Tomás Chio Manchete PolíticaAviação | AACM diz que “é cedo” para discutir exclusividade do espaço aéreo O presidente da Autoridade de Aviação Civil disse que este não é o momento certo para abrir o mercado aéreo a mais uma companhia. Simon Chan já tem em mãos o relatório da Mega Maldives Airlines e diz que a legislação dos drones está a caminho [dropcap style=’circle’]S[/dropcap]imon Chan, presidente da Autoridade de Aviação Civil de Macau (AACM), confirmou no programa Macau Talk, do canal chinês da Rádio Macau, que “é cedo” para discutir a abertura do mercado de aviação. A AACM não tem o direito de interromper as operações comerciais já em curso, defende, pelo que a possibilidade ainda não está em cima da mesa. “Para uma abertura do mercado precisamos de analisar o risco de investimento, a qualidade dos serviços e a competitividade”, apontou Simon Chan, referindo que o Governo ainda tem uma concessão de quatro anos para cumprir com a Air Macau. A AACM diz ainda que não há uma direcção para que exista outra empresa de aviação no mercado, à semelhança do que já aconteceu com a Viva Macau, que acabou falida. Maldives na mão O presidente da AACM confirmou ainda que já recebeu o relatório sobre o incidente ocorrido com a companhia Mega Maldives Airlines. A empresa terá explicado que teve problemas com o avião e necessitou de mais tempo para procurar peças e reparar o aparelho, tendo isso essa a razão que levou a empresa a não divulgar o horário certo da partida do voo. Segundo Simon Chan, a Mega Maldives Airlines já indemnizou os passageiros e voltou a referir que a AACM não é o órgão responsável sobre essa área, por não ser uma entidade ligada ao Turismo. Em Março deste ano um voo da Mega Maldives Airlines com destino a Palau sofreu atrasos sucessivos, o que levou a que 200 passageiros tenham sido obrigados a ficar em Macau vários dias. Muitos desses turistas, do interior da China, desistiram da viagem. Drones na calha Em relação aos drones, Simon Chan voltou a referir que está a ser preparada a legislação para a operacionalização destes aparelhos de captação de imagem e vídeo, por forma a evitar que sejam operados em espaços perigosos, como é o caso do aeroporto. Simon Chan lembrou, contudo, que já existem normas sobre a matéria no Código Civil. Mais estacionamentos Questionado sobre a expansão do aeroporto, Simon Chan disse que a actual pista de aterragem é suficiente para aviões de grande dimensão. Com uns actuais 24 lugares, o aeroporto vai ter um novo planeamento e reorganização dos espaços, os quais vão sofrer um aumento, disse o presidente da AACM.
Joana Freitas SociedadeAeroporto com aumento nas receitas e no número de passageiros [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]CAM — Sociedade do Aeroporto arrecadou 1,22 mil milhões de patacas em receitas o ano passado, mais 16,6% face a 2014, e lucros líquidos de 153 milhões de patacas. Só o aeroporto conseguiu lucros brutos de 4,39 mil milhões, num balanço que a empresa traça de positivo. “O objectivo estratégico foi a inovação orientada para o crescimento e expansão de mercado, sendo que o tráfego aéreo no aeroporto continuou a apresentar uma tendência de crescimento face ao ano anterior, superando a meta estabelecida”, pode ler-se no relatório anual da empresa, publicado ontem em Boletim Oficial. Pelo aeroporto de Macau passaram mais de 5,83 milhões de passageiros no ano passado, mais 6,4% em relação ao ano anterior, e mais de 55 mil voos (mais 6%). A CAM fala de um “recorde histórico” no número de pessoas que se movimentaram no aeroporto, devido aos números representarem “dez vezes mais do que a população residente” no território. Durante 2015, nove companhias aéreas iniciaram operações, colocando à disposição oito novos destinos. Agora, a RAEM conta com 30 companhias a operar 44 voos domésticos e internacionais. Para 2016, o objectivo da CAM é atingir um maior volume de tráfego aéreo – aproximadamente seis milhões de passageiros. Para isso, a empresa diz que vai procurar formas de levar a cabo a prometida expansão do aeroporto para norte, “dando-se continuidade ao plano de aumento da capacidade”. Desde 1995 que mais de 79 milhões de passageiros e 770 mil voos passaram pelo aeroporto. A aposta nas companhias de baixo custo é uma das medidas que a CAM vê como positiva para o desenvolvimento do aeroporto.
Andreia Sofia Silva BrevesSecretário pede mais medidas de preservação do património [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]tecto da Igreja de Santo Agostinho foi abaixo, mas o Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, garantiu ontem que o incidente não é sinónimo de falhas na preservação e manutenção do património. Ainda assim, Alexis Tam referiu que o Instituto Cultural (IC) deve melhorar o seu trabalho. “Soube da queda do tecto através dos meios de comunicação social. Posso dizer que há sempre forças maiores que não podemos controlar, como incêndios, chuvas ou inundações. Isto pode prejudicar e danificar o nosso património cultural. Já pedi ao IC para melhorar o seu trabalho, sobretudo para enviar técnicos ao Centro Histórico, para inspeccionar de forma pontual a sua situação. Admito que há espaço de melhoria no nosso trabalho e temos de controlar ao máximo a parte danificada. O IC tem de reforçar as acções de inspecção e tem todas as informações sobre o ponto de situação de cada zona do património”, disse o Secretário à margem da inauguração do Centro de Avaliação Conjunta Pediátrica, no Hospital Conde de São Januário (ver páginas 2 e 3). “Posso dizer que não há nenhum conflito entre o desenvolvimento urbanístico e a protecção do património cultural. O Centro Histórico torna Macau um sítio peculiar. Estou ciente de qual é o nosso trabalho e sei que o IC dá grande importância à preservação do património. Somos uma cidade com um desenvolvimento do turismo, em parte devido ao nosso património, porque temos uma cultura única”, rematou Alexis Tam.
Filipa Araújo PolíticaVotação para afixação de publicidade traz dúvidas na Lei dos Condomínios [dropcap style=’circle’]”[/dropcap]O Governo quer encontrar um equilíbrio.” É assim que Chan Chak Mo, presidente da 2.ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa (AL), explica, aos jornalistas, o impasse do artigo que diz respeito à afixação de tabuletas e reclamos do Regime Jurídico da Administração das Partes Comuns do Condomínio. O artigo refere-se à afixação deste tipo de publicidade na fachada dos prédios ou segundo e terceiro pisos, assim como as renovações das actuais licenças. Até ao momento, o Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) atribuiu 20.575 licenças, das quais 18.513 correspondem a licenças de lojas no rés-do-chão, incluindo espaços destinados à habitação ou estacionamento, e ainda a lojas com publicidade em que não houve deliberação da Assembleia Geral do condomínio do prédio. No total, existem ainda 1400 licenças atribuídas para afixação em pisos que não o rés-do-chão e partes comuns. Actualmente o que acontece é que para afixação em áreas comuns do condomínio a Assembleia Geral responsável teria de aprovar com 2/3 dos votos. Agora, dita a proposta, “a autorização para afixação (…) depende da deliberação da assembleia geral do condomínio, tomada por votos que representem mais de metade do valor do total do condomínio (…)”. Isto é, apenas com 50% dos votos a decisão estará tomada. No caso das lojas do rés-do-chão, o proprietário pode afixar mas se a Assembleia Geral não concordar poderá convocar uma reunião para votar na autorização ou não. Algo que não agrada à Comissão pois, como explica Chan Chak Mo, poderá trazer situações que prejudicam as empresas, maioritariamente as Pequenas e Médias (PME) que se instalam neste tipo de lojas. “Imaginem que uma assembleia decide com o proprietário da loja que ele pode colocar publicidade na fachada do prédio por dez mil patacas. Tudo corre bem. No final de um ano uma nova assembleia decide que essa mesma publicidade custará cem mil patacas. Se for um prédio de seis proprietários, basta três estarem de acordo”, exemplificou, indicando que o problema não é a autorização mas sim a possibilidade de não permitir a afixação ao empresários. “O Governo assume que não quer prejudicar as PME, mas ao mesmo tempo está a diminuir os patamares. (…) Disse que vai tentar encontrar um equilíbrio”, garantiu o presidente. Por último, é definido ainda na nova proposta, que todas as licenças já permitidas continuam tal como estão, sendo que só em caso de troca de proprietário é que deve ser feito um novo pedido para aplicação. Questionado ainda pelos jornalistas sobre o pedido da Comissão para anular o artigo anterior, referente à criação de um fundo especial, Chan Chak Mo disse que só na reunião de hoje se irá debater o assunto, contudo o Governo assume que este Fundo trará “maior flexibilidade”, havendo várias vantagens na criação do mesmo.
