João Luz Manchete PolíticaEleições | Melinda Chan promete lutar pelo português nas escolas chinesas O ensino do português em escolhas chinesas, e vice-versa, é uma política pela qual a líder da lista Aliança para a Mudança quer lutar. A primeira lei que Melinda Chan quer ver aprovada na nova Assembleia Legislativa é o aumento das pensões de idosos, uma matéria que é da competência do Executivo [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] número três da lista Aliança para a Mudança, Jorge Neto Valente, quer uma maior integração linguística entre as comunidades que falam português e chinês. Como tal, uma das propostas que gostaria de ver discutida na Assembleia Legislativa (AL) é a introdução do ensino obrigatório do português nas escolas de matriz chinesa, e vice-versa. A ideia é aprofundar o bilinguismo desde o ensino básico até ao secundário. A própria cabeça-de-lista, Melinda Chan, lamenta o facto de não ter estudado português durante o seu percurso académico. Apesar de ser uma proposta enunciada por Jorge Neto Valente, a líder da Aliança para a Mudança garante que esta será uma das suas lutas no hemiciclo, mesmo se o seu número três não for eleito. “Se um for eleito, leva as sugestões de todos”, comentou. A ideia foi apresentada pela lista de Melinda Chan numa acção de campanha digna de um estúdio de televisão, com quatro pódios a evocar a atmosfera de debate, um mestre de cerimónias e aplausos do público. A candidata explicou que “este foi um novo estilo, um novo conceito” para a sua campanha eleitoral. A líder da lista recordou que a Associação de Beneficência Sin Meng, a que preside, tem 21 anos de ligação com a comunidade macaense. Propostas executivas Questionada sobre que primeira lei gostaria de ver aprovada na AL, Melinda Chan respondeu que quer corresponder à confiança depositada pelos idosos e aumentar as pensões. Uma medida que não carece de diploma legal, mas sim de acção governamental. Ainda na lista de promessas da lista Aliança para a Mudança, como de muitas outras candidaturas, a habitação ocupa um lugar fulcral. Nesse aspecto, Melinda Chan entende que o Governo deve atribuir subsídios aos compradores de primeiras casas. A cabeça-de-lista acrescentou ainda que a venda de imóveis a não residentes deve ser dificultada de modo a dar prioridade aos cidadãos. Além disso, a Aliança para a Mudança entende que os números de habitação pública devem ser aumentados e que o Executivo deve apresentar uma calendarização aos cidadãos neste aspecto. Outro dos cavalos de batalha da lista é a defesa das pequenas e médias empresas (PME), um segmento da economia onde Melinda Chan quer ver maior agilidade no processo de licenciamento. Depois de dois mandatos na AL, a candidata quer representar melhor os jovens que completam o ensino superior e que procuram casa e emprego. Quando aos mais idosos, além do aumento das pensões, Melinda Chan quer aumentar o número de vagas em lares para a terceira idade. Durante a acção de campanha, a cabeça-de-lista destacou a extensão do seu programa político, que tem 69 propostas, como uma evidência de que há muito trabalho por fazer em Macau.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeMarisa Peixoto, directora do Jardim de Infância D. José da Costa Nunes Era, até há bem pouco tempo, educadora no jardim-de-infância de matriz portuguesa, mas a saída de Lola Flores do Rosário levou à sua escolha para a direcção do D. José da Costa Nunes. Marisa Peixoto quer aproximar a escola aos pais e à comunidade, e diz que são necessários mais terapeutas da fala em Macau [dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m novo ano lectivo, mais alunos. O que traz de novo ao Costa Nunes? Por enquanto, ideias, porque tenho de seguir o que já estava definido. Normalmente preparamos o ano lectivo no fim do ano anterior. Tenho sobretudo ideias para implementar nos próximos anos. Espero que o ano lectivo corra da melhor maneira possível e que as crianças saiam daqui felizes, e que os pais também estejam satisfeitos. É, portanto, uma directora na continuidade. Ajudei a fazer o plano anual, mas ainda como educadora. Como directora ainda não trago nada de novo. Disse que queria fomentar o ensino do cantonês. Como é que isso vai ser feito? O cantonês já existia no ensino extracurricular. Este ano vamos ter o cantonês mas em moldes de workshops, e como são muitas horas dá para estender durante todo o ano lectivo. As crianças vão participar, sendo que o workshop é também dirigido a funcionários. O jardim-de-infância é de matriz portuguesa, mas tem cada vez mais alunos chineses. O objectivo deste projecto é ir transformando aos poucos a escola numa instituição bilingue? Não, de todo. O objectivo é que as crianças portuguesas e de língua não materna chinesa (temos crianças que só falam mandarim) possam aprender um pouco mais de cantonês, que é a língua que se fala na rua. Eu adorava saber cantonês, por exemplo. É interessante, já que vivemos em Macau, ter essa oportunidade, e decidimos estender isso às crianças. Quanto mais cedo começarem, melhor. O jardim-de-infância recebe mais alunos todos os anos. Há uma capacidade de expansão e de resposta face a esta tendência? Por enquanto temos capacidade de resposta, mas não iremos ter para muitas mais turmas. Estamos a usar a sala de actividades no edifício novo, onde estão as educadoras de infância. Temos ainda salas no edifício antigo, que são usadas como refeitório e também para as restantes actividades. A nossa capacidade não irá além de duas ou três salas, mas estão sempre a sair os alunos de cinco anos, que ocupam quatro salas. Por isso temos capacidade de reabrir estas salas. Sobre o ensino do mandarim, vão tentar equilibrar o ensino nas duas línguas? O mandarim é obrigatório para todos, mesmo para as crianças que já dominam a língua. Temos apoio ao português todos os dias e as crianças que já dominam o cantonês podem ter workshops de português, enquanto as outras estão nos workshops de cantonês. Mas ainda vamos fazer esses horários. As línguas dificultam o processo de integração dos alunos e a relação com as educadoras e os colegas? No início é um pouco difícil, se bem que tentamos ter sempre na sala alguém que fale cantonês. Algumas educadoras falam, mas nem todas. Depois, as crianças vão interiorizando algumas palavras. Para os pais também é difícil, ficam ansiosos porque não conseguem ajudar. Acham que depois de um mês as crianças já deveriam falar português. Eu tive a experiência como educadora. Como não domino cantonês, sentia que não os conseguia perceber para satisfazer as necessidades que tinham. Esperava chegar a directora de uma escola em Macau, sobretudo uma instituição como esta, com um papel importante na sociedade? Não, de todo. Estava a fazer o meu papel como educadora com muito gosto e não estava à espera. Fiquei contente porque é o reconhecimento do meu trabalho. Quando saiu a directora Vera Gonçalves achava que a nova directora (Lola Couto do Rosário) era para ficar. Traz a estabilidade que o Costa Nunes precisa, com esta nova direcção? Espero que sim. Disse-me que está a seguir o plano que já tinha sido estabelecido. Mas que novas ideias traz para o jardim-de-infância? São ideias que vou ter de amadurecer com as minhas colegas, porque muitas são elas que as põem em prática. Gostava de chamar mais os pais, para que fizessem mais parte deste processo educativo de três anos. Gostava de ter mais actividades direccionadas a pais e filhos e também à comunidade envolvente. Ia passar por pequenos e grandes projectos. Quero chamar mais a comunidade e os pais ao jardim-de-infância. As famílias entregam muito a educação dos seus filhos à escola e depois há um distanciamento? Não tenho essa ideia, de todo. Mas, se calhar, até gostariam de estar mais presentes. Temos algumas actividades dirigidas a pais e filhos, mas não muitas. Sinto os pais muito interessados no processo de educação dos filhos. A língua portuguesa é realmente uma aposta da parte deles. O Costa Nunes vai responder a isso nos próximos anos? Há uma manutenção desta tendência? Penso que sim, e se tivermos mais crianças de língua não materna portuguesa teremos de ter mais apoio, dentro e fora da sala de aula, ao português. A tendência vai continuar a ser esta, a ter mais crianças de língua materna não portuguesa. Em termos de recursos humanos fazem falta mais educadoras bilingues? Se existirem, óptimo. Por outro lado, se não souberem, não caem na tentação de falar a mesma língua da criança. Desta forma, as crianças mais rapidamente entendem o português e fazem um esforço para falar e entender. Mas, de facto, se houvesse mais educadoras bilingues não sentiam as dificuldades que senti no início. Pretendem contratar mais pessoas? Se abrirmos novas salas sim, até lá penso que não. Em termos de infra-estruturas, havia alguns projectos de obras em andamento. Como está esse processo? Já foram autorizadas as obras no recreio, que serão feitas no Verão do próximo ano. As obras nada têm que ver com tufão, tivemos apenas pequenos danos. O Costa Nunes continua a fazer a diferença e a demarcar-se das outras instituições de ensino? Como? A maior diferença – e é a opinião dos pais que nos chega, chineses sobretudo – é ser uma escola com um currículo muito diferente, mais aberto, onde as crianças aprendem através do brincar. Não temos o ensino da escrita e da leitura. Se virmos que a criança tem necessidade disso, claro que vamos alimentar, mas não é institucional, não é obrigatório. Temos crianças que antes de chegarem aos seis anos já conseguem ler, e aí não pomos de parte essa competência. Essa obrigatoriedade de leitura e de escrita não está sequer nas metas que seguimos de Portugal e de Macau. Os pais sentem essa liberdade e gostam da parte de brincar dos filhos, sentem falta disso nos currículos das escolas chinesas. Tendo em conta as novas directrizes implementadas pela Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ), acha que o ensino é muito exigente e apela pouco à criatividade e pensamento livre do aluno? As escolas pecam por isso. A DSEJ está a tentar mudar, a criar currículos mais flexíveis e que as escolas apliquem isso, que dêem importância à parte artística e ao brincar, que é tão importante nestas idades. É uma questão cultural, mas a DSEJ está a tentar mudar para melhor. Chegou a Macau em 2014. Que desafios sentiu em relação ao sistema educativo? Tive de mudar algumas coisas porque tinha crianças de língua não materna portuguesa. Esse foi o meu maior desafio. Tive de remodelar o meu modo de ensino, os meus planos, e tentar trabalhar de modo a dar mais apoio a essas crianças. Quando queria contar uma história, a alunos de três anos, tinha de usar coisas mais visuais. Tive de me adaptar. É preciso inovar no sistema educativo local? Em termos de recursos humanos e não só de docentes, mas ter, por exemplo, mais formação para o pessoal auxiliar? Em relação ao pessoal auxiliar, ou agentes de ensino, nenhuma das pessoas que temos cá tem formação em educação. Em Portugal já há esse curso e acho que seria importante ter cursos de formação aqui. Sentimos que é importante, e fazia a diferença e sentido. Em termos de apoio pedagógico ou de medidas para crianças com necessidades educativas especiais, há lacunas? No nosso caso, não temos necessidade de mais terapeutas. Temos duas educadoras a tempo inteiro para o apoio ao aluno inclusivo, três conselheiras escolares e uma psicóloga. Sentimos falta, com a quantidade de crianças que temos tido, de termos mais terapeutas da fala. Começamos a sentir que a pessoa que dá a terapia da fala não tem mãos a medir com tantas crianças. Seria importante termos um terapeuta mais dirigida para a nossa escola e não um profissional que tenha de andar por várias escolas. Pelo menos que estivesse a tempo parcial. É necessária uma flexibilização do sistema de recrutamento no sector da educação? Acho que sim. Não temos direito a um terapeuta só para nós, temos de seguir algumas normas, como termos um número de alunos suficiente. Mas depois têm poucas horas por semana. Os alunos recebem esse apoio, mas não é necessário para resolver alguns casos. Há pais que têm de recorrer ao apoio privado, e a maioria das terapeutas só fala chinês. Terapeutas que dominam o português são poucos. Aquando da saída de Lola Flores do Rosário foi noticiado que havia questões relacionadas com orçamentos por clarificar. Tudo isso já foi resolvido? Sim, penso que foi sobretudo sobre o financiamento do Fundo de Desenvolvimento Educativo, da DSEJ. Mas já está tudo resolvido.
Sofia Margarida Mota Eventos MancheteGonsalo Oom, arquitecto: “Gosto da influência das igrejas no espaço urbano” “Desenhos Expressionistas de Macau” é a exposição de Gonsalo Oom que mostra, a partir do dia 28, uma série de trabalhos acerca da paisagem do território. As obras vão estar na Creative Macau e trazem, na sua maioria, a interpretação do (também) arquitecto da expressão urbana da península É a sua primeira exposição individual no território. O que é que vamos ver na Creative Macau? A exposição chama-se “Desenhos Expressionistas de Macau” e tem que ver com a minha leitura e interpretação do território. São desenhos artísticos. Não são tão figurativos como os que faço em arquitectura, e deixam margem para uma interpretação. Sou arquitecto e normalmente temos de fazer desenhos sempre muito rigorosos, o que não acontece neste caso. Da arquitectura ao desenho artístico. Como é que aconteceu esta passagem? Comecei a desenhar para dar os trabalhos de presente aos meus amigos que casavam. Desenhava igrejas essencialmente. Têm que ver com arquitectura e era uma coisa de que gostava. Não tinha muito dinheiro e era um bom presente. Recordo que, na altura, tinha tanto trabalho acerca deste tipo de edifícios que quase que dava para fazer um roteiro das igrejas de Lisboa. Já na altura desenhava a carvão. Esta exposição também é maioritariamente a carvão. Sim. O carvão tem algumas particularidades, um bocadinho como o que acontece nos materiais que se escolhem na pintura. Há desenhos em que, por exemplo, uso aquilo que pode ser visto como tinta-da-china, mas não o é. É tinta de cargas de caneta em que também é requerida uma técnica específica. Quando tiro a carga da caneta, a tinta começa a borrar e há que saber controlar esse borrão. É uma mancha que se vai trabalhando para se retratar o que se está a ver, mas de uma forma, digo, expressionista. Este trabalho também depende de uma série de factores, como a emoção. É tudo desenhado à vista. Não dá para estar em casa a ver fotografias. Mas há sempre algumas dificuldades quando se sai para desenhar à vista. Temos sempre de lidar com insectos, com o calor e mesmo com pessoas. Desenhei uma vez ali em frente à Escola Portuguesa e quando os alunos saíram e me viram a trabalhar não consegui fazer mais nada. O mesmo aconteceu nas Ruínas de São Paulo. Encontrei um sítio porreiro, mais discreto, mas as pessoas acabaram por me descobrir. Gosto mais de estar recatado. Não desisto, mas estas situações acabam por interferir no trabalho. Macau é um lugar fotogénico? Sim. Os contrastes que existem no território, apesar de nem sempre serem bons, resultam muito bem no desenho. Que lugares escolheu para desenhar para esta mostra? Lá está, vamos ter igrejas e outras situações urbanas. Gosta especialmente de igrejas? Gosto da influência das igrejas no espaço urbano. A igreja é um local de conforto e de calma. Agora são mais as lojas, em Macau. Uma pessoa entre numa loja e tem a oportunidade de se refrescar, mas acho que antigamente as pessoas também iriam para as igrejas com esse objectivo (risos). Gosto também, ao nível urbano, da influência dos casinos, da massa formada por eles. Desenhei umas coisas para umas paredes grandes, era uma sequência de painéis com a skyline de Macau vista da Taipa. Tenho alguns trabalhos assim, nesta mostra. Enquanto arquitecto, como vê a alteração da paisagem local? Acho óptimo. Quer dizer, não deixa de provocar alguma perturbação porque as coisas parecem não ter controlo e há situações muito fortes. Em termos de urbanismo há coisas que “chocam”. Chegar às Ruínas de São Paulo e ver o prédio que está atrás é muito estranho. É um edifício que acaba por estragar um elemento icónico do património. Vim pela primeira vez para Macau em 2006. Voltei para Portugal pouco depois e regressei em 2013 numa altura de muita construção, pelo que assisti a muita transformação que acabou por afectar a paisagem. Já participou noutras exposições – e também na Creative Macau – com outro tipo de trabalhos. Sim. Já participei com objectos, principalmente com peças de mobiliário. Desenhar móveis é uma obsessão que tem que ver com a tridimensionalidade. Esta oportunidade foi uma sorte. Tenho um dos meus desenhos integrado na exposição que está a decorrer no mesmo local actualmente, e a responsável, Lúcia Lemos, constatou que tinha um espaço de um mês para preencher e acabou por me convidar. A minha primeira ideia até foi uma exposição com os trabalhos feitos pelas pessoas de Macau que desenham. Há muita gente a fazer isso e que depois não tem como mostrar o que faz. Achei que seria giro fazer uma coisa dessas. Será o próximo passo. Já alguma vez pensou em dedicar-se apenas à pintura e ao desenho? Caso não tivesse trabalho como arquitecto, dedicava-me ao desenho a tempo inteiro. É uma coisa natural em mim, mas é preciso trabalho. Não é uma coisa que se possa dizer que as pessoas têm jeito. É preciso trabalhar muito também. O jeito não é o fundamental.
