Concerto | FIMM traz a Macau jovens estrelas da música mundial

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] cartaz deste ano do Festival Internacional de Música de Macau está repleto de jovens talentos. Entre eles destaque para o pianista russo Lukas Geniusas, para a cantora norte-americana Jazzmeia Horn e para o artesão do vibrafone El Fog. O HM apresenta-lhe as propostas mais frescas do festival que arranca esta sexta-feira

As revoluções musicais foram, quase sempre, protagonizadas por sangue novo que rompe com velhos conceitos. O Festival Internacional de Música de Macau (FIMM) tem no seu cartaz uma panóplia de jovens valores dos mais variados quadrantes musicais.

Além do programa “Bravo Macao!” que tem como objectivo ser uma rampa de lançamento para os novatos talentos locais, destaque para o espectáculo de Masayoshi Fujita, o japonês sedeado em Berlim que em palco dá pelo nome de El Fog. Este é um dos destaques mais contemporâneos num cartaz pontuado pela música clássica. O músico experimental sobe ao palco do Antigo Tribunal no dia 13 de Outubro, para uma performance que leva o espectador numa viagem subtil a um mundo íntimo do vibrafone.

Com uma gama de influências que vão do jazz à electrónica, El Fog é dono de um som evocativo e onírico para ouvir, preferencialmente, de olhos fechados.

Num registo mais clássico, Lukas Geniusas apresenta o seu virtuosismo ao piano no pequeno auditório do Centro Cultural de Macau (CCM) no dia 27 de Outubro. O música russo/lituano irá interpretar um repertório com composições de Chopin, Ravel e Prokofiev.

Oriundo de uma família de músicos, Lukas Geniusas começou a estudar piano aos cinco anos, impulsionado pela sua avó, uma professora do Conservatório de Moscovo.

Voz de poder

Num registo totalmente diferente, o cartaz do FIMM oferece ao público uma prenda de inestimável valor: a voz de veludo de Jazzmeia Horn, cantora norte-americana de jazz.

Com apenas um disco na bagagem editado este ano, “A Social Call”, Jazzmeia Horn tem granjeado os elogios da crítica que vêm na cantora uma sucessora de  Betty Carter, Sarah Vaughan e Nancy Wilson.

A jovem de apenas 26 anos é daqueles fenómenos de tem no palco o seu habitat natural. Dotada de uma voz com grande amplitude, a cantora promete deliciar os melómanos no dia 29 de Outubro num concerto ao vivo na Fortaleza do Monte.

Dois dias antes, a norte-americana dará um workshop na Fundação Rui Cunha onde os apreciadores do jazz cantado podem experimentar a prática da improvisação, assim como outras técnicas de interacção entre instrumentos e voz.

27 Set 2017

Evandro Teixeira, fotojornalista: “Os políticos no Brasil são vergonhosos”

Evandro Teixeira esteve onde poucos conseguiram. Subiu nos palanques, fotografou a ditadura militar e captou o exacto momento em que um jovem cai no chão para morrer logo a seguir. A sua lente registou a febre do futebol no Maracanã, a pobreza das favelas, as visitas oficiais. São 81 anos de vida, 50 anos de carreira. Chegou a ser preso, mas nunca pensou em desistir: afinal de contas, o único fotojornalista que fotografou o corpo de Pablo Neruda numa maca de hospital sempre trabalhou por paixão. Até amanhã as suas imagens estão no Clube Militar, na exposição “Introspecção”, uma iniciativa da Associação de Fotografia Digital de Macau

[dropcap]A[/dropcap]ntes de falarmos das histórias por detrás das imagens, perguntava-lhe como surgiu a oportunidade de fazer esta exposição aqui em Macau.
Veja bem: o ano passado estive na China três vezes, onde fiz algumas exposições. E conheci o curador desta exposição numa dessas viagens. Aí ele perguntou-me se eu gostaria de fazer a exposição aqui em Macau. Foi muito curioso e gratificante estar aqui para ver a exposição porque em 1995 estive aqui, acompanhando a comitiva presidencial de Fernando Henrique Cardoso. Mudou muita coisa, mudou radicalmente.

Quase tudo.
Sim. Eu viajo muito, já expus no mundo inteiro – França, Alemanha, Suiça, sei lá mais onde. Tenho dez livros publicados sobre fotografia, todos esgotados. Trabalhei durante 47 anos no maior jornal do país [Jornal do Brasil], que fechou em 2010. E aí parei. O que faço hoje é dar palestras no Brasil e fora também, e faço workshops. Continuo a fotografar muito.

O ponto mais alto desta exposição serão as imagens que captou durante o período da Ditadura Militar. Como foi fotografar quando havia censura no país?
O Jornal do Brasil teve uma actuação muito grande durante o período da ditadura. Sempre fiz tudo por prazer, e como era contra a ditadura, a minha maneira de brigar com os militares era fotografando. Subir no palanque para fotografar. O Jornal do Brasil foi contra a ditadura e pagou caro por isso. Chegou a fechar. Há uma foto ali, e por causa dela eu fui preso. O jornal era muito inteligente e fazia frases irónicas. E o Governo não gostava. Muitos foram presos, caçados, intelectuais, muitos mortos. Com uma das fotos, no dia seguinte o Presidente me mandou chamar para estar presente no palácio. E aí ele me disse “como ousa publicar uma merda destas na primeira página, e o Presidente tão pequeno ficou lá atrás?”. E eu ri, pedi desculpa e disse que era uma questão de edição. E ele me respondeu “edição é a filha da p…” e me mandou prender. Quando os jornalistas não eram pegos na rua, e quando se publicava algo que os militares não gostavam, acontecia isso.

Desse período tem também uma foto rara de uma marcha que foi feita em 1978.
Estava ao lado do Vladimir Palmeira [político brasileiro] fotografando, e quando vi aquela faixa [que dizia “Abaixo a ditadura – poder ao povo], cliquei. No jornal seleccionamos aquela foto para a primeira página, mas havia dois militares censores lá. Eles perceberam e não deixaram publicar essa, só a que não tinha a faixa. Alguns anos mais tarde publiquei a foto num livro e a designer desse livro se descobriu na foto e o marido, que estava no meio da multidão. Aí começaram a descobrir muita gente, e aí tivemos a ideia de fazer um livro com todas essas pessoas. Quarenta anos depois publicámos as histórias de cem pessoas que estiveram nesse local, e fotografei-as como se tivessem olhando para o Vladimir Palmeira. Esse livro esgotou.

Os abusos da ditadura militar no Brasil © Evandro Teixeira

Acredita que muitos se esqueceram da ditadura? É preciso lembrar a história novamente?
Na verdade a memória do povo brasileiro é muito curta. Hoje em dia faço muita palestra e sempre fotografei no contexto da história. Mostro imagens do Vietname, da Ditadura Militar e também do golpe do Chile, onde também fotografei muito. Fotografei o chileno Pablo Neruda, também fiz um livro sobre Neruda, intercalado com os seus poemas. Nas palestras que dou há muitos estudantes, e isso é bom porque hoje em dia, nas universidades, o período da Ditadura Militar está muito esquecido. Um pouco de propósito da parte do Governo e também das universidades.

Como vê o Brasil dos dias de hoje, depois do impeachment a Dilma Rousseff?
Na verdade a situação do país está tão caótica que as pessoas voltam a falar de ditadura para dar o baixa. Essas pessoas que berram e que cantam isso não viveram essa época da ditadura militar, quando todo o mundo foi massacrado, artistas presos, o Chico Buarque, o Caetano Veloso, músicas censuradas, pessoas mortas. Mas também falam isso porque os políticos são tão corruptos e safados que deixaram chegar o país a este estado. Todo o mundo rouba, mas não tanto como fizeram agora no Rio de Janeiro. Lá está uma loucura, funcionários públicos sem receber. As forças federais foram enviadas pelo Presidente para tentar conter a violência nas favelas.

Esperava encontrar a mesma realidade que fotografou nas favelas, nos anos 60, tantos anos depois? Tinha esperança que algo mudasse?
Houve abandono e não houve um governo para tentar. Todo o mundo foi abandonado. Isso também não justifica o que está acontecendo. A revolta nos presídios, Rio Grande do Norte, Pernambuco, com matanças, é um absurdo. Isso não pode acontecer. Os políticos no Brasil são vergonhosos, e fico pensando: agora vamos ter eleições em 2018. Vamos votar em quem? Não temos um líder.

Não há confiança.
Acompanhei o Lula com o Jornal do Brasil e antes não falava com ele, tinha horror dele. Aí quando ele ganhou as eleições, em 2003, viajei com ele por todo o Brasil, de ônibus. Passei a adorá-lo, amá-lo, porque o que ele dizia parecia que ia mudar o mundo. Ele é bom nisso [aponta para a garganta]. O primeiro Governo dele foi muito bom, e a coisa depois chegou no que chegou. Ele não era aquilo que pregava. O pai do ex-governador do Rio de Janeiro, é Sérgio Cabral, escritor, é meu contemporâneo. Uma figura maravilhosa e começámos na mesma época. Vi o Serginho nascer, e agora o governo do Rio não tem dinheiro nem para pagar a polícia.

Teve momentos em que sentiu medo, quis desistir?
Pelo contrário. Estou com 81 anos, e fisicamente não tenho mais a sua força. Mas de cabeça e memória continuo bem. Não vou pensar em desistir. Em nenhum tipo de cobertura minha disse: “não vai ser possível”. Sempre fiz tudo para conseguir. Houve situações que me diziam “não vai entrar aqui”. Mas eu entrava. O Pablo Neruda, por exemplo. Todos os jornalistas naquela época ficavam no Hotel Carreira, no Chile. E nós estávamos no terraço e tínhamos de cumprir o recolher obrigatório. O Pinochet, o chefe do golpe, não recebia jornalistas. E queríamos achar o Pablo Neruda, que era o conselheiro do Presidente e a pessoa mais importante do país. Soubemos que estava preso. Uma informante minha me disse o hospital onde ele estava, mal tratado. Cheguei lá e o director do hospital não me deixou entrar porque não gostava de jornalistas. Disse-lhe que era amigo dele mas não era nada, era só conversa jogada fora. Quando liguei depois, às dez da noite, ele já estava morto. No dia seguinte o hospital estava cheio de gente, tinha a câmara Leica escondida aqui debaixo do casaco, filmes no bolso. Não tinha como entrar, mas fiquei lá. Passou uma hora, uma das portas abriu por acaso e eu entrei. Quando entro, está o poeta morto na maca. Fotografei primeiro, depois falei com a esposa dele. No dia seguinte fomos para o cemitério, a bandeira do Chile estava no caixão. Pinochet convocou a imprensa, achou que todos iam largar e correr para ele. Eu fiquei lá. Foi emocionante ver todo o mundo no cemitério. Foi lindo. Foi talvez o momento mais dramático e importante da minha vida. Depois de vários anos se soube que ele foi morto alvejado pelos militares. E fui agora ao Chile prestar depoimento, contei o que estou contando agora pra você.

Que Brasil lhe falta fotografar?
Tudo. O Brasil é muito grande, o mundo é muito grande. Toda a viagem onde vou, fotografo. Aqui também fotografei. Outro dia viajei para o Ceará, vi uma menina na rua vestida de bailarina, e disse para o meu amigo: “pára o carro”. Fotografei. Me perguntaram se tinha levado a menina para aquele lugar, mas aconteceu assim.

26 Set 2017

Língua | IPOR promove programa de leitura em português

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Instituto Português do Oriente começa hoje uma série de sessões de leitura com a contadora de histórias Cristina Taquelim em várias escolas de Macau, abarcando um universo de cerca de 500 crianças. O programa pretende dinamizar a leitura em língua portuguesa durante a semana que agora começa.

As sessões realizam-se na Escola Luso-Chinesa da Flora, Escola Zheng Guanying, infantário D. José́ da Costa Nunes, Escola Portuguesa de Macau, Oficinas de Língua Portuguesa para Crianças e Jovens do IPOR e o Curso Geral do próprio instituto.

Na quinta-feira, pelas 19h, no Café Oriente do IPOR a escritora conduz uma sessão aberta de narração de histórias dirigida ao público em geral.

Cristina Taquelim é coordenadora de vários programas de promoção e mediação de leitura, integra a equipa de especialistas do Projecto Casa da Leitura da Fundação Gulbenkian e é fundadora da Associação de Contadores de Histórias.

Além disso, é autora de vários livros de literatura infanto-juvenil, como “Na minha casa somos sete”, editado em Portugal e “Malaquias”, “Uma casa na Lua” e “Corrupio” editados no Brasil.

25 Set 2017

Instituto Cultural | Revelado inventário do património cultural intangível de Macau

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m misto de crenças espirituais e manifestações culturais preenchem o inventário do património cultural intangível que o Instituto Cultural (IC) pretende identificar, reconhecer e salvaguardar, cumprindo o estabelecido na Lei de Salvaguarda do Património Cultural.

A lista de expressões culturais intimamente ligadas ao território inclui 15 manifestações. São elas a Ópera Yueju (Ópera Cantonense), a preparação do chá de ervas, a escultura de imagens sagradas em madeira, o Naamyam Cantonense (Canções narrativas), a música de ritual taoista, o Festival do Dragão Embriagado e a crença e os costumes ligados à adoração a A-Ma.

A estes manifestações culturais, este ano o IC decidiu juntar a crença e os costumes de Na Tcha, o teatro em patuá, a gastronomia macaense, a crença e os costumes de Tou Tei, a crença e os costumes de Chu Tai Sin, a arte dos andaimes de bambu, a procissão do Nosso Senhor Bom Jesus dos Passos e a procissão de Nossa Senhora de Fátima.

O objectivo da actualização do inventário, anunciado na sexta-feira pelo IC, tem em vista a continuidade do levantamento do património de forma a ser inscrito na Lista do Património Cultural Intangível.

