Trump diz que Presidente chinês visita Washington num “futuro não muito distante”

O Presidente norte-americano Donald Trump adiantou na segunda-feira que o seu homólogo chinês Xi Jinping irá visitar Washington num “futuro não muito distante”, perante as crescentes tensões comerciais entre as duas maiores economias do mundo devido à imposição de tarifas.

“Isso acontecerá num futuro não muito distante”, revelou Trump aos jornalistas durante uma reunião do novo conselho de administração do Kennedy Center, um centro cultural famoso da capital Washington.

O chefe de Estado norte-americano observou ainda que altos funcionários do governo chinês, “logo abaixo” de Xi, visitarão em breve a capital dos EUA, embora não tenha adiantado nomes ou detalhes sobre possíveis datas.

Trump mencionou a visita de Xi ao referir que recebeu visitas de líderes estrangeiros na Casa Branca nas últimas semanas e perguntou-lhes como estava Washington. O republicano frisou que está a “limpar Washington”, incluindo tentar limpar tendas usadas por sem-abrigo e grafítis.

Na semana passada os meios de comunicação social norte-americanos tinham noticiado que Washington e Pequim iniciaram discussões sobre uma cimeira entre os líderes dos dois países, em Junho, nos Estados Unidos.

A imprensa chinesa tinha já sugerido a possibilidade de um encontro em Abril. Também o jornal de Hong Kong South China Morning Post avançou que Trump poderá deslocar-se à China em Abril para se encontrar com o homólogo chinês, Xi Jinping.

Desde a vitória do republicano nas presidenciais norte-americanas, em Novembro, que Trump e Xi manifestaram interesse na realização de uma cimeira.

Futuro em aberto

Desde a posse de Trump, em Janeiro, a administração norte-americana ameaçou, e depois suspendeu, taxas alfandegárias sobre o México e o Canadá, ao mesmo tempo que se comprometeu a punir também a Europa e outros parceiros comerciais.

Até agora, a China é o único país que enfrentou efectivamente aumentos generalizados das taxas decididos por Trump.

A Casa Branca impôs taxas adicionais de 20 por cento sobre todos os bens oriundos da China, citando o papel do país asiático na crise do fentanil nos EUA. Pequim retaliou rapidamente com taxas próprias, adaptando a resposta para evitar uma escalada das tensões.

Outras acções que estão a ser consideradas pela equipa comercial de Trump incluem restringir o investimento chinês nos EUA e o investimento norte-americano na China, visar indústrias dominadas pela China, como a construção naval, e limitar ainda mais a venda de produtos de alta tecnologia a empresas chinesas.

Trump e Xi já tinham conversado por telefone em Janeiro, dias antes da tomada de posse do norte-americano para o seu segundo mandato, numa conversa em que discutiram as relações comerciais e o futuro nos Estados Unidos da rede social TikTok, da empresa chinesa ByteDance.

Donald Trump disse estar aberto a negociar um novo acordo comercial com a China e elogiou Xi repetidamente.

Os dois líderes chegaram a um acordo em 2020 para pôr fim à guerra comercial que prejudicava ambas as economias. No entanto, as relações bilaterais deterioraram-se com a pandemia de covid-19, que Trump atribuiu à China.

19 Mar 2025

WSJ | EUA e China discutem cimeira Trump-Xi para Junho

O diário norte-americano Wall Street Journal (WSJ) noticiou que Washington e Pequim iniciaram ontem discussões sobre uma cimeira entre os líderes dos dois países, em Junho, nos Estados Unidos. A imprensa chinesa tinha já sugerido a possibilidade de um encontro em Abril.

As discussões, que as fontes do WSJ disseram estar na fase inicial, estão a decorrer numa altura em que a administração do Presidente norte-americano, Donald Trump, impôs taxas alfandegárias adicionais e outras medidas comerciais contra a China.

Também o jornal de Hong Kong South China Morning Post avançou que Trump poderá deslocar-se à China em Abril para se encontrar com o homólogo chinês, Xi Jinping. Tanto a Casa Branca como a Embaixada da China nos EUA não quiseram comentar, indicou o WSJ.

Desde a vitória do republicano nas presidenciais norte-americanas, em Novembro, que Trump e Xi manifestaram interesse na realização de uma cimeira. Sobre a possibilidade de Trump visitar a China em Abril, a porta-voz da diplomacia chinesa disse para já não ter informações.

Desde a posse de Trump, em Janeiro, a administração norte-americana ameaçou, e depois suspendeu, taxas alfandegárias sobre o México e o Canadá, ao mesmo tempo que se comprometeu a punir também a Europa e outros parceiros comerciais.

Até agora, a China é o único país que enfrentou efectivamente aumentos generalizados das taxas decididos por Trump. A Casa Branca impôs taxas adicionais de 20 por cento sobre todos os bens oriundos da China, citando o papel do país asiático na crise do fentanil nos EUA.

Pequim retaliou rapidamente com taxas próprias, adaptando a resposta para evitar uma escalada das tensões.

12 Mar 2025

Japão | Rejeitadas afirmações de Trump sobre moeda

As ameaças de Trump de impor tarifas adicionais ao Japão levaram a um desmentido do governo nipónico sobre o enfraquecimento propositado do iene

 

O Governo japonês rejeitou ontem as acusações feitas segunda-feira pelo Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de que o Japão está a desvalorizar a sua moeda, afirmando que está em estreita comunicação com Washington sobre essas questões.

“Não estamos a adoptar uma política para enfraquecer a nossa moeda. Se se lembrarem das nossas intervenções no mercado cambial nos últimos anos, compreenderão o que quero dizer”, afirmou o ministro das Finanças, Katsunobu Kato, numa conferência de imprensa após os comentários do Presidente norte-americano.

O porta-voz do Governo japonês, Yoshimasa Hayashi, também negou que Tóquio esteja a seguir uma política de controlo cambial e disse que “as questões cambiais continuarão a ser objecto de consultas estreitas” entre Kato e o secretário do Tesouro norte-americano, Scott Bessent, como tem acontecido desde a cimeira entre Trump e o primeiro-ministro japonês, Shigeru Ishiba, em Washington, a 10 de Fevereiro.

Os comentários do Governo japonês surgem horas depois de Trump ter ameaçado impor tarifas adicionais ao Japão e à China, alegando que estes países desvalorizam propositadamente as suas moedas para tirar partido dos benefícios comerciais que a desvalorização cambial oferece.

“É injusto para nós”, os Estados Unidos, disse Trump, garantindo que a forma de enfrentar uma situação destas “é fácil, [é] com tarifas”.

Reverso da moeda

O Banco do Japão (BoJ) manteve uma política monetária de depreciação cambial durante mais de uma década para tentar manter a inflação em torno do seu objectivo estável de 2 por cento, provocando uma forte desvalorização do iene em relação a outras moedas, especialmente o dólar norte-americano e o euro.

A desvalorização do iene contribuiu para inflacionar os lucros das empresas e o valor das exportações nacionais, além de ter alimentado o ‘boom’ do turismo.

Nos últimos anos, porém, o Japão interveio várias vezes no mercado cambial para conter desvalorizações acentuadas do iene, reflectindo a divergência de políticas monetárias entre o Japão e os Estados Unidos.

Desde que Kazuo Ueda se tornou governador do BoJ em 2023, o banco central japonês entrou num ciclo de subida das taxas, mas o iene continua fraco.

Os comentários de Trump levaram a uma súbita valorização do iene em relação ao dólar, que nas horas anteriores tinha sido negociado na faixa alta de 148 unidades por dólar, antes de se recuperar para 149 unidades.

4 Mar 2025

Diplomacia | China não confirma conversa que Trump diz ter tido com Xi Jinping

A China não confirmou ontem que o Presidente chinês, Xi Jinping, tenha falado com o homólogo norte-americano, após a sua tomada de posse, a 20 de Janeiro, como revelou Donald Trump na segunda-feira.

Uma reunião entre os líderes das duas maiores potências mundiais poderia facilitar as relações bilaterais, ainda ameaçadas por uma potencial guerra comercial iniciada por Donald Trump. Numa entrevista transmitida pelo canal de televisão norte-americano Fox News, na segunda-feira, um jornalista perguntou a Donald Trump se tinha falado com Xi Jinping desde o início do seu segundo mandato.

“Sim, falei com ele e também falei com as pessoas da sua equipa”, disse o Presidente norte-americano, embora nem Washington nem Pequim tenham alguma vez relatado esse telefonema. Questionado ontem sobre se a conversa efectivamente aconteceu, um porta-voz de Pequim limitou-se a recordar a conversa que teve lugar três dias antes da tomada de posse de Trump.

“O Presidente Xi Jinping teve uma conversa por telefone com o Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, no dia 17 de janeiro. A China emitiu uma declaração sobre o assunto”, disse Guo Jiakun, porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, em conferência de imprensa. Desde que tomou posse, Trump anunciou a imposição de taxas punitivas sobre os seus principais parceiros comerciais, incluindo a China, o México e o Canadá.

12 Fev 2025

MNE | Pequim contra taxas impostas por Washington

A China afirmou ontem que se opõe resolutamente ao aumento das taxas alfandegárias impostas pelos Estados Unidos sobre os seus produtos e apelou ao diálogo, depois de ter revelado uma série de medidas de retaliação na terça-feira.

“A China manifesta a sua profunda insatisfação e opõe-se resolutamente” às medidas dos EUA, disse Lin Jian, porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, em conferência de imprensa. “O que precisamos agora não é de um aumento unilateral das taxas, mas sim de um diálogo e de discussões baseadas no respeito mútuo”, acrescentou.

Alvo de taxas alfandegárias adicionais de 10 por cento sobre todas as suas exportações para os Estados Unidos, Pequim retaliou imediatamente na terça-feira, prometendo aumentar as barreiras alfandegárias sobre uma série de produtos norte-americanos, desde petróleo bruto a maquinaria agrícola.

Pequim anunciou também novas restrições à exportação de metais críticos, utilizados em sectores que vão da exploração mineira à indústria aeroespacial. “As medidas tomadas pela China são uma acção necessária para defender os seus direitos e interesses legítimos”, disse o porta-voz chinês.

O Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, disse na segunda-feira que uma chamada com o seu homólogo chinês, Xi Jinping, poderia ter lugar em breve, dando a impressão de que era possível uma reviravolta rápida. Mas mais tarde desmentiu a afirmação, dizendo que “não tinha pressa” em falar com Xi.

Questionado sobre uma possível futura conversa entre os dois líderes, o porta-voz da diplomacia chinesa não deu pormenores.

6 Fev 2025

EUA | Trump diz que tarifas são “a única forma” do país ser “tratado como deve”

Os países europeus vão ser sujeitos a tarifas aduaneiras, “a única forma” de os Estados Unidos “serem tratados como devem ser”, afirmou esta terça-feira o Presidente norte-americano, Donald Trump.

“A União Europeia (UE) é muito má para nós. Tratam-nos muito mal. Não aceitam os nossos automóveis nem os nossos produtos agrícolas. De facto, não aceitam muita coisa”, disse o Presidente dos Estados Unidos, acrescentando que, por isso, serão alvos de tarifas.

Questionado pela imprensa na Casa Branca, Trump garantiu ainda que a sua administração está a discutir “tarifas de 10 por cento sobre os produtos chineses, porque eles enviam [o opióide] fentanil para o México e Canadá”, que acaba por ser consumido nos Estados Unidos.

“É provavelmente para 1 de Fevereiro”, acrescentou Donald Trump, dia que corresponde à data anunciada na véspera para a aplicação de tarifas de 25 por cento sobre os produtos mexicanos e canadianos.

A China reagiu ontem, afirmando estar “firmemente determinada” a “defender os seus interesses nacionais”.

“Sempre acreditámos que não há vencedores numa guerra comercial ou numa guerra tarifária”, declarou Mao Ning, porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, numa conferência de imprensa.

A Presidente da Comissão Europeia (CE), Ursula von der Leyen, que participou no Fórum Económico de Davos, na Suíça, na terça-feira, garantiu que a Europa está pronta para falar com o governo dos Estados Unidos, lembrando que Washington é um importante parceiro comercial.

A nossa primeira prioridade é iniciar rapidamente as conversações sobre os nossos interesses comuns e estarmos prontos para negociar”, afirmou: “Seremos pragmáticos, mas manter-nos-emos firmes nos nossos princípios: defender os nossos interesses e respeitar os nossos valores”, afirmou a líder europeia.

“A Europa continuará a defender a cooperação, não só com os nossos amigos de longa data (…) mas também com todos os países com os quais temos interesses comuns”, acrescentou von der Leyen.

“A nossa mensagem para o resto do mundo é simples: estamos prontos para dialogar convosco, se isso puder conduzir a benefícios mútuos”, acrescentou, assegurando que pretende “aprofundar” as relações entre Bruxelas e Pequim.

Nada de novo

Durante a sua campanha presidencial, Trump já tinha denunciado o défice comercial dos Estados Unidos em relação à UE, comparando o bloco a “uma pequena China” e acusando-o de se aproveitar da primeira potência económica mundial.

“Temos um défice comercial com a UE de 350 mil milhões de dólares”, insistiu na terça-feira, referindo que “a China é agressiva, mas não é só a China, outros países também são grandes agressores”.

O défice comercial dos EUA com a UE ascenderá a 131 mil milhões de dólares em 2023, de acordo com dados do Representante Comercial da Casa Branca (USTR), e está concentrado principalmente em quatro países: Alemanha, França, Irlanda e Itália.

Antes de ser reeleito, Donald Trump já tinha ameaçado a UE com a imposição de direitos aduaneiros sobre os produtos europeus, a menos que o bloco aumentasse as suas compras de petróleo e gás americanos.

O Comissário Europeu para a Economia, Valdis Dombrovskis, garantiu na segunda-feira, após a tomada de posse de Trump, que a UE está “pronta a defender os seus interesses económicos”, como já fez “durante a primeira administração Trump, quando introduziu tarifas sobre o aço e o alumínio”.

22 Jan 2025

EUA | Trump toma posse e lança farpas à China sobre Canal do Panamá

O novo Presidente norte-americano, Donald Trump, prometeu esta segunda-feira assumir o controlo do Canal do Panamá, rebatizar o Golfo do México e reforçar a tributação dos países estrangeiros, confirmando intenções já expressadas para o segundo mandato na Casa Branca.

No seu discurso na cerimónia de tomada de posse como 47.º Presidente dos Estados Unidos Donald Trump sublinhou que o objectivo do acordo e o espírito do tratado em relação ao Canal do Panamá “foram totalmente violados”, prometendo assumir controlo desta infraestrutura marítima vital para o comércio global.

“E o mais importante, a China opera o Canal do Panamá, e nós não o demos à China, demos ao Panamá. E vamos tomá-lo de volta”, justificou no seu discurso realizado no Capitólio (sede do Congresso norte-americano), em Washington.

