Pearl Horizon | Investidores recorrem ao Conselho de Estado chinês

O facto do Governo de Chui Sai On não ter considerado o pagamento do imposto de selo por parte dos promitentes-compradores do Pearl Horizon no acesso ao programa de habitação para troca levou os lesados a entregar uma carta junto do Conselho de Estado para os Assuntos de Hong Kong e Macau do Governo Central. Na missiva, pedem igualdade de acesso a uma fracção

 

[dropcap]A[/dropcap] Macau News Agency (MNA) noticiou ontem que os promitentes-compradores do Pearl Horizon recorreram, pela primeira vez, ao Conselho de Estado para os Assuntos de Hong Kong e Macau do Governo Central, em Pequim, para se queixarem do facto de terem investido milhões numa casa que nunca será construída, pois o Governo retirou a concessão do terreno ao promotor do projecto habitacional, a Polytex.

A carta entregue junto do Conselho de Estado também apresenta críticas à postura do Governo relativamente ao programa de habitação para troca. Em declarações à MNA, Kou Meng Pok, porta-voz dos lesados e presidente da Associação dos Compradores do Pearl Horizon, disse que o Executivo liderado por Chui Sai On nunca convidou a associação que representa os lesados para uma reunião, que serviria para discutir o programa de habitação para troca.

“Qualquer proprietário é um investidor legítimo e está sujeito à propriedade privada de acordo com a Lei Básica de Macau. O Governo da RAEM deve respeitar o estatuto legal dos proprietários. A confiança nos contratos originais e no pagamento do imposto de selo é a posição consistente e o desejo de todos os proprietários”, pode ler-se. “Exigimos que o Governo Central intervenha e exija ao Governo de Chui Sai On a resolução deste problema o mais cedo possível”, acrescenta a carta.

O deputado José Pereira Coutinho entregou recentemente uma interpelação junto do Governo onde acusa as autoridades de criarem critérios errados no acesso à habitação para troca, o que faz com que muitos lesados não se consigam candidatar à aquisição de uma nova casa. Cerca de 100 lesados ficam de fora deste programa porque o Governo teve em conta o registo predial das fracções (que não foi feito por todos os lesados) e não o pagamento do imposto de selo. A empresa de renovação urbana já aprovou 1022 pedidos por parte dos promitentes-compradores do Pearl Horizon, mas mais de dois mil terão apresentado a sua candidatura.

“Às cegas”

A MNA noticiou também que esta quarta-feira houve uma reunião de membros do Governo, onde se inclui a secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, com outra associação ligada ao empreendimento Pearl Horizon, a Associação de Promoção da Habitação para Troca, que serviu para abordar o programa de habitação para troca, que vai nascer no terreno da Areia Preta onde iria ser criado o empreendimento da Polytex.

Kou Meng Pok disse que esta nova associação foi criada pelo Governo, numa acção que ele considera ser secreta. “Porque é que o Governo não discute directamente com a Associação de Compradores do Pearl Horizon? Se o projecto de habitação para troca e renovação urbana cobre todo o território de Macau, não seria mais adequado recorrer à nossa associação para criar uma associação de promoção da habitação para troca?”, questionou.

UM | Professor premiado com Medalha Científica na Suécia

[dropcap]S[/dropcap]un Guoxing, professor assistente do Instituto de Física Aplicada e Engenharia de Materiais da Universidade de Macau (UM) foi prestigiado com a Medalha Científica de 2019 na 27ª cerimónia de prémios da Associação Internacional de Materiais Avançados (IAAM), realizada na Suécia, “pelo seu excepcional contributo no campo da ciência avançada de materiais”, anunciou ontem a instituição académica.

O docente e investigador da UM é doutorado em Engenharia Civil e Ambiental pela Universidade de Ciência e Tecnologia de Hong Kong, e tem desenvolvido pesquisas nas áreas de materiais poliméricos avançados, nanocompósitos, materiais de cimentação, misturas de betão, e outras inovações aplicadas. Sun Guoxing tem já 43 teses académicas publicadas e sete patentes registadas.

Os vencedores da Medalha Científica do IAAM são seleccionados com base na sua contribuição de excelência nos cinco anos anteriores ao da nomeação, para as áreas da física, química, biologia, engenharia, ciências médicas e matemáticas, oceanologia, ciências da terra, da atmosfera e planetárias.

Diamantes | Novas regras de importação e exportação em Outubro

[dropcap]O[/dropcap] Governo anunciou ontem que as novas regras de importação e exportação de diamantes no território entram em vigor a 1 de Outubro, para alinhar o território com as regras do comércio internacional.

Sem a certificação do processo Kimberley, que estabelece as regras do comércio internacional, as regiões produtoras não poderiam exportar diamantes em bruto para Macau, que no ano passado importou diamantes já trabalhados no valor de 20 milhões de patacas, explicou, no final de Março, o porta-voz do Conselho Executivo, Leong Heng Teng.

O regulamento administrativo complementar divulgado ontem estabelece como prazo máximo de dois anos as licenças de operação de importação, exportação, trânsito, compra e venda e transporte de diamantes em bruto em Macau. O pedido deve ser feito junto da Direcção dos Serviços de Economia, já “o prazo de validade do certificado não pode ser superior a 60 dias, e as licenças de exportação, importação e trânsito são válidas por um período de 30 dias”, explicaram as autoridades do território.

EPM | APIM não passa concessão do terreno à fundação da escola 

A Associação Promotora da Instrução dos Macaenses não pretende transmitir a concessão do terreno à Fundação Escola Portuguesa de Macau, que, por sua vez, vai ser a concessionária do polo da escola nos novos aterros. José Sales Marques, membro da fundação, garante tratar-se de um “não assunto” e que ambas as entidades podem trabalhar em conjunto

 

[dropcap]D[/dropcap]uas concessões, o mesmo projecto educativo. O terreno onde está localizada a Escola Portuguesa de Macau (EPM) foi concessionado pelo Governo à Associação Promotora da Instrução dos Macaenses (APIM), e assim se deverá manter. Miguel de Senna Fernandes, presidente da APIM, garantiu ao HM que não tem em vista uma transmissão de direitos da concessão à Fundação Escola Portuguesa de Macau (FEPM), que ficará com a concessão do terreno nos novos aterros para o novo polo da EPM.

“O terreno foi concedido à APIM, portanto não é meramente detido. Não há uma transmissão do terreno à vista, pois não é esta a ideia da APIM”, apontou.

O advogado garantiu que cabe ao Governo tomar a decisão de alterar a concessão inicial, sempre com o aval do Chefe do Executivo e “com o acordo da APIM”. Neste sentido, uma eventual mudança não será feita “sem se ouvir a APIM”, acrescentou.

De frisar que a APIM é um dos muitos accionistas da FEPM, tendo a liberdade de sair a qualquer momento, mas Miguel de Senna Fernandes garantiu ao HM que “isso nunca esteve em causa”. “Nunca considerámos deixar a FEPM”, frisou.

A questão da titularidade do terreno da EPM foi colocada por Joana Alves Cardoso em entrevista ao HM, publicada nesta edição, onde a candidata pelo CDS-PP às eleições legislativas em Portugal, pelo Círculo Fora da Europa, defende que esta matéria deveria ser esclarecida em prol da sustentabilidade futura da EPM. Para a candidata, a APIM já deveria ter transmitido esse direito de concessão à FEPM.

Novos aterros com a FEPM

Do lado da FEPM, a reacção é de tranquilidade. Ao HM, José Sales Marques frisou que este é um “não assunto” e “não faz parte da agenda da FEPM”. O economista e membro do conselho de administração da FEPM assegura que esta entidade “será concessionária do terreno do novo polo, pelo que por aí teremos muito que fazer”.

Sales Marques, quando confrontando pelo HM, disse não temer uma eventual saída da APIM do corpo de accionistas da FEPM. “Não há razões para esses receios. A sustentabilidade das duas escolas precisa, como é óbvio, de ser objecto de estudo e de uma criteriosa análise, nomeadamente quanto à dimensão da nova escola e da actual EPM após a ampliação.”

O economista acredita que há até condições para a APIM e a FEPM trabalharem em conjunto no mesmo projecto educativo.

“Creio que as duas unidades poderão criar sinergias positivas entre elas e contribuir, no seu conjunto, para maximizar o potencial das duas”, acrescentou.

De acordo com o despacho datado de 1998, e assinado pelo, à época, Presidente da República portuguesa, Jorge Sampaio, o património da FEPM é composto pela “contribuição da Associação Promotora da Instrução dos Macaenses traduzida na disponibilização da utilização do terreno e do imóvel onde se encontra a funcionar a actual Escola Comercial Pedro Nolasco, sita na Avenida Infante D. Henrique, em Macau, para os fins a prosseguir pela Fundação”.

Joana Alves Cardoso, candidata às legislativas pelo CDS-PP | Apostar forte em Macau 

Advogada e com fortes laços ao território, Joana Alves Cardoso integra a lista candidata do CDS-PP, liderada por Gonçalo Nuno Santos, às eleições legislativas para a Assembleia da República em Portugal, pelo Círculo Fora da Europa. A candidata defende que a questão dos direitos do terreno onde está localizada a Escola Portuguesa de Macau deve ser alvo da atenção do Governo português e confessa que os resultados eleitorais vão ditar o estabelecimento de uma secção do partido em Macau

Porque decidiu avançar para esta candidatura?

Houve um convite pessoal feito pela líder do CDS-PP, Assunção Cristas, em Lisboa, e pelo candidato do CDS-PP ao Círculo Fora da Europa, Gonçalo Nuno Santos. Decidi avançar porque sou simpatizante do partido. Achei o convite natural.

Quais os maiores problemas sentidos pela comunidade portuguesa em Macau que vai destacar na sua candidatura?

Continuam a existir queixas quanto aquilo que os serviços consulares conseguem realizar. Existe uma efectiva quebra na ligação entre os órgãos de soberania em Lisboa e o que são as massas associativas junto das comunidades portuguesas. Há uma queixa que se prende com o facto de as redes consulares não utilizarem as línguas locais, pelo menos no seu funcionalismo. A comunidade portuguesa queixa-se de não ter os seus interesses ou os seus problemas absolutamente resolvidos pelos serviços consulares actualmente oferecidos.

Nesse sentido, qual a proposta do CDS-PP para a resolução desse problema?

Um dos pontos do programa eleitoral é a criação do que chamamos de consulados de proximidade, consulados esses que organicamente terão de ter uma comunicação diferente com os cidadãos e os utentes do consulado, que crie mecanismos de proximidade que não se prendam com os serviços consulares propriamente ditos. Deve haver uma ampliação dos serviços de apoio prestados pelo Governo de Portugal aos interessados.

O Governo português tem dito que os problemas com o funcionamento do consulado se prendem com questões financeiras, que não permitem um maior recrutamento de funcionários e um aumento salarial. Recrutar mais pessoas seria a solução para melhorar a situação?

Acho que a questão passará por dois vectores. Um será adequar os recursos humanos às necessidades das redes consulares. Tem sido manifestado pelo consulado que há um manifesto volume de trabalho ao qual este não consegue dar seguimento face à solicitação que tem. Haverá que implementar um programa de formação na comunicação dos funcionários face aos utentes, uma adequação de métodos de trabalho. Muitas vezes os utentes, quando procuram informação que depende dos serviços centrais, deparam-se com uma notória falha no processo. Haverá certamente limites orçamentais quanto ao recrutamento de pessoal, mas é verdade que hoje em dia as tecnologias colmatam muitas das falhas se forem bem implementadas. Houve francas melhorias ao nível do website, mas este tem-se limitado a ser uma plataforma de informação limitada e de reserva de acolhimento. Nesse aspecto a plataforma poderia ser melhorada face ao que são os hábitos de comunicação nos dias de hoje.

