LAG 2018 | Estaleiros de Coloane não vão ser substituídos por prédios de luxo

De acordo com o deputado Sulu Sou, correm boatos de que a zona dos estaleiros de Lai Chi Vun está destinada à construção e edifícios de luxo. O Governo garante que não e que os estaleiros vão ser protegidos. A compra por parte do Executivo de edifícios classificados para preservação é também uma hipótese a ponderar de modo a garantir a protecção do património

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] zona dos estaleiros de Lai Chi Vun não vai ser substituída por prédios de luxo. A garantia foi dada pelo secretário para os assuntos sociais e cultura, no segundo dia de debate das Linhas de Acção Governativa (LAG) da sua tutela.

A informação foi dada em resposta à questão do deputado pró-democrata, Sulu Sou, que interrogava o Governo acerca do incumprimento dos regulamentos relativos à altura dos edifícios da zona histórica de Macau, e concretamente, ao destino da zona dos antigos estaleiros do território situada em Coloane. “Os regulamentos de altura dos prédios não estão a ser cumpridos” começou por dizer Sou. “Quanto a Lai Chi Vun, já foram demolidos dois dos estaleiros daquela zona e correm rumores que, com a destruição causada pela passagem do tufão Hato, os que restam possam vir a dar lugar a prédios de luxo”, referiu o deputado.

Alexis Tam colocou completamente de parte esta possibilidade. “Temos limites de altura, cumprimos essas legislações e regulamentos. Por isso, estejam descansados. Quanto ao planeamento de Lai Chi Vun, disse que ouviu que iria ser demolido para a construção de um arranha-céus. Eu não concordo com isso, pelo que esteja descansado também”, sublinhou.

Com a passagem do Hato por Macau, ficou destruído mais um dos estaleiros de Lai Chi Vun, mas o objectivo do Governo é o mesmo. Está a decorrer o processo de classificação de Lai Chi Vun e o Executivo vai “reconstruir a estrutura demolida e os outros nove que ainda se mantêm vão ser reforçados”.

A conservação e renovação do património estiveram na ordem do dia no debate das LAG de sexta-feira.

Comprar para cuidar

Também Mak Soi Kun se mostrou preocupado com a capacidade do Governo em ajudar na reconstrução de edifícios classificados, nomeadamente quando se trata de privados. “Como é que salvaguardamos os edifícios de valor histórico e que pertencem a privados? O Governo vai adquirir os imóveis?”, perguntou o deputado.

O secretário fez notar que a tutela tem feito investimentos nesse sentido e deu exemplos: “Já estamos a gastar erário público nisso. Na Rua da Palha, por exemplo, com a farmácia Sun Yat Sen. Depois da classificação, adquirimos o edifício para fazer a revitalização e podemos fazer a mesma coisa em situações idênticas e adquirir os imóveis”, esclareceu.

Por outro lado, Alexis Tam já reuniu, também na semana passada, com o ministro da cultura chinês num encontro em que foi assinado um acordo com a administração do património na China que diz respeito a acções de formação sobre salvaguarda de património.

Relativamente à falta de quadros no território neste sector, Tam admite que há necessidade de formar mais quadros “além destes 24 voluntários em que 12 se dedicam a recuperação de monumentos”.

A ideia é ainda sensibilizar a população em geral e dotá-la de conhecimentos práticos no que respeita à preservação ao património. “Temos também de sensibilizar a população acerca desta salvaguarda do património em várias áreas como a caligrafia, pinturas, mobília, etc. Os idosos e outros cidadãos também podem estar interessados em frequentar estes cursos”, frisou Alexis Tam.

4 Dez 2017

LAG 2018 | Internatos médicos vão regressar para especializar profissionais do sector

O serviço de internato médico esteve suspenso durante dez anos mais vai voltar a ser praticado. O Governo pretende especializar médicos e conta com a ajuda da Academia de Medicina que está a ser criada

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] segundo dia de debate das linhas de Acção Governativa para os Assuntos Sociais e Cultura voltou a ser marcado por questões relativas à qualidade dos serviços de saúde locais. A Secretaria da tutela adiantou que o sector tem sido alvo de muitas melhorias e avançou que os internatos médicos vão voltar a ser prática no território. “Na construção do sistema de saúde temos feito muita coisa. Suspendemos o internato dos médicos diferenciados durante dez anos, mas já solicitei para reabrirem os internatos para médicos de diferentes especialidades e os resultados preliminares estão a começar a surgir”, apontou Alexis TAm.

O serviço pretende ajudar a formar especialistas em várias áreas em que há falta de profissionais e vai estar associado à Academia de Medicina que está a ser criada. Relativamente a este organismo o secretário mostrou-se optimista. O projecto está em curso e conta com ajuda de profissionais do exterior. “Temos também colegas de Hong Kong para nos ajudarem a formar o programa curricular e o funcionamento da própria academia”, esclareceu Alexis Tam.

Entretanto, está em curso a preparação do processo legislativo e estão a ser definidos os médicos que virão a ser responsáveis pelo seu funcionamento e gestão, bem como pelos cursos que irá ministrar.

Alexis Tam fez ainda questão de referir que a abertura da Academia e da profissionalização médica em Macau não será só dirigida aos médicos dos serviços públicos da RAEM. A ideia é que, no que respeita à especialização, o território possa vir a fornecer a devida formação para colmatar as necessidades dos serviços de saúde locais. “Não são cursos para os hospitais públicos, são para todos os médicos gerais para que passem a especialistas. Queremos chegar ao sector privado para que os conhecimentos dos que lá trabalham sejam aprofundados”, explicou Tam.

Desperdício local

A ideia foi deixada em resposta às dúvidas da estreia no hemiciclo nesta legislatura, Agnes Lam. Para a deputada, o aumento que, efectivamente, se tem registado no número de médicos continua a não conseguir acompanhar o aumento do número de utentes no território, sendo que, salienta, quando se trata de doenças graves “as pessoas continuam a ter de sair de Macau.

Neste sentido, Agnes Lam considera que o grande problema continua a ser a falta de médicos especialistas nos hospitais públicos locais. A culpa, afirma, é dos próprios serviços de saúde que não acolhem os licenciados em medicina que são formados no estrangeiro. “Estamos a desperdiçar recursos humanos, porque o Hospital de São Januário não tem aberto vagas para os médicos locais que se licenciam no estrangeiro o que é muito desmotivante para quem volta a Macau. Alguns vão para o mercado privado e outros tornam-se mesmo croupiers nos casinos”, referiu a também académica.

Para Agnes Lam, a criação de uma faculdade de medicina no território poderia ser uma solução para formar os estudantes locais. Já para Alexis Tam, a Academia que está a ser criada tem também essa função.

Saúde em números

De acordo com o secretário para os assuntos sociais e cultura, os números são o reflexo dos esforços da sua tutela.

O Centro Hospitalar Conde de São Januário aumentou, até ao mês de Outubro deste ano, os atendimentos respeitantes à consulta externa em quase seis por cento, com um total de 345 mil consultas. Nas urgências foram atendidos quase 260 mil casos.

No que respeita aos cuidados de saúde primários prestados pelos centros de saúde locais, “tivemos mais de dois milhões de atendimentos e reforçamos o nosso pessoal”, salientou Tam. Este ano, foram recrutados mais 200 trabalhadores para os serviços de saúde. “Entre o pessoal médico e enfermeiros temos um aumento de 4,9 por cento”

Podemos achar que são valores articulados com os padrões internacionais porque a população facilmente consegue ter cuidados de saúde e consultas mas não estamos satisfeitos com isso e vamos melhorar”, referiuo secretário.

A questão da falta de enfermeiros também foi levantada por alguns dos deputados do hemiciclo e Alexis Tam respondeu que “em 2014 teve inicio o novo programa de formação em enfermagem com a duração de dez anos”.

4 Dez 2017

Mais de 200 pessoas em manifestação de apoio a Sulu Sou

Ao contrário do que é habitual, membros das comunidades portuguesa, macaense e chinesa participaram no evento de apoio à não suspensão de Sulu Sou. No final o deputado sublinhou que os manifestantes foram à rua pela integridade da Assembleia Legislativa

 

[dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]ais de 200 pessoas participaram ontem à noite na manifestação contra a suspensão do mandato do deputado Sulu Sou. Ao longo de duras horas foram vários os gritos de incentivo ao pró-democrata e a noite acabou com os manifestantes a segurarem boletins de voto pela não suspensão do deputado de 26 anos.

“Fizemos o nosso melhor para promover este evento. Estou muito contente com o número de pessoas que apareceu. Acho que eles não estão apenas a apoiar-me mas também a apoiar as pessoas de Macau, o sistema e a Assembleia Legislativa. Fiquei muito contente com isso”, disse Sulu Sou, no final da manifestação.

Sobre a votação de hoje, cuja sessão da Assembleia Legislativa está agendada para as 15h00, o deputado admitiu não saber o que esperar. “Só posso dizer que vou preparar-me, porque não posso controlar a forma como os outros deputados votam. Houve deputados que manifestaram o seu apoio, mas os outros não me disseram nada, por isso não sei o que estão a pensar”, admitiu.

“O que posso dizer é que até agora não temos informações de que tenha havido alguma indicação de ‘cima’ [ndr. Governo Central] para os deputados. Por isso, acredito que se não houve indicações de ‘cima’, que haverá maior liberdade e independência para que os deputados sigam as suas convicções”, acrescentou.

Discursos da Novo Macau

Ao longo de duas horas, foram cerca de 10 os oradores ligados à Novo Macau que subiram ao palco para falarem da experiência de trabalhar com Sulu Sou e as mais-valias que o deputado traz para a Assembleia Legislativa. O antigo presidente da Novo Macau Scott Chiang considerou mesmo que Sulu Sou já está a mudar o hemiciclo.

“Não estamos aqui só a apoiar o Sulu Sou, mas também o seu lugar, o seu mandato e a sua promessa e compromisso perante o eleitorado e Macau”, começou por dizer Chiang. “O que aconteceu foi que em Maio do ano passado um grupo de nós decidiu protestar contra um donativo injusto da Fundação Macau. Queriamos uma reforma do sistema e actuámos pelo bem público. No final, o ponto de vista da Novo Macau é que se trata de uma perseguição política”, acusou, o também arguido.

“Apelamos aos deputado que pensem duas vezes, ou mais, antes de votarem porque isto não é apenas sobre o futuro de um deputado jovem, mas também sobre a integridade da Assembleia Legislativa”, frisou. 

Comunidades representadas

Entre as mais de 200 pessoas que passaram pela Rotunda do Três Candeeiros, estiveram membros das comunidades chinesa, macaense e portuguesa. Alguns participarem neste tipo de iniciativas em Macau pela primeira vez, como foi o caso do advogado Jorge Menezes.

“Por um lado, vim ver e, por outro, apoiar a causa do deputado. Acho que seria absurdo ser suspenso. Não tem lógica nenhuma nem justificação política”, disse Jorge Menezes, ao HM. “Os eleitores quando votaram já sabiam que havia um processo pendente, por isso se ele for suspenso é uma subversão do processo democrático. Os deputados não se podem substituir à vontade popular, quando os factos da acusação eram conhecidos pelos eleitores que decidiram votar”, considerou.

Medo português

Também o historiador Jorge Morbey fez questão de estar no evento, e durante alguns minutos conversou com Sulu Sou, quando o deputado chegou ao local. “Trata-se de um jovem deputado, eleito pela vontade popular, coisa que só um terço da AL tem essa representatividade popular e eu suponho que o sistema esteja interessado em retirá-lo da Assembleia”, afirmou Jorge Morbey.

“Gostava muito que os deputados respeitassem a vontade de quem elegeu o deputado Sulu Sou e que esperassem pelo fim do mandato para que prosseguisse o julgamento. Era o que uma assembleia democrática faria. Mas esta não é democrática”, sublinhou.

O historiador comentou também o facto de frequentemente a comunidade portuguesa estar afastada deste tipo de manifestações: “se calhar são os ventos do Oriente que não os deixam pensar que podem estar aqui com um sistema democrático e não só a fazer vénias aos senhores de Pequim”, defendeu.

“Há uma coisa subjacente às pessoas de Macau que é o medo: o medo de perder o emprego, o medo de ser recambiado para Portugal, entre os portugueses, e isso poderá fazer com que as pessoas deixem mesmo de votar. Se a suspensão for avante é exactamente para dar uma lição sobre a maneira como o autoritarismo funciona”, concluiu.

Sulu Sou é acusado do crime desobediência qualificada devido a uma manifestação contra o donativo de 100 milhões de yuan chineses da Fundação Macau à Universidade de Jinan. Como agora é deputado, a AL tem de decidir se pretender suspender o mandato de Sulu Sou para que o julgamento possa decorrer. Caso a AL considere que o mandato não deve ser suspenso, o julgamento decorrerá quando Sul Sou deixar de ser deputado. 

 

Forte contingente policial

Entre os manifestantes estiveram vários membros das autoridades vestidos à paisana com câmeras digitais para filmarem e fotografarem todos os presentes na Rotunda dos Três Candeeiros. Também no edifício do IACM estava uma câmara instalada que recolheu imagens durante as duas horas do evento de apoio de Sulu Sou. Além disso, as autoridades instalaram barreiras de segurança, o que permitiu que o trânsito na zona não fosse afectado pelo evento, que decorreu sem incidentes.

4 Dez 2017

Paulo Duarte, investigador: “‘Uma Faixa, Uma Rota’ é para os filhos dos nossos filhos”

Paulo Duarte esteve em Macau para o lançamento do seu terceiro livro na passada sexta-feira, “A faixa e rota chinesa: a convergência entre terra e mar”. Para o investigador que se dedica à pesquisa acerca das relações da China com o mundo, a política “Uma Faixa, Uma Rota” é uma estratégia de longo prazo para garantir o futuro dos habitantes do país mais populoso do planeta. Cabe aos países que se associam aproveitar os benefícios que o projecto lhes pode trazer. A Macau, enquanto plataforma, sobra a iniciativa de acções que aproveitem as vantagens geográficas e linguísticas do território na comunicação com os países de língua portuguesa

 

Tem três livros que fazem análises profundas sobre a China. De onde veio esse interesse pelo país?

Eu diria que não escolhi, fui escolhido pela China. A minha relação com a China foi recíproca. Fiz mestrado e doutoramento na Bélgica e tinha uma cadeira de China and World Politics. A cada aula que passava, a avidez por conhecimento pela China tomou conta de mim. Quer dizer, fui tomado pela China. Nesse sentido, continuei na Bélgica a fazer o doutoramento e depois tive a ocasião de ir para a Ásia Central fazer investigação de campo. Estive no Cazaquistão duas vezes, no Quirguistão e Tajiquistão, são três dos cinco Estados nascidos do colapso da União Soviética. São Estados do ponto de vista cultural extremamente enriquecedores. Esta passagem pela Ásia Central reflecte-se, sobretudo, no segundo e terceiro livro. Quis começar, justamente, por falar da periferia chinesa. Do porquê da importância da periferia. Basta recordar que é na periferia, no Cazaquistão, que a China lança a sua faixa e rota para o mundo. Quis aliar neste livro a convergência entre o mar e a terra. Não é só a terra que é importante, não são só as linhas de alta velocidade, é também o mar, sempre foi por mar que a China processou e processa a maior parte do comércio, as estatísticas divergem entre 80 a 90 por cento. Mas a terra vem aqui surgir como um complemento. A China está a revisitar a sua essência, a sua história. Desta vez sem camelos ou mulas, mas por ligações de alta velocidade, comboios e uma emergência de uma série de corredores logísticos e grandes portos.

O livro “Faixa e Rota Chinesa” é o primeiro livro em língua portuguesa sobre este grande projecto. O que é, realmente, “Uma Faixa, Uma Rota”?