Joana Freitas BrevesLotarias em monopólio por mais cinco anos A SLOT – Sociedade de Lotarias e Apostas Mútuas de Macau (Macau Slot) viu o seu contrato renovado por mais cinco anos. O anúncio foi ontem publicado em Boletim Oficial, num despacho assinado por Chui Sai On e que dá a Lionel Leong o poder para assinar o contrato. O acordo entre a RAEM e a Macau Slot iniciou-se nos anos 90 e continua agora até 5 de Junho de 2021, mantendo o monopólio da empresa por mais algum tempo, depois de no ano passado esta ter visto o contrato renovado apenas por um ano. A Macau Slot, ligada a Stanley Ho, explora as apostas desportivas, como de futebol e basquetebol, desde 1998. Há alguns anos que se tem vindo a especular a possibilidade dos casinos poderem operar este tipo de lotarias, sendo que recentemente Jorge Godinho, académico que lançou o livro Direito do Jogo na semana passada, sugeriu novamente a quebra deste monopólio. No ano passado, depois de uma prorrogação de três anos, a renovação do contrato por um ano voltou a trazer à baila a hipótese de que este monopólio estivesse a chegar ao fim, mas o Governo disse na altura não haver condições para que tal acontecesse.
Filipa Araújo BrevesChan Un Tong subdirector da DSAL Chan Un Tong, ex-coordenador-adjunto do Gabinete para os Recursos Humanos, é o novo subdirector da Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL), ficando responsável pelo Departamento de Emprego e do Departamento de Contratação de Trabalhadores Não Residentes. A nomeação foi ontem publicada em Boletim Oficial, assinada pelo Secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong. Também ontem decorreu a cerimónia de tomada de posso do novo subdirector. Wong Chi Hong, director do organismo, afirmou acreditar que o novo nomeado “tem capacidade profissional para desempenhar o cargo”. No seu discurso, Chan Un Tong garantiu empenhar-se nos trabalhos relativos as departamentos que agora dirige, de acordo com as Linhas de Acção Governativa, para que se avance com uma maior eficácia nas suas funções e na prestação dos serviços ao público. Formado em Direito Económico pela Faculdade de Economia da Universidade de Jinan, Chan Un Tong iniciou funções públicas, em 2002, como adjunto-técnico da Direcção dos Serviços de Assuntos de Justiça, passando para os Gabinete de Recursos Humanos e agora para a DSAL.
Tomás Chio BrevesBombeiro detido por alegado uso de droga Um membro das Forças de Segurança foi detido no hospital pela Polícia de Segurança Pública (PSP) por suspeitas de uso de droga. O homem é bombeiro e nega as acusações. Segundo o Jornal Ou Mun, o bombeiro, de apelido Leong e com 28 anos, foi mandado para o Centro Hospitalar Conde de São Januário (CHCSJ) por estar alcoolizado no último sábado. O hospital fez um teste que deu positivo para o uso de metanfetaminas, o que levou os médicos a chamar a polícia. Durante a investigação da PSP, diz a autoridade, Leong estava “excessivamente animado” e teve de ser amarrado pelos funcionários do hospital até ao final da tarde, quando foi levado para as instalações da PSP. Aí o homem admitiu que se encontrou com amigos num bar onde ingeriu álcool, mas recusa ter tomado qualquer tipo de droga.
Filipa Araújo BrevesSeminários de controlo de multidões na RAEM Nos últimos dois dias, Macau foi palco de seminários sobre “Estratégias de Resposta e Planeamento de Operações perante Grande Concentração de Massas”, no auditório da Escola Superior das Forças de Segurança. Tal como noutra ocasiões, Wong Sio Chak, Secretário para a Segurança, defendeu que, dado o rápido desenvolvimento da indústria turística de Macau, as grandes concentrações de massas e os acontecimentos colectivos têm vindo a ser cada vez mais frequentes e complexos, pelo que a gestão e indução eficaz do fluxo de pessoas e a resolução e extinção atempada das agressões à estabilidade social provocadas deste tipo de ocorrências são as tarefas prioritárias para manter a ordem social. Numa cooperação com órgãos de segurança pública e dos Institutos do Interior da China da Polícia de Hong Kong foram debatidos, durante os dois dias, temas diversos sobre a concentração de multidões.
Joana Freitas BrevesMaio de quebra nos casinos Os casinos fecharam Maio com receitas de 18.389 milhões de patacas, uma queda de 9,6% face ao período homólogo do ano passado, indicam dados oficiais ontem divulgados. Segundo a Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ), em termos acumulados, os casinos registaram, nos primeiros cinco meses do ano, receitas de 91.906 milhões de patacas, menos 11,9%. Maio marca o 24.º mês consecutivo de quedas homólogas das receitas dos casinos, mas apresenta ainda o terceiro melhor desempenho mensal em termos da receita arrecadada do ano – a seguir a Janeiro e a Fevereiro (o melhor). Em termos percentuais, foi a terceira menor queda, depois das registadas em Janeiro (-21,4%) e em Março (-16,3%). Macau contava no final de Março com 6087 mesas de jogo e 14.297 slot-machines, distribuídas por um universo de 36 casinos.
Hoje Macau Entrevista Eventos MancheteNuno Gonçalves, dos The Gift: “Queremos sempre o espectáculo como se fosse o último” A abertura da digressão da banda portuguesa The Gift já conta com sala esgotada em Macau no concerto que tem lugar hoje no Centro Cultural. Nuno Gonçalves, fundador e músico da banda, está radiante, não só com este espectáculo que representa a abertura das comemorações dos 20 anos de carreira, como pelo disco – ainda sem nome – que aí vem e que contou com a produção de Brian Eno [dropcap]E[/dropcap]sta digressão, iniciada hoje, marca os 20 anos de vida dos The Gift. Como é que nasceu e tem sido esta aventura? A banda nasceu como qualquer banda nasce. Pelo menos tenho esperança que hoje as bandas ainda nasçam dessa forma. Amigos de escola com amor pela música, com uma vontade própria da idade em fazer coisas. Depois pelo facto de virmos de uma cidade pequenina, como é o caso de Alcobaça, e por isso não termos tanto acesso à cultura como nos grandes centros urbanos, o que criava em nós uma motivação extra. Foi assim que começámos, num sótão pequenino em Alcobaça. De 1994 até hoje é uma história com muito trabalho em que fazemos os discos das nossas vidas e investimos muito tempo e dinheiro nas digressões. Queremos sempre apresentar um espectáculo diferente e o melhor possível, como se fosse o último. Algumas dificuldades quando se foram profissionalizando? No início ainda estudávamos. A música era um hobby, apesar de ser um hobby que nos roubava muito tempo. A profissionalização da banda só se dá entre 1998 e 2000. Sentimos algumas dificuldades associadas ao facto de sermos uma banda de fora dos grandes centros urbanos, que cantava em Inglês, com um estilo não muito definido. Não éramos Fado, não éramos o Pop da época, éramos diferentes dos Santos e Pecadores ou dos Delfins…. Mantêm hoje essa diferença? Acho que sim. Ao fim destes anos todos, e também pela presença e voz da Sónia e pela maneira como faço as músicas, acabamos por ter a nossa identidade e acho que essa também é uma das mais valias da banda. A entrada da Sónia inicialmente não era prevista… Não imaginava uma voz feminina, mas a partir do momento em que a Sónia cantou, fiquei rendido. É um dado curioso. Imaginava sempre a banda, o que também terá a ver com a adolescência, como uma coisa muito de rapazes. Não é a primeira vez que está em Macau. Como foi em 2000? Foi óptimo. Recordo-me desse ano em que andávamos com 12 músicos em palco. Vínhamos de Hannover e depois seguíamos para Paris. Foi uma época muito produtiva da banda. Foi um espectáculo muito engraçado porque na altura não vínhamos com muitas expectativas. Acho também que uma das grandes vantagens da banda é essa de não ter expectativas em muita coisa. Tentamos sempre fazer o nosso melhor e se corre bem, ainda bem. Lembro-me que estava cheio e que esgotámos os CDs todos que tínhamos trazido para venda. Divertimo-nos imenso. O público era também muito heterogéneo, dos oito aos 88 anos. Esta abertura de digressão em Macau foi por acaso ou planeada? Sabíamos que à partida seria mais ou menos por esta altura. Há uma lacuna de espectáculos normalmente entre Janeiro e Maio, apesar de nós, e por gostarmos de tocar em teatros, fazermos muitas vezes nesta altura os nossos concertos também. Aqui calhou e ficámos muito lisonjeados com isso. Por um lado vamos ter tempo para trabalhar e por outro vamo-nos divertir imenso porque vamos trabalhar para um público que à partida não está conquistado e isso é óptimo. O que esperam deste espectáculo hoje? Disseram-me que estava esgotado. Vamos fazer o nosso melhor e acho que as pessoas vão gostar muito. Como é que é levar a música que se faz em Portugal ao mundo, visto os The Gift também já terem esse papel? Acho que levar a música portuguesa ao mundo já se faz há muitos anos e mais especificamente no Fado. No nosso caso, é um bocadinho diferente, tentamos levar outra música. Na minha opinião é uma música mais identificativa do Portugal moderno do que propriamente duas guitarras e um xaile preto. Acho que Portugal tem bastante mais cor e é bastante mais luminoso do que isso. Nesse sentido, e o facto de ser também diferente, faz com que seja também mais difícil. Ainda não há estradas traçadas por uns Heróis do Mar, ou por uns GNR. Infelizmente essas grande bandas portuguesas e muito identificativas da nossa geração não conseguiram passar além fronteiras. Ao contrário de nomes como a Amália