Fogos provam que drones e kamov são fiasco

Todos os anos é a mesma coisa. Chega o Verão e com ele o calor que ajuda a propagar grandes incêndios nas florestas portuguesas. Com uma agravante: os maníacos que pegam fogo às matas, ao ponto de este ano as autoridades policiais terem detectado um ex-bombeiro que já tinha ateado 40 fogos. Desta feita as populações de Castro Marim, Tavira e Ourique estiveram com as chamas a provocar-lhes o pânico. O incêndio de Castro Marim foi considerado o maior do ano até aos dias de hoje. As chamas feriram populares e bombeiros, destruíram casas, armazéns, reservas de animais e veículos ligeiros e agrícolas. Um prejuízo enorme que nunca tem compensação estatal. Está confirmado que a maioria dos incêndios é fogo posto. Uma bandidagem maníaca que grassa no nosso país que não tem vergonha em enfrentar o sistema de videovigilância instalado pelas florestas. Servem mais para detectar o início dos fogos.

Um início de fogos que devia ser anunciado através das imagens de um conjunto de drones que foi adquirido para a Força Aérea e que redundou num autêntico fiasco. Tal como os polémicos helicópteros Kamov que em 2006 custaram ao Estado 50,9 milhões de euros e que estão abandonados, os 12 drones adquiridos pela Força Aérea no ano passado custaram 4,5 milhões de euros e não têm tido utilidade alguma. Aliás, a queda de um destes aparelhos há uma semana fez com que a Força Aérea suspendesse todos os voos de drones das missões de vigilância florestal e detecção de incêndios. 12 drones para nada. Ai, Portugal, como é isto tudo possível? Não há dinheiro para se aumentar o salário mínimo nacional, para aumentar as reformas de miséria, para construir casas para pobres, mas gastam-se milhões de euros que no final atiram-se para o lixo. Isto, chegou ao ponto de Emanuel Oliveira, o consultor para organismos do Estado na área dos Riscos Naturais e dos Incêndios Florestais, ter afirmado à imprensa, surpreendentemente, “Creio que os drones pouco adiantam nos incêndios florestais. Hoje, com simuladores podemos fazer o mesmo. Ajudam tal como o sistema de videovigilância. Servem mais para apoiar a tomada de decisão em situações críticas. Não vejo que sejam muitos úteis”. E o consultor ainda lembrou que esta é a segunda vez que a Força Aérea suspende o voo dos drones no combate aos incêndios por terem sido registados quatro incidentes desde o Verão passado. E os 4,5 milhões de euros gastos na aquisição dos drones que têm sido um fiasco não foram alvo de um estudo profundo ou de uma consulta generalizada a vários especialistas antes de se gastar o dinheiro? E onde estão os responsáveis que só agora concluem que os drones não servem para nada e suspendem os seus voos? O que terá a dizer sobre esta vergonha no seio do orçamento estatal o chefe do Estado-Maior das Forças Armadas? Nada? Que se esqueça o assunto para as calendas? A verdade é que os incêndios estão a destruir as nossas florestas e nem drones nem helicópteros que custaram uma fortuna podem valer à tragédia. Inacreditavelmente, os seis helicópteros Kamov estão parados e continuarão assim. É um problema que se arrasta há anos sem existirem culpados. Este assunto insere variadíssimos problemas, incluindo com a Heliportugal, empresa que intermediou a venda dos Kamov, e onde as divergências subsistem sobre a contratação e a manutenção. Quem adquiriu os Kamov foi o Ministério da Administração Interna e ninguém tomou conhecimento que se tratavam de aparelhos muito pesados, que não servem para o terreno montanhoso português e que não servem para actuar em equipa. Não, apenas o que interessou foi comprar, gastar e certamente alguém receber a respectiva comissão pecuniária. Para o combate aos incêndios em Portugal, disse um especialista ao Hoje Macau, que “devem ser usados helicópteros de tamanho médio e ligeiros que têm outro tipo de respostas”. Entretanto, o país vai ardendo na floresta e nos cofres do Estado…

 

PS – Sem se saber onde começa a desconhecida Fundação Casa de Macau e onde acaba a Casa de Macau em Portugal propriamente dita, a Direcção da Casa de Macau, em Portugal, perdeu uma excelente oportunidade de estar calada. Enviou ao jornal um “Direito de Resposta”, sem qualquer fundamento. Um direito de resposta só tem direito a existir se for para contestar algo de inverdadeiro ou ofensivo que tenha sido publicado. A Direcção da Casa de Macau, em Portugal, iniciou a sua missiva inserindo que [Face à publicação recente de um artigo de opinião no jornal “Hoje Macau”, onde são apresentadas alegações infundadas e factos que não correspondem à verdade…]. Alegações infundadas e factos que não correspondem à verdade? Nada está referido no “direito de resposta” que demonstre ao leitor que o autor do artigo de opinião sobre a Casa de Macau, em Portugal, tivesse apresentado alegações infundadas ou factos que não correspondem à verdade. Pelo contrário, é a própria Direcção da Casa de Macau que confirma que o edifício está e tem estado encerrado, que está a precisar de obras de manutenção e nem refere quaisquer iniciativas culturais que tenha desenvolvido nos últimos anos ou convites a macaenses residentes em Portugal e a cidadãos que viveram em Macau no sentido de serem sócios. O autor do artigo de opinião sentiu-se ofendido pelo “direito de resposta” emitido pela Direcção da Casa de Macau, em Portugal, por esta ter denegrido a sua dignidade, ao redigir “factos que não correspondem à verdade”.
Este assunto só teve um lado positivo: a honra que é colaborar para um jornal tão importante que é lido em todo o mundo, especialmente em Portugal.

23 Ago 2021

Emergência climática

O “Painel Intergovernamental sobre Alterações Climáticas” (IPCC sigla em inglês), organismo das Nações Unidas, publicou recentemente um relatório onde se afirma que o mundo actual enfrenta efeitos adversos provocados pelo aquecimento global. O gelo do oceano Ártico está a derreter e o nível das águas está a subir, desencadeando alterações climáticas muito acentuadas. A Direcção dos Serviços Meteorológicos e Geofísicos de Macau já tinha alertado para a possibilidade de mudanças climáticas radicais em 2021, esperando que os residentes se pudessem preparar com a devida antecedência. As chuvas intensas e as inundações na China, na Índia e na Indonésia verificadas nos últimos dias, bem como as temperaturas anormalmente elevadas e os fogos ocorridos na Europa e nos Estados demonstram que se a humanidade não enfrentar com seriedade a emergência climática, investigando a fundo as causas que a provocam, o planeta pode vir a enfrentar uma calamidade.

No entanto, as alterações políticas radicais são tão destrutivas quanto as alterações climáticas.
Nos últimos dias, pudemos assistir nos noticiários às mudanças radicais em curso no Afeganistão. Milhares de pessoas desesperadas precipitaram-se para o Aeroporto de Cabul, logo após os talibãs terem assumido o controlo do país. Imagens de vídeo mostraram várias pessoas a correr na pista de deslocagem e a treparem para entrar num avião da Força Aérea dos Estados Unidos. Alguns caíram quando o avião levantou voo e morreram. Qualquer pessoa com um mínimo de empatia com o próximo não quer assistir a desgraças como esta. A pergunta que agora se impõe, é se alguém vai pôr termo a esta situação? Será que algum dia se tentaram evitar as situações dramáticas que recorrentemente se registaram ao longo da História?

O número de pessoas que morre no mundo devido a conflitos políticos não é seguramente inferior ao número das que morrem devido às alterações climáticas e à covid-19.

Proteger o ambiente e promover a ecologia são medidas cruciais para combater as alterações climáticas extremas. Da mesma forma, é necessário manter a paz e a estabilidade nas sociedades e assegurar uma política ecológica equilibrada a todos os níveis.

No início de Junho, Hong Kong e Macau sofreram anomalias climáticas e políticas. Em termos climáticos, embora não tenhamos assistido à passagem de nenhum super tufão, ambas as regiões emitiram sinal de chuva intensa preto em diversas ocasiões, tendo acontecido as inevitáveis inundações. O surto de covid-19 verificado em Macau desencadeou mais um golpe na já fragilizada economia da cidade. Todos os residentes vivenciaram uma experiência inesquecível: a testagem universal ao ácido nucleico. Por outro lado, o excelente desempenho dos atletas de Hong Kong nas Olimpíadas de Tóquio não fez esquecer o impacto provocado pelas alterações legislativas. Mais de 90.000 residentes de Hong Kong emigraram, o que não é um bom indicador sobre a satisfação da população. Com a implementação do novo sistema eleitoral de Hong Kong e o episódio da desclassificação de candidatos à Assembleia Legislativa de Macau, é inevitável que a afluência às urnas, quer em Hong Kong quer em Macau, seja menor do que nas eleições anteriores.

Para criar uma atmosfera de harmonia social, não podemos banir, mas sim dialogar e comunicar. Nem todos os residentes de Hong Kong concordam com os pontos de vista e com as acções do jornal Apple Daily, do Sindicato dos Professores de Hong Kong, nem com a Frente dos Direitos Civis, mas estas instituições e organizações desapareceram num curto espaço de tempo devido à “Lei da República Popular da China de Salvaguarda da Segurança Nacional na Região Administrativa Especial de Hong Kong”. A súbita supressão destas instituições resultou de medidas um pouco excessivas, e também algo prejudiciais para a reconciliação social. Com a entrada no séc. XXI, os frutos nascidos dos esforços pelas reformas e pela abertura que a China fez nos últimos 50 anos não devem ser destruídos pelos métodos que foram empregues nas sessões de luta durante a Revolução Cultural.

Sinto falto do caracter chinês “和” (paz/harmonia) que aparecia nos Jogos Olímpicos de Pequim em 2008. Só quando as pessoas agem de uma forma “平和” (moderada) , “和平” (a paz) emerge em condições climáticas adversas.

Será que o caracter “和” (paz/harmonia) também irá aparecer nos próximos Jogos Olímpicos de Inverno de Pequim? Ou será afectado por condições climáticas muito severas? Não sou profeta, mas sim uma pessoa que anseia pela paz e que está determinada a trabalhar arduamente para a alcançar.

20 Ago 2021

Direito de resposta da Casa de Macau em Lisboa

Face à publicação recente de um artigo de opinião no jornal “Hoje Macau”, onde são apresentadas alegações infundadas e factos que não correspondem à verdade, a Direcção da Casa de Macau em Portugal vem, por este meio, esclarecer publicamente o seguinte:

1. O imóvel sito na Av. Almirante Gago Coutinho, 142, em Lisboa, é propriedade da Fundação Casa de Macau. O referido espaço foi cedido à Casa de Macau para o desenvolvimento das suas actividades, através de um contrato de comodato a termo.

2. Muito embora o edifício reúna todas as condições e dignidade para o normal funcionamento da Casa de Macau, a Fundação Casa de Macau tem previstas obras de manutenção, nomeadamente a pintura do seu exterior, as quais não puderam ainda ser realizadas devido a contingências múltiplas, resultantes da presente Pandemia.

3. Fundada em 1966 e reconhecida pelo estado português com o estatuto de instituição de utilidade pública em 1988, a Casa de Macau tem-se pautado, ao longo dos seus 55 anos de existência, pela promoção activa da cultura macaense em Portugal. Naturalmente, face à presente crise sanitária, não tem sido possível realizar as inúmeras e habituais actividades presenciais, que serão retomadas assim que estejam garantidas as condições necessárias de segurança, para os seus associados, parceiros e visitantes.

4. A Casa de Macau é um espaço de encontro intergeracional, de reflexão e partilha, aberto a toda a comunidade macaense, não só de naturais de Macau, mas também de todos aqueles que vivem ou viveram em Macau, ou se interessam pela sua cultura e identidade.

5. As instalações da Casa de Macau estão encerradas durante o presente mês de Agosto, para férias do seu pessoal, reabrindo no dia 1 de Setembro. São todos bem vindos a visitar-nos após essa data!

Por último, a Direcção da Casa de Macau gostaria de saudar e agradecer a todos os seus associados e amigos, que nos últimos dias têm manifestado publicamente o seu apoio a esta que é a sua “Casa”, assim como pela defesa daqueles que são os interesses genuínos e maiores de Macau e da sua comunidade.

19 Ago 2021

Estado Olímpico

Foram quatro medalhas – quatro – as que assinalaram a mais brilhante participação nuns Jogos Olímpicos jamais registada na História de Portugal, como observaram, ufanas e impantes, as autoridades competentes. Ou talvez não tão competentes como isso: na realidade, foram raros os países da Europa a conseguir piores resultados em Tóquio 2020, ou 21, que no caso vai dar ao mesmo: São Marino só conseguiu três, Finlândia, Estónia, Letónia e Kosovo ficaram pelas duas (mas os dois primeiros casos são de excepção em relação aos resultados do passado), enquanto Lituânia, Moldávia e Macedónia só trouxeram do Japão uma medalha cada um. Já a Holanda, só para dar o exemplo de um país que nem sequer é exactamente uma potência do desporto mundial, tem menos de metade do tamanho de Portugal e menos do dobro da população (17 milhões de pessoas), conquistou nove vezes mais medalhas (36).

Não serão os atletas os responsáveis por estes fracos resultados: Pichardo, Mamona, Fonseca ou Pimenta – e as respectivas equipas técnicas, naturalmente – mostraram que é possível preparar, competir, disputar as vitórias uma a uma, conquistar provas de exigência máxima. O mesmo também se aplica, aliás, a quem não trouxe medalhas mas construiu durante anos o percurso para lá chegar, a superação das provas de qualificação, a persistência, a capacidade para conseguir um lugar nesses palcos que durante dias concentram os holofotes e os olhares de grande parte da população do planeta. Não foi nas suas provas, no salto mais ou menos conseguido, no lançamento mais ou menos perfeito, na aceleração mais ou menos perfeita, no golo que se marcou, deixou de marcar ou sofreu, que esteve o problema: o problema está onde sempre esteve e a história também nos mostra isso.

Na realidade, talvez a mera contagem de medalhas seja uma medida pouco justa do esforço que se vai fazendo para participar em competições desportivas – ou, de maneira mais abrangente – da qualidade das políticas desportivas que se implementam. Certamente que o tamanho conta e que países mais populosos têm mais chances de encontrar super-talentos que os representem, independentemente do que falta fazer, antes e depois: a captação, a organização, o treino, o enquadramento na sociedade, antes, durante e depois dos períodos em que desportistas das mais variadas modalidades se dedicam a práticas de “alto rendimento” ou de “alta competição”. Para medir a qualidade, a eficácia ou o sucesso dessas práticas, relativizar o número de medalhas pela população de cada país oferecerá certamente uma comparação mais precisa do que representam as políticas desportivas nacionais – ou pelo menos de como se manifestam na obtenção de resultados. E é aí que se demonstra categoricamente o desastre histórico que temos permanentemente vivido – e continuamos a viver – em Portugal.

