Euforismos

Ter nascido não é um erro, mas uma equação irresolúvel.

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Errar não é humano, é cósmico. Tudo isto se assemelha a um erro gigantesco.

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Viemos das estrelas, mas a elas não voltaremos. A queda é irreversível.

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Fomos abandonados por um Deus que nunca foi.

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É patético o esforço de alguns filósofos quando pretendem convencer-nos do “prazer de viver”.

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Espaço e tempo: os dois se conjugaram para me tramar.

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O corpo é o embrulho de um presente envenenado.

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O melhor do ser humano é a capacidade de se saber desprezível.

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Quem que se crê livre é prisioneiro da sua própria arrogância.

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Viver com intensidade é o mesmo que um incêndio em terra queimada.

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O pior que pode acontecer é ter algum sucesso. Verás ser uma porta que te leva
à vacuidade de tudo. Onde, afinal, já abundantemente te banhavas.

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Omnia sunt sine ratione. Pensar é um exercício fútil quando em causa
não está a sobrevivência ou o prazer.

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A realidade é, em si mesma, infinita. Pretender dominá-la, compreendê-la em toda a sua extensão, é um sintoma de loucura.

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Teremos o dever de relatar o universo, mas a esse relato juntemos sempre
uma imprescindível nota de humildade.

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Por mais que me iluda, a razão regressa para me humilhar. Tenho então de a ouvir, eventualmente entender, mas nunca crer totalmente nos mundos que ela habilmente arquitecta.

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A constante dúvida pinta-nos um mundo difícil, talvez horrível.
Mas é com esse mundo que temos de saber viver.

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Acreditar numa verdade, é acreditar na exclusão, numa pobreza formatada da realidade.

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O século XIX acreditou na existência de génios.
Depois um vento frio desembaciou o espelho.

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O amor pelo outro é o reconhecimento da nossa profunda incompletude.
Isso, por outro lado, dota-o de uma arrepiante e ficcionada beleza.

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Digo-me: deve haver coisas que eu amo.
E rio-me deste esforço tonto para não levar a arma à boca.

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O desespero não é um sentimento. É uma condição.
Advém da constatação do nada, ou seja, de um mero olhar à volta.

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Ser poeira não é pessimismo, mas uma aspiração.

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O espectáculo da natureza: quanto mais belo, mais deprimente; porque plasma ali mesmo à minha frente, sem qualquer piedade, a dimensão da minha insignificância.

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O sublime é ofensivo.

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O fedor a podre é a verdadeira metáfora do tempo.

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Criar, criação, criadores, criativos! O melhor mesmo é criarem galinhas.

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Quando a ideia de ouvir música te exaspera e o silêncio te deprime, o que hás-de então fazer?

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O silêncio aporta um horror apocalíptico. Ninguém se quer ouvir demais.

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Só o que é doloroso nos faz sentir realmente vivos. Resta saber se vale a pena.

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Chego da rua, quero regressar a mim e não consigo.
Constato então que, provavelmente, não existo.

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Pensar é a doença da mente que nos faz perder a noção do ridículo.

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São o desespero e a raiva que ainda me obrigam a andar. A ver se depois fico liso e triste,
até a tristeza se tornar insuportável de tão inútil, tão parada, tão bovinamente melancólica.

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A existência seria absurda se não fosse meramente cruel.

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O pensamento é o ópio de uma aristocracia inexistente.

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Numa sociedade perfeita cairia a máscara da nossa utilidade.

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A utopia conduz-nos ao silêncio dos mortos a haver.

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D’après Shitao:
Vemos o mundo pelos olhos dos mortos,
embora não seja a barba deles o que nos cresce na face.

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O êxtase que uma pintura me provoca é um processo lento.
O tempo necessário para criar uma fantasia e nela me banhar para sempre.

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No século XX, a arte fez uma estrondosa colecção de becos sem saída.

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O minimal repetitivo exprime a sinceridade de quem compreende nada mais ter para dizer.

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A imaginação foi sobrevalorizada enquanto se acreditava no indivíduo.

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O individualismo é uma ambição ignorante. Talvez por disso ter consciência inicial,
procurei melancolicamente ir colmatando essa falta.

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O nojo de me saber gregário.

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Uma página em branco é o meu verdadeiro espelho.

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Um raio de luz entra pela minha janela e volutas de fumo percorrem-no em silêncio.
Para quê ir ao museu, se a arte não passa de uma contemplação do efémero?

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Tudo o que nos dizem ser infinito, não o é porque nos dizem. Se fosse, ninguém teria a capacidade de dizê-lo. Pergunto-me então o que existirá realmente infinito por descobrir ou para além de qualquer possível descoberta. Indizível. Indefinível. Infinito.

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Por vezes, obrigo-me a andar, a visitar as cidades. Só para mitigar o facto de saber
que não deixo nunca de estar parado e a isso dar alguma justificação.

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De nada adianta percorrer o planeta, porque ele hoje não passa de uma enorme favela.

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Algumas tribos praticavam um canibalismo ritual.
A civilização não se dá ao incómodo da cerimónia.

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Felizmente que quando comeram o Capitão Cook tiveram o bom gosto de não o cozinhar.

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Existimos num único plano, num desenho em espiral que não chegamos a completar.

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O narcisista não se olha ao espelho porque se crê belo. Quem regressa obsessivamente
à sua imagem é porque tem medo, a cada momento, de ter deixado de existir.

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Folheio mentalmente um cardápio de nuvens. Organizo por géneros, formas, comportamentos. Farto de me ver, invoco o vento, esqueço tudo, tudo se esvai.

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Passeio atormentado pela consciência do erro, da sua inevitabilidade. Subo jardins, desço vales, desemboco em ruas largas, avenidas imperiais. Aí percebo que me enganei no caminho.

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Saturei o silêncio de ideias para depois reparar que elas não estavam sozinhas.
Um gotejar martelante, um motor distante, um amor por saber, uma raiva por nascer,
outra conhecida, uma necessidade imperativa e mais…
As ideias sentaram-se no canto de uma sala que acreditara vazia.
Não estava. Há demasiadas coisas à nossa volta.

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Por baixo de qualquer pensamento, por baixo de qualquer acção, resfolgam os monstros.

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Estar sozinho não passa de uma reconfortante ilusão.

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Nasci, cresci, envelheci. Nada disto faz sentido.

27 Jul 2023

O último sortilégio

Problemas de género à parte, indagações sobre sexualidade, e será bom reflectir acerca da complexa natureza de alguns, agora que se escrevem tratados sobre a hipotética homossexualidade ou não de Pessoa, à margem, creio, de tudo aquilo que deve ser preservado quando estamos diante de personalidades assim. Mais para trás, vamos encontrar os mesmos desvarios face à natureza celibatária do mesmo, das suas cartas de amor, seu idílio platónico, tentando explicar o que não é passível de explanação sem um grande estremecimento de ridículo, vacuidade e, por que não?, uma derrapante ingenuidade. Se fôssemos todos tão previsíveis enquanto títeres de uma espécie, seríamos ainda bem mais entediantes. Não se pede que se compreenda, mas deseja-se que se respeite com sujeitado encantamento estas naturezas tão diferentes de cada um de nós, nos cálculos, análises, formas de viver, pois que acrescentam dimensões novas ao estreito circuito das motivações alheias. Isto, um breve intróito ao que aqui nos traz.

Nenhuma mulher por aí conseguiria hoje na vertente “literatura feminina” acoplada a discursos de correntes várias, escrever este muito fêmeo poema feito por um homem. Ou se esqueceram, ou já são outra coisa, o que faz que tudo o mais seja revisto, dado que a natureza de uma tal realidade parece ter-se apagado, e quando não houver mais explicação para nada, vamos todos ler os poetas, em vez de andar a fazer e ler tratados de vacuidade frouxa, ou a deslizar para correntes de escritas derrapantes.

«[…] Mando-lhe uma composição minha.

Chamo a atenção… verificar como essa pessoa é mulher (e, digamos, bruxa) que os adjectivos não saiam no masculino onde a pessoa falante se refere a si mesma.

Estamos diante do seu Sortilégio!

Digamos que nem por um instante nos ocorre que este mesmo homem no início de um recuado século vinte, ousasse mesmo em seus sonhos mais improváveis mudar de sexo; afinal, não é preciso. Tinha os dois de tal maneira bem interligados que até lhe interessou o aspecto dramático da feiticeira. Confesso que jamais vi tensão maior na compreensão do feminino. Talvez até nem seja por acaso que recorra ao mais audaz da mulher, o encantamento, e que diga em forma de advertência: «este poema é uma interpretação dramática da magia da transgressão». O mais interessante é que não se prende aos aspectos juvenis da feminilidade (facilitismo martirizante dos homens) e recorra a uma maturidade que põe fim aos dons, no começo de uma ininteligível outra marcha. Memorável! A partir disto, e como foi referido acima, pouco ou nada interessa o folhetim de suas sexualidades, que deve ser visto como arrivismo áspero e grosseiro, aquém desta compreensão.

Vidas há, que são também um grande exercício de elegância “lançadas à sorte” e onde tudo se corrompe, entristece e se confunde, deveríamos para o bem da saúde mental deixá-las intactas. Nem todos sabemos afinal o poder de um sortilégio, que outros, parecendo maiores, não entram no futuro que nos bate à porta. Mas este tipo de seres estarão lá à nossa espera.

«Outrora meu condão fadava as sarças…………..

Converta-me a minha última magia

Numa estátua de mim em corpo vivo!

Morra quem sou, mas quem me fiz e havia,

Anónima presença que se beija,

Carne de meu abstracto amor cativo,

Seja a morte de mim em que me revivo;

E tal qual fui, não sendo nada, eu seja!»

Se perscrutarmos as coisas vamos até aos altares de um país que duvidando de um certo “sortilegium” perdeu a capacidade de vasto entendimento. Não soube… não quis… não pôde… Não é subliminar, e muito menos sublime, e de seus ilustres acabou por fazer esteiras de conveniências. Reverberações que vêm de «Abdicação» para nos transformar na grande unidade, que é ser total no corpo e consciência repartidas.

25 Jul 2023

Family office

No passado dia 23, Li Jiachao, Chefe do Executivo de Hong Kong, visitou Singapura, a Indonésia e a Malásia em busca de oportunidades de negócio. Li Jiachao declarou que espera atrair mais family offices para Hong Kong. Na apresentação das Linhas de Acção Governativa para 2023, Li Jiachao mencionou que o objectivo é vir a ter 200 family offices em Hong Kong em 2025.

Family office é uma empresa privada de consultoria e gestão das fortunas de famílias muito ricas, com activos superiores a 100 milhões de dólares. Quantos mais family offices se estabelecerem em Hong Kong, mais famílias bilionárias farão negócios e investimentos em Hong Kong, promovendo a continuação do desenvolvimento económico da cidade. Além disso, as actividades económicas das famílias super-ricas não se limitam, obviamente, aos negócios e ao investimento. Dedicam-se frequentemente a leilões e a acções de caridade. Estas actividades também se desenvolvem com a presença de family offices, pelo que a sociedade de Hong Kong pode beneficiar de várias maneiras.

Family offices são criados por indivíduos e famílias, ou por instituições profissionais. O seu âmbito de serviços não envolve apenas investimentos e negócios, mas também inclui planeamento patrimonial, gestão pessoal, gestão patrimonial, educação dos membros da família, etc. Do ponto de vista dos investimentos, estas empresas formulam planos de gestão financeira para as famílias de acordo com as suas necessidades, de forma a aumentar os seus patrimónios. Do ponto de vista pessoal, gerem a logística relacionada com heranças, educação dos jovens, ajudando o crescimento e o desenvolvimento da próxima geração.

Como o âmbito dos serviços dos family office envolvem todos os aspectos da vida familiar e não se limitam à gestão das fortunas e dos investimentos, à semelhança do que é feito pelos tradicionais Bancos comerciais, os family offices surgem no mercado à medida que as necessidades assim o exigem. Os family offices são muitas vezes constituídos como «corporações colectivas» independentes e são totalmente detidos por administradores fiduciários ou empresas que detêm o património familiar. Por outras palavras, uma «corporação colectiva» independente é uma sociedade anónima. Um family office é propriedade de uma família, administrado por familiares ou por gestores externos, que promove os investimentos e gere os assuntos da vida familiar.

A legislação dos vários países e regiões têm regulamentações diferentes no que respeita aos family offices e diferentes incentivos fiscais. Os family offices têm geralmente de obedecer a três normas: sobre a forma como se estabelecem, a forma como operam, e os impostos que pagam sobre o património familiar. No passado dia 10 de Maio, o Conselho Legislativo de Hong Kong aprovou a ‘Inland Revenue (Alteração) da Lei de 2022 (Desagravamento fiscal para os instrumentos de controlo do investimento familiar’), que contém regulamentos claros sobre o estabelecimento e o funcionamento dos family offices. Em resumo, O capital mínimo de um family office é de 240 milhões de dólares americanos. Pode ou não ser estabelecido em Hong Kong, mas muitas das operações comerciais só podem ser feitas a partir desta região. Desde que os regulamentos sejam respeitados, os lucros do family office podem ficar isentos de 5 por cento dos impostos.

Para além de oferecer bonificação das taxas sobre a actividade comercial, Hong Kong também tem vantagens sobre o imposto sucessório. Desde 11 de Fevereiro de 2006, o imposto sucessório foi abolido na região, pelo que os herdeiros deixaram de pagar este imposto ao Governo. Estas medidas ajudam o estabelecimento dos family offices em Hong Kong.

Hong Kong é um centro financeiro internacional, e a livre circulação de fundos é garantida pela Lei Básica. Actualmente, existem cerca de 80 bancos e 70 sociedades de gestão de activos a operar em Hong Kong. No final de 2021, os family offices estabelecidos em Hong Kong administravam activos no valor de 4,6 biliões. Hong Kong é apoiado pela China Continental, tem um sistema de impostos simples, um sistema jurídico bem estabelecido e um sólido sistema financeiro, tudo excelentes condições que fomentaram o desenvolvimento financeiro da cidade. Por conseguinte, o meu país apoia Hong Kong no reforço do seu estatuto de centro internacional de gestão de activos no “Esboço do 14º Plano Quinquenal”.

Hong Kong está empenhado em ter pelo menos 200 family offices até 2025, o que significa que mais família super-ricas vão passar a operar e a investir na região. A isenção de 5 por cento dos impostos é apenas uma das condições favoráveis que aqui vão encontrar. Se se esperar a vinda de mais family offices para a cidade, o Governo de Hong Kong deve investir mais no desenvolvimento e na divulgação da Área da Grande Baía, salientando as oportunidades de negócio que esta pode trazer para o futuro desenvolvimento de Hong Kong. O facto de Hong Kong ser apoiado pela mãe pátria não está ao alcance de outros países ou regiões, e é insubstituível. Este factor insubstituível é o incentivo mais importante para atrair family offices para Hong Kong.

