Danny Leong, biólogo: “Aprendo todos os dias” Pedro Arede - 7 Jun 2021 Tem 27 anos, nasceu em Macau e foi seleccionado pela National Geographic para integrar um grupo de 15 exploradores emergentes a nível global. Biólogo e investigador, Danny Chi-Man Leong diz-se “honrado” pela nomeação e espera agora inspirar novas gerações a explorar o mundo. Ao Governo sugere uma forte aposta na área da biologia como forma de tornar Macau mais resistente ao impacto de fenómenos naturais Qual é para si a importância de integrar o grupo de exploradores da National Geographic? Este ano, apenas 15 pessoas de todo o mundo foram nomeadas para integrar a lista de exploradores emergentes da National Geographic e eu fui uma delas. É uma grande honra para mim. Tenho apenas 27 anos e não esperava que isto viesse a acontecer, até porque algumas das pessoas selecionadas para o grupo são investigadores da NASA dedicados à investigação espacial. Estou muito entusiasmado com esta oportunidade. Esperava fazer parte deste grupo? Fui escolhido para integrar a lista da National Geographic porque me consideram um exemplo para Macau e para todo o mundo. Querem que, tal como eu, haja mais estudantes e investigadores, capazes de contribuir com o seu tempo e capacidade mental para desenvolver o tópico da sustentabilidade, explorar o que está à sua volta e mudar o mundo e as pessoas. Para se ser um explorador da National Geographic é preciso ter uma ideia de como é possível mudar o mundo. A minha ideia passa pelo estudo da sustentabilidade urbana e gestão da vida selvagem. Uma forma de contribuir para esse fim é compreender melhor de que forma a urbanização e os habitats humanos têm vindo a substituir habitats naturais. No meu entender, ainda é possível aumentar os espaços verdes disponíveis nas cidades se for feita uma aposta na preservação de jardins e em planos de manutenção das espécies nativas. Por isso, ao estudar estes tópicos, o meu objectivo tem passado por contribuir para a sustentabilidade urbana e a National Geographic demonstrou admiração pelo meu trabalho, em particular ao nível da descoberta de novas espécies, pois em 2018 descobri uma espécie de formiga que só existe em Macau [Leptanilla macauensis], e do aumento do conhecimento sobre a biodiversidade. Espero, com os resultados do meu trabalho, chegar ao público. Adoraria que isso acontecesse. Sinto-me honrado por ter sido escolhido. Que tipo de apoio passa a receber da National Geographic através da nomeação? Ao fazer parte da família National Geographic, posso ter acesso a algum equipamento específico e a algum apoio. Mas isso depende dos projectos que estiver a desenvolver e, além disso, é um pouco difícil de utilizar [em Macau] os equipamentos que disponibilizam, porque estão todos em Hong Kong. Por isso, neste momento, só consigo ter algum apoio da parte deles, mas espero que o Governo de Macau apoie os investigadores e as universidades locais a fazer mais estudos ambientais e a tornar Macau numa cidade fantástica e sustentável. Qual foi a importância da descoberta da formiga endémica de Macau ao nível da investigação ambiental e biológica que é feita no território? Acho que todos nós temos vontade de investigar e descobrir coisas novas que pertencem ao sítio onde pertencemos, mas poucas pessoas dão o passo seguinte. Eu fui uma dessas pessoas que deu o passo seguinte e, da minha iniciativa, fui até diferentes cidades para prosseguir os estudos e usei o meu tempo pessoal para investigar a biodiversidade de Macau, acabando por descobri uma espécie que, até hoje, era desconhecida em todo o mundo. Por isso, encorajo a próxima geração de jovens e estudantes de Macau a pensar em formas de contribuir para a comunidade. Em Macau, como vê o panorama da investigação na área da biologia? A biodiversidade de Macau é muito rica porque se situa numa região subtropical. Além disso, é uma zona rica em recursos biológicos que tem contribuído muito, por exemplo, para áreas como a medicina tradicional chinesa. Há ainda muito trabalho pela frente. Em primeiro lugar é preciso classificar todas as espécies que existem em Macau, porque até hoje ainda não sabemos quantas espécies existem e, por isso, não é possível estabelecer campos de investigação. Sugiro que Macau invista mais em biologia e recursos biológicos, pois são áreas de investigação que oferecem um potencial elevado para se tornarem em indústrias. Inclusivamente, o presidente Xi Jingping mencionou que as paisagens verdes são até mais importantes que o ouro e o dinheiro, por isso o Governo de Macau deve encorajar a investigação ambiental por forma a alcançar o objectivo da sustentabilidade. Além disso, Macau como cidade que faz parte da Grande Baía e da China, tem a obrigação de fazer isso. De que forma a sustentabilidade pode ajudar a economia de Macau? Se não atingirmos o objectivo da sustentabilidade Macau vai perder muito dinheiro. Por exemplo, ao nível da resiliência contra fenómenos naturais extremos como a chuva intensa. Basta ver os estragos provocados pelas últimas chuvas fortes. Fizeram-nos perder muito dinheiro. Existem novos talentos em Macau na área da investigação ambiental? Estou ansioso para que apareçam novos investigadores em Macau e espero que a iniciativa da National Geographic contribua para promover as questões ambientais e de sustentabilidade em Macau e permita que Macau seja reconhecida por isso. Gostava muito que a investigação que é feita em Macau pudesse dar contributos a nível mundial. Depois de integrar a lista da National Geographic pretendo encorajar mais pessoas a explorar os seus talentos e a encontrar vias para solucionar os problemas do mundo. A partir daí, espero que se tornem, tal como eu, em exploradores e que haja cada vez mais pessoas a enveredar por este caminho. Eu sou o primeiro e espero em breve conhecer o segundo. Em termos académicos, existe oferta suficiente de cursos e planos de estudos nestas áreas em Macau? Considero que ao nível da educação ambiental, ciências ambientais e investigação de recursos biológicos não existe oferta suficiente. Por isso, espero que o Governo desenvolva programas relacionados com as ciências ambientais e a investigação de recursos biológicos para colmatar esta questão, porque o caminho para tornar Macau numa cidade sustentável passa por aqui. Além disso, uma maior aposta nestas áreas pode ajudar Macau a atingir as metas traçadas pela ONU ao nível da conservação da diversidade biológica. Como começou o seu interesse pelas ciências e pelo ambiente? O meu sonho é conseguir fazer ligações entre pessoas e natureza, porque actualmente esse elo de ligação com a vida selvagem está partido. Em grande parte, a culpa disso estar a acontecer neste momento está relacionada com a pandemia de covid-19. As consequências podem ser vistas em todo o mundo e, por isso, mais do que nunca, tenho essa vontade de contribuir para que se retome essa ligação. Mas, antes disso, já me tinha apercebido que existia um grande problema e, por isso, decidi estudar a biodiversidade em contexto urbano, o que me levou ir para Macau para perceber o quão bonita cada uma das criaturas que há em Macau pode ser e a questionar-me se não existiriam novas espécies por descobrir. Agora não estudo só a biodiversidade, mas também a sustentabilidade urbana e a gestão da vida selvagem, com o objectivo concreto de explorar que políticas são adequadas para tornar Macau num sítio melhor e relevante nestas matérias, não só na Grande Baía, mas também a nível global. Aprendo todos os dias e espero que a minha história possa inspirar mais jovens.
Covid-19 | Província de Guangdong detecta sete casos locais em 24 horas Hoje Macau - 6 Jun 2021 A província chinesa de Guangdong detectou sete casos locais de covid-19 nas últimas 24 horas, anunciou hoje a Comissão de Saúde da China. Guangdong detetou dezenas de infeções locais desde 21 de maio passado, situação que levou as autoridades locais a impor, esta semana, restrições à circulação interna de pessoas, ao ditar que quem quiser sair da província deve fazer um teste à covid-19, e a isolar bairros inteiros em Cantão. Pelo menos 180 mil pessoas estão em isolamento domiciliário em Cantão, de acordo com o Centro de Prevenção e Controlo de Doenças. A China registou ainda 23 casos, entre viajantes oriundos do exterior, nas cidades de Xangai (leste), Pequim (norte) e Tianjin (norte) e nas províncias de Guangdong (sudeste), Yunnan (sudoeste), Jiangsu (leste), Zhejiang (sudeste), Fujian (sudeste), Sichuan (centro) e Shaanxi (centro). As autoridades sanitárias também indicaram terem detetado 18 infeções assintomáticas, três por contágio local em Guangdong e as restantes importadas, embora Pequim não as inclua como casos confirmados, a menos que manifestem sintomas. A Comissão de Saúde da China adiantou que o número total de casos ativos é de 392, entre os quais dez em estado grave. Desde o início da pandemia de covid-19, o país registou 91.248 casos e 4.636 mortos.
Do vinho à cortiça, empresários chineses apostam em produtos típicos de Portugal Hoje Macau - 6 Jun 2021 Reportagem de João Pimenta, da agência Lusa Em Pequim ou Xangai, do vinho da Madeira à cortiça, pequenos e médios empresários chineses estão a apostar em produtos típicos portugueses, atestando a crescente sofisticação e cosmopolitismo da emergente classe média urbana da China. No complexo de torres envidraçadas Chaowai SOHO, situado no distrito financeiro da capital chinesa, a recentemente inaugurada Madeira Home (“Casa da Madeira”, em português), ostenta milhares de garrafas de vinho da Madeira, algumas datadas de finais do século XIX. “Estávamos em busca de algo perdurável e que pudesse até ser herdado pela próxima geração”, explica à agência Lusa a dona do estabelecimento, Zhang Ruoxi. Zhang, que gere há dez anos anos, em conjunto com o pai, uma empresa de importação de vinho, tinha “dificuldade” em promover produtos devido às suas “características homogéneas”, com “sabores e vinícolas com identidades semelhantes”. No vinho Madeira, porém, encontrou a “exclusividade” de um “sabor e legado únicos”: a “longevidade” da produção vinícola, com garrafas armazenadas há mais de cem anos, aliada ao espírito de “aventura e exploração” da Era dos Descobrimentos portuguesa. “O vinho passa de geração em geração: tem um caráter familiar”, explica. “Isso é algo que valorizamos muito”. Retratos de navegadores portugueses, incluindo Vasco da Gama e João Gonçalves Zarco, o primeiro administrador do arquipélago da Madeira, e painéis de azulejos importados de Portugal, atribuem genuinidade ao estabelecimento. Embora apenas cerca de 3% da população chinesa beba regularmente vinho, a China é já o quinto maior mercado do mundo, devido à sua dimensão populacional – 1,4 mil milhões de habitantes. “As pessoas estão cada vez mais interessadas em experimentar novos tipos de vinho. Em Pequim ou Xangai, todas as noites os jovens saem para beber um copo”, observa Zhang. No espaço de uma década, a China construiu a maior rede ferroviária de alta velocidade do mundo, mais de oitenta aeroportos ou dezenas de cidades de raiz, alargando a classe média chinesa em centenas de milhões de pessoas. O país asiático tornou-se o maior emissor de turistas e o maior mercado para marcas de luxo do mundo. As duas realidades confundem-se: os cerca de 170 milhões de chineses que viajaram para o exterior, em 2019, representaram mais de um terço de todas as vendas globais de bens de luxo, segundo analistas. Em Xangai, Li Shuhua inaugurou, no ano passado, uma loja dedicada exclusivamente a produtos em cortiça importada de Portugal, após quase 20 anos a trabalhar com aquela matéria-prima como material complementar no calçado ou canas de pesca. “Um material tão bom era usado apenas como complemento, foi então que pensamos: por que não utilizá-lo como material principal”, conta à agência Lusa. A marca, designada Kaoge, uma conversão fonética para chinês da palavra inglesa cork (“cortiça”, em português), fabrica e comercializa sapatos, carteiras, bolsas, malas ou chapéus em cortiça. Huang Xiaomian, o designer da marca, aponta a cortiça como paradigma da economia circular, numa altura em que o ambiente ocupa um lugar cada vez mais importante para os governos e consumidores. “Se não nos importamos com o meio ambiente hoje, estamos a degradar o ambiente para os nossos filhos”, aponta. “Tudo é um ciclo”. O designer chinês refere uma “consciencialização cada vez maior sobre a importância da sustentabilidade na indústria têxtil chinesa”, onde “novos regulamentos estão a ditar a transição para material renovável”. As trocas comerciais entre a China e Portugal aumentaram 4,82% em 2020, em relação ao ano anterior, segundo dados das alfândegas chinesas. Pequim importou mais 19,6%, ou o equivalente a 2,3 mil milhões de euros, face a 2019.
