Joana Freitas SociedadeWynn com quebra de mais de 60% [dropcap style=’crcle’]W[/dropcap]ynn Macau anunciou na quarta-feira uma quebra de 62,5% nos lucros líquidos do segundo trimestre para 73,6 milhões de dólares norte-americanos. Em comunicado é referido que a Wynn Macau teve uma quebra de 35,8% nas receitas líquidas do segundo trimestre para 617 milhões de dólares, das quais 578 milhões geradas em casinos, menos 36,4% em termos anuais homólogos. Entre Abril e Junho, a empresa registou um EBITDA ajustado (resultados antes de impostos, juros, depreciações e amortizações) de 173,4 milhões de dólares, traduzindo uma queda anual homóloga de 43,5%, “principalmente devido à debilidade no sector do jogo”. O volume de negócios nas mesas de segmento VIP da Wynn Macau caiu 41,1% para 15,5 mil milhões de dólares no trimestre terminado em Junho, altura em que o número médio de mesas para grandes apostas diminuiu de 263 para 247. Já os ganhos do segmento do jogo de massas da Wynn Macau sofreram uma quebra de 32,9% para 208,6 milhões de dólares no segundo trimestre do ano, tendo o número médio de mesas registado um aumento de 192 para 223. Nas operações globais do grupo, a Wynn Resorts obteve receitas líquidas de 1,04 mil milhões de dólares contra 1,41 mil milhões de dólares apurados no segundo trimestre de 2014. O declínio é atribuído à quebra de 35,8% nas receitas líquidas registadas em Macau e à diminuição de 6,2% dos ganhos nas apuradas em Las Vegas. Com dois casinos em Macau – Wynn e o Encore – a operadora tem actualmente em construção um resort integrado, com um orçamento global de 4,1 mil milhões de dólares. O Wynn Palace, localizado no Cotai, deverá abrir portas no primeiro trimestre do próximo ano. Durante uma teleconferência após a divulgação dos resultados do segundo trimestre do ano pela empresa mãe, nos Estados Unidos, o líder da Wynn, Steve Wynn, afirmou que planeia inaugurar o seu novo empreendimento em Macau em 25 de Março de 2016, de acordo com o portal especializado em jogo GGRAsia.
Filipa Araújo Manchete SociedadeFamílias que estavam em más condições foram realojadas, mas ainda “há muito a fazer” Vidas mudadas. Foi o que o HM encontrou quando voltou às casas de idosos e famílias carenciadas que viviam em más condições, um ano depois. Realojados em habitações públicas ou em lares, os residentes começam agora uma nova vida, ainda que haja muito a fazer [dropcap style=’circle’]U[/dropcap]m ano depois do HM ter visitado várias famílias a viverem com dificuldades, numa espécie de bairro improvisado e ilegal junto às Portas do Cerco, a surpresa chegou: apenas uma família resta e, até mesmo esta, está de saída. “Depois da reportagem [do HM] recebemos a visita de alguns deputados e, um dia, o Instituto de Acção Social (IAS) ligou-me por causa do meu irmão. Ele foi colocado num lar meses depois”, partilhou com o HM Ng Wai, irmão do Ng Su On, portador de poliomielite. Ng Su On vivia entre quatro paredes de cimento, num espaço minúsculo, com bichos e um cheiro nauseabundo constante. Aquela pessoa, de 55 anos na altura, em momento algum permitiu o contacto com a equipa do HM: nunca nos olhou e muito menos falou. Agora, a história é diferente. Ao lado viviam outras famílias. Três ou mais membros partilhavam espaços que nem para uma pessoa eram suficientes. Num corredor com diversas portas, muitas foram as histórias que ouvimos e agora nada mais há para além de um silêncio que aparenta felicidade. Mais que merecido Os atrasos e as controversas condições de acesso à habitação pública fizeram com que aquelas famílias fossem ali esquecidas e, entre estas, há ainda muitas mais. “Em Outubro passado, os deputados Si Ka Lon e Song Pek Kei, tomando conhecimento dos casos, foram visitar o espaço que acolhia aquelas famílias. Mas só conseguiram falar com o irmão do Ng Su On”, explica-nos o gabinete do deputado Chan Meng Kam. Depois de conversarem com Ng Wai e este contar todo o processo que levou o irmão a estar trancado naquele local, os deputados denunciaram o caso ao IAS, tal como o HM tinha feito. “A equipa dos deputados voltou ao lugar um tempo depois, falámos com uma idosa que iria receber ajuda dos filhos, outras famílias não nos abriram a porta e outras não estavam”, continua. Um mês depois, em Novembro de 2014, o telefone de Ng Wai toca. Do outro lado era o IAS e queria conversar sobre a situação do seu irmão. “Fizeram-me muitas perguntas e foram visitar o meu irmão. Uns dias depois voltaram a explicar que o meu irmão não iria conseguir obter o tipo de habitação porque não reuníamos as condições, mas que iam colocá-lo num lar”, conta o irmão. Em poucas semanas, Ng Su On era o novo residente de um lar de idosos na Taipa. “Aqui ele está muito melhor, tem fisioterapia, as condições são boas. Tem também terapia da fala. Nunca está sozinho, tem o apoio de médicos e funcionárias. Ele ouve muito mal, mas agora já fala mais e caminha com a ajuda de um andarilho”, continua. Durante a nossa visita ao lar, que agora acolhe Ng Su On, foi-nos difícil reconhecê-lo, tais eram as mudanças. Ng soube quem éramos e, pela primeira vez, olhou-nos e, mais do que isso, sorriu-nos. Num abraço sentido, Ng Su On partilhou o seu estado de espírito actual. “Estou feliz”, disse-nos com alguma dificuldade. Sentado numa mesa, numa grande sala que acolhia mais idosos, Ng Su On apontou para a televisão, mostrando aquilo que estava a fazer. A pedido do irmão levantou-se e exibiu a sua nova capacidade de locomoção – sem a ajuda de ninguém. “As quedas acabaram. Antes quando ele tentava levantar-se ou até ir àquela casa-de-banho que não era mais que um balde caía muitas vezes. Chegou a magoar-se, por isso é que lá ia visitá-lo todos os dias, por isso e para lhe dar comida também, claro”, adianta o irmão, que confessa que agora quando não se pode deslocar à Taipa, não fica preocupado. “Sei que cuidam bem dele aqui, basta olhar para a cara dele e vê-se que ele está feliz. As melhorias são visíveis”, repara. Mas nada disto é gratuito. “Aqui paga-se sete mil patacas por mês, mas por o meu irmão ser deficiente o Governo ajuda numa parte, quase quatro mil patacas, e nós pagamos o resto. Guardei todos os cheques pecuniários do meu irmão, portanto ele tem suficiente para se manter aqui, pagando só essa parte, com o dinheiro que guardámos”, conta o irmão, enquanto entrega um “mimo” a Ng Su On. “Venho pelo menos uma vez por semana e ele sabe que lhe trago sempre um doce ou um coisa que ele goste. Hoje trago uma perna de frango, ele adora”. Pelo olhar, o petisco foi bem recebido, mas o apetite já não dava para mais. “É para amanhã”, disse Ng Su On. [quote_box_left]“Depois da reportagem [do HM] recebemos a visita de alguns deputados e, um dia, o Instituto de Acção Social (IAS) ligou-me por causa do meu irmão. Ele foi colocado num lar meses depois” – Ng Wai, irmão do Ng Su On, portador de poliomielite[/quote_box_left] Só mais um bocadinho Das famílias que visitámos apenas uma se mantém pelo velho edifício. “Mas não é por muito tempo. O Governo disse-me que em menos de três meses já estou na casa nova”, conta Fei Ng, uma idosa que viveu naquele espaço “há mais de dez anos”. Fei tem tido companhia nos últimos anos. “O meu filho que é trabalhador não residente vem aqui comer todos os dias. Eu faço arroz nesta máquina e a carne ali”, conta, apontando para uma cozinha de improviso entre a cama e um armário carregado de roupa e bacias. “Estar aqui trouxe-me muitas doenças, tem lixo e cheira sempre mal. Eu limpo, eu limpo. Mas também vejo muito mal”, partilha a idosa, olhando para o filho que nos ouve atentamente. Fei Ng está há uma mão cheia de anos à espera da habitação social. Quando a conhecemos o ano passado não quis contar a sua história, referindo apenas que o Governo deveria preocupar-se mais com os idosos. “Depois de eles [Governo] virem aqui as coisas mudaram”, contou ao HM, explicando que lhe está prometida uma habitação em breve. “O IAS disse-me que em menos de três meses já posso ir para uma casa em Seac Vai Pan. Eu preferia no Fai Chi Kei ou na Ilha Verde, mas não faz mal”, remata. Questionada sobre as outras famílias, Fei Ng contou-nos que quase todas foram embora. “Foram para casas. Agora estão melhores”, acrescenta. A ponta do iceberg Confrontado com a intervenção por parte do Governo, o IAS sem adiantar informações sobre os casos, apenas defendeu que sempre que existe uma “detecção na sociedade de casos de emergência/risco, o IAS envia, de imediato, pessoal para proceder ao seu acompanhamento, por forma a prestar, na sua esfera de competências, apoio adequado aos necessitados”. Segundo dados do IAS, no início do presente ano, existiam 150 idosos à espera de vaga para lares sendo o tempo médio de espera de um ano. Dos 380 idosos que no final de 2014 estavam à espera de vagas, o IAS garantiu que 230 já foram contactados pelas autoridades, tento por isso começado a tratar das formalidades para a sua admissão. Relativamente à habitação pública, o Instituto da Habitação indica que até ao momento foram construídos 34 mil apartamentos, sendo que 28 mil referem-se à habitação económica e seis mil à social. Ainda assim muito trabalho há a fazer. Para o deputado Chan Meng Kam, situações destas são uma constante e a culpa deve-se às falhas da habitação social e às altas rendas que muitos residentes não conseguem pagar, sobretudo os trabalhadores não residentes. “Estes moradores saíram mas outros continuam nesta situação e aquele espaço vai ser ocupado por outros”, acredita. Para o deputado José Pereira Coutinho os casos destas famílias são apenas “a ponta do iceberg”. Num território que se mostra rico e cheio de brilho, existe “um número infinito de famílias a precisar de ajuda e a viver em condições miseráveis”. Muitas vezes, defende, o IAS não tem conhecimento destes exemplos de segregação social porque não tem recursos humanos suficientes. Também a Associação dos Trabalhadores da Função Pública (ATFPM) foi visitar estes casos tornados públicos e “fez um relatório sucinto e enviou ao IAS para acompanhamento do caso”. “O feedback que temos recebido do IAS é positivo porque eles de imediato tomam a iniciativa de contactar com as famílias em causa e a médio prazo resolvem as situações. Foi o que aconteceu aqui. (…) É clara a falta de assistentes sociais do IAS que possam dar vazão ao aumento de casos de famílias e idosos que precisam de apoio, não há dúvida. (…) O Governo precisa de olhar mais para os idosos, devem ser criados departamentos directamente vocacionados para o tratamento deste tipo de situações”, rematou. Dados da Direcção dos Serviços de Estatísticas e Censos (DSEC) mostram que, em 2014, existiam mais de 53 mil habitantes com mais de 65 anos, perfazendo 8,4% da população total de Macau. O índice de envelhecimento ultrapassa os 70% e continua a ser visto como “um dos maiores desafios” do Governo.
