Hoje Macau SociedadeHo Chio Meng | Antigo chefe de gabinete fala sobre viagem à Europa O antigo chefe de gabinete do ex-procurador de Macau confirmou que a viagem de Ho Chio Meng à Europa com familiares, cujas despesas foram pagas pelo Ministério Público, teve o aval de Edmund Ho. [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]ntónio Lai Kin Ian foi ouvido na passada sexta-feira pelo segundo dia na qualidade de testemunha no Tribunal de Última Instância (TUI) no julgamento de Ho Chio Meng, que responde por mais de 1500 crimes, incluindo burla, abuso de poder, branqueamento de capitais e promoção ou fundação de associação criminosa em autoria ou co-autoria com outros nove arguidos (incluindo o seu antigo chefe de gabinete), os quais vão ser julgados num processo conexo a partir do próximo mês. Ho Chio Meng, que liderou o Ministério Público (MP) entre 1999 e 2014, deslocou-se a Copenhaga, no Verão de 2005, para participar na Reunião Anual da Associação Internacional de Procuradores. E, segundo a acusação, aproveitou a oportunidade para usar o erário público para levar familiares, nomeadamente a sua mulher, para realizar viagens privadas na Holanda, Alemanha e nos quatro países nórdicos. “Eu ouvi o conteúdo da conversa. (…) Certas partes, não ouvi tudo”, afirmou António Lai, precisando que foi até ele próprio quem chamou a atenção do seu superior de que era preciso falar com o Chefe do Executivo, Edmund Ho, sobre a viagem à Europa. “Do meu entendimento, o Chefe [do Executivo] sabia que o procurador ia levar a esposa para a reunião e visita aos países nórdicos”, sublinhou, dando conta de que bastava um telefonema, pois o antigo procurador e o ex-líder do Governo tanto comunicavam verbalmente, como por escrito. Versões diferentes O testemunho de António Lai confirma a versão de Ho Chio Meng que anteriormente afirmou ter tido o aval, por telefone, do então Chefe do Executivo. Ho Chio Meng disse também na altura que o convite que lhe foi endereçado pela Associação Internacional de Procuradores abrangia a mulher e fez questão de sublinhar que foi a única vez que levou a mulher consigo durante o período em que foi procurador. Contudo, António Lai respondeu afirmativamente quando questionado relativamente à existência de outras deslocações em que Ho se fez acompanhar por familiares, mas não soube especificar quantas vezes tal sucedeu. Sobre quem arcou com esses gastos, o ex-chefe de gabinete afirmou: “Do meu conhecimento, as coisas ligadas a missões oficiais foram pagas pelo MP”. Um documento exibido em tribunal sobre a referida viagem à Europa incluía cinco nomes: o de Ho Chio Meng, o da sua mulher, Chao Siu Fu, do sobrinho Ieong Chon Kit (que o antigo procurador afirmou ser menor e cujas despesas garantiu ter pagado, pelo menos parcialmente), bem como o de Lee Kin Kei – funcionário do MP e também sobrinho de Ho Chio Meng – e o do seu cunhado Zhou Wen Sheng. No encontro na Dinamarca participaram outros membros do MP, nomeadamente magistrados, mas que não partiram na mesma data para a Europa e essas viagens não foram organizadas pela mesma empresa, mostrando dois tratamentos para a mesma reunião. António Lai explicou que “essa situação existia”, revelando que, quando foi criado o grupo de administração geral, Ho Chio Meng deu a “indicação” para que em “tudo o que tivesse que ver com deslocações ao estrangeiro ou missões de serviço [dele] não se identificar os nomes das pessoas”, embora não se recorde quando foi dada a referida instrução. “Acho que era por ser confidencial”, afirmou António Lai. Por causa das despesas de viagem para indivíduos não pertencentes ao MP, envolvendo mais de 227 mil patacas, o antigo procurador responde por um crime de valor consideravelmente elevado ou um crime de abuso de poder. O julgamento continua hoje.
Hoje Macau SociedadeMulher com vírus de gripe das aves afinal não está infectada [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] mulher de 72 anos que na quinta-feira que teve um resultado positivo para H7N9, tornando-se no primeiro caso importado de infecção humana com o vírus da gripe aviária em Macau, já não está infectada. Segundo os Serviços de Saúde, os resultados dos exames realizados este sábado à paciente, internada sob regime de isolamento, nomeadamente das amostras recolhidas da faringe, sangue e urina, “revelaram-se negativos à presença do vírus de gripe aviária H7N9”. A mulher é de Macau, mas reside na China, onde cria galinhas e fez compras em mercados de aves. Por ter sido diagnosticada com pneumonia, a idosa ficou em isolamento. Já na quinta-feira, os Serviços de Saúde indicavam que, apesar de o primeiro resultado do teste ao vírus H7N9 ter sido positivo, o segundo foi negativo. Nesse dia, os Serviços de Saúde deram conta que, no total, desde que entrou em Macau, a idosa teve contacto com 43 pessoas, incluindo 32 profissionais de saúde, quatro doentes, quatro bombeiros e três familiares, dois dos quais residentes na região, em acompanhamento. Considerava-se que o risco de contágio não era elevado porque “a infecção de aves para humanos é mais alta do que entre humanos no vírus H7N9”, além de que a doente foi transportada imediatamente para o hospital, explicou na altura o director dos Serviços de Saúde, Lei Chin Ion. A mulher, que também sofre de diabetes e hipertensão, foi trazida por via terrestre por familiares para Macau na terça-feira, depois de ter sido hospitalizada no interior da China no domingo e de ter tido alta na segunda-feira, explicaram as autoridades de saúde aos jornalistas. À entrada em Macau, a mulher não apresentava febre, mas foi chamada uma ambulância que a transportou desde o posto fronteiriço das Portas do Cerco, explicaram. Em Dezembro, um homem de 58 anos residente no local e dono de uma banca de venda de aves por grosso, foi diagnosticado com H7N9, sendo, de acordo com os Serviços de Saúde, o primeiro caso de uma infecção de gripe aviária em humanos em Macau. Este caso levou ao abate pelas autoridades de Macau de cerca de 10 mil aves de capoeira e à suspensão da sua venda por três dias depois de detectarem o vírus da gripe aviária no mercado abastecedor. O vírus foi detectado num ‘stock’ de 500 galinhas sedosas, mas por motivos de segurança foram abatidas todas as aves que se encontravam no mercado abastecedor, incluindo 6.730 galinhas normais e cerca de 3.000 pombos, segundo o Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais. Esta foi pelo menos a terceira vez em 2016 que o vírus da gripe aviária foi detectado em Macau.
Hoje Macau SociedadeEmpresa do Hotel New Century não desiste da licença [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Direcção dos Serviços de Turismo (DST) anunciou o cancelamento da licença do Hotel Palácio Imperial Beijing, antigo New Century, a pedido do detentor da mesma. Contudo, em comunicado, a empresa responsável pelo empreendimento, a Empresa Hoteleira de Macau Limitada, confirma que irá pedir uma nova licença de operação do espaço hoteleiro à DST, assim que todos os problemas forem resolvidos. “Temos planos para desenvolver, renovar e voltar a pedir a licença de operação do hotel assim que as irregularidades causadas pela antiga direcção da empresa forem rectificadas e assim que tudo esteja em conformidade. A nova direcção da empresa está empenhada em manter uma relação profissional com a DST e todas as entidades reguladoras”, lê-se no comunicado. O mesmo documento explica todos os problemas que a empresa tem vindo a enfrentar nos últimos meses. “A Macau Hotel Developers Limited, liderada por Ng Man Sun, criou equipas de engenheiros e pediu uma licença de trabalho à Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes por forma a permitir a remoção de estruturas ilegais que neste momento estão a sobrecarregar o hotel e também para outros trabalhos de remodelação. Contudo, como resultado de severas e problemáticas irregularidades causadas por e herdadas de Chen Mei Huan e Xu Jiaoji (antigos gestores), as licenças de trabalho estão ainda sob análise e com a aprovação pendente.” Para além disso, “as autoridades levantaram preocupações quanto à posse da propriedade do terreno do hotel”. “Tendo em conta o iminente fim do prazo do fecho temporário do empreendimento, a 22 de Janeiro, e a inviabilidade dos trabalhos de renovação serem concluídos antes da aprovação das licenças de trabalho, a Macau Hotel Developers Limited vê-se forçada a retirar o pedido de licença junto da DST”, afirma a empresa. A DST determinou a 22 de Julho o encerramento provisório do hotel de cinco estrelas – um facto que sucedeu pela primeira vez no território – “por graves infracções administrativas, ameaça da segurança pública e da imagem da indústria turística”, uma medida com a duração de seis meses, que previa a possibilidade de reabertura no fim do prazo no caso de corrigidas as irregularidades. Contudo, na quinta-feira, a DST recebeu uma carta do detentor da licença do hotel – a Empresa Hoteleira de Macau Limitada – a solicitar o cancelamento da mesma, pelo que, no dia seguinte, a directora dos Serviços de Turismo, Helena de Senna Fernandes, emitiu um despacho para o cancelamento da licença do hotel, “ficando assim sem efeito os procedimentos de encerramento aplicados ao estabelecimento”. Desde 2014 até Julho de 2016, foram abertos procedimentos sancionatórios e aplicadas multas com um valor global de 55.570 patacas, segundo indicou Helena Senna Fernandes. O hotel abriu portas em 1992 sob o nome de New Century, tendo sido alterado, em 2013, para Hotel Palácio Imperial Beijing. O hotel tem estado envolvido numa série de problemas, desde conflitos laborais a outras disputas que chegaram aos tribunais.
Sofia Margarida Mota EventosMoçambique | Ciclo de cinema na FRC para dar a conhecer o país real O cinema moçambicano vai estar em destaque do dia 21 a 26 na Fundação Rui Cunha. A iniciativa é organizada pela Associação dos Amigos de Moçambique. A ideia é permitir a quem vive cá conhecer o cinema e a cultura daquele país [dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ão cinco os filmes que vão integrar a terceira edição do ciclo de cinema feito em Moçambique. O evento tem lugar entre 21 e 26 deste mês no auditório da Fundação Rui Cunha e no cartaz traz quatro filmes de Licínio Azevedo e um da realizadora Teresa Prata. “Não podemos chamar a iniciativa de festival”, disse ao HM Helena Brandão, “porque não é uma coisa grande”. Para a responsável pela Associação dos Amigos de Moçambique, entidade organizadora, esta é antes “uma forma de alargar as actividades de forma sustentável”. “O dinheiro não é muito e fazemos o que podemos”, explicou. A iniciativa teve a primeira edição em 2012 e a ideia de projectar filmes surgiu como sendo a mais viável, de modo a que possam ser levadas a cabo outras actividades além da semana gastronómica. Para a organizadora, “basta ter cerca de 15 pessoas a assistir que podemos considerar um sucesso”. Mas certo é que a adesão tem vindo a crescer a cada edição. A ideia é mostrar à população de Macau um pouco mais da cultura moçambicana. Vasta e diversificada, Helena Brandão lamenta que não seja possível trazer mais actividades. “Gostava muito de ter cá teatro, que é uma área de relevo em Moçambique, mas é difícil trazer os actores, é muito dispendioso.” Com empenho, a associação consegue trazer, mais uma vez a Macau, o realizador Licínio Azevedo. Brasileiro de origem, Licínio Azevedo está radicado em Moçambique há mais de 40 anos e é hoje uma das maiores referências da sétima arte do país. O reconhecimento internacional aconteceu no âmbito do programa “Open Doors” do Festival de Cinema de Locarno, com o destaque que foi dado a “Comboio de Sal e Açúcar”. A película conta a história de um comboio e dos seus passageiros, que embarcam numa viagem perigosa durante a guerra civil moçambicana. Quatro histórias Do cineasta serão exibidos em Macau “A Ponte”, “Ferro em Brasa”, “A Ilha dos Espíritos” e “Desobediência”. “A Ponte” é a história do esforço colectivo para fazer uma travessia. De acordo com a apresentação da película, na estação das chuvas os rios enchem, e Chimanimami, uma das mais bonitas regiões de Moçambique, fica isolada do resto do país. No entanto, com a intenção de criar ali uma reserva natural, cuja principal atracção é o Monte Binga, o ponto mais alto de Moçambique, é necessário construir uma ponte e é a aldeia que se une para contribuir para a concretização do projecto. Um documentário sobre o fotojornalista Ricardo Rangel é a proposta de “Ferro em Brasa”. O fotógrafo, de 80 anos, é o símbolo vivo da geração que, no fim dos anos 40, iniciou as primeiras denúncias contra a situação colonial. Enquanto fotografava a cidade dos colonos, “Ricardo revelava a desumanidade e a crueldade do colonialismo”, lê-se na mesma apresentação. Desde então, e até ao fim da guerra civil pós-independência, o protagonista fotografou 60 anos da história de Moçambique. Neste filme, o fotógrafo conduz o público pela sua vida e obra, onde a cidade de Maputo, a boémia e o jazz têm um lugar especial. Também em formato documental é “A Ilha dos Espíritos”. Muito antes de dar nome ao país, a ilha de Moçambique teve um papel fundamental no Oceano Índico. “Foi um ponto de paragem de caravelas, de encontro de piratas, lugar de mistura de raças.” Os seus habitantes, orgulhosos do passado glorioso da ilha, são aqui personagens excêntricas que deambulam pelas ruas. Ainda de Licínio Azevedo é “A Desobediência”. Um filme real interpretado pelos protagonistas da história que conta. A película documenta a saga de Rosa, uma camponesa moçambicana que é acusada pela família do marido de ser a causadora do seu suicídio, por se recusar a obedecer-lhe. Para provar a inocência, e recuperar os filhos e os poucos bens que o casal possuía, Rosa submete-se a dois julgamentos: o primeiro num curandeiro e o segundo num tribunal. É absolvida em ambos. Durante a filmagem, o realizador decidiu instalar uma segunda câmara para seguir a história até ao fim. Segundo a apresentação da película, “uma montagem desta complexidade não tem paralelo no cinema africano.” Todas as projecções contam com a presença de Licínio Azevedo, que vai estar em Macau para falar não só dos filmes que faz, mas também da situação actual do país onde vive, do cinema que por lá existe e da cultura que o acolhe. A vida na tela Realizado por Teresa Prata é “Terra Sonâmbula”, uma longa-metragem premiada. Entre outras distinções, ganhou, em 2008, o FIPRESCI do International Film Festival Kerala, na Índia. O filme conta a história do velho Tuahir que encontrou Muidinga ainda com vida enquanto ajudava a enterrar crianças assassinadas numa aldeia. Tuahir cuidou da criança e viajou com ela para fugir da guerra. Cansados e com fome, encontraram um autocarro atacado pouco tempo antes, onde descobriram um diário. O achado leva as personagens à história de Kindzu, um jovem que teve a família assassinada e que estava em viagem à procura de uma criança. De acordo com a organização, “com o correr dos anos o cinema moçambicano ganhou experiência, tornou-se maduro e hoje, ainda sem actores profissionais, mais do que cinema político, conta histórias de factos como o drama humano, em histórias de ficção baseadas em factos reais, e é um cinema que, acima de tudo, revela a sociedade moçambicana pós-colonial e as suas contradições”.
