Índia / Paquistão | Comunidade internacional pede contenção

O ataque da Índia de terça-feira à noite contra três zonas do Paquistão fez escalar perigosamente o conflito entre as duas potências nucleares

 

A comunidade internacional pediu ontem à Índia e ao Paquistão para terem contenção militar após a escalada do confronto entre as duas potências nucleares, que já causou dezenas de mortos civis em ambos os países.

China, Rússia, França e Alemanha pediram contenção e mostraram preocupados com a escalada das tensões, destacando a necessidade de evitar situações de confronto e de proteger os civis. Também a Turquia manifestou preocupação e alertou para o “risco de uma guerra total” entre a Índia e o Paquistão.

“O ataque da Índia na noite passada representa o risco de uma guerra total. Condenamos esta atitude provocadora e os ataques contra civis e infraestruturas civis”, disse, em comunicado, o Ministério dos Negócios Estrangeiros turco. Da mesma forma, o Irão manifestou “profunda preocupação” com o confronto entre a Índia e o Paquistão, país com quem faz fronteira.

Antes, os Estados Unidos lamentaram a situação, tendo o Presidente, Donald Trump, considerado que o reinício dos confrontos “foi uma pena” e adiantado esperar que “pare muito rapidamente”. O líder da diplomacia norte-americana, Marc Rubio, exortou ainda os líderes dos dois Estados a abrirem um canal de diálogo para evitar uma maior escalada do conflito.

“O mundo não se pode dar ao luxo de um confronto militar” entre a Índia e o Paquistão, afirmou, por seu lado, o secretário-geral da ONU, António Guterres, referindo-se aos ataques das últimas horas, os mais graves das últimas duas décadas entre estes Estados.

Numa reacção mais assertiva, o Reino Unido também pediu calma aos dois países, mas assumiu estar pronto para intervir caso seja necessário. A Índia e o Paquistão têm “interesse na estabilidade regional”, disse o secretário do Comércio britânico, Jonathan Reynolds, acrescentando que o Governo britânico fará “tudo o que puder em termos de diálogo para reduzir a tensão”.

Mortos e feridos

Os dois exércitos trocaram tiros de artilharia ao longo da fronteira disputada em Caxemira após ataques indianos em solo paquistanês em retaliação por um atentado, a 22 de Abril, na Caxemira controlada pela Índia, que matou 26 pessoas.

A tensão entre a Índia e o Paquistão reacendeu-se a 22 de Abril, quando homens armados atacaram a região turística de Pahalgam, na Caxemira indiana, matando 26 civis. O ataque foi atribuído à organização Lashkar-e-Taiba e as relações deterioram-se ainda mais entre estes países vizinhos, rivais desde que se tornaram independentes do Reino Unido, em 1947.

Os dois governos ordenaram a saída dos seus territórios de cidadãos do Estado vizinho e, ao longo dos dias, foram-se registando incidentes nas fronteiras, com tiros disparados na chamada Linha de Controlo em Caxemira. Na terça-feira à noite, Nova Deli lançou ataques contra três zonas do Paquistão, que, segundo o Governo indiano, constituíam “locais terroristas”, na província de Punjab.

Poucas horas depois, o Governo paquistanês anunciou ter abatido vários aviões militares indianos e, ontem de manhã, uma sequência de bombardeamentos levados a cabo por Islamabade e Nova Deli provocou pelo menos 38 mortos, no maior confronto dos últimos 20 anos.

Dia da Vitória | Pequim justifica participação na parada de Moscovo como acto de respeito pela História

Pequim defendeu ontem a presença de tropas chinesas na parada militar de 09 de Maio em Moscovo como uma demonstração de “respeito pela História” e não como um gesto de apoio à Rússia na guerra na Ucrânia.

“A participação da China nas celebrações do 80.º aniversário da vitória soviética na Grande Guerra Patriótica reflete o respeito pela História e a firme determinação em defender as conquistas da Segunda Guerra Mundial”, disse o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês Lin Jian, em conferência de imprensa.

O porta-voz lembrou que a vitória na guerra foi “o resultado da luta conjunta de todos os países e povos amantes da paz e da justiça” e tanto o povo chinês como os povos da antiga União Soviética “fizeram enormes sacrifícios nacionais e contribuições históricas indeléveis”.

Os comentários surgiram um dia depois de a Ucrânia ter criticado a presença de tropas estrangeiras no desfile da Praça Vermelha como uma “manifestação de apoio ao Estado agressor”. Pequim evitou responder directamente à repreensão de Kiev, mas insistiu que a posição sobre a guerra “tem sido clara e consistente”.

“Evitar uma nova escalada das tensões é agora a prioridade urgente. Todas as partes envolvidas devem chegar a um consenso e criar condições para atingir esse objectivo”, acrescentou. Sobre a cooperação bilateral entre a China e a Rússia, o porta-voz reiterou que “sempre se baseou nos princípios do respeito mútuo, do benefício partilhado e do sucesso comum”.

O desfile em Moscovo vai contar também com unidades militares de mais 12 países. O Presidente chinês, Xi Jinping, vai estar presente, na primeira visita à Rússia desde Março de 2023. Está também prevista uma reunião bilateral com o Presidente russo, Vladimir Putin, a 08 de Maio.

Economia | Bolsas chinesas sobem com medidas de estímulo de Pequim

As principais bolsas da China abriram ontem com ganhos, na sequência do anúncio de um novo pacote de medidas por parte de Pequim para impulsionar a recuperação económica, pressionada pelas tarifas impostas pelos Estados Unidos.

Durante a sessão da manhã de ontem, o índice de Xangai avançou 0,59 por cento e o de Shenzhen subiu 0,22 por cento. Em Hong Kong, o índice de referência Hang Seng subiu 0,79 por cento. Também a Bolsa de Pequim, inaugurada em 2021 e com menor expressão por estar centrada em pequenas e médias empresas, operava em terreno positivo, com uma valorização de 0,48 por cento.

Meia hora antes da abertura dos mercados, o governador do banco central chinês, Pan Gongsheng, anunciou novos cortes nas taxas de juro, na taxa de reservas obrigatórias e nas taxas das operações de recompra a sete dias, uma das principais ferramentas de injecção de liquidez do banco central.

O Banco Popular da China anunciou ainda reduções nas taxas de juro hipotecárias, medidas de estímulo ao crédito para compra de serviços e cuidados a idosos, apoios temporários ao financiamento para a aquisição de automóveis e aumento do crédito à inovação tecnológica.

China pede sinceridade aos EUA para o encontro deste fim de semana

A China apelou ontem aos Estados Unidos para demonstrarem “sinceridade nas conversações” comerciais previstas para o fim de semana, sublinhando que aceitou o encontro com base nos seus interesses e nas expectativas da comunidade internacional.

“Os Estados Unidos devem demonstrar sinceridade nas conversações, corrigir as suas práticas erradas, encontrar um ponto de equilíbrio com a China e resolver as preocupações mútuas com base na igualdade e no respeito”, afirmou o Ministério do Comércio chinês, em comunicado.

O ministério reforçou que “todo o diálogo e negociação deve assentar no princípio do respeito mútuo”, em referência às reuniões que o vice-primeiro-ministro He Lifeng — principal negociador comercial da China — terá com o secretário do Tesouro norte-americano, Scott Bessent, no sábado e domingo, na Suíça.

“Nos últimos tempos, responsáveis norte-americanos têm feito circular informações sobre possíveis ajustamentos às suas tarifas e transmitido essa intenção à China por diferentes canais, manifestando abertura para o diálogo”, lê-se no comunicado.

“Tendo em conta as expectativas globais, os interesses da China e as exigências da indústria e dos consumidores dos EUA, a China decidiu aceitar conversar”, acrescentou.

Ser racional

O ministério acusou os Estados Unidos de terem adoptado, desde o regresso ao poder de Donald Trump, “medidas tarifárias unilaterais, ilegais e irrazoáveis”, que terão “afectado gravemente as relações económicas e comerciais bilaterais, perturbado a ordem internacional e criado sérios obstáculos à recuperação económica global”.

“Para defender os seus direitos e interesses legítimos, a China tomou contramedidas firmes. A nossa posição é coerente: quer no confronto, quer no diálogo, a determinação da China em salvaguardar os seus interesses de desenvolvimento não mudará, tal como não mudará o seu compromisso com a equidade, a justiça e o multilateralismo”, vincou.

O Governo chinês reiterou que mantém a porta aberta ao diálogo, mas advertiu que os Estados Unidos devem reconhecer “o impacto negativo das suas tarifas unilaterais”, respeitar as normas económicas internacionais e ouvir “as vozes racionais de todos os sectores”.

Mas se os EUA “disserem uma coisa e fizerem outra” ou recorrerem à “coacção e chantagem sob o disfarce de negociações”, isso é algo que a China “não aceitará jamais”, frisou Pequim. “A China nunca sacrificará os seus princípios nem a justiça internacional em troca de um acordo”, realçou.

