Fronteiras | Lei sobre declaração de dinheiro só com uma infracção

Desde a entrada em vigor, há um ano, da lei que obriga à declaração nas fronteiras do transporte de dinheiro no valor igual ou superior a 120.000 patacas foi detectada apenas uma infracção. Em causa um homem de Hong Kong que trouxe mais de três milhões em dinheiro vivo

 

[dropcap]Q[/dropcap]uem entra em Macau transportando numerário ou instrumentos negociáveis ao portador, como cheques ou livranças, no valor igual ou superior a 120 mil patacas tem de o declarar sob pena de multa. Desde a entrada em vigor da lei em causa, a 1 de Novembro de 2017, foi detectada apenas uma infracção, indicaram os Serviços de Alfândega (SA) ao HM.

O episódio em causa foi protagonizado por um residente de Hong Kong que entrou em Macau através do Terminal Marítimo do Porto Exterior com o equivalente a 3,1 milhões de patacas em dinheiro vivo. O homem, travado pelos verificadores alfandegários, foi multado em 30.200 patacas por não ter apresentado a devida declaração.

Ao abrigo da lei, a prestação de informação incompleta, de declarações que não correspondam à verdade ou o não preenchimento da declaração constitui infracção administrativa punível com multa correspondente a 1 a 5 por cento do valor que exceda o montante de referência (120 mil patacas), mas nunca inferior a mil nem superior a meio milhão de patacas.

Fraco resultado

Esta lei, pensada para prevenir e combater as actividades de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo, foi apresentada para responder a uma das 40 recomendações do Grupo de Acção Financeira (GAFI), emitidas em 2012 e actualizadas quatro anos depois.

No Relatório de Avaliação Mútua de 2017, aprovado pelo Grupo Ásia/Pacífico contra o branqueamento de capitais, Macau obteve um resultado descrito como “excepcional” quer no domínio do cumprimento técnico em termos do quadro normativo vigente com os padrões internacionais, quer no domínio da eficácia na implementação das medidas de combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo.

22 Nov 2018

Deputados pedem fiscalização a estabelecimentos de ensino devido a casos de abuso sexual

[dropcap]N[/dropcap]a sequência do recente caso de abusos sexuais alegadamente ocorridos num centro de explicações no Fai Chi Kei, deputados e dirigentes associativos apelam a uma maior fiscalização de todo o tipo de instituições de ensino locais, onde se incluem os centros de explicações. A intenção é prevenir a repetição de casos como o divulgado na passada terça-feira que envolve um professor e cinco alunos menores.

Em declarações ao jornal Ou Mun, Lam Lon Wai confessou estar chocado com o comportamento do docente em causa. Como tal, o deputado sugere que os centros de explicações instalem câmaras de videovigilância de forma a garantir a segurança dos alunos. O legislador avança ainda para a necessidade de promover a educação sexual entre os mais novos, de modo a que possam estar alerta para este tipo de comportamentos que ponham em causa a sua integridade.

Wong Kit Cheng também se manifestou relativamente ao recente caso de alegado abuso sexual de crianças. À mesma fonte, a deputada fez o alerta para o crescente número deste tipo de casos no território nos últimos meses. Para Wong é imperativo o reforço da fiscalização em todo o tipo de estabelecimentos de ensino de modo a garantir o profissionalismo dos docentes.

Mais legislação

Já a directora da comissão para os assuntos das mulheres dos Kaifong (União Geral das Associações dos Moradores de Macau), Che Mei Leng, apela à criação de um regime jurídico que previna com mais eficácia este tipo de crimes e proteja as crianças, segundo o Jornal Ou Mun.

Por sua vez, Webster Ng, membro da Aliança de Povo de Instituição de Macau, exige que o Governo dê seguimento ao caso e disponibilize serviços de aconselhamento para reduzir os problemas de foro psicológico que podem ser causados por este tipo de abusos. Segundo o responsável, o abuso sexual de menores pode deixar nas vítimas consequências e traumas difíceis de ultrapassar pelo que é urgente a tomada de medidas para ajudar as vítimas.

22 Nov 2018

Pearl Horizon | Deputados reuniram com Sónia Chan

[dropcap]O[/dropcap]s deputados Chan Hong, Ho Ion Sang, Ella Lei, Wong Kit Cheng e Song Pek Kei comunicaram à secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, que os lesados no caso Pearl Horizon pretendem que o valor que pagaram pela fracção comprada seja devolvido o mais rapidamente possível e apelam ao direito de receber uma indemnização.

A informação foi dada à secretária numa reunião com os deputados em que foram debatidos assuntos ligados ao arresto de bens da Polytex e à proposta do regime jurídico de habitação para alojamento temporário e de habitação para troca no âmbito da renovação urbana, de acordo com um comunicado da deputada Ella Lei.

Segundo a mesma fonte, Sónia Chan manifestou o seu apoio aos lesados para que solicitem nos termos da lei a devolução do pagamento de casa e indemnização. No que respeita à possibilidade destes lesados se candidatarem à habitação para troca prevista na proposta de lei em causa, Sónia Chan reiterou que o regime irá abranger os compradores de fracções no Pearl Horizon. A secretária adiantou ainda que a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes está a dar seguimento aos trabalhos do regime jurídico que prevê a troca de habitação.

Sónia Chan garantiu ainda que vai comunicar com deputados e compradores de fracções pelas vias previstas de modo a resolver a situação o mais breve possível.

22 Nov 2018

Jogo | Criada linha para denunciar trabalhadores que estejam em casinos fora do expediente

Vai ser criada uma linha telefónica exclusiva para a denúncia de funcionários do sector do jogo que se encontrem em casinos fora do horário de trabalho. A medida foi anunciada ontem por Ho Ion Sang, após a última reunião de análise na especialidade da proposta de alteração à lei do condicionamento da entrada de trabalhadores do jogo nos casinos

 

[dropcap]A[/dropcap] Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ) vai criar uma linha telefónica exclusiva para denúncias de suspeitas de trabalhadores do sector jogo que estejam dentro de casinos fora do seu horário de trabalho. A medida foi ontem anunciada pelo presidente da 1ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa, Ho Ion Sang, no final da última reunião de discussão na especialidade da proposta de alteração à lei do condicionamento da entrada dos trabalhadores do jogo nos casinos.

“Já existe uma linha de denúncias, mas esta que vai ser criada será exclusiva para queixas de suspeitas de trabalhadores que estejam em casinos de forma irregular”, revelou Ho. A linha estará aberta 24 horas por dia, sendo que “no horário de trabalho é atendida por operadores, enquanto nos períodos nocturnos as queixas serão gravadas” acrescentou o presidente da comissão.

A medida integra um conjunto de três acções que pretendem promover a fiscalização da entrada de trabalhadores do sector do jogo em casinos.

Além da linha telefónica, a DICJ vai ainda fazer uma lista com os nomes de possíveis suspeitos e alertar as concessionárias para estarem atentas aos trabalhadores que possam estar ilegais nas salas de jogo, até porque “as concessionárias e subconcessionárias dominam bem a identidade dos seus trabalhadores”, disse o deputado.

Contas certas

Foram ainda esclarecidas na reunião de ontem as regras para a reversão de prémios e de receitas das apostas feitas por trabalhadores do sector joguem ilegalmente. Neste sentido, quem obtiver ganhos, quer seja a operadora ou o jogador, os valores revertem a favor da RAEM. De acordo com Ho Ion Sang, este ponto da proposta foi clarificado de modo a “permitir uma melhor execução da lei”, explicou.

Outro esclarecimento que esteve na agenda da comissão foi procurar saber como seriam tratados os casos de trabalhadores que, depois de saírem do serviço, tenham por “motivo de urgência” de regressar ao casino sem incorrer em infracção. Ho Ion Sang apontou o exemplo de “o esquecimento de um telemóvel”. Para resolver a situação, o Governo garantiu que as operadoras vão ter tempo para se preparar para este tipo de situações e que poderão criar condições, como corredores específicos para trabalhadores e depósitos de objectos, que evitem a entrada do funcionário no casino.

A fase seguinte do processo legislativo é a elaboração de parecer que deverá estar pronto, de acordo com Ho, no próximo mês de Janeiro.