É o renascer de um projecto que outrora ligava a China à grande periferia mundial. A China já foi grande. Hoje Trump fala em “making America great again”, esta política é, por outras palavras, “making China great again”. Por várias razões. Economicamente, a China tem crescido ao longo das últimas décadas, excepto recentemente em que a economia conheceu um período menos bom. A indústria da construção, que tem sido o grande motor do crescimento chinês, precisa de ser lançada e a Faixa e Rota mais não é, em termos práticos, do que empregar os chineses em projectos logísticos entre o Oriente e o Ocidente. Em termos políticos, ao longo da história os vários líderes tiveram diferentes narrativas e o que se passou com a Teoria das Quatro Modernizações ou o que se passou com o desenvolvimento científico do Hu Jintao. Hoje temos mais uma narrativa, “Uma Faixa, Uma Rota” é mais uma narrativa. Não digo só esta política, mas da grande concentração de poder que se está a formar em torno de Xi Jinping.

O que é que esta política reflecte a nível cultural?

A componente cultural é o soft power. Não é por acaso que a China é um actor tardio em termos de soft power. Andei pela Ásia Central e a sinofobia, o medo da China é omnipresente. A propaganda soviética tinha incentivado o temor pelo povo chinês do ensino básico até à universidade. Ainda hoje na Ásia Central, para não dizer em outras regiões do mundo, há receio de que os chineses cheguem e tomem terras, empregos. A China sentiu, a tempo, que o crescimento económico não gera, propriamente, simpatia. É preciso revisitar o passado da Rota da Seda, em que a China negociava pacificamente com os povos da grande periferia global. Revisitar o passado traz boas memórias aos chineses. Mas para combater as percepções que o mundo tem da China é preciso arranjar aqui ideias nobres. É preciso explicar que a China não é aquele gigante que vem apenas aqui para fazer comércio e há que fazer proliferar, por exemplo, os Institutos Confúcio. 

Há que educar o mundo acerca da cultura chinesa?

Exactamente. A melhor maneira para nós percebermos aquilo que não conhecemos é começar por falar a língua do desconhecido. Não é por acaso que os Institutos Confúcio são não só um início da aprendizagem do mandarim, que é uma língua dificílima, mas também uma fonte de incentivo da cultura chinesa, porque a China não é só o mandarim, há toda uma cultura milenar, simplesmente não tem o nosso ponto de vista. Aquilo que a China faz fá-lo numa perspectiva de décadas, de gerações. “Uma faixa, Uma Rota” é para os filhos dos nossos filhos. A China não pensa à ocidental, o que eles fazem é pensar para décadas, porque estamos a falar de alimentar o povo mais populoso do mundo. Não se vai buscar recursos num planeta escasso, tem de se pensar a longo prazo. No futuro isso representa mais bocas, mais necessidade de alimentos e energia e mais necessidades de construir estratégias. “Uma faixa, Uma Rota” é, em todos os aspectos, económico, político e cultural, explicar que a China quer criar a tal comunidade de destino comum. Ou seja, o desenvolvimento deve ser não só para a China, mas para todos. Criar o ambiente favorável para a reemergência chinesa e dividir os dividendos do progresso com a comunidade. Fazer perceber que a China não é o gigante susceptível de ser temido, mas é alguém que quer partilhar os frutos do progresso. “Uma faixa, Uma Rota” é, nesse sentido, uma partilha e um emanar de soft power.

Acabou de chegar de Pequim onde esteve reunido com elementos de várias universidades chinesas com cursos de língua portuguesa. Qual o papel da língua portuguesa neste projecto “Uma faixa, Uma Rota”?

O português é a quinta língua mais falada do mundo. A China está atenta a isso. Tal como a China, os mercados onde a língua oficial é a portuguesa, nomeadamente o Brasil, não são mercados estanques, tendem a evoluir. Sendo o português a quinta língua mais falada do mundo, é preciso utilizar uma plataforma, pode ser Macau, embora a China não necessite tanto de Macau como Macau necessita da China. Isto é, a China sempre utilizou a via bilateral e Macau proporciona uma via multilateral. Mas quando a China tem realmente interesse em forjar laços sempre o fez pela via bilateral. Multilateralismo é um complemento. A China tem interesse nos mercados de língua portuguesa porque é preciso pensar em Angola, o segundo país que mais exporta petróleo para a China, a seguir ao Médio Oriente, à Arábia Saudita. Mas não é só petróleo, é marfim, minérios, ouro, mil e uma coisas. E quem diz petróleo de Angola diz também do Brasil. Mas há outra coisa muito importante: a China tem uma classe média emergente, que supera toda a população dos Estados Unidos e que começa a viajar. Estamos a falar de um potencial de turismo incrível, não só para Portugal como para o Brasil e destinos menos conhecidos como São Tomé e Príncipe, que muito poderão beneficiar disso. Existe também uma classe média que tem gostos cada vez mais requintados, que gosta de frutos exóticos. A China procura petróleo mas procura também, cada vez mais, comprar terras, terrenos para cultivo, porque apenas sete por cento das terras na China são aráveis. Isto quer dizer que durante décadas a China destruiu os solos, fruto da industrialização rápida. 28 mil rios desapareceram na China ao longo das últimas décadas. Isto significa que o país está a procurar cada vez mais aquilo que não tem, que é terrenos no estrangeiro. Há resistência local, então, muita vezes, a China envolve-se em joint ventures, em formas de desenvolvimento de agricultura sustentável nesses países.

Não estamos a falar de uma espécie de colonização?

Há quem faça essa crítica. Há autores que dizem que sim, outros que dizem que não. Eu digo o seguinte: a responsável não é apenas a China. Cabe aos países anfitriões diversificar as suas economias. Imagine que cai o preço do petróleo. Em vez de virem pedir empréstimos à China, o que têm a fazer é diversificar a sua economia e não concentrarem nem usurparem os recursos dentro da elite. Estes países é que dizem sim à China, não é a China que vai impor as suas condições. Se lhe permitem negociar e comprar, a China fá-lo e muito bem. Cabe a estes países aproveitar as bolsas que a China concede aos seus técnicos, o know-how e as parcerias para formar quadros e para se desenvolverem mais. Além disso, a China começa a ser um terceiro polo de educação. Há cada vez mais gente interessada em vir para o Oriente. Temos um mundo tradicionalmente dominado pela Europa e Estados Unidos a nível de educação, agora a China, Singapura e outros países, estão a emergir. Não é a China que vai fazer a mudança, pode ajudar mas depende dessas pessoas. Daí, aquela visão, ou não, de neo-colonizador.

Macau afirma-se muito como uma plataforma. Qual é o papel de Macau nesta política “Uma Faixa, uma Rota”?

É preciso ver que do ponto de vista geoestratégico e cultural, Macau beneficia muito da tal fórmula de Deng Xiaoping “Um País, Dois Sistemas”. Macau tem uma posição geoestratégica: está na Ásia, embora o legado seja ocidental. As empresas de Macau são sobretudo PME. Isto significa que Macau, por muito boa vontade que tenha, não pode partir à descoberta da África e da América Latina, sem se aliar com as grandes empresas que já têm conhecimento e know-how do Sul da China. Macau pode ser uma plataforma, não só para feiras, exposições, ou casinos, mas para um ponto de partida em que as empresas macaenses beneficiam de um trilinguismo, uma grande vantagem face a Hong Kong onde se fala só chinês e inglês. Em Macau fala-se português, chinês e nos quadros empresariais fala-se, naturalmente, inglês. Também está localizado a ocidente da foz do Rio das Pérolas, numa convergência de transportes terrestres, marítimos e aéreos. Temos o legado do Direito Ocidental, procedimentos aduaneiros relativamente céleres, empresas de tradução, formação de quadros na área do turismo, as grandes universidades que aqui existem com reconhecimento internacional. Não vejo Macau apenas como a tal feira de exposições, onde vêm cá de vez em quando os grandes industriais. Macau pode, de facto, ser essa plataforma de várias sinergias, na área da educação, do Direito, do Direito Comercial, porque as empresas necessitam de um Direito Internacional e Macau tem a possibilidade de ter e formar quadros que, inclusivamente, eduquem outros asiáticos pela proximidade na área do Direito, Educação e Turismo. Não é Portugal, ou Macau, que têm de esperar que a China Continental venha ao seu encontro de braços cruzados. Cabe a Macau e aos países de língua portuguesa verem aquilo que de melhor têm para oferecer à China. É um processo mútuo. 

O território pode também ter um papel na divulgação da cultura chinesa?

Com certeza. Mas há um ponto que eu critico. Vejo os países de língua portuguesa muito distraídos. Existe um grande receio, sobretudo na Europa, acerca da coexistência no mundo de dois senhores: o parceiro de longa data do pós-segunda guerra mundial, os Estados Unidos, e a China que vem preencher um vazio. Esta é a grande barreira psicológica que ainda existe no Ocidente. Como é que a NATO pode coexistir com a China em parceria numa área global como o terrorismo? Todos nós temos o terrorismo como inimigo, portanto, faz sentido a China aliar-se não só na protecção das linhas marítimas do Mediterrâneo, do Suez, etc. Faz sentido a cooperação cibernética, para fazer face aos apagões cometidos por aqueles países tidos como do eixo do mal, como a Coreia do Norte. Faz sentido uma sinergia de interesses. É preciso que a Europa e outros países afins percebam a China como um contraponto, uma mais valia, uma complementaridade, face ao Ocidente.

Está a ser uma percepção difícil?

Sim e isso é, talvez, a grande barreira que limita o maior envolvimento da China e a possibilidade de retirar proveito dessa relação com a China. 

Neste seu livro, “Metamorfose do Poder”, refere que o partido pode estar a terminar a sua idade de ouro, e que pode neste momento estar mais perto de ser um retrocesso do que uma solução. O que quer dizer com isto?

Isto é uma crítica que vários autores ocidentais fazem. Há que diga que o soft power chinês tem como grande limitação não partir da sociedade civil, como nos Estados Unidos. As pessoas têm o sonho americano, há um modelo de inspiração, o american way of life. Mas não se vê o chinese way of life porque as pessoas temem a China. A narrativa chinesa. O soft power chinês não nasce, ao contrário do soft power americano, da sociedade civil. Nasce do partido e da sua propaganda. O cidadão médio mundial está reticente em receber o que é do partido e não nasce da sociedade civil. Aí reside o complexo equilíbrio. O partido sabe que se autorizar a liberdade está no fundo a criar problemas à sua própria subsistência. Então o chinês que é mais culto, que viaja, que poderá vir a ter acesos à internet, é o chinês que vai querer sempre mais e vai dizer “não, eu não quero ser controlado, quero ser eu a controlar o meu destino”. E aí está o paradoxo do partido. A iniciativa privada, é aceite desde que possa gerar desenvolvimento, mas o domínio da informação é perigoso para este tipo de regimes por gerar mais necessidade de conhecimento e o indivíduo é sempre ávido. Aí pode estar, de facto, aquilo que mina o futuro do partido.

Fala também neste seu livro que nas décadas de 1980 e 1990 os responsáveis pelo poder tinham também interesses privados e isso está na base da corrupção dos altos cargos. O Xi Jinping tem vindo a desenvolver uma campanha contra a corrupção. Em Macau há um sistema em que os legisladores são também alguns dos maiores empresários do território. Não estamos perante um contrassenso?

De facto, o poder é fonte de corrupção se não for bem gerido. A grande luta de Xi Jinping é a de legitimar esta elite do poder, que aos olhos dos chineses está gravemente afectada. É preciso voltar a fazer com que a sociedade olhe de novo para os políticos, não como fonte de corrupção, mas como a vanguarda do povo, porque era assim que era o Partido Comunista Chinês nas suas origens. O partido era legítimo pela capacidade unificadora de pobres, de ricos. Hoje o partido é visto como a classe parasitária que conseguiu há várias décadas unir os chineses, mas que hoje é fonte de discórdia. O Xi Jinping percebeu que é preciso, a nível regional e local, fazer esses líderes corruptos pedirem desculpa aos chineses. Aí faz também uma eliminação dos seus principais rivais. A iniciativa privada é cooptada pelo regime. O Governo chinês pede frequentemente a multimilionários chineses que dêem a cara ao invés de passar determinado projecto como sendo do Governo chinês. Por exemplo, Wang Nuguo, apresentou à Islândia a intenção de comprar uma porção do norte de Islândia para construir um campo de equitação e um hotel luxuoso, mas o Governo da Islândia recusou essa proposta porque havia ali motivos ocultos. Em vez de equitação e turismo, havia reais interesses do Governo chinês em utilizar aquela parte do hemisfério norte, do Ártico, para um posicionamento estratégico face ao petróleo, ao gás e a uma, eventual, rota da seda polar. O gelo está a derreter e não vamos ter nas próximas décadas apenas uma rota convencional, vamos ter uma rota complementar quando o gelo permitir. Temos aí um exemplo de uma tentativa que nasceu morta, porque o Governo da Islândia decidiu dizer não e dizer “nós sabemos que não é o senhor que está a querer comprar, é o Governo chinês”. Nada do que a China faz no mundo é por acaso, existe uma grande estratégia e o indivíduo deve submeter-se ao todo, e não o todo ao indivíduo. Nós, os latinos, temos a tendência para sobressair face à massa, aqui o indivíduo serve a massa.

Isso não pode ser perigoso?

É e não é porque o individualismo também pode ser perigoso. Estaline sobrepôs-se face à massa e matou muita gente. O próprio Mao fez isso. Mao Zedong é apresentado como um herói nacional. A Inquisição fez o mesmo e marcou um dos períodos negros da Igreja. Há duas vertentes, o bom e o mau. Pode haver no individualismo o lado bom, como no holismo um lado positivo. Não podemos ser radicais e fundamentalistas.

4 Dez 2017

Justiça | Declarações trazem fantasma da erosão da influência portuguesa

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] vice-director do Gabinete de Ligação do Governo Central, Chen Sixi, proferiu declarações vagas sobre a revisão legal que Macau tem de fazer para se adequar à realidade trazida pela transferência e desenvolvimento rápido do território. Outra das questões que marca a erosão da influência lusa na justiça prende-se com, cada vez menos, existirem juízes portugueses nos tribunais de Macau.

Após o discurso da secretária Sónia Chan na abertura da conferência académica internacional sobre direito processual civil de Macau, subiu ao palco o vice-director do Gabinete de Ligação do Governo Popular Central na RAEM. Chen Sixi começou por referir a necessidade de “impulsionar a unificação da China”, à luz da “nova Era de socialismo chinês” saído do 19º Congresso Nacional do Partido Comunista Chinês.

A discursar perante uma plateia de juristas e académicos, Chen Sixi fez questão de vincar o compromisso com o “cumprimento rigoroso da Constituição e Lei Básica de Hong Kong e Macau”, assim como empenho em assegurar a estabilidade das duas regiões administrativas especiais. De seguida, o vice-director do Gabinete de Ligação referiu as fortes ligações entre a lei portuguesa e a legislação local, adiantando que “depois da transferência houve um grande desenvolvimento” que implica a necessidade de “rever a lei para a adequar à nova realidade”.

Jorge Neto Valente, presidente da Associação dos Advogados de Macau, entende que o “19º Congresso abriu uma nova Era que implica mudanças para a construção dos grandes objectivos definidos”. Quando interrogado sobre como interpretou as palavras do vice-director do Gabinete de Ligação, Neto Valente diz que “é preciso saber do que se está a falar”.

O advogado revela que ainda não conhece as alterações previstas para os códigos processuais, neste momento em fase de estudo, mas que “para alterar um código com a relevância de um código de processo civil é preciso saber-se muito de Direito, não é algo que se faça em duas penadas”.

Fazer alterações profundas num código que regula todas as fases processuais requer uma “evolução lenta”. Neto Valente dá o exemplo de algumas regras que “hoje existem no Código Civil que têm centenas de anos de sedimentação”.

Matriz lusa

O ordenamento jurídico de Macau foi fortemente influenciado pelo direito português. Por exemplo, o Código de Processo Penal foi elaborado por Figueiredo Dias, uma solenidade jurídica em Portugal.

Pedro Leal, que exerce advocacia em Macau há 30 anos, é da opinião de que o vice-director do Gabinete de Ligação “deu uma no cravo e outra na ferradura”, algo que entende como muito típico na cultura chinesa.

No entanto, o causídico não espera grandes alterações nos códigos de processo penal, principalmente que cortem a matriz portuguesa do direito local. “Se a ideia é cortar e ser um direito de matriz chinesa, isso vai demorar muitos anos. Algo que só é possível se for feito de uma forma gradual”, comenta.

