Italiano Ludovico Einaudi estreia-se no CCM a 10 de Junho

[dropcap style≠‘circle’]O[/dropcap] pianista e compositor Ludovico Einaudi vai subir ao palco do grande auditória do Centro Cultural de Macau (CCM) a 10 de Junho, anunciou ontem o Instituto Cultural (IC) em comunicado. O músico italiano, acompanhado pela sua banda, vai apresentar uma antologia das suas melhores composições tocadas ao piano, segundo o IC. Descrito pelo jornal britânico Daily Telegraph como “um pianista com tendência para deus do rock”, Ludovico Einaudi é um campeão das tabelas de vendas e mestre das bandas sonoras que se transformou num verdadeiro homem do espectáculo após cerca de 20 anos a trabalhar nos bastidores, compondo para ballet, teatro e instalações vídeo.

Ao longo da última década, o pianista tem esgotado as mais prestigiadas salas de espectáculo do mundo, tendo-se tornado num dos artistas de música clássica mais seguidos do mundo, batendo a popularidade de lendas como Mozart na plataforma digital Spotify. A música refinada de Ludovico Einaudi chamou a atenção do mundo cinematográfico tendo sido incluída em bandas sonoras de filmes como “O Cisne Negro” de Aronofsky, o sucesso de bilheteira francês “The Intouchables” ou “J. Edgar”, de Clint Eastwood.

A versatilidade do mestre italiano ficou também registada no thriller japonês “O Terceiro Assassinato” bem como numa série de grandes anúncios publicitários e spots, da NBA e da marca Nissan às promoções para a BBC. Em 2016, Einaudi ficou ainda mais conhecido quando um clip de sensibilização que gravou para a Greenpeace, no qual aparece à deriva no oceano, registou milhões de visualizações.

Os bilhetes para o concerto ficam disponíveis para venda a partir de hoje.

10 Abr 2018

“Interculturalidade – A lusofonia em Macau” com antestreia na próxima quinta-feira

O auditório do Consulado-Geral de Portugal vai ser o palco da antestreia do documentário “Interculturalidade – A lusofonia em Macau”, inserido na série “Macau, 20 anos depois”, do realizador Carlos Fraga. A sessão está marcada para as 18h30 da próxima quinta-feira

 

[dropcap style≠‘circle’]”I[/dropcap]nterculturalidade – A lusofonia em Macau”, com antestreia marcada para a próxima quinta-feira, figura como o quarto de seis filmes da série documental “Macau, 20 anos depois”. A série deve ser exibida na íntegra em Macau e em Portugal por ocasião do 20.º aniversário da transferência do exercício de soberania.

“No quarto documentário reunimos todos os presidentes das associações, das várias comunidades lusófonas e tivemos uma aproximação ao que é a convivência desta multiculturalidade”, explicou ao HM Carlos Fraga, para quem “os testemunhos de cada um dos representantes das diferentes comunidades” vão permitir aos espectadores “perceber que vivem aqui em harmonia”. O Festival da Lusofonia, que teve a sua 20.ª edição em 2017, “é realmente o momento auge de união que motiva muito a que se vão relacionando durante o ano precisamente para a festa”, sublinhou Carlos Fraga. O cineasta realça que “fica muito claro que é realmente um motor de movimentos e de contactos entre as diferentes comunidades”.

“Por outro lado, do que percebi e acho que as pessoas vão perceber também, a festa da lusofonia também motivou que as comunidades se organizassem, neste caso como associações. Isso fez com que se constituíssem como comunidades diferenciadas, embora depois se interrelacionem”, sustentou.

O documentário também capta “as experiências pessoais de cada um”. Na perspectiva de Carlos Fraga, “são igualmente interessantes”, na medida em que ilustram como “vivem precisamente essa multiculturalidade, a mistura, o cruzamento de pessoas de diferentes comunidades, inclusive no seio da família”.

Esta antestreia – à semelhança das anteriores – tem como objectivo dar a conhecer o documentário particularmente a quem dele participou. “Parece-nos justo vir aqui mostrar o documentário, principalmente às pessoas que estiveram envolvidas, mas também, claro, a todos os que quiserem ir assistir. É uma forma de agradecimento às pessoas que colaboraram”, salientou o realizador.

 

Documentário a rodar

 

Enquanto “Interculturalidade – A lusofonia em Macau” conhece a antestreia, Carlos Fraga ultima as filmagens do quinto e penúltimo filme da série documental intitulado “Macaenses em Macau” que figura como o “outro lado” do documentário inicial “Macaenses em Lisboa”. “Este surge porque tínhamos esse primeiro. Pensámos que seria importante ter os macaenses de Macau, porque é uma realidade diferente”, explicou o realizador que prevê regressar novamente ao território, desta feita para filmar o sexto e último documentário em Outubro/Novembro.

“A série estará terminada no início do próximo ano, devendo ser emitida na íntegra mais perto da data da transferência” do exercício de soberania de Macau de Portugal para a China, dado que se pretende que “faça parte das comemorações em Macau e em Portugal”.

Carlos Fraga deu conta de que há já um acordo com a TDM para a transmissão da série. “Primeiro, pensou-se em ir emitindo à medida que íamos fazendo os documentários, mas nós propusemos, porque achamos que seria mais interessante, esperar até terminar a série para ser transmitida toda num ciclo em 2019”, especificou. Em paralelo, adiantou, também estão a ser negociadas com a RTP datas para a emissão. Não obstante, no passado, ambas as televisões deram um cheirinho da série: a RTP exibiu os primeiros dois documentários, enquanto a TDM o inaugural.

“Também vai haver um ciclo na Cinemateca Paixão, que estamos a negociar mas que, logicamente, será anterior à emissão na TDM”, revela Carlos Fraga, indicando que o conjunto dos seis documentários também vai estar disponível para venda em formato físico.

A série “Macau, 20 anos depois”, da LivreMeio Produções, conta com seis filmes com a duração aproximada de uma hora. Os primeiros quatro (“Macaenses em Lisboa”, “Portugueses em Macau”, “Dar e Receber a Portugalidade”, “Interculturalidade – A lusofonia em Macau”) estão prontos. A faltar fica apenas “Macaenses em Macau”, que entrou então na fase final de filmagens, e “Uns e outros”, dedicado ao que pensam os chineses sobre a presença portuguesa em Macau.

Macau despertou o interesse de Carlos Fraga depois do documentário que realizou, em 2013, sobre a comunidade chinesa na capital portuguesa, projectado na Universidade de Lisboa e exibido na RTP “por três vezes”, que veio abrir caminho à realização de “Macaenses em Lisboa”, na sequência de uma recepção entusiástica nomeadamente por parte de académicos, como o investigador macaense Carlos Piteira.

“Decidi que tinha que vir a Macau, porque eles falam, como é natural, da sua terra, da sua origem, das suas saudades, dos seus cheiros, sabores e experiências. Tinha que vir a Macau filmar para ilustrar isso mesmo”, sublinhou Carlos Fraga que quando cá chegou concluiu que o conjunto precisava “do outro lado”, o que fez então crescer a série de cinco para um total de seis documentários, contou o realizador.

10 Abr 2018

Livros | “Yoga-me” vai ser apresentado na Livraria Portuguesa

[dropcap style=’circle’] O [/dropcap] ioga já há muito que saiu da Índia para entrar na vida das pessoas um pouco por todo o mundo. Filipa Veiga é um bom exemplo de alguém que mudou de vida graças à prática. De aluna de direito, com passagem pelo jornalismo, a agora professora de Yoga está em Macau para apresentar “Yoga-me”.

O livro “Yoga-me”, de autoria de Filipa Veiga, vai ser apresentado no próximo dia 11. O evento tem lugar na Livraria Portuguesa, pelas 19h, e conta com a presença da autora e co-apresentação da também professora de Yoga, Rita Gonçalves. “Yoga-me” é o livro que conta as experiências que Filipa Veiga tem tido entre Bali, Índia e Portugal.

Natural de Macau, foi com a ida para a Faculdade de Direito, em Portugal, que Filipa Veiga se sentiu pela primeira vez deslocada e fora de um mundo que não era o seu. “Quando fui para Portugal foi um choque, não gostei da Faculdade de Direito. Fui logo catalogada como diferente, como hippie. Não era igual às pessoas que lá estavam”, começa por contar ao HM.

Filipa Veiga sentia falta de algo. Sem saber bem de quê, recorda agora que talvez tivesse que ver com uma espiritualidade a que associa o território e que não via no ocidente. “O facto de ter crescido em Macau e na Ásia, faz com que convivamos com outros lados da espiritualidade mesmo sem ter consciência disso. Lembro-me de ir para o liceu e ver as pessoas a fazer Tai Chi e era tudo muito natural”, recorda.

Dividida, pensou em começar a fazer ioga. “Finalmente, encontrei o sítio ideal depois de duas ou três tentativas falhadas, e senti logo que era algo que eu precisava para me equilibrar entre a vida da Faculdade de Direito e de Lisboa e um lado muito meu. Na altura, não disse a ninguém que praticava ioga. Como ninguém o fazia e eu já era diferente, então não contei a ninguém”, revela.

Ser professora da modalidade ainda não era um objectivo. Acabou antes por ficar ligada ao jornalismo. “Entrei na SIC, e no meu segundo ano do estágio de advocacia inscrevi-me no CENJOR. Nunca pensei em dar aulas de yoga, queria ser jornalista e trabalhei 12 anos na SIC”.

Mas em 2012, pediu uma licença sem vencimento e foi viver para Bali. O resto foi natural. “Tive o convite para dar aulas no estúdio, e foi assim que comecei”, conta.

Com experiência em jornalismo, e numa altura em que os blogues estavam “na moda”, Filipa Veiga aproveitou a estadia em Bali e criou o seu lugar na blogosfera. “Sentia falta da escrita e senti que agora podia escrever sobre o que estava a acontecer na minha vida”, explica.

Depois surgiu o convite da editora 20/20 para passar as experiências do ioga, de Bali, de Macau, da Índia para um livro. “Quando voltei a Portugal, em 2015, decidi que o ia fazer”. A edição que contou com 200 exemplares está a esgotar.

<h4>ioga omnipresente</h4>

Já se passaram 15 anos desde que saiu de Macau. O regresso para a apresentação de “Yoga-me” está carregado de ansiedade, mas faz parte da própria forma de existir ligada à prática. “É o ioga a actuar na vida das pessoas”, refere.

Afinal, é ao território que agradece por este percurso e esta obra. “Quero agradecer a Macau por tudo aquilo que sou e ao que essa terra me deu. É um lançamento mais espiritual do que um lançamento normal de um livro, é uma entrega e uma forma de agradecer”.

O lançamento em Macau conta com a co-apresentação de Rita Gonçalves, professora de ioga do território e responsável pelo Yoga Loft Macau. De acordo com a apresentação do evento, “é uma oportunidade para conhecer a história de duas mulheres portuguesas que cresceram em Macau antes da entrega da soberania à China, e do boom dos casinos, duas histórias de vida que seguiram rumos muito semelhantes, do jornalismo à prática e ensino do ioga”.

Filipa Veiga vai ficar em Macau mais uns dias para dar um workshop durante o fim-de-semana de 13 a 15 de Abril no Yoga Loft Macau, com aulas práticas e teóricas para praticantes iniciados e regulares.

6 Abr 2018

Chui Tak Kei | João Guedes lança fotobiografia do tio do Chefe do Executivo

O jornalista e autor João Guedes lança no próximo sábado a obra “Chui Tak Kei – História numa biografia”, dedicado à vida do tio do actual Chefe do Executivo, Chui Sai On. Chui Tak Kei foi um dos principais elos de ligação entre as comunidades chinesa e portuguesa, a par de nomes como Roque Choi e Ho Yin

[dropcap style=’circle’] O [/dropcap] Albergue SCM promove o lançamento, este sábado, da fotobiografia sobre o tio do actual Chefe do Executivo, Chui Sai On, uma figura histórica da comunidade chinesa em Macau, falecida em 2007. “Chui Tak Kei – a História numa biografia” é da autoria de João Guedes, ex-jornalista da TDM e autor de várias obras sobre a história de Macau.

João Guedes desvendou ao HM um pouco sobre a obra que ele próprio propôs realizar e que contou de imediato com o apoio de Carlos Marreiros, arquitecto e director do Albergue SCM. Além disso, a Fundação Macau também apoia o projecto.

“Não há biografias em Macau e o que existe são pequenos artigos de jornal ou resumos biográficos”, contou. “A única biografia de fôlego que conheço foi a que foi publicada sobre o Roque Choi [da editora Livros do Oriente, de Rogério Beltrão Coelho e Cecília Jorge]. Há uma quantidade enorme de pessoas com interesse que não têm biografias”, acrescentou.

Chui Tak Kei é um nome proveniente da família Chui, uma das mais importantes de Macau. Tio de Chui Sai On, foi empresário nos mais diversos ramos, um dos quais o imobiliário. No plano político destacou-se como vice-presidente da Assembleia Legislativa e participou no processo de transferência de soberania de Macau e na elaboração da Lei Básica.

