Anabela Canas h | Artes, Letras e Ideias Iluminação ArtificialUma sombra nas palavras luz [dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]u queria falar do assombro. Mas entro em casa com a alma agitada por estes matizes de luz e sombra que as palavras não ajudam a acalmar. Queria falar do assombro e queria falar do deslumbre. Entro na casa. Numa determinada casa de mim, em mim. Esta. Num determinado momento – tantos iguais de ontem, tantos iguais de amanhã. E, sem dar contas ao tempo, a mim, a ninguém, do que isto é, que foi, que virá a ser, entro. E, de novo percorro os novos corredores de todos os dias. O dédalo que trago. Um projecto vascular. Conto e calo. A meada que se desenrola sem fim, a perturbação de sentidos únicos. E, sem querer nem resistir, no labirinto que me acompanha. Sem culpa, descaço os sapatos do dia percorrido. Largo a ponta do fio. E tento. Viver aí. Essa coisa etérea, de alma que vagueia pelos circuitos do sangue, pelos canais das lágrimas e pelos alvéolos pulmonares. Antes isso do que pelos corredores escuros da casa. Sem acender luzes. Aterroriza-me a escuridão. Mas não a sombra. Ou o que se instalou por alturas do assombro, caído de muito alto como se nada fosse nada. Ou que se imprimiu no soalho a desdizer passos seguros. Ou que desbotou de mapas antigos por efeito da humidade. Entro até aos confins de interiores não vistos. Quartos antigos, inexistentes e fechados. Entro por ela adiante – a casa – tão desconhecida da teia. Que se lhe acrescentou, que se lhe internou. No momento do deslumbre. Encandeada. Acendo uma luz baixa suave, confortável no seu desenho das sombras. E elas voltam, voltam as sombras. A luz a atenuar o excesso. A cegueira. Dominada por emoções de luz e sombra a encher palavras inadiáveis. E entro na casa do assombro que é minha. Sem domínio do mapa, nem dos passos que se estendem cuidadosos neste chão raso e plano. Direito e levemente cálido. Soalho a lembrar emoções mais soalheiras. Porque de luz e de sombra se faz todo o rol dos dias. De luz e de sombra. De sombras. O que dá a ver e demais, retira ao ver o ver. Recolho comigo o pouco ver à casa da escuridão. Acendo a luz. Ensombrada que estou, hoje, de palavras de luz e paradoxos de sombra. Porque não são os dias como dantes lineares de luz e escuridão às horas certas, é o que sei e não sei. E nada a fazer por hoje e amanhã. E ao fundo. Ao fundo de mim o bicho. Esperado. Inesperado e abusivo, que trago. Para dentro e de dentro de onde habita. Em mim e na casa de mim em que entro. Olho o corredor e bem fundo. De um lado a pré-história dos dias e do outro o dia é hoje. Não há que escolher. Penso, vou. No assombro. De quantos volts se precisa para iluminar o deslumbramento, o assombro? O que fascina, encandeia e encanta. O que perturba, maravilha e cega. Mas eu queria falar do assombro sem sombras. Do deslumbre à luz. Do Latim lumen. A negação da luz. A inundação. A raiz é implacável à palavra. Uma e outra. O assombro extasiado a encobrir-se na raiz invasora do latim, “umbra”. Assombro. Na forma regressiva de assombrar. Como voltar ao avesso do que nos assombra. De nós mesmos, aí. A interpretar, espaço irreprimível do pensamento a percorrer. Já os gregos antigos. E o seu espanto e assombro pela palavra transmitida. E em busca de tradução. O maravilhoso que nos suspende o olhar e o cobre de desconhecido. De sombra para reflectir. E retomar a luz. Talvez seja preciso um dia de sol como o de hoje, para mergulhar fundo e negro no abismo do assombro. Na entrada do labirinto. Tapete mágico que, de imediato, catapulta para o seu cerne de desorientação. Atracção do vórtice. Com sorte, para aquele braço de acaso em que luz a labareda de um fogo térreo, que aquece o monstro que o habita. Cabisbaixo, apanhado de surpresa. Pequenino como se visto de muito longe e encolhido para reter o calor da chama esquálida que na rarefacção de oxigénio, ameaça extinguir. O lado que desvanece. A um deslumbre sombrio sucede uma pertença a cuidar. Chegando lá por entre as paredes do corredor. Um a fazer-se cada vez mais difícil de amar. O outro, a amar cada vez mais. É assim o labirinto. Pontuado de luzes. Pálidas e pontuais. A escuridão é ausência. Terror. Nada. Está sol. Da admiração, também assombro do olhar. Essa atracção fatal pela problematização pela não indiferença. O movimento irreprimível produzido pela coisa admirada. De simples a complexa. De iluminada a escura, ou vice-versa. E no fim o conhecimento do vasto desconhecimento, invisível antes. Eu queria falar do assombro e sento-me nele com a eterna disjunção estudante. E depois queria falar da eternidade que é o que sobra desse assombro que tolda a vista por excesso de luz e escuridão. Essa intermitência demasiado veloz. A esta escala, de ínfima concavidade cósmica, de pessoa num pedaço de rocha insignificante. Numa outra, astronómica pode ser um nada no todo. De tantos minutos-luz. Os que não vivo, vivi, ou vou viver. Como uma sequência demasiado rápida de fotogramas numa escura sala de cinema. Estou naqueles fotogramas extraídos de algum lugar em mim para que sejam visíveis. E vejo-me de costas para mim, assaltada do assombro daquele conjunto. Mas na matemática a qualidade de um conjunto em si é irrelevante. O que conta – conta uma história. E o que conta é a relação entre cada elemento do conjunto e outros do mesmo conjunto. Como um álbum de fotografias – uma vida. Arrumadas por tempos, por pessoas, por viagens, por épocas, parentescos, celebrações, estáticas sensações que um dia nos assaltaram. E um dia rearranjando tudo aquilo, misturando até se quebrar qualquer fio condutor, juntar lado a lado imagens que nunca conviveram. Como discretas e tímidas solitárias a estabelecer relações inevitáveis de vizinhança induzida … e criar-se ia uma memória diferente de uma vida diferente de uma pessoa diferente. Re-cordis, de novo o Latim: recordar, voltar a passar pelo coração, fio a fio. Fiar uma outra memória. Diferente. “Um acontecimento vivido é finito, ou pelo menos encerrado na esfera do vivido, ao passo que o acontecimento lembrado é sem limites, porque é apenas uma chave para tudo o que veio antes e depois.”. W. Benjamin em tradução livre, em usurpação livre em descontextualização livre. Poder mudar a chave. Ou então ainda ele: “A verdadeira imagem do passado perpassa, veloz. O passado só se deixa fixar como imagem que relampeja irreversivelmente, no momento em que é reconhecido.”. E às vezes torna-se estranho, acrescento. Tiro os óculos de ler e de ver. Volto à memória. Volto ao assombro, uma noção de belo terrível, consubstanciado em si mesmo, sem eira nem ética nem beira. Antes uma estética de luz e sombras. De padrões difusos e permanentemente reajustados. Ao tempo. Desajustados de todo o tempo. Pares de conjuntos disjuntos aqui e ali. Com as suas intersecções de vazio. Ou ilusões de um olhar demasiado aproximado. Talvez. Ou demasiada luz. E, por coincidência do universo a querer, apesar de tudo, dar-me respostas pelos olhos adiante, olho o ficus que me acompanha o olhar há mais bem mais de uma década. E são idênticas as circunstâncias de luz e o sombreado das portadas, a tantas outras tardes. Mas, pela primeira vez, vejo uma linha sinuosa de folhas azuis. Literalmente azuis, como nunca as tinha visto. Uma linha sinuosa a fugir com a luz. Sinuosa e depois mutante. De passagem. Que tento reter. E porque são lustrosas reflectem o que a elas não pertence – não? Como muitas impressões que assaltam os dias. Construindo, destruindo. A força das palavras, sempre. Lembro-me “Da fábrica que falece…” da primeira vez que li o título. De Francisco d’Olanda. A impressão forte da palavra. Falece. Mas era construção que faltava à cidade. À vida é isso que falta. Fazê-la. Dia a dia sem estoicismo vão face ao destino que parece, esse sim, por vezes, edificado e convicto em fazer-nos falecer a vontade. Em demolir a construção do que nos falece. Dia após dia. O ruir com ajuda. Ruidosa térmita. E só apetece dizer: pára. Pára tudo. Por momentos, que seja. Ou a explicação das trevas. A luz sobre o indizível que chega ao horror e volta. Porque nos apontam armas. Devia ser proibido. Coloco as cartas sobre a mesa. Como para ler. A sorte. Minto. São fotografias retiradas à pressa dos seus lugares fixos, para que o seja sem hesitações. Perdidas, desorientadas da cronologia unívoca. Descidas dos seus andares e trocadas de casa. Num rodopio sem reservas. Inocentes. A mergulhar noutra vida. Outras vizinhanças e amores. Parentescos, dias. A tentar refazer a memória. Testar. Porque do deslumbre nasceu o meu monstro e o seu labirinto habitado. Nada a fazer. Como falar de luz sem sombras. Como falar do assombro desassombradamente ou como contemplar o etéreo sem contemplações. É coisa que não faz menos sentido do que atribuir carinhosamente a cada luminescência a sua dose natural de sombra difusa. A cada luz em cru a sua forma inevitável de produzir sombra. Recortada à faca. Na intempérie de emoções mais fortes. Volto-me para olhar os bichos. Bichos sedosos, naquele evoluir de minúsculas patinhas a ondular ligeiramente o corpo de estrias a negro, na caminhada que é longa. Para eles. Fugidos da caixa dos sapatos. O chão enorme. E noutro dia, casulos nos cantos das paredes nas costas das cadeiras. Nos braços do corredor. Do labirinto. E de súbito: umas asas pequeninas, gigantescas. A ver dali. A desembaraçar-se do pequeno constructo de fios sedosos e temporários. O céu a abrir-se. Perguntei queres vir? Respondeu naquele olhar turvado e imerso. Imenso. Fiquei. Abracei-me à fera que nem sentiu. Que se visse. A inércia do peso, difícil de mover. Por isso a fera é fera e o monstro é monstro e ambos são recém- nascidos todos os dias. Mas nascem já grandes. Lanço na mesa a criança que ainda é memória. Um combate de titãs em teoria. Duas desrazões que estão bem na balança prévia ao combate. Fico ali enroscada a ele. Se deixou é com ele. A batalha. Não em mim. Talvez abraçar o monstro liberte borboletas. Como bolhas de champanhe. Sei lá. As crianças não bebem. Volto. Não é dia, que não de assombro. E da confusa impressão dessas sombras, delineadas e sobrepostas. Nem tentativa nem erro. Olhar o assombro na sua versão acabada de nascer. Frágil monstro encolhido no seu canto. E ansiosamente aquietar e aquecer em mim esse corpo de gigante perigoso e ínfimo. A cada um a sombra do tamanho que os olhos conseguem alcançar. É isso. A existência nunca foi uma ciência exacta. Encaminho passos irresistíveis afinados por um magneto. E contemplo-o ali. No fim do corredor. É tarde. Apago a luz. E “sub umbra floreo”.
