Ano da Gastronomia | Criada base de dados de pratos macaenses

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]lexis Tam subiu ao palco, discursou na praça de Sai Van e depois andou a provar as iguarias que representam a gastronomia de Macau. Foi assim o lançamento oficial do Carnaval da Gastronomia de Macau, uma das medidas inseridas no plano que vai transformar o território como Cidade Criativa de Gastronomia da UNESCO. Este ano será a primeira vez que se comemora o “Ano da Gastronomia de Macau”.

Será lançado, “de forma programada”, um plano de quatro anos, que passa pela criação de uma entidade de gestão e supervisão chefiada por Alexis Tam, secretário para os Assuntos Sociais e Cultura.

Além do carnaval gastronómico a realizar na praça do lago Sai Van, uma das medidas deste plano passa pela criação de uma base de dados sobre os pratos da cozinha macaense.

O objectivo é “preservar a história, as receitas e técnicas culinárias macaenses, bem como definir padrões e condições objectivas para transmitir e difundir as tradições”.

Serão ainda adicionados mais elementos de comidas locais ao programa de roteiros “Sentir Macau Passo-a-Passo”. A ideia é “estudar o lançamento de roteiros gastronómicos em maior profundidade”.

O plano de quatro anos prevê ainda um maior número de acções de formação em parceria com o ensino superior local.

No seu discurso, o secretário Alexis Tam levantou a ponta do véu daquilo que será preparado para que Macau possa estar à altura do desafio que lhe foi lançado, depois de ter sido considerada Cidade Criativa da UNESCO nesta área.

“Pretendemos providenciar mais oportunidades de formação para as próximas gerações de talentos de artes culinárias, de modo a assegurar a transmissão da herança das cozinhas locais, como a nossa singular cozinha macaense.”

É também objectivo do Executivo “trabalhar mais de perto com os operadores do ramo da alimentação e bebidas, para aumentar a competitividade do sector”.

O poder da comida

Quem também esteve presente ontem na cerimónia de lançamento do Carnaval da Gastronomia de Macau foi Getachew Engida, vice-director-geral da UNESCO, que destacou a importância dos comes e bebes para o turismo de um lugar.

“O Ano da Gastronomia também proporciona uma oportunidade para que Macau desenvolva a sua cooperação regional e internacional com parceiros dentro e além da rede, fortalecendo a sua reputação como destino gastronómico.”

Este ano o território participa na 12ª reunião anual da Rede de Cidades Criativas da UNESCO, realizada na Polónia em Junho.

18 Jan 2018

Sónia Chan sobre ETAPM: Câmaras de vigilância ajudam a controlar pontualidade

Secretária para a Administração e Justiça admite que as câmaras de vigilância são utilizadas em algumas situações no Governo para verificar a pontualidade dos trabalhadores. A partir deste ano, pedidos de férias em 50 serviços começam a ser feitos de forma electrónica

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] secretária para Administração e Justiça admitiu que as câmaras de vigilância são utilizadas nos serviços da Administração Pública, em certas ocasiões, para confirmar que os trabalhadores cumprem a pontualidade. A revelação foi feita ontem, na Assembleia Legislativa.

“Os aparelhos de ponto recorrem muitas vezes à palma da mão ou impressão digital dos trabalhadores. Já é muito raro picar o ponto com o tradicional cartão. Muitas vezes quando há problemas e os trabalhadores dizem que estavam no trabalho à hora certa podemos utilizar a videovigilância para confirmar se chegou ao trabalho”, explicou Sónia Chan.

“Mas de acordo com a minha experiência no Gabinete para a Protecção de Dados Pessoais, existem normal que têm de ser seguidas para se poder visualizar e aceder a esses dados. Se não forem cumpridas há uma situação de violação da lei”, fez questão de sublinhar.

Os deputados aprovaram, ontem, na Assembleia Legislativa as alterações ao Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, com 30 votos a favor e uma abstenção, de José Pereira Coutinho. O presidente Ho Iat Seng optou por não votar.

No que diz respeito à utilização das novas tecnologias, na resposta às perguntas dos deputados, a secretária afirmou que a partir deste ano os pedidos de férias, justificação de faltas, entre outros, começam a ser feitos de forma electrónica em 50 serviços. O objectivo é que esta passe a ser a realidade em todos os serviços.

Com o novo regime é igualmente facilitada a dispensa dos trabalhadores para frequentarem acções de formação, cuja aprovação passa a exigir uma taxa de participação em 80 por cento das aulas. Anteriormente exigia uma frequência em 50 por cento.

“A nossa intenção é que estas acções de formação que são pagas com o erário público tenham uma taxa de participação de 80 por cento, para que os trabalhadores possam ser aprovados”, apontou a secretária para a Administração e Justiça.

Férias para serem gozadas

Outro dos aspectos que Sónia Chan diz que é imperativo passa pelos trabalhadores gozarem pelo menos 11 dias úteis de férias, durante o ano.

“A nossa intenção é que os trabalhadores possam descansar e utilizar as férias ao longo do ano, pelo menos 11 dias úteis”, disse. “A gestão das férias do pessoal tem de seguir os princípio humanitários e atender às necessidades dos trabalhadores”, frisou.

No entanto, a secretário recusou a sugestão de continuar a ser o Chefe do Executivo a aprovar as férias dos trabalhadores, mesmo que essa possa ser uma tarefa delegada. Assim, a competência passa para os directores do serviços.

“O Chefe do Executivo tem muito trabalho e assuntos muito importantes para apreciar. Consideramos que esta transferência de competências é o mais adequado”, opinou.

18 Jan 2018

Presidente da Associação de Advogados elogia retirada de resolução

[dropcap style≠’circle’]J[/dropcap]orge Neto Valente considera que a decisão dos deputados Kou Hoi In e Vong Hin Fai de abdicarem da proposta de resolução que visava reafirmar a natureza das decisões da Assembleia Legislativa, perante os tribunais, foi a decisão correcta e expectável. Em declarações ao HM, o presidente da Associação dos Advogados de Macau sustentou que foi a “única coisa certa” em todo o caso.

“Neste episódio todo, a única coisa certa foi terem retirado o projecto de resolução. Estava à espera que o retirasse depois de se ter concluído que aquilo era inútil e que não fazia sentido. Era uma das hipóteses [para o desfecho do caso], era a que eu achava melhor, e ainda bem que foi assim”, disse Jorge Neto Valente.

“Aplaudo totalmente a decisão de retirar o projecto. Fizeram muito bem. Era uma resolução que não tinha qualquer valor. Não acrescenta nada à ordem jurídica nem ao sistema”, apontou.

O causídico indicou igualmente a falta de tacto para a apresentação da proposta, numa altura em que o processo do deputado Sulu Sou ia começar a decorrer nos tribunais: “Pareceu muito mal ter surgido num momento em que o caso estava à beira do julgamento. Pareceu que era uma pressão ou orientação ilegítima ao tribunal”, sustentou.

Por outro lado, pediu maior ponderação em ocasiões futuras: “Têm de pensar bem antes de se meterem nestas situações. Como é que se pode propor que a resolução tivesse efeitos retroactivos até 1999?”, questionou. “Foi uma coisa que nunca se verificou [suspensão e perda de mandato], não pode ter aplicação retroactiva pela natureza do factos. O que não aconteceu para trás não precisa de ser coberto”, explicou.

Lei sem sentido

Sobre as declarações dos deputados, que justificaram a desistência do projecto com o facto de precisarem de mais tempo para trabalharem numa futura proposta de lei, Neto Valente apreciou a proposta como desnecessária.

“Se pensarem mesmo na hipótese de fazer uma lei, não vão fazê-la. Não é preciso lei nenhuma. Já se sabe que os tribunais não apreciam actos políticos da Assembleia Legislativa. Não é preciso nenhuma outra lei para dizer isso. Já se sabe que é assim”, afirmou.

Depois, lamentou o facto do processo estar pendente devido aos recursos, e considerou importante que houvesse uma resolução rápida: “O tempo vai passando e não chega só andar à procura do resultado final. É preciso ter uma táctica para abordar os assuntos. Enquanto isto está pendente, nunca mais se resolve o caso, o tempo está a passar e o deputado não está na Assembleia Legislativa. Era importante que se resolvesse toda a situação”, sublinhou.

18 Jan 2018

Sulu Sou, Pereira Coutinho e Agnes Lam aplaudem decisão de Vong Hin Fai e Kou Hoi In

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o final do plenário e após Kou Hoi In e Vong Hin Fai terem retirado a proposta de resolução, os deputados Sulu Sou, José Pereira Coutinho e Agnes Lam elogiaram a decisão dos dois veteranos. Contudo, Sou e Coutinho não deixaram de considerar que os danos para a separação de poderes já estão feitos.

“É uma decisão tardia, mas correcta por parte dos dois deputados”, disse Sulu Sou, em declarações ao HM. “No início tinha feito um comunicado a apelar aos deputados para que considerassem retirar esta resolução, por isso acho que é um resultado positivo, apesar de ter sido alcançado demasiado tarde. Já afectou a imagem da Assembleia Legislativa”, opinou.

Sobre a possibilidade de surgir uma nova proposta, em forma de resolução ou lei, o deputado suspenso entende que é a forma encontrada por Kou e Vong para terem um saída limpa.

“Penso que é só uma forma que encontraram para retirar a proposta, até que deixe de se mencionar o caso. Não me parece que vão fazer outra proposta, quer em forma de lei ou de resolução, pelo menos durante algum tempo”, opinou. “Foram criticados por especialistas em Direito e advogados de forma muito séria. Acredito que vão limitar-se a retirar esta proposta e não vão apresentar uma alternativa”, acrescentou.

Por outro lado, Sulu Sou disse que a medida vai ser sempre vista como uma forma de pressão sobre os tribunais: “Apresentar uma proposta de resolução desta natureza, na altura em que decorre um procedimento em tribunal, vai sempre afectar a independência judicial. A separação de poderes é muito clara, entre o poder judicial, executivo e legislativa, e deve ser respeitada”, apontou.

Vitória da sociedade

Por sua vez, José Pereira Coutinho afirmou que a retirada da proposta foi uma vitória da sociedade. “É uma vitória da sociedade. Nunca na minha vida como deputado assisti a tamanha reacção da sociedade, da comunidade jurídica, quer chinesa quer portuguesa, como contra esta resolução”, declarou o também jurista.

“Eles deveriam pedir desculpas à sociedade, fazer um exame de consciência sobre aquilo que fizeram e em como prejudicaram a imagem da Assembleia Legislativa. Espero que tenham aprendido a lição e que não voltem a repetir os erros porque os tribunais são um pilar e um alicerce do segundo sistema”, frisou.

Depois, colocou em causa as competências políticas do deputado Kou Hoi In: “Demonstrou ignorância em questões jurídicas. É espantoso que um indivíduo que é deputado desde a Administração Portuguesa não tenha o mínimo de consciência naquilo que se está a meter”, acusou.

Quanto a Vong Hin Fai: “Não me espanta a qualidade e a mente do deputado, sabendo conscientemente o que esta a fazer, não se preocupa em utilizar os meios necessários para atingir os fins”, apontou.

Finalmente, Agnes Lam admitiu ter ficado surpreendida, mas elogiou a decisão dos dois deputados: “Fiquei um pouco surpreendida. Ao mesmo tempo considero que foi a atitude correcta. Ontem [terça-feira] recebemos uma explicação enviada pelos dois deputados sobre a resolução”, disso ao HM. “É uma boa decisão, porque se tornou num caso demasiado sensível, para evitar que as pessoas suspeitem ou especulem que a proposta é uma forma de interferir com as decisões do tribunal”, sublinhou.

18 Jan 2018

Caso Sulu Sou | Vong Hin Fai e Kou Hoi In voltaram atrás com proposta “polémica”

Os deputados Vong Hin Fai e Kou Hoi In negaram que resolução tivesse sido proposta para responder a “um determinado caso” e admitiram apresentar uma nova versão da proposta no futuro

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]ra o debate mais aguardado do dia, mas a proposta dos deputados Vong Hin Fai e Kou Hoi In, para reafirmar perante os tribunais a natureza política das decisões de perda e suspensão de mandato da Assembleia Legislativa, foi retirada momentos antes do início no plenário. No final, os deputados justificaram a acção com a necessidade de melhorar o documento admitem apresentar uma proposta mais elaborada.

“Reparámos que não só o conteúdo como a forma têm espaço para ser aperfeiçoados. Considerámos que vale a pena continuar a reflectir sobre este assunto e oportunamente vamos tentar apresentar esta iniciativa. Pode ser um projecto de resolução ou de lei”, disse Vong Hin Fai, no final da sessão do Plenário. 

“Oportunamente vamos apresentar de novo o projecto, pode ser uma lei ou uma resolução”, acrescentou, sem querer dizer se seria antes ou depois da decisão dos casos que estão pendentes no Tribunal de Segunda Instância.

Por sua vez, Kou Hoi In sublinhou que os dois deputados estiveram atentos à opinião dos especialistas locais em Direito e que compreenderam a necessidade de esclarecer melhor o conteúdos da proposta perante os outros membros da Assembleia Legislativa.

“Ouvimos as opiniões dos especialistas em Direito, que respeitamos. Queremos melhorar a proposta porque há um entendimento pouco claro do projecto por parte dos outros deputados”, afirmou Kou Hoi In.

“Há partes da resolução que não fomos capazes de clarificar, por isso considerámos que devíamos retirar o projecto nesta altura”, sublinhou.

Sem intenção de interferência

Na carta em que justificaram a retirada do projecto, os membros da Assembleia Legislativa rejeitaram a intenção de interferir com as competências dos tribunais e negaram que fosse uma resolução contra um caso em concreto, o de Sulu Sou.

“O projecto de resolução apresentado não se direcciona para um determinado caso, visa sim, em sentido abstracto, reiterar e esclarecer que as deliberações do Plenário relativas à suspensão ou perda do mandato do deputado são actos de natureza política, sem qualquer intenção de influenciar ou de interferir no poder judicial”, é defendido.