Um dos aspectos onde Pedro Leal vê o desaparecimento da influência lusa é na substituição de juízes portugueses que saem do território e que são substituídos por magistrados mais inexperientes e formados localmente. “Havia uma boa dezena de juízes portugueses e deixou de haver, por alguma razão será”, recorda.

O advogado entende que “há uma espécie de um complexo de inferioridade de quem manda em Macau que não quer, pura e simplesmente, que venham juízes ou magistrados portugueses”. Como se formam juízes no território, a necessidade de “importar” magistrados de Portugal não se coloca nas mais altas esferas judiciais.

Outro problema fundamental prende-se com a morosidade e dificuldade de formar juízes. O processo é longo e é necessário ganhar calo para melhor administrar a justiça. Além disso, quando um magistrado português abandona o território, ou a profissão, a sua substituição não é imediata. Um episódio que aconteceu recentemente, quando uma magistrada portuguesa saiu do território sendo substituída quatro meses depois ilustra bem a situação. Ou seja, durante esse período os processos desse juízo estiveram parado, uma situação que revela clara falta de recursos humanos.

Velha história

António Katchi foi um dos juristas que testemunhou os primeiros dias de RAEM. “Lembro-me bem de, já nessa altura, diferentes personalidades, incluindo deputados, afirmarem que a legislação de Macau era obsoleta e que era necessário proceder a uma ampla e profunda revisão”, recorda.

O advogado evoca os tempos em que a pasta da Administração e Justiça estava nas mãos de Florinda Chan, quando se “chegou a elaborar planos de reforma legislativa que mais pareciam planos de produção de uma fábrica”.

Um dos fios condutores desses projectos, que não chegaram a ver a luz do dia, era a desconsideração perante o facto de que “grande parte dos diplomas legais de Macau datava de finais dos anos 1990 e havia passado pelo crivo do Grupo de Ligação Conjunto Luso-Chinês”.

António Katchi entende que o ramo que escapou ao processo de actualização nessa altura foi o direito do trabalho. “Nesse domínio, a oligarquia de Macau e a casta dirigente do Partido Comunista Chinês nunca quiseram que se mexesse, a não ser para degradar ainda mais a posição jurídica do trabalhador”, teoriza o jurista.

O facto é que uma alteração tão significativa no ordenamento jurídico local constituiria uma violação da Declaração Conjunta Luso-Chinesa, algo que realizado unilateralmente seria um atropelo ao direito internacional, uma vez que a China se comprometeu a manter inalteráveis as leis fundamentais e o sistema jurídico de Macau até Dezembro de 2049. Neste contexto, António Katchi entende que “as palavras de Chen Sixi correspondem a uma velha ladainha que só ganharão algum interesse se, e quando, vierem a adquirir um conteúdo mais definido”.

Uma coisa é certa: qualquer interferência mexe com os elementos identificadores do sistema legal de Macau. O direito de todos os países e regiões onde houve administração lusa, como por exemplo Cabo Verde, Angola, Moçambique, Guiné e Macau, são de matriz portuguesa. Jorge Neto Valente entende que assim terá de continuar a ser em Macau, “sob pena de se destruir e perder a identidade” do ordenamento local.

Bom partido

A China não tem uma separação de poderes nítida, confluindo tudo na unidade partidária. Por exemplo, um sector do Partido Comunista Chinês tem o poder para interpretar leis, tal como faria um Tribunal Constitucional.

Por cá, aquando das divergências interpretativas quanto à Lei de Terras, o Comité Permanente da Assembleia Nacional Popular pronunciou-se sobre a matéria concluindo que o diploma legal não infringia a Lei Básica. O caso ganha outros contornos políticos tendo em conta que quem deu a notícia foi Ho Iat Seng. À altura, o presidente da Assembleia Legislativa argumentou que o projecto da Grande Baía Guangdong–Hong Kong–Macau era uma oportunidade demasiado apetecível para o território e que deveria ser prioritária face a questões de natureza jurídica.

Independentemente do crescimento do primeiro sistema, ou da falta de juízes portugueses a decidir em Macau, há uma vontade conjunta entre juristas e a secretária para a Administração e Justiça: a simplificação do processo judicial.

Essa é uma das prioridades da reforma legal, de acordo com Sónia Chan, de modo a elevar a eficiência processual e a elevar a protecção dos direitos e interesses de quem busca justiça nos tribunais.

1 Dez 2017

Governo vai contratar 21 médicos a Portugal

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s atrasos na construção do Hospital das Ilhas e o sistema de saúde local dominou parte do debate de ontem das Linhas de Acção governativa da secretaria para os Assuntos Sociais e Cultura. Alexis Tam afirma ter um plano alternativo enquanto o hospital não está pronto e que passa pelo melhoramento dos serviços já existentes. Para o efeito, o Governo vai contratar médicos em Portugal.

Alexis Tam não duvida dos cuidados de saúde prestados no território e, no que respeita ao atraso na construção do Hospital das Ilhas, reitera que a situação está sob a tutela das Obras Públicas. No entanto, o secretário tem um plano alternativo. “Enquanto o hospital não funcionar o Governo vai continuar a apostar na melhoria dos serviços que estão activos”. Para o efeito, está na calha a contratação de médicos de Portugal. “Vamos celebrar um acordo com Portugal para trazer mais médicos portugueses para trabalharem aqui”, apontou ontem no debate das Linhas de Acção Governativa da sua tutela.

A ideia é não só poderem exercer a sua actividade nas instalações de saúde de Macau, mas servirem ainda de “mestres dos médicos locais que já frequentam formações no exterior para melhor a qualidade do nosso sistema de saúde”, explicou.

A revelação foi prestada quando de uma resposta dada ao deputado Ho Ion Sang que, depois de referir a importância da tutela do secretário que tem a seu cargo “todo o que diz respeito à população desde que nasce até que morre” e de apelidar Alexis Tam de “secretário one stop”, pediu satisfações relativamente aos atrasos sucessivos na construção do Hospital das Ilhas. Para o deputado, está em causa a qualidade do sistema de saúde do território.

De acordo com Alexis Tam é prioridade do Governo continuar a injectar mais verbas no sector de modo a promover um “desenvolvimento saudável e qualitativo”.

Mais do que olhar para um hospital em construção, Alexis Tam considera pertinente ter em conta o desenvolvimento dos serviços que já existem e que têm vindo a crescer e a ser internacionalmente reconhecidos.

O secretário avançou ainda com medidas que já estão em prática “antes do hospital funcionar”. “Já temos três centros de saúde que funcionam até à meia-noite e já há muitas especialidades no hospital de São Januário a trabalhar ao fim-de-semana”, explicou.

Problemas alheios

Por outro lado, não cabe à sua tutela a responsabilidade dos atrasos actuais da obra. “Quero reiterar o seguinte: nós somos utilizadores e não somos os serviços competentes pelas obras. Por isso, não conseguimos muitas vezes controlar o processo de evolução das empreitadas ou o calendário de construção mas sabemos que, até ao fim do mandato, teremos algumas coisas prontas”, frisou.

Já o director dos Serviços de Saúde (SS), Lei Chin Ion, fez saber que, no que respeita ao Hospital das Ilhas, os serviços estão a fazer o que podem e contam para o efeito com a ajuda de profissionais experientes do estrangeiro. “Convidámos hospitais da China para ajudar a gerir o processo, convidámos dois hospitais de Hong Kong, convidámos uma universidade chinesa e uma empresa dos Estados Unidos para nos ajudar a fazer concepção arquitectónica do bloco operatório e de oncologia”, referiu.

Lei Chin Ion adiantou ainda, quando questionado acerca dos serviços de saúde inteligentes, que além da partilha de metadados clínicos entre instituições de saúde, a ideia tem que ver com aplicações informáticas que as pessoas podem utilizar e que as ajudam a monitorizar o seu estado físico. Para desenvolver essas aplicações, o responsável já teve uma reunião com Jack Ma, dono da Alibabá, acerca deste tipo de sistemas.

Entretanto, está a ser finalizada a proposta de lei relativa à qualificação para o exercício de actividades no sistema de saúde, avançou o director dos SS ao mesmo tempo que admitiu a possibilidade do Governo pensar num seguro para a população, sendo que, alertou, “é uma questão complicada”.

1 Dez 2017

LAG | Canídromo vai acolher quatro novas escolas

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]omeçam a ser conhecidas as finalidades do espaço onde actualmente funciona o Canídromo de Macau. A primeira foi ontem dada a conhecer pelo secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, no debate sobre as Linhas de Acção Governativa (LAG) na sua tutela para 2018.

O Governo quer construir quatro novas escolas, no âmbito do projecto Céu Azul. Mais do que palavras, passaram-se aos actos, tendo o projecto sido já apresentado às Obras Públicas pela Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ).

“Estou muito feliz porque, quanto ao Canídromo, já apresentámos, através da DSEJ, o plano para a sua ocupação com a construção de quatro escolas, sendo que uma delas será uma escola de ensino especial”, anunciou o secretário.

O projecto Céu Azul é a iniciativa governamental que tem por objectivo transferir as escolas que estão a funcionar em pódios para instalações adequadas. Se no início, há cerca de três anos, as expectativas relativamente ao seu término andavam entre os dez e vinte anos, agora o projecto parece poder ser concluído mais cedo.

“O projecto foi apresentado há três anos e, nessa altura, tinha um prazo de dez a vinte anos para ser terminado porque não sabíamos que o Canídromo poderia ser revertido para o Governo ou outros, Por isso tínhamos de o encarar com cautela”, explicou o secretário.

Terrenos bem aproveitados

Também os novos aterros da zona A poderão vir a acolher temporariamente escolas que estejam em pódios, enquanto as instalações definitivas não se encontrarem prontas. “Além de conseguir reaver terrenos e do Canídromo, temos projectos para a zona A . Queremos ter edifícios temporários para escolas que ainda estejam em pódios”. A ideia é que sejam instalações temporárias até que exista uma solução definitiva. podem ter de ficar novamente temporariamente em edifícios nestes aterros”, adiantou Alexis Tam.

O secretário, visivelmente satisfeito, considera agora que o projecto Céu Azul reúne condições para terminar muito mais cedo do que o previsto. “Este projecto não vai mais durar de dez a 20 anos e vai ser mais rápido. Os resultados são muito positivos”, apontou.

Desta forma, o secretário respondeu às questões colocadas por Ho Ion Sang, Chan Hong e Lam Lon Wai.

Ho Ion Sang perguntava se a secretaria tutelada por Alexis Tam “tinha reservado espaço para escolas nos novos aterros da zona A”, Chan Hong queixava-se de que ainda existem 11 escolas a funcionar em condições precárias e Lam Lon Wai sugeria que o Canídromo fosse um espaço a ter em conta para a instalação de projectos educativos sendo que se trata de um local que ficará disponível no próximo mês de Julho, altura em que termina o contrato de concessão de exploração à empresa Yat Yuen.

1 Dez 2017

Erro Médico | Lei criticada por não incentivar prevenção

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] jurista Vera Lúcia Raposo critica a Lei do Erro Médico, aprovada em Agosto do ano passado, por considerar que o documento não procura evitar os erros, mas que se limita a procurar culpados.

A Lei do Erro Médico foi elaborada com o objectivo de procurar um culpado para trazer a público, sem pensar em prevenir essas ocorrências. A opinião foi expressa, ontem, pela jurista Vera Lúcia Raposo, durante uma conferência na Fundação Rui Cunha, com o tema A Lei do Erro Médico.

“Não é uma lei preocupada em prevenir ou evitar erros médicos. Não está preocupada com isso, está preocupada em encontrar um médico culpado e apontar-lhe o dedo: ‘foi este que fez’”, afirmou Vera Lúcia Raposo.

“Como paciente não me preocupo nada com isso, quero é que as coisas corram bem. Não quero que haja os erros provocados pelo sistema, que podem ser prevenidos. Mas só podem ser prevenidos se forem primeiro conhecidos, e depois estudados. A lei não quer saber disso”, considerou.

Um dos pontos mais focado pelos oradores, que incluíram também os jurista Paulo Cardinal, Rui Cascão, Mang Ten Iong e Luís Pessanha, foi o sistema de notificação. Este sistema obriga os médicos a reportarem o seus erros e dos colegas.

“Se fosse profissional de saúde, em vez de estar mais preocupada em saber se estou a tratar do meu paciente como deve ser, ia estar a olhar por cima do ombro para ver se algum colega me está a ver a mim. E também a ver o que o colega fez, porque da forma como o regime aparece na lei, parece que a obrigação de notificar não diz respeito apenas ao que eu faço de errado, mas ao que o vizinho do lado faz”, apontou. “O regime está implantado de uma forma que temos médicos a vigiar médicos. Big Brother is watching you [O Grande Irmão está a ver-te]”, acrescentou.

Insultos aos deputados

Por sua vez, Paulo Cardinal, jurista da Assembleia Legislativa, recordou que quando o diploma chegou pela primeira vez ao órgão legislativo, que continha diversas falhas.

“Demoraram 12 anos a estudar esta proposta de lei. A proposta de lei, tal como entrou na Assembleia Legislativa, estava prenha de situações negativas, de regimes que não se entendiam, de soluções que inclusive colocavam em causa os tribunais”, começou por dizer o jurista. “Não é uma lei boa, ainda tem muitos erros, mas infelizmente o ponto de partida era absolutamente negativo, em diversos aspectos essenciais”, acrescentou.

Entre as críticas apontadas ao documento original, Cardinal sublinhou duas situações: a ausência de referências à saúde do foro psíquico e o facto de só poder haver erro médico devido a acções e não a omissões dos médicos.

Estas foram situações corrigidas, e Cardinal elogiou o papel do presidente da comissão que tratou do documento, o ex-deputado Cheang Chi Keong: “Foi uma pessoa que nunca baixou os braços e que fez sempre questão de tentar conseguir o melhor possível para o ordenamento jurídico de Macau, para os pacientes e para os médicos”, apontou.

“É uma lei claramente melhor do que resultaria se a proposta tivesse sido aprovada de uma maneira acrítica, sem intervenção, apoio da sociedade”, sublinhou. No entanto, o jurista frisou que pela primeira vez uma comissão foi insultada na imprensa chinesa.

 

Questões sobre ausência de médicos e juristas portugueses

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]urante a conferência, Paulo Cardinal levantou questões sobre a ausência de médicos e juristas portuguesas da Comissão de Perícia do Erro Médico. Cardinal questionou se não haverá pessoas capazes com nacionalidade portuguesa para integrarem a comissão.

“Espantadamente vejo que na Comissão de Perícia do Erro Médico não há lugar para nenhum médico português. Presumo que serão todos não-peritos. Não percebo, pessoas com grande experiência médica, formação médica que se têm dedicado a estas questões não foram atendidas para estarem presentes na Comissão de Perícia do Erro Médico, do ponto de vista médico”, sublinhou o jurista.

“Então a nível dos juristas, se há especialistas em Direito Médico em Macau, estão aqui nesta mesa, do meu lado esquerdo. Também não encontraram o caminho para poderem estar na comissão de perícia”, frisou.

O presidente da Comissão de Perícia é médico legista O Heng Wa, responsável pelas autópsias do jovem português Luís Amorim, que foi encontrado morto em 2007, e de Lai Man Wa, antiga directora-geral dos Serviços de Alfândega, encontrada morta em 2015.

1 Dez 2017

Amnésia

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] vida tal como nos encontramos nela é espontaneamente metafísica. Tendemos a “produzir doutrina” sobre a vida. Temos opiniões fortes sobre o que é. Em cada situação em que nos encontramos, há tentativas e desistências de interpretação do que nos acontece, se estamos bem ou mal, se vamos indo, qual o estado em que nos encontramos, que impressão temos de todo e qualquer conteúdo. Não nos é indiferente percebermos ou não percebermos o que se passa, como se estivéssemos sob uma pressão contínua de saber que se manifesta de forma mais evidente, quando sofremos de incompreensão, não conseguimos perceber o que se está a passar.

