Fernando Sobral Folhetim h | Artes, Letras e IdeiasA grande dama do chá [CAPÍTULO ANTERIOR] [dropcap]S[/dropcap]ó a luz da Lua iluminava o Cais 16, onde Potapoff se destacava a dar ordens aos vários homens, vestidos com cabaias de ganga escura, que carregavam caixas para uma camioneta. Fora isso, só algumas luzes trémulas vinham de alguns barcos fundeados no Porto Interior. Naquele silêncio total, todos sabiam que estavam a ser espiados. Mas tinham de esperar que algo acontecesse. Se é que isso ia acontecer. Do junco que chegara essa noite a Macau, as caixas tinham sido transportadas para o cais em várias sampanas. Cândido e Jin estavam sentados num automóvel que estacionara próximo e observavam o que se passava. Estavam com atenção a ruídos estranhos que pudessem pôr em causa a falsa calma que os cercava. Os japoneses estava, por certo, a observar a descarga. E, depois, haveriam de seguir a carrinha para saber onde era o armazém onde ficaria escondido o metal precioso que acabara de chegar. Potapoff, que ostentava na cintura um coldre com uma Luger, tinha arquitectado um plano para prevenir um eventual ataque dos japoneses e dos seus aliados. Colocara próximo vários homens armados, distribuídos por diferentes grupos, que poderiam intervir se necessário. Quer Jin, quer Potapoff, não tinham tido receio que o que efectivamente transportavam, lingotes de cem taéis de prata, fosse um isco agradável. Era um risco calculado. Quando a carrinha partiu, o motorista do carro de Jin e Cândido esperarou um pouco, antes de o seguir a alguma distância. Repararam que um outro carro, com as luzes apagadas, ia atrás do de Potapoff. Cândido quebrou o silêncio: – Serão eles? Jin sorriu: – Tens alguma dúvida? Cândido não respondeu. Sentia-se estranhamente nervoso. Isso só lhe sucedia quando, no Inverno, Macau ou Xangai eram atingidos por ventos erráticos e tufões devastadores. Aí sentia medo. O carro foi percorrendo algumas ruas apenas iluminadas por lanternas vermelhas, rumo a uma zona onde havia algumas fábricas de fósforos e pirotecnia. O armazém onde Patapoff ia descarregar as caixas ficava na longa Rua da Praia do Manduco. Quando chegaram perto, o condutor do automóvel onde seguiam Jin e Cândido parou. Ficaram a observar. Dali viam os carregadores a levarem as caixas para dentro do armazém. Os japoneses deveriam estar escondidos perto, a seguir com atenção os acontecimentos. Não atacariam naquela noite. Jin, que estava encostada a Cândido, agarrou no braço deste e disse: – Nestes momentos agradeço sempre ao Céu. O Céu tem olhos. Ninguém poderia hoje segurar-nos, porque voamos como o vento da noite e os japoneses têm os pés pesados. Espero que tenham olhado com atenção e ficado com a ideia de que somos débeis e distraídos. Assim o nosso poder pode ter sido diminuído na sua imaginação. Cândido pensava noutra coisa. Um polícia sikh, das tropas inglesas, que tinha conhecido em Xangai dissera-lhe, uma noite, que no medo não há lugar para sabedoria. Ninguém poderia ser sábio ao mesmo tempo que tinha medo. Ninguém poderia ter medo e ser, ao mesmo tempo, sábio. E ele sentira medo nessa noite. Esperaram até que Potapoff voltasse para a camioneta e esta partisse. Depois o condutor deu meia-volta e transportou Jin e Cândido até à casa dele. Passadas algumas horas, Cândido olhou para o corpo nu de Jin. Ela estava descontraída e dormia na sua cama. Estava vulnerável, algo impensável numa mulher como ela, que deveria estar sempre atenta. Para estar assim, deveria confiar nele. Porque, se ele estivesse a fazer um jogo duplo, a favor dos japoneses, poderia matá-la ali, sem que ela se pudesse defender. Foi até à janela e, depois de a abrir, acendeu um cigarro e ficou ali a olhar para a escuridão. Muitas vezes gostava de estar ali, a apreciar o silêncio. E a pensar. Lembrou-se de uma frase do padre Afonso: – O que não se diz não existe. Precisamos de falar sobre tudo. É uma pena que o silêncio vá desaparecendo, tal como a escuridão. Temos de ter sempre ruído e luz. Desde a Idade Média que o silêncio tem vindo a desaparecer. Poucas vezes estamos sós e estamos sempre cercados de ruídos. O silêncio é uma coisa rara. Nas cidades, cheias de luzes, a escuridão é um luxo. Por isso procurei-o. E encontrei-o. Só nos mosteiros a regra da convivência se baseia no silêncio. Os orientais também sabem isso. Apesar das diferenças, são tão puros como nós. As palavras do padre ecoaram mais fortes naquele momento em que não escutava qualquer ruído. Era verdade: tudo o que de importante se faz, faz-se em silêncio. Falar é transformar grandes verdades em coisas demasiado simples. O padre dissera-lhe ainda: – Como sabes, o homem que é sábio não fala. Equilibra o que ouve e cala. Medita sobre a complexidade das coisas e a falsidade das aparências. Tudo o que é importante forja-se em silêncio. No silêncio surgem os ecos da verdade. Nada é mais poderoso do que o silêncio. Ouviu um galo cantar. O dia não estava longe de despertar. Pareceu ouvir a voz de uma cantora de jazz com quem tocara em Xangai: “Sentiste os cabelos dela roçarem per ti Quando a Lua desapareceu de vista” Apeteceu-lhe ir buscar o saxofone e ficar ali a tocar, até que os sinos despertassem a cidade. Sentiu-se um pouco nostálgico. As cidades como Xangai tinham cada vez menos segredos, porque a luz eléctrica tinha banido muitos dos segredos da noite. Ao contrário de Macau. Aqui, entre as avenidas ainda havia um labirinto de passagens, becos e ruelas apertadas, entre casas misteriosas. Ali poderia nascer o sol mil vezes e quem se escondesse continuaria sem ser visto. Muitas talvez tivessem passagens secretas que ligavam casas de seitas e grupos maçónicos que nunca tinham deixado de ter uma palavra a dizer na vida de Macau. Viviam-se tempos em que ninguém já sabia quem era o inimigo, ou onde estava, ou porque era o inimigo, ou quando atacaria. Estavam todos vulneráveis. Não era apenas Jin. Ou ele. Nesse momento sentiu o corpo de Jin encostado ao seu. – Não consegues dormir? – Não. Estava a pensar. Baixei até ao círculo do Inferno e agora sei coisas que turvam a paz dos outros. Mas, cuidado, o Inferno está a subir para os níveis onde todos os outros estão. Ela fez um sorriso e encostou-se mais a ele. Cândido novamente o desejo a conquistar-lhe o corpo. Jin disse: – Não penses nisso. Concentra-te no que fazeres. Na forma como tocas. Gosto de te ouvir tocar. Foi por isso que me apaixonei por ti. Ao ouvir-te tocar saxofone, e os sons que saem dele, percebi que o belo e o Bem são a mesma coisa. – Achas mesmo isso? – Sinto-o. Da mesma forma que sei que os portugueses são ternamente ingénuos. Acreditam que escapam sempre aos problemas maiores. Mas uma salvação imposta nunca pode ser mais do que transitória. Todos estamos em perigo, não achas? Cândido levantou-se e beijou-a nos lábios. – E se esquecêssemos, por alguns minutos, o perigo? Os olhos de Jin fecharam-se. E foi nesse momento que se começaram a ouvir os sinos que, aquela hora, despertavam Macau. [CONTINUAÇÃO]
Valério Romão h | Artes, Letras e IdeiasDos hábitos [dropcap]O[/dropcap] meu avô materno morreu com cerca de noventa anos. Gabou-se durante largas décadas de nunca ter ido ao médico e de nunca ter tomado um comprimido. Quando lhe apareceram cataratas nos olhos, não deu grande atenção à coisa, até ficar cego de um deles. Deixou-se relutantemente operar ao outro olho para logo se lamentar de não ter operado ambos. Quando o ia visitar, vendo ele já muito mal, acenava-lhe de longe e gritava-lhe vende-me um desses borregos, o mais gordinho? para ele responder, irritado com o despeito dos citadinos não estão para venda! Detestava médicos, hospitais e tudo quanto na cidade por motivos vários o afastasse do campo e dos seus afazeres. Tinha outra característica peculiar: fazer sexo todos os dias; coisa que, a determinada altura da sua provecta idade, a minha avó deixou de achar piada. Criando a necessidade o engenho, o meu avô passou a dizer à minha avó, sempre que iam para o quarto, à noite Maria, é a última… E, durante quase vinte anos, todos as noites foi a última. Numa dessas noites, a minha avó, tentando de algum modo fugir ao prazer que para ela se tornara um suplício, caiu da cama. Fracturou o fémur. Escusado será dizer que a minha avó tinha tanto apreço por hospitais e cidades quanto o meu avô. Nisso, coincidiam em uníssono. Magríssima e picuinhas com a comida, enquanto esteve no hospital comeu apenas as bolachas Maria que a minha mãe lhe levava. Era para ter estado três meses mas ao fim de mês e meio estava pronta para ir para casa. Ao que parece, não tinha sinal da osteoporose que costuma afligir as mulheres a partir de uma certa idade. A minha mãe ofereceu-se para a ir buscar ao hospital e levá-la para casa. Ao contrário da satisfação que esperava ver na sua cara com a ideia de ir para casa, a minha avó, cochichando, perguntou-lhe não posso ficar uma semaninha ou duas mais? A minha mãe, estupefacta mas mãe, porquê? E a minha avó ai filha, nunca estive tão descansada… A minha avó, que nunca tirou férias (o campo não tira férias, filha, respondia, quando a minha mãe lhe perguntava porque não tiravam uns dias para passear), descobrira na inesperada hospitalização um sossego que nunca conhecera ou de que não se lembrava. Provavelmente, o mais parecido que teve a vida toda com férias. Não pôde ficar essa semana adicional. Não disse uma palavra durante a viagem. O meu avô, sempre todo emoção, recebeu-a em lágrimas. Ainda hoje penso no que ele terá feito enquanto a minha avó esteve fora.
