John Rocha é autor do projecto Eurasian Food Journey, sobre gastronomia macaense

Gosta de comer e adora cozinhar. No regresso aos sabores da infância, John Rocha, um euro-asiático de Hong Kong, decidiu que tinha chegado a hora de partilhar as receitas que vai cozinhando com quem as quiser experimentar. Há uma página no Facebook, um blogue e aulas de gastronomia macaense

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] filho de pai português e de mãe chinesa, nado e criado em Hong Kong. “Cresci numa família bilingue e fui influenciado tanto pela cultura ocidental, como pela cultura asiática”, conta John Rocha ao HM. Consultor de gestão de marcas, decidiu investir, há um par de meses, num projecto pessoal ligado à gastronomia macaense. Criou um blogue e uma página no Facebook, meios que servem para partilhar as receitas que vai experimentando. Pelo meio há também pratos portugueses.

John Rocha decidiu acabar com a ideia de que as receitas de família apenas a ela pertencem. Explica que tem centenas de pratos para experimentar e dar a conhecer ao mundo. Há um regresso aos sabores da infância, aos tempos em que era miúdo e comia os pratos confeccionados pela avó.

“Lembro-me de ser muito pequeno e de a minha família organizar festas – a primeira comunhão, a comunhão solene, baptismos, aniversários e, claro, ceias de Natal. Recordo-me de ver todos aqueles bolos e sobremesas, diferentes dos que eram servidos nas festas dos meus colegas de escola, a maioria deles chineses”, diz.

Das memórias da infância fazem também parte as idas semanais ao Club Lusitano, em Central, depois da missa de domingo. “Comia umas tostas de queijo, galinha e o famoso minchi”, elenca. Com a avó era frequentador habitual de uma loja em Kowloon onde a família encomendava bebincas e chilicotes.

“Foi assim que descobri a comida macaense. E, claro, a minha avó adorava cozinhar”, explica John Rocha. “Era demasiado novo para perceber de que tipo de gastronomia se tratava, só mais tarde é que percebi. A cozinha macaense tem muito que ver com a família, cada uma tem a sua versão de minchi.”

Panelas virtuais, panelas reais

O minchi serve de exemplo para o projecto que já está lançado e que quer expandir nos próximos tempos. “Espero que o meu blogue possa ajudar pessoas que têm algo em comum e que sirva como espaço de partilha, com diferentes receitas para o mesmo prato”, diz. “Neste momento, estou a cozinhar com base nas receitas da minha família e também a partir de receitas que fui encontrando. Gosto muito de fazer isto.”

A ideia da partilha surgiu da utilização das redes sociais. “Como muitas outras pessoas, usava o Instragram e publicava fotografias das minhas fotos. De repente, no ano passado, percebi que não era isso que me dava mais gozo.” Foi então que decidiu “dizer adeus ao mundo das selfies” e começar a publicar conteúdos que “pudessem ser interessantes e terem algum valor para os outros”. Em Dezembro, criou o blogue sobre a viagem gastronómica euro-asiática que quer dar a conhecer ao mundo.

John Rocha tem também algumas preocupações de natureza histórica. “Espero poder ajudar a documentar a gastronomia macaense, que faz parte da história. E, quem sabe, talvez esta iniciativa possa ajudar ao reencontro de amigos que perderam o contacto ou de familiares separados por milhares de quilómetros.” Resumindo, “o Eurasian Food Journey é sobretudo acerca de ligações, pessoas que criam laços através do prazer da cozinha e da partilha.”

Além das fotografias e receitas que John Rocha tem vindo a disponibilizar, a iniciativa deste residente de Hong Kong vai ter uma dimensão mais real: aulas de gastronomia macaense.

“Não estavam nos meus planos”, salienta, vincando que não faz disto profissão. “Como gosto muito de cozinhar, inscrevi-me num curso de cozinha italiana. Estava a falar com a chef acerca do meu contexto familiar e, um dia, ela convidou-me a fazer alguns pratos macaenses”, explica. A professora de cozinha italiana gostou e convidou-o para dar algumas aulas. “Como não faço isto com fins lucrativos, acordámos que parte daquilo que os alunos pagam vai para instituições de caridade aqui em Hong Kong.”

O curso arranca em Março. “As aulas vão ser dadas em cantonês porque espero poder contribuir para que a comunidade local fique a conhecer a gastronomia portuguesa e macaense.” Na lista de pratos de John Rocha não faltam a bebinca de leite e os chilicotes.

8 Fev 2017

Ana Lara Clemente, professora: “Sou uma fã de Macau”

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]na Lara Clemente chegou há quatro anos e meio e cedo se apaixonou pela cidade. Os cheiros, as pessoas, as vivências e as ruas fizeram da professora, criada em Santarém, uma apreciadora de Macau. Até passou a ver algum encanto na confusão.

“Sou uma fã de Macau, adoro cá viver, adoro o clima, adoro as pessoas, adoro tudo.” Ana Lara Clemente, professora do ensino básico, trabalha hoje com crianças de Jardim de Infância. Mas as facetas apaixonantes da região não se ficam por aqui. “Adoro os cheiros, adoro andar pelas ruas, até da confusão, por incrível que pareça, porque venho de uma cidade em que não há confusão”, acrescenta a professora.

Hoje em dia gosta do burburinho do território, assim como das pessoas que partilham as artérias de Macau. “Têm uma cultura muito diferente da nossa, são mais fechados, mas identifiquei-me com isso, porque era, também, uma pessoa reservada”, confessa. Era! Actualmente, comunica muito mais, está mais aberta aos outros, uma evolução pessoal que atribui a Macau.

A sua adoração pela região começou com umas férias de uma semana, preliminares a uma viagem à Tailândia. A sua impressão da cidade já tinha sido boa, apesar da confusão reinante que a baralhou um pouco. Ana Lara tinha cá família, os cunhados, e a sua vida mudou quando o marido veio para Macau trabalhar. Então, no Verão de 2012, veio de malas aviadas para a Ásia, com uma filhota pequena, Carolina, que foi a sua primeira alavanca social. “Foi óptimo para mim a minha filha entrar na escola, porque acabei por fazer muitas amizades com os pais das colegas dela, criei o meu grupo de amigos, que mantenho até hoje”, conta.

Macau continua a seduzir Ana Lara, em todos os mercados, nos passeios que dá com as filhas na zona dos Três Candeeiros, na vila da Taipa, nos monumentos que gosta de visitar. Mas quando se questiona sobre o sítio que a mais marcou, a resposta é fácil: o Alto de Coloane. Outro dos prazeres que tem é levar as filhas aos parques, dar longos passeios, fazer uma visita aos pandas. A família também disfruta a oferta que Macau proporciona: sempre que há um bailado aproveita para levar as filhas e não dispensam uma ida ao cinema. A cidade acolheu-as, mas Ana Lara nota uma diferença entre Carolina e a filha mais nova, que nasceu cá. “A Inês é muito filha de Macau”, conta. Enquanto a filha mais velha quer muito ir a Portugal, sempre impaciente com a chegada das férias, a mais nova, quando regressou de férias e chegou a casa, suspirou. Foi como se dissesse “esta é a minha terra, é aqui que tenho as minhas raízes”, recorda.

Professora mãe

Desde criança que Ana Lara quis ser professora, a sua vida profissional é impulsionada por um sonho de infância. Lembra-se de brincar às professoras desde tenra idade. Porém, a sua experiência na escola primária não foi a melhor, à excepção da professora Isabel que, ainda hoje, recorda com carinho. “O que me inspirou a seguir este caminho foi o azar de ter tido maus professores no primeiro ciclo.” A experiência compeliu-a a ser uma melhor educadora, a procurar ser diferente. Uma espécie de vingança pedagógica.

Criou uma empresa de centro de estudos e ocupação de tempos livres em Santarém, à qual se dedicou durante quatro anos, antes de vir dar aulas para Macau. Por cá encontrou alunos que são expostos a uma vida diferente, com mais facilidades, com um maior acesso a tudo, que tomam o mundo como um dado adquirido. Isso reflecte-se no comportamento na sala de aula. A diferença é maior, principalmente porque Ana Lara trabalhou em Portugal quando a crise económica rebentou. No entanto, esta é a profissão que a realiza, até porque trabalha com “um público muito honesto e aberto”.

Um dos factores que atribui ao seu crescimento profissional é o facto de ter sido mãe. Passou a compreender muito melhor as preocupações dos pais que, anteriormente, podia achar um pouco intrusivas. “Desde que fui mãe apercebi-me das razões pelas quais os pais querem participar. Querem estar atentos à educação dos filhos, saber o que se passa tanto na sala de aulas, como no recreio. A insistência não é porque se querem intrometer na vida dos professores.” O factor maternidade fez com que passasse a dar ainda mais atenção à comunicação com os pais, a criar uma boa relação que una a escola à família.

3 Fev 2017

Cristiano Cannata | De Manhattan à Praia Grande

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] um longo caminho. Nascido e criado em Florença, Cristiano Cannata é um rookie de Macau com uma longa história de trabalho longe da sua terra natal. Começou a trabalhar no território a 1 de Outubro do ano passado e, para já, não podia estar mais satisfeito com a opção profissional e pessoal que fez. “Pela primeira vez em muitos anos, chego ao meu apartamento, fecho a porta e tenho a sensação de que estou em casa”, conta. “É a segurança, o ambiente, as pessoas que aqui vivem”, justifica.

O manager do Caffe B, um restaurante italiano junto ao Lago Sai Van, veio do Laos para Macau. Mas a história das viagens deste homem, que assume ter espírito nómada, começou em 2001. “Descobri que a Europa era um pouco apertada para mim e segui os meus sonhos. Mudei-me para os Estados Unidos, para Nova Iorque, com uns trocos no bolso.” Antes de entrar em detalhes sobre os anos norte-americanos, faz uma declaração: “Tenho de dizer que Nova Iorque foi a melhor escola possível em termos de trabalho”.

Até se abrirem as portas do universo da hospitalidade, Cristiano Cannata quis ser técnico de medicina dentária. Foi para isso que estudou, depois de ter começado a trabalhar, em tempo parcial, num laboratório. Tinha apenas 13 anos. “Ia à escola de manhã e depois aprendia uma profissão”, recorda.

A partir do momento em que a idade lhe deu a possibilidade de entrar em bares e clubes, surgiu mais um part-time. Foi então que apareceram novas perspectivas.

Os ataques de 11 de Setembro de 2001 adiaram a viagem para os Estados Unidos, mas em 2002 era trabalhador a tempo inteiro num bar em Nova Iorque. De empregado de bar passou a gerente, do bar saltou para o restaurante, foi empregado de mesa, tornou-se no responsável máximo pelo espaço onde trabalhava. O caminho fez-se até que, em 2006, aconteceu “a grande mudança” da vida do italiano, uma mudança ainda maior do que a ida para a América.

Maravilhosa Turquia

“Trabalhava no Paper Moon, em Manhattan, e tive a oportunidade de abrir um restaurante do mesmo grupo em Ancara, na Turquia. Precisavam de um gerente. Fui para a Turquia e descobri o país. Foi amor à primeira vista”, diz. Projecto em andamento, regressou a Nova Iorque em Junho de 2007, onde acabou por ficar mais três anos e meio. Questões familiares puseram um ponto final no sonho americano: voltou para Itália, mas o regresso a casa fez-se de forma temporária. Passados três meses tinha, de novo as malas feitas.

O destino que se seguia já era conhecido. Com contrato assinado com uma multinacional italiana, foi abrir um espaço na Turquia. Istambul, explica, tem muitos pontos de encontro com Itália. “É uma cidade muito cosmopolita. É Nova Iorque com 2000 anos de história.”

Dois anos depois desta nova mudança, a empresa pediu-lhe para ir para Miami. “Não gosto da Florida. Ofereceram-me um lugar em Ibiza, mas acho que já sou demasiado velho para ir para lá”, sorri.

A experiência que se seguiu foi a estreia na Ásia. “Fui para o Laos.” Cannata não esconde que sentiu um choque cultural e civilizacional, “vindo da civilização para um sítio que é, tecnicamente, terceiro mundo”. Mas o italiano, que sempre trabalhou em projectos com uma ligação ao seu país, acredita que “tudo acontece por uma razão”. A descoberta da Ásia permitiu-lhe perceber que, “às vezes, corremos em demasia”.