É o caso, por exemplo, quando não nos conseguimos lembrar de “certas coisas”, de conteúdos específicos como nomes próprios de alguém ou, quando esquecemos “coisas”, tanto e de tal forma que nem percebemos como ficou “apagado da memória”, obliterado, desaparecido. O paradoxo da lucidez humana é que não podemos equacionar logicamente o que é e o que não é com o que existe e o que não existe ou com o que está presente e o que está ausente. Há coisas que nos escapam, sem dúvida, e não nos apercebemos de que nos escapam, pelo menos durante algum tempo. De outro modo, não falaríamos delas. Aparecem num estádio ulterior da vida e percebemos que estiveram inertes e inactivas num qualquer “lugar” da mente. Mas há situações que estão ausentes como um buraco negro visível, tangível.

A indeterminação determinável de um nome que não nos lembramos ou da presença emocional com que vivemos um momento do passado. Podemos perceber que nos esquecemos do que acontece não apenas quando fazemos a experiência desagradável de não nos lembrarmos de um conteúdo específico. O meu esquecimento do nome de alguém é o esquecimento inequívoco do nome dessa pessoa e não de outra coisa a respeito dela nem do nome próprio de outra pessoa. Mas o que acontece o mais das vezes é que o presente que se activa na actualidade transita para um reino da alma ou do passado, e esta transição é contínua.

A esmagadora maioria dos conteúdos de vida transitam da expectativa mais ou menos activa do futuro para o presente e da vivência mais ou menos atenta do presente para o passado. E no passado moram a esmagadora maioria dos conteúdos vividos, todos os momentos da nossa vida até agora, sem que estejam explicitamente lembrados, em pormenor, isolados uns dos outros, vistos no seu começo, meio e fim.

Se nos perguntarem pela banda sonora das nossas vidas, podemos recordar muitos nomes de canções, mas não nos lembramos da esmagadora maioria, o mesmo se passando para os livros das nossas vidas, pessoas que conhecemos, modulações disposicionais, vivências afectivas, estados emocionais, etc., etc..

A perda de actualidade do presente faz que o passado absorva e sugue todas as nossas vivências e a lupa do presente altamente sensível cria o núcleo duro do sentido e deixa tudo o resto para a sua periferia. Assim é quando há dissociação entre o rosto de alguém, outrora agente do fascínio e encantamento e esse rosto fora do sortilégio e do enfeitiçamento. Pode também acontecer que nos lembremos de todo o sortilégio, feitiço, encantamento e fascinação, mas sem rostos.

É assim que pode surgir toda uma época da vida, décadas até, a primeira juventude de coração selvagem. E, contudo, nem na altura tínhamos qualquer hipótese de percepção de uma presença contínua da vida na dependência e sob presença do fascinante que propulsionava futuro, abertura, possibilidade.

De caminho, há momentos em que nos surpreendemos a ser com o sentido indespedível da actualidade presente. Como foi que a vida veio a dar até esta orla? O que a transformou? Quem eu era e quem eu sou? Vultos do passado ficaram congelados num tempo sem tempo. Aparecem, às vezes, no sonho acordado nas tardes passadas ao largo, como fantasmas que quererão dizer alguma coisa, mas nem sabemos o que por eles sentimos e, por isso, também não percebemos o sentido das suas aparições. Rostos conhecidos e com nomes mas como se fossem completamente desconhecidos.

Uma pessoa é a sua aura afectiva, o halo que descontinua o ambiente específico da nossa vida e o altera, a mudança do clima afetivo em que nos conhecemos. E desconhecemo-nos como se tivéssemos sido vítimas de um ataque de amnésia. Não se trata de um apagamento das memórias de longo prazo, dos seus conteúdos. Na verdade, podemos lembrar-nos de tudo, mas como num sobrevoo em que vemos “assim como ninguém quer a coisa” toda a nossa vida e todos os seus conteúdos, mas como se tivesse acontecido a outro, como se não fosse a nossa vida, como se nós fossemos alheios de nós próprios, sem saber verdadeiramente quem somos.

Podemos perder memória de todos os conteúdos como quem não sabe dar-lhes um nome próprio e, ainda assim, sabemos quem somos.

Saber quem se é, é saber-se como se é, do que se é capaz em situações extremas. É estar exposto à atmosfera rarefeita mas translúcida do sentimento que nos faz sentir ser quem somos. Muitas vezes esse sentimento existencial diz-nos da desorientação e do desnorte, da desistência da espera, de quem não somos quem supostamente éramos para ter sido.

A necessidade de memória não dá a entender apenas a necessidade de recuperar o tempo havido. Sem recuperar o que foi, não há orientação possível para o futuro, para o trânsito. A lembrança do passado traz consigo a possibilidade da abertura ao futuro. A presença do passado ausente erige uma possibilidade onde se pode vir a ser.

A invocação do passado não é uma invocação do conteúdo vivido, do dado auto-biográfico, mas uma edificação do possibilitante, da esperança sóbria que é dada pela onda espontânea que nos sintoniza a nós no nosso tom, onde aparece o que os outros representam para nós e como eles definem as nossas vidas, a nossa disponibilidade para existirmos com eles no espectro disposicional onde a vida aumenta a sua potência, onde há futuro e não apenas a passagem do tempo de quem ficou para morrer.

1 Dez 2017

Consulta pública para Procriação Medicamente Assistida começa segunda-feira

O período de consulta pública da primeira versão da proposta de lei que vai regular a procriação medicamente assistida começa na segunda-feira e decorre até 12 de Janeiro. Para já, apenas o Hospital São Januário está habilitado a fazer estas intervenções. O Hospital Kiang Wu também poderá, em breve, ajudar casais a serem pais

[dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]acau vai passar a ter uma lei que regula a procriação medicamente assistida. Hoje em dia, apenas o Centro Hospitalar Conde de São Januário está habilitado a realizar intervenções como a inseminação artificial e transferência de embriões e gametas. De resto, outros estabelecimentos que pretendam fornecer estes serviço precisam obter a licença dos Serviços de Saúde (SS). Até agora, apenas o Hospital Kiang Wu se candidatou à licença para realizar intervenções de procriação medicamente assistida.

De acordo com Leong Pui San, responsável pelo licenciamento de actividades e profissões privadas de prestação de cuidados de saúde, “em meados de Dezembro será feita uma inspecção ao Hospital Kiang Wu para ver se têm condições para emitirmos a licença”. Um dos requisitos essenciais é a unidade médica ter um bloco operatório.

Para já, a nova lei irá regulamentar quem pode fornecer o serviço e quem o pode receber. Além disso acrescenta dimensão penal às sanções que, pelo enquadramento legal actual, tinham apenas um regime sancionatório administrativo.

Na primeira versão, ainda antes da consulta pública, propõe-se uma pena máxima de oito anos para os casais que recorram a este serviço em circunstâncias irregulares. É de salientar que já existe uma moldura penal para os médicos que pratiquem este tipo de intervenções sem licença.

Para os operacionais das clínicas infractoras, a pena de multa vai até às 80 mil patacas, enquanto para as pessoas colectivas, ou seja, os estabelecimentos, a multa vai até às 120 mil patacas. Além das responsabilidades criminais e sanções administrativas são aplicáveis penas como interdição do exercício da actividade ou proibição e encerramento do estabelecimento.

Solteiras de fora

A ideia da legislação é trazer segurança a este ramo da medicina. Na primeira versão da proposta, apenas estão consagradas como aptas para a procriação medicamente assistida mulheres casadas. Rui Amaral, do departamento jurídico dos SS, explica que para esta determinação foram tidos em consideração os ordenamentos jurídicos vizinhos. Por exemplo, em Hong Kong uma mulher só pode recorrer a estas técnicas se já tiver determinado tempo de casamento. Neste domínio, Leong Pui San, acrescentou ainda que “a orientação da proposta se baseia nos valores éticos e morais da população”.

Este ano foram suspensas sete clínicas, onde se inclui a Taivex-Malo, por suspeitas de terem realizado técnicas de procriação medicamente assistidas sem terem a devida licença dos SS. Foram mesmo detectados anúncios de clínicas que publicitavam a possibilidade de escolha do sexo do bebé, algo que é considerado ilegal na actual proposta de lei, excepto em caso de risco de vida do feto. Alguns destes anúncios pediam preços na ordem das 170 mil patacas. A proposta poderá abrir lugar à própria dissolução das empresas que pratiquem técnicas de procriação medicamente assistida.

Vão igualmente feito um controlo aos fornecedores de gases usados nestes procedimentos, azoto e dióxido de carbono, que têm de informar os SS quando adquirem este tipo de material.

Entre 2002 e 2016 o São Januário realizou 576 ciclos de injecção para promover a fecundação, num universo total de 328 casais. Com a interrupção da prática da fertilização in vitro no centro hospitalar, as filas de espera baixaram de oito meses para três ou quatro meses.

30 Nov 2017

Veículos ligeiros de passageiros podem circular entre Hong Kong, Zhuhai e Macau

Com a entrada em funcionamento da ponte Hong Kong–Zhuhai–Macau, é autorizada a circulação de veículos de passageiros entre as três regiões. Para o efeito, os interessados têm de pedir autorização prévia às autoridades. Quanto aos autocarros, já existem quatro licenças emitidas no território para que façam o transporte inter-regional de passageiros

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Concelho Executivo (CE) aprovou a proposta de lei relativa à alteração ao regulamento dos transportes rodoviários interurbanos de passageiros. O diploma vai permitir o transporte de passageiros em veículos ligeiros a nível inter-regional e a decisão foi pensada tendo em conta as novas condições de circulação com a abertura da ponte Hong Kong–Zhuhai–Macau.

De acordo com o porta-voz do CE, Leong Heng Teng, em conferência de imprensa ontem, com este diploma vão existir dois tipos de serviços: os regulares, assegurados por autocarros e os não regulares, realizados por veículos ligeiros de passageiros e submetidos a marcação prévia. A permissão de veículos ligeiros para transporte de passageiros tem como finalidade “coordenar as necessidades e exigências do trânsito interurbano, com a abertura da ponte Hong Kong-Zhuhai–Macau, e as necessidades vindouras”, disse Leong Heng Teng. 

Via pouco aberta

Já para o director da Direção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT), Lam Hin San, a ideia é “facilitar a mobilidade da população interurbana intrafronteiras”. No entanto, esta circulação não pode ser ilimitada, afirmou. “Com a entrada em funcionamento da ponte Hong Kong–Zhuhai–Macau, temos de fixar limitações através da restrição da circulação dos veículos de passageiros”, referiu o responsável. É por isso que este tipo de serviço fica sujeito a autorização prévia dada pelas autoridades competentes. Para Lam Hin San, permitir uma circulação ilimitada seria “um bocado complicado”.

No que respeita aos transportes colectivos, as operadoras também estão sujeitas, para circular, a uma licença emitida pela DSAT.

Actualmente já existem quatro licenças emitidas para as operadoras de autocarros. Para os veículos ligeiros, e tratando-se de uma medida nova, ainda não existem autorizações dadas nem requeridas.

Complementos à previdência

O CE aprovou ainda o regulamento administrativo relativo às disposições complementares do regime de previdência central não obrigatório. As directrizes entram em vigor a 1 de Janeiro e definem a obrigatoriedade da autorização do Fundo de Segurança Social na constituição e alteração dos planos de previdência feitos por empregadores e titulares das contas.

O mesmo regulamento administrativo prevê ainda que as entidades gestoras de fundos devem disponibilizar a mudança de fundos de pensões e de percentagem de aplicação das contribuições, num mínimo de quatro vezes ao ano. Já o pedido de ajustamento do montante das contribuições pode ser efectuado pelo trabalhador uma vez por ano.

No que respeita à transferências de verbas entre subcontas, a operação passa a ser possível, mas apenas uma vez por ano.

O regulamento administrativo que define apresentação da lista de produtos de tabaco para os lacais de venda no território recebeu também luz verde do CE. A medida insere-se na alteração do regime de prevenção e controlo do tabagismo que entra em vigor mo início do próximo ano.

30 Nov 2017

Funcionamento do Metro vai gerar despesas avultadas

O alerta foi deixado pela deputada Ella Lei: o funcionamento do metro vai gerar despesas avultadas, e não foram planeadas soluções para gerar receitas, como a instalação de lojas ou esplanadas nas diferentes estações

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] funcionamento do metro ligeiro vai gerar grandes despesas devido às operações de manutenção e ao pagamento da mão-de-obra, mas as fontes de receitas vão ser limitadas. O cenário foi traçado por Ella Lei, presidente da Comissão de Acompanhamento para os Assuntos de Terras e Concessões, após uma reunião da comissão, que contou com a presença do secretário para os Transportes e Obras Públicas.

“A despesa do metro vai ser avultada. Vai ter de se fazer sobreviver um grupo alargado de trabalhadores e suportar os elevados custos de operação. Já sabemos que a empresa não vai ter receitas com lojas, esplanadas e cafés. É uma dificuldade que se vai ter de enfrentar”, revelou Ella Lei.

“Não há soluções para gerar mais receitas. As estações não têm espaços para cafés, esplanadas ou lojas, além das áreas para a instalação de bilheteiras e vias de passagem”, acrescentou.

Depois de ter sido identificado o problema, Ella Lei revelou que houve a intenção de construir na Estação Intermodal da Barra um centro comercial com dois andares. No entanto, as limitações de altura, fizeram com que o plano fosse abandonado.

“O secretário explicou que queriam construir um centro comercial na Barra com dois pisos para gerar outras fontes de receita. Mas devido aos constrangimentos de altura não foi possível construir esses pisos”, apontou a deputada.

Metro em Macau sem prioridade

Momentos antes, Raimundo Rosário tinha feito um ponto de situação das obras do metro. Até ao momento foram gastos 9,5 mil milhões de patacas com o troço da Taipa. Esta parte tem um orçamento de 11 mil milhões que, segundo o secretário para os Transportes e Obras Públicas, está a ser cumprido.

No próximo ano, o Governo vai dar início às obras do ramal de ligação da Linha da Taipa com a secção de Seac Pai Vai. Este é um segmento que tem de ficar concluído antes de 2019, para que depois o funcionamento da Linha da Taipa.

Raimundo do Rosário garantiu que os segmento do metro da Península de Macau não vai ser abandonado, mesmo que não seja uma prioridade. Neste momento o foco do Governo passa por aprovar a legislação para a empresa que vai gerir o metro e a nova lei do metro.

“O metro em Macau nunca foi abandonado. Pode é haver diferentes pontos de vistas. Mas foi definido como prioridade ligar a Linha da Taipa à Barra. Mantemos essa intenção e a prova disso é que a obras da Estação da Barra já começaram. Vamos fazendo isto por partes e por troços”, afirmou Raimundo do Rosário.

O secretário admitiu que o traçado de Macau só deverá ficar definido no próximo mandato: “Acho que não vamos ter tempo para fazer muito mais neste mandato”, apontou, sobre a possibilidade de ficar escolhido o traçado de Macau.

30 Nov 2017

Segurança | Política de mega-dados gera preocupações

O secretário para a Segurança Wong Sio Chak disse na Assembleia Legislativa que pretende combater o crime através de um sistema de investigação com recurso a mega-dados. Contudo, o analista Larry So e os deputados José Pereira Coutinho e Sulu Sou temem uma perda da privacidade dos cidadãos

[dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]al o secretário para a Segurança, Wong Sio Chak, anunciou no debate sobre as Linhas de Acção Governativa (LAG) para a sua tutela que pretende criar um sistema de investigação com recurso aos mega-dados, os alertas soaram na cabeça de muitos.

A ideia deixada pelo secretário é que esse sistema passe a ser legislado, para que se faça um melhor combate à prática de crimes como o consumo e tráfico de drogas ou as pensões ilegais. Larry So, analista político, teme que se viole a privacidade das pessoas.

“Tenho reservas em relação a essa forma de pensamento”, disse ao HM. “A privacidade das pessoas tem de ser respeitada e se é para reduzir ou parar o crime há outras formas de o fazer. Por exemplo, com mais polícias nas ruas ou mais formação sobre determinados crimes.” Larry So lembrou que os “grandes olhos” “vão custar muito dinheiro” aos cofres públicos.

“Esta não pode ser uma medida para parar ou reduzir o crime, pois não se consegue eliminar a criminalidade por completo. O secretário não deu respostas em relação à protecção da privacidade das pessoas, mas quando falamos deste sistema isso pode ser um pouco sacrificado”, lembrou.

