AL | Mak Soi Kun justifica voto contra debates

Na passada quinta-feira, Mak Soi Kun votou contra a promoção de vários debates sobre os meios de pagamento electrónico. No entanto, ontem justificou o sentido de voto num comentário publicado na rede social Facebook.

“Votei contra porque, dias antes de ser feita a votação, tive conversações com o Governo e senti que estavam de boa-fé na resolução deste problema”, começou por explicar. “Como senti que o Governo estava a ouvir as opiniões da população de uma forma sincera e que estava disponível para ouvir os deputados […] votei contra as propostas”, acrescentou.

No mesmo texto, Mak Soi Kun afirmou acreditar que o Governo vai reduzir a proporção do gasto de 30 patacas para obter um cupão de 10 patacas, assim como permitir que as pessoas recorram aos cartões de consumo distribuídos no ano passado.

Sobre um outro tema, Mak Soi Kun divulgou uma interpelação escrita em que considera que um dos factores para avaliar o desempenho do Governo prende-se com a resposta às interpelações escritas dos deputados dentro dos prazos legais, ou seja 30 dias, e defendeu a necessidade da taxa ser de 100 por cento.

A ideia consta de uma interpelação do legislador, citada ontem pelo canal chinês da Rádio Macau, em que é divulgado que no quarto trimestre do ano passado a taxa de respostas nos prazos legais foi de 99,59 por cento. Mak Soi Kun elogiou o aumento da taxa de resposta que no terceiro trimestre do ano passado tinha sido de 98,03 por cento e nota que já está a “produzir resultados positivos”.

Professores | Governo não cede sobre faltas justificadas

Deputados pediam que actos como doações de sangue ou participação em actividades sindicais passassem a ser considerados válidos para faltas justificadas, mas o Governo não aceitou incluir estas matérias na proposta de lei de alteração ao estatuto do pessoal docente

 

Os deputados tentaram, mas o Governo não cedeu. Apesar da insistência de alguns membros da 3.ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa (AL), para que motivos como o exercício de actividade sindical ou a doação de sangue fossem integrados no âmbito das faltas justificadas, o novo texto da proposta de alteração ao estatuto do pessoal docente submetido pelo Governo não inclui alterações nesta matéria.

Após uma reunião que contou com a presença da secretária para os Assuntos Sociais e Cultura, Elsie Ao Iong U, o presidente da 3.ª Comissão Permanente da AL, Vong Hin Fai explicou que o Governo está firme em manter a posição inicial plasmada na versão inicial da proposta de lei, até porque o que está em causa são situações como a falta de comparência a exames ou reuniões de avaliação de alunos.

“Alguns membros insistiram que o exercício da actividade sindical ou a doação de sangue deve constar na lista de faltas justificáveis (…), mas o Governo manteve a sua posição”, vincou o deputado na passada sexta-feira.

Recorde-se que de acordo com o diploma, as faltas a exames ou reuniões de avaliação de alunos só podem ser justificadas por motivo de casamento, maternidade, paternidade, falecimento de familiares, doença, acidente de serviço, prestação de provas em curso, isolamento profilático, adopção, prisão preventiva, cumprimento de obrigações legais e motivos não imputáveis ao docente.

Braço torcido

Alterado foi, contudo, o artigo que impedia os professores despedidos após processo disciplinar de exercer funções em escolas oficiais, mesmo depois de reabilitados. Segundo Vong Hin Fai, depois de ouvir as opiniões dos membros da Comissão, o Governo voltou atrás.

“No novo texto da proposta de lei, o Governo introduziu as opiniões expressas pela comissão, que referiu existirem normas semelhantes em profissões como a de contabilista. Ou seja, depois de reabilitados, os docentes podem concorrer a funções nas escolas oficiais”, referiu Vong Hin Fai.

O Executivo mostrou também ser permeável às opiniões dos deputados sobre o exercício de funções docentes em comissão de serviço, dado que foi fixado um limite máximo de três renovações anuais para os funcionários contratados em comissão de serviço.

“O modelo de comissão de serviço é só para contratar docentes em situações bastante especiais ou quando há falta de pessoal. Depois de ouvir a opinião da Comissão foi (…) afixado um limite máximo, ou seja, a comissão de serviço tem o limite máximo de um ano escolar, renovável até ao limite de três anos escolares”, transmitiu o deputado.

Cães acolhidos em edifício industrial levantam questões de saúde pública

Fundadora de associação dedicada à protecção dos animais alugou duas fracções num edifício industrial perto da Estrada do Pac On para acolher cerca de 100 cães abandonados. O caso veio a lume após um relato anónimo que considera a situação perigosa para a saúde pública, dado o cheiro “nauseabundo” e a infestação de ratos que surgiu no edifício onde trabalham várias pessoas. O IAM diz estar a acompanhar a situação “de perto” e que não foram detectadas “irregularidades”

 

O cenário é rocambolesco e as queixas sucedem-se há meses. O facto de a recém-criada associação de protecção dos animais “心肝寶貝浪浪義工團” (ainda sem nome em português) ter alugado um espaço num edifício industrial para acolher cães abandonados, tem suscitado apreensão ao nível de eventuais perigos para a saúde pública, mas também quanto às condições em que vivem os próprios animais. O edifício localiza-se nas redondezas da Estrada do Pac On e a fracção em causa alberga cerca de 100 cães, revelou ao HM a fundadora da associação que gere o alojamento, Anita Cheang.

De acordo com o relato apresentado ao HM, por uma fonte que pediu para não ser identificada, a situação terá começado “há cerca de seis ou sete meses atrás”, após as duas fracções em causa terem sido arrendadas para albergar cães. Pouco tempo depois, o Instituto para os Assuntos Municipais (IAM) terá sido chamado ao local para averiguar a situação, tendo afirmado que tudo estaria dentro da legalidade, dado que os animais têm acesso a água e comida.

No entanto, segundo a mesma fonte, com o passar do tempo “o cheiro “nauseabundo foi aumentando” e a qualidade de vida no andar “deteriorou-se bastante”, manifestando-se inclusivamente numa “insuportável” infestação de ratos.

“Trabalha ali muita gente e eu vejo nesta situação um caso de perigo para a saúde pública. Além de que, os próprios cães estão em sofrimento. Ouve-se constantemente os cães a ladrar e a agredir-se uns aos outros (…) até porque não vejo cães a sair de lá para ser passeados. Os cães estão lá fechados dia e noite”, partilhou a mesma fonte.

Sublinhando ser da opinião de que se trata de um caso de saúde pública e de protecção dos direitos dos animais, o queixoso contou ainda que, após uma segunda visita, o IAM terá dito que não pode intervir porque os animais não se encontram em espaços comuns, mas sim em propriedade privada.

“Na minha óptica isto é o mesmo do que alguém ter a música alta em casa e a polícia for chamada a intervir. Por isso, não sei até que ponto haver um cheiro nauseabundo num prédio também não será motivo para se fazer alguma coisa”, partilhou.

Escada acima

Não é preciso chegar ao segundo andar, onde estão alojados os cães, para se sentir o cheiro. O HM esteve no local, tendo sido possível comprovar que em várias áreas comuns do edifício, incluindo corredores, patamares e escadas, a atmosfera foi efectivamente afectada pela presença dos animais.

No mesmo corredor onde estão albergados os animais e onde a luz quase não entra pelo meio de maquinaria e mercadoria amontoada, estão várias empresas, entre as quais uma padaria. No andar de baixo há uma outra empresa dedicada a serviços de transporte e a serviços fúnebres de animais de estimação chamada “Pet Paradise”, que garante nada ter a ver os animais acolhidos por Anita Cheang.

Contactada pelo HM, a fundadora da associação revela que o espaço que arrendou já alberga cerca de 100 cães e que esta foi a solução encontrada para continuar a proporcionar uma vida melhor aos animais vadios com os quais se depara na rua ou que precisam de apoio, sobretudo por temer que acabem abatidos, caso permaneçam ao abandono.

Afirmando que desde 2015 tem levado uma vida dedicada a ajudar os animais, Anita Cheang, partilha ainda que, antes de alojar os cães na actual morada na zona do Pac On, estes estavam num outro edifício situado em Coloane, do qual teve de sair devido à decisão do proprietário de vender o imóvel.

Questionada sobre se considera que albergar os animais nas actuais condições e num edifício industrial pode constituir um perigo para a saúde pública, Cheang admite que o cenário não é o ideal e que está actualmente a procurar um novo espaço para os cães, mas descarta responsabilidades relativamente à infestação de ratos.

“De facto, os ratos são muitos e podem afectar a saúde pública, mas não posso usar veneno ou acabo a matar os meus cães. O máximo que posso fazer, e faço sempre que tenho tempo, é limpar todo o piso, incluindo as áreas comuns. Não é razoável pensar que são os cães que atraem os ratos, mas sim que a comida é que é a principal fonte de propagação. Não sei de onde vêm os ratos, mas toda a gente tem o dever de assumir as suas responsabilidades, até porque no mesmo andar existe, por exemplo, uma fábrica de alimentos”, partilhou.

Sobre as queixas relativas ao mau cheiro, Anita Cheang aponta que tem vindo a ser recorrentemente multada pelo IAM no seguimento das várias queixas apresentadas.

Cheang conta ainda que a pandemia tem dificultado em muito o apoio prestado aos animais, até porque, para além de ter perdido o emprego, as despesas mensais com a alimentação e cuidados médicos dos cães que acolhe “são caras” e dependem maioritariamente do seu investimento pessoal e de doações.

“Se tivesse mais recursos claro que já tinha encontrado um espaço melhor para os animais. De qualquer forma, estou ciente que esta é uma morada temporária e que, no futuro, vou mudar-me, até porque devido às queixas, estou certa que não vou conseguir renovar o contrato de arrendamento”, acrescentou.

Tudo controlado

Em resposta enviada ao HM, o IAM diz ter conhecimento do caso e que, desde o final do ano passado, tem enviado funcionários para garantir que, tanto o bem-estar dos animais, como a saúde pública estão assegurados.