Hoje Macau China / ÁsiaPequim reitera a Trump que política ‘Uma só China’ é inegociável [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Governo chinês reiterou que a política ‘Uma só China’ é “inegociável”, depois de o Presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, voltar a ameaçar que não a respeitará se Pequim não aceitar negociar os laços comerciais bilaterais. “Instamos os Estados Unidos a darem-se conta da elevada sensibilidade da questão taiwanesa e a respeitarem os compromissos tomados pelos anteriores governos norte-americanos”, assinalou o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros em comunicado citado pela agência oficial Xinhua. O Governo da China é o único com legitimidade para representar essa nação, algo que é “reconhecido internacionalmente e que ninguém pode mudar”, sublinhou a fonte. Trump deu a entender, na sexta-feira, numa entrevista ao jornal Wall Street Journal, que não respeitará o princípio de ‘Uma só China’, que implica não reconhecer Taiwan como um Estado, a menos que Pequim altere práticas comerciais e políticas monetárias que considera prejudiciais aos Estados Unidos. “Tudo está em negociação, incluindo o princípio de ‘Uma só China’”, sublinhou Trump, algo que já tinha dito em Dezembro durante uma entrevista à televisão Fox News, e que também despertou críticas e preocupação de Pequim. A China obriga todos os países com quem mantém laços diplomáticos a respeitarem esse princípio, segundo o qual o Governo de Taiwan – nascido do exílio da ilha na guerra civil entre comunistas e nacionalistas – não é legítimo e não é possível ter laços diplomáticos oficiais com ele. Trump, que em Novembro aceitou uma chamada telefónica da Presidente taiwanesa, Tsai Ying-wen, um gesto que também foi condenado pelo regime comunista chinês, tem mostrado, desde a sua vitória eleitoral, que pretende ter uma política dura face à China, tanto em termos políticos como comerciais. Os meios de comunicação oficiais chineses alertaram na semana passada que os Estados Unidos caminham para um “confronto devastador”, levantando até a hipótese de um conflito bélico, incluindo nuclear, entre as duas maiores economias mundiais, caso as ameaças de Trump se materializarem.
Hoje Macau DesportoQi Chen, o pioneiro do investimento chinês no futebol em Portugal [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] empresário Qi Chen é o rosto dominante do investimento da China no futebol em Portugal, com ligações a vários clubes nacionais em nome do objectivo de promover o desenvolvimento dos jovens futebolistas chineses. Pinhalnovense e Torreense são desde 2015 pontos de passagem obrigatórios no projecto deste investidor, nos quais figuram vários jogadores oriundos do seu país, entre os 18 e os 21 anos. Porém, a ligação a Portugal começou a ser trilhada em 2006, quando intermediou a transferência para o Benfica de Yu Dabao, hoje com 28 anos, a jogar no Beijing Guoan. Pelo caminho registou-se ainda a criação, em 2011, do Oriental Dragon FC, um clube só com jovens jogadores chineses entre os 15 e os 18 anos, bem como a Future Stars Football League, uma prova que acolhia este emblema e equipas dos escalões de formação de Vitória de Setúbal e Belenenses, entre outros. Tudo sob o patrocínio da WSports Seven, a empresa de Qi Chen. Em entrevista à Lusa, Qi Chen explicou que o clube da Margem Sul “foi uma oportunidade que surgiu” para reforçar a sua aposta em Portugal, num investimento que quer juntar a componente desportiva à vertente de “formação dos jogadores chineses”. “O objectivo para o clube é obter bons resultados. O objectivo para os jogadores chineses é eles poderem dar valor a esta plataforma e às condições que lhes estão a ser proporcionadas, aprendendo mais acerca do futebol em Portugal, da atitude profissional nos jogos e nos treinos, e que possam depois levar melhores ensinamentos para a China”, referiu. Sem querer quantificar os montantes já investidos desde que iniciou este projecto em Portugal, o empresário asiático assumiu que já gastou “algum dinheiro”, mas que contribuiu também para ajudar “clubes em dificuldades e receptivos a investimento estrangeiro”. “Aproveitei a oportunidade para poder dar continuidade ao projecto de formação dos nossos jovens. Não tem sido fácil. Tivemos vários obstáculos, como os problemas de comunicação e as diferenças culturais. Tudo isso foi causando contratempos ao longo dos anos. Neste caso, acho que mesmo assim tem valido a pena, porque já conseguimos que alguns jogadores do nosso projecto seguissem para grandes clubes na China”, acrescentou. A ambição da China de se tornar uma potência do futebol nas próximas décadas está ainda a dar os primeiros passos. Mas, se o recrutamento de grandes jogadores já se verifica, a colocação de futebolistas chineses em clubes europeus de relevo está por materializar. Porém, isso não é ainda uma prioridade, como revelou Qi Chen, quando questionado sobre a carreira destes jovens. “Tudo depende do jogador e do nível a que consegue chegar aqui em Portugal. Se conseguirem chegar a um patamar superior, a situação ideal seria uma transição para uma equipa da I ou II Liga aqui em Portugal ou para um outro clube europeu. Se chegarem ao limite da idade e não tiverem o nível que é esperado neles, terão de regressar à China e jogar na primeira ou segunda divisão chinesas”, sublinha. Depois da investida deste empresário no futebol português, já outros compatriotas lhe seguiram as pisadas, sendo disso exemplo o patrocínio da II Liga de futebol pela empresa Ledman. Todavia, Qi Chen acredita que ainda há espaço e oportunidades no futebol em Portugal para mais investimento chineses. “Desde que comecei a investir aqui em Portugal já atraí muitas atenções de clubes e investidores do futebol chinês e isso é sempre um cartão de boas vindas para outros investidores começarem a apostar no futebol português”, concluiu. Um jogador e um sonho A comunicação entre chineses e portugueses é apontada por todos como a maior barreira, mas um dos jovens já deu esse ‘grande salto em frente’. Lingfeng, de 19 anos, passou na época passada pelos escalões de formação do Sporting e, além do talento nos relvados, consegue já expressar-se em língua portuguesa. “O português é muito diferente do chinês”, começa por dizer o jovem médio, explicando também as profundas diferenças que encontrou dentro das quatro linhas: “É mais difícil jogar aqui em Portugal. Os jogos têm mais intensidade e também temos mais encontros do que na China. Aqui é tudo muito mais táctico do que aquilo que tínhamos no nosso país”. Cumprir uma carreira no futebol europeu é o “sonho” de Lingfeng, mas, para que tal se concretize, o jogador espera seguir as instruções de Qi Chen. “Pediu-nos para ajudar a equipa, para darmos o nosso melhor e que tínhamos de trabalhar muito para jogar. A adaptação não foi muito fácil, mas gosto muito desta equipa. Este clube é grande e tem muita história”, admitiu o médio. Shiao Wei, o chinês que não quer regressar O avançado do Leixões Shiao Wei é o futebolista chinês mais utilizado pelos clubes das Ligas profissionais portuguesas e assume o objectivo de prosseguir a carreira na Europa, em detrimento do regresso ao seu país. Shiao Wei, de 21 anos, cresceu a sonhar com as Liga inglesa e espanhola, mas agora quer afirmar-se no Leixões e chegar à I Liga, preferindo a “qualidade do futebol europeu” ao “muito dinheiro” na Liga chinesa. Wei tem sido um raro caso de sucesso entre os seis jogadores chineses a alinhar nas competições profissionais em Portugal, somando 65% de utilização pelo Leixões na II Liga, Taça da Liga e Taça de Portugal. O avançado chegou ao futebol português em 2013/14, para representar os juniores do Boavista, período que em entrevista à agência Lusa, Wei recordou como tendo sido “muito difícil”. “No primeiro ano, nos juniores, apenas joguei meia época. O futebol português não é diferente do chinês mas foi mais difícil para mim porque era o único jogador chinês e não falava português”, explicou o internacional nos escalões de formação. Oriundo de um país onde não há campeonatos de formação, Wei encarou a vinda para Portugal como uma ponte “para jogar na Europa” e os esforços de adaptação são visíveis, exprimindo-se com algum desembaraço na língua portuguesa. “Queria jogar aqui, ser melhor jogador. A China tem muito dinheiro, mas eu gosto mais deste futebol”, confessou o avançado que soma 17 jogos pelo Leixões esta época, 12 deles na II Liga. Wei explicou depois a ambição dos jovens chineses que sonham um dia afirmar-se pela via do futebol, confirmando que também os chineses são bem pagos no seu país. “A nós também pagam muito dinheiro, todos os clubes. Há aqui muitos jogadores jovens que vem para cá aprender e depois voltam para lá, onde é fácil ganhar dinheiro”, disse. Wei jogou oito anos no Shandong Luneng e reafirma que agora quer é jogar no futebol europeu. “Eu não quero voltar para a China. Fui internacional sub-15, sub-16, sub-21 e sub-23 mas eu quero é jogar na I Liga. Antes de vir para cá queria jogar em Inglaterra ou em Espanha, mas agora tenho 21 anos, já não sou muito novo, e quero jogar no Leixões e depois na I Liga”, garantiu Wei, autor do golo da última vitória do clube de Matosinhos na II Liga, diante do Penafiel (2-1), no minuto 90+3. Afirmando sentir no futebol nacional “muito melhor do que se estivesse na China”, Wei não escondeu a preferência quando instado a dizer em que posição gosta de jogar. “Sinto-me bem a jogar a ponta de lança, foi assim quando cheguei ao Boavista. Nos seniores também joguei nessa posição ou a extremo, mas gosto é de jogar a ponta de lança”, assegurou. Com mais um ano e meio de contrato com o Leixões, Wei não hesitou quando convidado a desvendar qual é o seu ídolo, respondendo Cristiano Ronaldo.