Mesmo contando só com os Jogos Olímpicos de Verão, que os de Inverno são em geral pouco propícios a uma prática regular no sul da Europa, os resultados de Portugal são uma lástima. O mesmo país que enche avenidas com celebrações eufóricas para vitórias futeboleiras, exibe pelo mundo permanentes figuras tristes, que a história acaba por revelar implacavelmente. Com base em várias compilações publicadas, é possível verificar que Portugal conquistou até hoje uma medalha olímpica por cada 440 mil habitantes (actuais) do país. Deixando de fora países com menos de um milhão de habitantes (cuja posição nestas tabelas é demasiado sensível a mais uma ou menos uma medalha) atrás de nós, na Europa, só encontramos a Moldávia, a Sérvia, o Montenegro, o Kosovo e a Macedónia, São todos países que resultaram da divisão da Jugoslávia e da União Soviética e que por isso participaram em muito poucas edições dos Jogos. Caso se considerasse a média de medalhas conquistadas em cada participação olímpica, Portugal ocuparia um destacado último lugar. E a participação deste ano em Tóquio, orgulhosamente apresentada como a melhor da nossa história, não destoa de tudo o que se fez antes.

Estes dados mostram outros aspectos da geo-política desportiva internacional. Continuando a deixar de lado os países com menor população (menos de um milhão de habitantes), encontramos nos dez primeiros lugares da tabela classificativa das medalhas olímpicas por habitante a Finlândia, a Suécia, a Hungria, a Dinamarca, a Noruega, a Bulgária, a Jamaica, a Nova Zelândia, a Estónia, a Alemanha Oriental (ainda!) e a Suíça. Em geral, são países que conquistaram a maior parte das medalhas durante o período em que tiveram um estado socialista, ou de países que reconhecidamente promoveram estados de bem-estar dos mais avançados do planeta. E se no primeiro caso até podemos dizer que os resultados desportivos foram regularmente utilizados como formas de promoção política e ideológica dos regimes então dominantes, já no segundo caso o mesmo não se aplica: não há grandes sinais de que governos da Finlândia, Suécia, Dinamarca, Noruega, Nova Zelândia ou Suíça evoquem os respectivos sucessos desportivos para fazer qualquer tipo de auto-promoção internacional.

Outro exemplo, aliás, das diferenças nos resultados desportivos entre um Estado altamente interventivo e um estado de orientação liberal pode encontrar-se ao comparar a China com a Índia: embora a população chinesa seja apenas 5 por cento maior que a indiana, a China conquistou em Tóquio 88 medalhas, 12 vezes mais do que as 7 conquistadas pela Índia. É visível que os resultados das Olimpíadas não se dão muito bem com as mais radicais economias de mercado: mesmo os poderosos Estados Unidos, líderes absolutos e inequívocos na conquista de medalhas olímpicas, aparecem na 39.ª posição quando se calcula o número de medalhas por habitante (atrás de grande parte dos países do leste da Europa mas também da Grécia, da Bélgica ou de Cuba).

O que os Jogos Olímpicos nos vão lembrando, implacavelmente, é essa ausência de uma política desportiva que integre a prática desportiva enquanto componente básica da educação e da formação integral de cada pessoa com as práticas orientadas para a competição e o “alto rendimento”. No caso português, faz-se pouco, num e noutro campo.

E de quatro em quatro anos (ou cinco, como nos calhou desta vez), celebrarmos essas misérias profundas da sociedade que conseguimos até agora construir. Fazer de conta que as quatro medalhas que vieram de Tóquio constituem qualquer coisa de notável é dar mais um passo para aprofundar essa miséria.

18 Ago 2021

Revitalizar a economia

Devido ao aparecimento de quatro casos de infecção pelo novo coronavírus em Macau, a população foi toda testada. Felizmente os resultados foram todos negativos, indicando que o risco de um surto de COVID na cidade é extremamente baixo. São muito boas notícias. Agora, o principal motivo de preocupação é a economia .

Os quatro casos de Macau surgiram em simultâneo com outros registados em zonas vizinhas. Embora tenha sido um incidente isolado, não deixou de ser preocupante. Devido à possibilidade de disseminação do vírus, o Governo fechou a 5 de Agosto, cinemas, espaços de diversão, centros de jogos, salas de espectáculos, etc. Foram suspensas as actividades sociais e reforçado o controlo das fronteiras. Estas medidas são sem dúvida eficazes para a contenção da pandemia, mas não deixam de afectar o consumo.

Dados da Direcção dos Serviços de Estatística e Censos de Macau indicam que no primeiro trimestre de 2021, a cidade recebeu 1.738.428 turistas, ao passo que no mesmo período de 2020 esse número ascendia a 3.219170, representando uma queda de 46 por cento. De momento, os números do segundo trimestre ainda não foram publicados, mas, no cenário que vivemos, o número de turistas está longe de ser o ideal.

As pessoas estão em geral pessimistas em relação às perspectivas económicas, os sectores que dependem de uma grande afluência de clientes, como o jogo, o turismo, as convenções e exposições e o comércio e a restauração foram ainda mais afectados. Os residentes estão mais cautelosos com os gastos supérfulos. Quando colocadas perante a possibilidade de fazer uma aquisição de algo que não é estritamente necessário as pessoas não compram, o que vai certamente afectar o consumo. Para revitalizar a economia em Macau, podemos considerar vários aspectos.

Em primeiro lugar, manter a prática de 2020 e implementar uma segunda emissão de cartões de consumo. Em 2020, a fim de estimular a economia, o Governo fez duas emissões de cartões de consumo, beneficiando com sucesso residentes e comerciantes. O aparecimento destas quatro infecções ocorreu pela mesma altura em que no ano passado o Governo emitiu o segundo pacote de cartões de consumo e três meses após a emissão do primeiro.

Em 2021, o Governo planeia investir 6 mil milhões de patacas, para impulsionar um consumo de 8 mil milhões. Este modelo de estímulo económico, conhecido por 3 mais 1, será implementado na segunda metade deste ano. Para além de fortalecer o consumo doméstico, demonstra que o Governo está determinado a fortalecer a economia de Macau e também revela a sua confiança nas perspectivas económicas.

Em segundo lugar, o cartão electrónico é um novo modelo de promoção do consumo e vai ter um papel muito importante na Área da Grande Baía. Para que Macau se integre completamente neste grande projecto, o cartão de consumo é indispensável. Este ano, muitos comerciantes participaram activamente no plano de consumo electrónico, facultando descontos de forma a estimular o consumo. Se houver uma segunda emissão de cartões, esperamos que os comerciantes possam continuar a proporcionar descontos, de forma a que “os negócios se possam manter e os residentes possam ter benefícios”.

Por último, identificar e desmantelar as fraudes online e as compras incorrectas. Os dados do secretário para a Segurança indicam que houve 326 fraudes no primeiro trimestre de 2021, mais 61 do que em igual período do ano passado. Registaram-se 26 casos que envolviam investimentos, mais 18 do que em igual período do ano passado.

Houve ainda 31 fraudes relacionadas com compras online, um aumento de 17 sobre 2020, 8 envolvendo cheques falsos, mais 3 do que em 2020. O número de fraudes não só aumentou, como surgiram novos métodos a acrescentar aos que já existiam. Destaco um caso especial. Uma mulher comprou uma pulseira de marca online. Quando a recebeu, percebeu que não era a pulseira original. Na sequência desta compra, começou a receber constantemente comida em casa com a mensagem “paga imediatamente após a entrega.” Sentindo-se ameaçada, pediu ajuda à polícia.

As compras online reduzem os contactos pessoais e permitem evitar deslocações. Os dados acima indicados demonstram claramente que o ciber-crime está a aumentar. É fundamental reunir esforços para combater este tipo de criminalidade, de forma a que as pessoas tenham confiança para comprar online.

Numa situação de pandemia estamos todos vulneráveis. A revitalização da economia de Macau não pode depender apenas do plano de cartões electrónicos do Governo, nem dos descontos proporcionados pelos comerciantes. Só o aumento do consumo pode beneficiar a sociedade no seu todo.


Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Escola Superior de Ciências de Gestão/ Instituto Politécnico de Macau
Blog:http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog
Email: legalpublicationsreaders@yahoo.com.hk

17 Ago 2021

Casa de Macau parece abandonada

Quando a revolução do 25 de Abril de 1974 veio para rua festejar a liberdade que não se sentia há cerca de quarenta anos, passei pelo largo do Príncipe Real, em Lisboa, e vi uns rapazolas, para não lhes chamar uns nomes muito feios, que atiravam para a rua o mobiliário e outros bens da Casa de Macau. Um absurdo que nada tinha a ver com a revolução que se vivia no país, onde a hora era de festejo. Alguns desses rapazolas, em vez de serem presos, foram para Macau e nunca mais ouvi falar deles, mas tenho os seus nomes na minha agenda. Pensei que a Casa de Macau tinha terminado os seus dias de convívio e de acções culturais que promoviam o nome da comunidade macaense.

Mas, há dias, ao visitar Lisboa, passei pela avenida do aeroporto e vi uma vivenda linda que tinha um letreiro junto do portão de entrada que dizia “Casa de Macau”. Fui investigar que imóvel era aquele? Qual não foi o meu espanto quando me disseram que aquela vivenda luxuosa estava praticamente abandonada depois de ter sido adquirida pelo Governo de Macau, durante a última administração portuguesa chefiada pelo general Vasco Rocha Vieira. Disseram-me que vieram muitos milhões de euros de Macau para que o imóvel ficasse a pertencer à comunidade macaense residente em Portugal.

A vivenda transformada em Casa de Macau parece que abriu as portas para uns almoços com um número ínfimo de sócios, a maioria composta por senhoras macaenses já de certa idade. Que a Casa de Macau nunca procurou contactar com muitas famílias macaenses e com cidadãos que continuam a amar e a ter saudades de Macau pelos anos que lá viveram. Ora, uma atitude de gestão desse tipo devia levar à imediata demissão.

Na pesquisa que realizei sobre uma instituição que devia ser acarinhada e promovida na sociedade portuguesa, como é a Casa de Macau, informaram-me que presentemente o presidente da instituição é um senhor chamado Faustino que esteve no Turismo em Macau e na delegação de Macau sob administração chinesa que desenvolveu a sua actividade na avenida 5 de Outubro, em Lisboa. Pois, o senhor Faustino devia imediatamente realizar um levantamento exaustivo das pessoas que nasceram e viveram em Macau. Procurar realizar um inventário que o levasse a convidar toda essa gente para sócios da Casa de Macau. E a partir daí, pensar na dinamização do nome de Macau por todo o Portugal através de iniciativas levadas a efeito nas instalações da Casa de Macau.

Por Macau, passaram pintores, escritores, poetas de renome, jornalistas, arquitectos, engenheiros, cozinheiros, empresários, historiadores, que muito mereciam que as suas obras ou as suas histórias fossem patenteadas na Casa de Macau. Temos de nos lembrar que Macau foi e é parte da história de Portugal. Que o nome de Macau não pode ser abandonado, especialmente, existindo uma instituição que custou aos macaenses milhões de euros e que está praticamente abandonada sem levar a efeito reuniões, exposições, palestra, seminários, convívios onde impere a culinária macaense e outras actividades que demonstrem que Macau continua vivo no coração dos portugueses que conheceram aquele enclave português inserido no Império do Meio.

O senhor Faustino tem uma grande responsabilidade depois de ter aceitado ser o presidente da Casa de Macau. Tem de se compenetrar que não pode fazer na Casa de Macau o que fez na 5 de Outubro, onde pessoas com mais de 20 anos de vivência de Macau lhe foram pedir patrocínio para escreverem livros sobre Macau e este mesmo senhor assobiou para o lado, porque o que lhe interessava eram as feiras de turismo que lhe proporcionavam benesses para a promoção do seu currículo de carreira. Quando me informaram da nova administração da Casa de Macau, acrescentaram-me logo, que ainda ninguém sabe que o senhor Faustino é o novo responsável por um marco tão importante da cultura macaense. Temos em Macau os mais diversos artistas plásticos, alguns dos melhores do mundo, por que não convidar alguns a expor as suas obras na Casa de Macau em Lisboa? Por que não convidar as cozinheiras e pasteleiras macaenses a virem a Lisboa para nos fazer saborear os seus pitéus excelentes? Por que não convidar historiadores, escritores e até antigos governantes que têm abordado a temática macaense ao longo das suas vidas e na Casa de Macau palestrarem sobre as suas experiências?

A dinamização da Casa de Macau com eventos de valor e bem promovidos a nível nacional é algo que se impõe. Macau merece não ser esquecido quando deu tanto a Portugal. É a hora de renascer o seu nome através de uma Casa de Macau que tem todas as condições para ser um vector de promoção de 500 anos de história digna e que nunca deixou o nome de Portugal nas ruas da amargura. O senhor Faustino que se lembre que Macau deu-lhe tudo o que é hoje e que a sua compensação para com o nome de Macau está agora nas suas mãos no sentido de realizar um trabalho que promova e que mantenha os laços de fraternidade que sempre existiram entre portugueses metropolitanos e macaenses. A Casa de Macau em Lisboa tem de passar a ser uma virtude constante do que foi e é Macau. Caso contrário, que se transforme o imóvel de luxo numa casa de repouso para os idosos que viveram e amam Macau.

*Texto escrito com a antiga grafia

16 Ago 2021

Mantém-se o espírito científico ao rastreamento da Covid-19

Por Liu Xianfa – Comissário do Ministério dos Negócios Estrangeiros da China na RAEM

 

Actualmente uma nova onda de epidemia, causada pela mutação do novo vírus da coroa, está a espalhar-se pelo mundo. Ė precioso que a comunidade internacional urgentemente se concentre na cooperação e dê as mãos no sentido de combater a epidemia por meios científicos. Entretanto, é lamentável a recente tendência doentia de politização do rastreamento do vírus, em países individuais, se tenha tornado cada vez mais grave, inclusive encorajando o Secretariado da OMS a propor unilateralmente um plano de trabalho de rastreamento da segunda fase sem o consentimento unânime dos estados membros, prejudicando seriamente a situação geral da luta global contra a epidemia. Muitos países expressaram preocupação e oposição a isso.

O rastreamento do vírus deve-se opor claramente à politização. Deve ser rastreado tanto o vírus da Covid-19 como o vírus político. Vimos que os EUA têm tentado politizar a epidemia, estigmatizar o vírus e instrumentalizar o rastreamento desde o início, ao chamar abertamente o vírus como “Vírus de Wuhan” no ano passado, à retirada escandalosa da OMS, refutando o exagero sobre a chamada “teoria da fuga a partir do laboratório” da Covid-19.

A intenção dos EUA é tão clara, desde a supressão de números cientistas que defendem o espírito científico à ordenação de agências de inteligência para chegarem às chamadas conclusões de rastreamento dentro de 90 dias, até fazer pressão sobre a OMS a emitir um plano de rastreamento para a próxima fase que viola o espírito da ciência e o princípio da cooperação, que é transferir a responsabilidade da própria luta ineficaz contra a epidemia e atingir o objetivo político de desacreditar e suprimir outros países.