Macau do nada

Os três anos e meio no Laos – com um intervalo de oito meses entre os dois restaurantes que abriu no país – serviram para que a Ásia lhe ficasse “na pele”. Ainda tentou prolongar a estadia, mas pouco mais havia para fazer. “No meu trabalho, é preciso motivação. Vender o mesmo menu e ver os mesmos clientes durante três anos torna-se um pouco pesado. Não havia nada mais que pudesse desenvolver”, afirma.

Em Março deixou o Laos e, mais uma vez, era a Turquia que se perspectivava no horizonte, “para um projecto grande” que, lamenta o italiano, foi cancelado por causa da situação política no país. “Foi aí que dei por mim à procura de emprego. Macau surgiu do nada.”

O que Cristiano Cannata sabia de Macau era apenas “de filmes antigos e que era a Las Vegas da Ásia”. Mas veio até cá para uma entrevista e achou a empresa “muito sólida”. “É uma empresa japonesa. O projecto é muito interessante, há oportunidades de crescimento, e gosto muito de Macau”, resume. “Sinto-me muito seguro, é uma cidade limpa, multiétnica, com pessoas muito interessantes”, acrescenta o manager.

O facto de aqui existirem muitas nacionalidades agrada a um homem que já passou por contextos culturais muito distintos. “Os anos de Nova Iorque ensinaram-me a lidar com sociedades multiétnicas. Basta andar no metro e ir do sul para o norte que, dependendo da paragem onde se está, o sotaque pode ser completamente diferente, com comunidades diferentes. É preciso ter uma mente muito aberta”, observa. “Gosto desse lado em Macau, de ser multiétnico, mas sem o ritmo apressado de vida que se encontra em Hong Kong ou em Nova Iorque.”

O facto de ser um rookie faz com que ainda lhe seja difícil fazer uma avaliação justa do território. Mas já detectou uma falha: para certas coisas, é preciso ir a Hong Kong. “Ando à procura de uma livraria e ainda não encontrei. Mas não tenho muito tempo para explorar a cidade, por isso talvez a culpa seja minha.” Estas “pequenas coisas” não diminuem a sensação de paz que aqui encontrou. Macau dá a ideia de ser a casa.

1 Fev 2017

Café Sab8 | Sandra Barros, proprietária

No coração do antigo Bazar, há um espaço que pega na tradição dos sabores de Macau e dá-lhes um twist moderno. No remodelado Pátio Chôn Sau, o Cafe Sab8 é uma opção para uma refeição, ou apenas para um café e um pastel

[dropcap style≠’circle’]Q[/dropcap]uem atravessar o Pátio Chôn Sau encontra os graffitis modernos mas, agora, completamente tomados de assalto pela decoração para o ano novo chinês. Depois do festim de cor, é possível que a visão seja tentada por um pequeno café/restaurante que convida quem passa a entrar: o Cafe Sab8. Aí, prepare-se para regalar o olfacto e o paladar num verdadeiro festim para os sentidos.

Se resistir ao minchi de carne picada e arroz, dificilmente poderá passar as tartes de bacalhau e sardinha. Se sobrar espaço, a torta de laranja é uma das mais populares sobremesas do restaurante à qual é difícil resistir. Estes são os pratos com maior saída do estabelecimento.

Sandra Barros, dona e mentora do Sab8, conta-nos que “procurou trazer a cozinha macaense para a modernidade”, isto porque considera que “esteve estagnada durante demasiado tempo”. A ideia foi dar-lhe um toque contemporâneo para a encaixar melhor no mercado actual e tornar os pratos tradicionais macaenses mais apelativos para as novas gerações.

A localização não podia ser mais propícia à fusão do moderno e do tradicional. O Pátio Chôn Sai é muito trendy, cheio de lojas de design e decoração com um toque vanguardista. Este pequeno oásis de modernidade fica situado numa das zonas comerciais mais antigas de Macau. A 50 metros de distância pode-se comprar um gelado de coco num barracão ou passear pelas lojas tradicionais que vendem antigo mobiliário chinês. Também se podem encontrar inúmeras barraquinhas de rua a vender toda a espécie de iguaria chinesa. É como se um pequeno reduto moderno estivesse a desafiar o tradicionalismo circundante.

Sandra sempre gosto de cozinha, as experiências com paladares e cheiros cresceram com ela. “Quando tinha 10 ou 11 anos, adorava ir ao mercado e cozinhar o que comprava”, conta. No entanto, a vida não a aproximou logo da restauração. Primeiro veio a formação na área económica. Depois de estudar gestão, onde teve a oportunidade de trabalhar numa cadeia de cafés de Macau, decidiu aprender pastelaria. Durante esse processo de formação, frequentou um estágio onde fez mais de 300 horas na cozinha de vários hotéis. Apaixonou-se e assim começou a aventura, que culminou com a inauguração do Sab8 em Agosto de 2015.

Atmosfera confortável

“A ideia era criar um espaço com uma atmosfera relaxada, simples, e acolhedora”, revela Sandra Barros. Quem entra no café é recebido com um sorriso hospitaleiro e um jazz suave. Apesar de não ser um espaço amplo, é confortável, mesmo para um cappuccino, ou uns aperitivos. Neste capítulo, aconselha-se um copo gelado de vinho verde Pássaros, um néctar que mistura as castas alvarinho e trajadura, da região vitivinícola de Monção/Melgaço, de preferência acompanhado por uma tarte de bacalhau.

O Sab8 está localizado numa zona turística, apesar de relativamente escondida pela Rua de Nossa Senhora do Amparo. Ainda assim, os principais clientes são “turistas e, também, pessoas locais que trabalham nas imediações, como Leal Senado e San Ma Lo”, revela a dona. Quem entra, normalmente, sai satisfeito. Para Sandra, esse é o grande objectivo. “Quero que os clientes sejam felizes no café, comer é uma parte tão importante na vida das pessoas, que é um prazer poder proporcionar essa satisfação a alguém”, confessa.

Para que tudo corra bem, Sandra Barros tem em atenção todos os detalhes, para manter tudo em ordem no café. A cozinha limpa e organizada, o chão imaculado, tudo no seu devido lugar. Estas são as partes chatas de gerir a operação de um café/restaurante. Por outro lado, há que garantir que os ingredientes são frescos através de um rigoroso controlo de qualidade. Este é o equilíbrio necessário para que nos chegue um prato a fumegar à mesa. Bom apetite.

25 Jan 2017

Oszkar Fulop: “Apaixonei-me por esta terra”

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]szkar sempre teve um fascínio com a Ásia, um continente que o aliciava e o chamava de forma surda, numa voz que chegou ao centro da Europa. Na altura, essa voz chegou através de uma proposta de emprego que não soube como recusar. Assim começava a expedição de um húngaro, oriundo da Transilvânia, a terra do Drácula. Antes da Primeira Grande Guerra, o território pertencia à Hungria, mas com a queda do Império Austro-Húngaro, seria anexado pela Roménia. Oszkar faz parte de uma família húngara numa região com apenas dois mil húngaros.

Oriundo de uma nação fracturada por múltiplos impérios, entalada entre blocos políticos, Oszkar desde criança que sentiu o chamamento dos países asiáticos. Com a queda do muro, e a chegada do capitalismo, as coisas melhoraram mas não tanto. “Tivemos um período difícil, e parecia impossível termos um trabalho e ganhar dinheiro que nos permitisse ser turistas”, recorda o segurança. Com a vida enleada num marasmo, em 2013 foi a uma agência de emprego e, por acidente, acabou por conseguir um trabalho na longínqua Macau. Seria um guarda imperial no Hotel Grand Emperor. “Apesar das condições salariais não serem espectaculares, esta era a melhor oportunidade que tinha para conseguir estar na Ásia, e Macau pareceu-me, desde logo, um bom sítio para começar”, lembra. Dessa forma o húngaro estaria a escassas duas ou três horas de voo de países que queria muito conhecer, tais como a Tailândia, o Japão, e a China interior.

“Cheguei ao aeroporto de Hong Kong e sabia zero sobre o que me esperaria, não sabia que Macau tinha sido uma colónia portuguesa”, confessa o segurança. Veio sozinho, e só tinha os representantes da empresa que o contratara à distância à sua espera no ferry. Depois de conhecer o sítio onde iria morar, de ter formação no trabalho que iria desempenhar, restava-lhe conhecer a cidade onde passou a morar. No entanto, o primeiro impacto foi difícil de encaixar. “Nos primeiros seis meses tinha a certeza de que ia apanhar o primeiro avião para deixar Macau para sempre, mas depois apaixonei-me por esta terra”, explica.

Primeiro estranha-se

Macau foi-se entranhado em Oszkar, lentamente. Levou tempo a perceber aquilo que não gostava. O principal problema a barreira da linguagem, a comunicação. Não tinha nada a ver com o local, nem com a cultura. Hoje em dia, o húngaro é feliz no território, vive num bairro tradicional, São Lázaro. Um dos episódios marcantes que mudou tudo aconteceu por acaso, foi uma feliz coincidência. Numa tasca tradicionalmente chinesa, conheceu um grupo de locais. “Comecei a passar mais tempo com eles, e aí conheci mais locais. Percebi que estava a fazer uma aproximação estúpida e que eu é que estava errado”, confessa Oszkar.

O húngaro percebeu que se demonstrasse que estava a aprender a língua, a fazer um esforço, os chineses gostavam de si, incondicionalmente. Foi aí que o amor lhe bateu à porta. “Conheci uma rapariga portuguesa que já vivia aqui desde 1994, com uma paragem pelo meio, e aí fui descobrindo a comunidade portuguesa, um grupo mais alternativo”, recorda. Essa foi mais uma porta aberta para mergulhar na vida da cidade, assim como para conhecer Portugal.

“No Verão de 2014 visitei Portugal, conheci o Algarve e o Alentejo, adorei os cenários naturais, as barragens e a comida”, explica.

Hoje em dia, Oszkar considera-se um cidadão do mundo. Apesar das saudades imensas da família, o húngaro olha para a Europa com imensa preocupação. “Existe muito racismo a vir à superfície na maior parte dos países europeus”, comenta com alguma tristeza. Tal facto, levou o segurança a sentir o velho continente como um território onde se espalha a ignorância, o medo, o que faz com que não se sinta seguro por lá. Porém, em Macau sente-se em paz.

20 Jan 2017

T-O-W | O moderno no coração do antigo

Em pleno zona do antigo Bazar, existe um pequeno oásis de modernidade, o Pátio de Chôn Sau. Aí podemos encontrar a loja T-O-W, onde os acessórios de escritório e casa ganham uma outra vida e cor

 

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]scondida pela Rua de Nossa Senhora do Amparo, numa zona tradicionalmente comercial, cheia de edifícios pouco coloridos e repletos de fuligem, encontramos a T-O-W. Encontramos se procurarmos, mas a descoberta vale a pena. A loja é uma mina de modernidade, de estética trendy no coração de um bairro tradicional chinês. Para quem passeia pela zona, encontrar o pátio onde fica a loja pode ser uma mudança de cenário demasiado abrupta.

“Esta é a zona comercial mais antiga de Macau, a primeira, e a nossa ideia é renovar e dar uma nova energia ao sítio, rejuvenescê-lo”, diz Eurico Ao, director criativo da loja. A T-O-W é um dos estabelecimentos que abriram no Pátio de Chôn Sau, numa atmosfera colorida, com grafittis nas paredes e lojas com produtos mais típicos de grandes cidades mundiais, como Nova Iorque, Londres ou Hong Kong.

Quem lá entra parece estar num museu de design para utensílios de casa e escritório. Tudo muito colorido, divertido, decorativo, mas funcional. Podemos encontrar quadros e alguns objectos curiosos de decoração, assim como comprar gadgets que farão com que quem nos visite pergunte: “Onde arranjaste isso?”.

Os artigos variam entre caixas para lentes de contacto que são joaninhas, sabonetes em forma de caveira mexicana, canetas de espião que escrevem com tinta que só é perceptível quando atingida com raios UV. Também se pode encontrar um robot que faz infusão de chá, um porta fita-cola em forma de tractor, borrachas que parecem bigodes, ou amendoins. Enfim, as possibilidades são tantas quanto a imaginação permite.