Noutra intenção já anteriormente expressada, Trump confirmou também que, em breve, vai mudar o nome do Golfo do México para “Golfo da América”.

Mais impostos

No seu regresso à Casa Branca (presidência norte-americana), depois de um primeiro mandato entre 2017 e 2021, o político republicano afirmou ainda que pretende reforçar a tributação dos países estrangeiros em favor dos cidadãos norte-americanos.

“Começarei imediatamente a reformar o nosso sistema comercial para proteger as famílias e os trabalhadores americanos. Em vez de taxar os nossos cidadãos para enriquecer outros países, vamos impor tarifas e impostos aos países estrangeiros para enriquecer os nossos cidadãos”, declarou.

Expulsar ilegais

Donald Trump garantiu ainda que irá expulsar “milhões e milhões” de imigrantes ilegais, um dos principais focos da sua campanha eleitoral. “Primeiro, declararei o estado de emergência na nossa fronteira sul” com o México, disse o Presidente, acrescentando que vai enviar o Exército para patrulhar essa região.

“Todas as entradas ilegais serão imediatamente bloqueadas e iniciaremos o processo de devolução de milhões e milhões de estrangeiros criminosos para onde vieram”, acrescentou o Presidente republicano.

O juramento do novo líder norte-americano foi realizado logo após a posse do seu futuro vice-presidente, JD Vance, com o qual liderou a nomeação do Partido Republicano, que, em 05 de novembro de 2024, venceu as eleições presidenciais contra a candidatura democrata encabeçada por Kamala Harris.

A cerimónia em Washington decorreu às 17h, hora de Lisboa (madrugada em Macau) e foi marcada pela presença de políticos internacionais populistas e de extrema-direita, mas com escassos responsáveis governamentais e sem líderes da União Europeia (UE), à excepção da primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni.

21 Jan 2025

EUA | China disposta a trabalhar com nova administração

A mensagem da diplomacia chinesa abre as portas ao diálogo com a administração de Donald Trump que ontem tomou posse nos Estados Unidos

 

A China afirmou ontem que está “disposta a trabalhar” com a nova administração norte-americana para “reforçar o diálogo e a cooperação”, poucas horas antes da tomada de posse do republicano Donald Trump como novo Presidente dos Estados Unidos.

“A história do desenvolvimento das relações entre a China e os Estados Unidos diz-nos que se os dois países trabalharem em conjunto, ambas as partes serão beneficiadas, mas se lutarem entre si, ambas serão prejudicadas”, afirmou o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, Mao Ning, em conferência de imprensa.

Mao afirmou que a China “sempre acreditou que as relações estáveis, saudáveis e sustentáveis entre a China e os EUA estão de acordo com os interesses comuns dos dois países e com as expectativas da comunidade internacional”.

“A China está disposta a trabalhar com a nova administração dos EUA para defender os princípios do respeito mútuo, da coexistência pacífica e da cooperação”, acrescentou, sublinhando a importância de as duas potências poderem “reforçar o diálogo e a comunicação, gerir correctamente as diferenças e alargar a cooperação”.

Mao reagiu assim a uma pergunta sobre possíveis conversações entre representantes chineses e norte-americanos nas próximas semanas.

Tradição quebrada

De acordo com o jornal norte-americano The Wall Street Journal, Trump manifestou aos seus conselheiros a intenção de viajar para a China após a tomada de posse, podendo fazê-lo durante os primeiros 100 dias do seu mandato.

O republicano já teve uma conversa telefónica recente com o Presidente chinês, Xi Jinping, durante a qual discutiram questões como o comércio, o tráfico de fentanil e a polémica em torno da proibição da aplicação de vídeos TikTok nos Estados Unidos.

Rompendo com uma longa tradição de não convidar líderes ou chefes de Estado estrangeiros para a cerimónia de tomada de posse do presidente dos EUA, Trump convidou Xi e outros chefes de Estado para a sua tomada de posse, mas o líder chinês enviou o vice-presidente, Han Zheng.

Durante o seu primeiro mandato, Trump manteve uma relação tensa com Pequim, dando início a uma guerra comercial que incluiu a imposição de taxas que se mantêm em vigor. O republicano promete agora impor taxas até 60 por cento sobre as importações provenientes da China.

21 Jan 2025

Indulto paterno (II)

A semana passada, analisámos o indulto que Biden concedeu ao filho. Esta semana, aprofundaremos o tema.

A decisão de Biden desencadeou discussões e críticas dentro e fora do Estados Unidos. Estas críticas vieram não só dos seus opositores políticos, mas também da população e do sector jurídico.

Em primeiro lugar, Biden salientou nas suas declarações que tinha tomado esta decisão na dupla qualidade de pai e de Presidente. Quando um pai vê o filho ser tratado injustamente e o apoia está a dar um testemunho vivo de amor paterno. Enquanto as pessoas tiverem filhos, existirá amor paternal. Não são só os Presidentes que amam os filhos. Assistimos frequentemente a situações em que os pais se sacrificam para salvar a sua prole. No passado dia 29 de Maio, o jornal britânico “Daily Mail” publicou uma notícia sobre a deflagração de um incêndio às 2.30 h da madrugada de 14 de Abril, numa casa situada na Warrington Road em Wigan, na Área Metropolitana de Manchester. Barry Mason, um pai de 45 anos, ignorou os avisos de familiares e amigos e lançou-se às chamas para salvar o seu filho Ethan de 4 anos. Infelizmente, acabaram por morrer os dois no incêndio. A família enterrou os dois no mesmo caixão para que ficassem abraçados para a eternidade.

A 25 de Janeiro de 2023, o órgão de comunicação social 01 de Hong Kong anunciou que Shao Zhijun, natural de Taiwan, China, e aluno da Faculdade de Direito, para salvar o filho que sofria de leucemia, dedicou-se ao estudo de medicina e descobriu um novo tratamento para a sua doença. Não só lhe salvou a vida, como o seu trabalho acabou por ser publicado em revistas académicas de investigação. Shao Zhijun disse no Facebook:

“O caso do transplante de medula óssea do meu filho foi publicado e eu sou o terceiro autor. É possível resolver o problema do cancro através da investigação genética. Os resultados dos últimos exames são bons. O meu maior desejo é que ele cresça saudável.”

Um pai morreu para salvar o filho e os dois foram enterrados no mesmo caixão. Para salvar o filho, um outro pai trabalhou dia e noite para se informar sobre matérias que desconhecia e foi bem-sucedido. Estes casos ilustram a grandiosidade do amor paterno. Desde que compreendamos este sentimento, compreenderemos o indulto que Biden concedeu ao filho. Biden tem 82 anos e espera que o filho venha a ter uma vida estável depois da sua morte. Não é isto que qualquer pai deseja? O que é que tem de errado?

Por um lado, quando um pai indulta o filho, é na verdade fácil pensar-se que a situação é injusta. Algumas pessoas pensam que desta forma se está a colocar o interesse familiar acima do interesse nacional, prejudicando a credibilidade presidencial. Esta preocupação não é infundada. Independentemente da explicação que Biden der, é difícil de ser aceite por todos.

Por outro lado, alguns americanos estão preocupados que esta decisão possa vir a estabelecer um mau precedente, ou seja, o Presidente vir a usar o poder de indulto para proteger os familiares de consequências legais. Como já foi mencionado, Clinton indultou o seu meio-irmão Roger Clinton da acusação de posse de droga. No seu primeiro mandato, Trump indultou Charles Kushner, pai do seu genro Jared Kushner, das acusações de evasão fiscal. Agora, Biden concedeu o perdão ao filho pela posse ilegal de arma e evasão fiscal. Estes exemplos podem suscitar preocupações públicas sobre favoritismo presidencial.

Além das preocupações do público sobre favoritismo presidencial, existe ainda a questão de abuso do poder de indulto. Como Biden perdoou criminosos a 10 de Dezembro, alguns meios de comunicação dos EUA assinalaram que, se Trump realmente perdoar os envolvidos nos ataques ao Congresso, então Biden deveria perdoar aqueles que investigaram a tentativa de Trump de anular os resultados das eleições presidenciais de 2020? Se isto vier a acontecer, o poder de indulto torna-se uma ferramenta que o Presidente usa para proteger os seus subordinados. Desta forma, a amnistia continuará a servir para reabilitar quem deseja enveredar pelo bom caminho? Continua a dar a estas pessoas a oportunidade de se integrarem e contribuírem para a comunidade? O poder da amnistia pode ainda ajudar infractores não violentos a regressar à normalidade? A intenção original do poder de indulto ainda se mantem?

Por último, esta decisão levantou a interrogação sobre se Trump se pode indultar a si próprio quando tomar posse. Como sabemos, o Procurador Jack Smith arquivou os processos federais contra Trump, nos quais se incluíam alegada interferência nas eleições de 2020 e posse ilegal de documentos confidenciais, alegando que o Presidente não pode ser indiciado. O indulto é uma questão legal. A Constituição dos EUA estipula que o Presidente tem o poder de indultar pessoas que cometeram crimes federais, mas a questão é se esse poder se pode aplicar a si próprio. Os americanos só saberão a resposta a esta pergunta mais tarde. Como espectadores, esperamos que este caso não afecte o sistema jurídico dos Estados Unidos e também que sirva de referência para o resto do mundo.

Seja como for, a decisão de Biden desencadeou uma ampla discussão e reflexão sobre o poder de indulto, sobre o abuso desse poder e ainda sobre se o Presidente se pode perdoar a si próprio. Este caso veio lembrar-nos mais uma vez que o poder de amnistiar é a última ferramenta de intervenção jurídica e o seu exercício deve ser efectuado de forma cautelosa para evitar controvérsias e mal-entendidos desnecessários. Devemos também compreender que a justiça e a autoridade da lei são os pilares da estabilidade social e do desenvolvimento. Qualquer tentativa de alterar estes princípios será amplamente questionada e criticada. Finalmente, neste caso, devemos considerar a preocupação de um pai idoso com o seu filho. Os laços entre os progenitores e as suas crias são os alicerces das famílias.

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Escola de Ciências de Gestão da Universidade Politécnica de Macau
Blog: http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog
Email: legalpublicationsreaders@yahoo.

7 Jan 2025

Aguentai-vos!

TODA a gente sabe que, se as taxas alfandegárias de Trump prevalecerem, a economia europeia, já de si estagnada por causa das despesas com a guerra da Crimeia e com a perda do petróleo e do gás russos a baixo preço, vai ser ainda mais duramente atingida.

O risco de uma crise levar ao fracasso e à desagregação do bando dos 27 existe e até o chanceler alemão Scholz já o percebeu.

Assim como o próximo xerife-mor ianque que, para já, escolheu sabiamente para liderar o Departamento da Energia um grande empresário do petróleo, para a Saúde um ativista antivacinas e para a Educação um gorila que, além do mais, é empresário de wrestling, aquela tão norte-americana luta em ringue com cordas e árbitro.

Como escreve o colunista do britânico “The Guardian”, Simon Tisdal, afinal, a União Europeia não passa de um guloso sem escrúpulos “discutindo tostões sobre quem fica com os assentos acolchoados da Comissão, como se isso fosse decisivo num mundo caótico e predador” e até Macron considera que “a Europa é uma frágil ovelha rodeada de lobos”.

É notório que Trump, o “lobo” menos que rasca e mais que apalhaçado da “América Primeiro”, representa uma certa rutura na alcateia da política externa norte-americana desde o pós-guerra, para a qual a Europa não está preparada- As escolhas da sua próxima administração provocam calafrios e são a prova provada da sua intenção de aplicar os planos que anunciou durante a campanha eleitoral, desde aplicar à Ucrânia uma “solução para o fim da guerra” até ao agravamento radical de uma guerra comercial com a Europa. “Os bárbaros estão à porta”, avisa o mesmo Tisdal que escreve com sotaque hebraico.

*

DEPOIS de um périplo quase à sorrelfa, por todas as capitais da União Europeia, durante outubro e novembro, António Costa que acaba de ser rotulado por Ursula von Leyen como indivíduo pertencente a uma minoria étnica, vai assumir formalmente o cargo de presidente do Conselho Europeu, um cargo de penacho que sempre foi entreque a rafeiritos cautelosos sem propensão para fazer ondas. Sai das mãos do belga Charles Michel, um careca muito alto e extrovertido, mas ultra obediente a quem de facto manda na coisa.

Além de provar as ideias que têm condimentado o apresigo da União, Costa tem tido como objetivo imediato escabichar as prioridades de cada chefe de Estado e de Governo, no bando dos 27, e começar a explanar também as prioridades do seu mandato de dois anos e meio.

À cabeça dessa lista está religiosamente a manutenção do apoio incondicional à Ucrânia, nem que tenha de lhe enviar um saco de fisgas e outro de mocas de Rio Maior, assim como o alargamento da EU com foguetório de potência global.

Há duas semanas o Charles belga disse ter a certeza de que o seu sucessor vai ser um indefectível “guardião de unidade” entre os Estados membros, sobretudo quando a EU enfrenta grandes desafios económicos e geopolíticos.

A presidência a dar na sexta-feira ao filho de Maria Antónia Pala, que é meio irmão de Ricardo Costa, coincide, assim, com a presidência da loira e donairosa maltesa Roberta Metsola no Parlamento Europeu e com a liderança de outra loira ainda mais loira, a tal von Leyen na liderança da Comissão Europeia. Mas a última palavra pertencerá sempre a Donald Trump, nem que seja através de um megafone instalado no cadeirão mais apropriado da NATO.

“Quem tem fome não tem escolha. O seu espírito não vem de onde ele gostaria, mas da fome”, assim falava, não Zaratustra, mas o grande escritor suíço que também era arquiteto, Max Frisch, e nos deixou obras primas como “Biedermann e os Incendiários” e “Andorra”.

*

Mariano José Pereira da Fonseca, filósofo, escritor e primeiro Marquês de Maricá, viveu entre 18 de maio de 1848, no Rio de Janeiro, deixando escrito:

“A vitória de uma fação política é ordinariamente o princípio da sua decadência pelos abusos que a acompanham.”

Talvez isto baste para que percebamos as razões por que o território mundial em guerra aumentou dois terços nos últimos três anos, ou seja, passou de 2,8% da superfície do planeta em 2021 para os 4,6 em 2024.

Claro que foi em tempos imemoriais, mas, perante isto, Gonçalo M. Tavares apenas conseguiu dizer:

“Catar pulgas seria, então, um ato físico que permitiria que os primatas se aproximassem uns dos outros, em tom amigável, e assim começassem a comunicar.”

Mas não foi o que aconteceu e até a Albânia tem há onze anos um primeiro-ministro de tez acobreada, bigode farto e calvície absoluta que se chama Edi Rama e deixou os EUA transformarem o seu pequeno país balcânico na maior base militar na Europa que agora têm na têm na Europa. Edi é também chefe do PS albanês e quere agora entrar para a NATO e seguidamente para a União Europeia, onde os neofascistas já fazem parte de vários governos, como acontece na vizinha Itália, na Bélgica, Holanda, na Suécia, na Noruega e na Finlândia.

