APN | Os nove artigos que alteram o sistema eleitoral de Hong Kong Hoje Macau - 12 Mar 202112 Mar 2021 Motins, interferência estrangeira e os pedidos de “independência” dos últimos anos levaram Pequim a alterar o sistema eleitoral de Hong Kong. Uma comissão de revisão de candidaturas vai apreciar cada um dos candidatos às eleições e decidir se apresentam as qualidades necessárias para concorrerem, quer para o Chefe do Executivo quer para o LegCo. O sufrágio universal não foi sequer referido A Assembleia Popular Nacional (APN) adoptou ontem, quinta-feira, uma decisão sobre o “melhoramento do sistema eleitoral da Região Administrativa Especial de Hong Kong (RAEHK)”, informou a Xinhua. A decisão, aprovada por uma maioria esmagadora de votos na quarta sessão da 13ª APN, contém nove artigos: – Melhorar o sistema eleitoral da RAEHK implica implementar plena e fielmente o princípio “um país, dois sistemas”, segundo o qual o povo de Hong Kong administra Hong Kong com um alto grau de autonomia, manter a ordem constitucional conforme estabelecido pela Constituição e a Lei Básica, garantir a administração de Hong Kong por pessoas de Hong Kong com patriotas nos seus órgãos principais de governo, melhorar efectivamente a eficácia da governação e salvaguardar o direito de voto e o direito de se candidatar a residentes permanentes da RAEHK. – A RAEHK deve estabelecer uma Comissão Eleitoral que seja amplamente representativa, adequada às realidades e representativa dos interesses gerais de sua sociedade. A Comissão Eleitoral será responsável pela eleição do Chefe do Executivo designado e parte dos membros do LegCo. A Comissão Eleitoral também será responsável pela nomeação de candidatos para o Chefe do Executivo e membros do LegCo, bem como por outros assuntos. A Comissão Eleitoral será composta por 1500 membros, dos seguintes cinco sectores: industrial, comercial e financeiro; profissionais; populares; trabalhadores, religiosos e outros; membros do LegCo e representantes de organizações distritais; deputados de Hong Kong na APN, membros de Hong Kong do Comité Nacional da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês e representantes de membros de Hong Kong de organizações nacionais relacionadas. – O Chefe do Executivo será eleito pela Comissão Eleitoral e nomeado pelo Governo Popular Central. Os candidatos ao cargo de Chefe do Executivo serão nomeados conjuntamente por pelo menos 188 membros da Comissão Eleitoral, entre os quais o número de membros de cada sector não deve ser inferior a 15. A Comissão Eleitoral elegerá o Chefe do Executivo designado em votação secreta, na base de uma pessoa, um voto. A eleição do Chefe do Executivo designado exige a maioria simples dos votos de todos os membros da Comissão Eleitoral. – O LegCo será composto por 90 membros em cada mandato. Os membros do LegCo incluirão os membros nomeados pelo Comité de Eleição, os designados pelas constituintes funcionais e os eleitos directamente por zonas geográficas. – As candidaturas serão apreciadas por uma comissão de revisão da qualificação do candidato. A comissão será responsável por rever e confirmar as qualificações dos candidatos a membros da Comissão Eleitoral, do Chefe do Executivo e dos membros do LegCo. A RAEHK deve melhorar o sistema e os mecanismos relacionados com a revisão de qualificação, para garantir que as qualificações dos candidatos estão em conformidade com a Lei Básica, a Lei de Segurança Nacional, a interpretação do Comité Permanente da APN do Artigo 104 da Lei Básica , a decisão do Comité Permanente da APN sobre a qualificação dos membros do LegCo e as disposições das leis locais relevantes. – O Comité Permanente da APN está autorizado a, de acordo com a decisão sobre a melhoria do sistema eleitoral da RAEHK, alterar o Anexo I da Lei Básica. Segundo a agência Xinhua, “a decisão é mais um grande passo dado pelo Estado para melhorar os sistemas jurídicos e políticos da RAEHK, desde que a Lei de Segurança Nacional foi adoptada”. Ao deliberar um rascunho da decisão, a sessão da APN foi de opinião que “o retorno de Hong Kong à pátria colocou a região sob o sistema de governação geral do país, e que a Constituição e a Lei Básica formam conjuntamente a base constitucional da RAEHK”. O sistema eleitoral da RAEHK, que inclui os métodos de selecção do Chefe do Executivo e de constituição do Conselho Legislativo (LegCo), é “uma parte importante da estrutura política da RAEHK”, de acordo com a APN. Assim, “o sistema eleitoral deve estar em conformidade com o princípio ‘um país, dois sistemas’, atender às realidades da RAEHK e servir para garantir que Hong Kong seja administrado por pessoas que amam o país e Hong Kong”. Por isso, entende a APN que o sistema eleitoral deve ser “favorável à salvaguarda da soberania nacional da China, segurança e interesses de desenvolvimento e ajudar a manter a prosperidade e estabilidade de longo prazo de Hong Kong”.
Trabalho de alunos da UM em Congjiang pode ser visto a partir de terça-feira Hoje Macau - 12 Mar 2021 O Colégio Chao Kuang Piu, da Universidade de Macau (UM) promove, a partir da próxima terça-feira, dia 16, uma exposição que revela o trabalho voluntário que alunos da UM têm desenvolvido com alunos do ensino primário em Congjiang, província de Guizhou, na China. A exposição, patente até ao dia 28 no Pavilhão de Exposições e Espectáculos Artísticos para Jovens, revela o voluntariado que tem vindo a ser feito desde Dezembro de 2018 numa província onde muitas das vidas dependem ainda da agricultura e onde a pobreza é uma realidade. Os alunos da UM deram aulas na escola primária Gantuan nos meses de Verão e Inverno e a exposição irá revelar fotografias, cartas e trabalhos artísticos desenvolvidos em conjunto com a equipa. Os alunos da UM dividiram-se em grupos de quatro nas deslocações a Congjiang. Segundo um comunicado, esta mostra tem como objectivo levar o público “a ter uma melhor compreensão dos modos de vida das crianças que crescem nas montanhas, bem como comunicar o compromisso das equipas com a mudança da vida das crianças através da educação”. Guizhou na agenda O combate à pobreza em Congjiang tem estado na agenda do Governo de Macau nos últimos anos. Prova disso foi um encontro ocorrido em 2018 entre o então Chefe do Executivo, Chui Sai On, e Chan Son Wui, presidente da Associação Amizade Guizhou de Macau. Nessa reunião, foram discutidas medidas de cooperação no combate à pobreza nesta região. Chui Sai On prometeu então lançar uma série de trabalhos com vários sectores de Macau, defendendo que “ambas as regiões podem pôr em prática um contributo à política nacional de combate à pobreza”. Chan Son Wui disse que estavam a ser financiados novos projectos educativos pensados para o distrito de Guian, também em Guizhou. A exposição pode ser visitada até ao dia 28 deste mês de terça-feira a domingo, com entrada livre no Pavilhão de Exposições e Espectáculos Artísticos para Jovens, ligado à Direcção dos Serviços de Educação e Desenvolvimento da Juventude. O pavilhão pretende providenciar espaços de exibição e performance para os mais jovens, dando o apoio necessário no fomento do processo criativo.
FAM 2021 | Edição traz peça de teatro Huangmei, património cultural intangível da China Hoje Macau - 12 Mar 2021 A 31ª edição do Festival de Artes de Macau regressa em Maio e já são conhecidos três espectáculos que fazem parte do cartaz. O programa inclui a peça de teatro “O Sonho da Câmara Vermelha”, pelo Teatro de Ópera Huangmei de Anhui. Este género teatral está classificado como património cultural intangível da China O Instituto Cultural (IC) divulgou ontem três espectáculos que farão parte do cartaz da 31ª edição do Festival de Artes de Macau (FAM), prometido para o mês de Maio. Um dos espectáculos é “O Sonho da Câmara Vermelha”, protagonizado pelo Teatro de Ópera Huangmei de Anhui. Este género teatral é considerado património cultural intangível nacional. Esta é uma nova produção desta peça que é um clássico e que foi protagonizada, nos anos 90, Ma Lan, contando com Yu Qiuyu e Chen Xiting como o núcleo da equipa criativa. A peça será agora representada pela nova geração de actores da ópera de Huangmei, “transmitindo a tradição e a inovação”, aponta o IC. Outra das iniciativas previstas para esta edição do FAM, que contará apenas com artistas locais, é a mostra “Imagens e Espaço: Exposição de Cenografia de Ren Dongsheng”. Ren Dongsheng é tido como um cenógrafo de “primeira classe a nível nacional” e “conhecido pelo seu estilo próprio”. “O seu cariz grandioso é complementado por detalhes criativos e perspicazes, dando origem a um intercâmbio e a um diálogo entre tradições simples e tecnologias de ponta por meio das suas interpretações visuais subtis e poéticas dos temas das obras representadas”, descreve o IC. Nesta exposição, “o cenógrafo levará o público a transcender as dimensões espaciais e a experienciar o encanto da cenografia”. Ren Dongsheng foi designer de iluminação geral ou director artístico de quase 100 produções chinesas e internacionais. Os seus trabalhos mais representativos incluem os teatros dança Balada da Paisagem, Nanjing 1937 e Huang Daopo, entre outros. Bilhetes à venda dia 28 O cartaz provisório do FAM encerra-se com a peça “Tirando Licença”, uma produção adaptada pelo Teatro Nacional da China da peça homónima do dramaturgo contemporâneo americano Nagle Jackson. Na peça, o encenador Wang Xiaoying, que já foi considerado o mais vanguardista encenador de teatro experimental e também uma figura icónica do teatro mainstream na década de 1990 na China, irá liderar um elenco de actores veteranos para apresentar uma interpretação mais profunda da fragilidade e da eternidade da vida e a omnipresença do amor. Esta semana Mok Ian Ian, presidente do IC, anunciou o regresso do FAM em Maio, mas apenas com produções locais, tendo em conta as restrições de viagens e de circulação nas fronteiras impostas pela pandemia. O IC promete anunciar o cartaz completo do FAM numa data posterior. Os bilhetes começam a ser vendidos a partir do dia 28 de Março.
Leong Sun Iok exige melhores condições para a prática de jogging Hoje Macau - 12 Mar 2021 O deputado ligado à Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM) Leong Sun Iok interpelou o Executivo para que sejam dadas melhores condições aos desportistas que gostam de correr. O legislador dá conta de queixas de atletas que elegem a zona da Barra e dos lagos para as suas corridas, devido às más condições do terreno, e de pessoas que conduzem para o Parque de Ciência, “percorrendo metade de Macau”, para correr à beira do rio. Na zona do Lago Sai Van, Leong Sun Iok argumenta que as raízes das árvores plantadas ao longo do passeio limitam a progressão num corredor estreito e acidentando, que pode resultar em lesões. Para solucionar o problema, o deputado sugere que o terreno seja aplanado, para suavizar a superfície, nas bermas da estrada para alargar o espaço para quem ali corre. Leong Sun Iok destaca também a falta de equipamentos, como fontes de água, no Campo 28 de Maio, no antigo Canídromo, outro lugar de eleição para quem corre. O deputado afecto à FAOM destaca na interpelação escrita que o Executivo tem ao longo dos tempos incentivado a prática de desporto e exercício físico, destacando os benefícios para a saúde. Assim sendo, precisa acompanhar esses esforços providenciando condições e infra-estruturas que respondam à crescente popularidade da prática desportiva, em particular de quem gosta de correr.
