Hoje Macau China / ÁsiaAviação | Suspenso temporariamente uso de Boeing que caiu na Etiópia [dropcap]A[/dropcap]s autoridades chinesas ordenaram ontem a todas as companhias aéreas do país para que não usem temporariamente aviões Boeing 737 Max 8, após a queda de um avião na Etiópia que provocou a morte dos 157 ocupantes. A Administração da Aviação Civil da China esclareceu que a ordem se deve a preocupações com a segurança. Trata-se do segundo acidente com aquele modelo no espaço de cerca de dois meses. O primeiro ocorreu ao largo da costa da Indonésia, em circunstâncias semelhantes, em 29 de Dezembro, e resultou também na morte de todos os ocupantes. A ordem irá prevalecer durante nove horas. Outro aviso será emitido após consulta com a Administração Federal de Aviação dos Estados Unidos e a Boeing sobre as medidas de segurança tomadas. Oito cidadãos chineses viajavam a bordo do avião que caiu no domingo, logo após a descolagem. O avião partiu da capital etíope, Adis Abeba, e tinha destino à capital do Quénia, Nairobi. O aparelho caiu numa zona chamada Hejeri, perto da cidade de Bishoftu, a cerca de 42 quilómetros a sudeste da capital da Etiópia e onde fica sediada a maior base da Força Aérea etíope. As causas do acidente ainda não são conhecidas.
Hoje Macau China / ÁsiaCiência | Aumenta investimento em investigação básica As autoridades chinesas vão promover um maior investimento na investigação científica básica numa tentativa de aumentar a concorrência com os Estados Unidos pela liderança tecnológica mundial [dropcap]A[/dropcap] China vai aumentar o investimento em investigação científica básica, afirmou ontem o ministro chinês da Ciência e Tecnologia, encorajando as suas empresas a juntarem-se na corrida contra os Estados Unidos pela supremacia tecnológica. “A China vai definitivamente impulsionar a investigação científica básica, [que gera conhecimentos que não têm necessariamente aplicação imediata], e apelar às suas empresas, e outras indústrias, para que participem” neste processo, afirmou Wang Zhigang. O ministro chinês falava durante uma conferência de imprensa à margem da sessão anual da Assembleia Popular Nacional, o órgão máximo legislativo da China. “Nos Estados Unidos, há muitos participantes a investir em investigação científica básica, mas, na China, sempre foi o Governo a prestar mais atenção à ciência básica”, afirmou. Wang Zhigang lembrou que a China aumentou “rapidamente” o investimento em tecnologia, que é já o segundo maior do mundo, “mas que ainda está longe dos EUA”. Pequim quer converter o país numa potência tecnológica, com capacidades em sectores de alto valor agregado, como inteligência artificial, energia renovável, robótica e carros eléctricos. O Presidente chinês, Xi Jinping, afirmou já que a ciência e tecnologia são as “principais frentes de batalha” na economia. Diferendo global A política industrial de Pequim é explicitada no plano “Made in China 2025”, que este ano não foi mencionada no relatório de trabalho do Governo, entregue, na semana passada, pelo primeiro-ministro, Li Keqiang, à Assembleia Popular Nacional. Os EUA consideram que aquele plano, impulsionado pelo Estado chinês, viola os compromissos da China em abrir o seu mercado, nomeadamente ao forçar empresas estrangeiras a transferirem tecnologia e ao atribuir subsídios às empresas domésticas, enquanto as protege da concorrência externa. Washington reagiu já com taxas alfandegárias sobre 250.000 milhões de dólares de produtos importados da China. As queixas dos EUA são também partilhadas pela União Europeia e o Japão, que ficam com a maior margem de lucro na cadeia de distribuição global – a China fabrica 90 por cento dos telemóveis e 80 por cento dos computadores do mundo, por exemplo, mas continua dependente de tecnologia e componentes oriundos daqueles países. Mas Li Keqiang reiterou que a China pretende actualizar a sua indústria manufactureira e impulsionar o desenvolvimento tecnológico. “A ciência básica é a fonte da inovação tecnológica e devemos manter um equilíbrio entre a pesquisa científica básica e a aplicação da tecnologia”, afirmou Wang. Os gastos da China com pesquisa e investigação científica deverão fixar-se, este ano, em 2,5 por cento do Produto Interno Bruto do país.
Andreia Sofia Silva Entrevista Eventos MancheteEntrevista | Vasco Morão, artista “Remember Hong Kong” é o nome da exposição de Vasco Morão, artista português radicado em Barcelona, patente no Art & Culture Outreach, em Wan Chai, até 24 de Março. Em discurso directo, o desenhador explica o fascínio que sente por paisagens urbanas e a forma como transforma memórias de cidades em arte [dropcap]A[/dropcap]ntes de mais, como é que Hong Kong surgiu no seu caminho enquanto artista? Há cinco anos, durante uma viagem de seis meses pela Ásia (Indonésia, Singapura, Vietnam, Japão), decidi passar por Hong Kong antes de voar para o Japão. Estive apenas seis dias, mas foi o suficiente para ficar fascinado. Passei os dias percorrendo as ruas da cidade e recolhi imensas referências fotográficas que guardei durante algum tempo. Quando no final do ano passado surgiu a oportunidade de voltar em Março a Osaka e Tóquio, para uma série de residências artísticas, quis imediatamente colocar também Hong Kong na rota. Isso levou-me a revisitar as fotografias de Hong Kong e criar uma série de desenhos na minha experiência pessoal de locais específicos da cidade. Achei que faria todo o sentido expor estes trabalhos sobre Hong Kong numa galeria da cidade. Após alguns contactos foi-me sugerido a ACO (Art and Culture Outreach), uma galeria em Wan Chai. Será a minha primeira exposição aqui. Porquê captar a paisagem urbanística de Hong Kong? O que lhe despertou mais interesse? Para mim, Hong Kong é simplesmente fascinante. A densidade e sobretudo a variedade de escalas, tipologias, fachadas, materiais, janelas, neons, estruturas, caixas de ar condicionado, etc. O contraste e proximidade entre os edifícios mais recentes e os mais antigos resulta em perspectivas quase surreais. É uma paisagem urbana vibrante e particularmente intensa que intriga e atrai desde o primeiro momento. Porque o nome “Remember”? Que memórias pretende transmitir, ou captar? O nome da exposição remete para o facto do trabalho estar baseado nas minhas memórias destes locais específicos que guardei da minha primeira visita. Não é uma memória fotográfica, mas sim uma memória fragmentada, distorcida e pessoal, mas ainda assim reconhecível. Fale-me um pouco das obras que vão estar expostas em Hong Kong e nos materiais que decidiu usar. As obras falam de locais específicos com que tive uma relação emocional. Onde, por momentos, parei e olhei. Todas as peças têm o mesmo formato e técnica. Desenho à mão com caneta negra e aguarela em papel. Para desenhar memórias pensei que isso implica usar uma técnica que quebrasse com o controle absoluto que costumo ter com o meu trabalho. As manchas em aguarelas dão-me um ponto de partida muito mais fluído para ir entrelaçando os diferentes fragmentos da cidade que me vou recordando. O que captou destes “fragmentos de cidade”? Em “Leaving Kowloon station” tinha acabado de chegar do aeroporto e queria olhar para a cidade o mais rápido possível. Por isso, ao sair da estação de metro, subi logo até à praça superior e encontrei-me no centro destes edifícios como lanças que configuram e recortam o horizonte. No trabalho “Around Chunking Mansion” foquei-me na energia da Nathan, Moody e Middle Road, o contraste das fachadas, as diferentes escalas e tantos detalhes e pormenores que se misturam num turbilhão de fragmentos. “Walking through Hoi Ting Road” aconteceu quase por acidente. Cheguei a esta parte da cidade por acaso, à procura de uma casa de chás que me tinha sido recomendada. Nesta zona recente de Kowloon, o ritmo das diferentes torres marca diferentes cadências que os olhos seguem até ao céu. Para “Looking at Yick Cheong building”, local bastante referenciado online, achei muito interessante a repetição do mesmo elemento (varanda coberta de janelas) com pequenas variações de tamanho, caixilharias, caixas de ar condicionados que configuram o pátio interior. O que mais o fascina nas paisagens urbanas? Quando percebeu que seria o urbanismo a área central do seu trabalho? As paisagens urbanas fascinam-me pelo seu carácter infinito e que encaixa perfeitamente com o meu estilo obsessivo de desenho. Estudei e trabalhei como arquitecto antes de ter uma carreira artística. Isso foi importante para ter entendimento de como as cidades são criadas e apreço pelas diferentes morfologias da paisagem urbana. A partir desse momento, fiquei obcecado por esta coisa incrível que é uma cidade. Reside actualmente em Barcelona, mas tem feito trabalhos sobre várias cidades. Qual o sítio que mais o fascinou e que mais o desafiou enquanto artista? Até agora, o maior desafio foi desenhar a paisagem urbana da cidade japonesa porque é relativamente banal e genérica, mas ao mesmo tempo incrivelmente interessante. E tenho um fascínio especial pelo Japão. Para mim, é o mais parecido a viver numa realidade alternativa. Gostaria de se embrenhar nas paisagens urbanas da China? Claro que sim! Xangai e Pequim seriam óptimas referências. Desenhar cidades noutras formas e moldes contribui para uma outra visão ou compreensão sobre elas? Desenhar é para mim como olhar devagar, penso que é isso que tento comunicar. As minhas peças pedem tempo para serem decifradas. E, ao observar com cuidado, até a paisagem urbana mais monótona tem algo para dizer sobre quem ali vive, quem a desenhou ou construiu. Já desenhou a paisagem urbana de Tóquio. Pondera explorar outros países do continente asiático? Claro que sim. A Ásia é um continente onde regresso sempre com muito prazer. Actualmente, tento passar algum tempo nos sítios enquanto os desenho. Por exemplo, nos próximos três meses no Japão vou estar de novo a viver e desenhar Osaka e Tóquio, porque tenho residências artísticas em ambas cidades. O que me dá mais tempo e prazer para descobrir a cidade enquanto vou criando peças que falam dessas experiências. Com vantagem de no final ter a oportunidade de expor o trabalho no local onde foi criado. Podemos esperar alguns trabalhos sobre Macau, um território tão perto de Hong Kong e com herança portuguesa? Talvez numa outra oportunidade. Também visitei Macau há cinco anos, mas foi para rever um amigo. Não tive muito tempo para descobrir a cidade… Apenas uma tarde e noite. Precisava de passar algum tempo aí para absorver um pouco melhor toda a paisagem urbana, que conheço apenas de fotografias. Aceito sugestões e convites.
Hoje Macau SociedadeUM | Escritora Wang Anyi com doutoramento Honoris Causa [dropcap]A[/dropcap] Universidade de Macau irá atribuir o doutoramento Honoris Causa em Letras à escritora Wang Anyi como reconhecimento pelos contributos que fez ao longo da sua carreira para a literatura chinesa. Depois da cerimónia, Wang irá apresentar uma palestra intitulada “Literatura em língua chinesa no contexto global”. A prolífera escritora, com obra publicada desde 1977, fez parte da programação do festival literário Rota das Letras em 2015 e foi distinguida com vários prémios nacionais e internacionais. Wang Anyi, filha do reputado escritor chinês Ru Zhijuan, tem como principal marco da sua carreira “Song of Everlasting Sorrow”, que conta a história de vida de uma rapariga de Xangai até à sua morte depois da Revolução Cultural. A cerimónia, aberta ao público, está marcada para as 17h do dia 22 de Março, no Edifício Anthony Lau na Universidade de Macau. DSAL | Promoção de cursos de electricidade e electrónica A Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL) vai organizar dois cursos de formação profissional nas área da electricidade e da electrónica, destinados aos jovens. O objectivo é ajudar esta faixa da população a “enfrentar o emprego e desenvolver as suas potencialidades”. A ideia é formar os interessados nestas áreas durante um curto período de tempo, aumentando “a competitividade dos jovens” no processo de inserção no mercado de trabalho, aponta a DSAL em comunicado. Estes dois cursos de formação inicial serão diurnos com curta duração de cerca de 5 meses e as inscrições vão estar abertas durante o segundo trimestre deste ano.
