Covid-19 | Isolamento passa para 21 dias e código prevê novas obrigatoriedades

O período de quarentena obrigatória foi alargado de 14 para 21 dias, para quem vem de territórios de alto risco. Entre as novas medidas de combate à pandemia, está ainda a obrigatoriedade de preencher o código de saúde com dados adicionais a partir de 7 de Janeiro de 2021

 

Quando no passado dia 21 de Dezembro foi convocada uma conferência de imprensa de urgência por parte do Centro de Coordenação de Contingência do Novo Tipo de Coronavírus, chegou a temer-se que a ocasião serviria para comunicar um novo caso de covid-19 em Macau. No entanto, não foi isso que aconteceu.

Ao invés, e depois de assegurar que não há registo de novos casos no território, Alvis Lo, médico adjunto da Direcção do CHCSJ, anunciou que, a partir das 22h00 desse mesmo dia, o período de quarentena obrigatória seria alargado de 14 para 21 dias, para quem chega a Macau proveniente do exterior, à excepção do Interior da China e Taiwan.

A justificação para a implementação da nova medida baseou-se no aparecimento da nova estirpe do vírus detectada no Reino Unido, considerada “mais contagiosa” e “nos casos confirmados em diversos locais, depois de cumpridos 14 dias de observação médica”.

Se para quem vem do exterior, o isolamento obrigatório foi alargado em sete dias, a quarentena para os que chegam de Taiwan continua a ser de 14 dias, ficando também inalterada a dispensa de qualquer quarentena para quem vem do Interior da China, à excepção das zonas do país consideradas de alto risco.

Contudo, mesmo para quem chega do Interior da China, Taiwan e Hong Kong há novas restrições. Isto porque a partir da meia-noite do dia 23 de Dezembro foi decretada em Boletim Oficial (BO), a proibição de entrada em Macau, de todos os residentes do Interior da China, Taiwan e Hong Kong “que nos 21 dias anteriores à sua entrada tenham visitado países ou regiões fora da China”.

Também em BO, passou a estar previsto que os não residentes que não possuem residência no Interior da China, Hong Kong ou Taiwan possam entrar em Macau “em casos excepcionais de reagrupamento familiar ou de relacionamento estreito com a RAEM”, desde que nos 21 dias anteriores tenham permanecido na China continental e tenham sido “previamente autorizados pela autoridade sanitária”.

Conta-me por onde andas

Na passada quarta-feira foi ainda anunciado pelos Serviços de Saúde (SS) a obrigatoriedade de partilhar dados adicionais por parte dos residentes, aquando do preenchimento do código de saúde.

A informação adicional deve ser preenchida no código de saúde obrigatoriamente a partir de 7 de Janeiro, sendo que quem não cumprir as novas directivas pode incorrer numa pena de prisão até seis meses ou numa multa até 60 dias, por infringir o artigo 10.º da “Lei de prevenção, controlo e tratamento de doenças transmissíveis”.

De acordo com um comunicado oficial, a médica Leong Iek Hou revelou que os utilizadores podem fazer a inscrição dos respectivos endereços, através do preenchimento do campo relativo ao “Local de residência habitual em Macau” (destinado aos residentes) ou através do campo “Local onde exerce a sua actividade mais frequente em Macau” (destinado aos não residentes).

O objectivo passa por optimizar o plano de controlo e prevenção da epidemia por zonas e categorias para, em caso de ocorrência de uma situação epidémica em Macau, a conversão de cor do código de saúde seja efectuada rapidamente.

Máscaras | Nova ronda começa hoje

Começa hoje o 25.º plano de fornecimento de máscaras. As máscaras poderão ser adquiridas até ao próximo dia 26 de Janeiro de 2021 e as regras são semelhantes à ronda anterior, ou seja, cada pessoa pode comprar 30 máscaras com um custo de 24 patacas, mediante a apresentação de identificação. Para as crianças entre os 3 e os 8 anos podem ser adquiridas 30 máscaras infantis ou, em alternativa, 15 máscaras de criança e 15 máscaras de adulto ou 30 máscaras de adulto.

Pequim | Quarentena alargada a outros locais

A partir do meio-dia de ontem todos os indivíduos que nos 14 dias anteriores à entrada em Macau tenham estado nas vilas de Nanfaxin e Gaoliying ou no Subdistrito de Shengli, do Distrito de Shunyi, em Pequim, passam a ter de fazer quarentena de 14 dias nos locais designados pelos Serviços de Saúde. A medida foi revelada ontem pelo Centro de Coordenação de Contingência do Novo Tipo de Coronavírus. Além de Pequim, estão ainda obrigados a fazer quarentena os indivíduos provenientes de algumas localidades da cidade de Liaoning, da província de Heilongjiang, da Região Autónoma de Xinjiang-Uigur, da Província de Sichuan e da Região Autónoma da Mongólia Interior.

28 Dez 2020

Turismo | Helena de Senna Fernandes confiante nas entradas na passagem de ano

Tendo em conta comentários na internet, a directora dos Serviços de Turismo acredita que, apesar do cancelamento de celebrações como o fogo de artifício, os turistas consideram que esta é uma boa época para vir para Macau. Já no mês de Novembro o território registou um aumento de visitantes

 

O fogo de artifício foi cancelado, mas a directora dos Serviços de Turismo (DST) acredita que ainda assim os visitantes venham a Macau na passagem de ano, noticiou a TDM Canal Macau. Em causa estão interacções na internet sobre o território.

“Há algumas pessoas a dizer na internet e que estão a fazer o ‘sharing’ que de facto esta é uma boa época para vir a Macau. Embora não tenha fogo de artifício, tem outras actividades como o festival das compras, e os hotéis neste momento estão a fazer boas ofertas para os nossos visitantes”, disse Helena de Senna Fernandes. A responsável frisou ainda que muitas pessoas vêm a Macau mais de um dia, pernoitando por mais de uma noite. “Temos de continuar a fazer mais trabalho, mas mesmo assim é um bom sinal”, reflectiu.

Durante os feriados de Natal entraram em Macau mais de 50 mil pessoas, 24 mil das quais no dia 24 de Dezembro. A directora da DST esperava que os números dos dias seguintes fossem semelhantes, destacando os resultados obtidos pela indústria hoteleira. “A taxa de ocupação dos hotéis está muito boa, agora. Alguns hotéis atingiram 80 por cento de ocupação, outros ainda mais do que isso”, comentou.

Helena de Senna Fernandes apontou o plano de promoção de larga escala que tem como alvo os turistas do Continente como algo para continuar no próximo ano, por ser “muito positivo para o turismo”. Entre as medidas, estão ofertas especiais para hotéis, cupões de consumo, bem como descontos em bilhetes de avião.

Melhorias em Novembro

No mês passado chegaram a Macau 636.351 visitantes, o que representa um decréscimo de 78,1 por cento, em termos anuais. Ainda assim, este número traduz uma subida de 9,3 por cento em comparação a Outubro de 2020. A Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC) comunicou que os visitantes ficaram mais meio dia, em termos anuais, com um tempo médio de permanência de 1,7 dias.

A maioria dos visitantes veio da China Continental, mais de metade das cidades da Grande Baía. Seguiram-se visitantes de Hong Kong e de Taiwan. As Portas do Cerco foram a via preferida de entrada no território. Chegaram por meios aéreos e marítimos, 25.206 e 13.100 visitantes, respectivamente.

A DSEC apontou ainda que entre Janeiro e Novembro entraram no território 5,237 milhões de visitantes, menos 85,6 por cento, face ao período homólogo de 2019.

28 Dez 2020

Governo assina acordo com o China Media Group

Assinatura do acordo-quadro prevê colaboração entre as partes em conteúdos diversos. Na cerimónia, que ficou marcada pelo início da rodagem do documentário “Aerial China Macau”, Ho Iat Seng sublinhou a importância da iniciativa para a imagem “distintiva” do território

 

O Governo de Macau assinou no sábado um acordo-quadro com o China Media Group para aprofundar a cooperação estratégica e colaboração na criação de conteúdos noticiosos, transmissão de actividades desportivas, telenovelas, documentários e programas culturais.

Durante a celebração do acordo, o Chefe do Executivo Ho Iat Seng começou por frisar que a iniciativa irá contribuir para a “integração de Macau no desenvolvimento nacional” e optimizar “o bem-estar da população”, pode ler-se num comunicado oficial.

Após a assinatura do acordo, Ho Iat Seng juntou-se ao vice-ministro do departamento de propaganda do comité central do Partido Comunista Chinês, ao presidente e editor-chefe do China Media Group, Shen Haixiong, e ao subdirector do Gabinete de Ligação do Governo Central, Zhang Rongshun, para assistir ao início da rodagem do documentário “Aerial China Macau”, o primeiro projecto de cooperação previsto na iniciativa.

Afirmando que Macau é, muito provavelmente, o lugar com a área mais reduzida a ser filmado, desde que a série “Aerial China” começou, Ho lembrou as palavras de Xi Jingping, quando afirmou que Macau “tem alcançado grandes conquistas nos últimos vinte anos, desde o seu retorno à pátria, sem que a sua área geográfica reduzida tenha impedido de tornar-se próspera, possante, sadia e bonita”.

O Chefe do Executivo sublinhou ainda esperar que a gravação do documentário contribua para “a divulgação ao mundo da imagem distintiva de Macau enquanto cidade ‘pequena mas bonita’, permitindo que mais pessoas conheçam o seu elevado grau de abertura ao exterior e de inclusão”, assim como a “vitalidade” do princípio “Um País, Dois Sistemas”.

Em termos de gastronomia, Ho Iat Seng acrescentou que Macau é a terceira Cidade Criativa da UNESCO em toda a China e que o programa “O Sabor de Macau”, “poderá destacar as características de Macau, decorrentes da coexistência de diversas culturas do mundo no seu território”.

Ao jornal Ou Mun, Kevin Ho, empresário, e accionista do grupo português Global Media é também da opinião que a materialização das iniciativas previstas no acordo vão contribuir para “aumentar a atractividade e a boa imagem de Macau” e lembrou que, no ano passado, como prenda de aniversário pelo 20.º aniversário da RAEM, foi lançado o canal desportivo da CCTV no território. Segundo o empresário, esse facto reflecte a “postura positiva” da China em relação a Macau.

A todo o gás

Também no sábado, Ho Iat Seng e Shen Haixiong assistiram à cerimónia de lançamento da lista de competições que o Executivo e o China Media Group vão organizar em 2021, bem como o início da segunda temporada do Top Speed China, cuja derradeira prova acontece no território.

Sobre a competição automobilística, que combina desporto, tecnologia informática, cultura e criatividade, o Chefe do Executivo frisou que o Governo continuará a colaborar com o China Media Group para “aumentar os canais de desporto” e apoiar a diversificação económica de Macau.

28 Dez 2020

Covid-19 | Macau aumenta período de quarentena obrigatória de 14 para 21 dias

Macau decidiu aumentar a partir de hoje o período de quarentena obrigatória de 14 para 21 dias às pessoas que cheguem oriundos de territórios considerados de elevado risco de transmissão do novo coronavírus.

“A nível mundial (…), após 14 dias houve novas transmissões e vamos por isso reforçar as medidas de quarentena”, justificou o médico Lo Iek Long, dos Serviços de Saúde, em conferência de imprensa.

A medida exclui as pessoas que chegam a Macau de locais identificados como de risco moderado na China continental e em Taiwan e inclui aquelas provenientes do Reino Unido e da região administrativa especial chinesa vizinha, Hong Kong, destacou.

No Reino Unido foi identificada uma variante mais contagiosa do novo coronavírus, que provoca a doença covid-19. “Esta nova variante tem uma transmissibilidade de mais 70%”, salientou Lo Iek Long, frisando que o objetivo das autoridades é de garantir a saúde pública dos residentes de Macau e minimizar os riscos de transmissão.

Macau não regista qualquer caso há quase seis meses, tendo sido dos primeiros territórios a ser atingido pela pandemia, em finais de janeiro. No total identificou apenas 46 contágios e nenhum surto local.

A pandemia de covid-19 provocou pelo menos 1.685.785 mortos resultantes de mais de 76,2 milhões de casos de infeção em todo o mundo, segundo um balanço feito pela agência de notícias France-Presse (AFP).

21 Dez 2020

RAEM, 21 anos | Jorge Rangel, presidente do Instituto Internacional de Macau: “O maior valor de Macau é o seu legado”

Ex-secretário adjunto de Rocha Vieira, Jorge Rangel assumiu vários dossiers e por pouco um problema de saúde não o afastou do cargo antes da transferência de soberania. 21 anos depois, Jorge Rangel defende um novo modelo de desenvolvimento para o território que não dependa tanto do jogo e acredita que deve existir equilíbrio na implementação da educação patriótica

 

Que análise faz à RAEM 21 anos depois da transição?

Sendo sempre fácil identificar insuficiências e até apontar naturais desvios, creio ser justo reconhecer que, em larga medida, os compromissos assumidos no acordo firmado em 1987, na Declaração Conjunta, foram cumpridos e o território conheceu períodos de crescente prosperidade. Houve, é certo, alguns graves acidentes de percurso.

Tais como?

Falo dos casos de corrupção que ganharam notória repercussão, mas esses percalços foram resolvidos pela via judicial, constituindo um teste à capacidade de resposta do sistema instituído, mesmo sabendo que nem todos terão concordado com a forma como alguns dos problemas criados foram resolvidos. Foram, entretanto, atribuídas à RAEM especiais responsabilidades.

Fala do seu papel de plataforma com a China…

E também da articulação de Macau com a iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota” e como centro mundial de turismo e lazer. Foram, igualmente, definidos novos percursos com vista à sua progressiva integração na Grande Baía Guangdong – Hong Kong – Macau. Estávamos precisamente nesta fase do desenvolvimento da RAEM, com a ilha vizinha de Hengqin em rápida transformação para servir este propósito, quando a pandemia impôs uma pausa, que pode e deve ser muito bem aproveitada para repensar os objectivos imediatos e as estratégias de médio e longo prazo.

A pandemia obrigou Macau a olhar-se de uma outra forma? Qual o caminho para recuperar de uma crise desta dimensão?

Claro que sim. A receita global, proveniente do jogo, fazia acreditar que o seu desenvolvimento seria linear e sempre continuado, à medida que as autoridades fossem permitindo a entrada de mais e mais visitantes do continente, criando emprego, mas também recorrendo mais e mais a mão-de-obra importada. Cheguei a expressar uma opinião sobre a vulnerabilidade do nosso modelo de desenvolvimento, dependente das receitas dos casinos. Disse que, numa situação de crise, como por exemplo um grave problema de saúde que tornasse imperativo o fecho das fronteiras, o nosso modelo seria, inevitavelmente, posto em causa e iria obrigar a um lúcido redimensionamento e a uma redefinição das prioridades. Há lições penosas que importa extrair e sobre elas, com coragem, repensar metas e ritmos de crescimento. E fazer incidir uma atenção maior na população.

Defende então um maior equilíbrio ao nível do turismo.

Os casinos e o turismo devem existir para servir os interesses da população e nunca o contrário. É imprescindível conseguir um muito maior equilíbrio. É estulto e estúpido o propósito primário de trazer mais e mais visitantes todos os anos. Em tudo há um limite e nós já ultrapassámos o nosso, até porque o nosso espaço é exíguo e a sustentabilidade do território depende mais da qualidade desse turismo do que do número de visitantes. Oxalá a pandemia nos permita repensar e redimensionar o nosso modelo de desenvolvimento, até porque o Chefe do Executivo, atento aos insistentes apelos das autoridades centrais, quer apostar numa maior e bem necessária diversificação.

Mas não haverá limitações a essa diversificação?

Ela é possível, havendo que apostar nas mais-valias do território, que vão da cultura e do património a um turismo de qualidade, muito mais selectivo e benéfico para a economia local. [Há também que apostar] nas indústrias, com as mais avançadas tecnologias e a inteligência artificial, com o suporte das universidades e dos seus centros de estudos e investigação. Temos também a área das finanças, assumindo alguns dos propósitos de maior utilização da moeda chinesa no exterior. E é preciso ter uma noção clara e realista dos nossos limites de espaço e dos nossos condicionalismos geográficos, sociais e políticos, em conjunturas nem sempre favoráveis. Haverá que ter em conta também as vantagens e os óbices que resultam da progressiva e, provavelmente, irreversível integração no projecto da Grande Baía, adoptando uma posição pró-activa mais consistente e consequente.

Que análise faz da governação de Ho Iat Seng?

Este, que é o seu primeiro ano em funções, foi imensamente prejudicado pela pandemia. Por isso não será possível fazer uma apreciação justa da sua governação em relação às linhas de acção que foram aprovadas e não inteiramente realizáveis. Mas podemos avaliar muito positivamente o esforço assumido para conter a pandemia e proteger a população dos seus nefastos efeitos. Houve liderança e sentido de missão. E as suas preocupações, desde o início, com a contenção nos gastos, a utilização correcta dos fundos públicos e contra o “despesismo” são de louvar.

Qual foi, para si, o melhor e o pior momento da transição de Macau?

Tutelei o Gabinete das Cerimónias e fui designado pelo Governador para acompanhar os assuntos da transição, trabalhando com a comissão preparatória e acompanhando o futuro Chefe do Executivo até ele tomar posse. E, no âmbito da Administração Pública, que era uma das áreas da minha responsabilidade, acompanhei de perto os processos de formação e “localização” de quadros, bem como os de integração e de ingresso nos quadros da República Portuguesa. Foram processos de particular complexidade. Também acompanhei os trabalhos do Grupo de Ligação e estive em reuniões da comissão interministerial sobre os assuntos de Macau. Estava em Hong Kong no âmbito de uma intervenção cirúrgica para remoção de um tumor, que me poderia ter impedido de continuar em funções governativas num tempo de grande exigência e intensa participação, quando tudo era urgente. Estava preparado para solicitar a minha dispensa e substituição, receando já não poder corresponder, quando recebi a visita do Governador.

Mas continuou no Executivo.

Na opinião da minha família deveria pedir ao Governador que autorizasse a minha saída, mas ele trazia-me uma pasta cheia de novas responsabilidades que acabei por aceitar, ficando em funções até ao último dia. Foi o fim de um tempo de Portugal e também o fim definitivo do meu exercício de funções públicas.

Mas houve bons momentos.