“O IAM está a acompanhar de perto a situação do alojamento em questão, que é mantido por um grupo de protecção animal de Macau. Desde o quarto trimestre do ano passado que o IAM tem enviado funcionários mensalmente para inspeccionar se as condições do local estão em linha com o estipulado na Lei de Protecção dos Animais, assim como o bem-estar dos animais. Não foram detectadas irregularidades”, pode ler-se na nota.

Por outro lado, o organismo sublinha que a entidade que gere o espaço “deve cumprir as medidas necessárias para evitar impactos na saúde pública”, tendo sido já prestado o devido aconselhamento.

“Relativamente ao mau cheiro, o IAM prestou aconselhamento aos responsáveis e indicou medidas para realizarem melhorias das condições sanitárias e continuará a supervisionar este local em questão e outros similares por forma a garantir a saúde pública, o bem-estar dos animais e o cumprimento da lei.”

Problema maior

Contactada pelo HM, Fátima Galvão fundadora da Masdaw – Associação de Cães de Rua e Protecção dos Animais de Macau, considera que infelizmente este tipo de situações, em que a população acaba por tomar as rédeas no que toca a resgatar e prestar apoio aos animais, são recorrentes no território, acabando por criar situações indesejáveis, sobretudo quando Macau “tem tudo para ser um exemplo” nesta matéria.

“Se o Governo tivesse vontade esta situação era resolvida muito rapidamente, inclusivamente envolvendo clínicas particulares para esterilizar os animais. Macau podia dar um exemplo ao mundo. Há tantos terrenos que o Governo está a reaver, que era perfeitamente possível criar um ‘santuário’, vedar um espaço onde os animais pudessem viver e depois colocá-lo à responsabilidade das associações, por exemplo. De facto, não se justifica que as associações tenham de ter os animais em edifícios industriais, não é saudável. Os animais devem viver ao ar livre e de se exercitar. Tudo isto é um contra-senso. É uma pena que, numa terra onde há tanto dinheiro não tenhamos um Governo que tenha vontade de dar um exemplo ao mundo”, referiu.

Sobre o trabalho que tem vindo a ser desenvolvido pelo IAM, Fátima Galvão aponta haver melhorias, mais concretamente um “esforço” para não abater cães e comunicar com as associações que, na maior parte dos casos, tal como acontece na Masdaw, “estão a abarrotar de cães”.

Sobre Anita Cheang, que afirma conhecer, a fundadora da Masdaw aponta que “é uma pessoa com um grande coração que vive completamente dedicada aos animais e desenvolve um esforço absolutamente incansável”. “No dia 1 de Janeiro de 2021 às 4 da manhã, a Anita andava a alimentar cães ao frio”, partilhou.

Quanto ao futuro, Fátima Galvão espera que o Governo “comece a pensar em fazer alguma coisa por quem tanto faz pelos animais”, arranjando espaços para as associações e envolvendo as mesmas na procura de soluções.

AL | Agnes Lam pede esterilização de animais e colaboração com associações

Agnes Lam considera que o Executivo deve encontrar soluções para pôr termo ao “círculo interminável em que o Governo captura os animais e, depois, a população é que os salva”.

Afirmando ter recebido pedidos de apoio de vários voluntários que não têm capacidade de adoptar cães e gatos vadios e cujos encargos financeiros atingiram um nível “insuportável”, a deputada quer que Governo e população “estejam do mesmo lado”, defendendo planos de esterilização e a criação de zonas de protecção.

“Como os residentes não querem que os animais sejam abatidos e o Governo precisa de garantir a sanidade e a prevenção de epidemias na cidade, algumas associações de protecção dos animais apresentaram, há anos, o Programa de esterilização dos gatos e cães vadios (TNR), propondo ao Governo a atribuição de terrenos para criarem zonas de protecção para asilo dos gatos e cães vadios. O Governo poderia continuar a capturar animais vadios e, depois da esterilização, estes seriam colocados nessas zonas de protecção, e as associações responsáveis pela sua gestão e os cidadãos poderiam tomar conta deles e apelar à sua adopção”, defendeu Agnes Lam na passada quinta-feira, na Assembleia Legislativa (AL), durante o período dedicado às intervenções antes da ordem do dia.

Para a deputada, caso a actual situação persista “os recursos das associações de protecção dos animais vão acabar por esgotar-se um dia, pois estas têm, constantemente, de salvar os animais do abate”.

TDM | Deputados recusam voto de homenagem a jornalistas

Os deputados recusaram homenagear os profissionais da comunicação social que defendem a Liberdade de Imprensa. A proposta tinha sido apresentada por Sulu Sou, na sequência do caso da TDM, que resultaram na demissão de seis jornalistas.

A proposta contou com os votos a favor de Sulu Sou, Ng Kuok Cheong, Au Kam San e Agnes Lam. José Pereira Coutinho escolheu abster-se, e os restantes 24 deputados votaram contra.

“A polémica em torno da liberdade de imprensa na TDM […] originou discussões na sociedade, e mesmo sucessivas demissões resolutas de jornalistas da Direcção de Informação e Programas Portugueses”, começou por contextualizar Sulu Sou. “O assunto suscitou muita preocupação do sector e do público, e várias associações de imprensa manifestaram a sua atenção”, acrescentou.

“A polémica da TDM vem destacar o valor precioso da liberdade de imprensa e da liberdade de expressão do pensamento, de que a imprensa é veículo. Este valor nuclear é o suporte das sociedades modernas […] Neste momento importante, venho […] apresentar a proposta de voto de saudação, manifestando o agradecimento e homenagem a todos os profissionais da comunicação social que defendem a liberdade de imprensa de Macau contra a interferência e censura”, propôs.

A recusa foi verbalizada pelos deputados nomeados pelo Executivo, responsável pela escolha do Conselho de Administração da emissora. “A TDM funciona de forma autónoma e é por isso que goza do artigo 27.º da Lei Básica que protege a Liberdade de Imprensa […] De um modo geral, só porque um jornalista pediu a demissão não se pode dizer que a liberdade de expressão está em causa. Não concordo com isso”, afirmou David Fong.

Após a votação também Joey Lao se justificou: “Votei contra porque, como afirmou Davis Fong, o Governo permite a liberdade de imprensa, e o caso da TDM não tem nada a ver com a liberdade de imprensa”, considerou. “O assunto é do foro interno da TDM e o Chefe do Executivo já disse que nunca teve qualquer interferência. O Governo da RAEM também nunca interveio na independência dos jornalistas”, frisou.

Jorge Coelho, ex-secretário adjunto de Macau, faleceu aos 66 anos 

Jorge Coelho, histórico político do Partido Socialista (PS) e ex-ministro do Governo de António Guterres em Portugal, faleceu esta quarta-feira à noite vítima de ataque cardíaco. Em Macau, Jorge Coelho desempenhou funções políticas entre 1987 e 1991, tendo sido secretário adjunto para a Educação e Administração Pública no governo de Carlos Melancia e chefe de gabinete do secretário-adjunto Francisco Murteira Nabo.

Em declarações à TDM Rádio Macau, o deputado José Pereira Coutinho lembrou que Jorge Coelho teve um papel decisivo na isenção do IRS para os funcionários públicos da RAEM. “Foi a pessoa que abriu todas as portas para podermos resolver todos os problemas que tínhamos, nomeadamente a isenção do IRS, o facto de ainda hoje estarmos isentos do pagamento do IRS, o facto dos aposentados de Portugal continuarem a beneficiar das casas arrendadas ao Governo da RAEM, incluindo a assistência médica e medicamentosa”.

Jorge Coelho fez, para Pereira Coutinho, “um trabalho de bastidores que perdura até hoje”. “É um dia triste para todos os que acompanhamos naqueles tempos o percurso do doutor Jorge Coelho. Como pessoa, é uma perda lamentável”, adiantou o deputado.

“Conheci o Dr. Jorge Coelho nos tempos em que ele era secretário cá em Macau. Conversava com todas as pessoas que encontrava pela frente. Era um conversador, que permitia ter amigos de todos os estratos sociais. Marcou-me bastante a sua forma de estar, quer na política, como em ter uma relação de amizade pessoal que perdurou ainda por estes anos fora”, frisou Coutinho.

De megafone

Segundo o jornal Expresso, Jorge Coelho, já a trabalhar com Murteira Nabo, chegou a desmobilizar uma manifestação de dois mil polícias chineses, em cima de uma carrinha, com um megafone. Graças ao tradutor que o acompanhava, conseguiu dizer a seguinte mensagem à multidão: “Agora, meus caros amigos, já é muito tarde, estamos muito cansados, amanhã a população de Macau precisa de ver o seu território seguro. Portanto vamos dormir”. E foi assim que os polícias acabaram mesmo por abandonar o protesto.

António Lobo Xavier, político ligado ao partido CDS-PP, lembrou no programa de debate Circulatura do Quadrado, na TVI24, a amizade que sempre teve com Jorge Coelho. “Numa das últimas vezes em que me desloquei a Macau, sítio onde nunca tinha ido, e tinha uma reunião profissional com a presidente da associação de empresários local. E quando cheguei ela tinha uma carta do Jorge Coelho escrita sobre mim onde dizia coisas que acho que mais ninguém dirá sobre mim. Recordo-o com uma saudade enorme”, apontou.

Turismo responsável

Reabrem os nossos universos às possibilidades do convívio quando passou já mais de um ano sobre a chegada à Europa do vírus que havia de impor sobre os quotidianos e as economias restrições e transformações sem precedentes nas nossas existências. O calor, entretanto, começa a apertar, aproxima-se o estio e as vontades de ar livre e beira-mar, antecipam-se possibilidades de regresso aos prazeres de longos dias de sol na praia e outros espaços ao ar livre ou de longas noites de diversão ao fresco, exploram-se oportunidades para a reanimação das indústrias do lazer e do entretenimento, que a pandemia deixou francamente atordoadas ou definitivamente aniquiladas, conforme os casos.

