Tailândia vota quase cinco anos depois do exército ter tomado o poder

[dropcap]A[/dropcap]s mesas de voto abriram ontem de manhã na Tailândia para as eleições no Parlamento, o qual permanecerá, contudo, condicionado pelos militares independentemente do veredicto das urnas, quase cinco anos após o exército ter tomado o poder.

Cerca de 51 milhões de tailandeses, em aproximadamente 90.000 escolas em todo o país que começaram a funcionar às 8:00, são chamados a votar nas eleições que foram adiadas meia dúzia de vezes pela junta militar desde que assumiu o poder em Maio de 2014, quando os generais justificaram o golpe como forma de acabar com a corrupção e a instabilidade política após meses de protestos de rua.

Entretanto, a convocação das eleições, adiada várias vezes, aconteceu após uma reforma legal completa para restringir a margem de manobra dos Governos eleitos e fortalecer a interferência militar na vida política do país.

Estas eleições servem para avaliar o apoio ou a rejeição popular à junta militar e ao primeiro-ministro, o general Prayut Chan-ocha, que aspira a renovar o cargo, desta vez com a legitimidade das urnas.

O regime militar foi marcado pela intolerância em relação a qualquer forma de dissidência, o que levou centenas de pessoas às prisões.

Jogo das cadeiras

Neste sufrágio estão disputa 500 lugares na Câmara dos Deputados, dos quais 350 serão eleitos pelos círculos eleitorais, e outros 150 por listas de partidos, por um período de quatro anos.

Os deputados serão responsáveis pela nomeação do novo primeiro-ministro numa votação conjunta com os 250 senadores, que são escolhidos a dedo pela junta militar e incluirá os chefes das forças armadas.

Prayut, proposto como candidato a chefe de Governo pelo partido Phalang Pracharat, parte com vantagem para estender o seu mandato, uma vez que só precisa do apoio de 126 deputados eleitos.

A Comissão Eleitoral também colocou em prática novas regras que prejudicam os principais partidos, com regulamentos destinados a prejudicar as possibilidades do clã Shinawatra, cujas plataformas políticas venceram em todas as eleições desde 2001.

Thaksin Shinawatra e sua irmã Yingluck, cujos Governos foram depostos pelos militares em dois golpes, vivem no exílio para evitar a justiça tailandesa e são considerados inimigos pelos adeptos da monarquia e pelo comando militar.

Para ir às urnas, os Shinawatra dividiram o apoio político entre quatro formações, algumas delas novas. O Pheu Thai, que formou o último Governo democrático, é o principal partido dessa facção, que desta vez decidiu participar dividida em quatro formações para evitar a nova regra que limita o número de lugares por partido.

Acto falhado

Numa tentativa de surpreender os militares, o partido Thai Raksa Chart, uma das formações ligadas a Thaksin Shinawatra, propôs a candidatura de Ubolratana Mahidol, irmã mais velha do actual rei da Tailândia.

A candidatura não sobreviveu um dia, já que o monarca Vajiralongkorn declarou publicamente a candidatura da irmã como “inapropriada” e “contra o sistema constitucional”.

A Comissão Eleitoral apresentou uma queixa ao Tribunal Constitucional, que finalmente dissolveu o Thai Raksa Chart duas semanas antes das eleições.

O beneficiário desta situação poderá ser o Anakot Mai, partido recém-formado e liderado pelo empresário Thanathorn Juangroongruangkit, cujo sucesso entre os jovens eleitores e a sua proposta para reduzir o orçamento militar o colocou na mira dos militares.

Os Democratas, outro partido na corrida eleitoral, é tradicionalmente preferido pelas elites de Banguecoque, a mesma que apoiou o golpe, mas cujo líder, o ex-primeiro-ministro Abhisit Vejjajiva, anunciou a sua oposição à continuação de Prayut no cargo de primeiro-ministro.

As eleições serão as primeiras após a morte do rei Bhumibol, que morreu em Outubro 2016, após 70 anos de reinado.

25 Mar 2019

Comunicação Terminal

[dropcap]N[/dropcap]o princípio era o Verbo e no fim a salada de palavras sem tempero ou qualquer significado. Quando abrimos a boca para falar, quando anotamos palavras num suporte físico, até quando nos expressamos artisticamente, materializamos um pensamento com o intuito de passar mensagens. É assim que trocamos informação, excepto quando contactamos com alguns serviços públicos locais com o intuito de informar os leitores.

No passado dia 14 de Março, enviei um par de questões à Direcção dos Serviços de Assuntos Marítimos e de Água sobre o estado do Terminal Marítimo de Passageiros da Taipa. A ferrugem e o aspecto de cenário de filme de terror motivaram o meu contacto, depois de ver nas redes sociais imagens de degradação numa das infra-estruturas mais dispendiosas e atribuladas da RAEM. Para minha surpresa, recebi uma resposta pronta, que dispensou o habitual e subsequente telefonema a sublinhar que tinha enviado um e-mail, já por si sintomático de uma comunicação débil.

Procurei saber o que seria feito para resolver a situação, quem era responsável por aquele estado decante e quais as consequências do desleixo, falta de manutenção ou defeito de construção, que deixou parte do terminal chegar àquele ponto.

A resposta chegou quatro dias depois, assinada pelo Gabinete para o Desenvolvimento de Infra-Estruturas na forma de um quebra-cabeças para o qual peço ajuda para descodificar: “Acusamos recepção da consulta enviada da D.S.A.M.A., sobre a situação em questão, após recebido a informação reflectida, solicitámos no último sábado (dia 16 de Março) a presença da entidade adjudicatária, no local de obra, para atender o acompanhamento, indo este Gabinete programar de imediato o procedimento de entrega e recepção da empreitada de construção após conclusão da limpeza a ser realizada no respectivo local.” Depois de ler a frase cinco vezes acho que sangrei um bocado dos ouvidos. Algo rebentou no meu cérebro durante a tentativa de formar significado a partir deste enigmático arranjo de palavras. Ok, receberam as perguntas que coloquei à DSAMA.

Boa! Portanto, este email é uma resposta ao meu email inicial, informação útil se estivesse a sofrer de amnésia. Foi solicitado à adjudicatária a presença no local da obra para atender o acompanhamento. Aqui começam os problemas. O que é que isto significa?! Tenho de contratar um espírita, ler nos astros o que isto quer dizer? Será programado o procedimento de entrega e recepção da empreitada de construção?! Que construção?! O que é isto? Estarei a sonhar? Estão a ver aqueles sonhos em que damos por nós na rua sem calças, ou sapatos e não sabemos o que fazer?

Como é óbvio, tentei esclarecer o que ali estava, vislumbrar um pouco de significado, algo a que me agarrar noticiosamente. Perguntei ao GDI de que construção estavam a falar, e voltei a questionar qual a entidade adjudicatária e se haveria consequências para o estado lastimável comprovado pelas fotos que enviei. A resposta que recebi foi esta: “Relativamente à pergunta apresentada por V. Exa. e a qual temos respondido ultimamente, informa-se que este Gabinete não dispõe da informação relevante que pode ser complementada. Obrigado.”

Apraz-me responder a esta não resposta na mesma moeda: “Após consulta gastrointestinal dos factos de três peças descritos nos anexos A e X e acusando a recepção de coisas imateriais na esfera do etéreo, será prestada a máxima atenção à adjudicação do projecto de vida em estado terminal, sendo que a ferrugem e a decadência visam aprofundar a harmonia entre inox e humanidade”.

Um dos meus prazeres maiores é mergulhar em belas conjugações de palavras, especialmente em prosa poética, esse animal indomável que leva tudo à frente. Não sei se este tipo de resposta dos serviços tem aspirações a tornar-se corpo literário ao estilo de ofício kafkiano, mas pelo meio podiam ao menos procurar arranjos de palavras sublimes.

No fundo, todos ficamos a perder. Eu fico sem resposta a um par de questões simples sobre uma infra-estrutura que demorou quase 12 anos a ser construída e onde aportaram sucessivas derrapagens orçamentais. Perde-se em clareza e vence a opacidade e ninguém é responsável por absolutamente nada. Também os serviços perdem tempo, com o significado a ficar entalado algures nos dentes da roda burocrática. Mas, acima de tudo, perde o cidadão que além dos agravos justificados em relação ao gigantesco e precocemente decrépito terminal, tem aqui mais um exemplo de que por cá a culpa morre quase sempre solteira. É preciso acontecer algo excessivamente bárbaro e descarado, ou mexer com interesses superiores, para alguém ser chamado à pedra.

Por outro lado, as não respostas defendem a falta de escrutínio de um Governo e entidades públicas que se auto-fiscalizam. Como pode a corrupção não florescer neste canteiro? A resposta será um arrazoado ininteligível de palavras.

25 Mar 2019

Fórmula E | Penalizações encurtam liderança de Félix da Costa

[dropcap]A[/dropcap]penalização sofrida pelo suíço Sébastien Buemi (Nissan), já após a corrida de Fórmula E de sábado na China, deixou a liderança do português António Félix da Costa (BMW) presa por apenas um ponto.

O piloto de Cascais reassumiu sábado a liderança do campeonato de Fórmula E depois de ter terminado a sexta prova, disputada na cidade chinesa de Sanya, em terceiro lugar.

Félix da Costa terminou a 3,268 segundos do vencedor, o francês Jean-Eric Vergne (DS), que foi o sexto piloto diferente a ganhar uma prova esta temporada em igual número de provas disputadas.

No entanto, Buemi sofreu dez segundos de penalização depois de ter sido considerado responsável pela colisão que deixou o brasileiro Lucas di Grassi (Audi) fora de prova na penúltima volta. Isso fez com que o piloto suíço caísse do sexto para o oitavo posto na prova.

Assim, Félix da Costa mantém os 62 pontos no campeonato, mas tem agora o belga Jerôme D’Ambrosio (Mahindra) logo atrás, com 61.

O britânico Oliver Rowland (Nissan) foi o segundo, depois de um duelo intenso com Félix da Costa que quase terminava em colisão, mas cuja investigação posterior considerou que se tratou de um “incidente de corrida”.

Este foi o terceiro pódio da temporada para António Félix da Costa, depois da vitória na abertura, na Arábia Saudita, e do segundo lugar no México.

O campeonato segue, agora, para a Europa, com Roma a acolher a sétima jornada do campeonato, no dia 13 de Abril.

25 Mar 2019

Sub-23 | Macau sofre duas goleadas e diz adeus ao Asiático da Tailândia

Comandados por Iong Cho Ieng surpreenderam na primeira parte diante do Japão, mas no segundo tempo o descalabro foi total. A derrota de ontem confirmou diante do Myanmar foi a confirmação do adeus ao Asiático

 

[dropcap]C[/dropcap]om duas derrotas em outras tantas partidas no Myanmar, a selecção sub-23 de Macau ficou de fora na fase de qualificação para o Campeonato Asiático do escalão. A competição realiza-se no próximo ano na Tailândia.

A disputar o Grupo I da fase de qualificação, a selecção local foi goleada por 4-0, no Estádio Thuwunna, pelo Myanmar, que está a disputar o apuramento em casa. Mas já antes disso, na sexta-feira, a formação de Macau tinha sido massacrada pelo Japão por 8-0.

Com a selecção nipónica a ter levado de vencida, ontem, Timor-Leste, o Myanmar entrou em campo a saber que precisava de marcar pelo menos sete golos, sem sofrer, para igualar os nipónicos ao nível da diferença de golos. Caso conseguisse, poderia empatar com o Japão no encontro de amanhã, que vai decidir a equipa quem se apura directamente. A outra vai ficar dependente de ser um dos melhores segundos lugares.

Com este espírito, os birmaneses não facilitaram e adiantaram-se no marcador logo aos dois minutos, através de um canto. O defesa Ye Min Thu cabeceou na área, num lance quase a papel-químico do primeiro golo sofrido contra o Japão. A situação ficou mais complicada aos 19 minutos, com o 2-0, marcado por Win Naing Tun, de penálti. A partir deste momento o jogo acabou.

