Hoje Macau China / ÁsiaHong Kong | Conselho Legislativo pede inquérito a distúrbios O Conselho Legislativo de Hong Kong aprovou uma moção para estabelecer uma comissão para investigar as causas dos distúrbios do mês passado, mas o trabalho não deve começar até ao fim deste ano legislativo, em Julho. A moção, aprovada na quarta-feira e proposta por Alvin Yeung Ngok-kiu, do Partido Cívico, e Cyd Ho Sal-Ian, do Partido Trabalhista, foi apoiada por 24 deputados democratas. Yeung criticou o chefe do Executivo por classificar os distúrbios como “motins” antes de uma investigação cuidada. A expressão, repetida pela ala pró-Pequim, levou a que “conclusões não verificadas crescessem na sociedade”, disse. O deputado lamentou também que o Governo só estivesse preocupado em deter e condenar os envolvidos, recusando-se a estabelecer uma comissão para investigar as causas. “Muitos cidadãos participaram nos confrontos com a polícia”, apontou o deputado do Partido Cívico, considerando que “tal mostra que o problema não pode ser imputado a um pequeno grupo”. “Pode ter sido causado por um forte descontentamento com o Governo, que não pode ser solucionado com a detenção de umas dezenas de participantes”, frisou. Assunto para novo parlamento Os incidentes na zona de Kowloon, no primeiro dia do Ano Novo Lunar, causaram 130 feridos, vários detidos e, até à data, 50 acusados. Anteriormente, o Governo de Hong Kong rejeitou os pedidos para uma investigação independente, considerando que as investigações criminais são suficientes. Em declarações aos jornalistas, Ho admitiu que é “muito improvável” que a comissão comece a trabalhar antes de o Conselho Legislativo de Hong Kong terminar esta sessão legislativa, já que há outras duas comissões à frente. “Mas acreditamos que o campo pró-democracia tem responsabilidade de colocar a necessidade de uma investigação nos registos da reunião. Também esperamos (…) que os deputados da próxima sessão legislativa levem este registo e necessidade em consideração”, disse.
Hoje Macau Eventos MancheteVhils, artista urbano: “O graffiti é um cancro visual” É um dos mais internacionais artistas urbanos de Portugal e, desde há uns meses para cá, tem andado ocupado na produção de uma exposição encomendada pela Fundação de Arte Contemporânea de Hong Kong. Alexandre Farto – ou Vhils – é conhecido, entre outras coisas, por criar imagens com explosivos. A sua grande intenção é questionar o status quo. Vai intervir em Kowloon e Hong Kong, onde apresenta agora a exposição “Debris” Em meados dos anos 90 entrevistei uma das primeiras crews portuguesas de graffiti que me dizia que a melhor forma de pintar sem ter problemas com a polícia era fazê-lo de dia. Que mudou entretanto? De certa forma ainda se pode pintar durante o dia, e há quem o faça, tudo depende do local e da ousadia de quem o faz. No entanto, é certo que a forma como o graffiti é visto, seja em Portugal ou noutros cantos do mundo, mudou muito desde então. Enquanto na altura era ainda uma prática meio desconhecida, que tinha tido pouco impacto junto da sociedade, a popularização do fenómeno e a saturação visual do espaço público que daí resultou veio aumentar a hostilidade com que é hoje encarado. Por um lado, é natural que assim o seja, pois é uma prática polémica e transgressora por natureza que joga com a reapropriação do espaço visual da cidade sem olhar a terceiros. Por outro, está na origem de uma nova vaga de criação artística que tem transformado o mundo. Em que medida sente que o seu trabalho é uma acção de intervenção? A reflexão que tenho desenvolvido com o meu trabalho visa questionar sobretudo os pontos negativos presentes no modelo de desenvolvimento vigente, o modo como as transformações das últimas décadas têm afectado a identidade, quer das pessoas e comunidades, quer dos espaços que estas habitam. Este novo paradigma global tem trazido benefícios – temos estreitado o contacto e a interacção entre os povos do mundo. Mas, ao mesmo tempo, tem imposto uma crescente uniformização que tem erodido aquilo que nos distinguia e nos tornava únicos. Tem sido igualmente responsável por uma profunda descaracterização dos espaços que habitamos, das nossas cidades. Esta homogeneização tem afectado culturas diferentes de forma semelhante, afectando a identidade de todas. Interessa-me explorar esta fricção, este choque entre o global e o local, ao mesmo tempo que me interessa contactar com culturas de várias latitudes de modo a entender o processo e ajudar a divulgar algumas das suas consequências para com estas pessoas e comunidades. Agora é conhecido como um dos grandes artistas desta área. Mas teve alguma fase em que pintava às escondidas? Se sim, quer contar algum episódio ou descrever essa fase? Sim, pintei graffiti ilegal às escondidas durante anos. Vivia obcecado com a pintura de comboios, faltava à escola, saía de casa à noite às escondidas, deixava de almoçar para guardar dinheiro para comprar tinta. Passava literalmente horas a estudar os movimentos de entrada e saída de comboios nos locais onde eram guardados. Apontava tudo num caderno, era um trabalho sério e rigoroso que me permitia controlar o tráfego, os pontos de fuga, os locais onde se podia pintar sem problemas evitando os seguranças, pessoal ferroviário ou a polícia. Quando comecei a transitar para um tipo de trabalho mais figurativo com base no stencil e fui deixando o graffiti mais vandalístico de parte, continuei a pintar na rua às escondidas, mas era uma coisa muito mais suave. Mesmo quando já expunha em galerias e era convidado para eventos institucionais, continuava a pintar às escondidas. Mas hoje em dia tenho outra vida e poucas oportunidades para o fazer. Que é que a sua arte traz de novo ao mundo? Não sei se traz algo de novo ao mundo, mas gosto de pensar que poderá contribuir de uma forma ou outra para uma reflexão sobre alguns aspectos inerentes às sociedades urbanas contemporâneas e ao modelo de desenvolvimento globalizante que lhes dá forma. De uma forma geral, o trabalho procura reflectir sobre questões de identidade, sobre o modo como indivíduos e comunidades são hoje afectados pelas forças e estímulos presentes num meio que, à escala global, impõe padrões e condutas cada vez mais uniformes. Gosto de levantar questões, de chamar a atenção para determinados assuntos que considero importantes, mas não tenho a pretensão de oferecer respostas e soluções. Se não fosse artista era o quê? Não sei. Veio para Hong Kong recentemente. Porquê essa decisão? A decisão veio na sequência de um convite para trabalhar com a Fundação de Arte Contemporânea de Hong Kong (HOCA), numa exposição individual que irá abrir no próximo dia 21 de Março (no Cais 4). Há algum tempo que tinha uma inclinação para assentar aqui durante alguns meses e desenvolver trabalho e esta exposição veio justificar esta deslocação. Hong Kong não é uma cidade pródiga em manifestações de intervenção urbana ao nível pictórico. Praticamente nem são vistos tags. Como tem sido a sua relação com a cidade, com os artistas, com as autoridades? Tem sido muito boa com todos, mas o trabalho que tenho desenvolvido tem sido com base na sua maioria por comissões em contextos institucionais. Apesar de ter pouca presença de arte no espaço público, é uma cidade muito interessante em vários outros aspectos. Tem marcado muito a minha percepção do espaço urbano e o meu trabalho. Porquê a escolha da RAEHK e não de Macau? Pelo motivo que apontei acima. Tudo partiu do convite da HOCA para expor individualmente em Hong Kong. Teria todo o gosto em fazer o mesmo em Macau. Tem planos para fazer algum tipo de intervenção por cá? Planos e vontade tenho, tenho andado a sondar várias hipóteses mas ainda não se concretizaram. Gostava muito de o conseguir, vamos ver. Quais são os seus projectos actuais e futuros? Tem algum grande objectivo por concretizar? Objectivos tenho imensos. Alguns tenho conseguido concretizar, mas uma vez resolvidos dão lugar a outros por resolver. É isso que me faz andar em frente e querer fazer mais e melhor. Neste momento estou muito ocupado com a produção para esta exposição que abre dia 21 no Cais 4 em Hong Kong Central. Tem por título “Debris” e é a maior e talvez mais ambiciosa que já realizei. Apesar de ter vários outros projectos em diferentes fases de desenvolvimento, de momento toda a energia e recursos estão concentrados neste. Como surgiu a ideia de utilizar explosivos na sua arte? E, já agora, quantas paredes foram abaixo até descobrir a carga certa? Em termos materiais, o uso de explosivos pode ser visto como uma progressão natural da técnica de esculpir paredes e outras superfícies. Em 2010 andava à procura de um processo que fosse ainda mais destrutivo que me permitisse desenvolver uma reflexão sobre o modo como a crise económica que eclodiu em 2008 conseguiu fazer implodir aquilo que tínhamos como seguro nas sociedades prósperas (e sobretudo na Europa), dos valores éticos e sociais às instituições que nos regulam, trazendo à superfície todos os antagonismos e conflitos que pensávamos estarem enterrados há décadas. O conceito surgiu-me como resposta intuitiva a esta ideia de implosão, expressando o facto de que em alturas de crise económica e social basta uma pequena fagulha para trazer à superfície todas as camadas que pensávamos estarem soterradas sob o verniz da civilização. O processo de desenvolvimento da técnica foi interessante, mas muito exigente. Tinha uma ideia que queria pôr em prática, mas nem sabia se seria possível. Pedi ajuda a uma equipa de especialistas em pirotecnia, que também não tinha ideia se iria resultar porque ninguém tinha pensado em usar cargas explosivas desta forma. Para desenvolver o primeiro projecto em 2010 levámos cerca de oito meses para afinar o processo e chegar às cargas certas. No final conseguimos, mas foi o resultado de muitas tentativas e muitos erros. Não deitámos nenhuma parede abaixo, mas danificamos algumas… Como descreve a estética do vandalismo? Como é que o vandalismo pode ser estético se não for fruto de uma propositada manipulação artística? Ou será apenas uma forma bombástica de descrever um processo, uma expressão de marketing? Sim, tem tudo a ver com manipulação intencional, mas não é uma expressão de marketing vazio. O conceito de vandalismo estético devo-o ao graffiti. Vem da ideia de que o graffiti é essencialmente uma prática destrutiva, vandalística, sem qualidades ou intenções estéticas. Eu gosto de subverter esta ideia ao trazer para um meio mais institucional muitas das técnicas e processos destrutivos que são empregues no graffiti para marcar e desfigurar superfícies no meio urbano. Uso-os para criar com uma intenção fundamentalmente estética e artística. Ao recorrer a este conceito e prática de criação através da destruição procuro subverter quer o conceito de vandalismo, quer o conceito daquilo que é artisticamente válido. O processo é muito importante no meu trabalho, mais até do que o resultado final, é aí que se concentram as ideias e os conceitos que exploro. Podemos talvez ver este uso de processos destrutivos como uma espécie de manifesto de princípios. Bansky. Que ideia tem dele como artista? Será que é mesmo apenas uma pessoa? A sua obra, atitude e os conceitos que explora tiveram um grande impacto em mim quando comecei a explorar a técnica do stencil, por volta de 2003/2004. É um artista inteligente e criativo, que tanto sabe explorar o espaço público como manipular a opinião pública e os media e se tem mantido fiel aos seus princípios. Continuo a admirá-lo pelo que fez e ainda faz. Já trabalhei em alguns projectos com ele, alguns dos quais tiveram um impacto enorme. O contacto é sempre feito através da equipa que trabalha com ele. Há de facto uma pessoa por trás do trabalho, mas este é desenvolvido em equipa, uma vez que ele não dá a cara. Em que medida é que o secretismo de Bansky e do das velhas crews de graffiti faz sentido nos dias de hoje? Continua a fazer todo o sentido se as intervenções que se fazem são ilegais. Nesse sentido é natural que se queira preservar o anonimato. Tags. Que ideia tem sobre eles? O graffiti é essencialmente um cancro visual gerado por aquilo que o meio urbano oferece, tanto em termos materiais como imateriais. Pode ser visto como algo belo ou hediondo, mas é um fenómeno gerado pelo meio onde existe. Neste sentido pode ser visto como reflexo, ou até uma síntese, daquilo que existe de melhor e de pior nas sociedades urbanas contemporâneas. Analisado de forma neutra, um tag bem executado pode ser visto como um belo e interessante exercício de expressão caligráfica, mas para a maioria das pessoas é algo nefasto que exprime uma ideia de descontrolo. Para mim, quando bem executado, pode valer mais do que um graffiti elaborado, mas é uma apreciação individual. Também entendo o constrangimento que provocam. Os três melhores murais/pinturas urbanas para si e porquê? É cada vez mais difícil fazer uma escolha destas, pois hoje em dia há muitos artistas a produzir trabalhos excelentes em todos os cantos do mundo. Não querendo ser demasiado parcial prefiro realçar o excelente trabalho que vários artistas têm feito em Lisboa com o programa de arte pública da Galeria Underdogs. Um artista urbano que mereça destaque e porquê? O português AkaCorleone (Pedro Campiche), porque nos últimos anos tem vindo a demonstrar um amadurecimento notável no desenvolvimento do seu trabalho, tanto em peças de galeria como peças murais que pinta no espaço público. Tem desenvolvido uma linguagem visual própria, coerente e facilmente identificável, e tem ganho presença no estrangeiro. É um nome a seguir. No mesmo lote, e pelos mesmos motivos, podia ainda destacar o português Miguel Januário (±MaisMenos±). Música. Que relação tem com a sua arte e com a sua vida? Com a arte em si a ligação não é directa, mas quando trabalho estou sempre a ouvir música, é uma companhia constante e importante. Além disso é a melhor forma de bloquear o ruído do martelo perfurador. Será que a cultura de pintura urbana passou de contra-cultura a uma coisa comportada, quiçá posh e mainstream? Se assim é que espaço fica para a contra-cultura? É uma questão interessante, mas difícil de responder porque o desenvolvimento do fenómeno tem sido multiforme. A sua crescente popularização e aceitação têm feito com que parte tenha sido absorvida pela cultura dominante, mas há ainda uma outra parte que se mantém selvagem e indomada. O que vemos na galeria, no museu ou a ser aproveitado pelo mercado e pelas marcas é arte produzida por artistas ligados a esse meio das intervenções ilegais no espaço público, mas já deixou de ser arte selvagem de rua. Esta continua a viver na rua e para a rua e tudo indica que continua de boa saúde. Se há pureza tem de ser encontrada aí, naquilo que é feito de forma gratuita e é efémero por natureza.
