Brasileiro trazia no corpo 1,3 milhões de patacas em cocaína

Um homem de 34 anos foi detido no Aeroporto Internacional de Macau, no sábado, com 408 gramas de cocaína escondidas no corpo. Pelo serviço de “mula” ia receber 30 mil patacas

 

[dropcap]U[/dropcap]m indivíduo de 34 anos, com o apelido Ramos, foi detido no Aeroporto Internacional de Macau quando transportava 408 gramas de cocaína, com um valor de mercado de mais de 1,3 milhões de patacas. A revelação foi feita ontem pela Polícia Judiciária (PJ), que relevou tratar-se da maior apreensão deste ano.

Segundo a informação citada pelo canal chinês da Rádio Macau, o homem tinha sido contratado no Brasil para o serviço e, caso fosse bem-sucedido, ia receber 30 mil patacas, pelo transporte dos 408 gramas. Segundo os dados fornecidos pela PJ, ao HM, e anteriormente reportados, entre Janeiro e o fim de Maio deste ano, tinham sido apreendidas 355 gramas de cocaína, pelo que esta apreensão sozinha, é superior ao apreendido em cinco meses.

No entanto, o que surpreendeu as autoridades foi o facto de o homem ter um trajecto pouco comum para este tipo de casos. De acordo com a PJ, normalmente as pessoas envolvidas neste tipo de tráfico vêm para Macau vindos da Tailândia. Contudo, o homem viajou primeiro para a Etiópia, de onde seguiu para Xangai. Foi depois de chegar à “capital financeira” chinesa que embarcou com destino a Macau, no sábado passado. Por este motivo, a PJ acredita que o destino final não seria a RAEM, mas apenas um dos vários pontos de passagem.

A investigação terá sido iniciada devido a uma denúncia anónima, que levou as autoridades a conduzir o homem a uma máquina de Raio-X, que indicou o transporte de objectos estranhos.

Durante o exame, as autoridades detectaram 34 cápsulas de plástico com droga no interior. Cerca de 30 das cápsulas estavam na roupa e meias e quatro dentro do corpo do homem.

À PJ o homem terá explicado que trazia todas as cápsulas dentro do corpo mas que ao longo da viagem, principalmente em Xangai, que se sentiu mal e acabou por expelir 30 cápsulas. Assim, apenas quatro cápsulas acabaram por permanecer no seu organismo e só foram expelidas já no território, depois de ter sido detido. Por outro lado, o sujeito admitiu que antes do transporte já tinha recebido 2 mil dólares americanos, o equivalente a cerca de 16 mil patacas.

De acordo com os dados da PJ até Maio, a cocaína era a droga mais apreendida com 355 gramas, no valor de 1,065 milhão de patacas. A droga que ocupava o segundo lugar do pódio em apreensões é a quetamina, com 72 gramas no valor de 72 mil patacas. A medalha de bronze foi para a metanfetamina, mais vulgarmente conhecida por ice, com 29 gramas apreendidas no valor de 88.200 patacas.

2 Jul 2019

Adjunto da ministra da Justiça de Portugal contratado para assessor jurídico da Assembleia Legislativa

[dropcap]A[/dropcap] Assembleia Legislativa (AL) vai contratar mais um funcionário português para a área da assessoria jurídica. A notícia avançada pelo jornal Plataforma dá conta da contratação de Manuel Magriço, adjunto de Francisca Van Dunem, ministra da Justiça de Portugal, após este ter recebido a autorização do Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) português para obter licença especial de dois anos com vista a desempenhar funções de assessor jurídico na Assembleia Legislativa (AL).

Manuel Magriço foi procurador do Ministério Público em Portugal durante 14 anos e chega a Macau como o terceiro jurista português contratado pela AL este ano.

O jurista, de 44 anos, exerceu funções de procurador ao longo de 14 anos, antes de ser nomeado para o Gabinete de Francisca Van Dunem e publicou em 2014 um livro sobre “A exploração sexual de crianças no ciberespaço”, fruto da sua tese de mestrado «Competitive Intelligence», apresentada na Academia Militar.

Manuel Magriço esteve em Macau em Janeiro de 2016 para participar num workshop intitulado “TAIEX (Technical Assistance & Information Exchange Instrument) – Workshop de Especialistas em prevenção e combate ao Tráfico de Seres Humanos e Protecção às Vítimas”, na Escola Superior das Forças de Segurança de Macau.

Mais um

O magistrado torna-se assim no terceiro jurista português a ser contratado pela AL este ano, juntando-se a Maria José da Costa Morgado, juíza desembargadora, em funções desde Janeiro, e ao jurista Paulo Henriques que transitou dos Serviços de Administração e Função Pública de Macau para a Assembleia Legislativa no passado mês de Maio.

A entrada de três portugueses este ano para a equipa de assessoria jurídica acontece após a Mesa da AL ter decidido não renovar os contratos dos juristas Paulo Cardinal e Paulo Taipa que terminaram funções no final de 2018 ao fim de 26 anos e 17 anos, respectivamente, de trabalho no órgão legislativo. Paulo Taipa regressou a Portugal e foi nomeado adjunto da secretária de Estado Adjunta da Administração Interna, em Abril deste ano.

2 Jul 2019

Lei de Extradição | Secretário diz que preocupação não lhe foi comunicada

José Luís Carneiro passou o dia em Macau, teve um encontro com líderes de associações e empresas, mas o assunto da lei de extradição nunca foi abordado. O governante apelou ainda à participação da comunidade na política local, como forma de se proteger

 

[dropcap]A[/dropcap] comunidade portuguesa não se mostrou preocupada com a possibilidade de haver um acordo de extradição entre Macau e a China. A revelação foi feita pelo secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, José Luís Carneiro, que passou ontem por Macau, onde reuniu com representantes de associações locais. O governante português explicou assim o facto de não ter abordado o assunto com a secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, com quem se reuniu na manhã de ontem.

“Não foi objecto de conversações, nem da minha parte, nem da parte da senhora secretária do Governo de Macau. Não é algo que me tenha sido colocado pela comunidade portuguesa”, afirmou sobre o encontro.

José Luís Carneiro associou depois o acordo de extradição com a criação de Grande Baía. “Como disse na minha intervenção, vi nos portugueses e nas suas instituições que a criação desta importante área estratégica [a Grande Baía] é encarada como uma oportunidade, considerado o tipo de qualificações dos portugueses que aqui se encontram”, vincou.

Segundo Carneiro, também do lado da comunidade Hong Kong não houve qualquer queixa: “Não estive em Hong Kong durante a visita. Até agora, não temos qualquer comunicação dos portugueses que se encontram em Hong Kong. Para já nem dos portugueses em Hong Kong nem do Centro Lusitano recebi preocupações que exijam quaisquer diligências por parte do senhor embaixador”, justificou.

Em Macau ainda não foi apresentada uma lei de extradição com o Interior da China, mas houve uma proposta, em 2015 que entrou na AL. O projecto acabou por ser retirado, sem que nunca tivesse sido discutido. O conteúdo ainda hoje não é conhecido.

Comunidade mais activa

O secretário comentou também as declarações do presidente da Associação dos Advogados de Macau (AAM), Neto Valente, sobre a cada vez maior irrelevância da comunidade portuguesa. Como tal, Carneiro lançou um desafio à participação dos cidadãos lusos na vida política local.

“O apelo que fazemos a todos os portugueses que se encontram no estrangeiro, em territórios, regiões ou países é que procurem mais activamente viverem a vida política dos países ou regiões de acolhimento”, pediu. “É pela vivência activa da vida política que melhor podem contribuir não apenas para os países de acolhimento ou regiões, mas simultaneamente podem defender melhor os interesses das respectivas comunidades”, realçou.

Durante o dia de ontem, além do encontro com Sónia Chan, José Luís Carneiro esteve na Escola Portuguesa de Macau, almoçou com “dirigentes associativos”, visitou a Escola de Artes e Ofícios da Casa de Portugal, o Instituto Português do Oriente, esteve com os Conselheiros das Comunidades Portuguesas e terminou com um encontro com algumas pessoas das comunidades ligadas a associações ou empresas.

Sobre o dia que passou no território, Carneiro realçou o facto de haver cada vez mais pessoas a estudar português em Macau. Ainda em relação a este aspecto, elogiou a postura do Governo de Macau, que vai pagar a construção do novo Pólo da Escola Portuguesa de Macau. “A secretária garantiu que o Governo de Macau vai financiar o projecto de arquitectura, os equipamentos e a disponibilidade do terreno”, apontou. “Agradecemos muito” frisou.

2 Jul 2019

Governo diz que há sete projectos de prevenção de cheias

[dropcap]C[/dropcap]heong Chui Ling, chefe de gabinete do secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo do Rosário, disse, em resposta a uma interpelação escrita da deputada Ella Lei, que actualmente estão em curso sete projectos de infra-estruturas de prevenção de cheias, seis deles coordenados pela Secretaria para os Transportes e Obras Públicas e um pelo Instituto de Assuntos Municipais (IAM).

A obra que está sob responsabilidade do IAM é a instalação de uma box-culvert da estação elevatória de águas pluviais do Porto Interior, cujo projecto foi iniciado em Fevereiro de 2019 e deve estar concluído em 2021.

Ella Lei pediu um calendário específico ao Governo, mas Cheong Chui Ling disse que não podem ser adiantadas datas sem ter a certeza dos detalhes dos vários projectos. O chefe de gabinete de Raimundo do Rosário deu mesmo como exemplo o projecto de requalificação dos estaleiros de Lai Chi Vun, que está dependente do processo de classificação de património cultural.

2 Jul 2019

Rumores | Governo desconhecia que exemplo indiano era inconstitucional

É inconstitucional, mas o gabinete de Wong Sio Chak só ficou a saber depois da Novo Macau ter trazido a informação a público. Mesmo assim, o Governo não perdoa aos pró-democratas e acusa-os de distorcer as posições oficiais para impedir a criação de uma nova lei

 

[dropcap]O[/dropcap] Gabinete do secretário para a Segurança, Wong Sio Chak, acusa a Associação Novo Macau de distorcer a posição oficial sobre a Lei de Protecção Civil, para transmitir a ideia que o objectivo do diploma é controlar a liberdade de expressão. Foi desta forma que o gabinete do secretário reagiu às críticas da associação, que na semana considerou que à base do direito comparado pelo próprio Governo, o artigo 25, que criminaliza os rumores, é desnecessário.

Segundo a interpretação dos pró-democratas, os exemplos do Executivo, com base no direito suíço e francês, focam aspectos que já estão cobertos por normas do código penal. Além disso, a Novo Macau apontou o facto de o Executivo ter utilizado a lei indiana como referência, apesar desta ter sido considerada inconstitucional pelo Tribunal Suprema da Índia, algo que o Governo não havia mencionado.

Face a estas críticas, o gabinete de Wong Sio Chak aponta que nunca foi dito que os exemplos iam ser copiados e que houve manipulação das posições oficiais: “As autoridades de segurança nunca manifestaram que iriam copiar exactamente esses exemplos de legislação do exterior, para a configuração do ‘crime contra a segurança, ordem e paz públicas durante incidentes súbitos de natureza pública’”, é escrito. “Além disso, os comentários truncaram o contexto para distorcer o sentido da decisão judicial da Índia, alegaram indevidamente que as autoridades de segurança interpretaram erradamente os exemplos da legislação penal da França e da Suíça”, foi acrescentado.

