Terrenos | Governo declara caducidade de mais três parcelas em Coloane

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Yat Yuen, a Companhia de Corridas de Galgos de Macau, vai perder um terreno de que dispunha em Seac Pai Van por não o ter aproveitado. Não é caso único. O Executivo continuar a tentar reaver lotes vazios cujas concessões chegaram ao fim.

Foram cinco terrenos no início de Janeiro; agora, há mais três para recuperar. Por despacho do secretário para os Transportes e Obras Públicos, Raimundo do Rosário, a Yat Yuen, a Companhia de Corridas de Galgos de Macau, vai ficar sem um lote de 5235 metros quadrados localizado na zona industrial de Seac Pai Van.

A empresa tinha obtido a concessão da parcela, por arrendamento e com dispensa de concurso público, em Novembro de 1990. De acordo com o contrato, o terreno seria aproveitado com a construção de vários edifícios até dois pisos, destinados à criação de cães, a explorar directamente pela concessionária. No entanto, passaram-se os 25 anos estipulados no contrato para o aproveitamento do terreno e nada foi feito.

O segundo caso diz igualmente respeito à zona industrial de Seac Pai Van. O lote tinha sido concessionado também no final de 1990 à Sociedade Internacional de Indústria Pedreira e tem uma área considerável: 17.243 metros quadrados. No terreno seria construído um complexo destinado à serração e polimento de pedras, mas o prazo de arrendamento terminou no final de 2015 sem que a empresa tivesse levado a cabo os planos que tinha para o local.

Por fim, foi ainda ontem publicado em Boletim Oficial um despacho assinado por Raimundo do Rosário que determina a caducidade da concessão de um lote no gaveto das Estradas da Barragem de Ká-Hó e Nossa Senhora de Ká-Hó, em Coloane. O contrato de arrendamento tinha sido celebrado em 1990 com a Companhia de Investimento e Artesanato de Porcelana Novo Macau.

Os mais de 4500 metros quadrados serviriam para instalar uma unidade industrial para o fabrico de artigos de porcelanas, sendo que estavam projectados vários edifícios até três pisos. Mais uma vez, o terreno não foi aproveitado durante os 25 anos em que esteve arrendado.

No início deste ano, Raimundo do Rosário declarou a caducidade da concessão de cinco terrenos na zona industrial de Seac Pai Van. Destinavam-se à construção de unidades fabris de diferentes ramos, mas os projectos dos proprietários não saíram do papel. Uns dias mais tarde, o grupo de concessionários juntou-me para publicar uma carta no jornal Ou Mun, alegando que a responsabilidade pelo não aproveitamento dos lotes é apenas do Governo.

23 Fev 2017

Donald Tsang | Destino do antigo Chefe do Executivo é conhecido hoje

É hoje anunciada a pena que Donald Tsang vai ter de cumprir, depois de, na semana passada, ter sido condenado por conduta indevida no exercício de funções. O facto de o ex-Chefe do Executivo ter sido considerado culpado não é bom para a política da região vizinha, numa altura em que são cada vez menos aqueles que acreditam no sistema

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] fenómeno não é exclusivo de Hong Kong, aponta o politólogo Edmund Cheng: “Tem acontecido o mesmo também em várias novas democracias da Ásia”. Quando termina o mandato político, chega a vez do mandado judicial. Foi assim em Taiwan, na Coreia do Sul há uma ex-Presidente a braços com a justiça, e em Hong Kong é aquilo que se sabe, com um processo que hoje entra numa nova fase.

A justiça vai anunciar esta quarta-feira o que Donald Tsang terá de fazer para ressarcir a sociedade pela conduta indevida que teve enquanto Chefe do Executivo. O antigo líder do Governo foi condenado na passada sexta-feira mas, de forma diferente da de Macau – em que à condenação corresponde, de imediato, a pena a cumprir –, só agora é que o arguido vai ficar a saber o que o espera. Para já, passou pela experiência da detenção.

“A sentença tem aspectos positivos e negativos”, analisa ao HM Edmund Cheng, professor da Universidade Baptista de Hong Kong. “Demonstra, pelo menos, que Hong Kong tem um sistema judicial independente, comparativamente com as jurisdições à volta.” O lado simpático de toda esta polémica fica por aqui.

Para o politólogo, o facto de Donald Tsang ter sido condenado é preocupante em termos de opinião pública e estabilidade social. O académico faz uma viagem de 20 anos ao passado para falar do tempo em que o Reino Unido era soberano em Hong Kong. “Claro que se poderá dizer que, nos tempos do colonialismo, os problemas não eram revelados”, admite. No entanto, não é essa a imagem que as pessoas têm. “Havia a imagem de que a Administração zelava pelo interesse público e não pelos interesses específicos de um grupo. É a percepção que existe”, afirma.

“Sem dúvida que este processo é preocupante, porque tem um impacto negativo na confiança das pessoas em relação ao sistema. As pessoas pensam que o poder executivo é corrupto”, continua Edmund Cheng, que lamenta que Hong Kong tenha perdido o sistema de “check and balances” que outrora teve e que, entretanto, perdeu.

Sistema em deterioração

O politólogo não afasta a possibilidade de haver uma intervenção da justiça no dia em que o actual Chefe do Executivo, C.Y. Leung, deixar o poder. “Isto não é uma democracia, a responsabilização política não é feita enquanto os políticos estão no poder, pelo que é preciso esperar que abandonem os cargos”, vinca. O sistema político não tem suficientes mecanismos de fiscalização para ir garantindo que a governação decorre no mais rigoroso cumprimento da lei.

O facto de Donald Tsang já não estar no poder não significa que a opinião pública olhe para todo este processo como algo que pertence ao passado. “De certeza que o campo pró-democrata vai utilizar o caso para questionar por que razão houve tanta corrupção depois da transferência de soberania. É porque o sistema actual só serve os interesses dos magnatas?”, lança Edmund Cheng, que recorda que Donald Tsang não é caso único em Hong Kong, apesar de ser o mais alto titular de um cargo político a ser condenado pelos tribunais da RAEHK. O antigo secretário-chefe Rafael Hui, lembra o politólogo, está neste momento na prisão, a cumprir pena por crimes de corrupção.

“O mais importante é que estamos a falar de tecnocratas que foram educados e treinados durante o tempo colonial. Julgava-se que agiam de forma limpa. Mas estes tecnocratas foram autores de crimes desta natureza”, observa. “Isto levanta a questão se estas pessoas perderam qualidades durante estes anos ou se o sistema não tem uma forma eficaz de responsabilização.”

Qualquer que seja a resposta, o tempo é de “incertezas e de desconfiança” no poder executivo de Hong Kong. Mais uma vez, a antiga colónia britânica e Macau apresentam características diferentes, mesmo quando em causa estão a corrupção e o abuso de poder. Edmund Cheng acredita que os processos judiciais da RAEM que envolvem figuras de relevo “têm que ver com rivalidades políticas”. Já na região vizinha, os casos em tribunal devem-se essencialmente “à deterioração do sistema, o que gera muita preocupação”.

Tirar o laço

Ontem, Donald Tsang tornou-se no primeiro líder do Governo de Hong Kong a passar uma noite sob detenção. O tribunal decidiu que deveria permanecer detido até se saber da pena que terá de cumprir, sendo que existe a convicção generalizada de que irá passar uns tempos atrás das grades.

Num dos muitos artigos publicados sobre o assunto, o South China Morning Post não perdoa: “O antigo Chefe do Executivo Donald Tsang Yam-kuen em tempos jantou com empresários de sucesso em Macau e viajou em iates com magnatas, mas segunda-feira à noite bateu no fundo, ao dormir na ala prisional do Hospital Queen Elizabeth”, escrevia ontem o jornal.

Tsang, de 72 anos, “trocou o fato e o laço, que faz parte da sua imagem, por um uniforme da prisão” na noite de segunda-feira, descreve ainda o matutino em língua inglesa, depois de um juiz ter decidido enviá-lo para o centro de máxima segurança de Lai Chi Kok e ter dado a entender ser pouco provável a determinação de uma pena suspensa. No entanto, pouco depois das 21h, foi levado para o hospital, por ter dito que não se estava a sentir bem.

O antecessor de C.Y. Leung arrisca-se a sete anos na prisão. O júri de nove elementos entendeu que o antigo líder do Governo teve uma conduta indevida no exercício de funções, num processo que implicou a aprovação de três candidaturas da emissora de rádio Wave Media, entre 2010 e 2012, numa altura em que estava a negociar o arrendamento de uma penthouse em Shenzhen com o empresário Bill Wong Cho-bau, o principal accionista da estação.

Tsang vai ser ainda julgado por um crime de corrupção, uma vez que o júri não conseguiu chegar a qualquer conclusão acerca deste ponto da acusação. Ainda não há nova data para o novo julgamento. A acusação acredita que o antigo Chefe do Executivo aceitou, como compensação pelas concessões à emissora de rádio, trabalhos de renovação da penthouse em Shenzhen, no valor de 3,35 milhões de dólares de Hong Kong.

Amigos há muitos

A imprensa de Hong Kong relata que a advogada de defesa de Donald Tsang, Clare Montgomery, apelou a uma pena de curta duração, com pena suspensa, pedindo ao juiz que tenha em consideração que a aprovação dos pedidos feitos pela Wave Media eram justificáveis.

A defesa destacou ainda a quantidade de cartas de apoio a Tsang, escritas por aliados políticos mas também por adversários, incluindo os antigos secretários Carrie Lam e John Tsang, ambos candidatos a Chefe do Executivo nas eleições deste ano. “Teve uma vida dedicada ao serviço público e às pessoas de Hong Kong”, assinalou também Clare Montgomery.

“Sir Donald Tsang foi o único Chefe do Executivo moderado, que teve disponibilidade para discutir com a oposição”, diz o politólogo Edmund Cheng. “Apesar de as acusações de corrupção não terem nada que ver com o seu legado político e a postura que adoptou, parece-me que será julgado em conformidade. Como é possível constatar, foram poucos os políticos e os media pró-regime que o defenderam antes e depois da decisão judicial, o que torna clara a mensagem política”, afirma ainda. O politólogo não quer com isto dizer que haja uma motivação política por detrás do processo, mas chega à conclusão de que “ser simpático para com a oposição não traz necessariamente protecção política durante a crise”. Donald Tsang comandou os destinos políticos de Hong Kong entre 2005 e 2012.

22 Fev 2017

Kim Jong-nam | Malásia e Coreia do Norte às avessas. Televisão divulga filme do assassinato

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A Coreia do Norte não assume que o homem que morreu na semana passada em Kuala Lumpur é o filho mais velho do Querido Líder. E acusou, mais uma vez, a Malásia de estar a conduzir investigações com pouca credibilidade. A polícia procura quatro norte-coreanos. O filho de Kim Jong-nam já terá partido de Macau para a capital malaia

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m conjunto de imagens dos circuitos de segurança do Aeroporto Internacional de Kuala Lumpur foi ontem tornado público, mostrando o ataque de que Kim Jong-nam foi alvo. O vídeo, divulgado por uma estação de televisão do Japão, acompanha o meio-irmão do líder da Coreia do Norte a entrar no terminal e a ser abordado por uma mulher, que lhe tapa o rosto.

Com bastante nitidez, vê-se também o pedido de ajuda de Kim Jong-nam a funcionários do aeroporto, que o levam aos seguranças. Depois, o primogénito de Kim Jong-il dirige-se à clínica do aeroporto, sendo que o vídeo termina já com uma imagem da vítima numa maca. Recorde-se que morreu a caminho do hospital.

As imagens, que já correram mundo, foram divulgadas numa altura em que aumenta o conflito diplomático entre a Malásia e a Coreia do Norte, na sequência de divergências sobre o modo como deve ser tratado o corpo e conduzidas as investigações.

A Malásia chamou o seu representante diplomático em Pyongyang, tendo ainda convocado o embaixador norte-coreano em Kuala Lumpur, para obter explicações sobre as acusações de que as autoridades do país estavam em conluio com “forças estrangeiras” na investigação do homicídio.

Ir ao engano

Entretanto, a polícia está à procura de quatro norte-coreanos que saíram da Malásia no dia do ataque, tendo já detido um suspeito da Coreia do Norte, uma mulher vietnamita, outra da Indonésia e um homem de nacionalidade malaia. Acredita-se que o detido de nacionalidade norte-coreana não desempenhou um papel de relevo no ataque.

Pelo menos três dos suspeitos norte-coreanos procurados apanharam um voo da Emirates com destino ao Dubai, de acordo com informações recolhidas pela Reuters junto dos serviços de migração de Kuala Lumpur. Já o jornal local Star diz que os quatro homens regressaram a Pyongyang – a mesma versão é contada pelo Channel NewsAsia (CNA), que cita uma fonte da polícia malaia.

“Os quatro homens planearam e executaram o homicídio. Foram eles que recrutaram as duas mulheres”, explicou a fonte. Os suspeitos entraram na Malásia entre 31 de Janeiro e 7 de Fevereiro.

A mãe da mulher indonésia detida disse à Reuters que a filha, Siti Aishah, foi enganada, pois achava que tinha sido contratada para um anúncio ou programa de televisão. A imprensa malaia diz que a suspeita vietnamita, Doan Thi Huong, contou à polícia que achou que estava a participar numa brincadeira inofensiva.

Filho a caminho

Mal a notícia da morte de Kim Jong-nam foi conhecida, tanto os Estados Unidos, como a Coreia do Sul acusaram Pyongyang do homicídio. A morte do filho mais velho do Querido Líder – que desde 2001 se encontrava a viver fora do país – não mereceu um comentário imediato da Coreia do Norte. Foi preciso esperar e as palavras do regime mais isolado do mundo foram em tom acusatório.

A determinação da Malásia em levar por diante a autópsia e a recusa em entregar de imediato o corpo a Pyongyang levaram o embaixador norte-coreano a questionar os motivos da postura das autoridades malaias, num comentário raro feito à imprensa na passada sexta-feira.

Num comunicado, o Ministério dos Negócios Estrangeiros da Malásia rejeitou as acusações e anunciou o regresso do embaixador malaio na Coreia do Norte “para consultas”.

Quanto ao corpo, será entregue ao parente mais próximo – mas ainda ninguém da família o pediu formalmente. As agências internacionais de notícias diziam que o filho mais velho de Kim Jong-nam, Kim Han-sol, era esperado ontem na Malásia. Apanhou um voo para Kuala Lumpur a partir de Macau.

O Ministério da Saúde acredita que amanhã poderão ser divulgados os resultados da autópsia.

Sul em alerta

A morte de Kim Jong-nam fez com que a Coreia do Sul tivesse ontem uma reunião do Conselho Nacional de Segurança. O Presidente sul-coreano em funções disse no encontro ter “a certeza quase absoluta” de que Pyongyang – ou seja, Kim jong-un – é o culpado do homicídio.

Hwang Kyo-ahn deixou ainda um apelo ao reforço da segurança do país perante possíveis “provocações” da Coreia do Norte, tendo pedido a altos funcionários e militares que estejam alerta para a possibilidade de o país vizinho levar a cabo actos terroristas contra funcionários do Governo ou contra a Coreia do Sul “para desviar a atenção internacional” do crime.

“Se juntarmos o anúncio das autoridades malaias e várias informações e circunstâncias, parece que o regime norte-coreano está por detrás do incidente”, disse Hwang, que apoiou assim a posição do Ministério da Unificação de Seul que, no domingo passado, acusou Pyongyang ser responsável pelo crime.

O Presidente em funções classificou o homicídio de Kim Jong-nam como um “acto criminoso desumano inaceitável” e pediu aos funcionários que procurem cooperação internacional para que a Coreia do Norte pague pelo “acto de terrorismo”. “Isto demonstra claramente a natureza temerária e brutal do regime norte-coreano, que usa qualquer meio para manter o poder”, acrescentou Hwang Kyo-ahn.

Menos amigos

O modo agreste como a Coreia do Norte tem estado a lidar com Kuala Lumpur, na sequência da morte de Kim Jong-nam, faz com que o regime de Pyongyang possa ficar ainda mais isolado em termos internacionais.

A Malásia encontra-se entre um número cada vez menor de aliados do tempo da Guerra Fria com quem Pyongyang tem conseguido manter laços. De acordo com informações do Governo da Coreia do Sul, o regime de Kim Jong-un tem 53 embaixadas e missões diplomáticas no estrangeiro.

