MGM recebe até domingo a exposição “A Golden Way of Life”

[dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]ikael Kraemer é o descendente de uma família parisiense com uma longa história ligadas às artes ao longo do último quarto de milénio europeu, algo que está representado na exposição “A Golden Way of Life”, patente no MGM até domingo. Para além de se poder ver um percurso do ouro bruto, à barra e à folha de ouro, os visitantes podem viajar entre a história das relações entre a China e a França através da arte.

Uma das peças de destaque da exposição é o primeiro dicionário de latim/chinês, publicado em 1742, uma obra que teve apenas 200 exemplares e que demorou quatro décadas a ser elaborada. O dicionário foi encomendado por Luís XIV, o Rei Sol, e serviria para os enviados franceses à China aprenderem a língua pelo caminho. Neste aspecto, importa realçar que a viagem de barco demorava, à altura, quase um ano. “Este livro foi a melhor prova de amor entre essas duas civilizações”, comenta Mikael Kraemer.

O francês, proprietário da relíquia, procura um museu nacional chinês para doar a obra. “Talvez Pequim, Xangai, Macau ou Hong Kong, este dicionário tem de ser aproveitado pelo máximo número de pessoas possível”, explica.

Mikael Kraemer gostava de ver o livro digitalizado para que possa ser estudado e sirva de instrumento para que se “perceba a relação que havia entre a França e a China durante o Século XVIII”.

Arte dourada

Outra das obras em destaque é uma cadeira portátil que servia para transportar aristocratas, nobres e realeza pelas ruas da cidade. A peça foi feita por volta de 1770, antes da queda do absolutismo. Com o advento da Revolução Francesa o brasão da família que estava no centro da pintura a óleo que embeleza a cadeira teve de ser retirado por clara desadequação aos tempos.

A exposição patente no MGM é um banho de ouro, uma experiência de como a arte se move de acordo com as marés de poder e dinheiro.

Durante o século XV, em Espanha os movimentos artísticos expressavam a estética do Barroco, um século depois a Itália apadrinhava a Renascença, depois de uma passagem pela Holanda, Paris torna-se o centro das artes até ao Iluminismo. Com a Revolução Industrial a produção e mercado das artes muda-se para Inglaterra, enquanto o século XX trouxe os Estados Unidos para o centro de produção e mercantilização das artes.

Hoje em dia, a China afigura-se como uma potência económica que tem o mundo as artes no horizonte. “A China entende que trazendo para a Ásia as grandes colecções dos maiores museus e galerias criam um mercado local, é aquilo a que se chama diplomacia artística”, explica Mikael Kraemer.

Quem quiser experimentar um pouco da vida dourada e do glamour intemporal do ouro tem até domingo para visitar o MGM e deslumbrar-se com peças de joalharia, mobiliário e escultura da exposição “A Golden Way of Life”.

1 Set 2017

Camilo Pessanha, 150 anos | Antønio Falcão apresenta “Kleptokronos” e “Morri”, um livro de crónicas

“Se existir um deus, é o tempo”

Antønio Falcão é Ring Joid, mas podia ser outro qualquer. De regresso a Macau é também Pessanha e os muitos que vão habitando dentro de si. Está no território com a exposição “Kleptokronos”, que é inaugurada hoje e para apresentar o livro “Morri”, amanhã. É um dos artistas que integra as comemorações dos 150 anos de Camilo Pessanha do Edifício do Antigo Tribunal e vem mostrar a sua concepção de tempo

[dropcap]O[/dropcap] que é que vamos ter em “Kleptokronos”?
Quando recebi o convite comecei a pensar no que fazer. Não queria ir buscar imagens que já tinha nem recorrer a paisagens de Macau. Acabei por ter esta ideia, de jogar com o tempo da própria fotografia e tentar, trazer com a técnica, o tempo do Camilo Pessanha. “Kleptokronos” que dizer ladrão do tempo. Uso a técnica da fotografia em que a luz constrói a imagem durante o tempo necessário até ter uma imagem possível. A maioria das fotografias aqui presentes são feitas com várias exposições, e muitas delas, longas.

O próprio processo incorporou o conceito de tempo?
Sim. A exposição longa traz o tempo para trás e, tecnicamente, é um método em que o tempo se demora pela fotografia adentro.

Como é que isto se materializa na exposição?
A minha ideia era pegar neste tempo que se comemora do Camilo Pessanha e juntá-lo ao que também se passa agora, à contemporaneidade. Por exemplo, com a questão dos refugiados. Também se lançam ao mar e muitos acabam por naufragar.

Faz um paralelo com as situações da actualidade?
Sim, tenho uma imagem referente aos fogos que têm passado por Portugal e que se pode relacionar com o poema “Vida” do Pessanha. Fala disso, do lumaréu, de tudo a arder e das flores que deixam de existir. O arder, mais uma vez, também é referente à luz fotográfica que queima. Não foi pegar no poema e fazer uma imagem que se parecesse. Foi outra coisa.

Tem alguns auto-retratos.
Os auto-retratos têm que ver com outro processo. É um reencarnar-me como uma espécie de Camilo Pessanha de agora no sentido do delírio, da fuga, da própria erosão da pessoa que está fora, num sítio que não é dela mas que acaba por lhe pertencer. Isto passa também pela minha experiência por Macau. O que vivi e não vivi aqui. A ideia é tentar ser uma personagem, mais do que alguém que escreve ou que fotografa. É criar este embrulho para que tudo o que estou aqui a apresentar faça um certo sentido para que saia da realidade e traga outros elementos.

Vamos ter uma mistura de Camilo com Ring Joid, uma outra personagem sua?
Um pouco por aí. Mas sem rigor nenhum. O Ring Joid – e não interessa o nome porque foi quase aleatório – é o ideal de mim que não consigo representar na vida real. E por isso mantenho-o vivo artificialmente como complemento de uma vida com limites. Ele sou eu à solta.

Vai também lançar o livro “Morri”. Porquê o título?
Tem tudo que ver com a questão do tempo. Se existir um deus, é o tempo. É a única omnipresença que existe no mundo e da qual todos fazemos parte. “Morri” foi o título que me apareceu. Comecei a escrever, para o Hoje Macau, em 2004, numa altura da minha vida em que quase tinha uma necessidade da escrita para que pudesse continuar a viver ou a ficar perto do chão. Escrevia com outro nome, o de Ring Joid. Acabei por inventar essa personagem. Há sempre duas coisas a viver dentro de mim. É como se andasse com uma companhia. Um puxa para o desvio, para ir por outros caminhos mais longos e mais difíceis. Depois há as histórias ao longo do livro que têm esse carácter da morte. Aliás, o livro acaba com um pequeno texto em que sou eu dentro de um avião a cair, e relato os últimos momentos antes da sua queda. A morte. O livro têm alguns textos actuais também em que, mais uma vez, está presente o tempo. A introdução, em que relato uma situação de quando tinha três anos, representa tudo o que se passa agora. É uma situação biográfica em que tudo o que nós vivemos já vimos acontecer. É como se vivêssemos numa dimensão em que tudo está mais ou menos programado e que já vimos isso mas que não conseguimos perceber e agora, como o tempo se estendeu, tudo se descodificou. “Morri” fala também da história contemporânea de Macau. Os portugueses, as despedidas, as passagens, mas muitas vezes uma história idealizada. Por exemplo, os governadores que eram seres de uma dinastia superior, que passavam por um processo de estudo do oriente, da língua, da filosofia e quando chegavam integravam-se na vida do “outro” e eram admirados por toda a população. Eram textos escritos para um jornal na pressão semanal do fecho. Experiências de temas e de métodos de escrita. Coisas que via, cinema, música, noites. Sempre com o meu outro ser a testar as minhas capacidades, se conseguia realmente escrever alguma coisa. Uma escrita que parte de um trauma que se vai cosendo ao longo dos tempos. Vivemos num mundo isolado dentro deste território e era preciso soltar-me. E na escrita tudo é possível. Tudo existe. Não há freio.

E a fotografia? Qual a sua relação com ela agora?
A fotografia só funciona se de algum modo participar nela. Não pode ser apenas uma composição visual de elementos exteriores. Isso é uma espécie de malabarismo, tem de estar tudo no lugar para que as bolas não te caiam na cabeça. Eu fico à espera que elas caiam. E depois logo se vê.

O que acha das comemorações dos 150 anos do Pessanha e da sua representatividade para Macau?
O Camilo Pessanha é um dos poetas mais válidos da literatura portuguesa e também dos mais esquecidos. Já Fernando Pessoa o admirava mas depois houve este tempo todo em que parece que esteve adormecido. Em Macau, penso que nunca foi devidamente reconhecido e por isso é importante tanto a obra como a sua figura e a sua passagem pelo território. É preciso que resista para que as pessoas possam, algumas continuar a relembrar o homem e outras o puderem conhecer.

Viveu aqui 17 anos e está de regresso. Como está a viver a visita?
Não tenho bem a noção do tempo, quando olho para trás, passaram 17 anos em Macau, passaram seis desde que fui para Portugal. Está tudo compresso na cortina do engenho que capta imagens para dentro do nosso cérebro. Fui embora em 2011 e sempre que volto sinto como se me tivesse ido embora na semana passada. É sempre um sentir-me em casa. É bom e mau mas como estou sempre de partida, e não venho de armas e bagagens para ficar, também não desespero. É a sensação de estar num sítio inóspito.

Macau é inóspito?
Sim. O mundo é inóspito.

1 Set 2017

Jorge Barreto Xavier expõe no Albergue SCM

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]hama-se “A mão, escrevendo sobre o olhar” e é o nome da exposição que o Albergue SCM inaugura na próxima quarta-feira, dia 6. Trata-se de uma mostra de fotografias do antigo secretário de Estado da Cultura do Governo português entre 2012 e 2015.

Segundo um comunicado, a exposição terá um total de 72 fotografias, tendo curadoria do artista e também fotógrafo Ben Leong. As imagens estão organizadas em três grupos, intitulados “O código da fronteira”, “O código da estrada” e “O código do sentido”.

“Cada conjunto de imagens propõe um código, um conjunto de símbolos. E cada imagem tem o poder de ser conjugada com as outras ou de ser lida sozinha, citando o autor”, explica o Albergue.

Apesar de ter começado a fotografar na juventude, só em Dezembro do ano passado é que Jorge Barreto Xavier fez a sua primeira exposição individual na galeria de arte do Maquinez Palace, em Pangim, Goa, na Índia.

Homem de várias artes

Fora da política Jorge Barreto Xavier tem tido uma actividade artística intensa e polivalente. Em Maio deste ano lançou “Alexandria”, o seu primeiro livro de contos, tendo também “vários livros publicados sobre política cultural e gestão das artes”.

É ainda professor de políticas públicas da cultura e de gestão de indústrias criativas no Instituto Superior das Ciências do Trabalho e da Empresa – Instituto Universitário de Lisboa.

Antes de ter desempenhado o cargo de secretário de Estado, Barreto Xavier foi Director-Geral das Artes em Portugal entre 2008 e 2010.

Fundou e dirigiu várias organizações culturais privadas, como o Clube Português de Artes e Ideias, que presidiu de 1986 a 2002 ou o Lugar Comum- Centro de Experimentação Artística, que dirigiu entre 1997 e 2001.

O fotógrafo foi ainda consultor de várias organizações culturais, entre as quais a Agência Europeia para a Cultura (EACEA), Copenhaga, Capital Europeia da Cultura, Inteligence on Culture (Londres), Centro Cultural de Belém e Fundação Calouste Gulbenkian (Lisboa) ou Fundação de Serralves (Porto).

A exposição no Albergue SCM estará patente até 28 de Setembro deste ano na galeria A2, tendo entrada gratuita.

31 Ago 2017

Pessanha, 150 anos | José Drummond apresenta “O Exorcismo” este domingo

Conhecido artista plástico, José Drummond lança no domingo um livro que reúne poemas escritos à mão no início dos anos 90. Os textos falam de sentimentos mas mostram também o próprio autor na pele de artista

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]entimentos e palavras sobre pintura, ou simplesmente reflexões. O universo privado de José Drummond cabe todo em “O Exorcismo”, o livro de poesia que será lançado este domingo no edifício do antigo tribunal, inserido nas comemorações dos 150 anos do nascimento de Camilo Pessanha, uma iniciativa do Hoje Macau.

A revelação de Drummond como poeta não passa de uma forma do autor exorcizar – daí o nome – aquilo que lhe ia na mente e na alma no início dos anos 90. Mais de uma década depois, poucas alterações foram feitas e a publicação aconteceu mesmo.

“Este foi um período bastante intenso, em que tinha sempre uma série de cadernos antigos e ia escrevendo duas ou três linhas”, recordou ao HM. “Escrevi reflexões sobre pintura mas também reflexões sobre o que me acontecia na altura, fosse relacionado com amores ou o com o estado do tempo, por exemplo.”

Drummond nunca deixou esses cadernos, e no meio de idas e vindas, a poesia acabou por acompanhá-lo sempre. Alguns poemas chegaram a acompanhar uma exposição que o autor realizou em 1992.

