Uma China | Companhias aéreas obedecem a Pequim em relação a Taiwan

Vinte companhias áreas passaram a referir-se a Taiwan como parte da República Popular da China, cumprindo com as exigências de Pequim, que Washington classificou de “absurdo orwelliano”, apesar de a ilha funcionar como um Estado soberano.

[dropcap style≠’circle’]B[/dropcap]ritish Airways, Lufthansa e Air Canada são algumas das companhias que se referem já a Taiwan como parte da China, quando faltam apenas três dias para dezenas de operadoras decidirem se cumprem com as ordens de Pequim ou enfrentam consequências que podem paralisar os seus negócios no país, incluindo sanções legais.

A 25 de Abril, a Administração de Aviação Civil da China enviou uma carta a 36 companhias aéreas, na qual exige explicitamente que se refiram a Taiwan como parte da China.

A Transportadora Aérea Portuguesa (TAP) não inclui Taiwan entre os seus destinos, mas nos casos de Macau e Hong Kong, também alvos de discórdia com outras companhias, a empresa refere-se já aos territórios como parte da República Popular da China. Pesquisando no portal da TAP por destinos na Ásia, Macau surge identificado como ‘Macau, República Popular da China’.

A adopção de “Taiwan, China” ou “Taiwan, República Popular da China” nos portais electrónicos e mapas das companhias aéreas representa outra vitória nos esforços do Partido Comunista Chinês (PCC) em forçar empresas estrangeiras a aderir à sua visão geopolítica, mesmo em operações fora do país.

Críticos afirmam que a crescente pressão exercida pela China, usando o seu poderio económico para forjar novas normas internacionais – neste caso o status de Taiwan – gera preocupações sem precedentes. “O que está aqui em jogo é que nós estamos a permitir que um regime revisionista, com um historial terrível no que toca a liberdade de expressão, dite o que nós dizemos e escrevemos nos nossos países”, afirmou J. Michael Cole, pesquisador do China Policy Institute e do programa de estudos de Taiwan na Universidade de Nottingham, citado pela Associated Press. “Se Pequim não se deparar com limites, vai continuar a pedir mais”, acrescentou.

Reunificação à vista

Taiwan, a ilha onde se refugiou o antigo governo chinês depois de o PCC tomar o poder no continente, em 1949, assume-se como República da China, mas Pequim considera-a uma província chinesa e não uma entidade política soberana.

“Nós opomo-nos veementemente aos esforços da China para atingir os seus objectivos políticos através da intimidação, coação e ameaças”, reagiu o ministério taiwanês dos Negócios Estrangeiros, num comunicado enviado à AP.

“Apelamos a todos os países do mundo que se mantenham unidos na defesa da liberdade de expressão e liberdade para fazer negócios. Apelamos também às empresas privadas que rejeitem colectivamente a exigência insensata da China para que alterem a designação de ‘Taiwan’ para ‘Taiwan, China'”, lê-se na mesma nota.

O Presidente chinês, Xi Jinping, avisou já Taiwan de que a questão da reunificação não pode ser adiada para sempre, e as forças armadas chinesas têm enviado aviões de combate para a costa taiwanesa.

Várias multinacionais têm cedido à pressão de Pequim para alterarem as referências a Taiwan, apesar de o Governo dos Estados Unidos ter garantido que vai “apoiar os americanos que resistem aos esforços do PCC em impor as suas noções de politicamente correcto às empresas e cidadãos norte-americanos”. Na semana passada, o retalhista de vestuário norte-americano Gap pediu desculpa à China por ter vendido t-shirts com um mapa “errado” do país, que exclui Taiwan.

Em Janeiro, a marca têxtil espanhola Zara, a companhia aérea norte-americana Delta Air Lines e a fabricante de equipamento médico Medtronic pediram também desculpa por se referirem a Taiwan como um país nos seus ‘sites’. “Não é possível dizer não”, disse Carly Ramsey, especialista da Control Risks, consultora com sede em Xangai, a “capital” económica da China, citado pela AP. “Cada vez mais, em situações como esta, o incumprimento não é uma opção, se queres fazer negócios na China e com a China”, explicou.

24 Mai 2018

Secretário do Tesouro dos EUA satisfeito com acordo comercial

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] secretário do Tesouro norte-americano, Steven Mnuchin, mostrou-se satisfeito sobre os progressos nas negociações comerciais com a China, mas não afastou o recurso a novas tarifas se não for cumprido o acordado.

“Creio que fizemos progressos muito significativos”, afirmou Mnuchin em declarações ao canal televisivo de informação financeira CNBC, dois dias após representantes de Washington e de Pequim terem anunciado o final das conversações.

De acordo com o comunicado oficial, os dois países chegaram a um consenso para reduzir o défice comercial norte-americano com a China e as autoridades de Pequim comprometeram-se a aumentar “significativamente” a compra de bens e serviços aos Estados Unidos. Não foram avançados números concretos, apesar de os Estados Unidos terem solicitado que a China reduza em 200 mil milhões de dólares o excedente comercial que tem com os Estados Unidos.

Depois do acordo, os Estados Unidos anunciaram que suspendem provisoriamente a imposição de novas taxas à importação de produtos chineses. “Agora depende de nós assegurarmos que o podemos implementar”, afirmou Mnuchin ao resumir o que foi negociado com a China.

Possível retorno

O secretário do Tesouro não afastou, no entanto, que se recorra a novas taxas aduaneiras se as autoridades chinesas não cumprirem “o acordo com um quadro muito completo” que foi definido nas negociações que decorreram em Washington na semana passada. “Se as coisas não resultarem e não conseguirmos o que queremos, o Presidente pode sempre voltar a impor tarifas”, adiantou.

A administração de Donald Trump tinha ameaçado impor tarifas no valor de 150 mil milhões de dólares a centenas de produtos chineses para equilibrar a balança comercial entre os dois países.

O acordo alcançado, acrescentou Mnuchin, abre caminho às empresas dos dois países para desenvolverem os seus próprios negócios. Nesse sentido, o responsável dos Estados Unidos disse que as empresas de energia norte-americanas podem chegar a acordo com as chinesas para vender produtos num valor entre 40 mil e 50 mil milhões de dólares.

23 Mai 2018

Comércio | China e EUA renunciam a guerra comercial entre os dois países

[dropcap style=’circle’] A [/dropcap] China e os Estados Unidos decidiram renunciar a qualquer guerra comercial e à imposição de novas taxas entre os dois países, afirmou ontem o vice-primeiro-ministro chinês, Liu He, citado pela agência de notícias Xinhua.

“As duas partes chegaram a um consenso, não participarão numa guerra comercial e não aumentarão as respectivas taxas”, adiantou o governante, que liderou a delegação chinesa que se encontrou com o secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Steven Mnuchin, em Washington.
Entretanto, foi noticiado no sábado que Washington e Pequim concordaram em reduzir “significativamente” o défice comercial dos Estados Unidos, de acordo com um comunicado conjunto após negociações na capital dos Estados Unidos. “Houve um consenso em tomar medidas para reduzir significativamente o défice americano no comércio de mercadorias com a China”, escrevem os dois lados sem, no entanto, fornecer números.
A Casa Branca exige uma redução de cerca de 170 milhões de euros do seu défice com o gigante asiático. No ano passado, os Estados Unidos registaram um défice de cerca de 318 milhões de euros com Pequim.

Oferta e procura
“A fim de atender à crescente procura pelo consumo chinês e à necessidade de desenvolvimento económico de alta qualidade, a China aumentará significativamente as suas compras de bens e serviços dos Estados Unidos, o que apoiará o crescimento e o emprego dos Estados Unidos”, continua o texto difundido pela Casa Branca. Os negociadores americanos e chineses concordaram ainda avançar com um “aumento significativo” nas exportações dos EUA nos sectores agrícola e de energia. “Os Estados Unidos enviarão uma equipa à China para trabalhar nos detalhes” de um acordo, anunciaram, sugerindo que a delegação chinesa, chegada no início da semana, já deixou Washington.
Os dois países, com fortes laços comerciais e financeiros, iniciaram algumas semanas de negociações delicadas para tentarem encontrar uma solução para a sua disputa comercial após meses de tensões, medidas e ameaças de retaliação comercial de ambos os lados, com o receio de uma guerra comercial com consequências imprevisíveis.
Uma delegação liderada pelo secretário do Tesouro dos EUA, Steven Mnuchin, visitou Pequim há duas semanas. Em seguida, uma delegação chinesa, liderada pelo vice-primeiro-ministro Liu He, amigo íntimo do presidente chinês, havia continuado esta semana as negociações, desta vez na capital federal.
As negociações foram realizadas apenas alguns dias antes do final de um período de consultas sobre novas sanções dos EUA sobre as importações chinesas.

21 Mai 2018

Portugal | Governo revela investimentos chineses na área da indústria

[dropcap style=’circle’] O [/dropcap] ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, revelou que analisou com o homólogo chinês, em visita a Portugal, “novas oportunidades de investimento de empresas chinesas em Portugal, designadamente industrial”.

Após “uma reunião muito proveitosa” com o Conselheiro de Estado e ministro dos Negócios Estrangeiros da República Popular da China, Wank Yi, o membro do Governo português anunciou também a possibilidade de aumentar as exportações portuguesas para aquele mercado asiático.
“Também estão em curso na China processos de inspecção sanitária muito importantes para o desenvolvimento das exportações portuguesas para o mercado chinês, designadamente produtos na área agropecuária e alimentar”, referiu Augusto Santos Silva, acrescentando que espera que “esse processo esteja concluído ainda este ano”.
Augusto Santos Silva afirmou também que Portugal “está muito interessado em participar na grande iniciativa desenvolvida pela China, conhecida como nova Rota da Seda”. O ministro português aludiu às “razões geográficas e económicas” do país para afirmar que Portugal “pode ser um bom ponto de encontro entre a faixa terrestre e a rota marítima da nova Rota da Seda”.
Assinalando que o país asiático “é o sexto fornecedor de bens a Portugal”, o governante realçou que “o aumento das exportações portuguesas para a China significará que ambos os países beneficiam de uma relação comercial cada vez mais importante”. Santos Silva declarou que “as relações entre os dois países são excelentes”, sustentando que a “razão dessa excelência” funda-se “na mesma visão sobre a ordem internacional baseada em regras, baseada no multilateralismo”.
“Portugal e China estão unidos na defesa de uma globalização inclusiva que todos possam beneficiar, na defesa do comércio internacional, na resistência ao regresso de formas de proteccionismo comercial”, disse.
Augusto Santos Silva ressalvou “a importância” que ambas as nações dão “às agendas essenciais para o futuro da humanidade, a agenda do Acordo de Paris e a agenda do Clima ou a agenda dos Objectivos do Desenvolvimento Sustentável”.