Amélia Vieira h | Artes, Letras e IdeiasO tempo dos assassinos [dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]m Outubro de 1955, no centenário de Rimbaud, Henry Miller dá a conhecer a sua obra mais tocante acerca do até aí seu desconhecido Arthur Rimbaud, « O Tempo dos Assassinos». Ele afirma tratar-se de uma tentativa falhada de não poder tido traduzir «Une Saison en Enfer». Rimbaud foi um prodígio de linguagem, de produção de signos linguísticos, de inventividade, de construção, apanágio sem dúvida da sua radical dimensão poética. Estes atributos vieram a ser para todos os poetas do século XX uma referência, um mistério, também uma fonte de inspiração que não se esgota, ele é quase uma voz telepática… um arauto… uma sinfonia perfeita na composição do verbo. Mas este Rimbaud, corolário de uma peça que faltava na destreza da estrutura poética, foi sempre a meus olhos o eterno fugitivo, parecendo ter-se soltado de um raio cintilante que tombara sem que fosse muito consequente ou pródigo na sua defesa. Aconteceu-lhe aquilo, talvez fulminantemente, e hoje, é ainda nas suas brasas que vamos analisar o mistério de se ser Rimbaud. Olho-o insolente, carente, agarrado a Verlaine para o torturar com a sua audácia, inseguro, ciumento, implorativo, provocando à escravidão aquele que amava e lhe fugia num labirinto de emoções desencontradas; e Verlaine, não menos saciado da sua própria fúria, salvaguardava para si a sua mais preciosa metade. Vejo-os ensinando, compilando, traduzindo, rindo, comentando, bebendo, saindo e, por fim, dilacerados de caos e talvez de fome, gritando. Vejo-o a fugir da morte como de um parente querido, a atirar-se a ela como um amante em fúria… A sua obra tinha terminado. Há tiros certeiros. Continuou, mas já nas “saisons” dos seus infernos. Rimbaud partiu e nessa fuga estava encerrada o ciclo do tempo criador, do amigo/inimigo que nenhum lugar do mundo voltaria a devolver, o seu par, e sem ele não há projectos: há fugas e para fugir continua uma estranha noção de caminho. Ninguém vai ser feliz em lado algum se o laço da revelação foi quebrado, nem creio que essas noções o inquietassem. Uma coisa é uma relação, outra é esta “coisa” que está muito para fora desse âmbito — o encontro — e sem o nosso par do destino não há futuros premeditados, ele far-se-á andando na fuga. Verlaine chorou esta ausência, ele que o desejou matar, foi aquele (e só ele o poderia fazer) que mais tarde, quando finalmente a morte veio, lhe reúne a obra, compila e publica. Ficara cá para acabar o que juntos não lhes foi possível concluir e no seu eterno cachecol vermelho suado, sugado, sujo, ele terá certamente entornado mais vinho, mais lágrimas, até ficar sevado de emocionante maravilha. Na sua redenção final, ele, que tinha o pódio do poeta da época, vai servir a quem o vencera, aquele que encarnou a linguagem fazendo quase tudo o que se pode fazer com ela. “Quando deixam os anjos de se parecer consigo próprios?”, pergunta Henry Miller pois que nunca tinha assistido a um espírito mais recalcitrante. Miller, que reflecte aqui o seu “plexus” de um sentido refinadíssimo da compreensão das componentes poéticas, pegando ao colo este ser que queima e aguentando-o numa magistral análise que nos faz esquecer o estereótipo que dele guardam alguns, faz-nos reflectir. Nós ficamos doentes. Parece que encolhemos ao lado deles… que nos roubaram o fígado, a alma, os dotes, que a ave devorou as entranhas do nosso génio criador, parece que as coisas que fazemos se volatizam, ridicularizam… Nada a obstar à liberdade de tais seres que deitaram fora tudo aquilo de que os outros andam atrás, rastejando. E esta fuga vai encontrar Rimbaud não num oásis de predestinados, mas na maior das devastações, e diz Miller: «não se pode imaginar o lugar: não há uma árvore, nem sequer ressequida, não há um tufo de erva. Era a cratera de um antigo vulcão extinto onde um dos lados impediam o ar de entrar. Quer ser independente… como é que um homem de génio consegue enfiar-se num buraco onde vai assar, encarquilhar? Tem de novo medo de ser rejeitado e que o considerem inútil no mundo.» Não por acaso eles se encontram aqui: são duas personalidades escatológicas, cada uma à sua maneira. Mas há nele, sempre, uma recusa sombria na maturação, definindo-o como o agente do gesto supremo duma juventude triunfante. E assegura que lhe foi dado o privilégio de ver com o olho direito e com o esquerdo, metaforicamente, os olhos da alma. Ele permanecerá sempre marginal e mais desejoso de calcar o mundo de que o conquistar. Creio mesmo que a sua permanência na fonte da criatividade é uma antecipação magnética, telepática, da noção de uma linguagem futura… pois é Miller que acrescentado o diz: o futuro sempre pertenceu e há-de pertencer sempre…. ao poeta: e é tão surpreendente a forma como o reflecte que afirma: «em minha opinião, não existe qualquer discrepância entre a visão que ele tinha do mundo e da vida dos grandes inovadores religiosos. Nós que exortamos coisas sem nexo, perdemos o grande fio condutor daquelas que restam como códigos imperecíveis. » Creio que o título desta obra encerra toda a substância de uma deriva do mundo pela morte, morte essa, consubstanciada na vida de um poeta para quem os agentes sociais são meros assassinos. Assassinos sem mérito, dado que não há noção aparente dessa condição, assassino potencial seria mais Verlaine, pois eles partilhavam da fonte da criação e só esses têm essa inteira legitimidade, assim, uns assassinos obscuros, dementes, impróprios até para tais limites, a intransponível marca da besta que no Homem dorme como uma molécula parada. E também estou certa que ele mesmo, Miller, fez a sua prova de fogo a sua catarse na escrita desta natureza, pois todo o amor requer simpatia. E acrescenta o fundo empático e complementar: “Rimbaud restaurou a literatura convertendo-a em vida; eu esforcei-me por restaurar a vida restaurando-a em literatura.” Eles não pertenciam a sítio nenhum e há mãos que quando se apertam dão laços tais que não usamos contemplar a curva de cada uma. Paralelismos sem dúvida “assassinos” mais ainda e transfigura-se sempre o “amador na coisa amada”. E há ainda aquela mãe. E há os Natais. E o que há mais? Mais nada nesta fronteira onde sem dúvida será preciso fugir nem que seja para a cratera de um antigo vulcão já morto. “Começamos finalmente a compreender até que ponto é pouco moderna esta nossa alardeada era de ‘modernidade’. Quanto aos espíritos verdadeiramente modernos, fizemos o melhor que podíamos para os exterminar. E, de facto, os seus desejos mais profundos parecem-nos hoje românticos: é que falavam a linguagem da alma. Hoje falamos uma língua morta, e cada um de nós a sua. Acabou a comunicação; só nos falta entregar o cadáver.” A chave que fecha todos os Assassinos do outro lado onde moram. Aqui começa o dia. A quatre heures du matin, l´été, Le sommeil d´amour dure encore. Sous les bosquets l´aube évapore L´odeur du soir fêté. Mais là-bas dans l´immense chantier vers le soleil des Hespérides, En bras de chemise, les charpentiers. Déjà s´agitent. Ah! pour ses Ouvriers charmants Sujets d´un roi de Babylonne, Dont l´âme est en couronne. O Reine des Bergers! Porte aux travailleurs l´eau-de-vie. Pour que leurs forces soient en paix. En attendant le bain dans la mer, à midi.
Jorge Rodrigues Simão Perspectivas VozesA China empresarial “President Xi Jinping emphasized that innovation; economic restructuring and consumption should be among the top priorities of China’s next stage of growth (the 13th Five-Year Plan for 2016–2020). The “Internet Plus” action plan seeks to drive economic growth by integration of internet technologies with manufacturing and business.” “China’s Mobile Economy: Opportunities in the Largest and Fastest Information Consumption Boom” – Winston Ma, Xiaodong Lee and Dominic Barton [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] crescimento da economia chinesa parecia imparável. O antigo modelo de crescimento, que depende fortemente do planeamento estadual e de um imenso investimento em infra-estruturas e propriedades, prospera com um uso maciço de crédito fornecido pelo sistema financeiro dominado pelo Estado, que se está a esgotar a todo o vapor. O sucesso da transformação económica da China depende da capacidade de correcção das suas instituições. Muito pode ser alcançado se forem retiradas as lições correctas do passado recente, que permitiu o inigualável sucesso económico da China, e principiar o trabalho de fazer face aos problemas estruturais que têm algemado o espírito empreendedor do povo chinês. Apesar de todas as suspeitas que muitos analistas levantam sobre a economia chinesa, a imagem não é de pesar, antes pelo contrário, havendo muitas razões para ser confiante. Embora a taxa de crescimento anual do PIB tenha caído para menos de 7 por cento, ainda representa maior produção económica do que os 14 por cento de 2007, simplesmente, porque a economia se tornou muito maior, e ao longo do tempo, temos observado o surgimento de novos tipos de empresas na China. Os altamente disruptivos são os que mais agressivamente usam novas tecnologias, como a Internet móvel para desafiar operadores ineficientes, são globais em visão, mais dispostos a assumir riscos, e mais qualificados na administração do mercado de capitais, podendo aproveitar ao máximo as potencialidades da nova tecnologia e fornecer não só melhores produtos de fabrico, mas também serviços de qualidade cada vez mais sofisticados, sendo a esperança das grandes empresas da China. As pessoas estão curiosas em saber como se explica o crescimento da economia chinesa e a forma como tal aumento implicou para o resto do mundo. O surgimento da economia chinesa decorreu do espírito empreendedor dos executivos e fundadores corporativos que tinham sido incentivados e libertos devido à reforma da China e às políticas de abertura. As suas histórias de sucesso e fracasso tornaram-se gradualmente assuntos de pesquisa de negócios e matéria de casos usados no ensino das escolas de negócios, e instrução de empresários e líderes de negócios pelo mundo. Após três décadas e meia de desenvolvimento económico, a China transformou-se de um país empobrecido na segunda maior economia do mundo. O pesquisador do Instituto de Tecnologia Computacional da Academia Chinesa de Ciências (CAS), Liu Chuanzhi, em 1984, decidiu aventurar-se no mundo dos negócios e com a ajuda de dez outros colegas, criou uma empresa de tecnologia em Zhongguancun, um distrito onde a maioria dos institutos nacionais de pesquisa estão localizados, tendo conseguido juntar RMB 200.000 como investimento inicial. O objectivo de Liu era humilde, pois tratava-se de desenvolver um sistema para acelerar a digitação de caracteres chineses em computadores e, se possível, ganhar algum dinheiro, e provavelmente estava além dos sonhos mais loucos de Liu, pensar que a sua pequena empresa se tornaria em uma das empresas de tecnologia mais bem sucedidas da China. A empresa, mais tarde conhecida como Lenovo, foi classificada como a 231.ª maior empresa do mundo em vendas pela revista Fortune, em 2015. Liu não só se orgulha da maior quota de mercado de computadores do mundo, mas também desenvolveu uma base sólida em áreas como smartphones, tablets, megadados, computação em nuvem, private equity, venture capital investment e agricultura. A Lenovo era uma empresa totalmente doméstica, antes da aquisição da unidade de computadores da IBM, em 2005. A partir de 2015, os activos e as vendas no exterior ultrapassaram 50 por cento, e os executivos não chineses representam mais da metade dos executivos seniores da Lenovo. A Lenovo tem sido amplamente vista como a empresa mais orientada para o mercado e a mais internacional da China. Em 1980, Ren Zhengfei, um ex-oficial do exército, mudou-se para Shenzhen para tentar a sua sorte. Após algumas tentativas fracassadas, fundou a Huawai Technologies, em 1988. Em menos de trinta anos, a Huawai tornou-se a fornecedora e líder mundial de equipamentos de informação e telecomunicações, exportando produtos e serviços para mais de cento e cinquenta países. As vendas totais da Huawei, em 2014, ultrapassaram duzentos e oitenta e oito mil milhões de RMB, e o seu lucro líquido foi de cerca de vinte e oito mil milhões de RMB. A Huawei tem vendas significativamente maiores do que os campeões tradicionais neste campo, como a Ericsson, Alcatel-Lucent e Siemens. A Huawei é também o terceiro maior produtor de smartphones do mundo, com mais de 9 por cento da participação no mercado mundial, desde do terceiro trimestre de 2015. A Sany Group, empresa sediada em Changsha, capital da província de Hunan, anunciou em 20 de Janeiro de 2012, a aquisição da Putzmeister, fabricante alemão de máquinas de engenharia e gigante industrial. Quando Liang Wengen fundou a Sany em 1994, possuir o “elefante” (apelido de Putzmeister) era apenas um sonho. A Sany, em menos de 20 anos, possuía o “elefante”, e também obteve acesso às tecnologias de ponta e canais de distribuição da Putzmeister em todo o mundo. O maior processador de carne da China, a Shuanghui International Holdings Ltd., em Maio de 2013, firmou um acordo de 4,7 mil milhões de dólares para adquirir a Smithfield Foods Inc., dos Estados Unidos. O negócio marcou a maior aquisição de uma empresa americana por uma empresa chinesa. A Smithfield Foods Inc. foi criada em 1936, juntamente com outras quatro empresas, e controla 73 por cento da indústria de transformação de carne de porco dos Estados Unidos. Enquanto a receita de Shuanghui foi de 39,7 mil milhões de RMB, em 2012, a Smithfield referiu uma receita duas vezes maior que o da Shuanghui, de aproximadamente de 80,3 mil milhões de RMB, em 2012. A aquisição aumentou significativamente a escala global em negócios da Shuanghui, estabelecendo uma base sólida para a sua Oferta Pública Inicial (OPI), em Hong Kong. A procura por carne de porco continua a aumentar na China, estando a Shuanghui a emergir como um império porcino. O empresário Lei Jun, em um pequeno escritório alugado em Pequim, juntamente com os seus seis parceiros, em Abril de 2010, anunciou a fundação de Xiaomi.com. Lei Jun tinha sido um empresário de sucesso antes de fundar a Xiaomi.com e levou a Kingsoft, uma empresa de desenvolvimento de software, para o estatuto de OPI. Fundou também, a Joyo, uma plataforma de comércio electrónico que foi adquirida pela Amazon. O fundador da Xiaomi.com, estava predestinado a entrar no mercado de smartphones high-end. A Xiaomi.com, um ano mais tarde, lançou o seu telefone de primeira geração com um preço de retalho de 1999 RMB. Tendo por base as vendas na Internet e o marketing de boca-a-boca, as vendas de Xiaomi.com aumentaram rapidamente, vendendo mais de sessenta milhões de aparelhos em 2014, e tornando-se o sexto maior produtor mundial de telefones celulares. O telefone móvel, para Lei Jun, não é apenas um dispositivo simples. É um equipamento que engloba software, serviços de internet e hardware. O Xiaomi.com, desde o início, tem conseguido desenvolver um ecossistema que não só abriga aplicativos, mas vende também, uma ampla gama de artigos, desde entretenimento, passando por software até serviços. A sua mais recente avaliação, efectuada no final de 2014, fixou o valor da Xiami.com em quarenta e cinco mil milhões de dólares, sendo considerada uma das mais valiosas “startups” do mundo, e uma das dez maiores empresas de Internet, em valor estimado de mercado no mundo. Durante as últimas três décadas e meia, histórias como Lenovo, Huawei, Sany, Shuanghui e Xiaomi têm abundado na China. A China empresarial está a crescer, e juntamente com a surpresa improvável do impulso da China corporativa é o rápido crescimento da economia chinesa, desde que o governo chinês iniciou a reforma económica em 1978, a China conseguiu manter uma taxa