Com o rastreamento do vírus deve-se manter o espírito científico. Ė um tópico difícil para a comunidade científica internacional explorar a origem, disseminação e evolução do vírus da Covid-19 que está a ocorrer em todo o mundo.

Será mais esperançoso, através somente de pesquisas de rastreamento, totalmente orientadas por evidências científicas, em vários países e regiões ao redor do mundo, encontraremos a origem mais provável do vírus. Por um período de tempo, tem havido encontrar cada vez mais relatos de novos casos de coronavírus em vários locais ao redor do mundo no segundo semestre de 2019. Só nos EUA, há pelo menos em 5 estados que a infecção recém-encontrada por coronavírus foi anterior ao momento em que o primeiro caso confirmado foi notificado nos EUA.

Uma série de estudos mostram que vestígios do vírus nos Estados Unidos, Espanha, França, Itália, Brasil e outros países apareceram antes do primeiro caso em Wuhan. Tudo isso demonstra que o rastreamento do vírus é uma questão científica complexa, que deve ser realizado em cooperação com a comunidade científica internacional com base numa perspectiva global.

Com o rastreamento do vírus deve-se respeitar as conclusões e recomendações dos relatórios oficiais. A China, convidou especialistas da OMS a deslocarem-se à China por duas vezes para conduzir pesquisas conjuntas sobre rastreamento, fazendo grandes esforços para este fim, sempre tem participado na cooperação internacional de rastreamento com uma atitude aberta.

Os especialistas visitaram todos os lugares que queriam ir e encontraram todas as pessoas que desejavam. Após uma visita à China com o período de 28 dias no início do ano corrente, um grupo conjunto de especialistas OMS-China, composto por 34 especialistas de vários países, emitiu um relatório de pesquisa conjunta, concluindo que “a fuga a partir de um laboratório é extremamente improvável”, apresentou sugestões importantes, tais como “pesquisa precoce de casos possíveis em todo o mundo” e “estudo sobre a possibilidade de transmissão de vírus por cadeia de frio”.

Estas conclusões são tiradas por especialistas chineses e estrangeiros através dum trabalho de pesquisa séria e meticulosa, e são reconhecidas pela comunidade internacional e pela comunidade científica, as quais devem ser uma base importante para o rastreamento global na próxima fase.

Já realizámos a primeira fase do rastreamento do vírus, especialmente após a conclusão clara, não deve repetir na segunda fase . Com o rastreamento do vírus deve-se ouvir a voz de justiça da comunidade internacional. O objectivo de rastreamento é esclarecer a origem do vírus e evitar que epidemias semelhantes ocorram novamente.

A estigmatização pela epidemia só encontrará oposição firme da comunidade internacional. No dia 5 de Julho, 24 especialistas médicos de renome internacional emitiram uma declaração conjunta na revista médica oficial “The Lancet”, reiterando que o vírus evoluiu provavelmente na natureza, ao invés de um laboratório. Não faz muito tempo, que cerca de 70 países, incluindo Rússia, Finlândia e Portugal etc., escreveram à OMS, expressando sua aprovação dos resultados da pesquisa de rastreamento da primeira fase e se opondo à politização de rastreamento.

Tom Foday, especialista britânico em relações internacionais, sublinhou que “se o mundo desejar que a OMS funcione correctamente, os EUA devem parar de torná-la como bode expiatório”. Um questionário, emitido pelo CGTN think tank, afiliado à China Central Broadcasting and Television General Station, para internautas de todo o mundo nos seis idiomas oficiais das Nações Unidas, refere-se que 83,1% dos internautas votantes apoiaram a investigação de rastreamento do vírus da OMS nos EUA. Tinha havido mais de 25 milhões de internautas que assinaram uma carta aberta solicitando uma investigação sobre o Fort Detrick Biolab nos EUA. A voz de justiça na comunidade internacional deve ser valorizada e escutada.

Actualmente, a epidemia da Covid-19 ainda não foi controlada de forma eficaz a nível global, e Macau foi recentemente ameaçado por um vírus mutante do coronavírus. Em 5 de Agosto, a primeira reunião do Fórum Internacional de Cooperação para Vacina contra a Covid-19 foi realizada pela China com sucesso, a qual ajudou fortemente os países a lutarem conjuntamente contra a epidemia.

Acredito firmemente que, enquanto a comunidade internacional se apoiarem e se ajudarem mutuamente, realizando cientificamente o rastreamento, avançando de forma inabalável a cooperação internacional na luta contra a epidemia e promovendo conjuntamente a construção da comunidade comum de saúde ao ser humano, seremos capazes de derrotar completamente a epidemia o mais cedo possível e, em conjunto, proteger a saúde da humanidade e um futuro brilhante!

13 Ago 2021

Testagem universal em Macau

A semana passada, em resposta ao surgimento de alguns casos de infecção por coronavírus em Macau, o Governo local e o Governo Zhuhai tomaram em conjunto disposições em relação ao controlo de fronteiras. A validade dos testes negativos ao ácido nucleico passou de 7 dias para 24 horas e logo de seguida para apenas 12 horas. Zhuhai fechou algumas zonas e levou a cabo uma operação de testagem universal para impedir a transmissão do vírus.

Em consonância com esta medida, o Governo de Macau decidiu testar toda a população num prazo de três dias. Esta é sem dúvida a forma mais eficaz de identificar pessoas infectadas. Prevenir é melhor do que remediar e, como algumas pessoas foram infectadas, é da maior importância que o Governo de Macau tenha decidido testar toda a população.

Um operação deste género implica uma decisão difícil, mas muito importante. Para efectuar uma testagem universal, o Governo necessita não só de fazer um grande investimento em recursos humanos e financeiros, mas também da cooperação de todos os residentes. Basta que uma pessoa não colabore para deitar tudo a perder. Por aqui se vê como é difícil testar toda a população.

O primeiro passo implica reunir todo o material necessário e constituir equipas médicas. Com o apoio do Governo central, a Província de Guangdong enviou 300 médicos para reforçar as equipas de testagem, gesto que muito agradecemos.

Estas equipas trabalharam arduamente ao longo dos três dias que durou a testagem. Tiveram de recolher amostras, levar a cabo os testes de laboratório, lidar com as questões logísticas e ainda de contactar todos os residentes de Macau, num prazo muito curto. Além disso, foram as pessoas que mais se arriscaram a contrair o vírus. Devemos prestar um tributo a este auto sacrifício.

Para garantir que todos os residentes fossem testados, o Governo declarou que o código de segurança sanitária passaria a azul até ao final do processo. Depois de concluído, se o resultado for negativo, a pessoa voltará a ter o código verde. A quem não tiver feito o teste neste prazo, será atribuído o código amarelo. Infelizmente, devido a uma falha informárica, o código azul não esteve visível durante algum tempo e o código verde não podia ser gerado. Sem o código verde, os residentes não podem sair nem entrar, o que é de alguma forma inconveniente.

Durante os três dias da testagem, o tempo esteve quente e chuvoso. As filas para a testagem eram muito longas, algumas pessoas sentiram-se mal, outras ficaram incomodadas por causa da chuva, pelo que alguns residentes não ficaram satisfeitos com as condições em que foi feita a testagem. Os problemas que surgiram revelaram algumas falhas nesta operação de testagem universal. Devemos fazer um esforço para compreender e aceitar estas falhas, porque foi a primeira vez que Macau implementou uma operação deste género e é inevitável que tenha havido erros e omissões.

No dia em que escrevi este artigo, os resultados ainda não tinham sido divulgados. Esperemos que mais ninguém esteja infectado com o vírus, para que possamos respirar de alívio. Em qualquer dos casos, e na situação presente, se surgirem mais pessoas infectadas, todos teremos de voltar a ser testados. Esta experiência poderá servir de referência para ocasiões futuras.

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Escola Superior de Ciências de Gestão/ Instituto Politécnico de Macau Blog:http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog
Email: legalpublicationsreaders@yahoo.com.hk

10 Ago 2021

Os jovens não podem ter filhos

Muito se falou na semana passada pelo nosso Portugal no problema da natalidade. Parece mentira, mas o nosso país registou em 2020 o valor mais baixo de nascimentos desde 2015. Lisboa foi a cidade que rastreou mais recém-nascidos e Bragança o distrito com menor número de nascimentos. Digam-me lá como é que pode haver um número de nascimentos ao nível da Europa, se tudo está ligado: ao salário mínimo nacional, ao custo das rendas de casa, ao custo da aquisição de um imóvel, ao subsídio que o Estado facilita às novas mães, aos apoios que se dão a um casal que tenha um filho. Por essa Europa fora registam-se apoios de vulto por parte das autoridades governativas. Em Portugal, os jovens não podem ter filhos. Os jovens continuam a viver em casa dos pais. Os jovens não têm emprego.

Os jovens não têm apoio estatal para poder residirem em casas de renda acessível. Os jovens não podem comprar casa porque além de não terem dinheiro para tal, hoje em dia ninguém quer ser fiador da compra de um imóvel.

Nem os pais, a maioria deles sem possibilidades financeiras de ajudar os filhos. Uma jovem acaba o seu curso superior, tem um namorado, deseja casar ou ter um filho e desiste. Desiste porque não pode pensar em ter um filho porque não conseguirá sustentar o seu crescimento, não tem dinheiro para pagar a creche, não tem dinheiro para pagar os materiais da escola, o vestuário e quantas vezes a assistência na doença com que o filho já nasceu. Tudo isto, é o que os jovens sensatos começam a pensar e que lhes tira o sono. Como é que eu posso contribuir para o aumento da natalidade no meu país, se o meu país nada me ajuda, pensam os jovens assim que a cabeça encosta à almofada e não lhes vem o sono. Não conseguem dormir porque os seus sonhos vão todos por água abaixo. Que desgosto para um casal jovem que deseje ter um filho, ter de decidir que não é possível. É triste, chocante, desumano e traumatizante. Soube há cerca de um mês que uma jovem de 28 anos, suicidou-se quando concluiu que tinha de continuar a viver em casa dos pais e que não podia ter um filho por falta de sustento financeiro.

Quando olhamos para os números de nascimentos em 2020, o coração dói, porque é um número muito baixo, apenas cerca de 80 mil bebés vieram ao mundo em Portugal, o que não acontecia há mais de cinco anos. E os números são significativos. A realidade triste é que nasceram menos 1908 bebés do que em 2019. Lisboa e os seus subúrbios foi a cidade onde se registaram mais nascimentos, mas mesmo assim, menos 1267 comparativamente a 2019. Por todo o país o número de nascimentos diminuiu e não tenhamos dúvidas que o triste fenómeno está ligado à impossibilidade de sobrevivência de um casal jovem. Conheço pessoas com 45 anos que continuam a viver em casa dos pais, porque têm sobrevivido do subsídio de desemprego e de uns biscates que vão fazendo pelas casas e garagens dos amigos.

E depois verificou-se um fenómeno que deixou os especialistas surpreendidos. Para aqueles que pensavam que o confinamento devido à covid-19 iria encorajar os casais a procriar, enganaram-se redondamente. O ter ficado sentado no sofá a ver televisão o dia inteiro pode ser uma das causas de que o confinamento só prejudicou o crescimento populacional. A gravidade da pandemia provocou, inclusivamente, retraimento nos casais. Uma pesquisa sobre planos de fertilidade na Europa mostrou que 50% das pessoas na Alemanha e na França que planearam ter um filho em 2020 adiaram a decisão. Na Itália, 37% disseram em plena pandemia ter abandonado totalmente a ideia de ter filhos. Nove meses após o início da pandemia, França, Coreia, Taiwan, Estónia, Letónia e Lituânia relataram números mensais de nascimentos que foram os mais baixos em mais de 20 anos. E o caso da diminuição da natalidade é grave. No futuro, se houver menos pessoas em idade activa, haverá menos recolhimento de impostos para pagar aos reformados e os cuidados de saúde para os idosos que, por sua vez, estão vivendo mais anos. Para este problema são apontadas algumas soluções, tais como, aumentar a idade de aposentação ou encorajar a imigração, apesar de Portugal continuar a discriminar com laivos racistas todos aqueles que vêm de outros países.

E temos ainda outro problema grave, o relacionado com as mulheres que estão a ter filhos já com uma idade avançada, o que por vezes, segundo os médicos especialistas, tem criado graves problemas para os recém-nascidos.

E muitas mulheres já decidiram congelar os seus óvulos para terem filhos mais tarde, a fim de, segundo elas, proteger os idosos. Não sei se estão no caminho certo, o que sabemos é que o número da população jovem está a diminuir e isso é imensamente preocupante se pensarmos a longo prazo.

*Texto escrito com a antiga grafia

9 Ago 2021

É o pior dos tempos, é o melhor dos tempos

Na sua famosa obra “Conto das Duas Cidades”, o escritor inglês Charles Dickens fala-nos sobre um tornado político que agitou a vida de duas grandes cidades, Londres e Paris. Nos dias que correm, Hong Kong e Macau, as duas cidades que são Regiões Administrativas Especiais, estão também numa situação comprometedora devido a questões políticas.

O Artigo 25 da Lei Básica da Região Administrativa Especial de Macau estipula claramente que “Os residentes de Macau são iguais perante a lei, sem discriminação em razão de nacionalidade, ascendência, raça, sexo, língua, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução e situação económica ou condição social”. No entanto, sob a actual directriz “Macau governado por patriotas”, a lealdade política passou a ser factor decisivo. Desde que a nossa visão política não seja exactamente igual à dos governantes, deixámos de poder entrar na corrida independentemente do apoio que recebemos dos nossos eleitores. Só serão considerados “absolutamente leais” os que não possuem consciência política e que apenas buscam aprovação?

O Tribunal de Última Instância julgou improcedentes os recursos eleitorais interpostos pelos mandatários de três listas de candidatura ( processo n.º 113/2021). Eu próprio era um dos dois primeiros candidatos da lista “Associação do Progresso de Novo Macau”. Na minha qualidade de recorrente, só consigo aceitar a decisão porque tenho muito respeito pelos Tribunais. A minha decisão de insistir e recorrer ao Tribunal de Última Instância foi determinada pela vontade de que o público pudesse vir a ter um entendimento mais pormenorizado das circunstâncias que determinaram a Desclassificação dos Candidatos. Nesta matéria, os resultados que se obtiverem com muito esforço são preciosos.

No acórdão do Tribunal de Última Instância, foram citadas as justificações de ambos os recorrentes e da Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL). A CAEAL defende que “é inegável que a maior parte dos factos citados sobre os candidatos ocorreu antes das eleições de 2017 para a Assembleia Legislativa, e que estes factos não foram examinados nem considerados pela CAEAL antes das referidas eleições. Ou seja, como estes factos não foram considerados pela CAEAL antes das eleições de 2017 para a Assembleia Legislativa, é muito estranho que as autoridades da RAEM, em 2021 e perante os mesmos factos, tenham optado por dar uma resposta diferente”.