Outono em Pequim
O ministro afirmou que tem uma visita prevista para a China “no próximo Outono”, também para preparar a estada do Presidente da República Popular da China, Xi Jinping, em Portugal no fim deste ano.
Augusto Santos Silva limitou-se a dizer que “se trata de uma operação de mercado que dever ser acompanhada pelas entidades reguladoras competentes”, sem se ter referido a hipotética alteração à lei que facilita a OPA chinesa na EDP.
O Conselheiro de Estado e ministro dos Negócios Estrangeiros da China, Wang Yi frisou que “China e Portugal ficam nos dois extremos do continente euro-asiático, mas as relações e laços entre os dois países são estreitas”.
Wang Yi assinalou que, “especialmente nos últimos anos”, Portugal tem mostrado “espírito de abertura e inclusão” e em “expandir a cooperação e fazer com que a Parceria Estratégica Global seja elevada para um novo patamar”. “Vamos manter a nossa cooperação e aumentar a nossa confiança política, para consolidar a relação bilateral”, afirmou Yi, manifestando agrado pela possibilidade de Portugal, que goza de “uma posição privilegiada”, constituir “um parceiro para a construção de uma rota da seda” e “formar Portugal como país estratégico”.
Salientando a “abertura mais inclusiva chinesa a investimentos estrangeiros”, Wang Yi notou que a China pretende “aumentar a importação de produtos agrícolas de Portugal e explorar novas oportunidades na área da energia e do financiamento”.
Portugal e China estabeleceram uma Parceria Estratégica Global em 9 de Dezembro de 2005, para reforço da cooperação em vários domínios, com especial enfoque para o diálogo político, a economia, a língua, a cultura e a educação, a ciência e tecnologia, a justiça e a saúde.

21 Mai 2018

Diplomacia | MNE de Portugal visita Macau no Outono

[dropcap style=’circle’] O [/dropcap] ministro português dos Negócios Estrangeiros de Portugal, Augusto Santos Silva, vai incluir uma visita a Macau na deslocação à China, prevista para o próximo Outono. “Nessa ocasião visitarei também a Região Administrativa de Macau, porque o Fórum de Macau é o instrumento certo para promover a cooperação entre a China, Portugal e os países africanos de língua portuguesa”, vincou, sem ter comentado a Oferta Pública de Aquisição chinesa da eléctrica portuguesa EDP. A visita de Santos Silva à China tem como objectivo preparar a visita do Presidente da República Popular da China, Xi Jinping, a Portugal, que pode acontecer até ao final do ano. O agendamento destas visitas resultaram de um encontro entre Augusto Santos Silva e o ministro dos Negócios Estrangeiros chinês, Wang Yi, em Lisboa.

21 Mai 2018

O Espírito da Rota da Seda

[dropcap style≠‘circle’]E[/dropcap]m artigos anteriores foram explorados temas importantes para perceber o enquadramento histórico das relações comerciais actuais da República Popular da China (RPC) com o resto do mundo: ajuda externa, que durante décadas definiu as relações económicas da RPC com o estrangeiro; investimento em África, continente com o qual a RPC mantém desde sempre uma relação especial; a “Go Out Policy” e o ímpeto para a internacionalização e busca de mercados no estrangeiro, conjugados com a transformação do tecido industrial chinês.

A Iniciativa Faixa e Rota, que já assumiu vários nomes e siglas (OBOR, BRI, B&RI), pode, e deve, ser encarada como a evolução natural de políticas que a RPC tem implementado ao longo das últimas décadas.

Comecemos pelo discurso. A iniciativa foi anunciada a 7 de Setembro de 2013 em Astana, Casaquistão, pelo Presidente Chinês Xi Jinping, num discurso intitulado “Promover a Amizade entre Povos e Criar um Futuro Melhor”. Nele, multiplicam-se as referências históricas aos vários eixos de trocas comerciais que conectaram durante séculos diferentes regiões da Eurásia,e aos quais se refere habitualmente como “A Rota da Seda”.

O anúncio público do projecto tem forçosamente de ser analisado no plano político. Três pontos definem a sua base ideológica: (i) Ordem mundial multipolar; (ii) Globalização económica; (iii) Diversidade cultural. São ideias fundamentais do discurso político chinês.

O “Plano de Acção para a Iniciativa Faixa e Rota” publicado em 2015 pelo Concelho de Estado da RPC salienta a necessidade de “(…) aprofundar a confiança política; promover intercâmbio cultural; encorajar diferentes civilizações a aprender umas com as outras e a prosperar em conjunto; e promover o entendimento mútuo, paz e amizade entre as pessoas de todos as nações”.

Este apelo à multiculturalidade pode ser encarado como um aspecto complementar tanto da globalização económica como da promoção de uma ordem multipolar. Neste contexto, a evocação de um passado caracterizado por prosperidade global e de interacção entre povos contrasta com o mundo “ocidentalizado” (principalmente) pela difusão alargada da cultura popular americana. É este apelo a uma visão algo romantizada da Rota da Seda que marca o início do Plano de Acção, cristalizada no “Espírito da Rota da Seda – paz e cooperação, abertura e inclusão, aprendizagem mútua e benefício mútuo”.

Este aspecto não deve ser negligenciado em qualquer análise do BRI. No discurso político chinês, a história tem um papel importante. Serve como elemento legitimador para novas iniciativas, associando visão política a elementos identitários da nação chinesa.

Olhemos para a “Faixa”, a componente terrestre do BRI. A multiplicação de nomeações a Património da Humanidade associadas à Rota da Seda resulta de um esforço conjunto dos países do continente euroasiático. Estas nomeações servem um propósito político para os países participantes, com o reconhecimento internacional da história e cultura de diferentes civilizações. Mas a associação à Rota da Seda oferece também uma perspectiva histórica sobre a ideia de ligações comerciais e contactos civilizacionais transnacionais.

Existe também uma dimensão securitária na avaliação das potencialidades do BRI para os vários países envolvidos. Comércio e intercâmbio cultural contribuem para a construção de relações de confiança e respeito mútuo. Para a China, a estabilidade das suas províncias ocidentais (Xinjiang, Tibete) é uma preocupação constante. A criação de dinâmicas transfronteiriças nestas regiões, com o seu consequente desenvolvimento económico, é encarado como um processo necessário, tanto para a China como para países vizinhos, para mitigar problemas recorrentes de instabilidade, como os associados ao fundamentalismo islâmico.

Outro dos objectivos inerentes a este renovado ênfase no intercâmbio cultural relaciona-se com a desconfiança que a China tem enfrentado em alguns países. Do ponto de vista Chinês, trata-se sobretudo de um problema de percepção. Peter Frankopan, historiador britânico e autor do bestseller de 2015 “As Rotas da Seda” (que, inexplicávelmente, demorou cerca de três anos a merecer a sua primeira edição portuguesa) lamentava, em entrevista à organização Intelligence Squared, o carácter eurocêntrico do ensino de História no Reino Unido, daqui resultando uma visão distorcida que menospreza ou ignora civilizações cujo contributo para o desenvolvimento da humanidade é imensurável. Esta será uma conclusão que poderá ser considerada como válida para virtualmente qualquer país ocidental. Esta ignorância relativamente a outros povos e culturas, esta visão incompleta da história, contribui para um clima de desconfiança sustentada em primeiro lugar no desconhecimento e no preconceito.

O ênfase dado no discurso político chinês a uma ordem multipolar deve ser lido na lógica que decorre dos Cinco Princípios de Coexistência Pacífica (1954) –   de respeito mútuo pela integridade territorial e soberania; de não-agressão mútua; de não-interferência mútua em assuntos internos; de igualdade e cooperação para benefício mútuo; de co-existência pacífica. Outra leitura, complementar à primeira, é que constitui um desafio directo à ordem mundial vigente, interpretada como ainda a resultante do fim da Guerra Fria e caracterizada como unipolar, com os Estados Unidos da América (EUA) como potência hegemónica. Trata-se de resto de um passo que os EUA já previam desde o tempo da administração Clinton, como afirma o académico neo-conservador Robert Kagan no seu livro “O Paraíso e o Poder” (2003), onde afirma que era já consensual entre os dois partidos americanos que o crescimento da China constituíria o grande desafio estratégico para os EUA durante as duas décadas seguintes.

Não tenhamos dúvidas, no entanto, que nesta multipolaridade, a China pretende ocupar a posição que considera natural em face do seu legado histórico milenar, contributo civilizacional, e dimensões populacional (20% da população mundial) e económica (15% da economia global; contributo correspondente a cerca de 25 a 30% do crescimento económico global). Com o projecto BRI, a China assume um papel de liderança neste processo de mudança, re-definindo a sua posição à escala global.

Nas palavras do já citado Peter Frankopan: “We are seeing the signs of the world’s centre of gravity shifting – back to where it lay for millennia”.

18 Mai 2018

Pequim promete defender interesses em negociações com EUA

A China afirmou ontem não querer um aumento das tensões com os Estados Unidos na questão comercial, quando se preparam o reinício das negociações em Washington, mas sublinhou estar pronta a defender os seus interesses

 

[dropcap style≠‘circle’]O[/dropcap]s comentários de Gao Feng, porta-voz do Ministério do Comércio chinês, surgem depois de o Presidente norte-americano ter afirmado que “não recuou” nas negociações com a China. Gao Feng disse esperar que os EUA adoptem “acções concretas” para resolver o caso da gigante de telecomunicações chinesa ZTE, que na semana passada afirmou que suspendeu operações, depois de Washington ter proibido a empresa de comprar componentes norte-americanos, por ter violado o embargo imposto ao Irão e à Coreia do Norte.

O secretário do Tesouro norte-americano, Steven Mnuchin, e o vice-primeiro-ministro chinês Liu He estão a liderar as negociações em Washington, que terminam hoje, com o objectivo de travar uma possível guerra comercial entre as duas maiores economias do planeta.

“Nós não queremos um aumento das disputas comerciais entre a China e os EUA”, afirmou Gao, em conferência de imprensa, em Pequim. “Mas, claro, estamos preparados para todas as possibilidades”.

Trump ameaça subir os impostos sobre um total de 150.000 milhões de dólares de exportações chinesas para os EUA, como forma de punir Pequim por forçar empresas norte-americanas a transferirem tecnologia em troca de acesso ao mercado chinês. Em resposta, a China ameaçou subir os impostos sobre uma lista de produtos que valeram 50.000 milhões de dólares nas exportações norte-americanas para o país.

 

Chips e soja

A decisão do Departamento de Comércio dos EUA de negar encomendas à ZTE, no mês passado, levou a empresa a interromper as suas operações, que dependem de tecnologia norte-americana, como microchips e o sistema operacional Android. No início desta semana, Trump afirmou que quer encontrar uma solução para manter a firma chinesa a funcionar.

Segundo a imprensa norte-americana, os dois países negociaram uma troca: a isenção da ZTE, responsável pelo desenvolvimento da infra-estrutura 5G na China e fabricante de ‘smartphones’, por um recuo de Pequim em subir as taxas alfandegárias sobre produtos agrícolas norte-americanos.

“Vamos defender os nossos interesses resolutamente e não negociaremos os nossos interesses fundamentais”, afirmou Gao, questionado sobre aquela informação.

Na quarta-feira, Trump afirmou, numa mensagem na rede Twitter, que “nada se passou ainda com a ZTE, visto que pertence a um acordo comercial mais alargado”.