“Alguns cadernos desapareceram, outros permaneceram. Há cerca de um ano e meio, voltei a pegar neles e olhei para eles de uma outra forma. Comecei a encontrar correspondências com o trabalho que continuei a fazer e algumas linhas dos meus trabalhos na área das artes plásticas estão ali expostas.”

Daí a ligar a publicação do livro ao evento dedicado ao Camilo Pessanha foi um passo. Inicialmente havia a ideia de editar as crónicas que o Hoje Macau publicou no suplemento H, mas os poemas fizeram mais sentido na cabeça de José Drummond.

Palavras com sentido

Aquilo que Drummond escreveu à mão há anos atrás, quando escrever no computador estava longe de ser algo comum, ainda faz sentido nos dias de hoje. O artista plástico lembra que até utilizou alguns escritos para a última exposição que fez na Casa Garden, com curadoria de Margarida Saraiva e apoio da Fundação Oriente.

“Tenho algumas expectativas de ver como é que as pessoas vão reagir. Pessoalmente penso que o livro faz sentido também enquanto artista plástico, porque o que lá está escrito é um reflexo de um período no qual as linhas condutoras do meu trabalho como artista se mostram ali”, contou.

O nome do livro surgiu da necessidade de colocar cá fora “demónios privados”, um acto de exorcismo que aconteceu através das palavras.

Depois de ter dado provas como artista plástico, José Drummond não tem grandes expectativas face aquilo que o público vai pensar dele na versão poeta.

“Espero que o público olhe para o livro como ele é. É apenas um livro de poesia, mais nada do que isso.”

Pessanha, a influência

Associar o lançamento de “O Exorcismo” à efeméride dos 150 anos do nascimento de Camilo Pessanha é, para José Drummond, uma grande oportunidade. O poeta português faz parte dos seus autores favoritos.

“Para mim o Pessanha foi um génio, e está dentro do grupo de escritores que mais me influenciaram, ou que influenciam. Também lá estão o Mário de Sá Carneiro, Fernando Pessoa e alguns poetas americanos. Há um lado que me interessa muito no Pessanha que é a forma simbólica e a musicalidade que as palavras têm na sua obra. É uma oportunidade óptima poder participar nestes encontros”, rematou.

31 Ago 2017

Rolling Puppet: “O teatro serve para nos conhecermos”

Foi criado em 2014 por Kevin Chio e Ten Ten La depois de fazerem um curso em Praga. É a primeira companhia de teatro de marionetas do território em língua chinesa e já conta com espectáculos esgotados em Macau e no exterior. A Rolling Puppet vai apresentar “Notícias sobre Xiao An” nos próximos dias 16 e 17 de Setembro no Edifício do Antigo Tribunal

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] que é que vamos ter em “Notícias sobre Xiao An”?

K.C. –  É uma adaptação de um texto clássico de literatura chinesa. Usamos  a projecção com marionetas em miniatura em que temos alguns efeitos de imagem. O texto é de um autor conceituado, Yan Lianke, que ganhou  o prémio Franz Kafka em 2014. Conhecemos Yan Lianke em Praga na altura em que lá estávamos a estudar. Falámos acerca deste espectáculo. É um autor com um estilo de escrita que usa a metáfora, o que para nós é sempre material importante para um espectáculo. Já produzimos esta peça no ano passado e estes ano voltamos a ter o “Xiao An” am palco, com algumas alterações.

Que mudanças fizeram?

K.C. –  As modificações que fizemos foram essencialmente respeitantes à relação entre o público e o próprio espectáculo. Quisemos agora, além de manipular os bonecos, ter outro tipo de manipulação: a das pessoas que vão assistir ao condicionar-lhes o sentido dos movimentos.

Porquê esta história em particular? 

T.T.L. – É sobre uma a criança que devido a um acidente perdeu toda a gente, incluindo o seu avô, o único elemento que ainda era vivo. Ficou completamente sozinho, resolveu encontrar uma solução e gastou todo o seu dinheiro para comprar uma televisão. Era também a primeira vez que via televisão e descobriu que na sua aldeia todas as pessoas tinham um momento para aparecer naquela caixa mágica, fosse qual fosse o pretexto. Xiao An também queria aparecer. No fundo é uma metáfora a vários aspectos sociais. Através de uma criança percebe-se a importância dos media na formação das pessoas. Por outro lado é abordada, de alguma forma, a própria censura. Alerta também para o facto de que quando vemos as coisas de perto às vezes não nos apercebemos das falhas e que é necessário distanciarmo-nos para perceber as fragilidades que apresentam. Sinto que toda a história é uma espécie de humor negro mas que simboliza muitas situações reais que são brutais e tentamos mostrar isso através das marionetas de forma simbólica. Desta vez quisemos também retratar a situação actual de Macau. Nesta adaptação, o público começa a ver a história a partir do momento em que Xiao An também morre. Colocamos a audiência num cenário que, simbolicamente, é um museu cheio de produtos e a própria personagem é um deles. As pessoas entram numa espécie de museu e vão a caminho do palco onde é recriada toda a história.

É uma peça para todas as idades?

K.C. –  Sim e é o primeiro espectáculo que abrimos a todos a partir dos seis anos. Normalmente fazemos espectáculos para adultos. É interessante perceber como as diferentes faixas etárias percebem as situações de humor de forma diversa.

Como é que começaram a interessar-se pelo mundo das marionetas? 

T.T.L. – Eu era designer durante o dia e à noite actriz amadora e trabalhava com alguns grupos em Macau. Comecei a pensar que estaria na altura de escolher ou um ou outro trabalho. Conheci uma pessoa de Singapura que me motivou para apostar numa carreira de realização e encenação. Quando comecei à procura de uma formação descobri os cursos de marionetas em Praga. Em Macau não havia nada. Até ir para lá nunca tinha visto uma marioneta. Achei que a manipulação de objectos poderia ser interessante. Encontrei uma escola em Praga e fui.

Descobri um novo mundo, não só sobre o teatro mas acerca de toda a minha vida. No teatro foi surpreendente. Em Macau temos sempre muito material cénico nos espectáculos e ali descobri como fazer as coisas sem nada. Apendemos a usar menos materiais mas também a tornar as peças mais móveis para que se possam deslocar e ser apresentadas em vários sítios. Em Macau tínhamos um grupo de marionetas portuguesas mas não havia nenhum grupo de artistas chineses. Era preciso fazer alguma coisa nesta área e focámo-nos nisto. Por outro lado a República Checa é um país muito político e com intervenção, coisa a que não estávamos acostumados. Tudo é sobre política, e nas artes isso é muito evidente. Com as marionetas podemos também expressar coisas sem palavras e só com os bonecos. Mudou muito a forma como olho a arte em si. Quando regressei quis também deixar de usar peças de autores ocidentais e peguei na literatura chinesa. Transformamos os conteúdos que pertencem ao passado e adaptamos para situações actuais. Quando vejo, por exemplo Lu Xun, tentamos adaptar os textos a uma Macau actual. As coisas não mudaram muito desde Lu Xun até agora. As questões do controlo daquela altura são agora feitas, de outra forma. Tentamos encontrar sempre um conteúdo contemporâneo nos escritores clássicos. Já em 2014 fizemos uma peça baseada num texto de Lu Xun.  Tratava-se de uma foto acerca de um soldado japonês que executa um soldado chinês. Adaptámos a situação, numa altura em que se vivia o Occupy Central, em Hong Kong.  É uma reflexão acerca do espaço e de como as pessoas usam as suas motivações para fazer coisas. Vamos voltar a fazer esta peça para o ano em Hong Kong. Em 2015 fizemos um espectáculo em Praga chamado “Made in Macau” em que usámos objectos e vídeo para falar do território.

E o que mostraram? 

K.C – A ideia surgiu porque sempre que fazíamos novos amigos em Praga as pessoas perguntavam de onde vínhamos. Respondíamos de Macau, a notámos que não tinham ideia nenhuma do que era o território. Quando muito respondiam com a palavra “casino”. Resolvemos juntar objectos e alguma narrativa numa espécie de teatro documental. Por exemplo,  a Ten Ten nasceu praticamente dentro de uma fábrica na década de 1980. Aproveitámos para falar um pouco dessa altura e das vidas das pessoas, e das famílias. Foi um espectáculo também um pouco pessoal para falar da história e da realidade de Macau.

T.T.L. – A minha mãe trabalhava numa das fábricas de têxteis que existiam antes dos casinos. Enquanto crescia, as indústrias do território foram colapsando dando lugar aos casinos. Com a minha história pessoal, aproveitámos para falar dos problemas humanitários. Falámos da mudança de políticas e de como a abertura da China afectou o território, a chegada dos casinos e como isso afectou os mais novos e as suas possibilidades de emprego em vários ângulos, e mais tarde, como é que se vive hoje e como podemos tentar fazer das nossas vidas o que queremos. É uma peça simples, sem grande sofisticação. Por outro lado, o teatro também nos permite escrever a nossa história pessoal, a nossa narrativa, e aproxima as pessoas. Muitas vezes conhecemos outros locais pelas notícias e nada tem a ver com a realidade da vida das pessoas. O teatro serve para nos conhecermos.

Como sentem a adesão do público local ao vosso trabalho?

T.T.L. – Tem sido muito positivo. No início não podíamos abusar em alguns aspectos, para tentar com que este tipo de teatro entrasse suavemente na vida das pessoas. Fizemos sempre teatro para adultos para tentar mostrar que esta também é uma área que, apesar de usar bonecos, não é feita para miúdos. Também juntamos literatura chinesa e temos tido várias encomendas de espectáculos com esta vertentes. Os espetáculos têm esgotados em horas. As pessoas querem ver coisas novas e que reflictam a nossa sociedade e a actualidade. Tentamos usar o mínimo de linguagem oral possível para que as nossas peças não fiquem limitadas à linguagem verbal e que possam ser entendidas por toda a gente.

30 Ago 2017

Violeta Parra | Centenário do nascimento celebrado com concerto em Lisboa

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] centenário do nascimento da cantautora Violeta Parra é assinalado em Setembro, em Lisboa, com um concerto pela filha Isabel e pela neta Tita, que além dos seus repertórios, interpretam canções da criadora de “Gracias a la Vida”

Em Lisboa, “vamos cantar canções de Violeta, poemas de Violeta musicados por nós, e canções dos nossos repertórios”, adiantou à agência Lusa Isabel Parra.

O espetáculo celebrativo acontece no dia 12 de setembro às no pequeno auditório do Centro Cultural de Belém, em Lisboa, no âmbito da programação “Passado e Presente” de Lisboa, Capital Ibero-Americana de Cultura 2017 e das comemorações do centenário do nascimento de Violeta Parra, organizadas pela secretaria de Estado da Cultura do Chile.

Ao palco além de Isabel, que toca o quatro (um pequeno cordofone venezuelano), e de Tita, que toca quatro, guitarra e outros instrumentos, sobem também os multi-instrumentistas Greco Acuña, Juan António Sanchez.

Violeta Parra (1917-1967) “pode ser considerada a mãe da canção comprometida com a luta dos oprimidos e explorados, tendo sido autora de páginas inapagáveis como a canção ‘Volver a los 17’”, assinala a organização em comunicado enviado à Lusa.

“Foi graças a Violeta Parra que, nos anos 1950, a música tradicional chilena viveu um período áureo de resgate e valorização. Viajando pelo país, mapeou ritmos, danças e canções, reunindo um espólio de cerca de três mil canções tradicionais. Depois, na década de 1960, a sua defesa do património colocou-a na frente do movimento da ‘nueva canción’, que não foi mais que a música de intervenção do Chile de Salvador Allende”, refere a mesma fonte.

Na continuidade

Em declarações à Lusa, Isabel reivindicou o legado da mãe: “Nós vimos de uma raiz que nasceu da história social do Chile, o nosso compromisso vem da nossa mãe, crescemos com ela, trabalhámos com, formámo-nos com ela. Para nós é natural seguir esse caminho, que é o caminho de tanta gente. Na realidade é um processo que se desenvolve em cada um de nós, de uma forma espontânea, simples, e a partir das raízes de Violeta Parra, cada um de nós vai criando o seu próprio pensamento, a sua história, e a nossa relação com o nosso país [Chile] e com o continente sul-americano”.

“Temos, porém, uma linguagem e pensamento próprios”, sublinhou.

A organização realça “o lirismo dos versos de canções como ‘Gracias a la Vida’ que embalou o ânimo de gerações de revolucionários latino-americanos em momentos em que a vida era questionada nos seus limites mais básicos”.

Referindo-se ao alinhamento que vão apresentar no palco belenense, este “mescla o repertório das três mulheres”.

A ideia, explicou Isabel Parra, é mostrar não apenas as canções de Violeta Parra, como “¿Qué dirá el Santo Padre?”, mas também aquilo que as duas compõem e o que as inquieta.

“Queremos mostrar como Tita compõe as suas canções, quais são as suas temáticas, o que é que eu quero e tenho para dizer, e, claro, interpretamos as coisas de Violeta, que é algo natural para nós”, afirmou Isabel Parra, tendo adiantado que estão “a preparar algo especial para apresentar em Portugal”, nomeadamente o legado folclórico.