Pensando em tudo isto, dei-me a recordar um Walt Whitman ainda condoído pela morte, assassinado, de Abraham Lincoln, entrando por uma elegia que começa com os versos:

“A última vez que os lilases floriram no jardim junto da porta

E, à noite, o grande astro se inclinou a ocidente no céu,

Lamentei e hei-de lamentar o regresso eterno da primavera.

Regresso eterno da primavera, trazes-me sempre esta mesma trindade,

O perpétuo florescer do lilás, o astro que se inclina a ocidente

E o pensamento daquele que amo.”

Fernando Pessoa, atingido profundamente pelo célebre poema do autor das “Flores de Erva”, gritou para a outra banda do Atlântico:

“De aqui, de Portugal, todas as épocas no meu cérebro,

Saúdo-te, Walt, saúdo-te meu irmão em Universo,

Ó sempre moderno e eterno, cantor dos concretos absolutos,

Concubina fogosa do universo disperso,

Grande pederasta roçando-te contra a diversidade das coisas

Sexualizado pelas pedras, pelas árvores, pelas pessoas, pelas profissões,

Cio das passagens, dos encontros casuais, das meras observações,

Meu entusiasta pelo conteúdo de tudo,

Meu grande herói entrando pela Morte dentro aos pinotes,

E aos urros, e aos guinchos, e aos berros saudando Deus.”

Claro que Pessoa não era uma pessoa qualquer e até conseguia lavrar horóscopos e haver tido um tempo em que também fazia anos, mas eu não ignoro serem muitas as almas aguerridas que apoiam incondicionalmente os norte-americanos, mesmo que tal nos ponha a todos muito perto de uma III Guerra Mundial.

Grande azar, sermos nós a escrever as derradeiras palavras da história dos primatas, ou seja, a catar pulgas a alguém.

Aguentai-vos!

27 Nov 2024

Comércio | China melhor preparada para retaliar contra Trump

Pequim está melhor preparada a nível de legislação para retaliar contra sanções e outras medidas punitivas, afirmou ontem um investigador português, face à previsível intensificação da guerra comercial com Washington, após a eleição de Donald Trump.

Rosendo Guimarães da Costa, candidato a doutoramento em Direito internacional pela Universidade de Ciência Política e Direito da China, destacou à agência Lusa a promulgação, nos últimos anos, de legislação abrangente, incluindo a Lei Antimonopólio e a Lei Contra Sanções Estrangeiras, que permite a Pequim adoptar contramedidas extraterritoriais contra uma “vasta gama de intervenientes”.

“Os próprios Estados Unidos ou a Europa têm este tipo de mecanismo, no que é chamado o ‘efeito de Bruxelas’”, explicou o português, radicado em Pequim há mais de dez anos.

A China foi apanhada desprevenida durante o primeiro mandato de Donald Trump, que lançou uma intensa guerra comercial e tecnológica contra o país asiático, que incluiu a imposição de taxas alfandegárias punitivas sobre milhares de milhões de dólares de importações oriundas da China, sanções contra empresas – chave chinesas, como a Huawei, e controlos mais apertados sobre o investimento e acesso por entidades chinesas a alta tecnologia produzida nos EUA.

Nos últimos oito anos, no entanto, o país asiático introduziu novas leis que lhe permitem colocar empresas estrangeiras numa lista negra, impor as suas próprias sanções e cortar o acesso a cadeias de abastecimento cruciais.

O investigador português destacou a aplicação extraterritorial desta nova legislação, exemplificando com a Lei Antimonopólio, que permite punir uma empresa que não esteja sediada na China, desde que tenha qualquer tipo de relação comercial no país asiático, a Lei da Segurança Nacional de Hong Kong, que pode ser aplicada sobre não residentes na região semiautónoma, ou a Lei da Cibersegurança, que prevê também a punição de entidades que não estejam na China.

“A China tem actualmente instrumentos muito fortes, como a Lei Antimonopólio, que foi revista e que pode ser aplicada como arma de arremesso para efeitos proteccionistas”, frisou. “A lista negativa, criada pelo ministério do Comércio chinês, pode também proibir, restringir e limitar o acesso das empresas estrangeiras ao mercado chinês”, explicou.

Recado deixado

Nos últimos meses, Pequim fez já alguns avisos, incluindo proibir as empresas chinesas de fornecer componentes críticos à Skydio, a maior fabricante de “drones” dos EUA e fornecedora das Forças Armadas ucranianas.

Pequim também ameaçou incluir a PVH, cujas marcas incluem Calvin Klein e Tommy Hilfiger, na sua “lista de entidades não confiáveis”, uma medida que pode cortar o acesso da empresa de moda ao enorme mercado chinês.

Trump prometeu impor taxas de 60 por cento sobre as importações oriundas da China, o que teria um impacto no crescimento da segunda maior economia do mundo de até dois pontos percentuais, segundo analistas.

25 Nov 2024

Análise | Pequim e UE devem restaurar confiança política

China e União Europeia (UE) encontram-se num momento crítico para restaurar a confiança política, face às incertezas suscitadas pelo regresso de Donald Trump ao poder nos Estados Unidos, afirmaram diplomatas e especialistas chineses.

Citado pelo jornal de Hong Kong South China Morning Post, o vice-ministro dos Negócios Estrangeiros chinês responsável pelos assuntos europeus, Cao Lei, disse que a vitória eleitoral de Trump pode ser “o ponto de viragem dos [nossos] tempos” e instou Bruxelas e Pequim a corrigirem as clivagens e a melhorarem os laços.

“Ninguém quer voltar à lei da selva, à era do confronto e da Guerra Fria e à hegemonia unilateral. É este o cenário que as relações China – UE enfrentam”, afirmou, durante o lançamento da Rede de Grupos de Reflexão da China sobre a Europa, um ‘think tank’ da Universidade de Estudos Estrangeiros de Pequim, que visa promover um novo entendimento entre as duas partes. China e UE enfrentam a perspectiva de taxas alfandegárias mais elevadas na segunda administração Trump.

A Europa está também atenta a mudanças políticas em Washington sobre a NATO e a guerra na Ucrânia, enquanto procura novo equilíbrio de poder nas relações transatlânticas. Citado pelo SCMP, o director de estudos europeus da Academia Chinesa de Ciências Sociais, Feng Zhongping, afirmou que a Europa é mais importante para a China do que os EUA e que ambas as partes devem ser capazes de restaurar a confiança política.

“Com o regresso de Trump à Casa Branca, uma cooperação reforçada entre China e Europa será benéfica para ambas as partes enfrentarem os desafios no início de uma nova era de incertezas no mundo”, afirmou.

Analistas também alertaram para o facto de Bruxelas poder responder aos desafios do segundo mandato de Trump utilizando Pequim como moeda de troca para se aproximar ainda mais de Washington. As tensões entre China e UE aprofundaram-se nos últimos anos em relação económicas, diferenças ideológicas e à percepção de riscos de segurança, especialmente desde a invasão russa da Ucrânia em Fevereiro de 2022.

A UE classificou a China como um rival sistémico e concorrente económico, decidiu reduzir a dependência de uma cadeia de abastecimento centrada na China e tornou-se mais vocal e assertiva em relação aos direitos humanos, às disputas territoriais no mar do Sul da China e à questão de Taiwan.

As relações bilaterais foram ainda mais perturbadas quando Bruxelas impôs taxas punitivas sobre veículos eléctricos fabricados na China, uma medida que Pequim considerou proteccionista.

Apesar dos conflitos crescentes, Pequim tem repetidamente descrito o bloco como um dos seus parceiros mais importantes na manutenção do multilateralismo e na promoção da globalização. Pequim continua a sublinhar a estreita relação económica – com o comércio bilateral a atingir 2 mil milhões de euros por dia – e o importante papel da UE como principal exportador de tecnologia para a China.

“A China apoia firmemente a integração europeia, mas não deseja que a UE se torne uma fortaleza proteccionista fechada em si própria”, afirmou Cao. “A China apoia a Europa a desempenhar um papel mais importante nos assuntos internacionais, mas não quer que esta escolha um lado e provoque um confronto entre blocos”, acrescentou.

Visões desalinhadas

De acordo com um relatório divulgado durante o evento, existe um profundo desfasamento entre a China e o bloco de 27 membros, em termos das suas percepções mútuas sobre questões que vão desde as relações económicas a questões de segurança.

O relatório referiu que as rápidas mudanças registadas na China têm constantemente “ultrapassado os limites cognitivos da Europa, desafiado as suas experiências históricas e antecipações políticas”. A opinião pública na Europa revela desconforto com as mudanças na política global, incluindo a ascensão da China, bem como preocupação com a dificuldade de exercer influência, vincou o relatório.

“Isto tornou-se uma barreira psicológica que a China e a Europa têm de trabalhar em conjunto para ultrapassar”, lê-se.

Cao observou que “o factor-chave é a percepção”. “O posicionamento da UE em relação à China está continuamente a inclinar-se para a competição, com alguns a afirmarem que a China é uma ameaça à segurança. Este é um problema que deve ser levado a sério”, afirmou.

19 Nov 2024

EUA | Com Trump na Casa Branca, China espera reconciliação

O receio de uma nova guerra comercial existe, mas Xi Jinping espera a reconciliação com os Estados Unidos durante o novo mandato de Donald Trump. O presidente chinês deseja “uma relação sino-americana estável”, com benefícios para os dois países

 

Donald Trump está de regresso à Casa Branca para um segundo mandato como presidente dos Estados Unidos da América (EUA), o que coloca diversas questões sobre o futuro, a começar pelo relacionamento com outra grande potência, a China. Recorde-se que no primeiro mandato de Trump, os dois países protagonizaram uma guerra comercial.

Porém, para já, as palavras de Pequim são de felicitações e esperança de um bom relacionamento nos próximos quatro anos. Ontem, o presidente Xi Jinping felicitou Donald Trump pela vitória nas eleições presidenciais norte-americanas, apelando ao entendimento entre os dois países, após anos de tensões bilaterais, informou a imprensa oficial.

“A história demonstra que a China e os Estados Unidos beneficiam com a cooperação e perdem com a confrontação”, disse Xi Jinping ao presidente eleito dos EUA, citado pela televisão estatal chinesa CCTV. “Uma relação sino-americana estável, saudável e duradoura está em conformidade com os interesses comuns dos dois países e com as expectativas da comunidade internacional”, sublinhou Xi. Estes foram os primeiros comentários do presidente chinês desde a vitória do candidato republicano.

Donald Trump e a rival democrata Kamala Harris prometeram durante a campanha conter a ascensão da China. O magnata republicano prometeu impor taxas de 60 por cento sobre todos os produtos chineses que entram nos EUA.

No entanto, Xi Jinping espera que os dois países “defendam os princípios do respeito mútuo, da coexistência pacífica e da cooperação vantajosa para todos”. Washington e Pequim devem “reforçar o diálogo e a comunicação, gerir adequadamente as suas diferenças, desenvolver uma cooperação mutuamente benéfica e encontrar forma correcta de a China e os Estados Unidos se entenderem nesta nova Era, para benefício de ambos os países e do mundo”, acrescentou.

Xi Jinping e Donald Trump já se encontraram quatro vezes e o presidente eleito dos EUA gabou-se recentemente da sua “relação muito forte” com o líder chinês. Mas a vitória de Donald Trump abre um período de incerteza para as relações económicas sino-americanas, que foram fortemente abaladas durante o primeiro mandato do presidente eleito (2017-2021), quando este desencadeou uma guerra comercial e tecnológica contra Pequim.

A China está a braços com uma recuperação pós-covid difícil, sobrecarregada por fracos níveis de consumo interno e uma grave crise imobiliária, com muitos promotores endividados e preços a cair a pique nos últimos anos. Os principais líderes da Assembleia Popular Nacional (APN), o órgão máximo legislativo da China, estão reunidos esta semana em Pequim, para elaborar um plano de relançamento económico. Muitos analistas acreditam que a vitória de Donald Trump poderá levar os dirigentes chineses a reforçar este programa de medidas, nomeadamente para compensar futuras taxas aduaneiras prometidas pelo republicano.

Uma questão de respeito

Outra reacção do Governo chinês também surgiu na quarta-feira, através de Mao Ning, porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros. “Respeitamos a decisão do povo americano e felicitamos Trump pela sua eleição como presidente”, reagiu o ministério, num curto comunicado.

Um dia antes da vitória do candidato republicano sobre a democrata Kamala Harris, Pequim reafirmou a sua posição de respeito pelo processo eleitoral norte-americano, que considera “um assunto interno” dos EUA. “A nossa política em relação aos Estados Unidos é coerente. Defendemos a gestão das nossas relações com base nos nossos interesses comuns e na cooperação mutuamente benéfica”, sublinhou Mao Ning.

Alguns especialistas sublinharam que o regresso de Trump ao poder pode levar a dimensão do pacote de estímulo fiscal que está a ser negociado pelos legisladores chineses esta semana, no contexto da reunião da APN, até 20 por cento maior do que estava previsto.

Chee Meng Tan, professor de economia empresarial no ‘campus’ da Universidade de Nottingham na Malásia e especialista em política externa chinesa, disse à agência Lusa que apesar de Trump ser mais susceptível de impor um custo económico à China, a postura isolacionista do republicano favorece Pequim a nível geopolítico, particularmente na questão de Taiwan.

Trump acusa Taipé de “roubar” a indústria de semicondutores dos EUA e defende que o território deve pagar a Washington pela sua defesa. A ilha é a principal fonte de fricção entre China e EUA.

Renminbi desvaloriza

Amizades à parte, o que é certo é que a moeda chinesa, o renminbi, caiu ontem para o valor mais baixo desde o início de Agosto face ao dólar norte-americano. O forte movimento da taxa de câmbio não se deve tanto à fraqueza do renminbi, mas à forte subida do dólar, que reflecte os efeitos de uma segunda presidência de Trump, que prometeu baixar os impostos e subir as taxas sobre as importações.

A taxa de câmbio ‘offshore’, que reflecte as transações nos mercados internacionais como Hong Kong, era de 7,1980 yuan por um dólar, às 10h30 locais. A moeda chinesa perdeu cerca de 1,5 por cento do seu valor face à moeda norte-americana desde a manhã de quarta-feira, quando começaram a ser conhecidos os primeiros resultados das eleições. Trata-se também de uma descida de 3,17 por cento em relação ao seu último pico, que foi atingido depois de Pequim anunciar um pacote de estímulos económicos, no final de Setembro. É também a primeira vez que o renminbi desceu abaixo das sete unidades face ao dólar, pela primeira vez desde Maio de 2023.