Filipa Araújo Perfil PessoasLiliana Noronha Medalha, professora de Português [dropcap style=’circle’]N[/dropcap]asceu nas Caldas da Rainha mas bem cedo se mudou para a capital portuguesa, Lisboa. Licenciada em Línguas e Literaturas Clássicas e mestre em Ensino de Português como Língua Segunda e Estrangeira, Liliana Noronha Medalha decidiu arriscar e concorrer a uma vaga disponível para docente no Instituto Português do Oriente (IPOR). “Cheguei a Macau no final de Maio do ano passado”, relembra a jovem professora. Em conversa com o HM, Liliana, sempre de sorriso tímido, mostrava-se atenta ao que ao seu lado acontecia. Uma criança empoleirada na cadeira a espreitar para a professora, uma mãe concentrada no telemóvel, um empregado de mesa que pouco percebia e falava Inglês. Liliana ri-se e comenta: “o mais estranho foi isto tudo”. Assume-se como “perfeitamente adaptada”, mas consciente de que Macau não será um local onde vai ficar durante muito tempo. A sua ligação com o estilo europeu é inegável e isso nota-se a cada palavra que a professora diz. “Sim, gosto muito da Europa, apesar de Macau ser a primeira experiência fora das fronteiras portuguesas, portanto não tenho termo de comparação. Mas identifico-me muito com o estilo europeu”, partilha. Vir para “o outro lado do mundo” nunca foi ideia que passasse pelos planos da docente de Língua Portuguesa. “É engraçado não é? Nunca pensei, nunca me tinha passado pela cabeça vir para a Ásia, nunca esteve nos meus planos, mas com a situação económica de Portugal quando vi a vaga disponível quis arriscar, e aqui estou”, explica. Diferenças acentuadas As diferenças culturais são notórias, não fosse estarmos na China. “O primeiro impacto são as diferenças, em tudo. Comportamentos das pessoas, o clima e tantas outras coisas. Mas no início tudo é surpresa, tudo é novo, assumimo-nos como turistas, parece que as coisas não são reais”, partilha Liliana, depois de conseguir pedir o almoço, numa mistura de Cantonês com Português e Inglês. Canalizando o nervosismo da sua “primeira entrevista” para o garfo que tinha nas mãos, Liliana volta a olhar para a crianças e diz-nos “depois, quando assumimos que vivemos em Macau, que não somos turistas, temos de saber lidar com essas diferenças, porque elas podem ser boas ou más, dependendo da nossa capacidade de gerir [as situações]”. Amores meus Sem esconder, Liliana Noronha Medalha conta que a maior motivação para aguentar as saudades que sente de casa e da sua família são os seus “miúdos”. O amor pelo ensino sempre esteve muito presente na sua vida. “Adoro dar aulas, adoro os miúdos”, conta, acrescentando que tem turmas de várias faixas etárias, dependendo dos cursos, mas que maioritariamente são adolescentes “que em breve vão para Portugal” que ensina. “Essa troca de informações é muito simpática. Falamos muitas vezes sobre a minha experiência como portuguesa, a viver em Lisboa. Como eles vão para lá agora é giro”, explica. Mas o mais interessante é saber “que os alunos são todos iguais seja em que país for”, ainda que haja claramente “um maior respeito pela figura do professor aqui em Macau”. Os hábitos e posturas na sala de aula trouxeram a Liliana histórias para a vida. “No início, estava cá há pouco tempo, e os miúdos comiam na sala, mas não era uma espécie de snack, eram bolas de peixe, ou fast-food, comida de faca e garfo”, partilha, entre risos. “Não sabia muito bem como reagir, mas assumi que era uma coisa natural para a cultura chinesa. Foi um jogo de adaptação entre mim e eles”, acrescenta. Amizades no território Não foi difícil para a docente “conhecer pessoas” e a própria garante que, entre portugueses, é fácil conhecer muita gente. “Mas acredito que seja um bocadinho mais difícil criar relações de profunda amizade. Para aqueles que ficam aqui um período de tempo”, defende. Ainda assim, em pouco mais de um ano, Liliana já tem amigos com quem irá tentar manter relação, seja onde for. Nos seus tempos livres, aos fins-de-semana ou até ao final do dia, o que mais sente faltam são “cafés ou esplanadas” em que possa estar e descomprimir de um dia ou semana de trabalho. Ainda assim, na falta desses espaços, a jovem professora gosta de partilhar momentos com os amigos, nas suas casas ou em lugares em que todos possam estar tranquilos. “Não é importante os sítios, mas sim os momentos que partilhamos todos juntos”, remata. Apesar de Macau não fazer parte dos seus planos a longo prazo, e “embora toda a gente diga isso”, Liliana está convicta que isto será uma experiência para vida.
José Simões Morais h | Artes, Letras e IdeiasOs interesses da embaixada [dropcap style=’circle’]S[/dropcap]e Duarte Coelho foi um dos responsáveis pelo início das hostilidades navais com os chineses, apesar de Joaquim Veríssimo Serrão dele dar uma imagem de homem honrado e ilustre diplomata, anteriormente, já Simão de Andrade, sem tacto diplomático, “cometeu um erro que originou o primeiro equívoco grave nas relações com as autoridades locais”, como refere João Paulo Oliveira e Costa, e, “após os conflitos armados luso-chineses, ocorridos entre 1521 e 1522, nas águas de Tunmen, a Corte de Pequim decretou o encerramento dos portos cantonenses. Inicialmente, (…) as autoridades de Cantão recusavam (os portugueses,) os de Aname e Malaca. Desde que os mais variados bárbaros de Aname e Malaca foram recusados, eles iam fazer comércio clandestino às águas da prefeitura de Zhangzhou (漳州, Chincheo) fazendo com que a província de Fujian (福建) lucrasse com isso, deixando o mercado cantonense numa situação paupérrima” segundo Revisitar os Primórdios de Macau para uma nova abordagem da História de Jin Guo Ping e Wu Zhiliang, “O encerramento total dos portos cantonenses provocou danos insuportáveis à economia de Cantão, que tem sido, desde as dinastias Tang (唐, 618-907) e Song (宋, 860-1279), um importantíssimo empório para o comércio externo chinês. As receitas locais caíram a pique. A ordem económica local e de uma boa parte do Centro e Sul da China estava afectada e desequilibrada. A situação financeira de Cantão era de tal maneira caótica que nem conseguiam pagar os soldos e os vencimentos da função pública. Esta situação dramática levou o vice-rei Lin Fu a moralizar a Corte Central em 1529, apelando à revogação das proibições marítimas impostas a Cantão. O memorial ao Trono foi favoravelmente despachado e restabelecido o sistema tributário em Cantão, mas os portugueses continuavam proibidos de vir às águas de Cantão. No entanto, alguns, após uma década de ausência do litoral cantonense, começaram a voltar ao negócio da China, a título individual e integrados em grupos tributários de alguns países do Sudeste Asiático, principalmente disfarçados de siameses.” Com os dois conflitos navais no Rio das Pérolas ganhos pelos chineses aos portugueses, em 1522 terminou “o primeiro período que começara com a chegada de Jorge Álvares à China em 1513”. Iniciava-se um novo ciclo “em que os Portugueses começaram a frequentar o litoral de Fujian e Zhejiang e que acabou” em 1549 “e podemos designá-lo como Entre Chincheo e Liampó” Revisitar os Primórdios de Macau. O antigo Sultão de Malaca “As petições do enviado do antigo sultão de Malaca, ferozmente anti-portuguesas, encontraram um renovado acolhimento na corte imperial, onde foram analisadas pelo libo (Rui Manuel Loureiro, Cartas dos cativos de Cantão: O libo de Cristóvão Vieira corresponde ao Tribunal do Ritos pequinense, que estava encarregado de organizar o protocolo das missões tributárias (Hugh b. O’Neill, Companinon to Chinese History). A partir das informações, algo confusas, do prisioneiro português, pode deduzir-se que em finais de 1521 a missão de Tutão Mafame rumou novamente a Pequim, onde pôde apresentar as suas razões em audiência imperial. O embaixador malaio queixava-se da abusiva conquista de Malaca pelos portugueses, pedindo a intervenção militar do Filho do Céu para repor a legalidade, ao mesmo tempo que denunciava a embaixada de Tomé Pires como missão de espionagem. Subsequentemente, os malaios foram reenviados para Cantão, com a promessa de que brevemente [lhe mandariam o despacho]”. E continuando no Revisitar os Primórdios de Macau para uma nova abordagem da História de Jin Guo Ping e Wu Zhiliang: “A decisão imperial, com efeito, não tardou, após o lipu ter deliberado que [a terra dos franges devia ser cousa pequena chegada ao mar], uma vez que [depois que o mundo é mundo nunca viera a terra da China embaixador de tal terra]. O Imperador Jiajing (1522-66) ordenou, em primeiro lugar, que a carta do monarca português fosse queimada. Depois, o presente trazido por Tomé Pires devia ser recusado. Em terceiro lugar, o embaixador e os membros da sua comitiva deviam ser aprisionados e mantidos como reféns. Ou seja, a China não reconhecia a missão portuguesa como embaixada tributária formal. Finalmente, as autoridades provinciais deveriam escrever a el-Rei D. Manuel e ao seu representante em Malaca, com instruções peremptórias para que esta cidade fosse devolvida ao seu legítimo soberano. Após a entrega da praça ao antigo sultão, Tomé Pires e os restantes prisioneiros seriam libertados. Caso o Rei Venturoso desrespeitasse as decisões imperiais, realizar-se-ia um novo conselho. Entretanto, os navios portugueses deveriam ser rigorosamente impedidos de visitar portos chineses. (Rui Manuel Loureiro, Cartas dos cativos de Cantão. Para T’ien-Tsê Chang, a conquista portuguesa de Malaca, que viera perturbar o equilíbrio político-militar no Sudeste Asiático, foi o factor determinante no fracasso da embaixada de Tomé Pires (Malacca and the failure)” Rui Manuel Loureiro. “Com a denúncia dos emissários do desapossado sultão de Malaca, ficou apurado o facto – já tão bem conhecido pelas autoridades de Cantão como pelas centrais, mas omitido de propósito pelos mandarins e eunucos junto do Imperador – de que eram mandados pelo país Folangji, que conquistara a cidade, tributária da China. Mesmo assim, a Corte só mandou executar os intérpretes sob a acusação de terem trazido à China estrangeiros e não maltrataram os membros não asiáticos da embaixada” Revisitar Os Primórdios de Macau. E ainda desse livro: “Quanto aos contactos com a Corte, (…) foi Ning Cheng, quem fez este favor aos Portugueses porventura em troca de algum presente ou suborno”. Sem ordem de prisão Encontrava-se desde 22 de Setembro de 1521 Tomé Pires e os restantes membros da sua comitiva em Cantão, mas só a 14 de Agosto de 1522 foram formalmente acusados de entrarem em território chinês sob falsos pretextos. Altura em que decorriam nos mares de Cantão os confrontos entre a armada chinesa e os navios de Martim Afonso de Melo Coutinho. “Quanto à rejeição da embaixada, inicialmente, quando os Portugueses foram mandados de volta a Cantão, não houve ordem de Pequim para deter a embaixada em Cantão, como bem elucida um trecho do diário de Yang Tinghe, o ministro mais influente dessa altura: (…) quanto aos bárbaros de Folangji, mandem-nos sob escolta de volta para Cantão, onde ficarão à espera de novas ordens de Baofang (Casa de Leopardo). Esta ordem foi dada como correspondendo à vontade expressa pelo Imperador Zhengde no seu testamento, mas a verdade é que foi preparada postumamente por Yang Tinghe que exerceu a regência durante a sucessão, juntamente com a Imperatriz-Mãe. Pelas fontes chinesas, sabemos que no momento do falecimento do Imperador Zhengde, o quase regente Yang Tinghe, por uma questão de segurança da capital, tomou muitas medidas, das quais algumas implicavam o repatriamento de embaixadas, tais como as de Qomul, Turfan e a de Portugal, que se encontravam em Pequim, além da execução do eunuco Jiang Bin, entre outros protegidos do Imperador Zhengde. Como o falecido Imperador não deixou descendentes, o vácuo do poder poderia dar lugar a uma renhida luta pela sucessão entre os diferentes ramos da casa imperial, como costumava acontecer nestes casos. Assim sabemos que o principal motivo do reenvio da Embaixada de Tomé Pires para Cantão se ficou a dever a uma questão de segurança nacional.” “A questão é que a vinda da Embaixada de Tomé Pires para Cantão terá sido interpretada pelas autoridades provinciais como um claro sinal de rejeição dessa missão. Para esconder a sua cooperação e participação neste processo passível de ser considerado como uma fraude, uma irregularidade que poderia custar a carreira e até mesmo a própria vida a essas mesmas autoridades, caso fosse descoberta, houve, pois, todo o interesse em silenciar o caso. Entretanto, chegou de Pequim a ordem de deter a embaixada, tomando os seus membros como reféns até à desocupação de Malaca. Daí que, como nos informa Cristóvão Vieira, as autoridades de Cantão passassem a perseguir implacavelmente os Portugueses com todas as acusações possíveis e imagináveis e com todos os meios ao seu alcance” Revisitar os Primórdios de Macau para uma nova abordagem da História de Jin Guo Ping e Wu Zhiliang. O presente real Quanto aos presentes destinados ao Imperador chinês, pelas fontes portuguesas, sabemos que o embaixador Tomé Pires os levou; todavia, até agora não foi possível localizar nenhuma lista, embora haja muitas referências a eles. O que levou Rui Loureiro a colocar estas questões: “O presente para o Imperador nunca é descrito na documentação quinhentista. Por mero lapso? Ou talvez porque a missão de Tomé Pires não tinha o estatuto oficial de embaixada e, como tal, o presente que transportava não era significativo?” De novo no Revisitar os Primórdios de Macau de Jin Guo Ping e Wu Zhiliang: “Em nosso entender, dado que a primeira missão diplomática portuguesa junto da Corte chinesa foi uma iniciativa lisboeta e o embaixador seleccionado e nomeado pelo vice-rei da Índia, o presente destinado ao Imperador da China foi preparado in loco e de modo improvisado. Talvez esta tenha sido a razão da insignificância dos presentes. No entanto, a pobreza da oferta leva-nos a crer que a primeira missão diplomática portuguesa teria mais por objectivo um reconhecimento do terreno do que apresentar-se como uma embaixada propriamente dita, como nos revela António Galvão: ” Revisitar os Primórdios de Macau. E nele continuando: “Ora, também este documento chinês tem esse mérito: o de preencher uma lacuna multissecular na historiografia portuguesa das relações luso-chinesas. Analisando o conteúdo da lista, não podemos dizer que fossem presentes preciosos em extremo. No entanto, não eram de preço menor. Para isso, é interessante ver as componentes desta relação. O objecto que lidera o inventário é o coral em rama, que era muito apreciado na China imperial”. Mas, como objecto de maior valor que vinha no presente, para além de alguns tecidos e vidros, “os portugueses incluíram um espadagão de três gumes e outro terçado de ferro, uma escolha diplomática prudente a substituir as armas de fogo, que tanto poderiam causar admiração como suspeita.” A observação de que “o cabecilha costumava ler livros” confirma que Tomé Pires era um homem culto e amigo da leitura” Revisitar os Primórdios de Macau para uma nova abordagem da História de Jin Guo Ping e Wu Zhiliang.