Para Isabel Parra, de 78 anos, é uma estreia em Portugal, o que considera “magnífico”, até pelo convívio que teve em França com comunidades portugueses. Tita Parra, de 61 anos, atuou em 1991.

Isabel Parra qualificou de “interminável” o trabalho que tem feito em torno da obra de Violeta Parra.

“O legado e o compromisso político de Violeta Parra continuam actuais, e nós somos mulheres políticas e temo-la como referente, não só para nós, para músicos de todo o mundo”, disse.

Como mãe “era super-original, não era uma mamã tradicional, levava os filhos para todo o lado, envolvia-os no seu trabalho, convidou-os para esse seu mundo musical”.

Depois de Lisboa, Isabel e Tita Parra actuam em Barcelona, antes de regressar ao Chile, onde está previsto, no dia 4 de Outubro, “um grande evento com a presença da Presidente da República, Michelle Bachelet”.

29 Ago 2017

Documentário de Miguel Gonçalves Mendes na recta final

[dropcap style≠’circle’]G[/dropcap]igantones, um coro, a banda filarmónica e algumas dezenas de figurantes participaram no sábado em Viana do Castelo na rodagem final do documentário “O Sentido da Vida”, que Miguel Gonçalves Mendes conclui ao fim de quatro anos.

Neste período, o cineasta viajou até Macau para filmar algumas cenas do documentário.

Na movimentada Praça da República, com as esplanadas cheias de turistas, Miguel Gonçalves Mendes gravou a cena que encerra o documentário, um projecto que o levou a percorrer vários países com uma demanda quase filosófica sobre a ligação das pessoas ao mundo e que só deverá chegar aos cinemas em Janeiro de 2019.

“O Sentido da Vida” conta a história real de Giovane Brisotto, um jovem brasileiro portador de paramiloidose familiar, uma doença degenerativa, de origem portuguesa, conhecida como “doença dos pezinhos”.

Giovane Brisotto, que fez um transplante de fígado em 2015, decide fazer uma viagem pelo mundo, cruzando-se com várias personalidades que o ajudarão a entender o significado da vida. E é essa viagem de Miguel Gonçalves Mendes filma.

Volta ao mundo

Juntos, fizeram mais de 50 mil quilómetros pelo mundo, passaram por países onde existem ainda casos da “doença dos pezinhos”, como o Japão e o Brasil, gravaram imagens no espaço e concluem agora o périplo em Portugal.

“Pessoalmente, é mais importante a sua procura [o sentido da vida] e o questionamento do que a resposta. Eu, como descrente e muito pouco optimista em relação a este mundo, acho que nós somos fruto do acaso. O sentido da vida é vivermos e sermos felizes com a máxima dignidade que nos é permitida”, disse o realizador à agência Lusa momentos antes da rodagem final.

Entre as personalidades que Giovane Brisotto e o realizador encontraram no caminho estão a ex-presidente do Brasil, Dilma Rousseff, o astronauta Andreas Mogensen, o escritor Valter Hugo Mãe, o juiz espanhol Baltasar Garzón e o músico islandês Hilmar Örn Hilmarsson, todos eles retratados agora em gigantones para a cena final do documentário e que tanta curiosidade causaram em Viana do Castelo.

“Ao acompanharmos a vida de sete figuras públicas de diferentes culturas, países profissões – justiça, política, ciência, musica, literatura – qualquer pessoa se pode espelhar nas dinâmicas distintas do mundo na forma como lidamos com os problemas”, opinou.

A última cena filmada em Viana do Castelo é, no entender de Miguel Gonçalves Mendes, “uma espécie de mensagem para que as pessoas tomem as rédeas das suas vidas e que sejam felizes”.

“Era o meu maior desejo: que as pessoas saíssem do filme com necessidade de mudar as suas vidas e mudar o mundo. E terem consciência real de que infelizmente o tempo está a contar. Ou somos felizes agora e lutamos por aquilo em que acreditamos ou não”, disse.

“O Sentido da Vida” conta com co-produção do Brasil e de Espanha, e apoio das produtoras dos realizadores Fernando Meirelles e Pedro Almodóvar, e seguirá nos próximos meses para montagem e pós-produção.

28 Ago 2017

Exposição de Vhils em Macau em risco

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]ma das inúmeras consequências da passagem do tufão Hato por Macau foi a destruição do mural do artista Vhils junto à Escola Portuguesa de Macau. Além disso, a exposição “Destroços”, que o artista, também conhecido como Alexandre Farto, inaugurou nas Oficinas Navais, na Barra, poderá ter ficado seriamente afectada.

Um membro da equipa garantiu ao HM que estão a ser apurados os estragos e que “Destroços” deverá mesmo fechar portas.

“Posso dizer que foi com grande tristeza que recebemos a notícia do que se passou em Macau. Foi um choque para todos. Estamos neste momento a apurar todos os estragos e possivelmente teremos que encerrar a exposição pois será difícil recuperar a maior parte dos trabalhos.”

Aquela que é a primeira exposição de Vhils em Macau foi inaugurada a 31 de Maio, sendo que estaria patente na zona da Barra até 5 de Novembro. No local, Alexandre Farto colocou, além dos trabalhos com pedra trabalhada, instalações de vídeo.

À Lusa, o artista disse que o objectivo de “Destroços” era “fazer uma reflexão sobre o meio urbano de Macau e as suas particularidades”.

O mural que Vhils fez sobre Camilo Pessanha, exposto nos jardins do consulado-geral de Portugal em Macau, ficou intacto.

28 Ago 2017

Tufão Hato | Dois residentes criam logótipos solidários

Manin Vong é designer e decidiu criar o logótipo “Rezar por Macau” que, horas depois da passagem do tufão Hato, começou a povoar várias fotos de perfis de locais no Facebook. Uma funcionária pública criou outro logótipo em inglês e português

[dropcap style≠’circle’]T[/dropcap]êm ambos das cores da bandeira da RAEM e contêm mensagens de esperança para horas que foram bem difíceis. Ainda no rescaldo da passagem dos tufões Hato e Pakhar por Macau, dois residentes criaram dois logótipos que se têm tornado virais na rede social Facebook.

São já várias as pessoas que optaram por criar uma foto de perfil com estes logótipos, que dizem “Rezar por Macau” em chinês ou ainda “Que Deus abençoe Macau”.

Manin Vong, designer de moda e fotógrafo freelancer, contou ao HM porque decidiu criar esta imagem.

“Momentos depois da passagem do tufão, todos nós nos sentimos muito tristes”, referiu. “Sentimos que o Governo não estava a dar o devido apoio à população. Na internet líamos comentários negativos vindos de Hong Kong. Então decidi fazer algo para unir as pessoas em Macau.”

O tufão Hato vai ficar para a história como o maior dos últimos 50 anos e esta é talvez a primeira vez que no território se cria este tipo de imagens para as redes sociais.

Manin Vong estudou em Taipei, mas hoje vive e trabalha em Macau. Afirma não ter tido propriamente uma inspiração especial para fazer este logótipo.

“Na verdade é um símbolo muito simples. Usei a imagem da bandeira e a frase ‘Rezar por Macau’. Decidi usar esta imagem em vez das palavras”, explicou. Na sua visão, o facto de tantas pessoas decidirem ter utilizado o logótipo na sua foto de perfil só mostra que, na hora da tragédia, todos se uniram para ajudar.

“Acredito que esta imagem simboliza a esperança que todos têm neste momento”, disse.

Críticas ao Executivo

O HM falou com Martin Vong quando o Exército de Libertação do Povo Chinês chegava a Macau para ajudar a limpar as ruas. Nessa altura, em muitas das zonas as pessoas limpavam os destroços sozinhas ou com a ajuda da protecção civil.

“Esperamos poder recuperar as nossas casas o mais cedo possível, para que Macau possa voltar ao normal”, defendeu o designer, que considera que a resposta dada pelo Executivo demorou a chegar.

“O Governo de Macau demorou muito tempo a reagir ao desastre. No dia seguinte à passagem do tufão, os membros do Governo não apareceram. Sabemos que o pessoal da linha da frente, como os polícias e bombeiros têm trabalhado muito, mas infelizmente não vimos de imediato nenhum apoio do Governo”, referiu.

Um dia depois desta entrevista, vários membros do Governo, tal como Lionel Leong, secretário para a Economia e Finanças, Alexis Tam, dos Assuntos Sociais e Cultura, ou Wong Sio Chak, secretário para a Segurança, andaram nas ruas a ajudar nas limpezas, a verificar a acção da protecção civil ou a visitar os doentes no hospital público e os mais necessitados em diversos bairros. Chui Sai On, Chefe do Executivo, visitou a protecção civil horas depois da passagem do tufão Hato, mas só ontem é que se deslocou a algumas zonas do território, tal como a zona da Ponte Horta e Costa.

O HM tentou ainda falar com a criadora do logótipo em português e inglês, mas até ao fecho desta edição não foi possível estabelecer contacto.

28 Ago 2017

Hong Kong | Crystal Liu mostra trabalhos inéditos

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] a primeira exposição individual da artista com ascendência de Hong Kong, Crystal Liu. A mostra “In Dreams” foi feita especialmente para o evento a ter lugar na Galerie du Monde na região vizinha. São 17 pinturas inéditas que retratam de forma abstracta o tema da paisagem e que vão estar em exibição de 14 de Setembro a 29 de Outubro.

De acordo com a apresentação do evento, “In Dreams” é mais uma exploração levada a cabo pela artista, agora radicada no Canadá, da paisagem enquanto “metáfora das forças intangíveis que dominam o ser humano”. Nas telas estão representados, de forma livre, os vários estados emocionais que acompanham Crystal Liu no processo criativo. “São narrativas de aprisionamento, de disputas, de desejo e optimismos frágeis que se reflectem em montanhas, estrelas, rios e rochas”, lê-se na apresentação da “In Dreams”. A intenção é retratar a complexidade muitas vezes paradoxal da existência, o caminho entre a esperança e a desilusão num misto de paisagem e vida privada da própria artista.

O guache e a aguarela são os materiais escolhidos para esta série e “In Dreams” foca-se no reflexo do céu na água, em ambientes nocturnos dentro de um contexto montanhoso. “O reflexo simboliza o espaço imaginário dos sonhos”, lê-se.

A Galerie du Monde vai também levar o trabalho de Crystal Liu à China Continental com a participação na Art Shenzhen e na ART021 em Xangai.

23 Ago 2017

Filme de Pedro Pinho pré-seleccionado pela Academia Europeia

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] filme português “A fábrica de nada”, de Pedro Pinho, está entre os pré-seleccionados para os prémios da Academia Europeia de Cinema, anunciou aquela entidade.

“A Fábrica de Nada” é o único filme português na lista de 51 pré-seleccionados, de 31 países, divulgada na página oficial da Academia Europeia de Cinema na Internet.

Nas próximas semanas, os cerca de três mil elementos da Academia Europeia de Cinema irão escolher os nomeados nas várias categorias, cujos vencedores serão decididos por um júri constituído por sete pessoas.

As nomeações serão anunciadas a 4 de Novembro, no Festival de Cinema Europeu de Sevilha, em Espanha, e os vencedores serão revelados na 30.ª cerimónia dos prémios da Academia Europeia de Cinema a 09 de Dezembro, em Berlim.

“A Fábrica de Nada”, que chega às salas portuguesas de cinema a 21 de Setembro, estreou em Maio no Festival de Cannes, onde venceu o Prémio Fipresci, da Federação Internacional de Críticos de Cinema, a que se seguiu o prémio CineVision, em Junho, em Munique, para melhor novo filme.

O filme de Pedro Pinho, com três horas de duração, é interpretado por actores e não actores e segue a vida de um grupo de operários que tentam segurar os postos de trabalho, através de uma solução de autogestão colectiva, e evitar, assim, o encerramento de uma fábrica.

Pedro Pinho assina a realização, mas o filme de ficção foi construído em conjunto com Luísa Homem, Leonor Noivo e Tiago Hespanha, a partir de uma ideia de Jorge Silva Melo e da peça de teatro “A Fábrica de Nada”, de Judith Herzberg.

Sucesso em Cannes

Em Cannes, o filme foi considerado também o melhor de todas as secções do festival, de acordo com a soma final dos críticos presentes no evento, sendo só superado pela série televisiva “Twin Peaks”, de David Lynch.

“A Fábrica de Nada” teve estreia mundial na Quinzena dos Realizadores, secção paralela do Festival de Cannes. O director artístico da Quinzena dos Realizadores, Edouard Waintrop, destacou “a película pelo “uso de uma variedade incrível de géneros cinematográficos: é praticamente um ‘thriller’ no início, tornando-se íntimo, político, social, fazendo um breve desvio para a comédia musical.”

Em Julho, o filme venceu o prémio CineVision do Festival de Cinema de Munique.

“O prémio CineVision para melhor novo filme foi para ‘A Fábrica de Nada’, de Pedro Pinho. O júri considerou o filme ‘um drama comovente, um musical peculiar, um documentário preciso, um ensaio desafiador – compre quatro por um com este excelente filme em tempos de turbo capitalismo”, referiu na altura a organização do festival.