A taxa de câmbio ‘onshore’, que reflecte as transações nos mercados domésticos, acumulou uma queda de 1,07 por cento desde a manhã de quarta-feira, e de 2,34 por cento face ao seu pico mais recente, que remonta igualmente ao final de Setembro. Nessa altura, estava a ser negociada a cerca de 7,1782 por dólar.

O Banco Popular da China (banco central) reduziu ontem em 0,93 por cento, para 7,1659 yuan por dólar, a taxa de câmbio oficial que fixa todos os dias e que é fundamental para a cotação da taxa ‘onshore’, que só pode oscilar num intervalo máximo de 2 por cento.

Uma das possíveis manobras de Pequim, no caso de Trump agravar as taxas sobre produtos chineses, é precisamente permitir a desvalorização do renminbi, o que tornaria mais atractiva as importações chinesas com moedas mais fortes.

As reacções asiáticas

Na Ásia as reacções à vitória de Trump têm-se sucedido. No caso do Japão, o primeiro-ministro confirmou que teve ontem uma conversa telefónica com o vencedor das eleições norte-americanas e que os dois concordaram reunir-se “o mais rápido possível” e fortalecer a aliança. Durante a conversa de cinco minutos, o líder japonês, Shigeru Ishiba, disse que os dois vão combinar encontrar-se o mais rápido possível. Donald Trump, por sua vez, disse esperar falar com Ishiba “cara a cara”.

Além disso, concordaram continuar a discutir activamente o reforço da aliança entre o Japão e os EUA “de muitos pontos de vista”, porque esta não abrange apenas aspectos económicos, referiu Ishiba.

O porta-voz do Governo japonês, Yoshimasa Hayashi, sublinhou que a aliança é “a base da diplomacia e da segurança do Japão”, referindo-se à política externa japonesa e à aliança militar em vigor desde 1960, que permite a presença de bases militares norte-americanas em solo japonês, além do compromisso de defesa mútua.

“Continuaremos a nossa cooperação em vários domínios e como parceiros globais com um papel fundamental na manutenção de uma ordem internacional livre e aberta, reforçando simultaneamente a capacidade de dissuasão da nossa aliança”, afirmou Hayashi.

Ishiba, que tomou posse a 1 de Outubro, descreveu o líder republicano como amigável, no final da conversa. “Desejámos um ao outro o melhor para o nosso trabalho”, notou Ishiba aos meios de comunicação social.

A conversa telefónica aconteceu depois de, na quarta-feira, Ishiba ter felicitado Trump pela boa prestação nas eleições contra a democrata Kamala Harris. “Os meus sinceros parabéns a Donald Trump. Estou realmente ansioso para trabalhar em estreita colaboração consigo para fortalecer ainda mais a aliança Japão-EUA e promover um Indo-Pacífico livre e aberto”, disse o primeiro-ministro japonês na rede social X.

O regresso de Trump à Casa Branca pode significar que o líder republicano volte a exigir que o Japão aumente as contribuições por acolher bases norte-americanas.

Destaque ainda para a reacção da Coreia do Sul, com o presidente, Yoon Suk-yeol, a felicitar Trump. “Sob a sua forte liderança, o futuro da aliança entre a Coreia do Sul e os Estados Unidos da América será melhor,”, reagiu Yoon nas redes sociais, segundo a agência francesa AFP. “Aguardo com expectativa a continuação da nossa estreita cooperação no futuro”, acrescentou.

Em ruptura com o antecessor Moon Jae-in, Yoon adoptou uma linha mais dura com a Coreia do Norte, que possui armas nucleares, ao mesmo tempo que melhorou os laços com Washington, um dos aliados de Seul em matéria de segurança.

No seu primeiro mandato, Trump encontrou-se com o presidente norte-coreano três vezes, começando com uma cimeira histórica em Singapura, em Junho de 2018, mas sem fazer grandes progressos nos esforços para desnuclearizar a Coreia do Norte.

Desde o fracasso de uma segunda cimeira em Hanói, em 2019, Pyongyang abandonou a diplomacia e redobrou os esforços para desenvolver o arsenal militar, rejeitando as propostas de diálogo de Washington. Trump também se encontrou com Kim na fronteira entre as duas Coreias, no final de Junho de 2019, e deu 20 passos em território da Coreia do Norte.

Do lado da Índia, outra grande potência mundial e um protagonista económico a ter em conta, as felicitações chegaram logo no dia da eleição americana. O primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, felicitou Donald Trump pela “vitória histórica” nas eleições.

“Estou ansioso por renovar a nossa colaboração para reforçar ainda mais a (…) parceria global e estratégica” entre a Índia e os Estados Unidos, declarou Modi nas redes sociais, segundo a agência francesa AFP. “Vamos trabalhar juntos para melhorar a condição dos nossos povos e promover a paz, a estabilidade e a prosperidade no mundo”, acrescentou o chefe do governo ultranacionalista hindu.

Ucrânia | Nato quer discutir com Trump ligações a países

O secretário-geral da NATO anunciou ontem querer discutir com o Presidente eleito dos EUA, Donald Trump, o reforço de laços da Rússia com a Coreia do Norte, o Irão e a China contra a Ucrânia. “Estou ansioso por me sentar com o Presidente Trump e ver como vamos fazer enfrentar conjuntamente esta ameaça”, disse Mark Rutte à chegada à cimeira da Comunidade Política Europeia, que reúne cerca de 40 líderes em Budapeste para debater “as crises” europeias, num contexto de mudanças políticas nos Estados Unidos.

“Agora que os [militares] norte-coreanos estão destacados na Rússia, vemos que cada vez mais a Coreia do Norte, o Irão, a China e, claro, a Rússia estão a colaborar e a trabalhar em conjunto contra a Ucrânia”, acrescentou.

Rutte manifestou preocupação pelo facto de a Rússia ter recorrido ao apoio da Coreia do Norte em troca de fornecer tecnologia a esse país, o que, na sua opinião, “ameaça o futuro” tanto da Europa como dos Estados Unidos e dos países do Indo-Pacífico. “Estes são novos desenvolvimentos realmente perigosos e temos de falar sobre eles hoje”, reiterou. O responsável da NATO alertou ainda que, “muito em breve, os próprios Estados Unidos também estarão sob a ameaça destes últimos avanços tecnológicos graças ao facto de a Rússia ter dado os seus mais recentes conhecimentos e tecnologia à Coreia do Norte”.

8 Nov 2024

EUA | Trump regressa à Casa Branca. China espera relação pacífica

Donald Trump ganhou ontem as eleições presidências norte-americanas. O magnata nova-iorquino vai regressar à Casa Branca depois de derrotar Kamala Harris nos principais estados-chave, naquela que apelidou como uma “vitória política nunca antes vista”. A China reagiu ao desejar um relacionamento pacífico entre as duas potências

 

Donald Trump prometeu curar os Estados Unidos da América (EUA), mas não revelou o tratamento. Este foi um dos destaques do discurso de vitória do candidato republicano, que irá regressar à Casa Branca, numa altura em que a vitória estava praticamente garantida com 267 delegados do Colégio Eleitoral, ou seja, 51,2 por cento. Num país onde o Presidente é eleito por sufrágio indirecto, o Colégio Eleitoral é constituído por 538 delegados que representam os 50 estados norte-americanos. Para um candidato se singrar vencedor, precisa de 270 votos.

À hora em que Trump fez o discurso da vitória, já tinha ganho estados decisivos, como a Pensilvânia, Geórgia ou Carolina do Norte, sempre uns passos à frente da democrata Kamala Harris. A Geórgia, estado composto por uma grande população afro-americana, deu a vitória a Trump, atribuindo-lhe mais 16 votos.

Nestas presidenciais destacaram-se os resultados em mais cinco estados-chave, os chamados “swing states”, pelo facto de a vitória costumar oscilar entre o partido republicano ou democrata. Neste ciclo eleitoral, estes estados foram o Arizona, Wisconsin, Pensilvânia, Michigan e Nevada.

“É uma vitória política nunca antes vista no nosso país”, afirmou o magnata nova-iorquino a milhares dos seus apoiantes reunidos no Centro de Convenções de Palm Beach, no estado da Florida, depois de ter acompanhado a noite eleitoral no seu ‘resort’ em Mar-a-Lago.

Falando junto da mulher, Melania Trump, do candidato a vice-Presidente, J.D. Vance, e do presidente da Câmara dos Representantes, o candidato republicano disse que, com esta vitória, irá “ajudar o país a curar-se”.

Por seu lado, J.D. Vance referiu que “sob a liderança do Presidente Trump nunca vamos parar de lutar por vocês”. “Acho que acabamos de testemunhar o maior regresso político da história dos EUA. Depois do maior retorno político da história americana, lideraremos o maior retorno económico da história americana — sob a liderança de Donald Trump”, sublinhou o vice-presidente.

Trump prometeu que os próximos anos irão constituir “a era de ouro para a América”, referindo-se ao período de campanha eleitoral como “o maior movimento político de todos os tempos”.

O Presidente eleito não acrescentou muitos detalhes às promessas políticas feitas durante a campanha, declarando apenas que o país “precisa muito de ajuda”, garantindo que vai “consertar tudo”.

A desilusão dos democratas

A festa fez-se também pelos republicanos junto à Trump Tower, em Nova Iorque. Ainda a contagem dos votos nos ‘swing states’ ia a meio e já três dezenas de eleitores republicanos enchiam o passeio em frente à Trump Tower, cantando vitória antecipada nas presidenciais norte-americanas.

“Tentaram matá-lo, mas não conseguiram. Porque ele é o escolhido. Nós somos o povo e nós escolhemos Donald Trump. O ‘Estado profundo’ [Deep State em inglês] tem de acabar”, gritava uma mulher enquanto erguia uma bandeira com o ‘slogan’ de campanha do republicano: ‘Make America Great Again’.

A polícia estava presente no local e várias grades de protecção foram montadas ao redor do recinto. À Lusa, um eleitor exaltado dizia que Donald Trump tem de “começar a deportação em massa dos imigrantes ilegais o mais rápido possível”. “Fechem a fronteira, isto tem de acabar. Isto não é terra de ninguém”, disse o homem, que se identificou à Lusa como Sergey, misturando palavras em inglês com espanhol.

“Vou sempre apoiar Donald Trump, porque ele tem sido atacado pela imprensa de esquerda. Ele é um ‘outsider’ que tem desafiado o sistema, os democratas, o Congresso e até os próprios republicanos. Todos esses são falsos e ele é verdadeiro. Por isso é que gosto dele”, acrescentou.

A alguns metros de distância, no Rockefeller Center, onde foram montadas telas gigantes para transmitir a contagem dos votos, o ambiente era completamente oposto, com eleitores democratas desiludidos com a prestação da vice-Presidente, Kamala Harris.

Numa noite de vento forte em Nova Iorque, foram muitos os nova-iorquinos que começaram a desmobilizar assim que Donald Trump começou a conquistar vários estados consecutivamente. No público, vários democratas rezavam e outros levavam as mãos à cabeça de cada vez que Trump conquistava mais votos do colégio eleitoral. Em contrapartida, cada vez que Kamala Harris conseguia subir na contagem, ouviam-se aplausos.

Em Nova Iorque, sem surpresas, foi Kamala Harris quem venceu as eleições presidenciais. No entanto, a nível nacional, Donald Trump acabou a noite a declarar vitória.

China espera pacifismo

Talvez ainda com memórias dos anos da guerra comercial sino-americana, a China foi um dos primeiros países a reagir à vitória de Donald Trump, com uma mensagem de esperança sobre uma relação pacífica entre as duas potências. “Continuaremos a abordar e a gerir as relações entre a China e os Estados Unidos com base nos princípios do respeito mútuo, coexistência pacífica e cooperação mutuamente benéfica”, disse a porta-voz do ministério dos Negócios Estrangeiros, Mao Ning, em conferência de imprensa.

A guerra comercial entre os dois países remonta aos anos do primeiro mandato de Trump na Casa Branca, entre 2017 e 2021. Nesta campanha eleitoral, o candidato ameaçou intensificar esse conflito comercial.

Porém, em declarações à RTP, António Noronha, presidente da Câmara de Comércio Luso-Chinesa, não demonstrou sinais de alarmismo. “Teremos uma relação mais diplomática, uma relação, se calhar, com maior abertura, mas não teremos, com certeza, uma política comercial muito diferente da que temos tido.”

O responsável disse não estar “muito preocupado com a forma como Donald Trump anuncia” por comparação com “o conteúdo das políticas”, que “não serão tão agressivas como as [prometidas] por Kamala Harris, mas serão, sobretudo, políticas proteccionistas”.

“Naturalmente, ‘Europe Last’, e estou convencido que toda esta guerra comercial vai-se manter e vamos ter um sistema proteccionista, onde os EUA vão-se querer proteger daquela contradição que existe em que todos os factores de produção da China são tão distorcidos e subvencionados”, acrescentou.

Volta ao mundo

A Ucrânia foi também um dos primeiros países a dar os parabéns à segunda vitória de Trump. Na rede social X, Volodymyr Zelensky, presidente ucraniano, congratulou Donald Trump por uma “impressionante” “vitória” eleitoral. Zelensky sublinhou que aprecia o “compromisso de Trump com a abordagem ‘paz pela força'” para assuntos globais e que o princípio poderia “aproximar a paz justa na Ucrânia”. “Estou esperançoso que colocaremos isso em acção juntos. Estamos ansiosos por uma era de Estados Unidos da América fortes sob a liderança decisiva do presidente Trump”, disse.

Também o Reino Unido reagiu, com o primeiro-ministro do Reino Unido, Keir Starmer, a felicitar Trump por aquilo que disser ser uma “vitória eleitoral histórica”. “Estou ansioso por trabalhar consigo nos próximos anos”, disse o primeiro-ministro, acrescentando: “Como aliados mais próximos, estamos lado a lado na defesa dos nossos valores comuns de liberdade, democracia e empreendedorismo”.

“Do crescimento e da segurança à inovação e à tecnologia, sei que a relação especial entre o Reino Unido e os EUA continuará a prosperar em ambos os lados do Atlântico nos próximos anos”.

Também Mark Rutte, secretário-geral da NATO, deu os parabéns a Donald Trump, e defendeu que “a sua liderança será novamente a chave para manter a Aliança forte”. Na rede social X, Rutte sublinhou que está “ansioso para trabalhar com Trump novamente para promover a paz por meio da força por meio da NATO”.

Viktor Orbán e Netanyahu foram os primeiros líderes mundiais a felicitar Trump, com o primeiro-ministro húngaro a declarar que a vitória republicana foi “o maior regresso na história dos EUA”. “Parabéns ao Presidente Donald Trump na sua grande vitória. Uma vitória bastante necessária para o mundo”, declarou Viktor Orbán.

No caso de Benjamin Netanyahu, a mensagem foi também destinada a Melania Trump, agora de novo primeira-dama. “Queridos Donald e Melania Trump, parabéns neste grande regresso na história! O vosso histórico regresso à Casa Branca possibilita um novo começo para a América e um poderoso novo compromisso para a grande aliança entre Israel e a América. Esta é uma enorme vitória!”