25 Set 2017

Exposição | Hong Kong celebra a obra de Fang Zhaoling

Começa esta semana no Club Jockey de Hong Kong uma série de eventos dedicados à expressão artística no feminino como forma de comemorar a vida e obra de Fang Zhaoling. Além da exposição da pintora chinesa, haverá lugar para a projecção de um filme sobre a vida da performer sérvia Marina Abramovic

[dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]ang Zhaoling foi uma testemunha dos vários tumultos e comoções que atravessaram século XX. Desde cedo começou a desenvolver a sua paixão pela caligrafia e pintura com uma intensidade que a haveria de a catapultar para o panteão das artistas chinesas de maior relevo do século passado.

Fang Zhaoling viria a tornar-se numa mestre de caligrafia e pintura chinesa, atravessando fases tradicionais, modernas e contemporâneas.

Esta semana começou um ciclo de eventos que celebram a sua obra e vida. “Painting Her Way: The Ink Art of Fang Zhaoling”, é a exposição que abre ao público na próxima quarta-feira, no Asia Society Hong Kong Center, e que estará patente ao público até dia 31 de Dezembro.

A pintora, filha de um general do Kuomintang que lutou contra as invasões japonesas, viria a perder o pai ainda em terna idade depois deste ter sido assassinado pelos próprios nacionalistas chineses. Durante a década de 1930 é enviada para Manchester para estudar pintura, mas vê-se forçada a interromper a formação devido a uma guerra mundial que se lhe atravessa no caminho. Retorna a uma devastada Hong Kong onde prossegue a sua formação e inicia uma carreira incontornável no mundo da pintura chinesa.

Com uma vida repleta de dramas sociais e pessoais, Fang Zhaoling é um símbolo de perseverança e sucesso face a tremendas adversidades. Como tal, inspira um pequeno ciclo de eventos dedicados a mulheres fortes que encontraram na arte uma forma de luta.

Avó da performance

A inauguração da exposição de Fang Zhaoling começa com uma palestra marcada para quarta-feira às 19h, no Asia Society Hong Kong Center em Admiralty, conduzido pelos curadores da exposição Julia Andrews e Kuiyi Shen. Ambos especialistas em História de Arte, vão apresentar ao público a evolução do estilo pessoal da pintora no contexto chinês e internacional. 

Outro destaque será a apresentação do filme documental “Marina Abramovic: The Artist is Present”, de Matthew Akers e Jeff Dupre. O filme sobre a vida e obra da performer sérvia é exibido no dia 9 de Outubro, pelas 19h, no Asia Society Hong Kong Center.

Marina Abramovic é uma provocadora, uma artista destemida, fascinante e que não tem receios de forçar as barreiras das artes performativas há quase cinquenta anos.

A artista ficou conhecida por explorar a relação entre performer e público, levando essa relação aos limites físicos e psicológicos. A expressão artística de Marina Abramovic, conhecida como a avó das artes performativas, centra-se no confronto com a audiência e na partilha de sofrimento e do desconforto provocado pelo esticar dos limites do corpo humano.

O documentário que será apresentado no dia 9 de Outubro leva os espectador através do mundo de Marina, enquanto se prepara para um dos momentos mais importantes da sua vida artística: a grande retrospectiva da sua obra no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque (MoMA). Além de ser um momento importante na carreira de qualquer artista, a retrospectiva da sérvia serviu para procurar a resposta para uma questão que os seus mais ferozes críticos lhe colocavam há décadas: “porque é que isto é arte?”.

A exibição do filme será precedido por uma palestra com a artista Wen Yau que participou na retrospectiva da artista no MoMa.

Marina Abramovic é um dos nomes mais sonantes do avant-garde e experimentalismo performativo. Uma pioneira e uma revolucionária.

25 Set 2017

Cinema | Inscrições para curso da BIF termina amanhã

[dropcap style≠’circle’]T[/dropcap]ermina amanhã o prazo para a inscrição no concurso que vai escolher 18 talentos locais para participarem num curso preparado pela academia de cinema BIF International Film. A iniciativa vai decorrer ao longo do Festival Internacional de Cinema de Macau e é organizada numa parceria entre a BIF International Film Academy e a Associação de Cultura e Produções de Filmes e Televisão de Macau.

Para participar, os candidatos têm de entregar uma ficha com currículo, onde devem destacar a experiência na área, assim como as principais aptidões. Depois, o júri vai seleccionar os 18 vencedores, sendo a participação está limitada a pessoas com experiência com idades entre os 18 e 28 anos.

Ao longo dos nove dias do programa oferecido pela BIF, os alunos vão ter de produzir duas curtas, com a ajuda de profissionais. Os enredos e os preparativos da pré-produção vão ser feitos antes do curso. Um dos grandes desafios para os participantes é adequarem a produção ao orçamento disponibilizado, que os organizadores definem como “pequeno”, embora não esclareçam o montante.

Entre os 18 participantes, seis vão ser escolhidos do programa que foi realizado no ano passado. A decisão sobre os vencedores vai ser tomada entre sábado e 29 de Outubro e os contemplados vão ser informados a 30 de Setembro.

O curso começa a 1 de Novembro e termina no dia 9. Porém, a 7 de Outubro há um dia de preparação, que visa explicar aos contemplados o que precisam de fazer ao nível da pré-produção das curtas.

21 Set 2017

Concertos | Festival Internacional de Música de Macau arranca a 29 de Setembro

Está à porta o início do maior evento musical do ano em Macau. O Festival Internacional de Música de Macau abre em grande com uma performance operática da obra de Umberto Giordano “Andrea Chénier”. A música vai tomar conta da cidade até ao final de Outubro e o HM mostra-lhe alguns concertos a não perder

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]ma história de amor durante a Revolução Francesa é o pano de fundo para o espectáculo que abre o 31º Festival Internacional de Música de Macau (FIMM). No dia 29 de Setembro, o palco do grande auditório do Centro Cultural de Macau (CCM) recebe a ópera “Andrea Chénier”, uma obra escrita pelo compositor italiano Umberto Giordano e produzida pelo Teatro Regio Torino. O espectáculo, que se repete no dia 1 de Outubro, conta uma apaixonada história de amor cheia de idealismo e espírito de sacrifício que tem como pano de fundo a Revolução Francesa. Repleta de explosões dramáticas, “Andrea Chénier” centra-se em torno de um poeta imbuído de espírito patriótico que se enamora pela filha de uma condessa. À medida que os tumultos avançam, a aristocrata é condenada à guilhotina e o poeta decide seguir a amada no fatídico destino a que havia sido sentenciada.

O concerto insere-se na celebração dos 150 anos do nascimento de Umberto Giordano, o compositor romântico que marcou o mundo da ópera da segunda metade do século XIX. O programa do festival vai proporcionar ao público visitas aos bastidores do espectáculo.

Outro dos destaques do cartaz do FIMM é o concerto da The Deutsche Kammerphilharmonie Bremen, que ocorre também no grande auditório do CCM no dia 20 de Outubro. A prestigiada orquestra traz a Macau a música do imortal Ludwig van Beethoven, por ocasião do 190º aniversário da morte do compositor alemão. A The Deutsche Kammerphilharmonie Bremen, sob a direcção do maestro Paavo Järvi, vai interpretar a dramática “Abertura de As Criaturas de Prometeu”, a clássica “Sinfonia n.º 1” e a  “Sinfonia n.º 3”.

Música na cidade

Parte do cartaz do FIMM vai transbordar para a cidade, com espectáculos ao ar livre. Um dos exemplos disso é a interpretação de “Orfeu e Eurídice” pela Ópera de Israel, que se realiza na Fortaleza do Monte nos dias 21 e 22 de Outubro às 20h. Esta versão operática de Christoph Wilibald Gluck, do século XVIII, é uma das mais conceituadas, desta feita apresentada de uma forma vanguardista em termos de guarda-roupa e abordagem conceptual. A interpretação da Ópera de Israel rompe com os cânones clássicos das tragédias baseadas na mitologia grega.

No dia 26 de Outubro, a Fortaleza do Monte será tomada pelo poder das vozes do Soweto Gospel Choir. O famoso grupo sul-africano apresenta ao público de Macau um concerto vibrante e exuberante, que junta ao canto a dança e o ritmo das percussões africanas. O coro de gospel que celebra 15 anos tem como temas das suas interpretações o elogio da liberdade, algo que lhes valeu dois grammys e um emmy. O grupo que nasceu da explosão de popularidade da Igreja Cristã Zionista na África do Sul tem como influências notórias na sua sonoridade a música de Bob Marley e a forma como a espiritualidade e a música confluem numa só expressão africana.

Para fechar em grande, o FIMM propõe mais uma noite dedicada a Beethoven. No dia 30 de Outubro, pelas 20h, sobe ao palco do CCM a Filarmónica de Viena para deslumbrar a plateia com a 7ª Sinfonia do compositor alemão. O concerto será conduzido pelo jovem maestro Andris Nelsons e irá percorrer também as composições de Wagner para encerrar com chave de ouro a edição deste ano do FIMM.

21 Set 2017

Cinema | Produção local na Mongólia Interior

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] produção local “Our Seventeen” foi exibida na 26.ª edição do Festival de Cinema Galo Dourado e Cem Flores. O evento que tem lugar anualmente em Hohhot, capital da Região Autónoma da Mongólia Interior, seleccionou a película de Emily Chan para integrar a secção dedicada às produções de Macau e Hong Kong.

“Our Seventeen”, é um filme sobre histórias de Macau que conta as lutas internas dos jovens entre o anseio pela idade adulta e o medo de lá chegar. O filme é também uma carta de amor dirigida à juventude. De acordo com o comunicado enviado à imprensa, a produção local “promoveu a cultura cinematográfica de Macau junto dos espectadores e do público mongol, sendo alvo de reacções encorajadoras”.

A exibição contou com a presença de vários convidados de relevo como Yin Xiao, Vice-Presidente da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês de Hohhot da Região Autónoma da Mongólia Interior, Li Xuejian, Presidente da China Film Association e Crucindo Hung Cho Sing, Presidente da Federation of Motion Film Producers of Hong Kong.

Da delegação de Macau presente no Festival do Cinema fizeram parte Chong Siu Pang, representante do Instituto Cultural e os membros do elenco de “Our Seventeen”, Sean Pang e Kylamary.

O “Festival de Cinema Galo Dourado e Cem Flores” é um dos quatro principais festivais de cinema da China, constituindo o mais antigo evento de atribuição de prémios cinematográficos do país.

20 Set 2017

Jornalismo da Lusofonia | Trabalhos a concurso analisados

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] júri da primeira edição do prémio de jornalismo da Lusofonia, organizado pelo Clube Português de Imprensa (CPI) e Jornal Tribuna de Macau (JTM), já começou a analisar os trabalhos candidatos, subordinados ao tema Macau.

O vencedor vai receber o prémio anual, no valor de cem mil patacas, numa cerimónia marcada para 1 de Novembro, em Macau. Ainda de acordo com o regulamento, a entrega da distinção realiza-se alternadamente no território e em Lisboa.

Presidido por Dinis de Abreu, em representação do CPI, o júri integra ainda os jornalistas José Rocha Diniz, fundador e administrador do JTM, José Carlos de Vasconcelos, director do Jornal de Letras, Artes e Ideias, Carlos Magno, pela Fundação Jorge Álvares e por José António Silva Pires, também do CPI.

O prazo de candidatura ao prémio terminou na sexta-feira e registou-se “uma significativa afluência de trabalhos”, disse a organização, sem precisar um número.

O prémio de jornalismo da Lusofonia destina-se a jornalistas e à imprensa de língua portuguesa de todo o mundo, “em suporte papel ou digital”, de acordo com o regulamento.

Este prémio “surge no quadro do desejado aprofundamento de todos os aspectos ligados à Língua Portuguesa, com relevo para a singularidade do posicionamento de Macau no seu papel de Plataforma de ligação entre países de Língua Oficial Portuguesa”, referiu a organização.

O CPI e o JTM, que este ano assinala o 35.º aniversário, contam com o patrocínio da Fundação Jorge Álvares, que promove a continuidade do diálogo intercultural entre Portugal e Macau.

20 Set 2017

Fotografia | World Press Photo regressa à Casa Garden no final do mês

Chegam no final do mês à Casa Garden os trabalhos vencedores da 60.ª edição do mais prestigiado concurso de fotojornalismo do mundo. Este ano Hong Kong não aderiu à mostra pelo que se esperam mais visitantes no território. Entretanto, a parceria com a extensão local foi prolongada por mais três anos e vai contar com um orçamento maior

[dropcap style≠’circle’]T[/dropcap]em início no próximo dia 20 mais uma mostra dos vencedores da edição deste ano do Word Press Photo (WPP). O local escolhido para a exposição continua a ser a Casa Garden por ser, “o mais adequado”, diz Diana Soeiro ao HM. A representante da Casa de Portugal espera ainda um aumento de visitantes. A razão, aponta, tem que ver com o facto de os trabalhos não passarem por Hong Kong. “Esperamos mais de 2000 visitantes, valor superior ao das edições anteriores”, conta.

A Casa de Portugal é ainda responsável pela renovação da extensão da exposição de fotojornalismo por mais três anos e vai ter também um aumento no orçamento que passará para as 18 000 patacas anuais.

Apesar de em Macau o trabalho fotojornalístico não ser considerado com rigor, não é motivo para que as melhores imagens internacionais na área não passem pelo território. O WPP acaba por ser, diz Diana Soeiro, “um bocadinho uma janela para o que se passa lá fora”, sem esquecer que, existem no território vários fotógrafos, “e muita gente com sensibilidade para a imagem”.

Por outro lado, a exposição quer ir mais além e está concebida para atingir um público cada vez mais alargado. “Como temos legendas em Português, Inglês e Chinês, conseguimos chegar a mais pessoas”, diz a responsável.

