Sofia Margarida Mota PerfilPerfil | Alexandra Ascenso, veterinária [dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]hegou a Macau há sete anos. A vinda para o território aconteceu através de um contacto de um colega de profissão que cá estava. “Estavam a pedir um médico veterinário para uma substituição devido a umas férias e vim por um período de três meses, com a possibilidade de alargar o contrato”, conta Alexandra Ascenso ao HM. Agora, proprietária da sua clínica, a TaipaVet, a veterinária recorda que o caminho não foi fácil e que lhe pregou algumas partidas. Dos altos e baixos que tem encontrado, Alexandra Ascenso destaca, pela positiva, o tempo que trabalhou numa clínica chinesa. As diferenças foram evidentes entre o trabalho efectuado em clínicas ocidentais e locais. “O ambiente na clínica chinesa era muito bom mesmo”, refere. “A maioria dos profissionais era de Taiwan e fiquei muito surpreendida, até porque encontrei um ambiente mais acolhedor do que o que tinha encontrado antes”, recorda. Quando chegou a Macau, nem tudo foi simples e a adaptação entre colegas portugueses no território não correu da forma esperada. “Quando cheguei a Macau achei tudo muito fechado, havia muito poucas clínicas em termos veterinários e só conhecia os profissionais que trabalhavam comigo, sem que houvesse qualquer tipo de entreajuda”, lamenta. Habituada a Portugal, onde tinha trabalhado antes, a jovem profissional estranhou, mas foi com o convívio local que “os horizontes se voltaram a abrir”. Na parte técnica, os profissionais do território também não desapontaram. Independentemente de estar ou não de acordo com um ou outro procedimento, o profissionalismo é inquestionável. “Vinha com a ideia errada de que os médicos chineses são terríveis e, por regra, os veterinários têm uma boa formação”, comenta. A abertura de uma clínica aconteceu quase por acaso, “porque surgiu a oportunidade”, aponta. “Não sou grande fã no que respeita a gestão e o meu lema era que se me fossem oferecidas boas condições de trabalho, não haveria necessidade de ter o meu negócio”. Mas as circunstâncias foram diferentes. No local onde trabalhava existiam algumas particularidades que não iam de encontro ao que Alexandra Ascenso pretendia. “Os dias de férias, por exemplo, não me agradavam e para continuar em Macau, com qualidade de vida, precisava de fazer escolhas”, aponta. Uma questão de medicina Apesar de a ideia geral ser de que para se seguir veterinária a condição essencial será gostar de animais, Alexandra Ascenso não concorda e afirma que a realidade não é propriamente essa. “O ideal é realmente gostar dos animais, mas há muitos veterinários, bons profissionais, que não gostam particularmente de bichos. Não são o típico ‘dog lover’ que muitas vezes vemos em voluntários de associações de protecção animal.” Para Alexandra Ascenso, um veterinário é um médico, mas de animais e, como tal, “para ser bom profissional não tem de passar o dia a fazer festinhas aos animais e a derreter-se sempre que vê um cão ou um gato”. “Tem de se gostar de medicina”, vinca. No seu caso, junta-se o útil ao agradável. Alexandra Ascenso sempre quis seguir medicina e “até gostava muito de animais”. A solução foi imediata e perfeita, até porque não se via a ter outro tipo de pacientes. O facto de os bichos não falarem é o grande desafio. “Temos de trabalhar muito com o que diz o dono, mas também temos de aprender a ver sinais que nos levam a perceber o que se passa com o animal”, comenta. É aqui que também existe alguma pedagogia: ensinar os donos a tratarem dos seus animais e a conhecê-los. “Noto que, na comunidade chinesa, há ainda clientes que não sabem muito bem o que é um cão e um gato – falo destas espécies porque são as que vemos com mais frequência. Têm o animal, mas não percebem as suas necessidades.” Alexandra Ascenso dá exemplos: “Há situações de gatos dentro de casa, em jaulas, porque os donos ainda não sabem que os gatos podem andar livremente. Por outro lado, há cães de médio porte que ainda vão à rua de troller”. No entanto, não deixa de sublinhar que, no território, as pessoas estão muito abertas ao que os veterinários dizem, o que faz com que seja fácil trabalhar em Macau.
João Luz Ócios & NegóciosHonest Pizzeria | Tik Man Yuen, sócio-gerente Quem gosta de pizzas à americana tem um novo restaurante na zona velha da Taipa. Apesar da ementa estar ainda em criação, as pizzas de massa fina de frango e alho e meat lovers são já um sucesso [dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]sta comida é um exemplo da universalidade gastronómica, que ultrapassa fronteiras e se torna global. A pizza é algo que há muito tempo não se confina a Nápoles, em particular desde que atravessou o Atlântico em direcção à América do Norte. É desta universalidade servida em fatias que é feita a curta história da Honest Pizzeria. O restaurante nasceu da vontade de três amigos que passaram parte das suas vidas no exterior e que depois de voltarem a Macau sentiram falta de algo: comer uma fatia grande de pizza, à moda de Nova Iorque, com massa fina e crocante, longe das apropriações da comida rápida. Assim sendo, a Honest Pizzeria começa na amizade entre amigos que se tornam sócios: um viveu em São Francisco, outro estudou na Austrália e Tik Man Yuen cresceu em Toronto, no Canadá. “Nós sentimos falta deste tipo de pizza, estávamos habituados àquelas grandes fatias, à americana, e não havia nada disto em Macau”, conta Tik Man Yuen. Comer a iguaria era sempre uma frustração, nunca correspondia às expectativas “no sabor e em tudo o resto”. “Decidimos que seria algo que podíamos fazer, se ninguém o faz por que não nós?”, interroga-se o sócio-gerente. E assim começou a Honest Pizzeria, numa série de conversas no ano passado, até abrir as portas à experiência no dia 1 de Junho. Tik Man Yuen adianta que a abertura oficial do restaurante está prevista para o final de Agosto, ou início de Setembro. Para já, a popularidade da pizzaria vai crescendo com base na palavra passada, sendo que as pizzas mais populares entre a clientela são a pizza de galinha e alho, a pizza aloha e a pizza meat lovers. Esta é uma das comidas mais famosas do mundo, é muito difícil encontrar uma pessoa que nunca tenha comido uma fatia. Daí a aposta na qualidade como forma de surpreender a clientela. “Acho que não há por cá muitas pessoas que tenham comido uma pizza como a nossa”, teoriza Tik Man Yuen, que recorda um episódio com uns turistas do Interior da China. “Ficaram impressionados com os tamanhos das fatias, nunca tinham visto nada assim, experimentaram e gostaram muito”, conta. Palavra a palavra Desde que a Honest Pizzeria abriu em fase experimental, mesmo com a falta de promoção, o negócio tem corrido bem. “Os clientes vão passando a palavra, o que significa que a nossa pizza é de qualidade, que supera as expectativas”, explica Tik Man Yuen. Com a abertura oficial no horizonte, a Honest Pizzeria ainda está em fase de acerto de ementa, em fase de experimentação e estudo para actualizar a oferta. “Estamos a tentar perceber onde podemos melhorar e estamos a estudar a forma de incorporar ingredientes orientais nas nossas pizzas”, conta o sócio-gerente. Os donos da Honest Pizzeria conhecem o mercado onde estão e o gosto asiático pelo peixe e marisco; assim sendo, pizzas com estes sabores encontram-se em fase de testes. Porém, esta é uma pizza eminentemente ocidental. “Os nossos clientes têm, sobretudo, um background no Ocidente não são necessariamente caucasianos, ou portugueses, mas são como eu, cresceram fora”, elabora o gerente. A clientela local, assim como os turistas, também tem experimentado a ementa da Honest Pizzeria e denotado a diferença para as pizzas dos restaurantes de comida rápida e pizzas congeladas. O restaurante tem uma atmosfera descontraída, relaxada, com música para acompanhar a refeição. É um sítio que pretende transmitir algum cosmopolitismo, indo de encontro às experiências do trio de donos. Quem quiser provar a ementa da Honest Pizzeria, basta dar uma saltada à zona antiga da Taipa. Para aqueles que preferem degustar uma pizza com um filme, ou simplesmente no recanto do lar, existe um serviço de entregas disponível.
Sofia Margarida Mota Perfil PessoasPerfil | Nelson Moura, jornalista [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]asceu no coração do Porto, na Sé, e desde pequeno que se interessa pelas notícias do mundo. “Todos os fins-de-semana ia com os meus pais à praia e, enquanto eles liam o jornal, eu lia as minhas bandas desenhadas”, recorda. Mas não ficava por aí. “Quando acabava as bandas desenhadas, os meus pais já tinham acabado os jornais e era altura de eu lhes pegar”, conta. A razão tem que ver com o facto de sempre ter gostado de ler, mesmo que não entendesse bem o que lia. A formação numa área ligada à comunicação social era evidente. “Estudei Ciências da Comunicação na Universidade Católica de Braga. Acabei em 2011 e depois fiz um estágio profissional de seis meses na secção do Porto da revista Visão.” No entanto, o mercado de trabalho em Portugal não era o melhor e, de modo a abrir horizontes e procurar mais possibilidades, Nelson Moura foi fazer um curso de jornalismo internacional na London School of Journalism. Não contente, prosseguiu com um mestrado na mesma área, em Cardiff, que foi fundamental na sua formação, diz. “Aprendi mais num ano neste mestrado do que nos três em Portugal”, aponta. A razão é simples: “Foi um curso muito prático com um leque de alunos muito internacional”. Para Nelson Moura, as falhas que teve em Portugal deveram-se a circunstâncias específicas, até porque era um curso que ainda estava a ser consolidado naquela universidade. Por outro lado, os primeiros dois anos foram, na opinião do jornalista, muito teóricos. “Como escrever e como entrevistar, por exemplo, não eram áreas muito exploradas no ensino”, compara, sendo que em Inglaterra era enviado para a rua e tinha de se “desenrascar”. A caminho do Oriente O Oriente apareceu primeiro com Taiwan. Nos últimos meses de mestrado em Cardiff e com os colegas asiáticos teve conhecimento de um projecto do Ministério do Turismo de Taiwan. A ideia era escrever uma peça acerca da cultura daquela região. “Era um projecto de divulgação turística e tinha direito a uma bolsa. Fiz uma candidatura para escrever acerca dos aborígenes de Taiwan, um conjunto de tribos descendentes dos maori da Polinésia, que chegaram ali e se estabeleceram”, conta. Foi uma altura muito rica culturalmente. “Viajei pelo país e fiz entrevistas a várias tribos que ainda existem. São pessoas que ainda têm uma grande proximidade com a terra e com o ambiente à sua volta. São atléticos. Diz-se mesmo por lá que os aborígenes podem ser comparados, se falarmos no Ocidente, aos descendentes africanos, que são os melhores em música e no desporto”, refere o jornalista. Depois de terminado este projecto e porque gostou de viver em Taiwan, decidiu aprender a língua. Inscreveu-se na universidade em Taipé onde, durante um ano, esteve a aprender mandarim. No entanto, como a maior parte dos alunos eram estrangeiros, a comunicação acabava por ser toda em inglês. “Por outro lado, as pessoas acabam por ter a tendência para se isolarem, com outros estrangeiros”, explica Nelson Moura. Por isso, e de modo a embrenhar-se na língua, mudou de estratégia e foi aprender mandarim para uma escola profissional que ensinava a língua a trabalhadores estrangeiros. “Eram só vietnamitas e japoneses que não sabiam falar inglês”, conta. Foi ali que acabou por aprender “muito mais chinês do que na universidade”. Foram dois anos para assimilar a cultura, a língua, o país. “É um país muito acolhedor”, recorda. Macau, um lugar difícil Depois dos estudos e de ter trabalhado como professor de Inglês, jornalista freelancer que “escrevia artigos de vária ordem” e sem conseguir visto de trabalho, decidiu mandar o portfólio para os vários jornais de Macau. “Acabei por ser chamado para onde estou agora, o que até calhou bem.” “O meu português está, há muito, bastante enferrujado na escrita, por isso ainda bem que estou a trabalhar em inglês, onde me sinto mais à vontade”, explica. Está em Macau há cerca de um ano e a adaptação não foi fácil. “Macau é o oposto de Taiwan”, diz. “O território é muito fechado, com muito trânsito e não há para onde fugir. Em Taiwan, a meia hora da cidade, de comboio, conseguimos estar na praia ou na montanha, conseguimos estar no meio da natureza e aqui é impossível”, diz. “Macau é como uma panela de pressão”, metaforiza, tendo em conta os limites e a humidade. As coisas foram, com o tempo, melhorando. Agora já sabe onde ir para relaxar e evitar as multidões. “Dantes gostava muito de ir ao templo que fica por detrás do Jardim de Camões. Era um lugar mágico. À noite está cheio de gatos e incenso, e era um dos poucos sítios em que me sentia bastante relaxado. Agora vivo mais perto de Coloane e o meu sítio de eleição é a praia de Cheoc Van porque atrai muito menos gente do que Hác-Sá”, remata o jornalista do Porto.