Wong Sio Chak diz também que o objectivo das críticas é transmitir a ideia de que não há legitimidade para impor esta lei: “levaram a população a crer que esse crime é para controlar a difusão de expressão, com intenção infirmar a não legitimidade e a necessidade das sanções penais de Macau no que diz respeito à elaboração, transmissão ou difusão de rumores perante incidentes graves de protecção civil”, considerou.

Neste sentido, o gabinete do secretário explica que é necessária uma lei que permita criar “normas incriminadoras às condutas que se traduzam na elaboração de rumores durante o período de grande catástrofe”, o que argumenta hoje não ser possível.

Todavia, a proposta do Governo não explica que a proposta vai mais longe do que o que foi afirmado na consulta e que pune com pena de prisão quem elabore, difunda ou transmita “notícias tendenciosas”. O conceito de “notícias tendenciosas” nunca é definido no diploma.

A justificação

No que diz respeito ao facto de o Executivo ter usado uma lei indiana como referência que já tinha sido considerada inconstitucional, o gabinete de Wong Sio Chak escuda-se no facto de ainda não ter havido alterações no texto, por parte do Governo. Aliás, o mesmo gabinete terá mesmo feito um estudo, mas apenas depois da informação ter sido trazido a público pela Novo Macau.

“Recentemente, depois de se conhecer que o artigo 66-A.º da ‘Lei da Tecnologia da Informação da Índia’, promulgada em 2000 e revista em 2008, foi julgado inconstitucional pelo Tribunal Supremo daquele País, as autoridades de segurança deram grande importância e efectuaram imediatamente verificação”, é frisado. “Após esse estudo, verificou-se que entre o período em que foi elaborada a proposta de ‘Lei de Bases de Protecção Civil’ e da sua consulta pública, o Governo da Índia ainda não tinha feito qualquer actualização às respectivas informações publicadas no documento jurídico do seu website, pelo que as quais continuaram a serem tomadas como referências pelas autoridades de segurança”, foi acrescentado.

A consulta pública foi realizada entre Junho de Agosto de 2018. Nessa altura, a lei indiana já tinha sido considerada inconstitucional, num caso mediático. Foi a 24 de Março de 2015 que o Tribunal Supremo da Índia tomou esta decisão, a partir da queixa da advogada Shreya Singhal.

Na mesma resposta, Wong Sio Chak declara ainda que está aberto para ouvir a Assembleia Legislativa e os deputados e a realizar as melhorias necessárias: “Espera-se que seja dado mais um passo para melhorar o texto da proposta de lei e estabelecer uma ajustada, clara e rigorosa previsão criminal”, é sublinhado.

2 Jul 2019

Glenn Timmermans, académico: “Holocausto está além da compreensão”

A necessidade de dar contexto à matéria que lecciona levou Glenn Timmermans, professor de literatura inglesa na Universidade de Macau, a dedicar especial atenção ao período do Holocausto nazi. A partir daí, o docente desenvolveu um programa que tenta trazer todos os anos a Macau um sobrevivente de um dos “períodos mais negros da história ocidental.” A próxima convidada é Eva Schloss, que partilhou a infância com Anne Frank e viveu Auschwitz

 

O que o levou a sentir necessidade de ensinar a história do período do Holocausto em Macau?

[dropcap]S[/dropcap]ou professor de literatura inglesa. Estou em Macau desde 2001 a ensinar e uma das disciplinas que lecciono é literatura do séc. XX. Depois de dois ou três anos a ensinar em Macau, e a falar da guerra e de Auschwitz percebi que era impossível entender a história recente se não se souber o que aconteceu durante o período do Holocausto nazi. O Holocausto é a grande crise da civilização ocidental, foi o ponto mais baixo desta civilização. Como é possível entender a literatura ocidental, pelo menos a literatura da segunda metade do séc. XX, se não se souber o que aconteceu no Holocausto? Os meus alunos questionavam muitas vezes o que era isso. Foi quando parei e pensei que não iria avançar na área da literatura até que eles soubessem o que se passou. Um livro como o “Lord of the Flies”, de William Golding, surgiu porque o autor esteve no exército em 1945, altura em que percebeu a depravação da humanidade. Um livro como este tem relação com o fenómeno do Holocausto. Samuel Beckett em “À espera de Godot” mostra como tudo perde o significado. Penso que se trata de uma consciência pós-Holocausto. É uma crise na filosofia ocidental. Temos muito que nos orgulhar no ocidente, a cultura é extraordinária, mas no meio do séc. XX as pessoas mais cultas, as pessoas que ouviam Bach e Beethoven e todos os grandes filósofos, foram as pessoas que cometeram o maior crime da história. Esta situação ultrapassa todas as assunções do que somos, o que conseguimos, qual é o valor da cultura. Há esta ideia de que se souber tocar piano ou violino, de que se se for culto, as pessoas são melhores. Mas Adolf Eichmann, o “arquitecto” do Holocausto era um conceituado violinista. Isso para mim é incompreensível. Foi assim que comecei a introduzir aos poucos o Holocausto nas minhas aulas.

Agora está à frente de um programa totalmente dedicado a esta matéria.

Senti que precisava de ajuda e em 2007 fui a Israel fazer um curso no Yad Vashem, em ensino do Holocausto. Felizmente, com o apoio de Sheldon Adelson, que faz a sua fortuna em Macau e é um grande doador para o Yad Vashem, todos concordaram que uma pequena parte das doações seria destinada a levar académicos chineses a ter formação em Israel. Vou levar o próximo grupo em Setembro. Temos agora centenas de candidatos por ano, e só podemos levar trinta. Depois, em 2012 a universidade tentou americanizar-se e introduziu a Educação Geral, o que foi uma oportunidade. Pediram-me sugestões de ensino para esta área e eu avancei com a proposta de ensinar o holocausto enquanto disciplina independente. Disse que lhe queria chamar “O genocídio do Holocausto e direitos humanos”. Pediram-me para deixar cair a parte dos direitos humanos, mas eu neguei. Ainda continuo a ensinar esta disciplina que se está a tornar muito popular. No próximo semestre vou ter três turmas cada uma com 70 alunos. Os alunos, inicialmente, na sua maioria, sabiam muito pouco sobre este assunto.

Como tem sido a reacção dos estudantes?

Os alunos dizem muitas vezes: se o Hitler matou tantos judeus era porque existia uma boa razão. Respondo dando exemplos dos próprios chineses e da sua diáspora no sudeste asiático. Tal como com os judeus, há comunidades chinesas que têm muito sucesso e que, muitas vezes, são vítimas de preconceito. Sabemos que na Indonésia muitos chineses são mortos, sabemos que actualmente na Malásia, os chineses são muitas vezes mencionados como ameaça potencial. Porque, tal como acontecia com os judeus, há esta ideia de que os chineses conseguem controlar a economia. De facto, quando emigram, e tal como os judeus que estavam na Europa, acabam por ter sucesso económico e isso torna-os alvo de ressentimento.

Acha que esse ressentimento contra judeus contribui para o Holocausto de alguma forma?

De alguma forma sim. O Hitler andava a procura de um bode expiatório e os judeus que em 1933 eram 500 mil na Alemanha, menos de um por cento da população, controlavam muitas áreas. Quando Hitler procurou um bode expiatório aproveitou para dizer, “olhem estes, não são alemães, mas dirigem orquestras, são responsáveis por jornais, gerem negócios”. Encontrou quem culpar. Não faria sentido culpar pelas dificuldades que se viviam as empregadas domésticas, mas sim aqueles com algum sucesso. Claro que o antissemitismo tem uma história de mais de dois mil anos, mas, de facto, com o que se passou no Holocausto, os judeus acabaram por ser o bode expiatório associado ao colapso económico alemão.

Depois de um período tão negro, como se justificam os crescentes movimentos racistas na Europa?

A Angela Merkel, e isto para seu crédito, abriu as fronteiras da Alemanha aos refugiados na sua maioria sírios, mas a outros também. Ela apenas o fez porque existiu um Holocausto e foi uma forma de reafirmar que a Alemanha não pode nunca mais voltar a apoiar este tipo de descriminação. A Alemanha tinha a obrigação moral, mais do que qualquer outro país de abrir as suas fronteiras. Isto, está agora a criar outros problemas com o crescimento dos movimentos de extrema-direita no país que a culpam pelo problema dos refugiados. Na Europa vemos estes movimentos a ganharem força na Hungria, Polónia, etc..

Apesar da Polónia ter sido muito massacrada na 2ª Grande Guerra Mundial…

Sim, e está a tornar-se muito extremista. Tinha andado muito decente nos últimos 20/30 anos e temos também o ódio aos judeus da velha guarda da direita, na Alemanha e na Hungria. Mas estes sentimentos estão também a crescer na França, e agora dirigido aos muçulmanos. Os judeus acabaram por estar identificados com Israel e na Inglaterra existe antissemitismo dentro do partido trabalhista. Temos uma oposição de esquerda que parece ter um problema com o racismo. Israel era querido da esquerda, historicamente, nos 50 e 60, mas agora que Israel está muito identificado com os Estados Unidos da América, e a esquerda odeia os Estados Unidos, os protegidos passaram a ser os palestinianos.

Todos os anos traz a Macau um sobrevivente do Holocausto nazi. Porquê?

Porque o Holocausto é algo que está além da compreensão. Por mais que estude sobre aqueles acontecimentos e aquela época não entendo e duvido que alguma vez venha a entender. Dentro em breve todos os sobreviventes estarão mortos. Por isso, se os estudantes ouvirem a história directamente de um sobrevivente tem mais impacto do que todas as palestras e todas a aulas que tiverem. Basta uma hora com um sobrevivente e conhecer alguém que esteve realmente lá.

Qual o próximo convidado?

A minha convidada em Janeiro é incrível. Tem 90 anos e é a irmã “emprestada” póstuma da Anne Frank. Elas conheceram-se no início da guerra. O nome dela é Eva Schloss. A mãe, o pai e o irmão eram judeus austríacos e fugiram em 1939. O pai encontrou emprego na Holanda e juntaram-se todos em Amsterdão em 1940, antes do início da guerra. Viviam em frente à família Frank. No Holocausto esconderem-se tal como os Franks, mas foram traídos e o pai e irmão acabaram por morrer em Auschwitz. Entretanto, a mãe de Anne Frank também foi morta. Depois da guerra, o pai de Anne Frank conheceu a mãe de Eva Schloss que acabou por ser criada por ele. Estive com ela recentemente, em Londres, e ela aceitou vir a Macau em Janeiro. Quero que este testemunho, além de ser apresentado na universidade, seja também dado a conhecer às escolas de Macau.

Podemos dizer que há um paralelismo, quando se fala de horror, entre o Holocausto e o massacre de Nanjing, na China?