Hoje Macau EventosHoli Festival vai transformar a areia de Hac Sá num arco-íris No próximo dia 20 de Março, das 14h00h às 17h00 a praia da Hac Sá vai transformar-se num misto de cor, devido a mais uma comemoração do Holi Festival. Apesar da sua origem indiana, dadas as características históricas, culturais, sociais e performativas que o integram, o Holi tem vindo a ser realizado cada vez em mais regiões pelo mundo fora e Macau não é excepção. Foi Victor Kumar, indiano radicado em Macau, quem arregaçou as mangas para por Hac Sá a festejar uma das mais importantes celebrações indianas. De origens difusas, existem duas versões relativas à génese deste que é um dos cinco principais festivais indianos: alguns acreditam que a origem do Holi é Krishna, que enquanto pequeno e travesso se divertia em atirar água colorida às leiteiras que passavam, a outra abordagem, e talvez a mais divulgada e unânime, é referente à comemoração da vitória do bem sobre o mal personificada na morte de Holika na fogueira. Reza a lenda que, em tempos, o Hiranyakashipu, rei-demónio dominado pelo egoísmo e sede de veneração, seria por todos bajulado à excepção do seu filho Prahlad, que se manteve devoto de Vishnu. De modo a aniquilar Prahlad, a irmã do rei, Holika, pensando que era imune ao fogo, desafiou o sobrinho para entrarem os dois numa fogueira – contudo, parece que quem morreu carbonizada foi a tia e Prahlab terá saído imune das chamas. Esta victória sobre Holika terá também dado nome ao festival. Estão em ambas as versões implícitas duas das principais características do Holi: por um lado a fogueira – que ainda hoje abre as festividades e cujas cinzas, se crê, são portadoras de boa sorte – e, por outro, as cores que alegram e são mote de toda a celebração enquanto portadoras de virtudes e agoiros de bom futuro. Juntos pelo bem maior O Holi é actualmente, e acima de tudo, um festejar colectivo do bem, da chegada da Primavera e das colheitas que se avizinham, através da cor e da demonstração de amor universal. Curiosamente este é um dos raros momentos em que, na Índia, as pessoas se juntam para além das castas, origens, credos e preconceitos, fazendo do mesmo um grande espaço de encontro. Segundo a organização, este ano, o número de inscrições já superou as participações do ano passado. Victor Kumar afirma ainda, sob o mote, “acrescenta cor à tua vida”, que o “Holi Festival Macau” para além da recriação dos rituais que estão na sua origem, vai ter ainda muita dança, uma performance especial com características Bollywoodescas coreografadas pelo próprio e uma panóplia de actividades e jogos, em que os vencedores terão direito a prémios. E como nada disto se faz de barriga vazia, a acompanhar as festividades estão comes e bebes adequados à festa. Não esquecer o dresscode – tudo de branco (top e calça), para que se possa colorir com mais facilidade e participar activamente, “bem como receber as respectivas bênção”. A entrada está sujeita a registo prévio através do telefone 6393 2002 e custa 150 patacas. A organização admite ainda a possibilidade de alteração de data caso as condições meteorológicas não possibilitem a sua execução.
Joana Freitas EventosWu Ming-yi, escritor: “Mais importante que o sucesso é a felicidade” Wu Ming-yi, considera que o lado mais maravilhoso da escrita é poder fazê-lo contra qualquer tipo de pressão existente. Nascido em Taiwan, e convidado do Festival Literário Rota das Letras, Wu Ming-yi debruça-se sobre a necessidade de cuidar do ambiente e fala ainda de como a felicidade é mais importante que o dinheiro [dropcap]F[/dropcap]alar sobre escrita com Wu Ming-yi é falar em desafios. Sempre que escreve e tenciona publicar alguma coisa, o escritor de Taiwan admite que tem de pensar sempre “se poderá ter algum problema”, ainda que também nos confesse que, na Ilha Formosa, onde nasceu, as coisas não são tão más quanto no continente. “Os escritores taiwaneses preocupam-se sobretudo com o problema da impressão e em ter leitores. Quando publicamos no estrangeiro queremos ser lidos. Já o Governo chinês dá atenção a muitas coisas e o desaparecimento dos livreiros de Hong Kong trouxe um grande alerta para o público. Queremos sempre que haja liberdade para cada publicação e, enquanto escritores, acreditamos que os leitores são inteligentes e que os maus livros vão ser eliminados com o tempo, pela história. Mas a verdade é que, quando era jovem, também não podia ler certos livros, ainda que os lesse com os meus colegas às escondidas. Os políticos nem sempre conhecem bem a humanidade e isso é um limite”, confessa ao HM. Wu Ming-Yi gostava de ver a literatura da ilha mais traduzida, de modo a fazer chegar a “cultura muito própria” de Taiwan ao Ocidente, que considera que vê Taiwan como a vê a China. “As pessoas que vivem em Taiwan sabem que não se trata apenas de política, a cultura é muito diferente”, assegura-nos. O também ambientalista fala-nos da sua ilha, que caracteriza como um território pequeno, com pouco mais de 20 milhões de pessoas e onde “a cultura e a arte têm vindo a desaparecer graças à destruição do ambiente”. A protecção ambiental, diz-nos, sempre foi “um lado importante” da sua vida e muito popular na juventude de Wu Ming-yi. “Nasci em 1971, a pior fase para a poluição, e acabou por ser natural que temas como a ecologia e a protecção do ambiente fossem abordados nas minhas obras”, diz-nos, admitindo que também enquanto dá aulas, já que é professor, aborda estes temas. “Dou uma aula onde se criticam as políticas ecológicas e onde todas as semanas discuto os assuntos relacionados com a protecção ambiental com os meus alunos. Soube do caso da construção de um edifício no Alto de Coloane e dou esse exemplo em relação ao que acontece em Taiwan, onde temos grandes cidades, mas onde não podemos ignorar as pessoas que querem manter um estilo de vida simples ligado ao campo. Espero que sejam os residentes a tomar uma decisão e não o Governo”, atira ainda. Recordar é viver Não é a primeira vez que está em Macau, porque já cá tinha vindo com a mulher e também para dar aulas. Do tempo que já passou, relembra o território como a “vila piscatória e tranquila” que era, ao invés da cidade barulhenta e moderna em que se tornou. Mas Wu Ming-yi assegura que é possível promover “uma convivência e equilíbrios entre a protecção ambiental e o desenvolvimento” urbano. Também a natureza luxuriante de Taiwan está ameaçada pela poluição e vícios da vida moderna, como diz o escritor, à semelhança da população aborígene e da identidade taiwanesa, temas que marcam, aliás, as páginas de “The Man with the Compound Eyes”, o único livro traduzido para Inglês de Wu Ming-Yi e o quarto que publicou. Inspirado no bucolismo dos antigos poetas chineses, o livro recupera um movimento literário taiwanês dos anos 1980, quando o desenvolvimento industrial despertou uma forte consciência ambiental na ilha. Em Macau para a sessão deste ano do Festival Literário Rota das Letras, Wu Ming-yi falou com estudantes locais, que se mostraram até curiosos sobre a cultura da Formosa. Mas não é só isto que parece preocupar os nossos estudantes. “Os jovens de Macau e Hong Kong sentem-se ansiosos em relação ao sistema político ou ao ambiente, os modelos de pensamento nestas regiões são semelhantes. Mas, os pais deveriam encorajar os filhos que querem ser outras coisas, como ser pintores ou artistas de rua. Devem encorajar os seus filhos a encontrar o modelo certo para a sua vida, porque a educação chinesa não é assim. Os pais preocupam-se se os filhos vão ou não ganhar dinheiro. Eu digo sempre aos meus alunos que, mais importante do que ter sucesso, é termos felicidade.” Ainda que tenha pisado pela quarta vez a RAEM, esta foi a primeira vez que veio como escritor, um trabalho que Wu Ming-yi – cujo escritor preferido é Anton Tchekhov – tem de coadunar diariamente com o papel de professor universitário. “Parte do meu dia é passado a escrever e quero sempre ter sempre tempo livre para escrever, mas tenho um horário muito cheio, sobretudo com o trabalho da universidade. Só posso escrever as minhas obras nas férias ou feriados”, diz-nos.