Como membro da comunidade chinesa, Chui Tak Kei foi uma das figuras que serviu de elo de ligação com a comunidade portuguesa. João Guedes prefere destacar a época da II Guerra Mundial e a crise do “1,2,3”, no período da Revolução Cultural, como dois momentos importantes na vida de Chui Tak Kei.

“Durante a guerra pertencia à Associação Tung Sin Tong e deu auxílio a refugiados. Esse é um ponto importante porque é aí que inicia a sua vida política. Também fazia parte da Associação Comercial de Macau, que era uma espécie de governo sombra da comunidade chinesa na altura”, contou. De frisar que a família Chui ainda hoje está ligada à Tung Sin Tong, uma das associações de caridade mais antigas de Macau.

Versão trilingue

A vida de Chui Tak Kei é contada e revelada num livro que estará disponível em português, inglês e chinês, e que contém 240 páginas repletas de “fotografias impressas em alta qualidade e documentação sobre Chui Tak Kei que, até agora, nunca tinham estado disponíveis ao público.” De acordo com um comunicado do Albergue, Chui Tak Kei foi uma “personalidade de invulgar dimensão humana e cívica, que Macau ainda lembra com saudade e respeito”.

Chui Tak Kei nasceu em Macau em 1911. Licenciado em Farmácia e com o curso técnico de Arquitectura, assume os negócios da família, ligados à construção civil, a partir de 1935. Figura preponderante do mundo empresarial de Macau, presidente da Associação Comercial de Macau, funda, nos anos 70, a Associação de Construtores Civis de Macau, de que seria o presidente executivo e mais tarde presidente honorário até ao fim da vida.

Foi uma figura de vulto nas instituições públicas e privadas do território e nos órgãos políticos de Macau, tendo ocupado o cargo no Conselho Consultivo do Governador e na Vereação do Leal Senado. Foi membro do Conselho da Redacção da Lei Básica da RAEM e da Comissão Preparatória da RAEM, bem como presidente do Comité Consultivo para a Lei Básica da RAEM. Amante de música e de Belas Artes, dedicou-se, nos tempos livres, ao desenho, pintura e caligrafia chinesa, além de ser um grande apreciador e coleccionador de arte chinesa.

5 Abr 2018

Plágio | Escritora Deana Barroqueiro acusa João Botelho de leviandade  

A escritora Deana Barroqueiro, autora do livro “O Corsário dos Sete Mares – Fernão Mendes Pinto”, acusa o cineasta João Botelho de estar a tratar o caso de plágio do seu romance para o filme “Peregrinação” com leviandade. E alerta que ainda não recebeu quaisquer créditos por parte da produtora

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] polémica em torno do plágio feito pelo cineasta João Botelho a algumas partes do romance de Deana Barroqueiro, intitulado “O Corsário dos Sete Mares – Fernão Mendes Pinto”, continua. Depois do caso ter sido denunciado pela escritora de romances históricos na sua página de Facebook, muitos meios de comunicação social portugueses escreveram sobre o caso. Botelho assumiu que foi buscar ao livro de Deana Barroqueiro a base para escrever parte do argumento do filme “Peregrinação”, e não ao original de Fernão Mendes Pinto.

Em declarações ao HM, a autora não esconde a revolta e conta que ainda não recebeu quaisquer créditos da produtora de Botelho. “Só queria aquilo a que tenho direito, e que Botelho não fez: que registe os créditos da minha obra nos materiais referentes ao filme, DVDs e outros. A contrapartida seria da parte deles darem-me os créditos nas acções e materiais sobre o filme, o que não aconteceu até hoje.”

Uma das mais conhecidas escritoras de romances históricos em Portugal, e uma das convidadas numa das anteriores edições do festival literário Rota das Letras, afirma nada ganhar caso leve a produtora de João Botelho a tribunal.

“Ir para tribunal contra João Botelho e a poderosa empresa que o apoia? Isso só se a editora [Casa das Letras / Leya] o fizesse, porque, do modo como a justiça funciona em Portugal, com tal lentidão e tantas artimanhas processuais, eu não ganharia para o processo e não teria paz para escrever, que é a única coisa que me interessa.”

A autora quer apenas “fazer chegar a informação a jornalistas não comprometidos e a outros media, que me permitam desmascarar o abuso, porque atropelar os direitos de autor e de propriedade intelectual é crime punido por lei.”

“O filme teve uma nomeação pela Academia de Cinema para o prémio de Melhor Adaptação da obra, [com base na] Peregrinação, de Fernão Mendes Pinto, quando, no fundo, grande parte do guião é o meu romance”, frisou.

João Botelho já escreveu uma carta à autora a assumir o plágio de algumas cenas do filme, sobretudo as que se passam na China, tendo afirmado que tentou, por diversas vezes, contactar a autora, sem sucesso. O cineasta terá mesmo dito achar que a autora se encontrava nos Estados Unidos, de onde é também natural.

Numa resposta, também já tornada pública, a autora recusa essas explicações para o caso de plágio que diz ser vítima. “João Botelho tem tomado este assunto como uma coisa divertida e insignificante. O que eles ‘concederam’ à editora foi que ela pusesse uma cinta nos exemplares do livro, com a referência à adaptação de algumas cenas, ou seja, eu é que ainda estou a fazer a promoção do filme! A contrapartida seria da parte deles darem-me os créditos nas acções e materiais sobre o filme, o que não aconteceu até hoje.”

Deana Barroqueiro disse ainda que, até hoje, todo o caso foi tratado entre os responsáveis da sua editora e da produtora, sem que tenha havido contactos directos com João Botelho. “Embora os representantes do cineasta (a produção), que se reuniram com a editora Leya, tenham reconhecido que as cenas da China tinham sido adaptadas do meu livro, nunca se quiseram encontrar comigo, embora dissessem que João Botelho o queria fazer. O que não aconteceu.”

Filme é “anti-pedagógico”

Deana Barroqueiro alerta ainda para o facto do filme ser recomendado nas escolas em Portugal, o que pode resultar no ensino de factos históricos errados.

“Se o filme passar nas escolas, como ele [João Botelho] pretende, vai apresentar inúmeras cenas do meu Corsário dos Sete Mares como se fossem da Peregrinação de Fernão Mendes Pinto, o que eu, como professora com mais de 35 anos de ensino, não posso admitir, por ser errado e anti-pedagógico.”

A escritora acrescentou ainda que não está à procura de mediatismo e que apenas deseja o reconhecimento por cinco anos de trabalho.

“Não é aos 72 anos que eu vou lançar mão de uma querela para ser falada dos media e vender livros. Eu vivo para a escrita, não vivo da escrita. Se João Botelho, em Novembro do ano passado, em que tudo começou, tivesse tido a frontalidade de se reunir comigo ou tão só de me telefonar a pedir desculpa e a aceitar pôr os créditos da minha obra, o caso ficava de imediato encerrado, pois dar-me-ia por satisfeita.”

Deana Barroqueiro considera ainda que João Botelho, que filmou parte da película em Macau, é “alguém sem escrúpulos, que, para mais, me retira a autoria desse trabalho, fazendo-o passar pela obra de outro autor ou dele próprio”. “É abjecto e inqualificável”, concluiu.

3 Abr 2018

Museu do Oriente recebeu mais de 450 mil visitantes numa década

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Museu do Oriente, em Lisboa, recebeu 450.725 visitantes em dez anos de funcionamento, com cerca de 24 por cento de entradas de estrangeiros, revelou fonte da Fundação Oriente, que celebra este ano o 30.º aniversário.

Contactada pela agência Lusa para um balanço dos dez anos de vida do museu, fonte da comunicação da Fundação Oriente indicou que estes visitantes passaram pelas exposições entre Maio de 2008, quando o museu foi inaugurado, e Janeiro de 2018.

Ainda segundo as estatísticas da entidade, 97.846 espectadores assistiram a cerca de 500 espectáculos de música, teatro, dança e cinema nestes dez anos.

Foram também apresentadas 115 exposições temporárias, 34.111 pessoas participaram nos mais de 700 cursos, ‘workshops’ e palestras realizadas no museu, 13.328 usaram o Centro de Documentação, onde se realizaram dez festas do livro, e 39.317 recorreram a diversas actividades do serviço educativo.

No Centro de Reuniões do museu, ao longo dos dez anos, foram realizados cerca de 1.700 eventos, nos quais participaram 141.600 pessoas, segundo os dados da fundação.

Actualmente, o museu tem patente a exposição “Um Museu do Outro Mundo”, com cerca de uma centena de peças, num diálogo de obras do acervo, com novas obras do artista José de Guimarães, até 3 de Junho.

O Museu do Oriente, que abriu portas em Maio de 2008, foi distinguido em 2009 como o melhor museu português desse ano pela Associação Portuguesa de Museologia (APCOM).

Possui um património museológico com mais de 15.000 peças, muitas delas sobre a presença portuguesa na Ásia, que vão desde as máscaras ao mobiliário, passando por armaduras, mapas, têxteis, biombos, porcelanas, terracotas, desenhos e pinturas.

Localizado em Alcântara, o museu foi instalado após obras de recuperação e adaptação do edifício originalmente desenhado pelo arquitecto João Simões, construído em 1939, um dos símbolos da arquitectura portuária do Estado Novo.

O novo projecto é da autoria dos arquitectos João Luís Carrilho da Graça e Rui Francisco.

3 Abr 2018

Leonor Teles venceu prémio no Festival Cinéma du Réel em Paris

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] filme “Terra Franca”, a primeira longa-metragem da realizadora portuguesa Leonor Teles, venceu o “Prix International de la Scam” no festival Cinéma du Réel em Paris, que começou a 23 de março e termina este domingo.

A entrega dos prémios da 40.ª edição do Festival Internacional de Cinema Documental aconteceu este sábado à noite, no Centro Pompidou, e Leonor Teles foi distinguida na secção Competição Internacional, na qual concorriam 11 filmes.

A realizadora de 25 anos, que venceu o Urso de Ouro para Melhor Curta-Metragem com “Balada de um Batráquio”, em 2016, contou à Lusa que ficou “muito surpreendida” com o prémio que carimbou a estreia internacional do filme.

“Estou muito feliz, como é óbvio, e estou muito surpresa porque não contava nada com isto, já me ia embora hoje. Então, foi muito bom. Na verdade, o filme, nas três exibições que teve, correu sempre muito bem, a aceitação foi muito boa, tivemos ótimas reações e isso para mim foi sempre o mais importante”, afirmou a cineasta.

Leonor Teles destacou que, “obviamente, um prémio destes é sempre importante também para dar continuidade à vida do filme, especialmente em Portugal”, porque “parece que, quando uma coisa é falada internacionalmente, acaba também por ter mais peso em casa”.

“Acaba por ser um festival com bastante prestígio, é uma janela na Europa que dá muita visibilidade aos documentários sobretudo ou então aos filmes que têm ligações com temas ligados ao real, com a atualidade, com cinema de urgência. Acho que especialmente para mim, sendo uma primeira longa [metragem], é assim um grande ‘kick’ e um grande incentivo para continuar a trabalhar”, comentou.

Produzido por Uma Pedra no Sapato, o documentário vai estar, em maio, numa das secções paralelas do Festival de Cinema de Cannes, organizada pela Association du Cinéma Indépendant pour sa Diffusion (ACID), e vai estar, em abril, no Festival Internacional de Documentário de Tui – Play-Doc.

“Terra Franca” retrata a vida de um pescador, Albertino Lobo, e da sua família, tendo sido um dos filmes destacados pelo jornal francês Libération, na edição de hoje, que o descreve como “um vasto filme de família lírico e geracional, que se torna cada vez mais narrativo e empolgante”.

Leonor Teles explicou que, de facto, o documentário “acaba por ser não só um retrato da vida do Albertino Lobo, que é o pescador” mas “mais do que isso é também o retrato de uma família e de uma família bastante portuguesa”.

“Eu acho que é uma família típica portuguesa com as suas tradições e eu acho que qualquer português que veja o filme poderá identificar-se com as personagens, com as pessoas que estão ali representadas. Ao mesmo tempo, tenta também transmitir uma mensagem do que é que é isto da família, desta união, quais são as diferenças entre os pais e os filhos, a minha geração e a geração dos meus pais”, continuou.

O filme também “retrata um estilo de vida de pessoas muito simples, muito genuínas, verdadeiras, maravilhosas”, que “merecem estar figuradas no grande ecrã” e a terra da realizadora, Vila Franca de Xira “uma zona absolutamente incrível” pelo que “é importante o cinema devolver as imagens às pessoas e dar-lhes um novo olhar”.

Graças a um avô varino, a realizadora cresceu “com esta ligação ao rio” Tejo e foi durante um trabalho, na escola de cinema, que conheceu o Albertino e ficou com a imagem de “um cowboy de um western a cavalgar o seu barco”, uma pessoa “que pertencia àquele sítio”.

