Habitação pública | Governo vai reavaliar casos em Seac Pai Van

 

Um total de oito deputados esteve ontem reunido com o secretário Raimundo do Rosário para falar do caso das 150 pessoas que se viram impossibilitadas de assinar as escrituras de casas económicas. O Governo assume erros do Instituto de Habitação e promete rever caso a caso

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Governo vai analisar os processos de atribuição de casas económicas no complexo de habitação pública de Seac Pai Van, em Coloane, após ter sido denunciada a decisão do Instituto de Habitação (IH) de não assinar as escrituras com várias famílias, que habitam no local desde 2007.

Ontem, oito deputados – José Pereira Coutinho, Leong Veng Chai, Kwan Tsui Hang, Ella Lei, Ho Ion Sang, Ella Lei, Wong Kit Cheng, Au Kam San e Ng Kuok Cheong – estiveram reunidos na sede do IH com o seu presidente, Arnaldo Santos, e com o secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo do Rosário.

“O secretário pediu alguns dias para rever todas as situações, que são algo complexas. Vai estudar caso a caso antes de ter uma solução final. O secretário admitiu que houve alguns erros e, nesse sentido, irá ver o que é que pode ser feito para evitar que essas situações se repitam”, explicou ao HM o deputado José Pereira Coutinho.

Apesar de a reunião ter sido pedida por Pereira Coutinho, outros membros do hemiciclo também estiveram presentes, pois também receberam queixas dos visados.

Um final feliz?

“Pela minha parte disse que é importante que o IH dê informações de forma uniformizada, para evitar que a transmissão de informações seja conforme a pessoa que está ao balcão a atender. Isso não pode acontecer”, acrescentou Coutinho, que acredita num desfecho feliz para este caso.

“Fiquei satisfeito [com a reunião] porque vai serenar os ânimos das pessoas, que estão muito preocupados com o futuro, e é importante que as coisas sejam claras e precisas. Estamos a lidar com uma questão sensível, que é a habitação”, apontou.

As candidaturas às casas económicas em Seac Pai Van começaram a ser feitas a partir de 2003, tendo sido assinados os contratos de compra e venda dos apartamentos em 2007, com a respectiva entrega das chaves.

Recentemente, os moradores foram informados de que as escrituras não poderiam ser assinadas pelo facto de as condições de candidatura terem sido alteradas nos últimos anos. A título de exemplo, foi referida a alteração do agregado familiar ou a aquisição de uma herança, factos que terão ocorrido após o processo de candidatura à habitação económica. O deputado José Pereira Coutinho já submeteu as queixas sobre o caso ao Comissariado contra a Corrupção.

26 Abr 2017

Think Tank | Académico alerta para poucas investigações

O deputado nomeado Ma Chi Seng integra um novo think tank focado na política “Uma Faixa, Uma Rota”. Em Macau são poucas as organizações do género formadas pela sociedade civil. Para o académico Eilo Yu, não importa a ligação à elite política e social, mas sim o facto dos think tank realizarem pouca investigação

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]riado há sete anos, o Gabinete de Estudo das Políticas é o único think tank oficial do Governo, tendo já lançado, a título de exemplo, um relatório sobre a política demográfica do território. Fora do campo institucional, são raros os think tanks criados no seio da sociedade. Mas, acima de tudo, são também pouco conhecidos os trabalhos de investigação que desenvolvem, aponta o académico Eilo Yu ao HM.

Esta semana foi criado um novo think tank, composto, entre outros membros, pelo deputado nomeado Ma Chi Seng. Os representantes do Grande Thought Think Tank reuniram com o Chefe do Executivo logo no dia oficial da sua constituição e revelaram o seu principal objectivo: pensar estratégias de acordo com a política chinesa “Uma Faixa, Uma Rota” (ver texto em baixo).

Segundo o Boletim Oficial, conta-se pelos dedos das mãos o número de associações que se autodenominam think tanks. Há a Comissão de Inteligência para os Estudos Sociais (Social Studies Think Tank, em inglês), criada em 2013. Um ano depois, foi criado o Instituto de Gestão e Investigação de Usina de Ideias de Macau (Macao Think Tank Management Research Society). Há também o Usina Jovem de Ideia de Macau, ou Macau Youth Think Tank, criado em 2015.

Para Eilo Yu, o problema destas organizações não reside no facto de poderem, na sua maioria, estar ligadas à elite política e social de Macau. O académico alerta, sim, para a pouca visibilidade e trabalho realizado.

“Em Macau falamos de um reduzido número de think tanks e não são muito activos”, apontou. “Temos muitos grupos sociais que fazem sugestões ao Governo e que elaboram propostas mas os think tanks não são muito activos em termos de investigação.”

Um think tank é um órgão que realiza investigação e elabora relatórios sobre políticas governamentais a adoptar, com uma total independência face ao meio político. No caso de Macau, muitas das políticas são sustentadas com base em relatórios elaborados por empresas de consultadoria ou universidades, que são encomendados pelo Executivo.

Algumas associações cívicas, como a Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM) ou a União Geral das Associações de Moradores de Macau (UGAMM, ou Kaifong), também elaboram relatórios sobre o mercado laboral e a gestão dos terrenos.

Trabalhos às cegas

“Temos de ser cuidadosos em relação ao que fazem os think tanks e não estou certo quanto à sua posição face ao sistema político de Macau”, apontou Eilo Yu.

“Um think tank faz investigação e publica relatórios. Em Hong Kong, essas organizações publicam documentos com sugestões mais detalhadas, estabelecendo uma comparação com os casos ocorridos noutros países. Mas, no caso de Macau, não estou certo de que exista essa investigação em termos de políticas ou outro tipo de pesquisa”, defendeu o académico.

Eilo Yu acredita que um think tank tem sempre uma ligação a uma elite, seja ela política ou empresarial, e que tal não acontece só em Macau, mas também em Hong Kong ou nos Estados Unidos. A razão prende-se com o facto de ser necessária uma estrutura sólida para apoiar a realização de investigações. “Em Hong Kong, as organizações think tank são também compostas por figuras políticas ou são apoiadas por alguns empresários. É compreensível [que isso aconteça], porque sem recursos é difícil fazer este tipo de pesquisa e análise de forma sustentável.”

“A questão é se temos essa diversidade na sociedade, para que haja diversos grupos dentro dessa elite para apoiar as investigações, em prol de novas políticas e de uma reforma institucional. E o que me parece é que, no caso de Macau, não é óbvio [o trabalho dos think tanks] ou então essas organizações não funcionam de forma pró-activa”, referiu.


Um cheirinho a elite

O mais recente think tank vindo da sociedade civil chama-se Grand Thought Think Tank e visa pensar estratégias e medidas para a implementação da política da China “Uma Faixa, Uma Rota”. Além do deputado nomeado Ma Chi Seng, outras figuras fazem parte desta associação, tal como Hao Yufan, director da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade de Macau, ou Lou Tak Chong, com ligações à Associação Comercial de Macau. No encontro com o grupo, realizado esta semana, o Chefe do Executivo destacou o facto de, pela primeira vez, se formar um think tank virado para esta área. Citado por um comunicado oficial, Ma Chi Seng disse que o grupo tem “um sentido de missão” e que visa “promover a internacionalização de Macau” através da política “Uma Faixa, Uma Rota”. É ainda objectivo proporcionar mais oportunidades às pequenas e médias empresas, bem como “elevar o desenvolvimento académico” nesta área. O think tank quer também “colaborar com a Comissão de Trabalho para a Construção de ‘Uma Faixa, Uma Rota’”, estabelecida pelo Executivo. O despacho que cria a entidade, já publicado em Boletim Oficial, afirma que o think tank irá também realizar estudos, que serão entregues ao Governo de Macau e ao Governo Central. A associação pretende realizar, já em Junho, uma palestra “onde serão convidados peritos e académicos do interior da China e do exterior, para apresentarem as suas opiniões sobre a participação e contribuição de Macau no desenvolvimento de ‘Uma Faixa, Uma Rota’”, aponta o mesmo comunicado.

26 Abr 2017

Coreia do Norte | China pede contenção aos Estados Unidos

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap] Presidente Xi Jinping apelou a “contenção” sobre a questão norte-coreana durante uma conversa ao telefone com o homólogo norte-americano, Donald Trump. A troca de impressões, mantida ontem de manhã, acontece numa altura em que um contingente de navios militares, liderado pelo porta-aviões Carl Vinson, anda em águas asiáticas.

O telefonema foi feito com uma preocupação crescente em mente: teme-se que Pyongyang leve a cabo outro ensaio nuclear ou um teste com mísseis para assinar o 85.o aniversário da fundação do Exército Popular Coreano. A efeméride assinala-se hoje.
A China “espera que as partes envolvidas possam manter a contenção e evitar acções que possam aumentar a tensão na Península Coreana”, disse Xi Jinping, citado por um comunicado do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
“A única forma de concretizar a desnuclearização da Península Coreana e de resolver rapidamente o problema nuclear da Coreia do Norte é se cada parte envolvida cumprir totalmente os seus deveres”, continuou o Presidente chinês.
Foi a segunda conversa ao telefone entre os dois líderes desde o encontro no resort de luxo de Donald Trump, na Florida, no início deste mês. A conversa tinha sido previamente marcada e, dizem as agências internacionais de notícias, partiu da iniciativa do Presidente dos Estados Unidos.
O pedido de Pequim em relação à necessidade de moderação por parte de Washington surge depois de, no sábado passado, o vice-presidente norte-americano Mike Spence ter anunciado que o porta-aviões Carl Vinson iria chegar, “numa questão de dias”, ao Mar do Japão, perto da Península Coreana. No domingo, o Carl Vinson juntou-se a outros navios de guerra para exercícios militares conjuntos com o Japão, no Mar das Filipinas.
Mike Pence aproveitou ainda para reiterar os pedidos feitos a Pequim – o único grande aliado e o maior parceiro comercial de Pyongyang” – para que utilize a sua “posição única” para obrigar o regime de Kim Jong-un a ceder nas suas pretensões nucleares.
“São recebidos com muito agrado os passos que temos visto a China dar, passos sem precedentes em muitas formas, aumentando a pressão económica na Coreia do Norte”, afirmou ainda o vice-presidente. “Acreditamos que a China pode fazer mais”, acrescentou.
Em Fevereiro, a China anunciou que ia suspender todas as importações de carvão da Coreia do Norte – uma fonte de rendimentos essencial para Pyongyang – até ao final do ano. Pequim deixou ainda o aviso, já este mês, que um conflito com o regime de Kim Jong-un poderia rebentar “a qualquer momento”, numa altura em que Pyongyang ameaçava com uma resposta “sem misericórdia” a qualquer acção militar norte-americana.

Varrer com eles

A Coreia do Norte tem aumentado as ameaças nas últimas semanas, já depois do falhado teste de um míssil que coincidiu com o 105.o aniversário do nascimento do fundador do país, Kim Il-sung. Um recente artigo difundido pela agência oficial norte-coreana KCNA acusa Pequim de ceder às pressões de Washington, advertindo que a postura chinesa poderá ter “consequências catastróficas”.
Um site oficial norte-coreano advertiu os Estados Unidos de que serão “varridos da face da Terra” se desencadearem uma guerra na península.
Numa série de editoriais, o jornal Rodong Sinmun, porta-voz do partido único no poder, explica que as forças norte-coreanas não estão impressionadas com a chegada iminente do porta-aviões norte-americano, que constitui “uma chantagem militar sem disfarces”. As forças norte-coreanas estão prontas para “afundar o porta-aviões nuclear norte-americano com um único ataque”, escreveu o jornal.
O site de propaganda Uriminzokkiri considera que o envio do Carl Vinson é uma declaração de guerra. “É a prova de que uma invasão da Coreia do Norte fica mais próxima todos os dias”, referiu. Num editorial apresentado como tendo sido escrito por um oficial do exército, o site alerta Washington para não confundir a Coreia do Norte com a Síria, que não lançou um “contra-ataque imediato” após um ataque dos Estados Unidos a uma base aérea síria no início do mês.
Em caso de ataque à Coreia do Norte, “o mundo verá como os porta-aviões inconscientes de Washington são reduzidos a pedaços de aço e naufragam e como um país chamado América é varrido da face da Terra”, ameaça.
Mike Pence, que terminou uma viagem à região, declarou, como outros responsáveis norte-americanos, que face às ambições nucleares norte-coreanas “todas as opções estão sobre a mesa”, incluindo a militar.

Arigato a Trump

Antes da conversa com Xi Jinping, Donald Trump esteve ao telefone com o primeiro-ministro nipónico, Shinzo Abe. O tema da conversa foi o exercício militar conjunto em que participa o porta-aviões Carl Vinson e a Força Marítima de Auto-Defesa do Japão. “Disse-lhe que apreciamos muito as palavras e as acções dos Estados Unidos, que demonstram que todas as opções estão em cima da mesa”, disse o chefe de Governo aos jornalistas. “Concordamos totalmente com esta exigência de forte contenção por parte da Coreia do Norte que tem, reiteradamente, agido de forma provocatória e perigosa”, acrescentou Shinzo Abe. A demonstração da força naval nipónica reflecte a preocupação crescente de um ataque da Coreia do Norte. Alguns deputados do partido do poder em Tóquio pediram já ao primeiro-ministro que compre armamento capaz de lidar com os mísseis norte-coreanos, temendo um ataque iminente. A frota naval militar japonesa é a segunda maior da Ásia, logo a seguir à da China, mas é sobretudo constituída por contratorpedeiros. A imprensa japonesa tem dado conta de um receio da população em relação a um ataque nuclear da Coreia do Norte na região, que se tem traduzido na procura de abrigos nucleares e na compra de purificadores de ar capazes de bloquear as radiações.

Grupo de norte-coreanos em risco de repatriamento

Oito norte-coreanos que fugiram do país arriscam-se a serem repatriados depois de terem sido detidos, no mês passado, pela polícia chinesa. A denúncia foi feita ontem pelo grupo Human Rights Watch (HRW), que tem estado a ajudar os desertores.
A organização não-governamental explica que as autoridades da China detiveram os oito norte-coreanos em meados de Março, durante uma operação de rotina numa estrada do nordeste do país.
A detenção do grupo acontece numa altura em que o Presidente dos Estados Unidos tem estado a pressionar Pequim para que aja de forma mais activa em relação a Pyongyang, por entre um clima de tensão em torno das intenções nucleares norte-coreanas.
“Temos, neste momento, muitos relatos de sobreviventes que indicam que a administração de Kim Jong-un persegue aqueles que são obrigados a regressar à Coreia do Norte depois de terem partido ilegalmente. São sujeitos a tortura, violência sexual e trabalhos forçados – e ainda a pior”, afirmou em comunicado o vice-director para a Ásia da HRW. Phil Robertson pede à China que não repatrie os desertores.
As Nações Unidas já condenaram o facto de Pequim recambiar os norte-coreanos que são encontrados em território chinês, alertando para o facto de o Governo Central estar a cometer uma violação da legislação internacional.
A China contra-argumenta alegando que os desertores norte-coreanos são imigrantes ilegais que fugiram do país de origem por razões de natureza económica. Já a Coreia do Norte diz que se trata de criminosos e chama sequestradores a quem os ajuda a chegar à Coreia do Sul.

Apelo aos Presidentes

Os oito norte-coreanos em risco de repatriamento estavam na cidade de Shenyang, onde a polícia de trânsito os encontrou. Foram levados para a esquadra por não terem documentação válida.
Um pastor cristão que ajuda desertores da Coreia do Norte na China – e que pediu à Reuters para ser identificado pelo pseudónimo Stephan Kim – contou que os homens lhe enviaram um vídeo em que pedem ajuda ao Presidente norte-americano Donald Trump e ao homólogo chinês Xi Jinping. O vídeo mostra o grupo dentro de um veículo, à porta de uma esquadra da polícia chinesa.
São muitos os norte-coreanos que, todos os anos, tentam fugir do país natal. Porque a fronteira com o Sul é a mais protegida do mundo, a fuga faz-se, por norma, através da China, passando por outros países do Sudeste Asiático até chegar à Coreia do Sul. Cerca de 30 mil conseguiram chegar a Seul, muitos com a ajuda de grupos de direitos humanos sul-coreanos, de organizações religiosas e até de empresários.

25 Abr 2017

Habitação | Caso das casas económicas entregue ao CCAC

[dropcap style=’circle’]C[/dropcap]erca de centena e meia de famílias estavam prestes a assinar as escrituras das casas económicas que já habitam em Seac Pai Van, mas o destino mudou-lhe as voltas. O Instituto de Habitação (IH) alega que as condições com as quais se candidataram à habitação pública, em 2004, mudaram, pelo que não poderão ficar com os apartamentos.

O deputado José Pereira Coutinho conta que recebeu o caso no seu gabinete de atendimento e reúne-se hoje com o secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo do Rosário, para debater o assunto. Além disso, o caso já foi entregue ao Comissariado contra a Corrupção (CCAC), adiantou o deputado ao HM.
“Encaminhámos dezenas de queixosos que vieram ao gabinete de atendimento para o CCAC. Não vamos deixar este assunto acabar. Temos uma reunião agendada com o secretário”, explicou o deputado. No encontro, marcado para hoje, vai estar também presente o presidente do IH, Arnaldo Santos, que inicialmente tinha dito ao deputado que “não tinha tempo” para o atender.
Coutinho refere-se ao caso como sendo “uma tamanha irresponsabilidade” da parte do Governo. “É centena e meia de requerentes de fracções económicas. Em 2003 ou 2004, as pessoas declararam o seu agregado familiar, cumpriram os requisitos, submeteram os pedidos. Em 2007 ou 2008 foram chamados para escolher as casas, foram entregues as chaves, assinaram os contratos-promessa [de compra e venda].”
Entretanto, tudo mudou este ano. “Com as casas já decoradas, eis que as pessoas recebem uma carta do IH a dizer que a escritura não vai ser assinada porque o seu agregado familiar mudou, porque receberam heranças, porque estão em uniões de facto”, contextualiza.
“Isto é de uma tamanha irresponsabilidade dos dirigentes máximos do IH. Querem que os requerentes cumpram o celibato até à assinatura da escritura? É inconcebível”, acusou o deputado.

Exigido cumprimento da lei

O deputado Ng Kuok Cheong também abordou este assunto na última edição do Fórum Macau, tendo defendido que os problemas ocorridos no processo de candidatura devem ser revelados aos candidatos nessa altura e não numa fase posterior.
Segundo a imprensa chinesa, o deputado referiu ainda que a lei de habitação económica já define os casos de exclusão dos candidatos. Contudo, Ng Kuok Cheong acredita que, nesta caso, a maioria dos lesados não terá prestado falsas declarações.
Ng Kuok Cheong disse ainda que as alterações do agregado familiar ocorridas após a obtenção da casa económica não devem constituir motivo para o cancelamento da escritura. O deputado pede, por isso, que se respeite o conteúdo da lei da habitação económica, ao invés de se alterarem subitamente os critérios.