Especula-se também que a paciência da China com a Coreia do Norte possa estar a ser testada. Depois de ter deixado a Coreia do Norte, o filho mais velho de Kim Jong-il passou a viver entre Macau e Pequim, sendo que viajava precisamente para o território quando foi alvo do ataque fatal.

No sábado passado, Pequim anunciou a suspensão, até ao final do ano, de todas as importações de carvão da Coreia do Norte – os analistas dizem que se trata de um duro golpe para a já frágil economia do regime. O gesto tem sido lido como uma forma de bater o pé a Kim Jong-un, depois de Pyongyang ter vindo a comportar-se de forma cada vez mais agressiva, com ensaios nucleares que causam preocupação ao nível internacional.

Na edição desta segunda-feira, o Global Times, jornal do Partido Comunista Chinês, justificava a suspensão das importações de carvão com a determinação de Pequim em trabalhar em conjunto com a comunidade internacional para travar os esquemas nucleares norte-coreanos, mas não deu pistas sobre uma eventual mudança radical de atitude perante o vizinho.[/vc_column_text][vc_column_text css=”.vc_custom_1487807395168{margin-top: -20px !important;margin-bottom: 14px !important;}”]

O filme

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21 Fev 2017

Instituto Cultural | Biblioteca e Estoril são para avançar

Desde a passada sexta-feira que o Instituto Cultural tem um novo líder. Leung Hio Ming fazia já parte da equipa de Guilherme Ung Vai Meng e há mais de 20 anos que trabalha na casa. Defende que há áreas que só se podem ser melhoradas com novas infra-estruturas

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]nquanto não houver um novo espaço na cidade para o ensino de dança, vai ser difícil elevar o nível do conservatório local. A dificuldade foi apontada por Leung Hio Ming, o novo presidente do Instituto Cultural (IC), em declarações aos jornalistas à margem da cerimónia de tomada de posse.

“Esperamos que o Estoril possa entrar em funcionamento”, explicou, quando questionado sobre a solução para colmatar as falhas no ensino de dança. “A escola precisa de novas instalações. Se forem lá, poderão ver que as instalações não estão de acordo com os padrões profissionais.”

Já quanto ao ensino de música, as preocupações são outras. Leung Hio Ming conhece bem esta área – é músico de formação e foi director do conservatório local. “Todos os alunos [que fazem os exames e se candidatam] estão a conseguir entrar em universidades no estrangeiro. Acho que o sistema de educação está a funcionar bem. Se assim não fosse, a taxa de entrada na universidade não seria de 100 por cento”, destacou.

Neste momento, o conservatório de música tem mais de 800 estudantes, acrescentou. A aposta passará, no futuro, por uma presença mais forte do ensino de instrumentos chineses, “porque a percentagem é muito menor do que a dos instrumentos ocidentais”.

Quando o antigo Hotel Estoril for convertido num centro de artes, também estes estudantes passarão a dispor de novas estruturas. Sobre o controverso projecto, o presidente do IC explicou que “o plano já está definido”, sendo que, “em breve”, a concepção da obra começará a ganhar forma. Leung Hio Ming não tem, no entanto, um calendário, porque “o projecto está nas mãos dos Serviços de Educação e Juventude”.

“O centro terá um auditório de tamanho médio. Haverá muito espaço para artes performativas, que será partilhado pelas associações e residentes de Macau”, salientou. “Isto significa que, durante o período das aulas, as instalações vão ser usadas pelos alunos mas, depois, as outras associações vão poder utilizar o novo centro.

Tribunal num museu

O sucessor de Guilherme Ung Vai Meng falou também da Biblioteca Central, projecto que, na semana passada, voltou a estar na ordem do dia por causa de um debate na Assembleia Legislativa (AL). Leung Hio Ming afasta que exista “uma grande polémica” em torno da reconversão dos edifícios onde, em tempos, funcionaram o Tribunal Judicial de Base e a Polícia Judiciária.

O responsável recordou que foi organizada uma exposição sobre o projecto, sendo que a oportunidade serviu para o IC perceber que a maioria da população concorda com a ideia. Quanto aos custos, reconhece que se trata da “maior preocupação” da opinião pública. “O orçamento foi calculado com a taxa de inflação anual”, indicou. Na semana passada, Alexis Tam, secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, admitiu que os 900 milhões de patacas anunciados inicialmente poderão não bastar para concluir a obra.

Em relação à localização – questão central do debate na AL –, o presidente do IC vincou que a decisão teve na base as recomendações internacionais do sector sobre este tipo de infra-estruturas. Leung não acredita que o turismo possa ter impacto no edifício e no modo como será utilizado, uma vez que, nos últimos anos, têm ali sido organizadas exposições e “não se verificou um grande número de visitantes”.

Questionado sobre a manutenção de peças que pertenceram ao antigo tribunal, Leung Hio Ming explicou que as antigas salas de audiência terão de ser reconvertidas, para poderem adaptar-se às novas finalidades. No entanto, existe “uma ideia preliminar para um museu judiciário, um espaço que sirva para exibir objectos do tribunal”.

O novo presidente do Instituto Cultural admite que a “parte mais pesada” do trabalho do organismo tem que ver com a conservação do património. “Vamos continuar a trabalhar nesta área mas, ao mesmo tempo, vamos disponibilizar bons serviços culturais a todos os cidadãos de Macau”, prometeu. Além do património, há mais duas vertentes que entende serem de grande importância: as indústrias criativas e os serviços culturais.

Além de Leung Hio Ming, tomou posse na passada sexta-feira o novo vice-presidente do IC: Ieong Chi Kin ocupa o lugar deixado vago pelo agora sucessor de Guilherme Ung Vai Meng.

20 Fev 2017

Kim Jong-nam | Activista acredita que “questão de sangue” esteve na origem do homicídio

Ninguém duvida que se tratou de um homicídio. Washington e Seul acreditam que Kim Jong-nam morreu a mando de Pyongyang. Mas por que sentiu Kim Jong-un necessidade de matar o meio-irmão? Há um investigador japonês que tem uma teoria: por uma questão de sangue, o líder da Coreia do Norte não tem direito ao poder. É a verdadeira guerra dos tronos

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]aiu do país em 2001 e, segundo contou há uns anos a um órgão de comunicação social japonês, já nos últimos tempos em que viveu em Pyongyang se sentia afastado do pai. O primogénito de Kim Jong-il, assassinado esta semana num aeroporto de Kuala Lumpur, era defensor da reforma e abertura do país, um pouco aos moldes do que aconteceu na China de Deng Xiaoping. Por isso mesmo, era contra a lógica da sucessão no poder da Coreia do Norte.

Kim Jong-nam não parecia ter aspirações políticas – pelo menos foi essa a sensação que deixou nas poucas entrevistas que concedeu e junto dos amigos que fez em Macau, terra onde passou longos períodos, até começar a sentir que teria a cabeça a prémio. Foi nessa altura que passou a viajar mais, sendo que França era um dos destinos predilectos do homem que estudou no Liceu Francês de Moscovo. Foi nessa altura também que a actividade no Facebook, com o nome Kim Chol, deixou de ser tão regular – mas é possível ver ainda fotografias junto a vários casinos de Macau.

A residência no território, casa também da mulher e dos dois filhos, tem um significado claro para os analistas, reforçado pelas viagens frequentes a Pequim: a China protegia o filho mais velho do Querido Líder, apesar de as relações com o pai terem deixado de ser as melhores. Era Kim Jong-nam, de certa maneira, um trunfo para Pequim, numa altura em que Pyongyang lhe escapa, por ser controlada por um líder imprevisível? Teria Kim Jong-nam um papel importante a desempenhar numa eventual abertura do país ao mundo? 

São perguntas que ficarão, por certo, sem resposta. Assim como deverá ficar sem justificação a verdadeira razão do homicídio do meio-irmão de Kim Jong-un. As agências internacionais de notícias davam ontem conta de que a Malásia vai entregar o corpo à Coreia do Norte, a pedido de Pyongyang, depois de concluídos os procedimentos em curso – à hora de fecho desta edição, ainda não tinha sido divulgado o resultado da autópsia. Desconhece-se que tipo de funeral pretende Kim Jong-un organizar para o meio-irmão que não terá conhecido em vida.

Uma linha de sangue

O investigador Ken Kato não tem dúvidas sobre quem mandou matar Kim Jong-nam. “Ao assassinar o irmão mais velho, Kim Jong-un atravessou mais uma linha vermelha e o regime é mais perigoso do que nunca”, comentou ao HM. O activista japonês – que se dedica sobretudo à luta pelos direitos humanos na Coreia do Norte – faz um enquadramento familiar do clã Kim para sustentar a afirmação.

“O pai de Kim Jong-un, o ditador Kim Jong-il, também teve um irmão que foi seu adversário, Kim Pyong-il. No entanto, Kim Jong-il não o mandou matar ou prender”, observa o director da Human Rights in Asia. De facto, Kim Pyong-il foi embaixador da Coreia do Norte durante várias décadas. “Até mesmo Kim Jong-il se sentia incapaz de matar um filho de Kim Il-sung [o fundador da Coreia do Norte]. Mas Kim Jong-un matou um filho de Kim Jong-il e um neto de Kim Il-sung”, sublinha. “Isto tem um enorme significado.”

Ken Kato aponta uma razão concreta para que o que aconteceu no aeroporto da Malásia, admitindo que haverá outros motivos para o homicídio. Trata-se de uma “fraqueza” de Kim Jong-un, uma “questão de sangue” que o líder da Coreia do Norte jamais poderá resolver, porque se trata de uma traição imperdoável aos olhos da cultura e da lei norte-coreanas.

“Tenho provas documentais de que o avô materno de Kim Jong-un trabalhou para o Exército Imperial Japonês, o que faz dele ‘um traidor’ na Coreia do Norte”, declara o activista. Ora, o avô materno do jovem líder nada era a Kim Jong-nam. Já o fundador da Coreia do Norte era avô dos dois. E foi ele que determinou, em 1972, que “faccionários ou inimigos da classe, independentemente de quem sejam, a sua semente deve ser eliminada nas três gerações seguintes”. Ou seja, pela lógica política de Pyongyang, “Kim Jong-un deveria ser enviado para um campo de detenção e morrer lá”, uma vez que teria de pagar pelos pecados do avô materno.

A filha que valeu a vida

“Para os estrangeiros, isto pode não parecer uma questão importante”, continua o investigador, que viu a descoberta de há cinco anos ser publicada pela imprensa internacional. “Mas, para os norte-coreanos, trata-se de uma questão de legitimidade extremamente importante.”

De acordo com a documentação encontrada por Ken Kato, o avô materno de Kim Jong-un, Ko Gyon-tek, trabalhou numa fábrica em Osaka, no Japão, onde eram feitos os uniformes para o exército que queria derrubar Kim Il-sung.

O facto de Ko Gyon-tek ter colaborado com a nação que ocupou a Península da Coreia teria valido o seu encarceramento, bem como o de toda a sua família. O avô de Kim Jong-un conseguiu escapar a semelhante destino, quando viajou para o Norte no início dos anos 1960, porque a filha caiu nas graças de Kim Jong-il.

Os documentos que sustentam a teoria de Ken Kato foram encontrados nos arquivos militares do Japão e na biblioteca do parlamento nipónico. “A Coreia do Norte não desmentiu a minha descoberta”, salienta. O activista acredita que Kim Jong-un desconheceria o passado do avô, que teria feito dele um elemento da classe mais baixa da sociedade norte-coreana.

Nascido na ilha de Jeju, território que hoje pertence à Coreia do Sul, Ko Gyon-tek mudou-se para o Japão em 1929, numa altura em que muitos coreanos procuravam uma vida melhor no país vizinho. A filha, Ko Young-hee [a mãe de Kim Jong-un], nasceu em Osaka em 1953, mas a família foi obrigada a mudar-se para a Coreia do Norte em 1961, depois de Ko Gyon-tek ter sido detido e deportado pela polícia japonesa, acusado de tráfico humano – isto de acordo com as investigações feitas pelo académico Lee Yong Hwa, professor da Universidade Kansai.

O avô materno do líder de Pyongyang conseguiu resolver as questões do passado e encontrou trabalho numa fábrica de produtos químicos, indicam os arquivos que Ken Kato encontrou. Já a filha começou a dançar no grupo artístico Mansudae. Foi precisamente como bailarina que despertou a atenção de Kim Jong-il, com quem viria a casar. A mãe de Kim Jong-nam não tinha contraído matrimónio com aquele que viria a ser o Querido Líder. Doente, morreu no exílio em Moscovo.

“Há um sistema de classificação muito rígido na Coreia do Norte, baseado na linhagem”, reitera o activista japonês. “De acordo com a filosofia norte-coreana, Kim Jong-un não reúne condições para ser líder porque a legitimidade de todo o regime tem a linhagem como fundamento.”

Ken Kato contou ainda ao HM que, há já alguns anos, enviou uma carta ao filho de Kim Jong-nam, Kim Han-sol, com cópias das provas documentais que reuniu sobre a família materna do tio.

Agora, numa altura em que teme como nunca pelos direitos humanos em solo norte-coreano, o activista tem apenas uma esperança. “Espero que possa agir pelo pai e pelas pessoas da Coreia do Norte, e atacar ‘a fraqueza’ de Kim Jong-un”, diz. É tudo uma questão de sangue nesta guerra dos tronos que acontece aqui bem perto.


E vão três

A polícia da Malásia deteve ontem um terceiro suspeito, durante a caça ao homem que está a ser feita por causa do homicídio de Kim Jong-nam. De acordo com a Agência Reuters, o detido mais recente é namorado de uma mulher indonésia que também ontem, ao princípio do dia, tinha sido levada para a esquadra.

A nacionalidade do homem não foi revelada. “Ele foi detido para facilitar as investigações, uma vez que mantém uma relação com a segunda suspeita”, explicou o chefe da polícia do Estado de Selangor.

A mulher indonésia vai ficar, para já, detida durante sete dias, juntamente com outra suspeita, que tinha um documento de viagem do Vietname e foi apanhada quando tentava sair do país, no terminal das companhias aéreas de baixo custo do Aeroporto de Kuala Lumpur.

Ainda em relação à suspeita de nacionalidade indonésia, sabe-se apenas que estava sozinha quando foi detida. A diplomacia de Jacarta pediu já para ter acesso à mulher.

Apesar de o regime da Coreia do Norte ter, no passado, ordenado execuções fora do país, as fontes das agências internacionais têm dificuldade em encontrar uma razão que ligue Pyongyang à morte de Kim Jong-nam.

Até à hora de fecho desta edição, a Coreia do Norte não tinha feito qualquer referência pública à morte do primogénito do Querido Líder, sendo que a embaixada de Pyongyang na Malásia não tem estado a atender o telefone.

A Reuters cita uma fonte não identificada de Pequim, com relações tanto aos governos da Coreia do Norte como da China, que garantiu que Kim Jong-un não esteve envolvido no homicídio, até porque não havia motivo para tal. “Kim Jong-nam não tem nada que ver com a Coreia do Norte. Não há razão para a Coreia do Norte o mandar matar”, frisou a fonte da agência de notícias, que adiantou que Pyongyang também está a investigar o sucedido.

A morte do filho mais velho de Kim Jong-il passou igualmente ao lado da imprensa estatal da Coreia do Norte. Ontem, o exército sul-coreano anunciou que o país iria recorrer aos altifalantes instalados na fronteira com o Norte para informar a população acerca do que aconteceu. Os militares estavam apenas à espera da confirmação oficial, o que aconteceu ao princípio da noite: a Malásia anunciou que o homem que morreu na segunda-feira em Kuala Lumpur era Kim Jong-nam.

17 Fev 2017

Código Penal | Comissão da Assembleia Legislativa volta a reunir-se em Abril

Os deputados estão de acordo com a intenção do Governo, mas é preciso resolver agora assuntos que têm que ver com o equilíbrio das molduras penais e com o próprio sistema jurídico do território. Está concluído o principal trabalho sobre os novos crimes de natureza sexual

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] 3.a Comissão Permanente da Assembleia Legislativa (AL) terminou ontem a primeira fase da análise em sede de especialidade das alterações ao Código Penal que visam os crimes de natureza sexual. Os deputados concordam com a intenção legislativa do Governo, que se fez representar na reunião desta quinta-feira pela secretária Sónia Chan, mas há questões que merecem uma revisão técnica. Assim sendo, as assessorias da AL e do proponente vão agora trabalhar para que se chegue a um novo texto, que deverá estar pronto no final de Março.