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Escola de Ciências de Gestão do Instituto Politécnico de Macau
Blog: http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog
Email: legalpublicationsreaders@yahoo.com.hk

25 Jul 2023

A seita espiritual e a morte de um bebé de catorze meses

Ao que isto chegou em Portugal. Uma seita dita espiritual, denominada Reino do Pineal, instalada na aldeia de Seixo da Beira, em Oliveira do Hospital, no ano de 2020, comprou uma herdade de cinco hectares completamente fechada. O seu líder não acredita que a terra seja redonda ou que o homem tenha ido à Lua. Os membros são brancos e pretos e passam a maioria do tempo em danças e abraços. A seita assistiu à morte de um bebé de pouco mais de um ano, e resolveu cremá-lo e atirar as cinzas para o rio Mondego, em Abril do ano passado. Um crime hediondo, com a agravante de existirem na herdade mais crianças que estão a preocupar as suas famílias e as autoridades.

O Ministério Público já começou a investigar a morte do bebé e a avó de um outro bebé de sete meses alertou as autoridades para forçarem a entrada na herdade e recuperarem todas as crianças que lá vivem. A bebé que a avó reclama nunca foi registada, não foi vacinada e nem teve qualquer assistência médica. A preocupação dos familiares das crianças deve-se fundamentalmente ao facto devido às crenças da seita ali praticadas estarem relacionadas em não ter acesso a cuidados de saúde, educação e cidadania. A Câmara Municipal de Oliveira do Hospital já participou várias denúncias sobre a comunidade em causa à Comissão de Protecção de Crianças e Jovens, ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e consequentemente ao Ministério Público.

Os membros da seita caracterizam-se como “nómadas viajantes com uma vocação espiritual” que escolheram “restaurar, proteger e preservar os modos de vida orgânicos, naturais, espirituais, culturais e indígenas”. Um chorrilho de mentiras chocantes que levam a uma prática incivilizada sem lei e sem moral.

O líder da seita, Água Aknal Pinheiro, teve o desplante de afirmar que “estamos aqui a viver em paz, cuidando respeitosamente da terra que actualmente habitamos até ao momento em que encontrarmos e estabelecermos uma casa permanente, talvez uma ilha…”.

Inclusivamente, a Câmara Municipal de Coimbra já tinha feito denúncias sobre esta comunidade às várias instâncias oficiais, salientando a presença na herdade de mais crianças e com a edilidade coimbrã preocupada com a segurança dos menores e por suspeitar que os mesmos não tinham acesso a cuidados de saúde, cidadania e educação, quando a lei diz que o ensino é obrigatório até aos 12 anos de idade.

A avó de uma bebé de sete meses luta na justiça pela guarda da neta – que está na seita do Reino do Pineal. A criança nascida no seio da seita está a deixar os seus familiares desesperados, sobretudo depois de terem conhecimento da morte de um bebé no ano passado. A avó da criança não consegue falar com a filha e quer urgentemente a guarda da neta.

A Polícia Judiciária já está a investigar as circunstâncias da morte do bebé, mas até agora as outras crianças da comunidade seitosa continuam na quinta à guarda do chefe da seita. Toda esta prática inacreditável nos dias de hoje, poderá ser alvo de processos judiciais, especialmente devido à exposição ao abandono, maus-tratos e profanação de cadáver, crimes pelos quais a seita do Reino do Pineal pode responder judicialmente após a morte e cremação de uma criança.

Vários canais de televisão, jornais e revistas têm dedicado o maior espaço à actuação desta seita em causa, salientando-se que vivem na marginalidade, que a morte da criança e a cremação decorreu completamente na ilegalidade e à margem da lei, que uma comunidade de 40 a 100 pessoas que se instalou em território português e que decretou a autodeterminação, que ao acreditarem que a terra é plana é inserir-se numa teoria de conspiração que leva a todo o tipo de pensamento depravado, que a maioria das pessoas que vivem na herdade não é portuguesa tratando-se de estrangeiros que se conheceram na internet e que ninguém sabe se estão em Portugal dentro da legalidade, que a soberania que apregoam relativamente ao Estado português é por si só uma afronta ilegal ao Direito Constitucional português, que naquele espaço se gera uma grande vulnerabilidade dos direitos fundamentais particularmente dos menores, que se trata de um abuso sobre humano possuir uma criança que morre sem registo e cremada sem certidão de óbito. Enfim, estamos perante algo idêntico ao que tem acontecido por esse mundo fora na área das teorias de conspiração e que em certos casos tem levado ao suicídio dos membros pertencentes a este tipo de seitas.

O que não é aceitável é que perante tanta gravidade, as autoridades judiciais ainda não tenham tomado uma posição severa, chamado à colação os membros da seita e terminar em absoluto com este denominado Reino do Pineal.

24 Jul 2023

Lembrando o Doutor Li Wenliang

Na obra, “Homo Deus: Uma Breve História do Amanhã”, da autoria do académico israelita Yuval Noah Harari, é mencionado que, ao longo da História, o desenvolvimento da Humanidade foi por vezes interrompido pela fome, pelas pragas e pela guerra. Recentemente, o mundo inteiro, e Macau em particular, viveu durante quase três anos a ameaça de uma praga: a COVID-19, que se começou a manifestar globalmente em 2020.

No início de 2023, o Governo de Macau implementou a política nacional relativa à infecção pelo novo tipo de coronavírus, “doenças de categoria B e gestão de nível B”, e a Organização Mundial de Saúde anunciou, pouco depois, que a COVID-19 deixara de ser uma “emergência de saúde a nível global”. A ameaça da pandemia parece estar cada vez mais longe de nós. Com o gradual regresso da circulação entre Macau e o resto do mundo à normalidade, tudo o resto também deveria estar a regressar à normalidade. No entanto, ainda existem muitos problemas.

Recentemente, visitei um amigo em Hong Kong e marcámos um encontro no distrito de Mongkok. Antes de me encontrar com ele, fui beber um café. Passaram poucos anos sobre o período conturbado que Hong Kong atravessou e a sociedade voltou aparentemente à normalidade, mas, só quem experienciou as reviravoltas ocorridas, pode falar do que aconteceu verdadeiramente a Hong Kong.

Em primeiro lugar, muitos dos restaurantes onde costumava ir têm agora novos proprietários e os preços da comida aumentaram, enquanto outros encerraram depois da pandemia. Estes negócios fecharam devido ao aumento das rendas e ao abrandamento da economia. De tudo isto, o que mais me perturbou foi o seguinte: pouco depois de ter tomado café, cerca das 17.00 horas, na Shanghai Street, em Mongkok, vi muitas mulheres vestidas de forma provocante, já não muito novas e com um aspecto vulgar, calcorreando as ruas. São certamente muitas as razões que contribuem para este fenómeno, mas isto não deveria acontecer quando o Governo de Hong Kong se empenha em contar ao mundo belas histórias sobre a cidade e acolhe a “Sinfonia das Luzes”, um espectáculo diário de luz e som realizado ao longo do Victoria Harbour. Este cenário urbano fez-me sentir desconfortável e pouco à vontade.

A luta contra a pandemia deve focar-se na prevenção e não só no tratamento. Em Dezembro de 2019, Li Wenliang, um oftalmologista da cidade de Wuhan, enviou uma mensagem sobre o coronavírus no grupo de chat dos seus colegas, recordando-os que deveriam ter cuidados para se protegerem. Daqui resultou que Li Wenliang, o homem que deu o alerta, passou a ser o“espalha boatos”. Embora, no final, se tenha feito justiça a Li, foi uma pena que o jovem e promissor oftalmologista tenha morrido. O que ficou para a História foi uma frase que Li proferiu durante uma entrevista à Caixin Media: “Penso que se deve falar a mais do que uma voz numa sociedade saudável”.

O período da consulta pública sobre a revisão da Lei Eleitoral para o Chefe do Executivo e da Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa termina a 29 de Julho. Se prestarmos atenção ao que se passou durante todo o processo de consulta, nomeadamente aos conteúdos, às discussões e à publicidade nos jornais, os resultados desta consulta podem ser inferidos de uma forma geral. Algumas pessoas podem dizer que em Macau o povo goza de liberdade de expressão. Se tivermos uma opinião sobre a revisão da Lei Eleitoral para o Chefe do Executivo e da Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa, podemos ligar para um programa da Rádio TDM para a expressar, ou comparecer nas sessões de consulta abertas ao público. Ainda se deve lembrar que em 2012, quando Governo de Macau realizou a Consulta sobre Desenvolvimento do Sistema Político, os membros da sociedade debateram os temas entusiasticamente.

Quando uma pessoa adoece tem de ir ao médico. Mas o que devemos fazer quando uma sociedade fica doente?

21 Jul 2023

Tagore

Contemplamos-lhe o perfil e vemos de imediato que se trata de um aristocrata, de frente parece de uma imponência serena tal que não somos capazes de nos desviar daqueles olhos fundos, lindíssimos, impressionantes. Contemplamo-lo. E este brâmane ensina-nos que a beleza é uma conquista da alma, o seu melhor requisito, e que nestas castas ela se aperfeiçoo. Um poeta deve ter esta qualidade, ou então, o que o instrui pode correr muito mal. Não só pode, como geralmente assim acontece, e concluímos que muitos vingam soberbas ofensas através de uma lei que não lhes pertence, e assim na vingança absurda, atiram-se à corrente da escrita como camundongos. Rabindranath, “Rabi” nascido em Calcutá, o último de treze filhos (uma mesa de irmãos para nós de triste lembrança) e uma mãe que dava pelo nome de Sarada Devi, e de patriarcas fundadores da fé Adi Darma. Para além de ter sido o décimo terceiro filho, ganhará em mil novecentos e treze o Prémio Nobel de Literatura sendo o primeiro escritor asiático a ser agraciado.

Tagore não se extingue em um qualquer percurso lacrimoso a um tempo, e de herança tamanha, todos os caminhos da justiça social, da igualdade, de temas, de obras, de poderes, ele se fez presente. Foi ao que chamamos agora um homem do mundo, mas sobretudo, um homem para o mundo. E escreveu. Oh, se escreveu! Em primeiro lugar ele era o poeta, e por isso, o que se lhe seguia enquanto autoridade natural pronta a servir a sua própria humanidade, foi ouvida, valorizada. Mas não nos esqueçamos do prolífico compositor, sendo mesmo conhecidas como rabindrasangit ( Canção de Tagore) muitas das suas composições musicais, e o mais espantoso é que ainda hoje o Hino Nacional do Sri Lanka é daqui que sai, e também os Hinos Nacionais da Índia e Bangladesh estão consagrados pela escrita dos seus poemas, e se tudo isto não bastasse, aos sessenta anos, ei-lo pintor! Ele pintou a escrita, escreveu a música, mas a sua superioridade pareceu falhar no trabalho da imagem. Só os bárbaros gostam de imagens, efetivamente, para nós, basta não ser cego e poder olhá-lo: não necessitamos que se transforme em pintor. Aos sessenta anos todos achamos que pintamos. Mantas ( mas seria melhor, mantras) mas ele, estilisticamente mais talhado, vai trabalhar algumas noções visuais para embelezar os seus próprios manuscritos. Uma espécie de poesia visual a algumas décadas de distância

Percorreu o mundo, conheceu os do seu tempo, e estancou perante um beduíno do deserto do Iraque, para designá-lo a voz da humanidade essencial. Interessado pela ortodoxia – todas as ortodoxias – os movimentos nacionalistas indianos onde irá em 1920 liderar o de libertação: a guerra contra o imperialismo inglês tinha dentes fortes, mas não se crê que a sua relação com Gandhi tivesse sido muito compatível. Parece que Tagore era uma personalidade sistémica, com enorme capacidade associativa, de princípios e ideias, e pouco dado a interpretações através de castigos abstratos. Os homens cruzam-se, e nem sempre a cruz de cada um é perceptível para ambas as partes. Uma muito bela aparição foi sem dúvida « A Asa e a Luz» um livro que compreende duas obras, Pássaros Perdidos e Pirilampos, e cujo título é feito dos elementos que mais se destacam nos dois ( pássaros e pirilampos) pela primeira vez editadas entre nós. Este livro é todo a Oriente, a sua viagem à China e ao Japão.

Dizia: « Na China e no Japão pediam-me muitas vezes para, sobre leques e panos de seda, escrever pensamentos: assim nasceram pirilampos.».

Acrescentando então que o rigor e a escassez de palavra o norteiam, coberto por um guarda sol muito haiku.

Os nossos aforismos são mais ásperos… mas se quisermos, poderemos equipará-los.

Que esta Asa nos transporte e esta Luz nos ilumine.

19 Jul 2023

Viagra: a erecção milagrosa?

O viagra está agora em todo o lado. Com o fim da patente pela Pfizer em 2019, alternativas genéricas ao fármaco multiplicaram-se. Muitos jovens com pénis e com alguma forma de disfunção eréctil têm recorrido a esta forma fácil de resolução do problema.

A experiência de não conseguir manter uma erecção pode ser vivida como profundamente problemática, já que vai contra a perspectiva da virilidade da juventude. A primeira preocupação é a de resolver o mecanismo, e não procurar perceber porque é que não está a funcionar. A medicação é essencialmente utilizada para evitar o desconforto social e relacional que um pénis não-erecto provoca no sexo performativo – que se julga penetrativo. A ausência de erecção também pode ser entendida como desinteresse pelo/a outro/a, que aumenta ainda mais a pressão da performance.

A medicação, nestes casos, ajuda a perpetuar uma narrativa que há muito se tenta desmantelar: que o envolvimento no sexo é de responsabilidade individual, exigindo-se uma espécie de configuração sexual perfeita. O aumento da (hétero- e auto-) prescrição deste tipo de medicamentos revela que há um constante evitamento em abordar outros factores que influenciam a disfunção eréctil e esta construção do “sexo perfeito”. São estes factores relacionais, psicológicos e sociais.

Ainda assim, a forma como os jovens entendem a sua (auto-)prescrição de viagra trouxe-me laivos de esperança. O mais interessante dos testemunhos de um estudo realizado, foi a descrição do dilema que enfrentam. O viagra traz o empoderamento milagroso, mas também traz a frustração da sua dependência. Como pequenos espaços de consciência, estes jovens compreendem a complexidade dos outros factores na disfunção eréctil. Sabem que talvez se o sexo fosse mais comunicativo, em vez de performativo, não sentissem tanta pressão para resolver o problema desta forma. A expressão de vulnerabilidade, no sexo, paradoxalmente, pode ser mal acolhida e compreendida.

Não tem de ser sempre assim. Na forma como os corpos se envolvem, abrem-se espaços mais ou menos susceptíveis à partilha. A responsabilidade estende-se para outros espaços e configurações. A forma como as sociedades e os sistemas de saúde funcionam também têm responsabilidade em normalizar e ajudar a resolver a insegurança e o desconforto da disfunção eréctil. Isso implicaria a existência de serviços cada vez mais integrativos, onde se cuida da sexualidade e das preocupações que se tem sobre ela. Com dados promissores sobre o efeito da psicoterapia nestes casos, e com a evidência da influência da ansiedade ou depressão na libido e a sexualidade, faz sentido que se priorize a saúde mental e o bem-estar em todas as áreas da vida.