Na mesma nota, o Ministério do Comércio garantiu que a China continuará a trabalhar com outros países para “reforçar a coordenação, resistir em conjunto ao protecionismo unilateral e à intimidação hegemónica, defender o comércio livre e o multilateralismo e promover uma globalização económica inclusiva e benéfica”.

Encontro na Suíça

O Ministério dos Negócios Estrangeiros confirmou ontem que He Lifeng — figura de confiança do Presidente chinês, Xi Jinping — visitará a Suíça entre 09 e 12 de Maio para encontros com Bessent, no âmbito dos esforços para aliviar a tensão entre as duas potências.

Bessent já tinha anunciado na terça-feira que se reunirá com a delegação chinesa este fim de semana, após ter mantido uma videoconferência com He em 25 de Fevereiro, durante a qual discutiram as tarifas e o combate ao tráfico de fentanil, um poderoso opiáceo.

Também na terça-feira, Donald Trump afirmou que haveria negociações “no momento apropriado”. Nos últimos dias, Washington indicou que já existiram contactos prévios e Trump alegou ter falado com Xi Jinping — algo que Pequim negou e que a Casa Branca não clarificou.

Guerra comercial | China e Brasil puxam por integração regional face política dos EUA

Lula da Silva vai estar em Pequim na próxima semana para participar na Cimeira China-CELAC (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos). Face à política económica agressiva de Donald Trump, Pequim e Brasília acertam agulhas para continuar a promover acordos bilaterais que beneficiem as duas nações

 

O Presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, desloca-se na próxima semana à China, num momento em que os dois países procuram aprofundar a integração regional da América Latina, num contexto marcado pela guerra comercial desencadeada por Washington.

Lula participará, em Pequim, na Cimeira China-CELAC (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos), agendada para os dias 12 e 13 de Maio, tendo também previsto um encontro bilateral com o homólogo chinês, Xi Jinping. A deslocação coincide com as negociações entre Pequim e Brasília sobre a eventual construção de uma ligação ferroviária até ao porto de Chancay, construído pela China no Peru e inaugurado em 2024.

No ano passado, Xi e Lula estabeleceram a integração do Brasil ao Pacífico como um dos quatro pilares estratégicos das relações sino-brasileiras, durante uma visita de Estado do líder chinês ao país sul-americano.

De acordo com a imprensa chinesa, uma delegação chinesa, composta por 11 funcionários da empresa estatal China State Railway Group e do Ministério dos Transportes da China, visitou no mês passado o Brasil para “análises técnicas”.

O Brasil já desempenha um papel importante na segurança alimentar da China, representando mais de 20 por cento das importações agrícolas e pecuárias do país asiático. A guerra comercial desencadeada pelo Presidente norte-americano, Donald Trump, deverá reforçar ainda mais essa procura.

Washington aumentou as tarifas sobre produtos chineses até 145 por cento nas últimas semanas. Pequim retaliou com taxas adicionais de 125 por cento sobre produtos norte-americanos e suspendeu as compras de produtos agrícolas.

O ministro da Agricultura e Pecuária brasileiro, Carlos Fávaro, assegurou que o Brasil vai aproveitar todas as oportunidades geradas pela guerra comercial entre Pequim e Washington.

“Das crises nascem oportunidades. E o Brasil está atento às oportunidades e vai ampliar as trocas comerciais”, declarou, citado pela imprensa brasileira.

Benefícios colaterais

O Brasil tem beneficiado das disputas comerciais entre as duas maiores economias do mundo desde a primeira guerra comercial, iniciada durante o primeiro mandato presidencial de Donald Trump (2017-2021). Desde então, a China aumentou as compras de soja ao país para reduzir a dependência dos EUA.

Em 2024, a China importou um total de 105 milhões de toneladas de soja, das quais 22,14 milhões provinham dos EUA, representando 21,1 por cento do total – uma queda de 13,3 por cento face a 2018.

Durante o mesmo período, as importações chinesas de soja do Brasil atingiram 74,65 milhões de toneladas, representando agora 71,1 por cento do total, de acordo com dados das alfândegas chinesas.

O acesso ao Oceano Pacífico permitiria ao Brasil e aos países vizinhos contornarem as rotas marítimas tradicionais do Atlântico, reduzindo significativamente os tempos de trânsito e os custos logísticos das exportações agrícolas, como a soja, a carne bovina e os cereais.

O porto de Chancay também pode ajudar Pequim a diversificar as opções de transporte marítimo e reduzir a dependência do Canal do Panamá, uma rota que acentuou as tensões diplomáticas e geopolíticas com os Estados Unidos.

Os objectivos estratégicos de Pequim e Brasília inserem-se na política de Lula para a CELAC. Lula promoveu o retorno do Brasil à organização intergovernamental, após o país se ter retirado do bloco em 2019. O movimento sinalizou a retomada da integração regional como prioridade da política externa brasileira, através do projecto Rotas de Integração da América do Sul.

Interpretar Confúcio: a volta estética e os seus desafios

Por Li Chenyang

O livro de Peimin Ni sobre Confúcio: O Homem e o Caminho do Gongfu1 é notável não apenas por ser lucidamente escrito e rico em informações, mas também, o que é mais importante, porque lança uma grande mudança na interpretação de Confúcio. Na sua leitura, os ensinamentos de Confúcio são mais sobre como levar a vida artisticamente do que sobre conduta moral. Podemos chamar a mudança de Ni de “volta estética” na interpretação de Confúcio. Este trabalho merece uma atenção séria e um tratamento cuidadoso por parte das comunidades académicas pertinentes.

O livro de Ni é composto por 6 capítulos. O capítulo 1 “Confúcio como figura histórica” coloca Confúcio em contextos históricos, cobrindo o seu nascimento, a sua vida e o seu legado ao longo dois milénios até aos tempos contemporâneos. Ele descreve Confúcio como um precursor de uma grande tradição viva que define a China desde a antiguidade. Capítulo 2 “Confúcio como um Líder Espiritual” introduz a religiosidade de Confúcio à luz de noções-chave como “Céu” (tian 天), “Mandato e Destino” (ming 命) e imortalidade. Ele destaca a dimensão religiosa da tradição de Confúcio em estreita conexão com sua compreensão do sentido da vida. O capítulo 3, “Confúcio como filósofo”, defende que a tradição confuciana deve ser considerada filosófica no sentido amplo da busca da sabedoria, centrando-se em questões-chave de tornar-se humano, ren e li, retificação de nomes e zhongyong. O capítulo 4, “Confúcio como um reformador político”, explica os esforços políticos exercidos por Confúcio e seus seguidores para alcançar a boa sociedade. O capítulo 5 é sobre “Confúcio como educador”, ilustrando a educação, filosofia e programa iniciados pelo mestre. Finalmente, o Capítulo 6 “Confúcio como pessoa” retrata o personagem principal do livro como uma pessoa histórica na vida real e discute questões relacionadas ao elitismo e ao sexismo. Ni deixa explícita a importância de concluir o livro dessa forma e escreve: “o Mestre era, afinal de contas, humano. Ao retratar Confúcio como uma pessoa real, que apreciava boa comida, gostava de música e canto, tinha preferências pessoais peculiares por roupas e estava sujeito a cometer erros e encontrar situações embaraçosas, a grandeza do Mestre parece muito mais real e acessível a todos”.

Na minha opinião, a característica mais significativa do projecto de Ni reside no facto de abordar uma questão que há muito coloca desafios aos estudiosos da filosofia confucionista, nomeadamente uma diferença conspícua entre os Analectos de Confúcio e outros textos clássicos da tradição confucionista. Tem sido do geral, e de algum modo incómodo, que os Analectos não apresentam articulações altamente intelectuais, teóricas e filosóficas – no sentido de estudar a natureza fundamental do conhecimento, da realidade e da existência2- sobre assuntos de importância, apesar de tocar em muitos desses temas. Os leitores perguntam-se frequentemente: o que é que coisas como manter uma boa postura corporal, comer boa comida e, no entanto, não comer demasiado (Analectos 10.4, 10.8) têm a ver com a vida moral? Em comparação com alguns outros textos confucionistas clássicos, como o Yijing, o Zhongyong, o Mengzi e o Xunzi, os Analectos parecem bastante escassos e mínimos como texto filosófico. Podemos chamar a esta questão a caraterística não filosófica dos Analectos. A solução de Ni para o problema é morder a bala e argumentar que o intelectual, o teórico e o filosófico não são a de Confúcio. Confúcio, de acordo com Ni, é sobre como viver uma vida boa; Confúcio preocupa-se com a “arte” de viver bem. No centro do movimento de Ni está o conceito de “gongfu”, que significa “as artes da vida que exigem capacidades cultivadas e habilidades eficazes”. O “gongfu” serve como uma lente através da qual podemos ver as coisas de uma certa forma e compreendê-las de um determinado ângulo. Uma abordagem de gongfu pode ser melhor compreendida em contraste com um sistema teórico de ensino. Enquanto uma teoria geralmente começa com a apresentação de premissas e raciocínios para chegar a uma conclusão, um sistema de gongfu “parte da condição existente do praticante e, através de orientação e prática passo a passo, gradualmente alcança níveis mais altos de perfeição artística” (xii). Num tal sistema, os diferentes componentes estão ligados entre si através das suas implicações práticas e não teóricas. Ni observa que essa leitura de Confúcio não é sua própria invenção. Ele traça uma fonte de sua interpretação para Cheng Yi e Zhu Xi. Ele escreve:

Cheng e Zhu apontaram a diferença entre duas abordagens à leitura – uma é intelectual e a outra é a abordagem gongfu. A primeira requer apenas compreensão intelectual, enquanto a segunda requer autorreflexão do que é aprendido e a sua aplicação na prática. A primeira leva apenas a um conhecimento livresco, enquanto a segunda leva a uma compreensão incorporada e a um crescimento holístico. O primeiro leitor recebe passivamente a informação do texto, mas o segundo interage com o texto, dando-lhe vida através do seu envolvimento pessoal.