José Cesário é candidato pelo PSD, Augusto Santos Silva concorre pelo PS. Quais as expectativas face a estes dois candidatos?

O PS fez uma aposta forte, porque é a primeira vez que um ministro dos Negócios Estrangeiros em funções encabeça uma lista. José Cesário é uma pessoa muito conhecida e tem exercido um papel muito activo como deputado e ex-secretário de Estado. Ao CDS-PP interessa o facto de ser a primeira vez que faz uma aposta tão forte no Círculo Fora da Europa com candidatos locais.

Há o projecto de abrir uma secção do partido em Macau?

Veremos. Serão as próprias comunidades que verão a questão colocada na mesa. Não se retira a hipótese de abrir uma secção do partido em Macau, trabalharemos e estaremos disponíveis para isso, mas tudo depende dos resultados eleitorais, no sentido do que venha a ser um processo mais ou menos acelerado.

Que outras matérias ligadas à comunidade portuguesa, ao nível de direitos, liberdades e garantias ou questões laborais, por exemplo, que pretenda debater nesta campanha? O caso dos dois juristas que saíram do hemiciclo, por exemplo, preocupou bastante a comunidade.

Esse é um assunto de particular interesse e de uma particular realidade de Macau. A comunidade portuguesa em Macau tem um contexto histórico diferente face às outras comunidades portuguesas no exterior. Tenho assistido de forma observante e preocupada às informações que nos chegam de determinadas situações. Em relação à que me referiu em especial, e que teve destaque nos últimos meses, ainda estamos para saber os detalhes que envolveram a não renovação dos dois contratos, de forma a que não me vou alargar muito porque não sabemos as circunstâncias. Face aos direitos de residência de cidadãos portugueses, tem-se verificado um notório acréscimo de um poder discricionário mais limitado em relação à renovação dos pedidos de residência. Isso resultará de uma política do território e terá os seus fundamentos. Sem dúvida que a Assembleia da República (AR), através dos deputados pelo Círculo Fora da Europa, tem de estar preocupada com o cumprimento de prerrogativas históricas e legislativas que foram acordadas com países terceiros.

Na entrevista que concedeu ao HM, José Cesário também disse que a componente pedagógica da Escola Portuguesa de Macau (EPM) deve estar na agenda política. O CDS-PP tem o mesmo objectivo?

A questão da existência e da sustentabilidade da EPM deve ser sempre uma prioridade da AR, em especial do Círculo Fora da Europa. Mas as declarações do doutor José Cesário face à EPM revelam a falta de conhecimento profundo que o PSD tem quanto a matérias de particular importância em Macau, nomeadamente quanto a este tema em particular. E só podem ser justificadas pelo mero esquecimento que estes deputados tenham quanto ao que foi a origem do projecto da EPM.

Em que sentido?

É inequívoco que a EPM faz parte necessariamente da agenda política do Governo de Portugal porque o Ministério da Educação faz-se representar por três membros no conselho de administração da Fundação da EPM (FEPM), e como tal não é necessário que o PSD venha dizer que este tema precisa de estar na agenda para que isso aconteça. Por outro lado, quer o conselho de administração da FEPM, quer o órgão interno do conselho pedagógico da EPM, estão encarregues de assumir e orientar o projecto pedagógico da escola. Estes elementos podem, de forma capaz e articulada, promover o melhor projecto pedagógico para a EPM e para aquele que é o único público alvo da escola, que é o estudante que pretende frequentar o ensino de matriz portuguesa. Quanto à afirmação de que os alunos seguem estudos noutros países, e da existência de diferentes públicos-alvo, quero deixar duas notas. Mais uma vez revela-se uma falta de conhecimento ou um esquecimento face ao que foi o nascimento da escola, pois ela sempre foi feita de alunos que sabiam de outras opções que não passavam apenas por Portugal. E eu pessoalmente nunca soube de nenhum caso em que o nosso currículo fosse colocado em causa, antes pelo contrário. Sempre foi muito bem aceite em escolas na Europa, australianas ou americanas. Quanto às diferenciações em matéria do perfil do aluno, elas sempre existiram no liceu de Macau, no Colégio Dom Bosco e na Escola Comercial. O que aconteceu é que foi tudo aglutinado numa escola exclusivamente portuguesa. O que não tem acontecido, e isso sim deveria fazer parte da agenda política e ser uma prioridade, é haver um olhar mais atento aquilo que é a sustentabilidade da EPM.

Refere-se à sustentabilidade financeira?

É sabido que a associação de pais pediu, mais do que uma vez, contas à FEPM, e estas nunca foram satisfatoriamente prestadas. Por outro lado, e mais importante, é sabido que desde o inicio é a Associação Promotora da Instrução dos Macaenses (APIM) que detém o direito sobre o terreno onde está localizada a escola. A APIM é uma mera accionista da FEPM e é livre de sair como qualquer accionista, como aliás fez a Fundação Oriente há algum tempo. Sabe-se também que a APIM nunca transmitiu esse direito da transmissão do terreno à FEPM, como seria de esperar, nem nunca diligenciou nesse sentido. E essa questão é essencial e deveria estar no topo da agenda política, porque decide, ou não, a afirmação de uma EPM livre de quaisquer vicissitudes.

José Cesário fez também uma crítica face ao posicionamento do CDS-PP relativamente às alterações à lei eleitoral. Como reage a isto?

No que concerne ao recenseamento eleitoral é falso o que o doutor José Cesário vem dizer, não é verdade que o CDS-PP não tenha participado nas discussões. Somos absolutamente a favor de uma alteração que promova a liberdade do voto e que facilite o voto nas comunidades portuguesas, mas facto é que, quanto ao voto electrónico, há ainda que se fazer estudos e implementar experiências e enquanto isso não acontecer a posição do CDS-PP é de que a lei eleitoral que temos terá, por hora, satisfazer positivamente as necessidades. O CDS-PP continua a pensar que o voto deve ser preferencialmente presencial, e não o sendo, não serão as associações locais as entidades mais adequadas para supervisionar o acto eleitoral.

Também houve críticas face ao posicionamento do CDS-PP em relação à lei da nacionalidade.

A última proposta apresentada pelo CDS-PP e PSD foi aprovada em 2015 e prendia-se sobretudo com a concessão da nacionalidade portuguesa a netos. É totalmente falso que o CDS-PP tenha estado longe dessas matérias. Quanto a outras propostas que têm vindo a ser apresentadas, o CDS-PP, não votou favoravelmente porque tem uma participação activa, mas discute as propostas apresentando os seus fundamentos. A lei da nacionalidade é demasiado importante para estar a ser alterada a cada seis meses ou um ano, sempre que uma bancada parlamentar entende que está na hora de acrescentar mais uma adenda. É uma lei estrutural do país e não devem ser pasmados orgulhos partidários. O CDS-PP toma como posição de que o critério que deve ser continuado a ser tomado em conta nas alterações à lei da nacionalidade é o do laço sanguíneo. De resto, as expectativas da comunidade portuguesa na diáspora é de que continue a prevalecer o critério do laço sanguíneo.

Assusta-a a abstenção nas próximas eleições?

Muito, é um dos pontos principais da minha candidatura individual. Como candidata inserida na lista tenho promovido o apelo ao voto, independentemente da escolha que as pessoas façam.

O consulado poderia ter tido um papel mais activo neste campo? Vítor Sereno, ex-cônsul, chegou a fazer uma campanha a apelar ao recenseamento eleitoral.

Poderia ser feita uma maior promoção do acto eleitoral começando por Portugal e acabando nas redes consulares. Se isso poderia ser feito pelo consulado, sem dúvida, mas não sei se esse é o propósito de Paulo Cunha Alves (actual cônsul). Conhecem-se algumas das plataformas digitais para verificar o recenseamento e capacidade eleitoral, mas é uma publicidade muito mitigada e institucional.

Nesse sentido, é também necessário que os partidos olhem com mais atenção para os eleitores portadores do passaporte português mas que não dominam a língua?

Será sempre uma comunidade portuguesa de origem chinesa, mas para mim é comunidade portuguesa. Tem de haver um trabalho maior de divulgação e de apelo à participação na vida comunitária, porque apenas com um sentido de pertença é que as pessoas abordam princípios de direitos cívicos. Falhando essa pertença à comunidade, dificilmente as pessoas se vão sentir próximas para cumprirem um dever cívico. Reforçaria o facto de o Círculo Fora da Europa ser desde há 30 anos o mesmo e isso não serviu para resolver problemas que se arrastam há anos. Considero que está na altura de haver uma verdadeira mudança.

Hong Kong | Corrida à renovação de passaportes no Consulado

[dropcap]D[/dropcap]esde há dois ou três meses a esta parte, notámos um aumento da procura por parte dos utentes que residem em Hong Kong, no que diz respeito à revalidação de passaportes e de cartões de cidadão” portugueses, confirmou ontem o cônsul-geral de Portugal em Macau e Hong Kong à Rádio Macau.

Paulo Cunha Alves comentou aos jornalistas que, desde o início dos protestos contra o Governo da ex-colónia britânica, cresceu a procura dos serviços consulares por parte de cidadãos nacionais ali residentes. “Muitos deles são titulares destes documentos, mas não os costumavam renovar regularmente. Eventualmente, agora estarão mais interessados em tê-los regularizados”, justificou.

Sobre um maior interesse da população vizinha numa alternativa à instabilidade política e económica que se vive em Hong Kong, o cônsul-geral português adiantou ainda, que não é só a renovação de documentos nacionais que tem aumentado, mas também a emissão de vistos de residência e de investimento em Portugal.

O diplomata esteve com a comunicação social ontem, durante a entrega da Medalha de Mérito das Comunidades Portuguesas, atribuída pelo Governo português à Santa Casa da Misericórdia de Macau.

Misericórdia distinguida com Medalha de Mérito das Comunidades Portuguesas

[dropcap]A[/dropcap] Santa Casa da Misericórdia de Macau foi ontem distinguida com a Medalha de Mérito das Comunidades Portuguesas, um reconhecimento que “dá mais força e alento”, disse o provedor da instituição à agência Lusa.

“A cerimónia de ontem, na qual se formalizou a distinção feita pela Secretaria de Estado das Comunidades é um honroso reconhecimento do esforço colectivo”, que “dá mais força para continuarmos a defender e valorizar a nossa identidade, bem como o nome de Portugal no Oriente”, sublinhou António José de Freitas.

“Dá mais força e mais alento” à “Santa Casa da Misericórdia, que é o espelho solidário de Macau”, acrescentou, lembrando que a distinção sucede também num momento especial: no ano em que se assinala o 20.º aniversário da Região Administrativa Especial de Macau [RAEM] e os 450 anos da instituição, sempre numa “missão de índole social e de cariz humanitário”.

A Medalha de Mérito das Comunidades Portuguesas (grau Placa de Honra, neste caso) procura galardoar as pessoas singulares e colectivas, nacionais ou estrangeiras, cuja actividade contribua ou tenha contribuído para o fortalecimento dos laços que unem os Portugueses e lusodescendentes.