“Temos um pouco de tudo, são produtos divertidos, dinâmicos. Os preços são acessíveis, perfeitos para prendas de aniversário, ou quando se quer comprar algo divertido para animar um amigo”, explica Eurico. Nove meses depois da inauguração, o director criativo do espaço confessa que o negócio corre bem. “Os produtos que vendemos aqui são fáceis de comercializar, aliás, basta ver a primeira reacção de quem entra na loja, que é sorrir.” Além disso, o lojista tenta acompanhar o cliente, guiá-lo pelos diferentes artigos, como se fosse uma visita a um museu de design em que se podem comprar peças.

É frequente que quem visite a T-O-W já conheça muitos dos produtos de revistas de gadgets, ou através da Internet. A loja também vende a famosa cerveja artesanal IPA, assim como uma longa variedade de abre-garrafas, de todas as formas e feitios.

Clientela jovem

“A T-O-W é uma loja moderna, atrevida, mas dirigida a todo o tipo de idades, diria que é para o cliente com um espírito jovem”, explica Eurico Ao.

Quem entra no espaço é bombardeado por cores e um conjunto de formas que normalmente não são associados a utensílios de casa ou escritório. Para o director criativo do estabelecimento, é difícil escolher um produto que se destaque entre os mais vendidos. “As vendas são muito bem distribuídas, equilibradamente, mas, talvez, a caneta de espião.”

A T-O-W é um pouco a síntese do ambiente que se vive no Pátio de Chôn Sau, um pequeno quarteirão trendy, com cafés, lojas de decoração, lojas de noodles. Tudo muito colorido, jovial, com um fortíssimo componente contemporâneo, apesar do contexto local ser tradicional e cinzento.

Portanto, é natural que este tipo de espaços seja mais atractivo para quem vem de fora. Não é de estranhar que Eurico Ao considere que a loja é concebida, ou mais bem entendida, para quem tenha um background europeu, ou norte-americano. Neste contexto, é natural que a maioria da clientela seja de Hong Kong, também com bastantes sul-coreanos e taiwaneses. Curiosamente, o estabelecimento tem passado um pouco ao lado dos locais o que, para Eurico, só pode ser explicado pelo “espírito um pouco mais conservador”.

18 Jan 2017

Teresa Fernandes, estudante: “Há muita coisa a mudar neste mundo”

 

[dropcap style≠’circle’]T[/dropcap]eresa Fernandes tem 16 anos e a convicção de que um futuro melhor é possível. A adolescente, que frequenta o 11.º ano na área das Ciências Económicas, não anda a ver o mundo de longe. As acções e decisões que já toma reflectem um olhar atento para as necessidades, actuais e futuras. A escolha académica é também um exemplo disso. Se a prioridade seriam as humanidades, a “economia pode dar mais oportunidades”. “É também uma área que me interessa muito e fundamental na actualidade”, disse ao HM. O objectivo é possuir ferramentas capazes para, na medida do possível, “intervir no mundo e poder trabalhar, por exemplo, em organizações não-governamentais que se dediquem a ajudar quem precisa”.

Para a adolescente a saída é clara: “Um economista pode trabalhar em áreas além do universo financeiro e intervir activamente para a justiça”. Teresa Fernandes sublinha que “há muita coisa a mudar neste mundo porque roda tudo à volta do dinheiro”. “Gostava que não houvesse tanta injustiça social, gostava que acabasse o comércio de armas, por exemplo”, diz. No entanto, a esperança é maior que a desilusão: “O mundo é muito imperfeito mas, se houver mais controlo nalgumas áreas, poderá ser melhor. Isso parte muito de nós enquanto jovens, porque somos o futuro”.

E porque o dia de amanhã se prepara hoje, Teresa Fernandes embarcou, no Verão passado, naquela que foi a experiência da sua vida. A mais nova da equipa “Meninos do Mundo” passou uma semana em São Tomé e Príncipe, integrada numa missão de intervenção junto das escolas. A ideia foi dar a conhecer os direitos das crianças porque “elas muitas vezes não sabem que os têm e, se sabem, não sabem quais são”.

A experiência não foi a de umas férias num sítio bonito. Foi antes uma realidade que, apesar de mais ou menos esperada, “jamais será esquecida”. Antes de embarcar, fez o trabalho de casa. “Imaginei de tudo um pouco: como vivem as pessoas, o que comem, como me iriam tratar, como seria a pobreza, etc.”, recorda. No entanto, a realidade supera a imaginação, os livros ou os documentários televisivos. “Uma coisa é ver na televisão, outra é ver com os próprios olhos. Ver as coisas à nossa frente muda tudo, dá-nos a verdadeira noção da realidade e isso mudou a minha vida”, considera.

Das diferenças que nota do antes e depois de uma acção humanitária em São Tomé, a maior é o valor dado às coisas que possui. “Aprendi a valorizar o que tenho. Aquilo que as mães dizem desde que somos pequenas, para comer tudo porque há gente a morrer à fome, é verdade”. Na altura não entendia como é que a comida que deixava no prato poderia suprir as necessidades dos outros que, “tão longe”, não tinham com que se alimentar. Agora não tem dúvidas que, “acima de tudo, é uma questão de respeito”. “Depois de São Tomé, não faço questão de ter muitas coisas em casa e não compro por sistema aquilo de que não necessito verdadeiramente.”

A adolescente não deixou de fazer a analogia com Macau, “esta bolha que é tão rica”. “Aqui é tudo muito fácil. Viajo, vou a restaurantes, passeio, mas isto é um mundo à parte”, reflecte.

Esta, espera, foi a primeira de muitas missões que quer fazer no futuro porque acredita que, “mesmo com tão pouco, é possível mudar alguma coisa”.

Fotografias para contar histórias

Da missão ficou uma exposição de fotografia que Teresa Fernandes quer mostrar. “Já tinha ideia de fazer uma exposição depois da viagem para dar a conhecer a experiência de outra forma. Tive necessidade de guardar aquelas imagens que nos entraram pelos olhos”, recorda.

Depois de uma apresentação na Escola Portuguesa, a adolescente tem na mira a Fundação Rui Cunha, a Casa de Portugal ou o Consulado, em suma, “algum lugar visível para partilhar a experiência”.

A ideia da fotografia é, para a jovem, “importante para que se possa captar os momentos”. A experiência fica para sempre, “mas as imagens ilustram e comunicam com os outros: é como se fossem um livro”.

Mais do que momentos, a exposição foi concebida para criar uma linha de pensamento, para construir uma narrativa. Uma história que “retrate uma realidade distante e muito dura”. “Estamos a falar de pessoas que, apesar de muito pobres, conseguem ter em si a alegria.”

13 Jan 2017

Get Shape, roupa desportiva | “Queremos atingir o público chinês”

A Get Shape é uma marca de roupa desportiva que vem do Brasil e que chegou a Macau pela mão de Cácio Borges Inhaia. Desde há três anos para cá que as roupas fazem sucesso, existindo planos para a expansão em Hong Kong e na China

[dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]oje em dia não basta fazer desporto, há que fazê-lo também com estilo. Foi a pensar nessa tendência que o brasileiro Cácio Borges Inhaia resolveu trazer a marca brasileira “Get Shape” para Macau há três anos. O negócio tem estado a correr tão bem que há até planos para a sua expansão para além das fronteiras da RAEM.

“Quando a marca chegou a Macau, a ideia era vender as roupas apenas na loja de depilação brasileira ‘We love wax’. Mas como a marca está a registar um grande fluxo de vendas, estamos a pensar em expandir e vender para Hong Kong e China”, contou o importador ao HM.

Cácio Borges Inhaia garante que os clientes sentem de imediato a diferença das roupas. “Ao início não reagem, mas depois o que acontece é que, em vez de levarem uma peça, levam muitas mais. A malha e o corte brasileiro são muito bons. Além de proporcionarem conforto, são peças que ajudam a definir a silhueta, o que faz com que sejam diferentes daquilo que se conhece, não só na Europa, como também em Macau.”

A ideia de trazer a representação da marca para Macau partiu da vontade de mostrar o que de diferente existe no mercado do outro lado do mundo. “Hoje em dia temos uma gama de produtos para tentar atingir o público chinês e os estrangeiros que cá vivem. Achamos necessário trazer algo novo para Macau, para além do que existia, baseado num conceito um pouco retro. Quisemos trazer um design completamente novo, tanto no que respeita ao corte e às malhas de confecção, como aos estampados”, explicou Cácio Borges Inhaia.

“Estamos a fazer uma nova campanha publicitária e a montar o catálogo para este ano, que já contém colecções para o Verão e o Inverno. A ideia é, com isto, entrar de cabeça no mercado chinês. No início vamos à procura de lojas e ginásios para que possamos tentar chegar directamente ao público-alvo, que são as mulheres”, disse ainda o responsável.

Cácio Borges Inhaia garante que os seus produtos prometem aliar o conforto ao lado estético. “Umas calças de ganga não terão o mesmo conforto de umas leggings. As nossas malhas são de elastano que, por serem de elástico, dão muito conforto e são práticas de usar. Como é um design brasileiro, são confortáveis e encaixam bem no corpo, acabando por corrigir algumas imperfeições, como estrias ou celulite.”

O responsável garante que esta junção melhora o estado de espírito de quem usa estas roupas. “Quem veste fica em forma, molda o corpo e também o estado de espírito, porque a pessoa se sente bem vestida, fica mais bem disposta e com uma maior auto-estima.”

A China e o desporto

É certo que a moda há muito que entrou no mundo do desporto, mas só recentemente é que a China aderiu a essa tendência. Para Cácio Borges Inhaia, trata-se de um “mercado pouco misto”, com uma gradual abertura.

“Sinto que vamos lentamente introduzindo e mostrando novos conceitos, e os chineses estão à procura de novidades de outros mercados. É uma coisa boa para um país que esteve tanto tempo fechado ao mundo, e agora está a ter esta oportunidade de aceder a coisas e conceitos novos.”

Apesar de considerar a moda desportiva retro, Cácio Borges Inhaia nota um aumento da prática de desporto. “Os hábitos desportivos estão a crescer cada vez mais. Temos o Crossfit e maratonas também. Este é já um mercado forte no estrangeiro e isso começa a reflectir-se por cá, não apenas para melhorar a saúde, como também a aparência”, rematou.

11 Jan 2017

Dennio Long, arquitecto e fotógrafo | Por entre esboços e detalhes

 

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] um apaixonado pelo património da terra que o viu nascer e isso nota-se assim que se visita a sua página no Facebook com o seu nome. Trata-se de um espaço cheio de memórias, muitas vezes com rostos.

Dennio Long estudou Arquitectura no interior da China mas, nos tempos livres, gosta de fotografar os monumentos dos quais ninguém se lembra, que ficaram esquecidos nas velhas memórias de uma Macau que já não existe. Há ainda fotografias sobre Itália e Portugal.

São os detalhes que ele quer mostrar, para que nem tudo se perca com o passar do tempo. “Como estudei Arquitectura, estive sempre atento aos monumentos de Macau e reparei que as transformações são enormes, e parece que ninguém está a tomar atenção a isso. Por isso tiro fotos aos monumentos a que as pessoas não prestam muita atenção. Dou atenção sobretudo aos que não estão protegidos pela UNESCO, que têm um estilo mais moderno ou que são esquecidos pela população.”

Dennio Long dá como exemplo a zona do Porto Interior ou os pátios tradicionais chineses, a maioria deles em risco de ruína. O arquitecto fala ainda do exemplo da Escola Portuguesa de Macau ou das casas da zona de San Kio, um exemplo de Art Nouveau ao estilo chinês.

“Depois da transferência de soberania, o desenvolvimento económico da cidade foi rápido e as mudanças foram demasiado rápidas, muitas das quais não notamos. Espero que a nossa geração possa ser como a geração mais velha, ou seja, mais responsável, com a criação de memórias da nossa cidade. Esse também é o objectivo da fotografia.”

O interesse pela fotografia começou há dez anos e foi através dela que Dennio Long percebeu que, em Macau, há coisas que se perdem de um dia para o outro para nunca mais voltarem. “Notei uma grande diminuição de monumentos. Costumo andar pela rua, olho uma casa e, como não trago o meu equipamento, não tiro a fotografia. Um mês depois a casa já não está lá.”

O passado ignorado

Além das fotos que partilha nas redes sociais, Dannio Long pretende chamar a atenção do Governo para a forma como a cidade está a crescer e, ao mesmo tempo, a desaparecer.

“As pessoas elogiam os cenários bonitos mas, na prática, não querem voltar ao passado. As pessoas não querem morar nas casas velhas, sobre as quais o Governo não tem capacidade de gestão, por serem privadas. É difícil usar os cofres públicos para fazer algo. O Governo tem de pensar em métodos mais detalhados para proteger as zonas em separado.”