25 Abr 2017

CCAC | Instituto Cultural propõe modelo provisório a Alexis Tam

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap] Instituto Cultural (IC) apresentou ontem as conclusões do relatório interno sobre o caso dos funcionários contratados sem concurso público e apenas com base no regime de aquisição de bens e serviços, uma situação denunciada pelo Comissariado contra a Corrupção (CCAC).

Para resolver a situação dos 94 funcionários envolvidos nesta questão, o IC vai propor um modelo provisório ao secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam. O modelo passa pela assinatura de contratos individuais de trabalho com alguns desses trabalhadores, sendo que, até final do ano, todos eles deixarão de prestar serviços ao IC.
“De um total de 94 pessoas, temos actualmente 82 recrutadas desta forma. Para não prejudicar o funcionamento dos serviços, elaborámos uma proposta de acordo com o regime de contrato de trabalho dos serviços públicos. Queremos propor ao secretário este modelo”, explicou Choi Cheng Cheng, jurista.
Segundo Leung Hio Ming, presidente do IC, “a maioria do pessoal termina a relação de trabalho com o IC até ao terceiro trimestre [deste ano]”, sendo que “três quartos do pessoal vão ser dispensados” até ao final de 2017. “Até ao terceiro trimestre os 94 trabalhadores vão ser desvinculados do IC”, garantiu.
“Cada contrato vai ser rescindido e, mesmo nos novos contratos individuais de trabalho que serão assinados, há um termo”, acrescentou Leung Hio Ming.
A assinatura destes contratos com alguns meses de duração prende-se com o facto de o IC necessitar de uma reestruturação. “Para resolver este problema não podemos prejudicar os serviços culturais que prestamos à população. Temos de ter tempo para reajustar a situação e dar tempo ao pessoal afectado para pensar na sua situação”, apontou.
Apesar da saída dos trabalhadores, o IC pretende preencher as mesmas vagas com recurso ao concurso público. “A fim de satisfazer as necessidades temporais e urgentes deste período, vamos fazer um ajustamento com o número de trabalhadores que temos. No futuro, quanto ao recrutamento, vamos abrir concursos públicos e cumprir tudo de forma transparente”, explicou Choi Cheng Cheng.
O presidente do IC fez ainda esclarecimentos sobre o caso da nomeação de dois funcionários para o cargo de chefia sem estes terem o número de anos de experiência suficientes.
“A partir de 1 de Janeiro de 2016 nomeámos 14 chefias mas, devido à falta de conhecimento das leis, nomeámos dois chefes de divisão sem estes terem os anos de experiência necessários. Quando fizemos a proposta não demos muita atenção se todas as chefias tinham os requisitos suficientes [para subirem de categoria]”, adiantou Leung Hio Ming.

Pareceres ignorados

Na conferência de imprensa não foram apontados nomes concretos de culpados, nem sequer o de Ung Vai Meng, ex-presidente que pediu a demissão por motivos de aposentação. Falou-se sim de uma responsabilização dos dirigentes do IC no seu todo.
Leung Hio Ming adiantou que a contratação de pessoas sem a realização de concurso público sempre foi uma prática comum.
“O IC tem uma grande responsabilidade e o CCAC fez avisos em relação à situação entre 2012 e 2014, mas esta situação já se verifica desde que eu entrei para o IC, em 1995”, disse o presidente, que descartou responsabilidades sobre o caso.
“Sempre estive mais ligado à área das artes performativas e não estava directamente ligado ao recrutamento. Não tinha grandes conhecimentos sobre esta lei [regime de aquisição de bens e serviços].”
Não só a situação era comum, como os próprios juristas do IC fizeram vários alertas, sem sucesso. “Os nossos juristas elaboraram pareceres e alertaram-nos para o risco, mas as chefias não aceitaram esses pareceres. Quando desenvolvemos o trabalho sentimos a necessidade de o fazer [a contratação] sem pensar bem na lei, e temos a responsabilidade de aperfeiçoar o nosso conhecimento jurídico”, frisou Leung Hio Ming.

Sem corrupção

O presidente do IC referiu também que o relatório não concluiu a existência de corrupção ou de troca de interesses com as referidas contratações. “No estudo que fizemos não há corrupção ou troca de interesses”, disse o responsável, que justificou a contratação de pessoas com o aumento de trabalho nos últimos anos.
“Devido ao desenvolvimento socioeconómico, temos aumentado a realização de actividades culturais e a diversidade de actividades é cada vez maior. Por exemplo, só no desfile de ‘Macau, Cidade Latina’, participam cerca de mil pessoas. A implementação da lei da salvaguarda do património cultural também aumentou o volume de trabalho”, exemplificou.
“Houve um aumento de trabalho entre 2012 e 2014, mas concordamos que não deve ser um pretexto para o não cumprimento da lei”, admitiu Leung Hio Ming, que disse ser necessário reforçar a fiscalização.
“Temos de valorizar os pareceres jurídicos e temos de reforçar a formação do pessoal na área jurídica. Temos de ter cuidado na aplicação da lei e tratar os assuntos relacionados com os recursos humanos nos termos da lei. Temos de criar um mecanismo de fiscalização permanente”, rematou.

25 Abr 2017

25 de Abril | Data é celebrada com a realização de três jantares

[dropcap style=’circle’]C[/dropcap]elebrar Abril em Macau continua a ser uma realidade. A data que marca o fim do Estado Novo e o começo da democracia em Portugal é todos os anos lembrada com a realização de várias actividades, e este ano não é excepção. Grupos diferentes compostos por membros da comunidade portuguesa promovem hoje três jantares de celebração do 25 de Abril, sendo que não há o objectivo de politização desses encontros.

“Havendo três jantares, há sempre o risco de poder ser interpretado como sendo actividades divisionistas. Mas essa não é a minha leitura”, começa por dizer João Pedro Góis, organizador de um convívio na zona do NAPE.
“Há diversos grupos de pessoas que, por comodidade ou maior aproximação, acabam por organizar jantares distintos. Mas não são contrários, nem contraditórios. Todos eles têm a mesma missão, que é celebrar a liberdade. Não me parece grave haver mais do que um jantar, porque isso significa que, em diversos focos e espaços, há pessoas a celebrar esta data”, contou ao HM.

João Pedro Góis costuma organizar todos os anos um jantar via Facebook, convidando o círculo de pessoas que conhece. Ainda assim, aponta, “este jantar não é institucional, mas sim transversal, aberto a todos os que gostam da liberdade, sejam de direita, esquerda, católicos ou monárquicos”.

Também Tiago Pereira partilha do mesmo pensamento. É secretário-coordenador do Partido Socialista em Macau, mas não é nessa qualidade que ajuda a organizar o jantar que decorre hoje no Clube Militar.

“Este é um jantar informal, uma festa, no fundo. Vamos ter o convívio com música e poesia, até porque o lema do jantar é ‘traz um poema e um amigo também’”, contou ao HM.

“Queremos mesmo que seja um jantar em que esteja presente o espírito de Abril. O jantar está a ser organizado por um grupo de cidadãos de diferentes cores partidárias e que resolveram celebrar o 25 de Abril à sua maneira”, acrescentou Tiago Pereira.

A Casa de Portugal em Macau organiza o jantar habitual. Amélia António, presidente da associação, fala da importância de celebrar o 25 de Abril. “É uma data em que prestamos homenagem aos que lutaram para que o país se tornasse mais alegre e democrático. Estamos também a lembrar às nossas gerações que é preciso estar sempre atento e defender esses valores.”

Comunidade atenta

Mesmo à distância, a comunidade portuguesa em Macau nunca deixou de celebrar o 25 de Abril. António Katchi, jurista, lembra os habituais jantares e as actividades da Escola Portuguesa de Macau, a título de exemplo.

“Tem havido iniciativas importantes e, às vezes, vêm aqui personalidades a convite, ou são exibidos filmes. Penso que o facto de aqui não ser feriado diminui a presença de pessoas nessas actividades. Mas, de qualquer modo, nunca foi esquecido”, observou.

Para Amélia António, “há pessoas que se mantém indiferentes à data, mas há muita gente que reconhece a sua importância e a comemora com grande empenho”. “Graças ao 25 de Abril, toda a gente pode ter as suas opções e fazer as suas escolhas, e comemorar ou não conforme os seus sentimentos e convicções”, disse ainda a presidente da Casa de Portugal em Macau.

João Pedro Góis acredita que “a globalidade da comunidade portuguesa residente em Macau celebra esta data e considera-a importante”. Já Tiago Pereira destaca a importância do 25 de Abril ser celebrado no mundo inteiro. “Independentemente de estarmos em Macau, o 25 de Abril ganha uma importância maior visto estarmos a assistir ao crescimento do populismo e de movimento segregacionistas na Europa. Não é o caso em Portugal, mas temos visto os partidos de extrema direita a ganharem força”, concluiu.

25 Abr 2017

José Pereira Coutinho, deputado: “Estas eleições serão sempre injustas”

José Pereira Coutinho vai manter a composição da lista Nova Esperança para as eleições de Setembro, com uma novidade: Gilberto Camacho. Rita Santos será mandatária da candidatura. O deputado acredita que Sónia Chan será um nome apontado para o cargo de Chefe do Executivo por influência de O Lam, chefe de gabinete de Chui Sai On, mas diz que Ho Iat Seng é o que mais se destaca na corrida

Ho Iat Seng disse que o trabalho de fiscalização levado a cabo por parte da Assembleia Legislativa (AL) melhorou. Concorda com estas declarações?

Não concordo pela simples razão de que se está a passar uma ideia de que a AL tem melhorado nos seus trabalhos. O facto dos dois pedidos de debate sobre questões de interesse público terem obtido votos suficientes [não é suficiente], porque nunca teriam obtido pernas para andar se fossem submetidos há um ou dois anos atrás. Há ainda o facto de ninguém ter pedido a palavra quando o meu colega [Leong Veng Chai] apresentou o pedido de debate. A AL é bastante conivente com o Governo. Fiquei contente que cerca de 20 deputados tenham apoiado a minha proposta relativa ao Pearl Horizon e, pela primeira vez, houve um consenso, porque estamos às portas das eleições. Gostaria que houvesse eleições todos os anos para a AL, porque assim os problemas de Macau seriam resolvidos e fiscalizados. Não há margem de dúvidas de que o Governo é o porta-aviões e a AL faz parte dos navios de abastecimento que o acompanham. Temos estado a pedir mais transparência ao Governo quando a própria AL é pouco transparente.

Como é que esse aspecto poderia ser ultrapassado?

Deveria perguntar-se ao presidente da AL porque é que esta é tão opaca. Estou bastante desiludido pelo facto das seis comissões de trabalho serem à porta fechada e os meios de comunicação social não terem acesso. Com que legitimidade temos nós, AL, o descaramento de pedir ao Governo mais transparência, quando nós somos tão fechados e opacos. Somos os primeiros a criar problemas à sociedade. Quando o Governo mete um diploma proibindo fumo em todos os casinos, o diploma é aprovado por uma grande maioria dos deputados, chega à comissão permanente na especialidade, os deputados mudam de posição e o diploma, na sua estrutura, a base da nota justificativa, muda.

Foi tudo alterado.

A meu ver, esse diploma deveria ser retirado pelo Governo e nunca teria sido permitido que o mesmo pudesse ser analisado na especialidade. Desvirtuou-se por completo o ponto de partida, que era a proibição de fumo em todos os casinos. Sou contra esta forma de actuação da própria AL. Violaram-se todas as normas procedimentais da AL.

Há uma falta de consciência ou de responsabilização relativamente ao acto de votar no hemiciclo? Vota-se porque sim e não se pensa nas consequências?

Vota-se por votar. E há pouca divulgação e sensibilidade, por parte da população, em relação ao sentido de voto dos deputados. É preciso educar e sensibilizar a população em relação ao sentido de votação dos deputados. É preciso responsabilizar os deputados pelo acto da escolha, quer seja contra ou a favor, e também nas abstenções. Os deputados têm de ser responsabilizados pelos meios de comunicação social, têm de encontrar justificações da sua conduta dentro da AL. Não existe um eficiente sistema de verificação para que a AL consiga executar a sua missão nobre de fiscalizar a actividade governativa. Pagamos um elevado preço com os escândalos que vão aparecendo.

A Lei de Terras é um exemplo.

O primeiro escândalo foi o ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas (Ao Man Long). E o segundo está neste momento a decorrer, que é o julgamento de Ho Chio Meng, e não me cabe a mim pronunciar-me muito para não interferir no julgamento. Mas pelo que se lê nos media dá para perceber que a RAEM não aprendeu a lição. Fico espantado com casos como o que li hoje nos jornais, em que o Governo recuperou um terreno na Taipa, junto ao quartel dos bombeiros. Mas não se pergunta porque é que não se incrimina o ocupante ilegal do terreno, durante 20 anos, não se pede o arrendamento, e não se divulga quem ocupou o terreno? Isso é de bradar aos céus. O Governo desocupa e não pede responsabilidades. Se não são negociatas, não sei o que é que será. 

O antigo secretário Lau Si Io deveria ter tido a iniciativa de vir a público falar sobre os alegados erros do passado?

Acercar responsabilidades sobre o caso da Lei de Terras a Lau Si Io não será justo, porque a Lei de Terras passou pelo Conselho Executivo, e estão lá representantes de todos os quadrantes da sociedade. Não é por acaso que na AL temos deputados que têm uma perna no Conselho Executivo. Devemos acercar responsabilidades às instituições em si e ao dirigente máximo da RAEM. Ser o dirigente da RAEM e falar a quatro ventos da predominância do Executivo não deve ser só nos momentos de festa. Deve ser dito nos momentos mais difíceis, em que tem de tomar responsabilidades e tomar decisões.

Em relação à responsabilização, ou à falta dela, têm vindo a público muitos relatórios do CCAC e CA. Nunca se verificam grandes mudanças após a sua publicação. Considera que já era tempo de Macau voltar a ter um tribunal de contas, como teve durante a Administração portuguesa?

Concordo, e fui daqueles que sugeri a alteração da lei orgânica do Comissariado de Auditoria (CA) para, de facto, haver mecanismos preventivos e de assumpção das responsabilidades por parte das entidades antes de elaborarem os orçamentos ou de utilizarem as verbas avultadas, que são acções que merecem uma ponderação e supervisão mais adequada, feita por órgãos independentes, tal como um tribunal de contas. Mas não me parece que isto convenha… hoje em dia cada vez menos pessoas têm interesse em ler os relatórios onde se denunciam irregularidades e ilegalidades e depois misturam-se esses dois conceitos. Isto é muito mau, porque afecta o primado da lei e estamos a tratar as pessoas de forma desigual. Não podemos pintar as irregularidades, chamando-as de ilegalidades. Se formos por este caminho estamos a destruir toda a matriz do Direito de Macau.

Quando diz que não convém criar um tribunal de contas, refere-se ao Governo.

Exacto. Não convém porque assim facilita as manobras de bastidores. Se houvesse o tribunal de contas haveria um travão ao despesismo.

Como explica que no seio da Função Pública existam muitos trabalhadores que desconhecem as leis com as quais têm de trabalhar?

Não concordo com isso. Os trabalhadores, na sua maioria, são sujeitos a exames rigorosos para entrar na Função Pública, embora muitos entrem pela porta do cavalo, como se vê pela denúncia do ex-procurador da RAEM que recebeu 14 telefonemas. Está por apurar quem foram as outras pessoas que lhe telefonaram para entrar pela porta do cavalo. Desde o estabelecimento da RAEM, e até 2007, ano em que se instituiu o regime de previdência, criou-se uma grande mordaça no seio dos trabalhadores da Função Pública. Trabalham com medo de represálias e dos seus superiores e cumprem porque têm de sustentar a família. É nesse sentido que se compreende que os mega-escândalos que estão a acontecer e que vão acontecendo no seio da Função Pública não sejam denunciados. Há que criar mecanismos de protecção aos que denunciam ilegalidades dentro da Função Pública, porque sem isso nada feito. Temos muitos casos de pessoas que até têm medo de falar comigo.

Nunca lhe tinha acontecido antes.

Nunca aconteceu e cada vez mais têm medo, de mostrar que estão comigo em eventos sociais, porque se o superior os vê, passam a ter a vida negra [no emprego]. Já disse que o sistema de queixas que se quer criar será inútil. Como é que se pode ganhar a confiança das pessoas para que estas se queixem, quando, no momento a seguir, podem ser demitidas através da não renovação do contrato, ou então são chamadas para pedir a resignação dos cargos? Parece-nos que a secretária para a Administração e Justiça é uma forte candidata ao cargo de Chefe do Executivo, com a bênção da actual chefe de gabinete do Chefe do Executivo.

O Lam?

O Lam. E com isso não estou a ver que haja mudanças na Administração pública. É por isso que se compreende que a maioria dos funcionários públicos se querem aposentar o mais depressa possível, mesmo com dez ou quinze anos de actividade.

Falam-se de vários nomes para ocupar o cargo de Chefe do Executivo a partir de 2019. Por quê Sónia Chan?

Penso que o presidente da AL [Ho Iat Seng] continua a ser a escolha do Governo Central para o cargo.

Quais as razões?

Tem menos ligação com o sector empresarial e, embora faça parte, não é da ala estabelecida em Macau desde o primeiro dia da RAEM. Depois é o mais bem posicionado, em termos políticos, em Pequim, porque é vice-presidente do comité permanente da Assembleia Popular Nacional (APN). Lionel Leong (secretário para a Economia e Finanças) está a perder muita da sua influência, porque faz parte do grupo instituído que já mudou politicamente junto do Governo Central, porque estamos na era de Xi Jinping e não na era de Jiang Zemin. É o protegido do ex-Chefe do Executivo (Edmundo Ho), mas é evidente que o actual Chefe do Executivo (Chui Sai On) tende a seguir mais a sua chefe de gabinete, que é a pessoa mais chegada a ele para tomar decisões governativas. O Lam tem a afilhada que é a secretária para a Administração e Justiça (Sónia Chan), e não estranho que esteja a ocupar este cargo com a bênção da chefe de gabinete e do próprio Chefe do Executivo.

De onde vem essa ligação?

O Lam vem de uma família tradicional, ligada à Nam Kwong. O tio de O Lam teve uma grande influência no desenvolvimento económico de Macau. (Sónia Chan) será indicada ao Governo Central para ser a próxima Chefe do Executivo, está bem posicionada. É evidente que não nos podemos esquecer do bom trabalho do secretário para a Segurança (Wong Sio Chak), que será sempre um cavalo a não esquecer.

Ainda assim nenhum desses nomes pertence a outra das famílias tradicionais de Macau, nomeadamente a família Ma, que já tem um deputado nomeado na AL (Ma Chi Seng). Esperava-se um nome daí?

Penso que não, porque há um consenso de que já beneficiaram muito ao nível dos maiores projectos, concursos públicos e terrenos, para compensar o défice na área política. São compensados com outras coisas.