Diana do Mar SociedadeIPM | Novos mestrados, incluindo em Tradução e Interpretação Chinês-Português O Instituto Politécnico de Macau (IPM) vai oferecer dois novos mestrados: um em Tradução e Interpretação Chinês-Português e outro em ‘Big Data’ e Internet das Coisas [dropcap]O[/dropcap] secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, aprovou o plano de estudos de dois novos mestrados, a serem ministrados no Instituto Politécnico de Macau (IPM). A saber: um em Tradução e Interpretação Chinês-Português e outro em ‘Big Data’ e Internet das Coisas. Ambos têm a duração de dois anos. Segundo os despachos, publicados ontem em Boletim Oficial, o curso em Tradução e Interpretação Chinês-Português, que tem essas duas línguas como veiculares, compreende, como o nome indica, a duas áreas de especialização: tradução e interpretação. O curso é ministrado mediante aulas presenciais, estando a obtenção do grau de mestre condicionada ainda à elaboração, entrega, apresentação e aprovação de um relatório de projecto original. Já o mestrado em Big Data e Internet das Coisas, a ser criado na Escola de Administração Pública do IPM, tem como língua veicular o inglês. O curso, de dois anos, é igualmente ministrado mediante aulas presenciais, estando a obtenção do grau de mestre dependente ainda da elaboração, entrega, discussão pública e aprovação de uma dissertação escrita original. Designações alteradas No Boletim Oficial de ontem foram ainda publicados outros despachos do secretário para os Assuntos Sociais e Cultura que aprovam alterações a denominações e planos de estudos de outros cursos. É o caso do mestrado em Estudos Lusófonos de Literatura da Universidade de São José (USJ), que passa a designar-se mestrado em Estudos Lusófonos de Linguística e Literatura, com o curso a abranger assim duas áreas de especialização (Linguística e Estudos Literários). O novo plano de estudos aplicar-se-á aos estudantes que iniciem a frequência do curso no próximo ano lectivo de 2019/2020, podendo os que já iniciaram os estudos concluir o curso à luz do plano definido anteriormente ou requerer a transferência para o novo, a qual fica sujeita à aprovação da USJ. O plano de estudos do mestrado em Design da Universidade de Ciência e Tecnologia também vai ser alvo de mexidas, passando a compreender seis em vez de três áreas de especialização (Design de Comunicação; Design de Produtos; Design Interior; Design de Vestuário e de Têxteis; Gestão de Design e Protecção de Património Cultural). O curso, de dois anos, tem as línguas chinesa e inglesa como veiculares. Também na Universidade de Ciência e Tecnologia foi alterado o plano de estudos da licenciatura em Línguas Estrangeiras, que tem o português, o inglês e o espanhol como áreas de especialização. A nova organização científico-pedagógica aplicar-se-á aos estudantes que iniciem a frequência no próximo ano lectivo de 2019/20, devendo os restantes concluir o curso, com a duração de quatro anos, nos moldes do plano de estudos actualmente em vigor. O mesmo sucede com as licenciaturas em Medicina Chinesa e em Bio Medicina, também ministradas pela Universidade de Ciência e Tecnologia, cuja organização científico-pedagógica e respectivo plano de estudos também foram alvo de mudanças.
Hoje Macau SociedadeSaúde | Gripe colectiva no Jardim de Infância Santa Rosa de Lima [dropcap]F[/dropcap]oi ontem identificado um caso de infecção colectiva de gripe em 17 alunos do Jardim de Infância do Colégio de Santa Rosa de Lima (S. Chinesa), situado na Rua de Santa Clara da Praia Grande. As crianças infectadas são três meninos e 14 meninas com idades compreendidas entre três e cinco anos. Segundo comunicado emitido pelos Serviços de Saúde, os sintomas de infecção do tracto respiratório, febre e dor de garganta foram-se manifestando desde o dia 6 de Março. A maioria dos alunos foi submetida a tratamento em centros de saúde, mas não se registaram casos graves. Crime | Homem de 71 anos tentou trocar fichas falsas Um homem de 71 anos de Hong Kong foi detido quando tentou trocar 100 mil dólares de Hong Kong em fichas falsas. De acordo com a informação da Polícia de Segurança Pública o homem foi descoberto uma vez que o padrão das fichas apresentadas já não era utilizado desde 2015. Após ter sido detido, o homem contou às autoridades que tinha sido contactado na região vizinha para trocar as fichas. O idoso relatou ainda que desconhecia que as fichas eram velhas e que ia receber 20 mil dólares de Hong Kong.
João Santos Filipe Manchete SociedadeTribunais | Falta de comparência de Conselheira deixa julgamento pendurado O caso em que os Conselheiros das Comunidades Portuguesas exigem mais de 167 mil patacas ao director do jornal San Wa Ou arrancou ontem. Na primeira sessão apenas esteve presente Armando de Jesus, que declarou sentir-se injuriado com o artigo em que os conselheiros eram acusados de andarem a vender passaportes portugueses [dropcap]T[/dropcap]riste, injuriado e com a reputação afectada. Foi desta forma que Armando de Jesus se sentiu devido a um artigo do jornal San Wa Ou, em que os três Conselheiros das Comunidades Portuguesas em Macau eram acusados de estarem envolvidos num esquema de venda de passaportes portugueses. O julgamento em que o deputado José Pereira Coutinho, Rita Santos e Armando de Jesus exigem 55.916 patacas, cada, num total de 167.748 patacas, ao director da publicação Lam Chong arrancou ontem. Além do pedido de indemnização, o director da publicação enfrenta também a acusação da prática do crime de abuso de liberdade de imprensa, na forma de difamação agravada. A sessão de ontem no Tribunal Judicial de Base (TJB) ficou marcada pela falta de Rita Santos, que não se encontra no território e que, de acordo com a conta de Wechat, está no Brasil. Por esse motivo, o colectivo de juízes, liderado por Chao Im Peng, teve de marcar uma nova audiência para 27 de Março para ouvir a Conselheira das Comunidades. Por sua vez, José Pereira Coutinho, por ser deputado, pode depor por escrito, o que evitou que tivesse de comparecer à audiência. Quem esteve presente foi o arguido Lam Chong e o terceiro ofendido Armando de Jesus, um dos três Conselheiros das Comunidades Portuguesas em Macau. Lam optou por não prestar qualquer tipo de declaração, mas Armando de Jesus relatou os impactos para si e para o deputado José Pereira Coutinho do artigo. O conteúdo nunca identifica pelos nomes os conselheiros em causa, apenas refere os três conselheiros, ou seja os ofendidos. “Senti-me triste [com o artigo]. “Porque é que nós, que estávamos a ajudar as pessoas, a contribuir para a sociedade, acabámos acusados injustamente?”, afirmou Armando de Jesus. José Pereira Coutinho terá tido uma reacção semelhante: “Ele teve a mesma reacção que eu. Sentiu-se injuriado. A nossa reputação e de Conselheiros das Comunidades Portuguesas foi afectada por factos que não correspondem à verdade”, apontou. Segundo Armando de Jesus, a reputação de Coutinho terá sofrido mais com o caso, uma vez que também é deputado. O conselheiro presente na sessão revelou também que foi abordado por “sócios e amigos”, que o questionaram sobre a situação. Violação portuguesa De acordo com o artigo, “o lado português” estaria a violar a Declaração Conjunta Sino-Portuguesa, visto que os Conselheiros das Comunidades Portuguesas estariam a vender passaportes portugueses, através da Associação de Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM). Segundo a informação publicada, em forma de opinião, por cada passaporte era cobrado um montante de 18 mil renminbis. Apesar de confirmar que o Conselho das Comunidades Portuguesas está instalado no mesmo espaço que a ATFPM, Armando de Jesus, que também é membro dos órgãos sociais da associação, a par de Rita Santos e José Pereira Coutinho, negou que houvesse qualquer tipo de pagamento. Segundo Jesus, o conselho terá mesmo contratado pessoas para ajudar nas marcações online de emissão ou renovação de passaportes no Consulado de Portugal. Questionado sobre se havia a recomendação de advogados às pessoas que utilizavam este serviços, o conselheiro admitiu a prática, nos casos mais complicados, como divórcios. Porém, negou que houvesse a menção de qualquer da quantia a pagar aos causídicos. Ainda em relação à a cobrança de 18 mil renmibis pelo serviço, Armando de Jesus negou o cenário. “Não consigo adivinhar de onde vem esse montante”, frisou. De acordo com o código penal de Macau, nos casos em que o crime de difamação é realizado através de um meio de comunicação social, o agente é punido com pena de prisão até 2 anos ou com multa de pelo menos 120 dias.
Hoje Macau PolíticaAL | Aceite debate pedido por Sulu Sou para discutir excesso de turistas [dropcap]”O[/dropcap] Governo da RAEM tem a responsabilidade de adoptar todas as medidas viáveis para atenuar os efeitos negativos do número excessivo de turistas sobre a vida da população local”. É o que defende o deputado Sulu Sou na proposta de debate de interesse público submetida à apreciação dos seus pares. A moção, admitida na Assembleia Legislativa, aguarda agora pela marcação do plenário para ser votada. “Se o aumento sem limites do número de visitantes continuar, vai afectar a vida quotidiana dos residentes, agravar os conflitos entre residentes e turistas e pôr em causa a qualidade e a segurança da experiência turística, afastando Macau do objectivo de [se transformar] num centro mundial de turismo e lazer”, como define expressamente o 12.º Plano Quinquenal da China, sustenta na nota justificativa da proposta de debate. Para o deputado, na hora definir medidas viáveis, a adoptar, “o quanto antes”, o Governo pode levar em linha de conta sugestões apresentadas ao longo dos últimos anos, como “criar um limite para o número total de turistas, reavaliar o impacto da triagem dos visitantes, reforçar a orientação do fluxo de pessoas nas zonas turísticas mais movimentadas, criar carreiras de autocarros turísticos para partilhar a pressão dos transportes públicos, combater as excursões a custo zero e as lideradas por guias ilegais, etc.”. Do trânsito às PME “É inegável que a expansão sem limites do turismo está a afectar o espaço de vida da população”, realça, dando como exemplos a pressão exercida sobre o trânsito e sobre as pequenas e médias empresas. “É verdade que a expansão do turismo acelera o desenvolvimento económico global, mas também está a ameaçar o espaço de sobrevivência das pequenas e médias empresas”, salienta o deputado pró-democrata. Sulu Sou aponta ainda que, “com o surgimento de lojas para servir exclusivamente os turistas, as lojas pequenas e tradicionais estão a ser substituídas, os preços e as rendas estão inflacionados”. O tema reveste-se de “seriedade, necessidade e premência”, merecendo “muita atenção da população”, enfatiza Sulu Sou que espera que os seus pares votem a favor do debate, de modo a “inspirar mais discussões, reflexões activas e opções para o rumo de desenvolvimento”.