José Simões Morais h | Artes, Letras e IdeiasOs diamantes da Condessa [dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]eixamos o final da história da Madame Paiva para, envolvendo o período de tempo da vida de Pedro Alexandrino da Cunha, rematar os acontecimentos ocorridos no século XIX na Europa. A estadia em Paris de Thérèse Esther Blanche Lachmann (1819-1884) ocorreu durante a governação da França por Louis-Philippe I (Luís Filipe de Orleães, 1830-1848) e Napoleão III (1852-1870), que em 1840 ao tentar depor Luís Filipe foi preso. Terceiro filho de Luís Bonaparte e sobrinho de Napoleão Bonaparte, fugindo da prisão regressou a França após a Revolução de 1848, restabelecendo o Império em 1852. Com a chegada ao poder, Napoleão III nomeou em 1852 Georges Eugène Haussmann, o Barão Haussmann, como Perfeito do Seine para modernizar Paris. Ano em que Thérèse vivia com o suposto marquês, Albino Paiva de Araújo o seu segundo marido, a quem dera dinheiro em troca do seu grau nobiliário, quando numa noite de ópera foi apresentada, pelo cônsul alemão Félix Bamberg, ao conde Henckel von Donnersmark. “Herdeiro duma antiga família, com valiosas minas de zinco, ferro e carvão na Silésia [subúrbios de Munique], este belo e jovem de 22 anos, onze anos mais novo do que ela, logo caiu de amores pela deslumbrante marquesa”, assim refere o Padre Manuel Teixeira. Esta, a princípio com ele jogou, divertindo-se com a sua enfatuação. Guildo, desesperado, fugiu para Berlim e ela, reconhecendo o ambiente de segurança financeira que este lhe poderia oferecer, foi ter com ele. Daí “foram para Neudeck, regressando a Paris, onde, em 2 de Dezembro (1852), o príncipe Luís Napoleão recebeu o título de Imperador Napoleão III”, segundo Flectwood-Hesketh, que refere, em 1853 estar já o Paiva fora da vida de Thérèse, “Ela partilhava com Henckel o entusiasmo pela música, sobretudo de Richard Wagner, assíduo visitante”, da sua casa em Paris no lugar de S. Jorge. Em 11 de Julho de 1855, a Madame Paiva “comprou por 406 640 francos a área 25 da Avenida des Champs Elysées. Este distrito estava, sob Haussnann, a suplantar o Faubourg St. Germain como centro da moda”. Então “contratou Pierre Maugin como arquitecto com uma hoste de pintores – Ernest Hébert, Gérome, Eugène Thirion e Paul Baudry; escultores – Barrias, Dalou, Carrier-Belleuse; e decoradores – para adornar” o interior do que ela pretendia que fosse a casa mais sumptuosa de Paris, segundo Flectwood-Hesketh, que refere ter-se mudado para lá só em 1866, “inaugurando-a com uma calorosa recepção que incluía toda a vida literária, artística, política e diplomática de Paris”. Em 1867, ou no ano seguinte, ainda o casal comprou uma casa de campo em Pontchartrain. Após a guerra franco-prussiana “Sabe-se que aquela aventureira – tão famosa no bosque de Bolonha como na fria Avenida de Lichtenthal – pôs em jogo os mais hábeis artifícios da táctica feminina e representou um papel de primeira ordem na obra tenebrosa de investigação clandestina e permanente que os alemães praticaram em França durante a época em que governava Badinguet (…). E sabe-se mais, que no seu faustoso palacete dos Campos Elísios se centralizou o serviço de espionagem alemã”, segundo refere Pinto de Carvalho, em Lisboa d’ Outros Tempos. “Como era alemão e amigo de Bismarck, Guido teve de ir para a sua terra durante a guerra [franco-prussiana] de 1870, e Teresa, envolvida em intrigas políticas, foi com ele”, segundo Flectwood-Hesketh, que adita, “A sua hostilidade à França durante a guerra havia tornado Guido e Blanche antipáticos em Paris; por isso, retiraram-se para a Alemanha, para o seu castelo de Neudeck, que eles haviam feito reconstruir à maneira francesa por Hector Lefuel, arquitecto de Louvre”. Jorge Forjaz refere “Ainda viveram algum tempo retirados na Silésia, mas assinada a paz franco-prussiano, ele foi nomeado governador da Alsácia-Lorena. Regressando à vida social, impôs a amante nos salões de Estrasburgo e Paris, e provocou um escândalo tal, que ia levando a um conflito diplomático. Em 1875 resolviam o problema, casando na Prússia”. Ano que não se ajusta, pois então não seria já necessário a anulação pelo Vaticano do seu segundo casamento, devido a ser ela desde 1872 pela segunda vez viúva. Nas palavras do Padre Manuel Teixeira, “Tendo obtido do Santo Ofício a anulação do seu casamento com o <Marquês> de Paiva (segundo Flectwood-Hesketh a 16 de Agosto de 1871) a aventureira consorciou-se pela terceira vez com o Conde Henckel de Donnesmark” em 28 de Outubro. Guido Georg Friedrich Erdmann Heinrich Adalbert Graf Henckel von Donnesmark, nascera a 10 de Agosto de 1830 em Breslau e morreu em Berlim a 19 de Dezembro de 1916. Foi um nobre alemão, magnata industrial e um dos homens mais ricos do seu tempo. Esther Blanche Lachmann casada em terceiras núpcias com o conde Donnesmark, em 1875 saiu de Paris para o seu castelo de Neudeck, perto de Tarnovitz, na Silésia. Entre 1878 e 1883 Blanche fez grandes investimentos em jóias, gastando uma imensa fortuna na Casa Boucheron, tendo uma dessas peças, com quinze diamantes e outras tantas esmeraldas, em 2007 sido leiloada por um milhão e novecentos mil euros, o que veio reavivar o interesse sobre esta obscura personagem. Com 72 anos, dizem uns, e com 58, diz o marido, “morreu em 1885, no seu Castelo de Newdeck – rica e condessa, mas os jornais parisienses ao noticiarem o acontecimento lembraram que, por de trás daquele título nobiliárquico, estava a famosa Madame de Paiva, que enchera as colunas sociais de Paris com o seu nome do casamento com um macaense rico e infeliz”, segundo Jorge Forjaz. Já Flectwood-Hesketh refere, “Blanche morreu lá em 21 de Janeiro de 1884 duma doença de coração e de cérebro, ‘rica e respeitada’ por alguns, mas considerada por outros como aventureira baixa e sem princípios (possivelmente até uma espia), que só adorava o dinheiro; e ainda que consciente do seu sex appeal para os homens, não possuía humor e era fria. No entanto, guardou até à morte o sentimento de adoração pelo seu terceiro marido. Pontchartrain foi vendida logo após a Guerra Franco-Prussiana, mas não a casa de Paris, que Guildo tencionava remover, pedra por pedra, para Berlim, por razões sentimentais, projecto que não se materializou. Após a morte da sua amada, Guildo casou com Catarina de Slepsow, 32 anos mais nova do que ele, de quem teve dois filhos. Vendeu em 1893 o Palácio Paiva nos Champs Elysées a Soloschin, banqueiro de Berlim” e “em 1900, Cubat, cozinheiro-chefe do Kaiser, montou lá um restaurante, mas não deu resultado”. A proposta para aí se instalar a Câmara do 8.º Arrondissement não se materializou e em 1901, ano em que Guido ficou príncipe, foi vendido” e acabou por fim nas mãos do Travellers’ Club de Paris, fundado por um grupo de ingleses ali residentes, que em 1904 tornaram o Palácio Paiva na sua sede. Esta história termina no Castelo de Newdeck com Guido, então de novo casado, a permanecer durante longas horas num dos quartos, que ele mantinha sempre fechado. Certa vez, esquecendo-se da chave na fechadura, a sua esposa curiosa, ao entrar, deu um salto ao deparar-se com o corpo da Madame Paiva, a famosa judia, bastarda, espia, três vezes casada, muitas outras amancebada e esbanjadora de fortunas, ali guardado em formol.
Isabel Castro VozesOs mal-agradecidos [dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]hamando os bois pelos nomes: sabemos todos perfeitamente que, em Macau, há duas ou três características que contribuem de forma significativa para o sucesso profissional. Entre as mais relevantes encontra-se a quantidade de tios e primos e maridos e mulheres em cargos importantes. Nos dias que correm, pesa também muito o facto de se ser portador de um cartão de plástico, feito de material inteligente de cor esverdeada, que garante o gozo à residência. Gente da terra e de boas famílias é o que se quer à frente (e atrás) das coisas de Macau, públicas e privadas. São atributos que, claro está, dão a quem os tem capacidade de visão, sagacidade e inteligência. Se a eles juntarmos um master feito num gueto universitário no estrangeiro, teremos um doutor. Um doutor talentoso de uma competência inquestionável, à prova de ideias alheias e novíssimas correntes de pensamento e acção. Por confiar muito nos nados e criados na cidade, filhos de bons pais e boas mães, quem manda não tem grandes preocupações. As coisas fazem-se ao ritmo do calor, quem manda também é filho de boa gente e é filho da terra, o que importa é que hoje estamos todos melhor do que antes, haja patacas para distribuir, sejam gordas as estatísticas e os yum-chas, que o resto logo se vê. E foi assim que os anos aconteceram. E foi assim que, entre regulamentos administrativos, circulares internas e leis complicadas, se foi decidindo a cidade. Se tem lei faz, se não tem lei espera. Se está na lei pode ser, se não está pode ser também, mas diferente. Se tem poder obriga, se não tem poder vira as costas e vai embora falar com os amigos. Se tem dinheiro compra, se não tem dinheiro arranja, que ele abunda por aí. Há alturas em que tenho dificuldades em acreditar no que leio. Esta semana houve alguém que trabalha no Instituto Cultural que relativizou a importância dada ao Porto Interior e à preservação dos edifícios daquela área do território. Macau nasceu em Mong Ha e nasceu ali naquele porto, foi por ali que se chegou e se foi embora. Ao longo de séculos, eram de todos os lados. Entre os que vieram estão os antepassados daqueles que se dizem da terra, como se a terra fosse pertença de alguém. É uma história demasiado batida: alguém avisa e está inacreditavelmente só no aviso. Quase que cai no ridículo por pensar de forma diferente, tão espantadas e escancaradas são as bocas perante o alerta. Depois, quase que como por magia, outras almas juntam-se à prece, fazem-se duas ou três petições e alguém manda parar a grua quando metade da casa já veio abaixo. Ou então não. Tenho a sorte de ter nascido num país que rebenta história pelas costuras, apesar de as ganâncias imobiliárias terem contribuído para desfigurar várias urbes. Nas cidades onde vivi, não faltam pedras antigas para falarem do início de tudo. É também por causa das portas velhas que sei de onde sou sem que ninguém me tivesse enfiado um compêndio de história entre as orelhas. Tenho ainda a sorte de ter nascido num país de portas mais abertas do que as da terra onde hoje vivo. Quando não se sabe ou se quer diferente, vai procurar-se noutro lado. E foi assim que se fizeram hospitais, universidades, centros de investigação, casas para as artes. Com os de lá e de todos os outros sítios, pensou-se no que se quer ser porque não existem dúvidas sobre o que se é, tão fortes são as marcas do passado. Quem é de cá, independentemente da quantidade de passaportes que guarde em casa, deve ter o direito a saber de onde vem, a sentir de onde vem, apenas por aquilo que vê, cheira e toca. Deve poder mostrar aos filhos e netos e bisnetos e todos os outros que estão para vir os pedaços de chão na origem deles, na origem deste mundo que começou ali à beira-rio.
