David Chan Macau Visto de Hong KongCelebrar a morte [dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]sta semana a área da Educação tem estado ao rubro em Hong Kong. Um dos casos que mais deu que falar foi a morte do filho de Christine Choi Yuk-lin, Sub-Secretária da Educação. Poon Hong-yan, de 25 anos, atirou-se da janela do seu apartamento, localizado no condomínio Sorrento, Austin Road, e foi encontrado inconsciente num terraço do 9º andar do Bloco 3. Foi transportado imediatamente de ambulância para o hospital, onde o óbito acabou por ser declarado. Por enquanto, os motivos do incidente permanecem desconhecidos. Posteriormente surgiram papéis afixados no campus da Universidade de Pedagogia (EdUHK), onde se podia ler “Parabéns ao filho de Choi Yuk-lin por ter ido para Ocidente”. “Ir para Ocidente” significa ter morrido. É uma tradução literal do cantonês. Os estudantes congratulavam-se, portanto, com a morte do filho de Choi Yuk-lin. É habitual existirem nas Universidades de Hong Kong espaços onde estudantes e trabalhadores podem afixar o que bem entenderem, conhecidos como Paredes da Democracia. Quem põe um papel nesta parede tem de se identificar, quer seja estudante quer seja trabalhador. As Paredes da Democracia são um símbolo da liberdade de expressão dentro das Universidades. Como se pode ler no website “HKFP”, Choi é um dos vice-presidentes da Federação dos Trabalhadores da Educação de Hong Kong (HKFEW sigla em inglês). É também Reitora do campus de Siu Sai Wan da Escola Secundária Fukien. As duas organizações têm fortes ligações a Pequim. Em Setembro de 2016 Choi candidatou-se pelo sector da Educação a um lugar no Conselho Legislativo, que perdeu para o candidato pró-democracia Ip Kin-yueneve. Choi obteve menos 30% dos votos que o seu opositor. Mas, apesar disso, Choi foi indigitada com Sub-Secretária da Educação em Julho de 2017, pelo que foi muito criticada. Ip declarou na altura, “O resultado das eleições demonstrou que as suas opiniões políticas não são apoiadas pela maioria do sector da Educação.” A indigitação para o cargo de Sub-Secretária da Educação será “um insulto aos eleitores.” É muito provavelmente devido a estes antecedentes, que apareceram nas Paredes da Democracia da EdUHK os papelinhos de “felicitações”. Mas infelizmente este não foi o único ataque a Choi. O website “hongkongfp.com” escrevia no passado dia 8, “Também foram postadas mensagens online de ataque à família: “Sabia que o seu filho estava deprimido. Mas em vez de lhe dedicar o seu tempo, aceitou uma promoção que ainda a ocupou mais, e deixou-o ao cuidado de uma empregada. Que modelo de pedagogia! Se não sabe ser mãe, como é que pode encarregar-se da educação dos filhos dos outros? É uma vergonha, devia demitir-se,” escreveu um comentador numa discussão do fórum LIHKG.” A EdUHK emitiu um comunicado a condenar estes comentários e apresentou as suas desculpas pelo pesar que possam ter causado a Choi. Podia ler-se: “A escola gostaria de reafirmar que, embora desfrutemos do direito à liberdade de expressão, deveremos também assumir uma atitude razoável na discussão de certas situações, e respeitar sempre os sentimentos dos outros. No caso presente, os actos ofensivos são vergonhosos – esperamos que quem afixou os cartazes faça alguma auto-crítica.” Os responsáveis da EdUHK declararam que estão a visionar as imagens das câmaras de vigilância e que, se necessário, serão tomadas medidas disciplinares. A Associação de Estudantes da EdUHK emitiu um comunicado a negar a responsabilidade por esses actos e enviou representantes para retirar os papéis. A Universidade não deve, por causa destes acontecimentos, coartar a liberdade de expressão dos estudantes. “Ainda não foi confirmado se foi um estudante a colocar os papéis na Parede. De qualquer maneira, é evidente que se um estudante for punido pelas autoridades académicas, devido a declarações moralmente controversas, fica aberta a porta ao medo da liberdade de expressão e à auto-censura, e instala-se o terror no campus,” Se foi efectivamente um estudante que afixou os papéis, que castigo lhe será aplicado? Vão suspender-lhe a bolsa de estudos? Para já ninguém sabe. No entanto, a resposta de Universidade de Harvard a este tipo de casos poderá servir de modelo para situações futuras. Soube-se através do site “kknewscc” que Harvard vai recusar a admissão de, pelo menos, 10 candidatos, porque criaram um grupo de chat intitulado “Harvard memes para miúdas burguesas com tusa”. Este grupo permite que os seus membros postem fotos e mensagens sexual e racialmente discriminatórias. A este respeito a Universidade de Harvard declarou: “A Universidade reserva-se o direito de cancelar a admissão de um candidato se a sua conduta for desonesta, imatura ou imoral.” Todos sabemos que o desrespeito à moralidade é diferente do desrespeito à Lei, porque o primeiro não implica uma pena e o segundo sim; sobretudo, se se tratar de Lei Criminal. Os papelinhos de “felicitações” são obviamente desumanos. Representam uma falta de respeito à moral estabelecida, mas não implicam sanções legais. No entanto, podemos revoltarmo-nos e dizer alto e bom som “Não” a este comportamento desumano.
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesA marcha dos voluntários [dropcap style≠’circle’]R[/dropcap]ecentemente, o jornal China’s People’s Daily publicou uma notícia sobre a nova lei que rege as transmissões do hino nacional chinês, em vigor desde dia 1 deste mês. O jornal avança que a lei pretende assegurar que o hino só se faça ouvir em situações adequadas. A lei proíbe que o hino seja tocado em eventos privados, como funerais, ou que sirva de música de fundo em espaços públicos. Proíbe ainda que o hino seja associado a qualquer tipo de publicidade. Sempre que o hino seja transmitido todos os presentes deverão permanecer de pé em atitude “solene”. A lei também contempla o ensino e a divulgação do cântico. Fica estipulado que deve integrar o programa escolar do ensino primário e secundário. As pessoas são incentivadas a cantá-lo nas ocasiões próprias para “expressar o seu patriotismo”. No continente, os prevaricadores podem ser detidos até 15 dias. A violação a este regulamento pode colocar o faltoso sob a alçada de outras leis. Wu Zeng, director do gabinete jurídico do Comité Permanente do Congresso Nacional do Povo, declarou, “É uma regra básica que todos os cidadãos terão de respeitar e compreender. Todos têm de saber cantar o hino.” “A Marcha dos Voluntários” é o hino nacional da República Popular da China. O hino foi tocado em Hong Kong por ocasião da passagem de soberania da Grã-Bretanha para a China, em 1997 e, em Macau, quando Portugal devolveu a soberania do território em 1999. Em Hong Kong o hino foi adoptado ao abrigo do Anexo III da Lei Básica da cidade, com efeito a partir de 1 de Julho de 1997. Em Macau, também ao abrigo do Anexo III da Lei Básica local, com efeito a partir de 20 de Dezembro de 1999. Em termos da regulação do uso do hino, a lei de Macau é superior à de Hong Kong. A Lei nº 5 / 1999, que entrou em vigor a 1999-12-20, foca-se nesse aspecto. O Artigo 7 estipula que o hino deve sempre ser tocado de acordo com a pauta e, no Apêndice 4, proíbe-se qualquer alteração à letra. O Artigo 9 adianta que qualquer alteração intencional da letra ou da música representa uma violação à lei, e que o faltoso fica sujeito a uma pena de prisão até três anos ou a uma taxa diária ao longo de 360 dias. Embora na RAEM existam duas línguas oficiais, o chinês e o português, a letra do hino só está imprensa em chinês. Em Hong Kong não existe regulação sobre a transmissão do hino nacional. No entanto, durante certas cerimónias oficiais todas as escolas do governo são obrigadas a tocar e cantar o hino e a hastear a bandeira. É o caso do Dia Nacional da China (1 de Outubro) e do Dia Comemorativo do Estabelecimento da RAEHK (1 Julho). Nas Universidades, durante as cerimónias de graduação o hino é sempre ouvido. A implementação da Lei do Hino Nacional teve grande eco em Hong Kong. A este propósito pudemos ler no “South China Morning Post” no passado dia 30 de Agosto, “O noticiário de Pequim divulgava segunda-feira que o Comité Permanente do CNP vai propor em Outubro, durante a reunião bianual, que esta legislação seja inserida no Anexo III da Lei Básica.” De acordo com o princípio “um país, dois sistemas” a lei nacional chinesa só pode ser extensível à RAEHK se for inserida no Anexo III da Lei Básica de Hong Kong. Algumas leis chinesas foram inseridas no Anexo III, e entraram em vigor a 1 de Julho de 1997, data da transferência de soberania. Foi o caso da legislação referente à bandeira nacional, ao emblema nacional, ao exército chinês e às regulações dos privilégios consulares e imunidade. Se a “Lei do Hino Nacional” for incluída no Anexo III, Hong Kong passará a ter legislação nesta matéria. Funcionará exactamente como o “Regulamento de Hong Kong sobre a Bandeira e o Emblema Nacionais”. O propósito deste Regulamento é a aplicação em Hong Kong das Leis Chinesas referentes à Bandeira e ao Emblema Nacionais. “É obrigação e responsabilidade e do Governo da RAEHK a protecção da dignidade do hino nacional e, na verdade, de todos os cidadãos chineses,” declarou a Chefe do Executivo de Hong Kong, Carrie Lam, que não acredita que neste assunto haja qualquer margem para susceptilidades. Segundo alguns legisladores citados pelo South China Morning Post, a lei contém alguma linguagem pouco clara; por exemplo, o que é que constitui exactamente uma quebra de solenidade? A propósito o repórter, Wu Zeng colocou a seguinte questão, “É ilegal tocar a Marcha dos Voluntários no telemóvel?” A Chefe do Executivo respondeu que não sabia porque nunca tinha lidado com um caso semelhante. É necessário proteger a dignidade do hino nacional e, por isso, a Lei do Hino Nacional deve ser incluída no Anexo III das duas Leis Básicas. Mas, ao contrário de Macau, Hong Kong não tem legislação própria sobre a matéria. O Governo da RAEHK terá de lidar com as questões atrás mencionadas com clareza e com cautela. Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau Blog: https://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog Email: legalpublicationsreaders@yahoo.com.hk
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesHato, o devastador [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Tufão Hato, conhecido nas Filipinas como tempestade tropical Isang, atingiu recentemente o sul da China com grande violência. Chegou à costa quarta-feira 23 e, de repente, Macau e Hong Kong foram tomadas de assalto pela fúria dos ventos e por chuvas diluvianas. Até ao momento há a lamentar 10 mortos e mais de 200 feridos. O Tufão Hato foi a maior tempestade dos últimos 53 anos a atingir Macau. O impacto na cidade foi tremendo. Nas zonas inundadas as águas encapelavam-se, via-se andaimes caídos e todo o tipo de destruição. As ruas ficaram atapetadas de lixo. A passagem do Hato interrompeu o fornecimento de electricidade, água, rede telefónica, rádio e internet. Dia 23 estes serviços foram sendo interrompidos um a um. O corte de electricidade, rádio e internet impediu a divulgação imediata dos acontecimentos. A maioria dos habitantes deixou de poder estar a par do desenvolvimento da situação. Depois da passagem do Hato, houve quem tivesse comentado que a vida em Macau tinha recuado aos anos 70. Sem electricidade nem água, restaurantes e casinos tiveram de fechar. Ao longo dos passeios formavam-se filas enormes de pessoas com baldes na mão para recolherem alguma água potável. Só existe uma palavra para classificar tudo isto: terrível. O Chefe do Executivo, Fernando Chui Sai On, acompanhado de alguns secretários, deu uma conferência de imprensa no dia 24. Após a observação de um minuto de silêncio, o Chefe do Executivo declarou, “Durante estes dois dias, enfrentámos juntos um teste extremamente difícil. O Hato foi o tufão de maior intensidade dos últimos 53 anos e provocou danos tremendos em Macau.” “Admito que a forma como lidámos com este desastre teve algumas falhas. Estas respostas ainda precisam de ser melhoradas. Estou aqui em representação do Governo de Macau e, nessa qualidade, apresento as minhas desculpas aos residentes,”. De seguida comunicou a demissão do chefe dos Serviços de Meteorologia. Parece-nos que esta demissão merece alguma análise. Não há dúvida que o Hato foi o tufão mais forte dos últimos 53 anos, mas a sua intensidade não parece justificar por si só o estado deplorável em que ficou Macau. Há quem ache que o relatório sobre as condições climatéricas e o tufão não foi feito correcta nem atempadamente. Às 9.00h foi hasteado o sinal 8, e às 11.30 o sinal 10. Esta alteração deu-se apenas no espaço de duas horas e meia. É razoável que perguntemos. Será que o Hato sofreu alterações tão rápidas que era impossível aos serviços de meteorologia tê-las previsto? Em Hong Kong, às 5.20 já tinha sido hasteado o sinal 8 e já tinha sido avançado que mais tarde seria hasteado o sinal 10. É clara a diferença. E é natural que incomode algumas pessoas. O timing do alerta pode ter sido um problema, mas não foi o único. A interrupção do fornecimento de água e electricidade foi um dos mais graves, já que interfere com o dia a dia dos residentes. E já se sabe que quando as necessidades básicas são afectadas começam os burburinhos. A falta de água, por exemplo, proporciona o aparecimento de doenças infecciosas. É vital que o fornecimento de água e electricidade estejam sempre garantidos. Olhemos para Hong Kong, que sofreu os efeitos da mesma tempestade, e nunca deixou de ter água e electricidade. Parece ter chegado a altura de renovar algumas infra-estruturas em Macau. As questões estruturais são um problema, mas as questões funcionais também o são. Enquanto o Hato atacava Macau, o Facebook mostrou restaurantes a vender caixinhas com almoços a 100 patacas cada, hotéis a pedirem 10.000 patacas por noite, e algumas lojas a venderem garrafas de água a 50 patacas. Estes comportamentos fazem lembrar os assaltos a uma casa a arder. É usar o infortúnio alheio para fazer negócio. Felizmente também existem bons samaritanos que, de forma voluntária, têm limpado o lixo, ajudado a cuidar dos mais idosos, etc. Algumas empresas também têm ajudado a transportar água e outros bens de primeira necessidade de Hong Kong para Macau. Os voluntários mostram que têm bom coração, e as empresas que honram a sua responsabilidade social. São sinais positivos para Macau. A pedido do Chefe do Executivo, o Exército Popular de Libertação participou nas operações de limpeza e de desobstrução, a seguir à passagem do tufão. Na televisão vimo-los remover lixo sem máscaras e sem a ajuda de qualquer instrumento. Aliás, as emanações do lixo podem ter sido a causa do adoecimento de quatro soldados. A atitude destes soldados merece todo o nosso respeito e deveria receber também o reconhecimento do Governo. O rendimento per capita em Macau é 18.000 patacas, o mais elevado de toda a Ásia. A distribuição anual de 9.000 patacas por residente também causa inveja a muita gente. Também há quem se queixe por o valor do cartão de identidade em Macau ser superior ao de Hong Kong. No entanto, depois do Hato, muitos dos problemas de Macau vieram ao de cima. As infra-estruturas precisam de ser melhoradas com urgência. O comunicado do Governo a desincentivar as deslocações a Macau de 25 a 31 de Agosto pode pôr em causa o epíteto de “centro mundial de turismo e lazer”. Talvez esteja na altura de enfrentarmos todos os nossos problemas e de tentar resolvê-los. Escrevo este artigo antes de dia 27, altura em que está prevista a vinda de outro tufão. Espero sinceramente que todos fiquem a salvo e que não se venham a registar mais danos. Professor Associado do IPM Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