Nanjing é um acontecimento terrível, mas não deve ser confundido com o Holocausto nazi. Há uma tendência, na China, para comparar esses dois acontecimentos. Em parte por causa da própria linguagem. Em chinês a palavra datusha é utilizada para ambos os acontecimentos. São ambos massacres. Mas o Holocausto não foi um massacre, foi um processo que decorreu primeiro entre 1933 e 39 com propaganda e com as leis contra judeus, e que depois se tornou num processo de matança industrial. Não estou a dizer que o massacre de Nanjing não foi horrível. Todas as matanças o são. Mas o massacre de Nanjing foi aquilo a que se chama realmente de massacre. Os japoneses esperavam conquistar Xangai muito mais rapidamente do que fizeram. Pensaram que iriam ter Xangai em poucas semanas e levou-lhes três meses. Muitos japoneses tinham sido mortos, os chineses combateram corajosamente e, por razões que não são muito claras, Tóquio ordenou que se avançasse para Nanjing. Não havia importância militar em Nanjing. Depois de conquistarem Xangai controlavam o delta do rio Yangtze, aliás controlavam a China. Acho que Nanjing foi o lugar escolhido pelos japoneses para humilharem a China. Quando chegaram lá, os soldados japoneses estavam exaustos, zangados e ficaram loucos. De acordo com os números aproximados, terão morrido 300 mil chineses. Foi muita gente. Mas penso que o mais horrível foram as violações. Sabemos que cerca de 20 mil mulheres foram violadas, e não era apenas uma violação, era o seu horror. Mais uma vez, os alemães eram um povo muito sofisticado e levaram para a frente o Holocausto e aqui, os japoneses eram um povo muito refinado e também cometeram as maiores e mais cruéis atrocidades. Temos estas duas culturas intelectuais altamente refinadas e depois vemos que foram as potências que mais horrores causaram e que cometeram crimes indescritíveis.

A história de Nanjing só começou a ser divulgada muito depois do massacre. Porquê?

A China fez um trabalho muito mau na preservação da sua história. Nanjing, ao contrário do Holocausto, foi durante muito tempo silenciado por razões políticas. Os comunistas não estiveram lá, estavam a combater o Kuomintang e não a combater os japoneses. Ou seja, os comunistas não tiveram nenhum papel nesta história de Nanjing. Por duas razões. Por um lado, por não terem estado lá, e por outro porque se não estivessem a lutar contra o Kuomintang e sim com eles, se calhar juntos teriam derrotado os japoneses. Depois, tanto a China como Taiwan, nos anos 50, queriam investimento japonês. Apenas nos anos 80, quando a China começou a ficar mais forte, se começou a reconhecer o massacre de Nanjing. O primeiro museu dedicado aos acontecimentos só foi criado em 1985, 40 anos depois do massacre. Infelizmente, do ponto de vista histórico perderam-se muitos registos, nomeadamente depoimentos de sobreviventes, fundamentais para documentar aquele período.

2 Jul 2019

Portugal tenciona abrir consulado honorário em Malaca

[dropcap]O[/dropcap] secretário de Estado das Comunidades Portuguesas anunciou sábado à Lusa que o Governo português pretende abrir um consulado honorário em Malaca, onde existe um legado patrimonial e imaterial desde a chegada de Afonso de Albuquerque, em 1511.

“O senhor embaixador está a elaborar uma proposta que irá submeter ao Ministério dos Negócios Estrangeiros (…) para criarmos aqui, em Malaca, um consulado honorário, disse à Lusa José Luís Carneiro, à margem da 2.ª Conferência das Comunidades Portuguesas na Ásia.

O encontro juntou no Bairro Português de Malaca representantes das comunidades asiáticas descendentes de portugueses, numa iniciativa de partilha das raízes culturais, com cerca de 300 luso-asiáticos, de várias comunidades do continente.

“Depois de ser apreciado pelas autoridades portugueses [pretensão de abrir consulado honorário em Malaca] irá ser submetido às autoridades malaias”, explicou o responsável português, que esteve reunido na sexta-feira com o secretário-geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros da Malásia, Muhammad Shahrul Ikram Yaakob, em Kuala Lumpur.

“Tratar-se-á de um consulado honorário e naturalmente para que possa ser criado é necessário que haja condições físicas, materiais, para que possa funcionar como um consulado honorário”, revelou José Luís Carneiro, não apontando, contudo, uma possível data de abertura.

Acompanhado pelos artistas das comunidades de herança portuguesa da Indonésia, Malásia, Tailândia e Sri Lanka, que atuaram durante a conferência, o secretário de Estado das Comunidades Portuguesas assumiu o compromisso de ajudar estas comunidades através de apoio financeiro para actividades culturais e de preservação do legado deixado pelos portugueses, durante a época dos descobrimentos.

“Assumi o compromisso com a associação Coração de Malaca (e outras Organizações não-governamentais) em Malaca de os apoiar na elaboração de candidaturas para efeitos de financiamento por parte do Ministério dos Negócios Estrangeiros (…) no apoio ao trabalho que aqui desenvolvem relativo à defesa e valorização da herança histórica que aqui une comunidades de toda esta região, desde a Indonésia, até Macau, Singapura, Tailândia e Malaca”, disse.

“Como se vê, são jovens que serão o futuro destas comunidades que aqui mostram a sua ligação a Portugal”, disse enquanto interagia com aqueles jovens luso-asiáticos.

O responsável português lembrou ainda o trabalho feito por dois portugueses em Malaca que querem identificar todo o património imaterial deixado por Portugal, desde o século XVI na cidade costeira da Malásia, onde ainda vive uma forte comunidade que diz ser portuguesa, e disse que o Governo os vai ajudar na candidatura à UNESCO, para que esta organização reconheça este património único.

Joana Bastos e Bruno Rego, dois bolseiros Fernão Mendes Pinto, um projecto de parceria entre a associação Coração de Malaca e o instituto Camões, disseram à Lusa que estão, desde que aterraram em Malaca, há cerca de três meses, a desenvolver um mapeamento cultural que vai abranger toda a comunidade luso-malaia com o objectivo de enviar estas informações à UNESCO

Por fim, o Secretário das Comunidades Portugueses anunciou ainda que para o ano, durante as celebrações do São Pedro em Malaca, o grupo vencedor das marchas de Santo António em Lisboa irá participar nas festividades da cidade outrora conquistada pelos portugueses.

As festividades do São Pedro arrancaram na sexta-feira em Malaca e terminaram este domingo.
A relação de Portugal com Malaca remonta a 1509, quando Diogo Lopes Sequeira, enviado do Rei D. Manuel, aportou em Malaca para estabelecer relações e dois anos mais tarde Afonso de Albuquerque desembarcou em Malaca, demoliu a Grande Mesquita, e levantou no local uma fortaleza que seria um importante entreposto comercial.

1 Jul 2019

Relações luso-chinesas entre 1644 e 1911 tema de curso na Fundação Oriente em Macau

[dropcap]A[/dropcap]s relações entre Portugal e a China entre 1644 e 1911 vão estar em foco num curso, na próxima semana, que vai realizar-se na delegação de Macau da Fundação Oriente.

“Dois Impérios, Cinco Tempos”, ministrado por Jorge Santos Alves, vai analisar as relações luso-chinesas, durante as duas últimas dinastias imperiais, a de Bragança em Portugal, e a Qing na China, em articulação com a evolução histórica de Macau, porto entre os dois impérios e com a história geral da Ásia oriental na transição para o período colonial, de acordo com um comunicado da delegação de Macau da Fundação Oriente.

“A compreensão desse quadro geral será repartida em Cinco Tempos, que correspondem a outros tantos processos históricos, alguns dos quais com forte ligação à época contemporânea”, indicou.

Este curso de formação avançada terá quatro sessões de duas horas, que vão decorrer entre 8 e 12 de Julho, na Casa Garden, em Macau. Jorge Santos Alves é professor auxiliar da Faculdade de Ciências Humanas e Coordenador do Instituto de Estudos Asiáticos, da Universidade Católica Portuguesa, em Lisboa.

Além de investigador sénior do Centro de Estudos de Comunicação e Cultura (FCH-UCP), Jorge Santos Alves dirige a Revista Oriente, da Fundação Oriente. Foi professor convidado da Universidade de Macau (2006-2010), onde tinha ensinado a título permanente entre 1990 e 1996.

1 Jul 2019

Manifestantes investem contra a entrada do Conselho Legislativo de Hong Kong

[dropcap]A[/dropcap] polícia de Hong Kong travou hoje, usando gás pimenta, manifestantes que investiram contra o edifício do Conselho Legislativo, quando decorre a marcha anual pela democracia no 22.º aniversário do regresso do território à China.

De acordo com a imprensa local, os manifestantes conseguiram quebrar algumas portas de vidro do edifício, enquanto a polícia de choque tentava dispersar a multidão com gás pimenta.
Devido aos confrontos, a organização Civil Human Rights Front [Frente Civil de Direitos Humanos] já indicou que a marcha não vai terminar no Conselho Legislativo, como estava previsto, mas num local próximo.

Milhares de pessoas estão concentradas nas ruas da região administrativa especial chinesa para a marcha anual em prol da democracia, que este ano é também uma marcha contra as controversas emendas à lei de extradição, que permitiria extradições para a China continental.

Esta manhã, pouco antes da tradicional cerimónia do hastear das bandeiras da China e de Hong Kong, a polícia carregou sobre grupos de manifestantes, sobretudo jovens, que tentavam bloquear algumas das principais artérias da cidade.

1 Jul 2019

Automobilismo | Red Bull dispensa duplo vencedor do GP Macau

No passado mês de Novembro, Dan Ticktum entrou para o restrito painel de pilotos que venceram o Grande Prémio de Macau de Fórmula 3 por duas ocasiões. Depois da notícia de que a restrita porta da Fórmula 1 poderia estar aberta ao britânico, a Red Bull veio agora fechar essa possibilidade

 

[dropcap]H[/dropcap]á seis meses, aclamado pela imprensa internacional especializada pelo seu triunfo irrepreensível entre nós, o inglês de 20 anos era um sério candidato a um lugar na Fórmula 1. Seis meses depois, Ticktum recebeu “ordem de marcha” de quem lhe ia proporcionar essa possibilidade, a Red Bull.

Depois do segundo triunfo consecutivo no Circuito da Guia e sem pontos suficientes para tirar a super-licença, e assim garantir um lugar na Fórmula 1 esta temporada, o piloto que igualou o feito de Edoardo Mortara (2009/10), António Félix da Costa (2012/16) e Felix Rosenqvist (2014/15) foi enviado pela Red Bull para o Japão. A ideia era que o vice-campeão europeu de Fórmula 3 seguisse as pisadas do francês Pierre Gasly que usou a experiência acumulada no exigente campeonato de monolugares nipónico Super Fórmula como trampolim para o “Grande Circo”.

Contudo, ao fim das três primeiras corridas, Ticktum só somou um ponto e ocupava uma modesta 14ª posição na classificação de pilotos.

Na passada quinta-feira, a Red Bull Junior Team comunicou que o mexicano Pato O’Ward iria tomar o volante de Ticktum no Japão. Não houve lugar a explicações, nem qualquer menção ao futuro do jovem inglês. Todavia, em declarações à imprensa durante o fim-de-semana do Grande Prémio da Áustria de Fórmula 1, o Dr Helmut Marko, que gere todas as actividades relacionadas com o automobilismo do gigante das bebidas energéticas, esclareceu que Ticknum não abandonou o Red Bull Junior Team, foi sim afastado.

Menino mal-comportado

Ticktum foi recebido de braços aberto no programa de jovens pilotos da Red Bull, apesar do seu passado colorido. Em 2015, o londrino, então com 16 anos, foi suspenso por duas temporadas por ter atingido propositadamente um rival durante um período de “safety-car” numa corrida da Fórmula 4 britânica. Regressaria à competição no final de 2016 após a Red Bull ter visto nele um campeão em potência.