Estamos em ano de eleições. Questionou, numa sessão de esclarecimento, a questão da liberdade de imprensa. É algo que o preocupa, a possibilidade da Comissão dos Assuntos Eleitorais da AL (CAEAL) vir a controlar o que se notícia?

Preocupa-me as difamações que aparecem na internet e que alguns media aproveitam para fazer noticias, como já aconteceu no passado. Mas os jornais chineses pertencem todos a determinados sectores da sociedade, que são muito influentes e com representatividade na AL. Veja-se o jornal Si Man, que pertence a Angela Leong. O jornal Si Si pertence ao deputado Chan Meng Kam. O jornal Va Kio e o jornal Ou Mun Iat Po são conotados com o Governo. E todos os outros jornais estão conotados com outras pessoas, e em todos os actos eleitorais há uma tendência desses jornais de publicarem notícias dos candidatos preferidos. Se queremos eleições justas, a CAEAL tem obrigação de falar nos casos em que uma pessoa tem dupla função, enquanto representante de uma associação e candidata às eleições, e depois sai em primeira página uma actividade associativa no Ou Mun Iat Po. Em Hong Kong mete-se na notícia do jornal de que há outros candidatos para além do visado. Mas nunca conseguiremos contornar a escolha das grandes fotos na primeira página do jornal Ou Mun, que tem um grande impacto na sociedade. Mas não tenhamos ilusões: estas eleições serão sempre injustas.

Por quê?

Vão continuar a existir autocarros, porque já está tudo reservado. Ainda ontem liguei para algumas empresas para tentar perceber o ponto de situação da reserva de autocarros, e já está tudo reservado. Muitas das empresas de turismo estão conotadas com deputados da AL. Os trabalhadores dos casinos vão ser coagidos a entrar nos autocarros dos casinos para irem votar, como aconteceu no passado.

A CAEAL sabe disso?

A CAEAL sabe disso e não quer emitir instruções. A CAEAL tem de emitir instruções aos casinos para que sejam impedidos de ajudar certas listas cuja publicidade chega aos cacifos e refeitórios dos casinos. É injusto para com as outras listas que não têm esse acesso.

E esse trabalho já está a ser feito.

Está a ser feito! Inclusivamente nas salas VIP já foram designadas pessoas para atrair o pessoal, com instruções de que têm de votar em determinados candidatos. O grupo SunCity vai participar nas eleições, e eles têm muitas salas VIP. A CAEAL tem de actuar. Tem de se dar instruções às escolas, para que os meninos de três ou quatro anos sejam educados de uma forma honesta, e não se deve enfiar panfletos dos Moradores (União Geral das Associações de Moradores de Macau, ou kaifong) e dos Operários (Federação das Associações dos Operários de Macau) nas mochilas. Isso foi o que aconteceu nas últimas eleições, estive à porta das escolas e assisti a isso. O que sinto é que a CAEAL não tem vontade de intervir e enfrentar esses problemas. Talvez porque não queiram afrontar o poder estabelecido.

Uma das questões trazidas pela lei eleitoral foi a obrigatoriedade dos candidatos assinarem uma declaração de fidelidade a Macau e à China. Contudo, aquando da votação, ninguém interveio e a proposta acabou por ser aprovada.

O Governo continua a ser o porta-aviões. Veja-se a actual composição da AL. Pagamos um preço elevado pelo facto de não haver mais deputados eleitos pela via directa. Isto prejudica Macau em termos gerais. O que me pergunta é a consequência de tudo isto, e enquanto não alterarmos o sistema, vamos continuar a pagar caro. Esta cidade está a ser comida pelo jogo, e não tenho fé e confiança na implementação do Plano de Desenvolvimento Quinquenal. É impossível ir contra a maré. Macau vai continuar a ser uma cidade casineira, com alguns satélites à volta, dependentes dessa actividade, como os hotéis e os táxis. E os próprio salários dos funcionários públicos e o orçamento da RAEM. O Governo acomoda-se.

Sobre a sua lista. Rita Santos já disse que não vai ser candidata…

Ela vai ser mandatária e eu vou concorrer com o meu colega, Leong Veng Chai. Logo a seguir estará o meu colega Gilberto Camacho, estamos a acertar para que seja o número três ou quatro da lista. É uma pessoa jovem, de Macau, que estamos a tentar formar para assumir [esse lugar]. Embora não seja fácil encontrar pessoas que nos possam substituir na lista Nova Esperança. Já é bastante tempo, são 12 anos.

Está cansado de ser deputado?

(Risos). Não. Dá-me muita satisfação pessoal poder ajudar as pessoas, e sinto-me realizado todos os dias, quando os cidadãos, por sua iniciativa, nos solicitam apoio. O exercício do cargo de deputado tem de ser em regime de exclusividade, e todos devem fazer uma declaração de interesses. Isso faz muita falta.

24 Abr 2017

Alexis Tam alega que Ung Vai Meng desconhecia leis de contratação

O secretário para os Assuntos Sociais e Cultura já recebeu o relatório das mãos do Instituto Cultural, no âmbito da última investigação do CCAC. Alexis Tam defende o ex-presidente do organismo e afirma que Ung Vai Meng não conheceria as leis de contratação de funcionários e, por isso, errou sem intenção

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]lexis Tam, secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, veio ontem em defesa do ex-presidente do Instituto Cultural (IC), Ung Vai Meng, no caso do relatório do Comissariado contra a Corrupção (CCAC), que detectou irregularidades ao nível da contratação de funcionários.

Segundo o canal chinês da Rádio Macau, o secretário disse que Ung Vai Meng não esteve envolvido em casos de corrupção, e acredita que tudo aconteceu por um mau entendimento das leis por parte do ex-presidente, pelo que este não saberia que estava a errar ao contratar pessoas através do regime de aquisição de serviços, sem concurso público.

Alexis Tam referiu ainda que, além do IC, outros departamentos públicos não estiveram envolvidos no problema das contratações. Questionado sobre a responsabilização do Executivo, o secretário garantiu que não tinha conhecimento das acções de Ung Vai Meng quanto à contratação de funcionários.

“Os trabalhos de recrutamento foram feitos pelo ex-presidente do IC, é algo que não tem a ver com o actual presidente e também não tem nada a ver comigo”, disse Alexis Tam, citado pelo Jornal do Cidadão.

Questionado face à possibilidade de Ung Vai Meng vir a ser investigado pelo CCAC, Alexis Tam não quis fazer qualquer comentário.

Relatório será público

Após a publicação do relatório do CCAC, o IC ficou encarregue de realizar um relatório de análise sobre o assunto, sendo que este documento já está nas mãos de Alexis Tam. O Jornal do Cidadão escreve que esta semana o conteúdo do relatório deverá ser divulgado, estando prevista a realização de uma conferência de imprensa sobre o assunto, para explicar os detalhes do documento junto do público.

Alexis Tam promete ainda encontrar soluções para os funcionários que foram contratados com base no regime de aquisição de bens e serviços, uma vez que o Governo ainda estará a analisar os detalhes e a viabilidade de cada caso.

O secretário promete ainda encontrar formas de garantir a responsabilização dos funcionários do IC que terão estado envolvidos na contratação de pessoas.

O relatório divulgado pelo CCAC deu conta das violações à lei que têm acontecido nos últimos anos ao nível da contratação de funcionários para o IC. A investigação, iniciada há um ano, revelou que o IC “recorreu ao modelo da aquisição de serviços para contornar sistematicamente o regime legal do recrutamento centralizado e do concurso público”.

Entre 2010 e 2015, o número de trabalhadores contratados em regime de aquisição de serviços, quase duplicou, passando de 58 para 110, o que o IC justificou com o aumento do volume de trabalho nos últimos anos e com a escassez dos recursos humanos.

Além disto, “o IC adoptou só a análise curricular e a entrevista na selecção dos candidatos, sem obter a necessária autorização daquele secretário para a dispensa das provas de conhecimentos, constituindo este facto, sem dúvida, uma usurpação do poder do órgão superior no âmbito da gestão de pessoal”, revelou o CCAC.

24 Abr 2017

Canídromo | Terreno vai albergar infra-estruturas sociais

O Chefe do Executivo está preocupado com o bem-estar das pessoas e a qualidade de vida. Por isso, o Canídromo vai ser substituído por estruturas sociais, entre elas escolas e zonas de lazer e desportivas

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] terreno que neste momento é ocupado pelo Canídromo já tem destino traçado. Estabelecimentos de ensino e zonas recreativas e de desporto vão ocupar aquele espaço quando terminar a concessão da Companhia de Corridas de Galgos, em Julho de 2018. A informação foi dada na sexta-feira pelo Chefe do Executivo, Chui Sai On, numa sessão de perguntas e respostas sobre as Linhas de Acção Governativa e assuntos sociais, na Assembleia Legislativa.

“Temos recebido muitas instruções da população e de vários órgãos sobre esta matéria que incluem a construção de escolas e de instalações desportivas naquela zona”, referiu Chui Sai On.

O sector da educação, de acordo com o Chefe do Executivo, também se manifestou a favor do aproveitamento do lote em questão para a construção de infra-estruturas de ensino, de lazer e de desporto.

Desta forma, “o Canídromo vai ser aproveitado para o interesse público e não para a construção de edifícios privados”, afirmou o líder do Governo.

Para o Executivo, aquela área já é densamente populosa, pelo que não se justificaria criar estruturas que fossem aumentar ainda mais o número de moradores. Por outro lado, e de modo a satisfazer as necessidades daqueles que ali vivem, é necessário renovar algumas instalações. “Há escolas que já têm muitos anos e que se mostram insuficientes para a melhoria da qualidade de vida das pessoas que ali residem”, acrescentou.

Assim sendo, Chui Sai On acredita que “o terreno pode ser aproveitado para melhorar a qualidade de vida da população, sendo que de parte fica qualquer finalidade associada à exploração hoteleira e comercial. Será apenas aproveitado para fins recreativos, desportivos e educacionais”, assegurou.

O destino do Canídromo foi dado a conhecer em resposta à questão da deputada Angela Leong que, tendo no passado sido forte oponente ao fecho daquele espaço, questionou o Executivo quanto à sua utilização, sugerindo que fosse aplicado na construção de habitações dirigidas aos jovens.

Ideia ao encontro do povo

Já em Julho do ano passado, Chio Lan Ieng, membro do Conselho Consultivo de Serviço Comunitários da Zona Norte e chefe de gabinete da Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM), considerou que a decisão do Governo em dar outra utilidade àquela área que não a promoção de corridas de cães tinha sido uma boa notícia para o público, sugerindo ao Executivo que desse início ao planeamento do lote com a maior brevidade. A ideia da responsável era no sentido de que o terreno pudesse ser um complexo desportivo e parque de estacionamento. Lam Lun Wai, membro do Conselho do Planeamento Urbanístico e vice-reitor da escola para os Filhos e Irmãos dos Operários, concordava com a sugestão e pediu também escolas para o local.

Uma ordem executiva, publicada a 19 de Dezembro do ano passado em Boletim Oficial, delegava poderes no secretário para a Economia e Finanças “na escritura pública de prorrogação do prazo até 20 de Julho de 2018 e alteração do contrato de concessão celebrado entre a RAEM e a Companhia de Corridas de Galgos Macau (Yat Yuen), S.A., para a exploração, em regime de exclusivo, das corridas de galgos”.

A ordem executiva veio formalizar o anúncio do Governo de que, em Julho de 2016, que a Yat Yuen teria de decidir entre terminar a exploração da actividade ou relocalizá-la no prazo de dois anos.

24 Abr 2017

França | Primeira volta das presidenciais no próximo domingo

Os franceses vão a votos no domingo para umas presidenciais invulgares, com candidatos fora do sistema partidário e um resultado imprevisível. As eleições têm importância interna, mas são também de extrema relevância para uma Europa que já conheceu melhores dias. Em Macau, pela primeira vez, há uma mesa de voto

 

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o próximo domingo, a partir das 8h, os quase 140 eleitores franceses que residem em Macau poderão exercer o direito de voto na mesa que vai ser instalada na Alliance Française. Têm à escolha, no boletim de voto, 11 candidatos, numas eleições que ficaram, para já, marcadas por escândalos de corrupção e por uma tentativa de ruptura com sistema, com candidatos que não têm o apoio de máquinas partidárias.

A mesa de voto em Macau trata-se de uma novidade e poderá ter apenas uma edição, explica o politólogo francês Éric Sautedé que, no próximo domingo, fará parte da comissão presente na Alliance Française. É bem provável que, nas próximas eleições, já seja possível o recurso ao voto electrónico. Mas, para já, esta novidade introduzida pelo novo cônsul-geral francês em Hong Kong e Macau vem reconhecer a importância dos franceses residentes no território que, em sufrágios anteriores, tinham de se deslocar a Hong Kong ou votar por correspondência.

Ao todo, Macau e Hong Kong têm oito mil franceses recenseados. Éric Sautedé acredita que a afluência às urnas não deverá ficar atrás do que aconteceu nas últimas eleições, altura em que 60 por cento dos eleitores exerceram o direito de voto. Este ano, pela imprevisibilidade em torno do resultado das eleições, é bem provável que a afluência cresça em França. E esse movimento deverá ser acompanhado fora do país.

Em termos domésticos, nestas eleições jogam-se sobretudo políticas económicas, laborais e de imigração. Mas as presidenciais francesas têm impacto também para o futuro da União Europeia (UE). Paris tem uma importância histórica na construção da comunidade de países do Velho Continente. Desempenhou – e continua a desempenhar – uma papel fundamental no equilíbrio de forças da UE, a par da Alemanha. “Ninguém consegue olhar para o futuro da União Europeia sem pensar no eixo franco-alemão, tanto mais agora que o Reino Unido deixa de ser membro da União”, observa José Luís Sales Marques, presidente do Instituto de Estudos Europeus de Macau (IEEM).

Sufrágio da diferença

Dos 11 candidatos inscritos no boletim de voto, há dois mais bem posicionados para sucederem a François Hollande, que decidiu não se recandidatar. Emmanuel Macron, independente do centro, de apenas 39 anos, vai à frente nas sondagens, mas é seguido de perto por Marine Le Pen, da Frente Nacional, candidata de extrema-direita que os europeístas não desejam ver eleita. Se nenhum dos candidatos conseguir mais de metade dos votos, os eleitores são de novo chamados às urnas a 7 de Maio.

Na análise às eleições francesas, Éric Sautedé começa por fazer uma distinção entre o que é a perspectiva interna e o que sentem os eleitores que vivem fora do país. “Os franceses que estão no estrangeiro são globalizados, são muito pró-Europa. Quando se fala com quem está no local, é diferente, porque as grandes preocupações são domésticas, são internas.”

Numa Europa que tem vivido, nos últimos anos, fortemente afectada pela crise, as decisões e a influência das instituições europeias são frequentemente utilizadas (justa e injustamente) como justificação para o que vai mal. “Os nossos políticos culpam amiúde as instituições europeias pelas medidas de austeridade, por tudo o que é mais difícil de apresentar ao eleitorado. A Europa é muitas vezes acusada de uma série de dificuldades”, analisa o politólogo. Por isso, é mais fácil para os franceses no estrangeiro terem consciência da importância da União Europeia.

Dentro das fronteiras, “muitas pessoas estão insatisfeitas com os políticos, com o facto de a taxa de desemprego rondar os dez por cento”. A “falta de capacidade de vários Governos” tem contribuído fortemente para que o eleitorado esteja desagradado, sublinha Éric Sautedé. E é neste contexto que surgem candidatos que não estão no sistema partidário. Do grupo dos 11, há dois nomes independentes, sendo que é bem provável que um deles seja o próximo Presidente.

“Emmanuel Macron, o candidato mais bem posicionado, criou o seu próprio movimento há um ano e meio. Está fora do Partido Socialista, apesar de ser de esquerda, mas está mais do lado liberal. E depois há Jean-Luc Mélenchon, que foi também socialista, mas que tem a sua organização independente. Também está fora do sistema partidário”, realça o politólogo.

Ainda na análise aos candidatos, Sautedé não esquece François Fillon, à direita, que chegou a ter uma posição confortável, mas que passou a lidar com acusações – entretanto formalizadas – de corrupção. Depois, na Frente Nacional, Marine Le Pen, que também vive com a sombra de suspeitas de corrupção, que “se diz anti-sistema, mas faz parte dele”.

Em suma, “são umas eleições invulgares”, resume o analista francês. “Há dois candidatos fora dos partidos e dois candidatos que se deparam com acusações de corrupção”.

Contas imprevisíveis

À hora a que este texto é escrito, e depois de a campanha ter começado com quatro candidatos bem posicionados, tudo aponta para que Emmanuel Macron seja o vencedor da primeira volta. “Até há pouco tempo”, recorda Sales Marques, “as sondagens indicavam que Marine Le Pen ganhava a primeira volta e perdia na segunda”.

Porque a história recente conta muito para estas análises, apesar de as geografias serem outras, o presidente do IEEM não arrisca resultados. “Estas coisas são imprevisíveis. Se Marine Le Pen ganhar à primeira volta, nunca se sabe o que poderá ser a química interna desses movimentos eleitorais que, às vezes, nos trazem surpresas desagradáveis.” O analista não esquece o Brexit no Reino Unido e a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos. As sondagens valem o que valem e o mundo político tem hoje contornos diferentes do que teve no passado, com a polarização de posições e com o refúgio em candidatos que se apresentam com promessas de ruptura do sistema.

Na extrema-direita, Marine Le Pen é adepta do proteccionismo, quer acabar com a dupla nacionalidade quando em causa estão cidadãos de fora da Europa, e quer levar a cabo um referendo sobre a presença francesa na União Europeia, um “Frexit” que seria, muito provavelmente, fatal para a UE. Tudo isto é embrulhado com o laço da recuperação da identidade francesa.

“Do ponto de vista do projecto europeu, é evidente que seria ideal que ganhasse um candidato europeísta à primeira volta que, neste caso, seria Macron”, nota José Luís Sales Marques.

Aos 39 anos, Emmanuel Macron foi ministro da Economia do impopular Presidente François Hollande. Deixou o cargo em 2016 para dar início ao seu movimento – En Marche!. É um defensor do projecto europeu e, como liberal, quer diminuir os impostos às empresas, tornar mais flexíveis as leis laborais, investir 50 mil milhões de euros num plano de investimentos públicos e encorajar os empreendedores. Diz ser, do ponto de vista ideológico, o oposto de Marine Le Pen, e espera convencer os franceses de que “um projecto positivo e uma perspectiva progressista é mais conveniente aos desafios” do país.

Além dos desafios económicos e sociais apontados por Éric Sautedé, Sales Marques recorda que “a França tem sido alvo de várias questões de segurança interna, com alguns ataques terroristas, uma certa desestabilização que, como todos sabemos, abre sempre caminho para soluções securitárias, para o fecho de fronteiras, para a tentação de discriminar certos grupos sociais, étnicos e religiosos”.

