Sofia Margarida Mota EventosLaura Nyögéri, directora artística da Artfusion | A arte de aprender a ser livre A Artfusion existe há quase três anos para ensinar a criar em liberdade. A direcção artística é assumida por Laura Nyögéri que, um dia, substituiu a publicidade pela criatividade e agora encaminha os mais novos na descoberta [dropcap]C[/dropcap]omo é que descreve o projecto Artfusion? O Artfusion é um grupo de artes performativas que existe em Macau desde 2014. Surgiu exactamente nesta altura, no ano novo chinês. Era o ano do Cavalo e a formação apareceu de uma colaboração com o grupo de capoeira Axé. Tivemos a ideia de juntar a capoeira e os batuques com dança contemporânea, ginástica e muita criatividade. O resultado foi surpreendente. Nasceu o conceito de fusão de artes, de onde apareceu o nosso nome. Não ficaram por aí. Não. Com a experiência resolvemos começar a organizar workshops onde desenvolvemos várias áreas das artes performativas. Optámos, desde logo, por diversas vertentes: a expressão dramática, a dança, técnicas de improviso e até as próprias artes plásticas. Este trabalho permitiu aos alunos que se inscreveram o contacto com várias valências e, a nós, percebermos quais as competências das crianças e jovens para delinearmos qual seria o caminho a seguir. A partir daí, iniciámos as aulas de artes performativas em que as inscrições foram muitas. Tivemos alunos dos quatro aos 17 anos, o que fez com que começássemos a dividir as formações por turmas, consoante as idades. Actualmente temos cerca de 50 alunos, divididos em três grupos. São também uma escola? Acabamos por ser. Uma das nossas principais missões é a formação através das artes orientada para o desenvolvimento da expressão da criatividade e, acima de tudo, para a noção de liberdade. Outro aspecto importante é o desenvolvimento da expressão individual e de grupo. Pontualmente funcionamos com grupos de adultos para eventos específicos. Neste momento, cerca de 80 por cento dos alunos são portugueses e os restantes dividem-se entre macaenses e chineses. Também aqui há uma fusão de culturas que torna a experiência muito interessante. Como são organizadas as aulas? Exploramos e seguimos muitos modelos e técnicas criativas aliadas à expressão corporal e dramática. Queremos também permitir a exploração da consciência do eu e do outro para que não só desenvolvam conhecimentos nas diversas áreas artísticas, mas que encontrem também aqui um lugar de divertimento e de criação. Sinto que muitos jovens têm um plano curricular com muitas actividades e uma das maiores dificuldades é terem tempo para fazerem as coisas. É por isso também que temos aulas apenas uma vez por semana e, mesmo assim, os alunos têm, frequentemente, de fazer alguma ginástica com a agenda para conseguirem fazer tudo. Por outro lado, isto também implica algum trabalho das próprias famílias para coordenar os vários horários, mas é possível. Eles gostam muito das aulas. O Artfusion tem aulas e espectáculos? Sim. Muitas vezes aproveitamos as aulas para o ensaio de espectáculos, mas também sinto que temos de parar esse processo de produção para que tenham espaço para se libertarem. Sinto que precisam deste espaço. Não são uma associação. Como é que se organizam? Somos um grupo que colabora com a associação “Macau no coração”, o que nos permite participar em actividades organizadas por instituições governamentais. Quando participamos em determinados eventos, como a Lusofonia, fazemos questão de levar conteúdos, de alguma forma, lusófonos. Já dançamos o fado, por exemplo. Como é que chegam à ideia para um espectáculo? Os alunos também têm aí um papel muito importante. Tentamos perceber quais são os seus interesses e de que forma a nossa cultura pode ser interessante para ser explorada por eles. O nosso público é, essencialmente, familiar e o nosso universo muito vasto pelo que, para agradarmos a todos, temos de fazer um espectáculo o mais completo possível. Tentamos explorar conceitos que inicialmente podem parecer mais abstractos e torná-los mais simples. E como é que fazem isso? Posso mesmo dizer que os alunos são a principal fonte de inspiração. Antes da concepção de qualquer espectáculo exploramos os temas que queremos abordar com os estudantes. Eles dão ideias, que não são só verbais, mas também ao nível do corpo. Procuro sempre que, por exemplo, através do grafismo ou do desenho, também possam expressar o seu universo. Depois fazemos a nossa pesquisa e levamos ideias do nosso contacto com grupos que não são de cá. O Cirque du Soleil é um exemplo? Sim. Passei o Verão de 2016 nos Estados Unidos a acompanhar o Cirque du Soleil num dos seus espectáculos. Juntei-me a eles desde a criação do espectáculo à digressão. Era uma outsider, mas acompanhei todos os departamentos, vi como aconteciam as coisas e como se fazia a produção, e aprendi com os excelentes profissionais que fazem parte daquela equipa. Foi uma experiência única, apesar de assustadora. É uma equipa muito grande e que envolve uma logística que a maioria das pessoas não faz ideia. O que trouxe do Cirque du Soleil para Macau? Trouxe um bocadinho de tudo aquilo. Trouxe ideias, daquelas que muitas vezes nos assustam por acharmos que não são possíveis, mas depois pensamos que existe sempre alguma forma de as concretizar ou adaptar à nossa realidade. Também tive, nos Estados Unidos, oportunidade de conhecer vários grupos de jovens em que o trabalho deles era sem qualquer limite. Ali tudo era possível e é este universo de possibilidades infinitas que acho importante trazer para Macau. Quase nunca é fácil, mas não é impossível. Quais são as maiores dificuldades que têm sentido? Os alunos mudam todos os semestres. Crescem e saem de Macau ou experimentam outras actividades. A diferença é que o Artfusion acontece aqui mas poderia acontecer em qualquer lado. Recentemente estivemos em Portugal e fizemos um intercâmbio com vários municípios. Na mira está Taipé onde pretendo que nos juntemos, além de integrar outras actividades, ao Cirque du Soleil na sua digressão asiática da companhia. Esta actividade permitirá mostrar o que é fazer produção em grande escala e com uma equipa em que trabalham profissionais de várias áreas. Quero organizar um programa de residência artística em que poderão participar não só alunos do Artfusion, mas todos os interessados: uma semana de workshops com os artistas do Cirque vindos de diferentes backgrounds, visitas a espaços culturais e artísticos, visitas aos bastidores, etc. Enfim, é dar oportunidade aos jovens de terem contacto com esta realidade e conhecerem o percurso daqueles artistas. E o seu percurso até aqui, como foi? Sou formada em Publicidade e Marketing e, da minha experiência, foi a criatividade que mais me chamou a atenção. Acabei por trabalhar em cinema e em televisão, fiz formação em teatro e, com os conteúdos que fui assimilando, descobri que o que mais gostava de fazer era estar na produção, nomeadamente na direcção artística. O facto de ter passado por vários departamentos foi para mim muito importante: deu-me consciência do que é o trabalho de equipa. Trabalham essencialmente com jovens. Porquê esta população? O que vejo de especial nestas pessoas é a espontaneidade e a capacidade de trabalhar os medos. As crianças e os jovens são também muito criativos e verdadeiros, o que para mim é um desafio. Cada um tem de ser trabalhado de uma forma individual e, depois, quando colocados em trabalho de equipa, mostram uma grande transformação. Acabo também por desenvolver as minhas competências para poder chegar até eles. O que vamos ter no espectáculo integrado no Fringe? Este espectáculo é uma estreia em Macau, a primeira vez que foi apresentado foi em Shenzhen. Mas são espectáculos diferentes. Aqui tive de fazer várias adaptações. Ter o Nam Van como palco foi um desafio enorme, é um palco muito grande. Chama-se “Connection” e o objectivo foi explorar o próprio conceito da palavra, ou seja, como é que o ser humano está ligado aos outros, à natureza, ao mundo à sua volta, muitas vezes de forma inconsciente. Este é um trabalho de alerta para a inconsciência das ligações que existem. São laços muitas vezes invisíveis ou ignorados e, cada vez mais no mundo real, esta falta de consciência transforma-se em intolerância. Todo o trabalho de concepção é neste sentido e os protagonistas têm de sentir tudo isto para fazerem um bom espectáculo, que só acontece se conseguirem fazer com que o público sinta o mesmo.
Hoje Macau China / ÁsiaFórum | Xi Jinping em destaque em Davos A extensa comitiva liderada pelo Presidente chinês marca em Davos uma posição de combate à crescente política proteccionista dos Estados Unidos anunciada por Donald Trump e ao populismo que ameaça a estabilidade europeia [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] secretário-geral do maior partido comunista do mundo, lidera esta semana uma delegação de cem funcionários e executivos no Fórum Económico Mundial de Davos, numa aparente resposta à tendência proteccionista que atinge as potências ocidentais. A primeira participação de um Presidente chinês num evento que promove a globalização e o comércio livre surge numa altura em que movimentos populistas ganham forçam na Europa e Estados Unidos. A vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais norte-americanas faz prever um aumento do proteccionismo nos EUA; a saída do Reino Unido da União Europeia e a ascensão de Marine Le Pen em França ameaçam o projecto europeu. “A China insiste que a globalização é um processo irreversível, para nós e para o mundo”, afirmou à agência Lusa Cui Shoujun, director do centro de estudos para a América Latina da Universidade Renmin, em Pequim. Os jornais chineses têm enaltecido o contributo de Xi para a estabilidade internacional, mas analistas rejeitam a possibilidade do líder chinês se referir directamente a Trump. “Nesta altura, ele quererá esconder o jogo. Não faria sentido que se referisse a Trump”, disse Steve Tsang, director do SOAS China Institute in London, à Associated Press. Francois Godement, especialista para a China do Conselho Europeu, lembrou à AP que os chineses são “extremamente cautelosos quando comentam a futura presidência” norte-americana. “Por agora, penso que estão ocupados a observar e questionar-se o que virá a seguir”, afirmou Godement. “Mas não tenho dúvidas de que ele (Xi) vai retratar a China como aberta, corporativista, estável, previsível e fiável em várias questões internacionais. Mesmo não se referindo à administração de Trump, tentará projectar um contraste”, disse. Reunião alargada Xi leva a Davos quatro ministros chineses. A Rússia estará também representada por dois vice-primeiros ministros e vários executivos. Quando Davos se realizou pela primeira vez, em 1971, apenas participaram líderes europeus e norte-americanos. Na segunda-feira, Klaus Schwab, fundador do fórum, frisou que este ano o evento “não é apenas uma reunião do ocidente”. Um terço dos participantes é oriundo de países em desenvolvimento – incluindo as maiores delegações de sempre da China e Índia -, revelou Schwab. A recente posição de Pequim a favor do comércio livre contrasta, no entanto, com a adopção de restrições no acesso ao seu mercado. As empresas estrangeiras estão interditas de participar em vários sectores do mercado chinês ou são forçadas a fazer parcerias com empresas locais e transferir tecnologia chave. Pequim usa também frequentemente o comércio como alavancagem em situações de disputa política, chegando mesmo a banir as importações de determinados produtos a partir de países com os quais atravessa períodos de maior tensão.
Julie Oyang h | Artes, Letras e IdeiasGuanxi, o dínamo da língua chinesa (限制) 中国人脑筋里的一件事 [dropcap style≠’circle’]G[/dropcap]uanxi關係significa relacionamento. Ou simplesmente: contactos. Guan 關 significa demasiado perto, clausura; aprisionar. Mas, no sentido estratégico, também significa localização crucial, especialmente no que à Rota da Seda diz respeito. Xi繫 significa ligação, laços, correlações, sistema organizado, etc. O caracter inclui a palavra “seda”. De facto, a Rota da Seda pode ser vista como a manifestação máxima das poderosas redes comerciais Guanxi, no tempo em que a seda era a moeda internacional. O projecto do Partido Comunista Chinês para uma nova Rota da Seda está em sintonia com a forma de funcionar das mentes chinesas. Contrariamente à nossa palavra “relacionamento”, que sugere algo durável e com valor de per si, a utilização da palavra Guanxi altera-se quando combinada com um verbo. Guanxi implica sempre muita acção. É um conceito enérgico e auto-motivado e constantemente em movimento. Guanxi é um herói de acção, tipo Bruce Lee, divertido, rápido e com um historial muito antigo. Guanxi é de longe a palavra mais dinâmica da língua chinesa. E, na minha opinião, é também um factor que limita a mentalidade chinesa e restringe a autenticidade e a criatividade. Na cultura chinesa Guanxi é um factor fundamental para fazer negócio. Aos olhos dos ocidentais representa qualquer coisa de mítico e profundo que deve ser respeitado e venerado. Mas se olharmos por trás da cortina de fumo, é apenas uma forma de reciprocidade: ‘um favor em troca de outro’. Muitas vezes os homens de negócio chineses oferecem qualquer coisa a alguém, para que posteriormente possam cobrar os seus dividendos, ou para obterem de alguma forma mais poder e influência. São procedimentos que permitem criar contactos, relacionamentos e redes que os ajudam a ultrapassar as normas impostas pelo Governo e as práticas comerciais convencionais. Aspecto importante deste processo são as ligações sociais entre os indivíduos, pensadas para proporcionar acesso directo e privilegiado a informações internas, sobre contratos comerciais e bens escassos. Por outras palavras, o talento não é para aqui chamado e na maior parte dos casos nem se lhe dá hipótese de existir. No universo Guanxi, a inovação só existe enquanto efeito secundário e quem ousar arriscar um pensamento inovador tem a derrota garantida. O talento e a habilidade sofrem com a subjugação a uma tradição empedernida. A carta na manga deste sistema é, e sempre foi, o conjunto mais significativo de relações e contactos. Estamos quase no Novo Ano Chinês, uma altura fantástica para “guanxar”. Por falar em “guanxar”, vamos dar uma olhadela aos rituais de bebida chineses. Quanjiu, “persuadir (o parceiro de negócio) a beber” é um dos pontos altos das festas chinesas. Existem muitas expressões chinesas relativas a esta forma de comportamento, que poderíamos classificar de “extremo”. “Bebe! Mostra que és meu amigo!” “Bebe como deve ser porque é raro teres hipóteses de te embriagar.” “Sente (a amizade) profunda, bota abaixo. Sente (a amizade) frágil, como a taça.” Etc. Na China valoriza-se a quantidade de álcool que estamos dispostos a beber com o nosso parceiro de negócios. Os jogos de bebida dos chineses não têm a ver com o prazer da bebida propriamente dita. Levar o outro a beber até cair esconde a intenção de poder e controlo; “quem manda em quem”. É um sinal de conquista. Se alguma das minhas leitoras tiver intenção de participar num banquete do Ano Novo Chinês, não se esqueça do que acabei de dizer.
