4 de Junho | Noite sem incidentes assinalada apenas com vigília online

Ao contrário do ano passado, quando o aparato policial se fez sentir a 4 de Junho, este ano não houve incidentes no Largo do Senado. A vigília online promovida por Ng Kuok Cheong e Au Kam San decorreu até ao fim, apesar de alguns cortes de rede nos minutos iniciais da transmissão. Ng frisou que o objectivo da vigília “nunca foi lutar contra as autoridades”

 

Apesar de ter estado debaixo do olho das autoridades, foi uma noite sem sobressaltos no Largo do Senado. Ao contrário do que aconteceu em 2020 onde a presença da polícia se fez sentir a 4 de Junho, na passada sexta-feira não houve incidentes nem detenções a registar no local onde durante 30 anos se assinalou em Macau a vigília em memória das vítimas de Tiananmen.

Ao largo da fonte que acolhe a esfera armilar e onde foram colocados vários canteiros a vedar o espaço, a noite caiu ao som de um concerto de jazz que decorria alguns metros à frente. Ao longo de várias horas, contudo, a presença de elementos das autoridades à paisana fez-se sentir, tanto nas arcadas que ladeiam o Largo do Senado, como noutros pontos estratégicos.

Um cenário bem diferente do verificado a 4 de Junho do ano passado, quando vários agentes circularam em pleno Largo do Senado com altifalantes a passar o aviso sonoro dos Serviços de Saúde para evitar a concentração de pessoas, e outros elementos da polícia pediram mesmo a identificação de cidadãos que, maioritariamente, compareceram no espaço vestidos de preto.

Faltavam 10 minutos para as 20h00 quando, Ng Kuok Cheong e Au Kam San, os habituais promotores da vigília organizada em nome da União de Macau para o Desenvolvimento Democrático (UMDD) se preparavam para dar início ao evento online dedicado ao 4 de Junho, espalhando no chão várias velas e ensaiando algumas palavras. Aos jornalistas, Ng Kuok Cheong começou por dizer que “é possível construir uma China melhor”, sublinhando que o objectivo da vigília “nunca foi que pessoas lutassem contra as autoridades” e que, por isso mesmo, é necessário continuar a assinalar a data.

“Fazemos tudo de acordo com a lei e estamos a dar o nosso melhor, com os meios que dispomos, para que as pessoas de Macau possam prestar este tributo”, apontou o deputado.

Preocupações futuras

Antes do início da vigília, Ng Kuok Cheong frisou ainda estar “preocupado”, não só com o “presente”, mas também com o “futuro” de Macau, tendo sobretudo em conta, a “diferença” verificada ao nível da forma como a vigília foi enquadrada pelas autoridades, de um ano para o outro. Em relação ao futuro, o deputado mantém a esperança, mesmo que não seja a breve trecho.

“Eu sou apenas um ser humano, a minha vida é limitada. No entanto, temos de fazer aquilo que sentimos estar certo. Eu também sou chinês e tenho de insistir e ter esperança de que é possível construir uma China democrática. Mesmo que não seja agora, talvez isso possa acontecer no futuro, porque sei que a minha vida é limitada. É preciso continuar a fazer aquilo que se pode”, sublinhou.

De seguida, ainda no período reservado à comunicação social, a vigília começou, embora alguns minutos depois a transmissão tenha caído devido à ausência de rede no espaço. Cerca de três ou quatro minutos depois a emissão foi retomada e a vigília decorreu com leituras, alguns cânticos e sem sobressaltos.

Recorde-se que a realização de uma vigília online foi a única forma que os promotores arranjaram para assinalar a data, depois de o Tribunal de Última Instância (TUI) ter chumbado o recurso para uma vigília no Largo do Senado em memória das vítimas de Tiananmen, por considerar que a liberdade de reunião não pode admitir “abusos e ofensas sem limites”. Foi a primeira vez que as autoridades de Macau citaram razões políticas para proibir a comemoração.