De qualquer forma, a representante da Casa de Portugal considera ainda que o próprio fotojornalismo poderá estar em crise. A culpa, afirma, é do mediatismo e da facilidade com que hoje em dia se conseguem capturar momentos. “Os telemóveis vieram facilitar essa parte, basta chegar a um evento, tirar umas fotos e o trabalho está feito. Não são precisos grandes equipamentos nem nenhum profissional”. É para contrariar esta tendência que o trabalho da WPP é cada vez mais pertinente: “Uma Fundação como a World Press Photo, com as respectivas exposições espalhadas pelo mundo inteiro, contrariam esta tendência lembrando-nos da importância do fotojornalismo”, remata Diana Soeiro.

Este ano participaram na disputa mais de cinco mil fotógrafos de 125 países, e foram submetidas a apreciação do júri mais de 80 mil imagens.

Homicídio por Alepo

Sem ornamentos, Mevlüt Mert Altintas está de arma em punho. Não se ouve a voz, mas gritava por Alepo. Ao seu lado um corpo. O embaixador russo na Turquia, Andrei Karlov, tinha acabado de ser assassinado enquanto fazia o discurso de abertura de uma exposição de fotógrafos do seu país, na Galeria de Arte Contemporânea de Ancara. “An Assassination in Turkey” é o nome da imagem vencedora, registada pela lente do fotojornalista da Associated Press, o turco Burhan Ozbilici. Antes de ser abatido, Altintas, que fazia parte do dispositivo de segurança do diplomata feriu mais três pessoas.

“A imagem choca, como chocam quase sempre as imagens vencedoras. É meio hollywoodesca”, diz Diana Soeiro. A força, principalmente na tragédia, é uma tónica em muitas das fotografias do WPP. Pode agradar ou desagradar, mas é impossível ficar indiferente. “Pessoalmente custa-me a exposição de um corpo ali e o gesto triunfante do assassino mas infelizmente foi o que aconteceu e é mais um confronto duro como a realidade a que a World Press Photo já nos habituou”, aponta a responsável pela organização.

A China volta a estar em destaque. Desta feita na categoria do quotidiano em que Tiejun Wang arrecada o segundo prémio. A fotografia Sweat Makes Champions mostra, a preto e branco, quatro meninas estáticas, de nódoas negras nas pernas. Treinam para ser as melhores.

20 Set 2017

Emmy’s | Distopias e actualidade lideram estatuetas

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] histórico ‘talkshow’ Saturday Night Live, o drama familiar “Big Little Lies” e “The Handmaid’s Tale”, dominaram os prémios Emmy, que distinguem as produções televisivas norte-americanas.

A 69.º edição da entrega dos prémios decorreu numa cerimónia em Los Angeles em que a política e o Presidente Trump foram as “estrelas” convidadas.

“The Handmaid’s Tale”, baseada na adaptação de um romance homónimo de Margaret Atwood sobre uma América nas mãos de uma seita totalitária, venceu a melhor série dramática e dominou a noite dos prémios de televisão com um total de cinco Emmys.

A série que retrata a violência contra as mulheres ganhou também o prémio para melhor actriz de série dramática (Elisabeth Moss), melhor actriz secundária em série dramática (Ann Dowd), melhor realizador de série dramática (Reed Morano, segunda mulher na história que ganha nessa categoria) e melhor guião de série dramática (Bruce Miller).

A mini-série “Big Little Lies”, sobre as mães de família, os seus filhos e os seus dramas na Califórnia, venceu noutras cinco categorias, com os prémios de melhor mini-série, melhor realizador (Jean-Marc Vallée), melhor actriz de mini-série (Nicole Kidman), e melhores actores secundários em mini-série (Alexander Skarsgard e Laura Dern).

Comédia apreciada

O histórico ‘talkshow’ Saturday Night Live (SNL) foi outro dos vencedores da noite, com nove troféus, incluindo cinco de carácter técnico.

Saturday Night Live, que este ano se destacou pela crítica ao Presidente norte-americano e à sua administração, criado pelo produtor Lorne Michaels, em 1975, soma perto de 830 emissões e, até à data, tinha conquistado um total de 45 Emmys.

O programa de humor, que conta com 42 temporadas consecutivas, na cadeia NBC, estava nomeado em 22 categorias, a par da série “Westworld”, e a meio da cerimónia já tinha conquistado quatro estatuetas, incluindo uma para Alec Baldwin e outra para Kate McKinnon, pela sua imitação da ex-candidata presidencial, Hillary Clinton.

O sucesso de SNL na 69.ª edição dos Emmy foi além das estatuetas conquistadas.

“Sabíamos que a maior estrela de televisão do ano passado foi Donald Trump. E Alec Baldwin”, certamente, ironizou o apresentador da noite, Stephen Colbert, em referência ao actor que personifica Trump no Saturday Night Live (SNL).

“Finalmente, Sr. Presidente, aqui está o seu Emmy”, disse Alec Baldwin ao receber o galardão, numa referência ao show “The Apprentice”, um ‘reality show’ que foi apresentado por Donald Trump e em que executivos competem por um cargo em uma das empresas do multibilionário.

Baldwin acrescentou que depois de ter tido três filhos em três anos, a sua mulher não deu à luz no ano passado, um ano em que a sua interpretação do papel do Presidente dos Estados Unidos impulsionou as audiências do SNL para um nível recorde.

“Quando alguém usa uma peruca cor de laranja (como a cor do cabelo de Donald Trump), isso funciona como um contraceptivo”, afirmou.

O antigo porta-voz da Casa Branca Sean Spicer, que cessou funções em Julho, fez uma aparição surpresa nos prémios Emmy, sob o olhar divertido de Melissa McCarthy, que ‘veste a personagem’ no SNL.

Alec Baldwin já tinha, alás, na conferência de imprensa saudado Spicer pela arrojada entrada na cerimónia dos Emmy.

“Já fiz alguns trabalhos que vocês não devem respeitar ou admirar (…) Temos isso em comum”, disse.

19 Set 2017

Literatura | “Morri”, de Antønio Falcão, reapresentado na Livraria Portuguesa

[dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]orreu e ressuscitou. A mais recente obra de Antønio Falcão, MORRI, será reapresentada ao público de Macau na próxima quinta-feira, dia 21 de Setembro, pelas 18h30 na Livraria Portuguesa. O evento irá contar com a leitura das histórias que compõem o livro pelas vozes de alguns residentes de Macau. Entre o leque de leitores figuram Ana Dias, Carlos Morais José, Carlos Picassinos, Fülöp Oszkár, Miguel de Senna Fernandes, Selma Branco, Victoria Man, entre outros.

O livro de Antønio Falcão foi escrito entre 2004 e 2017 e reúne mais de 60 textos de material diverso, grande parte publicado no formato de crónica no jornal Hoje Macau durante esse período.

MORRI é uma colectânea de contos, ensaios, pequenas peças dramáticas e correspondências várias. O livro aborda também a história de Macau, antiga e contemporânea, tentando delinear novas perspectivas para a sua complexa compreensão, totalmente fora da habitual zona de conforto. Nele podem-se reconhecer factos do conhecimento público, personagens reais de outros regimes que se debatem com seres puramente ficcionados, como se tudo decorresse numa trama cinematográfica.

MORRI foi publicado pela editora COD de Macau, no âmbito das celebrações do 150.º aniversário de Camilo Pessanha. Nesta mesma ocasião o autor apresentou também a exposição de fotografia “Kleptokronos”.

19 Set 2017

Exposições | Pan Gongkai estreia-se numa mostra de pintura em Hong Kong

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] pintura chinesa tem vários nomes de peso que a transportam para a arte contemporânea de relevo mundial. Pan Gongkai é um deles. A primeira exposição do artista em Hong Kong abre no dia 25 de Novembro na Kwai Fung Hin Art Gallery. Um evento que merece destaque no calendário das artes dos próximos meses

Entre 25 de Novembro e 24 de Janeiro de 2018, Hong Kong recebe pela primeira vez uma exposição de Pan Gongkai, um artista de renome internacional que pegou na veia mais tradicional da pintura chinesa e a revestiu de contornos contemporâneos.

A mostra estará patente ao público na Kwai Fung Hin Art Gallery, que é composta por um total de 30 peças criadas ao longo de três anos. Um dos destaques da exposição é um quadro com seis metros de largura que pertence a uma série de trabalhos de tinta da China em papel em consonância com uma instalação de vídeo.

Pan Gongkai é um nome de vulto incontornável da pintura chinesa. Nascido em 1947, como David Bowie, o artista foi criado num ambiente intimamente artístico.

O seu pai, Pan Tianshou, foi um dos mais relevantes mestre da pintura a tinta da China do século XX. Depois de uma educação onde aprendeu a domar a técnica da tinta da China na Academia de Belas-Artes de Zhejiang, o pintor acabaria por chegar a presidente da Academia Central de Belas-Artes de Pequim entre 2001 e 2015. Já antes havia liderado a Academia de Belas-Artes de Hangzhou.

Um dos educadores de artes mais prestigiado na academia do Interior da China, Pan Gongkai é um nome que extravasa em muito as barreiras da cultura chinesa para patamares internacionais.

Mais além

Pan Gongkai, apesar de estar intimamente enraizado na expressão artística chinesa tradicional, em particular pelo uso da tinta da China, é um entusiasta dos estudos comparados entre a arte chinesa e ocidental. Esta confluência de referências díspares espelha-se na estética do pintor e académico, que rompe as barreiras conceptuais das belas-artes da China.

Nos início dos anos 1980, Pan Gongkai argumentou que as artes chinesas e ocidentais eram sistematicamente complementares e que poderiam coexistir e influenciar-se mutuamente. Segundo o pintor, ambas as expressões artísticas são compatíveis e representam duas formas diferentes de perseguir a derradeira visão estética. Esta perspectiva teórica tem atraído atenção de académicos tanto no Interior da China assim como pelo mundo fora. Dessa forma, não é de estranhar que Pan Gongkai tenha reunido o consenso de várias áreas artísticas, da pintura, teoria artística, arte contemporânea, arquitectura e design.

As obras de larga escala do pintor são, normalmente, intensas em termos de impacto visual, reveladoras da elegância e da subtileza típicas da tradicional expressão em tinta da China. Ao mesmo tempo, a mestria técnica que exibe nas pinceladas demonstram uma estética contemporânea única, bom gosto e tensão dramática.

A juntar à criatividade e mestria em termos de pintura, Pan Gongkai também se exprime através de instalações e novos media de forma a explorar as potencialidades de transformação que pretende que a tradicional tinta da China atinja no contexto da cultura contemporânea.

Os trabalhos do artista chinês têm sido exibidos com grande frequência, ultimamente, no Museu Suzhou, no Museu de Artes de São Diego, no Museu de Artes de Frye em Seattle e no Today Art Museum de Pequim.

Em 2011, Pan Gongkai participou na 54º Bienal de Veneza com uma instalação intitulada “Melting”, tendo chegado a um patamar de apreciação mundial.

Com a leveza de pincelada que caracteriza a pintura chinesa, Pan Gongkai transcende conceitos artísticos definidos chegando a um patamar global em termos de expressão estética. Profundamente conduzido por temáticas metafóricas e ideias simbólicas, as pinceladas do artistas chinês conseguem transmitir poder, emoções fortes e uma amplitude conceptual que extravasa fronteiras artísticas.

Definitivamente, uma exposição a não perder.

19 Set 2017

Gulbenkian de Paris regista história da emigração cultural e artística

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] delegação em França da Fundação Calouste Gulbenkian está a fazer entrevistas filmadas a artistas e figuras da cultura portuguesa que viveram em Paris, como Eduardo Lourenço, Graça Morais e Sérgio Godinho, entre muitos outros.

O projecto chama-se “Artistas Portugueses em Paris – Uma História Oral” e o primeiro filme foi publicado há dias na página Internet da delegação da Gulbenkian em França, com uma entrevista de uma hora e vinte minutos ao ensaísta Eduardo Lourenço.

O objectivo é preservar a memória das personalidades artísticas que passaram por França, sobretudo pela capital, disse à Lusa o diretor da Gulbenkian de Paris, Miguel Magalhães.

“O projecto ‘Artistas Portugueses em Paris – Uma História Oral’ nasceu da necessidade de preservarmos a memória de algumas gerações de artistas e figuras da cultura portuguesa que foram passando por Paris nos últimos 50, 60 anos. Há um conjunto de figuras tutelares da cultura portuguesa que passaram por França, alguns começam a deixar-nos”, explicou.

Miguel Magalhães destacou que, além de Eduardo Lourenço – “provavelmente a pessoa mais habilitada para falar sobre a relação de Portugal e França” e que foi “ele próprio um português em França durante cerca de 60 anos” –, já estão terminadas entrevistas ao músico Sérgio Godinho, aos artistas plásticos José de Guimarães e Graça Morais, e ao escritor e político António Coimbra Martins, que foi fundador do Centro Cultural Português em Paris em 1965 e embaixador na capital francesa.

Há, ainda, “uma planificação intensa nos próximos tempos de entrevistas com várias outras figuras”, a começar pelo pintor Manuel Cargaleiro, o músico José Mário Branco e o artista Jorge Martins, entre “tantas outras figuras da arte e da cultura portuguesa em França e em Paris”.

“Não tem um limite, a verdade é essa. O conjunto de pessoas, de figuras importantes da cultura portuguesa que foram passando por França nas últimas décadas é de tal forma impressionante que não começámos este projecto com o fim em vista”, continuou o director da delegação, não excluindo a possibilidade de as entrevistas filmadas virem a ser transformadas em livro, mais tarde.

As conversas assentam na formação de cada personalidade, nas suas motivações para emigrar, na sua vida em França – nomeadamente as dificuldades, as conquistas e as ligações com o meio artístico francês e português – assim como as relações entre Portugal e França.

