Hoje Macau BrevesMeteorologia | Fim-de-semana a bater o dente Segundo os Serviços de Meteorologia e Geofísicos, prevê-se que uma nova vaga de frio visite o território devido a uma frente fria que vai atravessar a costa meridional da China. A descida da temperatura deve vir acompanhada de chuva, trovoada e vento com rajadas. Hoje será o dia em que a descida de temperatura se fará sentir mais acentuadamente, com os termómetros a cair para os oito graus, acompanhado de períodos ocasionais de chuva. Nos próximos três a quatro dias, a situação deverá manter-se sem grandes alterações. Ou seja, tempo frio com temperaturas inferiores aos 12ºC.
Andreia Sofia Silva BrevesHelen Liang | Governo abre concurso público para obras O Governo está finalmente a avançar com o projecto de transformação do Instituto Helen Liang, que acolhe crianças com problemas familiares, numa creche pública. Foi ontem publicado em Boletim Oficial (BO) o despacho que determina a abertura de um concurso público para a realização de obras de remodelação no edifício, o qual é assinado pelo Instituto de Acção Social (IAS). Foi em 2013 que o IAS anunciou a intenção de utilizar o Instituto Helen Liang para abrir uma nova creche, dada as poucas vagas existentes no território, mas o projecto tem sido sucessivamente adiado. As crianças que actualmente residem no Instituto Helen Liang deverão ser transferidas para outras instituições ou enviadas de novo para as suas casas, consoante o processo. O edifício que alberga o instituto foi concebido pelo arquitecto português Manuel Vicente.
Filipa Araújo Eventos MancheteLuiz Ruffato, escritor e colunista no El País : “Os intelectuais brasileiros são muito covardes” Numa pausa entre livros, Luiz Ruffato fala-nos do mundo, da política brasileira, da literatura elitista e da falta de partilha de letras entre Portugal e o Brasil. Para o autor, os intelectuais devem assumir posições sociais e no seu caso não se importa de não ser reconhecido como escritor quando o chamam para discutir ideias Portugal e Brasil estão mais ligados no mundo da literatura por partilharem a mesma língua? Tenho uma visão muito pessimista da relação entre o Brasil e Portugal, porque é uma relação muito difícil, por ser o único caso em que o colonizado assumiu uma proporção política e económica maior que o colonizador. Isto acabou por provocar um sentimento negativo entre estes dois países. Não existe no Brasil esta relação que Macau tem para com Portugal. A maioria dos brasileiros não tem qualquer relação com Portugal. Existe um certo desprezo. Mas por outro lado existe também um Portugal que tem uma ideia muito má do Brasil. Num determinado momento chegaram muitos brasileiros a Portugal que acabaram por deixar uma imagem de prostituição e de pessoas irresponsáveis. Isso é verdade? Não, antes pelo contrário. O Brasil é um país super trabalhador, há muitas coisas no Brasil que seriam muito interessantes para os portugueses conhecerem. Em relação à literatura, nós conhecemos a portuguesa… mas só as pessoas que lêem. O contrário não é verdade, os portugueses não conhecem nem querem conhecer a literatura brasileira, não dão a menor importância, alegando uma certa dificuldade em perceber esta literatura. Isto é uma contradição, ou seja [se os portugueses] têm dificuldade em perceber então não estamos a falar a mesma língua. Mas se dizemos que não é a mesma língua, os portugueses ficam chateados. É a única coisa que resta a Portugal? Daí o não apoio ao Acordo Ortográfico? (risos) Todas as vezes que vou a Portugal perguntam-me o que acho do AO e digo: nada. Para nós isso tem zero importância. Mas eu sei, é a única coisa que vocês têm. É um problema. Gostaria que nos sentássemos e resolvêssemos os nossos problemas. Colocávamos dinheiro no Instituto Camões e ele deixava de ser português para ser lusófono. Ensinava língua brasileira, africana… cultura, literatura. Mas isto vai acontecer? Nunca. O que vai acontecer é que vamos cada vez mais distanciar-nos, o português de Portugal vai acabar por ser um mero dialecto da língua brasileira. Há um exemplo muito concreto: eu num carro com um motorista brasileiro e dois portugueses atrás. Eles a conversarem e o motorista intervém dizendo: “desculpem, vocês estão falando uma língua que eu entendo bastante, que língua é essa?”. Bem, aquilo deixou os portugueses surpreendidos e eles disseram que falavam Português. E o motorista perguntou de que país eram porque ele não sabia que em Portugal também se falava Português. Desde crianças que nós achamos que falamos Português, nós brasileiros. Por isso é que acho que daqui a uns anos isto poderá acontecer. Acha que os seus livros são mais lidos no Brasil ou no estrangeiro? Mais lidos não sei, devido ao elevado número de pessoas. Mas com certeza tenho mais visibilidade fora do Brasil, isso é indiscutível. No seu livro “A História Verdadeira do Sapo Luiz”, que ganhou a 57ª edição do Prémio Jabuti de livros infantis, conta a história de um sapo que nunca se tornou príncipe, porque não precisamos de ser príncipes para termos um lugar no mundo. Faz muitas vezes referência à sua origem, mostrando-se como alguém que não é filho de intelectuais mas conseguiu entrar neste mundo da literatura. Há uma ligação? O Luiz é o sapo da fábula? Sim, eu sou o sapo que não [se transformou] num príncipe e não é por isso que não sou feliz. (risos) Na sociedade brasileira 99,99% dos escritores são filhos de classe média alta, em geral são pessoas que tiveram em casa uma biblioteca, eram filhos de intelectuais. E isso é reproduzido na literatura, mesmo quando escrevem de pobres e bandidos. Como não sou filho de classe média, a minha biografia é diferente e isso deu-me um lugar dentro do mercado literário, do seu sistema, bastante diferenciado. Cada vez menos, é certo. Mas subjectivamente continuo a ser alguém que entrou pela porta dos fundos. Sente-se muito essa diferença? Sim, muito. Basta olhar para o tipo de personagens que uso na minha literatura, não são comuns na literatura brasileira. O tipo de actuação que tento fazer nas colunas do El País, que é discutir política. Os intelectuais brasileiros são muito covardes, eles preferem não discutir. Não se posicionam no mundo político… É muito difícil encontrar alguém que se posicione de forma clara. Mesmo quando são discutidas questões mais ligadas à literatura é muito comum encontrar um escritor que diga: “o que tinha a dizer está escrito nos livros”. Isto é uma estupidez imensa. Portanto, neste sentido, sim, optei por ser sapo num sistema literário. Os seus livros são o retrato de uma classe que não a média alta, que não os intelectuais. Nasceu por ninguém escrever sobre este grupo? Comecei a escrever exactamente por isso, ninguém escrevia sobre as pessoas que eu conhecia. Isto incomodava-me muito, achava super estranho. Como não existia uma literatura que falasse da classe que trabalha eu decidi escrever. Não foi uma necessidade que nasceu de dentro para fora, foi ao contrário. Eu escolhi escrever sobre isto, foi sempre muito claro, muito intencional. Mas marcou uma posição muito clara de actividade social depois do polémico discurso na Alemanha, em 2013, onde apresentou várias críticas ao Brasil… Depois desse discurso muito professores de escolas secundárias e de lugares distantes imprimiram esse discurso e levaram para a sala de aula. Acho que bastantes pessoas que hoje me conhecem não me conhecem como escritor mas sim devido àquele discurso. Não há problema algum, não lamento que não leiam os livros. Mas sim, depois desse discurso recebi várias intervenções da sociedade e pedidos para conversar e saber das minhas ideias. Queria ser mais conhecido como escritor, claro, mas num país como o meu, que é horrível, que tem um nível de educação baixo, com problemas políticos graves, querer abrir mão deste papel, lugar e espaço é quase criminoso. Portanto fico frustrado por ser pouco lido? Claro que sim. Mas é importante que me procurem como pessoa que dá opinião? É. Abdicava dos livros por este lado político? Sinceramente, se pudesse actuar de uma maneira mais efectiva, não digo político institucional, abria mão dos meu livros. Está a fazê-lo na sua coluna no jornal El País… Sim, de alguma maneira. É algo que consome muito tempo, muito esforço e um problema sério, é que todas as vezes que escrevo alguma coisa perco leitores. (risos) É o meu papel, enfim, acho que é. Escrevo semanalmente, é uma loucura, são colunas muito polémicas. Hoje no Brasil quando criticamos o Governo somos da oposição, mas se criticamos a oposição somos do Governo. Isto é errado. O bom é termos independência, quer dizer, até podemos estar errados quanto às nossas opiniões, mas é melhor estar errado pela nossa cabeça do que estar certo de coisas que não são nossas. Prefiro estar equivocado e ter menos leitores. Deixou o jornalismo para se dedicar exclusivamente à escrita. Isso mesmo. E isso era muito incomum, era raro. Ainda é raro encontrar alguém no Brasil que se dedique exclusivamente à literatura. Fiz essa opção. Em alguns entrevistas cheguei a dizer que tinha orgulho que a literatura me fizesse ganhar dinheiro, que vivia disso. Isso para os intelectuais era uma vergonha, porque eles não precisam disso. Isto para mim é profissão. Tenho muito orgulho nisso, gosto muito. Em que é que mais de 15 anos na área o ajudaram como escritor? Não tenho dúvidas de que o jornalismo é a mais importante arma da democracia, não tenho nenhuma dúvida. Mas o meu papel no jornalismo era ridículo. Sempre fui um péssimo repórter, digo repórter, não jornalista. Sou muito tímido, morria de vergonha de fazer perguntas, e o jornalista tem de ser cara de pau e “encher o saco”, como dizemos (risos). Isso chateava-me imenso. Muito cedo, dentro do jornalismo, percebi que gostava de inventar reportagens (risos) e como isso não pode acontecer comecei por ficar dentro da redacção. E aí sim, como redactor e editor era bom, isso era. Mas ainda assim era frustrante, ao mesmo tempo via que tudo o que me interessa era exactamente aquilo que não interessava. Até que um dia decidi deixar e tentar literatura. Como escritor, o jornalismo não me deixou nada. Como está o jornalismo no Brasil? Há muitos anos que a entrada da internet no mundo fez com que fosse necessário discutir o formato [do jornalismo]. O grande problema, focado na imprensa, é que o número de pessoas que lê é pouco e as pessoas que lêem começaram a ficaram cada vez mais desinteressadas, porque os jornais não conseguiram resolver o problema da internet. Há um problema também na diversidade ideológica, no Brasil, nos jornais. Todos defendem interesses iguais. Por exemplo em Portugal, vamos comprar um jornal e conseguimos ver diferentes interesses. No Brasil isto é impossível. Todos os jornais são iguais. Há também uma perda na credibilidade, o leitor perdeu a confiança. Muitas teses de mestrado e doutoramento tiveram como base os seus livros. Como vê a educação brasileira actualmente? Tenho várias teses, em várias universidades. É interessante observar como é que de alguma maneira os meus livros foram incorporados no sistema de educação. [Mas o ensino é] horrível, é horrível. Temos um dos piores índices da avaliação internacional que é feita. O sistema educacional é um fracasso completo. A grande crítica que faço ao Governo é essa, nunca imaginei que com o PT [Partido dos Trabalhadores], eu que ajudei a formar o partido, tivéssemos estas mudanças absurdas estando no poder. Imaginei uma mudança fundamental na educação, mas não foi feita. Porquê? Como é que se perdem os valores? Poder. O Frei Betto, que é um frade católico meu amigo, escritor, foi do primeiro Governo de Lula durante dois ou três anos e saiu logo. Continua próximo do PT, mas não do Governo. Depois de sair escreveu um artigo que tinha esta frase que, acho eu, ser a síntese do problema do Brasil: “O PT trocou um programa de governo para um programa de poder”. É este o problema. O seu último livro foi em 2014, teremos um novo livro este ano? Nos último quatro anos tenho ficado mais tempo fora do Brasil do que dentro. É bom para conhecer outras coisas e partilhar trabalho, mas o lado mau é que fico sem tempo para me dedicar à escrita, agravado pela coluna semanal. Dificilmente vou conseguir terminar alguma coisa, um novo livro talvez só em 2018.