Diogo Simões Tecnologia VozesA qualidade no sucesso da empresa [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]os dias de hoje a implementação de um Sistema de Qualidade e consequente certificação em normas de qualidade já não constitui um desafio impensável para a maioria das empresas. São agora inúmeras aquelas que já deram este passo. Dependendo da estratégia de cada empresário para a sua empresa – é perfeitamente legítima (e necessária à economia) a existência de empresas que não têm como objectivo evoluir e, para estas um SGQ como o certificado pela família de normas ISO 9000 constitui, efectivamente, um encargo desnecessário – é quase unânime a percepção que um Sistema que apoia o sucesso da Organização na satisfação dos seus clientes, libertando recursos que podem ser usados noutras iniciativas, constitui um salto essencial para o crescimento sustentável de uma empresa. É que o esforço das empresas gasto em actividades não produtivas pode, em alguns casos, chegar a 80% do esforço total. É um enorme esforço dispendido em actividades inúteis ou ineficazes – é aqui que os Processos para a Qualidade tentam agir e assegurar o registo de tudo o que é relevante para que eventuais problemas sejam detectados atempadamente e se aprenda com a experiência. No entanto, o mundo está sempre em mudança. Depois de anos de aperfeiçoamento de processos de optimização e monitorização de produto, o que falta então a cada empresa fazer, enquanto organização, para resistir a um mundo que nunca foi tão competitivo e tão rápido, e que obriga a um esforço cada vez maior para manter e fazer crescer o seu negócio? A resposta pode residir simplesmente nestes dois pontos: A adaptação dos processos ao ambiente em que se insere o negócio da organização; Pensar menos em soluções técnicas ou tecnológicas para os problemas, pois estas incidem sobre cada problema em particular e não às suas origens comuns, e pensar mais em agir sobre a cultura e valores da organização. Alguns pensamentos orientais apregoam uma série de passos que são necessários percorrer para que cada indivíduo possa atingir a plena realização pessoal. Que tal estender este conceito às organizações, adaptando-o à sua Cultura e Valores? Este foi um exercício defendido pelo Dr. Gary Cort, na altura presidente do TC 176 – a comissão que zela pela manutenção e revisões da família ISO 9000 – num seminário que o autor destas linhas assistiu no Porto em finais de 2013, intitulado “A Qualidade e o Futuro”. Seguindo esta filosofia, poder-se-ão aplicar às organizações oito princípios, como oito degraus que serão necessários subir, conquistando passo a passo o “nirvana”. São eles: Passo 1 – Mente positiva: O estado de espírito positivo que permite olhar para o futuro, fomentando a curiosidade constante em evoluir, resultando numa maior flexibilidade da organização em adaptar-se ao ambiente em que se insere. Passo 2 – Corpo são: manter a saúde da organização, como se fosse um organismo humano, que quanto mais saudável, mais capacidade tem para resistir a doenças. Numa organização, isto manifesta-se numa maior resiliência para ultrapassar tanto as dificuldades do dia a dia, como obstáculos inesperados. Passo 3 –Relações equilibrados: manter a organização unida, fomentando o relacionamento equilibrado entre as pessoas e equipas. Evitar que equipas trabalhem em “roda livre”, cada uma com os seus próprios objectivos, desperdiçando energias que podiam ser aplicadas a transmitir mais força a um mesmo rumo. Passo 4 – Sentido da Vida: agir sobre a Missão da organização de modo a que tenha um sentido, no mais abrangente significado do termo. Isto vai-se reflectir na motivação dos seus colaboradores, abrindo caminho à constante inovação e flexibilidade da organização. Passo 5 – Inspiração: Decorrente do passo anterior, uma cultura inspirada e inspiradora de novas ideias e acções será extremamente positiva para o desenvolvimento da organização. Passo 6 – Contribuição: uma organização, como somatório da capacidade dos seus colaboradores ganhará se fomentar que todos sintam vontade de contribuir para o seu crescimento Passo 7 – Sustentabilidade: Todos os princípios anteriores tiveram de ser percorridos para se chegar até aqui. Que instrumentos as empresas e organizações detêm para garantir a sustentabilidade da sua posição no negócio e no mundo? Mais uma vez, o principal instrumento sobre o qual todos os outros princípios incidiram: a cultura da organização. Passo 8 – Legado: O resultado final da aplicação de toda esta filosofia. O que fica depois de desenvolvida a actividade da empresa, depois da interacção da empresa com o meio onde se insere. Afinal, o que a empresa passou para os outros e para o futuro? Eis o que poderá ser a chave para as empresas vencerem os desafios da competitividade no mundo actual: agir sobre a própria cultura e valores, transmiti-la aos seus colaboradores e envolvê-los de modo a que todos se mantenham comprometidos com ela e sigam o mesmo rumo. E assim diferenciar-se da sua concorrência.
João Luz Ócios & Negócios PessoasT-O-W | O moderno no coração do antigo Em pleno zona do antigo Bazar, existe um pequeno oásis de modernidade, o Pátio de Chôn Sau. Aí podemos encontrar a loja T-O-W, onde os acessórios de escritório e casa ganham uma outra vida e cor [dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]scondida pela Rua de Nossa Senhora do Amparo, numa zona tradicionalmente comercial, cheia de edifícios pouco coloridos e repletos de fuligem, encontramos a T-O-W. Encontramos se procurarmos, mas a descoberta vale a pena. A loja é uma mina de modernidade, de estética trendy no coração de um bairro tradicional chinês. Para quem passeia pela zona, encontrar o pátio onde fica a loja pode ser uma mudança de cenário demasiado abrupta. “Esta é a zona comercial mais antiga de Macau, a primeira, e a nossa ideia é renovar e dar uma nova energia ao sítio, rejuvenescê-lo”, diz Eurico Ao, director criativo da loja. A T-O-W é um dos estabelecimentos que abriram no Pátio de Chôn Sau, numa atmosfera colorida, com grafittis nas paredes e lojas com produtos mais típicos de grandes cidades mundiais, como Nova Iorque, Londres ou Hong Kong. Quem lá entra parece estar num museu de design para utensílios de casa e escritório. Tudo muito colorido, divertido, decorativo, mas funcional. Podemos encontrar quadros e alguns objectos curiosos de decoração, assim como comprar gadgets que farão com que quem nos visite pergunte: “Onde arranjaste isso?”. Os artigos variam entre caixas para lentes de contacto que são joaninhas, sabonetes em forma de caveira mexicana, canetas de espião que escrevem com tinta que só é perceptível quando atingida com raios UV. Também se pode encontrar um robot que faz infusão de chá, um porta fita-cola em forma de tractor, borrachas que parecem bigodes, ou amendoins. Enfim, as possibilidades são tantas quanto a imaginação permite. “Temos um pouco de tudo, são produtos divertidos, dinâmicos. Os preços são acessíveis, perfeitos para prendas de aniversário, ou quando se quer comprar algo divertido para animar um amigo”, explica Eurico. Nove meses depois da inauguração, o director criativo do espaço confessa que o negócio corre bem. “Os produtos que vendemos aqui são fáceis de comercializar, aliás, basta ver a primeira reacção de quem entra na loja, que é sorrir.” Além disso, o lojista tenta acompanhar o cliente, guiá-lo pelos diferentes artigos, como se fosse uma visita a um museu de design em que se podem comprar peças. É frequente que quem visite a T-O-W já conheça muitos dos produtos de revistas de gadgets, ou através da Internet. A loja também vende a famosa cerveja artesanal IPA, assim como uma longa variedade de abre-garrafas, de todas as formas e feitios. Clientela jovem “A T-O-W é uma loja moderna, atrevida, mas dirigida a todo o tipo de idades, diria que é para o cliente com um espírito jovem”, explica Eurico Ao. Quem entra no espaço é bombardeado por cores e um conjunto de formas que normalmente não são associados a utensílios de casa ou escritório. Para o director criativo do estabelecimento, é difícil escolher um produto que se destaque entre os mais vendidos. “As vendas são muito bem distribuídas, equilibradamente, mas, talvez, a caneta de espião.” A T-O-W é um pouco a síntese do ambiente que se vive no Pátio de Chôn Sau, um pequeno quarteirão trendy, com cafés, lojas de decoração, lojas de noodles. Tudo muito colorido, jovial, com um fortíssimo componente contemporâneo, apesar do contexto local ser tradicional e cinzento. Portanto, é natural que este tipo de espaços seja mais atractivo para quem vem de fora. Não é de estranhar que Eurico Ao considere que a loja é concebida, ou mais bem entendida, para quem tenha um background europeu, ou norte-americano. Neste contexto, é natural que a maioria da clientela seja de Hong Kong, também com bastantes sul-coreanos e taiwaneses. Curiosamente, o estabelecimento tem passado um pouco ao lado dos locais o que, para Eurico, só pode ser explicado pelo “espírito um pouco mais conservador”.
João Luz SociedadeJornalistas | Aprovado debate sobre atribuição da carteira profissional em Macau [dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]oi aprovada para debate a proposta da Associação de Imprensa em Português e Inglês de Macau, que pretende a atribuição da carteira profissional para os jornalistas que trabalham no território. Porém, ainda há um longo caminho a percorrer. Há 19 anos que não se realizava um congresso de jornalistas em Portugal, apesar de há muito se falar no assunto, nomeadamente para a criação de uma ordem profissional. Segundo João Francisco Pinto, presidente da Associação de Imprensa em Português e Inglês de Macau (AIPIM), os trabalhos foram “muito focados em questões que nos passam ao lado, como a precariedade profissional dos jornalistas, os baixos salários, a instabilidade laboral”. O problema de Macau prende-se com a certificação profissional de quem trabalha em órgãos de comunicação social locais. Em primeiro lugar, porque não existe um organismo que emita o título. Em segundo, porque os regulamentos da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ) não permitem a emissão de títulos para fora do território português. Além da falta de certificação, acrescenta-se que na RAEM não existe código deontológico que regule a profissão, assim como não estão aprovados quaisquer estatutos de jornalistas que, de acordo com a associação, são mais de cem. “A moção que a AIPIM levou ao congresso para que a comissão da carteira profissional reconhecesse a situação dos jornalistas portugueses de Macau teve votos contra”, relata João Francisco Pinto, que ainda não tem dados concretos sobre o número de votos negativos que a moção recebeu. Ainda assim, a proposta segue para debate. Muito além de um mero capricho de reconhecimento burocrático, a carteira certifica o profissional enquanto jornalista. Ou seja, quem começou a profissão em Macau, se quiser regressar a Portugal, ficará na posição de estagiário e terá um escalão salarial mais baixo, por muitos anos que tenha de jornalismo. Situação similar aplica-se para quem vem de Portugal com o título, uma vez que, chegado ao território, deixará de o poder revalidar. Outro aspecto que deve ser tido em conta é o reconhecimento da profissão. Hoje em dia, em Macau, qualquer pessoa pode apresentar-se numa conferência de imprensa identificando-se como jornalista. Curiosamente, de acordo com João Francisco Pinto, “a maioria dos jornalistas chineses representados pelas suas associações opõe-se à criação de um título profissional”. Como tal, nunca foram conseguidos pontos de consenso com as associações chinesas para a criação de um organismo que regule a profissão. Sem instituição em Macau que certifique os jornalistas, e com os estatutos da CCPJ a não permitirem a emissão de títulos fora de Portugal, os profissionais que exercem no território vivem num limbo. Para o presidente da AIPIM, esta é uma situação que deve ser resolvida, para bem da dignificação do jornalismo em Macau.