As razões da viagem

Os artistas convidados têm aderido ao projecto “de forma muito calorosa”, em entrevistas conduzidas, até agora, pelo artista e investigador António Contador e por Luísa Braz de Oliveira, especialista em cultura portuguesa e antiga colaboradora de Eduardo Lourenço e de António Coimbra Martins.

“Julgo que todos os entrevistados perceberam a importância da preservação desta memória, destes testemunhos. Estamos a falar de diferentes gerações, de diferentes motivações. Estamos a falar com pessoas que fugiram à ditadura, estamos a falar com outras que vieram cá porque eram bolseiros na Fundação Gulbenkian, outros que vieram porque estavam de passagem”, continuou Miguel Magalhães, sem esquecer os que escolheram Paris por causa da “vida artística estimulante”.

O responsável sublinhou também que este “não é um projecto científico, é verdadeiramente um projecto de preservação da memória” que pretende servir, no futuro, para as pesquisas de investigadores, estudantes e pessoas interessadas pela cultura portuguesa em França.

Ainda que se trate “de um testemunho oral”, Miguel Magalhães defendeu que “a história da emigração portuguesa em França, em geral, tem sido investigada”, mas “a história da emigração cultural e artística está provavelmente um pouco menos feita”, pelo que o projecto da Gulbenkian de Paris é como “uma investigação especializada” dentro da emigração portuguesa.

Na apresentação do projecto, no ‘site’ da instituição, pode ler-se que “a cidade de Paris ocupa um lugar proeminente como destino para artistas, músicos e homens de letras portugueses ao longo dos tempos”, nomeadamente, “André de Gouveia no século XVI, Eça de Queiroz no século XIX, Amadeo de Souza Cardoso, Almada Negreiros, Vieira da Silva, Lourdes de Castro, Manuel Cargaleiro, Sérgio Godinho e tantos outros”.

“Esta lista poderia continuar indefinidamente, tal é o número de personalidades da cultura portuguesa que viveram e trabalharam por esta cidade ao longo de décadas. Paris foi porto de abrigo, cidade de exílio, mas também de aprendizagem e de liberdade – política, de pensamento, liberdade criativa – para gerações sucessivas de jovens portugueses”, conclui o texto.

18 Set 2017

Cinema | Thomas Lim quer colocar “Sea of Mirrors” no Festival Internacional de Macau

Começou a ser gravado em Abril, deverá estar concluído em Dezembro. “Sea of Mirrors”, a nova película de Thomas Lim, poderá ser um dos filmes presentes no Festival Internacional de Cinema de Macau

[dropcap style≠’circle’]T[/dropcap]homas Lim, cineasta de Singapura a residir actualmente em Los Angeles, tem vindo a ter contactos e reuniões com organizadores do Festival Internacional de Cinema de Macau para que o seu mais recente filme, “Sea of Mirrors”, possa fazer parte das películas a concurso.

Em entrevista ao HM, o cineasta quis deixar claro que o filme só deverá estar concluído no próximo mês de Dezembro. Ainda assim, Thomas Lim quer fazer esta tentativa para mostrar uma película sobre Macau no território onde ela foi filmada.

“Tenho vindo a ter reuniões com os organizadores do festival e disseram-me que gostariam de ver um excerto do filme, ainda que a edição de vídeo e imagem não esteja concluída”, contou Thomas Lim, que deverá entregar as primeiras imagens já em Outubro.

“Faltam ainda três fases para concluir o filme, relacionadas com a edição de imagem, som e banda sonora, mas espero conseguir fazer isso. Como cineasta de Macau seria importante ter o meu filme neste festival.”

“É um festival local e seria para este filme um bom começo”, acrescentou o realizador. Contudo, Thomas Lim não quer criar falsas expectativas ou, sequer, apresentar uma película incompleta aos organizadores da segunda edição do evento.

“Não quero acelerar o processo de produção do filme. Vou tentar o meu melhor, mas não quero apresentar algo incompleto. Não quero dar uma má primeira impressão. Gostaria de lançar o meu filme no mercado no próximo ano, em meados do ano novo chinês, por isso seria óptimo mostrar agora o meu filme”, adiantou Thomas Lim.

ROBYN BECK/AFP/Getty Images)

Mais experiência

Thomas Lim passou recentemente por Macau, para onde viaja com alguma frequência. O território faz parte do seu imaginário como cineasta e é a ele que Lim recorre sempre que quer fazer um filme.

“Roulette City”, a sua primeira longa-metragem, teve o jogo como pano de fundo. Mas com “Sea of Mirrors” o cineasta de Singapura quis fazer diferente e contar outras histórias. Toda a película foi filmada com um iPhone. Mas entre os dois filmes há mais diferenças.

“Ambos foram filmados em Macau, mas sinto que, desta vez, aprendi mais. À medida que o tempo passa vamos aprendendo mais e mais, e aprendi muito a fazer o ‘Roulette City’.”

Com “Sea of Mirrors”, Thomas Lim conta que teve mais recursos e percebeu melhor as estratégias do que queria fazer. “Filmar com um iPhone foi uma das estratégias que decidi adoptar, trabalhar com antigos colaboradores foi outra. Quando fiz o ‘Roulette City’ não tinha muitos colaboradores a trabalhar comigo, foi o meu primeiro filme.”

A história de “Sea Of Mirrors” é sobre um ex-actriz japonesa que viaja para Macau na esperança de encontrar um investidor que pague um novo filme por ela protagonizado, mas nem tudo corre como esperado.

“O meu segundo filme continua a ser sobre Macau e o que acontece aqui. Gosto de usar Macau como a personagem principal dos meus filmes, e espero poder contar histórias que só tenham Macau dentro delas”, frisou.

Se no seu primeiro filme Thomas Lim deu destaque às interpretações, porque antes de ser cineasta foi actor, desta vez, em “Sea Of Mirrors”, a atenção foi transposta para a parte da realização.

Cineasta vs orador

No dia em que Thomas Lim conversou com o HM, esteve na Universidade de Macau a dar uma palestra para alunos. Algo que o cineasta afirma gostar de fazer, mas que não está no topo das suas preferências.

“Em primeiro lugar, gosto de fazer filmes. Porque, no final de contas, todas estas conferências que dou, estes eventos onde vou, acontecem porque faço filmes. E o filme tem de ser bom, então essa é a minha prioridade. A seguir, começo a pensar em como fazer um novo filme que também seja bom.”

Thomas Lim gosta de contar as suas experiências como cineasta, uma oportunidade que não teve quando começou no mundo do cinema.

“Não me considero um professor de cinema, apenas dou umas palestras nas universidades. E dá-me muita satisfação poder partilhar as minhas ideias junto dos jovens, porque quando comecei não tinha muitas pessoas que me inspirassem”, contou.

Em Singapura, Thomas Lim sentiu falta de referências. “Lá não temos figuras que nos inspirem no mundo das artes ou do desporto, por exemplo. Temos talvez figuras que nos inspirem no meio político, empresários. Não sabia, quando era jovem, que podia fazer isto. Não creio ser ainda bem sucedido, mas espero poder inspirar alguém com aquilo que faço.”

Macau e o jogo

Apesar de ter feito um filme que tinha os casinos como tema principal, Thomas Lim considera importante filmar outros fragmentos de Macau, contar outras histórias. Mas assume: filmar os casinos garante sempre a atenção da indústria estrangeira.

“Não foi deliberado não fazer, desta vez, um filme sobre o sector do jogo. Não temos de usar sempre o jogo como protagonista de um filme, mas podemos tirar partido disso, porque se a história tiver o jogo como pano de fundo vai atrair sempre mais a atenção do mercado internacional. Se fizermos um filme apenas sobre Coloane, vai ser difícil à comunidade internacional estabelecer um ponto de ligação, em termos de atenção”, rematou.

18 Set 2017

Hong Kong | The Prodigy juntam-se ao cartaz deste ano do Clockenflap

Esta semana conheceram-se mais alguns nomes de peso para o Festival Clockenflap, de onde se destacam os britânicos The Prodigy. A banda de punk electrónico actua sábado, no festival que decorre entre 17 e 19 de Novembro. Além dos The Prodigy juntaram-se ao cartaz os Young Fathers, Temples, Pond e SKREAM

[dropcap style≠’circle’]Q[/dropcap]uem ainda não viu The Prodigy ao vivo tem uma lacuna que precisa de colmatar o mais rapidamente possível. Para quem está em Macau, ou Hong Kong, o cartaz do Clockenflap possibilitará essa experiência.

A banda britânica, que lançou o seu primeiro disco, “Experience”, há exactamente 25 anos, revolucionou o mundo da música de dança ao juntar agressividade à cena das raves. Com seis discos na carreira, os The Prodigy juntam-se aos Massive Attack e a Feist para formar o trio de cabeça de cartaz do festival que festeja o seu décimo aniversário, que ocorre no Central Harbourfront entre 17 e 19 de Novembro.

A carreira da banda britânica tem entre os seus melhores momentos os discos “Music for the Jilted Generation”, onde despontam os intemporais hinos de agressão “No Good”, “Voodoo People” e “Poison”.

O grupo sustentado pela genialidade do produtor, e mais discreto membro da banda, Liam Howlett atingiu um público mais alargado em 1997 com o disco “Fat of The Land”, que tem músicas que rodaram em pistas do mundo inteiro como “Smack My Bitch Up”, “Firestarter” e “Breathe”.

No mesmo dia em que os The Prodigy sobem ao palco, há outra banda que merece destaque: os Tinariwen. Um grupo oriundo do norte do Mali. Além disso, os mais saudosistas vão poder dançar ao som da banda de covers The Bootleg Beatles.

Psicadélicos

Na lista das bandas que foram anunciadas esta semana ao cartaz do Clockenflap, houve uma acréscimo do novo rock psicadélico que surgiu nos últimos anos. Neste capítulo, os Pond, banda australiana que partilha alguns membros com os Tame Impala, são um dos grupos mais aguardados do festival. Com uma discografia extensa, que conta com sete discos em quase oito anos, os Pond fazem uma belíssima ponte entre o rock psicadélico e a pop. Os australianos de Perth sobem ao palco no domingo, dia 19.

Outra banda com sonoridades de rock psicadélico anunciada esta semana são os britânicos Temples. Com dois discos na bagagem, o grupo inglês apresentará ao público de Hong Kong o seu mais recente álbum, “Volcano”, igualmente no domingo, um dia que será encerrado pelos históricos de Bristol Massive Attack.

Além destas bandas, juntaram-se ao cartaz do Clockenflap o grupo de hip-hop Young Fathers, a banda de pop japonesa Wednesday Campanella.

O DJ SKREAM regressa ao cartaz do Clockenflap depois de ter incendiado a pista na edição de 2014. De seu nome Oliver Jones, o londrino é um dos nomes cimeiros da cena dubstep mundial. Com raízes sonoras firmadas em terras de tecno e house, SKREAM é um dos melhores actos da actualidade de electrónica ao vivo.

Os bilhetes para o festival encontram-se já à venda, por agora, a preços mais acessíveis. Ainda assim, quem quiser ir aos três dias de festival terá de desembolsar 1620 dólares de Hong Kong. Os bilhetes para sexta-feira custam 890 dólares, enquanto os de sábado e domingo custam 960 dólares de Hong Kong.

17 Set 2017

Man Booker Prize | Paul Auster, Ali Smith e George Saunders entre os finalistas

Os escritores Paul Auster, Emily Fridlund, Mohsin Hamid, Fiona Mozley, George Saunders e Ali Smith são os seis finalistas do Prémio Man Booker. No próximo mês, é distinguida a melhor obra de ficção do ano escrita em língua inglesa

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] anúncio foi feito ontem e a lista inclui “4 3 2 1”, de Paul Auster (ver texto nestas páginas), “History of Wolves”, de Emily Fridlund, “Exit West”, de Mohsin Hamid, “Elmet”, de Fiona Mozley, “Lincoln no Bardo”, de George Saunders, e “Outono”, de Ali Smith. Entre as obras finalistas, estão publicados em Portugal os livros de Paul Auster, Ali Smith e George Saunders.

Nesta edição do Man Booker prize, ficaram para trás “Days Without End”, de Sebastian Barry, “Solar Bones”, de Mike McCormack, “Reservoir 13”, de Jon McGregor, “O Ministério da Felicidade Suprema”, de Arundhati Roy, “Home Fire”, de Kamila Shamsie, “Swing Time”, de Zadie Smith, e “A Estrada Subterrânea”, por Colson Whitehead.

O júri do prémio Man Booker deste ano é presidido por Lola Young, antiga professora de Estudos Culturais da Universidade de Middlesex e responsável cultural da Autoridade da Grande Londres.

Entre os membros do júri encontram-se ainda as escritoras Lila Azam Zanganeh e Sarah Hall, bem como o artista Tom Phillips e o presidente da Real Sociedade Literária britânica, Colin Thubron.

Os membros do júri consideraram que os romances, cada um à sua maneira, desafiam e alteram suavemente os preconceitos – sobre a natureza do amor, sobre a experiência do tempo, sobre questões de identidade e até mesmo a morte.

A lista dos finalistas, que apresenta três mulheres e três homens, abrange uma ampla gama de assuntos, desde a luta de uma família que tenta manter a sua auto-suficiência na Inglaterra rural, até uma história de amor entre dois refugiados que tentam fugir de uma cidade sem nome, na agonia de guerra civil.

No quarto ano em que o prémio foi aberto a escritores de qualquer nacionalidade, a lista é composta por dois escritores britânicos, um britânico-paquistanês e três americanos.