João Luz Perfil PessoasMiguel Canuto, técnico de equipamentos electrónicos de vigilância | Testemunho histórico [dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ão raras as pessoas que se misturam, inadvertidamente, com a história de uma cidade, mas Miguel Canuto é uma delas. Chega a Macau, em circunstâncias trágicas, em pleno Motim 1-2-3, é pai da última menina portuguesa nascida antes da transição e assiste à primeira sessão plenária da Assembleia Legislativa depois da transferência. No fundo, Miguel é a Macau dos últimos 50 anos, nascido de uma mistura de culturas, tal como a cidade onde mora. Filho de mãe macaense, com avó materna chinesa e avô mexicano, e pai português com uma costela inglesa, é a personificação da cidade multicultural onde vive há mais de 20 anos. Nascido em Díli, fruto da incerteza geográfica de ter um pai militar em comissão no antigo Ultramar, cedo conheceu Macau, pelas piores razões. Na sequência da morte do pai em solo indonésio da ilha de Timor, vê-se na iminência de partir para Macau, terra da sua mãe. Tinha, na altura, dois anos e o Motim 1-2-3 tinha acabado de rebentar. Foi a primeira vez que tropeçou na história do território. Esteve por cá pouco tempo, e foi para Portugal com a mãe e os irmãos. Passados 30 anos retorna a Macau. “Foi um regresso às origens, embora em Portugal tivéssemos muitas visitas de familiares chineses”, revela Miguel, que sentiu alguma nostalgia na altura de voltar a pisar o solo de Macau. Estabeleceu raízes por cá e teve o seu segundo rebento em Macau, a filha Rita, que nasce envolta em simbolismo, uma vez que foi a última menina portuguesa a nascer no território antes da transferência de Administração. “Para a minha mãe foi o fechar de um ciclo ver a neta nascer em Macau”, conta. Passados oito dias, Miguel assiste à primeira sessão plenária da Assembleia Legislativa, depois da transferência de Administração, onde trabalhava na altura. Corria o dia 19 de Dezembro de 1999. “Foi uma sessão histórica, votaram-se os princípios básicos e lembro-me bem do nervosismo de alguns deputados”, recorda Miguel. “Sentia-se uma alegria natural, as pessoas estavam felizes e foi algo que também me contagiou, foi memorável, algo de que nunca me vou esquecer.” Legado de cultura Miguel, que assistiu ao desenvolvimento de Macau desde a década de 1990, é um homem que gosta de pensar no passado da cidade. Identifica dois momentos de grande impulso em Macau. Primeiro quando “Stanley Ho vai a Portugal e promete a Salazar que, caso a concessão do jogo lhe seja dada a ele, investe o dinheiro em Macau”, promessa que é cumprida, e depois, mais tarde, a liberalização do jogo. Além da biologia que se nota na fisionomia dos macaenses, Miguel Canuto vê o verdadeiro legado português na cultura e na língua. Aliás, uma das riquezas que reconhece em Macau são as pessoas que conheceu na comunidade macaense e o convívio com gentes de outras culturas. Outra das oferendas é a própria cidade. “Gosto muito de me perder por cá e, às vezes, faço de propósito por isso”, conta. “Em Macau estamos sempre a conhecer coisas novas, podemos cá estar uma vida inteira e temos sempre coisas para apreender, é uma questão de saber procurar”, revela. Quanto mais tempo passa por cá, mais compreende que vive num local com uma cultura vastíssima. “Uma só vida não dá para assimilar tudo o que a China tem”, contabiliza o português. Aliás, Miguel Canuto vê um paralelismo entre os vários povos do Interior da China e os povos do Interior de Portugal, que são “pessoas muito curiosas, ao princípio, mas depois muito afáveis se as tratarmos com educação”. No entanto, Miguel gostaria de ver um aspecto melhorar em Macau: a forma como os jovens que vão para fora estudar são tratados pela cidade. “Isto é uma crítica construtiva, mas há que criar condições para chamar de regresso os jovens e não perder essa mais-valia”, explica. No entender de Miguel Canuto, grande parte da riqueza de Macau não se esgota nos casinos, mas estende-se às suas gentes. Como tal, gostaria de ver formados quadros que saíssem fora do âmbito do funcionalismo público, da advocacia e das profissões relacionadas com a construção civil. “Precisamos de bons arqueólogos, historiadores, investigadores em química, farmácia, biologia, assim como bons escritores e pessoas do mundo do espectáculo”, aponta Miguel Canuto, um homem que sabe ler a cidade e que, de certa forma, a personifica.
Hoje Macau China / ÁsiaFilipinas | Pelo menos 174 mortos em combates entre extremistas e exército [dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ubiu para 174 o número de mortos em combates na cidade de Marawi, no sul das Filipinas, entre grupos extremistas ligados ao Estado Islâmico e o exército, informaram ontem fontes militares. O tenente-coronel Jo-ar Herrera, porta-voz da 1.ª Divisão da Infantaria, declarou aos media que pelo menos 120 islamitas foram abatidos enquanto 25 efectivos governamentais perderam a vida em acção. O ministro de Defesa filipino, Delfin Lorenzana, confirmou ontem que pelo menos outros 10 soldados morreram durante um ataque aéreo lançado pelo próprio exército, o que eleva o número de baixas governamentais para 35. Os números oficiais também dão conta da morte de 19 civis, enquanto o porta-voz do Comité de Gestão de Crises da província de Lanao do Sul, Zia Alonto Adiong, disse à agência Efe que “o número de baixas civis rondará uma centena”. Entre 50 a 100 extremistas do grupo Maute, ligado ao Estado Islâmico, permanecem no centro da cidade e usam mulheres e crianças como escudo humano, disse em conferência de imprensa o porta-voz do exército Restituto Padilla. Os combates começaram no dia 23 de Maio com o fracasso de uma operação militar para capturar Isnilon Hapilon, líder do grupo extremista Abu Sayyaf, também com ligações ao Estado Islâmico, e que estava a ser protegido por membros do grupo Maute. Os extremistas contra-atacaram com o objectivo de tomar parcialmente a cidade e pegaram fogo a uma esquadra da polícia, uma prisão e uma igreja, de onde sequestraram um padre e 13 paroquianos, que mantiveram cativos. O exército recuperou desde então 90% da população e tenta eliminar “pequenos grupos de resistência” escondidos atrás de um número indeterminado de civis.
Hoje Macau China / ÁsiaLi Keqiang diz que combate às alterações climáticas é “consenso global” [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, disse ontem que o combate às alterações climáticas é um “consenso global” e uma “responsabilidade internacional”, face à possibilidade de os Estados Unidos se retirarem do Acordo de Paris. “As nossas palavras têm peso e as nossas acções devem alcançar o êxito”, disse Li, numa conferência de imprensa em Berlim, ao lado da chanceler alemã, Angela Merkel. O responsável chinês recordou que o seu país teve um papel activo no processo de negociação do acordo e foi um dos primeiros a levá-lo ao parlamento para ser ratificado e a apresentar nas Nações Unidas as medidas que planeia implementar. “A China é um grande país e assume a sua responsabilidade internacional”, realçou. Em Pequim, a porta-voz do ministério chinês dos Negócios Estrangeiros Hua Chunying afirmou também que a China vai trabalhar com a União Europeia (UE) para manter o Acordo de Paris contra as alterações climáticas, mesmo que se confirme a retirada dos EUA. O aquecimento global é um “desafio global” que nenhum país pode ignorar, afirmou Hua. “Não importa as mudanças nas posições de outros países, nós vamos manter um modelo de desenvolvimento sustentável”, afirmou. O Presidente norte-americano, Donald Trump, deve estar prestes a anunciar a sua decisão sobre a retirada dos EUA. Caminho conjunto A China é o maior emissor mundial de gases com efeito de estufa, seguida pelos EUA. Ambos os países foram elementos chave para a conclusão do acordo em Paris, em 2015, que foi assinado por 195 nações. Trump afirmou anteriormente que as alterações climáticas são uma “farsa” criada pela China para danificar a economia norte-americana, numa posição que desafia um consenso cientifico alargado. Na sexta-feira, o primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, vai abordar o acordo em Bruxelas, durante um encontro com líderes da UE. “Desejamos trabalhar com a UE para reforçar a nossa comunicação e cooperação prática nas alterações climáticas”, disse Hua. Questionada sobre qual o tipo de intercâmbio que os líderes chineses têm tido com Trump sobre a sua decisão, Hua afirmou apenas que a China e os EUA “têm mantido uma comunicação próxima a vários níveis”, incluindo na questão das alterações climáticas.
Sofia Margarida Mota PolíticaHabitação pública | Governo acusado de desperdiçar recursos O deputado Au Kam San considera que o Executivo é o primeiro a desperdiçar fracções de habitação pública, dando como exemplo as fracções sociais cujas rendas triplicaram, obrigando os moradores a sair. Contudo, o Instituto da Habitação não as arrendou de novo [dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] mais um rol de críticas ao Instituto da Habitação (IH). No plenário de ontem da Assembleia Legislativa (AL), o deputado Au Kam San acusou o organismo de ter diversas casas sociais vazias. “Quem mais desperdiça habitações públicas é o Governo”, começou por dizer o deputado, no período de interpelações antes da ordem do dia. Au Kam San referiu que, depois da implementação de um plano de aumento das rendas das casas sociais, os valores triplicaram, o que obrigou vários arrendatários a deixarem as fracções. Muitas chaves foram devolvidas ao IH, “mas quase nunca se viu o IH a arrendá-las novamente”, apontou. Au Kam San considera que o Governo optou por deixar as casas vazias, o que considera “inadmissível”. O período de interpelações de antes da ordem do dia serviu ainda de palco para outros deputados apresentarem as suas queixas relativamente à habitação pública. Kwan Tsui Hang pediu um planeamento antecipado para os terrenos que podem vir a ser recuperados pelo Executivo. “O Governo vai recuperar cada vez mais terrenos: os que não estão aproveitados, os que estão relacionados com subornos e outros ocupados ilegalmente.” A deputada alerta ainda para a estagnação da oferta de habitação pública, com valores nulos de atribuição, entre 2005 e 2010, numa fase em que “as rendas tiveram uma subida louca e em flecha”. Kwan Tsui Hang lembrou que só recentemente é que o Executivo divulgou o arranque da construção de cerca de 3500 fracções. No entanto, “a quantidade e o ritmo da referida construção não conseguem dar resposta às necessidades da sociedade”, disse. Candidaturas distantes Au Kam San quis também saber quando abre um novo concurso para as candidaturas à habitação pública. Para o deputado, “não passa de mera retórica” o facto de o Chefe do Executivo ter dito que as novas candidaturas só avançam após o planeamento dos terrenos da Avenida Wai Long. “O método de só avançar com o concurso quando a construção já está em curso só se aplica à habitação económica e não à social”, acrescentou. Por outro lado, “há sempre quem defenda que as candidaturas à habitação social devem ser regulares, tal como acontece com outros serviços prestados pelo Governo”. Já Ng Kuok Cheong pediu que as casas de Macau sejam para os locais. Para o deputado, a questão tem que ver com o aproveitamento dos novos aterros. Apesar das promessas do Executivo sobre a construção de mais de 50 mil habitações públicas nos novos aterros, o deputado considera que não há garantia de que estas fracções sejam efectivamente destinadas aos residentes. Para que haja certezas, Ng Kuok Cheong sugere que o Executivo implemente medidas que garantam o destino destas habitações a residentes permanentes.