O ano passado, quando era uma séria possibilidade para a Toro Rosso, a segunda equipa da Red Bull no mundial de Fórmula 1, Christian Horner, o chefe de equipa da Red Bull Formula 1, criticou o compatriota publicamente por “falar antes de pensar”. Isto, depois de Ticktum ter levantado suspeitas quanto à performance superior de Mick Schumacher na segunda metade no europeu de Fórmula 3. Na altura, Horner afirmou que Ticktum teria que moderar o temperamento se quisesse ser considerado um candidato viável à F1.

Colocado pela Red Bull nas séries de Inverno do asiático de Fórmula 3, com o objectivo de alcançar pontos para a tão desejada super-licença, Ticktum voltou a falar com coração quando os resultados ficaram muito aquém das expectativas. Com dois triunfos em Macau no bolso e o estatuto de super-favorito, Ticktum não conseguiu impor-se a uma concorrência teoreticamente mais fraca e lançou dúvidas infundadas sobre a legalidade dos carros dos seus adversários. A desilusão foi tão grande que a Red Bull colocou um fim prematuro a esta primeira aventura asiática.

O seu curto périplo na Super Fórmula também não correu bem, deixando críticas à equipa e levantando dúvidas sobre a condição do seu monolugar. A Red Bull não foi na conversa e desta vez cortou o mal pela raiz.

1 Jul 2019

A grande dama do chá

Por Fernando Sobral

 

[dropcap]A[/dropcap] porta não tinha número. Só uma luz fosca, que vinha do interior de uma lanterna vermelha que se agitava ao sabor da brisa nocturna, deixava entender que ali havia uma casa comercial. Daqueles muito comuns na Rua da Felicidade, onde os donos nem vendiam nem compravam produtos. Eram fachadas para o jogo e para o consumo de ópio que se fazia no interior, algo que não inquietava ninguém, nem mesmo as autoridades policiais. Cada um vivia no seu mundo, como sempre acontecia em Macau. Cada casa daquelas escondia segredos muito próprios, tal como as pessoas que ali entravam. Quando Du Yuesheng entrou naquele local anónimo pediu aos seus guarda-costas para ficarem à porta. Nada o espantava, nem o fumo intoxicante, nem as luzes difusas, nem as prostitutas de olhar cansado que circulavam no interior em busca de clientes, nem os homens que, concentrados no jogo do fan-tan, não olhavam para quem entrava. Sabia que, mais escondidos, estavam os salões de ópio e os divãs onde alguns homens procuravam um pouco de amor e sexo. Até ali havia alguma discrição. Era um local para os mais pobres e marinheiros que não conseguiam entrar nos melhores bordéis e casas de jogo da rua de todas as perdições. Du caminhou calmamente em busca do seu objectivo. Tossiu, ao sentit o cheiro misturado do tabaco e do ópio de pouca qualidade. Num canto, com pouca luz, viu-o. Estava sozinho, com cartas na mão. Olhava para as que estavam sobre a mesa e para as que tinha entre os dedos. Jogava poker consigo próprio. Tinha um espelho na mesa, para onde olhava fixamente de vez em quando. Estudava a postura da sua cara, treinando uma das componentes principais do poker, o bluff. Algo que muitos diziam que era errado e imoral. Mas, que, de facto, era admirado como forma de sucesso.

Luc LeFranc estava assim, concentrado ou, pelo menos, abstraído de tudo o que o cercava. Du aproximou-se e ficou perto dele. Depois sentou-se à sua frente. Nem assim Luc desviou os olhos das cartas. O seu ar era um pouco oriental, o que era natural num filho de uma chinesa e de um francês. Conhecedor da língua chinesa, e também do francês, singrara rapidamente na polícia do quarteirão francês de Xangai. Fora lá que se tinham conhecido. Luc era conhecido pela sua razoável honestidade, algo que também era importante num mundo onde todos pareciam ser corruptos ou desejosos de o ser. Du devia-lhe algo. Era uma época sangrenta, sem muitas regras.

Nessa altura o chefe dos serviços secretos de Chiang Kai-shek, Dai Li, matava todos os suspeitos de serem comunistas em Xangai. E estes retaliavam como podiam. Du alinhava com Dai Li, e o seu Bando Verde era conhecido pela sua ferocidade. Quando tentaram raptar uma das amantes de Du, na Rue Lafayette, Luc vira e anotara a matrícula do carro que a levava. Fizera com que ela chegasse a Du. E este enviara os seus fiéis em busca dos raptores, que tinham sido mortos com uma violência inimaginável. Du agradecera-lhe, mas talvez cansado de tudo o que acontecia por esses dias, Luc LeFranc fugira de Xangai e refugiara-se em Macau. Ou talvez tivesse seguido uma mulher. Nunca se soube. Du, que não esquecia certos gestos, protegera-o discretamente de todos os que tinham contas a ajustar com LeFranc. Escondera o facto de ele viver em Macau e ganhar a vida a jogar. Mas sabia o que ele fazia. E viera ter com ele. Porque Luc LeFranc tinha olhos e ouvidos em todo o lado. Quem quisesse ganhar a guerra da informação em Macau tinha de contar com ele. Ao fim de algum tempo, Luc levantou os olhos das cartas, sorriu, e disse:

– O que o traz a Macau, senhor Yuesheng?
– Podes tratar-me por Du. Sempre o fizeste em Xangai.

Fez uma pausa antes de prosseguir:

– Não sabes porque estou aqui?

O olhar de Luc enfrentou o de Du. Continuava igual, irónico e mordaz, tal como o gangster o tinha conhecido em Xangai.

– Eu sei que és perseguido, mas não é isso que te traz aqui. Não estás com medo. Que queres saber, Du?

– Como está a correr a tua vida pacata.
– Só isso? É pouco. Não te incomodarias em vir até este sítio sebento só para saberes isso.
– É verdade. Não vale a pena mentir-te. Jin Shixin. Lembras-te dela, de Xangai? Como se tem comportado ela?
– Não é isso que queres saber. Queres saber quem ó o português, não é?

Du olhou à volta, para aquele ambiente escuro e encardido. Um dos que não era frequentado por ocidentais. Ali dentro só estavam chineses e Luc. Mesmo assim não era completamente seguro. Poderia haver comunistas ou agentes japoneses. Mas estava mais tranquilo. Lera no “South China Morning Post” uma notícia sobre ele que o deixara confiante. Dizia que tinha sido avistado em Hong Kong. Era bom que os seus inimigos e os japoneses acreditassem. Assim estava mais seguro em Macau. Voltou a olhar à volta, por precaução. Todos estavam com atenção ao jogo e não a eles. Luc deu uma gargalhada.

– Não te preocupes, Du. Todos eles estão aqui pelo fan-tan e pelas mulheres. Ninguém sabe quem tu és.

Du Yuesheng olhou para as cartas que estavam em cima da mesa.

– Continuas a jogar, Luc?
– Todos temos as nossas maneiras de ganhar a vida. Eu tenho o jogo. Chega-me para viver feliz. O Du tinha poder. Mas, já viu, o que é o poder?

Os olhos de Luc pareciam imersos numa abstracção sombria, olhavam para as cartas num jogo solitário. Vinha para ali abstrair-se antes de sair para ir jogar, e ganhar, nos hotéis e salas de jogo frequentados por ocidentais.

– Já não tenho tempo para sentimentos, Du. Tenho relações comerciais.

Luc falava pouco. Sabia o perigo que era, nesses dias, dizer o que se pensava ou se sabia. Agora todos se abstinham de confidências junto das pessoas que tinham conhecido pouco antes, pois num bar de hotel todos poderiam estar a soldo de alguém ou de um serviço secreto. Macau já estava cheio deles. Todos desconfiavam de todos. Du percebeu:

– Aqui até a lealdade tem um preço, não é verdade, Luc?
– Sim, é isso. Por isso é que este lugar é seguro. Aqui só vêm os que pouco têm. Por isso neste local imundo ouve-se o que mais ninguém escuta. Que desejas afinal?
– Informações. Saber o que todos fazem em Macau.
– É possível. E em troca?
– Tenho uma informação que te interessa.
– Não sabes nada que me interesse, Du. Tudo o que sabes, eu sei. Tal como acontecia em Xangai, mas ao contrário. Aí tu é que sabias tudo. Mas serás informado. Sobre os japoneses. Sobre os negócios.

Du sorriu. Luc aprendera o valor da informação. Perguntou-lhe:

– Não tens medo de perder todo o teu dinheiro ao jogo?
– Não, Du. Nunca perderei ao jogo porque não tenho nada a perder.

1 Jul 2019

Zhuge Liang, o Dragão Adormecido

[dropcap]C[/dropcap]omo grande estratega militar, só comparável com Sun Zi do século V a.n.E., Zhuge Liang (181-234) tinha o nome literário Kongming e era conhecido pela alcunha do Dragão Adormecido. Potência à espera de ser acordada pois, pouco antes da sua existência se criara da Filosofia do Dao o Daoísmo religioso como contrabalanço às religiões estrangeiras que chegavam à China.

Em 207, o próprio Liu Bei, descendente da família imperial dos Han, veio a casa de Zhuge Liang pedir para, como homem de Estado e criativo inventor, se tornar o seu conselheiro militar e organizar o exército do que viria a ser o Reino Shu Han, no Período dos Três Reinos (220-280).

Nos finais do século II, a dinastia Han (206 a.n.E.-220) tinha governantes fracos e corruptos, havendo contínuas lutas dentro da corte, sendo a população oprimida e explorada. Em 184, trezentos mil camponeses em muitas partes do país levantarem-se contra o Governo, no que ficou conhecida pela Revolta dos Turbantes Amarelos. Três anos antes, no ano 181 nascera Zhuge Liang em Yangdu de Langya, hoje vila de Yinan, pertencente ao distrito de Linyi situado na parte Sul da província de Shandong. A sua mãe morreu quando tinha três anos (184) e devido à morte de seu pai, Zhuge Gui, que fora magistrado no distrito de Taishan, ainda criança, com oito anos (189) ficou à guarda do tio, Zhuge Xuan.

O general Yuan Shu, um senhor da guerra que mais tarde em 197 se auto proclamou imperador da curtíssima dinastia Zhong, enviou Zhuge Xuan para tomar conta de YüZhang, pequena localidade a Norte da actual província de Jiangxi, próximo de Nanchang. Como a nomeação não teve a aprovação dos oficiais Han, Zhuge Xuan foi ter com o seu amigo Liu Biao, o perfeito (governador) da província de Jing (Jingzhou em Hubei), que no ano 190 mudara a capital de Hanshou para Xiangyang. Assim em Xianyang ficou a viver, acompanhado pelo sobrinho Zhuge Liang, tendo este estudado durante três anos numa escola, talvez na Academia fundada por Liu Biao pelo ano de 196. Ao mesmo tempo, Liang escolheu Pang Degong para ser seu mestre.

Zhuge Xuan morreu em 197 e após a morte do tio, Zhuge Liang com dezassete anos foi viver para a aldeia Longzhong, actualmente próximo de Xiangyang, província de Hubei, onde se dedicou à agricultura. O seu tempo livre passava a ler, assim como gostava de conversar com os mestres Pang Degong e Xü Shu, pessoas mais velhas ensinando-lhe coisas da vida e com quem trocava ideias sobre as convulsões que ocorriam pelo país.

Zhuge Liang passou mais ao menos dez anos em Longzhong, onde fez muitos amigos entre os locais, mantendo relações de amizade com intelectuais como Sima Hui e Huang Chengyan.

