DSAT | Anunciadas isenções para veículos novos após danos com tufão

[dropcap style≠’circle’]Q[/dropcap]uem ficou com o carro danificado na sequência da devastação provocada pelo Hato pode ser reembolsado do imposto pago pelo veículo danificado. Esta isenção estende-se ainda a viaturas que não existem à venda no território, tais como carros movidos a energia solar ou gás natural

Estão aí as medidas concretas que se esperavam para remediar os danos causados aos veículos que foram apanhados pelo tufão Hato. “No dia 23 de Agosto lançámos apenas um quadro geral. Para implementar esta medida em concreto tivemos de ouvir opiniões de várias partes e depois definimos o limite mínimo e máximo de reembolso”, explica Lam Hin San, director da Direcção dos Serviços para os Assuntos do Tráfego (DSAT).
O dirigente, explicou ainda que quem ficou com os veículos danificados terá até 18 de Setembro para proceder ao cancelamento de matrículas. “Entre 23 de Agosto e 6 de Setembro recebemos 1100 requerimentos para cancelar matrículas, 548 automóveis e 460 motociclos”, anunciou Lam Hin San. O director acrescentou ainda que destes cancelamentos, 90 por cento são veículos afectados pelo tufão.
Os automobilistas, assim como os motociclistas, que necessitem de um novo veículo vão ter uma isenção, ou reembolso, de imposto pago pela viatura danificada pelo tufão.
Em primeiro lugar, será necessário uma lei aprovada pela nova Assembleia Legislativa, uma vez que é o órgão com competência exclusiva para aprovar uma medida desta natureza.
Iong Kong Leong, director dos Serviços de Finanças, adianta que “será pedido efeito retroactivo” para reembolsar quem já pagou o imposto dos novos veículos antes da lei aprovada. O director acrescentou que “o processo legislativo terá natureza urgente” e que ainda não existe uma redacção para a proposta de lei que fixará estes reembolsos fiscais.

Carros inexistentes

O proprietário do automóvel danificado que adquirir um carro novo que use combustíveis fósseis, terá um reembolso até 80 por cento do imposto pago pelo veículo danificado, num montante máximo de 140 mil patacas. Quanto aos motociclos, o reembolso pode atingir os 100 por cento, para um valor limite de 5500 patacas. Quem estiver interessado terá de pedir primeiro o cancelamento da matrícula.
A DSAT adianta que a taxa de amortização pode ir até aos 100 por cento no caso da compra de veículos movidos a energias renováveis. Em comunicado de imprensa dos serviços pode-se ler que quem comprar viaturas movidas a gás natural, energia solar e carros eléctricos será reembolsado dos impostos pagos pelo veículo danificado. É de referir neste capítulo que em Macau não existem viaturas movida a energia solar e que a gás natural apenas existem alguns autocarros de transporte público. Quanto aos carros eléctricos, são uma parcela ínfima do parque automóvel do território. Em Abril último, havia 180 veículos eléctricos, sendo que 22 pertenciam ao Governo.
Neste aspecto, Lam Hin San entende que “se houver mais procura destas viaturas movidas a novas energias, acredito que os concessionários terão mais incentivos para importar este tipo de veículos”.
Outra das questões levantadas pela destruição de carros e motociclos prende-se com a falta de locais para acolherem aquilo que normalmente se designa como ferro-velho. Aliás, um problema que Macau já sentia antes da passagem do Hato, sendo recorrente o abandono de veículos na via pública.
Porém, o director da DSAT refere que “segundo os dados recolhidos não temos problemas nesta matéria”. Lam Hin San acrescentou ainda que serão feitos esforços para que “os veículos abatidos sejam enviados para a DSF para irem a leilão”. Em seguida, de acordo com o director, a empresa que os adquirir pode exportá-los para o exterior.

8 Set 2017

Eleições 2017 | O olhar da comunidade portuguesa sobre a campanha

Os votos na “aldeia grande”

Programas políticos com conteúdos pobres, ausência de identificação com ideias, a continuação dos interesses no hemiciclo. Portugueses, com residência permanente, dizem o que acham da campanha eleitoral que anda nas ruas. Votam sempre a cada quatro anos, mas afirmam existir um certo distanciamento face à sua comunidade

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]lbano Martins é, talvez, um dos poucos portugueses em Macau que pode votar de duas maneiras para escolher os deputados que quer ver na Assembleia Legislativa (AL). O economista e presidente da ANIMA pode pôr a cruz nos deputados que concorrem pela via directa, bem como naqueles que participam pela via indirecta, através das associações.

Isto significa que, este ano, Albano Martins pode decidir por um dos 24 candidatos que concorrem pelas directas, o maior número de sempre. Pode também votar no nome de uma das 14 listas que participam pela via indirecta.

Mas Albano Martins revela-se, ainda assim, um eleitor desiludido. “Vemos que há muita pólvora e pouca explosão”, disse ao HM. O problema? Ideias que fazem parte do poder Executivo e não Legislativo.

“A maior parte das pessoas ainda pensa que concorre para chefiar o Governo, e não para a AL. As pessoas continuam a fazer programas políticos como se fossem Governo, esquecendo-se que a sua função é fiscalizar o trabalho do Governo e fazer leis. A politica de Macau é feita pelo Governo, isso faz parte da Lei Básica e há-de ser sempre assim”, adiantou.

Albano Martins considera que os “programas políticos das listas são fracos”, numa “aldeia grande” que “cresceu com muito dinheiro e desejos”.

O economista não é o único a apontar o dedo aos cartazes e programas políticos que desde sábado andam nas ruas. Rui Furtado, médico, também é residente permanente e vota sempre, mas revela baixas expectativas para o acto eleitoral de 17 de Setembro.

“A campanha decorre de modo habitual, sem grandes surpresas. O conteúdo da campanha é pobre, sempre foi e continua a ser. As pessoas fazem os programas políticos que são um conjunto de acções e sugestões conforme as ocasiões do momento. O aumento dos salários dos funcionários públicos, a protecção dos residentes. São tudo pedras batidas, não são ideias novas e não têm um verdadeiro conteúdo político”, contou.

“Voto sempre e de acordo com o que tenho possibilidade de votar, nas listas em que me revejo mais ou menos nas ideias. Mas são pobres na mesma”, assegura.

O médico diz que persistem dificuldades de comunicação na campanha eleitoral, pois a comunidade portuguesa não tem acesso à maior parte dos programas políticos em chinês.

“Há traduções, mas são de má qualidade. A pobreza política, intelectual e cultural dos programas é o que toda a gente sabe”, frisou.

Já a arquitecta Maria José de Freitas assume que tem vindo a prestar atenção a “algumas listas”, sem ter ficado muito convencida.

“Não me parecem muito inovadoras nos programas. Tenho vindo a ver até que ponto essas listas espelham algum interesse junto da comunidade portuguesa, e também noutras comunidades, com essa cultura internacional que Macau sempre evidenciou”, defendeu.

Maria José de Freitas diz que não vota por obrigação, mas cada vez que coloca uma cruz no boletim é na lista que poderá trazer algo “favorável ao desenvolvimento do território”, sem esquecer a diversidade cultural.

É por isso que defende que, este ano, os programas eleitorais “não avançaram muito nesse sentido”.

“Pode ser que até às eleições se avance mais um pouco. Tenho algumas expectativas, há listas que ainda podem propor coisas interessantes. Há professores universitários envolvidos, há pessoas com experiência em Macau que conhecem a cidade, mas falta se calhar mais conhecimento cientifico. Esta é uma lacuna importante.”

De costas voltadas

Para Rui Furtado, a necessidade de tradução das ideias políticas ou a falta dela faz com que a comunidade portuguesa seja afastada das eleições. “Nem lhe é dada a oportunidade de estar perto”, assegura.

“Não temos acesso aos programas e são corpos estranhos no meio de toda esta discussão. E isto também vale para as comunidades dos expatriados.”

O antigo presidente da Associação de Médicos de Língua Portuguesa levanta ainda a questão dos actos de corrupção eleitoral. “A verdade das eleições, em si, é uma coisa duvidosa. Entre a compra de votos e as pressões para votar, tudo é altamente duvidoso.”

Albano Martins frisa que há poucos portugueses interessados neste acto cívico, com excepção dos macaenses. No seu reduzido grupo de amigos, as eleições para a AL raramente são tema de conversa.

“Acredito que esse número reduzido de amigos vota, mas não conversam comigo sobre o assunto. Se calhar achamos que não é importante falar sobre isto, mas cada um assume o voto à sua maneira. A maioria das pessoas que conheço tem consciência de que é importante, nem que seja por uma cruz fora do quadrado.”

A arquitecta afirma que “não há muito interesse” da parte dos portugueses, sobretudo dos que acabaram de emigrar. Mas Maria José de Freitas acredita que há uma vontade de mudar o rumo dos acontecimentos.

“As pessoas estão atentas face ao facto de que algo tem de mudar, não podemos sempre ficar no status quo. Por isso estou na expectativa se essa mudança vem mais à superfície.”

Sem representação

Quando se vota coloca-se a cruz no boletim na expectativa de que um candidato represente ou defenda aquilo em que acreditamos. Rui Furtado diz ter a plena consciência de que ninguém o irá representar no hemiciclo da Praia Grande.

“A AL não representa ninguém, representa-se a si própria e aos seus deputados que têm os seus interesses a defender. E quem pensa que tem a AL para os defender está muito enganado.”

Na visão do médico, a falta de empatia entre a comunidade portuguesa e a  política local começa logo nos debates. “Temos um problema: não assistimos às discussões do plenário mas sim à tradução dos debates. Gosto de pensar que os deputados são melhores do que aquilo que são, e que as traduções são melhores do que a realidade.”

“Basta ouvir para vermos o que a AL faz de facto. O interesse dos cidadãos não é a coisa mais importante para quem está na AL”, frisa o médico.

Também Maria José de Freitas reconhece que, apesar de cumprir o seu dever cívico como residente permanente, será difícil ver os seus interesses e desejos representados.

“Se me pergunta se algum dos candidatos corresponde ao que penso, ou qual a utilidade do meu voto, direi que há uns candidatos que correspondem mais do que outros. O ideal é difícil de atingir, mas há-de haver uma situação que pode ser mais interessante apoiar, e é por aí que vou”, remata.

 

Proibições na fronteira

Votar em Macau é sinónimo da existência de um segundo sistema, mas Albano Martins alerta para os recentes casos de proibições de deputados e jornalistas de Hong Kong na fronteira. “Estamos a assistir a mudanças cada vez mais repentinas e muito antes do prazo terminar [2049]. Basta olhar para as fronteiras. Não faz sentido que no segundo sistema um deputado da ala democrata de Hong Kong não entre em Macau por ir contra a segurança do território. Faz parte da lógica do segundo sistema ele poder viajar entre as duas regiões e emitir opiniões. Penso que viajam para a China, mas não podem viajar para Macau. É um dossier que está a ser mal gerido. Se me disserem que há intervenção da China, não acredito. Haverá aqui mais papistas do que o papa.”

A política e a ANIMA

Albano Martins recusa participar em qualquer iniciativa do foro político, além do exercício do dever cívico como residente permanente, por não querer aproveitamento político da associação a que preside, a ANIMA. “Não estou interessado em que haja aproveitamento político do nosso trabalho. Já houve no passado duas organizações que tentaram colar-se a nós, e eu recusei. Incentivo todos os que sejam residentes a participar nas eleições tentando equacionar os problemas que os futuros deputados devem levantar.”

7 Set 2017

Hato | Comissão define acções que podem interferir com liberdade

A Comissão para a Revisão do Mecanismo de Resposta a Grandes Catástrofes já está em acção e com alguns objectivos definidos a curto e médio prazo. A revisão legislativa vai avançar e pode interferir com a liberdade e privacidade nas comunicações. Para já, as primeiros números, ainda provisórios, relativos aos prejuízos provocados pela passagem do Hato, apontam para mais de 10 mil milhões de patacas

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] estimativa, para já, dos prejuízos causados pela passagem do tufão Hato pelo território é na ordem dos 11,4 mil milhões de patacas. A informação foi adiantada ontem pelo Chefe do Executivo, Chui Sa On em conferência de imprensa.

No encontro com os jornalistas estiveram presentes os membros da recém- criada Comissão para a Revisão do Mecanismo de Resposta a Grandes Catástrofes e o seu Acompanhamento e Aperfeiçoamento, onde foram apresentados os trabalhos que já estão em andamento.

De destacar a criação da Direcção de Protecção Civil e de Coordenação de Contingências (DPCCC). O nome ainda é provisório, disse o secretário para a Segurança, Wong Sio Chak, mas o organismo já está a ser pensado. A ideia é que seja uma entidade capaz de dirigir o Centro de Operações de Protecção Civil que, prevê-se também, irá mudar de nome.

A criação do DPCCC vai exigir uma revisão legislativa para conferir à entidade poderes próprios sob a tutela do secretário para a Segurança.

Os trabalhos vão começar “já”, disse Wong Sio Chak. No entanto, sublinhou o secretário, o exercício legislativo que se impõe desenvolver “tem de ser feito com toda a competência, até porque poderá interferir na liberdade das pessoas”.

O secretário não concretizou em que aspectos a liberdade dos residentes de Macau poderá estar comprometida ou em que áreas é que a lei poderá interferir. No entanto, na apresentação feita por Wong Sio Chak , dentro dos planos a médio prazo para a nova direcção, pode ler-se que cabe ao organismo “estudar, em caso de urgência e de necessidade , a viabilidade de fiscalização dos grupos de comunicação das aplicações de telemóveis.

A intenção é que esta acção aconteça para monitorizar os falsos rumores e insere-se na promoção do policiamento inteligente de modo “a fornecer um sistema de gestão de informação de crises”, apontou o secretário.

Diques a concurso

Com as cheias que decorreram no Porto Interior e depois de anunciadas medidas para as evitar, o secretário para as Obras Públicas e Transportes, Raimundo do Rosário, falou ontem dos estudos que vão ter de ser revistos.

“Em 2015 tínhamos uma empresa de consultadoria a fazer estudos para os quais já existem projectos. No entanto, com as subidas recorde das águas temos de ponderar um aumento dos muros a ser construídos no Porto Interior”.

O levantamento, naquela zona, de estruturas com uma altura segura, que para Raimundo do Rosário, seria de cerca de 2,5 metros, traz questões que, disse, “têm de ser analisadas cuidadosamente”. “O que sei é que se precisarmos de construir um dique no Porto Interior, temos de ter pelo menos 2.5 metros de altura, porque de outra forma não conseguimos travar a circulação da água”.  Mas, uma parede com esta dimensão vai alterar as características paisagísticas daquela zona pelo que “é preciso uma análise em pormenor”, apontou.

De acordo com Raimundo do Rosário, o sector da construção já deu várias propostas mas tem de se  ter em atenção a sua viabilidade.

Novos estudos estão a ser feitos e, garante a secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, no primeiro trimestre do próximo ano deve ser lançado um concurso para o projecto na zona do Porto Interior.

Já a retenção da subida das marés, matéria que implica, disse o Chefe do Executivo , o trabalho inter-regional, também está em andamento. Com o apoio do Governo Central, está marcada para o próximo dia 11 uma reunião com responsáveis da província de Guandong.

A ideia, avançou Chu Sai On, “é construir um sistema de comportas para controlar o nível do mar”.

Ainda relativamente à subida das águas, esperam-se revisões na concepção e construção de novos aterros. “Com certeza que vamos rever a cota altimétrica dos novos aterros” afirmou Raimundo do Rosário, fazendo mais uma vez referência ao recorde registado com  a passagem do Hato, com valores que, disse, não se conheciam desde 1925.

Trabalho repensado

Com a recolha de opiniões que a comissão levou a cabo nos últimos dias e que ainda decorre, podem ainda existir alterações na legislação laboral. “Vamos fazer uma revisão da legislação de modo a criar um mecanismo de análise de casos de emergência e decidir se os trabalhadores vão ou não trabalhar aquando do sinal 8”, avançou o secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong.

A ideia da revisão legislativa, que tem por base o estado de emergência, não se limita à passagem de tufões e deve abranger outras situações.

Chui Sai on reforçou a ideia de Lionel Leong. “Podem existir imprevistos de ordem pública, como doenças transmissíveis ou relativos à segurança em que temos de definir medidas obrigatórias para as pessoas respeitarem”.

O Chefe do Executivo apontou ainda, que está a ser estudada a localização para uma nova área onde possam ser colocados os contentores de mercadorias. “Queremos deslocar a estrutura para um sítio mais adequado”, referiu, sendo que,  Ka Ho pode ser uma possibilidade.

A ponte elevatória prevista para o cais 23, vai ter nova localização. O local para a sua construção é ainda desconhecido, mas, de acordo com Sónia Chan, a decisão vai ser tomada tendo em conta a opinião do Instituto Cultural.

7 Set 2017

Eleições 2017 | Au Kam San criticado em debate por opinião sobre exército chinês

Wong Kit Cheng criticou ontem Au Kam San pelo facto deste se ter mostrado contra a presença do exército chinês em Macau, e o candidato chegou mesmo a pedir desculpas. Temas como a habitação e os cheques pecuniários marcaram o debate organizado pela TDM

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] texto do candidato do campo pró-democrata sobre a presença do exército chinês nas ruas marcou ontem o debate sobre as eleições organizado pela TDM, e que juntou representantes de cinco listas.

O assunto foi levantado pela candidata Wong Kit Cheng, líder da Aliança do Bom Lar. Esta exigiu a Au Kam San um pedido de desculpas em público depois deste ter criticado a permanência do Exército de Libertação Popular no território, aquando da passagem do tufão Hato.

Au Kam San escreveu no Facebook que a presença do exército chinês só se justificava em catástrofes de maior dimensão. Foto: HM

Au Kam San, líder da lista Associação Novo Democrático, ainda disse que o seu trabalho, na qualidade de deputado, é fiscalizar o Governo, mas Wong Kit Cheng cortou-lhe a palavra de imediato.