Sofia Margarida Mota PolíticaSi Ka Lon pede integração das creches no ensino público gratuito [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] deputado Si Ka Lon pediu ontem ao Executivo que as creches do território passem a estar sob a alçada da Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ). A razão, apontou ontem Si Ka Lon durante o período de antes da ordem do dia na Assembleia Legislativa, tem que ver com a necessidade de dar mais importância à vertente educativa destas instituições, para que possam ser abrangidas pela escolaridade gratuita. O objectivo é a redução da pressão económica nos jovens casais. Para Si Ka Lon, trata-se de uma medida que pode contribuir para um fomento real de um ambiente favorável às crianças no território. O deputado salientou que, apesar das medidas anunciadas pelo Governo para promover “o nascimento saudável e o aumento da respectiva taxa”, Macau continua a não ultrapassar uma das maiores dificuldades sentidas pelos pais trabalhadores: “Conseguir inscrever os filhos numa creche”. “Como [os pais] têm de trabalhar, se não podem deixar os filhos ao cuidado dos avós ou parentes, só os podem entregar às creches”, referiu o deputado. Si Ka Lon recordou que, de acordo com informações disponibilizadas no ano passado, as creches de Macau tinham cerca de 8600 vagas, sendo que o Governo terá garantido que, para este ano, o número aumentaria para as 10 mil. No entanto, olhando para os nascimentos registados entre 2014 e 2015, o número já ultrapassou os 14 mil. O resultado é óbvio: “Nalgumas creches financiadas pelo Governo são 30 crianças a disputar uma vaga”, enquanto nas creches privadas “o preço é elevado, podendo chegar a mensalidades de 3700 patacas, ou seja, duas vezes mais caras que as creches financiadas”, ilustrou Si Ka Lon. A mensalidade de uma creche privada em Macau pode ainda atingir as nove mil patacas, sendo “mais cara do que a propina das universidades”. A solução passa pela integração das creches na DSEJ. Hoje em dia, é o Instituto de Acção Social que trata desta matéria.
Hoje Macau PolíticaLínguas oficiais: Mak Soi Kun quer comissão a analisar leis [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] deputado Mak Soi Kun recorreu ontem ao período de antes da ordem do dia, no plenário da Assembleia Legislativa (AL), para pedir a criação de uma comissão que analise todas as leis em vigor no território e eventuais disparidades que possam existir entre as duas línguas oficiais. “Gostaria de sugerir que fosse criada uma comissão especializada para, quanto antes, verificar a correspondência das versões das leis, em português e em chinês. É, pois, através desta verificação, enquanto forma de remedeio e correcção, que se vai conseguir apurar se igual situação também acontece noutros diplomas e se alguns direitos e interesses legítimos dos residentes terão sido afectados na aplicação das leis ou políticas, por essas mesmas razões”, disse no hemiciclo. Esta questão surgiu no âmbito da alegada existência de divergências entre as versões portuguesa e chinesa do regime eleitoral da AL. Para o deputado, “esta pode ser apenas a ponta do icebergue, pois não se sabe se a desconformidade entre essas versões também acontece noutros diplomas legais”.
Sofia Margarida Mota Manchete PolíticaPrevidência central | Proposta de lei aprovada com reparos O regime de previdência central não obrigatório foi ontem aprovado na especialidade. O diploma, contudo, não reuniu consenso. Deputados e Governo discordaram quanto à incidência das contribuições [dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]oi ontem aprovada na especialidade o regime de previdência central não obrigatório. No entanto, o debate ficou marcado por algumas divergências entre deputados e Governo. O valor de incidência das contribuições de patrões e trabalhadores esteve no centro da discórdia. De acordo com a proposta de lei, “as contribuições para os planos conjuntos de previdência são mensais e têm como base de cálculo o salário de base do trabalhador referente ao mês em causa”. Para alguns dos deputados, a designação de salário não se mostrou justa e Ella Lei manifestou-se contra esse artigo do diploma. Para Ella Lei, a terminologia da proposta apresentada deve ser mudada de “salário” para “remuneração”. A razão, apontou a deputada, é estarem em causa valores diferentes. Quando se fala de remuneração é tido em conta um montante em que estão incluídas as gorjetas, prémios e outras recompensas que são dadas aos trabalhadores. A deputada deu ainda como exemplo a situação de Hong Kong, onde já existe este regime e onde que é aplicada a remuneração de base dos trabalhadores. Ella Lei acabou por pedir ao hemiciclo que fosse feita uma alteração. Um artigo de liberdade O secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, defendeu que “neste momento há 70 mil trabalhadores que utilizam o salário base, pelo que o Governo entende que este é o método mais adequado”. De acordo com o secretário, o mais importante é o facto de a proposta de lei dar a liberdade para que as entidades envolvidas possam optar pela solução que lhes for mais conveniente. “É a própria proposta que prevê que o valor seja alterado pelas respectivas entidades, caso considerem que é a melhor opção”, sublinhou Alexis Tam. De modo a afastar cepticismos, o secretário reiterou: “Este artigo não afasta a hipótese de o empregador escolher critérios melhores para os seus trabalhadores para que possam fixar um método melhor”. Por outro lado, “o salário base é mais fixo e estável e, por isso, é mais fácil para fazer cálculos”. Com a possibilidade de o artigo em causa poder vir a ser votado em separado, e ser mesmo chumbado, os juristas da AL e do Governo foram chamados a dar explicações. Para o especialista que acompanhou Alexis Tam, sem o artigo em causa a lei ficaria “coxa”, ou seja, não se saberia como calcular a incidência. “Torna-se impraticável”, referiu. O deputado Gabriel Tong não deixou de se manifestar perante a situação e chamou a atenção para a abertura de precedentes que podem ser seguidos em votações futuras. Já Vong Hin Fai considerou que, “sem este artigo, toda a proposta de lei deixa de ser exequível”. A alínea do artigo em causa acabou por ser aprovada com 22 votos a favor, três contra e uma abstenção. Os votos contra couberam a Ella Lei, Kwan Tsui Hang e Leong Veng Chai. Luta de classes O debate ficou ainda marcado por outro assunto polémico, relacionado com o facto de o diploma não prever a dedução das contribuições, mas sim o pagamento de uma taxa sobre o montante salarial. Para o deputado José Chui Sai Peng, a solução encontrada não agrada à maioria, em especial às entidades patronais. Já Kou Hoi In, que se apresentou como porta-voz dos empresários, explicou que os empregadores sempre quiseram que os valores fossem deduzidos. “Quando um trabalhador é despedido, além da indemnização, o empregador ainda tem de devolver o fundo que pagou”, afirmou. O deputado mostrou-se também preocupado com a situação das pequenas e médias empresas, sendo que, afirmou, “há companhias que nem para pagar impostos têm capacidade”. O Governo entende que a solução é a mais adequada, não sendo o momento ideal para mais alterações. “Já discutimos isso há muito tempo e não podemos agora introduzir esta figura da dedução”, referiu o presidente do Fundo de Segurança Social (FSS), Iong Kong Io. Foi ainda discutido o direito de reembolso do pagamento aos trabalhadores com menos de três anos de trabalho. Patrões e trabalhadores dividem-se. Quem emprega considera que o facto de os trabalhadores com menos de três anos de serviço não poderem receber as suas contribuições é justo e ajuda á estabilidade da mão-de-obra; quem trabalha por conta de outrem defende que é uma medida que não deveria constar do diploma. Alexis Tam referiu que, daqui a três anos, será altura para realizar uma nova consulta pública e implementar o regime de contribuições de carácter obrigatório. Na reunião plenária de ontem foram ainda aprovadas na especialidade, por unanimidade, as propostas de lei referentes ao controlo do transporte transfronteiriço de numerário e de instrumentos negociáveis ao portador, e ao regime jurídico da troca de informações em matéria fiscal.
Isabel Castro Manchete SociedadeAnálise | Dia Mundial da Criança: o futuro talvez seja deles O mundo fez progressos espantosos na redução da mortalidade infantil e na saída de milhões de crianças da pobreza extrema. As tecnologias levam a ajuda a locais outrora inacessíveis. Mas há a guerra, os desastres naturais, os milhões de refugiados. E falta sobretudo um compromisso político para que o mundo dos mais pequenos se escreva com outras linhas [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] aviso foi feito esta semana: só no último mês, foram registados 55.200 casos de cólera no Iémen, um surto sem precedentes que está a afectar sobretudo crianças. Na semana passada, outro alerta: só este ano, pelo menos 200 crianças morreram afogadas no Mediterrâneo quando fugiam do Norte de África para Itália. É mais do que uma morte por dia, contabiliza a UNICEF, que tem detectado um aumento do número de crianças a fazer a perigosa travessia por mar. Muitas delas viajam sozinhas. Para as crianças do Iémen e para aquelas que, neste momento, fogem da casa que conheceram, nada dirá a data que hoje se assinala em vários pontos do mundo. Foi em 1925 que o dia surgiu, mas só começou a ser comemorado com regularidade depois da Segunda Guerra Mundial, como forma de pensar nas crianças que, então, precisavam de muita ajuda. Na altura, como hoje, o mundo faz-se de desigualdades. A UNICEF estima que, da cólera do Iémen aos ataques em hospitais na Síria, os conflitos armados ameacem a vida de mais de 24 milhões de crianças no Médio Oriente e no Norte de África. Além das mortes que resultam de bombardeamentos, balas e explosões, a violência impede o acesso a alimentos, serviços de saúde, água potável e condições sanitárias que permitam crescer. No relatório mais recente sobre a situação das crianças ao nível mundial, a agência das Nações Unidas congratula-se com os progressos que o mundo tem feito na redução da mortalidade infantil e da pobreza extrema. Mas faz uma ressalva: na maior parte dos locais onde a infância é um pesadelo, as restrições não são técnicas, devendo-se, isso sim, à falta de compromisso político para que os recursos cheguem a quem precisa deles. É tudo ainda uma questão de vontade colectiva, acrescenta a UNICEF, que traça objectivos muito concretos para 2030. Agora ou nunca O tempo certo para agir é agora, diz a agência da ONU. Se não for feito um grande esforço para combater a desigualdade, daqui a 13 anos quase 70 milhões de crianças poderão morrer antes de completarem o quinto aniversário, sendo que aquelas que vivem na África Subsariana são as que se encontram em maior risco. É também neste ponto do globo que, em 2030, poderão viver nove em cada dez crianças em risco de extrema pobreza. O cenário mais pessimista da UNICEF aponta ainda para que mais de 60 milhões de crianças estejam excluídas do ensino primário, ou seja, sensivelmente o mesmo número que hoje se verifica. Mais uma vez, a maioria será da África Subsariana. Prevê-se ainda que 750 milhões de meninas contraiam matrimónio durante a infância. “Estes enormes perigos e desigualdades não representam apenas a violação dos direitos. Colocam em causa o futuro de cada uma destas crianças e perpetuam ciclos intergeracionais de desequilíbrio que minam a estabilidade a segurança das sociedades”, sublinha a UNICEF. Entre os principais objectivos para 2030, estão as questões relacionadas com a maternidade, os recém-nascidos e o combate à mortalidade infantil. Pretende-se reduzir o número de mortes à nascença para 12 em cada mil bebés e garantir que as crianças que morrem antes dos cinco anos não são mais do que 25 por cada mil. O acesso generalizado a cuidados de saúde – outra das metas – contribuirá para que estes números possam tornar-se reais. Desde 1990 que a morte de mães e recém-nascidos, bem como de crianças em tenra idade, tem estado a diminuir, e houve progressos extraordinários nalguns dos países mais pobres do mundo. A China encontra-se no grupo que registou avanços mais significativos. No entanto, ainda há muito por fazer: a Índia e a Nigéria, por exemplo, continuam a mostrar dificuldades em resolver este dilema. A UNICEF chega a uma grande conclusão: o crescimento económico pode ajudar a garantir a sobrevivência de mães e filhos, mas não é garantia de que tal aconteça, se em falta estiver um compromisso político nesse sentido. Também a nutrição desempenha um papel determinante. Metade das mortes com crianças menores de cinco anos deve-se à falta de uma alimentação adequada. O dinheiro que existe em casa é essencial, mas também a educação dos progenitores: no Sul da Ásia e na África Subsariana, as crianças com mães sem acesso a educação correm riscos muito maiores. “Se todas as mães tivessem completado o ensino secundário, haveria menos 1,5 milhões de mortes por ano de crianças com menos de cinco anos na África Subsariana e menos 1,3 milhões no Sul da Ásia.” Outro factor a ter em conta é a maternidade na adolescência. Apesar de ser um número em queda, todos os anos existem 15 milhões de raparigas que casam antes de terem feito 18 anos. “Estas meninas são um grupo muito vulnerável: é-lhes negada a infância, têm poucas oportunidades de educação e, com muita frequência, são mães demasiado