Andreia Sofia Silva Perfil PessoasJoana Epifânio Lança: “Não trocava Macau por outro lugar” [dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]e cabelo negro e farto e sorriso contagiante, já para não falar do sotaque cerrado do Ribatejo, Joana Epifânio Lança conta com dez anos de residência em Macau e diz-se pronta para continuar. Casada, com dois filhos, Joana veio parar ao Oriente por amor e é por amor que continua cá. Mas esse amor já é também sentido pela terra que a acolheu. “Sou uma pessoa que gosta de tudo. Gosto de pessoas, de cheiros, de luz, de barulho. E Macau tem isso tudo. Tem cultura, tem tudo o que eu gosto. Apaixonei-me [pelo território], se bem que tenho de admitir que não foi fácil. E o facto de estar completamente apaixonada pelo Miguel foi a essência de tudo isso. Foi o que me trouxe a Macau, vir atrás do grande amor.” Após uma breve visita a Macau, em 2005, Joana veio definitivamente no ano seguinte para não mais sair de cá. Ao contrário da maioria das pessoas, esta portuguesa, que trabalha como técnica de contabilidade, gosta da confusão das ruas e da enchente de turistas que diariamente povoa o centro histórico. “Não trocava Macau por outro lugar nenhum do mundo. Continuo a gostar, independentemente de tudo. É normal, fartamo-nos, mas há algo que nos agarra aqui. Não há explicação e, se perguntarmos a mais pessoas, ninguém te vai conseguir explicar.” O lugar onde mais gosta de estar é a varanda da sua casa, da qual contempla o Delta do Rio das Pérolas. Fora de casa, todos os lugares preenchem Joana. “Sinto-me bem em qualquer lado. Nada me faz confusão. Gosto das confusões de Macau, o que me assusta é o silêncio. Não gosto do silêncio, nunca gostei de momentos calmos e monótonos e demasiado parados. Adoro andar no meio da multidão. Toda a gente evita ir para as Ruínas de São Paulo, eu tenho coragem de ir para lá em plena hora de almoço. Adoro toda aquela gente.” Joana Epifânio Lança recorda-se da fase em que chegou, quando em Macau viviam pouco mais de dois mil portugueses. Nas suas idas aos lugares mais turísticos, a portuguesa lembra-se das fotografias pedidas pelos visitantes da China, com abraços e beijinhos à mistura. Ainda hoje Joana afirma que se insere em todas as comunidades que por aqui vivem. “Sou uma mulher do mundo. Tanto me dou com chineses, com portugueses ou australianos. Não escolho e sou muito curiosa. Em Macau todas as pessoas têm histórias, coisas que nos ensinam e que nos ajudam a amadurecer. Não podes estar aqui restrito à comunidade portuguesa ou chinesa, porque esta é uma terra multicultural. Se queres ser feliz em Macau, tens de ter a mente aberta.” Crescer na China Dez anos depois, e após várias experiências profissionais, Joana Epifânio Lança garante que este território lhe ensinou muita coisa. “Macau foi essencial no meu processo de crescimento como pessoa e mulher. Aqui descobri que posso viver em qualquer canto do mundo. É a prova de fogo para tudo, desde questões profissionais até ao lado familiar, amoroso. Há o velho ditado de Macau que diz: ‘Vens solteiro, sais casado, vens casado, sais divorciado’. Estou casada há 13 anos, estou feliz e quero manter-me assim.” Na área profissional, Joana Epifânio Lança garante que em Macau “não há limites”, usando mesmo um velho ditado português para explicar porquê. “Em terra de cegos quem tem olho é rei. Esta é uma terra de oportunidades. Vês uma e tens de agarrá-la. O único entrave é a língua. Falo o essencial de chinês, todas as minhas colegas são chinesas, mas não faço conversa fluente.” Se Joana passou toda a vida a fugir dos números, a verdade é que foi a eles que veio parar. Mas nem isso a deixa infeliz. “Tenho um trabalho muito árduo que é ser mãe, mas também estou num escritório de contabilidade há três anos e gosto do que faço. É uma escola, porque sou licenciada em Marketing e Relações Públicas e vim parar a Macau a um gabinete de contabilidade. Toda a minha vida fugi da matemática mas, por ironia do destino, vim cá parar.” Afirmando-se mais de Macau do que de Portugal, Joana Epifânio Lança até podia viver em Hong Kong, mas se fosse na China a adaptação já seria mais complicada, admite. “A China é completamente diferente, não sei se me adaptaria tão bem. Não acho que as pessoas sejam tão amistosas, são mais rudes e frias. Há certas coisas de que nós, ocidentais, gostamos. A higiene é essencial, lugares limpinhos. Não podemos dizer que a China seja realmente limpa. E os cheiros são de facto muito intensos. Aí já me fazem confusão.” Caso fosse para a região vizinha, Joana Epifânio Lança ia ter saudades dos petiscos portugueses que se servem em Macau. Ainda que o marido com jeito para a cozinha iria consigo para resolver o problema. “Tenho sorte porque tenho um marido que tem mão para a cozinha. Casava-me com ele outra vez se fosse preciso só por causa disso. Eu sou um zero à esquerda na cozinha.”
Isabel Castro Perfil PessoasCassia Schutt, designer de eventos | Querer que dê certo [dropcap style≠’circle’]“V[/dropcap]amos? Então está, vamos.” Foi assim que aconteceu Macau na vida de Cassia Schutt, brasileira, carioca, menina do Rio. Já lá vão dez anos, “agora mesmo, no final deste mês”, e foi por acaso. Podia ter sido outro sítio qualquer, mas foi Macau, “uma vinda muito tranquila e uma mudança desejada” para dar início a mais um episódio na vida de uma mulher que procura ver o lado positivo dos locais por onde vai passando. “A empresa do meu marido faliu”, recorda. “Era uma empresa grande de aviação no Brasil e Macau foi a primeira opção que apareceu. Não tínhamos a mínima ideia onde era”, confessa. Cassia Schutt era, na altura, produtora de casting no Brasil e sair do país foi uma opção que nem todas as pessoas que a rodeavam conseguiram perceber quando receberam a notícia. “Tinha uma vida muito confortável. Tinha acabado a universidade, estava realizando um trabalho que adorava e que me dava frutos e rendimentos, tinha uma empresa no Brasil. As minhas amigas, quando falei que vinha, disseram ‘O quê, você está louca? Vai viver para a China? Está tudo certo aqui’”, relata. O facto de estar “bem resolvida profissionalmente” no Rio de Janeiro não foi um obstáculo à adaptação a Macau, antes pelo contrário – permitiram-lhe encarar a pausa que iria fazer com mais conforto. E se, por um lado, esta licenciada em Comunicação Social, da área da Publicidade, gostava do que fazia, o tempo para a vida pessoal era pouco. Sem filhos à chegada ao território, decidiu então que era altura para parar, “curtir o casamento” e pensar em ter filhos. “Com o trabalho que tinha no Brasil, não me conseguia imaginar a ser mãe. Era uma coisa que me angustiava”, diz. “Os filhos vieram, os dois nasceram em Macau, foi planeado dessa forma.” Depois do nascimento do primeiro filho, surgiu a vontade de voltar a trabalhar – Cassia Schutt é a responsável em Macau pela Meemo, uma empresa em que se juntam vários serviços prestados a quem quer fazer uma festa, da concepção do conceito à decoração temática do espaço, passando pela execução, venda e aluguer de acessórios. O projecto apareceu “naturalmente”: “As pessoas diziam ‘que legal que você faz isso, foi uma coisa que surgiu e que me preenche. Estou abraçada a um trabalho de que gosto”. Cassia Schutt explica que há procura em Macau deste tipo de serviços, até porque há pouca oferta, mas identifica dificuldades. “Sinto muita falta de fornecedores, de materiais, apesar de a gente morar na China”. No Brasil, exemplifica, há empresas que se dedicam a fornecer produtos específicos para festas, “produz-se uma muito depressa, com alguns telefonemas de casa, ao computador, já se alugou e se entregou o material, aqui não existe isso”. É aqui que tem de haver criatividade em dose dupla: “Quando o cliente está disposto a fazer uma coisa mais bacana, tem de se comprar o material e fazer a produção”. Nas vésperas de completar uma década longe do Rio de Janeiro, Cassia Schutt diz continuar a viver com a mesma tranquilidade com quem encarou a mudança. E analisa Macau com esse mesmo estado de espírito: “Várias pessoas reclamam do trânsito. Olho para Macau e penso ‘que bom que tenho cinema com pipoca, que bom que tenho restaurantes novos’. Acho que, em qualquer lugar, o crescimento vai trazer coisas boas e coisas ruins também. Consigo ver muita coisa boa”. Apesar de todas as transformações destes últimos dez anos, a designer de eventos encontra em Macau “um lugar tranquilo, que dá a facilidade de fazer as viagens que gostamos, onde se vive uma vida sem violência”. “Acho que quando a gente faz essa mudança, tem de querer que dê certo, tentar ver o lado positivo das coisas”, remata.
Angela Ka Ócios & Negócios PessoasPutajanai, loja de bolos alemães: “Vinte camadas de dedicação” Foi no Japão que o patrão da Putajanai se inspirou para trazer até Macau a primeira confeitaria exclusivamente dedicada à confecção da variedade do bolo assado alemão baumkuchen. Com preços entre as 18 e as 20 patacas a responsável da loja espera que cada vez mais clientes conheçam um produto único na RAEM, mas já bastante conhecido nas regiões vizinhas [dropcap style≠’circle’]B[/dropcap]aumkuchen é uma variedade alemã de bolo assado no espeto que nasceu em 1807, e que actualmente é muito popular no Japão. O baumkuchen é feito aplicando-se camadas finas e homogéneas de massa de pão-de-ló. Cada camada deve dourar antes que uma nova seja acrescentada. Quando o bolo é removido e fatiado, cada camada é separada da seguinte por uma linha dourada, assemelhando-se aos anéis de crescimento de um tronco de árvore seccionado. Um baumkuchen típico é composto de 15 a 20 camadas de massa. Laura Ng, responsável da loja, garantiu que se alguma vez visitou o Japão, certamente já ouviu este nome. “Os nossos baumkuchen são assados repetidamente com vinte camadas de bolo e imensa dedicação.” Como a sua aparência é muito parecida com moedas, os japoneses vêem-no como uma representação de sorte, de riqueza, e possui também o significado de votos de perfeição. “Somos a primeira confeitaria que trouxe este conceito de produtos para Macau, juntamente com os seus bons votos,” admitindo que antes da abertura da loja, nunca viu nenhum estabelecimento a vender este tipo de produto. Não é pastel de nata Alguns tipos de baumkuchen da PUTAJANAI são enchidos com creme ou geleias, tornando os bolos muitos parecidos com os pastéis de nata. Para evitar que os clientes se confundam com este símbolo de Macau, o patrão decidiu dar o nome de “PUTAJANAI 不是葡撻” à loja, cujo nome em chinês significa literalmente “não é pastel de nata”, enquanto o nome em língua estrangeira é a transliteração de japonês com o mesmo significado. Como os chineses também são relativamente supersticiosos e gostam da cultura tradicional, a responsável espera que com o significado auspicioso o bolo vá ganhando fama gradualmente. Foi numa viagem ao Japão que o dono da loja, que pessoalmente também adora cultura tradicional japonesa, se inspirou para criar a loja. As influências nipónicas estão à vista. O design do interior é decorado com muito elementos japoneses, mas também foi adicionando o seu próprio estilo. “A nossa porta é porta deslizante de estilo japonês, mas é feita de vidro em vez da madeira tradicional. Embora o interior seja de tom escuro de estilo japonês, o mobiliário como os armários que usamos são modernos.” Os trabalhadores da loja aprenderam a fazer o bolo no Japão e as máquinas que utilizam são importadas do país. Entretanto, admitiu, que como esta sobremesa ainda é relativamente nova para as pessoas de Macau, embora em Hong Kong, no Japão e em Taiwan conheçam muito bem este tipo de bolo, em Macau o reconhecimento ainda é limitado. “Se calhar por causa disso, temos reparado que muita gente não se atreve a comprar. Portanto tentamos divulgar os nossos produtos e o seu contexto aproveitando as promoções online e dentro da loja também deixamos as pessoas provar.” Uma pedaço pequeno custa entre 18 e 22 patacas e uma fatia maior cerca de 80 patacas. A responsável garantiu que o preço é relativamente baixo quando comparado com regiões vizinhas como o Japão e Hong Kong, mas para os clientes que não conhecem o produto é possível que os considerem caros. Orientação clara Laura Ng admitiu que para as confeitarias de Macau é difícil dedicarem-se a um único produto. “Abrir uma confeitaria aqui em Macau é fácil, o que é difícil é dar a conhecer aos clientes as técnicas profissionais e únicas para fazer as sobremesas e a singularidade dos produtos. Quando se fazem as sobremesas, não se pode querer fazer todos os tipos, na minha opinião é mais importante fazer bem um produto, e depois gradualmente acrescentar outros novos.” Laura Ng não teve muitas dificuldades com o valor da renda, mas admitiu problemas em encontrar mão-de-obra, sobretudo de pessoas experientes e que se dedicam a um tipo específico de bolo. “Portanto, gastamos sempre bastante tempo para formar os nossos funcionários.” PUTAJANAI Travessa do Matadouro, nº6 – Macau