“Apesar de ser um acto necessário para o estabelecimento do sistema da AL, como a natureza desta resolução é abstracta, não se afasta a possibilidade de alguém ligar este acto ao caso em causa. E na sociedade também se registaram entendimentos diferentes”, é acrescentado.

A proposta dos deputados tinha surgido após Sulu Sou, deputado suspenso, ter posto no Tribunal de Segunda Instância dois processos: um recurso contra o desenrolar dos procedimentos que resultaram na decisão da suspensão do seu mandato, e um pedido de suspensão de eficácia da suspensão. Os processos ainda estão pendentes.

18 Jan 2018

Miguel Rodrigues Lourenço, investigador, sobre a Inquisição em Macau: “A prática do poder é sempre objecto de negociação”

Apesar do Santo Ofício ter actuado no território de uma forma cuidada para não destabilizar os interesses mercantis de Macau, foram enviados para Goa muitos condenados. Por cá, as sentenças eram ouvidas no Convento de Santo Agostinho. O investigador Miguel Rodrigues Lourenço, autor de “A Articulação da Periferia: Macau e a Inquisição de Goa (c. 1582- c. 1650)”, desvenda-nos um passado cheio de enigmas

 

Macau foi um refúgio para quem escapava às garras do Santo Ofício. Que condições oferecia a estes refugiados?

Macau era demasiado importante do ponto de vista mercantil para o Estado da Índia e também como centro logístico no acesso às missões da China, do Japão e do Sueste Asiático. Talvez por esses motivos não se conheça qualquer intervenção inquisitorial destrutiva ou desestabilizadora em Macau que tenha tido como consequência o afastamento de figuras-chave ou uma renovação da sua elite mercantil. Isso pode ter criado condições favoráveis a uma migração de cristãos-novos para Macau, como o sugere genericamente alguma documentação, mas devido à destruição do arquivo do Santo Ofício de Goa é difícil quantificar quantos estariam em fuga do tribunal e quantos procuravam aproveitar as oportunidades comerciais. Além de tudo isto, Macau era também um espaço cujo grau de institucionalização era bastante reduzido no século XVI, acelerando-se a presença dos representantes da Coroa no século seguinte. Quem foge da justiça, qualquer tipo de justiça, quem procura ganhar distância, foge para as margens, onde o poder é, pelo menos, menos visível.

A presença do Santo Ofício traz um conjunto de novas leis ao ordenamento jurídico de Macau. Há algum registo de como esta novidade legal foi recebida?

A presença do Santo Ofício traz, para a população, sobretudo um dever de consciência, um dever de denunciar quem tem comportamentos suspeitos para preservar a comunidade católica da exposição a exemplos que possam pôr em causa a sua ulterior salvação no quadro do cristianismo romano. Em termos pessoais, esse dever passa a ser uma realidade quotidiana da população a partir do momento em que reside no território um representante do tribunal de Goa, o comissário do Santo Ofício. Este deveria, uma vez em posse das denúncias, remetê-las a Goa e aguardar a resposta do tribunal. Nos inícios da representação inquisitorial em Macau, estas funções couberam ao bispo D. Leonardo de Sá em virtude de uma comissão passada pelo próprio inquisidor-geral de Portugal. Por isso, não há uma oposição do poder episcopal. Mas houve resistências de sectores da população pouco depois da chegada do bispo. Por exemplo, sabemos que um importante mercador cristão-novo chamado Pedro Fernandes d’Arias subornou algumas pessoas para que lhe fossem reveladas as culpas que tinham sido reunidas em Macau contra a sua mulher, Francisca Teixeira, também cristã-nova, e que tinham sido enviadas à Inquisição de Goa. A tentativa foi descoberta e ambos foram processados pelo tribunal.

A dependência administrativa/religiosa de Goa provocou algum ressentimento em Macau. Até que ponto o alcance do Santo Ofício até Macau teve um papel nesse ressentimento?

Há uma imagem muito forte na memória colectiva sobre Macau, a de uma trajectória de autonomia do território, que faz pensar que naturalmente o Santo Ofício seria percepcionado como mais um dispositivo de poder que poderia reforçar o controlo de Goa sobre Macau. Aliás, difícil é pensar que o poder que se manifesta de forma coerciva possa ser sentido senão como exógeno ao quotidiano das populações que o experienciam. Mais no caso da Inquisição, que deixa um escassíssimo espaço para manifestações críticas sobre a sua validade ou valência no seio da sociedade em que se inscreve. Em Macau, tais manifestações de desconforto acerca da presença do Santo Ofício são reduzidas e foram produzidas num contexto de tensão social entre facções onde estava em causa o correcto desempenho do comissário do Santo Ofício. Isso faz com que o valor desses testemunhos enquanto espelho de uma realidade esteja comprometido pela intenção com que os textos foram escritos. Mas a prática do poder, mesmo quando é identificada como absoluta, é sempre objecto de negociação. E esse é o lado da história do ressentimento em relação a Goa que falta fazer. Porque um dos lados do poliedro que forma a história de Macau é preenchido por Goa e pelas profundas solidariedades existentes entre as duas cidades que sustentam operações comerciais, protagonismos sociais ou estratégias colectivas em Macau.

Houve alguma figura entre o comissariado do Santo Ofício em Macau que se tenha distinguido como alguém de relevo em Macau?

Eu destacaria, sobretudo, o primeiro, D. Leonardo de Sá, que recebeu do inquisidor-geral uma comissão que o nomeava como inquisidor sobre os naturais do seu bispado recentemente convertidos ao catolicismo (chineses e japoneses, portanto). Infelizmente, nada sabemos sobre a sua actividade neste domínio. Quanto aos portugueses, deveria remeter as denúncias a Goa, funcionando, na prática, como comissário. A chegada de D. Leonardo de Sá a Macau significou a presença de uma nova autoridade eclesiástica, de resto terá o seu próprio juízo, o seu próprio tribunal, que no domínio formal contrabalançava o ascendente espiritual da Companhia de Jesus entre os moradores de Macau. Mesmo que esse ascendente tenha permanecido nas décadas seguintes, a presença do bispo alterava necessariamente as configurações dos poderes eclesiásticos locais, introduzindo um elemento concorrencial. De facto, a figura de D. Leonardo não foi sempre grata aos jesuítas que residiam na cidade.

A partir do momento em que a Inquisição está em Macau, qual a extensão da sua influência na sociedade local? Que tipo de castigos eram aplicados?

A Inquisição teve uma trajectória variada do ponto de vista dos moradores de Macau que processou. Foi no século XVI que se registou o maior número de casos contra cristãos-novos com acusações de judaísmo, bem como de obstaculizar a actuação do Santo Ofício. No século XVII, a tipologia de acusações é muito variada: envolve feitiçaria, sodomia, apostasia, islamismo. Houve mesmo um ex-comissário do Santo Ofício que foi julgado por conduta irregular no desempenho das suas funções. Mas o caso mais sonante é, sem dúvida, o do julgamento das quase duas dezenas de clérigos que negaram a sua obediência a frei António do Rosário, governador do bispado e interlocutor habitual do Santo Ofício em Macau. Os clérigos foram enviados para Goa, onde foram julgados no tribunal do arcebispado e na Inquisição por fomentarem o cisma no seio da Igreja e por obstaculizarem a actuação do Santo Ofício. Tanto quanto a documentação permite averiguar, só no século XVIII é que encontramos chineses cristãos moradores em Macau processados em Goa. Há registos de chineses cristãos condenados pelo Santo Ofício antes, mas a sua ligação a Macau não está comprovada. O local por excelência de demonstração da justiça inquisitorial era a cidade-sede do tribunal, no caso, Goa, através dos autos-de-fé. No entanto, o tribunal podia determinar que um réu cumprisse a sua pena ou penitência na cidade onde o delito julgado pelos inquisidores ocorrera. Em Macau, alguns processados pelo Santo Ofício foram obrigados a ouvir a sua sentença no Convento de Santo Agostinho. As sentenças variaram muito, desde penas pecuniárias, desterro, açoutes e pelo menos uma pessoa foi condenada a ser relaxada, ou seja, a morrer pela fogueira.

Há alguma informação de como a Inquisição se relacionava com a comunidade chinesa?

A Inquisição não tinha jurisdição sobre não-cristãos, com excepção em situações de fautoria (promover a apostasia de um cristão) ou por prejudicarem o aumento da cristandade, como se dizia. Não consta, no entanto, que o tribunal de Goa tenha instaurado processos por esses motivos, e não porque faltassem notícias a esse respeito. Mas, ao mesmo tempo, a Inquisição de Goa não ficou indiferente à comunidade chinesa de Macau. Nos finais do século XVII, os inquisidores chegaram mesmo a destituir um dos seus comissários em Macau por entender que era conivente com as muitas procissões chinesas realizadas na cidade, nomeando outro para que tentasse pôr um fim a esses acontecimentos. O caso não veio a ter consequências de maior porque o comissário não recebeu qualquer apoio do Senado nesse sentido.

Existem vestígios da presença de cristãos-novos em Macau, ou da sua influência na sociedade do território?

Há um conjunto de preconceitos, no sentido de entendimentos a priori, cultivados pela historiografia sobre uma forte presença de cristãos-novos em Macau que a documentação não permite quantificar com segurança. No entanto, o facto de essa menção ser recorrente significa que o seu número deveria ter sido abundante ao ponto de constituir opinião corrente na época. Ora, esta dimensão, que aparentemente impressionava os contemporâneos, contrasta com a informação precisa disponível sobre os cristãos-novos de Macau. A identificação de alguém como cristão-novo está longe de ser uma realidade objectiva. Fazê-lo, nos séculos XVI ou XVII, era lançar sobre a pessoa um estigma social, a presunção de alguém ser um potencial judaizante. A existência de Macau, um espaço de institucionalização portuguesa em solo chinês, amparado por múltiplas parcerias asiáticas, exigia pragmatismo e compromissos. No que diz respeito aos cristãos-novos, esta necessidade fez com que Macau fosse, em larga medida, um espaço de silêncios que se reflecte, por exemplo, no reduzido número de processos por delitos de judaísmo, sobretudo quando comparado com Goa ou Cochim. Conhecemos alguns nomes de envergadura desigual ligados ao comércio, como Pedro Fernandes d’Arias, Pedro Rodrigues, António Galvão Godinho, Jorge Dias de Montoya, Jorge Vaz de Azevedo. A partir de meados do século XVII, deixamos de conseguir seguir na documentação a descendência destes cristãos-novos.

As tensões entre ordens religiosas da primeira metade do século XVII colocaram Macau numa situação fracturante de conflito eminente. Até que ponto as nomeações dos comissários do Santo Ofício influenciaram esta situação?

A distribuição das ordens religiosas pelos territórios asiáticos, a constituição das missões e, sobretudo, o seu sustento do ponto de vista financeiro foram tudo menos questões pacíficas entre jesuítas, dominicanos, franciscanos e agostinhos. Por haver destinos que atraíam mais os missionários que outros; por a entrada de uma nova ordem religiosa num dado território gerar o desagrado de quem já lá se encontra; e, muito importante, por o dinheiro da Coroa não chegar para todos, tudo isto foram factores que fizeram com que a relação entre as ordens no Estado da Índia tenha sido marcada por momentos ou episódios de especial tensão. As tensões, portanto, não surgem em Macau, mas agudizam-se aqui por várias razões. As missões da China e do Japão foram motivo de um profundo mal-estar entre jesuítas, de um lado, e mendicantes, do outro. A responsabilização mútua pela implosão da missão japonesa, as violentas críticas a respeito das respectivas estratégias de missionação na China, a competição pelo reconhecimento dos seus membros como mártires no Japão geraram, aqui sim, um forte ressentimento entre as ordens que se somou a uma já de si convivência difícil em Macau.

18 Jan 2018

Proposta de lei da habitação social já tem sugestões de alteração

As primeiras alterações à proposta de lei relativa ao regime jurídico da habitação social começam a ser sugeridas. Os rendimentos de um cônjuge não residente vão ser considerados no processo de candidatura e o tempo de espera para recandidatura de um membro de um agregado familiar que tenha comprado uma casa económica passa a ser de cinco anos

 

[dropcap style≠‘circle’]A[/dropcap] proposta de lei relativa ao regime jurídico da habitação social ditava dez anos de espera para um membro de um agregado familiar que tivesse comprado uma fracção de habitação económica, mas os membros da primeira comissão permanente não concordam, e pedem que que seja mudado para cinco.

Em causa, estão possíveis mudanças de situação económica dos membros deste agregado que podem justificar a candidatura a uma habitação social mais cedo. “Segundo a proposta do Governo um elemento do agregado familiar que tenha comprado habitação económica nos últimos 10 anos não pode candidatar-se a habitação social”, começou por referir o presidente da sede de comissão onde a proposta está em análise na especialidade, o deputado Ho Ion Sang.

No entanto, os deputados que estão a discutir o documento consideram que há situações que requerem que este prazo de espera seja diminuído e apontam os cinco anos como o tempo de espera mais adequado. “Nós consideramos que é uma situação que precisa de alterações porque temos de pensar que os filhos desse agregado podem querer viver sozinhos e ser pobres”, justificou Ho Ion Sang, ontem, após a reunião da comissão.

 

Mais atenção

No que respeita aos arrendamentos, o Governo propõe que quem faz parte de um agregado que tenha rescindido um contrato de arrendamento nos últimos três anos, referente a uma fracção social, não possa voltar a fazer parte de um processo de candidatura. Apesar do Executivo ter voltado atrás e ter definido um período de espera de cinco anos, a comissão ainda acha que este é um assunto que merece mais atenção. “Mas, nós consideramos que é preciso pensar melhor a situação porque em cinco anos uma pessoa pode recuperar financeiramente e voltar a cair na pobreza. É preciso ter isso em consideração, pelo que pedimos um tratamento especial”, revelou o presidente de sede de comissão.

