Política no feminino | Eleição de Wong Kit Cheng e Agnes Lam podem agitar as águas

A reeleição de Wong Kit Cheng como deputada, pela lista Aliança do Bom Lar, e a estreia de Agnes Lam, com a lista Observatório Cívico, podem mudar o panorama da política local feita no feminino. Em termos numéricos, a Assembleia Legislativa mantém as mesmas deputadas que a anterior legislatura, mas as suas intervenções podem ser diferentes

[dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]á quatro anos uma enfermeira chamada Wong Kit Cheng decidiu deixar os corredores do hospital para enveredar pela política. Apesar de pertencer à Associação Geral das Mulheres (AGM), Wong Kit Cheng decidiu aliar-se a Ho Ion Sang, da União Geral das Associações de Moradores de Macau (UGAMM, ou Kaifong), tendo conseguido a sua estreia no hemiciclo, como número dois do deputado.

Este ano a candidata da lista Aliança do Bom Lar terá sentido que já tinha terreno para avançar sozinha e decidiu fazê-lo, representando a AGM e afastando-se da espécie de coligação feita com os Kaifong em 2013. A estratégia compensou: Wong Kit Cheng obteve 9499 votos no passado dia 17 deste mês.

Agnes Lam, líder da Observatório Cívico, foi a grande vencedora das legislativas e é mais uma voz feminina no hemiciclo. Contudo, na prática, a saída da deputada Melinda Chan fez com que o número de deputadas permaneça inalterado. A nova legislatura da Assembleia Legislativa (AL) continua a fazer-se com cinco mulheres, eleitas pela via do sufrágio directo (Ella Lei, Angela Leong, Song Pek Kei, Agnes Lam e Wong Kit Cheng) e uma eleita pelo sufrágio indirecto (Chan Hong). Resta saber se o Chefe do Executivo vai nomear alguma mulher como deputada.

Ao HM, o advogado e analista político Sérgio de Almeida Correia disse acreditar que a vitória de Wong Kit Cheng, enquanto representante da AGM, pode significar uma maior participação do sexo feminino na política local. Ou pelo menos um começo.

“O facto de nestas eleições ter aparecido uma lista ligada à associação das mulheres, e de ter obtido um assento, é um resultado muito significativo e poderá ser um indício”, defendeu.

A eleição de Wong Kit Cheng pode, também, “constituir um estímulo à entrada de mais mulheres na política”. “Oxalá isso possa acontecer, porque já temos muito cinzentismo na política de Macau e era bom que houvesse novas representações”, acrescentou Sérgio de Almeida Correia.

A AGM, através de Wong Kit Cheng, na sua maioria, tem vindo a defender políticas como o aumento da licença de maternidade ou de paternidade, bem como medidas mais favoráveis à família, para que, aos poucos, a mulher possa ter um papel mais representativo na sociedade.

Contudo, aquando da implementação da lei da violência doméstica, a AGM não mostrou de imediato uma postura aberta em relação à constituição desse acto como um crime público.

Com ou sem tradicionalismos, e sem comentar se, de facto, a maioria das mulheres se sente representada pela AGM, Sérgio de Almeida Correia encontra um lado positivo na reeleição de Wong Kit Cheng.

“As coisas em Macau levam o seu tempo”, frisou. “O facto de ter havido alguma emancipação dessa lista tem a ver com razões estratégicas e conjunturais, e com outras ligações que a associação já tinha. Acredito que tenha sido ditado por uma estratégia eleitoral, mas o resultado pode servir de estímulo, para que não haja tantas ligações ao universo mais tradicional.”

Papel activo

Se na AL o número de deputadas se conta pelos dedos das mãos, fora do hemiciclo essa realidade também se verifica. Sónia Chan, secretária para a Administração e Justiça, é a única mulher no Governo. Ao nível de direcções de serviços, surgem os nomes de Helena de Senna Fernandes (Turismo) e Susana Wong (Direcção dos Serviços para os Assuntos Marítimos e da Água), mas são poucas as que chegam a líderes na Função Pública.

No activismo político, o panorama não é diferente. Cloee Chao tornou-se o rosto da defesa dos direitos dos croupiers e até concorreu nas últimas eleições. Winkie Kuan chegou a liderar a associação Juventude Dinâmica, mas afastou-se.

“Não sei responder porque é que na AL há mais homens do que mulheres, nunca fiz um estudo aprofundado sobre isso”, adiantou Winkie Kuan.

Na sociedade, Winkie Kuan defende que as mulheres têm hoje um papel mais activo.

“Antes as pessoas tinham um nível de escolaridade muito baixo. Os homens trabalhavam fora de casa e as mulheres ficavam no lar a cozinhar, a cuidar da família. Os homens tinham mais acesso à sociedade e podiam expressar as suas opiniões se não estivessem satisfeitos. As mulheres tinham um acesso mais limitado.”

“A maioria das pessoas nos dias de hoje tem uma maior escolaridade e há uma maior participação das mulheres na sociedade. Tive várias amigas que se voluntariaram para apoiar várias candidaturas nestas eleições”, acrescentou Winkie Kuan.

Para a antiga líder da Juventude Dinâmica, eleger mais mulheres para o hemiciclo seria importante para que o meio político desse mais atenção aos assuntos sociais.

Sem incentivos

Para Sérgio de Almeida Correia a tradição ainda é o que sempre foi na política e este panorama vai demorar a mudar.

“A falta de mulheres na política de Macau é resultado da tradição e da forma como a participação das mulheres na politica é vista aqui e na própria China. Tradicionalmente a mulher está reservada a um papel menos activo na participação cívica e politica. Isso tem a ver com factores históricos.”

O advogado recorda-se das palavras do deputado Fong Chi Keong aquando do debate sobre a lei de violência doméstica. O tribuno considerou normal bater nas mulheres, uma intervenção que originou um protesto nas ruas a pedir a sua saída do hemiciclo.

“Esses comentários foram inenarráveis e mostram como as coisas são vistas. Vemos que não há qualquer incentivo à participação das mulheres na política”, apontou Sérgio de Almeida Correia, que lembrou ainda o facto de parte dos deputados da AL ser eleita pela via indirecta ou através da nomeação.

“O próprio sistema não favorece a participação, não é aberto nem apelativo. O papel de democracia directa acaba por ser menosprezado pela forma como a AL é constituída e as reservas que existem a um pleno sufrágio universal. E isso tudo contribui para afastar as mulheres da politica.”

Saiu Melinda Chan, que fez da lei da violência doméstica uma das suas principais bandeiras políticas, e Kwan Tsui Hang, histórica deputada ligada ao sector tradicional. Os novos rostos vieram substituir as suas vozes, mas são precisos mais.

“Elas fazem falta porque é importante que a participação seja cada vez mais inclusiva, para que haja uma distribuição equitativa de género e para que todos se sintam parte de um projecto político”, reiterou Sérgio de Almeida Correia.

 

Agnes Lam vai promover maior participação das mulheres

Agora que foi eleita deputada, Agnes Lam espera que a sua acção na Assembleia Legislativa contribua para fazer com que mais mulheres participem activamente na política do território. Em conversa com o HM, a líder da lista Observador Cívico, confirmou que esta vai ser uma das suas bandeiras nas bancadas do hemiciclo.

“Sem dúvida que vai ser uma das bandeiras que vou defender. É importante que haja uma maior participação das mulheres na política de Macau”, afirmou Agnes Lam.

Em termos das vantagens de uma maior participação feminina, a recém-eleita deputada aponta os assuntos familiares, cuja gestão tem tradicionalmente sido mais associada à figura materna.

“Se nos focarmos nos assuntos familiares, elas têm uma opinião muito importante sobre esses tema, também porque permite contribuir para uma maior igualdade de tratamento mesmo dentro das famílias”, apontou.

No entanto, quando questionada sobre a eleição de Wong Kit Cheng, através da lista apoiada pela Associação Geral das Mulheres, e se isso representa uma possível mudança de paradigma em Macau, Agnes Lam realçou a importância de eleger mais mulheres.

“Independentemente de quem seja eleito, desde que faça com que haja mais mulheres no hemiciclo já é positivo porque leva as pessoas a pensar mais nas questões do género”, defendeu. “Dou as boas-vindas a todas as mulheres que quiserem participar nas eleições”, sublinhou.

Da tradição

Por outro lado Agnes Lam apontou que o menor número de deputadas face aos deputados também está relacionado com questões culturais e o papel tradicional da mulher, mais focado no tratamento dos assuntos da família.

“A participação da mulher na política não é encorajada pela sociedade chinesa, que lhe reserva um papel mais associado à ideia de tratar da família. Também como a participação na política requer que se passe muito tempo fora de casa e longe da família, isso não é muito bem visto pela sociedade”, comentou.

A legisladora reconheceu também que muitas vezes são as próprias mulheres que optam por se colocar à margem da política, por serem ensinadas a atribuírem mais importância a outras questões.

“São ensinadas a colocaram-se à margem e a não considerar estes assuntos importantes, sentindo que não têm grande capacidade política. Esta é também uma das razões para que não participem”, justificou.

27 Set 2017

Alemanha | Quarto mandato de Merkel na eleição que leva a extrema-direita ao Bundestag

A hipótese mais provável para Angela Merkel formar Governo é a coligação com Liberais e Verdes, depois dos socialistas do SPD terem obtido o pior resultado de sempre. O partido de extrema-direita Alternativa para a Alemanha é a terceira força política neste momento. No entanto, as relações com a China devem permanecer fortes

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] CDU de Angela Merkel ficou em primeiro lugar nas eleições federais alemãs apesar do crescimento do populismo isolacionista da extrema-direita, com a Alternativa para a Alemanha (AfD) a ficar em terceiro lugar e a chegar pela primeira vez ao Bundestag. A líder dos cristãos democratas, no poder desde 2005, não tem uma vida fácil pela frente na tarefa de formar um Executivo, principalmente tendo em conta o desaire dos sociais-democratas do SPD de Martin Schulz, que obtiveram a pior votação de sempre, com 20,5 por cento. Neste contexto, resta à Chanceler formar Governo com os Liberais e Verdes.

José Sales Marques, presidente do Instituto de Estudos Europeus de Macau, vê com preocupação os resultados das eleições alemãs. “Há um reforço nítido da extrema-direita, agora representada no Parlamento com um número razoável de deputados”. O economista aponta a possível destabilização política trazida pelos “discursos populistas, anti-imigrantes, que surgiram também noutros pontos da Europa”, trazidos para a campanha alemã pela AfD. De facto, o partido de Frauke Petry, apelidada por alguns sectores como Adolfina, chega aos 94 deputados, num total de 630 possíveis.

A própria CDU tem de fazer contas à vida depois de conseguir um dos piores resultados de sempre com 33 por cento, uma marca que apenas encontra um registo pior em 1949, o primeiro sufrágio depois da queda de Hitler e da divisão do país, quando tiveram 31 por cento. Importa recordar que nas eleições de 2013 a CDU conseguiu 41,5 por cento.

Queda socialista

Contudo, o grande derrotado destas eleições foi o SPD, o partido de centro esquerda liderado por Martin Schulz, que apesar do segundo lugar obtido ficou muito aquém do esperado com apenas 20,5 por cento, o pior resultado de sempre. O desaire levou o líder dos socialistas a confirmar que vai passar para a oposição, deixando a Merkel apenas a possibilidade de se coligar com os Liberais e os Verdes.

O tombo socialista também não foi uma surpresa tendo em conta a tendência política europeia e mesmo a eleição de Donald Trump.

“Os partidos socialistas na Europa parecem perder eleitores para forças políticas que são anti-imigrantes, um movimento difícil de fazer”, diagnostica Sten Verhoeven, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Macau. O docente especialista em direito europeu realça o muito tempo que estas forças políticas estiveram no poder, durante as quais surgiram pressões sobre o estado social. O eleitorado vira-se para forças que apontam o dedo a outras causas para a crescente pressão sobre o trabalho e benefícios sociais, tais como o federalismo europeu e as vagas migratórias. “Os socialistas têm de se reinventar e voltarem a focar-se em assuntos sociais”, aponta o académico. Feitas as contas o SPD fica com 149 deputados.

Em terceiro lugar no pódio das eleições fica então a AfD. Com tamanha representatividade parlamentar, o partido de extrema-direita terá algum poder de arremesso para pressionar o Governo de Angela Merkel a tomar posições mais isolacionistas, tanto em políticas de imigração como na relação com a União Europeia (UE).

Sinais preocupantes

As eleições alemãs foram mais um cartão amarelo às instituições europeias. Apesar de estar em perspectiva um quarto mandato para Angela Merkel, a agenda euro-céptica do AfD ganhou tracção considerável no eleitorado, algo que não deverá passar em claro a Bruxelas. Isto também tendo em conta que o partido de Frauke Petry anunciou que irá coordenador esforços com a Frente Nacional francesa e com o partido de extrema-direita da Áustria. Tudo “situações preocupantes para a UE”, no entender de José Sales Marques, que realça as características nacionalistas e isolacionistas destes movimentos profundamente contrários ao processo de integração europeia.

Angela Merkel na primeira reacção aos resultados apurados dirigiu-se aos eleitores da AfD, dizendo que quer ouvir os seus medos, compreender as suas preocupações e procurar resolvê-las.

