Mais de uma centena abusam de auto-silos

No primeiro semestre do ano de 2016 registaram-se cerca de 167 casos do estacionamento abusivo de veículos em parques de estacionamento públicos. Os dados são fornecidos pela Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT), que esclarece que o período de estacionamento permitido nos parques públicos é de oito dias consecutivos. Se excedido, os veículos podem ser sujeitos à aplicação de multa ou mesmo ser considerados como abandonados e submetidos aos serviços financeiros de modo a serem vendidos em hasta pública.
  

18 Jul 2016

IPIM reaproveita projectos para a Ilha da Montanha

O Conselho de Gestão da Nova Zona da Ilha da Montanha voltou a solicitar ao Governo de Macau a recomendação de projectos de investimento para a nova zona Industrial da Ilha da Montanha, um segundo pedido desde 2013. O Governo assegura que vai ter em conta os projectos submetidos anteriormente que não foram selecionados.
A Comissão de Apreciação dos Projectos de Investimento de Macau no Âmbito do Desenvolvimento da Ilha da Montanha decidiu recomendar projectos que fazem parte de um lote de 87 propostas apresentadas em 2013, entre aquelas que não foram selecionadas no primeiro grupo recomendado pelo Governo. A iniciativa é justificada tendo por base a avaliação feita em 2014 e no facto destes investidores terem já efectuado o esforço de elaborar um plano de negócios. Aquando da decisão de recomendar o primeiro grupo de 33 projectos, em 2014, a Comissão de Apreciação não colocou de parte a possibilidade de recomendar mais projectos para o Parque Industrial.
No seguimento desta decisão, o Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM) efectuou um questionário para se inteirar das intenções dos investidores que tinham apresentado propostas em 2013, no sentido de preparar uma nova lista de projectos a ser recomendada.

18 Jul 2016

S. Tomé | Um país em busca de estabilidade em altura de eleições

O próximo domingo é a data marcada para as eleições presidenciais de S. Tomé e Príncipe. Os cerca de 111 mil eleitores irão eleger o representante de Estado. Na corrida estão cinco candidatos para presidir um arquipélago com sonhos ainda por realizar

[dropcap style=’circle’]E[/dropcap]ste domingo, 17 de Julho, S. Tomé e Príncipe vai às urnas eleger o Presidente da República para os próximos cinco anos. Um país pouco badalado e que tem no sonho do petróleo uma esperança para ultrapassar a pobreza que o caracteriza. Ao mesmo tempo, anseia por uma estabilidade que passe da aparência à realidade interna.
Com 41 anos de independência face ao colonialismo português, os candidatos ao Palácio do Povo são cinco, na sua maioria com historial político no país para que “as pessoas votem em quem conhecem”. Esta é, pelo menos, a afirmação de Manuel Pinto da Costa ao Deutsche Welle (DW).

Os candidatos

Herói da independência, Manuel Pinto da Costa é novamente candidato. Foi um dos membros fundadores do Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe (MLSTP) e também do comité de libertação do país que o antecedeu, o Comité de Libertação de São Tomé e Príncipe. O MLSTP assumiu o poder após a independência das ilhas em 1975 e Manuel Pinto da Costa instaurou então o regime de partido único, tendo o seu mandato terminado em 1991. Em 2011 volta a ser eleito presidente em segunda volta eleitoral, contra Evaristo de Carvalho.
Evaristo de Carvalho volta à carga nestas eleições. Apoiado pela Acção Democrática Independente (ADI), partido no poder em São Tomé e Príncipe, o candidato argumenta, acima de tudo, a estabilidade interna, estando o poder na sua totalidade entregue a um mesmo partido.
Será “um presidente diferente porque irá cumprir escrupulosamente as regras da Constituição”, afirma no lançamento da candidatura em citação no DW.
A antiga Primeira-Ministra, Maria das Neves, actual vice-presidente da Assembleia Nacional, é outra das candidatas. Concorre com apoio do seu partido, o Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe – Partido Social Democrata (MLSTP-PSD), o maior partido da oposição e do Movimento Democrático Força da Mudança (MDFM/PL). É a segunda vez que a economista tenta chegar ao Palácio do Povo , tendo já estado à frente do governo.
Maria das Neves é uma Primeira-Ministra que deixa o poder em 2004. A demissão coincide com um processo de corrupção de que era alvo. As suspeitas estavam relacionadas com o desvio de fundos do Gabinete de Gestão das Ajudas (GGA) de São Tomé e Príncipe, ligado ao Ministério do Comércio e da Indústria, na sequência de uma auditoria relativa à actividade deste gabinete entre 2001 e 2003. Maria das Neves foi considerada inocente. Agora, a candidata aponta a necessidade premente da luta contra a pobreza. “Não posso deixar de manifestar a minha indignação perante um país com tanta potencialidade, mas com um nível de pobreza tão exagerado”, afirma ao DW.
Mais discretos são os candidatos Manuel do Rosário e Hélder Barros. O primeiro é professor do ensino básico e foca a atenção no cumprimento constitucional do país, sendo que considera a sua candidatura “divina”.
O segundo encerra a lista. Radicado em Portugal, o antigo alto funcionário da Organização das Nações Unidas (ONU) tenta chegar ao Palácio do Povo pela segunda vez consecutiva, depois de ter concorrido nas eleições de 2011 enquanto independente.
“Já chega dos conflitos que têm prevalecido ao longo destas décadas de independência”, afirma o candidato em citação na DW. “Se conseguirmos ultrapassar essas divergências, que acho secundárias, então iremos todos juntos, numa só frente para, de facto, atacarmos os problemas que são reais e que são problemas de todos, os problemas de sub-desenvolvimento”, remata.
Na linha do Equador
S. Tomé e Príncipe é o arquipélago verde situado na linha do Equador ao largo do Golfo da Guiné. Um país menos falado do que os colegas africanos, pautado por dificuldades económicas e ainda com um longo caminho a percorrer no que respeita à estabilidade política interna.
Histórica e economicamente, o sector da agricultura tem sido predominantemente a fonte de desenvolvimento, segundo dados do Banco Mundial. As exportações de cacau, café e óleo de palma são produtos de crescente exportação que, no entanto, ainda não são suficientes para compensar as também crescentes importações. Sendo o turismo de extrema importância na economia local, ainda não é suficiente para suportar um desejado crescimento económico de um país que depende da ajuda internacional. Este auxílio está avaliado em 80%.

Petróleo prometido

As suspeitas relativas à existência de petróleo ao largo de S. Tomé já movem forças e entidades. Visto como uma possível alavanca económica de um país que sofre de escassez em todos os sentidos, a possibilidade de explorar petróleo, e assim conseguir uma fonte de rendimento e uma maior atenção internacional, é algo inevitável.
A portuguesa Galp e a norte-americana Kosmos Energy têm planeado para Janeiro do próximo ano uma pesquisa sísmica conjunta de prospecção de petróleo em três blocos da Zona Económica Exclusiva (ZEE) de São Tomé e Príncipe. O anúncio foi feito pelo director da Agência Nacional de Petróleo, Orlando Sousa Pontes, durante a apresentação pública do estudo de impacto ambiental elaborado conjuntamente pela Kosmos Energy e publicada no Jornal Económico no passado mês de Abril.
“A pesquisa sísmica em 3D está prevista para começar no início de Janeiro de 2017, com duração prevista para seis meses”, disse Sousa Pontes, sublinhando que “a área abrangida pela operação 3D é de 12.799 quilómetros quadrados”.
Sem avançar com as estimativas do custo, Sousa Pontes disse que a área da operação dista 50 quilómetros do arquipélago são-tomense.
Se o tempo parece próximo para alguns, já a ex-Ministra da Economia Cristina Dias vê esta exploração com cautela. Para Cristina Dias, “só lá para 2021 é que poderá haver exploração de petróleo e se os preços não continuarem a baixar”, afirma na publicação Odisseia dos Mares. Por outro lado, e dada a distância do “sonho prometido”, a responsável considera que o país deveria continuar a apostar seriamente no turismo qualificado e na exploração agrícola de produtos da terra. Por outro lado, lamenta que as novas gerações estejam a começar a optar pelo consumo de produtos importados e a deixar para trás o que se faz nas ilhas verdes.

Nem um barril

A expectativa do ouro preto já traz capitais para S. Tomé desde 2014. Na zona de desenvolvimento conjunto de S. Tomé e Nigéria, onde se perspectiva haver petróleo e gás, os lucros são repartidos, com 40% para S. Tome e 60% para a Nigéria. No total, a zona ocupa uma área de 34.500 quilómetros quadrados em águas profundas e tem nove blocos petrolíferos delimitados. Até agora ainda não se produziu um único barril de petróleo, mas, só com os contratos assinados com as empresas petrolíferas até agora, o Governo são-tomense já ganhou fundos.
Ao todo, e segundo Luís dos Prazeres, presidente da Autoridade Conjunta São Tomé e Príncipe – Nigéria, “o Estado são-tomense já encaixou cerca de 77,8 milhões de dólares” através das receitas de “bónus de assinatura” na realização de duas rondas de licitação dos blocos petrolíferos, em que foram assinados cinco contratos de partilha de produção”, como indica a publicação DW.

Do outro lado do sonho

Mas a pobreza é ainda uma constante no país. O Banco Mundial alerta e as roças são disso prova. As grandes plantações de outrora foram abandonadas aquando da independência e são agora reutilizadas. É nas roças que vivem muitas das famílias são-tomenses já sem as condições que um dia tiveram.
Segundo reportagem do jornal Observador, é nestes espaços partilhados que se escondem vidas de pobreza que se repetem de geração em geração. Uma herança de falta, distante dos centros urbanos do arquipélago, em que a vida quotidiana é cheia de estratégias e truques para enganar a fome.
“Às vezes passam dois a quatro dias sem fazer jantar em minha casa. No dia em que não se tem nada, passo fome sim”, conta Domingas, uma habitante da Roça de S. Agostinho. Começou a ajudar nos trabalhos de campo aos dez anos: “partia cacau, fazia capinação, ajudava a abrir valas para a água e a colocar adubos”. Agora o cacau é cada vez menos e Domingas também planta o milho que a filha Marlinda leva ao mercado da capital. As viagens ao mercado têm que ser bem calculadas porque não há dinheiro para fazer muitas. “E se a fome aperta o que é a gente vai fazer?”

S. Tomé do lado de cá

António Costa, Presidente da Associação de São-Tomenses e Amigos de São Tomé e Príncipe Macau-China e representante da comunidade na RAEM, prefere “não tomar partido por nenhum dos candidatos”, como diz ao HM. O argumento é que, acima de tudo, estes “defendam o país, independentemente do candidato ou da cor política que representam” e “desde que legitimamente eleitos”. É seu desejo que o próximo responsável do Palácio do Povo venha a servir da melhor maneira o arquipélago.
Para António Costa “a estabilidade interna ainda não existe, mesmo passados 40 anos da conquista da independência”.
O desentendimento entre os partidos do governo e da presidência são a fonte desta meta inalcançada, ressalvando que a distância da terra mãe não permite verificar a veracidade da situação. Na perspectiva de que a cor do governo passe a ser também a da presidência, António Costa considera que poderia ser um “motivo de estabilidade”, enquanto lamenta a inexistência de uma acção concreta materializada “num plano bem definido, transparente e com uma execução clara para que possa ser visível a todos”.
Mas, para a conquista da estabilidade há muito ainda a fazer, afirma o representante de S. Tomé na RAEM. No país, o problema é antigo e prende-se não só com questões políticas como, e essencialmente, por “rivalidades pessoais entre alguns dos elementos que participaram no processo de independência”. São estas tricas de foro pessoal que “têm contribuído negativamente para o desenvolvimento do país”.
Por outro lado, diz, também é sabido o pouco investimento que S. Tomé recebe. Muitos dos projectos que avançam não vêem a luz do dia, sendo “por vezes iniciados, mas raramente continuados e ainda mais escassamente terminados”.