No acórdão, também é assinalado que a “Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa da RAEM” não prevê que os candidatos aprovados tenham de renegar as suas opiniões ou actos prévios. Assim, apesar de um candidato (como é o meu caso) ter assinado a “Declaração de Defesa e de Fidelidade do Candidato” para as eleições de 2021 à Assembleia Legislativa, igual à que assinou para as eleições de 2017, a CAEAL tomou a decisão de o desclassificar, devido à emergência de novas situações.

Pela informação disponível do processo n.º 113/2021, sabe-se que a CAEAL se reuniu no dia 25 de Junho e declarou que “defender a Lei Básica da Região Administrativa Especial de Macau da República Popular da China e ser fiel à Região Administrativa Especial de Macau da República Popular da China, são os critérios fundamentais que os deputados da Assembleia Legislativa devem satisfazer”. A CAEAL também solicitou a 2 de Julho à Polícia informações sobre todos os candidatos tendo o Gabinete do secretário para a Segurança respondido a 5 de Julho. As provas fornecidas pela Polícia à CAEAL foram recolhidas em posts da Internet e fotos tiradas em actividades públicas, incluindo as que foram exibidas na exposição do “4 de Junho” promovida pela União de Macau para o Desenvolvimento da Democracia, e pelas actividades em memória de Liu Xiaobo, entre outras. A CAEAL não usou toda a informação disponibilizada pela Polícia. Apenas tomou a decisão de desclassificar candidatos baseada no facto de os candidatos terem, directa ou indirectamente, participado em certas actividades ou baseada nos objectivos das actividades em que os candidatos participaram.

No acórdão, também se declara que “Os critérios estabelecidos pela CAEAL não são vinculativos em Tribunal. O Tribunal de Última Instância tem plena jurisdição, pode concordar ou discordar destes critérios e, baseado nas circunstâncias específicas do caso e nas disposições legais adequadas e, de acordo com os critérios que considere exactos e adequados, pode determinar a sua decisão”.

Finalmente, o Tribunal de Última Instância acabou por concordar com a posição da CAEAL e ratificou a decisão de excluir três listas do campo democrata de participarem nas eleições em Setembro de 2021. Vale a pena mencionar o que José Maria Dias Azedo, o 1.o juiz adjunto do Tribunal de Última Instância, afirmou no decurso na sua declaração de voto, neste caso. “Tendo em conta a “matéria” (a sua natureza), a participação nas eleições directas é um “direito fundamental”, e não é razoável ser “restringido” da forma acima mencionada. Penso que deve suscitar o cuidado apropriado (e a clarificação) das autoridades competentes”.

Agradeço ao Governo da RAEM por recolher toda esta informação, o que  me deu a oportunidade de olhar para o discurso que fiz na reunião de 4 de Junho  de  2012:  “A história pode ficar confinada, mas não se ajoelhará perante os governantes. As pessoas não vão esquecer e a história não vai esquecer”. Penso que a história e o povo de Macau não esquecerão esta Desqualificação de Candidatos, a primeira desde a transferência de Macau.

8 Ago 2021

CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS (COP26)

Sob o lema “Unindo o Mundo para Enfrentar as Alterações Climáticas”, sob a presidência do Reino Unido e em parceria com a Itália, irá realizar-se em Glasgow entre 31 de outubro e 12 de novembro de 2021 a 26ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas (26th Conference of the Parties of the United Nations Framework Convention on Climate Change – UNFCCC).

Os grandes objetivos da COP26, que se realiza com um ano de atraso devido à pandemia Covid-19, consistem em (1) garantir que a neutralidade carbónica seja atingida até 2050 e que o aumento da temperatura não ultrapasse 1,5 graus Celsius; (2) proteger as comunidades e os habitats naturais; (3) mobilizar meios financeiros necessários para o cumprimento dos dois primeiros objetivos; (4) no trabalho de todas as partes interessadas em estreita colaboração.

Além destes objetivos pretende-se também completar o livro de regras (Paris Rulebook) em que se estabelecem as diretrizes de funcionamento, na prática, do Acordo de Paris.

Para a concretização dos objetivos, os decisores políticos serão convidados a tomar medidas necessárias à eliminação do uso do carvão, reduzir o desmatamento, incrementar o uso de veículos elétricos e incentivar o investimento em energias renováveis.

O primeiro ministro do Reino Unido, Boris Johnson, numa declaração por ele assinada, resume da seguinte forma o princípio básico em que deve assentar esta conferência: “Garantir um futuro melhor para nossos filhos e gerações futuras exige que os países tomem medidas urgentes no próprio país e no exterior a fim de reverter a tendência das alterações climáticas. À medida que nos aproximamos da crucial Conferência COP26, no Reino Unido, é com ambição, coragem e colaboração, que devemos aproveitar conjuntamente este momento, de modo a que possamos restaurar o nosso planeta, tornando-o mais limpo e mais verde”.

Esta declaração, politicamente correta, contradiz a atitude que o atual primeiro ministro do RU tem demonstrado em relação à crise climática. A sua forma de encarar as alterações climáticas, como, aliás, outras áreas, tem sido ziguezagueante. Chegou a escrever artigos que refletiam o seu ceticismo sobre este assunto e, quando membro do parlamento, votou contra a captura e armazenamento de CO2 e a favor da tributação em projetos de energia renovável. Seja ou não sincero na sua posição atual, o certo é que o RU se disponibilizou para acolher a próxima Conferência das Partes.

O mesmo não aconteceu com o Brasil no que se refere à COP anterior. Este país, que se havia oferecido como anfitrião da COP25, deu o dito por não dito sob a presidência de Bolsonaro. Em novembro de 2018 foi anunciada a quebra deste compromisso, sob o pretexto de restrições orçamentais e a transição entre governos. Perante esta recusa, o Chile ofereceu-se então como anfitrião, no entanto, devido à agitação social que antecedeu a data prevista para a cimeira, a COP25 acabou por se realizar em Madrid, de 2 a 13 de dezembro de 2019, por acordo mútuo entre o Chile, Espanha e a ONU.

A UNFCCC, que entrou em vigor em 1994, foi assinada por 198 países que se juntaram no sentido de se estabelecerem objetivos genéricos tendo em vista enfrentar as alterações climáticas. É um dos três tratados internacionais adotados na Cimeira da Terra do Rio, que se realizou no Rio de Janeiro em 1992. Os outros dois, a Convenção Sobre a Biodiversidade e a Convenção de Combate à Desertificação, estão também intimamente ligados à crise climática.

A COP26, em que participarão chefes de estado, cientistas, organizações internacionais, ONGs e outras entidades privadas, é a cimeira mais importante deste tipo desde a COP21, em 2015, quando quase 200 países chegaram ao histórico Acordo de Paris. O Papa Francisco, que considera as alterações climáticas “um dos fenómenos mais graves e preocupantes de nosso tempo”, anunciou a sua intenção de participar na cimeira.

Sejam quais forem as recomendações, conclusões e compromissos que serão acordados na COP26, não será fácil pô-los em prática, na medida em que a produção de energia com recurso a combustíveis fósseis (petróleo, gás natural e carvão mineral), principal causa da injeção de gases de efeito de estufa (GEE) na atmosfera, dificilmente será substituída por processos limpos, nomeadamente com recurso ao vento, sol, geotermia, recursos hídricos, hidrogénio e fusão nuclear.

Atualmente, quase 30 anos depois da entrada em vigor da UNFCCC (1994), 16 anos depois da ratificação do Protocolo de Quioto (2005) e da realização de 25 COPs , cerca de 84% da energia à escala global ainda é produzida com recurso a combustíveis fósseis. Apenas cerca de 11% da energia é de origem renovável. No que se refere à energia nuclear, que contribui com cerca de 4% para o total da energia produzida globalmente, deve-se considerar não-renovável, na medida em que o urânio não é abundante na natureza. No futuro poder-se-á classificar a energia nuclear como renovável quando se recorrer à fusão nuclear, cuja matéria prima, o hidrogénio, existe abundantemente. A China é um dos países onde se procede experimentalmente à fusão nuclear de núcleos de isótopos de hidrogénio através do Experimental Advanced Superconducting Tokamak (EAST), a cargo do Institute of Plasma Physics of the Chinese Academy of Sciences (ASIPP), em Hefei, no vale do rio Yangtzé, onde se consegue confinar plasmas a temperaturas elevadíssimas, com recurso a potentes ímanes que geram campos magnéticos muito intensos. Recentemente, segundo órgãos estatais chineses, conseguiu-se atingir, no ASIPP, cerca de 120 milhões de graus Celsius durante 101 segundos, tendo-se atingido um pico de 160 milhões de graus, durante 20 segundos.

A fusão nuclear, que acontece naturalmente no sol e nas estrelas, dá-se quando dois núcleos de elementos leves se fundem para formar um núcleo mais pesado, gerando-se grande quantidade de energia. Fundindo dois núcleos de isótopos de hidrogénio, o deutério e o trítio, obtém-se um núcleo de hélio, sendo a massa deste menor que a soma das massas dos núcleos que lhes deram origem. Parte da massa dos dois núcleos iniciais transforma-se em energia, de acordo com a célebre equação de Einstein E = m.c2 (a energia gerada é igual ao produto da massa transformada pelo quadrado da velocidade da luz). Apesar de até hoje não ser possível proceder à fusão nuclear de forma que a energia produzida possa ser controlada e usada para fins pacíficos, já se recorreu experimentalmente a este processo para fins bélicos, com o fabrico das chamadas bombas termonucleares ou bombas de hidrogénio. Os EUA fizeram explodir uma bomba deste tipo em 1952, e a ex-URSS em 1961.

A fusão nuclear será muito provavelmente discutida na COP26, assim como a parceria de 35 membros (entre os quais União Europeia, Índia, China, Japão, Coreia do Sul, Rússia e EUA), que procede atualmente, em regime experimental, a experiências de produção de energia a partir de isótopos de hidrogénio, através do International Thermonuclear Experimental Reactor (ITER), instalado no sul de França.

Apesar de todos os investimentos em energias renováveis, a concentração de dióxido de carbono na atmosfera não diminuiu. Antes pelo contrário, aumentou significativamente. Estima-se que no início da era industrial a concentração era de cerca de 280 partes por milhão (ppm). De acordo com dados do observatório de Mauna Loa, no Hawaii, onde se encontra a estação que há mais tempo monitoriza a concentração deste gás, esta, em 6 de julho de 2021 era de 418,94 ppm.

Embora haja nitidamente discrepâncias entre as intenções manifestadas por muitos decisores políticos e as suas atitudes na prática, é de esperar que a opinião pública continue a pressionar os governantes no sentido da concretização do Acordo de Paris. A COP26 pode contribuir para esse efeito. Caso contrário, as novas gerações terão razão em nos acusar pelo estado em que lhes legaremos o planeta que habitamos. Como diria Ban Ki-moon, não há planeta B.

5 Ago 2021

Cheung Ka Long

O atleta de Hong Kong Cheung Ka Long ganhou a medalha de ouro na modalidade de esgrima nas Olímpiadas de Tóquio. Esta vitória foi um acontecimento na China e em Hong Kong e uma honra para todos nós.
Cheung nasceu e cresceu em Hong Kong. Ambos os progenitores eram jogadores de basquetebol. Tendo nascido numa família de desportistas, Cheung teve sempre muito apoio ao nível formativo e competitivo. Cheung é um atleta do mais alto nível. Iniciou a carreira em 2014 e foi acumulando vitórias nas diversas competições em que participou. Nestas Olímpiadas, bateu um adversário por 9-14. É impossível um atleta estar em vantagem em todos os momentos da competição. Há alturas em que o seu adversário o ultrapassa. Mas quando está em desvantagem Cheung demonstra calma, altera a estratégia, contra-ataca e acerta todos os golpes. Foi assim que obteve a medalha de ouro, após seis golpes certeiros consecutivos. Nas competições de esgrima a possibilidade de conseguir mais pontos do que o adversário é muito maior do que noutras modalidades. Assim sendo, todos os esgrimistas compreendem que a partida se pode resolver muito antes do final. Mas Cheung soube adaptar-se rapidamente e nunca desistiu. Este tipo de atitude competitiva é fundamental.
Cheung não só bateu o recorde da equipa de Hong Kong, como trouxe a medalha de ouro para a China e para Hong Kong. Esta medalha de ouro não é uma simples medalha. É a primeira medalha de ouro olímpica obtida por Hong Kong após o regresso à soberania chinesa, e a segunda de sempre. Em 1996, a atleta Li Lishan ganhou a primeira medalha de ouro olímpica para Hong Kong, tendo feito História com o seu feito. Os grandes talentos surgem apenas de tempos a tempos. Vinte e cinco anos mais tarde, Cheung ganhou a medalha de ouro na modalidade de esgrima.
Cheung tornou-se famoso do dia para a noite e recebeu o respeito e o afecto de todos. Várias organizações de Hong Kong prontificaram-se a oferecer-lhe prémios e bónus. A “Henderson Elite Athlete Recognition Program” ofereceu-lhe 5 milhões e a Lin Dahui Middle School Supervisor and Chairman of the Sports Institute ofereceu-lhe 2,5 milhões para o ajudar a comprar uma casa. A transportadora Kowloon Bus Company deu-lhe um passe válido por um ano. A MTR Corporation Limited deu-lhe um passe vitalício e a Pricerite Furniture Company ofereceu a Cheung a toda mobília para decorar a casa. Estas generosas ofertas revelam que Cheung ganhou fama e fortuna.
Será que a conquista da fama e da fortuna pode atrair os jovens para se tornarem atletas profissionais e mais tarde ganharem medalhas de ouro nas competições olímpicas?
Quem quiser ser atleta profissional tem de ter paixão pelo desporto e bastante determinação e também necessita de avaliar se consegue submeter-se a treinos rigorosos. É preciso não esquecer que a dureza dos treinos pode vir a alterar a paixão inicial.
Se as respostas a estas questões foram afirmativas, a pergunta que se segue é a seguinte: porque é que queres abraçar uma determinada modalidade desportiva e vir a ser um atleta profissional? Existem muitas motivações que levam as pessoas a tornar-se atletas, não podemos generalizar. As pessoas tornam-se atletas profissionais devido à sua paixão pelo desporto e também devido às suas preferências. Claro que não têm necessariamente de sentir a pressão de ganharem uma medalha de ouro nas Olimpíadas. É também necessário providenciar o futuro após o final da carreira. Afinal de contas, a idade tem consequências no desempenho físico. Quanto mais velhos ficamos menos aptos para o desporto estaremos. Este factor tem menos impacto nos atletas profissionais que não aspiram a medalhas.
Os atletas profissionais que aspiram a medalhas de ouro nas Olimpíadas têm mais questões a considerar. Este tipo de atletas tem de se submeter a treinos árduos todos os dias, para conseguir dar o seu melhor. Só existe uma medalha de ouro para cada modalidade, pelo que apenas uma pessoa a pode ganhar. Toda a gente fica a conhecer os atletas que ganham as medalhas de ouro nas Olimpíadas e ouve os aplausos que recebem, mas quem ouve o choro dos atletas vencidos? Por detrás do choro existe muita tristeza e muito suor. Nesta medida, após completarem o treino diário, os atletas de alta competição deveriam dedicar-se a outras aprendizagens profissionais. Quando se retirarem do desporto, podem ter outra forma de sobrevivência e não deitarão tudo a perder. Quem tem este tipo de mentalidade pode mitigar a tristeza por não ter ganhado uma medalha de ouro e também pode viver confortavelmente depois de se retirar. O desporto é apenas uma parte da vida e a vida tem de continuar.
Os atletas de alta competição precisam de saber enfrentar a desilusão da derrota e de saber procurar o seu próprio caminho, para que não venham a ter dificuldades depois de se retirarem da modalidade. Só com a preparação adequada se pode captar mais jovens para o desporto. Esperamos que os atletas de Macau também possam vir a ganhar medalhas de ouro Olímpicas num futuro próximo.