novas”, destaca a UNICEF. Fora da escola, longe de casa Se tem havido progressos nalguns aspectos, não se pode dizer o mesmo sobre o acesso à educação. Desde 2011, aumentou o número de crianças em idade escolar que estão excluídas do sistema de ensino. São quase 124 milhões que a quem não é dada a possibilidade de entrar na escola ou concluir os estudos. A pobreza e a guerra contribuem para este número, mas há ainda outro problema: as meninas continuam a ser aquelas com maiores dificuldades de acesso ao sistema educativo. Se esta tendência global se mantiver, em 2030 haverá 60 milhões de crianças sem escola, sendo que, nos países com maiores índices de pobreza, 76 por cento dos alunos do ensino primário não chegarão sequer a concluir este ciclo. Os padrões actuais levam ainda a UNICEF a dizer que, a não ser que haja uma profunda alteração do cenário, só na viragem para o próximo século é que se poderá esperar ensino primário e secundário universal em todos os países. A situação vivida por milhões de pessoas obrigadas a deixarem as suas casas também não deixa margem para optimismo. No final de 2014, metade dos refugiados estava no exílio há mais de dez anos. Mas os conflitos armados não são o único obstáculo à vida das crianças de vários pontos do mundo. As alterações climáticas têm vindo a aumentar os riscos associados a tempestades e cheias. São desastres naturais que impedem o acesso à educação e à saúde, e que aumentam os riscos de negligência, tráfico e trabalho infantil. Para tentar minimizar todos estes problemas, a UNICEF defende que é necessário criar programas de ajuda que correspondam às necessidades reais. Os programas de emergência de pouco adiantarão se não houver apoios a longo prazo, o tempo que as crianças precisam para serem crianças. Crianças de Macau com pouco espaço e valores materialistas Há zonas do mundo onde nascer é, em si, um factor de risco. Por cá, as crianças enfrentam dificuldades muito típicas do ambiente social e geográfico que Macau oferece. “Estão muito constrangidas no desenvolvimento por vários factores”, adianta Gertina Van Schalkwyk, professora de psicologia da Universidade de Macau, especializada em desenvolvimento infantil. Em primeiro lugar, a própria cidade, com elevada densidade populacional e falta de espaço físico, constringe os movimentos e oferece poucas oportunidades para brincar no exterior. Esta peculiaridade de Macau leva a “uma carência de actividades de lazer que beneficiem o desenvolvimento de capacidades de motricidade fina e grossa”, explica a académica. Estas competências habilitam a criança a aprender a manusear objectos com destreza e a ter controlo corporal. Depois, há a questão comportamental. Nesse capítulo, as crianças enfrentam o desafio de crescerem com pais ausentes, sobrecarregados com pesadas cargas horárias de trabalho. “Se por um lado crescem sem controlo parental, por outro os pais têm a tendência para serem altamente exigentes, sem darem resposta às necessidades psicológicas dos filhos”, destaca Gertina Van Schalkwyk. Exigem notas e desempenhos elevados aos filhos, num ambiente altamente competitivo, mas sem suporte emocional. Outro dos aspectos que a especialista em psicologia infantil denota no desenvolvimento das crianças de Macau é uma mudança de mentalidade e de sistema de valores que levou a um crescendo do materialismo. “São inundadas com coisas, bens materiais, e começam a achar que esse é um direito seu, que devem ter tudo aquilo que querem”, explica. Esta ligação a bens materiais tende a substituir a aprendizagem de resolução de problemas e a interacção social. Esta viragem para uma sociedade mais materialista sente-se na educação das crianças e, para a académica, é a grande diferença no desenvolvimento infantil da última década. De resto, as crianças em Macau sempre tiveram “desafios em termos de identidade, nomeadamente pela ausência dos pais”. Este tipo de crescimento pode levar a problemas na adolescência, nomeadamente a comportamentos de risco tais como o alcoolismo, o crime, o consumo de drogas. “São crianças vulneráveis em relação a problemas de saúde mental”, revela Gertina Van Schalkwyk. Os adolescentes que cresceram neste contexto precisam de regras dos pais, assim como os jovens em qualquer parte do mundo. Regras, autoridade e limites mas, também, amor e compreensão.
João Luz PolíticaCAEAL reúne com operadoras de jogo para lançar alerta [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL) esteve reunida com os representantes do sector do jogo para avisar que devem cumprir com a obrigação de neutralidade e imparcialidade. “As operadoras e promotoras de jogo, durante o processo eleitoral, não podem fazer de forma directa, ou indirecta, actos que favoreçam ou prejudiquem quaisquer listas de candidaturas”, disse Tong Hio Fong à saída da reunião. O presidente da CAEAL acrescentou ainda que estes deveres se estendem aos funcionários dos casinos durante o seu período de trabalho, inclusive nas salas de descanso. André Cheong, responsável máximo do Comissariado contra a Corrupção (CCAC), esclareceu que “as operadoras podem estimular os seus trabalhadores a participarem na eleição, mas não podem, sob qualquer ameaça ou violência, exigir que votem numa determinada lista”. Para evitar que haja propaganda eleitoral nos casinos, o CCAC, em parceria com a Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ), promete tratar as queixas que recebam. Além dos casos que cheguem pela DICJ, a entidade fiscalizadora conta com as denúncias de cidadãos para a linha aberta durante o período do processo eleitoral. O comissário André Cheong revelou que sensibilizou as operadoras para as alterações ao Artigo 72.º da Lei Eleitoral, nomeadamente quanto aos poderes atribuídos ao CCAC para iniciar investigações a irregularidades. O responsável acrescentou que “o âmbito da fiscalização inclui os casinos, todas as salas VIP, assim como as salas de descanso dos trabalhadores”. Cheong espera contar com a total colaboração das operadoras. Quanto à possibilidade de o CCAC emprestar mão-de-obra à DICJ para proceder à fiscalização dos casinos, o comissário não foi claro se haverá deslocação de quadros entre as entidades. Apenas comentou que o Governo é uma equipa e que cada serviço tem as suas atribuições estatuídas na lei. Além disso, André Cheong esclareceu que não há nada na lei que impeça um alto quadro de um casino de concorrer às eleições, nem sequer tem de abandonar o cargo que ocupa na operadora de jogo.
Hoje Macau PolíticaCimeira | Governo promete ligação com empresas dos países de língua portuguesa Na primeira cimeira sobre a construção de uma plataforma de serviços para a cooperação com os países de língua portuguesa, o Chefe do Executivo, Chui Sai On, destacou o papel que Macau pode ter como elemento de ligação entre as empresas do espaço lusófono e as que estão localizadas na China [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Chefe do Executivo apresentou ontem algumas ideias sobre o papel que o território poderá desempenhar na ligação entre as empresas sediadas no Continente e as que fazem parte dos mercados lusófonos. Chui Sai On discursou na Cimeira sobre a Construção da Plataforma de Serviços para a Cooperação Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa de Macau, que se realizou ontem. No seu discurso, o governante “prometeu que Macau irá apoiar activamente o sector industrial e comercial dos países de língua portuguesa no desenvolvimento da cooperação com as empresas estatais nacionais e o mercado do Interior da China”. O Chefe do Executivo garantiu que o Governo “já elaborou o planeamento geral de estratégias, mecanismos e recursos” nesta área. Além disso, “estão a ser desenvolvidos diversos trabalhos programados para a construção da plataforma”, estando a ser “continuadamente introduzidos novos elementos”. Nesta perspectiva, “torna-se entusiasmante o futuro do desenvolvimento [de Macau]”, acrescentou Chui Sai On. O lado bom O Chefe do Executivo afirmou ainda que a cimeira que ontem teve a sua primeira edição vai proporcionar “uma ligação mais estreita entre as empresas estatais nacionais, as empresas de Macau e as empresas dos países de língua portuguesa”. No caso de Macau, “as empresas estatais nacionais têm contribuído, de forma ímpar, para o desenvolvimento económico [do território], trazendo-lhe novas energias nas diversas fases”, frisou. O território está ainda a posicionar-se em prol de uma maior integração no “desenvolvimento nacional”, participando em políticas implementadas por Pequim, como é o caso de “Uma Faixa, Uma Rota”, sem esquecer a integração na zona da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau, entre outras medidas. Chui Sai On lembrou ainda os diversos projectos que já estão em curso no âmbito do Fórum Macau, tal como a concretização das 18 medidas anunciadas pelo primeiro-ministro, Li Keqiang, onde se inclui o início da construção do Complexo da Plataforma de Serviços para a Cooperação Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa. A primeira fase do concurso público para a construção daquela que será a sede do Fórum Macau terminou em Fevereiro deste ano, tendo a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes recebido propostas de nove empresas.
Isabel Castro SociedadeLei de Terras | Tribunal de Segunda Instância dá razão ao Chefe do Executivo O caso foi julgado duas vezes mas a decisão foi a mesma: a concessionária de um terreno no Pac On, que ficou sem ele por não o ter aproveitado, não tem por que se queixar. O Governo cumpriu com a sua parte do acordo. A empresa não fez o mesmo, diz a Segunda Instância [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] processo andou para a frente e para trás. Da Segunda Instância foi para a Última e chegou a realizar-se um novo julgamento. Mas a decisão final, ontem tornada pública pelo Tribunal de Última Instância em comunicado à imprensa, é basicamente igual à que foi inicialmente tomada: o colectivo do Tribunal de Segunda Instância (TSI) julgou improcedente o recurso contencioso contra o acto do Chefe do Executivo que declarou a caducidade da concessão de um terreno no Pac On. A recorrente era a SINCA – Sociedade de Indústrias Cerâmicas, concessionária do lote “D” situado no aterro da ilha da Taipa. A empresa alegou “total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários” do Governo, por não ter tido em consideração três factores que levaram a que a parcela não tivesse sido aproveitada dentro do prazo estabelecido no contrato firmado com a Administração. A SINCA deu vários argumentos para tentar justificar a falta de aproveitamento do terreno. Em primeiro lugar, lembrou a crise económica conjuntural em Macau entre 1994 a 2004. Depois, no período entre 2004 a 2006, aumentaram os custos da produção, houve alterações às quotas da indústria têxtil e o Governo Central incentivou novos investimentos na China Continental, pelo que a recorrente temia “sofrer prejuízos irrecuperáveis” caso insistisse em executar o plano original. Por último, a concessionária invocou “a própria inércia da Administração na revisão do Plano do Aterro de Pac On a partir do ano de 2007”. Administração e bondade O TSI não acolheu as justificações apresentadas, afirmando que, tal como em qualquer negócio, o concessionário do terreno tem de suportar o risco do negócio, “não podendo fruir dos benefícios de uma concessão a longo prazo e, ao mesmo tempo, alegar que não podia realizar já a finalidade que esteve na base dela, reservando para si, e por seu livre alvedrio, o momento mais conveniente para a concretizar”. O tribunal diz ainda que, “no domínio de uma relação contratual estabelecida por acordo e conjugação dos interesses das partes, não se pode só ponderar os interesses do particular e ignorar os interesses públicos subjacentes à concessão”. O colectivo de juízes pronuncia-se ainda em relação à alegada inércia da Administração na revisão do Plano do Aterro de Pac On. “Esta circunstância também não constitui causa justificativa da falta de aproveitamento do terreno dentro do prazo, já que se trata de uma circunstância muito posterior (mais de dez anos) do termo do prazo do aproveitamento.” A decisão judicial indica ainda que “a Administração chamou várias vezes a atenção à recorrente da necessidade do cumprimento do prazo do aproveitamento”, tendo ainda convidado a concessionária para justificar por que não o fez e requerer a prorrogação do prazo em questão. “É a própria recorrente que ignorava a bondade da Administração pois, só em Agosto de 2003, decorridos já mais sete anos do termo do prazo do aproveitamento, é que veio justificar o atraso e formular o pedido da prorrogação.” O TSI continua dizendo que, mesmo assim, a Administração ainda realizou, em 2003, uma reunião com o advogado da concessionária, em que lhe comunicou que a empresa deveria apresentar de imediato o projecto de arquitectura, essencial para que as Obras Públicas avaliassem o pedido de prorrogação. Só em 2008 é que a recorrente apresentou o requerimento para a alteração da finalidade da concessão, de indústria para habitação e comércio. “Não obstante a entidade recorrida não ter declarado atempadamente a caducidade da concessão por falta de aproveitamento dentro do prazo, a sua actuação nunca conferiu à recorrente qualquer expectativa de que o prazo do aproveitamento poderia ser prorrogado, muito menos a prorrogação do prazo da concessão provisória”, conclui ainda a Segunda Instância.