18 Mai 2018

Economia | Empresários “apavorados” face a possível guerra comercial

[dropcap style=’circle’] E [/dropcap] mpresários chineses estão “apavorados e indignados” perante uma possível guerra comercial entre Washington e Pequim, que ameaça indústrias inteiras nos dois países, testemunham exportadores radicados na China, na véspera de nova ronda de negociações.
“Existem fábricas com 300 funcionários que provavelmente vão parar”, contou Ricardo Geri, cofundador da Plan Ahead, empresa com sede em Pequim que exporta pedra artificial à base de quartzo para os Estados Unidos. Para cumprir uma das principais promessas eleitorais, o Presidente norte-americano, Donald Trump, exigiu à China uma redução do crónico défice comercial dos EUA com o país em “pelo menos” 200.000 milhões de dólares, até 2020.
Trump quer ainda taxas alfandegárias chinesas equivalentes às praticadas pelos EUA e que Pequim ponha fim a subsídios estatais para certos sectores industriais estratégicos. Caso estas exigências não sejam satisfeitas, o chefe da Casa Branca ameaçou subir os impostos sobre um total de 150.000 milhões de dólares de exportações chinesas para os EUA.
“Há uma certa indignação entre os empresários chineses, que investiram muito dinheiro para aumentar a produção”, admitiu Geri, natural do estado brasileiro de Rio Grande do Sul e radicado em Pequim há cinco anos. No caso particular dos produtos de quartzo, “a China fornece 70 por cento do mercado norte-americano” e, nos últimos anos, “fábricas que tinham duas linhas de produção, passaram a ter quatro, seis ou até nove”, beneficiando da recuperação do sector da construção nos EUA e taxas alfandegárias inferiores a 2 por cento, contou o empresário.
No entanto, aproveitando a crescente tensão entre Washington e Pequim, o fabricante líder norte-americano de produtos de quartzo, o Cambria Co., apresentou ao Departamento de Comércio dos EUA uma petição para subir as taxas sobre as importações oriundas da China para 455 por cento, acusando os produtores chineses de receberem subsídios ilegais e prática de ‘dumping’, venda abaixo do custo de produção.

Cenário de risco
Em Setembro, Washington irá decidir a taxa preliminar e, em Julho do próximo ano, sairá a taxa final, com os produtos importados entre aquele período a serem taxados retroactivamente.
“Criou-se um cenário de alto risco, que parará praticamente todas as importações”, afirmou Ricardo Geri.
Pedro Ribeiro, empresário português radicado em Cantão, no sul da China, e que também exporta para os EUA, lembrou que as disputas comerciais poderão afectar também os exportadores norte-americanos de produtos alimentares.
“A China tem muito a perder nesta guerra”, refere Pedro Ribeiro. O empresário refere ainda que não acredita que o que “os EUA anunciaram entre em efeito na totalidade”. “Esta é apenas a forma como o Trump negoceia”, concluiu.
Porém, a China advertiu ontem que vai manter a posição na próxima ronda de negociações com os Estados Unidos, que visa encontrar uma solução para as crescentes disputas comerciais entre as duas maiores economias do mundo.
“A posição chinesa é muito clara: opomo-nos ao unilateralismo e ao proteccionismo comercial. Os EUA devem retirar as suas ameaças”, disse Gao Feng, porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês.
Na véspera de uma delegação chinesa, chefiada pelo vice-primeiro-ministro Liu He, retomar as negociações com o secretário de Tesouro norte-americano, Steven Mnuchin, em Washington, Gao advertiu: “A posição chinesa não mudou e não mudará”. O porta-voz disse esperar que a nova ronda de negociações permita que a China e EUA “avancem, em conjunto, no desenvolvimento da cooperação económica e comercial e que alcance benefícios mútuos para os povos de ambos os países e do mundo”.
A viagem de Liu a Washington segue-se a uma primeira ronda de conversações, realizada na semana passada, em Pequim, entre uma delegação norte-americana chefiada por Mnuchin, e da qual não resultaram acordos concretos.

11 Mai 2018

Comércio | “Grandes diferenças” no prevalecem entre Pequim e Washington

[dropcap style=’circle’] P [/dropcap] equim e Washington acordaram estabelecer um mecanismo que permita lidar com as crescentes disputas comerciais, mas reconheceram que prevalecem “grandes diferenças” entre os dois países, noticiou a agência oficial chinesa.

A agência noticiosa oficial Xinhua, que cita o ministério chinês do Comércio, afirma que os dois lados abordaram um aumento das exportações norte-americanas para a China, comércio de serviços, protecção de propriedade intelectual e como resolver as disputas em torno da implementação de taxas alfandegárias.

Os dois lados “chegaram a um consenso em algumas matérias”, refere a agência, sem avançar com mais detalhes.

Também o secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Steven Mnuchin, deu um sinal positivo sobre as negociações com as autoridades chinesas, que decorreram em Pequim. “As conversas estão a correr bem”, disse, num breve comentário aos jornalistas.

O Presidente dos EUA, Donald Trump, quer reduzir em 100.000 milhões de dólares o deficit na balança comercial com a China e exige que Pequim garanta às empresas norte-americanas uma melhor protecção dos direitos de propriedade intelectual. A sua administração ameaçou subir as taxas alfandegárias sobre um total de 150.000 milhões de dólares em exportações chinesas para o país, incluindo produtos do sector da aeronáutica, tecnologias de informação e comunicação ou robótica.

Em retaliação, Pequim ameaçou subir as taxas alfandegárias sobre uma lista de produtos norte-americanos, cujas exportações para a China se fixaram, no ano passado, no mesmo valor.

 

 

 

Expectativas vs realidade

Continua a não ser claro se as negociações desta semana vão levar as autoridades de ambos os países a anular aquelas medidas, que perturbaram as praças financeiras em todo o mundo, temendo uma guerra comercial entre as duas maiores economias do planeta.

Analistas consideram ser difícil China e EUA chegarem a um consenso, tendo em conta a forte incompatibilidade entre as estratégias de ambos para o sector tecnológico, no qual Pequim ambiciona competir com Washington.

O jornal oficial China Daily lembra que é normal que existam diferenças entre os EUA e a China em torno de questões comerciais, mas que os recentes “ataques mostram o quão acesas se tornaram as disputas e o quão difícil será para os dois lados ficarem satisfeitos”. Um acordo é apenas possível se os “dois lados tiveram expectativas realistas”, acrescentou o jornal.

Na raiz desta disputa está o plano de Pequim, designado “Made in China 2025”, para transformar o país numa potência tecnológica, com capacidades nos sectores de alto valor agregado, incluindo inteligência artificial, energia renovável, robótica e carros elétricos.

A China fabrica 90 por cento dos telemóveis e 80 por cento dos computadores do mundo, mas depende de tecnologia e componentes oriundos dos EUA, Europa e Japão, que ficam com a maior margem de lucro.

Washington queixa-se de que as autoridades chinesas estão a subsidiar empresas locais e a protegê-las da concorrência, enquanto forçam firmas estrangeiras a partilhar tecnologia com potenciais futuros rivais chineses, em troca de acesso ao mercado do país.

A delegação norte-americana incluiu ainda o secretário do Comércio, Wilbur Ross, o representante comercial da Casa Branca, Robert Lighthizer, e o assessor económico máximo de Trump, Larry Kudlow.

Do lado chinês, as discussões foram lideradas pelo vice-primeiro-ministro Liu He, principal encarregado da política económica e financeira do país asiático e visto como próximo do Presidente da China, Xi Jinping.

7 Mai 2018

Ideologia | Xi enaltece ideais de Marx apesar de abertura do país ao capitalismo

[dropcap style=’circle’] O [/dropcap] Presidente chinês, Xi Jinping, enalteceu os ideais de Karl Marx, que teoricamente continuam a reger o país, onde milhares de operários morrem anualmente em acidentes laborais, numa celebração do bicentenário do nascimento do filósofo alemão.

“Como um espectacular amanhecer, o marxismo ilumina o caminho da humanidade”, afirmou Xi, no Grande Palácio do Povo, local que acolhe os mais importantes eventos políticos da China, situado junto à Praça de Tiananmen.
Durante um discurso de uma hora e meia, proferido perante personalidades militares e civis da China, Xi classificou Marx como “o maior pensador dos tempos modernos”. “Duzentos anos depois, apesar das enormes e profundas mudanças na sociedade humana, o nome de Karl Marx continua a ser respeitado em todo o mundo e a sua teoria continua a ser iluminada pela luz da verdade”, lembrou Xi.
Um enorme retrato do filósofo alemão, nascido em 5 de Maio de 1818, ocupou o espaço normalmente reservado aos símbolos do regime chinês no Grande Palácio do Povo.
Desde que ascendeu ao poder, em 2013, Xi Jinping tem vindo a promover o estudo do marxismo entre os altos quadros do Partido Comunista, visando um “regresso às raízes”. O segundo centenário do nascimento de Karl Marx foi comemorado na China com várias actividades, incluindo a organização de exposições ou a reedição de clássicos marxistas como o “O Capital” ou “O Manifesto Comunista”. Segundo a sua Constituição, a China é “um Estado socialista, liderado pela classe trabalhadora e assente na aliança operário-camponesa”.

O reverso da moeda
Em 1979, no entanto, o país abriu-se à iniciativa privada e ao investimento estrangeiro e é hoje a segunda maior economia do mundo, após quatro décadas a crescer, em média, quase 10 por cento ao ano. Desde então, centenas de milhões de chineses saíram da pobreza extrema, num “milagre” sem precedentes na História moderna.
No entanto, segundo contas da Organização Internacional do Trabalho, o operariado chinês regista, em média, cerca de 70.000 mortes por ano devido a acidentes no trabalho – 192 óbitos por dia.
A desigualdade social é também uma das principais fontes de descontentamento popular no país. O rendimento ‘per capita’ em Pequim ou Xangai, as cidades mais prósperas do país, é dez vezes superior ao das áreas rurais, onde quase metade dos 1.750 milhões de chineses continua a viver.

7 Mai 2018

Delegação norte-americana em Pequim para negociar disputas

Uma delegação norte-americana de alto nível iniciou ontem conversas em Pequim visando pôr fim à guerra comercial com a China, apesar de ambos os lados considerarem difícil um acordo definitivo entre as duas maiores potências comerciais

 

[dropcap style≠‘circle’]O[/dropcap] Presidente norte-americano, Donald Trump, que acusa Pequim de práticas comerciais “injustas” e definiu como prioridade reduzir o défice comercial com a China, nomeou o secretário do Tesouro norte-americano, Steven Mnuchin, para liderar as negociações.

A delegação, que chegou ontem a Pequim, inclui ainda os principais responsáveis pela política comercial de Washington, incluindo o secretário do Comércio, Wilbur Ross, o representante comercial da Casa Branca, Robert Lighthizer, e o assessor económico máximo de Trump, Larry Kudlow.

A visita ocorre a poucos dias do fim do período de apreciação das taxas alfandegárias propostas por Washington sobre um total de 1.300 produtos chineses de vários sectores, incluindo aeronáutica, tecnologias de informação e comunicação ou robótica. Aquela medida afectará, no conjunto, 50.000 milhões de dólares nas exportações chinesas para os EUA.

As negociações decorrem na Residência de Hóspedes Oficiais Diaoyutai, em Pequim, segundo a embaixada dos EUA na China.

Do lado chinês, as discussões são lideradas pelo vice-primeiro-ministro Liu He, principal encarregado da política económica e financeira do país asiático e visto como próximo do Presidente da China, Xi Jinping. Os Estados Unidos, que almejam uma redução de 100.000 milhões no défice comercial com a China, reclamam uma maior abertura do mercado chinês.

 

Expectativas tímidas

Washington exige ainda uma protecção mais forte dos direitos de propriedade intelectual e critica a “transferência forçada de tecnologia e propriedade intelectual norte-americana” em troca de acesso ao mercado chinês. Ambos os lados expressaram, no entanto, cautela sobre o resultado das negociações.

“Este é um passo construtivo, desde que os Estados Unidos sejam sinceros (…), mas dada a complexidade das economias dos dois países, não é realista imaginar uma solução para todas as disputas”, afirmou na quarta-feira Hua Chunying, porta-voz da diplomacia chinesa.

Também Lighthizer advertiu: “Eu prefiro esperar, mas nem sempre sou optimista. É um grande desafio”.