 

Não residente, mas com bens

Outra das alterações que vai ser sugerida para a proposta actual tem que ver com a consideração ou não dos rendimentos de um elemento do agregado que seja cônjuge não residente.

“A ideia de considerar um cônjuge não-residente como parte do agregado na avaliação dos pedidos para a habitação social foi uma questão que levantou algum debate, mas conseguiu reunir-se um consenso”, disse Ho Ion Sang.

Para os membros da comissão tratando-se de um cônjuge, mesmo sendo não residente, deve ser tido como “especial”, e , como tal, “os seus rendimentos e património devem ser incluídos nos processos de candidatura”, apontou.

 

Relatório “comprado”

O relatório relativo às necessidades de habitação social recentemente divulgado continua a ser alvo de polémica, desta feita com a acusação de Au Kam San de que foi feito de acordo com o princípio de “quem paga manda”.

Para o deputado pró democrata trata-se de um documento em que os dados são falsos. “O estudo tem como ponto de partida a situação em 2016, por isso é que se chegou, através de inferência, à conclusão de que a procura de habitação económica e social corresponde a 16 mil e sete mil respectivamente, mas isto, evidentemente não corresponde à realidade, afirma Au Kam San.

Em causa está o facto de que os dados considerados em 2016 eram errados por não serem completos. “Pode ver-se que grande parte dos principais dados do relatório sobre a procura de habitação pública consiste em dados demográficos, de forma a que os dados do passado, relativos aos pedidos de habitações económicas e sociais, não foram incluídos”, lê-se na interpelação que dirigiu ao Governo.

De acordo com o deputado, é um estudo irreal que põe em causa as entidades que se dizem independentes e a quem o Governo recorre para realizar pesquisas. Se até agora, considera, podiam ser consideradas “de confiança”, para Au Kam San, com o estudo relativo à habitação, “quem paga, manda” e o descrédito alarga aos estudos académicos.

“Conseguir falsas realidades através dos estudos académicos, afectando a definição de políticas com conclusões incorrectas é o mesmo que atirar sobre o próprio pé”, aponta Au Kam San, pelo que alerta, “as autoridades não devem ocultar nem omitir dados com vista ao controlo dos resultados”.

17 Jan 2018

Deputados fazem sugestões depois de acidente com autocarro

[dropcap style≠‘circle’]V[/dropcap]ários deputados aproveitaram ontem o período de antes da ordem do dia para falar do acidente que vitimou mortalmente uma idosa na semana passada, depois de ter sido atropelada por um autocarro da Nova Era. Este era conduzido por um motorista que prestava serviços para a concessionária a tempo parcial.

Na visão da deputada Song Pek Kei, o acidente ocorrido na rua Xavier Pereira “deveu-se à falta de recursos humanos, além das deficiências do regime de trabalho a tempo parcial”. “Mais, o funcionamento do metro ligeiro está atrasado, e os sistemas pedonais também não conseguem surtir efeitos, o que acarreta grandes riscos para o trânsito”, acrescentou a deputada, que fez uma sugestão.

“Deve tentar-se estudar um plano de redes viárias públicas nas margens costeiras a este, para que haja um autocarro directo entre a Taipa, os NAPE e as Portas do Cerco, reduzindo-se a pressão do trânsito nos bairros antigos e urbanos e aumentando a eficiência do trânsito.”

“Não queremos mais nenhum acidente rodoviário.” Foi desta forma que o deputado Zheng Anting iniciou a sua intervenção, onde criticou o facto do Governo pretender aumentar as tarifas dos autocarros sem garantir mudanças ao nível da qualidade.

“Sem se verificarem aperfeiçoamentos significativos na qualidade dos serviços de autocarros, o Governo lançou, à pressa, uma proposta de aumento das tarifas e fez o público dúvidar, uma vez que este entende que a proposta não é razoável e que há falta de fundamentos.”

O número dois de Mak Soi Kun no hemiciclo lembrou que sem outras soluções as vozes de oposição não vão diminuir. “Se a intenção do Governo é esperar, com o aumento das tarifas, reduzir os subsídios financeiros atribuídos anualmente às companhias de autocarros, mas sem elevar a qualidade dos serviços prestados, só vão existir mais vozes de oposição.”

Mak Soi Kun exigiu a criação de um regime de carteira profissional. Tudo para que “os diferentes motoristas portadores de carta de condução de pesados só possam conduzir depois de obterem a carteira profissional”, apontou. “O facto do motorista ter carta de pesados não significa o domínio das técnicas de segurança. Devem, portanto, passar por formação e só depois de aprovados no exame, e de obtido o certificado, é que devem poder trabalhar”, rematou o deputado.

17 Jan 2018

Áreas marítimas | Coutinho exige concurso público para concessão de terrenos

O deputado José Pereira Coutinho pressionou a secretária para a Administração e Justiça quanto aos futuros aterros inseridos nos 85 quilómetros quadrados de águas marítimas que passam a ser geridos pela RAEM. O deputado quer que a defina a realização de concurso público para a cedência dos terrenos. Sónia Chan promete cumprir as leis do território

 

[dropcap style≠‘circle’]O[/dropcap] debate sobre a votação da lei de bases de gestão das áreas marítimas resultou num longo braço de ferro entre o deputado José Pereira Coutinho e a secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan. O diploma foi aprovado na generalidade, mas Pereira Coutinho chegou mesmo a dizer que votaria contra caso não obtivesse explicações sobre a forma como os terrenos inseridos nos 85 quilómetros quadrados de área marítima serão concessionados no futuro. Contudo, acabaria por votar a favor.

Macau passa agora a gerir esta área cedida por Pequim, mas o deputado lembrou que a lei de bases de gestão não determina se esses terrenos serão ou não concedidos pela via do concurso público.

“Espero que esta matéria possa ser regulada por lei, pois tem a ver com os direitos inerentes às concessões. Estes terrenos podem vir a ser concessionados a particulares, espero que haja mais transparência. Será por concurso público, ajuste directo? As orlas marítimas não deixam de ser um bem muito importante para Macau.”

O deputado questionou também se caberá à nova comissão de gestão das áreas marítimas a decisão sobre o tipo de concessão a realizar. “É a comissão que decide se é por concurso público ou ajuste directo? Espero que seja por concurso público para evitar problemas.”

A secretária deixou claro que “existe um planeamento geral para o desenvolvimento dessas áreas” e que as concessões serão efectuadas de acordo com a lei de terras em vigor. “Quanto aos aterros, carecem de autorização do Governo Central e a concessão vai ser feita de acordo com a lei de terras. Os aterros que ainda não estão formados, e que serão para uso temporário das áreas, temos algumas normas”, frisou Sónia Chan.

José Pereira Coutinho deixou bem claro que não quer ver implementada uma “lei bifurcada”. “A lei de bases de gestão das áreas marítimas é clara: não há nada para o jogo. Temos uma lei de terras e o Governo tem de ter uma política geral em relação ao uso dos terrenos. Só podem haver concessões por concurso público, mas a lei de bases não refere isso. Vão haver muitos pedidos porque sabemos que cá em Macau toda a gente está interessada nos terrenos”, adiantou.

 

Comissão decisória

A lei de bases de gestão das áreas marítimas será, como o nome indica, a base para todas as outras leis que serão criadas nos próximos anos para gerir os espaços que Pequim deu a Macau para gerir. Liu Dexue, director dos Serviços para os Assuntos de Justiça (DSAJ), explicou ontem que falta ao Governo realizar 47 trabalhos legislativos, tais como leis, regulamentos administrativos ou outros diplomas.

Será criada uma comissão liderada pelo Chefe do Executivo e composta pelos cinco secretários, que terá como responsabilidade coordenar todos os trabalhos de gestão dos 85 quilómetros de área marítima.

Esta comissão irá tomar decisões, garantiu Sónia Chan. “É um órgão decisório mas não é um órgão consultivo, tendo a responsabilidade de fazer o planeamento para o desenvolvimento das áreas marítimas. Cabe a esta comissão fazer a elaboração de diplomas e emitir orientações. Será um órgão decisório do mais alto nível”, concluiu.

17 Jan 2018

Julgamento de Sulu Sou e Scott Chiang novamente adiado

Pela segunda vez o julgamento de Sulu Sou e Scott Chiang, por desobediência qualificada, foi adiado por tempo indeterminado. A juíza Cheong Weng Tong justificou a decisão com a providência cautelar que pode fazer Sulu Sou regressar à Assembleia Legislativa e impedir o prosseguimento do julgamento

[dropcap style≠‘circle’]O[/dropcap] julgamento do deputado Sulu Sou e do activista Scott Chiang estava agendado para ontem de manhã, mas acabou por ser adiado, pela segunda vez, quando os intervenientes já estavam na sala de audiências. A juíza Cheong Weng Tong considerou que não estavam reunidas as condições para avançar com o caso, devido ao pedido da defesa para que Sulu Sou regresse temporariamente à Assembleia Legislativa, até que haja uma decisão final sobre a legalidade do processo que resultou na suspensão do seu mandato.
A juíza do Tribunal Judicial de Base justificou a decisão com o “risco” da providência cautelar apresentada por Sulu Sou no Tribunal de Segunda Instância ser aceite, o que interromperia a suspensão do mandato do legislador e o voltaria a proteger pela imunidade parlamentar. Mesmo que as sessões do julgamento para ouvir as testemunhas, apresentação de provas e alegações finais fossem realizadas a tempo, a juíza apontou que poderia haver o risco da decisão do TSI ser tomada antes da leitura da sentença, o que colocaria automaticamente todo o processo em causa.
A decisão de ontem foi tomada em pouco mais de uma hora, depois do Tribunal Judicial de Base ter sido notificado, logo pela manhã, pelo Tribunal de Segunda Instância e terem sido notificadas e ouvidas as partes envolvidas, ou seja os advogados de defesa e a representante do Ministério Público.
Assim, frisou Cheong Weng Tong, “tendo em conta a necessidade de estar reunido o princípio processual da continuidade” e a possibilidade das decisões tomadas pelo tribunal poderem “ser consideradas inválidas ou incorrerem em vícios”, o julgamento foi adiado por tempo indeterminado. O objectivo passa por aguardar por uma decisão do TSI.

Promessa de compromisso ignorada

Quando confrontado com este cenário, o deputado Sulu Sou comunicou ao seu representante, o advogado Jorge Menezes, que estava disposto a abdicar da providência cautelar e a comunicar essa decisão ao TSI até hoje.
“Se o tribunal considerar que é suficiente para não criar um impedimento e o julgamento prosseguir, o meu cliente, Sulu Sou, está disposto a comprometer-se a abdicar do pedido de suspensão de eficácia da deliberação da Assembleia Legislativa no Tribunal de Segunda Instância”, disse Jorge Menezes, na sala de audiência. “Esse compromisso vai ser comunicado hoje [ontem] ou, o mais tardar, amanhã [hoje]”, frisou.
Apesar da promessa do deputado suspenso, a juíza não esboçou qualquer resposta, limitando-se a declarar que o julgamento ia ser adiado.
Porém, momentos antes, Cheong Weng Tong tinha-se mostrado muito agastada com a situação, uma vez que considerou que a defesa tinha o dever de ter informado o TJB sobre a providência cautelar e sobre o recurso da suspensão do deputado. Estes são dois processo que foram apresentados pela defesa e decorrem no TSI.

Sermão à defesa

Como a defesa não comunicou ao tribunal a existência dos outros processo, a juíza apenas teve conhecimento oficial dos mesmos na manhã de ontem. Cheong Weng Tong mostrou-se bastante incomodada com a situação e não hesitou em utilizar um tom mais áspero para questionar o advogado Jorge Menezes.
“Se o processo de suspensão de eficácia for diferido o arguido Sulu Sou volta a assumir as funções de deputado e não podemos avançar com o processo. Disse que os outros processos tinham sido entregues no outro tribunal no dias 4 de Janeiro e 5 de Janeiro. A resposta da Assembleia Legislativa foi dada a 8 de Janeiro. Porque razão não informou este tribunal?”, perguntou Cheong.
“Se soubesse que tinham sido apresentados esses processos não tinha agendado para hoje a sessão do julgamento. O Dr. [Jorge Menezes] tem o dever de colaboração com o tribunal e devia ter apresentado essa informação”, apontou.
“A minha intenção nunca foi perturbar o andamento da sessão e não queria que o tribunal ficasse com a impressão que recorremos a outro tribunal para perturbar este processo”, respondeu o advogado.
“Queríamos que os dois processos corressem de forma separada para que não se afectassem, mas admito que não ponderei completamente os efeitos. Deixo a ponderação sobre a situação ao tribunal. Quero realçar que não se tratou de nenhuma estratégia para atrasar o julgamento”, sublinhou.

MP apoiou adiamento

Ainda antes de Sulu Sou ter admitido a hipótese de voltar atrás com a providência cautelar, tanto o MP, que está representado no julgamento através de Mei Fan Chan da Costa Roque, como o advogado de defesa de Scott Chiang, Pedro Leal, concordaram que o adiamento seria a melhor opção.
“Muito provavelmente, devido ao pedido de suspensão de eficácia, Sou Ka Hou vai retomar as funções e o processo crime não vai poder continuar”, começou por dizer Mei Fan Chan da Costa Roque. “Há um risco e há que ter em conta o princípio da continuidade, que é um dos princípios processuais”, acrescentou.
“Concordo com a posição do Ministério Público. Eu e o meu colega [Jorge Menezes] não tomámos este aspecto em conta. Podemos tentar acabar o julgamento antes de uma decisão [do TSI], mas corremos o risco de enquanto esperamos pela sentença haver a decisão e isso impede o julgamento de prosseguir”, considerou, por sua vez, Pedro Leal.
Esta é a segunda vez que o julgamento é adiado. A primeira sessão estava agendada para 28 de Novembro, mas a data teve de ser alterada para que a Assembleia Legislativa votasse o levantamento da imunidade parlamentar do deputado.
Sulu Sou e Scott Chiang são acusados do crime de desobediência qualificada devido às manifestações contra uma doação da Fundação de Macau à Universidade de Jinan, no valor de 100 milhões de yuan. A pena máxima para o crime aplicado é de 2 anos de prisão. Caso Sulu Sou seja considerado culpado e condenado com uma pena superior a 30 dias, a Assembleia Legislativa pode votar a perda do mandato do pró-democrata.