Laivos orwellianos

Sulu Sou foi um dos deputados que interveio no debate de ontem sobre as LAG para 2018 e não ficou satisfeito com as respostas dadas por Wong Sio Chak.

“Não apenas eu, mas muitos dos cidadãos mostram-se preocupados com a perda de liberdade de expressão. Ele não respondeu directamente às minhas questões e disse que a liberdade de expressão está garantida na lei, mas queria que me explicasse melhor a relação entre a lei e este tipo de liberdade”, apontou.

O deputado receia que em Macau venha a ser implementado um sistema semelhante ao que existe na China, em que plataformas como o Facebook, Instagram ou Whatsapp estão bloqueados.

“Os cidadãos têm receio de que as aplicações de telemóvel passem a não ter autorização de utilização em momentos sensíveis, e que tenhamos de recorrer ao sistema VPN”, acrescentou.

Também o deputado José Pereira Coutinho se revelou preocupado com a implementação de um “Big Brother” no território. “Estamos a caminhar para que haja um Big Brother, um controlo da vida pessoal das pessoas a todos os níveis. Tendo em conta os baixos níveis de criminalidade e o facto do território ser diminuto não há necessidade de fazer isso”, reiterou.

Para Pereira Coutinho, Wong Sio Chak quer “controlar tudo e todos, sobretudo as vozes dissentes na sociedade”. “É a minha percepção quando o vejo a querer implementar a política de mega-dados à força”, rematou.

30 Nov 2017

Fong Fong Guerra: “A vida é para ser recomeçada em Portugal”

A macaense Fong Fong Guerra chegou no passado dia 25 a Lisboa, com o marido Tiago Guerra, depois da fuga de Timor-Leste. O casal, que foi condenado por peculato em Díli, espera agora conseguir que o processo seja transferido para Portugal. Para, acima de tudo, limpar a imagem e reorganizar a vida

 

Como é que está a ser este regresso a Portugal?

Ainda estamos muito emocionados com o facto de, finalmente, estarmos em casa. Voltar a reencontrar a nossa família está a ser muito bom, mas também muito intenso, dadas as circunstâncias que temos vivido. Mas não quero deixar de prestar o nosso agradecimento a quem nos acompanhou nos últimos três anos. Não teríamos sobrevivido sem a amor das pessoas que nos rodeiam. Estamos muito agradecidos ao apoio que recebemos sempre dos nossos familiares e amigos. Pessoalmente, agradeço, em particular, à presença da minha família e amigos de Macau, que, apesar de longe, estiveram sempre ao meu lado, e não posso esquecer a ajuda dos nossos advogados. A equipa que nos tem acompanhado em nossa defesa tem sido incansável e estão a fazer tudo o que podem para que possamos continuar a lutar pela nossa inocência, dentro de um sistema judicial injusto e que tem dado mostras de que não funciona.

Tem sido um problema da justiça de Timor-Leste?

A inoperância e ineficácia do sistema judicial de Timor não é nova. A situação é conhecida pelos próprios líderes do país que reconhecem as suas limitações. Mas, desejamos que esta situação possa vir a melhorar, até porque o nosso caso é apenas um no meio de muitos que estão a ser injustamente tratados. Nós tivemos sorte por termos uma forma de expressar o que nos aconteceu e de dar voz às experiências inacreditáveis por que passámos. Mas, quem lá está, quem é de Timor, não pode fazer o mesmo. A população local, muito provavelmente nem conhece os seus direitos básicos.

O processo continua em Timor. O que pretendem fazer?

Estamos muito agradecidos ao governo português, especialmente pelo que tem feito por nós no último ano. Neste momento, ainda estamos a explorar as possibilidades de conseguir transferir o caso judicial para Portugal para que possamos limpar os nossos nomes. Mas é uma situação que não depende de nós. Para já, a nossa maior prioridade é a de reestabelecer novamente as nossas vidas em Portugal e aproveitar o tempo para podermos estar perto dos nossos filhos e parentes que já sofreram o suficiente.

Como foi a viagem e a estadia na fuga para a Austrália?

Estivemos sempre muito ansiosos e quando ficámos no centro de detenção dos serviços de emigração, em Darwin, a tensão foi sempre muita. Mas as autoridades australianas foram muito simpáticas e contámos com o apoio do cônsul-geral que estava em Sidney e que se deslocou a Darwin para monitorizar a situação. A Austrália é completamente diferente de Timor-Leste em tudo e nos centros de detenção também. As instalações que tínhamos eram eram melhores do que aquelas que tínhamos no apartamento em que estávamos em Díli: tinham camas e ares condicionados melhores, por exemplo. Também fomos o primeiro caso na Austrália de detenção pelas autoridades fronteiriças de alguém que entrou no país para de lá sair o mais rápido possível. 

Como está a ser a reacção, em Portugal, ao vosso regresso?

Os nossos filhos não podiam estar mais felizes. Desde que chegámos que pulam de alegria. Estão extasiados. Agora, temos de, calmamente retomar as nossas rotinas pessoais e familiares em que todos estamos a reaprender a viver, outra vez, juntos.

Quais as vossas expectativas para um futuro próximo?

O que mais queremos neste momento é limpar os nossos nomes e a nossa reputação. Mas, no que diz respeito ao processo legal, trata-se de uma situação que não depende de nós. Temos também, dentro da reorganização das nossas vidas, de encontrar emprego e começar a pagar as nossas dívidas.

Relativamente a um regresso a Macau, equaciona essa possibilidade?

Esse era o nosso grande desejo em 2014 e era o plano que tínhamos para a nossa família quando decidimos ir para Macau. Mas, infelizmente, já não o é agora. Os nossos filhos já se adaptaram a Portugal e seria muito injusto para eles voltar a tirar as crianças de um ambiente a que já se habituaram. Já têm aqui amigos e precisam, acima de tudo, de estabilidade. Nestes últimos anos também se afeiçoaram muito aos avós paternos e no que respeita à língua, já praticamente não falam cantonês. Seria muito cruel para eles. Agora a nossa vida é para ser recomeçada em Portugal.

Mas não sente a falta de Macau?

Sim, sinto muito a falta de Macau. Tenho muitas saudades dos meus pais e espero que os possa visitar o mais cedo possível.

Relativamente à empresa que tinham, pensam voltar a ela?

Quando criámos a empresa, a ideia era que fosse um projecto para nos acompanhar na mudança de vida que estávamos a efectuar com a ida para o território. Mas, com tudo o que se passou em Timor, todos os nossos planos foram mudados e foi tudo muito confuso. O que se passou afectou-nos muito enquanto família, e prejudicou a nossa vida toda, no geral. Tudo mudou. É uma pena, mas agora a empresa não é uma prioridade e não faço ideia do que vamos fazer relativamente a isso. É um assunto que para já está parado e que representa mais uma consequência muito negativa de toda a situação.

 

Saga internacional

Tiago e Fong Fong Guerra são o casal português que, desde 2014, está a braços com um processo judicial em Timor. Acusados de peculato, branqueamento de capitais e falsificação de documentos, o casal acabou por ser condenado pelo colectivo de juízes do Tribunal Distrital de Díli, a oito anos de prisão e ao pagamento de 859 mil dólares no passado mês de Agosto.

Foram acusados de “prejudicar as finanças e a economia do Estado” de Timor-Leste, por alegadamente se terem apropriado de fundos oriundos da indústria petrolífera, que pertencem ao país. A condenação foi apenas pelo crime de peculato, tendo sido absolvidos das restantes acusações.

Os portugueses recorreram da sentença. O argumento utilizado tinha que ver com lacunas no próprio processo. Na altura, Tiago Guerra defendia que o caso padecia “de nulidades insanáveis” comuns em “regimes não democráticos”. Para o português, as provas que sustinham as acusações eram mesmo manipuladas e até proibidas.

Apesar de em Díli terem os passaportes confiscados e estarem sujeitos ao termo de identidade e residência, na semana passada, recuperaram os documentos de viagem. De acordo com o ministro dos Negócios Estrangeiros português a embaixada em Díli respeitou a legislação portuguesa ao atribuir passaportes ao casal.

A caminho da Austrália

De passaportes na mão, Tiago e Fong Fong Guerra fugiram de barco para Darwin, na Austrália, onde foram novamente detidos por não terem autorização de entrada no país. De acordo com Fong Fong Guerra, a ideia era mesmo a de conseguir, a partir da Austrália, regressar a Portugal.

Na sequência da fuga para a Austrália, o chefe da diplomacia portuguesa, Augusto Santos Silva, ordenou a realização de um inquérito urgente à Inspeção Geral Diplomática e Consular, cuja conclusão foi entregue quinta-feira da semana passada.

Independentemente da situação jurídica, Tiago e Fong Fong Guerra, “enquanto cidadãos portugueses têm direito a documentos de identificação como cidadãos portugueses, desde que não violem certas disposições legais”, referiu Santos Silva relativamente ao facto de terem sido renovados também os respectivos cartões de cidadão do casal.

Entretanto, e durante a detenção na Austrália, foi enviado um “pedido internacional de extradição para Portugal com detenção provisória” à Procuradora-Geral da República portuguesa, Joana Marques Vidal, com conhecimento para a ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, e para o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva.

O casal chegou a Lisboa no passado dia 25 e, até agora, de acordo com a ministra da justiça portuguesa, não foi apresentado “qualquer pedido de intervenção”.

30 Nov 2017

Imobiliário | Compensações para compra de casa não vão aquecer mercado

A compensação financeira paga pelo Governo a proprietários de habitações renovadas não significa que vá haver um aquecimento do mercado imobiliário, apesar de haver mais procura. A opinião é do coordenador-adjunto do 1.º Grupo Especializado do Conselho para a Renovação Urbana, Paulo Tse

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] renovação dos prédios antigos e a atribuição de compensações financeiras aos moradores para que adquiram novas fracções no mercado privado não vão fazer com que os preços no mercado privado aumentem. A opinião foi partilhada, ontem, por Paulo Tse, coordenador-adjunto do 1.º Grupo Especializado do Conselho para a Renovação Urbana (CRU) e presidente da Associação de Construtores Civis e Empresas de Fomento Predial.

Segundo a ideia defendida pelo grupo de trabalho, os residentes que optem por ter os prédios onde vivem demolidos e reconstruídos, devem ter o direito a receber uma compensação financeira para comprarem uma nova habitação. Esta é uma opção para complementar o cenário proposto pelo Chefe do Executivo, que passa por realojar as pessoas em habitações temporárias, cedidas pelo Governo, enquanto aguardam o fim das obras.

“Não tenho a certeza que a demolição de edifícios faça com os preços no mercado do imobiliário vão subir. Vai criar mais procura, mas ao mesmo tempo o facto do Governo disponibilizar casas temporárias significa que nem toda a procura entrará no mercado”, disse Paulo Tse, após a última reunião deste ano do CRU.

“Ao fornecer subsídios financeiros, o que talvez vejamos acontecer é que algumas das pessoas, como casais mais velhos, fiquem durante algum tempo com os filhos e filhas. É por isso que queremos ter uma variedade de escolhas para os residentes”, complementou.

O grupo especializado em causa tem como coordenador o empresário ligado ao mercado imobiliário Chan Chak Mo. Paulo Tse é o número dois e actuou como porta-voz devido à ausência do deputado, que estava na Assembleia Legislativa.

Ainda de acordo com Paulo Tse, em 2018 o regime de benefícios ficais para os cidadãos que optem por comprar casas novas deve ser votado na Assembleia Legislativa. Por outro lado, o empresário espera que no próximo ano sejam conhecidos melhor os pormenores do mecanismos de compensação financeira, incluindo o montante do apoio, “quando houver um consenso entre o CRU, Governo e a comunidade”.

Utilização limitada de edifícios

Outro dos assuntos debatidos na reunião do CRU foi a questão da utilização dos edifícios industriais para outros fins, como espectáculos artísticos. A questão é antiga, mas voltou a ser colocada na semana passada, na Assembleia Legislativa, pela deputada Song Pek Kei.

A explicação foi prestada pelo coordenador do 2.º Grupo Especializado do CRU, Paulino Comandante: “segundo o Regulamento de Segurança Contra Incêndios, os prédios com fins industrias são classificados em diferentes classes de risco”, começou por explicar o também advogado.

“Tivemos o cuidado de confirmar junto das autoridades competentes, que estamos no mesmo prédio são incompatíveis actividades de risco médio e alto. Para que um prédio industrial possa ser utilizado para outras finalidade, todos os riscos terão de ser de baixo risco”, complementou.

29 Nov 2017

Sobrinho de Edmund Ho é candidato à Assembleia Popular Nacional

Kevin Ho quer contribuir para a integração do território na Grande Baía e para o bem-estar da população. Ao HM, negou que, caso se sente na Assembleia Popular Nacional, vá representar os interesses de “uma pessoa em particular”

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]ma candidatura para representar a população de Macau e contribuir para o desenvolvimento da Grande Baía. Foi desta forma que Kevin Ho explicou, ao HM, a sua intenção de representar o território na Assembleia Popular Nacional. O acto eleitoral está agendado para 17 de Dezembro e as inscrições terminam a 6 do mesmo mês.

“Primeiro, o objectivo passa por aproximar mais Macau e o desenvolvimento do território do nosso país, especialmente com a iniciativa da Grande Baía. Também queremos defender a forma mais eficaz de nos integrarmos em toda a área e no crescimento desta zona”, afirmou Kevin Ho, cuja candidatura foi revelada pela Rádio Macau.

“Temos de fazer com que Macau contribua para a Grande Baía, não só de uma perspectiva empresarial e de desenvolvimento das empresas locais, mas também focando o bem-estar da população. Temos de fazer os nossos melhores esforços para sermos uma parte da Grande Baía e estarmos bem integrados”, frisou.
A candidatura de Kevin Ho, sobrinho de Edmund Ho, surge após ter sido anunciado que Lionel Leong, actual secretário para a Economia e Finanças, não se recandidataria ao lugar na APN. Leong é tido como uma pessoa muito próxima do anterior Chefe do Executivo.

Contudo, Kevin Ho recusa que a sua candidatura seja de uma fracção ou pessoa. O empresário diz que caso tenha a sorte de ser eleito, que vai estar a representar toda a população de Macau.

“Na Assembleia Popular Nacional vou representar Macau, não é uma pessoa em particular. Se tiver a sorte de ser eleito, vou representar todo o território”, sublinhou. “Se for eleito, vou pedir conselhos a pessoas de diferentes áreas. Claro que os conselhos de Edmund Ho vão ser muito importantes, mas vou pedir conselhos a toda a gente”, acrescentou.

Sobre o processo de candidatura, Kevin clarificou que ainda está a recolher as 10 cartas de nomeação exigidas, pelo que ainda não é um candidato formal. No entanto, mostrou-se confiante no cumprimento dos requisitos.

O candidato Dominic Sio

Outro dos nomes mencionados pela emissora foi o de Dominic Sio, empresário e ex-deputado nomeado pelo Chefe do Executivo, Chui Sai On. O HM contactou Dominic Sio, que se mostrou indisponível para prestar qualquer comentário, por estar ocupado. Porém, não negou a informação.

Na corrida a um lugar na APN estão ainda Ng Su Lai, da União Geral das Associações de Moradores de Macau, e Lai Sai Kei, director da Escola Keang Peng. Si Ka Lon, deputado na Assembleia Legislativa de Macau e Lao Ngai Leong, presidente da Federação Nacional de Chineses Ultramarinos Retornados são igualmente candidatos. Entre as listas com ligações à AL, estão ainda José Chui Sai Peng, primo do Chefe do Executivo, Ho Iat Seng, presidente da AL, e Kou Hoi In, deputado. Wong Ian Man, membro da Comissão Eleitoral do Chefe do Executivo também é candidato.

Quem também deve concorrer para mais um mandato na APN é a advogada Paula Ling e o director do jornal Ou Mun, Lok Po.

No sentido opostos, ou seja de saída a APN, estão Lei Pun Lam, bem como Io Hong Meng, da União Geral da Associação dos Moradores de Macau, e Leong Iok Wa, da Federação da Associação dos Operários de Macau.

No total estão disponíveis 12 lugares.