Pelas contas do Governo chinês, no ano passado, a China registou um excedente de 223,5 mil milhões de euros no comércio com os Estados Unidos. As contas de Washington fixam o excedente chinês ainda mais acima, em 304,1 mil milhões de euros.

4 Mai 2018

Da Política “Going Out” à Iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”

[dropcap style≠‘circle’]A[/dropcap] iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota” (OBOR ou BRI) pode em certa medida ser encarada como a evolução natural da política “Going Out” promovida por Jiang Zemin em 1999, política essa centrada na internacionalização da economia chinesa, traduzida pela transição da República Popular da China (RPC) de país receptor para país promotor de investimento directo estrangeiro (IDE).

A estratégia foi progressivamente consolidada em 2001 com a admissão da China na Organização Mundial do Comércio e o anúncio, em 2004, pela Comissão Nacional para Reformas e Desenvolvimento da RPC (NDRC) e pelo China Eximbank de medidas de apoio ao investimento em 4 sectores específicos:  (i) recursos naturais e bens primários relativamente aos quais a China é deficitária; (ii) investimento em sectores exportadores ou que envolvam novas tecnologias e equipamentos; (iii) colaborações com entidades estrangeiras em projectos de investigação e desenvolvimento (I&D) e novas tecnologias, gestão e formação de quadros; (iv) fusões e aquisições com vista ao aumento progressivo da competitividade internacional de firmas nacionais e à expansão dos mercados de produção e vendas.

O plano conjuga, portanto, a transformação progressiva do tecido económico e industrial Chinês para sectores de valor acrescentado com a internacionalização de empresas e sectores cujo mercado interno caminha para a saturação. Com efeito, a China apresenta actualmente excesso de capacidade em sectores críticos, como a construção e indústrias associadas, bem como no sector energético. Como tal, a sustentabilidade dessas empresas exige uma política expansionista em busca de mercados em território estrangeiro. Os dois sectores acima referidos são porventura os que têm maior visibilidade. A produção de energia a carvão constitui um exemplo de conjugação de várias políticas: Pequim, a partir de 2014, reintroduziu taxas sobre a importação de diversas qualidades de carvão e proibiu a compra de carvão de baixa qualidade. Medidas estas que surgem na sequência da implementação de políticas de combate à poluição, bem como de protecção dos produtores chineses. Por outro lado, e já antes do anúncio da iniciativa BRI, têm-se multiplicado a construção de centrais térmicas a carvão por empresas chinesas no estrangeiro.

No que respeita ao IDE, foi feita uma descrição, num artigo anterior, do crescente investimento chinês em África, num padrão onde se constata a progressiva transferência de indústria transformadora para regiões com menores custos laborais, funcionando em simultâneo como uma forma de criação de emprego e de desenvolvimento económico e social. Padrão similar observa-se nos países do Sul da Ásia.

Mas o cenário muda radicalmente quando olhamos para o continente europeu. A Europa é a principal destinatária do IDE chinês (29 por cento do total), estando a aposta centrada nos sectores de energia, finança, tecnologia e infraestruturas. O sector imobiliário perdeu importância nos últimos anos em virtude de um maior controlo administrativo chinês sobre certos tipos de transacções, como forma de travar a fuga de capital. No entanto, o incentivo à diversificação para firmas chinesas é inegável. As restrições sobre o investimento em imobiliário, de resto, resultaram num redireccionamento do investimento chinês para outros sectores, também em face da desaceleração do mercado doméstico.

Conhecemos bem os exemplos portugueses, como o investimento da China Three Gorges na EDP e a aquisição pela Fosun da Caixa Seguros. Todavia, Portugal, com um total de investimentos entre 2000 e 2017 de 6 mil milhões de euros, é o sétimo destinatário europeu do IDE chinês. O pódio pertence ao Reino Unido (42 mil milhões de euros), Alemanha (20.6 mil milhões de euros) e Itália (13.7 mil milhões de euros). Exemplos recentes de investimentos são a aquisição pela Midea da empresa alemã de robótica KUKA e a compra por um consórcio chinês de 49 por cento da operadora de centro de dados do Reino Unido Global Switch.

A aposta chinesa em sectores de valor acrescentado poderá ser associada ao plano “Made in China 2025”, um masterplan anunciado em 2015 e que tem em vista a transformação da China nas próximas décadas numa superpotência industrial com base em tecnologias inovadoras. Contudo, esta aposta era já visível a partir de 2004. Os números assim o demonstram: investimento chinês no estrangeiro disparou a partir sensivelmente de 2005, tendo o IDE na década seguinte tido uma média anual de crescimento de 30 por cento. O investimento chinês em Investigação & Desenvolvimento aumentou exponencialmente a partir da mesma data, correspondendo actualmente a 20 por cento do investimento mundial nesta área. Circunstâncias mais recentes (desaceleração económica; desenvolvimento económico e social; saturação de certos sectores) poderão ter ditado uma aceleração mais acentuada. Mas é nítido que esta aposta estava já na mente dos governantes chineses.

Constata-se agora um crescente nervosismo na classe política europeia com as aquisições chinesas em sectores chave da sua economia, argumentando falta de reciprocidade na medida em que muitos investimentos são em sectores nos quais as empresas estrangeiras continuam a encontrar barreiras no acesso ao mercado chinês. Acresce que problemas políticos no seio da União Europeia, como os diferendos com os países do leste, são encarados como sendo agravados por acções como a iniciativa “16+1” entre a China e países da Europa Central de Leste, iniciativa esta que tem em vista a realização de projectos no âmbito do BRI.

Que a liderança europeia esteja preocupada com o crescimento chinês e o impacto económico e político na Europa é normal. Estranha-se, no entanto, é que esta preocupação surja de forma tardia. Por outro lado, as preocupações têm mais a haver com problemas europeus do que propriamente com a China. A reciprocidade é possível através de negociações. E as deficiências institucionais europeias são um problema exclusivamente europeu.

Percebe-se que existe uma sequência lógica na evolução do investimento externo chinês, num processo contínuo de aprendizagem e delineado com rigor e pragmatismo. Perante isto, como podemos interpretar a iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”? Será tentador encará-la de forma cínica como nada mais do que um processo de etiquetagem e exercício de retórica sobre um projecto já em marcha, mas essa interpretação não corresponderia à verdade. Este tópico, porém, merece um artigo em separado.

4 Mai 2018

China | Pequim nega ter “subornado” República Dominicana

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] China recusou ontem as acusações de Taiwan de que conseguiu que a República Dominicana rompesse as relações diplomáticas com Taipé a troco de empréstimos no valor de 2.500 milhões de euros àquele país.

“Não fizemos qualquer acordo e não há essa necessidade”, afirmou ontem Hua Chunying, porta-voz do ministério chinês dos Negócios Estrangeiros.

Os ministros dos Negócios Estrangeiros da China e República Dominicana, Wang Yi e Miguel Vargas, respectivamente, assinaram na terça-feira, em Pequim, o estabelecimento das relações bilaterais, o que supõe um corte de Santo Domingo com Taipé.

O Ministério taiwanês dos Negócios Estrangeiros assegurou, entretanto, que Pequim prometeu empréstimos ao país do Caribe.

Em Pequim, Hua Chunying assegurou que o “estabelecimento das relações diplomáticas tem apenas uma premissa, que a República Dominicana respeite o princípio de uma só China”.

Também o senador norte-americano pela Florida Marco Rubio acusou a China de “subornar” a República Dominicana e pediu ao Congresso do EUA que faça mais para travar a crescente influência de Pequim na América Latina.

3 Mai 2018

A China e a inovação (II)

“China’s innovative ability languished after the fourteenth century. Today, however, China is determined not only to catch up with the West, but to re-establish itself at the forefront of technological innovation. Two forces are driving the surge of Chinese innovation. One is based on need-China’s pressing need to solve the myriad domestic problems that rapid economic development has created. The other is based on a new strategic direction for Chinese corporations: to enter high-value, high-margin sectors that are internationally competitive and where they will be matching global corporations, innovation for innovation. Much of this recent drive is through mergers with and acquisitions of successful Western firms that were made to gain brands, technology, and markets”
“China’s Next Strategic Advantage: From Imitation to Innovation” – George S. Yip and Bruce McKern

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] sucesso do sítio de leilões, “Taobao”, acabou por forçar o “eBay” a sair da China. Se analisarmos o “Baidu”, líder de mecanismos de busca chinês, que cresceu maciçamente no mercado doméstico com uma oferta que não fractura nenhum campo tecnológico e não desafia a ortodoxia política e adaptou o seu produto, organização e processos às necessidades da manta de retalhos chinesa dos mercados regionais.

O “Baidu” tem uma procura de 80 por cento, tendo-se tornado no maior motor de busca do mundo. Assim como o Japão alcançou os Estados Unidos tecnologicamente em muitas indústrias durante as três décadas após a II Guerra Mundial, a China está a fazer o mesmo através de inovações. Adaptar a tecnologia tornou-se uma prática padrão e altamente lucrativa. Obter essa tecnologia por meio de aquisições, no entanto, é uma nova tendência importante.

A escrita tem sido volumosa sobre a actual onda de investimentos directos estrangeiros no exterior, a maioria dos quais se concentrou em recursos de matérias-primas, particularmente na África e na América Latina. A mudança para os Estados Unidos e Europa pela tecnologia, no entanto, não é menos significativa. As empresas chinesas cansadas de pagar taxas de licenciamento, marcas e patentes, têm cada vez mais, e com o incentivo do governo, tentado comprar, em vez de alugar, capacidades revolucionárias de inovação por meio da aquisição de tecnologia e talento. Se observarmos o caso da “Huawei” que é retratada como a maior empresa da qual nunca se ouviu falar, que engloba centros de P&D em todo o mundo, e as controvérsias geradas sobre as suas tentativas de aquisição nos Estados Unidos. A “Haier” é uma das principais fabricantes chinesas de electrodomésticos e electroelectrónicos, possui uma rede similarmente ampla de centros globais de projecto e P&D nos Estados Unidos, Japão, Coreia, Itália, Holanda e Alemanha. Para os fabricantes de automóveis chineses, Turim é o lugar para se localizar, com os centros de P&D operacionais em Zhuhai, Changchun e Changan.

As correntes culturais anti-ocidentais podem ser fortes domésticamente, mas empresas chinesas privadas que operam no exterior adoptaram talentos seniores locais. A “Huawei” tem contratado os melhores executivos estrangeiros americanos e ingleses para liderar os esforços de P&D nos Estados Unidos e supervisionar todo o orçamento e operações. Todos estão subordinados ao fundador e presidente da “Huawei”, um ex-oficial militar chinês. A fabricante de turbinas “Goldwind”, de igual forma contratou executivos de créditos firmados no campo de energia limpa, para representar a empresa nas suas operações nos Estados Unidos. A fabricante de máquinas “Sany”, cujos principais concorrentes internacionais incluem a “Caterpillar” e a “Komatsu”, tentou inicialmente ter sucesso nos mercados europeu e americano, contando com talentos e tecnologia locais. Mas alguns passos errados encorajaram a empresa a estabelecer centros de P&D intimamente ligados à sede regional europeia e americana e a contratar profissionais desses países.