É importante reconhecer a capacidade do viagra de salvar, de forma momentânea, tantas situações de desconforto. Mas é preciso mais ambição. Querer transformar representações de uma masculinidade rígida que inundam tantas instituições formais e informais da sociedade, bloqueando espaços discursivos e físicos para a vulnerabilidade, é o desafio de agora. O verdadeiro milagre seria uma mudança na forma de pensar e agir em relação à disfunção eréctil, e, para isso, não há nenhum comprimido capaz de o concretizar.

18 Jul 2023

Sistema de protecção dos depósitos

No passado dia 13, o Hong Kong Deposit Protection Board (Comissão de Protecção de Depósitos de Hong Kong) lançou uma consulta pública a três meses, convidando as pessoas a manifestar as suas opiniões sobre a optimização do sistema de protecção dos depósitos.

O Hong Kong Deposit Protection Board propõe aumentar o montante dos depósitos protegidos dos actuais 500.000 dólares de Hong Kong (HKD) para 800.000. O motivo apresentado para este aumento é a inflação. Se esta proposta for implementada, a percentagem dos depósitos protegidos aumentará de 89 por cento para 92 por cento e os custos decorrentes desta operação serão suportados pelos bancos.

Quando os depósitos estão protegidos os bancos pagam taxas ao Governo para a criação de um Fundo. Se o banco suspender a sua actividade, o Governo pode usar este Fundo para indemnizar os depositantes de acordo com a lei; protege também os direitos dos depositantes e estabiliza o sistema financeiro.

A criação do Hong Kong Bank Deposit Protection Scheme ocorreu depois do incidente do International Commercial Credit Bank (ICCB) em 1991. A 6 de Julho de 1991, o Hong Kong Banking Regulatory Office (o predecessor da Autoridade Monetária de Hong Kong) descobriu que o ICCB tinha concedido empréstimos problemáticos entre 1988 e 1990 e o Governo de Abu Dhabi, o maior accionista do ICCB, recusou-se a injectar capital no banco. No dia 7 de Julho, à tarde, o Hong Kong Banking Regulatory Office ordenou que o ICCB cessasse a actividade na manhã do dia seguinte.

Na altura, o Governo de Hong Kong também declarou que não iria recorrer ao Fundo Cambial Internacional para salvar o banco. O ICCB foi dissolvido a 17 de Julho. Devido a este incidente, vários bancos de Hong Kong foram profundamente afectados porque os clientes quiseram levantar os seus depósitos, mas acabaram por conseguir superar as dificuldades. Ao início, o ICCB pedia aos clientes que levantassem apenas 25 por cento dos seus depósitos o que causou a muita insatisfação. Em Novembro de 1991, o Hong Kong Chinese Bank (o predecessor do China CITIC Bank (International)) adquiriu todas as acções do Hong Kong ICCB. Em finais de 1999, os clientes do ICCB recuperaram a totalidade dos seus depósitos, pondo desta forma fim ao incidente.

A crise financeira asiática de 1997 conduziu, durante um breve período de tempo, a uma corrida ao Hong Kong.g Bank. Este caso demonstra que as pessoas reagem fortemente aos rumores e que incidentes semelhantes são prejudiciais para o sistema financeiro. A Autoridade Monetária de Hong Kong liderou uma pesquisa sobre protecção dos depósitos em 1998, e promulgou a “Deposit Protection Scheme Ordinance” (Regulamentação para a Protecção dos Depósitos) em Maio de 2004, a qual entrou em vigor a 25 de Setembro de 2006. Ao abrigo desta regulamentação, os prémios dos seguros têm de ser pagos pelos bancos e não pelos clientes, que, no entanto, continuam a ser protegidos.

Em Hong Kong, o âmbito desta protecção inclui depósitos em dólares de Hong Kong, Renminbi e outras moedas estrangeiras e os juros que geram. O montante máximo segurado é de 500.000 HKD.

Durante a crise financeira de 2008, começaram a surgir falsos rumores na Internet sobre a iminente falência dos bancos de Macau, e o Governo local decidiu criar as “Medidas de Protecção dos Depósitos”, que deveriam estar em vigor entre 14 de Outubro de 2008 e 31 de Dezembro de 2010. Mas, depois da data-limite, as medidas continuaram activas e a Assembleia Legislativa de Macau aprovou a Lei No. 9/2012 – Sistema de Protecção dos Depósitos. Ao abrigo desta lei, criou-se um “Fundo de Protecção dos Depósitos”. De acordo com a Lei No. 9/2012, o Fundo tem autonomia administrativa, financeira, goza de protecção do seu património e é coadjuvado pela Autoridade Monetária de Macau. O Governo da RAEM alocou inicialmente 150 milhões de patacas ao Fundo de Protecção dos Depósitos, para facilitar a seu funcionamento. Os bancos de Macau passaram a ter de participar no sistema de protecção de depósitos e, a partir de 2014, passaram a pagar prémios de seguros a este Fundo.

Com este sistema, os depósitos feitos nos bancos de Macau estão protegidos, mas os produtos financeiros como acções, obrigações e unidades de participação em fundos de investimento e metais preciosos não estão cobertos. Em Macau, os depósitos ficam segurados até ao montante máximo de 500.000 patacas por banco, o valor máximo que os depositantes podem reaver caso o banco cesse actividade. Isto deve-se ao “método de compensação líquida”. Em Março de 2018, o Fundo de Protecção dos Depósitos introduziu o “método de compensação bruta” em substituição do “método de compensação líquida”. Ou seja, quando se calcula o valor da compensação que o cliente deve receber, prevalecem o saldo e os juros do depositante. Não há necessidade de deduzir as dívidas do depositante para com o banco. Este método pode simplificar o cálculo do montante da indemnização e melhorar a eficiência da emissão de compensações.

A protecção dos depósitos é necessária para estabilizar o sistema financeiro. Em caso de insolvência do banco, os depositantes serão certamente indemnizados. O Silicon Valley Bank e o Signature Bank são disso um exemplo. Sem protecção de depósitos, muitos clientes dos bancos americanos veem as suas poupanças desaparecer de um dia para o outro. Hong Kong está agora a aumentar a percentagem de protecção dos depósitos de 89 por cento para 92 por cento para que mais depositantes possam estar protegidos, o que pode reforçar ainda mais a estabilidade da banca e o estatuto de Hong Kong como centro financeiro internacional. É uma medida louvável, mas as despesas dos bancos vão aumentar.


Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Escola de Ciências de Gestão do Instituto Politécnico de Macau
Blog: http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog
Email: legalpublicationsreaders@yahoo.com.hk

17 Jul 2023

Rui Rio regressou na varanda

A história da separação do poder político e o poder judicial é uma treta. O director da Polícia Judiciária (PJ) depende directamente da ministra da Justiça e, por sua vez, é da total confiança do primeiro-ministro. Os inspectores da PJ no decurso do seu trabalho analisam queixas, mesmo anónimas, escutam telefones e têm uma panóplia de trabalhos de investigação infinita. Na semana passada assistimos ao décimo quarto membro do Governo que se demitiu ou foi demitido.

O secretário de Estado da Defesa, Capitão Ferreira, há muito que andava metido em cambalachos e a PJ ao investigar os milhões de euros gastos a mais nas obras do hospital militar descobriu uma data de jogos sujos que levaram à suspeita de corrupção.

O governante demitiu-se logo assim que o Ministério Público (MP) o decretou como arguido num caso de bradar aos céus. O senhor fingiu que contratou um assessor para determinado trabalho, ele próprio efectuou o processo e recebeu por dia a “módica” quantia de 12 mil euros, num total de 61 mil em apenas cinco dias e as ilegalidades não cessam, inclusivamente milhões gastos na manutenção de helicópteros sem passar pelo Tribunal de Contas.

Obviamente, que o falatório pelo país foi generalizado. Simultaneamente o ministro da Cultura, Adão e Silva (nome sonante de outros mundos), criticou em entrevista os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito à TAP (CPI) e os seus membros ficaram na corda bamba através das palavras do socialista governante. Caiu o Carmo e a Trindade.

O presidente da CPI, o igualmente socialista e conceituado deputado e ex-membro do Governo, António Lacerda Sales, respondeu a Adão e Silva de uma forma contundente e salientou que o governante deveria pedir desculpas à Assembleia da República. E mais, Lacerda Sales relembrou o ministro que é o Parlamente que visiona o Governo e não o contrário. Seguiram-se outros socialistas e demais deputados de outros partidos a criticarem Adão e Silva, um dos mais protegidos do primeiro-ministro, António Costa.

Ora bem, quando o mundo político estava com o Partido Socialista e o Governo na corda bamba, de que se lembrou a PJ, a instituição que depende directamente do Governo? De virar o disco e terminar com as “guerrinhas” no seio dos socialistas e na má imagem criada com a demissão do tal secretário de Estado da Defesa. E de que maneira?

Arranjou um modo simples de fazer rebentar uma bomba entre os social-democratas e a generalização de todas as bancadas parlamentares, indo aos magotes, inusitadamente mais de 100 agentes por todo o lado, sem que antes vergonhosamente avisasse a TVI para o espectáculo, particularmente a casa do ex-presidente do PSD, Rui Rio, e às sedes desse partido no Porto e em Lisboa, de onde levaram os telemóveis e computadores após lá estarem 19 horas, alegando que Rui Rio teria gasto dinheiro público em pagamentos a funcionários ou a colaboradores do partido.

Mas, isso é o que todos os partidos fazem. O dinheiro, segundo a lei, não é público, é concedido pela Assembleia da República aos partidos com assento parlamentar, a fim de ser utilizado nas suas despesas, incluindo na contratação de colaboradores para a efectivação do trabalho parlamentar. E esses colaboradores não são obrigados a trabalhar no Palácio de S. Bento.

Por exemplo, se um fotógrafo é contratado por um partido para efectuar a cobertura da actividade dos deputados nas mais diversas acções no exterior do parlamente, esse fotógrafo tem de ser pago pelo seu trabalho. Ou seja, a PJ pariu um rato e até obrigou Rui Rio a vir à varanda, imagine-se, para explicar aos jornalistas o seu ponto de vista irónico sobre o que se estava a passar. Esta actuação da PJ até mereceu um comunicado da Procuradoria-Geral da República salientando que ninguém foi anunciado como arguido, mas o PSD enviou uma carta de protesto à procuradora-geral protestando contra o circo levado a efeito pelo MP.

A jogada dos inspectores deixou a maioria a pensar que todos seríamos atrasados mentais, porque viu-se de imediato que a estratégia judicial era abafar as críticas diárias ao secretário de Estado da Defesa e ao ministro da Cultura, mudando a agulha do remoque aos socialistas e ao Governo e passar a bola para um assunto que não é assunto, mas que deu impacto mediático em todos os órgãos de comunicação social.

Não, o MP não esteve bem, mais a mais, porque se tratou de uma denúncia vingativa de alguém no interior do PSD que se sentiu prejudicado no reinado de Rui Rio quando este tentou limpar a casa e diminuir as despesas no seio do seu partido.

Agora, fica-se na perspectiva de saber se o MP irá dirigir-se às sedes de todos os partidos políticos presentes na Assembleia da República e se as suspeitas irão recair igualmente em Mariana Mortágua (BE), Paulo Raimundo (PCP), António Costa (PS), Rui Rocha (IL) e André Ventura (Chega). O mais espantoso é que o crime organizado tem aumentado em Portugal de uma maneira assustadora e a PJ não anuncia a detenção dos vários cabecilhas que se passeiam em carros topo de gama por esse país fora controlando todas as redes de tráfico de droga e de prostitutas/tos brasileiros…

16 Jul 2023

Direito de Resposta

Exmo. Senhor,

Carlos Morais José

Director do Jornal Hoje Macau

Pátio da Sé, Nº 22, Edf. Tak Fok, R/C, Macau

 

Assunto: Pedido de publicação de um Direito de Resposta acerca do artigo “Tudo tem o seu tempo”, da autoria do Sr. João Santos Filipe – Jornal Hoje Macau 10 de Julho de 2023.

 

Exmo. Senhor,

 

Ao abrigo do Direito de Resposta consignado na Lei de Imprensa, e enquanto membros do Conselho Permanente do Conselho das Comunidades Portuguesas, para os devidos efeitos concernente à publicação mencionada no assunto em epígrafe, vimos por esta via solicitar a publicação deste esclarecimento relativamente ao conteúdo do artigo Tudo tem o seu tempo, da autoria de João Santos Filipe, publicado no Jornal Hoje Macau no dia 10 de Julho de 2023.

A posição expressa no artigo intitulado “A Oportunidade Perdida”, que foi publicada nas redes sociais, a que o Jornal Hoje Macau teve acesso, e se baseou para tecer considerações sobre as alterações à Lei que regulam o Conselho das Comunidades Portuguesas, aprovada na última sexta-feira, 7 de Julho de 2023, não é da autoria dos Conselheiros das Comunidades Portuguesas do Círculo China, Macau e Hong Kong, nem a reacção à votação pode ser atribuída individualmente à Conselheira Rita Santos, conforme referido no artigo supra mencionado, porquanto se trata de um comunicado emitido pelo Conselho Permanente do Conselho das Comunidades Portuguesas, composto por membros representantes das diversas comunidades Portuguesas espalhadas pelo Mundo, cuja lista segue abaixo, para referência desse jornal e do autor do artigo.

Agradecendo ao Jornal Hoje Macau a atenção dispensada na elaboração do artigo referente ao comunicado do CP do CCP (A Oportunidade Perdida), julgamos de elementar justiça que o texto seja publicado na íntegra, juntamente com a publicação deste direito de resposta, por forma a não suscitar qualquer dúvida em relação à posição colectiva do Conselho Permanente, cujo conteúdo passo a citar:

 

A OPORTUNIDADE PERDIDA

 

Hoje, após meses em espera, finalmente a Assembleia da República aprovou, com os votos do grupo parlamentar do PS e da deputada do PAN o texto com alterações para a Lei 66-A, que regulamenta o CCP.

Infelizmente deixaram de avançar com diversos temas e acabaram por aprovar outros que jamais foram objeto de diálogo prévio com o CCP como, por exemplo, a limitação de mandatos aos conselheiros; o que não se exige dos deputados.

O PS talvez tenha considerado que a maioria absoluta permite decidir mesmo sem levar em causa as históricas pautas do CCP e a manifestação de outros grupos parlamentares. Aprovação houve, é verdade, mas com declarações das mais variadas tendências naquela Casa da Democracia. PSD, Chega, IL, PCP e Bloco de Esquerda, todos manifestaram pública e contundentemente seu descontentamento com o processo.

Ratificadas as alterações, o texto, em breve, irá à apreciação do Presidente da República. Vamos continuar a acompanhar atentamente, relembrando que a oportunidade perdida, expressão repetida por quase todas as intervenções, continuará a ser objeto de radical crítica do atual CCP.

Poderíamos ter avançado com a adopção de políticas que melhor servissem às Comunidades e a sua ligação no sentido de reforçar a coesão nacional, com uma melhor estrutura, com o plenário a meio de mandato, com o piloto do voto eletrónico descentralizado, com deveres e direitos dos conselheiros mais detalhados e com uma regulamentação que desse ao CCP uma verdadeira autonomia, como deve ter qualquer órgão de consulta do Governo.