Sofia Margarida Mota Perfil PessoasRita Amorim O, psicóloga clínica | Uma mulher de família [dropcap]R[/dropcap]ita Amorim O é psicóloga clínica mas, e acima de tudo, é uma mulher de família. Chegou a Macau há cinco anos. Casada com um designer com ligações ao território, foi opção conjunta, após o nascimento da primeira filha, tentar a vida neste lado do mundo. “O início foi muito complicado”, afirma Rita Amorim O, ao recordar a chegada com um bebé nos braços. Apesar de já conhecer a cidade, “mas só de passar férias”, os primeiros tempos foram marcados principalmente pelas dificuldades enquanto jovem mãe. No entanto, e rapidamente, ambientou-se, até porque considera que “o ser humano tem uma capacidade de adaptação muito maior do que se imagina” e hoje vê Macau como sendo também a sua casa. “É uma cidade muito generosa”, principalmente para quem tem filhos. Para a psicóloga, Macau é um lugar onde existe tempo. “Vinha de Lisboa, uma capital onde só se corre de um lado para o outro e com uma outra dimensão, enquanto aqui está tudo muito mais à mão.” Para ilustrar a qualidade de vida com que foi surpreendida, Rita Amorim O lembra que, “na altura, conseguia almoçar todos os dias em casa, aproveitava muito a bebé”. A vida mudou e o tempo também mas Macau continua a ter mais-valias. “Continuo a achar que esta terra é muito generosa para quem tem filhos pequeninos, por exemplo”, apesar de muita gente ter o hábito de se queixar de que não há nada para fazer. “Claro que as actividades que fazemos dependem um bocadinho da rede social que nos envolve mas, por exemplo, em Portugal temos de partilhar o nosso tempo com a nossa família e o fim-de-semana por vezes é passado com almoços entre pais e sogros” e o tempo para os amigos escasseia. O mesmo não acontece em Macau. Com menos família a requisitar horas “conseguimos partilhar melhor o tempo com toda a gente”, explica Rita Amorim O. “Conseguimos combinar sempre coisas diferentes: uma ida ao parque ou mesmo a estes casinos todos que já contam também com espaços dedicados a quem tem filhos.” Por outro lado, e para a mãe de família, o tempo pode passar-se muito bem por cá e mesmo a usufruir de actividades ao ar livre. “A Taipa tem agora uma marginal espectacular e, se quisermos, passa-se ali uma tarde com as crianças a andar de bicicleta, numa zona bonita e a aproveitar um programa de que todos gostamos”, ilustra, acrescentando que “isto são coisas que nos ajudam muito mais do que aquilo que possamos imaginar. De mãe para mãe Rita Amorim O não separa a vida pessoal da escolha profissional. A psicóloga é uma das fundadoras da “Moms”, um projecto ao qual dá o coração para ajudar as famílias da terra. A iniciativa surgiu da necessidade que a própria sentiu quando cá chegou relativamente ao apoio à parentalidade. “Temos vários projectos que vão desde a preparação para o parto ao apoio às rotinas do bebé. Também fazemos cursos de massagens a crianças e formação para quem dedica a vida a tomar conta dos mais pequenos.” Paralelamente, também dá consultas no âmbito da psicologia da família. “A maternidade está realmente sempre presente, na vida e na profissão” conta, ao mesmo tempo que recorda que “acabou por acontecer naturalmente, apesar de sempre ter sido muito maternal”. No fundo, o projecto começou com o nascimento da segunda filha, “correu tudo muito bem mas, pelo facto de não falar chinês, senti-me pouco apoiada”. Juntou-se a Maria Sá da Bandeira, que é sua sócia, e optaram por trabalhar nesta área, de modo a ajudar as mães que não falam chinês. Com a iniciativa, a “Moms” acaba por ser pioneira neste tipo de iniciativas que cada vez mais recebem mulheres chinesas. Para já, são apenas casos cujo cônjuge é ocidental, mas já representa uma nova etapa. Para o futuro é o sucesso da “Moms” que ocupa as preocupações de Rita Amorim O. Tal como ver um filho a desenvolver-se, o desejo da psicóloga é ver este projecto também a crescer. “Nem tudo acontece, por vezes, no tempo que queremos e há momentos em que as coisas não são fáceis, mas continuaremos a fazer tudo pelo sucesso da ‘Moms’”, remata.
Andreia Sofia Silva Ócios & Negócios PessoasTuga & Lola, Vinhos e Tapas | O lugar do petisco ibérico No mais recente espaço de Cristiana Figueiredo e Mónica Gonzzalez há enchidos e queijos espanhóis com vinhos portugueses, sem esquecer a tortilha, as gambas salteadas e o pão português. A gastronomia ibérica serve-se à mesa no Tuga & Lola [dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] a seguir a um supermercado filipino e a um restaurante de rua chinês, que serve as típicas refeições hotpot, que encontramos um espaço de petiscos e bebidas completamente diferente, cujo nome faz lembrar uma célebre marca de roupa espanhola. O Tuga & Lola, espaço de tapas e vinhos, abriu há cerca de um mês na Rua da Tercena e vende o melhor do mundo português e espanhol: tem o pão e os queijos, os enchidos e os vinhos. Este não é o primeiro projecto desenvolvido por Cristiana Figueiredo e por Mónica Gonzzalez. A portuguesa, socióloga e proprietária do espaço Cuppa Coffee, na Taipa, já tinha trabalhado com a espanhola num negócio totalmente diferente, na área das lembranças para turistas e pequenas decorações de casa. Mónica, que já foi piloto de helicópteros, tinha um negócio de importação de chás, carnes curadas, queijos e vinhos de Espanha. “Como a nossa parceria correu tão bem, pensámos que poderíamos fazer uma coisa que fosse meio portuguesa, meio espanhola, porque as pessoas gostam de petiscar. Criámos este conceito e encontrámos este espaço que estava num sítio óptimo, com um preço óptimo, uma coisa difícil de encontrar”, contou Cristiana Figueiredo ao HM. Numa tábua de madeira chegam fatias de presunto e de queijo para comer com pão, bem como tortilha espanhola ou cogumelos salteados, sem esquecer as gambas com azeite e alho. A ideia é petiscar enquanto se bebe um copo de vinho tinto ou rosé. Mas há também espumante para preparar sangrias. “A ementa foi feita por gosto pessoal e nas expectativas das pessoas. Todos pensam em gambas e pequenos pratos com coisas fritas, como a tortilha. Foi muito simples”, disse Cristiana Figueiredo. No Tuga & Lola também se vendem queijos e presuntos importados, os quais vêem directamente do produtor, com preços são mais apelativos. “Temos o presunto pata negra, mas o que é realmente diferente é a língua de vaca fumada, servido com um pouco de azeite e vinagre, e o presunto de vaca, que não temos em Portugal. Pensámos que aquilo que combinaria com as tapas são os vinhos secos e as sangrias”, disse a proprietária. Cristiana Figueiredo frisou que a abertura deste novo espaço “não foi uma coisa planeada”. “A Mónica já tinha sido dona de um restaurante espanhol na Taipa. Eu sei mais do lado da pastelaria e padaria, ela domina a preparação das comidas”, contou a empresária portuguesa. Para já, o Tuga & Lola está aberto ao público em regime de take away, organizando pontualmente alguns eventos privados. “Decidimos abrir a porta para ver a reacção das pessoas apenas”, referiu Cristiana, que espera que o espaço ganhe outro dinamismo daqui a uns meses. Experiência que vem de trás A vontade de enveredar por coisas novas sempre existiu na mente de Cristiana e Mónica, que vivem em Macau há mais de uma década. “Somos pessoas que gostamos de fazer coisas e para alguém ser empreendedor é preciso não gostar de rotinas nem de horários, e aí tem de se encontrar outra solução. E passa muitas vezes por gerir os próprios horários.” No caso de Cristiana, tudo começou com o Cuppa Coffee e com a ideia de fazer diferente num território onde não havia estabelecimentos desse género. “Quando chegámos a Macau, há 15 anos, não havia cafés como aqueles a que estávamos habituadas em Portugal, onde há sítios onde podemos estar e estudar, por exemplo. Achamos que faltava um café com um conceito novo, mais internacional. Eu e o meu marido achamos que podíamos criar isso e começou tudo por aí, sem nenhum tipo de experiência. Tínhamos de fazer as nossas próprias coisas e então fomos ler como se faziam as coisas. Temos pães e bolos produzidos por nós, a nossa padaria é artesanal.” Esses produtos artesanais, sem químicos, corantes ou conservantes, e que não são congelados, também podem ser encontrados na montra do Tuga & Lola. “Queremos ter um espaço para que as pessoas se possam sentar lá em baixo a petiscar. Acabámos por ficar aqui e foi uma feliz coincidência o facto de termos uma casa de cocos mesmo em frente, muito conhecida pelos turistas. Queremos ter uma simbiose com o vizinho e um sítio dinâmico, com lugares sentados, pois só assim será sustentável”, concluiu Cristiana Figueiredo.
Sofia Margarida Mota Perfil PessoasLaurentina da Silva, produtora de eventos: “Já não se sonha em Macau” [dropcap style≠’circle’]L[/dropcap]aurentina da Silva é “orgulhosamente” macaense. Nascida e criada em Macau, lamenta nunca ter saído da terra para conhecer as suas raízes lusas. “Sempre vivi aqui, nunca daqui saí e tenho pena por não conhecer a terra do meu pai e as minhas origens portuguesas, pelo que a ideia que tenho daquele país é apenas das histórias que o meu pai contava”, explica ao HM. Enquanto filha da terra, sente-se um verdadeiro fruto da mistura de culturas. “Também tenho a cultura chinesa muito vincada por causa da minha mãe e no fundo não sou nem uma coisa nem outra e ao mesmo tempo sou as duas.” Laurentina da Silva festeja com a mesma intensidade as duas grandes festas da família, uma de cada cultura: “Festejo sempre o Natal e o ano novo chinês e nem podia ser de outra maneira. São duas datas muito importantes para mim, precisamente porque sou filha deste cruzamento.” O dia-a-dia da macaense é passado a lidar com arte. Trabalha na Fundação Rui Cunha e faz a ponte entre linguagens, a chinesa e a portuguesa, no que respeita à produção de exposições e eventos. “Finalmente tenho um trabalho ligado à arte”, desabafa enquanto explica que na sua formação na Escola Portuguesa de Macau fez o secundário na área artística, mas a vida não permitiu o seguir dos estudos. A paixão pelas “coisas bonitas” sempre a acompanhou e vem desde pequena. “Gosto de criar coisas”, explica Laurentina da Silva. Numa viagem às memórias, a jovem vai a um infância em que via a mãe a costurar e com o tempo e a proximidade começou a interessar-se pelo ofício. Na adolescência pediu para que lhe ensinasse os dotes da agulha e dedal e começou a fazer roupas para si e para quem quisesse. De tal forma que quando casou foi ela que fiz os vestidos das amigas. As línguas aproximam Paralelamente, Laurentina Silva é uma poliglota. Nasceu bilingue a comunicar entre o Português e o Cantonês. Apesar de nunca ter tido ensino oficial de Mandarim, a infância encarregou-se de a amestrar na escrita e leitura de caracteres por obrigação materna. “A minha mãe obrigou-me a aprender caracteres e eu tinha que passar horas a fazer cópias, porque é a única maneira de os memorizar”, relembra ao pensar nos dias, não tão felizes, de calo no dedo. “Nas férias, por exemplo, tinha, diariamente, que decorar um número de caracteres que a minha mãe definia e não podia sair de casa sem os saber.” Se na altura foi duro, agora Laurentina da Silva “agradece”. Na oralidade, percebe-se o sotaque de Taiwan, num Mandarim mais doce. “Gostava de ver programas daquela região e fui assim que fui aprendendo a falar”, confessa. Mas a formação linguística continua, porque “falando em diferentes idiomas, não só as oportunidades de emprego se abrem, como as relações sociais também podem ser mais e melhores”, como explica. Foi assim que o Inglês, disciplina a que não era muito boa na escola, também foi desenvolvido e, recentemente, resolveu abraçar o Coreano, porque “conhecimento não ocupa espaço”. Macau, a terra que a viu nascer e onde vive é, actualmente, sentida com um ligeiro amargo de boca. “Já não se sonha em Macau”, afirma com tristeza ao olhar para o crescimento do território e as suas consequências. Macau deixou de ser um sítio pequeno onde as pessoas são próximas, agora é um lugar em que os jovens se desinteressam porque pensam que têm o futuro assegurado com um trabalho no Governo ou nos casinos, ilustra a macaense com alguma tristeza. Mas nem tudo são espinhos e o crescimento galopante da terra fez com que “mais pessoas conhecessem Macau”. Outro aspecto de relevo e que acompanhou a evolução da terra foi a criação de mais empregos e uma maior acessibilidade a determinados cargos por parte dos locais. “Antigamente quem não soubesse Português não tinha acesso a determinados empregos e agora isso já não é assim, o que faz com que as pessoas de cá tenham outras oportunidades.” Mas Laurentina continua a sonhar e os desejos que tem não se desvinculam da sua própria identidade. “Gostava que Macau protegesse o Patuá por ser um dialecto de cá e porque transmite esta coisa do que é ser macaense”, remata.