David Chan Macau Visto de Hong KongDeliberações online [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s jornais chineses anunciaram no passado dia 18 a criação de um Tribunal de Primeira Instância Online, que irá deliberar apenas sobre crimes e infracções relacionadas com a utilização da internet. O tribunal está sediado em Hang Zhou, China. Esta região concentra a grande maioria das disputas nesta área, já que a empresa Alibaba Group tem sede em Hang Zhou. A notícia não avança pormenores sobre o funcionamento do Tribunal, indica apenas que irá criar maior eficácia na adjudicação, mediação e na clarificação de leis, de casos, etc. Na verdade, a criação de um rastreamento legal das transacções online não é novidade. Já a 19 de Agosto de 2009 o Tribunal de Segunda Instância de Xangai tinha autorizado a possibilidade de serem feita adjudicações online. O site deste Tribunal também permite submeter documentos legais e pesquisar a legislação que regula as mediações via internet. No entanto a diferença entre um Tribunal dedicado em exclusivo a esta área e um site é significativa. De qualquer forma, o Tribunal Online, e os julgamentos realizados via internet, serão sem duvida uma novidade absoluta a nível mundial. Implicará uma combinação da alta tecnologia com os procedimentos legais. De futuro é normal de se adoptem novos procedimentos para os julgamentos online. Estas questões merecem algum desenvolvimento. Recentemente ouviu-se rumores sobre a existência de um julgamento na China realizado via Wechat. Mas é apenas um rumor, não existem provas que o sustentem. Agora voltemos ao Tribunal Online. Como já mencionámos, os julgamentos deste Tribunal são efectuados via internet, e vai ser o primeiro Tribunal chinês a ocupar-se em exclusivo de casos relacionados com transacções online. De acordo com as notícias, em caso de litígios nesta área é necessário recorrer ao Tribunal de Segunda Instância de Hang Zhou. O Tribunal Online não altera os termos originais do processo de recurso. No entanto, será preferível que venham a ser esclarecidas algumas questões relacionadas com este novo Tribunal. Por exemplo, se alguém fotocopiar um texto da autoria de outrem, o imprimir e o puser à venda na internet, mas também, na versão física, numa loja, será que vamos estar perante dois casos distintos, que devem ser apresentados a dois Tribunais? E isto porque o Tribunal Online se ocupa apenas de infracções cometidas online, desta forma, a venda do material na loja já não cairia sob a sua alçada. Mas, por razões de conveniência, poderão estas duas situações ser tratadas como um caso único, e ser entregues apenas a um Tribunal? Outra questão a analisar é a qualificação do juiz do Tribunal Online. Pela natureza dos casos que lhe são entregues, é natural que as provas apresentadas a este Tribunal sejam todas electrónicas. Daí que, o domínio que o juiz tenha desta área seja relevante. Mas qual será exactamente a formação académica exigida para o efeito? Seguindo o mesmo raciocínio, os advogados de defesa e de acusação também deverão ser “fluentes” em plataformas informáticas, sob o risco de não conseguirem lidar bem com este modelo, e assim, não poderem apresentar os seus casos convenientemente neste Tribunal. Por fim, apontarei outra questão que me parece importante. Sem poder olhar directamente os rostos e ouvir as vozes das testemunhas, poderá o juiz compreender da mesma forma se estão a falar verdade? Neste quadro, a mediação passará a ter um papel muito importante, porque independentemente das declarações falsas ou verdadeiras, o que vai valer para todos é o resultado final da mediação. Caso contrário, este resultado não pode ser implementado. Não há dúvida que a criação do Tribunal Online pode ter mérito em termos de eficácia e de eficiência. Vai poupar o tempo das deslocações às partes envolvidas e dispensar grande parte da logística dos julgamentos. Contudo, as questões relacionadas com a jurisdição deste Tribunal e com o domínio da área informática por parte do juiz e dos advogados devem ser levantadas. Devido às limitações deste processo, a mediação deverá prevalecer sobre a litigação nos julgamentos online. Para já, podemos afirmar que a criação de um Tribunal e de julgamentos online parece ser uma boa ideia, e que pode vir a ser uma nova tendência na área da justiça. No entanto deveremos estar atentos a algumas questões de ordem prática.
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesMulta ou prisão, eis a questão! [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o passado dia 9 ocorreu um acidente de viação perto de La Baie Du Noble. Um carro preto, conduzido por um indivíduo do sexo masculino, chocou com um táxi e acabou por capotar. Uma das portas do táxi foi arrancada. Felizmente os carros transportavam apenas os condutores, que saíram do acidente com ferimentos ligeiros. Posteriormente ambos os condutores foram submetidos ao teste de alcoolemia. Numa análise preliminar percebeu-se que o condutor do carro preto apresentava valores superiores ao normal. O condutor do táxi não apresentava sinais de ter ingerido álcool. Mais tarde veio a saber-se que o condutor do carro preto estava efectivamente embriagado. Este incidente foi divulgado pela imprensa de Macau e, ficou a saber-se, que o condutor do carro preto iria ser indiciado por “conduzir sob efeito de bebidas alcoólicas”. Acabaria por ser condenado a 100 dias de prisão, substituídos pelo pagamento de uma multa de 20.000 patacas. Ou seja, o transgressor pôde sair em liberdade pagando a multa. Ficou também com a carta apreendida durante um ano. O acidente teve lugar à luz do dia e foi testemunhado por muitas pessoas. Algumas tiraram fotografias e postaram-nas no Facebook. Este incidente desencadeou surpreendentemente uma quantidade de discussões. Um dos temas mais debatidos no Facebook foi a pena aplicada ao condutor. As pessoas em geral gostariam de tê-lo visto preso. Para analisar este assunto em pormenor, teremos de olhar para o Código Penal de Macau. O Artigo 279 (1) estabelece que, a condução sob efeito de bebida alcoólica, que ponha em risco terceiros ou bens alheios, implica uma pena de prisão até três anos ou uma pena pecuniária. Os Artigos 279 (2) e (3) estabelecem o montante da multa e o período de detenção consoante as circunstâncias. Por aqui podemos ver que o Artigo 279 deixa duas opções em aberto. O réu pode ser detido ou condenado ao pagamento de multa. Mas quem decide a opção a tomar, o juiz ou o réu? Para responder a esta pergunta temos de voltar à lei. Em primeiro lugar, a lei deve estabelecer de forma clara as circunstâncias que conduzem a uma penalização e as circunstâncias que conduzem à outra. Em segundo lugar, deverá ser inequívoca ao estabelecer sobre quem pesa a responsabilidade da decisão. Se a lei não for suficientemente clara nestes aspectos o juiz terá dificuldade em pronunciar-se adequadamente quando é chamado a decidir. O artigo 125 (1) do Código Penal de Macau, estabelece que a pena pecuniária não pode substituir a pena de prisão, salvo algumas excepções. Por aqui se depreende que o objectivo da nossa lei é impedir que os réus comprem a liberdade. Mas será que o réu pode escolher entre pagar a multa ou ir para a prisão? Mais uma vez a resposta depende da lei. Se esta lho permitir, uma vez cumpridos todos os requisitos, pode. Caso contrário terá de se sujeitar à decisão do Tribunal. O incidente que temos vindo a referir foi muito aparatoso e provocou muitos danos materiais e além disso envolveu um condutor alcoolizado. Foi uma situação grave, pelo que muita gente apelou à prisão do transgressor. No entanto, devemos salientar que, à parte os ligeiros ferimentos dos condutores, não houve mais danos pessoais. Só se pode pronunciar uma sentença de forma justa se todos os factores forem tomados em linha de conta. Se a lei permite que o transgressor pague uma multa em vez de ir para a prisão, teremos de aceitar. Se não concordarmos teremos de alterar a lei. Se este sentimento for maioritário, precisará de ser reportado ao Governo e, a partir daí, serem implementados os procedimentos que abrem caminho à criação de uma emenda à lei. Mas, mais uma vez, antes de abraçar essa opção, há que pesar todos os factores pois estão em jogo questões vitais e de justiça para todos. David Chan Professor Associado do IPM Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
David Chan Macau Visto de Hong KongFronteira fora de portas [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o passado dia 21 ficou a saber-se pelo site noticioso de Hong Kong “scmp”, que as autoridades continentais estão a preparar a instalação de um posto fronteiriço conjunto, dentro do terminal de comboios de alta velocidade de West Kowloon. A notícia vem levantar algumas questões de ordem jurídica devido à localização de um posto alfandegário chinês em território de Hong Kong. A linha ferroviária que liga West Kowloon, Hong Kong, com Shenzhen e Guangzhou, China, começou a ser construída em 2010. Os trabalhos deverão estar concluídos no próximo mês de Outubro. Este projecto vai trazer grandes melhorias ao nível das ligações entre as regiões para lá do Rio das Pérolas e as zonas em torno de Guangdong. As deslocações serão mais rápidas e mais facilitadas. A implementação deste projecto requer cooperação. Desde o início que, quer a China quer Hong Kong, pensaram localizar postos de controle fronteiriço conjuntos, serviços de imigração e quarentena na estação terminal de West Kowloon. O controle de fronteira, efectuado por funcionários chineses e por funcionários de Hong Kong permitirá aos passageiros residentes em Hong Kong concluir os procedimentos de saída e de entrada na China antes de apanharem o comboio, sem terem de passar pelo mesmo processo na chegada ao destino. Os passageiros continentais também poderão desembarcar em qualquer estação chinesa sem terem de passar por mais nenhum controle aduaneiro. Até aqui parece simples. Sem este posto de controle conjunto no terminal de West Kowloon, os passageiros teriam de ser submetidos ao mesmo processo na chegada à China, pelo que parece ser um procedimento que só traz vantagens. No entanto, para seguir este plano parte das instalações do terminal de West Kowloon terá de ser cedida aos serviços de fronteiras, de imigração e de quarentena da China continental. As leis e os regulamentos continentais vão poder ser aplicados em território de Hong Kong. A proposta desencadeou preocupações ao nível da segurança da legislação aduaneira entre a China e Hong Kong. Simplificando, este procedimento fará com que o cais da estação, bem como o interior das carruagens, fique sob a alçada da jurisdição da China continental. Os detractores desta ideia temem que os funcionários chineses possam vir a prender pessoas mesmo fora da estação. O Secretário da Justiça de Hong Kong, Rimsky Yuen Kwok-keung, prestou declarações sobre o assunto em Pequim, a 14 de Março último. “As responsabilidades legais dos passageiros não aumentarão, e o seu estatuto legal não será afectado de forma alguma.” “Foi este o espírito que orientou o projecto de localização de um posto de fronteira avançado, assegurando que esteja de acordo com a Lei Básica e que venha a ser conveniente e eficaz para os passageiros.” Esta terça-feira, 25, ficaremos a saber todos os pormenores do acordo. Para um residente de Hong Kong, é importante estar a par da forma como as leis da China continental podem vir a ser implementadas Hong Kong. No fundo é uma forma de ficar a saber como opera o princípio “Um país, dois sistemas”, tanto na China como em Hong Kong. Se Hong Kong permitir que os funcionários governamentais do continente apliquem a lei chinesa no terminal ferroviário, território de Hong Kong, estar-se-á a infringir o principio “um país, dois sistemas”. À luz da Lei Básica de Hong Kong, a cidade implementa a sua própria lei. O Artigo 18 da mesma lei, estipula que a lei chinesa só será aplicável em circunstâncias excepcionais. O acordo para a criação de um posto fronteiriço chinês dentro de terminal não cabe nessa excepção. Aparentemente uma forma de resolver o problema da aplicação da lei, é fazer passar uma nova resolução no Comité Permanente do Congresso Nacional Popular (SCNPC – sigla em inglês) que permita a aplicação da lei chinesa no posto fronteiriço do terminal e no comboio, enquanto este percorrer território de Hong Kong. Esta lei não irá regular apenas questões alfandegárias, terá de ter em consideração questões como operações de socorro a vítimas, em caso de acidente com algum comboio. Também se ficou a saber pelas notícias que os funcionários alfandegários chineses não têm autorização para pernoitar em Hong Kong enquanto estiverem de serviço. Não têm permissão para circular fora das áreas onde a lei da China continental é aplicável. Resumindo, de dia trabalham, à noite regressam a casa. Se esta ideia for para a frente, os funcionários alfandegários chineses vão ter uma vida difícil. Vão gastar imenso tempo nas viagens. Depois do trabalho, não podem sair da zona circunscrita e desfrutar de uma boa refeição, nem mesmo de uma bebida estimulante. Podemos desde já prever o quanto se vão aborrecer em Hong Kong. Seja como for, o comboio expresso vai ser bom para todas as Regiões Administrativas Especiais da China. Vai estabelecer mais ligação e promover o mútuo conhecimento entre a China e as suas RAEs. Se, futuramente, surgir outro posto fronteiriço avançado, a experiência de Hong Kong pode vir a ser útil.