22 Nov 2018

Grande Prémio | Son Pek Kei sugere dias de feriado

[dropcap]A[/dropcap] legisladora Song Pek Kei defendeu ontem a necessidade de se criarem feriados durante os dias do Grande Prémio, com o objectivo de afastar os inconvenientes para a população da realização do evento.

“Na minha opinião, se no futuro se conseguir realizar o Grande Prémio e, ao mesmo tempo, reduzir as inconveniências para a população, será uma vantagem para o Governo, residentes e amantes da actividade”, frisou a deputada.

“Sugiro o aumento dos feriados para gozar durante o Grande Prémio, incentivando os cidadãos a participarem nas actividades relacionadas com a competição”, afirmou. “Com a introdução desses feriados, pode resolver-se o problema das deslocações dos cidadãos e aliviar o trânsito, isto é, matam-se dois coelhos duma cajadada só”, acrescentou.

22 Nov 2018

Deputado Wu Chou Kit queixa-se de pouca participação de empresas locais nas grandes obras

[dropcap]O[/dropcap] deputado Wu Chou Kit considera que as empresas locais estão a ser afastadas, devido à sua dimensão, das grandes obras em Macau e pede ao Governo para ajudar o sector. O pedido foi feito pelo legislador nomeado pelo Chefe do Executivo, ontem, na Assembleia Legislativa (AL), antes da ordem do dia.

“Em resultado da abertura do mercado do jogo e da realização de grandes empreendimentos, diversas empresas do Interior da China e estrangeiras vieram investir e construir em Macau”, começou por dizer Wu. “Mas as empresas de construção civil de Macau, devido à sua pequena dimensão e falta de experiência, não têm conseguido participar nos grandes empreendimentos de construção, uma vez que, em termos de dimensão, se têm mantido como ‘micro-empresas’”, considerou.

Wu recordou também que no passado o Chefe do Executivo tinha prometido que seriam implementadas medidas para promover a cooperação entre empresas do exterior e locais, com o objectivo de desenvolver o sector do território. Ao mesmo tempo, seriam igualmente tomadas medidas para que os profissionais de Macau tivessem oportunidades para aprender e participar nas grande obras.

Contudo, o deputado diz que a construção civil local considera que as medidas ainda estão por ser adoptadas: “As empresas e profissionais locais da construção civil anseiam pela implementação das referidas políticas, porque através da colaboração e da prática é que conseguem aprender novas técnicas para servir Macau”, vincou.

Por outro lado, o legislador indicou que se obtiverem experiência nas grandes obras, as empresas locais vão poder participar “nos projectos de construção de Zhuhai e de Hengqin, e até nos empreendimentos da Grande Baía de Guangdong-Hong Kong-Macau”.

Bomba-relógio

Também o deputado e construtor Mak Soi Kun abordou a situação das obras, nomeadamente a necessidade de avançar com a renovação urbana. O legislador criticou ainda as construções antigas, devido à falta de qualidade.

“Os prédios com mais de 30 anos, tendo em conta o passar do tempo e os materiais e as técnicas de construção de pouca qualidade daquela época, apresentam uma qualidade muito inferior aos que existem actualmente, por isso, facilmente há infiltrações de água, desprendimento de betão e problemas estruturais”, defendeu o empreiteiro. “Se estes prédios não forem reparados atempadamente, poderão tornar-se em ruínas, transformando-se numa bomba-relógio na sociedade”, alertou.

Mak sugeriu assim que sejam tomadas medidas como a inspecção obrigatória dos edifícios com mais de 30 anos e que seja alterada a lei para que os trabalhos de renovação nos prédios sejam facilitados, quando precisam da aprovação do condomínio.

22 Nov 2018

Orçamento 2019 | Governo vai trabalhar em lei para empresas de capitais públicos

[dropcap]O[/dropcap] Governo quer criar uma lei para regular as empresas de capitais públicos e os trabalhos deverão arrancar durante o próximo ano, revelou ontem o secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, na Assembleia Legislativa, justificando a medida com a necessidade de aumentar a transparência na utilização das verbas públicas.

“Creio que no curto prazo vamos elaborar orientações internas para melhorar a situação financeira e o grau de transparência da utilização dos dinheiros públicos. Ainda em 2019 temos de começar a ver como vamos legislar uma lei para as empresas de capitais públicos”, afirmou Lionel Leong, durante o debate da proposta de Lei do Orçamento para 2019, aprovada na generalidade, por unanimidade.

O assunto tinha sido trazido para a discussão por deputados como Agnes Lam e Zheng Anting, que se mostraram interessados na fiscalização das empresas de capitais públicos. Contudo, Lionel Leong garantiu que companhias como Macau Investimento e Desenvolvimento, que investe num parque de Medicina Tradicional Chinesa na Ilha da Montanha, têm a sua contabilidade analisada por auditorias independentes por uma questão de transparência.

Segundo a proposta de orçamento, o Governo prevê ficar 19,04 mil milhões de patacas mais rico, no final do próximo ano, dado que estima que as receitas globais ascendam a 122,3 mil milhões de patacas (+13,3 por cento) e que as despesas atinjam 103,3 mil milhões de patacas (+2,2 por cento). Leong prometeu ainda “manter o montante das despesas abaixo da receitas”, uma exigência da Lei Básica, e apenas “gastar o necessário”.

Mais 1158 trabalhadores

Outro dos pontos discutidos foi o aumento no número de funcionários públicos contratados. Ella Lei tentou obter explicações para a razão de haver um aumento em cerca de 1158 trabalhadores. Segundo a deputada, os Serviços de Alfândega e a Polícia Judiciária, assim como o sector da saúde, serão os principais responsáveis pelo aumento.

Também José Pereira Coutinho abordou o assunto da contratação e questionou o facto do Comissariado Contra a Corrupção necessitar de mais 60 funcionários.

Na resposta, Lionel Leong explicou que as contratações são avaliadas por si, depois de ouvir os Serviços de Administração e Função Pública e que é sempre tida em conta a capacidade dos serviços para suportarem as despesas com o aumento dos trabalhadores. Por outro lado, o secretário para a Economia e Finanças deu uma prova de confiança aos colegas: “Acredito que os meus colegas são responsáveis”.

22 Nov 2018

Feriados | Deputados dos Operários juntam-se a protesto no domingo

Os dois deputados da Federação das Associações dos Operários de Macau eleitos por sufrágio universal voltaram ontem a atacar o Governo na Assembleia Legislativa devido à polémica selecção de feriados no âmbito das mexidas à lei laboral e, no próximo domingo, saem à rua em protesto

Com Vítor Ng

 

[dropcap]A[/dropcap] luta continua. Após o ataque concertado, há uma semana, por parte de toda a bancada dos Operários contra o Governo devido à polémica em torno da transferência de gozo de feriados obrigatórios, Ella Lei e Leong Sun Iok voltaram ontem à carga durante o período de intervenções antes da ordem do dia na Assembleia Legislativa (AL) e, no próximo domingo, juntam-se a um protesto no Jardim Vasco da Gama, confirmou o HM junto de um dos deputados.

No centro da polémica figura a chamada proposta “três em quatro” no âmbito das mexidas à lei laboral, à luz da qual três de quatro feriados obrigatórios podem ser gozados em dias de feriados não obrigatórios. A saber: Fraternidade Universal (1 de Janeiro), Cheng Ming (Dia dos Finados), dia seguinte ao Chong Chao (Bolo Lunar) e Chong Yeong (Culto dos Antepassados). Uma medida que a ala laboral recusa por entender que as garantias mínimas dos trabalhadores saem beliscadas.

Nas intervenções de ontem a tónica de ambos foi para as consequências que o nó górdio da selecção de feriados acarreta. “O Governo apresentou a proposta da ‘escolha de três em quatro’ e juntou-a a outras que já reúnem consenso social, caso da sobreposição de feriados e da licença de paternidade remunerada”, apontou Leong Sun Iok. “Esta medida atrasou significativamente o processo legislativo, desiludiu a parte laboral e não cumpre o compromisso assumido pelo Chefe do Executivo”, realçou.

Ella Lei bateu na mesma tecla: “Afinal, qual é o objectivo de se legislar esta proposta em pacote com as restantes alterações à lei? É para obrigar a parte laboral a optar entre duas propostas? Ou seja, aceitar a ‘escolha de três em quatro’ imposta pelo Governo ou abandonar a compensação para os feriados sobrepostos e a licença de paternidade?”