Hoje Macau Ócios & Negócios Pessoas“Slow Tune”, Livraria | Jeff e Emily, proprietários Fica perto do Consulado de Portugal e promete oferecer mais do que livros, apesar de ser à volta das palavras que se faz este negócio. Jeff e Emily contam como decidiram apostar no mundo das letras, com um pouco de artes à mistura [dropcap style=’circle’]P[/dropcap]odemos concordar que Macau é um território que anda a um ritmo muito rápido, sendo certo que são necessários sítios onde possamos gastar o tempo de uma maneira mais lenta. A livraria “Slow Tune”, localizada na Rua do Pato, atrás do Consulado-geral de Portugal em Macau, talvez seja um desses lugares, onde é possível ler livros enquanto se bebe um café ou chá num final de tarde, ou mesmo aos fins-de-semana. “Gostamos muito de ler livros e quando viajamos para diferentes sítios gostamos muito de passear em livrarias, porque há livros específicos que só se vendem em determinados sítios. E essa é a melhor forma para conhecer as culturas locais”, disse ao HM Emily, esposa de Jeff. Os dois são proprietários da “Slow Tune”. Por considerarem que Macau não tem uma livraria tão confortável como aquelas que visitaram por esse mundo fora, decidiram criar um espaço semelhante por cá. Mas nem só de literatura se faz esta livraria, que também abrange áreas como a arte, sociedade, cultura, educação ou psicologia. May, outra das sócias do projecto, disse ao HM que a livraria faz por ter os livros que são difíceis de encontrar no território, para além de desejar partilhar os livros que gosta com os clientes. A “Slow Tune” procura ainda vender e comprar livros em segunda mão. Sessões diferentes A livraria tem um espaço reservado para a venda das tradicionais canetas-tinteiros, um dos muitos produtos criativos ali disponíveis. “Conhecemos este tipo de produtos na internet e achámos muito atractivos. Estabelecemos então contacto com os fornecedores porque queremos promover este conceito em Macau”, referiu May. A loja, de cor branca e azul, até passa despercebida num lugar tradicional onde nem sempre andam muitas pessoas, mas foi aí que os seus proprietários descobriram uma renda mais comportável para os seus bolsos. Estar numa rua mais movimentada seria impossível, mas ainda assim Jeff, Emily e May consideram que a freguesia de São Lázaro é uma zona agradável para ter uma livraria. Ao fundo situam-se várias mesas e cadeiras onde as pessoas podem ler os livros que escolhem para aquele momento ou mesmo para levar para casa. “Ler livros é um momento individual e num ambiente tão povoado como o de Macau não é fácil encontrar concentração para ler um livro, já que há muitas coisas a causar distracção. Esperamos oferecer esse ambiente ideal para a leitura de livros. Muitos clientes até compram canetas e gostam de praticar a caligrafia aqui. Acredito que essa é uma forma de acalmar o espírito e aproveitar o tempo livre”, adiantou Emily. Para quem já tem demasiados livros em casa e não quer comprar mais, a “Slow Tune” permite a leitura dessas obras. Para Emily, é uma forma de proteger o meio ambiente, mas considera que vai demorar tempo até que as pessoas se habituem a este novo modelo. Tanto Jeff, como Emily e May têm os seus trabalhos fora da livraria, pois consideram “impossível” manter o negócio como um trabalho a tempo inteiro. O dono da “Slow Tune”, contudo, não é um novato na arte de abrir negócios, pois já teve uma experiência com uma empresa criada entre Hong Kong e Macau há alguns anos. Balanço positivo Inaugurada há dois meses, a livraria tem gerado comentários positivos e tem recebido muitos clientes. “Às vezes os clientes entram na livraria e dizem o que gostam e até sugerem aquilo que pode ser feito de melhor. O intercâmbio com os clientes é interessante, mesmo que não possamos satisfazer todos os seus pedidos”, acrescentou May. Por se tratar de um espaço onde o tempo passa devagar, a “Slow Tune” tem três gatos, os quais são aceites por quem lá passa e que já são as mascotes do negócio. Os gatos são adoptados e já estavam com Jeff antes deste abrir a livraria. Para o futuro, a “Slow Tune” pretende realizar workshops de caligrafia, algo que partiu da ideia de vários clientes que gostaram das canetas-tinteiro. “Antes só escrevia quando fazia os trabalhos de casa na escola, mas depois cresci e percebi que o objectivo da escrita é bem diferente. Quem gosta de praticar caligrafia e quer escrever bem palavras e frases pode participar”, rematou Emily.
Andreia Sofia Silva Perfil PessoasMiguel Lança: “Recorri à pintura para aliviar o stress” [dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m passeio com um dos filhos reavivou-lhe uma paixão antiga, quase como quem vai buscar algo ao baú das memórias. Miguel Lança costumava pintar na escola, mas acabou por deixar esse hobby de lado com o passar dos anos. Foi o filho mais velho que, tendo igualmente paixão pelas artes, o levou de novo ao mundo das telas e dos pincéis. “Um dia passámos por uma loja, comprámos umas telas e umas tintas e começámos a aventurar-nos. Comecei então a pintar, sobretudo com acrílico, com técnicas mistas. Tenho algumas obras pintadas a óleo. Também gosto de usar tinta da china”, contou Miguel Lança ao HM. Hoje mostra um pouco do seu trabalho através da sua página do Facebook, a Msv Art. Uma visita leva-nos a compreender que se tratam de obras dominadas pela cor e pelos traços fortes. A trabalhar actualmente como chefe de sala no Instituto de Formação Turística (IFT), onde também dá alguma formação prática aos alunos, Miguel Lança pinta nas horas vagas para “aliviar o stress do dia-a-dia”. Apesar de não fazer dessa a sua profissão principal, Miguel já realizou duas exposições. “As minhas experiências foram apenas duas exposições que fiz no Venetian, uma em que fui convidado por uns alunos que estavam a frequentar um curso no IFT e que precisavam de artistas locais para expor. A outra exposição foi através de um amigo que me convidou para expor os meus trabalhos.” Inspirações não as tem, sendo o seu trabalho marcado pela espontaneidade, com base naquilo que vê. Aqui, a cultura chinesa também acaba por ter uma certa influência. “Uma vez, para celebrar os dez anos de Macau, pintei um quadro com carpas, por ser um peixe que existe muito na Ásia. Às vezes inspiro-me em algumas fotografias que tirei, do Hotel Lisboa, do Jardim Lou Lim Ioc… as coisas vão surgindo naturalmente, não posso dizer que seja algo planeado. Agarro nos pincéis e nas tintas e é o que sai. Também gosto de usar tinta da china.” Miguel Lança acredita que ser artista em Macau pode ser fácil, mas também difícil. “Há que reunir os contactos necessários, temos algumas facilidades. A Fundação Rui Cunha dá a possibilidade a artistas locais para exporem os seus trabalhos, bem como o Instituto Cultural e até a Macau Creative”, lembrou. História com 11 anos A história de Miguel Lança em Macau começou há 11 anos, quando veio por intermédio do pai, que já cá estava. Com um curso técnico-profissional, Miguel começou a trabalhar no restaurante Fernando, em Hac-Sá, lugar escolhido por inúmeros turistas de vários países. Daí, onde esteve quase uma década, guarda boas memórias. “Foi uma boa experiência, é um restaurante com muitos clientes, alguns já de vários anos, passam por lá muitas pessoas, dá para fazer novas amizades. Foi uma experiência engraçada.” Esteve oito anos como gerente, tendo passado depois para o Clube Militar, onde trabalhou como chefe de sala. “Sempre gostei muito da área da hotelaria, mas no início da minha carreira trabalhei mais em bares e discotecas”, revela ao HM. Miguel Lança recorda o período em que 500 patacas chegavam para comprar toda a comida necessária para casa e onde um apartamento era bem mais barato. Onze anos após a sua vinda para o Oriente, Miguel destaca a segurança e o desenvolvimento de um território que teve um crescimento galopante. Nunca trabalhou directamente na área de confecção de alimentos, mas defende que a variedade de pratos portugueses continua a não existir em Macau, apesar das inúmeras inaugurações de espaços que aconteceram nos últimos anos. “Existem muitos restaurantes mas na maior parte dos menus a oferta é quase a mesma. Há restaurantes com uma boa feijoada, um bom leitão, mas não se pode dizer que haja um restaurante que reúna todas as condições e se possa dizer ‘aqui é tudo bom’. Há um bocado essa falha nos restaurantes portugueses, tudo é idêntico, a maneira de confeccionar a comida é muito semelhante. Não há muita diversidade”, concluiu.
Andreia Sofia Silva Ócios & Negócios PessoasRui Rocha, fundador da Casa da Rocha: “Faço a convergência de duas tradições” Rui Rocha deixou de ser apenas académico para se dedicar a um negócio seu. A “Casa da Rocha” abriu portas há cerca de uma semana no Centro Histórico e mostra o bom de dois mundos: chás chineses e doçaria conventual portuguesa. A loja poderá um dia ser palco de exposições e workshops [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] “Casa da Rocha” esteve quase para nascer em Lisboa, mas Rui Rocha, o seu fundador, decidiu que é em Macau que quer ficar para o resto da vida. Aberta há uma semana, na Calçada da Rocha, no Centro Histórico de Macau, esta loja tem uma panóplia de chás chineses, escolhidos pelo também director do Departamento de Português da Universidade Cidade de Macau (UCM), e doçaria conventual portuguesa, até então inexistente no território. Há ovos moles, suspiros e cavacas, entre outros doces. A corrida aos doces foi tanta que no segundo dia de funcionamento da “Casa da Rocha” estava praticamente tudo esgotado. “Não vou morrer de barbas na universidade e isto dá-me uma certa liberdade e prazer, porque são coisas de que gosto. Permite-me também investigar um pouco mais sobre o chá”, contou ao HM Rui Rocha, enquanto à mesa se bebia um chá verde. O antigo director do Instituto Português do Oriente (IPOR) explicou ainda que, com a Casa da Rocha, faz “a convergência de duas tradições, uma centenária e outra milenar”. “Funcionava aqui a Futura Clássica (projecto de Ivo Ferreira e Margarida Vila-Nova), mas tivemos uma conversa e perguntaram-me se não queria ficar aqui porque fazia-lhes pena deitar fora toda a obra que fizeram e o investimento. Os móveis ficaram, as mesas foram adquiridas por nós com azulejos da Casa de Portugal em Macau”, contou ainda. Um gosto antigo Rui Rocha começou cedo a visitar casas de chás e a estudar esta bebida que pode ter efeitos relaxantes e terapêuticos. “A minha mãe é de Macau e recebíamos regularmente chá verde. Quando cheguei a Macau, em 1983, fiquei alojado no Hotel Metrópole e fui tomar o meu almoço e pedi chá e deram-me ‘Tetley’. Aí disse: “estou na China ou no império britânico?”. O ‘Tetley’ é aquilo que os produtores de chá dizem ser a parte não utilizada do chá”, recorda. Na “Casa da Rocha” existem sete variedades de chá verde, de entre mais de cem existentes. “Escolhi dois chás brancos, amarelos, pretos e depois há os chás florais, que conhecemos como chá de jasmim. Depois temos as tisanas, que são chás mais purificantes. Vou muitas vezes à China a lojas de chá e a mercados e desde que estou em Macau que gosto muito de chá. Venho sempre estudando coisas sobre o chá, porque para além do interesse cultural do chá, há a poesia, a estética, em termos de cerimónia do chá, que é mais simples do que a japonesa. A cerimónia chinesa não é tão cerimoniosa e a mim interessa-me mais. A cerimónia do chá do Japão acaba por menorizar um pouco o que é a estética do próprio chá”, referiu ainda o responsável pela loja. Quanto aos doces, são importados de Portugal e vêm preencher uma lacuna no território que, ao contrário de outros países asiáticos, ainda não tinha doçaria conventual portuguesa à venda. “O doce conventual português existe no Japão e existe em qualquer lado, as cavacas, o pastel de feijão, o pão de ló de Ovar, mas com nomes japoneses. E é curioso que aqui não temos. Quando houve a perseguição dos jesuítas e outras ordens religiosas, muitos deles eles fugiram para a Tailândia e hoje existe no país doçaria tradicional portuguesa”, explicou. Um espaço para as artes A “Casa da Rocha” pretende ser mais do que um espaço para beber chá e comer doces, sem esquecer aquela bebida tão portuguesa que é o café. Rui Rocha garantiu ao HM que a ideia é fazer da loja um espaço dedicado às artes. “Este é um espaço de confluência de culturas de Macau e não se confina apenas a vender chá ou doçaria conventual portuguesa. Também pode ser um espaço interessante para que artistas de Língua Portuguesa possam expor aqui as suas peças. Poderíamos também fazer workshops sobre o chá ou cerâmica portuguesa. Sem fins lucrativos, isso não nos interessa muito.” Mais do que o português que quer recordar o sabor dos ovos moles ou do chinês que quer beber um chá, a “Casa da Rocha” quer atrair as comunidades coreana e japonesa e preencher um vazio. “Sem menosprezo pelas casas de chá que existem, não vejo que haja aqui grandes casas de chá. Sei que há uns clubes de chá, havia uma casa muito interessante na Taipa, que fechou. Era de uma associação, cheguei a ir lá duas vezes. Há depois uma iniciativa ou outra, mas eu queria fazer uma coisa que fosse efectivamente minha”, concluiu.