João Paulo Cotrim MancheteDois efes a conversar [dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]anta Bárbara, Lisboa, 3 Setembro Agora os caracteres andam luminosos, mas desde sempre foram iluminados. Não há luz mais intensa que a de um pensamento, nem nada mais brilhante que o gesto da escrita, fruto do desejo de contar, da necessidade de um registo, de um apoio para pensar mais e mais longe. Pensar nesta história continua a ser mergulho no enigma, que exige falar de momentos grandiosos e invenções minúsculas, mas também de matérias e imagens, de religiões e rebeliões. De velocidades e arquitecturas, de técnicas e histórias de amor, saber e sabor. De muito, portanto, mas sobretudo de nomes e palavras: alfabeto e papel, volumen e codex, Gutenberg e Baskerville, Bíblia e Enciclopédia, minúsculas e gravura, Afonso X, El Sabio, e Geoffroy Tory, biblioteca e autor, multimédia e e-book. Quem mais senão a Natureza para fornecer o lugar da escrita? Pedras, tabuínhas de cera ou argila, ossos, folhas de palmeira, metais, peles de animais (o medieval pergaminho, por exemplo) e, enfim, liber (latim para uma película entre o tronco e a casca de certa árvore) e biblos (grego para «papyrus», essa planta oriunda do Vale do Nilo). Toda a Antiguidade se deixou escrever em longos rolos de dezenas de metros de papiro com textos copiados numa só face em colunas de 25 a 45 linhas. Como para tantos outros detalhes, pouco mais se consegue do que imaginar a enorme biblioteca de Alexandria ou obras como as 123 atribuídas a Sófocles das quais só conhecemos sete. A nossa época deve ter começado no exacto e revolucionário momento em que os rolos (volumen) passaram a codex, conjunto de cadernos dobrados e cozidos que permitiam a escrita de ambos os lados da folha, que reorganizaram o texto (títulos, capítulos, índices), que tornaram mais fácil o manuseamento e melhor a armazenagem. Questões de técnica, claro, mas que só nos nossos dias se vêem afectadas pelos formatos de computador (e-book) que possibilitam coisas de nada como procurar instantaneamente significados ou cruzar leituras, abandonando assim a evidente e sempiterna sequência das páginas. A mão foi, de facto, responsável por muitas mudanças, sobretudo a do monge copista medieval que celebrava em latim o seu Cristo reproduzindo a Bíblia, de modo cada vez mais rápido por exigência dessa fé que se espalhava através da rede crescente de mosteiros, que eram escolas e logo cidades. Terá sido a pressa que obrigou à passagem das capitais romanas para as unciais e destas para as nossas elegantes e legíveis minúsculas carolinas? Era outra a qualidade do tempo, que permitia iluminar cada página com uma arte feita de segredos e contemplações e encadernar o conjunto de modo tão protector quanto luxuoso. De velocidade só podemos falar por causa de um mistério chamado Gutenberg, a figura alemã que soube aproveitar a existência do papel, essa invenção chinesa, e as conhecidas técnicas de impressão como a de carimbos gravados de madeira para tudo verter na ideia de caracteres de chumbo móveis e tintados que por força de uma prensa conseguem, em 1454, reproduzir velozmente a célebre Bíblia de 42 linhas. Uma frase, ainda que seja um pulo, não nos consegue fazer percorrer a viagem deste instante em que o Livro é lido em voz alta, até que uma vontade de saber ou a necessidade da ficção nos fazem ver, de súbito em finais do século XVIII, um pequeno livro na mão de uma burguesa que lê apenas para si, num momento íntimo e silencioso, perigoso, portanto, um romance de cavalaria. Entre um momento e outro, não há apenas uma Europa que discutiu Deus e a Ciência, para quem as imprensas passaram a centros de saber, tantas vezes subversivo e digno de fogueiras simbólicas, há todo um percurso evolutivo feito da descoberta da numeração árabe, da pontuação e outras arquitecturas, da «ciência» dos tipos de um Garamond e da página segundo um Troy, ou da «paixão» total pelo objecto livro de um Baskerville; ou das visões gravadas para sempre como motivo de espanto, fossem elas a anatomia de Vesálio ou a de Charles Eisen para os contos de La Fontaine. Há, antes de mais, a ideia de que todos podem partilhar (em livrarias e bibliotecas) o tudo que cabe nesta caixa: todas as viagens, todos os saberes (Enciclopédia), todos os fogos pela mão não de um copista, mas de um autor. E o livro nunca foi só letras, foi iluminura e cercadura antes de ser design; foi a página fulgurante e absoluta de William Blake (Canções da Inocência e da Experiência) e as invenções de Laurence Sterne (Vida e Opiniões de Tristam Shandy) ou de Raymond Queneau (Cent mille milliards de poèmes). Foi, portanto, tudo antes de ser agora todas as formas, tamanhos e possibilidades. Os caracteres, que nunca foram cegos, continuam irrequietos. Santa Bárbara, Lisboa, 3 Setembro Na classificação das artes há uns lados de sombra onde se abrigam, ao fresco, aquelas disciplinas tão indisciplinadas e movediças que escapam às supremas etiquetas e às grandes hierarquias do gosto e da sensibilidade. São menores ou impuras, e por isso se atravessam no nosso caminho. Às vezes até se instalam para ficar nos nossos modos de ver e de experimentar. Como algumas insidiosas melodias que não nos deixam o ouvido, há pequenos momentos visuais que nos paginam os dias, que os arrumam logicamente ou os desarrumam poeticamente. Sebastião Rodrigues foi um desses discretos manipuladores com poder para, com uma capa, nos levar à descoberta de um livro fundamental, com um cartaz explicar nos uma revolução, no desenhar de uma letra nos aproximar do mundo. Era tido como designer e ilustrador, ou seja, como coordenador e intérprete mas o seu trabalho foi além disso. A sua obra tem tanto de irónica desconstrução dos modos de ver como de criação de paisagens fascinantes e faiscantes. A força de seta da linguagem de Sebastião está na maturidade que resulta do imenso trabalho de análise e leitura, de corte e costura, de um velho labor prolongado coerentemente por várias décadas. E que diz esta língua artesanal e discreta? Que os mais banais dos objectos podem ser símbolos, que uma letra pode ser uma imagem. A conversa que Sebastião Rodrigues pôs a letra a ter com a imagem é de um equilíbrio tão elegante que oferece uma inquieta tranquilidade. Dá ideia por um instante que a vida pode ser uma brincadeira entre contrários. Como se aquela estética bem humorada, aquelas sínteses luminosas fossem o sinal político da possibilidade de outras vidas, um piscar de olho à complexa simplicidade que tem um gato preguiçoso ou um f. Um efe de fragmento. Escreveu ele algures simplificando que desenhava «com a maior parcimónia os mais diversos símbolos, para os dispôr da melhor maneira que sei em variadíssimos espaços, além da parcimónia, também utilizo a alegria, (…) o jogo, (…) o improviso e até o imprevisto.» É estranho que dois efes a conversar nos possam dar lições de vida. Dois efes que falam podem dizer o quê (conferir em Divertimento, com Alexandre O’Neill, ed. Bruáa)? Dizem pontos de interrogação, corações, setas partidas e outros sinais que fora de contexto fazem outros textos, se tornam imagem. Um símbolo do jogo e da alegria que ainda pode ser a vida. Contra a morte.
Andreia Sofia Silva Manchete PolíticaNovo Macau | Lista diz-se afastada do movimento independentista de Hong Kong A lista Associação do Novo Progresso de Macau, liderada por Sulu Sou e ligada à Novo Macau, diz-se afastada do movimento independentista de Hong Kong e nega notícias que associam declarações de um candidato aos episódios políticos do território vizinho [dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ulu Sou e Paul Chan Wai Chi, os dois principais candidatos da Associação do Novo Progresso de Macau (ANPM), realizaram ontem uma conferência de imprensa para negar o que consideram serem rumores e falsas interpretações publicados na imprensa chinesa. Em causa estão comentários feitos pelo número quatro da lista, Wong Kin Long, no ano passado, nas redes sociais relativos a Macau e ao movimento independentista de Hong Kong. Em comunicado, a Associação Novo Macau (ANM), ligada à lista em causa, diz que as declarações do candidato foram retiradas do seu contexto e diz que “se opõe ao movimento independentista”. “A ANPM, ligada à ANM, rege-se pela Lei Básica e pelo princípio ‘Um País, Dois Sistemas’”. “Os candidatos da lista ANPM assinaram uma declaração de fidelidade para com a RAEM e a República Popular da China junto da Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa. As palavras que o candidato número quatro disse num debate académico foram descontextualizadas”, lê-se no comunicado. Os candidatos consideram que o surgimento destas notícias faz parte de uma “campanha para descredibilizar” a lista. “Wong escreveu nas redes sociais sobre a questão hipotética de uma possível coexistência entre a defesa da independência e candidatura. O objectivo do levantamento desta questão foi lembrar o público sobre a existência de possíveis lacunas na lei de segurança nacional e na lei eleitoral da Assembleia Legislativa”, esclarecem os candidatos. Sulu Sou e Paul Chan Wai Chi afirmam ainda que o número quatro da ANPM “foi o primeiro, este ano, a falar da discrepância entre as versões portuguesa e chinesa da lei eleitoral” Protestos em campanha Segundo o jornal Ponto Final, este caso levou a uma acção de boicote de uma actividade de campanha eleitoral levada a cabo pela ANPM. Quando os candidatos se encontravam a distribuir folhetos na zona da Rotunda de Carlos da Maia, uma dúzia de homens e mulheres começou a gritar frases como “Wong Kin Long, não envenene os jovens!”, “Perante a desgraça, a pátria apoia-nos” e “A independência de Hong Kong é desumana”. O mesmo jornal escreve que este grupo de pessoas afirmou ter lido notícias que afirmavam que o candidato seria a favor do movimento independentista de Hong Kong, que tem os activistas Joshua Wong e Nathan Law como os principais protagonistas. Ao HM, Andrew Cheung, outro dos candidatos da lista, afirmou que este episódio e a publicação destas notícias têm apenas como objectivo manchar a candidatura ligada ao campo pró-democrata. A conferência de imprensa de ontem serviu ainda para os candidatos se justificarem em relação a outros rumores que têm surgido na imprensa chinesa. Sobre o caso dos alegados subornos recebidos por Andrew Cheong, um caso que já está a ser investigado pelo Ministério Público, após queixa de Caruso Fong, os pró-democratas esperam que se faça justiça. “[Andrew] Cheong espera que o início do processo de investigação pelas autoridades revele a verdade junto do público. Cheong tem orgulho na sua participação honesta no seu trabalho e activismo”, remata o comunicado.
João Luz Manchete PolíticaCAEAL | Queixa da lista de Pereira Coutinho não vai ter seguimento Depois de começar a campanha eleitoral com um discurso onde apelou à elevação política, Tong Hio Fong entendeu que não devia dar provisão à queixa da lista de Pereira Coutinho, depois do ataque pessoal feito por Song Pek Kei num debate [dropcap style≠’circle’]“É[/dropcap] Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL) não vai dar seguimento à queixa apresentada pela lista Nova Esperança, liderada por Pereira Coutinho, contra a candidata Song Pek Kei. A decisão foi dada a conhecer ontem pelo presidente do organismo, Tong Hio Fong. O responsável justifica a posição da entidade fiscalizadora alegando que a situação em que Pereira Coutinho foi atacado pessoalmente no debate transmitido pela TDM não é da sua responsabilidade, e que cabe à estação de televisão tratar do assunto. “O debate foi organizado pela TDM e não tem uma relação directa com a CAEAL”, disse. A única acção da CAEAL a este respeito foi, disse Tong Hio Fong, encaminhar a queixa que recebeu para a estação de televisão. No entanto, caso o deputado Pereira Coutinho se sinta difamado, Tong Hio Fong sugere que se dirija às autoridades. Já quanto à situação que envolveu a eliminação de uma entrevista do candidato José Pedruco Achiam da plataforma online do jornal Plataforma, o juiz entende que se trata de situações diferentes, sendo que “foi antes da campanha eleitoral”. A mesma postura parece estar prestes a ser adoptada no que respeita às queixas dirigidas a três escolas que terão pedido aos pais dos alunos o voto numa lista específica. Para o responsável, esta é uma situação normal. “A lei eleitoral não permite que certas instituições façam campanha e têm de ter uma posição neutra, mas a lei não prevê isso para escolas privadas.” Ainda assim, Tong Hio Fong apontou que as “escolas têm de promover eleições de forma imparcial”, acrescentando que não recebeu qualquer queixa por parte dos pais no caso em apreço. Não obstante as queixas e os ataques pessoais que têm marcado algumas das intervenções de propaganda, o presidente da CAEAL mostra-se satisfeito. “Achamos que o tom é positivo, apesar de terem existido algumas irregularidades” que estão a ser tratadas pelas autoridades. É de recordar que aquando da reunião dos membros da CAEAL com os, à altura, deputados à AL, a questão das calúnias e dos ataques pessoais foi das mais discutidas. Tong Hio Fong participou ontem num simulacro do acto eleitoral no Fórum de Macau. Aquele espaço vai estar até sexta-feira aberto ao público para quem quiser ver como funciona uma assembleia de voto e o procedimento de votação. As eleições decorrem no próximo domingo das 9h às 21h, e os eleitores só têm de apresentar o BIR para poder votar. Todo o procedimento de votação é confidencial e, durante o momento do voto, “não se podem tirar selfies, usar telemóveis ou equipamentos de gravação que fotografem ou filmem o boletim de voto”. Quem o fizer está a cometer um crime, alertou. Onde fica o equilíbrio? Para a mandatária da lista Nova Esperança, Rita Santos, a decisão da CAEAL é uma surpresa. “Não há tratamento igual entre todos”, disse ao HM. A mandatária salienta que seria dispensável “fazer o espectáculo do primeiro dia, em que Tong Hio Fong disse esperar uma disputa entre cavalheiros”. A mandatária lamenta que, quando a CAEAL é chamada à responsabilidade, “passe a bola à TDM”. Rita Santos considera que a candidata da lista da Associação dos Cidadãos para o Desenvolvimento de Macau tem de responder pelo ataque pessoal que dirigiu a Pereira Coutinho. A TDM, nota, “é uma estação televisiva 100 por cento do Governo e a CAEAL tem de encarar a sua responsabilidade”.