“Nesta conjuntura, com a realidade do Brexit, há a necessidade de reequacionar o futuro da Europa”, perspectiva o presidente do Instituto de Estudos Europeus de Macau. Apesar de as forças populistas de extrema-direita dificilmente terem capacidade para chegar ao poder, o seu crescimento pode levar a mudanças de políticas que levam o pêndulo ideológico a afastar-se do centro. Uma circunstância que, de acordo com José Sales Marques, também pode trazer más notícias para os países do Sul da Europa.

Com este resultado, o AfD pode cimentar-se no Bundestag e na política nacional alemã. Embora possa haver alguma fragmentação interna entre as diversas facções dentro dos nacionalistas, os fundos federais que vão receber permitem que tenham uma estrutura sólida no panorama político alemão.

Relações chinesas

Apesar da descida do partido de Merkel, a agência Xinhua salienta os 12 anos consecutivos da Chanceler ao leme da Alemanha como uma apoiante da globalização e da cooperação internacional. Durante os seus mandatos, Merkel visitou a China uma dezena de vezes e a sua reeleição é tida pela agência oficial chinesa como “um sinal positivo para o desenvolvimento futuro das relações entre a China e a Alemanha”.

Importa salientar que neste momento Pequim é o maior parceiro comercial da Alemanha. Em contrapartida, os produtos alemães são os preferidos nas importações chinesas entre os países europeus. Aliás, a agência salienta que as estreitas ligações comerciais são uma das razões da robustez económica alemã, facto que terá sido fundamental para a reeleição de Merkel.

Outra das situações elencadas pela Xinhua para celebrar a vitória da CDU é a “volatilidade crescente que se faz sentir no mundo” sendo, portanto, uma boa notícia uma “relação de maturidade entre os dois países num contexto de prosperidade e estabilidade global”.

Sem aludir directamente ao nome de Donald Trump, a agência chinesa salienta o papel da Alemanha como um actor racional no plano internacional, que funda a sua conduta na resolução de crises e conflitos pela via diplomática, em vez da intervenção militar. Além disso, a Xinhua salienta a posição alemã de compromisso com o acordo de Paris quanto às políticas de combate às alterações climáticas.

José Sales Marques destaca a natureza da relação entre a China e a Alemanha, que é “na sua essência baseada em relações comerciais extremamente vantajosas para ambas as partes”.

Também Sten Verhoeven entende que os germânicos não devem abdicar da posicionamento que têm no comércio global. Aliás, o académico entende mesmo que para a Alemanha não existe alternativa a essa posição e que romper com esta aliança comercial traria dores económicas a ambos os países.

A possibilidade das forças políticas nacionalistas fincarem o pé numa posição de isolacionismo face ao mercado global é algo que José Sales Marques não acredita ser possível. “É do interesse nacional da Alemanha que essa capacidade económica se mantenha, ou que se fortaleça”, comenta.

Como faz questão de vincar a Xinhua, o eixo comercial e diplomático sino-germânico tem desenvolvido “ligações especiais”, e “qualquer interrupção desse intercâmbio seria demasiado custosa”. Nesse sentido, a agência refere que ambas as partes precisam estar atentas ao crescente espectro de proteccionismo que atravessa o velho continente.

26 Set 2017

Eleições | Tribunal nega pedido de recontagem de votos

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Tribunal de Última Instância de Macau negou “liminarmente” o pedido de recontagem dos votos apresentado pelo mandatário e primeiro candidato da lista Nova Ideais de Macau, Carl Ching Lok Suen. O pedido, entregue na quarta-feira, alegava que deveria haver uma recontagem devido a semelhanças entre o símbolo da lista número 1 e da lista número 2. Contudo o TUI decidiu que  pedido de recurso não se justificava.

“Visto que o recorrente nunca apresentou reclamação, protesto ou contraprotesto no decurso do apuramento, nem interpôs recurso gracioso perante a assembleia de apuramento geral, não estão preenchidos os pressupostos legais de interposição do recurso contencioso”, escreveu a titular do processo, a juíza Song Man Lei, de acordo com uma nota do Gabinete do Presidente do TUI, emitida na sexta-feira.

“O recorrente não pode interpor recurso contencioso relativamente a questões que poderão ter ocorrido no decurso do apuramento”, sublinhou a mesma fonte.

A lista de Ching obteve 199 votos nas eleições, abaixo dos 300 necessários para que a caução de 25 mil patacas seja devolvida. Também na sexta-feira, de acordo com a Lusa, a Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL) tomou uma posição sobre o assunto, defendendo que “para pedir uma reapreciação, o mandatário teria de ter apresentado uma reclamação durante o acto de apuramento”.

Na altura em que entregou o pedido de recurso, Carl Ching admitiu que se tinha endividado para que pudesse pagar a caução, e que agora precisava do dinheiro para o devolver aos amigos.

25 Set 2017

Eleições | Equilíbrios e tendências depois de domingo

A Universidade de Ciências e Tecnologia de Macau promoveu ontem uma conferência sobre as eleições legislativas de domingo. Figuras do meio académico falam num maior equilíbrio entre a ala pró-democrata e pró-Pequim, lembrando a busca da sociedade por uma mudança no meio político

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]ntrou Agnes Lam na sua terceira tentativa, saiu Melinda Chan, reforçou-se o campo pró-democrata com a eleição de Sulu Sou, ligado à Associação Novo Macau.

Assim foram as eleições de domingo, que deram a vitória aos tradicionais e habituais, como Mak Soi Kun (que obteve mais de 17 mil votos), mas também Ella Lei, ligada aos Operários, que conseguiu eleger o seu número dois e manter um lugar que durante anos foi ocupado pela histórica Kwan Tsui Hang. 

Finalizada a contagem dos votos, a semana tem sido pródiga em análises sobre aquilo que poderemos ver na Assembleia Legislativa (AL) nos próximos quatro anos. Ontem a Universidade de Ciências e Tecnologia de Macau (MUST) promoveu uma palestra sobre o assunto.

Fang Quan, vice-coordenadora executiva da Faculdade de Direito da MUST, considerou que os resultados das eleições revelam, acima de tudo, uma “mudança na estabilidade”.

“A estabilidade significa que, quer a estrutura social, quer as necessidades dos residentes estão numa fase estável em termos comparativos, não se verificando uma grande mudança”, referiu.

A responsável lembrou que em Macau, sobretudo nos votos por sufrágio directo, há ainda uma geração dos “votos de ferro”, ou seja, eleitores, que ao invés de darem mais atenção dos programas políticos, debates ou à experiência do passado, estão mais atentos à ligação social das listas e ao lado humano.

“Apesar de se afirmar que na próxima legislatura vão existir três rostos novos, na verdade só temos um [Agnes Lam], porque os outros dois deputados eleitos pertencem a grupos que já tiveram membros na AL [Sulu Sou, da Novo Macau, e Leong Sun Iok, dos Operários]. Isto é um sinal de estabilidade”, defendeu Fang Quan.

“As listas 8 e 9 [lideradas por Song Pek Kei e Si Ka Lon] ganharam, em conjunto, em 2013, 29,12 por cento dos votos, mas este ano só ganharam 24,44 por cento, por isso é uma diminuição dos votos. Isso prova que os eleitores fizeram uma escolha diferente, apesar da estabilidade.”

Fang Quan lembrou ainda a estreia de Lam U Tou, ex-Operários e líder da Poder de Sinergia.

“A lista foi candidata pela primeira vez e teve um bom resultado, superior a sete mil votos. Por isso acho que os jovens estão mais atentos à sociedade e preocupam-se mais com assuntos sociais. É uma das prioridades e os eleitores estão atentos.”

A surpresa Agnes

Sobre a vitória de Agnes Lam, Fang Quan considera que representa “uma mudança”. “Penso que foi eleita por representar a classe média e os sectores profissionais. Esta não foi a primeira vez que se candidatou, insistiu várias vezes na participação nas legislativas e obteve os seus frutos. Com isto percebemos que há novas solicitações da sociedade.”

A académica fala também de um novo olhar dos eleitores, mais afastado das associações tradicionais, como é o caso dos Operários ou Kaifong (moradores).

“Os cidadãos das classes sociais mais baixas dependem muito das associações tradicionais, que conseguem de facto melhorar a vida dos residentes. Mas com a evolução da sociedade, as pessoas pensam como resolver os problemas sociais de outra forma. E aí são necessários profissionais”, rematou.

Qualidade vs capacidade

Para a coordenadora da faculdade de Direito, nem o tufão Hato levou mais gente às urnas, apesar de se ter verificado uma afluência de jovens.

“Não se registou um aumento aparente da taxa de votação, pois nos últimos quatro anos foi de 59 por cento. Isso mostra que a paixão pela política não é muito elevada.”

Fang Quan explica as razões. “A Lei Básica determina o tipo e conteúdo das propostas de lei que os deputados podem apresentar no hemiciclo, e pensa-se que não se conseguem fazer muitas coisas.”

“No sufrágio directo a capacidade dos deputados é igual à qualidade dos seus eleitores. Quer sejam resultados satisfatórios ou não, ou se se criticam mutuamente, têm sempre um voto na mão. Daqui para a frente, vamos ver se os eleitores da ‘geração de ferro’ usam os seus direitos para o futuro do território e votam de modo racional. Deve-se prestar atenção aos jovens e profissionais, para que se resolvam as necessidades mais prementes.”

“Estrutura demográfica está a mudar”

Lok Wai Kin, docente da Faculdade de Direito da Universidade de Macau, falou sobretudo de uma mudança de paradigma daqueles que vão às urnas. “Este ano tivemos um aumento do número de eleitores, e embora a Comissão de Assuntos Eleitorais da AL não tenha apresentado dados estatísticos sobre o número de jovens que foram votar, parece que desta vez votaram mesmo mais jovens. E porquê? Porque que há uma mudança na estrutura demográfica”, apontou.

“A ala mais afastada de Pequim é composta agora por quatro listas, lideradas por Au Kam San, Ng Kuok Cheong, Sulu Sou e José Pereira Coutinho. Estas quatro listas tiveram mais nove mil votos dos novos votantes. Já as listas ligadas a Pequim, como as de Ella Lei, Ho Ion Sang e Wong Kit Cheng, receberam mais dez mil votos dos novos eleitores. Quem representa a classe média, como a Agnes Lam e o Lam U Tou, receberam mais três mil votos e sete mil, respectivamente”, frisou o professor.

Estes dados mostram que “a sociedade tem opiniões diferentes em relação à política mas não significa que as listas afastadas de Pequim consigam atrair os novos eleitores. Os resultados dizem-nos que a comunicação junto dos jovens deve ser destacada”.

A importância da economia

Lok Wai Kin defendeu também que “os programas políticos com conteúdos sobre economia e assuntos sociais atraíram mais votantes”. “Isto é uma inspiração para aqueles que querem estar na política. Quem se focar apenas nos assuntos políticos pode não ganhar apoios suficientes”, frisou o docente de Direito.

“Todos os programas mostraram ter algo em comum: a necessidade de aumento da fiscalização do Governo. A maioria das pessoas está de acordo nesta matéria e o Executivo deve, no futuro, aumentar a sua eficiência e transparência”, acrescentou.

Cadeiras equilibradas

Para Yang Jia Long, doutorando da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade de Macau, “a ala pró-democrata ocupa agora na AL uma proporção semelhante à ala próxima de Pequim”, graças à eleição de José Pereira Coutinho, Au Kam San, Ng Kuok Cheong e Sulu Sou. “Olhando para os programas dos candidatos, focaram-se sobretudo em temas como a habitação, trânsito, saúde e educação. Os preços do mercado imobiliário foi outra das prioridades. Assuntos relacionados com a cultura e indústrias criativas não mereceram grande interesse por parte das listas mais tradicionais.” Ainda assim, Yang Jia Long lembrou que “as fontes dos votos obtidos por estas listas foram sobretudo eleitores acima dos 40 anos”. Por isso, “assuntos da preservação da cultura poderão interessar mais aos jovens”.

Eleitores vs população

He Ning Yu, doutorando do Instituto para Pesquisa Social e Cultural da MUST, lembrou que Macau registou, nos últimos cinco anos, um aumento em termos de população e também de eleitores. Se a população registou um aumento na ordem dos 10,8 por cento, o número de eleitores subiu para 307 mil. O académico disse que grande parte dos eleitores rondam uma faixa etária acima dos 40 anos, ainda que “os eleitores jovens, entre os 25 e os 34 anos, ocupem uma certa proporção”. He Ning Yu defendeu que, nas últimas cinco eleições, houve uma tendência de aumento em termos de número de listas, sendo que os candidatos com uma ligação ao sector financeiro também registaram uma tendência de aumento.

21 Set 2017

Carl Ching pede recontagem de votos da sua lista e de Ho Iong Sang

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] cabeça-de-lista da candidatura da Nova Ideais de Macau, entregou ontem um requerimento ao Tribunal de Última Instância (TUI) a pedir a recontagem dos votos que a sua lista obteve nas eleições passadas de 17 de Setembro. Carl Ching pediu também que os votos da lista de Ho Iong Sang sejam contados novamente.