Sofia Margarida Mota Perfil PessoasNatacha Fidalgo, locutora [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]voz de Natacha Fidalgo não será estranha ao público de Macau. É ela que ocupa as tardes de sábado com o programa “Dois Dedos de Música” da Rádio Macau. Mas a cara por detrás da voz é iluminada por um sorriso que não significa facilidades na vida, mas antes uma força que lhe é intrínseca. Esta menina da rádio está em Macau há cinco anos, mas a história é diferente da maior parte dos portugueses que vieram para a RAEM. “A minha história é tipo filipina”, ilustra ao recordar a sua chegada ao território. A mãe de dois filhos (na altura com quatro e três anos) foi apanhada pela crise em terras lusas tendo deixado a família para trás. “Não era uma questão de opção, não havia alternativa se não pegar nas malas e ir em busca de sustento. Vim literalmente sem nada, aflita”, afirma com uma expressão que não esconde a forte memória. O que lhe terá valido foi o bom acolhimento por parte de um casal amigo com quem viveu os primeiros meses. O início não foi fácil, já que Natacha “não tinha nada e passava os dias a bater de porta em porta”. Com formação em Recursos Humanos, mas com experiências de trabalho em várias áreas, “o que viesse à rede era peixe”. Chegou no início de Junho para apanhar o final do ano escolar e tentar a sua sorte enquanto professora de Inglês. “Foi muito complicado”, recorda, enquanto fala das tentativas sucessivas e a distância dos filhos. O que fez “não foi um acto de coragem, foi sim um acto de desespero porque era a única alternativa”. Ao mesmo tempo que lembra as saudades, Natacha Fidalgo conta uma história que não esquecerá e que acompanha a altura em que arranjou emprego e voltou a ter a prole perto de si. “Fui a uma sapataria para comprar uns sapatos e consegui sair de lá com dois pares, um para cada um dos meus filhos. Lembro-me que, quando dei por mim, já na rua, as lágrimas abundavam por ter conseguido voltar a ter para as necessidades fundamentais, sem ter que decidir o que era mais urgente, estava feliz.” Tinha arranjado emprego enquanto professora de Inglês numa escola chinesa e já “podia pôr o miúdo na bola e a menina no teatro”. “Há muita gente que fala muito mal disto (Macau), mas eu não tenho nada que o fazer. Quando cheguei bati muitas vezes com a cara nas portas mas, agora, devo tudo a Macau”, afirma ao mesmo tempo que expressa que não entende o facto de outros cá estarem sem vontade. “Tenho um trabalho digno, tenho os meus filhos e faço o que gosto. Em Portugal, aos 35 anos, não me davam emprego por ser ‘velha’ e aqui senti que continuava a ter valor para ser digna e poder trabalhar. Estarei sempre grata por isso a Macau.” “Portugueses tenho em Portugal” A vida tem continuado e os projectos alargado. Até ao ano passado dava aulas de Inglês na escola chinesa de matriz cristã. Este ano mudou de rumo: está numa pequena escola chinesa de matriz confuciana e esta experiência com a comunidade local de origem chinesa só tem trazido “mais valias à vida”. Quando refere que é professora, as pessoas presumem de imediato que está na Escola Portuguesa de Macau, ao que Natacha Fidalgo responde prontamente que “portugueses há em Portugal”, não lhe fazendo sentido que estar numa comunidade sem a entender, sendo este tipo de experiência fundamental. Por outro lado, no ensino chinês, o professor é respeitado e a própria metodologia está a mudar. Não é contratada para “despejar e mais nada, as coisas estão a mudar e cada vez mais, dentro de alguns limites, uma das exigências que se fazem é mesmo que, por entre os conteúdos curriculares se ensinem estratégias de pensamento e de capacidade crítica por um lado, e por outro que se desenvolva a criatividade nas crianças. “Na comunidade chinesa não é fácil, mas é muito desafiante fazer parte desta mudança”, frisa. Para além da rádio Não contente em ser apenas a menina da rádio, mete-se em todo o tipo de projectos, desde a educação ambiental à sensibilização para a pobreza e a implementação de acções de solidariedade. São várias as áreas em que investe o seu tempo. “As pessoas têm que fazer aquilo que gostam”, avança Natacha Fidalgo. Quando se fala na rádio relembra a “garota de 16 anos que animava uma pequena rádio pirata”. Com o passar do tempo, em Macau, quis encontrar este amor antigo. “Não podia ser nada a sério porque não tenho formação e ninguém me aceitaria com um currículo cuja experiência era na adolescência em rádio pirata”, ilustra com uma gargalhada. “Para um programa de autor até podia dar”, confessou. Por gostar de pessoas e considerar que “todos são especiais” criou o “Dois Dedos de Música”, onde convida para cada edição alguém que fica encarregue de fazer a playlist do programa. “Com a música as pessoas ‘despem-se’ e acabamos por ficar a conhecer uma centelha da alma de cada um enquanto passamos uma boa tarde de sábado”, explica. Por outro lado, diz, esta é uma oportunidade para todos experimentarem “a magia da rádio”, da qual gosta tanto.
Angela Ka Ócios & Negócios PessoasAgora Taproom, bar | Angel Wong, proprietária O segundo espaço nocturno de Angel Wong pretende mostrar o que de melhor existe na cerveja artesanal. O bar, localizado na zona dos NAPE, espera trazer também mais música e aperitivos para que se crie um ambiente que incite aos brindes e à diversão [dropcap style=’circle’]P[/dropcap]rimeiro era a cerveja apenas em garrafa, tão banal como em qualquer outro bar ou loja. Mas Angel Wong quis inovar e abriu, em Julho deste ano, um bar com uma cultura diferente. O “Agora Taproom” existe na zona do NAPE e o principal objectivo é trazer a cultura da cerveja artesanal a Macau, contou ao HM a fundadora. No Agora vende-se cerveja guardada nos tradicionais barris, feitos à mão e importados do estrangeiro, tão difíceis de encontrar no outro lado de Macau. Angel Wong garantiu que o espaço ainda precisa de ser desenvolvido e que o ambiente não está como desejou. Falta uma maior diversidade de aperitivos nas mesmas, mais bandas de música ao vivo e jogos, para que se possa trazer alguma energia ao espaço, contou. O cliente tem mais de 20 tipos de cerveja à escolha e não tem sequer de se preocupar com as mudanças que Angel Wong pretende introduzir. Esta garante que o bar vai continuar a manter um ambiente tranquilo, propício à conversa e aos brindes em grupo. Se o seu primeiro bar, aberto em 2014, não tivesse tido tanto sucesso, Angel Wong jamais se atreveria a investir num novo espaço nocturno. Mas até agora a proprietária garante que, para os lados do NAPE, o negócio promete prosperar. A cerveja como fenómeno Em 2014, quando se aventurou neste tipo de negócio, Angel Wong reparou que nem todos os clientes estavam familiarizados com o mundo da cerveja artesanal. “No início as pessoas pediam as bebidas porque olhavam para as garrafas primeiro”, disse a proprietária. A popularidade da bebida disparou em Macau e beber cerveja tornou-se um fenómeno comum há cerca de dois anos, ao ponto de neste momento, ao ponto de Angel Wong garantir que muitos dos clientes já sabem distinguir a origem da cerveja e o país de onde vem. Angel Wong quer que o seu negócio cresça, até porque já não é exclusivo na cena nocturna de Macau. Esta referiu ao HM que há cada vez mais bares que têm cervejas artesanais vindas de todos os cantos do mundo, existindo mesmo pequenos cafés que já disponibilizam este tipo de bebidas. Primeiro festival realizado Aberto entre as 17h00 e as 4h00, o Agora foi buscar o seu nome à língua portuguesa, idioma que Angel Wong estudou quando era criança. A ideia é que os clientes possam “gozar o momento” enquanto estão no espaço. Por forma a promover as cervejas e o conceito por detrás do bar, Angel e o seu sócio começaram a contar a história das cervejas artesanais e todo o processo de produção que está por detrás. Neste momento os empregados estão a ser formados para este efeito, para que depois possam promover os produtos junto dos clientes. Também aqui a falta de recursos humanos se faz notar. “Em Macau só os proprietários dos bares é que percebem dos vinhos e das cervejas”, contou Angel. É necessário formar pessoas desde o seu início, para que a formação possa continuar. Angel Wong quer também promover as suas cervejas através de um festival de pequena dimensão. Para o evento foi convidado o responsável pela fábrica da cerveja “Brewdog”, da Escócia. Este fez uma apresentação da produção da cerveja neste país europeu, que neste momento chega a Macau graças aos fornecedores de Hong Kong. Para Angel Wong, eventos quase ao jeito do célebre Oktoberfest, onde as grandes canecas de cerveja são as rainhas, são essenciais para promover a cerveja artesanal que tem, quase sempre, um sabor diferente das cervejas banais.
Tomás Chio Perfil PessoasPhoebe Tong, artista: “Macau ainda não tem uma mente aberta” [dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]hoebe Tong estudava Marketing em Melbourne, na Austrália, e regressou há três anos ao lugar que a viu nascer. Formada em Artes, a jovem decidiu abrir caminho ao empreendedorismo e criou, para tal, uma página na rede social Facebook. “Tongbay Macau” oferece um serviço de desenho, caricaturas e retratos a quem quiser decorar a casa à sua maneira. A ida para a Austrália teve como base a opinião da família. Melbourne é uma das cidades mais conhecidas no que toca à Arte, confessa a jovem ao HM, e essa é uma das razões por que optou por ir para a terra dos cangurus. Entre a vida e o desenho, Phoebe deixa espaço para outras coisas de que gosta muito, como dançar. Mas o desenho está presente desde a sua infância e, durante os estudos na Austrália, a forma como a Arte era apresentada pelos seus colegas levou a jovem a abrir a mente. “Alguns amigos faziam espectáculos na rua e desenhavam caricaturas ou retratos. Achei interessante e comecei a fazer o mesmo”, explica, acrescentando que chegava a fazer retratos simples em cinco minutos, entre os intervalos das aulas. “Como chegavam muitos turistas todos os dias àquela cidade, o ambiente artístico interessou-me imenso e comecei a oferecer serviços de desenho rápido na zona turística de Melbourne. Quando voltei a Macau, precisava de trabalhar, mas queria a continuar a desenhar, portanto criei a página na Facebook para receber os pedidos de desenho”, explica. Mas Phoebe tem outros desejos. Gostaria de introduzir esta cultura no território, ainda que afirme compreender que ser artista de rua é uma profissão menos popular por cá e a arte não é algo visto como principal em Macau. Ainda assim, Phoebe vai continuar, porque sente que as pessoas ficam “felizes por receber desenhos feitos à mão”. Algo que a jovem “adora” e vê como muito especial. Momentos especiais O sucesso, aparentemente, não se fez esperar. Phoebe recebeu vários pedidos locais, mas também de fora, como Taiwan e Hong Kong e da Europa. Algo que, confessa, a surpreendeu muito, porque não previu que o feedback para o seu trabalho levasse a tanta agitação. Nos últimos três meses, recebeu centenas de pedidos. “Muitas pessoas até gostam de levar as minhas obras como um presente para os amigos finalistas das universidades”, diz, sorridente. Mas Phoebe destaca um dos pedido que foi o mais inesquecível: a cooperação com a Richmond Fellowship of Macau, uma associação social sem fins lucrativos. A jovem faz desenhos e ajuda os deficientes mentais que estão a receber tratamento na instituição a fazer flores secas, combinado as duas para vender como um presente. “Embora tivesse sido paga pelo trabalho, doei parte das receitas para esta associação social”, disse com satisfação. Outro dos pedidos que destaca é o de um fã de voleibol, que lhe pediu para fazer alguns cartazes para as jogadoras brasileiras durante o Grand Prix de Voleibol de Macau. A verdade é que os cartazes de Phoebe chegaram às mãos das jogadoras. E o futuro? Como trabalha numa empresa grande, na qual é responsável de Marketing, Phoebe ainda divide o seu tempo entre a Arte e a vida profissional. Questionada sobre se pensa em deixar o trabalho para se dedicar a 100% ao mundo dos pincéis, a jovem define prioridades: viver os nossos sonhos é algo que os jovens pensam muito hoje em dia, diz, mas tem de se ganhar o pão. A solução é “encontrar um equilíbrio entre os interesses pessoais e a vida profissional”, deixando, por agora, o seu tempo livre para desenhar. Sobre a aceitação desta cultura como uma cultura de rua, Phoebe acha que Macau ainda não tem uma mente aberta suficiente. Falta promoção e um lugar onde possa, efectivamente, haver mostras de rua.