Portugal também deu os parabéns a Trump. Numa mensagem publicada no site da Presidência da República portuguesa, Marcelo Rebelo de Sousa “felicita o Presidente eleito Donald Trump, desejando-lhe felicidades no novo mandato, na afirmação da relação transatlântica, da democracia e os direitos humanos, a construção da paz e do progresso sustentáveis”.

Na mesma nota, Marcelo recorda que “Portugal foi o primeiro país neutral a reconhecer a independência dos Estados Unidos da América, a importância da comunidade portuguesa neste país, bem como a colaboração durante o seu primeiro mandato, nomeadamente a reunião na Casa Branca em 2018 e durante a pandemia”.

Também Luís Montenegro, primeiro-ministro, destacou esta vitória, recorrendo à rede social X. “Parabéns, Presidente Donald Trump. Estou empenhado em trabalharmos em colaboração estreita, no espírito da longa e sólida relação entre Portugal e os Estados Unidos, a nível bilateral, da NATO e multilateral.”

7 Nov 2024

EUA | Alta diplomata visita Taiwan após críticas de Trump à ilha

A representação dos Estados Unidos em Taiwan anunciou ontem a visita de uma diplomata de alto nível ao território, depois de o candidato presidencial republicano, Donald Trump, ter reiterado recentemente críticas a Taipé.

Em comunicado, o American Institute in Taiwan (AIT) afirmou que Ingrid Larson, directora-geral do escritório do AIT em Washington, vai estar em Taiwan até 1 de Novembro, como parte do “forte compromisso dos EUA com Taiwan e para fazer avançar a crescente parceria EUA-Taiwan”.

“Durante a sua visita a Taiwan, [Larson] discutirá a colaboração contínua entre os EUA e Taiwan em questões de interesse mútuo, como a segurança regional, o comércio e o investimento mutuamente benéficos e os laços educacionais, culturais e interpessoais”, indicou a agência.

A visita surge depois de Trump ter reiterado ataques a Taiwan na sexta-feira, afirmando que a ilha roubou a indústria de semicondutores dos EUA e que deveria pagar a Washington pela sua defesa. “Taiwan roubou-nos a nossa indústria de ‘chips’. Querem protecção, mas não nos pagam para isso. A máfia faz-nos pagar dinheiro”, disse Trump, durante uma conversa com um conhecido apresentador norte-americano.

30 Out 2024

EUA | Trump sofre atentado durante comício na Pensilvânia

O ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump, candidato republicano às eleições de Novembro, foi ferido numa orelha enquanto realizava um comício eleitoral neste sábado na Pensilvânia, num incidente que chocou o país a poucos meses das eleições de Novembro.

“Fui baleado com uma bala que perfurou a parte superior da minha orelha direita”, disse Trump logo após o atentado na cidade de Butler, na Pensilvânia (nordeste), um estado crucial nas eleições presidenciais.

Trump, de 78 anos, acabava de começar o seu discurso com um dos habituais temas sobre a entrada massiva de migrantes no país, da qual culpa o Presidente democrata, Joe Biden, indica o Sapo24.

Enquanto falava, ouviram-se tiros, levou a mão à orelha e atirou-se para o chão atrás do púlpito antes de ser imediatamente cercado por agentes dos serviços secretos, enquanto o público gritava horrorizado.

Depois de alguns instantes, Donald Trump levantou-se, despenteado e sem o seu boné vermelho, cercado pelos agentes. “Deixem-me calçar meus sapatos”, foi ouvido a dizer. O ex-presidente saiu do palco erguendo o punho e escoltado por seguranças.

Um participante do comício morreu e outros dois estão em estado crítico, segundo os serviços secretos, embora o promotor do condado de Butler tenha falado apenas de um ferido grave, acrescenta a publicação.

O autor dos disparos, que estava situado “num ponto alto” fora do recinto onde o magnata republicano realizava o seu comício, também morreu, disse o promotor Richard Godlinger. Por sua vez, os serviços secretos disseram que o agressor foi “neutralizado”.

“Não sei como chegou ao local onde estava, mas estava fora do recinto. E acho que vamos precisar descobrir como ele chegou lá”, disse o organizador.

“O presidente Trump agradece às forças da lei e aos primeiros socorristas pela rápida acção durante este acto atroz. Ele está bem e está a ser examinado num centro médico local. Haverá mais detalhes”, disse o porta-voz de campanha, Steven Cheung, num comunicado.

Um funcionário da Casa Branca anunciou que Biden conversou com Trump sobre o incidente. “Esta tarde, o Presidente Biden falou com o ex-presidente Trump”, disse, acrescentando que o actual Presidente dos EUA será informado dos detalhes do ataque na manhã de domingo.

Condenação presidencial

Mais cedo, o próprio Biden, possível rival do republicano nas eleições de 5 de Novembro, declarou que “não há lugar para este tipo de violência”. “Não podemos ser assim”, disse antes de acrescentar que está “agradecido por saber que está a salvo e bem”, disse em comunicado.

“Estou a rezar por ele e pela sua família e por todos que estavam no comício, enquanto aguardamos mais informações”, disse antes de acrescentar que “devemos unir-nos como nação para condenar” a violência.

Este era o último comício de Trump antes da convenção republicana que está programada para acontecer em Milwaukee (Wisconsin) a partir de segunda-feira.

A sua equipa anunciou que Trump participará à mesma, onde deve ser oficialmente nomeado como candidato para enfrentar Joe Biden nas eleições de 5 de Novembro. As reações não demoraram a chegar. “Horrorizado”, disse o líder da maioria democrata no Senado, Chuck Schumer.

O ex-presidente Barack Obama também reagiu na rede social X, dizendo que se sentia “aliviado” por Trump “não ter sido gravemente ferido” e aproveitou para pedir “civismo e respeito à política”, em um país muito polarizado.

Elon Musk, magnata proprietário da Tesla e do X, reagiu declarando publicamente o seu apoio a Donald Trump nas eleições e desejando-lhe uma “rápida recuperação”. Entre os participantes do comício, também houve reações fortes.

“Ouvi vários tiros. O homem ao meu lado foi atingido na cabeça, morreu instantaneamente e caiu no fundo das arquibancadas”, disse um homem identificado apenas como Joseph à rede NBC News. As consequências deste acontecimento para a campanha são imprevisíveis.

Nos últimos dias, a atenção estava focada no estado físico e mental de Joe Biden, de 81 anos, e sua capacidade de enfrentar Donald Trump, após seu desastroso debate de 27 de Junho. Uma dúzia de deputados agora pede que se retire da corrida presidencial.

A vice-presidente Kamala Harris, uma possível alternativa a Biden, voltou a assegurar sua lealdade e confiança ao actual presidente, num evento de campanha na Filadélfia, pouco antes do comício de Donald Trump.

“Esta é a eleição mais existencial, consequente e importante das nossas vidas e sempre soubemos que seria difícil”, disse.

Atirador identificado

O FBI identificou o autor do disparo contra o ex-Presidente Donald Trump como um homem branco, 20 anos, natural da Pensilvânia, chamado Thomas Mathiew Crooks.

“O FBI identificou Thomas Matthew Crooks, 20 anos, de Bethel Park, Pensilvânia, como sendo o indivíduo envolvido na tentativa de assassinato do ex-presidente Donald Trump no dia 13 de Julho, em Butler, Pensilvânia”, refere o FBI, em comunicado, citado pelos canais norte-americanos NBC e CBS.

O atirador, que foi abatido por agentes dos serviços secretos, encontrava-se num telhado fora do perímetro do comício, informaram as autoridades.

15 Jul 2024

Donald Trump

Esta semana, uma das mais importantes notícias a nível internacional foi Donald Trump, ex-Presidente americano e actual candidato às próximas eleições presidenciais, ter sido considerado culpado pelo tribunal das diversas acusações que sob ele pendiam, facto muito preocupante em termos sociais. Trump foi condenado por 34 infracções penais e a sentença será proferida no próximo dia 11 de Julho. A decisão do tribunal fez de Trump o primeiro ex-Presidente da história dos EUA a ser acusado de crimes após deixar o mais alto cargo do país.

Foi divulgado que o júri confirmou, através das provas fornecidas pelo advogado de acusação, que Trump tinha falsificado documentação comercial em conluio com o seu advogado, Michael Cohen. À primeira vista, Trump tinha pagado, como habitualmente, os honorários de Cohen. Na verdade, essa verba incluía 130.000 dólares que se destinavam a comprar o silêncio da estrela de filmes pornográficos Stormy Daniels para não divulgar a relação de natureza sexual que manteve com Trump. O processo surgiu porque os registos do paradeiro dos fundos empresariais não correspondiam à realidade. Dado que Trump se candidatou às próximas presidenciais, o desfecho do julgamento irá sem qualquer dúvida ter impacto nestas eleições.

Trump ficou em liberdade sob fiança durante todo o julgamento. Após dois dias de deliberações dos 12 jurados, o juiz Juan Merchan declarou Trump culpado, no passado dia 30 de Maio. Até que a sentença seja proferida a 11 de Julho, Trump continuará em liberdade sob fiança.

Cada uma das 34 infracções implicam uma multa até 5.000 dólares e/ou a uma pena até 4 anos de prisão, o que significa que Trump pode ser multado até 170.000 dólares e/ou condenado a 136 anos de prisão. No entanto, o juiz vai ter em conta a idade de Trump, o seu passado criminal (se o tiver), o seu contributo para os Estados Unidos e outros factores, antes de tomar a decisão final. Alguns órgãos de comunicação assinalam que em Nova Iorque é relativamente raro que uma pessoa sem passado criminal seja condenada a uma pena de prisão apenas por falsificar documentação comercial. Pensa-se que Trump possa vir a ser condenado a pagar uma multa ou que receba uma pena suspensa.

Do ponto de vista jurídico, Trump ainda tem o direito de recorrer da sentença depois de ser condenado. Embora ainda não se saiba se Trump possa ser inocentado na segunda instância, a decisão destaca que Trump não está acima da lei dos EUA e que as suas acções são reguladas por essa mesma lei.

A possibilidade de Trump continuar na corrida para a presidência depois de ser condenado tem preocupado muitas pessoas. De acordo com a Constituição dos EUA, para que alguém se candidate à Presidência tem de ter mais de 35 anos, ter nascido no país e aí residir há pelo menos 14 anos. A Constituição não estipula explicitamente que quem cometeu um crime não possa candidatar-se à Presidência. Por conseguinte, a condenação não irá afectar a elegibilidade de Trump às próximas eleições.

Embora Trump possa continuar a participar nas eleições, este caso pode afectar o apoio dos eleitores. Um estudo da Bloomberg News/Morning Consul apurou que 53 por cento dos eleitores de estados-chave afirmaram que se recusariam a votar em Trump. Um outro estudo, da Universidade de Quinnipiac, também aponta que 6 por cento dos apoiantes de Trump declararam que podem mudar o sentido do seu voto.

Estes resultados podem mudar com a passagem do tempo e com a evolução dos acontecimentos sociais, por isso só podem ser usados como uma referência. A questão-chave é se os americanos vão votar em Trump dia 5 de Novembro, o dia da eleição presidencial.

Não podemos antever qual o candidato que o povo americano vai escolher para ser o próximo Presidente dos Estados Unidos. No entanto, enquanto chefe de estado, o Presidente dos EUA tomará decisões que terão um profundo impacto nas questões mundiais. O impacto nas relações sino-americanas fala directamente ao coração dos chineses em todo o mundo. O resultado ideal desta eleição será que o próximo Presidente dos EUA possa prestar mais atenção ao desenvolvimento harmonioso das relações sino-americanas, promova a cooperação e reduza os litígios. Com isso todo o mundo seria abençoado.

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Escola de Ciências de Gestão do Instituto Politécnico de Macau
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4 Jun 2024

A eleição de Trump

O Supremo Tribunal do Colorado decidiu no passado dia 19 de Dezembro que o ex-Presidente Donald Trump violou a Constituição dos Estados Unidos devido ao seu alegado envolvimento em 2021 no ataque ao Capitólio, declarando que, naquele Estado, não reúne condições para se candidatar às eleições primárias. Trump recorreu da decisão junto do Supremo Tribunal Federal e o recurso foi aceite. Isto significa que os tribunais americanos decidirão se Trump poderá ou não ser o candidato republicano às eleições presidenciais. Como é muito provável que Trump venha a representar o Partido Republicano nestas eleições, a decisão dos tribunais influenciará directamente a escolha do próximo Presidente dos Estados Unidos.

O caso começou no Tribunal Distrital do Colorado. Um grupo de pessoas entrou com uma acção judicial alegando que Trump não tinha condições para participar nas eleições primárias no Colorado. Depois de perder nesta instância, o grupo recorreu ao Supremo Tribunal do Estado. O Supremo decidiu por 4 contra 3 que Trump não estava habilitado a concorrer às eleições devido ao seu envolvimento no ataque ao Capitólio. Trump violou o Artigo 3 da 14ª Emenda da Constituição dos Estados Unidos.

O Artigo 3 da 14ª Emenda da Constituição dos EUA foi redigido pelo antigo Presidente Abraham Lincoln em Julho de 1861 durante a Guerra Civil. Este artigo reflectia a aposta de Lincoln na justiça e legalidade das escolhas dos americanos e lançava as bases para que os Estados Unidos nunca mais se envolvessem em conflitos armados internos.

Foi aprovado em 1868, três anos depois do fim da Guerra Civil. O artigo estipula que todos os membros do Congresso, funcionários do Governo e de órgãos governamentais, agentes de autoridade e funcionários de órgãos judiciais que tenham jurado defender a Constituição dos Estados Unidos, e que estejam no exercício das suas funções, se participarem em motins ou rebeliões ficarão impedidos de se candidatar ao Congresso, à Presidência e à Vice-Presidência, e não podem ocupar qualquer cargo público.

Mas o caso do Colorado não foi único. O Secretário de Estado do Maine anunciou a 28 de Dezembro último, que Trump seria desclassificado como candidato republicano às primárias. Trump recorreu.

Em contrapartida, o Minnesota decidiu em Novemvro passado que Trump tinha condições para se candidatar às primárias, tendo-se passado o mesmo no Michigan. Embora alguns grupos tenham contestado a legalidade da candidatura entrando com uma acção a 18 de Dezembro, o Supremo Tribunal do Estado decidiu a 27 de Dezembro a favor de Trump, com o fundamento de que as questões levantadas pelos eleitores não devem ser analisadas pelo tribunal.