Apesar de as sondagens não darem a vitória a Marine Le Pen, Sales Marques teme que esta “forte candidatura discriminatória e xenófoba” obtenha um resultado elevado, o que poderá significar “uma situação muito complicada” para o país e para a continuidade do projecto europeu”.

“Infelizmente, a UE, com a crise económica, com as soluções neoliberais e com uma visão curtíssima do que é a solidariedade europeia, tem vindo a perder”, lamenta Sales Marques. No domingo, os franceses vão a jogo. No boletim de 11 candidatos aposta-se também o futuro da Europa.

21 Abr 2017

Paulo Cardinal, constitucionalista: “A Declaração Conjunta mantém-se em vigor”

O tratado internacional que Portugal e Macau assinaram há 30 anos continua a valer, apesar de ter sido arquivado precocemente pela mentalidade colectiva. Por isso, é importante que quem cá está contribua para que o pacto continue vivo e de boa saúde. Paulo Cardinal apresenta hoje a obra “Direito, Transição e Continuidade”. Assessor da Assembleia Legislativa desde 1992, o constitucionalista entende que, em termos gerais, têm sido respeitados os princípios definidos para o pós-99, mas há sinais que o deixam preocupado. Algumas das posições tomadas pela Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa são um exemplo. O jurista espera que não passem de um equívoco

 

Apresenta hoje um livro que reúne uma série de textos. Como é que surge esta publicação?

É uma colectânea de textos que foram sendo escritos ao longo dos últimos 25 anos. Alguns deles foram publicados, sendo que, dentro deste grupo, alguns foram publicados fora de Macau – em Portugal, no México… Há também alguns textos que foram escritos há uns anos e que, por motivos vários, não foram publicados, pelo que aproveitei para os incluir. Tem ainda uma componente de uns textos que foram elaborados especificamente para suporte às minhas aulas na universidade. Dentro deste fio condutor de estudos de direito público que não direitos fundamentais, fiz esta selecção. São estudos jurídicos, tratam a maior parte deles a questão da transição de Macau sob o exercício da Administração portuguesa para a Região Administrativa Especial de Macau mas, depois na tónica da continuidade, que é o que impõe a Declaração Conjunta Luso-Chinesa – que ainda agora fez 30 anos. A continuidade da maneira de viver, do sistema jurídico e dos direitos fundamentais, entre outras continuidades. São estes os eixos essenciais deste livro.

Começando pela transição. Macau e Hong Kong têm um sistema constitucional que é único no mundo. Faz-se no livro uma reflexão sobre esta solução constitucional que se encontrou para as duas regiões administrativas especiais.

É uma questão absolutamente essencial e incontornável para quem quiser estudar e perceber do ponto de vista jurídico – e não apenas, mas eu trato de questões jurídicas – este especialíssimo estatuto de Macau e Hong Kong. São situações muito particulares, quer na história do direito constitucional e no direito constitucional comparado, quer também na perspectiva do direito internacional público. A solução ‘Um País, Dois Sistemas’ permite um grande pragmatismo na resolução de questões que foram legadas pela história e permite, sobretudo, dentro da unidade de um país, a manutenção e a garantia da manutenção da diversidade – da diversidade da maneira de viver, da preservação do sistema jurídico, do conjunto de valores que moldam a sociedade de Macau e Hong Kong, etc.. Portanto, este é um tema obviamente obrigatório para quem quiser estudar matérias de direito constitucional em Macau. Como disse, este livro não trata de direitos fundamentais – os estudos sobre essa matéria foram objecto de uma publicação anterior. Aqui lidamos com direito constitucional numa perspectiva mais institucional: a organização da autonomia, a transição pactuada entre Portugal e a República Popular da China, matérias como o sistema político e a fiscalização judicial da constitucionalidade das leis. É nesses tópicos que este livro se movimenta.

A especificidade de Macau em termos constitucionais, as soluções que foram sendo encontradas e que permitiram que Macau seja aquilo que é hoje, pelo menos em termos formais, estão devidamente estudadas? Continua a haver essa necessidade, que já foi apontada no passado?

Continua a haver essa necessidade mas devo dizer, em nome da justiça, que não é específica neste campo. Contrariamente ao que se passa em Hong Kong – que tem uma comunidade académica relevante e altamente produtiva –, Macau, desde logo pela sua dimensão muito reduzida, mas não apenas, tem um grande défice de produção doutrinária no direito. É um défice que é visível em virtualmente todas as áreas do direito – mais numas do que em outras, mas é um défice que existe. Nesta questão do direito constitucional e do estudo deste especial estatuto, da Declaração Conjunta, dos direitos fundamentais, do sistema político – porventura pela sua natureza mais sensível ou capaz de suscitar algumas apreensões não jurídicas –, esse défice de produção doutrinária é ainda mais acentuado. Por exemplo, faz falta a Macau – à sua comunidade jurídica e à população em geral – haver Leis Básicas anotadas. Em Hong Kong, há várias publicações, quer em língua inglesa, quer em língua chinesa. Seria importante haver em Macau esse tipo de publicação, de reflexão. Não temos necessariamente de concordar com essas reflexões, como é óbvio: faz parte do pensamento jurídico um debate, uma adesão ou uma recusa a determinadas ideias. Mas o que é importante é reflectirmos sobre estas normas, sobre estes princípios, e trazer a público as nossas reflexões.

Um maior conhecimento sobre aquilo que é a especificidade do território poderia acabar com alguns receios que existem em termos políticos e sociais? Seria possível acabar com algum melindre que existe se houvesse uma certa simplificação deste tipo de questões?

É importante a divulgação. Ao divulgarmos, ao debatermos e ao reflectirmos, as questões saem necessariamente simplificadas. Se me pergunta por simplificação no sentido de uma hipersimplificação, de reduzir questões jurídicas quase a histórias infantis, aí não concordo, porque uma hipersimplificação poderá levar a resultados enganadores e a explicações que não serão compreensíveis. Agora, uma divulgação, uma ponderação e um debate, isso sim, sou completamente a favor, quer em Macau, quer em qualquer outro sistema jurídico. Com o debate e com essa divulgação, as pessoas perceberiam melhor quais as nossas normas jurídicas, nomeadamente no patamar constitucional e direito internacional. Estariam também mais habilitadas a defender melhor os seus direitos e a compreender melhor este sistema que só tem paralelo no caso de Hong Kong. Mas também é um paralelo limitado, desde logo pelo facto de a matriz em vigor ser a Common Law e aqui ser um sistema de matriz romano-germânico, muito influenciado pelo direito português. Macau precisava de ter mais estudos, uma academia mais actuante, mais divulgação do direito.

A continuidade que se pensou na transição está a ser garantida? Em termos jurídicos, há um esforço para que essa continuidade se mantenha, ou seja, para que seja respeitada a Declaração Conjunta?

Não é um processo perfeito. Obviamente, poderemos sempre detectar situações de alguma descontinuidade. Relativamente à Declaração Conjunta, lamento que tenha entrado numa espécie de arquivamento precoce na mentalidade colectiva. Quase que se apresenta a Declaração Conjunta como uma relíquia do passado, algo que foi um acordo importante, mas que entrou já para a história, não está em vigor, não tem interesse. É falso – a Declaração Conjunta mantém-se em vigor, é um verdadeiro tratado internacional, depositado na Organização das Nações Unidas quer por Portugal, quer pela República Popular da China. Tenho pena de não ver mais referências à Declaração Conjunta, de não ver reedições da publicação da Declaração Conjunta, como vemos da Lei Básica e de uma série de outra legislação. Quanto à questão da continuidade, no essencial, tem estado garantida. Não assistimos à eliminação de determinados direitos fundamentais que já vinham de antes de 1999. As leis têm sido mantidas respeitando os seus princípios essenciais, a sua estruturação, as suas razões fundacionais. Pode haver – e haverá com certeza – alguns casos em que essa continuidade de valores pode estar a ser algo afectada.

Ainda em relação à continuidade, temos assistido a tomadas de posição da Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL) diferentes do que tem sido a prática nos actos eleitorais dos últimos anos. Há aqui alguma descontinuidade naquilo que se está a desenhar para as próximas eleições?

Ainda é relativamente cedo, mas devo confessar que começo a ficar com algum desconforto relativamente a opiniões veiculadas pela comissão eleitoral. Não sei se já foram tomadas algumas decisões formais e definitivas mas, pelo que tem sido veiculado pela comunicação social, fico preocupado porque me parece que há claramente aqui uma quebra, uma descontinuidade, e alguma confusão, nomeadamente quando parece que em Macau não vigora um documento chamado Lei Básica. Ora, a Lei Básica é a lei suprema de Macau e tem de ser observada por todas as leis, por todos os agentes administrativos e por todas as outras normas ou quase normas, que é o caso das chamadas instruções vinculativas da CAEAL. Quando a comunicação social veicula que, por exemplo, a CAEAL se reservará o direito, através de uma instrução, de retirar conteúdos de plataformas de sítios na Internet, só posso ficar preocupado e esperar que seja uma má reprodução dessa ideia, porque isso seria uma violação de direitos fundamentais, da Lei Básica e do ‘due process’. Espero que haja apenas uma mera confusão e não já uma decisão tomada que, como digo, estaria em desconformidade com a Lei Básica, com direitos fundamentais e com a própria Lei Eleitoral da Assembleia Legislativa e com a Lei de Imprensa. Aliás, há pelo menos dois pareceres da Assembleia Legislativa que chamam precisamente a atenção para esta questão das instruções, que não poderão vincular terceiros – são instruções que deverão apenas vincular os membros da CAEAL e os funcionários públicos que para ela trabalham, mas não vincularão candidatos e mandatários, e muito menos a comunicação social. Depois, há mais uma ou duas situações que também me deixam apreensivo. Uma delas é a questão do ruído: as manifestações existem para fazer ruído e o próprio Tribunal de Última Instância já afirmou isso. Dizem que vão limitar o ruído – como e em nome de quê? Da Lei de Prevenção do Ruído Ambiental? Essa lei não se aplica às reuniões e manifestações em geral, e às reuniões e manifestações eleitorais. Creio que a CAEAL estará porventura a dar os primeiros passos, algo confusa talvez, mas seria bom acertar rapidamente isto e sobretudo olhar para estas questões não de uma forma isolada, mas do sistema jurídico – não esquecendo a Lei Básica, a Declaração Conjunta, o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, não esquecendo leis e direitos fundamentais como o direito de reunião e manifestação, a Lei de Imprensa, etc.. É importante para Macau ter uma comissão eleitoral que se saiba pautar pelo escrupuloso cumprimento do princípio da legalidade. E também que não entre em considerandos que fogem da área da legalidade e entram mais na área de uma espécie de moralismo ou de moralidade. Não é essa a função da comissão eleitoral.

Portugal, enquanto um dos signatários da Declaração Conjunta, tem estado atento ao que é a obrigação da China no respeito pela continuidade que ficou acordada em 1987?

Não sei o que possa dizer – se Portugal tem agido, não se sabe. Pode eventualmente ter outro tipo de contactos ao nível não público. Se a pergunta é se Portugal tem ou não legitimidade para averiguar e analisar o efectivo cumprimento da Declaração Conjunta, tem. Há pouco tempo foi afirmado, relativamente a Hong Kong, que era uma questão meramente interna e que o Reino Unido não poderia tecer considerações e emitir opiniões – isso não é verdadeiro. A legitimidade de Portugal advém do facto de ser uma das duas partes signatárias deste acordo internacional que é a Declaração Conjunta. Portugal não pode, obviamente, interferir no dia-a-dia da administração de Macau – seria uma atitude quase neocolonialista –, mas deverá estar atento e terá legitimidade, caso considere que há uma violação a determinada norma e garantia da Declaração Conjunta.

Há intenção de continuar a escrever sobre este conjunto de questões?

Tenho escrito com regularidade nos últimos 25 anos, não tenho planos para deixar de escrever sobre estas matérias. À medida que este segundo período de transição vai avançando em direcção a 2049, creio que é ainda mais importante escrever, porque a memória vai-se apagando, o referencial Declaração Conjunta vai ficando, nalguns sectores, um bocado obnubilado, para não dizer quase esmagado ou mesmo estigmatizado. É cada vez mais importante escrevermos sobre estas matérias e mantermos viva esta ideia sublime de ‘Um País, Dois Sistemas’. Com isso, estamos a defender não apenas a Declaração Conjunta, mas também a Lei Básica – isto é, estamos a defender as vontades soberanas de Portugal e da República Popular da China expressas na Declaração Conjunta e, a meu ver, aquilo que a República Popular da China inscreveu na Lei Básica. Por vezes, quando alguém defende a Lei Básica contra determinado regulamento administrativo, determinada legislação ou determinado comportamento que estará desconforme com a Lei Básica, parece que, com isso, está a atacar a Lei Básica. Bem pelo contrário – a Lei Básica funciona como uma lei constitucional de Macau. Devemos manter-nos alerta e, como juristas e académicos, temos mesmo o dever de chamar a atenção quando determinado acto normativo ou acção administrativa está em desconformidade com a Lei Básica e/ou com a Declaração Conjunta.

 

 

 

 

Bacelar Gouveia no lançamento

O lançamento da obra “Direito, Transição e Continuidade” está marcado para o final da tarde de hoje, pelas 18h30, e insere-se no programa de comemorações do quinto aniversário da Fundação Rui Cunha. Para a apresentação do livro vem de Portugal Jorge Bacelar Gouveia, que é o autor do prefácio da obra de Paulo Cardinal. Bacelar Gouveia é professor catedrático da Universidade Nova de Lisboa e da Universidade Autónoma de Lisboa. É presidente do Instituto do Direito de Língua Portuguesa e dos juristas portugueses que mais estudou e escreveu sobre o Direito de Macau.

21 Abr 2017

Fisco | Proposta de troca de informações aprovada até 30 de Junho

O tempo é limitado e o Governo de Macau tem até 30 de Junho para aprovar, na especialidade, a proposta de lei sobre o regime jurídico de troca de informações em matéria fiscal. A 1 de Julho começa a recolha de informação e o primeiro dia de 2018 marca o envio aos países com que Macau tiver acordos selados

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] aprovação da proposta de lei sobre o regime jurídico de troca de informações em matéria fiscal tem de ser concluída até 30 de Junho. O tempo urge para que o território não fique mal visto aos olhos do mundo. “Se Macau não tiver a proposta de lei aprovada, vamos ser considerados uma jurisdição incapaz de implementar as normas internacionais”, referiu ontem a presidente da 1.ª Comissão Permanente, Kwan Tsui Hang. “O dia 30 de Junho é também a data que corresponde à conclusão de uma avaliação internacional sobre as diferentes jurisdições internacionais e sobre a sua capacidade de implementação de normas”, sublinhou.

As próximas reuniões estão marcadas para 26 e 27 deste mês. A ideia é poder concluir uma apreciação preliminar para que depois se possa passar a uma avaliação capaz de dar por concluído todo o processo. Na prática, até 27 deste mês, um primeiro parecer acerca do diploma tem de ser emitido.

A recolha de informações para a troca fiscal vai ser iniciada a 1 de Julho deste ano e o envio das informações vai ser feito a partir de 1 de Janeiro de 2018. “Vamos ter seis meses para a preparação da matéria a ser enviada”, disse a também deputada.

Ficarão abrangidos pelas directrizes do diploma os residentes fiscais estrangeiros. “São residentes fiscais estrangeiros que têm o estatuto de residente fiscal estrangeiro. Se foram residentes apenas de Macau não estão incluídos nesta proposta de lei. São residentes que estão em Macau, mas que têm residência num país estrangeiro também”, esclareceu a presidente da comissão que tem a cargo a apreciação do diploma.

O Governo já tem acordos internacionais referentes à troca de informação fiscal com alguns países mas, após a aprovação e entrada em vigor desta proposta, vai proceder “ao estabelecimento de mais acordos com países considerados relevantes”. Por outro lado, “segundo esta proposta, as informações relativas a matéria fiscal dos residentes fiscais estrangeiros vão ser enviadas de acordo com os critérios definidos a nível internacional”, referiu Kwan Tsui Hang.

Portugal sem pressas

Para já, Portugal está de fora. O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Fernando Rocha Andrade, visitou o território no inicio do mês mas não deixou assinado qualquer acordo a respeito de matéria fiscal.

“O que nos informaram é que havia empenho da região de Macau no processo relativo às trocas de informações no âmbito da norma comum da OCDE. Também nos foi dito que não tinham sido concluídos os procedimentos do lado de Macau, portanto a República Portuguesa reafirmou a sua disponibilidade para o fazer”, disse aos jornalistas. “Não é uma questão para nós de muita urgência e, portanto, continuamos disponíveis para assinar, para chegar a um acordo”, acrescentou.

21 Abr 2017

Isabel Capeloa Gil, reitora da Universidade Católica Portuguesa: “USJ precisa de muito para crescer”

A reitora da Universidade Católica Portuguesa está de visita a Macau para estreitar laços com o Governo e com a Universidade de São José. Na calha está a criação de pós-graduações em Direito, bem como um mestrado em Ensino de Português Língua Estrangeira. Isabel Capeloa Gil destaca a boa gestão da instituição levada a cabo por Peter Stilwell, mas assume que o caminho ainda está a ser construído

[dropcap]V[/dropcap]eio a Macau para ter encontros com o Governo e também para acompanhar o progresso da Universidade de São José (USJ). Que planos concretos traz na bagagem?
Temos uma relação forte com a USJ, que foi criada há 20 anos através de uma participação entre a Universidade Católica Portuguesa (UCP) e a Diocese de Macau. É importante para nós acompanharmos o desenvolvimento dos cursos e também desenvolvermos novas iniciativas. Estamos num momento em que a universidade já tem o seu rumo autónomo, e interessa estudar possibilidades de ligação em áreas específicas entre aquilo que se faz em Macau e as iniciativas que se fazem em Portugal. É isso que estamos a estudar em algumas áreas em particular, como o Direito e a Economia.

A USJ pode ter uma licenciatura em Direito?
Não está nada explorado, nem discutido. Neste momento estamos sobretudo a trabalhar na área das pós-graduações, em articulação com a escola de Direito da UCP no Porto. Depois há outras áreas, como o ensino do português, e outras que ainda estão a ser estudadas. Há uma cooperação muito forte com a Faculdade de Indústrias Criativas [da USJ].

Em Macau, a qualidade dos cursos de Direito tem sido questionada. Seria importante para a UCP, através da USJ, marcar uma posição nesse sentido?
Se houver interesse da parte do território e das autoridades locais, estamos disponíveis. Queremos que essa necessidade surja da parte das autoridades locais. A UCP tem vindo a inovar no ensino do Direito em Portugal. Criámos, há dez anos, a Global School of Law, que internacionalizou o ensino do Direito. A Católica mudou o paradigma em Portugal, mas não só. Tem vindo a ser considerada pelo Finantial Times como uma das dez universidades mais inovadoras no ensino do Direito em todo o mundo. Temos interesse em estudar parcerias na área do Direito Internacional e se houver de facto uma abertura…

Para que haja licenciatura em Direito, além das pós-graduações.
Para já, o que está estudado com a USJ são apenas pós-graduações.