Certa vez, Huang Chengyan sabendo Zhuge Liang andar à procura de esposa para se casar, propôs-lhe a filha. Avisou-o ser ela feiosa, apesar de dotada de muitos talentos, que bem se complementaria com os atributos dele. Concordando, casou-se com Huang YueYing, apesar de no registo histórico local Xiangyang Ji, onde vem narrado tal episódio, o nome da esposa nunca ter sido mencionado.

Pérola da imortalidade

É preciso lembrar pouco se saber sobre Zhuge Liang, figura para além de histórica tem a complementá-la várias lendárias e mitológicas narrações a envolvê-lo num ser misterioso e de grande poder. Se a maior parte da sua vida apenas vem narrada no Romance dos Três Reinos (San Guo Yanyi 三国演义) escrito por Luo Guanzhong (1330-1400), há outras histórias que nem aí foram contadas e uma delas, a mais estranha de todas, refere-se a como Zhuge Liang se torna um Imortal. Registada após via oral ter passada de geração em geração e só escrita muito tempo depois nas Histórias de Longzhong.

Nessa mitológica lenda sobre a sua juventude explica-se a razão de Zhuge Liang se apresentar sempre com um leque de penas na mão e uma túnica de mestre daoista.

Ainda criança, durante o dia trabalha numa loja de chá e à noite estuda em casa. Certo dia, à loja, cheia de gente a beber, chega um idoso daoista e sentando-se, logo começa a falar sobre assuntos deveras muito interessantes, colocando as pessoas a escutar com atenção. Vem desde então diariamente à casa de chá, sentando-se de manhã até à hora do fecho, aparecendo cada vez mais gente para o escutar e com ele falar. Parece saber de tudo, desde o passado histórico até aos dias que correm, de astronomia à geografia, de política aos assuntos militares. Como empregado Zhuge Liang muito aprecia aquelas sessões e cada vez mais a admiração cresce perante aquela prodigiosa figura, mas, devido à sua juventude e posição, não lhe é permitido questionar a distinta personagem. Assim aumenta a curiosidade sobre aquele estranho ser.

Certa vez Zhuge Liang encontra a oportunidade de saber onde ele habita pois, usando inteligente solução, enquanto o ancião entusiasmado fala, consegue apoderar-se da bengala de bambu que sempre o acompanhava. Pegando no bastão, faz um buraco na última sessão e aí coloca uns pós de incenso. Bengala no lugar, sem que o orador desse por nada.

Após este sair da casa de chá, Zhuge Liang, para não ser apanhado a segui-lo, espera, pois, apenas tem de perseguir o rasto desse pó deixado pelo caminho e assim pôde chegar ao local onde o idoso estará. A marca do pó desaparece em frente a um pequeno pinhal, sem haver casa alguma. Estranho!

De repente o som do ressonar e olhando de onde vem, repara num ninho colocado no alto de uma dessas árvores, onde dorme um grande crane. Devagar aproxima-se para melhor analisar o ninho e já por baixo, continuando a olhar para cima, de repente do bico cai uma gota de saliva em forma de pérola na boca de Zhuge Liang, que a engole.

De repente o crane acorda e com a pérola desaparecida, cai do ninho e ao chegar ao chão, logo se transforma no nosso conhecido ancião. Este desabafando refere trabalhar na pérola há milhares de anos e ter ela o poder de saber fazer muitas coisas. Transmitida quando ele a engoliu, agora podia deixar a vida. Ao ouvir tal, Zhuge Liang assustado e pesaroso pelo que provocara, logo escuta do ancião, ter acontecido porque tinha que ser (yuanfan).

Então relatou-lhe ter ali vivido milhares de anos, sem ninguém o ter encontrado. – Hoje tu viste-me, por isso és uma pessoa especial. Assim, após eu passar desta vida e transformado em crane, tu retiras sete penas de cada uma das minhas asas para fazeres um leque e ofereço-te as minhas roupas de mestre do Dao que te protegerão. Quando tiveres algum problema, abanas o leque e a pérola dentro do teu corpo dar-te-á a solução.

Terminada a conversa o idoso finou e transformou-se de novo num crane a jazer no chão. Assim, estes dois adereços, roupa e leque, passaram a acompanhar Zhuge Liang durante toda a vida.
Ana Maria Amaro refere sobre “a pérola que todos os dragões transportam e que não podem perder, para manterem a imortalidade, pérola que é formada pela sua própria saliva e tem a propriedade de satisfazer todos os desejos se for apanhada por algum feliz mortal”.

1 Jul 2019

Umwelt I

[dropcap]O[/dropcap] ser humano para a medicina antiga não era o corpo humano desligado anatomicamente do meio ambiente, do milieu físico, da Umwelt. Não é o interior somático delimitado pelas fronteiras físicas do corpo humano.

Podemos conceber o corpo humano como a configuração mecânica com que nos surge. É como o aspecto físico que um profiler esboça a partir da descrição que alguém faz de um suspeito. Nesse sentido, as características: sexo, idade, etnia, compleição física, tamanho, envergadura, peso, altura, aspecto do rosto, etc., etc., são determinações que apontam para uma morfologia mais ou menos complexa, mas exterior do ser humano. A percepção do corpo humano é igual à percepção de qualquer corpo. Capta só superfícies, isto é, o lado visível do objecto dentro da nossa perspectiva. Não vemos nada do que está tapado. Para lá da epiderme não vemos nada. Nenhum horizonte interno é captado à vista desarmada.

Assim, compramos roupa, ocupamos espaços públicos e privados, temos lugar ou não em transportes públicos, restaurantes, espectáculos, etc., etc.. É inegável que cabemos ou não cabemos com outras pessoas em aviões e que sentimos mais ou menos as dimensões simpáticas e acolhedoras do tamanho de apartamentos, roupa, camas, cadeiras, etc., etc..

Isto é, nós somos o tamanho do corpo que temos. Temos também uma percepção do que se passa no nosso interior. Sentimo-nos mais ou menos enfartados, pesados, leves, com o comemos, se muito, se pouco. Sabemos da nossa altura, se somos mais ou menos altos. Somos, portanto, o que achamos ser a configuração mecânica do corpo.

O nosso corpo está continuamente sob acção de um radar interior. O corpo não se reduz nunca apenas a músculos, tendões, articulações, ossos, carne, órgãos e aparelhos. Há sempre um sobredeterminação funcional a dar sentido ao conteúdo estritamente percepionado. Sabemos como puxar e empurrar, agarrar e soltar, porque há uma acção do corpo todo, com uma maior solicitação de uns músculos do que de outros. A própria pele — que cobre toda a extensão do nosso corpo — sente-se diferente ao vento, ao frio e ao calor, dentro e fora de água. Sentimos também o bater do coração, o fluxo sanguíneo, a falta de ar, dores musculares e de cabeça, tudo no nosso interior por assim dizer. Não damos conta dos músculos solicitados habitualmente. Há actividades físicas que, às vezes, solicitam músculos que nem sabíamos que tínhamos.

O texto sobre o ar, as águas e os lugares esboça uma concepção do corpo humano a existir para lá do interior das suas fronteiras físicas. O ser humano é mais do que um volume tridimensional. É mais do que um vulto com um determinado aspecto. Por um lado, cada pessoa é igual a si própria e diferente de qualquer outra. Cada um é como cada qual. Para a medicina, cada caso é um caso.

Por outro lado, podemos apurar características semelhantes e diferentes entre indivíduos: rostos, compleições físicas. Um asiático é diferente de um europeu. Mas há asiáticos e europeus parecidos e diferentes entre si.

1 Jul 2019

Trump é o primeiro Presidente americano a entrar na Coreia do Norte

Donald Trump tornou-se ontem no primeiro Presidente dos Estados Unidos a entrar em solo da Coreia do Norte, depois de cumprimentar o líder norte-coreano, Kim Jong-un

 

[dropcap]E[/dropcap]ste foi o terceiro encontro entre os presidentes dos dois países, depois da cimeira histórica de Singapura em Junho de 2018 e o encontro de Hanói em Fevereiro passado. “É um grande dia para o mundo”, disse Donald Trump depois de ter cumprimentado Kim Jong-un, cerca das 15:50 locais (14:50 em Macau). O Presidente norte-coreano afirmou que espera “ultrapassar as barreiras” graças às ligações com Donald Trump.

O encontro não será suficiente para solucionar o delicado ‘dossier’ nuclear norte-coreano, mas é simbólico para os dois países, que antes se ameaçavam de aniquilação mutuamente.

Este encontro, que ocorreu na vila de Panmunjon, onde foi assinado o armistício (entre as duas coreias) de 1953, “significa que queremos pôr termo a um passado infeliz e tentar criar um novo futuro”, afirmou ainda o Presidente norte-americano antes de uma reunião privada com o homólogo norte-coreano.

Donald Trump disse ainda que vai convidar o líder norte-coreano, Kim Jong-un, a visitar Washington “no momento certo”. “Vou convidá-lo agora mesmo à Casa Branca”, afirmou Trump, depois de se encontrar com Kim na fronteira entre as coreias e momentos antes de ambos iniciarem uma reunião privada junto da linha divisória e da zona desmilitarizada (DMZ).

O Presidente dos Estados Unidos afirmou também que os dois países vão iniciar reuniões de trabalho “nas próximas três semanas” sobre o processo de desnuclearização. “O que vai acontecer é que nas próximas duas ou três semanas as equipas vão começar a trabalhar”, disse Trump, depois de concluir o encontro à porta fechada com Kim Jong-un, na fronteira entre as Coreias e que durou cerca de 50 minutos.

Apesar deste passo, o Presidente norte-americano disse que as actuais sanções à Coreia do Norte vão continuar em vigor.

Comitiva familiar

Antes de deixar solo sul-coreano, Donald Trump disparou as habituais críticas à Administração Obama e contra os meios de comunicação social, enquanto o Presidente Moon Jae-in se manteve em silêncio. O Presidente norte-americano agradeceu a Kim Jong-un a gentileza de o ter salvo das críticas dos jornalistas presentes e categorizou as relações com Pyongyang com a Administração Obama como “desastrosas”.

Porém, o alvo preferencial de Trump antes de entrar na zona desmilitarizada foram os jornalistas. “Se ele decidisse não aparecer, vocês iriam atacar-me fortemente. Quero agradecer-lhe [a Kim Jong-un] por ter sido tão rápido em proporcionar este encontro. Movemos montanhas”, disse Trump, antes de entrar na zona desmilitarizada.

Entre a comitiva norte-americana estiveram Ivanka Trump e o seu marido Jared Kushner. Assim que o casal saiu de uma das casas que estão ao longo da linha de demarcação, uma jornalista da Bloomberg perguntou à filha do Presidente norte-americano como tinha sido entrar na Coreia do Norte. “Surreal” foi a resposta de Ivanka Trump.

1 Jul 2019

Cimeira do G20 termina com apoio ao comércio livre e crescimento económico

[dropcap]O[/dropcap]s países do G20 concluíram no sábado a cimeira daquele grupo com uma declaração de apoio “aos fundamentos do livre comércio” e ao “crescimento económico”, com as tensões globais como pano de fundo, segundo o Japão, que recebeu a reunião.

Os líderes do G20 “concordaram na sua determinação em favorecer o crescimento económico” e mostraram “ansiedade e descontentamento no contexto da globalização” e pelo “sistema comercial global”, afirmou o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, numa conferência de imprensa no final da reunião de dois dias. O grupo “foi capaz de reafirmar os fundamentos do livre comércio”, segundo Abe, que sublinhou em particular o apoio do G20 a “alcançar mercados abertos, livres e não discriminatórios” e “um terreno de jogo justo”.