João Luz Ócios & NegóciosRoomage 30 | Carr Che, gestora do espaço Ao lado da Igreja de São Francisco Xavier há um sítio que multiplica possibilidades. Roomage 30 congrega as funções de uma loja, café, galeria de arte, espaço para workshops, concertos, feiras improvisadas. Basicamente é um sítio onde coolness e criatividade florescem [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] número em Roomage 30 representa a percentagem dos lucros que o espaço doa para caridade, ou seja, 30 por cento. Este é um dos cartões-de-visita de um daqueles locais que nasce espontaneamente da criatividade de uma juventude inquieta. Tudo começou há dois anos quando um grupo de amigos iniciou o projecto com a cooperação da Caritas, que cedeu o espaço. “Trabalhámos juntos para criar um espaço novo, com novos elementos, com capacidade para organizar exposições e vender produtos locais com bom design”, explica Carr Chen, uma das pessoas que gere a Roomage 30. Além das valências elencadas, o local também se destina a receber exposições de fotografia, workshops com os mais variadíssimos conceitos, feiras da ladra. Outra dos aspectos primordiais do sítio é ser um porto de abrigo para quem se interessa por arte urbana. “Roomage 30 é um espaço também para os criadores de street art e para diferentes tipos de manifestações artísticas”, explica Carr Chen. Uma das pessoas no cerne do espaço é Pat Lam, mais conhecido por Pibg Gantz, o nome com que assina grafittis. Como não podia deixar de ser, a presença do graffiter torna o espaço numa paragem obrigatória para os aficionados das expressões artísticas urbanas. “O mais importante para a street art é ter um ambiente, um local onde possa ser criada”, comenta a gestora. Carr Chen acrescenta ainda que em Macau existem poucos sítios onde este tipo de arte pode ser posto em prática. “Estamos dedicados a lutar por mais paredes e espaços para criar street art”, explica. Número 30 O local tem uma dinâmica muito imprevisível e fluida. Tanto pode organizar um concerto, como ceder o espaço a uma marca. É o que acontece actualmente. De momento, a Roomage 30 acolhe uma pop-up store, um conceito comercial baseado no improviso e no comércio inesperado. O local está entregue a uma marca de roupa local chamada Mr. Stockman. Este é outro dos objectivos do espaço, oferecer uma casa a designers, criadores e marcas locais. “Esperamos no futuro poder partilhar instalações com um bom designer local e dar a conhecer o seu trabalho ao nosso público”, projecta Carr Chen. Uma ideia que começou pequena, com uma clientela basicamente local, começa a chegar a um universo mais alargado. A pequena exposição que a Roomage 30 teve em meios de comunicação de Hong Kong e da China Continental deu-lhe visibilidade que tem atraído alguns turistas. A Roomage 30 tem no nome um compromisso. Dos lucros apurados, 30 por cento reverte para instituições de caridade apoiadas pela Caritas de Macau. “Sentimo-nos muito agradecidos por estarmos envolvidos neste aspecto de caridade”, explica a gestora do espaço. Carr Chen tem noção de que o montante das contribuições que reverte a favor da Caritas pode não ser avultado; ainda assim, é algo que merece o esforço e a dedicação total da equipa da Roomage 30. Não admira que quem lá trabalhe se sinta realizado, apesar da azáfama que o espaço implica. Nesse aspecto, os fins-de-semana representam os picos de actividade da Roomage 30, principalmente quando é organizado algum evento especial, como uma feira improvisada ou uma exposição. “Durante os dias de semana, o espaço é bastante acolhedor e tranquilo”, revela Carr Chen. O aspecto filantrópico, a consciência social e a vitalidade criativa são aspectos nucleares no conceito do espaço. Revestida de um grande componente social, cultural e solidária, a Roomage 30 é um ponto de encontro de várias valências de uma instituição que promete ser uma pequena referência na cultura local. É uma casa para uma geração que vive da criatividade que se esconde nas margens da cultura, ao mesmo tempo que fomenta um forte sentimento de comunidade.
Andreia Sofia Silva PerfilPerfil | Sara Figueira, artista de maquilhagem e pintura corporal [dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]as mãos de Sara Figueira saem verdadeiras obras de arte, mas aplicadas ao corpo humano. Com 30 anos de idade, Sara cresceu em Macau e desde cedo revelou uma paixão e uma apetência para a pintura facial e corporal, pensada para espectáculos e actividades com artistas de rua. O trabalho que hoje desenvolve para diversas entidades ligadas ao mundo do entretenimento e do espectáculo começou quando era criança. “Em pequena observava a minha mãe, que sempre se maquilhou muitíssimo bem”, contou ao HM. “Ela dava-me liberdade para experimentar algum batom, sombra ou rímel. A maquilhagem é um acto muito íntimo para a mulher, em que muitas vezes estás contigo própria e com a imagem reflectida no espelho. Uma mulher tem de dar atenção à sua imagem e à mensagem visual que quer transmitir”, apontou. Quando era adolescente, os videoclips dos cantores pop que passavam na televisão passaram a ser não só uma fonte de inspiração como um fascínio. “Por mera graça comecei a tentar reproduzir os vários estilos que via e a explorá-los. Porquê ficar só limitada ao batom e ao rímel? Porque não desenhar na cara e no corpo? A pele é o nosso maior órgão e é como se fosse uma tela, se quisermos podemos ser obras de arte.” Das perguntas passou aos actos, e Sara Figueira decidiu fazer da maquilhagem a sua profissão. Foi esta área que estudou em Portugal, onde fez os estudos superiores. “Aos 25 anos, devido a esta paixão pelo mundo da maquilhagem, decidi aprofundar os meus conhecimentos e tirei um curso de maquilhadora profissional na Make Up School em Portugal. Tive mestres excelentes que me ensinaram bastante e que me deram as ferramentas certas para progredir.” Horas de pinturas Sara Figueira pinta os rostos e os corpos de crianças e adultos, e os trabalhos que desenvolve têm diferentes graus de dificuldade. Ainda assim, todas mas maquilhagens “são estimulantes e puxam pela criatividade”. “Cada pintura é um desafio. Normalmente, um trabalho de pintura corporal demora entre quatro a seis horas, por isso tenho de ser bastante persistente. Às vezes é preciso muita concentração, não só minha, mas também da pessoa que está a ser pintada, mas tenho sempre o foco de acabar tudo o mais rápido possível, para não atrasar a hora do início do espectáculo.” Sara Figueira recorda os trabalhos que realizou para a ArtFusion Macau, apresentados no festival Fringe de 2015. “Foi um sucesso e foram trabalhos que foram muito bem fotografados, e ficam, por isso, eternizados.” Macau, aquele oásis Aos 16 anos, Sara Figueira fez as suas primeiras maquilhagens faciais para uma festa de aniversário. A viver em Macau na altura, tudo era diferente. “Tenho recordações muito ternas e boas da minha juventude aqui”, recorda. “Vi Macau crescer desde 1995. Quando cheguei com a minha família fomos viver para a zona do NAPE, que era considerada uma zona fantasma.” Lá, Sara Figueira podia dar-se ao luxo de andar de bicicleta por todo o lado, sem os constrangimentos do trânsito e das ruas cheias de pessoas que existem hoje. “Da minha casa ao liceu eram cinco minutos. As rendas das casas, os transportes e a alimentação eram bem mais baratos”, recorda a artista, que assistiu a momentos icónicos do desenvolvimento do território, como a inauguração do Aeroporto Internacional de Macau e às cerimónias da transferência de soberania para a China. A artista olha para o passado com algum saudosismo, mas admite que o presente era inevitável. “A cidade tinha necessariamente de evoluir. Foi perdendo coisas boas e más, mas também adquiriu coisas boas”, disse. Sara Figueira pede que o território continue a apostar “o mais possível em iniciativas com artistas de rua, e trazê-los para os hotéis e escolas, para que possam criar novas identidades em Macau”. “O seu contributo artístico é importante para que mais turistas visitem a cidade”, rematou.
Andreia Sofia Silva Ócios & Negócios PessoasArt Habitat, aulas de ballet | Dançar por amor à arte Tudo começou com o espectáculo Zaia, mas depressa se estendeu a todo o território. Anna Kizlyuk Acconci é professora de ballet e dança desde que se lembra de ser gente. Hoje ensina crianças, adolescentes e adultos, e só lamenta que não haja um ensino mais profissional desta forma de expressão artística [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]nna Kizlyuk Acconci criou a Art Habitat em 2011, quando o espectáculo Zaia, da companhia canadiana Cirque du Soleil, estava no território. Bailarina profissional desde criança, Anna dava aulas aos bailarinos da companhia. Quando o espectáculo fechou portas, a responsável pelo Art Habitat virou-se para a cidade e para aqueles que também queriam aprender, de forma profissional, a forma mais clássica de dança. Sem um espaço físico, a Art Habitat funciona com aulas particulares e também em escolas e jardins-de-infância. Tudo depende dos interessados e das marcações que são feitas. “Acredite ou não, recorri à numerologia e astrologia, através de uma amiga da minha mãe, para ver qual seria o nome mais bem-sucedido para a minha empresa. Troquei emails com ela durante quase um mês, até que o nome final estivesse confirmado”, contou Anna ao HM. Hoje dá aulas a bebés, a crianças e a adolescentes até aos 18 anos de idade. Há também aulas para adultos que começam agora a interessar-se pelo ballet. Até agora, o negócio parece estar a correr de feição. “Tenho alguns pais que comentam e dão-me um feedback positivo, no sentido que preferirem o meu método em relação a outros. Isto porque nas minhas aulas não temos só brincadeira e jogos o tempo todo. As crianças aprendem e não estão apenas a brincar toda a aula.” Anna explica que tenta misturar o melhor de dois mundos, ou seja, a brincadeira e o lado sério de uma forma de dança exigente, que pede disciplina e concentração. “Tento combinar o divertimento com a dança, numa prática saudável que mistura o lado clássico da escola russa, chamado método vaganova, e que é mais apropriado para os pequenos alunos. Para as crianças mais velhas há uma maior estrutura e as aulas são dadas num ambiente mais restrito e com mais disciplina, onde há a ideia de que nunca se pode desistir. Este é um dos objectivos mais importantes para qualquer arte, sobretudo o ballet”, adiantou a mentora da Art Habitat. Uma paixão desde criança Anna Kizlyuk Acconci tinha um ano de idade quando começou, de forma espontânea, a querer dançar como as bailarinas profissionais. “A minha paixão pelo ballet começou muito cedo. Segundo a minha mãe, começou quando tinha um ano de idade. Estava a ver um espectáculo de ballet na televisão e de repente comecei a imitar as bailarinas. Partia os meus chinelos ao meio, porque só queria andar em bicos dos pés.” Com cinco anos, Anna começava a ter as primeiras lições de ballet para começar a praticar como uma bailarina profissional a partir dos nove anos. Começou então uma carreira que dura até aos dias de hoje. Em Macau, a criadora da Art Habitat lamenta que a dança clássica não seja levada a sério. “Os pais não consideram o ballet ou estilos de dança mais contemporâneos como uma verdadeira carreira que os seus filhos podem seguir. Não surpreende que as únicas aulas existentes sejam dadas por associações de dança, mas que são apenas como hobbie e divertimento, e não para aprender a dançar como uma profissional. Há uma mentalidade pequena.” O lado sério da dança No futuro, Anna “gostaria de ver mais interesse em aprender dança da forma correcta”. “Foi aí que comecei e fui obtendo mais experiência e conhecimento para transmitir aos meus alunos, após ter passado por várias escolas de ballet”, lembra. Ainda assim, a professora considera que os pais dos seus alunos têm consciência da importância da sua prática. “O facto de os pais inscreverem os seus filhos nas aulas só significa que sabem o quão importante são para o seu desenvolvimento, e não apenas físico.” Apesar de a Art Habitat estar cheia de alunos de todas as idades, Anna defende que é muito difícil abrir um espaço físico. “O maior desafio é ter as portas abertas num local permanente ou numa escola. Financeiramente é um grande peso e as rendas em Macau são um grande problema. Sem o apoio do Governo é verdadeiramente difícil operar um negócio na área das artes”, conclui.