 

Vigília | Novo Macau lamenta que recordar Tiananmen seja “crime”

A Associação Novo Macau criticou na passada sexta-feira a proibição da vigília em memória dos acontecimentos de Tiananmen, lamentando que recordar as vítimas seja agora considerado “crime”. “Este ano, o Governo da RAEM optou por introduzir acusações falsas contra a vigília anual. De repente, a recordação torna-se um ‘crime’ e a verdade é encoberta pela versão oficial”, escreveu a associação. “No entanto, acreditamos que a verdade histórica não depende da definição do Governo”, acrescenta-se na mesma nota. A associação pró-democracia sustentou também que a vigília de 4 de Junho nada tem a ver com “difamação”, “provocação”, ou mesmo “subversão” porque, “como disse o Tribunal de Última Instância, o direito a comemorar os mortos não deve ser negado”. “Os nossos direitos de comemorar publicamente o 4 de Junho foram privados. Mesmo assim, ainda esperamos que cada cidadão de Macau não esqueça o evento e o assinale à sua própria maneira”, pode ler-se no comunicado.

7 Jun 2021

4 de Junho | TUI nega recurso sobre realização de vigília no Leal Senado 

O Tribunal de Última Instância rejeitou o recurso apresentado pela União de Macau para o Desenvolvimento da Democracia, alegando que a vigília constitui “um planeado e deliberado ataque e insulto a autoridades, entidades e instituições” de Pequim. Associação irá realizar vigília online

 

Pelo segundo ano consecutivo a zona do Leal Senado não irá receber a vigília do 4 de Junho em memória das vítimas dos acontecimentos de Tiananmen. Isto porque o Tribunal de Última Instância (TUI) rejeitou o recurso apresentado pelo deputado Au Kam San, em nome da União de Macau para o Desenvolvimento da Democracia (UMDD), que pedia a anulação da decisão do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP), de 25 de Maio, que proibiu a realização da vigília.

Segundo o acórdão, em causa estão as expressões usadas em cartazes e que constituem “um planeado e deliberado ataque e insulto a autoridades, entidades e instituições do Governo Central da República Popular da China (RPC)”.

Considera o TUI que “o recurso a expressões como ‘terror’, ‘massacre’ e ‘matança’ (e outras), que pela sua própria natureza e sentido implicam, (no mínimo), a causa da morte de um grande número de pessoas com ‘crueldade e desprezo’ e com ‘intenção do seu extermínio’” e que fazem recordar “episódios negros da história da Humanidade’, (como os ocorridos em Nanjing e Auschwitz) – são, sem dúvida, inadmissíveis em qualquer espécie de evento público”.

O uso destas expressões “com o claro propósito de incitar, incendiar e instigar à pública ‘oposição’, ‘combate’, ‘derrube’ e (à própria) ‘extinção’ das referidas Autoridades e Instituições, constitui, igualmente, uma conduta que ultrapassa o aceitável”.

Os juízes entenderam também que este exercício do direito de reunião e manifestação “pode ‘colidir’ com o exercício de outros direitos”, podendo estar em causa um “excesso” e uma “clara e directa ‘ofensa à honra e consideração’ do seu destinatário”.

“Invocar-se o direito – fundamental – à “reunião e manifestação” para cobertura (e palco) de um planeado e deliberado ataque e insulto a Autoridades, Entidades e Instituições do Governo Central da RPC, violando-se, grosseiramente, a honra, dignidade, respeito e consideração que lhes é devido, é, como se mostra óbvio, claramente inadmissível e de necessário repúdio”, acrescenta ainda o TUI.

De frisar que José Dias Azedo fez uma declaração de voto apontando que “se podia avançar para uma solução no sentido de se permitir a pretendida ‘reunião/manifestação’ desde que expurgada de todos os seus ‘elementos abusivos e ofensivos’”.