Com inequívoca clareza, a indústria do turismo na Europa demonstrou no ano passado a sua capacidade de persuasão: com o inestimável apoio de diversas instituições internacionais e de reputados especialistas dos universos político, empresarial e académico, entre sistemáticos apelos a práticas renovadas de “turismo responsável”, as fronteiras internacionais abriram-se à circulação de turistas ávidos de prazeres estivais para gáudio ainda maior de empresários e trabalhadores dos sectores relacionados, a viver em crise permanente desde que o covid-19 se instalou entre nós.

Não são só os empresários e trabalhadores do turismo dos países mais dependentes de formas sazonais de ultra-exploração de recursos territoriais: na realidade, as maiores empresas do planeta a operar em actividades directamente relacionadas com o turismo têm origem nos países mais desenvolvidos do mundo: é alemão o maior operador turístico do planeta, com a sua poderosa frota de aviões e milhares de hotéis a operar com marcas diferentes para diferentes tipos de clientes; são norte-americanas as maiores cadeias de hotéis, com a breve intromissão de um grupo francês entre os cinco maiores do mundo; são também norte-americanas as maiores empresas de aviação, ainda que nas entre as cinco maiores se encontrem também uma alemã e uma franco-holandesa; têm a sua base nos Estados Unidos quatro das cinco maiores empresas relacionadas com prestação de serviços turísticos, com a exceção a registar-se na Holanda.

É bom também lembrar que não foi o poder das economias do sul da Europa nem o decorrente peso político a determinar essa apressada reabertura de fronteiras ao turismo internacional: foi também (ou sobretudo) a importância do sector para essas grandes empresas das economias mais ricas, que não deixaram de promover – com intensas diplomacias e acelerados compromissos governamentais – a tal abertura “responsável” do turismo. Hoje sabemos com clareza que o turismo internacional foi, de facto, “responsável”: na realidade, foi directamente responsável pela tragédia que se seguiu ao verão, com o nível de propagação do vírus a atingir níveis incomparáveis com os que se tinham registado no início da pandemia – e que já eram suficientemente trágicos – para se concretizar uma das maiores mortandades jamais registadas na Europa em tempo de paz.

Essa responsabilidade do turismo na propagação da epidemia começa agora a ser devidamente comprovada em circuitos científicos. Em artigo recentemente publicado numa das mais prestigiadas revistas académicas da área do turismo (Journal of Travel Reserach), um grupo de investigadores de diferentes países identifica, em breve mas clarividente e rigoroso artigo, a relação de causalidade entre a intensidade do turismo praticado (quer em termos de saída, quer em termos de entrada de turistas) e a propagação da epidemia de covid-19 (quer em termos do número de casos de infecções, quer do número de mortes). Analisando mais de 90 países, o modelo estatístico utilizado detecta a relação directa entre a actividade turística, o número de pessoas infectadas e as mortes por covid-19 registadas em cada país.

Naturalmente, o estudo considera ainda a possibilidade de outras variáveis contribuírem para explicar os problemas em questão (número de infecções e mortes por covid-19 em cada país) mas são raras aquelas para as quais se detecta uma causalidade que se possa considerar estatisticamente válida (ou significante, na gíria técnica). Por exemplo, a idade da população e os meios à disposição nos serviços de saúde (medidos em termos de número enfermeiros ou de camas disponíveis em hospitais) não têm qualquer relação estatisticamente verificável com o número de infeções detectado. No entanto, o número de camas disponíveis em hospitais é identificado como uma causa relevante para a diminuição do número de mortes.

Mais interessante é a observação sobre o dinheiro gasto directamente pelas pessoas em despesas de saúde (despesas não cobertas por esquemas de seguro, público ou privado). Neste caso, o estudo identifica relações positivas, quer com a propagação da doença, quer com o número de óbitos: quanto mais as pessoas têm que cobrir despesas médicas do seu próprio bolso, mais fácil a difusão da pandemia – e a consequente mortalidade. Mais do que a estrutura etária da população ou os recursos disponíveis nos serviços de saúde, o carácter privado dos custos a suportar com os tratamentos é que aparece como determinante na propagação da doença.

Em todo o caso, o turismo internacional revela-se como a causalidade mais determinante – e é também o aspecto sobre o qual se podem tomar medidas com impacto mais imediato. Há outro Verão que se aproxima e com ele as apetências dos prazeres estivais, da recuperação dos negócios e das oportunidades de emprego. Uma nova esperança para quem vive do turismo, sejam os trabalhadores precários e sazonais, os pequenos empresários locais ou as grandes empresas transnacionais. Todos voltarão a pressionar para que que o turismo internacional reabra de forma “responsável”. Mas, como se tem visto na Ásia, a única solução “responsável” é o encerramento ao tráfego internacional. Por mais uns tempos, o turismo doméstico, mais passível de ser identificado e tratado por sistemas de saúde de carácter nacional em caso de propagação de infecções, é a única solução “responsável” (ainda que modesta) para a actividade turística.

Hackear e Meditar

Quando a mãe olhou para o computador todo desfeito, pegou numa pá para bater no filho de oito anos. O computador tinha sido comprado a muito custo. Uma mãe solteira da classe baixa inglesa não ganhava para aquilo.

Dylan tinha chorado baba e ranho para que a mãe lhe comprasse aquele computador. Vê-lo despedaçado em várias partes foi para ela um grande choque que resultou num enxerto de porrada. Mesmo cheio de nódoas negras, Dylan passou a noite a pé. O computador estava de volta à sua forma original no dia seguinte. A partir daquele dia, a mãe nunca mais lhe bateu. Conheci Dylan já com 35 anos. Comprara uma casa perto de Coimbra e sediara a sua empresa de segurança digital em Portugal. Estava a vir de uma temporada na Suécia que se sucedeu depois uma temporada em Tóquio, mas o lugar que melhor conhecia era a baía de São Francisco. Foi ali que a sua empresa cresceu, no epicentro da fecundidade digital. Quis pôr-me a aprender programação em troca de aulas de português, mas já tenho muito em mãos a aprofundar o conhecimento das programações linguísticas às quais já me dedico. Então, decidiu ensinar-me a meditar.

Se nunca viram o Zuckerberg em retiros espirituais no Hawaii, é porque não andam atentos. De facto, nada como estar profundamente submerso no tecido tecnológico para reconhecer a importância de se ausentar dele. “É preciso manter sempre um sentimento de fundamentação (groundedness)”, dizia-me. Essa necessidade de sentir a materialidade do corpo como um alicerce que se equilibra com o campo da existência mental subjectiva, acabava por ser essencial. Meditar é um processo auto-regulatório da atenção. Executar funções cognitivas complexas corre melhor com menos cortisol no sangue. Não é por acaso que a grande indústria digital está de mão dadas com a neurociência – com nootrópicos a substiuirem os nossos psiquiatrizados receptadores de serotonina cuja fórmula não muda há muitas décadas. Optimização tecnológica é também optimização humana. É apenas natural que as mentes mais curiosas tentem compreender vias alternativas para problemas antigos e essa descoberta possa passar pela medicina preventiva de origem chinesa e indiana que tantas empresas em Silicon Valley estão agora a explorar.

Sobretudo, quando os fundos de investimento cientifico de grandes farmacêuticas ocidentais preferem perpetuar fórmulas ultrapassadas, por exemplo, de antidepressivos (tradozona?). Não é necessário ser-se apelidado de estúpido quando decidimos educar-nos sobre meditações oriundas do yoga, como a meditação transcendental e a meditação budista samatha. A relação entre a meditação e a diminuição de cortisol está comprovada em centenas de estudos fidedignos. Dylan não é um new age de rastas cheio de ametista ao peito. É CEO de uma empresa de segurança digital e hackeava computadores quando era pequeno. Agora, hackeia também a vida. Coloca em causa a nossa arrogância etnocêntrica em relação à supremacia da ciência ocidental e esse questionamento é uma tendência que veio para ficar. Todos devem ter acesso àquilo que a tecnologia de ponta produz em termos de saúde. E essa tecnologia passa tanto por vacinas anti-covid como pode perfeitamente passar pela revisitação dos benefícios da ashwagandha. Só se chega à verdade quando esta é permanentemente questionada. Continuemos a fazê-lo sem pudor e, acima de tudo, sem preconceitos.

Depois de grande

No dia 2 de Abril assinalou-se o dia mundial da consciencialização do autismo. Já escrevi um par de crónicas aqui para o Hoje Macau sobre o assunto; nem sempre o faço, nem sempre tenho a energia para voltar a dizer mais ou menos as mesmas coisas a pretexto de divulgação pedagógica ou de página de diário. Há imensa gente a trabalhar todos os dias para desfazer os mitos acerca do autismo e das suas consequências, para quê acrescentar ao ruído?

Na verdade nada tenho a dizer sobre o autismo, essa constelação tão vasta e desconexa de características. Nunca conheci dois autistas iguais. Mas reconheço um autista ao longe. É como se o autismo fosse uma nacionalidade e não uma condição: a gente percebe que todas aquelas pessoas, muito diferentes umas das outras, vêm do mesmo sítio. Sabemos muito pouco acerca dos factores que espoletam o seu aparecimento (daí proliferarem tantos charlatães a fazer dinheiro à conta do desespero dos pais). Não há medicamentos, as terapias que existem são extremamente caras e apresentam resultados muito díspares e mesmo os melhores profissionais e as melhores práticas não garantem qualquer melhoria significativa.

O meu Guilherme vai fazer dezoito anos em Setembro. Não fala. Não consegue abrir a porta de um armário para roubar um pacote de bolachas. Não sabe limpar o rabo depois de ir à casa de banho. Não consegue dizer se lhe dói alguma coisa ou onde lhe dói. Tende a meter tudo quanto é migalhinha à boca (uma condição chamada «pica»).

Nunca beijou uma rapariga (ou um rapaz). Não gosta de desenhar, de colorir, de fazer puzzles ou legos, de brincar com outras crianças (ou não sabe). Tudo quanto gosta de fazer é de ver desenhos animados na televisão ou no telemóvel. É surpreendentemente ágil a deambular nos seus vídeos preferidos do Youtube e nesse aspecto maneja um telemóvel com a desenvoltura expectável para um adolescente da sua idade.