Andreia Sofia Silva Manchete ReportagemViolência doméstica | IAS detectou 29 vítimas do sexo masculino Os homens que são vítimas de violência doméstica em Macau tendem a viver na sombra do medo. Não falam porque não é suposto serem vítimas e muitos temem perder o emprego. O Governo registou 29 casos de violência doméstica que envolvem 11 homens que estão em relacionamentos. Para eles, faltam centros de acolhimento e um diferente tipo de aproximação [dropcap style≠’circle’]G[/dropcap]anhou coragem quando foi expulso de casa. A mulher agredia-o e a família mandou-o embora. Teve de arranjar coragem para começar tudo do zero: era necessário encontrar uma casa e um novo emprego. O estigma, contudo, era maior do que o medo. “Foi difícil para ele, mas depois conseguiu encontrar um alojamento e um emprego. Ganhou confiança para enfrentar o problema e entrar na sociedade.” A história, descoberta pela Caritas Macau há cerca de um ano, é contada ao HM por Paul Pun, secretário-geral da instituição. O caso deste homem é apenas um de muitos que acontecem no território e sobre os quais pouco se fala. Dados concedidos ao HM pelo Instituto de Acção Social (IAS) revelam que, no ano passado, o sistema de registo central relativo à violência doméstica contou com 29 casos em que as vítimas são do sexo masculino. Onze desses processos dizem respeito a homens que estão em relacionamentos, enquanto 16 casos são sobre rapazes menores de idade. Não foi registado qualquer caso de violência contra idosos ou homens com incapacidades. Paul Pun garante que há mais histórias por detectar para além dos números oficiais. “Acredito que há mais casos por descobrir, porque os homens que são vítimas de violência tendem a não falar do que se passa e não procuram ajuda. No passado, as pessoas acreditavam que os homens não eram vítimas de nenhum tipo de violência, mas há vários casos a acontecer. Muitas vezes só podem contar aos profissionais, com os quais têm mais confiança. Muitos perdem o emprego”, apontou o secretário-geral da Caritas. Tendo em conta a sua experiência a lidar com a comunidade chinesa, Paul Pun fala de casos esporádicos, que raramente entram para as estatísticas. “Temos de fazer um maior trabalho para reduzir os casos de violência, incluindo os casos em que os homens são as vítimas. Não encontrei muitos casos de violência doméstica entre famílias, mas os números avançados pelo Governo podem revelar que há mais situações deste género.” Melody Lu, docente da Universidade de Macau e membro da Coligação Anti-Violência Doméstica, fala da dificuldade que é lidar com estes casos na prática. “Sabemos que, em Macau, a violência doméstica é predominante nas mulheres, mas não podemos esquecer que as vítimas também podem ser os filhos e os maridos. Quem esteja numa posição mais fraca na família pode ser a vítima e, neste caso, quando as mulheres são mais fortes em termos de personalidade ou têm melhores salários. Mas isso não está reportado. Os homens sentem mais vergonha do que as mulheres em dizerem que sofrem de violência doméstica.” Os homens “sentem vergonha, sentem que não deveriam ser eles as vítimas”. “Também estão mais esquecidos porque não é suposto que sejam vítimas de violência física ou mesmo psicológica. É mais difícil ver as evidências”, acrescentou Melody Lu. Homossexuais na penumbra Anthony Lam, presidente da Associação Arco-Íris de Macau, mostrou-se surpreendido com o número de vítimas registado no ano passado. “É a primeira vez que oiço falar destes números, porque o IAS não contacta connosco. Basicamente não há qualquer tipo de comunicação. Por um lado, é um fenómeno positivo que a legislação sobre a violência doméstica esteja a funcionar em termos práticos mas, por outro, a comunidade gay está totalmente afastada desta lei e há casos de violência que também necessitam de apoio, tanto da parte da associação, como do Governo.” Se os homens em relacionamentos heterossexuais vivem na sombra do medo, os homossexuais ainda mais. “Há casos escondidos, mas penso que mesmo que os casais homossexuais reportem os casos de violência junto do IAS, como a lei não os protege, o IAS não irá fazer nada para os ajudar”, referiu Anthony Lam. O presidente da associação que defende os direitos da comunidade LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgénero) continua a defender a inclusão dos casais LGBT na lei, numa altura em que se volta a falar da revisão do diploma da violência doméstica. “Estamos felizes com o facto de o Governo estar a fazer a sua parte, mas diria que não estamos em contacto próximo com a Administração para monitorizar a situação de perto”, sublinhou. “Se me pergunta como podemos melhorar a legislação, a nossa posição mantém-se igual à de há um ano: queremos que os casais homossexuais sejam abrangidos pela lei da violência doméstica. Os casais homossexuais não estão a ser protegidos pela legislação e não há nada que o IAS possa fazer para os ajudar”, frisou Anthony Lam. Que medidas? Paul Pun considera que os casos de violência que envolvem homens e mulheres devem ser tratados da mesma maneira pelas autoridades, mas acredita que “a forma de protecção deve ser diferente”. “Os homens que são vítimas de violência podem perder o emprego. Se as mulheres disserem que são vítimas de violência, continuam a ser protegidas. Em alguns casos, as mulheres tendem a dizer directamente às pessoas, mas os homens têm de se proteger, há uma diferente perspectiva e sentem-se ainda piores. Deve ser feita uma aproximação diferente ao problema.” Melody Lu fala da falta de acolhimento para as vítimas de sexo masculino. “Em Macau há poucos casos, não porque não há vítimas, mas porque têm vergonha de contar que o são. Quando o IAS toma conta das ocorrências não há uma divisão, homens e mulheres devem ser tratados da mesma maneira. Mas no que diz respeito ao alojamento só temos dois centros, um deles o Centro do Bom Pastor. Não há um centro para vítimas do sexo masculino”, concluiu. O IAS divulgou os primeiros dados sobre a violência doméstica, após a implementação da lei, em Outubro do ano passado. Foram recebidas 96 queixas só no primeiro semestre do ano, mais do que os casos denunciados em 2015. Quanto às denúncias, foram feitas 80, sendo que envolveram 82 vítimas. No primeiro semestre as queixas foram 96, afectando 97 vítimas. À data, a presidente do IAS, Celeste Vong, atribuiu estes números ao facto de a nova lei da violência doméstica ter tornado público este tipo de crime. Celeste Vong disse que as autoridades esperam que as denúncias continuem a aumentar, na sequência da entrada em vigor da lei, e da elaboração de um guia de resposta à violência doméstica destinado a diversas entidades e instituições. Foi criada, em Novembro de 2015, uma linha de apoio às vítimas. Juliana Devoy | Número de casos vai aumentar este ano A directora do Centro do Bom Pastor, que acolhe mulheres vítimas de violência doméstica, garante que os casos de violência sobre os homens são menos comuns do que no feminino. “Todos podem ser vítimas de violência, os idosos também. Estou certa de que há casos de homens que são vítimas de violência, mas os números não se podem comparar. Na sua maioria, os homens são os agressores e as mulheres as vítimas.” Independentemente disso, garante que os casos deverão voltar a aumentar este ano. “Seria necessário fazer uma investigação comparativa todos os anos para saber se há ou não um aumento de casos. Penso que os casos ao longo dos anos têm sofrido uma flutuação, mas não diminuíram, e não me parece que o número de casos vá diminuir este ano. Pelo contrário, penso que vão aumentar. As pessoas vão sentir mais confiança em falar.” Juliana Devoy acredita ser necessária mais formação junto dos agentes da autoridade, para que saibam mais facilmente identificar os casos de violência doméstica. “Espero que haja uma melhor formação dos polícias na identificação dos casos e mais encorajamento junto das vítimas para que possam reportá-los. Esperamos que, em breve, haja uma diminuição da violência doméstica, mas não acho que vá desaparecer para sempre. Na maior parte dos lugares onde a lei foi testada surgiram novos casos de violência, com pessoas que ganharam coragem para denunciar as situações.”
Isabel Castro Manchete PolíticaLago Nam Van | Au Kam San exige explicações sobre terreno Há oito anos que anda preocupado com o assunto, sem ter obtido respostas que o satisfaçam. Há um aterro no Lago Nam Van construído de forma provisória que Au Kam San entende que deve ser destruído. Por isso, escreveu ao Chefe do Executivo [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] deputado Au Kam San quer saber por que razão parte do lago Nam Van está ocupada por um aterro que, aquando da construção, foi justificado como sendo provisório. Numa interpelação escrita, o pró-democrata conta que há oito anos apresentou uma interpelação sobre o assunto mas, até à data, a desocupação ainda não aconteceu. “Não sei se esta situação se deve a esquecimento ou a condescendência por parte das autoridades”, diz. Au Kam San recorda todos os passos da história: em meados de Março de 2008, “um terreno com cerca de dois mil metros quadrados, conquistado por aterro, estendeu-se repentinamente ao lote 9 nas proximidades do Lago Nam Van, com a movimentação de um elevado número de camiões de algumas empresas de construção, para a realização de obras, que decorreram ao longo de várias noites”. Explica o membro da Assembleia Legislativa que, na altura, os moradores da zona ficaram “bastante assustados” com o aterro, tendo questionado a legalidade do terreno conquistado ao lago “subitamente” e a “altas horas da noite”. Ainda de acordo com Au, o Governo da RAEM explicou que as obras de aterro se destinavam à construção de uma plataforma de trabalho provisória, afirmando que o construtor tinha já obtido a licença necessária do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) e a autorização das Obras Públicas para os trabalhos preparatórios de construção de alicerces. Estes trabalhos preparatórios, destaca, incluíam “a demolição de pilares que já estavam cravados no lago e as obras de aterro para a construção de uma plataforma provisória”. Em resposta a uma interpelação de Au Kam San apresentada na altura, as Obras Públicas apontaram, “claramente”, que a plataforma em questão seria destruída “logo depois de concluídas as obras de demolição e substituição dos pilares já cravados, e que o panorama original do lago seria reposto”. O lote de volta Acontece que, depois de “realizados alguns trabalhos”, as obras do estaleiro “cessaram por completo e ninguém sabe se já foi levada a cabo a tal substituição dos pilares cravados”. Também não existe uma calendarização concreta para a demolição da plataforma de trabalho provisória, assinala o deputado. “O IACM, que autorizou a ocupação do lago naquela altura, sabe que o prazo da ocupação já foi excedido há muitos anos mas, segundo sabemos, pelo facto de não ter competências para isso, não consegue que sejam removidos os materiais que estão a ocupar o lago, nem que seja reposto o panorama original”, lamenta. Também as Obras Públicas não estarão a acompanhar o caso, pelo que Au Kam San pretende que lhe expliquem o que está a Administração a fazer em relação ao caso. O pró-democrata alerta ainda para o facto de a plataforma estar a impedir a fluidez da corrente, com lixo acumulado à volta, o que prejudica “gravemente” o ambiente no lago. “As autoridades vão continuar a tolerar esta situação?”, pergunta. Por fim, em relação ao terreno que esteve na origem da construção da plataforma – o lote 9 da zona A –, o deputado escreve que o prazo de aproveitamento da parcela terminou em Janeiro de 1998. “O construtor em questão não procedeu ao aproveitamento dentro do prazo legal”, aponta, defendendo que o Governo deve reaver o lote.
Angela Ka PolíticaElla Lei insiste na proibição da procura de emprego por visitantes [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] cruzada de Ella Lei na demanda contra a entrada de estrangeiros no mercado de trabalho em Macau conheceu ontem mais um capítulo. A deputada perguntou à Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL) a razão pela qual ainda não foi elaborada uma proposta de lei que proíba os não residentes que entram em Macau de procurarem emprego. A questão prende-se com quem chega com estatuto de visitante, mas permanece para trabalhar no território. A representante da Federação das Associações dos Operários de Macau não se refere apenas a visitantes do Interior da China. “Os casos que envolvem visitantes que procuram emprego em Macau e que, depois, permanecem na qualidade de trabalhador não residente, têm sido um motivo de irritação por parte de muitos trabalhadores.” A deputada acrescenta ainda que estas pessoas podem representar um problema latente de segurança pública, não apresentando para o efeito quaisquer dados estatísticos. Para tal, baseou-se no caso episódico de um filipino que raptou uma criança no território. Ella Lei recordou ainda que em Julho de 2014, em resposta a uma interpelação escrita relativa a este tópico, a DSAL referiu estar a analisar a lei da contratação de trabalhadores não residentes, assim como os regimes relacionados. No final de 2015, durante o debate das Linhas de Acção Governativa, foi referido que estava em curso um estudo interdepartamental para responder à exigência de proibição da transformação dos turistas em trabalhadores não locais. Porém, “pesadas as vantagens e desvantagens, ainda não decidida uma proposta final”, comenta. A deputada mencionou ainda que em Julho de 2016 a DSAL, em resposta a uma interpelação escrita, referiu que tinha comunicado com o Corpo de Polícia de Segurança Pública e com o Gabinete dos Recursos Humanos no sentido de elaborar uma proposta de lei. Além disso, a DSAL terá recolhido opiniões de organizações no sentido de apertar o cerco a quem chega ao território em busca de emprego. “Já entrámos no ano de 2017, porém, a proposta ainda não foi concluída,” lamentou. Insistindo, Ella Lei pergunta até quando a proposta irá ser adiada e quando será implementada, alertando para o facto de que a iniciativa legislativa está há mais de dois anos à espera de resolução. Recorde-se que, em Macau, a taxa de desemprego mantém-se estável, nos 1,9 por cento, número que se enquadra no conceito económico de pleno emprego.