Tivemos um revés, mas não desanimaremos. Que a responsabilidade seja de quem efetivamente deixou passar essa oportunidade.

Lisboa, 07 de Julho de 2023.

 

Pelo: Conselho Permanente do Conselho das Comunidades Portuguesas

 

◦        Amadeu José Santos Batel – Suécia (Vice-Presidente)

◦        Ângelo Leite Horto – Rio de Janeiro, Brasil

◦        António Manuel Mota da Cunha – Londres e Manchester e Dublin, Reino Unido

◦        Flávio Alves Martins – Rio de Janeiro, Brasil (Presidente)

◦        Maria de Lurdes Almeida Traça, Caracas, Venezuela

◦        Maria Lígia Gonçalves Sardinha

◦        Fernandes – Cabo, África do Sul

◦        Nelson Ponta Graça – São Francisco, EUA

◦        António Paulo Neves Marques – Paris, França

◦        Paulo Jorge de Jesus Martins – Boston, EUA

◦        Pedro Cláudio Caldeirinha Rupio – Bélgica

◦        Rita Botelho dos Santos – China, Macau, Hong Kong

 

Finalmente, e tendo em consideração que o artigo publicado pelo Jornal Hoje Macau, inicia o texto com referência inadequada aos Conselheiros das Comunidades Portuguesas do Círculo China, Macau e Hong Kong, vai esta solicitação de publicação de um Direito de Resposta assinado pelos três conselheiros que compõem o Conselho das Comunidades Portuguesas do Círculo China, Macau e Hong Kong.

 

O Gabinete dos Conselheiros das Comunidades Portuguesas do Círculo da China, Macau e Hong Kong, aos 11 de julho de 2023.

 

Pel´o Gabinete

 

Comendadora Rita Santos

Membro do Conselho Permanente do Conselho das Comunidades Portuguesas

Presidente do Conselho Regional da Ásia e Oceânia do Conselho das Comunidades Portuguesas

 

 

Armando de Jesus

Conselheiro do Conselho das Comunidades Portuguesas

 

 

Gilberto Camacho

Conselheiro do Conselho das Comunidades Portuguesas

 

 

Nota da Redacção

 

O texto a que se refere o Direito de Resposta foi publicado na página de Facebook “Conselho das Comunidades Portuguesas da China, Macau e HK – 葡國委員會(中國、澳門、香港)” que tem sido utilizada para partilhar comunicados dos Conselheiros das Comunidades Portuguesas do Círculo China, Macau, Hong Kong, encontros de Rita Santos com amigos e que apresenta o seguinte endereço electrónico: rsantos@atfpm.com. Sendo verdade que a publicação em causa atribui no final o comunicado ao “Conselho Permanente do CCP”, do qual Rita Santos faz parte, também é verdade que na publicação, e ao contrário do que acontece neste Direito de Resposta, não surgem identificados os outros membros.

12 Jul 2023

O Livro de Horas

«Tempo! Suspende o teu voo». Lamartine implorava assim num magnífico poema: «parai, horas propícias!», mas o tempo não se detém e circula até desfazer todas as Horas. Propícia se devastadoras. Outrora apelidava-se assim por uma questão litúrgica, sendo um missal da regência quotidiana composto no século VIII, ao tempo de Carlos Magno, por um dos seus abades que desenvolveu tanto os ritos consagrados, quanto a pintura, por suas ricas iluminuras. Um livro destes era mais que um grafismo alfabético, destinava-se a ser contemplado, mas também é certo que só uma escassa minoria teria acesso a tão precioso objecto dado que todos eram compostos manualmente.O conjunto dos leitores também seria restrito, daí que, as imagens trabalhadas se apresentassem para grupos mais alargados tendo em conta sempre a maior sensibilidade plástica dos povos. Escrever era tarefa prodigiosamente morosa, e a palavra escrita um hermetismo tamanho de signos visuais, que ainda hoje proferimos a expressão «uma imagem vale mais que mil palavras». Só que não!Podemos ter muitas imagens sem jamais imaginar o poder do sopro do verbo.

Os grandes poetas retomam os temas, por isso nada se perde e, neste circunscrito e audacioso tema, pouco ou nada se transforma, que Rilke assume para si esta grande marcha criativa que vai encontrar intacta pela forma como nos devolve, uma das suas mais honrosas obras, «O Livro de Horas», em busca da alma russa, tão em voga no século dezanove enquanto entidade espiritual. A devoção das gentes aos seus ícones e a forma como dialogavam com eles deve ter sido um sintoma forte de um veio longínquo que nele tomou posse, e vemo-lo encantado debruçando-se quase no sentido contrário como que a legendar imagens, que o paradoxo é toda uma temática russa, idem, em sua grande dimensão: pois foi aí que a propriedade privada se cancela e ganha corpo uma nova sociedade, que as mais pequenas são feitas de muros e basta levantá-los para que todos tenham direito a ela. Mas o paradoxo maior é que ele mesmo sendo tão frágil, derrubou nas estranhas estradas de Eros candidatos de maior monta quando a bela Salomé por ele também se apaixona, tão russa quanto os seus apaixonantes ícones onde encontrou leituras até então inimagináveis.

Primeiro Livro, Segundo Livro, Terceiro Livro, e temos o seu Livro de Horas. Primeiro: «O Livro da Vida Monástica». Segundo: «O Livro da Peregrinação». Terceiro: «O Livro da Pobreza e da Morte». Quando isto acontece num só Rilke, a única coisa que me vem ainda à lembrança é Outubro Les Très Riches Heures du duc de Berry», mas também aqui me sinto longe. Outubro é demasiado burguês, tendencial, ornamental e evasivo para nos transmitir tão completo memorando e, ao adentrarmo-nos, vemos enfim diálogos raros em forma de poema, que é a única forma de transmitir o que subsiste de toda a aparência, e encontramo-nos de novo em presença de um livro de orações. Que nós também não devemos politizar o mundo desta maneira áspera que nos inunda se desejarmos uma rectificação mais abrangente, que todo este artifício com que somos contemplados nos desvia de todas estas outras coisas essenciais.

 

A França arde, mas o mundo também aquece, exactamente pelas mesmas razões em que tudo entra em rápida ebulição, que o ensinar esqueceu uma silhueta que não se sombreia entre as gentes, mas que teria dado forma a realidades mais humanas, assim a Humanidade tivesse desejado. Que toda a aflição nasce de situações ofensivas, e que há muito passámos colectivamente a barreira de ajustados diálogos que não nos servem absolutamente para nada. Neste livro tocamos as lamentações dos desvalidos, mas Rilke é apenas um poeta, mas talvez que tudo o mais não passe afinal de um desesperante efeito pernicioso.

 

Minha vida tem a mesma veste e cabeleira

que todos os velhos czares a agonia….

 

Rilke, O Livro da Vida Monástica, Primeiro Livro de Horas

12 Jul 2023

Titanic

O navio Titanic ficou tristemente célebre por ter naufragado depois de chocar com um iceberg. A tragédia ocorreu em 1912 e foi posteriormente recriada no cinema há 25 anos. A acção deste filme romântico desenrola-se no navio. Para poupar a sua amada Rose, Jack, o herói da película, obriga-a a ir sozinha num bote salva-vidas. Quando está quase a embarcar, Rose volta para trás para beijar Jack e diz-lhe: “Saltamos os dois”. Neste momento do filme, as audiências emocionavam-se até às lágrimas. A rapariga deitava a cabeça ao ombro do rapaz e não parava de chorar e ele apertava-lhe as mãos, ambos determinados a nunca se separarem.

Jack e Rose acabam por cair à água enquanto o Titanic se afunda. Mas Jack encontra uma prancha e pede a Rose que vá para cima dela e espere até ser resgatada. Enquanto pôde, Jack foi segurando na prancha para evitar que submergisse no gelado Oceano Atlântico, mas acaba ele próprio por morrer afogado. O seu martírio teve como resultado a salvação de Rose que conservou Jack no coração até à hora da sua morte.

Recentemente, o Titanic voltou a fazer novas vítimas que também foram choradas. O acidente sucedeu com o submergível Titan propriedade da “Ocean Gate Expeditions” que organizava excursões submarinas aos destroços do Titanic. Cada um destes passageiros pagou 250.000 dólares americanos pela viagem e teve de assinar um contrato com uma cláusula de isenção de responsabilidade. Este submergível era apenas controlado por um comando activado por uma ligação sem fios via Bluetooth, e nem sequer tinha GPS. Os submergíveis destinados a excursões ao fundo do mar são pequenos não têm casa de banho e os passageiros têm de estar sempre sentados, de pernas cruzadas.

O Titan iniciou a sua viagem a 18 de Junho e perdeu contacto com o navio base 1h e 45 minutos após ter submergido. Mais tarde, um submarino da Armada americana detectou um som consistente com uma implosão. Finalmente, a Guarda Costeira americana encontrou destroços provenientes do Titan no fundo do mar a cerca de 490 metros do local onde jaz o Titanic, confirmando assim que todos os ocupantes do submergível tinham morrido.

A pressão da água junto aos destroços do Titanic é de aproximadamente 400 quilogramas por cm quadrado, muitíssimo diferente da pressão que se regista à superfície do mar, calculada em 1,033 quilogramas por cm quadrado. O material usado na manufactura dos submergíveis costuma ser o titânio ou o aço, mas o invólucro do Titan era feito de uma mistura de fibra de carbono e titânio, que pode provocar ligeiras infiltrações de água, o que explica a implosão provocada pela enorme pressão da água.

 

Rob McCallum, um antigo perito da Ocean Gate Expeditions para a exploração das profundezas do mar, enviou um email interno em 2018 a Stockton Rush, Presidente da empresa, assinalando que os submergíveis para fins turísticos apresentavam potenciais perigos para a segurança, e desaconselhava as viagens até aos destroços do Titanic até serem realizados os testes necessários e estarem na posse da certificação requerida. Mas Rush acreditava que a estrutura destes submergíveis, diferente dos tradicionais, representava a inovação. Como resultado desta sua crença, aconteceu um acidente e os cinco ocupantes do Titan morreram e a empresa anunciou que vai suspender a sua actividade.

As pessoas sentem-se atraídas a visitar os destroços do Titanic pela história lendária deste navio e também pelo filme. A palavra Titanic significa “enorme”. Por isso algumas pessoas chamavam ao Titanic “navio inaufragável”. A 2 de Abril de 1912, o Titanic saiu do estaleiro. Era o maior veículo da época, pesando 46,328 toneladas e com capacidade para transportar 3.547 pessoas. As suites mais luxuosas do navio eram “The Parlor Suites”. Além da decoração absolutamente deslumbrante e de todas as acomodações de apoio, também possuía um corredor privado à beira-mar. O preço só de ida destas suítes era de 4.350 dólares, o equivalente a cerca de 110.000 dólares nos nossos dias. Por isso, o Titanic também era conhecido como o “Navio de Sonho”. à semelhança das suites presidenciais da actualidade, desde que houvesse oportunidade, todos as queriam visitar.

A 14 de Abril de 1912, o Titanic chocou com um iceberg, provocando uma fractura no casco do navio que conduziu ao seu naufrágio, no qual morreram 1.514 pessoas. Todas estas mortes foram provocadas pelo pequeno número de botes salva-vidas existentes a bordo. Os botes do Titanic estavam pensados apenas para transportar passageiros para outros navios e não para permitirem uma evacuação geral em caso de naufrágio. Foi por este motivo que tantos passageiros se afogaram, porque o Titanic não possuía botes salva-vidas suficientes. Depois deste naufrágio, foi criada a “Convenção Internacional para a Salvaguarda da Vida Humana no Mar”, que estipula que o número de pessoas que os botes-salva vidas podem transportar não pode ser inferior ao número de pessoas que viajam no navio, para assegurar que todos se podem salvar em caso de naufrágio. Isto também demonstra o processo de promulgação de leis que, a partir de circunstâncias específicas, formula a legislação e as normas relevantes.

Os destroços do Titanic foram descobertos em 1985, mas infelizmente não puderam ser recuperados devido a vários factores. Mas a curiosidade humana fez nascer um negócio que, até agora, estava a crescer de dia para dia: as viagens turísticas em submergíveis à sepultura do lendário navio.

Outro motivo que justifica estas viagens é a psicologia dos muito ricos. Os destroços do Titanic estão escondidos no fundo do mar e este tipo de excursão envolve um certo risco. Os milionários gostam de aventuras e de novas experiências, interditas ao comum dos mortais. Um dos passageiros do Titan, o bilionário britânico Hamish Harding, era um exemplo do que foi dito. Em Junho de 2022, fez uma viagem espacial. Este homem não estava, portanto, intimidado com uma viagem às profundezas do mar. Mas quem haveria de dizer que a visita aos destroços do Titanic poria fim à sua vida?

Stockton Rush sabia que a estrutura do Titan era diferente das tradicionais e pensava que isso era algo inovador. A inovação é boa no mundo dos negócios, é um processo, cujo primeiro passo é a invenção. Ao inventar novos produtos, estimula-se a curiosidade da clientela que passa a desejar experimentá-los o que permite que as empresas aumentem os seus lucros. Sem inovação, as empresas ficam naturalmente sem outras opções. Sem mudanças, os custos operacionais não são reduzidos, a competitividade diminui e, a longo prazo, é prejudicial para as empresas. A OGE usava uma mistura de fibra de carbono e titânio para fabricar o invólucro dos submergíveis que viajavam até aos destroços do Titanic, obtendo enormes lucros com esta actividade que era na verdade inovadora. É uma pena que esta inovação tenha estado ligada à falta de segurança. O resultado da negligência são os acidentes, que são inaceitáveis para todos.

As empresas não só apreciam a inovação, como não podem sobreviver sem ela, mas a inovação não pode excluir a segurança. A implosão deste submergível vem recordar-nos da importância da segurança e esperamos que acidentes como este não voltem a acontecer. Se quisermos recordar o Titanic, devemos aprender as lições extraídas deste acidente e não voltar a repetir os mesmos erros.