Em acção

A medalha é atribuída quando se verifica a dignificação da presença de Portugal no mundo, a valorização das comunidades portuguesas nas sociedades de acolhimento e a divulgação da língua e cultura portuguesas.

Em declarações à Lusa, o embaixador responsável pelo Consulado Geral de Portugal em Macau e Hong Kong explicou que a importância da distinção justifica-se pelo “esforço e acção solidária e de apoio social de associações como a Santa Casa da Misericórdia de Macau”, essenciais para se apoiar “o desenvolvimento harmonioso da sociedade” no território.

No seu discurso, durante a cerimónia, Paulo Cunha-Alves desejou que a Santa Casa da Misericórdia de Macau “prossiga a sua acção de solidariedade e que continue a ser elo de união entre todos os residentes (…), contribuindo para o multiculturalismo da sociedade da RAEM, numa perspectiva social de estabilidade, desenvolvimento e prosperidade”.

Contas à vida

A Santa Casa da Misericórdia de Macau tem um orçamento superior a 70 milhões de patacas, com uma despesa mensal em salários superior a três milhões de patacas (próximo do valor que a instituição arrecada das rendas do seu património imobiliário) e um subsídio governamental que “representa apenas cerca de 25 por cento”, explicou em Maio o provedor em entrevista à Lusa, no mês em que foi condecorado pelo Presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa.

A obra social da Misericórdia em Macau abrange áreas como o apoio a deficientes, idosos e crianças.
Um centro de apoio a invisuais (80), um lar (135), uma creche (258) e uma loja social são estruturas que traduzem a actividade social da instituição que tem mais de 180 funcionários.
Inicialmente designada de “Confraria e Irmandade da Misericórdia de Macau”, foi criada poucos anos após a fundação de Macau, como entreposto português.

O fundador, o jesuíta Belchior Carneiro, esteve mesmo ligado à fundação do Senado, em 1853, a primeira instituição política no território. Nesse período, a instituição “contribuiu para a implementação de taxas organizadas sobre diversas actividades até então não reguladas, funcionou como banco, emprestando dinheiro, e promoveu uma lotaria muito popular”, pode ler-se no site da Santa Casa da Misericórdia de Macau.

 

Concessão renovada

Foi ontem publicado em Boletim Oficial (BO) um despacho que dá conta da renovação da concessão de um prédio a favor da Santa Casa da Misericórdia de Macau (SCMM). O despacho, assinado pelo secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo do Rosário, determina que o terreno, com uma área de 396 metros quadrados e localizado entre o Largo do Senado e a Travessa da Misericórdia, continua sob alçada da SCMM, destinando-se a “manter a construção nele implantada compreendendo dois pisos, para finalidade de escritório e comércio”. Esta revisão da concessão foi precedida de um pedido, feito pela SCMM, de alteração da finalidade do piso do rés-do-chão do edifício para comércio, pedido esse feito em 2017, apenas aceite em Abril deste ano por parte da Comissão de Terras.

Quase psicopatas 

[dropcap]S[/dropcap]omos todos seres humanos e atentos ao mundo que nos rodeia, até ao dia em que nos esquecemos disso mesmo. E, por norma, esse esquecimento ocorre com frequência nas redes sociais, onde nos atacamos quase sem dar por isso.

Há uns tempos, um leitor enfurecido decidiu escrever na página oficial do Hoje Macau, no Facebook, que nós merecíamos levar com uma bomba, uma publicação feita na caixa de comentários de uma notícia sobre ataques na zona da Faixa de Gaza. Bastante elucidativo.

Agora, são os protestos em Hong Kong que geram uma onda de revolta individual e quase colectiva contra os manifestantes. Há dias, um leitor escrevia que os tiros dados pela polícia não deveriam ter sido feitos para o ar, mas directamente para quem estava a protestar. Tipo arma de fogo, morriam logo vários de seguida.

Aposto que se trata de um bom residente, cumpridor das regras sociais e defensor da harmonia de Macau. Só não lhe dêem uma arma para as mãos. Somos todos bonzinhos e respeitadores, até termos acesso a uma rede social. Aí, destilamos ódio, somos uns quase psicopatas sem nos apercebermos. Seríamos incapazes de matar, mas nas redes sociais, não faz mal nenhum ameaçar. Serve para descomprimir das agruras da vida…

Confesso-me culpado

[dropcap]N[/dropcap]a leitura de Ernesto Sábato, por causa de um prefácio a escrever, descubro: o escritor argentino não traía a paixão mais chã pelo futebol.

Eu sempre liguei menos ao futebol (por ter sido um praticante medíocre?) e neste fim de semana esqueci-me de ver o Benfica-Porto.

Todavia, o meu desafecto prende-se mais com o que Hans Ulrich Gumbrecht explica:

«Existem dois modelos básicos de comportamento, no tempo de lazer, na sociedade burguesa, um reconhecido como “exigente” e outro como “trivial”, e esta dicotomia valorativa é acompanhada por uma outra diferenciação que, pelo menos desde o período moderno inicial, pode ser observada entre os jogos que enfatizam o corpo e os jogos que enfatizam a mente, entre o desporto e a literatura.»

Ou seja, padeço (padeci?) de snobeira quanto ao desporto. Não tenho dúvidas.

O Gumbrecht elucida nuns ensaios notáveis porque se deu a transferência da valorização pública duma orbe intelectual para a desportista; as “estéticas da presença”, performáticas, apagam mais facilmente o fosso entre o artista e o público/observador e geram uma atmosfera simbiótica, seja no desporto como na música pop/rock; os quais se usam de velhos mecanismos, como a “identificação”.
No filme Bohemian Rhapsody, sobre o cantor Freddie Mercury, há um momento que ilustra bem este ponto.

Após a morte do cantor, Bryan May, o guitarrista, conta como nasceu uma canção emblemática da banda, Radio Gaga: para intensificar essa interação com o público em que o Freddie era mestre, lembrou-se de fazer uma canção que levasse o público a co-participar na textura do refrão através das palmas. Claro, foi um êxito.

Vi também um concerto de uma cantora brasileira (não me lembro qual) no qual, aos primeiros acordes de um seu sucesso, o público desatou a cantar tão maciçamente que a artista, comovida, do princípio ao fim, limitou-se a direcionar o microfone para o público, no fito de ampliar a comunhão.

Existe apenas o transe da música, já não existe de um lado o autor/intérprete e o receptor de outro; a amplificação fez sobressair o sentimento de pertença.

No futebol é o mesmo. No Iniesta, no Messi e no Luis Suarez “projecta-se” a jogada que os fãs desejam. O futebolista? Um mero heterónimo do fã.

A paixão do fã é a de quem foi tomado pelo fanatismo próprio ao entusiasmo que, para Platão, era o abono de vida do poeta (- entretanto, desviado para as malhas da racionalidade mais ilhada), e é essa exaltação que encadeia aquele transe colectivo.

Alguma arte e literatura, da ala mais erudita, ficaram arredadas desta qualidade. Desde que deixei de juntar cromos de futebolistas que, progressivamente, se me tornou tudo demasiado cerebral, distanciado, mediado pelo discursivo. Fareja-se, o entusiasmo em T.S. Eliot, na Arte Conceptual, no filósofo Heidegger? Só solenidade, discurso e disforias.

Ficou pior, agorinha mesmo: por causa do Sabato descobri o livro de Evgen Bacvar, Le Voyeur Absolu o magnífico fotógrafo esloveno que é cego desde os 12 anos de idade. Sheet, ia começar esta tarde no ginásio os meus treinos de boxe e, está visto, vou faltar para ler as letrinhas que o esloveno nunca leu e apreciar-lhe as fotos que imaginou mas nunca viu.

Já nos anos cinquenta George Bataille acusava a civilização, não apenas de ter deixado insatisfeitas as necessidades corporais da humanidade, mas, através da permanência de tal frustração, de as ter reprimido – ao nível coletivo. E a hipóstase da corporalidade – através da suposta exclusão do intelecto – sempre enervou muito os intelectuais. Falo por mim, que nunca acreditei muito no mito da espada do Afonso Henriques, do bem que faria aos peitorais erguê-la.

Enuncia Gumbrecht: «(…) coloquemos a questão: quem lê literatura contemporânea e o que é que os seus (já poucos) leitores – tipicamente – fazem com os seus corpos? (…) Enquanto experiências subjetivas “autênticas” do corpo, os intelectuais de hoje apegam-se àquelas experiências do corpo que “vão ao limite”, àquelas nos quais a própria experiência do corpo se torna uma “expansão da consciência”. Talvez esta obsessão em “experimentar os limites” seja um indicador de quão difícil (impossível) se tornou para eles habitarem os seus próprios corpos.»

É pertinente a questão, desdenhámos a inteligência colectiva que se manifesta no fluxo e na materialidade do jogo desportivo e que além de ser hoje o fermento da sociedade de massas estabelece uma nova relação entre o corpo, a sua discursividade e aproveitamento. Embora continue a parecer-me tão bizarro e intratável – roça o irrelevante – que se gaste dois anos de vida num treino intensíssimo e orientado para a meta de baixar um segundo a um recorde de quatrocentos metros livres, como passar dois anos a querer justificar a bisonhice de Heidegger em relação à comédia: duas ilusões razoavelmente infecundas, apesar dos pergaminhos que tais exercícios concedam.

Contudo, como, de uma forma até insuspeita, tudo se relaciona, podemos ler na organização tácita de uma equipa de futebol o equivalente das geometrias secretas que delineiam a composição de um quadro, na pintura.

Qual é o problema de José Mourinho? Foi perdendo a alegria do jogo e, perdido o entusiasmo, reduziu a leitura do jogo ao cálculo das probabilidades (supostamente científico), apostando agora excessivamente nas jogadas com contorno e nas estruturas tácticas, o que inibe severamente a improvisação nas equipas: tornou-se “um treinador figurativo”, de feição hierática, como o pintor Georges Rouault. Guardiola pelo contrário, deixa que cada jogo conte a sua própria história, apesar de ou contra as estruturas que monta: é um “treinador abstracto”, da ala Kandinsky.

Pelo menos é a divagação que me chega, hoje, neste remorso de ter dado banhada, como espectador, ao “meu” Benfica. Sinto-me culpado pela derrota, ou sinto-me derrotado pelo pensamento mágico: sinto que a minha falta de comparência é que quebrou o elã, levando a que aquele indescritível algo que, para além da técnica, pode catapultar a vitória não se tivesse dado. Ora, porra!

Flores de Paris

[dropcap]N[/dropcap]unca peço este bolo. Há uma amiga que o escolhe sempre mas hoje, como ela não está aqui…” Completo-lhe a frase enquanto serve o seu chá. Pequenos, delicados, estranhos rituais estes, que passamos a ter na ausência de alguém para trazê-lo/a mais para perto de nós. Conversamos sobre as idas à piscina, o desamor, o negócio dos livros, doenças e solidão. Mais tarde falaremos sobre o cansaço das viagens e tudo o que pode correr mal em festivais literários. Dir-me-á para não pensar tanto em coisas que, assegura, fiz bem em deixar.