João Luz Perfil PessoasPeter Bartusek, profissional dos sete ofícios | Homem do renascimento [dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]á pessoas que deambulam pelo mundo, quase como se vivessem ao sabor do vento. Peter Bartusek é um bom exemplo disso, o protótipo daquilo a que se convencionou chamar de um cidadão do mundo. Em poucos anos, o húngaro viveu em seis países, sempre com ocupações diferentes. Há quatro anos chegou a Macau na sua primeira incursão asiática. O primeiro impacto foi perturbante para Peter Bartusek. “Na altura, vivia em França, nas montanhas, no meio do campo, e quando cá cheguei fiquei chocado, não gostei muito de Macau”, confessa. O abalo inicial foi como uma comoção. Habituado a ter campo de visão, Peter Bartusek sentiu uma enorme falta da natureza e de amplitude, de espaços abertos. “Achei a cidade claustrofóbica e poluída”, conta. Aos poucos, essa sensação foi sendo atenuada, em especial com a ajuda das amizades que foi firmando. “Conheci pessoas muito boas, mas é claro que se demora sempre um pouco a desenvolver amizades e a ganhar confiança”, recorda. Os primeiros contactos com locais, em particular chineses, foram complicados para o húngaro. O recém-chegado achou as pessoas rudes, com um trato duro, pouco polido. Uma primeira impressão que se foi alterando à medida que foi entendendo a cultura. “Normalmente não gosto de gritar com empregadas para conseguir chamar-lhes a atenção, não é assim que as coisas funcionam na Europa, mas foi algo a que me tive de habituar”, exemplifica. Hoje em dia, Macau ainda o sujeita a altos e baixos constantes. Depois de se ter apercebido do panorama geral, de ter entendido a cidade, Peter Bartusek passou a gostar de Macau, com o tempo lá sucumbiu ao seu charme. Para já, confessa que não tem planos para sair, é algo que não está no seu horizonte. Ainda assim, se sair, o húngaro “gostava de ficar algures na Ásia”. Multi-tasker Chegou a Macau porque as oportunidades de emprego na Europa escasseavam, mesmo para uma pessoa que faz de tudo um pouco. Peter Bartusek, enquanto estudava Química na Hungria, trabalhou na construção civil. Terminado o curso, conseguiu emprego numa empresa farmacêutica, onde ficou um ano e meio. Depois disso, o acaso tomou conta da sua vida profissional e fê-lo percorrer a Europa. Após uma conversa provocadora com um amigo, acabou por se mudar para a Grécia, onde trabalhou como fotógrafo. Em seguida foi viver para Inglaterra, onde foi empregado num centro de jardinagem e depois num centro de lavagem de automóveis. Voltou à Hungria, onde trabalhou em atendimento ao público num aeroporto a vender bilhetes de shuttle. Seguiu para mais uma temporada em Inglaterra, antes de viver seis meses em Oeiras. A passagem seguinte, antes de vir para Macau, foi em França. “Já fiz de tudo, acho que nunca fiz nada duas vezes, andei de trabalho em trabalho, de país em país.” Em Macau faz de tudo um pouco, pinta apartamentos, faz reparações, trata de canalizações. É algo que gosta de fazer e que veio mesmo calhar, uma vez que em Macau escasseavam pessoas a fazer este tipo de trabalho que falassem inglês. Na visão de Peter Bartusek, todas estas mudanças enriqueceram-lhe, em muito, a vida. “Acho que sou mais tolerante em relação a pessoas que são diferentes de mim, aprendi a adaptar-me a diversas situações em pouco tempo”, explica. O húngaro chegou, várias vezes, a terras que não conhecia sem ter um emprego, sem ter nada e a ter de arranjar formas de sobreviver. Sempre com o apoio de amigos, conhecendo pessoas e encontrando formas de trabalhar com elas. Até que chega a Macau, onde o húngaro de 33 anos já vive há quatro anos e se sente em casa. Por cá, gosta de Coloane, de ficar próximo da natureza, mas também se deixou encantar “pela estranheza da cidade, onde há zonas que são o equivalente a viajar pela história”. Outro dos destaques de Peter Bartusek são os pequenos restaurantes chineses, onde gosta de partilhar uma refeição com os amigos. Até nesse aspecto, Macau pode oferecer um pouco de aventura e uma sensação de entrar em território imprevisto, um pouco ao sabor da vida do húngaro. “Adoro as velhas tascas chinesas, onde é sempre divertido e desafiante pedir algo”, conta Peter Bartusek.
Andreia Sofia Silva Perfil PessoasRobby Kwok, empresário na área da educação: “Posso ser feliz em todo o lado” [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] vida de Robby Kwok é a prova de que o destino pode mudar de um momento para o outro. Este empresário, que lidera um grupo de escolas que oferecem cursos profissionais, começou por ser um mau aluno, que só tinha boas notas a Educação Física. A ida para a Austrália mudou completamente a sua vida. “Quando era miúdo, tinha notas muito más. Só consegui passar a Educação Física. Então a minha mãe perguntou-me para onde é que queria ir, porque não podia ficar aqui sem fazer nada. Deu-me duas hipóteses: Japão ou Austrália, onde tinha familiares. Cheguei a aprender japonês, mas não conseguia falar, a língua foi muito complicada para mim. Achei o inglês mais fácil”, contou ao HM. Na Austrália os seus horizontes expandiram-se totalmente, ao ponto de Robby Kwok ter ficado no país durante 12 anos, a trabalhar na área em que se formou, informática. Pelo meio, arranjou tempo para aprender taekwondo, que hoje ensina em Macau. Robby Kwok assume que pode ser feliz em qualquer lado, seja em Macau, seja noutro lugar. Acorda de madrugada para correr, trabalhar, tocar saxofone numa banda e ainda fazer voluntariado todas as sextas-feiras. Se a mãe não o tivesse enviado para o estrangeiro, o empresário talvez fosse hoje uma pessoa completamente diferente. “A Austrália mudou a minha visão e a minha vida mudou. Aqui há um maior controlo da família, um lado mais tradicional, mas eu compreendo isso. Tem o seu lado bom e mau. Os países ocidentais, o sistema e cultura, são, na sua maioria, bons. Por isso é que sempre quis implementar esse sistema em Macau, esses valores.” Ideias de empreendedor Robby Kwok deixou para trás a imagem de um aluno baldas, que não estuda, para se tornar, ele próprio, um educador. E garante que em Macau fazem falta cursos profissionais, mas não só. Falta também o seu reconhecimento e aceitação. “Em Macau há falta de cursos profissionais, cursos mais técnicos. Na Austrália, quem começa um curso técnico pode sempre ter acesso à universidade. Aqui as pessoas, as famílias, não compreendem os benefícios do ensino profissional. Lá um técnico é mais valorizado do que um médico, têm bons salários.” Num lugar onde a memorização ainda é um método bastante utilizado no ensino, Robby Kwok prefere o sistema australiano, mais flexível, onde há tempo para tudo. “Não digo que o sistema chinês de ensino é mau, às vezes é bom. Há muito a prática da matemática e ajuda a organizar o pensamento, é sistemático, com muita disciplina. Na Austrália gostei mais, porque há mais flexibilidade, há tempo para estudar e para fazer outras coisas.” “Alunos são preguiçosos” Robby Kwok viveu também 11 anos em Hong Kong. De regresso a Macau, o empresário na área da educação garante que nem tudo é mau no pequeno território. Defende que os alunos locais são preguiçosos, mas essa característica verifica-se menos do que se verificava há dez anos, quando trabalhar no Governo ou nos casinos eram passos mais naturais. Na sua visão, os estudantes vindos da China obrigaram a uma maior competitividade e empenho. “São muito interessados, querem aprender mais e têm boas notas”, referiu. Robby não esquece ainda os tempos conturbados que Macau viveu no final da década de 90. Já na Austrália, o então estudante recorda-se de ver imagens “terríveis” de conflitos entre seitas, que causavam o pânico e traziam insegurança nas vésperas da transferência de Administração. Hoje, o território é bem mais seguro. Olhando para a região vizinha, de onde também é residente, Robby Kwok não quis deixar de comentar a postura dos activistas que têm lutado por um sistema mais democrático em Hong Kong, tal como Joshua Wong. “O que fizeram eles pela sociedade, por Hong Kong? Eu tenho o meu emprego, criei postos de trabalho. Penso que têm exagerado nas suas acções. Vivi 11 anos em Hong Kong e é uma das sociedades mais livres que conheço”, remata.
Andreia Sofia Silva Ócios & Negócios PessoasLe César, Taipa Velha | Os pratos estão lançados Beber um café pela manhã ou tomar o pequeno-almoço no Le César, na Taipa, passou a ser um hábito de muitos que cá vivem. Diogo Geraldes abriu agora um segundo espaço na zona da Taipa Velha, mais virado para a restauração. Lá podem encontrar-se pratos portugueses que ainda ninguém provou cá [dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]á 13 anos que o Le César funciona junto ao Parque Central da Taipa e foi um dos poucos espaços que disponibilizou o típico café português, quando beber café estava longe de ser um hábito comum em Macau. O negócio cresceu e, recentemente, Diogo Geraldes, proprietário, decidiu abrir um restaurante com o mesmo nome na zona da Taipa Velha. Lá poderão provar-se as iguarias do costume, como é o caso da francesinha, mas há também novidades, como o arroz de robalo com amêijoas. “Temos a cozinha genuína portuguesa, temos alguns pratos que a maior parte dos restaurantes portugueses já tem. Temos alguns pratos novos. Que eu saiba, ainda não estão a ser feitos em Macau”, contou o responsável ao HM. O novo restaurante é “amplo”, com capacidade para 60 pessoas. Habituado a servir sobretudo locais, Diogo Geraldes vira-se agora para um tipo de clientela diferente: os turistas que todos os dias passeiam num dos lugares mais populares do território. “É um novo desafio, também em termos de visibilidade. São públicos-alvo diferentes. No café a nossa clientela é 99 por cento de residentes de Macau, enquanto neste novo espaço, devido à sua localização, vamos com certeza, e já estamos a receber, bastantes turistas de todas as nacionalidades.” Ainda assim, a curiosidade leva a que muitos dos habituais frequentadores do Le César acabem por almoçar ou jantar no novo espaço. “Um espaço de referência” Diogo Geraldes recorda o início de um negócio que já fez história e que faz parte do dia-a-dia de quem cá vive. “O Le César já tem bastantes anos e é um espaço de referência, sem dúvida”, considerou. “Temos grupos de portugueses e até chineses que só vão lá para comer a francesinha. Temos um grupo de clientes portugueses que, de há uns anos para cá, almoçam lá só por causa das francesinhas. É um espaço de referência não só para quem vive na Taipa, mas para toda a comunidade portuguesa e até de estrangeiros, incluindo chineses”, acrescentou o proprietário. Quanto ao projecto original, ou seja, o café que abriu portas em 2004, mantém-se igual, apesar das obras realizadas há alguns meses. “A filosofia e o projecto continuam os mesmos”, defendeu Diogo Geraldes. Há espaço para todos Com a abertura de mais um restaurante com comida portuguesa, o responsável considera que o conceito está longe de se esgotar no mercado da restauração. “A maior parte dos restaurantes portugueses em Macau são de sucesso e têm clientelas boas, e isso mostra que o conceito está longe de estar saturado. Há uns meses vi um estudo de uma revista que mostrava que os turistas têm bastante motivação para experimentar a gastronomia local. Os chineses não vêm a Macau para comer comida chinesa. Desde que os projectos sejam de qualidade e tenham mérito, há ainda espaço para alguma restauração portuguesa”, frisou. Além de servirem os pratos mais típicos, os restaurantes portugueses que abriram portas no território souberam inovar na oferta ao cliente, defendeu. “É difícil fazermos uma gastronomia tal e qual se faz em Portugal, porque em Macau não há muitos produtos. Tem havido alguma inovação, no princípio tínhamos o conceito das sardinhas e frango assado, mas hoje já temos restaurantes a fazer coisas completamente diferentes”, rematou Diogo Geraldes.