Com a mentalidade do costume, no segundo tempo Macau focou-se em defender e no segundo tempo cedeu mais dois golos, número mesmo assim superior às vezes que entrou na área adversária. Win Naing Tun, que bisou, e Lwin Moe Aung foram os autores dos golos que fizeram o 3-0 e 4-0, respectivamente.

Ligeira surpresa

Na sexta-feira, já Macau havia sofrido outra goleada por 8-0, desta feita diante do Japão, num encontro que seria sempre complicado. Contudo, o jogo até trouxe uma certa surpresa.

Com Macau a alinhar em 4-4-2, com U Wai Chon na baliza, Cheng Ka Chon, Ng Wa Seng, Un Kuong Fue Xiao Rongrui, na defesa, Ng Wa Keng, Cheong Hoi San, Wan Tin Iao, Carlos Choi, no meio-campo e Lei Chan Tou e Leong Hou In no ataque, a formação conseguiu aguentar 50 minutos sem sofrer qualquer golos.

Apesar do sufoco permanente, os comandados de Iong Cho Ieng acabariam mesmo por ceder num pontapé de canto. Foi o avançado nipónico Ayase Ueda, que desatou o encontro. Na marcação da bola parada, Ueda conseguiu saltar entre Wan Tin Iao e Un Kuong Fu e fez o 1-0, ao cabecear à entrada na pequena-área. O guardião U Wai Chong pouco mais pode fazer do que acompanhar a bola com os olhos.

25 Mar 2019

Amores de Shunzhi

[dropcap]O[/dropcap]Imperador Qing Huang Taiji morreu em 1643 sem designar sucessor e um comité de príncipes manchus elegeu, entre os seus onze filhos, o nono [e não o terceiro, como por engano ficou referido no artigo da semana passada], Aisin-Gioro Fulin (1638-1661) como continuador da Dinastia Qing. Tal ficou a dever-se em muito ao trabalho de bastidores da sua mãe, Bumbutai (1613-1688), a Imperatriz Xiaozhuang após Aisin-Gioro Fulin ser Imperador. Era uma das três mulheres que o clã mongol Borjigit enviara à corte nürzhen para estreitar relações, sendo as outras duas, a tia de Bumbutai, a então Imperatriz Xiaoduan (Jerjer, 1599-1649) e a irmã mais velha, a favorita consorte Minhui (Harjol, 1609-1641).

Fulin tornou-se o Imperador Shunzhi (1643-1661), o segundo da manchu Dinastia Qing, quando em 8 de Outubro de 1643 no Palácio Imperial de Mukden (Shenjiang) foi entronizado. Por ter apenas seis anos foram nomeados os regentes Jirgalang e Dorgon, filho mais novo de Nurhachi e meio irmão de Huang Taiji.

Quando os qing atravessaram em 1644 a Grande Muralha contava o seu exército aproximadamente dois milhões de homens no sistema das 8 bandeiras. No nono dia da décima Lua de Jiashen (8 de Novembro de 1644) Shunzhi tornou-se em Beijing o primeiro Imperador da Dinastia Qing da China. Aí, os jesuítas acabavam de alcançar uma grande vitória sobre os astrónomos chineses ao conseguirem prever um eclipse solar para o primeiro dia do oitavo mês lunar de 1644, não calculado pelo então calendário chinês. Tal demonstrava a necessidade de substituir o Calendário Shou Shi (Narração do Tempo) feito por Guo Shoujing em 1281.

Em Beijing, os jesuítas vinham trabalhando desde 1629 na correcção desse calendário e contra a vontade dos astrónomos da Dinastia Ming preparavam um novo calendário para o substituir.

Reinava já a Dinastia Qing quando aconteceu como previsto por Joannes Adam Schall von Bell o eclipse lunar de 15 de Janeiro de 1645, o que levou a ser oficializado o Calendário Shixian feito por esse jesuíta alemão, logo nomeado Director do Departamento de Astronomia de Beijing e a quem o Imperador Shunzhi sempre deu protecção.

Liberdade religiosa

Os padres da Corte puderam continuar em Beijing devido ao entusiasmo da Dinastia Qing para com o novo calendário. O elevado estatuto que gozava o então mandarim jesuíta Schall von Bell e a sua grande intimidade com o Imperador levaram-no a conseguir em 1650 autorização para construir a Igreja da Imaculada Conceição, mais tarde Catedral do Sul (Nantang).

Durante seis anos esteve o Imperador Shunzhi liberto da governação do país, entregue ao regente Dorgon, e por isso teve tempo para se dedicar às artes, sendo um bom calígrafo e um excelente desenhador de paisagens. Estudou o confucionismo e como extremoso adepto da piedade filial escreveu uma série de poemas dedicados à sua mãe. Após a morte de Dorgon, no último dia de 1650, Shunzhi iniciou com doze anos a governação do país.

Em 1651, numa caçada pela Montanha Jingzhong em Hebei, ao saber encontrar-se ali há nove anos o monge Bieshan em meditação numa gruta, para lá se dirigiu. Após ser por ele recebido, regressou ao palácio e mandou construir um local especial para o acolher, mas o monge recusou. Assim se iniciou o interesse do Imperador Shunzhi pela doutrina budista.

As esposas

A concubina Tunggiya hala (1640-1663) era proveniente de uma família manchu mas vivera sempre entre os chineses han. Entrara na Cidade Proibida em 1653 e a 4 de Maio de 1654 deu à luz Xuanye, o terceiro filho de Shunzhi e por este se ter tornado em 1661 o Imperador Kangxi tomou ela o título Cihe, mãe do imperador e após a morte, Imperatriz Xiaokangzhang.

Já por uma questão política e de tradição, para acalmar o clã mongol Borjigit, o Imperador Shunzhi casou-se em 1654 com Alatan Qiqige (1641-1718), que ficou a ser a Imperatriz mãe Xiaohuizhang, apesar do pouco afecto do imperador por ela.

A sua favorita era a concubina Donggo hala (1639-1660), que entrara no palácio em 1656 e tornou-se a consorte Xian. A 12 de Novembro de 1657 deu à luz o quarto filho do imperador e tal era o amor por ela que Shunzhi o escolheu para seu sucessor, mas este morreu passado três meses, trazendo um grande desgosto ao casal.

Em 1658 Shunzhi mandou chamar o monge budista Yülinxiu do Templo Baoen em Huzhou (hoje Wuxing, em Zhejiang) para ir a Beijing falar com ele. Este recusou e só após várias tentativas acedeu. O imperador ofereceu-lhe o título de mestre Dajue e tomou-o como professor, pedindo para que lhe desse um nome budista e assim ficou a chamar-se Xingchi, aliás Chidaoren. Após dois meses, o mestre regressou ao templo e o Imperador requereu que lhe enviasse um dos seus estudantes.

Shunzhi convidou um outro famoso monge do Templo Tiantong de Zhejiang, Muchenqin que nas conversas se apercebeu da sensibilidade do Imperador e seu entendimento sobre a abstracta doutrina do Budismo Chan. Teria na última reincarnação sido um monge, o que Shunzhi concordou pois, cada vez que visitava um templo não tinha vontade de lá sair e não fosse deixar a mãe sozinha já seria monge.

A Beijing chegou Xisen, o estudante enviado por Yülinxiu, com quem o imperador falava frequentemente sobre a doutrina e lhe pedia conselhos. Com a sua favorita Donggo hala conversava e discutia sobre os livros Chan tornando-se ela também budista. A sua morte em 23 de Setembro de 1660 afectou profundamente o Imperador, que logo passados dois dias lhe atribuiu o título póstumo de Imperatriz Xiaoxian e mandou celebrar um grande funeral budista, convidando 108 monges para durante 21 dias recitarem orações do Clássico budista.

O Imperador deprimido quis suicidar-se, obrigando dia e noite a ter uma pessoa a acompanhá-lo. Com uma tristeza imensa, pensou abandonar o trono e fazer-se monge. Dois meses após a morte da sua favorita, Shunzhi pediu a Xisen que lhe rapasse o cabelo e nem a Imperatriz viúva sua mãe o conseguiu demover. Esta, desesperada, mandou chamar Yülinxiu para vir ao palácio a fim de o obrigar a abandonar tal ideia. Levava 18 dias de monge, quando este chegou, mas nem as várias razões expostas o demoveram e em desespero, Yülinxiu ameaçou com a chantagem de mandar queimar Xisen. Só assim o conseguiu demover.

Dos oito filhos masculinos de Shunzhi, o primeiro nascido em 1651 morrera 89 dias depois.
Ao preparar a sucessão, dos seis candidatos o imperador inclinava-se para o segundo filho Fuquan (1653-1703), então com nove anos. Mas a mãe de Shunzhi, a Imperatriz viúva Xiaozhuang não concordou e por sugestão de von Bell, o único a saber sofrer o Imperador de varíola, propôs a escolha de Xuanye, pois aos dois anos tivera essa doença, bastante mortífera para os manchus que não tinham defesas contra ela. Assim vacinado, o seu terceiro filho Xuanye com oito anos foi o escolhido.

A 5 de Fevereiro de 1661, Shunzhi com 22 anos morreu, sendo sepultado conjuntamente com a sua favorita, a Imperatriz Xiaoxian, no Mausoléu Xiao.

25 Mar 2019

“Nova rota da seda” | Itália assina memorando de entendimento

Apesar do desagrado manifestado pelos Estados Unidos e pelas maiores potências europeias, o Presidente chinês, Xi Jinping, e o primeiro-ministro italiano, Giuseppe Conte, assinaram, em Roma, um acordo “não vinculativo” que torna a Itália no primeiro país do grupo G7 a participar no projecto “nova rota da seda”, desenvolvido por Pequim

 

[dropcap]O[/dropcap]s Governos italiano e chinês assinaram sábado um memorando de entendimento “não vinculativo” para selar a entrada de Itália na “nova rota da seda”, apesar das preocupações de Bruxelas e Washington.

A Itália é o primeiro país membro do G7 a integrar este projecto faraónico de infraestruturas marítimas e terrestres lançado por Pequim em 2013. Com este projecto, Pequim tenciona impulsionar o seu comércio com o Ocidente, apesar das reticências por parte da União Europeia.

O memorando de entendimento articula-se em 29 acordos em áreas como infraestruturas e energia e foram assinados em Roma, na presença do Presidente chinês, Xi Jinping, e do primeiro-ministro italiano, Giuseppe Conte, na Vila Madama de Roma.

Itália abre-se, assim, à iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”, um programa lançado pela China para se ligar às economias ocidentais na Europa, Médio Oriente e África, que vê nos portos italianos o ponto de chegada ideal para difundir os seus produtos e investimentos.

Itália torna-se assim o primeiro país do G7, o grupo das sete democracias mais industrializadas do planeta, a apoiar este projecto. Tal é conseguido através de um memorando de entendimento que não cria vínculos jurídicos, e que aquele país europeu vê como uma lista de intenções, um “acordo programático”, como defendeu nos últimos dias o primeiro-ministro Giuseppe Conte, face aos receios suscitados.

Maus olhados

Em concreto, os Estados Unidos e importantes membros da União Europeia, como a França ou a Alemanha, vêem com certa desconfiança o projecto chinês, que suspeitam que possa vir a aumentar a influência da potência asiática no continente.

Na Europa, assinaram acordos deste tipo países como Malta, Portugal, Bulgária, Croácia, República Checa, Hungria, Grécia, Estónia, Letónia, Lituânia, Eslováquia e Eslovénia, mas a Itália é o primeiro país do G7 a fazê-lo.

Nos termos do memorando de entendimento para a “Nova Rota da Seda”, Itália e China ractificaram 29 acordos entre as suas empresas para aumentar a cooperação em sectores como o das infraestruturas, da energia, da cultura e do turismo.