Andreia Sofia Silva Manchete ReportagemAnálise | Indústria norte-americana do jogo com pouca influência na política local A presença da Wynn e da Sands China na indústria do jogo trouxe para Macau dois gigantes norte-americanos: Sheldon Adelson e Steve Wynn. Os dois magnatas têm uma enorme influência na política norte-americana e um pouco por onde estabelecem negócios. Por cá, passam despercebidos e não se metem no sufrágio que vai eleger o próximo elenco da Assembleia Legislativa. O HM falou com alguns analistas que desvendaram este discreto fenómeno [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s eleições em Macau estão longe de estar inundadas com dinheiro de Super Pac, de anúncios televisivos milionários, grupos de lobbies a trabalhar com legisladores e outras emanações políticas norte-americanas. A curta duração da campanha eleitoral, em comparação com os quase três anos de angariação de dinheiro que os políticos norte-americanos têm de fazer para terem uma chance de eleição, mudam a forma como os grupos de interesse se podem aproximar dos centros de poder. Ainda assim, vista a composição da Assembleia Legislativa (AL), não falta representação de indústrias como a construção, imobiliário e, claro está, o jogo. Sheldon Adelson No entanto, os dois magnatas que têm uma influência tremenda em tudo o que são corridas eleitorais americanas, não apenas à Casa Branca, parecem afastados da eleição do próximo domingo. Uma das razões para tal acontecer passa pela própria legislação eleitoral que exige uma posição de neutralidade às concessionárias de jogo no que toca à qualquer vestígio de influência nas eleições. Isso não impede que tenham assento parlamentar figuras ligadas ao sector, tal como Angela Leong. “Não podem apoiar nenhum candidato, nem podem financiar directamente ninguém em específico. Se olharmos para Angela Leong, ou Melinda Chan, que estão ligadas à indústria dos casinos, reparamos que são candidatas que estão separadas do sector durante as eleições”, comenta o académico Larry So. Entre as pessoas com mais preponderância na política norte-americana oriundas do Estado do Nevada, onde fica Las Vegas, Adelson e Wynn surgem como duas figuras incontornáveis. Na campanha que viria a conduzir Donald Trump para a Casa Branca, Sheldon Adelson fez doações de mais de 82,5 milhões de dólares para candidatos republicanos e 40 mil dólares para democratas. O magnata e CEO da Sands já havia doado mais de 150 milhões de dólares na campanha que resultou na reeleição de Barack Obama. Estas são as somas que se conhecem, que foram declaradas à Comissão Federal de Eleições. Porém, existem formas de doar dinheiro anonimamente, através dos chamados Super Pac, que escapam a este controlo. Por cá, esta influência directa nos processos de eleição/nomeação não existe. Nem de forma sub-reptícia, de acordo com Larry So. “Não acredito que, mesmo de uma forma indirecta, apoiem candidaturas, não de uma forma tipicamente norte-americana, não compram candidatos ou influenciam as eleições”. Viragem histórica Steve Wynn Mas que não se pense que os interesses de quem financia o Super Pac e grupos de lobby fica pela predilecção de candidatos. Sheldon Adelson doou cerca de 20 milhões de dólares para um Super Pac, próximo do líder da maioria no Senado, Mitch McConnell, que resultou numa iniciativa legislativa que, efectivamente, iria banir o jogo online. Uma medida que o magnata do jogo há muito perseguia. As contribuições em dinheiro tornaram-se públicas no dia 20 de Setembro do ano passado; no dia 21 a legislação foi proposta ao Senado. Em Macau, este grau de interferência não se sente. Larry So entende que existe igualmente uma barreira cultural e de política internacional, ou seja, “as relações com norte-americanos podem levantar suspeitas”. O analista explica que os líderes do sector norte-americano do jogo em Macau podem ter alguém em mente, mas que esta proximidade não pode ser estrategicamente visível. A aproximação dos interesses norte-americanos ao poder local teria de implicar “uma abordagem mais diplomática”. O apoio directo a uma lista seria um óbvio erro para máquinas empresariais que estão habituadas a estar perto dos centros decisórios. “Eles preferem usar as suas práticas normais, sendo assim mais fácil tentar influenciar políticos que já estão no poder”, comenta Larry So. Numa outra perspectiva, Arnaldo Gonçalves entende que as operadoras de jogo não têm qualquer relação com a ida às urnas. “As eleições são para eleger representantes das comunidades locais, as operadoras são meros operadores económicos como os outros”, comenta. O académico considera que um comportamento deste género seria “uma intromissão nas questões internas da RAEM”, uma interferência que não se regista noutros sectores da sociedade. Aliás, no contexto do sufrágio que se avizinha, Arnaldo Gonçalves entende que “estas eleições marcam uma viragem na história, têm uma natureza completamente diferente das anteriores, são mais abertas, ligadas a grupos funcionais e a interesses da própria comunidade, não tanto como no passado, mais ligadas a casinos e a associações mais tradicionais”. O académico considera que Macau está a atravessar um período em que, “do ponto de vista político, há mais riqueza”. Pouca utilidade Arnaldo Gonçalves. Foto: Gonçalo Lobo Pinheiro Outra das questões que pode ser determinante para a não interferência dos grupos norte-americanos nas eleições que se avizinham é a proximidade da data de fim das actuais concessões. “Os empresários dos casinos não são estúpidos, estamos a alguns anos da revisão das licenças de jogo e esse comportamento seria um tiro no pé”, comenta Arnaldo Gonçalves. O académico acresce que tal estratégia representaria uma má aposta, uma perda de dinheiro e oportunidade. Na opinião de Arnaldo Gonçalves, a própria candidatura de Angela Leong, directora-executiva da Sociedade de Jogos de Macau, acontece do ponto de vista individual. O académico encara este tipo de candidaturas numa perspectiva da importância social de uma figura de relevo na sociedade que toma um papel de preponderância na esfera política. “Acho que vamos ver esta tendência no futuro. Por exemplo, nas eleições europeias, sobretudo as locais, temos pessoas importantes da comunidade a apresentar candidaturas independentes sem ligação a partidos”, comenta. Esta é uma tendência que Arnaldo Gonçalves encara que possa vir a ser cada vez mais frequente. As diferenças entre a política norte-americana, ou mesmo ocidental, e a de Macau são consideráveis no que à orgânica diz respeito. Como tal, a influência sobre o órgão legislativo pode não ser o alvo mais apetecível de interesses especiais. Aliás, já nas eleições de 2013 Adelson e Wynn se mantiveram afastados das eleições para a AL. Benjamin Wang, director do Centro Pedagógico e Científico da Área do Jogo, levanta a questão de que o verdadeiro poder não se encontra na AL. O académico é da opinião de que exercer influência no órgão legislativo não é uma estratégia eficaz. “Nestas eleições, apenas 14 deputados são eleitos directamente pelos cidadãos e, de qualquer forma, os legisladores não são a melhor via para fazer uma aproximação ao poder, porque não têm grande influência para a indústria”, teoriza o académico. Benjamim Wang não vê na AL o alvo mais apetecível para este tipo de sector. “Não acho que os legisladores sejam os melhores agentes para afectar o Governo, aliás, o sector tem muitos canais para passar a sua mensagem, tais como meios de comunicação social para moldarem a opinião pública”, explica. O investigador entende que para estabelecer um contacto mais directo seria mais útil uma aproximação à liderança da Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos, à Direcção dos Serviços de Finanças, a representantes do Governo mais elevados, incluindo o próprio Chefe do Executivo.
Hoje Macau Manchete SociedadeExposições | Macau é o mercado “mais destacado” da Ásia Pacífico [dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]az parte dos mais pequenos e dos que se começaram a desenvolver recentemente, mas foi aquele que teve o melhor desempenho nos últimos anos. A Associação Global da Indústria de Exposições destaca o território no relatório mais recente sobre o sector. A Associação Global da Indústria de Exposições (UFI, na sigla inglesa) está satisfeita com o progresso do sector em Macau. Os elogios são deixados no mais recente relatório anual sobre a indústria de feiras comerciais da Ásia-Pacífico: para a organização, a RAEM é um dos mercados da região com menor tempo de desenvolvimento e também um dos mais pequenos, mas foi aquele que, nos últimos cinco anos, teve o melhor desempenho no mercado de exposições. De acordo com o Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM), que dá conta da avaliação da UFI, a indústria das exposições foi a que mais cresceu no período em análise, quando comparando com outros locais na Ásia. Em 2012, a área útil de exposição vendida em Macau era de 72.500 metros quadrados, tendo subido para 215.250 metros quadrados em 2016. Feitas outras contas, registou-se um aumento de cerca de 200 por cento. Apesar de a economia global da RAEM continuar a ser afectada devido ao ambiente económico externo, realça o IPIM, “a área útil de exposição vendida em Macau ainda continua a registar algum crescimento, tendo cada exposição registado, em média, receitas de cerca de 2,1 milhões de dólares americanos, pelo que se pode constatar que o desempenho do mercado de exposições de Macau teve melhor desempenho em relação ao desempenho económico global”. Futuro feliz O IPIM refere ainda que o relatório em questão destaca o “grande apoio” dado pelo Governo da RAEM à indústria de exposições, “bem como as excelentes instalações inerentes, sendo esses os factores que contribuíram para o desenvolvimento estável da indústria de exposições de Macau”. O instituto dá como exemplos a Ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau, cuja abertura está prevista para final deste ano, e a expansão gradual da rede de destinos do Aeroporto Internacional de Macau. As duas estruturas “irão melhorar significativamente o transporte regional, criando uma nova perspectiva para a economia da Região do Delta do Rio das Pérolas”. O IPIM aponta que a indústria de exposições do território deverá manter a sua actual tendência de desenvolvimento: nos próximos dois a três anos, o crescimento médio será na ordem dos cinco por cento. A UFI congrega gestores e organizadores de exposição de todo o mundo, com o objectivo de promover o desenvolvimento do sector ao nível regional e em termos internacionais. A organização pede todos os anos a consultadoria que analise e estude as exposições que têm como alvo visitantes profissionais. O relatório em que Macau surge em local de destaque é um “importante material de referência para os organizadores de exposições e entidades de gestão de exposições internacionais”. Nas estatísticas relativas a 2016, foram incluídas 26 exposições realizadas na RAEM, que geraram receitas de 53,55 milhões de dólares americanos.
Sofia Margarida Mota Eventos MancheteEntrevista | Nicole Wong e Bobo Leong, “Queremos lutar contra estereótipos” Nicole Wong é encenadora, Bobo Leong é produtora e são as responsáveis pelo projecto de teatro comunitário desenvolvido pelo Teatro Experimental de Macau. O próximo sábado é dia de estreia de “Our Bodies” no Albergue, às 15h. A peça traz as histórias das empregadas domésticas indonésias do território, contadas e representadas na primeira pessoa [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] que é que vamos ver em “Our Bodies”? Bobo Leong (B.L.) – Trata-se de uma continuação do trabalho que apresentamos no ano passado, “Our Story”. É uma peça que usa o movimento, o corpo, para contar as histórias de um grupo de empregadas domésticas de nacionalidade indonésia. São casos pessoais em que as actrizes são da própria comunidade e as histórias são as próprias. Tentamos entender as suas experiências pessoais, promover a sua sensibilidade e explorar sentimentos. É também uma peça que vai acontecer no exterior e não num espaço normalmente associado ao teatro e que desafia a atenção do público no meio de várias distracções. Estamos a falar de teatro comunitário. Porquê a dedicação a esta área dramática? B.L. – Começámos o projecto de teatro comunitário como uma extensão do trabalho do Grupo de Teatro Experimental de Macau, há quatro anos. Nos últimos dois anos estamos a explorar este tipo de acção com comunidades imigrantes no território. Quando falamos de teatro comunitário temos de ter noção de que não se trata de arte dramática, de teatro de blackbox ou de uma peça para um teatro tradicional. Temos de gastar o nosso tempo a trabalhar com algumas das comunidades com as quais decidimos trabalhar e temos de arranjar uma forma de o fazer. Queríamos uma aproximação à própria sociedade e aos seus problemas. Queríamos prestar mais atenção a assuntos que dizem respeito a alguns dos problemas sociais do território. Por outro lado, e na continuidade do trabalho do Teatro Experimental, a intervenção comunitária também nos permite ter as nossas peças originais, com os nossos textos. Quais as maiores diferenças entre o trabalho com profissionais e com cidadãos comuns? Nicole Wong (N.W.) – Quando trabalhamos com profissionais há todo um trabalho de direcção de actores que quase não é necessário neste caso. Com actores temos de os orientar com a forma como pensamos nas expressões de emoções, por exemplo. Para mostrarem uma mesma emoção têm várias formas de o fazer e cabe ao encenador escolher. Com estas pessoas não temos de fazer isso porque elas vão buscar as emoções reais que sentem em determinada situação que está a ser representada. É tudo mais natural e genuíno quando trabalhamos com a comunidade. Não precisam de representar. Uma outra diferença está no guião. Elas não seguem um guião dado. A história é feita por elas, é a sua vida com as suas histórias. Não podemos pensar em coisas novas e somos nós que temos de nos adaptar ao guião que nos dão. São empregadas domésticas indonésias que contam o que vivem ou as memórias que têm do que viveram, e trazem à peça todos os gestos e emoções que associam a isso mesmo. Como é que apareceu a ideia de trabalhar com as empregadas domésticas indonésias, em particular? N.W. – Somos formadas em jornalismo. Eu, por exemplo, lembro-me de, ainda na universidade, ter visto uma reportagem acerca das empregadas domésticas, uma população que acarreta uma série de estereótipos. São retratadas muitas vezes como uma comunidade barulhenta e mesmo suja. Mas, quando estudei em Taiwan vi o tal documentário, vi pessoas a cantarem, famílias a criarem coisas e a mostrarem a sua cultura. Isso comoveu-me. Foi a primeira vez que pensei fazer uma coisa com esta população. Quando apareceu a oportunidade de trabalhar com a Bobo, lembrei-me logo de transferir a ideia para o teatro. Por outro lado, ainda não existia nada feito em Macau sobre isto e muito menos na área do teatro. Como encontraram as vossas actrizes? B.L. – Foi através de uma associação que está ligada à comunidade indonésia e que promove aulas em várias áreas. Neste caso, a nossa proposta foi fazer um programa de workshops de teatro. Fizemos aulas de movimento e de representação. Foi ao longo destas aulas que fomos chegando às suas histórias. Não eram aulas de teatro tradicionais. Eram workshops em que, recorrendo a técnicas dramáticas e de movimento, propúnhamos aos participantes que se repensassem e que reflectissem acerca do seu papel na sociedade de Macau. Foi daí que saíram muitos dos conteúdos que estamos a usar. Como é que foi a reacção das participantes? N.W. – O nosso espectáculo é muito diferente do teatro mais tradicional: tem dança e música entre a representação. A reacção tem sido muito boa por parte das participantes. É um momento em que também criam. No espectáculo do ano passado, em que abordávamos as dificuldades e as saudades de se estar longe de casa, tínhamos dois actores profissionais a participar, mas este ano não foi necessário. Tudo o que vai ser apresentado foi feito pelas empregadas indonésias que vivem em Macau. Têm alguma história em particular que vos tivesse impressionado? B.L. – São vidas difíceis. Trata-se de empregadas domésticas que nas casas onde trabalham têm câmaras de vigilância. Apesar de ser uma das coisas com as quais dizem estar à vontade, quando começamos a explorar dramaticamente o tema, percebemos que sentem alguma falta de privacidade, o que as incomoda. Por outro lado, há as histórias do amor que se perde, que se deixa na Indonésia. Deixam os maridos para virem trabalhar aqui. Mandam dinheiro para casa e passados uns anos descobrem que estão a mandar mantimentos para uma família que não é a delas, que é uma outra porque o marido entretanto casou com outra mulher. São mulheres que valorizam o amor e que lamentam muito esta situação. Sentem-se sozinhas e traídas. O que é que este tipo de actividade pode representar para as participantes? B.L. – Penso que este tipo de trabalho representa um conforto por se poderem expressar. Poderem mostrar o que lhes vai dentro e que não têm oportunidade de o fazer. Podem também ter noção de si e dos seus sofrimentos. Penso que é uma forma de encarar as situações que as incomodam e de poderem tentar ter algumas soluções, ou um modo de as ultrapassar. É preciso enfrentar os problemas, mesmo que não tenham grande solução. É possível arranjar outras formas de os abordar. Não precisamos de aceitar tudo. Elas não precisam de aceitar tudo também. Curiosamente, no ano passado tivemos alguns patrões e as suas famílias a verem o espectáculo, o que foi interessante. A empregada doméstica passou, durante o espectáculo, a ser alguém que era admirada. Houve, por momentos, uma espécie de inversão de papéis. Os patrões viram pessoas, com as suas histórias e os seus direitos. Há muitos preconceitos acerca desta população. Este projecto serve para lutar contra estereótipos. Como é a receptividade a este projecto, por parte da população local? N.W. – A arte é uma forma de expressão, mas também uma forma muito especial de mostrar as coisas, o que não quer dizer que essas coisas sejam aceites de forma positiva. Recordo que, no ano passado, quando convidava algumas pessoas para irem ver a apresentação, a resposta era de que estas participantes não seriam boas o suficiente para poderem estar em palco. Mas nós queremos continuar com este projecto. A arte é uma forma de esta comunidade encontrar o seu espaço. É também um lugar para se pensar. Relativamente ao público, penso que o grande desafio é este tema ser aceite pelo Governo, e conseguirmos ter estas peças a serem mostradas em espaços oficiais. É conseguir integrar, por exemplo, um Festival das Artes e ir ao Centro Cultural de Macau.