João Luz Perfil PessoasKerill Ezzy, instrutora de ioga | De Brisbane para Macau [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] vida tem uma dinâmica cada vez menos linear. A australiana Kerill Ezzy é um bom exemplo disso mesmo. Chega a Macau como engenheira de som de espectáculos musicais para a apresentação de “Cats”, há cerca de 10 anos, e torna-se instrutora de ioga. Passados dois anos da primeira visita ao território voltou com a companhia que apresentou “The House of Dancing Water” e acabou por ficar por cá. Com um trabalho com características itinerantes, na altura, a engenheira de som sentiu a estranheza de trabalhar apenas num sítio. Porém, criar, construir um espectáculo e continuá-lo “foi uma experiência linda”, comenta. Além disso, Macau, com o seu charme muito próprio, acabou por seduzir Kerill. Quando chegou, a cidade era muito mais calma do que é actualmente. Vivia-se a época da crise económica. “Quando, vim o City of Dreams tinha sido acabado de construir”, lembra. Também o caldeirão cultural impressionou a australiana originária de Brisbane. Ao princípio, “a mistura de um povo asiático numa cidade com arquitectura portuguesa foi muito estranha para mim, porque sou australiana e não temos este grau profundo de diversidade”, conta. A herança resultante do cruzamento de culturas criou um grande impacto em Kerill Ezzy. “Foi tão bonito descobrir uma antiga colónia portuguesa com chineses, numa mistura que casa com tanta perfeição”, explica. Entre o dia em que chegou e a actualidade, a australiana sente que uma das maiores diferenças é o evidente aumento do turismo, assim como da actividade ligada à indústria do jogo. Também o número de pessoas cresceu imenso, para dar resposta laboral às novas necessidades económicas. Na opinião de Kerill, a era de confusão e crescimento económico não tiveram repercussão na capacidade dos seus habitantes para pararem e se encontrarem consigo próprios. “Acho que a introspecção e a reflexão aumentaram como resposta ao crescimento de Macau”, analisa. No aspecto cultural, acha que ainda é cedo para medir as repercussões do boom da cidade. Uma coisa é certa, “os portugueses e os chineses continuam a ser os povos lindos que sempre foram”, conclui. Zen na cidade Hoje em dia, Kerill é instrutora de ioga, uma inversão que aconteceu por um acaso trazido pela sua antiga profissão. O ioga entra na sua vida devido aos problemas de costas provocados pelo trabalho como engenheira de som. O ashtanga foi-lhe recomendado pela sua fisioterapeuta e foi uma surpresa para a australiana. “Era uma pessoa muito activa e a ideia de fazer ioga não era algo que me passasse pela cabeça”, conta. Passados cinco anos de prática e na sequência da falta de professores, a australiana tornou-se instrutora. “Pensei que era a melhor forma de continuar a aprender, nomeadamente através dos meus alunos”, revela a instrutora, que falou ao HM numa pausa de formação que está a tirar na Tailândia. Contrariando a impressão recorrente de que o ioga pode ser uma actividade rotineira, Kerill vê a sua dinâmica tendo em conta a maleabilidade do corpo humano. “Para quem olha de fora, o ashtanga parece ser sempre a mesma coisa mas, na realidade, o teu corpo muda, comes coisas diferentes, dormes de forma diferente, todos os dias são diferentes”. Esta evolução torna o ioga algo fascinante de se trabalhar, na óptica da australiana. A instrutora encontra sempre algo na cidade locais que merecem atenção. “Há pequenas bolsas em Macau muito giras”, comenta. Por isso gosta de passar tempo nos pequenos cafés. Nesse aspecto, destaca o Macau Soul pelo belíssimo vinho português e fotografias antigas da cidade. Outro dos lugares de eleição da instrutora de ioga é o Jardim Luís de Camões, que “tem uma energia especial”. É um sítio onde gosta de estar, onde se sente bem a partilhar o espaço com os iodos que por lá ficam o dia inteiro a praticar tai chi, a meditar, ou simplesmente a conviver. “Há ali um sentido comunitário muito forte e uma grande tranquilidade apesar de se estar mesmo no coração da cidade”.
Victor Ng Ócios & Negócios PessoasNflorist | O incrível mundo das pétalas Está de portas abertas há quatro anos e chegou com a promessa de produtos diferentes. A Nflorist rompe com a tradição local das floristas. O investimento foi feito na inovação, em designs mais arrojados e ofertas diversificadas. Sempre com o delicioso perfume das flores [dropcap style≠’circle’]Q[/dropcap]uando a primeira loja abriu as portas, Macau nunca tinha visto nada assim. O mundo das flores respondia a métodos tradicionais, com ramos e coroas pouco diferenciados. Os mentores da Nflorist tinham visto outras coisas lá fora e decidiram abrir um espaço com “estilos diferentes”. Quatro anos depois, a ideia provou ser bem-sucedida e o território mostrou que tem um mercado suficiente para este tipo de negócio. Na Nflorist há flores para todos os gostos, mas a aposta no design é visível: procura-se sobriedade para deixar respirar as pétalas. Este lado inovador já permitiu criar uma pequena cadeia de lojas: a Nflorist tem três espaços comerciais em diferentes pontos da cidade. I Seong Lao é a responsável pelo estabelecimento principal e explica como funciona esta florista diferente. “Os nossos produtos são feitos por designers de Taiwan que se responsabilizam pelas fases de design e produção. Cada obra é produzida à mão pelos floristas”, afirma. Na Nflorist abre-se espaço também à criatividade dos consumidores, que podem dizer o que pretendem. “Tratamos dos pedidos dos nossos clientes com todo o carinho e tentamos fazer o melhor com o nosso profissionalismo”, garante I Seong Lao. Os anos de funcionamento das várias lojas permitiram perceber quem é o público-alvo: pessoas entre os 20 e os 45 anos. Para o facto contribuirá o estilo em que apostou a Nflorist, mas também serem estas as gerações “mais activas em termos sociais”, justifica a gerente. À semelhança do que acontece no Ocidente, também no Oriente as flores ocupam um lugar central em momentos decisivos da vida, do nascimento à morte. Oferecem-se flores às mulheres que acabaram de ter filhos, às namoradas, aos estudantes recém-formados. As flores servem ainda para celebrar datas tradicionais como o Festival da Lua e para assinalar, com pompa e visibilidade, a entrada em funcionamento de novos negócios. Usam-se flores nas cerimónias religiosas, nos casamentos, em festas. Homenageia-se quem parte com pétalas. I Seong Lao explica que, independentemente da ocasião e do objectivo, as flores frescas são as mais procuradas na Nflorist. “Têm um significado positivo, cheio de energia. É algo directo e natural.” O mundo das flores é riquíssimo, “existem imensas opções e variedades, são muito atractivas”. Frescas e eternas Em relação a planos para o futuro, I Seong Lao espera que a o negócio possa continuar a expandir-se pelo território, com a abertura de novos espaços. A gerente não tece comentários sobre a satisfação com o volume de vendas, preferindo abordar o assunto de outro prisma. “Uma loja de flores é um local onde se transmite felicidade e amor aos outros. Esperamos oferecer o melhor serviço possível aos clientes. Quando regressam à loja com um sorriso ou nos trazem notícias felizes é um grande incentivo ao nosso funcionamento”, declara. Outro objectivo da Nflorist é garantir que, de vez em quando, há novos produtos para oferecer a quem entra no espaço comercial. Entre ramos convencionais e arranjos gigantes de rosas, há plantas para venda e até jardins portáteis, como o “Bottle Garden”. “Neste dia-a-dia ocupado, queremos transmitir uma nova energia aos clientes”, diz I Seong Lao. “O Bottle Garden tem um sistema ecológico aperfeiçoado. Os clientes só precisam de pôr água uma vez por semana para terem esta beleza natural perto deles. Esperamos conseguir incutir a beleza e a energia a quem ama plantas como nós.” As flores à venda na Nflorist chegam de vários países, incluindo destinos distantes como o Quénia e a Colómbia. Mais perto, Taiwan é uma das principais fontes de plantas. Na loja é ainda possível comprar flores eternas, oriundas do Japão. “Colaboramos com a empresa japonesa Earth Matters, para garantir a melhor qualidade desse tipo de flores”, sublinha a gerente. Submetidas a um processo químico no momento em que são colhidas, as flores eternas podem manter o aspecto durante meses ou anos. “Mas nós não limitamos as fontes dos nossos materiais”, ressalva I Seong Lao. “Esta diversificação é que permite satisfazer as diferentes necessidades dos nossos clientes.” Nflorist Alameda Dr. Carlos d’Assumpção, 92 Wan Yu Villas Ground floor & Attic I Macau
Victor Ng Perfil PessoasKane Ao Ieong, cantor | Cidadão Kane [dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]eguir uma fantasia e concretizá-la é algo que não está ao alcance de todos. Kane Ao Ieong é uma das pessoas que leva exactamente a vida com que sonhou desde que era miúdo. “Quando estudava na escola secundária queria muito ser cantor”, lembra o jovem de 23 anos. Para concretizar a aspiração que tinha desde tenra idade, o artista local começou a participar em vários concursos de canto e a habituar-se a pisar o palco. Mas a paixão pela música era uma evidência bem antes de se atrever a subir a um palco ou a entrar em competições de canto. O pai de Kane Ao Ieong trabalhava junto de um local com karaoke. Portanto, a visão de pessoas a pegar no microfone a lançar-se em versão de canções populares foi algo que sempre esteve presente no quotidiano do jovem. Passou a ser uma ocupação de tempos livres, sempre que podia insistia com a família para o levarem a cantar no karaoke. O hábito rapidamente tornou-se paixão, com uma forte tendência a transformar-se num modo de vida. Para dar forma a este sonho, o jovem decidiu que, para levar as coisas mais a sério, teria de ter aulas de canto, uma condição essencial à evolução que projectava. Através dos concursos de canto em que entrou em Macau, foi conhecendo mais cantores e artistas locais, pessoas com aspirações e sonhos semelhantes. Hoje em dia, Kane Ao Ieong é cantor a tempo inteiro e o seu projecto musical levou-o a assinar contrato com a editora Easy Music. As sonoridades nas quais se gosta de expressar são muito assentes no R&B e nas influências da pop da Coreia do Sul. O jovem de Macau ainda se dedica à representação e à música clássica e, numa perspectiva mais contemporânea, anima festas como MC. À medida que a sua carreira avança, Kane enfrenta “o stress da necessidade de ter de evoluir e chegar a palcos maiores”. O artista considera que Macau é uma terra com grande margem de crescimento no que toca às artes de palco, mas é difícil furar e chegar a mais gente. Até bem recentemente achava que havia poucas oportunidades para os cantores locais encontrarem o seu espaço num panorama musical muito pequeno. Nesse aspecto, Kane é da opinião que “o desenvolvimento do sector da música em Macau é muito limitado, funciona de uma forma muito lenta”. Ainda assim, o jovem cantor está contente porque sente que cada vez mais a população da cidade aprecia as vozes dos artistas locais. Apesar de a abertura ser progressiva, os projectos musicais de Macau começam a ter público. Aula coreana Numa tentativa de acrescentar algo às suas performances, Kane Ao Ieong fez-se à estrada e partiu para a Coreia do Sul para estudar canto e dança. O artista considera que os coreanos estão no caminho certo no que à música pop asiática diz respeito. “Nos últimos tempos o público de Macau, Hong Kong e Taiwan, virou-se para a música coreana”, revela. No entendimento do cantor, este fenómeno de popularidade deve-se ao profissionalismo da produção musical da Coreia do Sul, que exporta artistas e bandas de grande qualidade. “O meu objectivo é cantar cada vez melhor, juntar a dança à minha música e trazer o que há de bom da pop da Coreia do Sul para Macau”, projecta Kane. Os tempos que passou em solo sul coreano fizeram-no enfrentar carências de interpretação que tinha, além de o terem despertado para o papel da dança num contexto pop. A experiência foi tão enriquecedora que o jovem de Macau pondera visitar outro país com a finalidade de ir buscar influências exteriores e evoluir como performer. Um dos frutos da sua passagem pela Coreia do Sul é a colaboração que tem na forja com uma rapper coreana que espera que venha a acrescentar algo novo no contexto do panorama musical de Macau. Kane Ao Ieong vê neste projecto uma oportunidade para colocar cá fora tudo o que aprendeu na formação que teve e dar um novo rumo à música que tem vindo a fazer. Ou seja, dar ritmo às melodias mais lentas e emocionais que têm dominado o seu repertório. O resultado desta coligação musical deve estar concluído ainda este ano e será um novo passo na carreira de Kane Ao Ieong.