Na opinião de Ni, existe uma diferença fundamental entre as duas abordagens. Uma é proposicional, enquanto a outra é instrucional. Essas duas diferem tanto que “talvez não seja muito rebuscado dizer que usar a abordagem intelectualista para ler Confúcio é como comer o cardápio em vez da comida” (xiv-xv). No entender Confúcio, devemos optar pelo “alimento”, ou seja, a sua mensagem instrutiva sobre como viver bem a vida, em vez do “menu” intelectualista. A abordagem de Ni dá-nos uma saída para o dilema de dar sentido aos Analectos de Confúcio. Se pudermos ler Confúcio da maneira que Ni defende, podemos evitar alguns problemas sérios com a interpretação de Confúcio de uma “maneira intelectual”. Esse argumento, por si só, torna o livro de Ni digno de nota.

Se bem entendi, o ponto de vista de Ni é diferente do daqueles que lêem os Analectos como defendendo uma vida moral, fornecendo dois relatos de uma filosofia moral que se complementam mutuamente. Ou seja, o texto não só apresenta ensinamentos teóricos e morais para a boa vida, como também fornece exemplos concretos de conduta humana na prática. Amy Olberding, por exemplo, argumentou que um propósito importante dos Analectos é fornecer “exemplares morais” para complementar e ajudar a operacionalizar os ensinamentos morais de Confúcio..(3) As várias descrições do comportamento de Confúcio no texto não só fornecem exemplos concretos de comportamento exemplar, mas também dão aos leitores uma forte sensação de como é agir virtuosamente na vida real. A principal diferença entre esse ponto de vista e o de Ni é que, para Olberding, embora os vários actos de Confúcio descritos nos Analectos possuam valor estético e artístico, seu real significado está em dar mais detalhes sobre o aspecto teórico de seus ensinamentos morais. Para Ni, no entanto, o valor estético e artístico da vida de Confúcio, conforme descrito nos Analectos, é de importância primária e deve ser considerado como tal em nossa compreensão do texto.

O ponto de vista de Ni pode fazer-nos lembrar a separação que Kierkegaard faz entre a vida estética, a vida ética e a vida religiosa. Para Kierkegaard, a vida estética e a vida ética são incompatíveis e talvez até incomensuráveis. A estética é caracterizada pela imersão na experiência sensorial, pelo tédio niilista e pela fuga egoísta da mesma. A estética opõe-se à ética; no entanto, ambas devem ser ultrapassadas pela religião. Na opinião de Ni, a estética dos Analectos é muito mais profunda e sofisticada do que a que Kierkegaard caracterizou com o mesmo rótulo. Ni não vê a estética, no seu sentido confucionista, como oposta à ética; é antes uma perspectiva diferente da vida boa. Se pudermos usar o rótulo de “religioso” para o confucionismo, a perspetiva de Ni implica que, em vez de ser suplantada, a estética é também “religiosa”, na medida que torna a vida significativa e importante.

No entanto, como acontece frequentemente na abordagem de problemas no discurso filosófico, a opção por uma solução pode dar origem a novos problemas. Na atitude de Ni, os leitores mais cautelosos podem sentir o perigo de uma tendência anti-intelectual. Mas esta preocupação pode não ser tão bem fundamentada como parece à primeira vista. Se há algo anti-intelectual no livro de Ni, é contra a leitura de Confúcio exclusivamente de forma intelectual ou contra a intelectualização excessiva dos ensinamentos de Confúcio, em vez de ser anti-intelectual em si. Ele opõe-se a uma abordagem intelectual para interpretar os ensinamentos de Confúcio em vez de tomar Confúcio ou seus ensinamentos como anti-intelectuais. Outros podem contestar o argumento de Ni para rejeitar interpretações teóricas dos Analectos e podem insistir que há uma base adequada para ler os Analectos como uma obra teórica e filosófica. Não vou entrar em tal disputa aqui. As minhas preocupações com o livro de Ni são diferentes. Embora eu ache persuasivo o argumento de Ni para sua interpretação de Confúcio nos Analectos, não me sinto totalmente confortável com o tratamento de Ni da relação entre o Confúcio apresentado nos Analectos e o Confúcio encontrado em outros textos clássicos da tradição confuciana, e da relação entre Confúcio, “o homem”, como destacado no subtítulo do livro de Ni , e o confucionismo, a tradição filosófica que tem intimamente associada com o nome de Confúcio.

Primeiro, vejamos a relação entre o Confúcio apresentado nos Analectos e o Confúcio encontrado em outros textos clássicos da tradição confuciana. Ao explicar Confúcio como um mestre de gongfu, Ni baseia-se fortemente não apenas nos Analectos, mas também em outros textos, como o Zhongyong e o Yijing. Esses são, inegavelmente, textos altamente teóricos e filosóficos que retratam Confúcio como um pensador teórico e filosófico. Se esses retratos e explicações de Confúcio como confiáveis, como podemos nos basear apenas no aspecto “prático” do gongfu de Confúcio, deixando de fora o “Confúcio” teórico, filosófico e intelectual? Se tomarmos esses retratos e explicações como confiáveis, como Ni faz, deveríamos também aceitar um “Confúcio” teórico e intelectual? Se aceitarmos um Confúcio teórico, filosófico e intelectual com base numa leitura holística dos clássicos confucianos, a leitura estética, artística e de gongfu de Ni ainda se manteria?

Podemos contrastar a solução de Ni para a questão da caraterística não-filosófica dos Analectos com a de Thome Fang (Fang Dongmei 方东美, 1899-1977). Embora reconheça os Analectos como um livro muito bom sobre os registros pessoais de Confúcio e seus ensinamentos sobre conduta pessoal, Fang também reconhece a falta de sofisticação filosófica do texto. Fang aceita os Analectos como um texto de sabedoria para a vida e reconhece o seu grande valor para orientar a vida das pessoas. Concordando com Ni, Fang defende que, apesar de se discutirem as virtudes morais, os Analectos não formam teorias éticas. Além disso, não cobre tópicos filosóficos tão importantes como a cosmologia e a ontologia. Por isso, chama ao Lunyu um texto de “moralogia (格言學)”. Na opinião de Fang, a moralogia não é filosofia, nem os Analectos são um texto clássico que contém a filosofia geral de Confúcio.4 Fang argumenta, no entanto, que seria um erro confinar a nossa leitura de Confúcio apenas aos Analectos e que devemos colocar o Confúcio dos Analectos no contexto de outros textos clássicos da tradição confucionista.

Fang utiliza a ideia de ren 仁 de Confúcio para defender o seu ponto de vista. Fang argumenta que, nos Analectos, Confúcio diz que ser ren é “amar as pessoas”. No entanto, Confúcio não diz como amar as pessoas. É em textos como o Liji (Livro dos Ritos) e o Yijing que encontramos as explicações filosóficas de Confúcio sobre ren. Na opinião de Fang, a ideia de ren de Confúcio deve ser entendida tanto de forma negativa quanto positiva. Negativamente, trata-se de não fazer certos tipos de coisas a outras pessoas. É semelhante à Regra de Ouro de Confúcio, registada nos Analectos (15.24), e enfatiza a empatia ao lidar com os outros.5Além disso, Fang argumenta que existe também uma forma positiva de compreender o ren. Esta é a ideia do Dao do Céu e da Terra (Tiandi zhi Dao 天地之道), tal como se pode encontrar no Zhongyong. Significa o coração humano que se preocupa com todos os seres vivos do mundo. Podemos encontrar ideias semelhantes no Yijing, que afirma que as forças yin-yang de Qian e Kun (乾坤) são para ampliar e multiplicar a vida (是以大生焉… 是以广生焉).