O assunto não ficou esquecido, e no tempo que lhe foi concedido para fazer perguntas, Au Kam San chegou mesmo a pedir desculpas ao Exército de Libertação Popular, pois apontou que nunca teve a intenção de criticar a sua presença, tendo assumido o uso de “palavras incorrectas” na rede social Facebook.

Wong Kit Cheng lançou também uma farpa a Angela Leong, questionando as razões pelas quais Arnaldo Ho, seu filho e membro da lista, tem estado tanto tempo ausente de Macau. A candidata invocou que Arnaldo Ho pode não conhecer bem o território, mas Wiliam Kuan disse que Ho é um jovem que tem contribuído para o desenvolvimento de Macau.

Habitação sempre

Ontem marcaram presença as listas Aliança de Bom Lar, Poder dos Cidadãos, Associação de Novo Movimento Democrático, Nova União para Desenvolvimento de Macau e Poder da Sinergia. No total, dez candidatos participaram no debate.

No período de perguntas e respostas, as cinco listas abordaram temas como a habitação, os cheques do Governo, a fiscalização de obras públicas e o acordo assinado entre o Executivo e o grupo Alibaba, do empresário chinês Jack Ma.

Wong Kit Cheng disse que a lei de habitação económica deve ser alterada e, caso seja eleita, vai lutar para que haja novos concursos para atribuição de habitação pública.

Angela Leong, da lista Nova União para o Desenvolvimento de Macau, não esteve presente, mas os seus parceiros William Kuan e Siu Yu Hong defenderam a criação de dois sistemas de atribuição de casas, com pontuação e sorteio, para diferentes grupos sociais.

Os cheques

Questionados sobre a continuação do programa de comparticipação pecuniária, Sze Lee Ah, líder da lista Poder dos Cidadãos, disse que os cheques podem servir melhores objectivos, pois só “uma viagem ao estrangeiro pode custar um total de nove mil patacas”, o valor de um cheque atribuído a um residente permanente.

Lam U Tou, da lista Poder de Sinergia, disse que as vantagens deste programa são “questionáveis”.

Ieong Wai Kit, da lista Poder dos Cidadãos, promete que não criar conflitos no hemiciclo mas sim lutar por uma união das ideias em prol da construção de Macau. Lam U Tou manifestou concordância e acenou com a cabeça, bem no final do debate.

7 Set 2017

Tufão Hato | EPM com prejuízos de um milhão de patacas

A direcção da Escola Portuguesa de Macau já avaliou os estragos causados pela passagem do tufão Hato. Os custos rondam um milhão de patacas. O ano lectivo arrancou ontem com reuniões da parte da manhã, sem grandes alterações

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s aulas arrancaram, como previsto, na Escola Portuguesa de Macau (EPM), duas semanas depois da passagem do pior tufão dos últimos 53 anos, que causou prejuízos na ordem de um milhão de patacas no estabelecimento de ensino, informou a direcção à agência Lusa.

“Neste momento apontamos para um prejuízo na ordem de um milhão de patacas”, disse o director da EPM, Manuel Machado.

O mesmo responsável salientou o apoio disponibilizado, “desde o primeiro momento, pela Direcção dos Serviços de Educação e Juventude e pelo conselho de administração da Fundação Escola Portuguesa de Macau para ajudar no que for necessário para estes trabalhos de reconstrução e reparação”.

“O que falta fazer é a substituição dos vidros partidos porque há escassez de vidros. (…) Há muita gente a precisar de vidros. Já foram encomendados, e o que está previsto é serem todos colocados ao mesmo tempo quando vierem. Há algumas janelas sem vidros, na cantina também faltam alguns, mas o funcionamento está assegurado”, explicou Manuel Machado.

Tufão Hato levou mural assinado por Vhils. Foto: HM

“Julgo que até ao final deste mês, os [trabalhos de reparação] devem estar concluídos”, observou.

O director da Escola Portuguesa adiantou também que os dois muros exteriores da escola derrubados pelo tufão já foram reconstruídos, mas que “ainda têm de ser pintados e têm que ser colocadas grades que também foram danificadas” pelo Hato.

Um desses muros tinha, no final de Maio, sido objecto de uma intervenção do artista português Vhils. A direcção da escola já informou o artista da queda do mural, mas não foram estabelecidos mais contactos no sentido de, no futuro, Vhils realizar novo trabalho naquele espaço.

“Isso ainda não foi conversado”, disse Manuel Machado.

O melhor possível

O mesmo responsável afirmou que o novo ano escolar arrancou ontem “da melhor maneira” para os 574 alunos inscritos entre o 1.º e 12.º ano, depois de realizadas algumas obras na escola.

“Felizmente, conseguimos em tempo útil fazer todos os trabalhos de reconstrução e reparação necessários ao arranque do ano lectivo sem pôr em causa a data previamente acordada”, afirmou.

Não houve necessidade de nenhuma medida extra porque “todos os espaços por onde circulam professores, alunos e funcionários estão devidamente seguros”, observou.

“De manhã, as crianças do primeiro ciclo foram recebidas pelos seus professores e estão ainda em actividades. Às 10:00 houve uma reunião geral dos alunos do segundo e terceiro ciclos do ensino secundário com a direcção da escola e posteriormente foram recebidos pelos directores de turma. Portanto, decorreu da melhor maneira, e as actividades estão agora em curso”, afirmou.

Além de algumas janelas e portas partidas e da queda de muros, quase todas as árvores nos pátios da escola foram arrancadas pelo tufão, que também causou danos nos ares condicionados e sistemas de ventilação.

 

Ensino | DSEJ diz que há mais alunos e professores

Mais de 79 mil alunos em 77 escolas. São estes os números oficiais do arranque de mais um ano lectivo, e que representam um aumento de 2,7 por cento de estudantes face ao ano passado, disse a Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ) em comunicado. O aumento de alunos verifica-se mais no ensino infantil, que conta este ano com um total de 19.023 estudantes, mais 6,6 por cento. Há também um aumento de 5,5 por cento de alunos no ensino primário, que conta com quase 30.800 estudantes. No ensino secundário, o número de alunos regista uma quebra de 2,8 por cento. Ao nível dos docentes, a DSEJ explica que este ano haverá mais professores nas salas de aula, num total de 7.606 face aos 7.304 registados o ano passado.

7 Set 2017

Pessanha, 150 anos | Valério Romão, escritor: “O amor já existia antes da literatura”

Valério Romão está prestes a encerrar o capítulo final de uma trilogia de romances, Paternidades Falhadas, com um livro, que terminou recentemente, sobre o Alzheimer. Tem também no currículo dois livros de contos. O escritor que gosta de temas arriscados esteve por cá para celebrar os 150 anos de Camilo Pessanha

[dropcap]C[/dropcap]omo se começa a fazer um livro?
Normalmente a coisa impõe-se de uma forma bastante natural. Quando dás por ti tens um projecto na cabeça que nasceu como uma espécie de revelação, uma iluminação. De repente há qualquer coisa que faz sentido e sobre a qual achas que podes passar alguns meses, ou alguns anos, a trabalhar sem que isso chateei, porque o romance é uma maratona. Começas agora e acabas muito tempo depois, portanto, tem de ser qualquer coisa que seja suficientemente apaixonante para te motivar. Acho que é bastante análogo ao trabalho académico, no princípio tudo parece muito bonito mas assim que começas a escrever surgem as dúvidas, pensas que está tudo uma grande merda. Tens oscilações, com amplitudes enormes, entre “eu sou muito bom” ou “eu sou uma grande porcaria” durante todo o processo, até que chegas a um ponto em que já nada importa a não ser acabar aquilo. Como o corpo do maratonista que já está tão anestesiado que já não lhe dói, já não é cansaço, já não é nada. É, pura e simplesmente, uma espécie de mecânica cuja inércia nunca mais termina e que faz com que ele chegue até ao fim da corrida. Entras num estado de semi-hipnose em que a cabeça se concentra num único objectivo e na única coisa que, de facto, te pode salvar naquele momento que é chegar ao fim.

Como é que se sabe que o processo de escrita chegou ao fim?
Tu decides. Há vários fins, ou seja, quando acabas de escrever a primeira versão, quando voltas a trabalhar naquilo. Havia um gajo qualquer que dizia: “sabes que está terminado quando já não consegues olhar para aquilo”. É mais ou menos isso. No meu romance “O da Joana” fiz sete revisões, cheguei ao fim e decidi entregar aquilo a alguém porque já estava a tirar vírgulas do sítio onde as tinha posto e a pô-las onde as tinha tirado. Corria o risco de estar naquilo, tipo Sísifo, o resto da vida. Acho que no fundo já não consegues fazer muito dano porque te estás a repetir. As partes de que não se gosta cortam-se, modificam-se, essa são fáceis de resolver. As difíceis são aquelas em que não tens a certeza. Depois também chegas a um ponto em que estás demasiado perto para poder avaliar aquilo, já não tens clareza suficiente para mexer nas coisas. É muito mais fácil quando estás a rever o livro de outra pessoa. Não é uma questão de ligação emocional ao que está escrito, tem a ver com o facto de haver uma espécie de opacidade que turva as coisas quando escreves qualquer coisa e vais revê-la ao fim de algum tempo. O que é muito bom e muito mau é fácil, o que está no meio é muito mais difícil e é a maior parte.

Como é que começou a escrever?
Começas a escrever porque gostas muito de ler e gostas muito de ler porque, normalmente, tens um problema social qualquer, ninguém te liga. A vida é muito mais interessante que a leitura. A maior parte das vezes não tens muito jeito para estar com pessoas, as pessoas não te interessam muito e refugiaste um bocado ali na leitura. Depois de estares nesse refúgio descobres que podes fazer um caleidoscópio do mundo e encontrar muitos mundos dentro deste mundo através da leitura e apaixonaste por aquilo. Com alguma naturalidade, vais tentando imolar aqueles de que mais gostas.

Que são…
Eu comecei, como julgo que imensos escritores da minha geração, com os Lobos Antunes da vida. É uma referência, mas também um eucalipto que seca tudo à volta porque, de facto, não se pode jogar no campo dele.

Os temas centrais dos seus livros são duros, extremados. Porquê?
Tenho algumas coisas, mais ou menos, simpáticas em contos, por exemplo. Mas, normalmente, vou à procura das coisas menos simpáticas. Primeiro, porque as acho mais interessantes, depois porque estão pouco trabalhadas, outras estão à espera que alguém pegue e faça alguma coisa. A literatura contemporânea tende a ser um bocado neutra a este tipo de temas, não os aborda, ou fá-lo de uma forma mais neutralizada. Interessa-me o desafio de pegar em matéria muito complexa. Pegar num tema destes e trabalhá-lo mal implica teres um livro que manipula uma determinada carga emocional e que redunda num livro delico-doce, ou num dramalhão. É um risco muito grande pegares no autismo, que é o tema do meu primeiro livro, ou numa gravidez falhada, que é o tema do segundo, corres o risco sempre de estar a manejar mal aquilo e de se tornar insuportável de ler por ser pornográfico. Porque expõe em demasia aquilo que as personagens estão a sentir, a desgraça alheia como finalidade, como no Big Brother. A minha finalidade não é essa. A minha finalidade é tentar perceber em que condições é que ocorre uma determinada experiência e tentar devolver essa experiência de uma forma intersubjectiva, de uma forma que faça sentido para mim e para ti sem que isso redunde em voyeurismo.

A sua estreia no romance tem uma recepção muito interessante, inclusive foi finalista do Prémio Femina, em França. Pensou que tinha alcançado um patamar interessante e estava no certo caminho para ser escritor?
Senti quando acabei aquele livro que era um bom livro. Precisava, talvez, de mais tempo para resolver alguns problemas de que ele enferma. Naturalmente, por ser um primeiro livro e por ser muito colado a uma vivência pessoal, mas senti que era um livro bom. Senti ainda mais isso no “O da Joana”, porque, na minha opinião, estruturalmente ainda é mais arriscado e não tendo falhado nesse risco acho que ainda é melhor. Mas percebes quando um livro é bom. Depois tens o teste do primeiro leitor, do editor, mas percebes quando é bom.

Sente que está a fazer o seu caminho e a conseguir o seu lugar?
Acho que ainda não cheguei lá, que ainda falta algum tempo para chegar ao meu lugar, seja lá o que isso for. Aquela coisa de encontrar a minha voz já está resolvida.

Acha que há uma geração nova de escritores portugueses? Um movimento pressupõe algumas condições…
O movimento característico desta geração é termos temas comuns. Muitas vezes o tema é uma espécie de incapacidade de encontrar um sentido para isto onde nós estamos a viver, o que não é nada de original mas que se acaba por repetir. A originalidade das coisas não pode estar no tema. Por exemplo, o amor existe antes de haver literatura, a morte também. O tema não pode ser diferente, mas a forma como o envelope lhe cai em cima, como é vestido é que pode ser diferente, a forma como pode ser vivido e expresso. Neste caso temos uma geração de pessoas que estão ligadas a essa incapacidade de encontrar sentido, que resulta também nalguma incapacidade de haver um movimento porque todo o movimento surge sempre como contraponto a qualquer coisa e aqui não há contraponto. Não é uma questão de realistas e românticos, não é uma questão de neo-realistas e simbolistas, não há isso. Para quê criar um movimento quando não há nada para ir contra? Claro que temos aquelas tricas, que não chegam sequer a ser dignas de menção literária, tipicamente lisboeta e portuguesa. É uma pequena cidade num país muito pequenino, em que as pessoas todas se conhecem e acabam por gostar e detestar-se mutuamente, com a mesma força.

Mas há, ou havia há um ano, um renascimento da poesia em Lisboa.
Há coisas interessantes a acontecer. Nunca tivemos tanta leitura de poesia, a poesia ficou sexy. Terá contribuído para isso a forma como é lida, porque a poesia era lida de uma forma em que acabava tudo a soar sempre a Manuel Alegre. A forma, a técnica, eram muito solenes e estamos numa altura em que as coisas solenes, para o bem e para o mal, não têm piada. Foi bom poder pegar em poetas e lê-los com uma guitarra eléctrica por trás, com piano, com o quer que seja, às vezes sem nada. Temos uma perspectiva muito desempoeirada do que pode ser uma leitura. Vais para um bar e não estás à espera de ver um gajo em modo lírico a noite toda a declamar como se estivesse a ser possuído por, sei lá por quem…

Pelo fantasma do Viegas…
Exacto.

O que nos pode dizer acerca do seu próximo livro?
Acabei de escrever a primeira versão antes de vir para cá. É um livro que ainda não sei muito bem como descrevê-lo porque é muito pulverizado. Tem como pano de fundo o Alzheimer. Gosto de adaptar uma forma específica de escrita a cada livro que escrevo. O “Autismo” tem uma série de capítulos que suportam e fazem a coluna dorsal do livro, que são as partes que se passam numa sala de espera de um hospital. Tudo o resto decorre daí, intercala-se como membros daquela construção que vão encaixar nessa coluna dorsal, em que há analepse, prolepse, para fazer essa sequência e uma espécie de bailado por dentro da história. É sinuoso, mas perfeitamente lógico. “O da Joana”, como é um livro que se passa numa noite, não tem capítulos, é vertiginoso, obriga o leitor a não parar. Como é um livro pequeno eu queria que a experiência fosse assim. Sem paragem, respirar só quando acabar o livro, é um shot de sofrimento. Este, como é sobre o Alzheimer, não tem ordem cronológica. Pode-se começar a ler do meio para o fim, e do meio para o princípio, a experiência não é igual mas pode ser feita. O livro está pulverizado, atomizado em capítulos de página, página e meia, que são uma espécie de ilhotas que simbolizam, de certa forma, as memórias do Alzheimer, que aparecem e desaparecem. Imaginemos um campo de dunas, em que as memórias aparecem em sítios diferentes, em dias diferentes. Queria que fosse uma coisa tão perigosa, tão frágil quanto isso. Não sei se vai resultar, vamos ver, mas já está acabado.

7 Set 2017

Coreia do Norte | Seis testes nuclear de Pyongyang geram terramoto geológico e diplomático

Após o regime de Kim Jong-un ter realizado o sexto teste nuclear, o mais poderoso até à data, o mundo ocidental divide-se entre a ponderação diplomática e as respostas bombásticas de Donald Trump. Seul admite receber armamento nuclear norte-americano, enquanto Pequim continua a criticar a retórica de Washington

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]a sequência do sexto teste nuclear norte-coreano, o mundo diplomático desmultiplicou-se em reacções díspares. Por um lado, a Coreia do Sul e os Estados Unidos apresentam uma retórica bélica, enquanto a China e os países europeus apontam a diplomacia como a resposta primeira.

O fim-de-semana passado na península coreana terminou com um terramoto de 6.3 na escala de Richter. Segundo os registos de várias agências sísmicas o abalo indicia a detonação de um engenho de elevada potência. O teste nuclear foi o mais potente até agora, constituindo uma clara violação às resoluções das Nações Unidas (ONU). De acordo com fontes oficiais japoneses e sul-coreanas, a detonação de domingo originou um abalo dez vezes maior que o sentido aquando do último teste nuclear realizado há um ano.

Na sequência da condenação internacional, o regime de Pyongyang adiantou tratar-se de uma bomba de hidrogénio com capacidade para armar um míssil de longo alcance. De acordo com a televisão estatal, o teste ordenado por Kim Jong-un foi um “perfeito sucesso”.

A resposta de Donald Trump não se fez esperar, no Twitter, claro. Em primeiro lugar, o Presidente norte-americano voltou a alertar para o perigo que a Coreia do Norte representa para o mundo, em seguida realçou o embaraço que o Estado mais isolado do mundo representa para a China.

Nações preocupadas

O teste nuclear de um engenho mais poderoso do que foi lançado sobre Hiroshima motivou uma reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU. A embaixatriz dos Estados Unidos na ONU, Nikki Haley, comentou que o regime de Pyongyang está a “implorar por guerra”. A norte-americana entende que chegou a “altura de esgotar todos os meios diplomáticos antes que seja tarde demais”.