Livros do desafio

“Com seis livros únicos e audazes que colectivamente pressionam as fronteiras da convenção, a lista curta deste ano reconhece autores estabelecidos e introduz novas vozes na cena literária. Jocosos, sinceros, inquietantes, ferozes: aqui está um conjunto de romances de tradição, mas também radicais e contemporâneos. O alcance emocional, cultural, político e intelectual destes livros é notável, e as formas como desafiam o nosso pensamento são um testemunho do poder da literatura”, considerou Lola Young.

Ali Smith faz parte da lista do Booker pela quarta vez, enquanto Fiona Mozley figura como a mais jovem autora da lista, com 29 anos, e uma das duas estreantes na corrida ao prémio, juntamente como Emily Fridlund, de 38 anos.

Os outros dois autores americanos são Paul Auster e George Saunders, o primeiro, de 70 anos, com o romance mais longo da lista, que lhe levou três anos e meio, trabalhando seis dias e meio por semana, a ser escrito, enquanto George Saunders, contista, se estreia com o seu primeiro romance.

O prémio Man Booker, no valor de 50 mil libras, distingue anualmente um livro de ficção escrito em inglês e publicado no Reino Unido no ano do galardão, independentemente da nacionalidade do autor. O vencedor vai ser anunciado no dia 17 de Outubro.

Em 2016, o Prémio Man Booker foi atribuído ao norte-americano Paul Beatty, com o romance “O Vendido” (“The Sellout”).

 

Quatro caminhos para um só homem no novo livro de Auster

O autor Paul Auster afirmou que a sua obra mais recente, “4 3 2 1”, resulta da combinação de circunstâncias inesperadas com o material genético, pré-existente, que compõe todos os seres humanos.

Paul Auster considerou, num encontro com jornalistas no âmbito do Festival Internacional de Cultura, que o romance procura responder à pergunta “E se…?”, delineando quatro caminhos distintos para um mesmo personagem, Archie Ferguson: “Em inglês há o termo ‘nature nurture’, que surge [da combinação] do ser natural e genético, com a maneira como se é educado ou o ambiente em que se cresce”, realidades que “estão interligadas e são impossíveis de separar”.

Este foi o mote fornecido pelo escritor norte-americano, de 70 anos, para abordar as questões feitas acerca do processo de escrita do romance, precedido por um hiato de sete anos, em que “a frequência com que algo inesperado acontece” foi, à semelhança de outras das suas obras, o dilema “que sempre o preocupou”.

Na opinião de Auster, o princípio de que diferentes circunstâncias conduzem, necessariamente, a pessoas de personalidades distintas, revela a importância de “dar espaço ao inesperado para viver a vida com algum tipo de coerência”. Como tal, aquilo a que gosta de chamar “os mecanismos da realidade” difere das crenças “no destino, na fé e na intervenção divina”, concepções nas quais o romancista recusa acreditar.

Ao escrever “4 3 2 1”, nomeado como candidato ao prémio Booker deste ano, Auster quer provar que “o estranho faz parte da normalidade” e que, no papel de arquitecto das suas narrativas, este “não manipula as personagens”, optando por “lhes dar vida” para depois “as seguir, sem as guiar” a um caminho concreto.

No decorrer da conversa, Auster frisou que “não escolheu tornar-se um escritor”, sendo que foi a profissão que o escolheu a ele: “Não se trata de uma opção. (…) Ser um artista de qualquer tipo é como apanhar uma doença da qual nunca se recupera. [Ser escritor] é uma obrigação.”

Na óptica de Auster, “o papel [social] da escrita mantém-se o mesmo há 500 anos”, algo que se complementa com o processo de leitura, “uma experiência muito íntima” que se faz individualmente. Posteriormente, ressalva que ler histórias “é uma forma excelente de confrontar medos ou ansiedades em relação ao mundo, de modo seguro”.

 

Auster avisa que Donald Trump está “apenas no início”

O escritor Paul Auster afirmou, de passagem por Portugal, que o mundo “entrou numa nova era” com o Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, mas que “ainda não é possível fazer arte” baseada no Governo que este constituiu.

Num encontro com jornalistas, no âmbito do Festival Internacional de Cultura com o propósito de debater os temas suscitados pela sua nova obra, “4 3 2 1”, Auster debruçou-se sobre o panorama político do seu país de origem, voltando a tecer críticas a Trump, uma figura que classifica como um indivíduo “furioso, irracional, instável e narcisista: um perigo que se alimenta da atenção” que o mundo lhe dá.

O autor afirmou que Trump “está apenas no início”, o que impede reflexões artísticas exactas. Na óptica do escritor, primeiro cabe “aos jornalistas apurarem a verdade de tudo o que se passa agora”, partindo do princípio que o “bom jornalismo” é o “trabalho mais importante para o bem-estar do mundo”.

Auster adianta que a mesma profissão está “sob ataque”, colocando em risco “a fé das pessoas na verdade”, numa fase em que nunca os jornalistas foram tão necessários, numa discussão dentro do contexto da narrativa quadripartida do romance mais recente, em que uma das quatro versões do protagonista, Archie Ferguson, toma a decisão de enveredar pelo universo jornalístico.

O escritor, vencedor de múltiplos prémios literários, receia que Trump continue “a persuadir as pessoas de que as mentiras [que conta sejam] verdade”, já que o 45.º Chefe de Estado norte-americano utiliza “as mesmas tácticas que os Nazis nos anos 1930 e 1940”, tornando-se “uma pessoa perigosa para governar o país mais poderoso do mundo”.

Um país à parte

Apesar de todos os tumultos sociais que acontecem, diariamente, Auster insiste que a inspiração para as narrativas de ficção não parte do mundo exterior, mas antes “do inconsciente”, que depois se mistura com os factores sociais “de um país construído por imigrantes”, no qual Nova Iorque funciona como um antídoto contra a crescente divisão visível nos Estados Unidos.

“Nova Iorque é encarada como a cidade representante do ideal norte-americano, [sendo que] 40 por cento dos seus habitantes nasceram noutros países [mas], às vezes, acho que a cidade devia abandonar os Estados Unidos e transformar-se num estado separado, porque o resto do país não percebe [o que o local simboliza]”, disse.

Questionado mais directamente quanto às falhas do Partido Democrata, de acordo com Auster “tudo se alinhou perfeitamente” a favor do magnata, reduzindo as hipóteses de Hillary Clinton, que perdeu votos devido “a um país misógino”.

O romancista “queria que Hillary percorresse o país da mesma forma que Martin Luther King [aquando do Movimento dos Direitos Cívicos]”, contrastando com o método de Trump, ao escolher “incitar o pior da natureza humana”, com “30 a 35 por cento do país a adorar aquilo que ele faz”. Estas são as razões que levam Paul Auster a concluir que “uma grande percentagem do eleitorado americano jamais votaria” em Hillary Clinton.

Portugal foi o sétimo país europeu por que passou, no espaço de um mês, para promover “4 3 2 1”, algo que levou o autor a verificar que as mudanças e a “nova era” de que fala se tratam de “um fenómeno global” que coloca a Europa e os Estados Unidos em posições similares, seja devido aos resultados do Brexit [referendo que determinou a saída do Reino Unido da União Europeia], ou devido à vitória de Donald Trump.

14 Set 2017

Exposição | O vidro é a arte de Sunny Wang

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]té ao dia 19 de Novembro, quem passar pela Galeria de Exposições Temporárias do Instituto de Assuntos Cívicos e Municipais poderá ver “Fluxo”, uma mostra do trabalho de Sunny Wang. A artista tem o vidro como principal meio de expressão, dedicando-se há já vários anos ao ensino e a actividades criativas relacionadas com este material, explica o Instituto Cultural (IC).

A exposição é constituída por 20 instalações de vidro da artista, fortemente marcadas por elementos culturais orientais. O IC destaca a obra “As Pedras Poéticas”, uma instalação composta por 28 pedras negras de diferentes formas e tamanhos, feitas de vidro, inspiradas no poema budista “Dez Touros” e na fonologia chinesa. O padrão das 28 pedras, dispostas em quatro linhas com sete pedras cada, é análogo ao padrão de ritmos e tons na estrutura das quadras de sete caracteres.

O IC faz ainda referência a outra obra, “Ru” (如), composta por sete peças, uma série sobre o ciclo da semana, “exprimindo simbolicamente o fluxo da vida”. Ao mesmo tempo, a artista “aproveitou os sete tesouros do Budismo para representar as sete forças espirituais, nomeadamente a confiança, perseverança, sensatez, tranquilidade, consciência, concentração e sabedoria”.

Sunny Wang é professora assistente na Universidade Baptista de Hong Kong. Recebeu uma menção honrosa no âmbito da Exposição Internacional de Vidro Kanazawa, no Japão, e o primeiro prémio na Categoria de Material Único dos Golden Glass Awards, em Taiwan. A artista participou em exposições em vários países, tais como Austrália, Alemanha, França, Itália, Maldivas, Singapura, Coreia do Sul e Interior da China.

Acrobacia | Bilhetes para “Mulan” estão à venda

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] 68.º aniversário da implantação da República Popular da China vai ser assinalado em Macau com o espectáculo acrobático “Mulan”. A iniciativa resulta de uma aliança entre o Instituto Cultural (IC) e o Departamento de Cultura e Educação do Gabinete de Ligação do Governo Central na RAEM, com a co-organização do Instituto do Desporto.

O espectáculo está a cargo da Companhia de Artes Acrobáticas de Chongqing, que vai fazer duas apresentações, a 30 de Setembro e 1 de Outubro, pelas 20h, no Fórum de Macau. Os bilhetes foram colocados ontem à venda.

O IC explica, em nota de imprensa, que a Companhia de Artes Acrobáticas de Chongqing irá reinterpretar a célebre história de Hua Mulan “com os seus extraordinários actos acrobáticos, incutindo um novo vigor nas artes cénicas tradicionais através da fusão da acrobacia e de outras formas típicas de expressão artística chinesa, como dança, kung fu, teatro de sombras e mudança de rosto (‘bian lian’), etc.”.

A organização indica ainda que Mulan representa “a devoção da guerreira pelo seu pai, a lealdade ao país e o espírito destemido de um verdadeiro herói, permitindo ao público desfrutar de uma nova experiência de grande impacto visual que dá vida a cenas de guerra monumentais, através dos exigentes e vertiginosos actos acrobáticos da companhia”.

Os bilhetes custam entre 100 e 200 patacas.

Cabaret | Crazy Horse Paris chega a Macau

[dropcap style≠’circle’]V[/dropcap]ai estar pela primeira vez no território, de 1 a 12 de Novembro, o espectáculo de cabaret para adultos mais famoso do mundo. Pelas mãos da companhia Crazy Horse Paris, a apresentação é um “best of” de “Forever Crazy” e traz a Macau um “espectáculo erótico e cheio de glamour que inclui dança, música e muita sensualidade”, diz a organização a cargo do Sands China.

O evento tem lugar no Teatro Parisian, e acolhe em palco um elenco multicultural de dez bailarinas com formação clássica e “vestidas apenas pela iluminação do espaço”. De acordo com a nota enviada à comunicação social, “o efeito é tão incrível que é difícil determinar onde a pele acaba e as reflexões começam”.

A organização destaca a sofisticação da apresentação, em que ao clássico cabaret burlesco é acrescentado “um toque de modernidade e de humor”.

O público pode esperar “um caleidoscópio de beleza, graça, paixão e precisão em sapatos exclusivos desenhados por Christian Louboutin”. A música é marcada pelos sons do jazz alternado com composições electrónicas da actualidade.

O “Forever Crazy” foi criado em 1951 pela já lendária companhia de cabaret, como homenagem a Alain Bernardin, o fundador da Crazy Horse.

Os bilhetes vão ser disponibilizados a partir do dia 19 com valores entre as 180 e as 680 patacas.

Música no Coração | Produção procura talentos locais

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] lendário musical da Broadway “Música no Coração” está à procura de jovens locais para interpretarem os famosos filhos Von Trap. Os castings de selecção vão decorrer no território na próxima segunda-feira sendo que, diz a organização, “é uma oportunidade única para os jovens locais talentosos de representarem num espectáculo aclamado mundialmente e de trabalharem com uma equipa de renome”. Os interessados, entre os 6 e os 14 anos, devem proceder à inscrição prévia online através do site www.soundofmusicmacao.com. O espectáculo será representado no território no mês de Dezembro.

13 Set 2017

Gonsalo Oom, arquitecto: “Gosto da influência das igrejas no espaço urbano”

“Desenhos Expressionistas de Macau” é a exposição de Gonsalo Oom que mostra, a partir do dia 28, uma série de trabalhos acerca da paisagem do território. As obras vão estar na Creative Macau e trazem, na sua maioria, a interpretação do (também) arquitecto da expressão urbana da península

É a sua primeira exposição individual no território. O que é que vamos ver na Creative Macau?
A exposição chama-se “Desenhos Expressionistas de Macau” e tem que ver com a minha leitura e interpretação do território. São desenhos artísticos. Não são tão figurativos como os que faço em arquitectura, e deixam margem para uma interpretação. Sou arquitecto e normalmente temos de fazer desenhos sempre muito rigorosos, o que não acontece neste caso.

Da arquitectura ao desenho artístico. Como é que aconteceu esta passagem?
Comecei a desenhar para dar os trabalhos de presente aos meus amigos que casavam. Desenhava igrejas essencialmente. Têm que ver com arquitectura e era uma coisa de que gostava. Não tinha muito dinheiro e era um bom presente. Recordo que, na altura, tinha tanto trabalho acerca deste tipo de edifícios que quase que dava para fazer um roteiro das igrejas de Lisboa. Já na altura desenhava a carvão.