Quando podem arrancar?
Creio que para o ano poderão ser oferecidas.

Que outras iniciativas, em termos de cooperação, estão a ser pensadas?
Estamos a estudar também possibilidades em áreas alvo, como é o caso da área das ciências, no sentido de termos parcerias ao nível da investigação com um dos centros que temos no Porto, na área da biotecnologia. Posso dizer também que uma das iniciativas que estamos a desenvolver em Macau, e que é uma das áreas prioritárias, é o lançamento de um novo curso de mestrado do Ensino de Português Língua Estrangeira, entre a UCP e a USJ. Os alunos de Macau que estão em Portugal a estudar português na UCP vão ter um ano curricular em Portugal e, depois, o acompanhamento do estágio será feito em Macau. É um projecto-piloto, com dupla titulação, e no fundo vai testar possibilidades de termos outras licenciaturas e mestrados com dupla titulação.

A UCP vem também à procura de uma maior internacionalização, à procura do que tem sido feito por outras universidades portuguesas?
Pretendemos ter contactos com outras universidades locais porque a UCP tem um plano de desenvolvimento estratégico muito ligado à internacionalização. É feito através da captação de alunos e da possibilidade de intercâmbio dos nossos alunos para fora. Já temos várias iniciativas com a USJ e também com a Universidade de Macau. Temos estado cada vez mais a desenvolver parcerias de investigação com Macau, Hong Kong e a China. A UCP vai ter um Instituto Confúcio, porque a China é uma área muito importante para o desenvolvimento da universidade. Já o era no passado, neste momento também é, pois temos muitos parceiros aqui em Macau.

Sobre o Instituto Confúcio. É importante para a UCP uma aproximação à China, uma tendência que se tem verificado no ensino superior em Portugal?
A UCP tem uma aproximação à China desde a sua fundação. Essa aproximação foi feita, inicialmente, através de Macau, sendo que as primeiras parcerias com universidades chinesas remontam ao final dos anos 90. Entretanto, essas parcerias têm sido alargadas e posso falar de uma cooperação muito forte na área do Direito, com a Universidade Tsinghua e com a Communications University, onde somos parceiros estratégicos. Estamos presentes em feiras na China, temos um contingente bastante razoável de estudantes chineses, e também alunos nossos que vão para a China. Com a criação do Instituto Confúcio vamos alargar ainda mais as possibilidades ao nível das cooperações. A China é um grande potentado, não só na área da economia, mas também tem um enorme potencial na área do ensino superior.

O que é que o Instituto Confúcio da UCP pode trazer de novo em termos do ensino do chinês e de investigação nessa área?
Estamos ainda a desenvolver o plano de actividades do instituto, que vai estar sediado no Porto. Será importante para a universidade, que já tem um Instituto de Estudos Orientais e um mestrado de Estudos Asiáticos de grande sucesso. Com a presença do Instituto Confúcio vamos ter uma maior capacidade de desenvolver iniciativas ao nível do estudo das relações entre Portugal e a China, mas também um conhecimento muito maior da cultura chinesa e o desenvolvimento político nos últimos anos. O instituto não se vai confinar só à língua.

Falando da USJ. A universidade passou por um grande processo de reestruturação em 2009, mudou de reitor, fechou cursos, despediu professores. Era fundamental esse processo?
A vinda do professor Peter Stilwell ocorreu muito tempo antes de me tornar reitora. Mas devo dizer que o trabalho do padre Peter Stilwell tem sido importante. As universidades são instituições aprendentes, moldáveis. À medida que o tempo evolui, elas vão-se transformando e adequando às necessidades. Esse trabalho mostra que a universidade está viva. Muitas vezes é necessário fazer um ajustamento para que haja um desenvolvimento. Foi isso que o reitor da USJ fez e agora a universidade passa por uma nova fase de desenvolvimento.

Uma fase que inclui a construção de um novo campus, que tem vindo a sofrer alguns atrasos no projecto. Isso tem sido um entrave?
O novo campus é certamente muitíssimo importante para a afirmação da universidade. Todos nós precisamos de uma casa para viver. E a USJ vai finalmente ter uma casa sua. Temos acompanhado à distância todas estas vicissitudes, mas estamos com grande interesse em ver o novo campus e vai ser muito importante para o futuro desenvolvimento da universidade. Encaro os atrasos como sendo normais, isso acontece com todos os projectos de construção.

A que se refere concretamente quando fala de um novo desenvolvimento da USJ?
Creio que as unidades [educativas], depois deste trabalho que o professor Peter Stilwell fez, terão novas iniciativas. A unidade que conheço melhor é a Faculdade de Indústrias Criativas, que está com uma enorme pujança. Há uma vontade de desenvolver iniciativas na área da criatividade, que é muito importante. Foi sinalizada pelas autoridades chinesas como uma das áreas de aposta no último Plano Quinquenal. No mundo inteiro, a área das indústrias criativas é muitíssimo importante para o Produto Interno Bruto (PIB) dos países. Em Portugal acordámos para esta questão há cerca de quatro anos e o discurso político começou a dar enorme importância a esse sector. Há uma mudança de ‘mindset’ e a Ásia é uma zona do globo absolutamente pujante ao nível do financiamento das indústrias criativas. Olhamos para Hong Kong, Singapura e o Japão, e Macau tem tudo a ganhar com a aposta nesta área de desenvolvimento.

A USJ, ao contrário de outras universidades locais, não pode receber alunos vindos da China. É outro constrangimento?
Acredito que o reitor da universidade tem desenvolvido uma série de iniciativas para tentar desbloquear esta questão. Certamente que receber alunos da China trará maiores possibilidades de desenvolvimento à universidade, como em todas as universidades de Macau. O mercado da China Continental é enorme, o diálogo tem vindo a ser desenvolvido e vai continuar. É uma questão que tem sido acompanhada com grande cuidado, mas estou confiante de que a universidade vai conseguir desbloquear este desafio.

Um desafio que tem implicado uma grande ginástica financeira por parte da USJ.
Sobretudo ao nível de finanças sustentáveis. O importante é sermos responsáveis pelo financiamento que se recebe, com as propinas dos alunos, e a actual gestão tem sabido fazer isso com grande coerência. É uma situação semelhante à que se vive em Portugal: a UCP não recebe fundos públicos e tem feito uma gestão eficiente enquanto instituição pública não estatal. Exige uma enorme responsabilidade de gestão. Acho que há bastante semelhança no modelo de gestão.

Mas se a UCP não recebe fundos públicos, a USJ, sendo uma universidade privada, tem apoios do Governo e da Fundação Macau. Sem essa ajuda financeira teria sido mais difícil erguer este projecto?
Se calhar, sim. Esta é uma questão a colocar ao reitor, mas asseguro que sim. [A USJ] é uma instituição pequena que ainda precisa de muito para crescer e para se desenvolver, mas o percurso das universidades é mesmo assim.

20 Abr 2017

Lei | Governo exortado a divulgar tratados internacionais

 

O deputado José Pereira Coutinho entregou na Assembleia Legislativa um projecto de lei que visa obrigar o Governo a divulgar os tratados ratificados pela RAEM ao abrigo da Organização Internacional do Trabalho, bem como os relatórios que façam referência ao território

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] meses de terminar a actual legislatura, e em ano de eleições legislativas, o deputado José Pereira Coutinho decidiu entregar na Assembleia Legislativa (AL) um projecto de lei intitulado “Promoção, sensibilização e divulgação dos tratados de Direitos Humanos e Convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT)”.

O objectivo é obrigar o Governo, através de uma lei, a divulgar os tratados internacionais na área do trabalho já ratificados, bem como os relatórios internacionais que fazem referência a Macau.

O projecto de lei determina que a RAEM “tem o dever geral perante a população de residentes e de não residentes de, activamente e amplamente promover, sensibilizar e divulgar os tratados de Direitos Humanos e Convenções da OIT, e os direitos que estes tratados e convenções atribuem às pessoas”.

A divulgação dessas informações deve ser feita “através dos media e das novas tecnologias”, ou então “outros que se revelem adequados, como a publicação de panfletos, esclarecimentos, jogos ou concursos”, lê-se no articulado.

Além da utilização das duas línguas oficiais de Macau, o deputado propõe que sejam usados outros idiomas, que sejam da compreensão de todos os que fazem de Macau a sua casa.

“Devem ser utilizadas outras línguas adequadas para a promoção, sensibilização e divulgação dos tratados de Direitos Humanos e Convenções da OIT, em especial junto das diversas comunidades de imigrantes”, esclarece o documento.

Conhecer é preciso

Na nota justificativa, o deputado, que também preside à Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM), afirma que “é preciso que a população de Macau, gente que aqui mora e trabalha, tenha um melhor conhecimento dos seus direitos e das leis internacionais” em vigor.

Pereira Coutinho dá o exemplo da lei sindical, cujos projectos de lei foram chumbados oito vezes na AL. “Parece claro que as entidades internacionais há muito tempo que não acreditam nas promessas sem cumprimento da RAEM. Quantas vezes foram chumbados neste hemiciclo os projectos de lei sindical? E acabar com a discriminação das mulheres no tocante à licença de maternidade?”, questionou.

Para o autor da proposta, a OIT e a Organização das Nações Unidas (ONU) “prestam cada vez mais atenção à RAEM e são cada vez mais duras nas apreciações que fazem, sendo que tem havido situações de clara actuação contra os tratados dos Direitos Humanos e da OIT”, rematou.

 

 

 

Coloane, nova tentativa

O deputado José Pereira Coutinho apresentou ainda um projecto de lei para garantir a protecção de Coloane enquanto zona verde de Macau, sendo esta a quarta vez que apresenta um articulado com este teor no hemiciclo. Todos os anteriores projectos de lei foram chumbados pelos deputados. Com este diploma, Pereira Coutinho quer garantir a preservação do ambiente da ilha, sem que seja permitida a edificação de projectos de construção nas zonas protegidas.

20 Abr 2017

Internet | CTM assume “total responsabilidade” pelo apagão

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]ma avaria no software da Companhia de Telecomunicações de Macau (CTM) na noite da passada terça-feira, durante cerca de quatro horas, deixou sem Internet cerca de 30 mil clientes, informou ontem a empresa.

Em declarações aos jornalistas, o director executivo da CTM, Vandy Poon, disse que a operadora de telecomunicações assume “total responsabilidade” pelo incidente, e que a intervenção no sistema iria continuar durante a noite passada, devendo os trabalhos de reparações estar totalmente concluídos hoje à noite.

A CTM recebeu cerca de 3500 queixas de clientes, incluindo particulares e empresas, durante o período em que o acesso à Internet registou problemas – entre as 19h30 e 23h49 de terça-feira. “A maioria das queixas foi de clientes particulares e, dado que o incidente ocorreu a partir das 19h30, a maioria das pequenas e médias empresas já tinha encerrado as operações diárias, e a maioria dos negócios que operam 24 horas [incluindo os casinos] opera com IP [Internet Protocol] fixos”, explicou Vandy Poon.

A empresa registou no passado outras interrupções no serviço de Internet, nomeadamente em 2012, em que um apagão cortou ou limitou as comunicações em todo o território durante cerca de seis horas.

Um comunicado da Direcção dos Serviços de Correios e Telecomunicações (CTT), divulgado ontem, referiu a ocorrência de “uma avaria em dois servidores de Internet, estimando, preliminarmente, que 30 mil utentes do serviço de banda larga tenham sido afectados”. Os CTT exigiram à CTM a resolução do problema, “com a maior brevidade possível (…) e a apresentação de um relatório preliminar do incidente no prazo de 24 horas”.

20 Abr 2017

Conselho Executivo | Pedida redução ou eliminação de deputados

O presidente da Assembleia Legislativa defende uma redução do número de deputados na composição do Conselho Executivo, mas há quem defenda a sua total eliminação. Leonel Alves, membro do órgão há 15 anos, diz que não há conflito de interesses nas duas funções

 

[dropcap style≠’circle’]Q[/dropcap]uatro, dois, três ou nenhum? A questão do número de deputados que são nomeados pelo Chefe do Executivo para fazerem parte do Conselho Executivo foi levantada esta semana por Ho Iat Seng, presidente da Assembleia Legislativa (AL). Actualmente, há quatro deputados no Conselho Executivo (Leonel Alves, Chan Chak Mo, Cheang Chi Keong e Chan Meng Kam, num total de 11 membros), mas Ho Iat Seng disse à Agência Lusa que deveriam ser escolhidos apenas dois ou três.

Em declarações ao HM, o analista político Éric Sautedé defende que nenhum deputado deveria pertencer ao órgão que presta aconselhamento às políticas do Governo e que também analisa as leis antes da sua entrega à Assembleia Legislativa (AL) para votação.

“Trata-se de um órgão sob alçada do Executivo e os deputados não deveriam fazer parte dele. Em Macau, o patronato sempre prevaleceu em relação a uma compreensão precisa do que é uma verdadeira separação de poderes. Se Ho Iat Seng se tornar no próximo Chefe do Executivo, poderia colocar as coisas mais de acordo com o espírito da Lei Básica”, defendeu o académico.

Também o deputado José Pereira Coutinho acredita que a eliminação dos deputados do órgão que coadjuva Chui Sai On na tomada de decisões seria a melhor opção. “O Conselho Executivo deve ter pessoas que, independentemente da sua relação de amizade pessoal com o Chefe do Executivo, possam ter opiniões diferentes e com diferentes relações de amizade. Isso iria permitir ao Chefe do Executivo sentir o pulso da sociedade, recebendo informações de diferentes extractos sociais”, defendeu.

Coutinho fala de uma situação em que os deputados “têm um pé em cada barcaça”. “Há que separar o trigo do joio. Não estou a ver como se pode exercer com honestidade o cargo de deputado, com uma acção fiscalizadora [em relação às políticas do Executivo], quando meses antes, no Conselho Executivo, se deu o aval ao mesmo diploma ou assunto que é objecto de discussão na AL”, argumentou.

O analista político Larry So defende a permanência de deputados neste organismo, mas acredita que as escolhas do Chefe do Executivo deveriam incidir sobre pessoas vindas de vários sectores.

“Precisamos de, pelo menos, dois deputados, porque tem de existir um trabalho em conjunto”, frisou. Contudo, “espero que não sejam apontados tantos deputados pelo Chefe do Executivo, mas sim mais figuras da sociedade que sejam representantes de diferentes sectores, como o jogo, o turismo, a cultura. Áreas que não estejam tão representadas na AL”, explicou.

Sem conflitos

O deputado Leonel Alves é membro do Conselho Executivo há 15 anos e garante que não há qualquer conflito de interesses nas duas posições que ele e os seus colegas da AL ocupam.

“Não há conflito de interesses, há sim uma harmonização dos interesses”, disse ao HM. “Há muitos assuntos debatidos que não têm nada que ver com a AL. Se calhar mais de metade dos assuntos não têm que ver com o dia-a-dia da AL. São coisas bastante distintas”, disse Leonel Alves sobre as reuniões do Conselho Executivo, que são à porta fechada e cujas discussões nunca são tornadas públicas.

“A utilidade de um deputado no Conselho Executivo não é tanto pelo seu estatuto ou conhecimentos enquanto deputado, mas sim pela pessoa em si, que tem o seu contributo próprio no aconselhamento das questões importantes da RAEM ao Chefe do Executivo”, explicou.

“No meu caso, represento a comunidade macaense, outros representam a banca, outros representam as pequenas e médias empresas. É mais nessa perspectiva de experiência e posição na sociedade [que são escolhidos], para transmitirem os conhecimentos que têm ao Chefe do Executivo”, acrescentou.

Leonel Alves lembrou ainda que os seus colegas até presidem a comissões no seio da AL. Cheang Chi Keong e Chan Chak Mo lideram comissões permanentes, enquanto Chan Meng Kam preside à Comissão de Acompanhamento para os Assuntos da Administração Pública.

“Não vejo que seja em função da sua presidência que exerçam as posições no Conselho Executivo. Pode ser uma mais-valia, mas não é exclusivamente por causa desse facto”, acrescentou Leonel Alves.

O também advogado recorda o período da transição para explicar que, afinal de contas, a Lei Básica prevê que deputados possam ser membros do Conselho Executivo.

“A Lei Básica prevê isso porque, se calhar, houve necessidade de frisar que um deputado e um membro do órgão municipal também poderiam ser membros do Conselho Executivo. Na Administração portuguesa, o membro de um conselho consultivo ou do órgão municipal não podia ser deputado, e houve necessidade de clarificar que, depois de 1999, o deputado de uma hipotética assembleia municipal poderia fazer parte do Conselho”, concluiu.

19 Abr 2017

Turquia | Oposição contesta resultado de referendo

O Partido Republicano do Povo, o principal partido da oposição turca, não se conforma com o resultado – nem com os métodos – do referendo que reforça os poderes de Recep Tayyip Erdoğan. O Presidente do país passa a ser um homem com força em demasia. Se as autoridades do país não resolverem o problema, a solução poderá passar pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] principal força da oposição da Turquia, o Partido Republicano do Povo (CHP), deu ontem início a uma batalha para anular o referendo que prevê novos poderes para o Presidente Recep Tayyip Erdoğan. Também a união das associações de advogados e os observadores internacionais duvidam da legalidade do processo, colocando em causa o modo como foram obtidos os votos favoráveis às intenções do Chefe de Estado.

Os turcos votaram no fim-de-semana passado uma alteração da Constituição que prevê a atribuição de mais poderes ao Presidente. Com a vitória do “sim” — com 51,37 por cento dos votos –, Erdogan passará a poder nomear e afastar ministros, membros do Tribunal Constitucional e a poder emitir ordens executivas. Até aqui, estas funções eram da competência do Parlamento que, a partir de agora, terá um papel meramente secundário.

Apesar da fraca margem com que venceu o referendo, Recep Erdoğan entende que o resultado termina com todo o debate em torno do poder que a presidência passará a ter. E fez questão de desvalorizar as críticas dos observadores internacionais, que concluíram que o processo não foi verdadeiramente democrático, uma vez que as duas partes não tiveram oportunidades iguais.

Através de um comunicado, o Conselho da Europa e da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa considerou também que a cobertura dos meios de comunicação social foi parcial e que houve limitações às liberdades fundamentais. Erdogan não esteve com meias medidas: aconselhou os observadores a “manterem-se no seu lugar”.

O primeiro-ministro Binali Yildirim – que deixará de ter emprego mal as alterações constitucionais entrem em vigor, uma vez que o cargo vai ser extinto – anunciou que Erdogan vai ser convidado a voltar ao AKP mal os resultados oficiais sejam anunciados, um sinal de que o Governo não tem qualquer intenção de esperar pelo resultado do apelo da desagradada oposição. Ao abrigo do actual diploma fundamental, ao Presidente é exigida imparcialidade e que renuncie a ligações a partidos políticos.