Hoje Macau PolíticaSónia Chan | Comissão de Assuntos Eleitorais da AL ainda em Janeiro A secretária para a Administração e Justiça prevê a constituição da Comissão de Assuntos Eleitorais ainda este mês. As eleições para a Assembleia Legislativa começam a tomar forma. O processo atrasou o trabalho para os órgãos municipais sem poder político [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] anúncio foi feito ontem à comunicação social, à margem da reunião da 1.a Comissão Permanente da Assembleia Legislativa (AL). A secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, revelou que os Serviços de Administração e Função Pública (SAFP) já começaram os trabalhos preparativos para a eleição da AL. Vão começar em breve as iniciativas com vista à promoção do acto eleitoral, sendo que os SAFP se prestaram a oferecer apoio aos trabalhos da Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa. De acordo com a dirigente, a comissão será constituída ainda este mês, aguardando-se ainda a atribuição pelo tribunal do nome do representante do organismo. Só findo este processo poderá ser criada a comissão, através de despacho do Chefe do Executivo. Sónia Chan explicou ainda que a necessidade de o Executivo se focar no processo eleitoral atrasou o calendário que estava previsto para a realização da consulta pública para a criação de órgãos municipais. A secretária acrescentou ainda que, como esta matéria envolve a Lei Básica, o Governo da RAEM precisa consultar os serviços competentes do Governo Central, com quem já se encontra a trocar impressões. Apesar da urgência na criação dos órgãos municipais sem poder político, o Executivo prevê que a consulta popular acerca deste assunto se realize ainda este ano. Recorde-se que a criação deste tipo de estrutura foi anunciada em Novembro de 2015, aquando da apresentação das Linhas de Acção Governativa para 2016. Na altura, o Chefe do Executivo referiu que, no segundo semestre de 2016, iriam ser concluídas as sugestões preliminares para que se iniciasse a consulta pública. A ideia inicial era a constituição do órgão municipal em 2018 mas, em Setembro do ano passado, na altura da divulgação do documento final do Plano Quinquenal de Desenvolvimento de Macau, ficou a saber-se que deverá ser concretizada apenas em 2019. Sónia Chan à espera do CCAC A secretária para a Administração e Justiça ainda não foi contactada pelo Comissariado contra a Corrupção acerca da queixa que foi apresentada sobre o facto de ter recomendado um familiar para trabalhar no Ministério Público. Sónia Chan diz ter conhecimento da queixa apenas pela comunicação social, tendo garantido, no entanto, que está empenhada em colaborar com o trabalho de investigação. O caso da recomendação da secretária surgiu depois de Ho Chio Meng, o antigo procurador da RAEM, ter dito em tribunal que recebeu telefonemas com indicações sobre pessoas interessadas em trabalhar no Ministério Público. “As duas secretárias de apelido Chan [em referência a Florinda Chan e a Sónia Chan, respectivamente antiga e actual secretária para a Administração e Justiça] chegaram a telefonar-me”, afirmou. Sónia Chan nega ter existido qualquer “troca de interesses” ou ilegalidade.
Hoje Macau SociedadeHo Chio Meng | Ex-assessor diz ter forjado dados para gastos irregulares no MP Chan Ka Fai, ex-funcionário do Ministério Público, admitiu existirem irregularidades no sistema de pagamento de despesas, com conhecimento do Gabinete do Procurador, durante o mandato de Ho Chio Meng [dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] arguido no caso mas, ainda assim, foi ouvido ontem como testemunha no Tribunal de Última Instância (TUI). De acordo com a Rádio Macau, que tem estado a acompanhar o julgamento do antigo procurador da RAEM, Chan Ka Fai, antigo assessor, admitiu que, durante anos, houve manipulação de facturas e de propostas de orçamento, com datas e valores alterados, e omissões de dados. Funcionário do MP até 2015, Chan Ka Fai estava à frente de um grupo criado por Ho Chio Meng para tratar dos assuntos relacionados com a aquisição de bens e serviços. A equipa foi criada por despacho interno e respondia directamente ao chefe de Gabinete de Ho Chio Meng, cargo então assumido por António Lai, também arguido. A comunicação seria feita através de notas “post-it”, coladas em documentos oficiais relacionados com gastos públicos, e eram dadas instruções nestes apontamentos. Ainda segundo o relato da emissora, a acusação exibiu uma nota em que António Lai terá escrito “tratar de uma forma mais segura” – em causa estava uma factura sobre a compra de móveis, apresentada como um exemplo de aquisição de bens para o MP, sem conhecimento prévio do departamento responsável. Chan Ka Fai contextualizou: “Quando [Ho Chio Meng] se deslocava ao exterior e via mobília que achava adequada, comprava. Só depois é que sabíamos se era para o serviço ou para [uso] particular”. A testemunha explicou que a liquidação do adiantamento deste tipo de despesas era feita através de empresas de Wong Kuok Wai, também arguido no processo por alegado favorecimento nas adjudicações do MP. Na versão da acusação, o empreiteiro (a quem foram atribuídos todos os contratos do MP durante o tempo de Ho Chio Meng) cobrava comissões até 20 por cento para a aquisição de bens e serviços. A testemunha falou numa margem de lucro de cinco por cento, com base na palavra dada por Wong Kuok Wai, uma vez que Chan Ka Fai disse não ter acesso às facturas dos fornecedores efectivos. O ex-assessor reconheceu que a prática era “inadequada” e “não justificável”, e garantiu que tentou confrontar o ex-chefe de Gabinete de Ho Chio Meng. “Tentámos perguntar mais, mas ele tem uma má atitude. Mostrava uma cara muito zangada ou não respondia. Se continuasse a insistir, ralhava comigo”, afirmou. Ouvido pela defesa, Chan Ka Fai reconheceu que “ninguém [do grupo] gostava” de António Lai e que “não havia uma boa relação”. Seis facturas falsas A testemunha disse ter recebido “instruções muito claras” de Lai para não identificar nas folhas de pagamento as pessoas que acompanhavam Ho Chio Meng em viagens ao exterior, com despesas pagas pelo MP. A matéria era tratada como “confidencial”. A viagem à Europa que consta da acusação contra Ho Chio Meng foi um dos casos – o ex-procurador aproveitou uma deslocação oficial à Dinamarca para viajar com a família para outros países europeus. A viagem custou 569 mil patacas ao MP, mais de metade do permitido por lei, anualmente. Para conseguir dar cobertura a esta despesa, Chan Ka Fai disse que metade dos gastos foi liquidada no ano seguinte, com a emissão de seis facturas falsas. A Rádio Macau conta ainda que a testemunha admitiu que um grupo de funcionários “inventou actividades”, com conhecimento de António Lai e de mais dois assessores. Chan Ka Fai disse não saber se Ho Chio Meng foi também informado mas, ao longo do depoimento, foi afirmando que sempre partiu do princípio de que as indicações do então chefe de Gabinete vinham do antigo Procurador.
Hoje Macau Manchete SociedadeCrimes ligados ao jogo aumentaram 19,2 por cento em 2016 Houve uma subida significativa no número de delitos associados aos casinos. Só sequestros foram mais de 500. Mas a Polícia Judiciária garante que este tipo de criminalidade não afecta que vive cá, uma vez que os envolvidos são de fora [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Polícia Judiciária (PJ) revelou um relatório sobre criminalidade que mostra que os crimes ocorridos dentro dos casinos aumentaram 19,2 por cento no ano passado, com destaque para os “casos de sequestros resultantes de agiotagem para jogo”. Em 2016 registaram-se 1851 casos relacionados com o jogo (inquéritos e denúncias), incluindo 441 casos de agiotagem para o jogo (contra 318 em 2015) e 503 casos de sequestro resultante de agiotagem para jogo (em comparação com os 366 casos em 2015). Na apresentação do relatório à imprensa, o director da PJ de Macau, Chau Wai Kuong, disse que os crimes relacionados com os casinos “não afectam a comunidade local”, já que os envolvidos não são residentes em Macau. Outro crime que registou um aumento considerável foi o de tráfico de droga, com uma subida de mais de 40 por cento. Foram registados 122 casos de tráfico de droga em 2016 (em 2015 tinham sido 85 e em 2014 um total de 103), sendo a cocaína a substância ilícita mais apreendida, num total de cerca de 20 quilogramas avaliados em cerca de 66 milhões de patacas. No ano passado foram detectados sete casos de tráfico de droga no aeroporto de Macau, tendo Chau Wai Kuong destacado o contributo da máquina de raio X instalada naquela infra-estrutura e também a cooperação com a polícia de Hong Kong para desmantelar várias associações criminosas transfronteiriças de tráfico de estupefacientes. No ano passado, os deputados aprovaram a revisão da lei da droga, que agrava as penas para o consumo até um ano e para o tráfico até 15 anos, e introduz testes de urina como método de prova. Ontem, o director da PJ referiu “o efeito dissuasor” da nova legislação. “A droga é trazida das regiões vizinhas e vamos cooperar com os outros países, através da Interpol”, acrescentou. Chau Wai Kuong disse ainda que será instalada uma máquina de raio X na futura Ponte Hong Kong – Zhuhai – Macau, justificando que “estas máquinas têm um efeito dissuasor” e que facilitam a acção das autoridades. No consumo de droga também se verificou um aumento, nomeadamente no número de pessoas envolvidas: em 2016 registaram-se 59 casos com 131 pessoas, depois de no ano anterior terem sido registados 51 casos que envolveram 107 pessoas. Menos burlas Foram ainda divulgados os números sobre a violência doméstica. Assim, desde a entrada em vigor da lei de prevenção e combate à violência doméstica, a 5 de Outubro, foram instaurados oito casos que envolveram oito autores e oito ofendidos. “Esperamos que esta lei encoraje a apresentação de queixa pelas vítimas. Em alguns casos detivemos alguns criminosos, mas depois eles maltratam as crianças. Vamos ter uma reunião para discutir como melhorar a cooperação com o Instituto de Acção Social (IAS), porque este presta serviço de alojamento e colabora com associações cívicas”, disse Chau Wai Kuong. “Para reprimir a violência doméstica precisamos da cooperação do IAS porque as crianças podem ser testemunhas nestes casos”, acrescentou. Ainda no âmbito da criminalidade grave, a PJ indicou que, em 2016, foi registado um homicídio, à semelhança dos dois anos anteriores. Os casos de burla, em contrapartida, registaram uma diminuição de 24,4 por cento em 2016 (329 casos, contra 435 em 2015 e 505 em 2014). Também os crimes informáticos diminuíram 23,2 por cento em relação a 2015, fixando-se em 466 casos, depois dos 607 registados em 2015 e 605 em 2014. Os casos de delinquência juvenil também baixaram, tendo sido presentes oito menores ao Ministério Público. Em 2015 tinham sido 21 e em 2014 um total de 30. Em termos gerais, no ano passado foram abertos 12.340 processos, ou mais 1035 casos relativamente a 2015.