 

 

Pedro Leal assume defesa de Scott Chiang

Foi uma das novidades de ontem. O advogado Pedro Leal surgiu como representante de Scott Chiang no Tribunal Judicial de Base, entrando no edifício do tribunal acompanhado pelos arguidos e pelo colega Jorge Menezes. “Há cerca de três dias fui contactado e assumi o patrocínio do Scott Cheang. Era uma decisão que já estava decidida há cerca de sete dias, mas só hoje [ontem] é que foi revelada. Não tem grande relevância, se o julgamento tivesse sido realizado, acredito que tivesse sido uma situação que nem se levantava”, afirmou Pedro Leal, em declarações ao HM. O causídico escusou-se ainda a prestar mais declarações, a de Scott Chiang e Sulu Sou.

 

 

“Confiantes num julgamento justo”

À entrada para o tribunal, ontem, o deputado suspenso Sulu Sou declarou estar confiante num julgamento justo e encorajou os jovens interessados na política a não abdicarem das suas ambições: “Estamos confiantes num julgamento justo. Agradeço à imprensa e aos cidadãos toda a atenção que me têm dedicado nos últimos dois meses. Espero do fundo do coração que os jovens que se interessam pela política continuem com os seus esforços”, disse Sulu Sou. O pró-democrata voltou a abordar o caso, já no fim da audiência, em comunicado, afirmando que a defesa vai ponderar se abdicar da providência cautelar ainda é a melhor solução, visto que o julgamento já foi adiado.

 

Cândido de Pinho decide providência cautelar

A decisão sobre a providência cautelar que pode fazer com que Sulu Sou regresse de forma temporária à Assembleia Legislativa está nas mãos do juiz José Cândido de Pinho, que foi escolhido para ser o relator do caso. A decisão sobre o processo que entrou no tribunal a 4 de Janeiro deve ser conhecida dentro do período de um mês. Neste momento, já houve uma primeira resposta à providência cautelar por parte da Assembleia Legislativa, a 8 de Janeiro, que invocou o “interesse público” para que o regresso de Sulu Sou ao hemiciclo não tivesse ocorrido de imediato. No entanto, a defesa da AL, a cargo do advogado Lei Wun Kong, ainda está a preparar a contestação formal, que só vai ser entregue ao tribunal mais tarde.

17 Jan 2018

União Europeia | Macau pode estar fora da lista negra dos paraísos fiscais ainda este mês

Depois de integrar a lista negra de paraísos fiscais da UE e das proibições de transferências bancárias com entidades do território que se fizeram sentir, Macau pode voltar a ter o nome limpo e ainda este mês. A razão está a disponibilidade do Executivo para ratificar e aplicar a Convenção Multilateral da OCDE

 

[dropcap≠’circle’]M[/dropcap]acau pode ser retirado da lista de 17 jurisdições classificadas pela União Europeia como paraísos fiscais, ainda este mês, afirmou a TDM Rádio Macau. Na origem do volte-face está o facto do Executivo local se ter comprometido, junto das instituições europeias, com um prazo para ratificar e aplicar a Convenção Multilateral da OCDE em matéria fiscal.

Este compromisso, apurou a TDM Rádio Macau, foi assumido pelo Governo de Macau perante as instituições europeias já depois da lista negra de paraísos fiscais ter sido divulgada a 5 de Dezembro.

De acordo com uma fonte da União Europeia, a decisão de retirar Macau da lista de jurisdições pode até acontecer já na próxima reunião do Conselho Europeu para os Assuntos Económicos e Financeiros, que está marcada para 23 de Janeiro.

A inclusão de Macau na lista negra foi precisamente justificada com o facto de o território não ter ratificado a Convenção da OCDE sobre assistência mútua administrativa em matéria fiscal. E, em particular, por não se ter comprometido a resolver estes assuntos até 31 de Dezembro de 2018.

Mudança de lista

Ao ser retirado do grupo de 17 jurisdições classificadas como paraísos fiscais, Macau deve ser incluído na chamada lista cinzenta, que inclui países e jurisdições como Hong Kong, Turquia, e Suíça.

Estas jurisdições foram incluídas na lista cinzenta porque já se comprometeram a fazer algumas reformas na área fiscal e vão ser monitorizadas ao longo do próximo ano em relação aos compromissos que assumiram.

De acordo com os critérios anunciados pelo Conselho Europeu, as chamadas economias desenvolvidas têm seis meses para concretizar as reformas prometidas enquanto as economias em desenvolvimento têm até um ano.

16 Jan 2018

Instituto Cultural | Tribunal pede formação de novo colectivo para julgar ex-vice-presidente

O Tribunal Judicial de Base absolveu o ex-vice-presidente do Instituto Cultural, Chan Chak Seng, do crime de abuso de poder e violação de segredo. O Ministério Público pedia uma condenação “não inferior a um ano” e recorreu. Na Segunda Instância, entendeu-se que houve erros na apreciação de provas e reencaminhou o caso para outro tribunal colectivo

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] caso diz respeito ao concurso público para a prestação de serviços de manutenção de equipamentos da Biblioteca Central de Macau e começou em 2008. O antigo vice-presidente do Instituto Cultural, Chan Chak Seng, estava acusado pelo Ministério Público (MP) do crime de abuso de poder por não ter pedido escusa, uma vez que familiares seus estavam ligados a uma das empresas concorrentes, tendo ganho o concurso. O MP pedia uma condenação “não inferior a um ano”.

O Tribunal Judicial de Base (TJB) entendeu que Chan Chak Seng não era culpado, mas perante recurso apresentado pelo MP, o Tribunal de Segunda Instância (TSI) entendeu que houve erros na apreciação de provas e que o caso deve ser entregue a outro colectivo de juízes.

O acórdão aponta que “o TSI entendeu que o Tribunal [TJB] errou notoriamente na apreciação do facto de o arguido [Chan Chak Seng] pedir ou não escusa, do facto de o mesmo revelar a B [irmão mais novo do arguido e trabalhador na empresa que ganhou o concurso] que o preço proposto no último concurso era demasiado alto”. Está também em causa o facto de Chan Chak Seng ter dito ao seu irmão mais novo “o preço para a fase experimental [para a manutenção dos equipamentos da Biblioteca Central]”.

Nesse sentido, foi ordenado “o reenvio do processo ao Tribunal a quo [TJB] para que o objecto da acção fosse julgado na totalidade por um novo tribunal colectivo formado por juízes que não tinham intervindo na decisão recorrida”.

Ligações próximas

Chan Chak Seng foi nomeado vice-presidente do IC em 2005, tendo recebido, no ano seguinte, competências da parte de Cheong U, à data secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, para a “direcção, coordenação e fiscalização relativas ao Departamento do Património Cultural, à Biblioteca Central de Macau e ao Sector de Informática”.

Tal significou que Chan Chak Seng daria opiniões sobre “todas as obras a realizar nas instalações pertencentes às subunidades da sua tutela”, sendo que este “ocupou o lugar de presidente da comissão de selecção das obras envolvidas”.

No concurso público para a gestão dos equipamentos, concorreu uma empresa cujos proprietários tinham ligações próximas a Chan Chak Seng. O empresário da empresa “não participou directamente na operação [participação no concurso público]”, sendo que esta era gerida por uma outra pessoa, que tinha conhecido o irmão mais novo de Chan Chak Seng “quando estudava na universidade”.

Em 2008, o IC convidou três empresas para apresentarem as suas propostas para o referido concurso público, tendo sido convidada a empresa com ligações ao antigo vice-presidente. Este “não pediu escusa, continuando a exercer o cargo de comissão de selecção”, sendo que neste concurso apenas esta e uma outra empresa apresentaram as suas propostas.

O acórdão aponta que “das propostas apresentadas resultou que o preço proposto pela companhia X [onde estava o irmão mais novo do arguido] era mais elevado, e nesta situação deveria ser seleccionada a proposta da companhia Y”.

A comissão de selecção de propostas “decidiu que se apresentassem propostas novas”, tendo Chan Chak Seng escrito “pelo seu próprio punho” a razão para essa decisão.

“Antes da abertura das novas propostas, o arguido revelou ao seu irmão que o preço proposto no último concurso era demasiado alto, dizendo-lhe ainda o preço para a fase experimental. Assim, a Companhia X baixou o preço e conseguiu ganhar a adjudicação”, explica o acórdão.

Não houve escusa

A mesma empresa acabaria por ganhar o concurso público para o mesmo projecto mais cinco vezes. O TSI, depois de apreciar o processo, concluiu que havia uma “relação estreita” entre o irmão mais novo do ex-vice-presidente do IC e o administrador da empresa. Isto porque “os dois não só se conheceram quando estudavam na universidade como também estabeleceram, posteriormente, uma empresa em conjunto e compraram bens imóveis na China”.

Chan Chak Seng deveria, no entender do TSI, “por causa da relação mencionada, pedir escusa, com vista a evitar que se suspeitasse da isenção da sua decisão”. Um outro interveniente no processo, que era técnico superior do IC “pediu escusa conforme a lei”. “Então porque é que o arguido, que era presidente da comissão de selecção, não precisava de pedir escusa?”, questionam os juízes do TSI.

16 Jan 2018

Aposentação | Paulina Santos exige projecto de lei a Vong Hin Fai, Kou Hoi In e Pereira Coutinho

A advogada Paulina Santos pediu, numa carta aberta, que os deputados Vong Hin Fai, Kou Hoi e José Pereira Coutinho apresentem um projecto de lei relativo às aposentações dos funcionários públicos com cargos de direcção e chefia. Tudo para que 42 pessoas possam estar incluídos nos efeitos retroactivos

 

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]uma altura em que os deputados Vong Hin Fai e Kou Hoi In assinam o polémico projecto de resolução relativo à “Natureza política das Deliberações do Plenário da Assembleia Legislativa (AL)”, a advogada Paulina Santos quer que estes membros do hemiciclo apresentem um outro projecto de lei de alteração ao diploma “Disposições fundamentais do Estatuto do Pessoal e Direcção de Chefia”, ou seja, a lei 15/2009.

Em causa estão 42 aposentados, que trataram do seu processo após a criação da RAEM, e que não foram abrangidos pelos efeitos retroactivos da lei, como explica Paulina Santos numa carta aberta, também dirigida ao deputado José Pereira Coutinho.

“A RAEM tem cumprido o princípio de igualdade e de não discriminação. Assim, deu efeitos retroactivos a todos os deputados da AL e aos conselheiros do Conselho Executivo o direito a assistência médica, com efeitos retroactivos a partir de 20 de Dezembro de 1999. Acontece que a lei 15/2009, que aumentou os índices salariais dos aposentados com a categoria de direcção e chefia, deu apenas efeitos retroactivos a partir de 1 de Julho de 2007.”

Paulina Santos acrescenta ainda que houve discriminação relativamente aos “aposentados das mesmas categorias que se aposentaram após o dia 20 de Dezembro de 1999 e antes de 1 de Julho de 2007”.

Neste sentido, a advogada pede “aos senhores deputados, com vasta experiência na AL para apresentar, com urgência, um projecto de lei, dando retroactividade a partir de 20 de Dezembro de 1999 a todos os aposentados com as mesmas categorias, que se aposentaram a partir de 20 de Dezembro de 1999”.

Um dos 42 aposentados em causa é o próprio marido de Paulina Santos, e esta é uma das razões pelas quais continua a exigir, anualmente, que seja apresentado este projecto de lei, disse a própria ao HM. Na sua carta, a advogada considera que a mudança “não pesa muito no erário público”.

Confiança cega

A advogada explicou que o pedido aos deputados Vong Hin Fai e Kou Hoi In nesta altura trata-se de uma mera coincidência. “Este pedido não tem nada a ver com o caso Sulu Sou. Faço o pedido ao deputado Vom Hin Fai porque percebe de leis e foi meu colega. Todos os projectos de lei que são apresentados por José Pereira Coutinho são reprovados. Tudo o que Vong Hin Fai e Kou Hoi In apresentam é aprovado, penso eu. São a ala mais forte [da AL]”, frisou.

O deputado José Pereira Coutinho nunca apresentou este projecto de lei no hemiciclo, enquanto Vong Hin Fai e Kou Hoi In ainda não deram uma resposta a Paulina Santos. Esta ainda está a ponderar marcar “uma audiência” com o também advogado.

“São dois deputados fortes, no sentido de terem apoio dentro da AL. Juntei os três nomes para ver se eles podem conversar. Penso que eles não conversam, mas faço esse pedido”, disse Paulina Santos.

O HM tentou, até ao fecho da edição de ontem, confirmar junto dos deputados se vai ou não ser apresentado um projecto de lei sobre esta matéria, mas não foi possível estabelecer contacto.

 

“Qualquer pessoa com um pouco de tacto político não fazia isso”

Apesar de confiar nas capacidades do deputado Vong Hin Fai como advogado e conhecedor das leis, uma vez que foi sua colega de turma no curso de Direito da Universidade de Macau, Paulina Santos condena o projecto de resolução que deverá ser hoje votado na AL, que afirma que os tribunais não têm competência para julgar casos de natureza política.

“Este projecto de resolução é muito inoportuno. Qualquer recurso que entre num tribunal, neste caso o de Sulu Sou no Tribunal de Segunda Instância, o juiz vê primeiro se tem competência para julgar o caso, se a lei permite ou não. O tribunal aceitou o recurso, portanto o processo está a andar. E aparecer cá fora esta resolução penso que é uma pressão para o tribunal, porque o juiz sabe muito bem se é ou não da competência analisar esse ponto. É mau para Macau”, defendeu ao HM.