João Santos Filipe PolíticaHotel Estoril | Lam Lon Wai quer saber qual o custo total da obra [dropcap]O[/dropcap] deputado Lam Lon Wai, ligado aos Operários, quer que o Governo avance com um orçamento para o Centro Juvenil de Actividades Cultuais, Recreativas e Desportivas, que vai ser construído no Hotel Estoril. É este o conteúdo de uma interpelação que questiona ainda o impacto dos atrasos no design do projecto. Em Agosto do ano passado a Direcção de Serviços de Educação e Juventude (DSEJ) organizou uma conferência de imprensa para explicar o futuro do Hotel Estoril. Nessa altura, foi apresentado o centro de actividades e anunciado que a concepção ia ficar a cargo da Companhia de Arquitectura e Design Chan Kam. A empresa comprometeu-se a finalizar o desenho do projecto em 233 dias, por um valor de 49,8 milhões de patacas. Contudo, o contrato apenas foi assinado em Dezembro e a falta de andamento dos trabalhos gerou críticas, que levaram a DSEJ a vir a público explicar que a fase concepção apenas fica concluída em 2020. Porém, Lam Lon Wai quer perceber o que se passou e pede ao Executivo que avance com um orçamento total, incluindo a fase de construção. “Segundo a DSEJ o projecto está na fase preliminar de concepção e ficará terminado para o ano. Mas este calendário não é consistente com aquilo que eram as expectativas sociais, uma vez que o contrato foi assinado em Dezembro e previa um prazo de 233 dias para os trabalhos”, escreve o deputado. “Registam-se atrasos do design do projecto, o que leva as pessoas a temerem que este projecto se torne em mais um ‘Hospital das Ilhas’, com muitos atrasos. Uma vez que o Governo espera que o design fique completo no próximo ano, já pode avançar um calendário para os trabalhos? O que é que vão fazer para que os trabalhos sejam finalizados o mais depressa possível?”, questiona o legislador, eleito pela via indirecta. E o preço? No mesmo documento consta também um pedido de todas as contas do projecto. “Ainda não foi apontado um orçamento total para a obra, o que leva a que as pessoas se sintam preocupadas com mais uma obra com um preço alto. Será que o Governo pode avançar com um orçamento o mais depressa possível e acalmar os receios da população?”, escreve. De acordo com as exigências do concurso, o Centro Juvenil de Actividades Cultuais, Recreativas e Desportivas do Tap Seac vai ter um parque de estacionamento público com capacidade para 900 lugares, piscina com cobertura, sala de artes e espectáculos. O edifício vai acolher ainda o Conservatório de Macau.
Sofia Margarida Mota Manchete PolíticaIndemnizações | Aumento de mil patacas beneficia 5000 trabalhadores O aumento de 1000 patacas para o cálculo das indemnizações em caso de despedimento sem justa causa vai beneficiar 5000 trabalhadores, segundo o director da DSAL. Apesar de não concordar com este acréscimo, a ala patronal aceita a medida. Os trabalhadores estão contra por considerarem que o aumento não é suficiente [dropcap]O[/dropcap] Governo aponta um aumento de mil patacas no valor mensal de referência para o cálculo das indemnizações por despedimento sem justa causa. De acordo com o director dos Serviços para os Assuntos Laborais, Wong Chi Hong, trata-se de “um aumento de 20 000 patacas para 21 000 patacas “o que significa um acréscimo de 5 por cento”, defendeu após a reunião plenária do Conselho Permanente de Concertação Social (CPCS). Segundo Wong, e tendo em conta os dados de 2017 da Direcção dos Serviços de Finanças, este aumento vai ter uma taxa de cobertura de 63,5 por cento dos trabalhadores locais, beneficiando mais de 5000 funcionários. Por outro lado, a medida vai ainda trazer benefícios a “176 mil empregadores, incluindo a pequenas e médias empresas”, disse. A alteração não é do agrado dos trabalhadores que defendem o cancelamento do artigo que prevê a existência de um valor de referência a ser pago durante o período de doze meses em caso de rescisão contratual sem justa causa. “A lei entrou em vigor há 35 anos e, tendo em conta o desenvolvimento da economia de Macau, já sofreu muitas alterações e por isso a parte laboral propõe ao Governo que cancele as regras previstas por serem muito injustas para os trabalhadores”, disse o representante dos trabalhadores após ao encontro de ontem. “Achamos que, tendo em conta os anos de trabalho, tem de existir outra forma de tratamento para evitar os casos injustos de rescisão contratual”, acrescentou Atrasos do costume O aumento agora anunciado estava previsto para 2017, ano em que se programou rever os valores das compensações. Para a ala laboral, os valores são demasiado baixos e têm como referência “dados que já não reflectem a realidade económica do território”. Por outro lado, consideram, “a taxa de cobertura na ordem dos 63,5 por cento não é alta e muitos trabalhadores vão ser prejudicados”. Por outro lado, o representante do patronato afirmou que as entidades empregadoras vão aceitar a medida do Governo, apesar de o fazerem com relutância. A ala patronal teme que as flutuações na economia internacional interfiram no desenvolvimento económico local. “Estamos numa incerteza e, se calhar, o território vai ser afectado pelos assuntos internacionais tais como a guerra comercial entre a China e os Estados Unidos. É necessário manter a estabilidade da economia local e evitar qualquer oscilação, mas vamos aceitar estas proposta”, afirmou o representante dos empregadores.
Hoje Macau PolíticaCooperação | Grande Baía na mira de empresas estatais [dropcap]P[/dropcap]arte da estratégia de Pequim para manter a competitividade das empresas estatais passa por alargar o raio de acção das mesmas aproveitando as oportunidades surgidas com a iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota” e o plano de cooperação da Grande Baía Guangdong – Hong Kong – Macau. A opinião é de Yan Bin, membro da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês e co-presidente da Câmara de Comércio para a iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”. Yan Bin, citado pelo China Daily, referiu que o desenvolvimento das grandes políticas de cooperação representa uma oportunidade para alargar os lucros das empresas estatais. As declarações foram proferidas na sequência de comentários sobre a reforma levada a cabo por Pequim na gestão das empresas públicas, com a expansão da propriedade mista entre o Estado e privados alargada a mais de 100 empresas públicas.
Sofia Margarida Mota PolíticaMotoristas ilegais | Pedido debate sobre agravamento de sanções Um aumento de sanções que inclua a interdição de motoristas ilegais apanhados a trabalhar no território é o tema do debate pedido por Ella Lei à Assembleia Legislativa. Para a deputada, as punições actuais não têm efeito dissuasor [dropcap]A[/dropcap] deputada Elle Lei solicita à Assembleia Legislativa (AL) um debate sobre o agravamento das sanções aos condutores ilegais. De acordo com a deputada com ligações à FAOM, a necessidade do aumento de multas e a existência de sanções que proíbam motoristas ilegais de voltar a trabalhar no território devem ser temas discutidos em reunião plenária visto que o actual sistema sancionatório não se tem mostrado eficaz no combate aos motoristas ilegais. “Segundo a lei actual, a punição por trabalho ilegal é relativamente pequena e as sanções que envolvem restrições de entrada em Macau, nestes casos, resumem-se a uma punição administrativa pelo que o efeito dissuasivo é limitado”, aponta a deputada no pedido de debate. “Além das penalizações impostas por lei, o Governo deve pensar em incluir a proibição de voltar a trabalhar em Macau para aqueles que foram apanhados em situação irregular”, acrescenta. Ella Lei recorda os dados da Direcção de Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL) que referem a existência de 154 sanções administrativas no ano de 2017, por condução ilegal no território. As multas atingiram 1 262 500 de patacas e, contas feitas, a deputada afirma que cada motorista apanhado em situação irregular terá pago uma média de 8.198 patacas, valor que considera reduzido. “A multa é de apenas alguns milhares de patacas e não existem penalizações adicionais. O custo por trabalhar ilegalmente é muito pequeno”, sublinha. Leque alargado Mas o problema do trabalho ilegal não incide apenas na actividade de motoristas, alerta a deputada, tratando-se esta profissão apenas “da ponta do iceberg”. A situação referente ao trabalho ilegal é “grave em Macau”, estendendo-se a vários ramos profissionais como “restauração, hotelaria, comunicações e logística”, aponta. Ella Lei aponta o dedo à DSAL que, apesar de já ter afirmado várias vezes a intenção de implementar medidas mais “agressivas” nesta matéria, não tem prosseguido com qualquer trabalho legislativo e concreto. “O que é insatisfatório é que nenhuma nova política ou medida foi implementada”, refere. Neste sentido, cabe ao Governo não atrasar mais os trabalhos legislativos que se impõem a agravação de “punições e melhorar o sistema legal” para assegurar maior protecção “dos direitos e interesses dos funcionários locais, regular o desenvolvimento económico e garantir justiça”, refere a deputada. DSAL admite revisão O director dos Serviços para os Assuntos Laborais, Wong Chi Hong, admitiu ontem que estão em curso “estudos” para rever a “moldura penal a que estão sujeitos os trabalhadores ilegais”. “Temos de ver como tratar devidamente os trabalhadores a quem foi dada autorização para trabalhar em Macau exercendo uma determinada função e que depois acabam por exercer outra. Por exemplo, temos de analisar casos em que um trabalhador de limpeza é autorizado a trabalhar, mas depois acaba por cozinhar”, apontou Wong. No entanto, no que respeita a motoristas ilegais, Wong Chi Hong salientou que a DSAL “nunca aprovou pedidos de motoristas não residentes”. Song Pek Kei avisa para “perigo escondido” A deputada Song Pek Kei considera que o facto de haver patrões que utilizam as quotas de empregadas domésticas para contratar trabalhadores de fora para outras funções é um “perigo escondido” para a sociedade de Macau. Na mais recente interpelação da legisladora apoiada por Chan Meng Kam, o Governo é questionado sobre os passos e medidas de segurança que vai adoptar para por fim a esta prática ilegal. Segundo a legislação em vigor, um trabalho não-residente é contratado para uma determinada funções e não pode fazer qualquer outro tipo de trabalho, nem em part-time. Contudo, Song queixa-se que este é um problema cada vez mais comum e que há cada vez mais empregadores a abusar do sistema.