Homem burlado em 16 milhões com promessa de empreitada Pedro Arede - 12 Mar 2021 A Polícia Judiciária deteve um empresário de 48 anos por suspeitas de falsificar contratos de construção de uma suposta obra prevista para o Canal dos Patos. Um homem que foi convencido a investir em troca de uma percentagem dos lucros foi lesado em 16 milhões de dólares de Hong Kong A Polícia Judiciária (PJ) deteve um empresário local por suspeitas da prática dos crimes de burla, emissão de cheque sem provisão e falsificação de documentos. Em causa, está a realização de uma suposta obra prevista para o Canal dos Patos, que terá servido de base para convencer um outro homem a investir no projecto, acabando por perder 16 milhões de dólares de Hong Kong. Segundo revelou ontem a PJ em conferência de imprensa, tudo começou em Junho de 2017, quando os dois homens se conheceram por motivos de trabalho. Na altura, o empresário terá avançado que a companhia que gere iria ficar responsável por uma obra de grande envergadura junto do Canal dos Patos, prometendo à vítima lucros de 16 por cento sobre o valor total da obra que, alegadamente, seria de 100 milhões de renminbis. No desenrolar das conversações, o suspeito terá ainda dito à vítima que seriam necessários 50 milhões de renminbis para que a obra pudesse avançar, pedindo-lhe para procurar investidores. Adicionalmente, caso angariasse os ditos investidores, ganharia uma comissão de 2 por cento sobre o lucro total da obra. Para provar a veracidade do negócio, durante os encontros que mantiveram, o empresário terá apresentado documentos comprovativos do contrato da empreitada e da participação de outros investidores no projecto. Convencida, a vítima decidiu avançar e, entre Janeiro e Novembro de 2018, entregou em numerário e por via de transferência bancária, o montante total de 20 milhões de dólares de Hong Kong, fruto do trabalho de angariação que fez junto de investidores. O bico ao prego De acordo com a PJ, a partir do momento em que o montante ficou do lado do empresário, este terá usado diversos pretextos para atrasar a obra, nomeadamente que faltaria a autorização do Governo para o projecto avançar. Apesar de a situação estar num impasse, a vítima apercebeu-se de que as obras no local já teriam começado e que a companhia que estava a cargo da empreitada não era a detida pelo empresário. Perante os factos, a vítima pediu ao suspeito que lhe restituísse os 20 milhões de dólares de Hong Kong. O empresário acedeu, tendo devolvido 4 milhões de patacas no imediato e emitido um cheque com os outros 16 milhões. Contudo, quando a vítima tentou depositar o cheque, o mesmo não tinha cobertura, levando o homem a apresentar queixa na PJ. No decorrer da investigação, a polícia conseguiu apurar que o empresário não era o empreiteiro do projecto em questão, e que os documentos eram todos falsos. Além disso, o suspeito fugira, entretanto, para o Interior da China na tarde do dia 25 de Março de 2020. Na passada terça-feira, as autoridades de segurança pública da China anunciaram a detenção do suspeito, que viria a ser entregue à PJ. Durante o interrogatório, o homem admitiu o crime e que nunca concorreu ao concurso de adjudicação da obra em questão. O caso seguiu ontem para o Ministério Público (MP), onde o suspeito irá responder pela prática dos crimes de burla, emissão de cheque sem provisão e falsificação de documentos. Caso se venha a confirmar a acusação, o suspeito pode ser punido, respectivamente, com penas de 2 a 10 anos, até 5 anos e até 3 anos, por cada uma das infracções.
Turismo | Docente alerta para falta de protecção de direitos fundamentais dos TNR Andreia Sofia Silva - 12 Mar 2021 Carlos Noronha, docente da Universidade de Macau, defendeu numa palestra online destinada a alunos do Instituto de Formação Turística que, à luz do Código de Ética da Organização Mundial de Turismo, os direitos dos trabalhadores não residentes não estão devidamente protegidos e dá como exemplo o caso do pedido de manifestação sobre Myanmar Os trabalhadores não residentes (TNR) não estão a ver os seus direitos fundamentais plenamente reconhecidos em Macau à luz do Código de Ética adoptado pela Organização Mundial do Turismo (OIT) das Nações Unidas. A ideia foi defendida por Carlos Noronha, docente da Universidade de Macau (UM) e um dos fundadores do Instituto para a Responsabilidade Social das Organizações na Grande China em Macau. Carlos Noronha foi convidado a comentar o assunto numa palestra online destinada a alunos do Instituto de Formação Turística (IFT), à qual o HM teve acesso, tendo referido um dos artigos do Código de Ética, relativo aos direitos dos trabalhadores do turismo. “Aqui falamos de direitos fundamentais e, em Macau, temos, na maioria, trabalhadores do exterior. Os trabalhadores locais, às vezes, formam associações laborais e têm alguma voz na sociedade. Mas e os TNR? Parece que não estão protegidos.” Carlos Noronha deu o exemplo da posição assumida pelo Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) relativamente ao direito de reunião e manifestação por parte dos TNR. Recorde-se que, a propósito de um pedido de reunião contra o golpe de estado no Myanmar, o CPSP defendeu que os TNR não têm direito a manifestar-se por não serem residentes. “Esta é uma acção que mostra um direito fundamental de patriotismo, mas o Governo diz que não têm o direito de reunião ou de manifestação. Então o que fazem? Apenas podem trabalhar, nada mais. Não têm direitos básicos para participar na sociedade e mesmo demonstrar sentimentos em relação a assuntos políticos ou sociais”, disse no mesmo vídeo. Ao HM, Carlos Noronha reiterou esta posição. “Segundo o Código de Ética os trabalhadores do turismo devem ter direitos fundamentais. Imagine-se um estudante do exterior, com visto, será que está proibido de aderir a determinado protesto? O mesmo se aplica aos TNR.” O Código de Ética, de aplicação voluntária, deve ser reforçado e implementado pela Direcção dos Serviços de Turismo, CPSP, serviços de emigração e pelo próprio sector, defendeu o docente. “Quando se está num negócio de turismo é preciso ter em atenção questões como a sustentabilidade e as condições de trabalho que são dadas aos funcionários. Pensar no respeito pela cultura e nos benefícios mútuos, não é apenas deixar que as pessoas venham, ganhem o seu salário e vão embora.” Garantir o equilíbrio Jenny Guan, docente do IFT, pretende promover junto dos alunos um maior conhecimento do Código de Ética da OMT, que tem um carácter voluntário e que, como tal, não tem uma lei de base que obrigue à sua implementação. Ao HM, diz acreditar que “a indústria e algumas entidades [em Macau] estão a tentar ter um desempenho de acordo com os padrões internacionais.” No que diz respeito aos TNR, Jenny Guan defende que é preciso olhar com objectividade para aquilo que empresas e concessionárias fizeram durante a pandemia. “As empresas fizeram o seu melhor para manter os trabalhadores locais quando, durante um período de tempo, não houve receitas. Temos de pensar que precisam de garantir um equilíbrio entre a responsabilidade social e as responsabilidades perante os accionistas”, disse ao HM. “Acredito que o objectivo nunca foi o despedimento desses trabalhadores e que providenciaram indemnizações ou outros apoios financeiros”, rematou. Tendo em conta o Código de Ética, Jenny Guan alerta também para a necessidade de “educar turistas, estudantes e residentes para terem um melhor comportamento, para que possamos melhorar a imagem internacional de Macau como uma cidade de turismo”.
Governo apoia aperfeiçoamento do sistema eleitoral de Hong Kong Pedro Arede - 12 Mar 2021 O Governo de Macau expressou ontem, em comunicado, que “defende e apoia firmemente” a decisão do Governo Central saída ontem da APN, sobre o aperfeiçoamento do sistema eleitoral da Região Administrativa Especial de Hong Kong (RAEHK). “O regime eleitoral é parte integrante e importante do sistema político. E o aperfeiçoamento dos sistemas eleitorais das Regiões Administrativas Especiais (RAE) é efectuado com base na Constituição da República Popular da China, sendo muito significativo para o Governo Central exercer de forma eficaz o poder pleno da governação”, pode ler-se no comunicado divulgado ontem pelo Gabinete de Comunicação Social. Na mesma nota, é sublinhado ainda que a APN, como órgão máximo do poder estatal decidiu aperfeiçoar o sistema eleitoral de Hong Kong “de acordo com a lei e a situação real” do território e com o objectivo de “defender a soberania, segurança e interesses de desenvolvimento do país”, insistindo “convictamente” no aperfeiçoamento do princípio “um país, dois sistemas”, uma acção “indispensável para garantir a sua concretização estável e duradoura”. Reagindo à decisão, o Executivo de Macau afirma ainda que o conceito se reveste de “grande significado” e tem um enorme impacto para a manutenção a longo prazo “da prosperidade e estabilidade de Hong Kong, bem como do bem-estar de toda a sua população”. Manter a estabilidade No mesmo comunicado, o Governo da RAEM frisa também que, desde a transição, tem concretizado “plena e correctamente” os princípios de “um país, dois sistemas” e “Macau governado pelas suas gentes” com alto grau de autonomia, sem descurar o princípio fundamental de “Macau governado por patriotas”. “Vem-se defendendo, de forma resoluta, a ordem constitucional da RAEM, em conformidade com o estabelecido pela Constituição e pela Lei Básica, abrindo-se caminho a uma implementação bem-sucedida do princípio ‘um país, dois sistemas’ com características próprias de Macau”. Para o futuro fica a garantia de “unir os diversos sectores da sociedade” e manter a estabilidade de Macau a longo prazo, “escrevendo um novo capítulo na implementação com sucesso” desse conceito. “A RAEM irá unir os diversos sectores da sociedade, continuar a promover a boa tradição do amor à pátria e a Macau, defender firmemente a soberania nacional, bem como a segurança do país e seus interesses de desenvolvimento, e manter a prosperidade e estabilidade de Macau a longo prazo”, consta do comunicado.