A segunda abordagem para ser ren também é encontrada nos Analectos, onde Confúcio diz que aqueles que desejam se estabelecer também (ajudam) a estabelecer os outros e que desejam ter sucesso também ajudam os outros a ter sucesso (6.30). Nas próprias palavras de Fang, isto significa que, porque valorizo e respeito a minha própria vida, valorizarei e a vida dos outros, alargando o amor-próprio e a auto-valorização ao amor pelos outros e à valorização dos outros. Isto aplica-se também às formas de vida não humanas.6Assim, ao interpretar o ren de Confúcio Fang recorre a outros textos para suplementar o que ele percebe como faltando ou inadequado nos Analectos. Os Analectos sozinhos podem nos dar um retrato incompleto ou mesmo distorcido de Confúcio; somente em conjunto com outros textos confucianos clássicos podemos entender completamente os Analectos. Em outras palavras, no que diz compreensão de Confúcio, o fato de os Analectos carecerem de elaboração teórica e filosófica não significa que Confúcio carece de elaboração teórica e filosófica, porque esta última pode ser encontrada em outros textos pertinentes.

(continua)

Ka Hó | Galeria “Hold On To Hope” acolhe “Our Time Zone”

A galeria “Hold On To Hope”, gerida pela Associação de Reabilitação dos Toxicodependentes de Macau (ARTM) na povoação de Ka-Hó, em Coloane, tem patente uma nova mostra, intitulada “Our Time Zone – Exposição Colectiva de Arte e Caligrafia Curativa” com trabalhos das artistas Kinki Wong e Belinda Chim. A exposição é organizada pela Macau Hope Paiting Association e, segundo palavras de Kinki Wong, que colabora não apenas como artista, mas também como curadora, “nasceu da ideia de que todos experienciam momentos de altos e baixos, de incerteza e confusão”.

Assim, para a artista, “Our Time Zone”, focada em trabalhos de arte e caligrafia, pretende “usar a interacção sensorial para expressar teorias de arte-terapia, fomentando uma interacção diversa entre a arte, cultura e exposição”. Tendo em mente que a “arte reflecte o corpo”, “Our Time Zone” promove “a consciencialização da comunidade local para a saúde mental”, a fim de se conseguir “compreender o próprio corpo através da arte-terapia”.

Kinki Wong é natural de Macau e tem trabalhado como terapeuta de artes expressivas, possuindo um mestrado nessa área e especialização em Psicologia pela European Graduate School, na Suíça.

Já Belinda Chim faz trabalhos de caligrafia ocidental desde que foi para a Austrália estudar design. Tendo mais de dez anos de experiência nesta arte, Belinda destaca-se na criação de obras com temas de animais, utilizando linhas expressivas dentro da caligrafia ocidental.

A artista já realizou exposições e cursos presenciais em Hong Kong, Japão e Malásia, tendo ensinado mais de quatro mil pessoas na área da caligrafia. A mostra pode ser visitada até ao dia 25 de Maio.

São Lázaro | Exposição de Ng I Weng para ver até final do mês

Está patente, até ao final do mês, na galeria 10 Fantasia, no bairro de São Lázaro, a exposição da artista Ng I Weng. Trata-se de uma iniciativa de diversas entidades, nomeadamente a Associação de Arte Juvenil de Macau, Sociedade de Artistas de Macau, Associação de Promoção das Indústrias Criativas do Distrito da Igreja de São Lázaro, e a galeria 10 Fantasia – Incubadora de Indústrias Criativas.

A artista nasceu em Macau em 1993, tendo-se formado em 2015 no Departamento de Belas Artes e Design Criativo Cultural da Universidade Huafan, em Taiwan. Segundo uma nota oficial sobre a mostra, a artista tem sido, desde “tenra idade”, uma pessoa “curiosa sobre a vida, possuindo uma rica profundidade emocional”. Assim, o seu trabalho artístico “explora temas da humanidade, ligações emocionais e natureza através de várias formas, revelando uma proficiência particular em pintura a óleo e acrílico”.

Ng I Weng participou em diversas mostras, como a Exposição de Arte da Universidade Huafan Dalun Mountain em 2013; a Exposição de Graduação Huashan, em 2015; e ainda a Exposição de Obras de Arte dos membros da Sociedade de Artistas de Macau. A artista, que também faz trabalho de curadoria, pertence a diversas entidades artísticas, como a Sociedade de Artistas de Macau, Associação de Educação Arte Visual de Macau ou Associação de Promoção da Leitura de Macau, entre outras.

Efeméride | Camilo Castelo Branco lembrado hoje no IPOR

Decorre hoje uma sessão do Clube de Leitura da Associação dos Amigos do Livro que irá centrar-se não apenas na obra “Fanny Owen”, de Agustina Bessa-Luís, mas também na comemoração dos 200 anos do nascimento do escritor português Camilo Castelo Branco. A partir das 18h30 é hora de recordar a sua vida e escritos com intervenções de Pedro D’Alte, Wang Suo Ying e Shee Vá

 

Comemora-se este ano os 200 anos do nascimento do escritor português Camilo Castelo Branco, uma data que é hoje recordada no Instituto Português do Oriente (IPOR) através de uma sessão do Clube de Leitura da Associação dos Amigos do Livro, realizada na Biblioteca Camilo Pessanha, no IPOR, a partir das 18h30.

Segundo uma nota do IPOR, a sessão aborda a obra “Fanny Owen”, da escritora portuguesa Agustina Bessa-Luís, sendo esse o mote para recordar Camilo Castelo Branco, um dos autores de eleição de Bessa-Luís, uma vez que a obra se inspira na vida pessoal do escritor.

Assim, a sessão de hoje “tenta compreender o escritor”, reunindo Pedro D’ Alte, que falará da sua experiência na abordagem da obra de Camilo Castelo Branco junto dos alunos chineses. Este será auxiliado por Wang Suo Ying, que traduziu para chinês algumas das obras mais conhecidas de Camilo, como “Amor de perdição” e “A queda de um Anjo”. Shee Vá, médico e autor, também participa na sessão de hoje, tentando “compreender o homem [Camilo Castelo Branco] através dos seus biógrafos e admiradores como Agustina Bessa-Luís, Manuel de Oliveira e Mário Claúdio”.

Para se perceber o gosto de Agustina Bessa-Luís pela escrita de Camilo, o IPOR cita as suas palavras: “Camilo é manipulador, a sua frivolidade não é senão tentativa de esconder as suas fragilidades”. A escritora nortenha disse também que “Camilo era um insurrecto, com lama até aos ossos e dois livros de gramática em vez de pulmões”.

Vida boémia

A escolha da obra “Fanny Owen” para esta sessão não surge por acaso, uma vez que Agustina se inspirou na história de vida de Camilo, quando este se apaixonou por Ana Plácido quando esta era casada, um caso que levou à prisão de ambos numa altura em que o adultério era considerado crime, no século XIX. Mais tarde, os dois seriam absolvidos, casando e tendo filhos.

“Fanny Owen” baseia-se, assim, nestes factos verídicos ocorridos no meio do ambiente intelectual e boémio da cidade do Porto do século XIX, em que a história de vida de Camilo Castelo Branco se entranha no percurso de um dos personagens do livro, um jovem, filho de um oficial inglês que se deixa envolver pelo amor que só lhe trará problemas e desgraças.

Segundo a nota do IPOR, Camilo Castelo Branco “é um autor maior da língua portuguesa”, com uma obra “extensa que abarca a novela, o romance, a crónica, o folhetim, a poesia, o conto e o teatro”. Além disso, “descreve como ninguém a sociedade da época usando o sarcasmo e a ironia pelo que criou inimizades, mas, também capaz de actos de grande generosidade”. Camilo Castelo Branco “viveu uma vida de romance transportando consigo frustração e enorme complexidade”, destaca o IPOR.

Camilo Castelo Branco foi, além de romancista, cronista, crítico, dramaturgo e tradutor. Recebeu do rei D. Luís o título de Visconde de Correia Botelho. Tendo ficado orfão de pais ainda criança, deixou Lisboa para viver em Vila Real com uma tia, tendo casado aos 16 anos. Estudou medicina no Porto, mas nunca chegou a acabar o curso, tendo definitivamente feito das letras a sua vida.

Depois da polémica em torno do caso amoroso com Ana Plácido, os dois ficam juntos até à morte deste, por suicídio, uma vez que a cegueira lhe impossibilitou continuar a escrever.

AMCM | Sobem transacções móveis no 1.º trimestre

Dados da Autoridade Monetária e Cambial de Macau (AMCM) mostram que nos primeiros três meses do ano aumentaram o número de transacções de pagamentos móveis em Macau, bem como o seu valor. Assim, o número de transacções deste tipo foram 90,4 milhões, um aumento de 11,6 por cento face ao primeiro trimestre de 2024.