A razão por detrás do requerimento prende-se com a caução de 25 mil patacas que Carl Ching pagou para participar nas eleições para a Assembleia Legislativa. Como o candidato não conseguiu o número de votos suficientes para reaver a caução paga na altura em que apresentou a sua lista, enquanto mandatário da sua lista, Ching entende que este dinheiro não deve ficar nas mãos do Governo. O candidato não quer que a verba que teve de desembolsar contribua para “engordar” os membros do Executivo com cargos importantes, até porque considera que o Governo não tem ferramentas de fiscalização eficazes para a utilização de fundos.

Descubra as diferenças

Carl Ching admite que caso não tivesse este problema com a caução prestada não iria apresentar o pedido de recontagem dos votos. A justificação para este pedido para o TUI é a semelhança entre os símbolos da lista Nova Ideais de Macau e a lista 2, de Ho Iong Sang. Ambos usam o preto e o branco no boletim de voto. Como tal, Carl Ching entende que os trabalhadores responsáveis pela contagem nas assembleias de votos podem ter falhado, subtraindo votos à sua lista e influenciado o resultado final que obteve no sufrágio de domingo.

O líder considera que como entregou 602 assinaturas aquando da propositura de candidatura à Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa, não se entende que haja tamanha discrepância para a quantidade de votos que angariou.

O mandatário da lista Nova Ideais de Macau diz não contar com nenhum apoio legal no pedido que fez ao tribunal de última instância e que precisa de reaver o dinheiro pago à CAEAL uma vez que este lhe fora emprestado por amigos que precisam ser ressarcidos.

Além disso, Carl Ching anunciou a criação de um grupo de fiscalização do Governo de forma a acelerar a compensação aos residentes afectados pelo tufão Hato.

21 Set 2017

Baralhar e voltar a dar

[dropcap style≠’circle’]R[/dropcap]ealizaram-se no passado domingo as eleições para a Assembleia Legislativa da RAEM, e pela quinta vez desde a transferência de soberania, a população foi chamada a escolher parte dos deputados que vão compor o hemiciclo na próxima legislatura. Das análises que foram feitas nestes últimos dias, concordo basicamente com o essencial: todos ficaram a ganhar. Os sectores tradicionais mantiveram ou reforçaram a sua presença, bem como o sector tido como “anti-establishment”. Foi um progresso significativo em relação ao sufrágio de há quatro anos, onde o eleitorado preferiu votar em massa nos sectores que representam mais os interesses económicos e associativos.

Se há algo com que não concordo é com a possível influência do tufão Hato nos resultados eleitorais, que assim serviriam para mostrar um “cartão amarelo” ao Governo. Pode ser que os danos provocados pela tempestade, e a resposta pouco adequada que foi dada à mesma estivesse na mente de uma pequena parte do eleitorado, mas não era o poder Executivo que ia aqui a votos, mas sim o Legislativo. Uma das funções deste é a de “fiscalizar a actuação do poder Executivo”, e nesse particular os resultados forma positivos. Existe pelo menos alguma esperança em relação a 2013, no que toca a esse particular.

Portanto, estabelecido de que aqui não se pode falar de quem “ganhou” ou “perdeu”, falemos de quem teve mais votos, que foi a Associação do Novo Macau (NM), que no somatório das três listas com que se apresentou ao sufrágio, obteve mais de 30 mil votos. Dizer que a lista única da União-Macau Guangdong foi a grande vencedora porque obteve mais votos que as 23 restantes é fazer “contas de merceeiro”. Aqui não se trata de uma maratona, ou de uma corrida de fórmula 1, onde ganha quem atravessa a meta em primeiro lugar – por essa lógica o PSD seria Governo em Portugal, nesta altura.

Nem se pode falar de um grande sucesso da parte das democratas nestas eleições, mas antes de um regresso à normalidade. Era a força que vinha obtendo mais votos desde 2001, e há quatro anos sofreram um revés, quando optaram por se dividir em três listas, perdendo eleitores, bem como um lugar na AL. A receita agora foi a mesma, mas com outro ingrediente. Em 2013 a terceira lista foi encabeçada por Jason Chao, que vinha sofrendo de um exposição negativa da sua imagem e era tido como um “radical”, e este optaram por Sulu Sou, uma figura mais carismática, com um discurso mais próximo do eleitorado de base da ANM. Sou conseguiu triplicar o número de votos do seu camarada e ser eleito, provando ter sido uma aposta sensata.

A grande surpresa da noite eleitoral foi a eleição de Agnes Lam, que concorreu pela terceira vez à frente do Observatório Cívico, duplicando o número de votos de há quatro anos. Atendendo ao facto de que o seu eleitorado não veio do sector democrata, nem de Pereira Coutinho, que reforçou a sua votação, apesar de ter perdido o seu companheiro de bancada, pode-se dizer que Agnes Lam foi a mais beneficiada com os novos 20 mil eleitores que participaram deste sufrágio. O papel que desempenhará na AL é ainda um mistério, mas pelo menos servirá para elevar o debate em termos de retórica. E sabemos como isso é necessário.

Em última análise, pode-se considerar que existem dois grandes blocos do eleitorado. Uma maioria com ligação aos sectores tradicionais e às associações, que desta forma garantem praticamente a sua representatividade com os votos vindos da sua base eleitoral, e cerca de 50 e poucos mil votos ditos “independentes”  (podiam ser mais caso a participação fosse maior), e que desta vez foram bem distribuídos.

21 Set 2017

AL | Chefe do Executivo promete diálogo com novo hemiciclo

[dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]indas as eleições que elegeram 14 deputados à Assembleia Legislativa (AL) pela via directa e 12 pela via indirecta, o Chefe do Executivo decidiu pronunciar-se sobre a matéria. Citado por um comunicado oficial, Chui Sai On deu ontem os parabéns aos deputados eleitos, tendo prometido um diálogo estreito com a nova AL.

“O Governo, juntamente com a AL, continuará a defender estritamente o princípio “um País” e a tirar proveito das vantagens facultadas pelos “dois sistemas”, em rigoroso cumprimento da Constituição e da Lei Básica, mantendo sempre uma estreita comunicação e uma cooperação pragmática, servindo a população”, lê-se no comunicado.

Chui Sai On adiantou ainda que tanto o Executivo que lidera como o hemiciclo “continuarão empenhados no desenvolvimento dos trabalhos de construção do sistema jurídico, mantendo um ambiente de harmonia e de democracia”.

“Iremos trabalhar em conjugação de esforços e de forma incessante para melhorar o bem-estar dos residentes de Macau e impulsionar a prosperidade e a estabilidade de Macau”, acrescentou ainda o Chefe do Executivo.

Na visão de Chui Sai On, as eleições legislativas “decorreram de forma suave e eficiente”, graças ao trabalho da Comissão de Assuntos Eleitorais da AL.

“Todos os sectores da sociedade de Macau, em conjugação de esforços e desempenhando, cada qual, as suas funções, participaram e colaboraram de acordo com a lei e de forma ordenada nos trabalhos eleitorais. A todos eles, manifesto os meus sinceros votos de agradecimento”, concluiu.

20 Set 2017

Eleições | Susana Chou acredita na vitória de Lam U Tou em 2020

A antiga presidente da Assembleia Legislativa manifestou nas redes sociais o seu apoio a Lam U Tou, que obteve mais de sete mil votos nas eleições, através da lista Poder de Sinergia. Susana Chou acredita que este candidato, ex-membro dos Operários, pode vir a ser deputado

[dropcap style≠’circle’]L[/dropcap]am U Tou foi um dos nomes que surpreendeu na noite eleitoral de domingo, tendo obtido mais de sete mil votos com a lista Poder de Sinergia. O resultado alcançado pelo antigo membro da Associação Geral dos Operários de Macau (AGOM) provou, segundo analistas, que este pode vir a representar uma nova força política daqui a quatro anos.

O candidato da lista 15 obteve o apoio público de Susana Chou, antiga presidente da Assembleia Legislativa (AL), que na sua página de Facebook defendeu que Lam U Tou pode muito bem vir a ser eleito nas próximas legislativas.

“Espero que continuem a lutar por um futuro mais brilhante em Macau e que façam coisas benéficas em prol da sociedade e população. Espero também que daqui a quatro anos a mesma lista se recandidate às eleições. Acredito que vão conseguir [ser eleitos]”, considerou.

Susana Chou lembrou que os resultados foram bastante satisfatórios para a estreia da Poder da Sinergia nas legislativas, tendo em conta os poucos recursos de que dispunham os candidatos.

“A lista 15 candidatou-se pela primeira vez sem grandes apoios e sem ir atrás de dinheiro. Mas conseguiram ter mais de sete mil votos. É óbvio que fizeram um bom trabalho. É por isso que digo que, apesar de não terem ganho, ficaram com a glória e toda a gente deve ficar contente por eles”, acrescentou a empresária e ex-presidente do hemiciclo.

Sem arrependimentos

Lam U Tou já garantiu aos jornalistas que, daqui a quatro anos, se candidata novamente às eleições pela via do sufrágio directo. Apesar da derrota, Susana Chou deixou bem claro que não se arrepende de ter apoiado publicamente este candidato.

“Vários amigos me perguntaram se fiquei desiludida por não existir nenhum candidato da lista 15 no grupo dos deputados eleitos. O que posso responder é que não estou desiludida e nem me arrependo de apoiar esta lista”, frisou.

Susana Chou revelou ainda na sua página de Facebook que chegou a ser aconselhada a não apoiar a lista liderada por Lam U Tou.

“Houve amigos que me disseram para não apoiar a lista 15 de uma forma aberta, porque caso revelasse o meu apoio publicamente poderia ofender muita gente. Mas sempre insisti na honestidade e nunca quis dizer coisas falsas. A esses amigos disse que sempre escolhi pessoas talentosas e não pessoas que conheço há muito tempo”, referiu.

Admitindo, apesar de tudo, que conhece Lam U Tou há muitos anos, devido ao seu passado associativo, Susana Chou adiantou que este “é um jovem talentoso e não há muitos em Macau”.

“Aprecio especialmente o seu bom carácter. Vi o programa político da lista 15 e percebi que foi uma lista composta por jovens com ideais, ambições e vontade de fazer coisas na prática. Por isso decidi apoiá-los sem reservas”, apontou.

20 Set 2017

Eleições | Sulu Sou, o jovem rosto do campo pró-democrata

Foi candidato às eleições legislativas há quatro anos, estudou ciência política em Taiwan. Perdeu, mas desta vez ganhou. Sulu Sou foi um dos vencedores da noite eleitoral de domingo

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ulu Sou, rosto do maior protesto em Macau desde o massacre de Tiananmen em 1989, foi este domingo eleito para a Assembleia Legislativa (AL), tornando-se, aos 26 anos, o mais jovem deputado e uma das poucas vozes pró-democracia no hemiciclo.

Começou a interessar-se por política, com 17 anos, quando acompanhava atentamente as notícias da vizinha Hong Kong. Sulu Sou viu esse interesse crescer já em Taiwan, onde concluiu a licenciatura em Ciência Política e actualmente prossegue uma pós-gradução.

Inicialmente, o jovem abraçou causas relacionadas com as dificuldades das classes mais desfavorecidas, mas acabou a “virar a agulha” para o sistema político.

“Acho que a raiz de todos os problemas está na falta de um sistema democrático”, disse em Dezembro de 2014, numa entrevista à agência Lusa.

O jovem Sulu Sou chegou a presidente da Associação Novo Macau no mesmo ano e apenas alguns meses depois de liderar uma manifestação que juntou 15 mil pessoas.

O protesto contra uma proposta de lei que previa regalias para membros cessantes do governo elevou-o a estrela da nova geração de activistas e inspirou-o a escrever um livro sobre o processo que culminou na retirada da proposta pelo próprio chefe do Executivo. O livro chegou mesmo a ser confiscado antes de chegar às livrarias.

As eleições de 2013

Há quatro anos, Sulu Sou prometia que não iria abandonar a defesa dos mais vulneráveis: “Venho das classes baixas e nunca me vou desviar das questões que afectam os pobres”.

Candidatar-se a um lugar de deputado era uma hipótese que já então admitia para “mostrar aos jovens como se podem envolver na sociedade civil”.

Já nesta campanha, Sulu Sou foi às lágrimas num comício, quando falava das dificuldades dos jovens ao entrarem na política, segundo o canal em português da TDM.

Popular entre os mais jovens, disse, no entanto, na apresentação da campanha que o seu programa político era dirigido a “todas as faixas etárias”.

Não escapou, no entanto, a ataques pessoais, e segundo o jornal Tribuna de Macau, foi criticado por “ser um conquistador, um libertino, um sedutor”, por ter tido duas namoradas, em alturas diferentes, quando era estudante em Taiwan.

Já nas legislativas de 2013, quando ainda não era conhecido, concorreu como número dois do veterano Au Kam San.

Nas actuais eleições, apesar de já não presidir à Novo Macau, Sulu Sou candidatou-se como líder da lista afiliada da associação que actualmente reflecte as divergências entre a ala mais tradicional liderada pelos fundadores Ng Kuok Cheong e Au Kam San e a ala mais liberal conotada com Jason Chao e Scott Chiang.

Além de temas directamente relacionados com o bem-estar da população, Sulu Sou mantém como bandeiras a defesa do sufrágio universal e diz-se preocupado com a erosão dos direitos vigentes em Macau pelo período de 50 anos iniciado na transição para a China, em 1999.