Sofia Margarida Mota EventosHusam Abed, artista: “Não sei o que é ter uma casa” Husam Abed é palestiniano, mas podia ser da Jordânia. Nasceu em Baka, um campo de refugiados a norte de Amã, e não conhece as origens. Está em Macau para apresentar hoje, sábado e domingo, o espectáculo “Uma Vida Suave”, com Réka Deák, mulher e directora de cenografia. A peça junta realidade, marionetas e público à mesa [dropcap]É[/dropcap] palestiniano, mas nasceu na Jordânia. Nasci num campo de refugiados. Em 1949, a minha família fugiu de uma pequena aldeia e ficaram num campo em Jericó. Em 1967, tiveram de mudar de novo e foram para Karama, para um campo de palestinianos. No ano seguinte mudaram para o campo de Baka, a norte de Amã. Hoje é um campo que acolhe cerca de 150 mil pessoas. Foi lá que nasci. No início, as pessoas viviam em tendas mas, aos poucos, foi mudando e agora têm casas. Mas é ainda sobrepovoado e vive numa situação ambígua. Não é reconhecido pelo estado da Jordânia, nem as Nações Unidas prestam lá cuidados. As pessoas estão no meio de dois fogos. Como é crescer num campo de refugiados? Vivia na Jordânia, mas só conheci alguém de lá já deveria ter uns 20 anos. É viver numa comunidade muito fechada onde se levanta a questão da identidade de uma forma muito forte. Muitas pessoas não sentem que são da Jordânia, mesmo depois de 60 anos a ali viverem, nem que são da Palestina, que já não passa de uma memória longínqua. Eu, por exemplo, conheci a minha avó há apenas dois anos. Ela ficou em Jericó e nunca a tinha visto. O meu pai morreu e a minha mãe foi lá buscá-la. É uma senhora muito velhinha, com o corpo cheio de cicatrizes da guerra. Ali, a guerra é diária. Por outro lado, toda a gente fala da Palestina e no direito de regressar. Não sei o que é ter uma casa. Nunca pude construir essa ideia. Há um sentimento nostálgico de que a “casa” existe, mas eu não sei o que é, nunca lá estive. É mais um sentimento de diáspora ou de exílio. Quando queremos ter educação ou saúde, não somos de lá, e não temos direito a nada. Como é que fez para estudar? A questão da educação na Palestina sempre foi muito forte. E esse foi o meu caso também. Apesar de o meu avô paterno ser talhante, teve o cuidado de possibilitar educação superior aos filhos e eu fui educado nessa perspectiva. A única hipótese era ir estudar para as mesquitas na Síria. O meu professor de inglês costumava dizer que, quando uma catástrofe atinge algumas pessoas, haverá outras a beneficiar com isso. Na Síria, que foi colonizada pelos franceses, o ensino do inglês era muito mau mas, com o regresso dos palestinianos, vieram muitos académicos que acabaram por se tornar professores de inglês e colmataram uma falha. A educação sempre foi uma questão essencial para os palestinianos. Como é que apareceram as marionetas? Quando estava a estudar Química tornei-me voluntário no orfanato que existia no campo de Baka. Não havia actividades para os mais jovens e não havia como libertar a energia. Existia um clube de desporto em que as pessoas se encontravam e a associação dos órfãos. Para conhecer a dinâmica da comunidade era necessário fazer algum trabalho voluntário ou social. Fazia campos de Verão e programas educacionais com as crianças. Queria também fazer qualquer coisa que ajudasse as crianças na formação do seu carácter e lembrei-me de fazer algo mais artístico. Foi quando apareceu a ideia das marionetas. Até então, só tinha visto os bonecos na televisão e nem sabia como fazer. Falei com os meus colegas e discutimos como fazer um guião, fazer os bonecos, etc.. Começou aí. Na altura, tinha uma ideia baseada no budismo, em que, depois de não existirem árvores, água e animais, o homem descobre que não pode comer dinheiro. Era essa a reflexão que queria passar. Fui ao mercado, comprei umas bonecas e precisava de uma personagem que fosse o contador de histórias. Num desses dias de compras vi um homem a vender melão. É um fruto que tem uma espécie de rugas e achei interessante. Tirei o interior e transformei-o num boneco. Foi a minha primeira marioneta. No entanto, acabei o curso em Química Aplicada, trabalhei numa refinaria de petróleo durante dois anos e depois comecei a dar aulas. Passado um ano decidi que não era aquilo que queria. Foi um choque para a minha família o facto de estar a perder uma oportunidade de estabilizar e ter um futuro. Decidi que queria trabalhar com marionetas. Estudou em Praga. Sim, mas foi uma coincidência. Quando fiz a minha escolha, em 2009, tive o meu próprio espectáculo e fiz alguns workshops para campos de refugiados. Em 2010 comecei a trabalhar com refugiados iraquianos. Trabalhei em Zaatari com a comunidade em geral e já fazia coisas também para adultos. Mas sentia que ninguém estava convencido com o meu trabalho e que precisava de algum tipo de reconhecimento internacional. Comecei à procura de opções. Apareceu-me uma formação na Alemanha, mas não podia ingressar sem um curso de língua. Ainda comecei a estudar mas só me aceitariam por meio ano porque já tinha mais de 26 anos. Continuei à procura e encontrei cursos em inglês em Praga. A capital internacional das marionetas… Sim, mas eu não sabia. Foi o que me apareceu. É uma história muito estranha. Descobri quando lá cheguei e nem queria acreditar. Os bonecos que tinha visto na televisão, que eram os meus favoritos, tinham sido criados ali, e eu estava ali. Fui admitido numa escola de teatro e estavam marionetas em todo o lado. Fiz o curso, durante três semanas, e o meu professor, responsável pelo programa, perguntou-me se não me queria candidatar ao programa de mestrado. Foi muito complicado. Não tinha um background no teatro e sentia-me completamente perdido. Sentia que não conseguia encontrar a minha forma de expressão. Vinha de uma cultura muito diferente e não me sentia pronto. Fui à Índia, onde vi alguns festivais que me inspiraram e me proporcionaram uma abordagem diferente das coisas. Regressei a Praga e consegui fazer um projecto mais pessoal. Aprofundei a área do teatro documental, que conta histórias. O que é que vamos ter com “Uma Vida Suave” aqui em Macau? Comecei a sentir que tinha de fazer teatro em que pudesse jogar com os limites da realidade e da fantasia, e em que pudesse juntar alguma actividade. Nesta peça estamos em casa, à mesa, e as pessoas vêm ouvir algumas histórias acerca da minha infância. A mesa tem estampado o mapa da Palestina e, ao mesmo tempo que vou contando as histórias, as pessoas vão bebendo chá. A peça acaba com a partilha de uma refeição tipicamente palestiniana que, traduzindo, se chama “de pernas para o ar”. É uma refeição especial que se faz especialmente ao fim-de-semana. A cenografia está a cargo da Réka Deák. Concebeu uma mesa com gavetas e as histórias vão saindo delas. É também uma peça sobre a família e as memórias. Acima de tudo, o que quero mostrar é que cada pessoa tem a sua história que deve ser contada. Estamos num tempo em que as pessoas se reduzem a números. Lidamos como as pessoas como se fossem algarismos. Por exemplo, diz-se que três mil pessoas foram mortas, mas quem são estas pessoas? As pessoas tornam-se números e os números esquecem-se. Mas as histórias não. As histórias devem fazer a diferença, e ficar no coração e na memória das pessoas.
Hoje Macau China / ÁsiaPequim | Preparados para combater por Taiwan [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] China está a ficar sem paciência para o Presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, na questão de Taiwan, escreveu ontem a imprensa estatal, afirmando que Pequim está pronta a combater pelo território. Trump disse na semana passada que poderá reconsiderar o princípio “uma só China”, visto por Pequim como uma garantia de que Taiwan é parte do seu território, e reconhecido por Washington desde 1979. O Presidente eleito dos EUA quebrou já no mês passado com a tradição diplomática norte-americana, ao aceitar a chamada telefónica da Presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen. No sábado, depois dos comentários feitos numa entrevista ao jornal Wall Street Journal, o Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês avisou que o princípio “uma só China” é inegociável. Ontem, o jornal estatal China Daily disse que a questão de Taiwan é “uma caixa de Pandora de potencial letal”. A China tem dado o benefício da dúvida a Trump, mas se ele “está determinado a fazer este jogo ao assumir funções, será inevitável um período de interacção hostil e nociva, e Pequim não terá outra escolha a não ser preparar-se para combater”. Donald Trump prometeu uma postura dura face ao que considera ser concorrência desleal por parte da China e sugeriu que a política “uma só China” poderá servir como moeda de troca nas negociações com Pequim. “Tudo está sob negociação, incluindo o princípio ‘uma só China'”, afirmou. Pouco espaço Pequim considera Taiwan uma província chinesa e defende a “reunificação pacífica”, mas ameaça “usar a força” caso a ilha declare independência. Já a ilha onde se refugiou o antigo Governo chinês depois de o Partido Comunista (PCC) tomar o poder no continente, em 1949, assume-se como República da China. Os EUA reconhecem Pequim como o único Governo legítimo de toda a China desde 1979. O jornal Global Times, visto como próximo do PCC, avisou ainda que Trump tem menos espaço para negociar do que julga. A China vai “combater impiedosamente quem defender a independência de Taiwan”, afirmou em editorial na segunda-feira. Se Trump optar por usar a ilha como moeda de troca, talvez “acabe por ser sacrificado devido a essa estratégia desprezível”. O mesmo jornal escreveu no mês passado que a decisão de São Tomé e Príncipe de cortar relações diplomáticas com Taiwan “não foi acidental”, constituindo, “obviamente, um castigo” para Tsai Ing-wen. A Presidente de Taiwan fez este mês duas paragens nos EUA, numa viagem com destino à América Central, apesar dos protestos de Pequim. No regresso, Tsai afirmou que a sua “nova direcção” para a política externa é clara. “Devemos continuar a trabalhar para que Taiwan seja visto, para que Taiwan dê o seu contributo para o mundo”, disse.
Hoje Macau China / ÁsiaAmiga da Presidente sul-coreana contesta ter obtido benefícios [dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]hoi Soon-sil, que está no centro de um escândalo de corrupção na Coreia do Sul, negou ontem ter obtido qualquer benefício ou privilégio, durante o seu testemunho no processo que já levou à destituição da Presidente Park Geun-hye. “Nunca obtive benefícios ou privilégios. Isto resulta de conclusões precipitadas”, disse Choi, de 60 anos, amiga da presidente e conhecida como “Rasputina sul-coreana”, durante a audiência, citada pela agência Yonhap. Choi, detida desde Novembro, negou perante o Tribunal Constitucional, tal como já tinha feito perante o parlamento e o tribunal penal que investiga o caso, os crimes de que é acusada e incluem abuso de poder, chantagem ou tentativa de fraude. A declaração aconteceu na quinta sessão do processo para analisar a destituição da Presidente sul-coreana, Park Geun-hye, aprovada pela Assembleia Nacional no passado dia 9 de Dezembro devido a suspeitas de que cooperou com Choi, sua amiga próxima, para extorquir grandes empresas. A equipa do Ministério Público encarregue de investigar o caso considera que Choi, com a conivência de Park, extorquiu os principais conglomerados do país para fazer entrar 77.400 milhões de wones (cerca de 61 milhões de euros) em duas fundações que controlava. À defesa Choi queixou-se no tribunal dos procedimentos da equipa de investigação do Ministério Público e por momentos levantou a voz para responder ao que disse serem “perguntas tendenciosas”. Choi defendeu também a inocência da Presidente, apesar de admitir visitá-la com alguma frequência e ajudá-la com “assuntos pessoais”, tendo acesso a rascunhos de discursos de Park – considerados material presidencial confidencial – que modificou para lhes dar mais “emoção”. O Tribunal Constitucional sul-coreano tem até inícios de Junho para ratificar ou rejeitar a destituição de Park aprovada pelo parlamento. Caso a destituição seja aprovada, devem realizar-se eleições presidenciais num prazo não superior a 60 dias desde o veredicto.