Andreia Sofia Silva Ócios & Negócios PessoasJosephine Lam, criadora da “Loving Macau”: “Macau inspirou-nos muito” Josephine Lam juntou-se a uma pequena equipa de designers e juntos criaram a “Loving Macau”, que cria lembranças com os tradicionais símbolos de Macau e que tem inclusivamente a vertente de merchandising, vendendo para outras empresas ou clientes. T-shirts, canecas e canetas tentam mostrar a verdadeira Macau [dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]acau é pastéis de nata, é pauzinhos e dumplings em qualquer dim sum, é Ruínas de São Paulo, é espaços cheios de cultura e calçada portuguesa. Foi a pensar em tudo aquilo que preenchia as suas memórias, e também pelo amor que sente a este território, que Josephine Lam criou a “Loving Macau”, juntamente com mais sócios. Criada em Dezembro, só há cerca de dois meses é que esta empresa de pequenas lembranças começou a promover-se. Josephine Lam estudou Design no estrangeiro, mas quis voltar à terra que a viu nascer. Aqui encontrou um nicho de mercado. “Quando regressei percebi que havia falta de projectos de design que pudessem representar Macau. Então decidi criar algo que representasse melhor a nossa cidade.” Dessa ideia nasceram t-shirts, canecas e canetas com todos os elementos que representam a história e cultura tão características de Macau. “Fomos buscar a inspiração a uma série de coisas. Macau inspirou-nos muito. Tentámos escolher os elementos mais icónicos, mas que não fossem os mais banais. Queríamos encontrar elementos que tivessem algum significado para nós, que nos fizessem lembrar a nossa infância, quando éramos jovens, quando apanhávamos o autocarro, por exemplo.” Apesar da equipa ser pequena, o sucesso tem sido muito, garantiu ao HM Josephine Lam. “Temos vindo a receber muito apoio da comunidade local e dos turistas. O mais importante para nós é produzirmos coisas a pensar nos locais, algo que os faça ficar orgulhosos e que os faça lembrar da infância. Algo que possam oferecer aos amigos.” Com parceiros de negócio e designers, a “Loving Macau” trabalha ainda com vários colaboradores. A ideia é trazer sempre novas ideias e ir além da banalização deste tipo de produtos. “Temos colaboradores e até fotógrafos, mas adoramos trabalhar com todos aqueles que tenham sempre uma perspectiva mais criativa”, contou Josephine Lam. Expansão é o caminho Um olhar sobre a loja online permite chegar à conclusão que a “Loving Macau” procura fazer diferente com aquilo que existe há muito. Há pins para camisolas feitos com o tradicional pastel de nata e não faltam sequer pins com a imagem dos velhinhos autocarros da Transmac que antes povoavam a cidade. Há outros com a imagem de uma caixa de correio com a palavra em Português, que fica bem em qualquer camisola ou mochila. Josephine Lam acredita ter criado um projecto pioneiro ao nível da criação de produtos de merchadising locais, com uma aposta na qualidade. “Em termos de merchandising acredito que somos pioneiros na área das lembranças, porque criámos algo do qual os locais também se podem orgulhar. Trabalhamos arduamente para que isso aconteça. As t-shirts são o produto que vendemos mais, sobretudo as que dizem ‘Macau’, porque somos pioneiros na criação de um t-shirt de alta qualidade que promover Macau de forma simples.” Ao criar este tipo de produtos, a “Loving Macau” acaba por estar a contar a história do seu território, tão cheia de coisas diferentes e semelhantes ao mesmo tempo. “Somos apenas uma empresa criativa que produz estes elementos sobre Macau. Tentamos ter sempre uma nova perspectiva sobre as coisas e ter uma mente criativa, a criatividade é muito importante para nós. Tentamos promover essa história que está por todo o lado, na cidade.” Para o futuro Josephine Lam pretende aumentar ainda mais a extensão do seu negócio. Sempre da maneira mais criativa e original possível. “Vamos continuar a expandir o nosso negócio e gostaríamos de fazer mais produtos e convidar mais mentes criativas para colaborarem connosco, para fazerem desta uma cidade mais bonita.”
Andreia Sofia Silva Ócios & Negócios PessoasObento Fit, restaurante de takeway: “Poderia ter um negócio ainda maior” Sayaka Mcpherson criou, há cerca de um ano, uma marmita com refeições saudáveis à qual deu o nome de Obento Fit, nome dado em japonês à lancheira do almoço. Hoje entrega cerca de 30 refeições por dia nas zonas de Taipa e Coloane e o negócio só não cresce pela falta de recursos humanos [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] história do restaurante de take-away “Obento Fit” começou com um espectáculo de dança. Foi graças ao House of the Dancing Water que a ideia de fazer comida saudável para vender para fora ganhou forma. Daí até à sua expansão foi um pequeno passo. Sayaka Mcpherson, de ascendência japonesa e americana, começou a fazer refeições caseiras sem gordura ou hidratos de carbono porque os artistas e trabalhadores do espectáculo estavam cansados de fazer más refeições. “O meu marido trabalhava no House of Dancing Water e começou a pedir comida. Numa primeira fase comecei a fazer comida mais saudável para mim e para o meu filho, para testar, e também para quem trabalhava no espectáculo. Depois começaram a perguntar-me se poderia entregar refeições nas escolas da Taipa e também para os trabalhadores dos casinos”, contou ao HM. “Comecei a perceber que em Macau era difícil encontrar sítios com comida saudável e os sítios disponíveis eram caros. Queria criar um negócio que permitisse entregar refeições todos os dias. As pessoas começaram a gostar e decidi começar a fazer mais publicidade nas zonas da Taipa e Coloane”, disse a responsável. Assim nasceu o “Obento Fit”, nome da marmita vendida pelo restaurante e que é, em japonês, o nome da tradicional lancheira de almoço. O objectivo é disponibilizar uma refeição completa e saudável a preços baixos, sendo que actualmente são distribuídas cerca de 30 refeições diárias, apenas nas zonas da Taipa e Coloane. “A comida é feita na minha casa, tudo é natural e não utilizo coisas processadas, ou comida congelada. Não acredito em apenas uma dieta, então experimento várias coisas.” Substituições saudáveis Para comer melhor e sem aditivos existem truques. Nada de usar o maléfico óleo, mas apostar sim no azeite ou no óleo de coco. Sayaka garante que experimentou ela própria a comida que vende para fora e que já perdeu cerca de seis quilos em oito meses, juntamente com o marido. A fundadora faz sempre substituições de alimentos nas marmitas “Obento”. “Costumo substituir a massa, por exemplo, e muitos dos clientes não acreditam que aquilo não é massa. Faço substituições com alimentos mais saudáveis, mas faço os pratos que todos costumam comer. Todos os dias tenho menus diferentes, com carne, marisco… A minha crença na comida saudável baseia-se numa diminuição do consumo de açúcar e dos hidratos de carbono e a aposta em mais carne e vegetais.” Sayaka acredita que em Macau há cada vez uma maior consciência social em relação à comida saudável, mas que é preciso uma maior informação junto do público. “Não há muita gente que saiba o que de facto significa comer de forma saudável. Não basta comer saladas todos os dias, não é essa a dieta mais equilibrada. Temos de comer diferentes refeições.” Os clientes que procuram o “Obento” não são todos aficionados do desporto, conforme explicou Sayaka. “Tenho pedidos todos os dias, muitos dos meus clientes praticam fitness, mas muitos [querem] apenas experimentar. É de facto importante comermos comida saudável sem químicos e quando comemos fora muitos restaurantes utilizam esse tipo de produtos. Tento que seja comida caseira, como se fosse a nossa mãe a cozinhar, com mais vegetais e carne.” As dificuldades O sucesso do “Obento Fit” é uma realidade, porém limitada: Sayaka Mcpherson não consegue fazer entregas em Macau devido aos parcos recursos humanos de que dispõe. As entregas são totalmente gratuitas. “Não consigo entregar refeições em Macau porque não tenho recursos humanos suficientes. Entrego cerca de 30 refeições por dia”, disse, alertando para as dificuldades diárias que enfrenta para ter um negócio. “Poderia ter um negócio ainda maior, mas é muito difícil. Sou estrangeira, não sou residente, é mais difícil para nós, estrangeiros, fazer negócio em Macau, porque não falo Chinês nem Português. Para encontrar condutores ou para comunicar é difícil e isso é importante para aumentar o volume de negócio. Mas se encontrar um parceiro de Macau, isso será possível”, conclui. A comida pode ser encomendada na página do Facebook da empresa.
Hoje Macau Ócios & Negócios PessoasEcoAmigo, consultora ambiental: “Plantar é positivo para a vida” Qual é a relação entre a engenharia e a protecção ambiental? Esta empresa sediada em Macau pode talvez, dar uma resposta [dropcap style≠’circle’]“E[/dropcap]coAmigo é uma companhia de engenharia e consultoria ambiental, que quer melhorar o ambiente e a qualidade de vida da sociedade em Macau”, começou por explicar a secretária Karen Chan. Conhecemos a empresa porque tem uma loja na Rua da Tercena – atrás da Rua Cinco de Outubro – com uma porta de vidro que dá para ver o que se passa lá dentro: tudo é verde e branco. Karen explicou-nos que a empresa já tem quatro anos de existência mas o espaço onde está o “showroom” foi aberto há cerca de um mês. Lawrence Tam, director executivo, explica que a empresa promove as novas tecnologias de poupança de energia como é o caso da solar. Mas ao lidar com este mercado, apercebeu-se que ainda é um assunto desconhecido e que muitos pensam ser complexo, por isso esclarece que, a protecção ambiental não tem de ser uma coisa complicada e tecnológica, mas sim uma coisa simples e que pode fazer parte da vida. Decidiu abrir a loja para “aproximar a população”, promovendo a ideia junto do público e do Governo. “Green living” é o principal conceito da empresa. EcoAmigo quer que cada pessoa, cada família de Macau plante em casa ou no local de trabalho, tornando-se um interesse ou um hábito do dia-a-dia. Espera também que as crianças compreendam a ciência simples do ambiente e da agricultura. Mas não só de plantas verdes, solo orgânico, mini-estufa, e sistema de purificação do ar interior, vive esta empresa. Painéis solares, design, consultoria e gestão de projectos de interior são outros serviços que a EcoAmigo oferece. Além disso, Lawrence acrescentou que a empresa tenta também envolver-se na parte da Educação. Já elaborou programas e materiais didácticos para escolas primárias, com conteúdos como reciclagem e energia solar, para que os alunos aprendam mais sobre a protecção ambiental. “Olhando à minha volta , 80% de pessoas não têm o hábito de plantar, mas eu espero criar esta tendência porque, primeiro; plantar é muito barato e segundo; é positivo para a vida. Se o Governo não promove, eu promovo. Sugiro também que os namorados não comprem ramos de flores para as namoradas, mas sim uma planta inteira, que é reproduzível.” Durante a visita à loja, Lawrence salientou que todos os produtos que a EcoAmigo selecciona para vender são da Europa e têm boa qualidade, e por isso os preços são um pouco mais caros. O que o responsável quer trazer para Macau produtos de qualidade. “Por exemplo, vendemos um vaso de plantas com preço de 150 patacas, muito mais caro do que um vaso normal, mas o nosso é especial porque se consegue regar a planta automaticamente e aumentar a taxa de sobrevivência da planta. Mesmo que se esqueça de regar a planta durante duas semanas, ela não morre,” acrescentou. Outro produto que a secretária Karen recomenda, é de uma marca portuguesa, Minigarden, o “green wall”, que reutiliza materiais incluindo pneus abandonados para fazer uma parede, onde se pode plantar produtos hortícolas na varanda, com um sistema de rega automática e poupança de água. O produto tem garantia de fabricante de dez anos. Em tom de orgulho, Karen acrescentou que esta loja não é só de venda de produtos. Porque caso haja algum problema com algum dos produtos aqui comprados, comprometem-se a resolver os problemas e a prestar a máxima ajuda. Apesar de estarem abertos há pouco tempo, Karen explicou que a loja já conseguiu atrair a atenção dos moradores e recebeu bons comentários. “Os clientes disseram-nos que não havia uma selecção de produtos como os nossos em Macau. Os pais também aceitaram bem estes conceitos, porque não querem que os filhos passem todo o tempo a jogar no smartphone ou a ver televisão. Querem também incutir-lhes o espírito de plantar legumes na varanda, em casa”, disse. Para Karen, o que é preciso para a empresa nesta altura, é apostar mais na promoção e é por essa razão que a EcoAmigo participa na Feira da Taipa, todos os domingos, no Largo dos Bombeiros, onde espera poder promover os seus produtos ecológicos. Como outras pequenas e médias empresas, EcoAmigo enfrenta a pressão da renda, mas também grandes custos de, por exemplo, transporte de produtos estrangeiros. Lawrence Tam revelou que o dinheiro investido na loja ainda não foi recuperado, mas os trabalhos paralelos de design e engenharia ajudam a equilibrar as despensas. No futuro, Karen espera que empresa cresça e gostaria de aumentar a equipa, que agora é de apenas oito pessoas, mas tudo depende da situação que a EcoAmigo vai enfrentar no futuro.