Eleições sem programa

Para António Costa, a incapacidade de avanço para um desenvolvimento real vai desde a “má preparação dos locais, à falta de lucidez de quem gere o projecto” . “O compadrio” também é o modus operandi que vai “dominando as políticas são-tomenses e que acaba por boicotar o bom andamento do país”, justifica.
Outro aspecto a ter em conta para o líder associativo é a falta de cultura democrática, sendo que o trabalho para o seu desenvolvimento cabe à Educação como “bandeira de qualquer governo de S. Tomé e Príncipe”. Prova disso são as recentes eleições.
“Não há uma discussão de um programa eleitoral para as eleições que aí vêm”, afirma, “dando a sensação que presidenciais e legislativas se confundem”. Fala-se da pobreza e das crianças e outros “discursos bonitos”, mais ligados à acção governativa, quando “o que deveria constar do programa eleitoral seria uma discussão dos problemas prementes que o país atravessa”, opina António Costa, dizendo que é ainda necessário que os programas apresentam diferenças ideológicas, pois neste momento falam quase todos do mesmo.
Mas, eleições são também sinónimo de esperança e, para António Costa, S. Tomé tem tido alguns desenvolvimentos: “foram feitas algumas escolas, expandiu-se o ensino primário e secundário” ao longo dos diferentes governos e apesar das dificuldades. Um desenvolvimento que “sabe a pouco” tendo em conta que se passaram quatro décadas.
“A democracia não se faz com uma declaração solene, é preciso ser praticada, cultivada, trabalhada e aplicada por todos e o exemplo deveria vir de cima pela acção dos dirigentes”, diz o responsável, que ainda não vê um país a trabalhar com clareza e honestidade. À espera de domingo estão cerca de 111 mil eleitores.

15 Jul 2016

Lançado concurso para desenhar prémio do Festival de Cinema

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]troféu “Prémio do Público” do primeiro Festival Internacional de Cinema de Macau, a decorrer entre 8 e 13 de Dezembro, será uma criação local. O desafio é lançado aos criadores locais para que apresentem um projecto para “a taça” que galardoará um dos 12 selecionados para a competição para melhor filme eleito pelo público.

Os projectos candidatos serão submetidos à avaliação de um júri criteriosamente escolhido. Ao presidente Dante Ferretti, director artístico três vezes galardoado com o Óscar, junta-se um conjunto de nomes locais conhecidos pelo trabalho realizado em diferentes áreas. São eles: Chui Sai Peng, Buddy Lam, Carlos Marreiros, Ho Ka Long, Lok Hei, Pedro Ip, Si Ka Lon e Terry Sio.

O concurso está aberto a todos os artistas residentes em Macau e as inscrições terminam a 9 de Setembro, sendo que não há qualquer restrição relativa a formas, materiais ou tamanho do troféu. O vencedor do concurso terá como prémio o montante de 50 mil patacas e as inscrições podem ser feitas no site do Festival.

Equipa conhecida

Foi ainda dada a conhecer a equipa de curadores que irá acompanhar Marco Muller na organização deste primeiro Festival Internacional de Cinema. A notícia é adianta pelo Hollywood Reporter e citada no Ponto Final.
Da equipa que levará a cabo a programação e curadoria do festival constam nomes conhecidos pela experiência no sucesso de eventos idênticos: Deepti D´Cunha, Shan Dongbong, Marie-Pierre Duhamel, Sandra Hebron, Diego Lerer, Tomita Mikiko e Alena Shumakova.

Marco Muller afirma ainda na mesma publicação estar “especialmente feliz por reunir mais uma vez com a equipa que tanto contribuiu para a criação de um programa tão diverso e atraente para os festivais de Veneza e de Roma. E que ajudou a trazer tantas estreias internacionais a Pequim e a Fuzhou”.  À equipa junta-se ainda uma veterana da indústria cinematográfica asiática, Lorna Tee, a quem caberá assumir a direcção da gestão do festival. Nomes que também fazem parte deste festival são ainda Huang Jianxin, realizador chinês, Oh Jung-wan, produtor coreano ou ainda o produtor e guionista norte-americano James Schamus e o português Luís Urbano.

15 Jul 2016

AFA | Kay Zhang apresenta exposição para além da inocência

A primeira exposição a solo da jovem artista Kay Zhang é uma compilação visual de trabalhos que desafiam o tabu sexual. Uma exploração desenhada e colada sobre corpos e desejo, de uma artista que desafia a própria pureza da arte

[dropcap style=’circle’]P[/dropcap]ara lá dos limites da inocência e num pensar sobre ela e a sua antítese é a “tela” que dá corpo ao trabalho de Kay Zhang. A 1 de Agosto às 18h30 está marcada a abertura da exposição “INNOCENCEPEDIA”, que concretiza a primeira mostra individual da jovem artista chinesa.
O evento terá lugar na Art for All Society (AFA) e traz à luz do dia o conjunto de trabalhos que marcam a estreia, a solo, da mestranda da Academia de Belas Artes de Pequim. Aluna de Xu Bing, um dos nomes que marcam o cenário artístico chinês contemporâneo pela sua linguagem criativa ligada à tipografia, Kay Zhang traz a Macau “INNOCENCEPEDIA”. 15716P10T1
A exposição aborda o sexo. Palavra associada muitas vezes a tabu, ao proibido que não se fala, à pornografia ou obscenidade. Assunto inerente à essência humana e a um conjunto de curiosidades partilhadas por muitos, como relembra a AFA. A exploração da componente sexual também se reflecte na arte, sendo muitas das vezes representada através da exploração da nudez. Para Zhang, a expressão do sexo e do desejo é inevitável.
A artista recorre também ao nu, mas numa combinação de técnicas e materiais que no seu conjunto denomina de artigos visuais. Estamos perante uma enciclopédia imagética que pretende, por vontade da artista, deixar a questão da pureza artística… ou a falta dela.
Nascida em 1991, Zhang estudou pintura a óleo no Instituto de Belas artes de Sichuan em 2009. Esteve em Braunschweig, sendo que continuou, de regresso à China, os estudos na área da arte experimental. Actualmente a sua pesquisa e trabalho estão voltados para a arte contemporânea. Do seu leque de interesses contam o uso de diferentes meios e técnicas para abordar os assuntos que mais lhe interessam. Já viu o seu trabalho em diversas exposição na China continental e até na Suécia.
A exposição na RAEM é o resultado de uma bolsa de estudo que a artista recebeu por parte da AFA para desenvolver trabalho na Academia de Belas Artes de Pequim. Os 33 trabalhos que vão ser apresentados combinam desenho e colagem, fruto dessa aprendizagem, avança uma responsável do AFA ao HM. A exposição está patente até 21 de Agosto e conta com entrada livre.

15 Jul 2016

Fotógrafa capta imagens proibidas na Coreia do Norte

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]fruto proibido é o mais apetecido, já diz o ditado, e um território hostil torna-se facilmente apetecível a profissionais de várias áreas, nomeadamente da fotografia. Foi o que aconteceu com Nathalie Daoust, fotógrafa e cineasta canadiana, autora de “Sonhos Coreanos”, um projecto que capta imagens proibidas na Coreia do Norte. Apesar das limitações, a artista não baixou os braços. Sempre vigiada e em áreas permitidas, Nathalie foi mais além e arriscou a recolha de imagens inéditas e interditas.
As dificuldade em viajar na no reino de Kim Jong-un são mais que muitas. Do preço à dificuldade em chegar ao país, à vigilância extrema e manipulação dos visitantes, conhecer o coração da Coreia do Norte é impossível. Ali, só se vê o que é autorizado e só se fica nos hotéis aprovados. Só se fotografa sob vigilância, enquanto que as aldeias onde vive grande número da população com salários de cerca de um dólar mensal, ou os campos de concentração do tamanho de cidades onde estão encarceradas três gerações por crimes, não fazem parte do roteiro nem da permissão.
“Tive que viajar através da China como uma turista”, diz Nathalie Daoust em entrevista à revista Another. “Depois de uma excursão de pesquisa, organizei uma segunda viagem” ao país onde não são permitidos fotógrafos alheios à Associated Press. 14716P9T2
Esta segunda incursão por terras de Kim Jong-un já foi feita especialmente para capturar imagens. Utilizou um passaporte que não era o seu, colocou a câmara à altura da barriga e um disparador remoto escondido debaixo do braço e fez-se à aventura. Ficou hospedada num pequeno hotel que mais parecia um “motel de estrada” e, apesar da sua estadia ser constantemente vigiada, com câmara analógica e disparador imperceptível estava aberto o caminho para conseguir imagens inéditas.
A utilização do sistema analógico terá sido fundamental. “Acho que eles pensaram que seria uma amadora porque não usava uma câmara digital”, admite. A verificação que se faz aquando da captura de imagens “do querido líder” – para que nenhuma apresente cabeça ou pés cortado – também aqui não era possível, o que conferia à fotógrafa uma maior liberdade.
O resultado é perturbador. Num misto de fotografia artística que roça as imagens eróticas do início do séc. passado, em tons sépia quase fantasmagóricos, Nathalie Daoust apresenta uma Coreia à vista de todos mas com o peso de realidade.
São imagens à altura das entranhas, que convidam a quem as observa a uma imersão e consciencialização do que se passa naquele país, sendo que é este agora o objectivo da autora.
Nathalie Daoust adianta ainda que passou “grande parte da carreira a explorar o mundo quimérico e fantasioso” de desejos e impulsos ocultos que estão na base dos sonhos e condutas de cada um e que os levam a ultrapassar os limites do convencional. Na Coreia, a exploração foi direcionada aos instintos de fuga, não como escolha individual, mas como modo de vida de quem é aglutinado pela nação. “Uma nação irreal” e produto de reinterpretações e ditames do poder.
Agora, é objectivo do trabalho alertar todos para uma maior consciência do que ali se vive. Num país que obedece ao culto da personalidade de Kim Jong-Un, num regime opressivo, o projecto “Sonhos Coreanos” é um grito de esperança e alerta para que os governos de todo o lado sejam capazes de “impulsionar a mudança eficaz neste país”, refere Daoust na mesma entrevista.

14 Jul 2016

Eventos MICE agradam a gregos e troianos

[dropcap]O[/dropcap] recente investimento na realização de eventos que contribuem para o desenvolvimento da indústria das convenções e exposições (MICE, na sigla inglesa) tem-se revelado do agrado não só das organizações de grande envergadura, como das pequenas e médias empresas que confirmam um aumento de receitas aquando das iniciativas. É o que diz um comunicado de imprensa do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento (IPIM), onde é possível verificar que Macau já pode ser considerada a “primeira escolha pelos responsáveis que escolhem o território para o seu evento”.

Robin Lee, Director da Jeunesse Greater China, explica que a cidade goza de uma localização privilegiada, complementada por excelentes infra-estruturas e instalações especializadas para a realização de convenções e exposições. A empresa planeia organizar encontros internos quatro vezes por ano, cada um com cerca de 12 mil participantes e Macau surge como a primeira escolha para a realização deste tipo de eventos.