Anabela Canas de tudo e de nada h | Artes, Letras e IdeiasFicam dois e uma parte [dropcap style=’circle’]D[/dropcap]or e cão para pernoitar. Como uma senha cúmplice. Disse ao monge que me abre a porta pesada a ranger nos gonzos, com aquela idade indefinida que lhe imaginei, e que me parece um conhecido de sempre, tantos os emails trocados. Estendo-lhe a mão e ele, olhando para mim e para trás de mim, surpreende-me com três beijos nas faces. Muito fraternais, muito firmes muito urbanos aqui neste confim que tanto me obrigou a trepar. Exausta. Pedi um quarto de casal com uma caminha extra desmontável, lembro-lhe. Ele riu, ligeiramente trocista. Entendi mais tarde que aquilo que parecia ironia, nele, raramente era outra coisa senão ternura. Abriu a porta do quarto que eu esperava e disse que teríamos que nos revezar, ou tirar a cama estreita à sorte todas as noites. Vim pelo claustro. Mas também pelas montanhas que aqui bem perto têm a verticalidade lisa de lâminas, e pelas árvores que densamente bordejavam o caminho até aqui acima. E também pelas mesas compridas de madeira que percorrem o refeitório em que eles se sentam silenciosos em frente a malgas que eles mesmos fazem, de um minimalismo essencial como só no Japão e por outras razões que tradicionalmente talvez se cruzem com as que subjazem a esta estética. E pela cama sóbria, elementar e nua que habita os quartos de todos e também dos visitantes como eu. Não vou dizer o lugar, que conheci há muito num artigo de jornal, nem vou descrever a aventura quase penosa que me trouxe aqui. Eles merecem essa descrição e merecem ser conhecidos mas ficar na memória só para quando algo de especial passa. Eu vim pelo claustro e pelo silêncio radical a que eles me destinam de que precisava usufruir como um banho purificador. Não vou detalhar-me na candidatura quase desesperante nos termos. Entendo a auto-protecção necessária e por fim vim. Está frio aqui. Mais do que imaginei, mas vim prevenida e sem vaidades. Tudo aqui é reduzido ao elementar. Vim pelos claustros, já o disse, e pelo silêncio. E vim para alimentar o meu desgosto em paz. Todos dizem isso. Diz-me de olhar azul e transparente num sorriso, o monje, que é a ponte entre mim e as regras do lugar. Com aquela calma contemplativa e a benevolência que se espera. Respondi que é natural os seres humanos terem em comum essa necessidade. Aí o olhar dele, mas não os lábios, sorriu ainda mais, e acrescentou que raramente depois e de facto se verifica ser essa a verdadeira necessidade, mas sim a de derramar a alma, nos ouvidos de quem puder acolhê-la. E aqui, só ele se destinou a ter essa função, talvez por também ter menos vocação para o silêncio. Talvez porque o mosteiro se deixa usar mesmo para sua própria viabilidade, ou talvez porque dedicando-se aos outros alcança melhor as trilhas do seu caminho. Lancei-lhe estas hipóteses e finalmente sorriu com o rosto todo. Peut-être… E quanto a si, veremos… acrescentou e sorriu de novo. Julguei ver de novo uma pontinha de ironia benévola. Garanti-lhe que não o incomodaria muitas vezes saindo das minhas primeiras intenções e de facto poucas vezes o vi, e sempre pelo acaso da sua preocupação. E sempre sorriu como se contente da minha persistência. Mas nos primeiros dias, reparei que era ele que de algum modo se propunha ao diálogo, como se quisesse inteligente e generoso, deixar-me confortável para encetar o meu silêncio das despedidas só se verdadeiramente fosse aquilo de que necessito, ou para estar ali a acompanhar-me, sem me dar a impressão de insucesso, poupando-me à eventual frustração, já que era ele a vir ao meu encontro. Porque ele sabe que muitos dos visitantes chegam imperfeitos, e ser generoso é não os confrontar com a imperfeição. Poucas vezes ou nenhuma, senti tanto o reflexo atento de alguém, face ao intuído. Até o fumo negociei com ele. O fumo e o feminino, assunto este, tão ou mais complexo e igualmente fora dos limites estritos da ordem. Mesmo nos visitantes. Dura negociação e duras conversações. E também aí, fui surpreendida pela profunda generosidade que na maioria das vezes não se encontra na ortodoxia destas ordens. Garanti-lhe que, nas camisas brancas que levaria, recordação dos vários homens da minha família, e no resto do meu equipamento habitual, pouco vislumbrariam desse feminino proibido ali. O quarto, e a cama reduzidos à essência, como disse. Belos e legítimos. Uma assombrosa janela sobre um pedaço do vale meio confundido pelo muito arvoredo. Da cama, tudo o que é necessário para ser uma boa cama. Os lençóis de um linho quase áspero e amarelado, um colchão firme. Uma almofada rija e alta e um único cobertor de lã, num castanho muito escuro, que na primeira noite percebi insuficiente para mim, e com uma única risca cinzenta a delimitá-lo de um só lado, o que me intrigou. Ainda persisti duas noites no frio irremediável até que cedi à incontornável necessidade de dormir algumas horas e apelei por mais dois. Iguais em tudo e que, somados, eram de um enorme conforto, então. E o meu cão ao lado da cama sempre. Sem um tapete mas com o pêlo comprido a fazer parecer que esteve sempre bem. A mesma estética minimalista ou essencialista e depurada, constatei nos utensílios à refeição, toda a cerâmica feita ali mesmo por eles, e uma parte dela comercializada por necessidade, embora com tristeza. Gostariam de não ter que lidar com dinheiro e de pouco precisam. Mas a variedade subtil de formas e tons maioritariamente variando entre os azuis e os verdes aquosos, fizeram-me pensar que as cores quentes não são para eles um anseio da alma. Nas formas, perfeitas até ao desaparecimento de vestígios artesanais, via-se serem a procura e o apuro progressivo e perfeccionista. Com variações por vezes para pequenas assimetrias. Uma cerâmica fina, argila da região, a lembrar oriente. E os talheres de pau. Basicamente apenas colheres e as facas do pão. Mesmo as refeições se pautam pelo mesmo rigor. Tudo produzido por eles na horta primorosa. Uma única refeição sempre constituída por uma sopa espessa variada e abundante. Com alguma carne, muitos legumes e uma grossa fatia de pão. E ao dejejum, sempre o mesmo pão, com queijo fresco ou mel, ou ambas as coisas e sempre. Como são belíssimos aqueles pães enormes grosseiros, toscos, cheirosos e ainda quentes. Tudo intenso de paladar e curiosamente em quantidade saciante. O que me pareceu bem, não pensei nunca que o sacrifício e o maltratar do corpo fossem caminho necessário para provar o que quer que fosse. Eles têm uma vida útil, oferecem o silêncio e a fé. Para quê adicionar sofrimento… Rumei um pouco mais a norte, para chegar aqui. Passei duas fronteiras. Penso que uma é a da dor e outra, a do lugar da dor. Penso que uma é a da dor e outra, a da inércia. Mas só por uma delas ponho as mãos no lume. Quanto à dor, não se pode deixá-la escorrer no espaço normal de sempre e para o sempre de todos os dias, sob pena de ela impregnar indelevelmente o habitáculo das paredes que por reflexo voltarão a macular-me mais e mais. A dor precisa do seu cenário próprio. Acolhedor, digno, acalentador mas longínquo. E de ficar lá, tentando que não nos acompanhe no regresso. Mas a dor, como um cão. Não se deixa abandonar facilmente e por vezes percorre os quilómetros de uma vida e até à exaustão, atrás do dono. Caminhar. Foi para o que vim. Sem o olhar se perder em nada ou prender a nada. Nada querer e nada querer ver. Uma sucessão de minutos e horas e dias, cheios de sinais exteriores à dor, em que as únicas marcas que se imprimem são aquelas coisas – tantas – que a fazem lembrar. E todos esses signos de que se rejeita a leitura, todos esses conjuntos de formas significantes, todas as cores, os movimentos e os sons, nada dizendo que se queira ouvir, funcionam a longo prazo como uma superfície abrasiva. Uma pedra-pomes que desgasta, refina e alisa o sentir. Mais ainda. Mas não se ama a dor. Como não se ama a mágoa. Só que uma e outra, a ter uma representação possível, é literalmente o rosto do objecto da dor. Da mágoa. E como tal, é paradoxal o desejo e temor de a perder. Porque com uma e outra, se vai ele também. Para o lugar do nunca mais. Maior o rigor e diria que se ama a tristeza e a dor, mas não se quer ficar nela ou com ela para sempre. E não por elas em si mas pela memória registada a ferro e fogo nelas. É só um divórcio triste. E que se deve encetar com a delicadeza e o tempo de fazer bem as partilhas. Sim, eu trouxe o meu cão. E ao meu cão dei um nome feminino. Não sei bem porquê, talvez para ser forte. Tal como chamei Feliz ao gato para enganar a sorte. Não o deixei abandonado nem vim a fugir dele, e com ele, desesperado, a correr atrás do comboio tentando não me perder o rasto. O meu animal querido. E com ele passei os dias. Colado a mim. A caminhar em torno do claustro até à tontura. Tentando progressivamente andar mais devagar e assim abrandar o ritmo cardíaco e as guinadas da dor. E ele, que foi lentamente conhecendo o ritual diário e a obsessão do percurso, passou a, uma vez por outra, esperar-me deitado ou sentado no ponto qualquer do caminho, seguindo-me depois a partir dali. Ou não. Aleatoriamente primeiro, e a pouco e pouco, mais espaçadamente. Suponho que se resignava a ficar, tal como eu aprendia a deixá-lo para trás. De início custou-me. Da primeira vez que parou sem me seguir, senti um travo amargo de desapontamento. Mas quase sempre não se afastava muito das minhas pernas. Suponho que queria dizer que estava lá para mim, enquanto necessário, mas sabia que não era para sempre e que teríamos que nos despedir com desgosto no final da estadia. Ele sabe, não sei como, que o vou deixar ali. Não abandonado, mas entregue a quem tratará bem dele. E que encontrará ali a sua última morada, num sítio belo. E com uma pequena pedra com uma frase minha de carinho. E eu sabia que ele não iria seguir-me na abalada porque entendia. Que tinha que ser assim. E que eu não iria esquecer nunca. E ele também não. Iria farejar de vez em quando pequenos pontos nas pedras daquele chão, onde talvez persistisse um registo ténue de lágrimas. E depois, vou ter para sempre saudades do meu cão. Hoje eu sei que este e outros sentimentos são para sempre. Mas o esquecimento recobre as saudades como recobre um amor. E só quando umas e outros vêm à memória, de forma aguda e cortante, se entende que estão lá e sempre estiveram. Num recanto escuro e esconso dos bastidores. Para sempre. Ou então, se a memória for generosa como o monge que conheci aqui, para nunca mais. Mas ele, por aqui, não vai comer pão por muito tempo. Carrega uma idade inverosímil para um cão. E um dia, não muito longe, virá uma carta, simples e delicada – eu sei – com uma fotografia do lugar em que ficou. Tratei de tudo com o irmão. Perguntei-lhe se me enviaria um email, porque há toda uma logística que mesmo aqui já se trata desse modo. E ele, sem aquele sorriso habitual e só dos olhos, neste caso, disse que as coisas importantes se escrevem em papel. Sim. Com invisíveis dedadas e impressões deixadas pela subtil gordura das mãos, o ritmo da escolha das palavras certas em modo e número. As dobras no papel, a espessura, a dança da caligrafia o rasgar do envelope. Ou no silêncio do ar. Como o contrato de silêncio – perguntei. Sim, disse. Fiz alguns desenhos do claustro e da capela. Quando fiz menção de lhos deixar, foi rigoroso na recusa. Disse: leve-os para suporte de memória. Nós ficamos com o melhor de si. (A dor?) Para se lembrar de como ela ficou bem entregue. O seu cão. Amanheceu e levanto-me de imediato com os primeiros raios. A experiência diz-me que acordada na cama sou pasto fácil para pensamentos devoradores. Preciso de caminhar muito ainda e aproxima-se o tempo de voltar. E das despedidas. Amanhã. A porta fecha-se entre mim e o irmão dos olhos sorridentes, sérios no momento. No último instante já não é ele mas um outro diferente e dos que nunca quebraram o silêncio devido. Quase duvido do que vejo, tão fugaz foi o momento. E de tudo. Enceto a descida. O passo rápido e embalado porque a descer todos os santos ajudam. E do que não posso duvidar, é de que vou mais leve. Sem eles. Mas não menos triste. Ficam dois, e uma parte. O combinado. Dois e uma parte.