Foram muitos, e incluem a forma empenhada como o Gabinete das cerimónias funcionou, cumprindo exemplarmente uma missão, em nome de Portugal, e a forma como, indo até onde era possível no pouco tempo que nos restava, a conclusão do processo de “localização” de quadros, viabilizando uma transferência suave da administração.

E os maus momentos?

Se ainda vale a pena falar deles, recordo algumas incompreensões que rodearam o tratamento de vários processos que dependiam das autoridades nacionais e as questões políticas que condicionaram o diálogo, e o andamento célere e correcto de assuntos que requeriam urgência, a qual nem sempre foi correspondida. Mas isso já é passado e deixou de ter interesse para mim.

A transferência da soberania esteve envolvida em algumas polémicas. Acha que está na altura de encerrar definitivamente o passado?

Quem viveu aqueles acontecimentos não os esquecerá jamais. As polémicas a que se refere ganharam dimensão pelas motivações políticas que as estimularam. Sobre elas já muito foi dito, embora algo possa ter ficado por contar, nomeadamente sobre os bastidores e a intriga política que sempre existiu e existirá e que se agrava enormemente nos períodos de mudança histórica. É minha convicção que, com todas as dificuldades e incompreensões que rodearam o processo de transição, se cumpriu da melhor maneira possível a missão que aceitámos e que exigiu de nós tudo quanto lhe pudemos dar. Trabalhei com os seis últimos governadores de Macau. Pude ver, comparar e entender as motivações de cada um, até pela relação de grande proximidade e confiança que pude manter com quase todos. Sei que quiseram fazer o melhor em nome de Portugal. Mas nenhum se livrou de polémicas, que existem sempre no decurso da acção governativa, naturalmente surgidas ou intencionalmente provocadas.

Considera que há hoje uma tentativa de apagar o passado colonial por parte de algumas personalidades de Macau? É necessário reforçar esse aspecto para a manutenção da identidade de Macau?

São ainda vozes pouco generalizadas e que não tiveram grande eco, mas vão surgir, inevitavelmente, mais. Aliás, é bom lembrar que, nos próprios dias 19 e 20 de Dezembro de 1999, já em alguns organismos locais eram defendidas mudanças maiores, além de ali festejarem entusiasticamente (leia-se “patrioticamente”) a mudança.

Porque é que essas ideias não avançaram?

Foi o pragmatismo das autoridades centrais que foi sempre travando alguns ímpetos maiores, como acontecera no período da Revolução Cultural, de muito má memória cá fora e, sobretudo, lá dentro, pela forma como atingiu muitos milhões de pessoas. Convém também lembrar que, mais do que a sociedade civil chinesa tradicional de Macau, foram as autoridades centrais que quiseram que à RAEM fosse cometida a responsabilidade de se assumir como plataforma de cooperação com os países de língua portuguesa e que múltiplas iniciativas tivessem sido realizadas neste domínio. Cabe às instituições de matriz portuguesa e a muitas outras entretanto criadas continuar a defender a singularidade de Macau, porque o seu real valor é caracterizado pela sua diferença, mesmo no contexto da Grande Baía.

O que pensa do projecto actual da Escola Portuguesa de Macau (EPM) e da educação de matriz portuguesa?

Acompanhei de perto o processo de criação da EPM, como membro do Governo responsável pela educação, ainda antes da decisão final tomada pelo Estado Português, que escolheu um modelo diferente daquele que havíamos defendido. Já estávamos a prepará-la e a fazer ensaios e estudos sobre o seu papel e dimensão. Tomada a decisão, embora não tivesse deixado de oferecer as minhas opiniões, que apontavam para um maior envolvimento, desde o início, das instituições de matriz portuguesa e do Governo de Macau, abrindo-se o caminho para a participação da própria RAEM no apoio ao seu funcionamento, apostámos na sua criação segundo o modelo escolhido. Fiquei desligado dela [da EPM] durante muito tempo e voltei a acompanhar mais de perto o seu funcionamento, como membro do Conselho de Curadores da Fundação da EPM. A minha participação será, contudo, transitória.

Mesmo com todas as mudanças que já ocorreram, considera a EPM um projecto importante.

Sempre considerei a EPM a instituição mais relevante para garantir a permanência de portugueses e um bom ensino em língua veicular portuguesa, além de promover a difusão da língua e da cultura, podendo ainda contribuir seguramente para a viabilização do preceito da Lei Básica que atribui à língua portuguesa o estatuto de língua oficial. Espero que, com base na experiência feita, os seus responsáveis, através de um diálogo que se deseja amplo com as entidades financiadoras e todas as outras que têm um papel a desempenhar no seu regular funcionamento e nas experiências pedagógicas ensaiadas, encontrem para ela o melhor modelo de gestão e que os seus planos curriculares sejam consentâneos com a realidade presente, como escola portuguesa no estrangeiro e, simultaneamente, como estabelecimento de ensino particular da RAEM.

Mas, no que diz respeito ao ensino do português, há ainda outras entidades. Qual a estratégia a adoptar para elas?

O Instituto Português do Oriente deve também merecer a continuada atenção das autoridades para que possa cumprir bem a sua relevante missão, em articulação com o Camões – Instituto para a Língua e Cooperação. Quanto ao Jardim de Infância D. José da Costa Nunes e outras escolas e centros de formação onde a língua portuguesa é ensinada, importa, igualmente, assegurar-lhes a colaboração necessária e contribuir para que lhe sejam garantidos os meios adequados ao seu regular funcionamento. Creio que, no âmbito dos Serviços de Educação e Juventude da RAEM, é possível e desejável ir ainda mais longe, mas esta é matéria que já transcende o âmbito da pergunta feita.

Preocupa-o a aposta crescente na educação patriótica?

Macau é uma região chinesa com um estatuto especial transitório. É apenas natural que as autoridades, quer centrais, quer locais, se preocupem com a educação patriótica, mas, exactamente por causa deste estatuto especial que ainda deverá vigorar, oficialmente, por mais quase 30 anos, é bom que haja um sentido de equilíbrio e muita lucidez na forma como essa educação é ministrada. Os programas e textos de apoio não devem, a meu ver, ser simplesmente transpostos duma realidade diferente, mas sim adequadamente adaptados, sob pena de se tornarem ineficazes. O amor à Pátria sempre foi um valor naturalmente assimilado e convictamente assumido. Pode até ser estimulado e cultivado, mas nunca imposto. Quem não perceber isto, não deve estar a perceber nada do que tem a ver com o presente e o futuro da RAEM.

Como perspectiva o futuro da RAEM?

Faltam quase 30 anos [para 2049]. Parece muito tempo, mas, na realidade, nem o é, já que estes vinte, desde a transferência da administração, passaram assaz vertiginosamente. Podemos perspectivar o porvir através dos planos de desenvolvimento aprovados ao longo da última década e meia, primeiro para o Delta do Rio das Pérolas, e, logo a seguir, a sua articulação crescente e interligação regional, para culminar agora no ambicioso projecto da Grande Baía. Esses planos apontam metas para 2022 e para 2035, prazo fixado para a sua conclusão. As coordenadas do desenvolvimento de Macau estão ali claramente delineadas, através do plano sectorial elaborado pelo Governo da RAEM, o qual merece mais ampla difusão, para que todos possam tomar conhecimento do que está verdadeiramente em preparação. Executado o plano da Grande Baía, entrará certamente em vigor um plano que estabelecerá as linhas mestras da integração definitiva.

Mas, no contexto da Grande Baía, Macau deverá ser um território único.

O que devemos desejar é que haja sempre clarividência para se entender que o maior valor de Macau reside no seu legado de séculos. A sua diferença é a marca da sua singularidade e só a manutenção da sua singularidade garantirá a utilidade da sua participação e da sua integração em condições que ainda estão por definir e podem, por isso, depender ainda da nossa legítima intervenção, em nome das associações e outras organizações da sociedade civil a que estamos ligados, como residentes permanentes. Filho da terra, invocarei sempre a legitimidade de participação que essa antiguidade deve facultar. Mas essa legitimidade de participação deve ser assegurada a todos quantos, de qualquer origem, aqui têm a sua casa e aqui decidiram fazer o seu futuro, que é o mesmo que dizer, fazer o futuro de Macau, sua terra, com as suas gentes, que acreditam que sem memória não haverá futuro. Esse futuro, porém, dependerá sempre muito mais da China do que de nós, dos rumos que ela for apontando para o seu desenvolvimento nas próximas décadas e dos sucessos da afirmação da sua influência crescente no mundo.

21 Dez 2020

Secretário para a Economia e Finanças diz ter confiança no orçamento para 2021

O secretário para a Economia e Finanças considera que o orçamento para 2021 é para cumprir sem ajustamentos e que, com a ajuda da vacina contra a covid-19, a economia de Macau vai melhorar em breve. Para ajudar, fica a promessa de mais medidas para atrair turistas. A distribuição do cheque pecuniário não deverá ser antecipada

 

A confiança está lá. O secretário para a Economia e Finanças Lei Wai Nong descartou ontem a possibilidade de vir a alterar o orçamento para 2021. Isto, apesar de o valor orçamentado de 96 mil milhões de patacas ter sido calculado com base em receitas de jogo que incluem a retoma à normalidade nas fronteiras entre Macau e Hong Kong.

Segundo Lei Wai Nong, é preciso não esquecer que a vacina contra a covid-19 está a caminho e que o número de turistas que entram em Macau está a aumentar gradualmente.

“Quanto ao orçamento de 2021 alguns dos nossos serviços fizeram estas estimativas e, de acordo com os dados anteriores e a nossa previsão, até agora, estamos confiantes neste orçamento. Quanto ao próximo ano, com as vacinas e o controlo da pandemia, o orçamento vai decorrer com o previsto”, afirmou à margem da recepção oficial para assinalar o 21.º aniversário do estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau.

O orçamento para 2021 prevê que a receita bruta de jogo para o próximo ano atinja 130 mil milhões de patacas e que, como deverá ser deficitário, serão injectados 26,58 mil milhões de patacas da reserva financeira.

Recordando que, desde a retoma na emissão de vistos turísticos a partir do Interior da China, o número de visitantes tem vindo a aumentar mês após mês, Lei Wai Nong mostrou-se confiante na melhoria da economia, a breve trecho. A juntar a isso, o secretário revelou que serão reforçadas “divulgações para que os turistas saibam que Macau é uma cidade segura” e “muitas medidas de benefícios” para atrair mais turistas ao território.

“Foram já 90 mil os quartos alugados pelos turistas devido a estas medidas e eles não se podem esquecer que a pandemia ainda não passou. No entanto, vai passar e nós vamos continuar a fazer o trabalho de prevenção”, acrescentou o secretário.

Sobre a temática do desemprego entre residentes, cuja taxa continua nos 4,1 por cento, Lei Wai Nong revelou que, até Agosto, foram recebidos 320 pedidos de apoio e houve 6.200 trabalhadores a arranjar emprego, muito por culpa dos resultados muito favoráveis“ das sessões de conjugação de emprego.

Questionado sobre se estão a ser ponderadas medidas para solucionar a questão dos trabalhadores não residentes (TNR) sem trabalho, impedidos, pela nova lei de contratação, de arranjar emprego, o secretário vincou que a prioridade são os trabalhadores locais e que os TNR “são para colmatar a falta de trabalhadores residentes.”

Tudo como dantes

Confrontado com a antecipação do prazo para a atribuição do cheque pecuniário, Lei Wai Nong apontou que o Governo “irá atender às necessidades dos cidadãos e ouvir a população”, mas que, tanto o modo de distribuição, como o calendário a de distribuição “será feito como em anos anteriores”.

Sobre a possibilidade de vir a ser lançada uma terceira ronda do cartão de consumo, o secretário lembrou que as duas rondas anteriores foram motivadas “por situações especiais” e espera que a população “continue a apoiar a recuperação da economia e as PME”, fazendo uso das 10 mil patacas do cheque pecuniário no consumo local.

21 Dez 2020

RAEM 21 anos | Personalidades fazem análise ao estado do território

Reforma Política | Coutinho lamenta défice democrático

Pereira Coutinho considera que o “calcanhar de Aquiles” de Macau, ao fim de 21 anos enquanto região autónoma especial, é o progresso democrático. “A Assembleia Legislativa não tem uma maioria democrática, e isto é mau para Macau. A falta de representatividade, significa défice democrático e que as vozes da população de Macau não estão a chegar onde deviam chegar”, apontou ontem o deputado. Apesar disso, considera que Macau “foi-se desenvolvendo e atingiu a maioridade”, sabendo manter a estabilidade. “Com muitos desafios para a frente, espero que a sociedade se mantenha estável, mas seja mais justa. É o que falta a Macau em todos os aspectos, ou seja, uma sociedade mais justa, equilibrada, e que, de facto, beneficie todos com o seu desenvolvimento económico”, vincou.

Amélia António: Número simbólico

A maioridade talvez demore mais um pouco a chegar, mas em 21 anos houve muitas coisas bem feitas. É esta a opinião de Amélia António: “Não sei se Macau atingiu a maioridade [com os 21 anos], porque ainda faz tanta asneira (risos)… mas é um número simbólico”, disse, em tom divertido. “Há muita coisa que precisa de ser feita e melhorada, porque a certos níveis há muita coisa que funciona mal. Por outro lado, outras funcionam muito bem, como a segurança com que vivemos, e que se nota agora ao nível da saúde. É um dado que não se pode nunca menosprezar”, acrescentou. “Macau está de parabéns”, realçou.

Tina Ho: A Pátria começa em casa

Tina Ho, presidente da Associação Geral das Mulheres de Macau e irmã do Chefe do Executivo, considera que a família tem um papel fundamental no desenvolvimento de Macau para o futuro. Em declarações ao jornal Ou Mun, Ho apontou a família como pilar para a promoção de um ambiente social harmonioso, assim como das virtudes morais chinesas, que permitem aos cidadãos adoptar os julgamentos morais correctos no esforço da harmonia e prosperidade social. A Constituição e Lei Básica, a participação no plano quinquenal e a governação segundo a lei foram outros pontos destacados.

Sales Marques: “Balanço extremamente positivo”

À margem da cerimónia oficial do 21º aniversário da RAEM, José Luís Sales Marques considera que desde o dia da transição, o território adquiriu novas experiências ao longo do tempo e que o “balanço global é extremamente positivo”. “Temos muita sorte em viver em Macau. O caminho traçado pelo Chefe do Executivo é sólido, prudente e (…) aponta no sentido de uma recuperação gradual, e, portanto, assente em bases sólidas. Esperemos que toda a conjuntura mundial e o desenvolvimento da própria China nos ajude no sentido de conseguir isso”, acrescentou.

Carlos Marreiros | “A qualidade de vida não melhorou nos últimos 10 anos”

O arquitecto Carlos Marreiros considerou ontem que em Macau a qualidade de vida da população não melhorou nos últimos 10 anos. “Depois de 10 anos em que as pessoas estavam felizes porque Macau prosperou, nos 10 anos seguintes (…) Macau não conseguiu criar aproximações sistémicas a vários níveis. A qualidade de vida das pessoas que não melhorou”, apontou. À margem da cerimónia oficial do 21º aniversário da RAEM, Marreiros acredita, contudo, que “o novo Governo vai alterar significativamente muitos sectores de Macau”. Exemplo disso, segundo o arquitecto, é o Plano Director. “É um instrumento que, não sendo perfeito, funciona como a decisão do comandante de um navio. Mesmo que a decisão seja não perfeita, é melhor que indecisões. Por isso, vamos ter esperança”, rematou.

Neto Valente | “Feliz por estar vivo”

O Presidente da Associação de Advogados de Macau, Jorge Neto Valente considerou que, apesar de ter completado ontem 21 anos, a Região Administrativa e Económica de Macau (RAEM) dá sinais de não ter alcançado a maturidade desejada. “Estou feliz por estar vivo. Com 21 anos, para mim a maioridade não tem a ver com a idade, mas com a maturidade. Estou mais preocupado com a maturidade”, começou por dizer, à margem da cerimónia oficial do 21.º aniversário da RAEM. Questionado sobre o caminho traçado por Ho Iat Seng durante o discurso de ontem, Neto Valente mostrou-se reticente. “Que caminho? Eu estava à procura do caminho para aqui e alguém me disse: ‘If you don’t know where you are going, any road will get you there’. É onde nós estamos”, rematou.

Santa Casa | Provedor destaca estabilidade de Macau

No 21.º aniversário do estabelecimento da RAEM, o Provedor da Santa Casa da Misericórdia destacou a estabilidade no território. “Julgo que a população não tem argumentos para contestar muitas situações. Claro que em alguns terá argumentos, mas tem reinado a estabilidade social, que é importante. Isto veio a provar que as orientações de ‘Um País, Dois Sistemas’ e ‘Macau Governado pelas Suas Gentes’, é um sistema que funciona”, declarou ontem António José de Freitas. O Provedor observou ainda o “boom económico” que se seguiu à liberalização do jogo. Indicando que a última distribuição do ano ligada ao projecto da loja social foi feita recentemente, mostrou-se confiante de que “tem pernas para andar” no próximo ano.

21 Dez 2020

Covid-19 | Ho Iat Seng diz que reunião familiar também pode ser feita fora de Macau

As famílias separadas por causa das restrições fronteiriças não têm de se reunir em Macau: os residentes podem sair do território. Foi o que indicou ontem o Chefe do Executivo à margem das celebrações do aniversário da RAEM. Ho Iat Seng admitiu também a possibilidade de os contratos de concessão do jogo serem prolongados

 

As reuniões com familiares também podem acontecer fora de Macau. Foi a solução que o Chefe do Executivo reiterou ontem para reatar os laços de família de não residentes que vivam na RAEM, depois da separação imposta pelas limitações fronteiriças. “Se estiverem na Europa ou nos Estados Unidos e não forem residentes de Macau, por enquanto [ao nível das] medidas não temos outro remédio, temos de insistir nisso”, disse Ho Iat Seng, indicando que, por sua vez, os residentes de Macau podem regressar ao território ou sair para outras zonas.

“Se estiverem em Macau não há problema em regressarem para a Europa ou Estados Unidos. Mas se não tiverem bilhete de identidade de residente de Macau não podem entrar. A reunião não é de um lado só, pode ser de cá para lá, não só de lá para cá”, frisou.

O Chefe do Executivo remeteu a possibilidade de as interdições serem levantadas quando os países de origem não tiverem casos durante 14 dias. “Se esse país não tiver nenhum caso, for zero, nós permitimos. (…) O essencial é que esses países têm de fazer as medidas de prevenção e controlo”, observou.