Diana do Mar Manchete SociedadeHistória | Livro reaviva papel do Seminário de S. José na formação das gentes de Macau Desde princípios do século XX, é uma escola vocacionada em exclusivo para a formação de padres, mas o Seminário de S. José foi muito mais ao longo de quase 300 anos de vida. João Guedes foi revisitar o passado, reunindo peças de um ‘puzzle’ que estava por montar, num livro a ser apresentado na próxima semana [dropcap]C[/dropcap]om quase tantas páginas como os anos de vida do Seminário de S. José, o novo livro de João Guedes figura como um capítulo da história de Macau que estava por escrever. Aceitando o repto lançado pelos Antigos Alunos do Seminário de S. José, o autor lançou-se à missão de recolher os pedaços dispersos sobre a vida e o papel de uma instituição, cujo legado, olvidado pelos tempos, fica agora cristalizado em livro. A obra, intitulada “O Seminário de S. José – Na Formação das Gentes de Macau”, é patrocinada pela Fundação Macau. O lançamento está marcado para o próximo dia 19, pelas 19h, no restaurante Metrópole, localizado na Avenida da Praia Grande. Não se sabe exactamente quando tudo começou, porque a data da fundação do Seminário de S. José continua a ser “controversa”, mas as estimativas, com base em documentos da época, apontam para o intervalo entre os 1728 e 1749. Projecto dos jesuítas, o Seminário de S. José surge no contexto da almejada evangelização do Oriente que tinha o Japão e a China como principais eixos, constituindo-se como a “ponta de lança” para a missionação do império do Meio. “Os jesuítas fizeram a grande acrópole que é S. Paulo, com o colégio, para a evangelização do Japão, e depois, uma segunda, também erguida num alto, com uma imponência semelhante, para a evangelização da China”, começa por explicar João Guedes, em entrevista ao HM. Por ali passaram “nomes importantíssimos”, principalmente da cultura, e em escala antes de seguirem para o tribunal das matemáticas, em Pequim, iluminados da área das ciências, complementa. No entanto, o plano, “bem organizado”, vai perdendo fôlego até se esvanecer com a chamada “questão dos ritos”. Em causa o conflito que opôs os jesuítas – que defendiam a continuação da prática dos ritos pelos católicos chineses – e outras ordens religiosas, como os dominicanos – que alegavam que os permitir nos ritos era alimentar superstições incompatíveis com o catolicismo – terminou no século XVIII com a veredicto de Roma contra os homens da Companhia de Jesus. “A polémica foi de tal ordem que o imperador [da China] não teve alternativa senão pura e simplesmente expulsar os padres todos da China”, contextualiza João Guedes. Muitos procuraram refúgio em Macau, em concreto no Seminário de S. José, incluindo o último bispo consagrado da China que fica no território 14 anos à espera de poder entrar em território chinês, mas em vão, salienta João Guedes. A ordem de expulsão dos jesuítas dada pelo Marquês de Pombal chega em 1762, com a execução a redundar num cerco às instalações pertencentes aos jesuítas e na prisão de todos os professores em Macau. Com a expulsão dos jesuítas, o Seminário de S. José fica praticamente ao abandono, um reflexo, aliás, do encolher da força do padroado português do Oriente, mantendo-se pelos 15 anos seguintes na ‘mais apagada e vil tristeza até à chegada dos lazaristas’”, que irão “refundar” o Seminário de S. José que “regressaria, ou mesmo ultrapassaria, o seu antigo esplendor”. Ecos revolucionários Como narra o autor, foi nesta segunda fase da história que o prestígio do Seminário de S. José “se consolidou de facto”, constituindo-se como “a instituição de ensino local, já que a educação laica era virtualmente inexistente”. O liberalismo em Portugal vem, contudo, abrir um nova frente de crise, com os ecos da revolução a fazerem-se sentir localmente a partir de 1822. “Estamos numa altura em que o Seminário de S. José concentra a inteligência local e os professores eram todos sujeitos de grande formação e, portanto, progressistas, pelo que o liberalismo é decididamente apoiado por eles” e “contestado pelo clero secular, principalmente pelos dominicanos”. Após o golpe, Macau singrou durante um ano independente do intermediário poder de Goa e também à revelia de Lisboa”, um período que João Guedes descreve como “muito interessante”: “Durante um ano, Macau foi gerido como uma República e quem mandava era o Leal Senado e, aliás, esteve por um fio de deixar de pertencer à coroa portuguesa e passar a pertencer à brasileira”. Isto porque estávamos na altura do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves e “existia em Macau uma corrente liberal para a qual fazia mais sentido Macau ser administrativamente gerido pelo Brasil”. Desde logo porque “quem justificava a existência de Macau eram os comerciantes que, naturalmente, preferiam os brasileiros democráticos em detrimento dos portugueses absolutistas”, mas essa aspiração nunca vingou. A ascensão ao poder dos miguelistas e, por conseguinte, o fim do liberalismo em Macau, dita a prisão ou a fuga dos padres do seminário que volta a mergulhar “numa lenta agonia”. “A educação em Macau simplesmente acaba. Não havia mais nenhum sítio para estudar em Macau. Era muito oneroso para as famílias terem que mandar os filhos para Portugal ou para as Filipinas, por exemplo…”, realça João Guedes. Durante a guerra civil travada em Portugal (1828 a 1834) mantém-se o interregno na formação, mas o cenário que viria depois estaria longe do ideal: “O Seminário de S. José seria novamente afectado, desta feita, por outra razão: o facto de o poder instituído em 1834 ser liberal anticlerical”, explica João Guedes. Os apelos para que o Seminário de S. José voltasse a ser entregue à Companhia de Jesus foram ganhando ímpeto, com os jornais da época a chamar a atenção para a “crassa ignorância” que reinava em Macau, com críticas de que “não existiria um só macaense de 20 anos que soubesse ler, falar e escrever com acerto a sua própria língua”. Os jesuítas acabam por voltar, num regresso que, segundo João Guedes, foi “tão marcante quanto fugaz”. “Durante os nove anos dos Jesuítas, o Seminário, além de ter crescido exponencialmente em quantidade revelou-se igualmente pela qualidade do ensino”, forjando alunos que “acabariam por ter papéis de relevo não só na vida eclesiástica, mas também noutras áreas”. O liceu Em 1870, por virtude de um decreto, o Seminário passa a “servir de liceu”, oferecendo “instrução secundária aos indivíduos que não se destinarem aos estados eclesiásticos”, tornando-o no “único estabelecimento de educação onde se ministrava o ensino secundário, com programa de estudos oficializado”, antes da criação de um Liceu em Macau, em 1893. Uma portaria definia que os professores teriam de ser obrigatoriamente de nacionalidade portuguesa e, pela segunda vez, os jesuítas foram novamente “arredados da história de Macau”. A saída do corpo docente não redundou, como antes, na ruína do seminário, já que no mesmo dia em que os jesuítas partiram (em 1871) chega a Macau um novo grupo, ainda que com um único padre entre os professores. Já a entrada no século XX marca o ponto de viragem, assinala João Guedes, dado que o S. José passa a ser um “verdadeiro seminário”, existindo exclusivamente para formar padres, depois de ter tido, durante décadas a fio, o “exclusivo da educação” e a particularidade e a “grande vantagem” de formar ambas as comunidades de Macau – a portuguesa e a chinesa –, enaltece João Guedes. Alunos notáveis Do universo de vultos que frequentaram o Seminário S. José, o autor do livro destaca nomeadamente o marechal Gomes da Costa, líder do golpe militar de 28 de Maio de 1926, que instauraria o Estado Novo, mas outras figuras de relevo nacional ali completaram a educação primária e secundária, como os irmãos Artur e João Tamagnini Barbosa, exemplifica João Guedes. O primeiro foi, por três vezes, governador de Macau, enquanto o segundo foi ministro do Interior, das Colónias e das Finanças e desempenhou o cargo equivalente a primeiro-ministro durante a I República. Já da área da cultura emergem nomes como o pintor Luís Demée ou o intérprete-tradutor Pedro Nolasco da Silva. O livro, dividido em 12 capítulos, traça o percurso do seminário, fazendo-se acompanhar por uma série de fotografias de diferentes momentos de uma instituição que “entronca” na vida social da própria cidade.
Sofia Margarida Mota EventosLiteratura | José Luís Peixoto entre hoje e quinta-feira na UM [dropcap]O[/dropcap]escritor português José Luís Peixoto vai estar entre hoje e quinta-feira na Universidade de Macau para conduzir um oficina de escrita no Centro Bilingue Chinês-Português daquela instituição. A iniciativa é dirigida à promoção da escrita de ficção literária e está estruturada em quatro sessões a decorrer das 15h às 17h30. O objectivo é “divulgar a língua e cultura portuguesa” e “fazer com que cada um dos participantes produza um texto literário, percebendo a estrutura, criatividade e métodos envolvidos no processo de criação”, aponta a organização em comunicado. José Luís Peixoto, recebeu em 1997, aos 23 anos, o Prémio Jovens Criadores atribuído pelo Instituto Português da Juventude, com a obra de ficção “Morreste-me”, dedicada ao pai. Em 2001, o autor começa a destacar-se no panorama da literatura portuguesa ao receber o Prémio Literário José Saramago, da Fundação Círculo de Leitores com o romance “Nenhum Olhar”. Da sua obra, que se encontra traduzida em mais de 25 línguas, fazem parte seis romances, seis livros de ficção, três séries de poesia e dois livros infantis.
Hoje Macau SociedadeReligião | Procissão do Senhor dos Passos juntou centenas [dropcap]L[/dropcap]argas centenas de pessoas integraram ontem a procissão do Senhor Bom Jesus dos Passos em Macau, entre a Sé catedral e a igreja de Santo Agostinho, numa das mais importantes tradições católicas da cidade. Ontem à tarde, a procissão, que contou com a participação do bispo de Macau, Stephen Lee, percorreu algumas das ruas mais movimentadas do centro da cidade, para cumprir sete estações da via-sacra, representativas do percurso feito por Jesus Cristo até ser crucificado no monte Calvário, em Jerusalém. Em cada estação, algumas dezenas de pessoas esperavam a imagem. Cânticos e orações foram entoados em português, chinês e latim, tal como nas cerimónias que antecederam e concluíram a procissão, acompanhada pela banda de música das Forças de Segurança. Esta tradição religiosa está repartida por dois dias. No dia anterior, ao final da tarde de sábado, decorreu a procissão da Cruz, que juntou igualmente algumas centenas de fiéis. A imagem do Senhor dos Passos saiu da igreja de Santo Agostinho com destino à Sé, onde ficou durante a noite. Esta cerimónia assinala também o primeiro domingo de Quaresma, período de oração, penintência, jejum e abstinência para os católicos. Com uma longa história, que remonta a 1708, a procissão do Senhor Bom Jesus dos Passos realiza-se todos os anos em Macau, no primeiro sábado e domingo de Quaresma. Em Setembro de 2017, esta procissão e a de Nossa Senhora de Fátima entraram para a lista de património intangível de Macau, publicada pelo Instituto Cultural de Macau.
Hoje Macau SociedadeEspecialista de jogo pouco optimista relativamente ao desempenho dos casinos em 2019 [dropcap]D[/dropcap]avid Green, fundador da Newpage Consulting, consultora especializada em regulação de jogos, mostrou-se pouco optimista em relação aos resultados dos casinos em 2019, devido à entrada do Japão nas apostas, do crescimento do Camboja e da guerra comercial EUA/China. Os casinos de Macau fecharam 2018 com receitas 303 mil milhões de patacas, traduzindo um aumento de 14 por cento face a 2017. Contudo, na opinião de David Green, face a vários factores externos a Macau, a tendência de crescimento que se tem verificado nos últimos anos pode ter chegado ao fim. “O Japão será uma grande distracção para os grupos interessados em ganhar uma concessão de jogo”, afirmou, em declarações à Lusa. Cinco das seis operadoras de jogo (MGM, Sands, Wynn, Melco e Galaxy) “manifestaram publicamente interesse” em garantir uma licença no Japão, depois de o parlamento nipónico ter aprovado a abertura de três casinos a partir de meados de 2020. Na opinião do fundador da Newpage Consulting, a entrada em força de outros países asiáticos no jogo, como o Camboja e o Vietname, pode levar os turistas chineses que visitam Macau (25 milhões dos 35,8 milhões de turistas em 2018) para essas paragens. “O Camboja tem potencial para conseguir alguns dos jogos de massa e VIP de Macau, tanto em Naga, como no aglomerado de casinos em Sihanoukville”, já o “desenvolvimento de Hoi An, no Vietname” poderá “afastar os jogadores” VIP de Macau, considerou. Guerra comercial Já sobre a guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, apesar de estimar que “será resolvida”, David Green entende que Pequim “terá de fazer concessões que preferiria não fazer (…) e vai perder a face”. “Isso poderá prejudicar os operadores norte-americanos (MGM, Sands e Wynn) que estarão mais vulneráveis a qualquer acto de retaliação”. “A retaliação provavelmente será subtil, mas significativa”, frisou. O ‘fraco optimismo’ de David Green é também suportado pelas estimativas do Fundo Monetário Internacional que estima que a economia de Macau cresça 5,3 por cento em 2019. No ano passado, o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 4,7 por cento, em termos reais, reflectindo um forte abrandamento de cinco pontos percentuais face a 2017.