Paul Chan Wai Chi Um Grito no Deserto VozesA corrupção eleitoral é um crime que faz com que os candidatos errados sejam eleitos [dropcap style=’circle’]R[/dropcap]ecentemente, os tribunais locais pronunciaram dois membros de uma associação que concorreu na quinta sessão eleitoral para a Assembleia Legislativa como culpados do crime de corrupção eleitoral, tendo para o efeito recebido sentenças de 18 e de 15 meses de prisão. Mas mesmo assim, várias pessoas manifestaram o seu desagrado com esta decisão, defendendo que esta sentença não vai conseguir mudar os resultados eleitorais já obtidos nem tão pouco deve conseguir dissuadir a própria tradição de corrupção eleitoral. Mesmo atendendo ao facto de esta decisão judicial não ter poder para reverter os resultados do acto eleitoral em questão, conforme está estipulado na Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa agora em vigor, não nos devemos esquecer que pode contudo servir de aviso para aqueles que aceitam receber ordens de outros em troca de recompensas materiais. No mínimo esta história serve para demonstrar que de facto se verificaram casos de fraude eleitoral durante o processo eleitoral para a quinta constituição da AL, sendo no entanto necessário realçar que os dados agora comprovados em tribunal representam apenas a ponta do icebergue. De forma a garantir que tal não volte a acontecer no futuro mas também que as próximas eleições decorram de uma forma justa e equitativa, o Governo da RAEM deve rever a Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa e colmatar as eventuais lacunas que esta revelar. Ao mesmo tempo, o Comissariado Contra a Corrupção assim como a Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa devem igualmente trabalhar de uma forma pro-activa para impedir que qualquer indivíduo se aproveite de possíveis falhas de rigor legislativas para assim se dedicar ao crime de fraude eleitoral. Isto deve ser feito o mais rápido possível de forma a prevenir que membros do público façam uso de associações para transferir favores ou outros benefícios a terceiras partes, sendo este um dos truques utilizados no passado para comprar votos, não obstante ser realizado de forma dissimulada. Além disso, a decisão do Tribunal vem informar o público que aqueles que se dedicam à compra de votos, quer através da oferta ou aceitação de subornos, estão de facto a quebrar a lei, constituindo este acto um crime que deve ser punido de acordo com a lei. E, mesmo que a Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa não seja capaz de anular os resultados das eleições em causa, conforme acima mencionado, esta pode contudo acarretar consequências graves para os candidatos eleitos. As leis são sempre justas e correctas. Quem quiser acusar qualquer um dos candidatos da prática de corrupção eleitoral, tem invariavelmente de apresentar provas para corroborar essa mesma acusação. E, quando ficar provado que os membros de uma qualquer associação com candidatos eleitos para a AL cometeram de facto corrupção eleitoral, o caso assume contornos semelhantes ao que se verifica quando um empreiteiro contrata imigrantes ilegais para uma das muitas obras locais. Pois mesmo quando este se encontra numa situação de falta de mão-de-obra, o mesmo não pode deixar de ser responsável pela contratação ilegal de trabalhadores empreendida pelos seus subempreiteiros, nem que seja devido a uma obrigação moral. Da mesma forma, quando uma associação pratica corrupção eleitoral para conseguir a eleição dos seus candidatos, todas as outras associações são injustamente prejudicadas. Já no que diz respeito aos candidatos eleitos, e de acordo com a premissa de que todos são inocentes até serem provados culpados, estes não são considerados como culpados de corrupção a não ser que existam fortes provas para o mesmo, e da mesma forma o seu estatuto de candidato eleito permanece válido e não deve ser desacreditado. Existem porém casos em que os membros de uma qualquer associação local utilizam o seu próprio dinheiro para proceder à compra de eleitores, mas estes casos devem contudo ser encarados de uma maneira diferente. Não nos podemos esquecer que o factor crucial para o sucesso de uma candidatura à Assembleia Legislativa é a escolha dos eleitores. Durante o acto de 2013, todas as assembleias de voto foram supervisionadas por fiscais de modo a garantir o cumprimento das normas. Mas que táctica foi então utilizada para garantir que certos eleitores votassem nos candidatos especificados por aqueles que procederam à compra de votos? Foi por esta mesma razão que eu decidi dedicar todos os meus esforços nos anos transactos ao fortalecimento da consciência cívica da população de Macau, ao mesmo tempo que procuro encorajar aqueles que considero serem não só incorruptíveis mas também como dispostos a servir a RAEM, a se candidatarem para a AL nas próximas eleições. Tenciono desta forma contribuir para que as gentes de Macau desenvolvam um novo respeito pelo processo eleitoral, ao mesmo tempo que se fortalece a tradição democrática na RAEM. Mas para que isto se torne numa realidade, vai ser necessário não só melhorar a qualidade dos próprios eleitores como ainda rever e melhorar as leis que supervisionam todo este acto eleitoral. Na minha opinião, o Governo da RAEM tem de tornar público o relatório final que lhe foi submetido pela Comissão de Assuntos Eleitorais da AL, referente este às eleições legislativas de 2013, para que a população em geral possa compreender os problemas que temos de resolver. Assim sendo, qualquer futura revisão da Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa deve obedecer a uma análise analítica com vista a colmatar as lacunas aí contidas, especialmente no que diz respeito a um eventual cancelamento do próprio acto eleitoral. Por fim, teremos de melhorar a educação cívica dos nossos cidadãos para que estes compreendam que, nas lides políticas, nada se colhe gratuitamente. Cada processo eleitoral acarreta os seus riscos específicos, mas como as penas para os infractores não são severas, muitos candidatos acabam por cair na tentação de quebrar a lei de modo a garantir a sua eleição. Mas, se estes mesmos indivíduos conseguirem na realidade conquistar o lugar e chegar ao cargo de legisladores, que futuro nos espera então? Em Macau, é comum ouvir as gentes do território compararem a AL a uma “assembleia de lixo” (em cantonense), mas será que algum destes dissuasores chegou a perder tempo para reflectir no que é necessário para impedir que esse lixo consiga entrar na Assembleia?
Leonor Sá Machado Eventos MancheteDesign | Jovem local vence competição para decorar fachada do Hotel Roosevelt Kenny Leong venceu o concurso para decorar parte da fachada do futuro Hotel Roosevelt, na Taipa. Este deverá ser livre de mesas de Jogo, focando-se na temática de Hollywood. A inauguração está prevista para 2016 [dropcap style=’circle’]M[/dropcap]acau vai ter um novo hotel na Taipa, desta vez livre de mesas de Jogo e totalmente dedicado ao mundo hollywoodesco, onde reinavam estrelas como Marilyn Monroe, Marlon Brando ou James Dean. Este deverá ser inaugurado durante o primeiro semestre do próximo ano e vai, de acordo com um dos investidores, Aaron Iu, dar primazia às gastronomias asiática e ocidental. “Estamos a planear ter um hotel com um serviço especializado de alta qualidade. Vai ter restaurantes chineses e ocidentais, por isso vai apresentar um bom estilo, mas não [será] para Jogo”, disse o investidor à Agência Lusa. O Roosevelt pertence à mesma cadeia dos hotéis Roosevelt dos EUA, mas com uma componente asiática. “O conceito não é exactamente o mesmo do hotel de Hollywood, onde foi construído o primeiro. Este combina as tradições de Macau e as de Hollywood”, afirmou Iu. A possibilidade de abrir um hotel da cadeia na região foi anunciada em 2013, mas apenas recentemente se soube mais pormenores. Foi através de um concurso que o realizador local Kenny Leong venceu um prémio pecuniário de 300 mil patacas e a oportunidade de decorar parte da fachada e do terraço do empreendimento. O HM conversou com Leong e percebeu que se trata de um projecto complexo, revolucionário e “no qual poucas grandes cadeias investem”. Isto porque, explicou o artista, preferem ficar-se por elementos mais básicos e de mais fácil e barata manutenção, uma vez que se tratam de espaços frequentados por um grande volume de pessoas. Questionado sobre a natureza do projecto, Kenny Leong respondeu que demorou cerca de dois meses a completá-lo totalmente e as coisas foram surgindo aos poucos. “Demorei um mês e meio para desenvolver a ideia e acho que não vai ser assim tão caro [montar o projecto]”, disse. Visualmente, a obra de Kenny é feita de vários materiais e recorre a uma série de técnicas artísticas. Antes de mais, será colocada uma instalação de canos no terraço que ganha vida através da técnica de impressão em espuma em 3D. “Desenhei uns painéis verticais de [luz] LED com os quais os visitantes podem interagir, por meio de uma aplicação móvel por exemplo”, explica Kenny. Kenny Leong com a directora dos Serviços de Turismo, Helena de Senna Fernandes O conceito, diz, gira em torno da relação entre espaço e utilizador. Além de tudo isto, há ainda espaço para colocar painéis de fumo que criam “uma enorme parede de projecção instaladas do hotel cá para fora”, contrariando assim o conceito tradicional de uma projecção, que o faz do projector para uma parede. Para completar, Kenny escolheu imagens de celebridades da “Era Dourada” para figurar nos painéis. “The Era” é o nome da sua invenção, precisamente por aludir aos actores como Marlon Brando e Marilyn Monroe da Hollywood americana. O talento não abandona o artista A história de Kenny começa em Macau, mas rapidamente continua do outro lado do mundo, no Canadá. Desde os cinco anos de idade que lá viveu, tendo frequentado a Universidade Ryerson, em Toronto. A sua primeira escolha havia sido Design de Interiores, a segunda Rádio e Televisão, mas o destino deixou que o jovem fosse parar ao curso de Novos Média. “Na escola, desenvolvi um projecto relacionado com design, mas acabei por não entrar no curso mais tarde, quando me candidatei”, lamenta. Foi há três anos que regressou ao território e confessou-se “muito agradecido” ao Centro de Design de Macau pela oportunidade de poder ter o seu próprio estúdio de produção de vídeo neste local. “É isso que basicamente faço e onde passo quase todas as horas dos meus dias, a trabalhar, pelo que estou muito grato ao Centro”, disse. Lembrar para não esquecer Entre os premiados estiveram ainda projectos de Henrique Silva e de Rui Rasquinho, juntamente com uma equipa da Associação Art for All (AFA). O primeiro fez, de acordo com declarações do autor ao HM, uso de resíduos de estaleiros para decorar partes da fachada do prédio, de uma forma original. “A ideia foi pegar no entulho das obras e utilizá-los como elementos decorativos do próprio hotel, embutindo-os dentro de placas de epoxi [plástico semelhante a verniz]”, começa por explicar. O terceiro projecto foi primeiramente criado por Rui Rasquinho, mas posteriormente desenvolvido por uma equipa de artistas da AFA. No entanto, ao HM, o artista plástico disse que a ideia inicial foi recriar a cultura chinesa, com uma espécie de recursos aos elementos básicos. “Faz parte de uma série que estou a fazer e que se inspira directamente em elementos da pintura chinesa, mas não recria, apenas se inspira, usando elementos como a água, as rochas, as nuvens”, explicou. Apenas Kenny Leong ganhou a oportunidade de ver o seu projecto ganhar vida, mas Henrique Silva e Rui Rasquinho também receberam galardões pecuniários, no valor de 50 mil patacas, ao lado de Ng Hio Wai e Carlos e Pedro Ho.
Andreia Sofia Silva PolíticaHabitação Económica | Concluída análise da revisão da lei [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]s deputados da 2.ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa (AL) concluíram ontem a análise na especialidade da primeira fase de revisão da Lei da Habitação Económica. Segundo Chan Chak Mo, o processo decorreu “sem grandes controvérsias”. A alteração do diploma, que entrou em vigor em 2011, pretende simplificar os processos de acesso a uma casa do Governo, para reduzir o tempo de espera dos candidatos. “O novo método é de apreciação preliminar e esta fase inclui os excluídos e não excluídos. Depois inclui-se o sorteio e uma nova apreciação e esta nova regra aplica-se ao concurso para as habitações económicas em 2013. Este novo método não vai afectar os interesses legítimos dos candidatos. O Governo está a deparar-se com muitas candidaturas e são poucas as habitações disponíveis, e por isso pretendeu-se alterar para um novo método, encurtando o prazo para os trabalhos administrativos”, explicou Chan Chak Mo. Segundo o deputado, o parecer jurídico “sugere algumas soluções para o aumento da oferta de habitação económica, e no próximo passo este parecer pode servir de referência para o Governo proceder aos trabalhos [da revisão global da lei]”. Outro ponto que também será legislado aquando da revisão global da Lei de Habitação Económica é a existência de muitas casas públicas desocupadas. “Houve um consenso com a Comissão [para os Assuntos de Administração Pública] de que a resolução dessa questão das fracções não habitadas passaria por duas possibilidades: ou faríamos uma revisão parcial da lei, só para tratar deste assunto, ou uma revisão global, como está prevista. Optámos por incluir esta matéria na revisão global”, disse Raimundo do Rosário, Secretário para as Obras Públicas e Transportes. Seac Pai Van | Mais instalações sociais este ano Para além da questão das penas de condução com droga ou álcool, a Comissão de Acompanhamento para os Assuntos de Administração Pública também serviu para o Governo apresentar a lista detalhada dos espaços comerciais e sociais que existem na habitação pública de Seac Pai Van. Três instalações sociais, da responsabilidade do Instituto de Acção Social (IAS), deverão entrar em funcionamento já este ano. Um lar para deficientes entrará em funcionamento em Setembro, uma residência para crianças e jovens no próximo mês, um centro de dia para idosos e um centro integrado de reabilitação para portadores de deficiência deverão abrir portas em Outubro.