Paulo José Miranda h | Artes, Letras e IdeiasDesmontar o brinquedo da vida [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o seu melhor, a poesia faz-nos ver. Traz até à nossa consciência uma mundividência, visões às quais o acesso nos é difícil ou completamente vedado. Em Respirar Debaixo De Água (Averno, 2013), Tiago Araújo leva-nos pelas páginas a sentir o que é ter uma vida de empréstimo. A vida surge diante de nós como se não fosse uma vida real, uma vida de verdade, mas antes uma vida que nos foi emprestada. A vida surge-nos como se fosse uma temporada numa casa ou num país emprestado. E, no fundo, é isso que todas as nossas vidas são, embora não as sintamos como sendo assim. Aqui, passamos a respirar isso com claridade, passamos a respirar debaixo de água como se fosse esse o nosso elemento natural. Lê-se logo, na primeira estrofe do livro: no meu círculo familiar sabe-se que na infância estive quase a afogar-me num rio calmo. a gravidade da situação pode ter sido exagerada, mas essa tarde quente tornou-se numa das ficções que ajudam a definir a personalidade. alguns anos depois passei a ver-me como o afogado, o rapaz que respira debaixo de água onde os sons são distorcidos à passagem da boca. (…) Aquele que esteve à beira da morte, ainda antes mesmo de saber o que é temer a morte, antes de saber que a morte é o caroço da vida, como é o caso da criança, passa a assumir esse evento da sua vida como constitutivo do seu ser. E, como é bem de ver, o que menos importa aqui, como em todas as visões, é se há alguma correspondência entre a poesia e os factos. Aqui, no livro, é assim. Aqui no livro, um homem caminha com a vida que podia não ter sido, com a consciência aguda de ser uma vida que só foi até ao momento de poder não ter sido. E, a partir desse momento, ela faz-se sentir como empréstimo; como se tivesse espatifado o carro e alguém lhe emprestasse um outro até que resolva a situação. E a situação não se resolve, porque a situação é a vida. E, por isso mesmo, a continuação do poema que lemos atrás, diz: como é habitual nas pessoas a quem é dada uma segunda oportunidade, tenho-a desperdiçado sem sentimentos de culpa (…) A vida, a única que se tem, passou a ser sentida como uma segunda oportunidade, que é desperdiçada, e que é também uma metáfora poderosa acerca da condição humana. Por exemplo, quem já não deu conta de si a pensar: “como vim parar aqui a esta vida?”; “que me aconteceu no tempo que passou?”; “que fiz eu da minha vida?”. São tudo formulações, e outras há, de espanto por se estar na vida, numa vida que não parece ser a nossa, mas que também não há outra. Esta distorção existencial, esta dobra no tempo, esta duplicidade de nos vermos a nós mesmos como se não fôssemos nós, aparece de modo particularmente feliz nestes versos de Tiago Araújo, ainda no primeiro poema do seu livro: sinto a adolescência como um membro amputado que continua a doer depois de desaparecido, uma dor fantasma num corpo fantasma, trazido de uma era em que a música começava a definir a personalidade e a hiena do desejo inaugural e não saciado devorava as entranhas durante todo o dia, durante toda a noite. (…) depois, como sabes, entrámos todos na vida adulta como quem no mar sai para fora de pé (…) a realidade, como a água, devolve sempre os corpos que engole. (…) Esta consciência de que a vida nos falta, que há qualquer coisa que nos falta, não se fica apenas por aquilo que já foi, como a adolescência amputada pela realidade da vida adulta, a vida falta-nos a cada instante, porque nós estamos no mundo como sonâmbulos, não só em relação ao mundo, mas principalmente em relação a nós próprios: “na infância ensinaram-me como é perigoso / acordar um sonâmbulo, lição que tenho / aplicado de forma exemplar em relação a mim próprio.” (p. 8) Embora no poema, o poeta se refira apenas a si mesmo, podemos alargar a acusação a todo o humano, com mais ou menos variáveis nessa prática de caminhar a dormir. Mas neste livro sui generis acerca do humano, nesta consciência da vida não nos chegar, de ela mesma ser simultaneamente o que temos e o que nos falta, encontra o seu paroxismo nos versos iniciais do terceiro poema, “matar o tempo (mente corpo)”: “nasci gémeo. o meu irmão falso / morreu quase à nascença. formei a personalidade como a memoria da metade que me falta.” (p. 10) E se a vida, enquanto está a ser, já é o que é, quando deixa de ser mostra então a sua pouca valia em todo o seu esplendor. A cada momento que a vida passa valemos menos, a vida vale menos, e na morte não só desaparecemos, mas rapidamente desapareceremos também da memória dos outros. Um dia havemos de não ser como se nunca tivéssemos sido. Havemos de não ser como se nunca tivéssemos vindo à existência, como se nunca aqui tivéssemos posto os pés. O nada que somos será literal, “colecciono fotografias de família, vendidas em alfarrabistas / por pouco dinheiro, como prova de que estamos / a uma ou duas gerações do esquecimento.” (p. 12) Passamos uma vida à procura de quê? Passamos uma vida a fazer o quê, na realidade, para além “das tarefas diárias com que nos ocupamos a / matar o tempo” (p. 15)? Este livro é, no fundo, uma enorme interrogação, de um modo muito particular, acerca do que estamos nós aqui a fazer, na vida, no mundo, na memória. Que fizemos nós para merecer isto, a vida, assim tão grande que temos de inventar tarefas, e tão pequena que ninguém se lembrará de nós? “(…) esta é a hora em que / não chegas, pontualmente, todas as tardes.” (p. 19) E isto que o poeta escreve acerca de alguém, também escreve acerca da vida: ela, pontualmente, a horas, sempre a horas, nunca chega até nós. Temo-lo visto ao longo destas páginas. E quando Tiago Araújo termina o poema “yorick (2)” com “pedacinhos de nada”, estes pedacinhos de nada não são apenas o que eventualmente possa ou não ter nos bolsos, mas cada um de nós, no vórtice do universo, no vórtice de não se saber nada de nada de nada. Não sabermos quem somos é não sabermos o que é a vida, o que andamos a aqui a fazer, e é este o mundo em que estamos a viver, isto é, é assim que é estar vivo, é assim estar a viver. A vida aparece-nos como praxis inevitável, um contínuo ter de fazer coisas até ao fim. Não é mau, nem bom, é assim, como nos dizem estes versos certeiros, do poema Lázaro: “a canção pode ter chegado ao fim lázaro, mas não o teu trabalho: / a arte da ressurreição inserida na rotina diária”. (p. 27) A vida como ela é, ou respirar debaixo de água, ou viver sem saber o que isso é, ou estar a fazer caminho para nada são sinónimos que aprendemos neste livro, que não é um livro pessimista, nem abjecto, pois sabe que a vida diz-se de muitas maneiras e encarregar-se-á ela própria de se adjectivar a cada momento. Mais do que um livro contra a vida, e as nas suas múltiplas apresentações, quer sejam social, biológica ou metafísica, é um livro que desmonta o brinquedo que é a vida, deixando página a página as múltiplas peças que a compõem, que não são mais do que peças, nem boas nem más. Fique-se, por fim, com este poema de Tiago Araújo: os números este é o livro da minha descendência: adelino gerou armindo que gerou adão que gerou tiago que gerou três. dois deles correm agora na sala em perseguições alternadas. o terceiro cresce sem que o vejamos ainda. somos cada vez mais, embora insuficientes para substituir os mortos que coleccionamos em álbuns de família, e por motivos práticos vivemos quase isolados na nossa felicidade domestica, um sentimento mal recebido pela crítica. durante a infância ninguém morreu. os corpos eram retirados do olhar das crianças de forma subtil e eficaz. chegou por fim o momento de consultar a conta-corrente, de avaliar os ganhos e as perdas. um nome por cada nome, numa família em que o que passou é quase tão desconhecido como o futuro. fomos trazidos até aqui por uma paixão quase constante entre os sexos, ao longo dos séculos. e agora, na idade adulta, é a cada dia que nos vamos aproximando do passado. por ter sido muito diferente em outras épocas, mas hoje é Saturno que é devorado pelos filhos enquanto vê televisão, numa tarde de sábado.
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesA polémica do Museu II [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]a semana passada discutimos a construção da sucursal do Museu do Palácio de Pequim em Hong Kong. O anúncio da construção do edifício foi feito depois da assinatura do memorandum entre o Governo da cidade e os responsáveis do Museu do Palácio, sem consulta pública. Este arranjo teve em vista assegurar a construção da sucursal do Museu em Hong Kong. A perspectiva de virmos a ter um Museu em Hong Kong é positiva, e deve ser apoiada. Mas a forma como o assunto foi tratado é questionável. A polémica não ficou encerrada com a comunicação da construção do Museu. No passado dia 7 o website de Hong Kong, “South China Morning Post”, publicava um artigo onde se afirmava que o arquitecto responsável pelo projecto, Rocco Yim Sen-kee, já tinha sido contratado antes do anúncio oficial da construção do complexo, feito pela Secretária Carrie Lam Cheng Yuet-ngor. Podíamos ainda ler, “A Autoridade Administradora do West Kowloon Cultural District contratou … Yim em Junho (de 2016) para determinar se, no local, … poderia ser construído um complexo multifuncional, que pudesse acolher exposições, convenções, espectáculos e dependências destinadas a um museu, e foi-lhe pedida a apresentação de uma planta do projecto.” “Posteriormente, em Novembro de 2016, o conselho administrativo aprovou a designação de Yim … para a função.” O artigo continuava, “Yim deu início ao projecto cerca de seis meses antes da comunicação de Carrie Lam.” A “Rocco Design Architects”, a empresa de Rocco Yim Sen-kee, que foi escolhida como consultora para os planos arquitectónicos do Museu, já tinha começado a trabalhar nas plantas do complexo no passado mês de Junho (2016), cinco meses antes da reunião do Conselho de Administração, levada a efeito para aprovação do empreendimento. Foi também por esta altura que Yim foi formalmente indigitado.” Os detalhes do contrato entre Yim e a Autoridade para o West Kowloon Cultural District foram também divulgados, “A Autoridade para o West Kowloon Cultural District tratou este projecto com “um secretismo sem precedentes, tendo recorrido durante a fase inicial ao nome de código “Projecto P” para o designar internamente.” “A FactWire, citando fontes, divulgou que a planta foi deliberadamente dividida em partes, para que as pessoas que trabalhavam no projecto não ficassem a par da estrutura global do Museu.” “As fontes acrescentaram que o plano era “absolutamente secreto”, completamente diferente de qualquer outro em que já tinham trabalhado, e o primeiro com um nome de código.” Os legisladores de Hong Kong não ficaram satisfeitos com todo este secretismo em torno da construção do Museu. Tanya Chan, do Partido Cívico, declarou, “Vou interpelar Lam para que explique porque é que Yim começou a trabalhar com tanta antecedência.” A nomeação de Yim para arquitecto do Museu do Palácio de Pequim está também a dar muito que falar. Como é que esta nomeação se processou? Porque é que foi escolhido? Quanto é que vai receber? Estas serão algumas das questões que os legisladores irão colocar. Estão em causa a justiça e a imparcialidade. Se o Governo der o seu apoio a escolhas à margem dos procedimentos correctos, abre as portas à arbitrariedade. Passa a ser uma questão de “gostos” ou de “não gostos”. Um procedimento com estas premissas não tem qualquer relevância. Neste caso, podem levantar-se suspeitas junto da opinião pública de que o Governo favoreceu a candidatura de Yim. Vai ser muito difícil, quer para o Governo quer para Yim, explicar a situação, mesmo que não tenha havido má intenção de nenhuma das partes. Neste caso os fundos para financiar a construção do Museu vieram do Jockey Club de Hong Kong, não são dinheiros públicos; mas mesmo assim não é suficiente para acabar com as suspeitas. É sabido que os legisladores têm o poder de debater qualquer assunto de interesse público ao abrigo do artigo 73(6) da Lei Básica de Hong Kong. Podem também convocar pessoas envolvidas para testemunhar ao abrigo do artigo 73(10) da mesma Lei, através de uma Ordenança do Conselho Legislativo (Poderes e Privilégios). Se os legisladores acabarem por convocar a secretária Carrie Lam, Yim e outras partes envolvidas para prestar declarações, será muito constrangedor e muito prejudicial para Hong Kong. Esperamos que o Museu do Palácio de Pequim possa vir a ser construído em Hong Kong e que os procedimentos correctos se mantenham. Professor Associado do Instituto Politécnico de Macau Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Tânia dos Santos Sexanálise VozesPower Rangers da Fantasia [dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]elhor ou pior, dependendo da vossa geração, o pessoal deve ter ouvido falar dos Power Rangers. Eles são uns super heróis de uma série de entretenimento juvenil onde há cinco jovens que vestem um fato (cada um de uma cor diferente) e salvam o mundo das desgraças que por aí andam. Lembro-me de ver os power rangers naquelas idades em que queremos ser os heróis do mundo também – lembro especificamente de brincar que tinha um relógio onde podia comunicar com os meus parceiros (já antecipava um smartwatch!) e lá íamos nós salvar donzelas e cavalheiros em desespero. Ora, caiu-me nas mãos aquelas pérolas da literatura cor-de-rosa, que permite aconselhamento sexual e amoroso, o caso de um rapaz a queixar-se que só poderia fazer amor ao fim-de-semana, quando o genérico dos Power Rangers tocava na televisão. A música de entrada dos Power Rangers, para este rapaz, é um turn on instantâneo e exclusivo – daí a limitação temporal. Nunca ninguém saberá da veracidade destes casos tão particulares, nem é o meu objectivo descobri-lo. Para este rapaz o imaginário dos Power Rangers é tudo o que ele precisa para a satisfação sexual. À primeira vista parece-me um pouco limitativo, se considerarmos a panóplia de cenários sexualmente interessantes que existem por aí. Mas não deixa de ser uma reacção honesta ao sexo. O que é que tu gostas? Da música dos Power Rangers. As fantasias sexuais são isso mesmo, o poder de expressar e reconhecer a nossa sexualidade de forma honesta, ainda que, por vezes, fique somente pelo mundo das ideias. A nossa imaginação é riquíssima em cenários, posições e possibilidades, ainda que o dia-a-dia rotineiro não permita uma fertilização desta nossa imaginação sexual. Mas é preciso cultivá-la, pela nossa saúde sexual, precisamos de cultivá-la e tentar entendê-la em todo o seu esplendor. Porque a fantasia pode caracterizar-se de várias formas. Pode ser íntima e privada, a ser imaginada em momentos de masturbação – que podem ser momentos importantes até quando se vive em casal. Não há mal nenhum em querermos a privacidade das nossas fantasias… Contribui para o mistério. Ninguém precisa de saber tudo sobre ti, sobre o teu sexo, os/as parceiros/as podem estar perpetuamente a tentar descobri-lo. Tal como a fantasia pode ser o completo oposto, pode ser partilhada pelos dois, as fantasias individuais podem tornar-se vossas, recriadas em conjunto. Mas às vezes, porque as fantasias são tão íntimas, temos medo que não sejam bem vistas e que não sejam entendidas. No que toca ao sexo é muito fácil patologizar tudo e todos que parecem cair nos meandros da não-‘normalidade’. Como eu tenho vindo recorrentemente a escrever, o normal nunca é (nem deve ser) categoricamente definido. Caso assim seja, o sexo, que ainda por cima é pouco discutido, estaria limitado a casais heterossexuais em posição de missionário. Contudo, graças à nossa imaginação tão rica, e à nossa vontade de explorar os limites da sexualidade humana, o sexo normal é um espectro de possibilidades. Tal como com o nosso amigo que gosta muitíssimo da música do genérico dos Power Rangers. Continuo a reforçar que não há fórmulas feitas para a realização das fantasias de cada um. Nós nunca saberemos onde a nossa imaginação pode ir – por isso não vale muita pena seguirmos listas de fantasias genéricas. Mas há quem julgue que sim, que consegue descobrir uma lista de fantasias prototípicas para a satisfação geral. Sexo não é uma checklist que temos que ir riscando à medida que envelhecemos. Um menage à trois não é a fantasia de todos! Apesar de ser bastante prevalente em rapazes (com a fórmula 1 boy + 2 girls, pergunto-me, porque será?). A sexualidade é uma forma de expressão como o amor é uma forma de expressão, nem quero ser presunçosa ao dizer que é uma forma de expressão artística. Talvez o sexo seja a inspiração mais visceral – mais básica – que podemos ter. Julgo que a fome não produza grande coisa, talvez tratados político-sociais do que a fome é. Mas o sexo sente-se, fantasia-se e cria-se. Dá vontade de fotografar corpus nus, de entrar no mundo fantástico do desejo, de perceber a sexualidade humana nas formas mais puras de beleza e de estética. Ou o sexo pode ser tão simples como a música do genérico dos Power Rangers.