Paulo José Miranda MancheteO Primo Basilio – Continuação da quarta e última parte [dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]as como é que se pode acreditar no tudo? Como é que se pode acreditar em Deus? Precisamente porque está-se deposto no vício da justificação. Desejar Deus mostra-nos claramente que todo o vício é uma justificação para nada. Viver é justificar-se de nada. Justificar-se do nada que somos. E a grandiosidade do vício está em fazer de nós animais justificativos. Só isto bastava. Isto era suficiente para nos dobrarmos perante O Primo Basílio de Eça de Queirós. Mas isto não fica por aqui. É agora, aqui, que vamos encontrar finalmente a grande passagem para a tragédia grega. Perguntemos então agora: porque é que Luísa morre? Porque o vício deixa de ter poder sobre ela. Mas como é que isso pode acontecer, como é que o vício deixa de ter poder sobre o humano? Quando o humano não consegue mais suportar a vergonha. A vergonha é o calcanhar de Aquiles do vício ou, se preferirem, a kriptonita do Super-Homem. Quando a vergonha se apossa de uma alma humana, o vício acaba e, com ele, a própria vida. Não quero com isto dizer que a toda a vergonha que sentimos tenha esse poder de acabar com o vício. Há vergonha e vergonha. Uma coisa é a vergonha social e outra a vergonha ontológica, constitutiva. Ter-se vergonha do que fizemos a alguém dói muito, mas não é por aí que o vício vai às filhoses, não é por aí que o vício morre. Isso com o tempo passa. O problema é quando a vergonha não tem direcção, não tem acusativo, não tem complemento directo. Não temos vergonha de termos feito o que não devíamos, de ter agido mal, de não termos dito o que devíamos ou de ter dito o que não devíamos. Nada disto. A vergonha no seu esplendor máximo não acusa nada senão o nada que somos, isto é, temos vergonha. Mas como é que se pode ter vergonha de nada? Voltemos então ao livro do Eça. No penúltimo capítulo do livro, é-nos descrita a revelação de Jorge a Luísa. Jorge diz-lhe que sabia de tudo, a aventura dela com o primo e de ter sido escrava da Juliana. Nesse mesmo momento ela sofre um choque, pela surpresa, pois passou grande parte do romance atormentada com isso, tentando escondê-lo de Jorge e, agora, que Juliana já tinha morrido, que ela se julgava finalmente libertada, vem Jorge dizer que sabe de tudo. Mas ele não diz apenas que sabe de tudo, como ainda diz que não tem importância que lhe perdoa e que continua a amá-la como sempre amou. Efectivamente, e também aqui Eça não perde o seu jeito de acertar na natureza humana, só quem nos ama nos pode perdoar, mais ninguém. Por conseguinte, Luísa estava perdoada. Jorge acabava de perdoá-la. A partir daqui, que parecia então tudo ir ficar em bem, pelo menos para uma pessoa normal assim seria, Luísa adoece e definha até à morte. Luísa morre de vergonha. Reparem que ela não morre de vergonha do que fez, pois sem a revelação feita por Jorge e o seu perdão, Luísa viveria até à velhice sem vergonha. Ela não tem vergonha do que fez, mas de si. Luísa morre por vergonha de si mesma, vergonha do que é. Não se trata de uma impossibilidade de ver Jorge, depois do que ela lhe fez, em contraposição à magnanimidade dele. Através de Jorge, Luísa vê o seu próprio nada. Chegado aqui, a este ponto, ou se dá um salto para Deus, e este nunca depende do próprio, pois a graça da fé é-nos concedida, não é uma escolha, ou abriga-se na morte. Ou seja, Luísa vai ao encontro do seu próprio nada que lhe foi revelado na vergonha de si mesma, através da revelação de Jorge. E, agora, sim entremos na tragédia. Dois pontos fundamentais: 1) Como verificámos, só a vergonha de si mesmo tem poder para destruir o vício e, com ele, a vida; é aqui que a vergonha se assume como Herói trágico, como verdadeiro herói desta Tragédia. Édipo fura os olhos perante o conhecimento de ter assassinado seu próprio pai e desposado sua própria mãe, concebendo filhos com ela, Luísa deixa-se morrer. A vergonha assume assim, em O Primo Basílio a dimensão do conhecimento em Édipo Rei, fazendo de Jorge o arauto da má notícia. Há uma diferença clara: Édipo desejava saber e Luísa não desejava a vergonha, a vergonha aconteceu-lhe, mas ao acontecer-lhe ela viveu-a com a dignidade de um personagem de Sófocles. 2) Vejamos a diferença entre o Jorge da reunião social em sua casa, antes de partir para o Alentejo, no início do livro, e o Jorge que perdoa a esposa, no fim do livro. No início ele jurava a pés juntos que, em situação de adultério, matava impiedosamente a esposa. Na realidade, o que aconteceu é que ele acaba por perdoá-la. E, ao fazê-lo, ela morre. Bom se isto não é LITERALMENTE um tema maior de uma tragédia grega, então eu não sei o que é uma tragédia grega. Mas a tese mais radical de Eça de Queirós neste livro é a de que todo aquele que escreve é para os outros como Basílio, porque no fundo todo aquele que escreve só pode pensar em si, em mais ninguém; é um condenado à fraqueza mais próxima, nasce para si mesmo como uma flor para o fico lugar onde despontou. Basílio, e por isso o livro se chama O Primo Basílio, é o humano irredutível ao outro; o humano no seu esplendor máximo de egoísmo. O egoísmo é uma espécie de autismo moral; no egoísmo o humano não consegue ver para além dos seus interesses, por mínimos que sejam; no egoísmo fica-se fechado em si mesmo para sempre. No egoísmo, a morte de outrem pode muito bem ser apenas um contra-tempo nos nossos planos, e não a morte de alguém, e não o fim da vida de alguém e o começo do sofrimento dos outros que o amam. E a tese mais radical de Eça de Queirós é mostrar-nos que o escritor se comporta, não só enquanto escreve, mas na vida, como o primo Basílio, completamente e inteiramente para ele. Como se irá ver mais tarde em Fernando Pessoa, ou se vive ou se escreve. E escrever, enquanto contraposição a vida, surge como a impossibilidade de sair de si mesmo, a impossibilidade de ver o outro como outro. Para o escritor o outro será sempre a possibilidade de uma personagem, o outro será sempre uma extensão do seu interesse pessoal. Isto nunca é dito no livro, mas é intuído, na contraposição que existe entre o livro que se acaba de ler e o outro que Eça escreve através do Ernestinho, para crítico ler. Ernestinho faz precisamente um livro “mais natural”, um livro que vai ao encontro do outro, um livro que pede para fazer amigos. O livro de Eça, que termina com a flor bela e rara e para sempre da imagem máxima do egoísmo, na frase última de Basílio “Que ferro! Devia ter trazido Alphonsine.”, não pede para fazer amigos, pelo contrário, choca-nos a existência de tal personagem, quer seja pela criação, quer seja pelo retrato. Basílio é a vida tal como não a suportamos ver; a vida tal como nos esforçamos para não ver. E, assim, o autismo do escritor, contrariamente ao autismo de Basílio, traz-nos a verdade do humano, enquanto o autismo de Basílio traz-lhe a inexistência do humano. No fundo, tanto para Basílio quanto para o escritor, o humano não existe. Para Basílio existe apenas ele mesmo, mais ninguém (pois todos são extensões do seu prazer ou do seu desprazer), para o escritor existem apenas caracteres, personagens. Cabe ao leitor, decidir se as personagens dos livros reflectem ou não os humanos. Cabe-nos a nós a difícil tarefa de reconduzir o escritor à humanidade, que ele não tem, nem pode ter, ainda que o homem que faz de escritor, possa, aqui e ali, ser humano, ou quase humano. Terminamos assim aqui a nossa viagem ao coração de O Primo Basílio, no preciso momento em que o pior dos personagens se encontra com o seu criador, no momento em que Eça de Queirós se reconhece Basílio, pois só quem é se pode reconhecer.
Andreia Sofia Silva Manchete PolíticaEleições | Menos de metade das listas têm programa político em português Apenas quatro das 24 listas candidatas às eleições legislativas pelo sufrágio directo têm programas políticos em português e inglês. No sufrágio indirecto, só Chan Hong tem algumas frases na língua de Camões. Candidatos e um ex-deputado consideram que há um distanciamento face ao eleitorado que domina o português, por ser pouco representativo [dropcap style≠’circle’]“É[/dropcap] necessária uma voz profissional e independente na Assembleia Legislativa (AL)”. É esta a frase que faz a capa do programa político de Agnes Lam, docente universitária e líder da lista Observatório Cívico. A lista número 4, candidata às legislativas do próximo dia 17, é das poucas que tem o programa político traduzido em português, bem como em inglês. No ano em que as eleições contam com o maior número de listas candidatas de sempre, um total de 24, são apenas quatro as listas que optaram por traduzir os seus programas políticos na íntegra. Algumas das restantes listas têm apenas algumas frases traduzidas para português, inclusivamente com alguns erros gramaticais. A Aliança pr’a Mudança, liderada por Melinda Chan, além de ter o macaense Jorge Valente na lista, é outra das que apresenta um programa político bilingue. Um dos lemas é “lutar pelas futuras gerações” e promete-se, entre outras coisas, “promover o desenvolvimento do sistema político, fiscalizar as acções governativas e aperfeiçoar o ordenamento jurídico”. A lista Nova Esperança, liderada por José Pereira Coutinho, também tem um programa eleitoral nas duas línguas. Com macaenses e chineses na lista, a Nova Esperança propõe-se a lutar pelo aumento do valor dado pelo Governo nos cheques pecuniários, bem como “aumentar os direitos e regalias dos grupos vulneráveis”. A lista “Nova Ideais de Macau”, liderada por Carl Ching, é a única que tem o programa político traduzido para inglês, algo que pode estar associado ao facto de o candidato ser natural de Hong Kong. A lista encabeçada por Sulu Sou, intitulada Associação do Novo Progresso de Macau, diz apenas na língua de Camões que pretende “Unir esperanças para o progresso de Macau”. Já a lista do veterano Au Kam San, intitulada Associação de Novo Movimento Democrático, apresenta apenas palavras chave como “habitação”, “emprego” ou “transporte”, bem como a máxima “Aumentar as habitações públicas, assegurar os empregos, avançar corajosamente para Macau”. O único espaço que portugueses e macaenses (que não dominam por completo a língua chinesa) têm para ouvir as ideias de todos os candidatos é no período de tempo de antena que passa diariamente na Rádio Macau. Aí é garantida a tradução. Eleitorado sem interesse Em declarações ao HM, Jorge Fão, membro da direcção da Associação dos Aposentados, Reformados e Pensionistas de Macau (APOMAC), e antigo deputado, garante que a ausência de tradução é uma questão de “pragmatismo”: afinal de contas, o universo de eleitores portugueses conta muito pouco para a obtenção de um assento no hemiciclo. “É uma questão de pragmatismo e não de desprezo [pelo idioma]. As pessoas acham que a comunidade portuguesa é pequena e não tem havido contactos. Pensaram que eventualmente poderiam dispensar os votos das comunidades portuguesa e macaense”, defendeu. Fão, que chegou a ser deputado ao lado de David Chow, recorda que a língua portuguesa nunca foi presença assídua nas campanhas eleitorais. “É triste e é uma pena que as pessoas não dêem importância à língua lusa. Já antes de ser deputado, nos actos eleitorais, apoiando o meu amigo, tínhamos sempre os programas nas duas línguas. E nas outras listas raramente havia programas traduzidos.” O membro da direcção da APOMAC destaca uma ou outra lista que traduziu as suas ideias políticas para a língua de Camões, incluindo a presença de “vários membros da comunidade”, como é o caso de José Luís Pedruco Achiam e de Armando Amante, que compõem a lista liderada por Angela Leong, Nova União para o Desenvolvimento de Macau. Jorge Fão aponta sobretudo o dedo às listas do campo pró-democrata. “Nunca deram muita importância à nossa língua. Conheço Ng Kuok Cheong há muito tempo e sempre foi um indivíduo que nunca deu muita importância à nossa língua. É triste verificar isto. Acharam que não temos força em termos de votos para influenciar o que quer que seja, e podem dar-se ao luxo de dispensar os nossos votos.” Afastamento natural Para Jorge Valente, número três da lista Aliança pr’a Mudança, estamos perante uma situação onde há “falta de visão e de abrangência”. “Um deputado deveria representar toda a população, e se não fizer um programa político noutras línguas está a excluir os falantes de português.” Para o candidato, a ausência de tradução não afasta os eleitores. Simplesmente mostra que a lista em causa não tem nada para lhes oferecer em termos de ideias e objectivos políticos. “Não afasta o eleitorado, as listas é que, por opção, não têm nada que interesse aos falantes da língua portuguesa. Há listas que não têm nada que seja a favor dos portugueses e macaenses”, apontou. Jorge Valente adiantou ainda que “nestas eleições observamos que há muitas listas específicas”. “Não é isto que um deputado deveria ser. Quem vai para a AL não deve representar só um grupo de interesses.” Jorge Fão recorda que todo este afastamento ou distanciamento começou após a transferência de soberania. “Estamos um pouco à margem. Depois de 1999 a comunidade começou a desligar-se mais da política. Até aí estávamos bastante ligados. Isto não é bom, mas é a realidade. Tem sido difícil para vingar ou ganhar alguma coisa no acto eleitoral, a não ser que já tenhamos uma máquina montada.” Jorge Fão recorda o tempo em que foi dirigente da Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM). “Nessa altura a máquina estava montada e elegemos um deputado.” José Pereira Coutinho, actualmente presidente da ATFPM, só seria eleito em 2005. “Quando ainda estava nas lides eleitorais Coutinho também não foi eleito. Apesar de ser uma máquina, nem sempre conseguiu eleger. E com o meu afastamento ele foi eleito”, frisou. Obrigar ou não? Para Jorge Fão, a Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL) deveria obrigar as listas candidatas a elaborarem os programas políticos nas duas línguas oficiais. “A CAEAL deveria exigir isto, poderia dar instruções nesse sentido. Se não deu, foi incorrecta”, apontou. “Para que a comunidade pudesse participar deveríamos obrigar a que os programas políticos fossem feitos nas duas línguas. A CAEAL fez publicidade nas redes sociais e mesmo aí a língua usada é o cantonense, não ouvi português. A própria comissão eleitoral também não se dignou a estimular o uso da língua portuguesa, o que não é bom.” Para o candidato Jorge Valente, tornar a tradução uma obrigação poderia ser interessante, mas não mais do que isso. “Não sei se faz muito sentido obrigar. A campanha eleitoral é feita pelas listas, e se eles optarem por não traduzir o programa politico diz tudo, estão a mandar uma mensagem muito clara no sentido que os falantes de português estão excluídos.” “Mesmo que o programa eleitoral seja traduzido este eleitorado não encontra nada que os interesse. Seria interessante mas não iria mudar nada, seria algo feito por obrigação e até poderia ficar tudo mal traduzido”, rematou o número três da Aliança pr’á Mudança. Um macaense numa lista chinesa Na lista Poderes do Pensamento Político o nome de António da Conceição Oliveira Lopes é o nome português que se destaca. Ao HM, o candidato, que assume o lugar de número dois, explicou que foi ele próprio que traduziu algumas ideias essenciais do programa político para português. Ainda assim sentiu dificuldades, por não ser formado em tradução. “O nosso programa foi escrito em chinês e traduzimos alguns pontos essenciais para português. Só temos mesmo alguns temas em português, é difícil para mim fazer a tradução e foi difícil encontrar tradutores para fazer este trabalho, para me ajudar. Tenho feito este trabalho sozinho”, apontou. Falta de meios e recursos financeiros são apontados por António Lopes como causas para a ausência de tradução. “Era importante que os programas tivessem traduzidos, porque há muitos portugueses e macaenses. Há quem só fale português e quem não consegue ler chinês.” António Lopes garante que a tradução acaba por ficar posta de lado pelo facto dos candidatos terem a ideia de que o eleitorado português pouco ou nada acrescenta aos votos necessários para a eleição. “Sei de muitas pessoas que sabem que a maioria dos eleitores são chineses e não ligam muito aos portugueses e macaenses. Muitos pensam que se colocarem o programa em português não traz grandes avanços, e acabam por pôr isso de parte.” Na visão do número dois da Poderes do Pensamento Político, a própria CAEAL deveria “obrigar à existência dos programas nas duas línguas”. “Seria melhor para os macaenses que não conseguem ler chinês, para que possam ter acesso a todos os programas.” Sufrágio indirecto sem tradução Um olhar sobre os candidatos à Assembleia Legislativa pela via do sufrágio indirecto permite concluir que a língua portuguesa também está afastada dos programas eleitorais. A tradução não existe mesmo nas listas em que um dos membros domina o português, como é o caso da União dos Interesses Profissionais de Macau, que tem o advogado Vong Hin Fai como candidato. Chan Hong, que concorre pelo sector educacional, é a única candidata que tem algumas frases em português no seu programa político. Os seus objectivos passam por “zelar pela salvaguarda da justiça social”, “promover a inclusão e a convivência harmoniosa dos deficientes” ou “reflectir as opiniões da população.