Quanto ao centro histórico, Dennio Long considera tratar-se de um “conceito vago”, onde se misturam vários estilos e temporaneidades. “Há dez anos ainda conseguíamos ver as ligações, mas tudo isso desapareceu. Acho que o que existe actualmente já não corresponde ao centro histórico.”

O arquitecto recorda-se, então, da Europa. “Em Itália há uma zona inteira com arquitectura antiga em várias ruas e isso em Macau não existe, está tudo misturado com outros tipos de arquitectura, quebrou-se a ligação.”

Dannio Long tira fotos da perspectiva de um arquitecto e são os detalhes que mais gosta de mostrar: aquela janela que enferrujou com o tempo, a cortina que ficou, o degrau que nunca mais foi limpo.

“Se olharmos com mais atenção, as fotos publicadas pelo Governo são falsas, são cenários que não correspondem à realidade. Quero apresentar cenários verdadeiros às pessoas, e espero que as minhas fotos possam gerar algum tipo de pensamento nos outros.”

O que faz, considera, é quase único. “Não há muitos fotógrafos profissionais em Macau, e os poucos que existem não gostam muito de tirar fotografias exclusivamente dos monumentos”, remata.

6 Jan 2017

Juice Ga, empresa de sumos naturais: “Acredito cem por cento nos meus produtos”

 

Há três anos no mercado, a Juice Ga está prestes a reinventar-se como empresa local de fornecimento de sumos naturais em casinos e empresas. Vem aí a distribuição de sumos à porta de casa, a fazer lembrar o extinto hábito de entrega de garrafas de leite

 

[dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]uito antes de Macau receber a moda dos sumos naturais e programas de desintoxicação através dos alimentos, já Vincent Ma tinha a ideia de abrir um negócio nesta área. Tudo se deveu à sua experiência na Califórnia, nos Estados Unidos, onde fez os estudos superiores.

“Criei a empresa em 2014 e decidi apostar neste negócio porque vivi uma temporada nos Estados Unidos, em Los Angeles, e passei por várias empresas. Queria trazer essa cultura para Macau, porque não havia uma grande diversidade na altura. Queria apostar em bons produtos, saudáveis, e queria trazer isso para cá.”

Nascia assim a Juice Ga, que fabrica os seus sumos num espaço localizado na Areia Preta e que começou por fazer o fornecimento a casinos e hotéis. Mas a ideia é ir além disso: depois de um período menos bom em termos de vendas, Vicent Ma quer apostar na entrega de sumos em casa.

“Antigamente as empresas distribuíam as garrafas de leite à porta de casa. Estou a tentar lançar um projecto semelhante, mas com sumos. Queremos que muitas famílias de Macau comecem o seu dia com um bom copo de sumo”, contou ao HM.

Completamente natural

Numa altura em que há várias empresas e restaurantes de comida natural em Macau, o que torna diferente a Juice Ga? Vincent Ma garante que é o facto de todas as frutas e legumes serem biológicos.

“Fazemos sumos de pressão, com uma tecnologia diferente em relação às outras empresas. Temos sumos cem por cento naturais, sem adição de açúcar ou de água, usamos frutas e vegetais cem por cento naturais também. Temos planos detox próprios, em que a pessoa não come mais nada e apenas bebe os sumos para desintoxicar o organismo. É um tipo de dieta muito popular nos Estados Unidos e que ajuda o funcionamento do organismo”, conta.

Todas as receitas são preparadas por um nutricionista. “Acredito cem por cento nos meus produtos, porque são totalmente naturais, sem conservantes. Estou a tentar apostar numa maior diversidade de produtos para fazer os nossos sumos. Trabalhamos com uma nutricionista para criar sumos que sejam equilibrados em termos de calorias, com a dose certa para cada pessoa consumir diariamente”, adiantou Vicent Ma.

Apesar deste tipo de programas detox serem cada vez mais populares, a verdade é que a Juice Ga teve de passar por uma reestruturação recente, com um olhar mais atento ao mercado local.

“O negócio tem sofrido altos e baixos, não tem estado muito bem ultimamente. Estamos a tentar analisar o mercado de novo, porque não utilizamos quaisquer conservantes nos nossos produtos e penso que os preços que praticamos são algo elevados. Mas, neste momento, o mercado continua a aceitar os nossos produtos. Depois da nossa redução de preços em Dezembro, para metade do valor, o mercado está lentamente a aceitar os nossos produtos. Dezembro foi um mês muito importante para nós”, acrescentou.

Depois de fornecer bebidas para a indústria do turismo, a Juice Ga pretende ter uma visão mais abrangente do mercado. “A economia decresceu e muitas empresas começaram a cortar em alguns produtos. Então começámos gradualmente a passar do fornecimento da indústria hoteleira para todo o mercado. Neste momento apenas fornecemos alguns cafés, estamos mais focados no mercado no geral”, rematou o empresário.

 

 

Edifício industrial Chong Fong Bloco 1

Rua Doca dos Holandeses nº 75 84

Macau

4 Jan 2017

Andrea Prado, visual merchandiser | Da Amazónia para a selva urbana

[dropcap style≠’circle’]“C[/dropcap]omo eu vim do Brasil, achava que a China ficava no fim do mundo.” As palavras são de Andrea Prado, que hoje recorda o quão Macau lhe parecia longínquo ao chegar. Algo com que não sonhava, quando saiu de Belém, no belíssimo estado do Pará. Tinha, na altura, 15 anos. Com laços familiares em Portugal, o pai de Andrea sempre acalentou mudar-se para a Europa. Assim foi, chegaram a Portugal, alugaram um carro e percorreram o país de norte a sul durante dois meses, com particular detalhe para o norte. Passaram vários dias em cada cidade para as experimentar, para as provar. Lisboa, Coimbra, Porto, Braga, Guimarães, as principais cidades, até porque o pai de Andrea “tinha de trabalhar e não dava jeito ir para uma aldeia”.

Quando chegou a altura de decidir, o Porto foi o sítio eleito por acharem que era mais fácil a integração. “Era uma cidade fácil de atingir, de conquistar e muito romântica. Além disso, conheci os filhos de uns amigos do meu pai, que eram meio artistas, e deram-nos CD dos Bandemónio e dos Delfins”, lembra. Lisboa não dava para Andrea, era muito dispersa, e tinha-se de usar mais o carro.

Entretanto, vieram os estudos de design de moda e o amor. Casou-se com Simão, arquitecto. Na altura começava a rebentar a crise em Portugal e, com um filho a caminho, a vida em Portugal começava a perder encanto. Uma situação complicada para um casal em que ambos são profissionais liberais. Ele no atelier de arquitectura, ela no atelier de design de moda. “Quando a crise começou, o mercado da moda foi o primeiro a ser afectado, as coisas supérfluas são deixadas mais à parte”, recorda. Estava na altura de fazer as malas outra vez.

Rumar a Oriente

A resolução estava tomada, restava saber para onde ir. Chegaram a ponderar o Brasil mas, como o marido de Andrea tinha residência de Macau, o casal pensou que seria mais fácil a mudança e integração.

Quando chegou, não tinha qualquer expectativa de Macau, até porque a Ásia era um mundo novo. Num ápice a distância para o Brasil aumentou consideravelmente. Tinha uma ligeira ideia de sujidade e desorganização, o que acabou por bater certo. Mas não conhecia o outro lado, o factor surpresa de um contexto cultural completamente diferente. “Acho piada às discrepâncias e às desigualdades de uma cidade tão confusa e descomposta. Já estive em muitos sítios, mas aqui as coisas são tão desreguladas, e têm um lado cómico que podemos achar exagerado ou mesmo excêntrico”, lembra a visual merchandiser.

Na adaptação, o facto de a cidade ainda manter a língua portuguesa nas placas das ruas e nos serviços foi algo que ajudou bastante, não é a mesma coisa que “ir para Zhuhai ou Shenzhen”, acrescenta.

Por outro lado, Andrea fala de um sentimento de clausura. “Para onde quer que vás tens de passar fronteiras, pagar vistos, dá um pouco a sensação de prisão.” Além disso, a designer não acha piada à forma como se “constrói e destrói sem a mínima consciência, plano ou organização, sem se pensar na população de forma coerente”.

Muito diferente dos anos da Macau romântica e charmosa que o seu marido conheceu, do glamour do Hotel Lisboa, e da cidade que parecia muito mais pequena, quando o Cotai não existia.

Mãos à obra

Nos primeiros tempos ficava muito em casa com o bebé e não foi fácil encontrar emprego. Primeiro surgiu-lhe uma proposta para o Studio City como técnica de guarda-roupa para espectáculos. Ficou na dúvida, até que lhe surgiu a possibilidade de trabalhar na Prada como visual merchandiser, onde está há dois anos.

Hoje em dia, o trabalho é das melhores coisas de Macau, onde trata das montras da Prada, assim como de todo o arranjo visual de produtos nas lojas, em coordenação com as vendas e distribuição.

Se o emprego é um mar de rosas, criar o filho de três anos em Macau não tem sido nada fácil. “É uma cidade suja, muito poluída, e uma criança que vá para um parque não pode brincar na relva, só no alcatrão”, comenta Andrea. Essa foi uma das razões que fizeram a família mudar-se para Coloane, para ter mais espaço, mais verde, mais liberdade.

Se por um lado, é fácil encontrar uma babysitter, a preços baixos, Andrea não vê nisso uma vantagem assim tão grande. “Se fosse em Portugal poderia deixar com a minha irmã, ou encontrar uma escola com a qual me identificaria mais em termos de métodos de ensino e pedagogia”, confessa.

 

30 Dez 2016

#Matters, marca de joalharia | Pedras com estilo

 

Clara Yung já tinha uma paixão por roupa antiga quando decidiu criar a sua própria marca de joalharia. A #Matters pretende trazer algo de novo a quem usa as jóias da marca, que não passa apenas pelo estilo

 

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ão fios debruados a ouro com pedras que pretendem transmitir algo de novo a quem as usa. São clássicas mas, ao mesmo tempo, contemporâneas. É assim a #Matters, marca de joalharia criada por Clara Yung. Esta não foi a primeira incursão de Clara Yung no mundo do estilo e beleza: é proprietária da Old Town Vintage, uma loja de roupa localizada junto ao Bairro de São Lázaro que vende peças antigas, que fazem lembrar os anos 60, 70 ou 80.

A joalharia da #Matters é vendida no mesmo espaço e pretende ser um complemento a este tipo de roupa. “Criei esta marca porque tinha a intenção de criar as minhas próprias jóias, para que pudessem coincidir com a minha loja de roupas vintage [Old Town Vintage]. A marca foi criada na Primavera do ano passado”, conta.

Com a marca surgiu ainda um website para a divulgação das jóias que, diz a designer, “tem recebido muitas reacções por parte das pessoas”. “Estou também à procura de oportunidades no envio de joalharia por encomenda”, conta Clara Yung ao HM.

Com uma paixão por este tipo de trabalho artesanal, Clara Yung quis criar algo único e com qualidade, diferente do que se vende por aí ou do outro lado da fronteira. “Sou uma apaixonada por cristais e cheguei à conclusão de que a maioria das pulseiras ou colares feitos com cristais são bastante rudimentares. Queria ter as minhas próprias pulseiras e colares, e por isso comecei a desenhar as minhas jóias.”

Os colares e pulseiras da #Matters são, assim, feitos com peças em ouro. “Uso fio em ouro e pedras em ouro para criar uma pulseira. Adoro criar pulseiras com pedras feitas ao estilo japonês, adicionando um toque mais europeu.”

Transmitir energia

Clara Yung tem uma noção diferente do papel que as jóias devem ter para quem as compra. Não basta comprar porque uma jóia é bonita ou tem um valor elevado, há que transmitir algo. Foi essa ideia que levou ao nome dado à marca.

“Decidi pôr o nome ‘#Matters’ porque é uma palavra que significa substância. São coisas que estão ao nosso alcance e nas quais podemos tocar, mas têm, ao mesmo tempo, um lado espiritual. Não quero apenas que os meus clientes melhorem o seu estilo com os meus produtos, também quero que se melhorem a si mesmos enquanto pessoas, ao nível da mente e da auto-confiança, para que possam obter energia a partir dos cristais”, explica a criadora.