11 Jul 2023

Este país não é para políticos com maioria absoluta

O nosso país não é para políticos que façam parte de uma maioria absoluta. Por quê? Porque goste-se ou não, o PCP é o único partido político coerente e que na Comissão Parlamentar de Inquérito à TAP (CPI) só se preocupou com os muitos cambalachos que aconteceram na TAP ao longo de diferentes governações. Na semana passada foi apresentado o relatório preliminar dos trabalhos que decorreram durante meses. Assistimos a 46 audições no parlamento. Mas, ninguém acredita, que o relatório é um autêntico branqueamento de diversos assuntos graves que tomámos conhecimento ao longo das audições. A TAP foi partidarizada pelo governo de Passos Coelho. Essa partidarização foi uma vergonha, onde os accionistas levaram a companhia aérea portuguesa quase à falência. Um deles, David Neelman até levou uma indemnização de cerca de 50 milhões de euros. Um escândalo. E o relatório quase que se preocupou apenas com isso. Depois, o governo de António Costa nacionalizou a empresa e o ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, delegou no seu secretário de Estado Hugo Mendes a tutela da TAP. Esse governante teve uma prática política que bradou aos céus, dando ordens constantemente à CEO francesa da TAP, esta CEO começou a embirrar com a competência da administradora Alexandra Reis, ao ponto de a querer despedir e colocar os advogados de ambas as partes a negociar uma indemnização para a engenheira Alexandra Reis. Esta gestora acabou por levar 500 mil euros de indemnização para deixar a administração da TAP. O ministro das Finanças, Fernando Medina disse na CPI que não teve conhecimento… quase para rir. Não ter conhecimento do meio milhão de euros que foi entregue à engenheira, quando a sua mulher era directora jurídica na TAP e que aconteceu com o beneplácito do ministro Pedro Nuno Santos, que ao mentir e ao meter os pés pelas mãos sobre o assunto, acabaria por se demitir. Medina ainda viria, para cúmulo, a convidar Alexandra Reis para secretária de Estado do Tesouro. A bronca dos 500 mil euros rebentou e a senhora nem aqueceu o lugar no ministério.
Nas audições da CPI, João Galamba, como ministro que substituiu Pedro Nuno Santos na pasta das Infraestruturas teve um comportamento indigno e a provar-se que, realmente, o primeiro-ministro devia ter aceitado a sua demissão. Galamba, através da sua chefe de gabinete, contactou com o SIS (Secretas) a fim de esta instituição ter um comportamento ilegal de funções policiais ao ir reaver um computador de um adjunto do ministro Galamba. O caso deu água pela barba e agora o relatório da CPI não aborda a gravidade destes factos que ficaram provados. O partido neonazi, de André Ventura, até já marcou pontos, vindo anunciar que o relatório foi redigido pelo Governo e entregue à deputada presidente da CPI. Os outros partidos políticos têm-se manifestado abertamente contra o branqueamento inserido no relatório sobre factos graves de que se tomaram conhecimento ao longo das audições e que o relatório nada refere.
O Estado português introduziu na TAP mais de três mil milhões de euros do povo, alegando que seria para salvar a empresa de transporte aéreo. Com esse dinheiro foi criado o tal Fundo da Airbus, para a aquisição de aeronaves, mas afinal, a TAP ainda tem mais de 20 aviões por receber da Airbus. A discussão não tem fim. Há partidos políticos que dizem ir votar contra o relatório. Outros manifestaram que irão redigir outro relatório com todos os factos graves que foram abordados na CPI e que todo o país ouviu e leu através da comunicação social.
Um relatório sobre 46 audições parlamentares não pode ser uma espécie de generalizações balofas omitindo as passagens graves que comprometiam membros do Governo e até o Partido Socialista, quando, por exemplo, o seu grupo parlamentar mobilizou uma reunião com a CEO da TAP para combinarem as perguntas e respostas durante a audição na CPI. O facto de um relatório parlamentar desta importância ser apresentado de um modo leviano e partidário é muito grave. O primeiro-ministro, António Costa, disse que se pronunciava apenas quando o relatório estivesse finalizado. Pudera, ele sabe que o relatório não haverá de conter nada que comprometa a sua governação. O Presidente Marcelo Rebelo de Sousa (que voltou a desmaiar na semana passada) também afirmou que aguarda pelo final das conclusões do relatório para convocar o Conselho de Estado. O caso não é nenhuma brincadeira e o povo sabe perfeitamente que a TAP tem sido um cambalacho de enormes dimensões para certos indivíduos e os trabalhadores é que viram os seus salários diminuir e outros foram mesmo despedidos da empresa aérea. O relatório tem, no mínimo, três pontos muito polémicos e de grande controvérsia: a afirmação de que o Governo não interferiu na gestão da TAP, quando se sabia que o ministro Pedro Nuno Santos dava ordens para a CEO da TAP todos os dias, a afirmação de que não sabia do valor da indemnização de meio milhão a Alexandra Reis, quando o próprio secretário de Estado Hugo Mendes é que tratou de tudo e depois deu conhecimento ao seu ministro e a ausência de referências ao episódio que envolveu João Galamba e o seu ex-adjunto Frederico Pinheiro, o que constituiu uma das maiores palhaçadas jamais vista na governação democrática. Neste último particular, inventaram-se cenas de pancadaria, agressões a funcionárias, roubo de computador, chamada dos SIS para fazer de Polícia Judiciária, insultos ao telefone e o relatório nada refere? Não, assim, o povo já nem na casa da democracia acredita. É o descrédito total quando Ana Paula Bernardo, relatora do relatório se encontrou com os jornalistas, dissecou uns quantos (poucos) temas relacionados com as 200 páginas e levantou-se da mesa dizendo que tinha de se ir embora porque existia outro compromisso, precisamente no momento em que os jornalistas queriam colocar as mais diversas perguntas. Bem, isto já não é democracia, não é nada. Reina o compadrio, o partidarismo e a pouca vergonha.

10 Jul 2023

O poder não deve ser arbitrário

Na entrega do “Relatório de Acção Governativa de 2015”, o então primeiro-ministro chinês Li Keqiang disse no seu discurso que “o poder não é para ser usado arbitrariamente”, pelo que foi calorosamente aplaudido pelos representantes presentes e, mais tarde, a frase veio a tornar-se viral na Internet. Actualmente, Li Keqiang está retirado e deu início a uma nova fase da sua vida. No entanto, a sua advertência de que “o poder não é para ser usado arbitrariamente” parece não ter alertado algumas pessoas que exercem o poder, por isso, as irregularidades continuam a acontecer.

Desde a eleição da 7.ª Assembleia Legislativa em 2021, o Plenário passou a ter uma configuração política hegemónica e as vozes discordantes praticamente desapareceram. A Assembleia Legislativa e o Governo da RAEM estabeleceram relações de cooperação mais próximas e o Governo e os seus representantes dispõem de maior liberdade e de mais oportunidades para capitalizar essa abertura. Mas como a Assembleia Legislativa tem muita margem para melhorar a sua supervisão do desempenho do Governo, é provável que os departamentos competentes ignorem a realidade e as opiniões da população quando tomam decisões.

Por exemplo, a Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT) decidiu o encerramento permanente de um troço da Avenida Dr. Francisco Vieira Machado – junto do edifício habitacional Bai Yun Garden e que dá acesso à Avenida 1 de Maio e à Avenida da Amizade. Mas esse troço foi reaberto 14 horas após o seu encerramento, porque estava a provocar congestionamento do trânsito. Este caso ilustra perfeitamente o conceito de “o poder não é para ser usado arbitrariamente”. Na ausência de uma supervisão pública forte, a DSAT deve pensar cuidadosamente antes de tomar decisões, porque mesmo havendo um comité de aconselhamento, os seus membros só emitem opiniões favoráveis às decisões administrativas do Governo da RAEM.

As árvores da Baía Norte do Fai Chi Kei foram cortadas por causa da construção da Estação Elevatória de Águas Pluviais. Não sei se o Conselho Consultivo de Serviços Comunitários da Zona Norte teve conhecimento antecipado do abate das árvores, mas os moradores da Zona Norte é que não foram certamente informados. Os funcionários públicos que trabalham em salas com ar condicionado provavelmente não sentem o calor insuportável que sufoca quem anda na rua ou quem está na paragem à espera do autocarro à torreira do Sol. Se o abate das árvores era considerado necessário para a construção da Estação Elevatória de Águas Pluviais, o que dizer das intensas obras de escavação rodoviária realizadas ao mesmo tempo na zona sul do Porto Interior, que dificultaram a circulação do trânsito? Qual é a explicação do departamento governamental responsável pelo agendamento das obras de escavação? Porque é que não existe um mecanismo adequado para a coordenação das várias obras rodoviárias? Como é que se faz o planeamento destas obras? Com o poder vem a responsabilidade e nada pode ser feito de forma arbitrária.

Olhando para as chamadas “mudanças que acontecem uma vez em cada século” a nível mundial, sabemos que muitas delas são causadas pelos caprichos de quem detém o poder. O Presidente russo Vladimir Putin desfruta de poder autoritário a nível doméstico e de uma reputação sem precedentes. Mas a operação militar especial da Rússia contra a Ucrânia arrasta-se há mais de um ano. Embora muitos estados (nos quais se incluem a China e o Vaticano) continuem a tentar promover as conversações de paz, os seus esforços têm sido em vão. Ultimamente, o Grupo Wagner, um grupo de mercenários, organizou uma rebelião contra a Rússia, algo que Putin nunca imaginou ser possível!

Na altura em que o primeiro-Ministro Li Keqiang deixou o aviso de que “o poder não é para ser usado arbitrariamente”, Guo Tianyong, um professor da Faculdade de Finanças da Universidade Central de Economia e Finanças, disse numa entrevista: “O poder é propriedade pública e é concedido pelo povo. Deve ser exercido sob rigorosa supervisão, com restrições e sem a menor arbitrariedade”.

Aqueles que detêm o poder não podem agir com “arbitrariedade”, o que é uma advertência para todos, especialmente para os próprios.

9 Jul 2023

O negacionismo, as alterações climáticas e a poluição

Vem este texto a propósito dos que não acreditam que as alterações climáticas são causadas pelas atividades humanas. Na realidade é lícito que haja quem duvide, atendendo a que alguns cientistas também são dessa opinião. Trata-se, no entanto, de uma minoria pouco significativa, considerando que se estima que cerca de 97% dos cientistas que estudam este assunto estão de acordo que são os gases de efeito de estufa (GEE) que retêm o calor, o que provoca o aquecimento global e, consequentemente, essas alterações.
Os negacionistas não acreditam nas conclusões a que chegaram numerosas instituições científicas, tais como universidades, institutos, agências especializadas e programas das Nações Unidas, entre os quais a Organização Meteorológica Mundial e o Programa das Nações Unidas para o Ambiente (UN Environment Programme – UNEP). Também não acreditam no IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change), nem nas conclusões e recomendações das 27 Conferências das Partes (Conferences of the Parties – COP).
Curiosamente, os negacionistas das alterações do clima estão em geral de acordo com teorias da conspiração defendidas por movimentos de extrema-direita. Bolsonaro e Trump são exemplos bem conhecidos como defensores destas teorias, nomeadamente no que se refere às alterações climáticas e à epidemia Covid-19. Alguns até creem que a terra é plana, como defendia um dos mentores de Bolsonaro, o “filósofo” brasileiro Olavo de Carvalho, falecido em janeiro de 2022, vítima da Covid-19, na qual não acreditava e designava por “historinha de terror”. São conhecidas afirmações proferidas pelo ex-presidente do Brasil em que se referia à pandemia como “uma gripezinha” e em que preconizava o uso de medicamentos comprovadamente ineficazes. Também ficou célebre a frase “Se tomar vacina e virar jacaré não tenho nada a ver com isso”. Segundo um relatório da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), difundido em 24 de novembro de 2022, referindo-se às medidas de combate à pandemia, “caso o país tivesse seguido o padrão médio global, três de cada quatro mortes por Covid-19 ocorridas no Brasil teriam sido evitadas”.
Como negacionista, Bolsonaro deu também o dito por não dito quando anunciou que a 25ª Conferência das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas (COP25) não se realizaria no Brasil, conforme havia sido anteriormente acordado, o que provocou a sua transferência para Madrid (2-13 de dezembro de 2019). Segundo ele, a pressão internacional sobre a problemática das alterações climáticas não passaria de um “jogo comercial”.
Também Trump subestimava a pandemia e não acreditava nas alterações climáticas. Segundo a revista científica The Lancet, uma das mais antigas e prestigiadas publicações de carácter médico, entre as 450 mil mortes por Covid-19 nos EUA, cerca de 40% poderiam ter sido evitadas. Também como negacionista das alterações climáticas, numa mensagem via Twitter, Trump chegou a comentar “Brutal and Extended Cold Blast could shatter ALL RECORDS – Whatever happened to Global Warming?” (“Uma brutal e extensa invasão de ar frio pode rebentar com TODOS OS REGISTOS – o que aconteceu com o aquecimento global?”), confundindo meteorologia com climatologia, comparando um simples evento meteorológico com valores médios referentes a dezenas de anos que são necessários para caracterizar o clima.
A Organização Mundial da Saúde e o Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME) são duas das entidades que se dedicam ao estudo da saúde à escala mundial. Ambas as instituições chegaram a valores muito semelhantes no que se refere à estimativa do número de vítimas mortais precoces causadas anualmente pela poluição atmosférica, respetivamente cerca de 7 e 6,7 milhões.
A poluição atmosférica está intimamente relacionada com as alterações climáticas, na medida em que a causa principal destas alterações consiste na injeção de GEE provenientes da utilização de combustíveis fósseis (carvão mineral, petróleo e gás natural). Estes gases são também poluentes, os quais, quando respirados, contribuem para o desenvolvimento de doenças respiratórias que afetam os seres vivos, constituindo um fator importante de mortalidade. De acordo com a OMS, cerca de 99% da população mundial respira ar cujo conteúdo em poluentes excede o estabelecido como limites nas diretrizes desta organização. Os principais poluentes atmosféricos, nomeadamente partículas em suspensão, monóxido de carbono, dióxido de azoto, dióxido de enxofre e ozono, resultam dos combustíveis fósseis. Entre as partículas microscópicas arrastadas pelo vento sobressaem as PM10 e as PM2,5, respetivamente com diâmetros iguais ou inferiores a 10 e 2,5 micrómetros (μm), provenientes não só das atividades industriais, mas também de fogos florestais e transportes terrestres, marítimos e aéreos. Ainda recentemente foi detetado na Europa fumo proveniente dos incêndios florestais que têm devastado milhares de hectares de florestas no Canadá. A frequência e a intensidade dos fogos florestais estão intimamente relacionadas com as alterações climáticas, na medida em que o aumento da temperatura é propício à criação de condições favoráveis a esses incêndios.
Como 99,9% das moléculas que constituem o ar se encontram na camada atmosférica entre a superfície e 50km de altitude, mesmo os negacionistas das alterações climáticas, se forem honestos, compreenderão que, em situações meteorológicas de grande estabilidade, estes poluentes se acumulam na camada baixa da troposfera, com graves consequências para os seres vivos. Há países em que é frequente proceder a restrições do trânsito automóvel durante situações meteorológicas caracterizadas por grande estabilidade atmosférica. Não são raras as imagens veiculadas pelos media, hjunnnnnnnjuhkkkkkkk (desculpem, o meu gato passou agora por cima do teclado), em que os cidadãos circulam de máscara para evitar respirar as partículas poluentes em suspensão no ar.
Os combustíveis fósseis e seus derivados estão também intimamente ligados à poluição dos oceanos, atendendo a vários fatores, entre os quais os acidentes com navios de transporte de produtos petrolíferos e as chuvas ácidas, com graves consequências para a biodiversidade marinha. Também o plástico, que é um subproduto da indústria petrolífera, é um dos poluentes mais presentes nos oceanos, cujas partículas microscópicas já são detetáveis na cadeia alimentar humana.
No que se refere à poluição do solo, entre as agressões a que o meio-ambiente está sujeito causadas pela atividade humana, é de salientar a atitude agressiva do governo do país mais extenso do mundo, no que se refere ao rebentamento de barragens, à deposição de metais pesados nos campos, provenientes de bombardeamentos indiscriminados e de minas, e à agressão a este nosso planeta por milhares de toneladas de detritos de bombas e restos de mísseis de “elevada precisão”, tão certeiros que já destruíram milhares de instalações relacionadas com a saúde, a instrução e a energia, tais como centros médicos, hospitais, maternidades, escolas, universidades, centrais elétricas, etc.
A poluição provocada pela guerra na Ucrânia irá refletir-se negativamente na qualidade de vida das futuras gerações.
Perante o exposto, é fácil concluir que, na luta contra as alterações climáticas, está implícita a luta contra a poluição. Assim, embora pareça ser razoável que haja quem não acredite que essas alterações são em grande parte motivadas pelos gases de efeito de estufa, já não é aceitável que não acreditem que os poluentes provenientes dos combustíveis fósseis são a causa principal das doenças respiratórias.
As medidas preconizadas no que se refere à mitigação das alterações climáticas, que implicam o banir dos combustíveis fósseis, têm também como consequência a diminuição da poluição do ar, dos oceanos e do solo. Daí a necessidade da redução drástica da utilização desses combustíveis, conforme preconizado pela ONU.