Hoje Macau SociedadeComércio externo subiu cinco por cento até Abril [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] comparação é anual: o comércio externo de Macau atingindo 27,14 mil milhões de patacas, o que representa um crescimento de cinco por cento nos primeiros quatro meses do ano. Segundo a Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC), entre Janeiro e Abril, Macau exportou bens avaliados em 3,78 mil milhões de patacas – mais 9,3 por cento – e importou produtos avaliados em 23,36 mil milhões de patacas – mais 4,4 por cento em termos anuais homólogos. Por conseguinte, o défice da balança comercial atingiu 19,57 mil milhões de patacas, traduzindo um agravamento de 3,5 por cento comparativamente aos primeiros quatro meses do ano passado. Em termos de mercados, as exportações para a China totalizaram 548 milhões de patacas até Abril, reflectindo uma diminuição de 4,2 por cento. As vendas de mercadorias para os países de língua portuguesa foram de 300 mil patacas, valor que traduz uma queda de 85,4 por cento em termos anuais homólogos. Em contrapartida, as exportações para Hong Kong cresceram 16,8 por cento entre Janeiro e Abril. A mesma tendência foi verificada nas vendas de mercadorias para a União Europeia (71 milhões de patacas) e para os Estados Unidos (62 milhões de patacas) que aumentaram, respectivamente, 22,2 por cento e 27,1 por cento. Diamantes e relógios Em termos de mercadorias, exportaram-se 3,54 mil milhões de patacas de produtos não têxteis, mais 11,8 por cento, em termos anuais. As exportações de joalharia com diamantes cresceram 46 por cento, enquanto as de máquinas, aparelhos e das suas partes (193 milhões de patacas) diminuíram 45,2 por cento, aponta a DSEC. Já do lado das importações, Macau comprou à China produtos no valor de 7,72 mil milhões de patacas – menos seis por cento em termos anuais homólogos. A mesma tendência foi verificada nas importações de mercadorias dos países de língua portuguesa (195 milhões de patacas), que diminuíram 6,1 por cento. Em sentido inverso, as compras à União Europeia aumentaram 14 por cento. Ao nível dos produtos, destaca-se as importações de joalharia em ouro e de relógios de pulso que subiram, respectivamente, 25,5 por cento e 37,4 por cento, de acordo com a DSEC. Já as compras de combustíveis e lubrificantes (1,75 mil milhões de patacas), de telemóveis (1,45 mil milhões de patacas) e de materiais de construção (625 milhões de patacas) registaram descidas de 2,8 por cento, 9,7 por cento e oito por cento, respectivamente. Só em Abril, Macau exportou produtos avaliados em 839 milhões de patacas – mais 11 por cento face ao mesmo mês de 2016 – e importou mercadorias no valor de 5,42 mil milhões de patacas, ou seja, menos 1,1 por cento, indica a DSEC. Por conseguinte, o défice da balança comercial de Abril alcançou 4,58 mil milhões de patacas.
Andreia Sofia Silva SociedadeCPU | Rui Leão fala de ataque ao património no Porto Interior [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Conselho do Planeamento Urbanístico (CPU) aprovou ontem um novo projecto de construção na Avenida Almirante Sérgio, que poderá levar à destruição da fachada histórica do edifício em causa. O arquitecto Rui Leão foi o único membro a apontar o dedo ao Governo quanto à possibilidade do fim de mais um símbolo arquitectónico na zona do centro histórico. “Estes edifícios mantêm a traça original e estão numa localização especial, pois faziam todo o alinhamento com o antigo porto e funcionavam como armazéns. Qualquer razão burocrática ou administrativa que exista para não proteger este edifício deveria ser ultrapassada. Estou contra e estou incomodado com a demolição destas fachadas”, apontou. A responsável do Instituto Cultural (IC) presente na reunião referiu que o edifício em causa não só não é classificado, como não tem valor histórico suficiente para que seja considerado património. “Poderemos manter o mesmo modelo [arquitectónico], mas será uma opinião não vinculativa. Pelo valor histórico deste edifício, não achamos necessário manter a fachada.” Rui Leão voltou a apontar o dedo à postura do Executivo. “Já foram demolidos edifícios à volta e não devemos estar aqui a brincar. Houve uma altura em que não havia CPU e não tínhamos como preservar o património. Não custa nada manter a fachada e fazer ali um recuo qualquer.” Uma Disneylândia? O arquitecto considerou ainda que “não podemos deixar que o centro histórico se transforme numa Disneylândia”. “Julgo que este conselho existe para deliberar e tratar casos como este, que estão fora da zona de protecção e que não estão sob alçada do IC. O que está em causa são edifícios em pórtico, que ligavam o Porto Interior de uma zona à outra.” Li Canfeng, director dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), referiu apenas que o Governo pode incentivar o proprietário do terreno a não demolir as fachadas na fase de construção do novo projecto, mas será sempre uma opinião não vinculativa. “Podemos exigir ao proprietário que faça como o Governo quer mas, muitas vezes, temos de respeitar a opinião do proprietário”, rematou.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeRamal dos Mouros | DSSOPT vai analisar novamente o projecto A Associação Islâmica de Macau propôs ao Governo o alargamento da via de sentido único na Estrada de Cacilhas, junto ao projecto residencial que quer erguer na zona do Ramal dos Mouros. As Obras Públicas vão analisar mais uma vez o projecto. Os membros do Conselho do Planeamento Urbanístico questionaram a necessidade de uma segunda votação [dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]á um ano, o Conselho do Planeamento Urbanístico (CPU) aprovava a construção de um edifício residencial de 127 metros de altura, na zona do Ramal dos Mouros. Contudo, o projecto está longe de arrancar. O concessionário do terreno, a Associação Islâmica de Macau, fez uma nova proposta para o alargamento da faixa de rodagem na Estrada de Cacilhas, para que haja circulação nos dois sentidos. A Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) levou novamente o projecto para discussão no seio do CPU, mas os membros criticaram a decisão, por considerarem que a votação final já foi feita e que cabe agora às autoridades decidir as questões mais técnicas. “Acho que não cabe ao concessionário fazer um estudo da viabilidade do tráfego nesta zona a longo prazo”, defendeu o arquitecto Rui Leão. “O que é preciso é que se permita um alargamento para que, no futuro, daqui a cinco ou dez anos, se possa fazer uma adaptação viária. Isso deve ser assegurado pela DSSOPT”, acrescentou. Outro membro do CPU referiu não considerar necessária uma nova discussão. “Depois de aprovarmos o projecto houve uma nova proposta por parte do concessionário. Parece que está tudo igual, só está em causa o alargamento da via pública. Não sei por que temos de discutir este assunto de novo no CPU”, adiantou. Confrontado com estes comentários, o director das Obras Públicas, Li Canfeng, garantiu que será emitido um novo parecer sobre o edifício residencial que a Associação Islâmica de Macau quer ver construído. “Não temos novos dados para saber se este alargamento da via será bom ou não. É melhor deixarmos este caso para a DSSOPT analisar porque, até agora, só há dúvidas”, referiu o director. Outro representante da DSSOPT adiantou que as restantes entidades públicas concordam com o alargamento da via na Estrada de Cacilhas. “Achamos que a proposta traz uma contribuição positiva para a zona e fizemos um novo projecto de acordo com a proposta. A maioria dos representantes do Governo deu uma opinião positiva”, apontou. CPU ineficiente? A possibilidade de uma segunda votação levou muitos membros do CPU a acusarem o organismo de ineficiência. “Mesmo que seja preciso eu não vou votar”, apontou Chan Tak Seng, membro do organismo, também ligado à Aliança do Povo de Instituição de Macau. “Se não é uma anedota. Para que serve este conselho? O proprietário quer alargar a via, mas não deve preocupar-se com este assunto e sim o Governo”, frisou. Paulo Tse também fez acusações. “Duvido de mim mesmo e da eficiência do CPU. Porque é que temos demasiadas opiniões sobre os processos? Os concessionários alteram a sua proposta várias vezes e há outros factores que causam ineficiência.” “Já passou um ano [face à votação do projecto do Ramal dos Mouros] e ainda precisamos de fazer uma nova análise. Teremos de esperar mais um ano?”, questionou Tse, dando como sugestão o prazo de três meses para a tomada de uma decisão final. Li Canfeng defendeu que três meses podem não ser suficientes, tendo recusado ainda as acusações dos membros do CPU. “Não concordo com as opiniões aqui ditas, porque em cada reunião temos analisado cerca de 20 casos. Temos de tornar os casos o mais transparentes possível. Não queremos simplesmente despachar os casos, mas queremos sim tomar decisões que sejam as mais correctas”, concluiu.