25 Mar 2019

Corrida tecnológica ao 5G conta com participantes de todo o mundo

Entre suspeitas de espionagem, com a gigante chinesa Huawei a ser a principal visada, a corrida tecnológica joga-se um pouco por todo o mundo, com os Estados Unidos, o Japão, a Coreia do Sul e a China a assumirem a liderança no desenvolvimento da rede de quinta geração

 

[dropcap]A[/dropcap]rede móvel de quinta geração (5G) está a ser desenvolvida em vários países do mundo, estando os asiáticos e os Estados Unidos mais bem posicionados para vencer a ‘corrida’ tecnológica, que tem sido marcada pelas suspeitas de espionagem chinesa.

Nesta ‘corrida’ está também a União Europeia (UE), com os Estados-membros a darem passos para que o 5G seja disponibilizado, de forma comercial, em pelo menos uma cidade por país até 2020 e para que haja uma cobertura mais abrangente até 2025.

Ainda assim, os avanços são maiores fora da UE, já que “os Estados Unidos, o Japão, a Coreia do Sul e a China são os principais países em termos de desenvolvimento” desta tecnologia, admite o Observatório Europeu para o 5G no seu relatório de acompanhamento mais recente, datado de final do ano passado.

Além de monitorizar o que está a ser feito na União, este observatório criado pela Comissão Europeia acompanha a aposta no resto do mundo, indicando no relatório, a que a agência Lusa teve acesso, que “os Estados Unidos são um país muito avançado no 5G”, sendo esperado em breve que as operadoras AT&T ou Verizon o comercializem, após testes no ano passado.

Também a China está “a experimentar o 5G”, prevendo o seu lançamento comercial em 2020 através da China Unicom e da China Telecom, segundo o documento.

Antes, para o segundo semestre deste ano, é apontada a comercialização do 5G na Coreia do Sul, país que chegou a testar esta tecnologia numa zona limitada dos jogos olímpicos de Inverno, em Fevereiro do ano passado, na região de PyeongChang.

No próximo ano, esta oferta comercial deverá chegar ao Japão, com “os operadores japoneses a pretenderem lançar o 5G a tempo de acolher os jogos olímpicos e paraolímpicos de Verão em Agosto de 2020”, segundo o relatório.

“Além destes países e da UE, outros estão a planear desenvolvimentos no 5G, como a Índia, a Austrália, o Canadá, a África do Sul e os países do Golfo, como os Emirados Árabes Unidos, o Qatar e a Arábia Saudita”, aponta o mesmo documento do Observatório Europeu.

No caso da Índia, o lançamento comercial só é estimado para 2022. Entre os restantes, “o Qatar e os Emirados Árabes Unido reivindicam ter sido os primeiros a lançar o 5G”. Porém, “sem qualquer dispositivo 5G disponível até ao momento [nestes dois países], parece ter sido mais uma ‘luz verde’ para a infraestrutura do que um lançamento comercial completo”, observa o relatório.

Alvo a abater

No que toca aos principais fabricantes de equipamentos 5G, o documento aponta a Ericsson, a Huawei, a Nokia, a Samsung e a ZTE, alguns dos quais podem vir a ser lançados ainda este ano.

É, contudo, a chinesa Huawei que está no cerne da polémica, estando acusada de 13 crimes por procuradores norte-americanos, incluindo fraude bancária e espionagem industrial.

O Congresso dos Estados Unidos chegou, inclusive, a proibir agências governamentais de comprarem produtos da Huawei, ao abrigo da Lei de Autorização de Defesa Nacional, por considerar que a empresa serve a espionagem chinesa.

Ao mesmo tempo, o país tem pressionado vários outros, incluindo Portugal, a excluírem a Huawei na construção de infraestruturas para redes de 5G.

A empresa tem rejeitado alegações sobre a segurança da sua tecnologia 5G, insistindo que não tem “portas traseiras” para aceder e controlar qualquer dispositivo, sem o conhecimento do utilizador.

A Huawei informou ainda que vai processar o Governo dos Estados Unidos por ter proibido a compra dos equipamentos de telecomunicações pelos serviços públicos.

Entretanto, em meados deste mês, o secretário-geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Nato), Jens Stoltenberg, disse estar a ponderar eventuais acções contra a Huawei, tendo em conta as preocupações de segurança.

Também nessa altura, o Parlamento Europeu mostrou-se preocupado com a ameaça tecnológica chinesa na UE, instando a Comissão Europeia a agir perante possíveis acessos ilegais a dados em equipamentos móveis de 5G.

Já esta semana, o ministro chinês dos Negócios Estrangeiros, Wang Yi, pediu aos países da UE que garantam livre concorrência para as empresas chinesas, e denunciou tentativas de “afundar” grupos como a Huawei por motivos de segurança.

25 Mar 2019

“Arte Macau” arranca com duas exposições a 12 de Abril

[dropcap]É[/dropcap]já em Abril que serão inauguradas duas exposições incluídas na iniciativa “Arte Macau”, e que terão o Renascimento em Itália, a implantação da República Popular da China e a transferência de soberania de Macau como pano de fundo.

A exposição “Desenhos da Renascença Italiana do British Museum” estará patente entre 12 de Abril e 30 de Junho e irá apresentar 52 desenhos originais de 42 mestres da Renascença italiana, como Mantegna, Correggio, Leonardo da Vinci, Michelangelo, Titian, Raphael e Rosso Fiorentino, e explora a importância do desenho no processo criativo dos artistas entre 1470 e 1580.

Este ano assinala-se o 500.º aniversário da morte de Leonardo da Vinci e a exposição inaugura em Abril que coincide com o aniversário do nascimento do grande mestre renascentista (15 de Abril de 1452). Além disso, e pela primeira vez em Macau, a exposição proporcionará uma experiência táctil aos espectadores com deficiências visuais através da impressão 3D e tecnologia relevante, promovendo uma experiência cultural universal.

A política chinesa merece destaque com a exposição “Beleza na Nova Era”, que marca não só os 70 anos da RPC como os 20 anos do regresso de Macau à China.

Esta mostra estará patente entre os dias 4 de Maio e 28 de Julho, tendo sido seleccionadas cerca de 90 obras a partir do acervo do Museu Nacional de Arte da China. Será mostrado o trabalho de mestres modernos e contemporâneos como Qi Baishi, Zhang Daqian, Xu Beihong, Liu Haisu, Lin Fengmian, Fu Baoshi e Li Keran, entre outros, permitindo uma visão abrangente do desenvolvimento da arte chinesa nos últimos cem anos.

Evento transversal

A iniciativa “Arte Macau” irá decorrer durante cinco meses, entre Junho e Outubro, e conta com a participação de operadoras de estâncias turísticas, hotéis integrados e consulados estrangeiros que são convidados a acolher exposições de arte simultaneamente.

O objectivo deste evento, afirma o Instituto Cultural, é “criar uma atmosfera cultural por toda a cidade e transformá-la numa galeria de arte, espalhando um irresistível ambiente artístico em todos os seus cantos”. O principal local de exposições será o Museu de Arte de Macau, podendo decorrer eventos noutros locais.

“Arte Macau” também pretende levar ao público “concertos de grande escala” protagonizados pela Orquestra de Macau e pela Orquestra Chinesa de Macau, além de estar prevista a realização da Exposição de Artes Visuais das Instituições do Ensino Superior de Macau, do Festival Juvenil Internacional de Música, do Festival Juvenil Internacional de Dança e o Festival Juvenil Internacional de Teatro.

O objectivo destas iniciativas é o de “tornar a cidade numa plataforma de intercâmbio cultural e artístico de nível mundial e de partilhar com longo e memorável Verão artístico com todos os residentes e turistas”.

25 Mar 2019

FAM | Dança e teatro protagonizam primeiros espectáculos da 30ª edição

A trigésima edição do Festival de Artes de Macau acontece entre os dias 3 de Maio e 2 de Junho e já há alguns nomes em cartaz. De Portugal chega o Teatro do Eléctrico com a peça Karl Valentin Kabarett, enquanto que de Pequim a comédia ganha forma com o espectáculo O Sr. Ma e o Filho, da BJAMC Drama

 

[dropcap]N[/dropcap]o ano em que o Festival de Artes de Macau (FAM) celebra 30 anos de existência, o Instituto Cultural (IC) decidiu criar um cartaz que homenageia os clássicos. Com o tema “um tributo aos clássicos”, o programa pretende mostrar ao público um “leque de espectáculos de diferentes estilos e programa do Festival Extra e convidando o público a apreciar os clássicos”.

Os primeiros nomes já são conhecidos e trazem dança contemporânea e teatro. Vertikal é o espectáculo de dança que marca a abertura do FAM no dia 3 de Maio. Trata-se de uma co-produção de Mourad Merzouki, um conceituado coreógrafo francês, e da CCN Créteil & Val-de-Marne / Cie Käfig, considerada “uma das principais companhias de dança hip-hop de renome mundial”.

De acordo com o IC, podemos esperar uma performance em que “dez dançarinos deslizam no ar por cordas, libertando-se dos limites da gravidade para criar elementos coreográficos e produzir sequências de hip-hop únicas e contemporâneas”. O público poderá ver o espectáculo também no dia 4 de Maio, no grande auditório do Centro Cultural de Macau (CCM).

No dia 12 de Maio é apresentado Rain, um espectáculo de dança que resulta da colaboração entre o músico contemporâneo Steve Reich, a coreógrafa belga Anne Teresa De Keersmaeker e a sua companhia de dança Rosas.

Anne Teresa, considerada pioneira no mundo da dança, traz Rain novamente a palco 18 anos depois, mostrando ao público uma dança pura e música minimalista. “Impelidos pelos tons pulsantes de Steve Reich, nove bailarinos percorrem o palco com agilidade, dançando variações infinitas de liberdade física e precisão geométrica, com uma leveza de tirar o fôlego”, descreve o IC.

Rain é também composto por “figuras matemáticas, a repetição sustentada, a ocupação geométrica do espaço, a arte da variação contínua”. “Tudo o que gradualmente se tornou a assinatura da coreógrafa, é levado ao extremo em Rain”, acrescenta o IC.

Senta-te e ri

Além da dança estão também agendadas duas peças de teatro. Uma delas irá evocar aquele que foi considerado o “Charlie Chaplin da Alemanha”, Karl Valentin, e será levada a cena pela companhia portuguesa Teatro do Eléctrico. Karl Valentin Kabarett acontece a 24 de Maio no grande auditório do CCM e “cruza várias peças curtas por ele escritas com canções populares alemãs do início do século XX, cantadas ao vivo em alemão por 11 actores e um cantor lírico, acompanhados por uma orquestra de dez músicos”. Karl Valentin Kabarett revela o “constante complexo de inferioridade” das personagens de Karl Valentin e está carregado de ironia, música, dança e teatro. A encenação desta peça está a cargo de Ricardo Neves-Neves, também fundador do Teatro do Eléctrico.

De Pequim chega também outra comédia, intitulada “O Sr. Ma e o Filho”, da companhia BJAMC. Trata-se de uma adaptação do romance de Lao She para comemorar o 120º aniversário do seu nascimento, e é uma peça que revela o intercâmbio entre a cultura chinesa e a cultura ocidental, imbuída dos reflexos da sagacidade de Pequim e do humor inglês.

A história acontece à volta do Sr. Ma, que sonha um dia vir a ser mandarim. Devido à morte do seu irmão, o Sr. Ma vai para Londres com o seu filho para assumir a gerência de uma loja de antiguidades por ele deixada, tornando-se num modesto comerciante. Pai e filho ficam hospedados em casa da Sra. Wedderburn. Com o passar do tempo, vai-se desenrolando uma história de amor satírica e agridoce. O “Sr. Ma e o Filho” é apresentado nos dias 25 e 26 de Maio no grande auditório do CCM.

O cartaz provisório do FAM encerra com o espectáculo de ópera cantonense “A Alma de Macau”, que celebra o décimo aniversário da ópera cantonense inscrita na Lista Representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade.

Esta produção de ópera cantonense foi adaptada pelo dramaturgo Li Xinhua a partir de uma peça original de um autor de Macau e contará com a interpretação de actores de Macau e da Trupe de Ópera Cantonense de Foshan, dando vida à épica história de Macau.