No próximo ano ou no seguinte deixa de ir para a escola (que funciona, para um autista com as suas limitações, mais como um centro de terapia ocupacional do que qualquer outra coisa). Não sabemos bem o que fazer com ele depois disso. Ninguém sabe. Os apoios aos autistas vão sobretudo no sentido de recuperá-los para uma vida tão normal quanto possível na maioridade. O investimento social e público pára por aí. Percebe-se.

Há umas décadas, nem isso acontecia. Nem os autistas nem as suas famílias sabiam com o que lidavam. Eram simplesmente «atrasados», crianças atoleimadas incapazes de aprenderem a ler ou a escrever, excêntricos míopes para os códigos sociais, os tontos da aldeia. Quando os pais morriam ou se fartavam deles, eram entregues a uma instituição qualquer (quando esta existia) ou viviam da caridade alheia.

Apesar da manifesta insuficiência dos apoios estatais e/ou sociais, demos uns passinhos desde então. Já existem algumas associações cuja vocação é acomodar a vida pós-escolar dos autistas. Mas são ou insuficientes e com longas listas de espera (vaga um lugar quando morre um dos seus usufrutuários) ou extremamente dispendiosas. Mas de que estávamos à espera num país que enfia os seus velhos em sítios onde não conceberia deixar o cão nas férias? A massificação do trabalho teve a consequência positiva de permitir a todas e todos prosseguirem uma carreira e serem independentes, mas acabou por desfazer a rede familiar e social que sustentava a possibilidade de uma vida condigna para os mais velhos e os mais frágeis.

Vou saboreando este fim de festa enquanto a realidade não vem – mais uma vez – arrancar-me bruscamente ao meu torpor. Todos os dias me repito a mim mesmo que tenho de começar a pensar agora. Todos os dias adio. Chegará um dia em que não poderei adiar mais.

Ai Love Venezia  

No Outono de 1987 regressas a Veneza e, depois da leitura matinal do Il Gazzettino, fechas-te num pequeno hotel a escrever o teu terceiro romance. Dez anos depois, no prefácio à segunda edição, Luciana Stegagno Picchio escreveu: “É uma meta-Veneza apenas fruível de olhos fechados, tal como uma música que nos envolva e que nos absorva pelas suas volutas em espiral, ora esfumadas no enleio do sentido ora solidamente apegadas à realidade dos nossos dias, através da reprodução de factos e ambientes da actualidade”. 
 
É a mais pura verdade que um romance apenas cabe no (limite) que escapa à experiência, depois de se ter subido as escadas a correr. O esforço é essencial. O que nele se representa foge às referências que seriam óbvias, mesmo se a cidade e as suas águas e canais forem vistas de cima, a partir das águas-furtadas, em noite de trovoada. O que se passa num romance são as latas de conserva de Warhol. Elas existem para que se possa amar aquilo que passaria despercebido. Elas, as personagens, não quantificam objectos. Antes duvidam, quando não existem sequer questões para pôr em causa. Antes questionam, sem que haja sequer respostas possíveis à vista. Antes se dispõem a responder, ainda que não existam perguntas que atravessem a encenação criada. Sim: um romance tem a sua música própria ambulante que voa sobre o mundo e o captura como uma tautologia (por vezes torna-se numa máquina surda que sabe serrar todas as dunas e que adora falar de lenha como se fosse um navio a aprender o futuro).
 
Estás agora na esplanada do Carrossel e o Almeida Faria pergunta-te: “como estava este ano a nossa Veneza?”. Tinhas acabado de regressar, duas décadas depois da tua reclusão romanesca a poucos metros do Rialto, num pequeno hotel feito para transformar os ossos daquela cidade irreal numa cartografia de palavras e elipses com marés, maleitas e escolhos à flor da água. 
 
A literatura não representa nada que não a si mesma, nem conta histórias que ameacem ser fidedignas. Num romance, como o que escreveste em 1987, apenas interessa que na colheita haja aquilo que o olhar de qualquer mortal capta quando chega aos limites do Veneto: um batimento que se perca entre o sublime e a pulsão de morte. Um sentimento de perdição que saiba acender ou alcançar o íntimo de uma existência realizada. A Veneza literária é um intertexto vasto e cheio de história. Na língua portuguesa, Almeida Faria é certamente o criador mais apurado desse percurso. Sabendo isso, reagiste com algum alarido. 
 
Respondes, certamente com razão, que nas últimas décadas, Veneza se transformou em Venezilândia, isto é, numa espécie de nova Marbella onde os turistas (doze milhões por ano) – fardados para resistirem ao peso da viagem e do património – fazem a vez do peregrino sem missão nem destino. Já lá ia o tempo em que Veneza respirava com limpidez as heranças de Dante, Ruskin, Tiepolo, Goethe, Byron, Casanova, Henry James ou Marino Contarini. Hoje, os fantasmas digitais e as pizzas liofilizadas tornaram-se em anfitriões dos novos bárbaros que, há muitos séculos, tinham sido a causa da fundação da cidade em plena Laguna. Paradoxos.
 
Respondes que a farda vale pela missão e pela nova santidade: calções de fibra colorida enxameados de bolsos, ténis com sabor a marca, t-shirt´s com mensagens estilo Twitter (concebidas para a rapidez indiferente do olhar – Ay love you, Fuck yourself, Try just Once) e a invariável mochila que militariza o nomadismo de galgo insaciado; sem esquecer ainda o manancial de sacos, guias, telemóveis e garrafas de água que substituem o velho cantil; fitas no cabelo, pulseiras e lenços de pirata para absorver o suor da caminhada sem paragens, pois a finalidade do novo caminhante é transformar cada passo numa meta, esgotando aí o sentido e o maior desejo do século: o stress. Por fim, lucubraste sobre o ombro. Sim: um ombro sempre queimado pelo sol. O bronze em estado puro. 
 
Respondes que o ombro é o princípio e o fim de tudo, embora não passe de um pequeno dorso musculado, flácido, ossudo ou elegante. Tanto faz. O que fará do ombro uma âncora dos deuses é a fina correia de couro, ou de plástico, que nele se suspende. O ombro é assim o porto de abrigo de uma máquina que diz ao viajante que tudo o que está à sua volta pode ser reduplicado. Parado ou em corridinho, em fotografia ou em filme. Cada ombro seria, nesta óptica de realidade aumentada, o porta-estandarte de uma euforia mágica que faz do turista um ser com quatro braços, quatro pernas, quatro olhos, duas cabeças, dois pescoços e duas bocas. Tudo a dobrar. Ou duas S. Marcos com oito e não com quatro cavalinhos de ouro oferecidos por Bizâncio à Sereníssima. Ou sessenta e oito e não trinta e quatro arcos da Loggia do Palazzo Ducale virados para o Canale. Ou quatro e não dois mouros de pátina escura a baterem as horas na Torre dell´Orologio. Tudo a dobrar. Mas uma dobra que se multiplicará até ao infinito como Deleuze e sobretudo Leibniz adorariam. 
 
Almeida Faria bebe o café compassadamente e conhece há muito este divórcio. Como escreverias mais tarde, em ‘Anatomia’, já o ombro onde se suspendia o mundo fora substituído pelos dois polegares a alardear telemóveis: “A finitude ata-nos a pequenas coisas” (…) “compraz-se com os balidos longínquos/ e sabe coar como ninguém os degelos/ imprevistos” (talvez por fugir ao lugar desses balidos para nele afinal permanecer, tal como acontece aos viajantes que vivem apenas do fluxo das suas inúmeras e protegidas viagens). Somos todos peregrinos, afinal, e Veneza, essa beleza imaculada, creio que nunca realmente existiu à superfície da terra.
 
(texto – apenas parcialmente – extraído de ‘Órbita-I: Visão Aproximada’, título de obra de longo curso em trânsito)
 

Pequim contra passagem de contratorpedeiro dos EUA no Estreito de Taiwan

A China protestou ontem contra a passagem de um contratorpedeiro dos Estados Unidos pelo Estreito de Taiwan, numa altura em que ambas as nações aumentam as suas actividades navais na região. A China rastreou e monitorou o USS John S. McCain, ao longo de sua passagem, na quarta-feira, disse Zhang Chunhui, porta-voz do comando militar do leste da China, em comunicado.

A passagem do contratorpedeiro enviou o “sinal errado” ao governo de Taiwan e “deliberadamente perturbou a situação regional, ao colocar em risco a paz e a estabilidade em todo o Estreito de Taiwan”, disse. A China opõe-se firmemente a estas movimentações e as forças chinesas responderão com “estritas precauções e vigilância”, acrescentou.

Numa declaração de apenas uma frase, a Marinha dos EUA disse que o McCain “realizou um trânsito de rotina no Estreito de Taiwan, em 7 de abril, em águas internacionais, de acordo com a lei internacional”, lê-se.

A passagem do McCain segue o anúncio da China na segunda-feira de que seu porta-aviões Liaoning e embarcações associadas estavam a realizar exercícios perto de Taiwan, visando “salvaguardar a soberania nacional, segurança e interesses de desenvolvimento” chineses.

A Marinha dos EUA anunciou que o porta-aviões Theodore Roosevelt e o seu grupo de ataque reentraram no Mar do Sul da China no sábado para “conduzir operações de rotina”. Embora o Estreito de Taiwan esteja em águas internacionais, o seu trânsito por navios da Marinha dos Estados Unidos é visto como uma demonstração parcialmente simbólica de que Washington não permitirá que as forças de Pequim dominem aquele espaço marítimo.

As incursões aéreas chinesas, incluindo voos ao redor da ilha, tornaram-se uma ocorrência quase diária, servindo para anunciar a ameaça e aprender mais sobre as capacidades de Taiwan. Na quarta-feira, o ministro dos Negócios Estrangeiros de Taiwan disse que a ilha vai defender-se “até ao último dia” caso seja atacada pela China.