“Terra Franca começou com estas duas premissas: um lugar e uma personagem. E depois com uma procura, com a intenção de passar um ano a filmar, mas ao mesmo tempo ver o que o próprio filme me devolvia a mim (?) O filme começou com a pesca e, depois, devagarinho, começou a abrir a porta para o outro lado do Albertino que era a família”, acrescentou.

Leonor Teles licenciou-se na Escola Superior de Teatro e Cinema de Lisboa e o seu filme de fim de curso, “Rhoma Acans” (2013) teve uma menção honrosa no IndieLisboa desse ano, venceu o Prémio Take One! no Curtas Vila do Conde, ainda em 2013, e teve uma menção especial do júri no FICUNAM – Festival Internacional de Cinema da Universidade Autónoma do México (2014).

A Balada do Batráquio (2016) ganhou o Urso de Ouro para Melhor Curta-Metragem na Berlinale de 2016, o Prémio Firebird para Melhor Curta-Metragem no Hong Kong International Film Festival, em 2016, a Melhor Curta-Metragem no Belo Horizonte International Short Film Festival, em 2016, e o Prémio Cervantes para Curta Metragem Mais Inovadora no Festival Medfilm, em Roma, em 2016.

Em 2010, Susana Sousa Dias venceu o Grande Prémio do Cinéma du Réel com o filme “48”, e, no ano passado, Ico Costa venceu o prémio de melhor curta-metragem com o filme “Nyo Vweta Nafta”.

O Grande Prémio do festival foi para “L. Cohen”, do norte-americano James Benning, um documentário sobre uma paisagem do Oregon, nos Estados Unidos, atravessada, a dada altura, por uma canção de Leonard Cohen.

2 Abr 2018

Estreia de “2001: Odisseia no Espaço” foi há 50 anos

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] filme “2001: Odisseia no Espaço”, de Stanley Kubrick, estreou-se em Washington há 50 anos, em 2 de abril de 1968, antes de chegar a salas de Nova Iorque e Los Angeles, nos dias seguintes.

Baseado num conto de ficção científica de Arthur C. Clarke, coautor do argumento, o filme parte da descoberta de um monólito na superfície lunar, similar ao que definira a origem da humanidade, em comunicação com um terceiro, em Júpiter, o que impõe a demanda pela nave Discovery, a sua tripulação e o quase humano computador HAL9000.

Nomeado para quatro Óscares, entre os quais os de melhor argumento e melhor realizador, “2001: Odisseia no Espaço” obteve apenas o de melhores efeitos especiais, entregue a Kubrick, mas transformou-se numa das referências da história do cinema e inspirou realizadores como Steven Spielberg, George Lucas e Riddley Scott, que o consideram uma “obra-prima”.

No início, porém, as críticas não foram favoráveis. O The New York Times colocou-o entre o “hipnótico e o chato”, a Harpers Magazine acusou-o de demonstrar “uma monumental falta de imaginação”, enquanto a Variety, embora o considerasse um filme “grande e belo”, com uma “fotografia soberba”, também o classificou como pesado, confuso e demasiado longo.

A produtora MGM considerou retirar o filme das salas, perante a falta de entusiasmo da crítica, mas os exibidores, compostos na maioria por pequenos e médios empresários, ainda independentes das ‘majors’, opuseram-se, pois tinham verificado um aumento progressivo de público durante as primeiras semanas de exibição.

“2001: Odisseia no Espaço” teve estreia portuguesa em 01 de outubro de 1968.

Cerca de 20 anos antes, em 1948, Stanley Kubrick visitara Portugal, como fotorrepórter da antiga revista norte-americana Look (1937-1971), numa viagem de Lisboa à Nazaré, na procura de locais do país europeu que escapara a bombardeamentos durante a II Guerra Mundial.

As imagens, todas a preto e branco, estão agora depositadas na Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos, com o acervo da revista, e testemunham locais que vão do Buçaco à Nazaré, passam pela praia do Guincho, e detêm-se em Lisboa, em sítios como o Castelo de São Jorge e o Bairro Alto.

A reportagem foi publicada em 03 de agosto de 1948, repetida na edição de 01 de dezembro de 1953, e as imagens incluídas na obra “Drama and Shadows”, do historiador Rainer Crone, sobre o realizador como fotógrafo.

Para Crone, Kubrick, que trabalhou para a Look dos 17 anos aos 21 anos (1945-1950), “já era um cineasta”, que construía “autênticos ‘storyboards'”, com estas imagens.

“2001: Odisseia no Espaço” surgiu na carreira de Kubrick depois de “Spartacus” (1960), “Lolita” (1962) e “Dr. Estranho Amor” (1964), os filmes que lhe deram as primeiras nomeações para os Globos de Ouro e os Óscares, e antecede “Laranja Mecânica” (1971), “Barry Lyndon” (1975), “Shining” (1980), “Nascido para Matar” (1987) e o derradeiro, “De Olhos Bem fechados”, estreado após a sua morte, ocorrida em março de 1999, aos 70 anos.

“Horizontes de Glória” (1957) e “Medo e Desejo” (1953), dois manifestos antiguerra, “Um Roubo no Hipódromo” (1956), incursão no ‘filme negro’, assim como “O Beijo Assassino” (1955), premiado em Locarno, foram as primeiras longas-metragens de Kubrick, que surgiram depois de documentais como “Seafarers” (1953), elogio ao movimento sindical, e “Day of the Fight”, sobre um ‘boxeur’.

Os 50 anos de “2001: Odisseia no Espaço” – e os 90 do nascimento do realizador – vão ser celebrados no próximo Festival de Cannes, com a estreia de uma cópia de 70 mm, numa sessão apresentada por Christopher Nolan, que se inspirou no filme para dirigir “Interstellar” (2014).

“É uma grande honra para Cannes ter Stanley Kubrick na seleção oficial”, disse o diretor do festival, Thierry Fremaux, na semana passada, no anúncio da sessão.

2 Abr 2018

Cinema | João Botelho assume plágio de romance histórico no filme “A Peregrinação”

O cineasta João Botelho assumiu o plágio do livro “O Corsário dos Sete Mares – Fernão Mendes Pinto”, na escrita do argumento do filme “A Peregrinação”, rodado parcialmente em Macau. A autora da obra, Deana Barroqueiro, não esconde a revolta e denunciou o caso na sua página pessoal do Facebook

[dropcap]A[/dropcap]final, o cineasta português João Botelho não escreveu o argumento do seu filme “A Peregrinação” com base na obra original do escritor Fernão Mendes Pinto, mas sim a partir do romance histórico de Deana Barroqueiro, intitulado “O Corsário dos Sete Mares – Fernão Mendes Pinto”. O filme foi parcialmente filmado em Macau e ambos os autores estiveram presentes no território a convite do festival literário Rota das Letras.

Foi a própria autora que fez a denúncia do caso na sua página pessoal de Facebook, depois de ter recebido uma carta de João Botelho, também endereçada à sua editora, Casa das Letras/Leya.

Na missiva, o cineasta explicou que tentou, durante meses, contactar Deana Barroqueiro, mas que nunca conseguiu. “Sou o autor do filme “A Peregrinação” e durante meses, nesta ‘arte de vampiro’ que é afinal o cinema, li, consultei, adaptei e reescrevi cenas para a minha curta adaptação da vida e do livro de viagens de Fernão Mendes Pinto. Na verdade, o seu romance, o Corsário dos Sete Mares, foi forte inspiração para algumas cenas do filme, as da China”, pode ler-se.

Botelho adiantou ainda que pensou que a autora estaria nos Estados Unidos, pois tentou “contactar a editora e não conseguiu à primeira nem à segunda”. “É evidente que devia ter insistido três, quatro vezes. Mas meteu-se a produção – trabalhosa, longa e difícil. Tive o cuidado de colocar em primeiro lugar nos agradecimentos, no genérico final do filme, o seu nome. É pouco, eu sei. Eu e o produtor aceitamos a sugestão da sua editora para colocar uma cinta com os dizeres: ‘Inclui episódios adaptados do romance O Corsário dos Sete Mares’. Perdoe-me”, conclui a carta.

Na sua resposta, que também partilhou no Facebook, Deana Barroqueiro não escondeu a indignação. “A sua justificação de que não me conseguiu contactar nem à editora Leya é inverosímil, bastava que algum dos seus ajudantes pusesse o meu nome no Google e acharia diversos meios para o fazer – sou figura pública, tenho blogues, várias páginas no Facebook, e-mails e telefones e passo meses sem sair de casa, a escrever; do mesmo modo, a Leya não é uma editora de vão de escada, que não atende o telefone.”

Uma das mais conhecidas autoras de romance histórico em Portugal defendeu ainda, na sua resposta, que o cumprimento dos direitos de autor nem sempre é cumprido no seu país. “João Botelho, se eu vivesse na América, o senhor não se atreveria a usar a minha obra do modo como o fez, porque lá os direitos de autor são sagrados. Em Portugal, as leis existem, mas só são cumpridas por alguns.”

Deana Barroqueiro confessou ainda ter tido conhecimento da situação de plágio depois de ter sido avisada por leitores mais atentos. “Fui alertada por leitores que comentaram a ‘adaptação cinematográfica do Corsário dos Sete Mares’, convencidos de que o realizador usara o meu romance e que eu sabia. Perplexa, fui pesquisar na internet. O primeiro texto/entrevista que li foi o de Nuno Pacheco, no Ípsilon. E passei da admiração ao pasmo. O senhor fala das personagens que eu inventei no meu romance, como se fossem da Peregrinação, de Fernão Mendes Pinto. E refere como fontes a obra do próprio aventureiro, as canções do Fausto e a adaptação do Aquilino, de onde tirou a conhecida e rebatida ideia do alter ego de Fernão, sem nunca mencionar o meu livro, que tantas personagens e ideias lhe deu.”

A autora viu o filme e gostou “bastante” dele, mas viu nele todo o romance que escreveu. “Fiquei com a sensação de que o senhor seguiu mais de perto o guião do meu romance (porque de um guião se trata) do que o da Peregrinação, que é confuso e de tal maneira intrincado, que me levou muitíssimo tempo a destrinçar.”

Cenas da China copiadas

Segundo as declarações do cineastas, as partes do romance histórico que mais usou no filme são as que dizem respeito à China. A respostas da escritora nessa matéria é peremptória. “Sabe bem que não foram apenas as cenas da China que adaptou do meu romance ou nas quais se inspirou, João Botelho. A japonesa Wakasa também não existe na Peregrinação, foi com muita pesquisa que encontrei a história e as crónicas japonesas, ficcionei o seu casamento com Fernão, fazendo dela uma espécie de Madame Butterfly.”

A autora dá ainda outros exemplos de plágio. “A ‘Senhora’ adúltera foi também uma ficção minha a partir de um crime do tempo, que encontrei num arquivo e numa genealogia. Até o ‘número mágico nove’, de que fala nas entrevistas, é o leit-motiv do meu livro. Assim, é de facto muitíssimo pouco o seu reconhecimento.”

Além disso, “não há nenhuma namorada ou amante de Pinto na sua obra, só existem no meu romance (exceptuando a rainha da Etiópia)”, sendo que “a violação da chinesa, por António de Faria, não existe de todo na Peregrinação”.

Deana Barroqueiro escreveu também que criou a personagem da amante chinesa, “assim como o nome Meng e os seus amores”. “Inventei-os a partir da menção feita por Pinto aos filhos do português Vasco Calvo – ‘dois meninos e duas moças’ -, no cap. 116 da sua Peregrinação. Ora, a cena que se vê no filme de ‘Meng’ com uma bacia de água perfumada de flores, a lavar as cicatrizes que Pinto tem nas costas, das chicotadas na prisão, é um dos episódios do meu romance que considero melhor conseguidos. A diferença é que João Botelho coloca a cena em Pequim e não na aldeia onde vão viver os portugueses junto à muralha da China, como condenados a trabalhos forçados”, escreveu ainda a autora, que deu outros exemplos.

O caso já gerou reacções nas redes sociais, nomeadamente do escritor Rui Zink, que também esteve no festival literário Rota das Letras. “Por que motivo os gajos que fazem filmes são amiúde tão desrespeitadores para com quem escreve os livros que, ora com autorização, ora surripiando, vampirizam?”, questionou.

“Curiosamente, no teatro acontece menos. Há um desejo de apropriação (já vi cartazes de peças sem nome do autor, e faz-me espécie a moda dos «a partir de», e uma cultura do DJ quase como quase verdadeiro compositor das musiquetas que ‘sampla’) mas é em menor grau. No caso do cinema, o abuso torna-se tão natural como, em tempos idos, o realizador casar com a estrela do filme. É chato”, escreveu ainda Zink.