A aquisição pela “Sany” da “Putzmeister”, líder na fabricação de bombas de cimento da Alemanha, em 2012, deu à empresa acesso à tecnologia de um único concorrente. Vemos as empresas chinesas a fazer um esforço concertado e eficaz para preencher grandes lacunas na sua capacidade de inovação por meio de aquisições e parcerias estrangeiras cada vez mais difundidas. Ainda assim, para se tornar uma força líder de inovação no século XXI, os chineses precisam de alimentar os inovadores do futuro. Esse é o trabalho das universidades chinesas. Na primeira metade do século XX, a China desenvolveu fortes instituições estatais como a “Universidade de Pequim”, “Universidade Jiao Tong”, “Universidade Nacional Central” e, no apogeu da pesquisa, a “Academia Sinica” que foram acompanhadas por um conjunto criativo de faculdades e universidades privadas.

Actualmente, as faculdades e universidades particulares são responsáveis ​​por mais de um quarto de todas as instituições de ensino superior na China, e estão a crescer mais rapidamente que as públicas. As grandes empresas também estão a envolver-se. A unidade “Taobao” do “Alibaba”, por exemplo, estabeleceu a “Universidade Taobao”, inicialmente para treinar proprietários de “e-business”, gestores e vendedores e com o tempo, oferecerá educação de negócios para mais de um milhão de estudantes “on-line”. A China em breve obterá mais “PhDs”, a cada ano do que qualquer outro país do mundo, dado que as universidades chinesas pretendem ser berços de pesquisa e forças criativas de alto nível, capazes de transformar pesquisa e inovação em maior produtividade. O governo chinês e muitas outras fontes estão a injectar enormes receitas nas principais instituições. Dentro de dez anos, os orçamentos de pesquisa das universidades de elite da China aproximar-se-ão das suas congéneres americanas e europeias, e em engenharia e ciências, as universidades chinesas estarão entre os líderes mundiais.

Será que as universidades chinesas estabelecerão padrões globais no século XXI? É possível (mesmo que nenhuma actualmente esteja na lista das cinquenta melhores a nível mundial) simplesmente por causa dos recursos que provavelmente terão. Mas a questão mais importante é se a China tem um bom quadro institucional para a inovação. A resposta é que a muito curto prazo terão. A independência de procurar ideias onde quer que possam levar é uma pré-condição para a inovação nas universidades. Mas, por qualquer medida comparativa, os membros do corpo docente nas instituições chinesas terão maior poder na sua governança. Tal como na indústria, na educação, a China pode desfrutar por algum tempo daquilo que Joseph Schumpeter chamou de vantagem inicial que é a capacidade de aprender e melhorar o trabalho dos seus antecessores imediatos. A China mostrou inovação através da adaptação criativa nas últimas décadas e agora tem capacidade para fazer muito mais. A China terá a sabedoria para aliviar e a paciência para permitir o surgimento pleno do que Schumpeter chamou de verdadeiro espírito de empreendedorismo? Sobre isso, não há que ter dúvidas.

[primeira parte]

3 Mai 2018

Diplomacia | MNE chinês em Pyongyang para reforçar posição no diálogo

O ministro chinês dos Negócios Estrangeiros chegou ontem a Pyongyang e deverá reunir-se com o líder norte-coreano, Kim Jong-un, visando garantir um papel mais importante para a China nos esforços para a desnuclearização do país

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] visita de Wang Yi surge poucos dias após Kim e o Presidente da Coreia do Sul, Moon Jae-in, prometerem que vão trabalhar juntos para alcançar a “completa desnuclearização” da península coreana, apesar de não terem avançado com mais detalhes.

Ambos concordaram ainda trabalhar para terminarem formalmente a Guerra da Coreia (1950-53), que culminou com a assinatura de um armistício e não um tratado de paz, através do diálogo com os Estados Unidos e, possivelmente, a China. Kim deve reunir com o Presidente norte-americano, Donald Trump, ainda este mês ou em Junho.

Com esta visita, Wang Yi deverá tentar garantir que Pequim não é secundarizado, numa altura em que Pyongyang se aproxima de Seul e Washington. Analistas sul-coreanos consideram que Wang vai procurar que Kim se comprometa a incluir a China no processo de terminar formalmente com a guerra na península coreana.

Ombro amigo

O encontro entre Kim e Moon, na aldeia de Panmunjom, na fronteira entre os dois países, ocorreu um mês depois de Kim se deslocar a Pequim e de se reunir com o Presidente chinês, Xi Jinping. A visita de Kim foi vista como uma tentativa de assegurar o apoio chinês, visando ter maior margem de negociação com Trump.

Analistas consideram que Kim terá pedido à China, o maior aliado diplomático e parceiro comercial da Coreia do Norte, que relaxe a aplicação das sanções económicas contra o país, impostas pelas Nações Unidas. O líder norte-coreano deverá também ter pedido à China que se oponha contra uma intervenção militar, caso o diálogo com Trump falhe e o país recomece com os seus testes nucleares e com mísseis balísticos.

Seul afirma que Kim expressou um interesse genuíno em abdicar do seu programa nuclear, mas durante décadas Pyongyang tem exigido que Washington retire as suas tropas da Coreia do Sul e Japão e remova as armas nucleares que protegem aqueles dois países.

A decisão de reinserir a China nas negociações é vista como um sinal de que a Coreia do Norte irá manter a sua postura original.

Pequim tem apelado a uma suspensão do programa nuclear norte-coreano, em troca do fim dos ensaios militares conjuntos entre a Coreia do Sul e os Estados Unidos.

3 Mai 2018

Taiwan | Taipé afirma que não vai ceder à pressão de Pequim

[dropcap style=’circle’] A [/dropcap] Presidente de Taiwan afirmou ontem, numa cerimónia militar, que a ilha não vai ceder “à pressão de Pequim”, na sequência do corte de relações diplomáticas entre Taipé e a República Dominicana.

O Gabinete da Presidência de Taiwan instou a China a “suspender de imediato” todas as acções que afectem negativamente as relações bilaterais e a paz e a estabilidade na região. Taiwan acusou a China de prejudicar “a paz e a estabilidade” da região, num momento em que na península coreana se procura a reconciliação através do diálogo, de acordo com um comunicado.
Pequim está a aumentar a intimidação militar e a manipular a política de “uma só China” para obrigar Taipé a aceitá-la, e as suas acções “aumentaram as tensões no estreito de Taiwan”, indicou a Presidência, o que na opinião das autoridades da ilha “não deve ser o comportamento de uma parte interessada responsável”.
Taipé disse que “lamenta profundamente” a decisão da República Dominicana de reconhecer a China, mas não cederá à ameaça ou à pressão de Pequim. “O Governo não cederá à pressão de Pequim, e fará tudo o que é possível para salvaguardar os interesses da nação, defender a soberania e a dignidade da República da China (Taiwan) e trabalhar com amigos da comunidade internacional para garantir a paz e a estabilidade regionais”, segundo o comunicado.
Deputados da oposição e peritos afirmaram que a pressão diplomática chinesa vai continuar até que a Presidente Tsai rejeite o “consenso de 1992”, o que significa aceitar que a ilha é parte da China. “É de esperar que a China continue a conquistar aliados de Taiwan até que haja um sinal de mudança na posição da Presidente”, disse a professora do Instituto da América Latina da Universidade Tamkang, Elisa Wang.
Outros especialistas consideraram que a China não vai lançar uma campanha para conquistar muitos dos 19 aliados diplomáticos de Taipé, mas poderá tentar que o Paraguai, ou outro país de maior importância económica ou estratégica, deixem de reconhecer Taiwan.

Sem efeito
Nas últimas semanas, Taipé entregou ajuda à República Dominicana no valor de 29 milhões de euros, dois helicópteros, 90 camiões militares e 100 motociclos, para consolidar os laços bilaterais, lembrou na edição de ontem o diário Jinji Ribao.
Em conferência de imprensa, na manhã de ontem, em Taipé, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Joseph Wu, anunciou o fim das relações diplomáticas com a República Dominicana “para manter a dignidade nacional” e “a suspensão imediata de todos os projetos de cooperação e ajuda”.
O ministro atribuiu a responsabilidade pela ruptura à China e às ofertas de “incentivos financeiros”, promessas de investimento e ajuda ao país das Caraíbas, destinadas a levar ao corte diplomático com Taiwan. Em Pequim, o chefe da diplomacia da República Dominicana, Miguel Vargas, anunciou o fim das relações diplomáticas com Taiwan, em conferência de imprensa, na presença do homólogo chinês, Wang Yi. “Anunciamos à nação dominicana que decidimos estabelecer relações diplomáticas com a República Popular da China, com a convicção de que esta decisão será extraordinariamente positiva para o futuro do nosso país”, declarou o executivo, em comunicado. O acordo foi formalizado em Pequim, na segunda-feira, pelo ministro dos Negócios Estrangeiros dominicano, Miguel Vargas.
Ao mesmo tempo, o consultor jurídico do Governo dominicano, Flavio Dario Espinal, fazia o mesmo anúncio no palácio da presidência, em Santo Domingo. Dario Espinal disse que o Governo dominicano apoiava, a partir de agora, o princípio de “uma só China”, passando a reconhecer Taiwan como parte do país.
“A República Dominicana reconhece que, no mundo, existe apenas uma única China e Taiwan é parte inalienável do território chinês”, de acordo com o comunicado, que agradece a Taipé a cooperação mantida ao longo dos anos e a realização de numerosos programas.
Mas “a história e a realidade socioeconómica obrigam agora a uma mudança”, indicou. “O Governo está confiante de que a nova situação resultante desta decisão será gerida da forma mais construtiva e mais harmoniosa possível”, referiu o comunicado.

Reacção em cadeia
Com esta ruptura, Taiwan mantém apenas 19 aliados, dez dos quais na América Latina e Caraíbas.
Em Dezembro de 2016, São Tomé e Príncipe cortou as relações diplomáticas com Taipé e passou a reconhecer Pequim. Na mesma altura, o Presidente norte-americano, Donald Trump, decidiu dar protagonismo à ilha, com um telefonema a Tsai Ing-wen, o que agravou o relacionamento entre Pequim e Taipé.
Depois da vitória de Tsai nas presidenciais, Pequim interrompeu as negociações e contactos oficiais com Taipé, enviou navios e aviões militares para zonas mais próximas da ilha Formosa, e tem procurado isolar o Governo de Tsai.
O Vaticano, único Estado europeu com relações diplomáticas com Taiwan, está a negociar uma aproximação com Pequim, o que pode resultar numa mudança de apoio.
O número de países que reconhecem Taiwan caiu consideravelmente nas últimas décadas, tendo permanecido estável apenas durante a governação de Ma Ying-jeou, nos últimos oito anos, quando as relações entre Pequim e Taipé entraram num período de desanuviamento sem precedentes.

2 Mai 2018

A China e a inovação (I)

“China’s innovative ability languished after the fourteenth century. Today, however, China is determined not only to catch up with the West, but to re-establish itself at the forefront of technological innovation. Two forces are driving the surge of Chinese innovation. One is based on need-China’s pressing need to solve the myriad domestic problems that rapid economic development has created. The other is based on a new strategic direction for Chinese corporations: to enter high-value, high-margin sectors that are internationally competitive and where they will be matching global corporations, innovation for innovation. Much of this recent drive is through mergers with and acquisitions of successful Western firms that were made to gain brands, technology, and markets.”
“China’s Next Strategic Advantage: From Imitation to Innovation” – George S. Yip and Bruce McKern

[dropcap style≠‘circle’]O[/dropcap]s chineses inventaram a pólvora, bússola, roda de água, papel-moeda, serviço bancário de longa distância, serviço civil e a promoção de mérito. Até ao início do século XIX, a economia da China era mais aberta e estimulada pelo mercado do que as economias da Europa. Actualmente, porém, muitos acreditam que o Ocidente é o lar de pensadores e inovadores de negócios criativos, e que a China é em grande parte uma terra de aprendizes rotineiros, um lugar onde a P&D é diligentemente perseguida, mas as descobertas são raras. Quando perguntamos qual a razão, as respostas em geral variam, segundo um estudo conduzido pela Universidade de Harvard, pois algumas pessoas culpam os engenheiros.