Esta exposição também é maioritariamente a carvão. 
Sim. O carvão tem algumas particularidades, um bocadinho como o que acontece nos materiais que se escolhem na pintura. Há desenhos em que, por exemplo, uso aquilo que pode ser visto como tinta-da-china, mas não o é. É tinta de cargas de caneta em que também é requerida uma técnica específica. Quando tiro a carga da caneta, a tinta começa a borrar e há que saber controlar esse borrão. É uma mancha que se vai trabalhando para se retratar o que se está a ver, mas de uma forma, digo, expressionista. Este trabalho também depende de uma série de factores, como a emoção. É tudo desenhado à vista. Não dá para estar em casa a ver fotografias. Mas há sempre algumas dificuldades quando se sai para desenhar à vista. Temos sempre de lidar com insectos, com o calor e mesmo com pessoas. Desenhei uma vez ali em frente à Escola Portuguesa e quando os alunos saíram e me viram a trabalhar não consegui fazer mais nada. O mesmo aconteceu nas Ruínas de São Paulo. Encontrei um sítio porreiro, mais discreto, mas as pessoas acabaram por me descobrir. Gosto mais de estar recatado. Não desisto, mas estas situações acabam por interferir no trabalho.

Macau é um lugar fotogénico?
Sim. Os contrastes que existem no território, apesar de nem sempre serem bons, resultam muito bem no desenho.

Que lugares escolheu para desenhar para esta mostra?
Lá está, vamos ter igrejas e outras situações urbanas.

Gosta especialmente de igrejas?
Gosto da influência das igrejas no espaço urbano. A igreja é um local de conforto e de calma. Agora são mais as lojas, em Macau. Uma pessoa entre numa loja e tem a oportunidade de se refrescar, mas acho que antigamente as pessoas também iriam para as igrejas com esse objectivo (risos). Gosto também, ao nível urbano, da influência dos casinos, da massa formada por eles. Desenhei umas coisas para umas paredes grandes, era uma sequência de painéis com a skyline de Macau vista da Taipa. Tenho alguns trabalhos assim, nesta mostra.

Enquanto arquitecto, como vê a alteração da paisagem local?
Acho óptimo. Quer dizer, não deixa de provocar alguma perturbação porque as coisas parecem não ter controlo e há situações muito fortes. Em termos de urbanismo há coisas que “chocam”. Chegar às Ruínas de São Paulo e ver o prédio que está atrás é muito estranho. É um edifício que acaba por estragar um elemento icónico do património. Vim pela primeira vez para Macau em 2006. Voltei para Portugal pouco depois e regressei em 2013 numa altura de muita construção, pelo que assisti a muita transformação que acabou por afectar a paisagem.

Já participou noutras exposições – e também na Creative Macau – com outro tipo de trabalhos. 
Sim. Já participei com objectos, principalmente com peças de mobiliário. Desenhar móveis é uma obsessão que tem que ver com a tridimensionalidade. Esta oportunidade foi uma sorte. Tenho um dos meus desenhos integrado na exposição que está a decorrer no mesmo local actualmente, e a responsável, Lúcia Lemos, constatou que tinha um espaço de um mês para preencher e acabou por me convidar. A minha primeira ideia até foi uma exposição com os trabalhos feitos pelas pessoas de Macau que desenham. Há muita gente a fazer isso e que depois não tem como mostrar o que faz. Achei que seria giro fazer uma coisa dessas. Será o próximo passo.

 Já alguma vez pensou em dedicar-se apenas à pintura e ao desenho?
Caso não tivesse trabalho como arquitecto, dedicava-me ao desenho a tempo inteiro. É uma coisa natural em mim, mas é preciso trabalho. Não é uma coisa que se possa dizer que as pessoas têm jeito. É preciso trabalhar muito também. O jeito não é o fundamental.

13 Set 2017

Entrevista | Nicole Wong e Bobo Leong, “Queremos lutar contra estereótipos”

Nicole Wong é encenadora, Bobo Leong é produtora e são as responsáveis pelo projecto de teatro comunitário desenvolvido pelo Teatro Experimental de Macau. O próximo sábado é dia de estreia de “Our Bodies” no Albergue, às 15h. A peça traz as histórias das empregadas domésticas indonésias do território, contadas e representadas na primeira pessoa

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] que é que vamos ver em “Our Bodies”?

Bobo Leong (B.L.) – Trata-se de uma continuação do trabalho que apresentamos no ano passado, “Our Story”. É uma peça que usa o movimento, o corpo, para contar as histórias de um grupo de empregadas domésticas de nacionalidade indonésia. São casos pessoais em que as actrizes são da própria comunidade e as histórias são as próprias. Tentamos entender as suas experiências pessoais, promover a sua sensibilidade e explorar sentimentos. É também uma peça que vai acontecer no exterior e não num espaço normalmente associado ao teatro e que desafia a atenção do público no meio de várias distracções.

Estamos a falar de teatro comunitário. Porquê a dedicação a esta área dramática?

B.L. – Começámos o projecto de teatro comunitário como uma extensão do trabalho do Grupo de Teatro Experimental de Macau, há quatro anos. Nos últimos dois anos estamos a explorar este tipo de acção com comunidades imigrantes no território. Quando falamos de teatro comunitário temos de ter noção de que não se trata de arte dramática, de teatro de blackbox ou de uma peça para um teatro tradicional. Temos de gastar o nosso tempo a trabalhar com algumas das comunidades com as quais decidimos trabalhar e temos de arranjar uma forma de o fazer. Queríamos uma aproximação à própria sociedade e aos seus problemas. Queríamos prestar mais atenção a assuntos que dizem respeito a alguns dos problemas sociais do território. Por outro lado, e na continuidade do trabalho do Teatro Experimental, a intervenção comunitária também nos permite ter as nossas peças originais, com os nossos textos.

Quais as maiores diferenças entre o trabalho com profissionais e com cidadãos comuns?

Nicole Wong (N.W.) – Quando trabalhamos com profissionais há todo um trabalho de direcção de actores que quase não é necessário neste caso. Com actores temos de os orientar com a forma como pensamos nas expressões de emoções, por exemplo. Para mostrarem uma mesma emoção têm várias formas de o fazer e cabe ao encenador escolher. Com estas pessoas não temos de fazer isso porque elas vão buscar as emoções reais que sentem em determinada situação que está a ser representada. É tudo mais natural e genuíno quando trabalhamos com a comunidade. Não precisam de representar. Uma outra diferença está no guião. Elas não seguem um guião dado. A história é feita por elas, é a sua vida com as suas histórias. Não podemos pensar em coisas novas e somos nós que temos de nos adaptar ao guião que nos dão. São empregadas domésticas indonésias que contam o que vivem ou as memórias que têm do que viveram, e trazem à peça todos os gestos e emoções que associam a isso mesmo.

Como é que apareceu a ideia de trabalhar com as empregadas domésticas indonésias, em particular?

N.W. – Somos formadas em jornalismo. Eu, por exemplo, lembro-me de, ainda na universidade, ter visto uma reportagem acerca das empregadas domésticas, uma população que acarreta uma série de estereótipos. São retratadas muitas vezes como uma comunidade barulhenta e mesmo suja. Mas, quando estudei em Taiwan vi o tal documentário, vi pessoas a cantarem, famílias a criarem coisas e a mostrarem a sua cultura. Isso comoveu-me. Foi a primeira vez que pensei fazer uma coisa com esta população. Quando apareceu a oportunidade de trabalhar com a Bobo, lembrei-me logo de transferir a ideia para o teatro. Por outro lado, ainda não existia nada feito em Macau sobre isto e muito menos na área do teatro.

Como encontraram as vossas actrizes?

B.L. – Foi através de uma associação que está ligada à comunidade indonésia e que promove aulas em várias áreas. Neste caso, a nossa proposta foi fazer um programa de workshops de teatro. Fizemos aulas de movimento e de representação. Foi ao longo destas aulas que fomos chegando às suas histórias. Não eram aulas de teatro tradicionais. Eram workshops em que, recorrendo a técnicas dramáticas e de movimento, propúnhamos aos participantes que se repensassem e que reflectissem acerca do seu papel na sociedade de Macau. Foi daí que saíram muitos dos conteúdos que estamos a usar.

Como é que foi a reacção das participantes?

N.W. – O nosso espectáculo é muito diferente do teatro mais tradicional: tem dança e música entre a representação. A reacção tem sido muito boa por parte das participantes. É um momento em que também criam. No espectáculo do ano passado, em que abordávamos as dificuldades e as saudades de se estar longe de casa, tínhamos dois actores profissionais a participar, mas este ano não foi necessário. Tudo o que vai ser apresentado foi feito pelas empregadas indonésias que vivem em Macau.

 Têm alguma história em particular que vos tivesse impressionado? 

B.L. – São vidas difíceis. Trata-se de empregadas domésticas que nas casas onde trabalham têm câmaras de vigilância. Apesar de ser uma das coisas com as quais dizem estar à vontade, quando começamos a explorar dramaticamente o tema, percebemos que sentem alguma falta de privacidade, o que as incomoda. Por outro lado, há as histórias do amor que se perde, que se deixa na Indonésia. Deixam os maridos para virem trabalhar aqui. Mandam dinheiro para casa e passados uns anos descobrem que estão a mandar mantimentos para uma família que não é a delas, que é uma outra porque o marido entretanto casou com outra mulher. São mulheres que valorizam o amor e que lamentam muito esta situação. Sentem-se sozinhas e traídas.

O que é que este tipo de actividade pode representar para as participantes?

B.L. – Penso que este tipo de trabalho representa um conforto por se poderem expressar. Poderem mostrar o que lhes vai dentro e que não têm oportunidade de o fazer. Podem também ter noção de si e dos seus sofrimentos. Penso que é uma forma de encarar as situações que as incomodam e de poderem tentar ter algumas soluções, ou um modo de as ultrapassar. É preciso enfrentar os problemas, mesmo que não tenham grande solução. É possível arranjar outras formas de os abordar. Não precisamos de aceitar tudo. Elas não precisam de aceitar tudo também. Curiosamente, no ano passado tivemos alguns patrões e as suas famílias a verem o espectáculo, o que foi interessante. A empregada doméstica passou, durante o espectáculo, a ser alguém que era admirada. Houve, por momentos, uma espécie de inversão de papéis. Os patrões viram pessoas, com as suas histórias e os seus direitos. Há muitos preconceitos acerca desta população. Este projecto serve para lutar contra estereótipos.

Como é a receptividade a este projecto, por parte da população local?

N.W. – A arte é uma forma de expressão, mas também uma forma muito especial de mostrar as coisas, o que não quer dizer que essas coisas sejam aceites de forma positiva. Recordo que, no ano passado, quando convidava algumas pessoas para irem ver a apresentação, a resposta era de que estas participantes não seriam boas o suficiente para poderem estar em palco. Mas nós queremos continuar com este projecto. A arte é uma forma de esta comunidade encontrar o seu espaço. É também um lugar para se pensar. Relativamente ao público, penso que o grande desafio é este tema ser aceite pelo Governo, e conseguirmos ter estas peças a serem mostradas em espaços oficiais. É conseguir integrar, por exemplo, um Festival das Artes e ir ao Centro Cultural de Macau.

12 Set 2017

Dois portugueses escolhidos para Bienal de Lyon

[dropcap style≠’circle’]B[/dropcap]andeiras transparentes, paredes carimbadas com “Forever Immigrant” e um piano a tocar um poema são algumas das obras de Marco Godinho e Davide Balula escolhidas para a Bienal de Lyon, em França, sob o tema “Mundos Flutuantes”.

A 14.ª edição do evento, que se realiza de 20 de Setembro a 07 de Janeiro, conta com artistas de 23 países e questiona o conceito do “moderno” na arte, a partir do tema “Mondes Flottants” (“Mundos Flutuantes”).

O tema atraiu, de imediato, Marco Godinho que, no ano passado, já tinha feito uma exposição no Museu de Arte Moderna e Contemporânea de Nice intitulada “Mundos Nómadas”, tendo agora escolhido três obras que convidam à “deambulação porque não se pode apreender só com o olhar”.

“O mundo flutuante é um mundo incerto que se gere no presente. Com estas obras, a minha leitura tem a ver com a ideia de uma certa poesia no nosso quotidiano, tem a ver com os poemas de Mallarmé e uma forma um pouco mais aberta de fazer arte e realizar experiências que não se limitem à ideia do observador, que vai para um espaço confinado simplesmente observar”, explicou à Lusa Marco Godinho.

Na primeira obra, “Forever Immigrant”, um carimbo circular da frase em inglês vai preencher a fachada do edifício de exposições, La Sucrière, e propagar-se ao interior, fazendo eco não apenas do exílio e “tudo o que acontece no Mediterrâneo” mas também da própria “ideia de incerteza”, ligada ao seu percurso de emigrante.

“Sem Título (Bandeiras Transparentes)” é uma “obra em evolução”, inicialmente inspirada nas estrelas da União Europeia, em que “as bandeiras em vez de terem símbolos são completamente transparentes” e, sendo expostas no exterior, “pouco a pouco vão começar a rasgar e evoluir no tempo”.

Em “Written By Water”, vão ser expostos cadernos que o artista recolheu ao longo de viagens por países mediterrânicos e que mergulhou em água, “para que a água pudesse escrever a sua própria poesia e história”, uma obra que vai estar acompanhada pela projecção de um vídeo.

Marco Godinho, nascido em 1978 em Salvaterra de Magos, e residente entre Paris e o Luxemburgo, participou, no ano passado, na feira de arte contemporânea Art Central de Hong Kong e expôs no Museu de Arte Moderna e Contemporânea de Nice, tendo apresentado o seu trabalho, em 2015, no Museu Nacional de Arte Contemporânea – Museu do Chiado, em Lisboa.

Experiência no espaço

Davide Balula, que nasceu em 1978 na aldeia de Vila Dum Santo, no concelho de Viseu, e reside entre Paris e Nova Iorque, escolheu para a Bienal de Lyon duas obras inéditas: uma peça sonora em que “um piano vai tocar um poema” e uma peça luminosa que realiza um “movimento abstracto de ‘laser’ nas paredes”.