António de Castro Caeiro h | Artes, Letras e IdeiasO paradoxo sorites [dropcap]S[/dropcap]e uma multidão de gente for subtraída de uma pessoa, quando é que deixa de ser uma multidão parar passar a ser um conjunto de pessoas, algumas pessoas, poucas pessoas, etc. Hoje estive numa praia onde estive quando tinha seis anos. Uma família a sul. Alguém atira uma bola ao rio. A corrente leva a bola a uma velocidade estonteante. Era a mãe, o pai e o mano, sobrevivente a uma doença mortal. A bola é levada para a foz. Mal podia eu saber que era uma metáfora viva da vida. E estamos a ir todos na corrente do rio para o mar. Esta mesma praia é onde estou. Não está lá ninguém que eu conheça. Há o mesmo bar de praia de que me lembro. Era só madeira outrora. A madeira apodreceu. Hoje, é uma coisa moderna com pessoas que não sabem da bola nem do rio. O rio é sempre diferente. Quando a maré sobe, quando faz frio, quando chove, quando faz sol. O rio vai para o mar. É por isso que nasce. É para ir ter com o Atlântico. E esta multidão é o quê? Os antigos cépticos tinham vários paradoxos. Quanto se perde de cabelo para se ser considerado careca? Quantos grãos de areia fazem uma praia? Há uma multidão sem uma pessoa. Quantas pessoas fazem uma multidão? Quantas pessoas estão ausentes para se dizer que a praia está vazia? Nós estamos lá a olhar para a praia, quando é inverno e não há ninguém, só o nosso ponto de vista. Mas há também uma multidão sem ti. Nada compensa a tua ausência. Nada. Olho para a praia cheia de gente e não estás lá, nem a bola, nem a maré a vazar em direcção ao rio. Pediste-me que te espalhasse as cinzas onde olhavas o horizonte. Ainda não o fiz. Estás aqui connosco, mãe e eu. o que é uma multidão de gente sem ti? Só eu dou por isso. Há uma multidão sem uma pessoa que continua uma multidão mas é a abominação da desolação. Só tu enchias a praia. A praia vista sem ti e praia vista contigo é completamente diferente. Não há praia sem uma pessoa. A praia sem ti é uma lente sem objecto. E quando a praia está no inverno estar e não estar, aparecer e desparecer é diferente de tudo. A vivência sem prendimento e com a entrega que a infância representava a vida que estava para ser e que foi. Agora não se está bem lá sem se perguntar se é ou não a última vez. A primeira até à última vez da visita é sempre só nós lá, num só sítio, até que nós a encerramos e fechamos para sempre. Uma praia sem ti é diferente de uma praia contigo. Agora, estás lá, com todos os teus jornais, todos os teus dias, os almoços, a política, os amigos que também se foram, os teus filhos que estão velhos. Há uma família que vai a uma praia pela primeira de todas as vezes da tua vida. A bola chutada vai para o rio, o rio leva-a para o Atlântico. Ninguém a salva. Ninguém nos salva. O rio é diferente sempre todos os dias, maré que enche e maré que vaza. Onde estás? Quantas pessoas saem para fazer uma praia vazia? Olho para todos os grãos de areia, para todas as gotas do rio que é diferente à superfície e no seu fundo. Não te encontro. Não vives já, mas continuas a existir, moreno, a beber vinho tinto, a falar política, a ter misericórdia pelos pobres. Encontrava-te sempre sentado, a escutar rádio, a ler o jornal. Encontro-te ainda sempre, porque não sairás de mim nunca.
Raquel Moz EventosCIFAM | Mais fogos-de-artifício nos céus de Macau em Setembro e Outubro São doze as equipas que este ano chegam do exterior para apresentar a sua arte pirotécnica no 30º Concurso Internacional de Fogo-de-Artifício de Macau (CIFAM). A Malásia e a Austrália estreiam-se nesta edição, que arranca a 7 de Setembro e termina a 5 de Outubro [dropcap]É[/dropcap] a primeira vez que a organização convida 12 países para participar no 30º Concurso Internacional de Fogo-de-Artifício de Macau (CIFAM), que este ano se realiza durante seis noites, entre 7 de Setembro e 5 de Outubro. Em ano comemorativo do 20º aniversário da transferência de soberania do território, a Direcção dos Serviços de Turismo (DST) estendeu o período festivo e acrescentou novidades ao programa das celebrações. Duas equipas estreiam-se pela primeira vez no evento, provenientes da Malásia e da Austrália, que serão respectivamente a primeira e a última a actuar. As restantes equipas vêm, por ordem de apresentação, das Filipinas, de Portugal, da Coreia, do Reino Unido, da Roménia, da África do Sul, do Canadá, de França, da China e do Japão. Os espectáculos acontecem na baía em frente à Torre de Macau. As noites de espectáculos acontecem nos dias 7, 13, 21 e 28 de Setembro, e nos dias 1 e 5 de Outubro, entre as 21h e as 22h. A competição decorrerá com a actuação de duas equipas por noite, cada uma com direito a 18 minutos para mostrar a sua criatividade na arte da pirotecnia, num total de 12 exibições. A população é convidada a votar no seu espectáculo preferido, até um máximo de seis votos por pessoa, através do sistema de telecomunicações disponibilizado pela CTM, parceira do evento. Os votantes que tiverem acertado na equipa vencedora, em cada noite, ficam habilitados ao sorteio de prémios variados. A TDM também irá transmitir os fogos-de-artifício em directo pela televisão e a rádio emitirá as bandas-sonoras que acompanham os elementos visuais. O 30º CIFAM coincide este ano também com o Festival do Bolo Lunar e prolonga-se até à semana dourada do 70º aniversário da República Popular da China, a 1 de Outubro, pelo que a DST aproveitou a oportunidade para organizar uma série de actividades paralelas com a intenção de “enriquecer o conteúdo do programa” e aumentar a atracção do evento para residentes e turistas. O orçamento para esta edição excedeu os 24 milhões de patacas, já com o acréscimo de 10 por cento em relação à verba despendida em 2018. A directora da DST, Helena de Senna Fernandes, justificou ontem em conferência de imprensa que o 30º CIFAM é um evento maior do que no ano transacto, “porque cresceu o número de equipas e de espectáculos”, sendo este um ano especial de “dupla celebração” dos aniversários da RAEM e da RPC. Em complemento Diversas iniciativas estão programadas para acompanhar as noites de espectáculo, com workshops de artesanato dedicados às famílias, palestras sobre a arte da pirotecnia, arraiais com música, jogos e gastronomia entre as 17h e as 23h, e já os tradicionais concursos de fotografia e de desenho para estudantes. O conjunto de actividades de animação popular conta com o apoio da União Geral das Associações dos Moradores de Macau. Este ano são lançados dois novos concursos alusivos ao CIFAM, para a “Produção de Curta Metragem” e “Design de Cartaz”, cuja entrega de propostas deverá ser feita online de 7 de Setembro até 31 de Outubro. Voltam também os concursos lançados no ano passado, de “Composição de Canção” e de “Design do Troféu CIFAM”. A canção vencedora em 2018, “Light Your Fire”, vai estar integrada nas bandas-sonoras musicais de todas as equipas concorrentes, e o design vencedor de 2018 será a actual figura do troféu entregue ao melhor fogo-de-artifício deste ano. A contribuir para a atmosfera do evento estará a iluminação das ruas, decoradas para o “4º Festival Internacional de Lanternas de Macau”, que se realiza este ano entre os dias 7 de Setembro e 15 de Outubro, no espaço em frente aos Lagos Nam Van e na zona pedonal ribeirinha da Avenida de Sagres, entre o One Central e o Wynn Macau. Uma outra novidade é também o patrocínio de uma empresa de passeios de barco, que se associou ao CIFAM para proporcionar aos interessados a experiência de poderem assistir aos espectáculos de luz e cor a partir da água. Os bilhetes deverão ser adquiridos online com antecedência, estando a informação disponível no site da DST.
Andreia Sofia Silva SociedadeTufões | Governo rejeita criar diploma que obrigue a inspecção de janelas [dropcap]D[/dropcap]e acordo com a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, não está a ser equacionada a consolidação, num único diploma, de disposições que imponham a obrigatoriedade da inspecção de janelas.” A frase consta na resposta do Instituto de Habitação (IH) a uma interpelação escrita apresentada pelo deputado Ho Ion Sang. A resposta, assinada pelo presidente do IH, Arnaldo Santos, afasta, assim, a possibilidade do Executivo ter mão nesta matéria, que se tornou alvo de grande debate na sociedade desde que o tufão Hato, em 2017, deixou um rasto de destruição no território. “O Governo, através dos sete planos de apoio financeiro do Fundo de Reparação Predial, incentiva os proprietários a procederem às obras de inspecção e reparação das partes comuns do condomínio, a fim de salvaguardar a segurança dos espaços públicos do edifício. Os proprietários também devem cumprir as suas responsabilidades e obrigações legais, e tomarem a iniciativa dos equipamentos das fracções privadas”, lê-se. Ofícios aos donos Na resposta ao deputado Ho Ion Sang, Arnaldo Santos dá conta de mais um passo que o Governo pretende fazer no que diz respeito à renovação de edifícios antigos. “Além do reforço das acções de sensibilização para tal efeito, o Governo da RAEM propôs a introdução de disposições legais na proposta de lei, ora em elaboração, referente ao regime jurídico da construção urbana, no sentido de conferir ao Governo competência para a aplicação de medidas sancionatórias, no caso de incumprimento por parte dos proprietários, de ordens de reparação predial emitidas pelo Governo”, lê-se na resposta ao deputado. No mesmo documento, é referido que já foram simplificados muitos procedimentos para que seja mais fácil aos proprietários procederem a obras de reparação e renovação.
Hoje Macau SociedadeMercadorias | Paragem de aeroporto de Hong Kong não afectou Macau [dropcap]A[/dropcap] interrupção do funcionamento do Aeroporto Internacional de Hong Kong nos últimos dias não interferiu no fornecimento de mercadorias em Macau. A informação o foi dada pela Presidente da Direcção da Associação da União dos Fornecedores de Macau, Lei Kit Heng ao Jornal do Cidadão. “A maioria das mercadorias que sofreram atrasos de entrega por cancelamento de voos eram essencialmente alimentos frescos e nem todos os voos foram cancelados, o que afectou apenas uma ou duas empresas no território”, disse. Por outro lado, os produtos importados pelos dos fornecedores locais são essencialmente transportados via marítima pelo que o encerramento do aeroporto não afectou este mercado. Lei Kit Heng acredita ainda que o Governo de Hong Kong tem a capacidade de controlar os tumultos sociais que tem vivido nos últimos meses, antevendo no entanto que em caso de deterioração da situação, as mercadorias possam ser transportadas para Macau através de outras regiões como Shenzhen ou Zhuhai Já o presidente do Conselho de Administração do supermercado Dah Chong Hong, Herly Lei Kit Chi, apontou alguns atrasos pontuais em algumas mercadorias despachadas de Hong Kong por via terrestre para Macau, que não tem ultrapassado os três dias. Apesar de temer que a influencia no abastecimento local possa vir a aumentar, caso a situação na região vizinha não melhore, o responsável acredita que a repercussão nunca será muito elevada neste sector, até porque a maioria dos armazéns está localizada em Kwai Chung, numa zona que não é atingida por protestos.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeEPM | Projecto de ampliação em consulta pública até dia 29 O projecto de ampliação da Escola Portuguesa de Macau deu entrada no Conselho de Planeamento Urbanístico, estando sujeito a consulta pública até ao próximo dia 29. Está prevista a construção de um parque de estacionamento e a manutenção de uma altura máxima de 50 metros para um dos edifícios [dropcap]J[/dropcap]á é possível conhecer mais detalhes sobre o projecto que dará origem a uma nova Escola Portuguesa de Macau (EPM). Este já deu entrada no Conselho do Planeamento Urbanístico (CPU) e será discutido pelos seus membros na próxima reunião, que ainda não tem data marcada. O projecto prevê que um dos edifícios terá, no máximo, 50 metros de altura, prevendo-se a manutenção do edifício já existente, da autoria do arquitecto Chorão Ramalho, sem esquecer “a preservação das características do espaço livre na zona C”. Por forma a colmatar a crónica falta de estacionamento que sempre existiu na zona, o projecto pretende roubar uma parcela de terreno destinada à via pública, pois determina que se deve “proporcionar no lote um espaço adequado para a espera de veículos, no sentido de evitar que os mesmos impeçam o transito na via pública aquando da espera para acederem ao parque de estacionamento do referido edifício”. De frisar que, actualmente, a EPM não possui qualquer parque de estacionamento. O projecto tem também a intenção de manter espaço livre entre as construções. “O novo edifício a construir na zona C deverá ficar devidamente distanciado das construções situadas na zona A, de forma a que se possa continuar a apreciar o aspecto exterior dos mesmos”. Além disso, “a concepção arquitectónica da construção nova deve estar em harmonia com as construções situadas na zona A”, lê-se ainda no documento em consulta pública. A nova EPM deverá estar concluída em 2023. Em aberto O arquitecto responsável por este projecto é Carlos Marreiros, que já garantiu ao HM que a adição de mais um edifício não irá por em causa a existência de espaços livres. “Ao acrescentar um bloco novo vão continuar a existir espaços abertos redefinidos e desenhados de forma distinta. Não vai haver ocupação massiva do local”, adiantou. Ao actual auditório “será integrado no bloco novo”, que terá “um pódio e um prédio muito delgado”. A nova EPM “vai ter espaços ao ar livre, quer a nível do piso térreo quer ao nível dos terraços para actividades”, até porque o projecto preliminar assegura a criação de “espaços abertos para que haja uma ventilação transversal. Os blocos estão pensados para permitir a entrada da luz do sol e do ar”, frisou Carlos Marreiros. Além do projecto da EPM, estão também sujeitos a consulta pública uma construção na zona A dos Novos Aterros, junto à Avenida Marginal do Lam Mau, na península de Macau, e em Coloane.