As pequenas e médias empresas também dão aval a estes eventos, visto que o aumento de visitantes contribui para o desenvolvimento da economia comunitária local, indica o IPIM, que assegura que vários proprietários de estabelecimentos comerciais situados na Rua do Cunha consideram que a realização de eventos de grande dimensão no Cotai impulsiona o número de visitantes na zona, o que contribui para um aumento de mais de 10% nas receitas diárias.

14 Jul 2016

Hotel Estoril em curta clandestina

O Hotel Estoril e os seus dias contados não são alheios à vizinha Hong Kong. Num momento em que se aguarda a demolição do edifício, a equipa Hong Kong Urban Exploratio (Urbex) entrou porta adentro para mostrar ao mundo um dos marcos da arquitectura moderna do território.
A informação, adiantada pelo jornal Ponto Final, dá a conhecer os jovens que formam parelha e entraram nas instalações de cara tapada, lanterna e câmara em punho. São anónimos que exploram os restos de uma história que não querem deixar de contar. O resultado é uma curta-metragem de seu nome “The condemned casino”.
A película começa com as ruas de Macau e a entrada furtiva dos intervenientes. À medida que se aventuram no edifício devoluto, vão contando a sua história, retomando o tempo que que o Estoril era a coqueluche de uma Macau que já não existe. “Foi umas das melhores atracções turísticas no seu tempo, com muitos visitantes a virem de Hong Kong”, ilustram.
Por entre destroços alternados com a natureza que invade o espaço, os Urbex passam por quartos, ora interessantes, ora assustadores, reencontram restos do que foram cerimónias religiosas e estátuas de deuses chineses, casas de banho em cacos e um sem número de destroços que em breve ficarão para sempre esquecidos.
A curta-metragem é um caminho de cinco minutos, inacessível. Saem tão clandestinamente como entraram, a trepar o muro que lhes serviu de acesso.
Os Urbex são um grupo da cidade vizinha que se dedica à exploração clandestina de espaços abandonados para que estes não sejam esquecidos.

14 Jul 2016

Equipa da UM pioneira na descoberta de efeitos de artemísia

[dropcap style=’circle’]U[/dropcap]ma equipa de investigação da Universidade de Macau (UM) é pioneira na descoberta dos efeitos da artemísia contra danos induzidos por stress oxidativo e identifica ainda o mecanismos de acção desta planta. O resultado foi anunciado em comunicado de imprensa, que congratula a equipa liderada por Zheng Wenhua e que saiu da Faculdade de Faculdade de Ciências da Saúde da UM.
O estudo constitui o primeiro relatório mundial sobre o efeito neuroprotector da artemísia e confere à planta um forte potencial de aplicação clínica, nomeadamente no que respeita ao tratamento de distúrbios do sistema nervoso central, adianta a UM. O desenvolvimento de medicamentos nesta área tem tido um crescimento significativo devido aos fenómenos recentes de envelhecimento populacional e incidência de doenças neurodegenerativas. um_UM
A maioria dos projectos, porém, terão ficado pelo caminho dada a dificuldade em ultrapassar a barreira sangue-cérebro sem efeitos secundários insuportáveis. As propriedades anti-malária da planta forma alvo do prémio Nobel da Medicina em 2015, pelos estudos conduzidos por Tu Youyou, sendo agora aprovada enquanto medicamento com a capacidade de transpor a barreira hemato-cefálica sem consequências graves.
A propriedade neuroprotectora da artemísia abre um novo capítulo na pesquisa farmacológica deste composto sendo que, para Zheng Wenhua, o caminho a trilhar ainda é de muito trabalho para que se possam efectivamente proceder a aplicações clínicas.
As descobertas foram publicadas nas revistas da especialidade Free Radical Biology and Medicine e Redox Biology, sendo que ambas as publicações lideram a credibilidade na pesquisa de radicais livres, endocrinologia e metabolismo, remata a UM.

14 Jul 2016

Creative Macau | Fotógrafos apresentam livro que junta música, poesia e fotografia

É um projecto experimental que chega agora ao público. Rusty Fox e Chong Hoi, artistas locais, apresentam o livro “BRutAL”, que junta artes numa composição improvável

[dropcap style=’circle’]”[/dropcap]BRutAL” dá nome ao livro recentemente publicado pelos criativos locais Chong Hoi e Rusty Fox. Este é um foto-livro experimental, que concretiza um projecto que junta o design, a música electrónica e a poesia à fotografia. Vai ser apresentado na Creative Macau, a 21 de Julho, pelas 18h30.
O projecto começou com o uso de uma fábula oriental de modo a representar um sentimento distópico do mundo. Segundo a organização, é um livro que retrata a complexidade de sentimentos que fazem parte da RAEM, um dia pertença portuguesa. É ainda uma abordagem contemporânea dos problemas emergentes globais, tais como a crise económica, a inflação e as questões sociais que de alguma forma afectam o quotidiano de todos.
“Há de alguma forma, receio de fazer parte da cauda da cadeia alimentar dentro desta sociedade capitalista”, afirma a organização em comunicado de imprensa.
Chong Hoi é pós graduado em Design Gráfico pelo Instituto Politécnico de Macau. Depois de alguns anos em Xangai, onde aprofundou carreira na área da publicidade e tem trabalho feito nas áreas de fotografia, literatura, música electrónica e arte de rua, regressa a Macau. Actualmente trabalha como designer no Museu de Arte de Macau, enquanto participa na realização de filmes documentais. livro brutal
O artista vê cada projecto criativo como uma oportunidade de crescer e promover o design de Macau ao nível da classe mundial, insistindo em obras únicas capazes de comunicar com os outros. Para Chong Hoi, a fotografia é um meio e uma técnica de ver o mundo, sendo que considera este conceito como “além da criação”. Através das técnicas de composição e das faculdades oferecidas pelos equipamentos, o “verdadeiro espírito de fotografia é o de sentir o mundo através dos sentidos”, afirma o artista.
Já Wang Lap Wong, conhecido artisticamente por Rusty Fox, sempre teve como preocupação os equilíbrios e desequilíbrios da cidade dentro da dinâmica dos seres que a habitam e que influenciam a própria percepção do conceito. Para o artista, “a maioria das pessoas anda como máquinas, dormentes e sem alma”. Neste contexto, a fotografia documental não tem limites, sendo que o seu trabalho pretende permitir ao público entender a relação, muitas vezes escondida, entre homens e os seres inanimados que os rodeiam. Tudo para que possa ter noção do extraordinário que existe na normalidade. Rusty Fox nasceu em Macau e é mestrado em Fotografia Documental pela University of South Wales.
O evento marcado para a semana conta com a presença dos autores, que vão explicar como o projecto nasceu e cresceu. A entrada é livre.

14 Jul 2016

Aperfeiçoamento contínuo | Tribunal dá razão à DSEJ

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] tribunal deu razão à Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ) relativamente a um processo levantado por um Centro de Educação a quem foi rejeitada a participação no Programa de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento Contínuo, que confere aos cidadãos de Macau o direito a um subsídio aplicado em formação.
O Tribunal de Segunda Instância dá razão à direcção, depois de ter sido detectado que alguns alunos não assistiam aos cursos organizados pelo referido centro. Com a suspeita de que haveria violação da lei, a DSEJ denunciou o caso à Polícia Judiciária (PJ). Em Março de 2014, a PJ remeteu o processo ao Ministério Público visto os responsáveis do Centro de Educação serem também suspeitos da prática dos crimes de burla e de falsificação de documentos.
Em Abril de 2014, o centro educativo requereu, de novo, à DSEJ a participação no Programa de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento Contínuo 2014 a 2016, mas esta decidiu indeferir o pedido tendo em conta as infracções verificadas e pelo mesmo se encontrar sob investigação. O caso foi alvo de recurso, que chegou ao Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura. Por rejeição deste, o caso arrastou-se, então, até ao TSI.
Segundo o acórdão deste tribunal, durante a investigação do caso, verificou-se que o centro educativo em causa recebeu os subsídios atribuídos pelo Governo a alunos que não compareceram às aulas e inscreveu pessoas que não tinham vontade de frequentar cursos. Os recorrentes não contestaram ou negaram os factos de que foram acusados.

13 Jul 2016

Lax Café | Nicole Helm, gerente: “Sem bom café não se faz uma casa”

“Lax” surge da palavra “relax”. O “Lax Café” é um espaço de comes e bebes com uma pequena esplanada que se especializou no café de qualidade e dá as boas-vindas aos animais

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] “Lax Café” existe há cerca de quatro anos na Rua de Bragança na Taipa. A ideia para um espaço acolhedor por dentro, e que oferece uma pequena esplanada, surgiu da oportunidade. Nicole Helm, proprietária e gerente do café, procurava um sítio para investir quando o então estabelecimento que ocupava aquele espaço foi posto à venda. “O meu marido perguntou-me e porque não aproveitar?”. Meio a medo, avançou.
Com a mudança de proprietário foi tempo de mudar os ares. “Mudei tudo aqui, fiz uma espécie de limpeza ao espaço”, frisa. Os trabalhos não se ficaram por aí e são “um processo que se vem mantendo ao longo do tempo”, acrescenta.
Outra lufada de ar fresco foi dada também ao menu, de modo a que se tornasse exequível e apelativo a um público generalizado. “A forma como está organizado reflecte a preocupação de que todos o entendam.”
Cada sugestão é acompanhada por uma imagem ilustrativa de forma a que, independentemente da origem, o cliente possa saber o que está efectivamente a escolher. A opção tem em conta “a crescente multiculturalidade local”. Por outro lado a escolha é feita conforme o que Nicole gosta.
“Não posso ter no menu coisas que não goste, não faria sentido”, refere, dizendo que, como cartão de visita, escolhe o hambúrguer australiano, uma criação do seu marido.
Por outro lado não deixa de frisar os ovos beneditinos como uma das escolhas que sempre marcaram a diferença na casa pela “sua concepção cuidadosa”. Apesar de ser um prato capaz de ser encontrado “em qualquer lado, aqui é especialmente bom”, garante, falando de uma ementa que vai de pequenos almoços a refeições e snacks com destaque ainda para as sobremesas “caseiras”. “O Lax oferece repasto para todos os gostos.”
Outra grande aposta foi o café, sendo que “sem um bom café não se faz uma casa que se chama de tal”, afirma Nicole sem hesitação. “Não sou propriamente uma apreciadora, mas passei três meses em formação intensiva para que esta casa possa ter um café de qualidade e feito como deve ser”, sublinha.
Por outro lado, o “Lax” aposta na diversidade desta bebida, não querendo igualar-se a estabelecimentos do género que só se baseiam numa marca ou num tipo de café. A proprietária aprendeu a degustar e a diferenciar várias origens e várias formas de se fazer café, para diferenciar o estabelecimento que gere, sendo que considera que “é uma forma de atrair os clientes e de convidar a um regresso”.