João Luz Manchete PolíticaEleições | Escolas entram na campanha e enviam propaganda a pais de alunos A lista Aliança de Bom Lar, cujo líder é Wong Kit Cheng, foi abertamente apoiada por, pelo menos, três escolas privadas de Macau. Alexis Tam veio a terreiro suscitar a atenção das entidades que fiscalizam a campanha eleitoral em prol de eleições limpas e imparciais [dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]elo menos um trio de estabelecimentos de ensino privado apoiaram a candidatura de Wong Kit Chen a deputada da Assembleia Legislativa (AL). A notícia veiculada pela TDM, e que já havia sido divulgada nas redes sociais, indica que os encarregados de educação de três escolas receberam sugestões para votarem na lista Aliança de Bom Lar. Foi também sugerido o envio de material de campanha para os pais dos alunos. Um representante de um dos estabelecimentos envolvidos, a Escola Secundária Pui Va, afirmou à TDM que não colocou nenhuma pressão sobre os pais quanto ao sentido de voto. Porém, admitiu ter incentivado o voto na supracitada lista, acrescentando que, como a escola é um estabelecimento privado, tem o direito de apoiar a candidatura que bem entender. Apesar da lei eleitoral apenas exigir neutralidade política a instituições públicas, o secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, que tem o pelouro da educação, encara a situação por outro prisma. Alexis Tam lembra que a Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL) realizou, em conjunto com o Comissariado Contra a Corrupção, uma sessão de esclarecimentos com o sector. A reunião foi dirigida a directores e pessoal de médio e alto nível de gestão de escolas de ensino não superior. Alexis Tam entende que todas as escolas, inclusive as privadas, estão obrigadas a observar escrupulosamente as orientações de neutralidade relativas à campanha eleitoral definidas pela CAEAL. Área cinzenta O secretário para os Assuntos Sociais e Cultura especifica que caso haja irregularidades, ou actos ilícitos que sejam contrários a eleições imparciais, justas e limpas, devem ser acompanhadas pelas autoridades competentes. “Em Macau não há uma distinção clara entre organizações políticas, operadores de ensino e serviços de acção social, aliás, estas instituições podem, inclusive, receber enormes financiamentos do Governo”, comenta o activista Jason Chao. O assunto é complexo, sendo possível que este tipo de instituições estejam ligadas a forças políticas com representatividade na AL. O fundador do projecto Just Macau vai mais longe ao considerar que os estabelecimentos de ensino não devem usar dos seus meios para promover um candidato. “As instituições privadas de ensino são financiadas pelo Governo quase inteiramente, deviam manter-se neutras em termos políticos, mas trata-se de uma área cinzenta e a CAEAL não parece muito activa a investigar estes casos”, acrescenta o activista. Paul Pun, secretário-geral da Cáritas e director da Escola São João de Brito, considera que esta é uma questão de bom senso. Sem se focar em nenhum caso particular, Paul Pun entende que “uma escola deve focar-se em educar, assim como uma entidade de serviços sociais deve focar-se nas suas funções”. Ou seja, não se imiscuir na batalha política. Além disso, um bom exercício de cidadania deve ser algo fomentado pelas escolas “para formar as gerações futuras”.
Victor Ng Manchete PolíticaEleições | Lista de Cloee Chao pede benefícios iguais aos da Função Pública [dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]omeçou por ser activista em defesa dos direitos dos croupiers. Depois dos protestos de 2014, Cloee Chao deixou de estar tão activa nesse trabalho. Este ano, porém, decidiu voltar à ribalta como candidata às eleições legislativas através da “Linha da Frente dos Trabalhadores de Casinos”. A lista, composta por oito membros, todos eles funcionários da indústria do jogo de nível básico, apresentou ontem o seu programa político. Cloee Chao disse que o objectivo da candidatura é aumentar os benefícios de todos os que trabalham no sector, equiparando as regalias às que são atribuídas aos funcionários públicos. A candidata fala de benefícios como a atribuição de cinco dias de trabalho e dois dias de folga por semana, 22 dias de férias por ano, 90 dias de licença de maternidade e cinco de licença de paternidade. Cloee Chao pede ainda que sejam pagos 14 meses de ordenado. Cloee Chao referiu que, aquando da liberalização do sector do jogo, as operadoras que investiram no mercado prometeram regalias como a atribuição de subsídios para a habitação ou mais vagas nas creches destinadas aos filhos dos trabalhadores do jogo. A candidata lamentou que, passados mais de dez anos, o aumento significativo das receitas não levou as operadoras a cumprirem as promessas feitas. Uma delas prende-se com o não pagamento das gorjetas pagas pelos clientes nas mesas de jogo. “Todos os anos as operadoras têm lucros elevados mas nem todos os anos recebemos aumentos de salário ou bónus”, apontou a líder da lista 25. Sim à Lei Sindical A “Linha da Frente dos Trabalhadores de Casinos” pede ainda que seja legislada a Lei Sindical, que já foi chumbada nove vezes na Assembleia Legislativa. Para Cloee Chao, o diploma em causa nunca foi aprovado devido aos interesses de alguns deputados do hemiciclo. Por isso, um dos objectivos da candidatura é apresentar a Lei Sindical, para que os trabalhadores possam ter outras formas de diálogo com as operadoras em vez de optarem por protestos ou greve. Cloee Chao defende ainda que os trabalhadores não residentes não devem desempenhar as funções de croupier (algo que a legislação em vigor já prevê), além de defender o fim das salas de fumo nos casinos. A maioria dos pontos do programa político versam sobre os trabalhadores do jogo, mas a lista 25 diz estar também atenta a questões como o trânsito ou a habitação. Contudo, como são temas presentes em todas as candidaturas, Cloee Chao disse preferir enfatizar a luta pelos direitos dos trabalhadores do jogo.
Hoje Macau Manchete SociedadeHato | Vitor Sereno assina carta a pedir apoio para associações [dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]em possibilidades de arcar com as despesas nos reparos aos estragos causados pela passagem do Hato por Macau, associações pedem apoio ao Governo em carta assinada por Vitor Sereno. Os danos e necessidades foram debatidos em reunião no passado dia 30 entre as associações de matriz portuguesa no território e o cônsul-geral de Portugal em Macau e Hong Kong Vinte e uma associações portuguesas e de matriz portuguesa propuseram, na sexta-feira, ao Governo de Macau a criação de um mecanismo de apoio para os trabalhos de recuperação dos danos causados pela passagem do tufão Hato, a 23 de Agosto. Na carta, assinada pelo cônsul-geral de Portugal em Macau e Hong Kong, Vítor Sereno, em nome das 21 associações e entregue à secretária para Administração e Justiça, Sónia Chan, é destacada a necessidade de um apoio específico para estas organizações sem fins lucrativos. Sobre o “mecanismo de apoio” às associações afectadas é proposto um “subsídio extraordinário, tendo em conta a gravidade dos danos e o valor das respectivas reparações”, ou que sejam autorizadas a utilizar “algum montante do subsídio já concedido no presente ano”. As associações de matriz portuguesa “têm desempenhado um papel importante nas áreas da cultura, educação e solidariedade social”, com destinatários “que ultrapassam o universo dos sócios”, representando um “complemento no cumprimento das metas da acção governativa”, de acordo com a mesma carta. Apoios para quase todos Após a passagem do Hato, o mais forte tufão a atingir Macau em 53 anos, o Governo de Macau lançou uma linha de crédito, sem juros, para as PME afectadas até ao montante máximo de 600 mil patacas, e anunciou um pacote de “Medidas de abono” paras as empresas “responderem às situações emergentes”, “de natureza pós-calamidade” com um limite máximo de 30 mil patacas. A nível individual, a Fundação Macau (FM) anunciou três tipos de apoios financeiros para as vítimas do tufão, incluindo familiares de cada vítima mortal, residentes que ficaram feridos, um montante máximo de 30 mil patacas a atribuir às famílias que “sofreram estragos nas suas residências provocados pela intrusão de água do mar causada pela passagem do tufão, ou com janelas partidas ou vidros quebrados”. Duas mil patacas serão disponibilizadas às famílias “afectadas pelo corte do abastecimento de electricidade e água”, sendo este subsídio “acertado” com as empresas de abastecimento de electricidade e água, de acordo com a FM. No passado dia 30, teve lugar uma reunião entre Vitor Sereno e as associações e matriz portuguesa no território. Após o encontro, o presidente da Associação dos Macaenses, Miguel de Senna Fernandes disse ao HM que quando questionou a FM acerca de possíveis apoios a resposta foi negativa. “A Fundação Macau disse que não há, neste momento, qualquer tipo de apoio dirigido às associações”, referia Miguel de Senna Fernandes. Associação dos Macaenses, Casa de Portugal em Macau, Associação dos Aposentados, Reformados e Pensionistas de Macau, Instituto Internacional de Macau e Associação Promotora da Instrução dos Macaenses, Escola Portuguesa, Jardim de Infância D.José da Costa Nunes. Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau, Clube Militar, Instituto Português do Oriente são algumas das 21 associações subscritoras.
Hoje Macau Manchete SociedadeHo Chio Meng | Negada possibilidade de recurso [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] processo que culminou com a sentença que condenou o ex-procurador a uma pena única em cúmulo jurídico de 21 anos de prisão transitou em julgado. O arguido interpôs recurso, a 4 de Agosto, da decisão condenatória sugerindo a criação de um tribunal de recurso, ou de um tribunal ad hoc que admitisse essa fase processual. Foi exactamente a falta desta entidade que sustentou o despacho da juiz que decidiu sobre o recurso da defesa de Ho Chio Meng. “A admissão de recurso pressupõe a existência de um órgão judiciário com poder de julgar em instância superior, que pode apreciar e decidir o recurso”. Uma vez que o Tribunal de Última Instância é o mais elevado órgão judiciário da RAEM, não existe outro tribunal competente para julgar o recurso de uma decisão que daí seja emanada. Além disso, a juiz argumenta que a criação de um órgão judiciário é algo que pressupõe “a existência de uma previsão legal”.