Jorge Rodrigues Simão Perspectivas VozesA olvidada paisagem sonora [dropcap]S[/dropcap]e fechar os olhos por um momento e escutar o espaço que me rodeia dou conta que da minha cadeira, ouço a agitação rítmica do ciclo de centrifugação da máquina de lavar, abafada apenas levemente por uma porta fechada. Na sala ao lado, ouço uma melodia cadenciada de bandolim. Ainda mais longe, a sugestão de um zumbido baixo, como o de um raro jacto cruzando o céu, que me faz lembrar a presença do frigorífico no espaço contíguo à cozinha. Se eu me concentrar mais, posso ouvir o gemido distante de sopradores de folhas na rua, embora o que poderiam estar a soprar no meio do inverno esteja além de mim. E ao lado do “click clack” da minha digitação, ao enviar estas palavras à página, está o ronronar de um disco rígido externo, um som reconfortante da era digital. Estes são os sons da minha e da nossa vida diária. Os sons possuem muitas universalizações compartilhadas pelos povos do mundo como lembretes sonoros de electricidade, canalização interna e motor de combustão. No entanto, são simultaneamente e totalmente exclusivos do local onde ocorrem e podem incluir o clamor longínquo de um raro galo ou um chamado árabe à oração. Ao ler a passagem acima, provavelmente ouviu os sons descritos na sua mente, em um processo chamado de audição. Ainda que a minha audição possa ser diferente de outra pessoa, a imagem sonora mental vívida ilustra o poder do som como meio de comunicação. Pode transmitir significado, emoção, memória e factos por meio de linguagem, música e gravações. O som, quando entendido como um ambiente, é uma paisagem sonora; uma ferramenta poderosa que ajuda os seres humanos a se relacionarem com o ambiente. Os sons podem ser conscientemente projectados por um indivíduo ou grupo de indivíduos, ou o subproduto de circunstâncias históricas, políticas e culturais. Podem ser composições musicais, gravações de campo antropológicas etnográficas ou de uma floresta tropical tomadas por um ecologista, ou ainda imaginações de um projectista de som/historiador ruminando os sons do passado. As paisagens sonoras definem comunidades e os seus limites, actores, complexidades geográficas e indústrias. Os sons surgem através das interacções entre forças externas e internas dentro de uma comunidade. O que torna a paisagem sonora de um lugar diferente de qualquer outro local no mundo são as marcas sonoras. A marca sonora da nossa casa pode ser uma pequena fonte borbulhando no canto da sala de estar, ou o tilintar de um carrilhão de vento no seu quintal, se o urbanismo tresloucado ainda o permitir. Por certo gosta desses sons porque o fazem sentir-se de alguma forma feliz, e coloram a impressão de todos os outros sobre o ambiente sonoro do seu espaço pessoal. A marca sonora do local onde mora pode ser a piscina local, quiçá metida no meio dos arranha-céus dos prédios que constituem as edificações da utilização de um lote urbano, pensado para engaiolar gente que não merece ter o mínimo de qualidade de vida, com o som de salpicos e gente rindo dominando a paisagem sonora, sempre que a temperatura sobe acima dos vinte e cinco graus centígrados. Mas durante os Outonos e Invernos que se misturaram selvaticamente com as outras estações, por força das alterações climáticas que os seres humanos irresponsavelmente tiveram a ousadia de atiçar, talvez a paisagem sonora da sua cidade seja dominada pela marca sonora do fole diário dos apitos e ronronar de motores de carros e motociclos, altamente causadores das maiores poluições atmosféricas e sonoras que o mundo conhece e que a boas e más governanças nacionais não querem ou não podem resolver. Talvez tenha adicionado a fonte e o som do vento na sua casa se não viver enjaulado para combater a estética desagradável desses sons, pois criamos a nossa paisagem sonora em diálogo com a comunidade e como sua reacção. Tais escolhas iluminam aspectos da nossa sensibilidade estética e formação pessoal e cultural. A resposta do vizinho ao som que medido virou ruído, pode ser cultivar um jardim atraente para os pássaros na marquise improvisada da minúscula varanda, de modo que a nossa paisagem sonora pessoal fosse constantemente preenchida com o canto dos pássaros. Todos os membros da comunidade podem ter reacções individuais à paisagem sonora, e o contraste entre a paisagem sonora aos níveis micro e macro, ajuda a pintar uma imagem da composição diversificada de uma comunidade. Este é o poder da paisagem sonora. Se fecharmos os olhos novamente, podemos imaginar um espaço que não seja diferente do descrito e o ronronar baixo do frigorífico lentamente desaparece e o gemido distante do soprador de folhas foi substituído pelos cascos rítmicos dos cavalos. O ciclo de centrifugação da máquina de lavar roupa foi substituído por roupas batendo em um estendal no quintal. Escutamos passos barulhentos e o rangido de um cesto de vime pressionado contra um corpo. É mais fácil ouvir o seu batimento cardíaco, respiração, suspiros ecoando e o vento assobiando pelas rachaduras na janela. É uma paisagem sonora de um tempo passado. Esta poderia ser a paisagem sonora de uma casa do século XIX, até mesmo de uma casa singular do século XX. Em um contexto ambiental, a paisagem sonora ajuda-nos a entender a ecologia acústica de um lugar. A floresta repleta de muitos tipos de pássaros e outras actividades animais indicaria um ecossistema saudável, diversificado e resiliente. Por outro lado, um ecossistema dominado por uma única fonte sonora, como o canto da cigarra, ilustra uma possível falta de diversidade e resiliência. Quanto mais resiliente for um ambiente, maior será a sua capacidade de resistir a um distúrbio significativo sem danos e mudanças irreparáveis. Também são importantes as maneiras pelas quais os sons interagem entre si. A hipótese do “nicho acústico” desenvolvido por Bernard Krause, músico americano e ecologista de paisagem sonora, que afirma que todos os organismos ocupam uma faixa de frequência funcionalmente específica dentro de um ecossistema. Por exemplo, se em um pasto houver grilos e pássaros, a chamada de críquete estará em uma faixa de frequência diferente ou ocorrerá em um horário distinto do canto dos pássaros, de modo que cada grupo de comunicação dos organismos sobreviva, tais como chamadas de emparelhamento, podem ser mais facilmente ouvidas. Os ruídos conflituantes decorrentes da actividade humana forçam os organismos a alterar o seu comportamento para se adaptarem a novas frequências, como o tráfego automóvel e os nichos acústicos nítidos tornam-se confusos, à medida que os modos naturais de comunicação dos organismos se tornam ineficazes face às mudanças, comprometendo a aptidão e a sobrevivência das espécies. As comunidades humanas não são diferentes. A distinção entre as facetas sónicas das comunidades é cada vez mais difícil de discernir no nível superficial. Muito parecido com uma nota à cigarra, é o clamor da música pop ocidental em restaurantes e táxis que dominam as paisagens sonoras de todo o mundo. É de considerar que milhares de quilómetros quadrados da floresta tropical brasileira deram lugar a herdades de gado e pastagens, trazendo consigo paisagens e marcas sonoras completamente novas. No entanto, mesmo entre essa mudança, é importante lembrar que, sob a superfície aparentemente homogénea, ainda existem ricos recantos culturais na forma de música de fundo, narrativa e industrial. Tudo isso requer uma pequena amplificação para ser ouvida. A experiência humana é altamente sonora e como uma das propriedades centrais do som é sua efemeridade, não perdura muito além da sua produção, e até mesmo uma gravação é apenas uma representação subjectiva da realidade, fácil de esquecer, embora seja um dos nossos principais sentidos. É fundamental que não nos esqueçamos do som, por causa do seu papel decididamente cultural dentro da nossa ecologia acústica. Lembrar os sons do passado pode-nos fornecer indícios da evolução de uma comunidade, proporcionando às pessoas as ferramentas para olhar o futuro. Uma comunidade costeira pode mobilizar as memórias dos sons do martelo em madeira de um estaleiro, como uma força motriz para revitalizar uma indústria. A promoção da diversidade cultural global ajuda a incutir nas pessoas um senso de lugar e pertença. Os sons dão-nos uma representação do mundo ao nosso redor tão vívido e evocativo das paisagens visuais que competem pela nossa atenção. A geografia preocupou-se sempre e principalmente com a compreensão do mundo através de termos inerentemente visuais. As obsessões geográficas com mapas e cartografia, actividade que tem sido intrinsecamente ligada à conquista e construção de impérios, dependiam muito do olhar visual para quantificar, entender e, finalmente, ordenar o mundo. O mundo foi estruturado a partir de uma perspectiva ocidental e foi o resultado pretendido e não uma consequência imprevista. As estreitas ligações que a geografia compartilha com os militares continuam na actualidade, e quem viu a magistral peça de teatro “Translations” do dramaturgo irlandês Brian Friel, escrita em 1980, tem a noção de que é uma peça apenas sobre linguagem, mas lida com uma ampla gama de conteúdos, que se estende da linguagem e comunicação à história irlandesa e ao imperialismo cultural. As relações uniram-se durante o período em que a peça é adaptada, e foi a primeira pesquisa completa em qualquer país do mundo. O mapeamento, limites e o controlo definem essa actividade, e o visual foi usado para o codificar e validar. O papel desempenhado pelos sons na paisagem, pelo contrário, só recentemente começou a receber a atenção que merece. Assim como as pistas visuais, os sons combinam-se para formar sistemas de significado que podem servir para transmitir, reificar, desafiar ou reinventar simultaneamente normas e valores socioculturais. O termo paisagem sonora está a começar a desafiar o domínio da paisagem na escrita geográfica e no pensamento. As paisagens sonoras são o som entendido como um ambiente. Se alguém fechar os olhos, se estiver de pé na beira de uma rua movimentada ou sentado em uma mesa de um escritório, o fluxo de barulhos concorrentes orienta o ouvinte ao seu ambiente imediato da mesma forma que as dicas visuais o fazem. Se o fizer por tempo suficiente, os sons começarão a assumir ressonâncias espaciais maiores à medida que o ouvinte distingue as distâncias dos ruídos individuais, o nível de ameaça que o objecto que os produz, ou os tipos de respostas emocionais que provocam e tudo se combina, para nos dar uma representação do mundo ao nosso redor, tão vívida e evocativa das paisagens visuais que competem pela nossa atenção. O poder dos sons afecta-nos de várias maneiras. Só se tem que assistir a uma cena de um filme de terror, com o volume baixo para se aperceber de uma diferença na nossa percepção do que pode ser uma ameaça. Uma figura sombria que se aproxima da tela, geralmente, não parece tão ameaçadora sem as pistas de áudio que sinalizam o perigo. As paisagens sonoras e as marcas sonoras que os compõem contribuem e informam os conhecimentos que experimentamos ao longo da vida. Por exemplo, os povos aborígenes australianos usavam mapas mentais audiovisuais, esboçados em sons através de canções que ajudavam os iniciados a navegar pelo vasto continente australiano. Cantando versos na sequência correcta, foram capazes de usar marcadores visuais identificáveis na paisagem, como rios ou cordilheiras, para observar quais as áreas seguras para viajar. Ainda que sejam mais frequentemente ignorados até desaparecerem, as marcas de som em uma paisagem sonora são tão importantes quantos os pontos de referência visuais para identificar ou lembrar um lugar. Os cantos icónicos das cigarras evocam imagens de um verão japonês para os ouvintes que lá passaram. O cinema japonês abunda com esses cantos, especialmente quando retrata uma cena de verão. O codornizão, na Irlanda, foi a omnipresente ave campestre de verão que se encontrava em todo o país. O seu canto, agora ausente e em perigo de extinção na Irlanda, excepto em algumas concavidades vulneráveis ao longo dos rios, costumava ocupar um espaço semelhante no folclore irlandês como a cigarra no Japão. As ligações muito próximas que os sons têm em contextos específicos de tempo e lugar, tornaram-se um crescente campo de interesse em todas as disciplinas desde a década de 1940. Os estudiosos de música, antropologia, cinema e ecologia reconheceram a importância cultural e ecológica do som em ambientes humanos e naturais. É de recordar que Bernard Krause tem vindo a coleccionar gravações do mundo natural desde 1968. Nesse período, demonstrou como os ambientes naturais são profundamente afectados pelos seres humanos, mesmo quando realizam actividades relativamente ecológicas em uma determinada área, e no seu livro “Great Animal Orchestra”, descreve algumas das paisagens sonoras bioacústicas mais atraentes do planeta, e como podem ter ajudado a contribuir para o desenvolvimento da música e da fala humana. O músico e ecologista americano divide os sons em três categorias, que são a biofania (sons feitos por animais e plantas); geofania (sons naturais como os produzidos pelo vento e chuva) e antropania (ruídos induzidos pelo homem que impactam desproporcionalmente os ecossistemas que os sofrem) e formula a hipótese de que, quanto mais saudável e estável for o habitat, maior a complexidade e o alcance da musicalidade expressa pelas criaturas que o ocupam. Essencialmente, reduções na biodiversidade levam à desertificação do sinal de acústica de um habitat. O livro de Bernard Krause fornece um exemplo de uma floresta antiga no oeste dos Estados Unidos, onde registou a biofania da área antes e depois da extracção selectiva de madeira. O entendimento convencional, sugeriu que as práticas de exploração selectiva teriam um impacto mínimo sobre a biodiversidade da floresta, especialmente quando comparadas ao desmatamento que geralmente ocorre. Quanto mais saudável e estável for o habitat, maior será a complexidade e variedade de musicalidade expressas pelas criaturas que o ocupam. Mas através das suas gravações, Bernard Krause foi capaz de demonstrar que a paisagem sonora bioacústica tinha mudado dramaticamente, embora a floresta parecesse ser intocada em termos visuais. O impacto real da exploração madeireira, mesmo práticas ambientalmente sensíveis, como neste caso, só pode realmente ser entendido medindo-se a paisagem sonora. Com efeito, a sinalética bioacústica foi devastada após a extracção tendo sido registada a ausência da maioria das espécies de pássaros e insectos capturados durante a primeira gravação. É de considerar que vivemos uma era de extinção em massa de espécies animais e compreender a importância da paisagem sonora de um habitat como um indicador de um bioma saudável é profundamente importante, especialmente se fizermos uma tentativa realista de verificar o colapso da biodiversidade.