Bicharada bem-vinda

À porta do “Lax” encontrámos um letreiro a dar as boas-vindas a animais de estimação. Esta é, sem dúvida, uma das características que distingue este café na Taipa. Inserido na família, Nicole não vê porque é que as pessoas não devam ir aos sítios que gostam com os seus companheiros de quatro patas. A iniciativa, apesar de por vezes não agradar a todos, tem surtido efeito positivo na clientela em geral.
“Quando um cliente não deseja que o cão da mesa vizinha esteja por perto, até podemos perguntar educadamente aos donos se se incomodam de ir para a esplanada. No entanto, se estes não quiserem, ficam cá dentro com os animais”, afirma a gerente , sendo que “faz parte da política da casa e é uma iniciativa que criou” por também lhe agradar. “São parte da família e portanto devem estar com ela.”
É inevitável ainda perceber que cada refeição é acompanhada por uma escolha cuidada de modo a criar um ambiente confortável. “Escolho a playlist e trabalho para que possa encontrar a música que mais se enquadra neste tipo e estabelecimento”, refere Nicole com satisfação. “Não é possível agradar a todos mas é com entusiasmo que a grande maioria aprecia o que se ouve aqui”, assegura.

Trabalhos sem limites

O balanço deste quatro anos de existência é no geral muito positivo, sendo que a proprietária considera que a marca “Lax” está já positivamente afirmada no mercado local. “É um sítio onde as pessoas se encontram, entram, compram qualquer coisa de que mais gostam e ficam um pouco a usufruir do espaço.”
Se há três anos o “”Lax tinha um público composto “apenas por ocidentais”, agora as cadeiras são ocupadas por gente de todo o lado. Para o futuro, o trabalho “não tem limites”.
“Penso que continuarei a trabalhar numa melhoria permanente, não quero fazer um franchising do Lax Café, prefiro que este seja efectivamente um sítio popular em Macau. Fico muito feliz quando vejo o regresso de clientes”, remata a proprietária.

13 Jul 2016

Caminho das Hortas | Dois prédios vão nascer no sítio onde todos querem ficar

O Caminho das Hortas é o um dos poucos lugares que sobreviveu à urbanização da ilha da Taipa. Ali moram pessoas em barracas com parcas condições de higiene e habitação, mas nem isso faz com que desejem sair de um lugar que sentem como seu. Sabem que vão ser construídos dois prédios e que um dia terão de encontrar uma nova casa, mas é ali que encontram a felicidade

[dropcap styl≠’circle’]D[/dropcap]entro dos painéis de zinco forrados a plástico e madeira habitam pessoas que desde sempre só conheceram aquele lugar e aquela casa. No Caminho das Hortas, logo à entrada da ilha da Taipa e no meio dos muros de betão, persiste uma quase aldeia que parou no tempo. As barracas continuam a existir, sem saneamento básico nem condições mínimas de habitação, mas nem por isso as pessoas querem sair daquele lugar pautado pela pobreza. Ainda assim, o tempo marca a hora e também ali o betão vai passar a existir. Em dois terrenos vão nascer dois edifícios com 90 metros de altura. Os projectos são privados e estão neste momento a ser analisados pelo Conselho do Planeamento Urbanístico (CPU).
Todos os dias Alessandra faz aquele caminho de terra batida. Tem a sorte de viver num apartamento localizado bem à entrada do Caminho das Hortas. O vai e vem para ir levar e buscar os filhos à escola faz com que o seu olhar se cruze com os dos moradores chineses.
“Gosto de viver aqui, é tranquilo, calmo, ninguém mexe com ninguém. Mesmo que eu não fale Chinês eles cumprimentam”, disse ao HM. Alessandra desconhece os planos que estão pensados para aquele local, mas não tem dúvidas: com certeza que um dia também aquele local vai ser destruído. caminho_2_sofiamota
“Aqui em Macau tudo se destrói para construir casinos, hotéis e prédios altos. Não queria que isto fosse destruído porque tem muita área verde, até para respirarmos um pouco, temos de manter este pulmão de Macau que é cada vez menor”, diz ao HM.
Se por debaixo do zinco moram pessoas sem nada, que caminham quase por cima dos esgotos e que têm as cozinhas na rua, a verdade é que há famílias que moram em barracas com um pouco mais de condições e exibem o carro que possuem à porta. “O Governo poderia fazer algo por estas famílias, mas provavelmente vai fazer o que faz sempre, que é colocá-las nestes prédios de habitação pública e construir algo aqui”, aponta Alessandra.

O sítio que os viu nascer

Min sai da garagem da barraca que habita com a sua família e já sabe que um dia vai ter de sair dali, mas não vê como pode vencer o braço de ferro com os construtores. Nasceu ali e ali viveu toda a vida. “Os meus avós já aqui moravam”, relembra, e agora divide o lar com os pais e a irmã mais velha. Tem a vida folgada e afirma que se ali mora é por opção. “Não preciso de viver aqui, mas prefiro este sítio”, confessa.
É uma casa de família de quem não conhece outra. Tem um lugar de garagem e Min encara quase com indiferença a mudança nesta terra que está em constante mutação. “Gosto de viver aqui. Mas teremos que procurar outro lugar.” Não sabe ainda onde, nem quando, e aguarda o desenvolvimento do processo “com alguma preocupação”.
Wu, outro residente que ali nasceu diz que “aqui vivem pessoas com poucas posses.” Enquanto fuma um cigarro à porta na entrada do bairro diz ao HM que considera ainda que, por parte do Governo, deve vir uma ajuda. caminho_9_sofiamota
“Não precisamos de ajuda monetária”, afirma, mas sim “de um lugar para viver e acho que o Governo deveria arranjar um apartamento para nós”. Não deixa de referir que considera que as casas normalmente arranjadas pelo Governo “são pequenas para as famílias que ali vivem, sendo que se juntam várias gerações”. Não obstante o tamanho, Wu refere a existência de uma cozinha nos apartamentos, “o que é bom”.
Já para Lang, uma residente com cerca de 30 anos, é precisamente a cozinha que representa a mais valia daquela localização. A sua situa-se na rua, à entrada do quarto de dormir e único também. Lang nasceu e vive ali com o marido. Tem uma vida despreocupada e, apesar de saber do destino do lugar que a sua casa ocupa, não parece ter grandes preocupações. Na perspectiva de mudar para uma casa num prédio, engelha o nariz.
“São casas muito pequenas”, afirma, “com muito pouco espaço”. Lang vive da confecção de petiscos e é a cozinha que mais a preocupa. Ali tem uma placa de fogão improvisada numa banca de madeira ao ar livre em frente ao quarto onde mora.
“Cozinho aqui ao ar livre, o que é bom”, continua, justificando que gosta “de uma cozinha assim”, enquanto aponta com entusiasmo e orgulho para a panela ao lume e a panóplia de tachos e pratos que se acumulam na pequena bancada que é também o seu ganha pão. “Se for para uma dessas casas do Governo não tenho uma cozinha arejada e é tudo muito pequeno. Gosto assim como está”, remata com um sorriso.
Para Lang este lugar é um pouco melhor que “esses prédios altos” dos quais os moradores “não gostam”.
O corredor comum continua beco dentro em direcção ao interior da cozinha-sala-despensa de Hua. A vizinha partilha da opinião daqueles que por sempre ali viveram. Nasceu ali, mas para ela uma das razões fundamentais para lá querer permanecer é mesmo o facto de não gastar dinheiro em rendas.
“Ganhamos muito pouco e aqui também gastamos muito pouco”, afirma. “Pessoas com dinheiro vivem em sítios bons, nós não o temos e temos que viver aqui”, continua, com um sorriso de satisfação. “Eu gosto mesmo é de viver aqui.”
Na perspectiva de ter efectivamente que mudar, Hua tenciona ir procurar uma casa “nova” sendo que “gostaria que fosse semelhante àquela em que habita agora”. Ao mesmo tempo acha que o Governo “não os pode ajudar”.
A preocupação não se sente no bairro. É antes substituída por um certo conformismo, mais ou menos triste, ditado pelo destino. caminho_7_sofiamota
Para nenhum dos moradores a falta de saneamento parece representar um problema maior, sendo que casas de banho são lugares por ali desconhecidos e, se calhar por isso, desnecessários. Para quem sempre assim viveu, a vida ensinou como rodear obstáculos e transformar alguns em vantagens.

Sem consulta

Os dois terrenos nos quais vão nascer os edifícios fazem parte do Plano de Ordenamento Urbanístico da Zona Norte da Taipa, o mesmo que já levou a Associação Novo Macau (ANM) a protestar e a pedir uma consulta pública sobre mesmo. Jason Chao, membro da direcção da ANM, mostra-se contra a construção sem que tenha havido uma consulta prévia à população.
“Não sei se os habitantes têm outros sítios para viver, mas devem ser realojados em habitações públicas”, disse ao HM. “Estamos contra o plano da zona norte da Taipa porque pensamos que deveriam ser construídas mais zonas verdes.”
Rui Leão, arquitecto e membro do CPU, apenas referiu que “quando as pessoas ocuparam e construíram lá barracas tinham a obrigação cívica de ter consciência de que, mais cedo ou mais tarde, iriam ter de sair dos locais. Quando as pessoas constroem uma barraca têm de ter consciência de que estão a construir num terreno que, à partida, vai ter destino”.
Ainda assim, no tempo da Administração portuguesa foi dado aos moradores do local uma espécie de licença para lá habitar. Para Francisco Vizeu Pinheiro, arquitecto, “as pessoas devem ser compensadas, tal como foi feito noutras zonas de barracas em Macau”.
Isto, apesar das habitações públicas “nem sempre darem às famílias a dignidade que estas merecem”. “Há que ver caso a caso, se há famílias com idosos e crianças. Macau está bem fornecida em termos económicos e não deve tratar estas famílias como refugiados económicos ou sociais, mas sim dar-lhes um tratamento digno.”
O arquitecto lembrou a história do Caminho das Hortas, de um tempo em que o território tinha “muitas áreas com bairros de lata e pequenas povoações”. “A Taipa tinha as suas aldeias pequenas, havia muitas fábricas de panchões e zonas agrícolas que foram sendo invadidas por estaleiros de construção, uns legais e outros ilegais. Antes de ser concluída a ponte entre Macau e Taipa já havia zonas de aterros e essas zonas mais antigas ficaram abaixo do nível dos aterros, dos diques. Era interessante manter a memória dessa zona.”
Para Vizeu Pinheiro, “o grande perigo é autorizar apenas a construção de grandes torres sem que se tenha um plano global da zona com uma boa proporção de zonas verdes, paisagismo e zonas de ventilação”, concluiu.
Nos últimos anos, com o desenvolvimento de Macau e a chegada dos trabalhadores não residentes (TNR), o Caminho das Hortas começou a ser habitado por emigrantes que nada sabem da história daquele lugar. Junto a uma oficina moram Sandro Rana e Rojan Lam, vindos do Nepal. Falam com o HM enquanto fazem o almoço e lavam a roupa na máquina de lavar comum. caminho hortas
As casas são pobres, mas aqui os dois homens conseguem pagar uma renda inferior àquelas que são cobradas nos grandes edifícios: cinco mil patacas. Sandro e Rojan vivem alheados do que se passa com as famílias chinesas e desconhecem os planos de construção que existem para aquele lugar. Também não se preocupam que a História do Caminho das Hortas seja destruída: afinal de contas, sempre é melhor casas novas para morar em vez de barracas de quinze metros quadrados sem casas de banho e onde o plástico serve as vezes de chão.