Benefícios económicos e pegadas ecológicas João Romão - 5 Jun 20215 Jun 2021 O turismo de negócios é normalmente visto como um dos segmentos mais interessantes para qualquer destino turístico: são normalmente pessoas com gastos bem acima da média, que ficam por pouco tempo mas geram maiores benefícios económicos, quer porque os seus rendimentos pessoais não os obrigam a grandes restrições e até lhes permitem eventuais extravagâncias, quer porque, na maior parte dos casos, as despesas são larga ou totalmente cobertas pelas organizações que representam. São turistas com pouco tempo mas com acelerado consumo, o que frequentemente envolve restaurantes de gabarito e até permite mobilizar um conjunto de serviços com relativa sofisticação para oferecer programas de visita de curta duração e alta qualidade e conforto para quem tem oportunidade mas pouco tempo para explorar alguns dos encantos de um território pouco ou nada conhecido. Essa desproporção entre a o dinheiro e o tempo disponíveis tem outra consequência, no entanto: são viajantes sem tempo a perder, em correrias sucessivas para cumprir as tarefas profissionais, seja uma reunião para concretizar uma parceria estratégica para o desenvolvimento de novas áreas internacionais de negócio, uma feira de promoção turística, uma operação imobiliária, um encontro com jovens criadores, o patrocínio de um festival de verão ou a apresentação de uma comunicação numa conferência. Há sempre pouco tempo para as tarefas e ainda menos para explorar novos destinos ou as últimas novidades em territórios já conhecidos. Tudo corre com uma urgência que requer rapidez e flexibilidade, aparentemente tidas como incompatíveis com a programação colectiva dos transportes públicos e a inerente rigidez relativa de ritmos e horários. Foi essa a principal conclusão de um estudo ainda fresco, publicado esta semana no Journal of Transport Geography, em que explorámos potenciais relações entre as características sócio-demográficas dos turistas, as suas motivações para a visita, as respectivas opções de transporte e a satisfação que tiveram ou não com a experiência turística. O estudo foi conduzido em Barcelona, cidade com um vasto e bem organizado sistema de transportes público, que garante acessibilidade relativamente fácil a todas as zonas urbanas – ou pelo menos às zonas normalmente frequentadas pelos turistas, incluindo os que viajam por motivos profissionais. Informação abundante, de fácil identificação e interpretação, disponível em várias línguas, ajuda a ultrapassar as possíveis barreiras de comunicação frequentemente associadas à dificuldade de utilização de transportes públicos por turistas. Nestas circunstâncias – em que se dispõe de uma satisfatória rede de transportes públicos sem significativos problemas de linguagem e comunicação – observámos que as diferentes características dos turistas (idade, sexo ou nível de educação, entre outras variáveis) pouco influenciam a escolha dos modos de transporte (ainda que os turistas mais jovens tendam a preferir transportes colectivos, até por restrições financeiras). No entanto, o factor que se revelou mais determinante nessa escolha foi o motivo da viagem, com os turistas motivados pelo lazer ou pela visita a familiares e amigos a revelar clara preferência por transportes públicos, em contraste com a preferência por transporte individual (taxis, sobretudo) revelada pelos visitantes cuja presença em Barcelona se deve a motivos profissionais. Na realidade, o estudo mostrou ainda que também os turistas com motivação profissional tendem a preferir transportes colectivos quando a visita se torna mais longa e é combinada com lazer ou visitas a familiares e amigos. Também se demonstra com clareza que a utilização de transportes públicos, não só não diminui a satisfação com a visita, como é um dos factores que mais contribui para uma apreciação global positiva da cidade de Barcelona. A questão dos transportes é, evidentemente, um aspecto central no futuro do turismo, tendo em conta o respectivo impacto nas emissões de CO2 e inerentes implicações sobre as alterações climáticas em curso. Em estudo recente publicado pela Organização Mundial de Turismo e pelo Forum Internacional de Transportes, estimava-se em 5% o contributo do turismo para o total de emissões de CO2 provocadas por acção humana. Para essas emissões contribuem sobretudo o transporte aéreo (40%) e o transporte por automóvel (32%), sendo de apenas 3% o contributo de todas as outras formas de transporte (incluindo comboios, barcos ou autocarros). Se a redução drástica do turismo internacional e do transporte aéreo parecem a única alternativa razoável para tentar compatibilizar o futuro do turismo com uma resposta efectiva às alterações climáticas, a substituição do transporte em automóvel por transportes colectivos parece ter semelhante importância e urgência nos processos de mobilidade no interior de cada destino turístico. O obstáculo a esta transformação, sugere o nosso estudo, são os atarefados e apressados turistas com afazeres profissionais, o único grupo com preferência inequívoca pelo táxi. São turistas que pelo seu poder de compra proporcionam maior impacto económico, mas que também deixam nas paisagens marca mais pesada da sua pegada ecológica, com acumulação intensiva de emissões de CO2 relacionadas com aviões, primeiro, e automóveis privados, depois. Está por conseguir, mais uma vez, melhor equilíbrio nesta relação entre benefício económico impactos sobre o ambiente. Não deixa de ser relevante, já agora, que neste grupo de turistas nos encontremos também nós, investigadores mais ou menos preocupados com estas questões, quando participamos nas conferências e congressos de que não gostamos de abdicar. Concluo com uma curiosidade relevante: porque motivo um investigador japonês radicado no Japão e uma investigadora chinesa a trabalhar na Coreia se dedicam a estudar a cidade de Barcelona? É uma razão prática, sobretudo: em Barcelona é entendido que toda a informação obtida com financiamento público deve estar acessível ao público. Assim sendo, estão online e com acesso livre todos os dados recolhidos nos inquéritos regulares que a Câmara de Barcelona faz a turistas e residentes. É verdade que há poucas cidades onde um estudo destes possa ser feito – com quantidade significativa de turistas e uma rede de transportes públicos eficaz e sem grandes barreiras de comunicação – mas esta é a única que disponibiliza gratuitamente os dados necessários a um estudo deste género.
Plano Director VIII – Dos momentos históricos e da ideologia Hoje Macau - 5 Jun 2021 Por Mário Duarte Duque O espaço urbano demarca-se do espaço natural pela artificialidade, mesmo quando proliferam elementos naturais nas cidades. Por isso, as cidades nunca poderiam ser ingénuas. Só a natureza é ingénua, pois não avalia, não reflecte, não planeia os seus actos. Produ-los automaticamente. Em expressão disso, Kostof tipificou as cidades quanto ao seu método de génese por cósmicas, práticas e orgânicas. A cidade orgânica é uma cidade coesa e indivisível. Comporta-se mais como um organismo contínuo do que como uma máquina com componentes especializadas. Depende de uma dimensão ideal e tem interacções próprias que lhe permite de imediato ajustar-se à mudança. Fa-lo mais por via de uma “consciência própria” do que por via de intervenção instrumental. Admite-se que Macau se tenha desenvolvido e caracterizado nesta categoria. A cidade prática é a cidade a que recorre a instrumentalização para se manter factual e funcional, e depende recorrentemente da actualização dessa instrumentalização para lidar com a intensificação e com a mudança. É feita de componentes especializadas e autónomas, como se de uma máquina se tratasse. A falta de sincronia gera necessariamente disfuncionalidade. De todas as categorias, Kostof designou a cidade prática a menos “mágica”, que podemos também interpretar como a menos rica em deslumbramento. Admite-se que em Macau já se tenha extinguido qualquer viabilidade de uma cidade orgânica, e que o modelo necessário lançar mão para resolver o ordenamento urbano da RAEM seja necessariamente o da cidade prática. Todavia, dessa constatação resultam duas condições complexas. Desenvolver novos instrumentos directores de ordenamento territorial e, simultaneamente, mudar o paradigma da génese urbana. A equação não parece fácil numa cidade onde pesam atributos históricos. A cidade cósmica é a cidade ideal. Pauta-se por um diagrama ou um traçado que traduz uma interpretação do universo, onde os atributos podem ascender a um sentido de divino ou de verdade absoluta, muitas vezes articulado com a expressão do poder. Os modelos conhecidos no ocidente foram de apreensão racional, por via de uma grelha que regula todas as hierarquias espaciais e sociais, ou foram de apreensão sensorial recorrendo a eixos visuais e a impressionantes cenários urbanos onde o observador é um participante nessa teatralização. São estas as cidades onde o ordenamento territorial é mais marcado por um “texto” função de uma ideologia sobrejacente, e que é explícita. A título de exemplo, foi assim que as três vias do tridente que representa os três poderes da soberania, concentram-se à entrada do palácio de Versailles, e fácil é perceber em quem todos esses poderes convergiam à data. Mas em Washington DC o mesmo tridente já se concentra numa praça pública, e apenas numa das três vias o edifício do Capitólio tem a sua posição. Como também a abertura da Av. Almeida Ribeiro em Macau se pautou por um momento histórico e por ideologia sobrejacente. A mesma configuração urbana pode ainda ser simultaneamente expressão de um texto diferente a que chamamos “subtexto” quando, noutro plano de leitura, expressa ainda outro discurso cuja interpretação já é mais estrita. Exemplo disso é a Baixa Pombalina onde, a par de um modelo racional de índole iluminista e classista, configura um altar maçónico, porque também era esse o pensamento místico dos que aí intervieram Muitos planos de ordenamento territorial também emergiram de efectivos ou de eminentes cataclismos geográficos ou sociais que acabaram por servir a afirmação de já existentes ou novos status quo. Desastres naturais e convulsões sociais foram recorrentemente origem catalisadora para a reconstrução aperfeiçoada das cidades, nomeadamente com iniciativas ambiciosas e oportunidade exibir o prestígio das cidades e dos protagonistas dessas transformações. Muitas das linhas orientadoras dessas medidas são resultado de situações de exaustão, de risco, ou mesmo de colapso. São medidas que em muitas frentes se configuram em sentido de “defesa”, fosse qual fosse o efectivo “agressor”, assim como em sentido de “eficiência”. Foi assim que as cidades se especializaram em determinadas aptidões. Cidades fluviais desenvolveram conhecimento em hidrologia para fazer face a recorrentes inundações, Lisboa desenvolveu estruturas resistentes a tremores de terra, e Singapura especializou-se numa política de integração étnica, garantindo que a ocupação de cada conjunto habitacional tenha uma correspondência étnica equiparável à média nacional, pois foi esse equilíbrio que esteve na génese da separação de Singapura da Malásia. Mas também se conhece exemplos do contrário, como foi o caso de Londres, e importa conhecer as razões. Apesar de se terem configurado desenhos inovadores de grande escala para a reconstrução da cidade após o Grande Incêndio em 1666, nenhum prosseguiu. A razão atribui-se à dificuldade em reconfigurar direitos sobre o solo. No entanto, foram feitas melhorias na cidade, nomeadamente na higiene e segurança contra incêndios, com ruas mais largas, construção de pedra e acessos ao Rio. O mesmo não foi impedimento para que o conhecimento não fosse desenvolvido e viesse a ter utilidade, como efectivamente teve para o estabelecimento e apetrechamento de cidades na América do Norte. Chegados aqui é legítima a expectativa que o Plano Director de Macau seja particularmente forte nas vertentes que são as principais preocupações da RAEM e, nesse sentido, desenvolva aptidões acrescidas, que desde logo se afiguram serem o saneamento urbano em condições hidrológicas adversas, assim como a habitação e a pressão imobiliária. O que se delinear na vertentes de transportes será em função e em articulação com essas decisões. Como é igualmente legítima a espectativa de que o pensamento sobrejacente não seja ingénuo e, por isso, as soluções nas vertentes mais importantes não devem ser triviais. A Proposta de Plano Director pra a RAEM não produziu um “texto” relevante de uma posição ideológica que deve caracterizar o futuro ordenamento territorial, pelo que não é exercício inútil especular sobre possíveis “subtextos”. Daí é possível extrair que as orlas da RAEM são objecto de mais definição e intervenção, nomeadamente em circulação viária, do que as zonas mais interiores, seja qual for o actual nível de consolidação. É pela orla do território que será feita a integração definitiva da RAEM no território continental da RPC, como é também esse o alcance temporal do Plano Director. Por isso, não faz sentido que tal integração não seja um ponto forte, senão o mais forte, do “texto” da Proposta de Plano Director, ou que isso se deva extrair de um “subtexto”, sendo que “subtextos” são frequentemente discursos secretos ou enigmáticos. Assim, trazer esse “texto” à luz do Plano, permitiria estabelecer linhas orientadoras para definir funcionalmente e paisagisticamente essas frentes de integração do território, mesmo quando o ponto de partida ainda só seja a rede viária. Em verdade, mesmo projectando uma estrada regional ponderam-se as opções de traçado que, para além da sua utilidade, tornam a viagem mais aprazível. Sobrejacente ao acto de ordenar o espaço está, ou deve estar, o pensamento que comanda as regras por que um plano urbanístico se pauta, e que, necessariamente, é reflexo do ordenamento social existente ou em vista. É por isso impossível interpretar a paisagem urbana à margem de uma narrativa política ou do pensamento no momento histórico. Do mesmo modo que também é impossível não concluir pela ausência de narrativa, quando estamos perante algo ingénuo. Por isso, a interpretação na vertente ideológica poderá posicionar-nos diferentemente na apreciação de um plano de ordenamento territorial. Mas já nos colocamos solidariamente na mesma posição perante tudo o que se nos apresenta ingénuo, trivial, ou que não releve em discurso urbano.