Andreia Sofia Silva Perfil PessoasAiri Oguri, estudante japonesa de Português [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]ntes do boom desenfrado do turismo chinês em Portugal, já os japoneses gostavam de visitar o país e os seus lugares mais tradicionais. Airi Oguri, jovem estudante de Língua Portuguesa da Universidade de Macau (UM), confirma isso mesmo. “Portugal é um país muito semelhante ao Japão e é o melhor país para os japoneses morarem.” A jovem apaixonou-se pela língua de Camões muito cedo, aos 16 anos. Em Macau encontrou o lugar certo para aprender e explorar todos os idiomas que aprendeu. Contudo, ainda fala Português de modo tímido, como quem tem medo de errar e necessita de analisar cada expressão portuguesa e cada palavra que ainda lhe é estranha. “Estudei um ano no Brasil quando tinha 16 anos de idade. Depois entrei para a Universidade de Estudos Estrangeiros de Quioto para não esquecer o Português que tinha aprendido”, contou ao HM. Apesar de já ter visitado Portugal, há cerca de quatro anos, é para o Brasil que Airi quer voltar um dia, talvez por se sentir tão próxima do país das praias e do samba. Natural de Wakayama, a sul da cidade de Osaka, Airi Oguri deseja também aprender Chinês. “Quero aprender esta língua porque também é importante para arranjar trabalho no futuro, por isso decidi vir para Macau.” Neste momento a estudante encontra-se no Japão, mas é para a RAEM que deseja voltar. “Acho que só aqui posso aprender mais sobre as minhas outras línguas, como o Português, o Chinês ou o Inglês.” Macau, terra desconhecida Quando chegou à pequenina Macau, Airi Oguri não sabia os lugares para onde podia sair e onde podia comer. Esteve um ano aqui mas não conheceu apenas o pequeno território, tendo optado por viajar por outros países da Ásia. “Passei seis meses em que estava muito pouco tempo em Macau e praticamente só viajava para outros países, porque as viagens aqui são muito mais baratas. Mas aqui também tive experiências interessantes. Comecei a ir muito às piscinas e saía com as minhas amigas. A minha experiência em Macau foi óptima”, revelou. Dos lugares por onde passou, Airi Oguri tem mais saudades das Filipinas, “porque tem praias lindas”, e Taiwan, onde diz ter muitos amigos. Macau até seria um bom território para viver, dado os elevados salários, aponta. “Vivi um ano como estudante e achei caro, tinha sempre de me preocupar com os preços para não gastar muito. Mas acredito que deva ser um sítio interessante para viver. Macau tem uma coisa boa que é o facto de ficar muito perto da China ou de Hong Kong. Foi um sítio onde fiz amigos de várias nacionalidades e não apenas chineses.” Quando não está a estudar, Airi Oguri gosta de se exercitar no ginásio, para manter a boa forma. Enquanto espera por uma oportunidade, a jovem continua a sonhar com a sua profissão ideal. “O meu sonho é ser consultora na área social e nos seguros, gostava de um dia poder ter a minha própria empresa.” Para atingir o seu objectivo, a jovem já tem o seu caminho bem definido. “Para realizar esse sonho tenho de estudar várias línguas e tirar vários cursos. É por isso que gostava de morar fora do Japão, para não me esquecer das línguas”, conclui. Em Macau, Airi não deixou de frequentar bares bem portugueses e beber a típica cerveja com amigos lusos e estrangeiros. A cada palavra nova aprendida no decurso das conversas banais mostrou uma imensa curiosidade. Para ela, esta entrevista, que a deixou muito feliz, também representou uma oportunidade para se dar a conhecer e para praticar mais a língua à qual já deu tanta dedicação, contou. Quando lhe perguntamos como descreve Portugal, Airi Oguri utiliza uma palavra única, que nos define por inteiro e que não tem sequer tradução numa outra língua: a saudade. Apesar de a ter aprendido na sala de aula, numa terra que é chinesa e também portuguesa, é saudade que Airi Oguri parece sentir. Saudade de Portugal, que visitou há quatro anos com a irmã. Mas saudade também do Brasil, dono de um outro Português que lhe é familiar.
Sofia Margarida Mota Ócios & Negócios PessoasLax Café | Nicole Helm, gerente: “Sem bom café não se faz uma casa” “Lax” surge da palavra “relax”. O “Lax Café” é um espaço de comes e bebes com uma pequena esplanada que se especializou no café de qualidade e dá as boas-vindas aos animais [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] “Lax Café” existe há cerca de quatro anos na Rua de Bragança na Taipa. A ideia para um espaço acolhedor por dentro, e que oferece uma pequena esplanada, surgiu da oportunidade. Nicole Helm, proprietária e gerente do café, procurava um sítio para investir quando o então estabelecimento que ocupava aquele espaço foi posto à venda. “O meu marido perguntou-me e porque não aproveitar?”. Meio a medo, avançou. Com a mudança de proprietário foi tempo de mudar os ares. “Mudei tudo aqui, fiz uma espécie de limpeza ao espaço”, frisa. Os trabalhos não se ficaram por aí e são “um processo que se vem mantendo ao longo do tempo”, acrescenta. Outra lufada de ar fresco foi dada também ao menu, de modo a que se tornasse exequível e apelativo a um público generalizado. “A forma como está organizado reflecte a preocupação de que todos o entendam.” Cada sugestão é acompanhada por uma imagem ilustrativa de forma a que, independentemente da origem, o cliente possa saber o que está efectivamente a escolher. A opção tem em conta “a crescente multiculturalidade local”. Por outro lado a escolha é feita conforme o que Nicole gosta. “Não posso ter no menu coisas que não goste, não faria sentido”, refere, dizendo que, como cartão de visita, escolhe o hambúrguer australiano, uma criação do seu marido. Por outro lado não deixa de frisar os ovos beneditinos como uma das escolhas que sempre marcaram a diferença na casa pela “sua concepção cuidadosa”. Apesar de ser um prato capaz de ser encontrado “em qualquer lado, aqui é especialmente bom”, garante, falando de uma ementa que vai de pequenos almoços a refeições e snacks com destaque ainda para as sobremesas “caseiras”. “O Lax oferece repasto para todos os gostos.” Outra grande aposta foi o café, sendo que “sem um bom café não se faz uma casa que se chama de tal”, afirma Nicole sem hesitação. “Não sou propriamente uma apreciadora, mas passei três meses em formação intensiva para que esta casa possa ter um café de qualidade e feito como deve ser”, sublinha. Por outro lado, o “Lax” aposta na diversidade desta bebida, não querendo igualar-se a estabelecimentos do género que só se baseiam numa marca ou num tipo de café. A proprietária aprendeu a degustar e a diferenciar várias origens e várias formas de se fazer café, para diferenciar o estabelecimento que gere, sendo que considera que “é uma forma de atrair os clientes e de convidar a um regresso”. Bicharada bem-vinda À porta do “Lax” encontrámos um letreiro a dar as boas-vindas a animais de estimação. Esta é, sem dúvida, uma das características que distingue este café na Taipa. Inserido na família, Nicole não vê porque é que as pessoas não devam ir aos sítios que gostam com os seus companheiros de quatro patas. A iniciativa, apesar de por vezes não agradar a todos, tem surtido efeito positivo na clientela em geral. “Quando um cliente não deseja que o cão da mesa vizinha esteja por perto, até podemos perguntar educadamente aos donos se se incomodam de ir para a esplanada. No entanto, se estes não quiserem, ficam cá dentro com os animais”, afirma a gerente , sendo que “faz parte da política da casa e é uma iniciativa que criou” por também lhe agradar. “São parte da família e portanto devem estar com ela.” É inevitável ainda perceber que cada refeição é acompanhada por uma escolha cuidada de modo a criar um ambiente confortável. “Escolho a playlist e trabalho para que possa encontrar a música que mais se enquadra neste tipo e estabelecimento”, refere Nicole com satisfação. “Não é possível agradar a todos mas é com entusiasmo que a grande maioria aprecia o que se ouve aqui”, assegura. Trabalhos sem limites O balanço deste quatro anos de existência é no geral muito positivo, sendo que a proprietária considera que a marca “Lax” está já positivamente afirmada no mercado local. “É um sítio onde as pessoas se encontram, entram, compram qualquer coisa de que mais gostam e ficam um pouco a usufruir do espaço.” Se há três anos o “”Lax tinha um público composto “apenas por ocidentais”, agora as cadeiras são ocupadas por gente de todo o lado. Para o futuro, o trabalho “não tem limites”. “Penso que continuarei a trabalhar numa melhoria permanente, não quero fazer um franchising do Lax Café, prefiro que este seja efectivamente um sítio popular em Macau. Fico muito feliz quando vejo o regresso de clientes”, remata a proprietária.
Sofia Margarida Mota Perfil PessoasTelmo Gongó, chef de cozinha: “Um dia senti o chamamento” [dropcap style≠’circle’]T[/dropcap]elmo Gongó é o chef natural de Leiria que está a dirigir o leme da cozinha do Tromba Rija de Macau há cerca de dois anos e meio. O mundo da cozinha sempre foi um fascínio para o profissional de 34 anos. A paixão vem de família e as tardes passadas com a avó foram o primeiro passo para apurar o gosto pelo que se faz ao fogão. “Cresci com a senhora minha avó, que estava sempre em casa e na cozinha. Foi ela que me ensinou a cozinhar arroz e me explicou como se cozinhava massa”, conta-nos. Podia ter tido uma carreira no desporto, mas outros valores se levantaram. Aos 17 anos jogava andebol numa equipa de primeira divisão e “até iniciou os estudos para prosseguir com a carreira de professor na área”. Mas pelos vistos, os pratos é que marcaram golo e ganharam o campeonato num lance repentino e certeiro. “Um dia senti o chamamento. Desisti de tudo e entrei para um curso de cozinha. Foi amor à primeira vista.” Um amor que tende a durar sem divórcio à vista, até porque o prazer sentido por quem gosta de comer também parece ser comum a muitos. Ásia na mira Foi o gosto por ver o gosto dos outros pela arte de saborear que incentivou o chef para a “criação dos seus próprios pratos e receitas.” Criar sabores exige experiência, não só de cozinha, como de gentes, lugares ou de mundo, e foi neste contexto que Telmo Gongó arrumou as malas e veio, de repente, para Macau. O continente asiático até já estava na lista das visitas gastronómicas e quando surgiu o convite para dirigir a batuta da cozinha do restaurante situado na Torre de Macau a resposta foi inequívoca. “Foi um sim sem dúvidas ou hesitações e sem olhar para trás”, relembra. Na origem da vontade que alimentava o sonho que agora faz parte da realidade estavam os “mercados de rua com as suas imagens e cheiros e possíveis sabores, o peixe vivo a saltar nas bancas e a variedade conferida pelas especiarias” que tanto fazem parte do continente e da sua gastronomia. Mas não há bela sem senão e Telmo Gongó aponta o dedo para a “falta de cuidados no controlo de higiene. Falta sem dúvida alguma dar esse passo”. É também o peixe que faz os seus deleites quando pega no tachos por cá. “Gosto de cozinhar peixe, especialmente bacalhau e polvo, que são ingredientes muito apreciados aqui.” Mas o menu muda quando está do outro lado da mesa, sendo que o que lhe apraz saborear é mesmo a galinha africana. Não se trata aqui unicamente de pupilas gustativas, mas sim de um conjunto de factores histórico-culturais que fazem deste prato “uma refeição ainda mais apetecível”. Para Telmo Gongó a receita “é uma fusão das culturas trazidas pelos escravos e povos que vinham nos barcos do ultramar”, diz-nos, acrescentando que “é um prato que traz uma herança que se reflecte quando se come”. Na Ásia, já deu um pulo à Coreia do Sul e ao Japão movido pela curiosidade gastronómica. Da Coreia retém a morcela de sangue com arroz, prato típico da cidade que o viu nascer e que, com espanto, voltou a saborear numa receita idêntica tradicional deste país do Oriente. O Japão não é uma escolha só para visita, mas sim um “lugar de sonho para viver” sendo “uma civilização, uma cultura e uma gastronomia maravilhosas”. Macau de surpresas Da experiência pela Terra do Nome de Deus sublinha a surpresa que tem diariamente ao verificar que todos os dias “aprende uma coisa nova”, o que lhe confere uma vida pouco rotineira e de somas de conhecimento. É neste sentido que, com a devida humildade, desconhece o que lhe falta ainda aprender estando sempre disposto a assimilar o que “os dias de hoje e amanhã têm na manga para ensinar.” No entanto, e sem dúvida, o Mandarim é uma falha neste processo de aprendizagem, considera o chef: “aprender Mandarim dava muito jeito aqui”, diz, relembrando que as dificuldades na linguagem são uma constante para quem lidera uma cozinha e tem que comunicar diariamente com os funcionários locais sob risco de que as coisas não saiam como deveriam. Por outro lado, o crescimento desenfreado e sem olhar a meios da região não lhe passa despercebido. Amante da natureza, vê Macau com potencial para ser um exemplo a nível mundial, não fosse a má ordenação do território. “Devia ser uma cidade verde”, remata.