Há dois meses, na vigília convocada pela Novo Macau para assinalar a morte do dissidente chinês Liu Xiaobo, Sulu Sou disse à Lusa não tomar a liberdade de Macau como garantida.

“Perdê-la é muito fácil, preocupo-me com isso. Lutamos por um bocadinho de democracia em Macau e é muito difícil. Perder a liberdade de expressão, de imprensa, a liberdade de não ter medo, é muito fácil”, afirmou.

19 Set 2017

Eleições | Ho Ion Sang e Song Pek Kei agradecem aos eleitores

Com mais ou menos votos que o esperado ontem foi dia de agradecer ao eleitorado. Ho Ion Sang e Song Pek Kei andaram na rua e, mais ou menos satisfeitos, garantem o cumprimento dos programas a que se propuseram

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]ntem foi dia de agradecimentos por parte de algumas das listas que elegeram deputados nas eleições de domingo. Ho Ion Sang e Song Pek Kei, mantêm os lugares na Assembleia Legislativa e dirigiram-se à população para garantir que a aposta não será esquecida.

Ho Ion Sang, eleito pela “União Promotora Para o Progresso” e ligado aos Kaifong está satisfeito com o apoio dos residentes. Ao HM, o candidato eleito, refere que vai manter o contacto próximo com os vários sectores sociais do território. “Vou deslocar-me e visitar as comunidades locais para melhor compreender as necessidades e solicitações dos residentes”, apontou. Esta é também a forma de retribuir o voto de confiança que lhe foi dado nas urnas e é uma responsabilidade à qual não pode nem quer fugir. O único candidato eleito da sua lista, Ho Ion Sang está ainda assim “satisfeito”.

A “União Promotora Para o Progresso” arrecadou cerca de 12 mil votos e a lista liderada por Wong Kit Cheng, a “Aliança do Bom Lar” também ligada aos moradores mas que se candidatou separadamente, obteve 9500 votos. “Com as duas listas conseguimos um total de mais de 21 mil votos, número que representa uma subida significativa em relação às eleições passadas”, disse. Para Ho Ion Sang não há nada para lamentar e a divisão dos candidatos ligados aos Kaifong em duas listas separadas foi uma aposta ganha com a eleição de dois deputados.

O trabalho que tem pela frente vai ter como prioridade os assuntos sociais, sendo que no topo da agenda de Ho Ion Sang está o pedido ao Governo de um calendário para 40 mil fracções de habitação pública, para a reconstrução dos bairros antigos do território e para as medidas contra inundações.

O objectivo, sublinhou, “é fazer com que os residentes consigam ter uma vida confortável no território”.

Relativamente aos comentários acerca de pessoas ligadas aos Kaifong que terão acompanhado eleitores às mesas de votos, Ho Ion Sang não adianta comentários e argumenta que não tem conhecimentos detalhados acerca da situação.

Vitória menor

Já Song Pek Kei passou o dia de ontem entre a Areia Preta, o Fai Chi Kei e a Rua da Praia do Manduco onde, entre agradecimentos aos residentes, foi apoiada pelos eleitores e recebeu mais um apelo para que lute pelas necessidades da população.

Em declarações ao HM, a número um da lista “Associação dos Cidadãos para o Desenvolvimento de Macau” refere que os “objectivos básicos” foram atingidos, embora os resultados estejam longe do satisfatório.

Com pouco mais de 10.000 votos, Song Pek Kei admite agora que as listas em separado e a ausência de Chan Meng Kam foram factores determinantes para a perda de um deputado no hemiciclo.

A deputada eleita não deixa de querer alcançar os objectivos do programa que propôs aos eleitores ao mesmo tempo que pretende lutar pelo aumento da qualidade de vida dos residentes.

Apesar da aparente derrota, Song Pek Kei considera que o processo eleitoral decorreu sem grandes incidentes, o que se deve à actual lei eleitoral. No entanto, aponta, “há ainda faltas a colmatar na legislação e nos trabalhos da Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL), nomeadamente medidas relativas aos actos de propaganda.

 

Eleições| Ruas do contentamento

Mak Soi Kun e Zheng Anting, candidatos eleitos da lista “União de Macau-Guangdong” foram ontem à Rua da Praia do Manduco para agradecer o apoio dos eleitores. De acordo com o canal chinês da Rádio Macau, os candidatos eleitos foram recebidos por comerciantes e prometeram ter em conta as necessidades deste sector. Em relação aos novos rostos no hemiciclo, Mak Soi Kun considera que “qualquer pessoa é bem-vinda” desde que consiga trazer benefícios à legislatura que vai começar e mais-valias à sociedade.

Também Wong Kit Cheng, candidata eleita pela lista “Aliança de Bom Lar”, foi agradecer aos eleitores pelos votos. A localização escolhida foi a zona da Rua do Campo onde vários residentes deram os parabéns à deputada “Associação Geral das Mulheres”.

Wong Kit Cheng mostrou ainda o seu contentamento por poder continuar no hemiciclo mas considera que há eleitores que têm de ser conquistados. A candidata eleita vai continuar a encaminhar as propostas ligadas aos assuntos sociais que não foram completadas na 5ª legislatura.

Wong Kit Cheng sublinhou ainda que respeita “os deputados eleitos pelos votos da população, e espera que todos os deputados no hemiciclo cooperem em conjunto, para uma melhor fiscalização do Governo a uma melhor vida dos residentes”.

19 Set 2017

Indirectas | Mais ou menos dos mesmos

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]ra o único sector onde havia competição. Duas listas diferentes concorriam aos lugares reservados aos interesses profissionais. Chui Sai Cheong encabeçava uma lista composta por três candidatos, mas só conseguiu garantir assentos para dois. Vong Hin Fai – que, até agora, estava na Assembleia Legislativa (AL) por nomeação do Chefe do Executivo – entrou para o lugar deixado vago por Leonel Alves. A terceira vaga foi conquistada pelo líder da outra lista, o também já deputado Chan Iek Lap.

O resto da história das eleições por via indirecta faz-se sem qualquer agitação, uma vez que havia uma única lista para cada sector. Em representação dos interesses industriais, comerciais e financeiros, vão estar Ho Iat Seng, actual presidente da AL, o veterano Kou Hoi In, o engenheiro José Chui Sai Peng e o estreante Ip Sio Kai, ligado à banca.

O sector do trabalho terá como deputados dois novos rostos: Lam Lon Wai e Lei Chan U, ambos com cargos nos Operários. Pelos sectores dos serviços sociais e educacional permanece Chan Hong. Não há novidades também nos sectores cultural e desportivo, com Vitor Cheung Lup Kwan e Chan Chak Mo por mais quatro anos na AL.

18 Set 2017

Ala pró-democrata com três assentos na Assembleia legislativa

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o ranking dos vencedores das eleições por via directa estão os líderes das três listas pró-democratas do território. Os veteranos Au Kam San e Ng Kuok Cheong, bem como o estreante Sulu Sou vão integrar o hemiciclo nos próximos quatro anos.
A grande surpresa dos resultados eleitorais vai para Sulu Sou, da Associação Novo Macau (ANM) e número um da lista Associação do Novo Progresso de Macau.
O ambiente na sede de campanha não podia ser mais emotivo aquando da certeza dos resultados. Depois da ruptura com Au Kam San e Ng Kuok Cheong, a Novo Macau voltou a garantir presença na Assembleia Legislativa. Entre as lágrimas dos apoiantes e um futuro deputado visivelmente emocionado, a pequena sede da ANM estava abarrotada de gente e de alegria.
Com 8981 votos, o mais jovem deputado à AL pretende dedicar a legislatura aos princípios que tem vindo a defender e que estão ligados à defesa da liberdade e dos direitos humanos, e à promoção de uma juventude capaz de se exprimir sem restrições e de se envolver na vida política local. “Os mais novos devem confiar neles e na sua capacidade em mudar a sociedade e a própria AL”, disse Sulu Sou.
Para o futuro, Sou não esconde a continuação da luta pela democracia, sendo que “o que mais gostava de ver era uma Assembleia totalmente eleita pela via directa”, apontou.

Deu trabalho

O deputado eleito não ficou surpreendido com o resultado e considera que mais não é do que o fruto dos últimos quatro anos de trabalho da ANM e da vontade dos residentes, aos quais agradece.
O jovem deputado não deixou de mostrar satisfação pelos colegas que se afastaram da associação que lidera, Ng Kuok Cheong e Au Kam San. Para Sulu Sou, o facto de terem sido ambos eleitos, ainda que por listas diferentes, mostra o interesse das pessoas em participar na vida política. “Penso que muitos residentes, principalmente os mais jovens, querem liberdade mas têm medo de expressar a opinião e nós queremos fazer mais e melhor.”
A luta pela democracia em Macau não vai interferir, ao contrário de Hong Kong, com a soberania da China, garantiu ainda. “Vamos agir sempre a defender o princípio de ‘Um país, dois sistemas’ e ter sempre em conta os residentes do território”, sublinhou.
Ser o mais novo elemento do hemiciclo não é um problema para Sulu Sou, apesar de considerar que ainda tem muito para aprender.

Democratas tradicionais | Venha quem vier por bem

[dropcap style≠’circle’]L[/dropcap]istas diferentes, mas sempre juntos. Numa cave da Areia Preta, juntaram-se ontem apoiantes de Au Kam San e Ng Kuok Cheng, ambos reeleitos confortavelmente. Concorreram separadamente para manter os lugares na AL, e resultou. Au Kam San, com quase 11 mil votos, ficou desta vez à frente de Ng Kuok Cheong, que arrecadou 9791.

A dupla vai continuar a lutar pelo sufrágio universal para a eleição do Chefe do Executivo. “Queremos que este processo já possa acontecer em 2019”, disse Ng Kuok Cheong imediatamente após serem conhecidos os resultados eleitorais. O deputado agradeceu aos residentes de Macau a reeleição que representa “o apoio da comunidade a um futuro democrático”.

Ng Kuok Cheong não deixou de mostrar satisfação pela vitória de Sulu Sou. “Estou feliz por qualquer um que queira participar em verdadeiras eleições e estou contente por existirem mais amigos a favor da democracia na Assembleia Legislativa”, reagiu.

No entanto, ainda há muito para fazer e “a chave está nas mãos dos jovens”, sublinhou durante os festejos de vitória.

Se, em 2013, Ng Kuok Cheong arrecadou mais votos que Au Kam San, nas eleições de ontem aconteceu o inverso. No entanto, os objectivos mantêm-se.

Já Au Kam San, depois de saber os resultados, manifestou a necessidade de mais deputados pró-democratas. “A ala democrática ocupa uma minoria e é inevitável que se lute pelo aumento de lugares na AL para deputados eleitos por via directa”, referiu.

18 Set 2017

Melinda Chan, da lista 18, foi a grande derrotada das eleições

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] noite eleitoral começou bem para os lados da Doca dos Pescadores e os primeiros resultados, após a contagem dos votos de Coloane, pareciam indicar a reeleição de Melinda Chan, que concorria como líder da lista 18, a Aliança pr’a Mudança.

Contudo, à medida que as horas passavam, os gritos de euforia e os sorrisos depressa passaram às lágrimas da derrota. Melinda Chan não foi reeleita deputada por uma margem de 160 votos, e cá fora não faltaram rostos tristes e de semblante carregado, incluindo o de David Chow, seu marido e empresário, que esteve sempre ao seu lado à medida que se viam os números no ecrã.

“Estava confiante e estou muito desiludida”, disse aos jornalistas, por volta das 2h00, quando já se conheciam os primeiros vencedores. “Nunca pensei que não ia vencer, mas respeito a decisão dos cidadãos. Não sei o que aconteceu, talvez não tenham gostado do que disse na campanha”, apontou.

A candidata derrotada não sabe o que vai fazer a seguir. Continuar o trabalho na Associação de Beneficência Sin Meng é um dos planos, tal como “tirar umas longas férias”. O desapontamento de Melinda Chan foi tão grande que não sabe sequer se será candidata nas próximas legislativas, daqui a quatro anos. “Não me parece que vá concorrer novamente”, frisou.

O número três da lista, Jorge Valente, também se mostrou francamente desiludido, naquela que foi a sua estreia na política. “Teremos menos uma voz na Assembleia Legislativa que levaria várias ideias, incluindo algumas minhas”, respondeu. “Acho que perdemos alguns votos que viriam dos casinos, das listas que representam os trabalhadores, e os democratas ganharam alguns lugares. Temos de aceitar o resultado”, adiantou.

Apoiantes de Melinda Chan no auditório da Doca dos Pescadores. Foto: HM

Mudança de estratégia

No início da noite, o ambiente era de festa e vários residentes de Macau, a viver no Continente, deslocaram-se de propósito à Doca dos Pescadores para ver Melinda Chan vencer de novo.

Na plateia encontravam-se vários jovens, como foi o caso de Mathew Wong, de 27 anos e trabalhador num banco. “Ela teve um papel importante na discussão sobre a lei de protecção dos animais e lei da violência doméstica. Sinto que ela representa a maioria das pessoas. As gerações mais jovens querem uma mudança na sociedade e acredito que a maioria pensa que o futuro de Macau tem de mudar”, defendeu ao HM.

Mathew Wong não tem dúvidas de que a passagem do tufão Hato por Macau fez despertar consciências. “Muitas pessoas perceberam que algo tem de mudar no Governo e que precisamos de melhores transportes e infra-estruturas, mais transparência e menos burocracia”, apontou.