As vastas melhorias nas capacidades militares da China e a sua crescente actividade em torno de Taiwan levantaram preocupações nos EUA. Durante uma reunião regular na quarta-feira, o porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Ned Price, reiterou que o compromisso de Washington com Taiwan é “sólido como uma rocha”. “Acreditamos e sabemos que isto contribui para a manutenção da paz e da estabilidade em todo o Estreito de Taiwan e também na região”, disse Price. “Os Estados Unidos mantêm a capacidade de resistir a qualquer recurso à força ou a quaisquer outras formas de coerção que colocariam em risco a segurança ou o sistema social ou económico do povo de Taiwan”, afirmou.

Trip.com anuncia entrada na bolsa de Hong Kong

A agência de viagens virtual chinesa Trip.com vai entrar em bolsa, em Hong Kong, no dia 19 de abril, numa operação que renderá cerca de 1.353 milhões de dólares informou ontem a empresa. Em comunicado enviado à bolsa de Hong Kong, a empresa, que já está listada no índice norte-americano Nasdaq, anunciou que vai vender 31,6 milhões de acções a um preço máximo de 333 dólares de Hong Kong.

Esta marca seria um ‘prémio’ de pouco mais de 10%, em relação ao preço com que fechou na quarta-feira, no mercado de tecnologia de Nova Iorque, de 38,8 dólares por título. A empresa habilitou uma opção de lote suplementar (‘greenshoe’) para a qual emitiria até mais 4,75 milhões de acções, ou seja, um máximo de 15% da participação em oferta.

A empresa torna-se, assim, a última das grandes empresas chinesas de tecnologia a procurar um segundo IPO numa praça financeira chinesa, devido aos receios de que os Estados Unidos possam excluir empresas chinesas da sua bolsa, algo que já aconteceu com algumas empresas que Washington considerou próximas do Exército chinês. O último dos grandes IPOs de Hong Kong foi o Baidu, o principal motor de busca da China. O Baidu é um dos principais acionistas da Trip.com, já que controla 11,5% do capital social, segundo os dados fornecidos à bolsa de Hong Kong.

Trip.com, anteriormente conhecido como Ctrip, indicou que planeia usar 45% dos recursos do seu IPO para melhorar as ofertas de viagens e a experiência do utilizador, e que gastará o mesmo valor para “melhorar a eficiência operacional”. Os restantes 10% destinam-se a outros fins, que podem incluir investimentos estratégicos, embora a empresa esclareça que neste momento não existem negócios na carteira para investir ou adquirir.

Perante o impacto da pandemia da covid-19, que restringiu o turismo internacional durante quase todo o ano de 2020, a Trip.com teve um prejuízo de 3.247 milhões de yuans (418 milhões de euros), em comparação com ganhos de 7.011 milhões de yuans (902 milhões de euros), no ano anterior. A empresa mostrou a sua confiança na retomada da indústria do turismo, em 2021, principalmente no mercado chinês, onde o coronavírus está sob controlo há algum tempo.

Jogos Olímpicos de Inverno | Todos contra o boicote

O Governo chinês alertou ontem Washington para que não boicote os Jogos Olímpicos de Inverno 2022, em Pequim, depois de o executivo de Joe Biden ter revelado que está a considerar uma abordagem conjunta com aliados. O boicote surge como uma possibilidade, face aos abusos contra minorias étnicas de origem muçulmana em Xinjiang, no extremo noroeste da China.

Um porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros da China rejeitou as acusações e alertou sobre uma “resposta robusta da China” a um potencial boicote aos jogos. “A politização do desporto vai prejudicar o espírito da Carta Olímpica e os interesses dos atletas de todos os países”, disse o porta-voz, Zhao Lijian. “A comunidade internacional, incluindo o Comité Olímpico dos Estados Unidos, não o aceitará”, apontou.

O Departamento de Estado dos EUA sugeriu que um boicote olímpico está entre as possibilidades, mas um alto funcionário disse mais tarde que não foi ainda discutido. O Comité Olímpico Internacional e o Comité Olímpico e Paraolímpico dos EUA já disseram que se opõem a boicotes. A oposição foi reiterada por Susanne Lyons, presidente do conselho de diretores do Comité Olímpico e Paraolímpico dos EUA. “Nós opomo-nos a boicotes de atletas, porque eles mostraram ter um impacto negativo sobre os atletas, embora não tratassem de forma eficaz as questões globais”, disse Lyons.

O Comité não deseja “minimizar as graves questões de Direitos Humanos que estão a acontecer na China”, mas acredita que diplomatas e oficiais do comércio e outros governantes estão mais bem equipados para lidar com estas preocupações.

O secretário de imprensa da Casa Branca, Jen Psaki, disse na quarta-feira que a Casa Branca não está a planear um boicote aos jogos de 2022. “Não discutimos, e não estamos a discutir, qualquer boicote conjunto com aliados e parceiros”, esclareceu.

Xi Jinping | Crescimento da China é uma oportunidade para a UE

O Presidente chinês e a chanceler alemã tiveram a primeira conversa telefónica deste ano. Angela Merkel garante que a estratégia europeia, em relação à China, é autónoma

 

“O desenvolvimento da China é uma oportunidade para a União Europeia”, disse o presidente Xi Jinping na quarta-feira, exortando a União Europeia (UE) a “realizar julgamentos dignos de forma independente e alcançar de facto a autonomia estratégica”. Numa conversa telefónica com a chanceler alemã Angela Merkel, Xi disse que a China espera que a Alemanha e a UE realizem esforços conjuntos com a China para proteger e promover o desenvolvimento saudável e estável de sua cooperação, trazendo assim mais certeza e estabilidade a um mundo volátil.

Foi a primeira vez que Xi conversou por telefone com Merkel neste ano. No ano passado, os dois líderes realizaram quatro conversas telefónicas para trocar impressões sobre as relações bilaterais e a cooperação entre a China e a União Europeia.

Eliminar distrações

Observando que a sua comunicação no ano passado desempenhou um papel importante para o desenvolvimento das relações China-Alemanha e China-UE, Xi afirmou que o aumento da cooperação China-Alemanha e China-UE deverá alcançar resultados importantes.

Xi disse que “para encarar as novas oportunidades e desafios enfrentados pela relação China-UE, é essencial manter a direção geral das relações China-UE numa perspectiva estratégica, respeito uns pelos outros e eliminar distrações”.

“A China está pronta para trabalhar com a UE para garantir o sucesso de uma série de agendas políticas significativas para a próxima etapa por meio de consultas, aprofundar e expandir a cooperação prática em toda a linha e fortalecer a comunicação sobre as mudanças climáticas e outras questões de governação global para praticar em conjunto o multilateralismo”.

O presidente chinês disse ainda que a cooperação prática entre a China e a Alemanha tem alcançado progresso apesar da pandemia da Covid-19 e outros factores, e, por cinco anos consecutivos, a China tem sido o maior parceiro comercial da Alemanha.

Partilhar, partilhar sempre

Xi encorajou os dois países a promoverem a cooperação bilateral sob o princípio do respeito mútuo e benefício mútuo para injectar confiança e ímpeto para a cooperação China-UE e a recuperação econômica mundial.
“A China está disposta a partilhar as oportunidades criadas pela nova ronda de abertura com empresas da Alemanha e de outros lugares”, disse Xi, acrescentando que “a China espera que a Alemanha permaneça aberta e ofereça mais conveniência para expandir a cooperação mutuamente benéfica entre suas empresas”.

O presidente chinês também pediu que as duas nações promovam intercâmbios em áreas como ciência e tecnologia, educação, cultura e desporto, aproveitando as oportunidades apresentadas pelo 50º aniversário das relações diplomáticas entre a China e a Alemanha e os Jogos Olímpicos de Inverno de Beijing no próximo ano.

Merkel: Europa autónoma

Por seu lado, Merkel disse que a UE aderiu a uma política externa autónoma. “A cooperação Alemanha-China e UE-China é cada vez mais necessária hoje para lidar com os desafios que o mundo enfrenta”, acrescentou.

“Reforçar o diálogo e a cooperação entre a UE e a China não apenas está de acordo com os interesses de ambas as nações, mas irá também beneficiar o mundo”, afirmou a chanceler, reforçando que a Alemanha está disposta a desempenhar um papel activo.

Merkel acrescentou ainda que “a Alemanha trabalhará com a China de modo a preparar a nova ronda de consultas intergovernamentais China-Alemanha e retomar o intercâmbio de pessoal o mais rápido possível”.

Mais tarde, a porta-voz do governo alemão Ulrike Demmer disse que Merkel e Xi tinham discutido os esforços internacionais para produzir e distribuir vacinas COVID-19, aprofundar a cooperação económica e as medidas para proteger o clima e a biodiversidade.

Demmer disse que os líderes concordaram em aprofundar os laços bilaterais nas consultas governamentais sino-alemãs planeadas para finais de Abril. “A Chanceler salientou a importância do diálogo sobre toda a gama de laços, incluindo questões sobre as quais existem opiniões diferentes”, disse Demmer, sem dar pormenores sobre as áreas em que a Alemanha e a China diferem.

Fotografia | Exposição “Sombras” inaugurada na próxima semana na Casa Garden

A Casa Garden abre portas na próxima semana para a exposição “Sombras”, com 49 fotografias de Vera Paz. A mostra apresenta sequências narrativas com imagens captadas em Macau e diversos locais de Portugal ao longo de vários anos, através de telemóvel

 

Foi com recurso à câmara de um Iphone8 que Vera Paz captou as imagens da sua sombra que compõem agora a exposição “Sombras”. A inauguração da exposição decorre na quinta-feira da próxima semana, na Casa Garden, pelas 18h30.

O ensaio fotográfico da autoria de Vera Paz apresenta 49 fotografias sobre Kline e uma caixa de luz em plexiglass, e foi criado a partir do registo de 500 fotografias capturadas entre 2017 e 2020, através de telemóvel. “Nesta fase da minha vida e ao fim destes anos de repente comecei a olhar e percebi que tinha mais de 500 imagens de sombras. E pensei: porque não fazer um exercício ou ensaio sobre estas figuras? Sobre estas sombras projectadas que narram um percurso e uma existência de mim? No fundo é uma auto-representação”, descreveu.