A advogada entende que “foi um pouco feio aquilo que ele [Vong Hin Fai] fez”. “Qualquer pessoa com um pouco de tacto político não fazia isso. Mesmo quem não é da área jurídica entende o que se está a passar. Dá a impressão de que os juízes não sabem o suficiente e que é necessário chamar a atenção”, rematou.

16 Jan 2018

Vong Hin Fai defende que resolução não interfere com tribunais

É hoje votado o projecto de resolução em que a AL não reconhece aos tribunais poderes para verificar se os procedimentos legais são cumpridos nos processos de suspensão de deputados. Também hoje começa o julgamento do deputado Sulu Sou. Para Vong Hin Fai, são coincidências e o projecto a votos é um reforço das competências internas que em nada interfere com o poder judicial

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] projecto de resolução assinado pelos deputados Vong Hin Fai e Kou Hoi In não pretende “interferir com os procedimentos judiciais”, disse ontem Vong Hin Fai à comunicação social. No entanto, o projecto não reconhece aos tribunais poderes para verificar se os procedimentos legais foram cumpridos no processo de suspensão de deputados, e concretamente, no caso recente que envolve o pró-democrata Sulu Sou. A proposta inclui todos os procedimentos de suspensão e perda de mandatos no futuro e desde 1999 e foi apresentada na quarta-feira.

“Este projecto de resolução não tem nenhum objectivo de interferir no funcionamento judicial e só queremos internamente, e de forma política, no âmbito da AL, através de uma deliberação a tomar pelo plenário, confirmar o sentido de acto político relativamente às decisões tomadas no passado dia 4 de Dezembro”, referiu Vong, sendo que a data apontada foi o dia em que a AL votou a favor da suspensão do deputado Sulu Sou.

No entanto, poucos minutos depois, o deputado refere que o projecto de resolução a ser votado hoje, nem tem directamente que ver com o caso de Sulu Sou. “Não é relativo a nenhum caso concreto. Não é esse o objectivo só estamos a exercer as nossas funções como deputados”, afirmou.

Processos de decisões

O facto de Sulu Sou afirmar que o recurso que está a interpor em tribunal não tem como finalidade colocar em causa a decisão da AL, mas sim o modo como o processo foi realizado, não é comentado pelo autor do projecto de resolução. “Neste momento não posso responder porque se o fizer estou a interferir na posição a tomar pelos tribunais”, justificou Vong Hin Fai.

Questionado acerca das causas que levaram à resolução de uma matéria que é óbvia e de conhecimento publico: o poder da AL em tomar decisões políticas, Vong Hin Fai considera que, mesmo sendo uma coisa que “toda a gente sabe, agora há quem não o esteja a perceber”, disse.

O deputado salientou ainda que o projecto de resolução quer frisar esta valência política da AL tanto para os de fora como para os de “dentro de casa, (…) nomeadamente sobre a suspensão das funções de deputado e de mandato que são actos de natureza política”.

Quis o destino

O projecto de resolução é votado hoje, no mesmo dia em que tem inicio o processo em tribunal que levou à suspensão do deputado Sulu Sou e, de acordo com Vong Hin Fai, trata-se de mera coincidência. “Isto não me cabe comentar porque não sou o secretário de convocação do plenário”, justifica.

Já a secretária para a administração e justiça, Sónia Chan, recusou-se a fazer qualquer comentário visto tratar-se de “um assunto interno”, apontou.

O projecto de resolução assinado pelos deputados, foi entregue a 10 de Janeiro, seis dias depois de Sulu Sou ter entregue o recurso no Tribunal de Segunda Instância. O deputado democrata pediu ao tribunal que analise se todos os procedimentos legais foram cumprido no processo que conduziu à sua suspensão. Os deputados Kou Hoi In e Vong Hin Fai são o presidente e secretário, respectivamente, da Comissão de Regimento e Mandatos, que optou por não emitir uma opinião sobre se Sulu Sou devia ser suspenso.

16 Jan 2018

Scott Chiang, activista político e ex-presidente da Novo Macau: “Casos nos tribunais obrigam-nos a crescer”

As batalhas jurídicas que envolvem a Novo Macau obrigaram a um crescimento e uma aprendizagem em áreas que os membros nunca tinham imaginado necessitar. A explicação é de Scott Chiang que hoje começa a ser julgado, com Sulu Sou, por suspeitas da prática do crime de desobediência qualificada. Sobre suspensão do deputado, o ex-presidente considera que as vozes dos democratas vão continuar a ser ouvidas em Macau

 

A Novo Macau tem sofrido mudanças significativas. Jason Chao deixou a associação, elegeram Sulu Sou como deputado, Kam Sut Leng assumiu a presidência. Que balanço faz das alterações?

Há uma evolução natural e temos aprendido muito e depressa. As pessoas que assumiram as novas posições estão a ter um bom desempenho. As eleições trouxeram muitas mudanças para a Novo Macau e o facto de termos um deputado está a alargar o nosso campo de acção. É uma fronteira nova com que temos de trabalhar e que nos exige uma nova adaptação.

Quando fala de nova adaptação, o que quer dizer?

Ao contrário de associações tradicionais, não nos focamos apenas numa área de acção, temos de lidar com muitos assuntos e diferentes, o que exige aprendizagem. Por exemplo, não quero falar dos casos que estão nos tribunais, mas são episódios que nos obrigam a crescer e a aprender sobre determinadas áreas que, como associação, nunca pensámos que teríamos de aprender.

Quais são as suas motivações para ser um activista pró-democrata no contexto de Macau e da China. O que acredita que é possível alcançar?

Quero sempre melhores condições e alcançar mais, mais transparência nos que têm o poder, uma maior responsabilidade dos políticos e uma população com consciência cívica e bem-informada, capaz de votar no que é melhor para si. Quero uma Assembleia Legislativa que trabalhe para as pessoas e não contra elas. Quero uma sociedade em que uma associação como a Novo Macau não é precisa porque a população tem um pensamento crítico, sabe defender e reivindicar os seus direitos e não tem medo de se expressar.

Acredita que esse objectivo é alcançável?

Dentro de um certo tempo razoável…

O que considera um tempo razoável?

Talvez até ao fim da minha vida… (risos) Talvez, no futuro, as pessoas de Macau não se foquem muito na política, nem tenho a certeza absoluta que isso seja obrigatoriamente positivo. Mas se estiverem mais preocupadas com os seus direitos, se tiverem uma maior compaixão pelos cidadãos com menos sorte e posses… Era algo que também já me deixava muito contente. Acredito que é possível haver essa mudança.

Macau tem falta de solidariedade?

As maiores tragédias nesta cidade não acontecem porque há um regime do estilo fascista a reprimir as pessoas inocentes. Acontecem porque não há solidariedade, existe muito o pensamento perante a adversidade dos outros: “Tiveste azar” ou “Isso é um problema teu e eu não tenho nada a ver com isso”. Se mudássemos um pouco isso, haveria mais justiça e menos medo de proteger os nossos direitos. Era um ponto de chegada que me agradaria.

Sulu Sou foi suspenso da Assembleia Legislativa, apesar de nunca ter defendido a independência de Macau. Em Hong Kong também houve pró-democratas que perderam os mandatos e nem todos defendem a independência. Há espaço para esta nova geração pró-democrata em Macau e Hong Kong?

Acredito que sim. Podem tentar silenciar-nos a todos, podem suspender-nos para acabar com o barulho, mas as nossas vozes vão ser ouvidas. Vão continuar a surgir pessoas nas gerações mais novas com coragem e pensamento crítico para apontarem as práticas do sistema que não justas.

O ambiente criado à volta dos pró-democratas faz com que as pessoas tenham mais medo de serem associadas à Novo Macau?

Não, pelo contrário. Nunca promovemos uma política activa de angariação de membros, até porque não estamos dependentes do valor das quotas que os associados pagam. Mas a verdade é que Sulu Sou tem um carisma muito grande, quase como se fosse uma estrela, o que faz com que muitos jovens tenham a curiosidade de perceber como funciona a Novo Macau nos bastidores. Por agora, não faz sentido falar de medo.

Quantos membros tem a Novo Macau?

Temos cerca de 100 membros. Ao longo da história da associação nunca se passou essa marca. Os “nossos pais fundadores” também nunca quiseram fazer a associação crescer muito porque tinham receio da transferência da soberania. Na altura, esperavam um ambiente muito adverso para os pró-democratas após a transição.

Têm muitos relatos de membros prejudicados no trabalho por serem membros da Novo Macau?

Estamos a falar de uma característica muito chinesa, em que ninguém vai explicitamente colocar um cartaz no escritório ou emitir orientações aos trabalhadores a proibi-los de aderirem à Novo Macau. Mas sabem fazê-lo de outras formas e impor uma certa autocensura que leva as pessoas a pensarem: “Posso estar na Novo Macau, mas não posso aparecer nas câmaras”. Foi algo que aconteceu logo desde o início da Novo Macau, quando muitos membros eram funcionários públicos.

A transição agravou esse problema?

Passou a ser mais frequente, porque as pessoas não querem ser vistas como causadoras de problemas. O cenário é muito semelhante, só que as gerações mais novas são muito corajosas e sabem dividir a vida profissional da vida política. Percebem que as duas não têm de estar ligadas. Ter um emprego não implica abdicar de ter opinião. É uma mudança muito positiva.

Há membros da Novo Macau a trabalhar para o Governo?

Não tenho conhecimento de a existência de algum caso.

Houve avisos do Governo para que os funcionários públicos não participassem na manifestação de apoio a Sulu Sou?

Tivemos relatos dessas situações, mas como já aconteceu anteriormente não temos provas e, por isso, o que podemos dizer é que é especulação… São relatos que nos parecem credíveis. As pessoas sabem como funcionam as coisas e acreditam que é plausível que isso tenha acontecido. O Governo devia mudar a sua postura face às manifestações, não devia encorajar a participação, mas também não é positivo se houver este clima de suspeição.

Olhando para a situação de Macau, que balanço faz da situação do segundo sistema e a região?

Na minha opinião, o sistema não está melhor do que há cinco anos. Já o desenvolvimento social, principalmente a nível material, teve uma evolução muito positiva, talvez melhor do que em qualquer outra parte do mundo. Este aspecto material é muito importante porque permite dotar as pessoas de uma maior consciência cívica.

Essa consciência pode ser uma semente mais democrática?

Talvez as pessoas não queiram uma sociedade mais democrata, mas querem explicações. Querem perceber como é que um Governo que tem recursos tão grandes é incapaz de resolver os problemas do sistema de transportes. Há cada vez mais pessoas a exigirem que o Governo resolva os problemas e apresente resultados.

Foram estas exigências que levaram as cerca de sete mil pessoas à Praça da Assembleia Legislativa contra a lei para dar mais benefícios aos membros do Governo aposentados?

Sim. As pessoas de Macau não se preocupam muito se os poderosos ficam mais ricos e tiram uma grande parte dos dinheiros para si, sendo pagos muito acima do que merecem. Mas também querem ver alguns resultados. Quando surgiu essa proposta, as pessoas consideraram que era um abuso face às incapacidades governativas.

 

 

“Autoridades querem ainda mais poder”

Qual é a sua opinião sobre a nova lei da cibersegurança?

É uma lei feita numa zona cinzenta. Evoca-se a necessidade de proteger os cidadãos e, depois, garantem-se enormes poderes às autoridades. É muito importante perceber como vai ser utilizado esse poder.

Considera que pode haver abusos?

Era uma pergunta que gostava de ver respondida. Parece-me muito claro que as autoridades não vão parar e querem ainda mais poder, ao mesmo tempo que não têm qualquer pudor em mostrar esse mesmo poder na cara dos cidadãos. Na última vez que fizemos uma pesquisa, e falando de uma forma muito geral, a percentagem dos gastos com a segurança em Macau em proporção do PIB era a mesma que o do Interior da China, numa área chamada estabilidade nacional. Esta área do orçamento não trata dos assuntos militares, são os gastos com o controlo da Internet, de informação, entre outros…

Após a passagem do Tufão Hato, o secretário Wong Sio Chak disse que o Governo ia equacionar vigiar as aplicações móveis para evitar que se espalhassem rumores. É uma questão que preocupa a Novo Macau?

Por causa dos chamados rumores foram detidas quatro pessoas após a passagem do Tufão Hato. Como é que eles poderiam ter feito essas detenções se não estivessem já a vigir as conversas? A minha especulação é que eles querem é legalizar algo que já fazem. As autoridades querem estar à vontade para fazerem tudo o que querem, mas para estarem mesmo à vontade querem um “selo legal”…

Quando a Novo Macau organizou um referendo sobre o sufrágio directo, foi levado para a esquadra com Jason Chao e mais outros três voluntários. Como ficou o caso?

Foi arquivado, mas nos próximos cinco anos, se tiverem provas novas, podem reabri-lo. Ainda não podemos dizer definitivamente que não vamos a julgamento…

 

“Não há apoios financeiros do exterior”

No passado chegaram a circular rumores que a Novo Macau poderia estar a ser financiada por instituições do exterior interessadas em criar instabilidade em Macau. Confirmas que houve financiamento do exterior?

Não, isso nunca aconteceu. O nosso maior apoio financeiro foi sempre a contribuição dos nossos membros que eram deputados na Assembleia Legislativa. Também temos donativos individuais, mas nenhuma dessas fontes de financiamento o faz de forma regular e consistente, comparando com as contribuições dos deputados. Nunca tivemos apoio de qualquer instituição.