Pouco após o anúncio do CHP em relação à contestação do referendo, o primeiro-ministro turco, Binali Yildirim, declarou que “toda a gente, a começar pelo principal partido da oposição, deve respeitar (…) a palavra da nação”. “Os que se esforçam por lançar uma sombra sobre o resultado do referendo propagando alegações [de irregularidades] agem em vão. A vontade da nação foi expressa livremente nas urnas, este caso está terminado”, atirou.

Recurso para nada

À hora de fecho desta edição, o CHP ainda não tinha apresentado junto do Alto Conselho Eleitoral (YSK) o pedido de anulação do referendo de domingo sobre o reforço dos poderes do Presidente, algo que deverá ter acontecido ainda ontem. Um responsável do Partido Republicano do Povo deveria reunir-se com o presidente do YSK duas horas antes da entrega do recurso.

Também o HDP, partido da oposição pró-curdo, denunciou “manipulações” no escrutínio. Em causa está a decisão de última hora do YSK de considerar como válidos os boletins não marcados com o selo oficial das autoridades eleitorais. A oposição vê nessa decisão uma manobra que permite a fraude.

São poucos aqueles que, na Turquia, acreditam que o recurso legal interposto pela oposição em relação ao referendo leve a uma recontagem dos votos e muito menos a uma nova realização da consulta popular. Mas se a polémica em torno do referendo não se resolver, permanecerão dúvidas profundas acerca da legitimidade de um acto que partiu o eleitorado ao meio, depois de uma campanha que polarizou a população turca e que deixou a Europa em alerta.

Também a organização que representa a advocacia no país entende que a decisão do YSK em relação aos boletins de voto viola claramente a lei, tendo evitado que os registos oficiais sejam devidamente guardados, o que poderá ter tido impacto no resultado.

“Com esta decisão ilegal, os conselheiros nas mesas de voto [os membros oficiais] foram levados a acreditar que a utilização de boletins sem o selo oficial das autoridades era apropriado”, afirmou a União das Associações de Advogados da Turquia (TBB) num comunicado, citado pelas agências de notícias internacionais. “Não lamentamos o que sai deste referendo, mas sim as violações claras e brutais da lei que têm um potencial impacto nos resultados.”

O principal partido da oposição – que já anunciou também que levará o caso ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, se tal for necessário – recordou que a decisão de última hora em relação aos boletins de voto não foi inédita, uma vez que o Governo tinha já autorizado um acto semelhante.

Não se sabe, para já, quantos boletins de voto sem selo foram considerados válidos pelo Alto Conselho Eleitoral. O presidente do organismo explicou que recebeu muitas queixas das mesas de voto porque não tinham selos para carimbar os boletins. A decisão de permitir documentos não oficiais foi tomada neste contexto, depois de recebido um apelo nesse sentido por parte de um político ligado ao AKP, o partido no poder.

Um membro austríaco da missão de observadores do Conselho Europeu, citado pela Reuters, indicou que 2,5 milhões de votos poderão ter sido manipulados, o que é quase o dobro da margem de vitória de Erdogan. Também este observador não compreende como podem ser autorizados boletins de voto sem o selo oficial.

“Estas queixas são para ser levadas muito a sério e são, de qualquer modo, de tal dimensão que vão surtir efeitos contrários ao do resultado do referendo”, afirmou Alev Korun à rádio ORF.

Em nome do bem

As autoridades responsáveis pelos processos eleitorais na Turquia ainda não tinham, ontem à noite, resultados oficiais – os provisórios apontam para uma vitória do “sim” com quase 51,4 por cento dos votos. Se Recep Tayyip Erdoğan levar a melhor, acontecerá na Turquia a maior reviravolta constitucional desde a fundação da república moderna. É um desejo que o Chefe de Estado alimenta há muito.

Os argumentos de Erdogan têm que ver com as características políticas e sociais da Turquia. Diz o político que a concentração do poder na presidência é necessária para evitar a instabilidade. Como é óbvio, a oposição tem um entendimento muito diferente da situação: a pretensão de Erdogan é criar um sistema em que o poder é controlado por um só homem. Esta monopolização de poderes acontecerá num país membro da NATO, que tem fronteiras com o Irão, o Iraque a Síria, e cuja estabilidade é de uma importância vital para a União Europeia e para os Estados Unidos.

Logo no domingo, o Partido Republicano do Povo escreveu no seu site que tinha recebido “queixas consideráveis” de eleitores a quem foram dados boletins de voto e envelopes sem o selo oficial.

Quanto à união de advogados, o presidente da TBB, Metin Feyzioglu, contou que recebeu telefonemas de várias províncias sobre votos em documentos não oficiais. Metin Feyzioglu, que é visto como potencial futuro líder do partido da oposição CHP, explicou ainda que os advogados que acompanharam o processo de perto recomendaram às autoridades nas mesas que os votos deveriam ser cuidadosamente guardados após terminada a contagem. Mas tal não terá acontecido, pelo que a prova das irregularidades não foi devidamente preservada.

Em Abril de 2014, o YSK decidiu anular o resultado de eleições locais em dois distritos do sudeste da Turquia, precisamente por causa do recurso a boletins de voto informais. O acto acabou por se repetir dois meses mais tarde – mas em causa estavam, na altura, diferentes ganhos políticos para o homem que manda na Turquia. E que quer mandar muito mais.

 

 

 

A América dá os parabéns

O Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, telefonou a Erdogan para o congratular pela vitória do “sim” no referendo de domingo passado na Turquia. De acordo com um comunicado da Casa Branca, durante a conversa telefónica, os dois governantes terão também discutido as acções levadas a cabo pelas forças norte-americanas contra a Síria no início deste mês. “O Presidente Trump agradece ao Presidente Erdogan por apoiar esta acção dos Estados Unidos e os líderes concordaram com a importância de responsabilizar o Presidente sírio Bashar al-Assad”, lia-se no mesmo comunicado. “O Presidente Trump e o Presidente Erdogan também discutiram a campanha contra o ISIS e a necessidade de cooperar contra os grupos que usam o terrorismo para atingir os seus fins.”

19 Abr 2017

Carlos Botão Alves, autor de “O Oriente na Literatura Portuguesa”: “Uma cultura procura na outra o que lhe falta”

 

“O Oriente na Literatura Portuguesa – Antero de Quental e Manuel da Silva Mendes” é o mais recente trabalho de Carlos Miguel Botão Alves, professor e investigador no Instituto Politécnico de Macau. É uma análise de textos dos autores portugueses com vidas e reconhecimentos diferentes mas, que em comum, têm uma forte influência da cultura oriental, e dos princípios budistas e taoistas

 

Como é que escolheu a temática deste livro?

Vem na linha de várias discussões que tive com professores de Portugal que me alertaram, desde a minha formação inicial na Universidade Católica, para a necessidade de explorar não tanto a filosofia, porque não é um saber racional autónomo no Oriente, mas antes a sabedoria oriental que tem vindo a ser aperfeiçoada. Depois, em Paris, quando fiz a minha formação específica em Tradução, o estudo foi melhorado com o diálogo muito próximo com a professora Helena Carvalhão Buesco. Apareceu uma área de estudo de Antero de Quental que teria que ver com o Budismo. Eram pesquisas do final de séc. XIX e tinham uma perspectiva assumidamente eurocêntrica. Quando fui leitor de português em Deli, de 1993 a 1995, tive ocasião de apurar ainda mais o campo de estudo da influência budista e pude delimitar mais concretamente o âmbito da minha análise. Foi um trabalho que esteve a marinar e a ser desenvolvido desde 2001/02 até 2014/15, quando acaba por ser redigido.

E porquê o paralelismo com Manuel da Silva Mendes, autor que viveu em Macau?

Tive contacto com os textos de Manuel da Silva Mendes já em Macau em 1990. Apercebi-me que o que se tinha escrito até à data sobre ele tinha muito que ver com a vertente da reflexão política e, sobretudo, com a análise que fazia pelo empenhamento que tinha na política portuguesa. Era republicano, do Norte, e com génese num proletariado que poderia existir na época. Explorava-se muito os seus escritos no sentido da análise de um socialismo utópico e mesmo anárquico. Mas muito pouca coisa, ou mesmo quase nada, apareceu relativamente aos textos que fez e a que chamo de ensaios. São artigos que publicava dedicados à exploração que fazia das temáticas da filosofia oriental. Quando comecei a colocar a par os textos de Antero de Quental e os de Manuel da Silva Mendes pensei que faria todo o sentido aproximá-los no sentido de criar linhas de leitura que pudessem ser exploradas por quem quisesse estar interessado pela sabedoria do Oriente. Esta parceria entre os autores pode parecer um pouco desequilibrada porque Antero de Quental tem um lugar mais que estabelecido no panorama literário português e Manuel da Silva Mendes nem tanto. Mas a literatura comparada tem também este objectivo, o de trazer para o palco autores não tão conhecidos por via de outros já reconhecidos. Pensei ainda que seria interessante fazer este paralelismo porque desenvolvi a minha vida em França e Portugal, e depois em Macau e na índia. Aqui tenho os dois mundos. Tive sorte por ter dedicado mais de dez anos a leituras para poder escrever o livro. Tive uma mulher que tomava conta de mim e das crianças, o que é muito importante. Pude analisar os textos em profundidade e dar uma visão cultural da segunda metade do séc. XIX e da primeira do séc. XX. O virar do século é fundamental na formação de consciências tanto a Oriente, como a Ocidente. São dois autores empenhados politicamente, ou seja, o que fazem não é uma mera reflexão filosófica, não é uma satisfação individual, quase egoísta. São autores que procuram precisamente, no aliar da tradição ocidental com a oriental, instrumentos de análise para poderem ter uma praxis. São homens extremamente activos, homens que escrevem, que insultam, que vão para os jornais. Mas, ao mesmo tempo, eram pessoas que percebiam que esta prática intensa só faria sentido se fosse bem grudada na realidade, e a realidade é reflexiva. Não se trata de uma mera erupção intelectual e é isso que está pouco estudado na literatura portuguesa. Em Portugal não temos muitos exemplos de autores que estejam no entrecruzamento dos registos literário e filosófico. Literariamente somos riquíssimos mas, do ponto de vista de uma reflexão metafísica e ético-moral, será bastante difícil encontrar nomes. O virar do século proporcionou alguns enquanto excepção: o Feijó, o Quental, o Silva Mendes em Macau e, mais tarde, o Luís Gonzaga Gomes. Os textos em que me baseei foram precisamente os da compilação de Luís Gonzaga Gomes. Era o principal discípulo de Manuel da Silva Mendes, no sentido de que é filho da terra e tinha a riqueza de poder ler e escrever a “outra língua”.

O livro começa precisamente com uma frase do Umberto Eco acerca da tradução de conceitos. Como é que estes autores, do final do séc. XIX, desenvolviam estes conceitos que, muitas vezes, não existiam na sua própria cultura?

O despertar dos estudos orientais acabou por ser um conceito abusado no sentido mais negativo de uma imposição europeia face ao outro, para o minimizar. Os estudos orientais eram uma tentativa de tornar o Oriente manejável e dominável aos olhos de um Ocidente que imperava. Muito além disso, os estudos orientais começam precisamente pela análise filológica, primeiro em França e depois nas universidades alemãs, no final do séc. XVIII, início do séc. XIX. Na viragem do séc. XIX para o séc. XX temos um retorno à filologia. Temos uma tentativa de procurar nos textos uma verdade, ou aspectos dessa verdade, percebida como o entendimento que o Homem pode ter de si na realidade, baseando-se na compreensão dos textos orientais por defeito da filosofia e do pensamento europeu. Digamos que é por deficiência, mas os contactos culturais são sempre assim, uma cultura procura na outra o que lhe falta. Institucional e politicamente, os impérios estendiam-se pelo Oriente mas, culturalmente, estes homens não tinham uma pretensão de domínio. Silva Mendes sentava-se nos templos de Macau a falar com os monges. Estes homens estavam numa tentativa de procurar, na cultura oriental, o que não era visível e podia colmatar deficiências que, naquele momento, a cultura europeia tinha – uma cultura muito marcada pela industrialização e pelo positivismo que também teve o despontar da procura do novo homem com Feuerbach e Nietzsche. Antero de Quental e Silva Mendes procuravam, aqui, um novo sopro de espiritualidade que a Europa não teria de forma tão vibrante. É essa confluência que quero mostrar quando falo de tradução cultural. Não é propriamente uma tradução de termos, mas sim a procura que uma cultura faz de elementos na outra cultura por deficiência e a capacidade que determinados autores têm de se apropriarem desses conhecimentos que observam na outra cultura, e de os trazerem e tornarem palavras na própria para que façam sentido. É o que me parece que estes dois autores fizeram: uma leitura do mundo e do percurso humano. São homens muito empenhados na renovação do ser humano com ideias de igualdade.

Um pensamento ainda muito actual?

Deveríamos voltar às línguas clássicas. A gritaria que se passou em França pela tentativa de tornar opcionais as línguas clássicas europeias, como o grego e o latim, é um exemplo dessa necessidade. Há uma urgência em voltar a encontrar a origem e o sentido de determinadas culturas num mundo que pode vir a perder sentido quando demasiadamente globalizado. Quando a ênfase da globalização reside na mera globalização – e a globalização não é propriamente uma troca ou um encontro, mas antes o esbater de características –, podemos correr um risco e, daí, a actualidade dos estudos deste tipo. Há a necessidade de procurar num mundo globalizado, não só as nossas raízes, mas também aquelas que temos através do confronto, do contraste e do diálogo com a alteridade. Para o fazer, é necessário estarmos conscientes daquilo que somos. Só há diálogo quando há troca e só há troca quando temos alguma coisa para dar. São autores que fazem uma reflexão própria e a tradução cultural que operam não é só de termos budistas e taoistas para análise metafísica mas, sobretudo, para orientações ético-morais. São autores de charneira e formativos da nossa cultura. O texto da não-acção, por exemplo, tem uma ressonância extremamente oriental, mas se lermos os textos pré-socráticos o conceito já lá está. Claro que os franceses vão de imediato dizer: “Pois, mas os textos pré-socráticos são da Ásia Menor”. A não-acção não tem a ênfase no não, mas sim na acção. Não é não fazer nada mas é, sobretudo, a promoção máxima do ser humano em reflexão. É isso que é o Oriente. A procura que o sujeito faz dentro de si e da sua própria natureza. Quando isso acontece, a acção exterior, a do fazer, deixa de ter sentido porque passa a ficar orientada por esse autoconhecimento. O “conhece-te a ti mesmo do Sócrates”, não é se não isto.

Os autores de Macau são muito pouco conhecidos internacionalmente e este é um livro que tenta promover um deles. Porque é que a literatura feita cá não chega a Portugal?

Macau tem autores diferentes. Tem pessoas que pensam sobre determinadas questões e fazem-no de uma forma diferente. Na Índia é a mesma coisa, existem vários autores que não são conhecidos de todo em Portugal, no Brasil, etc., porque as edições portuguesas não são feitas para serem publicadas nos lugares onde se fale o português. Se olharmos para a Oxford University Press e para a Cambridge University Press, promovem um mesmo título e uma edição aparece ao mesmo tempo nos vários centros do mundo anglófono. Nós não temos essa tradição, não temos a divulgação feita e agilizada de tal forma que permita que o mundo de língua portuguesa lhe aceda. É um mundo muito vasto, o que é bom, mas muito disperso geograficamente e sem essa ligação de editoras, de crítica textual e de academias. Outra questão é a da tradução. Os meus colegas, por exemplo da Universidade de Hong Kong, não conhecem as obras de autores portugueses porque não estão traduzidas. Se nos quisermos dar a conhecer, temos de dar o texto preparado com outras linguagens e não podemos fugir à tradução para as línguas principais: o inglês e o francês. A língua portuguesa tem um papel fundamental no diálogo entre Oriente e Ocidente. Foi a primeira a chegar e a última a ir embora, mas tem de saber traduzir-se para outras línguas. A língua, quando comunica, comunica também a cultura. A língua é sobretudo cultura, é uma visão do mundo. Ao se conhecer uma língua percebemos o mundo de uma forma diferente, mais rica.

19 Abr 2017

Isabel Machado e a escrita histórica: “Há em Macau uma constância surpreendente”

Isabel Machado não é uma estranha a Macau. Muito pelo contrário, aqui trabalhou na TDM entre 1989 e 2000, tendo sido igualmente professora de português no ensino secundário e de português como língua estrangeira, em Lisboa Regressou a Portugal no final de 2000. Depois de oito anos a trabalhar no Canal Parlamento, na Assembleia da República, em 2012 lançou o seu primeiro romance histórico “ISABEL I DE INGLATERRA E O SEU MÉDICO PORTUGUÊS”. Seguiu-se “VITÓRIA DE INGLATERRA, A RAINHA QUE AMOU E AMEAÇOU PORTUGAL”. Sempre na mesma editora, Isabel lançou o seu terceiro romance histórico, “CONSTANÇA, A PRINCESA TRAÍDA POR PEDRO E INÊS”, em 2015 e, recentemente, a sua última obra, “A RAINHA SANTA”. Pelas redes sociais pude aperceber-me do primeiro, depois segui o percurso do segundo e, finalmente, comprei o terceiro cujo conteúdo saboreei. Na sua breve visita à RAEM, foi possível conversarmos sobre alguns aspectos do seu percurso como autora de romances históricos.

[dropcap]Q[/dropcap]uais as suas impressões de Macau depois de 10 anos de ausência?
As minhas impressões de Macau são sempre, em primeiro lugar, emotivas. Desta vez não foi diferente. A estranheza pelo excesso de construção, de gente nas ruas ou de ruído foi muito rapidamente subjugada pelo encanto de voltar a casa, é sempre um voltar a casa, do odor característico e de que sempre gostei, da textura. Macau é, para mim, uma sensação física de textura, que é boa porque é familiar, mesmo que não goste nada da humidade… Sobrepõem-se muito rapidamente as sensações boas, as recordações maravilhosas prolongadas no presente porque tudo mudou mas há em Macau uma constância surpreendente também, pelo menos no mundo português de Macau. E há os amigos que são o melhor de tudo. É por eles que voltarei sempre. São as pessoas e o que vivemos com elas que fazem os sítios e as memórias e o mais emocionante do regresso é senti-los aqui, no mesmo sítio onde estavam há 10 anos, isto é, sem que o tempo beliscasse a nossa intimidade, a cumplicidade que vivemos juntos num tempo muito marcante.

A Isabel Machado começou por chamar a atenção de quase todos os telespectadores da TDM pela sua beleza física. Porém o tempo deu a conhecer uma mulher sensível, delicada e inteligente. Sente que a beleza física pode ser um anátema?
Pode. Porque há uma pré-avaliação que, idealmente, nunca deveria ser feita sobre os outros. E essa avaliação imediata, que se sobrepõe a qualquer critério racional sobre a pessoa em causa, é, muitas vezes, injusta e preconceituosa. Quem é, num primeiro momento, avaliado pela aparência tem sempre de provar mais do que os outros. Mas, claro que não é tudo mau. A beleza também pode abrir portas.