6 Jul 2023

Amêijoas à bulhão patos-bravos

Os patos-bravos criminosos ganham milhões de euros com o tráfico humano para a apanha de bivalves nas lamas dos rios Tejo e Sado, mesmo em frente aos ministérios do Terreiro do Paço, de Lisboa. Uma mafia bem organizada que sem ninguém conseguir explicar, fecharam os olhos durante anos às autoridades competentes (neste caso, muito incompetentes). Os patos-bravos criminosos estendiam a sua rede de traficar pobres seres humanos, especialmente, de países asiáticos ou do terceiro mundo, nomeadamente da Tailândia e Roménia. A apanha de amêijoas-japónicas tem sido feita por cerca de 1700 mariscadores ilegais. A amêijoa-japónica foi introduzida nas águas portuguesas do Tejo e do Sado como uma experiência ambiental para purificar mercúrio, chumbo e cádmio. Actualmente, esta espécie invasora, tóxica para os humanos, chega aos consumidores em Portugal e Espanha através de redes de caça furtiva. A amêijoa-japónica absorve as biotoxinas das águas dos rios lisboetas, um vestígio de um passado industrial que se tornou agora num problema de saúde pública. Apesar da sua elevada toxicidade, pode ser consumida caso tenha sido sujeita a níveis adequados de purificação, mas, na sua maioria, é obtida furtivamente, é frequentemente mal descontaminada e intoxica o consumidor, causando graves consequências que podem até levar à morte, segundo afirmou ao HojeMacau um médico especialista.

O problema tem crescido nos últimos anos. As redes clandestinas que traficam a amêijoa-japónica chegam a capturar até 14 toneladas por dia. Após um processo de limpeza insuficiente e documentos falsos, as amêijoas podem acabar em supermercados dos dois países ibéricos, apesar de não estarem aptas para consumo. Em Maio passado, foram apreendidas 1,5 toneladas de amêijoa-japónica impróprias para consumir.

Agora, as autoridades levaram a efeito uma operação relâmpago na vila do Samouco, Alcochete, onde existe um armazém que estava repleto de centenas de imigrantes ilegais e que eram explorados para a apanha dos bivalves. As autoridades depararam-se com um cenário de horror: cerca de 300 homens e mulheres, asiáticos, em condições absolutamente deploráveis, nojentas mesmo. Até foi difícil de entrar ou ainda menos permanecer no interior devido ao mau cheiro. Estava tudo no chão e pelo número de fatos de mergulho encontrado pelas autoridades, a conclusão é de que estão em Portugal muito mais imigrantes para a apanha ilegal. Quatro cabecilhas da rede criminosa foram detidos, três portugueses e um tailandês, indiciados de associação criminosa e exploração de mão de obra ilegal. A mega operação da Unidade Central de Investigação Criminal (UCIC) da Polícia Marítima estava a ser preparada há meses e já se sabia que numa rua do Montijo viviam dezenas de imigrantes asiáticos, explorados na apanha dos bivalves. Chegam a Portugal com a promessa de trabalho, mas acabam por ficar presos a intermediários e sofrem ameaças. Em média, os mariscadores vendem a amêijoa-japónica a três euros o quilo e os intermediários, depois de ensacados os bivalves, vendem a 18 euros, num negócio ilegal que pode render até 30 milhões de euros por ano. Deslocámo-nos ao Montijo para obter mais informação e ninguém quis falar sobre o assunto. Impera o medo. Apenas nos disseram que estão envolvidos indivíduos muito poderosos e perigosos. Falar sobre a apanha das amêijoas-japónicas é o mesmo do que se passava no tempo da PIDE sob a alçada do ditador Salazar.

Sob a ponte Vasco da Gama, as águas do Tejo têm um elevado nível de toxicidade, de acordo com o instituto meteorológico português. Uma prática comum dos caçadores furtivos é adulterar a origem das amêijoas, ou seja, apanhá-las no Tejo e certificar que são do rio Sado, por este ter muito menos toxicidade. A maior parte das capturas é transportada por intermediários para Espanha, principalmente para os portos de Vigo e Pontevedra, onde é entregue em estabelecimentos de aquacultura. Muitos destes estabelecimentos conhecem a origem dos bivalves, os quais também podem ser acusados da prática de crime contra a saúde pública. Uma das informações que recolhemos diz respeito à manobra do transporte. As redes criminosas falsificam os documentos de registo e as amêijoas partem para Espanha em carrinhas preparadas que fazem movimentos quase diários. E o mais grave é que de Espanha são comercializadas para toda a Europa.

Este perigoso e letal negócio que se inicia em Portugal com o tráfico humano vindo de países normalmente asiáticos, está a constituir um grave problema para as autoridades policiais, pois, os mafiosos não brincam em serviço, e têm ameaçado de morte quem se intrometa no negócio. Os responsáveis pela saúde pública também estão deveras preocupados com as negociatas porque uma grande quantidade de bivalves fica em Portugal.

3 Jul 2023

Ó raparigas do meu bairro!…

Curioso inquérito realizado há algum tempo na Universidade de Macau às raparigas: o sonho de quase todas é casar, ter filhos e tomar conta do lar. Portanto, estas candidatas a fadas (do lar), se puderem, não tencionam seguir uma carreira, dedicar-se a uma profissão, no fundo, ter uma individualidade social. Convenhamos que este tipo de desejos não parece estar muito de acordo com o espírito do tempo. Ou será que está?

No Ocidente, desde o século XX que a mulher tem vindo a ocupar um lugar importante no plano da produção. Há mesmo quem diga que a superioridade ocidental passou, em grande parte, por ter aproveitado a força de trabalho feminina ao invés de as deixar em casa a tomar conta dos filhos e outras actividades domésticas. O escritor marroquino Tahar ben Jalloun diz que o seu país conhecerá um desenvolvimento sem precedentes no dia em que as mulheres ocuparem o espaço público, na medida em que lhes reconhece uma capacidade de trabalho, de organização e seriedade que não encontram na sua contraparte masculina.

Contudo, a saída da “casca” das mulheres não deixou de ter efeitos que alguns consideram negativos, nomeadamente na educação das crianças, cuja emotividade se desenvolverá de modo bem diferente sem a constante presença das mães. O curto tempo de amamentação provoca também, segundo a psicanálise, o aumento de carências orais, que se reflecte mais tarde em numerosos vícios, adicções e comportamentos violentos. Seja como for, não passa quase pela cabeça de ninguém inverter o actual estado das coisas. Ninguém (ou muito poucos) pensará em remeter as mulheres à vida que levavam no passado e ninguém ousaria imaginar que seriam as próprias mulheres a prescindir do seu actual estatuto e desempenho para se remeterem ao remanso do lar.

Pois em Macau, pelos vistos, a coisa não funciona como se esperaria. O mulherio, longe de pretender dedicar-se à política, às finanças, ao ensino ou ao comércio, parece mais inclinado a deitar fora as conquistas do seu sexo e voltar à vidinha doméstica que durante tantos séculos foi seu apanágio e destino. Por quê? É caso para perguntar.

Estarão as raparigas da universidade muito à frente ou muito atrás? Serão estas moçoilas de Macau uma vanguarda conservadora no mundo contemporâneo ou umas atrasadas mentais, preguiçosas e fúteis? Terão as mulheres de hoje chegado à conclusão que a vida de antes era melhor e mais eficiente, no cômputo geral, ou não estão simplesmente para a agarrar pelos cornos, preferindo agarrar os do marido, afinal mais manso que a vida? Pois não sei. Mas é caso para reflexão. E devia ser mais ainda por parte dos responsáveis políticos por esta terra, na medida em que assistem ao produto da educação que lhes proporcionaram e do ambiente cultural e social de que as rodearam. Numa palavra: são estas as mulheres que queremos?

É certo que o modelo tai-tai (mulheres casadas com um marido rico, viciadas em compras e beauty care) tem grande projecção em Hong Kong e por extensão em Macau. Mas estas senhoras têm, em geral, muito pouca educação e são, afinal, gozadas um pouco por toda a sociedade que lhes reconhece os ultrajantes tiques de futilidade. As tai-tai, sobre as quais existem dezenas de anedotas, não deveriam ser invejadas, mas constituir um modelo daquilo que as raparigas de hoje não querem ser. Não é que eu considere que o trabalho dá dignidade, mas a independência sim e ser dependente de um outro ser humano, nomeadamente do ponto de vista financeiro é, no mínimo, confrangedor.

Não chega por isso utilizar o modelo tai-tai para explicar as respostas das moças de Macau. Existe, isso sim, aqui um culto da preguiça e do dolce far niente que este regime casinodependente tem vindo a reforçar. As consequências não tardam em chegar. Elas são profundas, são mentais, duram gerações. Se o governo não implementar políticas de dignificação do ser humano em breve terá nos seus braços uma sociedade de inúteis e atrasados mentais. Desde o tempo dos portugueses que venho avisando neste sentido, agora o resultado começa a estar à vista.

Ó raparigas do meu bairro! Vamos lá a ter outro tipo de atitude! Deixem lá os cornos do gajo e agarrem os da vida! No fim, no finzinho, garanto que vale a pena. Se a vossa alma não for pequena. Se for, OK; regridam que daí não virá um mal especial ao mundo.

2 Jul 2023

Plume

Há sempre aqueles que parecem de vento e são artífices laboriosos da transparência. Este extremo refinamento é talvez a mais conseguida capacidade humana para uma transfiguração, que este saber em dimensões aperfeiçoadas, pode passar incólume aos pesados seres das sombras por causa de toda uma sujeição que elas imprimem.
Claro! Estamos num mundo pouco depurado, e não se sabe bem porquê, agora que as tecnologias permitiram avanços prodigiosos nessa matéria, também vieram com ela os pesos mais agrestes da nossa truculenta condição: a inteligência pode vir a ser artificial, que o ser natural é concreto demais para ser já às portas de um futuro breve, contemplado. Essa leveza que faz o cérebro fazer as melhores ligações, possuem-nos alguns poetas como ninguém, e também será por isso que lhes testemunhamos semblantes esguios e finos como se fossem catedrais. Revisamos as suas anatomias! Por incrível que pareça, há ali elementos de éter puro.
Henri Michaux. Se há beleza, que o vento a traga, sinalize a forma, e seja ” lointain intérieur” que a lonjura a que nos mantém destila pródiga maravilha. Essa lonjura será ainda um propósito severamente poético ( que para proximidade temos os narradores, e a descritiva composição, que não sendo artificial inteligência, deve ser considerada por vezes aberrante função naturalista). E a voluptuosidade também deverá esconder-se de vergonha ensimesmada perante a mais impressionante construção de beleza “gasosa” deste outro instante a que passamos a chamar, poema

Le Malheur, mon grand labourer,
Le Malheur, assois-toi,
Repose-toi,
Reposons-nous un peut toi et moi,
Tu me trouves, tu m´éprouves, tu me le
prouves.
Je suis ta ruine.

Mon grand théâtre, mon havre, mon âtre,
Ma cave d´or,
…………
Dans ta lumière, dans ton ampleur, dans mon horreur,
Je m´abandonne.

Não há muito a dizer acerca deste magnífico poema oxigénio que se respira mas que não se vê. Nós deciframos os signos linguísticos, damos reformulações aos enxames de associações comparativas…mas chega o vento, e perante o domínio do leve, calamos. Creio que interrompemos estes seres para que se escutasse o defeito generalista, e isso abriu feridas gigantescas, grotescas, no domínio da linguagem, que deve sempre servir para muito mais do que debitar ideias e estados sensoriais. Em última instância, poder-se-ia concluir que não tarda, seremos traduzidos até para esferas telepáticas, outras linguagens, portanto. Devemos somente, e doravante, dizer como Michaux aqui, o que descobrimos, que isso será futuramente o maior dom saído da palavra ” on veut trop être quelqu´un. Il n´est pas un moi… MOi n´est qu´une position d´équilibre”
Se formos para a sua obra gráfica, vamos ainda olhar para o desenho do vento, e não dissociamos as linguagens que formam um acordo onde tudo se lê, contempla, e ganha dimensão estranha e espacial. Olhamos a sustentabilidade de uma impressão que nunca se fixa, como a chuva e a sombra, e quando contempladas nos parecem diáfano nos seus impressionantes efeitos ideográficos. O autor de « Um bárbaro na Ásia» deseja o que a este lhe fascina, saber como pode penetrar na sua espiritualidade. Que ele de facto não quer descrever coisa nenhuma em termos factuais, romanceiros: é um poeta, e quer a rota daquilo que a sua natureza impele para o símbolo. Nunca deixou de percorrer os « Paraísos Artificiais» mas ao invés de um Baudelaire, vai bastante mais longe. Se a alucinação for tudo isto, então quem se deve sentir alucinado são aqueles que não sabem afinal de contas aquilo de que um cérebro é capaz. Escrever e desenhar o vento.

28 Jun 2023

Os métodos da Cathay Pacific Airways (I)

A Cathay Pacific Airways teve problemas recentemente. Foi anunciado que um piloto tinha conduzido o avião na pista lentamente e logo a seguir ocorreu o incidente do cobertor relacionado com os assistentes de bordo, o que deixou a administração em maus lençóis. A condução lenta leva a empresa a pagar mais aos pilotos, visto que são pagos à hora, e provoca uma demora na chegada dos passageiros aos seus destinos, prejudicando a empresa e aqueles que viajam. Os assistentes de bordo lidam directamente com os passageiros e se existir algum problema que os deixe insatisfeitos, a imagem da Cathay Pacific Airways será afectada. O piloto é responsável pela segurança do voo e o assistente de bordo pelo trabalho de cabine e ambos prestam serviços aos passageiros. Portanto, se quer uns quer outros prejudicarem de alguma forma os passageiros isso vai reflectir-se na venda de bilhetes e nas receitas da Cathay Pacific Airways. Provavelmente, para tentar manter as suas receitas, a Cathay Pacific poderá tratar os dois incidentes como um só. Desta forma não só concentra os problemas, como também fará com que as pessoas sintam que a administração da empresa dá importância à situação, o que vai melhorar ainda mais a sua imagem.