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesDespedimento sumário [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o passado dia 14 o site “appledaily.com” publicou uma notícia sobre o despedimento súbito de oito funcionários de um jardim de infância em Mongkok, Hong Kong, após a cerimónia de entrega de diplomas. O director do infantário encontra-se entre os funcionários despedidos. A história conta-se em poucas palavras. A cerimónia foi realizada fora da escola. Quando o director e alguns educadores regressaram ao estabelecimento, o supervisor esperava-os acompanhado por seguranças. “Dêem-lhes 15 minutos para irem buscar as suas coisas. Os cheques com as indemnizações já estão passados. Estou de partida para o estrangeiro e quem não levar o cheque agora, vai ter de esperar três meses até que eu regresse a Hong Kong.” O despedimento sumário atingiu seis educadores, um funcionário administrativo e o próprio director. Dos onze funcionários ao serviço, a escola ficou reduzida a três. O supervisor convidou ex-funcionários a regressar à escola. O súbito despedimento perturbou imenso os atingidos. Alguns choravam convulsivamente. Os pais, acabados de saber do sucedido, voltaram rapidamente para o infantário. Educadores e crianças choravam abraçados. Aparentemente, por trás de tudo isto, esteve a má relação de trabalho entre o director e o supervisor. Os educadores despedidos afirmaram que eram pagos abaixo da média. Mas, nem mesmo assim, conseguiram garantir o posto de trabalho. Já eram mal pagos e ainda acabaram por ser despedidos. Na sequência dos acontecimentos a polícia foi chamada ao local. Mas por se tratar apenas de um conflito laboral os agentes nada puderam fazer. Em Hong Kong, o posto mais elevado dentro de qualquer escola é o de supervisor, o director está sob as suas ordens. A decisão do supervisor prevalece, portanto. O director estava ao serviço do infantário há 17 anos. Os educadores há dez, sete, cinco, três e um ano, respectivamente. Se os meus leitores estão recordados, há algumas semanas a esta parte falei sobre o Fundo Compensatório da Previdência, que se destina a indemnizar trabalhadores que ficam desempregados após trabalho de longa duração. Os trabalhadores com mais de cinco anos de casa podem habilitar-se a este Fundo. A desactualização da lei do trabalho de Hong Kong, que ainda se rege pelas condições socio-económicas e laborais dos anos 70, é um dos problemas que estas pessoas têm de enfrentar. Se se lembrarem desse período, sabem que na década de 70 não se vivia desafogadamente em Hong Kong e que a cidade não estava desenvolvida. As empresas em geral não tinham grande capacidade económica e, por isso, a os benefícios garantidos por lei aos trabalhadores eram escassos. Nestes contratos tudo se resume ao dinheiro. Se a entidade patronal estiver disposta a pagar ao empregado o valor da indemnização previsto, não terá qualquer dificuldade em despedi-lo, pondo desta forma um ponto final nas suas obrigações para com ele. Foi o que se passou na situação que temos vindo a relatar. O supervisor paga o que tem a pagar e vê-se livre dos oito empregados. Neste caso o que choca mais é a desumanidade do processo. Em primeiro lugar, os funcionários foram despedidos no dia da cerimónia de entrega dos diplomas. Era um dia feliz que se transformou num dia de lágrimas e infelicidade. Entretanto, o caso foi comunicado à polícia e à comunicação social. A história passou a ser do domínio público e, como tal, é possível que venham a ter dificuldade em contratar novos funcionários. Em segundo lugar, as crianças serão necessariamente afectadas e irá gerar-se um sentimento de insegurança. Esta insegurança vai alastrar-se aos pais e a outros educadores que venham a trabalhar no infantário e põe em risco os laços afectivos que se têm de estabelecer entre os educadores, as crianças e os pais. Em última análise os pais podem perder a vontade de deixar as crianças nesta escola. Desconhecem-se os motivos do mau relacionamento entre o supervisor e estes educadores. Mas, no que à educação diz respeito, a principal preocupação deverá ser o interesse das crianças. Estes meninos têm idades compreendidas entre os 2 e os 6 anos. Neste período das suas vidas, o afecto que recebem dos educadores é talvez mais importante do que os conhecimentos que estes lhes transmitem. Se os professores desaparecerem sem mais nem menos no final de cada ano, este estabelecimento acabará por vir a ter problemas, e as crianças não se vão sentir bem. É uma situação em que todos ficam a perder. A Lei Laboral de Macau é bem melhor do que a de Hong Kong, porque na altura em que foi elaborada já Macau era próspero. Os empregados têm direito a mais benefícios. Basta lembrarmo-nos que a lei de Macau impõe uma pausa no final de cada cinco horas de trabalho, pagamento de horas extraordinárias quando o horário excede o estipulado, etc. Talvez Hong Kong deva rever a sua Lei Laboral de forma a dar mais protecção a quem trabalha. No mínimo deve evitar que casos como o que acabámos de descrever se repitam.
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesCasas sem tecto [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] jornal “Exmoo” de Macau publicou recentemente um estudo onde se demonstrava que 60% dos jovens não têm intenção de comprar casa própria. O valor médio das casas ronda actualmente os 2 milhões e 125 mil patacas. Estima-se que para obter essa quantia os jovens precisem de cerca de sete anos de poupanças. Esta estimativa é feita a partir de um salário de 19.000 patacas mensais, que permitiria uma poupança de 9.500 patacas/mês (metade do salário), logo o valor da casa só poderia ser conseguido num período de sete anos. O estudo também apontava as dificuldades decorrentes de não se possuir casa. O ditado “sem casa, não há casamento” é muito antigo. No entanto, há quem rejeite esta ideia, afirmando que, se fosse verdade, só os ricos se casavam. Mas independentemente da opinião de cada um, a questão da habitação é um dos problemas sociais mais prementes de Macau. É inegável que o elevado custo das casas provoca inúmeros problemas sociais, como por exemplo o casamento tardio. O casamento tardio provoca a paternidade tardia. Se uma mulher planear ser mãe aos 35 anos, ou mais, estará a entrar num período menos fértil e a enfrentar uma gravidez de maior risco. Os problemas para a saúde da mãe e do bebé aumentam. Mas para além desta questão, temos a considerar os problemas financeiros decorrentes do elevado custo das casas. O estudo demonstra que em média as pessoas levam 17 anos a pagar a sua habitação, consumindo nesta despesa metade do seu ordenado. É evidente que se mais de 40% do rendimento familiar for gasto com os pagamentos da casa, a sua qualidade de vida será seriamente afectada. A casa passa a ser um fardo e não uma fonte de prazer. E é preciso não esquecer, que estes cálculos não incluem os juros cobrados pelo Banco. É muito fácil encontrar pessoas que levam 20 a 30 anos a pagar as prestações das suas casas. Nestes casos passam praticamente a vida inteira a despender metade dos seus rendimentos só com as despesas de habitação. Mas, mesmo depois do pagamento ter sido efectuado na íntegra, a história não chega ao fim. Se o casal tiver tido apenas um filho, depois da morte de ambos, o filho herdará a casa. Terá, portanto, a felicidade de não ter de vir a passar pelo que os pais tiveram. Mas se a família tiver mais do que um filho, aqueles que não herdarem a casa vão conhecer o mesmo calvário. O problema da habitação vai transitar para a geração seguinte. Devido à premência desta questão, o estudo sugere ao Governo algumas soluções. É preciso implementar um sistema para “facilitar a compra”. Quando o Governo decide vender um terreno, o contrato celebrado com a construtora deverá prever uma percentagem de fogos para jovens que vão comprar casa pela primeira vez. Se estas casas forem vendidas posteriormente, a venda só poderá ser feita a naturais de Macau. Obviamente que é uma boa medida porque permite que mais residentes, sobretudo jovens, possam ter casa própria. Se acreditarmos que a família é a base da sociedade é bom que façamos o possível para protegê-la. As medidas para “facilitar a compra” garantem um certo número de casas aos naturais de Macau. Mas se os preços continuarem elevados, o problema não se resolve. Disponibiliza-se a propriedade, mas não o dinheiro. Será bom que o Governo crie outras medidas para ajudar os jovens. O sistema da “Habitação Económica” é o melhor para a juventude. Este sistema permitia que o Governo vendesse casas a baixo preço. Ser-se natural de Macau era a primeira condição para a compra. A segunda condição implicava que se tratasse de uma primeira compra de casa. A terceira estabelecia o impedimento de venda durante um período de 16 anos. É uma pena que, depois de 2013, nunca mais se tenham vendido casas ao abrigo deste sistema. O estatuto que regula os rendimentos do Governo de Macau é diferente do que regula os rendimentos do Governo de Hong Kong. O segundo depende em grande parte dos lucros da venda de terrenos, ao passo que o primeiro depende sobretudo dos lucros da indústria do jogo. Assim, no caso de Hong Kong, se os preços dos terrenos baixarem, os lucros do Governo vão por igual caminho. Como em Hong Kong a margem que o Governo tem para lançar novos impostos é apertada é improvável que surjam novas taxas que contrabalancem as perdas provocadas pela eventual baixa do preço dos terrenos. Assim sendo. o custo das casas na cidade não deverá diminuir nos tempos mais próximos. No entanto, a situação em Macau é diferente. O facto de não ter na transacção de terrenos a sua principal fonte de rendimento dá ao Governo de Macau mais liberdade para fixar um preço para a venda de propriedades. O Governo de Macau tem, portanto, mais flexibilidade para criar um tecto para a venda de casas. O elevado preço da habitação em Macau é um problema que tem de começar a ser solucionado o mais breve possível. Se os jovens não tiverem casa própria, o sentimento de pertença a Macau diminui. Para além disso, sem controle dos preços, os proprietários de casas e terrenos enriquecem cada vez mais, provocando um fosso crescente entre pobres e ricos. E, obviamente, isso será péssimo para a sociedade em geral. A lei tem mecanismos que permitem a compra de casas ao abrigo do sistema da Habitação Económica e esta é uma das melhores ferramentas para resolver o problema habitacional em Macau. Não é só através de decretos que estas questões se solucionam.
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesA Torre do Inferno [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o dia 14 deste mês, o website da BBC divulgava uma notícia sobre um incêndio que tinha acabado de deflagrar em Londres. A Torre Grenfell, situada no Norte de Kensington, estava a arder. No dia 19, um porta voz do Governo veio comunicar que se presumia que o número de vítimas mortais ascendesse a 79, 74 das quais estavam desaparecidas, estando 5 cadáveres já identificados. Este incêndio já é considerado o mais grave de sempre no Reino Unido desde que há registos conhecidos, ou seja, desde o início do séc. XX. A Torre Grenfell foi renovada em 2016. Foram instaladas novas janelas e foi colocado um revestimento de alumínio sobre as placas de isolamento térmico que, supostamente, se destinava a embelezar o edifício. Os peritos afirmaram que este revestimento pode ter estado na origem da propagação muito rápida do incêndio. O espaço que existia entre o revestimento e as placas de isolamento criou uma espécie de chaminé por onde o fogo alastrou. A cobertura ardeu e derreteu, o que prova que era feita de material inflamável. No dia 23, a Superintendente Fiona McCormack comunicou que a polícia tinha provas de que o incêndio não tinha origem criminosa e que teria começado com a combustão de um frigorífico, modelo Hotpoint FF175BP. McCormack acrescentou que, “As amostras do revestimento recolhidas para análise chumbaram em todos os testes de segurança.” A investigação prossegue para a apurar responsabilidades pelos crimes de homicídio por quebra de normas de segurança. Por enquanto ainda é cedo para apontar culpados. No entanto, se se vier a provar de forma inequívoca que o revestimento de alumínio esteve na origem da propagação incontrolável do incêndio, os seus fabricantes virão a ser acusados. Será também acusado de cumplicidade quem contratou esta empresa e decidiu revestir o edifício com o referido material. É sabido que essa responsabilidade pende sobre a construtora. Neste caso poderá a construtora ser acusada de homicídio? À luz da lei do Reino Unido, a resposta é “sim”. No Reino Unido, e não só, um homicídio pode ser considerado voluntário ou involuntário. Considera-se homicídio involuntário quando as mortes são provocadas por irresponsabilidade ou negligência. Neste caso é muito provável que se estabeleça uma acusação de homicídio involuntário, devido à utilização de materiais altamente inflamáveis para o revestimento do edifício. Segundo a lei inglesa, o responsável directo e o indirecto respondem pela mesma acusação. Ou seja, quer o fabricante quer o construtor estão sujeitos à mesma pena. O responsável da construtora estará pessoalmente sujeito a acusação idêntica. A figura jurídica que suporta esta acusação é designada por “desconsideração da personalidade jurídica empresarial” e permite responsabilizar as pessoas que estão por trás da empresa e, desta forma, obrigá-las a cumprir a lei. Se uma empresa for acusada de um crime, mas os seus responsáveis não forem, a punição não fará sentido porque a empresa não é uma pessoa real; responsabilizar as pessoas que a dirigem é a única forma de prevenir o crime. Esta tragédia é um aviso claro para Macau e para Hong Kong quanto ao perigo do uso dos revestimentos de alumínio em edifícios. Ninguém quer assistir a casos idênticos. A prevenção é sempre o melhor remédio. É necessário tomar medidas imediatas para garantir que este material não venha a ser usado. Macau é uma cidade pequena. Se uma situação destas aqui viesse a ocorrer, é fácil imaginar as consequências que teria. Sabe-se que no edifício Wing On em Hong Kong foram usados estes materiais. Será bom que o seu proprietário e quem o administra tomem medidas para evitar uma tragédia. No entanto, parece que ainda não é chegada a altura de legislar sobre a utilização de revestimentos de alumínio na construção. Teremos de escutar as opiniões dos peritos em segurança, das construtoras e do público em geral antes de ser tomada a decisão final. Professor Associado do IPM Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau Blog:https://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog E mail:legalpublicationsreaders@yahoo.com.hk
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesMás práticas públicas [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o passado dia 14, o South China Morning Post de Hong Kong fez notícia das declarações de Adam Kwok Kai-fai, filho do magnata Thomas Kwok Ping-kwong. Thomas Kwok, proprietário do império Hong Kong Sun Hung Kai Properties, viu recentemente o seu recurso recusado pelo Tribunal e terá de cumprir os cinco anos de prisão a que foi condenado. O filho Adam prestou declarações à saída do Tribunal, afirmando que o pai não é corrupto nem é culpado das acusações de instigação a más prácticas em exercício de cargo público e insistiu que só é culpado de falta de cuidado e de ingenuidade. Thomas Kwok foi preso em 2014, acusado de conspiração e de indução a más prácticas no exercício de cargo público. Foram também sentenciados por cumplicidade Rafael Hui Si-yan, antigo nº 2 de Hong Kong, Thomas Chan Kui-yuen, ex-colaborador de Sun Hung Kai, e Francis Hung-sang, corretor da bolsa. O Tribunal de Recurso recusou os quatro apelos. O magnata, ex-co-Presidente da Sun Hung Kai, ofereceu a Rafael Hui, através dos outros dois réus, 8,5 milhões de HK dólares, pouco antes deste ter assumido funções como Secretário Chefe, em 2005. Os advogados de acusação viram nesta entrega de dinheiro uma forma de Thomas Kwok comprar favorecimentos para os seus negócios a um alto representante do Governo. No entanto, o advogado de defesa argumentou que Rafael Hui nunca favoreceu a Sun Hung Kai Properties, apesar de ter aceitado o dinheiro. Adam Kwok avançou ainda que respeita o Tribunal, mas que acredita que o júri falhou por apenas ter tido em conta as provas da entrega de dinheiro e não ter considerado o facto de posteriormente não ter havido qualquer acto que indicasse corrupção. “Dissemos-lhe que declarasse o dinheiro, mas quando soubemos que não o fez ficámos sem palavras.” Agora, vejamos o que se passou no Tribunal. Os réus foram julgados à luz da lei que condena as más práticas no exercício de cargo público e o suborno. O objectivo dos actos de corrupção é a criação de influência imprópria ou a garantia de posições vantajosas. Existe um vasto leque de actos e omissões que a lei considera indicadores destas más práticas. A essência deste tipo de crime é o abuso da confiança do público. Hui era Secretário Chefe do Governo de Hong Kong. Fazendo parte do Conselho do Executivo, tinha acesso a informação confidencial sobre matérias nas quais a Sun Hung Kai tinha interesses substanciais. Na posição de membro do Governo estava sujeito às normas de conduta e de regulação de conflito de interesses. Enquanto Secretário Chefe, Hui recebeu 8,5 milhões de HK dólares para pagamento de favorecimento. Este negócio é claramente corrupto. Almejava obter a preferência de Hui em relação aos negócios das outras partes envolvidas. Este tipo de actuação está em clara contradição com os deveres de Secretário Chefe e significa um abuso grave das prerrogativas do cargo e da confiança do público. O facto de o pagamento ter sido feito imediatamente antes de Hui ter assumido o cargo não quer dizer que os actos de abuso tenham sido cometidos nessa altura. O pagamento foi feito para vir a assegurar um favorecimento continuado dos empreendimentos Sun Hung Kai após a tomada de posse. O “pacto de sangue” estabelecido com este pagamento é o suficiente para estabelecer a existência de crime de más prácticas no exercício de cargo público. Os recursos foram por isso indeferidos. Este caso demonstra claramente uma situação de crime de más práticas no exercício de cargo público cometido por um alto funcionário governamental e os seus cúmplices. Não foi necessário ter havido uma acção de favorecimento comprovada, bastou ter-se estabelecido o elo de comprometimento para se provar o crime. Aqui a questão relevante foi o abuso da confiança do público. A questão do abuso da confiança do público é vital. Este critério pode ser aplicado a todos as acções desenvolvidas pelos servidores do Estado, independentemente dos benefícios que tenham atribuído a outrem. Em alguns casos, os favorecimentos são muito difíceis de provar. Se a lei mencionar “favorecimento efectivo”, a saber, a presença de dinheiro terá de ser provada para que exista crime, e negligenciar as atitudes de favorecimento, pode ser criada uma “falha de segurança”. Se os servidores do Estado puderem receber dinheiro em troca de favores, é fácil imaginar o que virá a acontecer à nossa sociedade. Este caso veio provar que o suborno de servidores do Estado é um crime grave e que todas as partes envolvidas serão castigadas. Na altura em que este artigo foi escrito, ficou a saber-se que os réus terão de suportar as custas do processo de recurso, que deverão montar aos 4 milhões de HK dólares.