Isabel Castro Manchete SociedadeLei de Terras | Lesados juntam-se e pedem acção ao Governo Um grupo de pessoas que dizem ter sido prejudicadas pela aplicação da nova Lei de Terras decidiu constituir uma união. Ontem, o movimento fez publicar uma carta na imprensa de língua chinesa. Entre outras reivindicações, pede a alteração da controversa legislação [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]ão se sabe se eram concessionários de terrenos e ficaram sem eles, se compraram apartamentos que não foram construídos, ou se o movimento junta este dois tipos de investidores. Também se desconhece quantos são. Para já, conhecem-se apenas as suas reivindicações, que vão da aplicação da nova Lei de Terras ao modo como o Governo gere a distribuição de habitação pública. A União dos Lesados da Nova Lei de Terras – tradução livre para português – publicou ontem uma carta na imprensa de língua chinesa em que defende que existe consenso suficiente para se avançar com a alteração à legislação que dispõe sobre os terrenos da RAEM. Para os autores da missiva, é “uma injustiça” o Governo declarar a caducidade de terrenos findo o prazo de 25 anos da concessão “mesmo quando a responsabilidade do não aproveitamento não é dos promotores” dos projectos em causa. O movimento entende que as consequências da recuperação das terras “não são nada racionais”, não obstante reconhecer que as decisões tomadas pelo Governo estão de acordo com a legislação em vigor. Precisamente porque o Executivo está a cumprir a lei é que os lesados pedem que se avance para uma alteração do diploma. Os membros desta nova união mostram-se compreensivos com os deputados à Assembleia Legislativa e com o facto de a actual lei ter dado espaço a consequências indesejáveis. Recordam que, na audição feita às reuniões em sede de comissão da AL, houve preocupações sobre os problemas que a lei poderia causar. E os outros também “O consenso que é preciso para a alteração da lei já existe na sociedade”, garante o grupo, que acrescenta que advogados, Comissariado contra a Corrupção (CCAC), presidente do Tribunal de Última Instância e “altos funcionários públicos” manifestaram já a ideia de que se deve avançar para uma revisão do polémico diploma. A união recorda ainda a recente mensagem deixada pelo presidente do Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional, Zhang Dejiang, que defendeu a necessidade de alteração dos articulados que não se adeqúem à realidade de Macau. O movimento reserva espaço na carta publicada para aqueles que dependem da habitação pública do território. A união faz referência ao relatório do CCAC referente aos promitentes-compradores que estavam prestes a ficar sem as casas que lhes tinham sido entregues, um caso em que o Instituto de Habitação tomou decisões que não estão de acordo com a lei. No mesmo relatório, o CCAC alertou para a necessidade da revisão da lei da habitação económica, uma ideia que os subscritores da carta também defendem, para que seja possível “garantir a atribuição e a utilização justa dos recursos” públicos.
Hoje Macau SociedadePatrimónio | UNESCO analisa Centro Histórico de Macau [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Instituto Cultural (IC) vai estar presente na 41.ª sessão do Comité do Património Mundial da UNESCO, agendada para Julho. Em nota à imprensa, o IC explica que a organização analisa anualmente os relatórios sobre o estado de conservação do património classificado. Este ano, durante a reunião, vai estar em cima da mesa o relatório da China sobre o estado de conservação de cinco itens do património mundial, incluindo o Centro Histórico de Macau. O IC acrescenta que já apresentou o “projecto de decisão” e afiança estar atento “aos trabalhos de acompanhamento do estado de conservação” do património reconhecido pela UNESCO, incluindo as obras junto à Casa de Lou Kau e o planeamento urbanístico do território, assim como o Plano de Salvaguarda e Gestão do Centro Histórico de Macau. “Como na ordem de trabalhos da reunião há muitos assuntos para discutir, o projecto poderá não vir a ser analisado”, avisa desde já o IC. “Após a tomada de decisão na reunião, o resultado vai ser comunicado ao Governo da RAEM através da Administração Estatal do Património Cultural da República Popular da China.” O relatório explicativo apresentado pelo IC sobre o Centro Histórico de Macau foi submetido à UNESCO pelo Governo Central. “A Administração Estatal do Património Cultural elogiou os esforços do Governo da RAEM nos trabalhos de salvaguarda do património cultural, e considerou que se encontram efectivamente na direcção certa, tendo confiança na determinação e capacidade de salvaguardar o Centro Histórico de Macau”, lê-se ainda no comunicado. A 41.ª sessão do Comité do Património Mundial da UNESCO realiza-se na Polónia.
Sofia Margarida Mota EventosPeggy Chan | Artista plástica: “Macau cresce com demasiada velocidade” Abre amanhã ao público a exposição “Cem Espécies – Obras de Peggy Chan”, no Museu de Arte de Macau. A mostra leva-nos numa interacção entre pessoas, a sua manifestação no espaço e a natureza em asfixia. Em discurso directo ao HM, Peggy Chan levanta uma ponta do véu da nova exposição O que é o público pode ver em “Cem Espécies”? Pode ver três séries de trabalhos gráficos, assim como um estúdio que montei na galeria. A primeira série é centrada em torno de “Bobo”, o urso preto, que vive no Parque Erlogyan com os seus amigos. Este animal faz parte do meu imaginário infantil enquanto crescia em Macau. A segunda série é focada na imagem de uma espécie de ecossistema, o mangal. Enquanto a terceira série se centra na ideia de uma floresta de mangal. O que pretende dizer com esta exposição? Quero que as pessoas prestem mais atenção ao meio ambiente, algo que é fundamental para a nossa existência. Especialmente em Macau, uma cidade que cresce com demasiada velocidade. Por que quis recrear na galeria um estúdio experimental? Durante a exposição vou estar, “in loco”, a fazer alguma pesquisa para trabalhos futuros, assim como a produzir peças novas. Além disso, também quero experimentar a interacção com o público enquanto crio. Tenta explorar a relação entre humanos e a natureza. Porquê o interesse neste tópico? Durante a pesquisa que fiz para um documentário sobre ecologia em Macau, cruzei-me com variadíssimos estudos e relatórios sobre o assunto. Ver como o meio ambiente tem evoluído no território é uma experiência, como observar a evolução de uma ilha artificial. Como vê essa relação entre humano e natureza? Esta relação… Entristece-me tanto. É um relacionamento que serviu apenas para extinguir a pureza natural de Macau. Visitei os pântanos e zonas ecologicamente protegidas onde vi, e senti, o confronto entre o desenvolvimento urbano e a protecção ecológica. Na obra que expõe agora trabalhou com cianótipos. Por que escolheu trabalhar com esta técnica? O cianótipo é um processo antigo de impressão de fotografia e tem sido o meu veículo criativo preferido nos trabalhos mais recentes. É um método que, no processo criativo, depende totalmente da luz solar. O cianótipo traz um grau de incerteza natural aos trabalhos que, de certa forma, simboliza a maneira como a nossa vida flui através dos ambientes em constante mudança. Além disso, gosto da tonalidade azul que o processo dá à impressão e que permite fazer camadas de imagens muito bonitas.
Hoje Macau China / ÁsiaMaioria dos fumadores chineses não quer deixar o vício [dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]ma investigação desenvolvida ao longo da última década indica que a maioria dos fumadores na China, o maior consumidor mundial de tabaco, não tem intenção de deixar de fumar e continua a desconhecer os riscos para a saúde. O estudo, divulgado ontem pelo Centro Chinês para o Controlo de Doenças e investigadores do Canadá, apura que 316 milhões de chineses fumam, um número que tem vindo a crescer. A grande maioria dos fumadores são homens, entre os quais 59% diz não querer deixar de fumar. Geoffrey Fong, coautor do estudo, afirma que um em cada três homens chineses vai morrer de doenças relacionadas com o tabaco e que 60% destes homens não sabem que fumar pode provocar ataque cardíaco. Algumas cidades chinesas proíbem o consumo de cigarros em espaços públicos. Funcionários chineses e estrangeiros da área da saúde defendem que aquela proibição deve ser alargada a todo o país. Seria um “passo crucial”, afirmou Yuan Jiang, um dos responsáveis pelo estudo, em comunicado. A decisão de alargar a todo o país a proibição de fumar em espaços públicos era para ser aprovada no final de 2016, segundo anunciou o Ministério da Saúde chinês, mas até agora não avançou. “Eles têm que perceber o que é importante como política”, afirmou Fong. “Quando tens tabaco barato, as pessoas vão fumar”, acrescentou. Em linha com a tendência mundial, os índices de consumo de tabaco caíram lentamente nos últimos 25 anos na China. Cerca de um por cento por ano, entre os homens, e 2,6%, entre as mulheres, segundo um outro estudo, publicado em Abril pela revista médica The Lancet. No entanto, devido ao aumento da população chinesa, para cerca de 1.375 milhões de habitantes, o número de fumadores aumentou. O aumento do poder de compra significa que fumar se tornou também mais barato, enquanto os baixos impostos mantêm o preço de algumas marcas a menos de um euro por maço de cigarros.
Hoje Macau China / ÁsiaInvestimento europeu no país cai 23% [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] investimento por empresas europeias na China registou uma queda homóloga de 23%, no ano passado, em parte devido aos obstáculos no acesso ao mercado chinês, e apesar da retórica pró-abertura e globalização adoptada por Pequim. No total, as firmas dos países da União Europeia (UE) investiram 8.000 milhões de euros no país asiático, segundo um relatório ontem difundido pela Câmara do Comércio da UE em Pequim. Este valor “seria substancialmente maior se fossem eliminados os obstáculos no acesso ao mercado e melhorado o ambiente jurídico”, lê-se no documento, assinado pelo presidente da Câmara, Mats Harbon. O responsável afirma que 54% das empresas se sentem descriminadas face às firmas locais. A falta de reciprocidade é mais evidente no acesso ao mercado. Em 2016, a China investiu um total de 35.000 milhões de euros na UE, uma subida homóloga de 77%. Além do referido favorecimento, as empresas europeias observam também que as firmas chinesas são cada vez mais inovadoras, um fenómeno que devem “seguir com cuidado”, aponta o documento. Ainda assim Apesar da percepção pouco optimista das empresas europeias sobre o mercado chinês, 55% destas registaram um aumento dos lucros no país, em 2016. As firmas dos sectores transportes, logística e distribuição apresentaram os piores resultados, mas os esforços de Pequim para atacar a poluição sustentaram um forte crescimento entre as empresas na área do ambiente. Ainda assim, apenas seis por cento das empresas europeias nota menos dificuldades em fazer negócios na China, enquanto 49% dizem que piorou. O sector mais afectado é o da engenharia civil e construção, com 79% das empresas a considerar que o acesso ao mercado se tornou mais difícil, com Pequim a conceder os contratos a empresas chinesas, sobretudo estatais. As empresas europeias enalteceram ainda a campanha anti-corrupção lançada pelo Presidente chinês, Xi Jinping, mas criticaram o pesado e imprevisível quadro regulamentar e a ambiguidade das leis no país.
Hoje Macau China / ÁsiaONG questionam posição dos EUA sobre direitos humanos [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]rganizações não-governamentais questionaram se os interesses comerciais da família Trump na China influenciam a posição norte-americana na promoção dos direitos humanos, após a detenção e desaparecimento de investigadores numa fábrica chinesa que fornece a marca Ivanka Trump. “A vontade de membros da família em fazer negócios na China, enquanto ignoram o histórico do país em Direitos Humanos e laborais é preocupante”, afirmou Nicholas Bequelin, director para o leste da Ásia da Amnistia Internacional. “Vamos ter que esperar para ver até que ponto os negócios estão a diminuir o capital diplomático norte-americano na promoção dos direitos humanos, direitos dos trabalhadores e democracia”, acrescentou. Um grupo de defesa de direitos cívicos denunciou na terça-feira que um homem que investigava condições de trabalho numa empresa chinesa que produz sapatos da marca Ivanka Trump foi detido e dois outros desapareceram. Os homens trabalhavam para a organização não-governamental norte-americana China Labor Watch na elaboração de um relatório que incluía acusações de salários baixos, tempo de trabalho excessivo e abuso de estagiários. Segundo o director executivo da organização, Li Qiang, os homens devem estar detidos pela fábrica ou pela polícia. Nos últimos 17 anos, este grupo tem investigado as condições de trabalho nos fornecedores chineses de algumas das empresas mais conhecidas a nível mundial, mas nunca tinha atraído o escrutínio do aparelho de segurança chinês, afirmou Li. A investigação da China Labor Watch tem também um alvo inédito: uma marca detida pela filha do Presidente dos Estados Unidos. “A marca da Ivanka deve imediatamente suspender a colaboração com este fornecedor, e a administração Trump deve inverter o seu curso actual e confrontar a China sobre abusos dos Direitos Humanos”, disse Adrienne Watson, porta-voz do Comité Nacional Democrata dos EUA, citado pela agência Associated Press. Ivanka Trump deve decidir “se pode ignorar uma aparente tentativa do Governo chinês de silenciar uma investigação sobre abusos no trabalho”, acrescentou. Negócios da China Os acessórios e vestuários da marca Ivanka Trump são quase todos importados da China, segundo dados oficiais. O Presidente norte-americano, Donald Trump, tem também várias marcas registadas no país, apesar de não ter uma presença forte no sector do imobiliário ou do retalho. No mês passado, a irmã de Jared Kushner, marido de Ivanka e conselheiro de Trump, esteve na China para promover o investimento de privados chineses num projecto imobiliário na cidade norte-americana de New Jersey. A mulher de Hua Haifeng, um dos investigadores detidos, informou que este foi acusado de vigilância ilegal, acrescentando que a polícia lhe ligou na tarde de terça-feira e, sem lhe dar qualquer detalhe, anunciou-lhe que não lhe iria ser possível ver, falar ou receber dinheiro do seu marido, que é o ‘ganha-pão’ da família. Li Qiang disse que os homens relataram que os funcionários trabalhavam às vezes mais de 18 horas por dia, por salários abaixo do mínimo legal. Os desaparecidos estavam a trabalhar para confirmar evidências de que os estagiários trabalhavam horas excessivas em tarefas que não estavam relacionadas com a sua área de estudo, em violação da lei chinesa.