A maioria das “start-ups” chinesas não é fundada por desenhadores ou artistas, mas por engenheiros que não têm criatividade para pensar em novas ideias ou projectos. Outros culpam o governo pela escala sem precedentes da sua falha em proteger os direitos de propriedade intelectual, chegando mesmo a invocar que os produtos da “Apple” foram pirateados em todo o mundo, mas absurdamente apenas a China abriu lojas totalmente falsificadas repletas de funcionários que pensam que trabalham para a empresa americana. Ainda outros culpam o sistema de ensino chinês, com a sua versão modernizada do que os japoneses denominam de inferno dos exames da China. Como é possível que estudantes tão completamente focados nos resultados dos testes possam ser inovadores?

As décadas de experiência de campo e pesquisa na China e as dezenas de estudos de casos que foram analisados e publicados, permitem observar a existência e pouco mérito em todos esses pontos de vista, devendo ressaltar que muitas das empresas ocidentais mais inovadoras foram fundadas por engenheiros. Tais críticas não contam toda a história. A China não tem falta de empreendedores ou procura de mercado e dada a enorme riqueza e vontade política do governo, o país tem o potencial de definir o tipo de políticas económicas e construir o modelo de instituições de ensino e pesquisa idênticas às que impulsionam os Estados Unidos no domínio tecnológico. Mas esse potencial é usado? É possível ver desafios consideráveis. A observação de como a inovação está a acontecer na China, de cima para baixo e vice-versa, através de aquisições e educação, lança luz sobre as complexidades da questão, destacando a promessa e os problemas que o país enfrenta na sua procura para se tornar o líder da inovação mundial.

O “Programa Nacional de Médio e Longo Prazo para o Desenvolvimento da Ciência e Tecnologia (MLP, na sigla em inglês)”, criado em 2006, declara a sua intenção de transformar a China em uma sociedade inovadora até 2020 e líder mundial em ciência e tecnologia até 2050. Tal declaração não é vazia, pois tem um histórico sólido de estabelecer políticas e incentivos, e depois observar os cidadãos e autoridades dos governos locais, até ao nível das aldeias, a segui-la. O governo chinês, durante quarenta anos, tem usado a sua riqueza de recursos e vontade política para estimular a inovação de topo. É de recordar que nas décadas de 1980 e 1990, a China criou a “National Natural Science Foundation of China” e o “State Laboratory”, e reformulou a “Academia Chinesa de Ciências” de estilo soviético para financiar pesquisas universitárias pré-comerciais em bases revistas pelos seus pares (em vez de políticas), da mesma forma que a “National Science Foundation” faz nos Estados Unidos.

Ao mesmo tempo, o Estado, com o apoio dos governos regionais, financiou o desenvolvimento de zonas de alta tecnologia para promover a comercialização da inovação. A partir de 1985, quando a primeira dessas zonas foi desenvolvida, em Shenzhen, proliferaram a ponto de serem uma paragem usual nas excursões oficiais de qualquer grande cidade chinesa. O poder do governo de moldar indústrias inovadoras novas pode ser visto nos efeitos das suas políticas no sector de turbinas eólicas, pois em 2002, lançou um processo aberto de licitação para projectos de parques eólicos para incentivar a concorrência entre os fabricantes de turbinas. As importações estrangeiras inundaram o mercado incipiente da China, e em um modelo que se repetiria em outras indústrias, o governo exigiu que as empresas estatais adquirissem 70 por cento dos componentes das empresas domésticas.

As empresas estrangeiras continuaram a investir directamente na China, mas até 2009, seis das dez maiores empresas de turbinas eólicas eram chinesas, o que culminou em um crescimento notável na participação das empresas domésticas nas vendas totais, que passaram de 51 por cento em 2006 para 93 por cento em 2010. O objectivo do MLP de 2006, era reduzir a dependência da China de tecnologia importada para uma cifra não superior a 30 por cento em poucos anos, aumentar o financiamento interno em P&D e ultrapassar os rivais estrangeiros no que o governo identificou como sectores estratégicos emergentes, biotecnologia, tecnologias de eficiência energética, produção de equipamentos, tecnologia da informação e materiais avançados. A fim de atingir tal objectivo, o governo chinês introduziu subsídios à exportação para as empresas chinesas e uma política que exige que os ministérios e as empresas estatais adquirissem bens, quando viável, de empresas de propriedade chinesa.

Apesar das objecções de que esses movimentos violassem os termos da participação da China na Organização Mundial do Comércio, poucas firmas internacionais saíram do país, tendo-se resignado a apoiar a inovação chinesa. Assim, enquanto em 2004 havia cerca de seiscentos centros estrangeiros de P&D na China, em 2010 esse número mais do que duplicou, e a sua grandeza e importância estratégica aumentaram. A “Pfizer” mudou a sua sede na Ásia para Xangai no mesmo ano e em 2011, a “Microsoft” abriu o seu centro de P&D na região Ásia-Pacífico, em Pequim, e a “General Motors” abriu um Centro Técnico Avançado, composto por vários laboratórios de engenharia e desenho. A sede da P&D da Ásia da “Merck”, em Pequim entrou em actividade em 2014. Talvez não exista uma demonstração mais possante da capacidade da China de estabelecer e realizar metas ambiciosas do que o apoio do governo ao transporte ferroviário de alta velocidade e os esforços para colocar seres humanos na Lua, em que ambos os projectos exigem financiamento em uma escala aparentemente impossível para o país.

É de acreditar na sua capacidade de inventar e adaptar numerosas tecnologias e que tais ambições podem impulsionar a inovação da mesma forma que os programas financiados pelo governo resultaram nos Estados Unidos na segunda metade do século XX. Há quem defenda limites, no entanto, para os que ainda consideram um governo demasiado musculado e motivado como o da China quanto às exigências em matéria de inovação e contra as intenções do governo e dos recursos nacionais, devido às correntes poderosas que se originam no sistema comunista e amenizadas pela forte liderança do presidente Xi Jinping e na cultura antiga da China. Existia o medo de que essas forças pudessem restringir a criatividade empreendedora que borbulha na China. No início da década de 1990, Edward Tian, um empreendedor educado nos Estados Unidos, fundou a “AsiaInfo”, que em três anos cresceu e se transformou em uma próspera empresa de trezentas e vinte pessoas e uma receita de quarenta e cinco milhões de dólares.

O então primeiro-ministro, em 1996, frustrado com o ritmo lento das mudanças tecnológicas no sector das telecomunicações da China, convenceu Tian de que era seu dever deixar a empresa para liderar uma nova empresa, a “China Netcom”, para construir uma nova rede de fibra óptica que ligasse cerca de trezentas cidades e passados cinco anos era uma empresa inovadora, com uma cultura aberta e criativa, apesar de ser propriedade conjunta de quatro agências governamentais. Em 2002, quando o gigante das telecomunicações “China Telecom” foi desmembrado pelo governo, os seus dez mercados provinciais do norte foram integrados à “China Netcom” e do dia para a noite, Tian tornou-se responsável por uma organização de duzentas e trinta mil pessoas.

O choque cultural entre as duas organizações foi extraordinário. Tian foi visto por muitos funcionários da “China Telecom” como um “outsider” americano que tentava reconstruir uma empresa estatal de forma inaceitável. Seis meses após a fusão, o estudo sobre o caso da “China Netcom” foi apresentado a setenta executivos chineses de topo, incluindo vinte da indústria de telecomunicações que em vez de extraírem lições sobre a relação entre mudança organizacional e o sucesso nos negócios, o grupo atacou Tian pela sua forma não-chinesa de administrar e de incompetência por apresentar a cultura do “Silicon Valley” na China de uma forma tão positiva, o que fez Tian abandonar o cargo na “China Netcom”. A “China Netcom” acabou por se parecer com uma empresa de telecomunicações moderna, com as estruturas de governança necessárias para serem cotadas nas bolsas de valores internacionais, mas permaneceu no coração de uma empresa estatal. Quando se pretende descobrir os gestores da empresa na procura do real proprietário poder-se-á pensar que é o secretário do partido, pois o “Partido Comunista da China” exige que um representante esteja presente em todas as empresas com mais de cinquenta funcionários. Todas as empresas com mais de cem funcionários devem ter uma célula partidária, cujo líder se reporta directamente ao partido no município ou província.

Tais requisitos não se vêem que possam comprometer a natureza proprietária da direcção estratégica, das operações e da vantagem competitiva de uma empresa, restringindo assim o comportamento competitivo normal. Mas mesmo se o governo dissolver as células partidárias e, em vez disso, redobrar os seus esforços para incentivar inovações revolucionárias, não haverá um desincentivo maior que seriam as realidades económicas dos mercados nos quais as empresas chinesas operam e há quem se interrogue qual o motivo de ter o trabalho de ser pioneiro em ofertas inovadoras, quando as recompensas e as perspectivas de crescimento para melhorias são tão grandes, quer no mercado doméstico como no exterior? Se considerarmos a plataforma de serviço “business-to-business (B2B) Alibaba”, que em 2001 era tão insegura que se temia que fosse à falência, mas que adaptou criativamente as tecnologias estrangeiras às necessidades dos mercados em desenvolvimento, e que serve cem milhões de clientes em quase duzentos e cinquenta países.

[continuação]
1 Mai 2018

Xi Jinping apela à cooperação com a Índia

O Presidente chinês, Xi Jinping, apelou à cooperação intensa com a Índia durante uma cimeira informal na sexta-feira com o primeiro-ministro indiano Narendra Modi, numa altura em que ressurgem tensões fronteiriças e rivalidades no domínio da influência local

 

[dropcap style≠‘circle’]X[/dropcap]i cumprimentou Modi no museu da cidade de Wuhan, no início de dois dias de encontros entre os líderes das duas nações mais populosas do mundo.

“Concretizar uma grande cooperação entre os nossos dois grandes países pode gerar influência mundial”, afirmou Xi, segundo a emissora estatal CCTV. Xi disse esperar que a reunião “introduza um novo capítulo nas relações China-Índia”.

Após a conversa, os dois líderes jantaram à beira do lago num dos ‘resorts’ preferidos do ex-líder chinês Mao Zedong, que estabeleceu fortes laços com a Índia independente antes de as relações se deteriorassem devido a disputas territoriais.

O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Índia, Raveesh Kumar, descreveu na rede social Twitter que os dois líderes “iriam rever a evolução das relações bilaterais numa perspectiva estratégica e de longo prazo”. As relações China-Índia datam de séculos, mas nas últimas décadas foram ensombradas pela corrida à liderança na Ásia.

Os países travaram uma guerra fronteiriça em 1962 e, no ano passado, envolveram-se num impasse de 10 semanas no Estado vizinho do Butão. Nova Deli ficou também alarmada com as iniciativas chinesas de construir laços estratégicos e económicos com países do Oceano Índico, incluindo o Sri Lanka, as Maldivas e o rival de longa data da Índia, o Paquistão.

A China, por sua vez, ressente-se do facto de a Índia acolher o líder espiritual tibetano exilado, o Dalai Lama, bem como o seu controlo de um território que Pequim diz pertencer-lhe.