O controlo da epidemia em Macau, bem como as verbas destinadas a ajudar a população – que tiveram “resultados positivos” – foram destacadas por Ho Iat Seng no seu discurso da recepção da celebração do 21º aniversário da RAEM. O dirigente máximo explicou que para o controlo da pandemia resultar é necessário trabalhar “de forma rigorosa, efectiva e precisa, do início ao fim”.

Esforço de contenção que ganha fôlego com a chegada de vacinas. A previsão do Chefe do Executivo é que os Serviços de Saúde deverão gastar cerca de 500 patacas por pessoa. A vacinação é voluntária e gratuita para residentes. Ho Iat Seng deixou em aberto a possibilidade de os trabalhadores não residentes também não pagarem.

“Estamos a analisar, mas não é uma grande questão, não é um grande problema. Nalguns países não houve máscaras para não residentes, o que deu problemas. Essa é uma experiência que adquirimos. Muitos não residentes também estão a trabalhar na linha da frente, portanto, vamos garantir isso”, notou.

Mudanças de jogo

Outra das declarações que merece destaque foi a sugestão de que os contratos de concessão do jogo podem ser prolongados. Questionado sobre a probabilidade do cenário se concretizar, o Chefe do Executivo respondeu que “qualquer situação será ponderada” e não contrariou previsões que apontam para a extensão das licenças de jogo até 2025, indicando que todos têm o direito de fazer comentários.

“Ainda estamos a consolidar a base legal. Sobre essas empresas e previsões não vou comentar. É difícil comentar porque tem a ver com o futuro desenvolvimento de Macau”, disse o Chefe do Executivo, acrescentando que os pormenores serão divulgados aquando a base legal estiver concluída. No entanto, o processo da revisão da lei do jogo está atrasado devido à pandemia, e a consulta pública adiada para o segundo semestre do próximo ano.

Sem receios

No discurso referiu também a segurança nacional e as eleições legislativas. “Serão adoptadas medidas eficientes de prevenção da infiltração e intervenção de forças externas, de modo a garantir a estabilidade e segurança da RAEM.

Iremos assegurar o sucesso das eleições para a 7ª Assembleia Legislativa que terão lugar no próximo ano, garantindo que decorram com imparcialidade, justiça e transparência”, disse.

No entanto, à margem do evento, Ho Iat Seng disse que “não há nada concreto que possa dizer” relativamente a medidas concretas.

Por outro lado, o líder da RAEM apontou que não há sinal de as eleições em Hong Kong afectarem as de Macau. “As duas regiões administrativas são diferentes em termos de mecanismos e estrutura. Cada qual tem o seu mecanismo para fazer as eleições. (…) A próxima legislatura é em Outubro, podemos prever que as duas regiões administrativas tenham eleições na mesma altura, mas não vemos [qualquer] influência”, declarou.

O impacto da pandemia nas eleições ainda é incerto. “Se houver muitos casos na altura se calhar temos de ponderar como adiar, mas agora não consigo fazer essa previsão”, disse o Chefe do Executivo.

Ho Iat Seng apontou ainda o dever de materializar as instruções dos discursos do presidente Xi Jinping durante a visita a Macau no ano passado, tendo em conta conjunturas que “ainda são complexas e mutáveis”. Além disso, declarou que a retoma sucessiva de vistos de turismo “injectou dinâmica e vitalidade na economia de Macau, que recupera gradualmente”. O líder da RAEM indicou que ainda não recebeu informações sobre a viagem a Pequim para o balanço anual.

Publicidade falsa

O Governo vai responder a problemas associados à aquisição de casas na Grande Baía ao melhorar aspectos relacionados com publicidade. “Depois de assumir o cargo de Chefe do Executivo, comecei a tomar medidas muito rigorosas para a publicidade, e também com os serviços da tutela da economia, porque no passado houve falta de gestão (…) em Macau. E há muitas publicidades que não são verídicas”, comentou Ho Iat Seng, apelando a que a população só pondere a compra de imobiliário depois de analisar toda a documentação.

21 Dez 2020

RAEM, 21 anos | José Pedro Castanheira, jornalista: “Quem fez Macau foram os macaenses” 

Poucos jornalistas portugueses conhecem a Macau do período pré-1999 como José Pedro Castanheira. Repórter de investigação, escreveu vários livros sobre a história do território, sobretudo a partir do motim “1,2,3” e fez a cobertura da cerimónia da transferência de soberania. Ao HM, recorda a rapidez com que os símbolos portugueses foram apagados a seguir ao evento e as tensões entre Jorge Sampaio e Rocha Vieira

 

Como é que Macau surge na sua vida profissional? 

Já tinha ido a Macau várias vezes [antes da cerimónia da transferência de soberania]. Em 1999 fui com bastante mais tempo, estive cerca de quatro meses, para escrever um livro, “Os Últimos Cem Dias do Império”. A primeira vez que fui a Macau foi em representação do Sindicato dos Jornalistas nos anos 80. Estava no semanário O Jornal, que já não existe, e decidi ficar mais uns dias para escrever uma reportagem. A partir daí, passei a ir com alguma regularidade a Macau e sempre em serviço para o jornal. A partir de 1989 passou a ser o Expresso. Até que em 1996 fui para fazer uma reportagem na área em que já me estava a especializar, a área da investigação histórica, a propósito dos 30 anos do 1,2,3, e que depois seria transformada em livro. O 1,2,3 era um episódio completamente desconhecido e sobre o qual havia um silêncio enorme. Falei mesmo de um tabu, era um assunto tabu para as partes chinesa, portuguesa e macaense. Havia um consenso generalizado das três comunidades no sentido de não falar do caso.

Como descreve o clima que se vivia nos anos anteriores à transição? Havia um sentimento de medo?

Preferiria as palavras dúvida e receio. A transferência da Administração era um grande ponto de interrogação, sobretudo porque tinha havido há pouco tempo os acontecimentos de Tiananmen. Tinha havido a Revolução Cultural, que marcou muito as relações entre a China e o Ocidente, e em particular com Macau e Hong Kong. Havia um ambiente de muita dúvida. Claro que a transição de Macau foi decisivamente influenciada pela transição de Hong Kong, onde as coisas não correram muito bem. Mas, no essencial, o modelo foi transposto para Macau. As coisas acabaram por correr muito bem, muito melhor do que se esperaria, e estamos perante um sucesso histórico assinalável.

Houve, no entanto, muitas polémicas associadas à transição. A criação da Fundação Jorge Álvares foi uma delas. 21 anos depois, permanece ainda um mistério ou está tudo esclarecido? 

Acho que as coisas já são conhecidas no essencial. Os principais sujeitos históricos já escreveram as suas memórias, e sei que, neste momento, há outras biografias que estão a ser feitas. Há sempre pequenos pormenores e mistérios e alguns deles ficarão para todo o sempre. Mas devo dizer que a partir da transferência deixei de seguir Macau com a atenção com que anteriormente seguia.

Rocha Vieira foi um bom último Governador?

Foi e não foi… Rocha Vieira foi nomeado para pôr ordem na casa. Os dois anteriores governadores, Pinto Machado e Carlos Melancia, não tinham conseguido gerir o território de uma forma pacífica e politicamente equilibrada, e ainda por cima com casos conhecidos na área da corrupção. Macau estava na ordem do dia pelas piores razões. O Presidente Mário Soares decidiu alterar a sua linha essencial em relação a Macau, que era, contrariando quase toda a tradição histórica, ter à frente do território governadores civis – no sentido de não militares. Rocha Vieira pôs “ordem” na casa, deixou de se falar de Macau na imprensa portuguesa e passou a gerir Macau de uma forma muito própria, centralizada e sem fugas de informação. Incluindo com alguns laivos de autoritarismo, e foi criticado por isso. Depois, havia que negociar com a China, e isso era naturalmente muito difícil. Tinha de ser uma negociação a uma só voz, sem grandes divergências da parte de Portugal, e Rocha Vieira conseguiu gerir internamente o território e externamente na sua relação com a China. Depois, na fase final, quando houve uma mudança na presidência da República, com a eleição de Jorge Sampaio, as coisas mudaram bastante.

Houve algumas desavenças entre Sampaio e Rocha Vieira. 

Jorge Sampaio teve uma forma de abordar a questão de Macau e o relacionamento com o Governador muito diferente de Mário Soares. Isso depois levou a alguma agitação, e isso é conhecido e escrevi longamente sobre isso na biografia de Sampaio. Houve alguns problemas e a Fundação Jorge Álvares foi um deles, mas houve outros problemas relacionados com a transição, em particular a questão da entrada das tropas chinesas em Macau, quando e onde entrariam. Isso provocou grande discussão. Mas isso ficou bem resolvido, e se há assunto do qual a diplomacia portuguesa se pode orgulhar é a forma como Macau passou para a República Popular da China.

Mas escreveu no Expresso que Macau levou Sampaio ao hospital. 

Isso passou-se em 1996, logo após a eleição de Sampaio para a presidência. Uma das primeiras decisões de fundo que ele teve de tomar foi reconduzir, ou não, o Governador de Macau. Havia uma grande pressão no sentido de o substituir, e essa pressão vinha de Macau e também de vários sectores políticos de Portugal, em particular do Partido Socialista que na altura estava no Governo. A primeira decisão de fundo que Sampaio tomou foi essa e manteve Rocha Vieira, mas com uma série de condições. Uma delas era que Rocha Vieira teria de apresentar de uma forma regular contas políticas ao Presidente da República sobre a sua gestão do território. E foi numa importante e tensa reunião em Belém que o Presidente Sampaio teve um problema do foro cardíaco que o obrigou a ser operado mais tarde. Mas isso é revelador da tensão que o caso Macau suscitava na política portuguesa.

O que acha mais fascinante na história de Macau, 21 anos depois?

A importância crucial que teve, durante séculos, uma pequeníssima comunidade que é a macaense. Foi um grupo que se foi criando e na prática eram os intermediários entre portugueses e chineses, que viveram quase sempre de costas viradas uns para os outros. Os portugueses nunca aprenderam chinês e a China vice-versa – só mais tarde é que viria a apostar no português, não por causa de Portugal, mas sim da lusofonia. Essa comunidade foi ganhando a sua importância, mas é evidente que, hoje em dia, tem menos relevo porque os macaenses já não são tão necessários como foram. As especificidades de Macau foram muito importantes em alguns momentos do século XX, em especial no pós II Guerra Mundial e na Guerra Civil chinesa, quando Macau passou a ser uma terra de refugiados.

Acha que a comunidade macaense foi devidamente ouvida neste processo de transição?

Não. Os macaenses nunca foram devidamente valorizados, pelo menos do ponto de vista político. Basta ver o número ridiculamente baixo de macaenses que foram membros dos vários governos de Macau, o número muito baixo de macaenses que foram deputados à Assembleia Legislativa, o número quase nulo de macaenses que foram magistrados. Infelizmente, não lhes foi dado o valor e a representação a que tinham direito. Macau só teria a ganhar se fosse dado mais espaço e valor aos macaenses. É lamentável que assim tenha sido.

Sente que, 21 anos depois, Portugal dá atenção a Macau por causa da relação que tem com a China? Ou já teria caído no esquecimento? 

Acho que Macau caiu completamente no esquecimento.

Mas Portugal ainda tem obrigações em relação a Macau. 

Sim, certamente que tem. Mas Macau é uma região autónoma da China. Macau cresceu e mudou muito, embora eu não tenha conhecimentos e informação suficientes para falar da Macau de hoje. Uma das coisas que mudou foi o interesse da opinião pública e do poder político portugueses. A opinião pública ignora o que acontece em Macau e, no essencial, o poder político também. É pena porque é um território com muita história, mas também com presente e futuro. Há muita coisa que poderia passar por Macau do ponto de vista económico. Macau poderia servir de porta de entrada para a China, e penso que não é. Isso acontece ou por falta de iniciativa empresarial, ou por ausência de motivação e empenho do poder político – ou pelas duas razões conjugadas.

Recorda-se de algum percalço curioso da cerimónia da transição?

Houve dois momentos muito diferentes. Houve a festa portuguesa, um espectáculo tipicamente português, a que assisti com muita emoção. Levei comigo a minha família e o meu filho mais velho até participou nessa festa. Horas depois foi a cerimónia oficial, com todas as características chinesas, e que foi completamente oposta à festa portuguesa. A frieza, a disciplina, o planeamento, a falta de alma… Depois, uma coisa curiosa foi a extrema rapidez com que o novo poder chinês decidiu remover todos os sinais da antiga soberania portuguesa. Bandeiras, emblemas, em poucas horas os símbolos portugueses foram apagados. Mas, felizmente, ficaram alguns monumentos que mostram que Macau não foi só chinesa e foi, sobretudo, uma terra de macaenses. Quem fez Macau foram, sobretudo, os macaenses.

20 Dez 2020

Carson Fong, residente de Macau com 21 anos: “Macau é um bom sítio para se viver”

Carson Fong, estudante do 3º ano da licenciatura de Estudos Portugueses da Universidade de Macau, nasceu no mesmo ano do estabelecimento da RAEM. Apesar de tratar Macau por “tu” e de considerar inegável a evolução desde a transição, aponta que, para os jovens, os tempos são de contenção devido à pandemia e que amar o país é uma matéria que não deve ser forçada

 

A RAEM foi estabelecida em 1999. Como é ter 21 anos?

Nasci em Macau, a 29 de Julho de 1999. Penso que ter 21 anos tem um grande significado, porque já sou adulto e Macau está muito melhor desde o dia da transferência de Portugal para a China, especialmente naquilo que é possível ver, ao nível da vida das pessoas, sinto isso também no meu dia-a-dia. Em termos económicos há uma grande diferença. Após a transferência, começaram a vir cada vez mais turistas a Macau passar férias e, por isso, o Governo foi enriquecendo ao longo dos anos e isso trouxe vantagens para os residentes. Inclusivamente, o Governo atribui anualmente um cheque de 10 mil patacas a todos os residentes, o que, na minha opinião, ajuda muito. Por isso, considero que a evolução é visível. Estamos hoje mais ricos e prósperos.

Tal como um adulto de 21 anos, considera que Macau atingiu também a sua maioridade e segue hoje o seu próprio caminho?

Definitivamente, Macau é um bom sítio para se viver, mas não acho que seja dona do seu destino porque após a transferência passou a responder ao Governo Central. É inevitável considerar que hoje, Macau é melhor em todos os aspectos mas, em termos de opinião e participação pública, e apesar de tudo isso existir e estar assegurado, a intervenção das pessoas é reduzida. Muitas vezes, considero que as pessoas não vocalizam opiniões negativas acerca do Governo e pensam muito antes de falar. Como exemplo disso, podemos olhar para a questão do Metro Ligeiro. Foi um projecto que custou muito dinheiro e com o qual muitas pessoas estão descontentes, mas pura e simplesmente é um assunto sobre o qual não se atrevem a falar ou a mostrar desagrado.

Como era Macau durante a sua infância?

Nasci em Macau, mas, porque os meus pais decidiram ir para o Interior da China por motivos profissionais, a minha infância e os primeiros anos escolares, foram passados em Foshan, em Guangdong. Regressei a Macau com 12 anos e, nesse momento, a minha primeira impressão foi que Macau era uma cidade com uma mistura incrível de culturas, incluindo a portuguesa e a chinesa. Isso fez-me sentir que Macau era o melhor lugar para mim. Desde que voltei, já cá estou há 10 anos e considero Macau a minha casa.

De que forma encara essa mistura de culturas?

É muito fácil encontrar as marcas deixadas pelos portugueses em Macau, por exemplo, ao nível da arquitectura, da gastronomia ou da própria língua que está em todo o lado. Considero que a mistura de culturas que encontramos aqui contribui muito para a minha aprendizagem e para conhecer factos sobre Portugal que desconhecia totalmente, antes de voltar para Macau. Além disso, aprendi que gosto muito da comida portuguesa.

Porque decidiu estudar português?

Quando era criança sempre me interessei em aprender outras línguas, como o inglês. E por isso, estando aqui, com todas as oportunidades inerentes a isso, decidi aprender português. A língua portuguesa é muito importante para Macau. Para além de ser um dos idiomas oficiais, se realmente formos capazes de falar português é possível ter uma carreira atraente a nível financeiro. Podemos ver isso com os tradutores e outras profissões que requerem a utilização do português. Além disso, também me interesso muito pela própria cultura e o português abre-me portas para o “mundo” dos países de língua portuguesa. Gostava muito de fazer uma viagem a todos eles.

De que forma os seus pais descrevem Macau antes de 1999?

Os meus pais contam-me que, antes da transferência, Macau era um território muito pobre, onde havia muito crime, e que o Governo da altura tinha poucos recursos e pouco controlo da situação. Antes da transferência havia muito mais portugueses em Macau, mas, na verdade, havia pouco contacto entre portugueses e chineses devido à barreira linguística. A ligação feita séculos antes entre o Ocidente e o Oriente através dos portugueses é muito importante. Portugal foi o primeiro país ocidental a chegar e a estabelecer contactos com o Oriente e trouxe consigo inúmeras aprendizagens, costumes e artefactos pioneiros na Ásia que, por sua vez, através de Portugal, conseguiu também transportar um pouco de si para o Ocidente.

Considera que em Macau as pessoas têm uma vida fácil?

Acho que sim. Além de ser fácil ter emprego, é possível obter facilmente muito dinheiro e apoios por parte do Governo e, no final, as pessoas acabam por ter dinheiro para fazer aquilo que gostam. Claro que este ano, as coisas mudaram devido à pandemia. Podemos ver que a taxa de desemprego, por exemplo, tem subido ao longo do ano. Muitas pessoas perderam o trabalho e, segundo as notícias, o número de suicídios também aumentou muito, devido aos efeitos colaterais da pandemia. Estamos a viver tempos difíceis. Mas falando também de mim próprio, para as pessoas que não precisam de trabalhar, como um estudante, esse dinheiro que obtemos do Governo contribui também para nos tornarmos mais preguiçosos. Gastamos constantemente dinheiro em coisas caras que não precisamos, eu incluído. Por exemplo, gasto muito dinheiro em refeições. Acho que não é uma boa ideia, porque este ano é um ano muito duro e acho que devo poupar mais dinheiro, até porque a situação da pandemia ainda não está controlada e não sabemos como vai ser em 2021.