“É difícil encontrar uma solução para tantos desafios globais de uma só vez, mas conseguimos mostrar uma vontade comum em muitas áreas”, afirmou o primeiro-ministro nipónico.

Os mandatários também reconheceram os “claros riscos da desaceleração da economia global”, segundo Abe, adiantando que os países do G20 “estiveram de acordo na sua determinação em favorecer o crescimento económico” e “reformar a Organização Mundial do Comércio (OMC)”.

O comunicado final acordado pelos líderes do G20 sublinha “a intensificação das tensões geopolíticas e comerciais”, mas no texto não se inclui qualquer menção ao auge do proteccionismo, no actual contexto de conflitos comerciais entre os Estados unidos e a China e outros países.

“O crescimento global parece estar a estabilizar-se, e em geral espera-se um crescimento moderado mais à frente este ano e em 2020”, sublinha a declaração conjunta do G20, que também se compromete a “enfrentar os riscos” derivados das tensões anteriormente mencionadas e a “empreender mais acções” se for necessário.

Entretanto, 19 dos 20 membros do G20 – sem os Estados Unidos – reafirmaram em Osaka o compromisso da “implementação completa” do acordo assinado em 2015 em Paris sobre a luta contra o aquecimento global. Os signatários concordam na “irreversibilidade” deste acordo, numa declaração final redigida em termos similares aos publicados no final do G20 no ano passado mas obtido com dificuldade devido à oposição de Washington.

1 Jul 2019

Hong Kong | HRW quer confrontos entre polícia e manifestantes investigados

A Human Rights Watch defendeu que Hong Kong crie de imediato uma comissão independente para investigar o alegado uso excessivo de força pela polícia a 12 de Junho, quando confrontos com manifestantes causaram pelo menos 80 feridos

 

[dropcap]E[/dropcap]mbora a polícia tenha a responsabilidade de fornecer segurança pública, tem de obedecer a critérios de direitos humanos no uso da força”, afirmou a directora para a China da organização Human Rights Watch (HRW), Sophie Richardson. “O uso bem documentado pela polícia de Hong Kong de força excessiva contra manifestantes pacíficos exige urgentemente uma investigação totalmente independente”, considerou, numa carta enviada na sexta-feira à chefe do Governo de Hong Kong, Carrie Lam.

No dia 12 de Junho passado, milhares de manifestantes reuniram-se junto ao Conselho Legislativo de Hong Kong para protestar contra a lei da extradição, formando barricadas para impedir qualquer acção policial.

Junto ao parlamento, os manifestantes – a maioria dos quais com máscaras ou lenços a cobrir a quase totalidade da cara – gritavam palavras de ordem como “Não à China!” e “Precisamos de democracia!”. O protesto visou pressionar o Governo a recuar na intenção de avançar com alterações à lei da extradição, que permitiriam a extradição de suspeitos para países que não têm acordo com Hong Kong, como é o caso da China continental.

A polícia de Hong Kong acabou por carregar sobre os manifestantes, numa das zonas de acesso ao Conselho Legislativo local, lançou também gás pimenta para obrigar os manifestantes a dispersar. À carga policial, os manifestantes tentaram travar o avanço da polícia com grades, mas a esmagadora maioria colocou as mãos no ar. Outros começaram a distribuir máscaras de protecção contra o gás pimenta.

Reputação em jogo

O Governo de Hong Kong opôs-se a pedidos públicos para uma investigação completa sobre a resposta da polícia ao protesto que, segundo o Hospital de Hong Kong, provocou 81 feridos. “A reputação das autoridades de Hong Kong está em jogo, não apenas por promover uma legislação profundamente impopular, mas também pelo tratamento dado aos manifestantes”, alertou Sophie Richardson. “Criar uma comissão independente de inquérito – que defenda as obrigações de direitos humanos de Hong Kong – pode ajudar a restaurar alguma credibilidade”, concluiu.

1 Jul 2019

Festival | Cinema premiado da China e dos PLP estreia esta quinta-feira

Vêm aí duas semanas de filmes premiados, em língua chinesa e portuguesa. Dezoito longas-metragens, três curtas e seis pequenas animações, compõem o ciclo de cinema que, de 4 a 17 de Julho, pode ser visto em Macau

 

[dropcap]O[/dropcap] Festival de Cinema entre a China e os PLP está prestes a iniciar a segunda edição, com mais de 20 filmes em cartaz no Centro Cultural de Macau (CCM) e na Cinemateca Paixão (CP), a partir da próxima quinta-feira, de 4 até 17 de Julho. Organizados em três categorias – “Retrospectiva de Clássicos”, “Nova Visão da China e dos Países de Língua Portuguesa” e “Olá Macau” –, os filmes serão complementados por conversas pré ou pós-projecção, com curadores e convidados, que irão contextualizar as obras de acordo com as diferentes épocas, geografias e culturas apresentadas.

Lançado como parte integrante da primeira edição do “Encontro em Macau – Festival de Artes e Cultura entre a China e os Países de Língua Portuguesa” em 2018, o 2º Festival de Cinema arranca este ano com uma versão digitalmente remasterizada da longa-metragem “Primavera Numa Cidade Pequena”, de 1948, uma obra emblemática do cinema chinês pelo poeta e realizador Fei Mu. A sessão conta com uma palestra final, intitulada “A Paisagem Mutante do Cinema Chinês”, apresentada pela curadora convidada Joyce Yang e pela conhecida crítica de cultura e cinema Dai Jinhua, professora de Literatura Comparada e Cultura da Universidade de Pequim.

Numa pequena cidade do sul da China, a jovem Yuwen atravessa uma realidade depressiva com o marido doente Liyan, mas a sua vida vai ser perturbada pela visita do antigo amante, Zhichen. Na conversa pós-projecção, “a narratividade urbana do cinema chinês será explorada historicamente, desde a fundação da RPC até ao presente”, pode ler-se no programa do Instituto Cultural (IC).

A longa-metragem do realizador chinês Jia Zhangke, “Natureza Morta” (Still Life, 2006), é outro dos destaques do ciclo, vencedor do Leão de Ouro do 63º Festival de Cinema de Veneza. Com o projecto da barragem das Três Gargantas por cenário, no rio Yangtze, o filme segue um mineiro e uma enfermeira de Shanxi, em busca dos respectivos cônjuges na cidade prestes a ser demolida. Thomas Shin, crítico cinematográfico de Hong Kong, falará com o público após a sessão, marcada para 5 de Julho, às 19h30.

“A Caminho de casa” (Getting Home, 2007), do realizador chinês Zhang Yang, foi o vencedor do Prémio do Júri Ecuménico (Panorama) do Festival de Cinema de Berlim 2007 e é um filme que narra uma história de viagem com “gente hilariante e incidentes surpreendentes”, a 11 de Julho.

“Antônio das Mortes” (The Dragon of Evil Against the Saint Warrior”, 1969), do cineasta brasileiro Glauber Rocha, um dos pais do chamado “Cinema Novo”, passa no dia 12. Trata-se de um antigo western que explora o fenómeno da decadência do “coronelismo”, naquela época conturbada do país, tendo Glauber Rocha conseguido o prémio de Melhor Realizador no Festival de Cannes em 1969.

Mais alguns clássicos, incluídos nesta mostra, são “A Ilha dos Amores” (The Island of Love, 1982), de Paulo Rocha (Portugal, Japão), nomeado para a Palma de Ouro do Festival de Cannes nesse ano, sobre o escritor português Venceslau de Moraes; “Chuveiro” (Shower, 1999), de Zhang Yang (China), que foi prémio da Crítica Internacional (FIPRESCI) no Festival Internacional de Cinema de Toronto; e “Mortu Nega” (Death Denied, 1988), de Flora Gomes (Guiné-Bissau), que daria ao realizador duas menções especiais no Festival de Cinema de Veneza. Passam a 6, 7 e 14 de Julho, respectivamente.

Filmes recentes

Entre o conjunto de filmes mais recentes, que dão uma visão do que tem sido feito na China e nos Países de Língua Portuguesa (PLP), encontram-se “Âmbar Azul” (Blue Amber, 2018), de Zhou Jie (China), que ganhou o prémio novo talento asiático no Festival de Cinema de Xangai; e “Jinpa” (2018), de Pema Tseden (Tibete, China), que contou com a produção de Wong Kar-Wai e venceu o Melhor Argumento do 75º Festival de Veneza. Os filmes são exibidos a 6 e 7 de Julho.

Também a 7 de Julho é projectado “Divino Amor” (Divine Love, 2019), de Gabriel Mascaro (Brasil), que foi nomeado para os Festivais de Sundance e de Berlim de 2019. O filme “Serpentário” (Serpentarius, 2019), de Carlos Conceição (Angola, Portugal), foi nomeado para o último Festival de Cinema de Berlim; “Cão Ladrando à Lua” (A Dog Barking at the Moon, 2019), de Xiang Zi, venceu de um Teddy Award, prémio especial do júri do 69º Festival de Berlim; e “Adeus, Meu Filho” (So Long, My Son, 2019), de Wang Xiaoshuai (China), arrebatou dois Ursos de Prata – Melhor Actor e Melhor Actriz – no último Festival de Berlim 2019. Os três filmes passam a 10, 13 e 14 de Julho.

Cinema de Macau

As longas de Macau chegam à tela nos dias 9, 10, 11 e 13 de Julho, dando oportunidade ao público de rever “Irmãs” (Sisterhood, 2016), da realizadora Tracy Choi; “O Amor é Frio” (Love is Cold, 2016), de Fei Ho; “Chuva Passageira” (Passing Rain, 2017), de Ka Keong Chan; e “Hotel Império” (Empire Hotel, 2018), de Ivo M. Ferreira, uma co-produção entre Portugal e Macau. Numa única sessão de curtas locais, a 16 de Julho, vai ser possível assistir aos filmes “Geração Ressaca” (The Age of Hangover, 2017), de Mike Ieong; “Ilegais” (Ilegalist, 2017), de Penny Lam; e “G.D.P.” (Grandma’s Dangerous Project, 2018), de Peeko Wong. A sessão tem 106 minutos.

Filmes de animação também fazem parte deste Festival. No dia 13 de Julho, sábado às 15h, os mais pequenos vão poder ver numa sessão única, de 37 minutos, “O Almoço de Meu Pai” (My Father’s Lunch), de Jason Pun; “O Farol” (The Lighthouse), de Jay Lei; “Céu Estrelado” (Starry Sky), de Zue Ku; “Pundusina”, de Ka Choi Lou; “Delicioso” (Delicious), de Su Kei Lam; e “O Coelho e o Crocodilo” (Rabbit Meets Crocodile), de Kin Hang Sam. As obras, de 2018 e 2019, são assinadas por realizadores locais.

O filme de encerramento é uma recente produção nacional, que fez parte dos nomeados para os Festivais Mar del Plata 2018 e Berlim 2019. “A Portuguesa” (The Portuguese Woman, 2018), de Rita Azevedo Gomes, é uma adaptação do romance do austríaco Robert Musil para um drama de época, passado no século XVI, sobre a história de uma mulher lusa que vive com o marido aristocrata no norte de Itália, até que este decide partir para a guerra. Esta sessão, a 17 de Julho às 19h30, termina o ciclo de duas semanas que passa na Cinemateca Paixão. Os filmes de abertura e de encerramento são exibidos no pequeno auditório do CCM. Os bilhetes custam 60 patacas, com diversos descontos, e já se encontram à venda.

