no artigo da semana passada, o sucesso deste programa não é apenas determinado pelo número de participantes, mas sim pelos portadores assintomáticos identificados com sucesso, porque basta um para pôr em causa o esforço de controlo da epidemia em Hong Kong. Só identificando os portadores e quebrando as cadeias de transmissão, se conseguirá que a vida das pessoas volte ao normal.

Hong Kong precisa de equipas de apoio para implementar este programa. Numa certa medida, indica que o sistema de saúde da cidade não consegue suportar acções de larga escala. Este facto é digno de alguma reflexão. Quando o vírus apareceu, ao contrário do que aconteceu em Macau, o Governo de Hong Kong não foi capaz de implementar o plano de fornecimento generalizado de máscaras à população. Depois de muitos esforços, apareceu finalmente a máscara com filtro de cobre, mas o seu fabrico deu origem a uma polémica.

As máscaras com filtro de cobre são produzidas apenas por um fabricante e as pessoas questionaram a transferência deste negócio do sector público para o sector privado. Além disso foi também posta em causa a eficácia destas máscaras em termos de protecção. As máscaras foram também criticadas pela sua aparência, dizia-se que pareciam “roupa interior”. Como a população continua a crescer em Hong Kong e os vírus são cada vez mais perniciosos, o Governo local deve colocar o seu foco no fortalecimento do sistema de saúde e na prevenção e combate às epidemias.

Para além das medidas sanitárias já anunciadas, o Governo de Hong Kong vai aplicar 24 mil milhões de dólares locais no terceiro fundo de combate à epidemia. Depois deste anúncio, muitas pessoas criticaram a redução de verbas o que significa que quem se encontra em situação difícil vai receber menos apoio. O Secretário da Administração declarou que depois de contabilizar as verbas do fundo de apoio, o Governo espera que o próximo ano fiscal venha a ter um deficit de 300 mil milhões. No entanto, ainda existem mais 800 mil milhões das reservas fiscais fiscal, o equivalente às despesas do Governo de Hong Kong durante 12 a 13 meses.

O que quer isto dizer exactamente? Para simplificar, significa que se o Governo de Hong Kong não tiver receitas durante um ano, estes 800 mil milhões podem ser gastos para suportar as despesas. Mas, nesse caso, as reservas ficam a zeros. A cidade ainda não conseguiu erradicar a epidemia. Podemos vir a necessitar de um quarto fundo de apoio. Os três primeiros foram respectivamente de 30 mil milhões, 130 mil milhões e 24 mil milhões, num total de184 mil milhões. Perante a necessidade de um quarto fundo de investimento, e com as reservas em baixo, onde é que o Governo pode ir buscar o dinheiro necessário para apoiar as pessoas e a economia?

Para além do mais, a economia da cidade ainda não recuperou. Muitas empresas não estão a laborar na totalidade devido ao alto risco de transmissão da infecção. Mesmo depois do fim da pandemia, a economia ainda vai levar algum tempo para se restabelecer. Ninguém sabe quanto tempo vai ser necessário. Durante o período de recuperação, o Governo vai certamente receber muitos pedidos de apoio. Tendo isto em consideração, os 800 mil milhões das reservas fiscais, não são uma grande margem. Será que nessa altura teremos de considerar seriamente os conteúdos do Artigo 107 da Lei Básica de Hong Kong que estipula “equilibrar as despesas e evitar os déficits”?

O melhor que o Governo de Hong Kong pode fazer para já é combater a epidemia e recuperar a economia o mais rapidamente possível. Ao mesmo tempo, terá de pensar cuidadosamente sobre a forma de melhorar a sua situação financeira. Para isso terá simplesmente de “aumentar as receitas e reduzir as despesas.” O principal veículo para o aumento das receitas é a subida dos impostos. Mas, nas circunstâncias actuais, tal será impossível. Contar apenas com a redução de despesas é uma forma muito simplista para o melhoramento da situação fiscal.

A China e Macau conseguiram efectivamente achatar a curva epidémica, a indústria do jogo em Macau em breve estará a facturar normalmente, pelo que as receitas do Governo voltarão a aumentar. Se Hong Kong quiser alterar a sua situação financeira, terá de procurar novas fontes de rendimento, para ter mais dinheiro e reforçar o sistema de saúde.