Concertação a 5 de Dezembro

Aos jornalistas, na AL, enquanto decorriam as intervenções antes da ordem do dia, o secretário para Economia e Finanças, Lionel Leong, insistiu que espera que as partes cheguem a acordo, apostando as fichas na reunião do Conselho Permanente de Concertação Social (CPCS), convocada para o próximo dia 5 de Dezembro. “Esperemos que através da reunião, convocada para apresentarem as suas preocupações e opiniões, possam chegar a consenso o mais breve possível”, afirmou.

Lionel Leong realçou que tem mantido o diálogo com ambas as partes – laboral e patronal – e insistiu – em linha com a garantia dada na semana passada pelo Chefe do Executivo – que os direitos adquiridos dos trabalhadores não vão ser prejudicados. “Todo o trabalho prestado nos dias seleccionados de entre os feriados públicos será pago conforme o estipulado na lei, isto é a triplicar”, reiterou. Já sobre a possibilidade de tal condicionar a escolha dos trabalhadores – face à sua capacidade negocial perante os patrões –, Lionel Leong respondeu com uma pergunta: “Obviamente que ambas as partes têm opiniões diferentes. Como podemos minimizar as divergências?”

O secretário para a Economia e Finanças abriu, porém, a porta à possibilidade de separar a selecção dos feriados das restantes seis alterações à Lei das Relações de Trabalho, de modo a que os pontos consensuais – como a licença de paternidade remunerada possam seguir primeiro para a AL – se as duas partes se entenderem a respeito no seio do CPCS.

Com efeito, antes da reunião do CPCS, os deputados Ella Lei e Leong Sun Iok vão juntar-se a um protesto, a ter lugar no domingo no Jardim Vasco da Gama, convocado nas redes sociais por um grupo denominado de aliança dos trabalhadores que estão contra a selecção de feriados. A informação foi confirmada por Leong Sun Iok ao HM: “Recebemos um convite do organizador e vamos participar porque a reivindicação é igual à nossa”.

22 Nov 2018

João Amorim: Protocolo com IC foi “empurrãozinho político”

[dropcap]Q[/dropcap]ue balanço faz dos 30 anos de existência da FO?
rinta anos é muito tempo e obviamente que o balanço é positivo. A fundação foi criada a partir de Macau e, na década de 90, criámos as delegações de Macau e da Índia. Criámos depois a delegação em Timor-Leste e em 2008 conseguimos criar o nosso projecto, que foi pensado e construído ao longo de dez anos: o Museu do Oriente. Foi algo que nos trouxe uma nova visibilidade aqui [em Portugal], porque até aí não tínhamos um local próprio para poder mostrar as nossas colecções e desenvolver outras actividades culturais.

Houve então um novo fôlego?
Sim. Em Macau, houve uma certa mudança de estratégia, não muito acentuada, entre a Administração portuguesa e chinesa, e mantivemos actividades ligadas ao ensino do português. O ensino do português é algo a que estamos ligados desde o princípio, em Macau, Índia e mais recentemente em Timor. A nível cultural desenvolvemos as nossas actividades nessas delegações e aqui em Lisboa temos o museu, que é um organismo vivo. Temos um programa de espectáculos, fazemos muitas conferências, workshops. O nosso centro de documentação funciona para dar apoio a investigadores.

A criação da FO esteve envolta em alguma polémica. 30 anos depois, esse capítulo está encerrado?
Não diria que a criação esteve envolta em polémica. Houve alguma no período que antecedeu a transição de Macau, e resolveu-se o problema com o Grupo de Ligação Luso-Chinês. A FO sempre foi portuguesa, mas o pensamento dos chineses não era exactamente igual ao nosso e foi necessário negociar o estatuto da FO em Macau, já que em Portugal nunca esteve em causa. Esse período coincidiu com a minha passagem por aí, na qualidade de responsável pela delegação, e foi, diria, muito interessante. Tudo se resolveu bem, tivemos que fazer umas escolhas, mas foi bom resolvermos isso com um acordo entre as duas partes, porque potenciou a continuação da ligação da fundação à China. Sinal disso é que mantemos, desde 1998, o protocolo com o Ministério da Cultura da China.

Foi assinado recentemente um protocolo com o Instituto Cultural (IC). Porquê tanto tempo para assinar um acordo desta natureza? Que actividades serão desenvolvidas?
Não fazia muito sentido termos um protocolo de cooperação cultural com a China e não termos com Macau. Demorou muito tempo, mas também as duas partes não tinham pensado nisso de modo muito activo. Há uns dois anos, com a visita do secretário a Portugal [Alexis Tam], ficou decidido que faria todo o sentido. O protocolo abre as portas para uma colaboração mais institucionalizada, e o que vamos fazer cabe agora às duas partes. Vamos propor actividades de Macau em Portugal e vice-versa, e queríamos explorar parcerias com os museus de Macau. O protocolo é mais um empurrãozinho político.

Uma questão formal que estava por concretizar.
Tem significado político e é importante continuarmos as boas relações que temos com Macau. É continuar o trabalho que tem vindo a ser feito.

Daqui a semanas o presidente Xi Jinping estará em Lisboa. Está prevista alguma visita ao Museu do Oriente?
Não fomos contactados para esse efeito. Fizemos alguns contactos para a realização de eventos ligados à visita do presidente, nomeadamente o lançamento de um livro do próprio presidente chinês. Por uma questão de espaço, o lançamento será feito no Palácio Nacional da Ajuda. Com esta visita talvez se fortaleçam investimentos e relações político-económicas entre os dois países, e dá-me impressão que o Governo português acordou agora para essa realidade.

Sobre a delegação da FO em Macau, quais os planos para o futuro? Prevêem-se mudanças no modelo de funcionamento?
Em equipa que ganha não se mexe. É natural que daqui a um ano ou assim possamos fazer uma avaliação do trabalho e, eventualmente, explorar novas coisas. Mas nesta matéria não há muito a inventar. A gestão da fundação é bastante descentralizada, e as delegações podem propor o que acham melhor e nós aqui analisamos.

22 Nov 2018

Fundação Oriente | A polémica e as três décadas de existência

A Fundação Oriente nasceu há 30 anos como contrapartida de um contrato de jogo assinado com a STDM durante o Governo de Carlos Melancia. Esteve envolvida em polémica até ao final da transição e, para alguns analistas, deixou uma mancha nas relações entre Portugal, Macau e China, apesar do extenso trabalho cultural feito em Lisboa e nas delegações

Com João Santos Filipe

 

[dropcap]O[/dropcap] tema é ainda polémico e nem todos querem falar dele. Há quem tenha passado pela Fundação Oriente (FO) e tenha decidido encerrar para sempre esse capítulo. Criada oficialmente em 1988, a entidade surgiu durante o Governo de Carlos Melancia como contrapartida incluída num contrato de jogo assinado com a Sociedade de Turismo e Diversões de Macau (STDM).

No contrato assinado com a STDM, uma cláusula previa a criação de uma fundação que iria receber, até 2001, 1,6 por cento das receitas brutas obtidas pela concessionária, o que levantou dúvidas e uma chuva de críticas junto da comunidade chinesa e dos deputados da Assembleia Legislativa (AL).

A FO arrancou com um fundo inicial de 212 milhões de patacas, montante ao qual acrescia uma contribuição de 100 milhões de patacas. Contudo, a FO deixou de estar ligada ao contrato de jogo da STDM no dia 1 de Janeiro de 1996, graças às negociações no âmbito do Grupo de Ligação Luso-Chinês. Como tal, a cláusula que daria 1,6 por cento das receitas à fundação foi suspensa.

Este foi, portanto, um tema que se arrastou até à Administração de Vasco Rocha Vieira, último Governador português de Macau. Na sua biografia “A todos os portos a que cheguei”, lê-se que quando Rocha Vieira tomou posse, em 1991, “a polémica em torno da FO estava a crescer como uma bola de neve”.
Isto porque “o grosso da opinião pública do território e as autoridades de Pequim contestavam a legitimidade de um contrato nos termos do qual uma entidade com sede em Lisboa era alimentada com recursos gerados em Macau”.

O caso chegou a atingir as relações diplomáticas entre Portugal e China, como recorda o historiador Jorge Morbey ao HM. “Do que eu conheço, a FO constituiu um empecilho no relacionamento entre Portugal e China”, frisou.