A partir destes incidentes, podemos prever que outros semelhantes lhes sucederão. Mas Trump entrou com uma acção directamente no Supremo Tribunal Federal sem passar pelos tribunais estaduais, e espera naturalmente vir a ter a última palavra e resolver o assunto de vez. Derek Muller, um professor americano de lei eleitoral disse que a decisão do Colorado constituiu uma grande ameaça para a campanha de Trump e que de alguma forma incentivou tribunais de outros estados a seguirem-lhe o exemplo. O Supremo Tribunal Federal já deferiu o recurso de Trump, agora resta saber a decisão do Supremo Tribunal dos Estados Unidos, dominado pelos conservadores. A frase “o caso foi aceite, mas o veredicto é desconhecido” é a melhor maneira de descrever a situação actual de Trump.

Como é que uma questão eleitoral pode ser resolvida em Tribunal? Ronna McDaniel, Presidente do Comité Nacional Republicano, afirmou que as decisões dos tribunais interferem nas eleições, o que é uma boa afirmação. É claro que é impossível que os Estados Unidos permitam que quem participou em motins ou rebeliões se candidate à presidência do país. Os motins e as rebeliões estão claramente definidos na lei. A partir daqui, é adequado que os tribunais determinem se Trump tem ou não condições para se candidatar à Presidência. No entanto, Trump nunca foi julgado pelo ataque ao Capitólio e, portanto, nunca foi condenado por este crime. Se agora se alegar que ele violou o Artigo 3 da 14ª Emenda da Constituição, é o mesmo que condená-lo sem julgamento legal. Obviamente, que a frase proferida pelo Supremo Tribunal do Michigan “as questões levantadas pelos eleitores não devem ser analisadas por este tribunal” não pode ser o único princípio jurídico a ser utilizado para a resolução do problema.

Independentemente do rumo que as coisas tomem, podemos ter a certeza que este processo vai chegar ao fim muito em breve. Para além de Trump e do Partido Republicano quererem obter resultados o mais depressa possível, o tribunal também compreende que se não tomar uma decisão rápida, não será possível saber quem vai ser o candidato republicano, o que desagradará aos americanos. Estas questões vão para lá de saber se Trump tem condições para se candidatar às primárias. Mesmo assumindo que Trump ganha a acção, a eleição fica sempre ensombrada.

O Artigo 3.º da 14.ª Emenda à Constituição regula motins e rebeliões. Pode imaginar-se o impacto do envolvimento de um candidato presidencial numa destas situações. Além disso, Trump esteve recentemente ligado a numerosos casos. Por exemplo, em Nova Ior que, esteve envolvido num caso de fraude comercial, tendo o Procurador-Geral do Estado pedido uma indemnização de 370 milhões de dólares e recomendado que o tribunal emitisse uma ordem proibindo-o a ele, aos seus dois filhos e às pessoas envolvidas no caso de realizarem operações comerciais no Estado de Nova Iorque para o resto da vida. Este processo revela desonestidade e não o vou agora analisar agora porque já o fiz em colunas anteriores. O caso de Nova Iorque e o do Capitólio terão um grande impacto nas eleições presidenciais. A candidatura de Trump vai depender da decisão do tribunal. Trump tem de ultrapassar este obstáculo antes que os eleitores possam decidir o seu futuro.

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9 Jan 2024

Trump acusado de crimes de falsificação

Na semana passada a comunicação social anunciou que o ex-Presidente dos Estados Unidos Donald Trump foi acusado de falsificação de documentos relacionados com a sua actividade empresarial, aquando da campanha para as presidenciais de 2016, ocultando informação que não lhe era favorável e comprometendo a integridade das eleições. Trump negou todas as 34 acusações e foi libertado sob fiança. O processo será retomado no início do próximo mês de Dezembro. Esta é a primeira vez que um ex-Presidente dos Estados Unidos é acusado da prática de crimes.

O procurador de Manhattan, Alvin Bragg, escreveu uma acusação de 13 páginas descrevendo três incidentes. O primeiro refere-se a uma “empresa de média americana” que tem uma relação próxima com Trump. O ex-Presidente terá pagado a um porteiro do Trump Building 30.000 US dólares para que não vendesse aos jornais uma história sobre um filho que alegadamente teria tido fora do casamento. Mais tarde, veio a provar-se que a história era falsa.

Os outros dois incidentes referem-se a alegados pagamentos de 150.000 e 130.000 dólares que Trump terá feito, respectivamente, a Karen McDougall, uma modelo da Playboy, e a Stormy Daniels, actriz de fimes pornográficos. Daniels, conhecida como “Storm Woman”, afirma que o ex-advogado de Trump, Michael Cohen, lhe pagou 130.000 dólares para que não divulgasse a sua relação com Trump, através de uma empresa fantasma em 2016. Trump negou o pagamento desta quantia e também o relacionamento sexual com Daniels.

A acusação alega que em 2017, Trump passou cheques a Cohen do seu fundo fiduciário e da sua conta bancária para pagar “honorários de jurista”, mas Cohen afirma que se tratou de um reembolso do dinheiro que terá adiantado para “silenciar testemunhas”. Como não houve o pagamento de uma taxa de contratação inicial, estas verbas não podem ser consideradas como liquidação de serviços jurídicos.

Segundo a legislação de Nova Iorque, não é ilegal pagar para silenciar testemunhas, mas se o dinheiro for dado a um advogado, fazendo-o passar pelo pagamento de serviços jurídicos, pode violar a “Lei Federal de Financiamento de Campanhas” e, neste caso, o arguido também fica sob suspeita de ter cometido o crime de “falsificação de documentação comercial”.

Especialistas americanos em jurisprudência assinalam que, em Nova Iorque, falsificar documentação comercial é uma contravenção, mas se puder ser provado que o objectivo da falsificação é encobrir outros crimes, a contravenção pode tornar-se crime ficando o réu sujeito a uma pena que pode ir até quatro anos de prisão.

“Trinta e quatro acusações de falsas alegações para encobrir outros crimes são crime no Estado de Nova Iorque e, seja o réu quem for, não podemos e não vamos normalizar essas infracções graves”, afirmou Bragg.

A acusação também apresentou postagens anteriores de Trump nas redes sociais em que ele ameaça a cidade de Nova Iorque e os procuradores e critica o juiz Juan Merchan alegando que o odeia. O advogado de Trump respondeu que ele tem direito à liberdade de expressão, enfatizando que a postagem não é ameaçadora.

Do lado de fora do tribunal, reuniu-se um grande número de manifestantes pró e anti Trump e a polícia rompeu os bloqueios para separar os dois grupos.

Trump deixou bem claro que se vai candidatar às eleições presidenciais de 2024. Do ponto de vista legal, a candidatura nestas circunstâncias levanta várias questões que merecem ser analisadas.

Em primeiro lugar, a lei americana estipula claramente que pagamentos para silenciar testemunhas que pudessem divulgar informação prejudicial a Trump durante a campanha não são ilegais, mas podem violar a “Lei Federal de Financiamento de Campanhas” dos EUA”. O objectivo desta lei é manter a equidade da eleição. Toda a informação sobre os candidatos, que inclui os factos positivos e os negativos, deve estar acessível ao público antes da votação para que possa eleger quem considerada mais qualificado para vir a ser Presidente. Os Estados Unidos têm muita experiência em eleições presidenciais, e a legislação que as regula está amadurecida.

Em segundo lugar, se puder ser provado que Trump pagou 130.000 dólares a Daniels para a silenciar, através de Cohen e de uma empresa fantasma, Cohen pode estar envolvido com Trump na violação da Lei Federal de Financiamento de Campanhas, e ser considerado seu cúmplice. Portanto, Cohen também pode ter infringido a ética profissional enquanto advogado e vir a ser ouvido pela Law Society. Se for condenado, a sua licença pode ser revogada.

Em terceiro lugar, segundo a acusação, não houve lugar entre Trump e Cohen ao pagamento “inicial de contratação de jurista” pelo que não pode haver pagamento de “serviços jurídicos”. Se os registos demonstrarem que estes pagamentos foram feitos por serviços jurídicos, a acusação não será sustentada. Portanto, Trump é suspeito de ter cometido o crime de “falsificação de documentos comerciais”. Se o arguido for condenado, o tribunal tem maior probabilidade de admitir que os 130.000 dólares entregues a Cohen se destinavam a reembolsar o pagamento feito pelo silêncio de Daniels. Se assim for, Trump pode ser acusado de infracção da “Lei Federal de Financiamento de Campanhas.”

Em quarto lugar, durante a audiência, um grande número de pessoas reuniu-se no exterior, uns para apoiar Trump, outros para o combater. Isto equivale a exercer uma enorme pressão sobre o tribunal. Além disso, no post, Trump questionava os motivos do procurador para o acusar e escreveu que o juiz o odiava, o que representa outra forma de pressão que pode afectar a justiça. A lei deve ser suficientemente imparcial, e nem o Ministério Público nem os tribunais podem ser sujeitos a interferências externas, quando estão a instruir e a julgar um caso. Bragg deixou tudo bem claro, “seja quem for que esteja em causa, não podemos normalizar os crimes”. O Ministério Público não pode retirar a acusação porque o réu tem um estatuto proeminente ou porque está a ser pressionado, e essa condição é indispensável ao exercício do estado de direito.

Uma vez que não conseguimos ver as provas apresentadas pela acusação ao tribunal, nem ouvimos a defesa de Trump, tudo o que até aqui foi dito não passa de especulação, e não podemos afirmar que Trump tenha cometido um crime, nem que o comportamento de Cohen tenha sido problemático, só porque houve uma enorme cobertura deste caso pela imprensa. Mas uma coisa é certa, nem a acusação nem o tribunal querem adiar o processo até 2024, porque se for eleito nas próximas eleições, Trump passará a gozar de imunidade e o caso pode ficar suspenso, algo que a Justiça não quer que venha a acontecer.

A Constituição dos EUA não exige que o Presidente não tenha antecedentes criminais. Portanto, embora Trump possa ser condenado, mantem o direito de se candidatar à Presidência. A acusação de Trump mostra que nos Estados Unidos, ninguém pode estar acima da lei e isso é uma manifestação concreta do estado de direito. Como é que o povo americano encara os pagamentos para silenciar testemunhas, as mentiras, os casos extra-conjugais e as transacções imorais? As respostas vão ser dadas nas eleições presidenciais de 2024.

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11 Abr 2023

China | Pequim apela ao fim da guerra comercial e à reposição do que Trump “destruiu”

O Governo Central quer que a relação entre as duas maiores potências económicas mundiais volte a ser de cooperação em vez de conflito. O Ministro dos Negócios Estrangeiros, Wang Yi, apelou ontem a Washington para abandonar os preconceitos e as suspeitas e restabeleça a racionalidade e o desenvolvimento saúde de uma relação bilateral. O caminho apontado foi o levantamento de restrições comerciais e o fim da interferência injustificada em Taiwan, Hong Kong, Xinjiang e Tibete

Com agências 

 

Por trás de Wang Yi um banner à largura da sala anunciava o teor do discurso do Ministro dos Negócios Estrangeiros chinês: “Trazer de volta ao bom rumo as relações entre China e Estados Unidos”.
Foi com este pano de fundo que o governante discursou ontem em Pequim, apelando aos líderes políticos norte-americanos para abandonarem preconceitos e suspeitas infundadas, de forma a retomar relações estáveis, saudáveis e racionais entre as duas maiores potências económicas.

A anterior Administração norte-americana lançou uma guerra comercial, que incluiu a imposição de taxas alfandegárias punitivas sobre grande parte dos bens importados da China e restrições no fornecimento de tecnologia às empresas chinesas ou nos intercâmbios académicos.

Trump também melhorou os laços militares e diplomáticos com Taiwan, enquanto puniu as autoridades chinesas acusadas de abusos contra minorias muçulmanas em Xinjiang e de repressão das liberdades em Hong Kong.

Reforçando a ideia de retorno, Wang Yi evocou uma memória histórica. “Há cinquenta anos, o Dr. Henry Kissinger quebrou o gelo diplomático e visitou a China. Com extraordinária resolução política, os líderes da China e Estados Unidos abriram em conjunto uma porta que esteve fechada durante décadas”, recordou Wang. “Cinquenta anos depois, devemos ter o sentido de responsabilidade e tomar decisões sensatas, acrescentou.

O governante chinês não deixou de realçar que nos últimos anos, as relações com Washington desviaram-se do caminho normal e enfrentaram grandes obstáculos. Sem grandes rodeios, Wang apontou responsabilidades à anterior administração que, “para satisfazer as suas necessidades políticas, adoptou várias medidas para reprimir e conter a China, infligindo danos incomensuráveis às relações bilaterais”, cita a agência Xinhua.

Futuro mal definido

Embora o novo Presidente norte-americano, Joe Biden, tenha prometido colaborar com Pequim e adoptar um tom diferente na diplomacia dos EUA, não é claro se fará mudanças fundamentais nas políticas seguidas nos últimos anos. A reversão pode ser complicada politicamente, uma vez que os dois países enfrentam um momento negro, nunca antes vivido, em termos comerciais, disputas territoriais com vizinhos e acusações de usurpação de tecnologia e espionagem. Além disso, existe um forte apoio bipartidário a Taiwan, assim como em relação as críticas de abuso dos Direitos Humanos da China, especialmente em Hong Kong, Xinjiang e Tibete.

Como tal, o governante chinês solicitou que Washington pare de “manchar a reputação do Partido Comunista da China e de conspirar ou mesmo apoiar as palavras e acções erróneas das forças separatistas de Taiwan e de minar a soberania e segurança da China em assuntos internos relativos a Hong Kong, Xinjiang e Tibete”.

Sobre o comércio, Wang disse que a China defenderá os direitos das empresas norte-americanas enquanto espera que os EUA “ajustem as suas políticas o mais depressa possível”, removam taxas não razoáveis sobre produtos chineses, levantem sanções unilaterais contra empresas chinesas e institutos de pesquisa e educação e abandonem a supressão irracional do progresso tecnológico da China”.

Os EUA também devem suspender as restrições aos intercâmbios nas áreas da imprensa, ensino ou negócios, para reverter a queda acentuada no número de chineses que estudam nos EUA e as visitas de chineses para turismo ou negócios, disse Wang. “Espero que os dois lados trabalhem juntos para dirigir o navio gigante que é a relação China – EUA de volta ao curso de um desenvolvimento sólido, em direção a um futuro brilhante, com perspectivas ilimitadas”, descreveu.

Embora o tom do ministro, assim como do conselheiro para a política externa Yang Jiechi ou o Presidente Xi Jinping pareça mais positivo, alguns porta-vozes do Governo Central têm adoptado um tom mais combativo. Em conferência de imprensa, na sexta-feira, a porta-voz Hua Chunying do Ministério dos Negócios Estrangeiros comparou a vaga de frio que atinge o Texas com as interações sociais e económicas observadas na China durante o feriado do Ano Novo Lunar, sem demonstrar qualquer simpatia. “Tudo isto nos deu uma compreensão mais profunda do que os Direitos Humanos realmente significam e como melhor protegê-los. Estamos mais convencidos de que estamos no caminho certo e temos toda a confiança no futuro”, disse.