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Escola Superior de Ciências de Gestão/ Instituto Politécnico de Macau
Blog: http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog
Email: legalpublicationsreaders@yahoo.com.hk

F4 China | Campeonato arrancou em Zhuhai de olhos postos no GP da RAEM

O Campeonato da China de Fórmula 4, a competição de monologares que irá substituir a Taça do Mundo de Fórmula 3 da FIA na 67ª edição do Grande Prémio de Macau, teve a sua primeira prova de 2020 no passado fim-de-semana. O evento que marcou o arranque do campeonato serviu também como um importante treino para todos os pilotos que projectam correr no Circuito da Guia

 

[dropcap]N[/dropcap]um evento organizado pela Associação de Desportos Motorizados de Zhuhai à porta fechada, tanto para o público, como para a imprensa, quinze Mygale-Geely disputaram as quatro corridas do primeiro fim-de-semana no Circuito Internacional de Zhuhai. Apesar de o pelotão não contar com qualquer nome sonante e ser composto principalmente por pilotos amadores que habitualmente competem em diversas categorias do automobilismo do outro lado das Portas do Cerco, as corridas foram bastante animadas.

A imprevisibilidade dos acontecimentos, e consequentemente do espectáculo em pista, não terá sido alheia a visita da chuva, principalmente no sábado. Em termos desportivos, He Zijian fez o melhor tempo nas duas sessões de qualificação que determinaram as posições de partida da primeira e da terceira corrida, e foi vencedor da primeira corrida de sábado, beneficiando do acidente na recta da meta que envolveu os dois primeiros na corrida à altura. Bei Siling venceu a corrida de sábado à tarde. No domingo, He Zijian começou o dia com nova vitória, enquanto que Stephen Hong triunfou na última corrida do fim-de-semana.

Ambição de longa data

Os monologares que veremos no Circuito da Guia no mês de Novembro chegaram à República Popular da China no início de 2015, após uma das subsidiária da Mitime Investment and Development Group, uma empresa do Zhejiang Geely Holding Group, ter comprado um lote de vinte e oito carros ao fabricante francês Mygale. Todos os carros foram equipados com motores de 2,000cc da marca Geely, o segundo maior construtor automóvel privado chinês e que hoje tem no seu portfólio marcas mundialmente conhecidas como a Volvo, a Lotus, a recém-nascida Lynk & Co ou a companhia que fabrica os famosos táxis pretos da cidade de Londres.

Devido ao elevado preço dos carros, durante estes cinco anos, apenas metade das unidades que chegaram ao país foram parar a mãos de equipas ou pilotos privados, pertencendo metade da frota à própria organização do campeonato que os aluga prova-a-prova ou então para o campeonato completo.

A temporada do Campeonato da China de Fórmula 4 deveria ter cinco provas este ano, uma delas como parte do programa do Grande Prémio da China de Fórmula 1, em Xangai. A crise sanitária reduziu a competição a duas jornadas de quatro corridas cada em Zhuhai e a duas corridas no Circuito da Guia. As corridas do território irão oferecer pontos a dobrar.

Esta presença em Macau era há muito ambiciona pela marca Geely. Desde o tempo da “Asian Formula Geely”, a competição nascida com o apoio da federação chinesa em 2006 e que antecedeu a Fórmula 4, que a Mitime namorava uma corrida no Circuito da Guia. O Campeonato da China de Fórmula 4, um dos catorze campeonatos da categoria reconhecidos pela FIA, terá sido uma terceira opção, após a recusa das equipas do Campeonato FIA de Fórmula 3 em deslocarem-se à RAEM com as condições que lhes foram oferecidas.

As estruturas da competição Euroformula Open – uma espécie de F3 e que tem um campeonato congénere no Japão – também terão declinado ponderar uma viajem a Oriente em Novembro pelas mesmíssimas razões.

Félix da Costa lamenta ausência de F3

O único ex-vencedor do Grande Prémio de Macau que publicamente comentou a ausência da Fórmula 3 no programa do evento deste ano foi o português António Félix da Costa. O vencedor das edições de 2012 e 2016 do Grande Prémio, recentemente condecorado com o grau de Comendador da Ordem do Mérito da República Portuguesa, expressou a sua tristeza pelo desfecho causado pela pandemia da COVID-19.

“A F3 em Macau é suposto ser o ponto alto do ano para aquelas equipas e pilotos, a atmosfera na prova não tem comparação, onde as equipas de F3 tornam-se no evento principal. Não fico feliz por ler estas notícias”, escreveu o piloto de Cascais e campeão da Fórmula E nas redes sociais.