CPSP recusou nove pedidos de manifestação desde 2018 João Santos Filipe - 12 Mar 2021 Desde 2018, o Corpo de Polícia de Segurança Pública recebeu 356 notificações de manifestações e recusou nove. No mesmo período, houve 23 promotores que desistiram dos pedidos de reunião e manifestação Desde 2018, altura em que passou a ser a entidade receptora pelas notificações dos manifestantes, o Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) proibiu nove manifestações. Segundos os dados disponibilizados pela corporação ao HM, 2020, foi o ano em que houve mais proibições, num contexto que fica marcado pelo surgimento da pandemia da covid-19. Entre 2018 e 23 de Fevereiro de 2021, o CPSP recebeu 305 pedidos de reuniões e manifestações formais, ou seja, aqueles em que houve um pedido por escrito e que não se esgotou nas comunicações verbais. No primeiro ano como entidade responsável por receber as notificações, mudança à lei que entrou em vigor a 13 de Setembro, o número de pedidos foi de 51. Nesse ano foram realizadas 45 reuniões e manifestações e o CPSP não permitiu duas manifestações. No mesmo período, de acordo com a lei, foram ainda canceladas duas manifestações pelos promotores e houve outras duas reuniões ou manifestações impedidas, porque se considerou que o aviso prévio não preenchia os requisitos legais. No ano seguinte, em 2019, os pedidos de manifestação recebidos foram 164, dos quais dois foram recusados. Entre a iniciativa recusada, constou uma manifestação marcada para o Leal Senado, com várias detenções, em que os promotores pretendiam mostrar solidariedade contra a violência da polícia em Hong Kong. A manifestação tinha sido proibida com o aval do Tribunal de Última Instância (TUI), numa decisão que dividiu os juízes entre Sam Hou Fai e Song Man Lei, contra a manifestação, e Viriato Lima, que votou vencido a favor de autorizar a iniciativa. Entre as 164 notificações de manifestação houve igualmente 15 pedidos retirados a pedido dos próprios promotores. 78 avisos este ano Foi em 2020, em contexto da pandemia, que as proibições mais do que duplicaram face a 2019. Nesse ano, o CPSP recebeu 78 avisos prévios, entre os quais cinco que foram recusados pela Polícia. Um dos pedidos de reunião e manifestação mais mediático, entre as recusas, prendeu-se com a vigília sobre Tiananmen, que depois de vários anos a ser organizada foi proibida pela primeira vez no ano passado. As autoridades justificaram a proibição com as medidas contra a pandemia da covid-19, numa decisão que mereceu igualmente o apoio do Tribunal de Última Instância, com votos a favor de Sam Hou Fai, Song Man Lei e José Dias Azedo. Entre os pedidos, houve ainda quatro promotores, que por iniciativa própria, abdicaram das iniciativas. Finalmente, este ano houve um aviso prévio de 12 casos, dos quais dois foram canceladas pelo promotor. Os dados não incluem ainda a iniciativa promovida pela associação Poder do Povo e o vice-presidente Wu Shaohong, mais recente, que pretendia fazer uma reunião de solidariedade para com as vítimas de violência no Myanmar. O pedido acabou por ser retirado por Wu, que revelou não ser capaz de corresponder às exigências do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) de garantir que não havia pessoas com febre alta ou doenças do tracto respiratório a participar no evento.
Educação | Song Pek Kei preocupada com excesso de professores Pedro Arede - 12 Mar 2021 Através de interpelação escrita, Song Pek Kei quer saber quais os planos do Governo para contrariar a fraca mobilidade, bem como a previsível “saturação” de professores em Macau. Citando um estudo, a deputada aponta que existem actualmente 7.400 professores em Macau e que, devido à baixa mobilidade laboral e procura de recursos no território, o mercado não terá capacidade para absorver, nos próximos três anos, os cerca de 500 licenciados que anualmente terminam a formação na área. Frisando que é a qualidade do ensino de Macau que está em causa e que existe uma discrepância entre a oferta e a procura, a deputada perguntou, por escrito, se o Executivo tem um plano “claro e certeiro” que possibilite manter o ritmo do desenvolvimento económico e do talento local. Song Pek Kei quer ainda saber que medidas serão tomadas para assegurar que existe um equilíbrio entre o fluxo de docentes do ensino superior e do ensino não superior. Por fim, pergunta, tendo em conta o Planeamento a Médio e Longo Prazo do Ensino Não Superior (2021-2030) apresentado pelo Governo, se o Governo considera “acelerar” os canais de comunicação entre Macau e a Grande Baía para que os talentos locais do sector possam procurar oportunidades na região.
José Pereira Coutinho quer respostas para suicídio Hoje Macau - 12 Mar 2021 O deputado Pereira Coutinho está preocupado com o suicídio entre os jovens e quer que o Governo arranje soluções. O tema foi abordado em interpelação enviada ao Executivo, com a sugestão que sejam apuradas as “causas da crescente deterioração da saúde mental dos jovens”. De acordo com o legislador apoiado pela Associação de Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM): “O Governo deve avaliar e discutir de forma aprofundada este fenómeno do suicídio de jovens cada vez mais novos, para apurar, quanto antes, as respectivas causas”, indica. “Os casos referidos [de suicídios] demonstram que muitos jovens se suicidam por impulso, porém, nas políticas e medidas actualmente adoptadas pelo Governo não se verifica a disponibilização do correspondente aconselhamento psicológico, para acabar com os comportamentos impulsivos dos jovens”, acrescentou. Coutinho pede medidas de combate ao fenómeno: “O Governo não consegue resolver a situação do suicídio por impulso de jovens. Pelo exposto, o Governo deve proceder a uma avaliação abrangente da saúde mental dos residentes de Macau, especialmente dos jovens, e deve reforçar a comunicação com as escolas e as famílias, a fim de acabar, em tempo oportuno, com a tragédia social. Já o fez?”, interroga. Caso tenha pensamentos suicidas e necessite de auxílio, pode ligar para o Serviço de Auxílio da Cáritas, através do número 2852 5222, em chinês, ou do número 2852 5777, em inglês.
Associação Novo Macau debateu com CPSP abusos contra animais João Santos Filipe - 12 Mar 202112 Mar 2021 A impunidade face aos maus-tratos está a preocupar várias associações de protecção dos direitos dos animais que pediram à polícia mais eficácia na implementação das leis A Associação Novo Macau e vários grupos de protecção animal reuniram com representantes do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) para discutir a impunidade dos crimes de maus-tratos animais no território. O encontro foi divulgado ontem num comunicado da associação democrática, que tem como vice-presidente o deputado Sulu Sou. Na conversa entre as diferentes partes, os elementos da associação Rocky Chan e Sulu Sou mostraram-se preocupados com o facto de apesar da Lei de Protecção Animal ter criminalizado maus-tratos contra animais, têm havido vários casos de envenenamento, atropelamentos e mortes que passam em claro, sem que as autoridades encontrem culpados. Sulu Sou e Rocky Chan comunicaram a preocupação com o caso particular da Travessa dos Poços, onde no ano passado foram encontrados vários gatos decapitados. Apesar de as autoridades policiais terem reencaminhado o caso para o Ministério Público, a investigação foi arquivada, sem que os culpados tivessem de assumir responsabilidades legais. Por outro lado, os grupos de protecção animal reflectiram junto das autoridades que apesar de ter havido condenações por maus-tratos, a diferença entre os casos concluídos com sucesso e a criminalidade nas ruas é muito significativa. Por esse motivo, foi deixado um apelo ao CPSP para que melhor a capacidade de resposta à criminalidade que vitimiza animais e que melhore as vias de comunicação com os diferentes departamentos do Governo, de forma a ter mais sucesso no combate à criminalidade. Implementação gradual Por sua vez, de acordo com o comunicado da Novo Macau, o CPSP defendeu que a lei trouxe melhorias, que a sua implementação é gradual, e que será mais eficaz com a aprendizagem e utilização de tecnologia. O CPSP explicou ainda que a investigação dos crimes de crueldade animal é conduzida por equipas de vários departamentos com diferentes valências e que os agentes da linha da frente têm preparação para lidar com os crimes deste género. Ainda de acordo com a polícia, desde o início do ano foram encontrados 32 corpos animais, e que vão ser feitos todos os esforços para apurar as responsabilidades possíveis. O CPSP indicou igualmente que foi aberta uma linha de telefone aberta 24 horas, do Instituto para os Assuntos Municipais (IAM), para denúncias. Estiverem presentes na reunião a Associação de Protecção aos Animais Abandonados de Macau, Casa de Animais Abrigo dos Long Long, Macau Animal Welfare Association e Macao Volunteer Association of Furry that wish a family — Furmily.