Rodrigues, Mariza, Dulce Pontes ou Madredeus. Existe uma auto-estrada com via verde aberta para o Fado na ‘worldmusic’, que não existe no Pop. O caminho é mais difícil. Nós, por exemplo, temos mercados em que estamos mais solidificados, como o de Espanha. Isso será também pela proximidade geográfica e por isso acaba por nos permitir abrir a nossa própria estrada. Por exemplo em Madrid já tocámos para 1700 pessoas. Já temos também uma presença forte nos média. Por outro lado já não temos a mesma projecção nos média de Portugal, o que pode significar que é um caminho já traçado, em que não somos mais a coqueluche da música portuguesa. Mas existe em Espanha um crescer de interesse ao ponto de virem a Portugal ver espectáculos nossos. No Brasil também temos tido destaque bem como nos Estados Unidos, onde com maior ou menor frequência, também vamos. Relativamente à estrada aberta do Fado. Os The Gift também já tiveram um projecto associado a ele. Como correu? É um projecto ligado ao Fado porque cantamos poemas de temas de Fado, mas que por si não o era. E só assim eu o poderia fazer. Não sou de todo amante do género, tal como não sou amante de Heavy Metal e convidei o Fernando Ribeiro dos Moonspell para fazer parte do projecto. E como foi abordar essa coisa pela qual não se tem um gosto especial? O facto de não gostar do estilo não é porque não ache que a Mariza, a Carminho ou a Ana Moura não tenham um talento tremendo. O mesmo se aplica aos novos compositores. Tem a ver com o xaile negro e toda aquela penumbra e melancolia que eu também tenho na minha música, mas gostava de ver mais cor nas coisas. O projecto da Amália Rodrigues foi pedido pela Paula Homem. No início disse imediatamente que não, mas depois ela disse-me que queria que fosse um projecto sem Fado e aí já entendi melhor e aceitei. Foi um grande sucesso e muito divertido para nós. Criámos laços que ficaram para a história, a Sónia por exemplo acabou por conhecer o Fernando e tiveram um filho, a minha filha nasceu nessa altura, etc. Foi uma época muito luminosa, divertimo-nos muito porque não havia a pressão de carreira e sabíamos que era um projecto que tinha um início e um fim. A música que se faz em Portugal está boa e recomenda-se? Sim, acho que sim e acho que sempre esteve. Não sou daquelas pessoas críticas em relação à música portuguesa. Quando começámos, por exemplo, existia um concurso de música moderna alternativa na nossa cidade de Alcobaça. Sem querer e sem se falar muito nisso nós tínhamos à porta uma pequena “Factory” do Andy Warhol naquele espaço todas as semanas. Nunca achei que a música portuguesa era de má qualidade. O que se fala muitas vezes é que não há oportunidades, que as rádios não passam esse tipo de bandas, etc. Nós não temos razão de queixa da rádio. Continuamos a perceber que é na rádio que se fazem os grandes sucessos e é de lá que saem os hits. Se a rádio está boa? Não considero. Acho que está muito má. Acho que há uma incoerência tremenda nas playlists. Não há uma linha condutora. O que é que aí vem? Vamos lançar um novo disco que já está feito. Se não for no final deste ano será para o ano. Tivemos a sorte de realizar este projecto de sonho produzido pelo melhor produtor do mundo que é o Brian Eno, misturado pelo não menos conhecido Flood, e é uma história de sonho. Aprendemos imenso. Foi tremendo. Foram dois anos de trabalho que chegaram agora ao fim. Temos um disco de sonho para lançar que rompe com barreiras dos The Gift e que constrói, para mim, as nossas melhores canções de sempre. Acho que ao final de 20 anos conseguirmos este projecto com o Brian Eno foi a cereja no topo do bolo e pode ser o início de uma nova etapa muito importante dos The Gift. Como foi trabalho com esse “monstro” que é o Brian Eno? Foi a melhor experiência que podíamos ter, quer profissional, quer enquanto relação. Um ser humano extraordinário. Tem também uma maneira muito interessante de conduzir as pessoas e os músicos. Eu nem tenho muitas palavras. Tudo poderá ser hipérbole. Quando falo do trabalho com ele é tudo muito grande e muito bom.
Hoje Macau EventosDesign | Iniciativa “This Is My Street” arranca amanhã Arranca amanhã no Centro de Design de Macau a actividade “This Is My Street”, que dá o pontapé de saída para um conjunto de iniciativas de olhos postos no cruzamento, integração e comunicação entre o design e a comunidade [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]proximar e envolver a comunidade local dos designers e do seu trabalho é o mote para o “This Is My Street”, iniciativa que arranca amanhã no Centro de Design de Macau, pelas 15h00, com uma palestra explicativa. Com o intuito de dar a conhecer o projecto, foram convidados de Hong Kong Freeman Lau e Kurt Chan que lideraram uma acção idêntica na área de Kai Tak, onde se situava o antigo aeroporto da cidade vizinha. Manuel Correia da Silva, co-fundador da Lines Lab e vice-presidente da direcção da Associação de Designers de Macau, adianta ao HM que a partir desta experiência a ideia é conseguir também na RAEM uma aproximação entre o trabalho dos designers em prol da comunidade e com o envolvimento desta. “This Is My Street” tem como coração a área circundante do Centro de Design de Macau, sendo considerada pelo responsável como “marginal”. Situada na zona norte da península, tem uma forte componente residencial e alberga ainda antigas zonas industriais, concretizando-se como um espaço mais “à mão” e com necessidades inerentes. Manuel Correia da Silva adianta que apesar de, por si só, não ser um projecto de intervenção urbana, pode acontecer que no decorrer do processo aconteçam acções de intervenção no espaço. A ideia é dar a conhecer aos vizinhos de bairro o papel do designer na comunidade que integra e com isso é intenção convidar cidadãos das redondezas para um diálogo. Procura de identidade A escolha dos membros da comunidade será efectuada com a observação dos habitantes e frequentadores assíduos da vizinhança, representando a sua identidade. As entrevistas entre habitantes e designers tem início marcado para a semana que vem e tanto nelas, como no decorrer de todo o processo, “o objectivo é cruzar dois eixos, um que aborda o olhar dos designers sobre as necessidades que sentem no bairro sendo que consideram possuir competências para melhorar a situação e um outro que é o lado da rua, dos que lá moram e dela fazem parte e que em si representem a sua identidade”. O registo da iniciativa pretende ser a produção de um filme documentário de cerca de dez minutos a ser apresentado no final de todo o processo e que documente todo o percurso. Manuel Correia da Silva salienta ainda que “o que interessa nesta estreia é a promoção deste tipo de relações, sendo que mais importante agora é o processo e não o resultado”. Apesar de por agora ainda não existir feedback por parte da comunidade, serve o seminário de amanhã para dar a conhecer o que aí vem. Manuel Correia da Silva há dez anos que leva a bom porto o festival “This Is My City”, que o mesmo considera “uma visão mais macro” da actual iniciativa” sendo que “acabam também por ser todos subprodutos da mesma ideia com elementos em comum”. O mote é sempre o discutir e pensar a cidade.
Hoje Macau China / ÁsiaBanco Asiático de Investimento terá 100 países membros O Banco Asiático de Investimento em Infra-estruturas (BAII), a primeira instituição financeira internacional proposta pela China, vai alargar o número de países membros de 57 para cerca de 100, anunciou ontem o presidente Jin Liqun. Em declarações ao jornal oficial China Daily, Jin disse que 30 países aguardam a adesão ao BAII e mais 20 indicaram já uma “intenção firme” de fazer parte da instituição. Caso se concretize, o BAII ultrapassa assim o Banco Asiático de Desenvolvimento, criado pelo Japão em 1966, e que conta com 67 membros, 19 dos quais exteriores à região da Ásia-Pacífico. Com uma participação de cerca de 13 milhões de dólares, Portugal é um dos 57 países fundadores do BAII, que no conjunto integra 14 países da União Europeia. O Brasil é o nono maior accionista, com uma quota de 3.181 milhões de dólares e o único membro em todo continente americano. Proposto pelo Presidente chinês, Xi Jinping, em 2013, aquela entidade é vista como uma reacção do Governo chinês ao que considera o domínio norte-americano e europeu em instituições globais como o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial. Gigantes de fora Entre as grandes economias do planeta, apenas Estados Unidos da América e Japão não fazem parte, mas Jin frisou que “a porta continua aberta”, acrescentando que as empresas daqueles países serão tratadas de forma “igual e justa”, destaca o China Daily. Segundo o antigo vice-ministro das Finanças da China, o banco irá anunciar a primeira rodada de projectos de infra-estruturas este mês, e a segunda e terceira no final deste ano. O BAII vai também estender o financiamento a países exteriores à Ásia com “fortes relações económicas” com o continente e, para além de infra-estruturas, irá também financiar projectos nos sectores educação, saúde e planeamento e gestão urbana. Com sede em Pequim, o BAII tem um capital inicial de 100.000 milhões de dólares (30,34% pertence à China) e é assumido como o principal instrumento de financiamento da iniciativa chinesa “Uma Faixa e Uma Rota”, um gigante plano de infra-estruturas, que pretende reactivar a antiga Rota da Seda entre a China e a Europa através da Ásia Central, África e Sudeste Asiático.