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesReforma Imperial [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] notícia da abdicação do Imperador japonês Akihito fez sensação esta semana. A 19 de Maio o Governo preparou um decreto lei excepcional, aprovado pelo congresso no dia 8 deste mês, que permite que o Imperador Akihito abdique. O Governo tem agora em mãos os preparativos para a sucessão do Príncipe Naruhito. A resignação do Imperador ocorrerá oficialmente entre 31 de Dezembro de 2018 e 1 de Janeiro de 2019. Actualmente, a monarquia japonesa é a única a deter o título Imperial. A Casa Imperial do Japão é a mais longa monarquia em funções no mundo. No Japão, o nome de baptismo do Imperador nunca pode ser mencionado, podendo apenas ser representado como “Sua Majestade o Imperador”, ou apenas por “Sua Majestade”. Nos textos escritos o Imperador é por vezes designado por “Imperador Reinante”. O reinado de Akihito foi apelidado de “Heisei” e, em conformidade com a tradição, depois da sua morte receberá o nome de “Imperador Heisei”. Nessa altura será decidido o nome do próximo reinado. O Imperador Akihito nasceu a 23 de Dezembro de 1933 e foi o 125º Imperador da sua Dinastia. Akihito sucedeu ao seu pai, o Imperador Hirohito, e ascendeu ao Trono do Crisântemo a 7 de Janeiro de 1989. Depois de resignar, Akihito receberá o título de Imperador Retirado. O Imperador Akihito abdicou por razões de saúde. O monarca já foi submetido a uma cirurgia ao coração e, em 2003, recebeu tratamento a um cancro na próstata. O anúncio da intenção de resignar e de entregar o trono ao filho, o Príncipe Naruhito, foi feito a 13 de Julho do ano passado, pelo canal de televisão nacional NHK. O último monarca japonês a abdicar tinha sido o Imperador Kōkaku, em 1817. Os porta-vozes da Casa Imperial negaram que tenha havido qualquer plano que levasse a esta decisão do Imperador. A abdicação do Imperador não está prevista no corpo legislativo que regula a Casa Imperial e, como tal, requer a criação especial uma emenda à lei. A 8 de Agosto de 2016 o Imperador fez uma das suas raras aparições na televisão, para comunicar a debilidade do seu estado de saúde; este comunicado foi interpretado como uma forma de dar a entender a sua intenção de vir a abdicar em breve. Segundo fontes governamentais, para evitar modificar a lei que regula a Casa Imperial, foi criada uma lei de excepção para permitir a resignação. O Imperador do Japão não é responsável pela governação do país. O artigo 65 da Constituição atribui explicitamente o poder ao Executivo governamental, liderado pelo primeiro-ministro. O Imperador também não é o Comandante Supremo das Forças Armadas, esse papel está atribuído ao primeiro-ministro, através do Acto 1954. Os poderes imperiais são limitados pela Constituição japonesa. O artigo 4 estipula que o Imperador só desempenhará funções dentro do quadro da Constituição e que não terá poderes de governação. No entanto, o artigo 3 prevê que as decisões do Governo terão de ser aprovadas pelo Imperador. Os outros deveres do Imperador estão descritos no artigo 7 da Constituição. Mediante conselho e aprovação do Governo, o Imperador desempenhará funções de Estado a bem do povo, particularmente no que respeita a, promulgações, emendas à Constituição, leis, decisões do Governo e Tratados. É possivelmente por causa dos poderes de promulgar leis e emendas à lei, que teve de ser criada uma regulamentação excepcional para sancionar a abdicação. É sabido que no passado o Imperador detinha um enorme poder. A palavra do Imperador ditava a lei. Não se admitia qualquer tipo de contestação. Tinha o poder de declarar guerra sempre que quisesse. Com o avançar dos tempos estas prerrogativas foram sendo alteradas e hoje em dia o Imperador desfruta de funções e de poderes muito mais limitados. O Imperador abdicou legalmente por via da lei excepcional. Podemos considerar fenomenal o momento em que as acções de um Imperador necessitam da caução da lei. Os princípios do Estado de Direito são, não só, aplicados ao cidadão comum, mas também ao Imperador. A lei é aplicada a todos sem excepção. A lei dá-nos as balizas dos nossos comportamentos. Se o Imperador é o primeiro a obedecer à lei, não existem motivos para que o cidadão comum não lhe siga o exemplo. Daqui decorre que todos passam a respeitar a lei. Quando este caso se verifica, o Estado de Direito está definitivamente implantado. Os privilégios perante a lei deixam de existir. O Direito aplica-se a todos por igual. Professor Associado do IPM Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesTerrorismo informático [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o dia 13 de Maio, o website “www.news.com.au” publicou uma notícia sobre um ataque informático global, desencadeado a partir do Reino Unido. Segundo a “Wikipedia” podemos definir ataque informático, ou ciber ataque, da seguinte forma: “Considera-se ciber ataque qualquer tipo de manobra ofensiva efectuada por Nações/Estados, indivíduos, grupos, ou organizações que vise atingir os sistemas de informação de computadores, infra-estruturas, redes informáticas e/ou computadores pessoais, mediante actos maliciosos praticados normalmente de forma anónima, que se destinam a roubar, alterar, ou destruir alvos específicos após descodificação de sistemas vulneráveis.” “Os ataques deste tipo podem ir da simples instalação de spywares em PCs até à tentativa de destruição das infra-estruturas de uma Nação.” No dia 20 podia ler-se no “telegraph.co.uk” que, na Grã-Bretanha, pelo menos 16 serviços de saúde (incluindo hospitais) tinham sido atingidos na semana anterior pelo ataque “aleatório” de um vírus conhecido como Wanna Decryptor. O pessoal teve de voltar a usar papel e canetas ou recorrer aos seus próprios telemóveis, depois deste ataque ter afectado sistemas chave, incluindo os telefones dos serviços. Vários hospitais ingleses viram-se forçados a recusar doentes e a adiar consultas e cirurgias. O ataque impedia o acesso aos dados dos computadores e os hackers exigiam pagamentos entre 300 a 600 dólares para reactivarem os sistemas. Nas áreas afectadas as pessoas foram aconselhadas a deslocar-se aos centros de saúde só em casos de urgência. Foram infectados mais de 300.000 computadores em 150 países. O vírus Wanna Decryptor, é também conhecido como WannaCry, WanaCrypt0r 2.0 e WCry. Muitas vezes é enviado através de emails. Quando o destinatário abre o anexo o vírus é descarregado. Esta técnica tem o nome de phishing. Assim que o computador é infectado, os ficheiros são encriptados e passa a ser impossível utilizá-los. É nesta altura que entra a chantagem. Para voltar a aceder é preciso pagar. Este deve ter sido o maior ataque do género de que há memória. Os hospitais não conseguiam funcionar, as operações e as consultas tiveram de ser adiadas até o problema estar resolvido. Todas as tarefas dependentes da utilização de computadores foram interrompidas. Os ataques informáticos são assustadores porque podem atingir o mundo inteiro, não conhecem fronteiras. Qualquer um pode ser atingido. desde que tenha um PC ou um smart phone ligado à internet. O WannaCry introduz-se no computador, modifica os programas e bloqueia a informação armazenada. A seguir, os hackers pedem dinheiro para “desbloquear” a informação. É um exemplo típico de crime informático. A actual legislação sobre crimes informáticos está apenas pensada para os “pequenos ataques” e não para os “grandes ataques”. Talvez seja chegada a hora de os legisladores virem a impor penas pesadas aos responsáveis por ataques informáticos de grandes dimensões, de forma a evitar que estes se repitam no futuro. Como os ataques informáticos podem sempre acontecer, é preciso encontrar respostas para o problema. Os peritos aconselham a fazer actualizações do sistema operativo, porque cada actualização pretende solucionar os defeitos da anterior. Quanto mais vezes for submetido a actualizações mais perfeito fica o programa. Outra ferramenta importante é a utilização registada. Hoje em dia, em Hong Kong e em Macau podemos comprar cartões sim a qualquer operadora e usá-los para estabelecer uma ligação dos dispositivos móveis à net, sem necessidade de qualquer registo. Mas, na China, o registo é obrigatório. Se todos os utilizadores da internet tiverem o seu nome registado junto das autoridades competentes, sempre que haja uma suspeita a polícia pode verificar. O registo facilita a investigação. As cópias de segurança dos ficheiros são também altamente recomendadas. Se sofrer um ataque, pode reinstalar o sistema operativo e os ficheiros e volta tudo a funcionar normalmente. Mas se lhe apagarem ou bloquearem a informação e não tiver cópias de segurança vai passar um mau bocado. E correndo o risco de parecer repetitivo, volto a lembrar, as cópias de segurança são a melhor forma de proteger a sua informação. Com antivírus mais sofisticados, também pode eliminar estas ameaças do seu computador. A prevenção é sempre a melhor defesa. Professor Associado do IPM Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesQuem paga adiantado pode ser mal servido [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o dia 9 deste mês o Conselho de Consumidores de Hong Kong publicou no website um comunicado de imprensa, onde se sugeria a criação de uma nova lei sobre – a situação dos credores de empresas em liquidação. A liquidação ocorre quando, por qualquer motivo, a empresa do ponto de vista legal deixa de existir. O principal motivo de uma liquidação é a falência. Os consumidores pagam frequentemente com antecedência bens e serviços a dinheiro, com cartão de crédito, etc. O caso de que vamos falar não se aplica, por exemplo, à aquisição de passagens de avião, telemóveis, electrodomésticos ou mobílias, porque entramos na posse destes bens logo a seguir ao pagamento. Mas se comprarmos uma assinatura para frequência de um ginásio, fazemos o pagamento à cabeça. O consumidor vai precisar de um determinado período de tempo para desfrutar de todos os serviços pagos antecipadamente. O pré-pagamento comporta um risco, nomeadamente no caso de o provedor dos serviços abrir falência de repente. Neste caso, o consumidor fica na posição de credor sem garantias, porque as hipóteses de reaver o seu dinheiro são muito poucas. O comunicado do Conselho dos Consumidores afirmava claramente que, se o consumidor usar o cartão de crédito para adquirir um serviço que posteriormente não lhe for prestado, pode recorrer à protecção do “mecanismo de devolução”. Este mecanismo está incluído no cartão de crédito e permite que o utilizador não pague os serviços ou bens de que não usufruiu. O “mecanismo de devolução” faz reverter a transferência, devolvendo o dinheiro à sua origem, caso tenha havido quebra do compromisso de prestação de serviços ou de entrega de bens. Este mecanismo faz parte das normas de funcionamento dos cartões de crédito. No entanto as condições e os prazos variam consoante a operadora de crédito. Para sua protecção, os utilizadores dos cartões deverão verificar previamente todos os detalhes do esquema de crédito a que acederam. Se o mecanismo de devolução funcionar, o risco desloca-se do consumidor para a operadora. A perda será então da operadora de crédito, a menos que consiga que o comerciante a reembolse. Por exemplo, imagine que vai comprar uma televisão a uma loja e que paga com o cartão de crédito (emitido pelo Banco A). O lojista compromete-se a entregar-lhe o aparelho no prazo de três dias. O pagamento dará então entrada no Banco B (do lojista). Mas, neste prazo, o negócio vai à falência. Neste caso pode apresentar uma reclamação por escrito ao seu Banco (A). A partir daí o seu Banco irá negociar com o Banco do lojista (B). Desencadeia-se o mecanismo de devolução e a perda vai recair no Banco B, o qual terá de devolver o dinheiro ao seu Banco. Contudo, em caso de liquidação, a televisão, que era um bem do comerciante, passa a ser propriedade de todos os seus credores. Ao abrigo do mecanismo de devolução, o Banco B assume o risco, e devolve-lhe o valor da televisão. Depois disto o Banco B entra na posse do aparelho. No entanto, este mecanismo não iria funcionar da mesma forma se o problema tivesse ocorrido na compra de uma assinatura para frequência de um ginásio, porque é um serviço que se projecta no tempo. Neste caso receberia uma protecção limitada. O Conselho dos Consumidores recomenda que se opte pela responsabilidade associada. Ou seja, o banco que concedeu o crédito para a aquisição do serviço/produto deve reembolsar o consumidor, caso este não receba o que pagou. Para o consumidor é a situação ideal, porque ninguém quer pagar pelo que não recebe. Claro que aqui a responsabilidade passa toda para o Banco. Agora, ponha-se na pele do Banco, acha que ia concordar com estas combinações? É evidente que não. O Banco vai alegar que é uma instituição de crédito, e que não tem obrigação de se responsabilizar por dívidas alheias. Realmente parece ser uma situação injusta. Talvez as companhias de seguros possam estar interessadas neste tipo de transação, porque devem ser muito poucas as empresas que deixam de fornecer um serviço por entrarem em falência de repente. Este tipo de risco poderá ser coberto pelas seguradoras, se nele virem interesse financeiro. Desta forma todas as partes estariam a salvo, no entanto coloca-se a questão de quem iria pagar o prémio da seguradora. Como já foi referido, o contrato entre o Banco e o portador do cartão de crédito é privado, e destina-se a proteger o cliente. Esta situação é igual em Hong Kong e em Macau. Se lermos com atenção o contrato que estabelece as condições de utilização do cartão de crédito, e as seguirmos cuidadosamente, estaremos protegidos e não teremos problemas em usá-lo. Contudo, por enquanto, ainda não existe forma de lidar com a situação que viemos a descrever, a não ser evitar os pagamentos adiantados. Será a protecção mais eficaz. Professor Associado do IPM Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesReforma Fiscal: pagar menos sai caro? [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o dia 23 de Abril, Paul Chan, o Secretário das Finanças de Hong publicou as seguintes declarações no blogue oficial, 1. Os sistemas fiscais de todos os países estão a optar pelo cruzamento de dados para prevenir a fuga aos impostos por parte das empresas. Foi também implementada a nível mundial a troca de listagens de indivíduos que se evadem aos impostos, para evitar situações de lavagem de dinheiro, etc. 2. Terá de ser criado um sistema fiscal atractivo em Hong Kong para captar investimentos futuros. Analisando o ponto 1, compreende-se facilmente que, com o aumento exponencial das trocas financeiras internacionais, os Governos precisaram de tomar estas medidas. Isto leva-nos à questão da possibilidade de acesso às declarações de rendimentos. Nos Estados Unidos os bancos exigem-nas para abrir conta e passam a informação ao departamento governamental competente. Mas voltemos ao blogue do Secretário das Finanças. É sua convicção que as bases do sistema fiscal devem ser alteradas de forma a atrair investidores. Subscrevo inteiramente. Nenhuma empresa quer pagar impostos elevados. Se a reforma fiscal for nessa direcção, o fardo fiscal das empresas será reduzido e poder-se-á captar mais investimento para Hong Kong. No entanto em Hong Kong a taxação é já bastante baixa, o que torna este sistema convidativo. Mas se quisermos implementar um sistema que seja ainda mais atraente para certo tipo de empresas, é provável que venham a existir ainda mais benefícios para determinados negócios. Estes detalhes não foram referidos no blogue. Estejamos atentos às próximas notícias. A taxação em Hong Kong é directa, simples e baixa. Daí resulta que as receitas de que o Governo dispõe para investir no desenvolvimento são insuficientes. Tomemos como exemplo o fundo de reformas e o serviço de saúde. Como estas áreas requerem verbas extraordinariamente elevadas, o Governo de Hong Kong optou por se começar a descartar de responsabilidades, alegando: 1. A criação de um fundo de reforma deve também competir aos cidadãos e não só ao Governo. É impossível para o Governo da RAEHK assumir sozinho a responsabilidade do Fundo de Reformas na sua globalidade. Aqueles que tenham o mínimo de possibilidades, terão de se responsabilizar por parte desse encargo. 