Victor Ng Ócios & Negócios Pessoas“I Want Coffee” | A arte do café latte Porque o café não é todo igual e porque a arte pode estar associada à estética da apresentação do latte, Chris Ip abriu o “I Want Coffee”. Servir um produto bonito e saboroso, ter opções para comer e ainda poder dar formação na decoração dos latte são os objectivos deste recente café do território [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] “I Want Coffee” não é mais um café em Macau. É um espaço onde a perícia e a arte se juntam para decorar o café, nomeadamente o latte. O gosto pela actividade começou, para o proprietário Chris Ip, quando foi convidado, há cerca de dois anos, para dar uma ajuda a um amigo. Na altura, com funções administrativas, teve o seu primeiro trabalho em que lidava com café. O contacto fez m que começasse a explorar os desenhos que poderiam ser feitos nas várias bebidas derivadas e, não tardou, estava tornar as chávenas “mais bonitas”. “Descobri um novo interesse”, diz. Do interesse à profissionalização foi um pulo. Autodidacta, Chris Ip dedicou-se à visualização de tutoriais do You Tube e foi aperfeiçoando a sua arte. Pouco tempo depois era concorrente assíduo nas competições que se dedicam a destacar os melhores neste sector. No entanto, ainda sem espaço próprio, e a trabalhar para outrem, os conflitos com a chefia começaram a surgir. “O meu chefe apoiava-me na participação de concursos, no entanto percebi que quando pedia autorização para ir não se mostrava satisfeito. O resultado foi tomar a decisão de abrir o meu próprio café”, conta. Em Maio do ano passado materializou o desejo e abriu um pequeno espaço dedicado exclusivamente à venda de cafés e lattes para fora. “A ideia era que as pessoas que fossem passando aproveitassem para parar e comprar a bebida que depois levariam com elas”, refere. Insatisfeito, o projecto que tinha em mãos ficava longe do que ambicionara. “Aplicar os conhecimentos que tinha naquilo a que chamo de arte do latte e desenvolvê-los não era possível”, diz, enquanto explica que “era muito difícil fazer os desenhos num copo de plástico que era de imediato fechado e levado”. Por outro lado, era um espaço com pouco conforto em que “as pessoas não tinham onde se sentar a saborear o seu café”. Em conversa com amigos, o proprietário do “I Want Coffee” foi aconselhado a investir noutro tipo de espaço. “Resolvi aceitar as sugestões que me foram dando e em Março consegui abrir este”, afirma satisfeito. Ir mais longe Mas o “I Want Coffee” não se fica pelo menu de comidas e bebidas personalizadas. Dos serviços prestados, consta a realização de cursos de formação na “arte do latte”. Para o proprietário é uma área que representa uma grande vantagem e um investimento naquilo que considera uma actividade a ser desenvolvida. A ideia do “I Want Coffee” é, para Chris Ip, ajudar no fomento da cultura do café e das suas bebidas associadas e, acima de tudo, desmistificar alguns preconceitos que encontra no território. “As pessoas pensam que os cafés com desenhos não são tão bons, tão deliciosos, mas acredito que sou capaz de fazer um café bonito e que, ao mesmo tempo, tenha todo o sabor que os clientes pretendem ter nesta bebida”, afirma. Por questões de sobrevivência, o “I Want Coffee” aposta também em refeições e noutros bens alimentares, até porque “seria muito difícil manter a casa aberta se não tivesse este tipo de opções”. A “obrigatoriedade” não significou, no entanto, limitações ao menu. Da carta constam saladas, pastas, muitas especialidades de pastelaria e sobremesas. As maiores dificuldades que sente com o novo negócio têm que ver com algumas diferenças que o território tem relativamente a outras regiões vizinhas, nomeadamente no que respeita à cultura do próprio café. O proprietário explica: “Em Macau, as mudanças são muito lentas. As pessoas pensam que os cafés que fazemos são iguais àqueles que se vendem nos estabelecimentos tradicionais de comida chinesa e não percebem a diferença”. Para o futuro, Chris Ip quer continuar a investir na área da formação para “atrair mais jovens para o sector e, desta forma, contribuir para um maior conhecimento do produto e da actividade de desenhar no latte”.
Sofia Margarida Mota Perfil PessoasAndré Silvério, engenheiro mecânico: “A Ásia é uma surpresa” [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]lfacinha, André Silvério está em Macau porque o destino quis. Uma vinda para a Ásia estaria fora de questão há cerca de dois anos, altura em que foi colocado no território dentro do programa de estágios Inov-Jovem. Na altura, a terminar a tese de mestrado na área da termodinâmica e a pensar no envio dos primeiros currículos para encontrar emprego, André Silvério não equacionava uma vinda para Macau. “Nunca me passou pela cabeça vir para aqui”, diz. “Aliás, quando estava a fazer a entrevista para integrar o programa foi-me perguntado se havia algum local para onde não quisesse ir, ao que respondei que sim: a Ásia.” Quando André Silvério soube da sua sorte, pensou de imediato na distância, ao mesmo tempo que se interrogava acerca das diferenças que poderia encontrar. Os receios que tinha relativamente a uma vinda para o continente asiático tinham que ver com “possíveis dificuldades de integração, porque são países muito diferentes”. No entanto, a vinda para o território acabou por não ser difícil. “Não estava à espera de encontrar tantas pessoas da comunidade portuguesa”, sendo que, a identificação com quem cá estava proporcionou, desde o início, algum “conforto” ao engenheiro. Foram seis meses de estágio, uma estreia na vida profissional que “correu muito bem”. O facto de ter estado numa empresa também portuguesa poderá ter ajudado, considera, e “a experiência acabou por ser incrível”. Mas as diferenças também se sentiram. “Os cheiros, principalmente da comida” são ainda recordados apesar de, com o tempo, já não serem sentidos. Saiu de Macau no final do estágio. Foi embora com agrado, porque “queria mesmo regressar a Portugal”, mas considerava que “talvez um dia ainda voltasse”. E assim foi. Depois de quatro meses à procura de emprego em Lisboa, sem respostas, apareceu a proposta de regresso ao território. Não hesitou. A trabalhar na construção de um dos novos casinos, André Silvério afirma estar satisfeito: “Estou a trabalhar num projecto fantástico com uma dimensão muito grande o que me faz sentir que, sem dúvida, fiz a melhor opção.” Macau, uma nova casa De lugar distante, Macau é agora uma casa. A constatação foi feita recentemente quando, “ao regressar de Portugal, senti que estava a voltar para casa, o que nunca tinha sentido”. No entanto, as ofertas do território podiam ser mais e melhores. “Tenho muita pena de não poder fazer coisas que faria noutros lugares. Tenho pena de não poder fazer mergulho e de não poder pegar num carro e fazer cem quilómetros para qualquer lado”, ilustra. Ao recordar a prática de mergulho, André Silvério não deixa de explicar a escolha do hobby que aqui não é possível. “Mergulhar é estar num mundo completamente diferente onde as preocupações desaparecem. Não sei o que é ser astronauta, mas penso que será algo semelhante, aliás, penso que os mergulhadores são as pessoas que não podem ser astronautas”, refere. Macau é um lugar pequeno e, como tal, as opções dadas aos que cá vivem acabam também por ser reduzidas. “Acabamos por ir sempre aos mesmos sítios. Até podemos tentar variar, mas o ambiente continua a ser muito o mesmo”, diz. A possibilidade de viajar pelo continente é, no entanto, uma das grandes vantagens de viver no território. Para quem tinha a Ásia como um destino não desejado, as viagens de André Silvério têm mudado, em muito, a sua opinião. Depois de passar pela Indonésia e pela Tailândia, por exemplo, o continente passou a ser “mágico”. “Há aqui qualquer coisa que surpreende”, diz, sem conseguir definir ao certo o que é. Uma logística complicada O desenvolvimento do território não passa despercebido ao engenheiro. André Silvério considera que, se por um lado é positivo até pelas oportunidades de emprego que cria, por outro pode trazer alguns problemas à região. “Lembro-me de que, quando regressei a Macau, voltei para a mesma casa e o que vi à minha frente foi um boom enorme no que respeita à construção.” Este crescimento é encarado pelo engenheiro com algumas reticências, nomeadamente no que respeita à logística que implica. “Acho que vai ser difícil lidar não só com o desenvolvimento local, mas também com toda a transformação que está a acontecer aqui à volta do Rio Das Pérolas e que inclui as regiões vizinhas.” As obras que lhes estão associadas implicam, considera, um movimento de pessoas, tanto locais como de fora, que “envolve uma logística que nem sempre é fácil”.
Andreia Sofia Silva Ócios & Negócios PessoasBohome Macau, loja online de decoração | Em busca do espírito boémio Na Bohome Macau vendem-se tapeçarias e mantas com padrões étnicos, tapetes de ioga, bijutaria e outros produtos de decoração. Jenny Ongoco criou, há quatro meses, a loja que funciona apenas online. Transmitir o espírito livre e boémio com cada produto é o objectivo [dropcap style≠’circle’]“T[/dropcap]udo começou com uma inspiração.” É desta forma que Jenny Ongoco descreve o arranque da Bohome Macau, uma loja online dedicada a produtos decorativos com um toque diferente. Há quatro meses que a fundadora deste projecto espalha o chamado espírito boémio com os produtos que vende, e que são tão variados como tapeçarias para a casa ou tapetes pensados para a prática de ioga na praia. “O nome da loja vem de boémio e obviamente combinei essa palavra com a palavra ‘casa’ [home]. Está presente o chamado espírito boémio, associado à mãe natureza e a um certo espírito livre que lhe está associado”, descreveu Jenny Ongoco. É a pensar na liberdade que a fundadora da Bohome Macau tenta manter os preços baixos. As vendas são feitas através da página oficial do Facebook, mas há sempre uma mensagem a transmitir em cada encomenda. “Acredito que os nossos produtos são símbolos do bem-estar, que nos fazem lembrar todos os dias das coisas que são verdadeiramente importantes. Ajudam-nos a ser espíritos livres, a sermos cuidadosos connosco, com os outros e com a natureza que nos rodeia.” O começo foi feito sem expectativas, mas a verdade é que, menos de meio ano depois, o negócio parece estar a correr bem. “Há quatro meses que temos este negócio e comecei sem qualquer expectativa. Fiquei muito surpreendida com a recepção que tivemos, tem sido muito boa. Muitas pessoas em Macau têm dentro de si um espírito livre!”, aponta. Preços ainda mais baixos Fiel ao espírito da Bohome Macau, Jenny Ongoco garante que o objectivo é baixar ainda mais os preços. “Neste momento estamos a trabalhar com os nossos fornecedores, esperando que os preços possam baixar um pouco mais”, diz. “Por norma, uma pessoa boémia não está focada na saúde e pensa em si como um ser individual que vai contra as regras tradicionais da sociedade. Esta pessoa deseja explorar o mundo da música e da literatura, sem esquecer as artes visuais. Simplesmente abraça uma atitude de livre pensamento e evita a visão típica e tradicional de como a vida deve ser vivida”, explica Jenny Ongoco. “Esta é uma das razões pelas quais eu mantenho os preços o mais baixo possível, pois quero que sejam produtos acessíveis a todos”, acrescenta a fundadora da Bohome Macau. Em busca da paz interior Jenny Ongoco tem a sua própria definição do que é ser boémio: alguém que não segue padrões sociais e tem, sobretudo, um espírito livre face ao que a sociedade determina. “Todos os nossos produtos são inspirados neste estilo boémio e acredito que colocar um produto destes nas casas vai trazer uma energia positiva. Estes produtos serão um símbolo da natureza dentro das suas casas. É daqui que a minha inspiração vem. Quero que todos tenham um pouco do espírito boémio dentro de si.” Jenny Ongoco assinala que o território não é conhecido por actividades ao ar livre ou pelo grande contacto com a natureza. A ideia é, através dos produtos da Bohome Macau, transmitir alguma paz e tranquilidade a cada cliente. “Macau não é conhecido pelas actividades naturais ou pela existência de uma natureza em abundância. Uma das minhas inspirações é partilhar este espírito [livre e boémio] com o maior número possível de pessoas”, defendeu. “Vivemos numa cidade que anda muito depressa e onde todos estão sempre a trabalhar. Muitas pessoas perdem a ligação ou o toque com as coisas que são mais importantes, como a família, o próprio bem-estar ou a natureza. Estamos demasiado focados em ganhar dinheiro, comprar materiais caros, e aí perdemos o rumo das coisas que verdadeiramente importam”, concluiu Jenny Ongoco.