Passaram alguns anos desde que me enviou essa foto que nunca esqueci: flores de Paris, de entre as quais sobressaem verónicas, dálias e hortênsias. Noutra altura, uma tarte de maçã ladeada de hortelã e manjericão a emoldurar a singeleza. Não costumo ir muitas vezes à Versailles, o que é pena, porque a sopa de cebola, o pastel de bacalhau, os bolos, e até mesmo a formalidade, são bastante prazerosos. Não fazer muitas vezes algo que nos dá gosto ajuda a preservá-lo como deveríamos. Há uma mini Versailles no hospital onde fui operada a primeira vez e há uma Versailles umas ruas abaixo de onde vivo agora. Mas na original sentei-me com a minha amiga Ana a falar da sua mãe e de bandas desenhadas. De como o pai queria aprender a cozinhar para a mulher, que era professora e cantava fado. Eu não chegaria a conhecê-la, mas naquela tarde senti que sim. Foi ali que estreitámos laços, comovidas que estávamos. Por isso, não sei como poderia ter-me encontrado com mais esta amiga noutro sítio, independentemente do jeito que desse. Há algumas coisas que notamos sempre na primeira vez: quando nos chamam pelo diminutivo, quando alguém de quem gostamos nos diz que somos bonitas (mesmo se agora já o sabemos), quando uma amiga se nos refere como tal, em voz alta, a outra pessoa.

«Como é que eu podia explicar à mamã que o problema não era ela, mas a deformação que o tempo sofria na casa dela? Eu entrava na casa da mamã e o tempo tornava-se um mecanismo tosco, como se alguém o esculpisse em fisga, eu à mercê dessa fisga, eu munição contra mim mesma, a ser puxada para trás no tempo e depois atirada, desprotegida contra o presente, onde via todos os meus erros e fracassos. A casa da mamã guardava tudo o que eu não quis ser, e que ironicamente acabei por ser.» Troco mensagens com uma amiga que me diz: “Cliffhanger maravilhoso na Eliete”. Rio-me.

Pergunto, citando o livro: “Não vais apagar agora, pois não, Carlota?” Responde com um “Somos todos Eliete”. Somos, mas só a Dulce pode ser a Dulce. Daí a uns dias, vamos a uma conversa na Tigre de Papel e rimos como umas perdidas enquanto trocamos bilhetinhos secretos, ela com uma carraspana de meter dó, anunciando uma morte para breve antes de abandonar a sala mais cedo.

«Vou ter de comprar um medidor de tensão arterial destes, e o coração ficou esquecido nos rascunhos.» A capa do livro funde-se com o meu velho edredão laranja. É bom saber que há mais de onde vieram estes livros, estas mulheres. Há muito de Portugal, daquela coisa mesmo deliciosa e terrivelmente portuguesinha em Eliete. Na Dulce há uma gentileza que me encanta sempre. Nunca usei tanto a expressão temos de parar de encontrar-nos desta forma com alguém como com ela.

Porque a encontrei quase sempre por acaso, em transportes públicos ou restaurantes de fast food. Não é todos os dias que temos um ataque de riso com alguém que nos faz sentir tanto com a sua escrita. A primeira vez que a vi, ainda não a conhecia, foi num evento com laivos de chique, trazia um vestido preto e havaianas. Sempre a rir, sem querer saber. Há uns anos, a um sábado de manhã, quando entrou e se sentou à minha frente no metro, mochila e casaco floridos, pareceu-me que era ela, a cabeleira loira inconfundível, mas achei que devia controlar-me. Os meus auscultadores só estavam a funcionar de um lado. Sorte a minha.

Ele – Lembras-te do Professor Pardal? Também andava sempre com uma lâmpada.
Ela – Lembro. Mas ele era magrinho. Terias de fazer uma dieta. (Risos)
Eu – Riso silencioso, a tentar ser discreta, mas sem conseguir, à medida que ela se ia metendo mais e mais com ele, um beicinho a nascer-lhe.
Ele – A música deve estar boa. (Para mim)
Ela – Ahaha
Eu – Peço desculpa. (Sem conseguir conter o riso mas a tentar, a limpar as lágrimas e a encolher os ombros)
Ele – Deve ser um podcast. (Já a corar)
Ela – Eu também tenho disso (Para mim, ambas a rir sem parar). Podia ser a tua imagem de marca, podias ir a todo o lado com uma lâmpada. (Para ele)

Como explicar uma amizade que começa antes de que se possa saber o mínimo não-tão-indispensável sobre alguém? Ou será assim que surgem algumas das amizades mais ternas? Não saber quase nada sobre alguém, nem precisar, é o derradeiro guilty pleasure das relações modernas.

Ou melhor, saber só o que importa. Levar o seu tempo, e fazê-lo olhos nos olhos. Coisas para as quais não há pressa, flores que continuam a crescer ininterruptamente, para lá dos seus vasos fotografados, num país onde nunca estive.

E se a Gronelândia fosse um travesti?

[dropcap]H[/dropcap]á alguns dias, andei à procura de ilações absurdas para iniciar uma crónica. Precisava desse condimento. Já veremos por que razão. O percurso seria elementar: bastava passar por notícias vindas da Arábia ou do Irão, ou entrar em algumas universidades como a de Quilmes, em Buenos Aires, cujas pesquisas científicas são sempre interessantes, nomeadamente a que provou que os hamsters recuperam melhor das mudanças de fusos horários, quando estão sob o efeito de viagra.

Mas como os humanos são seres azougados, bastou esperar umas horas para que um dos títeres do nosso tempo me proporcionasse ilações absurdas: depois de se comemorarem 152 anos sobre a compra do Alaska ao Canadá (já nem falo dos conhecidos episódios na fronteira sul pela mesma época), eis que o PR dos EUA se propôs comprar a Gronelândia à Dinamarca, um território correspondente a 26 vezes a superfície de Portugal. Um simples negócio imobiliário.

Moral da história: procurar ilações absurdas no nosso tempo é um acto absurdo. Kierkegaard e Camus, cada um a seu jeito, já se tinha encarregado do assunto e a primeira-ministra Mette Frederiksen, em Copenhaga, leitora do primeiro dos autores por razões óbvias, voltou agora a sublinhá-lo com aqueles seus olhos de iceberg verde vago. Há seis anos, já outra PM dinamarquesa, Helle Schmidt, tinha caído no goto de Obama, durante as exéquias de Mandela. As primeiras-ministras dinamarquesas e os EUA parecem, pois, para o pior e para o melhor, manter uma relação estilo Deucalião e Pirra.

Mas o assunto que me trazia para os corredores desta crónica era literário e elevado, podia lá ser outro, e prendia-se com o conto de Truman Capote ‘Uma candeia numa janela’ que pode ser assim resumido: um homem perde-se na floresta e descobre uma casa onde é bem recebido. A anfitriã é uma senhora de idade, viúva, que vive com vários gatos. O homem passa aí a noite e no outro dia descobre que o amor pelos gatos de Mrs. Kelly estava recheado de dotes faraónicos. Ao abrir a arca frigorífica, uma vasta colecção de gatos congelados comprova-o. E a dona da casa confessa a sua perdição: “Todos os meus velhos amigos. No eterno repouso. É que eu não suportava a ideia de os perder”.

O conto tocou-me, porque faço parte daquela franja da humanidade que tem um enorme fraquinho pelos gatos. Mas não sou maluco ao ponto de ir votar no PAN, pois é mais importante voltar a normalizar o Serviço Nacional de Saúde do que criar um paralelo destinado aos mais belos felinos da galáxia.

Voltando ao tema, devo referir que, por razões profissionais, procurei na rede críticas a este conto de Capote e ao livro onde ele surge publicado, ‘Música para Camaleões’. E foi então que, por acaso, encontrei um artigo científico que deixa as pesquisas da Universidade de Quilmes a um canto. Insere-se no naipe de investigações que, hoje em dia, fazem vida nos chamados ‘Estudos de Género’. O texto é da autoria de Michael P. Bibler e deixo-o aqui sem mais comentários (a tradução é minha, deixo o original em inglês em rodapé):

“Embora a história nos prepare para o facto de os gatos congelados serem símbolos ou substitutos do seu falecido marido, torna-se claro que ela ama os seus gatos literalmente enquanto gatos e nada mais. Capote leva-nos a compreender e a aceitar este amor pelos seus gatos como uma coisa em si mesma. E ao fazê-lo, ele convida-nos a imaginar um mundo mais hospitaleiro capaz de se ajustar a outras opções para além dos limites do casamento heterossexual, incluindo, ainda que sem se limitar a tal, a sua homossexualidade.”

Depois de ler esta preciosidade, pergunto-me se valerá a pena sequer comentá-la. Entre comprar a Gronelândia e a ideia de que os gatos congelados significam uma sexualidade de várias entradas, o que sobrará?

Sobrará talvez uma breve narrativa de teor oral que me foi contada por um amigo pintor que, por coincidência, é um apaixonado pela prosa de Truman Capote, pelos romances de Camus e pela filosofia de Kierkegaard:

‘O marido queria praticar sexo anal com a mulher, mas não sabia como pôr em prática um projecto de tal complexidade. Lembrou-se de comprar um busto de Napoleão. Colocou-o em frente à cama, ao lado da televisão. Na noite seguinte, a mulher perguntou – “O que faz ali aquele busto?” – e o marido, virando-se para ela, replicou – “qual busto, qual quê, o que tu queres sei eu”. E lá avançou como pôde, coitado’.

Esta breve narrativa, que em certos meios científicos é classificada como anedota, tem uma carga suplementar de vernáculo (diz literalmente “ir ao cu”), o que lhe confere um certo fundo antropológico. Se se convidasse o senhor Michael P. Bibler a interpretar este excurso no auditório da Gulbenkian, o que diria ele?

Diria que o marido, ao focar-se no peito de Napoleão (era essa a inexorável proeminência do busto), estaria a convidar-nos a imaginar um mundo mais hospitaleiro e capaz de se ajustar a outras posições e opções para além dos limites do sexo oral, competência em princípio partilhável nos mundos hetero e homossexual.

Acrescentaria ainda em jeito de conclusão: como os humanos não conhecem o género a que pertencem e precisam de aulas para o descobrir (por causa do dilúvio, Deucalião e Pirra ainda estão na lista de espera), se se tratasse do busto de Trump, tornar-se-ia necessário descongelar os gatos de Mrs. Kelly e a Gronelândia inteira e, depois de tudo derretido, tal como aconteceu com os hamsters de Quilmes, logo se veria para que fuso pendiam as coisas. Só então se podia, com propriedade, falar em negócio imobiliário.


Capote, Truman, Música para Camaleões, trad. paulo Faria, Livros do Brasil, Porto, 2015 pp.35-38 [Em linha]. (S/D.) https://static.fnac-static.com/multimedia/PT/pdf/9789723829044.pdf [Consult. 3 Ago. 2019].

“Although the story prepares us to expect that the frozen cats could be symbols or surrogates for her dead husband, it becomes clear that she loves her cats literally as cats and nothing more. Capote pushes us to acknowledge and accept this love for her cats just as it is. And by doing so, he invites us to imagine a more hospitable world in which we accommodate other kinds of object-choice beyond the confines of heterosexual marriage, including but certainly not limited to his own homosexuality.”. In Michael P. Bibler,  Capotes´s Frozen Cats – Sexuality, Hospitality, Civil Rights, Journal Angelaki, Journal of theoretical humanities. [Em linha]. (Volume 23, 2018 – Issue 1 / Queer Objects. Issue Editors: Guy Davidson and Monique Rooney) https://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/0969725X.2018.1435387?journalCode=cang20 [Consult. 3 Ago. 2019].

Comércio | UE alerta para impacto do sistema de crédito social

[dropcap]A[/dropcap] Câmara de Comércio da União Europeia na China apelou ontem às empresas europeias para que se preparem para o sistema de crédito social no país, alertando para interrupções “substanciais e amplas” dos seus negócios.