Sofia Margarida Mota PolíticaLei Sindical | Analistas duvidam que Ho Iat Seng defenda os trabalhadores O avanço de uma proposta de lei sindical por Ho Iat Seng não convence os analistas. António Katchi considera que se trata de uma forma de amenizar a má impressão política que deixou no final do seu mandato na Assembleia Legislativa, duvidando que a proposta avance. Já Larry So e Jorge Fão duvidam que uma lei sindical definida pelo Governo possa defender realmente os interesses dos trabalhadores [dropcap]A[/dropcap] intenção de avançar com a proposta de lei sindical, apontada pelo único candidato a Chefe do Executivo, Ho Iat Seng, não garante que esta ideia se venha a concretizar, defende António Katchi ao HM. Para o jurista, as expressões utilizadas por Ho Iat Seng para este avanço “não evidenciam, qualquer vontade de assumir um compromisso”, mas antes “a vontade de criar um ambiente de expectativa em torno da sua candidatura e de preparar um estado de graça para o período inicial do seu mandato”. O anúncio do avanço com a posposta de lei sindical pode ainda ser visto como uma das formas que Ho Iat Seng encontrou para combater a imagem negativa que deixou enquanto presidente da Assembleia Legislativa (AL), entre os finais de 2017 e o inicio de 2019, altura em que Sulu Sou teve o mandato suspenso e os juristas Paulo Cardinal e Paulo Taipa foram dispensados. “O que será mais revelador das características e das ideias de um político: aquilo que faz enquanto exerce um cargo ou aquilo que afirma enquanto candidato a um cargo?” questiona. Por outro lado, “no que respeita especificamente à lei sindical, ele teve inúmeras oportunidades para apoiar os projectos de lei que foram sendo apresentados na Assembleia Legislativa, mas nunca o fez”, apontou. Mesmo admitindo que o futuro Chefe do Governo venha a propor uma lei sindical as questões que se levantam são muitas. Katchi começa por questionar a própria postura do Governo Central nesta matéria. “Impedi-lo-ia de o fazer ou simplesmente interviria na definição do conteúdo da proposta de lei, violando, em qualquer dos casos, a autonomia de Macau?”, disse acrescentando que o âmbito da lei também é alvo de dúvidas. “Limitar-se-ia a regulamentar a liberdade sindical em sentido restrito ou regulamentaria também direitos conexos, como o direito de negociação colectiva, o direito à greve e o direito de organização colectiva sob outras formas além dos sindicatos, designadamente as comissões de trabalhadores e os plenários de trabalhadores?” interroga. O jurista vai mais longe e questiona ainda se uma proposta vinda por parte de Ho Iat Seng seria mesmo para “proteger o mais possível” os direitos dos trabalhadores ou pelo contrário, “restringi-los o mais possível e condicionar o seu exercício”. Fica também por esclarecer, para Katchi, se o novo Governo vai avançar com “alterações legislativas, no quadro de legislação securitária ou da chamada ‘reforma da Administração Pública’, para limitar as vantagens que em princípio decorreriam da lei sindical” Sem esperança Com este contexto a esperança de uma proposta de defesa dos direitos dos trabalhadores só pode acontecer se existir uma mobilização massiva das classes trabalhadoras. Contudo, “o resultado, será, ou a ausência pura e simples de qualquer lei sindical, ou uma lei ‘sindical’ de conteúdo amplamente desfavorável aos trabalhadores – portanto, uma lei anti-sindical”. Na melhor das hipóteses, defende, pode vir a existir um diploma “de âmbito muito limitado ou de reduzida eficácia”. O cepticismo relativamente a existência de uma proposta que defenda realmente os interesses dos trabalhadores e que abarque o direito à greve e à organização colectiva é também partilhado pelo académico Larry So. Para o sociólogo, no caso de Ho Iat Seng vir a avançar com uma proposta será um diploma “muito conservador”. “Não acho que qualquer negociação colectiva ou direito à greve seja incluído”, referiu ao HM, acrescentando qua poderá abranger apenas o aumento de férias dos trabalhadores, aumentando o tempo “em uns dias” ou na área das indemnizações em caso de despedimento. “Por natureza sou um indivíduo céptico e não tenho fé naquilo que vai ser apresentado”, começou por dizer Jorge Fão, membro da direcção da Associação dos Aposentados, Reformados e Pensionistas de Macau (APOMAC) que defende que esta intenção de Ho faz parte da auto promoção do candidato nesta fase de campanha eleitoral. “Pode ser uma lei sindical que no seu contexto acabe por não ser. Pode ser uma proposta que não dá direito à greve nem à negociação colectiva, ou seja pode não ser propriamente uma lei sindical “, salientou Fão. Para Jorge Fão, a Lei Básica não está a ser cumprida neste sentido porque “os desejos dos empresários de Macau conseguem ultrapassar a Lei Básica que é de natureza constitucional”, diz como justificação para os dez chumbos do diploma na AL.
Hoje Macau PolíticaHo Iat Seng | Idosos não vão ser enviados para instituições da Grande Baía [dropcap]O[/dropcap]s idosos de Macau não vão ser enviados para a zona da Grande Baía depois da aposentação”, apontou ontem o único candidato ao cargo de Chefe do Executivo para esclarecer os receios da população de que os mais velhos pudessem ser colocados em instituições situadas nas cidades que integram o projecto de cooperação inter-regional. De acordo com Ho, a questão não se coloca, no entanto, “se na Ilha da Montanha existirem Serviços de Saúde e condições sociais adequadas, tanto os idosos como os jovens de Macau podem considerar deslocar-se para aquela região de modo a aumentar a sua qualidade de vida”, disse, na visita que efectuou ontem ao Centro de Cuidados Especiais Rejuvenescer da união Geral da Associação de Moradores de Macau. O candidato também se deslocou na manhã de ontem ao Mercado do Patane onde ouviu as opiniões dos comerciantes que se queixavam do falta de espaço para colocarem os seus produtos à venda, num negócio que “já não é como antes”. A tarde de ontem foi preenchida com a passagem no Centro de Incubação de Negócios para os Jovens onde Ho Iat Seng defendeu que os mais novos devem apostar no empreendedorismo de forma a contribuírem para a diversificação da economia local.
João Luz Manchete PolíticaPSP recusa vigília contra a violência policial em Hong Kong A Polícia de Segurança Pública não autorizou a vigília silenciosa que estava marcada para segunda-feira no Leal Senado em protesto contra a violência policial em Hong Kong. As autoridades locais entenderam que a acção visava apoiar os actos ilegais praticados na região vizinha. Entretanto, a fonte do Leal Senado e parte da praça foram ontem cercadas com barreiras do IAM [dropcap]N[/dropcap]a quarta-feira, um cidadão pediu autorização à Polícia de Segurança Pública (PSP) para organizar uma vigília silenciosa na próxima segunda-feira, no Leal Senado, contra a violência policial em Hong Kong. O pedido foi ontem rejeitado pelas autoridades. Num comunicado enviado ao HM, a PSP refere que a razão de ser da vigília se prende com “os recentes conflitos em Hong Kong e actos de alguns manifestantes radicais que violaram as leis de Hong Kong e afectaram seriamente a ordem social e o Estado de Direito.” Como tal, “a PSP examinou o pedido e chegou à conclusão de que quem pede autorização para este tipo de assembleia apoia actos ilegais que enviam a mensagem errada para a sociedade de Macau”. A polícia acrescenta ainda que, apesar do cartaz sublinhar a natureza pacífica do protesto, este incita as pessoas a seguirem maus exemplos e a “expressarem as suas reivindicações de forma contrária às leis de Macau, resultando em impactos sérios na segurança pública, e no Estado de Direito”. Em conclusão, “estas assembleias não são permitidas pela lei que regula o direito de reunião e de manifestação, assim sendo, a PSP esclarece que a vigília não é permitida pela lei”. Scott Chiang, em declarações ao HM, referiu que “a PSP é uma força alegadamente forte e profissional”, e que “a noção de que podem falhar na manutenção da ordem numa ocasião destas é algo de impensável”. O activista, que já respondeu em tribunal devido a manifestações, entende que em Macau as perspectivas políticas da sociedade são moldadas pela TVB e pelo WeChat, em particular em relação ao que se passa em Hong Kong. Para Scott Chiang, os protestos na região vizinha são mal vistos por cá devido ao desapego aos assuntos públicos, ou à simples falta de reconhecimento da luta pela liberdade. Obras leais Ontem de manhã, e menos de 24 horas depois do pedido para a vigília no Leal Senado, a fonte da praça foi vedada por barreiras com o símbolo do Instituto para os Assuntos Municipais (IAM), e ao lado outras barreiras formaram um círculo algumas vigas de ferro rodeadas por quatro pinos. Segundo informação do portal do IAM, as obras destinam-se a melhoramento das fontes (do Leal Senado e Av. Infante D. Henrique). As obras adjudicadas à Good Macau a 5 de Junho deste ano, custam quase 630 mil patacas, têm início marcado para 14 de Agosto e um prazo de 90 dias para conclusão. Ao HM, foi explicado que as obras na fonte serviriam para instalar as decorações para o Festival do Meio de Outono. Zheng do contra Zheng Anting enviou ontem uma carta ao Chefe do Executivo a apelar à rejeição de qualquer tipo de reunião ou manifestação que possa destruir a prosperidade do território. “Macau é harmonioso, pacífico e próspero, isto depende muito do apoio do Governo Central e do esforço conjunto da população de Macau. Não quero que seja afectado pela situação de Hong Kong”, disse o deputado citado pelo canal chinês da Rádio Macau. Além disso, Zheng Anting expressou desacordo com o propósito da vigília e mostrou-se esperançado que o Governo aplique o artigo 23.º da Lei Básica. “Recebemos mais de 100 telefonemas de cidadãos e mensagens de WeChat, a favor da protecção de Macau, para que não se caia numa situação semelhante a Hong Kong”, sublinhou o deputado.