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesATV, encerrar ou não, eis a questão! [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]s últimas notícias sobre a ATV deixaram de ser novidade já há algum tempo. No dia 1 de Abril de 2015, o Conselho Executivo de Hong Kong deu à ATV um prazo de um ano para cancelar a licença de emissão de Televisão Digital Terrestre, que até aí lhe tinha sido cedida gratuitamente. Mal esta data expire deixaremos de poder assistir às emissões da ATV. Logo após o anúncio do Conselho Executivo, começaram a ser ventilados vários casos relacionados com a estação e que nada abonavam a seu favor. A ordem de liquidação provisória foi dada em Tribunal, no passado dia 4, e a notícia de despedimento dos 300 funcionários foi emitida pelo executor Deloitte. O despedimento foi geral. Uma ordem provisória de liquidação determina o fim da actividade de uma empresa e antecede a sua extinção legal. O executor provisório é apontado pelo Tribunal para levar a cabo a liquidação. Quer a ordem quer o executor têm um carácter temporário. Só poderão ser confirmados após reunião dos credores da ATV na qual sejam decididos os termos da liquidação. Sem perda de tempo, logo no dia 5 deste mês, a China Culture Media International Holdings Limited (o novo accionista) readmitiu 160 dos 300 funcionários despedidos, para manterem a estação a funcionar. Foi-lhes proposto trabalharem até ao próximo dia 1 de Abril, recebendo dois salários por um mês de trabalho. Não parece uma má proposta receber um mês a dobrar. No entanto a ATV ainda devia a estes funcionários os salários de Janeiro e de Fevereiro, pelo que esta proposta apenas resolvia parte do seus problemas. Acresce ainda que o novo accionista estipulou condições contra os direitos legais destes trabalhadores. Ficaram impedidos de reclamar o pagamento dos salários em atraso antes de dia 3 de Abril. Por outras palavras, os 160 trabalhadores não podem processar, nem a ATV nem a Deloitte, pelos salários em falta antes desta data. No entanto estão autorizados a apresentar queixa ao Fundo de Insolvência para Protecção de Salários, para tentarem recuperar o valor em falta. O Fundo de Insolvência para Protecção de Salários foi criado pelo Governo da RAEHK. As empresas que operam em Hong Kong são obrigadas a pagar 250 HKD por ano pela sua licença comercial. Estes valores são depositados num Fundo que cobre o pagamento de salários quando as empresas ficam impossibilitadas de o fazer. Qualquer valor que os empregados recuperem posteriormente do seu empregador deverá ser restituído ao Fundo. O Fundo funciona como um intermediário entre patrões e empregados e é um garante para os trabalhadores. Em caso de falência, pelo menos parte dos salários em falta será devolvida. Em Macau não foi criado um Fundo similar. E agora pergunto eu, se o meu caro leitor estivesse na pele de um destes 160 funcionários, aceitaria ou não a proposta que lhes foi feita? Bem, do ponto de vista financeiro não me parece que lhes reste outra alternativa senão aceitarem. Com um passivo de dois meses de salário em atraso e, evidentemente, com vidas para gerir, que mais podem fazer? Por um mês de trabalho recebem dois ordenados, estão à espera de quê? Do ponto de vista legal, serão legítimas as condições estipuladas pelo novo accionista, ou seja, que os trabalhadores abdiquem dos seus direitos legais até dia 3 de Abril? Em Hong Kong as leis que regem o emprego orientam-se por um princípio básico que defende que nunca deve haver qualquer limitação dos direitos dos trabalhadores. Mesmo que os trabalhadores concordem com essas limitações, continua a ser ilegal. E isto porque os acordos entre patrões e empregados não se sobrepõem aos requisitos estatutários. A Lei deverá ter sempre a última palavra. No entanto este acordo não priva propriamente os trabalhadores dos seus direitos, apenas os adia. O facto de se absterem de qualquer acção até 3 de Abril, não reduz em nada os seus direitos, portanto aparentemente não se verifica uma transgressão da Lei do Trabalho de Hong Kong. Mas o efeito de “adiar o exercício dos direitos legais” pode ser prejudicial. Está fora de questão pôr em causa o dever que o empregador tem de pagar os salários aos seus funcionários. Mas nesta situação esse dever é intencionalmente adiado, não lhe parece? É evidente que o novo accionista terá as suas razões para agir desta forma. A transferência das quotas dos accionistas originais da ATV para os actuais leva tempo. A aprovação do Governo de Hong Kong é necessária. Sabemos pelos media que esta transferência ainda está em curso. Logo se a transferência ainda não está efectivada, de momento os novos investidores são estranhos à ATV, ainda não são accionistas de pleno direito. Não têm direito a pronunciar-se. Além disso como a licença da ATV não vai ser renovada, o seu futuro ainda é um grande ponto de interrogação. Ninguém sabe dizer se depois de 3 de Abril a ATV vai continuar a emitir. Para já a estação precisa de investimento. No caso de haver um encerramento, todo o dinheiro que os novos investidores já injectaram será desperdiçado. Podemos pensar que o acordo feito com os 160 funcionários é melhor que nada. A nova vida da ATV vai depender dos novos accionistas e da sua equipa. * Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Leocardo VozesSó conversa (吹水) Strange days have found us Strange days have tracked us down They’re going to destroy our casual joys We shall go on playing or find a new town, yeah The Doors, Strange Days [dropcap style=’circle’]S[/dropcap]ão dias estranhos, estes que vivemos agora em Macau, e se não se pode dizer que estes dias tenham vindo atrás de nós e nos tenham encontrado, pode-se dizer que fomos nós que os procuramos, e se não formos cuidadosos, pode ser que arruínem a nossa felicidade. Discutem-se por aí agora questões que tiveram todo o tempo do mundo para ser discutidas, como sejam a identidade, e que papel desempenha cada um no contexto da RAEM. Tudo isto tem sido o mote para as mais variadas análises, que vão da simples opinião até a estudos mais ou menos elaborados, e se há alguma conclusão que pode ser retirada, é que não há conclusões a retirar. Tudo varia conforme o que se procura saber, e junto de quem. Macau é assim, uma terra de contrastes e de pessoas que contrastam, e permitam-me o lugar comum, “cada caso é um caso”. Quer no que concerne à questão da identidade, ou da forma como se encara esta realidade tão particular que é Macau, há um factor que é preciso ter em conta: a falta de um valor essencial que seja comum a todas as comunidades, algo precioso, original e único que seja um resultado do convívio entre todas elas, que tenha perdurado e cuja necessidade de preservar fosse unânime – em suma, uma matriz. Nunca seria fácil, mesmo que houvesse uma pretensão a tal, uma vez que Macau foi sempre tido como um lugar de passagem, parte de um plano maior, e nunca uma meta. O território usufrui hoje de um estatuto que é mais uma vez temporário, mesmo que os cinquenta anos estabelecidos até nova mudança sejam mais do que qualquer outro período da sua história recente na mesma condição. Parece confuso posto nestes termos, mas vou elaborar. O que se sabe de Macau dos tempos remotos não é muito diferente daquilo que hoje temos; podem ter desaparecido os pescadores, mas o passatempo a que estes já se dedicavam antes de chegarem os portugueses permanece e é a principal fonte de receitas, senão a única com relevância: os jogos de fortuna e azar. A história muitos de nós conhece mais ou menos bem, mas é já partir do século XX que Macau adquire a forma tem actualmente, e nesse particular foi sempre refém dos sobressaltos da História dos dois elementos que entraram na sua génese: Portugal e a China. O primeiro, longínquo e nem sempre atento administrador, passou por três fases distintas após o evento da República, e se por um lado o gigante chinês atingiu o mesmo estatuto quase em simultâneo, tudo aquilo que veio a seguir, e praticamente até aos dias de hoje nunca transmitiu uma sensação de segurança que garantisse a Macau um desenvolvimento paralelo à sua situação política. Durante estes cem anos não se pode dizer que tenha havido um período de estabilidade que permitisse a Macau que aparecessem mais do que duas gerações, e com elas um conjunto de valores comuns que se pudessem enraizar ao ponto de valer a pena lutar por eles. Não é fatalismo, é apenas a única realidade que temos. Por isso é que me causa alguma estranheza que se faça isto agora e com carácter de urgência. Ninguém se ralou durante os 15 anos que se passaram desde a transferência de soberania em chegar a consenso algum sobre temas como a identidade macaense, o papel da comunidade portuguesa ou como é o português-tipo em Macau, e numa perspectiva mais abrangente, qual o “peso” de cada um no contexto actual da RAEM – posso ir adiantando que o meu anda pelos 80 quilos, um pouco mais quem sabe, mas nunca acima dos 85, garantidamente. Toda esta súbita separação do trigo do joio dá até a entender que se prepara algo semelhante às Leis de Nuremberga de 1935, e torna-se urgente encontrar um lugar ao sol. Fora de brincadeiras, e voltando à questão do consenso: não somos um povo de consensos, temos um carácter que eu não chamaria de vincado, mas antes rígido, confundimos firmeza de princípios com casmurrice, e não temos a rectidão que muitas vezes é necessária para dar o corpo ao manifesto. Neste particular julgo ter sido Martim Moniz o último a fazê-lo, antes de ser inaugurada a modalidade de “heroísmo de bancada”, em que nos tornámos exímios. As descobertas? Bem, detalhes à parte, foi no rescaldo dessa epopeia que chegámos aqui e por cá continuamos, sem que para tal nos fosse necessário ser atribuído um papel, a não ser que estejamos aqui a falar do BIR, o que nesse caso será antes um cartão. Se somos titulares deste cartão que nos permite usufruir um estatuto de igualdade perante os restantes portadores do mesmo, devemo-lo unicamente à diplomacia – não à última administração portuguesa, e muito menos ao Governo português. Aqui quando digo governo falo obviamente nos sucessivos governos, que depois de se terem servido de Macau para financiar campanhas eleitorais e outras pantominices antes da transferência de soberania, vão-se demitido lentamente dos compromissos que assumiram inicialmente com Macau, revelando sempre um distanciamento que ora se vai acentuando, ora se fica pelas boas intenções. E é esta a imagem que passamos para os outros, para os que partilhando do mesmo estatuto que nós, e que nos é dado pelo tal BIR, têm consciência da nossa desunião e do nosso orgulho que consideram “bárbaro”, por culpa das vezes em que nos recusamos a parar para olhar um pouco à nossa volta e entender alguns sinais. A pouca queda que temos para o associativismo, que no nossa caso é misto de provincianismo e vaidade, faz com que a comunidade chinesa diga de nós que “só temos é paleio”, ou no dialecto cantonês “chui sôi” (吹水). E sim, aquele “sôi” é o caracter para “água”, que é como quem diz “saliva”, que temos de sobra e não nos inibimos de gastar. Mas há um lado positivo em tudo isto, e que foi abordado num dos tais estudos “à la minuta” que por aí apareceram: o direito de matriz portuguesa. E isso, meus amigos, é o princípio, meio e fim de todas as coisas, o que nos segura a nós e aos outros, todos os que têm BIR e alguns que não têm, e foi o maior tesouro que aqui deixámos. Fico a torcer para que tratemos dele com a maior reverência, e que lhe demos o corpo ao manifesto, se necessário. E eis finalmente qualquer coisa que valha a pena esse sacrifício.