1 Jul 2019

Guerra comercial sem impacto nas licenças de jogo, diz cônsul dos EUA

[dropcap]A[/dropcap] guerra comercial que se vive entre os Estados Unidos da América e a China não terá impacto na indústria do jogo de Macau, não comprometendo a atribuição de licenças em 2022. A ideia foi defendida pelo cônsul-geral dos Estados Unidos para Hong Kong e Macau, Kurt Tong, à Rádio Macau.

“A minha expectativa é a de que as pessoas que vão tomar as decisões em 2022 o façam com base unicamente nos investimentos que poderão ser feitos. O que quero dizer é que espero que o processo seja transparente”, disse me entrevista à mesma fonte.

A certeza advém das “garantias de toda a gente em Macau de que o processo vai ser justo e transparente”. Neste sentido, “quem procura fazer negócios aqui vai tomar a sua decisão com base no retorno que esperam obter dos investimentos e as pessoas que vão atribuir as licenças vão olhar para o desempenho passado, perspectivas futuras e tomar decisões racionais”, acrescentou. Como tal, Kurt Tong considera que “o processo não vai, de todo, ser afectado pelas negociações entre Washington e Pequim”.

O diplomata reconhece que Pequim tem uma palavra a dizer, mas insiste que o que importa é que o processo seja transparente. “O Governo Central tem um interesse legítimo na forma como Macau se desenvolve e certamente vai interessar-se pelo assunto, mas espero que tudo seja feito de forma transparente e que esteja focado, em primeiro lugar, no desenvolvimento da indústria e da economia”, referiu. Kurt Tong está de saída, deixando o cargo de cônsul-geral dos Estados Unidos para Hong Kong e Macau ao fim de três anos.

1 Jul 2019

Vistos Gold | Sócio de Stanley Ho ligado a alegada burla na compra de armazéns

O Ministério Público português está a investigar um alegado caso de burla na compra de armazéns em troca de vistos gold. Investidores chineses pagaram milhões por lojas, mas perceberam mais tarde que compraram armazéns. Choi Man Hin, sócio de Stanley Ho, está por detrás deste negócio, bem como um escritório de advocacia com ligações a Macau. O advogado Rui Cunha nega qualquer envolvimento no caso

 

[dropcap]O[/dropcap] diário português Público noticiou este sábado que o Ministério Público (MP) em Portugal está a investigar uma suspeita de alegada burla que envolve a compra de armazéns em troca da atribuição de vistos gold.

Os investidores chineses queriam adquirir lojas, mas perceberam mais tarde que tinham comprado armazéns à POAO II – Investimentos Imobiliários, que tem como um dos sócios-gerentes Choi Man Hin, sócio de Stanley Ho e presidente do conselho de administração do Grupo Estoril Sol, que opera casinos em Portugal.

Oito investidores apresentaram queixa às autoridades por se sentirem alvos de burla e especulação dos valores pagos pelos armazéns que, na verdade, não pretendiam comprar.

“O MP está a investigar os contornos que envolveram a construção do Centro POAO, o megacentro comercial chinês grossista no Porto Alto, Samora Correia, concelho de Benavente, que foi anunciado em 2016 como um investimento de 40 milhões de euros”, lê-se no jornal, que escreve ainda que muitos dos que investiram não receberam o visto gold como prometido.

Jin Wenjun, uma das investidoras, disse ao Público que, nos contratos, “em português está escrito armazém, mas em chinês está loja”, adiantando que “jamais compraria um armazém”. Esta disse ainda que “acreditava estar a comprar ‘duas lojas num conceituado centro comercial perto de Lisboa por mais de 551 mil euros’ e não ‘dois armazéns num centro grossista, onde só podem ir lojistas e que, neste momento, parece um local-fantasma, porque são poucos os armazéns ocupados’”.

Rui Cunha nega envolvimento

As queixas foram apresentadas contra a POAO II – Investimentos Imobiliários, os seus sócios e gerentes, os advogados que a representam, Rui Cunha, Glória e Associados, assim como a tradutora. Numa oferta de emprego online, o escritório de advocacia em causa afirma servir de “ponte entre a RAEM e Portugal, através da assessoria jurídica de clientes que pretendam estabelecer negócios em Portugal”. Ao HM, o advogado Rui Cunha, que em Macau detém o escritório de advocacia C&C, garantiu nada ter a ver com este caso. “Não tenho dados do escritório nem do que terá sido publicado. Pessoalmente, nada tenho a ver com esse assunto e com essas pessoas”, disse. Glória Ribeiro, advogada, também não quis fazer comentários ao Público.

A empresa do sócio de Stanley Ho prometeu aos investidores arrendar os armazéns a um valor de quase 14.000 patacas mensais durante cinco anos, sendo que depois iriam comprar esses mesmos armazéns pelo valor de aquisição. Uma das queixosas teme não ver o investimento de volta, uma vez que a POAO II está com um pedido de insolvência em tribunal desde 2017.

O jornal aponta que, depois da compra dos armazéns, “a POAO II contraía empréstimos e hipotecava as fracções que já estavam vendidas.” Segundo o Público, os contratos com hipoteca para a concessão de crédito “não eram do conhecimento dos compradores, que nunca deram o seu consentimento de forma a que aqueles bens servissem como garantia”.

1 Jul 2019

Saúde | Centro médico fecha devido a suspeita de irregularidades

[dropcap]O[/dropcap]s Serviços de Saúde suspenderam a actividade de um centro médico situado no NAPE por um período de 30 dias. Em causa está a suspeita de prática ilegal de actos médicos, administração de medicamentos não autorizada e ampliação de estruturas não licenciadas, apontam em os serviços em comunicado.

A medida foi tomada após inspecção, realizada na passada quinta-feira, em que foi detectado um “stock de medicamentos suspeitos de importação ilegal, incluindo injecção de timosina, injecção de placenta, injecção de hormonas de crescimento, injecção de andrógeno e 93 doses de injecção de glutationa “somente para uso hospitalar”, assim como dois tipos de vacinas (dez vacinas contra o pneumococo e cinco vacinas contra o cancro do colo do útero)”, apontam os SS.

Os trabalhadores do centro também alegaram que médicos não registados em Macau têm prestado serviços de diagnóstico e prescrição de medicamentos a pacientes que ali vão diariamente.

Por outro lado, os compartimentos do centro médico também não estavam em conformidade com o projecto aprovado, nomeadamente no que diz respeito a “uma expansão significativa do local para outra fracção autónoma”.

1 Jul 2019

Director e jornalista da WMG “absolvidos” do crime de calúnia e publicidade

O TJB deu como provado que os arguidos não estavam em Macau entre 28 e 29 de Janeiro de 2016 quando o artigo da polémica foi escrito e editado. Também o facto de não haver uma condenação no exterior contribuiu para que o processo fosse extinto

 

[dropcap]A[/dropcap]ndrew Scott, director-executivo da empresa O Media, que detém a revista especializada em jogo World Gaming Magazine (WGM), e Ben Blaschkle, jornalista da publicação, foram absolvidos num processo em que eram acusados dos crimes de publicidade e calúnia. De acordo com o Tribunal Judicial de Base (TJB), não ficou provado que os dois arguidos estavam em Macau quando foi publicado um artigo no portal da revista sobre a empresa Ho Tram Project Company. Como tal, as leis que os poderiam condenar em Macau não se podem aplicar.

De acordo com o artigo publicado no portal da revista a 28 de Janeiro de 2016, e corrigido no dia seguinte, teria havido um acidente de viação com trabalhadores da Ho Tram, no Vietname. Deste acidente teria resultado a morte de três operários, entre eles uma mulher grávida. No dia seguinte, a revista corrigiu a informação e relatou que afinal só tinha morrido uma pessoa.

Face à acusação, o Tribunal considerou, na sexta-feira, que “não se provou que os arguidos estivessem em Macau” nos dias em causa, pelo que as leis de Macau não se podem aplicar. O facto de a acusação não ter focado a revista World Gaming Magazine, que está registada na RAEM, contribuiu igualmente para que a publicação não tivesse de assumir as responsabilidades, assim como também contribuiu a ausência de uma condenação fora da RAEM, numa jurisdição onde um dos dois estivesse.

No entanto, a juíza do processo deixou reparos ao artigo, em si, e considerou que caso fosse possível aplicar as leis de Macau que o resultado seria diferente. “O artigo pode levar as pessoas ao erro e a considerarem que há uma ligação entre a administração da empresa e o acidente, o que é susceptível de transmitir uma imagem negativa”, foi dito durante a leitura da sentença. “Há dolo eventual”, acrescentou a magistrada.

Ainda na avaliação das provas, a juíza desvalorizou um email apresentado pela defesa, que seria correspondência interna da Ho Tram, e que poderia provar dolo no transporte dos trabalhadores. Isto porque o jornalista optou por proteger a sua fonte e não revelou o enderenço electrónico do correspondente.

Scott feliz

No final do julgamento, Andrew Scott mostrou-se satisfeito com o desfecho. “Estou muito feliz com a decisão. O tribunal considerou que não havia nada que justificasse uma resposta do ponto de vista criminal”, disse, ao HM. “Estamos felizes que o caso esteja terminado e que possamos seguir em frente”, acrescentou.

Em relação aos reparos feitos pela juíza, o director da publicação preferiu não comentar, por considerar que são assuntos do Direito, que não domina. “Não vou entrar nas tecnicidades da decisão, porque não sou um advogado. O que posso dizer é que saio do tribunal como um homem livre e estou feliz com esta decisão. É o que importa para mim”, sublinhou.

O director fez ainda questão de afirmar que a revista actuou sempre de boa-fé ao longo do processo e que corrigiu a informação errada.

Por sua vez, a advogada da Ho Tram Project Company, Sofia Nunes, estranhou a decisão e frisou que a responsabilidade criminal ficou provada. “Foram dados como provados os factos e a responsabilidade criminal. A única razão que o tribunal considerou para a extinção do processo é o caso de ser um artigo publicado online. Os tribunais de Macau não terão competência [nessas situações]”, defendeu, em declarações ao HM. “Estranho a decisão porque há aí uma fuga.

Qualquer pessoa que publique um artigo online no portal de uma revista e que não se encontre em Macau será desresponsabilizada”, apontou.

Ainda quanto à decisão judicial, Sofia Nunes admitiu que tenha pesado a ausência do território dos arguidos, na altura da publicação e, depois, da correcção. A decisão vai agora ser analisada com o cliente para se decidir se será interposto recurso. A contestação para o Tribunal de Segunda Instância tem de ser apresentada num prazo de 20 dias.

1 Jul 2019

Fórum Macau | Xu Yingzhen reconhece que organismo precisa de mais projecção

O Fórum Macau precisa de projecção. Quem o diz é a secretária-geral, Xu Yingzhen, que admite que só assim poderá servir melhor as relações comerciais entre a China e os países de língua portuguesa. Entretanto, o mais recente país a entrar no Fórum Macau, São Tomé e Príncipe, é anfitrião de mais um encontro do organismo

 

[dropcap]A[/dropcap] secretária-geral do Fórum Macau, Xu Yingzhen, reconheceu, em entrevista à Lusa, a necessidade de maior projecção e melhores canais de informação para “servir melhor” as relações comerciais entre a China e os países lusófonos.