Cloee Chao, representante dos Trabalhadores do Jogo | A mãe de todas as lutas João Luz e Nunu Wu - 12 Mar 202112 Mar 2021 Criou uma associação laboral porque não tinha para onde se virar, afectada pelo fumo passivo nas salas de jogo. Cloee Chao subiu a pulso na indústria dos casinos, criou duas filhas que a acompanham em lutas laborais enquanto trabalhava por turnos e prepara-se para voltar a candidatar-se a deputada. Ainda não decidiu se corre com Ng Kuok Cheong, mas garante que vai continuar a cooperar com o deputado pró-democracia, com quem partilha lutas e princípios Como chegou à indústria do jogo? Era algo que ambicionava? O que a atraiu? A minha entrada na indústria do jogo foi há mais de 20 anos. Na altura, tinha acabado o ensino secundário complementar e estava com dificuldades para encontrar emprego. Consegui trabalho como secretária num escritório, através de recomendação de familiares. Nesse tempo, Macau era uma cidade pequena, a população era pouco mais de 300 mil habitantes e as oportunidades de emprego não eram muitas, excepto nos serviços do Governo e casinos. A admissão na indústria do jogo não era como nos dias de hoje, era difícil encontrar um formulário de proposta de emprego, mas arranjei um através da irmã de um amigo que era croupier no casino Lisboa. Isto foi antes da liberalização do jogo, quando só havia o Casino Lisboa. Preenchi e entreguei o formulário e ligaram-me da Sociedade de Turismo e Diversões de Macau (STDM) a perguntar se tinha interesse em ir a uma entrevista. Nunca tinha entrado num casino. No início, o meu trabalho era tratar das bebidas, atrás do croupier, além de recolher fichas de jogo, entre outras coisas. Tudo era uma novidade para mim, mas a STDM era uma empresa grande e dava formação aos trabalhadores. Depois de três meses de formação, e de um exame rigoroso, podia ser promovida a croupier. Trabalhou num casino ao mesmo tempo que criou duas filhas, enquanto mãe solteira. Que protecções laborais faltam às famílias monoparentais? Sou mãe solteira, responsável por todas as despesas da casa. Como este trabalho implica turnos, não pude cuidar das minhas filhas e tive de contratar uma empregada doméstica, o que aumentou as despesas. Se perguntar a assistentes sociais, vão-lhe revelar que as crianças com maiores problemas são oriundas de famílias em que os pais trabalham na indústria do jogo. Hoje em dia, faço todos os possíveis para que as minhas filhas me acompanhem, até em manifestações estão perto de mim. Por exemplo, nas últimas eleições a minha filha mais velha, que estuda na universidade, foi quem fez o design da nossa campanha. Mas, de facto, não há qualquer apoio a famílias monoparentais. Quando me divorciei, senti-me desamparada, não me facilitaram turnos que me permitissem cuidar da minha família. Lembro-me da felicidade que senti na altura da liberalização, porque se começou a falar de creches, disponíveis 24 horas por dia, para filhos de funcionários. Mas é complicado, mesmo para um casal, se trabalharem por turnos que não coincidem. A relação torna-se distante e, assim, é natural que a taxa de divórcio seja mais alta entre trabalhadores do jogo. Que razões a levaram a criar a Associação Novo Macau pelos Direitos dos Trabalhadores de Jogo? Foi devido à gravidade de uma doença que contraí por causa do fumo passivo. Tive um problema nas amígdalas, que me forçou a ir ao hospital todos os meses para receber tratamento. O médico disse-me que se continuasse a trabalhar naquele ambiente poderia morrer. Alguns colegas tiveram cancro e problemas respiratórios. Estes casos eram frequentes antes da aprovação da lei que proibiu o fumo do tabaco nos casinos. Nesta altura, tinha salário de supervisora, superior a 20 mil patacas por mês, e não podia abdicar desse dinheiro. Procurei a ajuda de outras associações, que não defendiam a abolição total do fumo. Depois de nos termos manifestado, decidimos começar a associação. Ao princípio não foi fácil, os colegas tinham receio de chatear o chefe ou arranjar problemas se estivessem comigo. Mas, lentamente, começámos a ser aceites. Numa altura em que parte da população está em situação de subemprego, a DSAL recebe poucas queixas e dá conta de poucos conflitos laborais. Como analisa esta realidade? A DSAL recebe menos queixas que nós. Nós ouvimos trabalhadores com problemas tão diversos como licenças sem vencimento, pressões para assinar demissões ou cartas de aviso. Durante este período de pandemia, percebo as empresas do jogo, face à quebra de lucros. Muitos anfitriões de salas VIP continuam sob licença sem vencimento, há pessoas com um terço do rendimento, quem tenha perdido bónus e a receber menos de 10 mil patacas. Na minha óptica, os trabalhadores mais afectados são da área da restauração, que tem muitos não residentes e locais em part-time, contratados através de agências de emprego, e estes não se queixam à DSAL. Que confiança tem na Concertação Social. É um organismo eficaz? O que falta? Todos os membros do Conselho Permanente de Concertação Social (CPCS) são nomeados, o Governo só ouve a voz de um lado. Se perguntar aos residentes, não acredito que muitos saibam o que é. Por exemplo, queremos dar as nossas opiniões sobre a lei sindical, queremos participar activamente, e não temos meios. Se compararmos com a Assembleia Legislativa, que só tem alguns deputados que representam a população, o CPCS tem zero. Quais são as suas expectativas quanto à Lei Sindical? Temos receio que a lei sindical não seja o que nós queremos, mas o que o Governo quer. Temos contacto com associações sindicais do exterior, ainda esta semana reunimos online. No passado, visitámos outras regiões como Estados Unidos, Espanha, onde existem leis sindicais. O mais importante é garantir convenções colectivas de trabalho e direito à greve. Estou preocupada com a possibilidade de estes direitos serem restringidos. Receio também que os sindicatos sejam organizados pelos próprios empregadores, com inscrição obrigatória no momento da admissão na empresa. Está a ponderar a possibilidade de concorrer às eleições na lista de Ng Kuok Cheong. Não teme dividir o eleitorado de trabalhadores do jogo, que não se alinham com a política mais pró-democracia? Todos sabem que os deputados Ng Kuok Cheong e Au Kam San apoiam as associações de operários e que partilhamos escritório, estiveram presente na fundação da nossa organização. Estou sempre presente nas actividades que promovem e também os convidamos para acções organizadas por trabalhadores do jogo. Creio que quem conhece a nossa associação, sabe que somos apoiantes dos deputados Ng Kuok Cheong e Au Kam San. É possível que haja quem tenha conceitos políticos diferentes dos deputados, mas não me parece que isso tenha grande impacto, uma vez que eles apoiam os trabalhadores há dezenas de anos. Mesmo que possam não concordar com alguns aspectos políticos, conhecem os seus desempenhos em questões laborais. Pelo contrário, acho que os apoiantes do campo democrático não nos aceitam porque nossa associação celebra o dia nacional e o aniversário da associação. Não somos do campo democrático, nem pró-Governo, somos uma associação de operários. Em Macau só existem estes dois campos. Independentemente de me candidatar, ou não, com Ng Kuok Cheong, vamos continuar a cooperar. Concorda com as ideias e as lutas que Au Kam San e Ng Kuok Cheong têm protagonizado em Macau, como a vigília do 4 de Junho? Não acha que pode ser um risco político? Ao longo dos anos, organizaram as suas actividades e que nunca foram suspensas, incluindo as actividades não puderam ser públicas devido à pandemia, acho que o maior risco político é desistirem de as organizar. Claro que me reconheço nestas lutas, se não concordasse não estaria com os deputados. Como as pessoas sabem, o campo democrático em Macau é moderado, mas pode ter sofrido com a atmosfera que se vive em regiões vizinhas. Mas creio que a população os apoia há muitos anos. Numa eventual candidatura à AL, quais são as propostas e políticas que gostaria de ver implementadas em Macau? Como eu sou trabalhadora do jogo, o foco principal é a esperança de participar no processo da renovação da concessão das licenças de jogo, fazer sugestões legislativas e lutar pelos direitos dos trabalhadores. Na altura da liberalização do jogo, as empresas candidatas às concessões prometeram muito, como creches 24 horas, dormitórios para funcionários, mas só vi estas promessas cumpridas no estrangeiro. Se calhar, porque faltam terrenos em Macau, mas ao longo dos anos não me parece que as empresas se tenham esforçado muito. De qualquer das formas, a cultura não-jogo é fraca em Macau. Por exemplo, The House of Dancing Water era muito conhecido, mas fechou devido ao impacto da pandemia. Desta vez, espero que as promessas feitas pelas concessionárias fiquem estabelecidas a escrito, de forma clara. Outro exemplo é o sector das exposições e eventos, que, de facto, estão bem desenvolvidas no Venetian. Mas é raro recrutarem residentes. Como avalia o trabalho do Governo de Ho Iat Seng até agora e que medidas gostaria de ver implementadas? Acho que o Governo tem feito um trabalho muito bom, incluindo com medidas que tiveram como prioridade o bem-estar da população, algumas corajosas, como fechar os casinos durante um período devido à pandemia. De 0 a 100, dou uma pontuação de 85 pontos. Demonstram maior capacidade de trabalho do que os governos anteriores. Por exemplo, as medidas de prevenção da pandemia não foram aplicadas às empresas de jogo apenas tendo em conta interesses negociais. Creio que o Governo impediu que muitos trabalhadores não fossem despedidos.
Hush | Concertos de Verão já têm data Hoje Macau - 11 Mar 2021 A edição de 2021 do “Hush! Concertos de Verão” irá decorrer de 26 de Junho a 11 de Julho em palcos junto à costa como a Praça do Centro de Ciência, as Oficinas Navais nº 2 e o Terraço da Ponte Cais n.º 9, no Porto Interior. De acordo com um comunicado divulgado ontem pelo Instituto Cultural (IC), além de concertos, actuações temáticas, tendas de profissionais locais, arte da instalação e concursos de música online, este ano o evento irá contar pela primeira vez com o palco “hush! Kids”, destinado à participação de bandas formadas por membros com idade média de 12 anos ou menos. As restantes bandas participantes estão divididas pelas categorias “Hot Wave”, “Upbeat Power” e “Summer Chill”. Contemplado no programa deste ano está ainda o “Workshop de Música”, que inclui instructores disponíveis partilhar experiências e conhecimentos e ainda a actividade “Desenvolvimento Musical Temático”, que inclui bandas locais convidadas com o objectivo de “promover o desenvolvimento da música pop em Macau”. Como habitualmente, fica o convite para a apresentação de propostas de bandas e produtos locais. A apresentação de Propostas de Bandas e Músicos Locais decorrerá de 11 a 30 de Março e a recolha de propostas para “hush! x Indústrias Criativas” de 11 de Março a 12 de Abril.
Covid-19 | China e UE vão lançar ‘passaportes de vacina’ Hoje Macau - 11 Mar 2021 Muitos viajantes internacionais que planeiam viajar ainda este ano terão de provar que estão vacinados ou livres da Covid-19. A União Europeia e a China informaram que seguiriam em frente com planos para os “passaportes de vacinas”, segundo o Wall Street Journal. A China distribuirá certificados de saúde para viajantes internacionais, os quais declararão o estatuto de vacinação do visado, possibilitando um fluxo seguro de pessoas, segundo o conselheiro de Estado e ministro dos Negócios Estrangeiros, Wang Yi. Da mesma forma, o executivo da UE pretende apresentar planos para um “passe verde digital” em 17 de Março e cooperar com organizações internacionais para garantir que o seu sistema também funciona fora da União Europeia. Estes “passaportes de vacinação” especificarão se alguém foi vacinado e conterão detalhes dos resultados dos testes. Os líderes da UE esperam que esse programa possa ser executado no prazo de três meses. “O objectivo é capacitá-los gradualmente (cidadãos da UE) a deslocarem-se com segurança na União Europeia ou no exterior – para trabalho ou turismo”, afirmou a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.
Eleições | Imprensa deve ocultar artigos sobre eleições durante período de reflexão João Santos Filipe - 11 Mar 2021 No período antes das eleições, no dia da reflexão e durante as eleições, os órgãos de comunicação social vão ter de remover dos portais os artigos sobre as eleições e os respectivos candidatos que possam influenciar os eleitores. A obrigação legal foi declarada ontem pelo presidente da Comissão de Assuntos para as Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL), o juiz Tong Hio Fong, e abrangem artigos de actos eleitorais de outros anos. “Aqueles conteúdos que têm uma natureza de propaganda e que levam a esse efeito que pode influenciar a intenção de voto… Essas informações e reportagens pelo menos terão de ser ocultadas ou retiradas nos prazos estipulados pela lei”, afirmou Tong Hio Fong, no final de uma sessão de esclarecimento entre a CAEAL e os órgãos de comunicação social. “A liberdade de imprensa está consagrada na Lei Básica e na Lei Eleitoral, mas temos que chamar a atenção ao seguinte […] se as informações, directa ou indirectamente, por exemplo, estão a apelar ou a chamar um cidadão para votar, isto já ultrapassa a permissão da lei”, frisou. Apesar desta informação, Tong Hio Fong diz que a CAEAL vai ter em conta considerações técnicas, na altura de exigir aos órgãos de comunicação social para “ocultarem” os conteúdos. “Se a instituição ou órgão de comunicação social tiver sob seu controlo e puder manipular a plataforma em que a divulgação foi feita, como não pode haver divulgações, pelo menos tem a responsabilidade de ocultar essas informações. Claro que não podemos descartar a hipótese de haver razões técnicas que tornem isso impossível”, sublinhou. Sem período eleitoral Tong recusou ainda traçar um período temporal, considerando que a obrigação abrange qualquer publicação que se considere que pode influenciar as intenções de voto. Por outro lado, declarou que a obrigação não se limita aos órgãos de comunicação social, mas que pode implicar outras plataformas online, como as páginas de Facebook das associações. Por estes motivos, a CAEAL diz ter uma linha aberta para os órgãos de comunicação social, ao mesmo tempo que prometeu não reencaminhar qualquer caso directamente para o Ministério Público, sem primeiro ouvir os médias e dar uma hipótese para que os conteúdos sejam retirados. Nas eleições de 2017, o jornal Plataforma viu um dos seus artigos removidos, devido a uma entrevista com um candidato. Sobre este assunto, Tong Hio Fong declarou anteriormente que o caso foi reencaminhado para o Ministério Público e que depois disso não receberam mais informações.