Andreia Sofia Silva Manchete PolíticaEleições | O balanço da primeira semana de campanha [dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]az amanhã uma semana que as 24 listas candidatas à Assembleia Legislativa andam nas ruas a apresentar os seus programas políticos à população. Três analistas dizem existir pouca inovação por parte dos candidatos, uma repetição de ideias e uma mera troca de acusações entre adversários. O pontapé de saída oficial para a campanha eleitoral deu-se na passada sexta-feira à noite, na praça do Tap Seac. Desde então que a semana tem sido preenchida com acções de campanha e apresentação dos programas políticos das 24 listas que se candidatam este ano à Assembleia Legislativa (AL) pela via directa. Além das promessas habituais, os debates na TDM com todos os candidatos já originaram uma polémica, com a deputada Song Pek Kei a fazer referência ao facto dos filhos de José Pereira Coutinho estarem a ser julgados no Tribunal Judicial de Base por suspeitas de tráfico de droga. (Ver texto na secção de política). Troca de galhardetes e promessas à parte, três analistas dizem que existe pouca inovação dos programas políticos e que falta uma estratégia bem definida. “O maior problema que encontro nos programas políticos é o facto de parecerem catálogos e de não estarem muito bem projectados”, disse Eric Sautedé, analista político e docente universitário. “Falta um projecto, uma ambição, propostas que sejam abrangentes e ainda assim coerentes. Em vez disso, na melhor das hipóteses, os eleitores têm um catálogo com algumas boas ideias sem uma perspectiva articulada”, acrescentou o académico. Eric Sautedé diz que estes “catálogos” têm uma boa dose de populismo. “Do que temos visto, temos sobretudo um catálogo com sugestões populistas. São, na maioria, propostas que os candidatos, assim que forem eleitos, vão esquecer ou deixar de lado.” O analista, que expressou, nas redes sociais, o apoio à lista Associação do Novo Progresso de Macau, encabeçada por Sulu Sou e Paul Chan Wai Chi, explica as estratégias que as listas deveriam adoptar. “Se é uma lista pró-ambiente, as medidas de protecção ambiental devem ser o principal foco do projecto político. Se é uma lista mais virada para o mercado, então as medidas económicas são cruciais. Isto não significa que as listas não devam cobrir todos os assuntos, apenas revela que os candidatos estão dispostos a assumir prioridades.” Só acusações Façamos então uma retrospectiva do que algumas listas têm prometido, caso obtenham votos suficientes para os seus líderes terem assentos no hemiciclo. A lista União para o Desenvolvimento é agora liderada por Ella Lei e volta a defender a necessidade de atribuir regularmente habitação pública aos residentes, tal como garantir que não há importação excessiva de não residentes. Au Kam San e Ng Kuok Cheong são veteranos e concorrem este ano em listas separadas, Associação Novo Democrático e Associação Próspero Macau Democrático, respectivamente, mas as suas promessas não variam muito do que têm dito na AL: querem que seja implementado o sufrágio universal para a eleição do Chefe do Executivo e dos deputados, pedem mais concursos para habitação pública, sem esquecer a renovação dos bairros antigos. Wong Kit Cheng, estreante nas lides da política em 2013, lidera agora a Aliança do Bom Lar, que volta a pedir a implementação da licença de paternidade e o alargamento da licença da maternidade, sem esquecer mais medidas para os idosos e os jovens. Para Larry So, politólogo, estamos perante um sem número de ideias que estão longe de ser novidade. Até porque a maioria dos candidatos foram deputados nos últimos anos e estes são os temas que têm sido abordados na maioria das interpelações que apresentam ao Governo ou nas intervenções que fazem nos plenários. Larry So, politólogo, acredita que os candidatos estão sobretudo a auto-promoverem-se, ao invés de trazerem novas ideias ao panorama político. “Temos muitos debates e repetem-se os mesmos assuntos. Se olharmos para todas estas campanhas parece que os candidatos se estão a promover a si próprios mais do que a fazer realmente uma campanha. Depois falam do tufão, dos casinos e dos seus trabalhadores, mas não apontam o cerne das questões para que depois sejam feitas sugestões que resolvam os problemas”, acrescentou. Aniquilar o adversário Há, na maioria, uma troca de acusações entre candidatos, na visão de Larry So. “A maior partes das listas não tens mais objectivos em mente se não o de se venderem. Eles sabem que estão a ser irracionais e que não estão a usar este momento para propor mudanças para melhor por parte do governo”, disse. O antigo docente do Instituto Politécnico de Macau reforça a ideia da existência de uma certa irracionalidade. “Estão treinados para ser mais agressivos para com os seus adversários e não para fiscalizar e olhar para o Governo. Desta forma querem ganhar a confiança das pessoas, através da supressão do adversário, em termos de performance e tendo em conta diferentes personalidades e backgrounds.” Ainda assim, o politólogo assegura que o panorama não é muito diferente daquele que se verifica em Hong Kong. “Este tipo de debates não traz uma discussão genuína nem racional. Mas a maior parte dos debates que vimos em Hong Kong para a campanha do Conselho Legislativo (LegCo) também revelaram o mesmo tipo de comportamento.” Incompetências antigas Eric Sautedé não esquece as várias polémicas que têm povoado o hemiciclo, tal como a aprovação da Lei de Terras, em 2013, que deixou sem casas centenas de investidores do edifício Pearl Horizon. “Diria que oito listas pertencem à categoria dos candidatos pró-Governo que ultimamente têm falhado na monitorização e na supervisão das acções governativas e falharam na sua acção ao votarem a favor de leis que interessam a toda a comunidade.” Na sua visão, “os deputados que são eleitos por sufrágio universal são os únicos que têm alguma legitimidade popular. Os que são nomeados pelo Chefe do Executivo provaram ser incompetentes e não terem qualquer tipo de representatividade, algo que ficou claro com o caso da Lei de Terras”, exemplificou. O antigo docente da Universidade de São José fala também da campanha, bem mais discreta, que tem sido feita pelas 14 listas que concorrem pela via do sufrágio indirecto. “Os deputados eleitos pela via indirecta concorrem num campo oposto e representam vastos interesses relacionados com o sector empresarial. Os dois assentos adicionados em 2012 ao sufrágio indirecto revelaram-se absolutamente inúteis e provou-se ser um desastre nos casos de Chan Hong e Chan Iek Lap. Estes deputados têm acções ineficazes e irrelevantes”, rematou. Quando os candidatos parecem governantes [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]os últimos dias os programas políticos têm-se focado mais em medidas que entram na alçada do poder Executivo, relacionadas com a adopção de políticas ao nível da habitação, trânsito ou emprego. São poucos aqueles que dão destaque a matérias relacionadas com a iniciativa legislativa dos deputados. A título de exemplo, a lista Ou Mun Kong I, liderada por Lee Sio Kuan, apresentou há dias um programa político que, entre outras coisas, promete lutar pela proibição de importação de trabalhadores não residentes no sector dos croupiers e dos motoristas. Para Eric Sautedé, este não é, contudo, “o maior problema” nesta campanha. “O facto dos candidatos fazerem propostas relacionadas com o poder Executivo tem alguma lógica, se considerarmos que o Governo não é uma emanação do poder legislativo nem uma escolha soberana da população, mas uma selecção oriunda dos interesses da comissão eleitoral do Chefe do Executivo atestados por Pequim.” Pouca manobra António Katchi, jurista e docente do Instituto Politécnico de Macau (IPM) também desvaloriza esta questão, referindo que a apresentação destas medidas estão relacionadas com os entraves do próprio sistema. “Nestas eleições, como nas anteriores, as medidas preconizadas nos programas eleitorais exorbitam não tanto o poder legislativo da AL mas sobretudo o poder de iniciativa legislativa dos deputados, nomeadamente o seu poder de apresentar projectos de lei.” Para António Katchi, “um dos vários aspectos anti-democráticos do sistema político de Macau consiste precisamente nesta limitação do poder de iniciativa legislativa dos deputados”. “Sirva de exemplo a proibição que impende sobre os deputados de apresentarem quaisquer projectos de lei que envolvam receitas ou despesas públicas”, acrescentou. Isto faz com que os candidatos tenham de ir um pouco mais além da sua função legislativa. “Imaginemos quão pouco substancial ficaria reduzido um programa eleitoral se estivesse cingido às matérias sobre as quais os deputados dispõem de um poder de iniciativa legislativa. É natural que as listas concorrentes não queiram circunscrever o seu programa eleitoral dessa maneira.” Katchi diz mesmo que “há vantagem para os eleitores” que assim seja. “É importante que as listas exponham com a máxima amplitude possível o seu ideário político. Quanto mais não seja, fica-se a saber que posição os candidatos a deputados tencionam adoptar perante as propostas do Governo. Ainda assim, convém que informem os eleitores sobre as dificuldades impostas pelo quadro constitucional e político vigente”, concluiu. Aproveitamento político de um tufão A passagem do tufão Hato e as suas consequências desastrosas entraram de imediato para a agenda política dos candidatos. Larry So não tem dúvidas de que houve um aproveitamento político da tragédia. “Quase todas as listas falam no facto de o Governo não ter feito o trabalho necessário. Algumas vão mesmo mais longe e falam dos voluntários e das motivações políticas associadas. De certo modo o tufão veio trazer aspectos de que as diferentes listas estão a tirar vantagens. Por um lado acusam o Governo de não ter feito nada, e depois as listas atacam-se mutuamente”, defendeu.
Victor Ng Manchete PolíticaEleições | Salário mínimo foi tema de debate entre candidatos [dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]m mais um dia de debate sobre as eleições legislativas, promovido pela TDM, cinco candidatos discutiram a questão do salário mínimo. Lee Sio Kuan teve ainda alguma troca de palavras com Melinda Chan por causa de David Chow. A TDM voltou ontem a transmitir mais um debate com cinco candidatos às eleições legislativas de 17 de Setembro. Participaram Ella Lei, da União para o Desenvolvimento, Melinda Chan, da Aliança pr’a Mudança, Mak Soi Kun, da União de Macau-Guangdong e ainda Lee Sio Kuan, da Ou Mun Kong I e o advogado Hou Weng Kuan, da Associação dos Cidadãos Unidos para a Construção de Macau. A implementação do salário mínimo em Macau, que actualmente não é universal e existe apenas para as profissões de segurança e trabalho doméstico foi o tema principal do encontro. Lee Sio Kuan disse que, apesar do Governo realizar vários estudos sobre a matéria, existem sempre dificuldades a aprovar propostas de lei na Assembleia Legislativa (AL), não tendo feito mais comentários sobre o tema. Já Hou Weng Kuan, líder da lista número 19, afirmou que é necessário aumentar os valores do salário mínimo, mas não disse se concorda com o salário mínimo universal, pelo facto de muitas famílias não conseguirem suportar os custos de ter empregados domésticos. Ella Lei defendeu que é necessária a realização, o mais depressa possível, de um estudo sobre a matéria, tendo acrescentado que, se for bem discutido, o salário mínimo pode garantir os direitos e interesses dos trabalhadores. Liga ao David O debate serviu ainda para falar da ocupação de cargos de gestão nos casinos pelos residentes. Ella Lei questionou Melinda Chan sobre a possibilidade de 90 por cento destas vagas de emprego serem ocupadas por locais. A candidata pela lista Aliança pr’a Mudança disse apenas “concordamos”, sem mais nada acrescentar. Na hora de Lee Sio Kuan colocar perguntas, o nome de David Chow, empresário e marido de Melinda Chan, foi bastante evocado. Como resposta, Melinda Chan sugeriu ao adversário ligar, ele próprio, ao proprietário dos empreendimentos Doca dos Pescadores e Landmark para colocar as suas questões. A líder da Aliança pr’a Mudança quis deixar claro que a sua candidatura representa todos os cidadãos de Macau e não apenas as operadoras de jogo e o sector do turismo. “Votem em mim” O tema da corrupção eleitoral também foi abordado. Hou Weng Kuan questionou os restantes candidatos se defendiam a realização de eleições limpas, tendo Mak Soi Kun afirmado que nunca ofereceu refeições em troca de votos. O advogado e candidato pediu a Mak Soi Kun que mantenha a máxima “não vote por mim só pela refeição por mim oferecida”, mas o líder da União de Macau-Guangdong referiu apenas que “uma sociedade democrática tem a sua própria maneira de eleição”, tendo pedido aos telespectadores e presentes para votarem em si. Na sessão de perguntas e respostas, os candidatos falaram ainda sobre o mecanismo de garantias dos idosos e os serviços a eles prestados. A líder da União para o Desenvolvimento prometeu lutar pela implementação do regime de previdência central obrigatório, sem esquecer a criação de dormitórios para os mais velhos, para que tenham cuidados adequados.
João Luz Manchete PolíticaCAEAL | Nova Esperança queixa-se por alegada injúria de Song Pek Kei [dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]epois do debate quente na TDM, onde Song Pek Kei trouxe à baila o processo criminal onde os filhos de Pereira Coutinho são arguidos, a lista Nova Esperança apresentou queixa à comissão eleitoral. De acordo com a mandatária Rita Santos, houve um ataque pessoal que precisa de ser apreciado. O debate entre as listas lideradas por Pereira Coutinho e Song Pek Kei foi, até agora, o mais aceso da campanha eleitoral. A candidata da lista da Associação dos Cidadãos para o Desenvolvimento de Macau, trouxe à baila o processo crime no qual os filhos de Pereira Coutinho são réus num caso de tráfico de droga (ver página 9). Song Pek Kei, entende que “as pessoas sabem bem a verdade”, acrescentando que as suas declarações foram baseadas em factos amplamente noticiados pelos jornais acerca do referido julgamento. A candidata esclarece que não fez qualquer pergunta sobre os filhos de Pereira Coutinho limitando-se a questionar se o candidato “concorda com o aumento das sanções para casos que envolvam drogas e se assume a responsabilidade social pelo caso”. A polémica motivou uma queixa remetida pela mandatária da lista Nova Esperança, Rita Santos, para a Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL). Além disso, foi também enviada uma carta para a direcção da própria TDM. “Antes do debate, durante a sessão de esclarecimento, houve o cuidado de explicar as regras que os candidatos deviam cumprir, onde foi especificado que não podia haver ataques pessoais, regra repetida pelos moderadores no dia do debate”, lembra Rita Santos. A mandatária confessa que não dormiu na noite depois do debate e que ficou muito desiludida com o comportamento de Song Pek Kei. Uma surpresa Durante a emissão, Rita Santos queixa-se da passividade dos moderadores da TDM perante os ataques pessoais feitos pela candidata Song Pek Kei. “Deviam ter fechado o microfone, porque aquilo nada tinha a ver com programa político, sendo apenas acusações”, argumenta a mandatária da lista de Pereira Coutinho. Rita Santos acrescenta ainda que já nas eleições de 2013 houve casos de difamação contra o português. Song Pek Kei não entende que tenha usado ataques pessoais. “Os moderadores do programa poderiam ter cortado as minhas intervenções, segundo as regras do debate, como não o fizeram significa que não foram ataques pessoais”, argumenta. “Fiquei muito surpreendida porque, aquando da apresentação do projecto de lei das rendas, foram todos muito simpáticos, com muita camaradagem e amizade”, desabafa Rita Santos. A mandatária acrescenta que tem uma “ideia muito correcta de Chan Meng Kam mas que ficou desiludida na sequência do debate. A mandatária da Nova Esperança recorda que quando a campanha eleitoral arrancou, o discurso do presidente da CAEAL, Tong Hio Fong, no pavilhão do Tap Seac, perspectivou a campanha como um debate de ideias entre cavalheiros, onde deveria imperar o respeito. “Infelizmente, a TDM, uma televisão pública, não respeitou as regras emanadas pela CAEAL”, comenta Rita Santos. A mandatária revela que depois do debate ainda se dirigiu aos moderadores tendo dado a opinião de que o debate, que foi gravado em diferido, não deveria ser transmitido. Entretanto, Rita Santos espera que a CAEAL reaja à queixa e que proceda de acordo com a lei eleitoral, recordando que a comissão até agora tem sido muito rígida.
João Luz Manchete SociedadeDSAT | Anunciadas isenções para veículos novos após danos com tufão [dropcap style≠’circle’]Q[/dropcap]uem ficou com o carro danificado na sequência da devastação provocada pelo Hato pode ser reembolsado do imposto pago pelo veículo danificado. Esta isenção estende-se ainda a viaturas que não existem à venda no território, tais como carros movidos a energia solar ou gás natural Estão aí as medidas concretas que se esperavam para remediar os danos causados aos veículos que foram apanhados pelo tufão Hato. “No dia 23 de Agosto lançámos apenas um quadro geral. Para implementar esta medida em concreto tivemos de ouvir opiniões de várias partes e depois definimos o limite mínimo e máximo de reembolso”, explica Lam Hin San, director da Direcção dos Serviços para os Assuntos do Tráfego (DSAT). O dirigente, explicou ainda que quem ficou com os veículos danificados terá até 18 de Setembro para proceder ao cancelamento de matrículas. “Entre 23 de Agosto e 6 de Setembro recebemos 1100 requerimentos para cancelar matrículas, 548 automóveis e 460 motociclos”, anunciou Lam Hin San. O director acrescentou ainda que destes cancelamentos, 90 por cento são veículos afectados pelo tufão. Os automobilistas, assim como os motociclistas, que necessitem de um novo veículo vão ter uma isenção, ou reembolso, de imposto pago pela viatura danificada pelo tufão. Em primeiro lugar, será necessário uma lei aprovada pela nova Assembleia Legislativa, uma vez que é o órgão com competência exclusiva para aprovar uma medida desta natureza. Iong Kong Leong, director dos Serviços de Finanças, adianta que “será pedido efeito retroactivo” para reembolsar quem já pagou o imposto dos novos veículos antes da lei aprovada. O director acrescentou que “o processo legislativo terá natureza urgente” e que ainda não existe uma redacção para a proposta de lei que fixará estes reembolsos fiscais. Carros inexistentes O proprietário do automóvel danificado que adquirir um carro novo que use combustíveis fósseis, terá um reembolso até 80 por cento do imposto pago pelo veículo danificado, num montante máximo de 140 mil patacas. Quanto aos motociclos, o reembolso pode atingir os 100 por cento, para um valor limite de 5500 patacas. Quem estiver interessado terá de pedir primeiro o cancelamento da matrícula. A DSAT adianta que a taxa de amortização pode ir até aos 100 por cento no caso da compra de veículos movidos a energias renováveis. Em comunicado de imprensa dos serviços pode-se ler que quem comprar viaturas movidas a gás natural, energia solar e carros eléctricos será reembolsado dos impostos pagos pelo veículo danificado. É de referir neste capítulo que em Macau não existem viaturas movida a energia solar e que a gás natural apenas existem alguns autocarros de transporte público. Quanto aos carros eléctricos, são uma parcela ínfima do parque automóvel do território. Em Abril último, havia 180 veículos eléctricos, sendo que 22 pertenciam ao Governo. Neste aspecto, Lam Hin San entende que “se houver mais procura destas viaturas movidas a novas energias, acredito que os concessionários terão mais incentivos para importar este tipo de veículos”. Outra das questões levantadas pela destruição de carros e motociclos prende-se com a falta de locais para acolherem aquilo que normalmente se designa como ferro-velho. Aliás, um problema que Macau já sentia antes da passagem do Hato, sendo recorrente o abandono de veículos na via pública. Porém, o director da DSAT refere que “segundo os dados recolhidos não temos problemas nesta matéria”. Lam Hin San acrescentou ainda que serão feitos esforços para que “os veículos abatidos sejam enviados para a DSF para irem a leilão”. Em seguida, de acordo com o director, a empresa que os adquirir pode exportá-los para o exterior.