Como é lidar com o êxito, com os sucessivos lançamentos? Já estão na calha outros romances?
Não sei se posso chamar êxito. É muito importante para mim que o que escrevo chegue às pessoas, nunca me esqueço que estou a contar uma história e isso é que é uma sensação extraordinária: saber que vamos partilhar muitas horas de muitas vidas de que não sabemos nada, mas a quem podemos levar encanto, conhecimento, desfrute, alheamento dos problemas ou das tragédias que as afligem. Os leitores escrevem-me coisas muito bonitas. Eu gosto de críticas construtivas também, mas de tudo o que já me disseram o que mais me emocionou foi uma carta escrita à mão, enviada por uma jovem, aluna de Mestrado de Literatura, que me disse: os seus livros curam. Isto abalou-me profundamente. Esta jovem tinha estado com um problema grave, internada durante muito tempo e, por acaso, foi um dos meus livros que a acompanhou na fase mais crítica. Saber que aquela história lhe levou esperança ou a fez afastar-se da gravidade da sua situação durante umas semanas foi uma coisa que nunca esquecerei. Sim, já comecei a trabalhar num novo livro, não necessariamente um romance, desta vez…

Como surgiu na sua escrita o romance histórico e quanto de investigação cabe em cada obra e quanto de criação nela se incorpora?
Surgiu por acaso, como quase tudo tem acontecido na minha vida. Através de um amigo de há muitos anos, recebi um desafio de uma editora, A Esfera dos Livros, para fazer um romance histórico sobre um tema da minha escola. Disse logo que sim. Sempre gostei de escrever, a minha área de formação é a literatura não o jornalismo, ao contrário do que muitas pessoas pensam, sempre adorei História também e achei imediatamente que me sentiria bem naquele registo. Mas foi brutal. Chegava a acordar sobressaltada a meio da noite a pensar na loucura em que em tinha metido e isto só passou a partir do terceiro romance!

A investigação é fundamental e é sempre a primeira parte do trabalho, embora nunca a abandone totalmente, mesmo quando já estou em pleno na escrita. Passo meses inteiros a estudar, a pesquisar documentos, cartas, se as houver, livros, testamentos, tudo é importante. Para ser credível, a ficção histórica tem de estar assente numa boa pesquisa e não estou a falar apenas dos factos. Falo de tudo. Dos costumes, da alimentação, do vestuário, do mobiliário, da linguagem… A partir daí, construo a ficção, seguindo a estrutura que estabeleci, o fio condutor que quero dar ao romance. No fundo, segundo a minha história dentro da História. Romance, em português, significa ficção e o romance histórico deve ser, acima de tudo, ficção. Por isso, o espaço para a criação é imenso, inesgotável, sem freio, o que é maravilhoso. No entanto, gosto de respeitar a História e tenho imenso cuidado com isso.

É notório que nos seus livros existe uma decidida preferência por personagens femininas. Esta escolha pode significar também o que se vem designando como escrita no feminino?
Nunca tenho uma resposta convicta para essa pergunta. Não sei se a escolha pode significar exactamente isso, é certo que o mundo feminino é-me, naturalmente, menos enigmático…Tenho optado por personagens femininas mas isso não quer dizer que rejeite a ideia de ter uma personagem principal masculina, aliás já tive. No meu primeiro romance, a minha escolha recaiu numa mulher que eu sempre admirei, Isabel I Inglaterra, e nas suas ligações com Portugal na época na perda da independência, mas tinha como segunda figura, uma segunda figura muito importante, um homem, um médico judeu português fugido à Inquisição e que acabou na corte de Isabel I, como médico e espião. Esta pessoa existiu, não há quase nada sobre ele, teve uma vida fascinante e trágica, e quase metade do livro é na pele deste português praticamente desconhecido em Portugal, Rodrigo Lopes. Há quem diga que o meu romance mais feminino é Constança… Não sei, prefiro deixar essa avaliação para os leitores.

Macau poderá ser cenário para um próximo romance? Haverá alguém aqui nascido ou radicado que a possa motivar a criar um personagem?
Claro que pode, mas não é ainda o próximo! Há muitos aspectos da História de Macau que me seduziriam para escrever um romance. E pessoas aqui nascidas também.

18 Abr 2017

Crise na Coreia | Esforço diplomático pode prefaciar a guerra

Estados Unidos, China, Japão, Rússia e Coreia do Sul ainda acreditam ser possível chegar a acordo com Pyongyang por via diplomática. Mas entre a política errática de Trump e os caprichos de Kim, há quem esteja à espera da guerra a qualquer momento

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] último ensaio balístico da Coreia do Norte falhou – o míssil explodiu quatro segundos depois de levantar vôo – mas a comunidade internacional está, de uma forma ou de outra, a perder a paciência para o regime de Pyongyang.

O vice-Presidente dos Estados Unidos declarou que a “era da paciência estratégica acabou” em relação à Coreia do Norte, perante a indisponibilidade do regime para eliminar armas nucleares e mísseis balísticos. Aos jornalistas que o acompanharam na visita à fronteira entre as duas Coreias, Mike Pence disse que o Presidente norte-americano, Donald Trump tem esperança que a China use a sua “influência extraordinária” para pressionar a Coreia do Norte a abandonar as armas.

Mas Mike Pence recomendou ontem a Pyongyang para não testar a “determinação” de Donald Trump em relação aos programas balísticos e nucleares norte-coreanos. “É melhor para a Coreia do Norte não testar a determinação e o poder das Forças Armadas dos Estados Unidos nesta região”, disse Pence durante uma conferência em Seul em que esteve presente o chefe de Estado sul coreano, Hwang Kyo-Ahn.

“Nas últimas duas semanas, o mundo testemunhou o poder e a determinação do nosso novo presidente [Donald Trump] com as operações lançadas na Síria e no Afeganistão”, declarou Mike Pence referindo-se aos ataques dos Estados Unidos contra o regime de Damasco e ao lançamento da bomba GPU-43 em território afegão.

Tratar do problema à la Trump

Donald Trump que na quinta-feira afirmou que o “problema” norte-coreano vai ser “tratado” já tinha anunciado o envio do porta-aviões norte-americano Carl Vinson para a península coreana, escoltado por três navios lança-mísseis e submarinos.

No sábado, o regime da Coreia do Norte afirmou que o país está preparado para “responder à guerra total com a guerra total” e que um “ataque nuclear terá como retaliação um ataque nuclear”.

Mike Pence está desde domingo na Coreia do Sul tendo-se deslocado hoje à zona de fronteira, uma das zonas mais militarizadas do mundo.

“Nós destruiremos todos os ataques e vamos responder de forma esmagadora e eficaz a todo o tipo de utilização de armas convencionais ou nucleares”, disse também o vice-presidente norte-americano.

Pence exortou a “comunidade internacional” a pressionar a Coreia do Norte.

Por outro lado, Mike Pence, apesar de considerar positivas as posições de Pequim sobre a Coreia do Norte, acrescentou que os Estados Unidos estão “inquietos” em relação às medidas económicas adotadas pela República Popular da China contra a instalação do sistema antimíssil (THAAD) norte-americano na Coreia do Sul.

Assim ou assado

O vice-presidente norte-americano disse que os Estados Unidos e aliados vão atingir os seus objectivos através de “meios pacíficos ou, em última instância, quaisquer meios necessários” para proteger a Coreia do Sul e estabilizar a região. Mike Pence, qualificou hoje de “provocação” o lançamento falhado de um míssil efectuado horas antes pela Coreia do Norte, uma acção que fez prevalecer o clima de tensão na península coreana. “A provocação desta manhã do Norte é simplesmente o último acto dos riscos que cada um de vós enfrenta diariamente”, disse Pence

Pence visitou uma base militar perto da Zona Desmilitarizada (DMZ), na fronteira coreana, Bonifas, onde se encontrou com militares e com as tropas norte-americanas ali estacionadas. Cerca de 28.500 militares norte-americanos estão actualmente estacionados na Coreia do Sul.

A resposta será terrível

A visita surge numa altura de particular tensão na península coreana. Na manhã de domingo, Pyongyang realizou um teste de um míssil de médio alcance, que explodiu entre quatro a cinco segundos depois de ser lançado, de acordo com um responsável da Casa Branca.

No sábado, antes do desfile militar organizado para comemorar o 105.º aniversário do nascimento do fundador da Coreia do Norte, Kim Il-Sung, o “número dois” do regime norte-corano, Choe Ryong-hae, prometeu que a Coreia do Norte estava preparada para dar “uma resposta nuclear a qualquer ataque nuclear”.

Pyongyang lança regularmente mísseis de curto alcance, mas está a desenvolver mísseis de médio e longo alcance para tentar atingir as tropas norte-americanas na Ásia e, eventualmente, território norte-americano.

A Coreia do Norte realizou cinco testes nucleares, incluindo dois no ano passado. Imagens recolhidas por satélite sugerem que o país poderá estar pronto a efetuar um novo teste nuclar subterrâneo a qualquer momento.

“A era da paciência estratégica acabou. Queremos ver a Coreia do Norte a abandonar o imprudente caminho de desenvolvimento de armas nucleares, e também o uso contínuo e teste de mísseis balísticos, que é inaceitável”, afirmou.

Que a China nos valha

Em paralelo, o conselheiro para a segurança nacional do Presidente norte-americano Donald Trump afirmou que os dirigentes chineses trabalham “estreitamente” com os EUA para resolver a questão nuclear norte-coreana.

“Existe um consenso internacional, incluindo com os chineses e os dirigentes chineses, para dizer que a situação não pode durar”, declarou o general H. R. McMaster em entrevista à cadeia televisiva norte-americana ABC, a partir do Afeganistão, onde está deslocado.

O militar sublinhou por diversas vezes a inquietação, segundo disse, dos dirigentes chineses. “Trabalhamos com os nossos aliados e parceiros, e com os dirigentes chineses, para desenvolver um leque de opções”, precisou.

 

 

Pequim quer ajuda da Rússia para solucionar crise

A China quer colaborar com a Rússia para “ajudar a aliviar a situação (da Coreia do Norte) o mais rápido possível”, disse o ministro dos Negócios Estrangeiros chinês, Wang Yi, ao seu homólogo russo Sergueï Lavrov. “O objectivo comum dos nossos dois países é fazer voltar todas as partes à mesa das negociações”, disse Wang durante uma conversa telefónica com Lavrov, segundo comunicado divulgado na página de Internet do ministério.

O chefe da diplomacia chinesa disse que “a China está preparada para se coordenar estreitamente com a Rússia para ajudar a acalmar a situação na península e encorajar as partes envolvidas a retomarem ao diálogo”. Wang Yi fazia alusão às negociações a seis (Coreias, Japão, Rússia, China e Estados Unidos), as quais estão suspensas há anos. “Impedir a guerra e o caos na península está de acordo com os interesses comuns” de Pequim e Moscovo, sublinhou. Este apelo surge numa altura em que as relações entre a Coreia do Norte e os Estados Unidos estão extremamente tensas.

Neste contexto, o ministro dos Negócios Estrangeiros chinês, Wang Yi, advertiu que quem provocar uma guerra na península coreana “deverá assumir as suas responsabilidades históricas e pagar o preço”. “Se houver uma guerra, o resultado será uma situação em que todos perdem e ninguém sairá vencedor”, afirmou Wang, numa conferência de imprensa conjunta com o ministro francês dos Negócios Estrangeiros, Jean-Marc Ayrault.

Devido ao aumento da tensão na região e ante um possível ensaio nuclear na Coreia do Norte, o ministro chinês desafiou todas as partes a retomarem o diálogo e a “não deixarem que as coisas evoluam até um ponto irreversível e incontrolável”.

Pequim pediu contenção, enquanto Pyongyang ultima os detalhes para as celebrações do aniversário do nascimento do fundador do país, este fim de semana, quando se teme que possa levar a cabo um teste nuclear.

“A China opõe-se sempre com firmeza a qualquer acção susceptível de aumentar as tensões”, afirmou Wang, assinalando que, nesta crise, “o vencedor não será o que faça afirmações mais duras ou exiba mais músculo”.

Wang Yi recordou o dizer chinês “as oportunidades estão sempre nas crises”, para afirmar que o agravamento da tensão devolve actualidade à proposta chinesa de que todas as partes suspendam os ensaios, manobras e actividades militares, como um passo prévio para retomar o diálogo.

“Esta é a oportunidade que devemos de procurar e aproveitar”, disse Wang, sublinhando que Pequim está disposto a “escutar qualquer proposta útil”. Um porta-voz do ministério dos Negócios Estrangeiros, Geng Shuang, considerou que um teste nuclear por parte de Pyongyang seria “perigoso e irresponsável”.

 

Shinzo Abe pede diplomacia

O primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe, defendeu a diplomacia como meio para desarmar a Coreia do Norte, um dia depois do mais recente teste com um míssil de Pyongyang. “A Coreia do Norte está a mostrar o seu poder militar, mas é importante manter a paz através de esforços diplomáticos”, afirmou Abe durante uma reunião do comité do orçamento da Câmara Baixa da Dieta (parlamento), ao ser questionado sobre o mais recentemente lançamento de um míssil.

De acordo com a emissora pública japonesa NHK, o chefe do executivo japonês pediu a Pyongyang que evite realizar mais provocações e considerou ser “necessário exercer mais pressão para que a Coreia do Norte responda seriamente ao diálogo”.

Abe disse que para se conseguir estabilidade na região é necessário que Pequim, o principal aliado de Pyongyang, use a sua influência, e que Washington e Seul façam o seu papel, salientando ainda a ideia de cooperação com a Rússia.

A Coreia do Norte efetuou no domingo um lançamento falhado de um míssil, que coincidiu com a chegada à Coreia do Sul do vice-presidente norte-americano, Mike Pence. Os Estados Unidos decidiram enviar para a península coreana o porta-aviões nuclear ‘Carl Vinson’ e a frota de ataque, após o lançamento de outro projétil a 05 de abril.

 

Entretanto, mais a sul…

A campanha para as eleições presidenciais na Coreia do Sul de 9 de maio, na sequência da destituição da Presidente Park Geun-hye, começou ontem com o candidato liberal Moon Jae-in a liderar nas sondagens. No total, 15 políticos registaram-se oficialmente como candidatos à presidência (o que supera o recorde de 12 nas presidenciais de Dezembro de 2007) e vão participar na campanha eleitoral de 22 dias, que termina na véspera da votação.

Moon Jae-in, do Partido Democrático (com mais assentos no parlamento sul-coreano), é dado como o favorito para substituir no cargo Park Geun-hye, destituída a 10 de Março passado. Park está em prisão preventiva desde 31 de Março devido a ligações com um caso de corrupção.

A campanha eleitoral deve centrar-se quase exclusivamente na luta contra a corrupção ou na limitação do poder dos grandes conglomerados empresariais sul-coreanos, a maioria dos quais implicados no escândalo que levou à destituição e detenção da antiga chefe de Estado.

Uma possível reforma constitucional que diminua o perfil presidencialista do Estado ou a instalação do escudo norte-americano antimísseis THAAD vão estar também em foco durante a campanha.

Entre os principais candidatos, contam-se Ahn Cheol-soo, do Partido Popular (centro-esquerda), Hong Joon-pyo, do conservador Partido da Liberdade da Coreia (da ex-presidente Park), e Yoo Seong-min, do também conservador Partido Bareun.

Moon Jae-in, que perdeu as presidenciais de 2012 contra Park, e Ahn Cheol-soo reúnem 80% das intenções de voto, de acordo com as últimas sondagens.

Moon lidera as sondagens desde o início, apesar de na última semana a vantagem em relação a Ahn ter ficado reduzida a três pontos percentuais, segundo estimativas.

Park Geun-hye foi a primeira chefe de Estado que a Coreia do Sul destituiu em democracia, pelo que estas serão as primeiras eleições antecipadas no país, desde que a junta do general Chun Doo-hwan autorizou a realização de eleições democráticas em dezembro de 1987.

 

18 Abr 2017

Ho Iat Seng defende menos deputados no Conselho Executivo

O presidente da Assembleia Legislativa defende que o número de deputados que compõe o Conselho Executivo é elevado. Ho Iat Seng mostra disponibilidade para continuar no hemiciclo para evitar “especulações” quanto à possibilidade de ser candidato a Chefe do Executivo

 

[dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]o Iat Seng, presidente da Assembleia Legislativa, reconheceu ser “bastante elevada” a proporção de deputados que integra o Conselho Executivo, órgão que adjuva o líder do Governo, entendendo que o número podia ser menor. “Acho que não há nenhum conflito” na acumulação de funções e “está consagrado na Lei Básica”, mas a proporção actual é “bastante elevada”, admitiu Ho Iat Seng em entrevista à agência Lusa.

Ho Iat Seng recordou que a Lei Básica contemplou essa possibilidade para que “as vozes do órgão legislativo possam ser transmitidas ou veiculadas no Conselho Executivo” e para que “as opiniões ou políticas governamentais possam ser trazidas para o órgão legislativo”, mas o resultado pode estar aquém do pretendido.

“Ainda temos que analisar bem, estudar melhor” o resultado dessa forma de funcionamento, observou Ho Iat Seng, que foi membro do Conselho Executivo durante cinco anos até renunciar a esse cargo, em 2009, quando foi eleito deputado pela via indirecta.

Actualmente, o Conselho Executivo é composto por 11 membros, dos quais quatro são deputados (Cheang Chi Keong, Chan Meng Kam, Chan Chak Mo e Leonel Alves). “A Lei Básica não estipula o número, [mas] acho que o limite deve ser fixado em dois ou três”, defendeu.

Evitar especulações

Relativamente às eleições, marcadas para 17 de Setembro, Ho Iat Seng – que manifestou já vontade de continuar como deputado e, se os seus pares o desejarem, como presidente do hemiciclo -, não antecipou “alterações em termos substanciais” na composição da AL.

Sobre outras eventuais ambições políticas – dado que chegou a ser apontado no passado como potencial candidato a Chefe do Executivo – afirmou que manifestou a vontade de voltar a participar na corrida eleitoral ao hemiciclo “exactamente para evitar essa especulação”.

Sobre a metodologia para a constituição da AL, Ho Iat Seng afirmou não ver “grande probabilidade de alteração”. “Estou numa posição em que não me posso pronunciar”, respondeu, apesar de afirmar “estar de acordo com esse modelo” que pode, com efeito, ser alterado desde que reúna “consenso da sociedade” e haja “intenção ou vontade do Executivo” nesse sentido.

Para além de presidente do hemiciclo, Ho Iat Seng é também um dos 175 membros do Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional (APN), um cargo que desempenha há 17 anos.