Golos políticos Sara F. Costa - 5 Jun 2021 Ele está em todo o lado e é todo-poderoso. São milhares de seguidores em histeria colectiva nas ruas e outros tantos em histeria privada nos seus sofás. São ligas e taças nacionais, ligas e taças europeias, são os festejos da Champions e vem aí o Euro! Homens a baterem em mesas de cafés com a saliva a escorrer-lhes pelas mãos. A soltar uivos selvagens quando o seu clube atira a bola para dentro da rede. Os grupos de ingleses bêbados a sorrirem de forma animalesca para as câmaras de televisão, a destruirem esplanadas inteiras. Quando um fenómeno colectivo não nos diz pessoalmente muito, é inevitável achá-lo irritante. E eis que a sua origem milenar, como tantas origens milenares deste mundo, é chinesa. De acordo com a FIFA, o Futebol nasceu na China da Dinastia Han e deriva do Cuju, um antigo jogo de bola chinês. Na Europa, chegou a incomodar Eduardo II de Inglaterra que teve que impor restrições à prática do futebol em 1300 para que os seus soldados parassem se de dedicar à bola e treinassem mais tiro com arco, bem mais útil militarmente. Mas o desporto tem esta faceta da união, dentro da sua rivalidade. A União Europeia antes de ser uma aliança militar ou entidade económica deveria ser, de acordo com Robert Schuman, ministro dos Negócios Estrangeiros francês e arquiteto do projeto de integração europeia, uma comunidade cultural. As identidades culturais costumam formar-se em torno da literatura, do cinema ou da música. Contudo, o factor da diferença linguística torna-se neste caso um divisor irremediável. Então os sociólogos voltaram-se para o desporto eleito e para a forma como este se tornou um valor transnacional, capaz de fazer com que os povos exercessem assim, de forma mais pacífica, o seu nacionalismo, a exibição da sua identidade colectiva, o depósito na competição desportiva de uma intrínseca necessidade humana de pertença. Foi assim criada a UEFA e a atual Champions League. Jogos que cruzam o leste e o ocidente, uma expansão progressiva do espaço europeu onde se incluem países como a Islândia, a Turquia ou o Azerbaijão. É preciso acabar com a narrativa ingénua que separa completamente o futebol da política porque, se por um lado o futebol transcende a política, ele também lhe pertence. Na ultima década temos assistido à crescente desigualdade entre clubes que se baseia, puramente, na crescente desigualdade económica. O futebol é também espelho do que se passa no resto da sociedade. Corrupção, evasão fiscal, lavagem de dinheiro, tráfico humano, crime organizado. Este espaço de integração que devia pertencer ao colectivo é também refém de interesses privados e políticos. Na Turquia, com o aproveitamento partidário de Erdogan. Na Hungria, onde Viktor Orban decidiu fazer um movimento para tornar o futebol húngaro “Great Again” e reforçar severas leis anti-imigração. Nas máfias conhecidas cá da terra. Se por um lado, o futebol é união e manifestação de identidade coletiva, ele também é manipulação e fator de exclusão. Durante o período da revolução industrial, quando as mulheres começaram a exercer trabalhos nas fábricas até ali só exercidos por homens, tornou-se comum ver grupos de mulheres a jogarem futebol. Mas a Associação de Futebol considerou que o jogo, aos pés das mulheres, era incongruente e baniu-o até 1971. Hoje, podemos dizer que as coisas estão mais equilibradas. Sim, estão “mais equilibradas” mas ainda não realmente equilibradas. É inevitável associar o desporto ao género masculino e é essa exclusão estrutural que faz com que me sinta alienada. São grupos de homens a entregarem-se às causas dos seus clubes, de corpo e alma. E eu talvez um dia alcance a pureza de me preocupar mesmo com uma bola a entrar numa rede mas, por enquanto, agradecia que pudéssemos falar de outras coisas.
Culpa ensolarada Valério Romão - 5 Jun 2021 Lembro-me perfeitamente da primeira vez que senti um ataque de pânico. Tinha acabado de subir os três andares do prédio da minha namorada e na parte comum do andar desenhava-se uma espécie de óculo oval que dava para ao exterior. Lembro-me de me encostar ao pequeno muro e olhar pelo vão, lá para baixo, fixamente, e de me ocorrer a ideia de que afinal talvez fosse melhor estar morto do que estar vivo. Desatei num pranto, solucei, tive a sensação de, como um peixe, me estar a afogar em terra. Um ataque de pânico é como ter a morte a bater à porta; quando finalmente atendemos, não está lá ninguém. Nos dias seguintes fiz uma espécie de curso intensivo da doença mental. Na minha família toda a gente tem uma componente ansiogénica e depressiva acentuada. Cada um deles, da minha mãe às minhas irmãs, se apressou a dar-me dicas de como controlar a respiração, de o que fazer acaso o fenómeno ocorresse no trabalho ou nas aulas (eu tinha, à altura, dezoito anos), de o que tomar e como. Cada um deles me trazia, em segredo, na concha da mão, uma lamela da sua droga preferida e indicações passadas em surdina: «quando isso começar a dar-te, metes dois destes debaixo da língua, corres para a casa de banho e encharcas o rosto em água até ficares mais calmo». Senti-me como se tivesse nascido para aquela família pela segunda vez. Ou como numa espécie de crisma para maluquinhos. Pese a boa vontade de todos eles, a coisa não melhorou muito. Eu, que tinha assistido boa parte da minha vida ao deglutir desesperado das minhas irmãs e mãe de todo o tipo de calmantes e antidepressivos sem grandes melhorias evidentes, estava céptico em relação aos benefícios reais da medicação. Os psiquiatras e psicólogos também não eram figuras pelas quais nutrisse grande estima. Enfim, para além da solidão em que um sujeito se enfia quando se descobre diferente (seja que diferença for) acrescentava-se ainda a desconfiança em relação à eficácia ou bondade de tudo quanto de algum modo podia mitigar essa diferença ou a solidão que dela decorria. A minha namorada pouca paciência teve para os meus achaques (tinha também dezoito anos, não estava propriamente preparada ou motivada para uma temporada de enfermagem na ala psiquiátrica – mais a mais, era Verão). Acabei por ir tomando umas coisas ao sabor dos sintomas, sem compromisso. Quando estava mais instável, tomava. Quando me sentia melhor, deixava, até porque me apetecia beber uns copos e tinha medo de que a mistura de álcool e antidepressivos me arranjasse uma vaga no hospital psiquiátrico de Faro para fazer parte da exposição permanente. Só comecei a melhorar quando levei a coisa com a seriedade que esta merecia. Quando tomei os comprimidos a tempo e horas e confiei o suficiente num médico para respeitar o diagnóstico traçado e terapêutica proposta. Tem sido um carrossel com o qual me tenho habituado – cada vez melhor – a viver. Passados muitos anos sobre aquele garoto efemeramente suicida, percebo que o que realmente me afligiu naquele Verão atípico foi ter entrado nele em contraciclo disposicional. Explico-me: eu não tinha qualquer razão para estar deprimido; pelo contrário. Apaixonara-me recentemente, era correspondido e eu e ela andávamos de scooter a desbravar praias nos dias em que não trabalhávamos e a torrar o dinheiro das gorjetas em jantares opíparos. Não é possível – ou permitido – ser infeliz nesta situação, pensava eu, quanto mais deprimido. Eu próprio não tinha – não tive – grande paciência para os achaques daquele rapaz. De cada vez que hoje em dia me sinto mais chocho naqueles dias de Primavera em que o mundo parece novamente fazer sentido, penso naquele garoto assustado, a sentir-se culpado por ser diferente, por não corresponder ao que dele esperavam, por não saber sequer aproveitar a bonança da natureza e saber ser feliz. Penso nele e vingo-me com um dia cinzentão na cama, a mandar foder aquela gente toda que, à altura, não soube ou não quis fazer melhor. Eu incluído.
Despesa pública continua a subir, receita de impostos a cair Hoje Macau - 4 Jun 2021 A despesa pública em Macau continua a subir e a receita a cair, indicaram os últimos dados divulgados na quarta-feira pela Direcção dos Serviços de Finanças (DSF). Entre Janeiro e Abril, a receita corrente foi de pouco mais de 17,3 mil milhões de patacas, contra os 24,1 mil milhões de patacas de 2020, um ano económico que afectou fortemente o território devido à pandemia da covid-19. Desta receita corrente, o Governo arrecadou 12,4 mil milhões de patacas em impostos sobre o jogo, de acordo com o relatório da execução orçamental datado desta quarta-feira. Ou seja, menos 39,6 por cento em relação ao ano anterior, quando foram arrecadadas 20,5 mil milhões de patacas. Também de acordo com os dados da DSF, nos primeiros quatro meses do ano, Macau recolheu 27 por cento da receita projectada para este ano. Se a receita desceu, a despesa pública subiu. Isto porque este ano a despesa até Abril foi de 26,6 mil milhões de patacas, contra as 23,4 mil milhões de patacas registadas no ano anterior. Também a despesa corrente aumentou de 21,5 mil milhões de patacas em 2020 para 23,2 mil milhões de patacas este ano. Ao ritmo da pandemia Desde final de Janeiro de 2020, a pandemia teve um impacto sem precedentes no motor da economia de Macau, ou seja, o sector do jogo, com os impostos sobre as receitas desta indústria a financiarem a esmagadora maioria do orçamento governamental. Com o aumento de visitantes da China continental, começaram a melhorar este ano os resultados dos casinos, que registaram um recorde de receitas já em Maio, mas ainda assim longe dos montantes arrecadados no período pré-pandémico. Recorde-se que em Maio de 2021, os casinos de Macau registaram receitas de recorde desde o início da pandemia, tendo aumentado para 10.445 milhões de patacas, ou seja, mais 492,2 por cento em relação a 2020. Ainda assim, o valor representa apenas um terço do montante arrecadado pelos casinos em 2019, indicaram dados divulgados na terça-feira pela Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ). Desde o início de 2020 que os orçamentos do Governo de Macau têm sido marcados por sucessivas alterações e por pacotes de estímulo dirigidos às pequenas e médias empresas, à população em geral e ao consumo.