Ontem, em discussão estiveram as molduras penais. Cheang Chi Keong, presidente da comissão, começou por explicar que a proposta de lei prevê a revisão do regime geral de agravações das penas. “A comissão concorda com a uniformização de determinadas molduras penais”, afirmou, dando como exemplo “a violação e o coito anal, que passam a ter equivalência” em termos de punição possível.

O deputado disse ainda que existem alguns crimes – dois deles surgem por via desta proposta de lei – em que estão “previstas circunstâncias agravantes”. O articulado, acrescentou, prevê um reforço das penas em relação aos crimes de violação, recurso à prostituição de menor e pornografia de menor.

“Se de um crime de violação resultar gravidez ou houver a transmissão de doenças, está prevista uma agravação de dois terços da pena”, exemplificou Cheang Chi Keong. “Se a vítima for um deficiente, também vai haver agravação. O mesmo acontece se os crimes forem praticados de forma simultânea ou sucessiva por duas ou mais pessoas.”

Em debate esteve também a natureza dos crimes – se são públicos ou semipúblicos – e as excepções que se abrem para reforçar a protecção dos lesados. Há vários crimes que dependem de queixa da vítima para que a justiça possa actuar. Ora, o Governo entende por bem, nos casos que envolvam menores de 16 anos, que haja actuação directa do Ministério Público (MP). Os deputados concordam.

“O MP pode intervir sem queixa da vítima ou dos encarregados de educação. A taxa etária vai ser alargada aos 16 anos. Os menores entre os 12 e os 16 anos devem merecer uma protecção redobrada”, defendeu o presidente da comissão.

Receio dos enganos

Tal como já tinha dado a entender na reunião anterior, Cheang Chi Keong explicou que os deputados encontram discrepâncias em relação a algumas penas previstas, quando se compara a gravidade dos delitos em questão. “Para o crime de estupro, a pena de prisão é até quatro anos. Mas, para o crime de pornografia de menor, prevê-se uma pena de prisão que vai até cinco anos”, apontou. “Alguns membros da comissão entendem que o estupro deve ser punido de forma mais grave do que a pornografia de menores.”

Os deputados são ainda do entendimento de que é preciso melhorar o modo como está redigido o artigo relativo ao crime de pornografia de menores. A comissão concorda com a definição que se encontrou para o delito, mas teme que possam existir injustiças no que diz respeito à “divulgação” de materiais pornográficos que envolvam menores. Basta que haja um problema com as novas tecnologias e que, por um azar, alguém divulgue conteúdos proibidos sem ter contribuído de forma intencional, alertou Cheang Chi Keong.

São tudo “questões que vão ser discutidas numa próxima fase”. “É preciso ainda analisar o impacto das alterações introduzidas por esta proposta de lei no direito penal em vigor”, rematou o presidente da comissão.

A segunda fase do trabalho de análise deverá então começar em Abril. A 3.a Comissão Permanente tem mais três diplomas para analisar, uma tarefa para concluir até Agosto, para que não tenham de ser apresentados de novo, na próxima legislatura. Entre os articulados nas mãos destes deputados está a alteração do regime jurídico de arrendamento, em sede de comissão desde 2012.

17 Fev 2017

Amamentação | Sónia Chan diz que salas não vão ser obrigatórias

A secretária para a Administração e Justiça não pondera a possibilidade de criar normas para que todos os serviços públicos disponham de uma sala de amamentação. Sónia Chan alega que há edifícios com falta de espaço. Mas diz que o Governo faz o melhor que pode para apoiar os cidadãos

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] exemplo foi dado por Alexis Tam: porque o secretário para os Assuntos Sociais e Cultura entende que é necessário apoiar a política de amamentação através da criação de condições para as mães, decidiu dar instruções aos serviços debaixo da sua alçada. O resultado foi a criação de 80 salas de amamentação disponíveis para os trabalhadores dos serviços públicos da tutela e para os residentes.

Em declarações feitas esta semana, Tam disse ainda que seria desejável, “através da iniciativa da secretária para a Administração e Justiça”, implementar este tipo de estruturas “em todos os serviços e entidades públicas”. O repto ficou lançado.

Ontem, à margem de uma reunião na Assembleia Legislativa, Sónia Chan foi questionada acerca da ideia deixada pelo colega dos Assuntos Sociais e Cultura. A primeira resposta dada não foi elucidativa. “Tanto os funcionários públicos, como outros residentes têm necessidade desse serviço. Neste momento, existe já em vários serviços públicos este tipo de apoio”, disse.

Perante a insistência dos jornalistas, a governante explicou que é preciso alargar “os critérios aos serviços para, depois, cada um deles avançar com instalações”. Não existe um plano concreto sobre a matéria, até porque será uma questão facultativa. “Não estamos a pensar que seja uma medida obrigatória, mas esperamos que os serviços possam introduzi-la o mais cedo possível.”

Quanto aos edifícios da Administração que venham a ser construídos no futuro, “poder-se-á prever a existência desses espaços”, admite.

Sónia Chan também não tem, para já, uma resposta concreta em relação ao trabalho de sensibilização que deverá ser feito junto do sector privado. “Neste momento, vamos começar pelos serviços públicos. Quanto às empresas privadas, terá de ser mais tarde.”

Penosas esperas

O Governo também não dispõe de qualquer plano para criar legislação específica que garanta a prioridade do atendimento a grávidas, mulheres com crianças de colo, pessoas portadoras de deficiências e idosos com visíveis limitações físicas.

Em Portugal, desde o ano passado que este grupo de pessoas não fica nas filas à espera, por via de um decreto-lei que alargou o conceito de prioridade aos serviços privados, que estão sujeitos a multas caso não garantam a execução da legislação. Em Macau, não existem regras sequer para o atendimento prioritário nos balcões da Administração.

“O Executivo tem sempre vindo a fornecer serviços mais facilitados, apesar de não haver uma legislação específica”, começou por defender Sónia Chan, para conceder, depois, que “claro que o Governo pode fazer mais trabalho legislativo”.

Confrontada com a possibilidade de, numa primeira fase, se definirem meios para garantir o atendimento prioritário nos serviços públicos, a secretária para a Administração e Justiça admitiu a possibilidade de se poderem definir regras nesse sentido “a partir de certos guias”. “Neste momento não temos medidas obrigatórias, não temos a divulgação deste tipo de cultura”, sintetizou.

17 Fev 2017

A normalidade

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]a confusão dos dias, nas horas que se passam sempre da mesma maneira, é fácil esquecermo-nos de como esta terra é tão diferente de todas as outras. E de como esta terra se modificou. O nosso olhar está viciado, acostumámos os nossos sentidos ao que nos rodeia, deixámos de saber que as coisas podem ser diferentes. Que as coisas podem ter outros contornos, mais normais.

Foi assim que aconteceu. As ruas encheram-se de turistas e deixámos de passar por certas ruas, para evitar encontrões e pisadelas. Os pequenos restaurantes de sempre desapareceram e, hoje, mais não são do que notícias de jornais, guardadas no arquivo. Macau passou a ter o maior número de lojas de jóias por centímetro quadrado, o maior número de lojas de malas caras por rua. Como se vestíssemos carteiras e almoçássemos ouro e diamantes.

Deixámos de percorrer as ruas de antes e a cidade ficou mais pequena, ainda mais pequena. O que encontramos nas avenidas e becos e pátios não nos agrada, não nos sabe bem, pelo que a casa é a solução, é o sossego, desde que o vizinho não grite com a mulher ou bata com a porta ao final do dia.

Os números do PIB subiram, os números do PIB desceram, Macau é uma terra de imensa riqueza contada a patacas, mas de uma incrível pobreza no trato. Os velhinhos sorridentes dos mercados estão a desaparecer, escondidos pelas cabeças dos turistas que se fotografam, sorridentes, junto às coisas antigas do sítio onde podem ganhar milhões, para voltarem ricos a casa.

No meio de tudo isto, nós – e sobretudo o Governo – não demos conta de que o mundo evoluiu. É uma evolução já antiga, com provas dadas no resto do planeta que diz ser do primeiro mundo, por ter dinheiro para entrar nessa categoria. Macau parou num certo tempo, não sei bem qual porque não nasci nele, e justifica a pausa com questões de natureza cultural, desculpa aparentemente perfeita para que não se questionem as razões da paragem, do congelamento numa época que já não se usa. Arrepio-me de cada vez que um governante chama a cultura local à colação para justificar a inactividade, a incapacidade de mudança, a preguiça em não ajudar à evolução de que todos nós precisamos.

Há uns anos, fui insultada por várias pessoas por sugerir a uma mulher muito grávida que passasse à frente de uma longa fila para pagar a conta do telefone. Uns anos depois, um funcionário público que me atendeu, após uma hora de espera, sugeriu-me que, numa ocasião futura, deixasse o bebé que transportava comigo em casa ou, em alternativa, à porta do serviço público, junto ao segurança, qual animal de estimação.

Vivemos numa terra onde as salas de amamentação estão na ordem do dia. Vivemos numa terra onde os pais não têm direito a uns míseros dias por altura do nascimento dos filhos, onde as mães mal têm tempo para recuperar dos partos, onde a legislação não protege as mães trabalhadoras, onde o conceito de parentalidade ainda não entrou na ordem jurídica. É uma terra onde os patrões acham que ter filhos é uma questão pessoal e não entendem que é, essencialmente, uma questão de dimensão social.

Como vivemos numa terra onde as pessoas que aqui vivem pouco contam, nas mais pequenas coisas e nas grandes também, sugestões que venham de fora são encaradas com alguma estupefacção. Ontem, questionada sobre a criação de uma lei que garanta – pelo menos nos serviços públicos – a prioridade no atendimento a grávidas, mulheres com crianças de colo, portadores de deficiência e idosos com dificuldades de locomoção, a secretária para a Administração e Justiça não afastou totalmente a ideia, mas explicou aos ocidentais jornalistas que por aqui não há essa cultura. É mais ou menos o mesmo que dizer que, não havendo essa cultura, não há grande necessidade.

Acontece que as pessoas viajam, lêem, evoluem, amadurecem, envelhecem, sentem necessidades que, no atropelo dos dias, se tornam mais chatas, mais difíceis de gerir. A amamentação é um bom exemplo de que a sociedade muda mais depressa do que os nossos governantes, fracos no exercício da previsão política, são capazes de imaginar.

Mas depois fica tudo bem. Voltamos ao quotidiano certinho, ao casa-trabalho, trabalho-casa, evitamos as ruas de maior confusão e esquecemo-nos do quão longe anda a normalidade.

17 Fev 2017

João Miguel Barros: “Olhamos muito, mas vemos muito pouco”

Por achar que já tem idade para mostrar a fotografia que faz, João Miguel Barros decidiu avançar para um livro e uma exposição. “Entre o Olhar e a Alucinação” está na Creative Macau a partir do próximo dia 23. É uma experiência sobre um caminho que o advogado quer fazer: ir deixando os processos para trás e apostar na curadoria, trabalhar em fotografia, pensar na estética da representação

[dropcap]C[/dropcap]omo é que começa a fotografia?
Já começou há muitos anos. Talvez nunca tenha tido a coragem de começar pôr as fotografias cá fora. Neste momento, é uma especialização de uma preocupação cultural que já vem do meu tempo da faculdade quando, na altura, com a minha mulher, fizemos a revista SEMA. O gosto pela cultura é presente, tem-me acompanhado ao longo da vida, embora tenha sido muitas vezes distraído pelas questões do Direito, ou mais pelas obrigações profissionais do que pelo gosto do Direito. Nos últimos anos, em especial depois de ter saído do Ministério da Justiça, resolvi assumir que a cultura era – e é – uma área do sentir e do conhecimento demasiado vasta. Portanto, dentro da cultura em geral, identifiquei a área de que mais gosto: a fotografia. Sempre fiz fotografia. Antes da fotografia digital, lembro-me de uma viagem à Índia em que praticamente fiz turismo através da lente das máquinas fotográficas. Chegava ao final do dia completamente estoirado de carregar máquinas e lentes, coisa que neste momento já não faço, porque aperfeiçoei a lógica de funcionamento. Tenho uma câmara mais pequena, com uma lente de 35 mm fixa, e sou muito menos intrusivo na recolha das fotografias. É um gosto antigo, uma prática que tem sido mais ou menos descontinuada ao longo do tempo, mas tem sido uma constante e uma preocupação. Acho que já tenho idade suficiente para poder começar a pensar em pôr cá fora estas fotografias. Mas tem também uma outra componente: tenho o desejo de, um dia destes, começar a afastar-me mais da advocacia, e criar uma pequena galeria e uma pequena editora só para a fotografia a preto e branco. E pensei que um bom exercício seria fazer a experiência de como é que tudo isto funciona a partir de mim próprio.

Daí a exposição e o livro.
Peguei numa pequena verba que pus de lado e disse assim: em vez de ir apostar em alguém, vou apostar em mim. E acompanhei todo este processo, na produção, na escolha dos suportes e do material para a exposição, fiz uma série de ensaios de impressão das fotografias em suportes diferentes, emoldurei de formas diferentes, para tentar perceber qual era o melhor caminho a seguir. Todo o processo de produção do livro foi mais ou menos equivalente. O livro acaba por ser também um desafio, porque fazer livros com uma dimensão como esta, de 30 cm por 23 cm, é um risco, apesar de tudo, porque as fotografias aguentam ou não. Mas o tipo de fotografia que faço aguenta mais facilmente num livro com esta dimensão do que se fossem fotografias que andam à procura de uma perfeição técnica que eu não acho ideal. Portanto, tudo isto acabou por ser um exercício de como fazer, à custa de mim próprio.

“Entre o Olhar e a Alucinação”. Que conjunto de fotografias é este? São imagens que não andam à procura da perfeição. Como é que se chegou aqui?
Chegou-se de uma forma um bocadinho acidental, mas foi a partir de uma reflexão do que é e do que pode ser a fotografia. É uma conversa que é preciso desenvolver e aprofundar. A minha preocupação com a fotografia não é apenas tirá-las, trabalhá-las e eventualmente poder ou não expor, e poder ou não publicar. Neste momento, queria desenvolver uma outra vertente, à qual dou muita importância, que é fazer a curadoria de projectos e isso implica pensar na fotografia como arte e pensar nos projectos como um conceito. Neste momento tenho um projecto aprovado, para um ciclo de fotografia contemporânea chinesa, que vai realizar-se em Portugal com três dos mais importantes fotógrafos chineses da actualidade, pessoas cujo trabalho admiro muito. Tenho já a confirmação de que o Instituto Cultural de Macau também vai apoiar este ciclo de três exposições individuais, que virão ao território depois, em 2018 e 2019.

E quem são estes fotógrafos?
A primeira exposição é de Lu Nan, um fotógrafo por cujo trabalho tenho uma admiração imensa. Demorou-me quase um ano a chegar até ele. Vai ser inaugurada em Lisboa em Julho deste ano. Depois, em Outubro, vai haver uma outra exposição que é de Rong Rong, um homem muito conhecido na fotografia contemporânea chinesa, também produtor e divulgador cultural, tem um centro de arte contemporânea em Pequim. O terceiro é um fotógrafo menos conhecido que tem um projecto sobre o Tibete que demorou quase dez anos a conseguir. Yang Yankang tem fotografias lindíssimas sobre o lado mais filosófico e espiritual do Tibete. São três caminhos na fotografia contemporânea chinesa que quis explorar, sendo certo que havia uma quantidade de outras pessoas. E, voltando ao princípio, este livro nasce também de uma preocupação de tentar perceber qual é o caminho que quero explorar relativamente à fotografia.

Podemos dizer que este livro é um ensaio?
De algum modo, é uma experiência e que parte de um princípio que está contido naquela frase de Barthes, que é o mote da exposição, quando basicamente diz que as fotografias não precisam de ser chocantes, o que precisam é de fazer as pessoas pensar. Isto leva a que nós pensemos também como é que encaramos a fotografia como uma estética de representação. Se é uma estética de representação, significa que podemos olhar para uma fotografia de per si ou temos de seguir a corrente tradicional ou politicamente correcta dos trabalhos das pessoas mais conhecidas, que assentam na ideia do storytelling, de contar uma história? Está muito instalada a ideia de que as fotografias contam histórias e que os projectos fotográficos são verdadeiramente importantes, ou mais importantes, quando são capazes de contar histórias.