Andreia Sofia Silva Ócios & Negócios Pessoas“Malaninha”, uma marca com um pé em Macau e Portugal Com as mãos de Ana Cristina Sarmento pedaços de tecido transformam-se em malas e peças de roupa com um toque artesanal. A “Malaninha” e o croché fazem parte da vida de Ana desde a sua reforma, sendo que as peças que produz já chegaram a Macau [dropcap style≠’circle’]“M[/dropcap]alaninha” vem de mala e vem de ‘Aninha’. Era este o nome que o marido de Ana Cristina Sarmento lhe dava. Depois vieram as linhas e as agulhas e nasceu um projecto. Com ligações a Macau, onde residem os seus filhos, Ana decidiu, após a reforma, produzir peças em croché para todos os gostos, tamanhos e feitios. Na última edição do Arraial de São João as peças da “Malaninha” estiveram presentes, a mostrar uma técnica tradicional bem portuguesa. Tudo começou por acaso, contou Ana Cristina Sarmento ao HM. “Começou por ser uma brincadeira. O meu marido disse-me: agora que estás reformada porque é que não começas a fazer croché? Foi nessa altura que ponderei e comecei a expandir os meus trabalhos. O projecto foi desenvolvido juntamente com a minha irmã e com a ajuda dos meus filhos, que nasceram em Macau.” O arranque não foi fácil, conforme recorda Ana Cristina Sarmento. “Ao princípio tivemos muitas dificuldades, mas depois começámos a fazer algumas exposições em várias zonas típicas de Portugal.” A ligação da “Malaninha” a Macau parece ter ficado reforçada graças ao convite de Miguel de Senna Fernandes e da Associação dos Macaenses (ADM) para expor em São Lázaro. “Agradeço o facto de me ter aberto as portas e ter-me ajudado a ser reconhecida pelo meu artesanato”, referiu Ana Vieira. Apesar dos traços e laços portugueses que o território mantém, a verdade é que em Macau muitas pessoas continuavam a não compreender o método de trabalho da “Malaninha”, que trabalha com produtos vindos de Portugal. “Em Macau muita gente não acreditava que as linhas vinham de Portugal e tinham medo de comprar. Mas com o passar do tempo os nossos amigos começaram a passar a palavra e explicavam que se tratam de produtos mesmo artesanais.” Passadas as dificuldades iniciais, a “Malaninha” parece ter vindo para ficar. “Tenho tido muitas encomendas ao ponto de pedir ajuda à minha irmã. Quando estou em Macau tenho que lhe pedir linhas de Portugal para poder trabalhar. E foi assim que resolvemos ficar as duas sócias.” Técnica de infância Ana Cristina Sarmento aprendeu em criança a fazer croché, uma arte que tradicionalmente é passada de mães para filhas. Desde aí que adapta o croché para fazer malas, roupas e chapéus, sem esquecer carteiras mais pequenas. “Apesar de ter aprendido esta técnica quando era pequena tenho vindo a aperfeiçoar com alguns cursos”, referiu ao HM, garantindo que os produtos mais procurados são as malas, almofadas para decorar a casa e chapéus, ainda que não só. “As pessoas procuram de tudo um pouco, é algo que depende sempre do gosto de cada um.” Ana Cristina Sarmento garante não ter interesse “em mais parcerias com outros”, por gostar de “trabalhar em exclusividade”, mas não descarta a possibilidade de mostrar mais o trabalho da “Malaninha” no território. “Tenho tido várias oportunidades, mais do que em Portugal, porque as pessoas de Macau gostam muito de coisas artesanais vindas de Portugal. Neste caminhar de empenho do nosso trabalho esperamos que esta situação se desenvolva, a fim de poder participar em artesanatos e encontros, tal como fizemos no Arraial de São João e no Festival da Lusofonia, onde também estive em representação da ADM.” Apesar desta ser uma arte rara em Macau, Ana Cristina Sarmento defende, contudo, que a “indústria de artesanato é óptima” no território. Ainda assim, diz, “precisa de ideias diferentes em relação aos actuais hábitos da cidade, algo que, sem dúvida, levaria a própria indústria a desenvolver-se mais.” Os produtos da “Malaninha” podem ser vistos na página do Facebook com o mesmo nome.
Tomás Chio Perfil PessoasVitória Fong, aluna de português: “Primeira impressão que tive da língua foi muito boa” [dropcap style≠’circle’]V[/dropcap]itória Fong gosta de aprender línguas. No início, a agora jovem aluna finalista do curso de Língua Portuguesa não sabia porque decidiu estudar a língua de Camões. Mas o facto de ter sido transferida directamente da sua escola secundária para estudar na Universidade de Macau e de nesta instituição ter sido considerada uma das melhores alunas a Português permite, agora, perceber que a escolha foi bem feita. Depois de quatro anos de estudos, fala fluentemente a língua em que escrevemos. A jovem até fez a candidatura também para estudos em Inglês, mas teve de se decidir por um dos cursos, já que a UM só permitia uma opção. Vitória explica-nos a escolha. “Achei que o Português, sendo uma língua oficial, poderia trazer mais vantagens do que os estudos de Inglês, portanto, optei pela língua de Camões” diz-nos, com um sorriso. Sobre a dificuldade de estudar esta língua, Vitória explica-nos que a atitude na aprendizagem é algo muito importante. “Mesmo que um estudante tenha recursos bons, como os professores, as matérias e outras, se não tiver uma atitude positiva, ou seja não tenha qualquer interesse em estudar a língua, não vai conseguir aprender bem o idioma”, exemplifica ao HM. Vitória dá-nos um exemplo: um professor chinês de Língua Portuguesa é importante para os estudantes, porque “cria um base” para os alunos, ainda que os estudantes chineses não “possam depender tanto desses professores chineses, senão, a capacidade de falar a Língua Portuguesa não vai melhorar”. “Comecei do zero em Português e a primeira impressão que tive da Língua Portuguesa foi muito boa, a minha professora foi muito simpática e isto quebrou o conceito que tinha sobre os professores, diz-nos a jovem local, que ganhou o prémio de Melhor Aluna da Casa de Portugal em 2015. Além do galardão, Vitória conseguiu uma boa nota durante os estudos na UM. Qual o segredo para tal? “Uma grande atenção nas aulas”, diz-nos, juntamente com alguns esforços fora da sala. “Não sou muito trabalhadora, mas estou atenta a tudo o que os professores dizem, faço o que pedem e, às vezes, vejo e leio o que me interessa em Português. Só assim.” O futuro na RAEM Sobre o futuro para os finalistas de Português, Vitória diz que a maioria dos seus colegas aspira ser tradutor na Função Pública, mas nem isto é fácil: neste momento, podem apenas procurar emprego sem qualquer relação com a língua, confessa-nos, porque não existem muitas oportunidades. Além disso, alguns colegas consideram não ter uma qualificação suficiente para procurar um emprego que tem como base o Português, pelo que optam por outras áreas. Mas, a jovem de 22 anos já tem os planos traçados: quer ser professora de Português, até porque já acabou a licenciatura e quer dedicar-se à área da Educação. Mas Vitória ainda tem muito que caminhar: vai continuar os estudos na UM e já se candidatou a um mestrado de Linguística, porque ainda não há um curso de Educação em Português no território. “As instituições pedem uma qualificação elevada nesta profissão, como cinco anos de experiência educativa ou um certificado do curso de Educação em Português, mas no interior da China, o caso não é assim e alguns finalistas de mestrado podem ensinar nas faculdades ou nos colégios de línguas estrangeiras” diz-nos, acrescentando que o Governo deveria oferecer mais oportunidades de ensino para os residentes poderem fazer alguns estágios. Entre Macau e Portugal Nascida em Macau, Vitória reconhece que há uma diferença evidente entre a educação a Ocidente e Oriente. Conta-nos que fez um intercâmbio em Coimbra e relata que viu “que as crianças estavam muitos felizes a brincar” cá fora, algo que “nunca acontece em Macau, o que mostra que a forma de educar é muito diferente entre os dois territórios”. Ainda assim, a jovem preferiu estudar Português em Macau, porque acha que o território tem tudo o que Portugal tem no ensino do Português.
Manuel Nunes Ócios & Negócios PessoasHandyman | Simon Lam, proprietário: “Sempre tive jeito para trabalhar com as mãos” Há quase meia dúzia de anos em Macau, este polaco educado em Inglaterra, percebeu, ao arranjar a sua própria casa que um estrangeiro deveria ver-se grego ao tentar fazer obras em casa e resolveu lançar um serviço de faz-tudo. Estava a certo porque o problema agora é tempo para atender a todas as solicitações [dropcap style≠’circle’]“E[/dropcap]xiste um Handyman II mas não sou eu”, começou por explicar Simon que não percebe a razão pois ele apareceu depois. Ainda assim, o negócio começou já há dois anos e meio. Nasceu na Polónia, viveu em Londres cerca de 12 anos e por motivos familiares acabou por vir para Macau há uns cinco anos.“Comecei por fazer renovações no nosso próprio apartamento”, explica. Casado com uma residente, ao voltar, como o pai da mulher tem várias propriedades, “deu-nos uma para vivermos num desse prédios antigos”, diz Simon, “mas estava num estado horrível e tivemos de refazer tudo”. O processo de renovação durou mais de um ano. “Empreguei várias equipas, tive de ir à procura de materiais da China, da Europa e no final conseguimos um lugar agradável”, recorda. Não foi fácil mas aprendeu muito no processo e, especialmente, “fiquei a perceber quão difícil será para um estrangeiro em Macau fazer alguma coisa do género”, diz, o que lhe deu a ideia para o negócio. “Achei que era um nicho que eu poderia preencher”, revela.“Descobrir os materiais, os especialistas locais que trabalham bem…” Nunca foi um profissional da área mas “sempre tive jeito para trabalhar com as mãos. Pintava as minhas paredes, arranjava o mobiliário, canos, enfim, sempre fiz de tudo um pouco, e desde há muito”, assegura. “Mas aqui é diferente da Europa”, afiança, “não existem aquelas grandes lojas com tudo o que uma pessoa precisa”, o que torna difícil o processo de fazer mesmo as coisa mais simples em casa. “Em Macau, como sabe, existem uma série de pequenas lojas que vendem um pouco disto ou daquilo nas nenhuma vende tudo. Em chinês chamam-lhe ‘wǔjīn diàn’ (‘loja dos cinco metais’, em cantonês “ng gam pou”). Aproveitámos a intervenção em mandarim para percebermos de onde vinha a habilidade. “Aprendi quando cheguei”, explica “comprei uns livros, li muito, repeti muitos caracteres e agora leio, escrevo no computador e falo” e não teve qualquer professor, garante, “foi tudo na base do esforço próprio”. Chegou mesmo a abrir uma escola de chinês mas não tinha alunos suficientes e acabou por desistir. Mão de obra, essa raridade Voltávamos ao negócio, pois Simon explicava que “para se encontrar algum material melhor temos de mandar vir de fora, via Taobao, se for da China, ou de outra forma qualquer”. “Nestas pequenas lojas de Macau os problemas para quem não sabe procurar é um drama”, relata Simon. “Os tamanhos, os nomes, o material certo… muita gente não faz sequer ideia do que pode arranjar no mercado”. A sofisticação dos acabamentos nos casinos acontece porque “importam tudo” mas “na área residencial as coisas estão muito atrasadas por falta de oferta de material de qualidade”, explica. Problemas nas reparações? “Vários”, confirma, “os canos que correm por fora, os quadros que não estão preparados para a potência dos modernos equipamentos domésticos”, mas o problema maior para Simon é a burocracia. “As grades nos prédios são ilegais. Mas tirá-las, pintá-las ou mesmo mudar as janelas é um problema. Os fiscais do Governo aparecem e depois mandam uma carta para pararmos com tudo e pedir uma licença de obra. O processo é um inferno e tenho de contratar um advogado para tratar disso”, explica. A falta de mão de obra, naturalmente, é outro dos problemas que o afligem regularmente. “Tenho um empregado fixo e depois vou buscar equipas que já conheço, os melhores. Eles têm o negócio deles, independente, mas fazemos muita coisa em conjunto” porque contratar não é fácil. “Não posso empregar filipinos porque é ilegal. Os chineses de qualidade estão na maioria a trabalhar para os casinos e, se estão cá fora, é porque não são grande coisa” diz Simon adiantando ainda que “o pessoal local prefere sentar-se num escritório a trabalhar nesta área mesmo ganhando três vezes mais. É uma questão de estilo…”, aventa. Barulho? A culpa é dos azulejos De resto, em termos do trabalho propriamente dito, não encontra muitas dificuldades: “não é ciência espacial, sabe? Há sempre uma solução desde que tenhamos os materiais certos, as ferramentas certas e as equipas certas”. O sonho é focar-se em propriedades comerciais em vez de residências. “Um projecto do princípio ao fim”, diz, “um espaço, um orçamento e deixarem-me trabalhar, é tudo o que desejo”, confessa. Então e o nicho? “Continuará porque é a base do negócio mas quero mesmo chegar às grandes obras, das que levam meses”, explica. No que respeita a preços considera-se competitivo. “Se for directo a um chinês, nós somos mais baratos mas mais caros que os filipinos ilegais, naturalmente” Uma mudança com uma camião cheio, incluindo desmontagem de mobília transporte e remontagem no outro local, custa 1,800 patacas e 1000 por cada camião extra. Mudar uma torneira pode custar 200 patacas e um cano em baixo do lavatório 350 patacas. Não podíamos terminar a conversa sem tentar perceber as origens do barulho constante dos berbequins que assola a cidade e a explicação de Simon é simples: “O problema são os azulejos, sabe? É a cultura local de construção. Toda a gente usa azulejos em tudo. Depois querem mudá-los e a única solução é rebentar com eles. Tudo para pouparem uns centímetros de espaço, claro, porque podiam cobri-los com vinil, madeira ou outra coisa qualquer. Mas preferem mudar de azulejos para outros azulejos”. Estava explicado.