 

Disputas territoriais

A China reivindica cerca de 90.000 quilómetros quadrados de território no nordeste da Índia, enquanto a Índia diz que a China ocupa 38.000 quilómetros quadrados e terras no planalto de Aksai Chin, no oeste dos Himalaias. As autoridades de ambos os países reuniram-se pelo menos 20 vezes para discutir as respectivas reivindicações fronteiriças, sem avanços significativos.

Após um impasse de anos, a Índia concordou, no ano passado, retirar as tropas do disputado planalto de Doklam (Himalaias) onde as tropas chinesas haviam começado a construir uma estrada. A China reclama esta região estrategicamente importante, mas a Índia diz que pertence ao seu aliado Butão.

Apesar dessas diferenças, Modi espera que a China possa ajudar a impulsionar o crescimento económico indiano antes das eleições nacionais de 2019. No entanto, seu governo tem-se mostrado relutante no apoio à iniciativa chinesa “Uma Faixa, Uma Rota” com a qual Pequim quer ligar a sua economia às da Ásia, Médio Oriente, África e Europa, através de empréstimos e avultados investimentos.

Tendo em conta as actuais relações, a cimeira de Wuhan está a ser encarada como uma tentativa consciente de conduzir os laços numa nova direcção, disse Wang Lian, professor da Escola de Relações Internacionais da Universidade de Pequim.

Independentemente do resultado da visita actual, Modi parece ter a intenção de construir um forte relacionamento pessoal com Xi, que será o líder da China nos próximos anos. Modi viajará novamente até à China em Junho para uma cimeira da Organização de Cooperação de Xangai, com oito membros, dominada por Pequim e Moscovo

Juntamente com a China, a Rússia e a Índia, esse grupo inclui os Estados da Ásia Central do Cazaquistão, do Quirguistão, do Tadjiquistão, do Uzbequistão e do Paquistão.

1 Mai 2018

Economia | EUA vão enviar delegação à China para discutir conflito comercial

Donald Trump fala no balanço do comércio externo entre Estados Unidos e China como uma enorme injustiça económica desde as primárias republicanas. Depois de eleito, Trump aumentou tarifas às importações de alguns produtos chineses, manobra que levou a uma conflito comercial. Agora surge a altura de pacificar um conflito que tem destabilizado os mercados financeiros

[dropcap style≠‘circle’]A[/dropcap] Casa Branca vai enviar nos próximos dias à China uma delegação ministerial, chefiada pelo secretário do Tesouro, Steven Mnuchin, para “chegar a um acordo” no comércio. “Penso que temos uma possibilidade muito grande de chegar a acordo”, disse o presidente norte-americano, Donald Trump, na terça-feira, ao receber o seu homólogo francês, Emmanuel Macron.
Trump acrescentou que o presidente chinês, Xi Jinping, que qualifica como “um dos seus amigos”, afirmou, “há quatro dias, que a China ia abrir-se”, deplorando: “De momento, ela não está aberta. Fazem comércio connosco, mas nós não fazemos com eles”.
O Governo norte-americano impôs tarifas aduaneiras suplementares sobre as importações de aço e alumínio provenientes da China, entre outras.

Sentar à mesa

Descontente com a dimensão do défice comercial dos EUA com a China e as práticas comerciais chinesas, que classificou como “desleais”, Trump ameaçou reforçar aquela medida com novas tarifas sobre importações chinesas, no montante de 41 mil milhões de euros.
“É por isto que vai uma delegação” a Pequim, “a pedido da China […] nos próximos dias”, indicou, acrescentando que seria liderada por Mnuchin. Esta vai ser a primeira viagem do secretário do Tesouro à China, enquanto os seus três antecessores se deslocaram a Pequim nos primeiros meses de exercício do cargo.
No domingo, o Ministério do Comércio chinês reagiu com satisfação à viagem. “A China recebeu bem a informação segundo a qual a parte norte-americana deseja deslocar-se a Pequim para realizar consultas sobre as questões económicas e comerciais”, segundo o comunicado que emitiu.

26 Abr 2018

Os quatro pecados mortais de Donald Trump

Fogo a bombordo, fogo a estibordo

O presidente dos Estados Unidos da América, Donald Trump, foi eleito contra toda a expectativa. E, mal eleito, foi objecto de um coro de violentas críticas – não só nos Estados Unidos mas em todo o Mundo. Mal eleito não – ainda antes de ser eleito. Não teve assim direito ao “estado de graça” que é uso conceder a todos os novos governantes até se ver o que efectivamente valem – uma vez que só lhe eram reconhecidas más qualidades. Trump até fazia jeito: num Mundo tão dividido havia ao menos uma personagem, um “palhaço”, de quem todos podiam mofar – sem infringirem as regras do “politicamente correcto”.

Entretanto, duvidoso de tanta unanimidade – after all somos todos diferentes – procurei entender o que se passava. Para as “Esquerdas” (especialmente no entender moderno da palavra) Trump era um alvo óbvio: defendia o capitalismo “puro e duro” (como aliás é uso defender na América) – não aceitava o Obamacare – e era rico – culpado portanto pelos sofrimentos dos pobres; era branco e loiro – carregando assim aos ombros os “crimes históricos” da raça branca; era homem – culpado assim do papel menor que até há pouco foi reservado às mulheres. Entre os políticos e intelectuais era desprezado, por não estar preparado para o cargo, e não ser dado a filosofias.

E quanto aos seus gostos femininos era óbvio que preferia as Barbies às professoras ou às médicas.

Desse lado, portanto, compreendiam-se os ataques – embora para mim seja mais apropriado julgar um político pelas suas medidas, do que pela sua maneira de ser. Mas logo após Trump começou a ser atacado também pelas “Direitas”, sendo um dos seus mais violentos críticos McCain, que não era de forma alguma uma personagem menor: herói de guerra, e antigo candidato republicano à Presidência dos EUA.

Esse ataque tomou formas especialmente virulentas: Trump foi acusado de ter perturbações psíquicas, estar vendido à Rússia, e não ter um mínimo de idoneidade moral. Até antigas actrizes de filmes pornográficos foram usadas nesta luta (lembrando a história do vestidinho de Monika Lewinsky). O antigo director do FBI, Comey, lançou-lhe um ataque que é um monumento à hipocrisia: “Trump não está mentalmente incapacitado – está é moralmente incapacitado”.

 

Procurando entender

É verdade que para o comum dos cidadãos a descrição das várias facetas da personalidade e episódios da vida de um político se pode assemelhar ao desenrolar de uma telenovela. Mas, em termos históricos, são as medidas defendidas e especialmente os resultados obtidos o que define um político: “Não importa que um gato seja branco ou preto, desde que cace gatos” disse uma vez Deng Xiaoping.

E assim para procurar entender os ataques de grande parte da Direita americana a Trump é necessário analisar as medidas por ele defendidas.

A campanha de Trump baseava-se no slogan “Make America great again” – e concretizava-se em cinco pontos: baixar os impostos, cortando as prestações sociais; limitar o número de emigrantes ilegais na América (expulsando parte deles), e impedir a entrada de mais – pelo que seria construído um muro na fronteira com o México; limitar a emigração de cidadãos de certos países muçulmanos; levantar barreiras alfandegárias a produtos chineses; e tentar um entendimento com a Rússia (com quem as relações estavam esfriadas como consequência da anexação da Crimeia).

Ora apenas o primeiro ponto era do agrado das Direitas; as restantes quatro intenções constituíram para as “Direitas” quatro “pecados mortais”.

 

O abraço do urso

Trump, na sua lógica capitalista, gostaria de favorecer as empresas, baixando os impostos. Ora para tal, uma das medidas (além dos cortes nos gastos sociais) seria baixar um pouco os gastos no campo militar – para o que era indispensável um entendimento com a Rússia. Isto também seria benéfico para a Rússia, em fase de reconstrução depois do buraco em que caiu com o fim do comunismo e a consequente desorganização do Estado.

Mas esse aliviar do “estado de guerra” seria uma má notícia para a indústria do armamento. Só a Rússia tem tecnologia que se compare com a dos Estados Unidos – já em 1957 lançaram o primeiro satélite – pelo que só a manutenção de um estado de conflito latente com eles poderia justificar despesas crescentes em investigação e modernização das forças armadas.

Assim rapidamente se avançou com a ideia de que a Rússia teria ajudado Trump a ganhar as eleições, que teria havido contactos entre pessoas da sua “entourage” e agentes russos, etc.; e que, quando tais factos se procuraram esclarecer, Trump havia tentado impedir o prosseguimento das investigações. Esta “teoria”, por um lado ajudava a “explicar” a derrota de Clinton, e por outro lançava sobre Trump, embora sem o dizer expressamente, o labéu de traidor.

Ora tudo isto parece um pouco incrível – o país que mais se imiscui na política alheia são precisamente os Estados Unidos; e entre os políticos há estranhas alianças – os inimigos dos meus inimigos meus “amigos” são. Os contactos ou as conversas entre governantes (ou seus assessores) são normais, e muitas vezes secretas – pelo que não faz sentido (excepto em caso de traições propriamente ditas) que sejam objecto de “inquéritos”, para mais por órgãos do Estado.

Entretanto, esta campanha já deu os seus frutos – está instalada na população americana e europeia a ideia de que a Rússia é “má” – e, portanto, há que nos defendermos, para o que são necessárias novas e melhores armas (nos bombardeamentos na Síria experimentou-se a eficácia de novas armas).

 

 

O amigo árabe

Um dos mais estranhos episódios do início do mandato de Trump foi o de este pretender vedar a entrada nos Estados Unidos a cidadãos de sete países árabes – medida que foi contestada e rejeitada em sede judicial. E estranha porque, nessa mesma altura, a América travava guerras e fazia bombardeamentos em vários países árabes – Paquistão, Iraque, Síria, Qatar, Líbia…- sem que isso parecesse incomodar ninguém (excepto os cidadãos desses países, evidentemente). Que seria pior? Serem alguns residentes proibido de entrar ou ser queimado por uma bomba? Para os media parece que a 1ª hipótese era a mais gravosa. A guerra poderia prosseguir.

 

Os emigrantes e o muro

A ideia – actualmente em fase de concretização – da construção de um muro entre o México e os Estados Unidos para impedir a emigração ilegal foi das que despertou maior coro de protestos contra o actual presidente americano. Nas palavras dos seus opositores a ideia de fazer tal muro denunciava insensibilidade aos problemas dos mexicanos pobres, que assim deixariam de ter uma hipótese de entrar nos Estados Unidos.

Só que…esse muro já existia desde há dezenas de anos, e numa extensão de cerca de mil quilómetros (sendo o proposto por Trump apenas um completamento) – mas mal havia sido notícia, nem havia sido “apontado o dedo” ao ou aos que o havia mandado construir.

Outro facto que também evidencia a diferença de tratamentos dado pelos media conforme se trate de amigos ou de inimigos: durante a presidência de Obama foram expulsos muitos milhares de emigrantes ilegais sem que isso fosse notícia, enquanto o simples enunciado dessa hipótese por Trump logo apareceu criticado em parangonas nos jornais.

E porque tal ataque à limitação da emigração de mexicanos (e outros sul-americanos)? Pois porque estes constituem na América um manancial de mão de obra barata e sem direitos sociais, dado serem clandestinos. Todos sabemos como em Macau há uma pressão constante para a entrada de mais e mais trabalhadores não residentes para assim baixar os custos de mão de obra.

