Turismo lento João Romão - 13 Nov 2021 É verdade que vão emergindo novos conceitos de vida e de viagem associados à lentidão e ao usufruto tranquilo do tempo, normalmente ditos em inglês para acentuar o toque de modernidade, mas ainda assim a maior parte dos turistas tem pressas, pouco tempo disponível, muita coisa para ver e fazer numa visita inevitavelmente curta. Tal como o “slow living”, slow cooking”, slow city”, também o conceito de “slow travel” apela a um abrandamento do ritmo que acrescente prazer, sabor, qualidade àquilo que se faz. Fazer menos mas melhor, demorar mais a preparar e saborear os momentos, impondo uma certa lentidão no quotidiano. É difícil fazê-lo quando viajamos, sobretudo em cidades: há um ritmo próprio da urbanidade, sobretudo nas grandes metrópoles, que impõem longas e demoradas deslocações diárias para o trabalho, com a ruidosa azáfama dos transportes e dos congestionamentos vários a animar e a marcar a cadência de cada dia. É nesse contexto de relativa aceleração que temos que nos enquadrar mesmo enquanto visitantes, com os nossos planos do que há para conhecer no pouco tempo disponível, em sítios que conhecemos mal mas onde queremos ver e fazer o máximo, já que as despesas para ali estar foram feitas com antecipação. Se em ambientes rurais ou em áreas menos urbanizadas o conceito de “lentidão” é relativamente fácil de associar a uma certa tranquilidade no usufruto dos tempos de lazer – na realidade, essa ruralidade também implica uma certa escassez de alternativas de actividades que convida a que tudo se faça mais devagar – nas cidades, pelo contrário, há um permanente apelo à velocidade, ao movimento, à aceleração, que não só é induzido pelo ritmo quotidiano de quem lá vive mas também pelas nossas motivações de turistas com planos e agendas quase sempre mais preenchidos do que a realidade do tempo disponível nos permite. Esse frenesim é pouco compatível com a preferência por formas não-motorizadas de transporte – os transportes suaves, que vão hoje fazendo o seu caminho até uma aceitação mais ou menos generalizada, também em centros urbanos. Andar a pé, de bicicleta ou de patinete começa a ser hoje uma opção facilmente disponível em muitas cidades, quer para quem lá vive, quer para quem visita. São formas de mobilidade com menor (ou nulo) impacto ecológico e também menores impactos sobre o espaço urbano, quer em termos de poluição do ambiente, quer em termos de ocupação de um espaço público cujo planeamento foi nas últimas décadas largamente influenciado pela necessidade de acomodar a garantir a circulação de um número massivo e sempre crescente de automóveis. Para quem conhece mal as cidades e procura breves mas relevantes descobertas numa visita curta, estas formas de transporte, que obrigam também a uma autonomia máxima de cada pessoa na identificação dos percursos e previsão da sua duração, podem ser vistas como um obstáculo ao usufruto dos atractivos do território. Mas esta opção também pode ser vista como uma oportunidade para se marcar melhor o ritmo da visita, para aumentar a flexibilidade das opções e a liberdade dos caminhos a seguir. Diferentes turistas terão certamente diferentes preferências e essa foi a razão pela qual procurei estudar o assunto na cidade de Barcelona, onde a autarquia local – não por acaso governada por uma formação chamada Em Comum – disponibiliza gratuitamente toda a informação e dados estatísticos recolhidos com financiamento público local. Nesse estudo (em parceria com a investigadora chinesa Yahua Bi e recentemente publicado no jornal “Sustainability”) identificámos uma dupla clivagem geracional – uma que se vai diluindo e tenderá a desaparecer em breve e outra cuja evolução futura está por conhecer. A primeira tem a ver com a utilização de ferramentas digitais na obtenção de informação para preparação da viagem e decorrentes aquisições de serviços: se numa primeira fase esta era uma opção assumida sobretudo pela população mais jovem, hoje está generalizada a quase todas a gente. Na realidade, os resultados que obtivemos sugerem que apenas as pessoas em situação de reforma não recorrem de forma generalizada à internet e outras tecnologias da informação e comunicação para a preparação das suas viagens. A segunda clivagem tem a ver com as opções de transporte: apenas na faixa etária mais jovem (abaixo dos 24 anos) se observa uma preferência generalizada pelas formas não motorizadas de transporte. Na realidade, é também a população mais jovem (mas neste caso abaixo dos 34 anos) a que tem maior propensão a utilizar transportes públicos. Se estes comportamentos característicos de uma geração que convive mais directamente com os previsíveis impactos das alterações climáticas em curso corresponde a uma resposta cívica e política a estes problemas ou se se trata apenas de uma questão económica (transportes públicos e/ou não motorizados são mais baratos do que os taxis) é uma questão que o tempo se encarregará de esclarecer. Em todo o caso, as tendências são hoje claramente identificáveis – tal como é clara, já agora, a maior propensão dos turistas de negócios para a utilização de transportes individuais (automóveis), independentemente da idade. O nosso estudo permitiu ainda identificar outras formas de conservadorismo com manifestos impactos negativos sobre o ambiente: independentemente das respectivas idades, turistas com viagens organizadas por empresas ou outras organizações promotoras de deslocações em grupo (como excursões de estudantes ou empresas) são também menos propensos a utilizar formas não motorizadas de transporte. Se há sinais de que a população – sobretudo a mais jovem – começa a mudar hábitos para se adequar às exigências ambientais contemporâneas, também não deixam de se confirmar os sinais de que no universo dos negócios as prioridades continuam a ser outras, lentas na mudança e uma mudança que parece inevitável e inadiável se ainda queremos preservar a vida no planeta.
Uma ilusão de pertença Valério Romão - 13 Nov 2021 Tenho Facebook basicamente desde que a plataforma chegou a Portugal. A primeira coisa que notei, à medida que o número de utilizadores ia aumentando, foi a facilidade em encontrar amigos de que se tinha perdido contacto. Toda a gente estava – ou estava a entrar – no Facebook. E durante algum tempo foi simpático ver ressurgir das sombras do passado uma catrefada de gente que já apenas habitava o subsolo da memória. Recentemente decidi fazer uma pausa. Desliguei o Facebook uma semana e, quando o voltei a reactivar, passei a ir lá muito menos vezes e a demorar-me pouco tempo em cada visita. O modelo de negócio do Facebook é basicamente o mesmo que o do Google: maximizar o tempo de estadia do utilizador para desse modo incrementar tanto quanto possível a quantidade de anúncios que vê e em que clica. Não interessa propriamente se o utilizador fica mais tempo ou volta mais vezes por causa dos gifs de gatinhos ou da desinformação acerca das vacinas. Há oitocentos mil engenheiros, sociólogos, psicólogos comportamentais e especialistas de áreas por categorizar cuja missão na empresa é fazer com que cada utilizador passe o maior tempo possível ao ecrã do telemóvel. Desde que seja a fazer scroll no feed, pouco importa o conteúdo. E eu estava a passar muito tempo no Facebook. O algoritmo é exímio a fazer-nos perder tempo. Desperta em nós a ansiedade de estarmos a perder qualquer coisa de terrivelmente importante – não estamos – quando nos afastamos do ecrã. É uma noção difusa, pois o «importante» aqui traduz-se na sensação de que na nossa ausência acontecem coisas que de algum modo aproximam as pessoas que a elas assistem e interagem com elas – botando likes, partilhando-as, etc. É um problema de comunhão, empatia e identidade. Um tipo gosta de se sentir compreendido, respeitado, admirado. Gosta de se sentir parte de qualquer coisa. O Facebook e a sua legião de programadores e cientistas consegue transformar – admiravelmente – aquela salganhada de conteúdos numa constelação de sensações capazes de criar um sucedâneo de sentido e de comunhão. Mas esse conjunto de sensações com rosto de experiência não corresponde de todo à verdade das coisas, ou seja, a experiência de comunidade aparentemente palpável. De vez em quando temos sinais disso, quando damos conta por qualquer razão que alguém nos bloqueou – o Facebook não nos avisa disso; aliás, não nos avisa de nada que nos possa perturbar, pois isso poderia diminuir o tempo que passamos na plataforma –, ou quando nos apercebemos que o like é uma unidade monetária sobrevalorizada. A sensação de que fora do Facebook não se perde grande coisa é acompanhada de uma lucidez acrescida: a de que o Facebook, aparentemente capaz de induzir uma leve anestesia na confusão dos dias, faz exactamente o contrário; o desfile incessante de notícias, indignações e radicalismos de todo o tipo reforça num sujeito razoavelmente normal a sensação de que o mundo é um lugar estranho e, em muitos casos, inóspito. Esse reforço, por sua vez, acaba por encaminhar o sujeito para contextos onde se sente mais confortável, seja do ponto de vista político, religioso ou simplesmente do ponto de vista afectivo. O Facebook, prometendo a máxima diversidade e transparência, é na realidade uma câmara de eco construída de forma a proporcionar uma ilusão de exterior. E, como em todas as ilusões, é mais fácil percebê-las estando de fora.
APEC | Xi alerta para o regresso à mentalidade de Guerra Fria Andreia Sofia Silva - 13 Nov 2021 O Presidente chinês, Xi Jinping, alertou ontem para o ressurgimento de uma mentalidade de Guerra Fria no leste do Pacífico, numa altura em que os Estados Unidos tentam conter a ascensão da China. O comentário de Xi, à margem da cimeira anual do Fórum de Cooperação Económica da Ásia–Pacífico (APEC), surge semanas depois de os EUA, Reino Unido e Austrália anunciarem uma nova aliança de segurança para a região, que inclui o fornecimento de submarinos nucleares para a Austrália. Pequim condenou aquele acordo. A intervenção de Xi foi feita através de um vídeo pré-gravado. O Presidente chinês vai participar numa reunião virtual com outros líderes do Pacífico, incluindo o Presidente dos EUA, Joe Biden, no sábado. Xi disse que as tentativas de traçar fronteiras na região através de linhas ideológicas ou geopolíticas fracassarão. “A região da Ásia-Pacífico não pode e não deve recair no confronto e divisão da era da Guerra Fria”, frisou. O Presidente chinês defendeu que a região deve assegurar o funcionamento das cadeias de abastecimento e continuar a liberalizar o comércio e os investimentos. “A China vai permanecer firme no avanço das reformas e na abertura, visando adicionar ímpeto ao desenvolvimento económico”, assegurou. A tarefa mais urgente na região é fazer um esforço total para combater a pandemia, acrescentou. No conjunto, os membros da APEC somam 3 mil milhões de pessoas e cerca de 60 por cento do Produto Interno Bruto (PIB) mundial. Mas tensões profundas dividem o grupo de 21 nações e territórios, que incluem membros com interesses divergentes entre si, como os EUA, China, Taiwan, Rússia e Austrália.