23 Ago 2017

Exposição | Trabalhos locais inspirados no Circuito da Guia

São duas as exposições que marcam o primeiro aniversário da Associação para a Promoção e Desenvolvimento do Circuito da Guia de Macau. Os trabalhos são de artistas locais e pretendem sensibilizar a população para a importância do património

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] o primeiro aniversário da Associação para a Promoção e Desenvolvimento do Circuito da Guia de Macau (APDCGM) e a data vai ser comemorada com a realização de duas exposições acerca de “O Circuito da Guia como Património Mundial da UNESCO”. “Faz este ano um ano que fundámos a associação e vamos fazer uma pequena celebração com a realização de várias actividades”, disse o presidente da associação, José Estorninho, ao HM.

Para o efeito, a associação está a organizar duas exposições colectivas que contam com a participação de artistas locais. Para ter acesso às obras a organização fez o convite a várias entidades de modo a chegar ao maior número de possíveis interessados em expor no evento.

As áreas artísticas estão “praticamente todas abrangidas”, diz José Estorninho. “Temos pintura, escultura, fotografia e joalharia, por exemplo”, ilustra o responsável. O objectivo é também “não deixar ninguém de fora e dar oportunidade ao maior número de pessoas de expor o seu trabalho até porque nem todos têm a oportunidade de participar em exposições”, refere.

Lugar especial

Por outro lado, a associação pretende chamar a atenção para a questão do património, nomeadamente no Circuito da Guia. “A defesa do património local é fundamental e o Circuito da Guia do Grande Prémio é um local que precisa de atenção e preservação” completa José Estorninho. Com o envolvimento de artistas e da comunidade, a associação pretende ainda “apelar e sensibilizar as pessoas para esta causa”.

José Estorninho está satisfeito com os trabalhos que têm chegado à associação. “Já recebemos 21 obras, o que podemos considerar um número alargado de artistas a participarem”, afirma. Para o responsável, as obras que vão ser exibidas já representam “uma colecção bastante abrangente e simbólica” que reflecte diferentes manifestações artísticas locais.

A primeira exposição tem data de inauguração marcada para o próximo sábado, pelas 18h15, na Galeria do Edifício RITZ, no Largo do Senado. Dadas as limitações de espaço não estarão aqui expostos todos os trabalhos e a 16 do próximo mês é inaugurada a segunda exposição, agora sim, com todas as obras recebidas. O local é a Galeria de Acesso à Fortaleza do Monte.

A escolha de dois espaços é também estratégica. Para José Estorninho “estas duas mostras vão dar a possibilidade aos visitantes de conhecer dois espaços diferentes além da própria exposição”.

Depois das exposições está já agendada uma palestra no Ritz. O tema será “O Circuito da Guia e o seu Futuro”. “Vamos focar o tema tendo em conta o ponto de vista de profissionais em várias áreas úteis para a matéria”, explica o responsável. A palestra pode ainda dar origem a uma troca de opiniões, sendo que, afirma, “é a primeira palestra do género no território”.

23 Ago 2017

Efeméride | Nova edição de “Clepsidra” assinala nascimento de Pessanha

Uma nova edição da tradução de “Clepsidra” para chinês, da autoria de Yao Jingming, exposições de pintura e fotografia e conferências no edifício do antigo tribunal vão marcar as comemorações dos 150 anos do nascimento de Camilo Pessanha, já a partir do dia 31

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s 150 anos do nascimento do poeta português Camilo Pessanha começam a assinalar-se a 31 de Agosto, em Macau, com uma nova edição da obra “Clepsidra”, em forma de missal, anunciou o jornalista Carlos Morais José.

“Achamos que é a edição que o Camilo Pessanha gostaria de ver”, acrescentou ainda o mentor destas iniciativas.

Este lançamento, que vai decorrer no Consulado-Geral de Portugal em Macau, marca o arranque das comemorações dos 150 anos do nascimento do poeta, que viveu entre 1894 e 1926, na cidade onde morreu.

É “uma data que não podia passar sem uma manifestação cultural que trouxesse o poeta, um símbolo da cidade de Macau e uma das figuras mais importantes que aqui viveu, à memória das pessoas”, sublinhou o responsável pela iniciativa e director do jornal Hoje Macau.

Ao longo de uma semana, de 1 a 7 de Setembro, desta feita no edifício do antigo tribunal, Pessanha vai ser lembrado através de um conjunto de exposições de artes plásticas e de fotografia, conferências, inauguração de arte pública e lançamento de vários livros, disse.

No dia 1 de Setembro, “inicia-se oficialmente” a semana dedicada a Camilo Pessanha com a inauguração de duas exposições: uma de artes plásticas, com o título “Pessanha, a última fronteira”, com a participação de vários artistas de Macau com obras “inspiradas no poeta”. A outra exposição, “Cleptocronos”, é de fotografia de António Falcão, que já residiu em Macau e que vive actualmente em Portugal.

No mesmo dia vai ser lançada a versão em chinês da “Clepsidra”, numa tradução de Yao Feng e edição do Instituto Cultural de Macau.

“Vamos ter mais de 20 participantes, 11 de fora e os restantes locais, nesta semana de iniciativas sobre Pessanha”, adiantou Carlos Morais José, sobre o programa que vai decorrer ao longo da semana.

“A maior parte dos participantes são escritores conhecidos em Portugal e em Moçambique, como António Cabrita, que vêm cá falar de Pessanha e das suas obras”, afirmou.

A ideia de associar a comemoração dos 150 anos do nascimento de Camilo Pessanha à passagem de mais um aniversário do Hoje Macau surgiu por se tratar de um “bom pretexto” para reunir escritores portugueses que publicam no jornal.

“A personalidade de Camilo Pessanha ultrapassa o seu espectro literário, também há o lado de cidadão. Nesse sentido o panorama cultural de Macau tem mais do que a obrigação de celebrar a figura mais ilustre da comunidade portuguesa de sempre em Macau”, disse ainda Carlos Morais José.

Motivar os mais novos

Um dos objectivos desta iniciativa é “motivar as novas gerações a produzir”, considerou Carlos Morais José, explicando ter decidido avançar com a organização desta semana “por não ter visto nenhum evento preparado pelas autoridades competentes”.

A 7 de Setembro, dia em que Pessanha nasceu, vai realizar-se “uma romagem ao cemitério, seguido de um almoço com a família do poeta” na Associação dos Aposentados, Reformados e Pensionistas de Macau (APOMAC). A sessão de encerramento das celebrações vai estar a cargo de Luís Sá Cunha, com uma intervenção sobre “Por que é Camilo Pessanha o poeta de Macau”, disse.

Um jantar de gala no antigo hotel Bela Vista, actual residência do cônsul-geral de Portugal em Macau e Hong Kong, em que a “ementa será idêntica a que comia Pessanha no início do século XX” encerra a semana.

Além das exposições, conferências e recitais de poesia em mandarim, cantonense e português, Carlos Morais José adiantou que vão ser lançados cinco livros: “Abril” de Amélia Vieira, “O exorcismo” de José Drummond, “Returning home dirty with the light” de Rui Cascais, “Karadeniz – Entrevista com um assassino” de Paulo José Miranda e “Morri” de António Falcão.

Colaboração com a TDM

Durante a semana vão também ser inauguradas três esculturas públicas da autoria de Carlos Marreiros, no Leal Senado, no Jardim Marginal e no Albergue SCM (Santa Casa da Misericórdia), acrescentou o director do jornal Hoje Macau.

Carlos Morais José destacou também a colaboração com a Teledifusão de Macau (TDM), na transmissão de poemas em vídeo e áudio.

Em data a anunciar, vai ainda ser inaugurada uma exposição histórica “Macau no tempo de Camilo Pessanha” (1867-1926), sobre o “ambiente físico, intelectual e político” em que viveu o poeta, disse o responsável, sobre o programa que marca os 150 anos do nascimento do poeta português e que contou com o apoio da Casa de Portugal em Macau, da Confraria da Gastronomia Macaense e da Associação para a Instrução dos Macaenses (APIM), entre outros.

Considerado o expoente máximo do simbolismo em língua portuguesa, Camilo Pessanha nasceu em Coimbra a 1 de Setembro de 1867 e morreu em Macau a 1 de Março de 1926.

22 Ago 2017

Hong Wai, artista plástica: “Trago a mulher contemporânea em tinta-da-china”

Foi para Paris para fazer um mestrado em arte e não voltou. A artista local Hong Wai usa as técnicas mais tradicionais chinesas para representar a beleza da mulher emancipada e os seus trabalhos andam um pouco por todo o mundo

[dropcap]C[/dropcap]omo é que apareceu a criação artística?
Sempre gostei de desenhar. Do que me lembro, já desenhava muito quando andava no infantário. No ensino primário passava os meus tempos livres a pintar e os meus colegas começaram a pedir-me alguns trabalhos. Queriam que lhes pintasse os cães, que desenhasse bonecas. Mas as aulas de desenho não me atraiam, eram muito monótonas. Aos 14 anos experimentei ter uma aula de pintura tradicional chinesa e gostei muito. Neste tipo de pintura é preciso conjugar vários factores. Há a incerteza da tinta no papel e os próprios gestos que se fazem com o pincel demonstram a energia e as emoções do artista durante o processo de criação. É uma pintura muito especial. Também tive uma excelente orientação dada pelo professor Ieong Deang Sang. Foi quem me ensinou os princípios da pintura chinesa: a relação entre a tinta e a água, entre o espaço cheio e vazio, entre a parte da luz e da escuridão no desenho. São princípios também filosóficos e que têm que ver com o Livro das Mutações. Fui aprendendo e tive a minha primeira exposição individual em Macau, aos 17 anos. Fui a artista mais nova no território a ter uma exposição individual o que significou muito para mim e acabou por me levar a ganhar confiança no meu talento. Acabei por mudar de opção académica de biologia para arte. Saí do território depois do liceu quando fui para a Universidade Nacional de Taiwan e acabei por seguir os estudos com o mestrado em arte em Paris onde vivo até agora. No início da minha carreira tive algumas pequenas exposições. Em 2013 criei a série “Secret de Boudoir” que foi uma alavanca para o reconhecimento do meu trabalho e foram muitas as galerias interessadas. Foi com esta cooperação com as galerias que acabei por participar em várias feiras de arte internacionais como a “Arte Stage Singapore”, a “Art Taipei” e a “Art Central Hong Kong”. Os meus trabalhos têm também passado por Nova Iorque e por Miami. Depois de “Secret de Boudoir” criei “Feminine Landscape” e “Lumière Nocturne – La Foret”. Neste momento coopero também com várias galerias em Miami, Taiwan, Macao, Paris e posso dizer que sou artista a tempo inteiro.

Estudou arte tradicional e caligrafia. O seu trabalho é conhecido pela mistura que faz destas áreas com o que se pode chamar de arte contemporânea. O que é que vai buscar a cada género?
Na minha abordagem artística, o uso e a interpretação da tinta-da-china é uma jornada diária. Procuro criar novas fronteiras usando técnicas tradicionais antes reservadas aos letrados, à classe intelectual oficial (cuja teoria deriva da dinastia Song), com a minha forma pessoal, feminina e misteriosa. Através do uso de tinta e papel chineses, e de imagens que sugerem fortemente o mundo feminino, questiono o poder masculino. Tradicionalmente, a tinta-da-china era um campo exclusivamente de homens. Foi a classe letrada chinesa que decidiu os temas da pintura com montanhas, rios e paisagens, como representação filosófica da harmonia entre a natureza e o homem. Através da arte, pretendiam ilustrar o país imperial. Estas obras-primas da paisagem pertencem à Colecção Oficial de Arte da China Imperial das Cinco Dinastias e vai até os tempos modernos. Eu, em vez de representar a virtude através da arte ou da moda tradicional chinesa, prefiro expressar e ilustrar a feminilidade com imagens contemporâneas e não convencionais. As minhas paisagens com montanhas e rios transformam-se em lingerie entrelaçada. A ode ao céu e à terra torna-se uma ode ao “yin” sensual, oculto e incontornável.

É tratada pela crítica como a “Fille Mysterieuse” que dá sentido, de alguma forma, ao Taoismo.
Na minha última criação “Feminine Landscapes” o corpo feminino é tratado como se fosse uma paisagem com as suas diferentes camadas. A crítica de arte Myriam Dao classificou este trabalho como “de mulher misteriosa” em que o Taoismo ganha uma forma contemporânea. Penso que Myriam Dao integrou o Taoismo no meu trabalho por causa das imagens femininas desta filosofia. A figura da deusa é uma das personagens principais em muitas histórias taoistas. A diferença mais óbvia entre um deus e uma figura comum está na imortalidade. Os deuses conseguem sempre manter a vida e a juventude. A beleza e juventude são, nos contos taoistas, a grande tentação. Tal como eu, os contos taoistas gastam muita tinta na descrição da beleza imortal das deusas.