Sérgio Fonseca DesportoRodolfo Ávila testou um sport-protótipo na Malásia O piloto português de Macau Rodolfo Ávila testou na passada terça-feira, no Circuito Internacional de Sepang, o sport-protótipo ADESS 03 LMP3 da equipa Infinity Race Engineering. Para Ávila esta foi uma experiência nova, ele que nos últimos anos tem competido em corridas de carros de Turismo e de Grande Turismo. Este sport-protótipo de cockpit fechado tem um motor Nissan Nismo V8, capaz de debitar 420 cavalos, e pesa 930 kg. “Foi um convite inesperado e de última hora quando estava em Chengdu na prova de Fórmula 4 China. Fico grato à Infinity Race Engineering Group e ao Vignesa Moorthy por se terem lembrado de mim e me terem dado esta oportunidade”, disse Ávila ao HM. Sobre o teste em si, o piloto luso diz que foi uma experiência “realmente boa”. “Tudo era novo para mim mas eu adaptei-me rapidamente a um carro diferente de tudo o que tinha guiado até aqui”, acrescentou. Para além de Ávila, a Infinity Race Engineering testou no circuito malaio o australiano Jon Collins e o malaio Daniel Woodroof. Curiosamente, Ávila foi o primeiro piloto de nacionalidade portuguesa a alguma vez conduzir um carro da categoria LMP3 (Le Mans Prototype 3), classe que não corre nas 24 horas de Le Mans mas que é aceite e bem-vinda em campeonatos como o European Le Mans Series, Asian Le Mans Series e na Asian Le Mans Sprint Cup. “O motor não me impressionou, mas o carro tem bastante downforce e mais aderência do que eu esperava. Os tempos que consegui foram promissores e estou certo que poderíamos ser mais rápidos se tivéssemos tempo para trabalhar nas afinações, mas esse também não era o objectivo principal deste teste. Posso imaginar que correr com um carro destes deva ser bastante agradável”, explicou Ávila que esta temporada não tem um programa desportivo ainda definido. O piloto da RAEM também não tem qualquer plano concreto para correr no Asian Le Mans Series, campeonato que arranca em Outubro em Zhuhai, pois “o convite foi apenas para testar o carro”, mas não esconde que participar a tempo inteiro no campeonato de resistência organizado pelo Automobile Club L’Ouest na Ásia “poderia obviamente ser uma experiência interessante”.
Andreia Sofia Silva DesportoAssociação quer Circuito da Guia como património [dropcap style=’circle’]A[/dropcap] recém-criada Associação para a Promoção do Desenvolvimento do Circuito da Guia de Macau (APDCGM) pretende que o Circuito da Guia, onde anualmente decorre a competição do Grande Prémio de Macau, seja candidato à classificação como património mundial pela UNESCO. “É um objectivo da nossa Associação e um sonho também”, disse ao HM José Luís Estorninho, presidente da direcção. “Temos junto ao circuito o Farol da Guia e outros monumentos e temos de os preservar. É um conjunto muito valioso para Macau. Estamos numa fase muito inicial mas está dentro do nosso programa e iremos abordar o mais depressa possível essa questão junto das autoridades”, referiu. Para além de Estorninho, Fernando Gomes será o vice-presidente da assembleia-geral, enquanto que João Manuel Ambrósio será o secretário. Já o arquitecto Carlos Marreiros irá presidir à assembleia-geral da Associação. Da logística Mais do que a paixão pelo Grande Prémio de Macau, a APDCGM pretende chamar a atenção para os problemas logísticos causados pelo maior evento desportivo do território. José Luís Estorninho garantiu que um dos objectivos é dialogar com o Governo quanto à organização do Grande Prémio. “As pessoas que vivem em Macau já há alguns anos sentem esse problema e os embaraços que o evento traz ao nosso dia-a-dia. Esperamos cooperar com as autoridades e ajudar a resolver estas questões. As coisas resolvem-se com mais facilidade e é uma iniciativa que vai ao encontro daquilo que as pessoas querem ver resolvido”, apontou o presidente da Associação. “É mais uma causa cívica para que a população esteja alerta às coisas que a todos nós cabe resolver e ter atenção. O Grande Prémio é um evento de muita importância para Macau, que envolve muitas áreas, como o turismo e o trânsito. E tudo isso afecta a nossa vida e temos uma quota parte de responsabilidade no sentido de fazer chegar as nossas ideias e aspirações”, adiantou. Para José Luís Estorninho já fazia falta uma entidade representativa de um circuito automobilístico que anda nas bocas do mundo. “Em Macau temos associações em todas as áreas e porque não uma associação sobre o Circuito da Guia? Faz todo o sentido e achamos que merece ser representado por uma associação, ainda mais um circuito tão emblemático como o nosso. Há algum tempo que carecia de uma representação que pudesse cooperar com entidades públicas e privadas para a implementação de novas iniciativas.”
Manuel Afonso Costa Fichas de Leitura h | Artes, Letras e IdeiasUma profecia serial Faria, Almeida, Rumor Branco, Assírio & Alvim, Lisboa, 2012. Descritores: Romance, solidão, iniciação, Poesia, ISBN: 9789723716481, 160 páginas [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]lmeida Faria nasceu em 1943 a 6 de Maio em Montemor-o-Novo no Alto Alentejo. Estudou Direito e Letras e veio a formar-se em Filosofia, mas antes disso com apenas 19 anos publicou o seu primeiro texto de ficção, O Rumor Branco, obra à qual foi atribuído o Prémio Revelação da Sociedade Portuguesa de Escritores. Entre 1965 e 1983 elaborou os romances da “Trilogia Lusitana” (A Paixão, Cortes, Lusitânia) e com o Cavaleiro Andante, encerrou de algum modo este ciclo. Pela mesma época estagiou como bolseiro nos Estados Unidos e na Alemanha Federal e leccionou Estética e Filosofia da Arte na Universidade Nova de Lisboa. Além de romancista, é autor de ensaios, contos e peças de teatro. Recentemente publicou, a partir de um conto seu, o libreto para a cantata de Luís Tinoco Os Passeios do Sonhador Solitário. Publicou ainda O Murmúrio do Mundo, relato ensaístico de uma viagem à Índia. Ao conjunto da sua obra foi atribuído o Prémio Vergílio Ferreira da Universidade de Évora e o Prémio Universidade de Coimbra. Começo por citar Pedro Mexia, pois parece-me que ele encontrou o registo certo: “Mais «romance novo» do que nouveau roman, Rumor Branco é uma representação do mundo português de 1962 enquanto náusea”. Mas Almeida Faria consegue provar que pode haver náusea e poesia ao mesmo tempo, portanto é de uma poética da náusea que se trata. Contudo a náusea é apenas a atmosfera em que acontece aquilo que de mais importante acontece; pois para além disso Almeida Faria tinha já percebido aos dezanove anos que um homem é sempre “o primeiro homem. Porque o seu mundo é a reinvenção do mundo, a sua voz uma voz original”. Isto é o que dele disse Vergílio Ferreira, no prefácio da 1ª edição, mas isso é o que o romance diz de múltiplas formas embora fragmentadas. O recurso ao fragmento edifica a história a dois tempos. Há um tempo que é o dos materiais concretos que se sobrepõem assim como a sobreposição de tijolos edifica uma parede e há um outro tempo que é o tempo dos interstícios, dos espaços em branco que eram antes da narrativa povoados pelo silêncio e dos quais agora no tempo da execução da voz fazem ouvir o seu rumor. No processo complexo de dar voz a um mundo, o autor assiste com espanto ao nascimento da sua própria voz. Para mim o que é genial nesta obra inaugural de Almeida Faria é o facto de ela simular exemplarmente o nascimento do mundo e do demiurgo dentro dele. Para Almeida Faria o mundo nasce quando nasce o demiurgo, são ambos demiurgos recíprocos. Não existe uma separação entre criador e obra e nenhum pré-existe ao outro, criação e criador são a mesma coisa embora desdobrada ontologicamente. Não nos interessa se é assim que as coisas se passam ou se como pretendia Bocanegra o homem não é mais do que um copista e jamais um demiurgo. É assim que a oração começa: “uma voz existe intersticial. Há trevas à tua volta e tu não és.” E continua, mas os primeiros versos serão ainda durante algum tempo proféticos mas hesitantes, por vezes a visão parece claudicar e todo o trajecto até ao fim do primeiro fragmento é o caminho de um homem que começa dobrado e se vai levantando até que já completamente levantado vai dizendo, como um desafio “vamo-nos-deitar vamo-nos-deitar vamo-nos-deitar vamo-nos-deitar vamo-nos-deitar vamo-nos-deitar vamo-nos-deitar vamo-nos-deitar vamo-nos-deitar vamo-nos-deitar”. Exactamente dez vezes. A publicação de Rumor Branco fez correr muita tinta, em larga medida por causa do prefácio de Vergílio Ferreira, atendendo ao facto de este autor ter desertado pela mesma época, enfim uns anos antes, das fileiras do neorrealismo, inaugurando de algum modo a ficção de matriz existencialista em Portugal, com o romance Aparição. A polémica desencadeou-se a partir da publicação do romance de Almeida Faria, através de Alexandre Pinheiro Torres e do próprio Vergílio Ferreira, tendo-se depois alargado a outros vultos intelectuais contemporâneos. Lida hoje, a polémica dá conta de muitos equívocos, mas do ponto de vista documental e histórico mostra a realidade intelectual do tempo. Em boa verdade a maior parte das grandes discussões intelectuais e literárias em Portugal durante o período de vigência do Estado Novo tiveram o neorrealismo como pano de fundo, o que se compreende porque o neorrealismo foi a ideologia literária oficial do marxismo em Portugal e em particular do Partido Comunista Português e portanto ele era um reflexo da relevância deste partido na resistência ao regime. O neorrealismo nunca se pôde libertar da sua circunstância histórica, sobretudo em Portugal. O romance de Almeida Faria é que não tem culpa nenhuma, até porque relido hoje em dia à luz de outras ferramentas teóricas e de outras utensilagens mentais, verifica-se que não se adequava nada às reivindicações ideológicas da época e por isso muito mais certeiro se afigura o que dele diz Pedro Mexia quando enfatiza a sua vocação serial: “a fragmentação, a pontuação escassa, a sintaxe ousada, uma partitura dissonante e ofegante de provérbios, palavras de ordem, neologismos, clichés. Uma música pós-musical, como a de Stockhausen a que o título alude”. Estou inteiramente de acordo quanto à atonalidade constitutiva do romance e ao seu carácter pós musical, ao seu ritmo assimétrico e claudicante, mas sempre luminoso e poético. Li pela primeira vez este texto de Almeida Faria quando tinha vinte anos e se há uma obra de um autor português que me assombrou foi esta. Mais tarde voltei a ter o mesmo sentimento apenas uma vez, foi com o Silêncio de Teolinda Gersão. Estou a referir-me a obras de ficção portuguesas e de autores ainda não consagrados à época em que os li. Existem entre elas algumas similitudes. São ambas narrativas intensamente poéticas e soturnas, verdadeiras litanias espectrais da solidão. Rumor Branco é da ordem do “Nocturno” e o Silêncio é apesar de tudo mais solar, mas ambas esburacam o ser até ao lugar em que já não se ouve a sua voz, apenas silêncio e rumor.