11 Jul 2016

Cinema | Seleccionados projectos portugueses para Feira de Investimento

Das oito candidaturas submetidas, sete foram seleccionadas para participar em mais uma Feira de Investimento do Cinema que reúne Macau, Hong Kong e Guangdong. O caminho ainda agora começou, mas os autores mostram contentamento e esperança

[dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]axim Bessmertnyi, António José Caetano de Faria, Ho Fei, Hoi Kuok Meng, Lou Ka Hou, Fernando Eloy e Wong Kong Po são os escolhidos para estar na Feira de Investimento de Produção Cinematográfica Guangdong-Hong Kong-Macau 2016. Terminou mais um processo de selecção de candidaturas para participar na Feira, que este ano decorre a 16 e 17 de Agosto, e de Macau foram escolhidos sete de oito projectos cinematográficos para serem apresentados a investidores e produtores das três regiões.
Maxim Bessmertnyi diz ao HM que “está feliz”, salientando contudo que ainda é cedo para aprofundar comentários acerca do que aí vem. “Ainda são os primeiros passos de uma longa jornada”, refere o jovem cineasta radicado em Macau há mais de uma década. “O guião apresentado está numa fase muito inicial”, adianta. Para já sabe-se que versa “num estudo de carácter de quatro jovens de uma pequena cidade num período crucial de mudança nas suas vidas”. O filme é inspirado em Macau, sem descurar pequenas cidades de Portugal ou da Rússia, como frisa o realizador, que frequentou a Escola Portuguesa de Macau, ao HM.
Já Fernando Eloy foi selecionado com o guião para uma longa-metragem chamada “China Beat”. O filme “absolutamente contemporâneo” retrata a juventude chinesa através de “um grupo de jovens que anda à procura do sonho”. Por outro lado, representa também uma “plataforma de ligação com os países de Língua Portuguesa em que uma das personagens volta para a China depois de quatro anos a trabalhar para uma multinacional chinesa no Brasil”, facto crucial na mudança que sofre no que respeita à “sua percepção acerca do mundo e das pessoas, incluindo as preferências musicais.”
“Estes jovens percebem, aqui em Macau, que têm que fazer alguma coisa da vida deles e também pela China”, adianta Fernando Eloy.
Para o cineasta, este processo de abertura da China tem sido essencialmente de absorção, mas “cada vez mais a tendência é inversa”.
O filme é uma mensagem de esperança para o mundo e de esclarecimento do que é ser chinês, sendo que “os jovens chineses são mais parecidos do que diferentes relativamente aos seus pares no mundo.”
Para o realizador, os “filmes hoje em dia são uma indústria” e o papel do Governo é fundamental não só para a credibilização do processo mas para dar a conhecer aos investidores este mercado. “E por se estar a falar de indústria, será também obrigação do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM) integrar este processo”, admite.
O HM tentou contactar António Caetano de Faria, o outro único português nomeado, mas o realizador não estava disponível.

Plataforma de comunicação

A iniciativa promovida pelo Instituto Cultural contou com oito candidaturas. Segundo a organização, a selecção decorreu após análise realizada pelo júri e baseada nos critérios de criatividade do argumento, experiência e capacidade de execução do candidato, experiência e capacidade de execução do produtor e da empresa produtora, bem como racionalidade orçamental.
A iniciativa tem como objectivo descobrir potenciais projectos regionais para o grande ecrã, de modo a ampliar os canais de comunicação para os cineastas locais.
O evento que se realiza anualmente desde 2014 pretende proporcionar uma plataforma “de alta qualidade e de facilitação” de contactos aos produtores e investidores de cinema das três regiões, criar oportunidades para investimento e cooperação na área do cinema e estimular os talentos neste campo, bem como promover o desenvolvimento da indústria cinematográfica nas três regiões, afirma a organização.

11 Jul 2016

Abbas Kiarostami | Cineasta iraniano morreu segunda-feira

Em ano de despedidas, Abbas Kiarostami não resistiu a um cancro. O dia 4 de Julho foi a data em que o artista multifacetado morreu, aos 76 anos, em Paris. Mais conhecido enquanto realizador, o iraniano marca a sua carreira com prestígio feito longe dos blockbusters e assina cada filme com uma identidade única, numa poesia que confunde documentário e ficção

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]bbas Kiarostami morreu aos 76 anos em Paris, vítima de cancro. Tinha regressado à cidade luz para prosseguir com o tratamento à doença que o consumia. Uma semana antes estava no Irão, país que deu vida a muitas das suas obras primas no cinema, e do qual não se queria separar. Para Kiarostami, deixar de realizar na sua terra era perder as raízes que constituíam a sua essência e a da sua criação. Mas foi também esta terra que o baniu e, quiçá, com isso permitiu ao mundo conhecê-lo melhor.
Kiarostami tem a sua formação e trabalho marcados pela poesia, pintura, artes gráficas e fotografia. Uma mescla que, no seu conjunto, contribuiu para o que dele se pode ver no grande ecrã. É ponto comum na crítica internacional ser o criador de um cinema completo, em que cada produção que dirige tem um lugar preciso na história em que se insere.
Com formação nas Belas Artes de Teerão, estreia-se enquanto realizador com a curta-metragem “O Pão e o Beco” em 1970, à qual se segue “O Viajante” em 1974. Esta última, já longa metragem, conta a história de um rapaz que abandona a sua aldeia natal e percorre 500 quilómetros para ir assistir a um jogo de futebol em Teerão. Está lançada a semente do “filme retrato”, que acompanhará a vida e obra do realizador e que se passava, ainda, numa monarquia.
Assiste à Revolução Islâmica em 79 e foi com “Onde é a Casa do Amigo?” , em 87, que viu os seus trabalhos começarem a ser presença nos grandes festivais de cinema. O uso da criança e de temas delicados num país agora movido por tensões inerentes ao novo regime, conferem a Abbas um realismo característico que documenta a realidade à sua volta, num misto de ficção e documento.
“Onde é a Casa do Amigo?” junta-se a “Vida e Nada Mais” em 1991 e a “Através das Oliveiras”, em 1994. Um conjunto de três filmes que integram a conhecida “triologia Koker”, unida pelo lugar onde se passam os argumentos, e que continuam a afirmar um neo-realismo cinematográfico particular ao realizador. Falam de um Irão conturbado, real, escondido. De temas tabu, de questões que movem ou prendem a sociedade contemporânea. Um país que vacila entre a tradição e uma modernidade que lá não chega e que não pode chegar. Polémicos na terra que os produz, são filmes banidos das salas de cinema, bem como o nome Kiarostami.

A cereja de ouro

Apesar dos obstáculos, o realizador continua a produzir e, reza a história, envia uma cópia clandestina do “Sabor da cereja” para o Festival de Cannes em 1997. Um filme que trata agora do suicídio. Mais um tema delicado no lugar onde foi feito. Se a cereja se transformou em Palma de Ouro, trouxe agora a proibição total em filmar no Irão. Filmes posteriores como “Cópia Fiel” de 2010, que conta Juliette Binoche ou “Um Alguém Apaixonado”, de 2012, já foram rodados por outras paragens.
Mas Abbas Kiarostami não vai sem deixar um adeus. “Marcher avec le vent” é o filme de 2016, que marca o fim da carreira de um dos grandes génios do cinema do Séc. XX e que ficará com certeza para tempos vindouros.

8 Jul 2016

Macau prepara-se para mais um festival de fogo de artifício

[dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]oi apresentada ontem mais uma edição do Concurso Internacional de Fogo de Artifício de Macau (CIFAM). A iniciativa, dada a conhecer por Helena de Senna Fernandes, directora dos Serviços de Turismo (DST), já vai na 28ª edição e promete trazer nos dias 3, 10, 15 e 24 de Setembro e 1 de Outubro muita luz aos céus da zona ribeirinha em frente à Torre de Macau.
O evento, que conta com a participação de dez equipas, vai pintar e iluminar a RAEM com diferentes temas durante cinco noites.
A directora da DST mostrou-se satisfeita com as 27 edições passadas, em que o evento tem logrado do apoio de companhias de fogo de artifício de renome provenientes de várias partes do mundo. A iniciativa atrai todos os anos inúmeros visitantes que se deslocam propositadamente a Macau para apreciar as exibições, afirma. Com o objectivo de posicionar Macau como um Centro Mundial de Turismo e Lazer, Helena de Senna Fernandes refere que a DST irá continuar a proporcionar aos residentes e visitantes “espectáculos extraordinários e diversificados, reforçando a cooperação entre a indústria turística e sectores relacionados”.

Actividades múltiplas

Tal como nas edições anteriores, este ano estarão presentes empresas pirotécnicas de renome internacional. As dez equipas participantes no concurso deste ano vêm da Tailândia, Portugal, Reino Unido, Suíça, Japão, Coreia do Sul, Itália e interior da China, entre outras. Nesta edição, o concurso conta pela primeira vez com uma companhia proveniente da Roménia e uma do Canadá.
Este ano, volta a ser requerido às equipas a sincronização com música nas exibições e utilização de efeitos laser, para elevar o resultado do tema das apresentações e enriquecer os elementos dos espectáculos, refere a organização.
A directora sublinhou também que, este ano, os residentes e visitantes podem ainda optar por ir ao novo espaço de lazer “Anim’Arte NAM VAN”, para apreciarem o fogo-de-artifício, ao mesmo tempo que saboreiam alguns petiscos. Podem também ver os espectáculos culturais e artísticos com características próprias no local, ou ainda passear pelas lojas de produtos culturais e criativos e feira de artesanato, desfrutando de noites de lazer, remata.

8 Jul 2016

Telmo Gongó, chef de cozinha: “Um dia senti o chamamento”

[dropcap style≠’circle’]T[/dropcap]elmo Gongó é o chef natural de Leiria que está a dirigir o leme da cozinha do Tromba Rija de Macau há cerca de dois anos e meio. O mundo da cozinha sempre foi um fascínio para o profissional de 34 anos. A paixão vem de família e as tardes passadas com a avó foram o primeiro passo para apurar o gosto pelo que se faz ao fogão.
“Cresci com a senhora minha avó, que estava sempre em casa e na cozinha. Foi ela que me ensinou a cozinhar arroz e me explicou como se cozinhava massa”, conta-nos.
Podia ter tido uma carreira no desporto, mas outros valores se levantaram. Aos 17 anos jogava andebol numa equipa de primeira divisão e “até iniciou os estudos para prosseguir com a carreira de professor na área”. Mas pelos vistos, os pratos é que marcaram golo e ganharam o campeonato num lance repentino e certeiro.
“Um dia senti o chamamento. Desisti de tudo e entrei para um curso de cozinha. Foi amor à primeira vista.”
Um amor que tende a durar sem divórcio à vista, até porque o prazer sentido por quem gosta de comer também parece ser comum a muitos.

Ásia na mira

Foi o gosto por ver o gosto dos outros pela arte de saborear que incentivou o chef para a “criação dos seus próprios pratos e receitas.” Criar sabores exige experiência, não só de cozinha, como de gentes, lugares ou de mundo, e foi neste contexto que Telmo Gongó arrumou as malas e veio, de repente, para Macau. O continente asiático até já estava na lista das visitas gastronómicas e quando surgiu o convite para dirigir a batuta da cozinha do restaurante situado na Torre de Macau a resposta foi inequívoca.
“Foi um  sim sem dúvidas ou hesitações e sem olhar para trás”, relembra.
Na origem da vontade que alimentava o sonho que agora faz parte da realidade estavam os “mercados de rua com as suas imagens e cheiros e possíveis sabores, o peixe vivo a saltar nas bancas e a variedade conferida pelas especiarias” que tanto fazem parte do continente e da sua gastronomia. Mas não há bela sem senão e Telmo Gongó aponta o dedo para a “falta de cuidados no controlo de higiene. Falta sem dúvida alguma dar esse passo”.
É também o peixe que faz os seus deleites quando pega no tachos por cá. “Gosto de cozinhar peixe, especialmente bacalhau e polvo, que são ingredientes muito apreciados aqui.”
Mas o menu muda quando está do outro lado da mesa, sendo que o que lhe apraz saborear é mesmo a galinha africana. Não se trata aqui unicamente de pupilas gustativas, mas sim de um conjunto de factores histórico-culturais que fazem deste prato “uma refeição ainda mais apetecível”.
Para Telmo Gongó a receita “é uma fusão das culturas trazidas pelos escravos e povos que vinham nos barcos do ultramar”, diz-nos, acrescentando que “é um prato que traz uma herança que se reflecte quando se come”.
Na Ásia, já deu um pulo à Coreia do Sul e ao Japão movido pela curiosidade gastronómica. Da Coreia retém a morcela de sangue com arroz, prato típico da cidade que o viu nascer e que, com espanto, voltou a saborear numa receita idêntica tradicional deste país do Oriente. O Japão não é uma escolha só para visita, mas sim um “lugar de sonho para viver” sendo “uma civilização, uma cultura e uma gastronomia maravilhosas”.