João Luz VozesInfantilidade [dropcap]M[/dropcap]acau tem todas as idades. É velha, cheia de fantasmas, com um passado sofrido. Debaixo das suas ruas acumulam-se séculos em camadas geológicas de vidas perdidas e pirataria. É maior e vacinada, aglomera todos os vícios oferecidos pelo mafarrico e vende todos os pecados capitais que o capital consegue comprar. É uma cidade calejada pela violência, palco de sucessivas gerações de piratas, ladrões, corruptos e poetas, porto de abrigo para desesperados, berço confortável de tríades várias, local onde a lei é apenas um slogan que vende uma realidade pintada a rosa por cima de um mar de cinzas. Ao mesmo tempo, Macau é uma criança renovada a cada passo, em crescimento disforme e com dentes de leite a despontar de uma velha e seca gengiva. É uma cidade que vive em perpétua idade da inocência. A primeira manifestação de infantilidade que salta à vista para quem acaba de cá chegar é a publicidade institucional. O poder fala com o povo como a Ana Malhoa se dirigia ao público do Buéréré, com um aberto e sorridente “olá, amiguinhos”. Seja qual for o departamento do Governo, usa-se um tom adequado para comunicar com uma criança de seis anos, sempre com cores vivas, desenhos animados, banda sonora a evocar memórias de Teletubbies e um sentimento grotesco de Terra do Nunca com um design que, ironicamente, faz lembrar os sanguinários “cartoons” de Joan Cornellà. Em Macau, o complexo de Peter Pan é uma política basilar. Por exemplo, se a mensagem for a divulgação de uma linha telefónica para receber informações sobre a perigosidade de um destino de férias, as imagens são um desenho animado, como é óbvio. A publicidade institucional que tenho em mente retrata aquilo que só pode ser interpretado como um menino a fazer turismo, de máquina fotográfica em riste, num cenário de guerra ao estilo da Síria. Entre duas fotos, aparece um tanque de guerra que dispara contra o menino. O resultado não é morte, vísceras de fora e o horror consequência da guerra, algo que também seria completamente despropositado mostrar num anúncio de alerta. Em vez disso, o incauto turista fica com a cara tisnada de fuligem, cabelo de pé a fumegar e um ar confuso de quem esperava morrer depois de levar com munição de tanque. As forças de segurança ganham o óscar para melhor filme de animação, com vários exemplos de assuntos sérios e aterradores retratados como um episódio da Rua Sésamo. Do pequeno furto de carteiristas em autocarros até à ameaça de terrorismo, os prevaricadores têm sempre o aspecto de um Playmobil sorridente. Apetece pegar no Playmobil que se assemelha ao Bin Laden e pô-lo a jogar à bola com o Rato Mickey, ou numa festa de chá com a Barbie. Será que ainda assim, o terrorista animado iria detonar os palitos de dinamite atados a laço com um relógio em cima? Por um imperativo de falta de pachorra e espaço de página abstenho-me de elencar mais exemplos de como o poder fala com os residentes com cutchicutchis e apertões nas bochechas. Quem é o residente mais lindo, em conformidade com a harmoniazinha fofa do papá?! Quem é, quem é? É tu! Uma fórmula semelhante é usada na ligação entre Governo e comunicação social. Nos discursos oficiais, somos sempre representados como os melhores amigos, camaradas do peito que andaram na escola e que já choraram no ombro um do outro. Depois, no quotidiano, quando buscamos informação que descodifiquem a realidade, somos empatados ou, simplesmente, atiram-nos com uma resposta que pouca relação tem com a pergunta. Mas o pior mesmo é repetirem, até à náusea, que a função do jornalismo é transmitir as mensagens do Governo, ser o seu megafone, com a missão lateral de fazer sugestões de governação. É possível que o livro oficial do Executivo e a sua filosofia central seja “O Segredo”. Parece que ao poder basta pensamento positivo e desejar muito que a realidade se adeque aos seus desígnios em vez do contrário.
Sérgio Fonseca DesportoTaça do Mundo de Fórmula 3 continua em Macau O Conselho Mundial da Federação Internacional do Automóvel (FIA), que teve lugar na pretérita semana em Genebra, confirmou que o 66º Grande Prémio de Macau, a realizar de 14 a 17 de Novembro, vai ser novamente o palco da Taça do Mundo FIA de Fórmula 3. [dropcap]A[/dropcap]comunicação da FIA foi curta e não detalhou em que moldes será disputada este ano a prova que habitualmente encerra o programa de corridas do evento automobilístico da RAEM. Contudo, visto que a FIA só autoriza o uso da designação “Fórmula 3” a campeonatos que cumpram com a última regulamentação do órgão máximo que rege o automobilismo mundial, é expectável que sejam os mais recentes monolugares da disciplina, apenas usados no novo Campeonato FIA de Fórmula 3, a darem corpo à grelha de partida da corrida. A utilização dos novos monolugares de Fórmula 3, construídos pela Dallara e com um motor único fornecido pela Mecachrome, poderá requerer alterações ao Circuito da Guia, principalmente a nível de segurança, alterações essas que poderão ter sido já discutidas superficialmente com a Comissão do Grande Prémio e com a Associação Geral Automóvel Macau-China. Nenhuma das duas entidades ainda se pronunciou oficialmente sobre o assunto. Com uma potência de 380 cv, os novos carros da Fórmula 3 fizeram o primeiro “shakedown” no dia 1 de Março no circuito de Magny-Cours, em França, e segundo apurou o HM, rodaram com o peso mínimo de 692 kg. Para atender aos requisitos actuais do Circuito da Guia (FIA Grau 3), estes monolugares, com a actual potência, teriam que correr com 760 kg, algo que poderá não ser viável, sendo que a subida do Grau do circuito a solução provável para ultrapassar este obstáculo. Com a confirmação da continuidade da Taça do Mundo de Fórmula 3 em Macau, a 66ª edição do Grande Prémio vai voltar a contar com três Taças do Mundo da FIA, pois tanto a Taça do Mundo de GT e uma das provas da Taça do Mundo de Carros de Turismo (WTCR) já tinham sido anteriormente confirmadas. Sophia em análise A FIA também aproveitou também o primeiro Conselho Mundial da 2019 para dar conta dos últimos desenvolvimentos do impressionante acidente de Sophia Floersch no Circuito da Guia. É possível ler no comunicado de imprensa enviado na passada quinta-feira que: “Um relatório na investigação sobre o acidente durante a Taça do Mundo FIA de F3 em Macau, a 18 de Novembro, foi apresentado ao Conselho. As Comissões relevantes vão agora avaliar as conclusões do relatório.” Entretanto, na passada semana, Sophia Floersch voltou ao volante de um Fórmula 3 igual ao que tripulou em Macau num teste particular. Sem sequelas do acidente, a jovem de 18 anos cumpriu mais de 200 voltas ao circuito italiano de Monza e foi a mais rápida em pista.