“Estava em Pequim quando Mário Soares, à data presidente da República, visitou a China, e a presença do presidente da FO na mesma comitiva criou problemas extremamente desagradáveis na preparação da visita. Os chineses não queriam, de maneira nenhuma, reconhecer a FO, e também a sua presença na delegação portuguesa.”

Três décadas depois, Jorge Morbey considera que muita coisa ficou por fazer por parte da fundação. “Tendo em conta os estatutos da FO, temos é de perspectivar o bom e o mau que fez em Macau. Considero que o que fez se revelou uma frustração, tendo em conta os pressupostos iniciais e fundacionais e a realidade”, frisou. Para Morbey, o caso “pode estar esquecido, mas não deixa de ser desagradável”.

Na biografia de Rocha Vieira, lê-se que, aos olhos de Pequim, a FO “não era uma instituição privada e o Governo de Macau deveria ter direito a fiscalização sobre a sua actividade”.

O último Governador de Macau tentou “gerir o melhor possível a situação, não só para evitar que ela contamine a acção governativa mas também para ajudar a encontrar uma saída para o diferendo, através de um compromisso com a China”.

Cartas de Ng Kuok Cheong

Mesmo com a tentativa de evitar um descalabro político, a polémica chegou à AL, tendo sido analisado pela Comissão de Administração e Finanças Públicas, à época presidida pelo advogado e deputado Rui Afonso, já falecido. Os deputados questionavam a ausência de uma comissão instaladora da FO.

A criação desta entidade originou “um crescente azedume na sociedade macaense”, além de que a comunidade chinesa “forçou a entrada dessa questão na agenda diplomática das relações entre Lisboa e Pequim”, que culminou com a decisão da saída do Grupo de Ligação Luso-Chinês, já nos anos 90.
Quando Cavaco Silva era primeiro-ministro, o deputado Ng Kuok Cheong chegou a entregar-lhe uma carta, apoiada por “nove associações macaenses”, questionando as razões para a criação da FO, mas, segundo adiantou ao HM, nunca recebeu qualquer resposta. O episódio também é relatado no livro de Rocha Vieira.

“Questionei o facto do Governo de Macau atribuir uma grande quantidade de dinheiro a uma fundação portuguesa, e se isso se justificava. De acordo com a lei, os ganhos do Governo [com o jogo] deveriam ficar em Macau. O Governo nunca me respondeu de forma oficial, e mais tarde fui informado de que os fundos tinham deixado de ser enviados para Portugal devido à atenção pública sobre o caso.”

FO e Xi Jinping

O aniversário da FO coincide com a primeira visita do presidente chinês, Xi Jinping, a Portugal. Além disso, este ano celebrou-se o primeiro protocolo entre a FO e o Instituto Cultural. Para o analista político Arnaldo Gonçalves este é um sinal da aproximação de relações tardias.

“Quase 20 anos depois, celebrou-se este acordo e isso está ligado à visita do presidente Xi Jinping. Há hipóteses dele visitar a FO. Seria desagradável o presidente da China visitar uma fundação que é uma exaltação da cultura chinesa e o Governo da RAEM e as suas instituições estarem divorciadas da FO.”
Arnaldo Gonçalves destaca o conteúdo rico do Museu do Oriente e acredita que o “papel da FO tem sido desvalorizado”. “Lamento isso. Independentemente do que aconteceu no passado, parece um espírito curto e é uma pena que não haja um desenvolvimento. É um bocado desapropriado esse distanciamento”, concluiu.

O aniversário da FO tem sido celebrado com diversas actividades no Museu do Oriente, em Lisboa. Em Macau, os trinta anos da fundação celebram-se esta sexta-feira com a realização de um concerto, “Concordis”, na Casa Garden.

22 Nov 2018

Índia | Indígenas matam turista que acedeu ilegalmente à sua ilha

[dropcap]I[/dropcap]ndígenas mataram um turista norte-americano que se arriscou a chegar a uma ilha indiana remota no arquipélago de Andamão e Nicobar, no Oceano Índico, com acesso proibido para proteger o povo que a habita, disse fonte policial.

“O turista é cidadão norte-americano e foi visto pela última vez no passado dia 16 de Novembro pelos pescadores que o acompanharam até à ilha Sentinela do Norte”, explicou Jatin Narwal, porta-voz da Polícia de Andamã, na baía de Bengala.

Os pescadores que o levaram anunciaram o ocorrido a um “amigo local”, que por sua vez alertou as autoridades, acrescentou a fonte.

A polícia local procedeu então a uma investigação que determinou que John Chau, 27 anos, morreu assassinado pelos indígenas.

As autoridades desconhecem até agora de que forma o turista morreu, ainda que segundo a imprensa local a vítima tenha morrido pelo impacto de flechas, pouco depois de ter posto os pés na ilha.
Frequentemente descritos como a tribo mais isolada do planeta, os habitantes da ilha Sentinela do Norte vivem em autarcia nessa ilha.

O governo indiano proíbe a aproximação a menos de cinco quilómetros da ilha.

“A ilha de Sentinela do Norte é uma área proibida, a entrada nessa ilha está restringida pela regulação para a Protecção das Tribos Aborígenes, ninguém tem permissão de lá ir”, disse o porta-voz da polícia.
Segundo a organização não-governamental ‘Survival International’, em 2006, os indígenas que habitam a ilha há 55.000 anos mataram dois pescadores que se aproximavam da costa.

22 Nov 2018

TAP | Accionista chinês abdica da Urumqi Airlines para enfrentar dívida

[dropcap]O[/dropcap] conglomerado chinês HNA, accionista da TAP através da Atlantic Gateway, anunciou ontem que vai vender a sua posição maioritária na companhia aérea Urumqi Airlines, numa altura em que enfrenta problemas de liquidez.

A empresa vai reduzir a sua participação na Urumqi Airlines de 70 por cento para 30 por cento. O governo de Urumqi, cidade no extremo noroeste da China, vai comprar a posição.

O grupo HNA tem vindo a alienar investimentos e a cancelar negócios, incluindo na indústria da aviação, que é parte fundamental da empresa.

No início deste mês, o grupo cancelou a compra de uma participação de 60 por cento na companhia aérea chinesa Chongqing Western Airlines.

Segundo o jornal Financial Times, a empresa planeia ainda vender a Lucky Airlines, uma companhia aérea regional, a duas firmas estatais chinesas.

Este ano, a empresa falhou já o pagamento de uma dívida superior a 43 milhões de dólares contraída a um fundo de investimento chinês.

O HNA falhou já também em vários empréstimos constituídos junto de individuais, através de plataformas ‘online’ de financiamento directo (P2P, na sigla em inglês).

A entrada em incumprimento ocorre apesar do grupo ter vendido mais de 15 mil milhões de euros em activos, este ano, visando enfrentar uma grave crise de liquidez.

Em Portugal, o HNA detém uma participação na Atlantic Gateway, consórcio que detém 45 por cento da TAP. O Estado português é dono de 50 por cento da TAP, estando os restantes 5 por cento do capital nas mãos dos trabalhadores.

22 Nov 2018

Grande Prémio | Quatro detidos por venda de bilhetes falsos

[dropcap]A[/dropcap] Polícia de Segurança Pública (PSP) deteve quatro indivíduos do continente durante a realização do Grande Prémio por suspeita de falsificação de carimbos de acesso ao evento.

Os detidos cobravam 500 patacas por cada carimbo e foram levados ao Ministério Público (MP) por suspeita da prática de burla e de falsificação de notação técnica.

Segundo o canal chinês da Rádio Macau, a PSP recebeu a denúncia da companhia responsável pelos serviços de segurança durante o evento. As autoridades acabaram por chegar a dois suspeitos que declararam estar a falsificar os carimbos de entrada. Mais tarde detiveram mais dois indivíduos na zona do ZAPE.

22 Nov 2018

Carlos Marreiros nega ter copiado edifício no projecto da futura biblioteca

[dropcap]O[/dropcap] arquitecto Carlos Marreiros nega ter copiado o Auditório da Cidade de León na elaboração do projecto da futura biblioteca de Macau, que vai ser construída no edifício do Antigo Tribunal. Ontem surgiram várias publicações em diferentes grupos de conversa nas redes sociais, nas línguas chinesa e portuguesa, a comparar os dois projectos e houve mesmo alguns utilizadores a avançar a possibilidade de plágio.