O mecanismo, que será lançado em 2020, implica uma “nova abordagem de conformidade regulamentar”, através do uso de análise de dados em grande escala (Big Data), visando a detecção imediata de não conformidade com as regras do mercado.

Cada empresa passa a estar sujeita a um sistema de “pontuação”, que afectará o regime fiscal, condições de crédito, acesso ao mercado ou participação em concursos públicos.

Os reguladores chineses, desde o fisco às alfândegas, estão a classificar cada vez mais empresas de acordo com aquele sistema, e a partilhar “listas negras” de firmas que violam regras.

Joerg Wuttke, o presidente da Câmara de Comércio, afirmou que “não é exagerado dizer que o Sistema de Crédito Social Corporativo vai ser o sistema mais abrangente criado por qualquer governo para impor um mercado autorregulado”.

“Também não é inconcebível que se trate de uma questão de vida ou morte para as empresas”, apontou.

Wuttke considerou como “profundamente preocupante” a “esmagadora ausência de preparação pela comunidade empresarial europeia”.

Documentos do governo revelam que uma variedade de reguladores chineses, desde da segurança no trabalho ao comércio electrónico ou cibersegurança, estão a compilar classificações de empresas segundo 300 regras específicas, informou a Câmara do Comércio, num relatório.

Prós e contras

Em muitos casos, as empresas estrangeiras podem até beneficiar do sistema, pois geralmente têm melhor conformidade em áreas como a protecção do ambiente, ressalvou a Câmara.

“Empresas europeias cujas operações são frequentemente suspensas, em dias altamente poluídos, a par de competidores que não cumprem com requisitos ambientais, deverão poder continuar a produção, enquanto os poluidores perderão pontos” exemplificou.

Em outros casos, uma empresa pode perder pontos devido às acções de um parceiro local. Um caso citado no relatório revela que uma empresa estrangeira foi informada de que a classificação do seu parceiro pelas autoridades alfandegárias afectaria a sua classificação.

O controverso mecanismo afectará também indivíduos, com os dados coletados a resultarem em recompensas ou punições, dependendo da pontuação, pelo que críticos consideram tratar-se de um sistema “orwelliano”.

O relatório considera que a discussão se tem focado nas implicações para os indivíduos, mas que houve “muito menos discussão” sobre o impacto para os negócios.

FIMM | Billy Childs Quartet e Dorian Wind Quintet juntos em concerto

O Quarteto de Jazz de Billy Childs junta-se ao Quinteto de Cordas Dorian para dois espectáculos cada, um dos quais em conjunto, em Outubro no território. A proposta é tentadora e acontece no XXXIII Festival Internacional de Música de Macau

 

[dropcap]B[/dropcap]illy Childs Quartet e Dorian Wind Quintet são duas bandas de relevo convidadas para participar no XXXIII Festival Internacional de Música de Macau (FIMM), que se realiza este ano entre 4 e 30 de Outubro em diversas salas do território. Os dois grupos vão actuar no mesmo dia em separado, a 10 de Outubro, apresentando os seus trabalhos musicais, e no dia seguinte juntam-se para um novo concerto a meias, a 11 de Outubro, onde irão apresentar a estreia mundial de “Ecosystems”, a mais recente produção de Billy Childs.

O pianista e compositor de jazz norte-americano é figura de destaque neste programa do FIMM, considerado um dos artistas mais diversificados e aclamados da actualidade na sua área. “As composições e arranjos originais de Billy Childs valeram-lhe um Doris Duke Performing Artist Award em 2013, Guggenheim Fellowship em 2009, 16 nomeações e cinco prémios Grammy”, lê-se no programa divulgado pelo Instituto Cultural (IC).

As primeiras influências de Childs devem-se aos mestres de jazz norte-americano Herbie Hancock e Chick Corea, indo beber ainda aos compositores clássicos como Maurice Ravel e Igor Stravinsky. A carreira de William Edward Childs passou também pela “aprendizagem com o lendário trombonista de jazz J.J. Johnson e o grande trompetista de jazz Freddie Hubbard. Antes de conseguir um contrato com a sua editora, gravou e tocou com influentes músicos de jazz como Joe Henderson e Wynton Marsalis”.

Como pianista, Billy Childs tocou já em parceria com Yo-Yo Ma, Sting, Renee Fleming, Jack DeJohnette, Dave Holland, Ron Carter, Chris Bottio, os próprios Chick Corea e Wynton Marsalis, e as bandas The Los Angeles Philharmonic, The Detroit Symphony Orchestra, The Kronos Quartet, The Ying Quartet ou The American Brass Quintet.

Em 2001, formou o seu grupo de jazz de câmara, composto por piano, contrabaixo, percussões, guitarra acústica, harpa e sopros de madeira, embora fosse tendo diferentes formações em função dos projectos musicais em mãos. Para o espectáculo do FIMM, Childs traz consigo um quarteto de grandes intérpretes de jazz, como “o multipremiado saxofonista Shai Golan, o baixista Dave Robaire, que foi aluno do célebre baixista John Patitucci, e o jovem e enérgico baterista Christian Euman, aclamado como um dos ‘seis bateristas que devemos conhecer’”, informa o IC.

O grupo toca às 20h do dia 11 de Outubro, sexta-feira, no grande auditório do Centro Cultural de Macau. O espectáculo terá hora e meia de duração e apresentará obras do seu repertório, como “Backwards Bop”, “Stay” e “Rebirth”, sendo este último o título do seu disco mais recente, premiado com o Grammy de Melhor Álbum Instrumental de Jazz em 2018. Os bilhetes custam 150, 200, 300 e 400 patacas.

Sopros barrocos

No mesmo dia e à mesma hora – 11 de Outubro às 20h – apresenta-se o Dorian Wind Quintet no palco do Teatro D. Pedro V. O famoso quinteto de música de câmara, composto por instrumentos de sopro, é uma formação versátil e “exímia na interpretação de música de várias épocas, desde as transcrições e arranjos de obras-primas dos períodos renascentista e barroco, até ao século XX com obras contemporâneas de compositores americanos e franceses”.

O Dorian Wind Quintet é conhecido mundialmente como um dos mais proeminentes e activos conjuntos de câmara, formado em Tanglewood, no Massachusetts, in 1961. Desde a sua criação, colaborou já com “artistas lendários como Phyllis Bryn-Julson, Lukas Foss e Lorin Hollander”, e percorreu a Europa, Médio Oriente, Índia, África e Ásia, além das digressões que faz pelos Estados Unidos e Canadá. Em 1981, foi o primeiro quinteto de sopros a actuar no Carnegie Hall.

Até hoje tem sido “responsável por quase 40 encomendas a grandes compositores e estreou 98 novas composições. A sua encomenda do Quinteto de Sopros nº 4, de George Perle, ganhou o Prémio Pulitzer de Música em 1986, fazendo história por ser o primeiro atribuído a um quinteto de sopros”.

O ensemble é actualmente composto por Gretchen Pusch na flauta, Gerard Reuter no oboé, Benjamin Fingland no clarinete, Adrian Morejon no fagote e Karl Kramer-Johansen na trompa. O concerto, que terá aproximadamente 1 hora e 45 minutos, com intervalo, e conta com suites e peças de Trans. R. Roseman, J. Ibert, A. Harberg, P. Hindemith e Johann Sebastian Bach. Os bilhetes custam 250 e 300 patacas.

Todos juntos

No dia seguinte, sábado de 12 de Outubro, o Dorian Wind Quintet dividirá o palco do Teatro D. Pedro V com Billy Childs, para interpretarem juntos a estreia mundial de “Ecosystems” e o regresso de “A Day in the Forest of Dreams”, estreado em 1997, ambos compostos por Childs. A peça foi entregue pelo compositor ao quinteto em Agosto de 2018, com o apoio do CMA Classical Commisioning Program Grant, para ser estudada e interpretada algures no Verão de 2019, o que acontece agora em primeiríssima mão no FIMM. O espectáculo terá 1 hora e 45 minutos, com intervalo, aos preços de 250 e 300 patacas.

Carne fresca de porco deve aumentar 310 patacas por 60 quilogramas 

[dropcap]O[/dropcap] canal chinês da Rádio Macau noticiou ontem que a carne de porco vivo deve ter um aumento de 310 patacas por cada 60 quilogramas, o que, na prática, significa que o preço mais alto a cobrar deverá ser de 2660 patacas a cada 60 quilogramas.

Sobre este ponto, o subdirector-geral do grupo Nam Yuen, Wong, explicou que o aumento dos preços se deve aos valores praticados em Hong Kong, onde se cobram 4700 patacas por cada 60 quilogramas de carne de porco, o dobro face aos preços praticados em Macau.

Os porcos vivos exportados para Macau são criados em quintas pelos próprios fornecedores, o que faz com que o preço de aquisição se aproxime do preço por atacado em Macau. Isto resulta numa perda de lucros para os criadores de porcos, o que “não é viável”, disse Wong. O responsável da Nam Yue defende que os preços da venda de carne por atacado devem aumentar no território, para que os fornecedores estejam dispostos a vender para Macau.

De acordo com informações publicadas pelo Jornal do Cidadão, os locais de transbordo de mercadorias escolhidos pela Nam Kwong e Nam Yuen, localizados em Zhuhai e Zhongshan, foram rejeitados pelas autoridades chinesas. Por esse motivo, pede-se a intervenção do Governo de Macau nesta matéria, para que se chegue a um acordo com estas cidades, a fim de reduzir os custos com o transporte da carne.

Diversificar, é preciso

O Jornal do Cidadão deslocou-se ao mercado, tendo noticiado que houve uma quebra no abastecimento de porcos vivos em um quarto quando comparado com os dias anteriores, o que fez com que a carne de porco tenha esgotado pouco depois da hora de almoço, mesmo que o preço, por cada quilo, tenha registado um aumento de cinco a seis patacas.

Por forma a colmatar esta problemática com o fornecimento de porcos vivos para Macau, Hoi Long Tong, presidente da direcção da Aliança de Povo de Instituição de Macau, defende que haja uma diversificação das fontes de importação, sugerindo que a Nam Kwong e a Nam Yuen considerem comprar porcos vivos a países estrangeiros.

Chan Pou Sam, membro do conselho consultivo do Instituto para os Assuntos Municipais, disse ao jornal Ou Mun que os Serviços de Alfândega devem implementar medidas para combater o possível contrabando de porcos vivos, esperando que as autoridades de Macau e da China actuem em conjunto para prevenir uma possível propagação da peste suína africana. Também este responsável defende a importação de porcos vivos oriundos de outros países que não a China, para que se possa equilibrar os preços da carne fresca praticados no mercado.

SMG | Emitido alerta de ciclone tropical e aviso de inundações

[dropcap]O[/dropcap]s Serviços Meteorológicos e Geofísicos (SMG) emitiram ontem ao início da tarde um alerta devido à aproximação de um ciclone tropical que pode resultar em inundações.

As autoridades içaram o sinal 1, no momento em que o “ciclone tropical ‘Podul’, localizado na parte central do Mar do Sul da China, continua a mover-se para o quadrante oeste, dirigindo-se para a Ilha de Hainan”, lia-se no portal dos serviços meteorológicos.

O alerta foi emitido às 15h de ontem com a probabilidade moderada de ser elevado para sinal 3 durante a manhã de hoje, de acordo com os SMG.