Apesar de ambas as marcas de Clara Yung estarem localizadas num dos espaços icónicos de Macau, a Old Town Vintage e a #Matters são sobretudo negócios online, cuja venda de faz através de um contacto prévio.

 

#Matters
Rua de Manuel Arriaga 64-A
Macau
28 Dez 2016

Rita Serafim | Uma mulher entre voos

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]terrou pela primeira vez em Macau há 20 anos, ainda durante a administração portuguesa. Imagine-se, uma adolescente de 13 anos, arrancada do seu meio, dos amigos, da escola, e de tudo o que tinha conhecido até então, para vir morar para o outro lado do mundo.

“O meu pai foi convidado para trabalhar para a Air Macau e a família mudou-se para cá”, lembra Rita Serafim. Numa altura da vida em que tudo é um drama, vir morar para a Ásia foi aquilo que se espera. “Foi muito complicado no início porque, apesar de haver muita gente portuguesa aqui e de, na altura, termos três escolas, mudar de país foi muito difícil”, recorda. De repente, viu-se sem chão. “Senti que tinha tudo em Portugal, os meus amigos”, a vida a que estava habituada, tudo ficou para trás.

Mas o ser humano tem, de facto, grande capacidade de adaptação. Ao início não foi fácil, em particular nos dois primeiros anos, mas com o alargamento do ciclo social e integração, tudo passou a ser mais simples. Hoje em dia, Macau é a sua casa, “mais ainda do que Portugal”.

Para Rita Serafim, esta é uma cidade onde se consegue evoluir profissionalmente. Actualmente, a portuguesa trabalha numa empresa de jactos privados. A sua função é certificar-se de que tudo está em ordem antes de os aviões saírem, desde o tempo, lista de passageiros, bagagem, licenças, slots, etc..

A profissão que desempenha costumava ser quase exclusivamente feita por homens. “Há um bocado de preconceito, se calhar pelos horários e volume de trabalho, que é bastante pesado”, revela. Além disso, é um trabalho que precisa de constante actualização, que evolui ao sabor do avanço tecnológico. Rita aceita com prazer a aventura de estar nos bastidores do mundo da aviação, e da necessidade de constante adaptação. Algo em que se tem tornado perita ao longo da vida.

Vai e vem

Em duas ocasiões, e sempre para estudar, Rita Serafim viu-se na necessidade de regressar a Lisboa. Primeiro para terminar o ensino secundário de 2004 a 2007 e, mais tarde, para frequentar um curso de pastelaria de 2010 a 2013. “A ida foi mais uma questão de estudos, porque aqui não há, aqui o ensino é mais orientado para áreas como o Direito”, explica. No segundo regresso a Portugal, Rita foi estudar formação turística. Não gostou. Experimentou cozinha, com o mesmo resultado, até que acabou a tirar um curso em pastelaria tradicional portuguesa. O curso foi rápido mas, nessa altura, Macau estava a puxá-la com uma força irresistível: a sua filha. “Custou-me muito ter de deixá-la cá, foi a melhor opção na altura, mas assim que pude regressei”, lembra a operadora de voo.

Com uma vida em constante mutação, um pouco à imagem de Macau, Rita não esquece as suas raízes, em particular no que toca aos sabores. “Quando tive a minha filha decidi que em vez de comprar coisas deveria fazê-las e, como somos portugueses no estrangeiro, queremos comidas de Portugal”.

Duas décadas de Macau foram o suficiente para testemunhar a evolução tremenda no território. Rita considera que há algo a perder-se. “Acho que está cada vez pior, o nível de vida aumentou, e a cidade perdeu aquele estado de inocência que tinha, que fazia com que toda a gente que chegasse cá se apaixonasse”.

Na sua perspectiva existem demasiados casinos, e desapareceu a velha e romântica Macau, com aspecto de vila de pescadores. Não é contra a modernidade, mas considera que o progresso deixou a população para trás, atropelou a comunidade. O rápido crescimento parece ter sido “mais virado para fora do que para dentro”. Entre tanto progresso, Macau parecer ter-se esquecido do seu bem mais precioso: as pessoas.

16 Dez 2016

Castelbel Macao | Do Porto com classe 

Desde o passado fim-de-semana que existe uma loja no território da marca Castelbel, uma saboaria do Porto que ganhou fama – e clientes – por causa da qualidade e da apresentação dos produtos que disponibiliza. A marca já era vendida em Macau, mas tem agora uma ‘flagship’ no centro da cidade

[dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]á coisa de um ano, a empresa Futura Clássica começou a trabalhar com uma saboaria portuguesa que tem uma enorme projecção no estrangeiro: a Castelbel. A marca tem os sabonetes como ponto de partida, mas oferece uma gama de produtos diversificada. No passado fim-de-semana, passou a ter uma ‘flagship’, no centro de Macau, num pátio a poucos minutos a pé das Ruínas de São Paulo.

“Começámos a trabalhar com a Castelbel há cerca de um ano. É uma marca com uma diversidade de produtos grandes, consistente na sua qualidade e na forma como se apresenta”, explica Margarida Vila-Nova, sócia da Futura Clássica. “Criámos uma relação muito próxima desde o primeiro dia”, recorda. Cedo surgiu a possibilidade de a empresa de Macau ser a distribuidora exclusiva da Castelbel no território “e cedo nos rendemos à marca, quer pela sua apresentação, quer pela sua qualidade”.

Localizada no Grande Porto, a Castelbel começou a actividade no final de 1999, na altura com apenas nove trabalhadores. A empresa começou por se dedicar ao fabrico de sabonetes artesanais, destinados exclusivamente ao mercado dos Estados Unidos. Entretanto, a marca foi crescendo e hoje tem 150 funcionários.

“Uma das características da Castelbel é que quase todo o staff que desenvolve novos produtos, e procura novas combinações, tem formação em química”, relata Vila-Nova. “Juntou-se uma equipa de químicos experientes e capazes que desenvolvem maravilhosos sabonetes, mas também gel de banho e creme de corpo, e foram desenvolvendo uma linha para casa, extremamente completa, desde saquetas aromáticas a papel de gaveta”, diz.

O lado inovador de uma marca de apresentação clássica é um dos aspectos que atrai a empresária e actriz. “A marca está prestes a registar a patente das suas saquetas porque descobriu que a cortiça portuguesa é um absorvente de perfume com características altamente especiais. Absorve cerca de 20 por cento mais do que qualquer saqueta habitual que encontramos à venda na prateleira de uma loja”, conta. “Diariamente reinventam-se, tentando superar os seus limites”, nota a sócia da Futura Clássica.

História de uma surpresa

A loja no Pátio de Chon Sau surgiu depois de a marca ter estado vários meses à venda em vários pontos do território, da Mercearia Portuguesa de Margarida Vila-Nova a lojas numa das operadoras de jogo do território. “De dia para dia, as vendas tornaram-se surpreendentes.” Surgiu o desafio para a abertura de um espaço dedicado exclusivamente aos produtos da Castelbel e aconteceu uma parceria entre a Number 81 e a Futura Clássica.

“As vendas todos os dias subiam. Começámos a expandir a marca, a fazer crescer a gama e os produtos disponíveis. Não foi só um sucesso, mas também uma verdadeira surpresa, porque já há muito tempo que não via um caso assim”, conta a empresária.

A ‘flagship’ no centro da cidade tem a gestão da Number 81, sendo que a Futura Clássica fornece a gama de produtos à loja. “É uma forma de termos uma montra da marca que representamos em Macau, uma forma de atrair clientes, de fidelizá-los à marca e de continuarmos a traçar caminho aqui”, afirma.

Margarida Vila-Nova pensa já no próximo passo a dar: o desenvolvimento no território de um serviço que a Castelbel presta, o “private label”. Da fábrica portuguesa saem sabonetes e outros produtos para as mais diversas marcas. “Oitenta por cento da facturação é através do ‘private label’. A Zara Home em Espanha é desenvolvida pela Castelbel – todas as velas, difusores e sabonetes que encontramos à venda saem da fábrica da Castelbel em Portugal”, contextualiza Margarida Vila-Nova. “Têm feito produtos para museus, para galerias, para acontecimentos oficiais, empresas privadas e casamentos, de modo que gostaria de estender a Macau este serviço de ‘private label’, tão forte em Portugal”, diz, acrescentando que “faz todo o sentido aqui, porque vem ao encontro do mercado”.

Apesar de ser uma marca de luxo, a empresária entende que oferece produtos acessíveis. “Comparativamente com outras marcas do mesmo segmento, a relação qualidade-preço é razoável, e a Castelbel que oferece alternativas.” Vila-Nova dá um exemplo: quando um difusor acaba, não vai para o lixo, porque podem ser adquiridas recargas.

Além dos Estados Unidos, Espanha, Inglaterra, Alemanha e Austrália são os principais pontos de exportação da marca. A Futura Clássica quer agora fazer de Macau um ponto importante no mapa da empresa portuense.

14 Dez 2016

Teresa Correia: “Tenho muitas saudades do meu Macau antigo”

[dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]isou pela primeira vez o território em 1983 e trazia uma missão: organizar, juntamente com outros colegas, o sistema de conservatórias de Macau. Quando Teresa Correia, hoje reformada, foi convidada para vir para o sul da China, aceitou de imediato, quase como que por impulso. “Adelina Sá Carvalho, antiga secretária-adjunta, foi ter à nossa conservatória e pediu funcionários para vir organizar e montar todas as conservatórias em Macau. O meu chefe disse se estava interessada em ir para Macau e na altura estava farta de estar em Portugal, eram greves atrás de greves, já não podia mais com aquele ambiente. Disse logo: “ontem já era tarde”. O meu ex-marido também era funcionário da conservatória dos registos centrais e concordamos em vir com os miúdos.”

Aqui estava tudo no início: havia uma conservatória do registo predial, outra comercial e só uma do registo civil. Teresa Correia lembra com saudade os primeiros tempos em que, para fazer o trabalho, teve de andar com um dicionário de português-chinês na mão. “Foi um desafio, sem falar uma ponta de chinês, organizar todos os documentos necessários, andávamos com um dicionário na mão, à procura das coisas. Ao fim de um tempo dissemos que aquilo seria impossível, que tínhamos de ter um tradutor. O que nos valeu é que as pessoas de bastante idade falavam bem português.”

Tudo terminou em 1999, com a transição de Macau para a China, mas Teresa Correia já tinha criado laços em Macau. Não queria ir, tentou ficar, mas Rocha Vieira, à altura governador, não deixou. Em Portugal, a antiga funcionária pública voltou ao posto que tinha deixado, mas já nada era o mesmo: “não descansei enquanto não me reformei”.

“Macau já é a minha terra, e quando me fui embora nem queria acreditar, porque achei que ficava para sempre. Custou-me muito ir embora, fiz de tudo para cá ficar. Disseram-me erradamente que tinha de ir embora, mas afinal podia ter ficado, como todos os funcionários públicos portugueses.”

Falta de higiene

Teresa Correia acabou por voltar após a transição e é aqui que se sente em casa. Ainda assim, é do passado que tem saudades. “O meu Macau dos anos 80! Não tem nada a ver. Quando cheguei a Macau detestei, fiz uma ideia de uma coisa que não era.” A residente recorda um período em que não abundava a limpeza das ruas e a recolha do lixo não era algo permanente como é hoje.

“Tive amigas minhas que apanharam com sacos do lixo na cabeça. Os cheiros para mim foram o pior. Na zona de São Domingos tive quatro meses para conseguir entrar em algumas ruas. Fazia-se tudo na rua, a comida, a queima da pele do porco, a própria sujidade. Não havia higiene em Macau, não havia caixotes do lixo. Adorei tudo o resto. A Taipa era um descampado, não tinha prédios nenhuns. Coloane não tinha nada.”

À época, Teresa Correia sentia-se livre. “Era uma sensação de liberdade, de respirar, não digo ar puro, porque nunca houve. Respirava-se, e sentia-me completamente liberta. Aos poucos e poucos houve uma melhoria enorme na limpeza das ruas.”

Quase 17 anos passados desde a transferência de soberania, Teresa Correia vive no seu Macau, mas um território bem diferente daquele que conheceu a primeira vez.

“Tenho muitas saudades do meu Macau antigo. Também tenho muitas saudades das amizades que havia, do companheirismo.” E dá exemplos.