Exposições | Tap Seac e Oficinas Navais acolhem arte contemporânea João Luz - 13 Nov 2021 Duas exposições, com 81 obras de 22 artistas de 9 países. “Abraço na Diversidade” e “Simbiose”, são duas mostras que se tocam na partilha de visões contemporâneas com obras de artistas chineses e de países de língua portuguesa Dois blocos geográficos, uma língua vanguardista. Estão em exibição duas exposições de arte contemporânea que entre a Galeria do Tap Seac e o Centro de Arte Contemporânea de Macau – Oficinas Navais N.º 1 celebram a expressão artística moderna de artistas oriundos de países de língua portuguesa e criadores Grande Baía de Guangdong – Hong Kong – Macau. As mostras compõem os dois lados da Exposição Anual de Artes entre a China e os Países de Língua Portuguesa. Perto do local onde, reza a lenda, os portugueses atracaram em Macau pela primeira vez, o Centro de Arte Contemporânea de Macau – Oficinas Navais N.º 1 acolhe a mostra “Abraço na Diversidade” até 31 de Dezembro de 2021, onde vão estar expostas 36 obras/conjuntos de arte contemporânea com linguagens artísticas que incluem pintura, instalação, fotografia, escultura e vídeo. No total, o centro de arte contemporânea recebe obras de 17 artistas da lusofonia. A representar Portugal a mostra reúne trabalhos de Catarina Castel-Branco, Diogo Muñoz, Isabel Nunes, João Santa-Rita, Nuno Nunes-Ferreira, Rita GT e Sarah Ferreira. De Angola chegam obras de Ana Silva e Keyezua, e do Brasil para Macau vem a visão de Fernanda Lago. A “delegação” artística de Cabo Verde é composta por trabalhos da autoria de Abraão Vicente, David Levy Lima e Euclides Eustáquio Lima. Timor-Leste, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe são representados por um artista cada, a saber, Ino Parada, Nú Barreto, Gonçalo Mabunda e Kwame Sousa, respectivamente. Baía na Praça No capítulo local, a Área de Exposição da China e de Macau será a Galeria do Tap Seac, onde está patente, desde ontem e até ao fim do ano, “Simbiose”. A mostra reúne trabalhos de cinco artistas locais e cinco artistas da Grande Baía de Guangdong – Hong Kong – Macau. No total, “Simbiose” é o somatório de 45 de criações artísticas numa variedade de meios e formas, incluindo pintura a óleo, pintura acrílica, pintura a tinta em papel, fotografia, instalação interactiva de imagens criada por computador, instalação eléctrica, instalação de escultura tridimensional, instalação de luz LED e espelho, e instalação de arte performativa. A arte contemporânea local está representada por Leong Chi Mou, Lei Ka Ieng e Kit Lee, Tang Kuok Hou, Wong Iek e Jeff Wong, Yung Lai Jing e Karen Yung. Do Interior da China, a outra cara metade de “Simbiose” é composta pelas obras de Chen Yuan Long, Jiang An, Liu Xiang Lin, Xu Zi Wei e Zhang Chi.
Quarentena | Viajantes vindos por Singapura ficam no Hotel Tesouro João Santos Filipe - 13 Nov 2021 Isolados num hotel “especializado” e obrigados a fazer 10 testes de ácido nucleico nos primeiros 10 dias de quarentena. É esta a nova realidade para quem viaja de Portugal, ou de qualquer outra zona de alto risco, para Macau O Governo reviu as medidas de observação médica para quem viaja para Macau vindo de Singapura, como acontece com as ligações áreas entre a RAEM e Portugal, tornando-se obrigatório cumprir quarentena no Hotel Tesouro a partir de 1 de Dezembro. As novidades foram apresentadas ontem, por Leong Iek Hou, coordenadora do Núcleo de Prevenção de Doenças Infecciosas e Vigilância da Doença. “Os indivíduos com diferentes riscos serão distribuídos por instalações diferentes. Os indivíduos de risco máximo ficam no Centro Clínico do Alto de Coloane. Os indivíduos de risco elevado secundário têm de ir para os hotéis especializados, sem poderem fazer escolha”, explicou Leong. Segundo Liz Lam, dos Serviços de Turismo, os indivíduos de risco elevado secundário são “todos os que viajam vindos de Singapura”. Ainda de acordo com a responsável, o primeiro espaço designado como especializado é o Hotel Tesouro, o mesmo que estava a ser utilizado para isolamentos e que há dois meses registou um surto entre os trabalhadores de segurança. A escolha surgiu após a avaliação dos Serviços de Saúde e, neste momento, estão a decorrer obras na unidade hoteleira. “Escolhemos o Hotel Tesouro porque tem 500 quartos, uma capacidade grande, que facilita muito as operações. Também está fora das zonas residenciais, o que facilita as operações dos SSM”, justificou Lam. As pessoas que vierem do Interior, Hong Kong e Taiwan podem continuar a escolher o hotel para cumprir quarentena. Revisão das medidas Além da divisão das pessoas em quarentena por hotéis diferentes, foram anunciadas quatro novas medidas para os isolamentos. Quem vier de Singapura tem de fazer 10 testes nos primeiros 10 dias da quarentena. Leong Iek Hou explicou que o objectivo é detectar os casos o mais cedo possível. Questionada sobre se as mudanças da política podiam ser vistas como discriminatórias, o cenário foi recusado: “Não há rotulagem nem discriminação. A situação epidémica no estrangeiro está grave e, por isso, adoptámos medidas”, defendeu Leong. Nas outras alterações constam ainda a divisão clara de tarefas entre os serviços públicos, a realização de testes e gestão de circuito fechado para os trabalhadores dos hotéis em quarentena e a obrigação de fazer a reserva de hotel antes de viajar para Macau. Desde o início da pandemia até à passada segunda-feira, 58.060 pessoas cumpriram quarentena. No pico das quarentenas, 12 hotéis estiveram reservados para o efeito, onde foram detectados 25 dos 77 casos de Macau.
Desemprego | Procura de subsídio cai em 2021 mas triplica em 2020 João Santos Filipe - 13 Nov 2021 O desemprego está a abrandar, mas a pandemia levou à corrida ao subsídio do Fundo de Segurança Social em 2020, altura em que o valor dos apoios mais do que triplicou, passando de 14,43 milhões de patacas para 52,31 milhões A situação do desemprego tem melhorado ao longo deste ano com uma quebra de 3,6 por cento no número de indivíduos a receber o subsídio. Os dados foram apresentados na segunda-feira por Iong Kong Io, presidente do Conselho de Administração do Fundo de Segurança Social, ao canal chinês da Rádio Macau, e citados pelo jornal Cheng Pou. De acordo com Iong, nos primeiros dez meses do ano houve um total de 3.813 pessoas a receberem subsídio de desemprego, no que representou um valor de 36,88 milhões de patacas. O número de pessoas a recorrer a este apoio social demonstra uma redução de 143 indivíduos face aos 3.956 apoiados nos primeiros três meses do ano passado. Os dados anunciados por Ieong mostram assim uma quebra de 3,6 por cento. Em relação às despesas com o subsídio, no final de Outubro do ano passado, estas cifravam-se em 43,24 milhões de patacas, o que significa uma redução de 15 por cento. “Os dados mostram-nos que em comparação com o ano passado a situação do desemprego abrandou”, afirmou o presidente do Conselho de Administração do Fundo de Segurança Social. Ainda de acordo com o dirigente, desde o ano passado foram adoptados procedimentos para que os pedidos sejam aprovados o mais rapidamente possível. Ao mesmo tempo, em vez de se pagar o subsídio uma vez por mês, o valor permaneceu o mesmo, mas é pago em duas tranches, a cada 15 dias, de forma a “facilitar o pagamento”, foi explicado. Crise económica Os dados do FSS mostram também um agravar das condições de vida da população com o primeiro ano da pandemia, e as restrições de circulação, que atingiram gravemente a indústria do turismo. Em 2019, o último ano sem pandemia, o número de requerentes do subsídio de desemprego foi de 3.511, porém, no ano passado subiu para 12.141. Nem todos, entre os 12.141 requerentes, terão tido os pedidos aprovados, mas o montante anual gasto com este subsídio cresceu de 14,43 milhões de patacas para 52,31 milhões de patacas, ou seja, mais do que triplicou. Nos termos das leis em vigor, o subsídio de desemprego equivale a uma prestação diária de 150 patacas. Cada residente pode, por ano, receber 90 dias de subsídio, o que equivale a um limite máximo de 13.500 patacas por ano. O subsídio é pago a cada 15 dias, ou seja, 2.250 patacas de cada vez. Caso um residente receba as 13.500 patacas, tem de voltar a esperar um ano até poder a voltar a receber um valor semelhante.
Alojamento ilegal | Deputados preocupados com abusos criados com nova lei João Santos Filipe - 13 Nov 2021 Alteração à lei permite que se possa acolher familiares e amigos “bem” conhecidos. Porém, os legisladores temem que a vertente dos amigos possa ser utilizada para contornar a lei Segundo a revisão proposta pelo Governo à proibição de prestação ilegal de alojamento, a disponibilização de dormidas gratuitas a pessoas “bem” conhecidas, devido a motivos “familiares, profissionais de estudo ou relações pessoais” não é considerada ilegal. No entanto, os deputados da 1.ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa temem que termos como “relações pessoais” possam ser utilizados de forma abusiva, para continuar a prestar um serviço ilegal. A questão foi colocada ontem, durante a primeira reunião do grupo de trabalho, e vai ser apresentada nos encontros com os representantes do Governo, explicou Ella Lei, presidente da comissão. “Se uma pessoa presta alojamento a outra, e existe uma relação familiar ou pessoal, então considera-se que não é alojamento ilegal. Os deputados acham que as pessoas podem abusar desta regra para contornarem a lei”, explicou. De acordo com a proposta, o alojamento ilegal acontece sempre que alguém acolhe uma pessoa que esteja no território com um visto com uma duração inferior a 90 dias, a troco de dinheiro, sem ter uma licença de pensão ou hotel. Mais informações Porém, para analisarem o diploma, os membros da comissão pretendem ainda receber mais dados do Governo, nomeadamente o tipo de vistos de quem recorre ao alojamento ilegal, mas também a condição dos prestadores deste serviço, para se saber se são maioritariamente residentes ou não-residentes. “Queremos saber os tipos de vistos que detêm os prestadores de alojamento ilegal e os seus ocupantes. Pretendemos também obter dados sobre os alojamentos a baixo custo”, afirmou Ella Lei. Os legisladores querem ainda ser informados sobre os principais desafios na cobrança da multas e nas operações conjuntas entre a Direcção de Serviços de Turismo e o Corpo de Polícia de Segurança Pública. “Queremos perceber o estado da cooperação inter-departamental, porque no passado recebemos queixas de moradores sobre este aspecto. Sabemos que os Serviços de Turismo são a entidade que executa a lei, mas queremos perceber se há problemas durante a investigação e na cooperação com o Corpo de Polícia de Segurança Pública”, revelou a presidente da comissão. “Será que durante as investigações são descobertos outros crimes que depois podem criar problemas na investigação conjunta? E como é que está a ser feita a cooperação? São perguntas que os deputados querem deixar”, sublinhou.
Song Pek Kei diz que não deve haver “cortes radicais” às licenças Pedro Arede - 13 Nov 202113 Nov 2021 Abordando o futuro concurso público para a concessão das licenças do jogo, a deputada Song Pek Kei defendeu que o Governo não deve fazer “cortes radicais” e deve tratar a matéria de forma “simples”, para assegurar a estabilidade e os postos de trabalho do sector. “O Governo deve ter em conta os interesses gerais, não fazer cortes radicais e tratar esta matéria de forma simples, porque a revisão legislativa deve ter como objectivo principal a salvaguarda do mercado de emprego e a estabilidade do sector do jogo”, defendeu, vincando que as concessionárias, as salas VIP e os casinos satélite são a principal base do jogo de Macau. Recorde-se que na proposta de alteração à lei do jogo em Setembro, o Governo disse querer rever o número e prazos das concessões, bem como proibir as subconcessões. A deputada lembrou ainda que as receitas do jogo representam, actualmente entre 70 e 80 por cento das receitas financeiras do Governo e que o sector conta com mais de 80 mil trabalhadores, devendo as decisões relativas ao sector privilegiar “a estabilidade social e o desenvolvimento económico de Macau”. Para orientar o desenvolvimento do sector, Song Pek Kei sugeriu ainda que o Governo faça um “balanço do passado”, dando especial relevância às salas VIP enquanto “característica de Macau”. Sobre o desenvolvimento do sector, a deputada vinca que o Executivo deve “orientá-lo e desenvolvê-lo num trilho correcto e planeado”, de forma a desenvolver Macau enquanto Centro Mundial de Turismo e Lazer e contribuir para a diversificação económica. Jogar para não jogar A pensar no concurso para a concessão de licenças de jogo, Song Pek Kei sugeriu ainda que o Governo crie um fundo específico para a construção de elementos não jogo. Como exemplo, a deputada defendeu a criação de um “fundo de desenvolvimento para a construção de uma cidade inteligente” e um “fundo para startups” que permitam injectar mais investimentos neste tipo de actividades. Nesse sentido, defendeu que o Executivo “não deve limitar a curto prazo”, o desenvolvimento de elementos não jogo, alargando esses projectos à zona de cooperação na Ilha da Montanha e à Grande Baía. Sobre as condições dos funcionários do sector, foi sugerido um maior equilíbrio entre o tempo gasto no trabalho e em família, aumentando períodos de descanso e concedendo subsídios para quem tem de cuidar de crianças.