29 Nov 2017

LAG 2018 | Um muito elogiado Wong Sio Chak pediu legislação para vigilância através de mega-dados

O segundo dia de discussão das Linhas de Acção Governativa da Segurança foi marcado pela troca de elogios entre deputados e o secretário Wong Sio Chak e a aposta na investigação através de mega-dados. As excepções foram Sulu Sou, que questionou a aposta no policiamento tecnológico como um aperto à liberdade de expressão, e Pereira Coutinho. Mak Soi Kun falou como empreiteiro e anunciou que irá acelerar os trabalhos da nova prisão

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] dia dois da Linha de Acção Governativa (LAG) dedicado à Segurança foi marcado pela troca de elogios entre os deputados e Wong Sio Chak e a sua equipa. Durante a sessão discutiu-se o uso de tecnologia para vigiar possíveis crimes, a implementação da vigilância e investigação através da vigilância das comunicações online através da recolha de mega-dados. Porém, a maioria dos deputados não viu grande problema em termos de intromissão na privacidade dos cidadãos.

Porém, cada vez que a maioria dos deputados se dirigiu ao secretário para a Segurança fê-lo tecendo rasgados elogios. Wong Sio Chak referiu que era perceptível que Song Pek Kei acompanhou as diferentes LAG da Segurança, enaltecendo a colaboração das forças policiais com a Associação dos Conterrâneos da Província de Fujian.

O secretário para a Segurança agradeceu ainda os elogios de Wu Chou Kit e reconheceu a “relação de afectividade” com o deputado por ser filho de um agente da Polícia Marítima. “Estou próximo do senhor deputado Wu Chou Kit, mas isso não quer dizer que não esteja próximo dos outros”, referiu o representante do Executivo acerca dos membros do órgão soberano que tem como função fiscalizar o Governo.

No final da sua intervenção, Mak Soi Kun arrancou algumas gargalhadas no plenário alternando o papel de deputado como o de empreiteiro ao afirmar que “vai tentar acelerar as obras” de construção da nova prisão. Importa dizer que a Sociedade de Engenharia Soi Kun tem um contrato para construção assinado com o Governo no valor superior a 1055 milhões de patacas.

Depois de enaltecer “o sucesso à vista de todos da liderança de Wong Sio Chak” à frente da segurança, o deputado Ma Chi Seng questionou o secretário acerca da implementação da vigilância por megadados e CCTV e das suas consequências para a privacidade dos cidadãos e era o erário público. Depoi da pequena ressalva, o deputado desejou que os sistemas sejam implementados o mais rapidamente possível.

À parte as manifestações de agradecimento, Wong Sio Chak pediu a produção urgente de legislação que enquadre a implementação da investigação através do uso de mega-dados para atacar a prática de crimes como consumo e tráfico de drogas, as pensões ilegais. Adiantou ainda que deseja que em 2018 sejam legislado o regime da emigração, a actualização do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança, e a lei de combate aos crimes cibernéticos.

Big Brother

No capítulo da videovigilância, Chan Chak Mo lembrou que o secretário para a Segurança “ficou babado com o sistema videovigilância do Interior da China”, acrescentado que também ficou. O deputado eleito indirectamente revelou dar o seu total apoio à medida por entender que a disseminação das câmaras “contribui para a segurança dos cidadãos”.

Sulu Sou, que mais uma vez falou de pé, trouxe a suspensão da App Telegram em Macau, algo que adjectivou como “esquisito” e a justificação para a qual “muitos cidadãos usam VPN”, um mecanismo que camufla a posição geográfica do utilizador contornando o bloqueio local.

O jovem deputado chegou mesmo a citar George Orwell em inglês, “Big Brother is watching you”, acrescentando que a vigilância integral infringe os direitos e liberdades dos cidadãos.

Sulu Sou perguntou ao secretário da Segurança se a liberdade de comunicação em Macau se vai entrar em erosão gradual. O pró-democrata recordou que na China Continental não se pode aceder a meios de comunicação não certificados pelo Governo Central e que o Google, por exemplo, está bloqueado para os cidadãos chineses.

O deputado questionou ainda qual a opinião de Wong Sio Chak sobre a protecção do sigilo e se seria mesmo necessário “reforçar o controlo e a sociedade sacrificar a sua liberdade”.

Em termos de custos, Sulu Sou comparou os um por cento do PIB chinês investido em segurança, a comparar com os 2,73 por cento de Macau, dado que faz com que o jovem deputado considere que “não faltem recursos” no sector da segurança.

O secretário não entendeu “o que disse o deputado relativamente ao aperto às liberdades de expressão e comunicação”, acrescentando que todos têm direito a expressar-se desde que o faça dentro dos limites legais.

 

Au Kam San critica a proibição de entrada no território a académicos

O deputado pró-democrata trouxe para o debate das Linhas de Acção Governativa da Segurança os casos de proibição de entrada de professores, peritos, jornalistas e até uma criança de um ano. Au Kam San entende que esta não é uma forma de efectivar o projecto da internacionalização de Macau. No entender do deputado, estes são casos de abuso de poder, em que as autoridades seleccionam “personas non gratas”, extravasando os poderes conferidos pela lei. Wong Sio Chak respondeu que “cada região, ou país, tem o poder de salvaguardar a sua segurança”, dando como exemplos os Estados Unidos da América. O secretário para a Segurança acrescentou que as proibições de entrada se fazem de acordo com informações obtidas e que Macau “não barra pessoas de determinada nacionalidade, como os norte-americanos”. Quanto ao bebé proibido de entrar, Wong Sio Chak categorizou o caso como um “lapso que não se vai repetir”.

Agentes infiltrados em Macau não resultam devido a dimensão do território

Segundo a opinião de Wong Sio Chak, o uso de agentes infiltrados não funciona para detectar casos de jogo ilegal, uma vez que Macau é “um território onde tudo é transparente, logo, encobrir a identidade de um agente é muito difícil”. A dimensão da cidade foi a justificação dada pelo secretário para a Segurança para não se usar este tipo de investigação criminal, uma sugestão do deputado Davis Fong. O deputado nomeado sugeriu a medida para dar solução à criminalidade organizada que opera dentro dos casinos. Wong Sio Chak revelou que este método de investigação é mais apropriado para os crimes de tráfico e consumo de drogas, assim como para recolha de provas relativas às práticas criminais de seitas.

29 Nov 2017

Adopção | Os problemas de uma lei que não vai ser revista pelo Governo

Só num dos centros de acolhimento de crianças e jovens estão mais de 80. As famílias à espera de adopção são 70 e apenas uma criança está apta a entrar no processo. Os tribunais só as podem libertar para adopção depois do consentimento parental e a lei não vai ser revista

[dropcap style≠’circle’]V.[/dropcap] tinha cerca de 40 anos quando engravidou. Vivia precariamente e sofria de distúrbios mentais. Não conseguia tomar conta de um bebé, mas aconselhada a ficar com a criança, acabou por levar o filho para casa. Poucos dias depois, a criança foi entregue a um lar de acolhimento de menores para poder ser devidamente cuidada, visto a mãe não o conseguir fazer. Contudo, esta criança nunca foi admitida para adopção.

v. não queria abandonar o filho para ser criado por uma outra família e não podia ser a sua família. A lei de Macau relativa à adopção não permite que uma criança seja adoptada sem a autorização por parte dos pais biológicos nem contempla casos especiais, em que dada a incapacidade parental evidente, possa intervir para que o menor entre em processo de adopção. A criança é agora adolescente e está a terminar o ensino secundário. Nunca teve família e viveu sempre num lar.

H tinha 15 anos quando engravidou. Menor, não podia dar o filho para adopção. Em Macau, apenas as mães a partir de 18 anos podem declarar que querem entregar as crianças. O bebé ficou três anos à guarda dos avós, cresceu e transformou-se num fardo. Foi entregue a um lar. Foi resgatado pela mãe algum tempo mais tarde, mas as prioridades de uma jovem de 18 anos são outras. Voltou a ser entregue aos cuidados de uma instituição. Em Macau, uma mãe menor não tem poder para renunciar à parentalidade.

Jurisprudência, não lei

De acordo com directora do Centro do Bom Pastor, Juliana Devoy, não se trata, aqui, de um condicionamento legal. “A premissa saiu um dia da boca de um juiz que considerou a menor imatura para decidir se queria ficar com o filho e, a partir daí, é tido como um dado adquirido”, disse ao HM.

Independentemente das circunstâncias, são crianças que acabam por passar parte da vida a serem cuidadas por uma instituição e o Instituto de Acção Social (IAS) já reiterou ao HM: “A lei da adopção não vai ser revista”.

Para Juliana Devoy, a manutenção de um sistema, que não delimita tempos de espera para a libertação de crianças para adopção, mostra não se ter como valor o bem maior da criança. O mesmo se aplica à ausência de excepções quando é provada a falta de capacidade parental para cuidar dos filhos. “Quando uma mãe é visivelmente incapaz de cuidar da sua criança, o sistema deveria, desde logo, proteger o menor e encontrar mecanismos para acelerar a integração dessa criança numa nova família”, sublinha a responsável pelo Bom Pastor.

Juliana Devoy, que tem acompanhado mães que muitas vezes ainda não sabem se querem cuidar das crianças, não tem muitas dúvidas. “É urgente ter um regime jurídico capaz de encaminhar os bebés para adopção com a maior rapidez para que as crianças não passem o crescimento institucionalizadas”.

A razão, aponta, é o direito maior da criança a ter direito a uma família.

Além da lei

Mas as mudanças não podem ser apenas legislativas. As mentalidades, os serviços e mesmo os juízes têm de mudar a forma como pensam e actuam. “É preciso educar pais, funcionários e mesmo juízes. O IAS diz que não é do âmbito da sua acção e que a decisão é do juiz, mas isto pode ser mudado. Os juízes precisam de ser educados. Eles não sabem muito acerca de psicologia, mas quem saiba o mínimo, sabe que o período da primeira infância passado sem uma família ou de uma pessoa significativa, vai afectar todo o futuro das relações da criança”, explica Devoy.

A opinião é partilhada por Amélia António. Para a advogada, “o problema maior nem é a lei, são as pessoas e a sua sensibilidade”, algo que vai ter reflexos na forma como a lei é interpretada e praticada.

Tendo em conta o bem maior da criança e o direito a uma família, não há nada que impeça a confiança administrativa de um menor famílias candidatas a adopção enquanto os processos de espera por autorização parental decorrem.

“Uma criança candidata a adopção pode ser confiada com a ressalva de que aquela criança ainda não está com estatuto para poder avançar com o processo”, começa por dizer Amélia António. Mas, o que acontece, explica, é que a lei é interpretada de outra forma e as crianças só são libertadas para adopção depois de todo o processo concluído. Entretanto, vivem institucionalizadas.

“O processo administrativo e judicial pode estar a decorrer paralelamente. As pessoas têm é de estar devidamente esclarecidas. Conheço pessoas que adoptaram sem ter certeza se o processo iria funcionar e o que me diziam era que, enquanto a criança estivesse com elas, estaria a ser bem tratada e em ambiente familiar”, refere.

Para Amélia António, o maior problema tem mesmo que ver com a falta de esclarecimento das pessoas.

Desleixo nos serviços

O advogado Miguel de Senna Fernandes, especialista em Direito da Família, considera que a lei não é má. “As esperas não são uma questão de chatear as pessoas”, diz tendo em conta as 70 famílias que se encontram na lista de espera para adopção em Macau. Para o advogado, “o problema é a necessidade de existir uma actividade investigatória e todo um conjunto de procedimentos a ter em conta. Se aliarmos isto ao factor do desleixo, já é outra história e não é exclusivo no âmbito da adopção”.

No entanto, tratando-se de crianças que, de alguma forma, estão sob os cuidados do Governo, “há que ter todas as cautela, mesmo que este tipo de abordagem possa dar azo a muito papismo”.

Ainda assim, e mesmo em sintonia com a lei, Miguel de Senna Fernandes admite que os tempos indefinidos de espera em instituições “podem realmente não ir de encontro ao bem maior dos menores”.

Para o advogado, há que ter em conta os serviços e a sua pouca eficiência. “Não tem que ver com o regime mas com a forma como está a ser gerido e com a gestão dos serviços”, refere. Má pode ser a gestão dos recursos e o tempo de espera e as razões por esperas tão grandes sem ter que ver com  o próprio procedimento legal. É a este nível que tem de ser feita alguma alteração”, deixa com sugestão.

Discurso oficial

Em Macau há 70 famílias qualificadas para adoptar e à espera de acolher uma criança. Só num dos nove lares que recebem menores estão, neste momento, mais de 80 crianças. No território, apenas um menor está admitido para adopção “porque as autoridades judiciárias decretaram nesse sentido após os pais terem renunciado ao poder parental”, disse o IAS ao HM.

Quanto aos restantes utentes, por falta de renúncia de poder parental por parte dos pais biológicos, “não se encontram em situação susceptível de adopção”, reitera o IAS.

De acordo com o organismo, a colocação num lar de crianças e jovens tem como fim o “assegurar a sua permanência num ambiente seguro e o acesso aos cuidados adequados”, lê-se na resposta dada ao HM pelo organismo quando questionado acerca do assunto.

O IAS vai mais longe. “Em simultâneo, será também definido um projecto de vida em função das suas necessidades com o objectivo de reforçar a sua capacidade de se auto-cuidar ou desenvolver os seus interesses e talentos”, ainda que sem família.

E, nos casos em “que necessitam de ficar em lares durante um período de tempo mais prolongado e não possam regressar à família, o IAS apresenta periodicamente relatórios especiais ao Ministério Público para que as instituições judiciárias possam tomar as devidas providências”, refere o IAS.

 

Faltam leis para proteger os menores

As crianças que se encontram institucionalizadas, muitas vezes durante todo o seu desenvolvimento até atingirem a maioridade, são umas sobreviventes. A ideia foi deixada pelo psicólogo clínico Pedro Senna Fernandes ao HM.

Com experiência a trabalhar com crianças em idade escolar, Pedro Senna Fernandes considera que “Macau peca por não ter uma lei de protecção de crianças e de jovens em risco nem um regime relativo ao acolhimento institucional” o que faz com que “não se consiga apurar quem tem responsabilidades pelos menores que se encontram institucionalizados”, começa por dizer.

O resultado é o que se vê: “Crianças com um percurso saltitante entre aquilo que são os lares de acolhimento e orfanatos, e as próprias famílias”.

A situação tem consequências. Sem vínculos afectivos sólidos, têm elas próprias de arranjar forma de conseguir obter um reconhecimento emocional por parte das pessoas que estão nestes lares e que lidam com dezenas de outros menores, refere. “O que acontece em termos emocionais e comportamentais é que estas crianças começam a ter uma exposição às emoções básicas como a alegria tristeza e raiva, de uma forma muito dura o que faz com que desenvolvam competências emocionais de forma desajustada.”

Processos difíceis

Para Pedro Senna Fernandes a solução passaria além da criação dos regimes em falta, a constituição de equipas técnicas multidisciplinares que avaliassem cada situação em profundidade e apresentassem um relatório a um juiz que decidiria do seu encaminhamento para adopção ou não.

Em Macau o encaminhamento dado para adopção é “tremendamente dificultado”, considera, sendo que os casos que podem seguir para processo são ou de órfãos ou de crianças abandonadas, o que faz com que se mantenham, “num grande limbo, as crianças que continuam a estar nas instituições e a ir a casa, e que, muitas vezes permanecem em lares até aos 18 anos. Chegados à maioridade, saem dos lares e não há nenhum projecto capaz de os acompanhar”, remata.

29 Nov 2017

Cerca de 50 condutores manifestaram-se contra número dois de Mak Soi Kun

Zheng Anting afirmou que empresas locais não conseguiam contratar motoristas, apesar de oferecerem 40 mil patacas por mês, e um grupo de condutores apareceu-lhe no escritório a pedir emprego

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]erca de 50 condutores deslocaram-se, ontem, ao gabinete do deputado Zheng Anting, numa manifestação contra as declarações do membro da Assembleia Legislativa. Na semana passada, durante o debate das Linhas de Acção Governativa para a área da Economia e Finanças, o legislador ligado à Associação dos Conterrâneos de Jiangmen defendeu a abertura da profissão a trabalhadores não-residentes, argumentado que os locais não aceitavam empregos no sector, nem por 40 mil patacas por mês.