Macau de surpresas

Da experiência pela Terra do Nome de Deus sublinha a surpresa que tem diariamente ao verificar que todos os dias “aprende uma coisa nova”, o que lhe confere uma vida pouco rotineira e de somas de conhecimento. É neste sentido que, com a devida humildade, desconhece o que lhe falta ainda aprender estando sempre disposto a assimilar o que “os dias de hoje e amanhã têm na manga para ensinar.”
No entanto, e sem dúvida, o Mandarim é uma falha neste processo de aprendizagem, considera o chef: “aprender Mandarim dava muito jeito aqui”, diz, relembrando que as dificuldades na linguagem são uma constante para quem lidera uma cozinha e tem que comunicar diariamente com os funcionários locais sob risco de que as coisas não saiam como deveriam.
Por outro lado, o crescimento desenfreado e sem olhar a meios da região não lhe passa despercebido. Amante da natureza, vê Macau com potencial para ser um exemplo a nível mundial, não fosse a má ordenação do território. “Devia ser uma cidade verde”, remata.

8 Jul 2016

Incêndio em Hong Kong alerta para lacunas em Macau

O Comandante dos Bombeiros pede a criação de legislação que enquadre a questão do licenciamento dos mini-armazéns. As declarações de Leong Iok Sam aconteceram ontem, no dia em que foi dada a conhecer uma reestruturação no Corpo de Bombeiros

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]Comandante do Corpo de Bombeiros (CB), Leong Iok Sam, alertou ontem, à margem da conferência de imprensa que deu a conhecer a Revisão da Organização do CB, para a necessidade de criar legislação que enquadre o licenciamento dos denominados mini-armazéns, em Macau.
O alerta surge após os incidentes recentes em Hong Kong, onde deflagraram fogos que vitimaram dois bombeiros.
Leong Iok Sam afirma que Macau não dispõe de nenhum regulamento que contemple os mini-armazéns. “Actualmente não há mecanismo de licenciamento de armazéns e, por isso não, existe uma entidade responsável para os fiscalizar” afirma o Comandante. Na sua opinião “há necessidade de legislação neste sentido”.
O responsável adianta ainda que o regulamento contra incêndios já foi discutido, em coordenação com as Obras Públicas, tendo sido criada uma proposta que está neste momento em fase de consulta pública. Não há ainda calendário para que avance.
Apesar da lacuna legal, Leong Iok Sam afirma ainda que os 12 mini-armazéns identificados em Macau já foram submetidos a inspecção sendo que em todos foi registado o cumprimento das normas básicas de segurança contra incêndios.

Estrutura renovada

O Conselho Executivo deu ainda o aval à alteração da estrutura orgânica dos Bombeiros, extinguindo algumas unidades e sectores, o que “permite uma optimização dos recursos”. “Com o aumento de turismo, de trabalhadores e das vias de acesso a Macau há novas necessidades e é necessária a adaptação às mesmas”, adianta o porta-voz do Conselho Executivo, Leong Heng Teng.
A par das extinções está o aumento “de quatro departamentos e seis divisões para sete departamentos e dez divisões”. Esta mudança enquadra-se numa política de racionalização de quadros e extinção de serviços que tinham menos de cem funcionários.
Dentro da reestruturação destaca-se ainda a fusão do Bombeiros com a Comissão de Segurança dos Combustíveis. Com a integração, as responsabilidades da Comissão revertem para os Bombeiros sendo que não haverá prejuízo para os trabalhadores. Actualmente, fazem parte do CB 1589 funcionários, sendo que é o número previsto para colmatar as necessidades até 2019.

7 Jul 2016

CCM | Tiger Lillies e Theater Republique em espectáculo único

O aniversário da morte do escritor e dramaturgo Shakespeare continua a marcar lugar nas salas de espectáculo da RAEM. “Hamlet” regressa a cena a 1 de Setembro, agora em jeito de cabaret-punk, que mistura circo e vídeo numa apresentação única no Centro Cultural de Macau

[dropcap style=’circle’]”[/dropcap]Hamlet” está de volta a Macau para uma “encenação única”, afirma o Centro Cultural de Macau (CCM) na apresentação da peça agendada para abrir o mês de Setembro. O espectáculo junta o cabaret punk da banda de culto britânica The Tiger Lillies e a companhia dinamarquesa Theater Republique num trabalho que, segundo a organização, é “nunca visto” por juntar arte circense, vídeo e música para ilustrar a conhecida saga shakesperiana.
A história de um jovem confrontado com o dever de vingar a morte do pai conta, desta vez, com a encenação de Martin Telinius e traz ao público da RAEM duas horas de “refinada sedução teatral”, num espectáculo que aborda a completa futilidade da existência.
Numa explosão de som e imagem, a peça ilustra o processo inexorável da destruição de Hamlet, através de uma intensa colaboração entre “performers exímios”.
A peça junta ainda uma banda de prestígio a uma conceituada companhia teatral. Os Tiger Lillies estão de novo na estrada, depois de uma longa digressão pelo mundo com um alinhamento de canções sobre carteiristas e outros vilões londrinos. A cantar e a representar, Martin Jacques, líder da banda, veste agora a pele de mentor omnipotente, dando voz a uma suite de temas originais. Estas sonoridades mantêm a banda na senda do esplendor negro de espectáculos anteriores, como o que marcou a sua estreia em Macau há cinco anos.
Por seu lado, a companhia dinamarquesa Theater Republique recria em 2012, na terra natal de Hamlet, esta interpretação “extravagante e sofisticada” da obra-prima de Shakespeare e reinventa um clássico através de uma combinação inovadora de teatro, design de palco e imagens estimulantes. Ao estilo “Brechtiano”, esta “Ópera Grotesca” promete conquistar o público com uma série de canções macabras que leva os espectadores “numa viagem poética e tragicamente bela”, remata a organização.
O espectáculo tem lugar a 1 de Setembro pelas 20h00 e o bilhetes serão postos à venda a partir de dia 10 de Julho com valores entre as cem e as 250 patacas. A peça conta com tradução em Chinês. 





7 Jul 2016

Lesados com investimento em Zhuhai pedem ajuda a Gabinete de Ligação

[dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]oi entregue ontem uma petição junto do Gabinete de Ligação do Governo Central da China na RAEM e do Governo local, que denuncia um negócio relativo a fracções adquiridas por residentes locais no Condomínio Ling Xiu Cheng, em Zhuhai. Na entrega da petição – que aconteceu também em Hong Kong e Zhuhai, além de Macau – estiveram mais de cem pessoas que dizem ter sido enganadas na compra das referidas fracções, sendo que lhes tinha sido “prometido” um lucro substancial.
Contactado pelo HM, José Pereira Coutinho, deputado e presidente da Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM), que se juntou à causa, afirma que se trata de “uma acção derivada de uma ludibriação que os queixosos sofreram relativamente ao investimento”. As declarações do deputado foram feitas após reunião com os responsáveis pela petição.

Promessas vãs

A situação deriva de uma promessa de lucro, não cumprida, feita pelo responsável pelo arrendamento das fracções. Entre Junho de 2013 e Junho de 2016 o lucro obtido “situou-se apenas entre os 7% e os 9 %”. Com a alegada recessão do mercado, o mesmo responsável admitiu que o valor das rendas ainda teria que baixar cerca de 50%. A compra destas fracções pelos quase 200 residentes locais implicou “investimentos enormes sendo que há pessoas que venderam as casas que tinham em Macau para poder investir em Zhuhai”, afirma José Pereira Coutinho.
A entidade gestora do empreendimento tem vindo a mudar ao longo do tempo, o que “provoca uma grande complexidade jurídica e de compreensão deste processo. Trata-se de cerca de três ou quatro tipos de contratos envolvidos, em diferentes actividades” pelo que análise poderá ainda demorar uns dias, alerta o deputado.
O presidente da ATFPM aconselha ainda a apresentação de queixa por parte dos lesados ao Conselho de Consumidores de Macau alertando para a falta de legislação que defenda o consumidor. Por outro lado, alerta para o cuidado com investimentos na China “que podem correr mal”. A lei de Macau nada pode fazer face a investimentos feitos no continente.

Com Angela Ka

6 Jul 2016

Lei do Ruído | Leong Veng Chai pede esclarecimento sobre diploma

A Lei do Ruído é fonte de interpelação por Leong Veng Chai. O deputado pretende saber como é aplicada a legislação aquando da existência de ruído durante o dia bem como se processam as acções de medição

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] deputado Leong Veng Chai interpelou ontem o Governo no sentido de esclarecer questões relativas ao barulho e às condições da sua medição vigentes na actual Lei do Ruído. Da interpelação, constam essencialmente duas questões: por um lado o deputado pretende saber se há ou não legislação que regulamente a “produção dolorosa de ruído” durante o dia. Se actual lei não prevê, o deputado questiona a necessidade de regulamentação destas situações, bem como as sanções que daí podem decorrer.
Por outro lado, o Gabinete de Leong Veng Chai pretende saber quais as razões das autoridades para que exijam a apresentação de dados pessoais como condição para avançarem com os procedimentos de medição previstos legalmente. No caso da não apresentação destes dados, a questão do deputado é se a medição é realizada ou não e, consequentemente, se a queixa avança.

Má vizinhança

A interpelação resulta do elevado número de queixas que o deputado diz ter recebido. De modo a ilustrar a situação, Leong Veng Chai refere uma circunstância em que várias famílias são afectadas: devido a uma inimizade criada entre dois vizinhos, um deles coloca música a um nível muito alto entre as 13h00 e as 20h00, o que faz com que o outro vizinho retalie em jeito de competição de volume.
“Esta circunstância afecta acima de tudo as famílias que circundam esta má vizinhança”, frisa. O Gabinete do deputado já apresentou queixa à Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental (DSPA), “que não deu resposta alguma”.
Outra situação é referente à existência de exaustores de fumos e cheiros pertencentes a um hotel, que estão virados para as traseiras de um edifício habitacional. Estes equipamentos que funcionam cerca de 17h00 diariamente provocam não só um ruído constante, como ainda a emissão de cheiros “desagradáveis que se fazem notar essencialmente à hora do jantar”. Foi igualmente apresentada queixa à DSPA, sendo que neste caso foi exigida a identificação do queixoso para que pudessem ser iniciados os processos de medição, diz o deputado.
O deputado refere ainda a existência de um grupo de moradores da Praia Grande, que alerta para o ruído provocado pelas cargas e descargas de mercadorias durante a madrugada. Neste caso a DSPA terá destacado pessoal para proceder à medição no referido local de modo a dar uma resposta a estes moradores.