25 Mar 2019

CAECE | Propostas para eleger colégio eleitoral entregues até 7 de Maio

[dropcap]E[/dropcap]stá decretado o prazo de 7 de Maio para a entrega de propostas de participação, por parte de pessoas colectivas, nas eleições para compor o colégio eleitoral que irá eleger o próximo Chefe do Executivo. O sufrágio para a composição do colégio eleitoral tem lugar no próximo dia 16 de Junho. De acordo com um comunicado da Comissão Eleitoral do Chefe do Executivo (CAECE), os documentos para esse efeito estão disponíveis para levantamento junto dos Serviços de Administração e Função Pública (SAFP).

Os eleitores de pessoas colectivas com capacidade para votar que pretendam exercer o direito de um número máximo de 22 votos conferido por lei, podem, desde o passado dia 4 de Fevereiro, escolher entre os membros dos órgãos de direcção ou de administração que estejam em exercício, um número máximo de 22 votantes que observem o disposto nos regulamentos. Até 7 de Maio deve ser entregue a relação dos votantes nos SAFP juntamente com a “Declaração de Aceitação do Exercício do Direito de Voto em Representação da Pessoa Colectiva”.

Antes da entrega da proposta de candidatura será necessário submeter nos SAFP os dados de identificação do representante que assina o boletim antes do dia 23 de Abril.

25 Mar 2019

A priorização da segurança humana

[dropcap]”[/dropcap]At the end of the day, the goals are simple: safety and security.”

Jodi Rell

A 10 de Março de 2019, um avião da Ethiopian Airlines despenhou-se logo após a descolagem, matando cento e cinquenta e sete pessoas que se encontravam a bordo e nas horas após o acidente, mesmo antes de as autoridades recuperarem as caixas negras do avião, o mundo começou a questionar a segurança da aeronave. O Boeing 737 Max 8, foi anunciado como o futuro da aviação, graças à sua impressionante economia de combustível e toques futuristas, como música na cabine e nova iluminação LED. É um avião que começa uma nova fase na era da economia de combustível de dois dígitos em relação à geração anterior.

Os dois acidentes com aviões Boeing 737 Max 8 em apenas cinco meses, deixou o mundo consternado pelas consequências de perdas de tantas vidas humanas, e torna-se difícil não pensar a razão pela qual a Boeing resistiu aos esforços de manter os aviões no solo. A Southwest Airlines e a American Airlines, duas companhias aéreas americanas continuaram a voar, até o presidente Trump anunciar que os aviões se manteriam no solo, revertendo uma decisão anterior da Administração Federal de Aviação (FAA na sigla inglesa). A União Europeia (UE), a 12 de Março de 2019, proibiu o uso de aviões Boeing 737 Max 8 e 9, e que voassem no seu espaço aéreo. Os Estados Unidos ainda não tinham tomado qualquer decisão nessa data.

Todavia, em questão de meses, dois acidentes de avião Boeing 737 Max 8, pertencentes à Lion Air e a Ethiopian Airlines deixaram aos especialistas o benefício de descobrir se o avião é parte da equação ou se é apenas uma coincidência horrível. As companhias aéreas de muitos países, no entanto, não esperaram pela resposta e poucas horas após o acidente, a Ethiopian Airlines anunciou que iria manter no solo todos os seus aviões Boeing 737 Max 8. A China seguiu o exemplo, bem como Singapura, Austrália, Malásia e Reino Unido. Mas nesse momento, enquanto muitos países decidiam manter os seus aviões Boeing 737 Max 8 no solo, os mesmos continuavam em serviço nos Estados Unidos.

A American Airlines, enquanto apresentava as suas condolências às famílias e amigos dos passageiros que estavam a bordo do voo 302 da Ethiopian Airlines, afirmava que continuaria a voar com tais aeronaves pois não existiam factos concretos sobre a causa do acidente, além das notícias propagadas e que as suas equipas de voo, operações técnicas e de segurança, monitorizariam a investigação na Etiópia, dado ser o seu protocolo padrão para qualquer acidente de aeronaves. A American Airlines continuaria a colaborar com a FAA e outras autoridades reguladoras, dado que a segurança dos membros das suas equipas e clientes eram a sua prioridade número um, e que tinham total confiança na aeronave e nos membros da sua tripulação, que eram os melhores e os mais experientes do sector.

A FAA, entretanto, compartilhou a sua declaração de apoio à Boeing e aos aviões modelo 737 Max 8, afirmando que relatórios externos estavam a ser elaborados, delineando semelhanças entre o acidente da Ethiopian Airlines e o da Lion Air, ocorrido a 29 de Outubro de 2018, bem como as instruções de aeronavegabilidade continuada para a comunidade internacional, pelo que a investigação apenas tinha começado e não tinham recebido dados suficientes para retirar conclusões ou tomar quaisquer medidas. A FAA observou que exigiu mudanças de projecto na aeronave para serem realizadas até Abril de 2019. As alterações eram o resultado do acidente da Lion Air e não do recente acidente na Etiópia.

A Boeing defendeu os seus planos e declarou que especular sobre a causa do acidente ou discuti-lo sem deter todos os factos necessários não era apropriado e poderia comprometer a integridade da investigação. A outra companhia aérea americana, a Southwest Airlines, que actualmente opera com aviões Boeing 737 Max 8, disse que planeava continuar a usar os aviões, mas monitorizaria a investigação em curso. A Southwest Airlines possui trinta e quatro aeronaves modelo MAX 8, sendo a sua frota de setecentos e cinquenta Boeings 737, pelo que continuavam confiantes na sua segurança e aeronavegabilidade, e as aeronaves do modelo MAX 8 tinham produzido milhares de dados positivos durante cada voo, que são constantemente monitorizados, tendo realizado mais de quarenta e um mil voos e detinham informação suficiente que indicava a eficácia dos seus padrões operacionais, procedimentos e treino.

Todavia a Southwest Airlines, estava a ajudar a retirar o medo dos seus clientes, permitindo que as pessoas mudassem de avião se desejassem. Após dois dias do acidente da Ethiopian Airlines e de pressão crescente, os Estados Unidos mantiveram no solo os aviões Boeing 737 Max 8, revertendo uma decisão anterior em que os reguladores americanos afirmaram que os aviões poderiam continuar a voar. A decisão, anunciada pelo presidente Trump, seguiu determinações de reguladores de segurança de quarenta e dois países de proibir os voos desses aviões, que se encontram imobilizados no solo em todo o mundo. Os pilotos, comissários de bordo, consumidores e políticos dos principais partidos políticos americanos reivindicavam que os aviões permanecessem no solo nos Estados Unidos.

Apesar do clamor, a FAA estava decidida, e afirmava que não havia problemas sistémicos de desempenho que levassem as duas companhias aéreas a suspender os voos dos aviões. A 13 de Março de 2019, tudo muda quando, em uma sucessão relativamente rápida, autoridades de aviação americanas e canadenses disseram que estavam a manter no solo os aviões depois de dados de rastreamento por satélite, sugerirem similaridades entre o acidente na Etiópia e o da Indonésia. A segurança do povo americano e de todas as pessoas era a sua preocupação primordial, afirmaria o presidente Trump a repórteres na Casa Branca ao fazer o anúncio. É de entender que à medida que os aviões se tornam mais automatizados, alguns pilotos perdem habilidades de voo. O acidente do voo 302 da Ethiopian Airlines tem muitas semelhanças com o acidente da Lion Air. Os dados sobre a trajectória vertical do avião etíope na descolagem e os dados comparáveis ​​do acidente da Lion Air mostraram flutuações verticais e oscilações, e poucas horas depois, a FAA confirma que a sua decisão surgia depois da investigação que desenvolveu e de novas informações reveladas a partir dos destroços a respeito da configuração da aeronave logo após a descolagem.

Tomados em conjunto com dados recentemente refinados do rastreamento por satélite da trajectória de voo da aeronave, as informações indicaram semelhanças entre as quedas etíopes e indonésias que justificam investigações adicionais sobre a possibilidade de uma causa compartilhada para os dois incidentes e que necessitam de ser melhor compreendidos e abordados. A Ethiopian Airlines desde logo, informou que um dos dois pilotos da aeronave relatou ter problemas de controlo de voo aos controladores de tráfego aéreo, minutos antes de o avião cair e disse que queria voltar ao Aeroporto Internacional de Bole em Addis Abeba.

O piloto foi autorizado, três minutos antes do contacto se ter perdido com a cabine. Essa divulgação sugere que um problema com o controlo da aeronave, ou com o sistema computadorizado de controlo de voo poderia ter sido um factor. São descartadas qualquer hipótese de terrorismo ou outra interferência externa no funcionamento da aeronave, que tinha apenas alguns meses. As autoridades ao examinar o acidente da Lion Air levantaram a possibilidade de que um novo sistema de controlo de voo possa ter contribuído para esse acidente. A FAA, alertou que a investigação sobre o acidente da Ethiopian Airlines estava incompleta, e nenhuma determinação quanto à sua causa foi feita, nem qualquer conclusão final foi elaborada para o acidente indonésio.

Os dados de voo e os gravadores de voz, conhecidos como caixas negras no desastre da Etiópia foram recuperados e serão analisados ​​na França, pelo que ainda se tem muito para aprender antes de se poder afirmar que tiveram a mesma causa e efeito. Os acidentes colocaram a Boeing na defensiva. A companhia aérea de baixo custo, Norwegian Air, que tem uma das maiores frotas de Boeing 737 Max 8 fora dos Estados Unidos, disse que pedirá uma indemnização por manter os aviões no solo. O Boeing 737 Max 8 é o avião mais vendido da Boeing de todos os tempos e deve ser um grande estimulador de lucro, com mais de quatro mil e quinhentos aviões encomendados. As acções da empresa caíram cerca de 11 por cento na semana do acidente. A Boeing por seu lado está a apoiar esta fase proactiva com extrema cautela, e a cooperar para entender a causa dos acidentes em parceria com os investigadores, implantar melhorias de segurança e ajudar a garantir que tal facto não aconteça novamente.

Após o acidente indonésio, os sindicatos de pilotos reclamaram que não tinham conhecimento de uma mudança no sistema de controlo de voo do Boeing 737 Max 8 que poderia empurrar o nariz do avião automaticamente para baixo em certas situações. Acredita-se que a mudança no “software” tenha desempenhado um papel no acidente da Lion Air e também tenha sido um factor no acidente na Etiópia. A Boeing está a planear lançar uma actualização de “software” que está em desenvolvimento desde o acidente na Indonésia. A introdução de um novo recurso de controlo de voo consequente, sem qualquer requisito para o treino de pilotos, está a atrair mais atenção. As autoridades americanas planeiam conduzir uma investigação sobre a certificação do Boeing 737 Max 8 pela FAA, com o objectivo de saber o motivo pelo qual o órgão regulador não exigiu o treino dos pilotos a aprenderem a voar a nova versão. A FAA, transportadoras e fabricante irão trabalhar arduamente para tornar a imobilização dos aviões no solo no mais curto tempo possível, pois situações como estas são um alto teste para os líderes.

Ainda não está claro porque razão o avião da Ethiopian Airlines caiu. Os reguladores estiveram divididos, enquanto os da Ásia e Europa avançaram relativamente rápido com as proibições de voo, e nos Estados Unidos a FAA manteve a decisão de que a análise não mostra problemas sistemáticos de desempenho e não fornece uma base para ordenar a manutenção das aeronaves no solo. Os políticos e líderes da Boeing telefonaram ao presidente Trump garantindo a segurança dos aviões da empresa após um “tweet” presidencial que queixava de que os aviões estavam a tornar-se um caso muito complexo, afirmando desvairadamente “Eu não quero que Albert Einstein seja meu piloto”. A 13 de Março de 2019 mais de quarenta países imobilizavam os seus aviões. Toda esta confusão não traz benefícios nem aos investidores das empresas envolvidas, nem aos trabalhadores e passageiros. Ter-se-ia evitado grande parte da turbulência se os líderes da empresa tivessem feito um trabalho melhor em enquadrar a situação.  Os líderes têm uma tarefa crucial no início de um desastre em formação, devendo usar a arte de enquadrar para descrever a natureza do problema que a organização está a enfrentar.