média de crescimento do PIB de mais de 9 por cento. A China ultrapassou o Japão para se tornar a segunda maior economia do mundo, em 2010. A China ultrapassou os Estados Unidos para se tornar a maior fabricante do mundo, em 2012. A China produziu menos de 3 por cento da produção total mundial, em 1990. Esta proporção aumentou para quase um quarto. Considerando a indústria do alumínio como um exemplo. Os produtores chineses de alumínio representavam apenas 4 por cento da produção mundial, em 1990 e até 2014, a sua participação aumentou para 52 por cento. Ao longo do caminho do desenvolvimento, a China também se tornou o maior consumidor de bens de luxo do mundo, bastando caminhar pelas ruas de Pequim, Xangai, Shenzhen e muitas cidades costeiras, para se poder facilmente sentir o entusiasmo dos cidadãos chineses, em que muitos parecem viver uma preocupação optimista, falando pelos iPhones, carregando malas Rimowa, calçando sapatos Prada e usando relógios Piaget. Ainda que o crescimento do PIB tenha abrandado nos últimos anos e muitos tenham perdido a fé no discurso da China, esta continua a ser o mundo da manufactura e centro de exportação, e um dos motores de crescimento mais poderoso do mundo. Todos os anos, a revista Fortune publica uma lista das 500 maiores empresas do mundo, a Fortune Global 500. Este produto clássico da revista é muito valorizado pelos meios de comunicação chineses, bem como pelas empresas chinesas. O facto de constar desta lista, para muitos, tem o significado de se tornar em uma empresa de classe mundialmente respeitada. Para a China empresarial, o real progresso deu-se em 1986, quando duas empresas chinesas entraram na lista pela primeira vez. O número de empresas chinesas na Fortune Global 500, desde então, tem aumentado, aparecendo cento e seis empresas, em 2015, em comparação com cento e vinte e oito nos Estados Unidos. A China já obteve mais empresas listadas na Fortune Global 500, desde 2011, do que a Alemanha e o Japão, tendo sido ultrapassada apenas para os Estados Unidos. As empresas chinesas, nos últimos trinta e cinco anos, transformaram-se com sucesso de acordo com a prática e os padrões de empresas como a GE, Toyota e Shell. A revista Fortune classifica as empresas globais de acordo com suas vendas totais. O limiar para a lista de 2015 foi de cerca de vinte e quatro mil milhões de dólares, correspondente a cerca de cento e cinquenta e quatro mil milhões de RMB, e mais de cem empresas relataram vendas acima dos cento e cinquenta mil milhões de RMB, em 2015, pelo que o aumento da China empresarial não poderia ser mais óbvio. Em grande medida, esta vaga simboliza o sucesso económico da China nos últimos trinta e cinco anos. Em 2015, entre as dez maiores empresas do mundo por receitas, estão três empresas estatais chinesas, a Sinopec, PetroChina e State Grid Corporation da China. A China não tinha uma única empresa no sentido moderno do termo, quando em 1978, foi forçada a iniciar a sua reforma económica. As denominadas por empresas, eram unidades de trabalho do tipo instalado na União Soviética, destinadas a cumprir as tarefas que lhes fossem atribuídas pelas agências de planeamento, em diferentes níveis. Até então, o Banco Central da China, o Banco Popular da China (PBOC na sigla em língua inglesa), sob a supervisão do Ministério das Finanças, também funcionava como um banco comercial. O PBOC desagregou as suas funções comerciais e deu forma ao Banco Industrial e Comercial de China (ICBC na sigla em língua inglesa) nos princípios da década de 1980. Desde então, o ICBC tornou-se um dos maiores intermediários finais do mundo. O ICBC, em 2015, foi considerada a décima oitava empresa mundial em termos de receita, o maior banco e a empresa mais rentável, batendo a Apple e a Exxon. Transformando-se de simples unidades de produção sob a economia planeada para empresas orientadas para o lucro e mercado, a China empresarial concluiu com êxito a sua primeira metamorfose. Estudar a ascensão rápida e inverosímil da China empresarial é trabalho fascinante, pois apresenta muitas perguntas, algumas preocupantes, tal como o facto de milhões de empresas chinesas, muitas vezes em larga escala, conduzirem negócios na ausência de infra-estrutura institucional bem desenvolvida e como se processa a aplicação da lei e a protecção dos direitos de propriedade.
Hoje Macau InternacionalLondres | Ser português além de “passar o dia no café” [dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]uas jovens portuguesas lançaram um projecto multimédia intitulado “Little Portugal” para promover a comunidade portuguesa em Londres, recolhendo testemunhos em vídeo que disponibilizam numa página de Internet. A equipa inclui uma ‘designer’ portuguesa, um compositor de música romeno e uma operadora de câmara checa, mas a cara do projecto lançado no final do ano passado são as portuguesas Catarina Demony e Ana Có. “O projecto começou para ser uma celebração do que os portugueses estão a fazer aqui em Londres. Há muitas gerações, há todo o tipo de pessoas da comunidade portuguesa a viver em Londres e temos o objectivo de dar a voz a essa comunidade portuguesa”, disse Ana Có, responsável pelo programa de actividades de uma organização não-governamental em Londres. Formada em Ciências Política, Ana Có considera que existe mais para além do “estereótipo que passa o dia no café português. Há cada vez mais portugueses com qualificações e com cargos importantes que lideram na comunidade inglesa”. A ideia surgiu em conversa com a jornalista Catarina Demony, cuja amizade remonta à vida em Portugal e que reataram durante os estudos universitários em Inglaterra. Sendo ambas jovens, possuem uma experiência diferente do que é o Portugal contemporâneo e pretendem mostrar um lado mais moderno do país, que, além de profissionais da limpeza, construção ou restauração, também produziu criativos e empreendedores. “Quando começámos o projecto não sabíamos muito sobre a comunidade portuguesa”, admitiu Catarina Demony, para quem o primeiro passo foi convencer as pessoas da validade do projecto. Entretanto, já publicaram nove entrevistas, incluindo de políticos, empresários, activistas ou profissionais de várias gerações, incluindo um professor inglês que dá aulas de língua inglesa a portugueses. “Eu e a Ana já nos conhecemos há muitos anos e temos as duas uma grande paixão por contar histórias”, afirmou. Na sua opinião, “há uma necessidade de, tanto para os britânicos como para os portugueses em Portugal, que a vida de emigrante não é um conto de fadas”, por isso quer mostrar tanto os casos de sucesso como as histórias de dificuldades. O projecto é independente e, garantem, sobrevive do próprio esforço e financiamento. O envolvimento dos restantes membros da equipa veio por amizade, o que as obriga a explicar o contexto de algumas entrevistas e comportamento dos portugueses, como os encontros para beber café ou para ver futebol. “Ter amigos que não são portugueses a trabalhar neste projecto faz-me sentir que estou a conhecer Portugal um bocadinho mais porque temos de explicar-lhes estes detalhes”, brincou.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeONG na China | Lei aponta para cenário de forte repressão, diz académica A lei da gestão das organizações não-governamentais estrangeiras entrou em vigor na China este mês, e o cenário parece negro para as entidades que defendem os direitos dos trabalhadores. Mas Anita Chan explicou ontem, numa palestra na Universidade de Macau, que os trabalhadores estão a começar a protestar sozinhos, graças às redes sociais [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] polémica lei da gestão das organizações não-governamentais (ONG) estrangeiras entrou em vigor este mês na China e a repressão contra estas entidades dedicadas a proteger os direitos laborais parece estar a intensificar-se. É este o retrato feito ontem por Anita Chan, especialista em questões laborais na Ásia e docente na Australian National University, numa palestra dada na Universidade de Macau (UM). Ainda assim, os protestos que os trabalhadores da cadeia Walmart levaram a cabo o ano passado, com recurso ao WeChat e sem uma estrutura por detrás, pode ser o arranque de uma nova fase em termos de luta laboral, defendeu a académica. “Houve cerca de dez mil trabalhadores da Walmart na rua e, para mim, foi um dos maiores protestos na China sem o apoio de uma organização, que contou apenas com a participação das redes sociais. Os trabalhadores da Walmart podem muito bem ser a imagem de uma nova fase.” Isto porque “os trabalhadores começaram a adoptar as suas próprias estratégias”. “Há uma maior consciência dos direitos laborais muito por culpa da educação dada na última década e uma influência das ONG de Hong Kong. Os trabalhadores estão a tomar consciência em relação ao confronto com os patrões e já não querem pessoas de fora a forçá-los a ter uma agenda. A maioria das greves continuam a ser isoladas, mas o acesso fácil às redes sociais [permite isso]”, acrescentou a docente. Anita Chan defendeu que, desde a prisão de Zheng Feyiang (líder do Panyu Worker’s Center, actualmente a cumprir três anos de pena suspensa), que “há novas relações a emergir entre as ONG e os trabalhadores”. “As ONG tornaram-se espaços de moderação e de apresentação de queixas, mas alguns trabalhadores decidiram apostar nas suas próprias estratégias e organizar as suas próprias greves. As ONG não têm capacidade para mobilizar centenas de trabalhadores para uma greve e marchar para as ruas. O que podem fazer é intervir enquanto grupo. Intervêm nas greves, mas não as organizam, de facto”, explicou. Repressão que vem de longe A história das ONG na China está muito ligada a Hong Kong, cujas relações começaram na década de 80 com o desenvolvimento das Zonas Económicas Especiais de Deng Xiaoping no sul do país. Facilmente os sindicatos de Hong Kong estabeleceram laços com a vizinha Shenzhen, que se espalharam a toda a província de Guangdong. Se a China afirma pretender regularizar as várias ONG existentes no país, por não existir, até então, um quadro legal efectivo, a verdade é que há o receio da sua supressão por dificuldades de financiamento. A Organização das Nações Unidas e os Estados Unidos criticaram fortemente o diploma. “Todas as ONG de trabalhadores estão à espera, não estão certas da extensão de tudo isto e de até que ponto o Governo vai adoptar medidas sérias sobre esta questão. Têm sentido uma pressão intensa. Não se sentem apenas preocupadas com a possibilidade de supressão política, mas também com o fim do financiamento de doadores estrangeiros. Dependem disso para sobreviver.” O actual Presidente da China tem sido acusado de promover uma maior repressão política. “Xi Jinping acredita que o contacto com as ONG estrangeiras vindas de sociedades democráticas é algo subversivo e vai contra a estabilidade social. Então está a tentar regular esta influência estrangeira. As ONG, a partir deste momento, vão ser reguladas e monitorizadas, e qualquer violação das regras dará origem a multas e detenções. Transferir dinheiro será difícil.” No entanto, as tentativas de silenciamento foram algo que sempre aconteceu de forma pontual, explicou Anita Chan na sua palestra. “Nos últimos anos, as autoridades chinesas têm colocado imensa pressão nas ONG ao prenderem muitos dos seus membros ou ao convidá-los para um yum cha. No início, as ONG recearam estes contactos, há cerca de dez anos estavam bastante preocupadas, mas depois habituaram-se. Isso tornou-se uma espécie de jogo: os contactos fazem-se, mas estão sempre atentos ao que acontece.” Pouca corrupção Anita Chan falou ainda dos rumores que existem de que grande parte destas ONG que defendem trabalhadores estão ligadas à corrupção, os quais disse não terem fundamento. “A grande questão que não tem sido abordada nos estudos mais recentes é o financiamento. É algo difícil de discutir. A sobrevivência financeira é tão importante como a sobrevivência política. Infelizmente, o dinheiro está ligado a corrupção, e há rumores de que muitas das ONG laborais são corruptas. Mas, nos últimos 20 anos que passei a analisar as ONG na China, apenas duas revelaram ter ligações corruptas”, rematou. “China não quer lei sindical para Macau” Chumbada oito vezes na Assembleia Legislativa (AL), pedida por trabalhadores de vários sectores, estudada agora pelo Governo. A lei sindical, cuja implementação está prevista na Lei Básica, continua a ser um osso duro de roer e assim deve continuar. É esta a opinião de Anita Chan, académica de Hong Kong actualmente a residir na Austrália, onde é docente na Australian National University. Especialista em questões laborais, Anita Chan esteve ontem na Universidade de Macau (UM) a dar uma palestra sobre a situação das organizações não-governamentais (ONG) da área laboral na China. À margem do evento, disse conhecer muito pouco sobre a realidade local, mas admitiu dificuldades na implementação da lei. “Uma lei sindical pode conter muitos aspectos, relacionada com a organização das estruturas sindicais, protecção dos presidentes dos sindicatos. Mesmo sem liberdade sindical, esta lei seria útil, mas depois seria impossível voltar atrás. Penso que será difícil para Macau. Se foi difícil para Hong Kong, será difícil para Macau”, referiu. Anita Chan acrescentou ainda que “Macau está mais sob o controlo da China do que Hong Kong”. “É óbvio o que a China não quer que haja uma lei. Penso que é a China que não quer a lei sindical para Macau. E acredito que não tem nada que ver com a existência da indústria do jogo, simplesmente a China não quer sindicatos. Não querem sindicatos autónomos, independentemente do sector em causa. Não se pode dar permissão para a criação de um sindicato sem que outros apareçam”, apontou. Ausência pré-1999 A académica lembrou o cenário de Macau antes da transferência de administração, quando os sindicatos também não estavam legalizados. “Um colega disse-me que existe uma federação [Federação das Associações dos Operários de Macau], mas teria de analisar melhor os detalhes dessa proposta de lei [que foi chumbada na AL]. Se existe uma federação, assumo que seja uma federação oficialmente controlada pela China. A China só tem um sindicato oficial, mas a China tem uma lei sindical, foi estabelecida há muitos anos, quando a RPC foi criada, em 1949. Antes da transferência, durante a administração portuguesa, também não havia uma lei sindical.” Perante a hipótese de aprovação do diploma, Anita Chan acredita que haverá dificuldades de ordem prática. “Estou certa de que, independentemente da lei ser aprovada ou não, não deverá existir liberdade sindical. Em Hong Kong há essa liberdade, tem um sindicato oficial que é controlado pela China, mas também existem sindicatos independentes.” Anita Chan foi ainda questionada sobre os recentes protestos que têm ocorrido, relacionados com os trabalhadores do sector da construção civil e dos casinos, em que ambos pedem melhores salários e a não importação de trabalhadores residentes. “Se eles vão para a rua é porque a estrutura sindical existente não está a fazer o seu trabalho. Tudo dependerá do contexto da legislação, se diz que não haverá liberdade sindical, então pouco irá mudar. Neste momento não há qualquer lei, mas se a lei disser que não podem existir sindicatos independentes, será pior, porque isso é o que acontece na China.” Com a nova lei das ONG já em vigor, desde o início deste mês, o sector laboral no Continente vai enfrentar novos desafios, apontou a académica. “É por isso que os trabalhadores na China não formam associações independentes, formam ONG, que não são o mesmo que sindicatos. O sindicato oficial na China encara estas ONG como competidores, especialmente quando as ONG falam de negociações salariais. Esse é o trabalho do sindicato, mas o sindicato não fala disso”, concluiu.