Joana Freitas BrevesVitor Ng reconduzido no WTC Vitor Ng, empresário e ex-homem forte da Fundação Macau, foi reconduzido como Presidente do Conselho de Administração do World Trade Center Macau, ao lado de Alberto Expedito Marçal, como Administrador-delegado do Conselho de Administração e presidente da Comissão Executiva, e Tai Kin Ip, subdirector dos Serviços de Economia, como Membro do Conselho de Administração. O anúncio foi feito num despacho do Secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, publicado ontem, sendo que a renomeação é feita por dois anos.
Andreia Sofia Silva PolíticaPCP | Pedidas mais verbas para Conselho das Comunidades O Partido Comunista Português entregou um pedido para a alteração do Orçamento de Estado de 2016 em Portugal para que o Conselho das Comunidades Portuguesas tenha mais meios financeiros para actuar junto das comunidades emigrantes O Governo português recebeu um pedido por parte do grupo parlamentar do Partido Comunista Português (PCP) para a alteração do Orçamento de Estado de 2016, para que o Conselho das Comunidades Portuguesas (CCP) possa ter mais acesso a verbas estatais. A proposta feita pelos deputados da Assembleia da República (AR) Paulo Sá, Miguel Tiago e Carla Cruz pede que a verba da Reserva Orçamental do Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) seja transferida para a Reserva da Direcção-geral dos Assuntos Consulares, verba essa no valor de 140 mil euros. Segundo o PCP, essa alteração avai permitir ao CCP realizar “os seus objectivos e actividades, designadamente a sua próxima reunião plenária”. “O PCP tem reafirmado a importância do CCP e a necessidade deste ser dotado de meios humanos e financeiros para cumprir a missão e objectivos que lhe estão confiados”, lê-se na proposta apresentada pelo partido. O HM tentou, até ao fecho da edição de ontem, ouvir a opinião dos Conselheiros em Macau José Pereira Coutinho e Rita Santos sobre esta matéria, não tendo sido possível estabelecer contacto. De frisar que o antigo presidente do CCP, Fernando Gomes, disse em 2014, citado pela agência Lusa, que o novo modelo proposto para o funcionamento do organismo é “mais oneroso” e que leva a um afastamento em relação à diáspora. Fernando Gomes disse concordar com a criação do modelo de conselhos regionais e locais, que tem “a sua razão de ser porque acaba por debater problemas mais específicos”, mas que isso leva a que “as pessoas tenham de se reunir”, obrigatoriedade que levará a maiores gastos. “Há 13 anos o orçamento era três vezes mais do que o actual. Com o orçamento que temos actualmente – cerca de 100 a 110 mil euros – a nova lei não funciona porque acarreta custos acrescidos no deslocamento para reuniões regionais e locais”, explicou na altura, acrescentando que o modelo actual não é uma boa solução, mas é menos onerosa. “Até ajustamos o período para ter reuniões numa só semana, o que evita a duplicação de custos. Agora, com este modelo que o Conselho de Ministros propõe, penso que estamos a voltar para trás”, reiterou Fernando Gomes em 2014. Para Fernando Gomes, “não é só alterar a lei, mas alterá-la incutindo o espírito de tornar o Conselho das Comunidades mais dinâmico e mais pro-activo, porque caso contrário deixa de funcionar no dia seguinte”.
Joana Freitas SociedadeAssociação de Médicos de Língua Portuguesa pede fiscalização aos cuidados geriátricos [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]Associação de Médicos de Língua Portuguesa pediu ao Governo mais fiscalização face aos cuidados geriátricos, normalmente prestados por associações. De acordo com um comunicado do Executivo, o pedido foi feito numa reunião entre a Associação e o Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, onde também se referiu a necessidade de criar melhores condições para os médicos de fora. “A Associação dos Médicos de Língua Portuguesa referiu que, face ao aumento constante da população e da sua esperança de vida, os cuidados geriátricos nos lares de idosos deveriam ser fiscalizados o que permitiria antecipar problemas detectados aquando da chegada à urgência hospitalar”, pode ler-se no comunicado disponibilizado aos média. O HM tentou perceber junto de Jorge Sales Marques, presidente da Associação, a necessidade desta fiscalização e ainda obter comentários sobre outros assuntos da reunião, mas o também médico não se mostrou disponível por este ter sido um encontro interno e de “cortesia”. Alexis Tam, contudo, diz concordar com a sugestão. “O Secretário concordou em abordar esta questão com os responsáveis da Saúde e da Acção Social e reconheceu que, também aqui, a melhoria de gestão pode trazer melhorias evidentes. Por outro lado, reiterou que a família desempenha um papel imprescindível e insubstituível no cuidado aos cidadãos seniores.” Melhores salários Da parte da Associação de Médicos fica a promessa de “trabalhar mais para a melhoria dos cuidados de saúde”, ainda de acordo com o comunicado, que refere também que o grupo considera que esta melhoria tem sido atingida graças à “contratação de médicos estrangeiros como os portugueses”. É ainda deixada a mensagem de que “os constrangimentos de recrutamento salariais e de alojamento, uma vez ultrapassados, poderiam ajudar a atrair profissionais de saúde de elevada qualidade”. O Governo compromete-se a arranjar “melhores condições” face a esta situação, sendo que Alexis Tam assegura que a contratação ao exterior – de médicos portugueses e não só – é para continuar. No documento entregue pelo Gabinete de Tam aos jornalistas, fica ainda a saber-se que a Associação está satisfeita com as melhorias que têm vindo a ser feitas na área da Saúde, nomeadamente ao nível da comunicação interna e dos cuidados. “O empenho que tem sido feito na melhoria da comunicação interna entre os diverso departamentos e entre estes e os centros de saúde pode, em muito, resultar benefícios para os utentes. Sales Marques mencionou a importância das reformas que têm sido feitas, nomeadamente a da aposta nos cuidados primários como mecanismo essencial para evitar a sobrecarga dos serviços de urgência e a da formação médica, tendo reiterado o apoio da associação àquelas políticas do Governo.”
Tomás Chio PolíticaConselhos Consultivos | Nomes repetem-se em mais de três órgãos [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]jornal chinês All About Macau noticiou ontem a nomeação de Paulo Tse para o Conselho de Renovação Urbana, referindo que Chui Sai On, Chefe do Executivo e responsável pela nomeação, não cumpriu a sua promessa feita o ano passado, quando disse que um membro não podia pertencer a mais do que três Conselhos Consultivos. Paulo Tse já é membro de quatro. O jornal chinês referiu que, por norma, os despachos publicados em Chinês no Boletim Oficial (BO) devem mostrar os nomes chineses das pessoas nomeadas, mas que no caso do despacho que ditou a nomeação de Paulo Tse havia apenas uma referência ao apelido. A All About Macau questiona a razão por não ter sido revelado o nome chinês, lembrando que mais de metade da lista de nomeados são empresários ou ligados ao sector imobiliário, o que pode levar a sociedade a pensar que haverá um maior controlo dos projectos por parte destes membros. O artigo aponta para o facto do dirigente de Macau ter quebrado a sua promessa política e que tal pode constituir “um grande choque para os cidadãos”. O All About Macau lembrou que esta não é a primeira vez que Chui Sai On quebra o seu compromisso e volta a nomear as mesmas pessoas para estes cargos. No caso do Conselho de Renovação Urbana já terão sido nomeados dois membros que estão em mais três órgãos consultivos, sendo eles o advogado Paulino Comandante e Andy Wu Keng Kuong, secretário da Associação de Indústria Turística. Aquando da apresentação das Linhas de Acção Governativa (LAG), Chui Sai On garantiu que um membro de um Conselho Consultivo não podia ser nomeado para mais do que três órgãos, com um limite temporal de três anos. O HM tentou pedir esclarecimentos sobre o caso, mas até ao fecho desta edição não foi possível.