AL | Orçamento de 2022 aprovado apesar de chuva de críticas Pedro Arede - 13 Nov 202113 Nov 2021 Os deputados aprovaram ontem na generalidade a lei do orçamento para 2022, apesar das muitas críticas apresentadas. A redução do investimento nas obras públicas, falta de medidas para gerar receitas e ausência de referências ao cartão de consumo e ao apoio aos idosos estiveram entre as principais falhas apontadas. Sem se comprometer ou debater ideias, Lei Wai Nong admitiu discutir o assunto em sede de comissão A Assembleia Legislativa (AL) aprovou ontem, na generalidade, a proposta de Lei do Orçamento de 2022, que prevê retirar 30 mil milhões de patacas da reserva financeira extraordinária para cobrir despesas e alcançar receitas brutas do jogo de 130 mil milhões. No entanto, e apesar de ter recebido o voto favorável de todos os deputados, as críticas fizeram-se ouvir. “Espero que o Governo poupe o que deve poupar e gaste onde deve gastar”, começou por dizer Leong Sun Iok, o primeiro a intervir durante o período de discussão. Dada a tónica, o deputado criticou o facto de o orçamento prever, por um lado, um aumento de 31 por cento de despesas relacionadas com a investigação científica e, por outro, uma redução ao nível das obras públicas, materializada em menos 100 milhões de patacas alocadas ao Plano de Investimentos e Despesas de Desenvolvimento da Administração (PIDDA). Perante o aumento do número de desempregados, também Song Pek Kei foi crítica em relação à diminuição do investimento nas obras públicas, apontando que é necessário que o Governo “invista mais” para estabilizar o mercado de trabalho e a economia. “O orçamento deve ser capaz de estabilizar a economia e encontrar mais postos de trabalho. Tendo em conta a experiência de outras regiões, é necessário que o Governo invista mais para que a sociedade se desenvolva, mas o PIDDA não aumentou. Se as obras dos particulares já são poucas e o Governo reduz as obras públicas, muitos trabalhadores vão ficar sem emprego”, vaticinou. Em uníssono com José Pereira Coutinho, a deputada lamentou ainda a ausência de referências a uma nova ronda de cartões de consumo, sobretudo numa altura em que o subsídio de previdência central de 7.000 patacas destinado aos idosos continua omisso do orçamento. “No ano passado houve cartões de consumo para substituir a perda do apoio da previdência central, mas nas medidas de apoio deste orçamento, não há referências ao cartão de consumo (…) que pode servir de motor para acelerar a economia”, disse Song Pek Kei. Também Ella Lei e Ron Lam questionaram o Governo sobre as razões para não terem sido reservadas verbas destinadas aos idosos, quando a pandemia continua a criar muitas dificuldades à população. Numa altura em que a ordem é para cortar nas despesas, a deputada quis também saber o que explica o aumento dos investimentos em empresas de capitais públicos como a Macau Investimento e Desenvolvimento, S.A.. Dar a volta ao texto Do lado das receitas, e perante a diminuição dos rendimentos afectos ao jogo, Ip Sio Kai, Pereira Coutinho e Song Pek Kei apontaram que o orçamento é parco em ideias para encontrar novas fontes de rendimento. Como sugestão, os deputados colocaram a hipótese de o Executivo apostar na venda de terrenos ou na emissão de obrigações. Por seu turno, Ron Lam propôs ao Governo repensar algumas medidas de apoio à população que se mantêm inalteradas desde 2008, como os cheques pecuniários ou a isenção de rendas para vendilhões. “Concordo com as medidas de apoio, mas não devemos ajustá-las? Há vendilhões que abrem a banca só para passar o tempo e (…) o valor da compensação pecuniária não é pouco, sobretudo quando muitos dos que recebem o cheque não residem em Macau”, apontou. Na resposta, o secretário para a Economia e Finanças, começou por dizer que o orçamento deve ser “pensado de forma integral”. Sobre as propostas apresentadas, nomeadamente quanto ao apoio aos idosos, Lei Wai Nong não se comprometeu e admitiu discutir o assunto apenas em sede de comissão. Foi dito ainda que o Governo está a ponderar emitir obrigações para aliviar a crise económica e que a zona de cooperação em Hengqin será uma das soluções para revitalizar a economia de Macau. Suicídio | Lo Choi In diz que serviços sociais fazem “omeletes sem ovos” Preocupada com o aumento do número de suicídios e outras problemáticas associadas à pressão gerada pelo prolongar da pandemia de covid-19, a deputada Lo Choi In apontou que o Governo deve aumentar os apoios destinados às instituições de cariz social. Segundo a deputada, com as diversas medidas de austeridade adoptadas pelo Governo, as instituições profissionais cívicas foram “gravemente afectadas” e que isso limita a cobertura e a profundidade dos seus serviços. Isto, quando, apesar de não ter havido cortes no financiamento, o número de casos disparou. “As autoridades não reduziram os salários e o número de trabalhadores, mas (…) os pedidos de assistência aumentaram significativamente e é difícil fazer omeletes sem ovos. A falta de verbas limitou gravemente o desenvolvimento dos diversos trabalhos, reduziu significativamente a qualidade dos serviços e impossibilitou o acesso dos utentes aos serviços de apoio”, afirmou. Covid-19 | Wong Kit Cheng defende apoio a empresas com elevada taxa de vacinação No seguimento do início do plano de inoculação da 3.ª dose da vacina contra a covid-19, a deputada Wong Kit Cheng defendeu que o Governo deve aproveitar a oportunidade para atribuir apoios às empresas que apresentem elevadas taxas de vacinação. “Há que estudar medidas para as empresas em que a taxa de vacinação já tenha atingido um determinado nível, nomeadamente, conceder-lhes apoio ou, caso se registem alterações da situação de pandemia, dispensá-las das medidas restritivas ou da suspensão do funcionamento”, disse no período dedicado às intervenções antes da ordem do dia. Além disso, a deputada apontou que devem ser concedidos mais incentivos aos vacinados “no dia-a-dia”, tendo por base a aceleração do reconhecimento mútuo e da interligação com o Interior da China e Hong Kong no âmbito dos registos de vacinação. Com o objectivo de aumentar a taxa de vacinação, Wong Kit Cheng sugere ainda que o Executivo conceda um período de descanso após a vacinação. Também Zheng Anting pediu que o Governo crie “o quanto antes” um sistema de reconhecimento mútuo de vacinação com o Interior da China e Hong Kong, para prepare a abertura das fronteiras no futuro. Para que a normalização de movimentos entre Macau e as regiões vizinhas seja uma realidade, o deputado sugere que o Governo concretize o “registo autenticado” dos cartões Macau Pass e implemente a função de rastreamento no código de saúde. “[Estas medidas podem] reduzir os custos sociais, como a realização de testes em massa de ácido nucleico, o confinamento, a suspensão do sector dos serviços e das aulas, etc”, vincou.
Código de saúde com função de rastreamento lançado este mês Nunu Wu e Pedro Arede - 11 Nov 2021 O director dos Serviços de Saúde, Alvis Lo Iek Long revelou ontem que até ao final de Novembro, será lançada uma versão experimental do código de saúde com a funcionalidade de rastreamento de itinerários incluída. Segundo o responsável, o rastreamento será feito voluntariamente através da leitura de códigos QR instalados à entrada de estabelecimentos e espaços públicos, fazendo com que esses locais, e respectiva hora de acesso, fiquem registados, apenas, nos telemóveis dos utilizadores. Durante a fase experimental, a função de rastreamento será aplicada exclusivamente em instituições públicas afectas aos Serviços de Saúde, prevendo-se que seja alargada posteriormente a mais espaços “consoante as opiniões dos utilizadores” e as melhorias que venham a ser implementadas. À margem do programa “Fórum Macau” do canal chinês da TDM-Rádio Macau, o director dos Serviços de Saúde revelou ainda que, até à manhã de ontem, 292 pessoas tinham sido inoculadas com a terceira dose da vacina contra a covid-19. Destas, apontou o responsável, 224 optaram por receber a dose de reforço com o mesmo fármaco, ao passo que 68 escolheram mudar de vacina, acabando por cruzar doses da BioNTech e da Sinopharm. Firmes e constantes Citado pela TDM-Rádio Macau, Alvis Lo recordou que os Serviços de Saúde recomendam que a população opte por tomar uma terceira dose igual à vacina administradas anteriormente. “Recomendamos que as pessoas devem ser vacinadas com o mesmo tipo de vacinas”, disse. Questionado sobre a decisão de Singapura de obrigar não vacinados a pagar pelo tratamento médico caso acabem infectados com covid-19, Alvis Lo afirmou estar atento às medidas que estão a ser tomadas um pouco por todo o mundo, mas apontou que em Macau a lei dita que a população tem o direito de ser tratada. “Estamos atentos às medidas que estão a ser tomadas em todo o mundo. E na perspectiva de todo o mundo a maneira mais eficaz [de prevenir a doença] é a vacinação. Mas em Macau, de acordo com as leis vigentes, as pessoas que são infectadas com doenças transmissíveis têm o direito de ser tratadas. Por isso só podemos cumprir a lei”, referiu Alvis Lo de acordo com a mesma fonte.