Ontem, entre os gritos dos manifestantes, Zheng Anting ouviu insultos e pedidos para que se dedicasse à agricultura, expressão idiomática cantonesa equivalente à reforma. A dimensão da manifestação levou mesmo a que o presidente da Associação Geral dos Empregados do Ramo de Transportes de Macau, Tong Chak Sam, fosse ao local para tentar serenar os ânimos.

“Os motoristas ouviram que o deputado ia estar hoje [ontem] no gabinete e foram procurar um emprego onde pudessem ganhar 40 mil patacas por mês. Foi essa a intenção do protesto”, disse Tong Chak Sam, ao HM.

“Não acreditamos que essas propostas de 40 mil patacas por mês sejam verdade, mas se forem, vou deixar a empresa onde trabalho por essa, que oferece as 40 mil patacas”, acrescentou o presidente da associação local.

Tong Chak Sam sublinhou ainda que as declarações de Zheng Anting foram prestadas com a intenção de fazer com que as empresas possam importar trabalhadores não-residentes, para desempenharem as tarefas de motoristas.

Dito por não dito

Durante o protesto, Zheng Anting abordou a situação perante os jornalistas, ao mesmo tempo que era apupado por alguns condutores. Segundo o canal chinês da Rádio Macau, o número dois de Mak Soi Kun aproveitou a ocasião para sublinhar que não pretendia que as empresas pudessem importar trabalhadores não-residentes. Contudo, na quinta-feira passada, na AL, essa tinha sido uma das hipóteses abordados pelo legislador ligado a Jiangmen.

Zheng Anting deixou também um ataque ao Governo, que acusou de não fazer o suficiente para que trabalhadores e empresas possam ver as suas pretensões satisfeitas.

Finalmente, o deputado prometeu ajudar os 34 motoristas que lhe pediram auxílio a encontrarem um emprego, junto da empresa que alegadamente não conseguiu contratar locais por 40 mil patacas.

Guerra de Associações?

Horas após a iniciativa do grupo de condutores, começou a circular a informação de que a manifestação teria tido o apoio da Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM). Segundo as informações que circularam, os manifestantes teriam feito a concentração junto a um dos escritórios da FAOM, federação à qual a Associação Geral dos Empregados do Ramo de Transportes de Macau também pertence.

No entanto, a deputada ligada à FAOM, Ella Lei, negou esse cenário, frisando que a manifestação partiu dos demonstrantes: “Foi organizada pelos motoristas, de forma espontânea. Como não estive lá também não quero fazer grandes comentários sobre o assunto”, afirmou a deputado, em declarações ao HM.

“Também só tive conhecimentos do protesto através dos motoristas. Segundo percebi, eles é que se organizaram e sabem o que aconteceu”, acrescentou.

A versão da deputada foi apoiada por Tong Chak Sam, que negou ainda que a organização do evento tivesse partido da Associação Geral dos Empregados do Ramo de Transportes de Macau.

“Os motoristas é que se organizaram. A nossa associação teve conhecimento do protesto e decidiu deslocar-se ao local para apelar aos condutores que mantivesse a calma e não estivesse agitados”, afirmou Tong, ao HM.

Zheng Anting foi eleito como número dois da lista de Mak Soi Kun, o grande vencedores das eleições legislativas de Outubro.

28 Nov 2017

LAG 2018 | Nova direcção de protecção civil e tecnologia no debate da Segurança

O primeiro dia da discussão no hemiciclo da Linhas de Acção Governativa para a Segurança foi marcado pela falta de definição da nova Direcção de Protecção Civil e de Coordenação de Contingência. Wong Sio Chak admitiu também o investimento num armazém na China Interior para armazenar material da protecção civil. Paternalista, o secretário ousou criticar a postura de alguns cidadãos quando é içado o sinal 8

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]epois de rasgados elogios de vários deputados à resposta das forças de segurança na resposta dada no socorro prestado às vítimas do tufão Hato, as questões focaram-se na nova Direcção de Protecção Civil e de Coordenação de Contingência (DPCCC). Além disso, o secretário para a Segurança reiterou uma ideia já expressa de alterar a lógica de policiamento na direcção da pro-actividade, da prevenção e da vigilância através de CCTV e mega-dados.

O secretário para a Segurança, Wong Sio Chak, começou por dizer que além do Governo precisar se reajustar e aprender as lições da calamidade, também a população tem de rever a sua postura. “Quando é içado o sinal 8 de tufão as pessoas ficam contentes, porque não têm de ir trabalhar, podem ficar em casa, vão passear e jogar Mahjong”, comentou.

Lam Iok Fong começou por interrogar o representante do Governo como será estabelecido e instalado a nova direcção e quais as funções que terá no futuro. O deputado ainda perguntou ao secretário para a Segurança quais os equipamentos de resgate e salvamento que esta entidade terá a seu cargo. Como alguns parques de estacionamento ficaram alagados, Lam Iok Fong questionou se haveria falta de bombas de água para resolver estes casos.

No que toca a estas questões directas, Wong Sio Chak não revelou muito, mas admitiu que o Hato demonstrou as insuficiências de resposta por parte do Governo, uma posição relativamente consensual na Assembleia Legislativa (AL).

“Em termos de protecção civil, cada organismo está a tratar do seu quintal, sem grande coordenação”, explica do secretário para a Segurança. Wong Sio Chak revela que a DPCCC terá dois departamentos. Um destinado a ser o centro de decisão de acompanhamento da catástrofe e um outro departamento terá como competência a educação e sensibilização dos residentes para prevenir danos maiores. Wong Sio Chak diz que ainda não tem uma ideia da quantidade de pessoal que a criação do novo o DPCCC exigirá.

 

Armazém chinês

Depois de realçar a severidade do Hato, Wong Sio Chak vincou que o mecanismo de responsabilização para má gestão e incompetências nestes casos deixa a desejar. Além disso, a resposta também mereceu largas críticas de todos os quadrantes.

É aí que chega o DPCCC, organismo para o qual o secretário para a Segurança admitiu ter tido a colaboração de um grupo de peritos da China Continental.

As menções ao Interior da China não se ficaram por aqui, tendo sido equacionada a hipótese de localizar um armazém para a protecção civil em solo chinês continental. Wong Sio Chak considera uma boa ideia, apesar de ter revelado que o Corpo de Bombeiros de Macau já arranjou um sítio para apoio logístico nas Ilhas. “Há mercadorias e produtos que temos de armazenar tanto além fronteiras, como em Macau, tem de haver complementaridade entre as duas partes através de um mecanismo de troca de produtos”, explica Wong Sio Chak. A possibilidade deverá entrar no âmbito do projecto de construção da Grande Baía.

 

Sónia Chan já tem na gaveta lei dos crimes cibernéticos

O regime legal que irá reger a criminalidade cibernética já está na mesa da secretária para a Justiça, Sónia Chan. Quem o confirmou foi o Wong Sio Chak, que acrescentou que para “combater a criminalidade informática, para além do agravamento das penas, os crimes foram classificados como semi-públicos”. A distinção possibilita que as autoridades de investigação passem a poder iniciar um processo crime sem necessidade de apresentação de queixa por parte de um lesado.

Angela Leong interrogou ainda o secretário para a Segurança sobre a criação do centro de cibersegurança e quantas pessoas serão recrutadas para trabalhar nesse organismo. Uma pergunta que ficou sem resposta.

Foi ainda perguntado a Wong Sio Chak os contornos da criação da rede de vigilância CCTV, assim como a criação de uma base de dados para identificar criminosos. Neste aspecto, Macau irá passar para a terceira fase de instalação da CCTV, sem haver novidades quanto à velocidade de implementação do sistema.

No capítulo da vigilância através de filmagens, Lam Lon Wai destacou a previsível eficácia da rede, mas deixou um alerta para a possibilidade da instalação de câmaras violar a privacidade das pessoas. Além disso, o deputado é da opinião que o sistema CCTV é muito caro para os cofres públicos.

No que diz respeito à política quadro da “Cidade Segura”, inscrita nas LAG 2018, Wong Sio Chak adianta que ainda é cedo para especificar propostas nesta matéria. O secretário vincou que a sua aposta é “combater as organizações secretas e os crimes graves como homicídios e fogo posto”. Numa nota que motivou alguma perplexidade, Wong Sio Chak mencionou os avanços tecnológicos na área da inteligência artificial e como podem ser aproveitados para atendimento de chamadas telefónicas em casos de emergência.

 

Imigração | Deputados questionam secretário sobre inspecção a ilegais

Ella Lei começou por abordar o aumento do número de trabalhadores em situação de ilegalidade no território. Questão também abordada pela seu companheiro de bancada, Leong Sun Iok. Além disso, a deputada levantou a questão dos trabalhadores não residentes que compram uma quota de Bluecard para entrarem no território.

Foi sugerido, e admitido pelo secretário para a Segurança que podem ter havido fugas de informação antes de fiscalizações a locais de trabalho onde se suspeita que laborem trabalhadores em situação ilegal. Em particular, em estaleiros de obras de construção. Wong Sio Chak foi confrontado com a possibilidade dos números providenciados pelo Governo quanto à imigração ilegal não baterem com a realidade. Leong Sun Iok levantou a possibilidade de “as operações poderem ocorrer também durante as férias de alguns trabalhadores”.

O secretário para a Segurança explicou que com o crescimento económico a entrada no território tornou-se mais apetecível. Neste aspecto, os membros do Governo revelarem que entre Janeiro e Setembro deste ano foram feitas 3529 operações de fiscalização, tendo sido detidos 330 trabalhadores em situação ilegal e movidos processos contra 93 empregadores. Foi ainda revelado que os fiscais não podem levar telemóveis para as operações de fiscalização.

28 Nov 2017

Documento refere que Portugal queria transferir a soberania de Macau só em 2004

Documentos oficiais revelados ontem pelo portal Hong Kong Free Press revelam que Portugal pretendia transferir a soberania de Macau em 2004 e não em 1999. O historiador Jorge Morbey acredita que essa seria uma “vontade pessoal” de Mário Soares, tendo em conta o processo da Fundação Oriente. Carlos Gaspar, ex-assessor de Jorge Sampaio, garante que essas datas “são meras fantasias”. Camões Tam, académico, questionou as fontes de Donald Tsang e David Akers-Jones

[dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]uito antes de se assinar a Declaração Conjunta Sino-Portuguesa, em 1987, Portugal e a China fizeram uma ronda de negociações para decidir as questões relacionadas com Macau. O modo como esse processo decorreu levou o então vice-secretário do governo britânico, Donald Tsang, a discutir o assunto durante um almoço com Barbra Schrage, do consulado-geral dos Estados Unidos em Hong Kong.

Assinado pelo punho de Donald Tsang, ex-secretário das Finanças de Hong Kong, e datado de 1986, o documento que era confidencial fala deste episódio de uma alternativa à data da transferência da soberania de Macau.

“Durante um almoço com Barbra Schrage conversámos sobre Macau. Schrage disse-me que estava entusiasmada pela forma como os portugueses levavam a cabo as negociações com os chineses. Uma curta agenda – a Igreja Católica, o estatuto dos macaenses com passaporte português e a data de 2004 em vez de 1999”, pode ler-se num dos dois documentos ontem divulgados pelo portal de notícias Hong Kong Free Press.

Em Portugal cabem todos

Mas há mais. Segundo a missiva de Tsang, Portugal poderia ter aceite toda a população que Macau tivesse na altura, caso fosse pressionado para tal.

“Os chineses terão, aparentemente, reforçado a sua presença em Macau colocando novas caras na [empresa] Nam Kwong. Schrage também afirmou que os portugueses, caso sejam pressionados, estarão preparados para admitir a totalidade da população de Macau, incluindo os que não são cidadãos portugueses, em Portugal! Não perguntei a Schrage a origem da sua fonte, mas ela falou com convicção”, escreveu Tsang.

A data de 2004 surge num outro documento assinado por David Akers-Jones, governador de Hong Kong entre Dezembro de 1986 e Abril de 1987.

“Uma fonte disse-me que teve um jantar com o presidente Mário Soares e que Portugal mantinha-se firme na data de 2004, tendo frisado as diferenças entre Hong Kong e Macau, nomeadamente quanto à localização dos funcionários públicos”, pode ler-se.

Contudo, as autoridades chinesas mantinham-se firmes na convicção de receber Macau antes de 2000, pois era o ano em que o Grupo de Ligação Sino-Britânico deixaria de operar. “[A China] afirma que seria muito difícil explicar a data de 2004 aos britânicos quando eles foram tão insistentes face a 1997.”

Os documentos foram tornados públicos em Janeiro e Abril deste ano e estão disponíveis nos arquivos nacionais de Londres.

Vontade de Soares?

Contactado pelo HM, o historiador Jorge Morbey considera que a data de 2004 seria uma vontade do próprio presidente da República, Mário Soares. “Não tenho documentação, mas ouvi dizer que a data de 2004 se prende com a vontade pessoal de Mário Soares, [pois este] desejaria que todos os fundos destinados à Fundação Oriente (FO) saíssem de Macau e só depois é que deveria ser feita a transferência de soberania. Parece que houve uma intervenção pública de Mário Soares já depois de deixar a presidência, em que terá explicado isso, mas não assisti”, recordou.

Ainda assim, “o que vislumbro em termos de negociações entre as partes é que a data de 1999 foi marcada de forma consensual entre Portugal e a China”, apontou Jorge Morbey.

Jorge Rangel, presidente do Instituto Internacional de Macau (IIM) e, à data, secretário adjunto da Administração, Educação e Juventude do Governo de Rocha Vieira, afirmou que não confirma nem desmente esta versão dos acontecimentos.

“Não confirmo, não sei, pode ter acontecido”, disse ao HM. “Tivemos 12 anos para fazer uma transição e, evidentemente, com mais tempo algumas das coisas que estavam a ser tratadas poderiam ter tido mais tempo para serem concluídas.”

“O que ficou acordado foi que tínhamos 12 anos e durante esse tempo a transição foi considerada concluída, tivemos de concluir as várias tarefas que tínhamos em curso, como a formação de quadros, os arquivos, a localização de leis”, lembrou.

Rangel acredita que “terão sido abordadas várias datas nas conversas”. “Depois de muitas reuniões decidiu-se que seria no dia 20 de Dezembro de 1999. Não era a questão de Portugal querer uma data e a China querer outra. Esta data resultou de um acordo que foi conseguido no decurso das negociações.”

Carlos Gaspar, assessor do ex-presidente da República Jorge Sampaio, em 1999, garantiu ao HM que as datas citadas nos documentos são “meras fantasias”.

“As indicações contidas nos documentos citados são meras fantasias. Desde o inicio das conversações bilaterais em 1986, Portugal indicou que não aceitava que a transferência de soberania em Macau coincidisse com a data prevista para o fim da administração britânica em Hong Kong. No mesmo sentido, a parte portuguesa conhecia perfeitamente a data do fim do século fixada nos documentos oficiais chineses e não tinha nenhuma ilusão sobre os limites da flexibilidade de Pequim nessa matéria.”

“Pecados originais”

Há muito que a questão dos fundos financeiros entre Macau e Portugal é discutida e foi, aliás, abordada recentemente na biografia de Jorge Sampaio, presidente da República portuguesa em 1999, em que este afirmou estar contra a criação da Fundação Jorge Álvares. Esta acabaria por ser constituída a dias da transição.

Jorge Morbey recorda que “em matéria de fundações, quer a FO, quer a Fundação Jorge Álvares têm pecados originais muito graves”. “Julgo que quando se mete na política interesses de grupos ou negócios as coisas não podem ficar certas. O aparecimento da FO foi algo que perturbou bastante as relações entre Portugal e a China. Na visita que Mário Soares fez à China, nos anos 90, a China não aceitava que o presidente da FO [Carlos Monjardino] fosse na comitiva.”

Contudo, Monjardino acabou por embarcar no avião. “Não sei que voltas houve na altura, tenho ideia que o embaixador de Portugal em Pequim se terá portado muito mal nos diálogos que teve com a parte chinesa.”

Para o historiador, a dar aulas na Universidade de Ciências e Tecnologia de Macau, o processo de entrega de Macau à China “não é coisa de que Portugal se deva orgulhar muito”.