Os modelos adequam a forma como pensamos os problemas e também as oportunidades e dizem qual a categoria de dificuldade que estamos a lidar, porque ao identificar um tipo de problema, também contém as sementes de acção e resposta. É de lembrar que durante a crise de envenenamento por Tylenol em 1982, a J&J, empresa multinacional americana de produção de dispositivos médicos, produtos farmacêuticos e bens de consumo embalados fundada em 1886, notoriamente declarou que se tratava de um problema de saúde pública.  Tal enquadramento deu início a todas as actividades que associamos à reacção padrão da J&J e a uma crise em que vidas humanas estão em jogo. Assim, todas as embalagens de cápsulas de Tylenol, contra o conselho do Food and Drug Administration (FDA), foram pela J&J substituídas por novas embalagens resistentes a adulterações e entregou as cápsulas recém-embaladas em um período de seis semanas.

Quando um segundo surto de envenenamento ocorreu quatro anos após o primeiro, a J&J declarou que só oferecia Tylenol em cápsulas, que não podiam ser separadas e lacradas sem que os consumidores soubessem. A J&J poderia ter descrito a natureza do envenenamento por Tylenol de muitas maneiras diferentes, como um ataque à empresa, um problema em algum lugar no processo de distribuição do Tylenol das fábricas para lojas de venda a retalho, bem como as acções de um assassino solitário e cada um desses enquadramentos teria levado a um conjunto diferente de acções. Se a J&J tivesse chamado de ataque ao envenenamento, teria desencadeado uma guerra dispendiosa e difícil de vencer contra estranhos e desconhecidos tentando destruir a empresa.

Se fosse um problema de processo, haveria uma revisão minuciosa da cadeia de fornecimento de Tylenol e possíveis falhas no sistema, e se acaso pudesse ser trabalho de um homicida? Sabemos como tais generalidades podem levar à inacção no sector e a culpar sistemas muito distantes da empresa e das suas responsabilidades. É de acreditar que o presidente da Boeing insistiu com o presidente Trump e outros de que a aeronave era segura. O treino é projectado para ajudar os pilotos a identificar e substituir os controlos automáticos do avião se os mesmos erroneamente dirigirem o seu nariz para baixo.  Assim, o quadro do presidente da Boeing foi pintado no sentido de que se é um problema técnico podia ser corrigido com o treino dos pilotos. Tarde demais. É um quadro bastante comum para o mau funcionamento de um produto, mas ainda não sabemos se a semelhança nos dois acidentes é uma coincidência ou o sinal de um problema sistemático que precisa de ser corrigido.

Além disso, o quadro parece perder o momento, pois centenas de vidas humanas foram perdidas, e mais podem estar em risco, e os reguladores em muitos países imobilizaram os aviões.  As acções dos reguladores reflectem um quadro de priorização da segurança humana, que parece reflectir melhor os altos níveis de incerteza e risco que a Boeing está a pedir que aceitemos. O que poderia a Boeing ter dito de forma mais sensata? Talvez fosse melhor dizer que é um problema técnico que não dominam por completo e à luz dessa incerteza, recomendar a aterragem dos Boeings 737 Max 8 e 9 até terem a certeza de descobrir o que está a provocar as falhas e poder contentar a empresa, reguladores globais, transportadoras e passageiros e que possam ter todos a certeza do que está a causar essas falhas e de que os aviões são seguros para voar de novo.

Tal enquadramento leva a um caminho de acção muito mais claro e reconhece uma parceria com reguladores encarregados de proteger vidas humanas e teria sido melhor para todos os interessados ​​se a Boeing tivesse chegado a essa conclusão antes que o presidente americano aparentemente o fizesse. A questão principal para os líderes é o facto de ser necessário tornar a situação e o pensamento difícil. É necessário decidir que tipo de problema se está a enfrentar, e descrevê-lo em linguagem clara que ajudará as pessoas que o têm de resolver na empresa, bem como os que estão a julgar de fora, a entender como a empresa está a pensar e que tipo de problema enfrenta. O enquadramento é uma ferramenta para ser usada conscientemente. Se for bem utilizada, pode fazer uma enorme diferença em inspirar a acção responsável e confiar no julgamento e nos valores da empresa, mesmo que, como no caso da J&J, o problema não esteja totalmente resolvido e precise de ser abordado de novo.

22 Mar 2019

O espelho dos outros

Acontece com frequência: a nossa imagem aos olhos dos outros pode influenciar mais o nosso comportamento do que a imagem que temos de nós próprios. Ou a imagem que temos da imagem que os outros têm de nós, para ser mais preciso. Vem isto a propósito do que se vende – ou não – nas chamadas lojas de conveniência japonesas, agora que se avizinham os grandiosos Jogos Olímpicos do Verão de 2020 e massivas quantidades de visitantes estrangeiros são esperadas no sempre distante país do sol nascente.

 As lojas de conveniência têm uma popularidade no Japão incomparável com o que passa em qualquer país europeu, ou mesmo asiático, onde geralmente também se encontra com facilidade este tipo de estabelecimento. O caso japonês não deixa de ser extremo, em todo o caso: na generalidade das zonas urbanas é possível encontrar uma destas lojas quase em cada quarteirão. Há excepções de vários tipos: havendo quarteirões onde não há lojas, também há outros onde coexistem várias, em geral pertencentes a diferentes cadeias, nacionais ou internacionais.

Independentemente da cadeia, as lojas tendem a ser bastante semelhantes: estão convenientemente abertas 24 horas por dia, 7 dias por semana, e vendem, como o nome sugere, o que pode fazer falta em qualquer momento, com uma variedade surpreendente: refeições prontas, frutas e legumes frescos, lacticínios, produtos de charcutaria, vinhos, uma vasta parafernália de outras bebidas, doces, pão, bolachas, gelados, detergentes vários, utensílios de limpeza, produtos de higiene pessoal, cosméticos, papel higiénico, guarda-chuvas, tabaco, ou mesmo algum vestuário de emergência, incluindo as camisas brancas com que grande parte dos homens japoneses se veste para ir trabalhar.

Um pouco mais surpreendente, pelo menos para os nativos de países com tecnologias digitais de utilização quotidiana aparentemente mais avançadas, como é o caso de Portugal, são alguns dos serviços prestados nestas lojas e que nós já transferimos quase completamente para os cabos das redes de informação: compra de bilhetes para espectáculos, pagamentos de impostos ou outras contribuições para instituições públicas também são maioritariamente feitos nestes estabelecimentos, igualmente equipados com anacrónicas máquinas de fotocópias, que no Japão continuam a consumir despropositadas quantidades de papel.

O assunto desta crónica é outro, no entanto. É que entre os produtos de extrema conveniência comercializados nestes estabelecimentos estão os jornais, revistas e colecções de manga tão populares na cultura japonesa. E entre estas revistas (de animação ou não) estão as publicações para adultos – na esmagadora maioria dos casos orientadas para o público masculino – cujas capas normalmente ostentam magníficas representações de voluptuosos seios femininos e cujos interiores estão invariavelmente repletos de pornografia explícita.

Não sendo estes conteúdos particularmente diferentes daquilo que se pode encontrar na literatura recreativa para adultos em qualquer outra parte do mundo, o que surpreende é a exposição: estas publicações partilham espaços relativamente exíguos com outros géneros, incluindo a literatura infantil, normalmente a escassos centímetros de distância. Não consta que desta ultra-exposição pornográfica tenha vindo grande mal ao mundo – ou pelo menos ao Japão. Na realidade, poucos ou nenhuns problemas são conhecidos em relação ao assunto – nem sobre a manifesta e permanente objectificação dos corpos femininos para entretenimento masculino, nem sobre o fácil acesso que as crianças japonesas podem ter às publicações (mesmo que por lei não as possam comprar).

Em todo o caso, as coisas vão mudar num futuro próximo: até ao início dos Jogos Olímpicos, dentro de pouco mais de um ano, as lojas de conveniência são obrigadas a deixar de comercializar este tipo de literatura, que passará a ser disponibilizada em outros circuitos. A razão é simples: aos olhos dos visitantes estrangeiros que hão-de vir, esta exposição da pornografia é inaceitável. Ou pelo menos parece ser essa a imagem que as autoridades japonesas têm da imagem que os estrangeiros podem vir a ter do Japão. Seja como for, as revistazinhas com generosas mamas nas capas terão que passar a ser vendidas em circuitos especializados. Tanta exposição pública não é conveniente.

22 Mar 2019

Mundo e música

 [dropcap]N[/dropcap]ão tenho a certeza, mas imaginemos que o nosso primeiro sentido é o auditivo. A percepção acústica tem consequências no nosso corpo todo. Não nos lembramos de como era no ventre da nossa mãe. Mas podemos achar que é táctil, líquido, quente, interior: um pequeno mundo. Ainda assim, proponho: a nossa primeira sensação é acústica. Como será no interior do ventre da nossa mãe? Seremos nós exteriores dentro de um interior acústico? Lembro-me de como foram as minhas percepções: o mar, o trânsito em Lisboa, a cozinha onde se matavam animais para serem comidos, os primeiros dias de Primavera, o frio de Dezembro. Eram visuais, não? Mas todas tinham a vibrar no seu interior música, tinham tonalidades, melodias, harmonias. Eram músicas estranhas porque não tinham instrumentos a exteriorizá-las. Tinham uma camada visual e uma camada acústica. E não só. O tacto era musical: o corpo era quente e lento ou frio e rápido ou lento e rápido: quente e frio. E era húmido ou envolvente como um slow ou seco como um acorde do baixo para o agudo. O gosto era musical: batidos de morango eram uma sinfonia e a Coca-Cola um Rock pesado. Depois, há o olfacto: as doces e melódicas fragrâncias que contrastam com o ácido e azedo que dá prazer e nos faz elevar ao céu e descer ao inferno.

 As primeiras impressões são acústicas, são auditivas. Não apenas nas sensações. Não. São no espaço. O quarto da infância é lento como o tempo do tédio. O quarto, o mesmo, da juventude, é rápido como as músicas doidas que se ouviam e ouvem quando o tempo tem de ser preenchido. O quarto do estrangeiro encontra na luz ou na penumbra, numa segunda-feira ou numa sexta-feira, o seu ritmo. Mas era ao domingo que era lento. O tempo da vida tem esta musicalidade complexa, inebriante. Quando era tempo, era musical. Não sabemos bem como, mas era. E, depois, há os outros. Os outros têm as suas sensações, os seus locais, os seus tempos. Podem ser os outros com as suas sensações, os seus lugares e os seus tempos, mas os outros connosco e nós com eles somos outras sensações, outros lugares e outros tempos.

 Os outros vêm das suas mães, dos seus cheiros, sabores, visões e audições. Vêm do seu tempo, do seu lugar e do seu corpo. Quando conhecemos os outros vemos um misto de tudo: sensações, lugares, tempos. Os outros são os seus pais e avós, irmãos e filhos. Nós somos os outros: pais, irmãos e filhos. Os outros que são connosco e nós com eles somos um conjunto de sensações, lugares e tempos. E tudo isso é uma melodia complexa com múltiplas vozes, ritmos e melodias. Ninguém é só. Alguém é só na mudez e no silêncio das suas vidas. Não. Mesmo na voz solitária falamos connosco e somos três: eu que falo comigo sobre mim: tu que falas contigo sobre ti. O outro que fala consigo sobre si. Nós que falamos uns com os outros sobre nós. Vós que falais com os outros sobre vós. Os outros que falam com eles sobre eles.

 A primeira percepção da vida é acústica. O tempo é captado no tempo. A harmonia é ouvida na distensão temporal da harmonia. O ritmo é o da vida. Lento como nas tardes de domingo. Rápido é sexta-feira à noite ou sábado. O ritmo e a melodia é diferente nos primeiros acordes. É diferente nos acordes finais de um soneto. Um soneto é música falada. A fala é a música da conversa, do discurso, do que dizemos sem querer e do que dizemos sem querer. É como nas relações intrínsecas e íntimas. Tudo é um horizonte musical.