16 Jan 2018

Nova Era implementa sistema de monitorização de condução

Depois do acidente que provocou uma vítima mortal na semana passada, as medidas de emergência para prevenção de uma condução de risco estão em marcha. A Nova Era testa um sistema de monitorização e condução em que os primeiros resultados são apresentados no mês que vem e o Governo pretende que as restantes companhias sigam o exemplo. Estão ainda suspensos um total de 30 motoristas a tempo parcial

 

 

[dropcap style≠‘circle’]U[/dropcap]m sistema que monitoriza a condução dos motoristas já está em curso nos autocarros da empresa Nova Era. A medida pretende identificar os aspectos, na condução de autocarros, que podem representar um risco para a segurança rodoviária e foi anunciada na passada sexta-feira pelo director dos Serviços para os Assuntos de Tráfego, Lam Hin San e que contou com a representação das três empresas de autocarros locais. “Já tivemos uma reunião com a Nova Era para acompanhar um novo sistema de monitorização sobre o trabalho dos motoristas e que vai revelar, por exemplo, as travagens, as situações em que acontecem e a que velocidades para verificar se os motoristas estão ou não a conduzir de forma segura”, disse o responsável pela Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT).

Os primeiros resultados vão ser dados a conhecer no mês que vem e a ideia é que as restantes operadoras de autocarros locais implementem o mesmo sistema. “Em Fevereiro vamos reunir com a comunicação social para comunicar os dados que obtivemos e vamos falar com as outras concessionárias para introduzir este sistema”, referiu o director da DSAT.

Para Lam Hin San os problemas associados à condução não dependem, porém, apenas dos condutores, sendo que as condições físicas do território não são, considera, as melhores. “Compreendo que a atitude dos motoristas e o serviço prestado não é o melhor. Os problemas de condução podem ter que ver com as próprias características de Macau, com ruas muito estreitas e curvas muito apertadas pelo que os passageiros podem continuar a  não se sentir muito confortáveis”, apontou.

Na área da formação o director da DSAT salientou a necessidade de mais formação. “Após a revisão que fizemos com as concessionárias, achamos que temos alguns aspectos a melhorar e a optimizar como por exemplo a formação de motoristas”, referiu.

A importância da formação foi também sublinhada pelos representantes das três companhias de autocarros presentes no encontro, sendo que cada uma apontou melhorias neste âmbito.

 

Serviço suspenso

Entretanto, são trinta os motoristas de autocarros, provenientes das três operadoras que se encontram suspensos dentro da medida de emergência lançada pela DSAT depois do acidente que na semana passada provocou uma vítima mortal. Da Nova Era ficaram sem exercer funções 17 profissionais, da TCM, quatro e da Transmac, nove.

Para Lam Hin San, a medida é necessária visto tratar-se de uma faixa dos profissionais que pode representar uma grande risco para a segurança rodoviária. Em causa está a fadiga que pode estar na origem de uma má condução. “Precisamos de ter em conta a segurança e há motoristas que não estão a prestar serviço a tempo inteiro, por isso e como medida de emergência vamos pedir às companhias para rever o regime e pedir para verem se os motoristas têm o tempo de descanso suficiente de modo a evitar a fadiga”, disse.

“Temos de assegurar o tempo de descanso dos motoristas porque temos dúvidas quanto a isso, nomeadamente para os que estão a trabalhar a tempo parcial e vamos suspender o exercício de funções para os que não trabalham em regime permanente”, especificou o director da DSAT.

De acordo com o responsável da Nova Era, empresa que viu mais motoristas colocados de fora, existem lacunas no que respeita ao controlo dos tempos de descanso dos motoristas.

A medida tem ainda que ver com a prevenção e situações de risco. “Não podemos aceitar que motoristas que já trabalharam muitas horas por dia depois queiram conduzir um autocarro a tempo parcial porque pode por em causa a segurança”, afirmou.

 

Os atingidos

A suspensão abrange motoristas que tenham outros empregos a tempo inteiro, e os que não trabalham a conduzir autocarros pelo menos quatro dias por semana para as concessionárias locais.

Além disso, as regras referentes à suspensão abrangem ainda os motoristas que não cumpram os tempos de descanso previstos na lei.

Com a suspensão, vão ficar 100 percursos afectados o que representa um por cento do total dos trajectos do território, sendo que “o impacto não é assim tão grande”, considera Lam Hin San.

Em 2016, o número de acidentes de autocarros foi de 1709 e em 2017 baixou para 1495, tendo-se registado um decréscimo de 13 por cento. “Entre estes acidentes uns são da responsabilidade dos condutores e motoristas e outros dos próprios peões ou outros condutores de automóveis”, apontou o director. Para este ano, o responsável espera que o número de acidentes diminua em pelo menos 10 por cento.

Em 2016 morreram nove pessoas devido a acidentes de autocarro e em 2017, oito.

15 Jan 2018

Novo Macau diz que liberdade de imprensa está ameaçada pela lei da cibersegurança

A Associação Novo Macau deixou ontem vários avisos sobre a proposta de lei da cibersegurança, defende que faltam critérios que orientem a conduta da Polícia Judiciária nas investigações e que a proposta permite aceder às comunicações de canais de rádio e televisam, o que consideram ameaçar a liberdade de imprensa.

 

 

[dropcap style≠‘circle’]A[/dropcap] proposta para a lei da Cibersegurança ameaça a o direito de imprensa e a privacidade dos cidadãos. O aviso foi deixado, ontem, pela associação pró-Democracia Novo Macau, em conferência de imprensa.

“O Artigo 27 da Lei Básica garante explicitamente aos residentes a liberdade de expressão, imprensa e publicação. Mas o texto da lei propõe que os operadores de difusão sonora e televisiva, que incluem as estações de rádio e televisão, têm de ser incluídas nas entidades que vão estar a ser vigiadas”, foi explicado, ontem, por Sulu Sou, deputado suspenso, que foi eleito com o apoio da associação.

“Se a Polícia Judiciária autorizar o Centro de Alerta e Resposta de Incidentes de Cibersegurança a ter o direito de aceder aos meios de comunicação social e pedir qualquer tipo de informação a qualquer altura, é possível que prejudique a liberdade de imprensa e ameace o secretismo das fontes”, foi acrescentado.

De acordo com a leitura do texto da Associação, a nova lei autoriza mesmo as autoridades a alterarem a informação que os meios de comunicação divulgam através da televisão e rádio.

 

Privacidade é slogan

Ao mesmo tempo, a Novo Macau acusa a lei de não garantir a “privacidade das pessoas”, apesar de essa ser uma das intenções declaradas pelo Executivo no texto da consulta pública, que termina a 24 de Janeiro.

“O texto da consulta enfatiza o ‘respeito pela privacidade das pessoas’ como um dos princípio da Lei da Cibersegurança, mas não específica normas, procedimentos e aspectos legais que garantam a privacidade pessoal. Estamos preocupados que o ‘respeito pela privacidade das pessoas’ mão seja mais do que um bonito slogan no texto”, afirmou Sulu Sou.

Outro aspecto criticado está relacionado com a falta de supervisão para o Centro de Alerta e Resposta ad Incidentes de Cibersegurança, que vai estar em funcionamento durante 24 horas. A Novo Macau teme abusos de poder das autoridades, que passem sem punições.

“De facto, o texto não diz que mecanismo vai ser criado para supervisionar eventuais ilegalidades cometidas pelos supervisores, como abusos de poder e dos lugares ocupados, fugas de informação, tráfico de dados, entre outros”, defendeu Sulu Sou, secundado pelo também membro Alexis Chan.

Ao longo dos nove pontos apresentados, destaca-se igualmente a cobertura do centro de supervisão. Segundo o texto, a recolha de dados é limitada aos operadores de infra-estruturas críticas e não abrange individualmente os cidadãos. No entanto, a Novo Macau diz que tal é feito de uma forma diferente.

“São propostos como operadores de infra-estruturas críticas todas as autoridades públicas assim como os privados ligados à área das finanças, jogos de fortuna e azar, hospitais, transportes, redes públicas etc,. Isto significa que os equipamentos supervisionados englobam quase todos os aspectos da vida quotidiano, o que de “forma indirecta permite supervisionar todos os residentes e turistas”, foi defendido.

15 Jan 2018

Defesa de Sulu Sou pede pausa na suspensão

Além do recurso, a defesa de Sulu Sou fez entrar no Tribunal de Segunda Instância um pedido de suspensão de eficácia da decisão que afastou o deputado da Assembleia Legislativa

 

A defesa do deputado Sulu Sou fez um pedido ao Tribunal de Segunda Instância (TSI) para que o legislador volte a ocupar o lugar na Assembleia Legislativa (AL), enquanto aguarda pelo desfecho do processo contencioso que decorre no tribunal. O documento a que o HM teve acesso entrou no TSI pouco depois do recurso.

Entende a defesa do pró-democrata, liderada pelo advogado Jorge Menezes, que a suspensão deve ser interrompida enquanto se aguarda por uma decisão do tribunal sobre o contencioso, porque existem “fortes indícios” de ilegalidade do processo, assim como na própria suspensão.

Foi igualmente pedida a suspensão da eficácia de outras quatro decisões do presidente da Assembleia Legislativa, nomeadamente aquelas em que determinou que Sulu Sou estava em “conflito de interesses” e não podia votar, a marcação do Plenário para votar a suspensão, a rejeição do direito de defesa ao deputado e a decisão em que evitou que houvesse uma limitação temporal da suspensão.

Entre os argumentos para que o tribunal pause a suspensão do deputado consta existência de um prejuízo de difícil reparação, que a suspensão está a gerar para o sistema político e o princípio de existência de eleições democráticas.

“O próprio sistema político e princípio de existência de eleições democráticas, e a representatividade, estão a ser gravemente prejudicados com a suspensão do mandato, o que, como referido tem um impacto prejudicial no próprio Requerente”, pode ler-se no documento.

“O mesmo sucede com os direitos políticos fundamentais dos eleitores que o elegeram e que estão a ser gravemente ofendidos com a impossibilidade de exercício do mandato”, é realçado.

Ainda no que diz respeito à difícil reparação dos danos da suspensão, a defesa afirma que “são, por natureza, irreparáveis, na medida em que não são prejuízos patrimoniais”, não podendo ser compensados financeiramente.

 

Em nome do interesse público

Ao mesmo tempo, é evocado outro argumento essencial para que uma suspensão de eficácia seja aceite, ou seja, a “inexistência de grave lesão do interesse público” que o regresso de Sulu Sou ao hemiciclo causaria. Segundo a defesa, o regresso do deputado até faria que houvesse mais a ganhar para o interesse público.

“Não há uma lesão para o interesse público (antes pelo contrário) dado que nos termos do regime aplicável a não suspensão implica a não prescrição do procedimento penal”, é mencionado. “Quer isto dizer que o interesse da realização da justiça (quanto ao processo crime) está sempre salvaguardado”, é acrescentado.

“Aliás, é do interesse público que a AL possa contar com mais um deputado, que os cerca de dez mil eleitores que elegeram o Requerente não fiquem sem representação, que os demais cidadãos não percam o benefício da sua representação, que a AL, constitucionalmente estabelecido com número ímpar, não funcione com número par”, é apontado.

Na parte final, o documento indica os vícios que a defesa encontrou no processo de suspensão, entre as quais é apontado o dedo à conduta da Comissão de Regimento e Mandatos, liderada por Kou Hoi In e Vong Hin Fai, à presidência e à mesa da Assembleia Legislativa, cujo homem forte é Ho Iat Seng.

Após a entrada do recurso, que aconteceu a 4 de Janeiro, a Assembleia Legislativa tem um prazo de 10 dias úteis para ser ouvida sobre o assunto, prazo que deve acabar por volta de 18 de Janeiro.

 

 

Ho Iat Seng: dois pesos, duas medidas

Entre os vícios apresentados pela defesa de Sulu Sou ao processo de suspensão, surge o facto de Ho Iat Seng ter tido condutas dispares no que diz respeito à preparação da defesa do legislador suspenso. Segundo a defesa, o mesmo presidente da AL que exigiu ao TJB cinco dias para que os deputados pudesse ler o parecer não-opinativo da comissão, foi o mesmo que não agiu “no sentido de procurar assegurar de forma genuína que os Deputados tivessem tempo de reflectir no texto apresentado pelo Deputado Requerente [ndr. Sulu Sou]”. Ainda de acordo com a defesa, Sulu Sou só conseguiu dar uma versão dos facto hora antes do Plenário em que foi suspenso, tenho o próprio Ho Iat Seng reconhecido que esse texto “não foi considerado no Debate”.

15 Jan 2018

Defesa da Assembleia Legislativa prestou declarações e prepara contestação formal

Advogado da Assembleia Legislativa considera que processo de suspensão de Sulu Sou tem uma natureza política e já comunicou o facto ao tribunal. Deputado Vong Hin Fai remete responsabilidades sobre a proposta polémica para o Plenário e Sulu Sou diz que AL quer ser “jogador e árbitro ao mesmo tempo”

[dropcap style≠‘circle’]A[/dropcap] defesa da Assembleia Legislativa já prestou declarações ao Tribunal de Segunda Instância a defender que o processo de suspensão do deputado Sulu Sou é um acto político e, como tal, não deve sofrer interferências. No entanto, a contestação formal só vai ser enviada mais tarde, uma vez que o prazo limite para a entrega da mesma ainda está em vigor, explicou, ao HM, o advogado Lei Wun Kong.
“Apesar de ainda estar a analisar o caso, uma vez que o prazo oficial para a apresentação da contestação ainda decorre, já apresentei alegações junto do tribunal a defender que a suspensão foi um acto político da Assembleia Legislativa”, afirmou Lei Wun Kong, advogado de defesa do Hemiciclo, ao HM.
“De momento ainda está a decorrer o prazo de 10 dias que temos para enviar a contestação e vamos cumpri-lo. Nessa altura a informação que vamos enviar terá uma fundamentação mais completa e elaborada”, acrescentou.
O causídico evitou prestar mais declarações por duas razões: o facto do processo decorrer nos tribunais e também porque haverá um plenário na terça-feira, em que os deputados da Assembleia Legislativa vão assumir uma posição sobre o assunto.
Segundo o HM conseguiu apurar, o argumento da defesa está em linha com a posição da Mesa da Assembleia Legislativa, composta por Ho Iat Seng, presidente, Chui Sai Cheong, vice-presidente, Kou Hoi In, primeiro secretário, e Chan Hong, segunda secretária. Esta é uma opinião que o hemiciclo quer adoptar e foi é por isso que os deputados Kou Hoi In e Vong Hin Fai apresentaram a proposta de resolução “Natureza políticas da Deliberações do Plenário da Assembleia Legislativa”, para legitimarem a opção.
Segundo a proposta de resolução, que não tem poder de lei nem tem de ser obrigatoriamente seguida pelos órgãos judiciais, os Tribunais não tem legitimidade para analisar os processo de suspensão e perda de mandatos.
Com a proposta, Kou Hoi In e Vong Hin Fai começam também a precaver um futuro processo de perda de mandato de Sulu Sou. Acusado do crime de desobediência qualificada, a AL pode ser chamada a votar a perda do mandato do deputado, se o pró-democrata for julgado com pena superior a 30 dias de prisão. Os julgamento do caso tem início para amanhã.