10 Marias | Associação recria ambiente burlesco em festa num barco João Santos Filipe - 4 Jun 2021 A Associação Cultural 10 Marias vai animar a noite de sábado com o evento “Barco do Amor”. No Rio das Pérolas, 13 artistas e 250 participantes são convidados a vestirem-se a rigor para o cabaré, partilhar os seus alter egos e criar “um mundo mágico de fantasia, brilhos e arte” A Associação Cultural 10 Marias vai embarcar 250 pessoas e levá-las a vivenciar o ambiente burlesco de um cabaré. A iniciativa com o nome Love Boat (Barco do Amor) está agendada para este sábado e além do espectáculo com a duração de uma hora e quinze minutos, as pessoas vão ainda ter a oportunidade de apreciar a costa de Macau do Porto Interior até à Ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau e assistir a um DJ Set. Através de artistas que apresentam diferentes trabalhos, que vão da música ao texto, o público é transportado para “um mundo mágico de fantasia, brilhos e arte”. “Nós lançamos um tema, depois convidámos vários artistas de todas as nacionalidades para virem fazer diferentes performances, como texto, música, o que quiserem, dentro do tema. Cada um interpreta como quer”, explicou, ao HM, Mónica Coteriano, uma das organizadoras. Este ano o amor volta a ser o tema principal, tal como tinha sido em 2018, a última vez em que a associação promoveu uma iniciativa também com um ambiente de cabaré. “Os nossos eventos são sempre organizados à volta do amor. O evento de 2018 era Sunday of Love, porque era de sábado para domingo”, justificou a membro da organização. “Como este evento é num barco, faz sentido chamar-se Love Boat”, acrescentou. Durante uma noite, os artistas têm liberdade para fazer diferentes interpretações: “Apesar de o tema ser o amor, as pessoas não têm de apresentar uma visão ‘muito bonita’, podem ter um rasgo e passar uma ideia oposta sobre o amor”, indicou. Mundo de alter egos A experiência não se limita ao espectáculo, aos artistas é pedido que se mantenham nas personagens durante toda a duração da iniciativa. “Cada um arranja a sua personagem e tem a liberdade para explorar os seus alter egos. Mesmo os que não tiverem nomes de alter egos, nós inventamos um nome. Porque a ideia é mesmo experimentar um formato diferente, as personagens vão criar o ambiente de cabaré e mantêm-se na personagem do princípio até ao fim”, afirmou Mónica. Para participantes não há um dress code, no entanto, os organizadores incentivam as pessoas que se sentirem bem a adoptarem igualmente personagens para a festa. “Há pessoas do público que depois entram na onda e vão vestidas com um ar mais extravagante. Não são todas porque não há um dress code, mas aconselhamos as pessoas a vestirem-se. Se as pessoas se sentirem à vontade, nós agradecemos porque contribui para o ambiente” considera. No entanto, ressalva que depende da vontade individual: “se não quiserem vestir-se a rigor não precisam, o importante é sentirem-se bem e divertirem-se”, ressalva. Evento esgotado Ainda antes de embarcar, o Love Boat já pode ser considerado um sucesso. Os 250 bilhetes disponíveis para a iniciativa estão esgotados e até houve pedidos para que houve um segundo dia de festa. Os números deixam os organizados felizes com a aceitação do evento. “Os bilhetes estão esgotados, e a participação vai ser de 250 pessoas. Estou felicíssima com a participação. Se tivéssemos um cargueiro seria melhor… ficou muita gente de fora porque não conseguiu comprar bilhete”, admite Mónica Coteriano. “Na verdade, o barco poderia levar mais gente, mas optámos por não o encher para que as pessoas se sintam mais confortáveis”, reconheceu. Segundo a organizadora, o interesse pela iniciativa deve-se a duas questões. Por um lado, a atracção de fazer uma viagem de barco pela costa de Macau, e, por outro, o sucesso da festa de 2018 no espaço da Live Music Association, em que o ambiente de cabaré foi igualmente recriado. “Quando fizemos o evento no LMA também já tínhamos lotação esgotada, mas a capacidade era mais reduzida, só 100 pessoas. Por isso, acho que o sucesso desse evento contribuiu para que as pessoas falassem sobre a iniciativa e quisessem participar”, apontou. “E claro, a viagem de barco contribui para haver mais inscrições. A experiência de haver um cabaré no barco deve ser única em Macau”, considerou. O Love Boat será realizado no barco Blue Whale com embarque previsto a partir das 21h00 até às 21h50 no Cais 14. A embarcação parte do Porto Interior, passando pela Torre de Macau e pelas margens em frente ao Grande Lisboa, MGM, Wynn, Museu de Ciências de Macau em direcção à nova Ponte de Hong Kong-Zhuhai-Macau.
Inundações | Chuva intensa faz estragos na Universidade de Macau Pedro Arede - 4 Jun 2021 Durante as chuvas intensas da passada terça-feira, começou a cair água do tecto e houve inundações, pelo menos, num dos parques de estacionamento e na cafetaria do Colégio Cheng Yu Tung da Universidade de Macau. Ao HM a UM confirmou a ocorrência de “alguns casos esporádicos” que, no entanto, não causaram “danos sérios” aos edifícios O interior de algumas instalações do campus da Universidade de Macau (UM), inaugurado em 2014, foi afectado pela intempérie registada na passada terça-feira que provocou inundações, estragos e apreensão um pouco por toda cidade. Contactado pelo HM, um aluno da UM partilhou que o parque de estacionamento localizado junto ao edifício central (E3-E7) da universidade começou a ser inundado por água durante a chuva intensa que se fez sentir. O estudante apercebeu-se da situação, ao receber uma notificação da empresa de segurança, a aconselhá-lo a remover o seu motociclo do parque porque estava a começar a ficar molhado devido à água que estava a cair dentro da estrutura. Além disso, no momento em que se preparava para ir beber café, o estudante, que optou por não se identificar, encontrou o chão da cafetaria do Colégio Cheng Yu totalmente inundado, havendo, inclusivamente, água a cair do tecto. Através de vídeos partilhados com o HM foi ainda possível observar que, para atenuar o efeito da chuva que estava a cair também dentro de portas, foram espalhados baldes e panelas pelo espaço e, dentro do possível, as instalações eléctricas colocadas a salvo. Como resultado, os electrodomésticos ficaram molhados e foram necessárias várias horas para que o espaço pudesse voltar a estar em condições de ser usado. “Quando decidi ir fazer café reparei que o chão estava inundado devido à chuva. Ao início, pensei que era porque a janela não estava fechada, mas não. Quando abri a porta para o interior da cafetaria, vi logo que estava a cair água do tecto e que alguns electrodomésticos estavam molhados”, partilhou. O estudante referiu, contudo, que o dormitório onde vive não foi afectado pela chuva, desconhecendo se outros alunos foram forçados a sair dos seus quartos devido à intempérie. Recorde-se que o novo Campus da Universidade de Macau foi inaugurado em 2014, tendo recebido no mesmo ano a visita do Presidente Xi Jingping. O ano lectivo 2014/2015 foi o primeiro em que as novas instalações abriram para receber estudantes. Muito permeável O estudante conta ainda que a situação foi semelhante à ocorrida durante a passagem do tufão Mangkhut em Setembro de 2018, altura em que os andares superiores do Colégio Cheng Yu ficaram também inundados e começou a cair água do tecto. “Demorou muito tempo a limpar tudo e a tirar a água do chão”, recorda. Quando questionado sobre o que estará por trás do facto de, apesar de recentes, várias instalações da UM serem recorrentemente afectadas aquando da ocorrência de chuva intensa ou da passagem de tufões, o estudante aponta que tal se deve à fraca qualidade de construção. “Penso que uma das razões pelas quais estas situações lamentáveis acontecem está, principalmente, ligada aos materiais de construção. Na minha opinião, a UM devia dar mais atenção à qualidade da construção pois, de outra forma, este tipo de casos irá acontecer mais vezes e a situação não melhora”, apontou. O HM contactou a UM para comentar o sucedido e confirmar as ocorrências, nomeadamente quais as razões que explicam os incidentes reportados, tendo em conta o facto de todas as estruturas do actual campus da UM serem relativamente recentes. Na resposta, a UM confirma a ocorrência de alguns “casos esporádicos”, que não causaram danos sérios. “A Universidade apenas encontrou casos esporádicos de inundações após a tempestade, sendo que todos os problemas foram resolvidos prontamente sem afectar o normal desenrolar das operações. Não foram registados danos sérios nos edifícios aos edifícios da universidade como resultado da tempestade”, pode ler-se na resposta.
Covid-19 | IPM estuda previsão de infecções com base em análises ao sangue Andreia Sofia Silva - 4 Jun 2021 Cinco investigadores do Instituto Politécnico de Macau e da Universidade de Bolonha recorreram à inteligência artificial para analisar a precisão de quatro modelos de dados com o objectivo de prever o contágio de covid-19 através de análises ao sangue. Um deles atingiu bons resultados em todas as variáveis estudadas A possibilidade de prever contágios de covid-19 através de uma simples análise ao sangue, com recurso à inteligência artificial, foi o foco do estudo desenvolvido por quatro investigadores do Instituto Politécnico de Macau (IPM), Ziyue Yu, Lihua He, Wuman Luo e Rita Tse, e da investigadora Giovanni Pau da Universidade de Bolonha e departamento de ciências computacionais de Los Angeles. Na tese de doutoramento intitulada “Deep Learning for COVID-19 Prediction based on Blood Test” é feita uma análise a quatro modelos híbridos de Deep Learning, aplicados depois a 18 dados de análises sanguíneas do Israelta Albert Einstein Hospital, no Brasil. Este trabalho foi feito, em parte, com recurso ao sistema Big Data Driven Intelligent Computing do IPM. Foram analisados quatro modelos de Deep Learning, CNN+GRU, CNN+Bi-RNN, CNN+Bi-LSTM e CNN+Bi-GRU, aplicados depois aos dados das análises ao sangue. Os investigadores compararam depois os modelos segundo a sua precisão, recolha e pontuação, entre outras variáveis, sendo que “os resultados experimentais mostram que o modelo CNN+Bi-GRU atinge a melhor performance em todas as cinco métricas”. Os investigadores assumem que este estudo visa “aliviar o pessoal de saúde do trabalho duro de testagem” e “acelerar” esse mesmo processo, tendo em conta o problema da falta de recursos humanos na área da saúde. “Até agora a inteligência artificial tem vindo a tornar-se muito importante ao nível do diagnóstico médico. No entanto, a investigação ao nível da previsão da covid-19 com base no sistema de Deep Learning está ainda numa fase preliminar”. De frisar que o sistema de Deep Learning permite configurar parâmetros sobre dados e treinar o computador para fazer sozinho a sua leitura e reconhecimento. Apoio precioso Na tese pode ler-se que “o modelo CNN+Bi-GRU irá ser um método efectivo para o diagnóstico da covid-19 com base numa análise de sangue”. “No futuro, vamos continuar a explorar modelos de Deep Learning para a previsão da covid-19 e conceber novos modelos de previsão”, apontam os autores. Actualmente, há duas formas de testar a infecção por covid-19, através da análise ao sangue e do teste de ácido nucleico. Este “é de momento o mais usado dada a sua simplicidade”, mas “a percentagem de falsos negativos atinge os 20 por cento”. Os investigadores defendem que “a performance da análise ao sangue em termos de falsos positivos e negativos, por comparação ao teste de ácido nucleico, é muito menor”. Numa publicação nas redes sociais, o IPM comentou que esta investigação representa “uma ajuda altamente efectiva e precisa na previsão da infecção da covid-19”, além de constituir “um valor prático e académico significativo que pode ser aplicado de forma abrangente na prevenção e cura desta pandemia global”. Este estudo foi distinguido na 6.ª Conferência Internacional da Internet das Coisas e Segurança de Dados, em Abril, além de ter recebido um outro prémio atribuído pelo Instituto de Sistemas e Tecnologias da Informação, Controlo e Comunicação, uma associação sem fins lucrativos sediada em Lisboa.