 

A “guerra económica” com a China

Outro aspecto alvo de amplas críticas foi o facto de Trump ter decidido taxar uma série de produtos chineses, invocando o desequilíbrio da balança de pagamentos (e possivelmente a vontade de auto-suficiência em matéria militar, embora esse argumento não fosse expressamente referido). A globalização ajudou de facto certos países, mas teve (e tem) a injusta face de pôr a competir empresas em que os salários altos e tem de obedecer a leis ambientais mais ou menos apertadas, com outras de mão de obra barata e regulamentação mais relaxada.

A globalização permitiu que produtos pagos a x dólares nos países “pobres”, fossem vendidos a 10 ou 20 vezes mais dólares (e por vezes mesmo a mais) nos países “ricos”, o que deu origem a que enormes fortunas fossem acumuladas – (contribuindo para a actual “economia de casinos”) enquanto aumentava o desemprego nos países anteriormente industrializados. Uma das nações que poderá sofrer com esse protecionismo – indevidamente chamado de guerra – é a China (ao menos no curto prazo, no longo até poderá beneficiar na medida em que aumente a auto-suficiência); mas o certo é que temos que entender que Trump é presidente da América e não da China.

Mas os americanos que fazem os tais negócios da China não vão perdoar a Trump estas “aventuras”.

 

A teoria da conspiração

Os jornalistas tiveram assim, da parte dos principais meios de comunicação mundial, que estão, como se sabe, na mão dos grandes magnatas, “rédea livre” para atacar Trump – o que era fácil dada a sua figura vagamente caricata (com uma franjinha ridícula, olhos pequeninos e aureolados por papos esbranquiçados), o seu aspecto arrogante, e o seu desamor pelos pobres. Mas esses magnatas deram plena liberdade aos jornalistas pois lhes interessa manter na América milhões de emigrantes ilegais a trabalhar a preços inferiores aos dos trabalhadores “legais”, um estado permanente de guerra larvar com a Rússia para manter a indústria e a investigação militares florescentes, uma globalização da qual arrecadam biliões. Mas esses objectivos, por inconfessáveis, têm de vir mascarados com roupagens de amor pelos desfavorecidos e pela verdade, para que se tornem aceitáveis para o comum do Zé Povinho.

26 Abr 2018

Diplomacia | Pequim refuta críticas dos Estados Unidos sobre direitos humanos

A China qualificou como parcial um recente relatório sobre direitos humanos divulgado pelos Estados Unidos e disse que o objectivo de interferir nos assuntos internos da China está “condenado ao fracasso”

[dropcap style =’circle’]P[/dropcap]equim contestou oficialmente o relatório do Departamento de Estado dos Estados Unidos da América. Fê-lo através do porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Lu Kang, que falou à comunicação social na habitual e diária conferência de imprensa.

Os comentários do porta-voz foram feitos em referencia ao relatório global dos direitos humanos 2017 publicado pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos, um documento que critica intensamente os direitos humanos na China. “Os Estados Unidos divulgam esse relatório ano após ano e apontam o dedo para os outros países. A maioria dos membros da comunidade internacional está insatisfeita com isso”, disse Lu. De acordo com o Ministério das Relações Externas da China, o relatório deste ano, como sempre, ignora factos e é extremamente parcial.

“A China informou claramente aos Estados Unidos que seu intento de interferir nos assuntos internos da China e dificultar o desenvolvimento da China foi em vão no passado e que não terá êxito no futuro”, disse Lu.

“O Governo chinês dá grande importância à protecção e impulso dos direitos humanos, e obteve progresso histórico em tal campo. O povo chinês é o que pode dizê-lo melhor”, assinalou.

“A China é a favor de negociações e intercâmbios entre países na área dos direitos humanos com base na igualdade e a confiança mútua”, disse o porta-voz do Governo chinês. Lu Kang explicou ainda que “a maioria dos países, incluindo a China, se opõem à politização do assunto dos direitos humanos”.

Relatório minoritário

O documento emitido pela Casa Branca não destaca, pela negativa, apenas Pequim. “Os Governos de China, Rússia, Irão e Coreia do Norte violam todos os dias os direitos humanos daqueles que estão dentro das suas fronteiras e, como resultado, gera-se instabilidade”, escreveu o secretário de Estado norte-americano John Sullivan, no prefácio do documento anual.

Porém, no que à China diz respeito, o relatório refere que as piores violações de que “foi responsável o Governo” incluíram-se as “execuções sem o devido processo prévio”, “desaparecimentos forçados”, torturas, “detenções arbitrárias” e ilegais, e restrições às “liberdades de expressão, imprensa, reunião, associação, religião e movimento”.

25 Abr 2018

Presidentes da China e Índia reúnem-se no fim-de-semana

[dropcap style=’circle’] A [/dropcap] cooperação e a gestão adequada das diferenças vão estar em foco na reunião informal, na sexta-feira e no sábado, entre o Presidente chinês e o primeiro-ministro indiano, foi ontem anunciado.

A reunião entre Xi Jinping e Narendra Modi vai ser uma “oportunidade para aumentar a confiança mútua, aprofundar a cooperação pragmática, gerir adequadamente as diferenças, alcançar o desenvolvimento comum e contribuir para a promoção da paz e do desenvolvimento global e regional”, afirmou o chefe da diplomacia chinesa, Wang Yi, no final de um encontro, no domingo, com o homólogo indiano, Sushma Sawraji.

“As relações entre a China e a Índia mantiveram um desenvolvimento positivo”, indicou Wang no final da reunião, de acordo com agência noticiosa oficial chinesa Xinhua. Swaraji declarou que o encontro “reflecte o forte desejo de ambos os lados de fortalecer a comunicação estratégica” e insistiu que a Índia quer que a amizade entre Xi Jinping e Narendra Modi, que estiveram reunidos em Setembro passado, seja fortalecida e a cooperação entre os dois países atinja um novo máximo.

De acordo com observadores, os dois líderes vão, no encontro que se vai realizar na capital da província central chinesa de Hubei, discutir pontos de vista sobre a situação internacional e regional e poderão ainda abordar a questão das disputas territoriais na fronteira, entre outros assuntos.

Em Junho do passado, soldados dos dois países estiveram frente a frente numa zona disputada entre a China e o Butão, Doklam, ou Donglang (em chinês). A zona é reclamada pelo reino do Butão, um aliado de Nova Deli, mas Pequim diz pertencer à China, com base num tratado de 1890, assinado com o Reino Unido.

Butão e China participaram em várias rondas de diálogo, mas nunca resolveram a disputa. China e Índia, ambas potências nucleares, partilham uma fronteira com 3.500 quilómetros de extensão, a maioria contestada. Diferendos territoriais levaram a um conflito, em 1962, que causou milhares de mortos.

24 Abr 2018

Tecnologia | Empresas acusam Alibaba de pressão para acordos exclusivos

[dropcap style=’circle’] E [/dropcap] mpresas estrangeiras acusaram o gigante do comercio electrónico chinês de punir quem recuse fazer acordos de exclusividade com o Alibaba, uma acusação que a multinacional considerou “absolutamente falsa”.

Directores executivos de cinco grandes marcas de consumo, que pediram o anonimato, disseram à agência noticiosa Associated Press (AP) que, depois de rejeitarem a proposta de exclusividade do Alibaba, as vendas nas lojas ‘online’ Tmall [plataforma ‘online’ de vendas a retalho na China e que opera através do Alibada] caíram de forma notória. Esta situação resulta, segundo a AP, do rápido crescimento de outra plataforma de venda ‘online’, a JD.com.

A American Apparel & Footwear Association, um grupo industrial com sede em Washington, disse à AP que os seus membros protestaram contra táticas injustas do Alibaba. “Pedimos às autoridades que investiguem rapidamente e que tomem medidas para garantir que tais práticas sejam eliminadas do mercado chinês”, disse Stephen Lamar, vice-presidente executivo da associação, à qual pertence a JD.com, que é também patrocinador.

No mês passado, o director financeiro da JD.com, Sidney Huang, tinha afirmado que a empresa ainda está a tentar reconquistar mais de 100 marcas chinesas que abandonaram a plataforma sob pressão do Alibaba. “Nós apoiamos a concorrência justa e aberta, porque uma maior escolha é sempre melhor para marcas e para os utilizadores”, disse a JD.com, em comunicado.

 

Conceito de liberdade

Em comunicado, o Alibaba reconheceu que oferece benefícios às empresas que assinam contratos de exclusividade, em conformidade com a lei chinesa, mas acrescentou que as empresas são livres de escolherem qualquer plataforma de comércio electrónico.

 

“Como muitas plataformas de comércio electrónico, temos parcerias exclusivas com alguns dos comerciantes da Tmall”, indicou o Alibaba, sublinhando que “o comerciante decide escolher o acordo por causa dos serviços atraentes e do valor que a Tmall lhe pode trazer”.

De acordo com a lei antimonopólio chinesa, as empresas com posição dominante no mercado não podem exigir exclusividade sem apresentar uma justificação plausível.

O Alibaba é duas vezes mais lucrativo que a concorrente norte-americana Amazon e todos os anos serve mais pessoas do que as que vivem em toda a América do Norte.

De acordo com a AP, o Alibaba faz mais de 448 mil milhões de euros por ano em vendas, mais do que em todas as transacções ‘online’ nos Estados Unidos.

 

Destaque: Em comunicado, o Alibaba reconheceu que oferece benefícios às empresas que assinam contratos de exclusividade, em conformidade com a lei chinesa, mas acrescentou que as empresas são livres de escolherem qualquer plataforma de comércio electrónico.

24 Abr 2018

Cartas de condução | Ng Kuok Cheong exige interrupção do reconhecimento mútuo com China

[dropcap style =’circle’] O [/dropcap] deputado Ng Kuok Cheong considera que o Governo ignora as opiniões da população, que está num caminho que não é o correcto ao nível da cooperação com as regiões da China e, por isso, defende a suspensão do reconhecimento mútuo das cartas de condução com o Interior da China. Este é o conteúdo da última interpelação escrita pelo pró-democrata.

No documento, o membro da Assembleia Legislativa recorda que o Governo tinha sempre dito que não havia uma calendarização para implementar esta medida, mas que depois publicou um documento contrário no Boletim Oficial. Nesse documento, o Chefe do Executivo autorizou o secretário para as Obras Públicas e Transportes a assinar o acordo com as autoridades do Interior da China. Os moldes até agora desse eventual acordo ainda não são conhecidos.

Tendo em conta este contexto, Ng Kuok Cheong afirma que o Governo tinha conhecimento da posição adversa da população perante a medida, mas que mesmo assim decidiu seguir em frente. E é esta a principal justificação para que considere que o “ Governo ignora as vozes da população”.

Por outro lado, o pró-democrata questionou o Executivo sobre se o trânsito no território e as condições de emprego dos motoristas locais e dos residentes em geral se vão degradar com a implementação do reconhecimento das cartas. Nesse sentido, e até haver uma resposta, Ng Kuok Cheong quer que os procedimentos para assinar o acordo sejam interrompidos e que seja feita uma consulta pública.

Além disso, o deputado pede ainda que o Governo local comunique com o Governo Central e com as cidades chinesas para informá-las das reais características de Macau e das capacidades rodoviárias da cidade. Ao mesmo tempo, Ng Kuok Cheong sugere que da parte do Governo Central sejam tomadas medidas para que os reconhecimento para os condutores de Macau entre já em vigor.

Por outro lado, o deputado defende que enquanto o reconhecimento não avançar, as autoridades devem melhorar a situação do trânsito e criar melhores condições pedonais, para que as pessoas possam andar a pé.

24 Abr 2018