Uma genealogia simples da violência obstétrica Tânia dos Santos - 11 Nov 2021 Toda a gente tem medo da violência obstétrica. As parturientes, claro, mas também a Ordem dos Médicos (OM) em Portugal. A OM tem tanto medo da violência obstétrica que quer negar-lhe qualquer tentativa de definição. Não querer defini-la não quer dizer que a violência não exista. Se uma árvore cai no bosque, e ninguém estiver por perto para ouvir, emite algum som? Será que a resistência das instituições em nomear a violência obstétrica é porque ela não existe num país desenvolvido como Portugal? A Associação Portuguesa pelos Direitos da Mulher na Gravidez e Parto inquiriu várias mulheres acerca do seu parto e da sua interação com a equipa médica. O inquérito mostrou dados preocupantes sobre práticas não consentidas ou de práticas que não têm suporte científico – uma desatualização atroz entre a investigação e a prática. O resultado para o mau-estar das parturientes mostrou-se notório também. A necessidade de desenvolver mais investigação na área é urgente, porque existem vozes, realidades e perspectivas que parecem estar obscurecidas no suposto “normal” de realidades institucionais. A OM pega nos resultados deste inquérito para tirar uma conclusão diferente. No parecer sugerem que os dados não reflectem práticas de violência obstétrica, mas revelam insatisfação na relação entre parturientes e as equipas médicas. Esta é uma re-significação, no mínimo, interessante. Na visão da OM, as mulheres não são vítimas de violência obstétrica, mas estão insatisfeitas com o serviço prestado. Sim, o termo violência obstétrica é forte, pressupõe agressores e vítimas. Para a comunidade médica que tem como preocupação máxima a vida humana parece uma ofensa insinuar que as práticas diárias nas maternidades portuguesas – os sistemas – estão a promover práticas de violência. Mas reduzir estas experiências a uma disposição da parturiente é querer continuar a não ouvir quem deveria estar no centro de tudo o que o parto envolve: as mulheres a parir. A presente polarização deve-se muito em parte a esta incapacidade para o diálogo. Numa situação em que as pessoas se insurgem contra a falta de humanismo no parto, a OM tenta deslegitimar em vez de tentar dialogar. Não é surpreendente. As culturas institucionais parecem insistir num parto altamente medicamentado sem criar o espaço para as parturientes terem voz ou vontades. Das práticas referidas são as episiotomias de rotina e a manobra de Kristeller – que são contraindicadas na literatura e pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Também a posição ginecológica/litotomia (posição deitada) não é a mais indicada para parir e muitas instituições não permitem outras. A violência obstétrica tem no seu coração uma visão exclusivamente médica do parto e de uma relação hierárquica – de poder e autoridade – sobre o que o parto pode ser, infantilizando a parturiente e despindo-lhe de qualquer vontade, ou até sabedoria sobre o seu próprio corpo. A violência obstétrica mostra que é preciso construir uma visão do parto onde a parturiente é ouvida e onde as intervenções médicas são informadas, discutidas e consentidas. A argumentação da OM parece ter resquícios de uma visão do conhecimento médico como o propulsor do desenvolvimento. Num país onde a mortalidade materna e infantil tem vindo a diminuir a olhos vistos, agarram-se a esse indicador para justificar as práticas correntes. O contexto português, diz a OM, não tem problemas com direitos humanos, e a violência obstétrica é coisa dos “bárbaros”, parecem insinuar. Só que os gritos por ajuda são outros. Não se trata de recusar todo o desenvolvimento científico até agora, mas exigir melhores cuidados médicos no parto. É preciso reconhecer que a redução da mortalidade não é o único indicador de sucesso. O bem-estar das parturientes – que é tanto físico como emocional e psicológico – tem que ser considerado no desenho institucional de intervenção no parto. Até porque esse bem-estar ajuda no processo do parto em geral. Esta conversa pode ser estendida para as outras especialidades médicas. Mas a situação do parto é especialmente caricata porque tem sido construído como um evento de alto risco, com necessidade de intervenção médica obrigatória, uma visão, dizem alguns profissionais, um pouco exagerada. Outros países desenvolvidos mostram que há outras formas de abordar a questão. No Reino Unido, o Sistema Nacional de Saúde prevê que as mulheres saudáveis, sem uma gravidez de risco, podem ter o parto em casa se assim o desejarem. Podem estar rodeadas por quem quiserem e parirem na posição que quiserem. A genealogia da violência obstétrica exigiria muito mais tinta e papel, não tenho dúvidas. Esta uma visão simplificada para a tensão que hoje assistimos: a falta de diálogo nas salas de parto é um dos muitos sintomas da contínua falta de diálogo protagonizado pelas instituições médicas. E os dissidentes resistem ao trazer para a esfera pública uma visão do cuidado que é fundamentalmente humana: com capacidade de escutar os gritos de desconforto e de trauma das parturientes – com muitavontade de mudança.
Efeitos de vida António Cabrita - 11 Nov 202111 Nov 2021 01/11/21 Estou imensamente agradecido por o Super-Homem ter mudado a sua orientação sexual. Ele era um entrave na minha até aqui estoica paixonite por Lois Lane, a intrépida repórter que achava o Clark Kent um banana – isto na Terra 1, antes de inventarem uma Terra 2 na série televisiva e de os terem casado só para minar a minha confiança numa hipotética abordagem. Outras hipóteses se abrem agora. E esta viragem só corrobora o que sempre pensara: que ele não era homem suficiente para ela. Já aumentei a carga horária no Pilates. 02/11/22 Leio no “Livro do Desassossego”: «Considerando que eu ganhava pouco, disse-me o outro dia um amigo, sócio de uma firma que é próspera por negócios em todo o Estado: “Você é explorado, Soares.” Recordou-me isso de que o sou; mas como na vida temos todos de ser explorados, pergunto se valerá menos a pena ser explorado pelo Vasques das fazendas do que pela vaidade, pela glória, pelo despeito, pela inveja ou pelo impossível. Há os que Deus mesmo explora, e são profetas e santos na vacuidade do mundo.» Faltou a Karl Marx este entendimento das entrelinhas entre os humanos para perceber que a exploração do homem não é de facto só económica mas se alarga ao espectro mais amplo da antropologia e do comportamento interpessoal. Com mais este instrumento de análise, talvez as revoluções falhassem melhor, ou deixassem menos sequelas. Entregar tudo na crença acéfala da neutralidade das “estruturas”, sem regras que considerem a provável pequenez do homem que as instrumentaliza foi o erro da esquerda desde sempre. Neste item valia a pena fazer uso de algumas análises de René Girard (que explica como a imitação e a inveja comandam as relações humanas), mas como este se converteu ao cristianismo, canhestramente, oblitera-se. 03/11/22 Mais adiante, escreve Bernardo Soares: «A literatura, que é a arte casada com o pensamento, e a realização sem mácula da realidade, parece-me ser o fim para que deveria tender todo o esforço humano, se fosse verdadeiramente humano, e não uma superfluidade do animal. Creio que dizer uma coisa é conservar-lhe a virtude e tirar-lhe o terror. Os campos são mais verdes no dizer-se do que no seu verdor. As flores se forem descritas com frases que as definam no ar da imaginação, terão cores de uma permanência que a vida celular não permite.», e fico abismado, porque aqui Pessoa mais não diz do que aquilo que Marc-Mathieu Münch defende ferverosamente desde 1991, isto é com setenta anos de atraso. Este professor de literatura comparada cujas ideias eu descobri por grosso num livro sobre Estética redigido por um homem de 96 anos, Edgar Morin, defende, contra o relativismo que lançou no pântano a possibilidade de qualquer juízo estético ou literário, que existem «invariantes planetárias» que nos permitem estabelecer alguns «corolários», seis, na verdade, e que esta base legitima retomar a questão fundamental da natureza da arte literária. Dos seis corolários, sobressai «o efeito de vida», fulguração que está presente no seio das obras mais profícuas, aquelas que, como diria o poeta Robert Juarroz «ampliam as escalas do real». Resgatar pela arte o real do seu confinamento e sensibilizar-lhe novas estrias, de modo a que “os campos sejam mais verdes” e o perfume das flores mais extenso é forcejar no caminho que leva o homem a ser mais consciente de que não passa de um “morto transfronteiriço”, sendo o seu dever despertar os sentidos e a realidade que eles semeiam. Aliás, na esteira de Susan Sontag, que em “Contra a Interpretação” assim se pronunciava: «Rilke descreveu o artista como aquele que trabalha “para uma ampliação das regiões dos sentidos individuais”; McLuhan chama os artistas de “especialistas em consciência sensorial”. E as obras de arte contemporânea mais interessantes (pode-se começar pelo menos desde a poesia simbolista francesa) são aventuras entre as sensações, novas “misturas sensoriais” (…) O importante agora é recuperar os nossos sentidos. Precisamos aprender a ver mais, a ouvir mais, a sentir mais.» 04/11/21 Explicava Eliot, “quando a mente do poeta está perfeitamente equipada para o seu trabalho, está constantemente amalgamando experiências díspares”, as quais formam novas totalidades. A estas afluem todos os recursos e não apenas uns ou outros — oponhamo-nos a todas as modalidades redutoras. Não há poemas simples. Mas este conflito emerge periodicamente, com vários nomes, no território da poesia, reacendendo uma guerra antiga: a que se trava entre a memória e a imaginação, i.é, entre o velho e o novo, como se não pudessem e devessem conviver. Sempre achei um mistério esta interdição de um trânsito nas duas direcções, na medida em que uma sem a outra propendem a coagular. Nem a inteligência que as imbrica e as torna operatórias consegue actuar sem recorrer a uma e a outra à vez, ou simultaneamente, pois a memória inclusive só se actualiza pela recriação. E nesta há uma parcela de imaginação. 05/11/21 A arrumar materiais para compor um livro redescubro este brinquinho: «PHODER LEVA EM SI MESMO A CONSOANTE MUDA QUE BATE AS CLARAS EM CASTELO!» Um slogan que escrevi contra o Acordo Ortográfico. Não percebo porque nunca fui convidado por nenhuma agência publicitária, alguma mazela terei…
Xunzi 荀子 – Elementos de ética, visões do Caminho Hoje Macau - 11 Nov 2021 O Caminho da Liderança, Parte II O uso apropriado de equipamentos e medidas flui da boa ordem, mas não é a fonte da boa ordem. A fonte da boa ordem é a pessoa exemplar. Os oficiais vigiam as medidas, e a pessoa exemplar nutre a fonte. Se a fonte for pura, aquilo que dela fluir é puro. Se a fonte for turva, aquilo que dela flui é turvo. Assim, se o superior amar o ritual e yi [justiça], se elevar os meritórios e empregar os capazes, se o seu coração for sem avidez de lucro, então os seus subordinados cederão e deferirão o mais possível, atingirão o cúmulo da lealdade e fiabilidade e serão diligentes no seu serviço como ministros. Se forem assim, então mesmo a mais baixa das pessoas comuns será digna de confiança mesmo antes de se quebrarem e juntarem as tábuas, mostrará imparcialidade mesmo antes de se tirarem as sortes, será equilibrada mesmo antes de se aferirem as balanças e se verificarem os pesos e será equitativa mesmo antes de se medirem arrobas e alqueires e se alisar o topo dos recipientes. E assim o povo trabalhará arduamente sem expectativa de recompensas e obedecerá sem temer castigos. As coisas serão ordenadas sem aqueles que mandam terem de se esforçar laboriosamente e o estado estará repleto de bons costumes sem uma profusão de ordens governamentais. Ninguém, de entre o povo comum, se atreverá a desrespeitar as leis do seu superior, a não cumprir as suas intenções, a não trabalhar arduamente nas suas tarefas, mas todos se sentirão tranquilos, deleitando-se em segui-lo. Por isso, ao entregarem os impostos não se preocuparão em pagá-los, ao se dedicarem a projectos não se preocuparão em labutar duramente e, ao lidarem com bandidos e outros arruaceiros, não se preocuparão em morrer. As muralhas da cidade serão sólidas sem ser preciso esperar que as reforcem, as lâminas das armas estarão afiadas sem ser preciso esperar que as amolem. Os estados rivais se submeterão sem ser preciso esperar que sejam dominados e todos no território rodeado pelos quatro mares serão unificados sem ser preciso esperar que lhes dêem ordens. A isto se chama a paz suprema[1]. As Odes dizem: Quando o plano do rei foi um verdadeiro sucesso, As terras de Xu aquiesceram[2]. Isto exprime o que quero dizer. [1] Aqui, a palavra para paz é píng 平, que se traduz por “equilíbrio” – Xunzi joga com os dois sentidos do termo de um modo que é difícil transmitir noutro idioma. [2] O poema de onde foi extraída esta citação descreve como a terra de Xu é atacada e submetida pelo rei Xuan (regnavit 827-782 a.C.), o décimo primeiro monarca da dinastia Zhou. Nota Xunzi (荀子, Mestre Xun; de seu nome Xun Kuang, 荀況) viveu no século III Antes da Era Comum (circa 310 ACE – 238 ACE). Filósofo confucionista, é considerado, a par do próprio Confúcio e Mencius, como o terceiro expoente mais importante daquela corrente fundadora do pensamento e ética chineses. Todavia, como vários autores assinalam, Xunzi só muito recentemente obteve o devido reconhecimento no contexto do pensamento chinês, o que talvez se deva à sua rejeição da perspectiva de Mencius relativamente aos ensinamentos e doutrina de Mestre Kong. A versão agora apresentada baseia-se na tradução de Eric L. Hutton publicada pela Princeton University Press em 2016.