6 Jul 2016

FRC | Apresentação de “compilação” reflexiva sobre Manuel Vicente

Manuel Vicente não foi só um português em Macau. Foi o arquitecto que inspirou a metrópole, que fez do seu atelier um lugar de discussão e que tem agora um Catálogo, fruto de uma reflexão colectiva, e que é apresentado amanhã, na Fundação Rui Cunha

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]ma leitura híbrida da cidade é o mote do debate a realizar na próxima quinta-feira, na Fundação Rui Cunha. A conversa é em torno do catálogo “Macau: Reading the Hybrid City”, que representa o resultado de uma investigação desenvolvida pela Docomomo Macau acerca da figura do arquitecto Manuel Vicente. Junta todo o material produzido para os ciclos de conferências e para a exposição “Descobrir Manuel Vicente”.
Rui Leão, presidente da Docomomo, disse ao HM que o Catálogo que será apresentado é “uma coisa completa” que documenta a obra do arquitecto. “É uma reflexão crítica” que tenciona perceber a sua trajectória “no âmbito de Macau e na cultura arquitectónica portuguesa enquanto figura representativa da mesma”.
Esta publicação nasce da vontade de estabelecer uma reflexão sobre a obra de Manuel Vicente a partir do ponto de vista de quem com ele trabalhou, partilhando o processo criativo, o pensamento e as estratégias que foram por ele enunciadas na sua prática em Macau, revela a organização. Macau é o segundo grande protagonista desta publicação visto que, tanto a localização periférica de Macau relativamente ao centro da discussão sobre as correntes arquitectónicas contemporâneas, como a especificidade desta cidade contribuíram para a singularidade do contributo de Manuel Vicente.
“É uma obra fruto da dialéctica constante entre o seu desejo criativo de matriz europeia e a expectativa do gosto local.”

Da arquitectura portuguesa

Até 1974 a sociedade portuguesa era caracterizada pela sua clausura devido às circunstâncias do próprio sistema, adianta Rui Leão. Não era uma sociedade aberta ao posicionamento crítico, sendo que as limitações atingiam a arquitectura enquanto representante de acção política.
“Manuel Vicente é um arquitecto-autor que vai à procura da rede e do mundo que estava a acontecer fora de portas, tanto na arquitectura, como na produção artística”, sublinha.
Outra questão a ter em conta diz respeito à “prática exógena” do atelier que Manuel Vicente tinha em Macau. Mais do que um lugar de trabalho, era um lugar de reunião e discussão de época e que trazia ao território profissionais de Portugal para participar neste conhecimento.
“Pela pessoa que era e pela forma como vivia e se relacionava com os outros, este era um sítio de criatividade e discussão colectiva”, o que se reflectia tanto política como culturalmente. “Dessa gente toda que por ali passou, onde me incluo, que vieram ou voltaram a Macau,” vieram à procura da Macau de Manuel Vicente o que implica “a construção de uma escola de pensamento de produção arquitectónica.”
Rui Leão explica ainda a existência desta escola na medida em que “Macau, pelas circunstâncias, possibilitava ao arquitecto uma visão cosmopolita e contemporânea que acabou por ser seguida por vários profissionais que entretanto voltaram para Lisboa.”
Com este caso assistimos a um modelo de arquitectura portuguesa que, ao contrário do que acontecia com as colónias naquele tempo, não saía de Lisboa, mas antes de Macau para a metrópole.
Rui Leão espera que este venha a ser um documento importante enquanto refere a intenção de lançamento de um ensaio futuro juntamente com a biógrafa Raquel Ochoa que há seis anos que se dedica a Manuel Vicente.
A apresentação estará a cargo de Ung Vai Meng, presidente do Instituto Cultural, havendo igualmente lugar a uma leitura crítica da responsabilidade dos arquitectos Carlotta Bruni e Carlos Marreiros. A iniciativa que tem lugar às 18h30 será proferida em Língua Portuguesa, com tradução simultânea para Cantonês e conta com entrada livre.

6 Jul 2016

“Macau é único no território chinês”, Tang Kaijian, investigador e autor na área da “Macaologia”

Tang Kaijian é professor da Universidade de Macau e dedica-se sobretudo à investigação da área da “Macaologia”. O também autor lançou recentemente uma compilação exaustiva da influência do Ocidente em Macau entre os séc. VI e XIX. Considerado já pioneiro na investigação histórica da RAEM em língua chinesa, Tang Kaijian alerta para a necessidade de preservar a multiculturalidade que caracteriza a região e já está a ajudar nesse sentido, investindo o que pode em tradução de documentos

Como é que nasceu o interesse pelo estudo de outras etnias?
Estudei em Lanzhou que se situa no centro noroeste da China e que pelas suas características geográficas era um lugar propício à investigação nessa área.

Como surgiu a ideia de começar a estudar Macau e as suas influências?
Surgiu essencialmente devido a duas razões: por um lado, sou natural de Hunan, que fica situado no Sul da China. Quando fui para a Universidade de Jinan notei que o conhecimento entre o Norte e o Sul da China está completamente separado e que [os dois lados] não comunicam. Percebi também, visto que estudava as etnias no Noroeste, que em Jinan era difícil aceder a informações e materiais rigorosos acerca das etnias no norte. Por outro lado, naquela altura estava em discussão aberta a questão da transferência de Macau e Hong Kong para a China. A Universidade de Jinan criou uma equipa de professores para que estudassem estas questões. Integrei a equipa de Macau e comecei os meus estudos acerca do território.

Veio para Macau para aprofundar esse estudo?
Na Universidade de Jinan, após 20 anos de estudo na área da “Macaologia” formei uma equipa que honrosamente ficou chamada de equipa Tang por ser liderada por mim. Na altura era considerada a equipa mais forte no estudo da “Macaologia”. Acabei por formar muitos alunos também nesta área. As barreiras eram muitas, essencialmente linguísticas, na medida em que as fontes eram em Português, Espanhol ou mesmo Francês. Numa viagem de trabalho à Europa encontrei-me com o director da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade de Macau, que entretanto tinha criado na instituição o departamento de História. Daí surgiu o convite para vir para Macau. Seria mais fácil estudar a RAEM estando a viver e investigar aqui. Tang kaijian

Foi muito tempo a estudar Macau, numa investigação exaustiva. Quais os maiores desafios?
O maior desafio sem dúvida que foi a Língua Portuguesa. Se não houvesse o estudo dos documentos em Português para sustentar, o estudo de “Macaologia” nunca se poderia denominar de acabado. Quando percebi esta dificuldade em Macau passei a exigir que todos os meus alunos frequentassem também a disciplina de Português, sendo que já tinha a experiência de Jinan. São os meus alunos que acabam por traduzir muitos dos documentos de pesquisa. Com o financiamento dado pela UM pude trabalhar com alunos de mestrado e doutoramento de Português, o que representou uma grande mais valia. A história de Macau não é possível ser feita sem recorrer à Língua Portuguesa. Sem traduções dos documentos que na sua maioria estão em Português não é possível estudar Macau.

[quote_box_left]“Este processo de perda da herança multicultural é inevitável. Macau é um espaço pequeno com uma cada vez maior afluência e influência do interior da China”[/quote_box_left]

Do estudo que fez, quais as áreas que para si tiveram um maior interesse?
Penso que o mais importante é a influência que as culturas ocidentais tiveram na área da religião, nomeadamente no que respeita à católica. Apesar de também me dedicar ao estudo da lei ou da arquitectura, penso que a influencia religiosa social é a mais interessante.

Considera Macau um lugar único no mundo devido à miscelânea cultural?
Sem dúvida. Desde o séc. XVI ao séc. XIX que Macau foi o único espaço multicultural com contacto directo com a China. Só depois do séc. XIX é que cidades como Xangai e Hong Kong começaram a ter esta componente multicultural. Considero que Macau é efectivamente único no território chinês.

Com a integração de Macau na China, esta característica multicultural está condenada à morte?
Numa perspectiva objectiva, este processo de perda da herança multicultural é inevitável. Macau é um espaço pequeno com uma cada vez maior afluência e influência do interior da China. Isto faz com que a perda desta característica seja realmente inevitável. Quando falamos de “Macaologia” já podemos começar a estar falar em história. Por outro lado, considero que o Governo já investe na manutenção desta característica multicultural. Agora tudo depende do desempenho do próprio Governo. Se este não se empenhar, esta herança passará à história mais rapidamente.

O que é que o Governo pode efectivamente fazer?
Em primeiro lugar pode dedicar-se à protecção do Património Cultural presente e pode fazê-lo em vários sentidos. Por exemplo, a queda do tecto da Igreja de S. Agostinho não deveria ter acontecido. Deveria ser um dos edifícios a preservar, entre outros. Deveria ter sido feita uma avaliação prévia do estado desse edifício, bem como de todo o património histórico. Para além da protecção do património há ainda a questão dos livros. Há muitos livros antigos referentes ao séc. XVII e XVIII que também devem ser considerados património histórico e que deveriam ser organizados para que pudessem também ser objecto de estudo e de consulta, para mostrar ao mundo.

Na área da “Macaologia” o que tem previsto para o futuro?
O meu maior desejo é conseguir que todos os documentos que já existem em Macau possam ser traduzidos para Chinês, de modo a que possam ficar acessíveis a outros públicos, entre académicos e público em geral. Tenho investido todo o financiamento por parte da Universidade de Macau nesse sentido. Estou a traduzir o Arquivo de Macau e já estão realizadas dezenas de traduções de documentos. No total, tenho em mãos de cem a 200 livros. Este é também um trabalho que pretendo terminar para que posteriormente possa ser publicado e disponibilizado. Espero também que seja chamada a atenção do Governo para um maior investimento nisto mesmo, com mais financiamento e mais contratações, nomeadamente na área da tradução. Espero que, pelo menos até ao fim da minha vida, este trabalho esteja com 80% do volume concluído.

[quote_box_right]“Sem traduções dos documentos que na sua maioria estão em Português não é possível estudar Macau”[/quote_box_right]

Na China, a história da RAEM é então muito pouco conhecida…
Sim.

Acha que este trabalho permitirá dar início a essa divulgação?
Sim, sem dúvida. Penso que possibilita alargar esse conhecimento não só à China continental mas ao mundo também. No futuro haverá tradução para línguas estrangeiras, nomeadamente desta obra. Ainda não há previsões para a tradução para Português porque é uma língua muito difícil.

5 Jul 2016

Rogério Beltrão Coelho: “Macau é uma aldeia com grandes condições financeiras”

Rogério Beltrão Coelho é o jornalista responsável pela agora revitalizada Associação Amigos do Livro. Fortemente ligado a Macau, pretende dar um novo alento à actividade editorial para que o registo literário não se perca e a cultura permaneça


Jornalista, já passou pela imprensa da RAEM. Da sua experiência, houve mudanças significativas nos jornais antes e depois da transferência?