Hoje Macau h | Artes, Letras e IdeiasA manga, as líchias e o marido ideal 毛佬佬与习大大 * por Julie O’Yang [dropcap style=’circle’]N[/dropcap]os tempos que vivemos torna-se cada mais pertinente fazer uma reflexão sobre o culto de personalidade do Grande Líder Chinês. Vamos começar pelo episódio das mangas. Há cinquenta anos atrás, a China viveu a década mais turbulenta e traumática da sua história recente – a Revolução Cultural. Durante 10 anos, a nação mergulhou numa espécie de adoração histérica: uma obsessão, não por Mao, mas por… mangas! Corria o ano de 1966 quando Mao convocou os Guardas Vermelhos para se rebelarem contra os “reaccionários” que integravam o Governo central. Pretendia “reestruturar a sociedade purgando os elementos “burgueses” e as formas de pensar tradicionais”. Na realidade tratava-se de uma forma eficaz, mas também cruel, de se ver livre dos seus rivais políticos e das vozes discordantes. Durante o Verão de 1968 o País estava mergulhado num clima de hostilidades e cada uma das facções políticas em confronto agitava mais alto o Livrinho Vermelho, para demonstrar a sua lealdade ao Secretário-geral. Antecipando a eminência de uma carnificina, Mao decidiu enviar 30.000 trabalhadores à Universidade de Qinghua, em Pequim. Os estudantes atacaram-nos com setas e ácido sulfúrico. Os trabalhadores venceram a contenda. Para lhes agradecer, Mao enviou cerca de 40 mangas como presente, que tinha recebido no dia anterior do Ministro dos Negócios Estrangeiros paquistanês. O gesto de Mao teve um impacto enorme. No norte da China ninguém sabia o que eram mangas. Por isso os trabalhadores passaram a noite acordados a olhá-las e a acariciá-las, maravilhados com o poderoso odor e a forma exótica. Foi então que estes trabalhadores receberam a ‘mensagem sagrada’ de Mao: o proletariado deverá liderar em todas as frentes! Foi este o ponto de viragem do poder, que se transferiu dos estudantes para os operários e camponeses, unidos pelo mágico poder das mangas! As mangas de Mao provocaram intensos debates nos locais de trabalho. Um representante militar chegou a uma fábrica segurando uma manga nas mãos e deu inicio à discussão: o que fazer com ela, comê-la ou conservá-la? Acabaram por levar a fruta a um hospital e pô-la em formol! Neste ponto, os responsáveis da fábrica decidiram passar a produzir mangas de cera, cobertas com uma campânula de vidro. Cada uma destas réplicas seria oferecida aos trabalhadores revolucionários, que deveriam transportar o fruto “sagrado” solene e reverentemente e que seriam admoestados se falhassem a missão. A manga tornou-se um fruto destinado a altos voos! Conta-se também que quando uma manga apodrecia, os trabalhadores pelavam-na, ferviam-na em água, e cada um deles sorvia um golo do “santo” xarope. Uma das mangas de cera foi transportada por um representante dos trabalhadores em procissão acompanhada pelo rufar dos tambores, desde a fábrica até ao aeroporto, de onde partiria para uma fábrica de Xangai, enquanto as pessoas nas ruas se inclinavam à sua passagem! As mangas percorreram o País de lés a lés e foram “passeadas” solenemente em muitas procissões. A fruta tornou-se objecto de intensa devoção, com rituais inspirados nas tradições Budista e Taoista, chegando a ser colocada em altares nas fábricas para que os operários lhe pudessem vir prestar homenagem. “Ver as mangas douradas / É o mesmo que ver o Grande Líder Mao!” era parte de um poema que circulava na altura. A China tem uma longa história de simbolismos associados a alimentos que representam noções culturais importantes, tais como “profunda bondade” (pêssego), “longevidade” (cogumelos), estando o amor romântico inevitavelmente associado às líchias e a Yang Guifei. Yang Gui Fei, 杨贵妃. A Consorte Imperial Yang foi uma das quatro beldades da antiga China. Nasceu em 719 CE e recebeu o nome de Yang Yu Huan 杨玉环. Na corte foi baptizada “Guifei” 贵妃, uma consorte de grande categoria, e passou a ser conhecida como Yang Guifei ou a Dama Yang. As pinturas da Dinastia Tang mostram que, à semelhança de outras beldades da época, Yang Guifei era uma mulher corpulenta. Para lhe agradar, o Imperador mandou fazer grandes obras no Palácio das Termas de Huaqing onde, lânguida, ela passava muitas horas banhando-se para conservar a frescura da pele. As líchias, o seu fruto preferido, eram todas as semanas trazidas de pónei desde Guangzhou, cobrindo uma distância de cerca de 2000 Kms. Estou convencida que Yang Guifei foi uma espécie de cruzamento entre Eva e Helena de Tróia. Os historiadores afirmaram muitas vezes que o Imperador Tang, Xuanzong, se deixava levar pelos prazeres da carne em detrimento das suas responsabilidades na corte. Yang foi a causa directa da queda da Dinastia Tang e o Imperador acabou por lhe ordenar que se enforcasse. Desde essa altura que o amor romântico ganhou má fama na China. Compreende-se muito bem porquê! Mas as líchias são bem melhores que as maçãs, digo-vos eu, carnudas e sumarentas, macias como a pele dum bebé. Da próxima vez que as comerem, peço-vos que se lembrem dos lascivos lábios húmidos da Dama Yang. Ganham muito se forem comidas numa noite escura de Inverno. A minha nota final vai para uma canção que se tornou viral a semana passada, sobre o actual Presidente chinês, Xi Jinping. O Imperador Tang, o Secretário-geral Mao e o Presidente Xi Jinping foram considerados maridos chineses ideais. Então porque é que prefere brutos? “Se quiseres casar, escolhe alguém como o Xi Dada (Tio Xi), um homem heróico com amor para te dar; não importam as mudanças, nem os escolhos no caminho, ele não deixa de avançar.” https://bit.ly/1X6PO RV
Hoje Macau SociedadeAviação | Construção de terceira pista em Hong Kong pode causar problemas [dropcap style=’circle’]M[/dropcap]ais de 90% das partidas do aeroporto de Macau e quase 43% das aterragens em Shenzhen (China) podem ser afectadas por problemas de espaço aéreo causados pela construção de uma terceira pista em Hong Kong, conclui um estudo citado na imprensa. O trabalho é citado pelo jornal South China Morning Post, que indica que o grupo ambientalista Green Sense, juntamente com o Airport Development Concern Network, recorreu a dados dos portais FlightAware e Flightradar24 para analisar 1628 partidas de aviões de Macau em Janeiro, que representam cerca de metade do total dos movimentos aéreos. Foram também analisados mais de 16 mil movimentos aéreos de um total de 24 mil que chegaram e partiram do aeroporto Bao An de Shenzhen no mesmo mês. Pelo menos 5200 chegadas e 304 partidas de e para Shenzhen ficam em risco de se cruzarem com três rotas aéreas de Hong Kong. No caso de Macau, quase todas as partidas do aeroporto analisadas podem potencialmente chocar com saídas da pista norte de Hong Kong. Contactada pela agência Lusa, a Autoridade de Aviação Civil de Macau explica que “a gestão do tráfego aéreo da região do Delta do Rio das Pérolas é uma das mais complicadas do mundo” e que, por esse motivo, as autoridades da China, Macau e Hong Kong recorrem a um “mecanismo tripartido” para operarem. “Quaisquer alterações de procedimentos de voo ou desenvolvimentos no Delta do Rio das Pérolas têm de ser discutidas e acordadas entre as três partes, sob o princípio de que qualquer desenvolvimento nos aeroportos da região não pode prejudicar o desenvolvimento de outros aeroportos”, indica o organismo. Assim, “os procedimentos de voo da terceira pista do Aeroporto Internacional de Hong Kong estão a ser estudados e desenvolvidos e serão discutidos no âmbito do mecanismo referido em tempo oportuno”. Divisões de risco O South China Morning Post cita o director-executivo da Green Sense, Roy Tam Hoi-pong, que acredita que os problemas de conflito de rotas, se não forem solucionados, podem fazer com que Hong Kong tenha de ceder algum espaço aéreo à China continental, violando o princípio ‘Um país, dois sistemas’ e gerando uma repetição de uma polémica em torno da ligação ferroviária de alta velocidade para Cantão. Durante a reunião do conselho de planeamento da cidade este ano, o Departamento de Aviação Civil sugeriu que o espaço aéreo fosse dividido em dois, com Hong Kong a gerir a zona inferior e a China a superior. No entanto, Tam acredita que tal iria violar o artigo 130.º da Lei Básica de Hong Kong, que estipula que o território é responsável pelas matérias de gestão empresarial e técnica da aviação civil. “Se ainda acreditamos no princípio ‘Um país, dois sistemas’, então Hong Kong tem de gerir o seu espaço aéreo”, disse, pedindo que o projecto fosse arquivado. A construção de uma terceira pista no aeroporto de Hong Kong, aprovada em 2012, tem sido criticada por organizações ecologistas que alertam para impactos no ruído, poluição e biodiversidade.
Hoje Macau BrevesCampanha contra a corrupção chega a Macau e Hong Kong O Gabinete para os Assuntos de Hong Kong e Macau do Conselho de Estado passou a estar sob a alçada da Comissão Central de Inspecção e Disciplina do Partido Comunista da China, organismo que tem levado a cabo a campanha contra a corrupção no país. A notícia é avançada pela RTHK, que cita Li Qiufang, inspectora da Comissão Central de Inspecção e Disciplina. Li Qiufang falava aos jornalistas à margem de um encontro da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês, em Pequim. No passado dia 25 de Fevereiro, o jornal Epoch Times noticiou que o gabinete do Conselho de Estado responsável pelas duas regiões administrativas especiais estava “pela primeira vez” sob a fiscalização do organismo que combate a corrupção. Na altura, relembra a rádio Macau, a publicação com ligações ao movimento espiritual Falun Gong, proibido na China, escreveu que podia acontecer a demissão de titulares de altos cargos públicos em Macau e Hong Kong “a qualquer momento”. Dois dias depois, a 27 de Fevereiro, foi detido em Macau o ex-procurador Ho Chio Meng, acusado de corrupção. Em declarações sobre este caso, Chui Sai On disse que Pequim foi informado da investigação a Ho Chio Meng, mas o Chefe do Executivo garantiu que não houve interferências no processo.