Estes incidentes de condução lenta nas pistas ocorrem porque o salário dos pilotos é calculado com base nas horas de voo efectuadas. Ao prolongar o tempo da viagem os pilotos recebem mais. Por isso vemos por vezes na comunicação social a seguinte frase: “Se andarmos mais depressa reduzimos o nosso salário, então porque é que havemos de o fazer?”

A Cathay Pacific Airways declarou que não vai responsabilizar criminalmente os pilotos pela condução lenta, mas lembrou que este procedimento pode conduzir a um processo disciplinar. Recentemente, as medidas actualizadas que se aplicam a esta situação foram finalmente publicadas na comunicação social. A Cathay Pacific vai optimizar o método de cálculo do salário dos pilotos. Estes salários têm três componentes: o salário base, subsídios e horas de voo. Em 2023, a Cathay Pacific Airways aumentou o vencimento base dos pilotos em 3.3por cento. Além disso, a empresa vai comparar as horas de voo estimadas com as horas de voo efectuadas e usará o valor mais elevado para calcular o pagamento. Em resumo, os pilotos vão beneficiar com esta medida. Uma vez que o novo regime implica a actualização dos sistemas informáticos, estas medidas só vão ser implementadas só no próximo mês de Outubro.

Por estas medidas, podemos ver que a Cathay Pacific planeia solucionar o problema da condução lenta aumentando o salário dos pilotos. Mas se este aumento salarial não for o que os pilotos estão à espera, como é que se vai resolver o problema?

O Governo de Hong Kong aplicou 19.5 mil milhões de dólares de Hong Kong em acções preferenciais da Cathay Pacific Airways em Junho de 2020, e adiantou 7.8 mil milhões em empréstimos provisórios. Esta divida colocou pressão nas finanças da Cathay Pacific o que lhe torna impossível aumentar os salários dos pilotos a curto prazo.

Por motivos de gestão, por vezes, as empresas exigem que os directores comprem acções, ou então oferecem-nas. Como atrás foi dito, quando as empresas geram lucros distribuem os dividendos consoante o número de acções vendidas. Quem possuir mais acções recebe mais dividendos. Se os directores possuirem acções da empresa, quando existem lucros, para além dos seus salários recebem os dividendos. A estratégia não só permite que quando estes executivos tomam decisões considerem os interesses da empresa como seus, mas também permite que recebam dividendos. A prática de alinhamento de interesses torna a política anual de bónus mais flexível, o que beneficia o funcionamento da empresa. Li Ka-shing, magnata de Hong Kong que fundou a Enterprise Holdings Co., Ltd., recebeu apenas um salário anual de 5.000 dólares durante 46 anos enquanto director da empresa. Quando a economia de Hong Kong estava em recessão, um jornalista perguntou-lhe se ele ia reduzir o seu salário e Li Ka-shing respondeu: “Eu só tenho um salário anual de 5.000 dólares, como é que posso reduzi-lo?” Mas por causa das acções que detinha, Li Ka-shing recebia milhares de milhões de dólares em dividendos. Li Ka-shing afirmou que esta abordagem protegia os interesses da empresa, dos directores e dos accionistas.

A Cathay Pacific Airways está actualmente a passar um mau período. Agora que já vendeu acções ao Governo será que pode considerar vendê-las também aos pilotos? Ou mesmo doá-las? Uma vez que detenham acções, os pilotos para além de empregados da empresa passam também a ser accionistas. Quando a empresa tem lucros, os accionistas recebem naturalmente os seus dividendos. Mesmo que o piloto pense que o seu salário está abaixo dos padrões do mercado, depois de receber os dividendos vai pensar de outra forma. Com a melhoria da situação epidémica, a indústria da aviação vai gradualmente melhorar e os lucros da empresa vão certamente aumentar. Acredita-se que os dividendos a distribuir irão aumentar gradualmente.

Para a próxima semana vamos analisar a resposta da CathayPacificAirways ao incidente do cobertor.

27 Jun 2023

O povo não está cansado

Um amigo meu tem uma pequena fábrica de placas de contraplacados. Há dias, encontrámo-nos e a conversa percorreu vários continentes desde aquela loucura de irem ver os destroços do ‘Titanic’ a 3.800 metros de profundidade até às empregadas domésticas que cada vez são mais abusadas sexualmente para que possam obter um pecúlio extra dos patrões. No entanto, o principal da conversa situou-se na ideia peregrina que está em estudo nas hostes governamentais de se trabalhar apenas quatro dias por cada semana. O povo está cansado? Qual quê, qual carapuça. O meu amigo transmitiu-me que para o país andar para a frente, as fábricas e outras empresas até deviam trabalhar ao domingo. Aliás, algumas já o fazem, tal como hipermercados e centros comerciais. Antes, trabalhar aos domingos era um crime. Depois começaram a ficar de boca aberta ao verem as lojas dos chineses abertas ao domingo e agora uma grande parte de comerciantes já trabalham no “dia santo”…
O meu interlocutor explicou-me que a possível medida de trabalhar apenas quatro dias por semana, deve ser um caso para países ricos, muito desenvolvidos e que não tenham dívida externa. Se o pessoal começa a ter descanso três dias: sexta, sábado e domingo, a sua opinião é que o país regressa à bancarrota. Para alguns patrões trata-se da sorte grande porque ao parar tudo, a despesa da água e da luz diminui substancialmente. E os trabalhadores? Passam a receber o mesmo salário? Esses, estão muito enganados com o tri-descanso. O dia em que não trabalham será para dormir até ao meio-dia, depois têm de limpar a casa, pôr a roupa a lavar, passar a ferro, limpar os vidros e as varandas, cortar a relva, arranjar o jardim, lavar o carro e por aí adiante. Não haverá descanso nenhum, e irão trabalhar muito mais do que se estivessem no escritório ou na fábrica.
A medida dos quatro dias de trabalho por semana tem os seus apoiantes, mas também existe um grande número de trabalhadores que acha não haver qualquer vantagem. E alguns até já me salientaram: “É pá, mas o que é que eu estou a fazer em casa ou no café? A olhar para a televisão e a engordar com o sedentarismo ou no café a aturar bêbedos?”. A opinião varia. A medida poderá ser implementada, mas quer-nos parecer que ao fim de um ano tudo voltará ao princípio. O pessoal está habituado a um certo ritmo de vida e não está interessado em nenhum tipo de pasmaceira ou de trabalho caseiro de borla.
Para os que apoiam trabalhar só quatro dias por semana, segundo estatísticas confidenciais a que tivemos acesso, a maioria dos apoiantes tem dinheiro, é classe média alta. Pode pegar no carro com a cara-metade e passar três dias no ripanço numa praia ao longo da costa plantada. Mas, essa maioria tem um problema: se tiver filhos, já não haverá passeio para um turismo rural ou hotel de cinco estrelas porque a miudagem tem aulas à sexta-feira. Ou então, as escolas (professores, assistentes sociais, cozinheiros e funcionários da limpeza) também encerram porque só passam a abrir quatro dias por semana? Tudo isto, é muito confuso e perplexo. Não será fácil agradar a todos, como tudo na vida, mas o Governo terá de pensar muito bem, contactar patrões e comissões de trabalhadores antes de decidir pelo decreto. Não é fácil e sobre esta matéria muita água irá correr por baixo da ponte.
O que nós pensamos é que o país tem mais de dois milhões de cidadãos no limite da pobreza. Muitos desempregados, outros que fazem biscates durante todo o dia, outros dedicam-se à prostituição e ainda outros “inscrevem-se” nos gangues e a nessa vida fácil cometem um vasto número de crimes, que na maior parte das vezes, leva-os a ir ver o sol aos quadradinhos. Semana com quatro dias de trabalho? Hum… cheira-me que os pobres que trabalham (a maioria) não vão gostar da decisão e ainda vamos ter, pela primeira vez, uma manifestação sob o slogan “Somos pobres, queremos trabalhar!”. Uma verdade é certa: o povo não está cansado de trabalhar, o povo está é cansado de ganhar mal…

26 Jun 2023

Saúde mental

Num antigo livro chinês intitulado “Lie-Tzu” , podemos ler a seguinte história: Um homem perdeu o machado e suspeitou que o filho do vizinho o tinha roubado. Ficou a observar a forma como o rapaz andava – mesmo como um ladrão. Observava a expressão do rapaz – era a expressão de um ladrão. Observava o seu modo de falar –tal e qual como um ladrão. Resumidamente, todo o seu ser proclamava a culpa do roubo. Mas mais tarde, o homem encontrou o machado quando foi cavar a terra. E depois disso, os gestos e as atitudes do filho do vizinho deixaram de lhe parecer os de um ladrão.
Continuamos a encontrar este tipo de atitude nos nossos dias. Quando a suspeita, o sentimento de insegurança, o medo e o ódio tomam conta de uma pessoa, ela pode passar a agir como o homem do machado. Nos casos mais moderados, deixa de confiar nos outros, mas nos casos mais graves passa a ter comportamentos agressivos. Nos casos moderados, as vítimas sofrem de neurastenia, enquanto nos casos mais graves passam a sofrer de distúrbios do foro psiquiátrico. Estas perturbações mentais têm causas sociais, genéticas e hereditárias. A salvaguarda da saúde mental dos cidadãos e a prevenção de tragédias sociais é da responsabilidade de todos, mas sobretudo do Governo.
De acordo com a monitorização efectuada pelos Serviços de Saúde às causas de morte relacionadas com suicídio e registadas em Macau revelam que no primeiro trimestre deste ano foram cometidos 23 suicídios (16 do sexo masculino e 7 do sexo feminino), o que representa um aumento de 8 casos quando comparado com o trimestre anterior (Outubro a Dezembro de 2022). Se o leitor estiver a par das notícias, saberá que é provável que o número de suicídios volte a subir no segundo trimestre de 2023.
O aumento do número de turistas em Macau depois da pandemia não aliviou a atmosfera de depressão social. Basta ouvir o programa da manhã da rádio TDM para nos apercebermos da quantidade de desgostos e frustrações da população. Muitas das lojas localizadas nas zonas turísticas fecharam para sempre. A política de plena abertura à circulação dos veículos de Macau para o Interior da China via Posto Fronteiriço de Zhuhai da Ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau (adiante designada por “Circulação de veículos de Macau na província de Guangdong”) tem vantagens para os residentes de Macau, mas o negócio da restauração da zona Norte de Macau abrandou. Os representantes do sector manifestaram as suas preocupações na televisão e acredita-se que o Governo tenha reparado. No entanto, não se sabe ainda se o Governo vai reactivar o “Plano de Subsídio de Consumo” no segundo semestre de 2023, que se destinava a encorajar o consumo local dos residentes.
E, em vez de se focar na Revisão da Lei Eleitoral para o Chefe do Executivo e da Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau e na sua respectiva promoção, o Governo da RAEM devia concentrar os seus esforços para modernizar a sua capacidade administrativa e para melhorar a qualidade de vida dos residentes de Macau. As pessoas que estão emocionalmente perturbadas e que ligam para a Linha Aberta de aconselhamento psicológico da Cáritas de Macau ou para a Linha Aberta de 24 horas de Aconselhamento do Instituto de Acção Social podem ser ajudadas. Mas o que importa verdadeiramente é eliminar as causas que prejudicam a saúde mental da população de Macau.

Durante o último Dia do Pai, a polícia de Hong Kong reforçou as patrulhas nos maiores centros comerciais para evitar que voltassem a ocorrer actos de violência gratuita. Acredito também que o Governo da RAEHK não irá negligenciar a necessidade de dar mais importância às comunidades étnicas do Sul da Ásia que residem em Hong Kong e oferecer-lhes apoio. Embora a segurança nacional seja sem dúvida um assunto de grande importância, se a sociedade não estiver em paz e não se sentir segura, como é que a Nação poderá desfrutar de segurança?
Só as pessoas que adoecem precisam de medicação. Nenhum médico vai receitar quimioterapia para prevenir o cancro. Se desinfectarmos tudo à nossa volta só faremos com que as pessoas percam as suas respostas imunitárias. As questões de saúde mental podem levantar pequenos ou grandes problemas. Quando alguém tem um problema de foro psiquiátrico, o sofrimento recai sobre si e sobre os que o rodeiam. No entanto, quando a saúde mental de uma nação está comprometida, incidentes como o genocídio no Ruanda em 1994 podem voltar a acontecer, quando perto de um milhão de ruandeses foram brutalmente assassinados por compatriotas num genocídio liderado pelo Estado contra o grupo étnico Tutsi. Para restabelecer plenamente a normalidade social, o Governo não pode apostar apenas na economia, mas também no “amor e no perdão” entre os indivíduos.

25 Jun 2023

Campo de flores

Os grandes poetas amadureceram no tempo e tornaram-se iguais às lendas. Ao falarmos deles não o fazemos com a linguagem devida, isto porque ao aludirmos a debutantes costumes de poemáticos desfiles, nos iludimos também quando pronunciamos a mesma língua por eles trabalhada. Aqui falamos de Drummond de Andrade a quem a língua deve momentos verdadeiramente abençoados. Herdeiro do modernismo brasileiro que irrompeu com o verso livre e se dividiu em duas correntes, a primeira mais lírica, a segunda mais factual e concreta à qual aderiu Drummond; porém, pareceu não marcar território em nenhuma parte onde a poesia se quisesse explicar, formatar, alinhar. Pessoal ou socialmente «a poesia é incomunicável», definição que não deixará de seguir. No longo exercício da escrita, não esqueceu, como era apanágio da sua época e dos melhores, ser um elemento activo do Partido Comunista, mas era um poeta e isso nenhuma estrutura, poder, regime ou força, sabe ainda exactamente o que seja.
Este título alude a um poema que se insere inteiro na Primavera; porém, não são primaveras contadas, mas desfeitas em tempo e longos anos por onde os Invernos foram acontecendo, e não será demais lembrar que entre toda a beleza estilística da sua obra, ele é ainda de uma concentração de forças que nos prende e sustém como a mais bela lucidez da alma. É um poema não muito longo, que nos interpela e relembra do dom do merecimento: fala então no amor no tempo da madureza, nesse assombro que já não é esperado nem acontece de forma calculada. Por ser tão tarde, as coisas tornam-se diferentes, raras, exatas, como um último presente de Deus, ou quem sabe do Diabo, mas sem dúvida uma conquista recebida por méritos que a vida desejou consagrar.
Quando analisado em seus componentes estilísticos reconhecemos como a sua embarcação na vanguarda dos sonhos foi importante para produzir semelhante compreensão: ele fala do que tece a vida, e o poema vai com ela como se desfia-se o conteúdo da sua melhor essência; temo-lo intensamente poético, sem suor, lágrimas e vontades extemporâneas, seguindo a marcha quase profética do acontecimento que tinha de ser manifestado, que o tempo que já não ambunda, é agora proporcional ao espaçoso exercício de o poder contemplar sem a dúvida que outrora fora tão presente, sendo por isso mesmo imagem de terror convertida agora em jubilação perante a visão de muitos amores desgovernados que o tardio amor olha e sente como um (talvez) agradecimento para ter chegado até aqui.
Será certamente um campo de flores a análise de um poema tão contido, total, e ferozmente crepuscular, instado no tempo numa reflexão sobre o amor e sua jornada, mas que em nós se adentra como mistério, e para resolver a questão, o poeta alude ao justíssimo merecimento. E ele agradece em forma de poema esse inusitado amor que tudo clareia como um raio de lucidez e vida de quem não foi esquecido. Há reserva e humildade nesta conduta, e bom trato com forças antagónicas, o que supera em muito o que podemos achar que amor seja, que ele, é voltado então para os “mitos pretéritos onde acrescenta aos que amor já criou” que o amante se torna “o mito mais radioso/ e talhado e penumbra sou e não sou/ mas sou”.
São campos que não esperávamos saudar no tempo da Flor onde o poeta consegue dar a entender como são diferentes as Primaveras, ladrilhando suas mãos na terra fecunda de um momento diferente. Que o vigor deixado talvez seja agora a lembrança dos despojos que procura arrastar para fora do tempo, para aceitar a bela luz que baixa e o confunde. Pode bem ser um dos mais belos poemas em língua portuguesa, reconstruída em acordos, só que talhá-la vale tudo o que não acorde em nós o esquecimento de quem tão bem assim a trabalha, que a ironia dilacera a melhor doação, e por isso há que a amar e calar.