“A exposição reflecte a memória de um tempo e do seu devir, ao longo dos anos, em sequências narrativas onde a figura humana se materializa em sombras projectadas”, comunicou a associação cultural d’As Entranhas, que organiza a exposição.

Vera Paz, que é actriz, começou a tirar as fotografias pelo seu gosto por sombras. “Sempre gostei de tirar fotografias mas não tenho conhecimentos técnicos. E hoje em dia os telemóveis são um recurso, quase uma extensão de nós próprios”, observou. Num tempo marcado pelo “ruído” e “caras”, as sombras interrompem essa sensação. “Aquela imagem que fica ali é como se fosse o negativo daquele tempo. (…) E para mim as sombras são sempre muito silenciosas”, notou.

Estado de alma

As fotografias foram tiradas em Macau e em diversas cidades e vilas de Portugal, e o contexto torna-se visível no resultado final. De acordo com a autora, as fotografias de Portugal são mais luminosas e as texturas também marcam pela diferença. “São universos diferentes, são estados de alma diferentes”, disse a artista.

A nota d’As Entranhas, da qual Vera Paz é directora artística, descreve ainda que se trata de uma cartografia de lugares “desenhados” através das sombras no exterior, nos espaços públicos das cidades e também das sombras em espaços interiores e privados. “O contorno da luz, do traço instantâneo da silhueta na sua repetição e diferença, marca a presença ausente de um tempo habitado”, pode ler-se. Esta não é a primeira exposição de fotografia de Vera Paz. Em 2018 realizou uma mostra sobre noivas de São Lázaro que abrangia também outras vertentes, como o audiovisual. A exposição fica patente ao público de 15 de Abril a 15 de Maio e é de entrada livre.

Covid-19 | Residentes permanentes impedidos de regressar do Nepal 

Dez residentes permanentes de Macau, actualmente no Nepal, estão a ter dificuldades no regresso uma vez que a companhia aérea, a Nepal Airlines, não os deixa embarcar, alegando não poder aceitar residentes. No entanto, foram aceites reservas e pagamentos. O Governo de Macau assegura que nunca proibiu a sua entrada

 

A companhia aérea Nepal Airlines não está a deixar embarcar dez residentes permanentes de Macau, alegando não ter indicações para receber residentes. Os primeiros bilhetes foram reservados, sendo que o último voo que estas pessoas deveriam ter apanhado data de 1 de Abril. No entanto, não foram autorizados a embarcar.

O caso tem sido acompanhado pelo deputado José Pereira Coutinho, que tem prestado apoio a vários residentes que pretendem voltar ao território. “Eles [residentes] conseguiram comprar bilhetes para irem de Kathmandu para Macau, e deveriam chegar a 1 de Abril. Só que a compra dos bilhetes foi cancelada. Para nossa surpresa, e de acordo com as informações obtidas junto dos residentes que estão no Nepal, o Governo deu indicações à companhia aérea para não autorizar a venda de bilhetes para estes residentes”, disse ao HM.

Coutinho diz não compreender “porque há discriminação”, uma vez que “há voos da América ou da Europa e os residentes permanentes recebem todo o apoio, porque têm o direito de voltar a Macau”. No entanto, “se são oriundos de outras regiões, como o Nepal ou a Índia, a colaboração falha”, alerta o deputado.

Para dia 12

O deputado já questionou o Executivo sobre esta matéria, mas diz não ter recebido ainda resposta. O HM contactou o Governo sobre o problema, tendo os Serviços de Saúde de Macau (SSM) respondido que “as autoridades não proíbem o regresso de residentes”.

“Os Serviços de Saúde responderam a um pedido de consulta efectuado pela Autoridade de Aviação Civil. De acordo com informações existentes, no próximo dia 12 de Abril está agendado um outro voo do Nepal com destino Macau.

Os indivíduos interessados podem contactar a companhia aérea, directamente, para obter mais informações”, lê-se na resposta enviada. O HM tentou chegar à fala com residentes que se encontram no Nepal neste momento, mas até ao fecho desta edição não foi possível estabelecer contacto.

TSI | Novo julgamento de homem condenado por conduzir embriagado

O Tribunal de Segunda Instância (TSI) reenviou para novo julgamento o processo que levou à acusação de um cidadão da prática de um crime de condução em estado de embriaguez. Em causa, está o facto de o TSI considerar que o método de cálculo da taxa de álcool no sangue do suspeito que fundamentou a decisão não é válido.

Segundo um acordão divulgado ontem, o método de cálculo utilizado que está na base do retrocesso é denominado “taxa de eliminação de álcool” e consiste na redução do teor alcoólico no sangue com o tempo, ou seja, na ideia de que, em geral, o teor alcoólico em cada mililitro de sangue desce 0,17 a 0,104 miligrama por hora.

Isto, tendo em conta que o suspeito, após ter embatido num automóvel ligeiro pelas 2h00 do dia 13 de Março de 2019, colocou-se em fuga, tendo sido submetido ao teste de alcoolemia apenas pelas 11h45 do mesmo dia, no seu domicilio.

O resultado do teste, 0,72 gramas por litro de sangue, levou a que o cálculo determinasse que, na altura do acidente, o arguido estaria a conduzir com uma taxa de álcool no sangue entre 2,187g/l e 1,618g/l, levando-o a ser condenado a uma pena única de 9 meses de prisão, suspensa na sua execução por 2 anos e na pena acessória de inibição de condução pelo período de 2 anos e 9 meses. Em causa, está a prática dos crimes de condução em estado de embriaguez, condução perigosa de veículo rodoviário e de fuga à responsabilidade.

Segundo o acordão do TSI, o método de cálculo “taxa de eliminação de álcool” não é “o método de exame definido na respectiva lei e diplomas”, pelo que, no apuramento da taxa de álcool, o Tribunal “violou as regras sobre o valor da prova tarifada”.

Notas falsas | Desmantelada rede suspeita de lesar vítimas em 10 milhões

Numa operação conjunta com as autoridades de Guangdong, a PJ deteve uma rede criminosa suspeita de lesar várias vítimas em 10 milhões de patacas. No total, foram detidos três suspeitos em Macau e 21 no Interior da China. Foram ainda interceptadas 125 pessoas em vários casinos do Cotai. Em causa está a utilização de notas de treino de 1.000 dólares de Hong Kong para concretizar câmbios, com prejuízo total para os clientes

 

Através de uma acção concertada entre as polícias de Macau e Guangdong foi desmantelada uma rede transfronteiriça dedicada à prática de um esquema de burla, que utilizava notas de treino para lesar clientes interessados em trocar renminbis por dólares de Hong Kong. No total, as vítimas foram lesadas em 10 milhões de patacas, tendo sido detidos três suspeitos em Macau e 21 no Interior da China.

De acordo com as informações reveladas ontem em conferência de imprensa pela Polícia Judiciária (PJ), após “averiguação profunda” e accionados os mecanismos de cooperação entre as autoridades dos dois territórios, foi iniciada uma acção conjunta entre os dias 25 de Março e 2 de Abril, da qual resultaram as 24 detenções em Macau e no Interior da China.

As três pessoas detidas em Macau têm idades compreendidas entre os 30 e os 37 anos, são oriundas do Interior da China e suspeitas de estar envolvidas na prática de crimes de burla com uso de notas para treino, no valor de 80,100 e 200 mil renminbi.

Durante o mesmo período, a PJ interceptou ainda outras 125 pessoas em Macau, mais precisamente 103 homens e 22 mulheres, em vários casinos do Cotai, tendo sido reencaminhadas à esquadra para investigação, por alegado envolvimento em trocas ilegais de dinheiro.

Já no Interior da China, foram detidas 21pessoas, todos homens, com idades compreendidas entre os 19 e os 35 anos, incluindo os quatro cabecilhas da rede criminosa, um deles proveniente de Jiangxi e os outros três de Jiangsu.

Segundo as autoridades do Interior, os cabecilhas “estavam encarregados de coordenar e comandar as operações” que se materializavam sobretudo nos casinos de Macau.

A investigação levada a cabo após a operação, levou as autoridades a concluir que a rede esteve envolvida em 73 casos relacionados com transacções ilegais de dinheiro e que o valor total dos crimes ronda as 10 milhões de patacas. O porta voz da PJ revelou ainda que a rede criminosa começou a funcionar em 2020 e que tem, pelo menos, 100 membros, incluindo os cabecilhas.

“Este desmantelamento salienta a eficácia da cooperação entre as polícias da China e de Macau e mostrou a capacidade e determinação das duas partes no combate aos crimes transfronteiriços”, rematou o porta-voz da PJ.

Os três suspeitos detidos em Macau serão presentes ao Ministério Público (MP), onde vão responder pela prática do crime de burla.

Em crescendo

Durante a conferência de imprensa, o Chefe do Departamento de Investigação de Crimes relacionados com o Jogo e Económicos, Sou Sio Keong, traçou o cenário deste tipo de casos, sublinhando que desde Outubro de 2020 “o número de casos de burla com recurso a notas para treino com valor o de 1.000 dólares de Hong Kong tem vindo a crescer”.

“Entre Outubro de 2020 e Março de 2021, a polícia de Macau já recebeu 101 denúncias ou informações relacionadas com estes casos”, acrescentou.

Sobre o modo de actuar das redes criminosas, o responsável apontou que, normalmente, o negócio da troca de dinheiro costuma acontecer dentro dos casinos ou na respectiva área adjacente. Para concretizar a burla, antes do negócio, são recrutados, através de redes sociais e plataformas de comunicação, intermediários responsáveis por entregar as notas de treino aos clientes.

Para enganar as vítimas e ter a certeza de que estas não estão por perto quando se aperceberem tratar-se de notas de treino, o negócio “só é feito depois de efectuada a transferência bancária do valor para bancos do Interior da China” e os burlões arranjam “artimanhas para não mostrar directamente as notas” durante a entrega, tais como “tapar as notas com sacos de plástico” ou “colocar algumas notas verdadeiras por cima das notas de treino”.