Além disso, o valor desses pagamentos móveis foi de 7,9 mil milhões de patacas, mais 8,7 por cento em relação a igual período do ano passado. Até finais de Março deste ano, um total de 108.749 aparelhos e unidades, incluindo suportes de “QR Code”, aceitavam pagamentos móveis. Os dados da AMCM mostram ainda que no uso de cartões de crédito houve também um aumento do número de transacções, no total de 11,8 milhões, um aumento de 9,7 por cento face ao primeiro trimestre de 2024.

Além disso, o número de transacções realizadas com cartões de débito foi de 1,2 milhões, com um valor total de transacções de 464,9 milhões de patacas. De frisar que estes valores do uso de cartões de débito não incluem os levantamentos em dinheiro nas caixas ATM.

Terrenos | Governo faz despejos na Av. de Sidónio Pais

O Governo realizou ontem uma acção de despejo e limpeza de um terreno situado na Avenida de Sidónio Pais. O espaço, com uma área de cerca de 121 metros quadrados, passou assim para a alçada do Governo, uma vez que estava a ser ocupado ilegalmente.

Segundo uma nota da Direcção dos Serviços de Solos e Construção Urbana (DSSCU), “o terreno recuperado estava pavimentado e, no local, eram perceptíveis obras não autorizadas, nomeadamente uma construção clandestina composta por um portão metálico, paredes de tijolo e cobertura de betão, assim como escadas, canteiro e muro de vedação”.

A DSCCU explica que já tinha levado a cabo todos os procedimentos habituais para a desocupação do terreno, “ordenando ao ocupante ilegal que desocupasse o mesmo e o revertesse ao Governo da RAEM no prazo estipulado”. Porém, e como esse pedido nunca foi concretizado, as autoridades procederam ao despejo esta quarta-feira.

Saúde | Serviços alertam para vírus da varicela “mais activo”

O Governo lançou ontem um alerta para o aumento de casos de varicela em Macau. Desde o início do ano, as autoridades registaram 195 casos de infecção, quase o dobro em relação ao mesmo período de 2024. Cerca de três quartos das infecções são contraídas por crianças

 

O vírus da varicela em Macau está a tornar-se mais activo, indicaram ontem os Serviços de Saúde, apelando a pais, instituições de ensino e creches para estarem atentos a sintomas e adoptarem uma postura preventiva.

De acordo com os dados sobre doenças transmissíveis de declaração obrigatória, as autoridades apuraram que na semana passada houve uma “tendência de aumento do número de casos de varicela, com a média semanal de 12 casos a partir de 6 de Abril a subir para 23 na semana passada”.

O organismo liderado por Alvis Lo salienta que “este número é superior ao do período homólogo do ano passado (10 casos)”.

As autoridades dão conta ainda de um caso de infecção colectiva de varicela que foi detectado recentemente na Escola Secundária Pui Ching, afectando um total de 21 estudantes.

A partir de 1 de Maio, os alunos “apresentaram sintomas de erupção cutânea e pequenas bolhas na cabeça, na cara, nos membros, nas costas e no peito, tendo sido submetidos a tratamento médico”. As autoridades acrescentam que não se registaram complicações graves e que a “maioria dos doentes foi vacinada com uma dose de varicela”.

Desde o início

Entre 1 de Janeiro e 6 de Maio deste ano, foram registados 195 casos de varicela em Macau, um número que quase duplicou as infecções durante o período homólogo do ano passado, quando se registaram 105 casos.

Cerca de três quartos dos casos dizem respeito a crianças, a maioria com idades compreendidas entre 8 e 17 anos, representando 65,1 por cento do total, enquanto as pessoas com idade igual ou inferior a 7 anos representam apenas 6,1 por cento do total. Os Serviços de Saúde salientam que desde o início do ano não houve registo de casos graves ou mortais.

As autoridades acrescentam que parte da população inoculada contra a varicela continua susceptível de ser afectada por aquilo a que os profissionais de saúde chamam de infecção disruptiva. Porém, “os sintomas são geralmente ligeiros e atípicos, com menos bolhas e a duração da doença é relativamente curta”. Segundo o Governo, os casos de varicela na Escola Secundária Pui Ching tratam-se de infecções disruptivas.

Francis Lui diz que escassez de hotéis ameaça competitividade de Macau

O líder de uma das seis operadoras de casinos em Macau alertou ontem que a escassez de quartos de hotel poderá ameaçar a competitividade internacional da cidade como destino turístico.

O presidente do Galaxy Entertainment Group, Francis Lui Yiu Tung, disse que “a questão dos quartos de hotel deve também ser abordada”, à medida que os casinos de Macau se concentram na realização de eventos e em apostadores da classe média.

Francis Lui lembrou que Las Vegas recebeu 42,5 milhões de visitantes em 2019, antes do início da pandemia, e que actualmente conta com “mais de 155 mil quartos de hotel”. “Isto é mais de três vezes superior ao de Macau”, lamentou o empresário, apesar de a cidade ter recebido mais de 34,9 milhões de turistas no ano passado. E o número de quartos de hotéis disponíveis em Macau tem vindo a diminuir. De acordo com dados oficiais, os hotéis e pensões de Macau contavam, no final de Março de 2025, com 44 mil quartos, menos 5,8 por cento do que no mesmo mês do ano passado.

Como resultado, o número de hóspedes dos estabelecimentos hoteleiros caiu 5,4 por cento no primeiro trimestre de 2025 e cerca de 59 por cento dos visitantes chegaram em excursões organizadas e passaram menos de um dia na cidade.

Espaço na Montanha

“A procura por alojamento continuará a ultrapassar a oferta nos próximos anos”, alertou Francis Lui. “Se não conseguirmos enfrentar adequadamente a questão da oferta de alojamento, a competitividade de Macau (…), não só a nível regional, mas também global, poderá ser prejudicada”, avisou o empresário.

Francis Lui admitiu que a escassez de terrenos disponíveis em Macau é um desafio e apontou como possível solução “a maior integração” com Hengqin.

Por outro lado, o operador disse que as seis concessionárias devem “unir-se para proteger a posição de liderança de Macau, não competindo nos preços, mas na qualidade da experiência do cliente”. Francis Lui discursou durante o arranque da Global Gaming Expo Asia, o maior evento da indústria do jogo realizado em Macau, que vai decorrer até amanhã.

Wynn Macau | Lucros operacionais encolhem mais de um terço

A Wynn Macau teve lucros operacionais de 127,1 milhões de dólares no primeiro trimestre, menos 38,3 por cento em termos anuais. A operadora de jogo apurou nos dois casinos que tem na região 720 milhões de dólares em receitas, menos 12,2 por cento face aos primeiros três meses de 2024

 

A Wynn Macau anunciou ontem os resultados financeiros relativos ao primeiro trimestre de 2025, que revelam uma quebra significativa dos lucros operacionais, menos 38,3 por cento, para um total de 127,1 milhões de dólares.

De acordo com um comunicado divulgado pela concessionária de jogo, as duas propriedades operadas pela empresa registaram receitas de 865,9 milhões de dólares entre Janeiro e Março, uma queda de 13,3 por cento em comparação com o mesmo período de 2024. As apostas nos casinos Wynn Macau e Wynn Palace foram responsáveis pela maioria do volume de negócios da empresa, arrecadando 720 milhões de dólares em receitas, menos 12,2 por cento do que no primeiro trimestre do ano passado.

Craig Billings, director executivo da empresa-mãe, a norte-americana Wynn Resorts, disse no mesmo comunicado que os grandes apostadores tiveram mais sorte do que o normal no primeiro trimestre, algo que “afectou negativamente os resultados”.

Neste segmento, conhecido como jogo VIP, as apostas diminuíram apenas 1,25 por cento nos dois casinos da Wynn Macau, mas as receitas caíram muito mais, 34,4 por cento em termos homólogos, para 120,2 milhões de dólares.

Em média, os casinos de Macau conseguem arrecadar pelo menos 3 por cento das apostas no jogo VIP, mas este valor caiu para 1,09 por cento nos primeiros três meses do ano, no caso do casino Wynn Macau.

O chamado mercado de massas continuou a ser de longe o principal segmento para a operadora, representando receitas de 710,9 milhões de dólares entre Janeiro e Março, menos 6,9 por cento do que no mesmo período de 2024. Recorde-se que em 2019 o bacará VIP representava 46,2 por cento das receitas totais dos casinos de Macau. Mas nos primeiros três meses do ano este segmento ficou-se por uma fatia de 25,1 por cento.

O mundo lá fora

A Wynn Resorts, que está a construir um hotel-casino nos Emirados Árabes Unidos, disse que continua “a explorar oportunidades para desenvolver mais negócios de jogos ou relacionados no mercado nacional e internacional”.

Numa teleconferência com analistas, após o anúncio dos resultados, Craig Billings, reconheceu que a empresa poderia concorrer a novas concessões para casinos no Japão, mas apenas “se as condições fossem adequadas”. Billings deu ainda como exemplo a Tailândia, país que está a discutir a legalização dos casinos e que descreveu como “um potencial mercado incrível, com transporte aéreo, infra-estruturas, turismo, etc. inacreditáveis”.