É conhecida pela sua abordagem feminista. Como é que a descreve?
A minha perspectiva feminista está próxima do “Lipstick” no século XX.
O chamado feminismo do batom é uma variedade de feminismo de terceira geração que procura abraçar conceitos tradicionais de feminilidade, incluindo o poder sexual das mulheres. Ao contrário das primeiras campanhas feministas que se concentraram nos direitos fundamentais das mulheres, e que começaram pela exigência do direito ao voto, o feminismo do batom procura perceber se as mulheres podem ser feministas sem ignorar ou negar a sua feminilidade, nomeadamente no que respeita à sexualidade. Durante a segunda geração de feminismo, as activistas concentraram-se unicamente na igualdade jurídica e social das mulheres e recusaram-se a “abraçar” a sua sexualidade. Algumas mulheres abominavam a ideia da sua feminilidade e muitas vezes assumiam características físicas masculinas. Queriam distanciar-se da imagem da mulher tida como normal e acabaram por criar uma série de estereótipos associados à imagem do que seria uma feminista. O feminismo do batom, por outro lado, dá importância os conceitos de feminilidade, sexualidade feminina emitida pelo corpo de uma mulher e à necessidade de assumir o sexo. O feminismo do batom também procura recuperar algumas palavras depreciativas e transformá-las em ferramentas de poder feminino. É o caso da palavra “vagabunda” no movimento “SlutWalk”. Esta é uma ideia que se desenvolveu como resposta às ideologias mais radicais do feminismo de segunda geração que deram relevo à “feminista feia” ou “feminista anti-sexo”. No fundo esta terceira geração de feminismo veio adoptar o que a segunda tinha condenado.

O que é que as mulheres escondem, que a Hong Wai revela?
Tradicionalmente, a pintura com tinta da China era apenas reservado aos homens, como já disse. O que tento fazer é “dobrar” esta ideologia masculina neste tipo de pintura. Quero trazer a imagem estereotipada para uma nova fronteira, a mais feminina e escondida. Por exemplo, na pintura tradicional chinesa, “Maids of honour”, está representada a virtude. No meu trabalho “Secret de Boudoir”, não desenho sequer as mulheres não pretendo descrever as virtudes de uma mulher (que de si transporta já para a prestação de um serviço, normalmente a homens), o que faço é um retorno à própria mulher, à sua vida privada, aos seus bens. Faço isso com todo o detalhe, tanto na lingerie, como nos saltos altos, nos perfumes, etc. Trago a mulher contemporânea em tinta-da-china, uma técnica confinada durante séculos aos homens.

Considera-se provocadora?
Sim, e por isso que que o meu trabalho é divertido e tem significado.

O que acha da arte feita em Macau?
Temos bons artistas em Macau que têm de trabalhar muito para viverem das suas criações. Muitos deles estudaram na China Continental e trazem consigo muita energia e surpresa.

Na sua opinião, o que poderia ser feito em Macau para promover mais os artistas locais?
Os artistas precisam de duas coisas: um lugar para trabalhar onde possam criar e que seja acessível e estável e de galerias e colecionadores que promovam e vendam o trabalho feito. Para promover mais os artistas locais, primeiro há que ajudar os criadores a terem um local de trabalho em que não se tenham de preocupar com o aumento das rendas. Em França, por exemplo, há uma lei que protege o inquilino e o aluguer só pode aumentar até cinco por cento por ano durante o contrato. Depois há que promover mais galerias profissionais que tenham as suas redes de coleccionadores que comprem arte local.

Considera que o mundo ocidental está cada vez mais interessado no que é feito no oriente? Porquê?
Sim, sinto o mundo ocidental cada vez mais interessado em arte oriental e o contrário também acontece. Esta era, a da globalização, gera a interdependência das actividades económicas e culturais do mundo. O extremo oriente já não é tão longe, o mundo ocidental quer entender cada vez mais o que lá se passa e a melhor maneira é através da sua arte e cultura.

21 Ago 2017

Spa com massagens orientais abre em Guimarães

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]ois portugueses radicados em Macau abriram recentemente um spa com massagens de pés do sudeste asiático na cidade de Guimarães, em Portugal. O espaço, com o nome “Ponha aqui o seu pezinho” apresenta “um conceito de fusão único e inovador de massagem nos pés” e foi pensado por Gonçalo Lobo Pinheiro e Vanessa Amaro.

Segundo um comunicado, os dois decidiram abrir este espaço por terem “apanhado o bichinho da massagem na Ásia” nas muitas viagens que realizaram. O nome do spa surgiu a partir de “uma canção popular portuguesa e daí veio toda a filosofia de fusão: as massagens são essencialmente asiáticas, mas em vez da tradicional música relaxante de spa, ouve-se bom Fado e bebe-se uma chávena de chá cem por cento português”.

O spa, que abriu portas a 13 de Junho, disponibiliza tratamentos com produtos portugueses. Os clientes podem escolher o óleo de massagem que preferirem, tendo à disposição várias opções de esfoliantes e banhos de imersão, “bem como uma máscara de argila que ajuda a desintoxicar o organismo”.

Vanessa Amaro e Gonçalo Lobo Pinheiro já pensam na abertura de um segundo espaço, desta vez em Lisboa.

20 Ago 2017

Casa de Portugal | Instituição promove um festival de Verão

Uma festa de Verão para todos é a sugestão da Casa de Portugal para este fim-de-semana. Música, dança, jogos e presentes são alguns dos condimentos para amanhã e domingo na zona das Casas Museu da Taipa. “Na Rota do Verão” é uma iniciativa para estar mais perto da comunidade

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s rubricas são muitas e para todos os gostos. A proposta é da Casa de Portugal em Macau (CPM) que leva à zona das Casas Museu da Taipa o festival “Na Rota do Verão”. O programa foi feito a pensar em todas as idades e a ideia é ter dois dias “com coisas giras”, disse ao HM a presidente da CPM, Amélia António.

Os mais pequenos têm música especialmente feita para eles. Tomás Ramos de Deus, Miguel Andrade e Paulo Pereira são os intérpretes de serviço que prometem tocar alguns dos êxitos mais conhecidos dos miúdos. O tema “Let it Go”  da banda sonora do filme “Frozen” e o “Cavalinho”, que integra o disco “Castelos no Ar”, são apenas duas das canções que constam do repertório.

De acordo com Diana Soeiro, membro da organização, trata-se de “músicas infantis de temas emblemáticos da Disney em português e em inglês, e de desenhos animados internacionalmente conhecidos, transversais a todas as idades e nacionalidades”. Para ajudar não irá faltar um animador vestido de panda, completa.

Os mais velhos não são esquecidos e, dentro dos espectáculos musicais, há três espaços disponíveis em diferentes tempos, até porque cada horário apela a uma sonoridade específica.

“Ritmos da Tarde” é a rubrica que traz “a sonoridade marcada por ritmos alegres que caracterizam o Verão”, aponta Diana Soeiro. A organização dá exemplos de temas que se conjugam com o ambiente pretendido e que passarão com certeza na rota. Clássicos de Bob Marley, como “No Woman No Cry”, ou de Stevie Wonder não vão ser esquecidos.

Jazz da casa

A CPM destaca ainda a estreia do projecto de jazz local que, no repertório, traz temas de música portuguesa com arranjos originais de Miguel Andrade. São os Jazzés que vão interpretar temas de Sara Tavares e John Legend, entre outros.

Mas o dia acaba de noite e, para esse momento, está guardada a “Serenata ao Luar”. O objectivo, diz a organização, é “recriar um ambiente intimista com recurso a cubos de luzes em que a sonoridade é marcada por sons tranquilos”. Vozes, guitarras, saxofone e clarinete vão ser os sons ouvidos e “a originalidade deste concerto prende-se com o facto de os músicos apresentarem temas com novos arranjos feitos pelo Miguel Andrade, guitarrista do projecto”.

Entretanto, e para diversificar o programa, a dança vai ter lugar com “Aerodance”. O evento consta de música dançável e a ajuda de um instrutor que convida o público a participar em diversas coreografias.

Jogos tradicionais vão também animar as tardes num regresso ao passado que passa pelo jogo do elástico, da macaca, saltar à corda e jogar ao pião.

Um apontamento de interactividade é feito com o Riquexó. Trata-se de uma marioneta interactiva construída e manipulada por Sérgio Rolo que vai acompanhando o público ao longo de toda a festa.

De acordo com Amélia António, “Na Rota do Verão” é uma actividade esporádica que se inclui entre as várias iniciativas que a instituição tem, em cooperação com os Serviços de Turismo.

O evento vai ser feito na zona das Casas Museu da Taipa que, aponta a responsável, “é um lugar onde as pessoas gostam de ir”.

A importância deste e de outros eventos do género é evidente para Amélia António. “É uma maneira de chegarmos a um público maior e de levarmos a nossa presença um bocadinho mais longe.” Caso contrário, considera, “a Casa de Portugal fica muito confinada àquilo que é feito apenas com os associados”.

“Queremos mostrar um trabalho útil para a comunidade e para Macau, para a diversidade que o território apresenta”, remata a responsável.

20 Ago 2017

Tese | Indústria da moda profissionalizou-se e está a crescer

Chama-se “A indústria da moda de Macau no século XXI: uma perspectiva global do intercâmbio cultural entre a Ásia e a Europa” e é a tese de doutoramento da estilista Ana Cardoso. Nela é traçado um retrato sociológico dos designers locais e analisam-se perspectivas de mercado, sem esquecer a influência de um mundo multicultural nas colecções

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ão, na maioria, mulheres. Fizeram a sua formação em Macau e, em segundo lugar, no Reino Unido. Trabalham sozinhos e poucos têm empregados, apostando tudo na sua própria marca. É este o retrato sociológico que a estilista Ana Cardoso traça dos designers locais e que consta na sua tese de doutoramento, entregue à Universidade de São José.

Intitulado “A indústria da moda de Macau no século XXI: uma perspectiva global do intercâmbio cultural entre a Ásia e a Europa”, o trabalho faz uma análise da indústria de moda local, da influência que as várias culturas trouxeram ao processo criativo e quais as estratégias de mercado a adoptar.

Os números apresentados por Ana Cardoso são fruto de um inquérito online realizado entre Maio e Junho de 2015, que tentou abranger os 35 estilistas ou marcas com registo no território. Com base nas 13 respostas válidas recebidas, a doutoranda pôde concluir que 77 por cento dos estilistas locais são mulheres. A maioria, 61 por cento, tem entre 26 e 30 anos, sendo que 46 por cento dos inquiridos fizeram a sua formação superior em Macau. Com 31 por cento, o Reino Unido surge como a segunda opção de formação nesta área.

Os dados mostram que, apesar de estarmos perante uma indústria em crescimento, as marcas não têm ainda uma solidez financeira que lhes permita empregar pessoas, uma vez que apenas 15 por cento dos inquiridos disseram ter empregados. A maioria, 39 por cento, trabalha sozinho nas suas produções ou com amigos e familiares.

As conclusões da tese de doutoramento mostram que os estilistas locais têm hoje mais capacidade para viver do seu trabalho. “Descobrimos que os designers locais estão mais envolvidos no seu trabalho criativo do que esperávamos. Isso mostra que estes têm laços com a indústria, seja através de cursos de moda ou do apoio familiar. A maior parte dos estilistas locais trabalha a tempo inteiro nas suas próprias marcas”, lê-se no documento.

Ana Cardoso conclui que “a indústria de moda local tem uma base forte e tem vindo a expandir-se”, sendo que os estilistas locais utilizam Macau “como um ponto de partida para promover o seu trabalho nos desfiles de moda e websites”.

Tendo a maioria dos inquiridos feito a formação no Centro de Produtividade e Transferência de Tecnologia de Macau (CPTTM), as vendas das suas colecções fazem-se “nas suas próprias lojas, em showrooms e também em lojas com diversas marcas”.

O mercado online é, segundo a doutoranda, muito importante para a obtenção de receitas. “Outra descoberta importante foi a importância das plataformas online. Os designers locais vendem os seus produtos no comércio electrónico, além de manterem as lojas tradicionais, ateliers, showrooms ou lojas pop-up. Esta estratégia é inteligente, simples, barata e rápida”, lê-se.

Enquanto a produção de grandes peças se faz na China, os acessórios e outro tipo de produtos de menor dimensão são feitos em Macau.

Uma indústria a crescer

Findo o boom das indústrias têxteis a partir da década de 1980, o mundo da moda em Macau tem vindo a mudar. A tese de doutoramento de Ana Cardoso fala numa expansão e na existência de um momento de viragem do sector. “A maior parte dos designers locais acredita que a indústria da moda está a crescer lentamente e a tornar-se maior”, observa.

“Entendemos que hoje em dia o processo criativo dos estilistas locais é reconhecido como profissão. Os designers trabalham a tempo inteiro nas suas próprias marcas para desenvolverem produção em larga escala na China ou uma pequena produção nos seus ateliers”, lê-se na tese.

O trabalho académico de Ana Cardoso chama também a atenção para uma maior formação dos estilistas. “Ao longo dos anos, os cursos superiores têm vindo a adaptar-se às necessidades do mercado. A mudança foca-se sobretudo na especialização do design de moda. Hoje em dia, os cursos estão mais focados nas tecnologias ligadas ao processo criativo do design de moda, o que dá um maior potencial aos alunos na entrada do mercado.”

Sendo Macau um mercado pequeno, Ana Cardoso conclui que é importante que os estilistas olhem lá para fora. “Este estudo mostra que os designers locais necessitam de uma vasta flexibilidade e diversidade para se adaptarem aos mercados asiático, de Macau e ocidental. O mercado de Macau é pequeno, e a Ásia pode ser um mercado potencial, liderando o processo criativo”, diz.