Raquel Moz PolíticaLei do consumidor | Sete dias de reflexão para devolver compras na Internet [dropcap]O[/dropcap]s consumidores que fizerem compras online vão poder devolver os bens num prazo de sete dias a contar da data de entrega, sem necessidade de explicar quaisquer motivos, foi uma das garantias asseguradas na discussão da proposta de “Lei da Protecção dos Direitos e Interesses do Consumidor”. A 1ª Comissão Permanente reuniu ontem pela última vez, antes do encerramento da Assembleia Legislativa, para avançar com o tema das compras à distância, situação que carece de legislação adequada aos padrões de consumo globalizado de hoje. Sobre a mesa estiveram três situações distintas na lei – contratos celebrados à distância, contratos celebrados fora do estabelecimento comercial e contratos em forma de pré-pagamento – para as quais existirá um período de sete dias de reflexão e o direito de resolução dos contratos sem a obrigação de indicar motivos. Este prazo não existe nas transacções comerciais normais, mas os legisladores entendem que nos casos em que o consumidor não tem forma de ver o produto ou serviço no acto da compra, é necessária a salvaguarda desta condição. Um contrato à distância é para o efeito da lei uma venda online. Já o contrato fora do estabelecimento comercial pode ser uma venda de rua ou venda ao domicílio. No contrato de pré-pagamento estão em causa, por exemplo, bens ou serviços adquiridos através de cupões de ginásio, de salões de beleza, de férias, e outros. Por se tratar de contratos em que “não existe a presença física das duas partes em simultâneo”, também passa a ser exigido a estes operadores comerciais que divulguem informação mais completa, detalhada e rigorosa nas suas plataformas. Quem devolve paga Para evitar que o consumidor possa abusar deste direito de devolução, as despesas de transporte e os encargos bancários do pagamento electrónico ficam do lado de quem compra e se arrepende, a menos que o operador comercial as queira suportar. Se a devolução for por defeito do produto ou não conformidade com o que está contratado, então o caso passa a reclamação normal e tem os seus prazos e procedimentos já definidos também nesta proposta de lei. Quando a 1ª Comissão voltar a reunir, é esperado que o Governo apresente um novo texto para as cláusulas já discutidas, faltando debater quase metade da nova lei, embora a maioria sejam pontos já existentes noutros diplomas.
Sofia Margarida Mota PolíticaEleições | APOMAC sugere substituição de apoio pecuniário por habitação Os montantes gastos em cheques pecuniários deveriam ser aplicados na construção de habitações para os residentes. A ideia é defendida pela Associação dos Aposentados, Reformados e Pensionistas de Macau, numa carta entregue a Ho Iat Seng [dropcap]A[/dropcap] Associação dos Aposentados, Reformados e Pensionistas de Macau (APOMAC) desafia o futuro Chefe do Executivo a terminar com os cheques pecuniários dando em troca habitações. “A política do pagamento dos cheques pecuniários introduzida a partir de 2009 foi uma boa política por ter sido a panaceia para aplacar alguns ânimos contudo, mas não se pode considerar como sendo uma solução de natureza definitiva para as exigências que venham a aumentar com o decorrer dos tempos”, começa por apontar a carta de sugestões entregue pela associação ao único candidato ao cargo de Chefe do Governo. Conscientes de que para por fim à ajuda financeira é necessário apresentar uma alternativa satisfatória, a APOMAC propõe a oferta de casas. “Julgamos que a oferta de uma habitação seria muito bem aceite na sociedade desde que a sua alienação ou arrendamento seja a preços muito acessíveis.”, lê-se. Para sustentar a sugestão, a APOMAC avançou para cálculos, sendo que “os encargos anuais com o pagamento de cheques pecuniários dariam para construir, anualmente, sete edifícios de 30 pisos tipo T3”. Ou seja, se em vez dos cheques pecuniários o Governo tivesse investido o montante gasto até hoje em casas existiriam agora “16.800 fogos para os residentes autoctones, funcionários activos e aposentados”. A distribuição destas habitações, explicou Jorge Fão ao HM, deveria ser feita por sorteio, excluíndo as pessoas com maior capacidade financeira. O exemplo de Singapura é dado a este respeito, quando o primeiro ministro Lee Kuan Yew, “que por sinal, também encontrou forte oposição do sector imobiliário” avançou para uma medida idêntica de disponibilização de habitações. “Sabemos que os sucessivos governos da RAEM se deslocaram a Singapura em várias visitas de estudo e de trabalho mas pasma-se por que ainda não foi adoptada a mesma política habitacional em Macau”, tendo em conta que Singapura “aumentou em mais de 25 por cento de área desde a sua fundação para satisfazer as necessidades habitacionais e infra-estruturais”, remata a carta assinada pelo presidente da APOMAC, Francisco José Manhão. Para respirar A protecção ambiental foi também alvo de sugestões para o próximo Chefe do Executivo, apontando a APOMAC para a necessidade de investimento na promoção do uso de veículos eléctricos. “O uso de carros eléctricos está bastante em voga na China continental bastando referir os nossos vizinhos Zhuhai e Shenzen, tanto mais que os transportes públicos em Shenzen são quase totalmente eléctricos”, aponta a missiva para defender que Macau deve isentar de impostos “quem troque a sua viatura de combustível para uma de electricidade”. O número de postos de recarregamento de baterias deveria também subir significativamente. Desta forma, acredita a APOMAC poder-se-ia atenuar a situação da actual má qualidade do ar. A saúde não ficou de fora dos problemas urgentes que necessitam de acção por parte do novo Chefe do Executivo, uma vez os serviços actuais estão longe de serem “de excelência”. Em primeiro lugar, aponta a APOMAC, é necessário “acelerar a finalização da construção do hospital público da Taipa”. Entretanto, o Governo não deve esquecer “o recrutamento de pessoal médico altamente qualificado, seja proveniente da Europa ou da Ásia”. Só assim é possível a Macau “prestar serviços médicos de alta qualidade como os existentes em Singapura e Tailândia onde a promoção do turismo para a saúde é já conhecida há muito tempo”. Apesar da situação do trânsito também ser referida, a associação considera que se trata de um assunto demasiado técnico, a “ser analisado por especialistas”. Para a APOMAC, Ho Iat Seng é um candidato pode dar um futuro melhor à população dada “a sua longa experiência política no seio do centro de poder da República Popular da China”, o que permite aos membros da associação “ajuizar que estamos perante uma personalidade talhada para servir a pátria e a população de Macau com alma e coração”.
João Luz China / ÁsiaHong Kong | Trump apela a Xi por uma solução humana para os protestos O Presidente norte-americano pediu ao seu homólogo chinês que resolva a situação escaldante de Hong Kong de forma humana, sugerindo inclusive uma reunião para discutir possíveis soluções. Como Donald Trump mantinha um silêncio incómodo em relação à RAEHK, e depois de ser criticado por isso, tocou no assunto do momento, dando-lhe prioridade em relação à disputa comercial. Da Europa vieram apelos à resolução pacífica e ao respeito pelo princípio “Um País, Dois Sistemas” [dropcap]D[/dropcap]epois de um silêncio incómodo para muitos pesos pesados da política norte-americana, Donald Trump apelou a uma solução humana para a situação de Hong Kong. Como não podia deixar de ser, o Presidente norte-americano voltou a usar o Twitter para mandar o recado a Xi Jinping, sobre quem tem “zero dúvidas” quanto à capacidade para solucionar o imbróglio política em que está a região vizinha. Depois de se alongar no braço-de-ferro da guerra comercial, Trump escreveu: “É claro que a China quer chegar a um acordo. Mas tratem primeiro de Hong Kong de uma forma humana.”, terminando o tweet sugerindo um encontro para discutir o assunto. Os comentários vieram acompanhados de elogios a Xi, que Trump considera “um bom homem”. Assumidamente fã de governações fortes, há quase um mês Trump elogiou a forma como Xi Jinping estava a lidar com a situação de Hong Kong. “A China podia pará-los se quisesse. Acho que o Presidente Xi tem actuado com muita responsabilidade. Os protestos já duram há demasiado tempo. Espero que Xi faça o que é correcto”. O líder norte-americano chegou mesmo a caracterizar os protestos como motins, colando-se à posição de Pequim, algo que foi aproveitado pela imprensa estatal chinesa, que difundiu incessantemente as palavras de Trump. De Washington até ao resto da comunidade internacional, criou-se a ideia de que a Casa Branca apenas é dura com Pequim em questões comerciais, mas sem qualquer interesse na defesa de princípios. As reacções no campo democrata não se fizeram esperar. Michael Fuchs, que pertenceu ao Departamento de Estado durante a Administração Obama, resumiu a situação de uma forma simples: “Trump está a dizer a Xi Jinping, de uma forma muito clara, que pode fazer o que entender com Hong Kong. Ele só tem interesse no acordo comercial”. Empurrado a agir Depois da defesa dos protestos contra a erosão de direitos e liberdades dos cidadãos de Hong Kong por grandes personalidades de ambos os espectros políticos norte-americanos, assim como da comunidade internacional, Trump viu-se forçado a falar depois de segunda-feira terem sido reveladas imagens de satélite de veículos paramilitares chineses em Shenzhen. Ontem as imagens mostraram milhares de soldados em treinos na cidade vizinha de Hong Kong. Outro exemplo de sério aviso de uso de força foi publicado na conta oficial de WeChat do Exército de Libertação do Povo Chinês, que mostrava os mesmos veículos militares e um mapa com a distância para o Aeroporto de Hong Kong. A imagem foi acompanhada por uma citação de Deng Xiaoping: “O Governo Central deve intervir caso Hong Kong entre em turbulência”. A publicação foi, entretanto, apagada. Antes de Trump apelar a uma solução pacífica, já o seu Departamento de Estado havia demonstrado “preocupações profundas” sobre as movimentações junto à fronteira com Hong Kong, apelando a Pequim para o cumprimento dos compromissos, assumidos aquando da transferência de soberania em 1997, que garantem a Hong Kong “um elevado grau de autonomia”. Como vem sendo hábito, os órgãos de propaganda chinesa vieram meter água na fervura e “esclarecer” que os exercícios militares em Shenzhen já estavam planeados anteriormente, assim como em outra dúzia de cidades da província de Guangdong. Situação lose-lose Entre analistas existe um consenso: a intervenção militar chinesa teria consequências desastrosas tanto para Pequim como para Hong Kong. Ainda assim, enquanto os protestos entram no terceiro mês, os avisos de Pequim tornam-se cada vez mais claros e a intervenção militar mais provável. Uma pista evidente que aponta nesta direcção é a descrição de figuras de topo da hierarquia da política chinesa que caracterizaram os protestos em Hong Kong como terrorismo com a intenção de derrubar o Governo de Carrie Lam. Aliás, ontem na capa do Diário do Povo, um porta-voz do Partido Comunista Chinês (PCC) assinou um editorial contra o tratamento violento a que um repórter do Global Times, uma publicação do PCC, foi submetido num protesto que ocupou o Aeroporto de Hong Kong. O editorial lança um aviso “às mãos pretas” por detrás dos protestos anunciando que “1,4 mil milhões de chineses estão unidos para evitar qualquer dano provocado à nação e ao seu povo”. Também o Gabinete de Ligação do Governo Central na RAEHK condenou os protestos no aeroporto. “Os manifestantes detiveram, assediaram e agrediram um visitante e um jornalista do continente chinês. Tais actos violentos quase poderiam ser descritos como ‘terrorismo,'” disse o Gabinete de Ligação em comunicado, acrescentando que apoiará a polícia de Hong Kong para levar as multidões à justiça. “Queremos expressar as nossas condolências profundas às duas vítimas e mostrar o nosso respeito mais profundo ao jornalista que manifestou apoio à polícia de Hong Kong”, lê-se no comunicado. Apesar dos avisos de Pequim, os protestos continuam a marcar o dia-a-dia de Hong Kong. Até domingo estão previstas manifestações de professores, trabalhadores dos transportes públicos, funcionários públicos e até donos de animais de estimação. Para domingo, está marcado mais um protesto de grande escala. Cartas da Europa A Chanceler alemã, Angela Merkel, também se juntou ao coro de vozes internacionais no apelo ao fim da violência e ao início do diálogo político. Merkel mencionou mesmo a Lei Básica de Hong Kong e referiu que o território goza de direitos como a liberdade de expressão, que deve ser preservada, assim como outras liberdades salvaguardadas pelo princípio “Um País, Dois Sistemas”. Entretanto, o ministro dos Negócios Estrangeiros alemão, Heiko Maas, apelou aos turistas germânicos que adiem viagens para Hong Kong, justificando o conselho com a possibilidade de uma intervenção militar chinesa no território. A juntar às declarações de Maas, a porta-voz do ministério dos Negócios Estrangeiros, Maria Adebahr, acrescentou que o Governo alemão está “em constante discussão” com Pequim sobre Hong Kong e questões de direitos humanos. O princípio “Um País, Dois Sistemas” foi também mencionado pelo ministro francês para os Assuntos Europeus e Estrangeiros, Jean-Yves Le Drian, que sublinhou também a necessidade de se respeitar as liberdades garantidas pela Lei Básica, tais como “o Estado de Direito, a autonomia do sistema judicial vital para o povo de Hong Kong e a prosperidade económica”. O ministro do Governo de Macron acrescentou que a França tem um compromisso profundo com o respeito destes princípios. “Os protestos em Hong Kong continuam num crescendo de tensão. A França e os seus parceiros, especialmente os europeus, estão a acompanhar a situação de perto”, enquadrou o governante francês. Le Drian apelou ainda a todas as partes “em especial às autoridades de Hong Kong, que restabeleçam o diálogo de forma a conseguir chegar à paz e colocar um ponto final à escalada de violência”. Mensagem de Lisboa O ministro dos Negócios Estrangeiros português, Augusto Santos Silva, evocou a posição da diplomacia da União Europeia (UE), reiterando o apelo “a todas as partes” para que “não agravem a tensão e se abstenham de acções violentas”, “sejam eles as forças policiais ou os manifestantes”. “É muito importante que a violência não progrida e é muito importante que a questão política e legal que está em causa em Hong Kong, neste momento, seja resolvida por vias políticas e legais e não pela violência”, afirmou. O movimento de contestação em Hong Kong não causou até ao momento grandes perturbações a cidadãos portugueses, registando-se apenas “casos pontuais” de problemas com viagens, disse na quarta-feira à Lusa o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva. “Salvo casos muito pontuais não temos notícia de portugueses que estejam a ver as suas viagens ou a sua vida muito perturbada por estes acontecimentos”, disse o ministro. “Os poucos casos de que temos conhecimento, e estamos a acompanhar, são algumas pessoas e um grupo, uma tuna universitária, que esteve em Macau, ia agora de Hong Kong para Tóquio, e uma parte do grupo ainda não conseguiu partir”, precisou. “Mantemos as nossas recomendações […] que as pessoas tenham os cuidados de segurança habituais nestas circunstâncias, designadamente evitando os locais ou as áreas em que ocorrem confrontos, em que haja distúrbios ou em que haja repressão”, disse Santos Silva. Santos Silva disse ainda que apesar da proximidade com Hong Kong, “a situação em Macau é muito tranquila”.