José Simões Morais h | Artes, Letras e IdeiasLiaocheng e a cidade da Água Seguindo o Grande Canal, numa viagem que desde Hangzhou nos levará para Norte até Beijing, tentamos acompanhar o curso desta longa estrada de água, hoje com uma parte dos seus mil e setecentos quilómetros desactivada. Encontramo-nos já no Oeste da província de Shandong (Montanhas Leste) e somos levados à cidade antiga de Liaocheng, que se revela uma agradável surpresa pois, sem nunca a ver registada nos Guias de Viagem, apresentou-se como um lugar turístico escolhido por muitos chineses. Trazemos a curiosidade em perceber como a dinastia Yuan conseguiu resolver o atravessar por água as montanhas, para ligar os celeiros do país, maioritariamente em Zhejiang, até à capital dos mongóis na China, Dadu, a actual Beijing. É a secção mais alta do Grande Canal e por isso, viemos saber como foi resolvido um dos maiores trabalhos chineses de engenharia hidráulica, o conseguir elevar os barcos a atravessar montanhas. A tarefa era difícil pois o terreno levantava uma série de questões, resolvidas com a ajuda de reservatórios e comportas. A construção dessa secção terminou em 1327, sendo realizada por elevadores de água a diferentes níveis, encontrando-se o mais elevado a quarenta e dois metros de altitude. Outro problema mais tarde resolvido foi a turbulência criada nas águas do Grande Canal quando o Rio Amarelo (Huang He), com um nível mais alto, nele caía. Partindo de Jining, em direcção a Liaocheng, a trinta e quatro quilómetros de Dongping o autocarro sai da estrada principal e entra por um desvio de terra batida onde os agitados solavancos molestam os passageiros e a poeira envolve todo o cenário. Os montes estão a ser esgravatados por enormes máquinas, muitos ficando no cume com o espaço reduzido a uma casa, que ali insiste em permanecer. O autocarro parado, na fila de veículos para atravessar o Rio Amarelo, permite-nos vislumbrar aquela paisagem lunar de obras, fazendo os seus estaleiros lembrar o que terá sido a construção de muitas comportas e diques realizada na primeira metade do século XV, para que os sedimentos das águas do rio não atulhassem o Grande Canal, junto ao lago Dongping Hu. A solução foi dada por um cidadão, Bai Ying, durante o reinado do Imperador Chengzu (Yongle) da dinastia Ming, que propôs a escolha de um lugar onde o leito do canal fosse mais elevado. Nesse ponto, onde desaguava o Wen He, a água entrava no Grande Canal e dividia-se para o Sul e para o Norte. Ao longo do canal foram construídos alguns reservatórios, onde a topografia permitia assegurar um suplemento de água, sendo o seu fluxo equilibrado por trinta comportas. Os construtores fizeram o Grande Canal alimentar com as suas águas o Rio Amarelo, resolvendo assim o problema da turbulência e dos sedimentos que o rio transporta. Desde sempre o Rio Amarelo foi uma fonte de problemas e em 1855, no distrito de Lankao, província de Henan, de novo mudou a sua trajectória para Norte, o que levou o Grande Canal a deixar de ser navegável daí até à capital. Chegados ao Rio Amarelo, percebemos porque é que o autocarro percorre aquele desvio. Para o atravessar, uma ponte provisória feita de ferro, tipo ponte das barcas devido às quilhas dos flutuadores, contava com pilares de cimento para aguentar os inúmeros camiões que por ali transitavam. Meses depois aí voltamos a passar e já uma nova ponte está construída. A paisagem mudara completamente desde essa primeira passagem e a quantidade de montes que, apesar de muito surripiados de pedra ali se encontravam, agora desapareceram. Entrando de novo numa impecável estrada de asfalto, vamos passando por campos onde muitos fornos ainda servem para cozer tijolos. Em Donlong voltamos ao contacto com o Grande Canal; a princípio encontramo-lo seco e como vazadouro de lixo, mas, à medida que nos aproximamos de Liaocheng, aos poucos ganha largura e vai-se consolidando. A antiguidade da zona Chegamos a Liaocheng já a noite começa a tomar conta da cidade e por isso, escolhemos o hotel junto ao terminal de autocarros. Apenas necessitando de atravessar a rua, somos abordados por algumas pessoas que nos oferecem quartos por um baixo preço, angariando assim muitos clientes. Ficamos no oitavo andar do hotel e pela janela do quarto, a visão nocturna mostra não haver muitas luzes indicativas da extensão e altura da cidade. Há dois mil e quinhentos anos, no Período Primavera e Outono, para o local onde Liaocheng se encontra o Duque Huan do Estado de Qi marcou uma reunião com todos os duques dos estados afectos à dinastia Zhou do Leste. Aí, na Primavera de 679 a.n.E., o Duque Huan (685-643 a.n.E.) foi escolhido como chefe da Aliança Beixing, nome da localidade onde se realizou o encontro, hoje Juancheng, na municipalidade de Liaocheng e que deu a supremacia ao Estado Qi. Após a reunião, tropas Qi foram enviadas para aí erguerem uma guarnição militar, rodeando-a por árvores Jiao Liao, árvores cheias de espinhos. O local tornou-se estratégico e importante para os Qi, sendo esse bosque em Beixing mais tarde fortificado com muralhas e no seu interior um povoado começou a crescer. No século XIII passou a ser a cidade de Liao, aquando da construção de uma nova via para o Grande Canal. Acordamos e o nevoeiro acinzenta o dia. Desconhecendo a real dimensão de Liaocheng, apanhamos um táxi para nos levar a percorrer a secção Huitong do Grande Canal, que a atravessa. Transportados por uma larga avenida para Oeste, passamos depois por quarteirões, quais degraus numa escada horizontal, onde o VW-Santana vai circulando e sobre uma ponte, o taxista aponta para o lado direito. Vemos o curso de água interrompido por um monte de terra; mas sorridente, coloca-nos a olhar para o outro lado, onde uma marginal bem arranjada leva os nossos olhos até à ponte feita de vários arcos. Daí reparamos na circunvalação em quadrado, que concentricamente envolve por água o pólo originário da cidade. Encontramo-nos perante o Museu do Grande Canal e após visitado, seguimos pelo passeio junto à água, de ponte em ponte. Ornamentadas por estátuas de leões, umas grandes à entrada, outras mais pequenas no vão das pontes e a que nos parece a mais antiga, tem nos pilares junto à água representações do dragão Baxia. O Pagode de Ferro A secção Huitong do Grande Canal alimenta este lago, cujo centro é uma grande ilha, onde se encontra a parte antiga de Liaocheng e para lá chegarmos, atravessamos pontes que ligam pequenas ilhas. Na margem Oeste do Grande Canal, a Guilda Shanshan, conhecida também pelo Templo ao Sábio Guan, levou sessenta e cinco anos a ser construída. Começada em 1743, no tempo do Imperador Qian Long, só terminou em 1809, após muitas extensões para lhe dar os mais de três mil metros quadrados da área que ocupa. Ao longo do canal, pelo jardim onde habitualmente os mais idosos se juntam para jogar cartas, xadrez chinês e go, estão gaiolas com pássaros colocadas nos ramos das árvores para estes, quais filhos únicos, passarem a tarde em convívio. Acompanhando a água, atravessamos uma rua, onde ao fundo vemos a Torre do Tambor, edifício que normalmente marca o centro das cidades. Continuamos para um outro extremo da ilha e aí, as antigas casas foram deitadas abaixo e reconstrói-se a continuação do parque, que se pretende a envolver a zona Norte. Os lagos de água parada estão cheios de pescadores pelas suas margens, enquanto vão sendo rasgados canais para dar continuidade ao que se vai fazendo no centro da cidade, embelezando e criando espaços verdes para lazer. Por fim, após passar por uma ponte de pedra a ser construída com o suporte de terra a servir de apoio ao arco, chegamos junto ao Pagode de Ferro, que com dez metros de altura, é um dos quatro ainda existentes na China. Situa o local do antigo Templo de Long Xin, já inexistente, e na área todos os edifícios estão por terra, sobrando entulho. Nesta viagem temporal, mediada por cinco anos, voltamos ao núcleo da cidade antiga de Liaocheng. Na primeira estadia, a paisagem urbana da ilha central mostrava-se com um forte contraste em relação à cidade nova que a circunda. O quotidiano desenrolava-se sem grande trânsito e as pessoas viviam como em aldeia, sendo as casas térreas e antigas, muitas muralhadas e com pátio, onde o tempo parecia ter parado e muito se diferenciava da outra parte da cidade. Agora, dentro já de um urbanismo cuidado, os novos prédios avançam a cidade e entre eles, o canal Huitong, construído no século XIII, vai sendo dragado aos poucos. Por fim o lago, onde a cidade ganha espelho. Toda ela mostra aos nossos olhos o que estes não se tinham apercebido aquando da visita ao antiquíssimo local de Yang Cheng em Changzhou, província de Jiangsu. Aí faltava o balão para subir e ver de cima o que seria um povoado há três milénios. Essa visão foi-nos oferecida no Museu do Grande Canal, onde varandas em cada um dos três andares permitem ver por cima a planta de Liaocheng. A actualidade do antigo Sem perceber como, encontramo-nos na parte antiga da cidade, onde as ruas e passeios, que eram em terra, vão sendo revestidos com pedra e quanto mais nos aproximamos do centro, mais intenso o trabalho das obras. Entramos por estreitas ruas, cujos altos muros escondem os pátios das casas, sendo a nossa curiosidade satisfeita por portões abertos a mostrar de frente um mural de azulejos a receber quem entra. Já no centro da ilha, a Torre Guangyue foi construída por Chen Yong em 1374 e usou os materiais que sobraram da reconstrução da cidade, feita dois anos antes. Esta, transformada de terra para pedra, passou nessa altura a chamar-se Feng Huang Cheng, cidade Fénix. Da Torre Guangyue, partem quatro ruas e em torno dessa praça, alguns Bancos perceberam há muito, que aí virá a ser o lugar mais turístico da cidade e por isso colocaram agências nos edifícios para ela virados. Também uma casa com jardim bem arranjado parece ser um museu de alguém famoso, mas está fechado. Depois um outro edifício, este de madeira e de grandes dimensões, chama a atenção e ao tentar entrar, dizem-nos que o museu de pintura fica no outro lado do mesmo complexo. Continuando a explorar a cidade antiga dentro da ilha percebemos que esta não terá mais de três quilómetros de diâmetro. Ao passear por um dos seus cantos, encontramos um idoso vestindo roupas que já desapareceram do quotidiano chinês, o que nos chama a atenção e pedindo para o fotografar, aceita. Já nas despedidas diz-nos algo e pelo gesto parece pedir para lhe enviarmos a fotografia. Retiramos o bloco do bolso e passando-o para as suas mãos, começa a escrever, o que pensamos ser o endereço, mas este não pára e ocupa a folha toda. Tentamos saber em todos aqueles caracteres onde a se encontra a morada e então, com poucas palavras, convida-nos a ir a sua casa. Den Jin Lu nascera em 1925 em Liaocheng e aos dez anos servira como ajudante voluntário no exército. Já em 1936 juntou-se a Zhou Enlai durante dois meses e desde Julho desse ano passou a seguir Fan Zhu Xian, entrando em 1940 para o Exército e tornou-se membro do partido Comunista passado três anos. Estudou na universidade e combateu os japoneses, tendo o senhor Den em 2004 escrito sobre essa época e o seu superior Fan Zhu Xian. Ainda nessas deambulações damos com um artista que, pelas dimensões da folha de papel de arroz onde desenvolve a reprodução de uma pintura a tinta de água, necessita da rua para atelier. Olhando ao fundo os altos edifícios, saímos da cidade antiga pela longa e bonita ponte de mármore branco. Com vinte e um arcos, tem as pedras gravadas em relevo com imagens retiradas da novela do século XIV, Margem da Água (ShuihuZhuan), a representar histórias como a de Wu Song bateu num tigre até este morrer, ou Sun Er-Niang tornou-se dono de um restaurante, matando e comendo os seus comensais. Na segunda visita, em 2012, estranhamos o que os nossos olhos vêem. A cidade antiga está a ser muralhada, contando já com uma grande frente e uma porta. Chegados à parte nova da cidade, seguimos para apanhar o autocarro em direcção a Linqing e continuar a perseguir o Grande Canal. Liaocheng é uma cidade com vasto potencial para surpreender pela positiva os visitantes. Se para um estrangeiro, o que esta cidade tem para mostrar não parece significativo, comparado com os muitos locais de grande qualidade e antiguidade que existem pela China, já para o turismo interno mostra-se com grandes potencialidades, tanto culturais, como históricas e de lazer. Esconde ainda por baixo da terra muitos episódios do livro da História antiga da Civilização chinesa, que ficarão para outra história.
Manuel Afonso Costa Fichas de Leitura h | Artes, Letras e IdeiasO ovo da serpente: secularização e progresso Broch, Hermann, Os Sonâmbulos, Edições 70, Lisboa, 1989 Descritores: Literatura, Austríaca, Romance, Império Austro-Húngaro, Primeira Guerra Mundial, Valores, Crise, Fascismo, trad. de António Ferreira Marques, 167, [1] p. 2 v.:23 cm Cota: C-4-4-259,260 Hermann Broch, de origem judaica, nasceu a 1 de Novembro de 1886 em Viena, à época capital do Império Austro-Húngaro. O consagrado escritor veio a falecer nos Estados Unidos da América em New Haven no estado de Connecticut no dia 30 de Maio de 1951. Teve como a maior parte dos judeus daquele tempo uma vida atribulada, tendo sido preso pelos alemães logo após a anexação da Áustria à Alemanha em 1938. Conseguiu contudo ser libertado, através da intervenção da comunidade intelectual, em particular de James Joyce, e depois acabou por emigrar primeiro para o Reino Unido e finalmente para a América. Durante anos dedicou-se a uma vida de aventura e boémia durante a qual se casou e separou várias vezes. Casou primeiro com Franziska von Rothermann e mais tarde com Milena Jesenská. Por causa de Eva Von Allesch, jornalista, ex-modelo nu e designada a Rainha do Café Central, Broch rompeu o casamento com Jesenská, que, ao que parece começou uma relação com o escritor Franz Kafka. Antes do seu primeiro casamento tinha-se convertido ao catolicismo. Pôs termo a esta fase da sua vida vendendo os seus bens e dedicando-se completamente aos estudos e à literatura. Estudou Matemática, Psicologia e filosofia na Universidade de Viena entre 1926 e 1930 e conviveu com insignes escritores, como Rainer Maria Rilke, Elias Canetti e Robert Musil. Da sua obra destaca-se justamente A Morte de Virgílio considerada a sua obra prima, mas também Os Sonâmbulos e Os Inocentes no domínio da ficção. No domínio do ensaio merece menção honrosa, o Geist Und Zeitgeist: Essays zur Kultur der Moderne, que reúne seis ensaios do autor. Em língua portuguesa apareceu com o título Espírito e Espírito de Época— Ensaios sobre a Cultura da Modernidade, onde se discute, em particular, a questão do kitsch na modernidade. O romance Os Sonâmbulos consta de três volumes, a saber, Pasenow ou o Romantismo: 1888; Esch ou a Anarquia: 1903; e Huguenau ou a Objectividade: 1918. O primeiro