As vistas largas

Um editorial do jornal oficial Global Times, que faz eco de alguns dos pontos de vista do Governo Central, publicou no domingo um artigo que estimava o retorno dos Estados Unidos ao tom conciliatório e à cooperação por não conseguires derrotar a China.

Importa realçar que analistas da Câmara do Comércio norte-americana divulgaram na semana passada um relatório, em conjunto com a consultora Rhodium Group, a concluir que se os Estados Unidos venderem metade do seu investimento directo na China, os investidores norte-americanos poderiam perder cerca de 25 mil milhões de dólares em mais-valias, de acordo com um comunicado da Câmara do Comércio dos Estados Unidos.

Seguindo esta lógica, o jornal chinês teceu considerações à participação de Joe Biden na cimeia do G7 e na Conferência de Segurança de Munique, a estreia internacional do novo Presidente, sob o lema do slogan “A América está de volta”.

O artigo do Global Times refere que a reconciliação com os aliados tradicionais de Washington, para fazer face aos desafios levantados pela China, “tem sido uma característica da nova administração norte-americana desde que tomou posse”.

Porém, o editorial aponta que as mensagens de Biden na passada sexta-feira sugerem que a cooperação estreita entre Washington e os aliados está votada a resultar no compromisso, em vez do acção unilateral dos Estados Unidos contra os seus aliados devido às relações que mantém com Pequim. Em vez do tom de Guerra Fria, as intervenções em ambas as reuniões mencionaram a necessidade de trabalhar com Pequim em algumas áreas. O Global Times acrescenta que “quando fala com os aliados, Biden é claramente mais equilibrado do que quando comunica sozinho com os media norte-americanos”.

Segundo a fonte oficial, a principal razão pela qual Washington nada pode fazer em relação a Pequim, e porque a Casa Branca vacila entre a cooperação com os seus aliados para conter a China e trabalhar com a China, prende-se com o facto que um corte decisivo com Pequim e a confrontação total seria demasiado dolorosa para Washington. O romper final da relação entre as duas maiores economias mundiais é retratado pelo Global Times como “uma esperança ilusória”.

23 Fev 2021

2021, o ano decisivo

Com Joe Biden na presidência dos Estados Unidos, as relações sino-americanas entraram numa fase delicada. Para o Governo da China, um Presidente americano conhecedor da política chinesa torna-se um interlocutor mais complicado do que o intempestivo Donald Trump, que jogava cartadas políticas de forma irresponsável. No final do seu mandato, a estratégia de lançar um ataque à China em grande escala criou um clima político. Por isso, se Biden mudar de repente esta estratégia, pode vir a ser encarado pelos americanos como cobarde e pró-comunista. As recentes declarações dos EUA sobre os aviões de guerra da RPC que sobrevoaram Taiwan, demonstram que a atitude em relação à China se vai manter firme durante os tempos mais próximos. 2021 vai ser um ano decisivo para perceber se as relações sino-americanos se virão a tornar hostis ou cordiais.

A nova liderança americana tem de afirmar rapidamente uma imagem de sucesso, caso contrário o povo americano pode vir a sentir saudades do slogan de Trump “A América primeiro”. Se os Estados Unidos forem bem- sucedidos, a China tem de recuar. A Armadilha de Tucídides (um termo que descreve a aparente tendência para a guerra sempre que um poder emergente ameaça uma hegemonia internacional) não é só uma terminologia política, é uma realidade. Devido à ascensão da China para a posição de segunda maior potência económica, e à iniciativa

“Uma Faixa, Uma Rota” ao longo dos últimos anos, A Europa e a América deixaram de a encarar como um país em desenvolvimento, para a passarem a ver como uma ameaça às suas economias. Neste xadrez politico-económico, Hong Kong tornou-se a plataforma de confronto entre a China a Europa e a América.

Face a estes voláteis desenvolvimentos internacionais, e no cenário da actual pandemia, 2021 pode ser o ano decisivo para determinar quem serão os vencedores e os vencidos neste jogo de luta entre Hong Kong e a China e entre Macau e a China.

As transições de poder propiciam o surgimento de crises, e a eleição presidencial americana é disso um exemplo. Em 2022, o Partido Comunista Chinês (PCC) vai realizar o seu 20.º Congresso Nacional, que pode vir a mexer com os quadros de topo da política chinesa. Nos últimos anos, os corredores de poder da China tornaram-se ainda mais homogéneos, e qualquer erro pode provocar abalos políticos. Como em 2021 se comemora o 100.º aniversário da fundação do Partido Comunista Chinês, a distribuição de poder entre os quadros neste período vai determinar as mudanças pessoais no Congresso de 2022. Se essas mudanças não forem abruptas, os riscos para o país durante a transição de poder serão reduzidos, o que vai ser determinante para o equilíbrio de forças entre a China e os Estados Unidos. Caso contrário, quando a situação estabilizar na América e a sua presença militar se voltar a sentir na Ásia, estaremos de regresso a mais uma luta pelo poder.

Quanto a Hong Kong, é situação é ainda mais precária, e as clivagens no seu seio vão de mal a pior. Quando a discussão política passa para o campo do confronto, o enquadramento constitucional fica em segundo plano. Com a promulgação da Lei da República Popular da China sobre a Salvaguarda da Segurança Nacional na Região Administrativa Especial de Hong Kong, Hong Kong tornou-se num caranguejo que foi empurrado para debaixo de água por um pedregulho. O caranguejo certamente que não se consegue mexer, mas os peixes e os camarões que nadam à sua volta também sofrem. Basta olhar para as questões levantadas pelo BNO (British National Overseas passport) que pode dar ou não aos habitantes de Hong Kong a possibilidade de emigrarem para o Reino Unido, para ficarmos a perceber se as decisões que forem tomadas nesse âmbito serão certas ou erradas. Depois de os legisladores democratas se terem demitido do Conselho Legislativo de Hong Kong, os do campo pró-governamental tomaram controlo absoluto do Plenário. Infelizmente, o seu desempenho tem sido frustrante. Se nas próximas eleições de Setembro, os democratas continuarem a ser sistematicamente banidos da corrida, a cosmopolita cidade de Hong Kong tem grandes hipóteses de se vir a tornar apenas mais uma cidade da Área da Grande Baía de Cantão-Hong Kong-Macau. Hong Kong sem os seus habitantes vai tornar-se uma cidade portuária e nada mais. 2021 vai ser um ano crucial para virmos a saber o rumo que Hong Kong vai tomar.

Macau sobreviveu à pandemia em 2020. No entanto, a sua recuperação económica ainda depende do turismo, e os problemas dos cidadãos têm vindo a acumular-se. O V Governo da RAEM, foi muito bem-sucedido na resposta à epidemia com a estratégia de “defesa da estabilidade”, mas o seu desempenho tem sido medíocre no que respeita `à promoção da economia e à salvaguarda do estilo de vida da população. A administração excessivamente conservadora impediu que Macau se tenha tornado a cidade a registar a recuperação económica mais rápida da Área da Grande Baía de Cantão-Hong Kong-Macau. As eleições para a VII Legislatura da RAEM também estão marcadas para o próximo mês de Setembro. Mas na premissa de que a actual composição da Assembleia Legislativa permanecerá inalterada, o sufrágio directo seria a única forma de a revitalizar. Como é que se pode impedir o Governo liderado pelo Chefe do Executivo de errar se não houver suficiente supervisão? Quando as pessoas só sabem dizer “sim” e tecer “louvores”, estamos sempre a chover no molhado. Se a reorganização dos vários poderes que atrás mencionámos for bem conduzida, estaremos todos seguros. Mas se não for, temo que se venha a criar um problema sem solução.

5 Fev 2021

EUA | Biden toma hoje posse como Presidente, com a cidade de Washington sitiada

Joe Biden toma hoje posse como Presidente dos Estados Unidos da América num dos momentos mais conturbados da história moderna do país. Além da pandemia, a cidade de Washington encontra-se vigiada por 25 mil tropas da Guarda Nacional devido ao risco elevado de motins nas ruas. Joe Biden já tem um plano para reverter uma série de políticas de Trump em áreas como a imigração e combate à covid-19

Com agências

 

É num cenário de quase guerra civil que Joe Biden toma hoje posse como Presidente dos EUA. Depois do assalto ao Capitólio por apoiantes de Donald Trump, a 6 de Janeiro, dia em que foi confirmada a vitória de Biden, a cidade de Washington tem estado barricada nos últimos dias. Cerca de 25 mil homens da Guarda Nacional, o exército de reserva norte-americano, foram destacados para travar potenciais protestos ou motins na cerimónia de tomada de posse de Biden e Kamala Harris, vice-presidente.

Diante da colina do Capitólio haverá uma “zona vermelha” protegida pelos guardas, enquanto que o parque do “National Mall”, onde centenas de milhares de norte-americanos se deslocam habitualmente de quatro em quatro anos para assistir à cerimónia de tomada de posse, está encerrado e fechado a cadeado. Pelo menos dois civis foram detidos nos últimos dias em redor desta “zona vermelha”. Hoje dezenas de estações de metro estarão fechadas ao público, e foram alterados voos e viagens de autocarro para Washington, além de canceladas reservas no website Airbnb.

A Reuters falou com a norte-americana Dana O’Conner, que descreveu a capital do país como “uma cidade fantasma, mas com militares”. Nos anos anteriores, as cerimónias de tomada de posse reuniam sempre milhares de pessoas, mas este ano o cenário é bem diferente.

“Não queremos ver grades. Sem dúvida que não queremos ver tropas armadas nas nossas ruas. Mas temos de adoptar uma postura diferente”, disse a Mayor de Washington, Muriel Bowser, ao canal NBC, no domingo. A governante disse que, depois do ataque ao Capitólio, “os chamados patriotas poderiam tentar derrubar o seu próprio Governo e matar polícias”.

Christopher Miller, Secretário da Defesa ainda em funções, emitiu um comunicado esta segunda-feira, a afirmar que estas medidas são “normais ao nível do apoio militar para grandes eventos”. “Apesar de não termos nenhuma informação que indique uma ameaça interna, não deixamos nada para trás para garantir a segurança da capital”, acrescentou Miller, que agradeceu também “o apoio do FBI na assistência a esta missão e a cada um dos mais de 25 mil guardas”.

Esta segunda-feira o ensaio para a tomada de posse de Joe Biden foi interrompido por razões de segurança, depois de um incêndio ocorrido num centro de refugiados próximo do Capitólio, na capital norte-americana. Fontes dos serviços de segurança norte-americanos, citados pela agência Associated Press (AP), disseram que todos os que se reuniam para uma parada, incluindo elementos de uma banda militar, foram orientados para se refugiarem num local seguro dentro do complexo do Capitólio, em Washington.

Os participantes no ensaio indicaram ter recebido a informação das forças de segurança presentes de que o incidente não era um exercício. Quatro agentes da polícia adiantaram à AP que houve um incêndio a alguns quarteirões de distância e que o ensaio foi suspenso por “razões de segurança”. Uma hora depois, e extinto o fogo, o Capitólio voltou a abrir portas.

“Por uma questão de precaução o complexo do Capitólio foi temporariamente encerrado. Não há ameaça para o público”, escreveram os serviços secretos norte-americanos na rede social Twitter, segundo a Reuters.

Combater a China

Janet Yellen, futura secretária do Tesouro do Executivo de Biden, disse esta terça-feira que os EUA vão utilizar um grande arsenal de ferramentas para conter as práticas “abusivas, injustas e ilegais” da China. Janet Yellen falava num discurso no Comité do Senado norte-americano no âmbito do escrutínio aos novos membros do Governo.

A antiga presidente do Banco Central norte-americano (FED, na sigla em inglês) foi questionada sobre qual a atitude que a administração de Joe Biden, que será empossado quarta-feira, vai adoptar face a Pequim, após uma guerra comercial entre as duas maiores economias mundiais durante o mandato presidencial do Presidente cessante Donald Trump.

“Temos de combater as práticas abusivas, injustas e ilegais da China”, disse Yellen, defendendo que Pequim está a “prejudicar” as empresas norte-americanas, exemplificando com as barreiras comerciais e com subsídios corporativos “ilegais”. “[Pequim] rouba propriedade intelectual e envolve-se em práticas que lhe conferem uma vantagem tecnológica injusta. (…) Estamos a preparar-nos para usar uma gama completa de ferramentas para enfrentá-los”, acrescentou.

Por outro lado, e tendo como pano de fundo a crise pandémica desencadeada pela covid-19, Yellen aproveitou a audiência para pedir apoio ao Congresso para um grande estímulo fiscal destinado a “evitar o risco de uma recessão mais prolongada e dolorosa” nos Estados Unidos.

“Os economistas nem sempre estão de acordo, mas creio que, actualmente há um consenso: sem uma ação mais forte, arriscamo-nos a uma recessão mais prolongada e dolorosa, bem como cicatrizes a longo prazo na economia”, avisou Yellen na audiência virtual com o Comité de Finanças do Senado.

Na sua intervenção, Yellen reconheceu que um estímulo desta magnitude acrescentará problemas ao “crescente peso da dívida” do país. “Mas, actualmente, com a taxas de juro a níveis historicamente baixos, o mais inteligente que podemos fazer é ir em frente. A longo prazo, acreditamos que os benefícios vão superar os custos, sobretudo se nos preocuparmos em ajudar as pessoas que estão a sofrer há muito tempo”, frisou.

Yellen, quando confirmada no cargo, será a primeira mulher a liderar o Departamento do Tesouro da história dos Estados Unidos, já depois de ter sido a primeira a ocupar a presidência da Reserva Federal (FED), cargo que desempenhou entre 2014 e 2018.

Antony Blinken, futuro secretário de Estado, considerou que Donald Trump “teve razão” para demonstrar uma posição “mais firme com a China”, embora estivesse em desacordo em muitos temas. “O princípio de base estava correto”, disse Blinken no Comité de Negócios Estrangeiros do Senado norte-americano sobre a firmeza demonstrada pela Administração Trump, mas fez questão de vincar o seu “desacordo” em relação a “muitos pontos” da estratégia do Presidente cessante.

“Devemos fazer face à China com uma posição de força, não de fraqueza”, defendeu Blinken, que assegurou que tal implicará “trabalhar com os aliados em vez de denegri-los” e “participando e liderando as instituições internacional em vez de se retirar delas”.

Sobre o conflito israelo-palestiniano, Blinken indicou que Joe Biden defende que a única saída possível é “a solução de dois Estados”, reconhecendo, porém, que uma tal conclusão “não é realista a curto prazo”. Nesse sentido, apelou aos palestinianos e aos israelitas para, no imediato, “evitarem medidas unilaterais que tornem o processo ainda mais difícil”.

Por outro lado, o futuro chefe da diplomacia norte-americana adiantou que a administração Biden terá de “restaurar” a posição dos Estados Unidos no mundo, construindo sobre algumas das políticas externas de Trump. Para Blinken, muitas das decisões da política externa de Trump “deixaram muito a desejar”, ignorando questões críticas como a das alterações climáticas.