3 Ago 2021

Centenas que já vão dormir descansados

Os cientistas médicos já conseguiram descobrir que o ser humano até aos dias de hoje já foi afectado por duzentos e cinquenta tipos de demência, vulgo Alzheimer. O que não é verdade. A doença à base de demências não se deve chamar de Alzheimer, como se todos os tipos de demências fossem iguais e como todas as demências fossem Alzheimer. Infelizmente, os clínicos e a comunicação social têm culpas no cartório em denominarem qualquer tipo de demência por Alzheimer e deixar as pessoas no mais puro analfabetismo sobre o tema. Alzheimer foi simplesmente o neuropsiquiatra alemão que viveu entre 14 de Junho de 1864 e 19 de Dezembro de 1915, de nome Alois Alzheimer, que descobriu pela primeira vez o primeiro tipo de demência, o qual lhe mostrou que um cidadão estava a perder a memória e o conhecimento paulatinamente.

E porque estamos a falar do avanço da ciência médica acerca dos vários tipos de demência? Porque na semana passada rebentou uma “bomba” em Portugal sobre esta matéria.

A comunicação social anunciou que os advogados de defesa de Ricardo Salgado alegaram que o ex-presidente do Banco Espírito Santo (BES) e o português que ficou com o cognome de “Dono Disto Tudo, o DDT) sofria de demência . Ricardo Salgado foi o homem mais poderoso em Portugal. O banco da família, o BES, realizou os mais mirabolantes tipos de negócios e que a nível internacional usou e abusou de milhares de milhões de euros dos clientes. O BES foi à falência e milhares de portugueses que tinham depositado no banco de Ricardo Salgado as poupanças de uma vida, ficaram sem nada. O processo nunca irá terminar, especialmente, depois de terem inventado uma história tristíssima do um banco mau e de um banco bom em que dividiram o BES. Hoje, o tal banco bom, denominado Novo Banco, tem sido apenas um sugadouro dos dinheiros públicos onde uns felizardos têm ganho salários e mordomias chorudos que amiúde provocam escandalosas conclusões na gestão da nova unidade hoteleira.

Anunciaram que Ricardo Salgado terá um dos duzentos e cinquenta tipos de demência. Com esta doença que afecta milhões de pessoas em todo o mundo não se brinca. Nem pensar, que os advogados de defesa de Ricardo Salgado tivessem inventado uma doença desta gravidade como estratégia para que o seu cliente nunca mais colocasse os sapatos num qualquer tribunal. Nem pensar. Isso seria um crime maior do que todos os crimes que Ricardo Salgado cometeu ao longo da vida, inclusivamente a corromper centenas de personalidades situadas nos mais diversos locais de decisão como chefes de governos, presidentes da República, ministros, secretários de Estado, deputados, juízes, presidentes de conselhos de administração de empresas cruciais do país, enfim, centenas e centenas de VIP’s que foram corrompidos por Ricardo Salgado e que não dormem descansados desde que teve início a chamada “Operação Marquês”, que entre muitos, envolve o ex-primeiro-ministro José Sócrates.

Os advogados de Ricardo Salgado vão apresentar ao tribunal as provas clínicas da possibilidade efectiva de o seu cliente estar com falta de memória e com a actividade cerebral em plena degeneração. Naturalmente que não sabemos qual o tipo de demência que poderá ter Ricardo Salgado. Se for uma demência frontotemporal poderá viver muitos anos e apenas com a memória recente a desaparecer. Se for um outro tipo de demência, daqueles que pode patentear violência, que destrói tudo em casa, que não reconheça a esposa e os filhos, que saia pela porta fora e só pára de andar quando o cansaço o atira para o chão, então, teríamos Ricardo Salgado, infelizmente, com uma mazela cerebral que nunca mais permitiria abordar com credibilidade factos passados ao longo da sua vida. E neste particular, muitas centenas de corruptos já poderiam passar a dormir descansados visto ter terminado o perigo de Ricardo Salgado chegar a um tribunal e denunciar toda essa cambada que viveu à custa dos seus interesses económicos e materiais. Em Portugal, de norte a sul, centenas de “amigos” de Ricardo Salgado ao ouvirem a notícia de que o banqueiro estaria com um tipo de demência abriram, por certo, uma garrafa de champanhe, e disseram para com os seus botões “estamos safos, nada nos irá acontecer a não ser gozar os milhões que Salgado nos deu”…

A notícia caiu mesmo como uma “bomba”, meus amigos leitores. Nem fazem a mínima ideia quanta satisfação reina em certas casas da Quinta da Marinha, em Cascais, no Estoril, em Sintra, no Porto, em Évora e em vários países, em especial no Brasil para onde já fugiram muitos a quem Ricardo Salgado passou vários cheques ou malas cheias de dinheiro vivo. Há um ex-ministro que é meu vizinho que emagreceu mais de dez quilos desde que “rebentou” o BES, tem andado desesperado porque se Ricardo Salgado pronunciava o seu nome a um juiz o fulano sabe que iria para a prisão muitos anos. No sábado à noite, já andava a passear no bairro como o homem mais feliz do mundo. O DDT tinha-os todos na mão, centenas de corruptos ao mais alto nível, andavam com o cuzinho a tremer por todos os lados, deixaram de ir a festas, a conferências, a seminários, colocaram todos os bens em nome dos netos e enviaram fortunas para offshores, tudo fizeram para que Ricardo Salgado se mantivesse calado e em troca continuaria em liberdade. Agora, estão salvos, já não baixam a cabeça. Com uma das piores doenças do mundo a atingir Ricardo Salgado, os seus “criados” passam a dormir tão bem que até vão ressonar…


*Texto escrito com a antiga grafia

2 Ago 2021

Citius, Altius, Fortius – Veritas

Têm sido os Jogos das atletas: à falta de público nas bancadas, da habitual ostentação de impantes patrocinadores, da procura de visibilidade mediática para dirigentes desportivos e políticos com mais ou menos propósito e dependentes de posicionamentos geo-políticos diversos, estas Olimpíadas têm tido pouco mais do que o exercício dos jogos em si mesmo, a competição desportiva reduzida à sua essência, atletas a disputar vitórias e medalhas perante câmaras que hão-de dar visibilidade a uma solidão improvável para as Olimpíadas. Não é que tenham faltado motivos para, por exemplo, se reacenderem velhas Guerras Frias, mas mesmo a compulsiva exclusão da Rússia havia de ser sabiamente compensada e drasticamente atenuada pela participação da enigmática ROC, sigla inicialmente incompreensível para espectadores com menos dedicação à causa, mas hoje já familiar a quem acompanhe os Jogos, mesmo com alguma reserva e distância.

Foi aliás num desses momentos mais propícios à frieza da guerras geopolíticas antigas que a História foi registando em Olimpíadas diversas que as atletas decidiram afinal oferecer um exemplo magnífico e anacrónico de desportivismo, respeito por rivais, solidariedade entre quem dedica esforço máximo e quase toda a vida a dar o melhor de si para se aperfeiçoar no exercício desportivo, na celebração do jogo: a formidável equipa de ginástica dos Estados Unidos tinha perdido a sua melhor atleta em plena competição, teve que disputar a final colectiva com essa inevitável desvantagem, acabaria por ver interrompida uma hegemonia planetária de quase 30 anos, agora conquistada pela Rússia, aliás a ROC, a maior herdeira da magnífica tradição soviética que nas últimas décadas foi sistematicamente derrotada pelas rivais da América do Norte, essas que no momento da derrota atravessam ténues fronteiras implícitas nos territórios do pavilhão, para beijarem e abraçarem as novas campeãs olímpicas, transformando subitamente guerras frias em amizades quentes. Disso certamente pouco se falará, que os tempos mediáticos são mais propícios à exaltação do sangue que possa correr em cada arena competitiva, à glória de quem ganha e à miséria de quem perde, com pouco ou nenhum espaço para eventuais e anacrónicas fraternidades entre quem joga o jogo que tem a jogar e sabe da efemeridade de cada resultado.

Foi nessa prova que se assistiu a um dos mais dramáticos momentos dos Jogos até agora: a desistência da ginasta norte-americana Simone Biles, super-favorita a conquistar todas as medalhas em disputa, individuais e por equipas, em qualquer dos aparelhos. Era também candidata a igualar ou melhorar históricos recordes de medalhas conquistadas por ginastas em Olimpíadas anteriores e tinha sobre si todos os olhares de quem aprecia a modalidade.

Falharia rotundamente, no entanto, em até em sentido literal: que o corpo faça pirueta e meia quando estava preparado, treinado e programado para duas piruetas e meia é suficiente para confundir e desestabilizar um cérebro que ali e naquele momento opera em concentração máxima, quando cada centésimo de segundo é decisivo para a performance que dura alguns minutos, poucos mas que oferecem corolário inevitável a anos de esforço, preparação, mentalização, criatividade, inteligência, superação a cada dia, todos os dias. É essa a vida de qualquer ginasta e nem vale a pena entrar nos detalhes do percurso particular que levou Simone Biles até Tóquio, que também inclui um ambiente familiar violento e casos de abuso sexual por parte de um médico da equipa de ginástica dos Estados Unidos. Afinal, no tapete é só ela e os seus demónios, assume a super-ginasta, um prodígio atlético, que afinal assume tranquilamente a sua fraqueza perante o mundo, a sua verdade, a importância de preservar a saúde mental neste planeta em que o lema olímpico “mais rápido, mais alto, mais forte” parece ter sido abusivamente adaptado para servir de mote a uma sociedade despojada de solidariedade comunitária e obcecada com vertiginosos processos competitivos onde, na realidade, acabamos sempre por perder qualquer coisa.

Simone Biles não foi, no entanto, a única super-estrela do firmamento desportivo a sair sem a espera glória mas com inesperada humildade desta peculiar edição dos Jogos, marcada por esse triste isolamento e distanciamento social que a convivência possível com a pandemia de covid-19 implica. Também Naomi Osaka, tenista de excelência, a jogar no Japão e pelo Japão, o seu país de nacionalidade mas onde nem sempre viveu e onde os filhos de pessoas japonesas com pessoas estrangeiras, como ela, são carinhosamente tratadas por “metade”, acabaria por ter uma participação em competição muito abaixo do que os seus pergaminhos nos rankings internacionais poderiam fazer prever. Neste caso, as fraquezas até já se tinham revelado antes dos Jogos: jogar é bom mas enfrentar a avidez da imprensa é um acto de violência para o qual se assume impreparada, recusando até participar em torneios do chamado “Grand Slam”, naturalmente com muito generosos prémios, para não ter que enfrentar despropositados interrogatórios de jornalistas a seguir ao esforço do jogo. Tal como Simone Biles, Naomi Osaka, quer pôr a integridade possível da sua saúde mental à frente da insanidade competitiva das sociedades contemporâneas e da respectiva implacável mediatização permanente. Ficamos com a generosidade da verdade destas fraquezas humanas para agradecer a estas super-atletas.

30 Jul 2021

Testagem obrigatória

Soube-se na semana passada que os departamentos de saúde da Província de Guangdong, da cidade de Zhuhai e de Macau estabeleceram contacto após os Serviços de Saúde ter identificado alguns residentes de Macau que estiveram em contacto com pessoas infectados com COVID, na cidade de Zhongshan. Estes indivíduos foram testados e observados por uma equipa médica.

De acordo com o comunicado da cidade de Zhongshan, a 22 de Julho foi detectado um caso de infecção numa pessoa assintomática que estava a regressar a Guangdong, vinda de uma zona de risco mediano. Esta pessoa apanhou um voo no Aeroporto Internacional de Nanjing, durante a tarde de 19 de Julho. Posteriormente, apanhou outro avião de regresso ao Aeroporto Zhuhai Jinwan. De seguida, foi transportada no autocarro que liga o Aeroporto à estação ferroviária de Zhuhai, onde apanhou o comboio para Zhongshan. Durante este período, um total de cinco residentes de Macau tiveram contactos com esta pessoa. Os Serviços Saúde fizeram diligências para que fossem todos testados e submetidos a observação médica. Foi também feito um apelo aos residentes para que sempre que haja contacto com pessoas infectadas se dirijam de imediato ao Centro de Coordenação de Contingência do Novo Tipo de Coronavírus.

O Governo de Macau reajustou prontamente as medidas de combate à epidemia para todas as pessoas que entrem ou saiam da cidade de Zhongshan. A partir das 21h de 23 de Julho, todos os que tenham estado em Zhongshan depois de 19 Julho têm de apresentar um certificado de teste negativo, com a validade máxima de 48 horas.

Como existiram contactos próximos com residentes de Macau, o Governo afirmou que existe uma possibilidade de aparecimento de surtos na comunidade e apelou à vacinação urgente de toda a população. No entanto também sublinhou que não é caso para preocupação.

Embora a notícia de alguns residentes de Macau terem tido contacto com uma pessoa infectada não seja boa, na conferência de impressa surgiram outras que são animadoras. O Governo fez saber que existe um Plano de Testagem Universal Obrigatório (PTUO). Este Plano tem já todas as condições necessárias para avançar, em termos de materiais e de recursos humanos, no entanto ainda não existe data para a sua implementação.

Este plano representa uma segurança para todos os residentes de Macau. Como a epidemia não pode ser erradicada de um dia para o outro, a possibilidade do aparecimento de um surto na comunidade continua a existir. Na ausência de medicamentos que possam tratar quem contrai o vírus é fundamental rastrear a população. Para implementar o PTUO o Governo tem de fazer um grande investimento em recursos humanos, em recursos materiais e financeiros.

O Governo já afirmou que está tudo a postos para a implementação do Plano. Existe capacidade para lidar com um eventual surto que apareça na comunidade, não há necessidade de pânico.