Joana Freitas BrevesSubinspector desaparecido testemunhou e saiu do território O subinspector da Polícia que foi dado como desaparecido terá mesmo saído do território, garantiu ontem Wong Sio Chak, Secretário para a Segurança. Ao que o foi possível apurar, o agente foi testemunha de um processo de investigação criminal relacionado com crime organizado e terá, depois, saído do “território”. Wong Sio Chak diz que não é possível revelar o paradeiro do agente porque o caso está em fase de inquérito, mas assegura que foi já aberto um inquérito disciplinar. “Não se pode”, contudo, suspender as suas funções sem os resultados do inquérito, pelo que não é ainda possível “tomar uma decisão”.
Hoje Macau BrevesUSJ | Como depurar águas residuais com pântanos Utilizar jardins e pântanos para tratamento de águas residuais é o tema da conferência que Cristina Calheiros vai proferir amanhã na Universidade de São José (USJ). Para a bióloga, “é crucial que os sistemas de tratamento de águas residuais cumpram a sua função de forma a que a reutilização da água possa ser utilizada na protecção dos ecossistemas”. Na conferência vai ser explicado como as zonas pantanosas artificiais são um complemento da eco-tecnologia para o tratamento das águas residuais ou mesmo como forma principal de tratamento destas. “Estes sistemas, biológicos”, lê-se no prenúncio da conferência, “têm por objectivo mimetizar os processos biogeoquímicos que ocorrem nos pântanos naturais para depuração de águas residuais”. Na oportunidade serão apresentados casos onde estes sistemas já são utilizados com sucesso. Cristina Calheiros tem uma pós-graduação em Biotecnologia, com especialização em Ciências Ambientais da Escola Superior de Biotecnologia da Universidade Católica e é também uma investigadora em pós-graduação do Centro de Biotecnologia e Química Fina em colaboração com a Aarhus University da Dinamarca, precisamente na área de tratamento de águas residuais por via da instalação de zonas pantanosas aplicadas a instalações turísticas. A conferência será moderada pelo professor David Gonçalves e acontece no “Speakers Hall” da USJ pelas 19h00. A entrada é gratuita.
Hoje Macau BrevesJovem consegue transplante pulmonar com sucesso Os Serviços de Saúde (SS) informam que a situação clínica do jovem de Macau que efectuou um transplante pulmonar no Primeiro Hospital Afiliado da Universidade de Medicina de Cantão é estável e para já não precisa de sangue. A informação surge na sequência do pedido público que os familiares do jovem fizeram, para sangue do tipo B+. A informação dos SS surge após contacto com o médico assistente do doente em Cantão, tendo sido apurado que o transplante decorreu sem problemas. Não houve hemorragias graves e após três dias em observação não há necessidade de transfusões de sangue em grande quantidade.
Tomás Chio BrevesWynn | Deputada questiona recrutamento na China A deputada Kwan Tsui Hang interpelou o Governo sobre uma sessão de recrutamento que uma operadora de Jogo realizou recentemente no interior da China, sendo que já havia realizado uma sessão em Macau. Ao que o HM apurou, foi a Wynn que levou a cabo a sessão, a fim de recrutar para o seu empreendimento no Cotai, o Wynn Palace. Para a deputada, que no hemiciclo representa a Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM), a situação não é clara e esta questiona quais os mecanismos que o Governo possui para fiscalizar o caso. A primeira sessão de recrutamento terá ocorrido em Macau em meados de Fevereiro, tendo nela participado 700 locais para preencher 70 vagas, a qual recebeu o apoio da FAOM. Perante isto, Kwan Tsui Hang pretende saber se o Governo já tinha aprovado a quota para trabalhadores não residentes para esta operadora de Jogo antes desta ter promovido a sessão de recrutamento, exigindo mais medidas para proteger o trabalho dos residentes. “O Governo refere todos os dias que promove o emprego para os trabalhadores locais, mas como é que garante que os residentes têm prioridade em ser promovidos para cargos superiores depois da sua formação?”, apontou.
Joana Freitas Manchete SociedadeColoane | Novo Macau denuncia alterações à medida e chama pelo CCAC [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]Associação Novo Macau pediu a intervenção do Comissariado contra a Corrupção (CCAC) numa investigação ao projecto de luxo que poderá nascer no Alto de Coloane, na Estrada do Campo. O grupo diz ter documentos que poderão apresentar irregularidades e alterações feitas à medida para que o projecto fosse aprovado. A Novo Macau diz, por exemplo, que as restrições à construção em altura na zona onde poderá nascer o empreendimento foram “eliminadas” em 2012. Em 2007, afirma, o máximo permitido para a altura da construção no lote era de 11,6 metros, mas em 2012 a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) terá aprovado uma planta para o projecto que permitia a construção até cem metros, sendo que esta tinha a duração de um ano. É aqui que as suspeitas da Novo Macau surgem. “Há alguma ilegalidade administrativa neste processo? Queremos que o CCAC analise esta questão. Poderá haver alguma situação de favorecimento?”, questionam, ao mesmo tempo que pedem que o processo de aprovação para a construção seja suspenso. Além destes dados, a Novo Maca relembra ainda que, apesar de ter estado limitada a um ano, a planta ainda se mantém válida e diz que o anteprojecto da construção foi aprovado em 2013, para que, “talvez, o construtor pudesse começar a obra antes da entrada em vigor da Lei de Salvaguarda do Património Cultural e da Lei do Planeamento Urbanístico”. Pressões múltiplas Recorde-se que o Governo assegurou ao HM que ainda não há condições para que a licença de obra seja emitida, uma vez que o construtor – a empresa de Sio Tak Hong – ainda não apresentou um projecto. Na edição de ontem deste jornal, foi anunciado que o lote não se encontra dentro da área de protecção de Coloane e também que, como é um terreno que serve para aproveitamento de propriedade perfeita, não tem de ser publicada em Boletim Oficial a sua adjudicação. A DSSOPT ainda não deu aval total para o projecto avançar, mas a Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental já assegurou que o relatório de avaliação ao impacto no ambiente – feito pela empresa – mostra que não há problemas. Ontem, no dia em que a Novo Macau entregou o pedido de investigação ao CCAC, o grupo “Love Macau” entregou uma carta ao Chefe do Executivo que apela à protecção do “pulmão de Macau” e pede também a suspensão do projecto. Também o presidente da Novo Macau, Scott Chiang, disse ser urgente que tanto a população, como associações locais se unam na defesa de Coloane antes que “seja destruída por promotores imobiliários” e pelo Governo. Scott Chiang pede ainda ao Chefe do Executivo que não permita construções em Coloane até que haja um plano de manutenção da zona.
Flora Fong Eventos MancheteLolita Hu Ching-fang, autora de ‘The Third Person’: “Espero que Macau pense na sua cultura” Participou na primeira edição do Rota das Letras e cinco anos depois volta a ser convidada para partilhar os seus pensamentos. Lolita Hu Ching-fang, escritora de Taiwan, considera que o ambiente de Macau é apropriado para criar, sendo que até a autora conseguiu escrever uma obra inspirada no território. Numa conversa sobre o processo da escrita, Lolita fala ainda sobre a identidade dos chineses fora do continente Lolita Hu Ching-fang, escritora de Taiwan [dropcap]J[/dropcap]á é a segunda vez que está presente no Rota das Letras. Está a gostar de conhecer mais de Macau? Sim, estou gradualmente a conhecer a cidade. Como vivi em Hong Kong há 11 anos, para mim Macau é a casa dos meus amigos, que visito sempre. Como escritora como avalia o ambiente de Macau? Hoje vejo Macau como um lugar cheio de casinos, hotéis e entretenimento, mas lembro-me do charme que Macau tinha antigamente. Era um sítio onde não era preciso muito dinheiro para se viver e bastante profícuo para o desenvolvimento criativo. Acho que é preciso encontrar um equilíbrio entre as duas realidades. Os artistas precisam sempre de parar antes de dar os próximos passos e pensar qual o significado da sociedade, qual o sentido da vida… isto depois torna-se o material para a criação. Nos bairros antigos [de Macau], existe a verdadeira natureza da cidade, que é, de facto, inspiradora para se escrever. Costuma passear nos bairros antigos? Sim, porque os casinos e hotéis são para um certo grupo de turistas, mas não são para as pessoas comuns, como eu. Gosto de passear nas ruas e travessas pequenas, sobretudo em Coloane, onde posso conhecer como era Macau originalmente. Aí encontrei intimidade, familiaridade e humanização. Macau inspira-a para criar? De facto, quando participei na primeira edição do Rota das Letras, escrevi um conto sobre Macau, que está no meu livro “Floating”, publicado em 2014. Chama-se “Spring Dream” e fala sobre uma mulher que tem um marido rico, e costuma passear em Macau antes de voltar para a China continental, mas um dia tem um encontro especial com um jovem português. A mulher já viveu muitas mudanças na China e agora é rica, mas o amor que tinha durante a juventude desapareceu, mesmo que agora ela tenha tudo. O conto pretende demonstrar que a China está sempre a querer comprar, investir, ganhar e a mulher é o símbolo da China, porque quer comprar o amor do jovem português, mas o amor não é verdadeiro. O conto fala também da bandeira nacional da China em Macau, qual é a relação entre os dois lados e como o país recupera da perda de tempos antigos. A identidade dos portugueses em Macau também é um episódio. Antigamente, o Ocidente comprava o Oriente, agora é ao contrário. Tentei usar uma história simples para expressar significados complicados. Um dos seus livros – “A minha geração” -, publicado em 2010, fala sobre como os chineses que viajam para Hong Kong, Taiwan e interior da China mantêm ou reconfiguram as suas identidades. Esta questão voltou a ser polémica recentemente, depois de acontecer o caso da cantora taiwanesa Tzuyu, que levantou a bandeira de Taiwan num programa de televisão coreano, mas foi criticada por outro cantor taiwanês por ser apoiante da independência da ilha Formosa. Vários anos depois da publicação da sua obra, como agora olha para esta questão? Esta questão tem existido porque o intercâmbio dos dois lados do estreito se alargou. Quando escrevi o livro, achei interessante porque todos falavam a língua chinesa mas sentiam-se estranhos uns aos outros. Penso que os sítios por onde uma pessoa passa tornam-se parte dela. Por exemplo, eu vivi em tantos sítios diferentes, que considero que sou de Hong Kong, de Taiwan, de Tóquio. Sou de Paris e sou de Xangai. Espero que todos estes locais façam parte de mim, porque conheço e respeito todas as partes, ainda que considere que não preciso de uma divisão tão clara. Para Macau, Taiwan é sempre uma referência, em aspectos como o trânsito, infra-estruturas e protecção ambiental. Como vê as diferenças entre cidades como Hong Kong, Macau e Taiwan? Considero que Taiwan tem uma coisa que Hong Kong e Macau não têm: sufrágio. É muito importante porque as opiniões da população são expressas. O povo preocupa-se com a sua terra, o seu ambiente, então pensa em melhorá-los e espera, através de eleições, escolher pessoas que ajudam a elaborar políticas [nesse sentido]. Se o Governo não representa a população, mas apenas comunica com os grupos mais ricos, então não pensa em melhorar políticas, pensa apenas em números. Em Taiwan as opiniões da população são mais fáceis de ser ouvidas, é a vantagem quando comparado com Hong Kong e Macau. É um ambiente “de pessoas”, não “de números”. Consegue-se distinguir as vantagens de Hong Kong e Macau? O Estado de Direito. Em Taiwan, o interesse humano é maior mas as leis são menos dedicadas. Admiro que Hong Kong não exclua os estrangeiros porque é gerido pelas leis e também pela igualdade. Em Taiwan isso é pior. O que pretende passar para a audiência de Macau nesta edição do Rotas das Letras? Espero que Macau pense na sua cidade, na sua cultura. Agora o sector do turismo é um dos aspectos fundamentais, a cidade recebe sempre estranhos, que entram e saem todos os dias. Qual é o significado disso? Quando se é generoso ao receber os estranhos, o que se pode preservar? Se têm uma sala em casa para receber visitantes, o que é essa sala? É preciso pensar que essa sala é a divisão principal da “casa”. Espero que a minha presença faça reflectir como as pessoas locais são importantes e, ao mesmo tempo, espero ouvir as pessoas a falar e a pensar sobre qual é a sua cultura. Como foi partilhar sessões com o historiador José Pacheco Pereira e o escritor Chan Koonchung? Fiquei surpreendida ao saber que José Pacheco Pereira tem a maior biblioteca privada de Portugal. Quando conversei com ele, disse-lhe que somos da cidade e que os prédios são uma coisa muito aborrecida, não conseguimos viver numa casa grande, o espaço é muito precioso. Como escritora de outra geração, tenho experiências diferentes, porque a minha geração é obrigada a ser “digital”, os livros são electrónicos, é outro modelo de leitura. Sobre Chan Koonchung, que já conheço há 20 anos, ele foi convidado por mim e temos contextos semelhantes porque nascemos em grandes cidades, preocupamo-nos com as cidades e, portanto, escrevemos muito sobre isso. A curto-prazo que planos tem para a sua carreira literária? A escrita agora é a minha vida. Estou a escrever uma novela, está a meio. Além disso, vou publicar este ano uma colecção de prosa. As colunas que escrevo para os jornais chineses também vão manter-se. No final deste ano, vou mudar de Nova Iorque para Hong Kong, novamente. Portanto, ainda posso participar na próxima edição do Rota das Letras (risos). PERFIL Hu Ching-fang (C.F. Hu ou Lolita Hu) é ensaísta e romancista. Nascida em Taipé, viveu em Hong Kong, Xangai e Pequim, publicando livros e escrevendo artigos em Hong Kong, na China, em Taiwan e em Singapura. Os seus trabalhos exploram a temática da vida urbana nas grandes cidades, as identidades culturais num mundo globalizado, o inevitável destino de solidão do ser humano moderno. Com o livro “The Third Person” recebeu o Prémio Golden Tripod, de Taiwan, para a melhor publicação literária de 2013. A colectânea de contos “Floating” (2014) é o seu mais recente título. Reside presentemente em Nova Iorque, depois de ter vivido em Tóquio.
Joana Freitas Manchete SociedadeFundação Macau | Projecto para escritórios custa 60 milhões A falta de espaços próprios do Governo e de associações vai fazer com que Fundação Macau aposte na construção de um centro de escritórios, que vai nascer ao lado do Centro de Ciência. Só o projecto da obra vai custar 60 milhões [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]Fundação Macau vai gastar quase 60 milhões de patacas para a elaboração do projecto de um novo complexo de escritórios. De acordo com um despacho publicado na segunda-feira em Boletim Oficial (BO), e assinado pelo Chefe do Executivo, a ideia é ter espaços próprios para ajudar departamentos governamentais e associações. Ao que o HM apurou, é a Fundação Macau quem pretende construir um Centro Multifuncional e Edifício de Escritórios junto à Avenida Dr. SunYat-Sen, ao lado do Centro de Ciência. Isto porque, assegura a Fundação, “o espaço público do Centro de Ciência não é suficiente, especialmente a sala de reuniões”. Tanto departamentos governamentais, como associações, refere ainda a Fundação, “têm precisado de espaços” e o actual não é suficiente para todas as reuniões e eventos culturais. “A Fundação tem de arrendar espaços a proprietários privados para tratar de coisas da administração, por isso é que tem planeada esta construção, para ter um escritório próprio, a fim de responder aos pedidos do Governo e das associações”, referiram responsáveis da Fundação Macau. Segundo o despacho analisado pelo HM, este montante – de 59,9 milhões de patacas – é apenas para a “elaboração de projecto e apoio técnico”, faltando ainda o valor da construção propriamente dita. A adjudicação deste serviço – que será pago até 2019 – foi feita à P & T Architects and Engineers Limited, Sucursal de Macau. Esta empresa é uma das responsáveis pela concepção do edifício da fronteira da ponte Hong Kong – Macau – Zhuhai, pelo qual recebeu 71 milhões de patacas. Chui Sai On, Chefe do Executivo, é o presidente do Conselho de Curadores da Fundação Macau, que tem como presidente do Conselho de Administração Wu Zhiliang. O Centro de Ciência foi construído com o apoio da Fundação Macau, que injectou 370 milhões de patacas, sendo mesmo a responsável do projecto.
Fernando Eloy VozesTribunal, “tops” e tiques [dropcap style=’circle’]N[/dropcap]ão nos levem o Velho Tribunal. Não transformem o Velho Tribunal numa nova biblioteca cheia de ares condicionados e janelas cromadas. A sério, até parece uma boa ideia mas não é. Até parece um acto em defesa da cultura, mas não é. Não tenho nada contra livros, muito pelo contrário, e muito menos contra bibliotecas, mas o tribunal tal como está funciona e não precisa de ser alterado- talvez um reboco aqui ou acolá, talvez pintar-lhe as paredes exteriores de várias cores, e depois mudar outra vez. Talvez não fazer nada. Transformá-lo numa biblioteca será um desperdício pois essa pode muito bem funcionar noutro sítio qualquer. Se mais fosse preciso, a realização do festival de literário de Macau, que o tem vindo a utilizar como quartel general nos dois últimos anos aproveitando as suas capacidades multidisciplinares, as recentes actuações de teatro do grupo Hiu Kok, ou as várias exposições que por ali têm ocorrido chegam para perceber o porquê deste pedido. Há algo de intrinsecamente apelativo para um artista quando se depara com um espaço que já teve outros propósitos, como fábricas antigas, ou antigos tribunais, há algo de extremamente atraente e convidativo em desenvolver expressões artísticas em espaços nus, de concreto à vista, que parecem predispostos a tudo, disponíveis para acolherem as mais díspares manifestações. Tal como numa pintura o artista deve perceber quando é altura de parar, neste caso é preciso entender não ser necessário embelezar nem reconverter, bastando conservar. Poupa-se dinheiro e dota-se a cidade de um espaço multidisciplinar, atraente para as artes, onde tudo pode acontecer bem no centro da cidade. Quando tanto se fala na promoção da criatividade e das artes em geral, que melhor do que um local como o Velho Tribunal para a sua promoção? Entidades governamentais competentes, pensem nisso, por favor. Ainda estão a tempo de mudar de ideias. Tops Das coisas mais irritantes com que nos deparamos nos dias de hoje é a proliferação de rankings para tudo e mais alguma coisa. A praia mais bonita do mundo, a cidade mais não sei quê, os principais destinos para umas férias assim, os melhores locais para não sei quê assado, os mais ricos, os mais bonitos, os mais…. livra! Não há traseiro que aguente. Listas feitas para idiotas que não sabem distinguir, para incapazes de perceberem o que é melhor para eles, para bandos de carneiros se poderem juntar às moles e tirarem mais uma selfie à frente do não sei quê que está no top de não sei que mais. Mas, pior do que isso, quando se fala de destinos turísticos, é o orgulho pateta dos autóctones, quiçá mais seguros de si por viverem na cidade com mais igrejas, ou com mais pessoas de calções cor-de-rosa. Depois vêm os resultados. Porque quando se atraem muitas moscas o melhor é dar-lhes poias com fartura pois, caso contrário, o mosquedo vai varejar para outras paragens. Coitados dos locais, entretanto, zonzos no meio do zumbido, nauseados pelo número de poias bruscamente plantadas aqui e acolá. É o que me ocorre quando olho para a minha cidade natal, Lisboa, a ficar descaracterizada, dia após dia, em função de um fogo fátuo chamado turismo, embriagada em gourmets e boutiques, atarantada com tuk tuks e quejandos como se andar de triciclo motorizado fosse coisa de local desenvolvido e não uma necessidade de povos com menos recursos como os tailandeses, os cambojanos ou os indianos, fartos que estão de não terem autocarros não poluentes como Lisboa ou sistemas de metropolitano abrangentes. O turismo, esse tesouro dos países subdesenvolvidos, essa arma de arremesso de políticos populistas e sem ideias, especialmente quando é gerido de forma provinciana como em Portugal (e noutros locais mais próximos de nós) é apenas um bem temporário e nunca uma solução de fundo pela quantidade de impactos negativos que provoca e já mais do que estudados. Mas as pessoas não aprendem, não querem aprender ou, ignorantes por falta de mundo, não sabem. Portugal, em boa verdade, só evolui na aparência porque, lá no fundo, continua a ser formado, na sua maioria, por um povo de simplórios com tiques de grandeza desejosos de serem aceites entre os que considera importantes nem que para isso tenha de se prostituir. Tiques E por falar em tiques, mais ou menos pategos, custou-me ver o Festival Literário de Macau abrir com uma sessão em chinês… e inglês. Depois de ter sido revelado à imprensa a política da organização em não convidar autores banidos na China , foi também banido o português na abertura oficial, idioma oficial de Macau para os mais distraídos, e substituído pelo inglês, língua oficial de Hong Kong. Até percebo os desejos de internacionalização do festival e consequente reorientação estratégica ao abrir o elenco a escritores de outras línguas que não o português e o chinês para dar mais mundo ao evento, mas numa cerimónia de abertura de um evento organizado por um jornal português, numa terra onde os simbolismos políticos são tão importantes, com a presença do Secretário Alexis Tam que representa a cultura do território e fala português, numa sessão onde, ainda por cima, existia tradução simultânea, por mais que tente entender não consigo. A não ser à luz da eterna reverência portuguesa que nem aqui, tão longe de casa, continua a assomar nos comportamentos e de um processo de autocensura que, como o próprio convidado do festival, Chan Koonchung, dizia ontem nas páginas deste jornal, “é sempre uma das coisas mais perigosas”. Mas não pensem que tenho algo contra o festival, muito pelo contrário. É, provavelmente, o evento mais interessante do território. Mas não me lixem. Full stop. Música da Semana David Bowie – “We Are Hungry Men” “We are not your friends We don’t give a damn for what you’re saying We’re here to live our lives I propose to give the pill Free of charge to those that feel That they are not infertible The crops of few, the cattle gun There’s only one way to linger on So who will buy a drink for me, your Messiah”