 Tudo é um horizonte musical. Não é visual, táctil, olfactivo ou gustativo.

 Vem um tempo, o princípio, acordes primeiros da vida: sempre a criar expectativa, sempre, ao princípio de prazer. Depois, talvez tarde demais, mas ainda cedo, de sofrimento. A promessa transforma-se em ameaça. O tempo futuro, musicalmente, é o da ameaça e da promessa. A promessa do prazer e a ameaça de sofrimento.

 A noite abate-se sobre o quarto na solidão. A solidão não engana. A solidão pode não ser eu só, mas acompanhado por toda a gente. Um mundo cheio de vozes sem dizerem nada e cacofónicas. Também pode ser outra coisa. Eu com toda a gente do mundo e nenhuma harmonia. Ou então: eu só contigo: em vez de haver um ritmo tão lento que abranda a vida ao ponto de a parar. É que a morte não tem tempo e, por isso, não tem música.

 Mas tu vieste: cheia de ritmo e melodia e harmonia.

 A vida passa do silêncio da mudez a ser a melodia do silêncio em que nada preciso de dizer no tempo.

 O tempo é a vida. A vida é a música possível, quando há amor. Impossível, quando não o há.

22 Mar 2019

Fogo preso

[dropcap]N[/dropcap]ão há dinheiro mais bem gasto do que em foguetes e tabaco. Este aforismo hedonista, tão ancestral quanto os apetites de Gilgamesh, dispendeu-o um fogueteiro com quem jantava. Parte interessado certamente, mas talvez por isso omnisciente ao invés do que resmunga o hamster do senso-comum, esfalfado a correr no rolo sem sair do lugar.

Sem levar a mal, o artesão preferia que o intitulassem de pirotécnico. Fogueteiros haviam sido o pai e antes dele o avô, ambos sofrendo a glória de terem batido as botas no ofício. O avô numa banal explosão; descuidou-se um instante a misturar ingredientes e agora estás vivo, agora estás morto; o barracão em lascas pelos ares e os pinheiros à volta todos chamuscados. Sobejaram tão poucas parcelas do velho que ficaria o caixão à tara se não lhe metessem uns pedregulhos. Já o pai teve combustão mais lenta. Foram dar com ele de borco numa tina de água ao fundo quintal, provando que não lhe falharam o instinto e as pernas para fugir após o rebentamento. Clinicamente morreu afogado e não das queimaduras ou de baque cardíaco com o susto.

E tem medo? Não é medo é respeito.

Já não havia rojões, comemos fêveras assadas, rijas que nem cornos. Não fosse a prudência do homem e o jantar teria sido um desconsolo. Contratado para iluminar as festas de Vila Nova de Cerveira dali a pouco projectaria a sua arte atmosférica por cima da toalha negra do rio Minho. De baterias e balonas expandir-se-iam serpentes, girândolas, alternados e trauliteiros, invadindo furiosamente a noite de som e cor. O último morteiro seria de arrancar pedra.

À orla de lá do rio vinham os galegos bisbilhotar. Queriam festa de borla? Levassem com as canas. Sempre podia uma ou outra furar uma cabeça, com sorte furar um olho. Passou-se isto há 25 anos, ainda 40% da actual população do globo não era nascida, antes das Europas que voltaram a ligar terras que para os suevos eram uma.

Recuando 10 anos, ou seja até ao Pleistoceno, na Bienal de artes de Cerveira de 84 outros fogos mais rasteiros e daninhos por lá se atearem. O certame pusera a tónica na performance, modalidade então em alta, mas, como amiúde sucede com as vanguardas, julgando rasgar os caminhos do futuro afinal esvaía uma época. “Corpos críticos e políticos que questionam a relação social, política e ideológica do corpo no mundo” no passo em que se repensava “a própria arte e as suas limitações;” enfim, o costume desde Lascaux, se assim se quiser olhar para as artes.

Mas houve momentos. Uma performer credenciada cobriu a nudez integral de pigmento azul e espojou-se em delíquios sexuais com um espadarte intacto e fresco que há-de ter custado uma nota preta no mercado de Matosinhos. Honre-se-lhe a coragem e o risco que acabaram por ter consequências. Não procederam estas da afronta ao pudor burguês e à denúncia da sua hipocrisia, mas dos ferozes pruridos que a tintas de má qualidade lhe provocou e a precipitaram nas urgências de dermatologia do S. João.

Noutro vi-me desgraçadamente implicado. O artista centrou-se numa roda de gente. Nas minhas mãos depôs um pequeno petardo que lançaria uma bola de fogo: “aponta para mim e dispara quando fizer sinal.”

De tanga – a temperatura estava amena, não se constiparia – empreendeu uma dança com tochas e labaredas, toda conceito quase nada habilidade. A dado ponto acenou-me. Apontei e hesitei. Insistiu de má cara, a minha vacilação quebrava-lhe o ritmo. Atirei. Tão curto era o trajecto que o projéctil não descreveu elipse e cravou-se em chamas no ombro dele. Os circunstantes não reagiram logo – transitar da intenção para a ignição podia ser que fizesse parte. Lá acabou também ele por ir ter de charola ao S. João. Caso estivesse de banco a mesma equipa é de crer que diagnosticaria esta forma de expressão artística como um caso de saúde pública.

Execrado pela comunidade como sabotador fui degredado de Cerveira. Mas ele é que mandou disparar! Ora essa, parvalhão! A arte são alegorias, quando muito metáforas ou metonímias, não há desculpa para o dano.

22 Mar 2019

Diário imprevisto de viagem

[dropcap]N[/dropcap]ão tenho normalmente grande contacto com miúdos de quinze anos – calma, não é nada disso. Embora o meu filho tenha de facto quinze anos, é um miúdo – como diremos – assaz atípico. Não sei o que se passa na cabeça dos adolescentes agora, na verdade não sei o que se passa na cabeça das pessoas em geral e tenho por hábito desconfiar das personas judicativas que as pessoas assumem facilmente diante de um teclado e de um ecrã. Quase ninguém é tão mau, tão bom, tão engraçado ou tão feliz como o avatar virtual que o representa. Além disso, vivo – como quase toda a gente – numa bolha constituída pelas amizades que de certo modo reforçam o ponto de vista segundo o qual esta atmosfera pode ser, a espaços, respirável. Dito isto, um adolescente de quinze anos não é mais misterioso para mim do que os participantes num programa da manhã: equivalem-se. A diferença é que ainda assim é mais fácil – embora porventura menos tolerável – ter acesso a um programa da manhã.

Fui convidado em 2018 para estar duas semanas em Bordéus com outro escritor – um marroquino, desta feita; o negócio é ter duas perspectivas, uma de dentro e outra de fora, da europa e da união europeia – ao abrigo de um programa local de cidadania europeia. A ideia é que os putos contactem com escritores – vivos, porque para a maior parte deles ser escritor equivale a estar morto – que lhes coloquem desafios às preconcepções que naturalmente decorrem da falta de contacto efectivo com outros pontos de vista além daqueles que os rodeiam e que tendem a reforçar aquilo que pensam. A ideia era portanto pô-los a pensar ao lado daquilo que pensam. Duas escolas por dia, duas horas em cada escola, uma vintena de criaturas em ebulição hormonal e com uma paciência tendencialmente diminuta para tudo quanto não seja imagem. Uma maratona.

Eu que não tenho especial vocação para a troca de experiências a nível intergeracional – ou mesmo horizontalmente geracional – achei que podia valer a pena nem que fosse para parasitar a experiência alheia com a qual são feitos todos ou quase todos os romances. A minha grande surpresa foi encontrar miúdos em cada turma muito diferentes dos restantes, bastante mais isolados e circunspectos no início das sessões, mais silenciosos, também, mas surpreendentemente curiosos acerca da pequena fatia de mundo que lhes conseguíamos entregar entre as perguntas orquestradas e as risotas. Não me percebam mal, como quase toda a gente que olha para baixo na hierarquia geracional, estava convencido do absoluto desproposito da juventude. Achava que não queriam ler, que não queriam aprender, que não queriam saber de quase nada senão do que se passa no enquadramento de um ecrã de telemóvel ou de computador. É quase mas não inteiramente verdade. Lêem menos, de facto (multiplicada de tal modo a oferta de distrações, seria estatisticamente improvável que a escolha deles recaísse tantas vezes sobre o livro como quando este competia apenas com a televisão). A principal diferença, parece-me, é o facto de estarem muito mais preocupados com o futuro do que eu e os da minha idade estávamos. Preocupam-se com o desemprego, com as alterações climáticas, com os direitos das minorias, das mulheres, com o racismo e restantes discriminações. Não quer dizer com isso que o plano social coincida com o plano prático. Mas pensam nas coisas com uma seriedade incompatível com a manutenção de uma fachada social de aceitação. Infelizmente – não há bela sem senão – parecem-me muito adultos. Demasiado adultos. Com quinze anos eu estava essencialmente preocupado em captar a atenção da Fatinha que parecia só ter olhos para um latagão com um cabelo loiro e encaracolado a lembrar as piores fotos do antigamente e incapaz de alinhar duas ideias que não gravitassem em redor do seu umbigo. O meu pai coitado bem me tentava ajudar: “pelo menos não deixes que a tua mãe te escolha a roupa”.

22 Mar 2019

Europa | Divisões internas impedem definição de política comum para a China

[dropcap]O[/dropcap] antigo secretário de Estado português dos Assuntos Europeus Bruno Maçães considerou ontem que a Europa é “incapaz” de desenvolver uma política comum para a China, numa altura em que Pequim avança com as suas ambições geoestratégicas.

“É quase impossível para a União Europeia (UE) ter uma política comum para a China”, afirmou Maçães, durante a apresentação do seu livro “Belt and Road: A Chinese World Order” (Faixa e Rota: Uma Ordem Mundial Chinesa), em Pequim.

Lembrando que o sul da Europa se sente injustiçado por “regras parciais” da UE, o ex-secretário de Estado, actualmente consultor e a residir na capital chinesa, disse que é “muito tentador” para aqueles países usar a China para contrabalançar o poder da Alemanha.

“Não comprem essa ideia de que todos na Europa são europeus a pensar no continente: temos rivalidades históricas prontas a serem reabertas e revistas”, apontou.

Bruno Maçães falava nas vésperas da realização de uma cimeira do Conselho Europeu, que visa rever a política para a China, cuja rápida modernização e ascensão no espaço internacional têm suscitado preocupações entre as potências ocidentais.

No espaço de uma década, enquanto as economias europeias estagnaram, a China construiu a maior rede ferroviária de alta velocidade do mundo, mais de oitenta aeroportos e dezenas de cidades de raiz, alargando a classe média chinesa em centenas de milhões de pessoas.

Acompanhando este desenvolvimento, Pequim passou a assumir o desejo de aproximar o país do centro da governação dos assuntos globais, abdicando do “perfil discreto” na política externa chinesa, que vigorou durante décadas, e de competir nos sectores de alto valor agregado.

Expansão em curso

Nas vésperas da cimeira desta semana, Bruxelas produziu um documento sem precedentes, que classifica a China como “rival económico” e “adversário sistémico”, que “promove modelos alternativos de governação”, e apelou a acções conjuntas para lidar com os desafios tecnológicos e económicos colocados pela China.

Mas, apesar dos protestos de vários parceiros europeus, o Presidente chinês, Xi Jinping, iniciou ontem um périplo pelo continente que deverá ser dominado pela adesão da Itália ao projecto ‘Uma Faixa, Uma Rota’, que materializa esta nova vocação internacionalista de Pequim.

Bancos e outras instituições da China estão a conceder enormes empréstimos para projectos lançados no âmbito daquele gigantesco plano de infraestruturas, que inclui a construção de portos, aeroportos, autoestradas e linhas ferroviárias ao longo do sudeste asiático, Ásia Central, África e Europa.