Em comunicado, foi referido que entre hoje amanhã “podem ocorrer inundações em zonas baixas no Porto Interior”, pelo que lançou também o aviso de ‘storm surge’ (maré de tempestade) azul, quando o Podul se encontrava a 640 quilómetros de Macau.

A Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais recomendou também que, “como o tufão poderá destruir construções ou estaleiros de construção, os cidadãos e os empreiteiros devem adoptar, com a maior brevidade possível, as respectivas medidas de prevenção, principalmente em relação aos andaimes, aparelhos elevatórios (por exemplo, gruas), janelas de construções e materiais pendurados nas fachadas”.

Por outro lado, acrescenta-se na mesma nota, deve-se “fazer uma inspecção detalhada, tomar medidas para reforçar o equipamento e dar mais atenção aos assuntos relacionados com a segurança (…), a fim de garantir a segurança dos trabalhadores e do público, devendo os cidadãos, por sua vez, evitar aproximar-se de construções durante os tufões”.

Crime | Detido por suspeita de burla com troca de dinheiro

[dropcap]U[/dropcap]m homem oriundo do interior da China, de apelido Yang, 38 anos de idade, trabalhador de obras de construção, foi detido esta terça-feira por suspeita de prática de burla no valor de 45,8 mil yuan.

A vítima declarou que, depois de ter perdido dinheiro no jogo, contactou um indivíduo através de uma rede social para trocar 50 mil dólares de Hong Kong. O intercâmbio ficou marcado para uma sala VIP de um casino situado no NAPE. Após a chegada ao local, Yang pediu-lhe que transferisse 45,8 mil yuan para uma conta bancária do interior da China através do telemóvel, e que chegaria em seguida à sua conta VIP a quantia pedida. Como a vítima não recebeu o dinheiro, e o homem presente não conseguia pagar o montante, foi chamada a polícia e o suspeito detido.

O indivíduo alegou ter sido contratado por “burlões da troca de dinheiro”, e alegou desconhecer a razão pela qual a troca não foi concluída. Yang referiu ainda às autoridades que por cada transferência bem-sucedido iria receber 100 yuan.

O detido foi presente ao Ministério Público acusado de burla (de valor elevado). A Polícia Judiciária continua à procura dos restantes cúmplices.

Incêndio | TSI confirma pagamento de indemnização a dono de loja

O Tribunal de Segunda Instância reiterou a condenação de duas pessoas devido aos danos provocados num apartamento por um incêndio que deflagrou numa loja de vestuário na Rua do Tarrafeiro. O autor da acção terá direito a indemnização no valor de mais de 72 mil patacas. Porém, muito mais grave do que paredes tinadas, o incêndio provocou a morte de quatro pessoas

 

[dropcap]À[/dropcap]s 3h40 da manhã do dia 12 de Novembro de 2014, um incêndio que deflagrou numa loja de vestuário no piso térreo de um edifício situado na Rua do Tarrafeiro (que liga a Praça Luís de Camões à Rua Visconde de Paço de Arcos) tirou a vida a quatro pessoas, incluindo um funcionário do estabelecimento. As vítimas, que morreram na sequência de inalação de fumo, eram três homens e uma mulher, dois filipinos e dois indonésios.

No piso de cima, um morador num apartamento do primeiro-andar acordou em sobressalto, mas escapou ileso ao acidente. Porém, o apartamento ficou danificado ao ponto de ter de recorrer à justiça para reclamar uma compensação pelos danos sofridos. Assim começava uma batalha judicial, que conheceu recentemente o desfecho do segundo assalto com o acórdão do Tribunal de Segunda Instância (TSI) que confirmou a condenação dos dois réus, proprietário e locatário da loja, a pagar 72.300 patacas ao morador do apartamento.

O autor do processo pediu a condenação solidária para pagamento da indemnização a ambos os réus, ou seja, qualquer um dos dois réus pode ser executado até a dívida ficar totalmente paga ao autor.

Risco e prevenção

O Tribunal Judicial de Base considerou que o proprietário do imóvel, “tinha, necessariamente, o dever de prudência e o dever de cuidar da vigilância do imóvel, de forma a evitar quaisquer danos a terceiros”. Por outro lado, segundo o acórdão do tribunal superior, também o locatário do imóvel, ou seja, quem explorava a loja, tinha, naturalmente, “o dever de vigiar o imóvel, uma vez que, findo o contrato, era obrigado a restituir, à locadora, o bem locado em perfeito estado”. No fundo, ambos tinham o dever de vigiar o imóvel.

O tribunal deu como provado que os danos sofridos na residência foram causados pelo incêndio que ocorreu na loja. Mais concretamente, o morador teve de pintar dois quartos, duas portas, tectos e paredes. Instalou dois aparelhos de ar condicionado novos, arcando com os custos de trabalho e peças. Teve de proceder a obras de remoção dos outros aparelhos antigos, assim como toda a mobília danificada. Para estes trabalhos, o morador desembolsou mais de 29 mil patacas. A limpeza das paredes exteriores e grade de aço inoxidável custaram 6.500 patacas.

Além disso, o morador perdeu grande parte do recheio da habitação, incluindo uma cama que se viu forçado a substituir, despesa que lhe valeu um rombo no orçamento na ordem das 8.600 patacas. No total, os réus foram condenados ao pagamento de 72.300 patacas ao morador.

Aeroporto | Ampliação vai esperar pelo estudo de impacto ambiental

[dropcap]O[/dropcap] presidente da Autoridade de Aviação Civil (AACM), Chan Weng Hong, comentou esta terça-feira que as razões pelas quais foram aprovados apenas 149 hectares de aterros, para a ampliação do Aeroporto Internacional de Macau, se deveram a instruções do Governo Central para que a obra se enquadre na gestão dos assuntos hídricos do Delta do Rio das Pérolas.

Em 2017, a AACM solicitou ao Gabinete para os Assuntos de Hong Kong e Macau do Conselho de Estado um pedido de autorização para a realização de um total de 172 hectares de aterros para expansão do aeroporto, mas só foram concedidos 149 hectares para o projecto.

As instruções do Governo Central foram também claras quanto à próxima fase de construção dos aterros, que terão que passar por um estudo prévio de avaliação do impacto ambiental da execução da obra, que poderá demorar um ano e meio até estar concluído, e ficará sujeito a novo parecer de Pequim. Chan Weng Hong acrescentou não haver, portanto, qualquer cronograma previsto para o seu arranque.

O responsável lembrou que o transporte de passageiros no Aeroporto de Macau aumentou 18 por cento no primeiro semestre de 2019, estando previsto ultrapassar os 9 milhões de passageiros até ao final do ano. Sobre a abertura do Mercado de Transporte Aéreo, e a não prorrogação do direito de exclusivo à Air Macau, o presidente da AACM sublinhou que tal não afectará o tráfego actual, já que “existem 34 transportadoras e 61 rotas em operação hoje. E a Air Macau continuará a servir a comunidade como a operadora aérea registada localmente”.

Diocese de Macau perde concessão de quatro parcelas de terreno na Taipa 

Quatro terrenos situados na Taipa, junto à Avenida Carlos da Maia, concessionados à Diocese de Macau, viram a sua concessão anulada pelo secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo do Rosário. A primeira concessão data de 1938 e tem ligações a Pedro José Lobo, figura histórica da comunidade macaense

 

[dropcap]A[/dropcap] Diocese de Macau acaba de perder quatro terrenos cuja concessão data das primeiras décadas do século XX. O despacho, publicado ontem em Boletim Oficial (BO), dá conta do fim da concessão dos terrenos situados na Taipa, junto à Avenida Carlos da Maia, e que tinham como objectivo a construção de “um estabelecimento de carácter religioso destinado ao ‘Noviciado das Irmãs de Nossa Senhora dos Anjos’”.

Caso a Diocese de Macau não concorde com a decisão do Governo, pode recorrer para o Tribunal de Segunda Instância no prazo de 30 dias, tendo também a possibilidade de apresentar uma queixa ao Chefe do Executivo no prazo de 15 dias.

A primeira concessão feita dos referidos terrenos data de 1938, tendo sido autorizada a favor de António Maria da Silva. A ideia era que este ocupasse de forma temporária, por um período de 50 anos, um terreno com mais de dois mil metros quadrados “destinado a manter construída a casa de habitação com jardim nele existente”.

O terreno em causa chegou a estar duas vezes inscrito na Conservatória do Registo Predial, pois “não foi registada a extinção da concessão por aforamento desse terreno atribuída a Pedro José Lobo em 1928, por falta do seu aproveitamento”, descreve o despacho do BO. De frisar que Pedro José Lobo foi uma ilustre figura da comunidade macaense dos primórdios do século XX, tendo sido político, empresário, funcionário público e filantropo.

De mão em mão

Resolvida a questão burocrática com o registo do terreno, este seria concessionado, em Agosto de 1940, exclusivamente a António Maria da Silva. Poderia ocupar três parcelas de terreno durante 50 anos, a contar a partir de Abril de 1938, “destinadas à ampliação da propriedade existente”.

Acontece que em 1941 António Maria da Silva decidiu requerer junto do Governo a transmissão de quatro parcelas de terreno a favor da Missão do Padroado Português no Extremo Oriente. Esta transmissão foi aceite pelo Governo da época, tendo sido realizada a escritura a de 6 de Março de 1941. Dessa forma, os direitos dos terrenos ficaram sob alçada da Missão do Padroado Português no Extremo Oriente, que seria extinta em 1986, “revertendo os seus bens a favor da Diocese de Macau”.

Os prazos da concessão expiraram em 1988 e a Diocese de Macau apenas requereu a renovação do processo a 5 de Dezembro de 1989. A entidade não mais voltou a fazer novo pedido de renovação.

Além disso, os terrenos em causa não estavam sujeitos a um “regime de renovação automática ou tácita”, tendo sido assim anulada a concessão.

DSAJ | Lou Soi Cheong nomeado novo subdirector

[dropcap]L[/dropcap]ou Soi Cheong é o nome escolhido para ocupar o cargo de subdirector da Direcção dos Serviços para os Assuntos de Justiça (DSAJ), apenas pelo período de um ano. A nomeação, tornada pública com a publicação de um despacho em Boletim Oficial, entrou ontem em vigor.

Lou Soi Cheong é licenciado em Direito pela Universidade Chengchi de Taiwan, tendo ingressado na Função Pública em 1993. Começou por ser técnico superior na área jurídica no Gabinete para a Tradução Jurídica, de Outubro de 1993 a Maio de 1996.

Ocupou depois o cargo de adjunto, conservador e notário público, até 1998, tendo seguidamente assumido o cargo de Conservador da Conservatória dos Registos Comercial e Automóvel, de Dezembro de 1998 a Janeiro de 2002. Em 2002 tornou-se Conservador na DSAJ, tendo vindo a ocupar, desde Junho, o lugar de subdirector substituto da DSAJ, um lugar que agora se torna permanente.

Grande Baía | Shenzhen aprova fundo para atrair licenciados de Macau e Hong Kong

Os estímulos para a captação de mais valias das Regiões Autónomas Especiais sucedem-se. Depois de, em Maio, ser anunciado que os talentos oriundos de Macau e Hong Kong receberiam incentivos fiscais se fossem trabalhar no Continente, Qianhai aprovou agora um fundo de 150 milhões de yuan para subsidiar licenciados das regiões vizinhas

 

[dropcap]A[/dropcap] zona económica especial de Qianhai, em Shenzhen, aprovou um fundo de 150 milhões de yuan para atrair licenciados das cidades vizinhas de Macau e Hong Kong, avançou ontem a imprensa chinesa. Segundo o portal noticioso Caijing, o fundo abrange subsídios de transporte, residência ou isenção de impostos.