Andreia Sofia Silva PolíticaLeong Veng Chai exige pré-pagamento nos parquímetros [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] deputado Leong Veng Chai interpelou o Governo quanto à necessidade de criar um sistema de pagamento com cartões pré-pagos nos parquímetros espalhados pelo território. O deputado, parceiro de José Pereira Coutinho na Assembleia Legislativa (AL), acredita que este sistema deve ser sido instalado antes do aumento das tarifas. “O Governo deve reconsiderar o assunto e reduzir a taxa de aumento, com vista a atenuar a pressão dos residentes da camada social mais baixa. O Governo deve ainda considerar aumentar as referidas tarifas só depois da implementação do sistema de pré-pagamento, para que os residentes não precisem de transportar uma quantidade enorme de moedas”, pode ler-se. Para o deputado, os actuais parquímetros estão obsoletos. “As empresas responsáveis pela gestão dos parquímetros dispõem de técnicas desactualizadas, que não se coadunam com o uso de cartões pré-pagos, mas só com moedas. Depois da actualização das tarifas, os condutores serão obrigados a transportar uma grande quantidade de moedas, o que é perturbante. Há quem aponte ainda que os parquímetros têm uma capacidade limitada ao nível da recepção de moedas, temendo-se que os interesses dos utentes sejam prejudicados.” O deputado lembra que muitos não concordam com os referidos aumentos. “Muitos residentes opõem-se a isto, por entenderem que tal iniciativa vai impulsionar, ainda mais, a subida de preço dos lugares de estacionamento privado, a par de provocar o alongamento das filas para estacionamento nos auto-silos, onde se verifica a insuficiência de lugares. Tal medida não vai ajudar a atenuar a pressão rodoviária, nem aumentar a taxa de rotatividade dos lugares de estacionamento nas vias públicas.” As novas tarifas, que serão totalmente implementadas daqui a dois anos, prevêem que um motociclo passe a pagar duas patacas por hora, por um período máximo de duas horas de estacionamento. Já um automóvel terá de pagar três patacas por hora, com um limite máximo de quatro horas. Os valores de estacionamento podem ir até às 12 patacas por hora, consoante a cor dos parquímetros.
Angela Ka PolíticaAumento de taxas | FAOM e Ella Lei reuniram com DSAT A deputada Ella Lei e outros representantes da Federação das Associações dos Operários de Macau reuniram com o Governo para discutir o aumento súbito das taxas de veículos e motociclos. Criticam a burocracia e temem impacto social e empresarial [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] aumento das taxas de veículos levou ontem membros da Associação Geral dos Empregados do Ramo de Transporte de Macau, ligados à Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM), a reunir com os responsáveis da Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT). A deputada eleita por via indirecta que representa a FAOM no hemiciclo, Ella Lei, também esteve presente. O encontro serviu para apresentar queixas sobre o aumento das taxas de inspecções dos veículos e as consequências negativas para os negócios. Ella Lei explicou que o sector dos transportes concorda com a adopção das novas medidas. Contudo, o problema reside no aumento elevado das taxas, o que pode afectar os negócios e causar vários problemas. Lam Hin San, responsável máximo da DSAT, afirmou que a lei é integral e que o organismo teve em consideração os vários factores, mas nada disse quanto ao possível reajustamento da tabela de taxas. O grupo falou também da falta de lugares de estacionamento para os veículos pesados ao longo dos anos. Os responsáveis da DSAT disseram que, nos próximos dois meses, serão instalados 120 lugares de estacionamento localizados no Parque Industrial da Concórdia, em Coloane. Está ainda a ser pensada a reabertura da zona de estacionamento de pesados junto ao posto fronteiriço no Cotai, bem como a reorganização do aterro perto do MGM, para que possa ser usado pelo sector dos transportes. Não ao “pensamento burocrático” À margem do encontro, a deputada Kwan Tsui Hang, também representante da FAOM na Assembleia Legislativa, criticou os ajustamentos feitos pela DSAT, considerando que o Governo pensou o problema “de forma demasiada burocrática”. A deputada considerou necessário o pagamento feito pelos cidadãos, mas “nunca será possível a recuperação dos custos por parte do Governo”. “O facto de nunca terem sido alteradas as taxas foi responsabilidade do Executivo. Agora decidiu-se alterar tudo de uma só vez, e essa operação não foi simpática”, apontou Kwan Tsui Hang. Para a deputada, o Governo deveria estar disponível para aumentar as taxas gradualmente, sendo, na sua óptica, compreensível que tudo esteja a resultar numa revolta social, dado que os aumentos são “demasiado elevados”. Logo após a entrada em vigor das novas tabelas, o Executivo deixou claro não ter vontade de regressar às antigas taxas, tendo afirmado que as actualizações tiveram em consideração o facto de, nos últimos 19 anos, não terem sido alterados os valores em causa.
Hoje Macau PolíticaAlexis Tam encontra-se em Pequim com dirigentes do Governo Central [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] encontro aconteceu na quarta-feira, mas o comunicado oficial só chegou ontem. O secretário para os Assuntos Sociais e Cultura esteve reunido, na capital, com responsáveis dos ministérios da Educação e da Cultura, bem como da Administração Geral do Desporto da China. Trocaram-se ideias sobre as áreas da tutela de Alexis Tam e foi apresentada a candidatura de Macau como “cidade gastronómica”. Falou-se ainda sobre o desenvolvimento do território como “centro de intercâmbio cultural entre a China e os países de língua portuguesa”, e o desenvolvimento de actividades desportivas. Na reunião com o vice-ministro da Educação, foram elogiados os resultados de Macau neste sector. Du Zhanyuan congratulou-se com “a importância dada pelo Governo de Macau à igualdade nas condições de ensino, com uma constante melhoria do ambiente de aprendizagem dos adolescentes, nomeadamente mediante medidas como o projecto ‘obra de céu azul’ e o programa de avaliação PISA”. Já o secretário comentou que “este é o primeiro ano em que aumenta, de forma significativa, o número de estudantes de Macau recomendados para estudarem na China”, tendo-se verificado que a iniciativa “é muito bem acolhida pelas escolas e pelos estudantes” locais. Alexis Tam referiu ainda que a gastronomia faz parte da cultura chinesa e que Macau está a candidatar-se para entrar na Rede das Cidades Criativas na área da Gastronomia, algo que “beneficiará o desenvolvimento adequado e diversificado da economia local”. Du Zhanyuan “concordou e manifestou total apoio da Comissão Nacional da China para a candidatura de Macau junto da UNESCO”, lê-se no comunicado. Quanto ao encontro com o ministro da Cultura, teve como objectivo promover a criação do Centro de Intercâmbio Cultural entre a China e os Países de Língua Portuguesa. Luo Shugang prometeu que a estrutura que lidera “vai aproveitar os abundantes recursos culturais do Interior da China para ajudar o Governo da RAEM a criar mecanismos [de cooperação com o espaço lusófono], assim como apoiar a criação do Centro de Intercâmbio Cultural entre a China e os Países de Língua Portuguesa”. Por fim, na reunião com o director da Administração Geral do Desporto da China, Gou Zhongwen prometeu “continuar a apoiar o desenvolvimento do sector desportivo de Macau e a participação da RAEM nos Jogos Olímpicos”.
Isabel Castro Manchete PolíticaRecusa de entrada | Pereira Coutinho inconformado com resposta da PSP É a pergunta que o deputado faz para tentar perceber por que as autoridades recusaram fornecer dados estatísticos sobre as pessoas que ficam retidas na fronteira. Pereira Coutinho não compreende o argumento da polícia [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] questão tinha sido colocada pela Agência Lusa e a (não) resposta chegou esta semana: as autoridades de Macau recusaram revelar o número de pessoas que proibiram de entrar no território. De igual modo, não dizem as razões pelas quais o fizeram ou a procedência de quem bateu com o nariz na porta da RAEM, sob o argumento de que essas informações são confidenciais. “Os dados estatísticos de ‘recusas de entrada’ são classificados como dados e informações ‘reservados’, pelo que não há lugar para a sua divulgação”, afirmou a Polícia de Segurança Pública em resposta escrita enviada à agência de notícias de Portugal. Ontem, numa interpelação escrita ao Chefe do Executivo, Pereira Coutinho manifestou muitas dúvidas sobre o argumento utilizado pela PSP: a classificação destas informações como sendo reservadas. “Os dados referidos são meramente estatísticos e, portanto, sem identificação das pessoas a que se referem, pelo que não se compreende que estejam classificados como reservados”, comenta. Num texto curto, em que apela à clareza na resposta, o deputado à Assembleia Legislativa deixa duas perguntas, ambas relacionadas com a legislação em vigor no território. “Qual ou quais as disposições legais que impõem ou permitem à PSP classificar estes dados estatísticos como reservados?”, lança. Coutinho quer ainda saber quais as razões “de facto” que justificam esta classificação. “É ela necessária para salvaguardar a segurança interna de Macau? Porquê?”, questiona. Antes não era assim No texto que escreveu sobre o assunto, a Lusa recordava que houve tempos em que a postura das autoridades era bem diferente. Pelo menos durante o mandato do anterior secretário para a Segurança – que terminou em Dezembro de 2014 –, a PSP chegou a divulgar dados sobre as pessoas proibidas de entrar em Macau a pedido dos jornalistas. O impedimento de entrada em Macau acontece com alguma regularidade, com a grande maioria dos casos a serem tornados públicos pelos próprios visados, muitos dos quais políticos ou activistas da vizinha Hong Kong. A PSP não tem por hábito apresentar motivos concretos, invocando, com frequência, razões de segurança. Na resposta divulgada esta semana, a PSP reiterou que “cumpre a inspecção e o controlo de entradas e saídas” da RAEM em “estrita conformidade” com a lei, e “rigorosamente conforme as disposições legais e de acordo como os procedimentos estabelecidos, para examinar as condições de entrada de todas as pessoas e assim decidir autorizar ou recusar a entrada de visitantes”. Os mais recentes casos de interdição de entrada – pelo menos públicos – ocorreram no último dia de 2016. Dois antigos deputados pró-democracia de Hong Kong, que viajaram separadamente, viram-lhes ser negada entrada sob o argumento de que “constituíam uma ameaça à segurança e estabilidade internas” de Macau, segundo a imprensa de Hong Kong. * com LUSA
Hoje Macau SociedadeNegócios| Macau quer mais convenções [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]briu ontem portas a 13.ª edição do Fórum para a Cooperação Internacional da China (CEFCO, na sigla inglesa), que nos próximos três dias terá lugar no Venetian. A abertura do evento contou com a presença do secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, bem como de Yao Jian, vice-director do Gabinete de Ligação do Governo Central em Macau. Segundo o canal chinês da Rádio Macau, o fórum contou, pela primeira vez, com representações de países de língua portuguesa, como Angola, Brasil ou Guiné-Bissau. No seu discurso, Lionel Leong referiu que o evento conta com a participação de 800 representantes, e que vai servir para abordar os desafios da indústria de convenções e exposições a nível global. O secretário adiantou ainda que Macau irá continuar a seguir a estratégia de “prioridade às convenções”, introduzindo mais projectos de convenções de alta qualidade, aproveitando as vantagens únicas do território. Lionel Leong assinou ainda um protocolo com o presidente do Conselho Chinês para a Promoção do Comércio Internacional, Jiang Zengwei, em relação à promoção do desenvolvimento da indústria de convenções e exposições de Macau. O evento realiza-se pela primeira vez numa cidade fora da China Continental. A edição anterior foi realizada em Yinchuan, na região autónoma de Ningxia, tendo atraído a participação de mais de 600 organizadores de eventos, quadros superiores, elites e académicos da indústria de convenções e exposições.