Quando terminar os estudos receia ter dificuldades em encontrar trabalho?

Na verdade, os meus pais insistem que eu continue a estudar após concluir a licenciatura e que vá inclusivamente para Portugal prosseguir os meus estudos. Eles não querem que eu comece já a trabalhar. Pessoalmente estou preocupado em aprender a falar bem português.

Sente que a compra de casa é um problema para os jovens de Macau?

Sim, os jovens de Macau estão preocupados com a possibilidade de não conseguirem comprar casa no futuro. Os preços são elevados e a maioria não tem capacidade financeira para suportar essa compra. Por outro lado, é possível participar nos concursos de habitação pública do Governo para comprar uma casa mais barata. No entanto, penso que, mesmo aquelas pessoas que compravam casa para ter retorno com uma venda futura têm, hoje em dia, muito mais dificuldades em adquirir casas.

Como encara a indústria do jogo em Macau? Vê com bons olhos que a cidade seja, muitas vezes, apenas reconhecida por isso?

Acho que tem aspectos bons e maus. Do lado positivo, os casinos oferecem muitas oportunidades de trabalho para os residentes e, atingindo posições mais elevadas ao nível da gestão é possível ganhar muito dinheiro. Do ponto de vista negativo, as actividades relacionadas com o jogo são, muitas vezes fonte de vários crimes, mas também a razão pelas quais muitas pessoas acabam sem dinheiro. Há muitas pessoas que ficam sem nada depois de apostar tudo nos casinos. Por outro lado, lá está, eu mesmo cheguei a ter um trabalho temporário num casino, que me ajudou a ganhar algum dinheiro.

Como será Macau daqui a 21 anos?

Vão existir ainda mais casinos e as pessoas serão ainda mais prósperas. Os turistas continuarão a vir e as ligações culturais vão ser ainda maiores. Acho que vão existir mais oportunidades de negócio e de emprego devido à diversificação dos cargos existentes. Por outro lado, como disse antes, penso que o à vontade para dizer o que se pensa, sobretudo quando se trata de aspectos negativos, não será maior. O Governo oferece tanto dinheiro que as pessoas não se atrevem a dizer nada.

Tem-se assistido nos últimos tempos, ao reforço do ensino patriótico. Na sua opinião como estudante, de que forma os jovens encaram esta questão?

A China tem duas regiões administrativas especiais que são Macau e Hong Kong e, como disse, muitas pessoas aqui não gostam de falar apesar de terem opinião sobre os assuntos. Alguns amigos meus não gostam do Governo, mas não o dizem abertamente, porque Macau é controlado pelo Governo Central e têm medo. Acho que toda a gente tem o direito de falar e dar a sua opinião. Na minha opinião não é necessário que o Governo force os jovens a aprender sobre estes temas, como amar o país. Se amamos o país é porque amamos o país. Porque nos forçam a amá-lo?

20 Dez 2020

Receitas de impostos sobre o jogo caem para 27 mil milhões de patacas

As receitas correntes dos primeiros onze meses do ano desceram para cerca de 42,1 mil milhões, com os impostos do jogo a permitirem ao Governo arrecadar 27, 18 mil milhões de patacas

 

Até Novembro, o Governo arrecadou 27,18 mil milhões de patacas com impostos sobre o jogo – menos 76,9 mil milhões em comparação com o mesmo período do ano passado. É o que revelam os dados do relatório sobre a execução orçamental publicado pela Direcção dos Serviços de Finanças.

Há um ano, as receitas correntes ascendiam a 121 mil milhões de patacas, um número que desceu agora para cerca de 42,1 mil milhões. Além do sector do jogo, de entre outras fontes de receitas correntes, o Governo recolheu 9,5 mil milhões em impostos directos, cerca de um milhão em taxas ou multas, bem como 270 milhões em concessões de serviços de utilidade pública.

As receitas totais fixaram-se em 86,86 mil milhões. No entanto, é preciso recordar que o Governo precisou de recorrer a várias injecções de capital da reserva orçamental. Além disso, a venda de instalações e equipamentos que durante este período rendeu no ano passado 2,1 mil milhões, representou agora apenas 173 milhões de patacas.

Para o orçamento do próximo ano, o Governo prevê receitas na ordem das 95 mil milhões de patacas, e o recurso a mais de 26 mil milhões da reserva extraordinária. Na nota justificativa, o Executivo antecipa que o impacto provocado pela pandemia leve a economia da RAEM a continuar “crítica”, estimando-se que o imposto especial sobre o jogo renda 45,5 mil milhões.

Expectativa e realidade

Em sentido inverso ao das receitas, as despesas correntes passaram de cerca de 57,9 mil milhões nos primeiros onze meses do ano passado, para 69,9 mil milhões de patacas em período idêntico neste ano. A mudança mais significativa deu-se ao nível das transferências, apoios e abonos, que ascenderam a 50,7 mil milhões.

A taxa de execução das despesas correntes chegou a 75 por cento. No entanto, o Plano de Investimentos e Despesas da Administração (PIDDA), que estava orçamentado em 13,7 mil milhões até Novembro, teve uma execução de 57,1 por cento. Recorde-se que no mês passado, foi noticiado que 51 projectos de obras públicas estavam por concretizar devido à pandemia. Na altura, o presidente da Comissão de Acompanhamento dos Assuntos de Finanças Públicas da Assembleia Legislativa, Mak Soi Kun, disse que o Governo acreditava que ia recuperar o tempo perdido sem pagamentos adicionais pelos atrasos se deverem a “motivos de força maior”.

20 Dez 2020

Covid-19 | Conselho da União Europeia recomenda fim de restrições de viagem à RAEM

O Conselho da União Europeia (UE) recomendou na quinta-feira aos Estados-membros que levantem gradualmente restrições de viagens a Macau e Hong Kong, mas apenas no caso de haver reciprocidade.

Em comunicado, o Conselho informou ter actualizado a “lista de países [terceiros] para os quais as restrições de viagem devem ser retomadas”, como acordado pelos Estados-membros em Junho, quando foi adoptada uma recomendação sobre o levantamento gradual das restrições temporárias às viagens não essenciais para a UE em altura de pandemia de covid-19.

Nesse âmbito, e “com base nos critérios e condições” estabelecidos nessa recomendação, a estrutura onde estão representados os países da União Europeia defendeu que, a partir de quinta-feira, “os Estados-membros devem levantar gradualmente as restrições de viagem nas fronteiras externas” para oito países, nomeadamente para “as regiões administrativas especiais chinesas – Hong Kong e Macau -, sujeitas a confirmação de reciprocidade”.

No que diz respeito a Macau, a entrada de pessoas com nacionalidade portuguesa, e sem o estatuto de residente está proibida, como acontece com toda a gente, à excepção dos residentes com nacionalidade chinesa do Interior, Hong Kong e Taiwan.

Outras actualizações

Além da RAEM, é também nessa condição de reciprocidade que se mantém a China, ou seja, até o país asiático reabrir as suas fronteiras à UE. Incluindo a China, são oito os países terceiros abrangidos, desde logo Austrália, Japão, Nova Zelândia, Ruanda, Singapura, Coreia do Sul e Tailândia.

Face à lista anterior, divulgada no final de Outubro, o Conselho da UE deixa de fora o Uruguai, assim como países como Estados Unidos da América, Rússia, Índia e Brasil, assim como todos os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) e Timor-Leste, que aliás nunca fizeram parte desta ‘lista verde’, dada a situação epidemiológica.

Para a elaboração desta lista de países terceiros aos quais é permitido que sejam retomadas as ligações para a Europa, foram determinados critérios como o número de casos de contágio nos últimos 14 dias – e por 100 mil habitantes – ser idêntico ou abaixo da média da UE, e haver estabilização ou redução de tendência de novos casos neste período em comparação com os 14 dias anteriores.

20 Dez 2020

Fernando Chui Sai On, ex-Chefe do Executivo, agraciado com Medalha do Grande Lótus

Tal como tem mandado a tradição, o ex-líder do Governo é agraciado com uma das distinções pelos serviços prestados. Também os ex-secretários Lionel Leong e Lau Si Io vão receber um medalha

O anterior Chefe do Executivo, Fernando Chui Sai On, e o médico Zhong Nanshan, especialista em doenças contagiosas, vão ser galardoados, por Ho Iat Seng, com a mais alta distinção da RAEM, a Medalha de Honra do Grande Lótus. A lista, revelada ontem, é dominada por entidades e funcionários públicos que fazem parte e deram a cara pelo mecanismo de resposta à pandemia. O juiz Viriato Lima é o único português na lista.

Após ser anunciada a distinção, foi divulgada pelo Governo uma nota com a reacção de Chui Sai On. O ex-Chefe do Executivo afirmou “sentir-se muito honrado” com a medalha, agradeceu a Ho Iat Seng e considerou que a distinção pertence “a todos aqueles que contribuíram para a construção e estabilidade de Macau, incluindo o pessoal da Administração Pública e os diversos sectores da sociedade”.

Chui Sai On agradeceu ainda ao Governo Central “por todo o apoio e confiança” desde que assumiu o cargo de secretário para os Assuntos Sociais e Cultura até ao final do mandato enquanto Chefe do Executivo, assim como deixou uma palavra aos residentes por “com o espírito amar a Pátria e amar Macau” apoiarem e colaborarem com os trabalhos do Governo.

Além de Chui Sai On, foram ainda distinguidos dois ex-secretários, Lau Si Io e Lionel Leong, nestes casos com a Medalha Lótus de Ouro. A mesma distinção foi ainda atribuída à Associação de Educação de Macau e ao ex-chefe dos Serviços de Polícia Unitários, Ma Io Kun.

O juiz Viriato Lima, que se reformou no final de 2019 do Tribunal de Última Instância (TUI), é o único português da lista e vai receber a Medalha Lótus de Prata, a par da sucursal de Macau do Banco da China.

Mérito de SSM e médicos

É nas medalhas de mérito que as entidades e funcionários públicos estão em maior destaque, principal os serviços e os profissionais de saúde. A direcção dos Serviços de Saúde vai ser distinguida com a medalha de Mérito Profissional, enquanto o director Lei Chin Ion vai receber a medalha de Mérito Altruístico. Alvis Lo, médico-adjunto da direcção do Hospital Conde São Januário, Lam Chong, director do Centro de Controlo de Prevenção da Doença, e Leong Iek Hou, coordenadora do Centro de Contingência do Novo Tipo de Coronavírus, vão receber a Medalha de Serviços Comunitários.

Também as equipas de resgate dos residentes de Macau retidos em Wuhan e no Cruzeiro Diamond Princess, no Japão constam na lista. Nestes casos vão receber o título honorífico de valor.

A cerimónia para a entrega das medalhas e dos títulos honoríficos ainda não tem uma data marcada, mas segundo o comunicado do Governo vai decorrer na segunda quinzena de Janeiro. Segundo a tradição, as medalhas são entregues no Centro Cultural de Macau.

Lista de agraciados

Medalhas de Honra:
Grande Lótus – Chui Sai On Fernando
Grande Lótus – Zhong Nanshan
Lótus de Ouro – Associação de Educação de Macau
Lótus de Ouro – Lau Si Io
Lótus de Ouro – Leong Vai Tac
Lótus de Ouro – Ma Io Kun
Lótus de Prata – Banco da China, Limitada, Sucursal de Macau
Lótus de Prata – Viriato Manuel Pinheiro de Lima

Medalhas de Mérito:

Mérito Profissional
Serviços de Saúde

Mérito Industrial e Comercial
Associação das Empresas Chinesas de Macau
União das Associações dos Proprietários de Estabelecimentos de Restauração e Bebidas de Macau

Mérito Turístico
Associação das Agências de Turismo de Macau     
Associação das Agências de Viagens de Macau
Associação de Indústria Turística de Macau

Mérito Cultural
Livraria Seng Kwong, Limitada    
Kuan Kun Cheong
Ng Wai Kin

Mérito Altruístico
Lei Chin Ion       

Medalhas de Serviços Distintos:

Medalha de Valor
Centro de Prevenção e Controlo da Doença dos Serviços de Saúde
Serviço de Pneumologia do Centro Hospitalar Conde de São Januário dos Serviços de Saúde
Gabinete de Gestão de Crises do Turismo
Departamento de Fiscalização Alfandegária dos Postos Fronteiriços dos Serviços de Alfândega da Região Administrativa Especial de Macau da República Popular da China
Equipa de Ambulâncias para Doenças Infecciosas do Corpo de Bombeiros
Departamento de Controlo Fronteiriço do Corpo de Polícia de Segurança Pública
Departamento de Informações e Apoio da Polícia Judiciária

Medalha de Dedicação
Departamento de Higiene Ambiental e Licenciamento do Instituto para os Assuntos Municipais (IAM)
Departamento de Segurança Alimentar do Instituto para os Assuntos Municipais Fong Hou In

Medalha de Serviços Comunitários
Lo Iek Long  
Lam Chong
Leong Iek Hou

Título Honorífico de Valor
Equipa de missão de apoio no combate à pandemia em África               
Equipa de resgate de residentes de Macau retidos na província de Hubei por meio de voo fretado a Wuhan
Equipa de resgate de residentes de Macau retidos no Cruzeiro “Diamond Princess” no Japão

20 Dez 2020

Ariana Furtado, professora: “A escola tem de servir para educar para a empatia”

Ariana Furtado tem 44 anos de idade, é professora e coordenadora da Escola Básica do Castelo em Lisboa. É uma mulher com um sorriso contagiante, ideias fortes e um enorme sentido de justiça
Gostava que começasse por falar do projecto na sua escola “Com a mala na mão contra a discriminação”.

Este projecto nasceu de muitas pessoas, sobretudo da Simone Andrade do Teatro da Voz. A Simone estava com uma oficina nesta turma de 4.º ano que se chamava “como ler os direitos humanos”, onde todos faziam uma viagem pelos direitos humanos e como eram aplicados em vários países. Como é que as crianças olhavam para a Declaração Universal dos Direitos Humanos e o que é que no dia a dia delas seria diferente se a levassem a sério. E numa das sessões estivemos analisar os manuais escolares que abordavam os “ditos” descobrimentos e… aquilo foi tão arrasador em termos de linguagem histórica que eu fiquei chocada. Eu que já sou professora há tantos anos, ao ver a forma como a Simone abordou o tema e a facilidade com que os meus alunos respondiam às perguntas que ela fazia – a uma nova visão que ela trouxe para dentro da sala de aula, e não a visão apresentada no livro de Estudo do Meio sobre a classificação dos povos ao longo da história, no mundo – olhei para a minha turma, com miúdos vindos de várias partes do mundo, uma turma absolutamente heterogénea com miúdos da Ásia, de África, do continente americano, e percebi que nós estamos a fazer praticamente tudo errado nas escolas. Se queremos educar crianças para a cidadania, para a intervenção, para a discussão de ideias, para serem capazes de emitir uma opinião, e os manuais escolares só apresentam uma visão – e temos de ser francos, o ensino em Portugal está muito assente nos manuais escolares – tem que ser por aí que nós temos de começar a desconstruir um pouco e a dar espaço para eles encontrarem formas de conseguir emitir opiniões, fazer perguntas.

Está a dizer que os professores estão formatados para passar apenas informação?

Eu não quero generalizar não é nada disso, mas nós passamos informação mas não construímos caminhos para que eles possam dialogar, conversar sobre as questões. Ora, é isso que faz com que nós enquanto civilização avancemos, discutir sobre o que estamos a aprender. Mas não há tempo nas escolas para a discussão. É tudo muito formatado e o que os manuais apresentam “é o que os manuais apresentam” mas se apresentam informação, ela tem que ser correcta.

Os manuais que falam dos descobrimentos enaltecem apenas os feitos dos portugueses e nunca falam das diferentes culturas que já existiam nessas terras e a escravatura é apresentada como uma simples troca de produtos.

Exactamente, os povos europeus chegaram e já lá estava vida, cultura, civilizações, diferentes formas de organização; algumas bem mais avançadas do que as europeias e que não foram valorizadas. Nos manuais escolares europeus não há acesso a essa informação. No manual de Estudo do Meio da minha turma, os escravos continuam a surgir como um produto, como disseste, e muitas vezes o que eu sinto é que nós professores não somos capazes de provocar a discussão e a dúvida no aluno, não se discute se é correcto em termos de direitos humanos, se na altura já era correcto ou se não era, e isso é muito importante.

E surgiu assim o projecto.

Sim, depois juntei-me a várias pessoas, algumas ligadas ao associativismo, com as quais ia partilhando estas ideias e criamos um conjunto de oficinas sobre o tema “as relações entre todos” na sala de aula, nos recreios, fora da escola, na vida. Como é que podemos olhar-nos e discutirmos ideias. Se determinada situação faz sentido – mais do que ser correcto ou não correcto – se faz sentido ou se não faz sentido; se evoluímos, se não evoluímos; porque é que as coisas acontecem, porque é que as coisas não acontecem… e foi assim que este projecto começou.

Quer fazer uma viagem rápida pelas oficinas?

Uma das oficinas era feita com “Role Plays”. Muitos destes alunos pertencem a famílias que estavam a passar grandes problemas, por exemplo ao nível do arrendamento das casas em Lisboa e assim criamos algumas situações em que eles tinham que dramatizar como é para uma família negra, uma família asiática ou cigana conseguir arrendar uma casa numa capital como esta. E fomos discutindo estas situações que levavam as crianças a pensar sobre “como é que vive o outro”, será que a vida é fácil para o outro? Também é uma forma de educar para a empatia e percebermos “será que sou só eu que vivo estas condições?”. Outra era “como é que eles olhavam – por exemplo – para os mapas?”. Porque nos nossos mapas nas escolas a Europa vem sempre destacada, a Europa que é dos continentes mais pequenos vem destacada com uma importância tal que quase que nos induz que é o maior continente do mundo. E não é. Estamos às vezes tão euro centrados e tão confortáveis, que não conseguimos sair desse sítio.

Já que falou na habitação, há uma tendência das sociedades em geral, para criar zonas de habitação específicas para as pessoas negras. Os discursos populistas e nacionalistas usam como arma de arremesso seres humanos que gostam de apresentar como símbolos de fraqueza, doença ou perigo. Os alvos são na sua maioria essas pessoas que já sofrem de discriminação. Assustam-na estes movimentos de ódio?