A ex-Governadora da Carolina do Sul lembrou que “vinte e quatro anos de meias medidas e negociações falhadas são o suficiente”. A embaixatriz acrescentou que “os Estados Unidos vão passar a encarar todos os países que mantêm ligações comerciais com a Coreia do Norte como cúmplices” de Kim Jong-un.

O representante chinês na ONU, Liu Jeiyi, adiantou que Pequim reconhece a deterioração constante na península coreana. Porém, o diplomata aconselhou uma resolução pacífica, acrescentando que “a China nunca vai permitir que o caos e a guerra tome conta da península”.

O Kremlin junta-se a Pequim naquilo a que chamam de a “solução bipartida”, ou seja, que Pyongyang suspenda os testes nucleares enquanto os Estados Unidos e a Coreia do Sul interrompam os exercícios militares na região. Uma solução ainda sem um método prático à vista.

O Presidente russo, Vladimir Putin, disse ontem que a aplicação de novas sanções contra Pyongyang será “inútil e ineficaz”, prevendo uma “histeria militar” em torno da Coreia do Norte, o que “pode levar a uma catástrofe planetária”. O líder russo prestou estas declarações após a condenação do novo teste nuclear à margem da uma cimeira dos BRICs.

Durante a reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU, o embaixador russo, Vassily Nebenzia, insistiu que “não há uma solução militar”, reconhecendo, ao mesmo tempo, que o regime de Pyongyang tratou “com desprezo” todas as imposições internacionais.

O representante do Kremlin reforçou a “necessidade de preservar o sangue frio”, sendo necessário “dominar emoções e agir de forma calma e ponderada”.

A contrastar com a reacção calma do embaixador russo na ONU, Putin alertou Kim Jong-un para ter em conta o que aconteceu ao ditador iraquiano Saddam Hussein, uma vez que poderá sofrer um destino similar se não se afastar do programa nuclear.

“Saddam Hussein rejeitou a produção de armamento de destruição maciça, ainda assim a resposta destruiu o país, Hussein foi enforcado e a sua família foi morta”, disse Putin.

Bomba mercantil

Ainda a quente, como é seu apanágio, Donald Trump ameaçou cortar ligações comerciais com os países que façam comércio com o regime de Kim Jong-un. Desde a campanha eleitoral que o Presidente norte-americano ameaça uma guerra comercial com Pequim, o mais directo visado nas declarações de Trump, uma vez que mais de 90 por cento dos produtos importados por Pyongyang são oriundos da China.

A reacção chinesa não se fez esperar, que classificou as reacções do Presidente norte-americano como injustas. O porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, Geng Shuang, acrescentou ainda “é inaceitável uma situação em que, por um lado, trabalhamos para resolver esta questão pacificamente, mas por outro lado, os nossos interesses são sujeitos a sanções e ameaças”.

Os mercados financeiros asiáticos demonstraram ontem alguma instabilidade na reacção ao teste nuclear. Tóquio e Coreia do Sul registaram ontem quedas pelo segundo dia consecutivo. A bolsa japonesa desceu 0,6 pontos percentuais, enquanto Seul perdeu 0,3 por cento. Os mercados de valores de Hong Kong e Xangai subiram ligeiramente, acompanhando Singapura e Taiwan.

Movimentos perigosos

No meio da celeuma internacional, segundo uma fonte dos serviços secretos de Seul citada pelo Asia Business Daily, Kim Jong-un moveu armamento, nomeadamente misseis balísticos intercontinentais para a costa oeste do país. Importa salientar que é nesta área que se encontram as instalações de lançamento de projécteis de longo alcance.

De acordo com o jornal sul-coreano, as movimentações foram feitas durante a noite, de forma a atrair menos atenções, um modus operandi típico do regime de Kim Jong-un.

Ontem, a Marinha sul-coreana realizou cinco exercícios militares com disparos reais ao longo do Mar do Japão. Nos exercícios participaram a fragata Gangwon, com mais de 2500 toneladas, um navio de patrulha de mil toneladas e navios de guerra com capacidade para dispararem mísseis teleguiados. A demonstração de força teve como objectivo deter as intenções bélicas de Pyongyang.

O capitão Choi Young-Chan, que comanda o 13º grupo de batalha marítima, referiu ao Asia Business Daily que “se o inimigo ameaçar fora, ou dentro de água, vamos contra-atacar de imediato e enterrá-los no mar”.

As autoridades sul-coreanas discutiram também o envio de porta-aviões e bombardeiros norte-americanos para a península.

Por outro lado, Seul anunciou que o seu exército e o dos Estados Unidos têm prevista a realização de exercícios anti-submarino no Mar do Japão amanhã e na sexta-feira.

O Ministério da Defesa da Coreia do Sul afirmou ontem que admite autorizar, inclusive, o destacamento de armas nucleares norte-americanas no país, em resposta ao sexto teste nuclear realizado pelo regime de Kim Jong-un.

As autoridades de Seul acrescentam ainda que estão a estudar “todas as opções militares” para travar a crescente ameaça bélica do país vizinho, disse hoje em conferência de imprensa o porta-voz do ministério, Moon Sang-gyun, quando questionado sobre o possível envio de armamento nuclear táctico do seu aliado.

No entanto, Moon ressalvou que o Governo sul-coreano mantém o “princípio de desnuclearização” e que o seu objectivo a longo prazo é conseguir uma península coreana livre de armas nucleares, segundo declarações citadas pela agência Yonhap.

À medida que as tensões vão aumentando na península coreana, o mundo inteiro fica em suspenso com a possibilidade de uma guerra sangrenta e de um conflito às portas da China.

6 Set 2017

Justiça | Português condenado por abuso sexual dos filhos

João Martins foi condenado pelo Tribunal Judicial de Base a cinco anos e seis meses de prisão pela prática de dois crimes de abuso sexual dos dois filhos. O advogado de defesa, João Miguel Barros, afirma que o processo “está completamente cheio de falhas”

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] caso remonta a Maio de 2016, mas só ontem se soube o veredicto final. Há muito que a detenção de um português suspeito de abuso sexual dos filhos menores era muito comentada na praça pública, e ontem o Tribunal Judicial de Base (TJB) decidiu condenar o homem a cinco anos e seis meses de prisão.

O nome do arguido, João Martins, só ontem foi revelado. O TJB entendeu absolver o residente do crime de acto exibicionista de carácter sexual, noticiou a Rádio Macau. Não ficou provada a ocorrência de maus tratos nem a prática de relações sexuais com a filha.

Segundo a Rádio Macau, a juíza considerou que os depoimentos dos dois filhos de João Martins em tribunal são “credíveis” e que “não há prova que foi a mãe que influenciou” as crianças.

Em declarações ao HM, o advogado de defesa de João Martins, João Miguel Barros, disse que vai interpor recurso da decisão.

“O processo está completamente cheio de falhas desde o primeiro momento e neste momento não quero fazer declarações sobre o processo”, referiu o causídico, que continua a defender a inocência do seu cliente.

“Digo apenas que acreditamos na inocência do João Tiago, e se não fosse isso nunca teríamos aceite ter sido seus advogados. Por acreditarmos na sua inocência vamos defender a sua posição em recurso. Depois se verá quando acabar a fase de recurso e quando a sentença transitar em julgado”, acrescentou.

Tudo negado

As alegadas vítimas são uma menina de sete anos e um menino de nove. Tudo começou quando a mãe das crianças começou a estranhar o comportamento dos filhos quando estavam na presença do pai. O casal havia passado por um processo de divórcio e a mãe tinha conseguido a guarda das crianças.

Segundo a TDM, terá sido numa consulta com um psicólogo que as crianças contaram que eram vítimas de abusos e que o português lhes terá tocado nos órgãos genitais, além de os intimidar com agressões físicas para que não contassem a ninguém esses episódios.

João Martins vivia perto do Parque Central da Taipa e tinha à sua guarda os filhos desde 2011, ano em que começou a divorciar-se da mulher.

Quando foi detido pela Polícia Judiciária, negou todas as acusações de que era alvo, mas o TJB entendeu ser culpado.

O caso chegou a ser notícia nos media de língua chinesa. O diário Ou Mun, título com maior circulação no território, escreveu que os actos de que João Martins é agora acusado se prolongaram por vários anos. Também o jornal Va Kio escreveu que os filhos começaram a ter medo de estar com o pai.

6 Set 2017

Paulo José Miranda, escritor e poeta: “Esta também é a terra dos portugueses”

Em “Karadeniz – Entrevista com um assassino”, Paulo José Miranda explora um dos muitos limites da natureza humana, ao mesmo tempo que reflecte sobre o terrorismo. Convidado da iniciativa “Camilo Pessanha – 150 anos”, o escritor e poeta fala do novo livro, cuja personagem é o oposto do assassino profissional. O autor, que fala hoje no edifício do antigo tribunal, defende que a existência de duas culturas que se compreendem e que fazem de Macau um lugar singular no mundo, irrepetível

Publicou “Karadeniz – Entrevista com um assassino”, uma compilação dos textos que tem vindo a publicar no HM. Porquê a entrevista a um assassino?

Tenho duas participações no HM. Uma é com os textos que compõem a secção “Máquina Lírica”, em que costumo escrever acerca de livros e maioritariamente poetas mais novos do que eu, que têm editado em Portugal. Participo também com a secção “Em Modo de Perguntar”, com pequenas entrevistas que tenho feito a várias pessoas, actores, poetas e escritores. De repente ocorreu-me a ideia de fazer um projecto, algo que já tinha escrito em 2004, a ver se funcionava. E eu próprio entro como entrevistador. Este livro faz parte de um projecto que já terminei, sobre obras do século XX, onde explorava diversas formas. A entrevista é uma forma utilizada no século XX, e em Portugal o gosto do público pela entrevista intensificou-se nos anos 90.

Porquê?

Talvez devido ao facto de termos vivido muitos anos no Estado Novo, a entrevista não era propriamente algo que agradasse ao regime. Então na década de 90 começou a acontecer uma coisa curiosa, em que as pessoas liam mais as entrevistas dos escritores do que os próprios livros.

Isso mudou ou intensificou-se?

Hoje em dia a situação é diferente porque a internet mudou muita coisa. Partindo dessa observação construí uma narrativa, uma ficção, em forma de entrevista. Já não era preciso estar a ler a entrevista do escritor. O Carlos [Morais José] gostou da ideia, teve alguma aceitação. Depois fez-me a proposta para editarmos o livro. Nunca pensei que o texto fosse editado tão cedo. Uma das razões para isso prende-se com o facto da entrevista ser um formato estranho para um livro, não seria a forma mais apetecível para os editores. Mas julgo que a maior dificuldade é que o texto não é muito longo. Se fosse um longo romance…que, aliás, pretendo fazer um dia.

A partir deste livro?

Não, só com esta forma, mas com outros personagens. Talvez aí seja mais fácil e apetecível para um editor. Quando me foi feita a proposta, aceitei de imediato. E porquê um assassino? O assassino opõe-se em determinados pontos de vista, que me parecem fundamentais, em relação às nossas próprias vidas e ao nosso tempo. Um deles é que ele faz uma vida inteira sem ser conhecido, porque ele era excelente no que fazia e ninguém sabia quem ele era. Isto é o oposto do que nós queremos nos nossos dias. Não só queremos ser reconhecidos pelo trabalho que fazemos como queremos ser reconhecidos só porque sim. 

Queremos ter os tais quinze minutos de fama.

E que os quinze minutos se prolonguem. Houve uma grande explosão, que me parece que está a terminar, em que as pessoas iam para a televisão sem terem feito nada de extraordinário. Este personagem é então o oposto disso tudo. Ao mesmo tempo há um jogo de espelhos entre a actividade dessa pessoa e a do próprio escritor. Vai-se traçando, à medida que ele está a falar, toda uma preparação. Há ainda a relação com a morte. Para ele matar não é encarado como morte, é visto como um trabalho. Há um outro lado, que está muito presente no nosso tempo, que é o modo como o personagem se posiciona de forma antagónica com o terrorismo, o que nos causa algum choque. Imaginamos que um assassino profissional é um terrorista, e ele distancia-se disso.

Editar este livro foi a maneira que encontrou de reflectir sobre essa questão, numa altura em que o terrorismo é tão falado e tão incompreendido?

É uma das maneiras. Tenho um livro, passado em Hong Kong, que é “A Máquina do Mundo”, uma história de amor entre dois assassinos profissionais, que vão perdendo vidas como se fosse um jogo de computador. Aí reflicto mais sobre o assunto. Em “Karadeniz – Entrevista com um assassino”, o que há é o mostrar como nos anos 50 e 60 quase tudo era de elites. Até matar e pagar para matar. Hoje, como diz Karadeniz, qualquer um encomenda uma morte por meia dúzia de tostões. O assassino profissional já se tornou democrático também.

Foto: Sofia Margarida Mota

Percebo que há aí um certo fio condutor em relação à morte. Esse tema, sobretudo a morte premeditada, fascina-o?

Não. O que acho é que o assassino profissional interessa, porque todas as situações limites do ser humano nos fazem pensar. E ser um assassino profissional é uma situação limite. Isso são coisas que me fascinam porque reflicto sobre elas, sem dúvida nenhuma. Alguém que transforma uma pessoa numa coisa entra na esfera do horror.

Algo desprovido de sentimento.

É o horror, como o que aconteceu em Auschwitz. Estas são formas que me interessam para pensar e ao mesmo tempo expor o humano que habita em todos nós. Não vamos a esse extremo, mas há algo que se ilumina a partir dali, daquele limite. O meu próximo livro, um longo romance de mais de 600 páginas, é o oposto: é sobre alguém que viveu a vida de um ponto de vista absolutamente ético. O que também é uma posição radical, de limite. Passou a vida a ler e a estudar, tendo responsabilidade. São casos extraordinários para reflexão. Ao tentarmos descer ou subir até eles, acabamos por nos iluminar a todos nós, o humano, na sua normalidade.

Falou-me do livro “A Máquina do Mundo”. Foi esse o livro que o fez regressar a Portugal depois de ter vivido vários anos no Brasil. Chegou a ser referido na imprensa como um “fantasma literário”, porque desapareceu do panorama literário português durante uns anos.

O João Paulo Cotrim recebeu uma indicação do António Cabrita, que lhe tinha enviado “A Máquina do Mundo”. Ele gostou do texto e contactou-me a perguntar se já tinha editora. Eu vivia em Curitiba e ele foi a minha casa, e conversámos. Durante o ano de 2014 acabei por escrever um livro de poesia, então o João Paulo Cotrim acabou por editar três livros.

Mas como foi regressar? Sentiu-se esse “fantasma literário”?

Não pensei assim e continuei a escrever. No tempo em que não escrevi estava dedicado à música. Não publicava, mas não tentei publicar. Era uma situação difícil para publicar, porque estava muito afastado. Hoje em dia é muito difícil editar livros sem aparecer. Se não apareces para as entrevistas as pessoas deixam de existir, somos cada vez mais numa sociedade mediática.

E o escritor tem de ser uma estrela.

Não diria uma estrela. Comecei a publicar no final dos anos 90 e as coisas eram diferentes. Davam-se entrevistas, mas não se aparecia. Hoje isso é fundamental. Nunca senti a questão do “fantasma literário”. Continuei a publicar, mas de facto não aparecia. Foram livros que passaram, não estava lá. E do ponto de vista do jornalismo é interessante escrever sobre alguém que está exilado, desaparece e de repente edita três livros.

Esta terça-feira falou sobre a experiência do que é ser português em Macau. Viveu essa experiência na pele durante três meses.

Vivi um pouco, mas a minha experiência veio de uma grande intuição, e também pela experiência de ter vivido cinco anos em Istambul. Foi uma experiência mais radical do que estar em Macau, porque ninguém fala português. Haveria talvez uma pessoa que sabia quem tinha sido Fernando Pessoa. Em Macau, além de ter lido as cartas e imenso sobre Pessanha, fiquei com uma percepção. Há qualquer coisa que acontece com os portugueses de Macau que é uma espécie de amplificador de uma estrutura existencial. Essa estrutura é como aquele fenómeno que se passa na mecânica quântica, como se houvesse uma vida paralela. Durante um tempo poucas pessoas que vinham para aqui não sentiriam que a sua vida seria uma vida de empréstimo, e que mais cedo ou mais tarde iriam recuperá-la.

Sente que somos uns privilegiados em Macau?

Hoje em dia já não, mas na década de 90 sim, sem dúvida. As pessoas ganhavam uma fortuna a fazer o mesmo que fariam em Portugal. 

Falo do privilégio de ter acesso à cultura portuguesa e a pontos identitários nesse sentido.

O que acho é que Macau é um lugar privilegiado e provavelmente único. É provavelmente o único lugar onde os portugueses estiveram que não foi conquistado, foi doado. Isso muda tudo. Em Moçambique há uma sensação de racismo, porque os moçambicanos foram colonizados. Aqui isso não existe.

Mas há um distanciamento.

Que advém da enorme diferença cultural e da língua. Há essa experiência que é o convívio de duas culturas muito distantes uma da outra, que não se fundem. Houve muito mais fusão cultural, e entre as pessoas, em Moçambique do que aqui. Os portugueses tiveram, apesar de tudo, uma diferença em relação aos outros países, apesar das atrocidades cometidas. O português misturava-se. Quando chegamos aqui os bárbaros éramos nós, há logo uma diferença, porque havia aqui uma cultura instalada. Sempre houve esse respeito. Em nenhuma parte do mundo acontece isto. No mundo em que nós vivemos, é exemplar.

Quando viveu em Macau veio escrever sobre Camilo Pessanha.