Hoje Macau SociedadeBanda larga | CC diz que consumidores informados devem escolher os melhores operadores O Conselho de Consumidores levou a cabo uma investigação sobre os planos de Internet da fibra óptica, tendo chegado à óbvia conclusão que só um consumidor informado poderá escolher da melhor forma entre os dois operadores no mercado [dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]uidado com as promoções. Podem ser aliciantes à primeira vista, mas levar a uma decisão precipitada na altura de escolher um plano de Internet de banda larga em fibra óptica. As óbvias recomendações são do Conselho de Consumidores, que publicaram um relatório onde avaliaram as várias opções oferecidas pelos dois operadores no mercado. De acordo com o relatório do órgão consultivo, a CTM disponibiliza nove planos mensais que oferecem o uso de Internet ilimitado, enquanto a concorrente, a MTel, oferece cinco planos mensais. O documento publicado pelo Conselho de Consumidores fez uma análise comparativa de dois tarifários de 300M, tendo concluído que o plano da MTel traria ao consumidor uma poupança anual de 884 patacas, em relação à concorrente. Outra das conclusões do relatório prende-se com a fidelidade dos clientes, que não mudam frequentemente de fornecedor. Nesse sentido, o Conselho de Consumidores alerta para que haja atenção às cláusulas contratuais e à qualidade dos serviços prestados. Por exemplo, no serviço de diagnóstico e reparação, a CTM oferece gratuitamente a primeira visita ao domicílio de um técnico da empresa, sendo que a partir da segunda visita é cobrada uma taxa de 100 patacas durante as horas de expediente. Fora do horário de expediente a taxa duplica para as 200 patacas. Este serviço na operadora MTel é gratuito, além de não exigir o pagamento prévio de uma mensalidade como depósito, sendo, no entanto, cobrada uma multa no caso da cessação do contrato por parte do consumidor. Outra diferença substancial é ao nível das taxas de instalação. A CTM cobra 600 patacas para a utilização da rede de fibra óptica existente, sendo que, para uma nova rede, o preço é de 900 patacas. Em contrapartida, a MTel cobra 540 e 810 patacas, respectivamente. O órgão consultivo aconselha ainda que os potenciais clientes antes de escolherem um plano se aconselhem com familiares e amigos que já adquiriram serviços de Internet, de forma a tomarem uma decisão mais informada.
João Luz Manchete SociedadeUber | Balanço de um ano conturbado A certa altura de 2016, os condutores da Uber estavam com uma média semanal de multas no valor de um milhão de patacas. Com a entrada em 2017, as perspectivas são de crescimento e de manutenção de diálogo com o Executivo de forma a regularizar o serviço [dropcap style≠’circle’]“T[/dropcap]emos estado em contacto com o Governo local e esperamos continuar num diálogo construtivo.” As palavras são de Trasy Lou Walsh, directora da Uber de Macau, que acrescentou ainda que o crescimento da plataforma é uma tendência mundial que já implicou a alteração da legislação de mais de 100 países. Neste sentido, a Uber confia no poder da satisfação dos seus clientes e nos benefícios que podem trazer ao sector dos transportes da cidade. Em Setembro último, muito se falou sobre o fim da Uber na RAEM, tendo circulado uma petição a favor da plataforma. “Orgulhamo-nos das mais de 23 mil assinaturas que recolhemos em menos de uma semana, são um indicador de que Macau quer mais, exige transportes de qualidade”, comenta Walsh. A directora da Uber espera que a satisfação dos clientes, aliada à diversificação da economia, faça os decisores políticos compreender a importância da aplicação. A expansão do turismo a áreas fora do sector do jogo pode ser outra das vias para mostrar que o serviço é essencial à cidade. As intenções são boas, meter mais pessoas em menos carros. Uma meta que responderá a muitos dos mais urgentes problemas de trânsito de Macau. Do excesso de automóveis aos problemas de parqueamento, passando pelas preocupações dos automobilistas com o excesso de multas. Trasy Walsh recorda que, um pouco por todo o mundo civilizado, à medida que a Uber cresce, o número de automóveis comprados diminui. “Quando as pessoas se aperceberem que podem usar a Uber e começar as suas viagens em menos de cinco minutos, a tendência será para uma diminuição do uso do carro”, comenta. A directora crê que esta pode ser uma via para reduzir o número de veículos em Macau. Para tal, o serviço prestado terá de ser de confiança. Ano novo, novos serviços Este ano será lançado em Macau a Uber Assist, que permitirá aos passageiros com dificuldades motoras, e outros tipos de incapacidade, terem um meio de transporte à sua medida. Em parceria com a Caritas, está a ser dada formação a condutores para que estejam habilitados a transportar, por exemplo, pessoas em cadeira de rodas. Também tem sido dada formação básica de linguagem gestual a alguns condutores da Uber. A parceria com a Caritas não se fica por aqui e, no espírito do Ano Novo Chinês, está em curso uma campanha que pretende levar um pouco de calor às duas mil famílias apoiadas pela instituição de caridade. A app recolherá doações de clientes, e esses fundos serão usados para comprar roupa e brinquedos para as crianças destas famílias carenciadas. Os condutores de veículos da plataforma têm origem nas mais diversas ocupações. “Muitos colaboradores trabalham na indústria do jogo, desde antigos junkets, dealers, supervisores, ou pessoas cujo trabalho sofre com a sazonalidade”, esclarece Trasy Walsh. Mas não só de empregados ligados ao negócio dos casinos se fazem os condutores da Uber. Podem ser estudantes, agentes de imobiliário, vendedores de seguros, até donos de restaurantes de hot pot durante o Verão, uma iguaria mais apreciada no Inverno. No início de 2016, o tempo de espera médio por um carro da Uber ultrapassava ligeiramente os oito minutos. Até Dezembro, este período foi reduzido para menos de cinco minutos, e a meta para o ano que agora começa é baixar da barreira dos quatro minutos. Ainda no universo dos números, os carros ao serviço da plataforma percorreram três milhões de quilómetros, o suficiente para dar a volta ao mundo 38 vezes. Um dos objectos mais vezes perdidos dos tempos modernos é o telemóvel, o que também acontece, naturalmente, em veículos da Uber. Como tal, foram devolvidos 99 telefones esquecidos em carros da plataforma. No ano passado, o tempo de espera mais curto por um carro da aplicação foi de dois segundos, quase instantâneo, sendo que o utilizador que mais usou a Uber fez 768 viagens, quase duas viagens por dia. Governo contra-ataca Não foi preciso esperar pela chegada dos jornais à banca para que o Executivo respondesse à Uber. O Governo local lembrou, em nota de imprensa que, em Outubro, esteve reunido com os representantes da aplicação, reiterando que a Uber não preenche os requisitos legais para operar em Macau. Como tal, a posição do Executivo mantém-se rigorosa, alertando que não permite a exploração ilegal de actividades de transporte de passageiros no território. A posição é justificada como forma de garantir o direito e a segurança dos cidadãos e visitantes. A Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego avisa ainda que as autoridades vão continuar “a combater rigorosamente as irregularidades”.
Sofia Margarida Mota EventosCCM | Ballet de Hong Kong apresenta nova versão do Quebra-Nozes O “Quebra-nozes” está, até domingo, no Centro Cultural de Macau. Interpretada pelo Ballet de Hong Kong, a apresentação marca o fim de oito anos de direcção artística da sueca Madelaine Onne. O espectáculo é dirigido a todas as idades, numa recriação do clássico de Tchaikovsky [dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]adelaine Onne está de saída da direcção artística do Ballet de Hong Kong, não sem antes passar por Macau para uma apresentação especial do clássico “Quebra-nozes”. “É uma versão diferente porque foi feita especialmente para nós, pelo australiano Terence Kohler, e foi concebida enquanto forma de celebração do Natal. Como em Hong Kong não celebramos, efectivamente, a época, o sentimento foi misto e o resultado foi a construção de uma história passada num mundo de sonho através de uma casa de bonecas”, explicou Madelaine Onne num encontro com a imprensa. A presente edição do “Quebra-nozes” é dirigida a um público vasto em que as crianças são bem-vindas. No entanto, esta não é razão para que as plateias não sejam preenchidas com adultos. Se a experiência com os mais novos tem sido gratificante, para Madelaine Onne a peça não é menos positiva para os adultos. “Hoje em dia todos temos uma vida cheia de stress, com famílias e trabalho, e também nós precisamos de entrar nos teatros e ver outros mundos”, justificou. Além do clássico A “bailarina” do “Quebra-nozes” é interpretada por Yao Jin, que veio do Ballet Nacional de Pequim. Para a agora bailarina principal da companhia de Hong Kong, a mudança “concretizou um sonho”. A formação na capital foi de excelência, mas “não era suficiente”. “Queria sair e ter a oportunidade de tocar, de uma forma mais directa, o que vinha da cultura ocidental”, explicou. “Encontrei isso aqui: a companhia integra o factor liberdade e foi aí que consegui juntar a formação clássica a um ballet novo e mais contemporâneo.” Madelaine Onne reitera as palavras da primeira bailarina. Um dos grandes objectivos aquando do ingresso na direcção da companhia, há oito anos, era esse mesmo: possibilitar a criação de um estilo pessoal nos seus bailarinos. “Quando cheguei encontrei profissionais magníficos que se copiavam uns aos outros na perfeição e de onde eu vinha era muito diferente: não tínhamos a mesma excelência técnica e, por isso, éramos obrigados a desenvolver outras capacidades”, recordou. Ryo Kato interpreta o “Quebra-nozes” e não podia estar mais de acordo: “é realmente muito diferente trabalhar aqui.” O bailarino japonês passou por Portugal e pela Rússia ao longo da formação. Do primeiro trouxe a liberdade de movimentos e uma abertura ao ballet contemporâneo; do segundo, a formação clássica tradicional. Agora junta ambas. Para Onne, o desafio de juntar o lado artístico e criativo à perícia era grande, e hoje é possível ver com facilidade o estilo de cada um. Por outro lado, a valência criativa é notória em palco. “Todos os espectáculos são diferentes porque há sempre coisas a acontecer e a serem adaptadas naquele momento.” O caminho não terá sido fácil e levou cerca de dois anos a conseguir sair da cópia para a concriação. “No início eles achavam que eu era louca em pedir para fazerem algo diferente, e hoje tenho de pedir para pararem porque já têm o seu processo criativo individual de forma natural.” Para o efeito, a directora tentou, sempre que possível, trazer coreógrafos que trabalhassem directamente com os bailarinos, com uma peça definida ou com recurso a temas. O desenvolvimento foi significativo e agora, nas digressões, a diferença é reconhecida. O Ballet de Hong Kong conta actualmente com cerca de 50 bailarinos vindos de 11 países. Sem residência, o trabalho é duplamente difícil. “Alugamos estúdios mas, às 18h, temos de sair, o que impede o desenvolvimento de determinadas opções que vão aparecendo”, esclareceu Madelaine Onne. No entanto, a companhia aguarda a concessão de um local de trabalho nos novos espaços de West Kowloon. O “Quebra-nozes” está no Centro Cultural de Macau hoje e amanhã, às 19h30, e domingo às 15h.