22 Jun 2023

Cópia judicial

Um caso extremamente raro ocorreu em Hong Kong a semana passada. Quando um juiz do Tribunal de Primeira Instância do Supremo Tribunal julgou um processo de responsabilidade civil, preencheu 98 por cento do acórdão escrito com as alegações do queixoso, o que constituiu o que é vulgarmente conhecido como “cópia judicial”.

Depois da comunicação social ter noticiado o caso, surgiram várias opiniões na sociedade de Hong Kong. De um modo geral, levantaram-se dúvidas quanto ao veredicto.

Este caso envolve o produto Huang Dao Yi Huo Luo Oil, muito conhecido em Hong Kong. O queixoso, entrou com uma acção por violação de marca registada. Em Abril de 2014, o tribunal proferiu uma sentença escrita a seu favor. O réu recorreu ao Tribunal de Recurso, alegando que tinha havido “cópia judicial”, ganhou o recurso e o processo foi enviado ao Tribunal de Primeira Instância para novo julgamento.

O Presidente do Tribunal de Última Instância, Zhang Juneng, afirmou que a cópia judicial tinha causado injustiças a ambas as partes do litígio e que tinha afectado a confiança do público no poder judicial, o que é inaceitável. Por isso, emitiu um sério aviso juiz competente sobre o incidente.

No sistema jurídico de Hong Kong, o Tribunal de Primeira Instância, o Tribunal de Recurso e o Tribunal de Última Instância são todos tribunais superiores que devem proferir acórdãos escritos após a apreciação dos processos. Esta abordagem não só permite ao tribunal esclarecer os argumentos da sentença escrita, mas também permite que tanto o queixoso como o réu conheçam o ponto de vista jurídico do juiz e ajuda-os a decidir se devem ou não recorrer da sentença. Também ajuda os estudantes de Direito a conhecerem melhor a lei. De acordo com a Lei Básica de Hong Kong, a cidade pode implementar o sistema jurídico da common law (direito consuetudinário), cuja essência é a jurisprudência. A jurisprudência faz parte do direito de Hong Kong. Trata-se de um princípio jurídico formulado por um juiz quando confrontado com um processo. Além de resolver o litígio entre o queixoso e o réu no caso presente, este princípio será igualmente aplicável a casos semelhantes no futuro, pelo que este método resulta num desenvolvimento da lei. Por conseguinte, a sentença escrita é muito importante. A Lei Básica de Hong Kong estipula ainda que, ao julgar um caso, os tribunais de Hong Kong podem referir-se a precedentes de outros países ou regiões que implementam este sistema jurídico. Esta disposição sublinha a importância das sentenças escritas no sistema de direito consuetudinário.

Depois de o tribunal apreciar o processo, precisa escrever uma sentença, que frequentemente cita o queixoso e o réu para demonstrar que o juiz analisou os argumentos de ambas as partes. Portanto, não é surpreendente que as alegações do queixoso e do réu sejam citadas na sentença escrita. No entanto, neste caso, 98 por cento do conteúdo da sentença escrita era preenchido com as alegações do queixoso, o que, de facto, é relativamente raro. É a primeira vez desde que Hong Kong regressou à soberania chinesa, que se ouviu falar de um tal caso.

Redigir uma sentença é importante, mas se uma tarefa tão importante é completada citando um grande número de palavras do queixoso vai inevitavelmente suscitar dúvidas em ambos os lados do processo. Naturalmente, o que mais preocupa as partes é a forma como o juiz tira conclusões a partir de diferentes pontos de vista jurídicos e toma a sua decisão. Um grande número de citações de uma parte no processo pode facilmente fazer com que a outra parte duvide se o juiz estudou cuidadosamente os seus próprios argumentos e, portanto, recorra com este fundamento. Do ponto de vista do público, a função dos juízes é apreciar os processos e as sentenças escritas exprimem os resultados da análise jurídica. É mais difícil mostrar ao público o processo dos juízes que analisam as leis e produzem sentenças escritas, afectando assim a sua confiança na justiça judicial.

É claro que também precisamos considerar a questão do ponto de vista do juiz. Em qualquer sociedade, o número de juízes é pequeno e não pode haver muitos mais. Os incidentes sociais de 2018 exigiram que a polícia realizasse investigações aprofundadas em muitos casos, e, por conseguinte, os tribunais tinham um grande número de processos pendentes de julgamento. Os juízes precisam de muito tempo para preparar os processos com antecedência, mas a acumulação de processos em atraso e os prazos apertados exercem, sem dúvida, uma forte pressão sobre os magistrados. No sistema de common law, os advogados são eloquentes e os argumentos e opiniões jurídicas baseados no comportamento das pessoas são muitas vezes estranhos e complicados. Se o juiz não passar por uma reflexão e análise aprofundadas, não pode pronunciar-se sobre o caso. É por isso que vemos frequentemente o tribunal adiar o julgamento depois de ouvir as declarações de ambas as partes. Num julgamento, não importa se o juiz concorda com as opiniões do queixoso ou do réu, ao redigir a sentença, deve usar suas próprias palavras para expressar e analisar as opiniões jurídicas de ambas as partes, o que é uma tarefa muito difícil. É realmente muito complicado para os juízes correrem contra o tempo e concluírem rapidamente o seu trabalho sob pressão, quando a situação que exige muita reflexão.

Esta “cópia judicial”, para além de abrir portas a um recurso, também desencadeou muita controvérsia pública. Se circunstâncias semelhantes surgirem noutros casos, tal constituirá muito provavelmente um motivo para recurso para ambas as partes. Com base no julgamento deste caso, outros casos semelhantes têm maior probabilidade de serem reencaminhados para novo julgamento.

O Presidente do Supremo alertou o juiz competente para evitar este comportamento de forma a impedir que situações semelhantes voltem a acontecer. A longo prazo, o poder judicial pode ponderar a necessidade de rever o Código de Conduta dos Juízes, e identificar a “cópia judicial” como uma acção a que os juízes devem estar atentos. Acredita-se que esta alteração pode aumentar a confiança do público e de ambas as partes em litígio no sistema jurídico de Hong Kong. Além disso, uma vez que ainda existe uma grande acumulação de processos penais, o poder judicial pode considerar a possibilidade de aumentar o número de juízes-adjuntos, a fim de julgar o número de processos em atraso o mais rapidamente possível. Desta forma, o juiz pode ter mais tempo para preparar e redigir a sentença, o que pode evitar a recorrência da cópia judicial.

20 Jun 2023

Seis meses de inquérito à TAP

Seis meses, meus amigos. Seis meses de inquirições na Comissão Parlamentar de Inquérito à TAP. Aproximadamente 60 sessões de audições das mais variadas personalidades que terminaram na passada sexta-feira. Podemos concluir que se tratou de uma maratona parlamentar repleta de confusões, mentiras, deturpações, corrupção, desvios do tema principal, confrontos partidários, inquiridos a deturparem factos verdadeiros. Um sumário de assuntos que deveriam ser apenas relacionados com a TAP e assistimos a dada altura à ocupação das inquirições a um escândalo de um adjunto do ministro João Galamba que foi demitido após a chefe de Gabinete do ministro Galamba que recebeu ordens governamentais para contactar o SIS (Secretas), a fim de reter o computador de trabalho do referido adjunto ministerial ao bom estilo da antiga PIDE/DGS, quando se tratava de um assunto unicamente relacionado com a Polícia Judiciária. Este tema deu água pela barba e o povo acabou por ficar sem qualquer confiança nos SIS, por esta instituição não estar provida estatutariamente de qualquer acção do foro policial ou judicial.

A Comissão Parlamentar de Inquérito à TAP abordou ao longo dos seis meses os mais diferentes acontecimentos relacionados com a TAP, tais como privatização da empresa, nacionalização, indemnizações absurdas e investimento estatal de mais de três mil milhões na empresa num total desrespeito pelo dinheiro dos portugueses. A dada altura, o tema principal foi verdadeiramente ligado às indemnizações ilógicas e ilegais, como os 55 milhões a um fulano que era accionista da empresa enquanto privada, 500 mil euros à engenheira Alexandra Reis e apenas porque a CEO francesa da TAP entrou em discordância com a administradora portuguesa. A mesma Alexandra Reis haveria passado pouco tempo de ingressar como presidente da NAV, uma empresa igualmente pública e da área da aviação civil e logo de seguida “roubada” à tutela do Ministério das Infraestruturas para o Ministério das Finanças, por sinal, ministérios tutelados por dois rivais políticos, Fernando Medina e Pedro Nuno Santos. As audições conseguiram ser tão maçadoras e nada esclarecedoras que o país inteiro estava desejoso que terminasse o desiderato indicado.

As contradições e mentiras foram de tal ordem que podemos adiantar que a pior presença na sala de audições foi a do actual ministro das Infraestruturas, João Galamba, que simplesmente demonstrou incompetência, má preparação para a inquirição mentindo sobre factos que já estavam provados e a melhor presença foi efectivamente a de Pedro Nuno Santos, ex-ministro das Infraestruturas e Habitação que haveria de se demitir devido ao caso relacionado com Alexandra Reis. Pedro Nuno Santos mostrou ser um “lobo” político que se iniciou nestas andanças aos 14 anos de idade e que se apresentou aos deputados bem preparado, com seriedade, assumindo os erros cometidos e as responsabilidades que lhe coubera. É na verdade, o grande candidato a ser o futuro líder do Partido socialista.

As audições para as pessoas mais distraídas tiveram um número surpreendente de presenças que nos deixa perplexos ao imaginarmos as incongruências que ali foram ditadas. Para que tenham uma ideia real do que teria acontecido foram ouvidos pela Comissão algumas personalidades tais como: Eugénia Correia, chefe de Gabinete do ministro João Galamba; presidente da Comissão de Vencimentos da TAP; Fernando Pinto, ex-presidente executivo da TAP; Sindicato dos Técnicos de Manutenção de Aeronaves (SITEMA); Sindicato Independente de Pilotos de Linhas Aéreas (SIPLA); Sindicato dos Aeroportos de Manutenção e Aviação (STAMA); Plataforma de Sindicatos de Terra do Grupo TAP; Cristina Carrilho, coordenadora da Comissão de Trabalhadores da TAP; Tiago Faria Lopes; Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil (SPAC); Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Aviação Civil (SINTAC); Paulo Duarte, dirigente do Sindicato dos Trabalhadores da Aviação e Aeroportos (SITAVA); Ricardo Penarróias, dirigente do Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC); Mário Lobo, Parpública; Carlos Durães de Conceição, Parpública; José Gato, Direção Geral do Tesouro e Finanças; Maria João Araújo, Direção Geral do Tesouro e Finanças; Representante da Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados responsável pela representação de Alexandra Reis nas negociações com a TAP; César Sá Esteves, jurista da SRS Advogados; António Manuel Ferreira dos Santos, Inspector-geral da Inspeção-Geral de Finanças; Manuel Teixeira Rolo, ex-Presidente do Conselho de Administração da NAV; Jaime Serrão Andrez, presidente da Parpública; Luís Ribeiro, ex-presidente da ANAC; José Luís Arnaut, presidente do conselho de administração da ANA; Violeta Bulc, comissária Europeia que avalizou a privatização da TAP em 2015; Margrethe Vestager, comissária Europeia que tratou da reestruturação da TAP; Sérgio Monteiro, secretário de Estado das Infraestruturas, Transportes e Comunicações entre 2011 e 2015; António Pires de Lima, ministro da Economia entre 2013 e 2015; Pedro Marques, ministro das Infraestruturas entre 2015 e 2019; Luís Laginha de Sousa, presidente da CMVM; Responsáveis da DGComp com o acompanhamento do plano de reestruturação da TAP; Carlos Elavai, Managing Director e Partner da BCG; Auditores da TAP (PWC); Maria de Fátima Castanheira Cortês Geada, ex-Presidente do Conselho Fiscal da TAP; Luís Manuel Martins, Comissão Vencimentos TAP; Responsável pelo departamento jurídico da TAP na ausência de Stéphanie Sá Silva; Stéphanie Sá Silva, ex-diretora jurídica da TAP; Abílio Martins, ex-vice presidente do Marketing and Sales, da TAP; João Weber Gameiro, ex-administrador financeiro da TAP; António Macedo Vitorino, presidente da Assembleia Geral da TAP; David Neeleman, ex-accionista e administrador da TAP; Diogo Lacerda Machado, ex-Administrador Não-Executivo da TAP; Miguel Frasquilho, ex-presidente do conselho de administração da TAP; Rafael Quintas, ex-administrador financeiro da TAP; Antonoaldo Neves, Ex-CEO da TAP; Ramiro Sequeira, ex-CEO e atual Chief Operating Officer da TAP; Humberto Pedrosa, ex-accionista e administrador da TAP; Gonçalo Pires, administrador financeiro da TAP; Manuel Beja, presidente do conselho de administração da TAP; Christine Ourmières-Widener, CEO da TAP; Alexandra Reis, ex-administradora executiva da TAP, ex-Presidente do CA da NAV e ex-Secretária de Estado do Tesouro; João Galamba, ministro das Infraestruturas; Maria Antónia Barbosa de Araújo, ex-chefe do Gabinete do Ministro das Infraestruturas e da Habitação e actual chefe do Gabinete do Secretário de Estado das Infraestruturas; Hugo Santos Mendes, ex-secretário de Estado das Infraestruturas; João Nunes Mendes, ex-secretário de Estado das Finanças de João Leão e ex-secretário de Estado do Tesouro de Fernando Medina; Miguel Cruz, ex-secretário de Estado do Tesouro; Mário Centeno, ex-ministro das Finanças; João Leão, ex-ministro das Finanças; Pedro Nuno Santos, ex-ministro das Infraestruturas e da Habitação (período 2019 e 2023) e Fernando Medina, ministro das Finanças. É inacreditável e fantástico. Tanta personalidade ouvida, e ao fim e ao cabo, as contradições foram tantas que ninguém entendeu nada de nada.

19 Jun 2023