Estava inserido num projecto que era uma parceria entre a Fundação Oriente (FO) e a editora Cotovia, da qual fazia parte. A Cotovia enviava escritores para vários locais a Oriente e publicava os livros. A FO encarregava-se dos custos. Foi-me dado a escolher entre Pessanha e Venceslau de Moraes, e aí iria para o Japão. Eu não escolhi Macau, escolhi Pessanha. É um poeta pelo qual sentia um fascínio há muito tempo. Li muito sobre ele, andei nos lugares onde andou. Foi o Pessanha e a força da poesia dele que me trouxe, e interessei-me depois pela sua pessoa. É uma pessoa contraditória, cheia de mistérios à sua volta, alguém que é viciado em ópio e que tem uma profissão importante. Ao mesmo tempo tinha um desprezo pelos seus conterrâneos, e depois tinha uma sensibilidade enorme. Acho que Macau está melhor, porque já não há a sombra de muitos portugueses que sentiam isto como uma colónia. Alguns achavam que os chineses eram inferiores. Era uma sombra que pairava, mesmo que nem todos pensassem assim. Com a transferência de soberania essa sombra desaparece. Mas esta é também a terra dos portugueses, e isso é hoje mais claro.

6 Set 2017

Timor-Leste | Português condenado fala de incongruências na sentença

“Fomos todos enganados”

Tiago e a esposa, Fong Fong Guerra, foram condenados a oito anos de prisão pelo tribunal de Timor-Leste pela co-autoria do crime de peculato. Em entrevista, Tiago Guerra diz que há incongruências na sentença e muitas dúvidas sobre o paradeiro do dinheiro que o tribunal afirma estar nas contas do casal. O português, que aguarda a decisão do recurso, fala de entraves na sua defesa

[dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]erdeu 14 quilos enquanto esteve preso preventivamente em Díli. Tanto ele como a esposa necessitam de ser operados e de tratamento médico que não conseguem ter em Timor-Leste.

Do país não podem sai r por terem os passaportes confiscados e estarem sujeitos ao termo de identidade e residência. Os pedidos para que possam procurar ajuda médica no estrangeiro, foram entretanto recusados.

Eles são o casal português Tiago e Fong Fong Guerra, que desde 2014 se vêem a braços com um caso na justiça timorense. No passado dia 24 de Agosto foram ambos condenados pelo tribunal a oito anos de prisão pelo crime de co-autoria num caso de peculato, tendo sido absolvidos dos crimes de branqueamento de capitais e falsificação de documentos. O tribunal condenou-os ainda ao pagamento de 859 mil dólares.

Foram acusados de “prejudicar as finanças e a economia do Estado” de Timor-Leste, por alegadamente se terem apropriado de fundos oriundos da indústria petrolífera, que pertencerão ao país.

Tiago Guerra está na fase de recolha de mais provas para sustentar o seu caso. “Estes dias têm sido muito complicados. Somos condenados por um crime que não cometemos e estamos a ver as nossas vidas destruídas”, contou ao HM.

Tiago Guerra não faz a mínima ideia de quando será proferida a última de todas as decisões. “Aqui em Díli o tribunal de recurso pode demorar um ano ou dois a apreciar um caso. Aqui há dias houve uma decisão que tinha sido interposta em 2014, ainda estava preso. Pode demorar muito tempo.”

O português diz não aceitar a sentença e fala de entraves na apresentação de provas durante a preparação da sua defesa.

“A questão mais importante aqui é o direito à defesa. Os juízes tinham dúvidas, e isso está escrito no acórdão, sobre o paradeiro dos fundos. Queríamos chamar as testemunhas que fizeram a transferência, mas foram todas negadas, os juízes indeferiram esses pedidos. Depois tentamos ainda trazer uma testemunha do banco que fez a transferência, mas o pedido também foi indeferido”, contou.

O português adiantou que “sem direito à defesa, e sem cumprir os princípios básicos de justiça, tem sido muito complicado pensar em como podemos fazer isto”. “Estamos focados na apresentação do recurso e em garantir que está lá tudo”, acrescentou.

Onde está o dinheiro?

Em 2011, Tiago Guerra detinha a Olive Unipessoal, uma empresa sediada em Timor-Leste, a partir da qual efectuava negócios e recebia pagamentos por trabalhos de contabilidade, consultoria e auditoria. Desde 2010 que Fong Fong Guerra, a sua esposa, detinha em Macau uma outra empresa, a Olive Consultancy.

Segundo Tiago Guerra, foi esta empresa que serviu como intermediária no pagamento de 860 mil dólares norte-americanos entre uma sociedade de advogados norueguesa, em representação de uma empresa, a uma outra empresa norte-americana. O pagamento, feito através de um contrato de agente depositário (contrato escrow), foi feito a convite de Bobby Boye, nigeriano com nacionalidade americana.

Esse contrato valeu à Olive Consultancy o pagamento de dez mil dólares americanos, sendo que, a partir da transferência do dinheiro para os Estados Unidos, Tiago Guerra assume nunca mais ter tido contacto com Bobby Boye.

Boye, que chegou a desempenhar funções como assessor do Estado timorense no sector do petróleo, cumpre hoje pena nos Estados Unidos pela prática de vários crimes financeiros.

Tiago Guerra fala das diversas incongruências que encontrou na leitura da sentença que o condenou a si e à sua esposa, relativas ao paradeiro do dinheiro.

“Os juízes dizem que o dinheiro (860 mil dólares) foi enviado e saiu da conta, como ficou provado graças aos peritos do Banco Central, mas depois dizem que está em parte incerta. Há uma terceira afirmação de que o dinheiro está nas nossas contas em Macau. Quando têm estas dúvidas, penso que o principio da defesa não está a ser respeitado.”

Para descobrir o rasto do dinheiro, as autoridades timorenses enviaram cartas rogatórias, a pedir diligências e informações, às autoridades de Macau.

“Pediram cartas com informações sobre nós, e foi enviado um resumo, assinado pela Polícia Judiciária e Interpol, de todas as contas bancárias em nosso nome. O saldo de todas essas contas dá pouco mais de seis mil dólares. Dizem que estão congelados 860 mil dólares? Nessa altura estava preso, não tive nada a ver com esse pedido. [As autoridades timorenses] ignoraram todas essas informações”, clarificou Tiago Guerra.

O português, que foi condenado por alegadamente ter transferido dinheiro que pertence aos cofres públicos de Timor-Leste, afirma ainda que a sentença que ouviu não dá certezas sobre se os 860 mil dólares pertencem, de facto, ao país.

“As autoridades dizem que o dinheiro que foi transferido para a nossa conta lhes pertencia, mas essa é outra questão. Isso não ficou provado em tribunal. A lei diz que os pagamentos de quaisquer receitas do petróleo devem ser feitos directamente ao fundo soberano, que pertence ao Estado timorense e cuja conta está na Reserva Federal em Nova Iorque. Estamos a falar de um banco dessa dimensão”, referiu.

Tiago Guerra questiona: “a partir do momento em que o dinheiro não foi transferido para lá, alguém pensa que pertence ao Estado timorense?”

O português assegura que, quando fez a transferência do montante, em 2011, jamais poderia imaginar que esse dinheiro pertencia a Timor-Leste.

“Só em Dezembro de 2016, quando tivemos acesso aos autos, vimos que o dinheiro está em disputa entre a empresa norueguesa e o Estado timorense. Até então não tínhamos a mínima ideia de que o dinheiro poderia pertencer a Timor e muito menos que viesse dos impostos [da indústria petrolífera].”

Alguma ingenuidade

Tiago Guerra, licenciado em engenharia e com carreira feita na área das telecomunicações, chegou a Timor-Leste em 2010, depois de ter passado pelo Brasil e pela China. Trazia na bagagem uma proposta para abrir a Digicel, empresa irlandesa, em Timor-Leste, projecto que falhou.

“A empresa contratou-me para começar uma empresa de operações de telecomunicações, e quando cheguei não havia uma licença nem a legislação que permitisse ter a licença. Não havia nada.”

Na cabeça do casal Guerra começou a pensar-se a ida para Macau, e foi nessa altura que foi criada a Olive Consultancy. A ideia era colocarem os filhos na Escola Portuguesa de Macau, onde tinham uma reunião agendada que nunca chegou a acontecer, devido ao facto de terem sido detidos no aeroporto de Díli dois dias antes.

A ligação do casal Guerra com Bobby Boye surgiu pelo facto de serem vizinhos.

“Houve a necessidade de um agente depositário e na altura Boye era uma pessoa bem vista aqui. Sei que entretanto fomos todos enganados e ludibriados por ele. Na altura tinha uma óptima reputação aqui, eu diria que era o assessor mais visível em Timor-Leste. Era recebido por todos os ministros. Quando recebemos esta proposta decidimos avançar”, lembrou Tiago Guerra.

Hoje o português não tem duvidas de que foi algo ingénuo na hora de aceitar este contrato.

“Nunca pensei que alguém pudesse ser assim. Éramos vizinhos, quando cheguei a Díli a casa dele era mesmo ao lado da minha. Agora sabemos que é criminoso, está a cumprir a pena, e que já tinha estado antes na prisão. Mesmo assim conseguiu ser escolhido no processo de contratação de um assessor internacional.”

Tiago Guerra frisa ainda não compreender como é que o tribunal timorense nunca notificou Bobby Boye como co-arguido no crime de peculato.

“Não sei como é que estou a ser condenado de ser co-autor de um crime de peculato, quando o autor do crime nem sequer foi notificado pelas autoridades. Está a cumprir pena nos Estados Unidos e são conhecidas todas as informações sobre ele. Dizem que não o conseguem encontrar? Essa informação é difícil de aceitar”, remata.

5 Set 2017

Ministério Público | Queixa contra Fong Soi Kun por homicídio por negligência

[dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]ong Weng Kuan, candidato que encabeça a lista 19 da Associação dos Cidadãos Unidos para a Construção de Macau, apresentou ontem queixa-crime no Ministério Público contra Fong Soi Kun por homicídio por negligência. A razão da queixa prende-se com a actuação dos serviços meteorológicos e a falta de alertas atempados aquando da passagem do tufão Hato

Os Serviços Meteorológicos e Geofísicos (SMG) de Macau têm sido severamente criticados por vários quadrantes da sociedade. Porém, ontem a situação foi um pouco mais longe quando o Hong Weng Kuan, candidato da lista da Associação dos Cidadãos Unidos para a Construção de Macau, se deslocou às instalações do Ministério Público (MP) para apresentar queixa contra o antigo director dos serviços meteorológicos.

O líder da lista 19 acusa o ex-director dos SMG de homicídio por negligência, depois deste ter apresentado a demissão e passado à reforma, na sequência da polémica actuação dos serviços no dia em que o tufão Hato varreu o território.

“Toda a gente sabe que os SMG não fizeram o suficiente na previsão meteorológica, neste contexto, como a calamidade resultou em vítimas mortais, é um crime de homicídio por negligência”, diz o líder da lista, que frisou que o objectivo de denúncia é proteger o espírito do direito.

A passagem do Hato provocou uma dezena de mortos e deixou grande parte do território sem abastecimento de água e electricidade, consequências que Hong Weng Kuan considera resultar da falta de alerta dos serviços meteorológicos.

Carta anónima

Aquando da entrega de documentos da apresentação da queixa-crime, o candidato da lista 19 referiu a existência de uma carta anónima onde se terá revelado uma esgrima por poder dentro dos próprios SMG.

Nesse aspecto, Hong Weng Kuan considera que “apesar de a luta pelo poder não pertencer à competência de investigação do MP, se tiver sido o motivo causador do atraso na emissão de alerta, provocando perda de vidas, isto é abuso de poderes e não valoriza as vidas dos residentes”, lê-se no comunicado apresentado.

Apesar de ter sido a única baixa que apresentou a demissão, Fong Soi Kun, pode não ser o único a ser chamado à pedra segundo a opinião de Hong Weng Kuan, também advogado, que não afasta a possibilidade de acusação de mais pessoal pertencente aos SMG.

O candidato a deputado da Assembleia Legislativa acrescentou ainda que os procedimentos disciplinares não chegam para punir uma situação tão grave e com consequências tão trágicas. Hong Weng Kuan acrescenta que estas responsabilidades devem ser apuradas em sede de investigação criminal do MP.

Importa salientar que o Comissariado Contra a Corrupção iniciou um inquérito sobre os procedimentos de previsão de tufões e a forma como os serviços meteorológicos geriram todo o processo aquando da passagem do tufão Hato por Macau. Apuradas as responsabilidades, nomeadamente de Fong Soi Kun, os resultados serão entregues ao Chefe do Executivo.

5 Set 2017

Camilo Pessanha, 150 anos | António Cabrita: “Sou um filho da dificuldade”

Escolheu o tempo ao dinheiro. Foi para Moçambique após mais de uma década como jornalista no Expresso e desde aí a sua vida é escrever. António Cabrita está hoje no Edifício do Antigo Tribunal para uma conferência integrada na comemoração dos 150 anos do Camilo Pessanha

Publicou o seu primeiro livro de poesia aos 17 anos.

Sim, mas é um horror. Tenho quatro livros que não cabem na minha tábua bibliográfica. Foram absolutamente retirados. Ali só coloco os livros que publiquei a partir dos 38 anos. São poemas de uma imaturidade absoluta e não tenho nenhum prazer nem em revê-los. Até me custa falar disso.

Ainda muito novo também conheceu o Al Berto. 

Sim. Conheci o Al Berto devia ter uns 18 ou 19 anos. Ele tinha mais dez anos do que eu. Conheci-o pouco depois de ele ter chegado da Bélgica onde esteve numa espécie de exílio. O Al Berto tinha sido enviado para fora para estudar, para não ir à tropa. Também tinha outra condição que nessa altura era complicada de ser declarada, a homossexualidade. A família mandou-o para fora. Começou como pintor e depois rompeu com toda a pintura e figuração e dedicou-se à escrita. Teve também uma pequena editora. Andei com ele na altura a distribuir alguns dos livros pelas livrarias o que causava um certo escândalo. Tinha alguns livros ousados. Eram livros de afirmação da sexualidade o que causava escândalo diante dos livreiros que, nessa altura, não estavam habituados ainda a tais liberdades cívicas. Ele publicou um livrinho, o meu segundo livro. Era um poema de 17 ou 18 páginas que eu há uns anos reduzi a sete. Era uma longa verborreia lírica. Enxuguei as águas e ficou um vão mais potável, mas ainda assim com pouco sol. Só aos 38 anos é que achei uma voz. Na altura, e curiosamente, publiquei um livro. Queria-me candidatar a um prémio que ganhei. Precisava de pagar dívidas. Foi assim que realmente apareceu o primeiro livro.

Como é que se deu a passagem da poesia para a ficção?

Essa mudança acaba por ocorrer por uma circunstância simples. Fiz o curso de cinema e fui logo identificado como um tipo que tinha um jeito especial para fazer diálogos e nas aulas era recrutado para os fazer. Mais tarde, tinha formação técnica e sabia como realizar um filme. Acabei por fazer guiões mas ficava sempre chocado com o que via. Achava que eles eram uns grandes nabos. Não consigo escrever um guião sem imaginar como é feito. Nunca tive esses despojamento. Escrevo um guião imaginando-me um realizador. Depois de escrever uns sete ou oito filmes e ficar sempre com um sabor amargo face ao resultado percebi que, para a reconstituição do meu ego em clivagem, precisava de começar a comandar alguns dos processos. Tinha de estar diante de uma narrativa que tivesse controlado do princípio ao fim. E foi assim que comecei a escrever ficção. Comecei por um livro de contos que correu muito bem. A ficção começa também como um desafio. Eu escrevo porque não sabia escrever. A dificuldade é que me fez continuar. Na adolescência, fazia parte de um grupo de amigos, alguns deles famosos e que são pessoas consideradas, e que fizeram uma carreira. Todos eles escreviam poesia ou ficção e acabávamos a discutir esses assuntos. Era uma coisa engraçada em que eu era inevitavelmente o mais desajeitado. Eles desistiram todos, porque tinham facilidade. Eu como tinha dificuldade tinha de trabalhar para contornar os problemas e as deficiências e isso acabou por me melhorar. Mas, de facto, sou um filho da dificuldade. Venho de um meio pobre e tive de recobrir séculos de ignorância genética. Ainda hoje tenho lacunas graves.

Está em Moçambique. Depois do jornalismo e de muitos anos no Expresso, resolveu abandonar tudo e ir. O que é que aconteceu?

Estive no JL, depois estive na Elle e depois no Expresso. Fui para Moçambique ganhar um terço do que ganhava. Sou um caso do mundo emigrante que sai para ganhar menos. Depois tive de remontar a vida. Quis ganhar tempo. Perdi dois terços de tudo o que é pecuniário mas ganhei dois terços de tempo e isso mudou tudo. Desde que estou em Moçambique já publiquei treze livros.

Mudou também a sua maneira de escrever?

Sim. Mudou, entre outras razões, por causa do anonimato que encontrei em Moçambique. Estive cinco anos absolutamente anónimo e isso foi absolutamente extraordinário. Permitiu que rescrevesse tudo, que escrevesse de outras formas, experimentar outros modos sem ter nenhuma cabecinha atrás do ombro a dizer-me que estava a trair o meu estilo. Isso deu-me uma liberdade imensa. Quando reapareci, toda a gente ficou surpreendida. Quando fui para África as pessoas consideraram a minha opção muito estranha. Chego a África e desato a  trabalhar como um doido e, de repente, apareci renovado e com uma densidade que ninguém estava à espera. Tive de fazer o percurso. Os primeiros livros que editei depois de ter ido para Moçambique foram uma novela juvenil, um livro de poesia e um livro de contos grande. Na altura saíram quatro coisas muitíssimo boas nos jornais acerca deste livro, que não no Expresso, coisa que me magoou muito. Depois fiz o meu primeiro romance e mandei-o para a Porto Editora que me pediu uma versão light. O livro é a “A Maldição de Ondina”. Enviei-o para o Brasil que me mandou um contrato. O livro foi editado lá e depois acabou por ser finalista de um prémio. Recuperei uma ressonância mediática em Portugal. Mas teve de vir de fora, dar a volta ao Brasil, para ser reconhecido.

Porque é que acha que esse tipo de situação acontece?