Hoje Macau h | Artes, Letras e IdeiasQue estamos nós aqui a fazer, tão longe de casa? | 15 – O estripador *por José Drummond [dropcap styçe’circle’]“M[/dropcap]eu Amor. Escrevo-te aqui de uma cidade perdida nas montanhas do Japão. Espero que esta minha primeira carta desde que nos separámos te acalme e que te possa dar alguma esperança. É importante que saibas que eu não te esqueci. Vives dentro do meu coração. Sempre. Desculpa não ter conseguido contactar-te antes da minha partida. Tenho a certeza que ele desconfia de alguma coisa. Estou a ficar assustada. Ontem a voz dele alterou-se e frequentemente fica em suspenso e não acaba as frases. Como se estivesse realmente a pensar noutra coisa. Não sei porque não tive coragem de acabar isto aí. Deixei arrastar tudo e depois pensei que seria mais fácil de lidar com este palerma durante a viagem. Na verdade gostava que estivesses aqui ao meu lado. Agora. Neste preciso momento, para não ter que te escrever e poder sussurrar tudo ao teu ouvido. E deixar-me abraçar. E deixar-me beijar. Só estou bem ao pé de ti. Quero dar-me toda. Para que me conheças ainda melhor do que eu própria me conheço. Espero que não estejas triste. Não tolero o pensamento de que possas estar triste. Como sabes não sou o tipo de mulher que se enrola em infidelidades. Tudo isto é tão complicado. Tudo isto é tão novo para mim. Não sei como tens paciência para mim. Não sei o que vês em mim. Posso garantir-te que não estou nesta relação contigo para perder tempo ou para brincar com os teus sentimentos. Por favor acredita na minha sinceridade. Tu és o homem que eu amo. Que mais me iluminou. Que mais me faz feliz. O único que realmente me faz feliz. Aqui, ao lado dele, sinto-me rodeada por esta miséria. Espero com todo o meu ser que acredites que sou honesta quando te digo que tu és aquele que o meu íntimo deseja. Aquele que trago sempre no peito. Como gostaria de poder planear o tempo exclusivamente em tua função. Desculpa-me, sabes que nunca tive jeito para escrever, mas todas as palavras são puras e saem do meu coração. Contigo sou tão diferente. Estou sempre com vontade de fazer coisas. Como gostava de voltar a cantar ópera cantonense. Aquelas escapadas à sala privada de karaoke, onde acabamos uma vez por fazer amor, acordaram em mim o meu gosto em cantar. Sabes que quando era pequenina sempre quis ser como a minha mãe. Ela cantava frequentemente na associação de bairro. Ouve um período, no qual, fui a muitos concertos tradicionais com ela. Lembro-me que ela chegou a ganhar prémios. Dava gosto ouvi-la. ‘Uma mulher que sabe cantar bem pode hipnotizar o homem certo’, dizia-me ela com frequência. Ela podia cantar em todos os lugares. Era uma mulher muito corajosa e confiante de si própria e das suas decisões. Como gostava de ser um bocadinho mais como ela. Depois aquela horrível pneumonia acabou com as forças dela. Foi nessa altura que os meus tios me levaram para Macau. Nunca mais a vi e eles esconderam-me a sua morte até eu fazer 16 anos. Mentiram-me durante anos e anos. Nessa altura a minha vida começou a deixar de fazer sentido. Acreditei que o mundo estava contra mim e que Deus não existe. Acabei por seguir o trabalho mais estúpido do mundo. Como sempre odiei estar por ali a deitar fichas para jogadores porcos, almas penadas, pessoas sem interesse nenhum. Por causa do meu trabalho eu tinha que usar aquele uniforme completamente amorfo e sem estilo. Sempre que saia dirigia-me às casas de banho, na parte de trás do hotel, e carregava um pouco nos cosméticos até alterar o rosto. Trazia sempre um vestido leve num saco que me ajudava a voltar a fazer sentir-me pessoa de novo. Era mais forte que eu. Era o desejo de conseguir ter uma existência. Sabes que a verdade é que eu sonhava um dia ainda conseguir fugir para Paris e estudar moda. Foi numa dessa noites depois do trabalho no Casino Lisboa que acabei por conhecer este palerma. Levou-me a comer ostras e lagosta e confesso-te que me deixei seduzir pelo seu dinheiro. A cada encontro comprava-me a alma com mais uma jóia. Não demorou muito até nos casarmos. Proibiu-me logo de trabalhar. Muitas vezes pensei que a minha vida acabou ali. Mal sabia eu que ainda te viria a conhecer. Uma vez resolvi pintar o cabelo com tons vermelhos. Nessa noite não me falou e na manhã seguinte deixou-me um bilhete, antes de sair para o trabalho, que dizia: ‘é favor mudar a cor do seu cabelo. Não é uma cor decente para a mulher de um político. Se alguém a vê com esse aspecto o meu lugar na assembleia fica em risco.’ E foi assim que nunca mais mudei o meu corte de cabelo nem o pintei de outra cor que não preto. Lembro-me que quando era miúda cuidava imenso do meu cabelo longo. Sonhava encontrar o meu príncipe e sonhava que ele me ajudava a lavar o cabelo. E que depois, com imenso carinho ajudava-me a secá-lo. E que brincava com ele quando encostava a minha cabeça no seu peito. A minha felicidade quando nos conhecemos. Meu amor. Finalmente alguém brinca com o meu cabelo. Finalmente alguém despertou em mim o romance. Esta paixão que me revelou que afinal a vida não tinha acabado. Agora, aqui perdida de saudades tuas, sei que estou pronta para te dar todo o meu amor. Tu és tão especial. Espero que nunca te arrependas de estar comigo. Sonha comigo meu amor. Dá-me tempo para acabar isto que estarei de volta muito, muito em breve. Sempre tua. Daphne.”