Manuel Nunes Perfil PessoasGordon Yu, Organizador de festas e DJ: “Gentes de Macau precisam abrir a cabeça” [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]asceu em Macau, tem 35 anos e organiza festas ou trabalha como DJ desde há mais há mais de 16 anos. “Era uma loucura”, diz, “tinha uns 16 anos, era o tempo das ‘raves’ e havia muitas festas. Fiquei admirado com a música e a paixão por isto começou aí”, confessa Gordon, explicando ainda que “foi nessa altura que a música electrónica primeiro se fez sentir em Macau”. Foi há quase 20 anos e, na altura, “não havia dinheiro para os pratos e a misturadora”, diz Gordon. Com uns amigos juntaram algum e assim conseguiram comprar o primeiro conjunto de mistura. Aí surgiu o Kit Leong para os orientar. “Posso considerar o Kit o meu mestre. Ensinou-nos a misturar e a organizar festas”. Não é fácil organizar festas. A falta de espaços é o principal problema que Gordon encontra. Mas tenta. “Ando sempre à procura de um local que ninguém se tenha lembrado para organizar uma festa. Mas geralmente acabamos sempre no LMA ou no Kam Pek” Antes trabalhou na extinta Lótus (no Venetian) mas desde que o espaço encerrou tem agido por conta própria. A atracção pela música fez com que desistisse da escola cedo no final do secundário mas admite voltar a estudar um dia “Talvez venha a estudar para engenheiro de som ou algo assim”, confessa. Álbum para breve “A minha música preferida? Techno”, diz Gordon sem denotar a mínima dúvida. “Começou com o Derrick May, o lendário DJ do techno de Detroit”, explica. Mas para além de passar o que os outros produzem, Gordon dedicou-se recentemente a produzir um álbum de originais mas recorrendo a instrumentos antigos. “Queria instrumentos electrónicos a sério”. Encomendaram-nos e aguardam com alguma ansiedade. “Mandámos vir a Roland TR e o velhinho Mother 32 da Moog” diz, híper animado. “Estamos a preparar um ‘live set’ e esperamos editar um vinil também com 10 faixas.” O trabalho deve estar concluído ainda este ano mas lastima a falta de apoios. Todavia, desconhecia o programa do governo de apoio à produção de álbuns. “Concorri uma vez ao Fundo as Indústrias Culturais”, disse, “mas fiquei desmoralizado com o resultado.” “Disseram-nos que não era negócio”, explica. A ideia era montar um estúdio num prédio industrial para formação musical, gravação e com um espaço para apresentações ao vivo. “Tipo o “Boiler Room” da Mix Mag”, percebe? Mas isso para eles não era negócio.” Para Gordon não existe um verdadeiro interesse em apoiar os artistas locais. “A ideia que corre no meio artístico é que se não tiveres grandes contactos no governo nunca vais conseguir apoio nenhum”, lamenta. Por isso, não pensa concorrer a fundos. A solução é ir tentando por ele mesmo. Terra aborrecida, sem cultura “Qualquer dia, vou para Berlim”, desabafa Gordon quando começámos a falar da vida em Macau, “pois talvez lá consiga desenvolver-me”, diz. “Macau está para lá de aborrecido”, diz, atribuindo culpas à falta de cultura e à incapacidade dos locais em se aprimorarem. Em relação à falta de cultura, Gordon atribui grande parte da culpa ao Governo. “Apoiam pouco artistas como eu. Acham que música techno e electrónica é igual a drogas.” Propusemos imaginar-se no lugar de Chefe do Executivo. “Mais cultura e mais apoios para quem a pretende desenvolver”, diz sem hesitar. “Percebo que os casinos façam falta. Mas não deixava abrir tantos. Prejudica a cultura”. “Não temos entretenimento, não temos cultura. As pessoas vêm para aqui apenas para jogar”, lamenta. Mas a dificuldade é quando artistas internacionais lhe pedem para lhes mostrar sítios pitorescos que revelem a cultura local. “Já não sei que dizer”, desabafa, “digo-lhes que Macau é só casinos e pronto”, explica Gordon que resume dizendo que ,“não temos orgulho em mostrar a terra. A vida nocturna é atroz. Os bares, horríveis… até os karaokes, a maioria tem maus sistemas de som. As pessoas de Macau não pensam muito no que fazem.” Estávamos a entrar no cerne da questão. Mas a culpa seria apenas do Governo ou as pessoas também terão algo a ver com isso? “Não se preocupam em fazerem bem”, diz Gordon em relação aos locais. “Abrem negócios por ouvirem dizer que fazem dinheiro sem saberem o que estão a fazer. Passados uns meses já estão a passar o espaço”, indica. Para o DJ, “as pessoas deviam preocupar-se mais em estudar os assuntos.” “Temos internet, mas nem isso usam. Não há desculpa”, lamenta-se. “Precisam de abrir a cabeça e deixar de ser preguiçosas”, conclui. Nas chinesas não dá Voltávamos à ‘movida’ de Macau, ou à falta dela. Com tanta gente nova em Macau porque não existe um seguimento mais forte da cena underground? “Porque quando eu era novo não havia EDM. Era só música a sério”, diz. “Às vezes vêm uns miúdos às nossas festas mas acham aborrecido.” Será falta de promoção? Porque não levar as festas às escolas? “Só se for na Escola Portuguesa”, diz Gordon sem hesitar. Quisemos saber porquê. “Conheço bem as escolas chinesas. Tentei muitas vezes. Só querem os estudantes a estudarem mais. Não fazem festas. Com eles é mais jantares em restaurantes chiques ou alunos a cantarem modinhas locais. Só a Escola Portuguesa teria atitude para uma coisa dessas”, e prometeu ir mesmo reflectir sobre o assunto.
Joana Freitas Ócios & Negócios PessoasManna Cookery | Matthew Pang, proprietário [dropcap style=’circle’]E[/dropcap]scondida ao lado da igreja de São Lourenço, parece um café mas não é. Ao entrarmos ficamos com a certeza disso e depois encontramos Matthew Pang, cozinha escancarada à sua volta, ocupado entre encomendas e cozinhados. Alguns bancos para os clientes é tudo o mais que encontramos. O a decoração é simples e inspirada nas ideias mediterrâneas. “Queria dar um sentimento de conforto aos clientes”, justifica Matthew, mirando a decoração. Para além disso, a comida é toda ela “tradicional portuguesa”. “Esta loja é o meu sonho”, confessa ao HM. Cresceu numa família onde todos trabalhavam para a função pública. E ele também, na Polícia Judiciaria(PJ), imagine-se. Mas ter um restaurante falou mais alto e resolveu meter uma licença sem vencimento, não vá o diabo tecê-las. Uma licença de 10 anos. A casa de família teve sempre muitas festas, celebrações das grandes ocasiões do calendário. Essa prática desenvolveu nele “um prazer enorme pelo sentimento do encontro”. Cozinhar é celebrar esse encontro. É também a forma ao seu alcance, que Matthew julga a melhor forma para levar aos outros esse sentimento de comunhão. “Macau está cheio de cafés mas tem falta de comida caseira”, explica Matthew a propósito da escolha do negócio. “A comida caseira é mais saudável”, reforça, dizendo ainda que “partilhar a gastronomia tradicional portuguesa com os outros” é também outra das atrações responsáveis por o terem feito largar temporariamente a PJ. Entrou na polícia logo após terminar a licenciatura em Gestão de Empresas pela Universidade de Macau. Por lá esteve mais de dez anos, mas esta loja ia surgindo no pensamento até que um decidiu lançar-se ao negócio. “Enquanto tinha força física para isso”, confessa. Entregou um pedido de suspensão do cargo e atirou-se aos tachos. Mas a hipótese de voltar a ser um agente da PJ existe pois as regras permitem apenas dez anos de licença e já passaram dois. “Nunca trabalhei num restaurante”, admite, “mas gosto de cozinhar”, conclui. “Aprendi com a minha mãe, ou fui buscar receitas à internet” consente, mas como quem corre por gosto não cansa, todos os dias “aprendo um pouco mais”. O faz-tudo O valor da renda não divulga mas fica acima das 10 mil patacas. Não se queixa. Preferia que tivesse sido na Taipa mas um amigo descobriu aquele lugar e, como era perto da casa da avó e frente à sede do Governo, achou que até fazia sentido. Imaginou que muitos funcionários públicos procurariam um lugar na zona para “almoçarem saudavelmente”, o que veio a acontecer. “Portanto”, diz, “acabou por ser a localização ideal”. A cozinha aberta foi pensada “para ter uma ligação mais próxima com os clientes”. Normalmente, a comida só é confeccionada após receber os pedidos, tempo que aproveita para dar uns dedos de conversa com os clientes. “Empregados, para já, não”, garante Matthew que acha que dar boa conta do recado sozinho. “Uma pessoa numa loja de take-away chega”, diz. Assim, faz tudo: cozinha, limpa e recebe os pedidos. Viva os fins de semana O horário, das 8H às 15H, dá-lhe para passar mais tempo com a família. “Quando trabalhava na PJ, tinha um horário certo, mas muitas vezes trabalhei mais tempo do que previsto pois a PJ opera 24 horas”, relata. “Perdi muito tempo para estar com a família”, lamenta. Mas agora pode descansar aos fins de semana, e tudo. “Gosto disso, porque sou preguiçoso”, confessa com um sorriso. “Nunca promovi a loja”, diz Matthew. Alguns amigos até já lhe sugeriram utilizar o Facebook mas Matthew acha que “não é preciso”. “Cada um tem a sua preferência. Não quero clientes influenciados pelos comentários dos outros”, explica para justificar a sua recusa em promover o negócio. Os clientes todavia, continuam a chegar. O boca-a-boca tem funcionado e a fama tem-se espalhado. “A minha comida tem qualidade”, racionaliza Matthew, explicando ainda que todos os dias sai um menu diferente e há sempre quatro pratos à escolha..
Andreia Sofia Silva Perfil PessoasMarta Silva, estudante do curso de tradução português /chinês [dropcap style=’circle’]C[/dropcap]hegou aos 18 anos com a vontade de abraçar um mundo que não era o seu, mas que acabou por fazer parte da sua vida. Marta Silva, estudante do curso de tradução e interpretação em português/chinês, viveu um ano em Pequim e tem estado em Macau e não se arrepende da decisão que tomou: a de conhecer uma cultura totalmente diferente da sua. “Encarei isto como sendo a minha oportunidade, porque nunca tinha tido a oportunidade de viajar até tão longe. Este curso era perfeito pois estaria a estudar tradução e ao mesmo tempo estaria a vivenciar uma cultura completamente diferente”, contou ao HM. Marta Silva viveu no meio do rebuliço que é Pequim. Apesar das dificuldades constantes, a estudante retirou o máximo da experiência de situações boas e menos boas. “Conheci pessoas espectaculares e outro tipo de consciencialização acerca do mundo e das pessoas. Mas ao início senti que tudo era estranho, porque nunca tinha andado de avião na vida. Fascinou-me estar num sítio que literalmente nunca pára, mas depois numa outra fase começou a ser chato tanta confusão, filas para tudo. Começou a ser chato não ter espaço para mim. Muitas vezes fiquei chateada por não perceber ou ver o sentido em certos procedimentos da cultura chinesa e a forma de pensar dos chineses. Mas depois acabei por me habituar a tudo isso”, frisa a estudante. “Numa experiência deste tipo temos muitas situações em que sentimos medo, queremos desistir e temos muitas saudades de casa. Mas esses momentos são necessários. Quando saímos da nossa zona de conforto é quando começamos a conhecer-nos a nós mesmos. Há quem diga que um curso destes não é para toda a gente, e de certa forma concordo com isso”, aponta. Para além do desafio de viver na capital chinesa, Marta Silva começou a ter os primeiros contactos mais directos com os caracteres chineses, depois do arranque do curso em Portugal. “O mandarim não é mesmo nada fácil. Requer muito estudo e muita prática diária. As palavras têm sons muito curtos, o que nos pode deixar bastante perdidos quando ouvimos um chinês falar, porque parece uma maratona.” Oásis português Se em Pequim Marta Silva sentiu saudades da comida portuguesa e dos produtos típicos, a verdade é que em Macau acabou por se sentir no seu país. “Em Macau sinto-me perto de casa”, recorda. “Vivi nos dois sítios e percebi logo os contrastes. Temos as ruas com as típicas tascas e bancas de rua, onde se percebe que vivem as famílias mais pobres, e depois temos edifícios altamente luxuosos. Gostei um pouco mais de Macau pelo facto de ser o contrário de Pequim, por ser mais pequeno, por ter menos poluição, pelo facto das pessoas serem mais simpáticas.” “Aqui sinto-me mais perto da minha cultura, dos meus sabores, podendo continuar na China”, acrescentou. Marta Silva destaca ainda a presença do património português. “Gosto de passear em Macau e ver o rasto da nossa história deixado por aqui. Por momentos esqueço-me que estou na China, pois muitas das ruas fazem-me lembrar a Lisboa antiga”, conta a estudante. De Macau guarda a memória de um caso em que a polícia não a ajudou, mas confessa que um dia até gostava de ficar a viver neste pequeno território. “Identifico-me mais com Macau do que com Pequim. Não me importava nada de ficar aqui a viver.” Com o curso ainda por acabar, a cabeça de Marta Silva já fervilha com alguns projectos que pretende realizar. Mas os entraves ainda existem. “Sinto que ainda preciso de melhorar muito o meu chinês se quiser mesmo trabalhar com este idioma. Quatro anos de curso não são suficientes para obtermos um bom nível. Gostava de trabalhar como tradutora freelancer ou ser intérprete de grupos de pessoas em viagens de negócios”, aponta. Da Macau quase portuguesa Marta Silva leva também a percepção do lado mau das mesas de Jogo. “Há os esquemas da noite, os negócios ocultos, a lavagem de dinheiro, a corrupção, o crime, os contactos que são feitos por interesse. Mas penso que o facto de Macau ser uma cidade de Jogo lhe traz mais benefícios”, conclui.