Leonor Sá Machado Manchete SociedadeIAS sugere acordos com empresas para contratação de seniores. Ajuda a idosos em consulta pública O Governo está a ponderar a criação de acordos com empresas para que estas contratem idosos locais. De acordo com um estudo pedido a uma universidade de Hong Kong, é preciso investir em acessos sem barreiras, mais lares e formação de recursos humanos. Um novo mecanismo de protecção aos idosos vai agora a consulta pública [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]Instituto de Acção Social (IAS) pondera o estabelecimento de acordos com empresas privadas para que estas contratem idosos que tenham capacidade para trabalhar. Esta ideia, explicou ontem o presidente do IAS, Iong Kong Io, serve para ajudar a uma melhor integração destes residentes na sociedade e é uma das sugestões incluídas no Mecanismo de Protecção aos Idosos, que agora avança para consulta pública. Nenhum dos representantes presentes avançou mais novidades sobre o assunto, referindo apenas que este está em maturação. O anúncio teve lugar durante a sessão de apresentação de um plano decenal para minorar o impacto do envelhecimento da população – o Mecanismo de Protecção aos Idosos da RAEM -, desenvolvido pela mesma entidade, que teve como base um estudo feito pela Universidade Lingnan de Hong Kong. Foi o professor Alfred Cheung-ming Chan quem ficou responsável pela referida pesquisa, que durou mais de dois anos. As conclusões apontam para a aplicação de um mecanismo com enfoque em quatro pontos principais: serviços médicos e de assistência social, garantia dos direitos, participação social e ambiente de vida. Estes dividem-se, por sua vez, em 14 diferentes questões, como a reabilitação e cuidados a longo prazo, transporte e deslocações, construção e habitação e garantias jurídica e de segurança económica. Questionado sobre se a criação deste mecanismo estava relacionado com a Lei de Protecção de Bases dos Idosos, que já deveria ter sido entregue à Assembleia Legislativa, mas ainda está atrasada, Iong Kong Io afirmou que se trata apenas de uma medida cumulativa, exterior ao documento da proposta. Mudanças várias Tudo isto, assegurou o IAS na apresentação do plano, deve culminar na promoção de “sentimentos de segurança e de pertença, valorizando os idosos”. O Instituto prevê ainda que em 2036 a população com mais de 65 anos possa chegar aos 20,7%, sendo necessário preparar a região e a sociedade para lidar com o aumento progressivo dos seniores. A consulta pública sobre o novo mecanismo começou ontem e estende-se até 12 de Setembro, embora os resultados só venham a ser conhecidos “no primeiro semestre do próximo ano”, de acordo com um dos responsáveis do IAS ontem presentes na sessão. O mecanismo a desenvolver deverá implicar mudanças a vários níveis, nomeadamente na formação de recursos humanos na área da Geriatria, dos serviços sociais, dos médicos e enfermeiros, no número de vagas em lares de idosos, entre outras. De acordo com o estudo da universidade da RAEHK, é também necessário proceder ao “aperfeiçoamento da Lei de Bases dos Direitos e Garantias dos Idosos e das medidas para o acompanhamento, estabelecimento do regime de segurança social de dois níveis”. Em termos físicos, o mesmo relatório conclui que é preciso melhorar os acessos para as pessoas mais velhas, como em passagens superiores, passeios e a segurança doméstica.
Leonor Sá Machado SociedadeSands China e Câmara do Comércio querem comprar a PME É mais uma demonstração de apoio às PME locais da parte das operadoras de Jogo. Agora foi a Sands China quem fez uma parceria com a Câmara de Comércio local [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]Sands China e a Câmara do Comércio de Macau unem-se para criar um programa de incentivo à compra de produtos locais. De acordo com um comunicado, só no ano passado, a operadora comprou cerca de 12,5 mil milhões de patacas a mais de 2200 empresas locais, incluindo pequenos e médios vendedores e distribuidores. “Ao perceber as dificuldades sentidas pelos pequenos negócios em colaborar com grandes organizações, a Sands contactou a Câmara do Comércio de Macau, levando-a a perceber a importância destas empresas”, refere a empresa em comunicado. Durante a sessão de esclarecimento, foram mais de cem as PME interessadas em participar neste programa de fomento. Há, de acordo com a equipa gestora do projecto, três diferentes tipos de empresas: pequenas e micro, aquelas que “são feitas e criadas em Macau” e jovens empreendedores locais. O primeiro grupo é constituído por todos os negócios em que mais de 50% do capital seja detido por cidadãos residentes e não empregam mais de 15 pessoas, enquanto aquelas “criadas” no território detêm uma licença de Indústria e um certificado dos Serviços de Economia. Finalmente, descrevem como jovem empreendedor aquele que detenha mais de 50% do seu negócio e tenha entre 21 e 44 anos de idade. “A Sands acredita no investimento na comunidade local, seja através de esforços de voluntariado com ONG ou iniciativas como esta”, diz a Sands, citando o vice-presidente executivo, Ben Toh. Na passada quarta-feira, as entidades responsáveis pelo projecto publicaram uma lista de mais de 200 produtos que podem agora ser comercializados localmente, através de empresas de Macau. Estes eram anteriormente importados e a lista – de entre bens alimentares, instalações, iluminação e mobiliário – pode ser consultada online.
Andreia Sofia Silva PolíticaÁlcool e Droga | Decisões até fim do ano para punição por condução Os deputados da Comissão de Acompanhamento para os Assuntos da Administração Pública querem penas mais graves ou o fim da pena suspensa nos casos de condução com efeito de álcool ou drogas. Governo promete decisão até final do ano através de um estudo com várias Secretarias [dropcap style=’circle’]A[/dropcap] Comissão de Acompanhamento para os Assuntos da Administração Pública da Assembleia Legislativa (AL) debateu ontem o agravamento das penas para quem conduz sob efeitos de álcool ou estupefacientes. Segundo o deputado Chan Meng Kam, que preside à Comissão, os deputados defendem o agravamento das penas e o fim da pena suspensa, em casos de condenação dos condutores. “A Comissão está muito preocupada com essa situação e espera que para esses casos não haja lugar à suspensão da pena, porque isso vai reduzir o efeito dissuasor. Acabar com a suspensão ou agravar a pena, é esta a tendência”, referiu Chan Meng Kam. À saída do encontro, que contou com representantes da Polícia de Segurança Pública (PSP), Raimundo do Rosário, Secretário para as Obras Públicas e Transportes, garantiu que até ao final do ano o Governo vai tomar a decisão final. “Eu, com a Secretária para a Administração e Justiça (Sónia Chan) e o Secretário para a Segurança (Wong Sio Chak) combinámos fazer uma análise sobre se é ou não necessário aumentar as penas. Esse estudo ficará concluído no final do ano”, afirmou, em declarações reproduzidas pela Rádio Macau. Os membros da PSP apresentaram ainda dados sobre os casos de condução sob efeitos de drogas ou álcool relativos aos primeiros seis meses do ano, tendo sido revelada uma redução de 17% por ano. Nos casos de condução sob efeitos de droga a redução foi de 40%. “É claro e evidente que no que se refere ao álcool e droga a situação melhorou bastante”, disse Raimundo do Rosário.
Joana Freitas EventosIFT | Estudantes visitam Portugal para formação [dropcap style=’circle’]E[/dropcap]studantes do Instituto de Formação Turística (IFT) visitaram Portugal para uma acção de formação nas áreas da Viticultura e Enologia, a convite da ESPRODOURO. O convite da Escola Profissional de S. João da Pesqueira surgiu depois de uma parceria acertada em Macau, na MIF, entre a instituição portuguesa e o IFT. Durante uma semana de Julho, um grupo de 14 estudantes e um professor frequentaram um workshop sobre vinhos. Mas a viagem não se ficou por aqui. “A prioridade da ESPRODOURO foi a de mostrar a qualidade e os segredos do vinho do Porto, localmente conhecido por ‘vinho generoso’, e também os vinhos de mesa. Contudo, não era vontade da ESPRODOURO que esta formação se cingisse apenas à descoberta dos vinhos do Douro. Por isso, tentou-se mostrar aos estudantes o património material e imaterial desta região ímpar, tendo como base a paisagem e o Rio Douro, dar também a conhecer os monumentos arquitectónicos do concelho de S. João da Pesqueira”, pode ler-se num comunicado enviado ao HM pelo Gabinete de Comunicação e Imagem da Câmara Municipal de S. João da Pesqueira. O acordo entre a ESPRODOURO e o IFT foi celebrado em Outubro passado, quando uma delegação do município participou na Feira Internacional de Macau (MIF) e realizou reuniões com algumas instituições locais para eventuais parcerias. No encontro entre o IFT e a ESPRODOURO foi apresentada uma proposta de formação sobre a vinha e o vinho do Douro a ter lugar em S. João da Pesqueira, concelho que já foi representado em feiras de Macau por mais do que uma vez. “Este projecto teve grande aceitação por parte do IFT e um grupo de estudantes macaenses foi seleccionado para incorporar o primeiro grupo a frequentar esta acção de formação”, explica a Câmara em comunicado, acrescentando que “esta formação se revestiu de uma componente teórica em sala de aula e foi enriquecida em contexto real de trabalho com provas de vinhos, visitas a quintas, vinhas e adegas onde [os alunos] puderam verificar todo o processo produtivo”. Sendo a cortiça “um componente forte na fase final de engarrafamento dos diferentes tipos de vinho”, os estudantes foram ainda à corticeira de Castanheiro do Sul. “Puderam ainda apreciar a vida religiosa e mundana, os usos e costumes do povo duriense através das visitas a museus, nomeadamente aos museus etnográfico e de arte sacra de Trevões, e museu do vinho de S. João da Pesqueira. A gastronomia duriense esteve sempre presente e, porque em qualquer processo formativo a componente lúdica deve ser uma constante, foi ainda possível navegar nas águas do Douro. Com esse leque de saberes agora adquiridos, acreditamos que deixaram esta região, Património Mundial da Humanidade, enriquecidos culturalmente”, remata o Gabinete de Comunicação e Imagem da Câmara Municipal de S. João da Pesqueira.
Andreia Sofia Silva EventosPintura | Exposição de Crystal M. Chan no Albergue [dropcap style=’circle’]“[/dropcap]Eu sou a minha própria paisagem” é, mais do que uma exposição, o resultado de uma nova fase da vida profissional da artista local Crystal M. Chan. A inaugurar no próximo dia 5 de Agosto no Albergue SCM, a exposição parte de uma frase de um poema de Fernando Pessoa para revelar quadros mais intimistas e minimalistas, onde até a forma de pintar e os materiais utilizados são diferentes. Poucas horas depois de ter regressado a Oriente vinda de Nova Iorque, onde passou meio ano, Crystal M. Chan explicou ao HM o que pretende mostrar ao público com os seus quadros. “Nesta altura estou a trabalhar com aguarelas e é algo bastante diferente em relação ao que tenho vindo a pintar no passado. Costumava usar outros materiais em que se podia ver mais os olhos e a face. Depois, a certa altura, senti que queria fazer uma mudança, que queria ver quais seriam as outras possibilidades que tinha ao nível da pintura. Penso que muitos dos trabalhos que vi em Nova Iorque me inspiraram para fazer algo mais sobre a forma como quero representar o meu trabalho.” O uso da aguarela nos quadros não surge por acaso. “Estou à procura de algo poético no meu trabalho e tenho vindo a usar aguarela para buscar esse lado mais poético e ver as diferenças”, disse Crystal M. Chan. “Estou a pensar na melhor maneira de representar algo de forma mais poética, menos narrativa e mais sugestiva. Mais minimalista. Estes trabalhos fizeram-me pensar que estava a pintar muito à maneira chinesa na forma do corpo, que tem diferentes texturas ou padrões. Essa é a direcção que estou a tentar levar”, frisou. Não só a exposição revela uma nova fase de Crystal M. Chan como artista, como também revela uma fase em que a pintora tem estado mais virada para si mesma. “O nome da exposição é ‘Eu sou a minha própria paisagem’, é uma frase de um poema de Fernando Pessoa, um poeta português do qual gosto muito. Esse poema é sobre ‘eu tenho várias almas, não sei quem sou realmente’. Tenho vindo a pensar muito em o que sou, a minha própria existência.” Por essa razão, Crystal M. Chan decidiu pintar-se a si própria. “No passado, mesmo desenhando amigos, namorados ou familiares, a forma como os desenhava não os representava realmente. Desta vez pintei-me a mim mesma, porque percebi que os meus trabalhos têm muito a ver comigo”, explicou. Um olhar sobre os quadros de Crystal M. Chan permite perceber algumas semelhanças com o estilo expressionista do pintor austríaco Egon Schiele, para quem o corpo humano, mas sobretudo o feminino, era o ponto principal. “A primeira vez que vi os seus trabalhos tinha 18 anos, num livro de pintura, e depois vi uma exposição em Viena. Quando vejo os seus quadros sinto que são muito poderosos, nunca sabemos muito bem quem foram as suas musas, mas pela maneira como ele desenha consigo sentir o desenho e a sensação de uma mente distorcida como a de Egon Schiele. Ele é a minha maior influência”, rematou Crystal M. Chan. A exposição no Albergue SCM fica patente até ao dia 23 de Agosto e a entrada é livre. A primeira vez que Crystal M. Chan expôs em Macau foi em Julho do ano passado.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeDemografia | Macau vai ter 750 mil habitantes daqui a dez anos O Gabinete de Estudos das Políticas apresentou ontem o Relatório do Estudo sobre a Política Demográfica de Macau que revela que, em 2025, Macau vai ter 750 mil habitantes e uma população ainda mais envelhecida. Os responsáveis do Gabinete dizem que viver no continente pode e deve ser uma opção [dropcap style=’circle’]D[/dropcap]aqui a dez anos a população de Macau vai crescer, ainda que não tanto como agora. A conclusão é do Relatório do Estudo sobre a Política Demográfica de Macau, apresentado ontem pelo Gabinete de Estudos das Políticas (GEP). Os dados mostram que em 2025 Macau terá 750 mil habitantes e uma densidade populacional de 20.500 habitantes por quilómetro quadrado. O crescimento é de 1,9% anual entre 2014 a 2020, sendo que nos cinco anos seguintes a taxa de crescimento a cada ano deverá cair para 1,1%. Apesar dos números, os responsáveis do GEP garantem que as infra-estruturas do território vão conseguir suportar o aumento populacional, com base em informações analisadas em conjunto com o Instituto de Formação Turística (IFT), a Universidade de Macau (UM) e a Associação de Urbanização de Macau. “Se nos próximos dez anos a população atingir as 750 mil pessoas, as restantes áreas têm de ser aperfeiçoadas e segundo essas instituições é possível absorver essa população”, disse Lao Pun Lap, coordenador do GEP. “O ritmo vai ser diferente do que é agora e mesmo que haja uma subida vai ser mais estável e moderada do que agora”, acrescentou. O GEP garantiu ainda que um aumento mais “estável” da população se deve às mudanças nos horários nas fronteiras e ao fomento da cooperação regional, o que poderá levar muitos trabalhadores não residentes (TNR) a viverem fora do território. “Sabemos que temos cerca de 180 mil TNR, grande parte deles do interior da China. Cerca de 60% desses TNR vive em Macau, sendo que no período antes da abertura das fronteiras esse número era de 80%. Desde a abertura das fronteiras que houve alterações porque cada vez mais TNR optam por viver em zonas como Zhuhai ou Zhongshan. Vemos uma descida notável nas rendas e isso também tem a ver com a redução de TNR em Macau. Prevemos que o número de TNR [a viver cá] venha a descer até 40 a 50% e essa será uma tendência no futuro. Quem pode optar naturalmente vai viver nessas regiões onde os produtos e as rendas são mais baratos”, disse Lao Pun Lap. “Podem existir TNR e até residentes a residir na China. Isso pode acontecer devido a vários factores, mas também devido à cooperação regional. Temos de ter uma ideia mais regional e não apenas dentro das fronteiras”, referiu ainda o coordenador do GEP. Mais velhos Yun Kin Cheng, investigador do mesmo gabinete, pediu mesmo maior “responsabilidade” das concessionárias de Jogo no sentido de criarem soluções de transporte e alojamento dos seus trabalhadores. “Os TNR poderão ser mais ou menos, consoante as políticas do momento e as concessionárias devem ser responsáveis. Não temos outros desenvolvimentos de projectos de Jogo [além dos actuais] e no futuro pode haver uma subida de população, mas não tão alta como agora.” Daqui a dez anos, Macau terá também uma população ainda mais envelhecida, sendo que a população idosa irá rondar os 16,3%, com uma esperança média de vida de 84,6 anos. O relatório apresenta ainda vários sugestões na área da habitação, saúde e economia (ver caixa). Apesar de referir que Macau vai conseguir suportar mais pessoas, a verdade é que o coordenador do GEP defende mais medidas por parte do Executivo. “Se nos próximos anos existir uma melhor distribuição e um melhor reordenamento das zonas antigas podemos ver melhorias no futuro. Temos de reforçar e intensificar a coordenação entre diferentes Secretarias para que possam existir melhores resultados e aplicar ajustamentos aos processos. As medidas do Governo poderão responder melhor às necessidades da população.”