volume mergulha arqueologicamente no século XIX. Tudo leva a crer que foi aí que a crise começou. Terá sido aí que um certo mal estar civilizacional começou a fazer o seu caminho. E nesse primeiro volume o que interessa ressalvar é a brutal ascensão das massas, o Ovo da Serpente, associada à inevitabilidade da defesa dos valores da Modernidade, ou seja, progresso, felicidade para o maior número, ascensão social, democracia e direitos. Alguns intelectuais terão pensado levianamente que era possível promover tudo isto, que representava uma rotura imensa com a tradição e que ao mesmo tempo o sistema axiológico se mantivesse incólume e, ainda, que no fundo fosse possível adequar a nova ordem ao espartilho da ordem antiga, hierarquizada, disciplinada, diferenciada, portanto holista numa palavra, quando deveria ser óbvio que a revolução individualista e de massas exigia uma ordem nova, com valores de outra natureza, desde logo porque o equilíbrio e harmonia orgânica seriam abalados desde os seus alicerces e pressupostos e a primeira fase da fragmentação alucinante iria produzir como não podia deixar de ser e veio a acontecer, intranquilidade, desespero, insegurança e sobretudo vazio político mas também axiológico. Foi esse vazio que as modalidades endurecidas da modernidade exploraram sob várias formas, que aqui não vêm agora ao caso. Esch simbolizará premonitoriamente o esforço de organização do caos e nesse sentido o esforço de reconfiguração dos valores desmoronados. Tenho para mim que Esch, quer dizer Broch, não assumiu tanto quanto devia uma crítica ao tempo ultrapassado e portanto persiste sempre neste tipo de exercícios uma vontade de regeneração pelo regresso que embaraça em vez de desembaraçar e portanto a superação inclui o removido mas não à maneira hegeliana enquanto aufbhung dialéctica mas enquanto nostalgia. Como não há uma proposta de superação radical assente numa crítica e condenação das sociedades de antigo regime constitutivamente iníquas e moralmente decadentes abre-se a porta à reificação ideológica dos modelos que a história removeu, a formas de tirania agora sem a caução que a metafísica lhes conferia. O fascismo e o comunismo mais não são do que o holismo antigo imposto de forma autoritária. O terceiro volume consagra o arrivista sem valores, niilista, ou seja o arauto de uma expansão vitalista de uma ideia de poder e de domínio. Trata-se do individualismo mal interpretado, levado às suas últimas consequências. Mas Broch nunca compreendeu o individualismo senão na sua versão deletéria de independência e egoísmo, na sua versão leibnitziana de mónadas sem portas nem janelas, de gerador portanto de fragmentação e caos e jamais na sua perspectiva emancipadora da autonomia assente na ética kantiana. Nunca se perceberam muito bem, ou não se quiseram perceber, os motivos pelos quais Kant foi tão coerentemente anti eudemonista e as razões pelas quais a sua deontologia ética e moral promove o imperativo categórico, à margem da mínima suspeita de sentido do interesse egoísta, ao mesmo tempo que remete todo esse universo para um avatar do individualismo na sua versão hedonista e utilitarista. Herman Broch não percebeu ou percebeu, mas ao desafio complexo da Modernidade, com as suas inevitáveis crises de crescimento, prefere o retorno a um mundo mais estável, mais disciplinado, como se de resto isso fosse ainda possível. Coerentemente ao menos foi buscar as causas da sua ideia de decadência onde elas de facto, sejamos justos, se começaram a manifestar, ou seja naquela época da história em que o edifício da secularização, da autonomia, da liberdade e portanto do humanismo se começou a construir, quer dizer no Renascimento. Ele é corajoso no diagnóstico, ainda que esteja completamente errado: A origem da crise está n’ “Aquela época criminosa e rebelde que é chamada de Renascimento, aquela época que cindiu a estrutura de valores cristã em uma metade católica e outra metade protestante, aquela época em que, com o desmoronamento do órganon medieval, principiou o processo de dissolução dos valores que duraria quinhentos anos e no qual se deitou a semente da modernidade, (…)” Notável a clareza do equívoco. E mais lucidamente ainda Broch não deixa de salientar que não obstante não se pode nem deve imputar a responsabilidade a nenhuma das partes do complexo sistema, seja o individualismo, seja o protestantismo, seja a revolução humanista e científica, seja lá o que for. A culpa para Broch reside, usando uma ideia de episteme à maneira de Foucault, no puzzle conceptual moderno, no modo como as mesmas categorias se organizaram de modo diverso e para ele calamitoso. Eu penso modestamente que sei, mas penso que Herman Broch não sabia, provavelmente não o poderia saber: que a transformação nuclear que fez desmoronar o órganon medieval e no plano social esse organon é holista e corporativo, não foi o Renascimento, nem a Reforma, foi a revolução epistémica desencadeada no interior da própria Idade Média e protagonizada por Dun Scoto e Guilherme de Occam. É a posição do nominalismo na Questão dos Universais que promove a dissolução da harmonia social medieval. Provavelmente até o Renascimento é já um epifenómeno e uma consequência da revolução nominalista. Mas, e não pretendendo adequar-me excessivamente à cartilha ideológica marxista da teoria do reflexo entre o domínio económico-social da infraestrutura e o tecto da superestrutura, quem se atreverá a não reconhecer o papel determinante, na corrosão do holismo corporativo medieval, das transformações económicas e sociais que começam na baixa Idade Média com as sucessivas revoluções económicas, em torno das actividades agrícolas, artesanais, comerciais e demográficas que culminarão na revolução urbana que aos poucos vai modificar a configuração social da Europa e onde acabarão por se evidenciar dinamismos revolucionários deletérios relativamente à ordem tradicional e propiciadores de uma reconfiguração social de tipo novo e inédito, de algum modo. Afinal o individualismo emergente que o nominalismo consagra no plano intelectual possui os contornos de uma transformação sistemática dos modos de vida, das relações sociais e de poder, às quais não foi estranha a revolução das comunas ou dos concelhos. Para quê tapar o sol com a peneira da ignorância, quando qualquer estudo sistemático e integrador das múltiplas dimensões do processo histórico aponta para modificações estruturais e, parece-me, irreversíveis. A modernidade não foi uma opção, a Modernidade era o nosso destino.
Sérgio Fonseca DesportoFederação de Motociclismo de Portugal quer manter quota no GP Motos No próximo mês de Novembro Macau celebra o seu 50º Grande Prémio de Motos, um evento que será tão relevante para a RAEM, como também o é para Portugal, onde o evento goza de muitos aficionados. Mantendo a boa relação com as entidades responsáveis da RAEM, que dura deste o tempo da Administração portuguesa do território, a Federação de Motociclismo de Portugal (FMP) quer estar representada à altura na celebração da quinquagésima edição. André Pires e Nuno Caetano foram nos dois últimos anos os únicos representantes de Portugal na prova. Caetano, que o ano passado se viu privado de participar na corrida do Circuito da Guia devido a uma lesão na clavícula, após se ter qualificado em 30º, anunciou em Fevereiro o abandono das pistas. Na sua página oficial da rede social Facebook, o experiente piloto português, 24º classificado no Grande Prémio de Macau em 2013 e nome habitual nas principais provas de estrada mundiais, revelou que decidiu pendurar o capacete para se dedicar totalmente à sua vida profissional e familiar. Contudo, a FMP está confiante que se irá manter bem representada no evento de fim de época. “A participação de pilotos portugueses no Grande Prémio de Macau está dependente do amável convite da Comissão Organizadora do Grande Prémio à FMP. Satisfeito este pressuposto, o que nos agradaria seria de, pelo menos, manter a participação dos anos anteriores”, explicou ao HM Armando Vieira Marques, Director-Geral e Membro da Comissão de Velocidade da FMP. Tudo sobre rodas Apesar da ausência certa de Caetano e dos rigorosos critérios de selecção de participantes, o dirigente português está tranquilo quanto à qualidade da participação lusitana na prova, pois existem “outros pilotos que já participaram no Grande Prémio de Macau e que poderão cumprir com os critérios de elegibilidade”, diz. Poucos dias depois de Caetano ter dito adeus à competição, André Pires aproveitou para, também na rede social Facebook, revelar que um dos seus projectos para 2016 será competir no TT da Ilha de Man, a prova rainha da especialidade. Pires, que está mais habituado à competição em autódromos no Campeonato Nacional de Velocidade, onde foi campeão de Superbike em 2014, para além de contar com dois título nacionais em 125GP e SuperStock 600 no seu currículo, ainda não definiu onde correrá este ano, mas é praticamente presença confirmada na prova de Macau se Portugal mantiver a quota de dois convites. O motociclista de Vila Pouca de Aguiar foi 20º classificado na edição passada do Grande Prémio, aos comandos de uma Yamaha, tendo logo na altura deixado claro “querer vir cá outra vez” este ano.
André Ritchie Sorrindo Sempre VozesO Sotaque Era eu estudante do Liceu e tinha umas amigas de origem africana que, quando juntas, falavam português com um sotaque próprio da terra delas. Faziam-no a brincar, mas não eram propriamente low-profile quando o faziam e até era visível um certo orgulho da parte delas. Um dia, para provocar, perguntei-lhes porque apenas falavam assim quando entre si: ou seja, para onde ia aquele sotaque quando falavam comigo e com outros, porque revertiam logo para um português de pronúncia neutra? A resposta que obtive foi categórica: “e porque não falas tu com sotaque macaense quando estás connosco?” * * * No meu ano de caloiro no Porto fui um dia jantar com uma conterrânea minha, Macaense, estudante universitária que já lá estava desde o ano lectivo anterior. À boa maneira maquista, a nossa conversa à mesa foi feita num misto de português e chinês. Contudo, quando chegou o empregado de mesa e começámos a fazer o pedido, algo de totalmente inesperado deixou-me boquiaberto: da minha amiga, Macaense de gema com apenas um ano de vivência na Invicta, saiu um português com fortíssima pronúncia do Porto. Frase que me ficou na memória: “E para mim é um cuópu de beinho bráunco”. * * * Uma das coisas que me fascina em Singapura é o Singlish, uma vez que representa bem o melting pot que é aquela Cidade-Estado. Além disso, não posso deixar de achar piada ao sotaque dessa particular forma de inglês e, sendo eu falante de chinês, consigo compreender na perfeição algumas expressões típicas do Singlish. Uma das minhas favoritas é o “like this also can” (leia-se “lái this also caaaaaan”), equivalente ao kam tou tak (*) em chinês. Costumava ir com alguma frequência a Singapura. Em tempos fui convidado para o casamento de uns amigos meus e, na igreja, tive de fazer uma leitura em inglês. No final da cerimónia uma senhora veio dar-me os parabéns pela minha excelente pronúncia. Fiquei surpreendido pois sempre considerei o meu inglês uma mistela, um broken english fruto do que aprendi no Liceu – onde tive bons professores – complementado com o que fui apanhando pelo caminho com os meus amigos filipinos e anglo-saxónicos de origem diversa. “Really?”, respondi sem esconder a minha surpresa. “Mine’s not really British or the Queen’s English, is it?”, acrescentei. “Well.. For one thing, it sounded like proper English, not Singlish…”, respondeu. * * * Caríssimo leitor, este é um assunto sensível para nós, Macaenses: o nosso sotaque quando falamos português e, numa abordagem mais alargada da questão, o nosso domínio da língua portuguesa. E ainda outros complexos. Não sendo linguista ou intelectual, homem da cultura, orador de conferência ou profundo conhecedor da História de Macau – muito menos do tipo que só é capaz de falar do antigamente, do presente tem pouca opinião e do futuro nem um pouco de visão – atrevo-me ainda assim a debruçar-me sobre este tema. O sotaque Macaense é como o Minchi: cada casa tem o seu, não existe propriamente um standard. Mas, tal como o Minchi, tem as suas características principais que todos reconhecem. O sotaque em si não é um problema e não tem mal nenhum: é o que é e até podia ser motivo de orgulho ou a nossa imagem de marca, tal como o Singlish em Singapura. O problema é quando o sotaque é misturado e/ou confundido com o português gramaticalmente mal falado, que por sua vez é associado àquele que não é instruído. Conversa de elitista? Não. A conversa do “tem curso, não tem curso” é um complexo que de certa forma herdámos de Portugal, onde ainda se mantém a formalidade de se colocar o título à frente do nome das pessoas – é o senhor doutor, o senhor arquitecto ou o senhor engenheiro – e até se inventou o título Comendador para quem não tem canudo. (Não fique ofendido quem tem esse título, não é minha intenção desrespeitar quem não teve a oportunidade de tirar um curso superior e que subiu a pulso com base nos conhecimentos da “escola da vida”, e que por essa razão até merece a minha maior consideração). O caríssimo leitor poderá não concordar com esse ponto de vista, mas entenda como a opinião de quem o sentiu com alguma intensidade ao longo da sua infância no seio da comunidade Macaense. Não sendo propriamente do tempo em que se anunciava no jornal que fulano de tal, filho de tal, tinha partido para Portugal para prosseguir com os seus estudos superiores – sim, porque ir estudar para Portugal era motivo suficientemente importante para notícia no jornal – é um facto que esses tempos existiram aqui em Macau, pelo que regressar da Metrópole com canudo na mão conferia por si só um certo estatuto na nossa comunidade ao recém-licenciado. O sotaque prende-se então com isso tudo, com esses complexos todos, e naturalmente com a insegurança de muitos. Aliando-se isso tudo às crises de identidade e todas as tempestades emocionais que nós, Macaenses, de vez em quando, por razões diversas, enfrentamos dada a nossa natureza mestiça, isso tudo leva a que por vezes tenhamos comportamos inexplicáveis no que concerne ao uso da língua portuguesa. Não é por acaso que temos a expressão “torâ português” em Patuá, a qual se refere àquele que, de uma forma forçada e pouco natural, procura falar português com pronúncia de Portugal. Há umas décadas atrás chegámos até a ter no hemiciclo um ilustre Macaense que o torrava de forma particularmente anedótica, transformando todos os “r” em “rr”. Aliás, o senhor era de tal forma diligente que até aplicava essa fórmula ao seu próprio nome. Por outro lado, há também aqueles que, por insegurança, têm vergonha de falar português à frente de determinadas pessoas, refugiando-se no inglês ou no chinês. Em que