2. O Governo da RAEHK não pode garantir serviços de saúde gratuitos a todos os residentes. Recomenda-se a aquisição de seguros de saúde. A mensagem que o Secretário das Finanças deixou no seu blogue não aborda a questão das receitas governamentais insuficientes. Também não é feita qualquer menção a possíveis aumentos de impostos nem à criação de novas taxas. Há poucos anos atrás, quando Doland Tsang ainda era Chefe do Executivo de Hong Kong, pediu que fosse feito um estudo ao sistema fiscal da cidade e, nessa sequência, sugeriu a criação de um imposto sobre as vendas. “Imposto sobre as vendas” é um imposto directo que taxa a venda de produtos. Este imposto atinge todas as mercadorias e a taxa é fixada pelo Governo. Este imposto é um dos mais comuns a nível mundial. Hong Kong é uma cidade pequena, mas tem uma população enorme. Cerca de oito milhões de pessoas habitam uma área de 2.755 km². Se este imposto fosse implementado poderia garantir ao Governo uma quantia anual significativa e ajudar a reduzir os seus encargos financeiros. Como é sabido, em Macau a maior parte das receitas provem dos casinos. Mas, em Hong Kong, a maior parte das receitas deriva do leilão de terrenos. A receita do Governo é tanto maior quanto mais elevados estiverem os preços das terras. Este é um dos principais motivos para a inflação deste mercado e para o elevado preço das casas. Se o valor dos terrenos baixasse o Governo seria a primeira vítima. Daqui resulta um grave problema social – o da habitação. Desta forma podemos compreender facilmente o quadro do sistema de receitas fiscais do Governo da RAEHK. Receitas geralmente baixas, à excepção das provenientes do leiloamento de terrenos, mas mesmo assim insuficientes para implementar algumas políticas sociais. A taxação alta dos terrenos dá origem a habitações muito caras e torna este mercado uma área muito sensível. O caso contrário do que se passa em Macau, onde as receitas do Governo provêm em grande parte da actividade dos casinos. As finanças do Governo de Macau estão menos limitadas e têm mais campo para o desenvolvimento. Surpreende-nos que na sua mensagem o Secretário das Finanças não aflore a questão das baixas receitas do Governo. Seria sua intenção sondar a opinião pública? Será que está a lançar achas para a fogueira de forma a desencadear uma discussão em torno deste assunto? Por enquanto ninguém conhece as suas intenções. No entanto uma coisa é sabida. Sem receitas suficientes o Governo da RAEHK não pode implementar uma série de políticas. Mas o aumento de impostos criará sem dúvida muita contestação. Como equilibrar esta balança? Pois isso será da competência do Governo de Hong Kong. Professor Associado do IPM Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesA morte do gangster [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o passado dia 19 a televisão de Hong Kong difundiu a notícia da morte de Yip Kai Foon, conhecido como o Rei dos Ladrões. Yip morreu de cancro no Hospital Queen Mary. Yip Kai Foon nasceu em 1961 em Haifeng, na China. Ganhou fama como gangster especializado no roubo de joalharias, que assaltava empunhando espingardas AK-47. Foi o primeiro assaltante a usar este tipo de armas em Hong Kong. O seu primeiro assalto remonta a 1984. Yip e outros cinco cúmplices roubaram duas joalharias e arrecadaram 2 milhões de dólares de Hong Kong. Foi preso e considerado culpado de quatro acusações (duas de assalto, uma por cada uma das lojas, uma por posse de armas de fogo e outra por uso de arma para resistir à detenção). Foi condenado a 18 anos de prisão. A 24 de Agosto de 1989 conseguiu evadir-se depois de ter simulado uma crise de apendicite e de ter sido transferido para o Hospital Queen Mary. Aí, atacou dois guardas na casa de banho com uma garrafa partida e conseguiu fugir numa carrinha estacionada à entrada do Hospital. Furtou o veículo e arrancou com os dois ocupantes lá dentro, um homem de 37 anos e o filho de seis. Depois obrigou o homem a tirar a roupa para ficar com ela. Saiu em Wong Chuk Hang e apanhou um autocarro. Presume-se que a seguir tenha apanhado um avião para a China continental. A 9 de Junho de 1991, Yip e o seu bando, armados com AK-47s e com pistolas, assaltaram cinco ourivesarias situadas na “Dourada” Rua Mut Wah em Kwun Tong. Dispararam 54 tiros contra a polícia e fugiram com ouro e jóias no valor de 5,7 milhões de Hong Kong dólares. Yip também esteve ligado ao roubo de duas joalharias em Tai Po Road e em Sham Shui Po, a 10 de Março de 1992. Dessa vez, o bando disparou 67 tiros contra a polícia e contra transeuntes. O produto desse assalto foi avaliado em 3 milhões de Hong Kong dólares. Pensa-se que Yip também esteve envolvido no assalto a uma joalharia situada na Nathan Road, em Mong Kok. Neste assalto, na sequência de múltiplos disparos, uma mulher que ia a passar foi morta. Durante a perseguição que se seguiu, um dos assaltantes foi morto pela polícia; os outros lançaram o corpo para o meio da rua e conseguiram fugir de carro. A polícia de Macau suspeita que Yip esteve envolvido no assalto ao Hyatt Regency Hotel, na Taipa, que ocorreu em Abril de 1994. Desta vez foram roubadas fichas de jogo no valor de 40 milhões de Hong Kong dólares. Em 1995, Yip passou a actuar em Shenzhen e, em Janeiro desse ano, participou no rapto e no assassinato de um empresário de Tianjin e em Novembro na morte de um informador da polícia. Estima-se que o total do produto dos seus furtos ascenda a 20 milhões de Hong Kong dólares (aproximadamente $2,576,920 de dólares americanos). Mas a 13 de Maio de 1996 a carreira de Yip chegava ao fim, quando foi preso na sequência de um tiroteio na Kennedy Town. Nesta troca de tiros com a polícia Yip foi atingido na espinha dorsal e ficou paralisado da cintura para baixo. Dois polícias tinham surpreendido Yip e o seu bando numa travessa perto do cais. Tinham acabado de sair de um barco, e os agentes suspeitaram que fossem imigrantes ilegais e pediram-lhes a identificação. O resto do bando conseguiu fugir, mas Yip sacou de uma arma que trazia na mala e começou a disparar. Quando mais tarde testemunharam, os polícias disseram que o tinham exortado sem êxito a depor a arma. Yip continuou a disparar. Mas, de repente, a arma encravou. Um dos polícias disparou contra ele e a bala atingiu-lhe a coluna. Yip caiu de imediato e foi preso. A bala que o atingiu nunca chegou a ser tirada porque os médicos perceberam que a remoção ainda ia provocar mais danos na espinha dorsal. Desde essa altura Yip ficou confinado a uma cadeira de rodas e a uma sentença para a vida. Foi condenado, no acumulado das acusações, a uma pena de 41 anos de prisão. A detenção de Yip foi um caso espantoso. Como pudemos ver, cometeu vários assaltos e conseguiu sempre escapar. Mesmo quando foi preso em 84 acabou por se evadir. Nessa altura as pessoas achavam que era impossível prendê-lo. Acabaram por ser dois polícias, que não faziam ideia de ter perante si o Rei dos Ladrões, que o detiveram. E é preciso não esquecer que um destes agentes era um recém-graduado, acabado de sair da Escola de Polícia. Prender Yip nestas circunstâncias há-de ter sido qualquer coisa de inacreditável. Depois do tiroteio Yip ficou paralisado. Mais tarde na prisão foi-lhe diagnosticado um cancro que o veio a matar. A fase final da vida de Yip foi muito triste. Preso, paralisado e a sofrer de cancro fatal. Nem sequer podia receber os cuidados da família. Duma certa forma, antes de morrer teve apenas por companhia a doença e os seus erros. Os chineses têm um ditado que diz, “O nosso destino decide-se numa dimensão invisível.” Talvez a forma como foi preso seja disso um sinal. O cancro, a solidão e o peso dos seus erros serão outro. Talvez, nas sombras onde vive, o destino ajude a lei a atingir o objectivo de manter a ordem e a justiça social. Professor Associado do IPM Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
David Chan Macau Visto de Hong KongA menoridade e a doação de órgãos [dropcap style=’circle’]A[/dropcap] semana passada o site de notícias SCMP de Hong Kong, anunciou que a jovem Michelle, de 17 anos, solicitou à Autoridade Hospitalar de Hong Kong autorização para ser submetida a exames médicos, porque queria doar parte do fígado à mãe. Michelle só completa 18 anos daqui a três meses – a idade legal para se poder ser doador. A mãe de Michelle, Tang Kwai-sze, cujo fígado deixou praticamente de funcionar, estava na Unidade de Cuidados Intensivos do Hospital Queen Mary, em Hong Kong, entre a vida e a morte. Se não se encontrasse com urgência um doador compatível, poderia ter apenas alguns dias de vida. Mas, de repente, o milagre aconteceu. Ah Yan, uma jovem de 26 anos residente em Hong Kong, voluntariou-se para doar parte do fígado a Tang. A operação, que teve lugar no passado dia 13 e durou 13 horas, foi bem-sucedida. Na altura em que este artigo foi escrito, Tang e Ah Yan encontravam-se bem. Este caso desencadeou um debate em Hong Kong em torno da doação de órgãos. Nesta cidade o Regulamento de Transplante de Órgãos Humanos impede a Autoridade Hospitalar de efectuar transplantes de órgãos de menores. Segundo o Regulamento, não existem excepções. A lei é rigorosa para proteger os menores. Os doadores têm de ter pelo menos 18 anos. Kwok Ka-ki, médico e deputado do Civic Party, afirma que a lei de Hong Kong está a atrasar os processos e não vai ao encontro da posição oficial do Governo, que encoraja a doação de órgãos. Na Escócia não existe limite de idade para doadores e em Alberta, no Canadá, os menores são autorizados a doar órgãos e tecidos. No entanto, este assunto é muito questionável. A lei pretende proteger os menores quando impede que existam doadores com menos de 18 anos. Michelle tem 17 anos e 9 meses. Está a três meses de completar os 18. Em termos de idade a diferença é praticamente nula. Além disso a destinatária da sua doação seria a mãe. Alguém com quem tem uma relação muito estreita. Michelle expressou a sua vontade perante a opinião pública de doar parte do fígado para salvar Tang. Neste caso não pode haver suspeitas de pressão psicológica. Só podemos concluir que Michelle desejava salvar a mãe por vontade própria. A doação era uma forma de afirmação de amor filial. No entanto, devemos compreender que a lei é a lei. “18 anos” é a idade mínima legal para se ser doador de órgãos. Com esta idade existe maturidade legal. A pessoa tem capacidade de tomar decisões e é responsável pelas suas acções. Desta forma podemos concluir que, se Michelle fosse autorizada a doar parte do fígado a Tang, não só seria ilegal, como se veria privada de protecção jurídica. A lei em Hong Kong é diferente da de Macau. Em Macau, os menores não podem assumir qualquer responsabilidade pelos seus actos. A responsabilidade civil está totalmente a cargo dos pais. Contudo, em Hong Kong, têm autonomia para tomar algumas decisões legais. Podem, por exemplo, celebrar contratos de compra e venda de bens destinados ao seu consumo. Esta possibilidade está consignada na secção 4 do Regulamento de Compra e Venda. De acordo com a jurisdição do Direito Comum, o menor é protegido por diversos mecanismos. O exemplo típico é o que se refere ao casamento. Se um menor se casar, dentro de um certo prazo, pode anular a união após completar os 18 anos. E que duração tem esse prazo? A lei não específica. Varia de caso para caso. Mas o casamento de um menor está dependente da autorização paterna. Outro exemplo é a criação de uma sociedade comercial. Se um menor for sócio de uma empresa comercial terá de beneficiar da sua parte dos lucros, mas, caso haja prejuízos, não será responsabilizado pela sua parte das perdas, o único responsável será o sócio adulto. A mesma lógica vai aplicar-se se um menor comprar acções ou propriedades. É por este motivo que as seguradoras de Hong Kong não aceitam cobrir negócios que envolvam sócios menores. Para o fazerem todos os envolvidos terão de ter mais de 21 anos. Podemos assim constatar que, perante o sistema jurídico de Hong Kong, os menores têm algumas capacidades, mas não a capacidade plena para tomar decisões legais. Para proteger os seus interesses, a lei estabelece alguns limites. A doação de órgãos encontra-se para lá desses limites. No entanto, o Governo da RAEHK anunciou que irá proceder a uma consulta pública sobre esta matéria. A possibilidade de os menores doarem órgãos vai ser debatida no seio da sociedade de Hong Kong. Para já, ninguém sabe quais vão ser as conclusões deste debate. Mas uma coisa será certa, mesmo que os menores venham a ser autorizados a doar órgãos, essa autorização vai estar restrita a situações muito especiais. A protecção aos menores consignada na lei não poderá ser afectada por um novo regulamento.