Como se a fotografia enquanto forma de arte tivesse de ter alguma coisa de fotojornalismo, no sentido da construção de uma narrativa.
Pode confundir-se dentro dessa via, sendo certo que o fotojornalismo tem uma representação da realidade que não permite a deformação dessa mesma realidade. O storytelling pode ser já uma alucinação da realidade e é legítima como forma de contar uma história. Com esta experiência, o que quis tentar foi perceber se é possível ou não juntar várias fotografias que nada têm que ver umas com as outras, apesar de, neste conjunto, haver vários subconjuntos que estão relacionados. O próprio título faz parte de um tríptico que vai estar apresentado na exposição. Há mais dois conjuntos, a que chamei “Night Vision I” e “Night Vision II”, que também são mini-séries de uma pequena história quase sem história. Mas o importante era testar a ideia se é, ou não válido, juntar fotografias que, de per si, possam ser uma história, mas uma história que não induza quem a vê num determinado percurso de interpretação. É engraçado olharmos para as fotografias e pensarmos que elas foram congeladas no tempo. Quando olhamos a realidade a passar dinâmica à nossa frente, certos momentos que são congelados têm um significado diferente do que teriam inseridos nessa sequência normal da visão.

Mas há sempre a possibilidade de se inventar uma narrativa…
Este livro tem uma intenção e tem muitas narrativas. Não é por acaso que as fotografias estão todas sequenciadas e que vão todas ao corte, sem nenhuma paginação especial que as tente influenciar. Não é por acaso que foram alinhadas desta maneira, e isso dá-lhes uma narrativa. Dou dois exemplos: há um contraste entre pessoas, situações e lugares; pelo meio coloco várias fotografias de escadas, que são simbolicamente a ideia de que nós, na vida, gostamos ou deixamos de gostar, vamos por um lado ou podemos ir por outro. O desafio que se coloca a quem vê o livro é saber se gosta deste caminho ou se não gosta, a escada está lá para subir e para descer. O livro acaba, também intencionalmente, com uma fotografia, sem nenhuma outra na página ao lado, de um rosto muito marcante de um homem velho, mas que tem um sinal de esperança, que é o facto de estar a rir. Este livro tem uma intenção – o modo como foi pensado – e pode ter muitas narrativas.

Quem for ver a exposição ou pegar no livro encontra várias imagens captadas no contexto em que vivemos. Para a escolha destas fotografias pesou o factor cidade ou isso não entrou no critério de escolha?
Não entrou. O meu critério de escolha foi o gosto pessoal, de adesão ou não a uma determinada fotografia, a um determinado contexto, ao modo como a fotografia é enquadrada na página ou na moldura.

Mas há uma relação com a cidade que acaba por transportar, até porque vive cá há muitos anos.
É inevitável. Dou comigo a pensar se o facto de vivermos aqui há tantos anos – de lidarmos tanto com estas pessoas, com estas situações, as cozinhas mal-arranjadas, os ambientes às vezes muito hostis – também não faz com que não tenha já capacidade de olhar. E isto é uma coisa que me preocupa. Por isso é, quando olho para Macau como lugar para fazer fotografia ou para registar momentos, tenho sempre um certo medo de não ser capaz de olhar da forma correcta, porque já nada me surpreende. E quando tiramos uma fotografia, do mesmo modo como queremos que essa fotografia surpreenda – como diz Barthes, que faça pensar –, também temos de ser capazes de nos podermos surpreender com aquele momento que estamos a registar. Confesso que, por uma certa saturação em relação à cidade, por já estar a viver em Macau desde 1987, sou capaz de já não ter bem essa capacidade.

Mas a lente, ainda assim, ajuda ao enquadramento, ao exercício do foco sobre algo que a olho nu nos pode escapar.
É a tal ideia de que uma fotografia congelada no tempo pode ter uma leitura que é completamente diferente dessa fotografia inserida num movimento real em que as coisas acontecem. As máquinas fotográficas são formas de seleccionar a realidade, já por si, e eu em cima disso ainda agravo a situação, porque é raro o caso em que não faço um crop da fotografia. Gosto de fazer crops das fotografias – tenho amigos que dizem que isto é desvirtuar a realidade. Mas a máquina já desvirtua a realidade, porque vai só buscar um bocadinho. Os lugares são relativamente importantes no contexto deste projecto, sendo certo que, muitas vezes, uma pessoa sente-se mais motivada para dirigir a máquina para sítios que são uma surpresa do que propriamente para locais que vemos todos os dias e que já não temos capacidade de ver. Realmente, há uma grande diferença entre olhar e ver, e este é o problema dos nossos dias, é o problema da nossa civilização: olhamos muito, mas vemos muito pouco. A fotografia, congelando momentos que, para nós, são significativos, é uma forma de ajudar a ver determinado tipo de realidades. Olhamos para algumas fotografias, como as que estão aqui [no livro], de pessoas. E é legítimo perguntar o que é que esta pessoa estava a fazer antes e o que estava a fazer a seguir? Esta pessoa está neste contexto, que não se percebe muito bem, porque a fotografia está muito cropada, não tem propriamente todo o seu ambiente à volta, mas qual era o contexto em que se estava a mover quando foi fotografada? Há outras questões mais teóricas que têm que ver com fotografia.

A questão da estética da representação.
É o que procuro, e também tentar perceber como é que consigo apurá-la, sendo certo que há muitas estéticas de muitas representações. Uma coisa sei que não quero, que é a técnica da representação, que é uma coisa completamente diferente: aquela fotografia muito bonita, tecnicamente supercompetente. Há um fotógrafo que tem um trabalho admirável, num campo completamente diferente, o Erwin Olaf, que teve uma exposição aqui na Casa Garden. É um fotógrafo fabuloso, que vem da fotografia de moda. Todas as fotografias que faz são encenadas, são pensadas ao milímetro. Um dia, contou-me que há fotografias, que eu pensava que o ambiente natural era um hotel onde punha os seus figurantes, em que os cenários são todos construídos por ele. Essas fotografias têm obviamente uma história para ele, mas são fotografias tecnicamente representadas, há uma representação técnica da realidade, evidentemente com muita criatividade. Não procuro nada disso, porque acho que os critérios de avaliação das fotografias nos tempos que correm já não passam pelo lado técnico, porque a fotografia deixa de ser um meio para passar a ser um fim. Quando a fotografia deixa de ser tecnicamente um meio para mostrar qualquer coisa – que passa a ser acessória, porque o meio é que é importante –, neste caso já temos a possibilidade de olhar para a fotografia e achar que os meios passem a ser acessórios.

Onde fica a advocacia, no meio disto tudo?
Como não sou rico, tenho de trabalhar, tenho de fazer advocacia. Mas já tenho 58 anos e acho que já tenho o direito de começar a fazer menos advocacia e a fazer mais aquilo que me realiza pessoalmente. Já estou na advocacia há muitos anos, já passei por processos complicados e já tenho a minha dose que chegue de descrença relativamente ao sistema. E em Macau é fácil ter-se descrenças em relação ao sistema. Entretanto, tenho tido oportunidades na vida, como foi a última experiência que tive em Portugal no Ministério da Justiça, de ser parte activa em projectos de reforma significativos, como foi a questão da reforma do sistema judiciário. Mas também isso me deixa, apesar de tudo, um certo amargo de boca. Não sei como explicar. Sou muito devotado ao serviço público no sentido de me dar a ele, passe o auto-elogio, com alguma generosidade. Isso tem-me prejudicado. Aconteceu no princípio dos anos 2000, quando fui para a Ordem dos Advogados, e depois quando fui para o Ministério da Justiça, quando estourei completamente a possibilidade de fazer advocacia em Portugal porque me dediquei a um serviço público. Mas realmente, o sistema judiciário, tal e qual como está montado, é muito conflituante de interesses e, às tantas, é uma máquina trituradora muito complicada. Quando verdadeiramente me consigo libertar, e fugir um bocadinho, é ao ir por este caminho da fotografia, porque também se não o tivesse era capaz de morrer mais cedo e muito mais frustrado. Acho que tenho de dar continuidade a este projecto, tentando avançar para outro livro, dentro da mesma linha, possivelmente. E avançar também nos trabalhos de curadoria, porque há necessidade de darmos a conhecer muito trabalho que está a ser feito por aí. Na Ásia – na China e no Japão, que é uma fotografia que me tem influenciado muito –, temos gente a fazer fotografias de uma forma absolutamente deslumbrante e magnífica.


O desconcerto

[dropcap]H[/dropcap]á um chão, um chão de relva, e há um corpo estendido, aconchegado, num agasalho que inclui um capuz. Está ali um olhar que fixa a lente e que não se percebe o que diz. É um olhar enigmático, entre a surpresa, a solidão, o sono, o abandono. Ou talvez apenas a preguiça, o embalo, a fruição de qualquer coisa que aquela lente não nos quis mostrar. Não sei de quem são estes olhos, onde estavam eles deitados, se quiseram ali estar ou se ficaram assim por falta de opção. A imagem não me diz nada mais sobre este olhar. Viro a página e o resto da história não está lá, porque não é para estar.

Este livro é feito de imagens soltas que se entrelaçam, se se tiverem de relacionar. Às tantas, não é preciso andarmos constantemente à procura de uma história, nós que vivemos com pressa para chegar ao fim de qualquer coisa. Às tantas, é este o princípio esquecido da fotografia: o que há para ver é o que está naquele rectângulo, o que parou no tempo daquele modo, naquele momento, e o resto nada interessa. Às tantas, é só assim, tão simples e, sim, tão complicado, porque aquele olhar fixou-me também.

Viro a página e há outra história qualquer. E mais outra. E há umas escadas. E outras, tantas escadas para subir e descer, uma vertigem de imagens que são densas, escuras, neste livro há muita noite, pouco dia, talvez não pudesse ser de outra maneira. Chego ao fim e há um sorriso, um sorriso velho e desdentado, um sorriso sincero e malandro, como que a ler o que me vai na alma. O desconcerto. Este livro é um desconcerto. Não podia ser de outra maneira.

O livro é de João Miguel Barros, advogado, homem há muito ligado às artes, às letras, às publicações. O nome escreve-se nos jornais sobretudo por causa de outras causas, de outras palavras, do mundo mais encenado que cabe nos códigos e nas leis, nos órgãos de investigação criminal e nos tribunais, nas críticas e no cansaço, nos culpados e nos inocentes. Desta vez, o nome escreve-se nos jornais porque não há história, são muitas histórias, e não há palavras, só imagens.

Construímos mundos e é neles que nos movimentamos, num entediante exercício ao qual demos o nome de quotidiano. Andamos sempre à procura de uma história, nós que vivemos com pressa para chegar ao fim do texto, ao fim do livro, ao fim da rua. “Entre o Olhar e a Alucinação” é um convite a uma paragem, é uma descida vertiginosa ou uma escalada penosa, é um desafio para uma certa solidão. É um desconcerto, daqueles que fazem bem no meio do ruído dos dias. E depois são os olhos que se fixam, porque aquele olhar fixou-me também.

16 Fev 2017

Óbito | Kim Jong-nam, irmão do líder norte-coreano, assassinado na Malásia

Era esperado ontem em Macau para um jantar com amigos. Kim Jong-nam, o filho mais velho do Querido Líder, morreu a caminho do hospital, depois de ter sido encontrado inconsciente no Aeroporto de Kuala Lumpur. Por cá, quem o conhecia ficou em choque

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]hegou a viver em Coloane, com os dois filhos e a mulher, numa altura em que dividia o tempo entre Pequim e Macau. Nos últimos anos, já não passava temporadas tão longas no território como nos primeiros anos, mas por cá tinha ainda familiares e mantinha uma casa. Também tinha amigos, pelo que vinha, de quando em vez, até à cidade que o acolheu depois de ter deixado a Coreia do Norte. Era esperado para jantar por alguns amigos de Macau, que receberam a notícia da morte “em estado de choque”, segundo apurou o HM.

Kim Jong-nam, meio-irmão do líder norte-coreano Kim Jong-un, morreu na Malásia na passada segunda-feira. A notícia só foi tornada pública ontem ao princípio da noite, através da Yonhap, a agência de notícias oficial da Coreia do Sul, que citava fonte do Governo de Seul.

A TV Chosun, uma televisão por cabo sul-coreana, avançou o motivo da morte do filho primogénito de Kim Jong-il: Kim Jong-nam foi envenenado no aeroporto de Kuala Lumpur por duas mulheres que, acredita-se, são operacionais da Coreia do Norte. As suspeitas encontram-se em paradeiro desconhecido, depois de terem apanhado um táxi. A televisão citava também fontes governamentais da Coreia do Sul.

Na Malásia, o comandante da polícia responsável pelo Aeroporto Internacional de Kuala Lumpur, Abdul Aziz Ali, explicou à Agência France-Presse que um homem coreano na casa dos 40 foi encontrado doente no aeroporto, na segunda-feira. Foi transportado para o hospital, tendo morrido no caminho.

“Não temos quaisquer outros detalhes acerca deste homem coreano. Não sabemos a sua identidade”, disse Abdul Aziz Ali, não obstante o facto de o indivíduo em causa se encontrar num aeroporto, o que pressupõe estar na posse de documentos de viagem.

Ao Channel NewsAsia, a polícia avançou que foi pedida uma autópsia. Uma fonte das autoridades policiais acrescentou ao canal que o incidente aconteceu no HKIA2, o novo aeroporto da capital malaia.

Uma fonte do Governo de Kuala Lumpur garantiu que a polícia está a levar a cabo investigações para “encontrar impressões digitais”.

“Amigo do seu amigo”

Kim Jong-nam, o filho mais velho do Querido Líder, nasceu em Maio de 1972, fruto da relação que Kim Jong-il manteve com a actriz Sung Hae-rim, natural da Coreia do Sul. O homem que comandou os destinos da Coreia do Norte entre 1994 e 2011 nunca chegou a casar com a mãe do seu primogénito, que acabaria por morrer em Moscovo.

Em tempos considerado o herdeiro de Kim Jong-il, caiu em desgraça aos olhos do pai em 2001, depois de ter tentado entrar no Japão com um passaporte falso. Pretendia visitar a Disneylândia. Desde então, viveu no exílio, sendo que as agências de notícias internacionais indicam que passou grande parte do tempo em Macau.

Após a morte de Kim Jong-il, em Dezembro de 2001, foi o filho mais novo – Kim Jong-un – que assumiu o poder em Pyongyang. O irmão mais velho, conhecido por não concordar com o modo como era gerido o regime mais isolado do mundo, não escondia, nas entrevistas que foi dando, que se opunha à transmissão dinástica do poder.

A confirmar-se o homicídio, Kim Jong-nam terá sido a figura de maior relevo da Coreia do Norte a ser assassinada a mando do actual líder, depois de o jovem Kim Jong-un ter ordenado a execução do tio, o outrora influente Jang Song Thaek, em Dezembro de 2013. Kim Jong-nam e Jang Song Thaek, que era dado como mentor do actual líder, mantiveram, em tempos, uma relação de proximidade.

Houve alturas em que Kim Jong-nam era avistado em Macau. Apesar de procurar ter uma presença discreta, tinha alguma vida social. Ao HM, foi descrito como sendo “um bom vivant, amigo do seu amigo, que deixa saudades”. Era apreciador de vinho português e francês. Os filhos, Kim Han-sol e Kim Sol-hei, chegaram a fazer parte dos escuteiros lusófonos de Macau.

A família deixou de ser vista em público depois de vários artigos publicados, sobretudo pela imprensa japonesa, numa altura em que o caso Delta Asia dava muito que falar, por causa das sanções aplicadas ao banco pelos Estados Unidos devido a fundos norte-coreanos. Supõe-se que Kim Jong-nam terá tentado preservar a privacidade dos filhos e da mulher. Quem o conheceu dizia que o filho mais velho de Kim Jong-il só queria viver em paz.

As outras vezes

A notícia da morte deixou em choque os amigos de Macau, mas não é totalmente surpreendente, atendendo às características obscuras do país de onde vem e a outras tentativas que terão sido feitas no passado.