Andreia Sofia Silva Ócios & Negócios PessoasPadre, Café e Cucina | Danny Natoly, proprietário: “Tentamos não usar ingredientes artificiais” Aberto há pouco mais de seis meses, o “Padre, Café e Cucina” roubou o nome à rua que o acolheu, do Padre António. Danny Natoli garante que ali se pode jantar e beber bom café, em conjunto ou em separado. O que importa é que o cliente se sinta em casa “Quer um café? Este é bastante forte, costumo beber antes de tomar o expresso de manhã”. Foi desta forma que Danny Natoli, proprietário do restaurante “Padre, Café e Cucina”, recebeu o HM, mostrando o elemento diferenciador de um espaço que abriu há seis meses junto ao Largo do Lilau. Situado na Rua do Padre António, bem junto à esquina, o “Padre” pretende ser um restaurante de comida italiana mas também um café. Os sabores característicos dos grãos misturam-se facilmente com os de uma pizza ou massa acabados de fazer. “Uma coisa boa deste lugar é que as pessoas que vivem aqui entram e perguntam quais são os pratos do dia, há essa ligação. Uma coisa que eu quero que o cliente perceba é que se pode sentar e tomar um café e sair em vinte minutos, ou pode mais tarde jantar com os amigos”, contou ao HM Danny Natoli, proprietário. O menu tem tudo aquilo que poderemos esperar de um restaurante tipicamente italiano. Há as pizzas caseiras, as saladas, massas e pães. Mas depois há uma variedade de cafés para todos os gostos, com grãos vindos de Melbourne e até do Burundi. Danny Natoli aderiu a uma tendência cada vez mais crescente dos produtos livres de glúten e confeccionados de forma mais natural possível. “Tentamos não usar açúcar ou ingredientes artificiais na nossa comida, usamos muito poucos químicos. Queremos que a nossa comida seja o mais natural possível. Uso muitas ervas frescas nos meus pratos. Uma das dificuldades que sentimos aqui em Macau é ter um fornecimento de produtos consistente, sobretudo de produtos naturais. As farinhas são todas importadas de Itália, sendo que a maioria não contém glúten ou químicos. Quero mesmo evitar as farinhas processadas, porque as pessoas começaram a desenvolver alergias a determinados produtos” , contou. O “Padre” assume-se como sendo uma mistura de culturas, tirando partido da cultura local. “Temos comida italiana e receitas inspiradas em pratos locais. Por exemplo temos uma pizza com chouriço chinês, que tem um sabor doce. É como se fosse uma receita de pizza macaense, onde coloquei alguns sabores com os quais as pessoas estão mais familiarizadas”, disse Danny Natoli. Australiano da Sicília Danny Natoli sempre teve uma relação próxima com a cozinha, muito por culpa das origens sicilianas da família, apesar de ter sido criado em Melbourne, na Austrália. “A minha relação com a cozinha está muito relacionada com as minhas raízes italianas, cresci numa família onde as pessoas se reuniam à volta da comida, algo que também é semelhante às famílias portuguesas”, disse. “Este espaço é uma mistura. Podemos dizer que é um restaurante italiano com alguns elementos macaenses e com uma aposta no café. E é isso que faz com que seja um restaurante adaptado a Macau devido à história e à mistura cultural que aqui existe. As pessoas aqui reúnem-se muito à volta da mesa e os macaenses são um pouco como os italianos, que se reúnem sempre às refeições. Se isto fosse só um café italiano, teríamos aqui dez pessoas a beber café e a falar de coisas banais”, explicou. Danny Natoli precisou de seis meses para encontrar o espaço ideal para abrir o “Padre”. Quando o encontrou, foi difícil chegar ao projecto de decoração ideal. Hoje, com uma cozinha aberta para a rua e dois andares, o restaurante está como Danny sempre desejou. “Gostei logo deste espaço porque é junto à esquina, mas remodelá-lo foi difícil, estava completamente diferente.” Os recursos humanos também foi outra etapa difícil que Danny Natoli teve de enfrentar. “As pessoas que trabalham comigo são óptimas, tenho uma pessoa já com alguma experiência em comida ocidental e todos os dias estão a aprender. Há uma rapariga de Macau que está a fazer um part-time. Claro que a barreira da linguagem é um problema, mas assim que começam a cozinhar aprendem depressa. O mais difícil também é encontrar pessoas que estejam interessadas em trabalhar numa cozinha”, rematou.
Andreia Sofia Silva Eventos MancheteYao Feng traduz “Clepsydra” Há sete anos que Yao Feng, pseudónimo de Yao Jingming, tinha a tradução para Chinês do livro “Clepsydra”, do poeta Camilo Pessanha, escondida numa gaveta. Muitos anos e muitas alterações depois, a poesia “triste” de Pessanha em caracteres chineses será apresentada no dia 12 de Março, no âmbito do Festival Rota das Letras [dropcap style=’circle’]M[/dropcap]ais de quatro anos depois de ter traduzido Eugénio de Andrade (“Branco no Branco”, com edição da Livros do Meio), o poeta Yao Feng, pseudónimo de Yao Jingming (académico da Universidade de Macau), embrenhou-se na tradução de “Clepsydra”, de Camilo Pessanha. Há muito que o projecto estava na gaveta, fruto de uma parceria com o Instituto Internacional de Macau (IIM) e a Câmara Municipal de Coimbra, cidade de onde o poeta português é natural e onde se formou em Direito, antes de vir para Oriente. Contudo, só sete anos depois é que Yao Feng decidiu publicar o trabalho, por ocasião da 5ª edição do Festival Literário Rota das Letras. “Fiz uma revisão bastante grande e cuidadosa dessa tradução”, contou Yao Feng em entrevista ao HM. “Mudei muitas coisas, era o poeta tradutor daquele tempo e agora que revi a minha tradução, já não gostei. Mesmo assim não estou completamente satisfeito com a minha tradução”, disse Yao Feng, que não deixou de estabelecer uma comparação entre os poemas leves e contemporâneos de Eugénio de Andrade com a poesia nocturna de Pessanha. “A sensação é muito estranha, porque quando traduzo Eugénio de Andrade ou outro poeta contemporâneo tenho muito mais confiança do que a traduzir Camilo Pessanha, uma vez que ele é o poeta que escreve muito com efeitos musicais. Os poemas têm muita rima, ele usa muitas simetrias, com muita mitologia. [Pessanha] também joga muito com uma pontuação muito própria dele onde, numa frase sem sujeito ou verbo, corta e põe uma vírgula ou ponto final. Confesso que algumas coisas não compreendi. Hoje em dia há muita pesquisa sobre a sua poesia e ainda existem sombras misteriosas. Mas dei o meu melhor para o traduzir”, contou. “Não há dúvida de que foi muito mais difícil traduzir Camilo Pessanha”, salientou Yao Feng, remetendo para diferentes épocas e estilos literários. “Não senti tantas dificuldades em traduzir Eugénio de Andrade porque se calhar é mais fácil encontrar imagens orientais nos seus poemas. Eugénio de Andrade é um poeta do qual gosto e o qual não paro de ler. É um poeta que conheço muito bem e que até conheci pessoalmente. Quando o traduzi era como se estivesse a traduzir algo de um amigo. Com Pessanha houve mais distância, apesar de estar tão perto de nós, a cinco minutos de táxi (risos)”, brincou Yao Feng, referindo-se ao Cemitério São Miguel Arcanjo, onde repousa o corpo de Camilo Pessanha. Repetição e perda Yao Feng não tem dúvidas: no processo de tradução de “Clepsydra” para Chinês, houve muita coisa que se perdeu. “A minha língua materna [o Chinês] tem o seu sistema próprio de rima que não é compatível com a rima portuguesa e, por isso, esta tradução estava condenada desde o início à perda de qualquer coisa. Não se pode dizer que se perdeu muito, mas perdeu-se alguma coisa, sobretudo ao nível dos efeitos sonoros. Quando a tradução não consegue jogar com a musicalidade, perdem-se coisas”, disse. “A tradução de Camilo Pessanha está condenada à perda e a tradução tornou a poesia dele um bocado triste e com um conteúdo um bocado repetitivo. É a tristeza, a saudade, o amor que nunca deu frutos. Isso pode cansar um bocado, é uma poesia muito triste. Foi como ele escreveu: um ferro que sempre pesa no coração”, acrescentou. Lançar este livro sete anos depois é “importante”, por se tratar de um poeta de Língua Portuguesa com fortes ligações ao território. “É talvez, dos poetas portugueses, aquele que é mais conhecido em Macau, que viveu aqui e marcou a literatura de Macau.” Confinado ao mercado editorial do território, a “Clepsydra” em Chinês até poderia ser lida nas escolas, concordou Yao Feng, se fosse feita uma selecção rigorosa de alguns poemas. “Podíamos fazer uma selecção de dois ou três poemas, há um sobre a chuva, por exemplo… poemas mais fáceis e acessíveis para os estudantes. Não é necessário levar alunos das escolas secundárias a ler coisas tão pesadas. Podiam por exemplo ler mais Eugénio de Andrade, mais sol, mais água, em vez da sombra, e da noite (risos).” Poesia e paixão Esta não é a primeira vez que a poesia de Camilo Pessanha pode ser lida em Chinês, sendo que há alguns anos foi lançada uma tradução de alguns poemas, inserida numa colecção de autores portugueses, que teve o apoio do Instituto Camões e de editoras da China continental e que teve a coordenação de Yao Jingming e Ana Paula Laborinho (presidente desse instituto). Contudo, Yao Feng não deixou de comentar o facto dessa tradução ter sido feita por alguém que “infelizmente” não é poeta. “Há uma teoria que defende que a poesia tem que ser traduzida por um poeta, mas às vezes o poeta também estraga a tradução. Depende de quem é e como é o poeta que traduz. Para mim o poeta tem que traduzir o tipo de poesia que conhece melhor, se não tiver paixão por esse tipo de poesia, então não consegue traduzir com paixão e prazer e isso pode condicionar o processo de tradução. O poeta que é tradutor não pode traduzir qualquer tipo de poesia”, apontou Yao Feng. Ao contrário desta edição chinesa de “Clepsydra”, essa tradução conseguiu chegar às livrarias do continente. “O nosso objectivo consistia em levar livros de autores portugueses mais longe, para que pudessem ser distribuídos na China continental, porque os livros produzidos em Macau não podiam nem podem circular na China continental. Com esta colaboração e co-edição conseguimos”. Rufino Ramos, secretário-geral do Instituto Internacional de Macau (IIM), referiu ao HM que a oportunidade de publicar esta tradução surgiu de repente, existindo projectos para distribuir a versão chinesa de “Clepsydra” em instituições académicas de Hong Kong, sem esquecer Taiwan. “Alguém tinha de fazer este projecto”, disse Rufino Ramos, que confirmou que a publicação é feita com o apoio da Fundação Macau. “A oportunidade de publicar este livro chegou há pouco tempo e quase nos apanhou desprevenidos. Era importante fazer chegar este livro a todos os lugares onde se fala Chinês”, apontou o secretário-geral do IIM.