“Todos os meus colegas macaenses ficavam parvos comigo. Quando entrava num restaurante chinês, quando me sentava à mesa traziam-me sempre um prato com pão, ainda que não comessem pão, só arroz. Hoje já não fazem isso, não há essa preocupação. É disso que tenho saudades. Havia mais comunicações entre os chineses e nós, e hoje não noto tanto isso.” A comunidade portuguesa era bem diferente também. “Éramos muito unidos, e fizemos amizades cá. Havia uma união muito grande, o que não se sente hoje. É raro.”

9 Dez 2016

Oh Mcdonald Farm, horta biológica | “Tudo o que planto dou aos meus amigos”

Em Março deste ano, Lavínia Che quis experimentar algo novo e, no terraço do seu prédio, começou a fazer pequenas plantações e a criar uma horta. Apesar de se tratar de um passatempo, sem fins lucrativos, Lavínia Che gostaria de, um dia, levar o seu projecto às escolas

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]uma terra onde não há plantas novas a nascer, mas apenas pedaços de cimento, surgiu, em Março, um projecto novo. Lavínia Che decidiu aproveitar o terraço do prédio onde vive e criou uma pequena horta, onde planta sementes que trouxe de vários lugares. A “Oh Mcdonald Farm” existe, para já, sem fins lucrativos, mas a ideia é que venha a servir a comunidade onde se insere.

Ao HM, Lavínia Che contou que tudo começou com uma tradicional canção infantil. “Queria tentar alguma coisa que nunca tivesse feito antes na minha vida. Em Macau temos pouco espaço. Ainda não é um negócio, aquilo que planto dou depois a amigos. O nome veio da canção que todos conhecemos, a canção “Old Macdonald has a farm”, que ouvimos desde crianças, mas talvez a maior parte de nós nunca tenha feito nada disto. E com isto podemos juntar as pessoas para poderem aprender mais, para cultivarem alimentos. Assim as pessoas sabem de onde vem a comida que ingerem. A maior parte das crianças não sabe de onde vêm os alimentos”, contou.

Apesar de ser um projecto individual sem grandes dificuldades, a verdade é que Lavínia Che encontra desafios com o material para criar a sua horta. “Eu e uns amigos tínhamos umas estufas e tínhamos de decidir o que fazer com elas. Tínhamos o espaço e decidimos começar a cultivar. Mas o maior problema que tenho é com a terra, pois tenho de ir a Hong Kong comprá-la. Depois, é muito pesada, pelo que tenho de contratar uma empresa que a traga para Macau. O meu quintal é num sétimo andar, num terraço, e tenho de contratar alguém para me ajudar a trazê-la para casa. É um problema.”

Se a terra para cultivo vem de Hong Kong, as sementes e plantas surgem de vários lugares do mundo, conforme as experiências pessoais de Lavínia. “Tenho manjericão da Tailândia e de Itália, e estou com umas sementes que trouxe da Austrália. Ainda estamos a pensar nas melhores maneiras de cultivar e de colher o que plantamos. Ainda não estamos estáveis nesse sentido. Não temos experiência e, por exemplo, agora temos muitas plantas que não estão boas. O nosso plano é primeiro estabilizar.”

Pensar nas escolas

Apesar de se tratar de um projecto raro, a verdade é que Lavínia Che já conhece algumas pessoas que começam a aproveitar de outra forma os terraços dos seus prédios. “Sei de pessoas que estão a fazer o mesmo, mas não os conheço. Seria interessante mais pessoas investirem neste tipo de agricultura em Macau. No fundo, a produção dos próprios alimentos é o sentido da vida. Na agricultura é isso que nós fazemos. Devíamos pelo menos saber como fazer isso. Com os problemas que o planeta atravessa, é bom ter conhecimentos neste sentido.”

Uma possível ligação às escolas, por forma a ensinar os mais pequenos a perceberem a origem daquilo que comem, é um projecto que Lavínia Che gostaria de ver realizado. “Já pensei nisso. Há uma quinta maior em Coloane e penso que a escola deve considerar levar os alunos para essa quinta. O terraço é parte pertencente a todos os residentes do prédio, mas gostaria de trazer os alunos aqui também, apesar de não ser fácil.”

A venda parece estar, por enquanto, posta de parte, mas a troca de produtos pode também ser uma possibilidade a ter em conta. “Não tinha pensado em vender as plantas, mas tive a ideia de, no caso de conseguir uma colheita diversificada, poder trocar com outros produtos, numa espécie de comércio de troca.”

7 Dez 2016

Leung Chon Kei, estudante de Direito | Coimbra é uma lição

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] o único aluno de Macau a estudar Direito na Universidade de Coimbra, enverga a tradicional capa e batina que todos os estudantes da cidade usam, mas apesar da experiência singular os desafios são muitos. Leung Chon Kei, aluno do terceiro ano, confessa que o primeiro sentimento que teve quando entrou na faculdade foi de abandono, sendo que ainda não conseguiu acostumar-se à sensação de solidão.

Leung é um dos bolseiros do projecto de continuação dos estudos em Portugal, lançado em 2004 pelo Governo, que tem o objectivo de formar profissionais bilingues na área jurídica.

Saído de Macau após a conclusão do ensino secundário, Leung Chon Kei começou a vida de estudante universitário em Lisboa onde, com outros bolseiros, fez um semestre no curso de língua portuguesa, sendo que o segundo semestre o ensino passou a estar focado em conteúdos jurídicos.

“Quando cheguei a Portugal não tinha muitas expectativas, porque já tinha no país estado uma vez. Não estava animado, nem nervoso”, recordou. Após um mês de frequência de um curso de Verão, a alegria sentida durante o processo de aprendizagem da língua não diminuiu, algo que o fazia não parar de aprender coisas novas da língua de Camões. “A minha paixão sobre o idioma continuou e decidi começar a fazer o curso de Português no Instituto Português do Oriente (IPOR)”, contou. As primeiras noites gastas a estudar a língua mostraram-lhe os desafios quando ainda andava no ensino secundário. “Depois isso vai-se tornando um hábito.”

O suporte que já tinha da língua inglesa acabou por ajudá-lo na aprendizagem. “É impossível associarmos o português com o chinês porque não há qualquer semelhança. Se pensarmos em chinês, a gramática vai ficar toda errada.” Chegado a Lisboa, e já com um nível elevado de português na bagagem, Leung Chon Kei ainda frequentou cursos nocturnos na Delegação de Macau em Lisboa para a preparação aos exames nacionais portugueses.

Lost in translation

A primeira aula em Coimbra trouxe ainda mais desafios ao jovem estudante, que descreve o momento como sendo uma “aula de ditado”. Leung Chon Kei só queria anotar tudo o que o professor estava a dizer. “No primeiro ano andei nervoso, e tive sorte que apanhei alguns alunos de Macau do quarto ano que me explicaram algumas dúvidas. Mas depois de dois a três meses comecei a perceber tudo o que os professores diziam nas aulas.”

Apesar de ter enveredado pelo Direito, esta área não foi amor à primeira vista. Depois, tudo mudou: “Há muitos raciocínios lógicos e posso aprender coisas sobre diferentes áreas sociais”.

A um ano de terminar a licenciatura na cidade dos estudantes, Leung Chon Kei diz que a maior desvantagem de estudar Direito em Portugal é o grande desconhecimento que continua a existir entre Portugal e Macau. Apesar de o Direito de Macau ser de matriz portuguesa, o jovem estudante fala das crescentes diferenças em ambas as jurisdições e teme dificuldades quando chegar ao território, onde terá de frequentar o curso de introdução ao Direito de Macau. Ainda assim, está confiante na carreira que o espera e pretende fixar-se em Macau, onde continua a existir carência de profissionais bilingues na área do Direito. A existência de muitas vagas são um chamariz para que regresse à terra que o viu nascer.

Em Coimbra, há tempo para estar com os colegas de curso, apesar da exigência do curso e da língua. Ao fim de três anos em Portugal, Leung Chon Kei já percebeu as diferenças em relação ao pequeno território do sul da China. “Macau é para trabalhar e Portugal é para passar férias, porque em Macau há poucos espaços onde podemos estar e tem uma elevada densidade populacional, o que faz com que pensemos em trabalhar, em ter uma vida mais ocupada. Em Portugal temos mais espaço, ar livre, praias e ambientes que são bons para descansar.”

2 Dez 2016

Le Petit Chef, escola de cozinha | “As crianças gostam de actividades de adultos”

A funcionar numa creche, na Taipa, a “Le Petit Chef” pretende ensinar os mais novos a fazer comida a sério, e a preparar doces e refeições para toda a família. Há muito que Andreea Apostol desejava estabelecer o projecto em Macau, algo que só foi possível em parceria com outro estabelecimento de ensino

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]uma época em que cada mais se consome comida rápida mas, ao mesmo tempo, se tenta combater o consumo de açúcar em excesso, Andreea Apostol decidiu apostar em algo inovador. Oriunda da Roménia, a chef de cozinha investiu num negócio próprio: ensina os mais pequenos a cozinhar refeições leves, saudáveis e divertidas. A “Le Petit Chef” funciona na creche Ze Ai e tem actualmente 15 alunos, divididos por turmas que vão, no máximo, até aos 12 anos de idade.

Ainda assim, esta escola de culinária está aberta a todas as idades. “Esta escola não é apenas para crianças. Se tivermos adolescentes ou adultos interessados nas nossas aulas também iremos organizar aulas para eles”, contou ao HM Andreea Apostol.

A mentora da escola de cozinha em ponto pequeno conta como tudo começou. “Uma escola de cozinha não é uma ideia nova para mim. Há alguns anos no meu país, a Roménia, tive este tipo de negócio, um clube para crianças que oferecia muitas actividades. Disponibilizávamos aulas de culinária.”

A ideia deste negócio passa também pela mudança de hábitos e promoção de uma melhor forma de comer. “As crianças gostam de cozinhar, porque estamos numa fase de criação de chefs, porque é altura de ignorarmos a comida rápida, porque é bom para toda a gente ter o mínimo de conhecimento sobre cozinha. Eu própria gosto de cozinhar, sou chef de cozinha, gosto de crianças e penso que essa é a combinação perfeita para formar uma escola.”

O problema da renda

Apesar de o projecto estar há muito na sua cabeça, Andreea Apostol não o pôde concretizar de imediato. “Os problemas com as rendas nunca deixaram o meu sonho concretizar-se. Até que um dia recebi uma mensagem de Ellen Ho, gestora da creche Ze Ai, que me perguntou se estava interessada em colaborar com ela na criação de uma escola de culinária. Viu o meu trabalho no Facebook e ela própria tem um negócio de confecção de bolos em casa, intitulado ‘Macau Sweet Ideas’. Deve ter gostado do meu trabalho, daí ter-me convidado para ser professora de culinária na ‘Le Petit Chef’.”

Na página oficial do projecto pode ver-se que as crianças aprendem a fazer de tudo um pouco, desde pequenos queques a sanduíches ou até pratos mais elaborados. No final de um minicurso de cinco dias, a família é convidada a provar tudo aquilo que os seus rebentos prepararam.

“Na última classe os nossos pequenos chefes mostram aos pais tudo o que aprenderam na escola de cozinha e preparam os pratos para eles. Terminamos uma sessão para os mais pequenos sobre fruta, enquanto os pré-adolescentes aprenderam a fazer pequenos-almoços saudáveis.”

Para Andreea Apostol, aprender a cozinhar está longe de ser uma tarefa aborrecida ou antiquada. “As crianças gostam de fazer actividades de adultos, e cozinhar é uma delas. Ensinar as crianças a cozinhar é uma poderosa experiência de aprendizagem e aprender a cozinhar pode ser muito divertido. As crianças vão aprender tudo o que implica a preparação de refeições, vão aprender que a comida simplesmente não acontece do nada”, conclui.

A funcionar na Rua Cidade de Braga, a “Le Petit Chef” funciona apenas aos sábados entre as 9h e as 18h, a pensar numa oferta diferenciada para a ocupação dos tempos livres dos mais novos. A escola começa agora a mostrar o seu trabalho junto da comunidade, já que, este sábado, vão ser vendidas bolachas de gengibre feitas pelos mais novos no primeiro Mercado de Natal realizado no Albergue SCM. Todos os lucros irão reverter para acções de caridade.