Portugal é, até à data, um dos poucos países da UE a apoiar formalmente o projecto. As autoridades portuguesas querem incluir uma rota atlântica no projecto chinês, o que permitiria ao porto de Sines ligar as rotas do Extremo Oriente ao oceano Atlântico, beneficiando do alargamento do canal do Panamá.

O objectivo é “redesenhar o mapa da economia mundial” de forma a “colocar a China no centro”, repondo a “visão antiga do país sobre si mesmo, como nação universal”, descreveu Maçães, classificando o projecto chinês como “muito ambicioso” e um desafio à ordem mundial definida pelo Ocidente.

Com condições

O ex-secretário de Estado considerou ainda que aquela iniciativa é a resposta “certa” do país asiático para ultrapassar a “armadilha do rendimento média”, reorganizando as cadeias de distribuição globais para competir no sector tecnológico e atingir um alto nível de desenvolvimento.

“Se queres focar na produção de alta tecnologia, precisas que outros países te forneçam componentes com baixo valor agregado ou produtos agrícolas (…) ou garantir a tua segurança energética”, descreveu.

Maçães considerou que, através da concessão de crédito, a China passou a ter “muito poder” para guiar o processo de evolução de outros países na direcção que lhe interessa.

“Se quiseres abrir uma fábrica no Paquistão que se adeque aos interesses da China, tens acesso a linhas de financiamento”, explicou. “Mas se quiseres abrir uma fábrica que não se encaixa nas prioridades chinesas, o crédito está indisponível”, notou.

22 Mar 2019

Filipinas | Ex-governantes apresentam queixa contra Xi Jinping no TPI

[dropcap]D[/dropcap]Ex-funcionários do Governo filipino e um grupo de pescadores apresentaram queixa no Tribunal Penal Internacional (TPI) contra o Presidente chinês, Xi Jinping, por crimes contra a humanidade e danos ambientais no mar da China Meridional.

A acção, que solicita a abertura de um exame preliminar contra o Presidente chinês, foi apresentada em Haia, Holanda, na sexta-feira, indicou ontem a imprensa filipina, que publicou algumas páginas do documento.

O ex-secretário dos Negócios Estrangeiros filipino Albert del Rosario e a antiga procuradora no combate à corrupção Conchita Carpio Morales assinaram essa queixa juntamente com um grupo de pescadores afectados pelas actividades da China nessas águas.

Os requerentes acusam Xi Jinping e outros funcionários chineses de cometerem “crimes que implicam um dano ambiental massivo, quase permanente e devastador em vários países”, uma vez que a China ocupou várias ilhotas e recifes, cuja posse é disputada por vários países da região.

Os antigos funcionários do Governo filipino e os pescadores alegam que os danos ambientais começaram quando o Governo de Xi Jinping empreendeu “um plano sistemático para tomar o mar da China Meridional”, de grande importância geo-estratégica, através do qual circula 30 por cento do comércio global e abriga 12 por cento  da pesca mundial, além de possíveis depósitos de gás e petróleo.

Os signatários da acção alegam que o TPI tem jurisdição sobre o caso uma vez que “os crimes” da China ocorreram quando Manila ainda era membro do tribunal.

Em 17 de Março de 2018, o Presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, retirou o país do tratado que dá jurisdição ao TPI para investigar acções criminais no seu território – com a medida a ser efectiva a partir da mesma data do ano seguinte. A saída foi oficializada no passado domingo.

22 Mar 2019

Meteorologia| Autoridades de Hong Kong antecipam terceiro tufão n.º 10 desde 2017

[dropcap]O[/dropcap] Observatório de Hong Kong antevê a passagem de mais um tufão n.º 10, a menos de 500 quilómetros da região vizinha. A informação foi divulgada, ontem, pelo director do Observatório Shun Chi-ming, que espera um Verão com temperaturas mais elevadas devido aos efeitos do El-Niño. Este é um fenómeno meteorológico temporário e cíclico que resulta no aquecimento das temperaturas das águas no Oceano Pacífico.

Em relação ao número de tufões, Hong Kong espera que o território possa ser afectado por quatro a sete ocorrências. “É um número normal”, disse Shun Chi-ming. “Uma vez que se vai fazer sentir os efeitos do El-Niño, é possível que a época de tufões apenas comece no início de – ou depois – de Junho”, acrescentou, de acordo com o portal Hong Kong Free Press.

A última vez que Hong Kong içou o sinal número 10 de tufão em três anos consecutivos foi entre 1960 e 1962. Caso este ano se registe um tufão número 10, então o registo é igualado. Porém, o director do Observatório de Hong Kong deixou o desejo que tal não se verifique. “Espero que a história não se repita”, afirmou.

Nos últimos dois também Macau içou por duas vezes o sinal de tufão n.º 10. Em 2017 tal aconteceu com o Tufão Hato, que matou pelo menos 10 pessoas, e no ano passado com o Tufão Mangkhut.

Em relação à RAEM o Governo ainda não realizou o evento em que antecipa a época de tufões, o que normalmente acontece entre Abril e Maio. Contudo, não é de afastar um cenário muito semelhante, uma vez que nos últimos dois anos sempre que Hong Kong içou o sinal número 10, Macau fez o mesmo.

Na mesma conferência de ontem, o director do Observatório anteviu que as temperaturas podem chegar aos 40 graus nos Novos Territórios. “A altura em que Hong Kong vai deixar de ter Inverno está quase a chegar”, afirmou Shun.

No ano passado foram sete as tempestades tropicais que passaram a menos de 800 quilómetros do território, com o Mangkhut a ser o único tufão que levou a que o sinal número 10 fosse içado.

22 Mar 2019

Rota das Letras | Rolling Puppets apresentam “Droga” de Lu Xun

“Droga” de Lu Xun está em cena hoje, amanhã e domingo, nas oficinas navais nº2, pelas mãos da companhia Rolling Puppets. O espectáculo fecha mais uma edição do festival literário Rota das Letras e insere-se nas comemorações dos 100 anos do movimento do 4 de Maio que revolucionou a escrita no continente colocando as palavras ao alcance de todos

[dropcap]”[/dropcap]A verdadeira acção não acontece quando se tem esperança de que se consiga alguma coisa com ela, a verdadeira acção acontece quando já não se espera”. Estas são as palavras de Tan Tan La, co-fundadora, com Kevin Chio, da companhia de teatro Rolling Puppets, para descrever o espírito de Lu Xun, autor de “Droga”, a peça que vai subir ao palco das oficinas navais, nº2, hoje, amanhã e domingo. Esta interpretação do trabalho de Lu Xun é também o mote para mais uma apresentação do espectáculo no território.

A ideia de pegar neste texto, “Droga”, que pode ainda ser traduzido por “Medicamento” da autoria de um dos escritores emblemáticos do Movimento literário do 4 de Maio, surgiu em 2013. Nesta altura os responsáveis da Rolling Puppets, assistiam em Macau àquilo que consideraram “um verdadeiro início de movimentação social”. “Vivia-se uma época de alguma esperança social”, conta Tan Tan. A responsável recorda a saída à rua dos moradores do edifício Sin Fong, reclamando contra as más condições em que viviam. A eles juntaram-se residentes, e tudo parecia apontar para “uma luta colectiva por direitos sociais”.

No entanto, esta “reivindicação”, foi de pouca duração. “Vimos a ocupação das ruas por parte de manifestantes, mas foi durante muito pouco tempo, nem chegou a uma noite, mas isso aconteceu”, recorda com satisfação. No entanto, de repente, “houve distribuição de dinheiro e deixou de ser necessário pedir que se fizesse justiça”, lamenta. “Quando começámos a ver as pessoas a saírem à rua, a pedir justiça, pensámos que finalmente estavam a acordar mas acabámos por perceber que afinal voltaram a adormecer muito rapidamente”, acrescenta a responsável.

Foi também nessa altura, que os artistas encontraram um texto de Lu Xun que falava de solidão, em que o autor classificava o ser revolucionário como sendo uma espécie de viver solitário. “Ele, como revolucionário falava de como se sentia sozinho no seio da sociedade”. A partir daqui, pegar num texto de Lu Xun tornou-se imperativo para Ten Ten La e Kevin Chio.

Por outro lado, trazer Lu Xun a cena pareceria ser também uma missão. Se os seus textos eram o reflexo de uma sociedade de há 100 anos, actualmente continuam a espelhar as necessidades de mudança. “Somos artistas e achamos que devemos ecoar alguma coisa no que fazemos que faça as pessoas pensar”, aponta Kevin Chio, “e este texto vai nesse sentido”, acrescenta.

Questão necessária

“Queremos que este espectáculo interrogue as pessoas acerca do que querem nesta vida confortável que aparentemente têm. Será que possuem alguma coisa que queiram proteger? Será que se sentem vivos?”, questiona Ten Ten. Mais, “será que a população agora é assim tão diferente daquela para quem escrevia Lu Xun, há exactamente 100 anos?”

O autor, famoso por ter revolucionado a forma de escrita na China, tornando-a acessível a todos e libertando-a das elites, “falava acerca das pessoas que o rodeavam, de como o olhavam, como viam este medicamento, esta droga. O sangue contaminado que representava o sangue de uma revolução, levantava a interrogação se se trata de um veneno ou de uma cura”, diz Ten Ten La.

Apesar das diferenças trazidas pela passagem do tempo, o responsável considera que ainda assim, as pessoas, agora, não diferem muito das do início do século. “Actualmente as pessoas continuam a ser como dantes. Continuamos a tentar protegermo-nos a nós próprios sem olhar para o mundo em geral e para o que nos rodeia. É o mesmo”, acrescenta. Lu Xun descreveu o que o rodeava, Ten Ten e Chio pretendem ser o seu “espelho”.

Em dois tempos

Para adaptar o texto do “mestre”, a Rolling Puppets reescreveu o conto de modo a que seja representado “a dois tempos” em paralelo. “Quando tentámos adaptar o texto, aproveitámos para preencher as lacunas que o autor deixou, propositadamente. Para isso alternamos a representação entre situações da história original, passada naquele restaurante de Pequim, em que um pai luta pela sobrevivência do filho doente através da dádiva de sangue, com situações actuais, em que adaptamos o espaço para um restaurante chique de Macau”, explica Tan Tan. Para o efeito, os artistas utilizam “o sangue que pode ser da cura ou da morte, que pode ser medicamento ou veneno, do conto original, e também o seu contraponto com os valores da actualidade que podem ser duplamente interpretados”, remata.

22 Mar 2019

Violência | Marido tentou estrangular mulher com carregador de telemóvel

Um homem desempregado zangou-se com a esposa após pedir-lhe para não gritar com o filho. A vítima queria dormir antes de cumprir um turno da noite, mas acabou por ser atacada. O caso aconteceu nas habitações públicas de Seac Pai Van

[dropcap]U[/dropcap]m homem de 40 anos foi detido após ter tentado sufocar a mulher com um carregador de telemóvel. Além disso, o atacante terá agredido a esposa com as mãos e um pontapé na barriga. O caso, revelado pela Polícia Judiciária (PJ), aconteceu na terça-feira passada quando a mulher, de 32 anos, pediu ao marido que parasse de gritar, uma vez que estava a tentar dormir.

“Por volta das três horas da tarde, a vítima estava a dormir no quarto porque tinha de trabalhar num turno nocturno. Mas, nessa altura, foi acordada com a voz do suspeito, que estava a gritar com o filho”, contou o porta-voz da Polícia Judiciária. “A vítima explicou ao suspeito que precisava de descansar. Mas este zangou-se e respondeu com um soco na cara da mulher. Depois, no quarto, começou a apertar-lhe o pescoço com as mãos, o que fez com que ela não conseguisse respirar”, foi acrescentado.

Os membros do casal são residentes de Macau, mas o casamento foi registado em 2005, no Interior da China. A PJ não quis esclarecer se se tratava de um casal de novos imigrantes. A mulher trabalha num casino local, o homem é desempregado e ambos vivem numa das habitações públicas em Seac Pai Vai, na Avenida de Ip Heng.