Assusta muito, mas não me surpreende. (pausa) Quase que me custa dizer isto mas é um pouco a essência da natureza humana. (pausa) Eu sei que estou rodeada de pessoas – e quando falo da essência humana não quero ser ofensiva mas tenho que ser brutalmente directa – pessoas que convivem comigo, que falam comigo, que são capazes até de me elogiar diariamente, de me pedir ajuda mas que são pessoas cheias de preconceitos. Bom… como é que eu coloco isto… isto é um assunto muito delicado… a forma como este partido (Chega) que ninguém quer dizer o nome, habita neste terreno… é tocando nos mais vulneráveis, nas pessoas que estão mais expostas à fragilidade, e em todas elas tocando em termos de pele: nas pessoas brancas mais vulneráveis dizendo “olhem quem mora ao vosso lado e vos está a tirar regalias”… nós negros, ciganos, asiáticos, que moramos cá, que crescemos cá ou nascemos cá e não somos nunca reconhecidos como tal.

Pode-se falar de crueldade.

É mesmo a forma mais cruel de se aproveitar de uma situação… através de uma pessoa em dificuldade. Porque não tenhamos dúvidas, as pessoas que votam nesse partido – eu vou falando com muitas, mesmo muitas pessoas – são pessoas que passam por muitas dificuldades financeiras e económicas. E em termos de estudos, têm o nível sócio cultural que se considera “aceitável” na sociedade hoje em dia – seja lá o que isso for – e são pessoas que acham que é “o outro” que lhes está a roubar espaço, que lhes está a roubar rendimentos e é assim que estes partidos crescem, é assim que estes partidos ocupam espaço na sociedade.

Aproveitam-se sempre de situações de crise.

Porque as pessoas retraem-se, fecham-se sobre si próprias e tornam-se egoístas. (pausa) É humano, quase que me atrevo a dizer isso. E é por isso que a escola tem este papel tão importante para mim. Porque a escola também tem de servir para educar, para educar para a empatia, para mostrar que quando sofremos, às vezes, sofremos todos, não é só um determinado sector da sociedade ou uma determinada cor de pele ou uma determinada pessoa. Sofremos todos. Claro que quando um partido como este, que está na Assembleia da República e tem imensa visibilidade televisiva, diz que há pessoas que por terem determinada cor ou determinada etnia são mais prejudiciais à sociedade do que outras, há outras pessoas que tendencialmente vão achar que sim, que essa pessoa está a lutar pelo bem delas e isso… é quase… humano. E como é que se combate isso? É muito difícil, é muito duro.

Há um estudo da European Social Survey que diz que em Portugal quase 50% da população continua a achar que as pessoas podem ser inferiores em função da cor da sua pele ou pela sua pertença étnico-racial ou cultural. Será herança do nosso passado colonial?

É uma herança pois. E não nos podemos esquecer que nós estamos, enquanto país, com um atraso enorme a todos os níveis, porque vivemos tanto tempo fechados no medo… acho que a ditadura portuguesa fez um dos seus trabalhos mais profundos nas ditas colónias porque conseguiu até convencer uma grande parte das pessoas que viviam lá, que eram inferiores.

Há muitos filhos que herdaram dos pais essa maneira de ver o outro?

Até hoje é uma mentalidade que ainda perdura. Desculpam-se com frases do tipo “ai agora por tudo e por nada é tudo racismo?! Tenho imensos amigos negros e gosto de música cigana. Claro que se tiver de viver com uma família negra ao lado prefiro não viver.” E apresentam uma lista de razões.

Tais como?

São muito barulhentos… e os cheiros… a comida… as pessoas dizem-te isso assim. Já me disseram várias vezes, frontalmente, essas coisas. Há pessoas que às vezes falam comigo como se não vissem a minha cor quando é aquilo que eu acho que de mais profundo tenho, e quando falo de cor é porque acho que a cor transporta muito daquilo que eu sou como pessoa. A minha pele fala por mim, sou muito transparente nisso. Mas às vezes há professoras minhas colegas que falam comigo como se eu não fosse negra e não tivesse nascido em Cabo Verde. Como se eu não tivesse crescido a viver também muitas dificuldades para poder continuar a estudar, conseguir entrar na faculdade e no mundo laboral. Dizem coisas como “oh pá os africanos têm isto e aquilo, gostam muito de dançar”, e eu pergunto “que africanos, mas estás a falar de que africanos (riso) mas quem são esses africanos de que falas?”

Para as pessoas em geral, alguém negro é imediatamente africano, não é europeu ou americano?

Sim. E as coisas que são ditas às vezes são muito agressivas. Faço questão de traduzir as diferentes formas de ser, numa mais valia para os meus alunos. Mas eles continuam a viver em sociedade e alguns têm famílias onde podem ouvir impropérios ou “já não suporto aquela preta” ou “aquele cigano não sei quê”. Isto só muda quando toda uma sociedade estiver aplicada de forma séria. Quando educarmos para o antirracismo. Quando esta questão for levada a sério e de forma transversal e para isso temos de implicar seriamente todos os professores, os pais e todos os adultos que estão com crianças, todos.

O próprio Estado.

O Próprio Estado que já devia ter começado – já vai muitíssimo atrasado. É preciso uma condução séria na forma como são abordadas estas questões com os alunos. Por exemplo, a questão do tratamento que é dado aos nomes dos alunos. Se nós recebemos um aluno africano ou asiático e estamos a falar para ele e para os pais e dizemos “ai eu não percebo nada do teu nome não sei como é que se pronuncia, é muito difícil”… não estou a dizer que isto é racismo, mas é uma forma de negar a diferença. É uma questão de respeito básico e nesse aspecto o colonialismo fez um excelente trabalho por nós. Conseguiu hierarquizar de forma muito vincada os povos.

Há estudos que provam por exemplo, que 80% dos alunos dos PALOP são orientados para os cursos profissionais, e dos 20% que fazem outro trajecto apenas 3% podem chegar ao ensino superior. São desigualdades estruturais no acesso à educação que, por sua vez, têm implicação no acesso ao emprego qualificado. Como professora e coordenadora do pré-escolar e 1º ciclo, que tem a dizer sobre isto?

As dificuldades ao longo do caminho são muitas, muitas e começam primeiro na escola. É preciso intervir muito cedo. Quando essa questão chega a um encaminhamento para as vias profissionais, nas bases já esteve tudo mal. Logo no primeiro ciclo nós começamos a assistir – por exemplo – a alunos que têm explicação de português, de matemática e a muitas famílias negras que não têm possibilidade de o fazer. Depois a competição é enorme logo desde pequeninos, o que é péssimo. O estímulo para a competição é péssimo, é mau em todos os sentidos. Deve haver um estímulo à aprendizagem, à troca de ideias, à entreajuda, à empatia e o resto vem por si. Se tivermos predispostos enquanto crianças a ajudar o outro, a acompanhar o outro na sala de aula a aprender com o outro estamos também a estimular o nosso colega.

Para que avancemos juntos.

Exacto, para que avancemos juntos como pares, e a autoestima deles sobe. E muitos desses pais, dessas famílias negras não têm – como já disse – possibilidade de pagar explicações, não têm como acompanhar os filhos nos trabalhos de casa, acompanhá-los nos inúmeros desafios que às vezes surgem na escola para serem feitos em casa, porque não têm tempo. Porque se levantam às cinco da manhã para trabalhar, porque acumulam 3 e 4 empregos por dia. E essas crianças quando voltam à escola e vêem que alguns colegas tiveram tempo para descansar, que tiveram tempo para fazer os trabalhos, para ler um livro, que alguém leu um livro com eles… é óbvio que isso já está a indicar um caminho; por isso é que a intervenção no primeiro ciclo tem de ser muito importante a esse nível. Porque depois, vão-se somando dificuldades pelos ciclos fora, ao ponto em que o aluno chega ao 9º ano e já não se sente capaz.

Sempre teve turmas muito heterogéneas? Alguma história que se destaque?

Tive uma aluna, uma menina muito resistente; saiu do Congo com o pai e o irmão, conseguiram passaporte português através de uma ascendência dele e conseguiram chegar a Portugal. Notava-se nela uma maturidade muito diferente das outras crianças, tinha oito anos, mas uma maturidade muito diferente das crianças da idade dela. Tinha uma história de vida lhe deu uma necessidade… estas crianças olham para a escola como uma arma, ela sentia que a arma dela para sobreviver era o conhecimento. O conhecimento era a arma para poder argumentar com o mundo.

Para terminar, gostava que nos dissesse porque escolheu fazer esta entrevista no Teatro?

Na procura para dar voz a todos os alunos considero que a arte e a cultura são importantes para o brotar da imaginação, da consciência crítica e libertação de tudo o que temos cá dentro. Procuro levar sempre os meus alunos ao teatro, ao museu, a distintas oficinas e o Teatro da Voz tem sido um parceiro incrível e de construção e desconstrução de tudo o que pensamos saber.

ENTREVISTA Teresa Sobral
FOTOS Inês Oliveira

19 Dez 2020

IAS | Abrigo de Inverno oferece protecção para quebra de temperatura

Quando as temperaturas descem, as portas do Centro de Abrigo de Inverno abrem. Se antes havia em média uma dezena de pessoas de Hong Kong, a pandemia e restrições fronteiriças mudaram o cenário, e agora são principalmente residentes de Macau a recorrer ao serviço. De quarta para quinta-feira o espaço acolheu pelo menos sete homens, um deles residente de Macau que chegou a dormir na bagageira de um autocarro

São oito e meia da noite e na Avenida do Conselheiro Borja, na Ilha Verde, o símbolo do centro de acolhimento do Instituto de Acção Social (IAS) contrasta com o escuro da noite. Contornando o edifício, uma mensagem luminosa indica que “o Centro de Abrigo de Inverno, situado na Rua do Asilo da Ilha Verde, será aberto ao público quando a temperatura em Macau descer aos 12 graus”.
Também aqui, a pandemia vai ditando medidas de prevenção: a temperatura corporal é medida, desinfectante para as mãos disponibilizado, e exigido o uso de máscara dentro do edifício. Também nos quartos foram tomadas medidas, como o distanciamento social superior a um metro entre cada cama. Cortinas azuis escorrem do tecto a criar divisórias ondulantes entre os utentes, que se deitam em colchões dispersos pelo chão, e as paredes são brancas – à excepção de marcas da passagem do tempo e avisos ocasionais, como da proibição de fumar.
Na noite de quarta para quinta-feira, pelo menos sete homens recorreram a este espaço para se escudarem do frio que invadiu a cidade. Um deles foi o senhor Chan. Tem cabelo branco e gesticula com as mãos enquanto explica o que o levou ali. O residente de Macau chegou a alugar um apartamento na China Continental. No entanto, depois de vir trabalhar para Macau teve de encontrar uma alternativa: dormia num autocarro da empresa de transportes para a qual trabalhou.
“Habitualmente, dormia no autocarro, porque era funcionário a tempo parcial nesta empresa ao longo dos anos. Mas agora não tenho trabalho devido à pandemia. Nunca assumi trabalho a tempo interno, por isso não podia obter o apoio pecuniário que o Governo concedeu a trabalhadores. Hoje (quarta-feira) está frio. Ouvi que o abrigo já abriu cinco noites, passei cá duas (incluindo esta noite)”, contou ao HM.
A possibilidade de dormir no porta-bagagens do autocarro foi-lhe vedada, já que a porta do veículo foi trancada e Chan não tem a chave. Os seus pertences ainda lá estavam e não conseguiu entrar para as buscar. Mas o sorriso resistiu às dificuldades. “Aqui está muito quentinho, tem comida, é muito bom”, disse, referindo-se às condições do abrigo de Inverno. Não é a primeira vez que visita o espaço, onde já ficou em altura de tufão.
Faltam dois anos para atingir os 63 anos, a idade da reforma. Até lá, mantém licença com validade para conduzir o veículo.

Estender a mão

Nem todos os utentes passam várias noites, mas há presenças regulares – que chegam a recorrer ao serviço durante um ou dois anos. Além de ser garantida comida a quem procura esta forma de apoio, o abrigo é também dado a conhecer através de amigos.
O espaço do IAS é gerido pela Caritas, sendo que as entidades se mantêm em contacto para ajustar a situação e perceber as necessidades a que importa acorrer. Para Ricardo Chan, assistente social da Caritas, o principal desafio “consiste no estabelecimento de uma relação com os utentes”. De acordo com a experiência do assistente social, há quem fique no abrigo durante um ano ou meio ano e continue sem querer revelar a sua história, ou sequer o nome.
O funcionário da Caritas indica de forma clara o valor do abrigo. “Acho que é importante, é uma maneira de manifestar carinho e solidariedade. Uma garrafa de água ou uma tigela de arroz já são um gesto de carinho para estas pessoas”, disse, acrescentando que “podem ser doentes mentais ou não ter família, por isso estes gestos podem ajudar a dar-lhes afectividade”.
Em relação aos locais, cerca de metade dos indivíduos não tem vencimento. Angel Ng, chefia funcional substituta da equipa de coordenação de serviços do IAS, revelou ao HM que nem todas as pessoas que usam o abrigo querem pedir subsídios. Questionada se a existência de estigma ou discriminação estará na base do fenómeno, respondeu que é difícil encontrar a razão. A representante do IAS apontou que a recusa em pedir subsídio, por vezes, é justificada pela assumida capacidade para trabalhar, enquanto outras vezes, motivados por dificuldades de relacionamento com familiares, as pessoas que recorrem ao abrigo preferem deixar a família e viver na rua ou outros locais.
São também diversos os motivos que levam ao centro. Angel Ng dá como exemplos típicos a pobreza ou não ter casa própria. No seu entender, o local fornece “um ambiente muito bom”, tendo em conta o perigo que situações de calor ou frio muito intenso representam.

Mudança de panorama

Dos indivíduos que passaram a noite, quatro eram de Macau e três de Hong Kong. Em anos anteriores observou-se que um volume elevado de quem recorria a este serviço era residente do território vizinho.
As histórias mais comuns que levava residentes de Hong Kong a pernoitar no abrigo está intimamente ligada à principal fonte de rendimentos de Macau. “É sobretudo por causa de situação familiar. A razão principal é que também são jogadores, por isso não voltam para Hong Kong”, explicou o assistente social.
No entanto, em contexto de pandemia que motivou restrições fronteiriças, o tipo de histórias dos que procuram abrigo mudou. “A grande diferença consiste na diminuição do número de estrangeiros e [residentes] de Hong Kong. Agora, são principalmente pessoas de Macau. Antes vinham em média um ou dois estrangeiros, e depois cerca de uma dezena de pessoas de Hong Kong, mas agora está a cair o número”, esclareceu Ricardo Chan.
Angel Ng apontou as restrições nas fronteiras como a principal explicação, apontando que é um entrave à vontade de entrar em Macau.
Um dos três residentes de Hong Kong que passou a noite no abrigo é desempregado e veio para Macau à procura de uma oportunidade de trabalho ainda antes da pandemia. O contexto dos restantes não se conhece, porque foi a primeira vez que apareceram.
Outra razão pela qual este ano menos residentes de Hong Kong recorrem ao abrigo pode ser o subsídio que o Governo de Carrie Lam atribuiu, na óptica de Ricardo Chan.
“Nós já temos comparticipação pecuniária, mas este ano Hong Kong também deu um cheque aos residentes no montante de 10 mil dólares de Hong Kong”, explicou, acrescentando algumas pessoas regressaram ao território vizinho para receber esse apoio. Também a necessidade de mostrar resultado negativo no teste de ácido nucleico na entrada dos casinos e o encerramento do terminal marítimo entre Hong Kong e Macau são razões que Ricardo Chan enumera para a diminuição do número residentes do território vizinho no abrigo.

Risco de hipotermia

Os Serviços de Saúde (SS) emitiram ontem um comunicado a alertar para risco de hipotermia decorrente da descida de temperatura nos próximos dias. Informações recentes da Direcção dos Serviços Meteorológicos e Geofísicos revelam que a temperatura deverá “baixar significativamente” para valores abaixo dos dez graus, e prevê-se que o frio se mantenha até à próxima semana. “As principais vítimas são normalmente elementos do sexo masculino, com idade igual ou superior a 65 anos e que vivem em circunstâncias de exclusão social”, indica a nota. Outros factores de risco incluem infecção e consumo de álcool. Face a esta situação, os SS apelaram aos residentes – especialmente idosos e portadores de doenças crónicas para adoptarem medidas de prevenção. Entre as sugestões estão o uso de roupas adequadas contra o frio, alimentos e bebidas quentes ou exercício físico para manter a temperatura do corpo e melhorar a circulação.

19 Dez 2020

Reforma Política | Au Kam San critica falta de desenvolvimento democrático

O democrata considera que a promessa de maior democratização do sistema político está a ser ignorada e é vista hoje como “uma serpente ou um escorpião”. Au disse ainda que a promessa foi promovida antes da transição com base na ideia de que Macau ia deixar de ser uma colónia com um Governador enviado da metrópole

O deputado Au Kam San criticou o Governo por recusar qualquer avanço democrático no sistema político, como considerou que havia sido prometido antes da transição. Em intervenção na Assembleia Legislativa, o democrata foi mais longe e falou de um novo ambiente em que a bandeira da pré-transição é quase proibida e vista como “uma serpente ou um escorpião”.
Segundo o democrata, antes da transição havia a promessa da defesa dos princípios de “igualdade, da transparência e da justiça, e a concretização da governação íntegra e a promoção ordenada e gradual dum sistema político democrático”. A evolução democrática do sistema era assim encarada como a concretização do “princípio de ‘Macau governado pelas suas gentes’, em vez de se voltar a ser uma colónia, com a escolha do Chefe do Executivo controlada pela metrópole”.
Quando se aproxima o 21.º aniversário da RAEM, Au faz um balanço negativo da progresso político: “Nem sequer um pouquinho de progresso gradual se verificou. Aliás, a matéria foi deixada de lado e até é vista como uma serpente ou um escorpião, uma matéria que ninguém se atreve a mencionar”, apontou.
O legislador admite que quando o Governo assumiu funções, em Dezembro do ano passado, tinha outras prioridades. Contudo, aponta que o facto de nas Linhas de Acção Governativa para o próximo ano não haver qualquer referência ao desenvolvimento político mostra que o assunto é ignorado.
Para o deputado, apesar de os elogios do Governo Central, a falta de avanços no sistema político, que contrastam com os avanços na transparência, justiça e vertente económica, acaba por denegrir o princípio Um País, Dois Sistemas e a dignidade da Lei Básica.
“[O progresso do sistema] segundo Deng Xiaoping e os demais criadores do princípio Um País, Dois Sistemas, é a grande concretização social, requer indispensavelmente a revisão constante conforme a experiência acumulada ao longo do processo. Não deve seguir uma mentalidade conservadora, que abdique de quaisquer progressos nem deve ser até “raptado” pelos titulares de interesses já adquiridos, deixando o sistema político democrático sem avanço nenhum”, atirou. “Isto não é defender a Lei Básica nem o princípio “Um País, Dois Sistemas”, mas sim denegrir este princípio e prejudicar a dignidade da Lei Básica”, acusou.