Manuel Afonso Costa Fichas de Leitura h | Artes, Letras e IdeiasA nódoa negra da nossa idiossincrasia Aires, Matias (1705-1763), Reflexões Sobre a Vaidade dos Homens, Fundação Biblioteca Nacional, Lisboa, 2007 Descritores: Literatura Barroca, Ensaio, Século XVIII, 288 p. ; ISBN: 9788533304529 Cota: 821.134.3(81)-4 Air “A ambição dos homens por uma parte, e pela outra a vaidade, tem feito da terra um espectáculo de sangue: a mesma terra que foi feita para todos, quiseram alguns faze-la unicamente sua” [dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]atias Aires mau grado as coordenadas do barroco mental que acompanham permanentemente as suas reflexões pensa e algumas vezes pensa muito bem. E por isso não é fácil isolar na sua obra a explicitação de um paradigma temático de uma forma escorreita e límpida. Prevalece alguma promiscuidade entre pressupostos ideológicos barrocos e pressupostos ideológicos clássicos. Quando por exemplo ele diz que «a solidão nos desterra para a solidão do ermo», ele analisa o evento segundo a ideia clássica horaciana de que «nunca podemos fugir de nós», mas ao mesmo tempo o que ele identifica como a nossa sombra negra é a barroca ilusão e vaidade, de tal modo que “somos como a ave desgraçada, que por mais que fuja do lugar em que recebeu o golpe, sempre leva no peito atravessada a seta”, querendo com isso dizer que ælun, non animum mutant, qui trans mare currunt. Aquilo que em Horácio é assumido como uma especificidade própria da condição humana substantiva, torna-se em Matias Aires um elemento de reforço do dispositivo barroco. Para Matias Aires o que nos persegue é a vaidade, nódoa negra da nossa idiossincrasia, enquanto que para Horácio o que nos persegue é simplesmente nós-mesmos, a nossa idiossincrática auto-individuação, independentemente desta ou daquela virtude. E de tal ordem é assim que a possibilidade do retiro integral não é admissível em Matias Aires. Todas as modalidades de retiro não se adaptam ao modelo do ensaísta português de Setecentos. Para ele o retiro absoluto não é possível porque ao “deixarmos livremente o comércio dos homens, não renunciamos o viver na admiração, e notícia deles”, o que significa que “consentimos em apartar-nos de sorte, que nunca mais sejamos vistos, mas não consentimos em não ser lembrados”. O dispositivo ideológico através do qual Matias Aires concebe a sua antropologia persegue os seus pensamentos. Para Matias Aires o retiro é uma dissimulação, não um retiro de facto, é uma representação teatral, é uma máscara. E é a máscara e a encenação que persistem com o seu valor ontologicamente dramático e não o retiro que deveria significar o que de facto significa no classicismo, assunção de modéstia, de humildade, de procura regenerativa da vida simples, discreta. Não é a lathe biosas epicurista (vida discreta e simples), que fundamenta este retiro, não é a completa separação e rejeição do modelo da ubris ou culto do excesso. A ubris é o que persegue o homem desesperado no seu exílio encenado. Falta aqui um ingrediente determinante do modelo da mediania: a tranquilidade que só advém por intermédio da realização da sabedoria clássica ou estóico-epicurista da phronesis e da sophrosyne. Eu sei que Matias Aires desenvolve o seu modelo sob uma forma crítica. A sua análise é realista e não idealista. Mas o simples facto de não conceber uma alternativa mostra o quanto está prisioneiro do seu próprio quadro conceptual. O realismo, que de resto é próprio do barroco, não deixa entrever a possibilidade de uma escapatória. O seu pessimismo de fundo sapa tanto a possibilidade da eutopia quanto da utopia. A verdade é que o que fomenta o retiro clássico, quer dizer salvífico e regenerativo, é a rejeição da ubris e esta no dispositivo clássico é profundamente marcada pela sua imbricação com o problema do mal. Desde a conceptualização ontológica, metafísica e religiosa do limite e da ordem até à definição do papel ético-moral da medida, que culmina no sacrossanto apotegma apolíneo do ne quid nimis (nada para além da medida), é sempre o bem e o mal que estão no horizonte. Ora em Matias Aires é o binómio conjuntivo ilusão / vaidade que enforma a sua aproximação teorética. O que quer dizer que lhe falta desde o princípio um modelo conceptual decisório, e analítico, que pela sua natureza se encontre acima do material em análise. Matias Aires julga questões morais com conceitos morais, procura compreender uma realidade empírica através da operatividade de ferramentas empíricas. Não há separação entre o modelo e a realidade, logo o seu esforço de desconstrução não é verdadeiramente operatório. Ele diz por exemplo: “A vaidade é cheia de artifício, e se ocupa em tirar da nossa vista, e da nossa compreensão o verdadeiro ser das cousas, para lhes substituir um falso, e aparente”. Nada se passa no plano ontológico ou metafísico, mas apenas no plano das consequências fenomenológicas da crise aberta pela ruptura com o paradigma da permanência e da estabilidade. A crítica e a condenação da ubris no barroco resulta do facto de que tudo é aparente, vão, ilusório, etc. enquanto que no classicismo a ubris simboliza o mal. E é só porque é o mal que a ubris configura uma ilusão, ou melhor um nada, um não-ser. O classicismo valoriza o texto, a substância e o barroco valoriza a cenografia, e o décor. A opção pela aparência desloca logo a questão do plano ontológico para o plano fenomenológico, sendo que esta fenomenologia não é hermenêutica mas gnoseológica. O mundo não possui uma alma que é enganadora ou não, uma vez que é da natureza da alma do mundo ser enganadora. Trazendo o que deveria ser um epifenómeno para o centro do debate gnoseológico o barroco dessubstancializa o problema do bem e do mal na sua raiz metafísica e assim acaba a explicar o equívoco pelo equívoco, a falha pela falha, a máscara pela máscara até ao infinito. Um jogo de espelhos, um labirinto. Não há fuga possível do labirinto, não há retiro possível do mundo. O retiro é uma aparência de retiro. E não é assim por acaso que o problema do mal seja profundamente relativizado. “É raro o mal, de que não venha a nascer algum bem, nem bem, que não produza algum mal”. A única fuga concebida por Matias Aires é uma ascética fuga de nós-próprios, isto é das nossas paixões. O neo-estoicismo do barroco informa aqui o pensamento do nosso autor. Neste domínio Matias Aires é um autor previsível. A presença de Santo Agostinho no seu ideário empurra-o para uma análise de tipo voluntarista em que finalmente aparece a questão do mal agora já indissociável do pecado, da queda e da culpa. Nem sinais de classicismo e de argumento onto-gnoseológico. Pelo contrário sente-se a presença do video melior proboque de Ovídio, das reflexões de Santo Agostinho, das Epístolas de S. Paulo, em particular a Epístola aos Romanos, e da Medeia de Eurípedes, entre muitas outras reflexões que colocam o mal no plano de uma oscilação da vontade ditada pela condição miserável do homem. Oscilação que o autor enfatiza de modo explícito: “Parece que cada um de nós tem duas vontades sempre opostas entre si; ao mesmo tempo queremos, e não queremos; ao mesmo tempo condenamos, e aprovamos; ao mesmo tempo buscamos e fugimos, amamos e aborrecemos, Temos uma vontade pronta para conhecer, e detestar o vício; mas também outra pronta para o abraçar”. Mas no essencial a nossa natureza propende para o mal, o que significa que triunfa em nós a vontade má, a concupiscência. A nossa vida consiste em combater esta má inclinação. As paixões, quer dizer a carne são o nosso inimigo, até porque a carne não é frágil só por um princípio, mas por muitos”. Biografia Matias Aires Ramos da Silva de Eça nasceu no Brasil, a 27 de Março de 1705, vindo a falecer em Lisboa a 10 de Dezembro de 1763). Filho de José Ramos da Silva e de sua mulher Catarina de Orta, nasceu como já vimos no Brasil, na Capitania, depois Província e hoje Estado de São Paulo. Foi Cavaleiro da Ordem de Cristo e Provedor da Casa da Moeda de Lisboa, obtendo e sucedendo neste emprego a seu pai, José Ramos da Silva, por sua morte. Foi Bacharel em Filosofia pela Faculdade de Ciências e Mestre em Artes pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Formou-se numa Universidade Francesa em Direito Civil e Canónico. Fez estudos de Matemática e Ciências Físicas. Conhecia o Hebraico e outras línguas. Foi em 1716 que acompanhando seus pais se mudou para Portugal, tendo ingressado no Colégio de Santo Antão. Em 1722, estudou nas Faculdades de Leis e de Cânones de Coimbra, onde recebeu o grau de Licenciado em Artes, graduando-se mais tarde na cidade de Baiona, na Galiza. Foi notável literato e naturalista e grande amigo do malogrado António José da Silva, o Judeu, que procurou ardentemente salvar da fogueira, o que não conseguiu. Escreveu obras em Francês e Latim e foi também tradutor de clássicos latinos. É considerado por muitos o maior nome da Filosofia de Língua Portuguesa do seu tempo, o que não era muito difícil tendo em conta a pobreza franciscana da nossa cultura filosófica e literária do século XVIII. Só, talvez António Soares Barbosa, autor de um tratado de filosofia moral, mas que é também um tratado jusnaturalista, se lhe pode comparar. Enfim, há Verney, Teodoro de Almeida e Frei Manuel do Cenáculo Villas Boas, mas que para mim são autores menores, pois lhes falta originalidade e arrojo. Em Reflexões sobre a Vaidade dos Homens, cuja primeira edição é de 1752, o autor tece suas reflexões a partir do trecho bíblico extraído do Eclesiastes: Vanitas vanitatum et omnia vanitas, ou seja, “Vaidade das vaidades, tudo é vaidade”. Como um dos exemplos da vaidade dos homens, é citada a sumptuosidade dos mausoléus. Inocêncio Francisco da Silva informa no seu dicionário que “Quanto à data de seu óbito é por ora ignorada, sabendo-se contudo que já era falecido no ano de 1770”. Ernesto Ennes informa data de 10 de dezembro de 1763, a partir de documentação comprobatória. O Dicionário Biobibliográfico de Autores Brasileiros informa a mesma data.