“É um trabalho muito desafiante e a responsabilidade é diferente. É mais aliciante” do que ser presidente da AL de Macau, sublinhou.

“Macau é um território de dimensão reduzida e esse emaranhar de interesses também é um desafio para o trabalho da Assembleia. Todos os dias estamos a resolver questões de confrontação e correlação de interesses, mas na APN não são questões destas que se colocam [porque] os grupos de interesses não são representados no órgão central da APN”, concluiu.

Fiscalização aumentou

Na entrevista, o presidente da AL assegurou também que houve “avanços” no trabalho de fiscalização por parte dos deputados e que hoje é maior do que no passado, apesar de haver “limitações”. “Agora temos muito mais fiscalização – é um facto”, afirmou, reconhecendo que “muita matéria” do trabalho governativo “pode ser alvo de fiscalização”. “Dadas as limitações em termos de recursos humanos”, a AL apenas pode focar-se nas “consideradas fundamentais”, como os Assuntos de Terras e Concessões Públicas, Finanças, e Administração, três áreas que têm respectivas comissões de acompanhamento, disse.

A aprovação pelo plenário é outra questão, dependendo muito do ‘lobby’, ainda mais atendendo a que em Macau não existem partidos políticos, considerou. “Qualquer iniciativa legislativa que entre para apreciação tem de passar por um período de correlação de forças”, disse, dando o exemplo da lei sindical que se confronta com a força opositora do sector patronal.

“Cada deputado está a representar o interesse do seu eleitorado – isso é natural em todo o lado do mundo”, afirmou. “É raro vermos uma iniciativa que não seja alvo de oposição ou de crítica – não seria saudável se isso não existisse”, argumentou ainda.

Sem passividade

Ho Iat Seng também rejeitou críticas relativamente a uma posição passiva do hemiciclo face a diplomas do Governo, ao sustentar que “há todo um processo de apreciação para que os diferentes interesses possam discutir”, além de que “cada deputado tem de assumir a responsabilidade pelo acto de ‘carregar no botão’”.

“Não pode dizer que foi enganado. Ninguém pegou numa arma ameaçando-o para votar em determinado sentido. (…) Pode abster-se ou votar contra” e mesmo “usar do direito de fazer uma declaração de voto”, frisou.

Relativamente às mexidas, por vezes substanciais, que as propostas de lei sofrem entre a fase da generalidade e da especialidade, Ho Iat Seng considerou que tal surge como “fruto dessa correlação de forças”.

“O que sucede em todos os parlamentos”, sublinhou, defendendo que “a maioria das iniciativas tem obedecido à política ou intenção legislativa inicial”, estando plasmadas no parecer as razões pelas quais foram introduzidas alterações e todos os pontos de vista manifestados pelos deputados.

18 Abr 2017

Efeméride | Declaração Conjunta Luso-Chinesa assinada há 30 anos

Há três décadas Portugal e a China assinavam o documento que decretou a transferência de soberania de Macau. Em 1987 começou o chamado período de transição em que foi preciso arregaçar mangas para formar, legislar, traduzir. Anos depois, analistas garantem que os direitos e liberdades foram garantidos, tal como a continuação da presença portuguesa. Falta apenas um sistema político mais representativo

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]m 1987 a China espreitava o mundo por uma janela em bicos dos pés, e ninguém imaginava o gigante em que se tornaria. Portugal administrava Macau, mas era altura de preparar a entrega do território. Há 30 anos, Cavaco Silva, presidente da República portuguesa, e Zhao Ziyang, chefe do Governo da República Popular da China (RPC), assinaram, em Pequim, a Declaração Conjunta Luso-Chinesa.

Estava dado o pontapé de saída para aquilo que Macau é hoje. Criou-se, a partir daí, o Grupo de Ligação Luso-Chinês, responsável por fazer tudo o que faltava na área da justiça e da Administração pública. Não havia tempo a perder: Macau passaria para a China em 1999, transformando-se na RAEM, com autonomia política e administrativa face à China, e regida pela Lei Básica, segundo o princípio “Um País, Dois Sistemas”, até ao ano de 2049.

O deputado Leonel Alves recorda ao HM que a China não era obrigada a assinar acordo algum. “Macau e Hong Kong sempre foram territórios chineses. E se a China entendeu celebrar acordos com Estados soberanos estrangeiros [Portugal, no caso de Macau, e Reino Unido, no caso de Hong Kong] foi uma forma de mostrar a sua vontade de firmar os seus compromissos internacionais.”

Em 12 anos foi necessário fazer a chamada locação dos quadros, de forma a garantir que a Administração pública da RAEM teria funcionários públicos bilingues em número suficiente. Foi preciso formar pessoas e, sobretudo, fazer a locação a nível jurídico, pois as leis feitas em Portugal deixariam de estar em vigor depois de 1999. Para além da adaptação das leis seriam elaborados os cinco principais códigos, ainda hoje a vigorar.

“Foi um período em que se lutou contra o tempo e também se aproveitou para modernizar o sistema jurídico de Macau”, lembrou Leonel Alves. “A Administração de Macau não estava devidamente preparada para, daí a uns anos, o exercício de soberania ser transferido e protagonizado por outras pessoas.”

Leonel Alves considera ainda que, a partir de 1987, começou “um período em que o Governo de Macau fez um grande esforço, e com muito mérito”. “Preparou-se muitos quadros bilingues nestas duas vertentes. Formaram-se técnicos chineses, muitos deles bilingues, e magistrados. Acreditava-se que a transição tinha de ser pacífica. Era preciso ter tudo em condições para que, no dia da transferência de soberania, o território pudesse continuar a ser a mesma Macau de sempre nos próximos 50 anos”, disse o também advogado.

Incertezas do futuro

Para Anabela Ritchie, que à época estava no Leal Senado, tendo sido presidente da Assembleia Legislativa, a Declaração Conjunta Luso-Chinesa “foi um documento de carácter geral que tinha as potencialidades necessárias para uma elaboração posterior”.

O clima era de ansiedade e de algum receio do que poderia acontecer após 1999. “As pessoas não tinham certezas, estavam na expectativa, porque ninguém sabia o que ia acontecer no processo de transição. Era algo novo. Iam ser tomadas decisões importantes para Macau e para a vida de todos em particular. Não foi um período isento de incertezas.”

Independentemente dos medos, tudo correu da melhor forma, na óptica do académico Arnaldo Gonçalves, ex-assessor do secretário-adjunto para a Educação, Saúde, Assuntos Sociais e Económicos, Francisco Murteira Nabo e do secretário-adjunto para a Coordenação Económica, Vítor Rodrigues Pessoa.

“Com a Declaração Conjunta os objectivos de Portugal foram atingidos. Por um lado manteve-se a identidade de Macau, ligada ao património e à língua portuguesa, e isso tem-se conseguido”, apontou o também presidente do Fórum Luso-Asiático.

Ao nível da garantia dos direitos dos residentes, Arnaldo Gonçalves defende que, “no essencial, são preservados”, não tendo sido “minimamente beliscados”. “Há liberdade de expressão e de associação, liberdade de imprensa, de religião, liberdade de participação política”, apontou.

Mundo português garantido

Para Arnaldo Gonçalves, todos estes anos mostraram que a comunidade portuguesa ganhou o seu lugar, com o devido respeito por parte do Governo local. Ainda assim, o académico alerta para a necessidade de maior trabalho por parte de algumas instituições de matriz portuguesa, como é o caso da Fundação Oriente (FO) e do Instituto Português do Oriente (IPOR).

“Felicito as instituições chinesas, como o Instituto Politécnico de Macau ou a Universidade de Macau [ao nível do ensino do português], mais do que propriamente a FO e o IPOR, que teriam a obrigação institucional de ter outra determinação na preservação do legado. Nos últimos 17 anos não vi isso acontecer. São instituições que funcionam um pouco de forma burocrática.”

Larry So, analista político, olha para a Declaração Conjunta Luso-Chinesa como um documento que “transformou Macau naquilo que é hoje”, ao abrigo da política chinesa “Um País, Dois Sistemas”. “Houve desenvolvimento económico nos últimos anos e uma tentativa de integração regional na China. Há 30 anos havia esta ideia.”

O facto dos chineses nascidos em Macau terem obtido a cidadania portuguesa é, para Arnaldo Gonçalves, a “primeira vitória do processo de negociação”. “Queríamos preservar a nacionalidade portuguesa e essa era uma questão de honra para nós. Os cidadãos chineses nascidos em Macau deveriam ser portadores de um passaporte português, e aí fomos profundamente diferentes e melhores do que a Grã-Bretanha, que deu aos seus cidadãos nascidos na colónia um passaporte de segunda classe.”

E a democracia?

Apesar do desenvolvimento económico e da transição pacífica, Larry So lamenta que, 30 anos depois, o território não tenho percorrido um caminho mais rápido em prol da democracia.

“Se olharmos para trás podemos dizer que tivemos desenvolvimento económico, mas não podemos ficar satisfeitos com o lento progresso a nível político. Não temos eleições directas e uma democracia, e para muitos de nós isso não é satisfatório”, defendeu o analista.

Larry So não acredita mudanças profundas até 2049, altura em que os efeitos da Declaração Conjunta deixarão de se fazer sentir. “Não vejo nenhumas mudanças a acontecer, especialmente se falarmos de uma verdadeira democratização. Há o controlo de alguns deputados na Assembleia Legislativa e não vejo um progresso nesse sentido. Se tivermos mais deputados eleitos pela via directa muitos interesses serão confrontados e eles vão tentar controlar o mais depressa possível.”

Arnaldo Gonçalves prefere ir ao passado para explicar a ausência do sufrágio universal para eleger o Chefe do Executivo e os deputados da AL. “Essa é uma tentativa de aplicação do mindset de Hong Kong a Macau. Uma questão que ficou clara no processo de negociação é que Macau era um caso singular que não se comparava a Hong Kong.”

As diferenças políticas revelaram-se desde cedo. “Hong Kong tinha, como colónia, associações políticas, que se tornaram em partidos políticos. Nós não tínhamos isso. Tínhamos meras associações cívicas, que não são estruturas de partidos políticos. Há disposições legais em Hong Kong que indicam que a eleição do Chefe do Executivo e a composição do LegCo deve ir no sentido democrático, mas nós não temos essas disposições.”

Arnaldo Gonçalves explica que, em 1987, essa questão acabou por se tornar secundária. “Não temos [essas disposições] porque a sociedade de Macau, na altura, também não sugeriu, ou não impôs aos negociadores portugueses. Era difícil estarmos a assumir uma posição de firmeza perante essa questão, quando a população não o queria.”

Ainda assim, “gostaríamos de ter um sistema de representação mais democrático, com maior representação simbólica da população”, apontou o académico.

“Não temos, mas é o que é possível. Deputados eleitos, os que representam associações e os que são designados pelo Chefe do Executivo, temos o compósito possível, mas representam de certa forma a sociedade de Macau”, acrescentou Arnaldo Gonçalves.

Leonel Alves mantém a posição que a maioria dos deputados da AL mantém: o sufrágio universal chegará quando houver condições para isso. “É preciso garantir a estabilidade social e o desenvolvimento económico. Qualquer alteração ao figurino político e do funcionamento de Macau não pode prejudicar a estabilidade e o desenvolvimento.”

Na opinião do deputado, “a própria sociedade civil que tem de demonstrar que já encontrou um patamar de desenvolvimento que permita que haja uma nova forma de gerir a coisa pública através da eleição ou da modificação das leis eleitorais. É a própria sociedade civil que tem de reflectir”, conclui.

13 Abr 2017

Eleições | Comissão pode eliminar conteúdos online

A ordem para remover conteúdos online ilegais durante o período eleitoral em que a propaganda é proibida, pode ser dada às operadoras de comunicação pela Comissão de Assuntos Eleitorais para a Assembleia Legislativa. A medida foi ontem admitida por Tong Hio Fong após o encontro com os deputados para apresentação das instruções eleitorais

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Comissão de Assuntos Eleitorais para a Assembleia Legislativa (CAEAL) vai poder dar instruções às operadoras de comunicação, nomeadamente à CTM, para que eliminem os conteúdos online ilegais. A ideia é que, no período em que a campanha eleitoral não é permitida, a CTM possa, quando detectadas publicações online, ser removida.

A medida vai ter luz verde “porque de acordo com a lei eleitoral, só se pode fazer propaganda durante um período limitado”, disse o presidente da CAEL, Tong Hio Fong,  após o encontro entre os representantes da comissão e do Comissariado Contra a Corrupção (CCAC) com os deputados à Assembleia Legislativa, numa sessão que constou da apresentação sobre instruções eleitorais.

As acções que impliquem informação capaz de promover ou denegrir candidatos, fora do tempo definido por lei, e que representem propaganda eleitoral, serão excluídas das partilhas na internet.

A medida não é apenas uma ideia e já está definida. “É uma indicação vinculativa e se a CAEL verificar que existe alguma coisa considerada irregular pede à CTM ou a outras companhias responsáveis para que procedam à eliminação da informação online”, explicou o presidente.

No entanto Tong Hio Fong garante que a remoção de conteúdos só acontece depois de uma análise de cada ocorrência. “Sempre que existam este tipo de situações fazemos uma avaliação e temos uma reunião para deliberar tendo em conta a opinião de todos os membros da comissão”, disse.

Trabalhos profissionais

Durante a reunião, o presidente sublinhou, tendo em conta as directrizes dadas à imprensa, que podem ser feitos trabalhos jornalísticos desde que não tenham ligação à candidatura política. “Podem existir reportagens acerca de um deputado e do seu trabalho desde que em nada entrem no âmbito da propaganda ou publicidade”, referiu.

Ainda nas instruções dadas ontem, com a revisão da lei eleitoral há algumas alterações relativamente aos processos eleitorais anteriores.

A atenção passa a ser dada às acções de pessoas colectivas que têm, a partir de agora, o chamado dever de declaração. A ideia, disse Lam Chi Long, adjunto do comissário do CCAC, é evitar situações do passado. “Houve casos em que as pessoas colectivas, entre elas sociedades, associações e fundações, que realizaram actividades para beneficiar algum dos seus membros”. Agora tanto as pessoas colectivas como os candidatos têm de declarar as actividades eleitorais que vão ter lugar entre 2 e 12 de Setembro, a 30 de Agosto. As actividades têm ainda um âmbito definido e constam de “qualquer uma que não seja de propaganda eleitoral, mas destinada a atribuir benefícios aos membros e que proporcione comidas e bebidas, viagens, entretenimento, subsídios e presentes”.

13 Abr 2017

Lai Chi Vun | Conselho do Património Cultural apoia processo de conservação

Estão dados os primeiros passos para a protecção dos estaleiros de Lai Chi Vun. Durante a reunião do Conselho do Património Cultural foi sugerida a candidatura da zona a património cultural da Unesco. Também foram discutidas as melhorias de habitabilidade da povoação

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]om a hipótese de demolição dos estaleiros afastada, iniciaram-se os trabalhos para saber exactamente a forma como conservar os estaleiros de Lai Chi Vun e devolver-lhes utilidade pública. O planeamento da recuperação está nas mãos da Direcção das Obras Públicas em parceria com um vasto leque de entidades, entre elas o Instituto Cultural (IC), a Direcção dos Serviços de Turismo (DST), a Direcção dos Serviços Marítimos e da Água (DSAMA), assim como o Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM). Um autêntica colectânea de serviços públicos a trabalhar com o mesmo objectivo.

O Secretário dos Assuntos Sociais e Culturais, líder de um dos organismos do Governo que mais se mostrou a favor da preservação, destacou à saída da reunião do Conselho do Património Cultural o carácter intergovernamental desta matéria. “Nós somos uma equipa, por isso temos de planear em conjunto e cumprir a lei”, disse Alexis Tam. Acrescentou ainda que para qualquer classificação como património de interesse cultural contam as opiniões do conselho a que preside, para de seguida se avançar para a consulta pública. O processo de classificação na etapa seguinte traz o assunto de regresso ao conselho para emissão de parecer, que esperará autorização do Chefe do Executivo.

Nesse sentido, o presidente do IC, Leung Hio Ming, diz que será feita avaliação, sem que isso afecte os habitantes. O instituto irá contactar a DSAMA para marcar uma reunião e fazer uma visita ao local já depois das férias da Páscoa.

Apesar de serem necessários alguns passos administrativos, o presidente do IC está confiante de que a consulta pública poderá ser feita para meados de Junho. Leung Hio Ming quer o processo avance o “mais rapidamente possível e, como os terrenos são do Governo, pode-se poupar tempo”. Isto porque numa perspectiva de classificar património é preciso ter em conta as opiniões dos proprietários.

Agir em harmonia

Para já a urgência de acção prende-se com a chegada da vinda dos tufões, como foi argumentado por Lei Ip Fei, membro do conselho.

Carlos Marreiros, também com assento no Conselho do Património Cultural, considera que a zona de protecção desenhada actualmente não é suficiente por não incluir a baía. O arquitecto tem uma visão de Lai Chi Vun que ultrapassa os estaleiros e os integra na atmosfera circundante.

Além da madeira e do metal, “o ambiente, a zona costeira, a água, tudo isso constrói a alma desta zona”. Marreiros, que desenhou várias vezes a área, é da opinião de que todo o projecto deve interagir com a ecologia.

Outro dos pontos tocados pelo arquitecto, e que tiveram a concordância de Alexis Tam, foi a necessidade propiciar conduções de higiene aos habitantes de Lai Chi Vun. Nesse aspecto, o secretário concordou que se deveria ter em conta a situação da povoação, que se encontra sem saneamento básico, ou canalização. “O planeamento das Obras Públicas deve melhorar as condições de vida das pessoas de Lai Chi Vun, um dos pontos mais importantes que temos a considerar”, avança Alexis Tam.

Para a preservação dos estaleiros, Lee Hay Ip, outro dos membros do conselho, referiu ter realizado um pequeno estudo preliminar às condições das infra-estruturas, tendo concluído que as reparações de madeira e metal teriam um custo entre os 20 e 30 milhões de patacas. Neste sentido, Carlos Marreiros considera que a confirmar-se um valor desta ordem, o Governo deveria avançar imediatamente. No entanto, destaca que instalações em madeira têm o problema de serem sempre temporárias e de elevado grau de degradação. Como tal, o arquitecto confessa que não tem grande “confiança que seja possível, a nível técnico, proteger todos os estaleiros”.

Porém, Alexis Tam considera que os dois estaleiros que foram demolidos podem ser de novo construídos.

Ao longo da reunião do Conselho do Património Cultural as opiniões dos membros revelaram unanimidade na aprovação do projecto de classificação da zona. Algo que o Secretário dos Assuntos Sociais e Culturais fez questão de frisar. “Tanto para a qualidade de vida dos cidadãos, como para o desenvolvimento da economia, é importante preservar o património” de Macau. Os estaleiros de Lai Chi Vun são um desses marcos de passado que importa conservar.

13 Abr 2017