Em declarações ao HM, o arquitecto negou haver qualquer cópia e admitiu não ter conhecimento do edifício que fica situado em Espanha. “Não sei que edifício é este. Eu posso ir investigar e mais tarde falar […] Uma coisa posso dizer para já: estou de consciência tranquila. Não imitámos edifício nenhum quando fizemos o projecto”, disse Carlos Marreiros. “Quem me conhece sabe que sou uma pessoa extremamente afirmativa, independente, criativa e original para não fazer uma coisa destas. Por amor de Deus!”, acrescentou.

Em termos geométricos, na “composição do bloco de cima” da nova biblioteca, Carlos Marreiros foi buscar inspiração à Capela de Notre Dame du Haut em Ronchamp (França), do arquitecto Le Corbusier. Uma obra que, explicou, se destaca por ter “uma parede muito espessa, com muitas janelas, com muitos buracos e os vãos com aquelas inclinações”.

O Auditório da Cidade de León foi inaugurado em 2002 e teve como arquitectos os espanhóis Luís Moreno Mansilla, já falecido, e Emilio Tuñon Álvarez. Em 2003 foi galardoado com o Prémio de Arquitectura Espanhola e foi finalista do Prémio Mies van der Rohe de Arquitectura Contemporânea da União Europeia. Este último foi um prémio que Siza Vieira conquistou em 1988, com a sede do Banco Borges e Irmão, em Rio Ave.

O ateliê do arquitecto Carlos Marreiros foi o escolhido para desenhar a nova biblioteca central de Macau, que vai ocupar o edifício do Antigo Tribunal (na Avenida da Praia Grande) e a ex-sede da Polícia Judiciária (na Rua Central).

Por este projecto, o arquitecto vai receber 18,68 milhões de patacas e terá um prazo de execução de sensivelmente nove meses. A futura biblioteca, de 11 andares e 45 metros de altura, vai ter capacidade para acolher até um milhão de livros, oferecendo 1.125 lugares sentados nos espaços dedicados à leitura. Estão também previstos espaços lúdicos, como um anfiteatro, sala de exposições e um café, com aproximadamente 800 lugares.

22 Nov 2018

Timor-Leste defende confidencialidade de negociações sobre Greater Sunrise

Por António Sampaio, enviado da agência Lusa

 

[dropcap]A[/dropcap] negociação para a compra por Timor-Leste da maioria do capital do consórcio do Greater Sunrise teve que decorrer confidencialmente, mas será explicada em detalhe, disse hoje o ex-Presidente Xanana Gusmão, que considerou o projecto “essencial” para o país.

“Nestas coisas, quando a gente inicia, há sempre uma cláusula, um factor que nos orienta, que é pedido pela outra parte: confidencialidade. Até um momento concreto”, disse Xanana Gusmão, em entrevista à Lusa em Bali.

“Não estamos a roubar dinheiro ao Estado. Se querem transparência do dinheiro que gastamos nas viagens e despesas digam. Mas tem que se perceber que nestas coisas de negócios, não é segredo, é exigida confidencialidade”, sustentou.

Xanana Gusmão referia-se ao acordo que assinou hoje, em nome do Governo de Timor-Leste com a presidente executiva da Shell Austrália, Zoe Yujnovich, para a compra participação de 26,56% que a empresa detém no consórcio do Greater Sunrise por 300 milhões de dólares.

A operação, que depende ainda da aprovação do Governo e do Parlamento timorenses e dos reguladores, soma-se à participação de 30% adquirida à ConocoPhillips em setembro, o que dá a Timor-Leste uma maioria de 56,56% no consórcio.

O consórcio dos campos petrolíferos Greater Sunrise, no Mar de Timor, é liderado pela australiana Woodside, a operadora (com 34,5% do capital), e inclui a ConocoPhillips (30%), a Shell (28,5%) e a Osaka Gas (10%).

As operações têm suscitado críticas em Timor-Leste com pedidos de mais transparência, informação e debate público sobre o projecto.

Hoje, em declarações à Lusa, o ex-primeiro-ministro timorense Mari Alkatiri, líder da maior força da oposição, defendeu um debate nacional alargado sobre a operação de compra pela petrolífera Timor Gap das acções da ConocoPhillips no consórcio do Greater Sunrise.

“Precisamos de um debate nacional sobre esta questão porque o processo não só não tem sido claro, como tem sido muito obscuro”, disse o líder da Frente Revolucionária de Timor-Leste Independente (Fretilin).

Xanana Gusmão disse que “é claríssima” a necessidade de explicar e refere que a 8 de Dezembro decorrerá em Díli uma conferência, para que serão “todos convidados”, onde serão detalhados todos os aspectos do projecto, incluindo o seu custo.

“A sociedade tem que começar a pensar que temos que ter confiança uns nos outros. Eu lidaria a luta durante 20 e nunca coloquei o custo da libertação da pátria com o peso da mortandade que tinha acontecido. Nunca”, afirmou.

Como exemplo cita uma conversa em 1999, nos meses antes do referendo de auto-determinação, em que o então chefe da missão da ONU, Ian Martin, se reuniu consigo na casa prisão onde estava em Salemba (Jakarta). Martin sugeriu que estava a haver muita violência e muitas mortes e que se deveria adiar a consulta popular.

“Eu disse que nem um só dia. Para isto morreram quase 200 mil. Morrerem mais mil ou dois mil. O que está em causa é a nossa independência. Morremos para isto, vamos continuar a morrer para isto. E por isso em questão de preço, ou confiamos uns nos outros ou não confiamos”, afirmou.

“Quando foi do projecto das instalações das centrais eléctricas, disseram que era um elefante branco e mais não sei quê. Depois de todos terem um bocado de luz à noite nem um obrigado recebi. Fiz o meu trabalho, não estou à espera de obrigados”, afirmou.

Uma compra “histórica”

A compra de uma participação maioritária no consórcio dos poços do Greater Sunrise no Mar de Timor é histórica para Timor-Leste que tem condições para mudar a exploração do principal recurso do país, disse hoje Xanana Gusmão.

“Quando queremos alguma coisa isso leva tempo, exige esforços. Mas estou satisfeito na medida em que, como resultado natural da delimitação das fronteiras, vamos poder mudar as condições de exploração do Greater Sunrise”, afirmou em entrevista à Lusa em Bali, na Indonésia, o representante especial de Timor-Leste para os temas do Mar de Timor.

“A Shell mostrou-se muito cooperante, compreendeu. O Greater Sunrise já dura desde 1974, demasiado tempo para eles e compreendem o desejo do Estado de desenvolver e incentivar a economia. É realmente um dia histórico”, afirmou.

A compra da participação implica, necessariamente, um maior investimento timorense no componente de ‘upstream’ do projecto e Xanana Gusmão garante que, apesar de não poder “dizer tudo” para já “há bons sinais” e “várias formas do financiamento”.

“Estamos a receber bons sinais em questão de financiamento. Tenho contactado com várias pessoas e instituições sobre os mecanismos e estão abertas várias opções”, disse.

A Woodside, que tem até aqui o estatuto de operador do projecto, já se mostrou aberta a negociações com Timor-Leste, mas Xanana Gusmão insiste que prefere que esse diálogo comece quando as compras estiverem efectivamente pagas.

“Vamos pagar primeiro para que nos sentemos com dignidade, com serenidade, para definir as coisas”, explicou.

Para isso, Xanana Gusmão está convicto que o Presidente da República não bloqueará um conjunto de alterações legislativas, já aprovadas pelas bancadas da maioria no parlamento, para que a operação seja financiada, como investimento, diretamente pelo Fundo Petrolífero, não através do Orçamento Geral do Estado (OGE).

“Penso que não. No encontro que tive com o Presidente depois do contrato com a Conoco, abordamos a questão do pagamento. Aí estávamos muito dependentes do OGE, porque tínhamos que dar uma garantia à Conoco para vender já”, explicou.

“Metemos isso no OGE, sei que o Governo está desfalcado de verbas para os seus programas, quanto mais não seja no primeiro ano do seu mandato. E por isso vimos essa opção da lei de actividades petrolíferas e da lei do fundo petrolífero”, explicou.