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesÉ favor sair [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o passado dia 12 o website“https://people.com/human-interest/united-airlines-apology-forcably-removing-passenger-twitter-reacts/” divulgava uma notícia que começava assim: “… Acaba de ser publicado um vídeo assustador onde se vê um passageiro ensanguentado a ser arrastado para fora de um dos aviões da United Airlines…” A notícia reporta-se a um caso ocorrido nos EUA dia 9 deste mês, no avião nº. UA3411 da companhia aérea United Express Airlines. O que aconteceu naquele avião foi algo de terrível. O passageiro David Dao foi expulso violentamente do avião na sequência de se ter recusado a ceder o lugar que ocupava. A companhia ofereceu uma indemnização até 1.000 dólares e estadia paga num hotel, aos passageiros que libertassem os lugares de que precisava. E isto porque quatro funcionários da companhia precisavam de viajar com urgência naquele avião que já estava lotado. Mas como ninguém se voluntariou para sair, a companhia escolheu ao acaso quatro passageiros. Um deles era David Dao que se recusou a abandonar o lugar, alegando que tinha pacientes à espera em Louisville. Nessa altura a polícia de Chicago foi chamada para o obrigar a sair do avião. Na segunda-feira, Oscar Munoz, Director Executivo da United, publicou a sua versão da situação no Twitter da companhia. “Peço desculpa por termos tido de reacomodar estes passageiros. A nossa equipa está a colaborar com as autoridades e a preparar um relatório detalhado sobre a nossa perspectiva dos acontecimentos. Estamos também a estabelecer contacto com este passageiro para vermos com ele a melhor forma de resolver a situação.” No entanto a história tem outra faceta. No email que a companhia dirigiu aos funcionários, nesse mesmo dia, podia ler-se, “Dao criou problemas e teve uma atitude agressiva.” Na sequência da divulgação mediática deste acontecimento, o preço das acções da United Express caiu 5%. Na terça-feira Oscar Munoz veio declarar, “Os terríveis acontecimentos que tiveram lugar a bordo do nosso avião desencadearam em todos nós reacções de raiva, ira e frustração.” “Pessoalmente partilho todos estes sentimentos e, acima de tudo: lamento profundamente o sucedido.” “Como todos vocês, continuo a sentir-me perturbado pelo que se passou no avião e apresento as minhas mais sinceras desculpas ao passageiro que foi forçado a sair e a todos os que estavam a bordo.” “Ninguém deve ser tratado daquela maneira.” “Quero que saibam que vamos assumir todas as responsabilidades e corrigir o mal que foi feito.” Este pedido de desculpas foi alvo de duras críticas. Foi considerado por muitos como “desculpas de mau pagador”. A companhia aérea Royal Jordanian aproveitou a situação inteligentemente e publicou no Twitter “Gostaríamos de vos recordar que nos nossos voos é estritamente proibido arrastar pessoas para fora do avião.” Mas toda esta situação tem vários aspectos obscuros. Em primeiro lugar, nos EUA, o limite máximo das indemnizações em casos semelhantes é de 1.350 dólares. Neste caso a United Express só ofereceu um máximo de 1.000 dólares. Porque é que não ofereceram o valor máximo previsto? Em segundo lugar, os quatro funcionários da companhia precisavam dos lugares com urgência porque tinham de se apresentar ao serviço no dia seguinte. Nesse caso porque é que a companhia não lhes alugou um carro que os levasse ao seu destino? Porque é que fizeram questão que fossem naquele voo? Ficámos a saber pelos media que a viagem de carro duraria apenas cinco horas. Em terceiro lugar o avião esteve três horas parado na pista. Sem dúvida que as taxas que a companhia teve de pagar ao aeroporto aumentaram imenso. Porque é que a United suportou este custo e não quis reembolsar os passageiros com a indemnização máxima? Se virmos o vídeo que foi feito por um dos passageiros, podemos verificar que quando David foi agarrado pelos polícias estava aos gritos. Mas quando foi arrastado para fora do lugar deixou de gritar. Este comportamento não parece normal. A conclusão lógica é que deve ter desmaiado. Será que os polícias lhe bateram na cabeça ou terá sido atingido acidentalmente? Porque é que tinha o nariz a sangrar? Cerca de dez minutos depois David voltou ao avião. Não parava de repetir, “Tenho de ir para casa.” O que é que lhe aconteceu depois de ter sido arrastado para fora do avião? E porque é que voltou? Porque é que os polícias não o acompanharam quando regressou a bordo? O vídeo não responde a estas perguntas. David contratou dois advogados para processar a United Express Airline e a Polícia de Chicago. A resposta a estas perguntas será fundamental para o processo. É provável que a companhia e a Polícia de Chicago tenham de vir a arcar com a maior parte da responsabilidade. A possibilidade de David ganhar este processo é bastante elevada. Para salvaguardar as aparências a United pode vir a subir o valor da indemnização e tentar desta forma encerrar o assunto. Professor Associado do IPM Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau Jazz
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesObsessão pelo telemóvel e outras faltas de respeito [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o dia 30 de Março o website “Ming Pao” anunciou que Alvin Cheng Kam-mum tinha sido preso por desacatos em tribunal. Recebeu uma pena de três meses. Alvin é vice-presidente de um dos partidos políticos de Hong Kong, o Civic Passion. Inicialmente Alvin tinha comparecido em tribunal por não ter respeitado uma Ordem de Injunção emitida em 2014, que proibia a ocupação ilegal de Mongkok. Mesmo depois da proibição, Alvin permaneceu em Mongkok a liderar os manifestantes. Alvin foi representado por Gerord McCoy, dirigente da Ordem dos Advogados. Durante o julgamento, o juiz Andrew Chan interrompeu subitamente McCoy e dirigiu-se a Alvin nos seguintes termos, “Não se importa de parar de jogar no telemóvel enquanto está no tribunal? O tribunal tem autoridade para lhe apreender o telemóvel. Acha que tem liberdade para entrar e sair quando lhe apetece? Como é que eu posso acreditar na sinceridade do seu arrependimento pelas infracções que cometeu?” O juiz acabou por condenar Alvin a três meses de prisão após ter proferido estas palavras. Este caso é insignificante, mas tem grandes implicações. Hoje em dia os telemóveis tornaram-se parte da vida de todos nós, sobretudo dos mais novos. Todos os jovens, tenham a idade que tiverem, jogam nos telemóveis. É absolutamente invulgar ver um jovem sem telemóvel. Os telemóveis foram concebidos para comunicarmos, mas actualmente as suas funções excedem largamente a simples comunicação. Podemos ver vídeos, jogar jogos electrónicos e até trabalhar através do telemóvel. Mas se virmos bem, quantos jovens usarão estas plataformas para estudar ou trabalhar? Há duas semanas tiveram lugar em Macau os Exames de Admissão Conjunta. Foi um dos maiores acontecimentos no campo da educação, porque foi a primeira vez que se realizaram em simultâneo nesta cidade exames para admissão em quatro universidades, com o programa do ensino secundário muito mais unificado. É previsível que num futuro próximo o exame de admissão dê acesso a mais universidades e que o programa do ensino secundário conheça mais etapas de unificação. Esta unificação irá combater os programas individuais de cada escola, uma situação que deve ser evitada. Analisemos agora os comportamentos dos estudantes submetidos a este exame. Não vamos falar de resultados, mas sim de atitudes e expectativas. Estariam entusiasmados? Aparentemente, não. É fácil de verificar que os telemóveis foram um problema. A maior parte dos alunos não desligou o telemóvel depois de entrar na sala de exame. Sempre que o telefone tocava atendiam. Também se podia ver alguns a jogarem nestes aparelhos. Parte dos alunos falava com amigos através do Wechat ou de outras aplicações. No entanto, tinham à sua frente a folha de exame. Não pareciam dar-se conta de que os examinadores podiam desconfiar que estavam a falar sobre as perguntas do exame. Esta situação pode conduzir a uma desclassificação e ao impedimento de entrar numa sala de exames. Mas mesmo assim os jovens insistem nestes comportamentos. Será que não se apercebem que estão a desrespeitar a instituição escolar? Alguns estudantes mascavam pastilha elástica durante o exame e recusavam-se a deitá-la fora. Outros iam à casa de banho logo a seguir a terem entrado na sala de exame. Aparentemente não faziam ideia que, devido ao secretismo do exame, é proibido ir à casa de banho depois da entrada na sala. Este género de comportamentos parece indiciar que a nova geração não sabe respeitar o próximo. O relacionamento normal com os outros é um problema sério para estes jovens. O telemóvel deixou de ser uma ferramenta de comunicação e passou a ser uma plataforma de jogos. Torna os jovens mais auto-centrados e aprisionados no seu próprio mundo. Se isto continuar, não vão aprender a relacionar-se com as outras pessoas. Mas a questão do telemóvel também passa pelo local de trabalho. Alguns empregadores reportaram alguns casos curiosos que passo a descrever: Temos o caso de uma pessoa que se ia candidatar a um emprego. No entanto, antes da entrevista, pediu que lhe enviassem fotos do escritório para ver se as condições lhe agradavam. Se fosse o caso, ia à entrevista, se não fosse não ia. Vejamos ainda a história do empregado que se despediu através duma mensagem para o telemóvel do patrão. Ou seja, não se deu ao trabalho de ir ao escritório cumprir as formalidades necessárias ao despedimento, nem passar trabalho aos colegas. Em vez disso pediu ao patrão que lhe enviasse os documentos de rescisão. Outro exemplo: o patrão pede ao empregado para resolver um problema informático. O empregado responde que o assunto se resolve descarregando umas aplicações no telemóvel. Mas não pensa que alguns dos seus colegas podem não estar familiarizados com o uso do telemóvel nestas situações. Esta forma de resolver o problema só iria beneficiar alguns, não resolvia o problema de todos. Face a estas situações, é fácil compreender porque é que o juiz condenou Alvin a três meses de prisão. Se não ensinarmos os jovens a usar os telemóveis de forma adequada, os problemas vão continuar a acontecer. Professor Associado do IPM Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Paul Chan Wai Chi Macau Visto de Hong Kong VozesOs milagres dependem de nós [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] história de David e Golias que a Bíblia nos conta é sempre citada como um exemplo do triunfo dos fracos sobe os fortes. Mas será que esta história nos fala de um milagre? Depois de a lermos com atenção, reparamos que não foi tarefa fácil para David. David precisou de espírito, bravura e bastante preparação porque sabia muito bem que não tinha hipóteses de vencer Golias num confronto físico. Por isso recorreu aos jogos psicológicos e ao ataque surpresa. Golias subestimou as capacidades de David, deixou para trás o soldado que lhe transportava o escudo e lançou-se no ataque a David, que o ia provocando verbalmente. Esta reacção foi a que David esperava. Nessa altura, David usou a sua funda para atacar Golias. Lançou-o por terra e a seguir decapitou-o. A funda, usada na caça pelos pastores, lança a pedra a uma grande velocidade contra o alvo, fazendo dela uma arma letal. Há cerca de dez anos fiz uma peregrinação à Terra Santa e vi alguns locais a demonstrarem o seu funcionamento, com o objectivo de as vender aos turistas. Foi uma pena não ter comprado uma nessa altura. Mais tarde pedi a um amigo que também lá foi, para me comprar uma funda se as visse à venda. Mas possivelmente devido ao conflito israelo-palestiniano, foram retiradas do mercado. Carrie Lam venceu as eleições do passado domingo para Chefe do Executivo de Hong Kong, derrotando John Tsang que não conseguiu operar milagres junto da opinião pública. Mas, pessoalmente, penso que Carrie Lam conseguiu vencer devido à diferença de condições entre as campanhas, e não por falta de capacidade de mobilização e de entusiasmo de John Tsang. Uma das condições que marcou a diferença foi sem dúvida o apoio do Governo Central a Lam. A candidata (Carrie Lam) foi alcunhada por um adversário de “três-poucos”: pouca popularidade, pouca energia e pouca legitimidade, e mesmo assim conseguir ganhar a eleição. Este cenário terá algum paralelismo com a história de David que derrubou Golias? Na edição de sexta-feira do jornal “Sing Tao Daily”, vinha um artigo intitulado “Porque é que o Governo Central não apoiou John Tsang na corrida à liderança do Executivo?” Se isto se tivesse passado em Macau alguém teria apresentado queixa ao Comité Eleitoral, por causa do conteúdo do artigo e pelos possíveis impactos no acto eleitoral. O artigo explanava sobre o facto de John Tsang, que já foi um homem de confiança do Governo Central, ter concorrido às eleições sem esse apoio. Ou seja, John Tsang agiu de uma forma que não serviu os arranjos e as disposições do Governo Central. Foi esperto, mas no fim a sua esperteza acabou por se virar contra ele. Foi o contrário do que aconteceu, quando o ainda Chefe do Executivo Leung Chun-ying se pretendeu recandidatar. CY Leung tinha sido “encaminhado” para a vice-presidência do Comité Nacional da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês (CPPCC sigla em inglês). Logo a seguir a estes “arranjos”, anunciou a retirada da recandidatura devido a problemas familiares. Este anúncio foi feito três dias antes da demissão oficial de John Tsang de Secretário das Finanças, o que o colocou num dilema. Poderia dizer-se que Carrie Lam tinha sido encarregada num momento crítico da missão de substituir Leung Chun-ying, que não goza de popularidade junto do Comité Eleitoral. A atitude abnegada de Carrie Lam, no sentido de cooperar com as disposições do governo Central, foi a chave para a sua vitória. A “esperteza” e um certo sentido de humor de John Tsang, acabaram por lhe retirar a confiança do Governo Central. Foi-lhe permitido ocupar-se dos assuntos financeiros enquanto Secretário das Finanças, mas se se tivesse tornado Chefe do Executivo, poderia ficar demasiado poderoso e o Governo Central teria mais dificuldade em controlá-lo. É uma prática tradicional de manipulação na política chinesa. Olhemos agora para as eleições para a Assembleia Legislativa de Macau marcadas para Setembro. Se a orientação da “Estabilidade Acima de Tudo” se mantiver, o resultado será uma vitória desequilibrada, já que as fraudes e a corrupção eleitoral continuam a subsistir apesar do reforço da lei. A Democracia irá continuar a desempenhar o seu papel “decorativo” na Assembleia e os que combatem em seu nome irão enfrentar uma extinção sem precedentes. Passaram-se alguns dias sobre a eleição de Carrie Lam e, depois da poeira ter assentado, algumas pessoas já estão convencidas de que o resultado desta eleição não foi o pior possível. Carrie tem reafirmado que a resolução das cisões sociais é uma das suas prioridades enquanto Chefe do Executivo. Demos-lhe tempo para mostrar o que vale.