Orçamento para o próximo ano aprovado por unanimidade

Os deputados aprovaram por unanimidade o orçamento do Governo para o próximo ano, que prevê um saldo positivo de 597 milhões de patacas. No entanto, como o montante previsto para as despesas é superior às receitas, o saldo positivo só é possível pelo recurso a 26,6 mil milhões de patacas da reserva financeira.
Apesar da aprovação, Ella Lei e Leong Sun Iok, ligados à Federação da Associação dos Operários de Macau (FAOM), mostraram algumas preocupações. A legisladora questionou o corte de 200 milhões de patacas nos apoios à saúde. Apesar de o secretário para a Economia e Finanças, Lei Wai Nong, ter garantido que o corte não vai ter impacto no sector, Ella Lei confessou estar preocupada com os apoios às clínicas privadas poderem ser afectados, originando uma possível corrida aos centros de saúde públicos.
Leong Sun Iok criticou a injecção de 140 milhões de patacas na empresa de capitais públicos Macau Investimento e Desenvolvimento. Esta entidade foi na semana passada alvo de críticas do Comissariado de Auditoria, devido a gastos desnecessários. O secretário respondeu que o Executivo respeita as conclusões do CA e prometeu “optimizar” as operações da empresa.

Sem água nem luz

Também ontem foi aprovada, na generalidade e por unanimidade, uma nova lei da construção urbana, que segundo o secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo do Rosário, permite cortar o abastecimento de água e electricidade às fracções que não demolirem obras ilegais assinaladas pelo Governo.
A questão levantou dúvidas, mas o secretário sublinhou que é uma solução de “último recurso”, que poderá ser ajustada na especialidade, ou seja, quando se discute a lei artigo a artigo.
Além desta novidade, a DSSOPT fica com o poder de obrigar os proprietários de um apartamento a fazer obras, quando estiverem em causa questões de segurança pública, como queda de janelas ou reboco, e a garantia dos edifícios irá ser de um período que pode chegar aos 10 anos, após a construção.

Imobiliário | Lesados da Grande Baía sem soluções

Os residentes de Macau que foram lesados na compra de imobiliário no Interior no caso Guang Bo Hui, que causou 70 vítimas na RAEM em 2019, ainda hoje estão à espera de solução. A revelação foi feita pelo deputado Leong Sun Iok, apoiado pela Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM), que mencionou queixas de lesados ao Conselho de Consumidores e Delegação de Guangdong da FAOM.
“Nos últimos anos, o Conselho de Consumidores tem alertado os residentes para o risco de comprar casa no exterior, mas este e a Delegação de Guangdong da Federação das Associações dos Operários de Macau continuam a receber pedidos de apoio sobre conflitos na aquisição de habitação no Interior da China, nomeadamente, em Jiangmen, Zhongshan, Zhuhai e Hengqin, envolvendo muitos residentes e montantes avultados”, afirmou. “Os lesados podem pedir o reembolso por via judicial, mas até agora os problemas ainda não foram resolvidos, o que para eles é uma tortura mental diária, aumentando os conflitos familiares e afectando as pressões económicas”, acrescentou.
Face à lentidão da justiça no Interior, Leong Sun Iok apresentou sugestões ao Governo de Macau, para que tome medidas e crie um novo mecanismo que efectivamente proteja os residentes no âmbito dos investimentos na Grande Baía. A ideia passa por criar “mecanismos de cooperação para ajudar as vítimas na reivindicação dos seus direitos”.

Economia | Ip Sio Kai sugere união bancária com PLP

Ip Sio Kai, vice-Director-Geral da sucursal de Macau do Banco da China, defende a criação de uma união bancária em Macau com os Países de Língua Portuguesa (PLP), de forma a promover a Grande Baía e desenvolver mais trocas a nível dos serviços financeiros. A ideia foi apresentada ontem na Assembleia Legislativa, e entre outros aspectos poderia permitir que os PLP, através da compra de dívida em renminbis, invistam no Interior.
O deputado defende que desta forma Macau pode afirmar-se na função de plataforma e ser essencial para que também os bancos comerciais da Grande Baía consigam desenvolver produtos financeiros mais próximos da procura em países como Angola, Moçambique, Cabo Verde, Brasil ou Portugal. “Através do aproveitamento pleno das vantagens do sector bancário sino-português, ao nível de informações, recursos humanos, produtos e condutas, deve-se apoiar os bancos comerciais a estabelecerem a sua capacidade de serviços característicos dos PLP”, apontou como estratégia.
Segundo Ip Sio Kai, com este posicionamento, Macau pode aproveitar a expansão do renminbi como moeda internacional: “Os mercados-alvo são a Grande Baía e os PLP, e com capital suficiente, liquidez, produtos complementares, serviços, etc., reforçam-se as funções da plataforma de serviços financeiros China-PLP, com expansão gradual da dimensão do mercado offshore em renminbi”, acrescentou.

LAG | Kou Hoi In “picado”

Sulu Sou criticou a forma como os debates das Linhas de Acção Governativa são organizados pelo presidente da Assembleia Legislativa, principalmente no que diz respeito à sessão com o Chefe do Executivo, por considerar que o modelo não permite contra-argumentos, e por haver cada vez menos tempos para os deputados falarem. A apresentação que contou com relatos dos debates com outros presidentes da AL, como Susana Chou, fez eco de críticas partilhadas por Mak Soi Kun, com base em opiniões da população. Contudo, ao contrário do que aconteceu com Mak, o presidente da AL, Kou Hoi In, não gostou da intervenção e acusou o democrata de não ser rigoroso. Apesar desta situação ter acontecido no início da sessão, o presidente da AL acabaria por voltar ao tema no final, quando advertiu os deputados por fazerem perguntas de especialidade, em debates na generalidade.

DSSOPT | Mak Soi Kun elogia “mana” Chan Pou Ha

Mak Soi Kun, deputado e construtor civil, elogiou ontem o trabalho da directora da Direcção de Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, Chan Pou Ha, que apelidou de “mana” Ha. Ontem, o deputado criticou a Administração Pública e apontou que as melhorias com o novo Governo no funcionamento da “máquina” dependem mais do esforço individual dos directores do que da forma como tudo está organizado. Também o secretário para Administração e Justiça, André Cheong, e Arnaldo Santos, presidente do Instituto de Habitação, receberam elogios. “Os exemplos que citei são bons para demonstrar que o regime está morto e a pessoa é que está viva”, afirmou Mak Soi Kun.

Óbito | Agnes recordou Devoy

Agnes Lam recordou ontem na Assembleia Legislativa a irmã Juliana Devoy, que morreu na segunda-feira, aos 83 anos. Devido à importância do trabalho de acção social e à entrega a causas e direitos das mulheres, a deputada assinalou o momento, ao sublinhar que Juliana Devoy se dedicou a Macau e que merecia ser “reconhecida”. Lam e Devoy colaboraram no caso de Lao Mong Iong, a mulher que foi atacada com ácido e ficou desfigurada, depois de ter pedido o divórcio ao marido.

17 Dez 2020

Construção | Prevista realização de 363 obras viárias no próximo ano

Entre os trabalhos que vão ser feitos nas estradas, 55 são de grande dimensão e 28 transitam de anos anteriores. Este ano, os efeitos da pandemia permitiram acelerar as obras nas vias públicas em pelo menos 1.000 dias de construção

No próximo ano o Governo prevê a realização de 363 obras viárias, entre as quais 55 de grande dimensão. Os números foram apresentados ontem durante uma conferência de imprensa, organizada pela Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT).
Em relação a 2020 existe um aumento de um quinto no número de pedido de obras, uma vez que este ano o Governo tinha recebido pedidos para 301 obras nas estradas.
“Para o ano de 2021 recebemos pedidos para a realização de 363 obras nas vias, entre as quais 55 obras de grande dimensão. Este ano tínhamos recebido pedidos para 301 obras, e também 55 de grande dimensão”, afirmou Lo Seng Chi, subdirector da DSAT. “Mais de 20 grandes obras que fizeram parte da estatística de 2020 estão pendentes e por isso foram incluídas nas 55 obras para o próximo ano”, acrescentou.
O aumento dos pedidos foi explicado por Lo Seng Chi com o investimento público planeado para o próximo ano, que segundo Ho Iat Seng anunciou durante as Linhas de Acção Governativa, deverá chegar a 18 mil milhões de patacas.
As obras que vão decorrer em 2021 estão relacionadas com a instalação da rede de drenagem, instalação de canalização para o transporte de gás natural, melhoramento das vias, ou mesmo com a construção da quarta ligação entre Macau e a Taipa ou a extensão do Metro Ligeiro.

Zonas mais afectadas

Os trabalhos anunciados vão afectar com maior impacto o trânsito na Avenida Venceslau Morais, Rotunda da Avenida da Amizade e Avenida do Dr. Rodrigo Rodrigues, na Península, e nas rotundas do Estádio e dos Jogos da Ásia Oriental, na Taipa. Os trabalhos deverão demorar até 400 dias.
Os pormenores sobre as alterações ao trânsito só mais tarde serão anunciados, mas sabe-se que ao longo do ano autocarros como o 1A, 2, 2A, 3A, 6A, 10, 10B, 10X, 18, 18A, 18B, 28B, 29 e 34 vão ser afectados.
Ao contrário do que aconteceu em muitos sectores, os efeitos da pandemia da covid-19 no acelerar das obras foram positivos e permitiram ganhar pelo menos 1.000 dias de construção, nas principais artérias da RAEM.
“Durante a pandemia foi mais fácil organizar os trabalhos porque foi possível fazer algumas obras que estavam pendentes, porque havia menos trânsito e pessoas a circularem”, justificou Lo Seng Chi. “Quando calculamos o efeito para todas as obras, foram ganhos cerca de 1.000 dias de execução”, sublinhou

16 Dez 2020

Direito | Governo mostra abertura para regulamentar sociedades de advogados

O Governo diz-se disposto a avançar para a regulamentação das sociedades de advogados, um assunto que há vários anos permanece na gaveta da Associação dos Advogados de Macau. Se tal acontecer, o hemiciclo terá de votar o novo diploma. Advogados dizem que é preciso regulamentar algo que já acontece na prática e explicam as razões de um impasse de vários anos

Quando foi à Assembleia Legislativa (AL) discutir o relatório das Linhas de Acção Governativa (LAG) para a sua tutela, o secretário André Cheong, da área da Administração e Justiça, disse que existe abertura para a regulamentação das sociedades de advogados. Mais tarde, o HM confirmou junto do gabinete de André Cheong que existe abertura para rever o Estatuto do Advogado, implantado em 1991 e alvo de duas alterações, a última em 1995.
“Nos termos do artigo 24.º do Estatuto supramencionado, a lei especial regulamentará a constituição e funcionamento de sociedades de advogados, ouvidos o Conselho Superior de Advocacia (CSA) e a Associação dos Advogados de Macau (AAM). Actualmente não há regime referente a sociedades de advogados estabelecidas em Macau.”
Nesse sentido, “o Governo adopta uma atitude aberta em relação à legislação e às orientações legislativas do regime, e irá auscultar as opiniões e sugestões do Conselho Superior de Advocacia e da AAM, de acordo com a lei”, explicou ainda o gabinete de André Cheong.
Esta é uma velha questão que tem suscitado braços-de-ferro na classe profissional.
O que é certo é que no último congresso da Associação de Advogados de Macau (AAM), no ano passado, o advogado Sérgio de Almeida Correia foi uma das vozes que criticou a falta de regulamentação das sociedades.
Numa apresentação feita no contexto do congresso, Sérgio de Almeida Correia disse que “continuamos sem uma regulamentação das sociedades de advogados, o que não impede o seu funcionamento de facto à margem da AAM, como ‘simples firmas comerciais’, em que nada contribui para a dignificação desta, nem para a resolução do problema”.
“Esperamos que seja no mandato da actual direcção que essa regulamentação conheça a luz do dia”, acrescentou o causídico. “A existência de práticas sem enquadramento e cobertura legal tem permitido a existência de situações deontológica e disciplinarmente discutíveis, sem que o CSA actue ou a Direcção se preocupe, pese embora a forma como depois acaba por a alguns fazer exigências incompreensíveis”, adiantou.
Sérgio de Almeida Correia diz que mantém a mesma posição face a este impasse. “O que considero deplorável é que, ao fim destes anos todos, não se tenha avançado um milímetro, permitindo-se depois na prática situações sem qualquer enquadramento legal, que são uma fraude e que induzem as pessoas em erro.”

O que acontece hoje

O advogado Jorge Menezes considera que é cada vez mais importante “dar verdade a esta mentira e regulamentá-la”, uma vez que, na prática, os escritórios já funcionam como sociedades. No entanto, como não existe uma regulamentação, acontece o facto de escritórios de grande dimensão aceitarem a defesa de intervenientes em posições opostas num mesmo processo porque, na teoria, cada advogado trabalha por si.
“A partir do momento em que tal suceda [a regulamentação], o mesmo escritório fica numa situação em que não pode aceitar processos em que estejam envolvidos conflitos de interesses. Agora cada escritório poderá dizer que cada advogado é um advogado, e que um escritório não mais é do que uma soma de advogados, pelo que um deles pode ter um processo e um outro advogado representar a parte contrária num mesmo processo. Ou situações em que um escritório defende primeiro uma parte e mais tarde defende a outra.”
Neste sentido, “o facto de não haver sociedades permite a desculpa para aceitar processos que, de outra forma, não seria admissível e seria uma violação ética grave”, frisa o advogado.
Jorge Menezes esclarece ainda que, caso cada advogado trabalhasse por si, jamais poderia ter acesso a todos os processos num só escritório. “Não há separação dos arquivos. Uma das razões para evitar conflitos de interesse é o segredo profissional, e os arquivos tinham de ser completamente estanques e inacessíveis aos outros advogados. Neste caso, não só os arquivos estão acessíveis como o servidor, com todos os processos, é comum a todos.”
O advogado Óscar Madureira chegou a fazer parte de uma comissão criada especialmente para este fim, que entregou um documento à direcção da AAM para regulamentar a matéria.
“Foi submetido um documento à direcção, mas nunca mais se discutiu o assunto”, revelou ao HM.
Para o causídico, esta é uma questão que peca por tardia. “Não quer dizer que a prática individual não possa ser idónea, competente e responsável, tanto que tem sido sempre assim em Macau. Mas a prática da sociedade é corrente em todo o mundo e do ponto de vista da responsabilidade é muito mais protectora dos clientes.”
Ter uma sociedade de advogados regulamentada “é uma forma mais organizada, rigorosa e transparente do exercício da advocacia em conjunto”. “É um sinal dos tempos e uma evolução. Percebo as razões pelas quais existe relutância [em regulamentar este assunto]”, disse Madureira.
Poderá estar em causa a possibilidade de sociedades de advogados internacionais poderem entrar no mercado. “Nunca ninguém me confirmou a razão desse impasse, mas acho que existe algum receio de que a prática da advocacia em sociedade possa trazer as sociedades internacionais. Muitas delas são de Hong Kong, americanas e porque não da China. Mas existem formas de se limitar essa participação, basta que se delimite que um sócio de uma sociedade tenha de ser advogado em Macau”, apontou.
Questionado sobre se o Direito de Macau poderia ser um problema, Óscar Madureira rejeita. “Os sócios dessa sociedade continuariam a ser advogados habilitados a exercer em Macau, pelo que essa questão não se punha. A [chegada] das sociedades internacionais é uma falsa questão, porque não regulamentando é que podem surgir situações de menor transparência.”
Relativamente ao facto de Macau estar a caminhar a passos largos para a integração regional no contexto do projecto da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau, Óscar Madureira considera que essa é mais uma razão para se avançar nesta matéria.
“Se Macau tende a integrar-se mais na Grande Baía com outras jurisdições onde está regulado o funcionamento das sociedades, porque é que Macau há-de ficar atrás? Não há muito a ganhar nesse contexto, pois Macau tem óptimos advogados e em número suficiente para poder exercer e constituir sociedades”, explicou.

Uma questão de contas

Para Miguel de Senna Fernandes está na altura de a classe de advogados se modernizar e adaptar aos novos tempos. “É uma incógnita, não sei porque se tem travado tanto este assunto.”
“Não sei porque o Governo, até este momento, nunca adoptou uma medida sobre isto, quando se sabe que muitos advogados se agrupam e sentem necessidade de se juntar num corpo de serviços. Não sei se entende que uma sociedade possa afectar a questão da responsabilidade dos advogados”, defendeu.
Miguel de Senna Fernandes recorda que, à luz do Código Civil, existe a noção de lucro associada a uma sociedade. “Será que se pode falar de lucros numa sociedade de advogados? Nós temos os nossos honorários, uma contrapartida pelos serviços que prestamos. Mas haverá uma maneira de contornar essas questões.”
Jorge Menezes explicou que actualmente “como os escritórios têm de partilhar lucros e despesas, constituem sociedades que são gestoras de escritórios, e que são uma espécie de sombra das sociedades de advogados”.

AL terá de votar

Caso se avance para a regulamentação, os deputados da Assembleia Legislativa terão de votar a matéria. Para Sérgio de Almeida Correia, tal poderá levantar algumas questões. “Antes [de 1999] era aprovado por decreto-lei, mas esta figura, e a da portaria, foram abolidas após a transição. Se isto tem sido feito em 1996 não se colocaria este problema agora e há muito que estaria resolvido. Houve falta de visão dos que, na altura, mandavam na AAM, que são os mesmos de hoje.”
O causídico diz que houve “medo de perder ‘negócios’ com a chegada das sociedades”, existindo agora “o medo de ir à AL e perderem [a AAM] o estatuto de associação pública”. “Provavelmente, iremos todos, advogados e cidadãos, pagar o preço do egoísmo de alguns. Mas as sociedades entraram de forma encapotada”, frisou.
Jorge Menezes alerta para o facto de ser o Governo a avançar para esta regulamentação. “Isso de o Governo querer mexer no Estatuto do Advogado é uma coisa um bocado assustadora. A ideia fundamental é sermos a única associação auto-regulada. É fundamental que os advogados sejam uma ordem com completa autonomia, o Governo não pode decidir nada, para que os advogados não sofram nenhum tipo de pressão, nomeadamente de natureza política. E aí, Neto Valente tem lutado muito pela autonomia da AAM em relação ao Governo”, rematou.