Filipa Araújo PolíticaLei Bancária | Angela Leong questiona Governo sobre revisão Angela Leong quer saber quando é que o Governo vai rever a Lei Bancária, prometida pelo Executivo, permitindo um maior investimento nas plataformas da internet e, por sua vez, levando o nome “Made in Macau” mais longe [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]deputada Angela Leong quer saber em que ponto está a alteração à Lei Bancária, prevista pelo Secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong. Numa interpelação escrita, a deputada argumenta que apesar dos nos últimos anos o Instituto de Promoção do Comércio e Investimento de Macau (IPIM) apoiar e incentivar as empresas locais a utilizarem o comércio electrónico, desenvolvendo as suas plataformas na internet e a sua capacidade concorrencial e de expansão dos seus próprios negócios, pouco ou nada tem surtido efeito. “Actualmente apenas 28% das empresas utilizam o comércio electrónico, e uma das razões apontadas para a não vulgarização deste tipo de comércio entre os vários sectores de Macau é a inexistência de legislação para resolver e tratar a questão dos pagamentos através da internet”, argumentou a deputada. Angela Leong adiantou ainda que existem residentes e empresas das províncias onde Macau marca presença através de exposições que assumem que só “conseguem adquirir os produtos de Macau durante essas exposições”. Situação que poderia ser alternada com as plataformas comerciais electrónicas, permitindo ainda o fluxo de mercadorias entre as partes interessadas. Sendo assim, a deputada apela ao Governo que torne pública a calendarização dos trabalho na revisão da lei. Na mesma interpelação, Angela Leong defende que o Governo deve manter uma posição de apoio e orientação para os jovens empreendedores fazendo com que os mesmos assumam as plataformas online como uma mais valia para o seu negócio. “Tendo como objectivo implementar uma estratégia de promoção dos produtos Made in Macau no exterior através da internet, os serviços competentes devem ajudar as empresas a aumentar a promoção dos seus produtos através da utilização das técnicas do comércio electrónico, em especial, ajudar os jovem empreendedores e as industrias culturais. Vai fazê-lo?”, indaga a deputada.
Hoje Macau EventosArranca nova edição do concurso de contos Rota das Letras [dropcap style=’circle’]E[/dropcap]stá aí a quarta edição do Concurso de Contos do Festival Literário de Macau – Rota das Letras, que visa a recolha de histórias em português, chinês e inglês até ao dia 30 de Novembro. Segundo um comunicado da organização, “o concurso de contos decorrerá em moldes semelhantes ao do ano anterior, com os vencedores a serem seleccionados por escritores que passaram pela Rota das Letras, depois de haver uma pré-selecção de um júri composto por representantes da organização e outros convidados”. A história terá de ser obrigatoriamente sobre Macau, e, para além da publicação do conto, existe um prémio de dez mil patacas para cada um dos vencedores, um para cada idioma. O próximo volume da colecção “Contos e Outros Escritos” será lançado em Março do próximo ano, quando decorrer a 5ª edição do Festival Literário de Macau. Os vencedores da 3ª edição do concurso de contos foram J.Cool, natural de Macau, que escreveu em chinês, a brasileira Regina Nadaers Marques e ainda Kevin M. Maher, norte-americano. Ao jornal Ponto Final, Kevin M. Maher considerou o prémio do concurso como um “incentivo” para escrever mais histórias. “Serviu-me de validação e deu-me a segurança de que talvez possa, na verdade, escrever algo que as pessoas queiram ler”, disse o também docente de inglês na Universidade de Macau (UM). O mesmo livro incluiu ainda os textos dos escritores que passaram por Macau no âmbito do Rota das Letras e que foram convidados a escrever sobre o território. Hu Xudong, Afonso Cruz, Andrea Del Fuego e Karla Suárez são alguns dos nomes que podem ser folheados no livro, à venda na Livraria Portuguesa. Os vencedores da 2ª edição foram Pedro Amaral, com o conto “Diário dos Últimos Dias do Coronel Vicente Nicolau de Mesquita”, Loi Chin Pan com a história “A Pequena Loja” e Sam Lee com “M”. Carlos Afonso Portela recebeu ainda uma menção honrosa com o conto “A Chegada de Cesariny a Macau”, Isolda Brasil com “Cartas de Amor de Macau” e também Lawrence Lei, com “Caça ao Homem”.
Hoje Macau PolíticaWikileaks | UE acompanha queixa da Novo Macau [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]Chefe da representação da Comissão Europeia em Hong Kong e Macau, Vincent Piket, disse que ia acompanhar a exportação de ‘software’ de ciberespionagem de Itália para Macau, em resposta à solicitação de um grupo político. O caso remonta ao início deste mês e vem na sequência de revelações do portal Wikileaks que tornaram público o interesse da Polícia Judiciária de Macau na aquisição de um ‘software’ de videovigilância da empresa italiana Hacking Team – o Remote Control System (RCS) –, com base numa troca de emails iniciada em 2012. A revelação levou a Associação Novo Macau (ANM) a pedir uma investigação ao Ministério Público (MP) e a enviar, na semana passada, uma carta aos representantes consulares dos países membros da União Europeia, na qual encorajava os governos europeus a tomarem “precauções extras” ao aprovarem a venda de produtos de segurança e de defesa por empresas sedeadas no espaço europeu para o Governo de Macau. “Se a exportação de produtos de vigilância com capacidades intrusivas está sujeita ao controlo ou regulamentação no seu país, pedimos que informe as autoridades competentes do seu país sobre a possibilidade de abuso de tais produtos pelas autoridades policiais do governo de Macau”, referia a missiva. A resposta de Vincent Piket, publicada no Facebook de Jason Chao, membro da Associação Novo Macau, foi referida pelo jornal Ponto Final na sua edição de ontem. “Vamos olhar para esta questão com os nossos colegas italianos de forma a discutir as preocupações suscitadas por esta missiva”, afirma Vincent Piket, citado pelo jornal. Alvos potenciais No passado dia 17 a ANM convocou a imprensa para falar dos detalhes dos documentos revelados pela Wikileaks, que mostram que a Polícia Judiciária (PJ) e o Comissariado contra a Corrupção (CCAC) chegaram à fala com a empresa Hacking Team no sentido de adquirir o sistema de ciberespionagem. Jason Chao, membro da direcção da ANM, não negou a possibilidade de um dos principais alvos na aquisição deste sistema ser, precisamente, os activistas da ANM. “Não posso rejeitar essa possibilidade [da Novo Macau ser um dos alvos]. O que dizemos ao público é baseado com os documentos que vemos no Wikileaks. Não temos provas, mas não posso recusar essa possibilidade. Pessoalmente acredito nisso.” Na resposta à comunicação social, tanto a PJ como o CCAC não confirmaram uma eventual aquisição do sistema. O CCAC explicitou que “para exercer as suas competências na investigação criminal de forma legal e eficaz, todos os meios e técnicas adoptadas nas diligências do CCAC são de natureza confidencial. Pelo exposto, o CCAC não vai comentar ou responder a perguntas relativas aos métodos concretos adoptados na sua investigação.”
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeÁgua das habitações públicas sem excesso de chumbo O Governo avaliou 50 dos novos edifícios de habitação pública e concluiu que os níveis de chumbo da água canalizada estão abaixo dos padrões da Organização Mundial de Saúde. Executivo diz ter mecanismo de resposta em caso de contaminações [dropcap style=’circle’]E[/dropcap]stá concluída a primeira fase de análise da água canalizada nos complexos de habitação pública de Macau. Os resultados, apresentados ontem pelo Governo em conferência de imprensa, revelam que os níveis de chumbo da água potável da rede pública ficaram abaixo das 10 microgramas por litro de água, valores seguidos por Macau com base na Organização Mundial de Saúde (OMS). As amostras recolhidas permitiram concluir que os níveis de chumbo se situam, precisamente, entre 1 a 3,5 microgramas por litro. Os dados foram obtidos com base em análises feitas a 50 edifícios de habitação pública mais recentes, tendo sido recolhidas 99 amostras. Destas 49 foram recolhidas pelo grupo de trabalho nas zonas das entradas dos prédios, enquanto que as restantes foram feitas em casas desocupadas. Os representantes de diversos organismos públicos garantiram que não há motivos para preocupação, depois de ter sido descoberto um caso de excesso de chumbo na água numa habitação pública de Hong Kong. Quanto às análises nas restantes casas do Governo, ainda não têm data para acontecer. “Primeiro vamos ter de tratar das habitações recentemente construídas e depois é que vamos analisar as suas amostras de água. Temos 12 blocos de habitação social mais antiga e em breve vamos começar a analisar a qualidade da água nessas casas”, explicou Alex Vong, presidente do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM). Victor Chan, porta-voz do Governo, não garantiu se escolas ou outros estabelecimentos públicos de uso da população também serão alvo de uma avaliação. “O nosso trabalho é de carácter preventivo, porque o Chefe do Executivo mostrou preocupação sobre a saúde da população.” O Executivo garantiu ainda que sentiu problemas de ordem logística (falta de tempo e recursos humanos) para a elaboração das análises à água, o que fez com que apenas as casas desocupadas tenham sido alvo de recolha de amostras. Governo a postos Apesar de terem garantido que não há razões para alarme, os responsáveis do Executivo frisaram que têm planos em caso de futuras contaminações da água potável. “As informações que temos é que o nível do chumbo na água responde aos padrões da OMS e temos medidas emergentes de resposta, com o abastecimento de água de forma provisória para os mais necessitados. Em breve poderemos definir os postos provisórios de água. As instruções estão a ser lançadas de forma experimental nas habitações públicas”, disse Susana Wong, directora dos Serviços para os Assuntos Marítimos e da Água (DSAMA). A nível hospitalar, Lei Chin Ion, director dos Serviços de Saúde (SS), explicou que “se isso acontecer iremos acompanhar o mais depressa possível o tratamento das pessoas mais necessitadas. Temos equipamentos e recursos humanos suficientes para esse tratamento e a sociedade não tem de ficar preocupada”. Sem lei Apesar do Governo já ter analisado a água em algumas habitações públicas, a verdade é que não há uma lei que garanta a fiscalização da água nos edifícios privados. Susana Wong, directora dos Serviços dos Assuntos Marítimos e da Água (DSAMA), revelou ontem existir essa necessidade. “O Governo tem de assegurar que a qualidade da água potável se mantém. Ainda não temos legislação sobre a fiscalização mas temos de começar a trabalhar já nesse sentido. Penso que isso vai demorar algum tempo e precisamos de consenso social.” Numa interpelação entregue ao Governo, a deputada