Billings disse não esperar qualquer impacto para a Wynn Macau da guerra comercial criada pelas tarifas impostas pelos Estados Unidos às importações vindas da China, Hong Kong e Macau.

Na terça-feira, a agência de notação financeira Fitch Ratings considerou que a guerra comercial pode prejudicar as operadoras de jogo em Macau, que ficam “sujeitas a retaliação” e vulneráveis ao abrandamento económico chinês.

Administração | Ng Wai Han sai dos SAFP para dirigir DICJ

Com a passagem de Adriano Marques Ho para os Serviços de Alfândega, a Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos passou a ser liderada interinamente pelo seu sub-director Lio Chi Chong. O secretário para a Economia e Finanças nomeou ontem Ng Wai Han, a primeira mulher à frente da entidade reguladora do jogo de Macau

 

A Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ) tem uma nova directora. Um despacho assinado pelo secretário para a Economia e Finanças, Tai Kin Ip, publicado ontem no Boletim Oficial, nomeia Ng Wai Han como directora da DICJ pelo período de um ano. A comissão de serviço de Ng Wai Han iniciou-se logo ontem com a publicação do despacho.

Recorde-se que o cargo estava vago desde que Adriano Marques Ho foi conduzido ao posto de director-geral dos Serviços de Alfândega em Dezembro, durante a reformulação dos titulares de elevados cargos públicos com a tomada de posse do novo Governo de Sam Hou Fai. Para o lugar de Adriano Marques Ho, que dirigiu a DICJ desde Junho de 2020, o novo Executivo nomeou o sub-director Lio Chi Chong.

Ng Wai Han passou a ser a primeira mulher na liderança da DICJ, depois do exercício de funções de Manuel das Neves, Paulo Martins Chan e Adriano Marques Ho.

A ascensão da ex-directora de Serviços de Administração e Função Pública ao topo da hierarquia da DICJ marca uma diferença de perfil de dirigentes, que até agora eram provenientes da área das forças de segurança.

Trabalho e administração

O secretário para a Economia e Finanças refere que “Ng Wai Han possui competência profissional e aptidão para o exercício do cargo de directora da Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos, que se demonstra pelo curriculum vitae”.

A nova líder da entidade reguladora do jogo no território é licenciada em Direito pela Universidade de Sun Yat-Sen, onde também fez mestrado em Direito Penal.

Em 1999, entrou para a função pública, para o cargo de técnica superior (área jurídica) da Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL), onde permaneceu até 2013. Entre 2013 e 2016, chefiou as divisões de Estudos do Departamento de Estudos e Informática e de Controlo dos Direitos Laborais do Departamento de Inspecção do Trabalho. Em Maio de 2016, passou a liderar o Departamento de Inspecção do Trabalho e um ano depois foi nomeada subdirectora, substituta da DSAL, e subdirectora até 2020, altura em que mudou para os Serviços de Administração e Função Pública, depois de duas décadas na DSAL.

Entre Junho de 2020 e Agosto de 2023, Ng Wai Han foi subdirectora dos SAFP e um mês depois passou a dirigir os SAFP, cargo que ocupou até ontem.

Guias turísticos | Governo reduz valores das multas devido à crise

Os guias turísticos que trabalharem sem a devida identificação deverão passar a pagar montantes mais baixos de multas. É esta a vontade do Governo tendo em conta o novo cenário de redução do número de excursões.

O assunto foi discutido em mais uma reunião da comissão permanente da Assembleia Legislativa (AL) que analisa, na especialidade, a proposta de lei de actividade das agências de viagens e profissão de guia turístico. No encontro, que decorreu na terça-feira, o deputado Chan Chak Mo, que preside à comissão, explicou que o Governo determinou a redução significativa do montante da multa em caso de infracção após ter ouvido as opiniões do sector. Em causa, está o facto de o conteúdo da proposta de lei ter sido elaborado antes da pandemia, mas os anos da covid-19 vieram mudar o panorama do turismo, com menos excursões em Macau, o que levou a um cenário de crise. Assim, se a proposta de multa inicial incidia entre as 10 e 20 mil patacas, a nova proposta desce a penalização para valores entre as 2 e 10 mil patacas.

Além disso, na reunião de terça-feira foi ainda referido pelos representantes do Governo que vai ser criado um mecanismo de advertência para os guias que façam a primeira infracção à lei, nomeadamente quando não mostrarem o cartão de licenciamento da actividade.

SAFP | IA usada no atendimento de chamadas e informações

A Direcção dos Serviços de Administração e Função Pública (SAFP) começou a introduzir ferramentas de “inteligência artificial (IA) no serviço de atendimento por telefone para melhorar a qualidade das consultas sobre as informações dos serviços”, revelou numa interpelação escrita a directora Ng Wai Han, que foi ontem nomeada para dirigir a Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos.

Em resposta a uma interpelação escrita do deputado Ho Ion Sang, a responsável acrescentou que estão a ser realizados estudos sobre o uso de ferramentas de IA para apoiar os trabalhadores da administração pública no tratamento de documentos oficiais e aumentar a eficiência administrativa.

Para chegar a este ponto, a directora dos SAFP revela que as autoridades locais organizaram “várias visitas a diferentes cidades no Interior da China, tendo-se realizado intercâmbios com os seus governos e equipas, com vista a servir de referência para o desenvolvimento do modelo do governo electrónico, nomeadamente na aplicação de inteligência artificial”.

Conselho de Estado | Xia Baolong em Macau entre hoje e terça-feira

“O director do Gabinete de Trabalho de Hong Kong e Macau do Comité Central do Partido Comunista da China e director do Gabinete dos Assuntos de Hong Kong e Macau do Conselho de Estado, Xia Baolong, visitará Macau de 8 a 13 de Maio”, revelou ontem o Gabinete de Comunicação Social.

O representante volta assim a Macau “para se inteirar da situação local”, e “conhecer a actualidade socioeconómica de Macau e os trabalhos de governação do novo Governo da RAEM”.

“O Chefe do Executivo, Sam Hou Fai, em nome do Governo da RAEM, agradece a atenção e apoio prestados desde sempre pelo Governo Central, e dá as calorosas boas-vindas à visita do director Xia Baolong, a Macau”, indicou o GCS, acrescentando que o Executivo irá “proceder, de forma empenhada, às devidas disposições para garantir o pleno sucesso da visita de Xia Baolong”.

Há sensivelmente um ano, Xia Baolong também fez uma visita de uma semana a Macau. Mais recentemente, no início de Fevereiro, o responsável passou dois dias em Hengqin.

Subsídio infância | IAS diz que é incentivo à natalidade

Os bebés nascidos este ano irão receber, nos primeiros três anos de vida, um total de 87 mil patacas no âmbito da concessão do novo subsídio de infância. Hon Wai, presidente do Instituto de Acção Social, defendeu ontem que esta nova medida pode promover o crescimento da taxa de natalidade

 

Estão em marcha os preparativos para a criação do novo apoio às famílias que desejem ter mais filhos, e que foi anunciado nas últimas Linhas de Acção Governativa (LAG) para este ano. Segundo afirmou ontem Hon Wai, presidente do Instituto de Acção Social (IAS), no programa matinal Fórum Macau, do canal chinês da Rádio Macau, tal medida pode mesmo contribuir para um aumento da natalidade.

“Esperamos que este subsídio possa encorajar as famílias locais a ter filhos. Claro que para aumentar a natalidade temos de considerar vários aspectos, e com este subsídio esperamos poder dar algum apoio financeiro para aliviar a pressão económica das famílias de Macau. Lançamos o subsídio de assistência de infância, e para aumentar a natalidade vamos rever o sistema de serviços de creches”, referiu.

No caso de uma criança nascida este ano, o subsídio de infância implica a atribuição, por parte do Governo, de um total de 87 mil patacas em três anos, tendo em conta o montante mensal de 1.500 patacas.

As 87 mil patacas que as crianças nascidas este ano irão receber dizem respeito ao subsídio da infância somado ao subsídio de nascimento e cheques pecuniários.

Os destinatários do subsídio de assistência na infância têm que ser residentes permanentes, incluindo os bebés nascidos em 2022. Conforme já foi referido, trata-se de um novo apoio que chega a 15 mil bebés e crianças. Nesta fase, o IAS trabalha na elaboração do regulamento administrativo, pois a medida deverá entrar em vigor por altura do Verão.

O montante mensal serve, sobretudo, para aliviar a carga das famílias com despesas essenciais como a compra de fraldas, leite em pó ou alimentação, tendo sido calculado com base nos dados fornecidos pelo Conselho dos Consumidores.

“Baseamo-nos no Conselho dos Consumidores face aos preços médios de artigos de bebé, pelo que estimamos custos semanais na ordem dos 900 a 1.300 patacas”, disse no programa.