16 Dez 2020

Covid-19 | Governo comprou vacinas produzidas na China, Europa e Estados Unidos

As farmacêuticas Sinopharm, BioNTech e AstraZeneca foram as escolhidas para vacinar a população de Macau contra a covid-19. A cada uma foram compradas 400 mil doses, esperando-se que as primeiras cheguem antes de Março. Menores de 16 anos e grávidas não vão ser vacinados

O Governo encomendou 400 mil doses de vacinas contra a covid-19 à Sinopharm, BioNTech e AstraZeneca, anunciou ontem a coordenadora do Núcleo de Prevenção de Doenças Infecciosas e Vigilância da Doença. Um dos aspectos destacados pelo Governo é o poder de escolha resultante da oferta que será disponibilizada. “A população pode escolher qual a vacina que quer que seja administrada”, avançou Leong Iek Hou, ressalvando que isso só será possível quando houver mais de um tipo de vacina disponível.
Prevê-se que as vacinas do grupo Sinopharm – fabricadas em Pequim – cheguem até Março do próximo ano. Seguem-se as vacinas de RNA mensageiro, da BioNTech, adquiridas à Fosun Pharma e produzidas na Alemanha, França e Bélgica. Esta remessa tem data de chegada mais indefinida, primeiro semestre do próximo ano.
A terceira vacina, feita com base num vector modificado de adenovírus, é da farmacêutica Astrazeneca e chega a Macau no segundo ou terceiro trimestre de 2021. O agente de venda é de Hong Kong, e o produto é fabricado nos EUA.
Por motivos de confidencialidade, Leong Iek Hou não revelou o orçamento para a compra destas vacinas. A sua administração é voluntária, e os residentes estão isentos de pagamento. No entanto, as autoridades continuam sem assegurar gratuidade para trabalhadores não residentes.
Macau aderiu à aliança para vacinas e imunização da Organização Mundial de Saúde em Julho, e em Setembro adquiriu cerca de 200 mil doses, tendo já pago o depósito. Porém, prevê-se que as vacinas no âmbito da COVAX cheguem apenas entre Outubro e Dezembro do próximo ano.

Uma fatia de fora

As autoridades adiantaram ontem novidades em relação aos indivíduos com prioridade para a administração da vacina. “Os grupos de pessoas altamente expostas ao risco e com maiores necessidades são os primeiros destinatários da vacina, nomeadamente o pessoal da linha da frente: profissionais de saúde, bombeiros, polícias”. As autoridades de saúde apontam também como “grupos altamente expostos no trabalho” funcionários na área do transporte de mercadorias ou que contactam com produtos congelados e refrigerados. O terceiro grupo são residentes que têm de sair de Macau para ir ao estrangeiro.
“Depois da administração da vacina destes três grupos de pessoas com maior necessidade é que vamos efectuar a vacinação de toda a população”, disse Leong Iek Hou. No entanto, dados recentemente conhecidos afastam uma parte da população do plano de inoculação. Assim sendo, ficam de fora menores de 16 anos, grávidas, e mulheres que pretendam engravidar nos três meses seguintes.
A administração urgente de vacinas foi posta de parte. Já não se considera “premente” porque, entretanto, os ensaios clínicos estão finalizados. A coordenadora do Núcleo de Prevenção de Doenças Infecciosas e Vigilância da Doença apontou que não será exigido às farmacêuticas que forneçam de uma só vez as 400 mil doses adquiridas, pelo que haverá fases de entrega diferentes. Também vai ser tido em conta o espaço para armazenamento e conservação das vacinas.
Apesar de não haver planos para exigir vacinação a quem vier a Macau, o médico Alvis Lo Iek Long não afasta essa possibilidade.

15 Dez 2020

Óbito | Irmã Juliana Devoy morreu aos 83 anos

Após uma vida dedicada aos direitos das mulheres e à acção social, a irmã Juliana Devoy morreu ontem aos 83 anos. Há mais de três décadas em Macau, a bondade e o trabalho no Centro Bom Pastor ficará para sempre na memória daqueles que tiveram o privilégio de a conhecer. Entre batalhas ganhas por Juliana Devoy destaca-se a criminalização da violência doméstica

Faleceu ontem de manhã no Centro Hospitalar Conde de São Januário, a irmã Juliana Devoy, antiga directora do Centro do Bom Pastor, após uma vida dedicada aos direitos das mulheres e a outras causas como o tráfico humano. Tinha 83 anos e era natural do Nebrasca, nos Estados Unidos da América.
Reconhecida pelo trabalho desenvolvido há mais de 30 anos desde que chegou a Macau ao Centro Bom Pastor, Juliana Devoy foi louvada pelo Governo de Macau em duas ocasiões. A primeira em 1997, quando a administração portuguesa atribuiu a medalha de mérito filantrópico e a segunda em 2012, quando o Executivo da RAEM lhe destinou a medalha de mérito altruístico.
Contactada pelo HM, a actual directora do Centro do Bom Pastor, Debbie Lai, ressalva que a missão e a atitude da irmã Juliana “contribuiu muito para mudar a mentalidade das pessoas de Macau”, especialmente sobre os direitos das mulheres e das crianças e a respectiva consciencialização desses mesmos direitos.
“Ela deu inúmeros contributos para mudar a sociedade, mas talvez o maior tenha sido ao nível da lei da violência doméstica, situação que antes da sua intervenção não era considerada crime público”, lembrou Debbie Lai.
Importa ressalvar que para a criminalização da violência doméstica em Macau muito terá contribuído a deslocação de Juliana Devoy às Nações Unidas em 2014, para falar no Comité de Direitos Humanos sobre o tema.

Luta de causas

Quem também conviveu de perto com a irmã foi Agnes Lam. Ao HM, a deputada conta que a morte de Juliana Devoy “é uma grande perda para toda a sociedade de Macau”, mas também para as mulheres e as minorias que apoiou. Agnes Lam partilhou que, para além de ser encarada como um símbolo de justiça para as mulheres, e em termos de igualdade de género, “era também um símbolo de bondade”.
“Conheci a irmã Juliana nos anos 90, quando começou no Centro do Bom Pastor e, por isso, acho que devo ter sido a primeira jornalista chinesa a entrevistá-la sobre as lutas que estavam a travar. Ao longo do tempo, falámos muitas vezes acerca de casos de violência doméstica e adolescentes grávidas que foram abandonadas e ela ajudou todas essas mulheres. Mais tarde, fui escolhida para ajudar no Centro do Bom Pastor e durante alguns anos mantivemos uma reunião mensal para falar de problemas que se passavam na sociedade e para colocar na agenda temas como a criminalização da violência doméstica”, partilhou a deputada.
Uma das situações mais marcantes para a qual Juliana Devoy mobilizou esforços, recorda Agnes Lam, diz respeito ao caso de Lam Mong Ieng, mulher atacada pelo marido com óleo a ferver e ácido, deixando-a desfigurada e com lesões permanentes que lhe custaram a visão.
“Da primeira vez que a família da vítima contactou comigo, falei com a irmã Juliana para ver como podíamos ajudar. Ao princípio não sabíamos o quão grave eram os ferimentos e não havia reacção do Governo. A irmã esteve em silêncio ao longo de toda a reunião e um pouco zangada comigo até, pois achava que não devíamos esperar por ninguém e avançar com a angariação de fundos o mais cedo possível”, conta a deputada.
De todas as pessoas com quem travou contacto no Centro do Bom Pastor, Agnes Lam ressalva que “todas mencionaram a forma como a irmã Juliana as ajudou ao início, numa altura em que havia poucas verbas”, tendo chegado a angariar dinheiro “a título pessoal”. “Ela tomava genuinamente conta das pessoas, de uma forma personalizada. Dava todo o seu tempo e devoção para ter a certeza que todos à sua volta sentiam amor”, rematou Agnes Lam.

Sem hesitar

Meses depois de terminar o ensino secundário, Juliana Devoy integrou a Congregação de Nossa Senhora da Caridade do Bom Pastor em Los Angeles. Estávamos em 1954, Juliana Devoy tinha 17 anos e vontade de ser missionária longe de casa.
“Quando me despedi da minha família sabia que eles me podiam visitar, mas sabia também que nunca mais voltaria a casa. Somente a graça de Deus e a alegria que experimentei podem explicar como fui capaz de tal sacrifício”, pode ler-se no perfil de Juliana Devoy escrito na primeira pessoa e que consta no portal da Congregação para a região da Ásia-Pacífico.
Daí rumou a Hong Kong em 1963, onde ficou até 1988, ano em que veio para Macau.
“Quem quereria ir viver para Macau? Não se passa lá nada. Nunca pensei que os mais de 20 anos que passei em Macau seriam, na verdade, o período dourado da minha vida enquanto missionária. Aqui em Macau tive a oportunidade de criar, inovar e de fazer coisas que não poderiam ser feitas noutros lugares. No nosso Centro do Bom Pastor fomos capazes de receber muitas mulheres e meninas, desde adolescentes grávidas a vítimas de violência doméstica, passando por vítimas menores de tráfico humano (…) e tantas outras que não encaixam em nenhuma categoria”, pode ler-se no mesmo perfil. “Tem sido uma enorme alegria ser um instrumento de Deus para intervir em tantas vidas”.

Regresso a casa

Objecto de uma “amizade profunda de muitos anos”, o Padre Luís Sequeira conta que conheceu Juliana Devoy mesmo antes de ser padre e que teve o privilégio de a acompanhar no último retiro que fez, há cerca de duas semanas. A morte, conta, já estaria nos seus pensamentos.
“Diria que tive o privilégio de estar no último retiro que ela fez, há poucos dias antes de falecer, e posso dizer que durante esse caminho, que é um período de oito dias muito intenso (…) a linha de orientação foi a intimidade com Deus. Sinto que a irmã Juliana que tanto deu ao serviço das pessoas em grandes dificuldades e na problemática da mulher, estava a preparar-se para a morte. No meu entender, ela preparou-se, o que se explica com o desejo de estar intimamente ligada à Deus”, partilhou.
Segundo Luís Sequeira, esta “inconsciente” preparação para a morte, materializa “uma aspiração profunda de conhecer totalmente Deus”, característica da experiência fulcral das irmãs do Bom Pastor, em que a morte é sentida “como o encontro com Deus de uma mulher crente”.
O sacerdote da Companhia de Jesus lembra ainda que Juliana Devoy “tinha um dom especial para acompanhar e ajudar pessoas em grandes dificuldades” e que, mais recentemente, o seu trabalho estava mais orientado para o tráfico humano, apesar de o foco ter sido sempre “a problemática da família e, mais especificamente, da mulher”.
“Concretamente em Macau, é cada vez mais claro que o tráfico humano se faz e está muito ligado à diversão, prostituição e tudo isso. São situações que trazem grandes angústias às pessoas”, conta Luís Sequeira.
Sobre os marcos alcançados ao longo dos anos, o sacerdote não tem dúvida que o que fica, e que maior retorno terá dado a Juliana Devoy, foi o impacto que a sua obra teve na criação de “legislação mais condizente com a condição da mulher”.
“O que lhe poderá ter dado mais consolação como consequência da sua dedicação foram, em certo sentido, essas manifestações do tipo legal que promovem a protecção da mulher, pois houve uma evolução nos últimos anos (…) que ajuda pessoas em extrema dificuldade a melhorar as suas vidas”, apontou.
Questionado sobre a forma como irá recordar Juliana Devoy, o sacerdote destaca que, para sempre, sobressairá “o grande vigor interior na ajuda às pessoas em grande angústia”.
“Por vezes não se nota nem se vê, mas a angústia é uma realidade da vivência humana que está a aumentar cada vez mais. Ela com a sua vocação e perspicácia profundamente humana e espiritual foi ao encontro dessa angústia que vai tomando conta das nossas sociedades”, rematou.

15 Dez 2020

Política da Juventude | DSEJ troca pensamento crítico por “prudente”

A DSEJ garante que a independência de raciocínio está salvaguardada, apesar de a versão chinesa da Política da Juventude conter o termo “pensamento ponderado”, em vez de “crítico”. A chefe do departamento de juventude frisou que os alunos devem ter uma atitude prudente

A Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ) defendeu na sexta-feira a substituição do termo “pensamento crítico” por “ponderado” no documento em chinês da Política da Juventude para a próxima década. A chefe do departamento de juventude da DSEJ, Cheong Man Fai, argumentou que não se está a restringir o pensamento dos jovens, apontando razões culturais para a troca. “Na nossa cultura chinesa criticar pode ter um sentimento de negar, ou uma atitude ou posição oposta a tudo”, disse em conferência de imprensa.
No dia anterior, a Associação Novo Macau tinha alertado para as diferenças nos documentos em chinês e português. Sulu Sou considera que a troca do termo “pensamento crítico” está relacionada com o receio do impacto dos movimentos sociais de Hong Kong e outras regiões nos jovens de Macau.
“Sempre enfatizámos o ‘critical thinking’ [como] um pensamento independente”, frisou Cheong Man Fai, descrevendo que os alunos “devem ter conhecimentos suficientes, uma visão alargada e assim poderem julgar o que é correcto ou incorrecto”. A responsável entende que os jovens devem adoptar “uma atitude muito prudente”, só julgando as coisas depois de as conhecerem.
A mudança de terminologia na versão em chinês surgiu durante a recolha de opiniões para a elaboração do documento. “Os alunos devem ter uma atitude ainda mais prudente. Depois de recolher as opiniões do público e revermos o significado deste termo, pensamos que o pensamento prudente ou moderado é melhor”, disse Cheong Man Fai. A responsável da DSEJ apontou que o público também considera o termo “mais adequado”. No entanto, não avançou de quem partiu a ideia. “É difícil indicar qual foi a associação que sugeriu a alteração desse termo”, disse a chefe de departamento.
Em resposta aos jornalistas, frisou que a liberdade dos alunos se mantém. “Não estamos a mudar, limitar ou colocar uma restrição ao seu pensamento. Muito pelo contrário. O pensamento crítico será ainda mais restritivo, porque dentro do pensamento moderado ou prudente também se articulam alguns conteúdos que não contradizem o pensamento crítico”, disse Cheong Man Fai, acrescentando que por vezes traduções são alteradas devido a “questões linguísticas ou culturais”.

Escala emocional

Apesar de o patriotismo ser uma das prioridades do plano para a Política da Juventude, não existem critérios para analisar se um jovem alcança o objectivo. Cheong Man Fai frisou que o “sentimento de amor pela pátria é um sentimento pessoal”, à semelhança do amor pela família, e que passa pela pessoa “estar ciente e saber que o Estado, o país, merece protecção”. A responsável esclareceu que há critérios para avaliar a implementação da política da juventude, mas não para apreciar o sentimento patriótico. “Será que os alunos vão ajudar ou dedicar-se ao país quando este enfrenta uma grande dificuldade? Tudo isso é difícil de avaliar. (…) Não vamos avaliar os alunos com critérios fixos”, descreveu.
Wong Kin Mou, chefe do departamento de estudos e recursos educativos da DSEJ, defendeu que temas como o amor à pátria e a saúde mental dos estudantes têm recebido atenção, mas que “só com continuidade” é possível melhorar.
A DSEJ recolheu mais de 500 opiniões durante as sessões de consulta pública sobre a nova Política da Juventude.

14 Dez 2020

Auditoria | Projecto de medicina tradicional chinesa em Hengqin considerado dispendioso

O Comissariado da Auditoria considera que o modelo adoptado pela Macau Investimento e Desenvolvimento para a gestão do Parque Científico e Industrial de Medicina Tradicional Chinesa na Ilha da Montanha é “dispendioso” e deve ser revisto. Em reacção, Lei Wai Nong prometeu aumentar a fiscalização e fundir filiais

O Comissariado da Auditoria (CA) considerou “dispendioso” e contraditório o modelo de desenvolvimento adoptado pela Macau Investimento e Desenvolvimento (MID) para a gestão do Parque Científico e Industrial de Medicina Tradicional Chinesa em Hengqin (Ilha da Montanha). 

Segundo um relatório divulgado na passada sexta-feira, a entidade fiscalizadora questiona o modelo de gestão e construção “por conta própria” pela empresa de capitais públicos, sem que, para isso, tenham sido avaliados os prós e contras de outros modelos de desenvolvimento e respectivas estimativas de custos. 

“Em 2016, a MID fez uma estimativa dos custos de desenvolvimento de todo o Parque Industrial por conta própria, servindo esta estimativa de referência para as dotações a requerer junto do Governo (…) para os anos subsequentes. A auditoria verificou que antes de se optar pelo “modelo de desenvolvimento do terreno por conta própria, não houve qualquer análise às vantagens e desvantagens de outros modelos de desenvolvimento e das estimativas dos custos de cada modelo de desenvolvimento. Tal mostra que a MID não levou a cabo uma análise abrangente e profunda das questões”, pode ler-se no relatório.

O modelo adoptado foi o “arrendamento sem venda”. A auditoria entende que com uma análise comparativa de modelos de desenvolvimento do terreno teria sido possível “saber, com certeza, quais as vantagens e desvantagens, bem como os custos de cada modelo”.

É também referido que o facto de a MID ter feito “preparativos para uma eventual venda dos terrenos” demonstra que “houve contradições entre as decisões tomadas e a sua aplicação prática”.  

O CA aponta ainda que, de acordo com as estimativas apresentadas pela MID num novo plano elaborado em 2019, o valor total previsto para o parque de medicina tradicional chinesa seria de 16.353 milhões de renminbi, montante superior em 2.600 milhões de renminbi previstos nas estimativas elaboradas em 2014, que eram de 13.768 milhões. Ficam assim por explicar “os benefícios concretos do novo plano”, sendo que a MID “carece de clareza” sobre os resultados a alcançar e os fundamentos da análise que levou a cabo.