João Luz Perfil PessoasJosé das Neves, designer gráfico | Um macaense de gema [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]ascido e criado em Macau, José das Neves é a representação da mistura de culturas que o território sempre testemunhou. O seu pai é um macaense de primeira geração, fruto do amor entre um militar português e uma chinesa, enquanto a mãe é uma portuguesa de Moçambique. Mais conhecido pelos amigos como “Chefe”, José viveu em Macau até aos 13 anos. Recorda que durante a sua infância a cidade “era muito calminha, com muitas actividades de lazer” para as crianças. Viviam-se tempos tranquilos, em muitos aspectos antagónicos com a actualidade. Mesmo na escola, os jovens tinham mais espaço para desenvolverem a sua personalidade, para assumirem as suas diferenças. “Havia uma maior liberdade individual em relação aos dias de hoje, algo que gostava muito que o meu filho experimentasse”, revela. José gostava desse período, em que não havia a obrigatoriedade de usar farda, em que ele e os seus colegas vestiam o que lhe apetecia para ir para as aulas. Nos tempos livres, dedicava-se ao basquetebol e ao futebol, passando os dias a jogar, até que a música electrónica entrou de rompante na sua vida, inspirando José a tornar-se DJ durante vários anos. Entretanto, após os 13 anos, a vida do macaense tornou-se agitada num constante vai e vem entre Macau e Lisboa, vivendo um ano em Portugal e outro cá até aos 18 anos. Foi uma grande mudança para José, um mundo novo se abriu. “Lisboa era uma cidade em que se passavam muitas mais coisas, uma capital, havia sempre o que fazer”, recorda. Foram tempos de crescimento para o macaense. Experimentou pela primeira vez viver sozinho, fora da alçada protectora dos pais. “Aprendi muito mais sobre a vida nesse período do que em todos os anos que passei em Macau”, conta. Amiúde regressava à Ásia, e antes de voltar de vez, ainda viveu um ano em Inglaterra. Mas o bom filho à casa torna, com 23 anos feitos e muito mundo na bagagem. Barreira invisível As deambulações europeias de José abriram-lhe horizontes que não se limitaram à geografia. Em Portugal desenvolveu as suas capacidades na língua portuguesa que, antes das viagens, estava para lá de enferrujada, facto que tinha contornos sociais. Quando era jovem “havia muitos grupinhos e era preciso ter um domínio bom da língua portuguesa para entrar”. José conta que após o seu regresso, já a falar melhor português, o seu círculo de amigos mudou completamente. O designer gráfico recorda que nos anos 1990 havia uma espécie de barreira invisível entre portugueses e macaenses, “havia um certo elitismo e colonialismo também, mas isso foi desaparecendo gradualmente”. José diz que hoje em dia não se vê nada disso, facto que considera uma das coisas mais positivas em relação ao passado. A transferência de administração foi marcante e trouxe momentos algo bizarros na vida do designer gráfico. “Foi um período extremamente estranho, muitos dos meus amigos, de repente, foram embora, parecia que a cidade tinha ficado vazia”, recorda. José explica que sentiu uma espécie de vácuo durante esse período e o tédio aumentou consideravelmente. Algo que foi passageiro e que reverteu completamente assim que as pessoas começaram a voltar. Hoje em dia, nota uma enorme perda de qualidade de vida para quem reside no território. “Antes da liberalização do jogo, Macau era uma cidade muito artística, quase toda a gente tinha um piano em casa”, relata o designer gráfico. Apesar do crescimento económico, dos empregos e salários, José considera que a riqueza em Macau é muito mal distribuída. “Temos todo o dinheiro que é preciso para começar muitos programas – educação gratuita, ensino superior gratuito, saúde e transportes públicos gratuitos”, elabora o macaense. Com um forte cariz socialista, José acha que a cidade podia fazer melhor em proporcionar uma vida confortável aos seus cidadãos. Em termos de vida, José das Neves considera que Macau pode ser uma cidade claustrofóbica, que o impele a partir. “De tempos a tempos, sinto uma vontade descontrolada de sair daqui, nem que seja para Hong Kong, é completamente necessário.”
Sofia Margarida Mota Ócios & Negócios PessoasMacau, Let´s Go | Cultura para todos São estrangeiros, têm como língua comum o inglês, gostam de actividades culturais e não entendem o idioma local. Foi com esta situação em mente que surgiu a “Macau, Let´s Go”. O objectivo é dar a conhecer a “movida” da cidade [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] “Macau Let´s Go” é uma iniciativa de três amigos que querem dar a conhecer ao território o que nele se faz. A ideia, para já, é constituir uma plataforma de divulgação e, assim, preencher uma lacuna na comunicação dos eventos locais. O objectivo é fazer chegar à comunidade estrangeira que vive no território os eventos que vão tendo lugar. “A ideia da ‘Macau Let´s Go’ apareceu muito naturalmente”, conta Jacques Schurr, um dos mentores da plataforma. “Estávamos os três – eu a minha mulher Suryana Masse e um amigo comum, Michaël Borg – a falar sobre Macau e da dificuldade que sentíamos em encontrar eventos no território. Queríamos ter acesso a iniciativas de cariz cultural em que as pessoas se pudessem encontrar, e falar um pouco de arte e de cultura”, recorda o responsável. Aliada à presença nos eventos, está o encontro destas pessoas e a possibilidade de conhecer mais gente na terra onde agora trabalham e vivem. “Para conseguir concretizar esta ideia resolvemos começar por ter esta página em que divulgamos informações sobre Macau”, diz Jacques Schurr . A iniciativa, que começa com a criação de uma página no Facebook, está para já numa fase muito inicial. “Tentamos saber os eventos que estão a acontecer e colocamos na página, em inglês.” No entanto, faz parte dos planos para o futuro uma evolução no sentido de, um dia, poder produzir eventos, sendo que, para já, Jacques Schurr diz ainda não saber que tipo de actividades poderão ser feitas. Mas, afirma, “a ‘Macau Let´s Go’ que contribuir para a dinâmica cultural local”. A língua que separava A criação da “Macau Let´s Go” não se prende com a falta de divulgação dos eventos locais, mas sim com a língua em que são divulgados. “Não é que não exista divulgação suficiente no território. Mas não é à nossa maneira, e não é através de uma língua que entendamos”, explica o responsável. “Não somos chineses, não somos portugueses. Somos de vários países. Se soubéssemos chinês, se calhar seria diferente. Esta plataforma é para pessoas como nós”, diz. “Podemos não ser muitos mas vivemos aqui, fazemos parte da população e gostamos de ver coisas”, reitera. Para se fazer entender melhor, Jacques Schurr exemplifica: “Ainda agora, nas corridas dos barcos-dragão, tínhamos alguma informação em inglês, mas foi um pouco difícil para nós e para pessoas que conhecemos ter informação concreta acerca de quando e onde eram realizadas, porque a maior parte da informação estava em chinês”. Para facilitar as traduções, Suryana Masse, também criadora da plataforma, já começou com aulas de chinês e a “Macau Let´s Go” conta com a ajuda da sua professora para traduzir conteúdos. Quanto ao português, a “Macau Let´s Go” tem a colaboração de amigos. “São pessoas que trabalham connosco, que nos traduzem as coisas e, mais do que isso, nos mantêm informadas acerca do que vem em língua portuguesa. São elas que nos ajudam, por exemplo, com as notícias dos jornais e da televisão.” Uma terra com algum movimento Macau não tem um “vida louca”, o que para Jacques Schurr não é de estranhar. “É um território pequeno e temos de ter esse factor em consideração”, diz. Esta é uma característica que faz com que o território não tenha tantas exposições quando comparando, por exemplo, com Hong Kong. No entanto, Jacques Schurr tem constatado que as pessoas têm mostrado um interesse crescente e “há cada vez mais gente a querer mais para Macau e a querer ver coisas”, pelo que “cabe a Macau oferecer mais propostas”. “Pessoalmente, e tendo em conta as minhas preferências, gostava de mais oferta no que respeita ao cinema e à fotografia.” Quando se fala da “Macau Let´s Go”, as portas estão abertas para a divulgação de todo o tipo de acontecimentos. “Qualquer que seja a actividade que tire as pessoas de casa é bem-vinda”, sublinha Jacques Schurr.
João Luz Perfil PessoasMiguel Canuto, técnico de equipamentos electrónicos de vigilância | Testemunho histórico [dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ão raras as pessoas que se misturam, inadvertidamente, com a história de uma cidade, mas Miguel Canuto é uma delas. Chega a Macau, em circunstâncias trágicas, em pleno Motim 1-2-3, é pai da última menina portuguesa nascida antes da transição e assiste à primeira sessão plenária da Assembleia Legislativa depois da transferência. No fundo, Miguel é a Macau dos últimos 50 anos, nascido de uma mistura de culturas, tal como a cidade onde mora. Filho de mãe macaense, com avó materna chinesa e avô mexicano, e pai português com uma costela inglesa, é a personificação da cidade multicultural onde vive há mais de 20 anos. Nascido em Díli, fruto da incerteza geográfica de ter um pai militar em comissão no antigo Ultramar, cedo conheceu Macau, pelas piores razões. Na sequência da morte do pai em solo indonésio da ilha de Timor, vê-se na iminência de partir para Macau, terra da sua mãe. Tinha, na altura, dois anos e o Motim 1-2-3 tinha acabado de rebentar. Foi a primeira vez que tropeçou na história do território. Esteve por cá pouco tempo, e foi para Portugal com a mãe e os irmãos. Passados 30 anos retorna a Macau. “Foi um regresso às origens, embora em Portugal tivéssemos muitas visitas de familiares chineses”, revela Miguel, que sentiu alguma nostalgia na altura de voltar a pisar o solo de Macau. Estabeleceu raízes por cá e teve o seu segundo rebento em Macau, a filha Rita, que nasce envolta em simbolismo, uma vez que foi a última menina portuguesa a nascer no território antes da transferência de Administração. “Para a minha mãe foi o fechar de um ciclo ver a neta nascer em Macau”, conta. Passados oito dias, Miguel assiste à primeira sessão plenária da Assembleia Legislativa, depois da transferência de Administração, onde trabalhava na altura. Corria o dia 19 de Dezembro de 1999. “Foi uma sessão histórica, votaram-se os princípios básicos e lembro-me bem do nervosismo de alguns deputados”, recorda Miguel. “Sentia-se uma alegria natural, as pessoas estavam felizes e foi algo que também me contagiou, foi memorável, algo de que nunca me vou esquecer.” Legado de cultura Miguel, que assistiu ao desenvolvimento de Macau desde a década de 1990, é um homem que gosta de pensar no passado da cidade. Identifica dois momentos de grande impulso em Macau. Primeiro quando “Stanley Ho vai a Portugal e promete a Salazar que, caso a concessão do jogo lhe seja dada a ele, investe o dinheiro em Macau”, promessa que é cumprida, e depois, mais tarde, a liberalização do jogo. Além da biologia que se nota na fisionomia dos macaenses, Miguel Canuto vê o verdadeiro legado português na cultura e na língua. Aliás, uma das riquezas que reconhece em Macau são as pessoas que conheceu na comunidade macaense e o convívio com gentes de outras culturas. Outra das oferendas é a própria cidade. “Gosto muito de me perder por cá e, às vezes, faço de propósito por isso”, conta. “Em Macau estamos sempre a conhecer coisas novas, podemos cá estar uma vida inteira e temos sempre coisas para apreender, é uma questão de saber procurar”, revela. Quanto mais tempo passa por cá, mais compreende que vive num local com uma cultura vastíssima. “Uma só vida não dá para assimilar tudo o que a China tem”, contabiliza o português. Aliás, Miguel Canuto vê um paralelismo entre os vários povos do Interior da China e os povos do Interior de Portugal, que são “pessoas muito curiosas, ao princípio, mas depois muito afáveis se as tratarmos com educação”. No entanto, Miguel gostaria de ver um aspecto melhorar em Macau: a forma como os jovens que vão para fora estudar são tratados pela cidade. “Isto é uma crítica construtiva, mas há que criar condições para chamar de regresso os jovens e não perder essa mais-valia”, explica. No entender de Miguel Canuto, grande parte da riqueza de Macau não se esgota nos casinos, mas estende-se às suas gentes. Como tal, gostaria de ver formados quadros que saíssem fora do âmbito do funcionalismo público, da advocacia e das profissões relacionadas com a construção civil. “Precisamos de bons arqueólogos, historiadores, investigadores em química, farmácia, biologia, assim como bons escritores e pessoas do mundo do espectáculo”, aponta Miguel Canuto, um homem que sabe ler a cidade e que, de certa forma, a personifica.