O amargo fedor do sucesso Carlos Morais José - 11 Mar 2021 O pior que pode acontecer a alguém é ter sucesso. Ser o orgulho dos parentes, reconhecido pelo vulgo, cumprimentado pelos amigos. Experimenta produzir qualquer coisa que agrade aos outros, que te catapulte ainda que por quinze minutos para alguma fama e, mesmo que te faça entrar na carteira algum dinheiro inesperado, verás o sarilho em que inesperadamente te embrulhaste. E não se trata aqui de lidar mal com a falta de anonimato, que isso é chato, mas na verdade não importa. Nem sequer de sentir a inveja alheia a morder-te os calcanhares, as facas a entrarem nas costas, quando tu, simplesmente, estás a passar a manteiga pelo pão. Não. É muito pior do que isso tudo junto. O Andy Warhol inventou os tais quinze minutos de fama. Mas ele sabia muito bem no que se estava a meter. Só que não alertou ninguém para o que realmente interessa no assunto. Como bom rato que era, ficou calado e a roer queijo, a ver se esquecia a própria fama entre festas e festinhas. O primeiro problema é que na nossa sociedade ter sucesso parece ser um objectivo primordial e imprescindível, algo de obrigatório, sem o qual não és ninguém. Mal nascemos e gatinhamos, que nos gritam ao juízo a sua necessidade, a imperiosa precisão. O sucesso é a cenoura que nos impõem para que corramos sem saber muito bem para onde, ainda que nos digam para quê. Sussurram que para o alcançar vale tudo e que se chega lá por quase nada. O sucesso é a justificação em si mesma seja lá do que for, nem que sejam as piores atrocidades. Chega a ser da dor que a outro indiferentes provocamos, sem que isso a nós possa causar qualquer dano. Pode ser de ter vendido a alma por dez réis de mel orgânico, raramente por ter escrito o texto mais belo do mundo. No fundo, o sucesso é o que importa, é a porta sempre querida, não importa se merecida e quase sempre fechada, que a custo entreabrimos. E para quê? Ah… se soubéssemos o que nos espera além, nunca um passo seria dado, uma corrida encetada, uma finta executada, enfim, nada. Ficaríamos parados, a contar os nossos berlindes nesse saco sem fundo a que chamamos existir. Ou então, simplesmente, descansados, que é hoje tão difícil quão subir um Himalaia. “O menino não é ambicioso. O menino não faz pela vida. O menino não merece o pão que come mas, no entanto, tem fome. Onde é que já se viu?” Não pode ser. Insistimos em vencer, em ser conhecidos, famosos e, por esses quinze minutos, quase capazes de matar. Se não o outro, a nós mesmos de tanto nos afogarmos nesse mar de tentativas. E repetimos baixinho: é por mim, é por mim… e que se lixe o vizinho. Truz, truz, truz… bato à porta sem temor. A porta abre e eu entro, entre clamores de uma turba que, à falta de ser real, transporto nesta cabeça, antes que o mundo adoeça e a coisa seja vã. Mas… o que há do outro lado? Tu mesmo e chateado de nada de importante em ti ter realmente mudado. Conseguiste, chegaste lá, enriqueceste ou és conhecido no pequeno charco onde nadas. Mas isso o que significa, quando fechas a porta de casa e mergulhas na solidão com franqueza? O que mudou o sucesso de importante na tua vida? Na verdade, tudo parece agora mais distante: o amor, as amizades, o mundo, as cumplicidades que, num só dia, se esvaem. Num primeiro momento, quase não dá para acreditar. Não é este o reino que nos fora prometido. Depois advém o vazio e a obrigatoriedade de guardar o que a tanto custo se conquistou. Uma trabalheira infernal e o que em ti era espontâneo passa ser algo fatal, do qual dependes para te manter nesse topo imaginário, nessa torre de cristal na qual és, afinal, prisioneiro. Mas o pior de tudo é quando olhas o espelho e já não te reconheces. Não sabes quem é aquele, ali semi-reproduzido, nem tens a certeza dos próximos passos a dar. Vês o abismo como caminho. E, acredita, mais que nunca estás sozinho, que o sucesso é feito a sós e as gentes não têm dó quando te virem cair. É quando um cheiro mau, repugnante, se evola – meio podre, meio a ti – que ao corpo e à mente se cola. Nunca mais te deixará, por mais cara que seja a colónia que agora usas. Não podes voltar atrás, ainda que tudo percas, nisto não há retrocesso. Todos o sentem e conhecem, mas garantem que é perfume. Não é, sabemos bem: é o amargo fedor do sucesso.
Dos brasões e dos impérios António Cabrita - 11 Mar 2021 Coitado do império romano, um império de mil anos, que foi sempre colonizado mentalmente. Dir-se-ia até que foram marionetes, primeiro dos gregos, depois do Cristianismo – ‘tadinhos! O que nos ensina, este exemplo? Que a História não é linear, não é um mecanismo que conduza ao estipulado pela caução determinista. A História extravia-se irremediavelmente em becos, desperta energias que diferem em relação ao seu eixo e restitui, nos gérmenes das mentalidades que desperta, o que estava na sombra e agora irradia com uma tremenda força de contágio em direcções não previstas. Daí que, di-lo Benjamin, caiba ao historiador suspender todo e qualquer preconceito se quiser contar a história tal qual ela é, i. é, no engendramento do que bifurca de si mesmo. E adianta na segunda das suas Teses sobre a História: “o cronista que narra profusamente os acontecimentos, sem distinguir grandes e pequenos, leva com isso a verdade de que nada do que alguma vez aconteceu possa ser dado por perdido para a História.” Pior, em Benjamin, a utopia não é mais pensada como a crença no acontecimento inexorável de um Ideal localizado no termo mítico da história, antes ressurge – através da categoria de Redenção – como “a modalidade do seu acontecimento possível a cada instante de tempo”. E neste resgate acrescenta-se dignidade aos vencidos, que apenas de forma temporária e contingente, se encontram desse lado da barricada. A História, portanto, reconfigura-se a partir das particularidades, do que nela jazia subterrâneo e marginal ao sistema em vigor. Pelo contrário, a História mostra-nos como tudo tende para o gradual e fosforescente domínio dos vencidos no plano das mentalidades. Para o bem e para o mal. Pelo que, na dúvida, na colisão das narrativas, é sempre melhor negociar cedências mútuas do que “vencer”. Até na “indústria cultural” é assim: o rap, expressão das periferias foi assimilado, e, convertido em hip-hop, tornou-se dominante, até à náusea. A Alemanha fascista ergueu-se sobre as ruínas dum tecido social vencido, humilhado e esquecido; a atracção pelo modelo estalinista nos países comunistas mais não foi que a violência maniqueia do ressentimento com que os vencidos trocaram de posições. A Primavera Árabe não foi pervertida, simplesmente acordou o monstro adormecido, que com um atitude sobranceira se havia negligenciado, etc., etc. Aquilo que o Freud explicava caridosamente quando dava como uma das leis do inconsciente a sua impossibilidade de esquecer, tudo se retém na caixa negra do inconsciente para ser baralhado e voltar à superfície lá mais para diante. Com os povos e a História é o mesmo. Tudo o que se censura volta, o que foi desdenhado e empurrado para a periferia voltará sem remédio. Acho por isso delirante a polémica em torno de “abafar” ou não os brasões, no Jardim da Praça do Império. O acto de retirar os 32 brasões do Jardim do Império é tão irrelevante para a dignificação da memória das comunidades afro-descendentes como desnecessário. Afinal, o que representam os brasões? Legumes, pequenos arbustos e flores das diferentes e antigas províncias do “Império”. Porquê vedar às crianças a oportunidade de perceberem que as papaias, a pêra abacate, as mangas, a goiaba, que vêem à venda nos hipermercados, são originárias dos países africanos de que inventámos os mapas – para depois lembrar que os “benefícios” do colonialismo geravam a infelicidade dos povos autóctones. Já retirar os brasões perpetua o erro de recalcar o que supostamente – no novo império do “politicamente correcto” – é vergonhoso. A História faz-se também das suas vergonhas e crimes e não convém ocultá-los. Só se adquire uma dimensão crítica quando ficam expostas as contradições do sistema e isso possibilita o recuo que nos distancia da carga ideológica de que os seus vários signos eram portadores. Como escreveu Sena no poema Chartres ou as pazes com a Europa: «Europa, minha terra, aqui te encontro/ e à nossa humanidade assim translúcida/ e tão de pedra nos pilares sombrios.» A “humanidade” nalguma Europa é ainda (apesar de tudo, confirma-o a condenação de Sarkozy) translúcida porque expõe os seus pilares sombrios, não os esconde com um tapume. Diga-se: a actual cultura ocidental aceita que a sua academia ou artes contrariem ou forjem narrativas paralelas à da sua “história oficial”, num ventilado sistema de correcção conceptual e de fugas, em sendo os argumentos convincentes. Esta liberdade não é global. Onde se oxigenam os ensaístas pós-coloniais, dos diversos quadrantes e raças, e que minam, tantas vezes com acerto e pertinência, a credibililidade das narrativas europeias; em cujo território, apesar de dissonantes, são tratados com respeito, beneficiando até de um mínimo conforto material para poderem zurzir com habilidade e apoio institucional na civilização ocidental? Na Europa (ou nos EUA). E adianto já: é assim que deve ser. A saúde democrática demanda a presença de antídotos. Não podemos é aceitar isto por um lado e querermos apagar, como revisionistas, o lado negro da História. Nas sociedades conservadoras ou autoritárias os liames que cimentam uma sociedade são mais diacrónicos do que sincrónicos: emerge de um desligamento forçado com o presente a força dos símbolos fundadores. Hoje, na era pós-colonial e da democracia electrónica, diferentes narrativas e tempos históricos digladiam-se e no tecido do quotidiano notamos a presença de vários tipos de presentes, correspondentes a uma heterogenia na composição do(s) passado(s). Neste panorama, o cultivo da memória e o seu debate são cruciais e não devem ser objecto de demagogia. Como o fará o Chega, que ergueu a bandeira de partido que preserva “todos os símbolos históricos da nação portuguesa”, os quais vai distorcer e idolatrar. É importante que um pai afro-descendente a passear no jardim, possa comentar aos seus filhos, “Era com estes engodos simbólicos que os filhos da puta endrominavam os soldados que iam para a guerra oprimir-nos”, e que eu possa apontar aos meus, “As nações fazem-se numa soma de erros e barbaridades que convém não serem escondidos para podermos estancar a irracionalidade.”