A estimativa da MID prevê também a alocação de 6.501 milhões de renminbi, relativa aos custos de investimento em todos os projectos de construção em conta própria. Contudo, o CA refere que, se a empresa de capitais públicos continuasse a adoptar o modelo de desenvolvimento de conta própria sobre os terrenos cujo modelo de desenvolvimento não está definido, “os seus accionistas teriam de investir mais 8.262 milhões de renminbi”.

O relatório dá ainda nota para o facto de a MID ter ido avante com o modelo de construção por conta própria, apesar de se ter verificado que a maioria dos potenciais investidores preferiam modelos alternativos.           

 “Após a recolha e análise dos dados, verificou-se que a maioria dos potenciais investidores preferiam um dos seguintes modelos: arrendar o terreno ao titular do direito de uso, arrendar as instalações ou a construção conjunta. Porém, a MID acabou por decidir que todos os terrenos que já tivessem propostas de desenvolvimento seriam desenvolvidos por conta própria”.

Resort à deriva

Também sobre o projecto de desenvolvimento integrado da Ruilian Wellness (Hengqin) Resort, dedicado à prestação de serviços de cuidados médicos, saúde e de hotel, o relatório do CA acusa a MID de apresentar “apreciações contraditórias” para justificar a opção de exploração por conta própria. “A MID nunca considerou nem analisou as vantagens e desvantagens da exploração de um hotel por conta própria e por conta de uma empresa que se vier a estabelecer no Parque”, aponta o CA.

O documento refere ainda que a MID foi incapaz de fornecer documentos de análise e registos de trabalho relacionados com as estimativas de retorno a 10 anos, fixadas em 8,3 por cento, e apresentadas pela empresa de consultoria em 2017. Em vez disso, e na ausência do relatório final, o organismo “apenas obteve um PowerPoint e um balancete elaborados na altura pela empresa de consultoria”.

O ajuste da taxa interna de retorno para os 6,2 por cento com base num período de exploração a 20 anos apresentado em 2020 pela empresa de consultoria originalmente contratada e a nova empresa de consultoria, levantou também dúvidas ao CA. “Como a MID não analisou devidamente a taxa de retorno estimada pela empresa de consultoria, nem recebeu desta o relatório final, é difícil saber se a estimativa original era demasiado optimista ou se o desenvolvimento do projecto de empreendimento não correu conforme o planeado”. 

Lucros e incertezas

Considerando que existem “incertezas quanto à possibilidade de o modelo de desenvolvimento actual chegar a um ponto de equilíbrio ou que venha a gerar lucro”, o CA considera que a MID deve rever várias questões “ponto por ponto”.

Das opções a considerar, fazem parte a necessidade de constituir um grande número de subsidiárias, o estabelecimento de um mecanismo de fiscalização viável, definir o que se pretende com o Parque Industrial e o seu modelo de exploração e ainda fazer uma análise aos riscos dos investimentos feitos no empreendimento hoteleiro.

“A MID deve analisar com rigor os modelos e o plano de desenvolvimento do terreno do Parque Industrial, e fazer com que as tarefas confiadas pelo Estado sejam cumpridas com rigor para, deste modo, contribuir para o bom desempenho na cooperação entre Guangdong e Macau”, pode ler-se no documento.

Além disso, o CA sublinha que, tratando-se de uma empresa de capitais públicos, antes de se decidir por investimentos que envolvam montantes significativos do erário público, “a MID deve explicar aos accionistas de forma clara e detalhada o investimento em causa, como será gerido o lucro, para assim provar que o investimento se justifica”. 

Desde a sua criação, em 2011, até 31 de Dezembro de 2019, a MID detinha, no total, 21 subsidiárias, incluindo 17 empresas a operar no projecto do Parque Industrial e quatro empresas a operar no projecto Zhongshan.  

Durante o mesmo período, foram feitos seis aumentos de capital, no valor de 9.285 milhões de patacas, sendo que o valor total despendido nos projectos de investimento foi de 8.964 milhões. Deste valor, 8.074 milhões foram investidos no projecto do Parque Industrial e 890 milhões foram investidos no projecto Zhongshan.

Menos é mais

Reagindo ao relatório do CA, o secretário para a Economia e Finanças, Lei Wai Nong referiu, em comunicado, já ter dado instruções à MID para avaliar” de forma aprofundada e efectiva” os seus modelos de gestão e operação. 

Em cima da mesa, estão planos de reforma e ajustamento globais, o reforço do mecanismo de fiscalização, a elevação da eficiência através do bom aproveitamento dos recursos públicos e ainda, a fusão de filiais da MID. As instruções vêm em linha com o que foi definido pelo Chefe do Executivo no relatório das Linhas de Acção Governativa (LAG) para 2021. “Será avaliada, de forma global, a situação operacional das filiais da MID e procedido, com pragmatismo, à fusão das mesmas, pretendendo (…) simplificar a estrutura da MID, optimizando a sua gestão e melhorando a qualidade do seu desempenho”, avançou o secretário.

Quanto aos terrenos que estão por explorar Lei Wai Nong aponta que “serão realizados estudos e delineados novos posicionamentos”, com o objectivo de “fazer melhores preparativos em prol do desenvolvimento industrial e fomentar a industrialização da medicina tradicional chinesa”.

O secretário aponta ainda que os cargos da direcção “devem ser desempenhados por indivíduos dotados de senso comercial, conhecimento sobre eficiência económica e capacidade de gestão empresarial” e que, por essa razão, a colocação de pessoal será feita a partir de agora, tomando essa direcção    

Face às sugestões apresentadas no relatório do CA e as orientações do Chefe do Executivo, Lei Wai Nong exige que a MID avalie aprofundadamente todos os aspectos relevantes, “aquando da realização de quaisquer actividades de investimento ou projectos de desenvolvimento”, tendo sempre em mente “a utilização com cautela dos erários públicos”. 

14 Dez 2020

Construção Civil | Acidente mortal lança debate sobre impacto da crise para a segurança

Um desabamento numa obra elevou o número de vítimas mortais em acidentes de trabalho este ano para 10. No sector, reconhece-se que a evolução da segurança tem aumentado consideravelmente nos últimos anos, mas existe a preocupação de que a crise económica possa afectar a segurança

Com o acidente da passada terça-feira, o número de vítimas de acidentes de trabalho subiu para 10 e ultrapassou a marca do ano anterior, quando nove pessoas perderam a vida no exercer da profissão. A ocorrência mais recente aconteceu numa obra de construção civil, um dos sectores mais propícios a acidentes com vítimas mortais, e lançou o debate sobre a possibilidade de haver redução nas despesas relacionadas com as medidas de segurança.

No caso, um trabalhador de 50 anos ficou soterrado quando escavava uma vala para a passagem de um tubo de esgoto, adjacente à Avenida dos Jogos da Ásia Oriental, na Taipa. A obra, onde aconteceu o desabamento e que vitimou o trabalhador não-residente, natural do Interior, tinha sido encomendada pelo Instituto para os Assuntos Municipais (IAM).

Apesar de ainda não haver um relatório público sobre as causas do acidente de terça-feira, Lei Ka Chi, presidente da Associação da Segurança na Construção de Macau, não afasta a possibilidade de ter havido um descuramento das medidas de segurança.

“Quando alguém do sector olha para as condições da obra nota que há erros óbvios. Por exemplo, numa construção com mais de 1,2 metros de profundidade é necessário instalar tábuas para suportar de forma temporária a terra. E é óbvio que isso não foi feito”, considerou Lei. “Como no dia 8 foi um feriado, não se afasta a possibilidade de os inspectores terem facilitado na supervisão e a construtora ter ignorado as medidas de segurança para cortar um custo”, acrescentou. “Temos de perceber que muitas vezes quando se saltam procedimentos de segurança, isso resulta apenas numa poupança de custos para as empresas”, frisou.

Pressão financeira

Na discussão das Linhas de Acção Governativa (LAG), Ho Iat Seng anunciou um investimento de 18,5 mil milhões de patacas na construção civil para promover a procura interna. No entanto, Lei Ka Chi fala de um sector para as empresas locais com margens de lucro bastante espremidas, devido a uma competição feroz e cada vez mais aos impactos para a economia decorrentes da pandemia da covid-19.

Este é um contexto que leva o presidente da Associação da Segurança na Construção de Macau a mostrar-se reticente face às perspectivas das questões de segurança no sector.

“A situação não nos permite estarmos optimistas para o futuro. Actualmente, os preços praticados na construção são irrazoáveis, demasiado baixos, e para sobreviverem as construtoras podem sentir-se motivadas a ignorar as medidas de segurança”, avisou Lei Ka Chi. “É fundamental que haja inspecção neste aspecto, porque estamos a falar de gastos essenciais para garantir a segurança dos trabalhadores”, reforçou.

O empresário mencionou também o caso de uma obra pública, que não especificou, em que fez uma proposta de 16 milhões de patacas no concurso público. A proposta vencedora apresentou um orçamento de 9 milhões de patacas. “O nosso preço pareceu-nos o adequado quando consideramos todos os factores, inclusive a segurança. Mas, no final houve uma diferença de 50 por cento”, apontou.

Obrigações contratuais

Ao contrário de Lei Ka Chi, Tommy Lau Veng Seng, ex-deputado nomeado pelo Chefe do Executivo e vice-presidente da Associação de Construtores Civis e Empresas de Fomento Predial de Macau, não acredita que as medidas de segurança sofram com a crise. Para sustentar este ponto de vista, Tommy Lau indica que os concursos públicos exigem que um certo montante seja gasto com as medidas de segurança.

“Eu não acredito que haja patrões que arrisquem a vida dos trabalhadores para pouparem dinheiro. Mas também sei que a Administração já adoptou medidas para garantir a segurança nas suas obras, por exemplo obriga que as propostas dos concursos públicos revelem o montante que vai ser gasto na segurança”, afirmou o construtor. “Quando os empreiteiros fazem as propostas já contam com o dinheiro que vão gastar nessa área, por isso acho que não têm uma motivação para cortar. Pelo menos, nos contratos públicos acho que este problema não se vai colocar”, acrescentou.

Opinião semelhante à de Tommy Lau é defendida por Harry Lai, um dos responsáveis pela empresa Lai Si, que reconhece que o ambiente de negócios está mais difícil. “O ambiente no sector está pior, porque o volume das obras foi reduzido e não se espera que no próximo do ano se regresse ao volume anterior à pandemia”, traçou como cenário. “A concorrência nos concursos públicos está mais intensa, principalmente no que diz respeito aos prazos das obras. Mas não acredito que as empresas, principalmente as maiores e mais conhecidas, vão arriscar a sua reputação ao nível da qualidade das obras ou da segurança”, considerou Harry Lai.

Uma história de evolução

Desde 1999 que nunca se morreu tanto no trabalho como nos anos de 2015 e 2016, com 19 e 21 mortes, respectivamente, que coincidem com o período em que estava em construção a segunda fase dos grandes hotéis no Cotai.

O aumento pode ser explicado com um maior número de obras, relacionado com o desenvolvimento económico, e também com a maior complexidade dos trabalhos realizados. No entanto, para os três empreiteiros ouvidos pelo HM, nunca a segurança no trabalho atravessou uma fase tão positiva em Macau, o que atribuem a políticas pró-activas da Direcção de Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL).

“A ideia que tenho é que se tivermos em conta o número de obras e acidentes mortais, a proporção era mais elevada no passado. Até porque a DSAL tem tomado medidas para que os próprios trabalhadores estejam mais atentos à necessidade de se protegerem”, afirmou Lei Ka Chi, presidente da Associação da Segurança na Construção de Macau.

Quando se fala do passado, na década de 90 e no início dos anos 2000, a atitude dos trabalhadores face aos equipamentos de protecção individual era vista como problemática. É o que recorda Tommy Lau: “Quando falamos desses anos era normal que os trabalhadores se recusassem a usar o capacete de protecção, as botas ou os arneses”, apontou. “Não havia tanta informação e as pessoas preferiam sentir-se mais confortáveis no trabalho a utilizar os equipamentos, mesmo que estes fossem oferecidos pelos patrões”, reflectiu.

Para a maior segurança, também contribuíram os empregadores, que o ex-deputado diz serem cada vez mais exigentes, assim como o Executivo. “Hoje em dia ninguém anda num estaleiro de obras sem o capacete, é obrigatório, e as empresas asseguram que isso é cumprido. Mesmo os trabalhadores têm de ter uma formação da DSAL sobre medidas de segurança e só quando obtêm o cartão podem ser contratados”, indicou.

Tommy Lau considera ainda que a DSAL faz cada vez mais e mais rigorosas inspecções aos estaleiros. Também Harry Lai elogia o Governo a nível das exigências de segurança nos estaleiros, mas indica que se pode fazer mais. “Os esforços da DSAL têm sido muitos e bons, mas pode ser feito mais para promoção e divulgação. Acho que se deve considerar criar um programa de prémios para os cumpridores”, sugeriu.

Momento de viragem

No sector da construção civil não há muitas dúvidas, a construção dos casinos pelas operadoras norte-americanas com empresas internacionais constituíram-se como um marco histórico. “Com a entrada da Sands, em 2003, houve realmente um aumento muito grande das exigências nos estaleiros. Houve um maior alerta para as questões do Governo e do sector e os resultados a que assistimos hoje em dia resultam dessa mentalidade”, opina Lei Ka Chi.

Tommy Lau concorda com esta visão: “As construções no Cotai trouxeram uma experiência e conhecimento a nível da segurança que não existia no sector local”, apontou. “Quando chegaram as empresas internacionais de construção o ambiente de segurança nos estaleiros era muito rigoroso para o que se fazia na época. Os gerentes eram muito pouco tolerantes para quem não queria utilizar capacetes e equipamentos de segurança e essa mentalidade foi ficando”, explicou. “Foi uma experiência de um ambiente de trabalho que não era comum, mas que ficou e levou muitos trabalhadores a perceberem e a aceitarem medidas que lhes podem salvar a vida”, acrescentou.

Por isso, quando olha para o passado, Tommy Lau tem a opinião que a construção civil é hoje uma actividade “muito menos perigosa do que no passado”. Contudo, não exclui que acidentes mortais vão continuar a acontecer, apesar dos esforços dos envolvidos e do desenvolvimento tecnológico: “A segurança passa por tentar prever todos os cenários possíveis e adoptar medidas para minimizar os riscos desses cenários para os trabalhadores. Só que há sempre a hipótese de não se conseguir prever tudo, e é essa hipótese que justifica muitos acidentes”, reconhece.

11 Dez 2020

Emprego | Wang Sai Man pede mecanismo para contratação de TNR retidos

Wang Sai Man pediu uma forma provisória de contratar os trabalhadores não residentes que não conseguem sair de Macau. Algo que o deputado justificou não só com a necessidade de recursos humanos, mas também com preocupações de segurança – riscos que o secretário Wong Sio Chak já disse serem “insignificantes”

Wang Sai Man quer que o Governo crie um mecanismo provisório para a contratação de trabalhadores não residentes (TNR) que por causa da pandemia tenham ficado retidos em Macau. O objectivo é que a curto prazo se possibilite a sua contratação legal por parte de micro, pequenas e médias empresas, bem como por famílias. O deputado alega que a medida “vai contribuir para uma redução dos riscos de segurança na comunidade e, ao mesmo tempo, aliviar a urgente necessidade de recursos humanos por parte de algumas empresas e famílias”.
Wang Sai Man reconheceu ontem a situação de muitos trabalhadores não residentes, que “foram despedidos por causa da epidemia”, ou não tiveram contrato renovado, e que devido à suspensão de voos internacionais não conseguiram regressar ao local de origem, ficando retidos no território. O deputado indicou ainda que como os Serviços de Migração só lhes emitem um “título de apresentação”, não podem ser legalmente contratados.
“Durante a permanência em Macau, esses trabalhadores não têm qualquer rendimento para sustentar a vida, por isso é alta a probabilidade de passarem a dedicar-se a trabalho ilegal, e alguns atrevem-se a colocar a sua vida em risco na prática de ilegalidades, o que constitui um perigo para a segurança pública”, declarou.
Note-se que o risco representado pelos TNR retidos em Macau foi anteriormente desvalorizado pelo próprio secretário para a Segurança. No debate das Linhas de Acção Governativa, a deputada Chan Hong associou a impossibilidade de alguns TNR saírem de Macau – e por isso ficarem com permanência provisória – a um aumento de crimes como abuso de menores e roubos. No entanto, Wong Sio Chak respondeu que os Serviços de Polícia Unitário estudaram a criminalidade de TNR e indicaram que entre Março e Julho os casos diminuíram. O secretário acrescentou ainda que os riscos por não conseguirem sair “são insignificantes”.
Além de questões de segurança, Wang Sai Man apontou a dificuldade de contratação de empregadas domésticas para apelar à criação do mecanismo de contratação temporário. “A Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais tinha sugerido que contratassem empregadas domésticas do Interior da China, mas os empregadores disseram que o salário, as regalias e o ambiente de trabalho em Macau não são atractivos para estas empregadas domésticas”, comentou. Além disso, indicou que nem todas as famílias conseguem dar alojamento a estas trabalhadoras.

Contratação conservadora

O emprego foi também tema central da intervenção de Leong Sun Iok, que pediu ao Governo para lançar uma terceira ronda de medidas de apoio económico para ajudar a população. O deputado mostrou-se preocupado com a dificuldade de a economia recuperar a curto prazo, observando que as vacinas vão demorar algum tempo a chegar a Macau. Assim, o deputado antecipa que as micro, pequenas e médias empresas vão “continuar a enfrentar grande pressão” e “passar a ser mais conservadoras” na contratação de trabalhadores.
Leong Sun Iok espera assim mais dificuldades por parte dos residentes no acesso ao mercado de trabalho. “Os trabalhadores que não foram demitidos e que anteriormente auferiam salários altos estão muito preocupados com o seu futuro, não depositam muita expectativa na obtenção de bónus, duplo salário e aumentos salariais”, acrescentou. Com a aproximação do Ano Novo Chinês, o deputado aponta a necessidade de gastar mais dinheiro – e consequentemente o aumento da pressão no trabalho e “na vida”.
Tendo em conta que a previsão das receitas do jogo no orçamento para o próximo ano é de 130 mil milhões de patacas, Leong Sun Iok aponta que a Fundação Macau poderá mobilizar mais de dois mil milhões de patacas. “A prestação atempada de apoios ajudará as empresas e a população a ultrapassarem as dificuldades”, apelou.

10 Dez 2020