Por sua vez, o filho do casal tem cerca de 14 anos e terá sido ele a ligar às autoridades, quando percebeu que o pai não estava com intenção de parar com as agressões: “O filho viu a situação e puxou o pai para fora do quarto. Mas o suspeito voltou a entrar no quarto. Nesse momento, a vítima percebeu que o atacante trazia o fio do carregador do telemóvel nas mãos para a estrangular. Então a mulher ficou com medo e pediu ao filho que ligasse às autoridades”, relatou o representante das autoridades.

Foi neste cenário que o homem voltou a atacar a mulher. Porém, optou por largar o carregador do telemóvel e procedeu ao ataque com as mãos no pescoço da vítima, que acabou inconsciente, por breves momentos.

Com a vítima inconsciente, o marido desistiu do ataque e foi para a sala, onde o filho já tinha ligado às autoridades. Momentos depois, a vítima ainda combalida também se dirigiu a essa divisão e foi novamente atacada, desta feita com um pontapé na barriga.

Episódios anteriores

Após a chegada das autoridades, o homem foi imediatamente detido e a mulher transportada para o hospital para receber tratamento. Durante o depoimento, a mulher explicou que esta não tinha sido a primeira vez que tinha sido atacada pelo marido.

“No interrogatório a vítima declarou que o suspeito tinha mau-humor e que esta não foi a primeira vez que tinha sido atacada”, revelou o porta-voz da PJ. “No entanto, justificou que nunca tinha pedido ajuda a amigos ou às autoridades porque tinha medo de prejudicar a vida do filho”, foi acrescentado.

O homem foi levado para o Ministério Público e enfrenta suspeitas da prática do crime de violência doméstica, que é punida com uma pena mínima de um ano de prisão e máxima de 8 anos. Nos casos em que há agravantes a pena pode chegar aos 15 anos de prisão e se houver morte, a pena máxima sobe para 25 anos.

22 Mar 2019

Caso das Saunas | PJ deteve mais um suspeito

[dropcap]A[/dropcap] Polícia Judiciária deteve mais um suspeito ligado ao caso das saunas, que revelou uma rede criminosa que desde 2017 terá gerado 313 milhões de patacas em lucros. O homem detido é um residente local com 50 anos, que se encontrava desempregado. Segundo a PJ, citada ontem pelo canal chinês da Rádio Macau, após a operação de 16 de Maio as investigações continuaram, resultando agora na detenção de um dos responsáveis pelo controlo e gestão das prostitutas. A detenção foi feita quando o residente entrou em Macau, uma vez que se encontrava fora do território.

Droga | PJ apreende 32,2 gramas de cocaína

A Polícia Judiciária deteve quatro pessoas na posse de 32,2 gramas de cocaína, avaliadas em 110 mil patacas. Segundo as autoridades, os suspeitos devem estar ligados a uma rede de venda de estupefacientes de Hong Kong. As detenções decorreram na quarta-feira à noite, depois da PJ ter recebido uma denúncia de que dois homens de Hong Kong pretendiam vir para Macau para vender cocaína num casino no NAPE. Inicialmente, a PJ apenas recebeu a indicação de dois envolvidos, mas em Macau os dois suspeitos de Hong Kong actuaram em conjunto com dois residentes locais, pelo que foram todos detidos. Após a detenção, os quatro homens acusaram positivo nos testes de consumo de drogas.

Trânsito | DSAT vai analisar cruzamento da Rua do Monte

A Direcção de Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT) vai avaliar as barreiras metálicas colocadas para impedir o trânsito entre o cruzamento da Rua do Monte e a Rua de Santa Filomena, junto ao restaurante Mariazinha. Numa resposta enviada ao HM, após o caso de uma ambulância que ficou presa na zona a aguardar que alguém retirasse as barreiras metais, a DSAT explicou que aquela zona integra a área do Largo do Senado, que ainda antes da transição foi fechada ao trânsito. Impedir a circulação de viaturas na área e proteger os peões foram as justificações dadas pela DSAT para a colocar as barreiras metálicas e instalar sinais de circulação proibida. Sobre o incidente da ambulância, a DSAT defende que há outros caminhos que permitem chegar às habitações. Mesmo assim, os serviços ponderam a reavaliação da situação e proceder a eventuais alterações necessárias.

Economia | Inflação disparou para o dobro em Fevereiro

A taxa de inflação dos 12 meses terminados em Fevereiro subiu 3,09 por cento em relação ao período homólogo do ano anterior, quando foi 1,46 por cento, o que representou um crescimento para mais do dobro. Os Serviços de Estatística e Censos (DSEC) justificam o aumento da inflação com a subida substancial dos preços do vestuário e calçado e transportes, que verificaram um incremento de 6,33 e 5,54 por cento, respectivamente. “Educação, transportes, vestuário e calçado registaram acréscimos significativos, ou seja, +5,95 por cento, +5,06 por cento e +4,48 por cento, respectivamente, face a Fevereiro de 2018”, lê-se na nota da DSEC.

22 Mar 2019

Jogo | Analistas projectam impacto da guerra comercial em Macau

[dropcap]A[/dropcap] grande questão para a indústria dos casinos na RAEM é como se vai lidar com os efeitos das relações comerciais entre a China e os Estados Unidos. Este foi o foco da discussão tida num painel de analistas do ASEAN Gaming Summit 2019, que terminou ontem em Manila, nas Filipinas. Uma das previsões é que os junkets podem cortar nos empréstimos a jogadores VIP ligados ao sector industrial, devido a preocupações com o aumento de tarifas e a possibilidade de estas resultarem em dívidas por saldar.

O painel constituído por Vitaly Umansky, da Bernstein Global Wealth Management, Praveen Choudhary da Morgan Stanley e Anil Daswani do Citigroup teve como objectivo discutir o futuro da indústria do jogo na Ásia.

Daswani referiu que as receitas do sector são imprevisíveis, e que toda a equação económica depende da relação comercial entre Washington e Pequim e da possibilidade de reconciliação. As oscilações dos resultados podem variar entre perdas de 15 por cento e lucros de 12 por cento em 2019.

O analista da Morgan Stanley destacou a mudança estratégica das concessionárias que apostaram com mais afinco no mercado de massas. Nesse aspecto, Praveen Choudhary acredita que a abertura da Ponte HKZM veio facilitar o acesso dos jogadores do Interior da China às mesas de jogo de Macau.

Já o especialista em jogo do Citigroup prevê que a liquidez dos jogadores que escolhem Macau para apostar está longe de se esgotar e que, a dar-se a recuperação, o segundo semestre de 2019 “pode ser enorme para região”.

No que diz respeito às concessões, o grupo de analistas foi unânime na expectativa de que as actuais operadoras vão ter as suas licenças renovadas em 2022. A ideia deixada é que a renovação é uma mera formalidade transformada numa grande novela. Foi também avançada, pelos três analistas, a possibilidade de haver uma nova concessão concedida a um operador local.

22 Mar 2019

Violação | Menor terá violado vítima enquanto o pai dormia

Um menor de 16 anos foi acusado de violação num caso insólito. O crime terá ocorrido enquanto o pai da vítima dormia na mesma casa. Exames forenses não revelaram sinais de violência, mas o atacante confessou o crime

[dropcap]U[/dropcap]m jovem de 16 anos foi detido depois de ter sido acusado de violar uma estudante de 17 anos. O caso foi apresentado, ontem, pela Polícia Judiciária (PJ) e terá acontecido no domingo, em casa da vítima enquanto o pai desta dormia. Segundo as autoridades, o alegado crime terá acontecido depois da jovem ter negado um pedido de namoro do rapaz de 16 anos.

Segundo a versão apresentada pela PJ, o rapaz era conhecido dos pais da vítima e deslocou-se à casa desta com o propósito de entregar compras feitas pela mãe da própria vítima. Nessa altura, além da jovem apenas o pai se encontrava em casa.

“Durante a visita, o suspeito pediu a vítima em namoro, mas foi recusado. Na sequência, a vítima foi para o quarto. Mas o suspeito ficou zangado, foi atrás dela e empurrou-a para o chão e tentou violá-la. Nessa altura, a vítima ainda conseguiu soltar-se”, contou o porta-voz da PJ. “Só que mais tarde, o suspeito voltou a empurrá-la para o chão, meteu o preservativo e violou-a”, relatou.

Após o ataque, o jovem arrependeu-se e pediu desculpas à vítima, que se tinha trancado no quarto. “Como a vítima estava trancada no quarto ele entrou através da janela, agarrou-se aos metais de protecção e conseguiu entrar. Nessa altura, o sujeito pediu desculpas à vítima”, contou, ontem, a força de segurança.

Queixa após dois dias

Só depois do jovem ter alegadamente tentado atacar a vítima duas vezes, ter entrado no quarto da rapariga pela janela e deixado o local é que o pai acordou. “Após o jovem ter saído do local, a vítima trancou-se no quarto a chorar. Isso fez com que o pai se apercebesse de que algo não estava bem. Contudo, a vítima não lhe contou nada”, informou a PJ.

Finalmente, na terça-feira, dois dias depois do ataque, a jovem contou aos progenitores que tinha sido violada. Nessa altura, os pais da vítima contactaram os do jovem, que lhes indicaram que o filho estava internado no hospital.

Assim, quando o atacante teve alta, na quarta-feira, foi detido pela PJ: “Depois de ter sido detido, ele confessou a prática do crime. Mas as análises forenses mostraram que não havia feridas óbvias no corpo da vítima [resultantes da violação]”, admitiu o porta-voz da PJ.

O caso foi reencaminhado para o Ministério Público (MP) e o jovem enfrenta uma acusação pelo crime de violação, punível com uma pena que pode ir dos 3 aos 12 anos de prisão.

22 Mar 2019

Extradição | Macau sem pedidos em mente para Hong Kong

Macau não tem, actualmente, intenção de pedir a Hong Kong a entrega de infractores em fuga. Já em sentido inverso, a ser aprovada a alteração à lei que regula a extradição na antiga colónia britânica, os pedidos da RAEHK vão ser analisados caso a caso pelo Ministério Público

[dropcap]A[/dropcap] secretária para a Administração e Justiça afirmou ontem que, actualmente, o Governo não tem interesse em pedir a Hong Kong a entrega de infractores em fuga para serem julgados pelos tribunais de Macau. Aos jornalistas, à saída de uma reunião da Assembleia Legislativa, Sónia Chan ressalvou, porém, que a revisão e entrada em vigor da lei na antiga colónia britânica “ainda necessita de tempo”.

Já em sentido inverso, ou seja, os pedidos de entrega de fugitivos por Macau a Hong Kong serão decididos “caso a caso” pelo Ministério Público, reiterou Sónia Chan, ao ser questionada sobre a proposta de alteração à lei que regula a extradição em Hong Kong, apresentada em Fevereiro. A revisão legislativa visa permitir a transferência recíproca de fugitivos para jurisdições com as quais Hong Kong não tem tratados de extradição, incluindo Macau, Taiwan e China.

Colarinho branco de fora

É expectável que o diploma, que tem gerado controvérsia na região vizinha principalmente pelo receio de que abra caminho à entrega à China de pessoas procuradas por motivos políticos, seja votado ainda durante a actual sessão legislativa que termina no próximo mês de Julho.

À luz do plano delineado pelo Governo de Hong Kong, num estágio inicial, cabe ao Chefe do Executivo decidir se autoriza a transferência do infractor em fuga, mas a última palavra compete aos tribunais.

A alteração à lei foi desencadeada na sequência do homicídio de uma mulher de Hong Kong em Taiwan no ano passado, dado que o principal suspeito regressou a Hong Kong ficando fora do alcance das autoridades da Ilha Formosa.

Esta semana foram divulgadas informações dando conta de que o Executivo de Hong Kong vai considerar a possibilidade de eliminar da proposta uma série de crimes de colarinho branco na alteração à lei que regula a extradição.

22 Mar 2019