É inegável que o investimento que é necessário fazer para o PTUO é muito grande e só deve ser levado a cabo se necessário. Não é uma estratégia de segurança a longo prazo. Devido à pequena dimensão territorial de Macau, se os recursos o permitirem, poderemos considerar a implementação regular do PTUO em diversas áreas? Com esta medida, mesmo que haja contactos de risco, podemos detectar mais rapidamente as infecções. Além disso, de forma a incentivar mais pessoas a serem testadas, devemos considerar a redução do custo dos testes. Só quando as pessoas decidirem fazer o teste voluntariamente, poderemos garantir a saúde de todos.

Houve ainda outra boa notícia divulgada na conferência de imprensa. O Governo vai convidar especialistas da China, da Comissão Nacional para a Saúde, para visitarem Macau e darem formação sobre o trabalho que é necessário efectuar para prevenir a epidemia.

A China é um país de grandes recursos e pode facilmente travar a propagação do vírus e reduzir o número de infecções. Os especialistas vão trazer esta experiência para Macau. As medidas que a cidade tomar para prevenir a propagação do vírus serão mais eficazes e a saúde de todos os residentes estará mais assegurada. É uma verdadeira mais valia. O Director da Secretaria para os Assuntos Sociais e Cultura, Ouyang Yu, afirmou que os especialistas vêm a Macau para inspeccionar as condições de prevenção e controlo e para fazerem sugestões relevantes, que irão ajudar na reabertura de fronteiras entre Hong Kong e Macau e também a facilitar a reabertura de fronteiras entre a China continental e Macau.

Desta vez, o aparecimento de contactos de risco na comunidade acabou por representar uma experiência valiosa que vai permitir compreender melhor a necessidade do Plano de Testagem Universal Obrigatório. Nas condições actuais, a única forma de identificar infecções, e impedir a sua propagação, é através da testagem.

 

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Escola Superior de Ciências de Gestão/ Instituto Politécnico de Macau
Blog:http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog
Email: legalpublicationsreaders@yahoo.com.hk

27 Jul 2021

A treta do teletrabalho e do ensino à distância

Em tempos de confinamento foi instituído o chamado teletrabalho, ou seja, os trabalhadores que normalmente trabalhavam a uma secretária com um computador na frente, passaram a ficar em casa e realizavam as tarefas laborais a partir da sua residência. Sobre este tipo de trabalho existem as mais inúmeras histórias, algumas muito vergonhosas. As empresas começaram a abusar dos seus trabalhadores querendo que efectuassem mais horas das que estavam estipuladas anteriormente quando exerciam a função na sede da companhia ou no escritório de uma sociedade. O confinamento foi terrível, os casais estavam em casa com os filhos e a maioria não conseguia concentrar-se no trabalho para tratar ou distrair os filhos. As reivindicações dos trabalhadores em teletrabalho começaram a suceder-se porque as empresas não pagavam as despesas inerentes a esse trabalho via computador.

Não pagavam a electricidade, a internet, as refeições quando em alguns casos os funcionários tinham refeições na empresa. Trabalhar em casa é um desassossego. Para além da atenção que se tem de dispensar constantemente aos filhos menores, tocam à porta o carteiro, a vizinha, o funcionário da EDP, o da EPAL, o do Gás, é um corrupio de interrupções para quem está a trabalhar. As empresas começaram a queixar-se que os trabalhadores interrompiam muitas vezes o trabalho via net. Pudera, como é que se pode estar concentrado e continuamente a laborar se em casa não há descanso? O problema tem feito correr muita tinta e há quem já se tenha sujado, como por exemplo, alguns sindicatos que não mostram competência nem destreza para resolver o problema dos seus associados. Quem tem sofrido mais têm sido ax mulheres, que para além do que ficou referido, ainda têm de sair de casa muito cedo para comprar os mantimentos, voltar para iniciar o teletrabalho, cozinharem o almoço e às vezes o jantar para o marido e filhos e voltar para o computador e desligando o telemóvel, caso contrário, as chamadas não paravam. A pandemia instalou-se, o incentivo à vacinação teve início e quando se perdem horas e horas para se receber uma dose da vacina, como é que é possível estar em teletrabalho? O que tem deixado muita gente trabalhadora preocupada é o facto de muitas empresas pretenderem que o teletrabalho continue ad eternum, o que desagrada imenso a quem trabalha. O problema não tem tido solução e dificilmente as partes chegarão a um acordo. Já não chegava a preocupação de se apanhar a covid-19 – que ainda na semana passada matou algumas dezenas de pessoas – e ainda querem obrigar os trabalhadores a ficar em casa a exercerem a sua função. Não, assim, Portugal não progride em nada.

Quase no mesmo sentido temos outro grave problema: o ensino à distância. Como sempre decreta-se em cima do joelho e o mexilhão é que paga. São os jovens estudantes mais pobres que estão a sofrer essa medida de obrigar os alunos a ficar em casa à frente do computador e o professor do outro lado à distância de uma fibra óptica. Não, isto não pode acontecer. Os alunos pobres nem têm computador e muitos pais nem sabem onde ir buscar dinheiro para pagar a internet. Concretizar o programa de investimento para a digitalização das escolas, elaborar um plano estratégico de substituição dos meios digitais, aperfeiçoar o sistema de gestão escolar, foram algumas das recomendações do Tribunal de Contas (TdC) ao Ministério da Educação na auditoria que fez ao ensino à distância, em substituição das actividades educativas e lectivas presenciais. O ensino à distância tem provocado um enorme esforço de alunos e professores, especialmente na implementação dos métodos para se ensinar. A auditoria do TdC acrescentou um pormenor de suma importância, quando salienta que a falta de meios digitais, o obstáculo mais significativo ao ensino à distância, beneficiou da solidariedade da sociedade em geral e da crescente adaptação e sofisticação dos procedimentos de suporte adoptados. Embora essa falta tenha sido mitigada por doações e empréstimos por parte das autarquias locais, associações e entidades privadas, não foi solucionada, substituindo um número não quantificado de alunos sem os meioss apropriados. E quando uma auditoria de uma instituição séria como o TdC afirma que a falta de meios para os alunos é uma realidade, estamos em que país? O Orçamento de Estado não fez previsões para que os alunos mais pobres fossem contemplados com um computador e um subsídio para pagar a internet?

Um outro facto que está a perturbar o país é a constatação de que os jovens do ensino superior têm vindo a abandonar a escola e desistem de terminar os cursos superiores, o que tem provocado um aumento de desemprego entre a juventude. Quase 13 mil estudantes que se matricularam no ensino superior em 2018 já não estavam no sistema um ano depois, o que corresponde a mais de 11%. No total, 12.726 entre os cerca de 112 mil alunos que começaram a estudar no 1º ou no 2º ciclo do ensino superior em 2018 já não voltaram à universidade no ano seguinte e isto tem vindo a acontecer anualmente. A primeira consequência é que estes jovens dirigem-se ao departamento de desemprego e a este nível a plataforma mostra que no segundo semestre de 2020 o número de estudantes inscritos como desempregados aumentou de 3,3% para 4,6% no ensino público e de 3,9% para 5,7% no privado. Mais uma vez, temos de desabafar com a expressão que denomina a nossa crónica: Ai, Portugal, Portugal…

26 Jul 2021

Hierarquia das leis

Fui deputado na Assembleia Legislativa (AL) durante quatro anos e nesse período aprendi muito sobre legislação. Por exemplo, em que circinstâncias é que uma lei se sobrepõe a outra, ou seja, tudo o que se relaciona com a hierarquia das leis. Durante o período de transição para a soberania chinesa, quando a Lei Básica de Macau estava a ser elaborada, formei um Grupo de Reflexão com amigos cristãos e convidei especialistas e universitários para darem algumas palestras. Foi assim que fiquei a saber que a Contituição da República Popular da China (RPC) obedece rigidamemente ao Sistema Jurídico de Direito Continental, e que a Lei Básica de Macau deriva dos postulados desta Constituição. Por isso, a Lei Básica é também referida como a “mini-constituição” de Macau, encontrando-se no topo hierárquico de todas as leis da cidade. É a pedra ângular que assegura o princípio “Um País, Dois Sistemas”.

No Capítulo III (Direitos e Deveres Fundamentais dos Residentes) da Lei Básica de Macau, o Artigo 25 estipula claramente que “os residentes de Macau são iguais perante a lei, sem discriminação em razão de nacionalidade, ascendência, raça, sexo, língua, religião, convicções políticas ou ideológicas”. O Artigo 26 estipula ainda que “os residentes permanentes da Região Administrativa Especial de Macau têm o direito de eleger e de ser eleitos, nos termos da lei”. Mas o que são os “Direitos Fundamentais”? De acordo com o sumário do acórdão do Tribunal de Última Instância relativo ao Processo n.º 81/2021, “os ‘direitos fundamentais’ podem ser entendidos como ‘direitos inerentes à pessoa humana e essenciais à sua vida (digna)’; são direitos ‘irrenunciáveis’, ‘inalienáveis’, ‘invioláveis’, ‘imprescritíveis’, ‘universais’, ‘concorrentes’ (na medida em que podem incidir em concomitância a outros direitos fundamentais), e ‘complementares’, pois que devem ser interpretados em consonância e em conjunto com o sistema jurídico”.

A decisão da Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL) de desclassificar 21 candidatos, pertencentes a seis grupos, à próxima eleição por sufrágio directo para Assembleia Legislativa abalou Macau, uma pequena e pacífica cidade. Como a CAEAL apenas deu uma conferência de imprensa durante a tarde do dia em que a decisão foi anunciada, quando os candidatos desqualificados e os grupos a que pertencem pediram a documentação que suporta a decisão da CAEAL, para ficarem a par dos critérios subjacentes, as pessoas ficaram com a sensação que esta tinha sido uma decisão de última hora.

É preciso que se compreenda que privar os residentes permanentes da RAEM do direito de serem eleitos equivale à privação de direitos políticos na China continental, e terá um grande impacto nos “Direitos Fundamentais” dos residentes da RAEM, especialmente naqueles que são considerados “ilegíveis” para se candidatarem a deputados da Assembleia Legislativa. Neste grupo estão incluídos actuais e antigos deputados da AL e algumas caras novas.

Quando a “desclassificação de deputados” é feita de forma incorrecta, as principais vítimas serão o princípio “Um País, dois Sistemas” e a Lei Básica de Macau. Se as autoridades continuarem a estreitar cada vez mais o conceito de “patriotismo” e a acrescentarem mais claúsulas e critérios à Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa da RAEM, em que é que se irá transformar o processo eleitoral?

Na informação facultada pelo Governo, recolhida através de redes sociais e outras plataformas, protestos e outras actividades, e também disponibilizada pela CAEAL, através da Secretaria para a Segurança para “análise e apreciação”, que provas concretas se podem encontrar? Acredito que essas provas serão reveladas uma a uma depois de os candidatos desqualificados terem apelado ao Tribunal de Última Instância. As diversas provas devem ser reveladas ao público; para que os residentes da cidade possam ficar a saber em que sociedade estão a viver.
Assim sendo, quando a Lei Básica se confronta com a Lei Eleitoral, qual delas deve recuar?

23 Jul 2021

O acelerador e o travão do desejo sexual feminino

A complexidade e a falta de compreensão à volta do desejo sexual feminino não são fáceis para ninguém. Estas ideias levam à assumpção de que algo de errado se passa com as mulheres. A Emily Nagoski apercebeu-se disso quando dava aulas de psicologia e sexualidade em contexto universitário. Muitas mulheres lhe confidenciavam as suas aflições. Esta investigadora assim trabalhou para desmistificar o desejo sexual à luz dos vieses actuais. Até publicou um livro para partilhar o que se sabe sobre o assunto (“Come as you are: the surprising new science that will transform your sex life”).

A sua investigação mostra que há um duplo sistema responsável pelo desejo, ou seja, não se trata de um só termómetro que aquece e arrefece mediante factores específicos. São sim dois sistemas: um que acelera e outro que trava o desejo sexual. Ambos os sistemas trabalham com sensações e percepções. Ver, sentir, cheirar ou pensar.

Estar enroscada com outra pessoa pode estimular o acelerador, mas, por exemplo, preocupações ou stress podem pôr o travão a fundo. Os aceleradores podem ser múltiplos: ambiente, preparação, antecipação, velas, erotismo, sensualidade. Os travões podem ser múltiplos também, até podem ser narrativas culturais do que se acha do sexo ou do nosso corpo.

Não vivemos num tempo especialmente sex-positive. A educação sexual continua presa à prevenção da gravidez e das doenças venéreas sem abordar o prazer. A constante critica ao corpo também continua bem de saúde, não fosse a gordofobia internalizada em tudo o que se faz hoje em dia. Todas estas ideias podem transformar-se em travões.

As sociedades contemporâneas também oferecem pouco tempo para se estar, pouca disponibilidade para parar. Andamos entre velocidades estonteantes que nos impossibilitam a conexão.

Mas os travões não funcionam com toda a gente da mesma forma, nem são consistentes. Dependem muito do contexto. E deixem-me clarificar que esse contexto é mental, um estado de espírito a que o nosso ambiente nos proporciona. A autora costuma dar o exemplo das cócegas. Há alturas em que cócegas nos entusiasmam e até nos fazem enrolar para mais uns beijos e amassos. Há alturas em que as cócegas são mais irritantes do que outra coisa.

Por isso, não há fórmulas perfeitas para os aceleradores e travões, a verdade é que estes exigem experimentação e auto-conhecimento. Nem as narrativas sociais tão complicadoras do sexo são determinantes para o que quer que seja. O importante é que haja consciencialização acerca destes processos. A autora sugere fazer listas dos nossos momentos sensuais. Perceber quais são os nossos aceleradores e os nossos travões. Perceber também que eles não vão funcionar da mesma forma ao longo da nossa vida. O corpo e a mente passam por muitas transformações. A menopausa tende a ser um período menos propício ao desejo sexual, por exemplo. O período pós-parto também. A medicação anti-depressiva faz com que a líbido se vá abaixo, entre outros factores.

Os ingredientes perfeitos para o desejo sexual são muitos e personalizáveis. Importante referir, contudo, que quando há menos vontade para o sexo normalmente é o travão que está mais reactivo, e não uma falha do acelerador. Em vez de se acreditar na incapacidade de sentir desejo, a verdade é que pode existir um bloqueador do desejo. É esse que normalmente precisa de ser tratado. Os estilos de vida em que tudo era suposto estar pronto para ontem, as preocupações que aí advêm, a dificuldade em ser mulher de carreira e uma mulher de família podem tornar o travão mais sensível. O ideal, segundo a autora, é ligar o acelerador e desligar o travão. Uma perspectiva simples na teoria, difícil na prática, mas que ajuda a perceber a dinâmica do nosso potencial sexual.