Em Outubro de 2012, o Ministério Público sul-coreano revelou ter detido um norte-coreano acusado de espionagem, que admitiu estar envolvido num esquema que tinha como objectivo a morte de Kim Jong-nam. O homicídio estava a ser planeado na China – o alvo seria apanhado num acidente rodoviário.

Já em 2009, a estação de televisão sul-coreana KBS avançava que as autoridades do Continente tinham abortado um plano para abater o primogénito de Kim Jong-il, na altura ainda no poder, mas já bastante doente. A estratégia estaria a ser elaborada por aliados de Kim Jong-un. A estação de televisão dizia que o plano consistia em assassinar pessoas próximas de Kim Jong-nam, sendo que o principal alvo seria morto em Macau.

A partir do momento em que deixou a Coreia do Norte, o paradeiro do filho mais velho do Querido Líder foi sempre objecto de especulação por parte da imprensa asiática.

Em 2014, foi dado como estando em Jacarta. Terá sido então visto num restaurante italiano acompanhado por um empresário japonês. Dizia-se então que dividia o tempo entre a Indonésia, a Malásia e França.

Em 2012, um jornal de Moscovo contava que Kim Jong-nam estava a enfrentar problemas financeiros depois de ter deixado de receber verbas da Rússia, em retaliação às críticas que fez sobre a política de sucessão da Coreia do Norte.

No ano passado, a Coreia do Sul lançou um aviso sobre possíveis tentativas de homicídio no país levadas a cabo por agentes norte-coreanos. O alerta tinha Kom Jong-nam como principal destinatário.


O defensor da reforma

Deu poucas entrevistas na vida, mas as que concedeu serviram para ilustrar como via a política do país onde nasceu. Em 2009, numa conversa com o jornal japonês Shimbun, Kim Jong-nam garantia não estar interessado em suceder a Kim Jong-il. O pai viria a morrer dois anos depois, mas discutia-se a questão da sucessão, sendo que já era apontado Kim Jong-un, o que acabou por acontecer.

Na altura, o primogénito do Querido Líder defendia que tinha chegado a hora da “abertura e reforma” na Coreia do Norte. E afirmava que a passagem da chefia do Estado norte-coreano através de uma lógica de sucessão hereditária não era o desejo do pai. A decisão de passar o poder para o irmão mais novo tinha sido tomada apenas “para garantir a estabilidade nacional”.

“Acredito que a decisão tenha sido tomada para estabilizar a nação. A instabilidade na Coreia do Norte significaria instabilidade para toda a região envolvente”, afirmou.

Na mesma entrevista, Kim Jong-nam deixava um apelo ao meio-irmão, para que melhorasse a vida da população norte-coreana, pedido que terá caído em saco roto, tanto quanto é possível perceber pelas notícias que chegam de Pyongyang.

Uns anos mais tarde, em 2012, num texto publicado pelo Guardian, o homem que agora morreu na Malásia dizia acreditar que o regime de Pyongyang tinha os dias contados – com ou sem reformas. O diário tinha como ponto de partida um livro escrito por um jornalista do Shimbun, a partir de conversas do autor com Kim Jong-nam.

Na obra, o filho mais velho de Kim Jong-il descrevia a sucessão dinástica como “uma piada para o mundo cá fora” e reiterava a ideia de que esse não era o desejo do seu pai.

15 Fev 2017

Código Penal | AL analisa dois novos crimes relativos a menores

O Governo vai ter de mexer nalgumas penas previstas para os crimes sexuais que pretende aditar ao Código Penal. É que há molduras que não batem certo com a legislação já em vigor. Ontem, a Assembleia esteve a analisar dois novos delitos, ambos sobre menores

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s deputados da 3.a Comissão da Assembleia Legislativa (AL) estão “preocupados” com o desfasamento que existe entre as penas previstas, neste momento, pelo Código Penal para crimes de natureza sexual e aquelas que constam da proposta de lei que vem aditar novos delitos à codificação. O assunto vai ser o tema dominante de uma reunião agendada para a próxima quinta-feira, de acordo com as explicações deixadas por Cheang Chi Keong, presidente da comissão.

“No artigo 166.o [abuso sexual de crianças] do Código Penal, a pena máxima prevista é menos grave do que no crime de pornografia de menor [sugerida na proposta de lei]”, exemplificou Cheang Chi Keong. “Vamos trocar ideias de modo a saber se as molduras penais vão ser definidas de uma forma equilibrada, para que haja compatibilidade entre os crimes.”

Ontem, o grupo de deputados esteve a analisar dois novos crimes que dizem ambos respeito a menores: o recurso à prostituição de menor e o crime de pornografia de menor. O Código Penal prevê já a criminalização destes dois actos, mas apenas em situações em que a vítima tem menos de 14 anos. Com o articulado, o Governo pretende estender a protecção até aos 18 anos.

“Uma pessoa que recorra ao serviço sexual prestado por um menor entre 14 e 18 anos vai ter de assumir responsabilidade criminal”, salientou Cheang Chi Keong. “Não está em causa uma ameaça, mas sim uma transacção sexual. Neste momento, os clientes não precisam de assumir qualquer responsabilidade criminal.” O crime tem natureza pública, não sendo preciso queixa da vítima para que o Ministério Público possa intervir.

Na reunião de ontem, discutiu-se sobretudo a intenção legislativa. “O objectivo é reforçar a tutela penal para com os menores”, vincou o deputado. “A prostituição infantil existe, de facto. De acordo com os estudos e as recomendações internacionais, a melhor forma para combater este fenómeno e o consumo deste tipo de serviços é a criminalização deste acto”, assinalou ainda.

Tal como Governo, a AL espera que a introdução deste novo crime “seja uma forma de eliminar a tendência da sua procura, contribuindo ao mesmo tempo para salvaguardar a saúde e o desenvolvimento das crianças”.

Que os há, há

O novo crime de pornografia de menor diz igualmente respeito a vítimas entre os 14 e os 18 anos. “Os menores que forem aliciados ou utilizados em espectáculos pornográficos ou em produtos pornográficos vão ter protecção reforçada”, explicou Cheang Chi Keong. “A pessoa que os alicia vai ser criminalizada. A moldura penal vai de um a cinco anos de prisão. A natureza do crime é igualmente pública.”

O deputado destacou ainda um aspecto “muito importante” do artigo em questão: “Este crime está já incluído na lei da criminalidade organizada. É uma forma de reflectir a determinação do Governo na criminalização desses actos e na protecção dos menores.”

Questionado sobre a existência de casos acerca das situações previstas nestes novos crimes, o deputado afirmou que o Governo não forneceu dados concretos, dando a entender, porém, que não há dúvidas sobre a existência deste tipo de delitos. “Na sociedade, temos acesso a este tipo de notícias, mas aqui não falámos de casos concretos”, resumiu.

14 Fev 2017

Lai Chi Vun | Zona dos estaleiros não vai ser comercial, garante IC

O Instituto Cultural ainda não tem um plano definitivo para as estruturas de Lai Chi Vun que vai recuperar, mas promete, desde já, que a zona não vai ser transformada numa “rua de lembranças”. Ung Vai Meng garante que os sectores interessados vão ser ouvidos

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] último parecer pedido pelas Obras Públicas ao Instituto Cultural (IC) acerca dos estaleiros de Lai Chi Vun já tem quatro anos. Mas, se for necessário mais conselhos e apoio técnico sobre o local, a entidade ainda presidida por Guilherme Ung Vai está disponível para dar a ajuda necessária.

A ideia foi deixada pelo presidente do IC num encontro com a imprensa, em que a área de estaleiros em Coloane foi o assunto principal. Há alguns dias, o HM deu conta do descontentamento da população do local em relação à demolição projectada de 11 estaleiros, num total de 18 estruturas. Os moradores não se opõem à destruição dos dois imóveis em piores condições, mas gostariam de ver os restantes edifícios preservados. Alguns deputados subscrevem esta posição. A Administração já reiterou, entretanto, a ideia de que os estaleiros são mesmo para ir abaixo.

Guilherme Ung Vai Meng não se pronunciou directamente sobre os edifícios que deverão desaparecer em breve, tendo apenas garantido que, nos últimos tempos, o IC não foi chamado a pronunciar-se sobre a matéria.

O presidente do Instituto Cultural – que deixa o cargo na próxima sexta-feira – fez, no entanto, um ponto da situação em relação aos imóveis que vão ser preservados pelo Governo. “Têm um certo valor histórico e patrimonial. Estamos basicamente de acordo com as Obras Públicas, não queremos transformar aquela zona numa rua de lembranças”, sublinhou. Neste momento, o IC está “à espera de mais perguntas das Obras Públicas”. “Vamos fazer o nosso trabalho muito bem”, prometeu, adiantando que, por enquanto, ainda não foi possível visitar os estaleiros porque as chaves ainda não foram entregues.

A Administração vai recuperar um estaleiro e duas casas da povoação de Lai Chi Vun. Já existe um plano geral para os trabalhos, que começa com o reforço das estruturas, em estado de degradação. Quando os edifícios reunirem condições de segurança, o IC pretende chamar ao local os sectores envolvidos no assunto, para ouvir opiniões sobre o aproveitamento futuro dos espaços. Mas Guilherme Ung Vai Meng adianta que o objectivo é fazer uma reconstrução que aproxime os estaleiros do seu aspecto original.

Biblioteca quanto antes

No último encontro com os jornalistas antes de deixar o cargo, o presidente do IC deixou ainda uma mensagem: a equipa do instituto “está pronta” para avançar com a nova biblioteca central.

Quando Guilherme Ung Vai Meng assumiu a liderança da entidade, em 2010, o projecto da biblioteca estava em águas de bacalhau, depois de terem sido anulados os resultados de um atribulado concurso de ideias para a reconversão do edifício do antigo Tribunal Judicial de Base. Com a chegada de Ung Vai Meng ao IC, abriram-se as portas do tribunal a exposições de arte e outros eventos de índole cultural, tendo o actual secretário para os Assuntos Sociais e Cultura recuperado a intenção da criação de uma nova biblioteca. A localização tem sido, no entanto, contestada. Na próxima quarta-feira há um debate na Assembleia Legislativa sobre a matéria, impulsionado pela deputada Song Pek Kei.

O presidente do IC explicou que, no ano passado, foram recebidas muitas sugestões sobre a biblioteca central. “São opiniões basicamente positivas. Esperamos que as obras sejam iniciadas o mais brevemente possível”, concluiu.

13 Fev 2017

Os desterrados

[dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]ouve um tempo, há suficiente tempo para ser um passado distante, que a Taipa ficava lá longe. As famílias iam de barco até ao outro lado do rio, em passeios de fim-de-semana que se assemelhavam a excursões ao campo, o verde campo. A Taipa era ali um mundo à parte, uma aldeola. Macau era o centro deste mundo.

Quem se portava mal, muito mal, ia para o desterro. O desterro era Coloane, essa ilha onde ainda era mais difícil chegar. Não havia istmo, nem casinos, nem Cotai, nem strip, e Las Vegas também não. Coloane era o destino dos leprosos que ninguém queria ver e dos larápios, dos funcionários públicos que se queria despromover por se terem portado menos bem. Coloane era quase o fim deste mundo.

As coisas entretanto mudaram. Os larápios e os malcomportados nem imaginam a sorte que tiveram por puderem viver junto do verde, perto do mar. Apesar dos insectos e de outra bicheza, é certo. O metro quadrado é agora muito mais caro na quase ex-ilha, quase ex-verde. Há autocarros com turistas que entopem o trânsito da vila.

Também a Taipa sofreu alterações com a construção da ponte que tem o nome de um antigo governador. Modificou-se de tal maneira que já não se vai de barco, de aldeia não tem nada, fizeram-se mais duas travessias e pensa-se agora numa quarta. Há prédios como cogumelos, obras como polvos, cheias de tentáculos, e o metro quadrado é mais caro do que na península, sobretudo se for a olhar para ela.

As ilhas deixaram de ser o fim do mundo, apesar de Macau continuar a ser o centro, até porque é na península que está o poder. O território cresceu, as pessoas acomodaram-se no buraco disponível, sem terem especial consideração pela centralidade. Macau, o território, esticou e ganhou novas características demográficas. Parece, porém, que o passado distante das ilhas continua presente na cabeça de alguns.

Esta semana, as autoridades policiais decidiram desviar para a Taipa o trajecto de uma marcha lenta de veículos que estava programada para Macau. A ideia do protesto deste sábado era chegar perto da representação do poder – a sede do Governo e a casa da Assembleia Legislativa –, e não da piscina olímpica ou do estádio do território. Assim sendo, os organizadores da manifestação sobre rodas decidiram cancelar o evento.

É curiosa a proposta de percurso feita pela polícia. A um sábado, dia em que não se trabalha, há que entupir a Taipa e não Macau. Os menos bem-comportados que fiquem pelas ilhas que aqui, na cidade, não queremos disso. Nem sequer tem grande importância haver obras em literalmente todas as ruas da Taipa, o que não sucede no percurso proposto pela organização. O que interessa mesmo é libertar as ruas da península de gente que pode ser um perigo à imagem de Macau, cidade harmoniosa sempre muito preocupada com quem a visita. E um bocadinho a marimbar-se para quem vive nela.

Tiveram sorte os organizadores. Uma marcha lenta em Coloane e ninguém dava por ela – corria-se o sério risco de ser confundida com um casamento. O campus universitário na Ilha da Montanha também seria uma boa alternativa: sem vivalma naquelas avenidas e jardins, ninguém dava por ela e não se corria o sério risco de ser confundida com coisa alguma.

O Governo de Macau tem, em termos gerais, sérias dificuldades em lidar com a dissonância. Quer-se longe quem discorda. As manifestações são uma coisa muito desagradável, uma chatice, as pessoas andam aí pela rua a gritarem contra quem decide. O que é bom é o sossego. Por isso é que também se bate com a porta no nariz dos vizinhos de Hong Kong que têm outras ideias, não venham eles doutrinar o povo de cá, com panfletos e livros lá de outros sítios do mundo, muito distantes.

Não, a Taipa já não é o desterro, as notícias não chegam por telegrama com vários dias de atraso, o mundo mudou e o modo como se lida com a contestação também. Quanto mais se deixa engrossar o coro do protesto, pior. Há que abraçar a discordância. Em nome da harmonia e coisa e tal.

10 Fev 2017

Governo admite importação exclusiva de aves congeladas

A criação de um mecanismo centralizado de abate de galinhas e pombos não afasta a possibilidade de haver gripe aviária no território, frisou ontem Sónia Chan. A Administração pondera, no futuro, autorizar apenas a importação de aves congeladas. Mas a ideia não é para avançar já

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] secretária para a Administração e Justiça não descarta a hipótese de, a longo prazo, Macau só autorizar a importação de aves congeladas. “Como o Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais já referiu, mesmo o abate centralizado implica riscos”, indicou Sónia Chan acerca da hipótese que tem estado a ser discutida nos últimos tempos. O tema ganhou maior pertinência na sequência da detecção de dois casos de gripe das aves, em lotes oriundos da China Continental, por altura do ano novo chinês, que obrigou ao abate de milhares de galinhas e pombos.

“Sabemos que a tendência é para não haver abate de aves. A longo prazo temos de substituir por aves congeladas”, declarou ontem a governante, à margem de uma reunião na Assembleia Legislativa. Sónia Chan acrescentou que existem pessoas que sugerem o abate do outro lado da fronteira, de modo a que as aves cheguem ainda frescas ao território. Mas também esta sugestão encontra obstáculos, porque a concretização “não depende de Macau”.

Insistindo que “o abate centralizado não evita totalmente o risco de vírus”, a secretária sublinhou que não há ainda uma decisão final sobre a matéria. “A forma melhor é deixar de ter abate de aves. Mas há pessoas que levantam outras questões que têm de ser estudadas”, recordou. O fim da venda de aves vivas nos mercados locais teria implicações para quem trabalha nesta área.

No início desta semana, Sónia Chan tinha reiterado que o assunto “é uma prioridade na agenda do Governo”. A responsável recordou que já foi feita uma consulta pública sobre esta matéria, sendo “necessário considerar as questões relativas aos hábitos gastronómicos dos cidadãos, bem como a reestruturação do sector”.

Leis e pessoas

Em menos de um ano, Macau registou cinco casos de gripe das aves e, em Dezembro passado, foi confirmado o primeiro caso de infecção humana. Os resultados da consulta pública a que a secretária fez referência foram divulgados em Junho do ano passado, tendo indicado que quatro em cada dez residentes de Macau se opõem à substituição de aves vivas por refrigeradas.