Eleições | Mak Soi Kun falta a apresentação de comissão de candidatura João Santos Filipe e Nunu Wu - 4 Jun 2021 O deputado eleito pela lista mais votada em 2017 foi a ausência mais notada na apresentação da comissão de candidatura para o acto eleitoral de Setembro. A exclusão de Mak não foi confirmada, mas o presidente da Associação dos Conterrâneos de Jiangmen prometeu que a lista vai ter muitas “caras novas” A lista União de Macau-Guangdong, que em 2017 elegeu os deputados Mak Soi Kun e Zheng Anting, apresentou ontem a comissão de candidatura, com o apoio de 500 residentes, o máximo permitido por lei. No entanto, a entrega dos documentos com as 500 assinaturas ficou marcada pela ausência de Mak Soi Kun, deputado e cabeça de lista nas últimas eleições. Face à ausência do deputado, Ian Soi Kun, presidente da Associação dos Conterrâneos de Jiangmen, acompanhado por Zheng Anting, ficou encarregue de prestar declarações aos jornalistas. Segundo o canal chinês da Rádio Macau, depois de entregar os documentos, Ian prometeu que a lista vencedora de 2017 vai apresentar muitas “caras novas” de vários sectores da sociedade. E será que na lista ainda há espaço para o vencedor das últimas eleições? Segundo Ian Soi Kun, a lista ainda está em aberto e só vai ser apresentada depois da comissão de candidatura ser validada. Ao HM, também o deputado Zheng Anting não quis confirmar se Mak Soi Kun vai abdicar de concorrer para fazer o quarto mandato na Assembleia Legislativa: “Não sei a razão de ele não ter comparecido. Talvez esteja ocupado com outros assuntos e por isso não tenha podido estar presente”, afirmou. Ian Soi Kun indicou ainda que a base de programa político está a ser preparada, mas que a habitação e a questão do trânsito são tidas como prioritárias. “A habitação e o trânsito são assuntos que vamos seguir com atenção, bem como o envelhecimento da população, uma vez que Macau está a tornar-se numa sociedade envelhecida e é necessário cuidar dos idosos”, apontou Ian. Ao mesmo tempo, o presidente da Associação dos Conterrâneos de Jiangmen sublinhou também que a integração na Grande Baía de Guangdong-Hong Kong-Macau e a questão da criação de mais empregos vão ser outros pontos importantes para a lista. Em 2017, a lista União de Macau-Guangdong foi a vencedora das eleições com 17.214 votos, mais 518 votos que a listas dos Operários de Macau. O resultado permitiu eleger os deputados Mak Soi Kun, deputado desde 2009, e Zheng Anting, eleito pela primeira vez em 2013.
4 de Junho | TUI nega recurso sobre realização de vigília no Leal Senado Andreia Sofia Silva e Nunu Wu - 4 Jun 20214 Jun 2021 O Tribunal de Última Instância rejeitou o recurso apresentado pela União de Macau para o Desenvolvimento da Democracia, alegando que a vigília constitui “um planeado e deliberado ataque e insulto a autoridades, entidades e instituições” de Pequim. Associação irá realizar vigília online Pelo segundo ano consecutivo a zona do Leal Senado não irá receber a vigília do 4 de Junho em memória das vítimas dos acontecimentos de Tiananmen. Isto porque o Tribunal de Última Instância (TUI) rejeitou o recurso apresentado pelo deputado Au Kam San, em nome da União de Macau para o Desenvolvimento da Democracia (UMDD), que pedia a anulação da decisão do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP), de 25 de Maio, que proibiu a realização da vigília. Segundo o acórdão, em causa estão as expressões usadas em cartazes e que constituem “um planeado e deliberado ataque e insulto a autoridades, entidades e instituições do Governo Central da República Popular da China (RPC)”. Considera o TUI que “o recurso a expressões como ‘terror’, ‘massacre’ e ‘matança’ (e outras), que pela sua própria natureza e sentido implicam, (no mínimo), a causa da morte de um grande número de pessoas com ‘crueldade e desprezo’ e com ‘intenção do seu extermínio’” e que fazem recordar “episódios negros da história da Humanidade’, (como os ocorridos em Nanjing e Auschwitz) – são, sem dúvida, inadmissíveis em qualquer espécie de evento público”. O uso destas expressões “com o claro propósito de incitar, incendiar e instigar à pública ‘oposição’, ‘combate’, ‘derrube’ e (à própria) ‘extinção’ das referidas Autoridades e Instituições, constitui, igualmente, uma conduta que ultrapassa o aceitável”. Os juízes entenderam também que este exercício do direito de reunião e manifestação “pode ‘colidir’ com o exercício de outros direitos”, podendo estar em causa um “excesso” e uma “clara e directa ‘ofensa à honra e consideração’ do seu destinatário”. “Invocar-se o direito – fundamental – à “reunião e manifestação” para cobertura (e palco) de um planeado e deliberado ataque e insulto a Autoridades, Entidades e Instituições do Governo Central da RPC, violando-se, grosseiramente, a honra, dignidade, respeito e consideração que lhes é devido, é, como se mostra óbvio, claramente inadmissível e de necessário repúdio”, acrescenta ainda o TUI. De frisar que José Dias Azedo fez uma declaração de voto apontando que “se podia avançar para uma solução no sentido de se permitir a pretendida ‘reunião/manifestação’ desde que expurgada de todos os seus ‘elementos abusivos e ofensivos’”. O CPSP entendeu, no despacho, que esta acção estaria “ferida de ilegalidade” e que seria “incompatível” com a lei de prevenção, controlo e tratamento de doenças transmissíveis, devido à pandemia. Online avança Au Kam San anunciou ontem a realização da vigília online às 20h do dia 4 de Junho num apartamento na zona da Praia Grande. O público poderá assistir ao evento no Facebook da UDDM e do gabinete dos deputados Au Kam San e Ng Kuok Cheong. O responsável disse temer não conseguir proteger os participantes. “Se a polícia acusar alguém de violar a lei, isso não tem custos, mas os participantes pagam um preço alto para provar a sua inocência. Achamos que não é apropriado os residentes arriscarem.” Foi feito um apelo para que a população “recorde [Tiananmen] de forma apropriada”. “Há pessoas que sugeriram vestir roupas pretas, ou colocar velas brancas em casa. Os pais podem procurar informações e partilhá-las com os filhos. Isso é educação cívica”, explicou. Au Kam San lembrou que, nos anos anteriores, a realização da vigília nunca constituiu uma ilegalidade e que não iria haver cartazes com as expressões referidas pelo CPSP e no acórdão do TUI. “Normalmente usamos slogans como ‘Reabilitação do movimento democrático de 1989’ e ‘Desenvolver a China democrática’”, frisou. O Governo disse que a decisão do TUI “vem confirmar que a reunião em causa viola artigos da Constituição, da Lei Básica e do Código Penal”. “O Governo da RAEM apela ao promotor em causa para dar cumprimento à decisão do TUI”, esperando que “a população reconheça a ilegalidade da actividade e o perigo que pode constituir à segurança nacional”.
Ana Jacinto Nunes, pintora e artista plástica: “Gosto da fusão da caligrafia com pintura ocidental” Andreia Sofia Silva - 4 Jun 2021 “Notícias da Floresta” é o nome da exposição de Ana Jacinto Nunes com inauguração marcada para 11 de Junho no edifício do Fórum Macau, no âmbito das celebrações do Dia de Portugal, Camões e Comunidades Portuguesas. A artista fala dos trabalhos que acabam por ser um diário do confinamento ou “um resumo dos dias”, onde se vislumbra “quase um final feliz” “Notícias da Floresta”. Porquê este nome? Isso tem sido o que temos tido. Está tudo fechado em casa e as notícias que temos é daquilo que nos é próximo, de um ecossistema grande em que tudo é importante e tudo faz parte de um todo. A notícia está a crescer, a semente brotou, a flor abriu, hoje choveu. São notícias que não interessam a ninguém, no fundo, mas que vão acontecendo. Que obras podemos ver nesta exposição? Os papéis funcionam quase como um diário, que não é gráfico no seu formato típico de apontamento, mas acaba por ser um diário. É uma escolha de desenhos que fui fazendo desde que não fui para Macau, porque a ideia inicial era fazer a quarentena aí. Há um desenho base, que é a menina e o cão, e que é alterado. Mas as telas não, são um resumo dos dias, momentos. Nas telas acaba por haver um final em que já se está mais descontraído. Apareceu o sol. Há quase um final feliz. À semelhança de uma exposição que tem patente em Grândola, Portugal, também pintou muito o que estava à sua volta, ao invés de um tema em específico? Sim. O tema específico talvez seja aquilo que me rodeia. Não tenho uns óculos de mergulho em casa, não desenho à vista, nunca. Parte tudo muito do meu imaginário, que é feito daquilo que vou vivendo. Há obras da exposição de Grândola nesta mostra, ou pelo menos que transmitam uma mensagem semelhante? Sendo eu a mesma artista há um fundo que é sempre o mesmo. Tenho estado cada vez mais preocupada com a situação das mulheres na pintura. Talvez isso esteja mais assumido, mas não sei muito bem como. Porquê? É óbvio que as mulheres estão menos representadas em todas as áreas. Se perguntarmos, a alguém fora de Portugal, quantas mulheres pintoras conhece, de certeza que são muito poucas. Temos a Paula Rêgo, a Lurdes de Castro. E as mulheres vendem a sua arte mais barata do que os homens. Como é que através do seu trabalho chama a atenção para isso? Quando pinto não chamo a atenção. Eu faço mais citações ou mais declarações. Não digo “agora vou fazer uma mulher debaixo da mão de um homem”. Mas se calhar a falta de expressão, o ter sempre o mesmo olhar, um olhar apático e incrédulo. O ter sempre uma mulher ou menina que olha para ti. Os bichos podem ser machos, mas a figura principal é sempre uma mulher. Mas esta exposição em Macau tem uma grande mistura. A forma de pintar, o pincel, o gesto. Nos últimos tempos tenho vindo a juntar o que procurava fazer no meu trabalho de antigamente, junto a expressividade da pincelada mais oriental. Na minha cabeça é um bocadinho como a caligrafia, tenho vindo a fazer isso. Não sei se é muito evidente nesta exposição. Já fiz trabalhos para aí muito dentro deste perceber que gosto de misturar os materiais daí com os de cá e fazer uma fusão entre a caligrafia e a pintura ocidental. Gosta de trabalhar com vários materiais, de ir experimentando? Gosto muito. Lá em cima [em casa] está tudo sujo, com óleos, e venho cá para baixo e posso desenhar. Depois tenho a garagem onde tenho a prensa, o material todo para fazer gravura. É perfeccionista, alguém que quando aprende uma coisa nova quer ir ao detalhe? Não. Nem pensar. Demora-se uma vida a ser meramente bom no que fazemos. Ter aspirações a fazer uma coisa perfeitinha é um trabalho. Na gravura sim. Não consegues fazer uma edição sem saber fazer aquilo na perfeição. Tudo vem de há muito tempo. O trabalho, aquilo que vou vendo e pensando, e lendo também, vai tudo para o trabalho. Desde há muito tempo que trabalho sozinha. Na gravura temos 90 por cento de trabalho e cinco por cento de criatividade. É um trabalho técnico e muito maior do que o criativo. Mas também gosto desse trabalho. Não gosto nada do trabalho esporádico, mas gosto do de continuidade. Os animais estão sempre muito presentes nas suas obras. [Na exposição de Grândola] há de facto muitos gansos, já os desenho há muito tempo. Se calhar tem a ver com a ida ao parque com os miúdos, não faço ideia. Mas na Gulbenkian eu fugia dos gansos. Em miúda lembro-me de ver um bando de gansos a fazer barulho, e eu adorava aquilo. Na minha cabeça tem a ver com uma antiguidade. [O meu trabalho é] o que acontece dentro de nós, à nossa volta, o que está em casa. E não interessa quando vou ver um concerto à Gulbenkian. Interessa-me todos os dias, se há pão ou não. E não é político o que estou a dizer. Há mesmo pão? O lado prático da questão, sem ideologia. Prático é uma expressão que eu não uso porque não sou nada prática. É desorganizada quando está a criar? Completamente. E quanto mais em pânico estou, e próxima de uma exposição fico, fica tudo um caos, como a minha cabeça. É preciso fazer e vai tudo à frente. Com os miúdos é: o que querem comer, tratem do assunto, tragam comida. Eles aturam… a Clara neste momento tem uma tela enorme que eu coloquei no quarto dela. Há três dias estava uma desorganização e eu não estava a gostar, aquilo não fazia sentido e queria aqueles quadros lá, mas… e sozinha à noite é que andei com os quadros de um lado para o outro. Eu sei o que está na minha cabeça mas se calhar não o sei dizer muito bem, se calhar por isso é que pinto. Fiz recentemente uma ilustração com base num livro que adorei, “O Plantador de Abóboras”, de Luís Cardoso. E acabou por ir para o seu trabalho. É dentro do meu mundo, completamente. O que ele escreve, para mim tem o mesmo tipo de encanto que tem a Marguerite Duras, no sentido de como eu me sinto a ler aquilo, embora não tenha nada a ver. O tipo de mundo em que tu entras… ele numa entrevista diz que as mulheres é que estão, vêem, estão presentes, preocupam-se. Diz que quem lhe contava as histórias era uma mulher, então cada vez que ele conta uma história é através dessa voz. Ele diz as coisas de uma forma muito bonita e consciente do modo de vida das mulheres. O que está na exposição [de Grândola] são ilustrações que foram usadas para esse livro e também outras que não foram usadas. Posso dizer que continuo a ter ali trabalho com os livros da Marguerite Duras que li em Macau, em 1996. Continuam ali, não sei onde, num cantinho. Que livros da autora a marcaram mais? Gostei de todos, só não consegui ler teatro. Não consegui fazer as vozes cá dentro, cansa-me muito. Mas “A Barragem contra o Pacífico”, que tenho andado a pensar que podia ler outra vez, porque há muito que não lia um livro que me encha as medidas, isto antes do livro de Luís Cardoso. Mas tenho aquele medo… vai lá ler “A Metamorfose”, de Kafka, agora. A mim não me apetece, não quero. Lês aos 14 ou 16 anos e faz sentido, mas aos 47? Deixa estar. E não queria isso com um dos livros que mais gostei. Mas ando com vontade de ler mais autoras mulheres agora. Porquê? Quando cresci, o que é que eu lia? Kafka, Boris Vian, tudo homens. Foi algo espontâneo? Lia homens porque ia a uma livraria, quantas mulheres escritoras havia em 1980? Poucas, hoje há mais. Há de facto um lobby masculino. Mas e nas outras artes? Falou-se nos jornais de que temos uma maestrina portuguesa. A Joana Carneiro. Sim, mas é a única. Gosto muito de música. Tenho uma filha que me lê em voz alta enquanto eu trabalho, o que se pode querer mais? E um filho que treina escalas ao piano, adoro ouvir aquilo. Acho muito bonito. Trabalho muito com música. Estou a trabalhar num quadro que começa com uma música. Durante aquele tempo, e para azar de quem vive comigo pode ser um mês, só se ouve aquilo. Se voltar daqui a três meses, posso ouvir a mesma música. É como se fosse um discurso musical que me põe naquele sítio a pintar aquilo. A Sylvia Plath tem um verso num poema que diz “I’m vertical but I would like be horizontal”, que penso que é a vontade de morrer dela. Mas aquela coisa entre o vertical e o horizontal, entre a vida e a morte, entre as nuvens e os papiros, ou entre lá em cima e o cá em baixo, o etéreo e o terra a terra… isto tem uma amplitude, para um lado e para o outro, muito grande. Se calhar por causa da doença ou de não sei o quê, e de a casa estar cheia, há a vontade de ir para o Alentejo, ter um sítio grande e arranjar paz. É uma nova fase. Sim, um descanso. A vida toda até aos 40 andei um bocado à procura de quem era. E agora não sei, mas estou-me lixando. Sou eu e não quero saber o que os outros pensam, se está bem ou mal. É como eu gosto e quero. Isso é uma grande liberdade. Sente-se mais livre agora do que antes? Sim, muito mais. Não voltava aos meus 16 anos nem com o Euromilhões na mão. Não tem medo de envelhecer? Estou a ficar velha, é esquisito olhar-nos no espelho e ver estas rugas. Dois anos foi muito tempo, as preocupações. Eu emagreci quando todos engordaram na quarentena. Mas comi muitos bolos. Mas não voltava aos 25 nem aos 35 anos. Talvez voltasse aos 40.