21 Jul 2021

Seguro de saúde obrigatório

A semana passada, uma organização não governamental levou a cabo uma sondagem junto da população sobre várias questões de ordem social. O evento teve lugar na Rotunda de Carlos da Maia. Alguns inquiridos afirmaram que, à medida que envelheceram, as despesas com a saúde aumentaram, tornando-se um peso significativo no orçamento familiar. Outros referiram que embora nos hospitais públicos possam ter acesso a consultas especializadas, o tempo de espera é muito dilatado e acabam por ter de procurar ajuda em hospitais privados ou em clínicas fora de Macau, o que implica enormes despesas. Estes problemas têm de ser abordados com clareza.

Ao abrigo do actual sistema de saúde de Macau, para os residentes permanentes os cuidados de saúde primários estão assegurados gratuitamente. Estão também isentas as grávidas, as crianças até aos 10 anos de idade e os estudantes do ensino primário e secundário. As pessoas a partir dos 65 anos, que se encontrem numa situação de pobreza extrema também podem receber cuidados médicos gratuitos. Estão igualmente isentos os pacientes do foro psiquiátrico e oncológico. No entanto, as diálises e as cirurgias cardíacas são cobradas.

Há algum tempo, o Governo de Macau encomendou um estudo à Universidade sobre a possibilidade de se criar um seguro de saúde obrigatório (SSO). O estudo revelou que apenas 33 por cento das pessoas concordava com a sua implementação e que 67 por cento dos inquiridos estava satisfeito com o sistema actual.

O SSO garante cuidados de saúde através da mediação de uma seguradora, que permitiria a todos os residentes cuidados nesta área, libertando-os da preocupação com as despesas no caso de virem a adoecer. O princípio é bom, mas coloca-se a questão de quem deveria pagar os prémios dos seguros, se deveriam ser os cidadãos, o Governo, ou se deveria ser uma responsabilidade partilhada. Após a implementação do SSO, os residentes esperam poder continuar a desfrutar dos actuais cuidados de saúde gratuitos.

Agora coloca-se a dúvida se o Governo terá capacidade financeira suficiente para a implementação do SSO. O estudo acima referido menciona que as despesas com a saúde representam 10 por cento do orçamento do Governo. Em Hong Kong e em Taiwan esta área representa respectivamente 16 por cento e 25 por cento dos orçamentos de cada um dos Governos. Em Macau, esta percentagem é mais baixa porque os serviços básicos de saúde são relativamente bons e a procura por serviços especializados não é muito alta. Se tivermos como referência Taiwan, as despesas do Governo de Macau com a saúde podem vir a aumentar após a implementação do SSO.

Referi nesta coluna a passada semana o relatório “Previsão sobre a População de Macau para 2016-2036”, assinalando que em 2026, a percentagem de pessoas com mais de 65 anos seria de 16 por cento, um total de aproximadamente 157.600 indivíduos. No segundo trimestre de 2020, as pessoas com mais de 65 anos representavam 12.9 por cento da população, um número que se aproxima do padrão estabelecido pelas Nações Unidas para identificar uma sociedade com uma população envelhecida. Quanto mais velhos ficamos maiores são as hipóteses de adoecermos. A estatística demonstra que os residentes de Macau estarão cada vez mais dependentes do sistema de saúde, uma situação que merece ser analisada.

A implementação do SSO garante a todos os residentes cuidados de saúde mesmo que não tenham capacidade financeira, mas este sistema não resolve a questão da qualidade dos serviços. E se a qualidade não puder ser assegurada, mesmo que todos os residentes de Macau venham a ter acesso aos cuidados de saúde?

A epidemia afectou os rendimentos dos residentes bem como os do Governo. Embora o princípio do SSO seja bom, é possível que não seja realista investir uma grande quantidade de fundos neste momento. Nesta fase, de forma a lidar com os problemas de saúde causados pelo envelhecimento gradual da população, além da manutenção do sistema actual, deveríamos considerar fortalecer os cuidados médicos para o grupo etário entre os 51 e os 64 anos, reduzindo o tempo de espera para as consultas de especialidade. Este grupo beneficiaria em termos imediatos e de igual forma beneficiaria toda a sociedade de Macau.

 

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Escola Superior de Ciências de Gestão/ Instituto Politécnico de Macau
Blog:http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog
Email: legalpubma a reduzir o tempo de esperalicationsreaders@yahoo.com.hk

19 Jul 2021

Temos pena dos restaurantes

Não faço ideia como tem sido em Macau e como é que os restaurantes têm sobrevivido. O que vos escrevo é que em Portugal tem sido uma desgraça. Os restaurantes estão quase todos na falência. A culpa não é da pandemia. É de quem não sabe gerir o país. Dou-vos um exemplo: os supermercados estão cheios de gente porque não se pode prejudicar os magnatas como os Azevedos da cadeia Continente, as pessoas passam ao lado umas das outras, param para ver os produtos e recolhem-nos mesmo encostadas umas às outras, algumas tiram a máscara por falta de ar no interior dos estabelecimentos que nem possuem ar condicionado digno desse nome. E qual é a diferença entre os supermercados e os restaurantes, se as regras do distanciamento de mesas têm sido cumpridas em todo o país?

Ninguém entende as últimas regras decretadas pelo Governo de só se poder entrar num restaurante se tiver o Certificado Digital de Vacinação, ou um certificado passado por uma farmácia de que o teste acusou negativo, ou ainda pior, se à porta do restaurante o cliente perder meia hora para realizar o chamado auto teste.

Os proprietários dos restaurantes andam desesperados. Alguns, muitos, já encerraram as portas porque o tal apoio governamental que foi anunciado nunca chegou. Os donos dos restaurantes têm família para sustentar, muitos têm os pais em lares, os filhos nos estabelecimentos de ensino onde as propinas não são baratas. E essencialmente têm os salários para pagar dos cozinheiros, empregados de mesa e pessoal de limpeza. Ninguém se apercebeu que muitíssimos portugueses davam de comer a muita gente à mesa do seu restaurante, mas também sustentavam muitas famílias. Mas encerraram. Deixaram de ter o ganha-pão. E quem os ajuda agora? Os familiares ou tentam abrir um restaurantezinho num bairro baratinho. Os horários que as inteligências governamentais puseram em vigor são um absurdo e tudo isto só tem tido um fim: os restaurantes estão vazios e temos mesmo pena de ver a situação dos estabelecimentos de venda de comida.

As novas regras de controlo e testagem à entrada dos restaurantes localizados em zonas de risco elevado já causaram perdas próximas dos 90%. A garantia foi-nos dada pela Associação Nacional de Restaurantes, que, com base num inquérito realizado há dias concluiu que nas salas interiores dos restaurantes com esplanada, verificou-se uma perda de 83,9% de clientes. Isto é muito triste para quem trabalhou uma vida inteira a servir o seu semelhante. E nos restaurantes sem esplanada a perda de clientes superou os 87%. A referida Associação salientou que estas últimas medidas tiveram um brutal impacto e veio criar enormes injustiças e que são muito discriminatórias, pois perante esta dificuldade, a maioria dos clientes dirige-se para restaurantes com esplanadas. A defesa da saúde pública não justifica tudo, mais a mais, quando há discriminação. As regras têm de ser bem pensadas antes de entrarem em vigor. A Direcção-Geral de Saúde não pode sequer pensar, como tem feito, que lá por um cidadão já ter recebido as duas doses da vacina contra a covid-19 que já não há problema na entrada nos restaurantes, enquanto aqueles que ainda não foram ou não querem ser vacinados têm de ir comer ao Tota…

A Associação dos Restaurantes fala ainda na reposição das restrições anteriores que permitiam os restaurantes funcionarem de segunda à sexta-feira até à meia-noite, alteração que passa pelo funcionamento ao sábado e domingo à noite desde que os clientes estejam munidos do Certificado Digital. O que nós não concordamos porque essa obrigação da amostragem do certificado só nos tem mostrado que estamos perante uma jogada das autoridades para que o povinho seja obrigado a ir vacinar-se, caso contrário, terá de deixar de pensar em ir almoçar ou jantar fora de casa.

Mas o inquérito realizado traz ainda mais conclusões, como 44,1% dos empresários recusam-se a fazer auto testes preferindo perder clientes do que terem que pagar uma multa irracional de 10.000,00 euros. Os empresários estão assustados e impreparados para decisões que se tomam de um dia para o outro. E têm razão para isso porque cada vez há mais falta de vagas nas farmácias para a realização de testes, dúvidas nos procedimentos em relação aos testes, onde colocar os testes usados e como fazer no caso de algum cliente estar infectado, são algumas das dúvidas dos proprietários dos restaurantes e dos clientes. O Governo tem de arrepiar caminho para que o objectivo principal seja não perder mais um Verão e que o negócio em baixa leve mais restaurantes a encerrar. Os proprietários desesperam porque todos os dias têm de comprar o peixe, a carne e os mantimentos necessários para preencherem a ementa.

A verdade é que nos dá um grande dó passar por certos restaurantes e ver que nem um cliente está a ocupar uma mesa. Um panorama desolador como este tem de merecer das autoridades algum bom senso. Por ironia, dizia-me um vizinho, a propósito da situação dos restaurantes, que “Portugal está a emagrecer”…

*Texto escrito com a antiga grafia

19 Jul 2021

Ainu

Comunidades indígenas é tema que pouco nos ocorrerá quando pensamos no Japão, ilha distante e relativamente isolada, com notoriedades internacionais várias, desde filosofias e saberes ancestrais até modernos desenvolvimentos tecnológicos, mas a que remotamente associamos a presença de minorias étnicas indígenas, que afinal existem, no seu longo e sistemático silêncio desde que se procedeu a um processo massivo e forçado de assimilação e “integração” na sociedade japonesa, no final do século XIX.

As comunidades Ainu viviam sobretudo na região de Hokkaido, uma ilha no norte do Japão, e num conjunto de outras ilhas, ainda hoje objecto de disputas internacionais com a Rússia, num trajecto marítimo que conduz à costa oriental russa. Com uma língua própria, não escrita, que se foi transmitindo oralmente, esta comunidade antecipou muito largamente a chegada de habitantes japoneses a Hokkaido, o que só aconteceria no final do século 19, para edificar a cidade de Sapporo e iniciar a ocupação da ilha.

A hostilidade foi grande desde o primeiro momento, incluindo também o universo académico, com grande centralidade, política e geográfica, na nova cidade de Sapporo. Ainda hoje o vasto campus da Universidade de Hokkaido fica situado em pleno centro urbano e já era um dos elementos centrais na planta e no conceito original desta nova cidade construída numa área quase inabitada do planeta. E é esse “quase” que assinala as relevantes diferenças: se não é original colocar uma universidade (neste caso uma escola de estudos agrícolas, na sua formulação original) no centro da urbe, já a presença de comunidades indígenas anteriores à chegada da população dominante no país foi uma novidade na evolução histórica da sociedade japonesa que ainda hoje coloca problemas por resolver.

A relação da população do Japão com as comunidades indígenas Ainu foi desde o início de imposição e assimilação: com o importante suporte ideológico de um professor vindo dos Estados Unidos para liderar a fundação da Universidade de Hokkaido (ainda hoje omnipresente na estatuária da cidade de Sapporo), as comunidades Ainu – e os territórios que ocupavam – foram juridicamente integradas na sociedade japonesa, quer em termos das suas identidades como pessoas, quer no que respeita aos seus nulos direitos de propriedade sobre o solo, ao contrário do viria a suceder noutros países com comunidades em situação semelhante. Na realidade estas comunidades foram obrigadas a relocalizar-se e a sua língua foi proibida.

Mais de um século passaria até haver um parco reconhecimento das comunidades Ainu, em 1997, relacionado com alguns aspectos culturais específicos, incluindo a língua, mas sem qualquer direito à posse de terras ou compensação pela imposição forçada de normas sociais estranhas à população. Na realidade, só quando Hokkaido acolheu magna reunião do denominado “G8” (em 2008, um anos depois da publicação da declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas), o governo japonês viria a reconhecer os Ainu como população indígena a viver em território japonês. Essa reconhecimento só viria a assumir plena força de lei em 2019, definindo-se a comunidade Ainu como uma minoria étnica no país.

A lentidão, injustiça e mesmo violência com que os processos administrativos impuseram a assimilação das comunidades ao longo de mais de um século tiveram naturalmente impacto nos modos de vida de cada uma das pessoas que lhes pertencia – e que eram inevitavelmente tratadas como de segunda categoria no próprio país onde sempre tinham habitado. Esse estigma fez com que, até aos dias de hoje, as pessoas de etnia Ainu evitassem assumir publicamente as suas origens.

Também a nível universitário a relação conflictual havia de ser prolongada – e ainda hoje não resolvida. Na realidade, o meu único contacto directo com membros da comunidade Ainu deu-se há quase 10 anos, quando trabalhava temporariamente num projecto na Universidade de Hokkaido. Em frente ao portão principal do campus, um pequeno grupo de pessoas Ainu reivindicava a devolução dos cadáveres que, com fins científicos, tinham sido expropriados aos seus antepassados durante a primeira metade do século 20 e que nunca tinham sido devolvidos. Um problemas de difícil solução hoje, portanto, e que continua a assinalar a tensão duradoura entre a academia e as comunidades indígenas de Hokkaido.

Na realidade, ainda que a Universidade tenha inaugurado em 2005 um centro de estudos dedicado às comunidades Ainu e indígenas, só agora ali trabalha uma investigadora de origem Ainu. A assinalar a sua entrada no centro, Mai Ishihara dá uma entrevista à página de internet da Universidade onde, entre outras coisas, descreve a forma como toda a vida omitiu as suas origens, que na realidade só lhe foram reveladas pela família quando já tinha 12 anos. Mesmo já adulta e a trabalhar na Universidade, a investigadora explica as dificuldades e hesitações que teve para assumir publicamente as suas origens ancestrais na sociedade japonesa contemporânea.

E no entanto, as comunidades Ainu que ainda hoje são vistas de forma preconceituosa e estigmatizadas como categoria social inferior, acabam por ser usadas como atracção turística na região de Hokkaido, onde visitei vários museus dedicados às suas tradições culturais e até uma “aldeia Ainu”, onde supostamente se realizariam performances artísticas da comunidade e se venderia o seu artesanato(o que afinal não foi propriamente o caso). Na realidade, nem nos museus, nem na dita aldeia voltei a ter oportunidade de contactar pessoas Ainu. Talvez esta integração num centro universitário de uma investigadora que assume a sua origem Ainu constitua um tardio mas relevante passo no sentido do reconhecimento de pleno direito desta comunidade. Talvez o museu nacional Ainu que abriu no ano passado em Hokkaido constitua outro passo importante. Mas até agora a tradição cultural Ainu tem servido mais para promover o turismo de Hokkaido do que para reconhecer os direitos de uma população historicamente oprimida, segregada e auto-silenciada.

16 Jul 2021

Segurança prateada

A Comissão dos Serviços de Aconselhamento à Comunidade de Macau regista as opiniões dos residentes sobre problemas do dia a dia, orienta pesquisas e é também um órgão consultor do Governo de Macau. Durante a reunião de 7 de Julho, analisaram-se as questões relacionadas com as “Finanças Prateadas”, ou seja, a situação financeira dos mais idosos.