A Primeira Sinfonia

[dropcap]A[/dropcap] Sinfonia N.o 1, Op. 14 de Yorgo Sicilianos, composta em 1956 e tecnicamente muito similar ao seu Concerto para Orquestra, Op. 12, pertence ao segundo período criativo do compositor, que durou cerca de 25 anos, caracterizado pela busca e experimentação das tendências musicais contemporâneas, como o dodecafonismo, o serialismo, as técnicas pós-serialistas, e a música electrónica.

Outras obras do jovem compositor tinham sido apresentadas anteriormente, a partir de 1948, e tinham sido recebidas favoravelmente pela crítica, que via em Sicilianos um compositor promissor que podia desempenhar um papel de liderança na música grega. Esta atitude favorável permaneceu inalterada quando o Concerto para Orquestra foi apresentado, embora alguns críticos tivessem questionado a possibilidade de combinar a técnica dos doze tons e desenvolvimentos recentes em geral, com a necessidade de criar uma música grega no contexto da Escola Nacional Grega, ou de acordo com os princípios do realismo socialista. Contudo, os críticos que nos anos seguintes se tornariam nos defensores da avant garde, saudaram este desenvolvimento como necessário para o futuro da música grega, como referiu na época o musicólogo grego Fivos Anoyanakis: “O Sr. Sicilianos, com o seu Concerto para Orquestra, transmite uma mensagem nova: o esforço de combinar a música grega com meios de expressão musicais europeus contemporâneos. Este é um esforço difícil e árduo, por vezes mesmo ingrato, que constitui mesmo assim uma exigência essencial. Esta é uma necessidade irreversível para a nova geração dos nossos compositores, que ardem com o desejo de renovação.”

Enquanto frequentava as aulas de Vincent Perischetti e de Peter Mennin na Juilliard School em Nova Iorque, entre 1955 e 1956, Sicilianos conheceu o colega grego, o maestro, pianista e compositor Dimitri Mitropoulos, na altura director musical da Orquestra Filarmónica de Nova Iorque. Mitropoulos concedeu-lhe o privilégio de assistir aos ensaios da orquestra, nos quais Sicilianos refere ter aprendido muito sobre várias obras e sobre orquestração. Mitropoulos acompanhou o progresso de composição da sua sinfonia, que Sicilianos viria a dedicar-lhe. A obra foi inspirada na peça The Great God Brown, de 1926, do dramaturgo americano galardoado com o Prémio Nobel da Literatura, Eugene O’Neill, notada pelo uso da máscara heróica do teatro grego antigo. Sicilianos pode ter visto a peça durante a sua permanência nos EUA. A recepção da crítica dividiu-se, mas a obra foi unanimemente considerada ecléctica, mas, de qualquer forma, não como uma composição avant garde. Ao contrário, após a sua primeira apresentação na Grécia no mesmo ano, em Novembro, pela Orquestra Estatal Grega liderada por Andreas Paridis, a Primeira Sinfonia foi recebida mais ou menos da mesma forma que o Concerto para Orquestra, isto é, como uma obra que acompanhou os desenvolvimentos, na altura, recentes, e que rompeu laços com a Escola Nacional Grega tradicional. A obra tinha sido estreada em Março de 1959 em Nova Iorque, pela Orquestra Filarmónica de Nova Iorque, sob a direcção de Dimitri Mitropoulos.

Ao longo da sua carreira, Yorgo Sicilianos recebeu distinções importantes. Em 1962 ganhou o terceiro prémio no Concurso Internacional de Quarteto de Cordas de Liège com o seu Quarteto de Cordas N.o 3, Op. 1, e as suas obras foram escolhidas duas vezes para representar a Grécia no Festival da Sociedade Internacional de Música Contemporânea (Stasimon B, Op. 25, Madrid, 1965 e Perspectivas, Op. 26, Praga, 1967). Também foi homenageado pela sua contribuição para a música com as seguintes medalhas e prémios: Cavaliere “al merito della Republica Italiana” (Roma, 1962), Chevalier des Arts (Paris, 1990), Prémio Herder (Viena, 1991) e o Prémio Eirini G. Papaioannou da Academia de Atenas (1994). Finalmente, em 1999, recebeu um Doutoramento Honoris Causa pela Universidade de Atenas.

Sugestão de audição:
Yorgo Sicilianos: Symphony No. 1, Op. 14
New York Philharmonic, Dimitri Mitropoulos – Lyra, 1991