Flora Fong Manchete SociedadeIC | Antigo vice-presidente começou a ser julgado [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]antigo vice-presidente do Instituto Cultural (IC) Stephen Chan começou ontem a ser julgado pelo Tribunal Judicial de Base (TJB), acusado de abuso de poder e de ter revelado informações para que a empresa do irmão vencesse em concursos públicos para adjudicação de serviços. Chan negou no Tribunal os crimes de que vai acusado, mas o Ministério Público (MP) diz que há contradição nas declarações do chefia. Segundo o Jornal Ou Mun, o antigo vice-presidente é actualmente assessor técnico superior, e foi acusado destes crimes a adjudicação da concessão de prestação de serviços de manutenção de equipamentos da Biblioteca Central de Macau. Em 2008, a empresa do irmão deste antigo responsável do IC terá sido candidata a esta concessão e Chan não assumiu estar impedido de participar na selecção do concurso público, a qual, pelo contrário, até presidiu. Chan terá revelado informações sobre os outros candidatos ao seu irmão, o que permitiu que a sua empresa tenha conseguido a prestação deste serviço seis vezes. No mesmo processo está ainda envolvido outro réu, um assessor técnico superior do IC, que também foi acusado de fornecer informações de cotações de uma obra de instalação de electricidade e de iluminação básica e monitorização na Casa do Mandarim ao irmão do antigo vice-presidente. Chan nega, mas o TJB diz que esta declaração é diferente das que foram feitas no MP, onde o antigo vice-presidente assumiu ter revelado estas informações. O juiz leu o conteúdo das declarações feitas no MP em 2011, mas Chan explicou que “estava confuso por causa das perguntas orientadas feitas pelo MP”. Sobre a questão de impedimento, Chan respondeu que o irmão não é responsável da empresa envolvida mas apenas trabalhador e, portanto, não considerou que existissem conflitos de interesse. A sessão continua hoje.
Hoje Macau PolíticaPortugueses ajudaram Macau ao nível político, mas não o suficiente [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]s portugueses ajudaram à democratização de Macau, mas também falharam ao não fazer mais exigências neste sentido antes da transição. É uma das considerações do sociólogo Hao Zhidong, presidente da Associação de Sociologia de Macau, em entrevista à agência Lusa. O académico aponta a “tradição religiosa” como um exemplo de um “legado positivo” dos portugueses em Macau, tal como a “relativa” democratização, reflectida na possibilidade de eleger uma parte da Assembleia Legislativa. Contudo, salienta o sistema eleitoral como a principal falha dos portugueses durante as negociações que antecederam a transição – ao não insistirem para que a Lei Básica de Macau previsse o sufrágio universal, como aconteceu em Hong Kong. Ainda assim, Hao concede que “a democratização [existente] é um legado português”, que deve ser valorizado e desenvolvido, acabando com deputados nomeados pelo Chefe do Executivo ou, pelo menos, reduzindo o seu número. Segundo o académico, considerando “a longa história de totalitarismo” da China, é necessário em Macau “algo que contraponha essa tradição”, ou seja, o legado dos portugueses, que transporta a tradição europeia “de liberdade e direitos humanos”. Juventude diferente Hao identifica uma juventude em Macau mais preocupada com a democracia, em grande parte por influência de Hong Kong e Taiwan. “Isso reflectiu-se num inquérito sobre a mudança de atitudes em relação à China. Identificam-se menos do que antes, menos do que em 1999 e até do que há uns anos”, explica. O académico acredita contudo que a comunidade portuguesa poderia ter um papel relevante no esforço de democratização. “Se houvesse diálogo entre grupos, entre os que acreditam na democracia, por exemplo, podia delinear-se uma estratégia para lutar por isso”, afirma o investigador, sublinhado como seria benéfico que portugueses e chineses cooperassem para “fazer um trabalho sério” de “investigação sobre Macau”. Apesar do seu olhar optimista quanto ao futuro, identifica sinais de ‘continentalização’ que considera preocupantes, como o caso dos dois académicos – Éric Sautedé e Bill Chou – que foram afastados dos seus lugares na Universidade de São José e Universidade de Macau, respectivamente, por motivos políticos. As pessoas de Macau, diz ainda, “estão numa crise de identidade”. A esmagadora maioria identifica-se como chinesa, mas tem em conta que isso acarreta muitas facetas: “As pessoas têm mesmo de pensar em quem são, politicamente. Se respondem que são chineses, de que tipo? Identificam-se com o Governo chinês ou com valores universais? São a favor do centralismo, da ditadura ou da democracia? Que tipo de China perspectivam?” O sociólogo defende que há pouca identificação com a República Popular como entidade política e o que o princípio ‘Um país, dois sistemas’ é acolhido. “É o único mecanismo que os protege”, sublinha. Hao mantém, contudo, as boas perspectivas para um futuro mais longínquo. “Não há fuga à democratização. Não acho que o Governo da China possa manter esta pressão em Hong Kong e, por associação, em Macau”, defende. Olhando para 2049, vários cenários se vislumbram: “Se a China se democratizar – política, social e culturalmente –, Macau e Hong Kong também o vão fazer. Esse é o melhor cenário, mas há também a possibilidade de as coisas se manterem mais ou menos na mesma, até depois de 2049. Há uma terceira possibilidade, pior, em que Macau se torna mais ‘continentalizado’, com menos liberdade de expressão, de imprensa, mais problemas na indústria do jogo, mais descontentamento popular. Mas acho improvável”. Canto lusitano Hao não hesita em reconhecer que a relação entre chineses e portugueses foi sempre de desencontros, mantendo-se assim até hoje. Admite que “os portugueses não tiveram uma boa prestação no passado porque estiveram sempre separados da comunidade chinesa”, o que “é uma pena porque até depois da transferência podia ter havido mais diálogo”, mas diz que 500 anos de presença portuguesa deixaram marcas no tecido social, mesmo após o retorno à China. “Diria que as pessoas têm orgulho em ser de Macau, acreditam que são diferentes dos chineses da China continental. São mais abertas politicamente, menos controladas pelo Governo, mais rebeldes. Também há rebeldes na China, mas são muito poucos, proporcionalmente. Consideram-se mais progressistas e isso faz parte do legado português”, diagnostica. Para o sociólogo, Macau precisa de “empreendedores culturais” que estabeleçam essa ponte de comunicação. “Aqui não temos essas pessoas, todos estão a tratar das suas coisas, não procuram as outras comunidades”, diz. História precisa-se Um dos outros problemas apontados pelo sociólogo é o desconhecimento da História. Dezasseis anos após a transferência de Macau para a China, o território ainda não sabe o que fazer com o seu passado e o desconhecimento da história impede-o de aproveitar e desenvolver o legado português, defende. “Há cada vez menos conhecimento sobre o que aconteceu no passado. [As autoridades] não sabem como lidar com a história, com o passado colonial como o de Ferreira do Amaral. Acho que devíamos recuperar a estátua, pô-la num museu, ou assim”, afirmou o presidente da Associação de Sociologia de Macau, referindo-se a um dos mais polémicos governadores da história de Macau, visto pelos chineses como símbolo do poder opressor português. João Maria Ferreira do Amaral liderou o território entre 1846 e 1849, quando foi assassinado. No início dos anos 1940 foi erguida no centro da cidade uma estátua em sua homenagem, em que o governador empunhava um chicote sobre um grupo de chineses, que foi retirada em 1992. “Devemos compreender a avaliar o legado colonial, o que foi bom, o que foi problemático. E se houve algo bom, devemos manter esse legado e até expandi-lo”, defendeu o autor do livro “Macau History and Society”, que analisa a história do território, com particular foco no desenvolvimento identitário de Macau.