Após uma análise preliminar, o Governo decidiu que as inscrições serão feitas através da plataforma da Conta Única de Macau, pois esta tem as informações essenciais dos pais e filhos. Hon Wai apontou também que as informações sobre a estrutura básica deste apoio já estão definidas, podendo ficar disponíveis na Conta Única.

“Prevemos que milhares de pais estejam abrangidos pelo programa e possam pedir o subsídio na mesma altura, pelo que o IAS precisa assegurar o funcionamento da plataforma e assegurar questões como a cibersegurança”, disse.

Estudo sobre creches

No mesmo programa, a chefe da Equipa de Trabalho na Área dos Serviços da Primeira Infância do IAS, Wong In Leng confirmou que o IAS vai estudar o panorama da procura pelo serviço de creches e as instalações disponíveis para crianças com idade inferior a dois anos.

Wong In Leng garantiu ainda que além de ser reforçada a formação para profissionais que tomam conta de crianças, vai ser feita uma avaliação externa a nível institucional a fim de assegurar a qualidade das creches.

A responsável concluiu que o IAS atribui anualmente mais de 240 milhões de patacas às creches subsidiadas, sendo que cada vaga é apoiada em 34 mil patacas. As creches oferecem mais de 900 vagas gratuitas.

Gaza | Hamas avisa que não vale a pena negociar nova trégua

Um alto funcionário do Hamas disse ontem que o grupo palestiniano considera inúteis, nesta fase, as negociações para uma trégua em Gaza, e apelou ao mundo para pressionar Israel a pôr fim à “guerra da fome” no enclave.

“Não vale a pena iniciar negociações ou examinar novas propostas de cessar-fogo enquanto a guerra da fome e a guerra de extermínio na Faixa de Gaza continuarem”, declarou à agência France-Presse (AFP) Bassem Naïm, membro do gabinete político do Hamas. “O mundo deve pressionar o Governo de Netanyahu para pôr fim aos crimes de fome, sede e assassínio” em Gaza, acrescentou.

As declarações surgem um dia depois de o Governo israelita ter anunciado uma nova campanha militar na Faixa de Gaza, que prevê a conquista do território. A Faixa de Gaza, onde os habitantes foram deslocados várias vezes, está sob um bloqueio de Israel desde 02 de Março e atravessa uma grave crise humanitária.

O porta-voz da Defesa Civil de Gaza, Mahmoud Baçal, afirmou ontem que três palestinianos foram mortos na sequência de bombardeamentos israelitas durante a madrugada em diferentes partes da Faixa de Gaza. O exército israelita retomou a ofensiva no enclave a 18 de Março, pondo fim a uma trégua de dois meses.

A guerra foi desencadeada pelo ataque sem precedentes do Hamas contra Israel a 07 de outubro de 2023, que causou a morte de 1.218 pessoas do lado israelita, na maioria civis, de acordo com uma contagem da AFP baseada em dados oficiais.

Das 251 pessoas raptadas, 58 continuam detidas em Gaza, 34 das quais foram declaradas mortas pelo exército israelita. O Hamas mantém também os restos mortais de um soldado israelita morto durante uma guerra anterior em Gaza, em 2014. A campanha de retaliação israelita fez pelo menos 52.567 mortos em Gaza, a maioria civis, segundo dados do Ministério da Saúde do Hamas, considerados fiáveis pela ONU.

Auditores de empresa de Macau acusados de falsificação de contas

Quatro auditores e consultores da Wellink CPA estão a ser acusados de terem falsificado as contas da Huarchi Global Group Holdings Limited, para que esta empresa de Macau conseguisse entrar na Bolsa de Hong Kong. O caso foi revelado ontem através de um comunicado Independent Commission Against Corruption (ICAC) de Hong Kong e está igualmente a ser investigado em Macau.

Segundo os resultados da investigação que decorria desde 2021, os auditores e consultores Lam Shui-mei, Siu Yuen-shan, Cha Wai-lun e Wong Yat-chung falsificaram as contas da empresa Huarchi Global, para que esta apresentasse um crescimento económico fictício e pudesse ser admitida na Bolsa de Hong Kong.

Além disso, os quatro pediram a ajuda de três familiares, identificados como Li Man-heung, Li Kit-chit e Wong Wing-man, para subscreverem títulos da empresa na primeira oferta pública. Segundo o Comissariado Contra a Corrupção (CCAC), que auxiliou o ICAC nas investigações, os envolvidos na compra de acções de receberam 1,5 milhões de dólares de Hong Kong.

Como consequência, os quatro estão acusados de dois crimes de conspiração para defraudar a Bolsa de Hong Kong, enquanto os três familiares estão acusados de um crime de conspiração para defraudar a Bolsa de Hong Kong. Os sete vão ser presentes ao longo do dia de hoje a um tribunal de Hong Kong. No entanto, o ICAC admitiu que as investigações ainda estão a decorrer e que poderá haver outras acusações.

Investigação em Macau

Em Macau, foram realizadas buscas na sede da Huarchi Global Group Holdings Limited, no Edifício Civil Plaza.

O presidente do grupo surge identificado no relatório anual da empresa de 2021 como Lou Cheok Meng. A identidade não foi confirmada pelo Comissariado de Corrupção de Macau, que num comunicado sobre o caso confirmou estar a correr uma investigação independente em Macau.

“A referida empresa de construção é uma empresa local de Macau e o seu responsável é também residente de Macau, pelo que o CCAC instaurou um processo de investigação na sequência dos respectivos indícios de crime”, foi comunicado. Além disso, o CCAC comunicou que o caso continua a ser investigado no território.

A Inteligência Artificial sobre o sexo em Macau

Fiz a experiência de perguntar à plataforma de inteligência artificial mais popular que temas sobre sexo, sexualidade e género fariam sentido discutir em Macau. A resposta trouxe três propostas que, embora não muito surpreendentes, achei interessantes. Claro que a plataforma usou alguma liberdade criativa e intelectual — que eu não lhe pedi — para inventar fontes, citações e pontos de vista. Basicamente, foi buscar o que já se sabe sobre Taiwan e Hong Kong, sobre a abertura crescente a temas LGBTQI+, e tentou fazer paralelismos com Macau. Mencionou o Arco-Íris de Macau/澳門彩虹/Rainbow of Macau como a associação mais ativa na defesa dos direitos LGBTQI+ no território, e até inventou entrevistas ao seu fundador, com citações fictícias.

A primeira proposta que a inteligência artificial sugeriu é sobre os jovens de Macau e a sua abertura a identidades de género não-binárias e plurais, como forma de navegar entre identidades culturais ocidentais e orientais, e acompanhar mudanças geracionais. No mundo inteiro temos visto um movimento de emancipação nesta área, com muitos jovens a discutirem estas questões abertamente. Se em alguns países as instituições e as políticas acompanham estas mudanças (e noutros até recuam), em Macau o fosso pode ser maior, tendo em conta a sua situação geográfica. Fui procurar estudos que aprofundassem o assunto e encontrei um que inquiriu jovens de Macau entre os 18 e os 25 anos. Os autores analisaram de que forma a adesão ao policulturalismo, a ideia de que as culturas estão interligadas e se influenciam mutuamente, se associa a níveis mais baixos de preconceito sexual, incluindo atitudes negativas em relação a pessoas LGBTQ+. O estudo sugere que a diversidade cultural de Macau, e a crença de que as culturas se misturam, pode criar uma predisposição para aceitar também a diversidade sexual. Mas diria que ainda é preciso explorar mais sobre estas questões, ouvindo testemunhos reais sobre as experiências dos jovens que vivem em Macau.

A segunda proposta — que eu já referi por aqui vezes sem conta — tem a ver com a falta de uma educação sexual acessível, inclusiva e focada em promover mais conhecimento e prazer, em Macau e no mundo. Se ainda há uns meses dei o exemplo de Hong Kong, onde se sugeria jogar badminton como forma de gerir a abstinência sexual, diria que Macau não está muito mais aberto a falar de sexo do que isso. Esta falta de discussão cria uma série de complicações que, pela ausência de dados na região, nem sabemos bem qual a verdadeira dimensão do problema. A ausência de uma educação sexual abrangente e inclusiva aumenta o risco de violência sexual, discriminação e propagação de infeções sexualmente transmissíveis.

A terceira proposta surpreendeu-me, porque é um tema em que raramente penso: o crescimento do turismo LGBTQIA+ na Ásia e a oportunidade que Macau tem de apostar neste nicho. Sendo a indústria hoteleira o pilar da economia de Macau, faria sentido abraçar esta oportunidade, como já fizeram a Tailândia e Taiwan, criando espaços LGBTQIA+, ou com eventos específicos, como as celebrações do mês do Pride. De acordo com alguns dados produzidos on-line, este tipo de turismo é rentável e está em crescimento.