O inquérito, destinado a avaliar a reacção do público à medida que o Governo pretende aplicar para prevenir surtos de gripe aviária, concluiu que 42,2 por cento dos 1026 inquiridos manifestam-se contra ou absolutamente contra a medida, 24,2 por cento exprimiram concordância ou absoluta concordância e 33,3 por cento afirmaram serem indiferentes ao assunto.

Também ontem, Sónia Chan foi questionada acerca de nova regulamentação para o sector dos táxis, na sequência de casos que têm vindo a público que envolvem a cobrança de tarifas excessivas a turistas. A governante não deixou novidades. “Este ano deverá haver reformas em curso. Esperamos poder avançar com mais brevidade com os diplomas que têm que ver com a vida da população.”

10 Fev 2017

Análise | Subsídios da Fundação Macau às universidades privadas

É um facto que salta à vista quando a Fundação Macau publica as listas de apoios concedidos: há uma universidade privada que recebe muito mais do que as outras. Sobre esta partilha de patacas, há pouco quem fale. Ng Kuok Cheong encontra um só critério para a bonança de alguns. Chama-se ‘guanxi’

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o ano passado, a Fundação Macau entregou ao organismo que gere a Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau (UCTM) mais de 509,6 milhões de patacas. Este montante, resultante da soma dos apoios trimestrais concedidos pela entidade liderada por Wu Zhiliang, diz apenas respeito aos subsídios para financiar os planos anuais de actividades e obras que estão a ser levadas a cabo pela instituição. De fora ficaram as ajudas para bolsas de estudo e outros projectos.

A principal fatia do bolo dado à Fundação da UCTM foi tornada pública esta semana: no último trimestre do ano, seguiram para a instituição do Cotai mais de 446 milhões de patacas. A maior parte do dinheiro destinava-se a custear as obras do Complexo Pedagógico (Bloco O) da universidade. A Fundação da UCTM tem também sob a sua alçada o Hospital da Universidade e a Escola Internacional de Macau.

Este visível apoio financeiro à Universidade de Ciência e Tecnologia está longe de ser uma novidade. “Já não é a primeira vez. A UCTM recebe subsídios da Fundação Macau com uma regularidade impressionante”, constata o jurista Pedro Coimbra. Chegou-se a um ponto em que a situação é encarada com normalidade.

“Não percebo, sinceramente, porque é que essa verba aparece”, comenta ainda o jurista, em relação ao montante atribuído à universidade privada na recta final do ano. “Conheço muito pouco do trabalho da UCTM. Como tal, não percebo qual é a justificação para serem atribuídas verbas desse tipo.”

Pedro Coimbra não é o único a ter dificuldades em perceber o funcionamento e os resultados da instituição de ensino universitário. Apesar de ter como grandes objectivos “promover a troca cultural, o crescimento intelectual, o desenvolvimento económico e o progresso social”, a UCTM não se distingue por ter uma forte ligação à comunidade local. Há alguns anos, esteve na ribalta pelas piores razões: o curso de Direito que ali era ministrado apresentava um currículo muito pouco compatível com as necessidades dos alunos que pretendiam exercer no território.

Do público para o privado

Entre universidades e institutos públicos e privados, há nove estabelecimentos de ensino superior na cidade. A Fundação Macau contribui para o financiamento dos planos anuais de três universidades privadas: além da UCTM, também a Universidade de São José (USJ) e a Universidade da Cidade de Macau (UCM) recebem apoios.

As diferenças são, porém, expressivas. No ano passado, a USJ, através da Fundação Católica de Ensino Superior Universitário, recebeu 38 milhões de patacas. Quanto à UCM, com ligações ao deputado Chan Meng Kam, teve direito a 47 milhões. Em ambos os casos, ao longo dos anos, o Governo tem ajudado na criação de condições de funcionamento destas instituições, nomeadamente através do apoio para instalações.

Num território em que a grande maioria dos estabelecimentos de ensino não superior está nas mãos dos privados – a RAEM jamais poderia garantir educação aos residentes com as poucas escolas públicas existentes –, a lógica de apoio foi alargada também ao ensino superior, não obstante o facto de haver uma universidade pública de grandes dimensões. Há quem tenha dificuldade em compreender a razão destes apoios, sendo que a questão se torna ainda mais complexa quando em causa está a Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau, pelos valores significativos que arrecada.

A UCTM é constituída por seis faculdades (Tecnologias da Informação, Direito, Medicina Chinesa, Gestão Hoteleira e Turismo, Humanidades e Artes, e Ciências Médicas) e por quatro escolas (Gestão, Farmácia, Formação Contínua, Estudos de Pós-Graduação), tendo ainda um Departamento de Educação Geral.

Ao todo, a UCTM oferece 16 licenciaturas, 24 mestrados e 11 doutoramentos, num total de 51 cursos. À semelhança da Universidade de São José e da Universidade da Cidade de Macau, tem ainda programas de formação contínua. Já a USJ dispõe, ao todo, de 36 cursos e a UCM, a mais modesta em termos de diversidade académica, disponibiliza 24 programas.

A Universidade de São José tem cinco faculdades (Estudos Religiosos, Humanidades, Administração e Governação, Psicologia e Educação, Indústrias Criativas) e um instituto, dedicado à Ciência e Ambiente.

Quanto à Universidade da Cidade de Macau, está estruturada em seis faculdades, a saber: Gestão e Turismo, Gestão, Humanidades e Ciências Sociais, Educação, Direito, Estudos e Gestão Urbanística.

Quanto às propinas, a USJ é mais cara do que a UCTM – a Cidade de Macau não disponibiliza online os valores a pagar. Na universidade sob a alçada da Fundação Católica de Ensino Superior Universitário, o valor anual por aluno de licenciatura anda entre as 43 mil e as 53 mil patacas. Os não residentes podem ter de pagar 73 mil.

Na Universidade de Ciência e Tecnologia, a tabela tem variações conforme os cursos em causa. A maioria das licenciaturas custa 32.800 patacas por ano. O curso de Medicina Tradicional Chinesa está entre os mais caros: as propinas dos primeiros quatro anos são no valor de 37.200 patacas e o último ano implica desembolsar 32.800. Quanto aos estudantes que não têm BIR, os cursos mais baratos andam pelas 71 mil patacas e o mais caro ultrapassa as 88 mil.

Ainda no universo da UCTM, o dinheiro da Fundação Macau segue também para a Escola Internacional de Macau. No ano passado, o erário público serviu para ajudar à expansão do estabelecimento de ensino. Também aqui as propinas chegam a valores consideráveis: uma criança que ande no jardim de infância paga 70 mil patacas por ano; os pais dos alunos do ensino secundário gastam 105 mil.

Sem fundamento

Os deputados Au Kam San e Ng Kuok Cheong estão entre as vozes mais críticas em relação ao modo como a Fundação Macau distribui o dinheiro. Há anos que detectam problemas no que toca aos principais beneficiados: o Hospital Kiang Wu e a Universidade de Ciência e Tecnologia.

“Os recursos da Fundação Macau são demasiado grandes”, considera Ng Kuok Cheong. “Devia existir um mecanismo de transferência para outros organismos, nomeadamente para o Fundo de Segurança Social.” A fundação recebe um montante correspondente a 1,6 por cento das receitas brutas das concessionárias de jogo.

Sobre os apoios à UCTM tornados públicos esta semana, Ng Kuok Cheong não se alonga, mas é incisivo: “A Fundação Macau distribui dinheiro sem uma razão concreta.” O deputado pró-democrata diz não saber a razão de tanta generosidade para com a universidade do Cotai, mas deixa uma hipótese. “Talvez tenham boas relações, incluindo com o Chefe do Executivo.”

O jurista Pedro Coimbra também não encontra uma explicação. “Não vejo que haja uma justificação que possa ser aceitável para o grande público para ser atribuída uma verba dessas à universidade.” A sensação que fica é, assim, de estranheza. “Há outras instituições de ensino superior de Macau que me parecem mais conhecidas e às quais não são atribuídas verbas minimamente semelhantes a essas.”

 

 

 

 

Números

446 milhões

Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau

38 milhões

Universidade de São José

47 milhões

Universidade da Cidade de Macau

(Apoios da Fundação Macau em 2016)

10 Fev 2017

Código Penal | Alterações deixam de fora importunação sexual sobre a forma verbal

O novo crime de importunação sexual, que o Governo quer acrescentar ao Código Penal, diz respeito apenas ao contacto físico. Os deputados concordam com a intenção legislativa. Ninguém pediu mais ao Executivo

 

Só comete crime de importunação sexual aquele que mantiver contacto físico com a vítima, contra a sua vontade. O esclarecimento foi deixado por Cheng Chi Keong, presidente da 3.a Comissão Permanente da Assembleia Legislativa, no final de mais uma reunião em que esteve a ser analisada a proposta de lei que visa modificar e aditar crimes de natureza sexual ao Código Penal.

Ontem, na terceira reunião desta semana, esteve em debate um tipo de crime que suscitou algumas preocupações aquando do seu anúncio, por se temer más interpretações e problemas na aplicação: a importunação sexual. Os deputados concordam com a intenção do proponente mas, ainda assim, pretendem obter uma redacção mais clara do artigo em questão.

Trata-se de um “crime que não existe no nosso sistema jurídico”, começou por contextualizar Cheang Chi Keong. “A introdução tem como objectivo responder às expectativas e aspirações da sociedade. Vai colmatar uma lacuna.”

Na reunião, que contou com a presença da secretária Sónia Chan, os representantes do Governo “salientaram que o propósito é reforçar a tutela jurídica para com as vítimas desses actos e punir devidamente os respectivos agentes, salvaguardando a ordem social”.

A discussão teve sobretudo que ver com a delimitação do âmbito de aplicação do novo crime. O deputado lembrou que houve pessoas que ficaram na dúvida “se um palavrão” poderá ser considerado crime. Tal não vai acontecer, esclareceu, porque a importunação sexual prevista na proposta implica contacto físico. “É um dos elementos fundamentais do artigo”, notou.

Questionado sobre se houve deputados a defenderem a inclusão da forma verbal de importunação sexual na legislação, Cheang Chi Kong afirmou que não houve qualquer deputado a deixar uma sugestão nesse sentido. “O princípio é o contacto físico, é essa a intenção legislativa”.

Em Portugal, onde o Código Penal foi revisto há menos de dois anos também com vista à alteração de crimes de natureza sexual, a “formulação de propostas de teor sexual” passou a caber no crime de importunação sexual. Na altura, a modificação gerou bastante polémica. O delito pode valer uma pena de prisão até um ano ou pena de multa até 120 dias.

O lápis ou a caneta

Os deputados da 3.a Comissão Permanente vão ficar agora à espera que as assessorias da AL e do Governo reúnam para tratar de questões técnicas. “Esperamos que a norma seja redigida da forma mais clara possível”, indicou o presidente.

Um dos aspectos que merece uma revisão tem que ver com o tipo de contacto em causa. “Por exemplo, se um agente, pegando num objecto, num lápis ou numa caneta, tocar noutra pessoa, é considerado ou não crime de importunação sexual? Ou terá de ser mesmo um contacto físico? Creio que é intenção legislativa do Governo que o contacto físico abranja igualmente objectos”, declarou Cheang Chi Keong. “Esta questão também foi abordada na discussão sobre o crime de violação porque, no caso de haver coito oral ou anal, podem ser utilizados objectos ou outras partes do corpo.”

O deputado explicou ainda que “o Governo propõe que o crime seja semipúblico, ou seja, se a vítima não apresentar queixa, não vai haver lugar a processo judicial”. Mas existe a vontade de proteger os menores de 16 anos pelo que, nessas circunstâncias, o Ministério Público pode dar origem ao processo mesmo sem a apresentação de uma queixa.

A comissão tem novas reuniões agendadas para a próxima semana e espera que seja possível terminar a primeira fase da análise à proposta de lei, que tem que ver com o conteúdo dos artigos. Cheang Chi Keong acredita que, lá para o mês que vem, os aspectos técnicos estejam também resolvidos. “As questões colocadas ao Governo não são de princípio”, rematou.

10 Fev 2017

Crimes sexuais | Assembleia continua análise à alteração ao Código Penal

Os deputados não têm uma posição sobre a matéria, pelo que o assunto vai ser discutido entre as assessorias da Assembleia Legislativa e do Governo. A definição do crime de violação deve seguir a lógica tradicional ou ser mais abrangente?

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] 3.a Comissão Permanente da Assembleia Legislativa esteve ontem reunida com representantes do Governo para debater o que deverá ser a definição do crime de coacção sexual, no âmbito da revisão que está a ser feita ao Código Penal. Os deputados concordam com o objectivo das alterações, mas manifestaram reservas sobre um dos pontos do artigo que versa sobre este tipo de crime.

De acordo com as explicações do presidente da comissão, Cheang Chi Keong, alguns membros do grupo de trabalho entendem que os actos punidos pelo crime qualificado de coacção sexual deveriam constar da definição do crime de violação.

“O Governo aditou o crime qualificado de coacção sexual, que visa punir quem constranger outra pessoa a sofrer introdução vaginal ou anal de partes do seu próprio corpo, do agente ou de terceiro, ou objectos, excluindo-se a introdução do pénis”, explicou o deputado, referindo que a lei actual não prevê este tipo de situações. Por seu turno, “de acordo com o conceito tradicional, o crime de violação implica penetração do pénis.”

A comissão quis saber porque é que não se podem considerar estes actos como violação. “O Governo esclareceu que, durante o processo de auscultação pública, recolheu opiniões diferentes: há quem defenda o conceito tradicional e outros não”, relatou o deputado.

Perante as questões levantadas, o Executivo demonstrou ter “uma posição de abertura, porque o essencial é punir esses actos e a moldura penal é a mesma” para os dois crimes (pena de prisão de três a 12 anos). Cheang Chi Keong acrescentou que a comissão “não insistiu numa solução”, pelo que esta matéria vai agora ser analisada pelas assessorias da Assembleia Legislativa e do Governo.

Quanto ao outro ponto do artigo ontem analisado, “a revisão tem por objectivo colmatar uma lacuna de punibilidade actualmente existente”, indicou o deputado. “A lei actual apenas abrange os casos em que a vítima seja constrangida a sofrer ou a praticar um acto sexual de relevo com um agente ou com um terceiro, e não os casos em que seja constrangida a praticar um acto sexual de relevo em si própria”, lembrou, dando como exemplo alguém obrigado a masturbar-se em público.

O perigo dos abusos

Aprovada na generalidade no passado dia 4 de Janeiro, a proposta de alteração ao Código Penal que visa reforçar a protecção às vítimas de crimes de natureza sexual está a ser analisada artigo a artigo. Para hoje está marcada uma nova reunião e Cheang Chi Kong avisou que o assunto é sensível: os deputados vão discutir o crime de importunação sexual.

“Depois da apresentação desta proposta de lei e aquando da discussão na generalidade, verificou-se uma certa preocupação em relação à sua aplicação”, afirmou. “Vamos ter uma reunião com o Governo especialmente para nos debruçarmos sobre esta matéria.”

9 Fev 2017

Autoridades garantem estar atentas ao terrorismo

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Gabinete do Secretário para a Segurança emitiu ontem um comunicado sobre a possibilidade de Macau ser palco de ataques terroristas, em “resposta às preocupações de alguns órgãos de comunicação social locais”.

Esta semana, o jornal de Hong Kong South China Morning Post (SCMP) publicou um texto em que defendia a tese de que o território poderia ser alvo de acções extremistas, por “combinar interesses chineses, americanos e judeus”. No mesmo artigo, eram citadas fontes não identificadas que davam conta de um reforço da segurança nas fronteiras do território, sendo que eram destacadas possíveis falhas no Aeroporto Internacional.

Na nota do gabinete de Wong Sio Chak, começa por se afirmar que “as autoridades de segurança da RAEM dão a maior importância aos trabalhos de prevenção do terrorismo”, para se vincar que “procedem, como sempre procederam, a uma avaliação rigorosa, e a uma prevenção antecipada e atempada relativamente aos factores de instabilidade que possam provocar diferentes impactos na segurança da sociedade”.