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesDesrespeito à autoridade [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] desrespeito à autoridade, ou “desprezo pela polícia” para seguir o jargão americano (contempt of cop), tem sido ultimamente um dos tópicos de discussão em Hong Kong, no seguimento da prisão de sete agentes condenados a prisão por assalto. Há quem ache que a polícia pode ser insultada durante o cumprimento do dever. A “Wikipedia” define o “desprezo pela polícia” nos seguintes termos: “Desprezo pela polícia é o termo usado nos Estados Unidos para descrever comportamentos que os agentes considerem ofensivos à sua autoridade…. Quando se discute esta questão associa-se muitas vezes a detenções arbitrárias e ilegais, que frequentemente ocorrem na sequência da expressão e do exercício de direitos garantidos pela Constituição dos Estados Unidos. A reacção dos agentes ao “desprezo pela polícia” aparece muitas vezes relacionada com más condutas policiais, como o uso de força excessiva ou mesmo violência policial, e não como uma resposta legítima para impor a Lei. As prisões motivadas por desrespeito à autoridade podem ter origem em certos tipos de comportamento “arrogante” que, segundo o agente em questão, põe a sua autoridade em causa. Na perspectiva destes agentes o “desprezo pela polícia” implica desrespeito e falta de deferência (desobediência a instruções, manifestação da vontade de participar do agente). Fugir à polícia também é considerado uma forma de desprezo pela autoridade. Estas situações podem ser potenciadas se estes comportamentos alegadamente desrespeitadores forem presenciados por outros agentes.” Mas o desrespeito à autoridade não está apenas previsto nos EUA, em Macau também é considerado na lei. Se repararmos nos artigos 129 (2) (h), 175, 176 e 178 do Código Penal, constataremos que uma ofensa a um agente da autoridade, que se encontre no exercício das suas funções, tem uma penalização 1,5 vezes superior ao normal. A legislação sobre os actos de desrespeito à autoridade pode dar mais protecção à polícia e vir a evitar que os agentes sejam insultados durante o cumprimento do dever. Como podemos ver pelas notícias, actualmente em Hong Kong as relações entre aqueles que exercem o direito de associação e assembleia e a polícia não são as melhores. E isto porque a força pode estar envolvida. Mas mesmo que essa força não se faça sentir, os comportamentos dos manifestantes envolvem habitualmente gritos e insultos à polícia. Estas atitudes podem despertar ressentimentos nas autoridades. Depois da Fish Ball Riot (Revolta das Bolinhas de Peixe), no ano passado, e da recente condenação de sete polícias, não é de admirar que estas questões sejam assunto de conversa em Hong Kong. Se o Governo de Hong Kong quiser manter este tipo de legislação as seguintes questões terão de ser consideradas. Em primeiro lugar, é importante que os residentes de Hong Kong saibam o que cabe exactamente no conceito de “Desrespeito pela Autoridade”. Que tipo de acções podem ser consideradas insultuosas para agentes no exercício das suas funções? Por exemplo, utilizar uma linguagem vulgar pode ser considerado desrespeito pela autoridade? Gritar com o agente pode significar desprezo pela polícia? É preciso não esquecer que, de acordo com as normas da Força Policial de Hong Kong, mesmo que um agente esteja fora de serviço é sempre considerado um agente e terá de ser tratado como tal. Se usar uma linguagem vulgar e gritar com um agente pode significar desprezo pela polícia, então será sempre necessário dirigirmo-nos às autoridades de forma educada. Em segundo lugar, se a legislação sobre esta matéria for aprovada, é preciso saber a que força disciplinar caberá a responsabilidade da sua aplicação. A resposta é: à Força Policial de Hong Kong. Se alguém se dirigir a um polícia de forma rude, este pode prende-lo por desrespeito à autoridade. Nesse caso que atitude deve a pessoa adoptar? Pode manter a atitude insultuosa, pois já que quebrou a lei uma vez, pode quebrar meia dúzia que vai dar ao mesmo. Saliente-se que, se a pessoa for presa por insultar um polícia, pode oferecer mais resistência. A legislação em casos de desrespeito à autoridade pode colocar numa posição injusta quer o agente quer o cidadão. Podem sair ambos a perder. Em terceiro lugar é preciso perguntar porque é que esta legislação só contempla a polícia. E os outros funcionários públicos? É forçoso que nos lembremos que muitos funcionários do governo desempenham funções de atendimento ao público. Se a polícia precisa de protecção, porque é que os outros funcionários públicos não beneficiam de igual apoio? Parece ser um pouco injusto. A ideia de penalizar o desrespeito à autoridade é boa. Dará mais protecção à polícia, sobretudo se algumas pessoas se portarem de forma irracional. Este tipo de legislação pode, em certa medida, travar os comportamentos desajustados. Mas como actualmente em Hong Kong os conflitos entre os residentes a polícia tendem a aumentar, não vai ser tarefa fácil. Se desta vez o projecto de lei for rejeitado pelo Conselho Legislativo, não parece que algum dia venha a passar. Neste sentido, é bom que o Governo de Hong Kong pese todas estas questões cuidadosamente antes de tomar qualquer decisão. Professor Associado do IPM Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesDifamação [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o dia 7 deste mês a “apple.nextmedia” publicou um artigo sobre o processo de difamação instaurado por Leung Chun-ying, Chefe do Executivo de Hong Kong, contra Kenneth Leung K C., membro do Conselho Legislativo da cidade. A propósito o “China Morning Post” escreveu, “A ordem judicial apresentada na segunda-feira pelos advogados de Leung Chun-ying acusa Kenneth Leung de difamação alegando que o Chefe do Executivo “ainda estava a ser investigado pela Comissão Independente Contra a Corrupção e também pelas autoridades tributárias de Hong Kong e de outros países, a propósito de uma receita de 4 milhões de libras da UGL”. A ordem judicial também especificava que Kenneth Leung tinha proferido declarações difamatórias quando afirmou que “as autoridades centrais irão ficar numa posição muito embaraçosa, na eventualidade de este vir a ocupar o cargo de Vice-Presidente da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês.” Para além do pedido de uma indemnização monetária, Leung Chun-ying solicitou ao Tribunal uma “Ordem de Injunção” a fim de travar os procedimentos difamatórios. A ordem judicial é uma intimação emitida pelo queixoso contra o réu e que dá inicio à acção judicial. Neste documento é habitual ser apresentada uma descrição dos factos e ser mencionado o valor da indemnização exigida pelo queixoso. Em Hong Kong, a difamação tanto pode dar origem a um processo cível como a um processo criminal. No entanto, é muito raro um caso desta natureza dar origem a um processo criminal, a menos que sejam postas em causa a paz e a ordem públicas. O queixoso costuma desencadear um processo cível para proteger a sua reputação. Em Macau é diferente, a difamação dá origem a um processo semi-criminal e, assim que a vítima dá o seu consentimento, o Governo formula a acusação. O artigo adiantava que uns dias antes do envio da acção judicial Kenneth tinha recebido uma carta-aviso. Numa acção por difamação, o queixoso costuma enviar uma carta elaborada pelo advogado, onde explica que as declarações do acusado prejudicaram a sua reputação. O destinatário da carta é intimado a apresentar prova que sustente as afirmações proferidas ou então a retratar-se e a apresentar um pedido de desculpas. Nestas situações, o pedido de desculpas e um desmentido público é a melhor forma de resolver o problema. No caso de Leung Chun-ying, é muito pouco provável que se chegue a um acordo antes da acção judicial. De qualquer modo, Leng Chun-ying não vai para já apresentar a ordem judicial a Tribunal para dar início à acção legal. Cabe agora a vez a Kenneth Leung de apresentar a Defesa aos magistrados. A “Defesa” consiste num documento apresentado pelo acusado ao Tribunal a expor as suas razões. Terá de apresentar provas da seriedade e da legalidade das suas afirmações. Em Hong Kong, os casos de difamação sobem ao Tribunal de Primeira Instância (em Macau, ao Tribunal da Relação). Estes julgamentos têm a presença de um júri. A presença do advogado também é requerida. É preciso ter em conta que os seus honorários são muitíssimo elevados. Se não se estabelecer um acordo antes da audiência, podem alcançar os dez milhões. Donde se concluí que a difamação é um jogo para milionários. De acordo com a Lei de Bases, o dever do legislador é monitorizar o desempenho do Governo e por isso é natural que os seus membros sejam alvo de críticas. No entanto, não é permitido proferir afirmações falsas. É preciso não esquecer que os membros do Governo também são residentes de uma Região Administrativa Especial e que a Lei protege os seus direitos. Combater a difamação é uma das armas que podem usar para defender a sua reputação. Mas se Leung Chun-ying usar o seu direito legal para processar Kenneth, o preço político pode ser muito elevado. Não é de admirar que existam comentários sobre “a quebra de relações entre o poder executivo e o poder legislativo”. Como é a primeira vez que em Hong Kong um Chefe do Executivo processa um deputado, os comentários “surpresa” irão surgir um após outro. Ninguém gosta destes constantes burburinhos que destabilizam Hong Kong. Embora a ordem judicial já esteja preparada para ser apresentada em tribunal, ainda estamos a tempo de resolver a situação pacificamente. Fazemos votos para que os litigantes cheguem a um acordo o mais breve possível. Será o melhor para Hong Kong e para as partes envolvidas. Professor Associado do Instituto Politécnico de Macau Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesXadrez eleitoral [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s candidatos a Chefe do Executivo de Hong Kong foram-se perfilando um após outro; John Tsang, Carrie Lam e Kwok-hing Woo. A semana passada a numeração das candidaturas foi sorteada. A Tsang coube o número 1, a Carrie Lam o número 2 e a Kwok-hing o número 3. Dois dos três candidatos são antigos funcionários públicos e o terceiro é juiz do Tribunal da Relação (High Court). Nesta eleição existem algumas questões obviamente incontornáveis, a saber: as futuras alterações aos métodos de eleição do Chefe do Executivo e do Conselho Legislativo, a gestão da resolução 8.31 tomada no Congresso Nacional Popular, etc. Para já é interessante tentar perceber qual dos candidatos tem o beneplácito do Governo Central. Sobre o assunto a “Wikipedia” adianta, “O Chefe do Executivo em funções, Leung Chun-ying, anunciou que não se iria recandidatar. Logo a seguir a esta comunicação, a secretária para a Administração Carrie Lam, que por diversas vezes anunciou a sua saída de cena, reconsiderou e candidatou-se à liderança do governo. Encarada pela maioria como a favorita de Pequim, Lam concorre contra o Secretário das Finanças John Tsang. Apesar da sua experiência governativa e de ser favorito nas sondagens, Tsang lutou para obter as nomeações do Comité Eleitoral. Especula-se que a sua candidatura não caiu nas boas graças de Pequim e que depende fortemente do apoio dos pró-democratas, que, por seu lado não patrocinaram um candidato doméstico para darem algum “gás” a uma candidatura alternativa dentro do sistema. Tsang obteve 165 nomeações das quais apenas 38 vieram das alas pró-Pequim.” Sexta-feira passada, o website “Yahoo” de Hong Kong publicou um artigo onde se afirmava que os votos lançados às urnas nestas