Sofia Margarida Mota Ócios & Negócios PessoasFoto Man Cheong | Recordar é viver Apesar de timidamente, Macau começa a mostrar interesse pela fotografia analógica. Foto Man Cheong é a loja de Denim Chou que pretende manter viva a técnica e assegurar a venda de câmaras para os interessados [dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]enim Chou tem 32 anos e podia ser apenas mais um proprietário de uma das muitas lojas de fotografia do território. Mas não. Denim Chou quer que a Foto Man Cheong seja diferente e que promova a fotografia como era feita em outros tempos. Apesar de vender câmaras e toda a panóplia de acessórios digitais, a Foto Man Cheong dedica-se também à fotografia analógica. Para o proprietário, que herdou do pai o negócio e o gosto pelas imagens, a fotografia é uma forma de viver outra vez. “As imagens que fazemos são uma forma de recordar, por exemplo, os sítios por onde passámos. São também uma maneira de matar as saudades de sítios por onde andámos e de manter as experiências vividas na memória”, conta ao HM. Uma das especialidades da Foto Man Cheong é a venda de modelos antigos de máquinas fotográficas. No entanto, a preferência nem sempre foi uma escolha fácil. “Actualmente não há muita gente que se dedique à fotografia analógica e ao uso de rolo, mas insisto na importação deste tipo de equipamento, tanto de câmaras normais como de polaróides e lomos”, conta. A crença de que a disponibilização destes produtos funcione como motivação para a sua utilização é um dos intuitos de Denim Chou. “Penso que a venda deste tipo de máquinas pode voltar a fazer renascer o gosto pela fotografia analógica e trazer a moda de volta”, explica. Trazer o sucesso Se um pouco por todo o mundo o fenómeno do regresso ao analógico se faz sentir, já em Macau a tendência não parece ser a mesma. No entanto “em Hong Kong há muitas lojas que se dedicam ao analógico e à lomografia, e tenho esperança que, pela proximidade, o panorama em Macau também mude”, revela. O sucesso de vendas é, sem dúvida, a Polaróide. Depois de quase cair no esquecimento as imagens instantâneas ganharam vida. O formato quadrado da clássica máquina Palaróide foi transformado pela Fuji em formatos para “todos os gostos”. “Os clientes são cada vez mais para este tipo de equipamentos”, diz. Apesar do negócio estar estável, Denim Chou ainda não está satisfeito. “Macau ainda não tem um mercado suficientemente grande e não há muita gente interessada em fotografia analógica”. No entanto, o proprietário da Foto Man Cheong não pretende baixar os braços. Denim Chou recorda outros tempos em que o filme era ainda o rei da imagem e a sua gradual saída da vida das pessoas. “Quando a fotografia digital começou a ter relevo, as pessoas que revelavam fotos também diminuíram muito. Tornou-se tudo mais fácil e barato com a fotografia digital”, diz. No entanto, “o analógico deu um passo em frente neste sentido”, considera. “Agora, as pessoas também podem fotografar em filme, digitalizar e depois escolher as suas imagens”. Esta possibilidade tem também sido um incentivo para o crescimento do negócio. Para Chou o regresso do gosto pelo filme vem da sua particularidade visual. “O rolo tem uma imagem diferente e a qualidade também é diferente”, diz. “As pessoas identificam de imediato a diferença entre fotografias analógicas e digitais”. Com a lomografia, por exemplo, há efeitos especiais que podem ser conseguidos, e esta tem sido uma das motivações para a crescente aquisição deste tipo de câmaras. “A maioria dos clientes da Foto Man Cheong está neste nicho de mercado e são estudantes do ensino secundário”, diz Chou. A razão é, não só a crescente popularidade deste tipo de fotografia, mas também o baixo custo das câmaras”.
Sofia Margarida Mota Perfil PessoasNuno Graça, arquitecto | Das casas ao baixo [dropcap style≠’circle’]T[/dropcap]em 36 anos e é natural de Vila do Conde. Nuno Graça está em Macau há quase um ano na sequência de um convite de trabalho. “Não podia recusar”, diz ao HM. A razão, apontou, foi sobretudo a dificuldade de emprego em Portugal, principalmente no ramo da construção. A chegada a Macau foi sentida como abrupta e sem tempo para pensar muito. “Cheguei num dia à noite e, no dia seguinte pela manhã, estava a trabalhar”, explica o arquitecto. Apesar de já ter trabalhado em vários pontos do mundo, a vinda para Macau não tinha sido equacionada. Para o arquitecto, “Macau é muito diferente, parece um microcosmos”. É uma zona marcada pelo contraste. “Tanto há o tradicional, como o moderno. O luxo dos casinos contrapõe-se à simplicidade, principalmente das pessoas.” Foi esta simplicidade que “mais chocou e agradou ao mesmo tempo”. Do convívio com os “novos” amigos, Nuno Graça não esquece quem o tem ajudado a passar pelos momentos menos felizes. Com uma filha de quatro anos, “a distância não está a ser fácil”. No entanto, o território continua a ser visto como um lugar com futuro e que confere ao arquitecto alguma segurança. Por outro lado “Macau não pára”. Para Nuno Graça, o movimento trazido até pelo próprio jogo faz com que exista uma vida permanente, dia e noite. É também uma cidade segura e um dos passatempos do arquitecto é perder-se pelo território. “Apanho um autocarro e vou por aí”, diz. Por gosto A opção pela arquitectura aconteceu naturalmente. É arquitecto porque gosta. “Quando era miúdo toda a gente me dizia que desenhava bem e, por isso, iria ser arquitecto. Pensava que ser arquitecto era desenhar casas e fui. Apercebi-me depois que é mais do que isso: ser arquitecto é também ter consciência social”, explica. Nuno Graça já passou por vários campos da arquitectura, mas não tem preferências de área. A carreira tem-se desenvolvido naturalmente. “Deixo as coisas andar e esta forma de estar tem acabado por me levar a sítios interessantes”, refere. “Quando acabei o curso estive a trabalhar em Nova Iorque, por exemplo. Quando regressei fui trabalhar com o Siza Vieira. Quando saí do Siza fui para um gabinete e mais tarde, segui para Angola. Agora estou cá”, elenca Nuno Graça. As experiências foram muitos diferentes. Nos Estado Unidos fez aeroportos, em Portugal casas. A passagem por Angola não lhe sai da memória: “Do trabalho fazia parte a visita às terras do fim do mundo, as aldeias que ficam perto da fronteira com a Namíbia e em que me vi numa realidade muito diferente”, comenta. Já Macau é o mundo dos casinos, mas não só. “O território tem sido um centro de misturas culturais e esse aspecto reflecte-se muito no planeamento urbanístico. No entanto, penso que a zona dos casinos é a que tem a atenção desse planeamento, enquanto o resto do território parece estar esquecido”, afirma. Mas foi a experiência com Siza Vieira que marcou um ponto de viragem, mesmo na forma de encarar a própria profissão. “Eu nem gostava muito do trabalho do Siza, era a escola do Porto, toda a gente tomava como referência e eu questionava as razões de ninguém fazer diferente”, confessa. Mas a opinião foi mudando. “Comecei a estudar mais e a trabalhar com ele e cheguei à conclusão de que, se calhar, não valia a pena fazer diferente. Comecei a achar que a caixa branca tinha muito mais conteúdo do que aquilo em que estava a pensar e que não tinha sido ainda totalmente explorada.” Do arquitecto Siza Vieira guarda também o exemplo. “É um senhor que nasceu em 1933, continua a ser o primeiro a chegar e o último a sair do escritório, e penso que isso só mostra a dedicação que tem à própria arquitectura”, diz. Além da profissão, Nuno Graça tem outro gosto especial: o baixo. “Toco baixo muito alto”, brinca. O gosto veio de casa, porque o pai também toca, e considera que se trata de um instrumento especial. “É, ao mesmo tempo, bateria e guitarra. É o instrumento que, no fundo, faz vibrar tudo.”
Sofia Margarida Mota Ócios & Negócios PessoasDaily Fit | Menu feito à medida Refeições saudáveis, com os nutrientes necessários e um sabor verdadeiro. É esta a proposta do Daily Fit. Um serviço de take away e entregas ao domicílio que garante um menu criado por um nutricionista, dedicado aos que não têm tempo para uma dieta equilibrada [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Daily Fit é o mais recente serviço local que se dedica à entrega de refeições saudáveis. Aberto desde 28 de Abril, a ideia de criar um “restaurante ao domicílio” de refeições equilibradas e cheias de sabor resultou de uma constatação básica do proprietário Pavlo Lysenko. “Chegámos à conclusão de que muitas vezes é difícil para as pessoas terem disponibilidade para preparar as suas refeições. As razões são várias, mas uma das mais relevantes é o facto de não terem conhecimentos reais acerca de nutrição e de programas alimentares que incluam uma dieta equilibrada”, conta ao HM. Por outro lado, na generalidade, as “pessoas não sabem como cozinhar refeições completas que as mantenham saudáveis e que preservem o sabor dos alimentos”, defende. O serviço fornecido pelo Daily Fit é também uma forma de dar tranquilidade aos clientes. “Aqui as pessoas não têm de se preocupar com nada e podem estar em qualquer lado, em casa ou a trabalhar, que têm a garantia de uma refeição completa”, diz Pavlo Lysenko. A maior parte das pessoas “não tem de ter tempo para cozinhar e, desta forma, não tem de ir às compras”. O serviço de entrega funciona tanto em Macau, como na Taipa. Para já, o Daily Fit ainda é só um serviço de entrega ao domicílio e take away mas, no futuro, Pavlo Lysenko pretende abrir um pequeno espaço ao público onde as pessoas se possam sentar e comer. Alimentos na balança A criação dos menus é feita com a supervisão de um nutricionista. É o profissional que prepara as refeições e que escolhe os seus ingredientes. “Cada refeição é cuidadosamente preparada e são estabelecidas as quantidades mais correctas de ingredientes, de modo a garantir a devida nutrição. Temos o cuidado de estabelecer as quantidades certas de calorias e de proteínas que têm de estar numa refeição completa e saudável”, explica Pavlo Lysenko. Aqueles que pretendem resultados físicos concretos, como a perda de peso, podem contar com um serviço de refeição personalizado, de modo a que consigam o seu objectivo de forma mais eficaz. “Também temos refeições feitas à medida para aqueles que têm algum objectivo concreto e que, para isso, precisam de um menu específico”, diz. Neste sentido, o Daily Fit disponibiliza um menu de dieta que “pode ser de uma semana, duas ou mais”, dependendo do tempo que é pedido e em que ajustam, com o apoio do nutricionista, a quantidade de carboidratos e de gorduras. Actualmente, o menu diário para o público em geral é constituído por nove refeições. São refeições gerais que podem constituir um almoço ou jantar. De momento, as opções de pequeno-almoço ou lanche ainda não estão disponíveis, mas a ideia é que, num futuro próximo, o serviço inclua todos os momentos diários dedicados à alimentação. Já está disponível uma opção vegetariana e em breve existirá também uma opção vegan. As refeições podem ainda ser acompanhadas com molhos que em nada prejudicam a linha, até porque “são feitos com ingredientes naturais e não processados, não é usado nenhum produto instantâneo”. As refeições andam entre as 60 e as 80 patacas e há descontos para quem fizer encomendas especiais. “As pessoas podem, por exemplo podem pedir um quilo de peitos de frango grelhado e armazenar em casa”, explica Pavlo Lysenko. No primeiro mês de trabalho, os clientes que têm recorrido ao Daily Fit são diversificados. “Temos clientes muito diferentes: desde aqueles que são frequentadores assíduos de ginásio e usam as nossas refeições para manter um estilo de vida mais saudável ao que usam os nossos menus como parte do seu plano de dieta. Depois, temos muitas pessoas que trabalham maioritariamente em escritórios do território e que querem apenas ter uma refeição saudável e saborosa, mas não têm tempo para a fazer”, refere.