ficamos, então? Não tenho nenhuma conclusão e nem sequer me atrevo a tecê-las. Mas apetece-me referir que, felizmente, muitos são os que não têm complexos nenhuns e falam à sua maneira, com o sotaque maquista e mesmo cometendo calinadas gramaticais. E ainda bem que assim é. Afinal o Patuá, de que tanto nos orgulhamos e do qual se deriva a nossa maneira particular de falar português, é também fruto de uma interpretação local da língua portuguesa, com inúmeras frases e expressões feitas com base numa construção gramatical chinesa e, de certa forma, um português mal falado, não? Além disso, Não estamos nós já habituados de ver na televisão, mesmo da boca dos ilustres políticos portugueses dirigentes do nosso país, erros de português? Os habituais “há-des” em vez do “hás-de”; o “interviu” em vez do “interveio”; o “evolóiem” em vez do “evoluem”; o “fostes” em vez do “foste”… Portanto, se o senhor doutor de Portugal pódi, porque temos nós tantos complexos, porque nós tamém num pódi? Sorrindo Sempre Karma hits you back, costuma-se dizer. No entanto, este ditado muito em voga nas redes sociais é aplicável nas situações em que fazemos mal a alguém, certo? Ora, porquê decidiu o karma hit me back numa situação em que tratei bem alguém é algo que não consigo compreender. Pois que há tempos escrevi um artigo a defender a polícia de Hong Kong na sequência daquela (absurda) revolta do yu tan. E, numa interpretação mais abrangente do artigo, defendi também os representantes do Governo que são vulgarmente maltratados pela população. (**) Contudo, dias a seguir, acabei eu por ser vítima de maltrato de um polícia de trânsito. Estava o senhor a passar-me a multa quando me aproximei do carro. Sem eu ter dito uma única palavra que fosse, o agente da autoridade decide desancar-me de cima a baixo, com um tom de voz agressivo em que faltaram apenas os palavrões para completar a coisa. Não me contive e respondi que achava inadmissível ele falar assim comigo. Houve uma pequena troca de palavras, embora nada do outro mundo porque, ainda assim, mantive a calma – ao contrário do outro. Moral da história? Nada de especial. Mas não havia necessidade. (*) 咁都得 : em tradução directa para português, o equivalente a “assim também pode” (**) “Rebeldes do Yu Tan”, edição de 19 de Fevereiro de 2016 do jornal Hoje Macau
Hoje Macau Perfil PessoasGonçalo Ferreira, colorista: “Trabalhar com Johnny To seria um sonho” Antes de vir para Macau, Gonçalo trabalhou durante sete anos na Tóbis. Saiu por causa da privatização. Corrigiu a cor de filmes de vários realizadores como Manoel de Oliveira, Pedro Costa, Edgar Pêra ou João Botelho e, por cá, além de continuar na área, é também formador em workshops e dá um módulo na Universidade de São José. Veio para Macau porque “o processo de privatização da Tóbis foi doloroso”. Uma situação que não entendeu pois, diz, “apesar de ser um processo difícil nós tínhamos trabalho. Eu estava a fazer 16 horas por dia…”, recorda. Mas não recebia a horas, a mulher estava na mesma empresa e, com filhos para criar, criou-se o cenário perfeito para a mudança. “Já cá tinha estado duas vezes e tinha gostado imenso. Depois tinha os filmes de Hong Kong no meu imaginário, cresci a vê-los, o Johnny To… e queria fazer um bocadinho parte disto”. Não pensava que conseguir manter-se como colorista por aqui, mas hoje, cinco anos volvidos, aos 39 anos de idade, Gonçalo confessa nunca ter pensado fazer tanta correcção de cor apesar de, lamenta, “a maioria ser publicidade e não cinema”. Isso fica a dever-se, na sua opinião, “filmar-se mais em Macau, apareceram as novas câmaras digitais que são muito complexas a nível de cor, e eu já tinha alguma experiência com elas..”, explica. Trabalho suficiente para já ter justificado o investimento numa estação de trabalho. Gosta de viver em Macau, não pensa ficar por cá, mas também não tem planos para se ir embora: “Sentimos saudades de Portugal; da família, dos amigos, do mar…” Tem 3 filhos, um de 12, outro de nove e uma menina de seis, a única sem memória de Portugal. A indecisão tem a ver com o facto de já ter sentido “mais esperança na vida em Macau”, porque, explica, “não é um sitio barato para viver”. O lado positivo são os amigos que tem feito e os vários destinos que se espraiam à volta como as Filipinas, o Japão, Taiwan ou a Tailândia que, de outra forma, seriam de difícil acesso. Cinema, sempre Sempre quis trabalhar em cinema e, especialmente, em pós produção. Via-se como editor mas o advento dos processos digitais abriu a nova profissão de colorista. Antes, explica Gonçalo, “era um processo físico, de revelação de película, onde era apenas possível definir se o filme seria mais claro ou mais escuro, mais quente ou mais frio”. Estavam estas novas ferramentas a surgir quando entrou nos laboratórios da Tóbis. Respondeu a um concurso onde apareceram 100 mas só entravam três, e conseguiu ser escolhido. Foi trabalhar num grande projecto de restauro da RTP e depois, “tive sorte”, confessa, “estava tudo a começar e acabei por ser formado pelos tipos da Da Vinci”. Cor que conta histórias “A correcção de cor é um complemento do guião, um suporte da história, a segunda parte do trabalho do director de fotografia, é o trabalho das sensações, do apuro da mensagem que o filme pretende passar”, elucida Gonçalo. Dando exemplos, refere-se aos “clichés do cinema de hoje onde as cenas quentes são geralmente amarelas, as frias mais azuladas, as de noite são esverdeadas ou azuladas…” Aí quisemos saber porque se convencionou que a noite seria azul e Gonçalo revela: “foi a técnica que os americanos desenvolveram nos westerns, a “American Night”. Filmavam de dia e depois tornavam tudo azul e mais escuro para parecer noite. Há mesmo imensos filmes desses, que se tornaram numa piada, em que se vê os actores a andarem à noite com sombras por todo lado”. Costa e To Pedro Costa é o cineasta preferido de Gonçalo. “Fiz a correcção de todos os seus filmes até ao momento”, diz orgulhoso, um trabalho que considera “dar-lhe um prazer especial porque as sessões com o Pedro Costa são muito diferentes, e porque gosto dos filmes dele”. Uma diferença que, para Gonçalo, acontece “porque ele abandonou a ideia de grandes equipas e prefere trabalhar apenas com grupos mais reduzidos, para aproximar mais a equipa, ele, a câmara e o actor. Um processo quase promíscuo, que depois também se reflecte na cor. Para além disso, com Pedro Costa percebi que o cinema pode ser muita coisa.” Mas há algo que pode mesmo adiar significativamente uma eventual partida de Macau: Johnny To, o icónico realizador de Hong Kong, de quem Gonçalo se considera grande fã, e a oportunidade até pode estar próxima. Foi a propósito do filme de outro realizador, mas “o curioso é que tudo aconteceu à conta de Pedro Costa”, explica Gonçalo, pois o produtor do To é fã do realizador português e quis conhecer o Gonçalo: “um dia apareceu-me lá no estúdio para me conhecer e foi engraçado porque ele só me fazia perguntas sobre o Pedro Costa e eu só lhe fazia perguntas sobre o Johnny To” (risos). Para já, irá trabalhar num filme do mesmo produtor mas de outro realizador. Mas a pergunta ‘gostarias de trabalhar com o Johnny?’ já lhe foi colocada.
Flora Fong Manchete SociedadeHotel Estoril | Associações contra decisão do Governo de não classificar edifício O Governo decidiu não classificar o edifício do Hotel Estoril, mas associações ouvidas pelo HM lamentam a decisão por se tratar, dizem, de um lugar com valor histórico e cultural. O deputado Ng Kuok Cheong duvida da composição do Conselho do Património Cultural [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]maioria dos membros do Conselho do Património Cultural (CPC) entendeu que o edifício do antigo Hotel Estoril não merece ser classificado, uma decisão que não gera acordo junto de associações ouvidas pelo HM. Em Setembro do ano passado, o grupo Root Planning, ligado ao urbanismo, entregou uma petição que pedia a classificação do edifício como património, tendo sido recolhidas mais de cem assinaturas nas redes sociais nesse sentido. Na rede social Facebook, o Root Planning mostrou-se descontente com a decisão do Governo. “Já tínhamos feito um pedido de avaliação do edifício do antigo Hotel Estoril em Agosto do ano passado e já tínhamos elaborado um projecto de suspensão do plano de reconstrução. Passado meio ano sabemos que o Instituto Cultural (IC) e o CPC decidiram que não vão iniciar o processo de classificação. Achamos isso lamentável”, pode ler-se. Ao HM, o deputado Ng Kuok Cheong defendeu que o Governo tratou a questão “de acordo com a lei”, já que a decisão foi tomada pelo Conselho. Mas acredita que os cidadãos podem reflectir sobre o grau de aceitação das decisões tomadas pelos membros do Conselho. “O Governo ouviu as opiniões da população e isso correspondeu ao processo de decisão do Conselho. Podemos criticar se o Governo nomeou os membros errados, até porque estes não são eleitos directamente. Podemos duvidar da sua composição”, referiu Ng Kuok Cheong. O deputado pró-democrata apresentou em Fevereiro do ano passado uma interpelação escrita onde exigiu uma classificação do antigo Hotel Estoril como património cultural. Ng Kuok Cheong criticou o facto do IC nada ter feito depois da petição ter sido entregue. Grandes valores Quem também lamenta a decisão do Executivo é Wong Ka Fai, presidente da Associação para a Reinvenção de Estudos do Património Cultural de Macau, defendendo que o Hotel Estoril está ligado à memória de pessoas famosas, como é o caso do magnata do Jogo, Stanley Ho. “O edifício era muito bonito na altura. Embora não tenha sido classificado tem um grande valor histórico. É uma pena o Governo ter tomado esta decisão”, apontou. Wong Ka Fai comparou o caso ao edifício da Rua da Barca, que o IC quer preservar, defendendo que o antigo Hotel Estoril tem mais valor e está menos destruído. Cheang Kuok Keong, presidente da Associação para a Protecção do Património Histórico e Cultural de Macau, e também membro do CPC, disse ter votado a favor da classificação, tendo ficado desapontado com o resultado. “Não se trata da questão se o edifício é feio ou não, mas temos de olhar também para a sua história, enquanto símbolo do desenvolvimento do sector do Jogo”, disse. Para Cheang Kuok Keong, se Macau dá importância às indústrias culturais e criativas, então o edifício deve estar incluído no património local. “Esperamos que o Governo dê atenção à lei e não negue a petição que foi entregue, não deve destruir o património assim tão facilmente”, referiu. Manter a fachada Ung Vai Meng, presidente do IC, referiu que “a autenticidade do antigo hotel é algo incerto”, tendo em conta os novos materiais encontrados pela Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), os registos no Arquivo de Macau e na Conservatória do Registo Predial. Ung Vai Meng disse que esses dados “não correspondem aos critérios de classificação para património da Lei de Salvaguarda do Património Cultural”. Wong Ka Fai não concorda com estas declarações. “Há muito património que sofreu várias reparações ou um acréscimo de diferentes materiais. Não se pode negar o valor de um edifício assim, porque os bens imóveis estão ligados a uma comunidade”, disse. Ung Vai Meng disse que ainda vai ser considerada a preservação do painel presente na fachada, da autoria do italiano Oseo Acconci. A associação de Wong Ka Fai defende a manutenção do painel, sendo que este espera que o IC continue com o plano de destinar este edifício a actividades juvenis e ao acolhimento do Conservatório de Música. O presidente do IC admitiu ainda que os especialistas “internacionais e do interior da China” que era suposto terem vindo avaliar a importância do edifício não chegaram a vir “por falta de tempo”.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeCPU | Pedidos mais limites ao projecto do Instituto Salesiano Os membros do Conselho do Planeamento Urbanístico defendem a preservação do estilo arquitectónico do Instituto Salesiano, por se tratar de um edifício centenário, e exigem limitações ao projecto de reconstrução. O projecto foi aprovado, mas será alvo de alterações [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]Conselho do Planeamento Urbanístico (CPU) debruçou-se ontem sobre o projecto de reconstrução do Instituto Salesiano, na Rua do Padre António, tendo os seus membros apoiado a manutenção do valor histórico de um edifício com mais de cem anos. Pedem, contudo, que o Instituto Cultural (IC) e a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) estabeleçam limitações quanto à reconstrução do projecto. “Muitas escolas optam por reconstruir para terem mais andares, por ser difícil pedir mais terrenos ao Governo. Não sei se as Obras Públicas podem definir mais critérios para a reconstrução. Entendo que a fachada deve ser preservada e deve haver uma harmonia com o Centro Histórico. Não sei se será possível estabelecer limites para manter o estilo arquitectónico. Os próprios requerentes não entendem a história do edifício. O Conselho deve determinar com mais detalhe estas exigências”, apontou Lam Lon Wai, um dos membros do CPU. “Para preservar o edifício de forma global não é fácil”, apontou Lam Iek Chit. “Os estudantes disseram-me que esta escola tem uma história com mais de cem anos. As escadas têm o seu valor próprio e devemos pensar mais sobre este projecto e não dizermos apenas que vamos preservar a fachada”, apontou o também membro do CPU. Acelerar processos Durante o processo de consulta pública foram apresentadas 918 opiniões ao CPU, sendo que algumas falam da necessidade de realização de uma consulta pública caso o projecto seja suspenso. “Falei com alguns professores que me referiram que este projecto existe há sete ou oito anos e penso que o Governo deve acelerar este processo”, referiu Lok Wai Kin. “Há várias formas de manter as condições antigas e claro que esse não é o plano da escola. Mas se não limitarmos eles podem destruir”, avançou outro membro do CPU. Leong Wai Man, representante do IC, apenas referiu que o organismo “avalia o valor histórico” e que vai ser ponderado o seu valor arquitectónico. “Quanto aos pilares e à fachada devem ser mantidos. Deve ser cumprida esta exigência, à frente existe a Igreja de São Lourenço e perto temos a Sede do Governo. Temos de ponderar também em relação ao Centro Histórico de Macau. Se a escola pretender recuperar o estilo não discordamos”, apontou. Raimundo do Rosário, Secretário para as Obras Públicas e Transportes, defendeu a presença do director do Instituto Salesiano na próxima reunião do CPU, sendo que alguns membros defenderam mesmo a realização de uma visita ao local. Apesar das questões levantadas, a maioria dos membros mostrou-se a favor do projecto de reconstrução, tendo o mesmo sido aprovado no seio da reunião, mas será alvo de alterações posteriores, a serem analisadas em conjunto pela DSSOPT e o IC.