Hoje Macau InternacionalNuclear | Espanha avança com obra em Almaraz [dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]spanha vai iniciar “nos próximos dias” a construção do armazém de resíduos nucleares na central de Almaraz, disse à Lusa o secretário de Estado para a União Europeia espanhol. Jorge Toledo reuniu-se esta segunda-feira de manhã com a secretária de Estado dos Assuntos Europeus portuguesa, Margarida Marques, em Lisboa. Questionada pela Renascença sobre se entende a decisão espanhola como uma provocação, Margarida Marques desvalorizou a intenção de Madrid. “Isso faz parte do processo normal relativamente a este caso. Isso não é novo”, afirma. “O que o secretário de Estado nos informou é que o que está neste momento em causa é a construção física do edifício e que não houve ainda por parte de Espanha uma decisão sobre a entrada em funcionamento do edifício”, diz. “O que é importante salientar é que é natural que entre dois países amigos como Portugal e Espanha haja uma diferença de análise da situação e, portanto, nós entendemos que a legislação comunitária não foi respeitada neste sentido relativamente à Comissão Europeia”, acrescenta a secretária de Estado. Portugal vai enviar “rapidamente” uma queixa para a Comissão Europeia. “Neste momento não lhe sei dizer se a queixa já seguiu ou não, mas será enviada rapidamente para a Comissão Europeia”, confirma Margarida Marques. Questionada sobre se não considera que Espanha devia aguardar por essa resposta de Bruxelas antes de avançar com a obra física, a governante portuguesa responde: “É evidente que nós preferíamos que o processo tivesse sido diferente e, por isso, face à forma como o processo evoluiu, entendemos que devemos apresentar uma queixa junto da Comissão Europeia”. À Lusa, o secretário de Estado dos Assuntos Europeus afirmou que “a obra civil, que vai durar quase um ano, vai começar nos próximos dias, mas é uma obra civil. Ainda não se iniciou o procedimento de autorização da operação, do funcionamento do armazém, que terá, como é normal, todas as garantias, necessitará de um relatório do Conselho de Segurança Nuclear espanhol para que tenha absolutamente todas as garantias”. O governante espanhol disse ainda que a construção do armazém na central de Almaraz pretende garantir a segurança. “Se não houvesse armazém, estaríamos perante um cenário de insegurança”, disse.
João Luz Entrevista MancheteManuel Porto, professor de Direito: “O mundo nunca esteve tão bem como agora” Vivemos tempos de mudança de paradigma, tanto em termos económicos, como políticos. O HM falou com Manuel Porto, especialista em assuntos europeus e antigo eurodeputado, sobre os principais desafios que se avizinham [dropcap]M[/dropcap]acau é tida como a ponte entre a China, o mundo lusófono e a Europa, através de Portugal. Acha que esta ponte é real, que é um papel assim tão importante ou mero protocolo? Realmente, não parece ser preciso, porque nada impede que haja mesmo uma relação entre Pequim e Lisboa. Mas é bom que haja uma entidade como Macau, com a História que tem. Vale a pena lembrar que os dois países do futuro vão ser a China e a Índia. Neste momento a China ainda está a crescer 6,7 por cento ao ano, enquanto a Índia cresce 7,7 por cento. Pouca gente presta atenção a isto, mas o último país da Europa a deixar de estar na China e na Índia, as duas grandes potências do futuro, foi Portugal. A Índia tornou-se independente da Inglaterra em 1947, mas Goa, Damão e Diu só foram integrados na Índia em 1961. O caso de Macau é um caso extraordinário. Quando se deu o 25 de Abril, a ideia proposta pelo MFA era imediatamente entregar a independência de Angola, Moçambique e todos os territórios ultramarinos. Na altura, o chefe de Estado da China era um senhor chamado Mao Zedong, muito conhecido cá no sítio. Na sequência da vontade expressa por Portugal, Mao mandou um recado para Lisboa a dizer que nós saíamos quando ele quisesse. Acabámos por ficar cá mais 25 anos. Vivemos tempos interessantes, de mudança de paradigmas. Considera que estamos numa era perigosa? Há uma tendência para achar que o mundo está pior, o mundo nunca esteve tão bem como agora. Hoje não morre ninguém de fome na Índia, por exemplo. Conheço muito bem a Índia, aliás, a minha mulher é indiana, a obra da Madre Teresa de Calcutá em Bombaim foi montada na paróquia de um tio meu, um irmão do meu sogro, o tio Paulo. Vou sempre passar uma semana, ou duas, à Índia nos últimos 30 anos, desde 1987, e posso-lhe dizer que não se pode comparar a pobreza de Bombaim há 30 anos e agora. A China também teve um progresso incrível. Sei que estes dois países não são o mundo inteiro, mas, o facto é que têm um terço da população mundial. Parece que o século XXI traz uma nova ordem mundial. Sim, dentro deste quadro global estamos a entrar num mundo diferente, há muitos poderes. O mundo do século XX era relativamente simples, era um mundo tripolar economicamente. Tínhamos os Estados Unidos, a Europa no seu conjunto e o Japão. Militarmente era bipolar, com os dois grandes blocos da União Soviética e dos Estados Unidos, a Europa não contava neste âmbito. Este mundo que se avizinha será multipolar, temos de ter noção disso, não haverá uma nação prevalecente, em vez disso teremos várias, seis ou sete. Agora, o problema que se põe é dentro dos países haver um certo sentimento de rejeição dos outros. Acho que o maior problema é a xenofobia e a falta de acolhimento. Por exemplo, com a crise dos refugiados na Europa, isso era algo que não era próprio da Europa, e é talvez aquilo que mais me preocupa. Como vê a inoperância europeia em relação à crise dos refugiados? Não é drama nenhum acolher aquela gente, eles podem, perfeitamente, ser integrados. Neste plano era de esperar maior abertura dos países da Europa. Se pensarmos no caso particular dos refugiados sírios, eles são pessoas que se integram com facilidade, não são assim tão diferentes de nós, assim como as pessoas provenientes dos países todos ali da zona. Acho que Europa aí não está a andar bem e está-se a criar uma tremenda má vontade contra os refugiados. Porque, apesar de tudo, somos um continente muito rico. Enfim, sempre temos as nossas limitações, o desemprego é grande, mas está na casa dos seis, sete por cento. Ainda assim, penso que temos todas as condições para assumir uma posição de abertura. Claro que a melhor solução seria resolver o problema na origem, evitar a existência de refugiados. A Europa até tem uma história recente de integração, por exemplo, um dos êxitos da política europeia foi a forma como lidou com a emigração dos países da periferia para o centro. Algo que, praticamente, deixou de haver, começando por Portugal e Espanha. Emigraram de Portugal, entre 1960 e 1976, 1,5 milhões de pessoas, grande parte para a Europa, e houve esse acolhimento. Aí, mais uma vez, Portugal deu ao mundo um belo exemplo, não sei se na história da Humanidade há algum caso como o português de 1975, quando vieram do Ultramar português 800 mil pessoas para uma população de nove milhões. Nessa altura não havia tanto emprego como isso e esse fluxo, quase dez por cento da população, foi integrado. Portugal tem muitos méritos na história, creio que este é um deles. Como vê o crescimento do populismo na Europa? A eleição de Donald Trump e o Brexit são sinais preocupantes. O eleitorado americano e britânico não votou em função dos candidatos, ou da pergunta do referendo. Em vez disso, exprimiram através do voto um sentimento de revolta, de angústia, de mal-estar. Nesse domínio é de salientar que há um país na Europa que não permite referendos, a Alemanha. A ilustre Alemanha, que dominou a cultura europeia no século XX, teve uma experiência desastrosa, a pior que há no século XX, nascida de um referendo. Isto é horrível de se dizer, em particular para um democrata convicto, mas uma pessoa começa a ter medo quando o povo vai todo votar desta forma. Votaram para se verem livres dos emigrantes, porque não querem acolher pessoas, com um profundo sentimento xenófobo. A eleição de Donald Trump foi a mesma coisa. Como é que ele ganhou aquilo? A senhora Clinton é uma pessoa sensata, com experiência dada, fez um bom lugar na administração Obama. É preocupante. Como chegámos a este estado? Olhe, eu vivia na Inglaterra quando foi o referendo de 1975 e, na altura, o voto foi de 67 por cento a favor da integração europeia, ou seja, mais de dois terços a favor. Na altura, um discurso de um antigo primeiro-ministro inglês, Macmillann, onde falou, celebremente, do “efeito de chuveiro frio”, motivou muita gente a votar pela integração na Europa. A ideia é que o isolamento faria o Reino Unido perder competitividade mundial, mesmo face à Alemanha e a França. Ou seja, a entrada na Europa seria preponderante para estimular a economia. O problema agora voltará a ser esse. Como é que a indústria inglesa compete? Neste momento, o Reino Unido tem o maior deficit na balança de pagamentos correntes de toda a Europa, 146 mil milhões. Apesar de ter superavit nos serviços bancários, os saldos das transacções de mercadorias são um desastre. Nesse aspecto interessa à Europa estudar o êxito orçamental alemão, que tem o maior superavit do mundo, acima do chinês. Isto apesar de ter uma mão-de-obra muito cara. Poderá o ambiente de instabilidade política ser consequência de grandes desigualdades económicas? É evidente que há muita desigualdade na China, por exemplo, até porque antigamente viviam sob o signo da grande igualdade. Fui educado a sofrer por ver pobres a morrer de fome, penso que estamos muito melhores hoje em dia. Quanto às desigualdades económicas, elas são naturais, mas depois do crescimento virá o equilíbrio. Basta ver quais são os países com maior igualdade do mundo, os nórdicos europeus, que são, actualmente, os melhores países do mundo em vários indicadores socioeconómicos. Por exemplo, há uma indicação das Nações Unidas para que seja afectado ao apoio ao desenvolvimento 0,7 por cento do PIB. Ora, os únicos países do mundo que cumprem esse desiderato são os países do Norte da Europa, Suécia, Noruega, etc. Com possibilidade de ganhar, Marine Le Pen já ameaça com um referendo à permanência de França na União Europeia. Como vê esta possibilidade? Isso seria o fim da União Europeia. A Europa tem, com os seus 500 milhões de habitantes, sete por cento da população mundial, com alguns países na casa dos 400 mil habitantes, como é o caso de Luxemburgo e Malta. Se não nos unirmos como é que podemos competir no mundo do futuro? Mas deixe-lhe contar uma estória interessante. Nunca conheci a Marine Le Pen, mas fui colega do seu pai, Jean-Marie Le Pen, no Parlamento Europeu, até tínhamos gabinete no mesmo andar. Um dia estava com o meu neto em Estrasburgo, e cruzámo-nos com o Le Pen, quando íamos a passar, ele fez uma festa na cabeça do meu neto e disse: “Il est mignon, Il est mignon”, ou seja, “ele é doce, ele é um doce”. Como vê as relações que se avizinham entre os Estados Unidos e a Rússia? Confesso que tenho dificuldade em prever algo nesse aspecto porque não consigo perceber a lógica das atitudes do Sr. Trump. É muito preocupante, porque os Estados Unidos são uma potência militar impressionante. Até há pouco tempo, agora não sei, a América tinha mais potência militar que todo o resto do mundo junto. Muitas vezes disse “oxalá que o país que tem mais de metade da potência militar continue a ser uma democracia”, porque existe uma ponderação institucional, as decisão têm de passar pelo Senado. Mesmo em caso de escalada bélica, nem consigo imaginar contra quem. Não sei quem são os inimigos do Sr. Trump. Depois existe todo aquele amor ao Putin. Ter o apoio do Sr. Putin é algo que não abona a favor de ninguém. Aquele homem perpetua-se no poder, vai ficar a vida toda. Como é que é possível criar estas situações? A Rússia, em termos de população, nem é um país assim tão grande quanto isso, tem 120 milhões de habitantes, menos que o Brasil. Mas, voltando ao Donald Trump, como é que é possível um homem destes chegar a Presidente dos Estados Unidos? Ainda por cima depois de um bom Presidente, que vai ficar na história, com actos políticos históricos como, por exemplo, a abertura com Cuba.
