Xunzi 荀子 – Elementos de ética, visões do Caminho

O Caminho da Liderança, Parte II

O uso apropriado de equipamentos e medidas flui da boa ordem, mas não é a fonte da boa ordem. A fonte da boa ordem é a pessoa exemplar. Os oficiais vigiam as medidas, e a pessoa exemplar nutre a fonte. Se a fonte for pura, aquilo que dela fluir é puro. Se a fonte for turva, aquilo que dela flui é turvo. Assim, se o superior amar o ritual e yi [justiça], se elevar os meritórios e empregar os capazes, se o seu coração for sem avidez de lucro, então os seus subordinados cederão e deferirão o mais possível, atingirão o cúmulo da lealdade e fiabilidade e serão diligentes no seu serviço como ministros. Se forem assim, então mesmo a mais baixa das pessoas comuns será digna de confiança mesmo antes de se quebrarem e juntarem as tábuas, mostrará imparcialidade mesmo antes de se tirarem as sortes, será equilibrada mesmo antes de se aferirem as balanças e se verificarem os pesos e será equitativa mesmo antes de se medirem arrobas e alqueires e se alisar o topo dos recipientes.

E assim o povo trabalhará arduamente sem expectativa de recompensas e obedecerá sem temer castigos.  As coisas serão ordenadas sem aqueles que mandam terem de se esforçar laboriosamente e o estado estará repleto de bons costumes sem uma profusão de ordens governamentais. Ninguém, de entre o povo comum, se atreverá a desrespeitar as leis do seu superior, a não cumprir as suas intenções, a não trabalhar arduamente nas suas tarefas, mas todos se sentirão tranquilos, deleitando-se em segui-lo. Por isso, ao entregarem os impostos não se preocuparão em pagá-los, ao se dedicarem a projectos não se preocuparão em labutar duramente e, ao lidarem com bandidos e outros arruaceiros, não se preocuparão em morrer. As muralhas da cidade serão sólidas sem ser preciso esperar que as reforcem, as lâminas das armas estarão afiadas sem ser preciso esperar que as amolem. Os estados rivais se submeterão sem ser preciso esperar que sejam dominados e todos no território rodeado pelos quatro mares serão unificados sem ser preciso esperar que lhes dêem ordens. A isto se chama a paz suprema[1]. As Odes dizem:

Quando o plano do rei foi um verdadeiro sucesso,

As terras de Xu aquiesceram[2].

Isto exprime o que quero dizer.

 

[1] Aqui, a palavra para paz é píng 平, que se traduz por “equilíbrio” – Xunzi joga com os dois sentidos do termo de um modo que é difícil transmitir noutro idioma.

[2] O poema de onde foi extraída esta citação descreve como a terra de Xu é atacada e submetida pelo rei Xuan (regnavit 827-782 a.C.), o décimo primeiro monarca da dinastia Zhou.

 

Nota

Xunzi (荀子, Mestre Xun; de seu nome Xun Kuang, 荀況) viveu no século III Antes da Era Comum (circa 310 ACE – 238 ACE). Filósofo confucionista, é considerado, a par do próprio Confúcio e Mencius, como o terceiro expoente mais importante daquela corrente fundadora do pensamento e ética chineses. Todavia, como vários autores assinalam, Xunzi só muito recentemente obteve o devido reconhecimento no contexto do pensamento chinês, o que talvez se deva à sua rejeição da perspectiva de Mencius relativamente aos ensinamentos e doutrina de Mestre Kong. A versão agora apresentada baseia-se na tradução de Eric L. Hutton publicada pela Princeton University Press em 2016.

 

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