admin DesportoFórmula E | Sam Bird vence na pista, Mortara na secretaria Final electrizante em Hong Kong, com o piloto inglês da Virgin, Sam Bird, a ser penalizado em cinco segundos após um toque em Andre Lotterer, que comandou grande parte da corrida, deixando-o fora de prova com um furo no seu DS Teecheetah. A vitória acabaria por sorrir a Edoardo Mortara. António Félix da Costa não foi além do 10.º lugar O circuito temporário de Hong Kong ocupa os novos aterros em Central. [dropcap]H[/dropcap]ong Kong recebeu pela terceira vez o campeonato de automobilismo do futuro, com monolugares totalmente eléctricos, organizando a quinta prova da época 2018/2019. Dada a estratégia envolvida, há quem diga que a Fórmula E está mais próxima de uma consola de jogos do que de uma corrida de automóveis tradicional. Mas nesta época, em que foram introduzidos os carros da segunda geração, mais rápidos e com maior autonomia, a emoção e a imprevisibilidade têm durado até à última curva. Foi o que aconteceu este ano no território vizinho. Stoffel Vandoorne (ex-piloto McLaren F1) saiu da pole mas foi surpreendido pelos seus adversários, com Oliver Rowland (Nissan) a assumir o comando, com Bird logo atrás. Mas um acidente envolvendo Filipe Nasr (Dragon Racing) e os dois homens da Mahindra, Jerome d’Ambrosio e Pascal Wehrlein, a equipa com melhor performance até aqui, accionou uma bandeira vermelha e interrompeu a corrida durante 15 minutos. Sam Bird não conseguiu repetir o triunfo de 2018, sofrendo uma penalização de cinco segundos que o relegou para a sexta posição. No reinício, Bird ultrapassa Rowland, que cai para décimo, e Lotterer não perde tempo e repete a operação ao britânico, quando este alarga demasiado a trajectória, ocupando assim o topo da classificação. Num circuito exíguo, construído no porto marítimo junto ao centro financeiro da RAEHK, não há lugar para erros, e Sebastien Buemi, o outro piloto da Nissan e eterno candidato ao título, conseguiu percebê-lo a meio da prova ao destruir uma roda numa das chicanes do percurso, trazendo o safety car de volta para a pista. Vandoorne também parava, continuando a sua série de maus resultados. Até ao fim A prova realiza-se apenas durante um dia, com treinos e qualificação durante a manhã e a corrida durante a tarde. Com 11 minutos de prova por cumprir, a luta continuou nas garras de Bird e do alemão da Teecheetah, que comandava pela primeira vez na sua carreira uma corrida de Fórmula E. Mas nunca se desiste e cada milímetro da pista conta. Forçando a ultrapassagem, o piloto inglês recupera a primeira posição, deixando um rasto de fumo no carro de Lotterer, com um dos pneus traseiros furado, não conseguindo completar a última volta. Já fora de horas, a manobra seria penalizada pelos comissários de pista, elevando Eduardo Mortara (Venturi), o segundo a passar a linha de meta, ao topo do pódio, seguido de Di Grassi (Audi) e Frinjs (Virgin). Bird foi relegado para o sexto posto, o que equilibrou bastante as contas do campeonato. Quanto a António Félix da Costa, vencedor do Grande Prémio de Macau, pela primeira vez esta época não conseguiu dar nas vistas. Partindo de 20.º lugar, cedo se queixou de falta de velocidade e aderência no seu BMW iFE.18, não conseguindo recuperar para além da décima posição, apesar de ter efectuado um excelente arranque. O piloto português ocupa agora o quinto lugar no campeonato, com 47 pontos. A competição é comandada por Sam Bird (54), seguido por d’Ambrosio (53) e Di Grassi e Mortara (ambos com 52), o que deixa tudo em aberto quando ainda faltam oito corridas até ao final. A próxima prova realiza-se na estância turística de Sanya na ilha chinesa de Hainão, no dia 23 de Março. O QUE MUDOU NA ÉPOCA 2018/2019 • São introduzidos os veículos Gen2, agora com 250kW de potência, atingindo 280km/h; • Novas baterias desenvolvidas pela McLaren; • Corridas apenas com um carro por piloto, com a duração de 45min + 1 volta; • Attack Mode: Área designada da pista que activa mais 25kw durante oito minutos; • Introdução do “halo” nos cockpits como medida de segurança; • A BMW torna-se construtor oficial em parceria com a Andretti; • A HWA entra no campeonato preparando terreno para a Mercedes; • A Renault passa o testemunho à sua irmã Nissan; • Felipe Massa e Stoffel Vandoorne juntam-se aos pilotos que transitaram da F1 para esta disciplina. Resumo da Prova https://www.youtube.com/watch?v=oEVcCWnufCI • SITE OFICIAL
José Simões Morais h | Artes, Letras e IdeiasOs nüzhen e o início dos Qing [dropcap]O[/dropcap]s manchus, nome que só apareceu em 1635, eram até então conhecidos por nüzhen e já tinham governado na China como Dinastia Jin (1115-1234). Os seus antepassados, provenientes das Montanhas do Altai, foram a tribo sushen que durante a Dinastia Zhou se encontrava a Norte das Montanhas Changbai. Dela se originaram as tribos tunguzes (yilou, huji, mohe e nüzhen) a viver há muitos séculos no Nordeste da China como criadores de cavalos e caçadores nas florestas siberianas do vale de Amur. Nessa zona, hoje a província de Heilongjiang, a 23 de Janeiro de 1115 foi criada pela família Wanyan dos nüzhen a Dinastia Jin, com a capital em Harbin. A dourada dinastia, pois Jin significa ouro, daí iniciou ataques contra os seus vizinhos khitan (mongóis descendentes dos xianbei), na época a reinar uma vasta área pelo Norte da China como Dinastia Liao (916-1125) e em 938 tinham capturado aos Song a cidade de Youzhou (Beijing), fazendo aí a sua segunda capital com o nome de Nanjing (Capital do Sul). Os Jin aliando-se com a Dinastia Song (960-1127) conseguiram em 1125 pôr fim a esse império, transferido para o Oeste, no actual Xinjiang, onde em conjunto com os uigures fundaram o Reino Liao Ocidental, que terminará em 1227 às mãos de Gengis Khan. Vencidos os mongóis khitan, os Jin voltaram-se contra a Dinastia Song e conquistaram-lhe em 1126 a capital Bianjing (Kaifeng). Daí levaram presas quase três mil pessoas da corte Song para a sua capital Harbin e as restantes retiraram-se para Sul, fugindo das contínuas investidas dos nüzhen (conhecidos no ocidente por jürchen, ou tungusic). Em 1153 a Dinastia Jin fez a sua nova capital em Beijing, mudando-lhe o nome para Zhongdu (Capital Central), mas em 1214 transferiram-na para Kaifeng, devido à invasão pelo Norte dos mongóis chefiados por Gengis Khan (1162-1227, Gengiscão, o unificador das tribos mongóis), que no ano seguinte conquistou Beijing. Acossado tanto pela Dinastia Song do Sul, como pelos mongóis (estes, descendentes dos xiong-nu), e já sem ter para onde fugir, o imperador suicidou-se em 1234, terminando assim a Dinastia Jin. Com uma língua própria ligada à mongol, tinham interagido com a população han na sua governação e decalcado muita da organização chinesa, encontrando-se já sinizados. A chegada ao trono da China da dinastia mongol Yuan (1271-1368) levou esses nüzhen de volta ao Nordeste onde, em conjunto com as restantes tribos que aí tinham permanecido, se dedicaram ao comércio. Se nesse território de estepes os khitan tinham instalado prefeituras à maneira chinesa, com a chegada da Dinastia Ming foram aí colocadas guarnições militares. Encontravam-se os nüchen, onde hoje são as províncias de Jilin e Liaoning, divididos em três grupos: jianzhou, haixi e donghai. Os ming chamaram-lhes dongyi (estrangeiros do Leste) e sendo bons guerreiros e cavaleiros, colocaram-nos a proteger as suas fronteiras do Nordeste, contra possíveis incursões mongóis. Devido aos jianzhou comercializarem a Norte com os mongóis, a Leste com os coreanos e a Sul com chineses han, trocando cavalos, gado, peles, pérolas e ginseng, por ferramentas de ferro e outros bens de necessidade diária, desenvolveram a sua tecnologia e economia, tornando-se dentro dos nüzhen os mais evoluídos. Dinastia Jin Tardia Em 1583, os Jianzhou elegeram como chefe Nurhachi (1559-1626), do clã Aisin Gioro. Nascido em Hetuala (赫图阿拉, lugar hoje adstrito a Yongling, na região autónoma manchu de Xinbin, província de Liaoning), era o filho mais velho de Taksi, o qual tinha morrido no ano anterior em circunstâncias com diferentes versões na História. Para uns, fora morto por engano pelos ming, mas outras fontes referem, às mãos de uma facção nüzhen rival. Em 1588 casou-se com a filha de um príncipe nüzhen da família Nala. Fazendo a sua base de operações em Hetuala, Nurhachi foi anexando ao longo de dez anos as tribos vizinhas, mas em 1593 seria atacado por uma aliança de outras tribos tunguzes e mongóis. Vitorioso, Nurhachi tornou-se ainda mais poderoso e nos vinte anos seguintes passou a controlar praticamente todo o território do Nordeste. Em 1616 completou a organização das tribos nüzhen e com elas unificadas estabeleceu a Dinastia Dajin (1616-1636, Grande Jin, que ficou na História com o nome de Hou Jin, Jin Tardio), com capital em Hetuala, cujo nome passou a ser Xingjing. O Khan Nurhachi (1616-1626) foi o seu primeiro soberano, com o título de reinado Tianming e nome-templo Taizu. Trazia um sistema político, económico e militar completamente independente da Dinastia Ming, com quem por vezes os nüzhen tinham colaborado no passado. Formou então o sistema das oito bandeiras (baqi), uma organização multifuncional, tanto administrativa, como militar e de produção, em que cada bandeira consistia em várias unidades básicas, chamadas niulu, de 300 pessoas que funcionavam em conjunto. Estruturada para em tempo de paz trabalharem na agricultura e na caça e em guerra constituírem-se em milícias. Cinco niulu continham 1500 pessoas e formavam uma jiala e cinco jiala, com 7500 pessoas, formavam uma bandeira, sendo cada uma das oito bandeiras identificadas por uma cor, ficando à frente de cada os filhos e sobrinhos de Nurhachi. Com a população civil registada e organizada, o povo nüzhen ganhou uma forte unidade e eficiência, desenvolvendo-se tanto económica como socialmente, tornando-se mais estreitas as relações entre os membros, o que favoreceu a liderança de Nurhachi. Este ordenou também a criação da língua man, escrita baseada nas palavras mongóis e pronúncia nüzhen. Em 1618 começou a atacar os territórios do Norte da Dinastia Ming, derrotando-a em várias batalhas. O mesmo ocorreu no ano seguinte, quando o Imperador Chongzhen enviou para cima de cem mil homens, morrendo mais de metade desse exército ming. Conquistou em 1621 Shenyang e Liaoyang, onde fez a capital e em 1625 foi esta mudada para Shengjing (Shenyang), mandando ainda nesse ano erguer aí o Palácio Imperial; uma réplica mais pequena da Cidade Proibida de Beijing. Em 1626, à frente de um enorme exército marchou para Sul atacando o exército ming, comandado pelo General Yuan Chonghuan. Mas saiu derrotado, tendo Nurhachi morrido, segundo parece, não na batalha, mas oito meses depois. Tal derrota deveu-se ao canhão enviado de Macau, que o Imperador ming Tianqi (1620-27) pedira aos portugueses para conter o avanço do exército nüzhen. Os tiros do canhão provocaram tantas baixas, que levou o invasor a ser mais cauteloso nos ataques. Sucedeu como segundo khan da Dinastia Da Jin o oitavo filho de Nurhachi, Huang Taiji (1592-1643), que governou como Tiancong de 1627 a 1636, sendo na língua local conhecido por Abahai. Quando o Palácio Imperial em Shengjing (Mukden) ficou completo em 1636, Huang Taiji mudou o nome da dinastia para Qing (puro), preparando um corpo militar forte para invadir a China.
Hoje Macau SociedadeCrime | Detidas 562 pessoas por troca ilegal de moeda [dropcap]N[/dropcap]o passado mês de Fevereiro foram detidas 562 pessoas por troca ilegal de moeda no território. As detenções foram o resultado de 208 operações levadas a cabo pelo Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP), revela um comunicado emitido pelas autoridades que adianta que todos os detidos foram expatriados, sendo que 407 foram sujeitos à medida de proibição de reentrada em Macau. Já no mês de Janeiro foram efectuadas 246 acções policiais de fiscalização, tendo sido interceptados 545 indivíduos envolvidos em “burlas de troca de dinheiro”, tendo os mesmos sido repatriados. Destes, 411 foram sujeitos à medida de proibição de reentrada. As autoridades recordam ainda que durante o ano 2018, foram repatriados 3050 indivíduos, dos quais 2269 ficaram impedidos de voltar a entrar em Macau. As autoridades recordam ainda que vão continuar a investir no combate a este crime de modo a “reduzir os riscos de segurança para a sociedade, procurando assegurar um bom ambiente para Macau”. Habitação | Índice de preços cai 1,3% entre Novembro e Janeiro Entre Novembro de 2018 e Janeiro de 2019 o índice global de preços da habitação diminuiu 1,3 por cento, em comparação com o período entre Outubro a Dezembro de 2018. De acordo com um comunicado emitido pela Direcção dos Serviços de Estatística e Censos, o índice de preços de habitações construídas baixou 1,0 por cento, em relação ao período anterior, destacando-se que na Península de Macau desceram 1,1 por cento e na Taipa e Coloane 0,9 por cento. Em comparação com o período de Novembro de 2017 a Janeiro de 2018, o índice global de preços da habitação e o índice de preços de habitações construídas subiram 3,2 por cento e 6,0 por cento, respectivamente, enquanto o índice de preços de habitações em construção desceu 3,1 por cento.