O CPSP entendeu, no despacho, que esta acção estaria “ferida de ilegalidade” e que seria “incompatível” com a lei de prevenção, controlo e tratamento de doenças transmissíveis, devido à pandemia.

Online avança

Au Kam San anunciou ontem a realização da vigília online às 20h do dia 4 de Junho num apartamento na zona da Praia Grande. O público poderá assistir ao evento no Facebook da UDDM e do gabinete dos deputados Au Kam San e Ng Kuok Cheong.

O responsável disse temer não conseguir proteger os participantes. “Se a polícia acusar alguém de violar a lei, isso não tem custos, mas os participantes pagam um preço alto para provar a sua inocência. Achamos que não é apropriado os residentes arriscarem.”

Foi feito um apelo para que a população “recorde [Tiananmen] de forma apropriada”. “Há pessoas que sugeriram vestir roupas pretas, ou colocar velas brancas em casa. Os pais podem procurar informações e partilhá-las com os filhos. Isso é educação cívica”, explicou.

Au Kam San lembrou que, nos anos anteriores, a realização da vigília nunca constituiu uma ilegalidade e que não iria haver cartazes com as expressões referidas pelo CPSP e no acórdão do TUI. “Normalmente usamos slogans como ‘Reabilitação do movimento democrático de 1989’ e ‘Desenvolver a China democrática’”, frisou.

O Governo disse que a decisão do TUI “vem confirmar que a reunião em causa viola artigos da Constituição, da Lei Básica e do Código Penal”. “O Governo da RAEM apela ao promotor em causa para dar cumprimento à decisão do TUI”, esperando que “a população reconheça a ilegalidade da actividade e o perigo que pode constituir à segurança nacional”.

4 Jun 2021

Chefe do Executivo não comenta proibição da vigília do 4 de Junho

O Chefe do Executivo não se quis pronunciar sobre a proibição da vigília do 4 de Junho, dado que o caso se encontra em processo judicial. “Não me convém pronunciar-me sobre o assunto”, respondeu ainda quando questionado sobre o seu entendimento relativamente ao que aconteceu em Tiananmen.

A União Geral das Associações dos Moradores de Macau (UGAMM), a Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM) e a Associação Geral das Mulheres de Macau concordam com a decisão do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) de rejeitar a realização da vigília em memória do massacre de Tiananmen no próximo dia 4 de Junho.

Segundo o jornal Ou Mun, o vice-presidente da FAOM, Fong Ka Kai apontou que está a ser evitado um cenário que poderia “provocar danos graves ao país”, tal como aconteceu relativamente às mudanças de regime verificadas anteriormente na União Soviética e noutros países do leste europeu, planeadas pelos países ocidentais e pelos Estados Unidos.

Já a vice-presidente da UGAMM, Chao I Sam, argumenta que o CPSP se baseou no código penal para “defender a segurança nacional de Macau”, a vida da população e a imagem do estado de direito. O responsável indicou ainda que, em Macau, não deve ser repetida propaganda contra o Governo Central, tal como aconteceu em anos anteriores através da exibição de cartazes como “Acabar com a ditadura do partido único”.

Por fim, Ao Ieong Ut Seng, vice-presidente da Associação Geral das Mulheres indicou que, ao longo dos anos, os promotores do evento têm “mostrado pouca consciência relativamente à defesa do país e de Macau”, difamando o princípio “Um País, Dois Sistemas” e dando um mau exemplo à população.

Assumir riscos

Au Kam San disse ao HM que a União para o Desenvolvimento da Democracia (UDD) chegou a um veredicto sobre a organização da vigília num espaço interior. Caso o Tribunal de Última Instância concorde com a decisão da polícia, a UDD vai fazer a vigília dentro de portas, mas esta será transmitida em directo e não será dado acesso ao público no espaço. “Nós comportamos o risco por só nós participarmos”, disse.