“Foi a sabedoria milenar da China que nos levou a portarmo-nos bem na questão da transferência de soberania de Macau, embora tenham sido criadas fundações de uma forma menos ortodoxa”, defendeu.

“Feitas as contas, e a esta distância, não valeu a pena esse grão de areia nas relações entre Portugal e a China, tendo em conta aquilo que a FO fez e faz por Macau. Também me parece que houve uma certa imprudência na criação da Fundação Jorge Álvares, a dias de Portugal transferir a soberania”, acrescentou o académico.

A visão de Camões Tam

Em declarações ao Hong Kong Free Press, o académico Camões Tam, que escreveu a sua tese de doutoramento sobre a transição de Macau, disse que Portugal apenas levantou a possibilidade da transferência se fazer em 2007, “uma vez que se celebravam o 450º aniversário da presença portuguesa”, lê-se na notícia.

“Desde [as negociações de 1986] até 1987, quando a Declaração Conjunta foi assinada, as informações relativas a Macau ficaram seladas…esta informação tornada pública pode não ser válida, uma vez que não é informação em primeira mão”, apontou.

Camões Tam lembrou que os funcionários do consulado-geral dos Estados Unidos em Hong Kong não dominavam o português nem o cantonês, o que os pode ter levado a erradas interpretações. “Donald Tsang pode ter citado fontes de forma incorrecta, e David Akers-Jones pode ter ouvido mal”, rematou.

As várias datas

Além de 2007, terão sido discutidas várias outras possibilidades. Camões Tam referiu ao Hong Kong Free Press que os chineses queriam que a transição de Macau se fizesse em 1997, tal como Hong Kong, mas os portugueses recusaram.

“Portugal disse que nunca invadiu a China, que pagaram uma renda anual e que tentaram devolver Macau duas vezes mas que nunca foi aceite. Eles teriam devolvido a soberania de Macau logo em 1985, quando as negociações começaram, mas isso assustou o lado dos chineses”, explicou Tam.

Morbey recorda que o presidente da República Ramalho Eanes, numa visita à China nesse ano, terá lançado os dados mais depressa do que os chineses esperavam. “A China contava que, no seu devido tempo, iriam colocar a questão de Macau na agenda para ser negociada.”

Camões Tam adiantou também que Portugal tentou devolver o território em 1975 e 1977, após a revolução do 25 de Abril, uma tese também defendida por Jorge Morbey. O que falhou? A existência de quezílias políticas.

“É preciso ter em conta de que o Partido Comunista Português (PCP) era de obediência soviética, e o comunismo chinês era alérgico ao comunismo soviético do tempo de Estaline. A última coisa que o Partido Comunista Chinês queria para Macau era negociar com o PCP. Isso complicava bastante o programa do doutor Cunhal”, concluiu Morbey.

Num país que, após o 25 de Abril, “parecia um manicómio sem psiquiatras”, as colónias portuguesas, como Cabo Verde, Angola ou Guiné-Bissau “foram sendo entregues aos partidos apoiados pela URSS”. Em Macau, assinou-se o Estatuto Orgânico, ainda o Conselho da Revolução governava em Portugal, e prolongou-se a transição. “Garcia Leandro fez o que pôde para equilibrar a situação em Macau. Esse estatuto foi o empenho de Garcia Leandro.”

Finalmente, a cerimónia de transferência de soberania de Macau realizou-se no dia do último solstício do milénio. Se é que isso quer dizer alguma coisa.

Notícia actualizada em relação à versão impressa: inserção do comentário de Carlos Gaspar, que respondeu ao HM depois do fecho da edição

28 Nov 2017

Tiago e Fong Fong Guerra chegaram a Lisboa

Os portugueses Tiago e Fong Fong Guerra, que fugiram para a Austrália depois de condenados por peculato em Timor-Leste, chegaram no passado sábado a Lisboa, onde foram recebidos por uma dúzia de familiares, mas escusaram-se a falar aos jornalistas. Afirmando não ter problemas em falar à comunicação social, Tiago Guerra disse que não o faria naquele momento no aeroporto.

[dropcap style≠’circle’]À[/dropcap] chegada ao aeroporto Humberto Delgado (Lisboa), este sábado de manhã, o casal foi recebido com emoção por alguns familiares, incluindo os dois filhos, que estão à guarda dos avôs paternos e que não abraçavam os pais há três anos.

Tiago Guerra escusou-se a falar aos jornalistas, posição também pelo pai, Carlos Guerra, que, ainda assim, não escondeu a emoção do reencontro, vivido entre família e “dois ou três amigos chegados”. “Está tudo bem. (O Tiago) Chegou bem. Está felicíssimo. Isto é um Natal antecipado. É dia 25”, desabafou, aliviado. “Basta olhar para a cara dos filhos, dos meus netos”, continuou.

O casal foi detido na semana passada, em Darwin (Austrália), onde entrou ilegalmente de barco, no início do mês, com passaportes portugueses. Os Guerra pediram a extradição para Portugal, tendo o requerimento, que visava o accionamento da convenção existente entre Portugal e Austrália, dado entrada na Procuradoria-Geral da República dia 17 de Novembro.

Dois dias depois, os pais de Tiago, responsáveis pela petição que solicitava a extradição do casal e que foi entregue no Parlamento, foram recebidos pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, de acordo com informação disponível no site da instituição.

Tensão diplomática

A fuga do casal casou tensão diplomática entre Portugal e Timor-Leste, com o assunto a suscitar críticas de dirigentes políticos e da sociedade civil, com artigos a exigir investigações à embaixada de Portugal em Díli.

Na semana passada, o ministro dos Negócios Estrangeiros português, Augusto Santos Silva, garantiu que a embaixada em Díli respeitou a legislação portuguesa ao atribuir passaportes ao casal. Na sequência da fuga para a Austrália, Augusto Santos Silva ordenou a realização de um inquérito urgente à Inspecção Geral Diplomática e Consular, cuja conclusão foi entregue esta quinta-feira.

O casal Guerra renovou os respectivos cartões de cidadão no início deste ano e, mais recentemente, foram emitidos passaportes portugueses, o que motivou críticas na imprensa timorense. “Os cidadãos portugueses têm direito a documentos de identificação como cidadãos portugueses, independentemente da sua situação jurídica, desde que não violem certas disposições legais. Neste caso, não houve essa violação, segundo o inquérito a que procedemos, a legislação portuguesa aplicável foi cumprida e, portanto, os passaportes foram atribuídos, no cumprimento da lei”, referiu então Santos Silva.

Tiago e Fong Fong Guerra tinham sido condenados em Agosto por um colectivo de juízes do Tribunal Distrital de Díli a oito anos de prisão efectiva e a uma indemnização de 859 mil dólares por peculato (uso fraudulento de dinheiros públicos).

Os portugueses recorreram da sentença, considerando que esta padecia “de nulidades insanáveis” mais comuns em “regimes não democráticos”, baseando-se em provas manipuladas e até proibidas.

Um “pedido internacional de extradição para Portugal com detenção provisória” foi enviado à Procuradora-Geral da República portuguesa, Joana Marques Vidal, com conhecimento para a ministra da Justiça, Francisca Van-Dúnem, e para o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, segundo uma carta do advogado do casal à qual a Lusa teve acesso.

Álvaro Rodrigues confiante

O advogado do casal Guerra disse ao HM estar confiante num resultado favorável a Tiago e Fong Fong. “Estou confiante num bom resultado. Achei e continuo a achar que eles estão inocentes e aguardo uma decisão favorável da parte do tribunal de recurso de Timor.”

Apesar do recurso à sentença que condenou o casal já ter sido entregue em Díli, Álvaro Rodrigues não sabe a data da próxima sessão de julgamento.

“O recurso já deu entrada na Comarca de Díli, o Ministério Público timorense já respondeu ao recurso e penso até que já subiu para o tribunal de recurso”, acrescentou o advogado que afasta qualquer ilegalidade na concessão dos novos passaportes e cartões de cidadão a Tiago e Fong Fong Guerra, como tem sido afirmado pelas autoridades timorenses.

“Qualquer cidadão português tem direito a ver renovado o seu passaporte e cartão de cidadão. Julgo eu que a embaixada de Portugal em Díli fez [o que estava correcto]”, apontou.

O casal já está em Lisboa graças a um pedido de extradição apresentado por Portugal junto das autoridades australianas. O casal Guerra havia chegado a Darwin de forma ilegal, o que “motivou uma detenção por parte do Governo australiano”. “Em virtude dessa detenção que Portugal requereu a extradição e mais nada, e isso não tem nada a ver com o processo final”, rematou Álvaro Rodrigues.

Ana Gomes está contra a extradição

A eurodeputada Ana Gomes escreveu às autoridades australianas objectando à extradição para Timor do casal português que fugiu para a Austrália após condenação pela justiça timorense, por o crime que lhes é imputado não ter fundamento. “Tendo ontem [segunda-feira] sabido que eles estavam detidos na Austrália e que, possivelmente, iria haver – como se confirmou – um mandado de captura e eventualmente um pedido de extradição por parte de Timor, e tendo lido as leis australianas em matéria de extradição, vi que é possível serem levantadas objecções à extradição”, disse Ana Gomes à agência Lusa.

“Portanto, escrevi às autoridades australianas – ao Procurador-Geral e ao ministro da Justiça – dizendo que tendo acompanhado o processo desde Maio de 2015 e sendo, de resto, uma velha amiga de Timor, estou disponível para ser ouvida e apresentar toda a informação que tenho sobre o caso, para o efeito de ser levantada uma objecção à extradição e para que eles possam ser repatriados para Portugal”, relatou Ana Gomes.

Frisando que tomou esta iniciativa por estar “convencida da inocência deles e de que estão a ser vítimas de um erro de Justiça”, a antiga embaixadora de Portugal na Indonésia, uma observadora atenta da realidade de Timor-Leste, explicou que esse erro decorre das “dificuldades e incapacidades do próprio sistema timorense”, que é “um sistema judicial novo e pouco experiente”.

“Como conheço peças do processo, sei que as acusações não são minimamente consistentes: peculato é um crime de que só podem ser acusados funcionários do Estado timorense, ora, não é o caso. Só esse simples facto é, do meu ponto de vista, demonstrativo de que as acusações não têm fundamento e de que a sentença não tem fundamento, e compreendendo eu as debilidades do sistema judicial timorense e estando absolutamente convencida da inocência deles, acho que é minha obrigação ajudar quem está a ser vítima de uma grande injustiça”.

Ana Gomes vincou que, da mesma maneira em que o fez “em relação a muitos timorenses”, também o faz “em relação a estes dois nacionais portugueses, sem dúvida nenhuma”.

27 Nov 2017

Governo reconhece ser incapaz de regular imobiliário

Lionel Leong levou à Assembleia Legislativa o discurso da economia livre no mercado da habitação e da regulação dos preços, que no seu entender, tem de passar por um maior equilíbrio entre a procura e a oferta

 

[dropcap style≠‘circle’]L[/dropcap]ionel Leong afirmou que há pouco que o Governo possa fazer para controlar as condições do mercado do imobiliário, perante a falta de oferta de novas habitações. A confissão foi feita no segundo dia das Linhas de Acção Governativa para a Economia e Finanças, na sexta-feira, após uma questão do deputado Ho Ion Sang.

“Temos alguns meios administrativos para definir medidas relevantes para o mercado da habitação. Mas sabemos que Macau é um mercado livre e dependemos muito da oferta e da procura. Se não temos uma oferta suficiente é difícil implementar medidas de controlo dos preços, porque mais tarde ou mais cedo o preço vai adaptar-se e vai aumentar”, explicou o secretário.

Antes de chegar a esta conclusão, Lionel Leong admitiu que houve uma visita por parte das autoridades locais às regiões vizinhas. Porém, o secretário não revelou as áreas visitadas nem se as deslocações incluíram Hong Kong.

“Fomos às regiões vizinhas, e chegámos à conclusão que só com oferta suficiente é que vamos controlar os preços [do imobiliário]. Por outro lado, se tentarmos controlar os preços quando não há oferta suficiente, os preços vão acabar por se ajustar, sem haver controlo”, apontou.

 

Candidato sem soluções

O mesmo assunto foi abordada pelos deputados Sulu Sou e Agnes Lam. A legisladora questionou mesmo Lionel Leong sobre as razões que justificam o facto do Governo ser incapaz de fazer um estudo para saber quantas fracções estão desocupadas actualmente desocupadas.

A resposta chegou por via do Director dos Serviços de Finanças, Stephen Iong Kong Leong, que argumentou com as dificuldades em contabilizar as fracções que não estão ocupadas.

“A criação deste imposto para fracções não ocupadas pode fazer com que estas fracções entrem no mercado de arrendamento. Mas a questão reside em saber como uma fracção pode ser considerada devoluta. Será através do consumo de água e electricidade?”, disse o director.

“Poderá haver o risco das pessoas utilizarem manobras fraudulentas para fugirem a esta situação”, apontou.

Por sua vez, Sulu Sou questionou o secretário sobre quando vai ser apresentada uma solução para o problema da habitação em Macau. O pró-democrata aproveitou ainda para criticar o secretário para os Transportes e Obras Públicas Raimundo do Rosário.

“Espero sempre a apresentação de medidas eficazes para o controlo dos preços dos imobiliário. Se perguntarmos ao secretário [Raimundo] Rosário, ele também diz que não é possível melhorar a situação. Não sei se vai concorrer no futuro para o cargo de Chefe do Executivo, mas gostaria de saber qual é o seu plano para a resolução do problema”, apontou.

“Mas se ainda está a estudar a questão, até quando é que vai continuar a precisar de estudar o problema da habitação? Precisamos de ter este problema resolvido”, acrescentou.

O secretário deixou Sulu Sou sem resposta.

27 Nov 2017

Budistas e taoístas repreendidos por práticas comerciais excessivas

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s templos budistas e taoístas em toda a China receberam instruções governamentais para que não procurem obter lucros em nome da religião. A Administração Estatal de Assuntos Religiosos (AEAR), o Departamento de Comunicação do Comité Central do Partido Comunista da China (PCC), o Gabinete do Grupo Dirigente Central para Assuntos de Ciberespaço e o Ministério da Segurança Pública, e outros 9 departamentos emitiram conjuntamente uma directriz para regular as actividades comerciais nos templos budistas e taoístas.

O documento recorda a estes centros a sua natureza de organizações não lucrativas e proíbe que organizações e indivíduos obtenham lucros pelas suas actividades religiosas.

Embora se permite aos templos dedicar-se a actividades comerciais, como a publicação de livros ou a venda de objectos religiosos e produtos artísticos, este tipo de actividades devem ter como objectivo a manutenção e a operação dos templos ou programas de caridade, destaca um comunicado da AEAR.

As actividades comerciais dos templos budistas estão destinadas à promoção do budismo da forma adequada e não a procurar lucros, assinalou o Mestre Xuecheng, presidente da Associação de Budismo da China.

Li Guangfu, presidente da Associação do Taoísmo da China, esteve de acordo com este comentário e acrescentou que é importante que os templos delimitem claramente as práticas comerciais necessárias da busca de lucros.

A AEAR decidiu fortalecer a supervisão sobre a administração financeira dos templos e pediu-lhes que adoptem os mesmos sistemas de finanças, impostos, administração de activos e contabilidade como as instituições não religiosas.

Os templos devem registar-se nas autoridades tributárias e informar das suas receitas e gastos segundo a lei. Será introduzido um supervisor, que vigiará as operações financeiras e a doação de fundos dos templos, e será publicada a informação relevante.

O governo também regulará a promoção online da religião. Organizações e indivíduos que queiram proporcionar serviços de informação religiosa online devem apresentar um pedido aos departamentos provinciais de assuntos religiosos, conforme ao documento.

A directriz também pede às autoridades locais para refrear a procura de benefícios em nome da religião. Locais de turismo conhecidos pelo significado religioso são proibidos de cobrar taxas de entrada, e os governos locais são impedidos de estabelecer grandes ídolos religiosos não necessários e de construir templos em locais não religiosos para atrair turistas.

O governo perseguirá organizações e indivíduos que empregam falsos monges budistas ou taoístas e realizam cultos ilegais para obter doações ou encorajar gasto irracional em cultos religiosos.

27 Nov 2017