Por inveja. Uma das coisas que distingue a editora Abysmo é que todos os escritores que ali editam são amigos uns dos outros, não se invejam. Ficamos contentes com os êxitos uns dos outros, lemos os livros uns dos outros e discutimos. Isso foi uma espécie de revolução coperniciana durante algum tempo na adição portuguesa.

Falando em escritores portugueses. Como é que vê a produção literária em Portugal neste momento?

Estou fora e há coisas que não acompanho. Mas, do que me é dado a conhecer, mais na ficção, neste momento acho que há uma coisa espantosa. Há uma geração de mulheres escritoras, tal como nos anos 70. Estou-me a lembrar, por exemplo, da Maria Velho da Costa, da Teresa Horta. Surgiram uma série de mulheres ao mesmo tempo naquela altura, o que era uma espécie de banco de coral muito enriquecido. Acho que do melhor que se está a fazer na literatura portuguesa tem que ver com a pressão feminina. Além disto parece que há uma série de gente nova muito boa. Não vou estar aqui a falar dos meus amigos (risos). Há sempre um discurso sobre a crise em que estamos em crise em tudo. Sou muito mais positivo. Acho que estamos num período difícil porque estamos numa encruzilhada entre regimes de cultura e existe uma grande confusão em relação a isto. Normalmente não damos conta no nosso quotidiano, mas enfrentamos signos de diferentes regimes de cultura. De cultura popular, de cultura erudita ou humanística, de massas, digital e por aí fora. Isto são regimes diferentes que implicam, não só imaginários diferentes, como valorizações e pautas valorativas diferentes. Confundimos a cultura pop com a cultura. É a mesma coisa que confundir a cosmética com a beleza natural. Há uma grande confusão sobre o que é cultura. Isto é um problema. Vivemos de frivolidade, de pouco esclarecimento e de pouco discernimento precisamente porque estamos neste caldo dos vários regimes culturais que coexistem ao mesmo tempo. Se formos para a globalização temos confusões ainda maiores.

Temos aqui um guionista, um escritor, um poeta, um ensaísta e um jornalista. Como é que estas pessoas convivem entre si? 

Ainda devo cerca de 10 mil dólares ao ensaísta (risos). Às vezes reencontramo-nos todos e jogamos a dinheiro. Mas, falando mais a sério, o ensaísta acontece por duas razões. Tenho um percurso solitário. Não tenho um percurso integrado numa geração. Cada geração cria os seus escritores e os seus críticos. Cada geração também tem os seus santinhos que são as chaves da decifração para o estilo de cada geração. Eu surjo como um ovni. Comecei por ficar surpreendido com as coisas que escreviam acerca dos meus livros. Achava que eram, na maior parte das vezes, um disparate. Às vezes intuía que era um disparate sem saber de forma racional e articulada explicar que o era. Com o ensaio, surgiu em mim, uma necessidade de me explicar. Mas nem gosto muito de escrever sobre livros, gosto de escrever sobre temas.

Gosta do vento e pensa ter um livro acerca do assunto.

Tenho este fascínio pelo vento. Penso que será o meu fim, que um dia serei levado por ele, para qualquer lado. Cada um tem a pancada que pode, eu tenho esta. Tenho já reunidos um cinquenta poemas de poetas que escreveram sobre o vento para uma antologia. Um dia gostava também de ter uma conversa com o vento. Não sei porquê mas desde miúdo que tenho este fascínio pelos elementos. De um ponto de vista académico dir-se-ia que é uma espécie de entronização com o sublime. O sublime é uma espécie de angariação com as forças que são maiores do que nós. Provavelmente é isso.

É a primeira vez que está em Macau e integra as comemorações dos 150 anos do Camilo Pessanha. Como está a ser a experiência?

Estou aqui há pouco tempo mas estou agradado. Até posso dizer que já tenho um projecto doido que tem que ver com Macau. Vou escrever uma peça de teatro acerca das relações difíceis entre o Camilo Pessanha e o seu arqui-inimigo, Silva Mendes. O Camilo pode representar um tipo humano periférico e difícil como a relação do poeta na cidade. O Silva Mendes representa aquilo que tenho encontrado muito. É o português que vive de irreais e que chega aos territórios sempre para tentar fazer réplicas da sua aldeia. Penso que pode dar uma boa comédia e vou tentar ter dois meses para vir cá fazer esta peça.

5 Set 2017

16 anos do jornal Hoje Macau

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]os tempos actuais, a palavra “jornal” começa a ter um sabor arcaico. Face às novas tecnologias, este objecto de papel parece ter perdido grande parte da sua importância e, dizem, cada vez menos pessoas se dão ao trabalho (ou ao prazer) de desfolhar estas páginas impressas.

No “Admirável Mundo Novo”, de Aldous Huxley, ninguém tinha acesso a jornais, muito menos a livros. Apenas o líder tinha acesso a uma biblioteca e é comovente (e perigoso) o efeito num cidadão das obras completas de Shakespeare.

Mais ou menos o mesmo se passa agora: a informação netificada, instantânea, de origem obscura, ultra-efémera, de importância menor, por um lado; e por outro os jornais sobreviventes, enquanto espaço de jornalismo, análise e crítica. Claramente, o Hoje Macau, no dia em que faz 16 anos, assume-se como pertencendo à segunda categoria.

Queremos ser um jornal e não uma fonte anódina de informação em segunda mão.

Queremos reflectir sobre os factos, analisá-los, de modo a abrir ao leitor a possibilidade de pensar neles ou mesmo de os recusar.

Queremos exercer um pensamento crítico no fluxo incessante de notícias e estender essa crítica, sem rodriguinhos, aos que entendem colocar os seus interesses pessoais acima dos interesses colectivos.

Queremos servir Macau e as suas gentes do modo que entendemos mais eficaz, no limite das nossas possibilidades: fazendo um produto digno, capaz de não envergonhar a comunidade que por aqui se exprime em português, seja como primeira ou segunda língua.

É inegável que a língua portuguesa faz parte integrante e fundamental da identidade de Macau, mas cabe-nos a nós garantir a sua importância, a sua permanência e futuro.

E queremos, sobretudo, que o Hoje Macau seja uma referência cultural activa (no sentido lato), na medida em que se assume como bastião da língua portuguesa e das culturas lusófonas.

De algum tempo para cá, este jornal tem dedicado parte significativa das suas páginas a assuntos literários, artísticos e culturais, no sentido de desafiar os nossos leitores a arriscarem os seus passos por caminhos belos e profundos.

Há mais de dez anos que publicamos semanalmente traduções de clássicos chineses, de poesia, de ensaios fundamentais para a compreensão do País do Meio. É um trabalho inovador, arriscado e, como quase sempre, talvez mal compreendido. Mas é esta a via pela qual pretendemos prosseguir.

São 16 anos desiguais que se confundem com a existência da RAEM, também ela perturbada por inúmeros acontecimentos paradoxais e bastas contradições. Mas hoje sentimos estar mais certos do que nunca das nossas capacidades de existir por aqui como um produto singular, único, irrepetível, incopiável, e de mostrar uma outra cidade ao mundo — esta amálgama de culturas, tradições e modernidade que Macau encarna sem pudor nem consciência.

É este, finalmente, o seu encanto e esperamos trazer alguma dessa magia para estas páginas. Sob pena de espelharmos um mundo baço, onde a escolha vacilaria entre a estupidez e o tédio.

5 Set 2017

Candidatos apresentam programas políticos

Novo Macau | Processos legislativos abertos

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Associação do Novo Progresso de Macau (ANPM) quer que os processos legislativos sejam mais rápidos, mas, acima de tudo, mais claros. A ideia foi deixada ontem pelo número um da lista candidata pró-democrata, Solu Sou. “Queremos que todas as reuniões de comissão sejam abertas e que o público tenha acesso”, disse, na conferência de imprensa de apresentação do programa eleitoral.

Paralelamente, o objectivo é permitir aos residentes participar no processo, situação que só pode acontecer com o devido conhecimento. “Queremos garantir um maior compromisso da população na própria concepção das leis”, explicou.

Solu Sou considera que este é um aspecto que já existe em vários países e mesmo em Hong Kong, pelo que também em Macau devem existir reuniões públicas para auscultar as opiniões da população de modo a permitir que sejam incluídas no processo legislativo”, reiterou o candidato.

Por outro lado, a ANPM quer que o Governo seja mais questionado. O meio, apontou Solu Sou, pode ser através de mais debates na Assembleia Legislativa, sendo que, considera, esta é uma forma de colocar em causa o próprio Governo. “Queremos iniciar activamente debates e levantar algumas questões ao Governo. Não é uma coisa muito comum, apesar de já se começarem a ver alguns debates na última legislatura, mas achamos que devem existir mais”, referiu.

Estas duas prioridades têm que ver com uma insatisfação da ANPM com o “conformismo” generalizado dos deputados da Assembleia. “O que temos assistido a nível legislativo em Macau tem sido sempre tudo muito igual. Os legisladores e deputados são pró-governo e sentimos que há relutância em usar mecanismos diferentes para contestar o que está mal”.

Programa com todos

Ao olhar para a proposta de programa da ANPM, não é difícil constatar que tenta abarcar todos os sectores locais. Da habitação, à educação e à saúde, não faltam ideias para o território. A defesa dos animais e a igualdade de género estão ainda contemplados na luta da lista pró-democrata.

De acordo com Solu Sou, o programa foi feito tendo por base três fontes de informação fundamentais.

“A primeira fonte pode ser considerada uma extensão do trabalho que vem do passado da ANPM e tem mantido a consistência ao longo dos anos”, explicou.

Paralelamente, a ANPM tem feito, nos últimos meses, várias reuniões com profissionais representativos de várias indústrias e sectores locais. Dos encontros, surgiram aspectos e necessidades que foram integrados no programa.

Por último, a lista candidata pró-democrata, foi à rua recolher opiniões dos eleitores e usou também os dados que foi recebendo na campanha eleitoral das últimas eleições.

Se no dia do início de campanha, no sábado à meia-noite, Solu Sou mencionou a importância da geração mais nova, ontem na apresentação do programa eleitoral o número um da ANPM reitera que apesar do apelo ao voto dos jovens locais, são uma associação para todos.

“O nosso foco não se concentra só nos jovens, esta é uma faixa da população à qual chegamos mais facilmente através da nossa divulgação online. Mas, na rua, estamos atentos a toda a população e recebemos apoio de várias faixas etárias. O nosso alvo são todos os eleitores”, remata.

Ontem a comitiva de campanha andou pela Horta e Costa e pela Taipa.

Agnes Lam espera obter um assento na Assembleia Legislativa

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]a sessão de apresentação do programa político, ocorrida ontem, Agnes Lam, líder da lista Observatório Cívico, disse ter esperança de obter um assento na Assembleia Legislativa (AL) pela via do sufrágio directo.

No programa político da lista Observatório Cívico não há diferenças notórias em relação aos restantes programas políticos, mas Agnes Lam considera que, no caso da sua equipa, todas as ideias e objectivos baseiam-se em estudos e provas. A candidata disse mesmo que, se houvesse ideias impossíveis de serem alcançadas, não as iria incluir no seu programa político.

Jovens e habitação

A habitação destinada aos jovens é um dos principais pontos do programa político da lista Observatório Cívico. Agnes Lam apontou ontem que, para que seja mais fácil a aquisição de imóveis por parte dos jovens, o Governo poderia recorrer às contribuições feitas para o regime de previdência central não obrigatório. Tudo para que os jovens tivessem dinheiro para pagarem as primeiras prestações dos empréstimos.

A candidata defende ainda o aumento do imposto para quem detém uma segunda habitação sem grande utilização. Agnes Lam prefere rejeitar a ideia “Terras de Macau dedicadas às gentes de Macau”, que tem sido adoptada pelo Governo, preferindo a mensagem “Prédios de Macau dedicados às gentes de Macau”.

A ideia seria levar os promotores imobiliários a disponibilizar partes dos edifícios para a construção de habitação pública.

Ainda na área do imobiliário, Agnes Lam defende a criação de um departamento público que trate e fiscalize as instalações eléctricas dos edifícios, à semelhança do Electrical and Mechanical Services Departament de Hong Kong.

Saúde e património

Apostando na necessidade da reabertura do turismo marítimo, em zonas como a Doca dos Pescadores, Taipa e Lai Chi Vun, Agnes Lam foca ainda a sua atenção na melhoria da qualidade dos serviços de saúde. A candidata acredita que os médicos que trabalham no sector privado não têm motivações para aumentar as suas habilitações.

A lista Observatório Cívico defende também uma melhoria da preservação do património cultural, a preservação das zonas verdes e ainda a criação de planos de apoio a trabalhadoras grávidas.

Na lista constam nomes como o de Cheong Chi Hong, número dois de Agnes Lam e médico. Ng Hio Cheng é o número três e é também médico, tendo defendido ontem que o Executivo não tem políticas suficientes na área da protecção ambiental. Keong Wai Cheng e Choi Chi Wai são o número quatro e cinco, respectivamente.

ACUM de Si Ka Lon quer habitação como prioridade

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] apresentação do programa político da lista encabeçada por Si Ka Lon, A Associação dos Cidadãos Unidos de Macau (ACUM), começou com uma exposição dos problemas actuais vividos pela sociedade local. O número um da lista candidata salientou ontem em particular, os elevados preços da habitação, os problemas relativos ao trânsito e a debilidade de algumas das indústrias locais. O candidato lamenta estas situações e a falta de medidas eficazes por parte do Governo para as resolver.

É com este contexto que Si Ka Lon propõe a criação de um mecanismo que possa “devolver a riqueza aos cidadãos” e em que seja dada resposta às solicitações dos residentes ligadas à habitação, aos serviços de saúde e às garantias de reforma. “Os cidadãos não deveriam de estar preocupados com a primeira prestação na aquisição do imobiliário, com as consultas médicas nem com a vida quando forem idosos”, referiu o candidato.

Função pública mais eficaz

Além dos assuntos sociais, é de salientar que Si Ka Lon considera importante que se aumente a qualidade do funcionamento dos serviços do Governo. Como solução, o número um da ACUM sugere uma melhoria do trabalho da função pública, com a criação de um sistema justo de ascensão na carreira, de responsabilização e de atribuição de benefícios. O objectivo, disse, é “excluir os trabalhadores da função pública que não reúnam os requisitos do Governo e promover a qualidade dos serviços públicos”.

No que respeita aos assuntos ligados à habitação, Si Ka Lon considera que o Governo deve incluir esta matéria nas prioridades. Para o candidato, a solução passa pela construção de habitação pública nos terrenos recuperados pelo Executivo e pela criação de um regime de previdência para habitação não obrigatório. A razão apontou, é apoiar aqueles que pretendem comprar casa pela primeira vez.

O número dois da lista, Kyan Su Lone, apresentou as acções do programa político referentes à saúde. Kyan Su Lone sugere a criação de um seguro para doenças graves para todos os residentes. Na área da educação, o número dois da ACUM quer ver aumentado o número de vagas nas creches do território.

A apresentação do programa feita ontem contou com a presença de Chan Meng Kam. Apesar de estar de saída da Assembleia Legislativa, o ainda deputado fez questão de mostrar o seu apoio à ACUM.

Lei Siu Kun | Melhor acesso à habitação e combate à corrupção

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] lista Ou Mun Kong I, que se apresenta no número 17 do boletim de voto, apresentou ontem o seu programa político. Segundo informação veiculada pelo canal chinês da Rádio Macau, a lista encabeçada por Lei Siu Kun tem na totalidade sete membros. Do programa eleitoral, o cabeça de lista destacou a necessidade de resolver a dificuldade na aquisição de propriedade e o combate à corrupção. Lei Siu Kun quer ainda que seja feito um melhor aproveitamento dos fundos públicos, que seja garantido o direito ao emprego através da aprovação de legislação e que seja feito um controlo de preços no consumidor. O líder da lista Ou Mun Kong I disse ainda que o preço do metro quadrado de um prédio construído em Macau deve rondar as duas mil patacas. Como tal, espera que o Governo possa conceder cerca de 60 terrenos afectos à construção de fracções residenciais vendidas a baixo preço para beneficiar os mais jovens.

NUDM | Em defesa do sector do jogo e habitação

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Nova União para o Desenvolvimento de Macau (NUDM) liderada por Angela Leong aposta, no seu programa político, na defesa do jogo e dos seus funcionários bem como nos jovens e na resolução dos problemas ligados à aquisição de habitação.

A candidata, ligada ao sector do jogo, destaca a importância da implementação de políticas de diversificação económica e de diversificação do próprio jogo, de modo a atrair um turismo global. Para o efeito, o programa da NUDM prevê ainda a luta pela construção de uma marina no território, bem como a aposta numa “cidade verde e inteligente”, sendo que não esquece a intenção de transformar Macau num espaço de qualidade de vida a nível internacional.

Os funcionários do sector representado pela NUDM, têm ainda os seus direitos defendidos, nomeadamente no que respeita à saúde. Angela Leong pretende continuar a lutar pelo melhoramento do sistema de saúde para os trabalhadores do jogo, sem esquecer que o mesmo tem de ser feito em relação ao resto da população.

Habitação jovem

O “Youth Hostel Scheme” é um dos pontos de relevo e que pretende promover a habitação mais acessível aos jovens locais. A ideia é, além de facilitar aos mais novos a aquisição de casa, “promover ainda a criação de espaços e actividades recreativas que mostrem que o território pode ser uma cidade energética”.

Património e patriotismo são também duas das linhas orientadoras da NUDM. O objectivo é “preservar a herança cultural intangível, promover a cultura do jogo e encorajar a integração cultural”, lê-se na apresentação enviada à comunicação social.

Outra das prioridades são o desenvolvimento de políticas dirigidas não só ao ensino para os mais jovens como ao programa de aprendizagem contínua. A transparência política é ainda parte do programa eleitoral da NUDM bem como o apoio a todas as acções que tenham em conta as políticas de “Uma Faixa, Uma Rota” e a “Grande Baía”, de modo a materializar a plataforma entre a China e outros países.