“É difícil descrever com palavras porque é simplesmente fazer a experiência da obra no espaço. Recorrendo a uma espécie de narração abstracta, eu diria que as duas obras tocam a questão da percepção”, explicou o artista à Lusa, sublinhando a importância do espaço e do tempo no seu trabalho, assim como o papel do espectador que “constata a sua própria presença quando observa uma obra”.

Os trabalhos apresentados dialogam, assim, com o tema da bienal, com David Balula a interpretar os “Mundos Flutuantes” como “a impossibilidade de alcançar as coisas”, ilustrando a sua ideia com uma peça de Marcel Broodthaers, “muito importante” para si e exposta na sala ao lado da sua.

“O autor tenta escrever uma carta debaixo da chuva. Escreve com tinta e chove na folha e a tinta não se agarra. Esta ideia de continuar a escrever e ter a tinta a escorrer faz parte da peça”, descreveu o artista que costuma explorar elementos naturais como a água e a terra, por exemplo, em “River Paintings” e “Buried Paintings”, e também o fogo, como em “Speaking in Flames (The Voice of the Firebreather)”, uma performance em que a voz é substituída por chamas.

No ano passado, Balula apresentou a performance “Mimed Sculptures”, na Art Basel Unlimited, em Basileia, na Suíça, e “Speaking in Flames (The voice of the Fire Breather)”, na Ecole Nationale Supérieure des Beaux-Arts de Paris, uma performance que também levou, em 2014, ao Palais de Tokyo, em Paris, e ao MoMA PS1, em Nova Iorque.

Para a Bienal de Lyon, também foi convidado o artista mexicano Hector Zamora, que vive e trabalha em Portugal, os brasileiros Cildo Meireles e Ernesto Neto, residentes no Rio de Janeiro, e o realizador tailandês Apichatpong Weerasethakul, vencedor da Palma de Ouro de Cannes, em 2010, com o filme “O Tio Boome Que Se Lembra das Suas Vidas Passadas”, e que em 2016 esteve em Portugal, para acompanhar o ciclo que lhe dedicou o Cinema Ideal, em Lisboa, e apresentar a sua primeira performance, “Fever Room”.

11 Set 2017

Warmwall | No disco “City of Dreams” há um outro lado de Macau

Chamam-se Gassi Pang e Chai Kefu e juntos formam a banda Warmwall. O disco “City of Dreams”, lançado recentemente, é muito mais do que uma alusão ao famoso casino do Cotai. São oito canções sobre os sonhos ou a falta deles, ou de como podemos ficar confortavelmente presos a cadeiras imaginárias

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s sonoridades pouco ou nada têm de asiático ou de inspiração das famosas musicas K-Pop. Ouvir as oito canções que compõem o álbum “City of Dreams” remetem-nos para a Europa ou Estados Unidos.

São estas sonoridades mais pop-rock, ou de rock alternativo, que fazem bater os corações de Gassi Pang e Chai Kefu na hora de fazer canções. “City of Dreams” foi lançado recentemente no espaço de concertos intitulado Live Music Association e, para ser gravado, obteve o apoio financeiro do Instituto Cultural (IC).

O HM encontrou-se com Gassi Pang e Chai Kefu e conversámos sobre um álbum que começou a ser delineado, um pouco por acaso, quando ambos eram alunos da escola secundária. Chai Kefu começou a escrever algumas canções, enquanto Gassi Pang concluiu muitas das composições que iam surgindo.

“Já tocávamos numa banda há cinco anos”, contou Gassi Pang. “Nessa altura tinha outro nome, mas esse projecto acabou.”

Para gravar “City of Dreams”, os dois fizeram-se acompanhar por vários músicos para chegarem ao resultado desejado.

“Tivemos muitos parceiros para gravar este disco. Somos apenas dois músicos e gostaríamos de adicionar outras sonoridades, outros instrumentos”, explicou Gassi Pang.

Gritos na cidade

“City of Dreams”, a música que dá o nome ao álbum, é, aos olhos dos seus compositores, um grito, uma expressão por aquilo que este território é na maior parte das vezes.

“Quando escrevi a canção ainda era estudante. Já conhecia o Gassi e foi ele que acabou de compor. A sensação que tínhamos nesta altura era uma enorme vontade de gritar. Gritar por causa da cidade”, contou Chai Kefu.

Para Gassi, as oito canções do disco dão a resposta aquilo que o álbum é na sua essência.

“Todas estas canções são diferentes, mas têm um ponto em comum: o facto de estarmos em Macau. É o mesmo nome do casino, mas é um nome que tem outro significado. A imagem do álbum mostra uma cadeira, e é como se alguém tivesse sempre amarrado à cadeira. A partir daí decidimos dar o nome ‘City of Dreams’”, apontou.

Quando Gassi saiu da escola começou a trabalhar num casino. Foi aí que se deparou com vidas presas a cadeiras, pessoas que ficam eternamente em empregos demasiado confortáveis, mas sem uma perspectiva de futuro.

“Trabalhava num casino há cinco anos mas não estava muito feliz. Vi muitos jovens assim, nestes trabalhos, sentados nestas cadeiras. Os meus colegas eram assim. Alguns deles preferiam estar a fazer música, ou outro tipo de trabalho, mas simplesmente optavam por ficar na cadeira, por causa do bom salário.”

Na cidade onde existe um espaço de jogo intitulado “City of Dreams” será fácil sonhar? Gassi garante que, no território onde existe pleno emprego, é fácil ter um bom salário, mas não chega para ter acesso a todos os sonhos.

“Talvez seja difícil sonhar em Macau. É fácil encontrar um trabalho, é fácil entrar nos casinos, este nome explica isso. Os mais jovens podem encontrar facilmente um emprego mas não têm outras perspectivas. A maior parte está sentada numa cadeira como a que está na capa do álbum e não se mexem, estão confortáveis. É isso que significa”, acrescentou um dos membros da banda.

Em Macau “as pessoas andam pela cidade, a um ritmo alucinante, e existem construções por todo o lado”. “Vivemos na cidade dos sonhos, mas só temos acesso a metade disso”, frisou Gassi.

Banda separada

Para divulgarem este projecto, a banda deixou espalhadas pela cidade várias mensagens nas paredes, onde constam apenas as palavras “City of Dreams” e pequenas cadeiras. Depois do primeiro concerto no LMA, é pouco provável que este disco volte a ser tocado ao vivo. Pelo menos no território, já que há a possibilidade de serem realizados alguns espectáculos em Taiwan, onde estuda Chai Kefu.

“Quanto a outros concertos, para já não, porque eles os dois vão voltar para Taiwan para estudar e este mês ainda podemos tocar em Macau. Mas como grupo será difícil voltar a tocar o ‘City of Dreams’”, explicou Gassi.

Gassi diz-se, ele próprio, afastado das canções que ajudou a compor há um punhado de anos. O tempo passou e ele próprio mudou como pessoa. Ainda trabalha num casino, mas confessa ter outros projectos musicais em mente.

“Acho que não vou fazer outro álbum, mas ele (Chai Kefu) sim. Fizemos estas músicas há três anos mas já não sinto nada em relação a estas canções, porque estou mais virado para outras sonoridades, como o Folk. Já não sou a mesma pessoa, mudei”, rematou.

11 Set 2017

Pessanha, 150 anos | Valério Romão, escritor: “O amor já existia antes da literatura”

Valério Romão está prestes a encerrar o capítulo final de uma trilogia de romances, Paternidades Falhadas, com um livro, que terminou recentemente, sobre o Alzheimer. Tem também no currículo dois livros de contos. O escritor que gosta de temas arriscados esteve por cá para celebrar os 150 anos de Camilo Pessanha

[dropcap]C[/dropcap]omo se começa a fazer um livro?
Normalmente a coisa impõe-se de uma forma bastante natural. Quando dás por ti tens um projecto na cabeça que nasceu como uma espécie de revelação, uma iluminação. De repente há qualquer coisa que faz sentido e sobre a qual achas que podes passar alguns meses, ou alguns anos, a trabalhar sem que isso chateei, porque o romance é uma maratona. Começas agora e acabas muito tempo depois, portanto, tem de ser qualquer coisa que seja suficientemente apaixonante para te motivar. Acho que é bastante análogo ao trabalho académico, no princípio tudo parece muito bonito mas assim que começas a escrever surgem as dúvidas, pensas que está tudo uma grande merda. Tens oscilações, com amplitudes enormes, entre “eu sou muito bom” ou “eu sou uma grande porcaria” durante todo o processo, até que chegas a um ponto em que já nada importa a não ser acabar aquilo. Como o corpo do maratonista que já está tão anestesiado que já não lhe dói, já não é cansaço, já não é nada. É, pura e simplesmente, uma espécie de mecânica cuja inércia nunca mais termina e que faz com que ele chegue até ao fim da corrida. Entras num estado de semi-hipnose em que a cabeça se concentra num único objectivo e na única coisa que, de facto, te pode salvar naquele momento que é chegar ao fim.

Como é que se sabe que o processo de escrita chegou ao fim?
Tu decides. Há vários fins, ou seja, quando acabas de escrever a primeira versão, quando voltas a trabalhar naquilo. Havia um gajo qualquer que dizia: “sabes que está terminado quando já não consegues olhar para aquilo”. É mais ou menos isso. No meu romance “O da Joana” fiz sete revisões, cheguei ao fim e decidi entregar aquilo a alguém porque já estava a tirar vírgulas do sítio onde as tinha posto e a pô-las onde as tinha tirado. Corria o risco de estar naquilo, tipo Sísifo, o resto da vida. Acho que no fundo já não consegues fazer muito dano porque te estás a repetir. As partes de que não se gosta cortam-se, modificam-se, essa são fáceis de resolver. As difíceis são aquelas em que não tens a certeza. Depois também chegas a um ponto em que estás demasiado perto para poder avaliar aquilo, já não tens clareza suficiente para mexer nas coisas. É muito mais fácil quando estás a rever o livro de outra pessoa. Não é uma questão de ligação emocional ao que está escrito, tem a ver com o facto de haver uma espécie de opacidade que turva as coisas quando escreves qualquer coisa e vais revê-la ao fim de algum tempo. O que é muito bom e muito mau é fácil, o que está no meio é muito mais difícil e é a maior parte.

Como é que começou a escrever?
Começas a escrever porque gostas muito de ler e gostas muito de ler porque, normalmente, tens um problema social qualquer, ninguém te liga. A vida é muito mais interessante que a leitura. A maior parte das vezes não tens muito jeito para estar com pessoas, as pessoas não te interessam muito e refugiaste um bocado ali na leitura. Depois de estares nesse refúgio descobres que podes fazer um caleidoscópio do mundo e encontrar muitos mundos dentro deste mundo através da leitura e apaixonaste por aquilo. Com alguma naturalidade, vais tentando imolar aqueles de que mais gostas.

Que são…
Eu comecei, como julgo que imensos escritores da minha geração, com os Lobos Antunes da vida. É uma referência, mas também um eucalipto que seca tudo à volta porque, de facto, não se pode jogar no campo dele.

Os temas centrais dos seus livros são duros, extremados. Porquê?
Tenho algumas coisas, mais ou menos, simpáticas em contos, por exemplo. Mas, normalmente, vou à procura das coisas menos simpáticas. Primeiro, porque as acho mais interessantes, depois porque estão pouco trabalhadas, outras estão à espera que alguém pegue e faça alguma coisa. A literatura contemporânea tende a ser um bocado neutra a este tipo de temas, não os aborda, ou fá-lo de uma forma mais neutralizada. Interessa-me o desafio de pegar em matéria muito complexa. Pegar num tema destes e trabalhá-lo mal implica teres um livro que manipula uma determinada carga emocional e que redunda num livro delico-doce, ou num dramalhão. É um risco muito grande pegares no autismo, que é o tema do meu primeiro livro, ou numa gravidez falhada, que é o tema do segundo, corres o risco sempre de estar a manejar mal aquilo e de se tornar insuportável de ler por ser pornográfico. Porque expõe em demasia aquilo que as personagens estão a sentir, a desgraça alheia como finalidade, como no Big Brother. A minha finalidade não é essa. A minha finalidade é tentar perceber em que condições é que ocorre uma determinada experiência e tentar devolver essa experiência de uma forma intersubjectiva, de uma forma que faça sentido para mim e para ti sem que isso redunde em voyeurismo.

A sua estreia no romance tem uma recepção muito interessante, inclusive foi finalista do Prémio Femina, em França. Pensou que tinha alcançado um patamar interessante e estava no certo caminho para ser escritor?
Senti quando acabei aquele livro que era um bom livro. Precisava, talvez, de mais tempo para resolver alguns problemas de que ele enferma. Naturalmente, por ser um primeiro livro e por ser muito colado a uma vivência pessoal, mas senti que era um livro bom. Senti ainda mais isso no “O da Joana”, porque, na minha opinião, estruturalmente ainda é mais arriscado e não tendo falhado nesse risco acho que ainda é melhor. Mas percebes quando um livro é bom. Depois tens o teste do primeiro leitor, do editor, mas percebes quando é bom.

Sente que está a fazer o seu caminho e a conseguir o seu lugar?
Acho que ainda não cheguei lá, que ainda falta algum tempo para chegar ao meu lugar, seja lá o que isso for. Aquela coisa de encontrar a minha voz já está resolvida.