Tomás Chio PolíticaPaula Ling pede acreditação para advogados de Macau trabalharem na China [dropcap]P[/dropcap]aula Ling, deputada de Macau à Assembleia Popular Nacional, sugeriu que se diminuíssem as exigências para que os advogados de Macau pudessem obter qualificação para trabalhar no interior da China. Em Pequim, onde participa na reunião do Governo Central, Ling pediu ainda que os advogados do território possam trabalhar no continente de forma mais alargada. Segundo o Jornal Ou Mun, a deputada relembrou que o primeiro escritório onde trabalham advogados do interior da China, de Hong Kong e de Macau, na Ilha de Montanha, começou a operar no último mês, algo que, para Ling, representa um importante marco na colaboração judicial entre as regiões. “Devido à Zona de Comércio Livre da Ilha de Montanha, o escritório está a ocupar um papel indispensável, bem como oferece serviços profissionais judiciais que são eficazes para as trocas comerciais, o comércio dos bens e o comércio dos serviços. E o escritório também pode mostrar como é único ao tratar de casos cíveis e comerciais sabendo utilizar qualquer lei, seja a do continente, seja a de Macau” disse. Para reforçar o papel de plataforma de Macau entre a China e os Países Lusófonos Paula Ling, também advogada no território, sugere que se diminuam as exigências, para que os advogados possam “tratar de assuntos judiciais do continente”. Apesar de admitir a diferença entre os sistemas, estes, diz, têm o mesmo fundo portanto poderia ser feito um estudo para a possibilidade dos advogados de Macau poderem praticar no país, sugeriu, acrescentando que isto pode reforçar a cooperação comercial entre a China e Macau e, ao mesmo tempo, melhorar e desenvolver os sistemas judiciais dos dois locais.
Flora Fong PolíticaGoverno não quer legislar limite mínimo de espaços verdes O verde que existe em Macau já é suficiente e não precisa de existir uma lei que imponha limites mínimos para os espaços verdes que existem em Macau. É assim que o IACM responde à deputada Ella Lei, que queria legislação neste sentido [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]Instituto para Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) afirmou numa resposta a Ella Lei que o Governo ainda não está a ponderar definir a proporção mínima de zonas verdes através da legislação. O instituto defende que a área de reserva ecológica e de lazer “já é grande”. Numa interpelação entregue ao Governo em Dezembro passado, Ella Lei questionava sobre a proporção de espaços verdes em Macau e inquiria o Governo sobre se considerava que estes eram suficientes, alertando que não concordaria se a resposta fosse positiva. A deputada falava em muitos espaços verdes destruídos por projectos de construção e pedia, por isso, que o Governo definisse um limite mínimo para a existência de zonas verdes no território, de forma a evitar “a diminuição constante desses espaços”. No documento de resposta, José Tavares, presidente do Conselho de Administração do IACM, respondeu que a área de espaços verdes atinge “mais de 12 quilómetros quadrados, ocupando 41,7% da área total do território”. Tavares diz que estas zonas verdes incluem ainda espaços de reserva ecológica e de lazer “que têm valor ecológico elevado” e que ocupam 57% de toda a área desses espaços verdes. O presidente do IACM diz ainda que, embora o Governo ainda não considere legislar uma limitação mínima de espaços verdes, a Lei do Planeamento Urbanístico exige os princípios de “proteger e manter o equilíbrio ecológico e da natureza, bem como a sustentabilidade do ambiente”, algo que o presidente considera que “já protege de forma apropriada e suficiente” os espaços verdes de Macau. O responsável afirmou ainda que o Governo vai “activamente adicionar área verde ao território”, reservando, para isso, “uma certa proporção dos espaços nos novos aterros” para essa finalidade.
Joana Freitas SociedadeSuncity “não comenta” alegadas doações a Grace Poe A Suncity Group disse ao HM “não querer comentar” a alegada doação de 150 milhões de pesos filipinos a Grace Poe, candidata à presidência das Filipinas. Numa resposta dada por telefone a este jornal, uma porta-voz do grupo junket disse que o caso está a “ser tratado” e que, por isso, não havia qualquer comentário a fazer. O jornal Daily Tribune, das Filipinas, escreveu esta semana que Poe teria violado a lei alegadamente por ter recebido dinheiro da Suncity Group, grupo junket de Macau que também opera no país. Poe, que concorre nas eleições de forma independente, já veio a público negar a situação, ainda que o jornal tenha apresentado documentos – que publica junto à notícia – e que mostram que Poe terá aceite “150 milhões de pesos (cerca de 25,8 milhões de patacas) em doações com fins políticos da Suncity”, no ano passado. “Um dos vouchers, de 50 milhões de pesos, tem a assinatura de Grace Poe”, assegura ainda o Daily Tribune. A Suncity, recorde-se, está a estender a sua base de operações para as Filipinas, depois de as receitas do sector do Jogo em Macau terem começado a baixar, especialmente no segmento VIP, controlado pela empresa. Notícias da imprensa local, datadas do ano passado, davam conta da abertura de salas VIP pela Suncity nas Filipinas, algo visto como um problema para Macau, já que a empresa poderia levar os jogadores de altas apostas para o país. Grace Poe lidera a corrida às eleições agendas para Maio. Apesar de ter escusado comentário aos HM, o jornal Macau Business Daily cita outro porta-voz da empresa a assegurar que a notícia é “falsa”.
Joana Freitas Manchete PolíticaAL | Lei de Congelamento de Bens deu entrada para aprovação Macau vai este ano ser novamente avaliado por autoridades internacionais face à eficácia para congelar bens que ajudem a financiar terrorismo. Sem ter, actualmente, qualquer medida para tal, o hemiciclo já tem nas mãos a proposta de lei que pretende colmatar essa lacuna [dropcap style=’circle’]J[/dropcap]á foi entregue e admitida na Assembleia Legislativa (AL) a proposta de Lei de Execução de Congelamento de Bens. O diploma surge no âmbito de resoluções adoptadas pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas para o combate ao terrorismo e da proliferação de armas de destruição maciça, num ano em que Macau volta a ser avaliado pelas autoridades internacionais. O território ainda não tem uma forma eficaz de congelar os bens que possam ser utilizados para fins deste tipo, como admite o Governo – autor da proposta de lei – na nota justificativa que acompanha a entrada do diploma no hemiciclo. Tal foi também já referido em 2007 pela Asia Pacific Group e pelo Group Of International Finance Centre Supervisions. “Nessa altura, a RAEM foi considerada apenas parcialmente cumpridora [das resoluções da ONU]”, pode ler-se no documento analisado pelo HM. “A RAEM será novamente avaliada pela Asia Pacific Group em 2016 no âmbito do sistema de combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo, incluindo dois dos parâmetros dessa avaliação sobre o cumprimento das resoluções.” Resoluções que passam pela aplicação de sanções financeiras específicas para quem cometer estes crimes e que passam pelo congelamento “sem demora” de fundos ou outros bens de qualquer pessoa ou entidade e que assegurem que não há qualquer tipo de financiamento indirecto para esses fins. Algo que a RAEM não consegue fazer actualmente. “É necessário que o Governo estabeleça, mediante produção legislativa, um regime de execução de congelamento de bens para suprir a insuficiência do ordenamento jurídico interno”, justifica o Executivo. Nas mãos do Chefe A proposta é composta por 33 artigos, que começam por identificar que os fundos em questão poderão ser valores em numerário, cheque, contas bancárias, imóveis, créditos, acções, entre outros bens. O congelamento vai impedir qualquer movimento, alteração ou transferência desses bens e pode ser aplicado a quem quer que esteja na RAEM ou em transportes com matrícula registada no território, às pessoas residentes da RAEM estejam elas onde estiverem, a transferências feitas para, de ou através de Macau e aos bens que estiverem no território. É ao Chefe do Executivo que cabe a decisão de congelar os bens, sendo este, contudo, ajudado por um grupo – a Comissão Coordenadora do Regime de Congelamento – que é, no entanto, escolhida pelo líder do Governo. Mas o sujeito lesado tem também direitos consagrados nesta proposta de lei, que passam, por exemplo, pelo direito à interposição de recurso da decisão de congelamento dos bens. Este recurso é julgado de forma “urgente” e por um tribunal superior. Ainda não há data para que a proposta de lei possa ser analisada e votada pelos deputados, mas ao que o HM apurou a próxima avaliação a Macau – que terá em conta a entrada em vigor desta lei ou, pelo menos, a sua aprovação – está marcada para Julho.
Andreia Sofia Silva PolíticaCPU | Pedido grupo na DSSOPT para prédios degradados O deputado Mak Soi Kun defende a criação de um grupo de técnicos para a avaliação dos edifícios degradados nas Obras Públicas, por forma a obrigar os proprietários a fazer obras [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]Código Civil determina que deve ser feita uma avaliação do estado estrutural de um edifício de cinco em cinco anos. Contudo, membros do Conselho do Planeamento Urbanístico (CPU) defenderam ontem na 3ª reunião plenária do grupo a necessidade do Governo fiscalizar mais este aspecto. O deputado Mak Soi Kun, membro do CPU, pediu a criação de um grupo especializado no seio da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT). “Temos de obrigar [os proprietários] a fazer inspecções de cinco em cinco anos. Quem é que tem qualificação para afirmar se um prédio está ou não degradado? Há cerca de quatro mil prédios com mais de 30 anos e muitos edifícios com mais de 70 anos. O Governo poderia ter um grupo de avaliação de prédios degradados, para saber como podemos preservar o património cultural”, defendeu. O responsável da DSSOPT garantiu que o Código Civil já possui uma norma nessa matéria, mas Chan Tak Seng, outros dos membros do CPU, refutou o argumento. “Isso está no Código Civil, mas quem tem essa competência? As Obras Públicas”, afirmou. O Secretário para as Obras Públicas e Transportes, Raimundo do Rosário, afastou essa hipótese. “Os proprietários têm esse dever de preservar o seu edifício e o Governo não pode enviar tantos editais para os prédios.” Planos globais No âmbito da análise de dois edifícios localizados na Travessa dos Alfaiates, os membros do CPU pediram ainda ao Executivo para criar planos globais de preservação. “Discutir terreno a terreno não é nosso objectivo. Este é um exemplo clássico que mostra como temos de discutir as coisas de forma abrangente, temos de ter uma orientação. Nas zonas antigas temos de planear de forma abrangente. Há muitos proprietários que esperam a total degradação para não manterem a fachada”, disse Wu Chou Kit, também do grupo. “Os terrenos merecem a nossa atenção, mas temos quer ver a zona no seu todo. Não devemos estudar terreno a terreno. Quero que o Instituto Cultural possa discutir connosco um plano mais global. Se discutirmos prédio a prédio e não discutirmos de forma abrangente pode haver problemas”, referiu outro membro. “Se o Governo tiver um plano geral sobre o estilo de construção ou algo que pode incentivar os proprietários a manterem o estilo do edifício”, apontou Leong Sin Man. “Não sei se é viável fazer um plano sobre essa área, não sei se o Instituto Cultural terá essa possibilidade”, rematou Raimundo do Rosário, referindo-se especificamente aos projectos na travessa dos alfaiates.
Hoje Macau SociedadeProcurador do MP ao lado do TUI sobre Ho Chio Meng O procurador do Ministério Público (MP), Ip Son Sang, coloca-se do lado da decisão do Tribunal de Última Instância no que diz respeito à recusa em aceitar o pedido de habeas corpus de Ho Chio Meng. De acordo com a rádio, o procurador falou pela primeira vez sobre o caso do seu antecessor, assegurando que “as investigações continuam com diligências de inquérito”. Pedindo que seja respeitado o “princípio de inocência presumida”, Ip Son Sang defende que, tal como disse o TUI, Ho Chio Meng não estava ao abrigo do estatuto de magistrado, porque coordenava a Comissão de Estudos do Sistema Jurídico-Criminal. Ou seja, não desempenhava as funções de procurador-adjunto, apesar de constar como tal em documentos oficiais. “O senhor Ho Chio Meng foi nomeado director daquela Comissão. Temos de respeitar a decisão do TUI”, disse Ip Son Sang, esta tarde, à margem da tomada de posse de Kan Cheng Ha como juiz presidente do Tribunal Colectivo dos Tribunais de Primeira Instância. A rádio diz ainda que Ip Son Sang foi questionado sobre as razões de o antigo procurador do MP não ter sido suspenso das funções que desempenhava, assim que começou a investigação e sobre se essa foi uma intenção para que fosse apanhado em flagrante delito. “Não posso dizer que foi uma estratégia de investigação”, afirmou, escudando-se depois no facto de não poder fazer muitos comentários. Ho Chio Meng é suspeito de ter favorecido empresas, algumas de familiares, na adjudicação de obras e serviços durante dez dos 15 anos em que foi procurador do MP. Está actualmente em prisão preventiva.