Hoje Macau China / ÁsiaHong Kong | Governo espera entrada em recessão técnica ainda este ano [dropcap]O[/dropcap] Governo de Hong Kong reviu hoje em baixa as suas estimativas de crescimento económico, prevendo que o Produto Interno Bruto (PIB) cresça entre 0% e 1% este ano, o que provocará a sua entrada em recessão técnica. “Se a economia de Hong Kong crescer, no terceiro trimestre, a um ritmo semelhante ao do segundo trimestre, a cidade entrará em recessão técnica”, disse o secretário das Finanças de Hong Kong, Paul Chan Mo-po, em conferência de imprensa. Chan Mo-po não se referiu diretamente aos protestos que têm acontecido em Honk Kong nas últimas semanas como causa desta revisão em baixa. A recessão técnica significaria que o PIB local teria baixado em dois trimestres consecutivos: os dados conhecidos até agora mostram que, durante os primeiros três meses, a economia de Hong Kong cresceu 1,3%, enquanto no período de Abril a Junho contraiu 0,3%. O secretário das Finanças também anunciou hoje um pacote de medidas que não são oficialmente destinadas a resolver a crise política enfrentada pela administração de Hong Kong, mas visam “tomar precauções” face ao “mau momento económico que está a chegar”. As medidas incluem especificamente um “mini-orçamento” avaliado em 19.100 milhões de dólares de Hong Kong. O pacote de medidas inclui um aumento das garantias de empréstimos a pequenas e médias empresas, a redução dos custos de licenças de negócios de alojamento local, isenções de impostos para arrendamentos e custos de electricidade, de acordo com o jornal local South China Morning Post. Segundo avançou hoje a consultoria britânica Capital Economics, o impacto económico dos protestos poderá causar uma queda de 1% no terceiro trimestre, acabando o ano com um crescimento anual de 0,5%. Segundo a consultora, o sector mais afectado será o turismo, que contribui com cerca de 4% para o PIB total. Se os protestos continuarem, ou no caso extremo de intervenção do Exército chinês, a economia de Hong Kong poderá enfrentar uma “profunda contracção” que ameaçará a força do dólar de Hong Kong e poderá causar um efeito em cadeia em vários indicadores macroeconómicos, referiu a consultora. As manifestações e a ocupação do aeroporto também afectam o mercado imobiliário porque “os promotores estão a adiar o lançamento de novos projectos”. Os protestos em Hong Kong começaram em Março contra a iniciativa das autoridades locais de promulgar uma lei de extradição que, segundo os seus críticos, poderia levar dissidentes políticos a serem julgados sem garantias na China. Sob a fórmula “Um país, dois sistemas”, Pequim comprometeu-se a manter a autonomia de Hong Kong e respeitar uma série de liberdades – inimagináveis na China continental – até 2047, depois de reconquistar a soberania do território das mãos britânicas, em 1997. As manifestações têm mobilizado centenas de milhares de pessoas desde Junho, apesar da repressão policial.
Hoje Macau China / ÁsiaPolícia de Hong Kong confirma cinco detenções após confrontos no aeroporto [dropcap]A[/dropcap] polícia de Hong Kong confirmou ontem a detenção de cinco pessoas na sequência dos confrontos registados entre as forças policiais e manifestantes pró-democracia no aeroporto internacional de Hong Kong. O porta-voz da polícia local, Mak Chin-ho, precisou que os cinco homens detidos, com idades compreendidas entre os 17 e os 28 anos, são acusados de promover uma manifestação ilegal. Dois dos detidos são igualmente acusados de agredir um elemento das forças policiais e de possuir armas ofensivas, segundo a mesma fonte. O porta-voz admitiu a possível detenção de mais suspeitos, incluindo activistas que agrediram um polícia da unidade anti-motim durante incidentes registados terça-feira à noite no aeroporto de Hong Kong. A lei do território prevê sentenças de prisão perpétua para as pessoas que cometam actos violentos ou actos que possam interferir na segurança do tráfego aeroportuário e do aeroporto. “A polícia promete a todos os cidadãos de Hong Kong que tomaremos as medidas para levar todos os culpados à justiça”, concluiu o porta-voz, em declarações à comunicação social. A grande maioria dos manifestantes pró-democracia são estudantes universitários, cerca de metade são homens e está na faixa etária dos 20 anos e quase todos admitem que odeiam a polícia, segundo um estudo hoje divulgado pelas agências internacionais que traça o perfil dos activistas que têm estado envolvidos nestas últimas 10 semanas de protestos em Hong Kong. O estudo, desenvolvido por investigadores de quatro universidades daquele território, envolveu entrevistas a mais de 6.680 pessoas ao longo de 12 acções de protesto de diferentes tipos, de grandes manifestações a iniciativas de menor dimensão. Quando questionados sobre as razões que motivaram o seu envolvimento no movimento pró-democracia, 87% falaram da anulação da lei de extradição, 95% apontaram o seu desagrado com a actuação da polícia nas manifestações e 92% pediram a criação de uma comissão independente de inquérito sobre a violência policial. Hong Kong, antiga colónia britânica, está a atravessar a sua pior crise política desde a sua transferência para as autoridades chinesas em 1997. Nos últimos dois meses, o território tem sido palco de manifestações quase diárias que muitas vezes têm degenerado em confrontos entre as forças policiais e activistas mais radicais. Iniciada em Junho contra um projecto-lei de alteração, entretanto suspenso, à lei da extradição (que visava permitir extradições para Pequim), a contestação nas ruas generalizou-se e ampliou as suas reivindicações, denunciando agora o que os manifestantes afirmam ser uma “erosão das liberdades” e uma ingerência da China nos assuntos internos daquele território.
Hoje Macau China / ÁsiaMNE com nota apenas de “casos pontuais” de portugueses afectados em Hong Kong [dropcap]O[/dropcap] movimento de contestação em Hong Kong não causou até ao momento grandes perturbações a cidadãos portugueses, registando-se apenas “casos pontuais” de problemas com viagens, disse ontem à Lusa o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva. “Salvo casos muito pontuais não temos notícia de portugueses que estejam a ver as suas viagens ou a sua vida muito perturbada por estes acontecimentos”, disse o ministro. “Os poucos casos de que temos conhecimento, e estamos a acompanhar, são algumas pessoas e um grupo, uma tuna universitária, que esteve em Macau, ia agora de Hong Kong para Tóquio, e uma parte ainda não conseguiu partir”, precisou. No contexto das manifestações pró-democracia que desde Junho se realizam em Hong Kong, milhares de manifestantes invadiram na sexta-feira o aeroporto local, um dos mais movimentados do mundo, num protesto que aumentou e levou, na segunda e na terça-feira, à suspensão de serviços e ao cancelamento de centenas de voos com partida de Hong Kong. “Mantemos as nossas recomendações […] que as pessoas tenham os cuidados de segurança habituais nestas circunstâncias, designadamente evitando os locais ou as áreas em que ocorrem confrontos, em que haja distúrbios ou em que haja repressão”, disse Santos Silva, que falava à Lusa à margem de uma entrevista sobre outro tema a divulgar em data futura. Santos Silva disse ainda que apesar da proximidade com Hong Kong, “a situação em Macau é muito tranquila”. O ministro evocou por outro lado a posição da diplomacia da União Europeia (UE), reiterando o apelo “a todas as partes” para que “não agravem a tensão e se abstenham de acções violentas”, “sejam eles as forças policiais ou os manifestantes”. “É muito importante que a violência não progrida e é muito importante que a questão politica e legal que está em causa em Hong Kong neste momento seja resolvida por vias políticas e legais e não pela violência”, afirmou. Hong Kong vive um clima de contestação social desencadeado pela apresentação de uma proposta de alteração à lei da extradição, que permitiria ao Governo e aos tribunais da região administrativa especial a extradição de suspeitos de crimes para jurisdições sem acordos prévios, como é o caso da China continental. A proposta foi, entretanto, suspensa, mas as manifestações generalizaram-se e denunciam agora aquilo que os manifestantes afirmam ser uma “erosão das liberdades” na antiga colónia britânica, enquanto pedem a demissão da chefe do executivo local, Carrie Lam, e a eleição de um sucessor por sufrágio universal directo, e não nomeado pelo Governo central.