A inteligência artificial até tem ideias interessantes, embora algo genéricas. Mas confesso que me agradou perceber que o algoritmo está afinado para defender os direitos de minorias sexuais e tem um discurso inclusivo. Torna-se perigosa, no entanto, quando começa a inventar dados e informação só para que o argumento soe bem. Ainda assim, em geral, pode ser uma ferramenta útil para discutir estas questões sem julgamento. Como a própria plataforma diz, tem o potencial de “combater mitos, difundir conceitos éticos e incluir perspetivas de grupos marginalizados, democratizando o acesso a uma educação sexual mais completa e positiva.” Nesta sugestão de criação de conteúdos, parecia alinhada com esses valores.

Se algum dia vai substituir o trabalho de pessoas como eu, que escrevem sobre estes temas, ou o trabalho de educadores sexuais… talvez ainda seja cedo para tirar conclusões. As pessoas sensíveis e pensantes ainda têm muito a contribuir.

Conferência de instrumentos musicais chineses em Mafra

A oitava edição do festival de música “Lisbon Conference Chinese Music and Musical Instruments” [Conferência de Lisboa da Música e Instrumentos Musicais Chineses] arranca hoje e decorre até domingo entre Lisboa e Mafra, sendo um evento apoiado e financiado por diversas entidades, incluindo ligadas a Macau, como é o caso da Fundação Jorge Álvares e Fundação Casa de Macau, entre outras.

Mais concretamente, hoje, amanhã e sexta-feira, 9 o evento decorre no Palácio Nacional de Mafra. O tema deste ano é “Expanding Horizons: Embracing the Wide Variety of Asian Music and Dance” [Expandir os horizontes: Abraçando a grande variedade de música e dança asiáticas].

A ideia é que nos próximos dias se fale e oiça não apenas música chinesa, mas também as sonoridades asiáticas e se conheça mais sobre os instrumentos musicais que emitem estes sons. Hoje decorre o painel “Traditional and Popular Performing Arts of Asia” [Artes performativas tradicionais e populares da Ásia], em que se falará da música folk chinesa graças à intervenção de Frank Kouwenhoven, investigador da Universidade de Leiden. Seguem-se três intervenções de académicos sobre as canções folk de Naxi, no Sudoeste da China.

Destaque ainda para o painel dedicado a Macau, nomeadamente “Macau: A Crossroads for Chinese and European Music” [Macau: Uma encruzilhada para a música chinesa e europeia], com intervenções de Xiao Ling Shao, que falará da “Arte da Música Portuguesa em Macau” e Enio de Souza, que fará uma “Abordagem aos Instrumentos Musicais nos Templos Chineses de Macau”. Destaque para a palestra protagonizada por José Pinto de Sá e Rui Magno Pinto sobre “Memória dos Concertos de Música Clássica Portuguesa em Macau”.

A parte musical acontece também hoje, a partir das 19h [hora de Lisboa], na Casa da Música Francisco Alves Gato, em Mafra, com um concerto com os músicos Supeena Insee Adler, François Picard e Je Jinhua, entre outros, com diversos instrumentos asiáticos.

Sons populares

Amanhã, quinta-feira, é a vez do debate em torno da música se fazer em Mafra, começando às 10h [hora de Lisboa] com três personalidades do Conservatório de Música de Xangai, China, que falam da “Investigação nas Teorias da Composição da Música Chinesa”. Segue-se a palestra de Rakesh Kumar, de África do Sul, que falará do “Afro-Indian Siddi Goma-Dhamal Performances: Bridging the Past and Present, the Local and Global” [Performances Afro-Indianas Siddi Goma-Dhamal: Trazendo o Passado e o Presente, o Local e o Global].

Novamente do Conservatório de Música de Xangai, China, surge Feng Changchun a falar da “Empatia através do Tempo e do Espaço – A Poesia de Li Yu e a Arte da Composição da Canção Chinesa Moderna”. Por sua vez, Maureen Russell, do Departamento de Etnomusicologia da UCLA – Universidade da Califórnia, Los Angeles, irá falar de arquivos musicais em “Sharing Soundscapes: The Bake / Jairazbhoy Digital Archive of South Asian Traditional Music and Arts”.

Este sábado, decorrem sessões paralelas na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa sobre a música chinesa e asiática em termos gerais. Um dos painéis versa sobre a História Musical Antes e Depois de 1949″, em que Zhang Xiaodong, do Conservatório de Música de Xangai, irá apresentar um “Estudo sobre o Desenvolvimento Histórico e Formatos de Performance do Yueqin”, instrumento de cordas chinês. Outro exemplo de palestra é a sessão protagonizada por Lisa Beebe, da Universidade de Wisonsin-Whitewater, sobre a presença dos instrumentos vietnamitas no Canadá.

Jonathan Stock aborda ainda o tema “Abordagem Temática e Multivocal da História da Música na República da China (1912-1949)”.

MUST | “Abraço do Amor” e outras obras, de Leong Kit Man, em exposição

A Universidade de Ciências e Tecnologia de Macau (MUST, na sigla inglesa) acolhe até domingo a mostra da autoria de Leong Kit Man, com diversas pinturas, onde se destaca a criação “Abraço do Amor”. Tratam-se de trabalhos financiados pelo Programa de Apoio a Jovens Talentos da Criação Artística do Fundo Nacional de Artes da China, na sua edição relativa a 2024, com curadoria de Julia Kwan

 

Leong Kit Man, jovem artista local, expõe a sua obra “Abraço do Amor” até este domingo na Universidade de Ciências e Tecnologia de Macau (MUST, na sigla inglesa). Trata-se de uma pintura de grandes dimensões, com 4,8 por 4,8 metros, resultado de um projecto artístico financiado pelo Programa de Apoio a Jovens Talentos da Criação Artística do Fundo Nacional de Artes da China de 2024.

Segundo um comunicado da MUST, esta é uma pintura onde flores e pássaros ganham destaque, rompendo “com a composição tradicional da pintura topográfica”.

Segundo uma nota da curadora, Julia Lam Tsz Kwan, a artista “une [na pintura] paisagens humanas e uma árvore centenária numa visão através de blocos de cores segmentados, com elementos diversificados, incluindo a árvore ancestral que simboliza o ciclo da vida, ninhos que simbolizam lares, criação de crias que representam a adopção e a herança, e placas votivas que evocam preces”. Todos estes elementos “significam crescimento humano”, lê-se na mesma nota.

Além deste grande quadro, o público pode ainda ver “seis pinturas originais de grande escala de flores e pássaros, a par de desenhos preparatórios, esboços e estudos de cor da artista”. A mostra inclui também “uma animação digital especial” enquadrada com a pintura “Abraço do Amor”. Este conjunto de trabalhos indica que “além da herança técnica, a evolução da pintura chinesa está em linha com o contínuo pioneirismo de novas expressões artísticas”. Todos estes trabalhos podem ser vistos de forma gratuita no quarto piso do Bloco R da MUST.

Questão de estilo

Na mesma nota, destaca-se que Leong Kit Man tem procurado, há mais de uma década, “fundir a pincelada meticulosa, ao estilo gongbi, com material com texturas, a fim de obter um estilo distinto, ao mesmo tempo que explora e expande infinitas possibilidades dos media [artísticos] orientais”.

De frisar que o estilo gongbi é, na pintura chinesa, sinónimo de detalhe e precisão na forma como os diversos elementos são retratados, a fim de dar uma noção de grande realismo a quem olha para as obras. Para este estilo de pintura são usados pincéis específicos a fim de obter determinados tipos de linhas e contornos, conforme o objectivo que o artista quer alcançar.

Mo Xiaoye, orientador da exposição e professor do Departamento de Belas Artes da Universidade de Ciência e Tecnologia de Zhejiang, afirmou que a peça “Abraço do Amor” representa “numa perspectiva única, a península de Macau vista de longe de Cotai”. Para o académico, esta pintura permite também “uma releitura altamente criativa e bem-sucedida do género de pintura topográfica de Macau, rompendo com os formatos convencionais”.

A própria artista explica que esta obra “tem como pano de fundo a paisagem urbana de Macau dramaticamente transformada 25 anos após a transferência [de administração portuguesa de Macau para a China], com uma árvore centenária como peça central a olhar para nós, que passamos por ela”.

Doutorada em Belas Artes pela Academia Nacional de Artes da China, artista, académica e curadora, Leong Kit Man é professora assistente de Belas Artes e supervisora de mestrado e doutoramento na Faculdade de Humanidades e Artes da MUST.

A artista teve ainda obras seleccionadas para a Exposição Nacional de Arte da China em 2014, 2019, e 2024. Destaque para a obra “Esplendor Efémero”, que foi escolhida para integrar a Exposição de Obras Selectas da Exposição Nacional de Belas Artes de 2019 em Pequim. A artista ganhou vários prémios na Exposição Anual de Artes Visuais de Macau.