Kwan Tsui Hang também chamou a atenção para esse problema. “Neste momento em Macau não há qualquer fiscalização, e a referida qualidade depende somente da manutenção da própria assembleia geral de condóminos e da empresa de gestão de propriedades”, escreveu a deputada da Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM). Perguntas pertinentes “Para os cidadãos terem confiança na água potável, as autoridades preparam-se para fazer análises por amostragem em sede de habitações públicas recentemente construídas, mas será que dispõem de um plano para uma avaliação sistemática dos riscos e uma análise por amostragem?”, questionou a deputada. “Como é que as autoridades vão avaliar e estimar os mais de mil prédios de Macau, para saber em quantos existe a devida limpeza e manutenção? Chegaram a ter em consideração legislar sobre a execução obrigatória, para assegurar a qualidade do abastecimento de água nos prédios privados?” Kwan Tsui Hang chama ainda a atenção para a existência de outros problemas. “Há muitos edifícios altos que têm falta de um mecanismo periódico de limpeza e manutenção, resultando em más condições do tanque da água, o que provoca preocupações quanto à sua qualidade.” Chui Sai On exige planos de contingência O Chefe do Executivo, segundo um comunicado, “determino que os serviços competentes não se podem desleixar com o assunto e devem ponderar e dar prioridade à saúde da população, colaborando e definindo planos de contingência para enfrentar eventuais situações que possam ocorrer relativas à qualidade da água”. Já Raimundo do Rosário, Secretário das Obras Públicas e Transportes, “garantiu o total empenho em assegurar um bom padrão de qualidade, segurança e abastecimento estável da água nos edifícios de habitação pública”. Destaque Os dados foram obtidos com base em análises feitas a 50 edifícios de habitação pública mais recentes, tendo sido recolhidas 99 amostras. Destas 49 foram recolhidas pelo grupo de trabalho nas zonas das entradas dos prédios, enquanto que as restantes foram feitas em casas desocupadas
Leonor Sá Machado SociedadeCPU | Vogais preferem réplicas a manutenção de fachadas A reunião de ontem do Conselho do Planeamento Urbanístico apresentou ontem 18 novos projectos, quase todos de fim não industrial. No entanto, houve quem se opusesse à decisão do IC de manter as fachadas originais: alguns vogais preferem a reconstrução dos prédios como réplicas [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]ntem foram apresentados 18 novos projectos durante a reunião do Conselho do Planeamento Urbanístico e alguns dos vogais presentes mostraram preferência pela reconstrução de edifícios antigos como réplicas dos originais ao invés de, tal como definido pelo Instituto Cultural, se manterem as fachadas como estão. Entre as preocupações estão os custos acrescidos de manutenção destas fachadas, que ficam a cargo dos proprietários dos edifícios. Sobre esta matéria, o IC comentou apenas que, ao abrigo da Lei de Salvaguarda do Património, o Governo poderá estar disponível para financiar parte dos custos da preservação. Dois dos projectos sobre os quais foram levantadas várias questões localizam-se na Rua dos Faitiões e na Avenida Almeida Ribeiro. De acordo com a Planta de Condições Urbanísticas (PCU), estes são de carácter não industrial e o primeiro, que tem actualmente 8,6 metros, poderá ir até aos 20,5 metros de altura. Já o número 135 da Almeida Ribeiro terá que ter a sua fachada preservada, abarcando parte do Beco do Senado. Foi durante a discussão destes projectos que alguns vogais se insurgiram contra a preservação das fachadas actuais, sugerindo que os edifícios fossem demolidos para serem reconstruídos como réplicas dos originais, de forma a que a sua manutenção fosse facilitada. No entanto o IC discorda desta opção, defendendo que é importante preservar aquilo que já lá está. “Emitimos um parecer para tentar respeitar os elementos originais, sugerindo ao proprietário a manutenção da fachada”, referiu um representante do IC, de acordo com a Rádio Macau. “Quando exigimos a manutenção da fachada, queremos é o estilo arquitectónico e ainda tentar utilizar o mesmo material para recompor esse mesmo estilo”, acrescentou o IC. Um hotel junto às casas Outro dos projectos apresentado localiza-se em Seac Pai Van e deverá compreender lotes de habitação e outro destino à construção de um hotel, ficando a área maior reservada para edifícios com apartamentos. Em declarações ao HM, o arquitecto Rui Leão disse apenas que a volumetria e altura apresentadas ontem vão ao encontro daquelas que já lá estão construídas. Durante a apresentação deste projecto, alguns dos vogais presentes mostraram-se preocupados com o facto da construção poder vir a toldar a passagem do metro ligeiro naquela zona. Em resposta, o Secretário para as Obras Públicas e Transportes, Raimundo do Rosário, assegurou os membros de que “está reservado espaço, pensamos que suficiente, para o metro ir até Coloane”, de acordo com a Rádio Macau. Hotel Estoril | Leung Hio Ming sem posição O presidente substituto do Instituto Cultural (IC) não quis pronunciar-se sobre a eventual manutenção da fachada do antigo Hotel Estoril, mostrando ainda ter dúvidas sobre se a decisão final fica mesmo a cabo do Conselho do Planeamento Urbanístico. As afirmações tiveram lugar durante a emissão do Programa Fórum Macau, do canal chinês da Rádio Macau. Por outro lado, a Chefe do Gabinete do Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Lai Ieng Kit, confirmou ontem, durante a emissão do mesmo programa, que o Governo ainda não tomou qualquer decisão definitiva sobre o destino a dar àquele local. A responsável apelou ainda à população para que fosse expressar as suas opiniões na hora e local para esse mesmo efeito, advertindo, no entanto, que esta seria uma matéria que dificilmente iria obter a concordância total da sociedade.
Amélia Vieira h | Artes, Letras e IdeiasOceano – Lua [dropcap style=’circle’]S[/dropcap]im, foi há quarenta e seis anos. Ainda a Terra pairava em rota de colisão com a sua Estrela, seguindo um ritmo muito próprio, quando alinhou com aquela massa cinzenta, vazia, sem som, como se de repente o Homem tivesse de novo descoberto a Roda avançando a passos gigantes para além de si. Entre a visão infantil do Peter Pan e aquela imagem em câmara lenta, a imaginação de uma criança desdobra-se em mil efeitos que não cessam jamais, dentro e fora dela. Presentes estavam as pessoas da «Viagem à Lua» de Georges Méliès quando os astronautas vagueavam na sua superfície. Lembro-me bem, da curiosidade e da vontade de lá ir, descolar, andar sem gravidade, muitas vezes me coloquei de forma a andar assim, porque quando somos crianças tudo é possível. Portanto, ontem, 20 de Julho, sinto-me sempre neófita. «Ir à Índia sem abandonar Portugal» Agostinho da Silva explica bem a correlação entre as coisas: ir à Lua sem abandonar a Terra, ainda é melhor! Findado que foi o ciclo das Águas, recomeça o ciclo do Ar. Ora, por mais que queiramos, há mais gases e ar que águas, oceanos. Estamos, sem que lhe demos a importância devida, no ciclo da Era Espacial. Não tenho preciso tudo o que senti naqueles instantes, mas ficou claro um imenso amor pelo Oceano-Galáctico. Aliás, não gosto de água, devo ser um raro organismo vivo juntamente com os gatos a ter tal reacção. A Água da Terra mete medo, é o resquício de um barro indistinto… uma manobra descongelada… chegados lá, já não temos guelras, mais fácil crescerem-nos asas. Em proporção ao espaço-tempo, levou tanto a sair da Terra como os Hebreus atravessarem o deserto; pois, era logo ali, claro, muito perto, mas libertar é tarefa dura e, na primeira parte do processo, estes aparelhos e marchas estão quase ao nível da Roda – mas é preciso ir. Quando a sonda chegou a Marte senti o mesmo frémito, olhei para o fundo de um oceano vazio, uma paisagem árida como quem olha para um deserto de libertação, ficamos encantados até com a escassez, a luz, a vibração outra… e, por instantes, há aquela dúvida, se não andamos em viagem, numa Diáspora que é preciso resolver. O Profeta Elias pode estar ainda algures no seu carro de fogo, numa dessas superfícies que o sol esqueceu, e a vida, tal como a entendemos, não contempla. ….”os homens amam a Terra por que esta lhes resiste”. Vir até aqui, à Terra, já não é destino, há moléculas que ficam presas às teias da quase invencível sobrevivência que vieram apenas registar e acabaram engolidas na engrenagem da reprodução dado que há sistemas sensíveis às fontes de calor…e eis, que nascemos pessoas, numa atmosfera hostil onde nada se mexe a não ser o movimento louco que faz da corrente de ar uma manobra difícil. Há um suborno à massa desfeita, que não é passível de ser acelerada, por outro lado, entre o Homem que somos e o que virá, o abismo cresce na proporção da recusa de um e da urgência de outro. Os «Velos de Ouro» estão agora além, além das águas dos Argonautas, Argos é Apolo. Todo o distintivo em provocar rupturas ficou aberto desde aquele dia, mas quase ninguém se lembra, dado que o asfalto é grandioso para quem se alimenta de húmus e na escala que evolui há um Olho Gigante que nos inquire da capacidade que cada um tem em suplantar a lei. Leis que não são eternas, apenas andaimes de uma estrutura tão requintada que nem damos conta, e tão implacável que só nas suas dobras se acorda. “Vi então um novo Céu e uma nova Terra pois que a primeira tinha desaparecido”- Apocalipse, um livro fortemente espacial, de grandezas várias e resultados insuspeitos. A Lua sempre estará vazia de curso nas instalações dos nossos mapas celestes, dado que não nos governa com a rotatividade das harmonias simples. Está ali, mas ninguém sabe bem para quê, não é uma sentinela de gestação, de fecundidade, de cortar cabelos (mais, cabeças?) tudo se produz num laboratório demasiado humano para ter o rasgo feiticeiro da sua luz… não nascemos lunares, os colos são frios, as barrigas até se alugam e quem dá curvas lindas são ainda os Matisses do Mundo. Quase não serve para nada a vitória da curva sobre a recta… giramos sem cessar mas sem projecto de Dança… Quando há Eclipses vai tudo espreitar, gostam de sobreposições, encavalgamentos, linhas rectas… mas, findo o instante, desatam a circular de forma desordenada. O Homem Fantasma! A Lua Lobisomem, perderam-se… eles também eram reais. As Lunações mais perfeitas, as casas a cheirar a lavado pela Lua-Nova, os acasalementos da Lua-Cheia, nada, nada disso a Lua faz, bem como a memória de a ela ter chegado se dissipou em mil verdades e mentiras, num desdobramento consoante ao «Homem que engoliu a Lua». E como ela esta vazia, temos muita fome de tudo, insaciáveis, somos os monstros que comem pedras. Pela noite ela ainda me vem visitar a pique no meu jardim secreto, e não vem redonda, dado que a espiral morreu, mas logo aqui, a faço Mãe e Irmã, dos meus sonhos mais fecundos. Lembro-me de ter lá estado, e nela ter vogado, numa atmosfera feliz.