Taiwan | Delegação de políticos norte-americanos inicia visita à ilha Hoje Macau - 11 Nov 2021 Depois da recente visita de deputados europeus, um grupo de políticos norte-americanos, todos do Partido Republicano, está desde terça-feira em Taiwan. A China já criticou veementemente a presença dos congressistas e senadores dos EUA, classificando-a como mais um “acto de provocação” Um grupo de congressistas e senadores dos Estados Unidos iniciou ontem uma visita a Taiwan, numa viagem que Pequim já classificou como um “acto de provocação”. O jornal de Hong Kong South China Morning Post apontou que a delegação dos EUA desembarcou em Taiwan na terça-feira, a bordo de um avião militar oriundo de Manila. De acordo com o mesmo jornal, que cita duas fontes familiarizadas com a viagem, que pediram o anonimato, a delegação é composta por pelo menos seis representantes políticos, incluindo os senadores John Cornyn, Tommy Tuberville, Mike Crapo e Mike Lee, e o congressista Jake Ellzey, todos do Partido Republicano. O Ministério dos Negócios Estrangeiros de Taiwan detalhou que a viagem é organizada pelo Instituto Americano de Taiwan (a embaixada ‘de facto’ de Washington na ilha, já que, em 1979, os Estados Unidos romperam relações diplomáticas oficiais com Taipé, e estabeleceram laços com Pequim). As autoridades de Taiwan recusaram-se a especificar a duração e os objectivos da visita e anunciaram que estas informações vão ser disponibilizadas “na devida altura”. Relações espinhosas Para a China, este é o mais recente “acto de provocação” num conflito particularmente espinhoso entre as duas maiores economias do mundo. “Exigimos que os Estados Unidos cessem imediatamente as suas acções provocadoras e destrutivas, que levam à escalada da tensão no Estreito de Taiwan, e parem de enviar mensagens erradas às forças separatistas em Taiwan”, disse em comunicado o porta-voz do Ministério da Defesa da China, Tan Kefei. O porta-voz do comando do Teatro de Operações do Exército Chinês, o coronel Shi Yi, anunciou que os militares chineses vão iniciar uma série de manobras, perto do Estreito de Taiwan – uma acção habitual, de cada vez que políticos estrangeiros visitam a ilha. A última vez que representantes dos EUA visitaram Taiwan foi em Junho passado, enquanto outro grupo fez o mesmo em Abril, a primeira vez desde a chegada de Joe Biden à Casa Branca. Ao longo deste ano, intensificaram-se as incursões de aviões militares chineses na zona de identificação aérea de Taiwan (554 entre Setembro de 2020 e Agosto de 2021, segundo um relatório recente dos militares do território).
Inês Pedrosa, escritora: “Machismo serve mal mulheres e homens” Andreia Sofia Silva - 11 Nov 2021 O que mudou no papel da mulher desde o ano 2000, ano em que foi lançada a primeira edição de “Vinte grandes mulheres do século XX”? Com uma nova reedição apresentada este ano, Inês Pedrosa defende que mudou muita coisa, mas que há ainda muito por fazer. A escritora, e também editora, acaba de lançar, em português, os escritos do poeta chinês Jidi Majia O seu último livro fala das grandes mulheres do século XX. Como chegou a esta selecção? Foi difícil porque, felizmente, no século XX, as mulheres surgiram, e, portanto, há muitas. Na verdade, este livro é uma reedição de um livro publicado em 2000, intitulado “As 20 mulheres para o século XX”. Tudo começou porque colaborava com o Expresso e o jornal pediu-me uma biografia da Eva Péron, e depois comecei a pensar na sua força, que foi maior do que a do marido. Era um populismo específico, ela foi uma das primeiras populistas. Vinha do nada e tornou-se um ícone político. Pensei que seria interessante fazer um livro com as mulheres do século XX e fui pensando nas mais diversas áreas. A selecção é arbitrária, pois procurei mostrar a entrada de mulheres em diversas áreas onde não tinham grande expressão. [A escolha] é arbitrária porque acaba por ser também uma selecção em torno das mulheres que, de alguma maneira, me marcaram. Não tenho nada a ver com a madre Teresa de Calcutá, mas foi muito interessante ver como na Igreja Católica, um centro patriarcal, aquela freira conseguiu ser um Papa, à sua maneira. Não são mulheres com as quais concordo mas são polémicas, controversas, e tinham um projecto de poder sobre a linguagem, como a Virginia Woolf. Uma das críticas que me fizeram quando o livro saiu pela primeira vez foi só ter escolhido cinco portuguesas no meio de 20 mulheres do mundo inteiro. Como reagiu? Disse que se fosse norte-americana, as 20 mulheres do século XX seriam, talvez, 19 americanas e uma não americana. Era um livro para sair em Portugal com a força das mulheres de Portugal e, felizmente, quando o publiquei, quase todas elas estavam vivas e agora a Paula Rego e a Maria João Pires ainda estão. O livro estava fora do mercado há muito tempo e por isso fiz uma revisão das biografias. Tem também ensaios biográficos, porque em cada uma das figuras procurei pensar como é que elas tinham contribuído para mudar a imagem das mulheres e para lhes dar poder. Por exemplo, a Bette Davis não cumpria os padrões de Hollywood mas conseguiu fazer um caminho de uma Meryl Streep, o que foi muito mais difícil no seu tempo. Refiz esse livro, mas hoje apetecia-me fazer 40 figuras. O que mudaria então no livro, caso existisse esse projecto? Gosto muito do Brasil, e quando escrevi este livro [na primeira edição] não conhecia a Clarice Lispector, que hoje teria incluindo. Teria incluindo uma figura como Carolina Maria de Jesus, que é uma favelada do Brasil que fez uma obra literária que só agora veio a ser descoberta, ou a Billie Holiday. Hoje falta a mulher negra nestas mulheres do século XX, que tiveram muito mais dificuldades. A mulher sempre foi destratada pela outra metade da sociedade e a mulher negra ainda mais, mesmo as que conseguiram ser figuras que se destacaram. Demoraram mais a ter esse destaque durante o século XX e hoje, século XXI, é que lhes estamos a dar esse crédito. Houve uma evolução do papel da mulher ao longo destes anos? Apesar de tudo, houve. Quando era jovem, nos anos 80, dizia-se “estamos quase a chegar lá”, e começou a dizer-se que não se podia deixar de contar com as mulheres. Agora oiço um discurso “o que interessa se são homens ou mulheres? O que interessa é a qualidade”. Criei uma editora [Sibila] para publicar mulheres porque têm muito menos visibilidade que os homens. Nas redes sociais, que hoje são um pouco o barómetro do nosso tempo, aparecem-me logo homens e mulheres que dizem não reparar se lêem um escritor ou uma escritora, que só lhes interessa a qualidade. Não se trata aí de esconder a realidade? Há uma tentativa de fazer isso. Sinto que, cada vez que há uma crise económica, há uma tentativa de afastar as mulheres dos lugares de visibilidade, sempre que escasseia o trabalho e o dinheiro empurram-se as mulheres. Houve uma certa inversão e agora está também na moda dizer que não há mulheres, que somos todos pessoas. E quando se começa a dizer isso, deixamos de ter estatísticas sobre a violência sobre as mulheres. Sinto que as mulheres começaram a ganhar uma tal presença que agora se tenta apagá-las de diversas maneiras. Há uma discriminação sub-reptícia que é muito mais forte, porque é menos visível. Mas por outro lado vejo uma juventude que não voltará atrás. Claro que é privilegiada, estudou, tem mais mundo do que nós tínhamos. As mulheres da nova geração não se deixarão ultrapassar desta maneira. O livro “Nas Tuas Mãos” conta três gerações de mulheres, e depois editou “Os Íntimos”, onde os homens falam sobre mulheres. Sente que também faz um trabalho em torno dos sentimentos e da questão do género? Sinto. É engraçado falar-me do “Nas Tuas Mãos”, porque vou reeditá-lo este mês, já está na gráfica. Esse livro não está a ser editado porque não renovei o contrato com a D. Quixote e vou reeditá-lo eu. Comecei uma editora em 2017 e no ano passado terminei o contrato com a Porto Editora e não faz sentido não editar o meu livro. Assim já não tenho que ouvir que tenho mau feitio, e que sou esquisita com as capas. Portanto vou colocar todos os meus livros no mercado à medida que lanço outras obras de outros autores. Editei agora um livro de um poeta chinês maravilhoso. Mas de facto o mundo das mulheres está em “Nas Tuas Mãos” e de como esse mundo evoluiu ao longo do século XX em Portugal. “Os Íntimos” apareceu depois de eu ter verificado que, quer em Portugal ou no Brasil, e em outros países, existir aquele hábito dos homens que são amigos de infância e que têm o hábito de juntar um grupo para um jantar em dia de futebol, mas como uma espécie de porto de abrigo, e que é muito diferente da relação das mulheres. Verifiquei que vários amigos meus, de idades diferentes, tinham esse hábito. A sociedade patriarcal e o machismo também torna os homens muito inseguros e obriga-os a serem muita coisa que vai contra eles mesmos. O feminismo só ganhará quando perceber que o machismo serve mal as mulheres e os homens. Cria infelicidade, lugares fixos, obrigações, clichés. O homem não chora… Sim, ou que o homem tem de estar sempre pronto para o sexo. O homem tem de ir à guerra. Quem viveu em Portugal antes do 25 de Abril sabe disso. O meu irmão cresceu na iminência de que, quando fosse grande, iria para África pegar em armas. Mas contra quê? São temas interessantes porque nada mudou tanto. Dizemos que o século XX foi o século das grandes descobertas do espaço, da tecnologia. Mas foi uma revolução nas relações humanas. Voltando à edição dos escritos do poeta chinês. Como chegou a esse autor? O livro acabou de sair [Planeta Dilacerado, de Jidi Majia]. Conheci-o através do poeta Nuno Júdice, um grande amigo meu. Ele leu esse poeta em tradução francesa e espanhola e gostou muito. O livro tem vários poemas, mas tem um poema central que se chama “Planeta Dilacerado”, uma espécie de poema épico sobre o tempo contemporâneo que estamos a trazer ao planeta. Uma espécie de manifesto poético, mas muito, muito bom. Com o livro “Faz-me Falta” teve a sua afirmação como escritora? Não falo do número de edições vendidas, mas para si própria. (Hesita). Para mim foi um livro muito especial, muito duro de escrever, mas muito fácil. Demorou muito a sair, mas é o único livro que tenho manuscrito, e foi quase todo sem rasuras, o que é raro, pois eu corrijo imenso. E foi um livro muito forte para mim. Foi talvez a minha afirmação como escritora porque quando entreguei o livro ao editor, ele achou que eu o devia reescrever novamente, porque era muito triste, muito poético, e ele achou que os meus leitores de “Nas Tuas Mãos” não iam gostar. Os críticos também iriam achar que era um lirismo descabelado. E eu disse que o livro era aquilo e que se tinha sido importante para mim iria ser importante para alguém. Lutei pelo livro. Até hoje, quando encontro alguém na rua, me falam desse livro. Não posso se não estar grata a ele. Mas acho que os meus últimos livros são melhores do que todos esses. Talvez goste mais do “Nas Tuas Mãos”, pois foi um livro que me fez viajar muito na minha cabeça. Aquelas personagens não têm a ver comigo mas ajudaram-me a perceber muitas coisas. O livro é como se fosse uma viagem a Portugal desde meados do século XX. Sim. A história da Jenny, improvável, do casamento disfarçado, contaram-me como sendo de uma tia de uma amiga, que eu não conheci, que morreu louca, sozinha e virgem. Sonhei com essa velha a dizer “estás a julgar a tua vida com os parâmetros que não são os meus”, e aí comecei a escrever por causa disso. Depois percebi, na minha história, que não é uma vítima, é outra coisa. Depois ela é que chamou as outras personagens. A história da Jenny é do tempo daquele salazarismo denso, do tempo da guerra, e senti que tinha de haver resposta de outras mulheres. Surge então o período do 25 de Abril, dos anos 80 no Frágil, no Bairro Alto. Aí foi a minha experiência. O que é que se tinha transformado, o que é que tinham sido aqueles anos 80? Recuperei um bocado isso novamente no último romance que escrevi, “O Processo Violeta”. Os anos 80 foram os anos da minha juventude, mas também de ebulição em Portugal, quando assentou a democracia. Íamos para a Europa e havia um cosmopolitismo um bocado estonteado. Era a experimentação.