AL | Questionado abandono de português nos Serviços Públicos

José Pereira Coutinho, ligado à Associação de Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM), mostrou-se preocupado com a forma como a língua portuguesa está a ser tratada nos Serviços Públicos. O deputado disse ainda que ao nível da falta de eficácia há trabalhadores que dominam o português e estão a ser obrigados a redigir documentos em chinês.

“Um dos exemplos mais paradigmáticos é a falta de respeito para com as línguas oficiais obrigando trabalhadores de língua materna portuguesa a redigirem propostas e informações em língua chinesa e os de língua chinesa para a língua portuguesa”, atirou. “Este tipo de gestão incompetente reduz a eficiência dos trabalhadores e sobrecarrega os colegas que se vêem obrigados a dar mútuo apoio. Desde quando a língua portuguesa deixou de ser oficialmente língua de trabalho dentro dos serviços públicos?”, questionou.

AL | Kou Hoi In diz que Coutinho não domina bem o chinês

O presidente da AL Kou Hoi In admoestou Coutinho por ter dito que parecia que o Governo estava a promover um “motim”.

O presidente da Assembleia Legislativa não gostou do conteúdo da intervenção do deputado e deixou um aviso a Coutinho: “Creio que usou uma expressão errada, disse que parecia que o Governo estava a promover um motim. Talvez o deputado não domine muito bem o chinês, mas espero que o deputado quando utiliza as palavras tenha cuidado”, afirmou Kou.

Coutinho foi avisado, depois de ter atacado o Governo devido ao programa de cupões de consumo.

Mak diz que papel higiénico nas casas-de-banho é sinal de patriotismo

Mak Soi Kun considerou que o Governo mostrou o seu patriotismo quando resolveu vários problemas, como a falta de papel higiénico nas casas-de-banho públicas ou a situação do trânsito.

Numa intervenção em que abordou as dúvidas sobre o princípio “Hong Kong governado por patriotas”, o deputado ligado a Jiangmen defendeu que o patriotismo é mostrado através do serviço à população: “Os assuntos relacionados com a vida da população são todos importantes, por exemplo, há anos o IAM esteve disposto a ouvir as opiniões da população e a resolver, o mais rápido possível, as situações caóticas relacionadas com a falta de papel higiénico nas casas de banho”, recordou.

“Os cidadãos dizem que a atitude de trabalho ‘urgente’ do Governo e a atitude de acção governativa de facilitar a vida da população não são apenas prova de que o Governo está realmente a servir o público: são um elogio! Mais do que isso: são manifestações dignas de patriotismo!”, acrescentou.

AL | Chumbadas nove propostas de debate

Na sessão de ontem foram votadas nove propostas de debate relacionadas com assuntos como os apoios sociais do Governo à população, a questão da impossibilidade de recrutar empregadas domésticas não-residentes e um debate sobre infiltrações.

Todos os debates foram recusados. No que diz respeito aos apoios sociais e ao programa de cupões foram feitas quatro propostas por Sulu Sou, Ella Lei, Song Pek Kei e Agnes Lam, que foram chumbadas com 13 a favor e 19 contra, 14 a favor e 18 contra, 13 a favor e 19 contra, e 14 a favor e 18 contra, respectivamente.

O debate sobre a contratação de trabalhadoras não-residentes como empregadas domésticas sugerido por Agnes Lam foi igualmente recusado, com 12 votos a favor e 20 contra. Os debates sobre a contratação de não-residentes em excesso para outros sectores, como a construção, que tinham sido propostos por Coutinho e Leong Sun Iok foram recusados com 11 votos a favor e 21 contra e 12 votos a favor e 19 contra e uma abstenção, respectivamente.

José Pereira Coutinho viu também outro debate recusado, sobre a qualidade das obras públicas, com 11 deputados favor do debate e 19 contra. Também Mak Soi Kun queria discutir a implementação de medidas para combater as infiltrações, mas a proposta foi recusada com 14 votos a favor e 18 contra.

Hong Kong | Au Kam San acusado por Vong Hin Fai de violar Lei Básica e não ser fiel à RAEM

Au Kam San disse que o Governo Central destruiu a democracia em Hong Kong com a reforma eleitoral. Apesar de ter recusado ser separatista, acabou por ser alvo de críticas de vários deputados. Vong Hin Fai acusou mesmo Au de não ser fiel ao juramento de deputado

 

O deputado Au Kam San considerou ontem que a Assembleia Popular Nacional (APN) destruiu a democracia e a esperança das pessoas de Hong Kong. E, apesar de ter sublinhado que os democratas não são separatistas, foi criticado e acusado de ter violado o juramento de deputado. Vong Hin Fai aproveitou a Intervenção Antes da Ordem do Dia para fazer a acusação mais grave.

“O Governo Central deitou as mãos ao regime eleitoral de Hong Kong e ‘aperfeiçoou-o’, com o pretexto de garantir que ‘Hong Kong é governado por patriotas’, corrigindo a política definida por Deng Xiaoping, isto é, ‘Hong Kong governado maioritariamente por patriotas’. O mais importante é que, ao destruir a democracia de Hong Kong, também está a destruir a esperança das pessoas de Hong Kong na procura do sufrágio universal”, afirmou.

“A Lei Básica de Hong Kong define, preto no branco, que o objectivo último é eleger o Chefe do Executivo e os membros do Legco por sufrágio universal. Trata-se duma promessa feita pelo Governo Central às pessoas de Hong Kong”, acrescentou. “Contudo, o sistema destrói-se, mas a convicção democrática não. Agora, a luta pela democracia e pelo sufrágio universal foi denegrida e caluniada, e qualquer voz ou reivindicação para esses objectivos são caluniadas como movimento independentista, separatista, e prejudicial à segurança nacional, que deve ser expurgado”, considerou.

Au Kam San sublinhou depois várias ocasiões em que Wen Jiabao terá dito que a China precisa de maior democracia, para continuar no caminho do desenvolvimento. Já no fim, recusou ser separatista. “É de referir seriamente que a luta pela democracia não é um movimento separatista, nem independentista de Macau e Hong Kong! A procura da eleição democrática não é uma ameaça à segurança nacional! Pelo contrário, está em plena conformidade com a Política Nacional ‘Um País, Dois Sistemas’, e espelha justamente o princípio de ‘Hong Kong e Macau governadas pelas suas gentes’ sob essa política”, destacou.

Chuva de críticas

Apesar das intervenções antes da ordem do dia não permitirem debate, de acordo com as regras da Assembleia Legislativa, Kou Hoi In, presidente da AL, permitiu cinco intervenções que visaram directamente as palavras de Au Kam San. Mesmo quando questionado sobre as regras por Sulu Sou, Kou limitou-se a responder que estava a permitir “pedidos de esclarecimentos”.

Vong Hin Fai foi o responsável pelas acusações mais graves, nomeadamente de violação do juramento dos deputados e de colocar em causa a integridade do país. “O deputado violou o regimento. Ele tem de seguir as interpretações do plenário. […] O artigo 38 do regimento diz que os deputados devem fazer cumprir rigorosamente a Lei Básica e as leis vigentes. Os deputados devem cumprir a Lei Básica, principalmente o artigo 101. Como deputados temos de ser fiéis à RAEM e ser honestos e dedicados à população”, começou por dizer.

“A APN fez uma interpretação para defender a RAEHK. […] O mais importante foi ele ter dito que ao destruir a democracia de HK está a destruir a esperança das pessoas de Hong Kong. Também disse que destrói democracia, e isto viola as normas de violação da integridade do território”, acusou Vong, antes de pedir ao deputado para retirar dois parágrafos da intervenção.

No entanto, Si Ka Lon, ligado à comunidade de Fujian, foi o primeiro a atacar Au: “Au Kam San fez referência à situação de Hong Kong, em que deputados utilizaram instrumentos para contrariar o Governo Central, desafiando os direitos e competências do Governo Central para tomar decisões e acções. Foi alegado que as acções prejudicaram os direitos da população de Hong Kong, mas isto não tem fundamento porque HK faz parte da nação e o patriotismo é um princípio basilares”, disse Si.

Por sua vez, Chan Hong defendeu a legitimidade de Pequim: “O Governo Central quer o melhor para a RAEM e RAEHK tem a última decisão. Essas alterações são totalmente legais, independentemente de serem os patriotas a governar HK e Macau. Este é o rumo que devemos seguir”, sustentou. Chui Sai Peng partilhou o mesmo ponto de vista.

Finalmente, Ho Ion Sang, deputado dos Moradores, acusou as declarações de Au de atentarem ao bem-estar da população de Macau. “Entendo que estas afirmações prejudicam a normalidade e a vida da população. É preciso proteger o bem-estar da população”, atirou.

Chamado a explicar-se, Au Kam San agradeceu as palavras dos cinco deputados, mas negou ter violado o juramento ou ser separatista: “Não concordo que esteja a violar o juramento. A APN deu uma interpretação, e aqui vamos lutar pela democracia, que não é separatismo”, sustentou.

Covid-19 | Circulação de pessoas respeita tratado internacional 

Fernando Dias Simões, professor de Direito na Universidade Chinesa de Hong Kong, considera que as medidas de circulação impostas por Macau no âmbito do combate à covid-19 respeitam o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, uma vez que nunca foi negada a entrada a residentes, ao contrário de alguns países que a rejeitaram aos seus cidadãos

 

As autoridades de Macau não violaram o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos da Organização das Nações Unidas (ONU) no que diz respeito às medidas de circulação de pessoas implementadas no contexto do combate à pandemia. A garantia foi dada ao HM por Fernando Dias Simões, professor de Direito da Universidade Chinesa de Hong Kong e antigo docente da Universidade de Macau.