Na audiência de confirmação perante o Senado relativamente não contenciosa, Blinken disse que, se for confirmado no cargo, trabalhará com o Congresso para fortalecer e melhorar o acordo nuclear com o Irão, de que Trump retirou os Estados Unidos em 2018. Assegurou também que vai tentar trabalhar sobre os “acordos de normalização israelo-árabes” que Trump selou nos últimos meses de sua presidência.

Blinken salientou ainda que a promoção dos direitos humanos e da democracia serão parte integrante da aproximação da administração Biden no que diz respeito às relações internacionais e pediu para que os Estados Unidos possam acolher uma cimeira mundial de líderes eleitos democraticamente.

Quem é quem?

Outro órgão que também será dirigido, pela primeira vez, por uma mulher, é a CIA [Agência Central de Inteligência]. Avril Haines trabalhou com Barack Obama como conselheira para a área da segurança nacional.

O cubano Alejandro Mayorkas deverá ser o próximo Secretário da Segurança Interna, numa altura em que Joe Biden prepara um plano de reforma das leis da imigração. O Departamento de Segurança Interna do Governo norte-americano tem actualmente 240 mil funcionários que prestam serviço nas fronteiras e nos postos de alfândega, sem esquecer a área da cibersegurança e protecção civil.

Para Secretário da Defesa foi apontado o nome do General Lloyd Austin, que também trabalhou com Obama e que será o primeiro governante de raça negra neste cargo. Na área dos Transportes foi escolhido o Mayor Pete Buttigieg.

Um dos primeiros trabalhos nesta pasta será coordenar o investimento de 20 milhões de dólares já anunciado por Joe Biden para salvar as empresas que têm enfrentado uma enorme queda no número de passageiros devido à pandemia da covid-19.

Denis McDonough foi nomeado para Secretário dos Assuntos de Veteranos, uma escolha que gerou alguma controvérsia pelo facto de McDonough nunca ter servido nas forças armadas. Susan Rice irá chefia o Conselho de Política Nacional da Casa Branca.

Sobre esta equipa, Joe Biden disse ser “a certa para este momento da história”. “Sei que cada um desses líderes começará a trabalhar desde o primeiro dia para enfrentar as crises interconectadas que as famílias enfrentam hoje”, frisou.

Fim das políticas de Trump

Segundo a Reuters, Joe Biden deverá assinar dezenas de ordens executivas e enviar muitas leis para o Congresso nos primeiros dias a seguir à tomada de posse, para reverter políticas da Administração Trump. Muitas dessas medidas versam sobre a pandemia da covid-19, incluindo a aprovação de um orçamento de 1,9 mil de biliões de dólares para a distribuição de vacinas e apoio económico aos cidadãos.

A Administração Biden deverá obrigar ao uso de máscara nos autocarros, aviões e outros espaços públicos, a implementação de moratórias e alívio nas despesas com a educação. Biden quer também aumentar o número de testes e regras mais claras de saúde pública, além de assinar uma ordem executiva que permite ajudar escolas e negócios a abrirem portas em segurança.

Outras prioridades visam as áreas do ambiente e imigração. O novo Presidente deverá pôr um fim à polémica medida de separação de crianças dos pais imigrantes na fronteira dos EUA, priorizando a reunificação das famílias.

Deverá também chegar ao fim as medidas apertadas sobre asilos, tal como as restrições adicionais a quem viaja do México ou Guatemala. Biden quer também acabar com a declaração de Emergência Nacional que permitia o envio de fundos federais do Departamento de Defesa para construir um muro na fronteira dos EUA com o México.

Trump não recebe

Esta segunda-feira a ainda primeira-dama dos EUA, Melania Trump, despediu-se com uma mensagem que instou os cidadãos norte-americanos a “escolher o amor ao ódio” e “a paz à violência”. Em vídeo, distribuído pela Casa Branca, com uma duração de sete minutos, Melania afirmou: “Devemos centrar-nos em tudo o que nos une, superar o que nos divide e escolher sempre o amor ao ódio, a paz à violência”. Apesar destas palavras amáveis, os Trump (Donald e Melania) vão romper uma das tradições mais antigas da investidura presidencial e sair da Casa Branca sem receber os seus sucessores, o democrata Joe Biden e a sua esposa, Jill.

Pressão para manter

Os Estados Unidos vão utilizar um grande arsenal de ferramentas para conter as práticas “abusivas, injustas e ilegais” da China, garantiu ontem a futura secretária do Tesouro, Janet Yellen, num discurso no Comité do Senado norte-americano. “Temos de combater as práticas abusivas, injustas e ilegais da China”, disse Yellen, defendendo que Pequim está a “prejudicar” as empresas norte-americanas, exemplificando com as barreiras comerciais e com subsídios corporativos “ilegais”. “[Pequim] rouba propriedade intelectual e envolve-se em práticas que lhe conferem uma vantagem tecnológica injusta. (…) Estamos a preparar-nos para usar uma gama completa de ferramentas para enfrentá-los”, acrescentou. Por outro lado, e tendo como pano de fundo a crise pandémica desencadeada pela covid-19, Yellen aproveitou a audiência para pedir apoio ao Congresso para um grande estímulo fiscal destinado a “evitar o risco de uma recessão mais prolongada e dolorosa” nos Estados Unidos.

20 Jan 2021

A liberdade problemática

Lembro-me sempre de Sebald, quando se fala da necessidade de esquecer a história de um modo intencional e compulsivo. Foi o que a Alemanha fez após a segunda grande guerra mundial. No fundo, é o que todas as narrativas fazem ao deixarem de lado o que não interessa a cada presente que as lê. Os nacionalismos e os colonialismos de todo o tipo – e de todos os tempos – sempre trabalharam desse modo. Se o esquecimento compulsivo pode atrair a ordem e uma coerência artificial dos factos, não deixa de ser verdade que o oposto – o esquecimento não compulsivo – atrai muitas vezes o acaso. A razão é simples: se o esquecimento não compulsivo está relacionado com uma quebra de continuidade e de controlo, o acaso, por seu lado, dá-se bem com saltos improváveis a que a realidade por vezes se reduz assim que a bússola e a mão de comando se dissipam.

O par ‘esquecimento não compulsivo’ vs. ‘acaso’ é um tema maior do nosso tempo e pode ser verificado todos os dias na actualidade política, na expressão da guerra (não necessariamente clássica), nos media, nas crises financeiras, na prolixidade dos comentadores, na redundância das campanhas eleitorais e até na estética publicitária.

As obras de Paul Auster reflectem estas realidades de um modo particularmente incisivo. Em quase todos os seus livros se prenuncia uma catástrofe. É assim no desfecho suicidário de Música do Acaso (1990), quando Nashe leva ao extremo a intriga em que se deixa envolver; e é assim quando o mestre Yehudi de Mr. Vertigo (1994), o caderno vermelho de Quinn (da Trilogia de Nova Iorque) e o livrinho preto dos telefones (achado por Maria Turner, em Leviathan – 1992) desencadeiam, cada um a seu modo, sucessivos movimentos de dominó nos destinos das personagens. O desconcerto assenta sempre em lapsos de memória, ou melhor, em descontinuidades entre o presente imediato e aquilo que o antecede, e apresenta-se ao leitor, por vezes explicitamente, sob a forma do acaso.

Para além disso, Paul Auster sempre explorou as semelhanças entre os acontecimentos mais diferenciados entre si. Este ponto de partida, baseado na equivalência do improvável, parece por vezes sobrepor-se a qualquer tipo de lógica. É o caso, no romance Música do Acaso, dos paralelismos entre as infâncias de Pozzi e de Nashe e entre os destinos de Flower e de Willie. É também o caso do paralelismo formal que se desenha entre os desaparecimentos de Sachs e de Dimaggio, em Leviathan, e, por outro lado, do tipo de simulação praticado por Quinn/Auster na Trilogia de Nova Iorque e por Maria/Lilian em Leviathan. É ainda o caso das semelhanças que são propostas entre o ponto de partida da própria vida de Nashe (em Música do Acaso) e o que acontece na vida de Walter, no final da segunda parte de Mr. Vertigo.

Vale a pena seguir estas pistas exemplares. As semelhanças – que atravessam a superfície lisa ou enrugada dos acontecimentos – narradas por Paul Auster não andam muito longe da interpretação que os media e os governos contemporâneos levam a cabo em situações limite. A tentação de relacionar o ‘não relacionável’ faz parte de um modo de entender o mundo, no qual o desejo adoraria transformar-se em profecia. De alguma maneira, encontramos materializado em Paul Auster aquilo que Gianni Vattimo designou por “liberdade problemática”. Quer isto dizer que a liberdade, tal como é tratada pelo escritor, se transforma quase sempre em algo insuportável, parte da curva de um labirinto maior onde a interpretação acaba por se esgotar, enclausurada que se sente por obsessões tão profundas que não cabem na cartografia das explicações.

A questão do terrorismo coloca-se igualmente neste tipo de parábolas actuais que disputam toda uma possível história do sentido. O mundo metaforizado por Paul Auster é, afinal, um mundo muito real, dominado por disjunções inexplicáveis e por ameaças maiores que, no entanto, nunca se tornam inteligíveis. O que acontece supera quase sempre a sua significação. É um facto que sempre existiu uma relação particularmente difícil entre a ética (o ‘dever ser’ interior) e as práticas do terror ou do mal. Susan Neiman afirmou que, desde o Iluminismo até ao presente, sempre existiram dois pontos de vista antagónicos a este respeito. O primeiro, que vai de Rousseau a Hannah Arendt, insiste que a moral nos obriga a tornar o mal inteligível. O outro, que vai de Voltaire a Jean Améry, insiste que a moralidade nos obriga a não o fazer. Esta ambiguidade traduz um campo fértil para a entrada em cena da personagem mais espessa do nosso espectáculo actual: a crise.

É difícil ter visto os arruaceiros que invadiram o Capitólio em Washington DC (e a complacência da polícia que os recebeu) e esquecer as incongruências anunciadas, anos antes, pelo mundo literário de Paul Auster. O incompreensível atrai sempre o sabor de uma impossibilidade que, de repente, já está a acontecer diante dos nossos olhos. É no movimento dessa atracção que reside justamente o que se entende por crise. Só que na realidade o acaso parece sempre premeditado como se fizesse parte de uma conjura maior, enquanto na ficção literária ele consegue ter um brilho próprio que se assemelha a uma promessa ou a uma velada predição.

Em ambos os casos é a “liberdade problemática” que age com as suas obsessões perigosas e irracionais, de que Trump será por estes dias a imagem mais evidente, mas também a figura que eu irei para sempre tratar ao nível do esquecimento compulsivo. Outra coisa não merece esse diabo.

14 Jan 2021

EUA | Joe Biden diz-se “chocado e triste” com invasão do Capitólio por apoiantes de Trump

O Presidente norte-americano eleito, Joe Biden, condenou a invasão do Capitólio perpetrada por Donald Trump, Presidente em funções até ao dia 20 deste mês. Biden disse estar “chocado e triste” com o ocorrido, que levou o Mayor de Washington a decretar o recolher obrigatório na cidade.

“A nossa democracia está sob um assalto sem precedentes, nunca vimos nada como isto em tempos modernos”, reagiu o presidente-eleito numa sessão com jornalistas que não teve direito a perguntas. “É um assalto contra a cidadela da liberdade, o Capitólio em si. É um assalto contra os representantes do povo, contra a polícia do Capitólio que jurou protegê-los, contra os funcionários públicos que trabalham no coração da nossa república. É um assalto contra o Estado de direito como vimos poucas vezes”, adiantou.

O vencedor das últimas presidenciais frisou também que “as cenas de caos no Capitólio não reflectem a verdadeira América, não representam o que nós somos. O que nós vemos é um pequeno grupo de extremistas, dedicados à falta de lei. Isto não é dissidência. Isto é desordem, é o caos”.
Joe Biden dirigiu-se directamente a Donald Trump. “As palavras de um Presidente importam, independentemente do quão bom ou mau esse Presidente seja. No melhor dos casos, as palavras de um Presidente podem inspirar. No pior dos casos, podem incitar”, continuou.

“Como tal, exijo que o Presidente Donald Trump vá já à televisão nacional para cumprir o seu juramento, defender a Constituição e exigir um fim a este assalto”, acrescentou Biden.

Disparos dentro do Capitólio

Agentes policiais tiveram de usar armas de fogo para proteger congressistas, depois de manifestantes pró-Trump terem invadido o Capitólio dos EUA, enquanto eram contados votos do Colégio Eleitoral.

Os agentes de segurança usaram ainda gás lacrimogéneo para dispersar dezenas de manifestantes que acabaram por entrar no edifício, invadindo a Câmara de Representantes e o Senado, que tiveram de interromper os trabalhos de contagem dos votos do Colégio Eleitoral, para validar a eleição do democrata Joe Biden.

Agentes das forças de segurança interna e membros da polícia de choque foram destacados para o Capitólio, para auxiliar a polícia destacada para a segurança do Congresso, que se mostrava impotente para travar os milhares de manifestantes que se juntaram quando os congressistas estavam reunidos.

Alguns dos manifestantes colocaram nas redes sociais imagens da sua presença nas câmaras do Congresso, sentados nas cadeiras de representantes e de senadores, obrigando as forças policiais a usar armas de fogo para garantirem a segurança dos congressistas.

Alguns congressistas foram aconselhados a ficar debaixo das secretárias e a usar máscaras de gás, para se protegerem, e alguns agentes tiveram mesmo de disparar as suas armas, para refrear as ameaças mais severas.

O presidente da Câmara de Washington ordenou o recolher obrigatório a partir das 18:00 (hora local), para ajudar no esforço das forças de segurança para conter os milhares de manifestantes que se concentraram no Capitólio.

Vitória não aceite

Milhares de manifestantes tinham-se reuniram-se ontem em Washington, protestando e contestando a vitória do democrata Joe Biden. Num comício em frente à Casa Branca, Trump pediu aos manifestantes para se dirigirem para o Capitólio e fazer ouvir a sua voz, em protesto do que considera ser uma “fraude eleitoral”, tendo mesmo dito que “nunca” aceitaria a sua derrota nas eleições de 03 de novembro.

Os manifestantes obedeceram ao comando do Presidente cessante e dirigiram-se para o Capitólio, tendo mesmo forçado a oposição da polícia, que tentou impedir a sua entrada no edifício.

Vários legisladores, incluindo republicanos, usam as suas contas na rede social Twitter para criticar a ação dos manifestantes, dizendo que não se vão deixar intimidar pela sua presença ou pelos seus apelos para que a contagem de votos do Colégio Eleitoral seja rejeitada.

Na sua conta pessoal da rede social Twitter, Donald Trump limitou-se a pedir aos manifestantes para serem “pacíficos” e respeitarem as forças de segurança.

7 Jan 2021