Apesar de sublinhar os esforços feitos nos últimos anos, Yingzhen disse que o Fórum, criado em 2003, ainda “precisa de chegar a mais pessoas” para “servir melhor a cooperação e implementar mais resultados” concretos. “Através de vários canais de divulgação, podemos dar maior conhecimento ao mundo exterior deste Fórum de Macau”, reconheceu a secretária-geral, sublinhando que as crescentes deslocações às províncias do interior da China têm sido promovidas com esse objectivo.

Encontro especial

Entretanto, o encontro empresarial que se vai realizar a 8 e 9 de Julho em São Tomé e Príncipe – o último país a aderir ao Fórum Macau, em 2017, meses depois de cortar relações diplomáticas com Taiwan – é, na sua opinião, uma oportunidade para aumentar a eficácia do Fórum. “Acho que podemos, através destes encontros, nomeadamente este primeiro encontro que se vai realizar em São Tomé, promover um maior conhecimento entre as empresas da China e os países de língua portuguesa”, disse.

Sem adiantar muitos detalhes sobre o 14.º Encontro Empresarial China-Países de Língua Portuguesa, o primeiro realizado naquele país africano, Yingzhen enalteceu “a importância” do evento. “É um país que aderiu um bocadinho tarde ao Fórum Macau, por isso a realização deste encontro empresarial chama muito à atenção. O secretariado permanente dá enorme atenção e importância a este encontro”, afirmou.

Participam neste 14.º Encontro Empresarial delegações de empresários dos países lusófonos, instituições públicas de promoção de comércio e de investimento e ainda empresários de municípios e províncias do interior da China, adiantou Xu Yingzhen.

Já sobre a possível adesão da Guiné Equatorial, Xu Yingzhen não afastou a hipótese. “O nosso fórum é uma plataforma aberta, se a Guiné Equatorial quiser aderir pode apresentar um pedido de adesão”, disse, escusando-se a debater o assunto.

De olho na Baía

Para Xu Yingzhen, outra grande oportunidade de promoção do Fórum surge com a Grande Baía, o projecto de Pequim para criar uma metrópole a nível mundial, que junta as regiões administrativas especiais de Macau e de Hong Kong e nove cidades chinesas da província de Guangdong (Dongguan, Foshan, Cantão, Huizhou, Jiangmen, Shenzhen, Zhaoqing, Zhongshan e Zhuhai). “Nas linhas gerais do planeamento para a Grande Baía, consta claramente o posicionamento de Macau enquanto plataforma de serviços”, o que obriga o Fórum a “envidar mais esforços para desempenhar o papel do Governo” neste projecto, acrescentou.

O projecto de Pequim prevê igualmente a construção de um corredor tecnológico e “Macau pode desempenhar um papel importante neste aspecto, nomeadamente na área da medicina tradicional chinesa”, elencou.

A estratégia de promover a medicina tradicional chinesa nos países lusófonos, utilizando Portugal como porta de entrada para a Europa, e Angola e Moçambique para África, é encarada como um dos eixos centrais de actuação para 2019 pelas autoridades de Macau.

“Na conjuntura do desenvolvimento da Grande Baía, Macau pode desempenhar um papel mais importante” enquanto plataforma, assumiu.

Bendita peste

A secretária-geral do Fórum Macau considerou ainda que a crise de peste suína na China pode beneficiar a produção agropecuária brasileira, reforçando as relações comerciais entre os dois países.

“A peste suína aumentou a necessidade de importação, o que pressupõe oportunidades alargadas para os países exportadores de carne de porco, como o Brasil”, disse Xu Yingzhen.

As importações de carne suína da China dispararam em Maio, numa altura em que o gigante asiático está a ser afectado por uma peste suína que está a ter efeitos inflacionários a nível mundial. “A expectativa é grande, até porque temos observado que a relação entre a China e o Brasil está num caminho de crescimento constante”, destacou Xu Yingzhen.

As exportações do Brasil parecem beneficiar também das tensões diplomáticas com o Canadá: Pequim bloqueou recentemente o mercado a três exportadores canadianos, numa altura de tensões com Otava devido à detenção de uma executiva da Huawei.

Questionada sobre a área em que o Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa (Fórum Macau) mais intervém na relação entre os dois países, Xu Yingzhen não hesitou a apontar o empreendedorismo. “No futuro, achamos que a cooperação entre a China e o Brasil vai focar-se no âmbito do empreendedorismo e da inovação entre jovens empresários”, afirmou.

1 Jul 2019

APN | Kevin Ho substitui Ho Iat Seng depois de falhar eleições de 2017

Kevin Ho, sobrinho de Edmund Ho e vice-presidente do grupo Global Media, foi nomeado delegado de Macau à Assembleia Popular Nacional, em substituição de Ho Iat Seng, que se candidata a Chefe do Executivo. Em Portugal, o grupo Global Media está na mira do Sindicato dos Jornalistas por não pagar a trabalhadores nem dar explicações

 

[dropcap]K[/dropcap]evin Ho, empresário e vice-presidente de um dos maiores grupos de media em Portugal, foi nomeado delegado de Macau à Assembleia Popular Nacional (APN) da China, noticiou sábado o semanário Plataforma.

O empresário substitui, naquele que é o mais alto órgão consultivo político chinês, Ho Iat Seng, que se demitiu do cargo após ter anunciado a candidatura a chefe do Governo de Macau, cujas eleições estão agendadas para 25 de Agosto.

“Estou extremamente honrado e o meu empenho em servir Macau e a China sai reforçado”, disse ao Plataforma o vice-presidente do conselho de administração da Global Media Group, que detém títulos como o Jornal de Notícias, TSF, O Jogo, Diário de Notícias, Dinheiro Vivo e também o Plataforma Media. Kevin Ho é presidente da KNJ Investment Limited, empresa que detém 30 por cento do capital do Global Media Group.

Já em 2017, Kevin Ho foi candidato nas eleições para a escolha dos membros deste órgão político da China. Dessa vez, Ho Iat Seng seria eleito com o maior número de votos de todos os candidatos de Macau, com um total de 440, enquanto que Kevin Ho não conseguiu ser eleito, recolhendo apenas 288 votos.

Salários por pagar

Entretanto, em Portugal, Kevin Ho está a ser acusado pelo Sindicato de Jornalistas (SJ) português de não pagar salários aos trabalhadores do grupo Global Media. De acordo com um comunicado do SJ, emitido na sexta-feira, não só estão por pagar salários do mês de Junho como não foram dadas explicações por parte dos membros do conselho de administração do grupo Global Media.

“A administração do Global Media Group tem ignorado os trabalhadores, recusando-se a prestar esclarecimentos quer ao SJ quer aos delegados sindicais sobre a degradação financeira das empresas de comunicação social que detém. Ao mesmo tempo, e pela primeira vez, os salários de Junho não foram pagos no penúltimo/último dia útil do mês (consoante os bancos), como é habitual há anos”, lê-se.

Nesse sentido, o SJ lamenta que, “mais uma vez, a administração opte por ignorar os funcionários do universo do grupo”, uma postura que “já não é nova”, uma vez que “o SJ e os delegados sindicais de JN, DN, TSF e O Jogo têm vindo a solicitar reuniões com a administração desde o início de Janeiro, face às notícias de estar a ser preparada uma reestruturação, que poderia implicar o despedimento de 100 a 200 trabalhadores. Nunca obteve resposta”.

O SJ também pediu “reuniões na sequência do agravamento de problemas de tesouraria, que levaram a atrasos no pagamento aos colaboradores, desde Novembro passado. Nunca chegou uma resposta”. O mesmo comunicado dá conta que “a situação financeira do Grupo Global Media está a deteriorar-se”, acusando os gestores da Global Media de “falta de ética ao ignorar quem trabalha no grupo, não respondendo aos emails enviados nomeadamente um abaixo-assinado de 234 trabalhadores solicitando uma reunião entre a administração e os delegados sindicais de JN, DN, TSF e O Jogo”.

Na última visita do Chefe do Executivo, Chui Sai On, a Portugal, Kevin Ho foi questionado sobre o projecto de reestruturação do grupo de media, mas poucos esclarecimentos foram dados.

“Não se trata apenas de despedimentos ou de recursos humanos, mas é algo que tem a ver com a reestruturação de todo o grupo. Todas as empresas vão passar por fases de reestruturação e há necessidades de mudança em todas elas. O processo de restauração ainda está a decorrer. Não se foquem no número de pessoas que vamos despedir, talvez até venhamos a contratar mais”, disse, à margem de um evento de apresentação dos seus investimentos na cidade do Porto.

1 Jul 2019

Steven Siu anunciou intenção de se candidatar a Chefe do Executivo

Gerir o equilíbrio entre os interesses da população e os de Pequim é o trabalho do Chefe do Executivo, segundo Steven Siu que se apresentou como o novo candidato ao cargo. O anúncio da potencial candidatura foi feito no sábado

 

 

[dropcap]T[/dropcap]em 73 anos, é cônsul honorário da Papua Nova Guiné em Macau, e o quinto candidato a Chefe do Executivo. Steven Siu apresentou a intenção de avançar para a corrida ao mais alto cargo do Governo em conferência de imprensa no passado sábado.

Nascido e criado em Macau, o diplomata avançou para a candidatura motivado por amigos e quer trazer a Macau novas perspectivas.

Siu afirma-se como um oficial diplomático e acredita que se o território continuar a ser governado por empresários, à semelhança do que tem acontecido, vai enfraquecer e perder competitividade no panorama internacional. Como tal, o objectivo de Siu é trazer “um novo olhar para Macau”.

O candidato mostrou-se confiante de que vai reunir os 66 votos dos membros do colégio eleitoral necessários para que a sua candidatura seja considerada. Para já, Siu está certo de que 30 membros o vão apoiar. Quanto aos restantes, a ideia é trabalhar para obter os apoios necessários.

Promessas concretas

Steven Siu pretende um salto na área da economia para Macau. De acordo com o diplomata, a estrutura económica local “é muito simples” e precisa de ser desenvolvida. As sugestões passam pela criação de uma bolsa de valores e a construção de um polo de comércio de ouro que abranja Macau e a Ilha da Montanha.

A ampliação de horizontes é também um objectivo que o novo candidato pretende implementar junto das camadas mais jovens. De acordo com o candidato, actualmente, grande parte da juventude de Macau tem apenas em vista os empregos proporcionados pelos casinos, o que faz com que uma larga faixa populacional acabe por não seguir o ensino superior. Para o novo candidato, a tendência precisa ser atenuada. Sobre medidas neste sentido, Steven Siu aponta a promoção e incentivo à continuidade dos estudos, especialmente no estrangeiro. O objectivo é fazer com que os mais novos tenham uma visão mais internacional e que sejam capazes de a aplicar ao território.

Ainda ligada à área do ensino, o diplomata apoia a criação de um novo curso universitário ligado aos pilares do pensamento chinês, como um curso de cultura do confucionismo, budismo e taoismo.

Pátria em primeiro lugar

Os objectivos de Siu dividem-se em dois grandes grupos. Por um lado, um conjunto de políticas que tenham em vista melhorar as condições de vida e de bem-estar da população. Por outro, a absoluta obediência à liderança de Pequim, porque “o interesse nacional está acima de tudo”. Neste sentido, cabe ao Chefe do Executivo agir enquanto gestor de uma empresa, que deve saber lidar com os interesses da população tendo em conta que quem manda é Pequim.

1 Jul 2019