Hoje Macau China / Ásia MancheteHong Kong: Manifestantes pediram desculpa em dia sem manifestações ou incidentes [dropcap]M[/dropcap]anifestantes em Hong Kong pediram ontem desculpa pela perturbação causada no aeroporto da cidade na segunda e terça-feira, num dia sem registo de manifestações ou incidentes, noticiou a imprensa local. Até às 20:00 de quarta-feira não se registavam protestos ou actos de violência na região administrativa especial chinesa, como tem sido frequente nos últimos dias, apesar de alguns manifestantes terem permanecido no aeroporto, em zonas específicas, tal como determinado pela justiça local, que proibiu manifestações ilegais no interior das instalações. Na declaração, assinada e emitida por “um grupo de cidadãos de Hong Kong que quer liberdade e democracia”, sem qualquer outra identificação, os manifestantes lamentaram a reação que consideraram excessiva de alguns indivíduos, na terça-feira, sem referirem incidentes específicos, de acordo com o jornal South China Morning Post (SCMP). “Pedimos a vossa compreensão e o vosso perdão enquanto jovens de Hong Kong que continuam a lutar em defesa da liberdade e da democracia”, podia ler-se num correio electrónico citado pela imprensa local. O mesmo “grupo de cidadãos” indicou que ia suspender, por agora, os protestos no aeroporto. Na terça-feira à noite, dois homens da China continental foram atacados e manietados por manifestantes, que suspeitaram tratarem-se de dois agentes policiais infiltrados. Mais tarde, foi confirmado que um deles era jornalista do Global Times, publicação do Partido Comunista Chinês, indicou o SCMP. Os incidentes aconteceram no quarto dia consecutivo de concentrações no aeroporto, para explicar aos visitantes a crise desencadeada, no início de Junho, pela apresentação pelo Governo de Hong Kong de uma proposta de alteração à lei de extradição. A proposta foi, entretanto, suspensa, mas as manifestações generalizaram-se e denunciam agora uma “erosão das liberdades” na antiga colónia britânica. A transferência de Hong Kong e Macau para a República Popular da China, em 1997 e 1999, respectivamente, decorreu sob o princípio de “um país, dois sistemas”, precisamente o que os opositores às alterações da lei garantem estar agora em causa.
Sérgio de Almeida Correia VozesVamos ao que interessa [dropcap]O[/dropcap] candidato único ao quinto mandato de Chefe do Executivo (CE) da RAEM, Ho Iat Seng, veio finalmente apresentar as linhas mestras do seu programa político-eleitoral. Falou, respondeu a algumas questões, umas mais pertinentes do que outras, sorriu muito, deixou a opinião pública com um conjunto de ideias daquilo que virá a ser o fio condutor do seu programa de governo para os próximos anos. Importa agora passar em revista as principais ideias que resultaram do seu encontro com os membros da Comissão Eleitoral na perspectiva dos direitos e interesses dos residentes de Macau, ou seja, aqueles que serão os destinatários da sua futura boa ou má governação, o que em muito dependerá daquilo que se mostrar capaz de fazer e da equipa que formar. 1. Reforma da Administração Pública: saúde-se quanto ao essencial o que o candidato disse sobre esta matéria. Há muito que a Administração Pública cresce sem que preste, salvo cada vez mais raras excepções, um melhor serviço aos cidadãos. O serviço tem vindo a piorar, mais moroso, excessivamente burocratizado e muitas vezes com exigências sem cobertura legal que não fazem qualquer sentido. Já estivemos melhor. É evidentemente necessário melhorar a formação dos funcionários, incluindo no domínio das línguas oficiais (são duas), aumentando o grau de exigência e de transparência das decisões, responsabilizando dirigentes superiores e intermédios. Informatizar procedimentos e racionalizar, diminuindo o número de direcções de serviços, institutos e comissões. Será um bom princípio. 2. Habitação: trata-se de uma área crucial da acção governativa. Muita da contestação social tem resultado da falta de alternativas condignas e a preços suportáveis para a generalidade dos cidadãos. É necessário construir mais e melhor, com preços acessíveis e cujo custo corresponda efectivamente ao que se constrói. A recorrente má qualidade da construção, que tem estado na origem de inúmeras queixas e processos judiciais, e os preços elevadíssimos da habitação, tanto para vender como para arrendamento, não se devem só à escassez de terrenos. A má gestão que deles foi feita pelas entidades públicas, a corrupção que já levou à cadeia altos dirigentes, e a ganância especulativa da protegida elite empresarial e política fizeram o resto. O sucesso da sua acção passará por aqui e pela forma como se mostre capaz de controlar especuladores, construtores e mediadores imobiliários. 3. Transportes: é hoje um dos cancros da RAEM, também eles com um longo historial de desperdícios e má gestão. Carreiras de autocarros às moscas, outras superlotadas e a qualquer dia ou hora, longos tempos de espera, veículos altamente poluentes, condução aos soluços, desrespeito pelos peões e pelas regras de circulação nas rotundas, táxis praticamente inexistentes e ineficientes, motoristas rudes, ordinários, mal-educados e pouco prestáveis, sem conhecimentos linguísticos numa cidade que se quer virada para o turismo, desrespeitando as regras da condução. O candidato mostrou estar sensibilizado para estes problemas. Esperemos pela concretização do programa pois que as Direcções de Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes e dos Serviços para os Assuntos de Tráfego são das que têm dado maiores provas de ineficiência. 4. Lei Sindical: o candidato confessou uma vergonha há muito conhecida, a de que a RAEM é a única região da China sem uma lei sindical. Deixou a ideia de que vai avançar rapidamente com a regulamentação de um dos direitos fundamentais da Lei Básica e que 20 anos depois, vergonhosamente, continua a aguardar concretização. O actual CE e todos aqueles que chumbaram os projectos anteriormente apresentados devem ter ficado com as orelhas a arder devido ao mau serviço que prestaram a Macau e à RPC nesta matéria. 5. Proteccionismo laboral: o candidato não se comprometeu. Fez muito bem, mas não pela peregrina razão de que poderia ser criticado pela sociedade. No segundo sistema a crítica faz parte das regras do jogo, não é crime, e quando fundamentada é um exercício saudável de cidadania, um contributo para o progresso. Seria bom que frisasse que o segundo sistema e as necessidades da RAEM em matéria de pessoal qualificado não podem ficar reféns da falta de qualificação e de brio profissional de alguns trabalhadores residentes. A incompetência é sempre má, ainda mais se for residente porque temos de conviver com ela. Ainda que a deputada Song Pek Kei possa não perceber isto, a incompetência não pode ser protegida só por ser local. 6. Turismo e turistas: dizer que o número de turistas é exagerado para a dimensão da RAEM já todos se tinham apercebido, com excepção da DST que deve achar normal um cidadão andar nas ruas em manada, aos encontrões e a levar com as malas dos “turistas” nos pés e tornozelos. Mas se limitar o número de entradas não for solução, vai-se então aguardar para ver como o candidato irá fazer a quadratura do círculo de maneira a que a entrada de “turistas” do Continente não continue a prejudicar a qualidade de vida dos residentes e a baixar o nível do turismo que por cá temos. 7. Reforma democrática: uma singela declaração de intenções que precisa de ser concretizada. Não acredito em milagres, muito menos por acto magnânimo do CE da RAEM. Não é pelo facto de os poderes coloniais não terem legado o sufrágio universal e directo que os residentes de Macau e Hong Kong e as futuras gerações têm de ficar limitados nos seus sonhos ou penar pela falta de exigência cívica dos seus antepassados. Convém, no entanto, recordar que, de acordo com a LB a iniciativa da mudança não tem de partir de Pequim. Tanto quanto à alteração da metodologia para escolha do Chefe do Executivo como para a constituição da Assembleia Legislativa a iniciativa deverá ser de Macau, com as alterações aprovadas por 2/3 da AL e a merecerem a concordância do CE. O Comité Permanente da APN será depois informado das alterações, para efeitos de ratificação e de registo, consoante seja o caso. O candidato não pode colocar as coisas ao contrário se não quiser ficar na história por ter sido ele quem deu o golpe de misericórdia na tão maltratada autonomia da RAEM. 8. Cidade verde: é algo pelo qual todos esperam e anseiam. A má qualidade do ar e das águas circundantes não depende só de Macau, embora muito possa e deva ser feito para atalhar aos dislates (crimes?) que se cometeram ao logo dos anos em matéria ambiental. Da patente falta de higiene urbana à autorização da entrada e circulação de autocarros e táxis poluentes, enganando-se os cidadãos quanto ao tratamento das suas águas e à capacidade da ETAR de Macau, deixando-se os peixes morrer, permitindo que as suas escassas praias se tornassem em vazadouros de detritos, onde toda a espécie de fungos, bactérias e vírus se podem reproduzir, tudo foi possível sem que ninguém fosse responsabilizado. Ficamos a aguardar que o candidato se deixe de generalidades e passe às acções para atalhar a estes problemas e reduzir os espaços de reprodução de roedores e baratas. 9. Jogo: pouco ou nada disse para além do óbvio. Será necessário aguardar para se perceber como pretende aumentar a competitividade do sector e melhorar a exploração dos jogos de casino num local que é só o mais competitivo do mundo na sua área de negócio e destronou Las Vegas. 10. Justiça: estranha-se a ausência de uma agenda nesta matéria, tantos e tão graves são os seus problemas. Das conservatórias aos notários públicos, cujos prazos são terceiro-mundistas. No prospecto que distribuiu, o candidato refere singelamente “prosseguir com a construção do sistema jurídico” e “salvaguardar o poder judicial independente”, mas estranhamente mistura estes dois pontos com o reforço da interacção e da “cooperação entre o Executivo e o Legislativo”. Ainda mais, pergunto eu? Mas que tem isto a ver com os tribunais, com a justiça? Existe uma coisa chamada separação de poderes e há respostas que urgem. Para primeiras impressões dir-se-ia que o candidato tomou boa nota dos tópicos. Aguardam-se também desenvolvimentos em matéria de saúde, educação e segurança, precisando de fazer uma revisão do seu programa depois de ouvir as críticas. Desenvolvendo-o, dando-lhe consistência através da apresentação de propostas credíveis e exequíveis, expurgando-o de banalidades, ao mesmo tempo rodeando-se de gente qualificada, de quem compreenda o princípio “um país, dois sistemas” e, em especial, o funcionamento do segundo sistema. Espera-se que o candidato Ho Iat Seng, futuro CE, não se esqueça de que a boa governação é que trará consigo o bem-estar aos residentes e a satisfação ao povo. O patriotismo chegará por acréscimo. Nenhum patriota, por mais convicto, talentoso e delirante, resistirá eternamente à má governação, à falta de transparência, à falta de respostas e de prestação de contas, ao nepotismo, à corrupção e ao autoritarismo policial desenfreado. O patriotismo sempre casou mal com a má governação. E se imposto pela força, num cenário de falta de respostas, nunca será genuíno. O candidato Ho Iat Seng, futuro CE da RAEM, tem o dever, este sim patriótico, de nos fazer esquecer a última década de incompetência política e governativa. E não pode cometer em Macau os erros que se viram, e vêem, em Hong Kong. Um lençol pelo qual estamos todos a pagar: a RPC, HK e a RAEM. Resta saber até quando e com que custo final em matéria de autonomia, direitos, liberdades e qualidade de vida.
João Luz VozesInter-nacional [dropcap]H[/dropcap]oje, esta coluna saco de pulgas é dedicada a um dos mais ouvidos chavões locais despegados da realidade: A internacionalidade de Macau. Com um passado, relativamente recente, em que foi uma cidade ponto de contacto entre Ocidente e a hermética e misteriosa China, Macau tem vindo progressivamente a fechar-se em si mesma. A administração portuguesa abdicou dessa função, batendo recordes de ingerência, numa altura em que Hong Kong não passava de um enorme pântano, ilhas dispersas com aldeias de pescadores. Hoje em dia, apesar dos discursos vazios, Macau é tudo menos internacional. O pendor global apenas se pressente nos negócios, e mesmo assim timidamente. O amor à pátria é de tal ordem assolapado, que mesmo projectos como a Grande Baía, com pretensões de atingir a escala global e competir com outras zonas (muito mais abertas), acabam por deixar cair o inter em internacional. Tudo é absolutamente nacionalista. O projecto de integração é isso mesmo, um processo de osmose, apesar de se falar muito da capacidade de atracção de investimento internacional e do papel de Macau nesse objectivo. Sinceramente, não vejo de que forma Macau é mais internacional que Shenzhen, por exemplo. Hoje em dia restam as ruínas, a arquitectura, os vestígios portugueses como o pastel de nata e pouco mais. Tudo o resto que vem de fora é visto com intensa suspeita e a cidade mundial de turismo e lazer encerra-se em si mesma, celebrando o provincianismo.