Andreia Sofia Silva Manchete ReportagemEleições 2017 | O olhar da comunidade portuguesa sobre a campanha Os votos na “aldeia grande” Programas políticos com conteúdos pobres, ausência de identificação com ideias, a continuação dos interesses no hemiciclo. Portugueses, com residência permanente, dizem o que acham da campanha eleitoral que anda nas ruas. Votam sempre a cada quatro anos, mas afirmam existir um certo distanciamento face à sua comunidade [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]lbano Martins é, talvez, um dos poucos portugueses em Macau que pode votar de duas maneiras para escolher os deputados que quer ver na Assembleia Legislativa (AL). O economista e presidente da ANIMA pode pôr a cruz nos deputados que concorrem pela via directa, bem como naqueles que participam pela via indirecta, através das associações. Isto significa que, este ano, Albano Martins pode decidir por um dos 24 candidatos que concorrem pelas directas, o maior número de sempre. Pode também votar no nome de uma das 14 listas que participam pela via indirecta. Mas Albano Martins revela-se, ainda assim, um eleitor desiludido. “Vemos que há muita pólvora e pouca explosão”, disse ao HM. O problema? Ideias que fazem parte do poder Executivo e não Legislativo. “A maior parte das pessoas ainda pensa que concorre para chefiar o Governo, e não para a AL. As pessoas continuam a fazer programas políticos como se fossem Governo, esquecendo-se que a sua função é fiscalizar o trabalho do Governo e fazer leis. A politica de Macau é feita pelo Governo, isso faz parte da Lei Básica e há-de ser sempre assim”, adiantou. Albano Martins considera que os “programas políticos das listas são fracos”, numa “aldeia grande” que “cresceu com muito dinheiro e desejos”. O economista não é o único a apontar o dedo aos cartazes e programas políticos que desde sábado andam nas ruas. Rui Furtado, médico, também é residente permanente e vota sempre, mas revela baixas expectativas para o acto eleitoral de 17 de Setembro. “A campanha decorre de modo habitual, sem grandes surpresas. O conteúdo da campanha é pobre, sempre foi e continua a ser. As pessoas fazem os programas políticos que são um conjunto de acções e sugestões conforme as ocasiões do momento. O aumento dos salários dos funcionários públicos, a protecção dos residentes. São tudo pedras batidas, não são ideias novas e não têm um verdadeiro conteúdo político”, contou. “Voto sempre e de acordo com o que tenho possibilidade de votar, nas listas em que me revejo mais ou menos nas ideias. Mas são pobres na mesma”, assegura. O médico diz que persistem dificuldades de comunicação na campanha eleitoral, pois a comunidade portuguesa não tem acesso à maior parte dos programas políticos em chinês. “Há traduções, mas são de má qualidade. A pobreza política, intelectual e cultural dos programas é o que toda a gente sabe”, frisou. Já a arquitecta Maria José de Freitas assume que tem vindo a prestar atenção a “algumas listas”, sem ter ficado muito convencida. “Não me parecem muito inovadoras nos programas. Tenho vindo a ver até que ponto essas listas espelham algum interesse junto da comunidade portuguesa, e também noutras comunidades, com essa cultura internacional que Macau sempre evidenciou”, defendeu. Maria José de Freitas diz que não vota por obrigação, mas cada vez que coloca uma cruz no boletim é na lista que poderá trazer algo “favorável ao desenvolvimento do território”, sem esquecer a diversidade cultural. É por isso que defende que, este ano, os programas eleitorais “não avançaram muito nesse sentido”. “Pode ser que até às eleições se avance mais um pouco. Tenho algumas expectativas, há listas que ainda podem propor coisas interessantes. Há professores universitários envolvidos, há pessoas com experiência em Macau que conhecem a cidade, mas falta se calhar mais conhecimento cientifico. Esta é uma lacuna importante.” De costas voltadas Para Rui Furtado, a necessidade de tradução das ideias políticas ou a falta dela faz com que a comunidade portuguesa seja afastada das eleições. “Nem lhe é dada a oportunidade de estar perto”, assegura. “Não temos acesso aos programas e são corpos estranhos no meio de toda esta discussão. E isto também vale para as comunidades dos expatriados.” O antigo presidente da Associação de Médicos de Língua Portuguesa levanta ainda a questão dos actos de corrupção eleitoral. “A verdade das eleições, em si, é uma coisa duvidosa. Entre a compra de votos e as pressões para votar, tudo é altamente duvidoso.” Albano Martins frisa que há poucos portugueses interessados neste acto cívico, com excepção dos macaenses. No seu reduzido grupo de amigos, as eleições para a AL raramente são tema de conversa. “Acredito que esse número reduzido de amigos vota, mas não conversam comigo sobre o assunto. Se calhar achamos que não é importante falar sobre isto, mas cada um assume o voto à sua maneira. A maioria das pessoas que conheço tem consciência de que é importante, nem que seja por uma cruz fora do quadrado.” A arquitecta afirma que “não há muito interesse” da parte dos portugueses, sobretudo dos que acabaram de emigrar. Mas Maria José de Freitas acredita que há uma vontade de mudar o rumo dos acontecimentos. “As pessoas estão atentas face ao facto de que algo tem de mudar, não podemos sempre ficar no status quo. Por isso estou na expectativa se essa mudança vem mais à superfície.” Sem representação Quando se vota coloca-se a cruz no boletim na expectativa de que um candidato represente ou defenda aquilo em que acreditamos. Rui Furtado diz ter a plena consciência de que ninguém o irá representar no hemiciclo da Praia Grande. “A AL não representa ninguém, representa-se a si própria e aos seus deputados que têm os seus interesses a defender. E quem pensa que tem a AL para os defender está muito enganado.” Na visão do médico, a falta de empatia entre a comunidade portuguesa e a política local começa logo nos debates. “Temos um problema: não assistimos às discussões do plenário mas sim à tradução dos debates. Gosto de pensar que os deputados são melhores do que aquilo que são, e que as traduções são melhores do que a realidade.” “Basta ouvir para vermos o que a AL faz de facto. O interesse dos cidadãos não é a coisa mais importante para quem está na AL”, frisa o médico. Também Maria José de Freitas reconhece que, apesar de cumprir o seu dever cívico como residente permanente, será difícil ver os seus interesses e desejos representados. “Se me pergunta se algum dos candidatos corresponde ao que penso, ou qual a utilidade do meu voto, direi que há uns candidatos que correspondem mais do que outros. O ideal é difícil de atingir, mas há-de haver uma situação que pode ser mais interessante apoiar, e é por aí que vou”, remata. Proibições na fronteira Votar em Macau é sinónimo da existência de um segundo sistema, mas Albano Martins alerta para os recentes casos de proibições de deputados e jornalistas de Hong Kong na fronteira. “Estamos a assistir a mudanças cada vez mais repentinas e muito antes do prazo terminar [2049]. Basta olhar para as fronteiras. Não faz sentido que no segundo sistema um deputado da ala democrata de Hong Kong não entre em Macau por ir contra a segurança do território. Faz parte da lógica do segundo sistema ele poder viajar entre as duas regiões e emitir opiniões. Penso que viajam para a China, mas não podem viajar para Macau. É um dossier que está a ser mal gerido. Se me disserem que há intervenção da China, não acredito. Haverá aqui mais papistas do que o papa.” A política e a ANIMA Albano Martins recusa participar em qualquer iniciativa do foro político, além do exercício do dever cívico como residente permanente, por não querer aproveitamento político da associação a que preside, a ANIMA. “Não estou interessado em que haja aproveitamento político do nosso trabalho. Já houve no passado duas organizações que tentaram colar-se a nós, e eu recusei. Incentivo todos os que sejam residentes a participar nas eleições tentando equacionar os problemas que os futuros deputados devem levantar.”
Sofia Margarida Mota Manchete PolíticaHato | Comissão define acções que podem interferir com liberdade A Comissão para a Revisão do Mecanismo de Resposta a Grandes Catástrofes já está em acção e com alguns objectivos definidos a curto e médio prazo. A revisão legislativa vai avançar e pode interferir com a liberdade e privacidade nas comunicações. Para já, as primeiros números, ainda provisórios, relativos aos prejuízos provocados pela passagem do Hato, apontam para mais de 10 mil milhões de patacas [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] estimativa, para já, dos prejuízos causados pela passagem do tufão Hato pelo território é na ordem dos 11,4 mil milhões de patacas. A informação foi adiantada ontem pelo Chefe do Executivo, Chui Sa On em conferência de imprensa. No encontro com os jornalistas estiveram presentes os membros da recém- criada Comissão para a Revisão do Mecanismo de Resposta a Grandes Catástrofes e o seu Acompanhamento e Aperfeiçoamento, onde foram apresentados os trabalhos que já estão em andamento. De destacar a criação da Direcção de Protecção Civil e de Coordenação de Contingências (DPCCC). O nome ainda é provisório, disse o secretário para a Segurança, Wong Sio Chak, mas o organismo já está a ser pensado. A ideia é que seja uma entidade capaz de dirigir o Centro de Operações de Protecção Civil que, prevê-se também, irá mudar de nome. A criação do DPCCC vai exigir uma revisão legislativa para conferir à entidade poderes próprios sob a tutela do secretário para a Segurança. Os trabalhos vão começar “já”, disse Wong Sio Chak. No entanto, sublinhou o secretário, o exercício legislativo que se impõe desenvolver “tem de ser feito com toda a competência, até porque poderá interferir na liberdade das pessoas”. O secretário não concretizou em que aspectos a liberdade dos residentes de Macau poderá estar comprometida ou em que áreas é que a lei poderá interferir. No entanto, na apresentação feita por Wong Sio Chak , dentro dos planos a médio prazo para a nova direcção, pode ler-se que cabe ao organismo “estudar, em caso de urgência e de necessidade , a viabilidade de fiscalização dos grupos de comunicação das aplicações de telemóveis. A intenção é que esta acção aconteça para monitorizar os falsos rumores e insere-se na promoção do policiamento inteligente de modo “a fornecer um sistema de gestão de informação de crises”, apontou o secretário. Diques a concurso Com as cheias que decorreram no Porto Interior e depois de anunciadas medidas para as evitar, o secretário para as Obras Públicas e Transportes, Raimundo do Rosário, falou ontem dos estudos que vão ter de ser revistos. “Em 2015 tínhamos uma empresa de consultadoria a fazer estudos para os quais já existem projectos. No entanto, com as subidas recorde das águas temos de ponderar um aumento dos muros a ser construídos no Porto Interior”. O levantamento, naquela zona, de estruturas com uma altura segura, que para Raimundo do Rosário, seria de cerca de 2,5 metros, traz questões que, disse, “têm de ser analisadas cuidadosamente”. “O que sei é que se precisarmos de construir um dique no Porto Interior, temos de ter pelo menos 2.5 metros de altura, porque de outra forma não conseguimos travar a circulação da água”. Mas, uma parede com esta dimensão vai alterar as características paisagísticas daquela zona pelo que “é preciso uma análise em pormenor”, apontou. De acordo com Raimundo do Rosário, o sector da construção já deu várias propostas mas tem de se ter em atenção a sua viabilidade. Novos estudos estão a ser feitos e, garante a secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, no primeiro trimestre do próximo ano deve ser lançado um concurso para o projecto na zona do Porto Interior. Já a retenção da subida das marés, matéria que implica, disse o Chefe do Executivo , o trabalho inter-regional, também está em andamento. Com o apoio do Governo Central, está marcada para o próximo dia 11 uma reunião com responsáveis da província de Guandong. A ideia, avançou Chu Sai On, “é construir um sistema de comportas para controlar o nível do mar”. Ainda relativamente à subida das águas, esperam-se revisões na concepção e construção de novos aterros. “Com certeza que vamos rever a cota altimétrica dos novos aterros” afirmou Raimundo do Rosário, fazendo mais uma vez referência ao recorde registado com a passagem do Hato, com valores que, disse, não se conheciam desde 1925. Trabalho repensado Com a recolha de opiniões que a comissão levou a cabo nos últimos dias e que ainda decorre, podem ainda existir alterações na legislação laboral. “Vamos fazer uma revisão da legislação de modo a criar um mecanismo de análise de casos de emergência e decidir se os trabalhadores vão ou não trabalhar aquando do sinal 8”, avançou o secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong. A ideia da revisão legislativa, que tem por base o estado de emergência, não se limita à passagem de tufões e deve abranger outras situações. Chui Sai on reforçou a ideia de Lionel Leong. “Podem existir imprevistos de ordem pública, como doenças transmissíveis ou relativos à segurança em que temos de definir medidas obrigatórias para as pessoas respeitarem”. O Chefe do Executivo apontou ainda, que está a ser estudada a localização para uma nova área onde possam ser colocados os contentores de mercadorias. “Queremos deslocar a estrutura para um sítio mais adequado”, referiu, sendo que, Ka Ho pode ser uma possibilidade. A ponte elevatória prevista para o cais 23, vai ter nova localização. O local para a sua construção é ainda desconhecido, mas, de acordo com Sónia Chan, a decisão vai ser tomada tendo em conta a opinião do Instituto Cultural.