O HM tentou chegar à fala com a autora, mas até ao fecho da edição não foi possível estabelecer contacto. Nos prémios Sophia, da Academia Portuguesa de Cinema, o filme “Peregrinação” foi um dos nomeados em várias categorias, incluindo a de melhor argumento.

29 Mar 2018

Clube Militar | Exposição de fotografias de Au Thien Yn inaugurada hoje

[dropcap style≠’circle’]“S[/dropcap]entimentos e Paixão – Exposição de fotografias de Au Thien Yn” é hoje inaugurada no Clube Militar. Organizada pela Fundação Macau, a exposição mostra 70 obras do artista de Macau, estando também prevista a apresentação de um livro com imagens de Au Thien Yn.

De acordo com um comunicado, “Au Thien Yn é um artista famoso de Macau e muito conhecido por ser um reputado fotógrafo e designer de arquitectura”, sendo também membro da Sociedade Real Fotográfica do Reino Unido. Em 1960 começou a estudar e a investigar as técnicas fotográficas e durante 10 anos, de 1978 a 1988, visitou o país para fotografar os costumes mais genuínos, as paisagens naturais e a ecologia do Interior da China no início da reforma e abertura ao exterior. Realizou exposições e intercâmbios de cultura fotográfica em várias cidades do Interior da China, incluindo Pequim, Guangzhou, Xinhui e Zhuzhou e em Taiwan.

As fotografias em exposição no Clube Militar “versam sobre as paisagens e monumentos de Macau, nomeadamente o Lago Nam Van, o Lago Sai Van, a Capela de Nossa Senhora da Penha, o Farol da Guia, o Centro de Ciência de Macau, o Centro de Ecuménico Kun Iam, a Taipa Pequena, as Casas-Museu da Taipa e outros pontos turísticos muito conhecidos dos residentes.”

“Sob os efeitos de luz e sombra diferentes, Au Thien Yn definiu a arquitectura de Macau, que apresenta os estilos chinês e ocidental do passado e de hoje, como a ‘Eternidade gloriosa’ que, além de mostrar o contexto histórico e cultural específico de Macau, também permite aos visitantes apreciar a composição única e os sentimentos do fotógrafo.” A exposição estará patente até à próxima terça-feira.

28 Mar 2018

IC | Han Lili traduziu contos de Eça de Queiroz para chinês

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] subdirectora da Escola Superior de Línguas e Tradução do Instituto Politécnico de Macau (IPM), Han Lili, traduziu para chinês alguns contos do escritor português Eça de Queiroz, falecido no ano de 1900.

De acordo com um comunicado, este trabalho integra o novo livro “Contos Seleccionados de Eça de Queiroz”, uma edição bilingue que se integra na “Colecção de Literatura Chinesa e Portuguesa”, publicada pelo Instituto Cultural (IC).

De acordo com um comunicado oficial, o livro inclui os contos “Um Poeta Lírico”, “No Moinho”, “A Aia”, “O Suave Milagre”, “Singularidades de uma Rapariga Loura” e “O Tesouro”. Han Lili debruçou-se também sobre um conjunto de artigos que Eça de Queiroz publicou no jornal brasileiro Gazeta de Notícias, no ano de 1893, numa coluna que teve o nome “Chineses e Japoneses”. De frisar que a história de “Singularidades de uma Rapariga Loura” foi adaptado para cinema, em 2009, pelo realizador português Manoel de Oliveira.

A publicação de obras no âmbito da “Colecção de Literatura Chinesa e Portuguesa” tem como objectivo, de acordo com o IC, que “autores e leitores ultrapassem barreiras linguísticas, reconhecendo outro mundo literário nas obras traduzidas para as línguas chinesa e portuguesa ou estrangeiras”.

Neste sentido, “a publicação da edição traduzida dos ‘Contos Seleccionados de Eça de Queiroz’ permite dar a conhecer aos leitores o estilo de escrita realista das obras de Eça de Queiroz, aprofundando assim o intercâmbio da cultura luso-chinesa”.

A sátira social

Nascido em 1845, na Póvoa do Varzim, e falecido em França, Eça de Queiroz é um dos nomes mais sonantes do realismo literário português, tendo dedicado a sua vida à escrita de romances, contos e crónicas de jornal. O IC considera que “os seus textos têm um estilo de escrita objectivo, directo e repleto de sátira, suscitando, muitas vezes, a reflexão dos leitores através do riso”.

Os seus livros “Os Maias”, leitura obrigatória no ensino secundário em Portugal, e “O Crime do Padre Amaro”, ambos adaptados para séries de televisão e filmes, são as obras mais conhecidas do autor. Estes romances “desvendam crimes e vícios da sociedade portuguesa de então”, tendo já sido traduzidas para mandarim nos anos 90.

Formada na Universidade de Pequim e Universidade de Macau, Han Lili publicou uma série de obras, tais como a antologia de contos infantis “Climbing a Tree for Fish”, o poemário traduzido “Poemas de Nalan Xingde”, a antologia de co-tradução “Pluck a Lotus for Pleasure: Women Poets of the Song Dynasty” e “Antologia de Poetas Portugueses de Macau”. Publicou as suas colecções de poemas “The Story of Winter” e “Estória da Primavera”. O livro “Contos Seleccionados de Eça de Queiroz” encontra-se à venda por 100 patacas no Centro de Informações ao Público, no Plaza Cultural Macau, Lda., no Arquivo de Macau e no Centro Ecuménico Kum Iam.

 

28 Mar 2018

Lisboa investe 110 mil euros na candidatura da calçada portuguesa a Património da Humanidade

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Câmara de Lisboa vai debater hoje uma proposta no sentido de atribuir um apoio de 110 mil euros à Associação Calçada Portuguesa (PORPAV), para aplicar na candidatura da calçada portuguesa a Património Cultural Imaterial da Humanidade.

De acordo com a proposta, será debatida em reunião privada do executivo, e à qual a agência Lusa teve acesso, vai estar em cima da mesa a “transferência da comparticipação financeira para o ano de 2018, no valor de 110.000,00 euros (cento e dez mil euros), relativa à comparticipação da Câmara Municipal de Lisboa para o projeto de candidatura da Calçada Portuguesa a Património Cultural Imaterial da Humanidade” (da UNESCO).

O documento, assinado pelos vereadores do Urbanismo (Manuel Salgado) e da Cultura (Catarina Vaz Pinto), lembra que a 15 de dezembro de 2016, foi “aprovada por unanimidade” em reunião de Câmara a autorização do “início da preparação do processo de candidatura da calçada portuguesa” a esta classificação.

Para os eleitos, esta candidatura “constitui um instrumento muito interessante para assegurar o evidente interesse público local subjacente à proteção, promoção e valorização da calçada portuguesa enquanto património cultural da cidade de Lisboa”.

Assim, a PORPAV incluiu no seu plano de atividades dar início a uma série de projetos “ainda no presente ano”, entre os quais um “levantamento exaustivo do património em calçada portuguesa na cidade de Lisboa e à identificação de elementos representativos da calçada portuguesa noutras cidades de Portugal e no mundo”.

No plano de atividades da associação está prevista também a “criação e regulamentação de um programa de criação artística, tendo por base a calçada portuguesa”, bem como a “definição e calendarização de um plano, a curto e médio prazo, de ações de sensibilização e divulgação da calçada portuguesa”.

De acordo com o protocolo que será assinado entre o município e a associação, e que é anexo à proposta, o financiamento será dividido, pelo que a Câmara de Lisboa vai transferir 66 mil euros “após a assinatura do protocolo”, 38.500 euros “no prazo de cinco meses a contar da assinatura” e o restante valor (5.500 euros) mediante a “apresentação do relatório” com “explicitação dos resultados alcançados e respetivos documentos justificativos da despesa, no prazo de 30 dias a contar da conclusão dos projetos”.

O texto elenca que cabe à PORPAV a “realização dos estudos necessários com vista ao enquadramento da Calçada Portuguesa enquanto elemento a valorizar em diferentes vertentes: património cultural; património económico; património turístico; património ambiental”.

A PORPAV fica também responsável pela ” definição da estrutura adequada ao processo da candidatura da calçada portuguesa a Património Cultural Imaterial da Humanidade, tendo nomeadamente presente os ‘timings’ [prazos] e as formalidades associados a estes processos”.

O protocolo será válido durante um ano e “cessa com a conclusão dos projetos apoiados”, é referido.

Na mesma reunião, os vereadores vão apreciar também a adjudicação à empresa ‘Construções Gabriel A.S. Couto, S.A.’ do projeto relativo aos realojamentos do Bairro da Cruz Vermelha, por 11.5 milhões de euros e com o prazo de execução de 600 dias.

Em meados do ano passado, a Câmara de Lisboa estimou que a demolição integral do Bairro da Cruz Vermelha, na freguesia do Lumiar, ocorra em 2019, depois do realojamento dos moradores em novos ou reabilitados fogos.

O projeto em causa prevê a construção de 130 fogos onde serão realojados os moradores do Bairro da Cruz Vermelha, depois da demolição integral daquele edificado.

27 Mar 2018

Macau acolhe pela primeira vez anúncio dos “50 Melhores Restaurantes da Ásia”

[dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]acau acolhe hoje, pela primeira vez, o anúncio da lista dos “50 Melhores Restaurantes da Ásia em 2018”, depois de hoje vários chefes de cozinha galardoados terem partilhado experiências numa sessão de conferências e demonstrações.

As “50 Melhores Conversas” (“50 Best Talks”), que decorreram durante o dia de hoje num hotel de Macau, tiveram como pano de fundo o tema “Explorando a Identidade” na cozinha asiática, em que os ‘chefs’ partilharam histórias e novas tendências.

Entre os vários oradores estiveram o premiado deste ano dos “50 Melhores Restaurantes” com o Prémio de Carreira, “número dois” da lista dos “50 Melhores Restaurantes da Ásia em 2017”, e o único chefe chinês na lista dos “50 Melhores Restaurantes do Mundo”, André Chiang, original da região de Taiwan, que falou sobre o seu percurso.

Um dos outros intervientes foi a chefe japonesa Hiroe Higuchi, que falou sobre sustentabilidade e combinação de ingredientes japoneses com técnicas francesas.

Organizada com o apoio da Direção dos Serviços de Turismo (DST), a cerimónia de divulgação da lista e a respetiva entrega de prémios são alguns dos eventos em destaque da iniciativa “2018 Ano da Gastronomia de Macau”.

Macau entrou para a Rede de Cidades Criativas da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) na área da Gastronomia em 31 de outubro de 2017, tornando-se a terceira cidade na China, a seguir a Chengdu e Shunde, a conquistar tal feito.

Por essa razão, foi nomeada também, pela primeira vez, como cidade anfitriã da cerimónia de entrega de prémios e outras atividades relacionadas entre 2018 e 2019, anunciou, em novembro, a DST.

A lista dos 50 melhores restaurantes asiáticos é votada por um comité de 300 membros, incluindo especialistas de restauração, escritores especializados em gastronomia, ‘chefs’ e donos de restaurantes de toda a região asiática.

Em 2017, dois restaurantes macaenses foram distinguidos, ocupando as posições 32 e 39 da tabela.

Este ano, serão também entregues dez prémios especiais, incluindo o “Prémio Restaurante Sustentável”.

Lançada em 2013, esta é uma adaptação regional da lista dos “50 melhores restaurantes do mundo”, publicada pela Restaurant Magazine, da empresa William Reed Business Media, desde 2002.

27 Mar 2018

Dia Mundial do Teatro | Macau com ausência de companhias portuguesas

Em Macau o teatro está vivo, reinventa-se, mas apenas em chinês. A época em que existiam companhias teatrais em português acabou em 1999, para não mais voltar à cena. No Dia Mundial do Teatro, Miguel de Senna Fernandes e Fernando Sales Lopes falam da importância de ter mais peças na língua de Camões

 

[dropcap style≠‘circle’]T[/dropcap]odos os anos, consegue-se assistir em Macau a teatro falado em português, mas os projectos não são locais. Tudo se deve à parceria existente entre os organizadores do Festival da Lusofonia e o Instituto Português do Oriente (IPOR), que traz, na iniciativa TEATRAU, companhias teatrais dos países de língua portuguesa.

Em 2015, o projecto MacauArtFusion e a companhia chinesa Hiu Hok juntaram-se para fazer a primeira peça bilingue, sendo que a adaptação para português esteve a cargo de Fernando Sales Lopes, historiador. O seu nome está também ligado ao teatro de língua portuguesa que se fez em Macau nos anos anteriores à transferência de soberania e que, desde então, ficou arredado dos palcos.

Hoje celebra-se o Dia Mundial de Teatro e Macau, apesar de ter o português como língua oficial, continua a não ter uma companhia teatral portuguesa. Em chinês há vários e novos projectos, com gente formada lá fora que faz adaptações de peças internacionais. Há depois o grupo de teatro em patuá Doci Papiaçam de Macau, mas em português esta arte praticamente não existe.