Destes factores de instabilidade fazem parte “os efeitos reais ou potenciais trazidos pela implementação de políticas dos países de todo o mundo”. O texto do SCMP associava a hipótese de manobras de grupos extremistas ao decreto do Presidente norte-americano Donald Trump relativo à interdição de cidadãos de sete países muçulmanos.

Polícias atentas às fronteiras

“Apesar de actualmente Macau se posicionar num nível baixo quanto ao risco de ataques de terroristas, as autoridades de segurança continuam a reforçar a avaliação dos diversos factores de risco, e a melhorar os trabalhos de implementação de políticas de execução e de gestão do dispositivo policial”, lê-se na nota à imprensa.

É igualmente deixada a garantia de que, nos últimos anos, as autoridades se têm esforçado nos trabalhos de monitorização e controlo de segurança, bem como de execução da lei nos postos fronteiriços, pontos de atracção turística, casinos e instalações importantes. Tem havido ainda um reforço da cooperação com os países e regiões vizinhos. “Por outro lado, as autoridades também estão a optimizar a segurança dos postos fronteiriços e a melhorar a gestão da migração.” O SCMP escrevia que foi apertado o controlo em relação aos portadores de passaportes de países muçulmanos e aos visitantes que chegam das Filipinas.

“Em conformidade com a evolução de conjuntura de situação de segurança interna e externa, as autoridades vão tomar medidas dinâmicas, e aumentar a eficácia e a qualidade de governação de segurança pública”, escreve o gabinete de Wong Sio Chak.

A possibilidade aventada pelo matutino de Hong Kong teve como base relatórios da consultora de Steve Vickers, antigo elemento dos serviços de inteligência da região vizinha. No artigo, afirmava-se que está a ser subestimada a hipótese de um ataque “espectacular” num alvo de relevo, o centro de jogo mais rico do mundo, Macau. Citando Vickers, o diário alertava que não deve ser descartada a hipótese de haver terroristas a considerarem “um ataque espectacular a um alvo acessível como um centro comercial na Austrália ou um casino em Macau”.

9 Fev 2017

Fundação Macau dá mais de 446 milhões à Universidade de Ciência e Tecnologia

Só nos últimos três meses do ano passado, a fundação liderada por Wu Ziliang entregou mais de 446 milhões de patacas à Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau. De todas as instituições de ensino do território, é a que mais beneficia do erário público. Contra números, não há argumentos

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] uma longa lista de beneficiários, entre fundações e associações, que mereceram ajudas que ultrapassam, no total, os 727,5 milhões de patacas. Foi publicada ontem em Boletim Oficial a lista de apoios concedidos pela Fundação Macau no último trimestre de 2016 e há, desde logo, um nome que sobressai, pelos números que o acompanham: a Fundação Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau (UCTM).

Somando os vários subsídios dados, entre Setembro e Dezembro do ano passado, a fundação da instituição de ensino superior localizada no Cotai recebeu mais de 446 milhões de patacas. O principal bolo, mais de 293 milhões, foi para custear as obras do Complexo Pedagógico (Bloco O) da universidade.

A entidade privada recebeu ainda a última prestação do apoio para a construção da quinta residência de estudantes e a aquisição de equipamentos, no valor de 20 milhões. Noutro cheque, seguiram mais de 71 milhões destinados à segunda fase das obras da construção de mais um edifício da Escola Internacional de Macau, sob a alçada da Fundação da UCTM.

Depois, foram dados 62,5 milhões a título de apoio financeiro para o plano anual de 2016/2017 da UCTM, do Hospital Universitário, da Escola Internacional de Macau e da Faculdade das Ciências de Saúde da UCTM. Este valor é referente à primeira prestação.

As escolas estão em destaque na lista ontem divulgada, mas não há instituição que chegue aos calcanhares da UCTM no que diz respeito a números. A Fundação da Universidade da Cidade de Macau, ao qual está ligada o deputado Chan Meng Kam, foi beneficiada com 45 milhões de patacas para ajudar “os estudos e publicação, actividades pedagógicas académicas, apoio aos equipamentos e subsídios aos estudantes”. Receberá outros fundos mais lá para a frente, uma vez que se trata da primeira prestação.

Bastante mais modesta é a ajuda à Fundação Católica de Ensino Superior Universitário: a primeira prestação para o actual ano lectivo da Universidade de São José vale 19 milhões.

No âmbito do ensino não superior, a Fundação Escola Portuguesa de Macau recebeu nove milhões de patacas para as despesas de funcionamento de todo o ano lectivo de 2016/2017. Para a Associação Promotora da Instrução dos Macaenses seguiram 1,65 milhões. É a primeira prestação de apoio ao plano anual da entidade presidida por Miguel de Senna Fernandes e também do Jardim de Infância D. José da Costa Nunes.

Às Missionárias de Nossa Senhora dos Anjos foram entregues 10,6 milhões, destinados à reconstrução do Edifício Verde e do Edifício de Paz da Escola Nossa Senhora de Fátima. Também as Franciscanas Missionárias de Maria estão a fazer obras: a Fundação Macau pagou 14,759 milhões para a remodelação e decoração do Prédio de Paz da Secção Chinesa do Colégio de Santa Rosa de Lima.

Comes e bebes

O Festival Gastronómico Internacional, evento que se realiza na rotunda junto à Torre de Macau, custou mais de sete milhões de patacas à fundação – isto só no último trimestre do ano. A Associação de Retalhistas e Serviços de Turismo de Macau recebeu 3,1 milhões de patacas; a União das Associações dos Proprietários de Estabelecimentos de Restauração e Bebidas de Macau encaixou 4,25 milhões. A união é presidida pelo deputado Chan Chak Mo, empresário com grande visibilidade no sector em causa.

Noutros domínios, a Aliança de Povo de Instituição de Macau, com ligações ao deputado Chan Meng Kam, teve direito a 10,5 milhões para custear as despesas com o plano de actividades de 2016. Esta última prestação contemplou 68 itens.

Já para a Associação dos Macaenses foi destinado um apoio de pouco mais de um milhão no terceiro trimestre de 2016, período em que a Santa Casa da Misericórdia recebeu 4,25 milhões, a serem aplicados no plano de actividades do Albergue.

9 Fev 2017

AL | Debate sobre Biblioteca Central marcado para a semana

Não critica o orçamento, mas duvida da necessidade de uma obra de semelhante complexidade na zona nobre da cidade. A deputada Song Pek Kei conseguiu convencer os colegas de que é preciso discutir um dos projectos principais de Alexis Tam. A discussão já está agendada

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]e nada adiantou ao Governo dizer que a decisão já está tomada: Song Pek Kei, a número três da bancada de Chan Meng Kam, quer discutir o sentido de oportunidade da construção da Biblioteca Central no edifício onde funcionou o Tribunal Judicial de Base. A sessão na Assembleia Legislativa (AL) está agendada para o próximo dia 15.

A deputada entende que, a ser necessário, um projecto desta envergadura deve nascer nos novos aterros ou no Centro Cultural de Macau. O espaço do antigo tribunal não é, para Song Pek Kei, a localização mais viável.

“Segundo algumas propostas, o Governo poderia escolher um local perto da nova zona de aterros, do Centro Cultural e do Centro de Ciência para construir a biblioteca, pois poderá ser melhor do que a actual localização”, aponta no pedido de debate, submetido à AL em Novembro.

Song Pek Kei não se mostra frontalmente contra o projecto – um dos mais significativos do secretário para os Assuntos Sociais e Cultura –, mas considera que é preciso discutir a ideia para que a construção da obra seja “mais científica, exequível e adequada às exigências dos residentes”.

Na proposta de debate, a deputada faz uma comparação com a estrutura similar de Hong Kong, edificada há seis anos. “O Governo referiu que a Biblioteca Central de Hong Kong, que entrou em funcionamento em 2010, tem uma área semelhante à da concebida para a Biblioteca Central de Macau. Na altura, o custo de construção atingiu os 700 milhões de dólares de Hong Kong. O custo previsto para a Biblioteca Central de Macau é de 900 milhões de patacas, tratando-se de um orçamento razoável”, aponta. Mas há uma grande diferença: “Os edifícios do antigo tribunal e da Polícia Judiciária implicam a protecção do património cultural; a fachada do antigo tribunal vai ser preservada, vão ser aditadas mais construções em cima e efectuadas escavações em baixo para a construção das caves, tratando-se de uma situação mais complexa do que construir um edifício em terreno plano, com provável desperdício de tempo e um custo elevado”.

Já há muitas

Song Pek Kei tem ainda reservas sobre a real necessidade de uma biblioteca deste género num local onde já há uma grande rede de estruturas destinadas aos livros e à leitura.

“Atendendo ao desenvolvimento das bibliotecas comunitárias nos últimos anos, o Governo deve, antes do planeamento da nova biblioteca central, avaliar a distribuição das bibliotecas comunitárias. Chegou a fazê-lo?”, pergunta.

De acordo com os números que a deputada recolheu, em Macau existem 305 bibliotecas: 86 salas de leitura e bibliotecas públicas, 103 bibliotecas escolares, 80 bibliotecas especializadas e 34 em instituições do ensino superior e escolas técnicas.

8 Fev 2017

John Rocha é autor do projecto Eurasian Food Journey, sobre gastronomia macaense

Gosta de comer e adora cozinhar. No regresso aos sabores da infância, John Rocha, um euro-asiático de Hong Kong, decidiu que tinha chegado a hora de partilhar as receitas que vai cozinhando com quem as quiser experimentar. Há uma página no Facebook, um blogue e aulas de gastronomia macaense

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] filho de pai português e de mãe chinesa, nado e criado em Hong Kong. “Cresci numa família bilingue e fui influenciado tanto pela cultura ocidental, como pela cultura asiática”, conta John Rocha ao HM. Consultor de gestão de marcas, decidiu investir, há um par de meses, num projecto pessoal ligado à gastronomia macaense. Criou um blogue e uma página no Facebook, meios que servem para partilhar as receitas que vai experimentando. Pelo meio há também pratos portugueses.

John Rocha decidiu acabar com a ideia de que as receitas de família apenas a ela pertencem. Explica que tem centenas de pratos para experimentar e dar a conhecer ao mundo. Há um regresso aos sabores da infância, aos tempos em que era miúdo e comia os pratos confeccionados pela avó.

“Lembro-me de ser muito pequeno e de a minha família organizar festas – a primeira comunhão, a comunhão solene, baptismos, aniversários e, claro, ceias de Natal. Recordo-me de ver todos aqueles bolos e sobremesas, diferentes dos que eram servidos nas festas dos meus colegas de escola, a maioria deles chineses”, diz.

Das memórias da infância fazem também parte as idas semanais ao Club Lusitano, em Central, depois da missa de domingo. “Comia umas tostas de queijo, galinha e o famoso minchi”, elenca. Com a avó era frequentador habitual de uma loja em Kowloon onde a família encomendava bebincas e chilicotes.

“Foi assim que descobri a comida macaense. E, claro, a minha avó adorava cozinhar”, explica John Rocha. “Era demasiado novo para perceber de que tipo de gastronomia se tratava, só mais tarde é que percebi. A cozinha macaense tem muito que ver com a família, cada uma tem a sua versão de minchi.”

Panelas virtuais, panelas reais

O minchi serve de exemplo para o projecto que já está lançado e que quer expandir nos próximos tempos. “Espero que o meu blogue possa ajudar pessoas que têm algo em comum e que sirva como espaço de partilha, com diferentes receitas para o mesmo prato”, diz. “Neste momento, estou a cozinhar com base nas receitas da minha família e também a partir de receitas que fui encontrando. Gosto muito de fazer isto.”

A ideia da partilha surgiu da utilização das redes sociais. “Como muitas outras pessoas, usava o Instragram e publicava fotografias das minhas fotos. De repente, no ano passado, percebi que não era isso que me dava mais gozo.” Foi então que decidiu “dizer adeus ao mundo das selfies” e começar a publicar conteúdos que “pudessem ser interessantes e terem algum valor para os outros”. Em Dezembro, criou o blogue sobre a viagem gastronómica euro-asiática que quer dar a conhecer ao mundo.

John Rocha tem também algumas preocupações de natureza histórica. “Espero poder ajudar a documentar a gastronomia macaense, que faz parte da história. E, quem sabe, talvez esta iniciativa possa ajudar ao reencontro de amigos que perderam o contacto ou de familiares separados por milhares de quilómetros.” Resumindo, “o Eurasian Food Journey é sobretudo acerca de ligações, pessoas que criam laços através do prazer da cozinha e da partilha.”

Além das fotografias e receitas que John Rocha tem vindo a disponibilizar, a iniciativa deste residente de Hong Kong vai ter uma dimensão mais real: aulas de gastronomia macaense.

“Não estavam nos meus planos”, salienta, vincando que não faz disto profissão. “Como gosto muito de cozinhar, inscrevi-me num curso de cozinha italiana. Estava a falar com a chef acerca do meu contexto familiar e, um dia, ela convidou-me a fazer alguns pratos macaenses”, explica. A professora de cozinha italiana gostou e convidou-o para dar algumas aulas. “Como não faço isto com fins lucrativos, acordámos que parte daquilo que os alunos pagam vai para instituições de caridade aqui em Hong Kong.”

O curso arranca em Março. “As aulas vão ser dadas em cantonês porque espero poder contribuir para que a comunidade local fique a conhecer a gastronomia portuguesa e macaense.” Na lista de pratos de John Rocha não faltam a bebinca de leite e os chilicotes.

8 Fev 2017

Índice Global da Paz mostra que mundo está cada vez menos pacífico

O planeta é um sítio cada vez menos pacífico. O Índice Global da Paz demonstra que não vamos pelo melhor caminho. O terrorismo e a instabilidade política são os grandes culpados da deterioração do panorama geral

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] mundo não vai bem. É esta a principal conclusão a retirar do Índice Global da Paz (IGP) de 2016, divulgado agora pelo Instituto para a Economia e Paz, um think-tank independente que analisa a situação mundial há uma década. “Os níveis globais de paz continuam a deteriorar-se, com um fosso cada vez maior entre os países mais e menos pacíficos”, escrevem os autores do relatório.

“Enquanto as nações mais pacíficas atingiram níveis históricos de paz, aquelas que não o eram tornaram-se ainda menos”, aponta o think-tank.

A internacionalização dos conflitos no Norte de África levou ao envolvimento de um número cada vez maior de países financiadores de operações da manutenção da paz. O IGP de 2016 conclui ainda que as operações levadas a cabo pelas Nações Unidas têm vindo a melhorar e, nos últimos três anos, os gastos militares desceram ao nível mundial.

No entanto, a situação no Norte de África “coloca em destaque a internacionalização dos conflitos modernos”, uma vez que “países a milhares de quilómetros de distância são afectados pelas vagas de refugiados que fogem da guerra”.

Em termos quantitativos, o estudo vinca que, em relação a 2015, o mundo tornou-se 0,53 por cento menos pacífico. Traduzindo a desigualdade entre países, 81 nações obtiveram melhores classificações nos critérios estudados, com 79 países a mostrarem piores notas nos indicadores em análise. “Como a dimensão da deterioração foi maior do que as melhorias, assistiu-se a uma diminuição da média destes países”, contextualiza o relatório.

A resistência europeia

O IPG é composto por 23 indicadores qualitativos e quantitativos, e as fontes utilizadas são “altamente respeitáveis”, garante a entidade responsável pela análise. Ao todo, foram avaliados 163 estados independentes e territórios, ou seja, 99,7 por cento da população mundial.

Dois dos principais indicadores pioraram, e muito, no ano passado: o impacto do terrorismo e a instabilidade política. As mortes causadas por actos extremistas aumentaram 80 por cento em relação a 2015 e apenas 69 países não foram palco de atentados terroristas. Houve 11 nações em que estas acções fizeram mais de 500 mortos – no ano anterior, tinham sido apenas seis as jurisdições a ultrapassar este número.

Quanto à instabilidade política, sentiu-se um pouco por todas as regiões. O IPG dá como exemplos os lusófonos Guiné-Bissau e Brasil, a Polónia, o Djibuti, o Burundi e o Cazaquistão.

A Islândia é, de novo, o país com a paz mais consolidada, seguindo-se a Dinamarca, a Áustria e a Nova Zelândia. Portugal encontra-se em quinto lugar, tendo subido nove posições desde 2015. No extremo da tabela, encontra-se, sem surpresa, a Síria. A lista das cinco nações onde os conflitos são mais difíceis completa-se com o Sudão do Sul, o Iraque, o Afeganistão e a Somália.