Desenterrar o visível Luís Carmelo - 11 Mar 2021 O romance ‘Aparição’ de Vergílio Ferreira foi importante nos verdes anos, porque, quando o leste, em 1971, desenterrou a cidade que continuavas a ver diante dos teus olhos. Foi um verdadeiro pasmo. Sem dares por isso, na altura, aprendeste que desenterrar aquilo que é visível corresponde, afinal, a toda a história dos humanos. A “Ideia” de Platão, o delírio sobrelunar inventado por Aristóteles, o lektón dos estóicos (ou “significado”, a única coisa incorpórea que existiria no meio de uma visão da vida inteiramente materialista), a pré-concepção de Santo Agostinho e os mil experimentalismos modernos, tudo isso, eram formas diversas de desenterrar o visível. Além deste detalhe gigante, o romance incorporava o debate existencial que à época ainda não arrefecera. Independentemente de tudo o que se possa mencionar à primeira vista, o livro vivia – e vive – duma atemporalidade de fundo que nada tinha que ver com o espaço concreto onde as acções (e as reflexões) decorriam. Havia ali um tempo paralelo, uma espera sem termo, uma incerteza longínqua, um aceno comovente. A grande literatura vive destes mitemas e sussurros, tantas vezes invisíveis, mas que frisam o espanto e o salto que a leitura pode e deve provocar. Desenterrar o visível tornar-se-ia no rastrear de algo sempre maior. A perder de vista (na verdade, uma aparição pode cegar). Alguns anos antes, estavas em Sintra e observaste o imperador da Etiópia, Hailé Selassié, a acenar dentro de um carro preto que tinha o tamanho de uma lança sem terminação. Uma lança que ainda hoje vês passar por ti tantas vezes. Foste ao encontro dos fungos que se instalam na memória e confirmaste que a visita teve lugar nos últimos dias de Julho de 1959, ano em que o romance ‘Aparição’ foi lançado. Entre essa data e 1996, a bandeira da Etiópia mudou oito vezes. As listas horizontais vermelhas, verdes e amarelas mantiveram-se, mas o leão da Judá do tempo de Selassié transformou-se numa estrela de cinco pontas. Lembras-te ainda de que havia rendas junto à janela onde a mão do imperador se agitava. Nunca tinhas olhado para um imperador e toda aquela sobreinvestida fez-te pensar, suspender os séculos. No ano em que a bandeira da Etiópia inaugurou a sua última versão, cruzaste-te no funicular de Haifa com vários soldados etíopes. Eram judeus etíopes. À saída, um deles avançou na tua direcção e disse: “I´ve been there!”. E ali ficou com o dedo a apontar para o Mediterrâneo, na direcção do sol-pôr. E tu entendeste que o alvo era inevitavelmente Sintra. Concluirias, nesse instante, que o entendimento é uma teologia sem deus ou o fac-símile de uma primeira pessoa confusa (a olhar para o mar). E lá continuaste a jornada, sempre a subir, em direcção ao monte Carmelo. Nesse mesmo dia – era 1 de Março – morreu Vergílio Ferreira. Alheio à morte, às metamorfoses das bandeiras e às taras do Selassié, Vergílio Ferreira continuou a sua tarefa de desenterrar o visível. Em certos dias, como hoje (fosse em 1986 ou em 1996, que interessam as tabuadas?), regressas aos mais altos cumes de Haifa e tentas seguir a direcção do dedo indicador do soldado etíope. Segue-lo como se espreitasses por um monóculo potente e, ao fundo, lá está o escritor na sua casa de Fontanelas (afinal era mesmo em Sintra) a escrever: “Alguém a trouxe de um paraíso perdido ou de uma ilha dos amores para uma serenidade de amar. Sintra é o refúgio de nós próprios e de todo o excesso que nos agride ou ameaça.”. O mar a perder de vista. E a desenterrar o visível. (texto parcialmente extraído de ‘Órbita-I: Visão Aproximada’ – título de obra de longo curso ainda em trânsito)
Governo chinês autoriza abertura de duas novas licenciaturas em língua portuguesa Hoje Macau - 11 Mar 2021 O ministério da Educação chinês autorizou a abertura de duas novas licenciaturas em língua portuguesa, elevando para mais de 30 o número daquele tipo de cursos na China continental. Os dois novos departamentos de português foram criados na Universidade Normal de Hebei e na Universidade Normal de Hunan. As licenciaturas arrancam oficialmente em Setembro. O curso na Universidade Normal de Hebei vai ter 30 alunos no seu primeiro ano lectivo e ambiciona apoiar a criação de uma Faculdade dedicada ao futebol naquela instituição de ensino superior. “Estamos a tentar criar uma Faculdade para o futebol e um centro para a formação de professores de chinês que vão ensinar para os países de língua portuguesa”, disse a directora do novo departamento de português, Qiao Jianzhen. “Sem a língua, seria impossível desenvolver estes intercâmbios mais profundos”, explicou. O departamento de português quer capacitar os professores que leccionam chinês nos Institutos Confúcio (IC) que operam nos países lusófonos, através da criação de um curso livre, para além da licenciatura. “Faltam professores que falem português, tanto no Brasil como em Portugal”, explicou Qiao, que leccionou, desde 2005, no IC. O organismo patrocinado por Pequim garante cursos livres de mandarim em cinco universidades portuguesas – Aveiro, Coimbra, Lisboa, Minho e Porto. A China ambiciona converter-se numa potência do futebol, ao nível do seu estatuto económico e militar, até meados deste século, pelo que tem atraído treinadores e jogadores estrangeiros, incluindo centenas de brasileiros e portugueses. O país conta apenas uma participação num Mundial de futebol, em 2002, na Coreia do Sul. No total, mais de 1.500 estudantes chineses frequentam agora cursos de português no país asiático. Até 1999, apenas a Universidade de Estudos Estrangeiros de Pequim e a Universidade de Estudos Internacionais de Xangai ofereciam licenciaturas em português. A acelerada abertura de novos cursos reflecte a crescente necessidade da China de formar melhores quadros para trabalhar com os países de língua portuguesa, face à evolução das trocas comerciais, que só em 2020 se cifraram em 145 mil milhões de dólares.
ONU | Guterres elogia Xi Jinping pela luta contra a pobreza Hoje Macau - 11 Mar 2021 O secretário-geral da ONU, António Guterres, felicitou recentemente o presidente chinês Xi Jinping por ocasião do anúncio dos esforços bem-sucedidos da China na luta contra a pobreza extrema. “Quero expressar os meus sinceros parabéns ao seu governo e a si pessoalmente”, disse Guterres. Observando que este momento é uma realização notável e uma contribuição significativa para a realização de um mundo melhor e mais próspero, como previsto na Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, o secretário-geral disse: “Eu elogio-o por sua visão e liderança”. “Este resultado extraordinário é uma razão de esperança e inspiração para toda a comunidade de nações”, disse Guterres. “Isso mostra a importância do compromisso político em todos os níveis do governo, e estabilidade em políticas para melhorar as condições dos mais pobres e mais vulneráveis”, disse o chefe da ONU. “Também sublinha a oportunidade de modelos de desenvolvimento que são orientados pela inovação, verdes, abertos e que funcionam para beneficiar todos”, acrescentou. Guterres expressou confiança de que “a China continuará a fazer progressos nos seus esforços para não deixar ninguém para trás”.
Primeiro acto – Cena 5 Gonçalo Waddington - 11 Mar 2021 Desatam a rir com a declamação de Valério. Quando acalmam, acendem um cigarro e servem mais vinho. Dão-se conta dos primeiros raios de sol que entram pela janela. Valério espreita o relógio e a sua expressão muda. Gonçalo Tens de ir embora. Valério Não devia. Gonçalo Não? Valério Não… Gonçalo O que é que se passa? Valério [hesitante] Troco mensagens com os meus alunos de faculdade… Gonçalo E…? Valério Temos um grupo… professor e alunos… fala-se de tudo e mais alguma coisa. Gonçalo Caramba, estás lento… desembucha! Valério Calma, deixa-me estruturar o discurso. Gonçalo Confessa… não penses muito. Valério Não vou confessar nada! Gonçalo [rindo] Porque ainda não fizeste nada… mas andas com o pecado às voltas na cabeça, seu maroto! Valério Mas qual pecado?! Gonçalo É tão óbvio! Estávamos às gargalhadas… reparaste que o sol estava a nascer, olhaste para o relógio e ficaste nini. Valério Nini? O que é isso? Gonçalo Nini… abatido, melancólico. Os teus alunos não usam essa expressão, nini? Valério Mas o que é que isso tem que ver com pecado? Gonçalo Tem tudo. Tens alguém em casa à tua espera… e tu aqui, a estas horas… pecado! Que eu saiba não vives com ninguém, portanto… Tens trabalho atrasado e tu aqui, a cavaquear e a emborcar à grande… pecado. Valério Culpa, queres tu dizer. Gonçalo Neste caso é a mesma coisa. Andas a trocar mensagens com quem não deves… continua. Valério Não é bem assim. Gonçalo Só pode ser isso… ficaste nini. Perguntei porquê. Disseste “troco mensagens com os meus alunos”. Valério Mas foi um engano… eu troco mensagens no grupo, mas também troco mensagens em privado. E são eles que me mandam mensagens… a propósito de trabalhos, ou exames, ou o que for… Gonçalo E? Valério Calma! [pausa] E… eu escrevi no quadro da sala os nomes e os horários de apresentação de uns trabalhos quaisquer, tirei uma fotografia e enviei para o grupo… apaguei o quadro e fui-me embora. Ao fim da tarde começo a ser bombardeado com mensagens no grupo… enganei-me, pelos vistos… havia duas apresentações à mesma hora, num mesmo dia. “Enganei-me, peço desculpa, fulano ou fulana tal apresenta na aula seguinte e não no mesmo dia, se estiverem de acordo”, respondi. “Tudo ok”, responderam eles… passadas umas horas recebo uma mensagem de um número que não tinha gravado… a mesma fotografia, com a mesma pergunta “Não se terá enganado?”… não respondi, não conhecia o número. Mas fiquei curioso, voltei a espreitar a mensagem e quem a enviou já a tinha apagado. Gonçalo [rindo] Estás a inventar! Valério Não estou! Gonçalo Para já, é uma seca! Uma sequência de factos insípidos… depois enviei isto, depois eles responderam aquilo, depois eu fiz não sei quê, depois eles fizeram não sei que mais… Ainda por cima, és monocórdico e deixas todas as frases suspensas… e tararará… e tararará… e tararará… não há paciência! Valério [levanta-se] Bem, vou-me embora. Gonçalo Oh, vá lá… Valério vai até ao lava-loiça e começa a lavar o seu copo. Gonçalo Agora vais tu fazer birra? Valério aproveita para beber água, volta a lavar o copo e deixa-o a escorrer. Vai até ao bengaleiro e veste o casaco. Põe-se a revistar os bolsos. Gonçalo Acaba lá a história. Valério Não! Valério continua à procura de qualquer coisa nos bolsos do casaco. Gonçalo Não podes conduzir assim. Valério Sem chave, não. Gonçalo Vá, sentas-te, não bebemos mais e daqui a pouco vais embora. [pausa] Começo já a fazer o café. Gonçalo vai até ao fogão de ferro e pega na cafeteira. Valério torna a tirar o casaco e a pendurá-lo. Põe as mãos nos bolsos das calças, contrariado, e descobre a chave do carro num deles. Gonçalo desatarraxa a cafeteira e passa-a por água no lava-loiça. Valério volta a sentar-se. Gonçalo Continua… Gonçalo põe o café, atarraxa a cafeteira e põe-na ao lume. Vem sentar-se ao lado do amigo. Valério Peço desde já desculpa pelo conteúdo e pela forma… [pausa] Atalhando… umas horas depois, estava eu num site de engate… já me tinha esquecido do assunto… Sabes que as procuras podem ser baseadas em proximidade, certo? Local de trabalho, casa… Gonçalo Sei, avô! Valério Pronto… nos critérios de busca, para além do género, idade, interesses… tenho o local de trabalho. Não pus a faculdade, pus a zona, como é óbvio. Gonçalo Porquê? Valério Porque não quero que saibam onde trabalho. Gonçalo E a profissão? Valério O que é que tem? Gonçalo Tens a profissão no teu perfil? Valério Tenho. Gonçalo Professor universitário? Valério Sim. Gonçalo Então, se és professor e trabalhas na zona tal… Valério [interrompendo] É óbvio! Mas não está lá o nome da universidade, não me apetece, pronto. Continuando… às tantas aparece-me o perfil de uma mulher… jovem… a fotografia não era muito boa, não dava para perceber bem como era a cara dela… acho que deve ter posto aquela fotografia de propósito, para não ser reconhecida… era uma aluna universitária ali da zona e tinha o número de telefone. Quando vi o número, percebi que era o mesmo da mensagem que tinha recebido e que entretanto tinha sido apagada.