Foto: HM

Jorge Fão, que foi número dois de David Chow, marido de Melinda Chan, no hemiciclo, disse que a Aliança pr’a Mudança tinha mudado a sua estratégia. Dos assuntos sociais, queria começar a abordar as necessidades dos pequenos empresários e do sector do turismo.

“Mudámos para a classe média, média alta. Mudámos a estratégia, com alguns riscos, mas mudámos. Acho que isto vai dar bons resultados porque, neste momento, vamos contar com uma base de apoio suficiente. Vamos ver se isto vai pegar”, disse ao HM. Horas depois, ficou confirmado que a mudança de estratégia não gerou frutos.

18 Set 2017

Liberdades e garantias | Alves defende discussão “de forma desinibida”

O deputado Leonel Alves despede-se da Assembleia Legislativa, ao fim de 33 anos, com um apelo: é preciso reflectir sobre como os direitos, liberdades e garantias estão a ser aplicados desde a transferência de administração

[dropcap style≠’circle’]”A[/dropcap]cho que Macau, depois destes 18 anos, devia parar um bocadinho, sentar-se à mesa e discutir de forma desinibida” sobre a experiência que advogados, juízes, Ministério Público e cidadãos têm sobre a forma como são abordados os direitos, liberdades e garantias, defendeu Leonel Alves, em entrevista à Lusa.

O advogado, que ao longo de mais de três décadas esteve envolvido na elaboração de leis neste âmbito – como por exemplo o direito à assistência jurídica de um advogado –, disse desejar uma “aposta mais activa do Executivo” nesta discussão.

“O princípio da presunção de inocência – até que ponto isto está reflectido no dia a dia? Não é nos livros, não é na letra da lei, é no dia-a-dia. O papel do juiz de instrução criminal, o que é? O nosso Código de Processo Penal como tem sido aplicado, não só na perspectiva de o Ministério Público rapidamente querer que a justiça seja feita, mas de o cidadão estar suficientemente munido de garantias de protecção dos seus direitos e liberdades?”, lançou.

Alves, que é ainda membro do Conselho Executivo, afirmou que como advogado teve algumas experiências “bastante negativas em sede de defesa do interesse da liberdade e dos direitos do cidadão”.

“Os nossos códigos são de inspiração portuguesa. Como é que os nossos magistrados os têm lido e interpretado? Como têm sido aplicados? A mesma lei, que já vigora há 30 anos, quando é interpretada por um jurista português [resulta] numa solução, quando é interpretada por um jurista ou magistrado chinês [resulta] noutra solução”, indicou, justificando tal com questões de “formação básica, contexto cultural e visão das necessidades da sociedade”.

Leonel Alves, que entrou para a Assembleia de Legislativa (AL) em 1984 e nos últimos dois mandatos foi deputado eleito por via indirecta, anunciou em Junho que não seria candidato às eleições realizadas ontem.

“Já participei muito. Participei nos trabalhos preparatórios da transição, depois veio a implementação da Região Administrativa Especial de Macau (…) É chegada a altura de não ter uma vida política tão activa”, resumiu.

 Avanços e retrocessos

Depois de uma fase de rápida aprovação de “leis importantes para poderem vigorar depois de 1999”, incluindo “códigos fundamentais”, Leonel Alves recordou o “primeiro contacto com a nova realidade constitucional de Macau”, que trouxe maior restrição às iniciativas do deputado, e não só. “O deputado não podia mudar coisíssima nenhuma sem o consentimento do Governo, enquanto [antes] podíamos alterar por completo a proposta do governador”, lembrou.

Perante esse cenário, foi necessário “imaginação e força de vontade”. “O melhor exemplo que posso dar da importância da AL neste quadro foi a insistência na feitura da lei das fontes normativas da RAEM”, em 2009, que define o que pode ser objecto de lei e o que pode ser objecto de regulamento administrativo.

Esta lei “marcou profundamente o próprio evoluir da RAEM a partir de então e pelo menos até 2049”, data até à qual vigora o actual princípio de ‘Um país, dois sistemas’. “Foi um trabalho que marcou a importância e o poder de influência da AL”, sublinhou.

Desde então – coincidindo com a primeira eleição do atual líder do Governo e de um novo presidente da AL – o hemiciclo “entrou noutro ciclo”. “Passou a ter um pendor cada vez mais controlador dos gastos públicos, das habitações públicas, das demandas disto e daquilo. Uma intervenção incisiva, pontual sobre determinados aspectos da vida corrente. O trabalho produtivo em matéria legislativa e o exercício da acção e influência, isso retrocedeu um pouco”.

Alves defende apelo para casos como o de Ho Chio Meng

[dropcap style≠’circle’]L[/dropcap]eonel Alves disse estar preocupado com a insistência do Tribunal de Última Instância (TUI) em não permitir recurso aos principais titulares de cargos políticos, defendendo que tal regra “não está escrita em lado nenhum”.

Depois do ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas Ao Man Long, também o antigo procurador Ho Chio Meng foi impossibilitado de recorrer da decisão do TUI, não obstante ter sido tomada em primeira instância. O reafirmou há dias a impossibilidade de os titulares ou ex-titulares de cargos públicos recorrerem de decisões, defendendo que “não se pode entender que haja uma lacuna jurídica”.

Em entrevista à Lusa, Leonel Alves rejeitou esta leitura e garantiu que “não há nenhum impedimento institucional” para que estes cidadãos, “que foram nomeados para um cargo importante e gozam de presunção de inocência”, tenham esse direito.

Alves lembrou que, antes de 1999, participou nos trabalhos relativos à Lei de Bases da Organização Judiciária e que essa “versão inicial previa o recurso”. “Mas depois houve alguém que entendeu que não, que tem de ser tudo imediatamente julgado pelo TUI porque são todos nomeados pelo Governo Central [da China]”, recordou. “Respeito a decisão do TUI mas, como participei nos trabalhos desde o início, [posso dizer que] a falta de possibilidade legal de recurso não se deveu a nenhuma fundamentação filosófico-política, mas sim ao défice de número de magistrados no nosso órgão máximo na justiça”, afirmou.

O TUI é composto por três juízes, o que impede a existência de um plenário para reavaliar casos que ali foram julgados em primeira instância. “Não há nenhum impedimento constitucional, não está escrito em sítio nenhum, nem na Constituição da República Popular da China, nem na Lei Básica de Macau, que o cidadão que, por acaso foi titular de principal cargo, não possa recorrer”, frisou.

O Chefe e os outros

Alves admitiu que “também não está escrito em sítio nenhum que pode recorrer”, mas lembrou que num Estado de Direito é preciso “reconhecer que errar é humano e ninguém pode garantir que os três juízes do TUI têm o dom absoluto da verdade e da certeza”. “É um direito do cidadão. Pessoalmente, como jurista, como cidadão, preocupa-me e acho que tem de ser resolvido”, disse.

Para o advogado, não mexendo na regra, ao abrigo da qual os principais titulares são unicamente julgados no tribunal de última instância, torna-se necessário dotar o TUI de “recursos humanos suficientes para poder acolher a apreciação de recursos das suas decisões”.

No entanto, defendeu que apenas o líder do Governo devia ser sujeito a tal: “O chefe é o representante máximo, os outros são colaboradores do representante máximo. Porque é que o colaborador tem de ter o mesmo tratamento a nível judicial que o Chefe do Executivo? Não faz sentido”.

18 Set 2017

Eleitor

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] somatório de todo o raciocínio, indiferença e sofrimento vertido na ponta de um carimbo. Com um simples gesto sepultam-se quatro anos de desfasamento na urna eleitoral. Já repararam na conotação fúnebre de tudo isto? O ciclo político encerra-se e reabre com um velório democrático. Um ritual mortuário mascarado de cidadania levando cortejos de eleitores enlutados e as suas lamúrias à cova das fracas opções. Um ciclo de vida afastado dos tronos da decisão onde se enterra a defunta liberdade. Tudo isto para chegarmos onde estamos, ou seja, exactamente onde estávamos antes. À terra regressamos.

Hoje voltámos a ser o que éramos antes da campanha eleitoral, uma massa disforme, por definir, nas antípodas do poder, perfeitamente camuflados por uma perfusão de estudos e consultas públicas fantasmagóricas. Sinto-me aliviado por não ter de testemunhar mais a charada dos bilionários a tentarem meter-se na minha pele, a fingir que conhecem as minhas dores. Tenham decência e deixem-me em paz, regressem às vossas torres de marfim, às vossas mulheres esculpidas a bisturi, às vidas onde não existe o medo de ficar sem tecto, onde não cabe a matemática da mercearia. O vosso único medo sou eu, somos nós, é um povo desperto e raivoso a reagir ao vosso despudor.

Este é o momento em que quase podemos tocar o Olimpo, roçar ombros com quem faz as leis da terra. Há um conceito que me desce da cabeça para onde se forma a bílis: Elite! A palavra tem origem no latim, eligere exlegere, uma cruel ironia para estes dias de retorno ao fosso incomensurável entre governadores e governados. Elegemos a elite, temos uma quota-parte de responsabilidade nisto tudo.

De certa forma, este exercício de intoxicante livre arbítrio é o que nos traz a este dia, ao rescaldo do concurso de popularidades que terminou na urna. Alimentaram-me com aspirações colossais face ao liliputiano gesto de eleger, venderam-me a ideia de acto essencial como a respiração e saiu-me na rifa uma acção onde não há qualquer tipo de processo cognitivo, nem análise, intuição, nada. Resta-me o vazio de utilidade depois do direito/dever cumprido, uma flor que teimo plantar em alcatrão fresco a cada quatro anos, sempre com uma réstia de esperança de que floresça além das limitações biológicas.

Mas pensemos no procedimento que me caracteriza, o voto. Como é que algo pode ser simultaneamente um direito e um dever? Este conceito tem na sua génese um enorme paradoxo que dificilmente poderá ter eficácia prática. É uma aberração lógica à qual não declino, talvez seja precisamente devido a esta inconsistência racional que não resisto, a todos os quatro anos, a carimbar um simulacro de escolha. Mas faço por eleger, presto-me ao sacrificial desígnio de sepultar o pequeno corpo democrático em caixão branco.

Fica toda a realidade citadina reduzida ao gesto aniquilador do voto, ao último golpe de teatro antes do regresso à normalidade e regressamos à cidade estrangulada pelas tenazes dos múltiplos interesses e à invisibilidade das suas gentes.

Agora instala-se a ressaca da inevitabilidade, mais quatro anos sem solicitações de cima. Volto a ser o cidadão, o residente, o mais elevado na hierarquia dos esquecidos, impertinente acorde na corda mais gorda do violoncelo, impetuoso na minha massificação, um fantasma andrajoso na cidade do super pib. Onde estão os milhões que as médias estatísticas me devem?

Hoje desperta um novo dia, mais um daqueles sem história depois de todo o rebuliço deste pedaço de Verão escaldante. A treva fica para trás e o sol irrompe num horizonte de normalidade. Um sentimento de paz apodera-se das coisas, entranha-se nos passeios, como se entre os objectos se instalasse um narcótico armistício.

Também entre as pessoas reina a reconciliação. Os eleitores voltam a ser quem eram, os trabalhadores residentes continuam a não ser ninguém e os políticos continuam a reinar acima de todos os outros. Como na relação entre astro e rotação celeste, Macau entra no “polistício”, a altura do ano em que a legislatura está no seu pináculo, iniciando, imediatamente, o seu declínio. A vida prossegue para mais um ciclo.

18 Set 2017

Eleições: Um derrotado chamado Governo

[dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]acau foi ontem a votos e não se pode dizer, desta vez, que as coisas tenham ficado na mesma. Não ficaram e a próxima legislatura provará que a correlação de forças se modificou, nomeadamente na ocupação do espaço mediático. Repare-se que vamos ter a maior representação de sempre de deputados “fora do sistema”: Ng Kuok Cheong, Au Kam San, Pereira Coutinho, Sulu Sou e, finalmente, à terceira tentativa, Agnes Lam. Se, por um lado, é preciso estar plenamente consciente de que estes deputados não terão força política para “mudar”; por outro lado, é quase certo que serão eles a ocupar a maior fatia do espaço mediático, interferindo na formação ideológica da população.

Será então nesse espaço que a sua voz se fará ouvir com uma outra densidade e propagação, graças ao facto de serem deputados. Este facto não agradará ao Governo e, provavelmente, não agradará a Pequim. Contudo, se tivermos em conta o grau de descontentamento que a acção do Executivo (ou a falta dela) tem provocado na população, poderão agradecer aos céus a existência de “distracções” que roubam votos aos candidatos “fora do sistema”. Sem elas os resultados seriam ainda mais sintomáticos dessa crescente (ainda que silenciosa) insatisfação.

E que “distracções” são essas? Trata-se, por um lado, das listas de “estrangeiros”, quer sejam de Fujian ou de Guangdong. Neste sufrágio, sobretudo o comportamento de Song Pek Kei teve consequências desastrosas e o grupo liderado por Chan Meng Kam perdeu um deputado. A menina Song continua na Assembleia Legislativa mas a sua credibilidade sofreu um rude golpe, que ela mesmo infligiu. Mak Soi Kun e Zheng Anting conseguiram a reeleição e pouco mais.