Uma opção, disse que, não representará uma despesa do OGE, mas um “investimento num sector que depois vai produzir dinheiro para o Fundo Petrolífero” garantindo receitas de investimentos nos mercados durante a vida do projecto.

“Não foi uma ideia mágica, mas foi a decisão mais correcta para comprar estas acções”, disse.

A fase a seguir, disse, é, no seu regresso a Timor-Leste, um encontro com o Presidente da República, Francisco Guterres Lu-Olo, a quem vai apelar “para promulgar a lei”, se possível, para permitir que se paguem, até Dezembro, as operações do Greater Sunrise.

“Se pagarmos já em Dezembro, a Timor Gap pode estar já sentada na ‘joint-venture’”, disse.

21 Nov 2018

Formador suspeito de violação e coacção sexual de menores fica em prisão preventiva

Educador suspeito de abuso sexual de cinco menores de idade num centro de explicações no Fai Chi Kei foi colocado em prisão preventiva

 

[dropcap]E[/dropcap]ncontra-se em prisão preventiva o homem, de 35 anos, oriundo de Hong Kong, detido na segunda-feira pela Polícia Judiciária (PJ) pela suspeita de abuso sexual de cinco menores num centro de explicações, onde era formador. A informação foi divulgada ontem pelo Ministério Público (MP) através de um comunicado, um dia depois da divulgação do caso.

A aplicação da mais grave medida de coacção foi proposta pelo MP e aceite pelo juiz de instrução criminal, atendendo à “natureza e a gravidade” do caso, ao “‘modus operandi’ dos crimes” e ao “impacto provocado sobre a ordem pública no âmbito da protecção dos direitos e interesses dos menores em Macau”.

O indivíduo é suspeito da prática dos crimes de violação e coacção sexual, ambos na forma agravada, detalhou o MP. À luz do Código Penal, o crime de violação é punido com pena de prisão de 3 a 12 anos, enquanto no caso da coacção sexual a moldura penal vai de 2 a 8 anos. No entanto, uma vez tratando-se de vítima menor de 16 anos, ambas as penas previstas são agravadas de um terço nos seus limites mínimo e máximo.

Outros casos

O caso – tornado público na terça-feira – foi reportado no domingo por uma das alegadas vítimas. Segundo a PJ, o rapaz de 14 anos que fez a participação afirmou que o formador o obrigou a fazer sexo oral, por seis vezes desde Outubro, sob a ameaça de que revelaria aos seus pais que tinha uma namorada.

Na sequência da investigação, a PJ chegou a outros quatro menores – todos do sexo masculino – que terão sido igualmente forçados a práticas como sexo oral e masturbação. De acordo com a PJ, o explicador tê-los-á intimidado, dizendo que contaria aos seus progenitores que não estavam atentos nas aulas ou que os seus resultados académicos eram fracos.

Os alegados crimes ocorreram dentro do centro de explicações, localizado no Fai Chi Kei e com alvará desde 2015, cujas actividades foram entretanto suspensas. De acordo com a Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ), o tutor, que segundo a PJ começou a trabalhar no centro em 2016, não estava registado noutras instituições de ensino de Macau.

21 Nov 2018

Investigação ao acidente de Sophia Flörsch levará semanas, diz FIA

[dropcap]A[/dropcap] investigação ao acidente de domingo no Grande Prémio de Fórmula 3 de Macau, em que cinco pessoas ficaram feridas, “levará várias semanas”, disse hoje Charlie Whiting, director de corridas de Fórmula 1 da Federação Internacional de Automobilismo (FIA).

“É muito cedo para tentar estabelecer a causa. Nós sabemos porque [a piloto alemã Sophia Flörsch) perdeu o controlo do carro, mas temos que nos dar a uma análise muito mais cuidada”, disse Charlie Whiting à agência France-Presse.

Lançado a mais de 270 km/hora a quase 300 metros de uma curva em ângulo recto, a mais apertada do circuito de Macau, o monolugar de Sophia Flörsch bateu na traseira de um outro, que estava a desacelerar inesperadamente, e voou contra uma bancada com repórteres fotográficos e comissários de pista.

“Levará várias semanas para analisar os dados e as imagens do carro o mais cuidadosamente possível para determinar como os dois monolugares se tocaram, as consequências desse contacto, o que se passou e como”, disse Charlie Whiting.

O director da Fórmula 1 para a área de segurança acredita que as barreiras, mesmo partidas, diminuíram um pouco o ritmo do carro e a solidez da célula de segurança também protegeu a piloto alemã, de 17 anos, que foi submetida a um enxerto ósseo para reparar uma fractura na coluna vertebral.

O piloto do carro atingido, o japonês Sho Tsuboi, dois repórteres fotográficos e um comissário de pista também ficaram feridos na sequência do despista do monolugar da alemã Sophia Flörsch.

21 Nov 2018

China detém 576 pessoas por contrabando de lixo estrangeiro este ano

[dropcap]A[/dropcap]s autoridades chinesas detiveram 576 pessoas por contrabando de lixo procedente do estrangeiro, entre Janeiro e Outubro, informou hoje a imprensa local, depois de a China ter deixado de importar vários tipos de resíduos sólidos.

No total, as autoridades do país confiscaram 1,46 milhão de toneladas de lixo, detalha a agência noticiosa oficial Xinhua. A China baniu, no início deste ano, a importação de 24 tipos de resíduos sólidos, incluindo plásticos, papel e tecido, visando combater os danos para o ambiente e a saúde pública.

“É da responsabilidade de todos os países e regiões lutar contra o contrabando transfronteiriço de resíduos sólidos”, afirmou o director da Administração Geral das Alfândegas da China, Ni Yuefeng.

O país asiático converteu-se no maior importador mundial de lixo desde que começou a importar resíduos para reciclar nos anos 1980, criando um fornecimento extra de metais e materiais que faltavam no mercado doméstico.

A China recebia, por exemplo, dois terços dos resíduos de plástico do Reino Unido. As autoridades de Pequim consideram agora que os problemas criados pela importação de lixo ultrapassam em muito os benefícios, apontando que, apesar do proveito industrial e criação de emprego, tem um impacto “muito negativo” para o ambiente.

O país já informou a Organização Mundial do Comércio que, a partir de 2019, a proibição irá alargar-se a outros artigos, como titânio, madeira, ferragens, barcos ou aço inoxidável.

21 Nov 2018

Gigantes tecnológicas da China reforçam luta interna contra a corrupção

[dropcap]A[/dropcap] firma chinesa de anúncios ‘online’ 58.com revelou hoje que dois dos seus altos executivos foram detidos por alegada corrupção, ilustrando os esforços do sector tecnológico chinês no combate ao crime económico, em linha com Pequim.

O jornal chinês Caixin revelou hoje que o vice-presidente e o director da divisão de negócios da empresa, Song Bo e Guo Dong, respectivamente, foram detidos por alegadamente terem aceitado subornos.

Com sede em Pequim, o 58.com é usado por internautas para publicar classificados ‘online’. A empresa explicou que a “má conduta” foi detectada após uma inspecção interna, no início deste ano, e que envolve valores “enormes” de dinheiro, sem detalhar quanto.

Outras empresas tecnológicas chinesas realizaram inspecções, nos últimos anos, à medida que Pequim aposta nos setores de alto valor agregando, visando transformar a economia do país de manufactura barata para potência tecnológica.

Desde 2016, o motor de busca Baidu despediu 30 funcionários por corrupção, enquanto, em Agosto passado, o gigante do comércio eletrónico JD.com denunciou 17 funcionários por corrupção e desvio de fundos, entre os quais quatro foram detidos pela polícia para investigação criminal.

O combate contra a corrupção é também uma das principais fontes de legitimidade do atual Presidente chinês, Xi Jinping, um dos líderes mais fortes na história da República Popular da China.

Após ascender ao poder, Xi lançou uma campanha anti-corrupção, hoje considerada a mais persistente e ampla na história da China comunista, e que puniu já mais de um milhão e meio de funcionários do Partido Comunista Chinês (PCC).

21 Nov 2018

Lisboa acolhe Semana do Cinema Chinês

[dropcap]S[/dropcap]eis filmes recentes da produção cinematográfica da China serão exibidos a partir de Domingo em Lisboa, num ciclo integrado no programa oficial da visita do Presidente da China, Xi Jinping, a Portugal.