A Europa continua a ser a região mais pacífica do mundo, mas a média dos indicadores registou uma ligeira descida. Esta quebra é justificada com o impacto do terrorismo no continente – os ataques em Paris e em Bruxelas –, bem como a escalada da violência e a instabilidade política na Turquia, com relações difíceis com os seus vizinhos.

As melhorias mais significativas verificaram-se na América Central e nas Caraíbas. Tanto a América do Norte, como a América do Sul também apresentaram resultados mais positivos no ano passado. Por outro lado, o Norte de África é o ponto do planeta que mais preocupa. A África Subsariana também piorou em termos de paz.

Por aqui tudo na mesma

A China é apresentada no IGP no lugar 120 da tabela, apresentando um “estado de paz médio”. Fica muito aquém do Japão, que se encontra na nona posição, ou de Singapura, que surge no 20.o posto.

A Ásia-Pacífico obteve a terceira posição no ranking das regiões. “O nível de paz manteve-se, em termos gerais, o mesmo de 2015”, lê-se no relatório. Alguns países estão, no entanto, melhor: Indonésia, Timor-Leste, Myanmar e Tailândia.

“As tensões no Mar do Sul da China vão continuar a ter impacto nas relações externas das três nações envolvidas, a China, o Vietname e as Filipinas. No entanto, apesar de ser elevada a hipótese de escaramuças nas águas disputadas, continua a ser improvável um conflito militar de grande escala”, indica o IGP.

No plano negativo, o relatório destaca a situação política no Camboja, com o desentendimento entre os dois principais partidos, prevendo um ano complicado em Phnom Penh. O think-tank não tem dúvidas de que “vai continuar a subir o número de pessoas detidas sem qualquer justificação”.

As modestas melhorias assinaladas na Tailândia têm quer ver com os esforços feitos sobretudo com o Camboja, um rival de longa data. A paz doméstica permanece instável, uma vez que se trata de uma condição forçada pela junta militar no poder.

Nota ainda para o Myanmar, onde se alcançaram progressos significativos em termos de estabilidade política, “o que faz com que o risco de conflito esteja agora restringido a pequenas partes das zonas fronteiriças do país”. O relatório não faz referência à situação da minoria étnica muçulmana rohingya.

A Nova Zelândia, o Japão e a Austrália são os países com melhores indicadores de paz.

O exemplo Portugal

Dos sete países onde a paz está mais enraizada, seis são europeus. O IGP faz uma referência especial a Portugal que, no contexto europeu, foi a nação que mais evoluiu nesta matéria. Os autores do documento explicam que Lisboa obteve bons resultados no regresso gradual à normalidade política, depois do processo de ajustamento financeiro e económico do Fundo Monetário Internacional e da União Europeia.

“Não obstante as dificuldades encontradas pelo Governo de esquerda eleito em 2015, Portugal registou o segundo ano de melhorias em várias dimensões, especialmente em indicadores como a probabilidade de manifestações violentas, na instabilidade política e na escala do terror político”, aponta-se. A situação em Lisboa é, para o IGP, bastante melhor do que a verificada noutros países europeus que também foram alvo de resgates.

No grupo dos maus alunos sobressai a Turquia, país da Europa onde se registou o maior nível de deterioração em 2016.

Em França, o ano passado decorreu no rescaldo dos ataques terroristas de Novembro de 2015, encontrando-se agora na 46.a posição, um posto abaixo do ranking anterior. A Bélgica caiu três lugares (18.o), consequência da degradação dos indicadores que medem o impacto do terrorismo e o nível de percepção da criminalidade na sociedade.

As médias de dois dos maiores países europeus – França e Reino Unido – são ainda prejudicadas por obterem classificações muito baixas nos indicadores relativos à paz externa, “em linha com a estratégia militar adoptada nos últimos anos”.

O que está pior

A situação no Médio Oriente e no Norte de África já era má, mas no ano passado conseguiu ser ainda pior, com os conflitos na Síria e no Iémen a tornarem-se cada vez mais complicados.

Sobre o Iémen, o IGP explica que a guerra civil, que teve início em 2015, agravou-se de forma significativa, com um maior número de mortes, um enorme aumento de refugiados e pessoas deslocadas interinamente, e ataques terroristas de vários grupos extremistas. O quadro do país tem tido repercussões nos estados vizinhos.

Quanto à Síria, o documento faz referência à presença cada vez maior de poderes estrangeiros no conflito que fez milhares de mortos – entre 250 mil a 470 mil.

Apesar deste cenário complicado, há jurisdições da região que têm conseguido escapar à tendência negativa: o Sudão, o Irão e Omã conseguiram resultados melhores do que em 2015.

7 Fev 2017

Comportamento do Governo em relação às interpelações dos deputados é perigoso, dizem analistas

O modo como o Governo se comporta em relação à assunção de responsabilidades políticas é perigosa, avisam políticos e analistas. A população está cada vez mais atenta ao comportamento do Executivo e não gosta de réplicas vagas. Um dia destes, a casa ainda começa a vir abaixo

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Chefe do Executivo tem de repensar o modo como lida com as questões que lhe são colocadas pelos deputados, sob pena de o Governo, no poder sem legitimidade conferida pelo voto popular directo, começar a sentir uma pressão cada vez maior. A ideia é deixada por Larry So, académico, comentador de assuntos políticos, na análise ao que aconteceu no passado dia 24 na Assembleia Legislativa.

Pereira Coutinho e Ng Kuok Cheong tinham apresentado duas interpelações orais, dirigidas ao Chefe do Executivo, sobre o episódio Sónia Chan. A actual secretária para a Administração e Justiça admitiu publicamente ter recomendado um familiar seu para trabalhar no Ministério Público (MP), uma sugestão que fez ao antigo procurador da RAEM, Ho Chio Meng. O caso aconteceu em 2008, quando era a responsável pelo Gabinete de Protecção dos Dados Pessoais, e só veio a público porque o ex-líder do MP, acusado de mais de 1500 crimes, falou dessa recomendação durante o julgamento que está a decorrer no Tribunal de Última Instância.

Os dois deputados acharam por bem pedir explicações a Chui Sai On. Por um lado, pretendiam perceber que mecanismos se pretende adoptar para evitar “cunhas” no seio da Função Pública; por outro, queriam ainda perceber se o Chefe do Executivo tem intenção de agir politicamente em relação ao caso. Pereira Coutinho foi ainda mais longe, falando em violações às regras da Função Pública e às normas do Código Penal.

Tanto Pereira Coutinho, como Ng Kuok Cheong não obtiveram resposta às perguntas que fizeram. E isto porque, apesar de as questões serem para Chui Sai On, foi Sónia Chan a ir à Assembleia Legislativa (AL) falar de Sónia Chan. Acresce que o caso da recomendação do familiar estava a ser alvo de uma investigação do Comissariado contra a Corrupção (CCAC), pelo que Sónia Chan se escudou na averiguação em curso para não falar dela própria.

Governante não fala assim

Para Larry So, a resposta dada pela secretária para a Administração e Justiça está longe de ser politicamente correcta, no sentido literal da expressão. “Não é apropriado. Pode ir à AL se o Chefe do Executivo lhe tiver pedido, mas só se tiver alguma informação para dar aos deputados”, admite o analista. “No entanto, ir lá para dizer que não pode falar sobre o assunto não é apropriado. Os deputados colocaram questões e a resposta foi ‘não vou falar sobre o assunto’”.

Para o académico, este tipo de comportamento é desadequado porque “estamos a falar da responsabilização dos membros do Governo”, pelo que Sónia Chan “deve explicações ao público”. O facto de ter chamado à colação a investigação do CCAC para não falar sobre a sensível matéria – depois de, numa primeira fase, ter assumido o que fez e ter ensaiado uma espécie de mea culpa – leva Larry So a considerar que está agora a tentar “pôr um travão” na polémica. “E deu a entender que a Assembleia Legislativa não tem nada que ver com o assunto”, aponta.

“Os membros do Governo devem assumir responsabilidades perante a população. Não me parece que Sónia Chan esteja a cumprir as suas funções de forma apropriada e correcta”, conclui.

Sobre a escusa de Sónia Chan ao tema central das interpelações, Pereira Coutinho sublinha que não é a primeira vez que o Governo “se aproveita” da abertura de investigações quando “não lhe é conveniente responder a questões sensíveis”. O deputado lamenta ainda que o Executivo não avance com um processo disciplinar sobre a questão em causa – entende que houve violação do dever de isenção –, independentemente de o caso estar a ser investigado pelo CCAC. “O exemplo tem de vir de cima, caso contrário, que legitimidade existe para assacar responsabilidades ao pessoal da linha da frente?”, lança. “Mas isto não é algo isolado, tem vindo a acontecer regular e sistematicamente desde o estabelecimento da RAEM.”

Onde fica a Lei Básica?

E a postura do Chefe do Executivo, o verdadeiro destinatário das cartas de Pereira Coutinho e de Ng Kuok Cheong? Que sistema é este que permite a delegação da responsabilidade da resposta às interpelações, independentemente do conteúdo das missivas, sabendo de antemão que o representante do Governo não irá responder ao que foi perguntado?

A Lei Básica, no seu Artigo 65.o, determina os termos em que o Governo responde à AL. Um desses termos diz respeito, precisamente, a um dos métodos de fiscalização da acção governativa, ao indicar que o Executivo tem de responder às interpelações dos deputados.

Pereira Coutinho recorda o que vem escrito no diploma fundamental da RAEM para afirmar que, “ao longo dos tempos, o Governo não tem cumprido com rigor a Lei Básica”.

“O objecto, o sujeito da interpelação, era a secretária para a Administração e Justiça. A interpelação era sobre a responsabilização política. Cabia ao Chefe do Executivo responder se iria assacar responsabilidades políticas pela conduta da secretária”, reitera. “O que Chui Sai On fez foi, pela lei do menor esforço, indicar o próprio sujeito da interpelação para ir à AL responder”, afirma.

Larry So faz uma análise pragmática do que aconteceu: “A questão foi colocada directamente ao Chefe do Executivo, mas como é ele que manda, pode sempre delegar a resposta na secretária”. O analista recorda que Chui Sai On “delega sempre” – nunca se deslocou à AL para um plenário dedicado a interpelações orais. Mas se, por exemplo, para uma interpelação sobre venda de aves vivas fará sentido a delegação da resposta no presidente do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais, esta lógica de remissão não será aceitável no caso em concreto.

“Parece que o Chefe do Executivo está a tentar não assumir uma grande responsabilidade”, diz Larry So. “Estão a fazer perguntas sobre a secretária, pelo que vai ela enfrentar as questões. E ela decide que não responde às perguntas.” Para o académico, trata-se de “um tipo de jogo bastante infantil, como quando as crianças estão a brincar, ‘vais tu, eu não vou’”, ironiza. “O Chefe do Executivo devia dizer alguma coisa, nem que fosse uma frase simples”, recomenda.

Pereira Coutinho aponta ainda o dedo à postura da própria Assembleia. “O presidente da AL não teve a coragem de chamar a atenção do Governo que, de facto, para responder à pergunta dos deputados, deveria ser o Chefe do Executivo a comparecer”, constata.

Sem solução à vista

Pereira Coutinho e Larry So concordam que o episódio do dia 24 põe a nu as fragilidades do sistema. O deputado volta à carga com o facto de as comissões da AL se realizarem à porta fechada. “Se virmos como a Assembleia funciona, causa-me enorme espanto que os deputados possam conviver com o facto de os jornalistas não poderem entrar nas seis comissões para informarem o público daquilo que se passa nas reuniões”, diz Coutinho, que tem lutado sem sucesso contra “esta grave falta de transparência”.

Quanto à questão das interpelações sem resposta, por o emissário de Chui Sai On não ter possibilidade de esclarecer os deputados, a solução passa pela assunção da responsabilidade, sugere Larry So. “A população tem vindo a pedir responsabilização”, alerta o académico. “O Governo tem de olhar para as questões com isso em mente, porque a responsabilização dos governantes não faz parte do cenário.”

O analista acredita que se a atitude governativa se mantiver, “a frustração vai crescer, porque não são dadas respostas”. A médio prazo, “a pressão vai aumentar para que os governantes sejam eleitos por via directa”.

Pereira Coutinho não parece acreditar que o Governo avance na direcção da responsabilização e entende que é preciso ir à origem do processo que legitima o poder. “A solução passa por alargar a democraticidade do próprio processo eleitoral do Chefe do Executivo”, sustenta. “Quando o Chefe do Executivo compreende que a legitimidade para governar deriva do facto de ter o apoio de 400 pessoas que fazem parte do colégio eleitoral, é evidente que não tem de dar qualquer satisfação às outras pessoas, incluindo aos meios de comunicação social.”

António Katchi, jurista, também é do entendimento que “o busílis da problemática da responsabilização política dos governantes reside no próprio sistema político de Macau”. O especialista em Ciência Política e Direito Constitucional desdobra o sistema em três grandes componentes: “A forma de Governo oligárquica, o sistema de Governo ultrapresidencialista e o carácter falacioso da autonomia”.

A forma de Governo oligárquica significa que “nem a composição do Governo (Chefe do Executivo e Secretários), nem a composição maioritária da AL são determinadas, directa ou indirectamente, pelo voto popular”. Por seu turno, diz António Katchi, “um típico sistema de Governo presidencialista permitiria que os membros do Governo – ou, pelo menos, o Chefe do Executivo – fossem destituídos pela AL por razões jurídicas de particular gravidade, através de um processo de ‘impeachment’”.

Acontece que não é esse o sistema da região, dada a subordinação do Governo de Macau ao Governo Popular Central, “em termos que limitam – e falsificam – grandemente a autonomia de Macau e, instrumentalmente, reforçam a supremacia do Chefe do Executivo no quadro do sistema político local”, razão que leva o professor a falar em sistema “ultrapresidencialista”. Precisamente porque é Pequim que manda, mesmo que o Chefe do Executivo proponha a exoneração de um membro da sua equipa governativa, nada garante que tal se verifique. “Pode até suceder que o Chefe do Executivo queira deixar cair um secretário mal visto na AL ou na opinião pública mas, se o Governo Popular Central resolver segurá-lo, nada feito”.

Resumindo e concluindo, para António Katchi, “a solução estaria, ou começaria, na correcção destes três males”.

6 Fev 2017

Macau e Hong Kong com as temperaturas mais elevadas desde que há registos

Desde 1952 que não se via, em Macau, um primeiro mês do ano assim tão quente. Os agasalhos pouco saíram dos armários. Em Hong Kong registou-se o mesmo fenómeno. A culpa é das alterações climáticas

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] média da temperatura em Macau no primeiro mês deste ano foi a mais alta em Janeiro desde que existem registos: 17,5 oC. O valor foi fornecido ao HM pelos Serviços de Meteorologia e Geofísica e confirmam um fenómeno que também se registou em Hong Kong, região com contas feitas à temperatura há bastante mais tempo.

“Esta média é relativamente alta. É a média de temperatura do ar mais elevada em Janeiro desde o estabelecimento desta direcção de serviços, em 1952”, explica a Meteorologia, numa resposta enviada por escrito. O valor representa uma subida de dois graus Celsius em relação à média normal de Janeiro.

Há várias razões para que os termómetros não tenham descido às temperaturas que, por norma, se sentem no Inverno – e nem o ano novo chinês que, por norma, vem acompanhado de frio, foi excepção. “A deslocação do ar frio e intenso foi pouco frequente para Macau e, ao contrário, o tempo foi afectado pela massa de ar quente e húmido que provocou as temperaturas altas em Janeiro.” O fenómeno também “está relacionado com as alterações climáticas”.

Em Hong Kong, os registos das temperaturas datam de 1885 – e nunca se tinha visto um mês assim. Em 1901, Janeiro foi também um mês invulgarmente ameno, mas mais fresco do que este início de ano.

De acordo com a imprensa da antiga colónia britânica, a média da temperatura foi superior à de Macau, ao chegar aos 18,5 oC. Por norma, em Janeiro a média das temperaturas é de 16,3 oC, assinala o Observatório da região vizinha.

As autoridades de Hong Kong divulgaram ainda outros dados: 6 de Janeiro foi o dia mais quente do mês, com os termómetros a chegarem aos 25,5 oC, e foram registadas, em média, mais 2,1 horas de sol do que é habitual.

3 Fev 2017