Por outro lado, temos as listas dos “revoltados” por isto ou por aquilo, que querem qualquer coisa muito específica, como a malta do Pearl Horizon. Imagine-se que esta soma de insatisfações e revoltas dirigia votos para os candidatos “fora do sistema” e os resultados poderiam ser bem diferentes.

Apesar dos “estrangeiros” e dos “revoltados”, que servem interesses muito específicos, não esquecendo igualmente Angela Leong, que consegue a reeleição, a presença de vozes dissonantes na AL é agora maior. E não só é maior como nos parece mais qualificada se acrescentarmos à existente na anterior legislatura os nomes de Sulu Sou e Agnes Lam. Mais jovens e melhor preparados do que a maior parte dos seus pares espera-se que tragam alguma inteligência e bom senso aos debates.

Não poderemos falar de vitória nem derrota dos chamados tradicionais (Kaifong e Operários), embora Ella Lei tenha sabido manter os votos que a saída de cena de Kwan Tsui Hang poderia ter dispersado. São máquinas velhas mas ainda bem oleadas.

Se olharmos com algum distanciamento, verificamos nestas eleições que o grande derrotado acaba por ser o Governo, as suas políticas e atitudes. O tufão Hato já não foi sintoma do distanciamento do Executivo em relação aos interesses da população: foi a prova. E isso caiu muito mal no goto de muita gente, deixando um sabor amargo difícil de apagar.

A prisão e julgamento de Ho Chio Meng já tinham sido um descrédito mais do que evidente das autoridades da RAEM — lembremo-nos que já foram detidos e condenados um alto membro do poder executivo e agora um dos mais altos cargos do poder judicial.

A inexistência de planos concretos para resolver as dificuldades da cidade exasperam o mais paciente dos cidadãos que não compreende, por mais discursos que lhe façam, por mais justificações que enumerem, como uma cidade tão rica está tão mal organizada e como os seus cidadãos não desfrutam de uma melhor qualidade de vida. E, de facto, é difícil de compreender.

Por isso, é caso para ainda irem abrindo as garrafas de espumante: poderia ter sido pior. Mas preparem-se para enfrentar uma barragem de vozes diferentes na AL. Não sei é se essas vozes terão capacidade para mudar alguma coisa além acrescentarem barulho no ar. Esperemos que sim.

18 Set 2017

Eleições | Chefe do Executivo e secretários votaram e apelaram ao voto

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s assembleias de voto abriram ontem às 9h00, tendo o Chefe do Executivo, Chui Sai On, ido votar por volta de um meio dia na secção de voto a que pertence na qualidade de eleitor, no Instituto Salesiano Imaculada Conceição.

Segundo um comunicado oficial, Chui Sai On apelou “aos eleitores para participarem activamente no processo eleitoral, exercendo o seu direito e dever cívicos, a fim de votar na lista favorita”.

O Chefe do Executivo referiu também que “as eleições decorrem de forma ordenada”, além de ter elogiado o trabalho da Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL).

Nas palavras de Chui Sai On à imprensa, este órgão tem cumprido a lei em vigor, “permitindo aos cidadãos escolherem os seus representantes na Assembleia Legislativa, com o objectivo de fiscalizar os trabalhos do governo, bem como, preceder aos trabalhos de legislação, apresentação e revisão de lei”.

Confrontado com notícias de pessoas que terão sido barradas na fronteira, Chui Sai On disse “não estar a par dos pormenores”, tendo referido que esse caso “não tem relação directa com os trabalhos da CAEAL e do Comissariado contra a Corrupção”.

Secretários também apelam

Quem também votou ontem de manhã foi o secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, que se deslocou à assembleia de voto localizada no Estádio de Macau, na Taipa.

Lionel Leong também apelou à participação cívica, tendo adiantado que “as eleições decorrem de forma legal, justa, transparente e íntegra”.

O secretário acrescentou que “os eleitores irão certamente exercer o seu direito de voto de forma racional e prudente, no sentido de eleger deputados à Assembleia Legislativa com capacidade de supervisão, debate político e aptidão legislative”.

Lionel Leong disse ainda, citado por um comunicado, que “qualquer tema político ou económico merece a atenção dos candidatos e dos futuros deputados”.

Também Alexis Tam, secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, votou num dos pavilhões do Estádio de Macau, tendo dito que o território “promoveu um sufrágio justo, parcial e íntegro”.

Alexis Tam votou esta manhã na Taipa. Foto: GCS

“De acordo com as notícias e com aquilo que fui ouvindo da parte dos residentes, as eleições deste ano encontram-se a decorrer de uma melhor forma em relação às edições anteriores”, disse, citado por um comunicado.

Alexis Tam lembrou a participação de todos os eleitores registados, mas sobretudo dos jovens, para que escolham os deputados que “falem por Macau e que trabalhem verdadeiramente pelos interesses da população”.

Quem também votou na Taipa, por volta das 9h00, foi Raimundo do Rosário, secretário dos Transportes e Obras Públicas, que disse estar bem disposto.

Relatório a caminho

Sónia Chan, secretária para a Administração e Justiça, também votou esta manhã, tendo dito que os eleitores “se devem empenhar no exercício do seu direito cívico”.

Sónia Chan, secretária para a Administração e Justiça

Concluídas as eleições, a secretária adiantou que a CAEAL “irá elaborar um relatório final onde irão constar as questões relacionadas com a execução da Lei Eleitoral e respectivas sugestões, que posteriormente servirão de referência para uma avaliação a ser efectuada pelo Governo”.

Presidente do TUI votou

Sam Hou Fai, presidente do Tribunal de Última Instância (TUI), votou no mesmo local que Chui Sai On e apelou aos eleitores para “exercerem o seu direito e dever cívico e para que participem activamente no acto eleitoral”. Tudo para que possam eleger “os candidatos que consideram estar empenhados no território, para que estes façam parte do próximo hemiciclo”.

O presidente do TUI adiantou ainda que “não recebeu qualquer informação sobre corrupção eleitoral, pelo que acredita que mesmo que existam casos, os mesmos deverão estar em fase de investigação e análise”.

Palavra de presidente

Ho Iat Seng, presidente da Assembleia Legislativa, votou ontem no Instituto Politécnico de Macau e disse esperar que “surjam novas caras na VI AL”, pois tal “dinamizará os trabalhos do hemiciclo”.

Ho Iat Seng votou esta manhã

“A AL dá sempre atenção às questões ligadas ao quotidiano da vida da população. Quando os assuntos ligados à habitação, transporte, assistência médica, educação e economia são bem resolvidos, a sociedade sente-se estável e os residentes são mais felizes”, acrescentou Ho Iat Seng.

O presidente do hemiciclo espera ainda que os novos deputados hoje eleitos possam “trabalhar de forma racional e não violar o Regimento da Assembleia Legislativa”.

17 Set 2017

Vong Hin Fai, advogado e candidato às eleições: “Não há aqui a luta por qualquer independência”

É advogado e foi, na última legislatura, presidente da Comissão de Regimento e Mandatos. Vong Hin Fai está na corrida eleitoral pela via indirecta como representante do sector profissional que, considera, tem falta de especialistas em várias áreas. O candidato vê ainda o território como um local harmonioso e sem qualquer risco de seguir os movimentos independentistas da vizinha Hong Kong

 

É candidato pela via indirecta pelo sector profissional. Quais são as maiores necessidades neste âmbito no território?

Sou um profissional da área jurídica, sou advogado e também exerço funções como notário privado. Macau, depois da abertura à indústria do jogo, passou por um desenvolvimento muito rápido e, como tal, cada vez mais carece de profissionais em várias áreas, não só no direito. Há a necessidade de pessoal especializado nos serviços de auditoria e de contabilidade. Há ainda necessidade de engenheiros e de arquitectos. Há, de modo geral, falta de profissionais em Macau.

Macau também precisa de mais notários.

Já foi feita também a alteração legislativa relativamente aos notários privados e já abriu o primeiro curso de formação. Penso que, daqui a uns tempos, vamos registar um aumento de notários privados no território.

Como é que o problema da falta de profissionais poderia ser resolvido?

Cada vez mais a Universidade de Macau (UM) e outras instituições de ensino superior estão a crescer e a desenvolver cursos para formar mais pessoas em várias áreas. Sou uma pessoa da área do Direito e, neste sector, além da UM, há outras instituições a fazer o mesmo. Há também, nesta área, a colaboração com universidades em Portugal, que estão a dar muito apoio à formação. Anualmente, há entre 20 e 30 jovens de Macau que vão a Portugal para estudar Direito.

Foto: Sofia Margarida Mota

Os advogados portugueses continuam a ser uma mais-valia?

Têm o seu lugar na vida profissional em Macau. Neste momento, e neste mercado, um terço dos advogados são locais e dois terços ainda são colegas portugueses.

Está à frente de uma nova associação ligada ao direito, a Associação dos Agentes Jurídicos de Macau. Não existe mesmo a possibilidade de esta entidade vir a concorrer com a Associação dos Advogados?

A Associação de Advogados de Macau é uma associação profissional e a lei já lhe conferiu os seus objectivos, atribuições e competências. Penso que outras associações ligadas ao direito e que integram colegas da área – não só advogados, mas também juristas da Administração Pública ou ainda académicos e agentes jurídicos das empresas privadas –, existem para que haja uma plataforma em que os seus elementos possam fazer intercâmbio académico e dos seus conhecimentos. A Associação dos Advogados tem uma função muito importante, que está relacionada com a sua autonomia para testar a qualidade dos profissionais locais e assegurar os estatutos disciplinares. Não há hipótese de existir uma associação com estas funções que a possa substituir.

Passando para a política. A população tem conhecimento suficiente acerca dos deputados eleitos por via indirecta?

Temos de respeitar esta forma de constituição da Assembleia Legislativa prevista na Lei Básica. Expressamente, e de acordo com a Lei Básica, há três tipos de deputados. Como residente, visto que nasci e cresci aqui, Macau é uma sociedade em que os seus habitantes já têm uma vida harmoniosa há muito tempo, especialmente depois do episódio “1,2,3” em 1966. A vida social do território é associativa. Existem aqui muitas associações. Porquê? Antes da transferência de Administração, o Governo português fazia o seu contacto com a população chinesa principalmente através das associações. Esta cultura associativa, depois da transferência de administração, manteve-se. Neste sentido, e no sufrágio por via indirecta, as associações têm o seu papel.

Como é que vê o actual sistema político local e a sua possível evolução?

O desenvolvimento do sistema político no território já foi previsto e já foram alterados os anexos 1 e 2 da Lei Básica, de modo a que o número de deputados eleitos por sufrágios directo e indirecto aumentasse. Depois da transferência, e até agora, o número dos deputados nomeados mantém-se e, em termos comparativos, os deputados eleitos são cada vez mais.

Há analistas que falam de um possível contágio dos movimentos que se têm registado em Hong Kong.

Quanto a este ponto, os residentes de Macau são, na sua maioria absoluta, patriotas e têm o seu amor à nossa pátria e ao território. Assim sendo, não há aqui essa chamada luta por qualquer independência. Não há mercado para se desenvolver qualquer indício deste tipo de acção ou acto. Não há lugar para isso. Também nos termos da lei, no que respeita à segurança nacional e de acordo com Artigo 23.o da Lei Básica, este tipo de acções são proibidas em Macau. Penso que, acima de tudo, os residentes de Macau são, na sua natureza, patriotas. Também penso que este tipo de acções não deve existir no território.

E como vê o bloqueio à entrada em Macau de deputados associados a movimentos pró-democratas da região vizinha e a jornalistas de Hong Kong?

Não faço comentários. Neste momento em concreto, em que estamos em fase de eleições, não quero comentar essa situação para que não haja qualquer influência na votação do dia 17.

Também foi o presidente da Comissão de Regimento e Mandatos da AL, que esteve à frente da proposta de proibição de cartazes e de limites às interpelações nas sessões plenárias.

Penso que, durante o último mandato, exerci as minhas funções como deputado e, através de outros trabalhos, cumpri com as minhas funções, mesmo que tenha sido limitado o número das minhas intervenções. Também cumpri nos trabalhos das comissões permanentes e da apreciação das propostas de lei, e no âmbito das comissões de acompanhamento.

E considera que as interpelações devem ser mais limitadas?

Tenho vários colegas que fazem muitas interpelações, o que tem a sua razão de ser. Da minha parte, as interpelações são limitadas. É preciso ser objectivo. Mas as interpelações, tanto orais como escritas, têm a sua razão de ser, e têm a sua influência para promover e impulsionar os serviços da Administração Pública. Da minha parte, fiz os meus trabalhos em outros aspectos. A proposta relativa aos cartazes acabou por ser retirada e, a meu ver, os cartazes ou objectos que os colegas usam durante o plenário têm, cada vez mais, uma dimensão maior e é essa a minha preocupação. Há três ou quatro anos, estes materiais não eram tão grandes, mas parece-me que recentemente, têm sido cada vez maiores. De qualquer maneira, respeito muito as opiniões dos meus colegas durante o período de antes da ordem do dia, em que há muitas oposições e críticas.

O tufão Hato passou há pouco tempo pelo território. A destruição que causou veio mostrar muitas das falhas de Macau e a falta de preparação para um fenómeno deste género. O Governo não devia ter assumido uma responsabilização mais concreta? 