Sofia Margarida Mota EventosTeatro físico, da companhia checa Spitfire, abre o festival Fringe O festival Fringe começa hoje e no cartaz tem o espectáculo “Antiwords” da companhia checa Spitfire. A peça é inspirada nos textos autobiográficos de Václav Havel e retrata a conversa entre dois homens. No entanto, “em vez das duas personagens masculinas, o diálogo é entre duas mulheres”, explicou o director artístico Petr Bohac ao HM. A situação é passada numa cervejaria e representa uma conversa entre um intelectual – proibido de escrever, trabalha numa cervejaria – e o proprietário do estabelecimento. A interacção é absurda, cómica e dramática. Para a actriz Sonia Feriencikova, o que sobressai na peça é o humor que camufla o desenlace final. “É um trabalho com muitas camadas, das mais superficiais às mais profundas”, referiu. O grupo que se dedica à representação do absurdo através do teatro físico assume que esta é uma forma de evitar enganos. “O corpo não consegue mentir. As palavras podem fazê-lo, e com muita facilidade, mas o corpo não”, defendeu Petr Bohac. Por outro lado, o movimento é uma linguagem universal que não depende de idiomas. Para a actriz, também o corpo é um elemento de comunicação especial que “usa outros níveis de pensamento para comunicar com o público”. A China chegou com as digressões e “Antiwords” permitiu o contacto com públicos diferentes. “Estivemos em Pequim e Xangai, por exemplo, e mesmo dentro do mesmo país, a ‘Antiwords’ teve um acolhimento distinto. Por exemplo, o público de Pequim é muito mais aberto do que o de Xangai, o que é um pouco surpreendente”, considerou o director. No entanto, sublinhou, o mais interessante é que “a audiência chinesa consegue sempre entender muito bem situações que envolvam o absurdo”. A passagem por Macau não acarreta expectativas, mas antes curiosidade. Em cada espectáculo a companhia procura “o contacto com o público numa tentativa de mudar as pessoas”, rematou Petr Bohac.
Hoje Macau China / ÁsiaHong Kong | Carrie Lam demite-se e deverá candidatar-se a Chefe do Executivo [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] número dois do Executivo de Hong Kong, Carrie Lam, demitiu-se ontem, uma medida que é assumida como o primeiro passo para apresentar uma candidatura a chefe do Executivo, noticiou o South China Morning Post. A secretária-chefe disse numa reunião à porta fechada que Carrie Lam tinha apresentado a sua demissão formalmente durante a manhã de ontem e que iria entrar na corrida eleitoral, informou o jornal em língua inglesa. Até à data foram apresentadas três candidaturas formais às eleições para chefe do Executivo de Hong Kong, que decorrem no final de Março. Regina Ip, antiga secretária para a Segurança e membro do Novo Partido Popular (New People’s Party), o juiz na reforma Woo Kwok-hing, e Wu Sai-chuen, um ex-membro da Aliança Democrática para a Melhoria e Progresso de Hong Kong [DAB, na sigla inglesa], são os três candidatos que formalizaram as candidaturas ao cargo. O impopular líder da cidade, Leung Chun-ying, também conhecido por CY Leung, e considerado por muitos dos seus críticos como um “fantoche” de Pequim, disse a 9 de Dezembro que deixaria o cargo em Julho e que não voltaria a concorrer ao lugar de chefe do Executivo. Na segunda-feira seguinte, 12 de Dezembro, o secretário para as Finanças, John Tsang, pediu a renúncia ao cargo – um procedimento entendido como o primeiro passo para avançar com uma candidatura formal –, mas até à data aguarda que o pedido seja aceite por Pequim. Bênção do norte Segundo a imprensa de Hong Kong, Carrie Lam reúne maior apoio entre as forças pró-Pequim, enquanto John Tsang – apelidado de “Sr. Pringles” pelos órgãos de comunicação local por sua semelhança com a mascote da marca – é visto como uma alternativa mais moderada ao actual líder Leung Chun-ying. Ao abrigo do actual sistema eleitoral, o líder do Governo de Hong Kong é seleccionado por um colégio eleitoral de 1.200 membros representativos dos vários sectores sociais. Em 2014, Pequim avançou com uma proposta de reforma política que previa a introdução de voto universal para o líder do Governo, mas só depois de os candidatos (dois a três) serem pré-seleccionados por uma comissão de 1.200 membros, vista como próxima de Pequim. A proposta, que ainda em 2014 esteve na origem do movimento Occupy, que durante 79 dias bloqueou as ruas da cidade, foi rejeitada pelo Conselho Legislativo em Junho de 2015. O pacote de reforma política proposto por Pequim acabou por ser chumbado pelo voto contra dos democratas.
Hoje Macau China / ÁsiaSecretário de Estado escolhido por Trump critica China [dropcap style≠’circle’]R[/dropcap]ex Tillerson, escolhido por Donald Trump para chefiar a diplomacia norte-americana, acusou ontem a China de perseguir, nem sempre respeitar compromissos económicos e comerciais e de não usar toda a sua influência para controlar a Coreia do Norte. Numa audição de confirmação no cargo no Senado, Tillerson foi especialmente questionado acerca da sua alegada proximidade com a Rússia, acabou por admitir que os EUA e a Rússia podem ser adversários ou parceiros, mas provavelmente nunca serão amigos. “Não é provável que alguma vez sejamos amigos”, disse. “Os nossos sistemas de valores são completamente diferentes”. Sobre a China, que durante a campanha ficou agastada por declarações de Donald Trump sobre a necessidade de justificar a política de “uma só China” com concessões políticas, económicas e comerciais de Pequim, Tillerson criticou medidas políticas económicas e comerciais chinesas que prejudicam os Estados Unidos. “A China tem mostrado uma predisposição para perseguir com determinação os seus objectivos, o que por vezes a tem colocado em conflito com os interesses norte-americanos. Temos de lidar com o que vemos, não com o que esperamos”, disse. O antigo executivo da petrolífera Exxon criticou igualmente a potência asiática por não ser “um parceiro fiável no uso de toda a sua influência para refrear a Coreia do Norte”, um aliado próximo de Pequim condenado internacionalmente pelas suas actividades nucleares ilegais. Tillerson frisou no entanto que divergências com a China em determinadas questões não impedem uma “parceria produtiva” noutras áreas. Ligações perigosas O empresário, que Trump quer venha a ser o seu secretário de Estado, foi intensamente questionado pelos senadores sobretudo acerca das suas ligações empresariais à Rússia, admitindo que “actividades recentes” de Moscovo contrariam os interesses dos Estados Unidos. Às insistentes questões do republicano Marc Rubio sobre a alegada interferência informática da Rússia numa tentativa de influenciar as eleições presidenciais norte-americanas, Tillerson respondeu que é “razoável pensar” que o Presidente russo, Vladimir Putin, estava a par de tais manobras. O provável futuro secretário de Estado frisou no entanto não conhecer os relatórios dos serviços de informações que alegam essa interferência. Noutro momento da audição, Tillerson criticou o processo de aproximação a Cuba lançado pela administração de Barack Obama, por considerar que, a ser feito, o seu progresso devia ter dependido de “concessões significativas” da parte de Havana em matéria de direitos humanos.
Paulo José Miranda Em modo de perguntar h | Artes, Letras e IdeiasRaquel Serejo Martins: “Os meus poemas são frutos para comer crus” [dropcap style≠’circle’]É[/dropcap]s poeta (acerca do teu livro de poesia, primeiro e até agora único, Aves de Incêndio, escrevi neste jornal esta semana), e escritora. Aliás, tens mais obra de prosa editada do que de poesia, dois romances na Editorial Estampa, A Solidão dos Inconstantes (2009) e Pretérito Perfeito (2013). Assinas ainda uma crónica semanal na revista “Sábado”, onde na realidade escreves pequenos contos. Qual de todas estas actividades é para ti a principal, se é que há uma principal, e não me refiro ao teu trabalho diário, que nada tem a ver com as letras? Nunca pensei nisso e não consigo dizer qual a principal, aviso já que sou óptima a não conseguir explicar as coisas, todavia consigo dizer que o romance me exige mais fôlego, sufoca-me, tenho medo que me falte o ar, o pé, de não me encontrar, é um burilar longo e penoso, processualmente duro. No romance sou escafandrista, enquanto na crónica ou no conto respiro. Muitas vezes chego ao papel já com uma história, com princípio, meio e fim, três linhas de história não mais, depois, aranha competente, vou tecendo a teia, acrescentando pontos ao conto e não são raros os momentos em que consigo divertir-me a escrever, a escolher as palavras, a limar as arestas, a polir e a puxar o lustro aos parágrafos. Já a poesia é um mistério, é um caso sério, é garimpo à procura de minério, de palavras pepitas, palavras que brilham e que juntas fazem luz, mesmo se dolorosas e escuras, a poesia acontece, é um relâmpago e, em consequência, os meus poemas são frutos para comer crus e muitas vezes com casca. E apesar de serem três registos diferentes, parece-me, dizem-me, que a poesia contamina tudo o que escrevo. E como entendes a poesia. De outro modo, imagino que leias e gostes de poesia diferente daquela que escreves, que procuras nos poemas que lês e o que procuras nos que escreves? Uma vez escrevi sob o petulante título Brevíssimo Manual Desconfia do poema se: Não te corta a respiração Não te sufoca Não te acelera o bater do coração Não te faz sorrir. E, de facto, é mais ou menos isto que eu procuro e quero da poesia, que me encante, que me deixe boquiaberta, que me roube à rotina dos dias. Sendo que, provavelmente, quase de certeza, escrevo por esse mesmo motivo, para roubar-me à rotina dos meus dias, porque são demasiados os dias em que nada disto tem sentido. E como vês a poesia actualmente em Portugal? Achas que se atravessa um período pujante ou antes pelo contrário? Eu tenho um amigo poeta, João Bosco da Silva, que diz que só os poetas compram livros de poesia e é quase verdade. Por outro lado, com base no volume de poesia que vejo circular pelas redes sociais, também me parece que nunca se fez e leu tanta poesia como hoje, assim como, em Lisboa e pelo que sei também no Porto, voltou a ler-se poesia em cafés e bares, e são várias as editoras especialmente vocacionadas para a poesia, o que indicia que a poesia está na moda. E, em estando na moda, há muita gente a escrever má poesia, há um excesso de péssima poesia que fere e prejudica o género, mas também há gente boa a encantar. É que dizer que Portugal é um país de poetas, não quer dizer que todos somos poetas, mas que temos excelentes poetas. Sendo que, obviamente, também me coloco a questão, será que posso chamar poesia ao que escrevo. Sentes que pertences a alguma geração de poetas? Que há essa geração? Sinto que andamos todos muito sozinhos, ou eu ando muito sozinha, é tão fácil fazer generalizações sem fundamento, pelo que não me reconheço nesse sentimento de pertença, mas dito isto, ultimamente tenho tido a boa ventura de conhecer uns quantos poetas e são pessoas que gosto de abraçar, pelo que melhor adiar a resposta a esta pergunta por uns tempos. E para quando o teu segundo livro de poesia? O meu próximo livro de poesia está na gaveta, tem dentro 100 poemas de amor, e um dia, não sei dizer quando, vai sair da gaveta. Neste momento não tenho pressa em editar, assim como me parece que o Aves de Incêndio ainda precisa de espaço para voar.