Grande Prémio | 133 pilotos participam na edição deste ano Pedro Arede - 11 Nov 2021 Ao todo, a 68.ª edição do Grande Prémio de Macau vai receber 133 pilotos, que vão estar obrigados a fazer testes à covid-19 a cada 48 horas. O evento, que acontece de 19 a 21 de Novembro, vai afectar o trânsito, levar à alteração de cerca de 50 carreiras de autocarros e mobilizar 400 agentes. A organização apela à população para andar a pé A organização do Grande Prémio de Macau revelou ontem que serão 133 os pilotos a participar na 68.ª edição do evento, denotando um aumento em relação aos 119 que marcaram presença no ano passado. De acordo com Pun Weng Kun, Coordenador da Comissão Organizadora do Grande Prémio de Macau, os pilotos estão “a pouco e pouco” a chegar a Macau apesar dos recentes surtos de covid-19 registados no Interior da China e, durante a competição, serão submetidos a testes de ácido nucleico a cada 48 horas. “A situação da pandemia no Interior da China tem vindo a recuperar gradualmente a estabilidade e, até agora, todos os pilotos estão habilitados a vir competir a Macau”, assegurou ontem o responsável durante uma conferência de imprensa dedicada às medidas de tráfego a aplicar devido ao Grande Pémio. De referir ainda que, durante a conferência de imprensa, a lista de pilotos participantes não era ainda conhecida. No entanto, poucas horas depois, as listas provisórias dos pilotos inscritos nas seis corridas previstas foram divulgadas online, após a questão ter sido lançada pelos jornalistas. Relativamente às alterações de trânsito, foi dito que entre os dias 19 e 21 de Novembro haverá, como habitualmente, cortes em várias artérias e alterações em dezenas de carreiras de autocarros. Ao todo, serão cerca de 50 as carreiras afectadas, havendo mudanças nos respectivos percursos. Por seu turno, a carreira H2, ficará suspensa durante esses dias. Também, como de costume, serão criados os percursos especiais 12T, entre o Terminal Marítimo do Porto Exterior e a Praça Ferreira Amaral, e 31T, entre o Terminal Marítimo do Porto Exterior e a Paragem Provisória do Fórum Macau. Por fazerem parte do circuito, a Avenida de Amizade, Avenida Venceslau Morais, Ramal dos Mouros e Rua dos Pescadores serão cortadas ao trânsito durante a realização das provas. Antes disso, entre os dias 16 e 18 de Novembro, devido à instalação de 159 barreiras metálicas, haverá constrangimentos em alguns locais da cidade, como na Estrada de Cacilhas, Estrada D. Maria II, Avenida da Amizade e na Rua dos Pescadores. Patrulha reforçada Para garantir o bom desenrolar das operações na via pública, serão destacados mais de 400 agentes para os pontos onde se prevê que haja maior pressão na circulação de trânsito, nomeadamente na zona norte e centro da cidade. Dos três dias de competição, o primeiro, por ser sexta-feira é aquele onde se prevêem maiores constrangimentos. “As vias rodoviárias vão ficar sobrecarregadas sobretudo na sexta-feira [dia 19 de Novembro]”, começou por dizer Lo Seng Chi, subdirector da Direcção de Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT). “Apelo aos cidadãos para prestarem atenção aos arranjos de trânsito e, se possível, que andem a pé para chegar aos seus destinos. Esperamos que os estudantes saiam de casa mais cedo e que as empresas sejam flexíveis com os horários”, apontou. A organização revelou ainda que, no ano passado, foram registados 2.000 casos de estacionamento ilegal e foi necessário rebocar 13 veículos durante os três dias de competição.
Jogo | Lawrence Ho conservador face à reabertura do território João Santos Filipe - 11 Nov 2021 A operadora Melco está preparada para que o levantamento das restrições de circulação com o Interior demore quase um ano, devido à política de zero casos de covid-19. Resultados da empresa agravaram-se no último trimestre A concessionária Melco está cautelosa face à reabertura das fronteiras e à recuperação do sector do jogo no próximo ano. Segundo Lawrence Ho, as condicionantes da política de zero casos de covid-19, as restrições de circulação, assim como os eventos de cariz político no Interior e em Hong Kong vão continuar a ter impacto no território. As explicações foram avançadas após a apresentação dos resultados financeiros, e o empresário revelou acreditar que a reabertura da circulação sem restrições para o Interior vai demorar entre seis e 12 meses, devido às medidas pandémicas adoptadas. “Acho que neste momento quase metade das províncias da China tem casos ou casos de contacto próximos. Isso afecta as viagens e vamos ter uma abordagem conservadora [nas previsões sobre o levantamento de restrições de circulação]”, justificou o empresário. “O próximo ano é igualmente muito importante para a China, devido à organização dos Jogos Olímpicos, à Eleição do Chefe do Executivo de Hong Kong, celebração do 25.º aniversário da transição de Hong Kong e à realização do Congresso do Partido Comunista, onde o Presidente Xi vai procurar assegurar um terceiro mandato”, explicou. “Estas são todas razões para sermos super conservadores em termos da abertura”, acrescentou. Apesar dos desafios, o filho de Stanley Ho garantiu que a empresa “está preparada para o pior”. Prosperidade comum Quanto à política de prosperidade comum, anunciada por Xi Jinping, e que tem sido encarada por alguns analistas como negativa para a liberdade do mercado, Lawrence Ho desvalorizou a questão. “A política [de prosperidade comum] tem como objectivo enriquecer as pessoas com rendimentos mais baixos e ajudá-las a subir na vida. Por isso, não acho que vá ter qualquer impacto no nosso mercado de massas, que é o futuro de Macau. Também não vejo impacto no mercado premium de massas”, frisou. “No segmento VIP a situação é diferente, mas, de qualquer maneira, a história do jogo VIP está estruturalmente comprometida”, considerou. Sobre a consulta pública da revisão da lei do jogo e a atribuição de novas concessões, o CEO da Melco disse que muitas das dúvidas foram esclarecidas durante as sessões da consulta pública e que a finalização da lei deve demorar “entre um a dois anos”. De acordo com os resultados anunciados, a Melco Resorts and Entertainment registou perdas de 1,87 mil milhões de patacas, o equivalente a 233.2 milhões de dólares americanos. O valor é um agravar da situação da empresa face ao segundo trimestre, quanto as perdas tinham sido de 1,49 mil milhões de patacas.
Património | IC admite alterar trânsito junto à Casa de Portugal Pedro Arede - 11 Nov 2021 Após o edifício que alberga a Casa de Portugal ter ficado danificado devido a um acidente de viação, o IC admite estudar o controlo do tráfego na zona. Sobre o restauro agendado para Dezembro, António José de Freitas mostra-se feliz, congratula a “acção rápida” do IC, mas lamenta não ter sido notificado pelo organismo O Instituto Cultural (IC) revelou que, na sequência do acidente de viação que danificou parte da fachada do edifício que alberga a Casa de Portugal, está a estudar medidas de controlo de tráfego na zona, em conjunto com a Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT). “Relativamente aos danos a edifícios patrimoniais provocados por uma condução negligente, o IC irá apresentar a situação à DSAT para estudar a melhoria do tráfego ou medidas de controlo”, admitiu o organismo em resposta enviada ao HM. Recorde-se, que no passado dia 11 de Setembro, ocorreu um acidente no cruzamento da Rua de Pedro Nolasco da Silva com a Travessa do Padre Soares, que danificou parte do canto do edifício no 24A. Juntamente com os lotes 26 e 28-28A, os dois imóveis germinados de interesse arquitectónico são propriedade Santa Casa da Misericórdia de Macau. Contactado pelo HM, o provedor da Santa Casa da Misericórdia de Macau, António José de Freitas, considera que, a concretizarem-se, as alterações de trânsito na zona “são boas notícias” e aponta o encerramento da Travessa do Padre Soares à circulação de veículos como uma possibilidade. “Considero que fechar aquela rua ao trânsito não coloca qualquer problema em termos de escoamento rodoviário. Não sou perito, mas como conhecedor do ambiente e da rede rodoviária envolvente, [um eventual encerramento] não vai afectar nada. Para chegar à Rua do Campo, os carros que passam pela Rua Nolasco da Silva, ou vão em frente ou viram à direita na Travessa do Padre Soares, pois as duas vão dar ao mesmo sítio”, apontou. O IC acrescentou ainda que, pelo facto de em Macau existirem muitos edifícios patrimoniais nas zonas antigas onde os troços são estreitos, os condutores devem “permanecer alerta e ter atenção à segurança da condução e do património cultural”. Ao ritmo da opinião pública Na mesma resposta, o IC confirmou que as obras de restauro no edifício que alberga a Casa de Portugal vão avançar em Dezembro. Detalhando, o IC sublinhou que “realiza periodicamente” uma avaliação do edifício e que, “neste momento, não se verificam problemas imediatos de natureza estrutural, pelo que (…) está a proceder (…) à realização dos concursos para as obras de reparação das fachadas, dos telhados, das portas e janelas e das infiltrações de água internas”. Ao HM, António José de Freitas diz estar “feliz” por saber que as obras vão começar em breve e aponta que o caso prova que “os serviços públicos só acordam depois da questão vir a público”. “Este é mais um exemplo de que o IC considera as opiniões veiculadas pela imprensa”, começou por dizer. No entanto, o responsável lamenta não ter sido notificado por escrito sobre o início das obras. “Fico feliz por saber que as obras vão começar, mas o IC não foi capaz de enviar uma notificação por escrito à Santa Casa. Recebemos uma notificação por chamada, mas nem falaram com o provedor”, disse o próprio. Sobre o facto de o organismo apontar que o edifício não tem “problemas imediatos de natureza estrutural”, António José de Freitas insiste que “as brechas que as imagens mostram são enormes”, mas admite não ser “perito” na matéria. “Ainda bem que nada caiu até agora e oxalá que não haja um problema estrutural. Não sou especialista para dizer se a estrutura corre ou não perigo iminente, mas, a meu ver, há perigo”, partilhou. Contudo, o provedor fez questão de congratular a “acção rápida do IC”, esperando que o organismo comece a dar “mais atenção” aos prédios classificados pelo Governo. Recorde-se que em Abril deste ano, a Santa Casa da Misericórdia de Macau enviou uma carta ao IC a alertar para os “graves danos estruturais na fachada” do edifício que alberga a sede da Casa de Portugal e para o “perigo iminente” que o mau estado de algumas estruturas coloca a transeuntes da via pública e utentes.