Houve muitas. A história da imprensa de Macau é muito curiosa. O primeiro jornal do território é a Abelha da China, que é criado com fins eminentemente políticos. Nos anos 80 há a Gazeta Macaense, que é um jornal dedicado aos escândalos. Em 82 aparecem o Jornal de Macau e o Tribuna de Macau, que na altura ainda era semanário. Estas publicações já eram feitas por profissionais vindos de Portugal e que respeitavam os princípios que formam a nossa actividade de jornalistas, nomeadamente éticos e de rigor. É aqui que começa de facto a aparecer a imprensa com alguma qualidade e alguma responsabilidade. A partir de meados dos anos 90, e essencialmente após a transferência, os jornais ganham outra força e outra forma e começam a vir mais jovens profissionais

É essa gente que dá novo alento à imprensa?
É gente jovem que, de uma forma geral, tem talento e qualidade e que imprime à imprensa uma outra dinâmica e uma outra qualidade. O que não quer dizer que, dadas as especificidades aqui da terra, os jornais sejam politicamente puros.

Há limites no exercício da profissão de jornalista?
Tive esse experiência também entre 2009 e 2011 no Macau Daily Times. Não que tivesse tido alguma dificuldade de funcionamento, mas acho que há limitações de várias ordens no exercício da profissão em Macau.

Fala da liberdade de expressão?
Não se pode dizer que há um exercício dessa liberdade. É um facto que ela existe, mas o seu exercício, fruto das especificidades de Macau, nem sempre é pleno. Não quer dizer que em situações pontuais a imprensa não vá aos limites positivos no seu papel de denúncia ou afirmação. Existem também as limitações inerentes a uma imprensa provinciana. Macau é uma aldeia com grandes condições financeiras, com um grande desenvolvimento, que pode ser discutível, mas que é de facto um grande desenvolvimento económico. A imprensa em Macau é de província, o que não quer dizer que seja má. Mas há que ter noção dessa dimensão e do que se pode fazer dentro dessas balizas. Não temos, por exemplo, condições para desenvolver uma imprensa de investigação. beltão_coelho_3_sofiamota

Está ligado essencialmente à actividade editorial. Como surgiu?
Tirando os primeiros dois anos em que estive cá a criar o Gabinete de Comunicação Social, toda a minha actividade jornalística foi desenvolvida na área editorial. Já em Portugal estava ligado à edição de livros e depois em 86 em Macau estive no Instituto Cultural, em que realizámos uma série de iniciativas entre as quais edições inéditas. Em 90 criámos a Livros do Oriente que funcionou muito bem até à transferência.

O que aconteceu?
Ao contrário do que as pessoas possam pensar nunca houve um apoio directo à actividade editorial. Na maior parte dos casos, a edição era a fundo perdido e o que a sustentava eram os projectos que tínhamos, como a Revista Macau. Tínhamos sobretudo a produção de livros para entidades terceiras como o Governo ou fundações, etc. Eram encomendas que nos permitiam depois alimentar a actividade editorial altamente deficitária. Hoje temos cerca de 90 títulos editados e tivemos dois ou três casos que não deram prejuízo.

Não há leitores em Macau?
Já houve mais. Hoje quando se faz um lançamento aparecem 20 ou 30 pessoas no máximo. O tema “Macau” é um tema que interessa pouco. Portugal está muito desligado da RAEM em termos de conhecimento ou interesse. Houve uma luta constante para ultrapassar essa situação criando um mailing próprio, por exemplo das pessoas que estivessem em Macau ou outros interessados que, no meu entender, atingiria umas dezenas de milhares de pessoas. No entanto isso nunca foi possível.

E porquê?
A actividade editorial em Macau padece de uma estrutura que nunca teve. Era e é possível encontrar apoios a nível individual. Posso criar um projecto mas sem uma estrutura que apoie toda a actividade e que vá ao encontro das necessidades de marketing e de divulgação, nunca chego a lado nenhum porque não tenho interlocutor e não há interesse ao nível oficial para o fazer.

Macau não tem interesse?
Não tem uma política do livro. A meu entender, a entidade que poderia regular, dinamizar e criar condições de apoio é o Instituto Cultural, que não o faz. Limita-se a ser editor, o que é profundamente errado.

Seria então essa a função do IC, de coordenação?
Não diria coordenar, mas sim de criar condições.

Que tipo de condições são necessárias?
Criar um fundo editorial. Uma verba que todos os anos os editores que concorressem com as suas propostas submetidas teriam apoio, como se faz com outras actividades culturais. Há ainda necessidade de uma coisa importantíssima: um fundo de tradução. Estando em Macau e sendo a ponte entre as comunidades e culturas portuguesa e chinesa, temos o dever e devíamos ter a missão de ser os transmissores dessa cultura. É intenção da Associação Amigos do Livro a promoção da actividade editorial de livros chineses em Macau. É preciso criar tradutores e um fundo de tradução para que esse obstáculo seja transposto. Ninguém vai editar um livro tendo que suportar os custos de tradução.

De que mais precisa o mercado editorial?
Não há um prémio literário ou de poesia em Macau. Não há incentivo à criação. Não há uma bolsa literária que responda à vontade de alguém querer escrever um livro e possa dedicar o tempo necessário à escrita com um suporte financeiro que o sustente. Não há sequer a preocupação das pessoas se sentarem à mesa e colocarem estes problemas e tentarem encontrar soluções.

Mas tem havido esforços no sentido de solicitar a atenção da Administração…
Estes problemas têm sido colocados à Administração ao longo dos anos e continuam a sê-lo. Caem em saco roto. Os casinos daqui a cem anos já não existem. Os edifícios deterioram-se. Mas daqui a cem anos, as obras que forem publicadas ainda estão consultáveis. As pessoas ainda poderão ler, seja em que forma for, impresso ou digitalmente. Essa informação perdurará.

Mas não há comércio do livro? Não há forma de entrar no mercado da China?
Foram traduzidas em Macau para Chinês algumas obras de alguns portugueses. Posso estar a ser injusto, mas penso que isso aconteceu numa perspectiva de mostrar serviço. Quando se traduz para a China uma edição de 500 exemplares que objectivos é que se pretende atingir? Numa das viagens que fiz à China encontrei o tradutor do Jorge Amado que me dizia que já na altura as traduções deste autor atingiam tiragens de cerca de 360 mil unidades. Agora com uma tiragem de cinco mil exemplares para o mercado chinês podemos dizer que poderá chegar aos meios académicos mas não entra na China. E mesmo esses não sei se são distribuídos. Por outro lado, não podemos fazer livros cá e mandá-los para a China. Temos que entrar em acordo e fazer parcerias com editoras chinesas que se mostrem interessadas e que assumam essa co-edição, o que não é fácil. Tem que se partir de um fenómeno que desperte a atenção, que foi o que aconteceu com o Jorge Amado e “Gabriela”.

Qual é o problema com a distribuição?
Aqui os livros morrem no lançamento. Há um grande folclore com isso e depois ficam nos armazéns. É apenas anunciada a cerimónia e não o livro. Não há uma crítica literária em Macau. Falta toda uma estrutura e uma vivência. Vai-se à livraria e o livro nem está lá. É o pior que pode acontecer a um livro. Um pessoa que tenha interesse numa obra vai uma e duas vezes à sua procura, não encontrando, esquece. Penso que é importante numa terra como Macau ter uma componente de conhecimento e de cultura que prevalece além de tudo e que, quanto mais enriquecida for, mais valor tem o território. Tenho 26 anos de actividade editorial aqui e não consigo falar com ninguém que supostamente terá a tutela desta área.

Por que razão?
Não sei. Acho que há coisas que funcionam hoje muito melhor do que na Administração portuguesa. Exemplo disso são os serviços públicos. Mas a nível de poder e decisão não há acesso a quem de direito. Se se conseguisse ir directamente a quem decide era mais fácil. Acho que isso é a grande falha da Administração no contacto com os agentes culturais.

Mesmo numa altura em que se fala tanto de indústrias criativas?
Acho que nem se sabe o que é isso das indústrias criativas, mesmo quem se agarra a isso como uma tábua de salvação económica. Neste momento as indústrias criativas são a moda e o design, mas a actividade editorial também o é: fomenta o design, a escrita, a tradução, a ilustração, etc. Não há um fórum onde isto possa ser discutido num território que tem tanto dinheiro e que pode pôr as coisas a funcionar, assim como fez com os serviços públicos.

A Associação Amigos do Livro está de volta com novas actividades.
A Associação, que foi criada há uns anos, devido a determinas circunstâncias esteve parada. Retomou a actividade o ano passado e estamos com uma série de projectos que precisam de apoios. Nalguns deles não há necessidade de dinheiro mas sim de disponibilização de espaços. E até pode haver parcerias em que nós damos a nossa parte e que sendo retribuída podemos seguir actividade. A primeira actividade, e que teve o apoio incondicional da Fundação Rui Cunha – o que nos permitiu seguir em frente, foram as conversas sobre o livro. É um espaço que nos permite discutir assuntos ligados ao livro, dar a conhecer aquilo que é a actividade literária em Macau e nos países à volta. Permite-nos conhecer o mundo em que estamos de forma a podermos partir depois para outras iniciativas. beltão_coelho_3_sofiamota

Quais são as iniciativas previstas?
Sessões de poesia, alguns programas para a televisão, com intervenções curtas na área literária, etc. Está ainda em marcha uma grande acção em Outubro: o Fórum do Livro de Macau em Lisboa. Neste momento metade do programa está garantido com apoios e parcerias com instituições em Portugal mas ainda faltam muitas respostas ligadas a Macau. Integra uma grande feira do Livro, conferências e terá lugar em vários sítios. Já temos o Centro Científico e Cultural de Macau, o Museu do Oriente, o Clube Militar Naval e a Casa de Macau de Lisboa e esperamos contar com a sala de visita em Lisboa que é a Delegação Económica e Comercial de Macau. Estamos à espera de uma resposta. Pensamos que será positiva mas a senhora da missão da Delegação não decide nada sem perguntar a Macau e é mesmo capaz de dizer que não.

De que vai constar este Fórum?
Vamos falar das várias vertentes do livro de Macau em Português e em Chinês. Dar a conhecer os autores vivos e outros que precisam de ser lembrados, como é o caso do Silva Mendes ou do Camilo Pessanha ou de Ondina Braga, que escreveu muito sobre Macau.

Quanto seria preciso vender em Macau para rentabilizar um edição?
Vender 500 exemplares de uma edição já é rentável. E há cada vez menos interesse. O livro de Macau não se vende na livraria e é preciso também um trabalho online. Julgo que uma acção pontual como esta do Fórum vai despertar interesse naquele momento, naquela semana. Hoje em Macau há um fenómeno muito curioso. A comunidade está muito dispersa. Este jovens que cá estão vêm com a mentalidade de emigrante, o que não acontecia no passado, e por isso cada um vive na sua tribo. Se um faz uma coisa os outros também fazem, mas se for alguma coisa que seja de interesse geral para além da tribo já não se importam. Têm os seus interesses culturais e económicos muito específicos e estão muito distanciados de Macau. Vivem na sua bolha, vão às compras, têm uma empregada para cada criança e consomem luxo. Vive-se hoje uma grande arrogância.

E a cultura?
É uma pequena minoria.

Não podia ser a cultura um chamariz para o turismo?
Poderia, mas o nosso turista é minoritariamente ligado à cultura. Têm que se criar motivos de interesse e programas para apoiar esse turismo. Macau não tem espaço, mas na Europa não há cidade que não tenha, por exemplo, esplanadas. Aqui distribuem-se panfletos com os telefones das “meninas” e em Praga distribuem-se a publicitar os concertos todos os dias em vários sítios diferentes e as pessoas vão porque se habituaram àquilo. É preciso que as pessoas que decidem tenham preocupações culturais e tenho dúvidas que as tenham. A partir daí tudo poderia funcionar.

4 Jul 2016