Ho Ion Sang | A tempestade e o serviço social

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ão oito candidatos e Ho Ion Sang surge como número um. Assim é a lista União Promotora para o Progresso, que dá prioridade aos assuntos sociais, sem esquecer as necessidades relacionadas com a habitação, trânsito, terrenos ou serviços de saúdes.

Ho Ion Sang disse ontem que vai exigir ao Governo mais medidas para atenuar as pressões sentidas pelos cidadãos que pertencem à classe média.

Na área empresarial, o líder da União Promotora para o Progresso referiu que deve ser feita uma aposta no desenvolvimento diversificado da economia local como estratégia a longo prazo. Ho Ion Sang entende que o sector do jogo se deve desenvolver em conjunto com as restantes indústrias, para que haja lugar ao fomento das Pequenas e Médias Empresas e negócios mais tradicionais.

Acerca da passagem do tufão Hato, Ho Ion Sang adiantou que faz falta a existência de um mecanismo eficaz na resposta às catástrofes por parte do Executivo. O candidato acrescentou ainda que, caso seja reeleito para um assento na Assembleia Legislativa, irá levar a cabo um papel de fiscalização e chamar a atenção para a responsabilização dos funcionários públicos.

Na área do planeamento urbanístico, Ho Ion Sang lembrou que devem ser reforçados os trabalhos de renovação urbana, tendo prometido continuar a apresentar sugestões sobre o controlo das inundações na zona do Porto Interior.

O programa político da União Promotora para o Progresso foca-se também no aproveitamento adequado dos cofres públicos, na necessidade de melhorar o serviço público e privado de saúde, sem esquecer a criação de um mecanismo de longo prazo para a formação de talentos no território, entre outros pontos.

As queixas da Aliança Pr’a Mudança

[dropcap style≠’circle’]J[/dropcap]orge Valente, número dois de Melinda Chan na lista Aliança Pr’a Mudança, alertou para a existência de vários entraves impostos pela Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL) na realização da campanha eleitoral.

“Sentimos que existem bastantes entraves porque, desta vez, especialmente em termos de publicidade e campanha, há muitas coisas que não estavam bem explicadas e isso apanhou-nos de surpresa”, disse Jorge Valente ao HM.

O candidato referiu ainda que continuam a existir muitas zonas cinzentas na aplicação prática da legislação. “Com tantas sessões de esclarecimento continuam a existir muitas perguntas à CAEAL e eles continuam a precisar de tempo para nos responder porque parece que também não têm uma resposta pronta.”

O número dois de Melinda Chan assegurou que o início da campanha eleitoral “foi bom”. “Temos ido à rua distribuir panfletos e falar nas zonas que nos permitem fazer publicidade. Tem sido boa a resposta. Ontem fomos aos três candeeiros, choveu e não apareceu muita gente. Ainda assim, apareceram responsáveis pelas Pequenas e Médias Empresas que ajudamos durante o tufão Hato”, explicou.

A Aliança Pr’a Mudança apresenta nos próximos dias o seu programa político para as eleições legislativas.

Poderes do Pensamento Político | Mais apoios aos funcionários públicos

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]ntónio Lopes é o número dois da lista Poderes do Pensamento Político e defende, segundo a Rádio Macau, mais medidas e melhores condições para os funcionários públicos. “Mais e melhores condições de habitação para os funcionários públicos vão permitir que façam um melhor trabalho e prestem melhor serviço à população. Salvaguardar as regalias destas pessoas é outro dos nossos objectivos”, disse António Lopes à Rádio Macau no dia em que foi apresentado o programa político da lista que, pela primeira vez, participa nas eleições de 17 de Setembro. O candidato disse ainda que “são necessárias mais vozes na Assembleia Legislativa a favor dos funcionários dos serviços públicos” além dos nomes de José Pereira Coutinho e Leong Veng Chai.

4 Set 2017

CAEAL | José Pedruco Achiam diz não ter feito nada de ilegal

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] campanha começou e já se pode falar. José Pedruco Achiam diz não ter cometido qualquer acção fora da lei ao ter dado a entrevista ao jornal Plataforma que veio a ser retirada da edição online. Paulo Rego, director do semanário, criticou a decisão da CAEAL considerando que se trata de censura

O candidato às eleições legislativas de Macau, José Pedruco Achiam, que viu a sua entrevista ao semanário Plataforma ser apagada por ordem da comissão eleitoral, garantiu que a sua lista não fez “nada de ilegal”.

“Não sei porque é que aconteceu (…) Muitos leitores podem também ter a mesma [dúvida]. Não fizemos nada ilegal por isso tenho a certeza de que o nosso advogado vai lidar bem com o caso”, disse, à margem de uma conferência de imprensa para apresentar a plataforma política da já deputada Angela Leong, no dia em que começa o período de campanha.

José Pedruco Achiam ocupa o lugar número 12 (o último) na lista Nova União para o Desenvolvimento de Macau, liderada pela quarta mulher do magnata do jogo Stanley Ho.

O candidato não quis tecer comentários sobre o caso, frisando apenas que não prevê consequências negativas para a lista: “A nossa equipa está sempre confiante de que tudo o que fazemos é legal e esperamos conseguir os melhores resultados que merecemos”.

Questionado sobre se já foi contactado pela polícia, José Pedruco Achiam disse ter sido “por isso” que o advogado “tomou conta do caso”.

No passado dia 18, o macaense deu uma entrevista ao semanário bilingue (português-chinês) Plataforma Macau, em que falou sobre quais considerava serem as possibilidades de ser eleito – “mínimas” –, as preocupações em relação à cidade e os temas fortes da futura campanha, prometendo “centrar-se nos jovens e nos macaenses, para que tenham uma voz mais forte na Assembleia Legislativa e na sociedade”.

Na altura, tinham já sido afixadas as listas definitivas, mas não iniciado o período de campanha, e por isso a comissão considerou que o conteúdo constituía propaganda eleitoral, não autorizada até duas semanas antes das eleições legislativas, marcadas para 17 de Setembro.

A entrevista saiu em papel, mas após a ordem da Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL) foi retirada da Internet.

Na quarta-feira, o presidente da CAEAL, o juiz Tong Hio Fong, explicou que a publicação da entrevista em causa não tem consequências para a lista, mas sim para José Pedruco Achiam: “Relativamente a esse candidato, mandámos para a PSP para tratamento subsequente. É um acto pessoal, é responsabilidade da pessoa. Pode sofrer uma pena de multa de duas mil a 10 mil patacas”.

Perversa confusão

Na sexta-feira, o director do Plataforma Macau, Paulo Rego, escreveu um editorial em que acusa o presidente da CAEAL de uma “perversa confusão entre jornalismo e propaganda”

“Tong Hio Fong acha que, em vésperas de eleições, os políticos não devem falar aos jornais; se o fizerem que falem de futebol e do tempo”, criticou, considerando que “assim se atropela alegremente a Lei Básica, a Lei de Imprensa e o Segundo Sistema”.

“Na China chama-se censura. Assumidamente, sem medo nem pruridos, por ser esse o regime que lá vigora. Aqui mascara-se a coisa com uma falsa higiene pública e de uma moral política que não cabe no espaço, no tempo e no regime que vivemos”, afirmou o director do Plataforma, que apagou a entrevista da sua página na Internet “para sinalizar o respeito pela lei, pelas instituições e por Macau”, mas prometeu lutar “contra uma decisão que não tem suporte legal.

A ordem de retirada da entrevista levou a Associação de Imprensa em Português e Inglês de Macau (AIPIM) a emitir, na segunda-feira, um comunicado no qual repudiou a decisão, que classificou como “incompreensível”.

“A AIPIM repudia esta situação, considerando incompreensível que um conteúdo jornalístico, neste caso uma entrevista, seja equiparado a propaganda. (…) A AIPIM considera que é fundamental que em todas as ocasiões e períodos, inclusive antes do início da campanha eleitoral, o exercício da liberdade de imprensa e o direito à informação sejam integralmente respeitados, incluindo a realização de entrevistas e cobertura noticiosa de acções envolvendo candidatos”, afirmou o comunicado.

4 Set 2017

Hato | Quase 30 por cento do território inundado

O director das Obras Públicas disse que 29 por cento do território ficou inundado com a passagem do tufão Hato. Governo tem em cima da mesa três planos para travar as águas, mas avisa que, com tempestades mais fortes, a população poderá ter de ser evacuada

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s medidas de protecção contra cheias de Macau “não resultaram” e durante o tufão Hato, o mais forte em 53 anos, 29 por cento da área da cidade ficou inundada, disse o director dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), Li Canfeng.

Apesar de Macau ter avançado com algumas obras em 2014 para evitar inundações na zona baixa do Porto Interior, e terem sido colocadas placas ou portas de protecção, “o resultado foi muito fraco e, de acordo com o nível da maré no tufão Hato, 29 por cento da área de Macau foi inundada”, explicou o responsável.

Os dados ainda não são finais, já que algumas estações de medição avariaram, mas estima-se que as águas tenham subido até aos 5,5 metros no Porto Interior.

“As obras que fizemos não resultaram nada. Temos de acelerar as obras para travar a maré”, afirmou Li.

Até porque, comentou, durante o Hato, que atingiu a cidade no dia 23, “não houve grande precipitação (…) Se houver, como é que é?”, questionou durante uma conferência de imprensa.

Macau tem actualmente uma barreira com cerca de quatro metros ao longo do Porto Interior, mas também este “dique não foi suficiente”, disse o responsável.

A directora dos Serviços de Assuntos Marítimos e de Água (DSAMA), Susana Wong, veio reforçar a ideia: “Com o Hato, o ‘storm surge’ [subida no nível das águas] atingiu 5,5 metros, não era possível evitar inundações na zona”.

Soluções na mesa

Para combater esta situação o Governo equaciona três soluções, uma a curto prazo, duas a longo.

O primeiro plano, que já estava em estudo antes da passagem do tufão, prende-se com a instalação de uma bomba de escoamento de águas pluviais, pensada para o local da ‘Ponte 23’, um dos vários cais do Porto Interior, estruturas que remontam ao tempo da administração portuguesa.

Devido ao valor histórico do imóvel, o Instituto Cultural (IC) emitiu um parecer que, apesar de não se opor à construção da bomba, insta à preservação do cais, nomeadamente através da deslocação para outro local.

No entanto, o porta-voz do Governo, Victor Chan, disse que está em causa “uma questão de equilíbrio entre a demolição de património e o interesse público”.

O IC, informou, irá “repensar a posição sobre a demolição da ‘Ponte Cais 23’ e emitir um novo parecer, tendo em conta o interesse público”.

Evacuação é hipótese

Segundo o vice-presidente do conselho de administração do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM), Lo Chi Kin, esta bomba de drenagem iria permitir escoar 14.550 litros de água por segundo, enquanto que sem ela só é possível escoar cerca de oito mil litros. No entanto, o mecanismo não funciona quando o nível das águas subir acima dos diques.

Lo explicou ainda que o ‘Cais 23’ é o local mais indicado por não ter movimento, ao contrário dos outros portos, com frequente passagem de barcos. “A bomba para escoamento de água pode causar instabilidade e perigo para as embarcações”, disse.

Em termos de planos de grande envergadura, o Governo estuda a construção de uma barragem e o aumento do dique em torno do porto.

A primeira obra “evitaria a entrada da maré e inundações”, mas implica cooperação com regiões vizinhas, já que a comporta ficaria entre Macau e a cidade vizinha de Zhuhai.

O projecto está ainda em estudo, mas o Governo espera poder começar a obra em 2019.

Quanto ao dique, tem a vantagem de ser uma questão “interna”, mas pode “afectar o canal de navegação, transporte de mercadorias, actividades comerciais da zona, a cultura histórica e a paisagem naquela zona”, alertou Li.

A ideia é aumentar o muro já existente, de cerca de quatro metros, de modo a ter entre seis e sete metros, o que poderia, por exemplo, bloquear a vista de rio.

Apesar de todos estes planos, o porta-voz do Governo admite que Macau pode não vir a ter estruturas suficientes para uma tempestade particularmente forte. Nesse caso, terá um último recurso: a evacuação.

“Devido às alterações climáticas, este tipo de tempestade radical pode acontecer mais vezes. Caso tudo esteja fora do controlo e não possamos responder, retiramos a população”, disse.

Chui Sai On em Guangdong

O Chefe do Executivo, Chui Sai On, deverá deslocar-se “muito brevemente” à província de Guangdong “para se encontrar com altos quadros para debater pormenores sobre questões ligadas aos problemas das inundações no Porto Interior”. Segundo um comunicado oficial, o Executivo, já em 2013, numa visita a Pequim, “teve encontros com responsáveis de diferentes departamentos a nível ministerial do Governo Central, fazendo uma abordagem exaustiva sobre a matéria, com o objectivo de alcançar uma solução viável” para a zona do Porto Interior.

4 Set 2017

Entrevista | António de Castro Caeiro, “Tudo quanto exista implica tempo”

António de Castro Caeiro fez parte da histórica banda punk, Mata-Ratos, até mergulhar a fundo na filosofia. Actualmente divide-se entre a crónica, a tradução de clássicos gregos e a divulgação filosófica. Está em Macau e dá hoje uma conferência no Antigo Tribunal, pelas 19h30, no âmbito da celebração dos 150 anos de Camilo Pessanha

[dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]ez parte de uma das bandas que mais marcou o panorama do punk nacional, os Mata-Ratos. Como se faz a passagem para a filosofia?
Na verdade, formalmente, não é uma transição difícil porque o “label” dos Sex Pistols era “no future”. Portanto, a expressão do punk mais barulhento dava conta disso na primeira juventude. Eu vou para filosofia aos 17 anos. Essa era outra forma de expressão erudita, mais complexa e não tão barulhenta, mas que também tem no sentido final essa ideia do ser no encaminhamento da morte. No fundo, toda a arte, poesia, filosofia, pintura, arquitectura tem, em certa medida, a ver com a nossa vivência na Terra, com a complexa compreensão de que ficamos para morrer, que não estamos aqui para sempre.

Tem escrito bastante sobre o tempo. É um tema que o tem perturbado, para o qual tem procurado resolução?
Comecei por abordar a filosofia de um ponto de vista analítico. Isto porque eu estive para estudar engenharia, portanto, a forma lógica esteve sempre nos meus horizontes. A partir de determinada altura, digamos assim, a lógica é sem tempo, é repetível em qualquer circunstância, em qualquer sítio do mundo. Isso contrasta e relativiza com a situação concreta de cada indivíduo na família, na nação, num estado de alma, num determinado contexto ou ambiente. Cedo comecei a estudar grego e latim e, a partir daí, li os filósofos alemães. Inclusivamente vivi alguns anos na Alemanha e li o grande livro de Heidegger “Ser e Tempo” e o “Tempo e Ser”. Tudo aquilo quanto existe implica tempo. É por isso, por exemplo, que pomos a mesa e que depois de comermos recolhemos a mesa, lavamos a louça, enxugamo-la e arrumamo-la para o dia seguinte. Tudo quanto nós usamos implica essa ideia de uma utilização, num determinado momento, de uma forma eficaz, com a expectativa que temos. Tenho 50 anos, uma idade em que acompanhamos o envelhecimento da mãe, do pai, ou dos avós e em que perdemos pessoas, nós próprios envelhecemos e percebemos que as circunstâncias não mudam apenas adjectivamente, mas substantivamente com o tempo. Portanto, ser, viver, estar na realidade não é uma coisa para sempre mas é uma coisa que está continuamente a deixar de ser. Esse é o objecto de estudo, o grande operador ontológico da filosofia.

Apesar da intensidade de trabalho que a vida académica implica e dos projectos em que está envolvido, ainda tem tempo para escrever. Está algum livro na forja?

Sempre, vários livros. Traduzi os fragmentos perdidos dos livros de Aristóteles há sete anos e agora vão ser publicados pela Abismo do João Paulo Cotrim as constituições perdidas de Aristóteles. Depois segue-se a publicação de textos sobre estética e, finalmente, textos científicos. À parte disso, estou a escrever semanalmente para o Hoje Macau. Vou alargar a minha colaboração com o jornal, tenho estado a traduzir o poeta austríaco Georg Trakl e estou a planear sair um poema por semana, bilingue, em alemão e português. Por outro lado, vamos ter uma coluna a quatro mãos com o João Paulo Cotrim que abordará temas ad hoc. Cada um escolherá o seu texto que passará pelas mãos do grande editor, grande poeta e ensaísta, João Paulo Cotrim e por mim, que sou um novato nestas coisas. Isto é algo que vou gostar muito de fazer. Dito isto, para além das cerca de dez conferências por ano que dou sobre temas academicamente complexos, sobre a linguística grega e o pensamento antigo, o meu objectivo é sempre explorar a filosofia a partir dos exemplos que tenho das aulas. Quem quer que seja que se interesse por um problema filosófico sem ter a sua certidão de nascimento na filosofia, num autor ou num texto, tem de conseguir perceber do que é que se trata. O que se trata é a relação connosco, a relação com os outros, com o mundo, a relação com o tempo. Como é que, em Lisboa, uma manhã de Primavera é completamente diferente de uma tarde de Verão em Agosto. Como, por exemplo, a Clepsidra que é uma descrição do tempo a escoar enquanto nós estamos lá no meio daquela bola que se vai indo. Isso para mim é o objectivo, não é uma questão de tornar simples, mas que as pessoas possam aproximar-se dos problemas da filosofia sem a carga e o peso da técnica académica. Essa é uma pretensão minha e, eventualmente, uma arrogância.

Como é a concretização semanal de escrever um artigo para um jornal?

Esta é a minha segunda experiência a escrever num jornal. Durante nove meses, como a gestação de um bebé, tive no Expresso online um blog que era “O modo e o tempo”. Quando o Carlos Morais José me convidou disse-lhe que queria fazer uma coisa sobre moods, tonalidades, que tivesse a ver com qualquer coisa que nos aconteceu durante a semana. Estou tão cioso destes meus textos que saem no Hoje Macau que, às vezes, por qualquer motivo, elas só saem à segunda-feira. Então, o Carlos leva com os meus emails, cheguei mesmo a dizer-lhe que esta era a única coisa boa que me está a acontecer e, portanto, fico contente por ver o artigo online e por o poder partilhar no Facebook. Muitas pessoas lêem e partilham e eu fico muito feliz por isso, por estar no sudoeste de Portugal a pensar no sudoeste asiático.