Ao HM, Fernando Sales Lopes fala da falta de interesse de possíveis colaboradores. “O teatro em português não o vemos. Havia um grupo, que fez teatro durante muitos anos, mas acabou antes de 1999 porque deixou de haver gente interessada. Trabalhávamos muito com pessoas novas que tinham este problema de que, quando a coisa estava a correr bem, os miúdos iam embora para Portugal estudar. As pessoas aproveitaram os últimos anos para estudar no ensino superior e também não tinham tempo livre.”

Gonçalo Lobo Pinheiro

Sales Lopes lembrou que, no TEATRAU, “a representação de Macau sempre foi coxa”. “Gostava que houvesse [mais projectos em língua portuguesa], e muitas pessoas ainda me dizem para fazer alguma coisa, mas depois no outro dia essas pessoas já não estão aí. Vai-se embora o entusiasmo, as pessoas gostam muito porque acham que é chegar lá e ir para o palco, e não é assim”, apontou.

Actualmente, o Conservatório de Teatro oferece uma formação muito virada para o cantonês e que não está equiparada a licenciaturas em Teatro, como existe em vários países. Sales Lopes espera que a nova presidente do Instituto Cultural, Mok Ian Ian, possa mudar o rumo das coisas, uma vez que é autora, mestre e doutorada em Ciência de Teatro Chinês pela Universidade de Nanquim.

“Não é tanto pela falta de espaço, há sítios para se ensaiarem e fazer as coisas. Não há teatro porque não há gente para o fazer. O que está a ser feito é aprendizagem para os jovens”, frisou Sales Lopes.

Miguel de Senna Fernandes, fundador do grupo Doci Papiaçam de Macau, lamenta que não existam mais projectos em português.

“A comunidade chinesa sempre teve o seu teatro, e não estou a falar de ópera chinesa. Eles têm o seu público e a sua escola. Há duas grandes companhias que são veteranas, e foram aparecendo mais. Antes de 1999 havia companhias da comunidade portuguesa, e lembro-me de uma dirigida por Fernando Sales Lopes, por exemplo. Se calhar, as pessoas não têm muito tempo e as coisas acabam por parar, mas vale sempre a pena formarem-se grupos de teatro nas comunidades.”

Para o também advogado, é preciso apostar mesmo que não existam espaços suficientes ou um público vasto. “Não tem a ver apenas com o facto de haver, ou não, público, mas com a atitude. O teatro pode ser um veículo de aprendizagem, com o patuá por exemplo. No contexto especial de Macau, é fundamental que haja teatro português. Os Doci Papiaçam têm características próprias e preenchem necessidades específicas.”

Foto: Sofia Margarida Mota

Olhando para o cartaz do Festival de Artes de Macau, Senna Fernandes lembra que há vários grupos a representarem no território vindos de Portugal. “São trabalhos bem feitos, têm público. Porque não voltam a formar grupos de teatro locais? Se existe uma comunidade portuguesa, porque não?”, questionou Miguel de Senna Fernandes.

 

Tecnologia destrutiva

Há 70 anos instituiu-se o Dia Mundial do Teatro. Várias mensagens de figuras ligadas a esta arte chamam a atenção para a importância de subir ao palco para combater o poder da tecnologia.

A dramaturga mexicana Sabina Berman defendeu que o teatro é a manifestação adequada para salvar a humanidade da submissão aos algoritmos, na “ordem tirânica” global, tal como sustentou o encenador britânico Simon McBurney.

“Mais do que a literatura, mais do que o cinema, o teatro – que exige a presença de seres humanos diante de outros seres humanos – é maravilhosamente adequado à tarefa de salvar-nos de tornar-nos algoritmos. Abstracções puras”, defende Sabrina Berman, na sua mensagem.

Para Miguel de Senna Fernandes, as redes sociais, os telemóveis e os computadores afastaram as pessoas dos palcos, que preferem ir ao cinema ou assistir a concertos.

“Não quero culpar a tecnologia mas, de facto, parece-me que o mundo digital veio substituir o entretenimento do dia-a-dia. Sem público é difícil expressar uma vontade de fazer teatro. Há uma dialéctica, que é o palco e a assistência, e muitas vezes o palco depende da reacção da assistência, e isso é fundamental. As artes performativas sofrem muito com isto.”

Em Macau falta também formação específica na área do teatro, não só em termos de formação de actores, como de técnicos. Há 25 anos que o grupo Doci Papiaçam de Macau sobe ao palco com casa cheia, mas fá-lo de uma forma amadora.

“Andei durante muito tempo à espera da formação técnica para os Doci Papiaçam, e resolvi avançar enquanto esperava. Andamos durante 25 anos assim, não sou formado em teatro. Não sei ainda se faço teatro, mas não interessa, pois faz 25 anos que estamos em palco, nunca tivemos uma preparação técnica, e sempre acalentámos essa oportunidade. Mas não é razão para não haver”, contou Miguel de Senna Fernandes. 

Espaços insuficientes

O teatro existe em Macau mas continua a estar inacessível a uma grande parte da população, uma vez que permanece a barreira intransponível da língua. Teresa Lam, fundadora do grupo Rolling Puppet, trouxe ao palco do edifício do Antigo Tribunal uma das poucas peças com tradução para inglês: o espectáculo “Macau 2.0”, um projecto que também esteve em Praga, capital da República Checa.

Ao HM, Teresa Lam fala de um florescimento de inúmeros projectos fundados por pessoas que estudaram lá fora e regressaram à sua terra natal. Há, contudo, ainda muito a fazer no teatro interpretado em chinês.

“Estes grupos têm vindo a brotar e precisamos de mais palcos e espaços para que estes profissionais consigam manter estes projectos. Mas, neste momento, não há uma grande atenção relativamente a esta questão, pois só existe o Centro Cultural de Macau e espaços em casinos, por exemplo.”

Ainda assim, é difícil as pequenas companhias teatrais terem acesso aos espaços que as operadoras de jogo disponibilizam. “Não há muitas oportunidades para as companhias teatrais locais apresentarem as suas peças, pelo que era importante o Governo fazer alguma coisa. Também gostaríamos de ter um plano de financiamento a três anos, por exemplo, pois teríamos acesso a um espaço. Há muitas coisas que têm de ser melhoradas.”

Teresa Lam acredita ser fundamental o reaproveitamento de espaços abandonados, como é o caso de antigas fábricas e cinemas, que “podem ser renovados para uso do público”. “Mesmo o Armazém do Boi está em obras e o edifício do Antigo Tribunal vai ser transformado numa biblioteca central. Estamos sempre em espaços provisórios e nunca sabemos por quanto tempo. Precisamos de um plano, de um centro multifunções”, concluiu.

Sobre este aspecto, o empresário William Kuan, ex-candidato às eleições legislativas, começou a desenvolver, há mais de dois anos, um projecto de renovação do Teatro Cheng Peng, localizado na histórica Rua da Felicidade.

27 Mar 2018

Documentos inéditos revelam relação cúmplice entre Natália Correia e António Sérgio

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m livro com documentos, maioritariamente inéditos, de Natália Correia, que testemunham a relação cúmplice, de partilha de lutas e ideais, com o pensador António Sérgio, chegou às livrarias, quando passam 25 anos da morte da poeta.

“Entre a Raiz e a Utopia (Escritos sobre António Sérgio e o Cooperativismo)”, editado pela Ponto de Fuga, inclui três datiloscritos inéditos escritos por Natália Correia sobre António Sérgio, maioritariamente em 1983, aquando do centenário do nascimento do pensador, pedagogo, ensaísta e cooperativista.

Esta edição, resulta de uma pesquisa na biblioteca e arquivo público de Ponta Delgada, onde estão depositados documentos da escritora açoriana, entre os quais datiloscritos, manuscritos e recortes de jornais, explica a escritora e investigadora científica Ângela de Almeida, que assina a introdução e faz as notas do livro.

Como resultado dessa pesquisa, foram também incluídos neste volume três artigos de Natália Correia sobre cooperativismo, publicados em jornais, acrescenta Ângela de Almeida, que defendeu uma tese sobre a simbólica da ilha e do Pentecostalismo em Natália Correia, sob orientação de Urbano Tavares Rodrigues.

Os documentos constantes de “Entre a raiz e a utopia” correspondem a pelo menos 12 anos de uma relação de “profunda cumplicidade e de luta pelos ideais universais, vivida entre poeta e pensador, na senda do cooperativismo e da paz”, diz a especialista.

Natália Correia e António Sérgio conheceram-se em 1946 – a jovem poeta com 23 anos e o pedagogo com 63 – e aderiram ao Movimento de Unidade Democrática (MUD).

No mesmo ano, António Sérgio foi admitido na Cooperativa Fraternidade Operária, e Natália Correia ingressou, no ano seguinte, passando a fazer parte de um grupo de intelectuais, entre os quais se contavam António Pedro, Adolfo Casais Monteiro e Ramada Curto, assim como “outros vultos maiores das letras que se opunham à ditadura de Salazar”, segundo as palavras da própria Natália Correia.

Mas a grande cumplicidade que aluna e mestre criaram e desenvolveram nos anos de ditadura em Portugal ganhou força em 1948, na sequência da proclamação, pela Assembleia Geral da ONU, da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Além disso, partilhavam vivências e ideais: foram duramente perseguidos, almejavam a liberdade e sentiam-se atraídos pelo cooperativismo.

Ambos lutaram pela candidatura de Norton de Matos à Presidência da República e, dez anos mais tarde, participaram na candidatura de Humberto Delgado, cuja derrota foi “fatal para o ânimo de António Sérgio, que esmoreceu gradualmente a partir desta deceção”, descreve a poeta.

Outro episódio de relevo contido neste volume é a primeira visita de Natália Correia aos Estados Unidos da América, em 1950, cujos motivos são explicados num dos documentos inéditos agora publicados.

Com apenas 26 anos, a poeta partiu “levando uma missão” de que o mestre a incumbira: pôr-se em contacto com Norman Thomas, líder do Partido Socialista norte-americano, com quem António Sérgio mantinha relações, para tentar que este despertasse o interesse da opinião pública norte-americana para a causa da resistência ao fascismo.

A escritora contou como encontrou um “desiludido”, que lhe deu uma resposta “desanimadora”: “Diga ao nosso Sérgio que aqui o socialismo é pregado no deserto. Para mim, acabou-se. Não posso dar-lhe qualquer espécie de colaboração”.

Natália Correia descreve também a forma como António Sérgio mantinha uma relação fraterna com muitos jovens que o rodeavam, porque “tinha o condão de se fazer amar”.

“Tão elegante, tão atentamente estético era António Sérgio em casar os seus contrários num corpo de ideias inteligentemente organizado, que nós, jovens seduzidos pelo fulgor multidisciplinar do seu discurso, nele víamos a panaceia para todas as injustiças que nos revoltavam”, foi como Natália Correia definiu o ensaísta e pensador, que escolheu para mestre.

O Centro Cultural de Belém dedica hoje um programa a Natália Correia, que se estende das 15:00 às 19:00, em que será abordada “a intervenção cívica e cultural” da escritora, e o seu “pensamento inovador”. Será também recordado o processo que lhe foi movido pela publicação da “Antologia da poesia erótica e satírica”, nos anos da ditadura.

Natália Correia nasceu nos Açores, em 13 de setembro de 1923. Morreu em Lisboa, há 25 anos, em 16 de março de 1993.

26 Mar 2018

Rota das Letras | O lugar da família Assumpção no romance de Isabel Valadão

Em “O Rio das Pérolas” lê-se a história de Luísa e Mei Lin, duas mulheres chinesas abandonadas à nascença pelas famílias que acabam por ter dois percursos de vida diferentes, sempre com a sobrevivência como força motriz. Convidada do festival Rota das Letras, que chegou ontem ao fim, a autora, Isabel Valadão, contou como a ligação à família de Carlos D’Assumpção a ajudou a escrever o romance

 

[dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]oram dois anos intensos, em que o corpo existiu em Portugal mas a mente e o coração estiveram de forma permanente em Macau. Esse foi o tempo que Isabel Valadão, licenciada em História da Arte, demorou a escrever “O Rio das Pérolas”, o romance sobre o lugar onde morou durante três anos mas que retrata uma outra época, a de uma sociedade onde meninas eram abandonadas à nascença apenas por carregarem consigo a condição feminina. Cuidadas por freiras, acolhidas por ordens religiosas, estas meninas acabariam por se dedicar à prostituição, a servir em casas de famílias macaenses, a serem sujeitas às boas maneiras para que, um dia, o casamento com homens ricos pudesse ser a salvação para uma vida difícil.

No último dia do festival literário Rota das Letras, Isabel Valadão esteve no edifício do Antigo Tribunal a falar do seu romance que fala da Macau dos anos 40 e 50. Viveu no território entre 983 e 1985, tendo conhecido muitas famílias macaenses. A de Carlos D’Assumpção, ex-presidente da Assembleia Legislativa e um dos mais importantes juristas do território, foi fundamental para o seu processo de absorção da cultura local.