Joana Freitas SociedadeTáxis | Governo vai atribuir mais 250 alvarás para carros comuns O Governo decidiu abrir novo concurso público para que haja mais táxis pretos a circular no território – este decorre até 14 de Abril O Executivo abriu um concurso público para a atribuição de mais 250 licenças para táxis pretos, numa ordem que chega do Chefe do Executivo e vem ontem publicada em Boletim Oficial. De acordo com o despacho, o preço base de licitação para cada alvará é de 200 mil patacas. No despacho assinado pelo director dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT), Lam Hin San, é dado ainda conta que o organismo fica responsável pelo concurso e que este termina a 14 de Abril pelas 18h00. As propostas são abertas a dia 17 do mesmo mês. A atribuição de mais 250 licenças de táxi foi uma promessa do Governo, depois de algumas autorizações para estes carros terem caducado e enquanto não são retomados os serviços de rádio-táxis. O ano passado, em Maio, o Executivo atribuiu 200 novas licenças de táxis pretos, visto que 230 anteriores veriam a sua licença caducada até ao final de 2015. A estes, juntaram-se mais cem, depois de um concurso público aberto em Outubro passado. Agora, a DSAT atribui mais 250 licenças. Num comunicado enviado ao final da tarde, a DSAT frisa isso mesmo. “Visto que alguns alvarás de licença de táxis [terão] o seu prazo terminado sucessivamente, e para responder à procura do público no que se refere aos serviços de táxis, o Governo lançou o presente concurso público”, pode ler-se. Certificado de habilitações A este concurso estão habilitadas pessoas singulares que sejam portadoras de BIR ou titulares de direito de residência na RAEM, sendo que os alvarás têm a duração de oito anos e não podem ser transmitidos. Há ainda exigências face ao tipo de automóvel a ser utilizado. “O titular do alvará deve utilizar um veículo com a lotação de quatro e cilindrada igual ou superior a 2000cc, para além de corresponder às normas de emissão de gases de escape Euro IV ou superior”, indica o Governo. Hoje, a DSAT abre as propostas candidatas às cem licenças especiais para rádio-táxis, sendo que há duas empresas na corrida.
Joana Freitas SociedadeCorrupção | Diplomata envolvido com Ng Lap Seng vai assumir culpa Francis Lorenzo, o diplomata da República Dominicana que responde num caso de alegada corrupção que envolve a ONU, deverá declarar-se culpado em tribunal. A situação poderá representar um entrave à declaração de inocência de Ng Lap Seng, empresário de Macau, já que – de acordo com o advogado de Lorenzo – a admissão de culpa vai “implicar a pessoa que vai acusada juntamente” com o diplomata dominicano. A admissão de culpa de Lorenzo foi anunciada num documento entregue pelo próprio advogado ao tribunal e citada pela Reuters, que indica que a sessão estava marcada para começar na madrugada desta quinta-feira em Macau, 13 horas a menos em Manhattan. O empresário e representante político de Macau Ng Lap Seng foi formalmente acusado pela justiça norte-americana de conspiração e suborno, num caso que envolve o ex-presidente da assembleia-geral da ONU John Ashe, estando acusado de participar num esquema de subornos a dirigentes da Organização das Nações Unidas (ONU) durante três anos. O magnata terá tentado conseguir o apoio de Ashe para a construção de um “centro de conferências milionário” para a ONU em Macau, usando Francis Lorenzo, o embaixador das Nações Unidas na República Dominicana, para transferir esses pagamentos. Ng Lap Seng sempre disse que pretende declarar-se inocente.
Hoje Macau Eventos MancheteErnesto Dabó, músico, escritor e activista: “Qualquer indivíduo é um produto cultural” Podia ser o Mohamed Dabó, mas para que pudesse ir à escola teve que mudar de nome. Hoje é Ernesto Dabó, convidado do Roteiro Literário, o músico, escritor, jurista, activista cultural e político que deu a conhecer ao Hoje Macau a vida que fez com que faça o que faz [dropcap]A[/dropcap]s histórias têm um início… a cultura na sua vida, como aconteceu? Começou em casa. Os meus pais motivaram-me desde muito cedo para o estudo e então começamos todos em casa a relacionarmo-nos com os livros, com outras esferas da cultura e aí por diante. No meu caso particular, desde muito cedo senti que tinha um gosto especial por estas áreas e em determinado momento já estava a fazer música e depois a escrever e assim por diante. Uma educação motivada para o conhecimento numa família Muçulmana que o pôs a estudar na Missão Católica. Como é que isto aconteceu? Nasci em Bolama, e o meu pai era um indivíduo que tinha a sua visão da vida, tinhas os seus conceitos e o regime colonial não oferecia muitas escolhas, nomeadamente as estruturas escolares. As mais abertas eram as chamadas missões católicas que davam instrução primária. Mas para ser matriculado nessas escolas, para ser aluno tínhamos que praticar a religião cristã: estudar a catequese, ir às missas e inclusivamente o meu nome Ernesto é uma imposição colonial. Naquele tempo, para ser matriculado tínhamos que ter um nome cristão. O que também aconteceu no meu caso. Quando me fui matricular mostrámos o meu nome e disseram que não era possível, quando chegámos a casa o meu pai pegou no nome Ernesto e disse “o importante é que ele vá para a escola”. Houve ainda a particularidade do meu pai nunca ter pressionado ninguém para a sua fé. Admitiu que nós praticássemos a religião que entendêssemos. E o meu caso foi esse, conheci a religião cristã, evolui na mesma até que cheguei a uma altura em que disse “agora não pratico nada”. Agora penso que há qualquer coisa que gere este universo e respeito muito isso, mas o essencial é praticar tudo aquilo que é a recomendação positiva de qualquer religião. Faço questão de fazer da vida um acto de partilha. Enquanto conseguir isso estou seguro que estou bem . Também é conhecido pela sua actividade politicamente interventiva, e em plena época colonial, dirigida à independência. Quando a determinada altura foi para Portugal, já tinha esta consciência? Como é que esta problemática ganhou forma? Quando fui para Portugal ainda não tinha esta consciência, era ainda muito novo, com 13 ou 14 anos. Ela nasce também com a minha família. Na altura estava em Portugal com um irmão meu e ele já percebia o que se estava a passar no país. O meu pai também mais uma vez, foi alguém que estava ligado em Bolama, a essa corrente de pessoas que já estavam a perceber que a libertação nacional era um projecto que tinha que ir para a frente. Associando estas questões comecei a observar o que se passava, a aprender e a ler, e como gostava muito de ler fui aprofundando as coisas. Depois também tive a sorte de ter bons amigos, com quem cresci e que alguns, da classe média portuguesa, eram também gente com uma cultura muito diferente e que me deram muitas dicas no sentido de perceber o que se passava. E depois também era fácil entender que eu era diferente. Sou negro, estou numa sociedade portuguesa, branca, que na altura, por sinal, não era assim tão culta e desenvolvida e juntando o meu carácter e a minha curiosidade em saber o que se estava a passar e porque fui forjando a minha consciência política até ter percebido, “ah, afinal é isto e não tem nada de mal, afinal a prova está aqui e agora compreendemos que afinal estávamos todos no mesmo barco”. Era o fascismo a fazer estragos em Portugal e era o colonialismo a fazer estragos na Guiné e eram combatentes pela democracia em Portugal e combatentes lá também. Gostei imenso de ter vivido este período. Ainda antes do 25 de Abril, e já com essa consciência política, ingressou no exército, na Armada Portuguesa. Como foi para si estar na “trincheira do inimigo”? Sim, foi das coisas mais giras que me aconteceram na vida. Fui recrutado, porque na altura era mesmo assim, mas ( vou-lhe revelar aqui algo que nunca revelei) eu já tinha relações com as estruturas que funcionavam da luta pela libertação. E quando entro para a Marinha, vou, e acontece uma coisa milagrosa – ainda há dias tivemos um almoço em Lisboa para celebrar os 45 anos desse encontro – um capelão da unidade resolveu criar um conjunto musical e como vinha com alguma experiência da Escola Agrícola onde tinha estado, convidaram-me para participar no projecto e participei. Aquilo ganha dimensão e o capelão propôs aos comandos da altura da Marinha para que esse conjunto, chamado “Os Náuticos”, começasse a animar no Ultramar, que fizesse uma digressão . Estava no conjunto como vocalista do grupo e lá no fundo disse “ isto vem mesmo a calhar, vou dar tudo por isto e vou fazer uma tropa de música e assim ninguém me põe a fazer guerra contra mim mesmo. E isso foi no fundo o que fiz, mas essa passagem pela vida militar foi ainda uma escola de vida muito importante para mim. Em que sentido? No sentido, por exemplo, humano! Estamos num período de guerra e as amizades que ganhei nesse período ainda hoje são as maiores amizades que tenho. Depois do ponto de vista da minha consciencialização, essa digressão em que estivemos na Guiné, Cabo Verde, Angola e Moçambique, foi aí que, finalmente, conclui esse processo “de tomada de consciência”. No contacto com a realidade. Estava fora da Guiné deste garoto e foi um choque brutal, extramamente interessante. Os meus amigos e os meus colegas da tropa que conhecia bem e que tínhamos confidências, também estavam contra a guerra mas não podiam fazer nada. E chego à Guiné e a guerra está a fazer mal às pessoas que não a querem . Foi um drama humano que não sei explicar. Vivi isto de forma dramática, fechava-me no quarto a pensar “mas, caramba, pessoas amigas aqui, ninguém tem nada contra mim enquanto pessoa e depois vês pessoas que o que têm para fazer é matar”. É das coisas mais absurdas que eu já vi na vida e que me marcou profundamente. Um outro aspecto é que a vida militar permitiu-me amadurecer como homem. Saber que eu devo contar comigo em primeiro lugar. Não tem pai, nem mãe nem irmão, é a tropa. Mas no fundo posso dizer que não me arrependo de nada nessa trajectória porque me valorizou muito. Aliás, em toda a minha vida tenho tido dificuldades e problemas , mas graças a esta escola de vida também tenho sabido saber sair e saber entrar. E tive a sorte de não confundir nada. De separar as águas, por isso é que mantenho as amizades que tenho, que são fraternas. Em 74 regressa à Guiné, e paralelamente inaugura o mercado musical Guineense com os Djorson e o disco “folclore da Guiné…. Antes de regressar, ainda em Lisboa, com uns amigos em Lisboa criámos esse grupo, ainda na tropa. E gosto de criar, não consigo estar sem criar, e naquela altura disse “temos que ter um disco, Angola tem, Moçambique também, todos têm, nós também vamos ter que ter um disco. Então peguei no projecto, ensaiámos, gravámos e fui ter com o meu mais velho Rui Mingas que já tinha uma carteira de relações, era uma figura respeitada e tinha vários contactos. Ele disse que ia ver o que podia fazer, ligou ao Victor Mamede que foi o produtor do nosso disco e gravámos um single com duas canções e foi o primeiro disco da discografia da Guiné. Cobiana Djazz, mais que um agrupamento musical, um projecto multifacetado… Iniciou-se como um agrupamento musical, mas para mim extravasou essa condição, aliás até estou a preparar um ensaio acerca disso que se chamará “ O movimento Cobiana Djazz”. Desencadeou uma série de consequências na nossa vida cultural, quebrou uma série de tabus, o primeiro é que não se cantava em crioulo coisas modernas, uns até diziam que o crioulo não era uma boa língua para cantar e nós começámos a cantar em criolo o que motivou com este projecto a criação de poemas em crioulo e letras para músicas . Os espaços nobres de dança em Bissau alargaram para as periferias, e mais, começou a ser um instrumento de divulgação de várias ideias e influenciou várias coisas da vida da sociedade guineense e pela primeira vez uma cultura urbana estava a ganhar espaço. Passado pouco tempo as canções da Guiné Bissau já estavam a circular pelo mundo fora, transformando-se em mais um veículo da luta que estava a decorrer. Estravazou os limites de uma simples orquestra e tornou-se um movimento cultural. Da sua relação entre as experiências que foi tendo e o que faz… Qualquer individuo é um produto cultural, por isso se quiser fazer arte, se quiser produzir cultura, não há outra reserva, a reserva que tem é aquele que temos em nós. O seu último trabalho escrito “PAIGC: Da Maioria Qualificada à Crise Qualificada” é um um livro político de um homem da política e das artes que (re)olha para o seu país. Como é que o vê, bem como à cultura e à sua importância, nos dias que correm? As nossas crises têm como fundo a alienação, uma crise cultural. No dia em que a nossa elite política começar a reflectir na cultura nacional e com a realidade nacional, tenho a impressão que vai ser mais humilde e mais responsável. Porque às vezes estão com cargos políticos mas a reflectir como se fossem administradores coloniais, e isso choca. “Podem tirar o homem da favela mas não podem tirar a favela do homem”, é isto que sente, mas no que respeita a esse pensamento colonial? É isso! O elemento de dominação mais importante é cultural, faz a pessoa negar-se a si mesma e subjugar-se ao outro, e segui-lo sem saber que tem o seu próprio caminho. E a luta de libertação é um facto de cultura porque rompe com isto e porque permite seguir por ti e para ti.