A medida surge depois de o Governo chinês ter anunciado que quer elevar o papel de Shenzhen no plano de integração regional da Grande Baía, face à contestação social em Hong Kong, prometendo maior abertura económica na cidade fronteiriça.

A directriz pede a Shenzhen que agarre as oportunidades e aprimore as suas funções como “motor central” da Grande Baía, projecto que visa construir uma metrópole mundial a partir de Hong Kong e Macau, e nove cidades da província de Guangdong, através da criação de um mercado único e da crescente conectividade.

Citadas pelo portal, as autoridades de Shenzhen afirmaram que o fundo é um compromisso da cidade para fortalecer a integração e cooperação entre Shenzhen e Hong Kong.

Para beneficiar do subsídio, o funcionário terá de trabalhar por um ano e garantir um contrato mínimo de dois anos com um empregador de Qianhai.

O mesmo artigo exemplifica que se um médico de Hong Kong ou de Macau se mudar para Qianhai poderá obter um subsídio de até 130.000 yuan, dependendo das qualificações académicas.

Primeiros estímulos

Em Maio, Pequim disse que, para desenvolver a área da Grande Baía, os melhores talentos de Hong Kong e Macau que optarem por trabalhar na China continental receberiam incentivos fiscais.
Situado na costa oeste de Shenzhen, a zona económica especial de Qianhai tem 15 quilómetros quadrados.

Os licenciados com idades entre os 18 e os 45 anos também poderão solicitar subsídios para financiar projectos de inovação.

O plano de Pequim para Shenzhen, divulgado na semana passada, incluiu reformas abrangentes a serem implementadas nos sectores jurídico, financeiro ou no sistema de saúde.

Hong Kong em perda

Analistas prevêem que o estatuto de Hong Kong na Área da Grande Baía seja reduzido, face ao actual clima de contestação social desencadeado pela apresentação de uma proposta de alteração à lei da extradição, que permitiria ao Governo e aos tribunais da região administrativa especial a extradição de suspeitos de crimes para jurisdições sem acordos prévios, como é o caso da China continental.

A proposta foi, entretanto, suspensa, mas as manifestações generalizaram-se e denunciam agora aquilo que os manifestantes afirmam ser uma “erosão das liberdades” na antiga colónia britânica, enquanto apelam à demissão de Carrie Lam, a chefe do governo local, pró-Pequim e à eleição de um sucessor por sufrágio universal direto, e não nomeado pelo Governo central.

O jornal oficial do Partido Comunista Chinês Global Times adverte também ontem que, caso os tumultos persistirem na antiga colonia britânica, a cidade “poderá perder o seu encanto” e levar à transferência de “alguns serviços financeiros importantes para o emergente vizinho Shenzhen”, em sectores como a captação de recursos para ‘startups’ ou a internacionalização da do yuan.
Situado na fronteira com Hong Kong, Shenzhen converteu-se numa das mais prósperas cidades da Ásia, símbolo do milagre económico que transformou a China, após a adopção da política de Reforma e Abertura, no final dos anos 1970.

Shenzhen, então uma vila pacata, deliberadamente por desenvolver – os comunistas, que receavam “contaminação” política e económica via Hong Kong, designaram-na de “fronteira de defesa política” – serviu de laboratório à abertura da China à economia de mercado.

Em 2017, o Produto Interno Bruto de Shenzhen ultrapassou os 338 mil milhões de dólares, à frente de Hong Kong ou Singapura.

A China tem grande poder económico sobre Hong Kong: segundo dados oficiais, é responsável por metade do comércio do território e a origem de um quarto do investimento externo na cidade.

O continente fornece mais de um quarto da electricidade consumida em Hong Kong e a maior parte da água potável, enquanto mais de três quartos dos turistas na cidade são chineses.

A importância de Hong Kong para a China diminuiu também, face ao início do processo de reformas económicas no continente, mas Pequim ainda precisa da região semiautónoma como um centro financeiro.

A maior parte do investimento estrangeiro na China passa pelo território, enquanto as empresas chinesas emitem títulos nos mercados internacionais através da praça financeira de Hong Kong.

Mulher que fugiu da Coreia do Norte morre de fome em Seul

Depois de uma fuga da Coreia do Norte digna de um filme, com um casamento arranjado pelo caminho, Han Sung-ok chega a Seul em 2009. Passada uma década na abastada capital sul-coreana, Han e o filho de 6 anos morreram à fome. As suas trágicas mortes levantam questões sobre a adaptação de quem foge a um dos regimes mais brutais do mundo

 

Laura Bicker, BBC News

[dropcap]H[/dropcap]an Sung-ok, de 42 anos, parecia determinada a escolher entre quase todas as alfaces disponíveis na barraca de legumes e verduras no subúrbio de Seul onde vivia. Examinou todas as alfaces, uma a uma, enquanto o seu filho de 6 anos brincava indiferente à confusão do mercado. A vendedora começava a dar sinais de aborrecimento. Han era muito exigente apesar de não comprar mais de um ou dois legumes, sempre pelo menor preço possível. Naquela ocasião, foi um pé de alface por 500 wons (pouco mais de 3 patacas). Pronunciando apenas algumas palavras, Han entregou o dinheiro e saiu com o filho. Algumas semanas depois, ambos foram encontrados mortos.

Depois de ter fugido da escassez de alimentos na terra natal, a Coreia do Norte, e sonhado com uma nova vida, acredita-se que Han e o filho morreram de fome numa das cidades mais ricas da Ásia.

Os corpos só foram descobertos ao fim de dois meses, quando um fiscal que ia tirar a leitura do contador de água notou mau cheiro vindo do apartamento onde moravam. Mãe e filho foram encontrados caídos no chão. A única comida encontrada no pequeno apartamento alugado era um saco de pimenta vermelha em flocos.

Uma das últimas pessoas que viu Han viva foi a vendedora do mercado de rua perto do seu apartamento, mais ou menos na mesma época em que a polícia diz que a desertora levantou da conta bancária os últimos 3.858 wons (menos de 26 patacas).

“Pensando bem, isso dá-me calafrios. No começo, odiei-a por ser exigente, mas agora que penso um pouco tenho muita pena dela. Se ao menos tivesse pedido ajuda, ter-lhe-ia dado um pouco de alface”, diz a vendedora.

A grande odisseia

A jornada de Han para a liberdade como desertora norte-coreana poderia ter-lhe dado alguma notoriedade, mas, numa cidade de 10 milhões de habitantes, tornou-se cada vez mais invisível. Muito poucas pessoas a conheciam. Aqueles que privavam com Han dizem que falava muito pouco e que andava quase disfarçada com um chapéu, evitando o contato visual. Quis o malfadado destino que a desertora só através da morte se tornasse visível em Seul. A sua fotografia foi colocada entre flores e presentes num santuário improvisado no centro da cidade.

“Quando soube da notícia, achei absurdo demais para acreditar. Simplesmente não faz sentido que, depois de passar por todas as dificuldades e desafios para vir para o sul, tenha morrido de fome. Isto parte-me o coração. Isto não pode acontecer na Coreia do Sul. Por que ninguém soube da sua situação até que morressem?”, diz um desertor, de luto, diante do santuário.
Escapar da Coreia do Norte parece quase impossível. Mais pessoas tentaram escalar o Monte Evereste este ano do que deixar o país empobrecido.

Mesmo ultrapassando os soldados que vigiam a fronteira, os desertores enfrentam uma jornada de milhares de quilómetros pela China. O seu objectivo é chegar a uma embaixada sul-coreana num terceiro país, geralmente Tailândia, Camboja ou Vietname. Atravessar a China é um risco. Se forem apanhados, são enviados de volta para a Coreia do Norte e podem enfrentar uma vida inteira de trabalhos forçados num dos campos de prisioneiros do mais isolado país do mundo.

Por outro lado, as desertoras que pagam a redes de tráfico humano para obter ajuda na jornada, muitas vezes acabavam aprisionadas e vendidas como noivas ou escravas sexuais.

No caso de Han, é difícil verificar como e quando saiu da Coreia do Norte. Dois desertores afirmam ter falado com ela e acreditam que foi vendida como noiva a um chinês, com quem teve um filho.

Metamorfose sulista

Han chegou a Seul sozinha, em 2009, e nunca foi muito dada a abrir-se sobre a sua vida privada com os colegas em Hanawon, um centro administrado pelo Ministério da Unificação de Seul onde desertores passam por processo de educação obrigatório de 12 semanas para se ajustarem à nova vida.

A turma de Han foi uma das maiores desde que o centro foi criado, com mais de 300 pessoas. Todos sabiam o quão difícil havia sido passar por território chinês. “Sei que ela foi para a China primeiro. Mesmo quando ria, havia algo sombrio. Perguntei-lhe se estava com algum problema, mas ela ignorou-me sempre”, disse um dos seus colegas no centro. “Então, disse-lhe: ‘Não sei o que é, mas podes ter uma vida boa se trabalhares. A Coreia do Sul é um país que recompensa quem trabalha. És jovem e bonita, não terás uma vida difícil. Faças o que fizeres, não te envergonhes e anda de cabeça erguida’.”

Han parecia estar a adaptar-se bem ao princípio. As autoridades ajudam desertores a encontrar apartamentos subsidiados, e, juntamente com seis colegas de classe, foi instalada no bairro de Gwanak-gu.

“Acho que foi a segunda pessoa depois de mim na nossa turma a conseguir emprego”, diz uma colega de classe. “No começo, trabalhou brevemente num café na Universidade de Seul. Ouvi dizer que causou boa impressão. O que lembramos melhor é que era inteligente e bonita, e pensámos que era capaz de cuidar de si própria. Não esperávamos que isto acontecesse.”

Vida em família

É difícil descobrir como, a partir do começo promissor, Han acabou em dificuldades que acabariam por ter um desfecho trágico. Dois desertores residentes no seu condomínio de apartamentos dizem acreditar que ela havia persuadido o marido chinês a mudar-se para a Coreia do Sul. Assim sendo, o casal foi viver para Tongyeong, onde o marido trabalhava num estaleiro. Han teve um segundo filho, que nasceu com dificuldades de aprendizagem.

Acredita-se que o marido tenha voltado para a China sem ela, com o filho mais velho, deixando Han sozinha, sem trabalho e responsável por uma criança com necessidades especiais. Os vizinhos dizem que ela sentia muita falta do outro filho.

Sem ter onde ficar, voltou para o sítio onde a sua vida na Coreia do Sul havia começado – os apartamentos subsidiados em Gwanak-gu – e pediu ajuda no centro comunitário em Outubro do ano passado, quando passou a receber 100 mil wons (que não chega a 670 patacas) por mês como auxílio para criar o filho. Han poderia ter reivindicado muito mais do que aquele montante. Uma mãe ou pai solteiro tem direito a seis a sete vezes esse valor. Mas isso exigiria um certificado de divórcio, e aparentemente ela não o tinha. Outra situação agravante foi a impossibilidade de continuar a receber ajuda como desertora, porque o período de protecção de cinco anos tinha expirado.