“A família Lobo Vicente [retratada no livro] foi inspirada em famílias que conheci aqui, famílias antigas. A família do Carlos D’Assumpção deu-me muito conhecimento de como funcionavam as coisas”, revelou ontem. “A família de Carlos D’Assumpção ajudou-me a perceber como funcionava uma família macaense e luso-portuguesa. Além da origem chinesa também tinha outras origens, havia sempre uma grande mistura de sangues. Não gostavam muito do sangue chinês, porque achavam que ia manchar um pouco o sangue português, no qual tinham muito orgulho.”

Isabel Valadão só agora regressou a Macau, e notou diferenças em relação ao passado histórico e aquele que presenciou. “Tenho visto a comunidade chinesa muito mais aberta e com uma abertura grande às pessoas, embora continuem a não falar português. Penso que está tudo diferente.”

A importância da mulher

Antes de escrever sobre Macau, Isabel Valadão escreveu sobre personagens reais, históricas, da Angola onde viveu a partir dos seis anos e até 1976, na altura em que se mudou para Portugal. Quando chegou a Macau esperava encontrar um pouco de África, mas não conseguiu, apesar de se ter deparado com um ambiente exótico.

“Quando chegamos a Macau encontrei uma realidade muito diferente da que estava à espera. Pensava encontrar um bocadinho de África quando cheguei, mas encontrei outra realidade muito exótica, muito sui generis. Foi um choque grande no início, porque não estava bem habituada à civilização chinesa. Mas a cidade começou a cativar-me.”

Desde que se licenciou, aos 49 anos, que a autora se tem dedicado a escrever sobre mulheres. Identifica-se com elas, mas não põe de parte escrever um romance onde os homens sejam protagonistas.

“Talvez me identifique mais com o papel das mulheres, ou porque encontre histórias interessantes. Talvez seja capaz no futuro de encontrar um personagem marcante masculino. Sim, acho que sim [que as mulheres estão perdidas na história].”

“Normalmente vou à história buscar personagens reais, que existiram, e estas personagens são reais, existiram. A Luísa foi de uma família de Macau. Nesse estudo sobre as ordens religiosas em Macau e as órfãs encontrei dois casos específicos. Foi nelas que me inspirei, dei outros nomes, e ficcionei de outra maneira. Em relação a Angola também fui buscar personagens históricas e são essas que eu desenvolvo na minha ficção, que eu gosto de chamar de ficção histórica”, acrescentou a autora.

A escrita de romances apareceu tarde na vida de Isabel Valadão. “Sou formada em História da Arte e só comecei a escrever depois de me licenciar. Sou uma escritora tardia. Mas fiquei sempre com o gosto pela investigação histórica e comecei a gostar de escrever.”

Escrever o “Rio das Pérolas” surgiu quando a autora de deparou com um artigo sobre a sociedade dos anos 40 e 50. O nome do livro já existia desde sempre. “Comecei a ler todas as revistas culturais de Macau, aprendi muito mais do que quando cá tinha estado. Surgiu-me a ideia da história porque encontrei um artigo que me impressionou muito, sobre o papel da mulher chinesa em Macau e na China. Encontrei nesse artigo o que é que acontecia às órfãs em Macau. Na China eram afogadas à nascença. Em Macau eram abandonadas à porta da Santa Casa da Misericórdia e depois esse papel começou a passar mais para as ordens religiosas. A sua vida era ditada por aquilo que conseguiam ou não fazer.”

Existia então as noivas portuguesas, meninas chinesas que acabavam por chegar às comunidades portuguesa e macaense da altura. “Muitas enveredavam pela prostituição, e havia o fenómeno das noivas portuguesas. As órfãs chinesas que eram educadas pelas freiras e que acabavam por fazer um percurso e ser integradas na comunidade macaense, como afilhadas para servir, mas muitas delas depois casavam com portugueses que vinham da metrópole.”

“Fui deixar a Mei Lin”

No regresso a Macau, tantos anos depois, Isabel Valadão foi aos lugares que leu nos artigos históricos e naqueles que conheceu na década de 80. Hoje o Hotel Central está em obras, os edifícios do Porto Interior estão degradados. Ainda assim, a autora deambulou pela avenida Almeida Ribeiro, subiu até ao Seminário de São José. “Ontem fui deixar a Mei Lin”, confessou no Antigo Tribunal.

O curso de História de Arte levou-a a ser descritiva nos seus livros, quase como por acaso. “Através disso comecei a adquirir as ferramentas para o ofício, a fazer investigação. Gosto de caracterizar os ambientes, as pessoas. Sou muito visual, porque eu própria quando estou a escrever, visualizo.”

Escreveu sempre sobre os sítios por onde passou. As suas histórias são aquelas que ela ainda não leu. “Escrevo os livros que eu gostava de ler e acho que os devo passar a outras pessoas, são temas que devem passar a outras pessoas”, rematou.

26 Mar 2018

Exposição de Raquel Gralheiro inaugurada segunda-feira no Albergue SCM

O Albergue SCM acolhe, a partir de segunda-feira, “O meu zodíaco chinês”, uma exposição da pintora portuguesa Raquel Gralheiro. O mostra apresenta uma releitura artísticas dos 12 signos, com a particularidade de aliar os animais à figura humana

A ideia surgiu depois de uma viagem pela Ásia com um grupo de amigos. Após passagens pelo Brasil, Moçambique e Cabo Verde em intercâmbios artísticos, a curiosidade de conhecer os lugares onde os portugueses deixaram a sua marca, trouxe Raquel Gralheiro a Macau para viver a cidade e mostrar o seu trabalho. Eis que surge “O meu zodíaco chinês”, uma mostra que resulta da simbiose entre o animal e a mulher, um imagem de marca da pintora natural de Viseu, mas radicada no Porto.

“Há alguns anos que tenho explorado na minha linguagem pictórica a relação entre o ser humano e o animal. Inicialmente, eram os animais de estimação, mas fui alargando o universo – também porque hoje em dia a relação com eles é diferente – e, de repente, tinha quase um jardim zoológico”, diz, em jeito de brincadeira, a pintora portuguesa ao HM. A imagem da mulher, essa, esteve sempre lá (ora sozinha ora acompanhada) e continua, talvez por ser essa a sua condição, afirma.

O projecto de trabalhar os signos chineses surgiu “de repente”, exactamente há um ano, depois da viagem ao Oriente, onde ficou fascinada com as “cores fortes” – dos vermelhos aos dourados –, “muito próximas” das que utiliza habitualmente nos seus quadros.

A coincidência de ter trabalhos com animais que integram o zodíaco chinês – como o galo, o porco ou a serpente – foram meio caminho andado para pôr o projecto em marcha. “Quando estava em Hong Kong decidi enviar uma proposta ao Albergue SCM a propor uma colecção para expor em Macau. Reuni com o arquitecto Carlos Marreiros para apresentar a minha ideia e mostrei três ou quatro pinturas que seleccionei”, indica Raquel Gralheiro.

“Como o meu trabalho tem sempre o animal e a figura humana presentes e como andava com a mania de conhecer Macau pensei em juntar o útil ao agradável”, realça.

“O meu zodíaco chinês” resulta de um ano de dedicação, que incluiu estudar a simbologia da cultura chinesa. “Não queria cometer nenhum erro nem ferir qualquer tipo de susceptibilidade” dadas as diferenças culturais, salienta Raquel Gralheiro. Como tal, a artista contou com a ajuda de um chinês, amigo de uma amiga, que visitou o seu ateliê no Porto para atestar que estava tudo bem.

A exposição reúne, ao todo, 25 obras inéditas. Entre elas 13 telas em acrílico, 12 para cada um dos signos e uma que reúne todos no mesmo quadro. Noutras perspectiva, a mostra tem também 12 caixas, em técnica mista, que, com um vidro na frente, se assemelham a uma redoma. No interior, as figuras em miniatura de cada um dos animais do zodíaco surgem a dourado, com a imagem da mulher sempre em pano de fundo numa combinação de pinturas e colagens.

Paixão à obra

Numa visão global das obras, Raquel Gralheiro não consegue escolher uma imagem predilecta. “Estou muito satisfeita com o trabalho final. Gosto de todos: são quase como filhos”. Para a pintora portuguesa, também não poderia ser de outra maneira. “Tenho que estar apaixonada. Não consigo assinar um trabalho sem gostar dele. Tenho de ser a primeira a gostar, não é?”
Mesmo no meio da indecisão emocional, um dos quadros é particularmente especial para a artista. “Acho que o quadro que reúne os 12 signos é fabuloso. Adorei fazê-lo. Foram mais de três meses de trabalho, porque é muito minucioso, até nisso tem um pouco a ver com a cultura oriental. Deu-me mesmo luta e até pensei em desistir a meio porque tinha muitas ideias na cabeça”.
As expectativas são elevadas. “Francamente, acho que vão gostar”, diz entre risos.

“Dediquei-me durante um ano e trabalhei com entusiasmo num projecto que idealizei para ter a minha marca, mas também a pensar na afinidade” que podia gerar com público. “Espero que achem engraçado que uma portuguesa tenha explorado [o zodíaco chinês]. Penso que vão poder sentir bastantes referências e ligações à sua cultura”.

Todos os trabalhos da exposição, que vai ficar patente até 13 de Maio, encontram-se disponíveis para venda, com os preços a oscilarem entre 8.600 e 45.000 patacas. No entanto, a artista não esconde que gostaria de poder ir mais além. “Adorava levar a exposição para Hong Kong ou para a grande China”, afirma a pintora, de 48 anos, que expõe curiosamente desde 1999, tendo participado em mostras individuais e colectivas.

A exposição no Albergue SCM surge integrada na iniciativa ARTFEM – a primeira bienal internacional de mulheres artistas, no âmbito da qual tem também um quadro que se encontra exposto no Museu de Arte.

23 Mar 2018

Exposição mostra obra do arquiteto José Maneiras em Macau

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] obra do arquiteto José Maneiras, focada na habitação e no planeamento urbanístico de Macau, vai estar patente ao público de sexta-feira a 3 de Abril, numa iniciativa da Docomo-Documentação e Conservação do Movimento Moderno.

“O trabalho do arquiteto José Maneiras é muito importante em Macau por ser um dos primeiros momentos em que alguém deste ambiente cultural, e que percebe perfeitamente este ambiente, desenvolve uma intervenção focada na habitação e de planeamento urbanístico”, afirmou Rui Leão, presidente do Docomomo em Macau, em março, aquando da apresentação da exposição.

“Nem todos [os trabalhos] são visualmente inovadores, mas todos têm uma ideia sobre habitação e qualidade de vida, e de compreensão da cultura urbana de Macau”, acrescentou.

Para Rui Leão, José Maneiras mostrou “a criatividade de saber o que pode ser feito, quando não se pode fazer tudo o que se quer”.

Nascido em 1935 em Macau, José Maneiras passou nove anos em Portugal, onde chegou em 1953 e se licenciou em arquitetura na Escola de Belas Artes do Porto, em 1962.

Nesse mesmo ano, José Maneiras regressou ao território chinês então sob administração portuguesa, onde integrou uma equipa coordenada por Manuel Vicente, que desenvolve planos urbanísticos para a cidade. A partir de 1967, o arquiteto abriu um ateliê próprio.

Desta fase é difícil encontrar exemplos, já que muitos dos edifícios foram demolidos ou remodelados, esclareceu Rui Leão.

Nos anos de 1960, o arquiteto desenha e concretiza vários edifícios residenciais, dos quais se destacam os conjuntos na Rua da Praia Grande (Conjunto São Francisco, 1964), na Estrada do Visconde de São Januário (duas residências, 1965), Belle Court na Penha (casa e bloco de apartamentos, 1968) ou o programa residencial para invisuais, a pedido da Santa Casa da Misericórdia (1970), na Rua Sete do Bairro da Areia Preta.

José Maneiras é membro honorário da Ordem dos Arquitetos portuguesa desde 2006, e um dos fundadores da Associação dos Arquitectos de Macau, em 1987. Entre 1989 e 1993, o arquiteto foi presidente da Câmara Municipal do Leal Senado.

22 Mar 2018

Filme “São Jorge” vence em prémios Autores da SPA dominados pela contestação

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] filme “São Jorge”, de Marco Martins, venceu os prémios da Sociedade Portuguesa de Autores (SPA) para melhor filme, melhor argumento e actor de cinema, numa cerimónia dominada pelas críticas à forma como as artes têm sido apoiadas. O filme fez parte do cartaz da primeira edição do Festival Internacional de Cinema de Macau.

A actriz Inês Pereira deu o mote para várias intervenções que se viriam a seguir, quando, ao receber o prémio para melhor espetáculo teatral por “A vertigem dos animais antes do abate”, dos Artistas Unidos, leu o comunicado, subscrito “por 650 actores em menos de 24 horas”, de protesto contra os atrasos na Direção-Geral das Artes.