Raquel Banha: “As pessoas não têm de ignorar a deficiência” Teresa Sobral - 11 Mar 202112 Mar 2021 Raquel Banha tem 24 anos e considera-se uma “Artivista”. Mulher de vários talentos, domina a arte da escrita no seu blog Chairleader e é mestre em Marketing Digital. Nasceu com uma doença neuromuscular rara e usa o blog para quebrar tabus e falar sobre a deficiência Foto – Inês Oliveira Li no teu blog, a certa altura, que “há 20 anos que namoras a tua varanda solarenga, local da casa onde te sentes mais viva e livre, e onde aprendes a viver através dos outros, das pessoas, dos animais, das plantas”. O que seria necessário para poderes sair da varanda e viver essa vida que tanto observas? Há muitos factores, na verdade. Moro num prédio com 24 degraus, que não tem rampa, não tem elevador, não tem nada. E durante 18 anos, o meu pai, todos os dias, me transportava às cavalitas. Além de eu estar, obviamente, dependente dele, 56 anos já começam a pesar no corpo de um adulto. Então apareceu a Ana. A Ana é a tua assistente pessoal. Sim, comecei a ter assistência pessoal desde Outubro de 2019 e já desde essa altura que houve a necessidade de arranjar maneira de sair de casa, de forma, mais ou menos, autónoma. E em Maio de 2020, instalámos uma cadeira elevatória. Ainda não é ideal, por várias razões: esta cadeira de rodas (eléctrica) não vai a casa por exemplo. Quanto é que pesa? 200 quilos. Há ajudas do Estado para tudo isso? Há algumas…esta cadeira foi o Estado que me deu, mas demorou três anos a chegar. É uma eternidade (sorri). Como estávamos numa situação complicada e urgente, pois o meu pai já estava mesmo muito mal das costas, tivemos de arranjar rapidamente a cadeira elevatória, e então fomos nós, do nosso bolso, que a pagamos. Agora estamos à espera da junta de freguesia. Disseram que como os degraus para entrar no prédio ainda estão na rua, poderiam fazer a obra sem cobrar nada. Portanto, para sair de casa, esta era a minha primeira barreira, a barreira arquitectónica, que é a mais óbvia. Depois há uma outra barreira, a barreira emocional. Eu agora, felizmente, com a Ana, supostamente já poderei fazer aquilo que quero. Mas estamos a falar de 23 anos. Foram 23 anos sem a oportunidade de fazer aquilo que eu queria, à minha maneira, no meu horário… E a nossa mente acaba por se moldar a essa realidade. E agora, tenho a oportunidade de sair, mas não sei o que é que vou fazer, não sei o que é que posso fazer, nem tão pouco tive oportunidade para construir um circulo social de amigos consistente para dizer “agora vou tomar um café com…” Não criei isso ao longo do meu desenvolvimento. E claro, tenho a consciência de que a minha personalidade também não ajuda. Às vezes acabo por ficar em casa, pois vou lá fora fazer o quê? Não sei. Há muita coisa que não conheço, não sei por onde começar… e isto depois é uma bola de neve. Costumo dizer que a independência é um músculo. E, no meu caso, foram 23 anos que estive sem utilizar esse músculo. É um processo lento e demorado. E há o problema com que se deparam todas as pessoas que têm de se deslocar em cadeira de rodas eléctrica, que é a impossibilidade de entrar na maioria dos locais públicos, porque não têm acesso. Pois, não entro. Portanto aquela coisa de telefonar a alguém a dizer “vamos jantar não sei onde e depois vamos a uma discoteca” ou uma combinação de última hora, é uma coisa que não existe para ti. Tens de ter tudo programado, saber onde é que podes entrar e onde é que não podes entrar. Lá está. É aí que entra o lado emocional. O trabalho de sair e planear tudo, com a grande possibilidade de chegar aos sítios e as coisas não correrem bem. Isso desmotiva-me imenso. Por isso é que digo que o lado emocional comanda tudo. Compreendo. Há aqui um degrau sim, mas o lado emocional é aquele que dita que vamos ter de arranjar uma solução, uma alternativa. E de facto a nossa vida tem de ser programada com muito tempo de antecedência. Tenho de telefonar primeiro, para saber se o sítio é acessível, depois as pessoas dizem-me que “ah, é acessível, sim”, chegas lá e não é acessível. Porquê? Porque as pessoas também não têm formação técnica para saber avaliar se aquele espaço é totalmente acessível ou não. Mesmo com a Ana ao meu lado é muito cansativo para mim… Há um termo, que começa a ser usado quando se fala de discriminação e preconceito social contra pessoas com capacidades reduzidas – que é o “capacitismo”. Queres falar um pouco sobre isto? E já agora, gostava imenso que desenvolvesses a tua ideia de que (para ti) está ligado a uma “premissa de que assim que uma pessoa nasce e/ou fica com uma incapacidade é automaticamente um ser especial.” Acho que é uma tendência natural da sociedade. Quando vês alguém diferente, começa a surgir uma variedade de suposições à volta dessa pessoa e nós baralhamos muito os termos “diferente” com “especial”. E não tem nada a ver uma coisa com a outra. Diferente é diferente… Ser especial é quando alguém faz alguma coisa que realça e tem valor. Estando agora mais dentro da comunidade de pessoas com deficiência, é algo que eu noto muito. Todos nós, a certa altura da nossa vida, somos chamados de “especiais e únicos”. Depois, quando chegamos ao mundo real e temos este contacto com pares da nossa comunidade, percebemos que afinal há mais pessoas como nós, percebemos que afinal não somos assim tão especiais, nem únicos. E isso tem várias consequências a nível psicológico e emocional. Por exemplo, pessoalmente, acho que isto mexeu muito, e mexe, com a minha autoconfiança. Quando faço alguma coisa e as pessoas me elogiam, fico sempre na dúvida se é puro mérito meu, ou se está ligado com esta conotação “especial da deficiência”. Ou seja, o facto de eu me ter apercebido desde cedo que não era assim tão especial, não era assim tão única, criou uma necessidade dentro de mim de criar essa “parte especial de mim” de que tanto falavam. E então há aqui uma espécie de exigência comigo mesma, “tenho de fazer alguma coisa para ultrapassar a minha deficiência”. Mas eu pergunto: será que isso é mesmo necessário? Será que isto é algo meu, ou é uma necessidade que desenvolvi por causa de tudo isto à minha volta? Não sei. Também dizes que sentes com frequência as pessoas estarem contigo e isso fazê-las sentirem-se bem porque estão perante alguém que está pior do que elas. Perverso, não? É perverso mas toda a gente pensa assim, eu inclusive. Aliás, ainda não consegui formular uma opinião sobre o voluntariado internacional, por exemplo. Agora está muito na moda, um jovem ir a África ou à Ásia fazer voluntariado durante umas semanas ou meses. Mas na maioria dos testemunhos que tenho lido, as pessoas vão com o objectivo principal de verem que há pessoas em situações piores do que elas. Vão lá, são iluminados pela desgraça dos outros e voltam seres superiores, com um currículo todo pimpão. E isso faz-me comichão. Mas lá está, não quero ser demasiado fundamentalista, porque ainda estou a tentar perceber este fenómeno e essa necessidade das pessoas se compararem a outras, para pensar “ah, afinal eu tenho que dar mais valor à minha vida”. Mas, até agora, com a informação que tenho, isso incomoda-me. Naturalmente. Incomoda-me, irrita-me. Nós não devemos comparar a nossa realidade com a dos outros. Sim, a dor dos outros não pode ser um bálsamo para nós… Não é? Irrita-me muito. É a isso que tu chamas “objectificação da deficiência como meio de inspiração”? Sim, mistura-se um bocado com o ponto anterior. “Eu gosto e sinto-me bem em ver alguém em “piores” condições que eu. Faz-me sentir melhor”… E há aquela cena do “ah eu vejo alguém com deficiência a fazer determinada coisa, se ela consegue, eu também consigo”. Mas também há pessoas que fingem ignorar. Conheço várias pessoas, das quais tive necessidade de me afastar um pouco, porque elas vinham sempre com esse discurso do “ah, eu quando olho para ti, não vejo a deficiência”… as pessoas claramente deparam-se com uma pessoa diferente, com alguma coisa que não conhecem ou entendem, e a maneira delas lidarem com isso, ou tentarem disfarçar esse sentimento de estranheza, é dizerem “ah, eu olho para ti e não vejo a deficiência”. As pessoas não têm de ignorar a deficiência. É como eu estar a olhar agora para ti e ignorar que tens uma coisa nos ouvidos (os auscultadores do gravador). É ridículo. Não é real…. não faz sentido. Como o que te aconteceu na escola, numa aula de ciências. Exactamente isso… acho que foi numa aula de ciências, sim, em que o laboratório era no primeiro andar. A escola não tinha elevador, rampa, nada. E marcaram a aula lá para cima e eu fiquei muito chateada porque, quando eu vou para uma escola, a primeira coisa que se faz é falar com o conselho, com a direcção, para mostrar que eu tenho uma deficiência e que não é para esquecê-la, é precisamente para tê-la em conta. E marcaram aulas para o primeiro andar. Eu falei com uma professora e ela, com um ar muito despreocupado, diz-me para eu não ficar chateada porque isso queria dizer que olhavam para mim e não viam a minha cadeira de rodas. E isso não é um argumento válido. É só parvo. Fazes parte da direcção do Centro de Vida Independente cujo objectivo é a defesa e a divulgação da filosofia da vida independente em Portugal. Queres falar-nos sobre o vosso trabalho? A filosofia da vida independente vem revolucionar a maneira como se lida com a deficiência, pois há vários modelos da deficiência e o mais comum é o modelo médico. Que pressupõe que estas pessoas “têm de ser curadas”, e até haver uma cura, não há nada a fazer. As pessoas são postas num hospital ou num lar, à espera que aconteça algo, que não vai acontecer. Pronto. E a esperança destas pessoas está apenas ligada à ciência e aos laboratórios. Quando, na realidade, os processos de descoberta e de evolução científica demoram, às vezes, mais do que uma geração. Ou várias gerações. E não podemos deixar morrer gerações, à espera de algo que pode ou não acontecer. Então, houve a necessidade de se criar o modelo social, que diz que somos todos diversos funcionalmente e que as sociedades é que não estão adaptadas para toda a gente. Nascemos ou adquirimos esta ou aquela doença, e vamos provavelmente, morrer assim. Mas