Andreia Sofia Silva Manchete PolíticaViagens oficiais | Coutinho pede actualização de ajudas de custo O deputado José Pereira Coutinho concorda com as novas exigências para as viagens ao exterior feitas por funcionários públicos, mas defende uma actualização das ajudas de custo. Os valores são os mesmos de há mais de 20 anos [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s funcionários públicos que participam em viagens oficiais ao exterior recebem poucas ajudas de custo quando estão no estrangeiro a representar a RAEM, sobretudo em dias de feriados, o que faz com que tenham de pagar despesas de alimentação e deslocação do seu próprio bolso. A acusação é feita pelo deputado José Pereira Coutinho, também presidente da Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM). Desde 1995 que os valores pagos em termos de ajudas de custo se mantém inalterados. “As ajudas de custo não são actualizadas há cerca de 20 anos. Há funcionários públicos que dizem que, em dias de feriados obrigatórios em que estão a participar em deslocações ao exterior, as ajudas de custo rondam as centenas de patacas, o que é uma miséria. Não se pode considerar que os funcionários públicos são máquinas para uso industrial e merecem a sua dignidade ao nível das ajudas de custo”, disse ao HM. Coutinho não avança valores específicos de actualização das ajudas de custo, mas defende que estas “devem ser actualizadas de acordo com a realidade actual da sociedade”. Segundo o Estatuto dos Trabalhadores da Função Pública, as ajudas de custo variam entre 700 a 1600 patacas por dia, consoante os destinos sejam a China, Hong Kong, Portugal ou outros países. “[Há casos] em que os próprios funcionários públicos têm de pagar do seu bolso quando as ajudas de custo não chegam para suportar as despesas de alimentação. Isto é degradante e desmoraliza os trabalhadores. Tenho recebido queixas de intérpretes que recebem centenas de patacas por dia que não chegam para cobrir as deslocações e alimentação”, acrescentou Coutinho. Informar os media Questionado sobre as novas exigências decretadas pelo Chefe do Executivo acerca das viagens ao exterior, o qual inclui a publicação de relatórios com acesso público, Coutinho fala de um “primeiro passo” em prol da transparência. “É um primeiro passo que deve ser complementado com a publicitação dos relatórios. Quando alguém representa Macau, ou o seu serviço público, os meios de comunicação social devem ter acesso a essas viagens, os seus resultados e o que foi falado fora de Macau sobre determinada matéria. Isso porque é graças ao erário público que essas deslocações são feitas.” O deputado eleito pela via directa afirma que tal medida “faz parte da transparência governativa”, sendo que “esta não se alcança apenas com um passo em frente”. “Vai-se alcançando à medida que o Governo perceba que é preciso dar satisfação às pessoas e explicar melhor este tipo de deslocações. Deve ser feito mais e melhor, porque só explicando por dentro não chega, é necessário explicar por fora. É preciso saber quantas pessoas foram e quais os custos para os cofres públicos.” Coutinho não consegue explicar porque é que só agora é que o Governo adoptou estas medidas, após vários abusos denunciados no passado. “Talvez se deva ao facto do Comissariado da Auditoria (CA) se ter esforçado para que o Governo saiba que tem de prestar contas.” Em Fevereiro de 2011 o CA divulgou um relatório que mostrou os elevados gastos com viagens ao exterior. Ainda Florinda Chan era secretária para a Administração e Justiça quando afirmou que o Governo iria “rever as normas de ajudas de custo de deslocações ao exterior em missão oficial de serviço” e, “antes de concluída a revisão, definir algumas orientações ou critérios, que sirvam para consulta dos serviços” durante as viagens. Foi também nessa altura que foi criado um grupo de trabalho para analisar novas medidas, que entraram em vigor em 2011. A obrigatoriedade da publicação de relatórios é mais uma regra, publicada em despacho do Chefe do Executivo a semana passada.
Angela Ka PolíticaDia Sindical | Ella Lei pede calendário para revisão da lei laboral [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] deputada Ella Lei e vice-secretária geral da Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM) pediu ontem, à margem da cerimónia de celebração do “Dia Sindical 2017” da FAOM, um calendário para a revisão da lei das relações do trabalho, no que diz respeito à compensação dos feriados obrigatórios que se sobrepõem aos dias de folga, bem como a implementação da licença de paternidade. Em declarações ao canal chinês da Rádio Macau, a deputada frisou que a sociedade já mostrou grande vontade quanto a esses aspectos. Para Ella Lei, as reuniões do Conselho Permanente de Concertação Social (CPCS) já mostraram que as partes patronal e laboral já exprimiram plenamente as suas opiniões. “O Governo deve definir já o calendário para impulsionar de forma ordenada os trabalhos de revisão da parte da lei laboral” referiu. “Houve muitos problemas em termos de relações laborais, os quais têm sido adiados por diversas vezes e que não foram resolvidos”, lembrou Ella Lei, tendo dado como exemplo os não residentes que estão em Macau a trabalhar com visto de turista. O Governo havia prometido a entrega do diploma no final do ano passado, mas Ella Lei aponta que a proposta “desapareceu”. “Enquanto não for avançado um calendário só vai continuar a adiar”, acrescentou a deputada. Na última reunião do CPCS, Lei Chan U, ligado à FAOM e representante da parte laboral na entidade, afirmou que seria desejável a implementação de cinco dias de licença de paternidade no sector privado, bem como 90 dias de licença de maternidade. “Estamos a favor de cinco dias úteis, e insistimos porque os funcionários públicos também têm cinco dias de licença de paternidade remunerados. Em Hong Kong serão cinco dias e esta é uma tendência mundial. Quanto à licença de maternidade estamos a favor de 90 dias, porque assim podemos seguir as convenções internacionais, onde se estabelece 98 dias. Devemos seguir o Governo quanto à proposta dos 90 dias, e depois passo a passo chegar aos 98.” Na celebração do “Dia Sindical 2017”, os responsáveis da FAOM anunciaram a realização de mais estudos, seminários e actividades para envolver os associados e promover mais a união no seio da entidade que representa os trabalhadores.
Angela Ka PolíticaAL | Governo justifica atraso em três propostas de lei Lei de bases dos direitos e garantias dos idosos, nova lei de habitação económica e ainda o regime jurídico de formação médica hospitalar. Eis os três diplomas que já deveriam estar no hemiciclo e não estão. À deputada Kwan Tsui Hang, o Governo explica as razões do atraso [dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]as oito propostas de lei que o Governo pretendia apresentar à Assembleia Legislativa (AL) em 2016, apenas cinco foram entregues. Em resposta à interpelação escrita da deputada Kwan Tsui Hang, a Direcção dos Serviços para os Assuntos de Justiça (DSAJ) explica as razões que estiveram por detrás do atraso na entrega do diploma da lei de bases dos direitos e garantias dos idosos e do regime jurídico da formação médica hospitalar. Inclui-se ainda a revisão da lei de habitação económica. Em Novembro do ano passado a deputada, que no hemiciclo representa a Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM), havia criticado o atraso na entrega dos referidos diplomas. Quanto à lei de bases dos direitos e garantias dos idosos, anunciada em 2012, a DSAJ explica que o Conselho Executivo já concluiu a análise ao diploma, tendo sido cumpridos os requisitos para que a proposta seja entregue no hemiciclo. Contudo, “tendo em consideração os factores objectivos dos actuais trabalhos de apreciação da AL e a mudança de legislatura no próximo ano (2017)”, o Governo garante que a nova lei deverá chegar à AL ainda este ano ou no próximo. No que diz respeito ao regime jurídico da formação médica hospitalar, a DSAJ apontou que “foi difícil” entregar o diploma no ano que agora findou, uma vez que está ligada ao regime legal da qualificação e inscrição para o exercício da actividade dos profissionais de saúde. Os Serviços de Saúde terão optado por alterar o processo legislativo ao decidir incorporar os regulamentos da formação médica hospitalar no regime de acreditação. Este último foi tido pela DSAJ como um projecto legislativo com um “conteúdo complicado” e que envolve “regulamentos de vários aspectos”. E as outras? Em relação à revisão da lei de habitação económica, a DSAJ disse não ser possível uma entrega em 2016 pelo facto do Instituto da Habitação (IH) ainda estar a aperfeiçoar o diploma, com base nas opiniões da própria DSAJ. “Tendo em consideração que o Governo poderá, no futuro, resolver os problemas de habitação através de um outro plano de arrendamento público de habitação, e por forma a aumentar a flexibilidade da política, optou-se pela elaboração de um regime básico para o arrendamento das habitações públicas aplicável a todos os tipos de habitação pública, incluindo a habitação social,” explicou o organismo liderado por Liu Dexue. A deputada Kwan Tsui Hang questionou ainda o Governo sobre o progresso da revisão do regulamento dos táxis e do regime jurídico da defesa dos direitos e interesses do consumidor, os quais não foram incluídos no plano legislativo de 2016 e que têm, na sua opinião, sido alvo de atenção por parte da sociedade. A DSAJ garantiu que a revisão do regulamento dos táxis já entrou na fase de aperfeiçoamento final do seu conteúdo, enquanto que a nova lei dos consumidores deverá ser entregue na AL no “momento adequado”. Isto porque a proposta já estará elaborada mas ainda não está concluído todo o processo legislativo. Relativamente ao Regulamento Geral da Construção Urbana e Regulamento de Segurança contra Incêndios, a DSAJ referiu que segundo as informações oferecidas pela Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), é previsto que os diplomas possam entrar no processo legislativo no primeiro trimestre de 2017.
Isabel Castro Manchete SociedadeJustiça | TUI nega residência permanente a criança adoptada Nasceu no território, mas a justiça entende que não tem direito à residência permanente, apesar de ser esse o estatuto dos pais adoptivos. Para o tribunal, conta mais o facto de a mãe biológica não ter, à data do nascimento, direito ao BIR Sónia Chan, Secretária para a Administração e Justiça [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] história tem já alguns anos, mas só agora terminou, com o Tribunal de Última Instância (TUI) a dar razão à Administração. O caso é contado pelo próprio TUI, através de um comunicado que chegou às redacções. A criança no centro da questão nasceu em Macau em 2011. É filho de uma mulher estrangeira, não portuguesa, sem direito de residência no território. Desconhece-se quem seja o pai. O menor acabou por ser adoptado por um casal português, ambos residentes permanentes da RAEM, tendo o processo de adopção sido concluído em 2014. No mesmo ano, em Agosto, o casal requereu à Direcção dos Serviços de Identificação (DSI) a emissão do bilhete de identidade de residente permanente, mas a Administração entendeu que a criança não tinha esse direito. Inconformados com a decisão, os pais recorreram hierarquicamente para a secretária para a Administração e Justiça. A responsável pela tutela assinou por baixo a decisão da DSI. Estávamos já em Janeiro de 2015. O processo passou então para os tribunais: por se tratar de uma decisão de um governante, o casal apelou ao Tribunal de Segunda Instância (TSI), que anulou o despacho, dando assim razão aos recorrentes. Ora, a governante entendeu por bem que a história não deveria ficar por ali e levou o caso ao TUI. Para a secretária para a Administração e Justiça, o menor em causa não deve ter direito à residência permanente porque, à data do nascimento, nenhum dos pais biológicos detinha este estatuto. Além disso, alegou a governante, o argumento de que os pais adoptivos são ambos residentes permanentes também não tem qualquer importância para caso. “Os filhos biológicos não foram equiparados aos filhos adoptivos pela Lei Básica”, cita o comunicado do TUI. Os argumentos do não O tribunal entendeu que a razão está do lado do Governo. Entre outros aspectos, o TUI cita a Lei Básica para explicar que o documento fundamental “atribui direitos de residência com base em vários factores atributivos: a nacionalidade dos interessados (chinesa, portuguesa e todas as outras), o local de nascimento dos interessados, a residência habitual em Macau durante pelo menos sete anos consecutivos e a filiação dos interessados”. No que toca à nacionalidade, a Lei Básica “concede mais vastos direitos de residência permanente aos cidadãos chineses, num segundo patamar aos cidadãos de nacionalidade portuguesa e, num terceiro nível, aos cidadãos de outras nacionalidades”, escreve o TUI. A mesma lógica é aplicada aos filhos de residentes permanentes. O tribunal entende que a interpretação feita tanto pelos pais, como pelo TSI é “absurda”, porque mesmo “os filhos nascidos em Macau dos residentes permanentes chineses (não nascidos em Macau) e portugueses (mesmo que nascidos em Macau), não têm direito à residência permanente se, à data do nascimento, os seus pais não tivessem direito de residência” no território. A importância de como se nasce O TUI acrescenta ainda que, na interpretação da Lei Básica, “o que releva é a filiação biológica”, porque é essa que existe à data do nascimento da criança. “A filiação adoptiva não existe no momento do nascimento. Os cidadãos portugueses, que adoptaram o menor, só são legalmente seus pais a partir da data do trânsito em julgado da sentença que decretou a adopção. À data do nascimento do menor, os seus pais eram os seus pais biológicos”, constata o tribunal. “Nenhuma norma do ordenamento jurídico de Macau permite fazer retroagir os efeitos da adopção ao momento do nascimento, sendo que a adopção dos autos teve lugar mais de três anos depois do nascimento.” Há um aspecto, porém, em que o TUI não dá razão à secretária, sendo que tal não muda, porém, o resultado final: diz a justiça que “é completamente irrelevante discutir a equiparação ou não do estatuto de filho adoptivo ao filho biológico na Lei Básica, porque não é isso que está em causa de acordo com as normas pertinentes”. O tribunal remata dizendo que “se trata de um acto administrativo vinculado, em que a Administração não tem margem de livre apreciação”.