Morada

Rua Cidade de Braga n.º 490
Aberta aos sábados, das 9h às 18h

30 Nov 2016

Marieta da Costa, arquitecta | A fazedora de mundos

[dropcap style≠’circle’]J[/dropcap]á conhecia Macau antes de vir para cá morar: o território era destino de férias por causa de ligações familiares. Há cinco anos, fez as malas e decidiu deixar Londres, cidade onde nasceu o primeiro filho, e mudou-se para a terra do marido. “O espírito de comunidade em Inglaterra não existe da mesma maneira que em Macau e foi também isso que nos fez voltar, além de que o meu marido tem cá família”, diz Marieta da Costa, arquitecta.

Um salto no tempo para o início do percurso que, feitas as contas, a fez chegar aqui. Marieta da Costa chegou ao final do 9o ano e, à semelhança de quase todos os miúdos com 14 ou 15 anos, não fazia ideia do que queria ser quando fosse grande. A mãe ainda lhe recordou que gostava de desenhar, tinha jeito e era criativa, mas a arquitecta não imaginava, na altura, que fosse possível colocar a criatividade ao serviço de uma profissão.

“A minha mãe decidiu pôr-me numa universidade a fazer exames psicotécnicos. Nessa altura, ainda não se ouvia falar muito disso. Estive um dia inteiro a fazer exames muito rigorosos e, quando vieram os resultados, dava tudo para Arquitectura, Design de Interiores, Design de Equipamentos, professora de Educação Visual”, conta. A mãe decidiu procurar “a melhor escola de Artes em Portugal, ao nível do secundário”, e foi assim que acabou por ir parar à António Arroio, onde estudou Design de Equipamentos, “com uma componente técnica muito grande”.

Curso terminado, quis ser arquitecta. “Não me adaptei, porque vinha de um ensino muito artístico e a universidade de arquitectura onde estive era muito ‘vamos copiar o Siza Vieira’, ‘porque é que ele é muito bom?’, ‘porque é o ‘Souto de Moura é fantástico?’. Queria fazer coisas à minha maneira”, explica.

Primeiro ano feito, esteve de férias em Inglaterra para melhorar o inglês. Ao final de um mês, voltou para Portugal, fez as malas e regressou a Londres. “Foi um grande choque para os meus pais, porque o ano lectivo em Inglaterra já tinha começado e normalmente prepara-se a entrada no ano anterior.” Os pais tinham medo que perdesse o interesse pelos estudos. “Disse-lhes que ia trabalhar e ver qual era a melhor universidade para fazer arquitectura, e assim fiz.”

Marieta da Costa começou a trabalhar, enquanto preparava as candidaturas às universidades de Arquitectura. Porque também se interessava por Design de Interiores, concorreu a um curso nesta área. Entrou em todas as instituições de ensino superior, mas a escolha foi para a Chelsea College of Arts. A licenciatura em Arquitectura exigia sete anos, um tempo que, à época, era em demasia. O Design de Interiores tinha vencido.

“No último ano conheci o meu marido, estávamos a fazer o mesmo curso, mas faltava-nos qualquer coisa. Eu sabia que me faltava arquitectura. Então acabei o curso e fui para a London Metropolitan University.” Foram anos “muito bons”, de “muito trabalho”. “Entretanto, engravidei. Tive de fazer a minha defesa de projecto enquanto o Lio ficava nos braços do pai à espera que a mãe acabasse. Foi um bocado complicado, mas correu tudo muito bem.”

A mudança para Macau foi fácil, mas ao nível profissional a integração foi “um pouco complicada”, sobretudo porque decidiu por um caminho alternativo. “Não queria ir trabalhar para casinos, nem no sector privado. Decidi abrir a minha empresa. Não andei à procura de trabalho. Ia fazendo muito design de interiores, fazia muito restauro. Há dois anos comecei com um projecto novo”, explica.

O “projecto novo” chama-se arquitectarte: aulas de arquitectura para crianças com idades compreendidas entre os três e os cinco anos. “Não é ensinar Arquitectura no verdadeiro sentido da palavra. É pegar numa forma, num objecto, e dar uma série de ideias para que percebam o que é habitar o sítio onde estamos, olhar em redor e ver as coisas de forma diferente”, descodifica. “É pegar num quadrado e explicar que dá para fazer uma coisa 3 D, um objecto. Trabalho muito a tridimensionalidade.”

Quanto a Macau, é uma cidade que a faz sentir-se em casa. Cinco anos depois de se despedir de Londres, as comparações continuam a ser inevitáveis. “Toda a gente diz que Macau é difícil e eu vejo muitas lacunas mas, comparando com outros sítios, existe imenso apoio”, aponta. Além do factor familiar, há “os amigos que se constroem e que se adoptam como parte da família”. Marieta da Costa encontra “um espírito de comunidade” que não existia no sítio onde viveu década e meia.

25 Nov 2016

iHome Macau, empresa online de decoração: “Queremos vender produtos de qualidade”

Christy Ieong tirou partido da nacionalidade chinesa para começar a comprar produtos do outro lado da fronteira e montar um negócio que se distingue pelos baixos preços praticados. Juntamente com o namorado, a fundadora da iHome Macau quer tornar a decoração das casas da cidade mais bonita, mas com custos acessíveis

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] iHome Macau recuperou algo que está na memória de todos, do tempo em que o yuan valia bem menos do que a pataca e ir a Zhuhai fazer compras era um passatempo para muitas famílias. A pensar nos tempos modernos, a iHome Macau pegou nessa ideia e colocou-a online: porque não ir buscar produtos ao continente e vendê-los em Macau? Assim começou o projecto.

“Encomendamos os produtos da China e vendemos online para os clientes em Macau. Queremos manter os preços baixos porque vemos que as lojas em Macau vendem produtos muito caros, com uma qualidade muito baixa. Então queremos fazer o contrário: vender produtos de qualidade com preços mais baixos”, contou ao HM Christy Ieong, co-fundadora do projecto.

Christy Ieong, que tem outro trabalho, numa operadora de jogo, acredita que este negócio poderá satisfazer as necessidades daqueles que querem comprar bom, bonito e barato, estando aqui tão perto de um grande mercado como é a China.

“Eu e o meu namorado percebemos que a maioria das lojas não tem bons produtos e que os funcionários não são educados, não atendem os clientes como deveriam atender. O serviço não é bom e os preços são elevadíssimos.”

O arranque oficial deu-se em Setembro e a época natalícia será, sem dúvida, a aposta da iHome Macau para entrar a sério no mercado, ainda que esta seja uma empresa que apenas funciona online. Ieong não tem planos para a abertura de um espaço físico.

“Começámos o negócio no mês passado e já tivemos os nossos primeiros clientes. Para já, temos alguns produtos de Natal e talvez teremos de esperar para que as pessoas comecem a decorar as suas casas, porque até agora ainda não tivemos uma adesão massiva. Gostaria de arrancar com o negócio mais a sério no Natal, com a encomenda de produtos, e se tudo isto se tornar lucrativo gostaria de apostar noutro tipo de produtos para a casa.”

É tudo verdadeiro

O comércio online tem sofrido um verdadeiro boom na China e a verdade é que poucos passam sem as conhecidas plataformas de comércio. Apesar dos problemas que muitas vezes este tipo de vendas acarreta, como os enganos feitos aos clientes em termos de preços e qualidade, Christy Ieong garante que na iHome Macau tudo é verdadeiro.

“Colocamos algumas fotografias no Facebook e depois os clientes encomendam através de mensagens privadas. O cliente só paga quando vir o produto. Todas as fotografias são verdadeiras, o cliente não tem de se preocupar com a falsidade do produto ou com a falta de qualidade.”

Nos próximos meses, a iHome quer tornar-se, tal como o nome indica, numa plataforma online em que todo o tipo de encomendas para a casa será possível, estando disponíveis para todas as carteiras.

“Depois do Natal podemos vender produtos como almofadas, coisas que habitualmente temos nas nossas casas, nas salas de estar ou na cozinha. Muitos dos supermercados e lojas que vendem estes produtos cobram preços elevados e com pouca variedade em termos de cores e formas.”

Um olhar pela página da iHome pela rede social Facebook permite perceber que já há alguns clientes interessados nos produtos. Para já, estão apenas disponíveis todos aqueles produtos que fazem parte do nosso imaginário natalício, como meias do Pai Natal, bolas para decorar a árvore, tapetes e bonecos de decoração. Para os adquirir, basta fazer um comentário ou deixar uma mensagem privada. A iHome Macau garante entregas gratuitas para compras superiores a duas mil patacas, tanto para a península, como para a Taipa. O cliente paga em dinheiro quando recebe aquilo que encomendou.

23 Nov 2016

Marta Pereira, locutora: “A rádio fala para as pessoas”

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]esde pequena que a rádio ocupa grande parte da vida de Marta Pereira. Da infância, recorda que os pais trancavam a porta da sala para não aceder à aparelhagem. Para evitar os discos riscados, eram-lhe oferecidos rádios que “atirava para o chão para tentar ver as pessoas que estavam lá dentro”. Desde essa altura que a paixão pela rádio não a larga “porque é uma magia e continua a ser uma companhia, a rádio fala para as pessoas”.

A locutora da Rádio Macau viu a vida mudar quando sentiu, na pele, o desemprego em Portugal e o avião rumo a Macau foi a solução, ao aceitar uma proposta de emprego no território. “Trabalhava como jornalista em Portugal e, em virtude da situação de crise económica que o país começou a atravessar, os órgãos de comunicação social começaram a definhar e acabei por ficar desempregada”, recorda ao HM.

Incapaz de “ficar parada”, decidiu investir num projecto pessoal e integrar um curso no Cenjor na área de jornalismo digital quando surgiu a proposta para vir trabalhar para Macau. Em registo de surpresa, Marta Pereira decidiu arriscar. “A proposta para vir para cá apanhou-me desprevenida, é certo. As primeiras questões que coloquei foram o que vou fazer e quanto vou ganhar para saber se, realmente, compensaria vir”, explica. Com as respostas na mão, a decisão não durou mais do que uma semana a ser tomada e passado um mês estava a chegar ao território. “Não foi uma decisão difícil, até porque gosto de aventuras e de desafios, e esta oportunidade pareceu-me mais um desafio que poderia colocar na minha carteira”.

Em vésperas de mudar de vida e de lado do mundo, Marta Pereira, que não conhecia Macau, tentou, pelos meios que podia, perceber o lugar que a esperava. “Quando aceitei a proposta comecei à procura de tudo o que dissesse respeito ao território mas não criei muitas expectativas, até porque já aprendi que o não devo fazer. Vinha com os pés relativamente assentes na terra.”

A chegada, há cerca de um ano, foi um misto de sensações em que as questões eram, essencialmente, “que luzes são estas, que cheiro é este?”.

Ninguém se entende

A grande dificuldade que encontrou foi a linguagem. “Sou uma pessoa, se calhar fruto da minha profissão, que gosta de comunicar. Chego a Macau e, de repente, tenho a barreira intransponível da língua.” Ingenuamente, Marta Pereira estava à espera que a língua portuguesa se falasse mais no território. “Queria comunicar e não conseguia, e isso foi muito difícil para mim”. No entanto, o problema “já está devidamente ultrapassado”. A exigência do entendimento atalhou e desenvolveu outros caminhos. “Aprendemos a desenvolver outras formas de comunicação e muitas vezes recorremos à mímica para nos fazermos entender”.

Mas Marta Pereira não cruzou os braços perante o muro linguístico e inscreveu-se na licenciatura de ensino da língua chinesa como língua estrangeira no Instituto Politécnico de Macau por achar que “poderia, de alguma forma, facilitar a comunicação e o conhecimento das vivências da comunidade chinesa, até porque é muito difícil entrar no meio deles, e o facto de falar a língua poderia abrir portas nesse sentido”. Por outro lado, e a pensar no futuro, o facto de conhecer a língua poderia ser uma mais-valia em termos profissionais futuros. A falta de tempo e a complexidade no estudo de um sistema linguístico muito diferente daquele a que estava habituada fazem com que “esteja a ser muito difícil a conjugação entre trabalho e aulas”.

Questões de linguagem à parte, Marta Pereira não sentiu dificuldades de maior. Para a locutora, “o ser humano é camaleónico e adapta-se muito facilmente às circunstâncias”. Hoje, sente-se “perfeitamente aculturada” apesar de existirem ainda algumas diferenças culturais que a perturbam. Mas é também na diferença cultural que encontra o fascínio. “Acho incrível poder conviver com comunidades tão diferentes”, afirma, salientando as particularidades de Macau, “uma cidade que não dorme e de contrastes”.