Filipa Araújo Manchete SociedadeNovos Aterros | Arquitectos denunciam falhas do Plano Director O Plano Director dos Novos Aterros muitas questões tem levantado. Habitação, trânsito e a 4ª ligação são os assuntos mais quentes. A visão de arquitectos mostra que há alterações a fazer para que não sejam criados guetos habitacionais e um tráfego de pouca resolução [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]s erros começam logo no nome. “Isto não é um Plano Director, porque isso é um tipo de plano é um plano da cidade, do município, que, por sua vez, tem os planos de pormenor. Portanto o plano dos novos aterros é um plano de pormenor”, começa por clarificar a arquitecta Maria José de Freitas, sublinhando o facto do plano director prevalecer sempre sobre o plano de pormenor. “O que temos em causa neste momento é realmente um plano de pormenor e o que me parece é que, enquanto plano de pormenor, está a prever-se uma densidade populacional muito elevada, principalmente no aterros da Zona A”, apontou a mesma profissional. O Plano Director do Novos Aterros foi apresentado na sexta-feira passada, pela equipa de trabalho dos Serviços das Obras Públicas, aos deputados que apresentaram as suas questões e preocupações: trânsito e a 4ª ligação entre a península e a ilha foram os pontos mais mencionados. Acompanhando as consultas públicas e a evolução do documento sobre os aterros, Maria José de Freitas continua a defender que as previsões para habitação na zona A, são excessivas face “à localização geográfica, deste aterro da zona A” por se localizar na Areia Preta, zona que já “está densamente povoada”. “Não se quer criar ali um gueto. As pessoas que lá vão morar, não vão ser pessoas que na sua maioria ali vão trabalhar. Não estão ali industrias, nem sequer estão planeadas, que consigam captar 100 mil pessoas”, diz. O Governo aponta que naquela zona sejam construídos 32 mil fracções, das quais 28 mil direccionadas para habitação pública e cerca de quatro mil para habitação privada. “Feitas as contas, se nos 23 mil apartamentos contarmos com três pessoas por família dá o valor que o Governo apresenta, mas basta fazermos as contas a 4 pessoas por família passando para as 150 mil pessoas, o que muda o caso um pouco de feição”, adianta a arquitecta, sublinhando que é preciso ainda ter em conta as pessoas que vão trabalhar na zona do Cotai. “Em termos de administração central pensam criar uma zona onde vão localizar prioritariamente as pessoas que vão trabalhar nas zonas do Cotai. Estes trabalhadores vão ter ali a sua residência, então é preciso prever todo um sistema de infra-estruturas para transportar aquelas pessoas, quer para Macau, quer para a zona do Cotai”, argumenta. Maria José de Freitas sublinha a necessidade de existência de “equipamentos sociais, equipamentos da área cultura e social para alojar e dar cobertura a todas as situações que resultam dos agregados familiares que irão para aquela zona, que têm crianças, pessoas de idade, e necessidades da primeira ordem, coisas do dia a dia”. Um ponto ainda defendido pela arquitecta é uma rede viária saturada, sentida pelos moradores da zona dos NAPE depois da construção dos últimos prédios na Areia Preta. “Portanto, se viermos juntar a isto a quantidade de apartamentos que vão fazer na zona A estamos a sobrelotar uma zona que já está sobrelotada e que não tem possibilidade nenhuma de ser resolvida a curto prazo”, remata. No mesmo tom De opinião semelhante é Francisco Vizeu Pinheiro, também arquitecto, que se mostra completamente contra a criação de uma zona habitacional tal como está prevista. “Nos países desenvolvidos o Governo ajuda as pessoas a comprar a habitação que necessitam e não faz, aquilo que se faz nos países em desenvolvimento ou pobres, que é forçar as pessoas a viver em gaiolas como se fossem refugiados, que foi o que aconteceu em Hong Kong nas décadas 50 e 60”, defende. Algo que, segundo o arquitecto, só acontece quando o planeamento não bem feito. Na visão do arquitecto este plano geral “é uma espécie de remendo às necessidades de crescimento de Macau, com vistas a curto prazo”. Para Vizeu Pinheiro há três aspectos cruciais, sendo eles, habitação, trânsito e a qualidade de vida. Relativamente à habitação, aquela que segundo o profissional é a maior preocupação dos residentes, verifica-se que a tipologia das habitações “está apoiada em fogos com dois quartos”. Algo que poderá trazer problemas, visto que “não satisfazem as necessidades dos vários perfis e diferentes grupos familiares de Macau”, embora, diz, seja o ideal para os novos trabalhadores não residentes. O verdadeiro problema é o tipo de famílias, ou seja, “em muitas famílias de Macau, além dos filhos é preciso cuidar dos avós e muitos agregados têm empregadas domésticas, logo, a tipologia de dois quartos é nitidamente insuficiente”. O trânsito, um dos pontos mais contestados pelos deputados aquando a apresentação do plano, é também explicado por Vizeu Pinheiro. Não é preciso ser especialista para ver que as saídas da zona A vão aterrar em zonas “já saturadas”, trazendo problemas para quem por lá terá de passar. Ainda há muita coisa para ser explicada, conforme defende Maria José de Freitas, que defende a revisão do plano apresentado pelo Governo. “As informações não me parecem completas e acho que este plano tem de ser revisto. É preciso verificar bem a densidade populacional e até eventualmente fazer estudos ou admitir que seja por fases (…) Parece-me que está tudo num nível muito embrionário, provavelmente depois de ouvirem a população irão surgir novas situações”, remata a arquitecta. Para Vizeu Pinheiro a solução mais rápida, viável – mesmo em termos ecológicos – é “construir na Ilha da Montanha”. A consulta pública decorre até 28 de Agosto, tendo sido alargada por mais 20 dias, depois do Governo considerar que a extensão irá “permitir à população em geral ter mais tempo para continuar a manifestar as suas opiniões sobre a matéria”, justifica o comunicado. Túnel ou Ponte? A experiência trazida por anos de presença em Macau, faz com que Maria José de Freitas perceba que em tempos de más condições atmosféricas seja difícil haver uma ligação entre Macau e a Taipa, e por isso defenda que a 4ª ligação “deve ser prioritariamente em túnel”. A concordar consigo está Vizeu Pinheiro que acredita que o túnel é a melhor opção. Para além de considerar que o metro ligeiro deveria ser um metro com mais capacidade, o arquitecto defende que deve ser “fechada a ponte Nobre de Carvalho ao trânsito e transformá-la numa zona pedonal” e ter pontes a “ligar a zona do NAPE para os aterros que vão para o meio da Taipa e outra [ponte] mas perto a ligar a zona dos lagos, da Torre de Macau, a ligar à zona C”.
Rui Flores VozesQue sociedade é esta? [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]cartaz pode ser encontrado numa paragem de autocarro qualquer da cidade. Nele pode ler-se, em chinês tradicional, português e inglês: “Cumprimente verbalmente ou com gestos quando encontrar alguém conhecido” e “Agradeça quando lhe for prestada alguma atenção ou ajuda”. Duas frases em que a polémica está ausente e com as quais todos estaremos de acordo. Certo? O cartaz tem a chancela do Instituto de Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) do Governo da Região Administrativa Especial de Macau. É um cartaz, entre outros, de uma campanha de educação cívica, que inclui mensagens como pedir às pessoas que ensinem aos seus cães a fazer “as necessidades em casa no sítio certo”. Sublinho o “em casa”. A minha experiência profissional tem-me levado a países em que abundam este tipo de mensagens, de campanhas destinadas a contribuir para alterar comportamentos sociais, associados, normalmente, a riscos de saúde. Ao lado da destruição da guerra civil, em Bangui, na capital da Republica Centro-Africana, ainda é possível encontrar hoje em dia mensagens que exortam os cidadãos a praticar sexo seguro, usando sempre o preservativo, ou que apelam a que as pessoas durmam debaixo de um mosquiteiro, de forma a prevenirem a malária. Ou então mensagens de educação política; em que se deixa claro, a possíveis eleitores, que o voto é secreto e que não devem deixar “vender” o seu por uma qualquer saca de arroz. O problema com o “nosso” cartaz, que nos exorta a cumprimentar as pessoas que conhecemos, não é a mensagem que ele transmite, um comportamento social tido por adequado em várias culturas. Estes comportamentos são inculcados nas crianças, até à exaustão, desde bem pequenas quando lhes é dito, por exemplo, dá aqui um beijinho a esta senhora, prima, vizinha ou outra coisa qualquer. Cumprimenta. Sorri! O problema deste cartaz é tudo aquilo que ele engloba, o quadro mais vasto que não cabe no escaparate da paragem de autocarro. É tudo o que está à sua volta. “The big picture” diria um anglófono. O problema deste cartaz é que nos leva a pensar: que sociedade é esta, a de Macau, em 2015? Poderia ser a de Macau ou outra, porque noutras culturas e noutras latitudes talvez não seja assim tão diferente. Mas é, de facto, sobre Macau que estamos a falar. É aqui que está o cartaz e é esta sociedade que impele pessoal dirigente, com capacidade de decidir estratégias de educação cívica, a incluir na sua campanha, em que são usados outros meios como a rádio ou a internet, uma coisa tão simples quanto “cumprimente quem conhece”! Dito de outra forma, este cartaz interroga-nos: o que somos quando dizemos cumprimente quem conhece? A actual vida em sociedade tem levado a um cada vez maior distanciamento em relação ao contacto pessoal directo, físico, não intermediado por uma qualquer plataforma de comunicação. Embora comuniquemos cada vez mais, fazemo-lo à distância. Temos todos os “amigos” disponíveis na ponta de um clique ou de um “sent”, seja no Viber, no Messenger, no Wechat, no Whatsapp, o que se quiser. Mesmo aí não cumprimentamos o nosso interlocutor. Vamos logo directos ao assunto: já viste isto? Já leste isto? Fiz isto! Conseguimos cada vez mais estar a par de tudo o que se passa – há cada vez mais pessoas a aprenderem o que acontece no mundo pelo que os “amigos” colocam online, do que por estarem a ver a BBC, a CNN ou a Al-Jazeera, ou por irem aos seus websites. Este homo telecomunicantes não vive bem com o contacto pessoal, frente a frente. À mesa, com os amigos (sem aspas), enquanto engolimos o jantar, temos o nosso telefone à frente; em vez de falarmos, de partilharmos as últimas com aqueles que ali estão, estamos a comentar o novo corte de cabelo do A ou a ver o vídeo que se tornou viral de um homem que caiu na rua sem que ninguém o ajudasse a levantar. Em grupo, em vez de pedirmos a alguém para nos tirar uma fotografia, esticamos o braço, ajeitamos o cabelo, sorrimos, e cá vai selfie. É por isso que o aluno deixou de cumprimentar o professor na sala de aula. E o professor deixou de olhar para o aluno, usando o microfone para se fazer ouvir, de olhos postos no powerpoint que exibe no ecrã ou no chão. É só ir à aula e ver o que se passa. No escritório, deixámos de pedir ao nosso colega sentado na sala ao lado para nos fazer isto ou aquilo em pessoa. Enviamos-lhe uma mensagem electrónica e já não partilhamos com ele o que nos está a acontecer na nossa vida. E muitas das vezes não escrevemos por favor. Quando entramos no autocarro, ocupamos, primeiro, o lugar da coxia na esperança que ninguém se sente ao nosso lado, no lugar da janela. Assim, talvez não nos incomodem e sigamos a viagem toda sozinhos. Vamos a ouvir música no telefone, com os nossos auscultadores, e a jogar Candy Crush, para o qual já convidámos todos os nossos “amigos” no Facebook. Segundo um estudo recente sobre o uso dos diferentes media, passamos em média 11 horas por dia ligados a plataformas de comunicação, entre as quais a internet, telefone, rádio ou televisão. Outros tipos de estudos, ainda numa fase embrionária, mostram que, em termos de afecto e de satisfação, conseguimos tirar o mesmo tipo de prazer e de consolo destas relações intermediadas. É por isso que o cibersexo foi alcandorado a estratégia para combater o perigo de contágio de doenças sexualmente transmissíveis. Precisamos pois que nos lembrem que devemos cumprimentar quem conhecemos. Como os nossos pais nos haviam ensinado quando éramos pequenos, mas que entretanto esquecemos. Há um certo hedonismo exacerbado, notório na ostentação dos nossos pequenos prazeres – o novo telefone, o novo tablet, o novo carro, a nova mala Louis Vuitton – aos quais podemos aceder sem ter de cumprimentar o vizinho quando o encontramos. Vizinho? Conheço eu o meu vizinho? Sei o que faz, de onde veio, quantos filhos tem? Não sei. Nem sei se seria capaz de o reconhecer na rua; afinal, quando passo à sua porta de manhã, já tenho os olhos postos no ecrã do meu telefone. Somos uma sociedade asséptica, focada em nós próprios e nos nossos pequenos prazeres quotidianos. Tenho dúvidas que isto se “corrija” com cartazes e campanhas na rua. Parece-me que será preciso mais.
Joana Freitas PolíticaGoverno não explica bases para extradição de Wu Quanshen [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]s autoridades de Macau capturaram um fugitivo da China continental que estava na lista dos cem mais procurados por Pequim na lista da Interpol, mas entregaram-no ao continente apesar de não haver um acordo de extradição para tal. Segundo o jornal Ponto Final, Wu Quanshen estava em fuga desde 2012, depois de as autoridades o terem implicado num processo de corrupção. Foi membro do Partido Comunista Chinês e acabou por ser capturado numa operação conjunta das polícias de Macau e da China. O jornal, que cita o China Daily, adianta que Wu Quashen, de 59 anos, foi escoltado de volta à China. Contudo, Macau e a China continental não têm ainda um acordo de cooperação judiciária ao nível da extradição de prisioneiros em fuga, o que não permite a entrega destes. Ainda segundo o Ponto Final, há até duas decisões de tribunais de Macau que indicam expressamente que os prisioneiros não podem ser entregues à China. O HM quis saber com que bases as autoridades de Macau prenderam o homem e o entregaram, mas, numa resposta por email, o Gabinete da Secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, disse apenas que, para saber mais informação, teria de ser contactada a Secretaria para a Segurança. Tal não foi possível devido ao avançado da hora. Sónia Chan é quem tem mantido as negociações com Hong Kong sobre um acordo semelhante e é também quem anunciou que estava em marcha uma cooperação neste sentido com a China.
Joana Freitas PolíticaVeículos | Aumento de imposto também para autocarros dos casinos As medidas em análise pelo governo visam, segundo a DSAT, controlar o número de viaturas em circulação. Os veículos dos casinos também não devem escapar ao aumento de impostos [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]umentar o imposto sobre os veículos motorizados e eliminar a actual isenção de imposto para os autocarros gratuitos de empresas privadas são duas das medidas em análise na proposta de revisão do respectivo regulamento. “O imposto sobre os veículos motorizados pode ser aumentado e a isenção do imposto dos autocarros gratuitos dos casinos e hotéis pode vir a ser eliminada”, revela o Governo numa resposta ao deputado Chan Meng Kam. A revisão, dizem os Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT), está já concluída, ficando apenas alguns pormenores por decidir. Na resposta a uma interpelação do deputado, o director substituto da Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT), Chiang Ngoc Vai, defende que vai, através das medidas e técnicas económicas e do regime jurídico, controlar o aumento do número de veículos em circulação. É necessário, de acordo com Chiang, efectuar uma actualização das percentagens de cobrança de imposto, uma vez que este se encontra em vigor há mais de 20 anos. “A Direcção dos Serviços de Finanças (DSF) já concluiu a proposta da revisão do Regulamento do imposto sobre veículos motorizados, onde sugere ajustar o imposto em relação à compra, obtenção e utilização dos veículos, eliminando os de uso turístico fora do âmbito da isenção do imposto. Prevê-se que a proposta da revisão do Regulamento do imposto sobre veículos motorizados entre em processo legislativo no terceiro trimestre deste ano”, revelou a DSF. Questionário Numa interpelação escrita o deputado Chan Meng Kam, questionou se o Governo tem um planeamento para controlar o aumento de veículos em Macau, e se considera aumentar o imposto da importação e o limite de compras, assim como eliminar a medida de isenção de imposto de veículos das operadoras de Jogo e dos hotéis. Além disso, Chiang referiu que vários departamentos já levaram a cabo os trabalhos relativos à diminuição do período dos exames de veículos de dez para oito anos, acelerando a eliminação de veículos de alta poluição. Tais factores, se coordenados com a abertura do novo centro de exames no Cotai, em 2016, podem ajudar a implementar uma nova regra que exige a realização de exames de condução para carros e motociclos ligeiros e pesados.