Sofia Margarida Mota Perfil PessoasCarla Rego Lopes, funcionária bancária | Ser daqui e não ser [dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]acaense com ascendência portuguesa, chinesa e “desconhecida”. É assim que Carla Rego Lopes começa por se apresentar. Nascida e criada em Macau, desde pequena que vai com regularidade a Portugal. “A primeira vez tinha eu quatro anos”, recorda. Da infância não tem muitas memórias, a vida era simples e, talvez, pouco entusiasmante. “Andava no colégio inglês, a minha vida era ir para a escola, depois das aulas seguia para as explicações e depois ia para casa”, resume. “Não era de todo interessante.” Talvez por isso considere Macau como um lugar “com pouco interesse”. O percurso da juventude foi comum: “Fiz o trajecto normal de quem frequenta a Escola Portuguesa. Acabei o ensino secundário, fiz as malas para ir para Portugal tirar o curso superior”, afirma. A opção foi Gestão. Era “do mal, o menos”. “Não tinha jeito nenhum para as letras, apesar de ser boa a apanhar línguas estrangeiras, mas não se vive disso. Por outro lado, não tinha grande aptidão para ciências, como a física e a química, pelo que acabei por optar por uma ciência social.” Terminado o curso, não pensava em regressar ao território, mas a vida dá muitas voltas. Numa altura em que os empregos em Portugal já não eram certos, cansada de trabalhar em pequenas empresas e de contar tostões, optou por tentar a sorte “noutro tipo de entidades”. Acabou por entrar numa instituição bancária onde ficou 11 anos, até a crise ditar novas mudanças. Depois de quase um ano no fundo de desemprego, aproveitou uma viagem do pai a Portugal e regressou com ele ao território. Voltar para Macau foi sentido como “uma coisa que tinha de fazer” para ultrapassar a ausência de emprego. Não foi desejado, mas “não está a correr mal”, afirma. No entanto, no que respeita à vida do quotidiano, Carla Lopes considera que o território mantém as características que sempre considerou negativas e que “não mudou muito”. “Há uma mentalidade ainda muito fechada. Há várias comunidades distintas que não se juntam: os portugueses, os macaenses, os chineses do Continente e os estrangeiros”, aponta. “É tudo muito segmentado.” Por outro lado, considera que a comunidade macaense continua a ser muito fechada, apesar de a sua própria natureza implicar uma troca cultural. Considera-se sempre dividida. “Eu faço e não faço parte da comunidade macaense. Não me identifico. Se calhar identifico-me mais com a portuguesa”, diz. A razão, aponta é que “os macaenses ainda têm muito a ideia de que eles são portugueses e nós somos daqui”. Um pensamento muito territorial, sublinha, que é o reflexo de uma herança dos tempos da Administração portuguesa. “Na altura os macaenses não tinham lugar nos cargos públicos de maior relevo”, justifica. Viajar para arejar O regresso a Macau aconteceu há quatro anos. Para desanuviar, dedica-se às viagens. A paixão é antiga e agora representa “uma forma de sair daqui”. Macau é um sítio privilegiado para viajar, “está próximo de vários países e as viagens acabam por ficar relativamente baratas”. Este lado do mundo também é muito diverso no que respeita a opções. “Há o Japão, por exemplo, e depois o Sudeste Asiático com uma cultura e uma dinâmica completamente diferentes”, diz. A China Continental não está nas prioridades, mas coloca a hipótese de visitar Xangai, “talvez por ser uma cidade mais cosmopolita”. Carla Rego Lopes assistiu também, de perto, ao desenvolvimento de Macau. Actualmente, refere, “estamos perante um boom insustentável”. “Teoricamente deveria ser impossível o que se está a passar no território”, diz. Outra preocupação “é a falta de diversidade”. “O problema é que está tudo direccionado para o jogo e, com isso, assiste-se a outro fenómeno assustador, o da especulação imobiliária que impossibilita que se viva no território”, lamenta. “Mas o que mais me preocupa é o que vai acontecer quando outros países asiáticos se abrirem ao jogo.” Nessa altura, pensa, Macau pode ter tudo a perder. Carla Lopes acredita que países como o Japão e o Camboja podem vir a ser muito mais competitivos e constituir uma ameaça para Macau. A razão é simples: “Geograficamente são muito maiores e já desenvolveram outros tipos de oferta para os visitantes”. “Assim sendo, mesmo as pessoas que vão jogar podem optar por estes lugares onde podem também fazer outras coisas e, infelizmente, ainda não temos muito mais para oferecer do que o jogo”, lamenta a macaense, sendo que “quando o jogo começar a decair não se sabe o que as pessoas vão fazer”.
João Luz Ócios & Negócios PessoasTake a Break Café | Pausa com menu variado Na Avenida Conselheiro Ferreira de Almeida há um restaurante com opções para todos os gostos. Quem quiser uma refeição ligeira, uma sobremesa ou simplesmente um café encontra ali solução para o seu apetite. O Take a Break Café é um convite a uma pausa no centro da cidade [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]o lado do Jardim Lou Lim Ioc, existe um restaurante com janelas que contornam uma esquina e convidam quem lá passa a entrar. A acompanhar a atmosfera tranquila do jardim vizinho, o Take a Break Café é um espaço onde apetece sentar, fazer uma pausa, respirar e espreitar o menu, enquanto o rebuliço de Macau acontece ali ao lado. A dona do restaurante, Houi Lou, esclarece que o estabelecimento “não é um café, mas um restaurante onde os clientes podem encontrar todo o tipo de comidas”. Há variedade na oferta para todos os gostos, desde pho, pratos de arroz, massas, pizzas, gelados, saladas, por aí fora. A gerente do espaço destaca como preferidos dos clientes as omeletes, os hambúrgueres da casa e as pizzas. Outras opções, para quem não estiver com preocupações com dietas, são os batidos de fruta e waffles com gelado. A profusão da oferta do menu e o cuidado na qualidade dos pratos confeccionados são duas apostas de Houi Lou, que preferiu não se focar “numa gastronomia específica de um país”. Aliás, nesta diversidade de menu, a gerente vê um reflexo de Macau. Esta não é a primeira experiência de Houi Lou no ramo da restauração, depois de uma experiência falhada com uma casa dedicada exclusivamente a sobremesas. A gerente considera um risco abrir um restaurante apenas com um tipo específico de oferta, dirigido a apenas um determinado tipo de cliente, algo que pode resultar em Hong Kong, ou na Coreia, mas não em Macau. Entre os pratos oferecidos, Houi Lou destaca ainda as pizzas de base fina, que têm bastante saída. A clientela do Take a Break Café é tão variada quanto o menu. “Aparecem por aqui estudantes, famílias com crianças, pessoas mais velhas, turistas”, conta Houi Lou. Novos “breaks” A gerente do Take a Break ambiciona abrir novos espaços mas, como muitos comerciantes em Macau, sente na pele o custo de manter o negócio aberto. “A renda provoca muita pressão”, conta. Houi Lou gostava de abrir um segundo espaço no território mas, devido aos elevados preços das rendas, pondera se não será mais viável fazê-lo no Interior da China. Depois de seis meses aberto, o Take a Break Café tem uma clientela estável, uma característica que não se estende ao menu. A dona do restaurante gosta de mudar o leque de pratos oferecidos, mudando-o de dois em dois meses, acrescentando novidades que substituem os pratos com menos saída. A busca do menu perfeito e os elevados standards de qualidade da comida confeccionada são as duas prioridades para Houi Lou. Outra das preocupações da dona do espaço é proporcionar um ambiente descontraído a quem se senta à mesa do Take a Break. Com um aspecto muito “clean”, o restaurante oferece uma panóplia de pratos, com uma selecção variada de saladas e espetadas. Porém, a sua imagem de marca são os gelados e os hambúrgueres. A atmosfera é convidativa, dando um certo ar de “dinner” americano que parece agradar a clientes de todas as idades. Quer o apetite esteja virado para uma refeição mais pesada, uma sobremesa, café, ou apenas beber umas cervejas no centro da cidade, o Take a Break é uma opção para uma pausa num ambiente tranquilo, bem no coração da cidade.
Sofia Margarida Mota Perfil PessoasPedro Benjamim, locutor de rádio | O jornalista acidental [dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]oi um acaso que o levou ao curso de Jornalismo e ao mundo da rádio. E foi um acaso também que o trouxe a Macau. Pedro Benjamim chegou ao território há três meses, por estes dias garante a animação musical nas primeiras horas de emissão da Rádio Macau, logo bem cedo, mas não tem o perfil convencional de quem trabalha num estúdio, entre microfones, música e notícias, com a oralidade como única forma de comunicação. “Não tenho o bichinho da rádio, mas tenho o bichinho da fotografia”, diz, garantindo, no entanto, que gosta muito do que faz. Vamos ao início. Nasceu em Guimarães, a primeira cidade de todas as cidades portuguesas, há 25 anos. Aos 18 anos, mudou-se para Coimbra, para estudar na universidade, um acaso que tem origem noutro acaso. Quando acabou o ensino secundário, não sabia o que escolher como profissão. Entrar no mundo do trabalho tão cedo estava fora de questão, pelo que foram testes psicotécnicos que o ajudaram a escolher o caminho. “Fiz os testes e o resultado dava-me algo entre jornalismo e tradução.” Na altura de preencher a candidatura ao ensino superior, ocupou as primeiras opções com cursos de Jornalismo, com o Porto como destino preferido. A última opção foi um curso que, “curiosamente”, o teria trazido à RAEM: Tradução Português-Chinês e Chinês-Português do Instituto Politécnico de Leiria, programa que inclui uma passagem de um ano pelo Politécnico de Macau. Não conseguiu entrar na faculdade no Porto, saiu-lhe a segunda hipótese: Coimbra. “Não tinha um gosto específico por escrever, não tinha gosto por contar histórias. Foi um acidente de percurso.” O outro acidente – ir parar à cidade dos estudantes – acabou por se revelar melhor do que se a vida tivesse corrido como planeado. “A cidade é mais fácil para um estudante porque está muito orientada para esse ambiente. O Porto tem uma realidade totalmente diferente”, constata, com base na experiência dos amigos que foram para faculdades na capital do Norte de Portugal. Terminada a licenciatura – que, pelo sistema de Bolonha, não demora mais de três anos a fazer – Pedro Benjamim chegou à conclusão, mais uma vez, de que ainda era cedo para arranjar um emprego. “O mestrado acontece da mesma forma como entrei em Jornalismo. Acabei a licenciatura e pensei que ainda não estava preparado para ir trabalhar, as ofertas também não eram muitas.” Além disso, o jovem licenciado não tinha feito sequer um estágio, uma vez que o curso de Coimbra só oferece essa oportunidade durante o mestrado. Continuar a estudar era o caminho e, no fim do programa curricular, passou três meses na TSF. “Foi fantástico”, diz, sem hesitações. O primeiro contacto com o mundo do jornalismo não podia ter sido melhor, pela forma como, enquanto estagiário, foi recebido na rádio. “Os estagiários curriculares são, em quase todos os locais, usados como mão-de-obra barata.” Na TSF, Benjamim conheceu “uma realidade completamente diferente”. Ao contrário de estagiários de outros locais, não passou os dias a “encher tempo nos noticiários”. “Fazia peças, gravava-as, e no final do dia a equipa juntava-se, ouvíamos e discutíamos o trabalho, era feito de uma forma mais pedagógica.” Deste “acompanhamento mais próximo” resultou uma grande aprendizagem. “Quando conseguimos colocar alguma coisa no ar, sabemos que foi feito com mérito”, nota. Da experiência da TSF não esquece um nome: João Paulo Baltazar. “Foi muito bom trabalhar com ele.” Venha Macau Estágio no fim, Pedro Benjamim passou por vários empregos. “Trabalhar, para mim, nunca foi um problema”, assegura. Apesar de estar numa rádio quando lhe surgiu a proposta para Macau, confessa que não se trata de uma paixão. “Também não tenho um gosto especial por rádio. Detesto imprensa, não gosto de escrever. Gosto muito de fotojornalismo, de multimédia, de sites, de vídeo. A rádio surgiu naturalmente.” Com o estágio aprendeu a admirar a linguagem radiofónica, que “permite fazer coisas que outros meios não permitem”, como “criar uma sugestão em alguém só com uma pequena palavra”. E Macau? Macau são três meses na vida do jovem que, até há bem pouco tempo, era editor numa rádio no Norte de Portugal quando a oportunidade surgiu. “Não estava à procura de nada. Estava a trabalhar, recebi uma chamada, estava naquela altura em que via que o meu percurso não ia sair dali. Estava a pensar em começar a ver outras oportunidades quando surgiu uma chamada, completamente inesperada”, relata. “Disseram-me que estavam à procura de uma pessoa para vir para a rádio em Macau e eu disse: ‘Impecável. Vamos a isso’. Acabei por vir para Macau de forma totalmente inesperada.” A adaptação também não podia estar a correr melhor. “Fazendo o que se gosta, é sempre mais fácil. Se fosse um emigrante a trabalhar numa área de que não gostasse, custaria muito mais.”