Organizado pela China Film Administration, o ciclo decorrerá de 25 de Novembro a 4 Dezembro, no Corte Inglés, em Lisboa, e na abertura estarão presentes, entre outros, o actor Huang Xiaoming e Wang Xiaohui, directora do departamento de apoio ao cinema do governo chinês.

Segundo nota de imprensa, Wang Xiaohui quer “estreitar os laços culturais entre as duas nações e dar a conhecer a Portugal o panorama da produção cinematográfica chinesa na actualidade”. O Presidente da República Popular da China estará em Portugal nos dias 4 e 5 de Dezembro.

A Semana do Cinema Chinês exibirá, por exemplo, “American Dreams in China” (2013), de Peter Chan, o filme de acção “Operation Mekong” (2016), de Dante Lam, e o filme de animação “O rei macaco” (2015), de Tain Xiao Peng.

Em 2019, Portugal e a China celebram 40 anos de relações diplomáticas. No Orçamento do Estado para 2019, o Governo incluiu, no âmbito da Acção Cultural Externa, diversas iniciativas de celebração das relações diplomáticas com a China, nomeadamente o Festival de Cultura Portuguesa na China e o Festival de Cultura Chinesa em Portugal que “contribuirão, de forma transversal, para a afirmação internacional da Cultura portuguesa”.

No próximo ano assinalam-se também os vinte anos do regresso de Macau à administração chinesa.

21 Nov 2018

“Hotel Império” de Ivo M. Ferreira estreia em Portugal a 18 de Abril

[dropcap]O[/dropcap] filme “Hotel Império”, de Ivo M. Ferreira, rodado em Macau, onde o realizador português vive há vários anos, estreia-se nas salas de cinema portuguesas a 18 de Abril, anunciou ontem a produtora O Som e a Fúria.
O filme conta a história de uma portuguesa nascida na cidade – interpretada por Margarida Vila-Nova – que, juntamente com outras pessoas, habita um antigo hotel em vias de ser destruído para dar lugar a um edifício moderno.

“Hotel Império” teve estreia mundial em Outubro, no Festival de Cinema de Pingyao, na China, tendo sido também exibido na Mostra Internacional de São Paulo.

Em 2016, quando apresentou o projecto do filme no Festival Internacional de Cinema de Macau, Ivo M. Ferreira explicou que a longa-metragem tem como pano de fundo um tema recorrente e muito presente na vida da cidade: a mudança acelerada do espaço, impulsionada pelo desenvolvimento económico.

“O hotel, evidentemente, que tem uma carga simbólica sobre Macau, vai ser destruído para ser construído um hotel-casino. Tem que ver com (…) a erosão da cidade [que] poderá criar uma identidade, a erosão poderá unir-nos, unir vizinhos que não se falavam. Acho que o filme gravita muito à volta desse ambiente, de que a destruição pode unir para proteger a cidade”, explicou na altura o realizador.

Além de Margarida Vila-Nova, o filme conta com a participação de Rhydian Vaughan, um actor taiwanês de ascendência britânica, e vários actores de Macau.

21 Nov 2018

Direito de resposta da Associação de Pais da EPM

[dropcap]E[/dropcap]xmo. Sr. Director do Jornal Hoje Macau,

A Associação de Pais e Encarregados da Escola Portuguesa (“APEP”) vem, na sequência do artigo de opinião com o título “Novos Desafios para a Escola Portuguesa de Macau”, publicado na vossa edição de 19 de Novembro de 2018, no exercício do direito de resposta, solicitar a publicação do seguinte:

1. Um artigo de opinião é, como o próprio nome indica, um artigo no qual o autor disserta sobre um determinado tema, apresentando-o e dando o seu ponto de vista, não devendo, nem podendo, ser aproveitado para, de forma indirecta, criticar pessoas ou instituições nem divulgar factos dos quais não tem, voluntária ou involuntariamente, conhecimento, passando aos leitores uma ideia errada da realidade.

2. À APEP, como a qualquer outra associação de pais, compete acompanhar os trabalhos de revisão curricular realizados pela instituição de ensino, podendo apresentar as propostas que considere relevantes, mas a última palavra cabe à instituição de ensino, à entidade tutelar, e às entidades administrativas competentes.

3. No âmbito das suas competências e aproveitando as possibilidades oferecidas pela nova legislação portuguesa, a APEP já apresentou à Direcção da EPM uma proposta a ser desenvolvida no próximo ano lectivo, proposta que abrange todos os ciclos de escolaridade e que se apoia precisamente na possibilidade de flexibilização curricular prevista na lei.

4. A APEP está bem ciente da nova legislação em vigor em Portugal e das potencialidades da mesma, mas não esquece que a EPM é uma instituição de ensino de Macau, que se rege também pela legislação local, o que implica um trabalho de compatibilização legislativo, que o autor não refere no texto, e não apenas a aplicação da lei portuguesa sem mais.

5. Como pessoa informada que é, o autor deve saber também que a implementação da nova legislação em Portugal não está a ser pacífica, havendo vários problemas de articulação com outra legislação em vigor, nomeadamente no que diz respeito à legislação de acesso ao ensino superior, que já levou os representantes dos directores das escolas públicas e das escolas privadas a virem a público afirmar que deve ser repensado o peso dos exames nacionais, o mesmo tendo já sido feito pela OCDE.

6. Para a APEP, no que se refere ao bem-estar e à educação dos alunos da EPM, bem como às ansiedades, dificuldades e queixas dos encarregados de educação, não há assuntos TABU. Os assuntos são é discutidos, como total transparência para os interessados, nos locais próprios e não em praça pública.

A APEP

21 Nov 2018

Direito à diletância

Elegance against ignorance
Difference against indifference
Wit against shit
Middle-class heroes, The Divine Comedy

 

[dropcap]D[/dropcap]esconfio de tempos com demasiadas bandeiras, épocas em que tudo é passível de ser interpretado como uma posição entrincheirada. Apesar de mim esse é o tempo em que vivo agora e mesmo não gostando tenho como mínima obrigação de sobrevivência aprender a lidar com isso. Mas é difícil. Tento, com denodo, aplicar a ironia, o sarcasmo, a auto-depreciação para temperar conversas inflamadas em que não existe debate – apenas combate. Habituado à nuvem da diletância – que insisto em confundir com liberdade – percebo que o humor é muitas vezes mal vindo numa discussão informal em que sempre parece estar em causa o futuro do universo. Cansa, garanto-vos.

Talvez a culpa – se é de culpa de que se está a falar, e duvido – seja minha. Desde cedo alimentado com Oscar Wilde aprendi que só o supérfluo pode ser essencial. Que muitas vezes é no paradoxo que reside a verdade e que mesmo esta última é uma entidade mítica e por vezes demasiado vulnerável. Há quem tenha ambições mais grandiosas e certamente mais perenes do que a minha, que é a de servir um aforismo decente ou uma frase com piada numa mesa ao jantar. Sei do mundo e é provável que o mundo me conheça; apenas não consigo levar ninguém muito a sério, a começar por mim. E, caro leitor, nos dias de hoje esta posição é tudo menos popular.

Pior: é perseguida. Num tempo de neo- literais – os que acreditam cegamente no que vêem e lêem sem questionar seja o que for, não admitindo qualquer tipo de polissemia – o humor ou a desmistificação da seriedade (o que provavelmente é a mesma coisa) é visto quase como um crime, um desinteresse maligno sobre os Grandes Temas Que Nos Regem E Que Normalmente Aparecem No Facebook. Não é que este clima seja novo: a auto-ironia ou a busca de uma forma perfeita para transmitir um conteúdo sempre foi vista como uma atitude distanciada e menor face à suposta militância que seria essencial para resolver os problemas da Humanidade. Ai do filósofo, académico, crítico de arte e etc. que se atreva a escrever longe do jargão a que está preso e que não mostre uma inegável vontade de deixar uma “mensagem” – é um diletante, alguém que não pensa nem leva a sério o que diz. Hoje, moralistas da envergadura de um Chesterton, Bernard Shaw ou Voltaire tendem a estar condenados à reserva dos engraçadinhos de serviço, gente com meras frases ornamentais que ficam bem mas não servem para nada.