Leocardo VozesDeixaste-nos, Donald [dropcap style=’circle’]D[/dropcap]eixaste-nos, Donald. Sem uma palavra, um último encontro no cais, uma troca de olhar cúmplices ou simplesmente um abraço, enfim. Eu entendo-te, como te entendo. Afinal não tens bracinhos, e apesar de não seres “feito de ferro” e por isso desprovido de emoções, és feito de borracha e…desprovido de emoções. Quem te viu ali no Porto Exterior, imponente, inchado e amarelo, com os olhos muito abertos, diz que parecias estar a boiar atento a quem passava por ali a “boiar”¹ – será verdade? Hei-de perguntar a alguém que tenha passado por lá, que eu abstive-me de o fazer. Talvez porque detesto despedidas. Ou não me interessava, não sei, tudo é possível, depois pergunto…se me lembrar. E se não tiver mais nada que fazer. Partiste assim, Donald, seu pato. Os dias sem ti nunca mais foram a mesma coisa, acredita. Pode ser que o Céu não tenha caído sobre as nossas cabeças, mas uma parte do tecto da Igreja de Santo Agostinho cedeu em plena missa dominical – fúria divina, advinda do ressentimento pela tua partida? De que outro jeito se explica algo assim, e logo quando a estrutura que é património cultural havia sido restaurada no ano passado? O quê? Não tens a culpa? Ah sim, é possível que tenha acabado o betão com que armavam os interiores, e para despachar a obra tenham recorrido a caixas de “ta-pao” de um restaurante ali próximo. Por isso é que foi “restaurado”, claro. Como é que não pensei nisso antes? Talvez eu tinha confiado demais nos sinais, meu adereço de banho do bebé agigantado. Parecia tudo tão claro…oito cobras encontradas mortas em Coloane… acho que o livro do Apocalipse, que relata o fim dos dias, fala de qualquer coisa assim lá para o meio, acho. É mais provável do que impossível. E o profeta-arquitecto, sim, aquele que foi à televisão avisar-nos dos talibãs, das carpideiras, do holocausto urbanístico e dos tectos de vidro (sic), foi tudo coincidência? Chamai-o de louco, se quiseres, mas eu não me atrevo a ignorar o seu presságio, a rir das suas profecias, nem que anunciasse ele um novo dilúvio – afinal choveu à brava no último fim-de-semana, não foi? Choveu sim, mas não que tu tivesses dado por isso Donald. Havias partido, e nada ficou senão as memórias dos outros que não eu, que gozaram de um momento efémero de prazer, fazendo uso do teu corpo para figurar como pano de fundo nas suas “selfies” tiradas junto ao mar. Eu até os invejaria, pobres tolos, alguns crentes que o teu amor não era pago, ignorando que era tudo um faz-de-conta. Agora acabou-se, e qual proverbial bonequinha de borracha, tiram-te o ar e metem-te numa caixa, e só te voltam a encher para os próximos fregueses. No fundo não passas de um reles “pato”², apegado aos bens materiais, como aqueles senhores que enquanto obtinham ganhos ilícitos estava tudo na paz dos anjinhos, mas quando os cheques foram acometidos de calvície gritaram “aqui d’el rei, que somos ‘vítimas’, e não cúmplices”! É um mundo cão, este. E um mundo pato, às vezes. Vai e não voltes, Donald. Chega, não te quero ver mais, e fosses tu de penas e chicha, desfiava-te e metia-te arroz por cima. Leva contigo o dinheiro obtido com o suor do nosso rosto, e não te lembres de nós, que tão bem te quisemos, na hora de o gastar. Adeus, Donald, seu grandessíssimo filho da pata. ¹ “boiar”: calão macaense para “divertir-se”, “fazer farra”. ² “Pato”: nome pelo qual os chineses se referem aos homens que se prostituem
Hoje Macau China / ÁsiaPortugal quer ser um “ponto estratégico” da Rota Marítima da Seda [dropcap style=’circle’]P[/dropcap]ortugal quer ser um “ponto estratégico” da iniciativa chinesa Rota Marítima da Seda, disse o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, em entrevista ontem publicada pelo jornal oficial do Partido Comunista da China (PCC). “Portugal está disposto a mover, em conjunto com a China, todas as diligências, no sentido de se tornar um ponto estratégico da Rota Marítima da Seda”, frisou Rebelo de Sousa, numa extensa entrevista publicada na versão impressa do Diário do Povo e na edição digital em português, inglês e chinês. Aquela iniciativa, anunciada pelo Presidente chinês, Xi Jinping, em 2013, refere-se a um gigante plano de infra-estruturas, que pretende reactivar a antiga Rota da Seda entre a China e a Europa através da Ásia Central, África e Sudeste Asiático. Segundo as autoridades chinesas, vai abranger 65 países e 4,4 mil milhões de pessoas, cerca de 60 por cento da população mundial. Local apetecível Neste aspecto, Rebelo de Sousa frisou o “elevado grau de operacionalidade” e a “localização privilegiada” do porto de Sines, na costa ocidental portuguesa, como “porta de entrada” para a Europa. “Este porto encontra-se numa fase de atracção de investimento e acredito que poderá oferecer inúmeras vantagens a eventuais parceiros chineses”, disse. Desde que a China Three Gorges comprou 21,3% da EDP (Energias de Portugal), em 2011, a China assumiu-se como um dos maiores investidores em Portugal, adquirindo participações em grandes empresas das áreas da energia, seguros, saúde e banca. O chefe de Estado português destacou a relação de “complementaridade” no sector energético, “especialmente nas árceas produção e eficiência energética e energias renováveis”. “Os investimentos levados a cabo por empresas chinesas neste sector traduziram-se em resultados palpáveis para ambos os lados”, frisou ao jornal oficial do PCC. Para Rebelo de Sousa, existe hoje um número considerável de acordos assinados entre os dois países, nas “mais diversas áreas”, enquanto o número de visitas oficiais “tem aumentado, não só em quantidade, mas também em qualidade”. No ramo da investigação científica, porém, o Presidente da República considerou que “existe ainda uma larga margem de progressão”, apesar de “centros de pesquisa das universidades dos dois países terem avançado com alguns programas de cooperação”. Atracção sínica Rebelo de Sousa, que revelou ter uma “atracção” pela China, disse ainda que Portugal sempre primou pelo reforço da colaboração entre empresas chinesas e portuguesas nos mercados de Angola, Moçambique e outros países de língua oficial portuguesa. E propôs que ambos os lados avancem com um mecanismo de cooperação para operar em terceiros mercados, nomeadamente em África ou na América do Sul. “As empresas portuguesas e chinesas podem trabalhar juntas nestes mercados nos sectores das infra-estruturas e energia”, indicou. Quanto ao estatuto de Portugal como membro fundador do Banco Asiático de Investimento em Infra-estruturas (BAII), a primeira instituição financeira internacional proposta pela China, Rebelo de Sousa disse ao Diário do Povo que deseja que este sirva para aproximar Portugal de outros países da Ásia. Fontes oficiais portuguesas estimam que a China investiu 10 mil milhões de euros em Portugal, desde 2012. Fundado em 1948, na província chinesa de Hebei, o Diário do Povo tem uma tiragem diária superior a 2,5 milhões de exemplares e 300 milhões de visualizações na edição digital. Não é o único órgão estatal chinês, mas logo junto à recepção nota-se o seu estatuto singular: quatro fotografias exibem os homens que lideraram a China, desde 1949, a ler atentamente o jornal. Mao Zedong, o fundador da República Popular que dirigiu o país ao longo de 27 anos, e os seus sucessores – Deng Xiaoping, Jiang Zemin e Hu Jintao – estão lá todos. Desde Setembro passado, o Diário do Povo ocupa um edifício de 33 andares construído de raiz no moderno e cosmopolita CBD (Central Business District) de Pequim, e emprega actualmente cerca de 10 mil pessoas.
Andreia Sofia Silva BrevesFinanças | Secretário promete rever sistema de impostos Lionel Leong, Secretário para a Economia e Finanças, admitiu ontem no hemiciclo que vai avaliar o actual sistema de impostos, tendo prometido mudanças na cobrança do imposto de selo sobre imóveis [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]s deputados pediram ontem ao Governo para introduzir alterações no actual sistema de impostos. Lionel Leong, Secretário para a Economia e Finanças, prometeu fazer uma revisão. “Vamos fazer um estudo para avaliar a questão e fazer uma análise com outros tipos de impostos. Aquando da revisão do imposto de selo vamos uniformizar o sistema de pagamento para que seja feito anualmente e não de acordo com o prazo afixado [consoante o contrato de arrendamento]”, apontou o Secretário, na Assembleia Legislativa (AL), depois de já ter sido posta essa questão na Comissão que analisa a Lei das Rendas. “Vamos avaliar os custos administrativos e a operacionalidade do imposto de selo aquando da sua revisão. Em relação ao tema pretendemos fazer um estudo aprofundado face à taxa de contribuição predial urbana. Tudo para que haja uma situação saudável da base tributária de Macau”, acrescentou Lionel Leong. Na sua resposta, o Secretário confirmou que em 2011 o Regulamento da Contribuição Predial Urbana levou a uma redução das taxas colectáveis dos prédios não arrendados de 10% para 6%, enquanto que o imposto sobre prédios arrendados passou de 16% para 10%. O deputado Si Ka Lon havia proposto uma redução dos montantes. Algumas melhoras Quanto à declaração voluntária de arrendamento por parte dos proprietários, o Secretário considerou que a situação melhorou. “Nos últimos três anos o número de indivíduos que tomaram a iniciativa de apresentar a participação de arrendamento da Contribuição Predial cresceu 26,5%, significando isto que a consciência do cumprimento da lei por parte dos contribuintes deve ter aumentado.” José Pereira Coutinho afirmou tratar-se de uma boa oportunidade para fazer a revisão dos impostos de Macau. “As formalidades administrativas e as taxas podem constituir uma certa inconveniência e não conseguem incentivar os contribuintes a prestar a respectiva contribuição. O Governo chegou a comprometer-se no sentido de modernizar o mecanismo de tributação de Macau e disse que ia apresentar uma proposta de lei à AL (…) O Secretário dispõe de uma calendarização para esse trabalho e vai elevar o grau de transparência em relação aos impostos?”, questionou o deputado.
Andreia Sofia Silva PolíticaAL | IACM admite rever regras de gestão dos cemitérios O Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais vai rever a lei de 2003 referente à gestão dos cemitérios. Pereira Coutinho pede o reconhecimento automático de sepulturas concedidas há mais de um século [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]Governo quer melhorar a gestão dos cemitérios e vai rever a actual legislação, em vigor desde 2003. A garantia foi dada pelo responsável do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM), ontem no segundo dia de plenário da Assembleia Legislativa (AL) dedicado às respostas aos deputados. “O IACM está a elaborar diferentes textos para optimizar a gestão dos cemitérios, porque isso consta no último relatório do Comissariado contra a Corrupção (CCAC)”, apontou o vice-presidente do organismo, Lei Wai Nong. O deputado José Pereira Coutinho, que no debate falou da existência de “razões estruturais que estão a constituir obstáculos”, explicou ao HM que a nova lei deve fazer o reconhecimento automático de sepulturas que foram concedidas a herdeiros há várias décadas. “Há sepulturas perpétuas que foram concedidas há mais de um século e que permitem que as ossadas de herdeiros e familiares sejam aí colocadas. Desde a implementação deste regulamento que o IACM deixou de reconhecer a posse dessas sepulturas por parte dos familiares. Como é que se pode exigir a essas pessoas comprovativos com mais de um século? Se calhar naquela altura os procedimentos eram diferentes. Isto tem de ser resolvido. No nosso gabinete de atendimento [aos cidadãos] temos vários casos, porque a solução é pôr em tribunal. Isso significa que o regulamento administrativo não está a dar resposta a esses casos”, referiu o deputado. “É preciso um reconhecimento automático dessas sepulturas. Se os actuais herdeiros conseguirem provar que essas pessoas são os seus antepassados, esse regulamento tem de permitir isso”, adiantou. Para além de rever a legislação sobre a gestão de cemitérios, o IACM promete continuar a reagir às conclusões do mais recente relatório do CCAC, que fala da aplicação de leis obsoletas. “O CCAC alertou para a necessidade de alterar regulamentos municipais e o IACM está atento. Temos dado início a diferentes trabalhos e há seis regulamentos aos quais estamos a dar a devida atenção. Vamos produzir novos regulamentos para dar resposta às opiniões do CCAC e essas alterações visam oferecer aos cidadãos um mercado mais liberalizado”, apontou o vice-presidente do instituto. Os deputados mostraram-se preocupados com a falta de fiscalização após a liberalização verificada nos mercados, depois da permissão de venda de produtos frescos fora desses locais. Os responsáveis do IACM garantiram que têm cerca de 90 fiscais para resolver eventuais problemas de segurança alimentar.
Andreia Sofia Silva PolíticaGoverno afasta criação de cotas para emprego de deficientes [dropcap style=’circle’]V[/dropcap]ong Yin Mui, presidente do Instituto de Acção Social (IAS), garantiu ontem na Assembleia Legislativa (AL) que o Governo não pondera a criação de cotas para facilitar o acesso dos portadores de deficiência ao emprego na Função Pública. “Essa é uma questão complexa que precisa ser abordada com outros serviços. Segundo dados disponíveis em relatórios da Organização Mundial de Saúde (OMS) e Banco Mundial, quanto à fixação de cotas para o emprego, é referido que essas medidas não tiveram resultados satisfatórios. A Organização Mundial do Trabalho (OMT) também fez um estudo e concluiu que a fixação de medidas obrigatórias não trouxe resultados satisfatórios e essa medida foi eliminada”, disse Vong Yin Mui. Uma interpelação da deputada Chan Hong chamava a atenção para o facto de apenas 73 portadores de deficiência trabalharem na Administração, o que representa apenas 0,2% do total de funcionários. “Parece que estamos a subestimar [o trabalho dos deficientes], mas não é o caso”, disse a presidente do IAS. “Temos de ter medidas para tratar de forma igual os deficientes. Hoje em dia em Macau a situação de emprego [destas pessoas] não é má, temos muitas medidas para apoiá-los, as grandes empresas estão receptivas aos deficientes e contratam, considerando que o desempenho [deles] é bom e conseguem assegurar muito bem o seu trabalho. Centenas de deficientes estão a trabalhar bem”, acrescentou Vong Yin Mui. Vários deputados alertaram para o facto dos deficientes perderem os seus apoios assim que obtêm um emprego, mas Vong Yin Mui garantiu que o IAS reduz o subsídio gradualmente. “Foi dito que os deficientes, quando obtêm um emprego, perdem o seu subsídio, mas nós só cortamos os montantes consoante a sua capacidade. Não vamos cortar de imediato a pensão ou o subsídio, vamos reduzir pouco a pouco para que consigam sobreviver à custa do seu próprio esforço”, rematou.
Filipa Araújo Manchete PolíticaLei Básica | Alguma da legislação vigente viola mini-constituição de Macau Há leis que violam a Lei Básica. A Lei de Terras e a futura Lei de Ensino Superior são alguns exemplos dados por advogados. É preciso mudar o sistema e antes da aprovação das leis verificar se estas estão a cumprir a mini-constituição de Macau, dizem [dropcap style=’circle’]H[/dropcap]á leis que violam a Lei Básica, a base jurídica de Macau? “Sim, isto acontece”, começa por afirmar o deputado José Pereira Coutinho, quando questionado sobre a possibilidade. O artigo 25 da Lei Básica que diz que “os residentes de Macau são iguais perante a lei, sem discriminação em razão de nacionalidade, ascendência, raça, sexo, língua, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução e situação económica ou condição social”. E é precisamente este artigo que mais violações sofre. “Esse artigo está constantemente a ser violado”, defende Pereira Coutinho. “A Lei de Prevenção e Combate à Violência Doméstica – aprovada na especialidade no passado dia 20 do presente mês – é um exemplo disso, excluindo casais do mesmo sexo. Aqui é violado o princípio da igualdade de tratamento”, exemplifica. Para a advogada Manuela António este exemplo levanta algumas dúvidas, sendo passível de diversas interpretações. “Acho que é discutível (…) acho que é possível defender que não [viola], mas também acho possível defender que sim [viola]”, afirma. A razão é simples. “Durante dezenas e dezenas de anos, tínhamos o princípio consagrado também na nossa lei [portuguesa], e na Europa em geral, da igualdade entre os sexos e não era admitido casamentos homossexuais. Também tínhamos este princípio, que está na Lei Básica. É um princípio do Direito dos países ocidentais portanto, dos Estados Unidos, da Europa em geral. Como se sabe, em grande parte destes países ainda não são aceites os casamentos entre pessoas do mesmo sexo”, argumenta. É preciso entender, frisa, que não é uma violação do princípio da igualdade, por que este é baseado “no respeito pelas diferenças”. “Acho que a igualdade não é tratar toda a gente por igual, é sim, tratar igual o que é igual”, sublinhou. Pessoalmente, e apesar de admitir que se possa fazer outra interpretação, Manuela António afasta a possibilidade de violação da Lei Básica nesta lei. Mas alerta: o mesmo não acontece quando se fala da Lei de Terras. Aos olhos de todos “A alteração à Lei de Terras, a lei vigente, viola de forma clara a Lei Básica”, diz a advogada. Mas, mais do que isso, é a interpretação errada que se está a fazer da lei em causa. “Acho que há confisco. A Lei Básica diz que se vai proteger e respeitar a propriedade privada (artigo 6º) e isso não está a acontecer. A interpretação que se está a fazer, ou alguns artigos da lei em causa, é uma violação à Lei Básica”, aponta a advogada. Manuela António vai ainda mais longe afirmando que “alguns comportamentos da Direcção de Obras Públicas relativamente a certos aproveitamentos de terrenos e certas áreas são violações à Lei Básica”. A advogada explica ainda que é tão óbvia esta violação que até o Gabinete do Governo Central da RAEM se mostrou contra esta alteração mais recente à Lei de Terras. “(…) Porque não aceita que se tenha feito uma lei que tenha violado a Lei Básica”, acusa. Encostar à parede Um outro exemplo é a existência da norma na Lei de Terras que diz que não é possível, neste momento, – ao contrário do que acontecia há 40 anos – que se construa num terreno em que “parte propriedade perfeita e outra parte é terreno arrendado”, isto implica a uniformização do regime jurídicos, isto é, ou “passa tudo a concessão ou a propriedade perfeita”. O que acontece é que numa propriedade perfeita, em que o dono do terreno quer construir um prédio, o território vem dizer que há uma parte que tem que ser concedida ao Governo para, por exemplo, arruamentos, e para que não haja uma parte de propriedade perfeita e outra concessão, então o Governo “transforma o terreno todo numa concessão”. “Isto é, o proprietário é espoliado do seu terreno todo e vai ficar apenas a arrendatário. Esta é a uma interpretação que se faz a esta lei. Isto é um espólio”, acusa. “É um acordo forçado, porque caso o proprietário não queira, não lhe dão autorização para construir. Há diversas entidades a trabalhar para violar a Lei Básica e a fazer construções que não são aquelas que estão nem no espírito, nem na [própria] Lei Básica. No fundo estão a existir expropriações disfarçadas sem compensação”, frisou. Todos iguais Aprovada na generalidade e concluída a análise na especialidade, a Lei para o Ensino Superior será outro regulamento a violar a Lei Básica. Em termos simples: determina esta lei que sejam realizados estágios para os alunos, sejam eles residentes da RAEM ou não. Questionado sobre a possível remuneração, o Gabinete de Apoio ao Ensino Superior (GAES) explica que os estagiários podem ser remunerados, mas só os residentes, nunca os não residente para “não violar” a Lei Laboral. Segundo a Lei Básica, contudo, no artigo 43º, “as pessoas que não sejam residentes de Macau, mas se encontrem na RAEM, gozam, em conformidade com a lei, dos direitos e liberdades dos residentes de Macau”, previstos nos capítulo III, sobre os Direitos e deveres fundamentais dos residentes, onde está também incluído o artigo 25º. “Sim, aqui pode ser encontrada uma ilegalidade”, começa por explicar Óscar Madureira, advogado. Acontece que a ausência da remuneração é discriminatória. “[Nesses] alunos, a única coisa que os distingue é uma formalidade jurídica, que é o facto de serem residentes ou não de Macau, mas isto não deveria ser suficiente para excluir uns de serem remunerados, ou para privilegiarem uns em detrimento de outros”, explica ao HM. No fundo, os estagiários estão a ser avaliados para cumprir os requisitos para as respectivas licenciaturas, mas não são tratados da mesma forma. “Parece que há uma violação do princípio de igualdade”, frisa. Oscilações ilegais Pereira Coutinho avançou com outro exemplo de violação da Lei Básica: a imposição de impostos aos trabalhadores da Função Pública. “Isto viola a Lei Básica no artigo 98º, que diz que os salários e os rendimentos nunca podem ser inferiores à data do estabelecimento da RAEM”, acusa. “Portanto se à data dos estabelecimento da RAEM eu tiver dez mil patacas e sobre esse valor forem retirados 200 patacas de imposto profissional, o valor de salário será menor. Houve quem se tivesse manifestado, acusando a violação da Lei Básica, neste artigo”, acrescentou. O deputado diz que, aquando da implementação do Regime de Providência, em 2007, surgiram muitas “situações onde se põe em dúvida a constitucionalidade”. Por exemplo, “os magistrados conseguiram manter as suas pensões de aposentação. Isto é, se o magistrados e funcionários da Função Pública recebiam pelo mesmo sistema de regime de pensões, porque é que para uns deu-se um sistema menos protector e para outros se manteve o regime? Isto volta a violar o artigo 25º da Lei Básica”, frisa. Questionado sobre o uso de jurisprudência, Pereira Coutinho diz que tudo é “esquisito em Macau”. “Nunca nenhum juiz solicitou a interpretação da constitucionalidade das normas na aplicação de casos concretos. Sobre isto acho que o Governo devia intervir, reformando a Lei de Bases da Organização Judiciária, aumentando o número de juízes e permitindo o recurso aos titulares dos principais cargos”, apontou. Soluções à porta Para Miguel de Senna Fernandes, advogado, a solução para estes possíveis erros passa por se declarar a lei que viola a mini-Constituição como ilegal. “Estamos perante um fenómeno muito semelhante à inconstitucionalidade. No fundo a Lei Básica é a Constituição. Portanto terá que haver um impulso processual de forma a que a lei seja anulada, revogada”, explicou. Para Manuela António a forma “mais simples de resolver é não fazer leis que violem a Lei Básica”, sendo que é Pequim, diz, que tem competência para resolver as possíveis violações. Pereira Coutinho diz que é um “assunto que precisa de ser estudado com muito cuidado”, admitindo necessárias mudanças. Há falta de um Tribunal Constitucional, poderá ser, diz, implementado um sistema de fiscalização sucessiva das leis aprovadas pela Assembleia Legislativa (AL), antes da promulgação do Chefe do Executivo e da sua publicação em Boletim Oficial. “Fica muito mau para Macau que, depois da aprovação do Chefe do Executivo, se venha a detectar que existem normas que violam a Lei Básica. É preciso arranjar um sistema para verificar esses possíveis erros no período entre a aprovação da AL e antes do promulgação do Chui Sai On”, sugeriu. José pereira Coutinho diz-se cansado de avisar, nos últimos dois anos, os deputados das Comissões Permanentes da AL para esta questão. “Ninguém que saber, porque muitos deles não têm formação jurídica, não sabem da importância da constitucionalidade das leis de acordo com a Lei Básica e é por isso que acham que não é importante”, rematou.
Joana Freitas SociedadeMais de sete mil acidentes de trabalho em 2015 e 1500 este ano [dropcap style=’circle’]U[/dropcap]m total de 1672 pessoas sofreram acidentes de trabalho em Macau no primeiro trimestre do ano, sendo que quatro morreram e 1653 sofreram uma incapacidade temporária, segundo dados oficiais ontem revelados. De acordo com Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL), entre as vítimas de acidentes registadas entre Janeiro e Março, 196 puderam voltar ao trabalho no mesmo dia do acidente. Os serviços estão ainda a investigar 15 casos. As quedas, choques com objectos, entalamentos e esforços excessivos estiveram na origem da maior parte (1326) dos acidentes. Mãos (532), tronco (285) e pés (269) foram as partes do corpo mais atingidas. A maioria das vítimas (848) é do sexo feminino e do escalão etário dos 25 aos 44 anos (857). Um total de 1977 trabalhava em “serviços colectivos, sociais e pessoais”, enquanto 1546 pertenciam ao ramo do “alojamento, restaurantes e similares” e 1491 à construção. A DSAL divulgou também os dados relativos a todo o ano de 2015: no total 7517 pessoas sofreu acidentes, 25 morreram e 23 ficaram o permanentemente incapacitadas. Segundo a DSAL, em 2015, 22,7% dos casos, os acidentes deveram-se a “entalamento num ou entre objectos”, em 20,6% a “queda de pessoas” e em 18,4% devido a “esforços excessivos ou movimentos falsos”. As partes do corpo mais atingidas foram as mãos (30,6%), os pés (19,7%) e o tronco (17%). Em 2015, a DSAL aplicou multas a 34 pessoas, no valor total de 196 mil patacas por violações às normas de segurança e saúde ocupacional que causaram 36 vítimas. Ao mesmo tempo, 215 pessoas foram obrigadas a pagar 800 mil patacas de compensação a 648 trabalhadores.
Tomás Chio Manchete SociedadeInfiltrações | DSAJ com planos para acelerar processos em tribunal A DSAJ quer acabar com as longas esperas por uma decisão face aos problemas de infiltração de água em edifícios e já tem planos para simplificar os processos em tribunal em casos que não passem as 50 mil patacas em prejuízos [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]Direcção dos Serviços de Administração e Justiça (DSAJ) planeia simplificar o processo sumário de forma a que o tribunal possa tratar casos de infiltrações cujos prejuízos ascendam até às 50 mil patacas de forma mais rápida. O anúncio foi feito por Chan Ka Ian, do Departamento de Produção Legislativa da DSAJ, que respondia assim a uma interpelação oral de Mak Soi Kun. Citado pelo Jornal do Cidadão, o responsável da DSAJ voltou a referir que o Governo está a rever o Código de Processo Civil para simplificar os procedimentos que permitam a entrada de fiscais do Instituto de Habitação nas fracções de onde vem a água. A DSAJ tinha também falado em rever os processos sumários e o organismo diz agora que tem como objectivo que o tribunal possa julgar de forma mais célere os casos de infiltrações de água em edifícios, a fim de resolver estes problemas o mais rápido possível. As alterações contemplam, no entanto, casos em que os prejuízos ascendam apenas às 50 mil patacas. Mak Soi Kun questionou o Governo sobre como é que pretende resolver as constantes infiltrações em edifícios, além dos estudos técnicos e da revisão de simplificação das formalidades que já tinha sido anunciada. Já mais que uma vez que o deputado apresentou esta problemática, tendo referido por exemplo que, desde 2009, foram registados 11.960 casos de infiltrações. Até ao ano passado, mais de 3500 ainda continuavam pendentes. Mak Soi Kun referia também que o caso iria piorar devido ao envelhecimento contínuo dos prédios e falava de um caso em particular de um residente que entrou pela via judicial para que lhe fosse pago o montante dos prejuízos causados pela infiltração de água e que ficou seis anos à espera de resolução, mesmo tendo sido descoberta a casa de onde vinha a água e o proprietário da fracção. O deputado questionou quando será concluída a revisão, mas o representante da DSAJ indicou apenas que o grupo do Conselho Consultivo da Reforma Jurídica está a acompanhar a situação e que espera ter algumas orientações sobre a revisão “este ano”, depois do Governo recolher as sugestões do sector.