Como surgiu a possibilidade de trazer a filosofia para um programa de televisão na RTP2?
Fui entrevistado duas ou três vezes na televisão. Este projecto resulta de uma conversa com o Nuno Artur Silva [administrador da RTP da área dos conteúdos de ficção]. Disse-lhe que queria ter um programa de filosofia justamente para fazer uma aproximação, que já se fez na ficção e na poesia, mas que nunca se fez na filosofia em Portugal. Há programas na Alemanha como o “Quarteto Filosófico”, na BBC há grandes entrevistas com grandes filósofos e o Nuno Artur Silva não me disse logo que não. Meses mais tarde disse-me: “Olha, o Público está a editar quinze livros de catorze autores, entre os quais Confúcio, porque é não começas por aqui? Em seguida abrir-se-ão portas”. Assim foi. Vamos ter treze programas de 30 minutos com o João Paulo Cotrim, o Luís Gouveia Monteiro, eu e alguns convidados. Depois a Teresa Paixão disse-me que tinha de apresentar em dois ou três minutos uma nota biográfica e uma nota bibliográfica.

A filosofia compagina-se com uma mensagem tão sucinta?
Sim. O Wittgenstein dizia que o que pode ser dito tem de ser dito claramente. Há pessoas que escrevem milhares de páginas e que falam muito, outras que não dizem nada nessas milhares de páginas. O Heidegger dizia que uma frase de Heráclito valia mais do que a inteira Biblioteca de Alexandria. Foi um exercício de compilação e, ao mesmo tempo, não de contracção mas de expansão. Foi interessante também por esse lado. Eu dou aulas de duas horas, os mestrados são de três horas, mas já dei aulas de quatro horas. É completamente diferente quando temos de pensar que não há reformulação possível. Diz-se uma nota bibliográfica e uma nota biográfica e espera-se que a pessoa não tenha tempo para fazer zapping e fazer-me desaparecer do ecrã.

4 Set 2017

Celebração dos 150 anos de Camilo Pessanha aviva uma memória adormecida

Depois de um século e meio do nascimento de Camilo Pessanha, Macau recebe uma série de eventos para assinalar a data do maior poeta em língua portuguesa do território. Após um longo período de relativo esquecimento, o autor volta a ser comemorado com uma série de eventos entre 1 e 7 de Setembro no Antigo Tribunal

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]omeça hoje uma semana dedicada ao mais alto vulto da literatura em Macau com poesia, conferências, livros e exposições no Antigo Tribunal.

“O Pessanha faz parte da identidade de Macau, não é apenas um vulto na literatura portuguesa, mas é um autor que tem muito a ver com Macau”. Quem o diz é Miguel de Senna Fernandes. O advogado, assim como muitos dos leitores do poeta, reconhece a universalidade de Camilo Pessanha mas destaca as influências que a cidade teve na obra do autor.

O escritor é um vulto omnipresente no imaginário literário de Macau, assim como a cidade onde escolheu viver é uma referência incontornável na sua obra.

“Tirando o facto de ser um grande poeta português, que escolheu Macau como sítio para viver, a sua obra reflecte as influências do tempo que aqui esteve”, refere Amélia António. A presidente da Casa de Portugal acrescenta que o poeta “é património de Macau, da língua portuguesa e conjuga-se na sua pessoa todas estas facetas que espelham a presença cultural portuguesa em Macau”.

A advogada enaltece a série de eventos que se iniciam hoje, “um tipo de trabalho que tem faltado em Macau”, apesar das esporádicas traduções que se vão fazendo da obra do poeta.

Amélia António destaca que não foi feito um trabalho sistemático de divulgação e estudo, ao longo dos anos, de forma a manter a memória e a obra de Camilo Pessanha presente em Macau. No entanto, destaca que esta falta de preservação não é exclusiva da RAEM, é uma negligência que vem de trás e que, além disso é recíproca. “A maioria dos portugueses também ignora a literatura e a poesia chinesa, nomeadamente a que é produzida em Macau. As traduções não abundam e também muita da literatura em chinês já não se foca em Macau”, explica a presidente da Casa de Portugal. Amélia António entende que a literatura é uma forma de ligar comunidades, um instrumento que permite aprofundar conhecimentos e apreciações mútuas.

Esquecimento centenário

Durante os últimos tempos a comunidade macaense tem-se afastado da cultura e língua portuguesa, com muitos jovens a preferirem aprender mandarim. “A comunidade macaense anda muito dispersa e um pouco desligada na sua relação com a cultura de Portugal, anda um pouco desfasada”, revela Miguel de Senna Fernandes.

É algo que escapa ao entendimento do presidente da Associação dos Macaenses e que lamenta uma vez que entende que “Camilo Pessanha é um dos nossos poetas, faz parte do património cultural de Macau”.

Amélia António alarga este esquecimento a um espectro mais global no território. “Acho que a memória de Camilo Pessanha não é nem bem, nem mal, tratada por cá. Simplesmente não tem sido tratada, não tem sido devidamente valorizada”, comenta. A presidente da Casa de Portugal entende que, como grande poeta local que foi, “Macau devia honrá-lo e devia ser feito tudo para tornar a sua obra mais conhecida”.

Outra das lacunas em termos de valorização e difusão encontra-se entre a comunidade chinesa, que tem pouco contacto com a obra do poeta.

“No fundo, Macau tem não tem dado atenção aos aspectos culturais. Não é uma doença nova, sem ela, certamente, hoje existiria um número diferente de pessoas com conhecimento de literatura, a apreciar, a dar valor e a defender esse património”, considera Amélia António.

Antes de recriminar quem quer que seja, temos de nos recriminar a nós próprios por aquilo que não se fez ao longo destes séculos.

Miguel de Senna Fernandes recorda o momento em que se debateu a possível trasladação dos restos mortais de Camilo Pessanha para Portugal e a forma como o Instituto Cultural se opôs. Mas acrescenta que se poderia fazer muito mais. Neste aspecto, é de salientar que a própria campa do poeta não tem qualquer destaque no cemitério onde está sepultado.

Até hoje, a memória e obra de Camilo Pessanha tem ficado encerrada num pequeno ciclo intelectual. “Só o interesse de um estudioso, ou de um apaixonado, pela literatura, origina uma tradução, ou algo do género. É preciso contornar esta circunstância e dar conhecimento da sua obra ao maior número de pessoas possível”, projecta Amélia António.

 

“Uma cidade de cultura”

Fazemos frequentemente apelo à importância e ao conhecimento da História como discurso que, ao representar a realidade de determinados tempos e espaços, nos apoia na construção de uma memória como Povo e como Comunidade em relação permanente com outras comunidades. Num outro registo, não é menos significativo ou importante o conhecimento da Literatura, igualmente como discurso produzido no tempo e no espaço, que nos interpela, nos projecta e nos convoca para a reflexão e para a fruição. De ambos os discursos se faz a cultura de um povo.

A grande relevância das comemorações dos 150 anos sobre o nascimento de Camilo Pessanha que, em boa hora, sob o impulso de Carlos Morais José, um conjunto de pessoas e instituições – entre as quais este Consulado-Geral – tornou realidade aqui em Macau, associa-se a estes dois aspectos.

Não se trata apenas de trazer para os dias de hoje a obra de um poeta português que constitui uma referência na sua geração e no seu tempo e de eventualmente reflectir sobre como, sendo intemporal, se poderá fomentar a sua divulgação e o seu maior conhecimento. Trata-se, também, de evocar um tempo na história de Macau e de a afirmar também como uma cidade de cultura, no passado como no presente.

Expresso, por isso, a minha satisfação por estas comemorações e faço votos para que estes dois propósitos possam delas sair reforçados.

Vítor Sereno, cônsul-geral de Portugal em Macau e Hong Kong
1 Set 2017

Tufão Hato | No Myfair Garden ninguém sabe quando vai ter água

O Myfair Garden, na Barra, é um dos cinco edifícios que continua a não ter acesso a água canalizada, por culpa dos estragos nas tubagens. A associação de condóminos reuniu ontem para tentar chegar a uma solução, mas a água só deverá chegar daqui a duas semanas

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o número 31 da rua Francisco António continua a não existir água quando se abrem as torneiras. Não fosse o regresso da electricidade, depois de um apagão que afectou toda a gente, seria ainda mais difícil transportar baldes de água pelas escadas, num prédio com 15 andares.

O Myfair Garden, localizado na zona da Barra, ainda não tem água canalizada, mas a culpa não é da Macau Water.

À semelhança de outros quatro edifícios no território, este prédio residencial ficou com as tubagens avariadas graças à passagem do tufão Hato e não há uma data concreta para o regresso da água potável. O HM falou com moradores no local e todos dizem que nas próximas duas semanas o problema será resolvido, mas ainda nada é certo.

Para irem buscar este bem essencial, todos os dias os moradores vêem-se obrigados a subir e a descer constantemente. Não há filas, mas junto aos pequenos tanques que fornecem água de forma provisória está sempre alguém de balde na mão.

Ieong é um deles. Os pais são membros da União dos Proprietários do Edifício Mayfair Court e, segundo ele, as concessionárias já deram todo o apoio na reparação das infra-estruturas. O abastecimento de água já deveria, portanto, ter voltado, mas as tubagens dos andares mais altos ficaram danificadas.

A união de proprietários já se reuniu para resolver a situação, estando neste momento à espera do apoio financeiro do Governo. As discussões entre condomínios prosseguem e não há ainda uma data para que a água regresse.

“A ideia é que todos os moradores dêem uma parte do dinheiro necessário, porque todos nós queremos ter água em casa o mais depressa possível”, adiantou.

Ontem à noite houve nova reunião, mas o consenso ainda não terá chegado.

A contar o tempo

Mário, italiano e idoso, é outro dos moradores do Myfair Garden que foi afectado pela passagem do tufão Hato.

“Ouvi dizer que a falta de água vai continuar nas próximas duas semanas, mas espero que demore menos tempo”, defendeu ao HM.

Leong, outra moradora, desloca-se para ir buscar água e conta que, apesar da inconveniência que a falta de água trouxe ao seu dia-a-dia, agradece a solidariedade de todos os condóminos e administradores do prédio.

Jojo também ouviu dizer que daqui a duas semanas poderá ter água para necessidades tão básicas como tomar banho ou lavar a roupa, esperando uma solução para breve.

O Myfair Garden está localizado numa das zonas mais afectadas pelo tufão. Contudo, a falta de água é o único problema que persiste depois de dias em que a luz faltou em todo o lado e o lixo se acumulou em vários locais.

Há dias, em conferência de imprensa, Susana Wong, directora dos Serviços dos Assuntos Marítimos e da Água (DSAMA), alertou para a existência de cinco prédios sem água, tendo sido prometida a cedência de apoio técnico. No caso dos prédios que utilizam a água de tanques já existentes no prédio, foi aconselhado a que esta seja fervida antes de ser consumida, pelo facto de não estar ligada à rede pública de abastecimento.

1 Set 2017

Camilo Pessanha, 150 anos | Antønio Falcão apresenta “Kleptokronos” e “Morri”, um livro de crónicas

“Se existir um deus, é o tempo”

Antønio Falcão é Ring Joid, mas podia ser outro qualquer. De regresso a Macau é também Pessanha e os muitos que vão habitando dentro de si. Está no território com a exposição “Kleptokronos”, que é inaugurada hoje e para apresentar o livro “Morri”, amanhã. É um dos artistas que integra as comemorações dos 150 anos de Camilo Pessanha do Edifício do Antigo Tribunal e vem mostrar a sua concepção de tempo

[dropcap]O[/dropcap] que é que vamos ter em “Kleptokronos”?
Quando recebi o convite comecei a pensar no que fazer. Não queria ir buscar imagens que já tinha nem recorrer a paisagens de Macau. Acabei por ter esta ideia, de jogar com o tempo da própria fotografia e tentar, trazer com a técnica, o tempo do Camilo Pessanha. “Kleptokronos” que dizer ladrão do tempo. Uso a técnica da fotografia em que a luz constrói a imagem durante o tempo necessário até ter uma imagem possível. A maioria das fotografias aqui presentes são feitas com várias exposições, e muitas delas, longas.

O próprio processo incorporou o conceito de tempo?
Sim. A exposição longa traz o tempo para trás e, tecnicamente, é um método em que o tempo se demora pela fotografia adentro.

Como é que isto se materializa na exposição?
A minha ideia era pegar neste tempo que se comemora do Camilo Pessanha e juntá-lo ao que também se passa agora, à contemporaneidade. Por exemplo, com a questão dos refugiados. Também se lançam ao mar e muitos acabam por naufragar.

Faz um paralelo com as situações da actualidade?
Sim, tenho uma imagem referente aos fogos que têm passado por Portugal e que se pode relacionar com o poema “Vida” do Pessanha. Fala disso, do lumaréu, de tudo a arder e das flores que deixam de existir. O arder, mais uma vez, também é referente à luz fotográfica que queima. Não foi pegar no poema e fazer uma imagem que se parecesse. Foi outra coisa.

Tem alguns auto-retratos.
Os auto-retratos têm que ver com outro processo. É um reencarnar-me como uma espécie de Camilo Pessanha de agora no sentido do delírio, da fuga, da própria erosão da pessoa que está fora, num sítio que não é dela mas que acaba por lhe pertencer. Isto passa também pela minha experiência por Macau. O que vivi e não vivi aqui. A ideia é tentar ser uma personagem, mais do que alguém que escreve ou que fotografa. É criar este embrulho para que tudo o que estou aqui a apresentar faça um certo sentido para que saia da realidade e traga outros elementos.

Vamos ter uma mistura de Camilo com Ring Joid, uma outra personagem sua?
Um pouco por aí. Mas sem rigor nenhum. O Ring Joid – e não interessa o nome porque foi quase aleatório – é o ideal de mim que não consigo representar na vida real. E por isso mantenho-o vivo artificialmente como complemento de uma vida com limites. Ele sou eu à solta.

Vai também lançar o livro “Morri”. Porquê o título?
Tem tudo que ver com a questão do tempo. Se existir um deus, é o tempo. É a única omnipresença que existe no mundo e da qual todos fazemos parte. “Morri” foi o título que me apareceu. Comecei a escrever, para o Hoje Macau, em 2004, numa altura da minha vida em que quase tinha uma necessidade da escrita para que pudesse continuar a viver ou a ficar perto do chão. Escrevia com outro nome, o de Ring Joid. Acabei por inventar essa personagem. Há sempre duas coisas a viver dentro de mim. É como se andasse com uma companhia. Um puxa para o desvio, para ir por outros caminhos mais longos e mais difíceis. Depois há as histórias ao longo do livro que têm esse carácter da morte. Aliás, o livro acaba com um pequeno texto em que sou eu dentro de um avião a cair, e relato os últimos momentos antes da sua queda. A morte. O livro têm alguns textos actuais também em que, mais uma vez, está presente o tempo. A introdução, em que relato uma situação de quando tinha três anos, representa tudo o que se passa agora. É uma situação biográfica em que tudo o que nós vivemos já vimos acontecer. É como se vivêssemos numa dimensão em que tudo está mais ou menos programado e que já vimos isso mas que não conseguimos perceber e agora, como o tempo se estendeu, tudo se descodificou. “Morri” fala também da história contemporânea de Macau. Os portugueses, as despedidas, as passagens, mas muitas vezes uma história idealizada. Por exemplo, os governadores que eram seres de uma dinastia superior, que passavam por um processo de estudo do oriente, da língua, da filosofia e quando chegavam integravam-se na vida do “outro” e eram admirados por toda a população. Eram textos escritos para um jornal na pressão semanal do fecho. Experiências de temas e de métodos de escrita. Coisas que via, cinema, música, noites. Sempre com o meu outro ser a testar as minhas capacidades, se conseguia realmente escrever alguma coisa. Uma escrita que parte de um trauma que se vai cosendo ao longo dos tempos. Vivemos num mundo isolado dentro deste território e era preciso soltar-me. E na escrita tudo é possível. Tudo existe. Não há freio.

E a fotografia? Qual a sua relação com ela agora?
A fotografia só funciona se de algum modo participar nela. Não pode ser apenas uma composição visual de elementos exteriores. Isso é uma espécie de malabarismo, tem de estar tudo no lugar para que as bolas não te caiam na cabeça. Eu fico à espera que elas caiam. E depois logo se vê.

O que acha das comemorações dos 150 anos do Pessanha e da sua representatividade para Macau?
O Camilo Pessanha é um dos poetas mais válidos da literatura portuguesa e também dos mais esquecidos. Já Fernando Pessoa o admirava mas depois houve este tempo todo em que parece que esteve adormecido. Em Macau, penso que nunca foi devidamente reconhecido e por isso é importante tanto a obra como a sua figura e a sua passagem pelo território. É preciso que resista para que as pessoas possam, algumas continuar a relembrar o homem e outras o puderem conhecer.

Viveu aqui 17 anos e está de regresso. Como está a viver a visita?
Não tenho bem a noção do tempo, quando olho para trás, passaram 17 anos em Macau, passaram seis desde que fui para Portugal. Está tudo compresso na cortina do engenho que capta imagens para dentro do nosso cérebro. Fui embora em 2011 e sempre que volto sinto como se me tivesse ido embora na semana passada. É sempre um sentir-me em casa. É bom e mau mas como estou sempre de partida, e não venho de armas e bagagens para ficar, também não desespero. É a sensação de estar num sítio inóspito.

Macau é inóspito?
Sim. O mundo é inóspito.