Contradições de especialista?

Apesar de ter apresentado uma proposta de resolução a declarar que os Tribunais não têm poderes para verificarem se todos os requisitos legais foram cumpridos no processo de suspensão de Sulu Sou, Vong Hin Fai, considerado um especialista na área do Direito, afirmou que não está a tentar condicionar o poder jurídico nem o Tribunal de Segunda Instância.
“Na Assembleia Legislativa temos o direito de explicar os nossos motivos políticos, mas não temos intenção de interferir na independência judicial”, afirmou no Sábado, de acordo com o Canal Macau.
Vong Hin Fai fez depois questão de sublinhar que só fez uma proposta e que a decisão cabe à Assembleia Legislativa: “Quero mais uma vez explicar que esta é uma proposta e não uma lei que já está aprovada”, frisou.
Kou Hoi In e Vong Hin Fai são o presidente e secretário da Comissão de Regimento e Mandatos, principal responsável pela forma como processo de suspensão foi conduzido. Apesar das várias críticas ao processo por parte do deputado José Pereira Coutinho antes da votação da suspensão, Kou Hoi In e Vong Hin Fai fizeram uma defesas acérrima do mesmo.
Também Sulu Sou comentou a proposta da resolução: “A Assembleia Legislativa está a colocar-se na posição de tentar resolver uma disputa em que é uma parte envolvida, desrespeitando o papel dos tribunais, a sua autonomia e autoridades para resolver diferendos. A Assembleia Legislativa não devia tentar colocar-se a posição de jogador e árbitro, ao mesmo tempo”, sublinhou.
“Era desejável que os deputados Kou Hoi In e Vong Hin Fai repensassem o assuntos da apresentação do projecto, de acordo com o respeito pela independência judicial e considerassem os impactos para a imagem pública da AL”, concluiu.

 

 

Coutinho: “O resultado é sempre a mesma coisa”

“Há muito tempo que a mesa da Assembleia Legislativa já fez circular o sentido de voto”. A crença é do deputado José Pereira Coutinho, que admitiu a mesma ao HM, sobre a proposta que visa impedir que os Tribunais possam verificar se todos os direitos de Sulu Sou foram respeitados no processo de suspensão e eventual perda de mandato. “O resultado é sempre a mesma coisa”, considerou ainda o deputado, que já tinha feito várias críticas ao processo. Sulu Sou acabou por ser suspenso com 28 votos a favor e 4 contra, e Coutinho considerou ainda que o resultado na terça-feira vai ser o mesmo.

15 Jan 2018

Encontrados dois corpos no petroleiro em chamas no Mar do Sul da China

Continua em chamas o navio iraniano intitulado Sanchi, que transportava 136 mil toneladas de petróleo condensado e embateu num cargueiro de Hong Kong. Dois corpos, do grupo de 31 marinheiros a bordo, foram encontrados, numa altura em que prosseguem as operações de resgate. Não se conhecem ainda as consequências ambientais para o Mar do Sul da China

 

[dropcap style≠‘circle’]A[/dropcap]s equipas de emergência resgataram ontem dois corpos que faziam parte do grupo dos 31 marinheiros desaparecidos após um acidente com um petroleiro iraniano que está a arder há uma semana.
Em comunicado, o Ministério dos Transportes da China disse que os cadáveres foram encontrados às 08:40 numa zona do convés do navio Sanchi que não está a ser afectada pelas chamas e à qual foi possível aceder devido à mudança do vento, que afastou o fumo tóxico, permitindo o acesso das equipas de salvamento.
As equipas também tentaram chegar a zonas interiores do navio mas as altas temperaturas não o permitiram.
A China conta com o apoio de unidades japonesas, sul-coreanas e iranianas nas operações de resgate dos 31 marinheiros desaparecidos, 29 iranianos e dois bengalis, após a colisão.
O petroleiro iraniano Sanchi, com 136 mil toneladas de petróleo condensado (um hidrocarboneto ultra-leve usado para produzir gasolina, diesel, jetfuel e combustível de aquecimento) a bordo, pegou fogo a 6 de Janeiro depois de ter colidido com um cargueiro chinês (com bandeira de Hong-Kong). O acidente aconteceu 300 quilómetros a Leste (ao largo) da cidade chinesa de Xangai. O petroleiro, com bandeira do Panamá, estava a ser operado pela National Iranian Tanker Company (NITC), a companhia que gere a frota de petroleiros iranianos. A carga a bordo destinava-se à firma sul-coreana Hanwha Total.
Na sexta-feira a Guarda Costeira do Japão informou que o navio chegou à zona económica exclusiva japonesa na quarta-feira e que um dia depois estava a cerca de 300 quilómetros a noroeste das ilhas Amami, empurrado por ventos fortes.
Inicialmente havia 32 tripulantes desaparecidos mas entretanto foi resgatado um corpo, identificado como um dos iranianos da tripulação.

Nova explosão dificultou resgate

Antes do resgaste destes dois corpos o petroleiro iraniano sofreu uma nova explosão e entrou, à deriva, na zona económica exclusiva do Japão, indicaram as autoridades iranianas e japonesas.
A nova explosão complicou as operações para extinguir as chamas, indicou o director-adjunto para os Assuntos Marítimos da Organização dos Portos iranianos, Hadi Haghshenas. “Se não fosse pela explosão desta manhã, talvez o fogo já tivesse sido extinto”, salientou Haghshenas à rádio-televisão estatal iraniana Irib.
Segundo Hadi Haghshenas, 12 elementos de uma equipa de resgate de elite foram enviados de emergência a partir do Irão. No entanto, ainda estão em Xangai, à espera que as condições meteorológicas lhes permitam chegar ao navio acidentado.
“O petroleiro está à deriva a partir do local do acidente (…) rumo a águas japonesas e encontra-se actualmente a cerca de 135 milhas (cerca de 217 quilómetros) da ilha de Okinawa”, sublinhou o responsável iraniano.
O Japão anunciou ter posto à disposição um navio de patrulha, uma vez que o petroleiro já se encontra na sua zona económica exclusiva, mas o Irão pede que se usem helicópteros e aviões para combater o incêndio.
“Nós oferecemos apoio (…) mas as autoridades chinesas indicaram que iriam gerir o problema sozinhas”, afirmou um porta-voz da guarda fronteiriça japonesa.
Os responsáveis iranianos criticaram a “falta de cooperação” das autoridades chinesas, enquanto o ministério dos Transportes chinês salientou na quinta-feira que a lentidão das operações deve-se às condições meteorológicas “execráveis” e aos gases tóxicos libertados pelo incêndio.
Um porta-voz do ministério chinês dos Negócios Estrangeiros considerou que o seu governo mobilizou um “esforço especial nas operações”.
Trabalhos retomados
As equipas de emergência retomaram na sexta-feira os trabalhos de resgate e extinção do fogo num petroleiro iraniano em chamas ao largo de Xangai, no Mar da China Oriental, interrompidas na quarta-feira devido a uma explosão no navio.
No comunicado das autoridades chinesas não fica claro se foram retomadas as buscas pelos 31 tripulantes ainda desaparecidos, quase todos eles iranianos (com a excepção de dois marinheiros do Bangladesh).
O ministério chinês também não forneceu pormenores sobre a magnitude da explosão registada na quarta-feira, e que obrigou os navios de resgate a recuarem para uma distância segura.
Após a explosão, a Administração Estatal chinesa para os Oceanos informou que um avião de vigilância marinha tinha detectado uma pequena mancha de petróleo perto do lugar do acidente, acrescentando que esta poderia ter origem no petroleiro sinistrado.

Riscos ambientais desconhecidos

O Sanchi, um navio iraniano registado no Panamá, transportava 136 mil toneladas de petróleo condensado (cerca de um milhão de barris). O petróleo condensado é ultraleve e resulta de uma mistura de hidrocarbonetos recuperados durante o processamento do gás natural.
O choque entre o petroleiro iraniano e o cargueiro de Hong-Kong aconteceu no Mar da China Oriental no passado sábado, a 160 milhas (295 quilómetros) a leste do estuário do rio Yangtse, que desagua na cidade de Xangai.
Desconhece-se se já há danos ambientais ou qual poderia ser a magnitude do impacto do afundamento do Sanchi. No entanto, a associação ambientalista Greenpeace alertou que um grande derrame de condensado (usado para produzir gasolina, diesel, jetfuel e combustível para aquecimento) poderia trazer riscos de toxicidade elevada para espécies de grande consumo na China, como a corvina amarela ou a cavala.

15 Jan 2018

USJ | Eric Sautedé exige 1.3 milhões e diz-se vítima do despedimento

O académico Eric Sautedé exige à Universidade de São José 1.3 milhões de patacas no âmbito do seu despedimento. O processo continua pendente desde 2015 e o responsável afirma que a conotação política do caso afastou-o de várias ofertas de emprego

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] despedimento do professor de ciência política Eric Sautedé da Universidade de São José (USJ), em 2014, fez correr muita tinta, mas o livro ainda não chegou ao capítulo final. O académico adiantou ao HM que o processo decorre desde Agosto de 2015 sem que tenha havido qualquer avanço na matéria.

Eric Sautedé, actualmente radicado em Hong Kong, exige 1.3 milhões de patacas à direcção da USJ por danos morais e materiais. “Estou a processá-los por me terem despedido sem justa causa e por, depois disso, terem apresentado inúmeras razões à imprensa. Claro que também os processo por discriminação, com uma natureza política, e por violarem a Lei Básica”, explicou.

Em mais de dois anos, Sautedé e a USJ nunca chegaram a acordo. “Nunca houve um gesto de conciliação da parte da USJ”, adiantou o académico. Sobre este assunto, o reitor da UJS, Peter Stilwell, nada quis dizer ao HM, pelo facto do processo ainda decorrer em tribunal.

Questões delicadas

Outro dos argumentos utilizados por Eric Sautedé prendem-se com o impacto que o caso teve na sua vida profissional, “sobretudo depois de Peter Stilwell ter indicado [que o despedimento] se deveu a razões políticas”.

“Isso eliminou as minhas possibilidades de encontrar outro trabalho. Na verdade duas universidades não me aceitaram apesar de ser altamente recomendado por dois docentes para dar aulas a tempo parcial. Uma delas chegou mesmo a pôr fim ao acordo inicial que tínhamos feito para me contratar para docente a tempo inteiro. Estava apenas à espera do contrato”, frisou.

Em Junho de 2014, o padre e reitor Peter Stilwell confirmava ao jornal Ponto Final a saída de Eric Sautéde. “Trata-se de clarificar as águas. Há um princípio que preside à Igreja de que não intervém no debate político dos locais onde está implementada”.

O contrato chegou ao fim em Julho desse ano e “foi dado como terminado”, sendo que não tinha termo. Contudo, Eric Sautedé considera que tem algo mais a receber.

“Tinha um contrato sem termo, uma vez que sou residente permanente, e fui informado da minha saída com um mês de antecedência, tendo-me sido pago apenas cinco semanas de salário por sete anos de um trabalho respeitável e depois de ter feito o meu papel como cientista político. É por isso que estou a processar a USJ”, apontou.

Nas primeiras declarações que deu sobre o assunto, Peter Stilwell disse que a saída de Eric Sautedé tratou-se de “uma questão interna”, tendo adiantado que “a decisão é da exclusiva responsabilidade da universidade”.

“Se há um docente com uma linha de investigação e intervenção pública [política], coloca-se uma situação delicada. Ou a reitoria pressiona e viola a sua liberdade, ou cada um segue o seu caminho”, referiu Stilwell.

O reitor da USJ esclareceu também que a saída foi o resultado de um “processo longo em que foi dado a entender ao Dr. Éric que a situação era cada vez mais delicada para a universidade”.

“Pode-se estudar os vários sistemas políticos ou a Lei Básica, mas não intervir na actual governação. É uma fronteira difícil de delinear, entre o comentário político e o académico”, frisou Stilwell. “Falamos de um docente que está há sete anos na universidade, não completou o seu doutoramento e está a colocar a universidade numa situação delicada. Temos de ver o modo como a universidade é percepcionada”, concluiu o reitor.

12 Jan 2018

Autocarros | DSAT suspende motoristas contratados a tempo parcial

Depois da tragédia, uma medida: o motorista envolvido no acidente mortal trabalhava a tempo parcial para Nova Era, logo a DSAT suspendeu-os a todos. O caso volta a trazer à baila a falta de mão-de-obra no sector, onde uns são contra e outros a favor da importação de motoristas

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Direcção de Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT) ordenou a suspensão de todos os motoristas de transportes públicos contratados a tempo parcial, devido ao acidente da Rua Xavier Pereira, que envolveu um autocarro da Nova Era.

De acordo com um comunicado ontem divulgado, a DSAT “exigiu à empresa a revisão imediata do seu regime de gestão de segurança em vigor e a apresentação, com a maior brevidade possível, do seu plano de melhoria”.

O organismo, liderado por Lam Hin San, adiantou também que reuniu, “há dias”, com as concessionárias de autocarros, tendo sido debatidas as questões de segurança da circulação.