Guangdong detecta 15 casos locais de covid-19 Hoje Macau - 3 Jun 2021 A província de Guangdong, que faz fronteira com Macau e Hong Kong, detectou 15 casos locais de covid-19 nas últimas 24 horas, anunciou hoje a Comissão de Saúde da China. Guangdong detectou dezenas de infeções locais desde 21 de maio passado, situação que levou as autoridades locais a impor, na segunda-feira, restrições à circulação interna de pessoas, ao ditar que quem quiser sair da província deve fazer um teste à covid-19. A China registou ainda nove casos positivos, entre viajantes oriundos do exterior, nas cidades de Xangai (leste) e Pequim (norte) e nas províncias de Guangdong (sudeste), Fujian (sudeste) e Sichuan (centro). As autoridades sanitárias também indicaram terem detectado 18 novas infeções assintomáticas, cinco por contágio local em Guangdong e as restantes importadas, embora Pequim não as inclua como casos confirmados, a menos que manifestem sintomas. A Comissão de Saúde da China adiantou que o número total de casos activos é de 364, entre os quais sete em estado grave.
Pais contestam explicações sobre aumento de propinas na EPM Andreia Sofia Silva - 3 Jun 2021 Filipe Regêncio Figueiredo, presidente da Associação de Pais da Escola Portuguesa de Macau (APEPM), disse ao HM que não concorda com as explicações dadas por José Sales Marques, administrador da Fundação da EPM, sobre o aumento das propinas em 12 por cento. “Contesto que venha dizer que não é verdade o que nós dissemos. O aumento global da propina é de 12 por cento, mas no montante global da propina anual não corresponde ao que os pais vão pagar, mas sim [um aumento de] 34 a 46 por cento dependendo do ciclo de ensino. Ele não pode dizer que são coisas que não têm nada a ver com a fundação. Esse aumento de 12 por cento é um problema da fundação e se os pais não colocarem os filhos na escola ela não serve para nada nem a fundação.” O presidente da APEPM lamenta também que Sales Marques o tenha acusado de “desinformação por referir que houve baixas de salário”. “O que disse é que há uma diminuição no valor do orçamento da escola para o ano lectivo 2019/2020 relativamente ao pessoal docente, mas há um aumento do orçamento para o pessoal da direcção, quando o pessoal dirigente [da escola] são apenas duas pessoas [Manuel Machado e Zélia Mieiro]. É o que consta nos documentos, pelo menos desde o ano lectivo de 2016/2017.” Além disso, Filipe Regêncio Figueiredo diz que a fundação “nunca respondeu aos nossos emails e desde ontem [terça-feira] que continuamos sem resposta nem qualquer tipo de contacto”. Instalações diferentes José Sales Marques referiu que existe a necessidade de aumento de propinas dadas as “dificuldades” financeiras que a fundação tem enfrentado e a redução do subsídio atribuído pela Fundação Macau em 1 milhão de patacas. Afirmou ainda que a EPM é, no seio das escolas privadas, a que cobra das propinas mais baixas. No entanto, Filipe Regêncio Figueiredo diz que há outras matérias a ponderar. “Não sei quanto se paga nas outras escolas, porque não estou interessado. Se comparar as instalações da EPM com a Escola Internacional de Macau [TIS], comparamos o incomparável. Tem de se olhar para aquilo que a propina engloba.” Sales Marques admitiu analisar casos de famílias com dificuldades devido à pandemia, mas o presidente da APEP não vê como essas situações possam ser resolvidas. “Vão abrir um regime excepcional por cada aluno? No meu caso pessoal, felizmente não entro em situações de dificuldades, mas tenho três filhos na escola e para o ano vou ter quatro. São questões que têm de ser ponderadas.” Contactado pelo HM, José Sales Marques não quis prestar mais declarações.
O estado do clima Olavo Rasquinho - 3 Jun 2021 São de tal maneira frequentes as referências ao aquecimento global e às alterações climáticas que, por vezes, se confundem os dois conceitos. O aquecimento global refere-se ao aumento da temperatura média do ar, à escala global, enquanto que alterações climáticas se trata de um conceito mais vasto, que inclui o aquecimento global e as suas consequências, como sejam o aumento da frequência e intensidade de fenómenos meteorológicos, como tempestades, degelo das calotas polares e gelo marítimo, ondas de calor, secas, etc. Pode-se afirmar que o aquecimento global é um dos muitos sintomas das alterações climáticas. Note-se que, quando se fala na temperatura do ar sem se especificar a que altitude se refere, subentende-se que é entre 1,25 a 2 dois metros de altura, medida num abrigo meteorológico sobre terreno com relva. Embora tenha sido em pleno século XIX que os cientistas começaram a dar grande importância ao facto de determinados gases na atmosfera terem a capacidade absorver calor, só nos anos oitenta do século passado foi possível antever, em termos quantitativos, o efeito que esses gases tinham no aumento da temperatura à escala global. Foi James Edward Hansen, climatologista americano, que, recorrendo a um modelo climático por si construído, em 1981, chegou a conclusões que levantaram grande celeuma no meio científico, antevendo que a temperatura média do ar poderia sofrer um aumento de 3,0 ºC a 4,5 ºC até 2100, valores muito próximos dos constantes nos relatórios do IPCC, apesar de nessa altura a capacidade dos computadores ser muito menor do que a dos atuais. Já antes, nos anos setenta, Hansen havia colaborado na elaboração do Relatório Charney, no qual se alertava o governo dos EUA sobre as implicações do uso intensivo do carvão como combustível. devido às emissões de dióxido de carbono. Este relatório constitui uma base científica sólida do que se convencionou designar por aquecimento global. Em 1988, Hansen proferiu uma palestra perante o Congresso dos Estados Unidos que causou grande controvérsia, não só nos meios científicos e políticos, mas também no público mais atento aos grandes problemas da humanidade. Era tão crente das suas conclusões, que se tornou ativista e foi várias vezes preso por incitar a manifestações populares contra o uso de combustíveis fósseis, alertando para as graves consequências para o equilíbrio do sistema climático. Já passaram algumas dezenas de anos e, apesar da criação da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas (United Nations Framework Convention on Climate Change – UNFCCC) e dos 25 encontros científicos, designados por Conferências das Partes (COPs), promovidos no âmbito desta Convenção, e dos compromissos assumidos, a concentração de gases de efeito de estufa (GEE) continua a aumentar. Os termos da UNFCCC foram submetidos à apreciação dos Estados participantes na Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro de 3 a 14 de junho de 1992, tendo entrado em vigor em 21 de março de 1994. Foi numa das 25 COPs promovidas por esta Convenção que se negociou o Acordo de Paris (COP 21, 2015), que veio a substituir o Protocolo de Quioto a partir de 2020. O Acordo de Paris constitui o primeiro tratado internacional a pressionar os aderentes a executarem planos de ação para reduzirem os GEE, induzindo os países a colaborarem dentro das suas possibilidades, exigindo, no entanto, a execução das chamadas NDCs, sigla em inglês de Nationally Determined Contributions (Contribuições Determinadas a Nível Nacional). Apesar das ações no âmbito destes tratados internacionais, promovidas sob os auspícios das Nações Unidas, para alertarem os governos sobre a necessidade do cumprimento das respetivas recomendações e decisões, as medidas tomadas até agora não têm sido de molde a reduzir as emissões dos GEE e travar as graves consequências desta inação. No último relatório sobre o estado do clima elaborado pela Organização Meteorológica Mundial (OMM), designado por “State of the Global Climate 2020”, são destacadas as seguinte conclusões: As concentrações dos principais gases de efeito estufa, dióxido de carbono, metano e óxido nitroso (CO2, CH4 e N2O), continuaram aumentar apesar da redução temporária das emissões em 2020, devida às medidas tomadas em resposta à COVID-19. 2020 foi um dos três anos mais quentes já registados. Os últimos seis anos, incluindo 2020, foram os mais quentes desde que há registos. A temperatura atingiu 38,0° C em Verkhoyansk, na Federação Russa, em 20 de junho de 2020, o valor mais alto registado a norte do Círculo Polar Ártico. A tendência de subida do nível do mar está a aumentar. Além disso, o armazenamento de calor pelo oceano e a acidez estão também a aumentar, o que implica diminuição da capacidade do oceano para moderar as alterações climáticas. A extensão do gelo marítimo do Ártico em setembro de 2020 foi a segunda menor registada. O recuo do gelo no Mar de Laptev, a norte da Ásia, foi o mais precocemente observado desde que há satélites meteorológicos. A tendência de perda de massa de gelo na Antártida acelerou por volta de 2005 e, atualmente, a Antártida perde aproximadamente entre 175 e 225 milhões de toneladas de gelo por ano. A estação de 2020 dos furacões no Atlântico Norte foi excecionalmente ativa. Furacões, ondas de calor extremo, secas severas e incêndios florestais causaram prejuízos de dezenas de milhares de milhões de dólares e elevado número de mortes. Durante o primeiro semestre de 2020 foram registados cerca de 9,8 milhões de migrantes, em grande parte devido a riscos e desastres hidrometeorológicos. Interrupções nas atividades agrícolas devido à Covid-19 agravaram o impacto de fenómenos meteorológicos em toda a cadeia alimentar, intensificando os níveis de insegurança alimentar. De acordo com o último relatório da Agência Internacional de Energia, divulgado em 20 de abril deste ano, esta organização antevê que em 2021 ocorrerá muito provavelmente o segundo maior aumento anual de sempre de emissões de dióxido de carbono. Entretanto, o regresso dos Estados Unidos da América ao Acordo de Paris constitui uma esperança para humanidade, na medida em que, sendo o segundo maior emissor de GEE, poderá contribuir grandemente para o cumprimento deste tratado internacional. A União Europeia, apesar da renitência de alguns membros, está a elaborar a Lei Europeia do Clima, preconizada no Pacto Ecológico Europeu, com cuja implementação se pretende atingir a neutralidade carbónica em 2050. Um dos países mais renitentes é a Polónia, país em cerca de 80% da eletricidade é produzida em centrais de carvão. Portugal tem vindo a tomar algumas ações significativas no sentido da diminuição da utilização de combustíveis fósseis, encerrando a central termoelétrica de Sines, em 14 de janeiro de 2021, e programando a cessação do funcionamento da central do Pego, em novembro próximo. Com este encerramento, o carvão deixará de ser utilizado para a produção de eletricidade no nosso país. *Meteorologista