Foto: Sofia Margarida Mota

Já está a decorrer o processo que envolve o director dos Serviços de Meteorologia. Foi um tufão muito forte e há mais de meio século que não havia registo de uma situação assim. As inundações das zonas do Porto Interior foram muito perigosas. Não sou arquitecto ou técnico dessa área, mas acho que as obras para a prevenção deste tipo de situações deveriam ser concretizadas a tempo. Porque é que isso não aconteceu? De acordo com o que sei, há algumas associações de protecção ambiental e do património que se manifestaram contra a escolha de um local naquela zona para a construção das bombas. O local escolhido também não mereceu uma opinião favorável por parte do Instituto Cultural, e julgo que temos de fazer um balanço. As obras para prevenir estas inundações, a meu ver, são prioritárias porque respeitam o interesse da segurança pública. Por outro lado, a posição do ambiente e do património cultural é importante mas, se fizermos uma comparação, temos de dar prioridade às instalações que previnem as inundações. Deste modo, e na sequência desta catástrofe, a Administração e o Governo estão a resolver com muito esforço a situação, de modo a concretizar e desencadear as obras necessárias em breve.  

Não acha que o Chefe do Executivo deveria ter colocado o lugar à disposição perante a ineficácia registada?

Não. Trata-se de uma catástrofe de que Macau nunca tinha sofrido.

Mas estamos numa zona de tufões.

Também os Estados Unidos estão a passar por uma catástrofe. São situações muito graves.

Quem é que poderá ser o próximo Chefe do Executivo?

Uma pessoa competente.

17 Set 2017

Eleições | Mais de 300 mil eleitores escolheram 14 dos 33 deputados do hemiciclo

[dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]ais de 300 mil eleitores de Macau escolheram 14 dos 33 deputados à Assembleia Legislativa (AL), numas eleições marcadas por um recorde de candidaturas para o sufrágio direto.

As eleições por sufrágio direto para a sexta AL vão ser disputadas por 24 listas compostas por 186 candidatos, incluindo sete luso-descendentes, dos quais apenas um é “cabeça de lista”.

Ao todo, 201 candidatos disputam 26 dos 33 lugares (14 pelo sufrágio direto e 12 pelo indireto), sendo os restantes sete deputados nomeados pelo chefe do Executivo da Região Administrativa Especial, após a publicação dos resultados oficiais.

Para o sufrágio indireto (através das associações) apresentam-se seis listas com 15 candidatos.

Na via direta, as atuais eleições ficam marcadas pelo número recorde de listas candidatas, num total de 24, e pela divisão dos pró-democratas em três listas, das quais apenas uma está afiliada à Novo Macau, a maior associação pró-democracia do território.

O jovem Sulu Sou lidera essa lista e, se for eleito, será o mais jovem deputado, aos 26 anos. Já os veteranos Ng Kuok Cheong e Au Kam San encabeçam duas candidaturas distintas, fora da Associação Novo Macau que fundaram.

A estratégia reflete, em parte, a divisão entre as alas tradicional e liberal do movimento pró-democracia e também o objetivo de aumentar a probabilidade de conquistar um maior número de assentos.

Esta é, aliás, uma opção seguida por outras forças pró-Pequim, como são os casos de Wong Kit Cheng e Ho Ion Sang, deputados que este ano lideram duas candidaturas separadas.

Isto porque a contagem dos votos nas eleições para a Assembleia Legislativa em Macau segue o método de Hondt alterado, que na prática dificulta a eleição de mais de dois deputados por candidatura.

Em ambos os sufrágios, a conversão dos votos em mandatos faz-se de acordo com o número de votos obtido por cada candidatura, dividido sucessivamente por 1, 2, 4, 8 e demais potências de 2, até ao número de mandatos a distribuir, sendo os quocientes alinhados por ordem decrescente da sua grandeza numa série de tantos termos quantos os mandatos.

Já a eleição pela via indireta tem a particularidade de, ao contrário do habitual, não estar totalmente definida antes do dia da votação, atendendo ao facto de um dos cinco colégios eleitorais – o do setor profissional – ser disputado por duas listas.

Na prática, três dos 15 candidatos a 12 lugares de deputados vão ficar de fora do hemiciclo.

Os cinco colégios eleitorais elegem 12 lugares pela via indireta: quatro pelo colégio eleitoral dos setores industrial, comercial e financeiro, três pelo do setor profissional, dois pelo do setor do trabalho, outros dois no colégio eleitoral dos sectores cultural e desportivo, e um no colégio eleitoral dos sectores dos serviços sociais e educacional.

Um total de 22 deputados da última legislatura figura como candidato: 13 concorrem pelo sufrágio universal e nove pela via indireta.

As eleições de hoje ficam ainda marcadas pelas saídas de algumas figuras de peso como Leonel Alves e Kwan Tsui Hang, após longas carreiras na Assembleia.

O português habitualmente eleito pelo sufrágio indireto decidiu não se recandidatar após 33 anos no hemiciclo, enquanto a histórica representante da Associação Geral dos Operários, que começou por ser eleita pelas associações, e mais tarde passou a conquistar o lugar através do voto da população, diz adeus à Assembleia depois de duas décadas de serviço.

Os restantes três deputados que não se recandidatam são Lam Heong Sang e Cheang Chi Keong, ambos eleitos por sufrágio indireto, e Chan Meng Kam, campeão de votos nas eleições de 2013, nas quais angariou mais de 26 mil votos, conquistando o feito inédito de garantir três assentos com uma única lista.

17 Set 2017

Mak Soi Kun | CCAC admite investigar acção de campanha

[dropcap style≠’circle’]L[/dropcap]am Chi Long, adjunto do Comissariado contra a Corrupção, admitiu ontem abrir uma investigação sobre uma acção de campanha organizada pela lista de União de Macau-Guangdong, liderada por Mak Soi Kun e Zheng Anting, noticiou a Rádio Macau.

À saída do programa Fórum Macau do canal chinês da emissora, um jornalista confrontou Lam Chi Long com fotografias que, alegadamente, mostram o grupo de Mak Soi Kun a ensinar eleitores a votar na lista, numa acção de campanha em que terá havido ofertas.

“Vamos recolher os dados e [analisar] se existe de facto uma violação à lei. Com base apenas numa fotografia, não posso tirar qualquer conclusão”, reagiu Lam, citado pela rádio.

Desde Março até agora, o CCAC diz já ter feito mais de duas mil operações de fiscalização, sendo que 1900 incluíram deslocações a restaurantes. Lam Chi Long diz que “não foi detectada qualquer ilegalidade”. Ainda assim, afirma existirem “algumas pequenas excepções que são suspeitas de violação da lei”. O organismo promete “proceder nos termos da lei”, mas não especifica quantos casos suspeitos existem, afirmando que “não pode avançar números concretos”.

Ainda segundo a Rádio Macau, o CCAC acrescenta que foram detectados casos de associações que levam os sócios em viagens, dentro e fora de Macau, mas Lam Chi Long também afirmou que, “por enquanto”, mas a investigação ainda está a decorrer, pelo que não pode avançar se são casos suspeitos.

17 Set 2017

Novo Macau | Queixa na CAEAL por alegada infidelidade ao regime

A notícia foi conhecida ontem: há uma queixa contra um candidato do universo da Novo Macau por alegada infidelidade ao regime. A lista diz ainda não ter sido informada. Está à espera da CAEAL

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL) recebeu uma queixa contra um candidato por alegada infidelidade ao regime, avançou ontem a Rádio Macau. A confirmar-se a acusação, o candidato, que será da lista ligada à Associação Novo Macau, poderá ser impedido de concorrer às eleições para a Assembleia Legislativa, um cenário que ainda não se coloca uma vez que o caso ainda está a ser analisado, explica a emissora.

“Os dados da queixa foram recolhidos através das redes sociais. Para acompanhar este caso, precisamos de recolher mais factos concretos”, declarou o presidente da CAEAL, Tong Hio Fong, que esteve esta manhã no programa Fórum Macau, do canal chinês da Rádio Macau. Numa nota ao final da tarde, referia-se que, além da obtenção de provas, a CAEAL necessita de avaliar “a possibilidade da legislação permitir a eficácia retroactiva pelos actos cometidos, no passado”, bem como “a intenção legislativa”.

Ao HM, Andrew Cheung, membro da lista, afirmou que ainda não houve qualquer contacto por parte da Comissão de Assuntos Eleitorais. “Não temos ainda informações sobre essa queixa e penso que a CAEAL tem de publicar mais dados sobre o caso”, disse. “Não fomos contactados.”

Esta semana, o candidato número 4 da lista da Nova Macau, do campo pró-democracia, disse que estava a ser alvo de uma campanha difamatória nas redes sociais Facebook e Wechat. Wong Kin Long, 20 anos, afirmou que foi publicamente acusado de apoiar a independência de Hong Kong.

A nova lei eleitoral obriga os candidatos a assinarem uma declaração de fidelidade a Macau enquanto Região Administrativa Especial da China. Foi a resposta dada pela secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, à interpretação feita pelo Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional sobre a questão do juramento dos deputados de Hong Kong pró-independência. Os candidatos de Macau podem ser impedidos de participar nas eleições e, mesmo após eleitos, arriscam perder o mandato caso se prove que são infiéis ao regime.

Depois das eleições do próximo domingo, a CAEAL terá de apresentar um relatório ao Governo sobre o acto eleitoral e os pontos a serem revistos. Tong Hio Fong admite já novas alterações à lei eleitoral, explica a Rádio Macau. O alvo são as redes sociais: “Posso avançar que, se calhar, temos de reforçar o combate à angariação de votos através das redes sociais, nomeadamente o Facebook, prevendo algumas sanções para este tipo de situações”.

A empresa Facebook arrisca pagar uma multa entre cinco mil a 50 mil patacas por divulgar conteúdos pagos pelas listas, classificados pela CAEAL como propaganda eleitoral ilegal. Tong Hio Fong esclareceu, no entanto, que apenas haverá sanções para a empresa, uma vez que, em termos jurídicos, ainda não estão definidas consequências para o comportamento do candidato.

17 Set 2017

Eleições | Lista de Sulu Sou queixa-se de três listas concorrentes ao Ministério Público

A lista Associação do Novo Progresso de Macau entregou três queixas junto do Ministério Público. Sulu Sou e Paul Chan Wai Chi dizem-se vítimas de difamação e boicote por parte das listas Ajuda Mútua Grassroots, Ou Mun Kong I e pela candidatura de Lee Kin Yun

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] campanha eleitoral da lista Associação do Novo Progresso de Macau tem decorrido de forma turbulenta nos últimos dias. A candidatura liderada por Sulu Sou e Paul Chan Wai diz-se vítima de difamação por parte de três listas concorrentes.

Segundo explicou Andrew Cheung, membro da lista, ao HM, as queixas apresentadas junto do Ministério Público (MP) dizem respeito a alegadas acções promovidas pela lista número 22, intitulada Ajuda Mútua Grassroots e liderada por Wong Wai Man. A lista número 23, Associação Activismo para a Democracia, liderada pelo activista Lee Kin Yun, é também uma das visadas, bem como a lista número 17, Justiça de Macau (Ou Mun Kong I), de Lei Sio Kuan.

Em causa estão acções de boicote nas actividades de campanha promovidas pela lista dos candidatos pró-democrata. De acordo com Andrew Cheung, as três listas visadas terão enviado grupos de pessoas para as actividades de campanha de Sulu Sou e Paul Chan Wai Chi, tendo empenhado cartazes com comentários negativos e proferido palavras de ataque.

“Segundo a lei, este tipo de comportamento violento pode levar a três anos de prisão. Além dos próprios candidatos, existem mais pessoas que interferiram nas nossas campanhas, e questionamo-nos porque é que a polícia não agiu”, afirmou Andrew Cheung.

Um dos últimos casos originou inclusivamente a abertura de um processo de investigação da parte da Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL).

Em plena acção de campanha, esta semana, os líderes da lista Associação do Novo Progresso de Macau foram confrontados com um grupo de pessoas que começou a gritar frases como “Wong Kin Long, não envenene os jovens!”, “Perante a desgraça, a pátria apoia-nos” e “A independência de Hong Kong é desumana”.

Estas pessoas afirmaram ter lido notícias que garantiam que o candidato seria a favor do movimento independentista de Hong Kong, que tem os activistas Joshua Wong e Nathan Law como protagonistas. Após esse episódio, os candidatos esclareceram que essas acusações são falsas e que não apoiam o movimento em causa. No entanto, a CAEAL prometeu averiguar o caso.

Contratos a prazo

Ontem, os candidatos Sulu Sou e Paul Chan Wai Chi realizaram uma conferência de imprensa no bairro do Iao Hon, onde prometeram lutar pela revisão do quadro geral do pessoal docente das escolas particulares do ensino não superior.

Em causa está a perda de garantias dos docentes com mais anos de experiência e que são, alegadamente, empurrados para a reforma sem o desejarem.

“Sabemos do caso de uma escola que recentemente despediu dez professores, sendo nove deles experientes. O Governo não garantiu uma supervisão adequada à acção destas escolas”, adiantou Andrew Cheung.