1 Set 2017

Angola | João Lourenço quer reformas ao estilo Deng Xiaoping

Os resultados ainda não são oficiais mas os números apontam para a uma maioria do MPLA. João Lourenço já se prepara para suceder a José Eduardo dos Santos e adianta que vai seguir uma política de reformas semelhantes às de Deng Xiaoping

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] general João Lourenço, que segundo os resultados provisórios da Comissão Nacional Eleitoral (CNE) será o próximo Presidente de Angola, sucedendo a 38 anos de liderança de José Eduardo dos Santos, promete ser reformador, ao estilo Deng Xiaoping.

Numa entrevista concedida em Madrid, para onde viajou logo após as eleições gerais angolanas de 23 de agosto, João Lourenço rejeitou a classificação que lhe tem sido colocada, de “Gorbachev angolano”, por suceder à prolongada liderança de José Eduardo dos Santos.

“Reformador? Vamos trabalhar para isso, mas certamente não Gorbachev, Deng Xiaoping, sim”, afirmou João Lourenço, militar formado na União Soviética e que agora se prepara para ascender ao poder em Angola, questionado na capital espanhola pela agência EFE.

Deng Xiaoping foi secretário-geral do Partido Comunista Chinês e líder político da República Popular da China entre 1978 e 1992, tendo criado o designado socialismo de mercado, regime vigente na China moderna e que posteriormente foi adaptado pelo Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) para aquele país.

Mudança de cara

No partido, João Lourenço mantém-se como vice-presidente, cabendo a liderança a José Eduardo dos Santos, que pode continuar a ditar a política no país.

“Está claro que o MPLA vai influenciar as políticas do Governo porque é o partido mais votado, tem 61% dos votos, não é justo pensar que o MPLA não vai conduzir as políticas do novo Governo. Então quem seria? O partido menos votado? Sem dúvida que o novo Governo vai seguir o ideal do MPLA porque é o partido em que o povo confiou”, afirmou Lourenço.

Tal como na campanha eleitoral, João Lourenço relativiza a convivência com José Eduardo dos Santos como presidente do MPLA: “O Presidente Dos Santos é uma personalidade muito respeitada, tanto dentro do partido como por um conjunto da sociedade e não é anormal que o presidente do partido no poder não seja ele próprio o Presidente da República. Apenas para citar um caso, Donald Trump é o Presidente dos Estados Unidos mas não do Partido Republicano”, afirmou.

Diversificações

“Diversificar a economia é fundamental e indispensável para sobreviver, é imprescindível abrir a nossa economia e esquecermos um pouco o petróleo. O nosso país, Angola, pode sobreviver, tem mais recursos além do petróleo”, afirmou João Lourenço.

Desde logo, garante que serão criados incentivos à agro-indústria em Angola, para potenciar as vastas terras aráveis e água disponíveis, afirmando que o país pode vir a ser “uma grande potência agrícola, do tipo do Brasil”.

A privatização de empresas públicas que não sejam lucrativas e representem um “peso morto para o Estado” mantém-se como prioridade de João Lourenço: “Quais? Não posso dizer, isso é o que vamos estudar, caso a caso, e será feito pelo novo executivo”.

Na mesma entrevista, João Lourenço assume o objectivo de “preservar e usar” as “conquistas” dos antecessores, Agostinho Neto e José Eduardo dos Santos, ambos do MPLA.

“Vou usar as nossas conquistas, a independência, a soberania, a paz, a reconciliação, e concentrar-me no desenvolvimento da economia. Angola tem recursos enormes e as condições necessárias para criar um ambiente de negócios que incentiva os investidores a virem para o nosso país”, concluiu.

Resultados satisfatórios

O candidato do MPLA às eleições gerais angolanas, que segundo os resultados provisórios da Comissão Nacional Eleitoral (CNE) será o novo Presidente de Angola, considera que os resultados eleitorais “foram bons”, apesar da quebra da votação.

Os dados provisórios divulgados pela Comissão Nacional Eleitoral (CNE) angolana apontam o MPLA como vencedor das eleições gerais, com 61% dos votos, e a eleição de João Lourenço como novo Presidente da República, sucedendo a 38 anos de liderança de José Eduardo dos Santos.

O MPLA perdeu 25 deputados na Assembleia Nacional angolana nas eleições gerais de quarta-feira, de acordo com os dados provisórios anunciados pela CNE – que são contestados pela oposição, com ameaça de impugnação -, quando estão escrutinados 9.221.963 votos (98,98% do total).

O Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) lidera a contagem nacional, com 4.115.302 votos (61,05%), o que corresponde a 150 deputados (maioria qualificada) e à eleição de João Lourenço para Presidente da República.

Nas eleições gerais de 2012, a última às quais concorreu como cabeça-de-lista do MPLA José Eduardo dos Santos, Presidente da República desde 1979, que decorreram nos mesmos moldes, o MPLA arrecadou 4.135.503 votos, equivalente a 71,80% da votação e 175 deputados, o que na altura já representou menos 16 mandatos.

No plano oposto, a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), liderada por Isaías Samakuva, sobe para 1.800.860 votos e 26,72% do total, com 51 deputados, quando nas eleições gerais de 2012 conquistou 1.074.565 votos (18,7% do total) e 32 deputados à Assembleia Nacional.

Os resultados oficiais só serão divulgados depois de 6 de Setembro.

 

Partidos da oposição não aceitam resultados

Com a vitória anunciada de João Lourenço nas eleições gerais de Angola, os dois principais partidos da oposião não se conformam.

A UNITA afirmou que apenas três comissões provinciais eleitorais (CPE) respeitaram até ao momento a lei, sobre o apuramento dos resultados das eleições gerais angolanas de 23 de Agosto, garantindo que vai recorrer para o Tribunal Constitucional.

Segundo um comunicado do secretariado executivo da comissão política da UNITA enviado à Lusa, aquele partido refere que apenas as CPE de Cabinda, Uíge e Zaire “respeitaram a lei”, no que toca ao recurso à “totalidade das actas das operações emitidas em todas as mesas de voto”, de cada província, para o respectivo apuramento provincial, que antecede o escrutínio nacional, conforme prevê a lei eleitoral.

Além destas três províncias, o partido do “galo negro” refere que o mesmo procedimento está agora em curso também nas províncias do Bié, Huíla e Cuanza Sul, enquanto as CPE do Cunene, Namibe, Cuando Cubango, Huambo, Lunda Sul, Lunda Norte, Moxico e Luanda “continuam a trilhar os caminhos da violação da lei, em obediência a ordens obscuras”.

A UNITA afirma ainda que “findo o prazo legal e a persistir a vontade de violar a lei”, vai avançar junto do Tribunal Constitucional com “a competente acção judicial”, de forma a “obrigar as CPE incumpridoras a pautarem a sua acção ao que a lei prescreve”.

O partido já avançou anteriormente com uma reclamação junto da Comissão Nacional Eleitoral (CNE) por terem sido “produzidos e anunciados resultados provisórios fora do previsto na Lei Orgânica sobre as Eleições Gerais”, os quais colocam o MPLA como vencedor da votação, com 61% dos votos, e elegendo João Lourenço como novo Presidente da República.

Coligação insatisfeita

A coligação angolana CASA-CE condenou também a ameaça da Comissão Nacional Eleitoral (CNE) de abrir processos disciplinares aos comissários representantes de partidos da oposição que se demarcaram dos resultados provisórios das eleições divulgados por aquele órgão eleitoral.

Em comunicado, o Conselho Presidencial da Convergência Ampla de Salvação de Angola – Coligação Eleitoral (CASA-CE), a terceira força política do país, refere que tem estado a acompanhar “com minúcia” todo o processo de escrutínio e apuramento provincial dos resultados eleitorais.

Nos últimos dias, vários comissários da CNE e dos seus órgãos provinciais têm assumido uma posição de distanciamento dos resultados provisórios divulgados pelos órgãos centrais, por alegarem violar a lei, com supostas ilegalidades ao processo de escrutínio.

A porta-voz da CNE, Júlia Ferreira, disse no final do plenário de quarta-feira que o órgão eleitoral angolano vai instaurar um inquérito para analisar o comportamento de alguns comissários nacionais e provinciais, que têm assumido “uma conduta desviante” dos princípios reitores do órgão eleitoral.

No seu comunicado, enviado à Lusa, a CASA-CE manifesta solidariedade com todos os mandatários e comissários afectos ao processo eleitoral, condenando e repudiando “com veemência” a ameaça da CNE, de promover processos disciplinares contra os membros do órgão eleitoral.

A CASA-CE classifica a conduta daqueles comissários como sendo “patriótica e exemplar” na salvaguarda dos preceitos democráticos, denunciando “irregularidades verificadas na divulgação dos falsos resultados eleitorais provisórios”.

Esta coligação de seis partidos diz ter sido feito o escrutínio e concluído o apuramento provincial nas províncias de Cabinda e Uíge, cujos resultados foram aceites pela CASA-CE.

O Conselho Presidencial da CASA-CE apelou à CNE a conduzir com rigor e imparcialidade o processo eleitoral e para instarem os seus órgãos provinciais a realizarem o escrutínio e apuramento provincial de acordo com a lei.

O apelo vai igualmente para os angolanos no sentido de se “manterem firmes, vigilantes e serenos e que não se deixem intimidar pelos comunicados intimidatórios e atentatórios à estabilidade e harmonia sociais, divulgados pelos órgãos de comunicação social públicos e alguns privados”.

31 Ago 2017

Tufão Hato | Governo reúne com FAOM e assume insuficiências

Num encontro com a Federação das Associações dos Operários de Macau, o Governo admitiu a existência de insuficiências na resposta a catástrofes naturais. Pessoal da protecção civil pediu mais meios e melhor coordenação

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]ma semana depois do tufão que fez disparar o alarme sobre a segurança e a capacidade de resposta do território a desastres naturais, o Governo reuniu com a Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM) para discutir “a revisão e a melhoria do mecanismo de resposta às grandes calamidades”, sem esquecer “a capacidade de gestão do Governo”.

No encontro estiveram presentes os secretários Sónia Chan, da Administração e Justiça, e Lionel Leong, da Economia e Finanças. Segundo um comunicado, Sónia Chan admitiu que “existem imperfeições no mecanismo de resposta a graves desastres”, incluindo “insuficiências na gestão de riscos no Governo”.

Lionel Leong foi confrontado com várias questões relacionadas com os trabalhadores do sector do jogo, tal como a sua segurança e a gestão das empresas. O secretário “afirmou que todas estas matérias têm vindo a ser alvo de um acompanhamento estrito por parte da Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais”.

Além disso, as “empresas são exortadas a tratar dos casos de forma humana e com uma programação adequada”.

Lionel Leong garantiu, contudo, que o Governo “irá rever o mecanismo supracitado e o regime da sua coordenação, assim como melhorar a alocação do pessoal e a distribuição de bens materiais para evitar o esbanjamento dos recursos”.

Já os representantes da FAOM deixaram alertas sobre “problemas relacionados com a construção urbana”, sobretudo ao nível das infra-estruturas, “o sistema de impermeabilização”, o funcionamento do serviço de protecção civil ou o pagamento de indemnizações aos trabalhadores em épocas de tufão.

Pedidos mais meios

Na terça-feira o Chefe do Executivo, Chui Sai On, esteve reunido, juntamente com o secretário para a Segurança, Wong Sio Chak, com o pessoal do centro de operações de protecção civil e bombeiros.

No discurso que proferiu, o Chefe do Executivo salientou “o altruísmo de todas as corporações” e que este tufão “veio mostrar as dificuldades nos trabalhos de rescaldo devido à destruição de infra-estruturas”.

A matéria em causa levou o Governo a “estudar a forma como poderá melhorar e aperfeiçoar toda a situação”. Chui Sai On disse ainda que o Executivo “vai continuar a optimizar o mecanismo de previsão meteorológica, de alerta e o mecanismo de divulgação de informações relacionadas com calamidades”, sendo também necessário “rever e aperfeiçoar o mecanismo da estrutura da protecção civil”.

No encontro, os agentes dos Serviços de Polícia Unitários apontaram que o Governo “tem de melhorar as suas infra-estruturas e optimizar o mecanismo de divulgação de informações de tufão”.

O pessoal dos Serviços de Alfândega disse ser “indispensável melhorar o equipamento actual dos mergulhadores”. Também os agentes da PSP defenderam “a necessidade de reforçar e optimizar os equipamentos, nomeadamente do pessoal em turnos durante o período de tufão”.

Os bombeiros apontaram que a recolha de informações e os recursos “devem ser uniformizados”. Deve ainda ser “efectuada uma boa distribuição de recursos humanos e materiais pelo trabalho, tendo por base as necessidades e prioridades para elevar a eficácia”.

Foi ainda lembrada a necessidade de rever o regime do pessoal militarizado.

31 Ago 2017

CAEAL | Novo tufão no dia das eleições pode adiar o sufrágio

O presidente da Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa considera que as eleições podem ser adiadas caso haja outro tufão com consequências graves no dia do sufrágio. Além disso, Tong Hio Fong reiterou que a entrevista que mandou retirar do jornal Plataforma Macau era propaganda política e não jornalismo

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o rescaldo do tufão Hato, Angela Leong sugeriu o adiamento das eleições por duas semanas, para que o acto eleitoral se procedesse com serenidade. O presidente da Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL), Tong Hio Fong, diz que “o andamento dos trabalhos da comissão não foi afectado e que a data das eleições é 17 de Setembro”.

Porém, admite que “se na data das eleições acontecer alguma catástrofe, o Chefe do Executivo vai decidir uma outra data para a realização das eleições dentro de 30 dias” de forma a garantir a segurança dos residentes.

Para já, a data mantem-se, uma vez que a maioria dos locais onde se encontram as mesas de voto, maioritariamente em escolas, estão em condições para receber os eleitores na data prevista. As instalações que precisam de ser recuperadas, de acordo com o presidente da CAEAL têm tempo para fazer as obras de restauro necessário. Estão a ser recuperados 13 locais onde irá decorrer o sufrágio.

Tong Hio Fong, apesar de dizer que compreende que a ordem social é importante durante o sufrágio, adiar o acto eleitoral teria um efeito de bola de neve em todo o calendário subsequente para a constituição da VI legislatura da Assembleia Legislativa. “Além do apuramento dos resultados, podem haver recursos contenciosos, as listas definitivas têm de ser publicadas no Boletim Oficial, o Chefe do Executivo precisa de tempo para nomear os deputados eleitos e há ainda a cerimónia de posse”, enumera. O presidente da CAEAL acrescenta ainda que adiar as eleições desencadearia uma reacção em cadeia que acrescentaria dificuldades ao início da nova legislatura a tempo.

Jornalismo ou propaganda

Em resposta à pergunta se teme que haja muitos votos em branco, como forma de protesto pela forma como o Governo se comportou durante o tufão Hato, Tong Hio Fong responde que “é uma escolha dos eleitos e um direito que podem exercer, uma vez que o voto está nas suas mãos”.

Quanto à retirada da entrevista ao Plataforma Macau a José Luís Pedruco Achiam, o número 12 da lista liderada por Angela Leong, o presidente da CAEAL entende que a mesma constitui propaganda política.

“Se lerem a entrevista vão distinguir o que é notícia e o que é propaganda”, justifica. Tong Hio Fong considera que o entrevistado direccionou de, de forma muito explícita, a atenção do público para o programa político, tentando ganhar o apoio do cidadãos”.

De acordo com o entendimento da CAEAL, a entrevista foi mandada retirar do jornal tendo o caso sido encaminhado para a Polícia de Segurança Pública. Na sequência da entrevista que a CAEAL entendeu ser contrária à lei eleitoral, o acto do candidato em questão poderá ser considerado contravenção e sujeitar-se a uma multa que vai das duas às dez mil patacas.

Até ao momento, a comissão eleitoral recebeu 54 casos de alegadas violações, 11 dos quais foram reencaminhados para as autoridades policiais a fim de serem investigados.

Tong Hio Fong acrescentou ainda que se um meio de comunicação social não retira uma entrevista, ou artigo, que a CAEAL considere contrária à lei eleitoral, pode incorrer em desobediência agravada.

Até agora, o caso do Plataforma Macau é caso único onde a comissão eleitoral interveio desta forma.

O presidente da CAEAL reiterou ainda o respeito que a instituição a que preside tem pela liberdade de expressão e pela liberdade de imprensa, depois de justificar a retirada de uma peça jornalística de um jornal e de considerar que uma entrevista é propaganda política.

31 Ago 2017

Porto Interior | Obras para travar águas no Porto Interior só em 2019

[dropcap style≠’circle’]G[/dropcap]onçalo Cheong, subdirector dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), disse ontem no programa do canal chinês da Rádio Macau que só no final do próximo ano é que deverão estar concluídos os trabalhos relativos à construção de uma barreira de protecção no canal na zona do Porto Interior, que fica entre Macau e Zhuhai.

“Já iniciámos os trabalhos da terceira fase, incluindo a sondagem do canal, os estudos especializados, por exemplo, e o estudo de impacto ambiental”, sendo que a previsão, nesta altura, aponta para que a conclusão ocorra “no fim do ano que vem”, disse à rádio.

Gonçalo Cheong não conseguiu estimar o orçamento para este projecto, mas adiantou que as obras possam arrancar em 2019.

Os estudos foram iniciados em 2015 e, segundo Gonçalo Cheong, “a primeira fase do estudo de viabilidade foi concluída em Julho de 2016” e a segunda, que abrange “a zona toda, incluindo Macau, Zhuhai e Zhongshan”, foi terminada em Março deste ano.

O relatório da segunda fase “já foi submetido a Pequim para recolha de opiniões”, conforme já tinha sido avançado pelo porta-voz do Governo, Victor Chan, em conferência de imprensa.

O responsável da DSSOPT explicou ainda que, em 2011, foram feitas obras para aumentar a altura dos muros ao longo do Porto Interior, algo que ficou concluído em 2015. Contudo, não foi suficiente, dada a dimensão do tufão Hato.

À margem do programa de rádio, Gonçalo Cheong garantiu que está a ser ponderada a instalação de infra-estruturas junto à entrada dos parques de estacionamento, para travar a entrada da água.

31 Ago 2017