O relatório “Previsão da População de Macau entre 2016-2036” assinalou que a população está a envelhecer. Em 2026, as pessoas acima dos 65 anos vão representar 16 por cento dos residentes, cerca de 157.600 indivíduos.

Segundo as Nações Unidas, se os maiores de 65 anos excederem 14 por cento dos habitantes, essa região tem uma população envelhecida. Embora o relatório assinale que Macau só estará nessa situação em 2036, a Direcção dos Serviços de Estatística e Censos de Macau assinalou que no segundo trimestre de 2020, os residentes da cidade com mais de 65 anos já representavam 12.9 por cento da população. Este número está bastante perto da percentagem indicada pelas Nações Unidas como indicadora de uma população envelhecida. É uma situação que merece ser analisada.

“Finança” faz-nos pensar em investimentos, ou seja, “aplicar dinheiro para gerar mais dinheiro”, “prateada” lembra “cabelo branco”, donde “Finança Prateada” é a designação dada aos “investimentos dos idosos”. O Governo não é uma instituição comercial nem tem ambições de lucro. O Governo promove as finanças prateadas, a par do conceito de protecção à terceira idade, com o objectivo de permitir que os reformados tenham um rendimento estável e melhorem a sua condição financeira.

Actualmente, Macau tem implementado um sistema de segurança social com dois níveis. O primeiro é regulado pela Lei No. 4/2010 “Sistema de Segurança Social”, promulgado a 1 de Janeiro de 2011. Ao disponibilizar mais do que um nível de segurança social, permite melhorar a qualidade de vida dos residentes de Macau. Durante a reforma, desde que o período de contribuições esteja completo, os residentes passam a receber 3.740 patacas por mês.

O segundo nível de segurança social é regulado pela Lei No. 7/2017 “Fundo de Previdência Central Não Obrigatório”, promulgado a 1 de Janeiro de 2018. Empregados e empregadores que participem voluntariamente neste sistema pagarão impostos mensais, contribuindo cada parte com 5 por cento do salário do trabalhador. Estas contribuições vão acumulando ao longo dos anos e, ao atingir os 65 anos de idade, o trabalhador pode reaver esse montante para aumentar a sua reforma. Ou seja, este segundo nível permite que os trabalhadores vão acumulando mensalmente numa “conta reforma” de 10 por cento dos seus salários. Como é lógico o valor acumulado depende do salário de cada trabalhador. O ” Fundo de Previdência Central Não Obrigatório ” precisa de ser revisto até 30 de Junho de cada ano. Com a pandemia, os negócios foram afectados e muitas pessoas ficaram sem trabalho. Nestas circunstâncias, é muito pouco provável que o ” Fundo de Previdência Central Não Obrigatório” venha a ser transformado num Fundo Obrigatório. Será necessário apresentar uma proposta que inclua outros métodos para aumentar a protecção na reforma.

Hong Kong já tem o sistema de “finanças prateadas”. Desde 2016, o Governo da cidade começou a emitir acções “prateadas”, que já sextuplicaram desde então. O período de maturidade destas acções é de três anos e os juros anuais variam entre os 2 por cento e os 3.5 por cento. O preço unitário de cada acção prateada emitida em 2021 era de 100 HK dólares, e cada lote de acções continha 100 unidades, com o valor de 10.000 HK dólares. Os investidores podem adquirir até 100 lotes de acções prateadas, o que perfaz 1.000.000 de dólares de Hong Kong. Se o juro anual atingir os 3.5 por cento, com um investimento deste montante, o retorno anual será de 35.000 HK dólares, o que representa um valor mensal de 2.916 dólares. O objectivo da emissão este tipo de acções é permitir que os idosos venham a ter um rendimento estável, e que independentemente de vir a haver inflação ou deflação esse rendimento não diminua. Outra das vantagens das acções prateadas é a sua simplicidade. Os investidores podem obter retornos estáveis sem precisarem de despender muito tempo a administrá-los.

Em Hong Kong para receber 2.916 dólares de Hong Kong por mês é necessário investir um milhão na aquisição de 100 lotes de acções prateadas. Se Macau quiser realmente emitir este tipo de acções, será necessário alterar os requisitos para estar mais de acordo com as condições de vida da cidade e poder vir a beneficiar mais reformados?


Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Escola Superior de Ciências de Gestão/ Instituto Politécnico de Macau
Blog:http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog
Email: legalpublicationsreaders@yahoo.com.hk

13 Jul 2021

O Benfica é enorme

Qualquer português que não seja do Benfica tem a maior consideração e admiração pela obra que muitos presidentes do clube foram edificando, o que é o meu caso. A história do Benfica é quase infinita, incontornavelmente digna. Conquistou miúdos, adolescentes e adultos. Começaram a jogar futebol num campo em que as poucas bancadas eram de madeira. O clube foi tendo adeptos, simpatizantes, sócios e dirigentes. Os jogadores que chegaram a praticar o melhor futebol de Portugal foram engrandecendo o Benfica. Conquistaram campeonatos, taças, torneios. Taças internacionais de campeões. Entre os muitos, José Águas, Simões, Costa Pereira, Neto, Cavém, Ângelo, Cruz, Coluna, Soeiro, Germano, José Augusto, Torres e tantos outros, apareceu um miúdo moçambicano que chegou a melhor do mundo. O Eusébio ofereceu ao Benfica a fama, o prestígio, a genialidade e a vitória. Eusébio deixou pelo mundo golos fenomenais. Eusébio engrandeceu o nome de Portugal pelos cinco continentes.

O Benfica foi crescendo, teve o maior estádio do país, encheu o velho estádio da Luz para festejar a Taça dos Campeões. Criou uma academia de formação de jovens. O seu historial é grandioso, os benfiquistas chamam-lhe “glorioso” e hoje é uma marca mundial de excelência. E por que razão estou a falar do Benfica? Porque me lembrei da confusão, especulação, acusação e detenção de que foi alvo o presidente do Futebol Clube do Porto, Jorge Nuno Pinto da Costa. As televisões andaram mais de uma semana a falar de fraudes, burlas, frutas, crime que o presidente portista teria cometido. No final, assistimos à absolvição total. Pois, esta semana, o circo repetiu-se, desta feita com o presidente do Benfica, Luís Filipe Vieira. A comunicação social enlouqueceu e ficou em histerismo total, com repórteres à porta de casa do presidente do Benfica, na garagem, no estádio da Luz, à porta da polícia, à porta dos amigos do presidente benfiquista, uma vergonha tudo o que se assistiu baseado em especulações e suspeitas.

Anunciam que Luís Filipe Vieira cometeu fraudes, burlas, fugas ao fisco, negócios ilegais de imobiliário, uso dos dinheiros do Benfica, só faltou anunciarem que Vieira tinha já vendido o Estádio da Luz. Luís Filipe Vieira foi sempre toda a vida um homem de negócios. Os benfiquistas sempre souberam isso e elegeram-no seis vezes como presidente do clube. Nos seus negócios pode ter cometido irregularidades, mas há muitos anos que se assistia a uma actividade obscura de certos indivíduos que pretenderam sempre destituí-lo do cargo.

No entanto, que não se misture nunca a grandiosidade do Benfica com a pessoa ou pessoas que dirigem o clube e que devido ao incumprimento da lei deverão abandonar as suas funções no clube. Luís Filipe Vieira tem tido negócios como tantos empresários e alguns deles banqueiros que gozam da liberdade porque sabem tudo acerca das centenas de cidadãos que corromperam. Vieira pode ter estado ligado ao BES, ao Ricardo Salgado, ao Novo Banco, ao “rei dos frangos”, a António Costa ou Mário Centeno, a centenas de outros empresários. A verdade é que durante a semana não se falou em outra coisa: na detenção de Luís Filipe Vieira e muito especialmente, persistindo-se na ideia de que o presidente já não tem condições para exercer o cargo. Ora aqui está o busílis da questão. Temos em Portugal milhares de traficantes, de meliantes, de assaltantes, de negociadores vigaristas, de ladrões e que são do conhecimento das autoridades. O que se lamenta é que as polícias queiram dar nas vistas e autopromoverem-se prendendo de vez em quando alguns nomes sonantes, a fim de passar a ideia ao povo de que actuam sem discriminação, que tanto o pobre como o rico são tratados por igual. E isso, não é verdade. Já prenderam José Sócrates? Já prenderam Ricardo Salgado? Já prenderam Arlindo Carvalho? Já prenderam António Mexia? Já prenderam Zeinal Bava ou Henrique Granadeiro? Já prenderam Moniz da Maia? Já prenderam Nuno Vasconcellos?

Já prenderam Gama Leão? Já prenderam outros presidentes de clubes de futebol? Já prenderam os responsáveis da construção do autódromo do Algarve? Poeira para os olhos é que não admitimos…

A detenção rápida na quarta-feira passada do presidente do Benfica não foi um acto inocente. Sabemos que estão muitos milhões de euros envolvidos nos negócios de Vieira, quer em Portugal ou no Brasil onde usou saques de bancos a que agora é acusado de dever. Sabemos das dívidas que Vieira tem ao Novo Banco. Sabemos que os fundos abutres americanos tentaram salvar ou afundar ainda mais Luís Filipe Vieira. Agora, a preocupação principal de certos grupos, não só de benfiquistas, traduzir-se no afastamento de presidente do Benfica leva-me a retornar ao pensamento sobre o presidente do Futebol Clube do Porto que andou nestas mesmas andanças no seio das televisões e seus comentadores, alguns bons canalhas. O tribunal decidiu que os arguidos fossem em liberdade sob o pagamento de caução e o vice-presidente do Benfica, Rui Costa, uma das glórias futebolísticas assumiu a presidência do clube.

O Benfica continuará a ser grande. O clube irá ao longo dos anos ter novos presidentes. A sua SAD terá que continuar com os negócios de compra e de venda de jogadores. Contudo, ninguém poderá acusar Luís Filipe Vieira que nada fez pelo Benfica ou que enriqueceu à custa do clube. Aconteça o que acontecer ao presidente Vieira, este ficará na história do clube pela obra que levou a cabo, naturalmente com uma página negra se se confirmar que usou o dinheiro do Benfica para os seus negócios pessoais.

*Texto escrito com a antiga grafia

12 Jul 2021

Debaixo da macieira

Segundo reza a história, Isaac Newton estava sentado debaixo de uma macieira quando descobriu a lei da gravidade, depois de ter sido atingido na cabeça por uma maçã que caiu da árvore. Por outro lado, Steve Jobs estava a fazer dieta e comia uma maçã enquanto pensava num logo para a sua empresa. Ao olhar para a maçã depois de lhe dar uma dentada, teve uma epifania e a maçã tornou-se a identidade da empresa.

Estas histórias são lendas que fazem parte do nosso imaginário, mas em Macau no dia 24 de Junho ao fim da tarde, uma grande quantidade de pessoas fez fila junto aos vários quiosques de venda de jornais para comprar a última edição do periódico de Hong Kong “Apple Daily”, facto verídico que todos vimos com os nossos próprios olhos. O número recorde de um milhão de cópias do “Apple Daily” foi vendido nesse dia, e estou em crer que há uma hipótese deste número vir a fazer parte dos Recordes do Guinness. A figura responsável por este fenómeno não foi o director do jornal (Jimmy Lai Chee-ying), mas sim Carrie Lai (Carrie Lam Cheng Yuet-ngor), a Chefe do Executivo de Hong Kong.

É evidente que sentimos dor quando uma maçã nos cai na cabeça, mas Newton não se queixou desse contratempo. Muito pelo contrário, a dor desencadeou a procura da verdade. Steve Jobs sempre teve dificuldade de perder peso, daí a dieta à base de maçãs. Pois foi deste “sacrifício” que nasceu uma ideia brilhante e a maçã (Apple) tornou-se a identidade de uma das empresas mais bem-sucedidas do mundo. Mas imaginemos agora uma pessoa sentada debaixo de uma macieira que é atingida repetidas vezes por uma série de maçãs. Devido à raiva que sente, decide cortar a árvore por ter sido incapaz de evitar que as maçãs lhe caíssem na cabeça. Parece-vos que arrancar a árvore é a solução indicada para o problema?

Durante a minha visita à Malásia, perguntei certa vez ao meu guia se o fruto do durião (coberto de picos) cair da árvore poderia ferir alguém? O guia explicou-me que estes frutos quando amadurecem, caiem das árvores geralmente entre a meia-noite e as 3h da manhã, um horário em que a sombra das árvores não é muito procurada, por isso os acidentes são raros. Se alguém se sentar debaixo de um durião nessa altura e morrer por ter sido atingido em cheio na cabeça por um daqueles frutos cheios de picos, terá de compreender que a culpa foi sua. Não podemos pegar fogo a toda a plantação de duriões só porque os seus frutos podem magoar, certo?

Ainda me lembro que Xi Jinping contou uma vez uma história sobre gaiolas. Xi disse que era necessário haver uma diversidade de pássaros que emitem diferentes sons para lhes dar vida. Ter só a mesma espécie de pássaros e o mesmo som durante todo o dia não cumpre este objectivo. Uma sociedade humana também precisa de uma diversidade de vozes, sejam elas de aprovação ou de crítica. Quem governa tem de escutar atentamente as diferentes vozes da sociedade, analisá-las e usá-las como indicadores da eficácia da sua governação. A difamação, o boato e a incitação à violência são punidos por lei. Mas as vozes da oposição que são apenas toleradas deviam ser ouvidas o maior número de vezes possível.

Na antiga China, existia o chamado Comissário Imperial, a quem o Imperador atribuía a “Espada Imperial” (o símbolo dos poderes arbitrários) que lhe dava o poder de decapitar quem infringisse a primeira lei, sem ter de informar o Soberano. No entanto, nunca ouvi falar de um Comissário Imperial que usasse frequentemente a “Espada Imperial” para castigar e executar pessoas que achasse que tinham infringido a lei, porque eles sabiam que não podiam banalizar o poder que lhes tinha sido conferido. Se um Comissário Imperial usasse com frequência o poder de executar os infractores, sabia que ele próprio acabaria por vir a ser executado.

Sempre admirei a capacidade executiva e a eloquência de Carrie Lam Cheng Yuet-ngor’s, mas tenho dificuldade de concordar com o seu estilo de liderança. Lee Yee, um colunista do “Apple Daily” escreveu a 23 de Junho, “…houve muita especulação sobre o tempo que o“Apple Daily” conseguiria sobreviver antes que os portões da escuridão se fechassem sobre ele. Agora que isso aconteceu, surgiu uma onda de simpatia pelo jornal “Apple Daily” e uma onda ainda maior de desrespeito pelos governantes”.

Embora a macieira já não exista, ainda continuam a cair maçãs no solo, por isso, o que fazer?

9 Jul 2021