Luís Carmelo h | Artes, Letras e IdeiasCatch, o Trumputin e o kitsch histórico [dropcap]M[/dropcap]al abriu em Junho passado a cimeira do G20 em Osaka, logo Trump apareceu, no seu jeito de incontido prestidigitador, a pedir a Putin para não interferir nas eleições americanas de 2020. Um teatro assim, produzido debaixo da mesa dos matraquilhos, tem o humor ao nível dos irmãos metralha. Até porque toda a gente já aprendeu a reconhecer os desviços penianos do marionetista nos acenos da marioneta. O tosco domínio da imaginação faz lembrar aquele delicioso texto de Barthes sobre o facto de o catch (texto que em 1957 abria Mythologies; wrestling na tradução inglesa) não ser um desporto, mas antes um espectáculo. Tal como o strip-tease, que sugere o apimentado palpite do sexo sem o ser, o wrestling sugere a avidez do desporto embora não passe de uma táctica espectacular ao serviço de um (tão perverso quanto) tácito empate. Aqui a manobra é a mesma: falar como se estivéssemos à mesa do café ou no FB a exercitar a imbecilidade natural, mas com o objectivo de dissuadir a ferida, de sacudir a mouche e de ludibriar as borbulhas às tabuadas. Quando eu era criança, qualquer futuro era melhor do que tudo aquilo que se passava à minha volta. Logo que a revolução cruzou o país, o futuro parecia querer emergir das pedras da calçada como uma corça que não sabe bem em que direcção correr. Mais tarde, chegou o tempo dos cartazes que diziam – aliás gritavam – “Europa Connosco” e o futuro começou a cheirar a croissants, a rendimento mínimo mas também às enviesadas cartilhas do FMI. Nos alvores da década de oitenta, o futuro soube ainda sorrir por cima da agonia comunista e olhou com desusada esperança para a rosácea do federalismo. Quando a última década do século passado se encontrou com o 11 de Setembro, o futuro libertou um cheiro amargo a paiol. Mas nada que fizesse temer um bom mortal lusitano, sobretudo se tivesse escutado a virilidade do Padre António Vieira a pregar que “uma das felicidades que se contava entre as do tempo presente, era acabarem-se as comédias em Portugal” (Sermão da Sexagésima, IX), adágio que prenunciou o afundamento (ou a crise, se se preferir) dos idos de 2008 a 2011. Fosse como fosse, apesar dos Obamas, das utopias federalistas com que Kant tanto sonhou e do coração de ouro de Steve Jobs, o boom das tecnologias não foi capaz de acossar nacionalismos, migrações humilhadas e hackers qb. e foi por isso que o final da segunda década deste século acabou por trazer consigo, entre muitos outras, as encenações Trump, Brexit e Bolsonaro. Um verdadeiro tufão que teve – e continua a ter – como base um enorme fastio e o esgotamento das soluções políticas clássicas. Poucos conseguirão definir com clareza o tempo que estamos a viver – o sorriso de Xi Jinping parece levitar sobre essa perdição – e muitos chegam a arder nas palavras com que o tentam. Ou, dito de outro modo bem mais avisado, pois um padre impõe sempre o seu respeitinho – “O definir-se foi declarar a sua essência: o arder foi provar a definição” (Sermão do Mandato). Quando há dias ouvi Trump a pedir a Putin para não se meter (onde já se meteu e atascou até ao pescoço), ocorreram-me aqueles cenários caóticos que, ao fim e ao cabo, fazem parte de um mundo arrumadinho (em que as regras entre senhorio e inquilinos estão escritas em contrato bem escondido num cofre sem quaisquer segredos). Desde os anos oitenta que retenho o que Kundera escreveu acerca do kitsch em A Insustentável Leveza do Ser (1984). Há coisas que a memória guarda, outras não. O primeiro de Maio soviético ou a música de fundo de um restaurante de luxo (suíço) eram exemplos romanescos que o autor dava para explicar essas simetrias açucaradas, onde tudo aparecia arrumadinho apenas na fachada: sem pó e sem grandes distracções. O pior é se, um dia, este tipo de catch ou de wrestling, que é o trampolim do verdadeiro e perigoso kitsch, se transforma em pólvora e a desarrumação no Golfo Pérsico vence os tapumes, as paredes de água e as frases sensaboronas. Com as devidas diferenças, há qualquer coisa na boçalidade de Trump que evoca a tibiez de Arthur Chamberlain, recém-chegado de Munique em Setembro de 1938, quando levantava no ar o papel de um (ilusório) tratado de paz. Já Nietzsche avisara, em Para Além de Bem e Mal (1886, §262) que os “incuráveis medíocres” aparecem e subsistem aos “pontos de viragem da história” enquanto – compreenda-se a “ironia” – porta-vozes da “única moral que poderia ainda ter algum sentido”. Esta prática de catch ou de wrestling é perigosa. Se é verdade que todas as actividades humanas, ao perderem a sua função mais imediata, se podem transformar em jogo, caso do uso da linguagem, da guerra, da caça ou do amor, não é menos verdade que um jogo não se força ou simula por muito tempo, pois, ao fim e ao cabo, depende sempre de regras muito claras e não da ventilação assistida aos irmãos metralha.
António Cabrita Diários de Próspero h | Artes, Letras e IdeiasO Brexit e a geofagia [dropcap]U[/dropcap]ma crónica é uma Bola de Berlim, às vezes tem creme, outras não. Na Ilha do Farol o vendedor, trajado de branco como um enfermeiro, fazia ecoar praia fora o seu pregão: Bolinhas, Bolinhas! Uma Bola de Berlim – com creme (é a gadelha) – parece o Boris Johnson, aquela que caiu na areia depois de alguém ter gritado Tubarão e o pânico assarapantar os veraneantes. Quando os mais atrevidos voltaram, um puto ranhoso topou a bola, felicitou-se e apanhou-a, devorando-a. Melhor: absorto pela sua sorte era-lhe indiferente que a areia se misturasse, ou antes, se sobrepusesse ao açúcar. Bola de Berlim crocante. Averiguo no Google, que males causará ingerir areia, e descubro esta reportagem da moçambicana Anchieta Maquitela, de 2014, que pico pelo inédito e por justificar o ar prazenteiro do puto ranhoso: «O consumo de areia virou moda em Maputo. As pessoas consomem areia na via pública, no interior dos “chapas” (…) a indústria de venda e consumo de areia está a ganhar terreno na província e cidade de Maputo (sic). Nas ruas, nas paragens e em frente das escolas, é comum a presença dos funis de papel branco cheios de areia. Se antes comer areia era hábito entre as mulheres grávidas, para remediar a falta de ferro, agora virou moda e até homens consomem a areia. Há três anos que Sitoe, por dia, acaba três a quatro funis: “No princípio, tive dificuldades, doía-me o estômago, tinha dificuldades de defecar, mas já estou viciado”. Por sua vez, para Alice Das Dores o vício começou aos 15 anos, tendo agora 22: “Esta areia tem um sabor incrível. Não sacia, mas traz um conforto à alma quando o desejo bate.”. Diz Angélica Sitoe, 44 anos, vendedeira de lençóis no mercado Xipamanine: “A areia não tem gosto. Consumo por capricho”. Para Angélica, o que incentiva os jovens é o baixo preço, “Por mais que queira resistir não consigo. Sempre caio na tentação”. A areia é extraída em Marracuene, a 30 quilómetros da capital. As mulheres pilam, seleccionam, põem nas bacias e vendem-na ao preço de 50 meticais. A seguir é submetida a um processo de transformação que passa pela adição de sal, incluindo a cozedura que dura entre duas e três horas. Logo a areia é peneirada para retirar a mais grossa. Para dar gosto, coloca-se sal de cozinha e segundo algumas fontes, sabão ou detergentes.» Nunca dei conta, mas amanhã começam as aulas: vou perguntar aos meus alunos. E percebo melhor a alegria do puto e porque votaram os conservadores britânicos em Boris Johnson. Continua a reportagem: «No mercado, as vendedeiras de areia colocam o produto em recipientes abertos e manipulam-na sem luvas. Teresa Francisco, mãe de dois filhos, vende areia no mercado Xipamanine, arredores da capital: “É vantajoso comercializar areia porque é rentável, não apodrece, os ratos não consomem, e muito menos as crianças em casa”, explica.» Confesso que este trecho me desconcerta. Se está na moda, não percebo a falta de sentido de oportunidade das crianças (serão abúlicas?) e como a Teresa Francisco não ocorre a poupança em tomates e feijão se as habituasse a consumi-la. Retomemos: «Por sua vez, Rosa Moiane também vendedeira do mercado Xipamanine e mãe de dois filhos disse que faz este negócio desde 2011, e que com o dinheiro que ganha com a venda de areia sustenta os seus filhos e ajuda o seu marido que é guarda-nocturno e não recebe quase nada. Contudo, Rosa reclama do aumento no custo do transporte e do número crescente de vendedeiras de areia na cidade. “Dizem que este negócio mata e que devemos procurar fazer outros mas já experimentei vender tomate e cebola, e não deu certo”, concluiu.» E, agora, a reportagem permite-nos aprender, pelo menos a mim, que nunca me tinha debruçado sobre estas práticas: «A geofagia (comer terra) é uma prática culturalmente sancionada, e portanto não é considerada um distúrbio”. Está documentado desde a pré-história, e a época dos faraós do Egipto. É um hábito com muitas variantes em sua prática e com diversos significados: nutricionais, psicológicos/psiquiátricos, terapêuticos, antropológicos, místico/religiosos e antropológicos. “Na selva amazónica, por exemplo, por não ser fácil conseguir-se sal, grupos indígenas realizavam uma peregrinação anual em busca da terra salgada. No Peru e Escandinávia a argila é material comestível. Em algumas regiões de África a prática da geofagia está associada à crença de que durante o primeiro trimestre da gestação diminui as náuseas e estimula a secreção láctea quando o bebé nascer”, lê-se no documento. A causa básica da geofagia é desconhecida, sendo que a deficiência de ferro no consumidor é a mais divulgada. Outros estudos relacionam a geofagia com a deficiência de zinco ou com as deficiências nutricionais múltiplas. O problema coloca-se quando as pessoas consomem terra como se fosse moda, sem prestar atenção às condições nada higiénicas do processo de preparação.» E, pronto, fim de citação, e afinal o Boris Johnson – que pelo contrário tem visíveis hábitos de higiene e daí a sua franja tão loura como o creme da mais estival Bola de Berlim – sempre teve razão: há saída para o Brexit e finalmente as praias do Reino Unido vão ser um sucesso digno de lambões. O género humano consegue invariavelmente colocar-se um passo adiante das malditas circunstâncias, e eu, como um George Orwell de segunda, hei-de fazer o relato dessas comezainas dos súbditos de Sua Majestade. Confesso até que estou disposto a propor a Boris um ”piqueno” negócio: cones de língua da sogra, com areia de Brighton tratada – polvilhada de sal, dentes de alho e salsa picados e uma colher de molho de soja. Embora sem descurar a vigilância quanto à restituição dos direitos aos meus amigos moçambicanos, pois, por muito que custe ao novel primeiro-ministro, esta solução não foi dele.