Segundo disse Sulu Sou ao HM, a lista tem vindo a receber muitas queixas de professores e docentes nos últimos dias de campanha. “A nossa plataforma política dá atenção ao sector da educação. Temos vindo a receber muitas opiniões e queixas nas últimas duas semanas. São opiniões de professores e pais. Querem que apelemos junto do Governo sobre a lei das escolas privadas”, frisou o líder da lista.

Sulu Sou disse ainda que são sempre assinados contratos a prazo a cada dois anos, sem que isso dê uma estabilidade à carreira docente. “Algumas escolas privadas, aquando da revisão dos contratos todos os anos, não respeitam a lei laboral. Mesmo que o professor trabalhe na escola durante o período de dois anos continuam a ser assinados contratos a prazo. Isto não está de acordo com a lei e isso causa pressão psicológica aos professores”, disse.

O candidato a um lugar no hemiciclo afirma existirem ainda, nas escolas privadas, casos de professores despedidos sem justa causa. “Queremos rever a lei caso sejamos eleitos, para que os professores tenham mais garantias”, concluiu Sulu Sou.

17 Set 2017

O último acto

[dropcap style≠’circle’]1.[/dropcap] Este texto devia ser, em rigor, sobre as eleições do próximo domingo. Devia ser um texto de análise, profundo e revelador de algum conhecimento sobre a matéria, um texto acerca das diferentes opções ao dispor do eleitor. Não é. Não sei se sei e, mesmo se soubesse, não me apetece. Também não é um texto baseado em teorias da semiótica das artes visuais, uma abordagem à estética eleitoral, ao modo como se pretende passar as mensagens políticas do momento.

Este texto devia ser sobre o momento político mais importante do território, mas não é. O momento não se dá à importância, não se dá ao respeito. Não se dignifica, nem dignifica os outros, os cidadãos comuns pelos quais deveria ter consideração. O que temos visto por aí é um pequeno circo ao ar livre, por entre os escombros do vento, as árvores e as tabuletas que continuam pacificamente derrubadas. Sendo certo que, independentemente da geografia, as campanhas eleitorais tendem a ser excessivamente burlescas, as da terra estão cada vez mais trágico-cómicas. Cómicas porque são arlequinescas; trágicas porque tudo isto é sério. Demasiado sério.

O que guardarei desta campanha eleitoral. Um candidato que acha que Che Guevara reencarnou junto ao Mar do Sul da China. Uma candidata que acha bonito andar por aí, na televisão, a falar dos filhos dos outros. Uma polícia que gosta de demonstrar o quão musculada é. Um IACM que diz que respeita os tribunais, como se tivesse outra opção. Umas carrinhas podres com uns cartazes fraquinhos. Uma Comissão de Assuntos Eleitorais que precisa de amadurecer. Promessas dirigidas única e exclusivamente a determinados sectores profissionais, como se andássemos todos a baralhar cartas em casinos. O que guardarei desta campanha eleitoral. A conversa vaga e vã do costume.

O que resultará destas eleições. Uma Assembleia Legislativa mais pobre, mais fraca, menos interessante. Ainda menos interessante. Não sabendo o que vai acontecer no próximo domingo, aposto um avo em como sairão vencedores aqueles que mais arroz distribuem, mais ajudam os necessitados e mais palmadinhas nas costas dão a velhinhos e crianças, como se política e beneficência se misturassem, como se melhor político fosse aquele que mais dinheiro tem.

Este texto devia ser, em rigor, sobre as eleições do próximo domingo. Não é. É sobre aquilo que eu não gostaria que Macau passasse a ser.

Ainda assim. Quando o próximo domingo chegar, vote, senhor eleitor, vote em consciência, coisa que falta à grande maioria dos candidatos. Mas vote, vote sempre. Ponha o carimbo no quadrado que a alma lhe indicar. Se não houver caminho para nenhum dos quadrados, vote na mesma, não escolha nenhum. Compreendo a indecisão, mas vá lá e vote, faça tudo como vem nos livros.

2. Há precisamente 20 anos, em Setembro de 1997, entrei numa redacção e nunca mais de lá saí, apesar de ter vindo para o outro lado do mundo e de ter conhecido algumas redacções, das quais também nunca mais saí. Muitas voltas dadas, este jornal. Casa de portas abertas onde cheguei uma e outra vez, sempre de maneiras diferentes. Que me ensinou o que é pensar nos outros, que me pôs a discutir, a perguntar, a perguntar muito, no desassossego constante sem o qual não é possível ser-se jornalista. Que me ensinou que tudo isto vale a pena, mesmo que amanhã já não tenha qualquer importância e estas páginas sirvam para embrulhar os copos em mais uma mudança de casa, para limpar vidros ou embrulhar peixe, funções todas elas nobres dos matutinos e vespertinos deste mundo.

Não sei como vim aqui parar, a esta redacção e às outras todas. Aconteceu e nem sequer consigo precisar o momento. Talvez tenha acontecido por gostar das palavras, do acto da escrita, e depois a vida e as pessoas que se atravessaram nela fizeram o resto. Ensinaram-me o resto. E ensinaram-me que, nisto dos jornais e do jornalismo, não se é, nem se está pela metade.

Quando as palavras nos custam, nos doem, mesmo que nos escorram pelos dedos às centenas, aos milhares, é porque só já somos metade de nós. E eu não sei ser só meia-eu.

Este é o meu último texto. Obrigada aos que me ensinaram a ser em contramão.

17 Set 2017

Arnaldo Ho, candidato às eleições: “Políticas de jogo e habitação não se devem misturar”

Filho de Stanley Ho e Angela Leong, Arnaldo Ho participa pela primeira vez nas eleições de Macau. Ligado ao projecto do Lisboa Palace e à gestão do Grand Lisboa, o candidato conta que começou por aprender a ser croupier para perceber as bases do negócio. Estudou em Londres e passou férias no empreendimento Vale de Lobo, no Algarve, mas é aqui que diz querer servir a comunidade. Arnaldo Ho garante que todos os eleitores são importantes, incluindo os portugueses, e defende que a habitação é o problema mais grave que o Governo tem de resolver

 

Que balanço faz dos últimos dias de campanha? Acredita que podem eleger dois candidatos?

Tenho de acreditar que existe essa possibilidade. Todos os nossos candidatos têm trabalhado arduamente nas últimas semanas. Precisamos de pessoas que acreditem e votem em nós.

Quais têm sido as maiores preocupações das pessoas, com base no contacto que tem tido com a população?

Uma das questões que mais tem preocupado as pessoas nos últimos dias tem que ver com a capacidade do território em termos de infra-estruturas e desenvolvimento urbano, depois da passagem do tufão Hato.

Num dos últimos debates promovidos pela TDM, a candidata Wong Kit Cheng [líder da Aliança do Bom Lar] acusou-o de não conhecer bem Macau. O que tem a dizer sobre isso?

Ela não me conhece bem. Eu também nunca me cruzei com ela na vida. Relativamente a Macau, estudei no estrangeiro [viveu oito anos em Londres, onde estudou Gestão de Empresas no King’s College], mas sempre viajei muitas vezes entre Hong Kong e Macau. Macau sempre foi a minha casa e aqui sempre fiz trabalhos de Verão. Alguns familiares meus vivem em Macau e vinha para cá todas as férias ou fins-de-semana desde criança. Sempre tive interesse pelos negócios da família e, na verdade, sempre estudei e analisei a sociedade de Macau. Quando entrei na Sociedade de Jogos de Macau (SJM) comecei por ocupar os cargos base da empresa. Todos os dias, quando terminava o meu trabalho, ia para as salas de formação para aprender a ser croupier.

Achava importante começar do início.

Queria aprender a ser croupier, esse era o meu interesse, para poder compreender todo o negócio. Temos de compreender o que os empregados fazem; se não, como podemos gerir um negócio como este? Nos últimos tempos tenho estado muito envolvido no projecto do Lisboa Palace e nas operações do Grand Lisboa. Talvez seja por isso que a candidata Wong Kit Cheng não saiba muito bem o que ando a fazer. O empreendimento Lisboa Palace deve abrir no próximo ano e tenho estado envolvido nos preparativos, na parte da construção, e gasto muito do meu tempo a gerir a pré-abertura. Estimamos que vamos necessitar de recrutar cerca de oito mil pessoas e isso constitui uma grande oportunidade para Macau, sobretudo para as gerações mais novas. Estou exactamente a fazer aquilo de que Wong Kit Cheng me acusou de não fazer, que é providenciar empregos e oportunidades aos mais jovens. E não são apenas empregos na área do jogo, mas em várias áreas, por se tratar de um grande resort. Queremos trazer um conceito novo. 

Em que sentido?

Queria ainda falar mais sobre a ideia de comunidade e serviço social. Ser um candidato e fazer parte desta lista mostra que sempre quis fazer este projecto, servir a comunidade que me deu oportunidades e experiências. Uma coisa vinda dos meus pais [Angela Leong e Stanley Ho] que sempre me inspirou foi o facto de não ter sido criado apenas com a ideia de ganhar dinheiro e operar um negócio. Sempre me transmitiram a ideia de como poderia servir a comunidade, os meus pais sempre acreditaram nisto. Ser candidato permite-me ter esta voz e atingir este objectivo. O meu pai sempre me transmitiu a ideia de servir a sociedade e nunca me esqueci das minhas raízes em Macau. É preciso olhar para as necessidades dos grupos mais vulneráveis e temos de nos focar na diversificação da economia e na implementação das políticas do Governo, caso sejamos eleitos. 

Há 24 listas a participar nestas eleições. Quais as grandes diferenças entre a Nova União para o Desenvolvimento de Macau e os restantes candidatos?

Temos 12 membros na nossa lista que vêm de várias áreas, não apenas do sector do jogo, mas também do imobiliário, desporto, educação e serviço social. Representam desde grupos vulneráveis a empresários, passando por trabalhadores da área social. A nossa lista abrange, portanto, um grande número de grupos sociais. A grande diferença é que, como equipa, entendemos as pessoas de diferentes estratos sociais, as suas necessidades e problemas. A nossa proposta para o futuro de Macau foca-se na resolução de problemas de uma forma prática.

Pode vir a substituir a sua mãe, Angela Leong, como número um nas próximas eleições legislativas?

Tenho aprendido muito com ela. Não gostaria ou deveria substitui-la nesse papel. Ela é o meu modelo e tenho vindo a compreender muitas coisas nesta campanha. De facto, esta é uma grande oportunidade para aprender. 

Vem de uma família muito importante do sector do jogo. Que ideias tem para os jovens da sua idade que enfrentam dificuldades diárias para a compra de casa ou pagamento de uma renda?

Compreendo que o mais difícil para os jovens de Macau neste momento é a compra de uma habitação no sector privado. Um empréstimo leva anos a ser pago e os casais com rendas elevadas sentem, claro, uma frustração ainda maior. Outro aspecto que também é importante é o facto de os jovens de Macau necessitarem de se focar nas suas carreiras, pois acredito que a sociedade precisa de inovação e diversificação. Mas ainda na área da habitação, a nossa lista defende a criação de alojamentos para jovens. Com este sistema os jovens poderiam ter acesso a uma casa por um período de três a cinco anos, a preços mais baixos. Nesse período poderiam focar-se na sua carreira ou na criação de um negócio, e não teriam de se preocupar com a questão da habitação.

No que toca aos principais problemas de Macau, quais são aqueles que ainda não têm uma solução apresentada pelo Governo?

A habitação é talvez o maior problema. Não há terrenos suficientes para a construção de habitação pública e os preços das casas privadas não são suportáveis. Esse é um problema que o Governo tem de resolver. Além da implementação dos alojamentos para jovens, o Governo deveria adoptar políticas diferentes. Em Hong Kong aponta-se para a adopção de medidas que apoiem os compradores da primeira habitação. Ainda não foram criadas, mas Macau poderia olhar para elas. Os mercados são diferentes, mas o Executivo precisa mesmo de adoptar outras políticas.

O Governo não garantiu, nos últimos anos, um equilíbrio entre o fornecimento de terrenos para o jogo e habitação?

As políticas do jogo e de habitação não se devem misturar. Os resorts construídos no Cotai foram um plano adoptado para o território há muitos anos e foi bom para a economia. O jogo tornou-se a indústria mais importante e todos os países do mundo têm uma indústria mais forte na sua economia, não podemos desistir disso. Agora que a maior parte dos empreendimentos está construída, precisamos de diversificar com mais elementos não relacionados com o jogo. A habitação é outra questão. Nos novos aterros o Governo tem de garantir um crescimento na vertical, como vemos em Hong Kong. Há que apostar também na renovação dos bairros antigos.

Sente-se ligado à comunidade portuguesa? Considera que é uma comunidade importante para as eleições, apesar de representar um pequeno número de eleitores?

É uma comunidade importante para o desenvolvimento social e económico. A estratégia nacional de “Uma Faixa, Uma Rota” e o projecto da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau são muito importantes para o futuro de Macau e aqui a comunidade portuguesa pode tornar-se mais importante na contribuição das relações comerciais com os países de língua portuguesa. Quanto às eleições, todos os cidadãos de Macau e todos os eleitores são importantes, porque têm o direito de votar. Cada comunidade tem o seu pensamento e os seus objectivos. É preciso comunicarmos mais entre nós, caso contrário nunca saberemos o que cada comunidade deseja.

14 Set 2017