queremos viver a melhor vida possível com a nossa realidade, no presente. Sabemos perfeitamente que vamos sempre precisar de uma segunda pessoa para concretizar aquilo que queremos. Isto da vida independente não é nada mais, nada menos, do que fazermos aquilo que nós quisermos, tendo controlo total da nossa vida, das nossas opções. Com a ajuda de uma segunda pessoa. No teu caso a Ana, a tua perna metade, como lhe chamas? A minha perna metade (sorri) é como ter uma muleta, estás a ver? A muleta está lá disponível para eu poder fazer aquilo que eu quiser. A vida independente já é uma realidade nalguns países na Europa. Nomeadamente na Suécia, onde estão super avançados, e onde ter um assistente pessoal é super banal. Em Portugal, até há muito pouco tempo, nunca se tinha falado na hipótese de sermos nós a controlar a nossa vida. Há uma frase emblemática neste movimento que é “Nada sobre nós, sem nós”. É muito isso: é trazermo-nos como parte activa deste processo todo. Uma coisa que é muito comum ainda nas associações e instituições de pessoas com deficiência, é que a maioria delas são geridas por familiares, por cuidadores e por pessoas que não têm deficiência. E temos de alterar isso, porque são essas pessoas que estão a decidir e a lutar por coisas que nós podemos lutar. Temos uma voz e queremos muito ser activos e fazer acontecer, e não ir por aquele lado da solidariedade, de pedinchar, entendes? Entendo, claro. É um direito que nos assiste enquanto seres humanos. Tem a ver com direitos humanos, é isso mesmo. Os direitos humanos não são solidariedade. Está na constituição, está na lei. E nós trabalhamos para garantir que estes direitos humanos são cumpridos. Acho que é essa a nossa principal função, para que mais pessoas tenham estes direitos. Porque, por exemplo, em Lisboa, neste momento, somos apenas, salvo erro, menos de 50 pessoas a usufruir de assistência pessoal, paga pelo Estado. E isso é muito pouco. Um tema que é particularmente sensível e que continua um tabu para as pessoas em geral é o amor, a paixão, a sexualidade. Muitas pessoas com diversidade funcional encontram-se dependentes da ajuda de outras para exercer a sua sexualidade. Em Espanha sei que há assistentes sexuais, mas não sei se esse serviço existe em Portugal, creio que ainda não. Oficialmente não. Queres falar um pouco sobre isso? Olha, ainda no outro dia falei disso, ou ouvi falar disso, que tem a ver com o papel do assistente sexual. Qual é o papel do assistente sexual? Isso também é um tabu. As pessoas pensam que um assistente sexual é quase como um prostituto ou uma prostituta e não tem nada a ver uma coisa com a outra. Portanto, na sua génese não há sexo entre a pessoa com deficiência e o assistente. O objectivo do assistente é…por exemplo, uma pessoa com muito pouca mobilidade e que tenha muita dificuldade em ter prazer sexual com ela própria – masturbação, o ou a assistente sexual ajuda nesse processo, mas é a mão da pessoa com deficiência que faz essa exploração, com a força da mão do/da assistente. Não é uma mão qualquer em cima do teu corpo, é a tua própria mão, onde tu quiseres, como tu quiseres, mas com o auxílio de uma segunda pessoa. Depois ainda há outro tipo de assistência, necessária numa relação sexual, onde já estão envolvidas duas ou mais pessoas. Imagina que uma dessas pessoas tem dificuldade em fazer o movimento necessário para a relação acontecer – o assistente sexual poderá auxiliar nisso. Poderá estar na relação, mas nunca activamente. Portanto, está lá, mas apenas para auxiliar na realização da mesma. Outra situação, por exemplo, é uma relação sexual entre duas pessoas com deficiência. Sim, sim. Eu conheço um casal assim. Têm dois assistentes, um para cada um deles. Lá está. Têm? A sério? Sim, vêm de Espanha, precisamente. Fantástico. Que bom para eles. E depois há aqui uma outra situação, que ainda não está muito bem delimitada. Por exemplo, a Ana não é assistente sexual, é pessoal, mas até que ponto eu não poderia pedir à Ana que me ajudasse a pôr uma lingerie mais sensual? Ou, imaginando que eu não preciso de ajuda para o acto em si, mas preciso ajuda para me limpar. É um assistente pessoal ou é um assistente sexual? Ainda há coisas não estão muito bem definidas. Porque no fundo as tarefas que eu mencionei já não fazem parte do acto em si, são coisas extras ou posteriores. Mas é importante que se criem condições em Portugal para formar esses assistentes. A sexualidade é um direito. Aos 17 anos fui a uma conferência sobre sexualidade na deficiência e foram mencionados vários exemplos de progenitores que masturbavam os filhos. Isto é uma coisa completamente impensável! Por vários motivos lógicos, emocionais, de privacidade e dignidade humana. E isto acontece em Portugal, mais no interior, onde os pais acabam por dar este prazer sexual aos filhos… É algo sobre o qual o Estado devia ser responsabilizado. A sexualidade é um direito humano, logo o Estado tem de dar resposta a este tipo de casos. Obviamente no que toca a encontrar um parceiro sexual, estamos, teoricamente, muito teoricamente, em pé de igualdade. Visto que todos nós passamos por isso. Quando falamos em sexualidade, falamos também da relação com o nosso corpo e é uma coisa por que toda a gente passa. Toda a gente tem de encarar isto como uma realidade. Faz parte da nossa vida, de todos nós. Mas eu estou confiante que mais dia menos dia também haverá assistentes sexuais em Portugal. Para terminar esta conversa, gostava que desenvolvesses a ideia que deixaste expressa no teu blogue e que diz: “Quero viver num mundo onde todos os Dom Quixotes têm lugar seguro para viver as suas aventuras de cavalaria e enfrentar todos os seus monstros e gigantes.” Dou muito valor à saúde mental, para mim é das coisas mais importantes na vida. Porque…ok, eu tenho uma deficiência, é o que é, não há volta a dar, nem há muito mais para explorar, digamos assim. Mas existem todos os desafios que passam por “viver com a deficiência” e “viver num mundo que ainda não está preparado para viver com a deficiência”. E além disso, como é que eu hei de explicar… venho de uma família toda ela bastante emocional, digamos assim…e também há historial de doenças psicológicas na minha família – eu própria tenho depressão crónica há cerca de 15 anos – tenho ansiedade, sou obsessiva e compulsiva, mas para mim tudo isto é muito natural. Sou uma pessoa que fala abertamente sobre tudo. Essa frase que eu escrevi vem da minha necessidade de querer falar sobre isto tudo, sem ter vergonha, sem ter medo. E por um lado também gostava de ser compreendida, sabes? Porque, na verdade, quantos de nós não enfrentamos demónios e monstros? Todos nós temos desafios ao longo da nossa vida e é super natural a nossa mente levar-nos a sítios estranhos. E eu sinto muito essa necessidade de falar com as pessoas e tocar em assuntos mais “chatos”. E as pessoas não gostam de falar de problemas, nem sempre gostam de pôr a cabeça a funcionar e eu não sou assim. Eu gosto de falar sobre as coisas, gosto de tocar nas feridas e tenho um humor, muito negro e sarcástico, “eu vou falar sobre aquilo que tu não queres falar”. Gostava de sentir mais abertura por parte das pessoas para poder falar e dialogar sobre isso, sobre monstros e gigantes. Eu acho que é muito por aí. Pelo menos eu espero contribuir com aquilo que eu faço na vida e com o meu blog.
Ensino superior | Propinas disparam em ano de pandemia Hoje Macau - 11 Mar 2021 A partir de Setembro os alunos locais da Universidade de Macau vão ter de pagar 120 mil patacas e 150 mil patacas pelas licenciaturas com a duração de quatro e cinco anos, respectivamente. Os montantes revelados ontem em Boletim Oficial demonstram que a Universidade de Macau decidiu aumentar, em tempo de pandemia, as propinas para os residentes em 20.800 patacas e 26 mil patacas. Apesar do aumento de 20,8 mil e 26 mil patacas, a UM diz que os alunos locais que se inscreverem ou retomarem os estudos vão poder ter uma isenção fiscal no próximo ano lectivo de 2.600 patacas por semestre, que totaliza 5.200 patacas. No caso dos alunos não locais, os cursos de quatro anos passam a custar 416,8 mil patacas, enquanto as licenciaturas de cinco anos custam 521 mil patacas. Os aumentos não se limitam ao cursos da Universidade de Macau, o mesmo acontece com o Instituto de Formação Turística. Enquanto este ano os alunos locais pagavam cerca de 24 mil patacas anualmente, no próximo ano lectivo o valor sobre para cerca de 30 mil patacas. No primeiro ano do aumento, há um desconto de 6 mil patacas. No que diz respeito aos alunos do Interior, de Hong Kong e Taiwan a subida é mais acentuada, de cerca de 8 mil patacas, que assim ficam a pagar aproximadamente 50 mil patacas por ano. Finalmente, para os alunos de fora da Grande China a propina sobe quase 10 mil patacas, passa para 63 mil patacas por ano, quando actualmente é de 53.900 patacas.
Património | Instituto Cultural assegura articulação com a UNESCO Hoje Macau - 11 Mar 202112 Mar 2021 O Instituto Cultural (IC) vai aproveitar a 44.ª reunião do Comité do Património Mundial para auscultar o estado de protecção dos locais de Macau classificados como património mundial. Sublinhando que um dos principais pontos na agenda da sessão anual do Comité do Património Mundial passa por apreciar os relatórios do estado de conservação de vários itens classificados, o IC garante num comunicado divulgado ontem, que o encontro irá servir para o Comité “conhecer e dominar a situação de protecção desses locais” e “dar orientações e supervisão sobre os trabalhos de salvaguarda do património mundial”. Na mesma nota, o IC aponta ainda que, em finais de 2020, apresentou ao Comité do Património Mundial da UNESCO o “Relatório actualizado sobre o Estado de Salvaguarda do Centro Histórico de Macau”. Recorde-se que a nota do IC chega um dia depois de a Associação Novo Macau ter revelado a resposta da directora do Centro do Património Mundial da UNESCO, Mechtild Rössler sobre as preocupações levantadas pela associação relativamente ao corredor visual da Colina da Penha. A 44.ª Sessão do Comité do Património Mundial, inicialmente agendada para 2020, irá acontecer este ano em Fuzhou, na China.