Armar a teia da sedução 2 António Cabrita - 3 Jun 2021 Que horas bem passadas a ler o livro de entrevistas de Jaime Gil de Biedma, Conversaciones (Austral, 2002). Não é um autor das minhas linhagens, mas ressuma inteligência em todas estas conversas, a tal ponto que até quando discordamos é com agrado que o fazemos. Veja-se este primor; diz Biedma ao entrevistador: «- A respeito disso, deixe-me contar uma anedota engraçada. Sólon, imperador de Atenas, tinha fama de sábio. A Atenas daquela época seria absolutamente provinciana, com as pessoas sentadas na soleira da porta, a observarem quem passava e com quem trocariam eventuais comentários. A Sólon havia morrido um filho de vinte anos; na altura, assim que os filhos arrebitavam iam para a guerra ou punham-se a cavar a horta… Uma coisa chata, os filhos morrerem nessa idade. E parece que Sólon, o criador da Constituição de Atenas e, na verdade, o inventor de Atenas, estava lamentoso, e então o cretino de plantão, que todos conhecemos porque, sabe-se, só a estupidez é imortal, viu ali uma oportunidade para achincalhar o sábio, e observou-lhe: “Por que o choras, se não serve para nada?” E respondeu-lhe o Sólon: “É por não servir para nada que choro!” O que é muito bom, e mostra como Sólon era realmente um sábio. – Bem, eu volto ao poema. Aquele intitulado “De vita beata”. (transcrevo-o inteiro: «Num país antigo e ineficiente/ algo parecido à Espanha entre duas guerras/ civis, num povoado à beira-mar,/ ter uma casa uma pequena renda/ e estar privado de memória. Não ler,/ não sofrer, não escrever, não pagar contas,/ e viver como um nobre arruinado/ entre as ruínas da minha inteligência.») – Ah sim. E que tem? – Você ainda o subscreve? – Imagine que não o subscrevia. Que fazer? Removo-o das edições de minhas obras? – Não. O que lhe quero perguntar é se foi o fruto de um momento determinado ou de uma concepção de vida mais duradoura. – É o fruto de um momento específico; não é o resultado de uma concepção da vida. E digo-lhe mais, ao poema compu-lo na cabeça enquanto nadava numa piscina. Claro que, por isso, é tão curto, o fôlego, quando estamos a nadar numa piscina, não é o mesmo. – Entre todas as entrevistas que lhe fizeram, que suponho terem sido muitas, que pergunta gostaria que lhe tivessem feito e ninguém fez? – Eu gostaria que me fizessem uma proposta desonesta. – Como desonesta? – Sim, é o que ainda se espera de uma entrevista, que nos façam uma proposta desonesta. – O que entende por desonesto? – Bem, repare, o normal numa entrevista é que te perguntem a opinião sobre a poesia e etc. e tal. Mas chegar alguém e passar-me a mão no pêlo, bem, seria o que não se espera, e aí poderia tornar-se realmente divertido.» Biedma, como Auden, faz do poema uma conversa, às vezes em chave alegórica como em Eliot e Cernuda, que também permeia de ironia e ou de auto-derrisão – e diga-se que o seu confessionalismo sinaliza mais um efeito retórico do que uma premissa psicológica. Na sua obra há vinte poemas excepcionais, os demais espelham um quotidiano hipostasiado em cultura ou uma espécie de auto-compadecimento, em pose, que me irritam um pouco e me põem sob reserva. Com a leitura deste livro entendi porquê. Biedma distingue entre poesia e poema: «a poesia é o que o leitor experimenta lendo o poema, não o que ocorre ao poeta enquanto o escreve. A poesia é o poema assumido no momento da leitura. Um poema não se faz para ser escrito mas para ser lido, inclusive pelo próprio». Ou seja, a poesia é primeiro que tudo um artefacto social, de que o poema é o epítome, não passando do seu processo desencadeador. E o que interessa sobremaneira a Biedma é o efeito do escrito sobre o seu leitor – «o meu interesse primordial são as pessoas», diz – e menos a experiência a montante do poema. O que explica a escassez da obra (pouco mais de cem poemas) e a desmotivação que, com a idade e a perda do seu tónus físico e da eroticidade que o galvanizavam, o tomou. Com esta distinção entre o poema e a poesia Biedma imita o engenho que ecoava na boutade de Duchamp:”ce sont les regardeurs qui font les tableaux!”. Por outro lado, a importância que dá ao leitor, a obsessão com “o seu” público, realça que os seus poemas funcionavam para o poeta como simulações com endereço prévio – i, é, mais não pretendem do que “fazer espírito” e armar a teia da sedução. Fica justificado o reparo do poeta da sua geração Caballero Bonald, com quem concordo: «dificilmente a sua narratividade anulava o meu hábito de leitor, seguramente defeituoso, de desdenhar a poesia que não ocupa mais espaço que o poema, quero dizer que não ultrapassa a própria fronteira do seu argumento para se cingir à sucinta órbitra realista, sem ramificar-se noutros voos…». Atenção, levantar as saias das senhoras ou baixar as calças dos homens: motivos tão superlativos como quaisquer outros para produzir poesia. Porém isto faz com que aflorem na poesia de Biedma, sumamente inteligente como factura técnica, vários momentos pueris (frívolos, lhe chama Bonald), dado que apenas pretendia organizar um solvente catálogo de engates. Com excepção daqueles poemas em que, ao contrário, está inteiro, como em No Volveré a Ser Jovem, que o poeta declarava como o seu preferido: «Que la vida iba en serio/ uno lo empieza a comprender más tarde/ —como todos los jóvenes, yo vine/ a llevarme la vida por delante./ Dejar huella quería/ y marcharme entre aplausos/ —envejecer, morir, eran tan sólo/ las dimensiones del teatro./ Pero ha pasado el tiempo/ y la verdad desagradable asoma:/ envejecer, morir,/ es el único argumento de la obra». Neste caso também deve tê-lo composto a nadar, mas não é preciso mais.
A fisionomia desaparecida Luís Carmelo - 3 Jun 2021 Ele anda muito devagar enquanto enrola o cigarro. Nas águas desenham-se aqui e ali círculos turvos e objectos perdidos – cruzetas, sacos, jornais e até uma luva com os dedos abertos -, embora o olhar persiga a folhagem dos amieiros de fruto negro que ladeiam a rua. De repente, parte desse homem como que se dilui no papel que acolhe as onças do tabaco e uma outra parte mergulha nos frutos esféricos do amieiro. Foi como se bipartisse a desatenção e, não obstante, o corpo continua a andar, indiferente, mecânico, incólume a tudo, mas com a consciência de que a vida foi sempre a correr. Uma maratona demasiado tépida. Parar subitamente e rever-se dentro da mortalha – estranho nome, esse – e do sabor acre dos frutos que se assemelham a pequenas pinhas ovóides tornou-se num verdadeiro desafio. Foi quando se virou de costas para o canal e viu a mulher. No outro lado do passeio, ela empurra o carro do bebé e guarda do homem uma imagem meramente periférica. Não o encara sequer. Cada um no seu flanco da rua e apenas o chiar das pequenas rodas suspende a presença do asfalto ainda molhado. A mulher caminha ao jeito de uma máquina de traço ocasional com pequenas mãos de bailarina. Como se ela fosse o duplo da música que lhe dá o ritmo certo à proporção das pernas e ao andar. De um momento para o outro, ela mergulha na sensação de que ouve flautas ao longe. Uma espécie de anunciação num adro vazio onde o tempo, a pouco e pouco, poderia recomeçar a partir do zero. Foi quando se virou de costas para as janelas e para as tijoleiras da fachada e viu o homem. Ele era incapaz de polir os seus sentimentos imóveis, vivia da rigidez que reavia da tristeza, mas o olhar, aquele olhar da mulher que avançava desenvolto de tanta solidão, definiu-lhe por dentro uma cratera que não ainda conhecia. A mulher tentou-o como nunca antes havia acontecido. A mulher empurrava o mundo inteiro e, no entanto, o carro do bebé estava vazio. Para ela, este caminho diário era uma floresta proibida, quase fechada, e, apesar disso, o olhar do homem como que o lavrou em profundidade, ao ponto de ter pressentido que era ele quem a impelia em movimento. Foi deste modo que se sentiu tentada como antes nunca tinha acontecido. Voltaram a olhar-se. O tempo. O homem e a mulher observam-se. Ainda o tempo. Com dimensões diferentes as mãos do homem e da mulher são rigorosamente iguais, todas em forma de bandeira com os dedos juntos e sem flexão. O perfil e a forma do nariz dão a ver cópias quase precisas. Os olhares traçam em simetria uma brancura prestes a ser preenchida e repetem essa intenção inicial do mesmo modo no homem e na mulher. Ela abre-se num estuário magnífico ao pau que o homem transforma em pedra. A afluência, para trás e para a frente ou levemente circular, permite ao infinito o seu sumo de possibilidades. Ela pronuncia em voz baixa que os ombros são aquela parte que nos frutos se alarga das sépalas até à polpa. Ele responde que a bacia é o tratado que o corpo assina com a imagem secreta de um equador. Riem os dois. Ela volta a dizer que a cintura resolve em forma de golfo todas as peças da intimidade. Como se essa reentrância ditasse um ou outro verso em sânscrito. Ele abriu muito os olhos e ela imitou-o com a firmeza de uma flauta. O homem e a mulher são iguais, nada os separa. A mesma ondulação nos braços, a mesma forma do queixo, a mesma fisionomia a arquear o fim do dia. Ela abre as pernas ao jeito de um compasso, levanta-as no ar e junta a sola das sandálias ao tecto onde está colado um planisfério cheio de cores. Ele está dentro dela e ela está com o corpo todo a atravessar os trópicos, depois o Ártico, depois ainda o abismo que se perde na densidade dos oceanos. O tempo naufraga e ele volta a fumar enquanto a mulher puxa o carro de bebé para junto da cama, dentro do qual permanecem os objectos que ela recolheu: cruzetas, sacos, jornais e a luva azulada com os dedos agora fechados em forma de bandeira. O homem e a mulher encostam os lábios e trocam os frutos do amieiro. São viscosos e alternam a cor escura do castanho com o rosa-violáceo. O homem e a mulher são iguais, serão irmãos certamente. É a partir deles os dois que vai nascer a memória daquela parcela de uma rua que não pertence a nenhuma cidade, a nenhum planisfério, a nenhum dia. A realidade é uma fisionomia sempre desaparecida.