Perante uma plateia que incluía o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, e o secretário de Estado da Cultura, Miguel Honrado, Inês Pereira declarou que aguardaram “com esperança esta nova Secretaria de Estado da Cultura” e aguardaram que “o ano de 2017 servisse para uma remodelação efectiva dos apoios às artes”, tendo continuado em 2017 com “a mesma situação de miséria que se instalou no quadriénio anterior”, deparando-se agora com “atrasos incompreensíveis na avaliação, e consequentemente, na disponibilização das verbas da DGArtes”.

Logo de seguida, João Pedro Mamede, vencedor pelo melhor texto português representado, leu uma publicação do encenador Jorge Silva Melo, ausente da cerimónia, que saudava o anúncio feito, na terça-feira, pelo primeiro-ministro, António Costa, de um reforço nos apoios às artes, mas realçava que “o tremendo disparate começou com o tão anunciado ‘Novo Modelo de Apoio’ (um ano de ‘estudos’ para uma coisa daquelas?), com a confusão entre iniciativas de Estado e iniciativas fora do Estado, entre criação e programação, entre companhias e salas, entre salas e teatros”.

A galardoada com o prémio de melhor actriz em teatro, Rita Cabaço, agradeceu o galardão, mas disse não se sentir com “grande alento para o festejar”.

“É desconsolador e perigoso a desconsideração que é dada à comunidade artística, quando é na minha profissão que encontro a forma para me expressar contra aquilo que não só não acredito como repudio”, afirmou.

Minutos depois, o escritor e jornalista Rodrigo Guedes de Carvalho, que venceu o prémio de melhor livro de ficção narrativa por “O pianista do hotel”, iniciou o seu discurso de agradecimento dizendo assinar por baixo e reafirmar tudo o que foi dito antes sobre os apoios às artes.

Noutro contexto, a também jornalista Sandra Felgueiras, a receber o prémio de melhor programa de informação televisiva pelo “Sexta às Nove”, salientou perante uma plateia onde também se encontrava o presidente da RTP, Gonçalo Reis, que num programa de investigação, ainda continuam a trabalhar três pessoas a ‘recibos verdes’, apelando para que a sua situação fosse corrigida.

O realizador e argumentista Marco Martins, por seu lado, enalteceu o ano que o cinema português teve em 2017, classificando-o como “fantástico” e um “ano feito de autores, (…) que urge continuar a proteger”.

Assim, 2017 foi um ano “feito de filmes sem compromissos, sem cedências, fieis à visão dos seus próprios autores. E ela não pode ser condicionada de nenhuma forma, quer por falta de apoio, quer nas formas como esses apoios são dados aos filmes”.

A gala da SPA decorreu no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, e foi apresentada por Ana Zanatti e por Virgílio Castelo, sendo o prémio anual para a programação autárquica entregue à Câmara Municipal do Seixal.

Os prémios Autores procuram distinguir “os mais importantes autores e obras que marcaram intensamente a vida cultural e artística portuguesa” no ano que passou, segundo a SPA, que distinguiu este ano o neurocientista António Damásio com o prémio Vida e Obra.

As categorias abrangidas são as de Televisão, Dança, Rádio, Artes Visuais, Literatura, Teatro, Cinema e Música, contando todas elas com júris especializados de três elementos.

22 Mar 2018

Novas regras de uso de monumentos reservam Panteão para “eventos culturais”

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Panteão Nacional vai passar a só poder ser usado para eventos culturais, “criteriosamente selecionados” e que respeitem a dignidade cultural do espaço, segundo o regulamento de aluguer e cedência de espaços, hoje publicado em Diário da República.

O despacho, que entra em vigor na quinta-feira, estabelece que todas as atividades e eventos a desenvolver devem obrigatoriamente respeitar o prestigio histórico e cultural do espaço cedido.

Nesse contexto, não serão autorizados pedidos de caráter político-partidário ou inseridos em campanha eleitoral, assim como não serão autorizados os pedidos que colidam com a dignidade dos monumentos, museus e palácios, que perturbem o acesso e circuito dos visitantes, e as atividades planeadas ou já em curso.

O diploma define que poderão ser autorizadas reuniões sindicais desde que legalmente enquadradas e envolvendo diretamente os trabalhadores dos serviços dependentes.

Especificamente sobre o Panteão Nacional, instalado na Igreja de Santa Engrácia, em Lisboa, o despacho assinado pelos ministros da Cultura e das Finanças determina que “só podem ser autorizados eventos de natureza cultural, criteriosamente selecionados e enquadrados com a dignidade dos espaços”.

Relativamente ao Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa, e ao Mosteiro de Santa Maria da Vitória, na Batalha, igualmente com o estatuto de Panteão Nacional, fica proibida a realização de refeições.

Contudo, essa restrição não se aplica a todo o conjunto edificado, mas apenas aos locais com estatuto de Panteão, o que significa que, no Mosteiro de Santa Maria da Vitória, é possível fazer jantares e ‘cocktails’ no Claustro D. Afonso V, enquanto no Mosteiro dos Jerónimos poderão ser autorizados ‘cocktails’ no antigo refeitório.

22 Mar 2018

Jornalista Paulo Moura vence Prémio de Literatura de Viagens Maria Ondina Braga

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] livro “Extremo Ocidental. Uma Viagem de Moto pela Costa Portuguesa, de Caminha a Monte Gordo”, de Paulo Moura, venceu por unanimidade o Grande Prémio de Literatura de Viagens Maria Ondina Braga, foi hoje anunciado.

O Grande Prémio, no valor de 12.500 euros, é atribuído pela primeira vez, tendo sido instituído pela Associação Portuguesa de Escritores (APE), com o patrocínio da câmara de Braga.

“Um júri, coordenado por José Manuel Mendes, constituído por António Mega Ferreira, Guilherme d’Oliveira Martins e Helena Vasconcelos, atribuiu, por unanimidade, ao livro ‘Extremo Ocidental – Uma Viagem de Moto pela Costa Portuguesa, de Caminha a Monte Gordo’, de Paulo Moura”, afirma a APE, num curto comunicado hoje divulgado.

Justificando o prémio, em ata o júri escreveu: “’Extremo Ocidental’, de Paulo Moura, resulta pelas suas características singulares – a viagem como redescoberta do próprio país – e pela sobriedade encantatória da sua escrita”, cita a APE.

Segundo a Elsinore, editora que publicou a obra, esta “é uma coleção de achados de viagem”. “Formas de vida, sombras do passado, pequenas utopias redentoras”, que “pode ser lido como um guia das praias e dos caminhos, um diário de aventura, ou um ensaio sobre a identidade portuguesa”.

O livro, esclarece a editora, “é uma jornada de repórter”, numa “narrativa que inclui as estradas, as paisagens, as praias, as cidades, mas também as pessoas, as histórias”.

“Um casino numa aldeia, uma capela que desapareceu misteriosamente, a última noite de uma discoteca de praia, um parque de campismo proibido a campistas, uma comunidade de amor livre, um homem que vive sozinho numa ilha, um pescador que comunica com os peixes” são algumas das histórias contadas por Paulo Moura.

Paulo Moura é professor de Jornalismo na Escola Superior de Comunicação Social, em Lisboa, e autor de nove livros, entre os quais a “Biografia de Otelo Saraiva de Carvalho” e “Passaporte para o Céu”, além de um décimo, que sairá em maio.

O autor nasceu no Porto, em 1959 e, durante 23 anos, foi jornalista no jornal Público.

Como jornalista recebeu vários prémios, entre os quais o Gazeta, o da Assistência Médica Internacional (AMI), do Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural (ACIDI), do Clube Português de Imprensa, da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD), entre outros.

Maria Ondina Braga (1932-2003), que dá nome ao galardão literário, nasceu em Braga, licenciou-se em Literatura Inglesa pela Royal Asiatic Society of Arts, e exerceu a carreira de professora em Angola e Macau, tendo sido também tradutora de autores como Herbert Marcuse, Graham Green e Bertrand Roussel, entre outros.

Como ficcionista estreou-se em 1965, com o livro de crónicas “Eu Vim para Ver a Terra”, tendo publicado cerca de 20 títulos, entre crónicas, romances, novelas e contos, designadamente “A China Fica ao Lado” (1968), “Estátua de Sal” (1969), “A Personagem” (1978) e “A Rosa de Jericó” (1982).

22 Mar 2018

Literatura | “Reflexões de Mesquita” com versão em português e em chinês

É sobre uma destacada figura de Macau que Marco Lobo se debruça no segundo romance histórico: Vicente Nicolau de Mesquita. Na obra, originalmente publicada em inglês e agora vertida para português e chinês, Marco Lobo recupera um “herói acidental”, imaginando a dimensão humana que ficou de fora dos relatos da História

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]traído por personagens com defeitos e emocionalmente alteradas, Marco Lobo escolheu o ilustre militar e oficial macaense Vicente Nicolau de Mesquita (1818-1880) como figura central do seu romance histórico – o primeiro sobre Macau, terra dos seus antepassados. “Dado que o livro era sobre Macau, achei que devia ter como personagem principal um macaense. Além disso, ele é muito importante na história de Macau. É por causa dele que Macau é o que é hoje”, explica.

“Eu diria que ele foi um herói acidental, porque foi por causa da morte do seu chefe, o governador Ferreira do Amaral [assassinado em 1849], que ele liderou o ataque ao Forte de Baishaling [Passaleão]. Por causa desse sucesso – embora não imediatamente, mas pouco depois da sua morte [1880] – Macau foi entregue a Portugal como colónia [1887]. As coisas estão completamente relacionadas”, refere.

Marco Lobo, convidado do Festival Literário – Rota das Letras – contextualiza: “O livro começa em 1849 [data da batalha do Passaleão], mas os eventos já estavam a acontecer na mudança do século: A rainha D. Maria II, de Portugal, estava enfraquecida, a coroa era contestada e, em 1822, o Brasil declarou a independência. Toda a Europa estava também em revolução: os militares tinham sido profundamente derrotados e esmagados por Napoleão, os ingleses estavam altamente dependentes dos seus aliados. Ora, tudo isto, criou uma atmosfera em que Portugal queria reconquistar o seu estatuto, além de que Hong Kong tinha acabado de ficar sob domínio britânico [1842], pelo que Ferreira do Amaral viu a Inglaterra como modelo”.

Considerando que a chave estava em derrotar a China no campo de batalha, “o governador Ferreira do Amaral foi criando uma série de situações para antagonizar os chineses e propiciar um conflito, mas acabaria assassinado. Os chineses não queriam uma guerra, mas as humilhações foram suficientes para que um pequeno exército se reunisse para atacar Macau. Eis que surge Mesquita que lidera o assalto ao Forte do Passaleão [nas cercanias das Portas do Cerco] e que, por acidente, diria eu, acabou por vencer a batalha”, diz o autor.

Estava criado o mito de um herói romântico que o escritor, de certo modo, contesta. “Quando fiz pesquisa para o livro, tentei ser o mais factual possível, mas também conto a história como a vejo. Por exemplo, acredito nos relatos sobre a Batalha do Passaleão? Não, de todo. Não acredito que pouco mais de 30 homens os derrotaram num único acto fazendo com que os chineses fugissem como ratos”, sublinha Marco Lobo que explorou as razões que terão levado à vitória, como a superioridade tecnológica em termos de armas.

Se, por um lado, procura ser “historicamente preciso”, adequando-se à época, por outro, Marco Lobo toma liberdades na caracterização das personagens, explorando o lado humano de Mesquita que escapa à História. “Não há muito escrito sobre ele como homem, pelo que tive que o imaginar”, revela.

Depois do grande feito, Mesquita “esperava ser distinguido como herói. Era segundo tenente na altura e, tipicamente, passados dez anos recebe-se um distintivo militar, mas ele demorou tempo a consegui-lo, por isso, penso que ele não era muito especial. Depois, como o chefe tinha sido assassinado não havia ninguém para o promover, só subiu de posto mais de um ano depois [da batalha], quando chegou o novo governador, passando a primeiro tenente. Havia, logo aqui, feridas emocionais”, descreve Marco Lobo. “Ele queixou-se a vida toda de que era olhado com inferioridade, porque era macaense e não português e talvez haja alguma verdade nisso”.

A simbologia das estátuas

Mesquita ganhou uma estátua décadas depois da sua trágica morte (suicidou-se depois de matar a mulher e uma filha num ataque de loucura) após ter sido reabilitado. Inaugurada em 1940 no Leal Senado acabaria por ser derrubada durante os incidentes do “1,2,3”, ocorridos em Dezembro de 1966, a primeira vez que a Revolução Cultural galgou as fronteiras da China. “As estátuas são sempre símbolo de algo. Basta pensarmos no Iraque, onde o derrube da estátua de Saddam Hussein [em 2003] marcou simbolicamente o fim do regime. Neste sentido, a estátua do Coronel Mesquita era símbolo de algo muito poderoso, pelo menos o suficiente para os chineses o atacarem”, argumenta.