Gisela Casimiro Estendais h | Artes, Letras e IdeiasÀ deriva e sem motor [dropcap]À[/dropcap] deriva e sem motor” é como, nas notícias, descrevem o barco resgatado pela polícia marítima portuguesa ao largo de Lesbos (Grécia) estes dias. De cinquenta migrantes, metade são crianças. Pergunto-me se ainda se recordam de quando eram apenas pessoas. A maioria das mulheres são afegãs. Não raras vezes, os maridos ficam para trás e enviam esposas e crianças primeiro. Os milhares de euros necessários para esta viagem deveriam garantir coletes salva-vidas e barcos de qualidade. Porém, os migrantes são apenas fontes de rendimento para facilitadores que recebem o seu quinhão sempre, independentemente de quem chega ou não vivo, ou onde. Normalmente, é escolhido um homem ao acaso para comandar cada barco. São-lhes dadas instruções e luzes que devem seguir. Cabem sempre mais do que deveriam, nos barcos, no mar, no campo. Entre noites frias e dias quentes, lutas entre afegãos, iranianos e africanos, nem o campo pode ser considerado seguro. O racismo existe também aqui. E o suicídio. A esperança de sair do campo e chegar à última fase, a do país longínquo com o qual se sonha, no qual pensam poder tornar-se cidadãos, é o que mantém estas pessoas vivas. No entanto, nenhum voluntário se atreve a dizer-lhes que, muitas vezes, nesses países, ninguém quer recebê-los. De outro modo, o que lhes restaria? Não nos vemos há muito tempo. Diz-me que se despediu no dia anterior. Dou-lhe os parabéns. Poderia dizer que me surpreende ouvir falar do seu próximo destino, mas não realmente. Fala-me da formação que teve recentemente na Estónia e sobre o que vai fazer durante seis meses no Uganda. Sentirão todos os alemães esta culpa, esta necessidade de compensar pelo passado do seu país? Qual é realmente a diferença entre campos de concentração e campos de refugiados? Conversamos sobre as duas semanas a colaborar com uma ONG que providencia uma refeição quente, banhos, roupa interior limpa a mulheres e crianças refugiadas. Rapazes até aos dez anos, também. Fazem-se tantas viagens quanto possível logisticamente, em carrinhas de nove lugares, do campo para o edifício da organização. Por vezes há risos e dança. A expressão inglesa mais popular, a forma de tratamento predilecta é Ma friend. Trocam-se histórias e costumes. Muitas destas esposas casaram aos quinze anos. Avaliam-se maridos pelo número de filhos. Espanta-as que algumas das voluntárias, tendo passado os trinta e cinco, não tenham nem uma coisa nem outra. A minha amiga é loira de olhos azuis, fisicamente bem diferente de Carola Rakete. E o que importa isso? Há activistas mais focados na cor de pele de quem, reconhecendo o quão boa a sua vida é, decide abdicar de parte dela para ajudar os outros. Quem é salvo/ajudado, não quer saber de cores. Essas questões ficam para quem tem tempo a perder. O turismo em Lesbos escasseia mas é ainda desesperadamente necessário, numa altura em que consciência cívica e lazer parecem dois pólos opostos. A praia ainda é paradisíaca. Nela, podemos fazer o mesmo que em quase qualquer outra. Lesbos só não se terá tornado uma Chernobyl, provavelmente, porque os campos de refugiados ficam longe da praia, de outro modo não teríamos já influencers de smartphone em riste, tirando selfies sobre um fundo de burcas e olhares tristes? Não duvido que esse dia chegue, em que lugares destes, já desabitados, se tornarão cenários de campanhas de moda, de anúncios, de vlogs. E como fica quem nasceu e cresceu em Lesbos? Ainda se lembrarão de quando a ilha era conhecida por Sapho? “Durante três anos confiei no mar para me levar à segurança. Porém o mar traiu-me”, desabafa um residente do campo Moria, considerado o pior do mundo, à BBC, de lágrimas nos olhos. A seu lado, a menina de olhar impávido tem agora a cabeça na mesa e as mãos juntas. Estar no campo não significa ter paz mas sim alopecia, envelhecimento precoce, doenças de pele e respiratórias. Uma das mulheres entrevistadas declara que ela e as suas crianças estão sempre preparadas para fugir a qualquer momento. Ficamos a saber que é preciso ir para a fila do pequeno-almoço às 3 da manhã, e à hora a que regressam à sua tenda, já é hora de almoço. Duas horas é quanto estas pessoas têm, na sede da Shower Power, para trocar por um momento a sua vida actual por higiene, privacidade, água limpa, champô, roupas lavadas e cheirosas, enquanto alguém lhes toma conta das crianças e brinca com elas, faz tricô, lhes pinta as unhas ou entrança o cabelo. Duas horas para poder voltar a ser só uma pessoa, quem sabe das que cantam no chuveiro. Entretanto, mais dois barcos sofreram um naufrágio na costa da Líbia: 70 mortos e 100 desaparecidos, no mínimo. Nem países nem ilhas nem campos parecem poder conter tantas vidas quantas as que os mares vão engolindo e velando. A ONU considera esta a pior tragédia até então. Mas quantas vidas mais se perderam, se perderão entretanto, nas notícias que nunca conseguiremos actualizar? As pessoas continuam a ser a derradeira fronteira umas das outras. Enviado da minha vida privilegiada e segura.
Raquel Moz EventosExposição | Yao Feng dá workshop de poesia no MAM O poeta Yao Feng foi convidado pelo MAM para fazer uma oficina criativa de poesia, no dia 24 de Agosto, inspirada na pintura da exposição “Poesia Lírica – Trabalhos de Artistas de Macau e Portugal”, patente até 4 de Novembro. O evento será em chinês, mas fica a sugestão da visita para quem ainda não foi [dropcap]G[/dropcap]raças à poesia, você morreu sem a morte. Graças à poesia, você encontrou uma lâmpada para suportar o peso da sombra. A poesia é o único que lhe resta, sendo uma possibilidade dentre as impossibilidades”. As palavras de Yao Feng são um excerto da poesia que escreveu, inspirada no quadro sobre a vida do poeta português Camilo Pessanha, pintado pelo artista e arquitecto local Carlos Marreiros. O poema é um exemplo do que vai acontecer na oficina criativa de “Poesia inspirada na Pintura”, marcada para dia 24 de Agosto, no Museu de Arte de Macau (MAM), e apresentada por Yao Feng, pseudónimo artístico do professor Yao Jingming, também director do departamento de português da Universidade de Macau. A ideia partiu do MAM, que convidou o conhecido poeta e professor a lançar um repto em língua chinesa aos Amigos do Museu, para que se inspirem num dos quadros da exposição “Poesia Lírica – Trabalhos de Artistas de Macau e Portugal”, patente ao público desde 13 de Julho até 4 de Novembro de 2019, e escrevam um poema alusivo ao tema da pintura escolhida. Ou mais, não há limite. Os textos devem ser enviados por email para o Museu até dia 21 de Agosto. Yao Feng fará a triagem dos trabalhos na preparação do workshop de dia 24, onde irá procurar despertar, incentivar e orientar a veia criativa dos participantes, num encontro de ideias e sensibilidades que pode até ser o início de uma forma diferente de se estar vida. “Acho que cada pessoa é um poeta potencial, essa capacidade poética pode estar a dormir em cada pessoa, mas então basta acordá-la”, respondeu o professor ao HM. A inspiração é, por vezes, o que falta. Daí a iniciativa do MAM, em que Yao Feng vai orientar os participantes “no uso da sua imaginação, despertada pelas obras de que mais gostaram, para criarem poemas integrando as conotações da pintura na poesia, expressando sentimentos induzidos pela arte”, conforme divulga a organização do evento. Poetas e pintura Sob o tema “Poesia Lírica”, a exposição integrou o 2º “Encontro em Macau – Festival de Artes e Cultura entre a China e os Países de Língua Portuguesa”, apresentando mais de 90 obras destacadas da colecção MAM, criadas por 60 autores que se estabeleceram ou exibiram os seus trabalhos em Macau – chineses, macaenses e portugueses – desde a década de 1980. São pinturas a óleo, acrílicos e aguarelas, gravuras de técnica mista, esculturas e instalações “que reflectem a criatividade dos artistas contemporâneos, bem como ricas conotações culturais chinesas e portuguesas”. A singularidade da mostra é a inclusão de sete poemas, da autoria de quatro poetas locais, que estabelecem uma relação com as obras expostas. O MAM convidou, na altura, além de Yao Feng, também Wong Man Fai, Ling Gu e Un Sio San, estando os poemas igualmente em exibição nas línguas chinesa e portuguesa. “Quatro palavras sobre Camilo Pessanha” foi a proposta de Yao Feng para a exposição, partindo da pintura de Carlos Marreiros sobre o poeta simbolista português, nascido em 1867, que viveu e trabalhou no território entre 1894 e 1926, onde viria a falecer. O poema é sobre fases da vida – que passam pelas palavras “amor”, “mar”, “arte” e “poesia” – do renomado autor de “Clepsidra”, obra traduzida para chinês pelo próprio professor. Milagre da poesia O workshop de poesia a partir da pintura será uma continuação desta ideia do MAM, que se estende agora à população interessada. É a primeira vez que Yao Feng faz uma oficina criativa com o Museu, mas o exercício não difere muito do que acontece na sua sala de aulas. “De facto, já tenho feito isto com os meus alunos, eu gosto sempre de dar um tema, ou uma palavra que seja muito usada e nada criativa, para que os alunos escrevam uma frase ou um verso, mas com uma linguagem criativa”, dá como exemplo. É que “a palavra é capaz de fazer milagres”, descrever e tornar “uma coisa muito comum, muito banal, numa coisa fantástica”. Como acredita e gosta de partilhar com os seus formandos, “na poesia o improvável pode acontecer”. O workshop é gratuito, organizado em língua chinesa, e terá um limite de 20 participantes. A inscrição deverá ser feita online no sítio electrónico do Museu. A comunidade portuguesa pode, também, aproveitar a sugestão e visitar a mostra em busca de inspiração poética. “Aprender a observar, a olhar o mundo com olhos poéticos, também é importante para o dia a dia, porque traz novidades, traz mais beleza para a nossa vida pessoal”, é a proposta deixada por Yao Feng.
Hoje Macau SociedadeMacaenses | Encontro anual inclui apresentação da Grande Baía [dropcap]O[/dropcap] Encontro das Comunidades Macaenses deste ano vai incluir uma apresentação do Plano de Desenvolvimento da Grande Baía, um concurso de culinária e uma visita a uma cidade chinesa, apontou ontem Leonel Alves durante o encontro entre a Comissão Organizadora do Encontro das Comunidades Macaenses e o secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, refere um comunicado. O programa está a ser preparado para o evento em que se espera um número recorde de participantes de “fora de Macau”. A organização estima uma participação de mais de mil pessoas representantes de 13 Casas de Macau espalhadas pelo Mundo. Alexis Tam não deixou de referir a importância do Encontro das Comunidades Macaenses para o desenvolvimento local. “O secretário para os Assuntos Sociais e Cultura reconheceu a importância deste reencontro de filhos da terra e da oportunidade de dar a conhecer a realidade e o enorme desenvolvimento de Macau”, refere a nota enviada à comunicação social. O secretário sublinhou que “o progresso que certamente Macau continuará a alcançar contará, por certo, com o contributo e o empenho dos macaenses que cá estão e dos que quiserem regressar”.