“Made in Macau” precisa-se

O inquérito revela ainda que 54 por cento dos inquiridos acreditam que a presença de produtos de luxo no mercado local afecta os produtos locais. Neste sentido, Ana Cardoso conclui que é necessário fazer uma maior ligação entre o que tem a etiqueta “Made in Macau” e o que vem de fora e que é vendido a preços elevados.

“O Governo precisa de ligar as marcas locais para criar produtos únicos em Macau, que possam garantir uma diferenciação face a outros produtos internacionais. Tal irá ajudar a expandir as lojas de diferentes marcas em Macau, numa mistura de marcas de luxo e produtos locais, para garantir que Macau possa ser um destino de compras no futuro.”

Ana Cardoso lembra ainda que o facto de Macau ser um território multicultural desde o século XVI trouxe influência à moda que se faz nos dias de hoje, sem esquecer as referências históricas do vestido de casamento tipicamente macaense.

Os estilistas locais “acreditam que Macau é um local de misturas culturais e que a indústria da moda é também um mercado com várias misturas, sendo que muitos dos cidadãos locais são influenciados pelos estilos do Japão, Coreia do Sul e Europa”.

“A realidade multicultural também influencia as criações dos estilistas e este panorama multicultural pode ser uma vantagem enquanto inspiração no processo criativo. Os estilistas mencionaram que ‘Macau é um lugar multicultural’ e que ‘Macau é território chinês e português, e as roupas reflectem estas duas culturas’.”

O trabalho académico faz ainda menção ao grande apoio que o Governo tem dado à indústria da moda, não só através da concessão de subsídios, como da criação de eventos que mostram as colecções que por cá são feitas.

17 Ago 2017

Ruy Castro escreve biografia sobre autor Nelson Rodrigues

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] vida “mítica” e “trágica” do autor brasileiro Nelson Rodrigues é revelada pela primeira vez numa biografia escrita por Ruy Castro, intitulada “O Anjo Pornográfico”, que chega às livrarias portuguesas no dia 25, pela editora Tinta-da-China. “Como se verá, ninguém o conheceu direito. Até agora”, escreve o biógrafo Ruy Castro, na introdução do livro em que conta a “espantosa vida de um homem que sempre foi arrastado para uma realidade mais dramática do que aquelas sobre as quais escrevia”.

Ruy Castro, considerado o maior biógrafo do Brasil, partiu de uma investigação exaustiva para construir esta biografia, sustentada em entrevistas feitas a mais de 120 pessoas que conheceram o escritor, consulta de arquivos e leitura dos seus livros.

É deste modo que Ruy Castro segue o rasto das obsessões que gravitam em torno de Nelson Rodrigues – sobretudo o sexo e a morte – e tenta responder às “muitas questões que pairam sobre a forte impressão que deixou: Génio ou louco? Tarado ou pudico? Reaccionário ou revolucionário? Raivoso ou apaixonado?”.

O resultado é a “assombrosa história” de um homem que, “além de escritor prolífico, com uma produção a todos os títulos espantosa”, foi também protagonista de uma “vida extraordinária”: com pobreza, fome, a cegueira da filha, sucesso e declínio, doenças fatais e sucessivos golpes à sua vasta família, desde homicídios (como a do irmão Roberto, a que assistiu) a soterramentos.

Ruy Castro explica que a narrativa lembra às vezes um romance, porque “não há outra maneira de contar a história de Nelson Rodrigues e da sua família”, mais trágica e rocambolesca do que qualquer das suas histórias, mas simultaneamente tão fascinante como as que criou. No entanto, não há neste livro qualquer estudo crítico, análise ou interpretações, apenas a explicação de onde, quando, como e por que Nelson Rodrigues escreveu todas as suas peças, romances, contos e crónicas.

Como exemplo, o autor refere que, num capítulo dedicado à peça de teatro “Vestido de Noiva”, não há teorizações de qualquer tipo sobre o significado dessa peça, tendo apenas pretendido saber, e revelar, o que aconteceu antes, durante e depois da montagem, na plateia, no palco, nos bastidores e como isso se reflectiu na vida de Nelson Rodrigues.

A biografia inclui uma compilação de fotografias obtidas em acervos de parentes ou amigos de Nelson Rodrigues e em arquivos de jornais.

A surpresa ambulante

Escritor polémico, Nelson Rodrigues carregou durante muitos anos a fama de “tarado” e nos seus anos finais a de “reaccionário”, tendo sido perseguido durante toda a vida, da direita à esquerda pela censura e pelos críticos, pelos católicos e pelas plateias, e “todos, em alguma época, viram nele o anjo do mal, um câncer a ser extirpado da sociedade brasileira”. Mas, ao mesmo tempo que queriam “caçá-lo a pauladas”, havia muitos para quem parecia impossível admirar Nelson Rodrigues o suficiente, acrescenta o seu biógrafo, lembrando que “para alguns, era um santo; para outros, um canalha; para todos, sempre, uma surpresa ambulante”.

Ruy Castro é também autor das aclamadas biografias de Carmen Miranda e Garrincha, e tem publicado em Portugal “Chega de Saudade: A História e as Histórias da Bossa Nova” e “Carnaval no Fogo”, ambos pela Tinta-da-China.

Editou e prefaciou várias colectâneas de textos de Nelson Rodrigues, cuja obra completa está a ser publicada em Portugal pela mesma editora, que conta já com os livros de crónicas, de memórias, de contos e o único romance escrito em nome próprio.

16 Ago 2017

Japão | Museu de Yayoi Kusama é inaugurado em Outubro

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] um dos nomes principais das artes japonesas, uma das artistas mais bem-sucedidas do mundo. A octogenária Yayoi Kusama vai ter um museu dedicado exclusivamente à sua obra. O espaço fica em Tóquio e já tem data para a inauguração

Será um local obrigatório numa visita à capital do Japão. A partir de 1 de Outubro, na zona de Shinjuku, vai ser possível ver várias obras de Yayoi Kusama num espaço só. Pintora, escultura e escritora, Kusama tem um trabalho que fica para a história da arte por ter uma obsessão por pontos. A arte da octogenária é conhecida como “Polka Dot”.

O museu dedicado à artista japonesa com maior projecção ao nível internacional tem cinco andares. Trata-se de um edifício branco, da autoria do arquitecto Kume Sekkei, que ficou concluído em 2014. Nada se sabia sobre o que poderia ser o prédio branco com grandes janelas de vidro e muito se especulou sobre a futura utilização da estrutura. Sabia-se que estava ligado a Yayoi Kusama e a imprensa japonesa admitia a possibilidade de ser um museu, que ainda não teria aberto portas por causa da saúde da artista.

Yayoi Kusama vive num hospital psiquiátrico no Japão, para onde foi de livre vontade em 1977, depois de ter passado quase 20 anos em Nova Iorque. A artista sofre de transtorno obsessivo-compulsivo, sendo que os pontos que utiliza no que faz são precisamente uma das suas maiores obsessões.

Sem grandes detalhes, o Museu Yayoi Kusama, que conta já com um website, anunciou que o espaço está pronto para ser inaugurado. No rés-do-chão, junto à entrada, haverá uma loja de recordações. Os segundo e terceiro andares são destinados aos trabalhos da artista plástica, com o quarto piso reservado a instalações. No quinto andar há uma sala de leitura onde será possível consultar documentos e outros materiais sobre a Kusama e a sua obra. Há ainda um espaço ao ar livre.

O museu terá duas exposições diferentes por ano. Na inauguração, vai ser exibida uma mostra que, em português, terá o título “A criação é uma busca solitária, o amor é o que nos aproxima da arte”. Estará patente até 25 de Fevereiro do próximo ano. O bilhete de acesso ao museu custará pouco mais de 70 patacas.

De Nagano para o mundo

Nascida na prefeitura de Nagano em 1929, filha de uma família abastada mas disfuncional, Yayoi Kusama começou a pintar pontos e redes por volta dos dez anos. Foi por essa altura que começou a ter alucinações que descreveu como “luzes e campos densos de pontos”. Esses momento envolvia flores que falavam com Kusama, padrões que ganhavam vida e se multiplicavam, um processo que viria a aplicar na carreira artística e ao qual chamou de “auto-obliteração”.

Aos 13 anos, em plena Segunda Guerra Mundial, foi enviada para uma fábrica de materiais militares, onde cosia para-quedas para o exército japonês. Recorda a adolescência como um período de escuridão, mas diz também que foi durante esta fase que descobriu a liberdade criativa.

Em 1948, foi estudar pintura para Quioto. Descontente com o que se fazia, na época, no panorama artístico do Japão, começou a interessar-se pelo movimento avant-garde europeu e americano. Durante a década de 1950, teve algumas exposições individuais em Matsumoto e Tóquio.

Em 1957, a artista nipónica mudou-se para os Estados Unidos. A arte que fazia passou a ser em grande escala: quadros e esculturas de dimensões consideráveis, com recurso a espelhos e a luzes. No final da década de 1960, participou em várias manifestações ligadas ao movimento contra a guerra.

Com o seu trabalho reconhecido também na Europa, Yayoi Kusama regressou ao Japão em 1973. Continuou a pintar, mas também se dedicou à escrita, tendo vários romances publicados. Os seus trabalhos já passaram pelos principais museus e galerias do mundo, do Georges Pompidou, em Paris, ao MoMA, de Nova Iorque, passando pela Tate Modern, em Londres.

Tem uma longa lista de prémios e foi objecto de teses, livros e documentários. Em 2014, foi considerada a artista mais popular do mundo. No ano em que a arte extravagante de Kusama atravessou a América do Sul, as suas obras foram vistas por mais de dois milhões de pessoas.

16 Ago 2017

Jenny Mok, directora da Associação de Arte e Cultura Comuna de Pedra: “Somos, felizmente, uma alternativa”

Já com 21 anos de actividade, a Comuna de Pedra continua a afirmar-se pela criação “fora da caixa”. A abordagem de temas sociais, e a opção por espaços alternativos e mais perto da comunidade são apenas alguns dos aspectos que distinguem a companhia. Para a directora, Jenny Mok, Macau precisa de uma verdadeira educação para arte e a Comuna está a dar uma ajuda

Antes de mais, porquê o nome Comuna de Pedra?

Não sou a fundadora mas, pelo que sei, na altura da formação da companhia, em 1996, tratava-se de um grupo de artistas que faziam coisas mais alternativas. No início, a Comuna de Pedra não era um grupo artístico, mas sim uma congregação que juntava artistas de várias áreas. A ideia era formar uma comunidade de artistas diferentes e daí o nome comuna. A pedra surge dada a sua importância. As pedras estão em todo lado: nos lugares, cidades e no planeta. As pedras são também únicas, são todas diferentes e são básicas. Muitas vezes nem se dá conta delas quando andamos nas ruas, mas são elas que estão no pavimento. São fundamentais. É sobre elas que andamos. Ao mesmo tempo são materiais duros e difíceis de moldar. Conseguem resistir a intempéries e assim é a arte também. Penso que foi com esta ideia que surgiu o nome do grupo.

A Comuna de Pedra começou por ser alternativa, mas ainda hoje o é. 

Sim. É ainda uma companhia alternativa, no bom sentido. Juntei-me ao grupo em 2000 ainda andava no liceu. Fui a uma audição para um espectáculo que ia ser encenado no exterior, ao lado do Centro Cultural de Macau. Até essa altura, ninguém tinha usado esse espaço para representar. Depois a Comuna de Pedra tornou-se, cada vez mais, uma companhia de artes performativas. No que respeita a este sector em Macau, o teatro físico, com dança e feito para determinados espaços, tem ocupado grande parte das actividades da Comuna. Se calhar, por isso, tem acabado por permanecer uma companhia chamada alternativa. As peças tidas como comerciais e que são do chamado “mainstream” focam-se muito em textos e em disciplinas mais tradicionais. Nesse sentido, somos, felizmente, uma alternativa. 

São conhecidos pelas vossas apresentações em espaços inesperados, nomeadamente nas ruas. Porquê esta escolha? 

Há vários factores que têm levado a esta opção. Em primeiro lugar, penso que, quando falamos de teatros, as opções disponíveis em Macau são muito limitadas. Antes do edifício do antigo tribunal ter sido transformado num, basicamente tínhamos os dois auditórios do Centro Cultural e tínhamos a black box do Teatro Experimental. O facto de não termos muitos espaços mais tradicionais disponíveis fez com que os meus antecessores na direcção da Comuna de Pedra pensassem em criar espaços para ter os espectáculos. Sempre houve esta intenção de considerar o espaço performativo e de reflectir sobre o que poderia ser. Será que uma peça tem de acontecer num teatro? Por outro lado, o aparecimento do Festival Fringe, no início dos anos 2000, também ajudou a ver a rua como um lugar que deveria ser aproveitado. Foi uma iniciativa que encorajou a ideia de ver a própria cidade como um palco. Com a ajuda do Governo, visto o Fringe ser um festival oficial, pudemos descobrir vários lugares diferentes para explorar. De acordo com a minha antecessora, às vezes um teatro tradicional é bom, mas há momentos em que esse tipo de espaço não nos traz grande inspiração, pelo menos não aquela que podemos encontrar em sítios mais reais: numa ponte, numa biblioteca antiga ou num parque.