“Temos a cidade moderna, das luzes e dos casinos e, em contraponto, temos a Macau antiga, com prédios cinzentos, com os rituais de se comer na rua e dos mercados exteriores. Este contraste é absolutamente delicioso.” Entre um e outro, Marta Pereira não tem preferências: gosta de viver em ambos.

18 Nov 2016

CriaMacau, projecto de marketing: “Saber comunicar é o pilar de tudo”

Este projecto embrionário nasceu nos corredores da Universidade de Macau e pretende desenvolver no mercado o chamado “marketing de guerrilha” junto de empresas locais. A ideia correu tão bem na prática que poderá continuar fora do meio universitário

 

[dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]á muito que as empresas usam redes sociais como o Facebook, o Youtube ou o Instagram para fazerem publicidade aos seus produtos e serviços, mas a CriaMacau entende que isso já não chega. Para que o público faça a sua opção em prol daquilo que a marca pretende, é preciso inovar. E é aí que a CriaMacau quer trabalhar.

Criado em Setembro, este projecto é uma iniciativa de quatro académicos ligados ao mestrado em Comunicação e Novos Media da Universidade de Macau (UM). Bruna Pickler explicou ao HM como tudo funciona. “A CriaMacau é um espaço onde abordamos o conceito muito pouco falado de marketing de guerrilha. Explicamos as melhores ideias criativas, as que não correram tão bem, a diferença do que se faz em cada parte do mundo.”

Além disso, “é também um canal onde pretendemos criar alguma ligação com o público, daí termos a nossa página aberta a todos aqueles que nos quiserem questionar sobre o tema e ao mesmo tempo disponíveis para ajudar quem pretenda melhorar a sua visibilidade junto do público”, disse ainda Bruna Pickler.

Para a académica, “as marcas precisam de chegar aos consumidores e os canais tradicionais estão sobrecarregados”. “Há cada vez mais uma completa cegueira para os anúncios a que todos estamos habituados. É a pensar nisso que pretendemos compilar as acções mais disruptivas e inspirar todos os que por aqui passam”, acrescentou Bruna.

Ajudar as PME

A CriaMacau foi criada a pensar também nas dificuldades sentidas pelas Pequenas e Médias Empresas (PME) no seu dia-a-dia, já que muitas vezes as dificuldades em pagar uma renda acabam por pôr uma estratégia de marketing em segundo plano.

“Foi com essa intenção que a página foi criada, para descobrir o que os pequenos negócios locais precisam, o que falta para que essas empresas se desenvolvam melhor. Auxiliamos com alternativas criativas. Acreditamos que as acções de baixo custo podem trazer benefícios para qualquer negócio que precise de ampliar resultados. Isto é válido para Macau e para o resto do mundo. Saber comunicar é o pilar de tudo”, defendeu Bruna Pickler.

Depois, o marketing pode ainda chamar a atenção para várias questões sociais. “Percebemos que Macau tem muito foco na indústria do entretenimento e algumas questões sociais ficam de lado. Com o marketing de guerrilha, podemos gerar acções que beneficiam as grandes e pequenas empresas integrando a comunicação com projectos sociais e culturais. E é isso que queremos ensinar aos utilizadores.”

Continuar no mercado

A CriaMacau é apenas um projecto universitário com existência através de uma página na rede social Facebook, mas poderá ser bem mais do que isso. Apesar dos seus membros ainda estarem a avaliar a viabilidade do projecto, há uma forte possibilidade de a CriaMacau se transformar numa empresa a operar no mercado.

“Com o decorrer da página temos percebido que pode ir além do âmbito universitário. Gostamos da pesquisa exploratória, de andar na rua à procura do exemplo mais básico, e por isso, e dependendo do avanço do projecto, será para continuar.”

A gestão de páginas nas redes sociais poderá ser um ponto de partida, sendo que muitos dos que trabalham na CriaMacau já estiveram ligados a empresas estrangeiras. “Alguns dos membros da CriaMacau trabalharam individualmente com projectos de marketing de diferentes empresas de todo o mundo. Este é um projecto muito jovem e ainda estamos à procura de negócios locais em Macau, ou então de gestores que queiram contactar-nos para desenvolverem um projecto de marketing”, concluiu. O projecto da CriaMacau poderá ser conhecido na página www.facebook.com/criamacau.

16 Nov 2016

Diana Barbosa, arquitecta: “Macau já é a minha casa”

[dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]acau era uma curiosidade desde os tempos de faculdade para Diana Barbosa. A arquitecta residente na RAEM há cerca de três anos recorda as referências ao território por parte dos professores que lhe foram beliscando a curiosidade. “Lembro-me de que comecei a ouvir falar de Macau na área da arquitectura ainda na universidade e já na altura este espaço, que me era dado como tão particular e longínquo me despertava a vontade de o conhecer”, explica ao HM. A vontade transformou-se em oportunidade. A recém licenciada em arquitectura candidatou-se ao programa de estágios Inovjovem, escolheu como destino a RAEM e meia volta ao mundo depois, aterrava no local que lhe veio dar, posteriormente, a  “oportunidade única no que respeita à construção em grande escala”.

Após os meses de estágio regressou a Portugal, mas a Ásia já se tinha instalado na sua vida e não tardou a regressar em busca da sua sorte. “Macau representava aquilo que queria viver profissionalmente. Os casinos são um universo muito rico, também em termos de arquitectura. Escondem um mundo, aquando da sua construção, que as pessoas na generalidade desconhecem, e eu queria aceder a ele”. Após venturas e desventuras, esperas de abertura de quotas em algumas das empresas para as quais se tinha candidatado, Diana Barbosa acabou por receber uma proposta à sua medida. Um gabinete internacional, dedicado aos projectos associados aos casinos apresentou-lhe uma oportunidade que a arquitecta não descurou e que “até hoje é fonte de realização profissional e muita aprendizagem”. “O que se faz em Macau não se faz em mais lado nenhum do mundo nesta área da arquitectura, e como tal, é o sítio certo para se estar”, afirma sem esconder a realização pessoal que o território lhe tem proporcionado.

Diana Barbosa recorda a segunda chegada a Macau como “um momento difícil”. Apesar de ir de encontro aos seus desejos, as maiores dificuldades sentidas foram na logística das mudanças, nomeadamente os problemas que teve de enfrentar para alugar uma casa. “Depois do Inov voltei a Portugal e quando regressei a Macau, em 2014, as rendas estavam a subir em flecha”, recorda.

Os tempos iniciais não foram fáceis neste sentido. O ter iniciado um trabalho recente não ajudava na conquista de um tecto onde ficar: “como ainda estava numa fase inicial de trabalho não tinha como alugar casa. O que me valeu foi que encontrei uma empresa à minha medida e o resto veio por acréscimo.”

Casinos vistos por dentro

Saber os meandros que envolvem as grandes construções associadas ao jogo em Macau, era um dos grandes objectivos de Diana Barbosa. “O que se faz aqui é muito diferente, mas também é muito aliciante”, explica. A razão é porque “permite oportunidades de intervir em questões que de outra forma nunca teríamos as portas abertas”.

Se agora os casinos são o mundo em que vive, Diana Barbosa não abandona uma paixão antiga que vai desenvolvendo por cá. O desenho, que sempre a acompanhou, está agora restrito aos tempos livres mas não deixa de marcar os cadernos de esboços que representam um projecto sempre em construção, a produção de um diário de viagem. A arquitecta pretende com esta iniciativa pessoal criar um registo do que tem sido “a vida aqui na Ásia” para um dia recordar. “Vou desenhado e escrevendo o meu diário destes anos, desde que cá cheguei porque um dia, quando regressar, não quero que nada fique esquecido” comenta.

Diana Barbosa recorda a chegada a Macau, terra a que hoje chama de casa, e não esquece que foram os odores, a primeira coisa que lhe chamou a atenção. Por outro lado “há aqui um sentimento de vizinhança que me faz sentir confortável”. “Lembro-me bem da primeira casa onde vivi, das ruas com luzes e sombras muito bonitas que me acompanhavam até ao trabalho, e da sensação de pertença a um bairro em que de manhã, por exemplo, no meu caminho passava pelas ruas e me cruzava com as pessoas que entretanto tomavam o pequeno-almoço aqui e ali, o que me fazia ter a sensação de proximidade e vizinhança”, comenta.

Para já os planos de regresso a Portugal estão longe dos objectivos a médio prazo. A maior dificuldade que ainda sente é a distância da família, mas a arquitecta está de mangas arregaçadas. “Macau já é a minha casa, já aqui tenho amigos e uma vida. O próximo passo é trazer os meus pais para cá”, explica. “Estou a trabalhar nesse sentido e sei que vou conseguir”, afirma com um sorriso de quem vê o futuro mais luminoso com a presença de todos os que estão dentro do coração.

11 Nov 2016

Mini Education Center: Encaixar o desporto na vida

O Mini Education Center é um estúdio de desporto que aposta em aulas de exercício funcional, um tipo de treino que visa explorar as capacidades básicas pessoais. O criador do projecto, Kid Ng, procura incorporar a nova tendência de exercício físico na vida quotidiana das pessoas de Macau

 

Chama-se exercício funcional e é hoje uma das tendências mais populares no plano de treino físico, mas em Macau a ideia parece ainda não estar a ter muita atenção. Kid Ng, jovem nascido e criado no território, introduziu este recente modelo de treino para Macau com a criação do Mini Education Center, pretendendo disponibilizar aos amantes de desporto – de todas as idades, profissionais ou amadores – cursos de exercício modernos e dinâmicos integrados com exercícios funcionais.

O treino funcional é considerado um método de trabalho mais dinâmico do que os treinos convencionais, caracterizado por conjugar diferentes capacidades físicas num único exercício. Os movimentos no treino trabalham a força muscular, a flexibilidade, o condicionamento cardiorrespiratório, a coordenação motora e o equilíbrio. Assim, o foco passa de um grupo muscular isolado para todo o corpo.

Apesar dos muitos benefícios trazidos pelo treino, há riscos de lesões. “Será melhor contar sempre com a supervisão de um especialista”, explica Kid Ng, referindo que o centro prefere oferecer treinos com turmas pequenas, constituídas, no máximo, por dez alunos, de modo a assegurar a comunicação e a supervisão. “Damos prioridade à qualidade, em vez da quantidade,” diz. “Guiamos os participantes para que sintam a alegria de fazer exercício e assim entenderem, nesta sociedade ocupada, a importância e os benefícios que os exercícios podem trazer, deixando-os coexistir com a vida.”

Kid Ng investiu na decoração do centro, para que esteja em consonância com a filosofia do tipo de treino que ali se disponibiliza. Quando se entra no espaço, nota-se logo que a concepção do local pretende criar a atmosfera de “exercício incorporado com a vida”, diferente dos ginásios ou estúdios de exercício mais comuns. A zona de serviço, junto à entrada, está equipada com um bar, uma televisão, dardos e bebidas, para que os clientes possam ouvir música ligeira, enquanto conversam com os amigos ou trocam dicas e experiências com outros amantes de desporto.

Pagar para suar

Kid Ng acredita que em Macau uma consciência social cada vez maior em relação aos benefícios do exercício: as pessoas procuram formas de diversão mais saudáveis, mas ainda se notam bastantes reticências em relação ao pagamento de aulas deste género.

“Provavelmente deve-se às medidas desportivas ou medidas de aprendizagem oferecidas pelo Governo, que fazem com que os eventos desportivos ou arrendamento das instalações desportivas sejam gratuitos ou a preços muito baixos, o que faz com que as pessoas não queiram pagar para fazer exercício”, refere. Para tentar dar a volta a este problema, o responsável pelo centro pediu a integração dos cursos no Programa de Aperfeiçoamento Contínuo dos Serviços de Educação e Juventude, para que os residentes possam utilizar o subsídio dado pelo Governo.

Além das turmas pequenas, o centro também oferece a possibilidade de se fazerem turmas em cooperação com companhias e organizações, para que os trabalhadores possam, através do exercício, procurar combater o stress. Kid Ng explica que esta modalidade é já uma alternativa às empresas que querem enriquecer o pacote de benefícios dos seus empregados.

Além disso, o Mini Education Center disponibiliza treino gratuito para os atletas profissionais locais, por considerar que, em Macau, são poucos os recursos dados a quem faz desporto de competição. Kid Ng espera poder, deste modo, contribuir para o desenvolvimento do desporto local.

 

Mini Education Center

Rua de Francisco António N. 167, Edf. Tak Yip, R/C D, Macau

 

9 Nov 2016