eleições serão levados para o Continente para verificação das impressões digitais. O Governo da RAEHK apresentou de imediato um desmentido, afirmando que se tratava de um rumor sem provas que o sustentassem. Em Hong Kong os rumores não são nenhuma novidade. Como é do conhecimento geral, o mandato de John Tsang terminava muito antes do de Carrie, mas o Poder Central autorizou que os dois terminassem na mesma data. A partir daí criou-se o rumor de que o Governo Central favorecia a candidatura de Carrie. Quanto a Kwok-hing, quase todos estão de acordo que tem muito poucas hipóteses de vencer as eleições. A RAEHK e a Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) são províncias chinesas com estatutos muito especiais devido ao seu elevado grau de autonomia. Têm por exemplo a capacidade de assinar tratados internacionais nas áreas do desporto, da cultura, e não só, capacidade que está vedada a outras províncias da China. Para além disso estas duas regiões têm sistemas jurídicos próprios e estilos de vida independentes, garantidos pelas respectivas Leis de Bases durante 50 anos. Acresce ainda que as vozes a favor da independência continuam a fazer-se ouvir em Hong Kong. É evidente que a China continental não aprecia estas “vozes” e que é do conhecimento geral que Hong Kong deve permanecer uma parte indissociável do País. A separação da China nunca deverá acontecer. O Governo Central está particularmente preocupado com a forma como o próximo Chefe do Executivo vai exercer o poder que lhe vai ser confiado e como irá lidar com os problemas levantados pelos que defendem a independência do território. O rumor da verificação das impressões digitais nos boletins de voto tem aqui a sua origem. Todos sabemos que o Governo Central da República Popular da China tem poderes para indigitar o Chefe do Executivo de Hong Kong. O que se poderá esperar se um candidato ganhar a eleição, mas não conquistar a “confiança e a conivência” da China continental? Por enquanto ninguém sabe a resposta exacta. Só podemos fazer votos para que o binómio “confiança e conivência” continuem a existir entre a China e Hong Kong. Será o cenário ideal para todos. Professor Associado do Instituto Politécnico de Macau
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesNinguém escapa ao braço da lei [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] dia 22 de Fevereiro foi o dia do Juízo Final para Donald Tsang, antigo Chefe do Executivo de Hong Kong. Foi acusado de conduta indevida durante a governação e condenado a 20 meses de prisão. Andrew Chan, juiz do Supremo Tribunal, não autorizou a liberdade condicional devido à gravidade das acusações. A Wikipedia faz uma breve descrição do caso de Tsang, “Em 5 de Outubro de 2015, “Tsang foi confrontado com duas acusações de conduta indevida durante o exercício de cargo púbico pela Comissão Independente Contra a Corrupção (ICAC) (CCAC em Macau). A 11 de Outubro de 2016, o Tribunal da Relação de Hong Kong (High Court), deliberou a favor da acusação e decidiu que Tsang deveria enfrentar uma acusação adicional por aceitação de benefícios e por suposta violação do Regulamento para a Prevenção do Suborno. O julgamento, que contou com a presença de um júri, teve início a 10 de Janeiro tendo o réu declarado-se inocente de todas as acusações. A 17 de Fevereiro o júri considerou Tsang culpado de uma das acusações de conduta indevida (da primeira) e inocente da segunda. Por enquanto o júri foi inconclusivo quanto à acusação de aceitação de benefícios por parte de terceiros. Foi condenado a 20 meses de prisão no dia 22 de Fevereiro.” O sistema jurídico de Hong Kong é diferente do de Macau. A presença de um júri para crime graves foi estipulada através do artigo 86 da Lei Básica da cidade. O júri é composto por jurados. Os jurados são pessoas comuns que terão de ser residentes em Hong Kong. O processo de selecção tem duas fases. Inicialmente a escolha é feita pelo Tribunal e depois o grupo seleccionado é sujeito à aprovação do réu. A rejeição de um jurado por parte do réu não precisa de ser justificada. No entanto este direito tem um limite, o réu só pode rejeitar no máximo cinco pessoas. Devido à seriedade deste caso o júri foi composto por nove jurados. Para que o veredicto seja proferido, o júri tem de tomar uma decisão maioritária. Ao juiz cabe apenas decidir a pena a aplicar, caso o réu tenha sido declarado culpado. O South China Morning Post divulgou a 11 de Novembro de 2016 as três acusações imputadas a Donal Tsang nos seguintes termos, “A primeira das três acusações alega que Tsang, enquanto exerceu as funções de Chefe do Executivo e presidiu ao seu gabinete, o Conselho Executivo, revelou conduta indevida por ter ocultado transacções comerciais com Wong Cho-bau relativas ao aluguer de uma penthouse. Na altura, Tsang era responsável pela atribuição de licenças para concessão de espaço radiofónico, lê-se na acusação. Na segunda incriminação de conduta indevida, Tsang é acusado de ter sugerido a nomeação do designer de interiores – Barrie Ho para um prémio e uma distinção honorífica atribuídos pela cidade. Estes acontecimentos tiveram lugar entre Dezembro de 2010 e Julho de 2011.” A terceira acusação é a aceitação de benefícios por parte do Chefe do Executivo”. O júri não chegou a um veredicto quanto a esta última acusação e por isso o Secretário da Justiça pediu um novo julgamento. O novo julgamento está provisoriamente agendado para o próximo mês de Setembro. É previsível que Tsang entreponha recurso para anular esta decisão. Este caso é de vital importância para Hong Kong. Antes do mais, porque é a primeira vez que um representante do mais alto cargo oficial de Hong Kong é processado judicialmente pelo ICAC. A sua condenação é uma mensagem clara para que todos entendam que a corrupção é ilegal e estritamente proibida em Hong Kong. Mesmo um antigo Chefe do Executivo não está à margem da lei, não existe excepção para esta regra. A mensagem “todos devem obedecer à lei” foi claramente transmitida. O respeito pelo Estado de Direito em Hong Kong está bem patente nesta situação. Para além disto, a condenação de Tsang funciona como um aviso para todos os governantes de Hong Kong porque, para além da sentença normal, será implementada uma sentença preventiva para impedir que casos semelhantes venham a acontecer no futuro. A sentença preventiva é um castigo adicional imposto ao réu. É aplicada para impedir a ocorrência de casos similares posteriormente. Esta punição só pode ser aplicada em situações especiais. O caso de Tsang pertence a esta categoria. Acresce ainda que, a sentença preventiva em conjunto com a condenação de Tsang são uma prova inequívoca para todos os investidores, em especial para os investidores estrangeiros, da coragem do Governo de Hong Kong na luta contra o suborno e a corrupção. Neste momento Tsang está na prisão. Devido ao seu estatuto, é natural que tenha uma cela só para ele e que não esteja em contacto com os outros prisioneiros. O novo julgamento terá lugar em Setembro. Por agora não fazemos ideia de qual será o veredicto. Fiquemos atentos aos desenvolvimentos.
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesFogo de origem criminosa no metro de Hong Kong [dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]ste último Sábado a Polícia de Hong Kong emitiu um comunicado de imprensa onde se podia ler, “A Polícia (de Hong Kong) está a investigar um incidente de fogo posto na estação de Metropolitano de Tsim Sha Tsui ocorrido na noite de ontem (10 de Fevereiro) e que provocou ferimentos a 18 pessoas.” Ontem, (sexta-feira), às 19h14m, a Polícia foi informada que tinha deflagrado um incêndio numa das carruagens do Metro que se dirigia à estação de Tsim Sha Tsui vindo de Admiralty. O incêndio foi controlado pelo pessoal do Metro e pelos passageiros. No incidente ficaram feridas 18 pessoas, 11 mulheres e sete homens, com idades compreendidas entre os 15 e os 60 anos. Os feridos foram assistidos nos Hospitais Queen Elizabeth, Kwong Wah, Prince of Wales, Princess Margaret e no Queen Mary. A Polícia deteve um homem de 60 anos por fogo posto estando o motivo do acto criminoso sob investigação. Foram encontrados no local agentes aceleradores de incêndio em forma líquida. Uma investigação preliminar apurou que o homem terá ateado o fogo por razões pessoais. O homem cometeu o acto de forma isolada não existindo indícios de ter sido obra de uma organização criminosa. A Polícia está também a investigar o estado de saúde mental do detido.” O jornal de Hong Kong “Oriental Daily” adiantava no seu website que o suspeito, Cheung Kam Fai, sofria de “Síndrome Delirante” e tinha “tendências violentas”. Sobre esta matéria a “Wikipedia” informa, “Síndrome Delirante é uma doença mental em que o paciente produz interpretações falsas da realidade, não é acompanhado por alucinações, mas sim por alterações de humor e por um embotamento afectivo. O delírio é um sintoma específico da psicose. Quanto ao conteúdo, os delírios podem ser “bizarros” ou “não-bizarros”; os delírios não bizarros fixam-se em crenças falsas que envolvem situações que, potencialmente, podem ocorrer na vida real, como ser perseguido ou envenenado. Apesar da doença, as pessoas que sofrem de delírios podem manter uma vida social e funcionar de forma relativamente normal sem apresentarem comportamentos estranhos. Contudo, a preocupação provocada pelas ideias delirantes pode vir a destruturar as suas vidas.” Mas voltando ao caso em análise, o suspeito tem dois filhos e está à beira do seu segundo divórcio. O Oriental Daily adiantava ainda que o suspeito recebe tratamento médico para o seu problema mental de quatro em quatro semanas. O último tratamento foi-lhe administrado em Dezembro. Não se apresentou para receber o tratamento de Janeiro embora o pessoal hospitalar o tivesse contactado nesse sentido. Do incidente resultaram três feridos graves de um total 18. O suspeito também ficou seriamente ferido e encontra-se a receber tratamento hospitalar. Depois da ocorrência de fogo posto, o Governo da RAEHK toma medidas. Em primeiro lugar, os sinistrados recebem tratamento hospitalar. Até ao momento, não se registaram vítimas mortais neste caso. O suspeito está também a receber cuidados médicos. A partir da consulta do website, ficámos a saber que na altura em que o incêndio deflagrou, algumas pessoas despiram as roupas que se começavam a incendiar para apagar o fogo. Em segundo lugar, o Governo desencadeia de imediato uma investigação policial. A zona é isolada e as testemunhas são convidadas a contactar a Polícia para prestar depoimento. O suspeito declarou que a sua família tinha sido vítima de um ataque. Os agentes deslocaram-se à residência, mas não encontraram qualquer prova nesse sentido. Os familiares estavam todos de boa saúde. O terceiro passo, foi a visita de membros do Governo às vítimas hospitalizadas. O Secretário para a Segurança, T K Lai, afirmou que este foi um caso isolado e que não existem quaisquer indícios de um ataque terrorista. Antes de mais quero desejar uma rápida recuperação a todas as vítimas deste incidente. Espero que sintam que os amigos e familiares se preocupam com elas. Devem prosseguir as suas vidas com coragem. Por isso, de momento, a recuperação é o mais importante. No entanto, será difícil que estas pessoas venham a ser indemnizadas pelo suspeito, devido à sua alegada doença mental. Se for considerado que não tinha perfeita consciência do que estava a fazer quando ateou o fogo, não pode ser processado. Se as vítimas tiverem seguro, podem pedir uma indemnização às Seguradoras. Se não for o caso, é muito improvável que venham a receber qualquer compensação monetária. O estatuto de doente mental do atacante não só afecta uma acção cível para fins de indemnização por parte das vítimas, como afecta a responsabilidade criminal do suspeito. Embora o suspeito tenha confessado à Polícia que ateou o fogo na carruagem do Metro, esta confissão pode não ser válida em Tribunal porque o magistrado pode considerar que o suspeito não estava em condições de entender o significado das declarações prestadas. Se uma junta médica comprovar que na altura em que ateou o incêndio o suspeito sofria de doença mental, e que como tal, não sabia o que estava a fazer, não poderá ser considerado culpado de fogo posto. Contudo, também não poderá ser considerado inocente, terá de ser enviado para um hospital psiquiátrico para receber tratamento até total recuperação. Ficámos também a saber pelas notícias divulgadas que o comboio em questão era antigo e não tinha câmaras de segurança. Não nos esqueçamos de que, na altura em que o incêndio deflagrou, o Metro se dirigia da estação de Admiralty para a de Tsim Sha Tsui, atravessando o Túnel de Cross Harbour. Mesmo que existissem câmaras na cabine do condutor, como tudo se desencadeou numa questão de segundos, este não teria tido tempo de parar a composição e de pedir ajuda. Depois de tudo isto, a possibilidade do suspeito repetir esta acção é muito reduzida. Para prevenir acontecimentos futuros, é urgente que o Governo da RAEHK prepare um plano de acção para lidar com situações similares. Este artigo vai ser publicado no Dia de São Valentim. Desejo a todos os namorados felicidades e um dia muito agradável. David Chan Professor Associado do Instituto Politécnico de Macau Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau