Pequim declara apoio à integração comercial

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] China disse ontem apoiar uma maior integração na região Ásia Pacífico, após o anúncio do futuro Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de que vai retirar o seu país do Acordo de Associação Transpacífico (TPP).

O acordo, assinado a 4 de Fevereiro, depois de cinco anos de negociações, inclui os EUA, Austrália, Brunei, Canadá, Chile, Japão, Malásia, México, Nova Zelândia, Peru, Singapura e Vietname e abrange 40% da economia mundial.

Porém, não inclui a China, tendo sido entendido por Pequim como uma forma de conter a crescente influência económica do país no Pacífico.

“Estamos abertos a todos os acordos que são positivos para a integração, a facilitação do comércio, a paz e a prosperidade na Ásia Pacífico”, disse ontem o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, Geng Shuang.

O porta-voz recordou que na recente cimeira da APEC (Fórum de Cooperação Económica Ásia Pacífico) os líderes do grupo concordaram em “aprofundar a integração económica e opor-se ao proteccionismo comercial”.

Geng considerou que os futuros tratados devem evitar a segmentação – numa referência à exclusão da China do TPP – e apelou a que sejam cumpridas as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), de forma a manter vigente o sistema multilateral de comércio.

“Esperamos que todos os acordos se reforcem entre si, em vez de se debilitarem. Devemos evitar a segmentação dos acordos de livre comércio ou a sua politização”, insistiu.

Encruzilhada

O futuro Presidente norte-americano, Donald Trump, anunciou na segunda-feira que vai retirar os EUA do Acordo de Associação Transpacífico quando chegar à Casa Branca por ser um “potencial desastre” para o país.

Alguns países consideram avançar com o TPP mesmo sem a participação norte-americana, enquanto outros apontam para tratados alternativos, como o Acordo Integral Económico Regional (RCEP), que inclui a China e exclui os EUA.

Geng lembrou que o RCEP não foi inicialmente proposto por Pequim, mas antes pelos dez países da Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), que têm mantido as negociações.

Pequim “espera que essas conversações possam produzir resultados em breve”, concluiu.

23 Nov 2016

O salto quântico (I)

“A great shift towards the East is taking place. This really is a case of back to the future: as Laza Kekic points out, by 2050 Asia will account for more than half the world economy, which is what its share was back in 1820 and for centuries before that. This will profoundly affect everything from the environment to the balance of military power and the centre of gravity of the global economy.”
“Megachange: The World in 2050” – D. Franklin and John Andrews

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] início do dia das eleições nos Estados Unidos foi marcado por dez baralhados inquéritos nacionais, em que oito davam a vitória a Hillary Clinton, um anunciava um empate e o último apostava na vitória de Donald Trump. No final da longa vigília, os embaraçados comentadores interrogavam-se de quem seriam os Secretários de Estado do candidato vencedor, quais seriam as grandes linhas de acção da sua futura gestão à frente dos destinos do país, de como seria a sua ligação com ambas as câmaras, após ter dado a vitória no Senado ao Partido Republicano, e como seria a sua relação dentro do mesmo partido, com a actual liderança que lhe virou as costas.

Tudo são interrogações no que respeita a Donald Trump, mesmo em áreas onde se supõe conhecer o seu pensamento, como o tema dos imigrantes e as alianças comerciais e militares. O candidato dado por todos como derrotado, em uma campanha política de poucos meses, transformou o cenário político e dos partidos do país, podendo influenciar ainda mais, as principais correntes de pensamento da sociedade americana, ao longo dos próximos quatro anos, se as constelações não conspirarem, para que sejam oito anos.

A partir de agora, existe uma nova forma de fazer política, outra maneira de compreender o funcionamento da democracia americana e do papel do país na cena global. Muitos serão os políticos que terão a tentação de seguir o seu exemplo e modelo. A campanha de Donald Trump, esteve ausente dos meios de comunicação tradicionais, e teve um orçamento muito menor que o do Partido Democrata. Teve como principal centro as redes sociais, o que talvez explique de certa forma, o impacto que conseguiu, e de algum modo tenha favorecido o facto de os meios de comunicação sociais tradicionais não terem observado com a agudeza necessária, o fenómeno Trump e o subestimaram.

Fica por ver se a nova etapa implica o abandono de toda a pretensão de injectar seriedade e transcendência ao debate político americano, com o consequente efeito que terá sobre as instituições, e sobre a essência do conceito actual de democracia. O Partido Republicano pode ficar sob controlo do novo mandatário, fragmentar-se, ficar nas mãos de um rival de Trump, ou rejuvenescer com contributos de novos dirigentes. As consequências do fenómeno são perceptíveis, em outras latitudes.

Muitos países europeus vêem o apogeu dos partidos de extrema-direita, que combatem os imigrantes, sem falar de todos os matizes do Brexit e da militância a favor do proteccionismo comercial e contra os tratados globais, e talvez seja esta a verdadeira tragédia, ou seja, o modo de entender a política de Trump, começa a ser uma parte normal da cena quotidiana. As consequências do Brexit, decidido pelos votantes ingleses, foi um severo choque para a União Europeia (UE).

A consagração presidencial de Donald Trump é a segunda violenta perturbação num curto período de tempo, uma verdadeira catástrofe como é denominada. A Alemanha é o único país com relevo, que resiste a um mundo que parece querer desabar. A unidade de acção transatlântica, que por mais de setenta e cinco anos foi a pedra angular da direcção do Ocidente, em todos os níveis, seja na defesa, comércio ou redução das alterações climáticas, parece estar a chegar ao fim.

A Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) foi a salvaguarda Europeia contra o ameaçador expansionismo soviético, que parece renascer com o sonho imperial da Rússia liderado por Vladimir Putin. Se os Estados Unidos, como tem advertido Donald Trump, refugiar-se no isolacionismo mais extremo, estará muito em jogo, pois os europeus ficarão sós para conter a agressividade russa e os esforços realizados no Médio Oriente para acompanharem os Estados Unidos serão inúteis, bem como os mortos e as perdas sofridas no Iraque e no Afeganistão, sem esquecer o famoso tratado de livre comércio, entre ambos os lados do Atlântico.

Os europeus encontram-se preocupados como não acontecia há muitas décadas. A vitória incontestável de Donald Trump nas eleições americanas veio certificar que vivemos uma era de transformações profundas e cíclicas, tal como sempre aconteceu na história da humanidade. As dramáticas descobertas científicas interromperam as práticas empresariais ou novas ordens sociais, como a Reforma e a Revolução Industrial, e alteraram fundamentalmente a vida das pessoas.

Os tempos mais recentes, foram também palco de grandes mudanças. Os Estados Unidos, por exemplo, enfrentaram transformações substanciais na década de 1860 durante e após a Guerra Civil, e novamente na década de 1930, devido à Grande Depressão, e na década de 1960 com a promoção dos direitos civis, da libertação das mulheres e dos movimentos ambientais. Em um tempo relativamente curto, perturbações em larga escala alteraram a sociedade e a política e deixaram uma marca duradoura nessas eras.

Existiram flutuações significativas, em várias épocas, nas políticas públicas ou nas atitudes dos cidadãos associadas à mudança social, política ou económica. Por exemplo, após um período de turbulência social e religiosa, uma proibição americana sobre a produção e venda de álcool foi adoptada a nível nacional, em 1920 e permaneceu em vigor até 1933. Após as mulheres se começarem a organizar politicamente no final do século XIX, os países ocidentais adoptaram gradualmente o sufrágio feminino, incluindo os Estados Unidos em 1920, por meio de uma emenda constitucional. Se reflectirmos na mudança dos costumes culturais, em relação a períodos anteriores, existiu uma dramática decisão do Supremo Tribunal dos Estados Unidos, em 1973, que legalizou o aborto em todo o país, que Donald Trump pretende reverter, para além da famigerada construção do vergonhoso muro entre a América e o México, e a expulsão ou deportação de três milhões de ilegais. Nunca é fácil separar as causas das consequências de transformações em grande escala.

A mudança por vezes é caótica e multifacetada e, portanto, difícil de definir com precisão. É necessário observar por algum período de tempo, para analisar cuidadosamente o que está a mudar e quais as forças que estão a gerar as alterações mais substanciais. Todavia, através dos estudos de alguns casos, é possível esclarecer as grandes alterações que afectaram os assuntos globais e a política americana nas últimas décadas. A nível interno dos Estados Unidos, vemos profundas alterações na mudança de atitudes em relação ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, tabagismo, legalização da maconha, desigualdade de rendimentos, terrorismo e segurança nas fronteiras.
A nível global, testemunhamos o surgimento e o colapso da “Primavera Árabe”, o ressurgimento do fanatismo religioso, a violência de actores não-estatais e as mudanças ao livre fluxo de pessoas, bens e serviços associados à globalização. O que acontece a nível mundial, por vezes, influencia a política interna dos países, ou vice-versa. O extremismo em um local pode provocar tensões em um lugar distante. Em uma era de comunicações globais e transmissão rápida de informações, eventos aparentemente pequenos podem repercutir em outros lugares, e tornarem-se um catalisador para mudanças dramáticas nos assuntos internos ou internacionais.

O termo “salto quântico”, emprestado dos físicos, passou a significar, popularmente, mudanças de grande escala que galgaram o conhecimento existente e introduziram novas formas de pensar. Os filósofos falam sobre “mudanças de paradigma” onde os modelos teóricos mudam drasticamente. Os biólogos referem-se a modelos de “equilíbrio pontuado”, nos quais há um tempo de grande mudança seguido por períodos de equilíbrio.

Os especialistas digitais enfatizam a “tecnologia disruptiva ou dominante no mercado” que desafia as velhas formas de produção e leva ao surgimento de empresas que tiram proveito, ou ajudam a criar novas realidades do mercado, ou melhor ligando o talento e a inovação que resulta em “startups” das indústrias culturais e criativas, que em muitos países abundam com êxito, e em outros não existem, perdendo tempo em filosofias e querelas sem consequência prática.

21 Nov 2016

Xi Jinping e Donald Trump vão “reunir em breve”

O Presidente norte-americano eleito e o Presidente chinês combinam para breve uma reunião para trocar opiniões. Em cima da mesa estarão temas de “interesse mútuo”

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Presidente chinês, Xi Jinping, e o futuro homólogo norte-americano, Donald Trump, concordaram ontem reunir-se “em breve” para discutir a relação entre os dois países, noticiou a televisão estatal CCTV.

Numa conversa por telefone, Xi e Trump “prometeram manter um contacto próximo, construir boas relações de trabalho e reunir em breve para uma troca de opiniões em assuntos de interesse mútuo”, referiu o canal.

Durante a campanha eleitoral, o país asiático foi um dos alvos preferidos do magnata nova-iorquino, que acusou a China de “manipulação da moeda”, ou “batotice” e ameaçou taxar os produtos chineses em 45%.

Trump chegou a chamar a China de “inimigo” e prometeu enfrentar um país que diz considerar os EUA “palermas”.

O presidente eleito sugeriu, no entanto, que não se quer envolver em disputas externas e recusou o Tratado Transpacífico (TPP, na sigla em inglês), um acordo que visa a criação da maior área de livre comércio do mundo e que a China vê como prejudicial aos seus interesses.

A CCTV cita Trump, que afirmou que “a China é um grande e importante país, cujo desenvolvimento surpreendeu o mundo”.

“Os EUA e a China podem beneficiar-se mutuamente”, disse.

O termo usado pela CCTV – “benefício mútuo” – é frequentemente utilizado pela diplomacia chinesa.

Mar de incógnitas

As posições contraditórias e ambíguas de Trump deixam dúvidas sobre a forma como lidará com a China, a segunda maior economia mundial e detentora de um poderoso aparelho militar.

Durante a administração de Barack Obama, Washington reforçou a presença militar e diplomática no leste asiático, levando Pequim a adoptar uma política assertiva, face ao que considera uma tentativa de conter a sua influência económica e geopolítica.

Mas Trump não propôs soluções para questões estratégicas que perturbam as relações, como as reclamações territoriais de Pequim no Mar do Sul da China, o programa nuclear da Coreia do Norte ou o futuro de Taiwan.

O vencedor das eleições norte-americanas indicou ainda que os EUA estão cansados de pagar pela defesa dos seus aliados, como o Japão e a Coreia do Sul, sugerindo que estes países deviam desenvolver as suas próprias armas nucleares.

Mark Williams, analista da consultora Capital Economics, sugeriu anteriormente numa nota que se os “EUA estiverem menos envolvidos na Ásia, Pequim terá a oportunidade de definir a integração política e económica da região nos seus próprios termos”.

Isso poderá incluir um acordo comercial que exclua os EUA, como o TPP excluiu a China.

Em andamento

Pequim já está em negociações para instituir a Parceria Económica Compreensiva Regional (RCEP, na sigla em inglês), uma área de comércio livre que inclui países do sudeste da Ásia, a China, Índia, Japão, Coreia do Sul, Austrália e Nova Zelândia.

No total, abarcará mais de 3.000 milhões de pessoas.

O ministro dos Negócios Estrangeiros da Austrália afirmou mesmo na quinta-feira passada que, caso o TPP falhe, “o vácuo que seria criado deverá ser preenchido com o RCEP”.

Questionado sobre a ameaça de Trump vir a taxar os produtos chineses, o porta-voz do ministério dos Negócios Estrangeiros chinês lembrou na semana passada que o comércio bilateral entre os dois países aumentou 200 vezes nas últimas décadas, beneficiando ambos os lados.

“Qualquer chefe de Estado nos EUA que considera os interesses dos seu país e do seu povo irá fazer a escolha certa”, disse.

15 Nov 2016

Assessor de Trump quer ver EUA na Rota da Seda

O ex-director da CIA diz que a oposição norte-americana ao Banco Asiático de Investimento foi uma falha e espera que a Administração liderada por Trump se associe ao plano da Nova Rota da Seda lançado pela China

[dropcap style≠’circle’]U[dropcap]m assessor de Donald Trump, Presidente eleito dos Estados Unidos, afirmou sexta-feira desejar que o seu país participe na iniciativa chinesa Nova Rota da Seda, e apelou a Pequim para que contribua mais nas questões internacionais.

James Woolsey, assessor para a Segurança Nacional, Defesa e Serviços Secretos, disse também que a decisão de Barack Obama em se opor ao Banco Asiático de Investimento em Infra-estruturas (BAII) foi um erro.

“Em Washington, reconhece-se hoje que a oposição da administração Obama ao BAII foi um erro estratégico”, escreveu Woolsey, num artigo de opinião difundido pelo jornal de Hong Kong South China Morning Post.

Fundado no início deste ano, o banco proposto por Pequim foi visto inicialmente em Washington como um concorrente ao Banco Mundial e ao Fundo Monetário Internacional, duas instituições sediadas nos EUA e habitualmente lideradas por norte-americanos e europeus.

Das grandes economias mundiais, apenas os EUA e o Japão ficaram de fora.

Portugal tem uma participação de cerca de 13 milhões de dólares e o Brasil é o único membro em todo o continente americano e o nono maior accionista.

Sobre a iniciativa chinesa “Uma Faixa e Uma Rota”, um gigante plano de infra-estruturas, que pretende reactivar a antiga Rota da Seda entre a China e a Europa através da Ásia Central, África e sudeste Asiático, Woolsey diz que espera “uma resposta muito mais clara da próxima administração”.

Segundo as autoridades chinesas, aquela iniciativa vai abranger 65 países e 4,4 mil milhões de pessoas – cerca de 60% da população mundial – e inclui a construção de uma malha ferroviária de alta velocidade entre a China e a Europa.

Apelos e visões

O assessor de Trump apelou ainda às economias emergentes como a China, “que beneficiam muito do mercado global”, para que desempenhem um maior papel nas acções multilaterais contra o terrorismo, missões de ajuda humanitária ou operações militares para salvaguardar a paz.

O ex-director da CIA (1993 a 1995) disse que o novo Governo dos EUA “provavelmente continuará a proteger os seus aliados contra abusos da China”, afirmando que “a presença norte-americana na Ásia não é guiada por ambições territoriais”.

As duas maiores economias do mundo devem assim chegar a um “acordo tácito”, em que Pequim respeita o estado actual da região e os EUA não desafiam o sistema social e político da China.

“[O sistema chinês], mesmo que não gostemos, não temos necessariamente de fazer algo nesse sentido. Vejo a emergência de um grande acordo em que os EUA aceitam as estruturas sociais e políticas da China e se comprometem a não alterá-las, a troco de um compromisso em que a China não desafia o actual status quo da Ásia”, escreveu.

“Será um empreendimento arriscado”, reconheceu.

14 Nov 2016

Um mundo ao contrário

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]omo presidente, Donald Trump não deverá adoptar todas as políticas que estiveram na base da sua campanha eleitoral e da extraordinária vitória sobe Hillary Clinton. As declarações que proferiu sobre o plano de seguro de saúde para os mais desprotegidos (Obamacare) após o primeiro encontro com Barack Obama, dão conta que, afinal, Trump, presidente, deverá deixar cair muitas das promessas de Trump, candidato. As ondas de choque à eleição de Donald Trump – sobretudo na Europa –, fazem prever profundas alterações não apenas na forma como os Estados se relacionam com Washington, mas também na forma como definem as suas políticas de segurança e de defesa e sob que prisma são definidas as linhas mestras das relações internacionais.

O presidente da Comissão Europeia, Jean Claude Juncker, por exemplo, aproveitou a eleição de Trump para salientar uma das principais prioridades da Estratégia Global da União Europeia para as políticas externa e de segurança: o reforço dos orçamentos de defesa dos Estados-membros. Aliás, a surpreendente vitória de Trump constituiu uma oportunidade para Juncker chamar a atenção para a estratégia adoptada pelos chefes de Estado e de governo da União Europeia, há quatro meses, que passou praticamente ao lado da imprensa internacional. O documento, aprovado cinco dias depois do referendo que determinou a saída do Reino Unido da União Europeia, no Conselho Europeu convocado para discutir o Brexit, não mereceu grande atenção por parte da comunicação internacional. Sobretudo aquela que é capaz de formatar a opinião pública internacional.

No documento – redigido muito antes de qualquer indicação de que Trump poderia ganhar a Casa Branca – propõe-se que os Estados-membros da União Europeia reforcem a sua contribuição para a NATO, aumentem os seus orçamentos de defesa para a percentagem indicativa de 2% do Produto Interno Bruto e intensifiquem a cooperação militar. Numa frase: os europeus tinham de ter melhor equipamento, reforçar a componente formativa e estar mais bem organizados. Objectivos que não são fáceis de conciliar com políticas orçamentais restritivas. Por tudo isto, a mera eleição de Trump e toda a incerteza subjacente à manutenção das políticas de Obama em matérias de relações externas, veio pôr as questões de segurança e de defesa no centro da discussão no interior da União Europeia.

Independentemente de vir ou não a aplicar muitas das prioridades enunciadas no último ano, convém ter presente algumas das prioridades que Trump tem para sua América.

Ambiente. Trump não acredita que as alterações climáticas sejam um problema ambiental significativo e duvida que seja o ser o humano o principal responsável pelo aumento da temperatura média do globo. Por isso, quer retirar os Estados Unidos (EUA) do acordo de Paris sobre as alterações climáticas que entrou em vigor apenas no início deste mês.

China. As principais ideias de Trump quanto à China passam pela denúncia da prática de dumping e de manipulação do mercado e por aumentar a presença militar americana no Mar do Sul da China.

Comércio internacional. Embora defenda o comércio livre, Trump tem criticado vários acordos assinados por Washington, por considerar que foram mal negociados e resultaram na perda de postos de trabalho para os norte-americanos. Quer, por isso, rever o acordo de comércio livre com o Canadá e México (NAFTA). Promete penalizar as empresas que desloquem a produção para fora do país, apontando o dedo à Ford, a quem promete impor uma taxa de 35% na importação de veículos oriundos das fábricas localizadas no México. Trump anunciou que vai retirar os EUA da Parceria Transpacífica (TTP, na sigla inglesa), pois, diz, esta beneficia apenas a China, o Japão e as grandes empresas americanas.

Defesa. O aumento do orçamento militar é apresentado como uma das suas primeiras medidas. Trump pretende aumentar os efectivos no exército, marinha e força aérea, além de reforçar o escudo antimíssil norte-americano. Admite que o Japão tenha armamento nuclear e quer Tóquio e Seul a pagar mais pelo apoio que lhes é dado pelos Estados Unidos.

Estado Islâmico. Trump promete intensificar os ataques militares ao Estado Islâmico. Suspender a compra de petróleo à Arábia Saudita, caso esta não coopere na luta contra o Estado Islâmico.

Imigração. Trump promete deportar 11 milhões de imigrantes sem documentos que vivem nos EUA, construir um muro na fronteira sul do país e triplicar o número de agentes de imigração e controlo aduaneiro. Trump quer acabar com a política de atribuição de cidadania a filhos de imigrantes ilegais nascidos em território americano.

Irão. Trump critica o acordo assinado com o Irão e propõe-se renegociá-lo, pois acusa Teerão de ser o maior patrocinador do terrorismo mundial.

NATO. Devido ao aumento do terrorismo na Europa, Trump questiona a utilidade da NATO, qualificando a instituição de obsoleta. Quer que os Estados europeus contribuam mais para a aliança.

Rússia. Trump está apostado em manter uma boa relação com Putin, a quem reconhece excelentes capacidades de liderança e elogia a sua actuação na Síria.

Segurança nacional. Trump propõe-se reforçar o programa de contra-terrorismo no interior dos Estados Unidos, incluindo os controversos programas de vigilância do governo da NSA, e manter a prisão de Guantánamo, em Cuba.

Vêm aí tempos de incerteza e de alterações profundas do posicionamento de Washington no mundo. Se, por um lado, as políticas anunciadas por Trump levarão a um maior isolamento de Washington (no que diz respeito ao comércio internacional, por exemplo), por outro, demonstram uma visão comercial em relação ao apoio que é dados pelos EUA aos seus aliados tradicionais. Ao mesmo tempo que Japão e a Coreia do Sul deverão ter de pagar mais pelo escudo que lhes é propiciado pela presença militar americana, um eventual reforço de meios no Mar da Sul China pode levantar alguma inquietação em Beijing.

Os tempos do “realpolitik” estão para ficar. Uma visão realista das relações internacionais parece ter tomado conta da lógica da política internacional. A resposta de Juncker à eleição de Trump indicia isso.

14 Nov 2016

A mancha humana

 

 

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]ão, o mundo não acabou. Teremos acordado, muitos de nós, de ressaca – mas o mundo não acabou, continua a ser o que era, aqui mais frio do que nos dias anteriores, mas isso é normal. O mundo não acabou mas está diferente, dir-me-ão. Está, mas também só mais ou menos. Se virmos bem as coisas, chegamos à conclusão de que só se confirmou. O mundo tem vindo a ser diferente há já algum tempo.

Não, este texto não é sobre Donald Trump. É mais sobre as pessoas que votaram nele, que não conheço, mas imagino mais ou menos como serão. Não são únicas, não são especiais – ninguém é – e não é a primeira vez que vivem na história. O mundo é redondo e escorregamos por todos os lados, a história dos homens é redonda e faz com que escorreguemos sempre para o mesmo sítio, nesta incapacidade que temos, todos nós, de aprender com os erros dos nossos avós. E com os erros dos avós dos outros. Julgamo-nos únicos, especiais – não somos, ninguém é. E a ignorância há muito que foi inventada.

É esse o grande problema de hoje, nos Estados Unidos, na Europa, aqui em Macau e ali na China Continental. A crise – real ou imaginada, como a que vivemos aqui na terra – veio trazer à tona o pior que há na Humanidade. Um por um, todos por mim. Se eu não me safo (ou se não me dou muito bem na vida) é por causa dos outros, jamais por minha causa. Se eu me enterrei e tropecei na recessão, a culpa é dos outros, só dos outros – e os outros são, por norma, os mais fracos. Atribuo a minha derrota a quem tem menos força do que eu, no mais completo e perfeito auto-atestado de estupidez.

Se não tenho sopa na mesa, a culpa é dos imigrantes, legais ou ilegais, tanto faz. O mundo está a dividir-se assustadoramente em dois: os homens com legitimidade para sobreviverem e os homens sem legitimidade para nada – nem sequer com direito a uma morte condigna, que é a morte em paz. Confunde-se imigração ilegal com bandidagem, aponta-se o dedo a quem não tem opções. Achamo-nos incrivelmente melhores do que os outros, só porque nascemos mais ricos, mais brancos e mais lavadinhos, com mais documentos nas mãos.

Não é preciso irmos longe para percebermos como é o eleitorado de Trump – se esticar o braço vai estar a tocar num fã do discurso enviesado do Presidente eleito dos Estados Unidos. Há muitas boas alminhas por estas bandas que acham piada a este conservadorismo sem nível e ao isolacionismo a cheirar a mofo. Há muitas criaturas por estes lados que adoram a globalização, mas só porque dá jeito para viajar e para comprar sapatos e malas italianas feitas por crianças famintas.

Quando a globalização é aceitar o vizinho, deixa de ter interesse: as pessoas dos países aqui ao lado não chegam a ser bem pessoas, pelo que nem sequer há discussão sobre direitos e liberdades e garantias, quanto mais sobre igualdade e sobre sermos todos gente com cabeça, corpo e membros, o que é que isso interessa, eu sou muito melhor porque tenho um cartão no bolso, isto é só meu, esta terra é só minha, eu nem nasci cá mas apropriei-me de um direito que não quero partilhar com mais ninguém, a globalização é boa para eu ir de férias à Europa, os outros que morram à fome que não tenho nada que ver com isso.

O mundo está perigosamente partido ao meio e o trumpiano fenómeno veio confirmar isso. Veio mostrar também que não há memória, não há história na cabeça do mundo. Que os líderes são fracos, porque fracas são as pessoas – não todas, mas muitas, demasiadas. O mundo está partido ao meio e vive tempos difíceis, sem pontos de equilíbrio. Quem tem poder quer ter ainda mais poder – a casa nunca é suficiente – e isso foi sempre assim, foi assim que o mundo se descobriu, por estarmos fartos de mandar em nós, por gostarmos de mandar nos outros. Mas as coisas agora são diferentes: o mundo está assustadoramente dividido entre quem advoga o obscurantismo e quem, sabe-se lá como ou porquê, conseguiu andar para aquilo que deveria ser o nosso tempo.

Fico assustada quando alguém bem mais novo do que eu se encosta ao lado errado desta noite em que parecemos ter acordado. Fico assustada porque sei que não estudou história, não se entristeceu por ver alguém pedir na rua, porque não foi capaz de sair do bairro onde vive apesar de até já ter visto outros mundos. Fico assustada com o que aí vem, pelo que vou ouvindo e vendo. Não foi este o mundo em que cresci, um mundo em que se deu cabo de um muro para que todos pudessem falar, um mundo em que havia uma ideia de que se devia respeitar o outro, os outros, um mundo em que a solidariedade se ensinava desde pequenino.

Há um imperscrutável mundo novo em formação. Para o que der e vier, e porque não mandamos nele para fazer dele uma coisa boa, que consigamos pelo menos torná-lo menos injusto, menos desumano, menos racista, mais igual. E sim, sim, isso depende de todos nós, nos que votam e nos que não votam, nos que vivem nos Estados Unidos de Trump ou na China de Xi Jinping, porque as pessoas estão em todos os lados e a globalização, queridos seres do século XII, não são só sapatos e malas italianas feitas por crianças exploradas e famintas de vida.

 

11 Nov 2016

Estados Unidos | Donald Trump é o novo Presidente eleito

As sondagens davam a vitória a Hillary Clinton, os jornais estiveram ao lado dela, o resto do mundo também – ou quase. Mas os norte-americanos foram às urnas e votaram diferente: escolheram um homem que, até há bem pouco tempo, nem sequer se imaginava que pudesse chegar a candidato. Agora, é o Presidente eleito. Donald Trump é sinónimo de que em política tudo pode acontecer

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]ito anos depois de terem escolhido o primeiro Presidente negro da história do país, os Estados Unidos elegeram ontem um candidato que fez uma campanha dirigida, sobretudo, aos homens brancos – deixando de fora os de outras cores e as mulheres, brancas ou não. A vitória de Donald Trump surpreendeu meio mundo, e o outro meio mundo talvez, que a confiança depositada nas sondagens era muita. Apesar de uma recuperação de terreno na última semana e meia, o republicano estava atrás da candidata democrata. Ontem, quando chegou a hora de contar os votos, foi Hillary Clinton que perdeu.

“Eu sei que nós, cidadãos americanos, estamos descontentes com o actual sistema, mas jamais poderia imaginar uma maioria desta dimensão incapaz de se sentir incomodada com a óbvia falta de qualificação e com a ausência de princípios morais de Donald Trump”, reage Linda Switzer, a viver há nove anos em Macau. “Estou profundamente triste e zangada com a ignorância”, acrescenta a vice-presidente de uma das operadoras de jogo do território.

Ardyth Comper, residente de Macau há oito anos, mostra-se menos surpreendida, apesar de partilhar o estado de choque. “Não posso dizer que estivesse à espera, mas também não fui propriamente apanhada de surpresa. Podia ser para qualquer um dos lados”, diz, justificando com o facto de Hillary Clinton não ser uma “candidata arrebatadora”. Compter, que veio para Macau trabalhar para uma empresa especialista em software de casinos, confessa estar “envergonhada” com o sentido de voto do seu país.

“Não sou fã de Clinton, mas sinceramente acho que o Donald Trump é um ser humano aterrorizador. Não é o exemplo que eu quero para os rapazes americanos. Ele enfatiza o medo e o ódio, não a oportunidade e o desenvolvimento”, considera. Para a americana, os dois candidatos eram maus, mas venceu claramente o pior: “É uma pessoa terrível”.

Ashley Sutherland-Winch, especialista em marketing, também não estava à espera do desfecho de ontem. “A minha única esperança é que o Presidente eleito seja capaz de respeitar os direitos da comunidade LGTB, [a decisão do Supremo Tribunal sobre o aborto] Roe v Wade, e mantenha as relações entre a China e os Estados Unidos”, desabafa. “Estou muito preocupada com o que isto significa para o nosso futuro.”

Mentir para as sondagens

Para Rui Flores, especialista em relações internacionais, os resultados da eleição “são uma surpresa, naturalmente”. Uma surpresa maior quando se tem em conta o que as sondagens nos foram dizendo e uma lição para a ciência política. “As sondagens não se dão bem com o populismo. Foi agora sim, nos Estados Unidos, foi assim em Junho, foi em Maio na Áustria. Sempre que o populismo se mexe, sempre que candidatos populistas estão quase a ganhar eleições, as sondagens não o demonstram”, diz. E porquê? “As pessoas têm alguma vergonha em dizer que vão votar no deputado populista, porque o media mainstream faz, de facto, campanha pelo outro candidato.”

Na lógica de comunicação que hoje temos, “o candidato populista fica fora, não recebe o apoio do media mainstream, e como a narrativa construída é a de que há um candidato que é muito pior do que os outros – é um candidato que não tem formação, que não tem capacidade, que não tem experiência –, as pessoas não têm coragem, têm vergonha de dizer que vão votar nesse candidato”. Na hora de votar, sem ninguém a ver, votam em quem querem, sem pruridos. “Não me parece que o problema seja a capacidade técnica dos institutos de sondagens, mas sim a incapacidade que têm de avaliar a dimensão da popularidade dos candidatos populistas”, vinca Flores.

O analista dá um exemplo: ontem de manhã, o New York Times tinha como previsão inicial a vitória de Hillary Clinton com 322 votos eleitorais. O jornal enganou-se redondamente. “Isto é também uma derrota para o media mainstream. No caso dos Estados Unidos, em que há a tradição de os jornais apoiarem um dos candidatos, há um dado significativo nestas eleições: a eleição de Trump foi apoiada por um jornal nos Estados Unidos, um jornal do Texas. Todos os outros apoiavam Hillary Clinton, apoiavam terceiros candidatos e houve até alguns jornais que disseram ‘não votem em Trump’.” Feitas as contas aos votos, “há aqui um desfasamento total entre os media mainstream e o que a população quer”.

Rui Flores alerta para uma outra questão que esta análise suscita: saber-se quem é que controla os jornais. “Vimos curiosamente Julian Assange, praticamente na véspera das eleições, a dar uma entrevista à Russia Today em que afirma que a política norte-americana, nomeadamente Hillary Clinton, é de certa forma controlada pela grande banca internacional, pela finança internacional. Essas entidades provavelmente conseguem ter algum poder para irem construindo uma narrativa em que o apoio a um candidato é melhor para o sistema do que o apoio a outro candidato.”

Os dois países

Ardyth Comper olha para os resultados eleitorais e diz, sem hesitar, que demonstram que “as pessoas votaram com as emoções”. “Não havia nada em Hillary Clinton que fizesse os eleitores dizerem ‘Sim! Queremos votar nela!’, como aconteceu com Obama há oito anos”, aponta a norte-americana.

“Parece-me que este voto demonstra que as pessoas estão fartas”, analisa Rui Flores. Estão fartas do sistema, “estão fartas desta questão de haver duas ou três famílias nos Estados Unidos que vão sucedendo no poder – estou a pensar nos Kennedy, nos Bush, nos Clinton. Este voto parece-me um grito contra isso”.

Para o especialista em relações internacionais, a vitória de Trump permite ainda outra leitura: “Parece-me que há claramente uma divisão nos Estados Unidos entre o mundo rural e o mundo urbano”. A eleição deste Presidente demonstra que “é um país dividido ao meio, entre uma América mais tradicional, mais agrária, mais rural, e uma América mais progressista, mais moderna, mais cosmopolita – são dois mundos completamente à parte”.

Ana Borges, antiga residente de Macau a viver no Kansas, é mais incisiva: a vitória do republicano, um facto que a deixou profundamente desagradada, demonstra que os Estados Unidos não são aquilo que parecem. “Os norte-americanos consideram-se a maior nação do mundo mas, em termos sociais, estão ao nível do terceiro mundo”, atira.

E agora? Agora há medos, vários. Linda Switzer entende que “a vitória de Donald Trump tem ramificações a longo prazo para o país por muitas razões, mas sobretudo no que diz respeito aos assentos que vão ficar vagos no Supremo Tribunal”. A norte-americana acredita que “os fundamentos religiosos vão fazer regredir o direito de escolha das mulheres e os direitos da comunidade LGTB”. Em suma: “É um dia muito triste para os nossos filhos e os nossos netos”.

Noutro plano, Switzer destaca o impacto imediato nos mercados financeiros de todo o mundo – as bolsas europeias abriram ontem em queda, as asiáticas fecharam a perder. “As relações internacionais com a China e com a Rússia vão ser ainda mais ténues. São tempos assustadores.”

Ardyth Comper mostra-se ligeiramente mais optimista, até porque “Donald Trump é o tipo de rico viciado em Wall Street”. “É do interesse dele que tudo continue como está para poder continuar a fazer dinheiro.” Mas há aspectos em que os Estados Unidos deverão mudar: “Vai ofender muita gente, provavelmente, ao estilo de Duterte, mas não acredito que vá fazer grandes ondas”. A americana destaca que a máquina governamental é enorme. “Sim, o Presidente é a pessoa mais poderosa, mas é apenas uma pessoa.”

Os republicanos conquistaram também ontem o controlo do Senado norte-americano, depois de já terem assegurado a Câmara dos Representantes. “São todos do mesmo partido de Trump, mas vão alinhar no mesmo discurso? É difícil dizer”, continua Comper. “Quando se olha para áreas como o Pentágono e a Defesa, há muitas coisas que estão de tal modo enraizadas que é difícil alterá-las de um dia para o outro”, acrescenta. Ardyth Comper partilha, no entanto, do receio de Linda Switzer em relação à justiça e ao modo como vai ser constituído o Supremo Tribunal.

Como emigrante, Ana Borges não teme alterações sociais no modo como vive, mas acredita que em breve começará a caça aos ilegais, sendo que “será mais difícil para quem quiser emigrar para os Estados Unidos”.

Caixa de surpresas

“A única certeza que fica destas eleições é que vivemos num mundo cada vez mais imprevisível”, nota Rui Flores. A imprevisibilidade é a nova tendência: “As surpresas eleitorais vão continuar a acontecer, o fenómeno do populismo está a aumentar no mundo. A imprevisibilidade política vai ser a grande questão para o futuro e as bolsas de valores a caírem um pouco por todo o mundo demonstram isso”.

A eleição de ontem foi, de algum modo, a abertura de uma caixa de surpresas. E “as surpresas vão suceder-se, sobretudo com a implementação de possíveis políticas trumpianas”. Resta agora saber se o vencedor vai avançar com as promessas que tantos eleitores moveram. “Vai o muro ser construído, a separar a América do México? Quem vai pagar? Como é que vai pagar? Os muçulmanos vão poder deixar de entrar nos Estados Unidos? Como? O que é que vai acontecer aos que lá estão? O Estado Islâmico vai ser derrotado, como prometeu Donald Trump? Como? Com tropas no terreno? Os Estados Unidos vão sair da Europa?”, lança o analista.

Num futuro difícil de imaginar, os Estados Unidos deverão regressar “ao isolacionismo, que é uma escola que tem história nos país”. Numa perspectiva mais abrangente, há que observar como vai ser o relacionamento com Moscovo, alerta Rui Flores. “É a questão essencial de tudo isto. Donald Trump diz que é preciso dialogar com a Rússia – vamos ver como é que ele vai tentar levar a bom porto essa lógica do relacionamento mais próximo com a Rússia”, afirma, recordando que muitos julgam que se trata de uma ameaça para os Estados Unidos.

E a China? A China dizia ontem, através de um editorial do Global Times, que Trump serve melhor a Pequim do que a adversária derrotada. Já depois de eleito o 45o Presidente norte-americano, a diplomacia chinesa declarou que acredita que poderá trabalhar com os Estados Unidos no sentido de manter um “desenvolvimento estável e equilibrado” das relações bilaterais e uma gestão “responsável” dos desacordos.

Na campanha eleitoral, recorda Rui Flores, Donald Trump “foi dizendo que era preciso aumentar a presença militar norte-americana no mar do Sul da China, que é preciso investigar e punir a China por práticas comerciais desleais, que quer designar a China como um manipulador da divisa e que quer garantir que os Estados Unidos conseguem travar os ataques cibernéticos oriundos do gigante asiático”. São estas as grandes políticas de Donald Trump para o relacionamento sino-americano. Se vai mudar de ideias e perceber que são um erro, um grande erro, só o futuro o dirá.

10 Nov 2016

Finanças | Macau reage à quebra das principais bolsas de valores

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Autoridade Monetária e Cambial (AMCM) emitiu ontem um comunicado após a queda abrupta das principais bolsas de valores de todo o mundo, após a declaração de Donald Trump como o Presidente eleito dos Estados Unidos (ver páginas 2 e 3). Segundo um comunicado oficial, a AMCM afirma que o Governo “tem prestado sempre grande atenção à evolução económica e financeira global, bem como ao mercado monetário e financeiro de Macau, como resposta ao possível surgimento de significativas flutuações nos mercados”.

Após as notícias das quebras e desvalorizações de moeda, a AMCM “desencadeou os mecanismos de supervisão e de resposta ao incidente, de modo a reforçar a comunicação e a coordenação com as instituições financeiras locais”, tendo tomado de forma atempada “providências, caso a situação o justifique, para manter a estabilidade económica e financeira de Macau”.

A AMCM afirma que a RAEM tem “liquidez bastante para fazer face a este incidente súbito”, com uma situação financeira “estável”. “Face à sólida capacidade financeira das finanças públicas, à situação estável dos pagamentos externos, ao sistema de indexação cambial fiável e ao sistema financeiro estável, o Governo e o sistema financeiro local dispõem de capacidade suficiente para fazer face às flutuações dos mercados financeiros.”

10 Nov 2016

O estertor de uma candidatura

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] semana horribilis de Donald Trump na campanha eleitoral norte-americana parece não ter fim. Foi apenas no dia 7 de Outubro que o vídeo de 2005 sobre o seu alegado “modus operandi” com as mulheres foi divulgado. Enfraquecido pela divulgação do vídeo, que surgiu na imprensa americana e um pouco por todo o mundo dois dias antes do segundo debate eleitoral com Hillary Clinton, a opinião pública decretou que, mais uma vez, ele havia perdido o embate.

A seguir ao debate, surgiram as primeiras alegações de assédio sexual alegadamente perpetradas por Trump. Partem de mulheres, aparentemente insuspeitas, com mais de 60 anos, que nunca se quiseram fazer ouvir e que só saíram do anonimato impulsionadas agora pelo facto de que ele, na discussão com Clinton, ter dito que nunca praticara qualquer comportamento que se assemelhasse a um avanço sexual não consentido. Entre esse momento e este fim-de-semana, o candidato republicano transformou-se numa espécie de saco boxe em que os sucessivos golpes começam a produzir um impacto cada vez mais profundo. No momento em que escrevo estas linhas são já 11 as mulheres que se expuseram publicamente, afirmando que foram vítimas do “predador sexual” Trump. A consequência imediata é a queda nas sondagens.

É evidente que numa sociedade como a norte-americana, puritana, conservadora nos costumes (como são frequentes as polémicas sobre casamento homossexual, aborto, adopção por casais homossexuais ou consumo de drogas), a linguagem de Donald Trump seria tudo menos adequada para conseguir convencer o voto decisivo das mulheres. Numa altura em que a igualdade de género foi considerada por António Guterres, futuro secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), como prioridade para o seu mandato e em que vários Estados europeus transpõem a convenção do Conselho da Europa para a prevenção e combate à violência contra mulheres e violência doméstica, que criminalizou, por exemplo, o piropo, a campanha contra Trump não irá parar, tornando irrelevante o debate final entre os dois candidatos marcado para a próxima quarta-feira (quinta em Macau).

No entanto, apesar de toda a polémica e da queda nas sondagens, Trump ainda atrai um número considerável de eleitores. A média das sondagens nacionais mais recentes revela que 40 por cento dos americanos registados para votar gostariam de ver o republicano na Casa Branca. A média das sondagens nacionais, dos institutos e das empresas que regularmente actualizam as previsões quanto ao resultado final das eleições de 8 de Novembro, dá conta de que a antiga secretária de Estado tem uma vantagem de cinco pontos percentuais. Apenas numa dessas sondagens Trump aparece à frente de Clinton, com uma vantagem de dois pontos percentuais.

Trump chegou até aqui com o discurso típico dos populistas, contra as elites, pela defesa do homem comum, do “nós” contra “eles”. “Eles”, os hispânicos, os muçulmanos; “nós” os brancos, os “verdadeiros” americanos. O realizador Michael Moore, autor de um documentário notável, “Where to invade next” (que deveria ser visto por todos aqueles que estão descrentes no que conseguiu alcançar a Europa da igualdade, da fraternidade, da solidariedade e dos direitos humanos), começou há meses uma campanha contra Trump, apelando à mobilização contra o candidato republicano. Tocando a rebate as campainhas dos riscos que os Estados Unidos correriam caso Trump vencesse, Moore foi dos primeiros a elencar as razões do êxito do discurso o candidato, que aponta particularmente ao homem branco, da classe média, do Upper Midwest, que foi ao longo dos anos mais recentes perdendo postos de trabalhos e poder de compra, por causa do declínio da produção industrial em quatro estados nucleares da economia norte-americana, Michigan, Ohio, Pensilvânia e Wisconsin. Consequência de acordos como o NAFTA, o acordo de comércio livre da América do Norte.

Mas, fora o discurso destinado ao homem branco da classe média – muito focado nas questões económicas, afinal a preocupação cimeira dos eleitores – Trump foi perdendo capacidade de atracção e vê-se agora chamuscado pelo seu passado. Trump não foi capaz de agregar. Alienou o voto hispânico com a mensagem da construção de um muro para isolar os Estados Unidos do México; não convenceu os afro-americanos com a pergunta “What the hell do you have to lose?”. E afastou os mais tolerantes com a mensagem de que iria banir a entrada de todo e qualquer muçulmano nos Estados Unidos.

Devido ao discurso populista, anti sistema, anti elites, Donald Trump transformou-se num alvo fácil. Apanhou muitos socos, mas o homem branco manteve-o de pé. Agora nem o “verdadeiro” americano nem os líderes republicanos o conseguem conservar à tona da água.

As mulheres, que segundo as sondagens têm muitas dúvidas sobre a seriedade de Hillary Clinton, estão agora em massa no campo da candidata democrata. Se as eleições fossem hoje e se apenas as mulheres fossem autorizadas a votar, Hillary seria eleita com 458 votos do colégio eleitoral (contados todos os votos dos 50 estados, nesta eleição indirecta do Presidente norte-americano). Se apenas os homens fossem às urnas, Trump seria eleito com 350 votos do colégio eleitoral. Para se ganhar a Casa Branca é preciso garantir 270 votos.

Apesar de irrelevante quanto ao resultado final, o debate desta quinta-feira é imperdível. Não, evidentemente, para esclarecer o que quer que seja. Há muito que os debates políticos não contribuem para esclarecer, adicionar votos ou alargar a base de apoio. São apenas um momento – mais um – de infotainment. Tão apetecido como um qualquer episódio dos fenómenos televisivos “Game of Thrones” ou “Veep”.

Acossado, provavelmente ferido de morte (passe a imagem de cariz político), Trump vai disparar em todas as direcções para tentar beliscar Clinton. Mas Hillary, como política experiente que é, vai passar pelo debate como um árbitro da liga inglesa de futebol em dia de dérbi: discretíssima. A 21 dias das eleições, parece que não há volta a dar. Nem o gongo parece poder salvar Trump.

17 Out 2016

EUA/Presidenciais | Sheldon Adelson vai doar “cem milhões ou mais” a Trump

O magnata da Sands disse publicamente estar disposto a contribuir com mais dinheiro para eleger Donald Trump do que aquele que doou em qualquer outra campanha. E a ajuda não se fica por mais de cem milhões de dólares: Sheldon Adelson diz que este é o homem que os EUA precisam, mesmo que “não se concorde” com algumas coisas que ele diz

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]s EUA precisam de alguém “forte” na liderança e esse alguém é Donald Trump. É a opinião bem vincada de Sheldon Adelson, o magnata dos casinos da Sands, com casinos em Macau, que justifica assim a doação de mais de cem milhões de dólares que poderá atribuir àquele que é um dos candidatos mais polémicos da corrida presidencial norte-americana.
Em 2012, Sheldon Adelson tornou-se o maior dador republicano de sempre, depois de doar entre 98 e 150 milhões de dólares americanos aos candidatos do partido que apoia. Mas este montante incluiu a corrida ao congresso e à presidência. Agora, o magnata está disposto a bater um novo recorde: mais de cem milhões de dólares apenas para Trump e a sua candidatura presidencial, como reportou o New York Times a semana passada. E Sheldon Adelson explica, ele próprio, porquê. sheldon-adelson
“[Entre tantos candidatos], um ganhou a corrida e agora os Republicanos têm de se juntar de forma a garantir que ele vença na etapa seguinte. Enquanto as primárias ainda têm algumas eleições importantes pela frente, está claro que Donald Trump será o Republicano nomeado para presidente”, começou por escrever numa coluna de opinião no jornal Washington Post. “Eu apoio publicamente Trump para a presidência e recomendo fortemente os meus colegas Republicanos – especialmente os oficiais eleitos através do Partido Republicano, os leais ao Partido e aqueles que fornecem um importante apoio financeiro – a fazerem o mesmo.”
A opinião de Adelson continua, considerando “assustador” a alternativa à presidência se não Trump. Num longo parágrafo onde critica Barack Obama – o homem que “conseguiu atingir os seus objectivos em muitos assuntos, ainda que estes não fossem os objectivos dos EUA” -, Adelson diz que é preciso colocar na Casa Branca alguém com um “R” (de Republicano) atrás. Esta é, assegura, a única forma de melhorar a situação. E essa oportunidade “ainda existe”.
“Sinto realmente que alguém com nível de experiência como CEO está suficientemente bem treinado para o trabalho de presidente. Isso é exactamente o que temos com Trump: ele é um candidato com experiência como CEO, moldado pelo compromisso e risco de utilizar o seu próprio dinheiro em vez do do público. Ele é um CEO com uma história de sucesso, que exemplifica o espírito de auto-determinação americano, compromisso para uma causa e boa gestão de negócios.”
Sheldon Adelson não menciona, por exemplo, as mais de duas dezenas de negócios montados por Donald Trump que não foram, de todo, “bem geridos”. Notícias correntes na imprensa norte-americana mostram esses casos – aliás motivo de chacota nos mais populares programas de comédia na televisão. São os bifes de Trump (um ano em funcionamento), o Trump Game (igual ao Monopólio, mas versão Trump, menos de um ano em produção), um restaurante (três meses), um motor de busca de viagens (um ano), água Trump Ice (menos de um ano), uma revista que durou dois anos e até uma universidade que acabou processada por diversos alunos porque, durante os seis anos em que funcionou, nunca conseguiu cursos acreditados.

[quote_box_left]Menos de 0,01% é o valor do apoio de Adelson a Trump quando comparado com o valor das receitas totais do ano passado da Sands, já que só a Sands China obteve lucros líquidos de 1,45 mil milhões de dólares em 2015[/quote_box_left]

Comer no prato que cuspiu

Apesar de alguns problemas nos negócios, a verdade é que Donald Trump foi sempre, de acordo com ele próprio e com média norte-americanos, “auto-financiado” na sua corrida à Casa Branca. Até porque “ele conseguiu alienar muitos dos seus doadores” devido a comentários menos próprios, como realça a imprensa dos EUA.
“Para começar a ter mais recursos [financeiros], Trump terá de ser mais activo em conseguir conquistar doadores que isolou durante as primárias”, escreve a CNN. “Charles e David Koch (dois dos maiores apoiantes das presidenciais) não parecem querer apoiar Trump. Charles Koch, em particular, foi publicamente crítico sobre a forma de candidatura de Trump durante as primárias.”
Esses comentários não passam sequer pela forma como Donald Trump fala das mulheres, ou da contínua ideia de construir um muro que separe o México do país. Os comentários foram dirigidos precisamente às figuras que agora poderão apoiar o candidato. puppet
“Trump foi claro durante a campanha, criticando os oponentes que esperam os ‘super PACS’ e dizendo que eles estavam a ser comprados por doadores ricos”, relembra o Wall Street Journal, referindo-se aos comités organizados para receber somas de dinheiro ilimitadas de empresas, indivíduos e uniões sem contribuírem directamente com o Partido ou os candidatos.
Trump dizia mesmo que o poder da sua campanha centrava-se no facto de ser “auto-financiado” e que isso acontecia porque as contribuições “têm um efeito de corrupção nos oficiais do governo”. Palavras que justificava com o facto de ser “um dos maiores doadores ricos a fazer essa compra”, como relembra o site MSNBC.
Nem Sheldon Adelson escapou. Quando o magnata apoiou Marco Rubio, Donal Trump não foi meigo. “Ele está a apoiar Marco Rubio para moldá-lo, para que ele seja a sua pequena marioneta”, escrevia o candidato em Novembro do ano passado, acrescentando no início deste ano que “os americanos não têm de se preocupar com esses ricos a dizer ao Trump o que fazer, porque ele não quer – e não recebe – o dinheiro deles”.
Apesar da retórica, a ira contra os ‘super PACS’ parece ter amainado, tal como a contra os “doadores ricos”: Donald Trump vai ser apoiado em “cem milhões de dólares ou mais” por Sheldon Adelson e a contribuição deverá ser feita precisamente através de ‘super PACS’.
A reacção de Trump quando confrontado pelos jornalistas? “Eu sei que as pessoas gostam de mim e formam um super PAC, mas eu não tenho nada a ver com isso. Vamos ser o que acontece”, disse à NBC News.
O dinheiro, escrevem analistas citados pela imprensa americana, é agora um ponto vital na corrida de Trump. É que, para combater Hillary Clinton na corrida geral à Casa Branca, Donald Trump deverá precisar de “700 milhões a mil milhões de dólares”. Trump tem neste momento cerca de 11 milhões de votos, precisando de cerca de 50 a 60 milhões para vencer. As eleições são em Setembro.

[quote_box_right]“Ele [Sheldon Adelson] está a apoiar Marco Rubio para moldá-lo, para que ele seja a sua pequena marioneta” – Donald Trump, em Novembro de 2015[/quote_box_right]

Jogo, ódio a Obama e Israel – Que interesses estão por trás dos apoios?

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]encontro entre Adelson e Trump de onde surgiu a notícia do apoio aconteceu há duas semanas em Manhattan. Desde então, o magnata do jogo tem insistido na necessidade de se juntarem a ele todos os republicanos possíveis, que ainda estão de pé atrás com Trump.
“Apesar de ter sido o neto de um mineiro e filho de um taxista, tenho muito experiência em ser parte de quase meia centena de diferentes negócios nos meus mais de 70 anos de carreira. (…) Ganhei o direito de falar sobre liderança e sucesso. Podem não gostar do estilo de Trump, ou daquilo que ele diz no Twitter, mas este país precisa de uma liderança executiva forte hoje em dia, mais do que em qualquer outro período na sua história”, escreveu Adelson na opinião publicada no Washington Post.
Mas, que interesses estão por trás do apoio a Trump? Primeiro, o “ódio” que Sheldon Adelson já manifestou contra Obama e a visão de que Hillary poderá ser a sua substituta mais parecida.
“Se os Republicanos não se juntarem no apoio a Trump, Obama vai, basicamente, ter algo que a Constituição não permite – um terceiro mandato em nome de Hillary Clinton. Passei algum tempo a falar com Donald Trump. Se concordo com ele em todos os pontos? Não. Mas é natural que nenhum americano concorde com o seu candidato preferido em todos os assuntos”, defendia Adelson na semana passada.
Outra das razões pode ser o interesse de Trump nos casinos. Como recorda a NewsWeek, Adelson é conhecido por apoiar políticos que poderão ajudar nos seus negócios de jogo, ainda que os casinos não pareçam ser o ponto forte do candidato à presidência. Trump declarou falência de três propriedades em Atlantic City: primeiro o casino Trump Taj Mahal, em 1991, depois de um ano em operação. Depois, em 2004, foi a vez do Trump Marina e o Trump Plaza. Depois disto, a Trump Hotels e Casino Resorts decidiu mudar para Trump Entertainment Resorts. Quatro anos depois, também esta empresa faliu.
E depois há a questão de Israel. Um dos cavalos de batalha de Adelson, judeu, a segurança de Israel é uma das maiores preocupações do magnata e parece ser, agora, também a de Trump, que Adelson considera ser “bom para Israel”. Mas a situação é confusa.
“Durante toda a corrida vimos reviravoltas que não eram suposto acontecer. Uma das maiores razões de Adelson para apoiar Trump é o grande apoio a Israel, ainda que Trump tenha feito comentários no passado que deveriam fazer os zionistas preocupar-se com tal presidência. Mas também já vimos as ideias de Trump mudar em diferentes eventos públicos”, frisou Myles Hoenig, activista e analista político, em declarações à Press TV.

Unidos por muros

Trump chegou a fazer comentários contrários sobre a questão Israel-Palestina, mas a última declaração pública é favorável à ideia de Sheldon Adelson. E mais uma vez, Trump usa-se a si próprio como exemplo. “Acontece que eu tenho um genro e uma filha que são judeus ok? E dois netos que são judeus.”
Para Hoenig, a liderança republicana sempre foi muito pró-Israel, mas também os democratas o têm sido, como refere, frisando que Hillary Clinton até é a candidata que mais apoia o país e que é activa nas suas acções para tal. Mas, para o activista, a dúvida não existe: por que razão Adelson apoia Trump? “Não é só para promover a conversa sobre Israel, mas para mostrar a oposição a todos os aspectos levantados por Obama nestes últimos oito anos. Obama é visto como uma oposição a Israel nas decisões que toma, mas ele apoiou o país em tudo o que fez e até cobriu crimes israelitas contra o povo palestiniano”, diz o analista, assegurando que, seja como for, a política dos EUA face a Israel não deverá mudar.
Uma das coisas que os dois milionários parecem ter certamente em comum é a ideia de construir um muro: Trump tem um planeado para o México. Adelson sugeriu construir “um grande, maior do que já existe”, para manter os palestinianos fora de Israel.

Wynn amigo de Hillary Clinton?

Dentro da política é habitualmente conhecido o papel de Sheldon Adelson como um dos grandes doadores, mas Steve Wynn também pondera apoiar alguém. Ainda que o nome do empresário do jogo, dono do Wynn em Macau e com um novo complexo a nascer no Cotai, não seja tão sonante nos meandros da candidatura, duas coisas são bem conhecidas: Steve Wynn “desaprova Barack Obama”, ao ponto de o comparar ao ex-presidente Richard Nixon, envolto num escândalo de escutas. Mas, ao contrário de Adelson (ver texto principal), o facto de Wynn não gostar de Obama pode não o impedir de apoiar Hillary Clinton, candidata pelos Democratas. Wynn assegura ter tido um “jantar charmoso com Clinton”, ainda que social e “não político” e que não descurava a eventualidade de apoiar a candidata, numa entrevista ao canal de televisão PBS. Do conhecimento público é também que Wynn não está nos melhores termos com Adelson ou Trump. Muito por causa dos negócios de casinos, já que o candidato republicano foi considerado, em tempos, provável competição de Wynn em Atlantic City.

Quem apoia quem?

Hillary Clinton: apoiada por Ben Affleck, Christina Aguilera, Tony Bennett, Drew Barrymore, Bon Jovi, Mary J. Blige, George Clooney, Bryan Cranston, Leo Dicaprio, Ellen Degeneres, Cher, Jesse Eisenberg, Morgan Freeman, Lady Gaga, Robert De Niro, Richard Gere, Tom Hanks, Ben Harper, Elton John, Beyoncé, Katy Perry

Donald Trump: apoiado por Hulk Hogan, Sarah Pallin, Stephen Baldwin, Azealia Banks, Kid Rock, Dennis Rodman, Mike Tyson

Bernie Sanders: Rosario Dawson, Danny De Vito, Mark Ruffalo, Danny Glover, Spike Lee, Seth MacFarlane, Michael Moore, Susan Sarandon, Red Hot Chilly Peppers,

18 Mai 2016