Têm feito um trabalho comunitário de relevo no que respeita à educação artística. Como é que aconteceu este envolvimento com a comunidade?

Começámos na educação. Foi em 2005, com uma turma de crianças no Centro Cultural. O que constatámos foi basicamente o que sabíamos até por experiência própria. O sistema de educação de Macau não contempla a educação artística. Atenção que isto não quer dizer que não ensine música ou teatro. Mesmo que as crianças frequentem o conservatório, por exemplo, e o que é bom, parece que, no geral, não há muito espaço para que se envolvam realmente com a arte. Se calhar, também é por isso que continuamos a ser a alternativa. Qualquer coisa que não seja texto e que envolva a participação da audiência é mais desafiante. Mas, voltando às crianças e à arte, o ensino tradicional é bom, mas não chega. Quando tentamos avançar para alguma coisa mais abstracta parece que as pessoas se perdem. Queremos ajudar as crianças a terem mais opções dentro da área artística. A arte às vezes é ambígua. O que vemos é que, se apresentarmos uma coisa diferente que não possa ser classificada como boa ou má, é muito difícil de se mostrar interessante para os mais novos. Posso dar o meu exemplo pessoal. Estudei em Macau e durante todo o meu processo escolar nunca me senti próxima de qualquer arte. Tive artesanato, mas o que nos era dado era um conjunto de materiais que tínhamos de juntar para replicar um objecto. Era muito aborrecido. Eram kits. Não tem mal darem-nos este tipo de coisas mas não remetem, de forma alguma, para a criatividade. Mesmo na música ou no teatro, as aulas acabam por não nos envolver nos processos artísticos. Penso que é uma grande falha. Por isso, o que quisemos fazer desde o início foi tentar colmatar esta falha. Queremos que as crianças se expressem, que abram os olhos e vejam o mundo. Vamos para a comunidade, levamos histórias e aulas às escolas. Recentemente estamos também envolvidos com as pessoas com necessidades especiais para que tenham acesso a mais do que actividades ocupacionais.

Da sua experiência, acha que a comunidade está cada vez mais aberta a este tipo de ensino?

Sim, penso que lentamente se vai abrindo e mostrando mais receptiva. Mas é um processo muito lento. As escolas ainda se baseiam muito em actividades tradicionais. Actualmente apresentam mais disciplinas fora do currículo, mas não passam de mais aulas. As crianças estão sobrelotadas de aulas e de trabalhos para fazer. Por outro lado, estas actividades extracurriculares estão sempre ligadas à competição. Mesmo nas artes, a motivação é sempre dada com a promessa de se ganhar algum prémio e recompensa. Depois, com as competições e com os prémios, a escola também faz publicidade do seu sucesso. No fundo, não é nada para o real interesse das crianças. As crianças continuam sem tempo livre. Têm mais alternativas, mas com tantas aulas de tanta coisa não têm tempo para fazerem somente o que lhes possa apetecer.

Que projectos tem agora em andamento?

Temos sempre duas vertentes que desenvolvemos de forma paralela. Temos a vertente criativa que se revela nos espectáculos que apresentamos e a educativa em que estamos mais ligados à comunidade. Neste momento estamos a trabalhar num projecto a longo prazo com diferentes faixas etárias de pessoas portadoras de deficiência. A intenção é criar um espectáculo, mas vamos ver. A apresentação não é a parte mais importante neste género de trabalho. Não queremos que esta intervenção acarrete muita pressão. É mais importante a aprendizagem e a experiência. Não queremos forçar ninguém a nada. É um projecto para ser feito em, pelo menos, um ano e meio. Teremos aulas e ensaios e, se tudo correr bem, em Setembro de 2018 mostraremos um espectáculo. No trabalho com pessoas com necessidades especiais, o mais importante é o processo criativo. Estamos a falar de uma comunidade que tem muito menos opções do que a maioria da população. Por outro lado, não é uma população visível. A nossa cidade também não é muito amiga destas pessoas no que respeita a infra-estruturas. O que acontece é que acabam por ficar restritas a centros de actividades ocupacionais. As que têm mais dificuldades nem podem trabalhar e passam a vida de centro em centro. Mais uma vez, a arte tem estado excluída. O que é importante aqui é desenvolver a expressão. Quando começamos a trabalhar com esta população, o que salta primeiro à vista é uma auto-estima muito baixa que tem muito que ver com as dificuldades de expressão. O mundo em que vivemos não lhes dá muito direito à expressão, o que é errado. A educação artística, por si, ajuda na comunicação. Não tem nada que ver com as necessidades especiais. Se virmos bem, todos temos necessidades especiais porque somos todos diferentes. Com o nosso trabalho, vemos que a auto-estima vai melhorando porque são trabalhadas várias formas de comunicação e de expressão.

Foto: Sofia Margarida Mota

Vem aí a nova temporada de espectáculos. Alguma coisa que possa adiantar?
No final do mês teremos a nova temporada de teatro. Este ano temos uma nova iniciativa a que chamámos de “Decorestruction”. Trata-se de uma série de espectáculos que será uma iniciativa anual. A ideia é ter um conjunto de criações que se focam na desconstrução do próprio conceito de espectáculo. É um espaço para se pensar o que é a performance e a representação. O que é o corpo. É uma temporada que vai consistir da apresentação de três ou quatro criações novas. A abertura desta iniciativa vai ser a 25 e 26 de Agosto, com “A Possible Path to Insomnia”. Vem de Hong Kong e mistura música ao vivo, dança, teatro físico, texto e intervenção comunitária. A peça foi criada depois da “revolução dos guarda-chuvas” em Hong Kong. Todo aquele movimento trouxe algumas questões relacionadas com o espaço. Esta abordagem trata da ideia de ocupar um espaço público para fazer alguma coisa. Trata da apropriação. Ao mesmo tempo, estamos também a falar de partilha de lugar. Toda a gente pode ir a um espaço público e, se forem cada vez mais pessoas, o espaço acabava por ser apropriado, mas não deixa de ser partilhado. É uma reflexão acerca do que é o espaço privado e de como uma peça pode dizer alguma coisa acerca de situações sociopolíticas. Nesta versão que vai acontecer em Macau, o espectáculo vai andar nas ruas juntamente com as pessoas. Sai do Armazém do Boi, passa para o Teatro Experimental e vai terminar na Live Music Association (LMA). Ao longo do percurso vai existir interacção com as pessoas da rua. Mais do que um espectáculo, é uma experiência. Depois, e ainda este ano, na mesma série, teremos peças em Outubro e Novembro que são criações novas.

15 Ago 2017

Concerto | Diiv ao vivo em Hong Kong daqui a um mês

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]om dois discos aclamados pela crítica na bagagem aclamados, os norte-americanos Diiv tocam na região vizinha no dia 14 de Setembro. O concerto, que terá na primeira parte a banda local Phoon, realiza-se em Kowloon na sala Kitec

Os Diiv foram apelidados como a grande esperança do rock sujo que tem as suas raízes entre bandas históricas como os Nirvana ou os Sonic Youth. Mas o conjunto de Brooklyn vai mais além do que as suas visíveis influências, que não se esgotam nestas duas bandas, tendo conseguido demarcar a sua sonoridade e marca identitária. A banda é liderada, e confunde-se com o seu guitarrista/vocalista, Zachary Cole Smith, o principal compositor e mentor do grupo.

No ano passado editaram o segundo e muito aguardado disco, “Is the Is Are”, depois de um hiato de quatro anos após o lançamento do registo de estreia “Oshin”. Ambos os álbuns mereceram aplausos da crítica, que quase em uníssono pegaram não só na música da banda, mas também na imagem do seu vocalista. Cole Smith é considerado por uma parte da crítica que gosta de estabelecer paralelismos como o sucessor natural de Kurt Cobain. As comparações agravaram-se depois do músico ter sido apanhado pela polícia na posse de uma quantidade considerável de heroína. Cole Smith estava acompanhado pela namorada, a modelo/actriz/cantora Sky Ferreira, levando a óbvias equiparações com trágicos casais do rock como Kurt Cobain e Courtney Love, ou Sid Vicious e Nancy Spungen. Pareciam destinados a seguir a rota decadente dos seus predecessores. Além disso, o caso trouxe ainda sérias dúvidas se o novo disco iria mesmo sair.

Vento a abrir

Assim que chegaram aos escaparates com três singles publicados online, “Sometime”, “Human” e “Geist”, mereceram a atenção das melhores publicações dedicadas à música alternativa, como a Pitchfork ou a Stereogum. Aí deu-se um contratempo identitário com a banda de Zachary Cole Smith que ainda teve de mudar de nome, uma vez que Dive já estava tomado. Assim nasciam os Diiv, que começaram a agarrar algum público com o lançamento do single “Doused”, popularizado em Portugal por musicar uma campanha publicitária de uma conhecida empresa de telecomunicações.

“Doused” é uma música que espelha bem a sonoridade da banda norte-americana, com um baixo pulsante, muito ritmado e guitarras carregadas de delay sempre prestes a irromper em solos. Os Diiv são difíceis de catalogar, com diversas influentes dentro do espectro do rock alternativo, vão buscar inspiração ao psicadelismo e outras às paisagens sonoras mais típicas do shoegaze. O seu mais recente disco mostra alguma maturidade, remetendo o ouvinte para um imersão completa num somatório que traz o melhor das últimas quatro décadas de música movida a guitarras. Foi assim que chegamos a “Is the Is Are”, que mal saiu mereceu um lugar de destaque entre os melhores discos do ano passado.

Desde então, a banda tem andado em tour a promover o seu segundo registo, até que chega ao território vizinho no dia 14 de Setembro para um concerto na Music Zone @ E-Max do centro Kitec, que abre as portas ao público a partir das 20h.

A primeira parte estará a cargo da banda local Phoon. Com assumida inspiração indie rock, o grupo de Hong Kong inspirou-se nos ventos que assolam a região e partiu da tradução inglesa da palavra “tufão”.

Este concerto serve bem de aperitivo para o festival Clockenflap, para o qual os espectadores ainda terão de esperar até Novembro.

14 Ago 2017

Disco | Álbum de Joel Xavier com Ron Carter editado mundialmente

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] trabalho discográfico do guitarrista português Joel Xavier, com o contrabaixista norte-americano Ron Carter, foi editado mundialmente pela discográfica germânica Galileo, divulgou a promotora do músico.

O álbum intitula-se “Joel Xavier & Ron Carter in New York”, foi gravado em Setembro de 2004 e editado em Novembro desse mesmo ano, numa edição de autor, sendo constituído por nove temas, entre os quais “Maria”, “Destiny” e “Memories”.

Joel Xavier, de 43 anos, tem colaborado regularmente com outros músicos do jazz, designadamente Chucho Valdés e Richard Galliano.

Natural da Ericeira, Xavier toca há 24 anos, tendo actuado em vários palcos internacionais e vencido, aos 19 anos, o concurso norte-americano “Namm-Show”, ao qual concorreram 70 músicos.

O músico foi considerado pelos críticos norte-americanos como um dos cinco melhores guitarristas do ano, em 1993.

Em 1992 estreou-se discograficamente com o álbum “18”. Ao longo da carreira editou cerca de dez álbuns, entre os quais um, em 1999, com Paquito D’Rivera, Michel Camilo, Larry Coryell e Arturo Sandoval.

“Silence”, “Happiness”, “Dream”, “Simple Things” e “Life” são outros temas que compõem o álbum “Joel Xavier & Ron Carter in New York”, agora editado internacionalmente pela Galileo.

Ron Carter iniciou-se musicalmente aos dez anos, tocando violoncelo, passando depois para o contrabaixo, no qual se tornou como mestre em performance, em 1961, na Manhattan School of Music, em Nova Iorque.

O músico de 80 anos tem uma vasta carreira no jazz, e uma extensa colaboração em gravações de música clássica.

Na área do jazz conta centenas de discos gravados, com nomes como Milt Hinton, George Duvier, Jacki Byard, Chico Hamilton, Randy Weston, Thelonious Monk, Wes Montgomery, Bobby Timmons, Herbie Hancock, Wayne Shorter, Tony Williams e Miles Davis, com quem formou um quinteto. O contrabaixista, natural do Michigan, colaborou também em álbuns das cantoras Roberta Flack e Rosa Passos, entre outros.

Música | Estrela australiana vai estar em Macau

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] lenda do rock australiano Jimmy Barnes vai estar pela primeira vez em Macau. O concerto tem lugar no Teatro Parisien, numa apresentação única a 9 de Dezembro.

Tido como “o coração e a alma do rock and roll australiano”, Barnes conta já com 40 anos de carreira. Um ídolo no seu país de origem, o cantor bate recordes de vendas na Austrália e é, até hoje, o artista que se dedica ao rock com mais discos vendidos.