Rita Taborda Duarte h | Artes, Letras e IdeiasO desenvolvimento de uma exclamação [dropcap]V[/dropcap]inde cá, meu tão certo secretário. Podemos tratar-nos por tu? Não? Compreendo…Perdoai, então. E perdoai por tudo: pela insolência e atrevimento, claro, mas também pelo logro. Prometi pedradas em livros de versos, a ver a mossa que lhes faria, calhando em acertar-lhes, mas aponto já para outros alvos, pousando o olho lírico noutras gaiolas, outras janelas. «Um Bailarino na Batalha», de Hélia Correia, não parece um poema, mas é-o, em certa medida. Percorro definições de poesia que o atestem, que isto da teoria literária pouco diferente será da água benta, cada qual toma de quanta quer e como lhe convém. Benzo-me, com uns salpicos abençoados por Valèry, para dizer ao que venho. Se bem não faz, também não prejudica: «A poesia é o desenvolvimento de uma exclamação». E por aqui se comprova o lirismo de Hélia Correia, ainda que numa novela que não descuida todas as categorias da narrativa: os vários tempos e ritmos a atravessar a temporalidade ficcional que manipula, por sua vez, os cordéis da acção, as personagens, o espaço e o narrador a um canto, afadigado, gerindo pontos de vista. Tudo isto ao serviço de uma inquietação aguda, de uma exclamação crescente: espécie de ponto luminoso que se acende, brilha até à sua intensidade máxima, quase cegando, e que depois se apaga. A luz fere, desaparece, fugaz, mas o golpe de luz permitiu ver, mesmo por breves instantes, uma imagem que persiste como emoção exclamativa, um brado que se ouve, apesar de embutido na garganta. Meu tão certo secretário, já que cá viestes, dando-vos a esta maçada, permiti-me continuar, que as metáforas são como as cerejas… Assim se pode distribuir a literatura: De um lado, temos as narrativas, espécie de ampla paisagem por onde se caminha; o leitor pára, cuida de pormenores, e ora os olhos se alongam lá para dos horizontes, ora se demoram na minúcia de um formigueiro, mesmo ali, ao cair do pé. O leitor deixa-se ficar no cenário da ficção, vê o nascer do sol, vislumbra o ocaso ao fundo; depois anoitece, e tudo se queda de seguida num repouso sossegado. Por outro lado, há também a poesia, que se mede por diferentes bitolas: aí, o leitor permanece como numa noite de tempestade: fica à janela, só olhando, que o tempo não convida a caminhadas. Tudo escuro, lá fora. Mas, de repente, cai um relâmpago. E então, num eis, toda a floresta se acha iluminada: bela e tenebrosa, como nunca se vira. O leitor já nem consegue mais dormir e, no dia seguinte, de manhã, olhando pela mesma janela, sabe que a floresta do dia anterior, vista à luz breve do relâmpago, sequer se aproxima daquelas árvores desfiladas, que sempre avistara no conforto da vida: assim é um poema. Depois, para lá da poesia e da prosa, ou enlaçando-as, até, há os livros de Hélia Correia: um constante caminhar na tempestade. O leitor anda à chuva, molha-se, por evidência, e a cada momento um relâmpago lhe mostra outra paisagem na paisagem, muito mais dura, exclamação breve, vislumbre assombroso à luz do relâmpago. «Bailarino na Batalha» é a graciosidade de um esgar, de um movimento que se liberta (o movimento do cavalo na batalha, não do combatente), terrível, mas belo, um movimento não previsível que se levanta em dolorosa elegância, na improbabilidade dos escombros. Este simbólico cavalo (literal e metafórico) não aparece na novela, só no poema final, belíssimo, que lhe serve de epílogo (sim, há um poema, neste texto, mas nem só por isso o podemos considerar, no seu todo, um poema também). Só um poema poderia resumir, como conclusão, o relâmpago de perplexidade e espanto, que ilumina o mundo, o nosso mundo, na novela: […] Oh, os cavalos do Mediterrâneo, leves como vapor, filhos das águas dourados como o mar quando entardece. Inalcançáveis criaturas mesmo quando delas fazem montadas, mesmo quando as conduzem para a linha do abate […] Da guerra, só acedemos aos estilhaços, somente ao eco daquilo que foi, aos resíduos, às sobras do que para trás se abandonou; uma memória física que se carrega aos ombros, na dura travessia deste deserto, também simultaneamente metafórica e literal, encetada por uma mole desgarrada de migrantes. Toda a novela, em capítulos curtos, alguns curtíssimos, como breves poemas em prosa, se socorre de um tom alegórico para expor uma reflexão profunda sobre o mito da terra prometida: essa Europa-miragem, que com uma mão acena, pungente, e com outra repele, altiva. Assim começa o livro, uma página em branco, só com um parágrafo, talvez um poema: Aquilo que voa nem espessura tem para projectar sombra. Passa e apenas entristece um pouco a já cinzenta areia. É a memória. A lívida memória, descolada dos cérebros, tão fina, tão doente, que não pode tocar-se, que, ao mínimo contacto, cairá, desfeita em pó. E o seu nome mudará para esquecimento. E o esquecimento tudo esquecerá. Um bando de migrantes juntos, mas desgarrados e sem pertença, foge da guerra rumo ao mar. Pretendem chegar à Europa. Estão famintos, desolados, mantendo só os mínimos resquícios de humanidade e traços vagos, soltos da sua civilização não nomeada, mas reconhecível, pelos modos de trajar, códigos de honra, uma clivagem entre os homens e as mulheres, de cara tapada pelos farrapos sobrantes, revelando um estatuto de submissão e inferioridade que se vai refigurando ao longo do livro. Não se trata de sobreviventes, são antes morrentes. A palavra não existe, mas ajustar-se-ia bem ao tom de todo o texto, que mostra o que as palavras não saberiam dizer. Um velho cego, um homem sem braço, desprezado do grupo, por traidor, uma criança visionária, uma mulher-fera, uma velha e mortos, muitos mortos, que vão largando o corpo pelos caminhos, são algumas personagens-símbolo deste povo cercado, sitiado, a reinventar-se nos escombros. Mais do que uma reflexão, «Um Bailarino na Batalha» é um livro que faz sentir a feridas profundas do confronto mundo ocidental/médio oriente. A urgência reflexiva, terrível, da novela funda-se, afinal, na força da linguagem, das imagens, que se vão sobrepondo com um vigor doloroso: desde a travessia do deserto, à transformação do rio em lodo quase inerte, ao conforto de um bosque, com frutos e animais, que logo se esgotam, até se alcançar o fim da jornada, quando ainda a meio do percurso se estava: o limite é, afinal, a cidade em nove círculos que lhes veda a progressão adiante, até ao mar, porque — adverte-se–a Europa não os quer: «Porque é que te pões tu à nossa frente? Tem dono este caminho?» «Ora, os caminhos têm sempre dono», disse o homem. «Tudo tem dono. Tu também tens homem. O teu homem? Escondeu-se atrás de ti?» Estendeu a mão para a agarrar e ela furtou-se. O homem desistiu. Aquele não era o jogo que ele jogava. «Existem nove círculos na cidade», repetiu ele. «O de fora pertence aos miseráveis, o do centro aos magníficos. Pode apenas passar-se de um círculo para o círculo imediato para fazer as limpezas e a comida. Ninguém sobe das caves e dos túneis, ninguém vê algo que não deva ver. Da cidade não se entra, não se sai. Ela é perfeita. Levou séculos a afinar. Imaginaram que seriam recebidos?» «Nós não queremos a tua cidade», disse Awa. «Queremos a Europa. Queremos chegar ao mar, pegar num barco e partir para a Europa.» O homem riu: «A Europa não vos quer. Sabes que mais? Nós somos a Europa. Nós somos a primeira instância da Europa. Estamos aqui para impedirmos o avanço.» Uma novela belíssima, que não só termina num poema, como é um poema: o tal relâmpago que mostra o mundo em torno e mostra-no-lo como não o conhecíamos ainda. Hélia Correia, Um Bailarino na Batalha, Lisboa, Relógio d’Água, 2018
João Santos Filipe Manchete SociedadeTribunais | Ministério Público recorreu de sentença que absolveu John Mo O Tribunal de Segunda Instância vai ter de decidir sobre a inocência do ex-director da Faculdade de Direito da Universidade de Macau, após o MP ter interposto recurso sobre a decisão que ilibou o académico da acusação de violação [dropcap]O[/dropcap] Ministério Público recorreu da decisão do Tribunal Judicial de Base (TJB) que absolveu John Mo, ex-director da Faculdade de Direito da Universidade de Macau, da prática de um crime de violação. A informação foi revelada pelo MP, ao HM, na sexta-feira, ou seja no dia seguinte à data limite para a contestação. “Vimos por este meio informar que o Ministério Público interpôs recurso da sentença do processo que envolve John Mo”, informou a instituição liderada por Ip Son Sang. O caso aconteceu a 23 de Junho do ano passado e envolveu John Mo e uma estudante do ensino superior, casada, de outra instituição de ensino local, que não a Universidade de Macau. Foi por volta das 23h00 e as primeiras horas do dia seguinte, num bar de karaoke, que o académico terá beijado, abraçado e inserido um dedo na vagina da queixosa. Mais tarde a mulher, do Interior da China, que já tinha terminado os estudos e ia regressar, nos dias seguintes, ao local de origem acabou por apresentar queixa por violação. No entanto, o colectivo de juízes do TJB, liderado por Lou Ieng Ha, considerou que não havia provas para considerar John Mo culpado. A situação ficou toda registada em vídeo, que foi o principal meio de prova do julgamento. Consciente ou inconsciente? Uma das grandes questões que esteve em causa na primeira instância foi decidir se a alegada vítima estava em condições de tomar decisões ou se o álcool ingerido fazia com que tivesse perdido o discernimento. O tribunal acabou por considerar que a ofendida estava na posse de capacidades suficientes para ter consciência do que estava a fazer. Além disso, para o tribunal, não houve qualquer acto de resistência ao avanços do académico: “Não há dúvidas que o arguido introduziu o dedo na vagina [da ofendida] e, por momentos, fez um movimento de vai e vem”, foi uma das frases da sentença proferida pela juíza Lou Ieng Ha. “[Ela] Ficou deitada [na sala de karaoke], mas o indivíduo não a prendeu [quando avançou]. A ofendida podia movimentar os braços. E ela mexeu-se, aparentemente para facilitar a introdução [do dedo]. Tinha as mãos livres, mas não bateu no arguido. Bastava que tivesse feito qualquer gesto de oposição como, por exemplo, puxar os cabelos do arguido, para mostrar que recusava. Não o fez”, foi sustentado, na altura. Além do académico, o caso envolve também Lei Iok Pui e Yang Manman, que enfrentavam acusações da prática do crime de violação e omissão de auxílio. Ambos foram absolvidos. A decisão segue agora para o Tribunal de Segunda Instância, que vai ter de se pronunciar sobre o caso.