A equipa do centro comunitário disse que visitaram o seu apartamento para uma avaliação anual de bem-estar em Abril, mas Han não estava em casa. Os assistentes sociais não sabiam da condição do seu filho. Durante um período Han não pagou renda do apartamento subsidiado, assim como as restantes contas da casa. Noutros países, isto teria servido de alerta para os serviços sociais. Mas parece não ter acontecido na Coreia do Sul.

‘Morte por indiferença’

Reunidos no santuário em Gwanghwamun, em frente ao retrato de Han, desertores da Coreia do Norte continuam a debater o caso. “Isto é absurdo, como um norte-coreano foge da fome para morrer de fome no sul?!”, questiona um deles. “O que é que o governo sul-coreano fez? Isto é morte por abandono”, atira outro. “É morte por indiferença”, responde outro desertor. Questões sobre onde estava o Estado, as autoridades e serviços de apoio social também ficam sem resposta lógica.

No entanto, um ex-colega de classe acredita que não é assim que Han gostaria de ser lembrada. “Não quero apontar dedos aos culpados. Devemo-nos unir e prometer nunca deixar isso acontecer de novo. Realmente, parte-me o coração ver como há quem tire vantagem desta tragédia para proveito próprio.”

Falta de um ombro

Os cuidados de saúde mental dos refugiados norte-coreanos é uma área que poderia ser melhorada, de acordo com desertores e psiquiatras.

Os últimos relatos sobre Han, de um vizinho, apontam que andava distraída e ansiosa. Muito diferente da mulher que chegou ao centro de Hanawon há 10 anos.

A maioria dos desertores norte-coreanos foram vítimas de violações de direitos humanos e traumas que vão da fome extrema a agressão sexual, à violência de serem forçados a testemunhar execuções públicas e a viver com o medo de serem alvo de traficantes de pessoas na China. A taxa de trauma psicológico é maior entre aqueles que viajaram pela China, de acordo com um estudo da Comissão Nacional de Direitos Humanos da Coreia do Sul.

Jin-yong, do Centro Nacional de Saúde Mental, diz ser comum que desertores sofram de ansiedade, depressão e transtorno de stress pós-traumático. Mas, como existem muitos estigmas associados à saúde mental no norte, o desconhecimento impede o pedido de ajuda.

Normalmente, quem sofre de doença mental na Coreia do Norte é enviado para um hospital nas montanhas conhecido por Número 49. A maioria nunca regressa. Neste contexto, é compreensível que muitos norte-coreanos não saibam ser possível receber apoio psiquiátrico. “Precisamos de serviços mais amigáveis ​​para os desertores, que os ajudem a encontrar esses cuidados”, diz Jun. “Os desertores recorrem menos a serviços de saúde mental do que os sul-coreanos, por questões culturais e de preconceito.”

Sozinhos acompanhados

De acordo com uma investigação sobre comunidades de refugiados norte-coreanos na Coreia do Sul, cerca de 15 por cento admitem ter pensamentos suicidas. Isto é cerca de 10 por cento superior à média sul-coreana. A maioria diz que as dificuldades económicas são a principal razão.
Joseph Park, que também fugiu da Coreia do Norte há 15 anos, acredita que as mortes chocantes de Han e do filho não foram causadas por falta de políticas governamentais, mas podem ser parcialmente atribuídas a certos aspectos da cultura sul-coreana. “A Coreia do Sul é uma sociedade onde se pode viver sem se relacionar com os outros. Acho que essa é a grande diferença. Na Coreia do Norte, é necessário manter relações com os vizinhos”, teoriza o desertor. “Por exemplo, nas escolas norte-coreanas, se uma criança falta às aulas, o professor envia colegas a casa do aluno. Então, naturalmente, ninguém se consegue isolar.”

Apesar do exemplo de Han, milhares de norte-coreanos que conseguem viver bem no sul Mas isso exige adaptação. Sucessivos estudos revelam que muitos dos que fogem ao regime norte-coreano se sentem diferentes e discriminados no sul.

A Vulgaridade da Morte na Morte de Herbert Marcuse

[dropcap]C[/dropcap]onheci Marcuse em Junho de 1967 quando ele veio a Berlim para uma curta estadia. Do aeroporto de Tempelhof dirigiu-se de pronto para o edifício da ópera onde, algumas semanas antes, um estudante tinha sido assassinado por um polícia à paisana durante as manifestações contra o Xá do Irão.

Na noite da sua chegada, encontrou-se com um pequeno grupo de pessoas no seu hotel, em Dhalem, para longas discussões. Hans Magnus Enzensberger, Rudi Dutschke e Henri Lefevbre já lá estavam quando entrei na sala. A primeira coisa que ouvi Marcuse dizer foi, “O nosso dilema é que as pessoas que beneficiariam das mudanças que desejamos levar a cabo não desejam essas mudanças em si mesmas.” Não era exactamente isso que queríamos ouvir naquele momento.

Muito depois, disse-me que ter encontrado todos aqueles estudantes alemães, decididos antifascistas, em protesto, significou, para si, uma espécie de reconciliação com a Alemanha.
Meio ano passado sobre aquela noite, encontrámo-nos na mesma universidade da Califórnia. O gabinete de Marcuse ficava dois andares acima do meu, pelo que nos vimos quase diariamente ao longo de mais de doze anos. Ele não tinha “tabus” de Esquerda; por exemplo, condenou o ataque dos Estados Unidos ao Vietname tanto quanto criticou o ataque chinês ao Vietname, e recusou um convite para ir à China com o comentário: “Não passarei por uma porta que tenha sido aberta por Kissinger!”

Quase todos os escritores e filósofos que conheci desenvolveram, no decurso das suas vidas, um hábil sistema de defesas, a fim de protegerem o seu trabalho das indignidades que se repetiam à sua volta. Não Marcuse. O que o caracterizava era uma constante vulnerabilidade, o seu choque, mesmo quando cara a cara com o esperado, e uma quotidiana, dolorosa consciência do contexto em que trabalhava. A frase que possivelmente o ouvi dizer mais vezes foi “Temos de fazer algo sobre isso imediatamente!” Era demasiado sensível aos horrores diários para se proteger do envolvimento neles. Pode dizer-se que o seu trabalho, a sua escrita, teve que ser feito, e defendido, nos breves intervalos de tempo entre cada novo ultraje.

Quando criança, sempre achei que um filósofo era alguém continuamente espantado com tudo, que levava tudo a sério. Marcuse preencheu essa minha noção de infância com a sua atenção não apenas às ideias, mas a tudo o que pudesse ser apreendido sensitivamente: um hipopótamo, uma alface, ou uma colher de chá da casa de seus pais. Estas eram três coisas que ele adorava; ao passo que veículos de recreio, rádios portáteis e motas eram três que ele odiava e queria abolir depois da revolução. Também odiava viajar, porque significava despedida.

Admirava o respeito dele pelos objectos. Ele desculpou a ordem militar na minha cozinha com uma citação de Virgílio, dizendo que “as coisas também têm lágrimas”; e o direito ao seu próprio espaço onde se sentem confortáveis.

Ele odiava a morte com uma intensidade que me surpreendia, até que finalmente entendi que só um ódio tão tremendo poderia sondar a vulgaridade, a gratuitidade da morte. Em Dezembro de 1972, convidei-o e à sua esposa Inge (com quem também muito aprendi) para jantar. Ele ligou-me na noite anterior para dizer que ela tinha uma dor de estômago e não podia vir. Por altura do Natal, na Alemanha, recebi uma carta registada. Marcuse comunicou-me que Inge estava a morrer de cancro e não teria mais que oito meses de vida. Concluiu a sua carta com as seguintes palavras: “‘L’amour est plus fort que la mort’ – que repugnante, desprezível aldrabice!”

Nos últimos doze meses da sua vida, Marcuse estudou minuciosamente A Alternativa de Rudolf Bahro e redigiu uma profunda análise da mesma. Mas as consequências da resposta pública ao “Holocausto” e, relacionada com isto, a célebre questão sobre a possibilidade da “poesia depois de Auschwitz”, ocuparam-no mais, chegando ao ponto de considerar uma revisão da sua estética anterior. Procurou material, instigou debates, correspondeu-se intensamente acerca destas preocupações. Teve grande relutância face a uma literatura que, retratando a violência, foi uma “privatização de Auschwitz”; e também se inquietou com a nova tendência romântica na Europa, na qual não há mais a lembrança do horror.

Os seus escritores contemporâneos favoritos eram Peter Weiss e Samuel Beckett, e ele sentiu-se honrado quando este último lhe dedicou um poema no ano passado, por ocasião do seu octogésimo aniversário. Perguntou-me uma dúzia de vezes se eu achava apropriado que ele escrevesse uma nota de agradecimento a Beckett. Encorajei-o, dizendo que não concebia que um escritor se ofendesse com o facto de Marcuse ter gostado de algo que ele tivesse escrito. Acabou por lhe escrever.

Nunca, durante o tempo em que o conheci, foi ele tão incapaz de esconder a sua emoção como durante o nosso último almoço em La Jolla. Parou de comer e disse-me que Beckett, certa vez, fora desafiado por um crítico para explicar a estrutura da sua escrita. “Eu posso explicar-lhe a estrutura da minha escrita”, respondeu Beckett. “Uma vez estive num hospital e, no quarto ao lado, uma mulher, que estava a morrer de cancro, gritou a noite toda. Este grito é a estrutura da minha escrita!”

 

tradução de:
The Vulgarity of Death. On Herbert Marcuse’s Death
City Lights Review, n.º 1, 1987, San Francisco, pp. 54-55
ed. Lawrence Ferlinghetti e Nancy J. Peters

primeira versão do texto de Reinhard Lettau:
Herbert Marcuse and the Vulgarity of Death
New German Critique, n.º 18, Outono de 1979, pp. 19-20

SMG | Emitem alerta de ciclone tropical e possibilidade de inundações

[dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]acau emitiu hoje um alerta devido à aproximação de um ciclone tropical e avisou para a possibilidade de inundações na cidade, aconselhando a população e empresas de construção a tomarem medidas de segurança preventivas. As autoridades içaram o sinal 1, no momento em que o “ciclone tropical ‘Podul’, localizado na parte central do Mar do Sul da China, continua a mover-se para o quadrante oeste, dirigindo-se para a Ilha de Hainan”.
O alerta foi emitido às 15h e existe uma probabilidade moderada de ser elevado para sinal 3 durante a madrugada e manhã de quinta-feira, de acordo com os Serviços Meteorológicos e Geofísicos (SMG).
Em comunicado, os SMG indicaram que entre quinta e sexta-feira, “podem ocorrer inundações em zonas baixas no Porto Interior”, uma área da cidade cronicamente afectada pela subida das águas, pelo que lançou também o aviso de ‘storm surge’ (maré de tempestade) azul, quando o Podul se encontra a 640 quilómetros de Macau.
Hoje, também, a Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais recomendou que, “como o tufão poderá destruir construções ou estaleiros de construção, os cidadãos e os empreiteiros devem adoptar, com a maior brevidade possível, as respectivas medidas de prevenção, principalmente em relação aos andaimes, aparelhos elevatórios (por exemplo, gruas), janelas de construções e materiais pendurados nas fachadas”.
Por outro lado, acrescenta-se na mesma nota, deve-se “fazer uma inspecção detalhada, tomar medidas para reforçar o equipamento e dar mais atenção aos assuntos relacionados com a segurança (…), a fim de garantir a segurança dos trabalhadores e do público, devendo os cidadãos, por sua vez, evitar aproximar-se de construções durante os tufões”.