Filipa Araújo SociedadeDocomomo | Associação quer classificar edifícios da “arquitectura moderna” [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]Associação Docomomo Macau inaugura, esta sexta-feira, uma exposição que pretende ser muito mais do que uma mostra de arte. Ao longo dos últimos dois anos, os membros da Associação têm realizado um trabalho de campo ao fazer o levantamento de edifícios que considera serem exemplares de arquitectura modernista e que estão em risco. A ideia é não só mostrá-los, através da exposição, à população, como propor uma classificação de alguns deles. Do grupo de peças expostas – são 39 – “há duas ou três que já estão classificadas”, apontou o arquitecto Rui Leão, que preside à Associação. Este trabalho tem como objectivo “chegar a uma argumentação” para que se possa avaliar ou não uma possível classificação. Rui Leão indica ainda que este não é um trabalho que termina com a exposição, mas sim de continuidade. “Entendemos isto como um trabalho de levantamento [em andamento] não é uma lista definitiva da arquitectura do período [Modernista]. Isto é um conjunto de edifícios que achamos, por várias razões, que eram os mais prioritários e significativos. Há outros que são igualmente importantes, mas que por uma razão ou outra não estão incluídos nesta lista”, esclareceu. Um dos exemplos é o orfanato Helen Liang, na Praia Grande, de Manuel Vicente. Outro é o Infantário da Guia, de Chorão Ramalho. Da narrativa Este é um trabalho que corresponde ao objectivo principal que a Docomomo pretende desenvolver, que é “a documentação do património do movimento moderno”. A questão da documentação é “muito importante” porque é ela que permite que exista “um registo completo do edifícios”, como também permite “fazer uma avaliação [a partir do registo]”. Muitas vezes, apontou o arquitecto, o facto de não existir uma “narrativa dos edifícios” faz com que os mesmos “fiquem vulneráveis em determinada circunstância”. A ideia do trabalho, aponta ainda Leão, é que haja uma documentação feita, “independentemente das circunstâncias”, para que quando o edifício estiver em risco, ou for eventualmente sujeito a alteração, possa ter algo escrito que permite que todos os seus intervenientes – Governo, arquitecto, construtores, entre outros – percebam melhor como têm de lidar com ele em particular. Na exposição, em conjunto com Hong Kong, podem ser apreciados painéis com fotografias, indicações gráficas e plantas. O local escolhido é a Casa Garden e a inauguração acontece pelas 18h45, a 18 de Março.
Hoje Macau DesportoRugby | Associação celebra 20 anos com campeonato na TIS Os 20 anos de prática de rugby em Macau vão ser celebrados no próximo dia 19 de Março, no sábado, no campo desportivo da Escola Internacional de Macau (TIS, na sigla inglesa). O evento, organizado pela Associação de Rugby de Macau e pelo Clube de Rugby “Os Morcegos”, quer comemorar não só a presença da modalidade na RAEM, como a promoção do desporto como modalidade Olímpica. As festividades têm início às 11h30, com o Festival de Mini-Rugby, em que “Os Morcegos” trazem à região perto de 400 praticantes da modalidade, com idades compreendidas entre os cinco e os dez anos. No total serão 31 equipas – o dobro do ano passado – de oito clubes, em 66 jogos. Às 15h30, o Clube de Rugby – com a equipa “Macau Rugby” – dá as boas-vindas à equipa senior de Hong Kong, os Valley Rugby FC, que vêm “fortemente motivados depois de uma época de bons resultados nos diferentes campeonatos de Hong Kong”. Será o seu primeiro jogo de 15, aqui na RAEM, e é esperada uma competição “à altura” dos seus intervenientes e do evento que integram. O Presidente do Clube de Rugby “Os Morcegos”, Simon Carrington, refere: “Estamos felizes por acolher todas estas equipas de Hong Kong. Inclusivamente não conseguimos aceitar todos os pedidos de participação neste evento. Apesar da nossa pequena dimensão em relação a estes clubes de Hong Kong, o rugby continua em crescimento em Macau ao mesmo tempo que os pais vão descobrindo os benefícios deste desporto nas crianças. Ensinamos o espírito de equipa, desportivismo, respeito, fitness e prazer de jogar – valores que nós julgamos muito importantes para as suas vidas e para o desporto”. A entrada para o evento é livre.
Hoje Macau EventosCinema | DST leva produtores locais à Filmart e apresenta Festival Internacional Vem aí o maior festival de cinema, tudo indica, já organizado em Macau e, aproveitando a maré, o Governo levou pela primeira vez uma dúzia de produtores locais ao Hong Kong Filmart. Uma plataforma entre o Ocidente e a Ásia Oriental, o festival e levar os produtores locais a mercados de alto impacto, com Busan e Cannes no horizonte, é do que fala a DST O já anunciado Festival Internacional de Cinema de Macau teve esta segunda-feira, pela primeira vez, um contacto entre os principais responsáveis executivos e a imprensa. No cocktail organizado pela Direcção dos Serviços de Turismo (DST), num hotel contíguo ao Hong Kong Filmart, estiveram presentes o director do Festival, Marco Mueller, a própria directora da DST, Helena de Senna Fernandes, Johnny To, conhecido realizador de Hong Kong e padrinho do evento, e produtores locais, entre vários outros convidados do sector de Macau e Hong Kong. Depois de uma visita ao pavilhão de Macau, onde estiveram, até hoje, os doze produtores locais, Helena de Senna Fernandes falou aos jornalistas explicando que a “HK Filmart é um evento estabelecido, com 20 anos”. Por isso, e por ser de fácil acesso, recaiu nesta feira a primeira aposta do Governo neste tipo de iniciativas. Senna Fernandes adiantou ainda que a aposta “enquadra-se na estratégia do Governo de impulsionar as indústrias criativas”, adicionando ainda que a ideia da DST é “estimular o contacto entre os produtores locais e as companhias de fora de Macau”. Questionada se essa não seria uma actividade mais apropriada para o Instituto de Promoção do Comércio e Investimento de Macau, ou outra entidade dos Serviços de Economia, a directora da DST foi dizendo que “esta é uma acção conjunta entre a DST e o Instituto Cultural (IC)” e admite que, no futuro, possam existir mais parceiros governamentais no projecto. Será, então, o cinema encarado como um elemento de turismo para Macau? A esta questão, Helena de Senna Fernandes começou por dizer que “não”, emendando rapidamente para um “não só”, explicando: “o cinema de Macau é sempre visto como uma indústria criativa e como é estratégia Governo apoiar o sector, e o Turismo é o Governo, estamos a dar o nosso contributo”. O pavilhão de Macau foi decorado sob um tema baseado em fotografia, numa linha gráfica reminiscente de tempos passados e algo acanhado para as 12 empresas, o que levou mesmo a organização a retirar um dos objectos da decoração – um cilindro na forma de um rolo de película para Reflex, onde se exibiam os filmes dos produtores. Algo que não feriu a visualização dessas películas, uma vez que existia outro ecrã e, assim, foi dado mais espaço. Distribuição e Comissão de Cinema Os produtores locais presentes na Filmart estavam, de uma forma geral, agradados com a iniciativa e pretendem a continuação deste tipo de apoio governamental. Todavia, alguns sugerem aperfeiçoamentos e falam de outro tipo de necessidades. Para Denise Lau, da Novart, que já no ano anterior tinha apresentado na Filmart um directório de produtores locais e locações (em colaboração com a Associação CUT e o apoio do IC), há falta de “apoios ao nível da distribuição, pois as empresas locais mesmo que produzam uma série, ou outro produto de televisão, não têm forma de escoar”. Campbell McLean, da Aomen.tv, que aproveitou a feira para introduzir um documentário sobre George Chinnery, estava satisfeito com a oportunidade de “estar presente em tão importante feira sem custos de instalação”, como explicou ao HM. O responsável considera ainda que, “no futuro, este tipo de eventos precisa de mais preparação para nos apresentarmos condignamente” – os produtores tiveram cerca de um mês para se prepararem. “Deveria existir um esquema de financiamento para deslocações a este tipo de eventos para que os produtores escolham os mercados mais indicados para os seus produtos”, ressalvou. Em termos do papel do Governo, Campbell entende que “Macau deveria ter a sua própria Comissão de Cinema”, que define como “uma entidade focada no financiamento de produções locais e na prestação de serviços de locações e programas de incentivo para equipas estrangeiras filmarem em Macau”. Um facto que o produtor aponta como crucial para o desenvolvimento das capacidades locais. O mercado local, para McLean, “está mais maduro do que há dez anos” quando se começou. “Há mais pessoas com habilitações, mas precisa-se de mais oportunidades para financiamento”. Uma solução seria a produção local pelo que Campbell refere que, neste âmbito, “a TDM está a perder uma grande oportunidade”. Palco intercontinental para a sétima arte Marco Mueller confiante com Macau como hub de cinema A grande curiosidade da conferência de imprensa que teve lugar esta semana em Hong Kong, onde estiveram uma dúzia de realizadores locais, residia no primeiro contacto com Marco Mueller, o futuro director do Festival de Cinema de Macau. Futuro, porque tudo ainda está em processo de organização como esclareceu a directora da Direcção dos Serviços de Turismo (DST), Helena de Senna Fernandes, no discurso de abertura. “Não tenho muito para dizer sobre o festival porque ainda estamos a montar a estrutura”, revelou, adiantando que Mueller “foi o escolhido para gerir o festival”, o que também vem confirmar a presença forte do Turismo na organização do evento apesar de, oficialmente, ser uma iniciativa de uma associação local, a Macau Films & Television Productions and Culture. Marco Mueller começou o seu discurso demonstrando confiança “na visão de transformar Macau num hub mundial para a produção de filmes”, ressalvando a importância que a Ásia Oriental tem dado a este sector. O futuro director do Festival de Macau considera ainda o evento como “um ponto focal para dar mais visibilidade aos filmes da Ásia Oriental e do resto do mundo”, numa acção que também visa “incrementar a distribuição e o intercâmbio entre cineastas e produtores”. A escolha das datas não é feita ao acaso (29 e 30 de Outubro) pois surge, explica Mueller, “no período dos grandes lançamentos”, pelo que o responsável espera ver Macau transformada numa plataforma. “Há necessidade de um hub destes”, diz. Uma combinação entre competição e galas com especial ênfase para o género asiático que o experiente director de festivais espera venha a ser “uma porta para o mercado Chinês”. Johnny To, apresentado como o primeiro embaixador do evento, foi, disse Mueller, o grande responsável pela sua visão de Macau por há muitos anos ter feito as apresentações. Num discurso muito breve, To apelou aos cineastas para apoiarem e trabalharem juntos. A madrinha do festival será, também de Hong Kong, a realizadora Ann Hui. Macau ou Macao? Corria o cocktail quando um dos empregados de mesa se acerca da nossa reportagem. Pergunta-nos: “este evento não é de Macau?” Respondemos que sim. Homem um pouco para lá da meia-idade, figura típica de Hong Kong, pelos traços, ou pelo jeito, ou pelo sotaque, continuava confuso: “mas Macau não é escrito com ‘U’?”, reinquiria. Explicámos que era a versão inglesa do termo, mas o senhor não ficou mais esclarecido. Continuámos argumentando que, talvez, porque o Turismo fala normalmente para estrangeiros, terá resolvido adoptar essa versão. Riu-se, encolheu os ombros e lá foi abanando a cabeça para mais uma ronda por entre os convivas.
Hoje Macau China / ÁsiaLi Keqiang diz que Hong Kong continuará a ter “alto grau de autonomia” O primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, assegurou ontem que Hong Kong continuará a gozar de um alto grau de autonomia, num momento em que a opinião pública da região crítica as intervenções do Governo central em assuntos internos do território. “O alto grau de autonomia não se alterou nem se alterará”, assegurou Li, na única conferência de imprensa que realiza todos os anos. A afirmação do responsável chinês surge num período de deterioração nas relações entre Hong Kong e Pequim, devido à designada ‘revolução dos guarda-chuvas’. Em 2014, aquele movimento levou milhares de pessoas para a rua em protesto por uma democracia plena no território e contra a intervenção do Governo central no processo de escolha dos líderes locais. Em Fevereiro passado, uma operação policial contra a venda ambulante ilegal de comida nas ruas de Hong Kong acabou em confrontos violentos, com 90 pessoas feridas e 54 detidos. Questionado sobre esse incidente, Li limitou-se a manifestar a sua confiança no executivo de Hong Kong e nos habitantes da região especial administrativa chinesa para enfrentar futuras dificuldades. “Acreditamos que o Governo de Hong Kong tem a capacidade e o povo de Hong Kong a sensatez para gerir adequadamente os complexos assuntos (que ocorram) em Hong Kong”, afirmou, no encerramento da sessão anual da Assembleia Nacional Popular (ANP), o órgão máximo legislativo chinês. “O futuro (do território) será brilhante”, frisou. Uma China Quanto a Taiwan, que Pequim considera uma província sua e não uma entidade política soberana, Li assinalou que o Governo central insiste na implementação de medidas para aumentar a cooperação económica e comercial entre ambos os lados. Após anos de aproximação de Pequim, os eleitores do território elegeram no ano passado Tsai Ing-Wen, que se afirma a favor da identidade e soberania da ilha em relação a Pequim. “Enquanto ambas as partes reconheçam que existe apenas uma China, poderemos tratar de qualquer assunto”, vincou Li.