As medidas impostas em Macau e também Hong Kong “não violam o Pacto na medida em que o direito de regresso dos residentes foi assegurado”. “Hong Kong adoptou medidas um pouco mais tarde do que Macau, que foi o território no mundo que actuou mais rapidamente nesta matéria. As medidas foram proporcionais. Não foi negada a saída a ninguém nem o regresso, foi apenas condicionada à realização da quarentena, que tem uma justificação científica”, acrescentou.

Fernando Dias Simões considera que a circulação entre Macau e Hong Kong poderá em breve voltar ao normal à medida que a vacinação chegue a mais pessoas. “As esperanças viram-se agora para a vacina e os passaportes de vacinação. Os níveis de contágio são os ideais. Em Macau não há casos há um ano, em Hong Kong temos tido uma média de casos abaixo dos dois dígitos. Creio que mais cedo ou mais tarde as autoridades vão chegar a acordo para que haja um sistema misto, com testes à saída e à chegada e o passaporte de vacinação, para que seja levantado o requisito da quarentena.”

Da ilegalidade

Fernando Dias Simões analisou, em dois artigos científicos, a legalidade das restrições de viagens impostas em alguns países, tendo concluído que muitos violaram matérias de Direito internacional.

Estas restrições passam pela obrigatoriedade de apresentação de testes à covid-19 ou a realização de quarentena. “O caso mais gravoso acontece quando mesmo mediante a quarentena ou a apresentação de documentação, a pessoa não pode entrar. Houve um grupo muito limitado de países que negou a entrada aos seus próprios cidadãos, o que levou a situações bastante dramáticas.”

O docente diz “ter dúvidas de que estas medidas passem nos testes quanto à sua necessidade, proporcionalidade e também no que diz respeito ao princípio da não discriminação”. “Ainda há muita incerteza científica em torno da covid-19. Não vejo como fechar a fronteira a todas as pessoas, ou a certas nacionalidades, reduza o contágio ou ajude a combatê-lo, quando há alternativas que permitem atingir o mesmo objectivo de saúde pública”, rematou.

Joseph Chan Nap-kee, especialista na política “Uma Faixa, Uma Rota”: “China nunca quis ser a ‘polícia do mundo’”

O presidente do Centro de Investigação e Desenvolvimento Económico ‘Uma Faixa, Uma Rota’, sediado em Hong Kong, defende que existe no Ocidente uma visão errada de que a dívida gerada pelos empréstimos concedidos pela China neste âmbito é uma armadilha. Joseph Chan Nap-kee frisa que os uigures devem ser ajudados com empregos, uma vez que não dominam o mandarim, e alerta para a presença de espiões em Hong Kong

 

Faz parte do projecto silkaandroadexplained, que tem por objectivo a despolitização desta iniciativa. Concorda que este seja o caminho?

Todas as reacções dos países ocidentais depois do lançamento deste projecto têm um lado bastante político, mas há também o aspecto dos negócios e das trocas culturais. Arrancámos com esta iniciativa com a ideia de partilha cultural antes de avançarmos para a área dos negócios. Mas os países precisam de dinheiro e o foco acaba por recair mais na economia. Esta política não é um tratado, não é como a NATO, ou outra organização internacional. Não há requisitos especiais para aderir. Qualquer país o pode fazer, mas claro que o Ocidente olha para tudo isto de uma forma diferente em relação à perspectiva da China, como se o país quisesse conquistar o mundo. Mas do que temos visto até agora a China deu zero provas de querer ser o número um ou de querer conquistar o mundo. O que o Presidente Xi está a tentar trazer com esta iniciativa prende-se com o facto de a China estar a crescer muito rapidamente. Temos recursos humanos de topo, temos 1.4 biliões de pessoas. Há 40 anos a nossa população era jovem, mas estamos no século XXI e com uma população mais envelhecida. Depois de 40 anos da reforma e abertura [com Deng Xiaoping] a maior parte das cidades chinesas tornaram-se sítios tão caros para viver como Hong Kong, Tóquio ou Londres. Por isso têm de movimentar as indústrias para outros países, repetindo a mesma fórmula de sucesso da China em outros países.

Pode dar exemplos dessa transferência?

Temos o Paquistão, com uma população superior a 200 milhões de pessoas, o Bangladesh, a Indonésia, as Filipinas. Todos estes países têm uma grande força de trabalho e precisam do mercado chinês. O foco do nosso presidente é partilhar com eles a nossa experiência, alargar o mercado em prol do desenvolvimento económico. Acho que ‘uma faixa, uma rota’ é sobre isso. Fala-se muito na questão da dívida [dos países em relação à China] como uma armadilha. Do facto de a dívida ser muito superior ao PIB [Produto Interno Bruto] destes países ou da sua real capacidade de pagamento. De novo, penso que este é um pensamento muito ocidental.

Porquê?

Há 40 anos, quando a China avançou para a reforma e abertura, o Ocidente emprestou muito dinheiro ao país. E isso foi uma armadilha? Tínhamos condições de pagar? Com a política ‘Uma Faixa, Uma Rota’há um calendário de pagamentos, e se os empréstimos não forem devolvidos, o país abre a possibilidade de um novo pagamento. Ou seja, nunca há a intenção de transformar essa dívida numa armadilha. Isto tem a ver com o facto de o Ocidente estar habituado a ser o número um, a controlar quando os países de terceiro mundo começam a emergir. Sentem-se ameaçados. Em 1979 a China só podia pedir emprestado. O país nunca entrou em incumprimento e foi isso que levou o país a recuperar. O que surpreendeu o Ocidente foi o facto de a China ter crescido até ser hoje um dos principais mercados mundiais. Segundo os padrões do FMI [Fundo Monetário Internacional], ainda somos um país em desenvolvimento.

A União Europeia (UE) olha também para esta política como uma ameaça, ou pelo menos alguns países europeus?

Acredito que a maior parte das nações europeias não olham para esta política como uma ameaça, mas como uma oportunidade.

Quais os maiores desafios trazidos pela pandemia em relação a esta política? São necessárias mudanças nos investimentos em prol de uma adaptação a uma nova realidade?

O sucesso da China deve-se ao que aconteceu há 40 anos, quando se decidiu apostar na construção de infra-estruturas para facilitar o crescimento. Isto prova que sem infra-estruturas os sectores da logística e manufactura não poderiam ter atingido os padrões actuais. Isso leva também a outras questões. Como uma nação em desenvolvimento, será que temos escolha? O Ocidente fala muito das questões da democracia e das alterações climáticas. Para ser honesto, penso que a China é o único país que está a apostar nesta matéria. Sabemos que temos problemas de poluição que é preciso resolver, e a China é o único país que gasta grande parte do seu orçamento com as alterações climáticas. Quando falamos de democracia, qual é o padrão? Nos últimos dias todos falam da questão do algodão de Xinjiang. Já esteve em Xinjiang?

Não. 

Diria que mais de metade dos que falam sobre Xinjiang nunca estiveram lá.

Não são fáceis as deslocações à província.

É muito fácil ir a Xinjiang. Temos muitos investimentos na região e passo muito do meu tempo lá. O que aconteceu com a BBC, não houve sequer verificação de factos. Será que temos de perder tempo com uma questão gerada nas redes sociais? Não. Vamos gastar tempo a ajudar os uigures. Como os podemos ajudar? Dando-lhes empregos.

E é essa a ajuda desejada pelos uigures?

Iria recusar ajuda, se lha dessem? Você iria aproveitar o emprego. A maior parte dos uigures são iletrados, então o que podem fazer? Podem ter formação. Pensa que os uigures podem trabalhar sozinhos num país onde a maior parte da população é da etnia Han? Nos EUA, se os migrantes não falarem inglês, conseguem trabalhar? É essa a questão. Se os uigures ficarem restringidos em Xinjiang, sem a ajuda dos Han, como pode haver um crescimento e criação de emprego? Não podem sobreviver. Porque é que ninguém critica os americanos? Mas não quero enveredar muito por esse caminho porque ‘Uma Faixa, Uma Rota’ não tem a ver com política. É para ajudar os nossos países vizinhos. A China nunca quis ser um líder global, a ‘polícia do mundo’, porque somos ainda um país em desenvolvimento.

E os EUA querem ser essa “polícia do mundo”?

Claro, ainda são. Por exemplo, qual é o seu papel em Hong Kong? Nenhum. São assuntos internos que temos de resolver com o país. Porque é que estão a meter as mãos em Hong Kong?

O território tem uma nova lei eleitoral e foi implementada a lei de segurança nacional. Não teme que esta situação política possa afastar os empresários?

Não. Os números falam por si. Os empresários podem falar sobre isso, mas não estão a ir embora. Os espiões têm medo, mas não os empresários no geral.

Que tipo de espiões?

Hong Kong tem muitos espiões, isso é conhecido. O território é um dos principais centros de espionagem do mundo. [Estão nas ] organizações não governamentais, em algumas plataformas de redes sociais, revistas. Não têm uma presença, mas sim uma representatividade, e o que fazem? Recolhem dados para outros países. São estas as pessoas que se preocupam com a lei da segurança nacional (risos).

Qual o papel que Hong Kong deve ter na política “uma faixa, uma rota”?

Desempenhamos um papel muito importante porque Hong Kong é a única cidade na China onde vigora a Common Law, e onde está implementada a política “um país, dois sistemas”. Continuamos a ter autonomia em tudo. Não temos capacidade diplomática porque somos apenas uma cidade, mas temos as nossas regras e o nosso Direito.

Olhando para Macau, há uma relação próxima com o Direito português. Qual é a sua visão para o papel de Macau na política “uma faixa, uma rota”?

Macau tem outro papel a desempenhar, tem de lidar com os países de língua oficial portuguesa. O Brasil é parte desta política, e porquê? Porque o actual presidente é pró-Trump [Jair Bolsonaro], não estou certo de ele ser pró-Biden. A China compra muitos produtos ao Brasil, como carne. A relação entre os dois países não é tão boa como antes, mas não posso dizer que seja uma relação má. Digo isto porque o cônsul-geral do Brasil em Hong Kong continua a promover a ‘Uma Faixa, Uma Rota’. Acredito que estão a tentar melhorar as relações.