AL | Pereira Coutinho de fora da Comissão Eleitoral do Chefe do Executivo João Santos Filipe - 11 Nov 202119 Ago 2024 Apesar de ter liderado uma das listas mais votadas no sufrágio directo, José Pereira Coutinho não vai fazer parte, como deputado, da comissão que elege o Chefe do Executivo. Entre os 23 deputados que se candidataram ao lugar, o português foi o único a ficar de fora José Pereira Coutinho falhou a eleição para integrar a Comissão Eleitoral do Chefe do Executivo, que decorreu ontem na Assembleia Legislativa. Entre os 33 legisladores, apenas 23 se candidataram às 22 vagas existentes e o deputado ligado à Associação de Trabalhadores da Função Pública (ATFPM) foi o menos votado, inclusive atrás do colega de bancada e deputado estreante Che Sai Wang. No final da votação, Pereira Coutinho desvalorizou o resultado. “Para mim é igual, as minhas funções são as de deputado e é por isso que a população votou em mim”, afirmou. “Não estou desiludido, não era a minha função primordial. Fui eleito para defender os interesses da população de Macau”, sustentou. Pereira Coutinho recusou ter sido prejudicado devido à nacionalidade. “Não sinto, de maneira nenhuma, que tenha sido penalizado por ser português. O meu colega também é português e foi eleito”, vincou. Contudo, não foi tão categórico na altura de avaliar se tinha sido castigado pelas suas posições políticas. “Não sinto que haja uma mudança no ambiente político. Mas, não posso ser eu a avaliar se fui penalizado [devido às ligações à ala pró-democracia], deixo que os outros avaliem a minha conduta”, desabafou. Por outro lado, destacou a eleição do número dois da sua lista Che Sai Wang. “Estou contente com a eleição do meu colega de bancada. Era importante que um de nós fosse eleito. Ele foi, por isso, é igual”, considerou. Com 17 votos Na eleição de ontem participaram 33 deputados. Cada um tinha 22 votos, para escolher entre 23 candidatos. Porém, muitos deputados não utilizaram todos os votos, o que fez com que dos 726 votos possíveis, só fossem contados 699. Pereira Coutinho foi o candidato menos votado, com 17 votos, atrás de Che Sai Wang, que obteve 19, e Ron Lam, com 22. Estes legisladores, que não fazem parte das associações tradicionais, foram os únicos com menos de 30 votos. No polo oposto, os mais votados foram Chan Iek Lap, Ângela Leong, Wong Kit Cheng, Ip Sio Kai, Lam Lon Wai, Ella Lei, Ma Chi Seng, Ho Ion Sang, Pang Chuan e Iau Teng Pio, cada um com 33 votos. Por sua vez, Song Pek Kei, Ma Io Fong, Lei Chan U e Ngan Iek Hang obtiveram 32. Vong Hin Fai, Zheng Anting, Leong Sun Iok tiveram 31 votos, e, finalmente, Lo Choi In, Chan Hou Seng, e Lei Leong Wong somaram 30 votos, cada.
Plenário do PCC e covid-19 explicam ausência de Xi na COP26 Hoje Macau - 10 Nov 202110 Nov 2021 A ausência do Presidente Xi Jinping da conferência do clima COP26, que termina na sexta-feira ao fim de duas semanas, não é surpreendente face à actual situação interna da China, apontam analistas, destacando os desafios das metas ambientais estipuladas por Pequim. “Visto pelo prisma da política interna chinesa, nunca houve muitas chances de que Xi comparecesse pessoalmente na COP26”, diz Melinda Liu, jornalista radicada em Pequim há mais de três décadas. Em causa, estão as restritas medidas de prevenção contra a covid-19, que praticamente eliminaram as viagens de e para o país asiático, que continua a insistir numa política de “zero casos”, ao contrário do resto do mundo, que está a aprender a coexistir com o vírus. Quem chega à China oriundo do exterior tem que cumprir uma quarentena de até 21 dias. Como resultado, Xi Jinping não sai da China desde o início da pandemia. O encontro em Glasgow coincide ainda com uma reunião-chave do Partido Comunista Chinês (PCC), que arrancou na segunda-feira. O plenário do Comité Central do PCC, que decorre até 12 de Novembro, reúne os 300 membros mais poderosos do Partido e vai servir para lançar as bases para um terceiro mandato de Xi Jinping, que será oficializado no próximo Congresso do PCC, no Outono de 2022. Metas ambiciosas A China é o maior emissor de gases poluentes do planeta e cerca de dois terços da sua produção energética assenta na queima do carvão. O país tem, no entanto, assumido ambições ímpares para a transição energética. O Presidente chinês, Xi Jinping, reafirmou, em Setembro passado, na Assembleia das Nações Unidas, os compromissos chineses para o clima: neutralidade carbónica “antes de 2060” e atingir o pico das emissões “antes de 2030”. O país tem já um dos programas de energia nuclear mais ambiciosos do mundo e um acelerado desenvolvimento da capacidade instalada em energia renovável. Zhang Xiaohui, reitor de economia da Escola de Finanças PBC da Universidade de Tsinghua, estima que, para atingir a neutralidade carbónica até 2060, a China vai ter que investir mais de 46 biliões de dólares. Mas o principal problema não é a falta de capacidade instalada de energia renovável, mas antes a ausência de capacidade de armazenamento da electricidade produzida e de uma ordem de mérito que penalize o uso de fontes poluentes, explica Renato Roldão, especialista em alterações climáticas a viver em Pequim desde 2008. Uma liberalização dos preços da electricidade para as indústrias, pondo fim aos limites impostos pelos reguladores, acrescentaria custos consoante as emissões de carbono da fonte utilizada na geração de energia. “Nessas situações, a forma de despacho na electricidade é diferente, ou seja, o que chamamos em Portugal a ordem de mérito”, descreve Roldão. Neste cenário, os preços adicionais cobrados pela emissão de gases com efeito de estufa encarecem o carvão, relativamente ao gás natural, e este último em relação às renováveis. A pior crise energética das últimas décadas, que afectou nos últimos meses a China, obrigou o país a reactivar minas de carvão, expondo a sua dependência face àquele combustível fóssil, numa altura em que os líderes mundiais se reuniam na conferência do clima. Para atingir os objetivos de descarbonização, a China tem que encerrar e substituir, nos próximos 20 anos, 660 centrais termoeléctricas a carvão. “É o equivalente ao total da produção energética em toda a União Europeia”, aponta Wuttke. Segundo o empresário, as metas estipuladas por Xi Jinping em Setembro surpreenderam não só os países ocidentais, como os próprios ministérios na China. “Mas ele está a falar a sério e um Presidente com tanto poder, se delineou estas metas, é para cumprir”, resume.
O mouro de Veneza Amélia Vieira - 10 Nov 202110 Nov 2021 -Nomes que falam quando nomear cunha o destino dos protagonistas remetem-nos para a importância deles no destino de cada um – um nome é uma espécie de mantra codificado – e mais longe que as histórias dos Josés, Paulos, Antónios, Manéis, nos dão, nos contam ou podem dar, sem que haja aquele vapor a enxofre para entrarem nos cofres imortais, mas também sem generosidade aparente para ascenderem às altas transparências, o autor do nosso trágico mouro alteia-lhe todas as características da apaixonante natureza humana, e aqui, a estória, História, e historicidades, transformam -se, pois que nada mais extraordinário que ser humano, a essa condição chamamos nós de tragédia. – Poder-se-ia apelidar, fado – o fado de cada um – mas coisa pouca seria fadar gentes de parcas melodias com Severas parcas, que de nostalgias estamos fartos. Morreu Otelo. Dito assim, nem parece que morreu alguém, pois todos sabemos que ele já tinha morrido vítima de sabotagem e autossabotagem, mas sobretudo, vítima de inveja e cobiça, o que o leva a matar a Dama da sua vida, Desdémona, suicidando-se de seguida; mas Otelo é um militar, um general, e o autor descreve-o assim «guerreiro, acostumado aos julgamentos de excepção, sempre muito rápido; matar ou morrer, sem maiores análises dos factos e das circunstâncias», uma personagem feita para emergências e não para atalhos labirínticos; fica perdida no meio dos ciúmes, das guerras de poder, dos falcatrueiros, e até dos Falcões – tudo conversa a mais – pois só ele sabe falar com a rapidez das rajadas e o encanto de um gladiador, características maravilhosamente hipnóticas nas questões linguísticas (que esta gente toda fala de forma apavorante pois que não têm pressa nem talento para emergentes) por vezes o poema sai assim, em carne viva, em golfadas germinais de macho alfa, todo abrasão, e nós sentimos por fim a presença rara dos homens. Nós, que nos esfalfamos para sexualizar os neurónios e encontrar razões nesta subespécie para o arranque erótico das idiotizantes jornadas, vergamo-nos diante a lembrança dos Homens. – «Veneza sem ti», é! Canções que entoam lá do fundo das melodias de amor, e que debaixo do sol as leituras se façam na comparada análise, literal e literária, pois que tudo volta de novo a encontrar-se: capas, espadas, cotas de malhas, chaimites, amor, ciúme, inveja, traição, equívoco, mordaça, o corpo identitário volta com novas roupagens mas com a mesma essência, não para todos, que nem todos não são agentes do destino, para tal é necessário uma silenciosa aritmética que a visualidade não é capaz de alcançar: a maior parte destas boas e más pessoas que nos rodeiam ainda não nasceram, são ecos com direito a pensar que pensam… e quanto às suas caricaturas, bom senso e grandiloquências, uns até já vêm com direito a outras estouvadas características, mas não são “Oteis” são Hotéis, que um país com tantos “génios” à solta pouco mais serviu que para porteiro Hotel de luxo, fazer mixórdias alimentícias, e andar armado em rico, efetivamente, para tal desfecho não seria preciso ter havido Otelos, bastava uma «Estrela Michelin» e todas as vítimas se tinham agachado. No meio de tudo isto as razões são tão claras que gelam, e a ingratidão tamanha dá vontade de abandonar os pobres sem destinos dos abocanhadores, às galés. – No fundo, Otelo não saberia viver sem a amada, a sua Dama, que vítima das vozes maléficas dos vencidos que depressa passam a vencedores, ele prepara então a tragédia para se tornar para sempre humano. Foi um equívoco bem o sabemos, mas era tarde demais. Esta belíssima humanidade de alguns só é possível na tragédia, que ora cómica, ora terrível, tem a força de nos estigmatizar até ao fim. A fornalha das forças contrárias e o labirinto por onde entoam, se escutam, e se nomeiam no elo da narrativa as semelhantes personagens, são tão nítidas, que entristece não haver aqui vestígio de consciência, talvez por que há muito também deixou de se saber identificar um poeta, mercê das enfadonhas armadilhas dos pretensos – “poetisos” e “poetisas”- que poeta acontece poucas vezes, é certo, tão raramente, que seria bom podermos ter uma maior assertividade quando da sua manifestação, pois que não ter visto em tudo isto o melhor Poema do Mundo em estrofe colectiva, é então não ter visto nada. « Há sempre aquilo que não pode ser preservado quando o Destino tem as rédeas na mão, mas a Paciência encarrega-se de fazer do prejuízo uma zombaria». “Suplico aos senhores que, em suas cartas, falem de mim como sou. Que nada fique atenuado, mas que se esclareça também que em nada Houve dolo. Os senhores devem mencionar este que amou demais, Com sabedoria de menos; Este que não tinha sentimento de ciúme e se deixou levar por Artimanhas” Shakespeare