No entanto, o deputado reiterou que não considera que incorram em violação do código penal. “Por exemplo, a polícia justificou que slogans como ‘acabar a ditadura de partido único’ é incitar à subversão do poder do estado. De facto, há vários anos que já não gritamos nem usamos este slogan. Ao longo dos anos, usámos ‘Reabilitação do movimento democrático de 1989’ e ‘Desenvolver a China democrática’ como temas, por isso não existe violação do código penal”, explicou.

2 Jun 2021

Kevin Ho apoia recusa das autoridades para a realização da vigília

Kevin Ho, empresário local e membro da Assembleia Popular Nacional (APN), mostrou apoio à recusa, por parte das autoridades, da realização da vigília do 4 de Junho, que recorda o massacre de Tiananmen. Segundo o jornal Ou Mun, Kevin Ho lembrou que na vigília foram divulgadas mensagens como “Acabar com a ditadura de partido único”, o que pode levar à incitação da subversão do poder do Estado chinês, violando a lei da segurança nacional em vigor.

“A divulgação destes assuntos de forma consecutiva pode influenciar as opiniões dos residentes, além de ter um impacto na reputação da governação do país ou do partido”, disse Kevin Ho, referindo-se ao Partido Comunista Chinês (PCC). O empresário frisou que as autoridades de Macau devem assumir uma postura “mais séria” na hora de lidar com este tipo de assuntos, questionando a legitimidade da organização da vigília.

Quanto à possibilidade de esta vir a ser organizada num espaço fechado, Kevin Ho disse que se a vigília conter mensagens como “Acabar com a ditadura de partido único” constitui também uma violação intencional da lei.

Também Suen Yan Kwong, membro da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês, se declarou contra a vigília. Macau é agora um local seguro no que diz respeito à covid-19 e a realização de iniciativas como a da vigília “é algo irresponsável e que pode perturbar a ordem social e levar os residentes ao engano”, afirmou.

1 Jun 2021

CPSP admite vigílias online caso sejam cumpridos requisitos legais

Numa resposta enviada ao HM, o Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP), admite que a vigília em memória do massacre de Tiananmen pode acontecer online e num espaço fechado, desde que sejam cumpridos os requisitos legais.

Segundo o CPSP, os direitos de reunião e de manifestação dos residentes de Macau estão assegurados, não só pela Lei Básica, mas também pela legislação em vigor. “As actividades podem ser realizadas nos termos da lei, desde que cumpram os requisitos legais existentes”, pode ler-se na nota.

Recorde-se que Au Kam San, um dos promotores da vigília que acabou por não obter autorização, partilhou na quarta-feira com o HM que tenciona organizar o evento da mesma índole, mas dentro de portas, à semelhança do que aconteceu no ano passado. Isto, apesar de considerar que tal é “provavelmente, arriscado”.

Sobre a razão pela qual não foram tomadas medidas para impedir a vigília do 4 de Junho em anos anteriores, quando factos ocorridos durante esses eventos foram usados para justificar a proibição da vigília deste ano, o CPSP refere que o despacho foi emitido tendo por base uma análise “factual e legal” e que havia a necessidade de as explicações serem claras.

“Os nossos serviços abordam cada aviso prévio emitido pelos organizadores de acordo com a lei; tecemos análises e avaliações sobre os tópicos e conteúdos dos avisos prévios e fazemos um despacho. A nossa análise, produzida com uma base factual e legal, é plasmada de forma clara no despacho. Adicionalmente, pretendemos explicar claramente o conteúdo do despacho aos organizadores. Tomamos decisões no âmbito do nosso dever e em conformidade com a lei”, pode ler-se na resposta.

Outro dos organizadores da iniciativa, Ng Kuok Cheong, confirmou ao HM que os promotores apresentaram ontem recurso sobre a decisão do CPSP junto do Tribunal de última Instância (TUI), devendo a decisão final ser conhecida daqui a cinco dias.

28 Mai 2021