Depois do sucesso inicial em que se fazia acompanhar pela também lendária banda “Cold Chisel”, Barnes optou por fazer carreira a solo a partir de 1984. O álbum de estreia, “Bodyswerve”, atingiu imediatamente os tops de vendas. Mas foi com “For the Working Class Man” que Barnes conseguiu o reconhecimento enquanto músico, “com um som único que lhe valeu um reconhecimento até aos dias de hoje”, lê-se no comunicado que apresenta o concerto. A canção homónima é ainda considerada o tema de referência do artista entre os admiradores australianos.

De acordo com o mesmo comunicado, “os concertos de Barnes são, pela sua intensidade, uma referência”.

Os bilhetes para a estreia no território já se encontram à venda e os valores vão das 380 às 780 patacas.

10 Ago 2017

CCM | Conto de Andersen em cena no fim-de-semana

[dropcap style≠’circle’]”A[/dropcap] Menina dos Fósforos” de Hans Christian Andersen vai ocupar o palco do Centro Cultural de Macau no próximo fim-de-semana. Vem pela mão da Open Heart Prodution, do Reino Unido, e promete transformar o triste conto infantil num momento de alegria

É capaz de ser um dos contos mais conhecidos de Hans Christian Andersen. “A Menina dos Fósforos” conta a história de uma criança que vive da venda de fósforos na rua. Numa noite, a de Natal, acaba por morrer de frio. O espectáculo trazido pela londrina Open Heart Prodution não fica por aqui e fez algumas transformações ao original.

A peça que integra dança, teatro e canções conta com a coreografia de Arthur Pita que, com o pedido, há cinco anos, para fazer uma peça de Natal, se juntou ao produtor Mathew Jones.

“Queríamos fazer algo que saísse do vulgar ‘felizes para sempre’”, conta o produtor na apresentação do espectáculo à imprensa. “Corremos uma série de histórias em busca de um tema que pudesse ser trabalhado e que saísse das peças comuns”, continua.

Por outro lado, a ideia seria não ter uma peça paternalista e completamente irreal, sendo que a procura incidia em “alguma coisa com um certo lado negro e que, ao mesmo tempo, pudesse servir a toda a família”.

“A Menina dos Fósforos” pareceu a escolha óbvia. “É uma história desafiante e achámos que seria também uma hipótese de desenvolver uma outra perspectiva para um espectáculo de Natal”, explica Mathew Jones.

Mudança de rumo

Para não ser “mais do mesmo”, de uma história que todos conhecem, a peça que vai estar no Centro Cultural de Macau foi alvo de algumas mudanças.

Passa-se numa cidade imaginária de Itália, e foram criados mais personagens que vivem naquele lugar e que interagem com a menina que vende fósforos.

Para ser fiel ao sítio, a produção resolveu também mudar o idioma. Apesar de ter sido concebido para Inglaterra, a companhia optou pela língua italiana como veículo dos diálogos que se vão desenrolando.

Mais do que uma opção estética e criativa, a ideia tem um propósito: “Desviar a atenção do público das palavras para que possam perceber a coreografia como um todo”, explica a directora artística e também bailarina Valentina Golfieri.

O próprio conto também sofreu alterações. “Esta peça não termina quando seria de esperar tendo em conta a versão de Andersen. Aqui, o fim da história passa-se mais ou menos a meio do espectáculo”, diz a directora. A partir daí, há todo um outro conto em que a personagem principal vai para “um lugar muito especial”, refere.

O conto mantém apontamentos “mais negros, mas o que se consegue com a transformação feita no final é transmitir uma sensação de esperança”, aponta Valentina Golfieri.

A matriz original de “A Menina dos Fósforos” mantém-se na produção que chega de Londres. “É um espectáculo social e político. Trata-se de uma criança que sofre devido ao contexto económico daquela época e é também uma história acerca de justiça social”, explica Mathew Jones.

No fundo, “não se trata de uma peça paternalista, mas de uma história que, infelizmente, pode acontecer no mundo real”, continua o produtor, sendo que, aqui, há a garantia de que, “após a apresentação, as pessoas não vão para casa com um sentimento de tristeza”.

Paralelamente, as situações que acontecem no palco são facilmente transponíveis para os dias de hoje. “O bullying, por exemplo, pode ser representado pela forma como as várias personagens tratam a criança.” O reconhecimento das situações tem também um papel pedagógico.

Para todos os públicos

“A Menina dos Fósforos” está pela primeira vez em Macau, mas já passou pelo Continente e por Taiwan. A surpresa da audiência parece ser um factor comum a determinada altura da apresentação. De acordo com Mathew Jones, “neste lado do mundo, as crianças são familiares com a história original e, quando pensam que estão a ver uma coisa que conhecem, são surpreendidas a partir do momento em que percebem a transformação que aconteceu ao final”.

Depois, completa a directora artística, “é uma história que convida a uma viagem e este é um aspecto que agrada a todos os públicos”.

O sucesso que tem tido em cinco anos de cena não surpreende a companhia. “Toda a apresentação acarreta algum mistério e deixa espaço ao público para a recriar, sendo que o facto de ser falada numa língua que muitas pessoas não entendem permite uma interpretação livre, em que não se consegue ter o detalhe da palavra”, remata a bailarina.

10 Ago 2017

Entrevista | Eugénio Novikoff Sales, artista plástico

Um desajustado do mundo. Nascido e vivido entre culturas, foi definido como o pai de um novo estilo de pintura, o da lusofonia. Eugénio Novikoff Sales mostra em cada quadro “a mancha negra africana”, com paciência da China e sem o apoio da terra que o viu nascer. Os seus quadros estão expostos no Albergue SCM até 3 de Setembro

[dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]ilho de pai português e mãe russa, nasceu em Macau e cresceu em Moçambique. Como é que se juntam estes mundos tão diferentes?

Só recentemente é que consegui, digamos, integrar-me comigo. Senti-me sempre diferente das outras pessoas. Por exemplo, quando estive no liceu em Macau, não me dava com os colegas chineses que estavam a aprender português. Não me identificava. Por outro lado, também não me identificava com os portugueses e não entendia as conversas. Não por causa da língua, mas pelo que diziam: falavam muito de compras e coisas novas, o que não me interessava. Tinha chegado de Portugal, onde também não me dei bem. Antes, tinha estado em África. Foi onde me senti melhor. Apesar de não me relacionar com a população portuguesa, acabei por ter outro tipo de amigos. Eram das tribos que havia em Nampula. Lembro-me que havia lá um jardim em que se fazia uma feira todos os domingos. Vinham pessoas das comunidades pequenas ali à volta e traziam os filhos. Traziam estátuas de pau-preto também, e vinham vestidas com as capulanas e aquelas cores todas. Tudo isso me marcou e era com estas crianças que brincava. Agora já percebi que o tempo dilui as coisas e já lido melhor com o desajustamento e mesmo comigo.

É considerado o pai de um novo estilo artístico, o da lusofonia. Como é que aconteceu?

Sempre gostei de pintar e de fazer desenhos. Quando andava no liceu de Macau já gostava de rabiscar nas paredes. Tive um professor que apareceu na sala uma vez para me fazer uma pergunta. Tinha visto uns desenhos e perguntou-me se eram meus. Disse que sim, e perguntou-me se tinha mais quadros. Respondi também que sim. Foi vê-los. Passados uns dias disseram-me que o antigo Museu Luís de Camões iria ter uma exposição de pintura e fui convidado a participar. Foi quando tive a minha primeira exposição oficial. Mas desde essa altura que quem via os meus quadros não os conseguia integrar em nenhum estilo específico. Aquela exposição acabou por ir para Hong Kong. As pessoas identificavam com facilidade os motivos africanos nas minhas pinturas, mas não sabiam dar-lhes um nome. Não era cubismo nem expressionismo, nem nada. A definição aconteceu quando tive a minha exposição na residência do cônsul e me foi dado o “título” de pai da arte da lusofonia na China. Mas se me perguntar o que é, também não sei dizer ao certo. Há, por exemplo, dois países com os quais não tenho ligação. São o Brasil e Timor Leste, e que também fazem parte do mundo lusófono.

Em que é que África se expressa na sua pintura? 

Em Moçambique marcaram-me muito as cores e os movimentos. Mas foi essencialmente a cor preta. É uma cor difícil de se manejar. Mas penso que é aqui que entra o que está dentro de nós e, neste caso, tem sempre uma ligação com a selva.

E como é que entra Macau nesta lusofonia? Através do papel de arroz que agora é um dos meios que utiliza?

Quando há exposições em Macau, há jantares no final em que os anfitriões colocam à disposição dos pintores folhas de papel de arroz e tinta-da-china. A primeira vez que peguei neste papel não achei fácil de manejar com aquela tinta porque espalha-se com muita facilidade. Mas lá ia tentando, resolvi fazer uns estudos neste material com acrílico e achei que funcionava bem. Desta forma podia também usar cores, as minhas cores mais puras. Nos meus desenhos não há remendos. Acho ainda que a China também se expressa no meu trabalho através da paciência que tenho de ter para fazer os meus traços. É como se fossem fios de uma renda, calculada e espontânea. Esta é a minha parte chinesa.

Sei que gosta da arte feita no Oriente, mas que também considera que lhe falta qualquer coisa.

Os artistas chineses têm uma técnica muito boa, mas falta-lhes, por vezes, cor. Não estudei arte, não estudei a técnica, mas também pinto e sou reconhecido. Sou reconhecido pela China, por exemplo. O que lhes falta é aquilo a que chamo de “mancha negra de África”. É um termo meu para descrever aquilo que não sei de outra forma. Penso que pintores internacionais como o Picasso ou o Matisse tinham esta “mancha negra”, estava dentro deles. É uma coisa que não se aprende e não é relacionada com a cor. A “mancha negra” é a alma de uma pintura.

Li numa entrevista que deu que, na sua opinião, devia existir um sistema em Macau para proteger os artistas. O que queria dizer?

Penso que, em Macau, a escolha dos artistas que devem ser projectados e reconhecidos está a ser manipulada dentro dos círculos em que se inserem. Deveria existir um departamento, sem interesses, para organizar uma base de dados de todos os artistas locais e do seu género de pintura. Aqui não há uma forma de identificar os artistas. Aqui nenhum artista é conhecido pelo seu estilo, enquanto no estrangeiro é o estilo que adopta ou que cria que marca um artista. Macau deveria ser a plataforma da lusofonia, é uma coisa nova e poderia influenciar a China, que está cada vez mais aberta ao Ocidente e às suas influências. Por outro lado, as associações têm uma espécie de monopólio dos artistas. Para se conseguir fazer alguma coisa neste sector temos de fazer parte de uma associação. São as associações que promovem os seus artistas e acaba por se tratar sempre de um ciclo fechado. Deveria ser criado um departamento para dirigir uma secção de apoio aos pintores locais, e Carlos Marreiros é um homem carismático, capaz de dirigir uma tarefa deste tipo.

O que acha da criação artística do território?

Em 1980, António Conceição Júnior organizou uma exposição dos artistas de Macau. Mais tarde apareceu o Círculo dos Amigos da Cultura com o Carlos Marreiros. Mas, depois disso, vários artistas saíram desse círculo e começaram a criar as suas próprias associações. Foi o descontrolo. As associações queriam artistas que pertenciam a outras. Estavam também presentes criadores que tinham vindo do Continente e que queriam fazer a sua própria associação. Em Macau, temos muitos artistas, mas derivam todos do mesmo grupo. O que se passa agora é que qualquer associação, para ter o seu apoio, ensina artes aos seus alunos. Quando fazem uma exposição até o nome diz: “Artista x vai fazer a exposição com os seus alunos”. Estas iniciativas têm o apoio do Governo mas são, na sua maioria, entidades que não projectam o nome de Macau para o exterior, porque não aparecem com trabalhos novos. Os professores também não querem que os alunos sejam melhores do que eles ou que tenham mais sucesso. O Governo deveria dar mais importância aos artistas que projectam a imagem do território no exterior, aos artistas internacionais. No meu caso, quando comecei a pintar, não era para ser famoso. Mas Macau está a fazer artistas para a posteridade e isto é feito dentro de um círculo fechado. Entretanto, há artistas que estão a ficar completamente esquecidos e que têm valor.

Tem sido fácil para si ser artista aqui?

Neste momento estou numa fase de alguma crise. Não vendo os meus quadros abaixo de determinado preço. Não posso fazer isso e prefiro não vender do que desvalorizar o meu trabalho. Como sou também o pioneiro do estilo da lusofonia, acho que os meus quadros têm de ter valores altos. Posso oferecer, mas não vendo as minhas obras se não for pelo valor que acho justo.

Mas tem sobrevivido com a pintura? Vive de quê?

Vivo de patrocinadores. Quando tenho de me deslocar para exposições, são os patrocinadores que tenho que me facultam o dinheiro. Dão-me um valor e eu faço a gestão desse dinheiro. Aqui também não há um mercado de arte. Não há leilões. O meu estilo de pintura é um marco e como tal tem um preço. Por outro lado, nunca tive apoios do Governo. Nunca fui apoiado pela Fundação Macau e já tenho três exposições internacionais. Mas penso que virá o dia em que os meus quadros vão ser reconhecidos aqui.

Está zangado com Macau?

Não é com o Governo em si que estou zangado. Mas há figuras negras em Macau que têm sempre uma palavra a dizer em quem é que deve ter apoios. É isso que me incomoda.

9 Ago 2017