Cinema | Festival entre a China e países de língua portuguesa arranca sexta-feira João Luz - 10 Nov 202110 Nov 2021 O Festival de Cinema entre a China e os Países de Língua Portuguesa começa na sexta-feira e irá exibir 30 filmes ao longo de duas semanas, tendo como o tema central paladares e encontros à mesa. Até 26 de Novembro, serão servidas obras de realizadores oriundos de países como a China, Portugal, Brasil e Angola, nas telas dos Cinemas Galaxy e da Cinemateca Paixão Vem aí mais uma proposta aliciante para os cinéfilos de Macau. Na sexta-feira arranca o Festival de Cinema entre a China e os Países de Língua Portuguesa, subordinado ao tema “Os Gourmets de Cinema”, com um cartaz que oferece 30 filmes ao longo de duas semanas, até 26 de Novembro, nas salas do Galaxy Cinema e na Cinemateca Paixão. O evento está integrado no 3.º Encontro em Macau – Festival de Artes e Cultura entre a China e os Países de Língua Portuguesa. Os ingressos já estão à venda e custam 60 patacas. O filme que inicia o banquete cinematográfico é “This Is Not What I Expected”, do realizador de Hong Kong Derek Hui, e passa às 19h30 de sexta-feira no Galaxy. Esta atribulada comédia romântica centra-se numa relação que cresce através da culinária, entre a chef do restaurante de um hotel e o presidente do grupo hoteleiro, um homem intempestivo e difícil de agradar. No dia seguinte, sábado, o menu fílmico é servido na Cinemateca Paixão, com três sessões. A entrada é o documentário “Meu Querido Supermercado”, uma produção brasileira/dinamarquesa que tem como epicentro, como o nome indica, um supermercado e a vida dos seus trabalhadores. A lente da cineasta Tali Yankelevich capta as mais variadas interacções entre os funcionários, desde declarações de amor, conversas sobre mecânica quântica e literatura, às maravilhas da encenação com disfarces. “Meu Querido Supermercado” torna-se um microcosmo que representa toda a humanidade, uma sociedade aparentemente coesa que vive num equilíbrio precário. “Mosquito”, de João Nuno Pinto, é exibido às 19h15 (já com lotação esgotada, mas com repetição a 23 de Novembro) é o primeiro filme a passar na Travessa da Paixão ao abrigo do festival. O épico histórico do cineasta português começa com o sonho idealista de um jovem que, com a imaginação salpicada por grandes aventuras e defesa da pátria, se alista no exército durante a Primeira Guerra Mundial. O soldado português acaba por ser enviado para a linha da frente em Moçambique e, após contrair malária, separa-se do seu pelotão e inicia uma caminhada de mais de mil quilómetros entre o delírio febril e visões exóticas. “Mosquito” é baseado na vida do avô do cineasta. Comes e conversas Às 21h30 de sábado, também na Cinemateca Paixão, é exibido “Êxtase”, da realizadora brasileira Moara Passoni, um filme que fica algures no limbo entre o documentário, a memória e ficção. Para começar, “Êxtase” tem banda sonora composta por David Lynch e Lykke Li e a estranheza prossegue também na imagem. A narrativa desta película centra-se em torno de uma adolescente, filha de uma congressista, que encontra o completo arrebatamento, prazer e espiritualidade no jejum. Com um cartaz diversificado, apesar do tema unificador, é impossível não destacar “Swimming Out Till the Sea Turns Blue”, o documentário do realizador chinês Jia Zhangke, uma das figuras de proa da chamada “Sexta Geração”, um movimento cinematográfico nacional. O filme será exibido a 16 de Novembro, às 21h30, e a 20 de Novembro, às 17h30 na Cinemateca Paixão. Outro dos momentos altos do festival é a exibição de “Diários de Otsoga”, de Miguel Gomes, na Cinemateca Paixão às 19h30 de 23 de Novembro (sessão esgotada). A acção centra-se nas vivências de três jovens amigos que passam as férias de Verão numa quinta, com os dias a serem passados com improvisos de dança, limpeza da piscina, insónias, apanha de fruta e ambiente de engate. Além dos 30 filmes em cartaz, o festival será complementado com actividades de extensão, como conversas depois de projecções de filmes, palestras e workshops de gastronomia.
Consulado das Filipinas pede a cidadãos que desistam de eventos políticos João Santos Filipe - 10 Nov 2021 O Consulado Geral das Filipinas em Macau apelou ontem aos seus cidadãos para que desistam de actividades e encontros de cariz político. A mensagem foi difundida ontem, depois de no domingo o Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) ter “convidado” 16 pessoas para a esquadra, por estarem envolvidas em actividades relacionadas com as presidenciais de 2022 nas Filipinas. “O Consulado gostava de recordar a todos os Filipinos em Macau para desistirem de se envolverem em encontros, reuniões e outras actividades com um cariz político ou partidário, incluindo a utilização de faixas e uniformes”, pode ler-se na mensagem, partilhada ontem à tarde. “Aos Filipinos é recordado, mais uma vez, que devem observar de forma rigorosa as leis e regulamentos do Governo de Macau e respeitar as sensibilidades da comunidade local”, foi acrescentado. A mensagem do consulado, actualmente liderado por Porfirio Mayo Jr, destaca as declarações dos governantes locais que negam aos não-residentes o direito de reunião e manifestação. “As recentes declarações das autoridades de Macau têm enfatizado que o direito de reunião e manifestação em espaços públicos é dos residentes permanentes de Macau e está sujeito às leis e regulamentos aplicáveis, incluindo a necessidade de obter uma autorização prévia”, é indicado. Deportação em causa O consulado recorda também aos trabalhadores não-residentes que no caso de infringirem a lei podem ver os contratos de trabalho terminados com justa causa e serem deportados, através do cancelamento do título de trabalhador não-residente. No domingo, as autoridades levaram 16 pessoas da comunidade filipina que estariam nas Ruínas de São Paulo e nas imediações da Torre de Macau para a esquadra a fim de prestarem depoimento. Em causa, estão investigações que podem envolver a violação ao direito de reunião e manifestação e ainda a utilização do símbolo da RAEM na produção de materiais de promoção do candidato presidencial Ferdinand Romualdez Marcos Jr.. As eleições presidenciais das Filipinas estão agendadas para 9 de Maio do próximo ano.
Caso Criptomoeda | Autoridades de Hong Kong ignoraram pedidos de assistência João Santos Filipe - 10 Nov 2021 Um investigador da Polícia Judiciária reconheceu que não há provas de transferências bancárias que demonstrem que Frederico Rosário lucrou com o esquema da criptomoeda. A investigação admite dificuldades, uma vez que as autoridades de Hong Kong não responderam aos pedidos de assistência A Polícia Judiciária (PJ) desconhece o destino 12 milhões de dólares de Hong Kong enviados para contas bancárias na RAEHK, no âmbito do esquema de investimento em criptomoeda, promovido por Dennis Lau e Frederico Rosário. Segundo um agente da PJ, ouvido ontem no tribunal, a polícia não recebeu qualquer auxílio de Hong Kong durante a investigação, nem depois de ter pedido assistência através de Interpol. Chamado a depor para explicar a investigação a Dennis Lau e Frederico Rosário pela prática de burla, o agente de apelido Lok confessou que as provas sobre transferências de dinheiro foram entregues pelo próprio Frederico Rosário e as vítimas. Os documentos mostram que num total de 18 milhões de dólares de Hong Kong enviados para a RAEHK, seis regressaram a Macau para pagar “juros” e 12 milhões desapareceram. Terá sido também através da informação disponibilizada pelo filho de Rita Santos que as autoridades perceberam que Rosário era accionista de 10 por cento da empresa Forgetech. “Nunca recebemos qualquer informação sobre as contas bancárias de Hong Kong. Foi o arguido [Rosário] que nos forneceu os dados da Forgetech e da Genesis”, explicou Lok. Face à falta de cooperação das autoridades de Hong Kong e do banco DBS, para onde terá sido enviado o montante de 12 milhões de dólares de Hong Kong, o agente Lok reconheceu que não há provas que indiquem que Rosário tenha ficado com qualquer parte do montante. Foi também reconhecido não existirem provas que indiquem se Rosário pode, ou não, aceder às contas e às informações sobre as empresas em que estava envolvido com Dennis Lau. Questionado pelo advogado de defesa, se isso indicava que o filho de Rita Santos podia ser uma vítima, Lok respondeu que a investigação não seguiu esse caminho, porque Rosário tinha promovido o investimento, era accionista de uma das empresas e não terá conseguido provar que o dinheiro foi efectivamente utilizado para a minerização de criptomoeda. Por outro lado, o investigador reconheceu que os materiais da investigação indicam que Frederico Rosário terá perdido perto de 450 mil dólares de Hong Kong com o investimento na Forgetech. Sem informação Na parte da manhã da sessão de ontem, foram ainda ouvidas três lesadas com o esquema de investimento. Todas elas foram a Hong Kong apresentar queixa contras as empresas de Dennis Lau e Frederico Rosário, em 2018, mas nenhuma tinha recebido, até ontem, qualquer indicação das autoridades vizinhas sobre o desenrolar das investigações. A sessão serviu ainda para analisar o papel de Manuela, mulher de Frederico Rosário, em todo o processo. Sílvia Mendonça, advogada da única assistente pediu ao Ministério Público (MP) para ponderar avançar com um procedimento criminal contra a esposa do filho de Rita Santos. “Na queixa inicial a minha cliente tinha visado a Manuela e o Frederico”, começou por revelar Sílvia Mendonça. “O Ministério Público deve ponderar se não deve levantar um procedimento criminal contra a Manuela, e deixar o procedimento contra o Frederico, tendo em conta o que vem deste julgamento”, apelou. A intervenção da causídica não mereceu qualquer resposta por parte do Ministério Público nem do colectivo de juízes. No entanto, foi o papel de Manuela que marcou a parte da manhã do julgamento, uma vez que uma testemunha identificada como Violeta revelou ter tratado sempre do “investimento” com a esposa de Frederico. A ouvida somou perdas de 925 mil dólares de Hong Kong, depois de ter investido 1,4 milhões. A desilusão Violeta vincou também que Manuela utilizava um grupo de Whatsapp para promover os investimentos na criptomoeda e as sessões na Associação de Trabalhadores da Função Pública de Macau. No depoimento, Violeta, que admitiu ter sido testemunha do casamento entre Manuela e Frederico, lamentou a forma como o casal se comportou ao longo do processo. “Acho que eles encobriram [informações relevantes]. Não digo que tenham tido a intenção de enganar os investidores, mas tiveram proveitos, como comissões. E eles nunca nos disseram bem como eram as coisas”, considerou. “Só no fim é que soubemos que eles não podiam mexer nas contas [da empresa]”, revelou. Segundo a testemunha, Frederico terá afirmado ao longo dos seminários de investimentos realizados na Associação de Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM) que era o patrão da empresa. Contudo, era apenas um accionista com uma participação de 10 por cento, que não lhe daria acesso às contas e movimentos de dinheiros da empresa. “Acho que não é no fim que vem dizer que afinal não tem responsabilidade. Não é assim que se fazem as coisas”, vincou. “Quando nos falaram no início, nunca nos disseram que não podiam gerir. Se tivessem dito não tinha investido”, lamentou. O papel de Manuela foi reforçado por outras duas testemunhas, Choi Teng e Lei Iok Meng, que também terão tratado dos investimentos através da esposa de Frederico Rosário. Choi Teng mencionou mesmo que Manuela terá reconhecido receber comissões pela captação de investidores.