Acha que há uma geração nova de escritores portugueses? Um movimento pressupõe algumas condições…
O movimento característico desta geração é termos temas comuns. Muitas vezes o tema é uma espécie de incapacidade de encontrar um sentido para isto onde nós estamos a viver, o que não é nada de original mas que se acaba por repetir. A originalidade das coisas não pode estar no tema. Por exemplo, o amor existe antes de haver literatura, a morte também. O tema não pode ser diferente, mas a forma como o envelope lhe cai em cima, como é vestido é que pode ser diferente, a forma como pode ser vivido e expresso. Neste caso temos uma geração de pessoas que estão ligadas a essa incapacidade de encontrar sentido, que resulta também nalguma incapacidade de haver um movimento porque todo o movimento surge sempre como contraponto a qualquer coisa e aqui não há contraponto. Não é uma questão de realistas e românticos, não é uma questão de neo-realistas e simbolistas, não há isso. Para quê criar um movimento quando não há nada para ir contra? Claro que temos aquelas tricas, que não chegam sequer a ser dignas de menção literária, tipicamente lisboeta e portuguesa. É uma pequena cidade num país muito pequenino, em que as pessoas todas se conhecem e acabam por gostar e detestar-se mutuamente, com a mesma força.

Mas há, ou havia há um ano, um renascimento da poesia em Lisboa.
Há coisas interessantes a acontecer. Nunca tivemos tanta leitura de poesia, a poesia ficou sexy. Terá contribuído para isso a forma como é lida, porque a poesia era lida de uma forma em que acabava tudo a soar sempre a Manuel Alegre. A forma, a técnica, eram muito solenes e estamos numa altura em que as coisas solenes, para o bem e para o mal, não têm piada. Foi bom poder pegar em poetas e lê-los com uma guitarra eléctrica por trás, com piano, com o quer que seja, às vezes sem nada. Temos uma perspectiva muito desempoeirada do que pode ser uma leitura. Vais para um bar e não estás à espera de ver um gajo em modo lírico a noite toda a declamar como se estivesse a ser possuído por, sei lá por quem…

Pelo fantasma do Viegas…
Exacto.

O que nos pode dizer acerca do seu próximo livro?
Acabei de escrever a primeira versão antes de vir para cá. É um livro que ainda não sei muito bem como descrevê-lo porque é muito pulverizado. Tem como pano de fundo o Alzheimer. Gosto de adaptar uma forma específica de escrita a cada livro que escrevo. O “Autismo” tem uma série de capítulos que suportam e fazem a coluna dorsal do livro, que são as partes que se passam numa sala de espera de um hospital. Tudo o resto decorre daí, intercala-se como membros daquela construção que vão encaixar nessa coluna dorsal, em que há analepse, prolepse, para fazer essa sequência e uma espécie de bailado por dentro da história. É sinuoso, mas perfeitamente lógico. “O da Joana”, como é um livro que se passa numa noite, não tem capítulos, é vertiginoso, obriga o leitor a não parar. Como é um livro pequeno eu queria que a experiência fosse assim. Sem paragem, respirar só quando acabar o livro, é um shot de sofrimento. Este, como é sobre o Alzheimer, não tem ordem cronológica. Pode-se começar a ler do meio para o fim, e do meio para o princípio, a experiência não é igual mas pode ser feita. O livro está pulverizado, atomizado em capítulos de página, página e meia, que são uma espécie de ilhotas que simbolizam, de certa forma, as memórias do Alzheimer, que aparecem e desaparecem. Imaginemos um campo de dunas, em que as memórias aparecem em sítios diferentes, em dias diferentes. Queria que fosse uma coisa tão perigosa, tão frágil quanto isso. Não sei se vai resultar, vamos ver, mas já está acabado.

7 Set 2017

Paulo José Miranda, escritor e poeta: “Esta também é a terra dos portugueses”

Em “Karadeniz – Entrevista com um assassino”, Paulo José Miranda explora um dos muitos limites da natureza humana, ao mesmo tempo que reflecte sobre o terrorismo. Convidado da iniciativa “Camilo Pessanha – 150 anos”, o escritor e poeta fala do novo livro, cuja personagem é o oposto do assassino profissional. O autor, que fala hoje no edifício do antigo tribunal, defende que a existência de duas culturas que se compreendem e que fazem de Macau um lugar singular no mundo, irrepetível

Publicou “Karadeniz – Entrevista com um assassino”, uma compilação dos textos que tem vindo a publicar no HM. Porquê a entrevista a um assassino?

Tenho duas participações no HM. Uma é com os textos que compõem a secção “Máquina Lírica”, em que costumo escrever acerca de livros e maioritariamente poetas mais novos do que eu, que têm editado em Portugal. Participo também com a secção “Em Modo de Perguntar”, com pequenas entrevistas que tenho feito a várias pessoas, actores, poetas e escritores. De repente ocorreu-me a ideia de fazer um projecto, algo que já tinha escrito em 2004, a ver se funcionava. E eu próprio entro como entrevistador. Este livro faz parte de um projecto que já terminei, sobre obras do século XX, onde explorava diversas formas. A entrevista é uma forma utilizada no século XX, e em Portugal o gosto do público pela entrevista intensificou-se nos anos 90.

Porquê?

Talvez devido ao facto de termos vivido muitos anos no Estado Novo, a entrevista não era propriamente algo que agradasse ao regime. Então na década de 90 começou a acontecer uma coisa curiosa, em que as pessoas liam mais as entrevistas dos escritores do que os próprios livros.

Isso mudou ou intensificou-se?

Hoje em dia a situação é diferente porque a internet mudou muita coisa. Partindo dessa observação construí uma narrativa, uma ficção, em forma de entrevista. Já não era preciso estar a ler a entrevista do escritor. O Carlos [Morais José] gostou da ideia, teve alguma aceitação. Depois fez-me a proposta para editarmos o livro. Nunca pensei que o texto fosse editado tão cedo. Uma das razões para isso prende-se com o facto da entrevista ser um formato estranho para um livro, não seria a forma mais apetecível para os editores. Mas julgo que a maior dificuldade é que o texto não é muito longo. Se fosse um longo romance…que, aliás, pretendo fazer um dia.

A partir deste livro?

Não, só com esta forma, mas com outros personagens. Talvez aí seja mais fácil e apetecível para um editor. Quando me foi feita a proposta, aceitei de imediato. E porquê um assassino? O assassino opõe-se em determinados pontos de vista, que me parecem fundamentais, em relação às nossas próprias vidas e ao nosso tempo. Um deles é que ele faz uma vida inteira sem ser conhecido, porque ele era excelente no que fazia e ninguém sabia quem ele era. Isto é o oposto do que nós queremos nos nossos dias. Não só queremos ser reconhecidos pelo trabalho que fazemos como queremos ser reconhecidos só porque sim. 

Queremos ter os tais quinze minutos de fama.

E que os quinze minutos se prolonguem. Houve uma grande explosão, que me parece que está a terminar, em que as pessoas iam para a televisão sem terem feito nada de extraordinário. Este personagem é então o oposto disso tudo. Ao mesmo tempo há um jogo de espelhos entre a actividade dessa pessoa e a do próprio escritor. Vai-se traçando, à medida que ele está a falar, toda uma preparação. Há ainda a relação com a morte. Para ele matar não é encarado como morte, é visto como um trabalho. Há um outro lado, que está muito presente no nosso tempo, que é o modo como o personagem se posiciona de forma antagónica com o terrorismo, o que nos causa algum choque. Imaginamos que um assassino profissional é um terrorista, e ele distancia-se disso.

Editar este livro foi a maneira que encontrou de reflectir sobre essa questão, numa altura em que o terrorismo é tão falado e tão incompreendido?

É uma das maneiras. Tenho um livro, passado em Hong Kong, que é “A Máquina do Mundo”, uma história de amor entre dois assassinos profissionais, que vão perdendo vidas como se fosse um jogo de computador. Aí reflicto mais sobre o assunto. Em “Karadeniz – Entrevista com um assassino”, o que há é o mostrar como nos anos 50 e 60 quase tudo era de elites. Até matar e pagar para matar. Hoje, como diz Karadeniz, qualquer um encomenda uma morte por meia dúzia de tostões. O assassino profissional já se tornou democrático também.

Foto: Sofia Margarida Mota

Percebo que há aí um certo fio condutor em relação à morte. Esse tema, sobretudo a morte premeditada, fascina-o?

Não. O que acho é que o assassino profissional interessa, porque todas as situações limites do ser humano nos fazem pensar. E ser um assassino profissional é uma situação limite. Isso são coisas que me fascinam porque reflicto sobre elas, sem dúvida nenhuma. Alguém que transforma uma pessoa numa coisa entra na esfera do horror.

Algo desprovido de sentimento.

É o horror, como o que aconteceu em Auschwitz. Estas são formas que me interessam para pensar e ao mesmo tempo expor o humano que habita em todos nós. Não vamos a esse extremo, mas há algo que se ilumina a partir dali, daquele limite. O meu próximo livro, um longo romance de mais de 600 páginas, é o oposto: é sobre alguém que viveu a vida de um ponto de vista absolutamente ético. O que também é uma posição radical, de limite. Passou a vida a ler e a estudar, tendo responsabilidade. São casos extraordinários para reflexão. Ao tentarmos descer ou subir até eles, acabamos por nos iluminar a todos nós, o humano, na sua normalidade.

Falou-me do livro “A Máquina do Mundo”. Foi esse o livro que o fez regressar a Portugal depois de ter vivido vários anos no Brasil. Chegou a ser referido na imprensa como um “fantasma literário”, porque desapareceu do panorama literário português durante uns anos.

O João Paulo Cotrim recebeu uma indicação do António Cabrita, que lhe tinha enviado “A Máquina do Mundo”. Ele gostou do texto e contactou-me a perguntar se já tinha editora. Eu vivia em Curitiba e ele foi a minha casa, e conversámos. Durante o ano de 2014 acabei por escrever um livro de poesia, então o João Paulo Cotrim acabou por editar três livros.

Mas como foi regressar? Sentiu-se esse “fantasma literário”?

Não pensei assim e continuei a escrever. No tempo em que não escrevi estava dedicado à música. Não publicava, mas não tentei publicar. Era uma situação difícil para publicar, porque estava muito afastado. Hoje em dia é muito difícil editar livros sem aparecer. Se não apareces para as entrevistas as pessoas deixam de existir, somos cada vez mais numa sociedade mediática.

E o escritor tem de ser uma estrela.

Não diria uma estrela. Comecei a publicar no final dos anos 90 e as coisas eram diferentes. Davam-se entrevistas, mas não se aparecia. Hoje isso é fundamental. Nunca senti a questão do “fantasma literário”. Continuei a publicar, mas de facto não aparecia. Foram livros que passaram, não estava lá. E do ponto de vista do jornalismo é interessante escrever sobre alguém que está exilado, desaparece e de repente edita três livros.

Esta terça-feira falou sobre a experiência do que é ser português em Macau. Viveu essa experiência na pele durante três meses.

Vivi um pouco, mas a minha experiência veio de uma grande intuição, e também pela experiência de ter vivido cinco anos em Istambul. Foi uma experiência mais radical do que estar em Macau, porque ninguém fala português. Haveria talvez uma pessoa que sabia quem tinha sido Fernando Pessoa. Em Macau, além de ter lido as cartas e imenso sobre Pessanha, fiquei com uma percepção. Há qualquer coisa que acontece com os portugueses de Macau que é uma espécie de amplificador de uma estrutura existencial. Essa estrutura é como aquele fenómeno que se passa na mecânica quântica, como se houvesse uma vida paralela. Durante um tempo poucas pessoas que vinham para aqui não sentiriam que a sua vida seria uma vida de empréstimo, e que mais cedo ou mais tarde iriam recuperá-la.

Sente que somos uns privilegiados em Macau?

Hoje em dia já não, mas na década de 90 sim, sem dúvida. As pessoas ganhavam uma fortuna a fazer o mesmo que fariam em Portugal. 

Falo do privilégio de ter acesso à cultura portuguesa e a pontos identitários nesse sentido.

O que acho é que Macau é um lugar privilegiado e provavelmente único. É provavelmente o único lugar onde os portugueses estiveram que não foi conquistado, foi doado. Isso muda tudo. Em Moçambique há uma sensação de racismo, porque os moçambicanos foram colonizados. Aqui isso não existe.

Mas há um distanciamento.

Que advém da enorme diferença cultural e da língua. Há essa experiência que é o convívio de duas culturas muito distantes uma da outra, que não se fundem. Houve muito mais fusão cultural, e entre as pessoas, em Moçambique do que aqui. Os portugueses tiveram, apesar de tudo, uma diferença em relação aos outros países, apesar das atrocidades cometidas. O português misturava-se. Quando chegamos aqui os bárbaros éramos nós, há logo uma diferença, porque havia aqui uma cultura instalada. Sempre houve esse respeito. Em nenhuma parte do mundo acontece isto. No mundo em que nós vivemos, é exemplar.

Quando viveu em Macau veio escrever sobre Camilo Pessanha.

Estava inserido num projecto que era uma parceria entre a Fundação Oriente (FO) e a editora Cotovia, da qual fazia parte. A Cotovia enviava escritores para vários locais a Oriente e publicava os livros. A FO encarregava-se dos custos. Foi-me dado a escolher entre Pessanha e Venceslau de Moraes, e aí iria para o Japão. Eu não escolhi Macau, escolhi Pessanha. É um poeta pelo qual sentia um fascínio há muito tempo. Li muito sobre ele, andei nos lugares onde andou. Foi o Pessanha e a força da poesia dele que me trouxe, e interessei-me depois pela sua pessoa. É uma pessoa contraditória, cheia de mistérios à sua volta, alguém que é viciado em ópio e que tem uma profissão importante. Ao mesmo tempo tinha um desprezo pelos seus conterrâneos, e depois tinha uma sensibilidade enorme. Acho que Macau está melhor, porque já não há a sombra de muitos portugueses que sentiam isto como uma colónia. Alguns achavam que os chineses eram inferiores. Era uma sombra que pairava, mesmo que nem todos pensassem assim. Com a transferência de soberania essa sombra desaparece. Mas esta é também a terra dos portugueses, e isso é hoje mais claro.

6 Set 2017