Ontem, à margem de uma reunião com deputados, o secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo do Rosário, explicou que o motorista do autocarro que causou a morte à idosa de 60 anos estava na profissão há pouco tempo. “A reacção imediata é porque o motorista em concreto estava há pouco tempo e trabalhava em regime parcial. [Isso aconteceu] por causa de uma procura maior, pois, como sabem, transportamos diariamente cada vez mais pessoas.”

O secretário adiantou que, em média, viajam nos autocarros 580 mil pessoas por dia. “Já houve vários dias deste ano em que ultrapassamos as 600 mil pessoas, é uma grande pressão sobre os autocarros e sobre os motoristas de autocarros.”

Raimundo do Rosário garantiu que o próximo objectivo é evitar que novos acidentes deste género venham a acontecer. “É uma questão em que não devemos falar, para dizermos uma coisa e depois as companhias de autocarro dizerem coisas diferentes. Todos temos um objectivo comum que é evitar que estas coisas aconteçam.”

O governante fez também uma sugestão que passa pela realização de uma reunião. “O melhor é a DSAT e as três companhias sentarem-se e encontrarem uma forma de evitar este tipo de incidentes ou pelo menos encontrar uma forma de melhorar a situação.”

Acidentes diminuíram

Dados apontados no comunicado da DSAT revelam que os acidentes de viação envolvendo autocarros até diminuíram em dez por cento o ano passado, tendo-se registado um total de 778 casos. Ainda assim, foi exigido um reforço em termos de segurança. “A DSAT exigiu às companhias de autocarros que tomassem medidas mais apropriadas para reduzir a taxa de ocorrência de acidentes, inclusivamente o reforço da formação dos motoristas, o aumento da sua consciência de segurança da circulação ou a intensificação da fiscalização nos pontos negros.”

Também o secretário alertou ontem para a necessidade de uma melhor formação dos que conduzem os autocarros públicos. “Em geral, conduzir um autocarro é uma grande responsabilidade, porque os autocarros transportam muitas pessoas, são dezenas de pessoas. É uma viatura muito pesada, como sabem e como se viu, ontem, em que não foi o autocarro que bateu directamente na senhora. Mas os motoristas dos autocarros têm de ser experientes, profissionais, bem formados.”

“Menos experiência e dedicação”

Em declarações ao HM, o deputado José Pereira Coutinho congratulou-se com a medida adoptada pela DSAT. Isto porque “a segurança está em primeiro lugar e é preciso rever toda a situação, introduzindo medidas para evitar que casos semelhantes voltem a acontecer”.

“Mais vale prevenir do que estar a remediar. Acho que os condutores a tempo parcial têm menos experiência e dedicação, porque tão depressa podem estar a conduzir como a amassar pão nas pastelarias”, referiu.

O deputado e presidente da Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau alerta também para as condições especiais de condução no território, sendo, por isso, exigida uma maior experiência.

“Há de facto questões levantadas por se permitir uma tamanha responsabilidade para condutores sem experiência. Uma pessoa com uma carta nova sente dificuldades em conduzir em Macau devido à estreiteza das ruas, à alta densidade populacional e carros e pelo facto de não haver muito respeito pelas regras de trânsito. Tudo isto somado faz com que a experiência conte muito, principalmente nos transportes públicos.”

A falta que o motorista faz

José Pereira Coutinho lembra, contudo, que a suspensão dos motoristas a tempo parcial levanta uma outra questão: a necessidade de contratação de profissionais no exterior. “A questão crucial tem a ver com o facto de em Macau haver falta de condutor de autocarros. Esta é uma questão velha que tem vindo a ser debatida na Assembleia Legislativa.”

Para Pereira Coutinho, “importar condutores seria uma solução, mas não é do agrado das pessoas do sector”. Isto porque poderia haver o risco da queda dos salários, que actualmente se situam entre as 20 e 30 mil patacas. “Como se sabe os não-residentes têm menos garantias, porque muitos não recebem o salário na totalidade que é repartido com as agências de emprego. São autênticos sanguessugas. Era preciso evitar essas questões antes de se pensar em importar não-residentes. Isto acaba por afectar os salários dos condutores locais”, apontou.

Por sua vez, o ex-deputado Lau Veng Seng prefere ser prudente quanto a este tema. “É importante não nos precipitarmos para qualquer conclusão só por causa do acidente de ontem. Contudo, um estudo credível sobre o número de condutores experientes e formados em Macau é necessário para olharmos de forma mais detalhadas sobre o condutores necessários para assumirem estas posições.”

Lau Veng Seng, que deixou o hemiciclo o ano passado, lembrou que já vários estudos revelaram que há poucos jovens a conduzir autocarros públicos. E assume que é preciso importar trabalhadores para este sector.

“Para reduzir a idade dos condutores temos de assumir duas posturas: a primeira é tentar atrair condutores mais jovens para trabalhar neste sector; o segundo é reconhecer que temos falta de condutores e que é necessários importar do exterior condutores.”

Apesar de considerar que a contratação de pessoas a tempo parcial para conduzirem autocarros “é uma forma de lidar com o problema”, Lau Veng Seng defendeu mais formação para aprender a conduzir este tipo de transporte público. “No passado já se tinha falado na possibilidade de importar motoristas para veículos pesados, mas temos de ter em consideração que a forma de conduzir e os hábitos locais também exigem uma certa formação. É preciso fornecer formações”, rematou.

 

 

“Suspensão dos condutores não resolve o problema”

Chiang Wa Cheong, representante da Associação Geral dos Operários de Autocarros de Macau, referiu que a suspensão dos condutores a tempo parcial não resolve o problema, tendo defendido mais tempo para que se apurem causas e responsabilidades.

“Os acidentes acontecem muitas vezes por negligência, não há intenção. Os acidentes acontecem com os condutores com ambos os condutores, os a tempo inteiro e parcial.”

Além disso, “os condutores a tempo parcial são necessários, sobretudo nas horas de ponta”, defendeu. “Ninguém quer que ocorram acidentes rodoviários, que dependem das condições rodoviárias como se há muitas pessoas ou veículos nas estradas, assim como outros factores”, disse Chiang Wa Cheong

Tal como alertou o deputado José Pereira Coutinho, Chiang Wa Cheong é uma das vozes que se mostra contra a contratação de novos motoristas ao exterior. “Os condutores já têm recursos ou treinos suficientes, não é preciso importar condutores do exterior.” Este considera que motoristas vindos do exterior poderiam piorar o nível de condução, por não conhecerem o território e a rede de tráfego.

Chiang Wa Cheong afirmou que 30 condutores da Nova Era, que trabalhavam a tempo parcial, ficaram suspensos, mas não conhece os números relativos às restantes operadoras.

No caso destes motoristas decidirem protestar contra a decisão do Governo, tudo terá de ser ponderado. “Temos de falar com os condutores sobre as solicitações”, concluiu o responsável.

12 Jan 2018

Habitação | Governo quer candidatos à habitação social maiores de 23 anos

A discussão na especialidade do regime jurídico da habitação social originou um debate aceso entre membros do Governo e deputados. Em questão esteve a idade mínima para as candidaturas ao benefício em questão. Executivo fixou em 23 anos, limite que deixa muitas dúvidas aos deputados

 

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m pouco por todo o mundo a maioridade, no que toca a direitos e deveres, é definida entre os 18 e os 21 anos. Por cá, o Executivo pretende que a idade mínima do candidato à habitação social enquanto membro de agregado familiar passe de 18 para 23 anos.

De acordo com Ho Ion Sang, presidente da comissão permanente que discute na especialidade a lei que regula a matéria, os membros do Governo justificaram o aumento da idade por questões de “utilização racional de recursos e para evitar abusos na habitação social”. Uma das razões do Executivo prende-se com jovens que se candidatam durante o início do ensino superior, quando ainda não têm rendimentos, mas que quando as fracções ficam disponíveis já não se encontram em situação de carência económica.

Porém, os argumentos do Governo não convenceram os legisladores. “O aumento da idade suscitou dúvidas entre os deputados, tanto aqui na comissão como em plenário aquando da aprovação na generalidade, além disso, há pessoas entre os 18 e 23 anos e isso cria um tratamento injusto e pode gerar discriminação”, explica Ho Ion Sang.

Este artigo motivou um “debate aceso”, de acordo com o presidente da 1ª comissão permanente, que acrescentou ainda que “os 18 anos são o critério normal de maioridade”. É a idade em que a pessoa “tem a capacidade plena do exercício dos seus direitos, é uma idade padrão”. Ho Ion Sang revelou que a comissão a que preside analisou este “critério sobre a perspectiva do direito comparado”, nomeadamente os casos de Portugal, Hong Long e Taiwan.

Esgrima de assessores

A discórdia entre legisladores e membros do Governo chegou ao ponto da decisão quanto ao requisito da idade ter sido adiada para o fim dos trabalhos em especialidade. “Vamos suspender este ponto e continuar na próxima reunião a ver os outros artigos. Após uma manhã a debater, os senhores deputados ficaram a saber das nossas razões e nós ficámos a saber as deles e no fim voltaremos outra vez a este artigo”, revelou Raimundo do Rosário à saída da reunião.

Outra questão de critério que originou esgrima de argumentos prendeu-se com a eliminação do texto da proposta de lei da necessidade do candidato ter residido sete anos em Macau, um critério redundante uma vez que só se podem candidatar residentes permanentes.

Outra questão controversa prende-se com regras, como a tipologia e área das fracções, que de acordo com a proposta de lei devem ser definidas por regulamento administrativo. Neste capítulo, Ho Ion Sang revelou que é um assunto que está a “ser discutido nas reuniões técnicas entre as assessorias das duas partes”. A prioridade dos deputados é defender a coerência de hierarquia de normas jurídicas e a concordância com a Lei Básica.

Raimundo do Rosário mantém-se inflexível quanto a esta matéria. “A nossa posição em relação à tipologia e área das fracções, que acho que está mais ou menos ultrapassada, é que deve ficar para regulamento administrativo”, comenta o secretário.

O membro do Governo entende que alguns deputados confundem habitação económica e social. “Eu vim para esta reunião e nem sequer trouxe uma cópia da lei da habitação económica, são duas coisas completamente diferentes”, revela.

Raimundo do Rosário entende que como a habitação social é um benefício social dado pelo Governo, deve ser o próprio Governo a regular administrativamente os detalhes, como as áreas das fracções.

12 Jan 2018

Caso Sulu Sou | Vong Hin Fai e Kou Hoi In negam competências a tribunais

Deputados apresentaram proposta a reforçar que os tribunais não têm competência para verificar legalidade dos processos de suspensão e perda de mandatos. Leonel Alves afirma que proposta parece um “acto de nervosismo” e diz que a Assembleia está a querer substituir-se aos tribunais

 

[dropcap style≠’circle’]V[/dropcap]ong Hin Fai e Kou Hoi In apresentaram uma proposta para declarar que a Assembleia Legislativa não reconhece aos tribunais poderes para verificar se os procedimentos legais foram cumpridos no processo de suspensão de Sulu Sou. A proposta inclui todos os procedimentos de suspensão e perda de mandatos no futuro e desde 1999 e foi apresentada na quarta-feira. A votação em Plenário vai decorrer na terça-feira, ou seja, no mesmo dia em que começa o julgamento de Sulu Sou.

“A presente resolução vem confirmar que as deliberações do Plenário que sejam relativas à suspensão ou perda do mandato de um deputado são actos de natureza política, que estão excluídos do contencioso administrativo, fiscal e aduaneiro, sendo que estas mesmas deliberações não podem ser também sujeitas ao regime de suspensão de eficácia de actos administrativo”, pode ler-se na nota justificativa.

O projecto de resolução assinado pelos deputados, que se mostraram incontactáveis ao longo de ontem, foi entregue um dia antes do prazo definido para a Assembleia Legislativa responder ao recurso entregue por Sulu Sou no Tribunal de Segunda Instância. O deputado democrata pediu ao tribunal que analise se todos os procedimentos legais foram cumprido no processo que conduziu à sua suspensão.

Os deputados Kou Hoi In e Vong Hin Fai são o presidente e secretário, respectivamente, da Comissão de Regimento e Mandatos, que optou por não emitir uma opinião sobre se Sulu Sou devia ser suspenso. Uma posição contestada na altura pelo deputado José Pereira Coutinho, que considerou que a comissão não cumpriu com as suas competências. Contudo, a proposta de resolução, e ao contrário das leis, só produz efeitos interno, ou seja, vincula a Assembleia Legislativa, mas não os externos, como os tribunais o Governo.

“Acto de nervosismo”

Em declarações ao HM, o advogado e ex-deputado, Leonel Alves, considerou que com esta proposta a Assembleia Legislativa está a substituir-se aos tribunais: “Essa resolução significa que a Assembleia substituiu o tribunal. O tribunal é que deve pronunciar-se se esses actos são sindicáveis. Não deve ser a Assembleia, num gesto que parece uma espécie de autodefesa prévia, a dizer que os actos são de natureza política logo são insusceptíveis de sindicância”, explicou Leonel Alves.

Por outro lado, o advogado recordou a separação de poderes vigente em Macau e definiu o acto como pressão sobre os tribunais: “Nós temos três poderes [Executivo, Legislativa e Judiciário], não seria muito cordial o próprio órgão que tomou a decisão pronunciar-se sobre este assunto, devia ser relegado para os órgãos judiciais. Indirectamente, esta proposta exerce uma pressão sobre os tribunais”, começou por dizer sobre este aspecto. “A proposta não impede o juiz de apreciar a questão, mas influencia a apreciação do tribunal, se ele for susceptível a estas influências”, acrescentou.

Leonel Alves revelou igualmente dificuldades para encontrar uma justificação para a proposta: “Parece-me um acto de nervosismo”, disse. “Se estivesse na Assembleia Legislativa votaria contra. Não faz qualquer tipo de sentido”, concluiu.

12 Jan 2018