Anabela Canas de tudo e de nada h | Artes, Letras e IdeiasO coro e o ponto – Aqueles dias normais [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]queles dias. Sim, aqueles que todos temos. Talvez. A cabeça a explodir de incompreensão e erro. Ou será o coração. Talvez. Ou as vísceras mais abaixo na hierarquia de valores dessa sociedade secreta de funções populares do corpo e lirismos emocionais não se sabe de onde. Que se enovelam como agoniadas de si próprias. E caem umas sobre as outras num tumulto espacial que a pele e todos os ligamentos contrariam afinal. Ou em cima aquele nó fechado de faltar o ar e vemos ao espelho e não está lá. Mas não são as sensações algo de realidade inequívoca em reacção a estímulos? Serão ou não. Talvez dependendo da realidade destes. E que realidade seja essa é inquestionável às vezes. Outras não. E dias em que verificamos que nada explode afinal. Que tudo são imagens e figuras de estilo. E que afinal ardemos simplesmente até ao pó. Passando pelas brasas incandescentes de belas mas em final de existência do fogo vital. Nada explode afinal senão ateado um engenho doméstico e mesmo assim. Sempre possível ficar-se vivo mas sem ver, ou sem pernas para andar, ou sem mãos para tactear as linhas. De uma escrita qualquer. Em que penso onde estará o desamparo maior, se na realidade, se no sonho. Se sonho é um roubo adquirido secretamente e sem documentos. Se a realidade alguma vez teria sido visível sem andares de arranha-céus por ali acima até um ponto indefinido que não é, no entanto, o dito mas a desdita de não se alcançar como limite. Sempre como limiar. E a pensar entre parêntesis que sim, que houve. Não porque sempre se terá sido mais jovem, sempre se terá tido menos vida, sempre se terá tido mais caminho para a frente. Na sua indefinida e feliz e inapropriável extensão. Que tudo permite. Sonhar. Imaginar até. Mas não é essa sobre todas as razões. A razão é uma época dividida em duas que nos calhou cruzar sem aprendizagem. Que não a de cada um em si, sem labirintos nem zonas proibidas. É o que pode restar de seguro na líquida impermanência de tudo. E no entanto, não sei. Disfarço bem, talvez, mas não faço a menor ideia do que faço aqui. Tudo o que se evola sem remédio, tudo o que passa por cada um como uma aragem demasiado etérea para, cabendo nos dedos, aí se sentir segura. Aí se saber segurar. Tudo o que é invisível. Tudo o que visível não se consegue ler. E mudamos. Vamos metamorfoseando algo impreciso de nós e olhando de revés ou de frente sem antagonismo mas cuidado. Tende-se a perder mais coisas na complexidade com que se apresentam. E fincar os pés no chão para não se ser arrastado pelo que nos tira de nós, não garante que algo de nós não se funda com o chão como um animal aterrorizado que hiberna para não pensar. Ou se enterra no conforto inóspito da terra para esconder a impotência face à dificuldade do caminho. O caminhar pesado e sólido pela vida a dentro. Do cante alentejano. Nos momentos de não fazer. Também. Como os outros, momentos de ser. E lembrei-me desse aspecto particular do cante alentejano. Da terra onde me nascem memórias mas em fuga. Donde retirar com rigor as origens não importa. As raízes, especula-se. São múltiplas, de sagrado e profano entrecruzadas de lugares, tradições. Do canto gregoriano ou das raízes árabes. Aspectos primitivos, ainda, parecem remontar mais lá atrás. Tradição de vozes graves. Vem das entranhas do passado e um dia destes passará a coisa leve para turista ver, como uma parede cega e sem densidade para trás. Ou um prédio de janelas vazias sobre o céu e sem mais do que a fachada à espera de demolição. Não posso dizer que me emocione. Coisa culturalmente incorrecta de se dizer, mas que fazer… Talvez intelectualmente, ainda. Dizer que gosto. Mas de uma maneira muito mental. Emoções fortes mas trabalhadas num apreço de recordação. Não oiço. Nunca oiço nem apetece. De que forma gosto para além do admirar, difícil fórmula estética de emoção na ausência. Não sei. Uma emoção teórica. Ou talvez o prefira na memória. Não é a embriaguez de outra música. Mas é pujante como um murro em pleno plexo solar aquela ideia de muralha firme de gente de braço dado a avançar lentamente. As passadas conjuntas, a banda compacta de seres enlaçados pelos braços a avançar inexoráveis e lentos. A balançar ligeiramente nesse avanço gradual e pontuado de vozes. Vozes só. A balançar ligeiramente de um lado para o outro segundo a cadência dos passos. Uma coisa da terra e talvez a vencer a imensidão desértica e sedenta dessa terra. E da musicalidade sóbria das vozes tão particulares que nem os instrumentos lhes chegam, a alternar em coro, ou ponto. Em desafio. Vozes respondem a outras. Umas às outras. Com um alto preenchendo as pausas. E é assim que as lembro. As vozes e depois o que lembrei antes. As avós. E tias avós. E irmãs e primas. Amigas. Nos homens não se usava. Mas nelas sim. Sem pudor, nem receio. Como se fosse mais seguro sempre andar ancorada em alguém. Uma na outra. Como se sempre contra um vento mau. Uma maré perigosa. E namorados. E esposos. Dar a mão é bom. Há o tacto. Mas dar o braço é um laço mais próximo e firme. Um ampara o outro. É belo isso. Era belo. E um dia destes aconteceu-me. Conheci uma mulher depois de um tempo talvez amplo de correspondência trocada. Virtual. Mas com o calor e a generosidade algo anacrónicos de um outro tempo de cartas em papel. E um dia veio. Primeiro, não vindo. O tempo a passar. Minutos, meia hora. Uma hora. E eu, ferozmente estoica a pé, a fugir às goteiras da chuva intervalada, à frente da Brasileira, no fundo, no fundo, só para ter a certeza de que não vinha e não havia desencontro possível no não vir. Uma coisa muito minha. E o tempo de pensar toda a irrealidade óbvia de um ser que seria talvez um outro completamente diferente do imaginado e expresso. E, quando já e sempre não esperava e quase nem tinha retrospectivamente esperado, surge bem de perto, sem espaço de recuo para a reconhecer, calorosa, igual e tridimensional, a voz cantada do telefone de Lisboa, e agarrou-se-me ao braço assim, à antiga, pujante, forte e alegremente, e seguimos como se combinado pela rua acima. Uma coisa que não se usa, já. Nunca me vou esquecer. Por mais Atlântico que nos separe nos dias todos da vida. Amigas para sempre se nada se desfizer noutras complexidades da distância, do tempo e da falta dele. E recuei uma geração ou duas, a um espaço estranho de conforto e quase receio. E é nesses momentos que aquele lado em mim, que tenta fazer-se ouvir a dizer “don’t look back, don’t look back”, se rebela e pensa, deixa ver se não me esqueci de nada. Essencial. De mim. A chave do lado de dentro. Neste tempo fatiado, fragmentado e líquido. De realidade mais imatérica do que qualquer fantasia. De intocáveis e impermanentes sonhos que só me dão descanso no sono. Quando vem. Se alguém vir por aí um personagem de figura bem apessoada e olhos e aparência de sono, é favor devolver, que deve ser o meu. Não consigo dormir sem ele. Enquanto isso, sonho. Não errar as estações. E nos intervalos, não sei. Nada. E quando não sei nada só queria dizer coisas bonitas a troar-me aos ouvidos, atordoar-me nelas e embalar-me na ausência de sentidos mais sólidos. Embriagar-me de palavras que existem e se existem basta pensar nelas. Dizê-las, e ganham vida própria de palavras. Reais. A meter medo. Entre todas as possíveis guardadas no dicionário surpreendente em si e mais ainda se o imaginasse feito de conjuntos de duas. E de três. Não avanço mais nem me atrevo a pensar nas possibilidades. Quantos volumes para as entender. Para as desbravar. Como floresta complexa e invencível e que afinal o simples Homem pode erradicar. Como num silêncio, árvore a árvore.
José Simões Morais h | Artes, Letras e IdeiasO auto didacta botânico e naturalista Alfredo Augusto de Almeida [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]lfredo Augusto de Almeida (1898-1971) é das poucas pessoas que em Macau tem, ou teve, uma estátua. Mas quem reconhece o seu nome? Não foi político, nem exerceu nenhum cargo de governação, assim como não era rico, nem esteve ligado ao comércio. Era um humilde funcionário público, homem autodidacta que gostava de saber, de aprender e ensinar, que se especializou em botânica e com quem muitos estrangeiros, que vinham a Macau, gostavam de falar. Também a ele se deve a recuperação de muitas das pedras pertencentes à História da cidade, atiradas para o lixo depois de partidas. Tetraneto do Primeiro Barão de Porto Alegre, um dos comerciantes de ópio mais ricos de Macau nos inícios do século XIX, Alfredo Augusto de Almeida nasceu em Macau a 21 de Janeiro de 1898 e aqui faleceu a 13 de Novembro de 1971. Era o sexto filho de Carlos Eugénio de Almeida e de D. Adelaide Maria Marques, tendo-se casado na Sé no dia 26 de Julho de 1925 com D. Rosalina Maria Boyol, mas não deixou descendência. Segundo o que refere Jorge Forjaz, “não herdou a fortuna dos seus antepassados e, por isso, foi toda a vida um humilde funcionário público e municipal. Mas herdou as suas virtudes, a sua grandeza de alma e um nobre coração. Filho de Macau, da mais ilustre aristocracia macaense, este homem foi sempre leal e honesto, nobre e respeitador no trato social e amigo da sua terra como poucos. A este botânico e naturalista, os jardins de Macau devem-lhe muito e o da Flora deve-lhe quase tudo, inclusivamente a classificação científica de todas as plantas e animais que lá existiam. Apaixonado pela floricultura e pela ornitologia”, reconstruiu o jardim da Igreja de S. Lourenço em 1935, sob as indicações da Sra. D. Laura Lobato. Depois da II Grande Guerra Mundial, Alfredo Augusto de Almeida, ao serviço do Leal Senado, renovou e transformou o espaço verde do Jardim da Flora, introduzindo novas espécies de flores, árvores de fruto e até uma pequena fauna. “Era um homem que se fez a si mesmo, um self made man, lia e consultava as autoridades em botânica e na arqueologia; por isso o Prof. Williams, de St. Francis Xavier College, perito em botânica, nunca vinha a Macau que não fosse a sua casa; o mesmo fez sempre o brigadeiro e historiador Sir Lindsay Ride, que tinha por ele o maior apreço; o então Governador Jaime Silvério Marques (1959-1962) correspondia-se frequentemente com este funcionário, a quem tanto apreciara e elogiara durante o seu Governo de Macau”, segundo refere o Padre Manuel Teixeira. Museu Arqueológico de S. Paulo Terminamos o artigo da semana anterior com a transferência das lajes sepulcrais, que foram removidas do chão do átrio do edifício do Leal Senado e colocadas no Museu Arqueológico das Ruínas de S. Paulo, instituído pelo então Governador Jaime Silvério Marques (1959-1962), nele se empenhando com todo o interesse o Sr. Fernando da Silva Amaro. Muito mais tarde, a esposa do então Governador Nobre de Carvalho disse ao presidente da Câmara que removesse as pedras do recinto de S. Paulo para outro local, onde não estivessem expostas às intempéries do tempo. “O presidente deu as suas ordens aos assalariados da Câmara e estes, achando as pedras enormes e muito pesadas, desconhecendo o seu valor histórico, pegaram em marretas e partiram-nas em vários pedaços e lançaram-nas para a doca de Lamau”, como refere o Padre Manuel Teixeira, dizendo ter-lhe sido tal relatado pelo amigo Alfredo de Almeida, que sabia melhor que ninguém o que se passara. Preparava Sir Lindsay Ride, ex-Chanceler da Universidade de Hong Kong, a obra The Voices of Macao Stones e pediu ao Padre Manuel Teixeira que fizesse a revisão. Foi então que este padre, encontrando grandes lacunas por faltarem as pedras do Museu Arqueológico de S. Paulo, descobriu terem estas daí desaparecido. Procurou o Sr. Alfredo de Almeida e ele, após contar o que ocorrera, levou-os à Doca de Lamau onde andaram à procura das pedras quebradas em 1966. Passaram vários meses nessa tarefa, andando Alfredo de Almeida também a recolhê-las pelas valetas da cidade. Sir Lindsay Ride, em conjunto com o Padre Manuel Teixeira, reuniram pedaço por pedaço até as reconstituir e Almeida incumbiu-se de os cimentar. Mas muitas pedras tinham desaparecido. A 5 de Maio de 1969 fizeram um Ofício ao Governador da Província Nobre de Carvalho onde dão a Voz das Pedras de Macau. “E elas falaram e pediram que transmitisse a V. Exa. o seu pedido: queixam-se de que estão votadas ao abandono, parte na Flora e parte na doca do Lamau, onde se vêem em risco de serem destruídas e levadas para construção de casas”. Assim a pedido do Padre Manuel Teixeira, o Governador de Macau mandou, no início de 1971, colocar na Fortaleza do Monte as pedras históricas recuperadas e o Museu ficou na parada da Fortaleza, à direita de quem entra. Das muitas pedras que Alfredo de Almeida conseguiu salvar, encontrava-se a cabeça de leão, por onde jorrava a água da Bica do Nilau (Fonte do Lilau), no sopé da Colina da Penha. Devido à sua remodelação daí fora retirada, mas agora está ela de novo desaparecida, restando dessa fonte a cabeça de Neptuno, hoje incrustada no muro do jardim da Casa Garden. Também a estátua de granito dum holandês, que se encontrava na Fortaleza da Guia, foi levada para o Museu Arqueológico das Ruínas de S. Paulo. O corpo aí se manteve, mas a cabeça foi encontrada pelos funcionários das Obras públicas no esgoto da Calçada do Botelho. Almeida reuniu de novo a cabeça ao tronco e a estátua foi para o Jardim da Flora, passando depois para os Jardins da Casa Garden, encontrando-se hoje no Museu do Oriente, em Lisboa. Assim Macau deve bastante a Alfredo de Almeida pela recuperação de muitas das pedras de alto valor arqueológico pertencentes à História da cidade, atiradas para o lixo depois de partidas pois, conseguiu salvar da destruição inúmeras delas. “Oseo Acconci, que tanto o estimava, moldou o seu busto, um mês antes da sua morte, o qual foi colocado no passeio central do Jardim da Flora, com a seguinte legenda: <A Alfredo Augusto de Almeida que em vida tanto amor dedicou a este jardim 1898-1971>”, segundo refere o Monsenhor Manuel Teixeira. Lembro-me de ver esta estátua ainda em 1994 e quando dela de novo me recordei, não a encontrei. Por indicação do Eng. Agrónomo António Paula Saraiva, ela encontrava-se agora no Jardim do NAPE. Bem a procurei, mesmo nas arrecadações do jardim, mas nada, a estátua desaparecera e ninguém sabe dela. NOTA: Antes de encerrar o ano do Macaco no calendário chinês, deixamos aqui corrigido o lamentável erro publicado no artigo de 18 de Novembro de 2016 com o título Gincana de automóveis na Feira de Macau. O primeiro automóvel a circular em Portugal foi adquirido pelo Conde Jorge Avillez que, em Outubro de 1895, (e não em 11 de Outubro de 1914, como por lapso fizemos referência), na sua primeira viagem, que demorou três dias, feita entre Lisboa, onde tinha ido buscar o Panhard and Levassor e a sua casa, em Santiago do Cacém, este aristocrata conduzindo-o a 15 km/h, entre várias peripécias, atropelou um burro, causando-lhe a morte.