Guia Fest | Primeira edição arranca no domingo em vários locais da cidade Andreia Sofia Silva - 3 Jun 2021 O cartaz da primeira edição do Guia Fest não é feito apenas de música experimental, mas é essencialmente sobre ela. Os organizadores apostam na realização de workshops para que os participantes possam criar as suas próprias sonoridades. O festival termina a 20 de Junho e acontece em quatro locais diferentes de Macau A primeira edição do Guia Fest começa este domingo e, até ao dia 20 deste mês, promete juntar músicos e público para que, em conjunto, explorem os meandros da música experimental. A ideia é criar “uma nova experiência sonora” e reúne “vários músicos de Macau, de diferentes géneros musicais”, como o DJ japonês AKI. O objectivo é “experimentar a música e o som além da nossa imaginação em diferentes formatos”. Este domingo, acontece o workshop de sintetizadores modulares na zona do Tap Siac, um equipamento que se tem tornado cada vez mais popular nos últimos anos “mas que só agora está a surgir em Macau”. O sintetizador modular é usado para criar sonoridades de raiz e, neste workshop, “vários músicos vão mostrar a diversidade [deste equipamento] e a forma como misturam estes instrumentos”. O workshop será apenas em cantonês, sem direito a tradução. A 12 de Junho, tem lugar o workshop sobre design de som, focado num programa de computador intitulado “Supercollider”, criado por James McCartney em 1996. Este workshop será administrado por Daniel Maszkowicz, um músico oriundo da Suíça que “vai ensinar os princípios e técnicas” deste programa através de um tutorial online. Já no domingo, 13 de Junho, ocorre o evento “Sound and Cocktail” [Som e Cocktail], no bar Two Moons, onde se pretende fazer uma “fusão experimental do álcool com o som”, uma vez que “o som e o álcool sempre fizeram parte da vida urbana, e a cidade sempre esteve repleta de álcool e som”. O público é convidado a testemunhar “com os olhos, ouvidos e pupilas degustativas um cocktail sonoro feito à medida”. O Guia Fest termina no dia 20 de Junho com o concerto “Guia Live!”, no espaço Live Music Association, onde “uma variedade de músicos locais vão sair da sua zona de conforto para trazer toda uma nova experiência numa performance sem precedentes ao nível dos estilos e formatos”. Neste concerto participam AKI com KaWaiNg, Ellison, membro da banda local Whyoceans e os INFLUUT, um duo de jazz electroacústico da Suíça. A novidade é o foco Ao HM, Matthew Ho e Steven Ng, organizadores do festival e membros do grupo Guia Experimental, explicaram que, inicialmente, a ideia era realizar uma série de workshops “sobre música feita com sintetizadores modulares”. “Tínhamos muitas ideias na área da música experimental. Então optámos por organizar um festival”, apontou Matthew Ho. Os amantes da música experimental no território constituem ainda “uma comunidade muito pequena”, mas, na hora de convidar os músicos a participar, a ideia é que estes toquem “músicas que nunca experimentaram antes”. “Faz-se muita música comercial, com bandas, música de dança ou hip-hop, mas queremos que os músicos explorem outras sonoridades para marcarem a diferença, para que haja algo de novo”, frisou Matthew. “O nosso conceito de música experimental não passa apenas pelos instrumentos. É também fazer algo que nunca se fez, uma experiência totalmente nova que não esteja no mercado neste momento. O que é experimental para mim pode não ser para ti, mas pelo menos estou a fazer algo novo sem pensar no mercado ou no público”, defendeu o organizador. A ideia de realizar os workshops é de levar as pessoas a explorarem novos territórios musicais. “Nos anos 60 e 70 estes instrumentos eram usados para fazer sons. Nessa altura, em Hollywood e em alguns anúncios publicitários usavam-se estes sons e equipamentos, mas não como usamos hoje. Decidimos então fazer um workshop para que os participantes façam os seus próprios sons sem recorrer a software, pois tem as sonoridades pré-definidas. Queremos que as pessoas comecem do nada para criar os seus próprios sons”, frisou Matthew Ho. Olhar para a história O mentor do Guia Fest explicou que a música experimental era uma realidade em Macau na década de 90, feita por alguns membros da comunidade portuguesa. Depois de um interregno entre 2000 e 2010, começou a surgir novamente. Eric Chan, membro da banda Forget the G, foi um dos grandes impulsionadores do movimento. “Nunca esperamos que o público adore a música experimental, mas esperamos que possa conhecer mais sobre o facto de esse género musical existir no mundo e em Macau”, disse Matthew Ho. Em 2018, teve lugar no território um festival de música experimental e industrial [noise music], mas, devido à pandemia, o seu curador ficou retido em Taiwan. Desta forma, explicou Steve Ng, optou-se por fazer um festival totalmente novo e apenas dedicado à música experimental. Também em 2018, foi criado o grupo Guia Experimental. “Na altura um artista da Suíça pediu-nos para fazermos a curadoria de um espectáculo dele, pois estava a fazer uma tour pela Ásia. Queriam que Macau fosse um dos locais de paragem e foi aí que decidimos criar este grupo. Continuamos a organizar espectáculos depois disso”, adiantou Matthew.
Grande Baía | Secretária desafia IFT a manter posição de “liderança” Hoje Macau - 3 Jun 2021 A secretária para os Assuntos Sociais e Cultura, Elsie Ao Ieong U, desafiou ontem o Instituto de Formação Turística a manter a posição de liderança na Grande Baía, ao nível da formação de quadros qualificados. A “esperança” foi deixada durante o discurso da cerimónia de licenciatura deste ano dos estudantes do IFT. “Espera-se que o IFTM acompanhe, de perto, as necessidades de Macau e da Grande Baía, desempenhando ainda mais o seu papel de liderança nos serviços de formação e educação nas áreas de turismo e lazer, no sentido de contribuir para o desenvolvimento contínuo da sociedade”, afirmou. A secretária apelou ainda à coragem dos alunos para que arrisquem e participem na Grande Baía. “Para abraçar o futuro, não só temos de ter grande coragem, como temos de alargar os nossos horizontes e manter as nossas mentes abertas. A Grande Baía está intimamente ligada à nossa vida, e as oportunidades de desenvolvimento na Grande Baía são únicas para nós”, afirmou. “Os alunos devem aproveitar estas boas oportunidades, atrevendo-se a tentar coisas novas e desenvolvendo as suas potencialidades”, recomendou. Além do desafio, Elsie Ao Ieong U elogiou o contributo da instituição para a integração de Macau na Grande Baía, através da “base”. “A Base de Ensino e Formação em Turismo para a Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau, estabelecida pelo IFTM, depois de menos de dois anos de desenvolvimento, já tem acções de cooperação estendidas a Zhuhai, Guangzhou e Shunde, em Foshan, assim concretizando gradualmente o conceito de exportar recursos de formação turística de qualidade para o ‘círculo de formação acessível em uma hora’”, reconheceu.
Renovação Urbana | Contratos milionários para empresas estatais Hoje Macau - 3 Jun 2021 A empresa Macau Renovação Urbana assinou ontem dois memorandos de entendimento para as obras no Lote P da Areia Preta, que vão garantir a empresas estatais quase 5 mil milhões de patacas. Em relação à obra mais cara, que envolve a construção das habitações para troca com os lesados do empreendimento Pearl Horizon, os trabalhos vão ser conduzidos pela empresa China Construction Engineering (Macau) a troco de 4,068 mil milhões de patacas. A informação foi divulgada ontem num comunicado da empresa, que apenas comunica em chinês e inglês. A outra obra implica a construção de habitação para troca, ou seja, as casas que poderão ser utilizadas como forma de compensar os proprietários que participarem no programa do Governo de renovação urbana. Os trabalhos implicam um custo de 878,6 milhões de patacas e foram atribuídos ao consórcio constituídos pelas empresas China Road and Bridge Corporation, Coneer Engineering Limited e Top Design Consultants Company Limited. Por outro lado, a empresa avançou também que o concurso público para a construção de mais habitações temporárias está em curso e deve chegar ao fim no final deste mês. Segundo a Macau Renovação Urbana, as obras no Lote P vão criar mais de três mil oportunidades de emprego. A empresa diz ainda estar empenhada em coordenar os diferentes trabalhos de escavação, de forma a evitar ao máximo os condicionamentos no trânsito. As obras de construção no terreno da Areia Preta, onde ia ser erigido o empreendimento de luxo Pearl Horizon, devem ficar concluídas no final de 2024.
Advocacia | Ordem quer reactivar Protocolo com AAM no início do próximo ano Andreia Sofia Silva - 3 Jun 2021 A Ordem dos Advogados assegura que o Protocolo com a Associação dos Advogados de Macau poderá ser retomado no início do próximo ano, ultrapassado o impasse causado pela pandemia da covid-19. O Bastonário, Luís Menezes Leitão, assegura que “a principal questão” nas negociações prende-se “com a exigência de formação complementar para exercer a advocacia” Pode estar para breve a reactivação do Protocolo entre a Ordem dos Advogados (OA) em Portugal e a Associação dos Advogados de Macau (AAM). Depois de meses de negociações, a OA aponta como prazo para a entrada em vigor o início do próximo ano. “Desde o início que manifestamos concordância com a recuperação do Protocolo, havendo apenas que ultimar as questões que se colocam para efeitos de reciprocidade. A pandemia prejudicou, no entanto, o decorrer das negociações. Temos esperança que, estando tudo resolvido, no início do próximo ano o mesmo possa ser reactivado”, confirmou ao HM Luís Menezes Leitão, Bastonário da OA. A exigência de formação complementar além da licenciatura em advocacia é, para já, o tema que continua a ser discutido. Esta formação é exigida para exercer a profissão no território e ter “o conhecimento da lei local, que é cada vez mais diferente em Portugal e Macau”. “Teremos que acertar em condições de reciprocidade qual a formação exigida para o exercício da advocacia em cada uma das jurisdições”, adiantou o Bastonário. Esta formação prende-se com a necessidade de aprendizagem do Direito de Macau. Um ano de negociações As negociações para que este Protocolo seja reactivado duram há cerca de um ano. Numa entrevista ao HM, Luís Menezes Leitão falou da importância do documento para a OA. “É uma forma de mantermos a nossa ligação em termos jurídicos com Macau onde neste momento existe ainda um grande património jurídico comum. Achamos que ambas as advocacias podem trabalhar em conjunto.” Jorge Neto Valente, presidente da AAM, referiu recentemente que o número de advogados portugueses que vêm para Macau trabalhar é cada vez menor. Em 1999 “havia 87 advogados de pleno direito e 13 estagiários, e a esmagadora maioria, seguramente 70 por cento, eram de língua materna portuguesa”, recordou. “Neste momento, eu diria que 70 por cento [dos inscritos] são de língua materna chinesa”, num universo de “436 advogados e 127 estagiários”, apontou o presidente da AAM em declarações à Lusa. “Há muito poucos [causídicos], porque, além da questão da pandemia, os advogados de Portugal não podem chegar aqui, bater à porta e dizer ‘estou cá’”, disse. Antes de poderem exercer no território, têm de obter autorização de residência e de trabalho, “o que não é fácil”, e “fazer um curso de adaptação ao Direito de Macau”. “Ou então têm de começar pelo estágio, e a maior parte dos advogados não quer ter de fazer estágio outra vez”, explicou Jorge Neto Valente.
Drenagem | Conselheiros questionam escoamento de águas Hoje Macau - 3 Jun 2021 A capacidade do sistema de drenagem do território marcou a reunião do Conselho Consultivo de Serviços Comunitários do Centro, realizada ontem. As opiniões dos membros foram apresentadas, depois de, na terça-feira, várias zonas terem ficado inundadas, após a maior chuvada desde que há registos no território. Um dos membros preocupado com o assunto foi Ho Weng Hong, considerando que as inundações mostraram que o sistema em várias zonas da cidade não tem capacidade para lidar com chuvas intensas. Ho alertou também para que os departamentos do Governo devem começar a estudar tão cedo quanto possível o sistema de drenagem e realizar as operações necessárias para aumentar a capacidade nas zonas mais afectadas. Por outro lado, o membro do conselho consultivo apelou às autoridades para fiscalizarem de forma mais activa os despejos ilegais na rede de esgotos e aplicarem as respectivas multas. Por sua vez, Chui Oi Lei, membro ligada à Associação das Mulheres, perguntou se não teria sido possível emitir o sinal de alerta mais cedo e levantou questões sobre o falhanço da box-culvert da Estação Elevatória de Águas Pluviais do Norte do Porto Interior. Segundo o canal chinês da Rádio Macau, a reunião serviu ainda para se falar da habitação para idosos e Luo Ping defendeu que as rendas cobradas aos membros devem ter por base os rendimentos de cada um. Sobre este assunto, Wu Hang San abordou o envelhecimento da população, e alertou o Executivo para a necessidade de aumentar anualmente e gradualmente o número de habitações para os mais velhos.