Victor Ng Manchete PolíticaEleições 2017 | Au Kam San criticado em debate por opinião sobre exército chinês Wong Kit Cheng criticou ontem Au Kam San pelo facto deste se ter mostrado contra a presença do exército chinês em Macau, e o candidato chegou mesmo a pedir desculpas. Temas como a habitação e os cheques pecuniários marcaram o debate organizado pela TDM [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] texto do candidato do campo pró-democrata sobre a presença do exército chinês nas ruas marcou ontem o debate sobre as eleições organizado pela TDM, e que juntou representantes de cinco listas. O assunto foi levantado pela candidata Wong Kit Cheng, líder da Aliança do Bom Lar. Esta exigiu a Au Kam San um pedido de desculpas em público depois deste ter criticado a permanência do Exército de Libertação Popular no território, aquando da passagem do tufão Hato. Au Kam San escreveu no Facebook que a presença do exército chinês só se justificava em catástrofes de maior dimensão. Foto: HM Au Kam San, líder da lista Associação Novo Democrático, ainda disse que o seu trabalho, na qualidade de deputado, é fiscalizar o Governo, mas Wong Kit Cheng cortou-lhe a palavra de imediato. O assunto não ficou esquecido, e no tempo que lhe foi concedido para fazer perguntas, Au Kam San chegou mesmo a pedir desculpas ao Exército de Libertação Popular, pois apontou que nunca teve a intenção de criticar a sua presença, tendo assumido o uso de “palavras incorrectas” na rede social Facebook. Wong Kit Cheng lançou também uma farpa a Angela Leong, questionando as razões pelas quais Arnaldo Ho, seu filho e membro da lista, tem estado tanto tempo ausente de Macau. A candidata invocou que Arnaldo Ho pode não conhecer bem o território, mas Wiliam Kuan disse que Ho é um jovem que tem contribuído para o desenvolvimento de Macau. Habitação sempre Ontem marcaram presença as listas Aliança de Bom Lar, Poder dos Cidadãos, Associação de Novo Movimento Democrático, Nova União para Desenvolvimento de Macau e Poder da Sinergia. No total, dez candidatos participaram no debate. No período de perguntas e respostas, as cinco listas abordaram temas como a habitação, os cheques do Governo, a fiscalização de obras públicas e o acordo assinado entre o Executivo e o grupo Alibaba, do empresário chinês Jack Ma. Wong Kit Cheng disse que a lei de habitação económica deve ser alterada e, caso seja eleita, vai lutar para que haja novos concursos para atribuição de habitação pública. Angela Leong, da lista Nova União para o Desenvolvimento de Macau, não esteve presente, mas os seus parceiros William Kuan e Siu Yu Hong defenderam a criação de dois sistemas de atribuição de casas, com pontuação e sorteio, para diferentes grupos sociais. Os cheques Questionados sobre a continuação do programa de comparticipação pecuniária, Sze Lee Ah, líder da lista Poder dos Cidadãos, disse que os cheques podem servir melhores objectivos, pois só “uma viagem ao estrangeiro pode custar um total de nove mil patacas”, o valor de um cheque atribuído a um residente permanente. Lam U Tou, da lista Poder de Sinergia, disse que as vantagens deste programa são “questionáveis”. Ieong Wai Kit, da lista Poder dos Cidadãos, promete que não criar conflitos no hemiciclo mas sim lutar por uma união das ideias em prol da construção de Macau. Lam U Tou manifestou concordância e acenou com a cabeça, bem no final do debate.
Hoje Macau Manchete SociedadeTufão Hato | EPM com prejuízos de um milhão de patacas A direcção da Escola Portuguesa de Macau já avaliou os estragos causados pela passagem do tufão Hato. Os custos rondam um milhão de patacas. O ano lectivo arrancou ontem com reuniões da parte da manhã, sem grandes alterações [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s aulas arrancaram, como previsto, na Escola Portuguesa de Macau (EPM), duas semanas depois da passagem do pior tufão dos últimos 53 anos, que causou prejuízos na ordem de um milhão de patacas no estabelecimento de ensino, informou a direcção à agência Lusa. “Neste momento apontamos para um prejuízo na ordem de um milhão de patacas”, disse o director da EPM, Manuel Machado. O mesmo responsável salientou o apoio disponibilizado, “desde o primeiro momento, pela Direcção dos Serviços de Educação e Juventude e pelo conselho de administração da Fundação Escola Portuguesa de Macau para ajudar no que for necessário para estes trabalhos de reconstrução e reparação”. “O que falta fazer é a substituição dos vidros partidos porque há escassez de vidros. (…) Há muita gente a precisar de vidros. Já foram encomendados, e o que está previsto é serem todos colocados ao mesmo tempo quando vierem. Há algumas janelas sem vidros, na cantina também faltam alguns, mas o funcionamento está assegurado”, explicou Manuel Machado. Tufão Hato levou mural assinado por Vhils. Foto: HM “Julgo que até ao final deste mês, os [trabalhos de reparação] devem estar concluídos”, observou. O director da Escola Portuguesa adiantou também que os dois muros exteriores da escola derrubados pelo tufão já foram reconstruídos, mas que “ainda têm de ser pintados e têm que ser colocadas grades que também foram danificadas” pelo Hato. Um desses muros tinha, no final de Maio, sido objecto de uma intervenção do artista português Vhils. A direcção da escola já informou o artista da queda do mural, mas não foram estabelecidos mais contactos no sentido de, no futuro, Vhils realizar novo trabalho naquele espaço. “Isso ainda não foi conversado”, disse Manuel Machado. O melhor possível O mesmo responsável afirmou que o novo ano escolar arrancou ontem “da melhor maneira” para os 574 alunos inscritos entre o 1.º e 12.º ano, depois de realizadas algumas obras na escola. “Felizmente, conseguimos em tempo útil fazer todos os trabalhos de reconstrução e reparação necessários ao arranque do ano lectivo sem pôr em causa a data previamente acordada”, afirmou. Não houve necessidade de nenhuma medida extra porque “todos os espaços por onde circulam professores, alunos e funcionários estão devidamente seguros”, observou. “De manhã, as crianças do primeiro ciclo foram recebidas pelos seus professores e estão ainda em actividades. Às 10:00 houve uma reunião geral dos alunos do segundo e terceiro ciclos do ensino secundário com a direcção da escola e posteriormente foram recebidos pelos directores de turma. Portanto, decorreu da melhor maneira, e as actividades estão agora em curso”, afirmou. Além de algumas janelas e portas partidas e da queda de muros, quase todas as árvores nos pátios da escola foram arrancadas pelo tufão, que também causou danos nos ares condicionados e sistemas de ventilação. Ensino | DSEJ diz que há mais alunos e professores Mais de 79 mil alunos em 77 escolas. São estes os números oficiais do arranque de mais um ano lectivo, e que representam um aumento de 2,7 por cento de estudantes face ao ano passado, disse a Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ) em comunicado. O aumento de alunos verifica-se mais no ensino infantil, que conta este ano com um total de 19.023 estudantes, mais 6,6 por cento. Há também um aumento de 5,5 por cento de alunos no ensino primário, que conta com quase 30.800 estudantes. No ensino secundário, o número de alunos regista uma quebra de 2,8 por cento. Ao nível dos docentes, a DSEJ explica que este ano haverá mais professores nas salas de aula, num total de 7.606 face aos 7.304 registados o ano passado.
João Luz Entrevista Eventos ManchetePessanha, 150 anos | Valério Romão, escritor: “O amor já existia antes da literatura” Valério Romão está prestes a encerrar o capítulo final de uma trilogia de romances, Paternidades Falhadas, com um livro, que terminou recentemente, sobre o Alzheimer. Tem também no currículo dois livros de contos. O escritor que gosta de temas arriscados esteve por cá para celebrar os 150 anos de Camilo Pessanha [dropcap]C[/dropcap]omo se começa a fazer um livro? Normalmente a coisa impõe-se de uma forma bastante natural. Quando dás por ti tens um projecto na cabeça que nasceu como uma espécie de revelação, uma iluminação. De repente há qualquer coisa que faz sentido e sobre a qual achas que podes passar alguns meses, ou alguns anos, a trabalhar sem que isso chateei, porque o romance é uma maratona. Começas agora e acabas muito tempo depois, portanto, tem de ser qualquer coisa que seja suficientemente apaixonante para te motivar. Acho que é bastante análogo ao trabalho académico, no princípio tudo parece muito bonito mas assim que começas a escrever surgem as dúvidas, pensas que está tudo uma grande merda. Tens oscilações, com amplitudes enormes, entre “eu sou muito bom” ou “eu sou uma grande porcaria” durante todo o processo, até que chegas a um ponto em que já nada importa a não ser acabar aquilo. Como o corpo do maratonista que já está tão anestesiado que já não lhe dói, já não é cansaço, já não é nada. É, pura e simplesmente, uma espécie de mecânica cuja inércia nunca mais termina e que faz com que ele chegue até ao fim da corrida. Entras num estado de semi-hipnose em que a cabeça se concentra num único objectivo e na única coisa que, de facto, te pode salvar naquele momento que é chegar ao fim. Como é que se sabe que o processo de escrita chegou ao fim? Tu decides. Há vários fins, ou seja, quando acabas de escrever a primeira versão, quando voltas a trabalhar naquilo. Havia um gajo qualquer que dizia: “sabes que está terminado quando já não consegues olhar para aquilo”. É mais ou menos isso. No meu romance “O da Joana” fiz sete revisões, cheguei ao fim e decidi entregar aquilo a alguém porque já estava a tirar vírgulas do sítio onde as tinha posto e a pô-las onde as tinha tirado. Corria o risco de estar naquilo, tipo Sísifo, o resto da vida. Acho que no fundo já não consegues fazer muito dano porque te estás a repetir. As partes de que não se gosta cortam-se, modificam-se, essa são fáceis de resolver. As difíceis são aquelas em que não tens a certeza. Depois também chegas a um ponto em que estás demasiado perto para poder avaliar aquilo, já não tens clareza suficiente para mexer nas coisas. É muito mais fácil quando estás a rever o livro de outra pessoa. Não é uma questão de ligação emocional ao que está escrito, tem a ver com o facto de haver uma espécie de opacidade que turva as coisas quando escreves qualquer coisa e vais revê-la ao fim de algum tempo. O que é muito bom e muito mau é fácil, o que está no meio é muito mais difícil e é a maior parte. Como é que começou a escrever? Começas a escrever porque gostas muito de ler e gostas muito de ler porque, normalmente, tens um problema social qualquer, ninguém te liga. A vida é muito mais interessante que a leitura. A maior parte das vezes não tens muito jeito para estar com pessoas, as pessoas não te interessam muito e refugiaste um bocado ali na leitura. Depois de estares nesse refúgio descobres que podes fazer um caleidoscópio do mundo e encontrar muitos mundos dentro deste mundo através da leitura e apaixonaste por aquilo. Com alguma naturalidade, vais tentando imolar aqueles de que mais gostas. Que são… Eu comecei, como julgo que imensos escritores da minha geração, com os Lobos Antunes da vida. É uma referência, mas também um eucalipto que seca tudo à volta porque, de facto, não se pode jogar no campo dele. Os temas centrais dos seus livros são duros, extremados. Porquê? Tenho algumas coisas, mais ou menos, simpáticas em contos, por exemplo. Mas, normalmente, vou à procura das coisas menos simpáticas. Primeiro, porque as acho mais interessantes, depois porque estão pouco trabalhadas, outras estão à espera que alguém pegue e faça alguma coisa. A literatura contemporânea tende a ser um bocado neutra a este tipo de temas, não os aborda, ou fá-lo de uma forma mais neutralizada. Interessa-me o desafio de pegar em matéria muito complexa. Pegar num tema destes e trabalhá-lo mal implica teres um livro que manipula uma determinada carga emocional e que redunda num livro delico-doce, ou num dramalhão. É um risco muito grande pegares no autismo, que é o tema do meu primeiro livro, ou numa gravidez falhada, que é o tema do segundo, corres o risco sempre de estar a manejar mal aquilo e de se tornar insuportável de ler por ser pornográfico. Porque expõe em demasia aquilo que as personagens estão a sentir, a desgraça alheia como finalidade, como no Big Brother. A minha finalidade não é essa. A minha finalidade é tentar perceber em que condições é que ocorre uma determinada experiência e tentar devolver essa experiência de uma forma intersubjectiva, de uma forma que faça sentido para mim e para ti sem que isso redunde em voyeurismo. A sua estreia no romance tem uma recepção muito interessante, inclusive foi finalista do Prémio Femina, em França. Pensou que tinha alcançado um patamar interessante e estava no certo caminho para ser escritor? Senti quando acabei aquele livro que era um bom livro. Precisava, talvez, de mais tempo para resolver alguns problemas de que ele enferma. Naturalmente, por ser um primeiro livro e por ser muito colado a uma vivência pessoal, mas senti que era um livro bom. Senti ainda mais isso no “O da Joana”, porque, na minha opinião, estruturalmente ainda é mais arriscado e não tendo falhado nesse risco acho que ainda é melhor. Mas percebes quando um livro é bom. Depois tens o teste do primeiro leitor, do editor, mas percebes quando é bom. Sente que está a fazer o seu caminho e a conseguir o seu lugar? Acho que ainda não cheguei lá, que ainda falta algum tempo para chegar ao meu lugar, seja lá o que isso for. Aquela coisa de encontrar a minha voz já está resolvida. Acha que há uma geração nova de escritores portugueses? Um movimento pressupõe algumas condições… O movimento característico desta geração é termos temas comuns. Muitas vezes o tema é uma espécie de incapacidade de encontrar um sentido para isto onde nós estamos a viver, o que não é nada de original mas que se acaba por repetir. A originalidade das coisas não pode estar no tema. Por exemplo, o amor existe antes de haver literatura, a morte também. O tema não pode ser diferente, mas a forma como o envelope lhe cai em cima, como é vestido é que pode ser diferente, a forma como pode ser vivido e expresso. Neste caso temos uma geração de pessoas que estão ligadas a essa incapacidade de encontrar sentido, que resulta também nalguma incapacidade de haver um movimento porque todo o movimento surge sempre como contraponto a qualquer coisa e aqui não há contraponto. Não é uma questão de realistas e românticos, não é uma questão de neo-realistas e simbolistas, não há isso. Para quê criar um movimento quando não há nada para ir contra? Claro que temos aquelas tricas, que não chegam sequer a ser dignas de menção literária, tipicamente lisboeta e portuguesa. É uma pequena cidade num país muito pequenino, em que as pessoas todas se conhecem e acabam por gostar e detestar-se mutuamente, com a mesma força. Mas há, ou havia há um ano, um renascimento da poesia em Lisboa. Há coisas interessantes a acontecer. Nunca tivemos tanta leitura de poesia, a poesia ficou sexy. Terá contribuído para isso a forma como é lida, porque a poesia era lida de uma forma em que acabava tudo a soar sempre a Manuel Alegre. A forma, a técnica, eram muito solenes e estamos numa altura em que as coisas solenes, para o bem e para o mal, não têm piada. Foi bom poder pegar em poetas e lê-los com uma guitarra eléctrica por trás, com piano, com o quer que seja, às vezes sem nada. Temos uma perspectiva muito desempoeirada do que pode ser uma leitura. Vais para um bar e não estás à espera de ver um gajo em modo lírico a noite toda a declamar como se estivesse a ser possuído por, sei lá por quem… Pelo fantasma do Viegas… Exacto. O que nos pode dizer acerca do seu próximo livro? Acabei de escrever a primeira versão antes de vir para cá. É um livro que ainda não sei muito bem como descrevê-lo porque é muito pulverizado. Tem como pano de fundo o Alzheimer. Gosto de adaptar uma forma específica de escrita a cada livro que escrevo. O “Autismo” tem uma série de capítulos que suportam e fazem a coluna dorsal do livro, que são as partes que se passam numa sala de espera de um hospital. Tudo o resto decorre daí, intercala-se como membros daquela construção que vão encaixar nessa coluna dorsal, em que há analepse, prolepse, para fazer essa sequência e uma espécie de bailado por dentro da história. É sinuoso, mas perfeitamente lógico. “O da Joana”, como é um livro que se passa numa noite, não tem capítulos, é vertiginoso, obriga o leitor a não parar. Como é um livro pequeno eu queria que a experiência fosse assim. Sem paragem, respirar só quando acabar o livro, é um shot de sofrimento. Este, como é sobre o Alzheimer, não tem ordem cronológica. Pode-se começar a ler do meio para o fim, e do meio para o princípio, a experiência não é igual mas pode ser feita. O livro está pulverizado, atomizado em capítulos de página, página e meia, que são uma espécie de ilhotas que simbolizam, de certa forma, as memórias do Alzheimer, que aparecem e desaparecem. Imaginemos um campo de dunas, em que as memórias aparecem em sítios diferentes, em dias diferentes. Queria que fosse uma coisa tão perigosa, tão frágil quanto isso. Não sei se vai resultar, vamos ver, mas já está acabado.