Uma sociedade que tem vindo a matar a ironia e a diletância é uma sociedade perigosa. É a que recusa a inteligência e a voz do outro em favor de uma literalidade contínua e sujeita a uma ortodoxia feroz. É o que está a acontecer, sob vários nomes. O célebre “politicamente correcto” pode ser um deles (e um dia voltaremos a falar sobre isso) mas não é o único. Prefere-se agora a politização da arte à arte da política. É o triunfo dos neo-literais. Combata-se, entre outras formas, com o garantir do direito à diletância.

21 Nov 2018

Entre nuvem e deserto

EL Corte Inglés, Lisboa, 9 Novembro

[dropcap]U[/dropcap]m dos objectos mais quotidianos acontece ser a conversa. Desatentos, não damos pelas palavras a explodirem ao nosso redor, demasiado perto apesar de alheias, a ecoarem autónomas do seu sentido, a despertarem indignações, quase sempre caladas, mas também as do comércio do espírito, soltas da nossa boca por receio do silêncio, para atapetar a urbanidade. Mas conversa séria acontece para além das palavras.

O modo como são ditas, como o corpo as interpreta, brinca com elas, gargalhando, repetindo, hesitando, sublinhando, sussurrando, provocando, acolhendo, sugerindo, comovendo, oferecem tanta informação como o resto, feito apenas ponto (e logo penso em Reinaldo Ferreira). «Mínimo sou,/ Mas quando ao Nada empresto/ A minha elementar realidade,/ O Nada é só o resto.» Recordo pouco, para defesa da razão, mas guardo como privilégio do que vou vivendo assinaláveis conversas, meros pontos que, no momento, fazem do resto pouco mais que nada. E ecoam. Acaba de acontecer com o António [Valdemar], esse portador da chama da memória que incendeia a minha mítica Lisboa. Encontramos sempre lugar onde encaixar figura, ou vice-versa. Pode ser um sátiro de Canto da Maia, uma passagem de Aquilino ou os olhos de Almada. Hoje passeámos bastante por Almada, o que quer Lisboa e o resto. As palavras, claro, mas sobretudo os olhos de ver ao longe. O que importa vai ficando dito pelo António. Preciso, para mim e para efeitos básicos de orientação, que me o António me faça, um destes dias, o mapa das famílias que há muito estendem redes, latitude e longitude, sobre este ponto de acostagem. Falo da cidade ou de cultura?

Santa Bárbara, Lisboa, 10 Novembro

Tons de amarelo, mais ou menos torrado pelo sol. Não há América do Sul (nem realismo, mais ou menos neo) sem torreira do sol. De que cor se veste a solidão? A adolescência acontece a Norte? «cem/ anos/ de solidão», minúsculas assim partidas em três linhas, a bold, a fazer cama para meio general ao baixo, quadriculado quase por inteiro, como se as mãos fossem medalhas, com muitas mãos por ser de baralho e, portanto, espelhado. À esquerda, quase a caber na altura da palavra «cem» lá aparece, cortando mais que o sabre do general: GABRIEL/ GARCIA/ MARQUEZ, maiúsculas assim partidas em três linhas. E o mundo mudou. O 13.º volume da preciosa colecção D (ed. Imprensa Nacional), do Jorge [Silva], anda por aí a mostrar fragmentos de Dorindo Carvalho (Lisboa, 1937). Muito trabalho de salvaguarda do património gráfico nacional acontece discretamente por aqui, dando atenção ao que a academia (quase) sempre despreza ou menoriza. Que importa o desenhador do logotipo da colecção Três abelhas, ou das capas dos Livros de Bolso Europa-América? Ou do logo da Assírio & Alvim bem como as capas ilustradas dos Cadernos Peninsulares dessa mesma editora? De que cor se veste a memória, amarelo-torrado?

Santa Bárbara, Lisboa, 11 Novembro

Vivi perto de Évora, nem cidade nem campo, lugar perdido do intermédio. Nunca antes havia experimentado o sol, mormente aquele que se faz entorno e nos sustém. Nunca antes tinha visto nuvens, sobretudo a diversidade que ora pasta no azul, ora vem prenhe de tempestade. Não longe, a Cartuxa de Évora, cujos muros nunca transpus. Tenho ideia que tentei, mas a memória esvai-se-me.

O duplo volume «Nuvem» (ed. Chili Com Carne), do Francisco Sousa Lobo, dedicado à Cartuxa, abriu-me espaços sobre a paisagem da inquietação, esse deserto. Um dos lados, com uma toada jazzística, de curtas e sucessivas aproximações, não apenas ao universo cartuxo, mas ao sagrado. O outro lado, que se chama «Deserto», funciona ora como prefácio, ora posfácio, à vontade do freguês, que para tanto ajuda o facto de serem dois volumes invertidos umbilicalmente colados pelas contracapas. O Francisco desenha com ponto de interrogação. Faz autobiografia, como a melhor da banda desenhada contemporânea, mas muito para além do recurso diarístico de episódios mundanos ou circunstanciais. Reflecte-se, no duplo sentido de se espelhar e de se pensar. E fá-lo combinando textos breves, simples, despojados, com uma estética minimal, a duas cores, na qual a criteriosa composição estética procura sublinhar não tanto a narrativa como o pensamento. Sim, temos uma banda desenhada de ensaio, que não se furta a questionar a própria linguagem que pratica. Mas são detalhes, se comparados com a rara atmosfera que do volume se solta, interpelações incluídas, algures entre nuvem e deserto.

Redes, Algures, 12 Novembro

Morreu Stan Lee (1922-2018), o inventor do pós-modernismo. O Umberto Eco percebeu antes de toda a gente, mas agora que o cinema vive da inesgotável máquina de produzir e questionar narrativa e heróis percebeu-se a realidade da fantasia. Ou melhor, a potência da narrativa gráfica. Este colosso da iconosfera foi pioneiro em dezenas de aspectos, mas, por estar tudo dito algures e me sentir nostálgico, vou apenas procurar os meus Spiderman, mais torrados que amarelos. Proponho apenas um quadradinho (algures na página), que, até por não ser apenas dele, afirma logo que esta linguagem resulta de singulares colaborações: entre palavra e imagem, gesto e reflexão, mas também entre criador e leitor. Conseguiu, por isso, atingir o âmago do humano, esse vértice das narrações. Stan Lee inventou a interactividade, ali nas páginas baratas das revistas que voavam abaixo do radar. Respondia às cartas dos leitores, pedia e aceitava sugestões, prolongava o fascínio tornando-o palpável. E no momento em que cada um dos adolescentes, perdido em mundo que os não entendia, sonhava em ser super-herói e assim resolver a enorme confusão da vida, Stan Lee cria o Homem-aranha, herói perdido na mais clássica das tragicomédias: que fazer com este destino? «Sai daí, não sejas empecilho do progresso.»

Almeida Garrett, Porto, 18 Novembro

Um dia a caminho de [Manuel António] Pina tinha que começar assim: o destino era o Porto, para o celebrar nos seus 75 anos. Ia com a inevitável companheira destas andanças e amizade, Inês [Fonseca Santos]. Chamei o táxi e a motorista, não tão comum no feminino, chamava-se Inês Santos. O gato sorriu-me, como só eles sabem, e segui. O Pina fez-se lugar, cada vez mais frequentado. Encontro-me sempre melhor em Pina, seja ele onde for. Antes de irmos à biblioteca tratar de «desimaginar o mundo», fomos comer ao Convívio e lá estava ele, modestamente iluminado em dia cinzento. As árvores tinham uma cor que não consegui investigar devidamente, entre outono e inverno, um trato por resolver entre a água e o frio. O Pina desconcertava muito. Oiço dizer que foi dos poetas que mais vestiu os versos de perguntas. Rio-me só de imaginar que alguém os andou a contar, aos versos. E aos gatos, sabidamente pontos de interrogação. A ideia de obra era-lhe estranha. E ter começado pelos livros para putos deve tê-lo afastado das ribaltas. E depois praticou o teatro e a crónica e a poesia (em bulas de medicamentos e outros papéis menores). Sem esquecer a conversa, arte maior. Até que choveu e se começou a reparar no Pina. Mas ele não ligava nenhuma. O Pina ligava às pessoas e aos gatos. E às palavras, mal se tornam desobedientes. Entrar no Pina, mesmo sem ser pela janela da amizade, era limpar os olhos. Sei lá com os restantes, os que fazem mundo, mas comigo mudou-me a maneira de ver os dias. Espanto-me mais, muito mais.

21 Nov 2018