“Reflexões de Mesquita” foi publicado originalmente em 2017 em inglês, ganhando uma versão em chinês e em português com a chancela da Praia Grande Edições, que organiza o Festival Literário de Macau – Rota das Letras, depois do desafio lançado por Ricardo Pinto. “Achei bastante interessante. Nunca tinha pensado nisso antes”, sublinha Marco Lobo, reconhecendo o potencial estimulante da nova audiência.

“Ao escrever sobre a diáspora portuguesa nunca tive a certeza se a audiência ocidental seria o verdadeiro mercado. Tenho a certeza que muita gente nem sabe onde fica Macau. Nós temos uma boa ideia da diversidade cultural porque vivemos aqui. De muitas formas esta pode ser uma melhor audiência para o livro porque a história é conhecida em Macau e na China, embora eu não tenha a certeza sobre quão conhecida é, pelo menos entre os chineses”, observa. O livro foi escrito de “vários pontos de vista”, incluindo o de Mesquita, [e] não sou gentil com ninguém”, salienta.

“O tempo em que decorre a acção é, por um lado, a Macau bonita das pinturas de George Chinnery e, por outro, a do comércio do ópio e do tráfico de cules. É um cenário em que há luz e escuridão”, sintetiza o escritor.

Macau em livro

Marco Lobo tem um terceiro romance em preparação que, por acaso, também se cruza com Macau. Com data prevista de lançamento para o Outono, o novo livro – ainda sem título – aborda o governador que sucedeu a Ferreira do Amaral, Pedro Alexandrino da Cunha, que permaneceu apenas 38 dias no cargo. Terá morrido de cólera, mas na nova trama de Marco Lobo a história é diferente. “O livro gira em torno das circunstâncias da sua morte. Ele é só central para a história porque morre, dado que um dos personagens está envolvido na sua morte”, explica Marco Lobo que recuperou personagens ficcionadas do livro “Reflexões de Mesquita” para o novo romance. Outra parte desenrola-se na Califórnia, nos tempos da corrida pelo ouro. “Esse personagem chinês, tal como outros, vai tentar encontrar a sua fortuna na Califórnia que, em 1850, conquista o estatuto de Estado norte-americano.

Biografia do avô Pedro José Lobo em estudo

Marco Lobo é filho de Sir Roger Lobo e neto de Pedro José Lobo, uma figura incontornável do século XX em Macau. Escrever sobre o avô é “uma ideia sob consideração”. “Até estou sob um pouco de pressão para escrever por parte das algumas pessoas, mas vamos ver como corre”, diz, entre risos. Há uma condição prévia para avançar com o projecto, que seria uma biografia ao invés de um romance. “Teria que ter total liberdade para escrever tudo o que quero e isso é difícil, até porque tenho uma família enorme”, enfatiza Marco Lobo, que profissionalmente é professor universitário de Economia.

Além da diáspora portuguesa – o seu primeiro livro, “The Witch Hunter’s Amulet” debruça-se sobre Goa – Marco Lobo, de 63 anos, tem particular interesse pelos conflitos culturais que envolvem a raça e a religião, como fica patente no romance histórico “Reflexões de Mesquita”.

Nascido em Hong Kong, sempre teve uma ligação muito íntima com Macau, onde vinha frequentemente passar o Verão ou o Natal porque o avô morava no território. “Macau é-me muito familiar. Guardo memórias muito queridas e nostálgicas da antiga Macau”, sublinha Marco Lobo, que estudou em Inglaterra e nos Estados Unidos antes de partir para o Japão, onde se encontra radicado há décadas.

22 Mar 2018

Rota das Letras | Exposição retrata relação entre cidade e o rio

[dropcap style=’circle’] M [/dropcap] aria José de Freitas é a curadora de uma exposição que conta pedaços da história de Macau e do o rio que rodeia o território. “Rivercities crossing borders: history and strategies” está patente no edifício do Antigo Tribunal até domingo, mas poderá deslocar-se a outros países

A exposição “Rivercities crossing borders: history and strategies”, com curadoria da arquitecta Maria José de Freitas, desaguou no edifício do Antigo Tribunal. Inserida no programa deste ano do festival literário Rota das Letras, a mostra apresenta em imagens parte da relação do território com o delta do Rio das Pérolas, e está relacionada com uma palestra que decorreu a semana passada, também no âmbito do festival.

Ao HM, Maria José de Freitas explicou a ideia por detrás de uma exposição que mostra a visão de fotógrafos como Carmo Correia, Gonçalo Lobo Pinheiro, António Mil-Homens e João Miguel Barros. Estão também incluídos desenhos de Guilherme Ung Vai Meng sobre os estaleiros de Lai Chi Vun, sem esquecer os esboços do plano da Baía da Praia Grande, da autoria dos arquitectos Manuel Vicente e Adalberto Tenreiro.

“Estamos cá há cinco séculos e pensei que Macau poderia ser um bom ponto de partida para esta reflexão conjunta, daí ter convidado diversos artistas locais e fotógrafos para nos fazerem uma apresentação do seu trabalho. Os fotógrafos que contactei são residentes de Macau, que têm esta perspectiva muito contemporânea da relação cidade-rio e que procuram recantos onde ela ainda ocorre.”

A exposição, que pode ser visitada até ao próximo Domingo, estende-se até à sala onde decorrem as palestras, revelando imagens que mostram uma panorâmica de Macau e a sua relação com a China, incluindo os novos aterros em construção.

Na visão de Maria José de Freitas, tratam-se de imagens exemplares “do ponto de vista da ligação entre margens, porque tudo isto é território chinês, embora esteja sujeito a uma administração diferente”. “É interessante perceber até que ponto esta ligação entre margens se pode fazer e manter alguma diferenciação relativamente a Macau, no que diz respeito ao seu passado histórico. Como forma de intervenção, pareceu-nos interessante mostrar o trabalho que permitiu uma nova frente de desenvolvimento para a cidade”, acrescentou a arquitecta.

Maria José de Freitas lamenta que um território que se foi desenvolvendo a partir da sua relação com o rio esteja hoje em dia distante dele, graças aos inúmeros tapumes espalhados pela cidade. “Há zonas em que há um divórcio, ou porque são zonas de novos aterros, ou porque estão ainda em vias de desenvolvimento, cobertas com tapumes, em que o rio é uma fronteira que nos separa da outra margem. Eu, os artistas que participam na exposição e os oradores da conferência, procuramos esbater essas fronteiras, como se esse rio pudesse transbordar e ser mais comunicativo e culturalmente mais válido e interessante.”

 

Imagens mais além

“Rivercities crossing borders: history and strategies” pode vir a cruzar fronteiras, embora a sua curadora ainda não tenha planos concretos para tal. Contudo, há um desejo de mostrar estes desenhos e imagens em países de língua portuguesa, por exemplo.

“Seria interessante levar a exposição a outros locais, mas ainda estou a averiguar”, contou. “Quando lancei o tema para a mesa procurei que se realizasse a conferência e a exposição, porque elas são complementares entre si. É um primeiro passo numa situação que gostaria de desenvolver no futuro. Depois da realização da conferência, e na sequência da inauguração da exposição, tenho encontrado artistas, pessoas associadas às artes plásticas que trabalham com elementos ligados à água, e que mostraram interesse em participar em futuras conferências e exposições que se venham a realizar. Da parte dos arquitectos e urbanistas de Macau a resposta também foi positiva”, rematou Maria José de Freitas.

A conferência que está ligada a esta exposição decorreu na passada Sexta-feira e teve como objectivo “analisar o papel dos rios como rotas, espaços de comunicação e diálogo, tendo como ponto de partida a cidade de Macau e outras cidades asiáticas”, explicou Maria José de Freitas à agência Lusa.

Os oradores, todos provenientes de cidades costeiras, analisaram os desafios e oportunidades históricas e a projecção futura, tendo em vista o projecto do Pan-delta do rio das Pérolas, entre nove províncias da região (Fujian, Jiangxi, Hunan, Guangdong, Guangxi, Hainan, Sichuan, Guizhou, Yunnan) e as duas regiões administrativas especiais chinesas, criado em 2004.

“É importante situar Macau neste contexto, que não é apenas económico, mas também cultural, e perspectivar o futuro”, disse a organizadora, destacando a intervenção de Wallace Chang Ping Hung, professor associado da Faculdade de Arquitetura da Universidade de Hong Kong, sobre aquele projecto.

Maria José de Freitas destacou ainda a intervenção de Xu Ying sobre a experiência da cidade de Wuhan, na província chinesa de Hubei (centro), focada na protecção do património e da sua reutilização em termos contemporâneos.

“Wuhan está no delta de quatro rios e está a recuperar o património e herança de influência francesa, o que nos pode levar a reflectir sobre as zonas do porto interior e exterior de Macau”

21 Mar 2018

Pianista Maria João Pires cria Fundação Partitura para “orientar e educar” músicos

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] pianista Maria João Pires criou a Fundação Partitura, através da qual pretende “orientar e educar” músicos jovens, dando-lhes a oportunidade de partilharem palco com artistas experientes, foi ontem anunciado.

“A sua ambição é orientar e educar intensamente um grupo em constante evolução de músicos jovens, e excecionalmente talentosos, e facilitar a sua evolução para uma atividade saudável de concertos, oferecendo-lhes a oportunidade de se juntarem em palco a alguns artistas experientes que desejem transmitir o seu ofício e ideais”, lê-se num comunicado sobre a Fundação Partitura, divulgado hoje pela agência internacional Askonas Holt, que representa a artista.

A conclusão de que “a obsessão contemporânea com as ‘superestrelas’ criadas pelo marketing tornou a música um ideal difícil de viver” inspirou a pianista a criar a fundação.

A “esperança” da Partitura, “tão humilde quanto ambiciosa, é ser um refúgio seguro para a arte como manifestação universal do espírito humano, desligada de objetivos económicos ou egoístas”.

A fundação terá um ‘Laboratório’, que inclui a “descoberta de talentos musicais”, através de concertos em várias cidades pelo mundo com oficinas e “sessões mensais”, com Maria João Pires e os restantes membros da Partitura a reunirem-se durante três ou quatro dias para trocarem ideias.

A fundação propõe a realização de “concertos partilhados, nos quais músicos consagrados e jovens se unem em palco”, dando assim a oportunidade aos mais novos “de se mostrarem a públicos que não os conhecem”.

Além disso, a Partitura “deseja investir tempo e energia consideráveis em gravações” e Maria João Pires e outros membros “irão assumir a direção artística dos discos a solo de jovens músicos”.

A Partitura decidiu também criar o Projeto Equinox [Equinócio, em português], dedicado à “criação e desenvolvimento de coros infantis”.

“[O Projeto] recruta principalmente entre crianças que tiveram um inicio de vida difícil por causa do sítio onde vivem (devastado por pobreza generaliza ou conflitos, ou ambos) e/ou por histórias pessoais particulares”, lê-se no documento hoje divulgado.

O Equinox “tenta instituir a criação musical em ambientes onde as condições não são diretamente favoráveis ao desenvolvimento natural desta prática”.

Em dezembro, a agência internacional de Maria João Pires confirmou à agência Lusa que a pianista deixaria de realizar digressões, mantendo apenas alguns concertos em agenda, ao longo deste ano.

Ao longo de mais de seis décadas de carreira, Maria João Pires foi reconhecida pela crítica internacional como uma das principais intérpretes de Mozart e Schumann, tendo as suas gravações do compositor austríaco, nomeadamente a integral das Sonatas para piano, assim como as suas interpretações do compositor alemão, editadas por discográficas como a Denon, Erato e Deutsche Grammophon, chegado ao primeiro lugar de escolhas de publicações internacionais como a Diapason, Gramophone e Clássica, além dos chamados “Guias Penguin”.

Esta não foi a primeira vez que a pianista, natural de Lisboa, anunciou uma retirada das salas de concerto. Em 2010, numa entrevista ao jornal britânico Evening Standard, declarou que “gostaria de se poder retirar”. “Já toquei muito. Toquei durante 60 anos, e acho que é demais”.

Um ano mais tarde, numa entrevista ao diário espanhol El País, a pianista afirmou que se sentia cansada e que tinha acordado com a sua agência internacional deixar os palcos em 2014, quando completasse 70 anos.

Todavia, tal não veio a acontecer. Maria João Pires voltou aos palcos e aos estúdios de gravação.

Em 2015, ganhou o Prémio Gramophone, pela gravação dos concertos n.º 3 e n.º 4, para piano e orquestra, de Beethoven, com a qual se estreou na discográfica Onyx, com a qual assinou em 2014, quando deixou a Deutsche Grammophon.

Maria João Pires nasceu em Lisboa, a 23 de julho de 1944. É a mais internacional e reputada das pianistas portuguesas, com um percurso artístico que remonta a finais dos anos 1940, quando se apresentou pela primeira vez em público, aos quatro anos.

Em 2010, obteve a nacionalidade brasileira.

20 Mar 2018